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Padre Antônio Vieira – resumo Biográfico

Por causa dos numerosos escritos (cartas e sermões) do padre Antônio Vieira é
possível organizar a cronologia de sua vida e seguir muitos de seus passos. Padre Vieira
era considerado alto para a época, moreno, rosto comprido, barba e cabelo abundante
“que nunca perdeu, nevando-se-lhe todo na velhice”. 1 Vestia-se como suas várias funções
exigiam: de civil nas cortes protestantes; de batina preta nas missões da Amazónia.2
Em sua espiritualidade estavam incorporados o amor a Nossa Senhora e à Paixão
de Cristo. Em sua vida sobressaem: o amor à pátria, à Igreja (defendendo sua doutrina e
moral), à Companhia de Jesus e à missão, a luta contra os escravagistas e os estilos da
Inquisição e, por fim, o grande gênio literário que revelou ser desde cedo. 3 Infelizmente,
em certo momento de sua vida, com seu espírito (talvez exageradamente) patriótico,
parece ter aderido a profecias milenaristas sobre o estabelecimento de um império
português de 1000 anos antes da vinda do anticristo.4
Nasceu a 6 de fevereiro de 1608 em Lisboa. Veio com os pais para o Brasil com
apenas 6 anos. Estudando no Colégio da Baía decide entrar para a Companhia em 5 de
maio de 1623.5 Em 1625, aos 17 anos fez o voto de gastar a vida na conversão dos gentios
e para isso se dedicou à língua geral e de Angola.6 Deu aula nos Colégios da Baía e
Pernambuco e foi ordenado sacerdote em 10 de dezembro de 1634.7
Trabalhou nas aldeias da Bahia e prestou serviços durante a invasão holandesa. No
Brasil, seus sermões e oratória logo ficaram famosos e assim que as notícias da
Restauração de Portugal (em 1 de dezembro de 1640) chegaram aqui, foi enviado pelo
Vice-rei (como era chamado o governador geral do Brasil nessa época) numa missão
gratulatória, para prestar homenagem a D. João IV. Padre Antônio Vieira conquistou e
logo tornou-se amigo e conselheiro do rei, D João IV, sendo nomeado pregador régio8.
El-rei o ocupou “em diversas embaixadas em França, Inglaterra, Holanda e Roma. Nesta
época da sua vida pública, em que lhe não faltaram combates e emulações violentas,
Vieira revelou-se também decidido defensor dos cristãos novos, cujo comércio tinha por
útil e necessário à Restauração de Portugal.” 9
Em 1643 escreveu uma proposta a D. João IV, falando da miséria em que se
encontrava o Reino e da necessidade de admitir os judeus mercadores que se tinham
espalhado pela Europa (por causa da inquisição de Portugal). Padre Vieira defendia uma
inquisição ao estilo da que se via na Itália.10 Nessa mesma proposta de 1643, o sacerdote
falava do desenvolvimento do comércio e da criação de Companhias de Comércio, idéia
que seis anos depois se concretizaria, com a criação da Companhia de Comércio do Brasil,
que foi de grande proveito ao reino e à reconquista de Pernambuco. Porém, essas
propostas, que deveriam ficar ocultas, acabaram sendo divulgadas e tornadas conhecidas
por todos. O apoio aos judeus trouxe grande preocupação aos jesuítas, que temiam
complicações nas relações entre a Companhia de Jesus e a Inquisição. Pensou-se em
algum castigo, mas o rei o defendeu11, enviando-o à Haia, para negociar a paz com
Holanda,12 onde mais uma vez manifestou suas opiniões, ao se encontrar com as
comunidades judaicas holandesas. 13
"Continuava, pois, sem solução a questão de Holanda. Toda ela consistia em evitar
a guerra. Quanto a Pernambuco, ponto nevrálgico da questão, as soluções então visíveis
eram apenas duas: ou compra ou entrega. Correspondendo a estas preocupações, a convite
de El-Rei, Vieira redigiu dois pareceres: Parecer sobre a compra de Pernambuco aos
Holandeses, 14 de Março de 1647; e, se a compra se não pudesse efetuar, a entrega: Papel
que fez o Padre Vieira a favor da entrega" 14 [Papel Forte].I
Como as coisas ficaram indecisas em Haia (por causa da Insurreição Pernambucana
e porque os holandeses desconfiaram do jogo duplo de Portugal, de negociar na Europa
e ajudar a Insurreição), Vieira foi enviado à França para outra negociação,15 o que
demonstra a confiança do rei no sacerdote.
Quando retornou à Lisboa, a inquisição o esperava, por causa das denúncias sobre
sua defesa dos judeus e sobre algumas características duvidosas de seus sermões.16 Para
o padre Antônio Vieira, 1649 foi o ano da crise. O superior da Companhia ordenara que
ele buscasse outra ordem religiosa. El-rei lhe ofereceu a chance de se tornar bispo, mas
ele não quis. Imploraria a permanência na Companhia, mesmo que fosse como simples
servo.17 D. João IV, sentindo-se ofendido pela decisão (já que os motivos da condenação
estavam relacionados com o serviço prestado ao reino de Portugal), proíbe que se toque
no assunto e Vieira acabou permanecendo onde estava18. No mesmo ano, foi também o
apogeu de sua vida política, por causa da criação da Companhia do Comércio, que prestou
grande serviço à reconquista de Pernambuco. Também em 1649, o provincial do Brasil
pedia missionários para trabalhar no Maranhão, pois os três que lá estavam tinham sido

I
Há quem diga que o padre Antônio Vieira era favorável à entrega de Pernambuco aos holandeses. O padre
Serafim Leite defende que Vieira apenas seguia o plano de dissimulação de D. João IV. O próprio padre
Vieira defendeu-se anos mais tarde, dizendo que jamais aceitou “que nem um só palmo de terra déssemos
aos Holandeses”. As propostas do rei que pudessem soar contra o Brasil, não passavam de estratégia. O
primeiro a levantar a ideia de entrega e de compra de Pernambuco foi Gaspar Dias Ferreira - (Leite 5, p.
407) – O papel forte datava de 1647, e foi escrito a pedido do rei. Pernambuco já havia mostrado que não
iria aceitar o jugo holandês e D. João IV, em janeiro do mesmo ano, ordena que se enviasse reforços aos
insurretos - Para entender melhor o assunto, ver Serafim Leite, volume 5 p. 405 a 413.
mortos pelos índios.19 Com grande custo, D. João IV, que era muito afeiçoado a Vieira,
permite sua partida.20 “Em 1652 embarcou para as missões do Maranhão e Pará, com o
cargo de Superior e depois Visitador”. 21
Vimos como logo após a chegada dos missionários ao Maranhão, o clima de revolta
aumentou, por causa das novas leis. Vimos também como Vieira tentou acalmar a
situação através dos seus sermões. Podemos pensar, “Por que os missionários
simplesmente não abandonavam uma terra tão ingrata? Por que não iam para outras
missões onde fossem melhor tratados? Afinal, índios havia por todo o Brasil”. Apesar de
sua principal missão ser a catequese do gentio, os missionários também se preocupavam
com a salvação dos portugueses.22 Padre Antônio Vieira suportava com paciência e
escreve sobre as dificuldades: "esta mesma perseguição devia animar mais nossa
confiança, pois o demônio nunca procura estorvar senão onde prevê alguma coisa que
temer!"23 Ou seja, se as dificuldades eram grandes, era porque o demônio sabia que o
fruto da missão seria grande.
Por causa da luta pela liberdade dos índios, os jesuítas foram expulsos e Vieira
enviado para a Europa, no motim de 1661. Em Lisboa, quando as coisas se encaminhavam
para a volta dos missionários em 1662, uma revolução se instalou no palácio, tirando a
regência da rainha regente Dona Luísa, que apoiava Vieira. O regente que assumiu em
seu lugar, D. Afonso VI, mandou exilar todos os que se tinham colocado ao lado de Dona
Luísa, por isso, padre Vieira foi deportado para o Porto e só não foi enviado às missões
na Índia Orientais por estar com a saúde debilitada.24 Foi denunciado à Inquisição por
causa de diversos escritosII e acabou sendo preso e enviado à Coimbra em 1665.25 Quando
D. Pedro II (de Portugal) finalmente subiu ao poder em 1668, Vieira foi libertado.
Conseguiu ir à Roma, em 1669, para se defender das acusações da Inquisição.26 “Aí
deslumbrou a Corte pontifícia com sermões e discursos, e persistiu no combate contra os
estilos da Inquisição portuguesa.”27 Alcançou sucesso em sua defesa e saiu de Roma em
1675 com um documento do papa que o isentava de todas as inquisições do mundo28,
após se retratar de seus erros.29

II
Principalmente a referência ao Quinto Império, uma crença profética milenarista, que proclamava o
estabelecimento do Quinto Império, que seria português, antes da vinda do Anticristo. Como bem disse
o professor Sidney Silveira sobre a ortodoxia dos sermões do Padre Vieira, o ideal “é filtrarmos a
pitoresca espécie de sebastianismo de Vieira e ficarmos com o que, em sua obra, não derroga a fé.”.
Leia mais sobre o Assunto em: https://speminaliumnunquam.blogspot.com/2017/03/sidney-silveira-
sobre-ortodoxia-do-pe.html
O esvaziamento das aldeias no Pará e Maranhão clamava por uma solução,30 Vieira,
que voltara a ter prestígio na corte e a ser ouvido, inspirou a nova lei de abril de 1680.31
Mas após a criação da Companhia do Comércio do Maranhão, que não teve bons
resultados, os jesuítas voltaram a ser expulsos do Estado.
Padre Antônio Vieira “nunca perdeu de vista a Missão do Maranhão, onde desejava
ir acabar a vida e o pediu expressamente em 1679. E, enfim, embarcou em 168l para a
sua Província do Brasil, onde no Colégio da Bahia e sobretudo na Quinta do Tanque,
junto da mesma cidade, viveu os últimos anos da longa vida, que Deus lhe deu, de quase
90 anos, ocupado na preparação para a imprensa das suas obras, e ainda com o ofício de
Visitador Geral do Brasil e do Maranhão, com faculdade de o ser, sem sair da Baía.” 32
Este último ofício, o recebeu já aos 80 anos. Continuou lutando pela liberdade dos
índios, vimos seu voto quando em São Paulo lhe pediram instruções sobre como proceder
na administração dos índios. Poucos meses após assumir o novo cargo, recomeçou a luta,
escrevendo instruções para o Maranhão, para que não se cometessem os velhos e
conhecidos abusos em cima das brechas da lei.33
No entanto, com o tempo, a Companhia de Jesus no Brasil acabou cedendo a
respeito da questão da escravização dos índios e perdendo autoridade.34 Isso porque, com
a necessidade de mais missionários, padres estrangeiros (não eram portugueses nem de
Portugal, nem do Brasil) começaram a vir para o Brasil, de tal modo que ao final do
século XVII, já havia uma preocupação na corte e entre os jesuítas portugueses sobre a
quantidade de missionários estrangeiros no Brasil. 35
No geral estes padres estrangeiros, que não eram muito afeitos à catequese nas
aldeias, muito menos na selva, acabaram se ocupando mais da formação, assumindo
cargos nos colégios e nas cidades, restando aos missionários portugueses as missões.
Dessa forma, começava a surgir duas classes de jesuítas no Brasil: a das aldeias
(geralmente portugueses) e a das cidades (geralmente estrangeiros), estes últimos, por não
lidarem diretamente com os índios, não se colocavam contra sua escravização com a
mesma intensidade que os portugueses.36
O rei português, preocupado com a questão dos estrangeiros, tomou algumas
medidas e em 1693 enviou certas ordens ao Brasil: “1º Que os estrangeiros não fossem
superiores das Casas, Colégios ou Missões; 2º que não se permitisse aos Padres
estrangeiros ir para o Brasil; 3º que não fossem Mestres de Noviços nem sócios ou
Secretários do Provincial.”37 Como a maioria dos cargos eram ocupados por missionários
estrangeiros, as ordens não foram totalmente obedecidas. Padre Antônio Vieira estava
plenamente de acordo com o rei, e sendo uma figura importante, era como se liderasse
um “partido português” contra a escravidão no Brasil. Decidiu-se então eleger um
representante para tratar de assuntos internos e da questão dos índios com o padre geral
dos Jesuítas, em Roma. Padre Vieira e um outro sacerdote acabaram acusados
injustamente de “fazer campanha” e foram punidos, sendo privados de votar e de serem
eleitos. Dessa forma, um sacerdote que se colocava firmemente contra Vieira acabou
sendo escolhido.38
Em 1694, padre Antônio Vieira escreve ao geral explicando a situação, e consegue
dele a promessa do restabelecimento de sua reputação e da missão no Brasil39. Entretanto,
após a morte do sacerdote e tendo assumido um novo padre geral na Companhia de Jesus
que também não tinha conhecimento das características da catequese indígena, as
questões da escravidão voltaram a se afrouxar e a Companhia acabou perdendo autoridade
nesse campo. 40
“Entre as suas virtudes está a de ter recusado a honra da mitra episcopal, para se
conservar fiel à vocação num momento difícil da sua vida religiosa. Os dotes literários,
de propriedade, pureza, vivacidade e energia, asseguraram-lhe a imortalidade: é grande
entre os oradores de todas as nações, e considerado o maior escritor da língua portuguesa
em prosaIII. Faleceu, a 18 de Julho de 1697, no Colégio da Baía. 41

Sugestão de Vídeo para os maiores:


https://www.youtube.com/watch?v=qXp6fhHNjQU&t=1187s

III
“Vieira está para a prosa em língua portuguesa, assim como Luís de Camões está para o verso
português, é o cume” prof. Sérgio Pachá – https://www.youtube.com/watch?v=qXp6fhHNjQU&t=1187s
Bibliografia

1
Leite 7, p. 90
2
Leite 7, p. 90
3
Leite 7, p. 91
4
Silveira, https://speminaliumnunquam.blogspot.com/2017/03/sidney-silveira-sobre-ortodoxia-do-
pe.html
5
Leite 9, p. 192
6
Leite 4, p. 6
7
Leite 9, p. 192
8
Leite 4, p. 9
9
Leite 9, p. 192
10
Leite 4, p. 10
11
Leite 4, p. 11
12
Leite 4, p. 12
13
Leite 4, p. 13
14
Leite 4, p. 13
15
Leite 4, p. 13
16
Leite 4, p. 14
17
Leite 4, p. 16
18
Leite 9, p. 403
19
Leite 4, p. 20
20
Leite 4, p. 34-40
21
Leite 9, p. 193
22
Leite 4, p. 49
23
Leite 4, p. 48
24
Leite 4, p. 60
25
Leite 9, p. 193
26
Leite 4, p. 62
27
Leite 9, p. 193
28
Leite 4, p. 62
29
Silveira, https://speminaliumnunquam.blogspot.com/2017/03/sidney-silveira-sobre-ortodoxia-do-
pe.html
30
Leite 4, p. 62
31
Leite 4, p. 62
32
Leite 9, p. 193
33
Leite 7, p. 75
34
Leite 7, p. 87
35
Leite 7, p. 97
36
Leite 7, p. 101
37
Leite 7, p. 103 e 104
38
Leite 7, p. 104 e 105
39
Leite 7, p. 107 e 108
40
Leite 7, p. 111
41
Leite 9, p. 193

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