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GRADUAÇÃO

Unicesumar

PRINCÍPIOS
TEÓRICOS DA
PSICOPEDAGOGIA

Professora Me. Raquel de Araújo Bomfim Garcia

Acesse o seu livro também disponível na versão digital.


Reitor
Wilson de Matos Silva
Vice-Reitor
Wilson de Matos Silva Filho
Pró-Reitor Executivo de EAD
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Pró-Reitor de Ensino de EAD
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Presidente da Mantenedora
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NEAD - Núcleo de Educação a Distância


Diretoria Executiva
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James Prestes
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Diretoria de Graduação e Pós-graduação
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Designer Educacional
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Projeto Gráfico
C397 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE MARINGÁ. Núcleo de Educação a Jaime de Marchi Junior
Distância; GARCIA, Raquel de Araújo Bomfim. José Jhonny Coelho

Princípios Teóricos da Psicopedagogia. Raquel de Araújo Arte Capa
Bomfim Garcia. Arthur Cantareli Silva
Maringá-Pr.: Unicesumar, 2019. Ilustração Capa
192 p. Bruno Pardinho
“Graduação - EaD”.
Editoração
1. Psicopedagogia. 2. Aprendizagem. 3. Avaliação 4. EaD. I. Título. Humberto Garcia da Silva
Qualidade Textual
ISBN 978-85-459-1927-8 Cindy Mayumi Okamoto Luca
CDD - 22 ed. 370.15
CIP - NBR 12899 - AACR/2 Ilustração
Bruno Pardinho

Ficha catalográfica elaborada pelo bibliotecário


João Vivaldo de Souza - CRB-8 - 6828
Impresso por:
Em um mundo global e dinâmico, nós trabalhamos
com princípios éticos e profissionalismo, não so-
mente para oferecer uma educação de qualidade,
mas, acima de tudo, para gerar uma conversão in-
tegral das pessoas ao conhecimento. Baseamo-nos
em 4 pilares: intelectual, profissional, emocional e
espiritual.
Iniciamos a Unicesumar em 1990, com dois cursos
de graduação e 180 alunos. Hoje, temos mais de
100 mil estudantes espalhados em todo o Brasil:
nos quatro campi presenciais (Maringá, Curitiba,
Ponta Grossa e Londrina) e em mais de 300 polos
EAD no país, com dezenas de cursos de graduação e
pós-graduação. Produzimos e revisamos 500 livros
e distribuímos mais de 500 mil exemplares por
ano. Somos reconhecidos pelo MEC como uma
instituição de excelência, com IGC 4 em 7 anos
consecutivos. Estamos entre os 10 maiores grupos
educacionais do Brasil.
A rapidez do mundo moderno exige dos educa-
dores soluções inteligentes para as necessidades
de todos. Para continuar relevante, a instituição
de educação precisa ter pelo menos três virtudes:
inovação, coragem e compromisso com a quali-
dade. Por isso, desenvolvemos, para os cursos de
Engenharia, metodologias ativas, as quais visam
reunir o melhor do ensino presencial e a distância.
Tudo isso para honrarmos a nossa missão que é
promover a educação de qualidade nas diferentes
áreas do conhecimento, formando profissionais
cidadãos que contribuam para o desenvolvimento
de uma sociedade justa e solidária.
Vamos juntos!
Seja bem-vindo(a), caro(a) acadêmico(a)! Você está
iniciando um processo de transformação, pois quan-
do investimos em nossa formação, seja ela pessoal
ou profissional, nos transformamos e, consequente-
mente, transformamos também a sociedade na qual
estamos inseridos. De que forma o fazemos? Crian-
do oportunidades e/ou estabelecendo mudanças
capazes de alcançar um nível de desenvolvimento
compatível com os desafios que surgem no mundo
contemporâneo.
O Centro Universitário Cesumar mediante o Núcleo de
Educação a Distância, o(a) acompanhará durante todo
este processo, pois conforme Freire (1996): “Os homens
se educam juntos, na transformação do mundo”.
Os materiais produzidos oferecem linguagem dialógi-
ca e encontram-se integrados à proposta pedagógica,
contribuindo no processo educacional, complemen-
tando sua formação profissional, desenvolvendo com-
petências e habilidades, e aplicando conceitos teóricos
em situação de realidade, de maneira a inseri-lo no
mercado de trabalho. Ou seja, estes materiais têm
como principal objetivo “provocar uma aproximação
entre você e o conteúdo”, desta forma possibilita o
desenvolvimento da autonomia em busca dos conhe-
cimentos necessários para a sua formação pessoal e
profissional.
Portanto, nossa distância nesse processo de cresci-
mento e construção do conhecimento deve ser apenas
geográfica. Utilize os diversos recursos pedagógicos
que o Centro Universitário Cesumar lhe possibilita.
Ou seja, acesse regularmente o Studeo, que é o seu
Ambiente Virtual de Aprendizagem, interaja nos fó-
runs e enquetes, assista às aulas ao vivo e participe
das discussões. Além disso, lembre-se que existe uma
equipe de professores e tutores que se encontra dis-
ponível para sanar suas dúvidas e auxiliá-lo(a) em
seu processo de aprendizagem, possibilitando-lhe
trilhar com tranquilidade e segurança sua trajetória
acadêmica.
CURRÍCULO

Professora Me. Raquel de Araújo Bomfim Garcia


Mestre em Psicologia pelo Programa de Pós-Graduação em Psicologia da
Universidade Estadual de Maringá (UEM), em 2016. Especialização em Educação
Especial, Inclusão e Libras pela Faculdade de Ensino Superior Dom Bosco (FDB), em
2011. Título Profissional de Especialista em Psicologia Escolar/Educacional pelo
Conselho Regional de Psicologia (CRP 8ª Região), em 2001. Possui graduação em
Psicologia pela Universidade Estadual de Maringá (UEM), em 1993. Atualmente,
é psicóloga na Associação Norte Paranaense de Reabilitação (ANPR) e professora
do curso de Licenciatura em Pedagogia na EAD da Unicesumar.

Para informações mais detalhadas sobre a atuação profissional, pesquisas e


publicações, acesse seu currículo, disponível no endereço a seguir:

http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?id=K8758668U9
APRESENTAÇÃO

PRINCÍPIOS TEÓRICOS DA PSICOPEDAGOGIA

SEJA BEM-VINDO(A)!
Seja bem-vindo(a), aluno(a)!
Com este material de apoio, estamos iniciando nossos estudos sobre os princípios teó-
ricos da Psicopedagogia, que tem, como objetivo, oferecer os subsídios fundamentais
para que você possa conhecer o universo da psicopedagogia. Quando você escolheu
esse curso de bacharelado, acredito que tenha buscado conhecer um pouco sobre o
trabalho desenvolvido pelo psicopedagogo, não é mesmo? Diante disso, nossa discipli-
na vem esclarecer e desmistificar a psicopedagogia, fundamentando-a teoricamente e
apresentando a prática.
Para isso, iniciamos os nossos estudos fazendo um resgate histórico, a fim de que com-
preenda como a psicopedagogia foi se estruturando ao longo dos anos, as influências
que recebeu no processo de construção de sua área de atuação em diversos países e os
princípios éticos que permeiam as suas atividades. Assim, a Unidade I busca lhe apre-
sentar a psicopedagogia, esclarecendo não só a sua atuação, mas também as teorias
que, hoje, são referências no trabalho psicopedagógico no Brasil.
Na Unidade II, selecionamos alguns temas que fundamentam todas as atividades do
psicopedagogo, visto que a aprendizagem é o foco do seu trabalho e o conhecimento
sobre a interdisciplinaridade, ou seja, as interfaces com outras áreas de conhecimento,
são fundamentais em sua ação. A discussão se encerra com uma reflexão sobre o fracas-
so escolar, partindo de algumas concepções e vertentes.
Partimos, então, para a compreensão dos fatores que interferem no processo de apren-
dizagem do sujeito, tema de grande relevância para a psicopedagogia, visto que muito
da sua atuação está voltada para amenizar e superar essas dificuldades. Na Unidade
III, vamos diferenciar as dificuldades de aprendizagem dos transtornos específicos de
aprendizagem, caracterizando cada um deles. Também, serão enfatizadas outras disfun-
ções que levam a criação de alterações no processo de aprendizagem.
Na Unidade IV, passamos para a parte mais prática do trabalho psicopedagógico tanto
no contexto clínico quanto institucional: a avaliação. Essa atividade psicopedagógica é
de suma importância, visto que é a partir dela que vai ser organizado todo o trabalho
de intervenção, bem como os encaminhamentos. Nesse processo, destacamos a obser-
vação como um ato essencial, já que estar atento a todas as informações, tanto verbais
quanto não verbais, possibilita uma melhor compreensão acerca dos resultados.
Terminamos nosso livro discorrendo sobre a importância da mediação no trabalho psi-
copedagógico, pois, dela, dependerá todo o processo de intervenção. Na Unidade V,
atribuímos destaque para algumas estratégias de intervenção no trabalho psicopeda-
gógico, evidenciando a relevância da ludicidade tanto no trabalho da psicomotricidade
e da expressão dramática quanto na caixa de trabalho psicopedagógico. Finalizamos
com a discussão sobre o trabalho de intervenção clínica e institucional.
APRESENTAÇÃO

Diante desse conhecimento, você poderá ter uma visão fundamentada acerca de
todos os aspectos principais que norteiam a psicopedagogia, sendo a base para que
você busque cada vez mais o aprofundamento teórico-prático para a sua atuação
profissional. Convido-lhe a descobrir o mundo da psicopedagogia e espero que essa
disciplina possa despertar ainda mais o seu interesse por esse trabalho tão impor-
tante e fascinante acerca da aprendizagem humana.
Aproveite e tenha um ótimo estudo!
09
SUMÁRIO

UNIDADE I

FUNDAMENTOS TEÓRICOS DA PSICOPEDAGOGIA

15 Introdução

16 Processo Histórico da Psicopedagogia

23 Conhecendo a Psicopedagogia

31 Correntes Teóricas que Influenciam a Psicopedagogia

38 Considerações Finais

45 Referências

47 Gabarito

UNIDADE II

TEMAS FUNDAMENTAIS PARA A PSICOPEDAGOGIA

51 Introdução

52 Temas Fundamentais para a Psicopedagogia

52 Psicopedagogia e a Aprendizagem

60 Psicopedagogia: Desenvolvendo a Interdisciplinaridade

67 A Visão da Psicopedagogia Sobre o Fracasso Escolar

74 Considerações Finais

84 Referências

85 Gabarito
10
SUMÁRIO

UNIDADE III

O QUE DIFICULTA O PROCESSO DE APRENDIZAGEM

89 Introdução

90 O que Dificulta o Processo de Aprendizagem

90 Dificuldades de Aprendizagem

93 Transtorno Específico de Aprendizagem 

96 Conhecendo os Transtornos Específicos de Aprendizagem

105 Outras Disfunções que Interferem na Aprendizagem

109 Considerações Finais

116 Referências

119 Gabarito

UNIDADE IV

AVALIAÇÃO PSICOPEDAGÓGICA

123 Introdução

124 Diretrizes Iniciais do Processo da Avaliação Psicopedagógica

130 Avaliação Psicopedagógica Clínica

133 Avaliação Psicopedagógica Institucional

139 A Importância da Observação e dos Encaminhamentos

141 Considerações Finais

148 Referências

149 Gabarito
11
SUMÁRIO

UNIDADE V

INTERVENÇÃO PSICOPEDAGÓGICA

153 Introdução

154 O Papel do Psicopedagogo como Mediador

162 Estratégias de Intervenção Utilizadas pela Psicopedagogia

173 Intervenção Clínica e Institucional

175 Considerações Finais

182 Referências

185 Gabarito

186 Conclusão
Professora Me. Raquel de Araújo Bomfim Garcia

FUNDAMENTOS TEÓRICOS

I
UNIDADE
DA PSICOPEDAGOGIA

Objetivos de Aprendizagem
■■ Compreender a organização da psicopedagogia ao longo da história.
■■ Assimilar o conceito de psicopedagogia e seu campo de atuação,
esclarecendo os princípios éticos que a organizam.
■■ Apresentar referências teóricas que norteiam o trabalho
psicopedagógico no Brasil.

Plano de Estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade:
■■ Processo histórico da Psicopedagogia
■■ Conhecendo a Psicopedagogia
■■ Correntes teóricas que influenciam a Psicopedagogia
15

INTRODUÇÃO

Caro(a) aluno(a), nesta unidade, quero lhe apresentar a psicopedagogia. É isso


mesmo! Vamos iniciar o nosso estudo fazendo um resgate histórico de como a
psicopedagogia foi sendo construída ao longo da história, mediante informações
sobre a sua origem na França, passando pela Argentina, até chegar ao Brasil. Esse
conhecimento possibilitará a sua compreensão sobre o caminho percorrido na
construção do saber psicopedagógico.
Serão destacados, também, os fundamentos da psicopedagogia, a fim de eviden-
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

ciar seu caráter prático alinhado à teoria, demonstrando seu enfoque preventivo
e terapêutico. Isso é importante para que você conheça a amplitude de sua atu-
ação, mediante a exposição da prática psicopedagógica em uma perspectiva
clínica e institucional.
Todo o trabalho desenvolvido pelo psicopedagogo, seja na clínica, escola, empresa
ou em outros locais, deve sempre estar pautado em atitudes que correspondam
ao que está estabelecido no Código de Ética. A compreensão sobre a ética pro-
fissional é fundamental para que você possa exercer as suas atividades dentro
dos parâmetros estabelecidos.
Partindo desse conhecimento prévio, vamos conhecer as teorias que têm ofe-
recido subsídios para a efetivação de uma prática eficaz. As teorias evidenciadas
são o construtivismo, a psicanálise, o associacionismo e a epistemologia conver-
gente. A partir do contato com essas teorias, você poderá verificar a contribuição
delas para a compreensão do sujeito em uma perspectiva psicopedagógica.
Iniciemos juntos essa jornada rumo ao conhecimento das primícias da
psicopedagogia, para que você possa compreender as bases em que ela se fun-
damenta. Bons estudos!

Introdução
16 UNIDADE I

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
PROCESSO HISTÓRICO DA PSICOPEDAGOGIA

Quando conhecemos uma pessoa e temos interesse por ela, surge a necessidade
de saber qual é a sua história, não é mesmo? Com o conhecimento científico
não é diferente, portanto, conhecer os fatos que levaram ao surgimento da psi-
copedagogia nos aproxima do entendimento acerca da sua importância para a
sociedade. Assim, convido-lhe a fazer uma viagem pela história da psicopeda-
gogia, iniciando na Europa, passando pela Argentina, até chegar ao Brasil.

ONDE TUDO COMEÇOU: PSICOPEDAGOGIA NA EUROPA

O surgimento dos primeiros centros de orientação educacional infantil aconteceu


na Europa e, por esse motivo, ela é conhecida como o berço da psicopedago-
gia (CLARO, 2018). De acordo com Mery (1985), foi no século XIX que surgiu
a necessidade de entender e oferecer atendimento para pessoas que apresenta-
vam alguma alteração que comprometesse a aprendizagem. Para tanto, a autora
ressalta que os responsáveis pelo trabalho com esses sujeitos adotaram uma pers-
pectiva médica e pedagógica.

FUNDAMENTOS TEÓRICOS DA PSICOPEDAGOGIA


17

Bossa (2007) explica que, a princípio, os problemas de aprendizagem eram


compreendidos em uma dimensão orgânica pelos médicos, educadores e tera-
peutas. A exemplo disso, a psicologia, naquela época, iniciava as avaliações por
meio de testes que visavam verificar a capacidade intelectual do indivíduo, bus-
cando saber se tal competência resultava de aptidões naturais e hereditárias. No
entanto, especificamente na escola, essas avaliações buscavam compreender as
diferenças no desempenho dos alunos.
Você percebeu como a questão orgânica é forte nos primeiros passos da
psicopedagogia? Isso realmente é um fato, já que a psicopedagoga Janine Mery
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

empregava o termo psicopedagogia curativa para explicar a atividade terapêu-


tica que visava tratar as questões relacionadas aos problemas escolares por meio
de recursos pedagógicos e psicológicos (BOSSA, 2007).
Mesmo diante desses fatos, o termo psicopedagogia foi utilizado pela pri-
meira vez na literatura em 1908, no livro chamado Essais de Pédologie Générale,
do autor G. Persigout. Entretanto, foi em 1911 que o italiano Emílio Galli escre-
veu um artigo explicando as etapas para se realizar um exame psicopedagógico,
esclarecendo que ele deve ser realizado pelo psicopedagogo (CLARO, 2018).
A sistematização da psicopedagogia na Europa ganhou força na década de
1930, com movimentos que buscavam a reeducação das crianças, em especial as
que apresentavam deficiência, a orientação psicopedagógica e a renovação peda-
gógica. Contudo, esses estudos foram comprometidos devido à Segunda Guerra
Mundial (CLARO, 2018).
Apesar da preocupação com a aprendizagem, segundo Mery (1985), os pri-
meiros centros psicopedagógicos fundados por Juliette Favez-Boutenier e George
Mauco, a partir de 1946, visavam ao tratamento de comportamentos que não
eram aceitos socialmente, buscando a sua adequação. O direcionamento era
médico e pedagógico, tentando integrar os conhecimentos relacionados a psi-
cologia, pedagogia e psicanálise (BOSSA, 2007).
Sendo assim, o que entendemos hoje por psicopedagogia tem suas origens
na Pedagogia Curativa (DEBESSE, 1948). Esse termo passou a ser usado a par-
tir de 1948, na França, e consistia em ser um método de readaptação pedagógica
do educando, cujo objetivo era o de possibilitar a aquisição de conhecimentos e
o desenvolvimento de sua personalidade (COSTA; PINTO; ANDRADE,2013).

Processo Histórico da Psicopedagogia


18 UNIDADE I

O centro de psicopedagogia de Estrasburgo, na França, fazia uso da Pedagogia


Curativa. Nele, eram oferecidos atendimentos individuais e em grupo, com o
intuito de ajudar o sujeito não só em sua readaptação pedagógica, mas também
no desenvolvimento de sua personalidade (BOSSA, 2007).
As ideias europeias sobre a psicopedagogia tiveram grande influência nas
Américas, principalmente na Argentina, assim como estudaremos a seguir.

A PSICOPEDAGOGIA NA ARGENTINA: A ESTRUTURAÇÃO DA

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
PROFISSÃO

Quando trato acerca da psicopedagogia na América Latina, tenho, como grande


referência, a Argentina. Inspirada pelas ideias advindas da França, ela foi a pio-
neira nessa área e, inclusive, influenciou o trabalho psicopedagógico no Brasil
(CLARO, 2018). Tendo, como base, a literatura francesa, a psicopedagogia foi se
consolidando nesse país por meio da prática, para só posteriormente ser orga-
nizado um curso de graduação (FONTES, 2006).
A prática psicopedagógica desenvolveu-se devido aos profissionais de outras
formações que perceberam a necessidade de ocupar um espaço que até o momento
não era preenchido pelos psicólogos ou pedagogos, procurando minimizar o
fracasso escolar por meio da reeducação (CLARO, 2018). Nessa época, o traba-
lho realizado pelos psicopedagogos, de acordo com Bossa (2007), estava voltado
para as funções de memória, atenção, percepção, pensamento e motricidade, já
que o plano de tratamento visava vencer essas dificuldades.
A consolidação da psicopedagogia, todavia, enquanto profissão na Argentina,
aconteceu no ano de 1956, com a fundação do primeiro curso de graduação em
Psicopedagogia na cidade de Buenos Aires. Com isso, a partir do ano de 1970,
foram criados vários centros de saúde mental nos quais eram realizados diagnós-
ticos e tratamento, mudando o enfoque de reeducação para tratamento clínico
(PÖTTKER; LEONARDO, 2014 apud CLARO, 2018).
O processo histórico da psicopedagogia na Argentina pode ser dividido
em três períodos diferentes. O primeiro compreende de 1956 a 1961, no qual
a formação estava pautada na filosofia e na psicologia, e a psicopedagogia

FUNDAMENTOS TEÓRICOS DA PSICOPEDAGOGIA


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era considerada uma nova prática, cujo pré-requisito era o título de docente
(BOSSA, 2007).
Já o segundo período compreende de 1963 a 1969, momento em que a for-
mação do psicopedagogo teve influência da psicologia experimental, estando
direcionada para medição das funções afetivas e cognitivas. Além disso, nesse
período, ocorreram mudanças no Curso da Escola Normal (extinta em 1969), já
que foram inseridas disciplinas básicas para habilitar os que buscavam o título
de psicopedagogo e foi acrescido um ano na formação total. No entanto, é no
terceiro período, a partir de 1978, que o curso de graduação em Psicopedagogia
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

efetivou-se, sendo inseridas disciplinas voltadas para a função terapêutica e a


atuação em clínicas psicopedagógicas, passando a ter uma duração de cinco
anos (CLARO, 2018).

No ano de 1984, com a Resolução 2473/84 do Ministério Da Educação Ar-


gentina, foram estabelecidas, de maneira oficial, as funções do psicopeda-
gogo naquele país. Além disso, foi determinado que a prática clínica poderá
ser exercida apenas por licenciados.
Fonte: Renault (2006 apud COSTA; PINTO; ANDRADE, 2013).

Na atualidade, a atuação da psicopedagogia argentina pode ser dividida em


duas grandes áreas: educação e saúde. No que se refere à educação, o peda-
gogo tem um papel importante em minimizar o fracasso escolar tanto no
plano individual quanto no da instituição. Já na área de saúde, o trabalho do
psicopedagogo acontece em instituições, clínicas e em hospitais públicos e par-
ticulares (CLARO, 2018).
Na elaboração do diagnóstico, os psicopedagogos argentinos utilizam diversos
instrumentos, tais como avaliações pedagógicas, testes projetivos, testes psico-
motores, provas de inteligência, avaliação perceptomotora, provas de nível de
pensamento e hora do jogo psicopedagógica. Esses mecanismos possibilitam a
obtenção de uma compreensão sobre o paciente e sua problemática.

Processo Histórico da Psicopedagogia


20 UNIDADE I

Diante do exposto, é importante destacar um profissional argentino de grande


relevância para a psicopedagogia: Jorge Visca. Ele influenciou de forma decisiva
a história da psicopedagogia no Brasil, assim como veremos a seguir.

A PSICOPEDAGOGIA NO BRASIL: O DESAFIO

Você deve estar se perguntando: mas, no Brasil, será que aconteceu de maneira
diferente dos outros países? A verdade é que não foi diferente. A visão de que a

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
dificuldade de aprendizagem estava relacionada com problemas orgânicos foi
mantida por diversos anos, sendo decisiva no tratamento do fracasso escolar.
Isso ocorreu principalmente na década de 1970, período em que a causa dos
problemas de aprendizagem passou a ser relacionada com problemas neuroló-
gicos, cuja denominação atribuída foi a de Disfunção Cerebral Mínima (DCM),
tirando o foco dos problemas sociopedagógicos. Essa perspectiva patologizante
teve a sua origem na Europa, no século XIX (BOSSA, 2007).
Diante dessa realidade, iniciou-se a implantação dos cursos de especialistas
em psicopedagogia no Brasil, com foco na clínica médico-pedagógica, cuja dura-
ção era de dois anos. O primeiro curso de psicopedagogia do Instituto Sapientiae
(São Paulo) aconteceu no ano de 1979, sendo uma iniciativa da psicopedagoga
e psicodramatista Maria Alice Vassimon (FAGALI, 2007).

Ainda é muito comum a prática das escolas em pedirem uma avaliação mé-
dica para as famílias, a fim de verificar os motivos da não aprendizagem.
Muitas vezes, o aluno já chega ao atendimento psicopedagógico com histó-
rico de avaliações médicas.
(Genoveva Ribas Claro)

FUNDAMENTOS TEÓRICOS DA PSICOPEDAGOGIA


21

No entanto, a realidade da década de 1980 não se fez diferente: a demanda


de crianças com dificuldades de aprendizagem era muito alta e faltava pro-
fissionais para realizar um trabalho efetivo com elas (SCOZ; BARONE,
2007). Além disso, os profissionais pedagogos não conseguiam obter resul-
tados satisfatórios na solução dos problemas de aprendizagem (CLARO,
2018). Para tanto, foi nessa época que, segundo Pöttiker e Leonardo (2014
apud CLARO, 2018), estruturou-se a Associação de Psicopedagogia de São
Paulo, com o intuito de organizar o perfil profissional do psicopedagogo e
suas atribuições.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Por sua vez, o ano de 1984 foi bastante relevante para a psicopedagogia no
Brasil, pois foi criada a Associação Paulista de Psicopedagogia e aconteceu o I
Encontro de Psicopedagogos. Foi nesse encontro que foi definida a criação da
Associação Brasileira de Psicopedagogia (ABPp), que aconteceu no ano seguinte
(CLARO, 2018).

Figura 1 –Fita Mobius - Símbolo da Psicopedagogia


Fonte: ABPp ([2019], on-line)¹.

Processo Histórico da Psicopedagogia


22 UNIDADE I

Partindo dessa iniciativa, foram sendo organizadas associações de psicopeda-


gogia em diversos estados brasileiros, cujas ações eram fortalecidas a partir dos
Encontros de Psicopedagogos que aconteciam a cada dois anos. No ano de 1988,
houve o I Congresso de Psicopedagogos e os temas desses primeiros encontros
estavam voltados para a compreensão da identidade profissional, sua formação,
práxis, e entre outros temas de relevância para a psicopedagogia. Dessa forma,
tais congressos foram de grande relevância para o fortalecimento da psicopeda-
gogia (CLARO, 2018).
É importante ressaltar que a psicopedagogia no Brasil, na década de 1990,

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
teve grande influência do argentino Jorge Visca, que ministrou aulas em dife-
rentes cidades, principalmente na região Sul do país. Ele também criou centros
psicopedagógicos nas cidades de Campinas, Salvador, Curitiba e São Paulo. Em
Curitiba, implantou uma clínica comunitária, com o intuito de tratar proble-
mas de aprendizagem.
No final da década de 1990, outras psicopedagogas argentinas também
influenciaram a psicopedagogia no Brasil. Foram elas: Sara Paín e Alicia
Fernández. Em um momento de muitas revisões e organização da psicope-
dagogia brasileira, Alícia Fernandez “reforçou a importância da Psicanálise
para o sujeito que aprende na clínica psicopedagógica e introduziu a aborda-
gem da dinâmica familiar no entendimento dos problemas de aprendizagem”
(COSTA; PINTO; ANDRADE, 2013, p. 19). Ela também propôs atendimen-
tos em grupo para os psicopedagogos, a fim de que eles revissem o próprio
processo de aprendizagem.
Finalizando essa breve retrospectiva histórica, ressalto a importância da
Associação Brasileira de Psicopedagogia (ABPp), a qual, hoje, é a instituição que
apresenta as normativas para o trabalho do psicopedagogo. Em 2002, o psico-
pedagogo foi incluído na Classificação Brasileira de Ocupações, reconhecendo
seu trabalho por meio da Portaria Ministerial 391/2002.

FUNDAMENTOS TEÓRICOS DA PSICOPEDAGOGIA


23
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

CONHECENDO A PSICOPEDAGOGIA

Considerando seu conhecimento prévio, como você definiria a psicopedagogia?


A partir da história, podemos afirmar que a psicopedagogia teve a sua origem na
necessidade de buscar alternativas para solucionar os problemas ou dificuldades de
aprendizagem. Entretanto, será que ainda hoje persiste essa característica? Novos
desafios foram acrescentados? Como está o seu campo de atuação? Buscaremos,
neste estudo, conhecer melhor a psicopedagogia na atualidade.

PSICOPEDAGOGIA HOJE

O termo psicopedagogia, a princípio, estava apenas relacionado com a junção


da psicologia, em especial, da psicanálise, com a pedagogia. No entanto, na rea-
lidade, nos dias de hoje, essas duas áreas de conhecimento e prática continuam
sendo a base da psicopedagogia, mas recebem contribuições de outras teorias,
tais como: linguística, psicanálise, neuropsicologia, psicofisiologia, filosofia,
medicina e semiótica (BOSSA, 2007).

Conhecendo a Psicopedagogia
24 UNIDADE I

Alguns autores acreditam que a psicopedagogia surgiu para ocupar um espaço


que não estava sendo explorado nem pela psicologia, nem pela pedagogia, tal-
vez, por questões conceituais ou de atuação. Então, a psicopedagogia dedicou
seus estudos e prática para as dificuldades de aprendizagem e o fracasso esco-
lar (GRASSI, 2013).

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Será que foram apenas a psicologia e a pedagogia que não conseguiram
analisar as dificuldades de aprendizagem e o fracasso escolar? Ou será que
nenhuma área do conhecimento conseguiu realizar essa tarefa, abrindo es-
paço para que a psicopedagogia buscasse meios para resolver esta situação?
(Tânia Mara Grassi)

De acordo com Bossa (2007), a psicopedagogia fundamenta-se por meio da sua


prática enquanto campo de investigação da aprendizagem, pretendendo ser um
saber científico. Sendo assim, apresenta as suas especificidades ao ocupar-se dos
problemas de aprendizagem em uma perspectiva mais ampla, com a contribui-
ção de diferentes áreas de conhecimento.
Diante disso, é importante compreender que a psicopedagogia não se limita
a uma prática, mas é uma área de estudos que tem como objetivo o conheci-
mento da ação de aprender e ensinar, refletindo aspectos internos (próprios do
sujeito e da sua estrutura) e externos (relacionados ao contexto no qual o sujeito
encontra-se) da aprendizagem, compreendendo que eles estão inter-relaciona-
dos (NEVES, 1991 apud GRASSI, 2013).
Você pode perceber, com isso, que a psicopedagogia se preocupa em com-
preender o processo de aprendizagem como um todo, considerando os fatores
internos e externos. Desse modo, ela também abrange os aspectos do processo
de ensino (GRASSI, 2013).
Bossa (2007) destaca os estudos da psicopedagoga Kiguel, que define a apren-
dizagem humana como o objeto de estudo da psicopedagogia. Ela esclarece que,
para isso, é fundamental que o psicopedagogo tenha conhecimento acerca do

FUNDAMENTOS TEÓRICOS DA PSICOPEDAGOGIA


25

desenvolvimento normal e patológico, considerando a relevância do meio (famí-


lia, sociedade, escola) nesse processo.
A ação psicopedagógica, segundo Golbert (1985 apud GRASSI, 2013), pode
ser qualificada em dois enfoques: o preventivo e o terapêutico. Em outras pala-
vras, a sua atuação visa prevenir o surgimento de dificuldades de aprendizagem,
bem como o fracasso escolar, buscando estimular o desenvolvimento e a apren-
dizagem ao orientar todos os envolvidos no processo. Já a ação terapêutica
abrange os aspectos relacionados ao tratamento das dificuldades já estabeleci-
das, reduzindo os seus efeitos por meio da “identificação, análise, diagnóstico e
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

tratamento” (GOLBERT, 1985 apud GRASSI, 2013, p.130).


Para Abaurre (1990 apud GRASSI, 2013), o psicopedagogo realiza um tra-
balho de mediação com o aluno que apresenta dificuldades de aprendizagem,
investigando os motivos que estão prejudicando esse processo ao oferecer um
atendimento remedial para auxiliá-lo na superação dessas problemáticas.

Na visão de Rubinstein (1992 apud SILVA, 2012), essa remediação das dificul-
dades de aprendizagem foi um dos objetivos iniciais da psicopedagogia, a qual
buscava metodologias de intervenção que ajudassem na superação dessas dificul-
dades. No entanto, a autora explica que, com o tempo, o objeto da psicopedagogia
passa a ser mais amplo, envolvendo o entendimento do processo de aprendiza-
gem e a relação do aprendiz com ela. Assim, passou-se a investigar a etiologia
das dificuldades e a compreender o processo de aprendizagem de maneira mais
ampla, considerando os diferentes aspectos que a influenciam.

Conhecendo a Psicopedagogia
26 UNIDADE I

Ao explicar a psicopedagogia, Bossa (2007) esclarece que seu trabalho está


delimitado como: i) uma atividade prática; ii) um campo de investigação do
processo de aprendizagem; e iii) um saber científico. Para tanto, sob o enfoque
da atividade prática, a psicopedagogia busca, por meio de técnicas de inter-
venção, conhecer as causas das dificuldades de aprendizagem, procurando
estratégias para a sua resolução. O tratamento deve sempre ter uma conota-
ção preventiva. Nesse processo, o psicopedagogo fará uso de avaliações e de
intervenções, os quais são comuns tanto no âmbito da clínica quanto institu-
cional (CLARO, 2018).

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Apesar da psicopedagogia ter iniciado seus trabalhos no Brasil com um
enfoque terapêutico, buscando tratar clinicamente as dificuldades de aprendi-
zagem, hoje, foram agregados outros objetivos, nos quais a prevenção dessas
dificuldades e a integração dessas crianças são fundamentais (BOSSA, 2000
apud CLARO, 2018).
Quanto ao campo de investigação do processo de aprendizagem, a psico-
pedagogia está em um processo de construção teórico-prático que conta com
o embasamento de diferentes áreas de conhecimento, com teorias fundamen-
tadas na pedagogia, psicologia, neurociência, neurologia e entre outras. Todas
essas correntes auxiliam no processo de desenvolvimento e aprendizagem do
aluno (CLARO, 2018).
No campo do saber científico, a psicopedagogia, apesar de trabalhar em
uma perspectiva interdisciplinar, estudando as dificuldades de aprendizagem na
visão de diversas áreas de conhecimento, tem procurado, a cada ano, sistema-
tizar um modelo teórico-prático próprio, evidenciando seu objeto de estudo e
delineando seu campo de atuação. Sendo assim, muitos estudos têm sido publi-
cados, a fim de fundamentar a prática psicopedagógica (CLARO, 2018). Ainda
segundo o autor, na atualidade, o objeto de conhecimento da psicopedagogia
tem sido o ser cognoscente, o qual, claramente, é muito complexo e necessita
ser entendido em sua totalidade.

FUNDAMENTOS TEÓRICOS DA PSICOPEDAGOGIA


27

O ser cognoscente, como sujeito inteiro, é constituído por distintas dimen-


sões: biológica, afetiva, desiderativa, relacional e racional, que interagem
entre si, com o ambiente natural e sociocultural e possibilitam o advento do
conhecer e do conhecer-se.
Fonte: Barbosa (2007, p. 94).

Diante desses fatos, a psicopedagogia aprimorou, por meio de sua prática clínica
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

diagnóstica, instrumentos, técnicas e recursos que favorecem uma visão inte-


gradora daquele que aprende. Nesse processo, ela pretende compreender como
esse sujeito, em sua totalidade e com suas características, relaciona-se com a
aprendizagem e o conhecimento, como lida com o não aprender e quais são seus
sentimentos. Para além do sujeito, também busca verificar como a família lida
com a aprendizagem, com o não aprender e com o sujeito, analisando a postura
da escola frente a essa problemática (GRASSI, 2013).

A PRÁTICA PSICOPEDAGÓGICA: CAMPO DE ATUAÇÃO

O trabalho psicopedagógico compreende duas grandes áreas: a clínica e a ins-


titucional (também chamada de preventiva por alguns autores). A prática da
psicopedagogia veio se modificando ao longo do tempo em função das mudan-
ças na maneira com que se foi compreendendo o fenômeno do não aprender.

Psicopedagogia com enfoque clínico

O trabalho da psicopedagogia clínica tem, como enfoque principal, o diagnóstico


e o tratamento das dificuldades e transtornos de aprendizagem. A realização das
atividades com o sujeito é individual, mas há todo um trabalho dirigido para a
escola, família e aos outros profissionais que fazem parte da rede de atendimento
desse sujeito. Com isso, a psicopedagogia clínica tem um caráter de tratamento,
sendo uma intervenção terapêutica (SOBRINHO, 2016).

Conhecendo a Psicopedagogia
28 UNIDADE I

Sendo assim, a psicopedagogia clínica visa conhecer os sintomas da não


aprendizagem, tratando suas causas e possibilitando uma nova maneira de ela-
borar o processo cognitivo. Tudo isso, a fim de torná-lo saudável e benéfico, no
qual o sujeito é o centro (SOBRINHO, 2016).
Para Bossa (2007), o atendimento clínico tem um enfoque investigativo e de
intervenção, os quais visam ao entendimento do significado da aprendizagem
para o sujeito, as causas do não aprender e o modo como ele aprende, a fim de
tratar as suas dificuldades. A autora ainda acrescenta que o foco da psicopeda-
gogia é a aprendizagem, assim como o da psicologia é a psique, o do neurologista

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
é o aspecto orgânico e o da pedagogia são os conteúdos escolares.
O caráter clínico da psicopedagogia caracteriza-se pelo fato de que a sua
prática está sempre relacionada a um processo de diagnóstico ou de investi-
gação, o qual a orienta na elaboração do plano de intervenção (SILVA, 2012).
No entanto, Claro (2018) explica que a prática do psicopedagogo também
deve considerar a prevenção, devido às especificidades do processo por ela
investigado.
A psicopedagogia, no Brasil de hoje, segundo Bossa (2007), além do tra-
tamento e a prevenção das dificuldades de aprendizagem, busca desenvolver
programas que facilitem a integração do sujeito.

Psicopedagogia com enfoque institucional

O ambiente institucional permite que o psicopedagogo amplie a sua atua-


ção, principalmente a preventiva, pois sua ação sai do plano individual para o
grupal e as relações passam a ser consideradas. Tudo isso propicia a elabora-
ção de uma visão mais abrangente, conhecendo a realidade em sua totalidade
(OLIVEIRA, 2014).
Quando se fala em psicopedagogia institucional, a maioria das pessoas a
relacionam com a instituição educacional. No entanto, Oliveira (2014) esclarece
que a aprendizagem é processo contínuo na vida do sujeito, independente do
contexto no qual ele está inserido. Sendo assim, a psicopedagogia poderá atuar
nas mais diversas instituições, tais como hospitais, empresas, Organizações da
Sociedade Civil (OSC) e entre outras.

FUNDAMENTOS TEÓRICOS DA PSICOPEDAGOGIA


29
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Fagali (2003 apud BOSSA, 2007) destaca alguns trabalhos psicopedagógicos


desenvolvidos em instituições. São eles:
■■ Na família: ajudando os pais a compreender a aprendizagem dos filhos,
buscando rever o papel educacional da família.
■■ Nas empresas: com treinamentos, a fim de desenvolver as múltiplas inte-
ligências, tais como criatividade, visão humanística e entre outras.
■■ No hospital: oferecendo oficinas que promovam a aprendizagem e o lúdico.
■■ Na escola: estabelecendo um diagnóstico do contexto escolar, trabalhando
em projetos, orientações sobre o processo aprendizagem, reorganização
curricular, o seu papel na relação com a família e entre outros.
Com isso, percebe-se que o trabalho psicopedagógico com enfoque institucio-
nal permite um estudo mais consistente em relação à aprendizagem, em uma
perspectiva de prevenção.

Conhecendo a Psicopedagogia
30 UNIDADE I

FUNDAMENTOS ÉTICOS DA PSICOPEDAGOGIA

Ao trabalhar os fundamentos éticos da psicopedagogia, é preciso, primei-


ramente, esclarecer o que é ética, já que esse tema é bastante complexo e de
grande relevância na prática profissional. Weber (2013) explica que a ética não
é o mesmo que moral, ou seja, não é constituída por um conjunto de regras,
hábitos ou normas. Segundo o autor, cabe à ética tanto explicar quanto influir
na moral.
Os códigos de ética profissionais possuem um caráter normativo. Dessa

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
forma, “a ética normativa procura mostrar quais são as ações certas e quais
são eticamente aceitáveis” (WEBER, 2013, p. 66). Sendo assim, busca-se levar
o indivíduo a refletir, com base em princípios que orientam a ação e a tomada
de decisões.
A ética profissional, de acordo com Michaelis (2018 apud CLARO, 2018,
p.161), estende-se a todos os setores profissionais, tendo por “objetivo interrogar
mais amplamente o papel social da profissão, sua responsabilidade, sua função,
e sua atitude frente aos riscos e ao meio ambiente”.
Segundo Ferreira (2005), os princípios éticos que orientam as atividades do
psicopedagogo foram instituídos pela Associação Brasileira de Psicopedagogia
(ABPp) no ano de 1996. Esse Código de Ética contempla essencialmente os prin-
cípios da psicopedagogia, as responsabilidades do psicopedagogo, as relações
com outras profissões, o sigilo, as publicações científicas, a publicidade profis-
sional, os honorários, as relações com a saúde e a educação, a observância e o
cumprimento do código de ética.
Portanto, concluímos que a psicopedagogia vem estruturando seus saberes
e construindo a sua prática em diferentes ambientes, tendo estabelecido princí-
pios éticos que regem a sua atuação.

FUNDAMENTOS TEÓRICOS DA PSICOPEDAGOGIA


31
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

CORRENTES TEÓRICAS QUE INFLUENCIAM A


PSICOPEDAGOGIA

A psicopedagogia, em sua construção enquanto saber científico, buscou emba-


samento em algumas correntes teóricas e, neste trabalho, destacaremos as que
tiveram maior relevância para a sua prática. Para tanto, apresentaremos, de forma
sucinta, o construtivismo, a psicanálise, o associacionismo e encerraremos com
a epistemologia convergente.

O CONSTRUTIVISMO DE PIAGET

Essa corrente teórica teve, como seu precursor, Jean Piaget, que realizou estu-
dos voltados para a psicologia evolutiva por meio da observação sistematizada
do processo no qual a criança adquire o conhecimento. Em sua teoria, são des-
tacados dois conceitos: aprendizagem e desenvolvimento. Assim, o estudioso
compreende que a aprendizagem vai acontecer por meio da experiência, de modo
sistemático ou não (CLARO, 2018). Já o desenvolvimento visa passar de uma
condição de menor equilíbrio para outra de maior equilíbrio, sendo o respon-
sável pelo conhecimento do indivíduo (QUADRO, 2009 apud CLARO, 2018).

Correntes Teóricas que Influenciam a Psicopedagogia


32 UNIDADE I

Para Piaget (1977 apud CLARO, 2018), a construção do conhecimento ocorre


em decorrência da interação de fatores genéticos com o contexto em que o indi-
víduo está incluso. Claro (2018) destaca que o desenvolvimento cognitivo é o
que dá sustentabilidade para a aprendizagem, esclarecendo que ele só ocorre por
meio da assimilação e acomodação.
No entanto, o que são os processos de assimilação e acomodação? Na assi-
milação, o indivíduo recebe as informações advindas do meio em que está
inserido, seleciona os conteúdos essenciais, processa a informação e a transforma
em conhecimento, o qual é controlado por estruturas mentais. Já o processo de

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
acomodação é quando há uma modificação nas estruturas mentais para aco-
modar as informações que foram assimiladas pelo indivíduo (CLARO, 2018).
A cognição, na visão piagetiana, é uma construção que acontece na intera-
ção entre o organismo e o meio em que o indivíduo está inserido. Ela ocorre de
modo ativo e envolve o funcionamento de estruturas cognitivas em diferentes
competências (memória, atenção e entre outros) (CLARO, 2018).

Diante disso, entende-se que aprendizagem acontece na interação do indiví-


duo com o meio, em um processo de construção. Na perspectiva dessa teoria, o
sujeito não conseguirá aprender aquilo que está além do limiar de sua estrutura
cognitiva (WEISS, 2012 apud CLARO, 2018).

FUNDAMENTOS TEÓRICOS DA PSICOPEDAGOGIA


33

Na teoria piagetiana, o desenvolvimento da cognição está organizado em


quatro estágios, os quais são evolutivos e sequenciais, com início no nascimento
e transcorrendo até a vida adulta. Eles se desenvolvem de maneira gradual e dife-
rem-se de indivíduo para outro. A sequência dos estágios são: estágio sensório
motor (do nascimento até os dois anos); estágio do pensamento pré-operatório
(dos 2 aos 6 anos); estágio operatório concreto (de 6 a 12 anos); e estágio ope-
ratório formal (dos 12 anos até a vida adulta) (CLARO, 2018).
Essa teoria é de grande relevância para a psicopedagogia, visto que o método
clínico de Piaget é utilizado tanto na avaliação quanto nas intervenções.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

A PSICANÁLISE DE FREUD

A psicanálise é uma teoria que foi construída com base nas ideias de Sigmund
Freud. Esse termo é atribuído tanto para a teoria de tratamento criada pelo
estudioso quanto para a teoria de personalidade. Assim, Freud revolucionou a
psicologia de sua época quando passou a ressaltar a importância do inconsciente
(MORRIS; MAISTO, 2004).

Consciente é uma parte relativamente pequena e inconstante da vida


mental de uma pessoa. Corresponde a tudo aquilo de que o indivíduo está
ciente em determinado instante. Pré-consciente é o reservatório de tudo
o que possa ser lembrado no instante seguinte. Já o inconsciente consiste
em ser uma área da vida psíquica onde se encontram os impulsos primiti-
vos que influenciam o comportamento e dos quais não se tem consciên-
cia e um grupo de ideias, carregadas emocionalmente, que uma vez forma
conscientes, mas em vista de seus aspectos intoleráveis foram expulsas da
consciência para um plano mais profundo, de onde não poderão vir à tona
voluntariamente.
Fonte: D’Andrea (1996, p.17).

Correntes Teóricas que Influenciam a Psicopedagogia


34 UNIDADE I

Para Freud, a personalidade do sujeito se organiza em torno de três estruturas, as


quais ele chamou de Id, Ego e Superego. O Id é a estrutura que existe desde o nas-
cimento. É inconsciente e funciona com base no princípio do prazer, evitando a
dor. Já o Ego é aquele que comanda o raciocínio e todas as atividades do pensa-
mento. Ele age de maneira consciente, pré-consciente e inconsciente, conhece o
meio externo e busca satisfazer as demandas do Id, dentro do princípio de realidade.
Entretanto, muitas vezes, adia os impulsos do Id, para que eles possam ser saciados
de forma segura e com sucesso. A terceira estrutura, o Superego, forma-se por meio
dos padrões morais que são apresentados ao indivíduo na interação com a famí-

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
lia e com a sociedade. Tem a obrigação de observar e direcionar o Ego, e sua ação
pode ser consciente, pré-consciente ou inconsciente (MORRIS; MAISTO, 2004).
De acordo com Morris e Maisto (2004), a teoria de personalidade desen-
volvida por Freud compreende cinco períodos: fase oral (do nascimento até os
18 meses); fase anal (aproximadamente dos 18 meses aos três anos e meio); fase
fálica (após os três anos); período de latência (por volta dos cinco a seis anos
até doze anos); e fase genital (começa com a puberdade e segue na vida adulta).
Portanto, a psicanálise, segundo Costa (2001 apud CLARO, 2018), contri-
buiu significativamente na psicopedagogia ao apresentar uma visão diferenciada
sobre o sujeito que aprende, esclarecendo que aspectos desconhecidos podem
estar implícitos no ato de não aprender ou no modelo de aprendizagem do sujeito.

ASSOCIACIONISMO DE THORNDIKE

A teoria do associacionismo tem, como seu maior representante, Edward L.


Thorndike. Segundo Bock, Furtado e Teixeira (1999), Thorndike foi o respon-
sável por desenvolver a primeira teoria de aprendizagem na área da psicologia.
Originalmente, o termo associacionismo desenvolveu-se a partir da compre-
ensão de que a aprendizagem acontece por meio da associação de ideias, partindo
das mais simples até chegar nas mais complexas. Desse modo, para que o sujeito
consiga aprender um conteúdo considerado complexo, primeiramente, deverá
compreender as ideias mais simples relacionadas ao mesmo conteúdo (BOCK;
FURTADO; TEIXEIRA, 1999).

FUNDAMENTOS TEÓRICOS DA PSICOPEDAGOGIA


35

Bock, Furtado e Teixeira (1999) destacam que Thorndike foi o responsável


por desenvolver a Lei de Efeito. Ela compreende que “todo comportamento de
um organismo vivo (um homem, um pombo, um rato, etc.) tende a se repetir, se
nós recompensarmos (efeito) o organismo assim que emitir o comportamento”
(BOCK; FURTADO; TEIXEIRA, 1999, p. 53). O resultado será inverso, caso o
organismo seja castigado (efeito) logo após a sua ocorrência. Além disso, essa
mesma lei considera que o organismo vai relacionar essas situações com outras
que se assemelham a ela.
Thorndike e Gates (1936 apud SASS; LIBA, 2011) explicam a importância
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

de entusiasmar o sujeito para as atividades de aprendizagem, ou seja, despertar


o interesse do indivíduo. Dessa forma, se houver grande interesse por uma ati-
vidade, seu resultado também causará maior entusiasmo, aumentando, assim,
os resultados da aprendizagem. Para esses autores, o interesse deve ser um cri-
tério a ser considerado na escolha de métodos e matérias, dado que o interesse
do aluno deve estar aliado aos objetivos da educação.
Essa teoria tem fundamentado a compreensão da aprendizagem e as inter-
venções psicopedagógicas até os dias de hoje.

EPISTEMOLOGIA CONVERGENTE DE VISCA

Destacamos essa teoria pelo fato de que ela é de grande relevância no trabalho
psicopedagógico. A epistemologia convergente foi desenvolvida pelo argentino
Jorge Pedro Luiz Visca, o qual buscou integrar três linhas da psicologia: a psico-
genética de Piaget, a psicologia social de Pichon Rivière e a psicanálise de Freud
(NOGUEIRA; LEAL, 2013).
Tendo, como aparato teórico, essas teorias, Visca desenvolveu a epistemo-
logia convergente, construindo uma metodologia de trabalho específica que dá
subsídios para a avaliação psicopedagógica. Dentre os instrumentos, ressaltam-
-se as técnicas projetivas psicopedagógicas, a Entrevista Operativa Centrada na
Aprendizagem (EOCA), anamnese, a caixa de trabalho, as provas operatórias
piagetianas, além dos recursos terapêuticos e de diagnóstico, tanto individual
quanto em grupo (NOGUEIRA; LEAL, 2013).

Correntes Teóricas que Influenciam a Psicopedagogia


36 UNIDADE I

No tratamento, Visca (1987) ressalta quatro conceitos essenciais que possi-


bilitam a flexibilidade operativa e advêm da teoria de Pichon Rivière. São eles:
I) logística (considerar as dificuldades e capacidades do sujeito ou do grupo
avaliado); II) estratégia (capacidade de organizar as operações no processo de
avaliação, possibilitando a sua utilização no momento indicado); III) tática (con-
duta de realizar o que foi planejado para cada caso no processo de avaliação);
e IV) técnica (a maneira com que cada profissional desenvolve o seu trabalho
avaliativo). Esses conceitos concedem um direcionamento ao psicopedagogo no
momento de organizar o tratamento.

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Segundo Nogueira e Leal (2013, p. 69), o interesse da epistemologia conver-
gente está relacionado com as etapas de aprendizagem, construindo um modelo
evolutivo que “integra e articula as relações entre os aspectos cognitivos, afetivos
e sócio-histórico-culturais no desenvolvimento do indivíduo”. Por essa caracte-
rística de inter-relação entre o indivíduo e o meio sócio cultural, essa teoria pode
ser classificada como sociointeracionista.

FUNDAMENTOS TEÓRICOS DA PSICOPEDAGOGIA


37

Considerando a complexidade da aprendizagem humana, Visca (1987) organi-


zou quatro níveis de aprendizagem, denominando-os de esquema evolutivo de
aprendizagem, e esclareceu que esse esquema se inicia a partir do nascimento e
vai até a morte. Essa estrutura organiza-se assim: I) protoaprendizagem ou pri-
meiro nível de aprendizagem (ocorre nas primeiras relações entre criança e mãe);
II) deuteroaprendizagem ou segundo nível de aprendizagem (compreensão na
dimensão do grupo familiar); III) aprendizagem assistemática ou terceiro nível
de aprendizagem (adquire instrumentos e técnicas que possibilitam a sua vivên-
cia em uma comunidade restrita); e IV) aprendizagem sistemática ou quarto
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

nível de aprendizagem (mais elaborada e apresentada por meio de instituições


educacionais). As dificuldades relacionadas ao vínculo, em qualquer uma das
etapas, podem afetar o desenvolvimento do sujeito, levando-o ao desenvolvi-
mento deficitário da aprendizagem.
Visca (1987) também organizou os obstáculos da aprendizagem em quatro
grupos, a saber: I) os epistemológicos (quando o sujeito resiste a qualquer conhe-
cimento que não venha de encontro com suas concepções); II) os epistemofílicos
(dificuldade em aceitar um novo conhecimento por questões emocionais, como
o medo do ataque, da indiscriminação ou perda, por exemplo); III) os epistê-
micos (a estrutura cognitiva limita o nível de conhecimento, de acordo com as
funções das operações que possui); e IV) o funcional (baseado na maneira com
que o pensamento do sujeito acontece, sofrendo evoluções que possibilitam, ao
examinador, usá-las como hipótese auxiliar diante da necessidade em utilizar
recursos diagnósticos que não estejam relacionados com as teorias que emba-
sam a epistemologia convergente).
É importante destacar que tanto os obstáculos epistêmicos quanto os funcio-
nais são estudados por meio de provas operatórias piagetianas, as quais são muito
importantes não só para o diagnóstico, mas também para o tratamento psicope-
dagógico como um todo. Isso acontece, porque elas estabelecem “regularidades
entre níveis cognitivos e aprendizagem e diferenças funcionais e aprendizagem”
(VISCA, 2008). Portanto, o autor destaca que essa visão é fundamental para o
trabalho psicopedagógico.

Correntes Teóricas que Influenciam a Psicopedagogia


38 UNIDADE I

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Quando retomamos a trajetória histórica da psicopedagogia, podemos perce-


ber que, no início, seu trabalho era essencialmente relacionado ao tratamento
das dificuldades de aprendizagem, mas, com o passar do tempo, verificamos
mudanças importantes que vieram destacar o seu trabalho. Em outras palavras,
a psicopedagogia passou a interessar-se pelo processo de aprendizagem e, prin-
cipalmente, pela relação desse processo com aquele que aprende.
Nesse processo, a psicopedagogia ampliou as suas perspectivas, passando a

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
preocupar-se não só com o tratamento, mas também com a prevenção, conso-
lidando, assim, suas atividades práticas, seu campo de investigação e seu saber
científico. Baseado nesses aspectos, ela também delimita seu campo de atua-
ção, o qual deixa de ser restrito ao consultório e ganha espaço nas instituições.
Dentro do contexto de cada uma dessas atividades, não podemos nos esque-
cer de seguir os preceitos que regem a atividade do psicopedagogo. Para tanto,
evidencia-se a importância do Código de Ética, o qual é o instrumento que nor-
matiza a atividade profissional.
Cada uma das correntes teóricas destacadas apresentam uma contribuição
importante para subsidiar o trabalho psicopedagógico. O construtivismo de Piaget
traz o conhecimento do desenvolvimento cognitivo, com ênfase na interação do
indivíduo com o meio. Já a psicanálise de Freud explica o desenvolvimento da
personalidade ao enfatizar que fatos desconhecidos podem influenciar na apren-
dizagem do sujeito. O associacionismo de Thorndike revela a primeira teoria da
aprendizagem, destacando a Lei do Efeito e a associação de ideias. Por sua vez, a
epistemologia convergente de Visca concentra as teorias da psicanálise, a psicoge-
nética e a psicologia social, buscando uma compreensão mais integrada do sujeito.
Sendo assim, entendemos a extensão e a importância do trabalho psicope-
dagógico, o qual, hoje, está pautado não só na prática, mas fundamentado em
teorias que esclarecem o processo de aprendizagem e oferecem subsídios para
as intervenções de tratamento ou de prevenção.

FUNDAMENTOS TEÓRICOS DA PSICOPEDAGOGIA


39

1. A psicopedagogia estruturou-se inicialmente na Europa, no século XIX, com o


intuito de oferecer atendimento para as pessoas com dificuldades. Resgatando
a história nesse continente, analise as afirmativas a seguir:
I. Os atendimentos tinham uma perspectiva médica e pedagógica.
II. O centro de psicopedagogia de Estrasburgo (França) fazia uso da Pedagogia
Curativa, oferecendo atendimentos individuais e em grupo. Seu intuito era
o de ajudar o sujeito somente em sua readaptação pedagógica.
III. A psicopedagogia curativa era uma atividade terapêutica que visava tratar
as questões relacionadas aos problemas escolares por meio de recursos pe-
dagógicos e psicológicos.
IV. Em 1911, o italiano Emílio Galli escreveu um artigo explicando as etapas
para se realizar um exame psicopedagógico, esclarecendo que ele deve ser
realizado pelo psicopedagogo.
É correto afirmar que:
a) Apenas as afirmativas I e III estão corretas.
b) Apenas as afirmativas II e III estão corretas.
c) Apenas as afirmativas II, III e IV estão corretas.
d) Apenas as afirmativas I, III e IV estão corretas.
e) Apenas as afirmativas I e IV estão corretas.
2. Quando retomamos a história da psicopedagogia no Brasil, verificamos que
ela foi influenciada por ideias advindas da Europa, mas principalmente por psi-
copedagogos argentinos. Diante disso, julgue as afirmativas a seguir com (V)
para as Verdadeiras e (F) para as Falsas.
( ) Sara Pain reforçou a importância da psicanálise para o sujeito que apren-
de na clínica psicopedagógica. Além disso, introduziu a abordagem da di-
nâmica familiar no entendimento dos problemas de aprendizagem.
( ) A psicopedagogia no Brasil, na década de 1990, teve grande influência do
argentino Jorge Visca, que ministrou aulas em diferentes cidades, princi-
palmente na região Sul do país.
( ) Foi no I Encontro de Psicopedagogos, em 1984, que foi definida a criação
da Associação Brasileira de Psicopedagogia (ABPp), a qual surgiu no ano
seguinte.
( ) A realidade da década de 1980 era a de que a demanda de crianças com
dificuldades de aprendizagem era pequena, mas faltavam profissionais
para realizar um trabalho efetivo com tais.
40

A sequência correta é:
a) V, V, F, F.
b) F, V, V, F,
c) V, F, V, V.
d) F, F, V, V.
e) V, V, V, F.
3. Bossa (2007), ao esclarecer sobre o trabalho da psicopedagogia, explica que
ele está delimitado enquanto uma atividade prática, um campo de investiga-
ção do processo de aprendizagem e um saber científico. Assim, disserte sobre
essas atividades do psicopedagogo.
4. A prática da psicopedagogia, no decorrer dos anos, tem se aperfeiçoado, em
decorrência das mudanças ocorridas na maneira de compreender a não apren-
dizagem. Partindo dessa premissa, no que se refere à atuação do psicopedago-
go no enfoque institucional, é correto afirmar que:
a) Tem, como enfoque principal, o diagnóstico e o tratamento das dificuldades
e transtornos de aprendizagem.
b) Visa ao entendimento do significado da aprendizagem para o sujeito, as
causas do não aprender e o modo como ele aprende.
c) Caracteriza-se pelo fato de que a sua prática sempre está relacionada a um
processo de diagnóstico ou de investigação, o qual é orientador na elabora-
ção do plano de intervenção.
d) Permite ao psicopedagogo ampliar a sua atuação, principalmente preventi-
va, pois sua ação sai do plano individual para o grupal e as relações passam a
ser consideradas. Tudo isso propicia a elaboração de uma visão mais abran-
gente, conhecendo a realidade em sua totalidade.
e) Busca conhecer os sintomas da não aprendizagem, tratando suas causas e
possibilitando uma nova maneira de elaborar o processo cognitivo, o qual
se torna saudável e benéfico, e o sujeito é o centro.
41

5. Explique os processos de assimilação e acomodação para Piaget.


6. Para explicar o tratamento psicopedagógico, Visca (1987) destaca quatro con-
ceitos essenciais que favorecem a flexibilidade operativa. Baseado nesses con-
ceitos, julgue as afirmativas a seguir com (V) para as Verdadeiras e (F) para as
Falsas:
( ) A tática visa considerar as dificuldades e capacidades do sujeito ou do
grupo avaliado.
( ) A estratégia está relacionada com a capacidade de organizar as operações
no processo de avaliação, possibilitando a sua utilização no momento in-
dicado.
( ) A logística envolve a conduta de realizar o que foi planejado para cada
caso no processo de avaliação.
( ) A técnica consiste na maneira com que cada profissional desenvolve o seu
trabalho avaliativo.
A sequência correta é:
a) V, V, F, V.
b) F, F, V, V.
c) F, V, F, V.
d) F, F, F, V.
e) F, V, F, F.
42

O OBJETO DE ESTUDO, OS FUNDAMENTOS E AS RELAÇÕES DA


PSICOPEDAGOGIA

Existe consenso entre vários estudiosos mento e consequentemente de vários


da psicopedagogia, dentre eles Fernán- especialistas, que se poderá intervir no com-
dez (1994), Kiguel (1990), Macedo (1992), plexo fenômeno da aprendizagem humana.
Rubinstains e colaboradores (2004), Massini
(2006) Visca (2002), e outros, de que a psico- Assim, ao considerarmos a psicopedagogia
pedagogia, desde a sua origem, tem situado como uma área de conhecimentos sensível
o seu objeto de estudo junto às questões a questões relativas do processo educa-
diretamente relacionadas à aprendizagem. cional e a contextualizarmos a partir de
seus referenciais teóricos, nos defrontamos
Respeitando-se os estudos, o contexto, as especialmente com as inegáveis contri-
particularidades, dentre outras questões, buições da psicologia e da pedagogia.
destacamos as contribuições de Macedo Segundo Visca (1987), a psicopedagogia
(1992) e Visca (1987), que, ao enfatizarem foi sendo construída como uma área de
o objeto de estudo da psicopedagogia, conhecimento ao mesmo tempo indepen-
consideram especialmente as questões dente e complementar da pedagogia, por
de origem metodológica, dentre elas, o considerar as questões metodológicas e em
como?; o quando? o por quê?; o para quê?; especial o trabalho docente. E em relação à
se ensina e se aprende. Com isso, a visão psicologia, por considerar especialmente,
positivista de educação cede espaço a uma as contribuições das escolas psicanalíticas,
concepção de ensino e de aprendizagem piagetiana e da psicologia social, por meio
decorrente da epistemologia genética. de Enrique Pichón-Rivière. A partir desses
Este novo enfoque realça a construção referenciais, a psicopedagogia enfatiza os
do conhecimento por meio do aprender aspectos cognoscitivos, afetivos, emocio-
fazendo. Com isto passa-se a considerar nais, sociais, além de outros.
as etapas de desenvolvimento cognitivo
do aprendiz. Portanto, partimos da premissa de que a
construção de conhecimentos não pode
Isso, segundo Kiguel (1990, p. 39), vem se limitar a contribuições isoladas de qual-
favorecer a “compreensão do fenômeno da quer área que seja, mas sim da inter-relação
aprendizagem de forma a integrar as várias entre elas em função de um objetivo maior.
áreas do conhecimento, considerando ainda Assim, a psicopedagogia entendida como
os diferentes níveis evolutivos.” Este mesmo uma área de conhecimentos, geradora
estudioso sugere que será pela interdiscipli- de uma prática interdisciplinar, não pode
nariedade, ou seja, por meio da conjugação ignorar as contribuições das várias áreas
de esforços das várias áreas do conheci- de conhecimentos.
43

Diante disso, Lima (1990, p. 19) apresenta procura embasar a ação docente; da episte-
a importância de um “diálogo confronto mologia e da psicologia genética que analisa
especialmente entre a psicologia e a peda- e descreve o processo de construção do
gogia de forma que se faça algo mais conhecimento pelo sujeito em interação
efetivo em função do sujeito cognoscente”. com outros e com os objetos; da psicolo-
Desta forma, não se trata de substituir a psi- gia social que se preocupa com as relações
cologia pela psicopedagogia, pedagogia, familiares, grupais, institucionais, com as
antropologia, filosofia, linguística, biologia, interferências socioculturais e econômicas
fonoaudiologia, medicina, ou por qualquer que permeiam a aprendizagem; da neurop-
outra área de conhecimento. Entendemos sicologia que possibilita a compreensão dos
assim que a busca por melhorias educa- mecanismos cerebrais que servem de base
cionais passa pela articulação das diversas para o aprimoramento das atividades men-
áreas em busca de significados para a atu- tais; da psicanálise que aborda o mundo do
ação profissional. Neste sentido, estamos inconsciente, das representações, que se
incluindo também a atuação psicopeda- expressa por meio de sintomas e símbo-
gógica que, no nosso entender, em muito los; da linguística que traz a compreensão
pode contribuir com o sucesso da dinâ- da linguagem, da língua enquanto código
mica educador-conhecimento-educando. disponível aos membros de uma sociedade.

Dentre os estudiosos que abordam as con- Com isso, tomando como referencial a ideia
tribuições das várias áreas de conhecimento de complementaridade das funções em
à área da psicopedagogia, destacamos as busca de articulá-las às diversas áreas do
de Bossa (2007) e de Stroili (2001). Assim, conhecimento humano para a compreen-
segundo os estudos desenvolvidos, sobre são do fenômeno educacional, temos que
este tema, temos alguns subsídios que se a psicopedagogia, segundo Fagali (1998),
destacam. Dentre eles, os: da pedagogia se caracteriza como uma área de atuação
que, ao estudar as diversas abordagens interdisciplinar desenvolvida por meio das
do processo de ensino e aprendizagem, modalidades, clínica e institucional.
Fonte: Peres e Oliveira (2007, p. 117-118).
MATERIAL COMPLEMENTAR

A Psicopedagogia no Brasil: contribuições a partir da prática


Autor: Nádia A. Bossa
Editora: WAK
Sinopse: a psicopedagogia constitui um conjunto de práticas
institucionalizadas de intervenção no campo da aprendizagem,
seja no âmbito da prevenção, no diagnóstico e no tratamento das
dificuldades de aprendizagem ou, ainda, na intervenção específica
no processo de aprendizagem escolar.
Seus domínios específicos são: o sujeito do conhecimento, o agente
de transmissão e as dimensões constitutivas do indivíduo. Logo, o
sujeito-objeto da psicopedagogia é o ser humano contextualizado em situação de aprendizagem.
O enfoque da pesquisa e trabalho psicopedagógico é multidimensional, no qual estão contemplados
os fatores constitucional/biológico, cognitivo, afetivo, sociocultural e pedagógico, em determinado
momento histórico de cada pessoa ou grupo, afetando a busca e a compreensão dos conhecimentos.
Além disso, a psicopedagogia deve se aproximar: i) dos obstáculos presentes na construção do
conhecimento e na relação com o saber; ii) da prática educativa na interseção com as particularidades
subjetivas, sociais e culturais das pessoas e instituições; iii) da relação entre pensamento meditativo e
subjetividade; e iv) das interações do homem com o mundo. Dessa forma, o olhar da psicopedagogia
sobre a aprendizagem e o processo ensino-aprendizagem se dá pela análise dos comportamentos
cognitivo-intelectual e simbólico-afetivo na produção de conhecimento.

Clínica Psicopedagógica: Epistemologia Convergente


Autor: Jorge Visca
Editora: Pulso
Sinopse: o professor Visca é o criador da clínica psicopedagógica
baseada na Epistemologia Convergente, marco teórico e conceitual
que ajudou e ajuda os profissionais que se dedicam a trabalhar com
os processos de aprendizagem a entenderem, de um modo mais
claro, o que acontece em cada caso.A Epistemologia Convergente
constitui-se dos fundamentos da Psicanálise, que desvenda os
aspectos afetivos, da Psicologia Genética, que estuda os aspectos
cognitivos, e da Psicologia Social, que aborda os aspectos sociais.

O conhecimento sobre o Código de Ética é fundamental para o trabalho do Psicopedagogo.


Conheça esse documento:
Web: http://www.abpp.com.br/documentos_referencias_codigo_etica.html.
45
REFERÊNCIAS

BARBOSA, L. M. S. A Epistemologia da Psicopedagogia: reconhecendo seu funda-


mento, seu valor social e seu campo de ação. Comemorando os 15 anos da ABPp
- Paraná Sul, 2006. Revista Psicopedagogia, São Paulo, v. 24, n. 73, p. 90-100, 2007.
BOCK, A. M. B.; FURTADO, O.; TEIXEIRA, M. de L. T. Psicologias: uma introdução ao
estudo de Psicologia. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 1999.
BOSSA, N. A. A psicopedagogia no Brasil: contribuições a partir da prática. 3. ed.
Porto Alegre: Artmed, 2007.
CLARO, G. R. Fundamentos de Psicopedagogia. Curitiba: Intersaberes, 2018.
COSTA, A. A.; PINTO, T. M. G.; ANDRADE, M. S. de. Análise Histórica do Surgimento da
Psicopedagogia no Brasil. Revista de Psicologia, v. 7, n. 20, jul./2013.
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to, titulação e formação do psicopedagogo – Triênio 99/2001. In: BOMBONATTO, Q.;
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2007. p.25-37.
FERREIRA, A. V. Psicopedagogia e valores na prática educacional com adolescen-
tes: um diálogo entre o valor de educar e o trabalho psicopedagógico. 2005. Tese
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FONTES, M. A. Psicopedagogia e Sociedade: história, concepções e contribuições.
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GRASSI, T. M. Psicopedagogia: um olhar uma escuta. Curitiba: Intersaberes, 2013.
MERY, J. Pedagogia curativa escolar e psicanálise. Porto Alegre: Artmed, 1985.
MORRIS, C. G.; MAISTO, A. A. Introdução à Psicologia. São Paulo: Prentice Hall, 2004.
NOGUEIRA, M. O. G.; LEAL, D. Psicopedagogia clínica: caminhos teóricos e práticos.
Curitiba: Intersaberes, 2013.
OLIVEIRA, M. A. C. Psicopedagogia: a instituição educacional em foco. Curitiba: In-
tersaberes, 2014.
PERES, M. R.; OLIVEIRA, M. H. M. A. Psicopedagogia: limites e possibilidades a partir
de relatos de profissionais. Ciências & Cognição, Rio de Janeiro, v. 12, p. 115-133,
nov. 2007.
SASS, O.; LIBA, F. R. T. Interesse e a educação: conceito de junção entre a psicologia e
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VISCA, J. Clínica psicopedagógica: epistemologia convergente. Porto Alegre: Artes
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VISCA, J. O diagnóstico operatório na prática psicopedagógica. São José dos
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WEBER, O. J. Ética, educação e trabalho. Curitiba: Intersaberes, 2013.

Referência On-Line:
¹Em: http://www.abpp.com.br/psicopedagogo_simbolo_psicopedagogia.html.
Acesso em: 22 jul. 2019.
47
GABARITO

1. A alternativa correta é a D.
2. A alternativa correta é a B.
3. A atividade prática busca, por meio de técnicas de intervenção, conhecer as cau-
sas das dificuldades de aprendizagem, procurando estratégias para a sua reso-
lução. Já o campo de investigação está em um processo de construção teórico-
-prático que conta com o embasamento de diferentes áreas de conhecimento,
com teorias fundamentadas na pedagogia, psicologia, neurociência, neurologia
e entre outras, as quais auxiliam no processo de desenvolvimento e da aprendi-
zagem do aluno. No campo do saber científico, mesmo estudando as dificulda-
des de aprendizagem na visão de diversas áreas de conhecimento, a cada ano,
tem procurado sistematizar um modelo teórico-prático próprio, evidenciando
seu objeto de estudo e delineando seu campo de atuação.
4. A alternativa correta é a D.
5. Na assimilação, o indivíduo recebe as informações advindas do meio em que
está inserido, seleciona os conteúdos essenciais, processa a informação e a
transforma em conhecimento, o qual é controlado por estruturas mentais. Já o
processo de acomodação é quando há uma modificação nas estruturas mentais
para acomodar as informações que foram assimiladas pelo indivíduo (CLARO,
2018).
6. A alternativa correta é a C.
Professora Me. Raquel de Araújo Bomfim Garcia

TEMAS FUNDAMENTAIS

II
UNIDADE
PARA A PSICOPEDAGOGIA

Objetivos de Aprendizagem
■■ Discorrer sobre a aprendizagem na perspectiva de diferentes
abordagens teóricas.
■■ Apresentar as interfaces da psicopedagogia por meio de
conhecimentos de outras áreas.
■■ Analisar o contexto do processo ensino-aprendizagem, elencando
as possíveis causas do fracasso escolar, a fim de propiciar meios de
prevenção.

Plano de Estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade:
■■ Psicopedagogia e aprendizagem
■■ Psicopedagogia: desenvolvendo a interdisciplinaridade
■■ A visão da psicopedagogia sobre o fracasso escolar
51

INTRODUÇÃO

Caro aluno(a), estamos iniciando a nossa segunda unidade e lhe convido a apro-
fundar os seus conhecimentos a respeito de alguns temas que são de grande
relevância para o trabalho psicopedagógico. Para tanto, vamos conhecer as princi-
pais teorias que discutem a aprendizagem, a importância da interdisciplinaridade
para a psicopedagogia e a sua visão sobre o fracasso escolar.
Considerando que a aprendizagem é o principal objetivo de estudo da psi-
copedagogia, iniciamos o nosso estudo conhecendo as principais teorias de
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

aprendizagem que oferecem o embasamento teórico para a prática psicopedagó-


gica. Dentre as teorias a serem apresentadas, temos a Análise do Comportamento
(Behaviorismo), a Psicanálise, o Construtivismo, a Teoria Histórico-Cultural e
a Teoria da Afetividade. Em cada uma delas, serão destacadas a sua importân-
cia para a psicopedagogia.
Assim como sabemos, a psicopedagogia foi construída por meio da con-
fluência de diferentes áreas do conhecimento. Em detrimento do fato de que a
interdisciplinaridade é um dos pilares da psicopedagogia, vamos entender como
se dá essa conexão entre os conhecimentos. Dessa forma, selecionamos as prin-
cipais áreas de conhecimento com as quais a psicopedagogia faz relação, ou seja,
a pedagogia, a psicologia, a psicanálise e o psicodrama, e enfatizamos os limites
entre as áreas de atuação de cada uma delas.
O trabalho psicopedagógico enfrenta, em seu cotidiano, situações de fracasso
escolar, o que atribui uma fundamental importância para o conhecimento dos
fatores que podem desencadear esse processo. Dessa forma, discorremos sobre
as concepções e as vertentes que norteiam a compreensão acerca do fracasso
escolar. Esse tema é bastante complexo e faz que você reflita sobre o contexto
educacional como um todo.
Enfim, esta unidade destaca temas que farão parte do cotidiano do psico-
pedagogo, oferecendo subsídios imprescindíveis para a compreensão do sujeito
e sua aprendizagem. Sendo assim, iniciamos nossos estudos.

Introdução
52 UNIDADE II

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
PSICOPEDAGOGIA E A APRENDIZAGEM

Sabemos que a aprendizagem é o objetivo principal do trabalho psicopedagógico.


Diante disso, acredito ser de fundamental importância que você tenha conhe-
cimento acerca desse tema, de acordo com diferentes teorias de conhecimento.
Segundo Barone, Martins e Castanho (2011), a psicopedagogia busca, por meio
do estudo de outras áreas de conhecimento, um aprofundamento no entendi-
mento acerca do processo de aprendizagem nos diferentes contextos em que ela
acontece. Para tanto, apresentaremos a aprendizagem sob a visão das principais
teorias que dão subsídio para a psicopedagogia.

ANÁLISE DO COMPORTAMENTO

A teoria que fundamenta a análise do comportamento é o behaviorismo, o qual


estuda o comportamento (behavior, no inglês), evidenciando as suas relações
com o ambiente. Dessa forma, aprofunda seu conhecimento no “papel e a influ-
ência dos estímulos ambientais na determinação das nossas ações” (PILETTI;
ROSSATO, 2012, p. 13).

TEMAS FUNDAMENTAIS PARA A PSICOPEDAGOGIA


53

O que é, entretanto, o comportamento para essa teoria? A resposta é que o


comportamento depende da interação ou da relação que se estabelece entre o
sujeito e o ambiente em que ele está inserido. Diante disso, verificamos uma inter-
dependência entre eles, já que um não existe desvinculado do outro (BARONE;
MARTINS; CASTANHO, 2011).
Sendo assim, passam a ser objeto de estudo dessa teoria o comportamento
público e o privado (estados subjetivos, sentimentos, cognições). A análise do
comportamento explica que o comportamento privado deve ser examinado
por meio da observação, assim como é feito com o comportamento público,
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

para que haja uma compreensão dos motivos de sua ocorrência. A aprendiza-
gem de cada um desses comportamentos ocorrerá por meio da interação do
sujeito com o meio, sendo divididos em dois tipos de comportamento: o res-
pondente e o operante.
O comportamento respondente ou reflexo é um comportamento reflexo, ou
seja, acontece como resposta imediata a um estímulo. Por exemplo, diante de uma
luz muito forte, os olhos se fecham. Já o comportamento operante é determinado
pela sua consequência, isto é, diante de um estímulo, o sujeito apresenta um com-
portamento que, por sua vez, gera consequências que podem levar a ocorrência,
ou não, do comportamento novamente (estímulo S → resposta R→ consequên-
cia C). O resultado ou a consequência do comportamento pode ser reforçadora
(positiva ou negativa) ou punitiva (BARONE; MARTINS; CASTANHO, 2011).
O trabalho da psicopedagogia, nessa perspectiva, consiste na análise dos
fatores que estão gerando as dificuldades de aprendizagem, os quais podem estar
associados ao repertório educacional do sujeito, isto é, falhas ou até mesmo ausên-
cia de habilidades necessárias para a aprendizagem de determinados conteúdos
(por exemplo, método não adequado para a necessidade do aluno). Assim, é
importante verificar as condições nas quais o problema escolar acontece, bem
como as suas consequências (HUBNER; MARINOTTI, 2000 apud BARONE;
MARTINS; CASTANHO, 2011). Em vista disso, Barone, Martins e Castanho
(2011) complementam que o psicopedagogo deverá mudar as situações antece-
dentes, programando consequências que sejam reforçadoras.

Psicopedagogia e a Aprendizagem
54 UNIDADE II

PSICANÁLISE

A psicanálise é considerada nas correntes psicológicas pela sua teoria, prática


e método de investigação. Essa teoria é uma reunião sistematizada de conteú-
dos referentes ao funcionamento da vida psíquica do sujeito. Enquanto método,
busca investigar e interpretar o que está velado, isto é, o que pode ser apresen-
tado por meio de atos, palavras ou produções imaginárias, como o sonho, por
exemplo (BOCK et al., 2002 apud NOGUEIRA; LEAL, 2018).

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Para Freud (1974 apud NOGUEIRA; LEAL, 2018), pai da psicanálise, nenhum
comportamento acontece por acaso: eles sempre estão relacionados a diferentes
causas, as quais, na maioria das vezes, não temos consciência. Segundo o autor,
essas causas estão associadas aos impulsos latentes de origem sexual.
Segundo Nogueira e Leal (2018), Freud compreendeu a psique humana e
desenvolveu a teoria do consciente, pré-consciente e inconsciente, bem como
a do aparelho psíquico dividido em Ego, Id e Superego. Além disso, definiu os
estágios do desenvolvimento psicossexual (oral, anal, fálico, latência e genital)
e o complexo de Édipo.

TEMAS FUNDAMENTAIS PARA A PSICOPEDAGOGIA


55

É importante destacar que, na psicopedagogia, a teoria psicanalítica tem


oferecido subsídios importantes para a compreensão do sujeito que aprende, res-
peitando seus desejos e atribuindo enfoque no prazer em aprender de maneira
significativa. Além disso, esclarece que o método de intervenção psicanalítico é
de domínio do psicólogo (NOGUEIRA; LEAL, 2018).

CONSTRUTIVISMO
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

O construtivismo tem suas bases na teoria da Epistemologia Genética, a qual


foi elaborada por Jean Piaget. Nessa teoria, o autor buscou compreender como
ocorre o processo de conhecimento no indivíduo como um todo, do nascer até a
vida adulta, mas suas pesquisas foram mais direcionadas para o desenvolvimento
infantil (NOGUEIRA; LEAL, 2018). Nesses estudos, observou as diferenças entre
a lógica de funcionamento mental infantil e a do funcionamento mental adulto,
bem como passou a investigar os mecanismos que levam a lógica infantil para a
adulta (DAVIS; OLIVEIRA, 1994 apud NOGUEIRA; LEAL, 2018).
Para a teoria de Piaget, conforme sustenta Nunes e Silveira (2008), o conhe-
cimento acontece de forma contínua, sendo construído por meio da relação do
indivíduo com o ambiente (social e físico). Os autores ainda ressaltam que o
desenvolvimento do ser humano acontece por intermédio de estágios, nos quais
ocorrem a organização tanto cognitiva quanto afetiva do sujeito, que se constrói
pela sua ação e as possibilidades apresentadas pelo ambiente.
Além disso, de acordo com Davis e Oliveira (1994 apud NOGUEIRA; LEAL,
2018), na teoria piagetiana, é de fundamental importância o conceito de equi-
libração (ou adaptação). Em outras palavras, o tempo todo, o organismo vivo
busca estabelecer um equilíbrio com o ambiente no qual está inserido. Essa
busca constante por um novo equilíbrio é denominada de equilíbrio majorante.
Nesse processo de equilíbrio majorante, dois mecanismos são fundamentais:
a assimilação e a acomodação. Sendo assim, para que ocorra a adaptação inte-
lectual, é preciso “o equilíbrio entre a assimilação da experiência às estruturas
(mentais) dedutivas e a acomodação dessas estruturas aos dados da experiên-
cia” (PIAGET, 2006, p. 157). Segundo Nogueira e Leal (2018), o equilíbrio é um

Psicopedagogia e a Aprendizagem
56 UNIDADE II

processo instável entre a assimilação e a acomodação, em que um não existe sem


o outro. Dessa interação, modificam-se ou criam-se novos esquemas mentais e,
consequentemente, novos conhecimentos.

A assimilação é um aspecto da atividade cognitiva que envolve a corpora-


ção de novos objetos e novas experiências a uma estrutura mental ou a um

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
esquema sensório motor. Já adaptação é um aspecto da atividade cognitiva
que envolve a modificação das estruturas mentais ou dos esquemas sensó-
rio-motores para corresponder aos objetos da realidade.
Fonte: Nogueira e Leal (2018, p. 126-127).

Diante disso, essa teoria depreende que o aluno é um sujeito ativo no seu pro-
cesso de aprendizagem, destacando seu modo de raciocinar e suas ações. Além
disso, compreende a sua maneira de interpretar e buscar soluções para os pro-
blemas ao entender que a construção do conhecimento se dá na interação com
o outro (NOGUEIRA; LEAL, 2018).
Para a psicopedagogia, a teoria desenvolvida por Piaget é de fundamental
importância, pois, na prática clínica, utiliza-se o diagnóstico operatório, o qual
é organizado por meio das provas piagetianas. Por sua vez, tais provas foram
elaboradas a partir dos estudos feitos pelo autor sobre a gênese do pensamento
lógico e racional (BARONE; MARTINS; CASTANHO, 2011).

HISTÓRICO CULTURAL

A teoria Histórico-Cultural tem, como seu principal representante, Lev


Semionovitch Vygotsky. Esse teórico estudou o processo de desenvolvimento
da criança, a relação entre o pensamento e a linguagem, bem como a função da
educação convencional no desenvolvimento do sujeito, mediante a colaboração
de Lúria e Leontiev (PILETTI; ROSSATO, 2012).

TEMAS FUNDAMENTAIS PARA A PSICOPEDAGOGIA


57

Segundo Leite, Leite e Prandi (2009, p. 204), Vygotsky busca compreender o


desenvolvimento intelectual partindo das relações histórico-sociais, explicando,
dessa forma, que o conhecimento “é socialmente construído pelas e nas relações
humanas”. Diante disso, os autores acrescentam que, na passagem do homem bio-
lógico para um ser humano social, é fundamental a convivência social. Portanto,
a aprendizagem resulta das interações sociais do sujeito, as quais possibilitam a
construção dos conhecimentos que servirão de alicerce para o desenvolvimento.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Partindo dessa visão, compreende-se que, no nascimento, o sujeito dispõe


somente das funções psicológicas elementares, mas é no processo de aprendiza-
gem da cultura que ele vai transformando-as em funções psicológicas superiores
(VYGOTSKY, 1991 apud LEITE; LEITE; PRANDI, 2009). Todavia, é importante
reforçar que esse processo necessita da intermediação explícita, ou não, daqueles
que interagem com o sujeito, visto que “é essa intermediação que dá às informa-
ções um caráter valorativo e significados sociais e históricos” (LEITE; LEITE;
PRANDI, 2009, p. 205).

Psicopedagogia e a Aprendizagem
58 UNIDADE II

Dessa forma, para essa teoria, a aprendizagem acontece em um processo


contínuo na interação com o outro, sendo fundamentais as relações sociocultu-
rais no desenvolvimento intelectual do sujeito (OLIVEIRA, 1992 apud LEITE;
LEITE; PRANDI, 2009). Vygotsky (1984), em seus estudos, também diferen-
cia dois níveis de desenvolvimento: o nível de desenvolvimento real ou efetivo
(relacionado ao que já foi conquistado) e o nível de desenvolvimento potencial
(refere-se às capacidades que podem ser construídas). O autor destaca, ainda,
a zona de desenvolvimento proximal, que se constitui no espaço entre o que o
sujeito pode fazer sem auxílio e aquilo que ele só vai desenvolver com ajuda de

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
alguém, sendo fundamental a intervenção de um mediador (LEITE; LEITE;
PRANDI, 2009).

A relação do indivíduo com os outros e com o meio em que vive é sempre


permeado por alguma vivência e/ou conhecimento já apropriado.

Essa teoria possibilita que o psicopedagogo, por meio da mediação, interfira na


zona de desenvolvimento proximal, oferecendo oportunidades ao sujeito para
que se aproxime do conhecimento científico que fora acumulado historicamente.
Na interação entre esse profissional e o sujeito que aprende, devem ser privile-
giadas as ações práticas, as diferentes formas de expressão, as interações sociais
e a organização do pensamento por meio do lúdico (BARONE; MARTINS;
CASTANHO, 2011).

TEORIA DA AFETIVIDADE

A teoria da afetividade tem, como mentor, Henry Wallon, cujos estudos se base-
aram em uma visão interacionista, na qual o desenvolvimento acontece por meio
da interação entre predisposições genéticas (próprias da espécie) e condições

TEMAS FUNDAMENTAIS PARA A PSICOPEDAGOGIA


59

ambientais. Dessa forma, o desenvolvimento da criança depende do encontro


de suas características genéticas com a sua situação de existência cotidiana, con-
siderando a sociedade, a época e a cultura em que está inserida (NOGUEIRA;
LEAL, 2018).
Wallon (1941, 2005 apud BARONE; MARTINS; CASTANHO, 2011, p. 206)
acrescenta ainda que:
O desenvolvimento é um processo contínuo de transformações, decor-
rentes da relação dialética organismo-meio e das diferentes dimensões
humanas, as quais denominou conjuntos funcionais: a afetividade, o
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ato motor, o conhecimento e a pessoa.

O estudioso também destaca que esses domínios funcionais seguem as leis de


alternância, predominância e integração. Além do mais, esse processo ocorre por
meio de estágios, os quais o autor denominou de impulsivo-emocional, sensório
motor e projetivo, personalismo, categorial, puberdade e adolescência.
No trabalho psicopedagógico, é importante considerar algumas concepções
de Wallon acerca: i) da compreensão das disciplinas mentais (capacidade da
criança em ter o controle sobre suas emoções); ii) das manifestações da criança
nos jogos; iii) da observação do contexto em que ela está inserida (BARONE;
MARTINS; CASTANHO, 2011).
Barone, Martins e Castanho (2011, p. 237) destacam, enquanto elemento
relevante, a necessidade de que:
O psicopedagogo compreenda e avalie o processo ensino-aprendiza-
gem, e não somente a dificuldade de aprendizagem, pois além do apa-
rato cognitivo, é nas relações de interação social e de afeto que estas
construções se dão, principalmente na relação com o adulto educador,
sejam eles os pais, ou professores.

Ressaltamos até aqui algumas das principais teorias de aprendizagem que auxi-
liam o psicopedagogo na compreensão de como a criança aprende. Contudo,
destaco que, neste momento, a intenção é a de apenas apresentar essas teorias,
sendo de suma importância o seu aprofundamento sobre, a fim de que haja um
efetivo trabalho psicopedagógico.

Psicopedagogia e a Aprendizagem
60 UNIDADE II

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
PSICOPEDAGOGIA: DESENVOLVENDO A
INTERDISCIPLINARIDADE

A interdisciplinaridade é um tema de extrema relevância para a psicopedagogia,


pois essa maneira de compreender o sujeito e sua aprendizagem é um dos pila-
res de sustentação da prática psicopedagógica. No entanto, é preciso que você
tenha claro o seu significado e as relações que a psicopedagogia estabelece com
outras áreas de conhecimento.

ENTENDENDO A INTERDISCIPLINARIDADE

Após Segunda Guerra Mundial, muitos foram os questionamentos referentes aos


avanços da tecnologia e o seu compromisso com as consequências. Dessa forma,
verificou-se “que as disciplinas científicas, enquanto produtoras de conhecimentos,
não poderiam continuar sendo tratadas de forma isoladas, tornando-se necessário
uma ruptura nessa forma de organização do saber” (FONSECA et al., 2015, p. 7596).
Contudo, foi só a partir da década de 1970 que as discussões sobre a abor-
dagem interdisciplinar avançaram. Para tanto, buscou-se estabelecer relações
entre os conhecimentos, até então compreendidos de forma compartimentali-
zada, exacerbados, muitas vezes, pela arrogância de especialistas, para estabelecer
vínculos entre diferentes disciplinas (FONSECA et al., 2015).

TEMAS FUNDAMENTAIS PARA A PSICOPEDAGOGIA


61
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Diante disso, Fonseca et al. (2015) definem que a interdisciplinaridade consiste


em ser uma maneira de entender a conexão entre conhecimentos diferentes que
se unem com o intuito de inovar, ampliando o saber, recuperando possibilida-
des e superando o pensamento fragmentado.
Assim, a interdisciplinaridade busca a compreensão de conteúdos complexos,
os quais necessitam da comunicação entre diferentes disciplinas. “Tal interação
pode ser desde uma simples comunicação de ideias até a integração de teorias
envolvidas nesta interação, os conceitos fundamentais, os dados e os métodos
de investigação” (SOBRINHO, 2016).
Dessa forma, a psicopedagogia procura compreender o processo de apren-
dizagem tendo, como referencial, diferentes áreas de conhecimento, tais como a
psicologia, pedagogia, psicanálise, psicodrama e entre outras afins. Esclareceremos
essas relações nos itens a seguir:

Psicopedagogia: Desenvolvendo a Interdisciplinaridade


62 UNIDADE II

PSICOPEDAGOGIA E SUA RELAÇÃO COM A PEDAGOGIA

A relação entre a psicopedagogia e a pedagogia é de longa data e é de fundamen-


tal importância diferenciar o papel de cada uma delas. Segundo Claro (2018, p.
135), “a psicopedagogia tem por objeto de estudo o processo ensino aprendiza-
gem e considera que o ato de aprender abrange as condições cognitivas, afetivas,
criativas e associativas”.
Já a pedagogia possui seu conhecimento fundamentado em concepções e
teorias que buscam compreender as práticas e fenômenos educativos, a fim de

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
obter a organização e a sistematização das ações pedagógicas no contexto esco-
lar (CLARO, 2018).
Para Gasparin (1997 apud CLARO, 2018), a escola é o lugar onde acontece o
processo de ensino-aprendizagem de conhecimentos que foram construídos ao
longo da história. No entanto, muitas vezes, os desequilíbrios ocorridos nesse pro-
cesso não são entendidos pela própria escola. Diante disso, Claro (2018) esclarece
que a psicopedagogia pode auxiliar a pedagogia, a fim de equilibrar esse processo.
Contudo, como a psicopedagogia pode ajudar? Barbosa (2001) explica que,
uma vez que o processo de ensino-aprendizagem é o foco de estudo da psicope-
dagogia, essa área de conhecimento pode ajudar a escola a resgatar o prazer no
ato de aprender. Além disso, sustenta que:
Transformar a aprendizagem em prazer não significa realizar uma ati-
vidade prazerosa, e sim descobrir o prazer de: construir ou descons-
truir o conhecimento; transformar ou ampliar o que se sabe; relacionar
conhecimentos entre si e com a vida; ser coautor ou autor do conhe-
cimento; permitir-se experimentar diante de hipóteses; partir de um
contexto para a descontextualização e vice-versa; operar sobre o conhe-
cimento já existente; buscar o saber a partir do não saber; compartilhar
suas descobertas; integrar ação, emoção e cognição; usar a reflexão so-
bre o conhecimento e a realidade; conhecer a história para criar novas
possibilidades (BARBOSA, 2001, p. 53).

Dessa forma, Claro (2018) esclarece que a psicopedagogia pode ajudar a escola a: i)
melhorar o processo ensino-aprendizagem; ii) promover o trabalho em equipe, com o
intuito de integrar os sujeitos; iii) elaborar projetos educativos que busquem estreitar
as relações entre a família e a escola; iv) promover cursos de formação e aprimora-
mento dos docentes; v) contribuir com equipe multiprofissional; entre outras ações.

TEMAS FUNDAMENTAIS PARA A PSICOPEDAGOGIA


63

A psicopedagogia e a pedagogia devem caminhar juntas, a fim de resolve-


rem os desafios apresentados pela escola. Assim, devem não apenas diagnosticar
as dificuldades de aprendizagem, mas elaborar intervenções que possibilitem a
superação dos problemas de aprendizagem (CLARO, 2018).

PSICOPEDAGOGIA E A PSICOLOGIA

Para a psicologia, a aprendizagem é um processo em constante investigação. Em


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sua construção histórica, foram desenvolvidas diversas teorias psicológicas para


compreender esse processo de ensino-aprendizagem. Segundo Claro (2018), a psico-
pedagogia e a psicologia interagem, a fim de contribuírem para a educação do aluno.
O trabalho em psicologia escolar, de acordo com Andaló (1984, p. 46), tem
se consolidado como um agente de mudanças. Dessa forma:
Temo-nos voltado basicamente para a constituição de grupos opera-
tivos com alunos, professores e equipe técnica, no sentido de encami-
nhar uma reflexão crítica sobre a instituição, incluindo o processo de
ensino-aprendizagem, a relação professor-aluno, as mudanças sociais
que estão ocorrendo, evidenciando, com isso, a defasagem cada vez
maior que se estabelece entre a escola e a vida. Dessa maneira, procura-
mos desfocar a atenção sobre o aluno como única fonte de dificuldades,
como o único responsável e culpado pela crise geral pela qual a escola
passa, propiciando uma visão mais global e mais compreensiva desta
crise, procurando considerar todos os seus aspectos e, conjuntamente,
encontrar formas alternativas de enfrentá-la.

Essa visão da psicologia apresenta mudanças importantes na maneira de com-


preender as dificuldades do educando, não se limitando à aplicação de testes e
à utilização de métodos e procedimentos da psicologia clínica (CLARO, 2018).
A psicopedagogia, em sua interface com a psicologia, visa compreender o
contexto interno e externo por meio de diferentes conhecimentos científicos
acerca da intervenção nas dificuldades cognitivas, orgânicas, familiares, sociais
e pedagógicas, a fim de planejar estratégias que possibilitem avanços no processo
de aprendizagem (ALENCAR et al., 2013). Para tanto, é de fundamental impor-
tância que o psicopedagogo conheça os seus limites de atuação, encaminhando
problemáticas para especialistas, quando necessário.

Psicopedagogia: Desenvolvendo a Interdisciplinaridade


64 UNIDADE II

PSICOPEDAGOGIA E A PSICANÁLISE

Segundo Franco e Albuquerque (2010), a psicanálise oferece a sua contribui-


ção para a educação por meio da sua teoria de desenvolvimento humano e com
o seu entendimento sobre o aparelho psíquico. Com esses aparatos, essa teoria
proporciona uma reflexão diferente dos processos educativos, incluindo ques-
tionamentos sobre a transferência e contratransferência, o reconhecimento
de medos e angústias relacionados ao aprender, bem como os mecanismos de
identificação projetiva que aparecem tanto na aprendizagem quanto na rela-

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
ção educativa.

Transferência é o processo inconsciente pelo qual a pessoa tende a relacio-


nar-se com outra, de maneira análoga a um relacionamento primitivo, ge-
ralmente, com uma figura paterna ou de autoridade com o qual o objeto
atual foi identificado. Já a contratransferência são os sentimentos e reações
do terapeuta para com o paciente, os quais são baseados em seus relaciona-
mentos passados, com figuras significativas.
Fonte: D’Andrea (1996).

Tendo em vista o que fora exposto, essa abordagem é de grande relevância na


compreensão do desenvolvimento do sujeito nos aspectos cognitivos e psicoa-
fetivos, contribuindo de maneira significativa na ação psicopedagógica. Isso se
deve, visto que, muitas vezes, o fato do sujeito não aprender não está relacio-
nado a questões orgânicas, mas pode referir-se a questões de baixa autoestima,
traumas, bullying, entre outros problemas emocionais de origem familiar ou
social (CLARO, 2018). Com embasamento na psicanálise, o profissional de psi-
copedagogia pode levantar hipóteses acerca dos possíveis motivos que estão
interferindo na aprendizagem do aluno e encaminhá-lo para uma avaliação
psicológica.

TEMAS FUNDAMENTAIS PARA A PSICOPEDAGOGIA


65

PSICOPEDAGOGIA E O PSICODRAMA

O psicodrama é uma abordagem psicoterápica que faz uso de técnicas de dra-


matização para trabalhar os conflitos do sujeito ou de um grupo. Essa teoria foi
elaborada por Jacob Levy Moreno, cuja compreensão de homem é a de que é “um
ser em relação e seu crescimento depende das interações que ele realiza consigo
próprio” (MORENO, 1974 apud CLARO, 2018, p. 144).
De acordo com Marques (2018 apud CLARO, 2018), Moreno desenvol-
veu técnicas para que o indivíduo possa enxergar a si mesmo e o problema que
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

está vivenciando. Alguns exemplos dessas técnicas são a inversão de papéis, a


dramatização da cena e a técnica de espelho.

Um dos conceitos principais do psicodrama é a espontaneidade, que se carac-


teriza por meio de quatro expressões: pela qualidade dramática (que possibilita
vivacidade e novidade ao que é repetitivo); criatividade (capacidade de criação,
seja de invenções, obras, nascimento, novos ambientes entre outros); originali-
dade (habilidade de expressar-se livremente, de maneira diferente das conservas
culturais); e adaptação das respostas (dar uma resposta adequada para as situ-
ações que surgem de maneira inesperada, tendo flexibilidade e mobilidade de
eu) (MORENO, 2003).

Psicopedagogia: Desenvolvendo a Interdisciplinaridade


66 UNIDADE II

Quando o comparamos com muitas outras funções cerebrais, como a inte-


ligência e a memória, o sentido da espontaneidade demonstra estar menos
desenvolvido. Talvez isso se deva ao fato de que, na civilização de conservas
que criamos, a espontaneidade é muito menos utilizada e treinada do que,
por exemplo, a inteligência e a memória.
(Jacob Levy Moreno)

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
As contribuições do psicodrama para a psicopedagogia estão relaciona-
das com a utilização de atividades lúdicas que possibilitam que o sujeito
manifeste a sua criatividade e desenvolva a sua espontaneidade tanto no con-
texto individual quanto em grupo. Além disso, tais atividades facilitam a
integração e socialização. Sendo assim, as técnicas psicodramáticas possibi-
litam o despertar, a fantasia e o encontro com a realidade interna do sujeito
(CLARO,2018).
Findando, é fundamental reassegurar que todas essas áreas de conhecimento
transpassam pela psicopedagogia, proporcionando subsídios importantes para
a sua prática. Além disso, propiciam o conhecimento necessário para que se
identifique as reais necessidades do sujeito, fazendo os encaminhamentos que
forem necessários.

TEMAS FUNDAMENTAIS PARA A PSICOPEDAGOGIA


67
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

A VISÃO DA PSICOPEDAGOGIA SOBRE O FRACASSO


ESCOLAR

As discussões sobre o fracasso escolar têm sido constantes na educação. Estudos


nas mais diferentes áreas de conhecimento – psicologia, pedagogia, psicanálise,
história, entre outros – têm buscado compreender as razões desse fracasso. Tais
trabalhos, por sua vez, ora culpabilizam o educando, ora o professor, outras vezes
a família ou o sistema, mas todos reconhecem a necessidade de se ter um conhe-
cimento aprofundado, o qual possibilite uma intervenção urgente para mudar
a situação. Portanto, o conhecimento sobre esse tema é fundamental para a sua
atuação enquanto psicopedagogo.
Diante disso, vamos compreender como esse processo foi acontecendo no
Brasil. Cordié (1996) explica que o fracasso escolar se despontou a partir do século
XIX, quando foi instaurada a educação obrigatória, a qual provocou mudanças
importantes na sociedade. Para a autora:
Não é somente a exigência da sociedade moderna que causa os
distúrbios, como se pensa muito frequentemente, mas um sujeito que
expressa seu mal-estar na linguagem de uma época em que o poder
do dinheiro e o sucesso social são valores predominantes (CORDIÉ,
1996, p. 17).

A Visão da Psicopedagogia Sobre o Fracasso Escolar


68 UNIDADE II

Analisando o fracasso escolar do ponto de vista social, verifica-se que o sistema


escolar, ao longo dos anos, ampliou o número de vagas, facilitando o acesso à
educação. No entanto, não conseguiu desenvolver ações que possibilitassem a sua
eficiência e a garantia do cumprimento de sua proposta principal, ou seja, a cida-
dania. Com isso, o que era para fomentar melhores condições de vida acabou por
produzir o insucesso e a marginalização de muitos educandos (BOSSA, 2008).
Para Bossa (2008), no Brasil, o conhecimento ainda é distribuído de maneira
desigual, já que alguns são privilegiados e outros são discriminados. Com isso, a
escola precisa de mudanças urgentes para que se possa ser resgatado o seu obje-

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tivo principal, que era o de suscitar o conhecimento mediante o vencimento de
questões como: “evasão escolar, aumento crescente de alunos com problemas
de aprendizagem, formação precaríssima dos que conseguem concluir o ensino
fundamental, desinteresse geral pelo trabalho escolar” (BOSSA, 2008, p.19).
Sawaia (2002) acrescenta, ainda, outros fatores, tais como: condições mate-
riais, pedagógicas e administrativas precárias em escolas públicas que oferecem
o Ensino Fundamental; número exagerado de atividades burocráticas; formação
e condições de trabalho rudimentar do professor; conteúdos e funções esvazia-
dos; ausência de autonomia e falta de valorização do profissional da educação.

Dessa forma, a escola passa a não cumprir com o seu papel de oferecer aos edu-
candos o acesso à herança cultural e aos conhecimentos que foram construídos ao
longo da história da humanidade, o que impossibilita uma melhor compreensão

TEMAS FUNDAMENTAIS PARA A PSICOPEDAGOGIA


69

do contexto em que o sujeito está inserido. No entanto, estudos revelam que a


complexidade desse tema envolve três principais concepções: médica, psicomé-
trica e sociopolítica (BOSSA, 2008).
Acerca da concepção médica, Bossa (2008) esclarece que, historicamente, os
problemas de aprendizagem foram investigados primeiramente pela medicina e
as suas causas eram relacionadas a alterações biológicas. Essa visão organicista
das dificuldades de aprendizagem teve seu início no século XIX e permaneceu
até recentemente no Brasil.
Já a concepção psicométrica teve, como precursores, Binet, o qual criou
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

os primeiros testes de inteligência, e Simon. Nessa visão, o fracasso escolar


era atribuído ao déficit intelectual, mais precisamente ao baixo QI (quociente
de inteligência), e qualquer dificuldade de aprendizagem passava a ser asso-
ciada à debilidade mental. No entanto, é fundamental não nos atermos ao
resultado do teste, ou seja, ao potencial intelectual do educando, mas estar
atento ao que ele possui, mas não consegue desenvolver (OCAMPO, 1994
apud BOSSA, 2008).

O quociente intelectual (Q.I.) foi proposto por Stern. É o quociente de uma


fração que tem por numerador o produto da idade mental por 100, e por
denominador a idade cronológica.
Fonte: Carvalho (1951, p. 144).

Sobre a concepção sociopolítica, Patto (1999 apud BOSSA, 2008) revela que o
próprio sistema educacional gerou obstáculos ao longo dos anos, que vêm dificul-
tando a efetivação de seus objetivos. Em consequência disso, a autora esclarece que:

As relações hierárquicas de poder, a segmentação e a burocratização


do trabalho pedagógico criam condições institucionais para adesão dos
educadores à simularidade, a uma prática motivada, acima de tudo, por
interesses particulares, a um comportamento caracterizado pelo des-
compromisso social (PATTO, 1999 apud BOSSA, 2008, p.24).

A Visão da Psicopedagogia Sobre o Fracasso Escolar


70 UNIDADE II

Outros fatores, tais como as condições de vida e de subsistência de uma parcela


considerável da população estudantil brasileira, bem como as questões ideo-
lógicas, permeiam o sistema educacional brasileiro e devem ser considerados
obstáculos para a aprendizagem escolar (BOSSA, 2008).

ALGUMAS VERTENTES DO FRACASSO ESCOLAR

Em um estudo realizado por Angelucci et al. (2004), verificou-se que as pes-

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
quisas realizadas sobre o fracasso escolar no Ensino Fundamental apresentam
quatro vertentes de entendimento sobre esse processo, as quais apresentare-
mos a seguir:

Fracasso escolar e a culpabilização do aluno e da família

Nessa perspectiva, podemos averiguar que os motivos do fracasso escolar estão


relacionados aos problemas de capacidade intelectual do aluno, devido às dificul-
dades emocionais. Em outras palavras, ele apresenta uma organização psíquica
imatura, a qual desencadeia uma alteração na atenção, ansiedade, agressividade,
dependência etc., provocando problemas relacionados à inibição intelectual e à
psicomotricidade, o que gera dificuldades de aprendizagem.
No entanto, é importante frisar que essas dificuldades são desencadea-
das por alterações emocionais resultantes de relações familiares patológicas.
Questões relacionadas à carência cultural decorrente das condições socioeco-
nômicas do aluno também são entendidas como causa da falta de sucesso na
escola (ANGELUCCI et al., 2004).
Nessa visão, ocorre uma compreensão de que a escola é um local harmô-
nico, a qual apresenta as condições ideais para que o aluno possa desenvolver
as suas potencialidades: cabe a ele adaptar-se. Podemos verificar, com isso, uma
concepção de normalidade, na qual a não adequação à escola ou o desconten-
tamento com as particularidades do ambiente escolar são compreendidas como
uma incapacidade do indivíduo (ANGELUCCI et al., 2004).

TEMAS FUNDAMENTAIS PARA A PSICOPEDAGOGIA


71
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Em uma pesquisa realizada por Leonardo, Leal e Rossato (2012), foram analisa-
dos diversos artigos sobre queixa escolar. Mediante essa pesquisa, verificou-se
que, em 65% desses trabalhos, a causa da não aprendizagem estava relacionada
ao aluno, ou seja, a responsabilidade é desse sujeito, “como se todas as outras ins-
tâncias estivessem realizando seu papel de forma adequada, ou que as falhas das
mesmas não interferissem de algum modo no insucesso escolar” (LEONARDO;
LEAL; ROSSATO, 2012, p. 34).
Machado (1997) enfatiza a relevância de se ponderar o histórico tanto escolar
quanto social do aluno, pois o seu insucesso não está apenas relacionado com as
questões de ordem individual, dado que muitos outros fatores sociais e escolares
podem intervir para o seu fracasso escolar. O autor também enfatiza a impor-
tância de se questionar sobre o funcionamento das relações que se estabelecem
no processo de aprendizagem e podem gerar esse fracasso.

A Visão da Psicopedagogia Sobre o Fracasso Escolar


72 UNIDADE II

Laudos invariavelmente ausentes de substrato teórico; mergulhados no


senso comum; lacônicos; arbitrários; carentes de crítica; feitos com uma dis-
plicência reveladora de desrespeito ao cliente e de certeza de que as vítimas
destas práticas não têm nenhum poder a opor ao poder técnico servem na
verdade, para estancar a carreira escolar de tantos pequenos brasileiros.
Fonte: Patto (1995, p. 16).

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
É importante ressaltar que o psicopedagogo deve estar atento a esses fatores para
não correr o risco de entender que o sujeito é o único responsável pela sua pró-
pria problemática apresentada, reduzindo a dificuldade de aprendizagem a uma
patologia individual.

Fracasso escolar e a culpabilização do professor

Nessa perspectiva, o foco passa a ser atribuído nas técnicas de ensino que não são
adequadas para as necessidades do aluno ou quando não há o domínio dessas téc-
nicas por parte do professor, enfatizando o descaso das autoridades em oferecer
uma formação técnica apropriada ao docente. Novamente, percebe-se que a com-
preensão acerca do fracasso escolar está voltada para variáveis individuais, no caso,
agora, para a capacidade profissional do professor (ANGELUCCI et al., 2004).
Dentro dessa perspectiva, acredita-se que as dificuldades do aluno podem ser
remediadas se o professor fizer uso de técnicas de ensino apropriadas. Defende-se,
assim, que a técnica de ensino adequada vai oferecer as condições para que o aluno
consiga desenvolver as suas potencialidades. Essa concepção do fracasso escolar
enfatiza a preocupação com a prática pedagógica (ANGELUCCI et al., 2004).
O desgaste físico e emocional dos professores, segundo Asbahr e Souza
(2007), tem sido a consequência direta das condições pelas quais os professores,
hoje, têm enfrentado em sala de aula. Em outras palavras, as políticas pedagó-
gicas têm sabotado a função do professor, apresentando condições de trabalho
que tiram a sua autoridade e enfraquecem o ensino.

TEMAS FUNDAMENTAIS PARA A PSICOPEDAGOGIA


73

Na prática psicopedagógica, é preciso estar atento às condições pelas quais


o ensino está sendo conduzido dentro do contexto escolar, buscando compre-
ender os fatores que podem estar dificultando o processo ensino-aprendizagem.
No entanto, deve-se ter cuidado para não determinar esses fatores como a razão
do fracasso escolar.

Fracasso escolar e a instituição escolar

A escola, enquanto instituição, pode ser compreendida, de uma maneira con-


Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

traditória, como reprodutora e transformadora do contexto social. Nessa


perspectiva, pesquisas afirmam que o fracasso escolar está presente desde que
o ensino público brasileiro foi implantado. Ao analisar a produção do fracasso
escolar, é preciso compreender que a escola se estabelece no interior de uma
sociedade de classes e é fundamentada no interesse do capital, cujas políti-
cas públicas também são determinantes nesse fracasso (ANGELUCCI et al.,
2004). Diante disso:
A reversão desse quadro requer, da política educacional, resistência
aos interesses privatizantes e compromisso com a construção de uma
escola pública capaz de distribuir com mais igualdade habilidades e co-
nhecimentos que lhe cabe transmitir (ANGELUCCI et al., 2004, p.62).

Portanto, a psicopedagogia tem um papel importante na análise desse contexto


institucional. Ao utilizar os conhecimentos interdisciplinares, oferece subsídios
para que haja reflexões sobre os reais propósitos da escola.

Fracasso escolar e questões políticas

Essa visão parte da concepção de que a escola é uma instituição social que segue
a lógica da sociedade de classes. Dessa forma, discute-se, aqui, as relações de
poder que acontecem no interior da escola, ressaltando a arbitrariedade com que
ela não reconhece a cultura popular e é organizada com base na cultura domi-
nante (ANGELUCCI et al., 2004).
Dentro dessa perspectiva, Angelucci et al. (2004, p. 63) destacam a impor-
tância de se fazer uma ruptura epistemológica:

A Visão da Psicopedagogia Sobre o Fracasso Escolar


74 UNIDADE II

Do conhecimento sobre a “criança fracassada”, o “professor incompe-


tente”, as “famílias desestruturadas” para o conhecimento que incorpo-
ra a fala dos alunos, dos profissionais da escola, das famílias das classes
populares, numa proposta de resgate da legitimidade de seus saberes,
experiências e percepções.

A psicopedagogia pode auxiliar na transformação desse processo a partir do


momento em que não se vincula a determinadas posturas educacionais que
estejam distantes da realidade do educando, contribuindo com propostas que
promovam uma educação de qualidade para todos.
De acordo com Silva (2016), dentre os indicadores da qualidade na educação,

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
os quais foram publicados em 2004, estão o acesso, a permanência e o sucesso
na escola. Diante disso, é fundamental que a escola eleve o educando ao cen-
tro de suas preocupações, incentivando seu desenvolvimento e promovendo as
relações interpessoais. Além disso, a equipe escolar deve acreditar no potencial
de aprendizagem de seus alunos.
Na próxima unidade, você poderá aprofundar seus conhecimentos sobre os
fatores que interferem na aprendizagem do aluno.

TEMAS FUNDAMENTAIS PARA A PSICOPEDAGOGIA


75

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Chegamos ao final desta unidade com a certeza de que você teve acesso aos prin-
cipais temas que permearão a sua prática como psicopedagogo. Acerca das teorias
de aprendizagem, podemos verificar que cada uma delas apresenta pontos rele-
vantes para a compreensão de como o sujeito aprende. Mesmo divergindo em
suas particularidades, cada uma delas apresenta subsídios ao psicopedagogo no
entendimento desse processo. Pode ser que você tenha se identificado com uma
dessas teorias, encontrando, nela, respostas para os seus questionamentos sobre
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

o processo aprendizagem. No entanto, enquanto profissional da área da educa-


ção, é essencial o conhecimento a respeito de todas.
Em relação ao desenvolvimento da interdisciplinaridade, consideramos
a sua importância para a compreensão do sujeito como um todo. O conheci-
mento compartilhado de outras áreas tem possibilitado a delimitação do campo
de atuação da psicopedagogia, diferenciando, assim, as funções específicas de
cada atividade profissional. Como constatamos, cada uma das áreas estudadas
apresenta conhecimentos que vão contribuir para um melhor entendimento do
processo de aprendizagem do educando.
Entretanto, e quando essa aprendizagem não acontece e nos deparamos com
o fracasso escolar? Como percebemos, no Brasil, houve mudanças importantes
que asseguraram o acesso do sujeito à educação, mas pouco se avançou acerca da
aquisição de conhecimentos científicos acumulados e da herança cultural. Você
pode perceber diferentes opiniões que justificam esse fracasso e que se centra-
lizam ora no indivíduo (aluno, professor, família), ora no contexto mais amplo,
ou seja, na escola, no sistema ou nas políticas públicas. Todavia, esse conheci-
mento nos permite fazer uma análise minuciosa do contexto como um todo,
compreendendo que a culpabilização não é o caminho para a solução da situação.
Dessa forma, acredito que as discussões propostas nesta unidade te levem a
ampliar o seu olhar para a aprendizagem e a educação, estruturando um pensa-
mento crítico para todo esse processo. Partindo desse embasamento, na próxima
unidade, delimitaremos ainda mais o corpo teórico da psicopedagogia.

Considerações Finais
76

1. O aluno é um sujeito ativo em seu processo de aprendizagem. Tudo isso, por


meio da sua maneira de raciocinar e das suas ações, compreendendo a sua
forma de interpretar e solucionar os problemas. Nesse processo de construção
do conhecimento, a interação com o outro é fundamental. Essa afirmação se
refere à teoria:
a) Histórico Cultural.
b) Teoria da Afetividade.
c) Construtivismo.
d) Psicanálise.
e) Análise do Comportamento.
2. Considerando a teoria histórico-cultural, cujos estudos se voltaram para o
desenvolvimento, a relação entre o pensamento e a linguagem, bem como a
função da educação formal para o desenvolvimento do sujeito, analise as afir-
mativas a seguir:
I. A zona de desenvolvimento proximal se constitui no que o sujeito só vai
conseguir realizar com ajuda de alguém.
II. A aprendizagem acontece em um processo contínuo, na interação com o
outro, sendo fundamentais as relações socioculturais no desenvolvimento
intelectual do sujeito.
III. Existem dois níveis de desenvolvimento: o nível de desenvolvimento real ou
efetivo (relacionado ao que já foi conquistado) e o nível de desenvolvimento
potencial (refere-se a capacidades que podem ser construídas).
IV. Podemos observar que, desde o nascimento, o sujeito dispõe das funções
psicológicas superiores.
É correto afirmar que:
a) Apenas as afirmativas I e II estão corretas.
b) Apenas as afirmativas II e III estão corretas.
c) Apenas a afirmativa II está correta.
d) Apenas as afirmativas II, III e IV estão corretas.
e) Apenas as afirmativas III e IV estão corretas.
77

3. A análise do comportamento aprofunda o seu conhecimento na função e na


influência dos estímulos advindos do ambiente enquanto determinantes nas
ações do sujeito. Tendo, como base, essa teoria, julgue as afirmativas a seguir
com (V) para as Verdadeiras e (F) para as Falsas:
( ) O comportamento operante é uma resposta imediata frente a um estímulo.
( ) A aprendizagem tanto do comportamento público quanto do privado
acontecerá na interação com o meio.
( ) O desenvolvimento depende da relação entre as características genéticas
e o contexto do cotidiano da criança, ponderando os aspectos sociais, cul-
turais e da época.
( ) A consequência de um comportamento pode ser tanto reforçadora quan-
to punitiva.
A sequência correta é:
a) V, V, F, F.
b) F, V, V, V.
c) V, V, V, F.
d) F, V, F, V.
e) F, F, V, V.
4. Assim como estudamos, a interdisciplinaridade tem um papel fundamental na
prática psicopedagógica. Em detrimento do fato de que a pedagogia é uma
das áreas de conhecimento que se conecta com a psicopedagogia, esclareça o
papel de cada uma delas.
5. Na abordagem teórica do psicodrama, segundo Moreno (2003), o principal
conceito a ser compreendido é o da espontaneidade. Acerca das expressões
da espontaneidade, é correto afirmar que:
I. A adaptação das respostas consiste em dar uma resposta adequada para as
situações que surgem de maneira inesperada, tendo flexibilidade e mobili-
dade do eu.
II. A criatividade baseia-se na capacidade de criação, seja de invenções, obras,
nascimento, novos ambientes e entre outros.
III. A originalidade possibilita vivacidade e novidade ao que é repetitivo.
IV. A qualidade dramática fundamenta-se na habilidade de se expressar livre-
mente, de maneira diferente das conservas culturais.
78

É correto afirmar que:


a) Apenas as afirmativas I e II estão corretas.
b) Apenas as afirmativas II e III estão corretas.
c) Apenas as afirmativas I e III estão corretas.
d) Apenas a afirmativa I está correta.
e) Apenas as afirmativas I, II e III estão corretas.
6. Explique a importância da psicanálise para a prática psicopedagógica.
7. Segundo Bossa (2008), a compreensão do fracasso escolar perpassa por três
concepções. Assinale a alternativa que corresponde à concepção psicométrica:
a) Considera as questões ideológicas que permeiam o sistema brasileiro de
educação enquanto fator importante no fracasso escolar.
b) Dentro dessa perspectiva, o fracasso escolar está relacionado ao déficit inte-
lectual, ou seja, a um quociente de inteligência abaixo do esperado.
c) As dificuldades de aprendizagem foram investigadas primeiramente pela
medicina.
d) O próprio sistema educacional vem gerando obstáculos que dificultam a
realização de seus objetivos.
e) Essa concepção tinha uma visão organicista das dificuldades de aprendizagem.
8. Quando consideramos a prática pedagógica como uma das principais preo-
cupações sobre o fracasso escolar, estamos enfatizando qual das vertentes do
fracasso escolar?
a) Fracasso escolar e questões políticas.
b) Fracasso escolar e a culpabilização do aluno e da família.
c) Fracasso escolar e a instituição escolar.
d) Fracasso escolar e a culpabilização do professor.
e) Fracasso escolar e a culpabilização da família.
79

OS DESAFIOS E PERSPECTIVAS DA ESCOLA CONTEMPORÂNEA

A escola atual não está conseguindo cor- Nesse sentido, “a escola torna-se cada vez
responder às demandas da sociedade. mais o palco de fracassos e de formação
As exigências do mundo atual apontam precária”. Isso porque as frágeis condi-
para uma educação diferenciada; exigindo ções tanto estruturais quanto funcionais
qualificação mais esmerada e constante for- de muitas escolas contribuem em grande
mação e informação dos educadores, uma parte para o fracasso escolar. Tais esco-
vez que o mundo globalizado aponta para las, na maioria das vezes, não conseguem
incessante transformação. lidar com as responsabilidades que lhes
são delegadas. Nesse contexto, os profes-
Esse desencontro entre escola e sociedade sores, não raras vezes, se veem oprimidos,
pode gerar e/ou fortalecer os processos de angustiados e com inúmeras incertezas,
exclusão, sobretudo, considerando uma fato esse que, em geral, se reflete na rela-
sociedade cujo conhecimento é distribu- ção com os alunos.
ído de forma desigual. Esse aspecto social
se apresenta como um expressivo desafio Devem-se reconhecer as tentativas de reor-
da escola nos dias atuais, na medida em que ganização da escola no sentido de prevenir
algumas pessoas são privilegiadas e outras e solucionar o fracasso escolar. Entretanto,
não conseguem ter acesso ao conhecimento. a busca de respostas para o grande número
Nessa mesma perspectiva, Bossa afirma que: de crianças e jovens com dificuldades de
“vivemos em um país em que a distribuição aprendizagem exige da escola um repen-
do conhecimento como fonte de poder social sar em relação aos seus processos. Nesse
é feita privilegiando alguns e discriminando sentido, reconhecemos em Paín um indi-
outros. Precisamos buscar soluções para que cativo para esse repensar, pois, para a
a escola seja eficaz no sentido de promover autora, a educação pode ser alienante ou
o conhecimento e, assim, vencer problemas libertadora, dependendo de como ela é
cruciais e crônicos de nosso sistema educa- instrumentalizada. É tomando a preocupa-
cional: evasão escolar, aumento crescente ção de Paín que pensamos na escola como
de alunos com problemas de aprendizagem, possível (re)produtora de problemas de
formação precaríssima dos que conseguem aprendizagem.
concluir o ensino fundamental, desinteresse
geral pelo trabalho escolar”.
80

Fernández, na mesma lógica de Paín, faz cada vez mais responsável pela exclusão
referências a “uma sociedade enferma e de muitas crianças e jovens. Sendo assim,
causadora de enfermidades, que provoca o espaço escolar que deveria ser de for-
oligotimia social e grande parte dos trans- mação de indivíduos críticos e capazes de
tornos de ‘aprendizagem reativos’[...]”. Estes transformar a realidade pode tornar-se
elementos permitem considerar que no um ambiente que contribui para o apri-
social e, especialmente em nossas escolas, sionamento da inteligência e, portanto, a
a (re)produção do fracasso escolar torna-se exclusão.

[...]
Costa ilustra o momento atual da educação contemporânea salientando que: “[...] pa-
rece que a escola do século XXI ainda se mantém como uma instituição central na vida das
sociedades e das pessoas [...]”.
Sem dúvida, a escola ainda ocupa um lugar central na vida das pessoas. É nela que são
depositadas inúmeras expectativas em relação ao futuro do sujeito e da sociedade. É
também o espaço por excelência onde o sujeito estabelece laços sociais para além da
família.

[...]

Em relação a isso, Beyer afirma que “uma às diferenças. Exige uma nova organização
escola para todos nunca existiu” e que a da escola, sendo esta pautada por proces-
escola sempre foi imposta como uma fonte sos que assegurem o acesso, a permanência
de poder social, em que somente os mais e a aprendizagem de todos os alunos.
abastados eram os mais privilegiados. Ele
evidencia que: “[...] na história da educação O professor, diante disso, é quem tem
formal ou escolar, nunca houve uma escola manifestado maior sofrimento, uma vez
que recebesse todas as crianças, sem exce- que tais transformações exigem dele um
ção alguma. As escolas sempre se serviram reposicionamento, pautando sua função
de algum tipo de seleção[...]”. para o olhar para diferentes processos de
ensino e aprendizagem. Isso porque o
Embora a escola nunca tenha sido para professor está frente a alunos que, mui-
todos, é fato que a Declaração de Sala- tas vezes, apresentam impasses no que
manca da UNESCO teve um impacto social, se refere à aprendizagem e ao relaciona-
cobrando da escola e da sociedade uma mento interpessoal, sendo frequente o
abertura para as diferenças. A proposta sentimento de incapacidade e até mesmo
da Educação Inclusiva remete a uma res- a recusa em trabalhar com eles. Por isso,
significação das práticas pedagógicas, é premente que o professor seja acompa-
respaldando-se no paradigma do respeito nhado nesse processo.
81

Pensar na escola e no educador em meio interdisciplinar, podem auxiliar o profes-


a este panorama social em plenas trans- sor a retomar a sua função como educador.
formações aponta para a necessidade de A Psicanálise trabalha no campo da subje-
criação de parcerias que possam traba- tividade e dos modos de subjetivação e de
lhar de forma articulada. Nesse sentido, a relação com o outro. A Pedagogia trabalha
articulação da Pedagogia, Psicanálise e Psi- no campo do currículo, do método e da
copedagogia traz subsídios importantes avaliação. A Psicopedagogia se insere no
para a implantação de uma escola verda- campo da aprendizagem humana, tendo
deiramente inclusiva e, sobretudo, uma como foco de estudo o aprender e o não
escola que busque a não (re)produção do aprender, ressignificando as relações do
fracasso escolar. sujeito com as mais diversas aprendizagens.
Trata-se de saberes que ao serem articula-
Nessa perspectiva, a Psicanálise, a Psi- dos podem trazer importantes benefícios
copedagogia e a Pedagogia, de forma à escola e ao social, como um todo.
Fonte: Travi, Oliveira-Menegotto e Santos (2009, p. 426-428).
MATERIAL COMPLEMENTAR

Fracasso escolar: um olhar psicopedagógico


Autor: Nádia A. Bossa
Editora: Artmed
Sinopse: este livro apresenta um estudo profundo, apoiado em
uma prática clínica de 20 anos, sobre o sintoma escolar, o qual é
considerado em sua dimensão social e em sua singularidade. O leitor
encontrará subsídios teóricos com interfaces no âmbito social e
cultural, fundamentados na psicologia e na psicodinâmica atuais e
em uma reflexão instigante sobre o papel da escola nesse fenômeno,
descritos de forma muito clara. Trata-se de uma referência única
sobre as dificuldades de aprendizagem escolar, incluindo os transtornos de déficit de atenção, de
leitura e de escrita, a dislexia, os transtornos de conduta e entre outros problemas específicos que
levam ao fracasso escolar.

Entre os muros da escola


Ano: 2009
Sinopse: François Marin (François Bégaudeau) trabalha como professor
de língua francesa em uma escola de Ensino Médio localizada na
periferia de Paris. Ele e seus colegas de ensino buscam apoio mútuo na
difícil tarefa de fazer com que os alunos aprendam algo ao longo do ano
letivo. François busca estimular seus alunos, mas o descaso e a falta de
educação são grandes complicadores
83
REFERÊNCIAS

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pedagogo: limites e possibilidades de atuação. Id on line Revista Multidisciplinar
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2016.
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porânea diante do fracasso escolar. Revista Psicopedagogia, São Paulo, v. 26, n. 81,
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VYGOTSKY, L. S. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 1984.
85
GABARITO

1. A alternativa correta é a C.
2. A alternativa correta é a B.
3. A alternativa correta é a D.
4. “A psicopedagogia tem por objeto de estudo o processo ensino-aprendizagem e
considera que o ato de aprender abrange as condições cognitivas, afetivas, cria-
tivas e associativas” (CLARO, 2018, p. 135). Já a pedagogia é um conhecimento
fundamentado em concepções e teorias que buscam compreender as práticas
e os fenômenos educativos, visando à organização e à sistematização das ações
pedagógicas no contexto escolar.
5. A alternativa correta é a A.
6. A importância da psicanálise para a prática psicopedagógica se dá na sua com-
preensão acerca do desenvolvimento do sujeito nos aspectos cognitivos e afe-
tivos. Ela esclarece que o não aprender pode estar relacionado a outros fatores
que não sejam orgânicos, tais como baixa autoestima e traumas, por exemplo.
7. A alternativa correta é a B.
8. A alternativa correta é a D.
Professora Me. Raquel de Araújo Bomfim Garcia

III
O QUE DIFICULTA

UNIDADE
O PROCESSO DE
APRENDIZAGEM

Objetivos de Aprendizagem
■■ Conhecer os principais fatores que podem dificultar o processo de
aprendizagem.
■■ Caracterizar o transtorno específico de aprendizagem,
diferenciando-o da dificuldade de aprendizagem.
■■ Discriminar os principais Transtornos Específicos de Aprendizagem,
apresentando as suas características essenciais.
■■ Explanar outras disfunções que podem dificultar o processo de
aprendizagem

Plano de Estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade:
■■ Dificuldades de aprendizagem
■■ Transtorno Específico de Aprendizagem
■■ Conhecendo os Transtornos Específicos de Aprendizagem
■■ Outras disfunções que interferem na aprendizagem
89

INTRODUÇÃO

Caro(a) aluno(a), nesta unidade, estaremos estudando um tema de grande rele-


vância para o trabalho psicopedagógico: as dificuldades de aprendizagem e suas
complicações. Nossa intenção é a de que você possa conhecer as principais cau-
sas que podem estar interferindo no processo de aprendizagem do aluno.
Durante a compreensão dos principais fatores que interferem no processo
de aprendizagem do aluno, você vai perceber que eles se diferem, de acordo
com a abordagem teórica. Além disso, para o psicopedagógico, é de fundamen-
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

tal importância o conhecimento de suas particularidades.


No entanto, a aprendizagem apresenta alterações mais complexas, as quais
vão para além das dificuldades e são denominadas de transtornos específicos de
aprendizagem. Esses transtornos têm sido tema de muitas discussões na atua-
lidade e os seus questionamentos vão desde o diagnóstico até a nomenclatura,
atendimentos e entre outros. Buscamos apresentá-los, considerando principal-
mente os aspectos clínicos desses transtornos.
Assim, você irá conhecer os principais transtornos específicos de aprendi-
zagem, tais como o transtorno específico de leitura (dislexia), os transtornos
específicos de escrita (disgrafia e disortografia) e o transtorno específico das
habilidades aritméticas (discalculia), bem como suas características e implica-
ções no processo de aprendizagem.
Acrescentamos, ainda, uma discussão sobre outras disfunções que interfe-
rem no processo de aprendizagem do aluno e que também têm sido alvos de
muitas discussões: o Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade (TDAH)
e a deficiência intelectual.
O conhecimento sobre esse tema possibilitará que você esteja mais atento
às sutilezas do processo ensino aprendizagem, identificando os entraves que
podem dificultá-lo. Além disso, você estará apto a reconhecer as diferenças
entre uma dificuldade de aprendizagem e um transtorno específico de aprendi-
zagem. Bons estudos!

Introdução
90 UNIDADE III

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM

Este tema é de fundamental importância para a psicopedagogia, pois, assim como


já estudamos por meio da história, a atividade psicopedagógica estruturou-se
devido à necessidade de auxiliar os sujeitos que apresentavam dificuldades de
aprendizagem. No entanto, no reconhecimento da dificuldade de aprendizagem
apresentada pelo sujeito, é fundamental o conhecimento sobre a aprendizagem
e os fatores que nela interferem (FERREIRA, 2008).
O conceito de aprendizagem, assim como já fora estudado, apresenta carac-
terísticas diferentes, de acordo com a abordagem teórica. Diante disso, Paín
(1985) esclarece que a aprendizagem é um processo complexo que acontece no
interior do indivíduo e sua manifestação se dá por meio de uma mudança de
comportamento.
Mano e Marchello (2015) acrescentam que o processo de aprendizagem
acontece em todas as etapas da vida do sujeito. Segundo José e Coelho (2009),
ela também está relacionada aos aspectos funcionais resultantes da estimulação
que recebemos do ambiente no transcorrer da vida.

O QUE DIFICULTA O PROCESSO DE APRENDIZAGEM


91

Dessa forma, é importante frisar que o ambiente escolar é uma referên-


cia acerca da aprendizagem, pois é nesse contexto que se oferece ao aluno uma
série de conteúdos para que ele pense e reflita, construindo, a partir disso, suas
ideias. Contudo, o ritmo de aprendizagem de cada indivíduo não é igual, o que
permite que o discente não consiga alcançar os resultados previstos para aquela
série/ano em que está matriculado (MANO; MARCHELLO, 2015).
Você encontrará, na literatura, muitas divergências no que se refere aos fato-
res que interferem no processo de aprendizagem do aluno. Destaco, aqui, a visão
de alguns autores, com o intuito de proporcionar subsídios para que, em seu tra-
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

balho psicopedagógico, você possa realizar uma análise mais ampla.


Para compreendermos as dificuldades de aprendizagem apresentadas pelo
sujeito em seu processo de aprender, é importante conhecermos os principais
fatores que podem levar a ocorrência desses obstáculos. Segundo Ferreira (2008),
eles podem ser classificados em: de origem física, sensorial, intelectual ou cog-
nitiva, neurológica, socioeconômica e emocional. Assim, em decorrência da
dificuldade de aprendizagem, o aluno pode desencadear problemas de desmo-
tivação, baixa estima, estresse, angústia e entre outros problemas emocionais.
Moraes (1997) destaca que todas as crianças apresentam possibilidades de
aprendizagem, mas quando isso não acontece, é preciso haver o questionamento
por parte de todos os envolvidos nesse processo – aluno, professor, família e
outros profissionais –, a fim de verificar os fatores que podem estar colaborando
para o não aprender. Para tanto, o autor destaca algumas causas para as dificulda-
des de aprendizagem, a saber: falta de estimulação adequada nos pré-requisitos
necessários para alfabetização; métodos de ensino inadequados; problemas
emocionais; falta de maturidade para iniciar o processo de alfabetização; disle-
xia; diferenças sociais e culturais; questões intraescolares (currículo, avaliação,
relacionamento aluno/professor e entre outros); deficiência intelectual; e pro-
blemas físicos/sensoriais.
As dificuldades de aprendizagem, para Visca (1987, apud PADILHA, 2012),
podem ser consideradas uma espécie de obstáculo que se apresenta no momento
em que ocorre a aprendizagem, enquanto resultado de toda uma história ante-
rior do aluno em seus aspectos afetivo, social, cognitivo, orgânico e funcional.
Assim, esse autor destaca quatro tipos de obstáculos: o primeiro está relacionado

Dificuldades de Aprendizagem
92 UNIDADE III

ao fato de que o conhecimento oferecido está além das possibilidades de com-


preensão do sujeito naquele momento. O segundo é a questão cultural: apesar
das experiências sociais serem diferentes, é esperado que todos aprendam os
mesmos conteúdos, da mesma maneira. Já o terceiro apresenta um atributo
afetivo, pois está relacionado ao medo que o aluno pode apresentar diante da
novidade, do conhecimento apresentado. Por fim, o quarto obstáculo tem um
caráter funcional, dado que está relacionado aos problemas orgânicos e às áreas
de funcionamento do pensamento.
Bossa (2007), ao tratar das dificuldades de aprendizagem, divide didati-

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
camente as suas causas em dois grupos: o das causas intraescolares e o das
extraescolares. Dentre as causas intraescolares, a autora destaca a metodolo-
gia do professor e sua formação, a cultura da escola, a relação professor e aluno,
a política educacional e a representação do professor sobre as dificuldades de
aprendizagem escolar. Já as causas extraescolares abrangem as questões orgâni-
cas, emocionais, culturais, intelectuais, específicas (transtornos) e a relação dos
pais com o estudo dos filhos.
As dificuldades de aprendizagem também são características secundárias de
quadros diagnósticos de deficiência intelectual, deficiência sensorial (visual, audi-
tiva) e/ou transtornos emocionais. “Nesses quadros mais sérios a alteração afeta
o indivíduo como um todo e secundariamente a aprendizagem” (RUBINSTEIN,
2012, p. 222).
É importante ter em mente que conhecer as possíveis causas das dificul-
dades de aprendizagem é apenas o passo inicial na compreensão do aprender
do sujeito. Tão importante quanto saber o porquê o aluno não aprende, é saber
como ele aprende. Isso se deve, pois, segundo Costa (2006), Vygotsky acredita
na capacidade que o organismo tem de ir para além de suas limitações, por meio
da construção de mecanismos adaptativos que possam superar suas dificulda-
des. Entretanto, tudo isso dependerá da interação de fatores internos e externos.
Nogueira e Leal (2012) explicam que a utilização do termo dificuldade de
aprendizagem ainda não é um consenso entre os estudiosos, visto que alguns
utilizam, como sinônimos, problemas de aprendizagem, transtornos de aprendi-
zagem ou distúrbios de aprendizagem. Vamos entender melhor essas diferenças
a partir da compreensão acerca dos transtornos de aprendizagem.

O QUE DIFICULTA O PROCESSO DE APRENDIZAGEM


93
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

TRANSTORNO ESPECÍFICO DE APRENDIZAGEM

Buscando definir o termo dificuldade de aprendizagem, o National Joint Commitee


of Learning Disabilities (NJCLD) sustentou que essas dificuldades estão rela-
cionadas a um grupo de transtornos que se apresentam como problemas, por
exemplo, na matemática. Além disso, elas podem acontecer em qualquer sujeito
que tenha a sua inteligência dentro dos padrões de normalidade ou até superior,
em qualquer etapa da vida (SISTO, 2007).
Segundo Mano e Marchello (2015), a definição apresentada está relacio-
nada às dificuldades de aprendizagem de cunho pedagógico. No entanto, houve
uma alteração na interpretação do termo learning disabilities (incapacidades de
aprendizagem, em português), o qual é compreendido, no Brasil, como distúrbio

Transtorno Específico de Aprendizagem


94 UNIDADE III

de aprendizagem. Diante disso, Carvalho, Crenitte e Ciasca (2007) revelam que


há muitos equívocos na literatura, dado que o termo distúrbio de aprendizagem
pode ser encontrado, muitas vezes, enquanto sinônimo de dificuldade de apren-
dizagem, dificuldade escolar e problema de aprendizagem.
Visando esclarecer esse equívoco, Drowet (2001, apud MANO; MARCHELLO,
2015) explica que, nos distúrbios de aprendizagem, é característica a existência
de uma alteração neurológica. No entanto, tal modificação se faz não presente
em alunos com dificuldade de aprendizagem.
No ano de 2008, o Ministério da Educação estabeleceu a Política Nacional de

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (documento elaborado
pelo Grupo de Trabalho, nomeado pela Portaria nº 555/2007, a qual foi prorro-
gada pela Portaria nº 948/2007, e entregue ao Ministro da Educação em 07 de
janeiro de 2008). Nesse documento, os distúrbios de aprendizagem passaram a
ser nomeados de Transtornos Funcionais Específicos e abrangem a dislexia, a
disgrafia, a discalculia, a disortografia, o transtorno de atenção e hiperatividade
e entre outros (NOGUEIRA; LEAL, 2012).
Quando recorremos à Classificação Internacional de Saúde (CID-10),
verificamos que o termo transtorno é utilizado para apresentar um grupo de
comportamentos ou sintomas reconhecidos clinicamente, os quais, geralmente,
estão associados ao sofrimento, interferindo nas funções pessoais. Alterações
referentes ao aprendizado estão classificadas no CID-10 como Transtornos do
Desenvolvimento das Habilidades Escolares (F81), dividindo-se em subcatego-
rias, a saber: Transtorno Específico da Leitura (F81.0); Transtorno Específico
do Soletrar (F81.1); Transtorno Específico de Habilidades Aritméticas (F81.2);
Transtorno Misto das Habilidades Escolares (F81.3); Outros Transtornos
do Desenvolvimento das Habilidades Escolares (F81.8); Transtornos Não
Especificados do Desenvolvimento das Habilidades Escolares (OMS, 2009).
Já no Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais: DSM-5, de
2015, encontramos o transtorno específico de aprendizagem, que está incluso
no grupo dos transtornos do neurodesenvolvimento. Nesse grupo, também
encontramos os transtornos de comunicação, do espectro autista, de déficit de
atenção e hiperatividade, motores, transtorno do neurodesenvolvimento espe-
cificado e não especificado. Além disso, nesse manual, o transtorno específico

O QUE DIFICULTA O PROCESSO DE APRENDIZAGEM


95

de aprendizagem pode ser especificado com: i) prejuízo na leitura; ii) prejuízo


na expressão escrita; ou com iii) prejuízo na matemática.
No DSM-5, estão descritos quatro critérios para o diagnóstico dos
Transtornos Específicos de Aprendizagem (TEA). No item A, são descritas
as principais características evidentes dos sujeitos com TEA. Já no critério B,
são apresentadas as maneiras de medir essas características. No C, é exposta
a idade de início do sintoma, enquanto o D descreve os critérios de exclusão
(MOOJEN; COSTA, 2015).
Portanto, podemos constatar que os transtornos de aprendizagem estão rela-
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cionados aos problemas de origem biológica e neurológica, justificando, assim,


o atraso do discente em suas aquisições acadêmicas. É importante ressaltar que,
nesses casos, o sujeito irá apresentar dificuldades de aprendizagem mais dura-
douras, visto que elas são inerentes ao sujeito (MANO; MARCHELLO, 2015).
Moojen e Costa (2015) esclarecem que, no diagnóstico de transtornos, é de
fundamental importância que o psicopedagogo estabeleça um diálogo com outros
profissionais, especialmente neurologistas, psicólogos e psiquiatras, devido ao
fato de que o diagnóstico primário é realizado por esses especialistas.

O problema de aprendizagem, pela sua magnitude e importância em seus


dias atuais, requer a interação entre os diversos profissionais que lidam com
o caso, particularmente para o estabelecimento do diagnóstico e das indi-
cações terapêuticas mais apropriadas.
Fonte: Moojen e Costa (2015, p. 91).

Destarte, compreendemos que é importante ter clara a diferença entre as difi-


culdades de aprendizagem e os transtornos específicos de aprendizagem, pois
é partir dessa distinção que será definida a intervenção mais efetiva em cada
caso. Com a delimitação dos transtornos específicos de aprendizagem, iremos,
a seguir, apresentar especificamente alguns desses transtornos.

Transtorno Específico de Aprendizagem


96 UNIDADE III

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CONHECENDO OS TRANSTORNOS ESPECÍFICOS DE
APRENDIZAGEM

Você deve estar curioso para saber quais são os transtornos específicos da apren-
dizagem. Assim como estudamos, o diagnóstico desse tipo de transtorno depende
de uma avaliação multiprofissional formada, principalmente, por neurologista,
psicólogo, fonoaudiólogo, pedagogo e psicopedagogo. No entanto, deve-se tomar
cuidado com o diagnóstico, principalmente o realizado no contexto escolar, para
que não se torne mais um rótulo do que um meio de auxiliar o aluno que apre-
senta um processo de aprendizagem alterado (NOGUEIRA; LEAL, 2012).
Para uma melhor compreensão acerca dos transtornos específicos de apren-
dizagem, Nogueira e Leal (2012) destacam a importância do psicopedagogo em
conhecer o desenvolvimento da linguagem normal. Assim, esse profissional deve
entender a linguagem como uma “forma peculiar que o homem tem de se comu-
nicar com os seus semelhantes por meios de símbolos gestuais, orais ou escritos”
(PEDROSO; ROTTA, 2006, p. 132).

O QUE DIFICULTA O PROCESSO DE APRENDIZAGEM


97

De acordo com Nogueira e Leal (2012), o desenvolvimento da linguagem


depende tanto de fatores genéticos quanto de estímulos do ambiente (ouvindo a
fala de outras pessoas). Essa evolução se inicia por meio da aquisição de aspec-
tos semânticos e textuais, passa para os aspectos fonéticos e fonológicos e, por
último, chega às questões pragmáticas e gramaticais.
Pedroso e Rotta (2006) ressaltam que essas etapas, apesar de bem definidas,
podem apresentar variações. Explicam, ainda, que, no processo de avaliação,
deve-se estar atento à presença de outros transtornos, tais como a disfasia (trans-
torno específico de linguagem), a disfonia (alteração na fonação), a disartria e
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a dislalia (alterações na articulação da palavra), a gagueira e o atraso no desen-


volvimento da fala.
Partindo dessa compreensão, vamos conhecer, agora, os transtornos de
aprendizagem. É necessário esclarecer que, apesar das mudanças na nomencla-
tura, manteremos aqui, os termos utilizados pelos autores. Portanto, iniciamos
o nosso estudo pelo transtorno específico de leitura ou dislexia.

TRANSTORNO ESPECÍFICO DE LEITURA - DISLEXIA

Para compreendermos esse transtorno, é importante conhecer como ocorre o


processo da leitura. Segundo Moraes (1997, p. 20), “a leitura envolve, primeira-
mente, a identificação dos símbolos impressos (letras, palavras) e o relacionamento
destes símbolos com os sons que eles representam”.
Nessa etapa inicial da leitura, a criança deverá identificar visualmente a letra
impressa e relacioná-la com a forma sonora correspondente. Já no contato com
a palavra, ela deverá realizar a discriminação visual de cada letra e, em seguida,
perceber a forma global da palavra, associando-a respectivamente ao som, para,
então, formar uma unidade linguística significativa. Dessa forma, se não acon-
tecer a associação da palavra impressa com o som, não ocorre a leitura, visto
que letras e palavras não possuirão correspondentes sonoros. Esse processo ini-
cial é chamado de decodificação e é essencial para a leitura (MORAES, 1997).
No entanto, de acordo com Moraes (1997), a leitura não se resume em deco-
dificar símbolos, pois é essencial que ocorra a compreensão e a análise crítica

Conhecendo os Transtornos Específicos de Aprendizagem


98 UNIDADE III

do que foi lido. Para tanto, o autor explana que a compreensão do que foi lido
consiste em “relacionar as palavras que são decodificadas aos seus respectivos
significados (objetos)” (MORAES, 1997, p. 21). Dessa forma, ela é fundamental
para despertar o interesse da criança pela leitura.
Para concluir o processo de leitura, temos a análise crítica do que foi deco-
dificado e compreendido, reagindo ao que está impresso. Essas reações, por sua
vez, podem ser intelectuais ou emocionais, visto que a análise do conteúdo sem-
pre partirá dos referenciais internos daquele que lê (MORAES, 1997).
O transtorno específico de leitura ou dislexia, segundo Sobrinho (2016),

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consiste em ser uma alteração na identificação e na memorização das letras e do
seu respectivo conjunto. O autor destaca que, diante desse transtorno, as letras
são apresentadas com a ordem e o ritmo alterado, dificultando tanto a leitura
quanto a escrita.
Guiachet e Capelline (2000, apud PEDROSO; ROTTA, 2006) acrescentam
que a dislexia é um distúrbio neurológico, cuja origem é congênita. Em outras
palavras, os sujeitos portadores possuem um potencial intelectual dentro do espe-
rado para a sua faixa etária, não apresentando um déficit sensorial, e carregam
uma instrução educacional adequada. No entanto, não conseguem apropriar-se,
de maneira satisfatória, a habilidade de ler e/ou de escrever.
Aprofundando sobre o tema, Stanovich (1994, apud FLETCHER et al., 2009)
esclarece que, quando a criança apresenta dificuldades no reconhecimento das
palavras, consequentemente, terá dificuldades em compreender o texto (leitura
com significado). Isso se deve, pois, “quando os processos de reconhecimento
das palavras exigem muita capacidade cognitiva, sobram menos recursos cog-
nitivos para direcionar aos processos superiores de integração e compreensão
do texto” (p. 281).
Fletcher et al. (2009) explicam que, na compreensão dos déficits no reco-
nhecimento de palavras, existem dois pontos de vista. O primeiro acredita que
esse déficit está relacionado ou tem a sua causa associada a algo que não tem
relação direta com a leitura, ou seja, com a consciência fonológica e o proces-
samento temporal rápido. Já a outra perspectiva acredita que essa alteração está
relacionada a vários fatores, tais como nomeação rápida, consciência fonológica,
memória verbal de curto prazo, entre outros.

O QUE DIFICULTA O PROCESSO DE APRENDIZAGEM


99

Em ambas as perspectivas apresentadas, podemos verificar que a consciên-


cia fonológica é destacada como um dos processos cognitivos significativos no
ato da leitura. Isso deve, porque:

Os sons da fala, ou fonemas, são as menores unidades da fala que fazem


a diferença no significado de uma palavra. Elas são descritas segundo
suas propriedades fonéticas, como o seu modo ou ponto de articula-
ção, e suas características acústicas e padrões de ondas sonoras (FLET-
CHER et al., 2009, p. 102).
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No português brasileiro há 27 fonemas consonantais e três alofones (o


número pode variar de região para região), além dos fonemas vocálicos.
Fonte: Fletcher et al. (2009, p. 102).

Quando o desenvolvimento da consciência fonológica acontece sem intercor-


rências, a criança consegue compreender o princípio alfabético, dominando
o reconhecimento das palavras já no começo do processo de leitura. Todavia,
quando ela não consegue assimilar a relação que se estabelece entre o som e
a escrita, pode ocorrer um atraso no reconhecimento das palavras. Com isso,
quanto maior for o tempo que a criança levar para adquirir a leitura de palavras,
maiores são as chances de ocorrer um transtorno significativo de leitura, pois
isso impossibilita o seu acesso à escrita (FLETCHER et al., 2009).
Shaywitz (2006) explica que, na Educação Infantil, é necessário estar atento
a alguns sinais que podem evidenciar tal dificuldade. Alguns desses indícios são:
desinteresse por rimas; persistência da linguagem “de bebê”; pronúncia errada
de palavras; dificuldade em saber as letras do seu nome ou de aprender o nome
das letras.
Já nas séries iniciais do Ensino Fundamental, conforme Rodrigues e Ciasca
(2016, p. 89), o aluno pode apresentar:

Conhecendo os Transtornos Específicos de Aprendizagem


100 UNIDADE III

Dificuldade em entender que as palavras são “divididas em partes”;


incapacidade de associar letras a sons; erros de leitura (sem conexão
entre fonemas/grafemas - por exemplo, ler panela, em vez boneca), in-
capacidade de ler palavras mesmo simples; reclamações e ou recusa em
situações em que tenha que ler.

Diante disso, José e Coelho (2009) chamam a atenção sobre os conflitos e frus-
trações que podem ser vivenciados pelo sujeito com transtorno específico de
leitura – dislexia –, pois, mesmo tendo condições intelectuais, não consegue cor-
responder às expectativas da família. Assim, os autores explanam que é muito
comum, nesses casos, que as reprovações e, consequentemente, o abandono da

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escola gerem consequências emocionais importantes, tais como a baixa estima,
a diminuição do autoconceito e entre outros.
Em consequência desses fatos, ressaltamos a importância do diagnóstico
multiprofissional, a fim de que, a partir dele, o psicopedagogo possa estabelecer
as etapas de atendimento individualizado, visando à reeducação da linguagem
do sujeito. No contexto escolar, é importante que o psicopedagogo realize orien-
tações quanto às adaptações pedagógicas fundamentais para o desenvolvimento
do aluno, as quais lhe são garantidas por direito (NOGUEIRA; LEAL, 2012).

TRANSTORNOS ESPECÍFICOS DE ESCRITA – DISGRAFIA E


DISORTOGRAFIA

Iniciamos o nosso estudo sobre esses transtornos, partindo da compreensão do


que consiste o ato de escrever. De acordo com Nogueira e Leal (2012), a escrita é
um processo no qual o pensamento converte-se em uma sequência de símbolos
gráficos e é a última habilidade a ser adquirida no processo de desenvolvimento
da linguagem. Além disso, é mais suscetível a danos e perdas, bem como car-
rega influências genéticas (CIASCA, 2009).
O processo de aquisição da escrita, segundo Gesell (1981 apud CIASCA,
2009), acontece de maneira ordenada, iniciando-se por meio da imitação, pas-
sando para as marcas no papel, reprodução de círculos, desenho de objetos e
de contornos, avançando para o interesse pelas letras e escrita, para chegar até
a escrita elaborada.

O QUE DIFICULTA O PROCESSO DE APRENDIZAGEM


101

Ciasca (2009), ao descrever esse processo, estabelece três fases distintas: a


fase pré-caligráfica (traços trêmulos, tortuoso, com margens desordenadas); a
fase caligráfica (aumento da agilidade e regularidade da escrita, iniciando uma
definição de estilo); e a fase pós-caligráfica (automação da escrita).
Dentre os transtornos específicos da escrita, temos a disgrafia e a disorto-
grafia. Vamos tratar primeiramente sobre a disgrafia.

Disgrafia
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Os alunos que apresentam disgrafia, segundo Cinel (2003), manifestam alterações


no ato motor da escrita e, com isso, acabam por tornar a grafia quase que incompre-
ensível. Dessa forma, podemos afirmar que a disgrafia é um transtorno relacionado
ao traçado das letras e à organização dos grupos gráficos em um espaço especí-
fico. Sendo assim, a disgrafia está associada às dificuldades motoras e espaciais.
As principais causas para o desenvolvimento da disgrafia são as alterações
na: i) motricidade fina e ampla; ii) coordenação visomotora; iii) organização
têmporo-espacial; iv) lateralidade; e v) direcionalidade. Os distúrbios da motri-
cidade fina e ampla estabelecem relações com as alterações no funcionamento
psiconeurológico ou na maturação do sistema nervoso central, o que ocasiona
a incapacidade de coordenação entre o que a criança pretende fazer e a ação em
si (CINEL, 2003).
Já a coordenação visomotora, segundo Cinel (2003), possui relações com
o movimento, seja de membros superiores, inferiores ou do corpo como um
todo, diante de um estímulo visual. O comprometimento nesse aspecto resulta
em alterações no traçado das linhas, no qual existe uma trajetória predetermi-
nada, pois a mão segue esse trajeto.
A organização têmporo-espacial é relativa à orientação e à estrutura do
espaço e do tempo. Assim, os déficits nesse âmbito resultam na inversão de letras
e combinações silábicas, não seguindo a ordem correta de execução das letras,
bem como não se respeita o limite da linha, pelo fato de que o sujeito não con-
segue se orientar no espaço da folha (CINEL, 2003).
Os problemas referentes à lateralidade e direcionalidade podem ter a sua ori-
gem em perturbações no esquema corporal, na dificuldade em organizar o corpo

Conhecendo os Transtornos Específicos de Aprendizagem


102 UNIDADE III

no espaço ou por desordem afetiva. Diante disso, o aluno pode apresentar: late-
ralidade ou dominância não definida; sinitrismo (canhotismo contrariado); ou
lateralidade cruzada (CINEL, 2003).
Assim sendo, verificamos que a criança com um quadro de disgrafia não
apresenta um déficit intelectual, visual ou motor, mas não consegue realizar, no
plano motor, o que percebeu no plano visual. Essa alteração apresenta diferentes
níveis, que vão desde a incapacidade de manusear o lápis ou de riscar uma linha
até a capacidade de fazer desenhos simples, mas não conseguir realizar a cópia
de figuras ou de palavras com maior complexidade (JOSÉ; COELHO, 2009).

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No processo de intervenção, é importante que o psicopedagogo apresente
atividades que proporcionem o relaxamento global, a reeducação da letra e a gra-
fomotora, bem como a sistematização da escrita e exercícios que possibilitem
o seu aperfeiçoamento (RODRIGUES, 2009 apud NOGUEIRA; LEAL, 2012).

Disortografia

Nas séries iniciais do Ensino Fundamental, você poderá perceber que é muito
comum que a criança apresente trocas ortográficas ou de letras. No entanto,
quando essas substituições persistem, é preciso estar atento, porque elas podem
ser sinais de um transtorno específico de escrita, a disortografia (CRENITTE;
GONÇALVES, 2009 apud OLIVEIRA, 2017).
Segundo a Associação Psiquiátrica Americana (2000 apud FERNÁNDEZ
et al., 2010), a disortografia é uma alteração no planejamento da linguagem
escrita que acarreta transtornos na aprendizagem da gramática, ortografia e
redação. Todavia, é necessário esclarecer que, nesses casos, tanto o potencial
intelectual quanto a escolaridade do sujeito estão compatíveis com a sua idade
cronológica.
A disortografia, na maioria das vezes, está associada ao transtorno específico
de leitura – dislexia –, sendo muito raros os casos em que não há esse vínculo.
Entretanto, o que se percebe, hoje, é que muitos alunos demonstram dificulda-
des na escrita devido ao fato de que a escola não ressalta o ensino da ortografia
(BERBERIAN; MASSI, 2005). Sobre essa problemática, Zorzi (1998) explica o
fato de que, muitas vezes, a escola é a única que possibilita o contato do aluno

O QUE DIFICULTA O PROCESSO DE APRENDIZAGEM


103

com a linguagem escrita, mas a metodologia de alfabetização utilizada não ofe-


rece meios de correção e ensino efetivo da escrita, o que gera o desconhecimento
da ortografia.
Fernández et al. (2010) esclarecem que a disortografia não está relacionada
com as dificuldades ortográficas resultantes de problemas ocorridos no pro-
cesso de alfabetização, devido à utilização de metodologias que não destacam
a ortografia. Eles a definem, portanto, como uma “alteração no processamento
fonológico e ortográfico decorrente de condições determinadas genética e neu-
rologicamente” (p. 501).
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Contudo, como você pode identificar se aluno apresenta disortografia?


Galaburda e Cestinick (2003) explicam que esse transtorno acontece quando o
discente demonstra dificuldades em aprender as formas ortográficas das pala-
vras e, com isso, passa a apresentar os seguintes sintomas: omissão, inversão e
substituição de grafemas; dificuldade na segmentação de palavras; necessidade
de manter o apoio da oralidade na escrita; e dificuldade em produzir textos.
No processo de avaliação e intervenção, o psicopedagogo deve centrar-se
na base do sistema de escrita, a qual está relacionada à língua materna do aluno,
tendo conhecimento específico sobre (BERBERIAN; MASSI, 2005). Nogueira e
Leal (2012) complementam os autores ao enfatizarem a importância de se reali-
zar atividades de consciência fonológica, soletração, composições e consciência
morfológica e ortográfica.

TRANSTORNO ESPECÍFICO DAS HABILIDADES ARITMÉTICAS –


DISCALCULIA

Os transtornos relacionados à matemática, segundo Fletcher et al. (2009), rece-


bem diferentes denominações, tais como: i) transtornos de aprendizagem em
matemática; ii) transtorno do desenvolvimento da aritmética; iii) transtornos
matemáticos; ou iv) transtornos específicos em matemática. Entretanto, todos
esses termos são utilizados para designar uma diversidade de comprometimen-
tos referentes às habilidades matemáticas, as quais vão desde os cálculos até a
resolução de problemas.

Conhecendo os Transtornos Específicos de Aprendizagem


104 UNIDADE III

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De acordo com Bastos (2006), a matemática faz parte do cotidiano de todos,
sendo uma habilidade básica do cérebro humano. Dessa forma, está presente
desde os primeiros anos de vida, quando é estabelecida a representação da quan-
tidade numérica, a qual será a base para o conhecimento posterior de símbolos
e operações numéricas.
A discalculia pode ser classificada em seis tipos: a verbal (dificuldade na
nomeação de quantidades); a léxica (dificuldade na leitura de símbolos mate-
máticos); a practognóstica (dificuldade em enumerar, comparar e manipular
objetos reais ou imagens); a ideognóstica (dificuldade na compreensão de con-
ceitos e na realização de operações mentais); a gráfica (dificuldades na escrita
de símbolos matemáticos); e a operacional (dificuldades em executar operações
e cálculos numéricos) (KOSC, 1974 apud BERNARDI, 2006).
É importante destacar que a discalculia não é decorrente de nenhuma defi-
ciência intelectual, déficit sensorial ou problemas de escolarização, visto que,
com esse transtorno, o aluno não consegue compreender os conteúdos mate-
máticos apresentados pelo professor. Portanto, o desinteresse gerado por essas
atividades acontece pelo fato de que o aluno não as compreende (BELLEBONI,
2004 apud GARCIA, 1998).
Assim como já constatamos com os outros transtornos, a discalculia tam-
bém requer uma avaliação multiprofissional, devido à sua complexidade. Assim,
é necessário destacar que as intervenções devem considerar, primeiramente, as
noções elementares da matemática baseadas em experiências não verbais, para,
posteriormente, investir nos fatos numéricos em si (BASTOS, 2006).

O QUE DIFICULTA O PROCESSO DE APRENDIZAGEM


105
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OUTRAS DISFUNÇÕES QUE INTERFEREM NA


APRENDIZAGEM

Assim como percebemos até o momento, a aprendizagem é um processo bastante


complexo, no qual diferentes fatores podem influenciar para que o sujeito possa,
ou não, aprender. Além dos transtornos específicos de aprendizagem, existem
outros transtornos e disfunções que podem dificultar o processo de aprendi-
zagem. Destacamos, a seguir, dois deles: o Transtorno de Déficit de Atenção/
Hiperatividade e a deficiência intelectual.

TRANSTORNO DE DÉFICIT DE ATENÇÃO/HIPERATIVIDADE (TDAH)

O Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade (TDAH) é um tema bastante dis-


cutido na atualidade, principalmente no contexto escolar, devido ao ato de provocar
um grande impacto nas relações e na aprendizagem da criança. Benczik (2010, p. 25)
explica que a característica principal do TDAH “é um padrão persistente de desaten-
ção e/ou hiperatividade, mais frequente e severo do que aquele tipicamente observado
em crianças de mesma idade que estão no nível equivalente de desenvolvimento”.
O interesse pela compreensão acerca das manifestações referentes à desatenção e
hiperatividade se apresenta na literatura desde o século XIX e muitas foram as deno-
minações, delimitações de diagnóstico e tratamentos definidos (BENCZIK, 2010).

Outras Disfunções que Interferem na Aprendizagem


106 UNIDADE III

De acordo com Bonadio e Mori (2013), a delimitação utilizada no momento


– Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade – tem, como referência, o
Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais: DSM- IV, de 1994.
Já para fins de diagnóstico, são utilizados, de maneira equivalente, os sintomas
referentes à desatenção, hiperatividade e impulsividade.
No ano de 2013, foi publicado o DSM-V, no qual podemos encontrar um
conjunto de 18 sintomas que caracterizam o TDAH. Dentre esses dezoito, nove
estão relacionados à desatenção, seis à hiperatividade e três à impulsividade. Além
disso, todos eles são organizados em dois grupos: os dos sintomas de déficit de

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atenção e os dos problemas comportamentais relacionados à hiperatividade e
impulsividade (BONADIO; MORI, 2013).
Bonadio e Mori (2013) esclarecem que, para fins de diagnóstico, é preciso
que a criança apresente, no mínimo, seis dos sintomas descritos nesse manual,
enquanto o adulto, no mínimo, cinco. A idade limite para o aparecimento dos
sintomas passou a ser de 12 anos e, conforme o grau de comprometimento desses
sintomas na vida do sujeito, o TDAH pode ser classificado em leve, moderado ou
grave. Os critérios apresentados pelo Manual DSM-V, além auxiliarem no diag-
nóstico, também servem de parâmetro para o estabelecimento da medicação.
O TDAH é um transtorno que gera dificuldades importantes não só nas
relações do sujeito, mas também em sua aprendizagem. Benczik (2010), em sua
obra, expõe algumas das principais características que a criança com TDAH pode
apresentar, a saber: alteração no nível de atenção; superatividade; dificuldade em
seguir normas e regras; problemas de conduta; agressividade; dificuldades de
aprendizagem; conflitos sociais e familiares; baixa tolerância à frustração; baixa
estima; e percepção negativa de si mesmo.
É importante destacar que a hiperatividade, no TDAH, não se restringe a
uma atividade motora excessiva, à impaciência ou à inquietação. Ela pode mani-
festar-se, também, por meio de uma hiperatividade mental ou psíquica que gera
sofrimento, pois, muitas vezes, o aluno não consegue terminar um assunto e já
inicia outro, ou interrompe conversas de outros (SILVA, 2009).
Muitos estudos têm sido realizados, a fim de compreender as possíveis cau-
sas do TDAH. Além disso, seus sintomas têm sido observados em indivíduos
com lesões na região frontal orbital do cérebro, a qual é mais desenvolvida nos

O QUE DIFICULTA O PROCESSO DE APRENDIZAGEM


107

humanos do que nos animais. Essa região cerebral é a responsável pela capa-
cidade de manter a atenção, o autocontrole, a inibição de comportamentos e o
planejamento (BENCZIK, 2010). Entretanto, outros fatores etiológicos estão
sendo investigados, tais como a hereditariedade, substâncias ingeridas na gra-
videz, sofrimento fetal, exposição ao chumbo, entre outros (BENCZIK, 2010).
No contexto escolar, os problemas decorrentes desse transtorno podem se
tornar mais evidentes, pois o rendimento escolar do aluno passa a ser oscilante,
devido à instabilidade da atenção (SILVA, 2009). Além do mais, é importante
destacar que o TDAH não é um transtorno de aprendizagem, mas pode levar o
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

sujeito a ter dificuldades de aprendizagem. Diante disso, evidencia-se a necessi-


dade de uma avaliação com uma equipe multiprofissional, possibilitando uma
visão integrada da situação do sujeito, a fim de se determinar as possíveis inter-
venções psicopedagógicas.

DEFICIÊNCIA INTELECTUAL

As discussões sobre a deficiência intelectual, nas últimas décadas, têm ampliado


o conhecimento referente ao tema. Assim, o senso comum está sendo abando-
nado para que haja o alcance de uma compreensão científica, a qual resultará
em avaliações mais criteriosas e permitirá a elaboração de estratégias de atendi-
mento efetivas (ROSIN-PINOLA; DEL PRETTE; DEL PRETTE, 2007).
Ao definir a deficiência intelectual, a Associação Americana de Retardo
Mental (AAMR) apresenta uma compreensão mais ampla, em uma pers-
pectiva multidimensional, bioecológica e funcional. Nesse âmbito, o sujeito
apresenta limitações importantes em seu funcionamento intelectual, bem
como em seu comportamento adaptativo, o qual pode ser verificado nas
habilidades sociais, práticas e conceituais (LUCKASSON et al., 2002 apud
MILIAN et al., 2013).
Em 2006, a AAMR passou a se chamar Associação Americana de Desabilidades
Intelectuais e do Desenvolvimento, “seguindo a tendência da Organização Mundial
de Saúde que substituiu o termo ‘retardo mental’ por desabilidade intelectual que
no Brasil corresponde à deficiência intelectual (DI)” (MOREIRA, 2011, p. 38).

Outras Disfunções que Interferem na Aprendizagem


108 UNIDADE III

No Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais: DSM-V (2015),


são definidas as principais características da deficiência intelectual. Todas elas
englobam prejuízos nas funções intelectuais responsáveis pela solução de proble-
mas, raciocínio, pensamento abstrato, planejamento, juízo, compreensão prática
e aprendizagem tanto acadêmica quanto pela experiência.
Esse manual também especifica os déficits relacionados ao funcionamento
adaptativo, envolvendo três domínios: o conceitual (raciocínio matemático,
memória, linguagem, leitura-escrita e solução de problemas); o social (empa-
tia, julgamento social, habilidades de comunicação, sentimentos, percepção de

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pensamentos, experiência dos outros); e o prático (cuidados pessoais, aprendi-
zado, autogestão, controle de dinheiro, organização de atividades, entre outros)
(AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2015).
O diagnóstico de deficiência intelectual é feito por meio de testes de medida
de inteligência padronizados, cuja avaliação psicométrica deverá ser realizada
por um psicólogo. O conhecimento sobre as características da deficiência intelec-
tual é de fundamental importância para o psicopedagogo, que poderá colaborar
com outros profissionais no processo de avaliação do sujeito, o qual objetiva ofe-
recer subsídios para o foco do trabalho psicopedagógico.
Pan (2013) reforça os cuidados com o diagnóstico, explicando a importância de
buscarmos procedimentos diagnósticos que não se restrinjam a aspectos clínicos e que
atendam às necessidades educacionais desse aluno no contexto escolar. Sendo assim,
é importante que estejamos atentos aos critérios da avaliação diagnóstica, visando
garantir oportunidades a todos, sem limitar a prognósticos ou níveis de educabilidade.
Vygotsky destaca, em seus estudos sobre a defectologia, a propensão do nosso
organismo de ir além de nossas dificuldades, pois o homem tem a capacidade
de desenvolver meios adaptativos que podem transcender os limites. Portanto,
o ambiente será determinante para o desenvolvimento de suas potencialidades
orgânicas (COSTA, 2006).
Diante disso, compreendemos que a psicopedagogia apresenta meios e recur-
sos desenvolvidos ao longo do tempo, os quais podem auxiliar os alunos tanto
com dificuldades, transtornos de aprendizagem e desenvolvimento, quanto com
deficiência intelectual. Assim, a mediação e a utilização dos instrumentos ade-
quados possibilitam o avanço no desenvolvimento do sujeito.

O QUE DIFICULTA O PROCESSO DE APRENDIZAGEM


109

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao final desta unidade, consideramos que as dificuldades de aprendizagem estão


presentes em todos os transtornos específicos de aprendizagem, na deficiência
intelectual e no Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade (TDAH). Além
disso, suas causas e manifestações serão diferentes em cada caso.
Sendo assim, a dificuldade de aprendizagem tem um cunho pedagógico,
enquanto os transtornos específicos de aprendizagem, o transtorno de déficit
de atenção/hiperatividade e a deficiência intelectual estão relacionados às alte-
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

rações no funcionamento neurológico.


Constatamos que o diagnóstico de um transtorno específico de aprendiza-
gem é bastante complexo e depende da avaliação de vários profissionais, devido
às suas especificidades. A atenção, nesses casos, deve ser redobrada, pois, por
exemplo, no transtorno específico de leitura, o educando poderá apresentar, tam-
bém, alterações na escrita.
O Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade (TDAH) é um dos gran-
des desafios da atualidade, principalmente no contexto escolar. Isso se deve, pois,
assim como foi exposto, pode trazer não só dificuldades de aprendizagem, mas
outros problemas de ordem emocional e relacional.
No que se refere à deficiência intelectual, verificamos a necessidade de se
realizar um diagnóstico minucioso que vá além de suas incapacidades e possa
analisar as suas possibilidades. Isso se deve, pois Vygotsky afirma que o ambiente,
por meio de seus instrumentos adaptativos, pode fazer diferença no processo de
desenvolvimento do sujeito com ou sem deficiência.
Encerramos esta unidade destacando a importância do trabalho psico-
pedagógico nas intervenções dos educandos com dificuldades, transtornos
específicos de aprendizagem, TDAH e deficiência intelectual, participando tanto
do diagnóstico e atendimento quanto dos encaminhamentos necessários para o
desenvolvimento do sujeito.

Considerações Finais
110

1. Todas as crianças apresentam possibilidades de aprendizagem, mas quando


isso não acontece, é preciso haver o questionamento por parte de todos os
envolvidos nesse processo – aluno, professor, família e outros profissionais –, a
fim de verificar os fatores que podem estar colaborando para o não aprender.
Aponte os principais fatores que podem levar a ocorrência de dificuldades de
aprendizagem.
2. O Transtorno de Déficit de Atenção/hiperatividade (TDAH) é um transtorno
que gera dificuldades importantes não só nas relações do sujeito, mas tam-
bém em sua aprendizagem. Considerando as características desse transtorno,
é correto afirmar:
a) Geralmente, os indivíduos se mostram autossuficientes, com uma percep-
ção positiva de si mesmo.
b) Tem sido observado em indivíduos com lesões na região temporal orbital
do cérebro.
c) O TDAH é considerado um transtorno de aprendizagem.
d) O TDAH é um padrão persistente de desatenção e/ou hiperatividade.
e) O TDAH restringe-se a uma atividade motora excessiva, impaciência ou in-
quietação.
3. Assim como constatamos, na discalculia, o aluno não consegue compreender
os conteúdos matemáticos apresentados pelo professor e Kosc (1974 apud
BERNARDI, 2006) a delimitou em seis tipos. Assinale a alternativa que corres-
ponde à discalculia operacional.
a) Dificuldade na nomeação de quantidades.
b) Dificuldades na escrita de símbolos matemáticos.
c) Dificuldades em executar operações e cálculos numéricos.
d) Dificuldade na compreensão de conceitos e na realização de operações
mentais.
e) Dificuldade na leitura de símbolos matemáticos.
4. Nas últimas décadas, tem-se ampliado o conhecimento referente à deficiência
intelectual, abandonando o senso comum e alcançando uma compreensão
científica sobre. Diante disso, defina deficiência intelectual.
111

5. O transtorno específico de leitura – dislexia é uma alteração na identificação e


na memorização das letras e seu respectivo conjunto. Considerando o tema,
avalie as afirmativas a seguir com (V) para as Verdadeiras e (F) para as Falsas.
( ) Consiste em ser um distúrbio neurológico, cuja origem é congênita. Além
disso, o indivíduo tem um potencial intelectual dentro do esperado para
a sua faixa etária.
( ) O sujeito com dislexia não apresenta déficit sensorial e, mesmo tendo uma
instrução educacional adequada, não consegue apropriar-se da leitura.
( ) A criança com dislexia pode apresentar dificuldades no reconhecimento
das palavras, mas não ter dificuldades de compreender o texto.
( ) A dislexia pode estar relacionada ao processo de alfabetização, devido à
utilização de metodologias inadequadas.
A sequência correta é:
a) V, V, V, V.
b) V, F, V, F.
c) V, F, F, F.
d) F, V, F, V.
e) V, V, F, F.
112

SUPERANDO LIMITES: A CONTRIBUIÇÃO DE VYGOTSKY PARA A


EDUCAÇÃO ESPECIAL

Visão dialética do problema

O olhar com o qual Vygotsky (1989) nos pro- Vygotsky deixa transparecer a sua crença
põe examinar as possíveis limitações dessas na plasticidade - capacidade de se trans-
crianças não é de complacência ou desâ- formar do organismo e do ser humano - na
nimo, mas, sim, o de uma visão dialética capacidade do indivíduo de criar proces-
do real, que leve à constatação de que, se sos adaptativos com o intuito de superar os
existem problemas, existem também pos- impedimentos que encontra. Apesar de o
sibilidades. E os problemas podem ser uma organismo possuir, em potencial, essa capa-
fonte de crescimento. Desse modo, para cidade de superação, ela só se realiza a partir
o autor, “um defeito ou problema físico, da interação com fatores ambientais, pois o
qualquer que seja sua natureza, desafia o desenvolvimento se dá no entrelaçamento
organismo. Assim, o resultado de um defeito de fatores externos e internos. Nessa pers-
é invariavelmente duplo e contraditório. Por pectiva, no caso dos cegos, seres privados de
um lado, ele enfraquece o organismo, mina visão, todo o organismo se reorganiza para
suas atividades e age como uma força nega- que as funções restantes trabalhem juntas
tiva. Por outro lado, precisamente porque para superar o impedimento, processando
torna a atividade do organismo difícil, o estímulos do mundo exterior com a ajuda de
defeito age como um incentivo para aumen- meios especiais, tal como o Braille. O mesmo
tar o desenvolvimento de outras funções no acontece com os surdos, seres privados da
organismo; ele ativa, desperta o organismo audição, que desenvolverão capacidades
para redobrar atividade, que compensará o visuais e espaço-temporais, na interação
defeito e superará a dificuldade. Esta é uma com instrumentos diversos, tendo a Língua
lei geral, igualmente aplicável à biologia e à de Sinais um papel preponderante nesse
psicologia de um organismo: o caráter nega- processo. É nessa perspectiva, também, que,
tivo de um defeito age como um estímulo para sujeitos com sérios problemas moto-
para o aumento do desenvolvimento e da res e que tenham grande dificuldade no ato
atividade”. da escrita, o uso de instrumentos como o
113

computador - ou, na falta desse, da máquina afirma, ainda, que a lei da compensação
de escrever - atua como estímulo e como - ou superação - desvela o caráter criador
suporte para a superação de dificuldades. do desenvolvimento. Citando Stern, ele
completa que: “tudo o que não me destrói,
O defeito se converte, assim, no ponto de me faz mais forte, pois na compensação da
partida e na força propulsora do desen- debilidade surge a força, e das deficiências,
volvimento psíquico e da personalidade. as capacidades”.
Qualquer defeito, segundo Vygotsky,
origina estímulos para a formação da com- O autor, entretanto, enfatiza constante-
pensação - ou superação. A lei geral da mente o papel do contexto sociocultural
compensação, segundo ele, aplica-se da nesse processo de superação. Esse processo
mesma forma ao desenvolvimento dito não se realizaria de uma forma espontane-
“normal” e ao “complicado”. Segundo ísta. Tal concepção seria avessa à perspectiva
Adler (apud Vygotsky, 1989), a elevada sociohistórica do autor, segundo a qual o
tendência em direção ao desenvolvi- desenvolvimento humano é um processo
mento é originada pelo defeito. O autor e um produto social.

Concepção dinâmica da inteligência

Adotar o paradigma vygotskyano implica, cepção ao postular que a inteligência não


como foi dito, apostar nas possibilida- é inata, mas se constrói nas trocas constan-
des de desenvolvimento do sujeito com tes com o meio ambiente. A educação se
necessidades educativas especiais. Nessa insere nesse contexto, tendo a escola um
perspectiva, um conceito que devemos papel privilegiado nesse processo. Para
ter sempre em mente - e que está implí- isto, torna-se essencial lembrar o que o
cito na noção de plasticidade - é o de que autor diz sobre as relações entre aprendi-
a inteligência não é estática, mas dinâ- zagem e desenvolvimento, o que é bem
mica, podendo, portanto, evoluir. Outra sintetizado no seu conceito de zona de
noção que não pode ser esquecida é a de desenvolvimento proximal. Nas palavras
que um dos objetivos da educação é pro- do autor (FREIRE COSTA, 2001), a Zona de
mover o desenvolvimento da inteligência. Desenvolvimento Proximal (ZDP) é com-
Vygotsky nos fornece as bases dessa con- preendida como:
114

A distância entre o nível de desenvolvimento real, que se cos-


tuma determinar através da solução independente de pro-
blemas, e o nível de desenvolvimento potencial, determina-
do através da solução de problemas sob a orientação de um
adulto ou em colaboração com companheiros mais capazes.

O conceito de ZDP nos mostra que, com mento dessas possibilidades está bastante
a ajuda do outro – adultos, professores, explícita nas obras de Vygostky dedicadas
colegas mais capazes – a criança terá pos- aos sujeitos com necessidades educativas
sibilidades de produzir mais do que produz especiais. Assim, ele diz:
sozinha. Esse conceito nos aponta o que
a criança tem em potencial, para as suas “O comportamento atualizado é apenas
possibilidades não realizadas. Foi a partir uma infinitésima parte do comportamento
dele que Vygotsky investiu no desenvolvi- possível. O homem está cheio de possibili-
mento de sujeitos com uma enorme gama dades não realizadas [...]”.
de dificuldades: crianças diagnosticadas
como ‘deficientes mentais’, crianças com “Todas as crianças podem aprender e
Síndrome de Down, crianças cegas, sur- se desenvolver... As mais sérias defici-
das, com lesões cerebrais, etc. ências podem ser compensadas com
ensino apropriado, pois, o aprendizado
A crença nas possibilidades do indivíduo adequadamente organizado resulta em
e no papel do aprendizado no desenvolvi- desenvolvimento mental”.
Fonte: Costa (2006, p. 233-234).
MATERIAL COMPLEMENTAR

Transtornos de aprendizagem: da identificação à


intervenção
Autores: Jack M. Fletcher, G. Reid Lyons, Lynn S. Fuchs e Marcia A.
Barnes
Editora: Artmed
Sinopse: em uma época de grande interesse por práticas educacionais
baseadas em evidências, a obra integra os diferentes domínios da
investigação, da prática e das políticas públicas relacionadas aos
transtornos de aprendizagem.

Taare Zameen Par (Como Estrelas na Terra, em português)


Ano: 2007
Sinopse: Ishaan é um garoto de nove anos que não tem muitos
amigos. Vive com sua família em uma pequena comunidade da Índia.
Ishaan apresenta muitas dificuldades na escola, tendo sido reprovado
no ano anterior e tendo risco de ser reprovado novamente. Já seu
irmão é o melhor da classe, com notas altíssimas e um grande sucesso
nos esportes também. Após uma reunião com os professores de
Ishaan, que informam aos pais que o menino não apresenta avanços
na escola, o pai decide enviar o garoto a um colégio interno para que
seja disciplinado e consiga êxito nos estudos. Após um período em
que Ishaan se sente cada vez mais triste e solitário, sofrendo severas
punições dos professores, ele conhece o professor Nikumbh, que além do trabalho no colégio,
leciona também em um colégio para crianças com necessidades educacionais especiais. É o
professor Nikumbh que descobre que Ishaan tem dislexia e, com ajuda dele, junto com os outros
professores e com a família de Ishaan, o garoto começa a compreender o mundo da leitura e da
escrita e vê sua infância tomar um rumo diferente.

Material Complementar
REFERÊNCIAS

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Transtornos Mentais: DSM-5. 5. ed. Porto Alegre: Artmed, 2015.
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119
GABARITO

1. As principais causas das dificuldades de aprendizagem podem estar relaciona-


das à falta de estimulação adequada nos pré-requisitos necessários à alfabeti-
zação; aos métodos de ensino inadequados; aos problemas emocionais; à falta
de maturidade para iniciar o processo de alfabetização; à dislexia; as diferenças
sociais e culturais; a questões intra-escolares (currículo, avaliação, relacionamen-
to aluno/professor, entre outros); à deficiência intelectual; e a problemas físicos/
sensoriais.
2. A alternativa correta é a D.
3. A alternativa correta é a C.
4. Em uma visão mais atual, a deficiência intelectual é compreendida em uma
perspectiva multidimensional, bioecológica e funcional. Nesse âmbito, o sujeito
apresenta limitações importantes em seu funcionamento intelectual, bem como
em seu comportamento adaptativo, o qual pode ser verificado nas habilidades
sociais, práticas e conceituais.
5. A alternativa correta é a E.
Professora Me. Raquel de Araújo Bomfim Garcia

AVALIAÇÃO

IV
UNIDADE
PSICOPEDAGÓGICA

Objetivos de Aprendizagem
■■ Expor as razões que justificam o processo de avaliação
psicopedagógica, destacando a importância da anamnese.
■■ Apresentar os elementos fundamentais a serem investigados no
processo de avaliação psicopedagógica clínica.
■■ Oferecer estratégias para a compreensão do processo ensino-
aprendizagem no contexto institucional.
■■ Evidenciar a relevância da observação e dos encaminhamentos no
processo de avaliação psicopedagógica.

Plano de Estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade:
■■ Diretrizes iniciais do processo da avaliação psicopedagógica
■■ Avaliação psicopedagógica clínica
■■ Avaliação psicopedagógica institucional
■■ A importância da observação e dos encaminhamentos
123

INTRODUÇÃO

Caro(a) aluno(a), nesta unidade, você terá a oportunidade de ter o seu primeiro
contato com uma das atividades mais importantes do trabalho psicopedagógico:
a avaliação. Ela é essencial, pois permite que o psicopedagogo conheça não só as
dificuldades de aprendizagem, mas principalmente as potencialidades do sujeito
ou da instituição, oferecendo subsídios para uma posterior intervenção.
Vamos iniciar o nosso estudo entendendo o processo de diagnóstico psi-
copedagógico, o qual possui, como objetivo principal, a compreensão de como
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

está o processo de aprendizagem, seja do sujeito ou de uma instituição. Serão


discutidos os aspectos relacionados com a necessidade de se ter uma teoria de
base que dê os subsídios para o conhecimento desse processo, a importância do
trabalho multiprofissional e a organização do contexto específico para a reali-
zação da avaliação.
Partiremos, então, para a atividade inicial desse processo: a entrevista. Esse
instrumento possibilita que o psicopedagogo conheça os dados históricos do
sujeito relacionados ao seu desenvolvimento em todos os aspectos, principal-
mente sobre a sua aprendizagem. Para isso, utilizaremos dois modelos de entrevista
baseados nos estudos de Jorge Visca e Weiss: a entrevista familiar e a explora-
tória situacional.
Já na avaliação psicopedagógica diagnóstica dentro do contexto clínico, apre-
sentaremos o modelo baseado na epistemologia convergente, de Jorge Visca, e
a investigação baseada em dois eixos: o horizontal – a-histórico e o horizontal
– e o histórico, de acordo com Weiss. No entanto, a avaliação psicopedagógica
não se restringe à clínica, pois, em sua atuação, o psicopedagogo poderá traba-
lhar em instituições das mais diversas. Por isso, apresentaremos um roteiro de
avaliação nesse contexto.
Encerraremos a nossa unidade de estudo discutindo os temas de grande rele-
vância para todo o processo de avaliação: a observação e os encaminhamentos.
Tudo isso lhe possibilitará o ganho de uma visão panorâmica acerca de todo o
processo da avaliação psicopedagógica.
Bom estudo.

Introdução
124 UNIDADE IV

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
DIRETRIZES INICIAIS DO PROCESSO DA AVALIAÇÃO
PSICOPEDAGÓGICA

Acredito que você tenha muitas expectativas relacionadas a esse tema e isso é
muito importante, pois a avaliação é o momento essencial de todo o processo
de ação psicopedagógica. Ela é quem permite que o psicopedagogo saiba onde
se encontram as dificuldades de aprendizagem do sujeito e, principalmente, as
suas potencialidades. Enquanto psicopedagogo, você deve ter um olhar que vá
para além das limitações, enxergando, em cada obstáculo apresentado, uma pos-
sibilidade que pode ser explorada por meio de instrumentos adequados. Diante
disso, inicialmente, vamos destacar alguns aspectos relevantes para a realização
de uma avaliação psicopedagógica.
Consideramos, inicialmente, que a preocupação do psicopedagogo está rela-
cionada a tudo o que se refere à aprendizagem, ou seja:
Como se aprende; como esta aprendizagem varia evolutivamente e está
condicionada a diversos fatores; como e por que se dão os distúrbios de
aprendizagem e como reconhecê-los e tratá-los; o que fazer para pre-
venir os distúrbios e promover processos que sejam significativos para
seus participantes” (SOBRINHO, 2016, p. 52).

AVALIAÇÃO PSICOPEDAGÓGICA
125

De acordo com Silva (2012), o diagnóstico é fundamental para que o psicope-


dagogo possa compreender as possíveis falhas na aprendizagem e, a partir desse
processo investigativo, estabeleça o seu plano de trabalho. Dessa forma, o psi-
copedagogo procura compreender o quê, como e por que o indivíduo aprende,
visando, com isso, meios de facilitar a aprendizagem (BOSSA, 2007).
A autora destaca, ainda, que o processo de investigação diagnóstica é bas-
tante complexo, com manifestações tanto conscientes quanto inconscientes.
Além disso, abrange vertentes pessoais, relações familiares do momento e as
passadas, questões educacionais, de aprendizagem sistematizada e sociocultu-
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

rais (BOSSA, 2007).


O psicopedagogo deve ter consciência de que a leitura do diagnóstico estará
pautada em sua formação, nas concepções que permeiam a sua prática e na
abordagem teórica que lhe dá subsídios na compreensão do sujeito. Além do
mais, há a necessidade de agregar conhecimentos relacionados ao corpo, orga-
nismo, intelecto e desejo, visto que apenas uma teoria não abrange todos esses
aspectos, se utilizada de maneira isolada. Por isso, é preciso elaborar uma teo-
ria cujos fundamentos possam oferecer conhecimentos relacionados a diversas
teorias (BOSSA, 2007).
Nesse processo de compreensão, Bossa (2007) destaca o conhecimento do
psicopedagogo acerca da constituição do sujeito, as transformações decorren-
tes de cada etapa da vida, os recursos de conhecimento disponíveis, como ele
produz o conhecimento e de que forma apreende novas aprendizagens. Já no
processo de avaliação, o psicopedagogo busca compreender os fatores que inter-
ferem no processo de aprendizagem de maneira global e integrada, visando à
organização de um plano de trabalho que resgate o prazer em aprender como
um todo. Também é ressaltada a importância de se realizar parceria com todos
os que fazem parte do processo educacional do sujeito, ou seja, pais, professo-
res, pedagogos e outros especialistas (SILVA, 2012).
A investigação diagnóstica permite o levantamento de hipóteses que possi-
bilitam a estruturação de estratégias a serem consideradas no planejamento das
atividades terapêuticas, a fim de vincular o sujeito com a aprendizagem. Dessa
forma, destaca-se que:

Diretrizes Iniciais do Processo da Avaliação Psicopedagógica


126 UNIDADE IV

O psicopedagogo também trabalha a relação do aluno com a aprendi-


zagem, no que diz respeito à sua postura, disponibilidade, buscando a
autovalorização, a fim de que o aluno torna-se agente do seu processo e
aproprie-se do seu saber, sendo capaz de construir novos conhecimen-
tos (BOSSA, 2007 apud SILVA, 2012, p. 56).

Diante disso, é importante que o psicopedagogo conheça a constituição do sujeito,


as transformações pelas quais ele passa em seu desenvolvimento, os recursos de
conhecimento que possui, como produz o seu conhecimento e apodera-se de
novas aprendizagens. Além disso, é essencial a fundamentação teórica sobre as

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teorias de aprendizagem e os princípios que dominam esse processo, considerando
os aspectos afetivos e as representações inconscientes peculiares (BOSSA, 2007).
Outro aspecto a ser considerado é o entendimento sobre a maneira com que
os métodos e sistemas de ensino podem interferir no modo com que o sujeito
aprende. Dessa forma, o psicopedagogo deve estar atento aos problemas estrutu-
rais que podem desencadear transtornos de aprendizagem, bem como influenciam
o próprio processo escolar (SILVA, 2012).
Nogueira e Leal (2013), por sua vez, sustentam que o diagnóstico psicope-
dagógico acontece em um contexto apropriado e organizado com materiais e
recursos específicos selecionados previamente. Além disso, o psicopedagogo
segue um roteiro que varia de acordo com a linha teórica que ele trabalha.
Portanto, a avaliação psicopedagógica é:
Um processo compartilhado de coleta e análise de informações rele-
vantes acerca dos vários elementos que intervêm no processo de ensi-
no e aprendizagem, visando identificar as necessidades educativas de
determinados alunos ou alunas que apresentem dificuldades em seu
desenvolvimento pessoal ou desajustes com respeito ao currículo es-
colar por causas diversas, e a fundamentar as decisões a respeito da
proposta curricular e do tipo de suportes necessários para avançar no
desenvolvimento das várias capacidades e para o desenvolvimento da
instituição (COLL; MARCHESI; PALACIOS, 2007, p. 279).

Fernández (1991) acrescenta a importância de se identificar a modalidade de


aprendizagem e os níveis de escrita e cognitivo do sujeito. De acordo com Weiss
(2012), cada sujeito tem uma maneira particular e individual de conectar-se
com o objeto de conhecimento. Além disso, a modalidade de aprendizagem se

AVALIAÇÃO PSICOPEDAGÓGICA
127

constrói desde o nascimento e em diferentes situações de aprendizagem, em um


esquema de operar ou processar informações. Diante disso, é fundamental que
o psicopedagogo identifique a modalidade de aprendizagem do sujeito para que
haja sucesso em sua intervenção, atendendo, assim, às especificidades do aluno.
No entanto, o que são essas modalidades de aprendizagem sintomáticas?
Segundo Fernandez (2001), as modalidades de aprendizagem sistemáticas
acontecem quando há um desequilíbrio nos movimentos de assimilação/aco-
modação, dado que a escassez ou o excesso de um desses movimentos atinge a
aprendizagem. Na Figura 1, podemos conhecer as características das diferentes
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

modalidades de aprendizagem sintomática:

• A assimilação consiste no movimento de adaptação que permite a alteração


das informações fornecidas pelo meio, para que possam ser incorporadas pelo
HIPERASSIMILAÇÃO
sujeito. Na aprendizagem sintomatizada, pode ocorrer um exagero desse
movimento, de forma que o sujeito não se submete ao aprender.

• A acomodação consiste em adaptar-se para que ocorra a internalização. A


HIPOACOMODAÇÃO sintomatização da acomodação ocorre pela resistência em acomodar elementos
do meio (informações), que podem ser definidas como a dificuldade de
internalizar os objetos.

• Se acomodar significa internalizar os elementos do meio (informações), o


HIPERACOMODAÇÃO exagero nesse processo pode levar a uma pobreza de contato com a subjetivi-
dade, levando à submissão e à obediência acrítica às normas.

• Na sintomatização, ocorre assimilação pobre ou baixa, o que resulta na pobreza


no contato com o objeto. As informações, ou elementos do meio, são pouco
HIPOASSIMILAÇÃO
alterados, de forma que não podem ser incorporados pelo sujeito, apenas
acomodados.

Figura 1 – Modalidades de Aprendizagem Sintomática


Fonte: adaptado de Fernández (2001 apud BATISTA; GONCALVES; ANDRADE, 2015, p. 38).

Bossa (2007) esclarece que a investigação, ou seja, o processo de avaliação psi-


copedagógica tem, como objetivo, a compreensão da causa, do significado e a
modalidade de aprendizagem do sujeito, a fim de remediar as suas dificuldades.
Segundo a autora, o diferencial do psicopedagogo em relação aos outros profis-
sionais é “que seu foco é o vetor da aprendizagem, assim como o neurologista

Diretrizes Iniciais do Processo da Avaliação Psicopedagógica


128 UNIDADE IV

prioriza o aspecto orgânico; o psicólogo, a ‘psique’; o pedagogo, o conteúdo esco-


lar” (BOSSA, 2007, p.66).
Partindo dessa compreensão, passamos a discorrer sobre a primeira etapa
do processo de avaliação psicopedagógica, que é a entrevista inicial.

ENTREVISTA INICIAL NA AVALIAÇÃO PSICOPEDAGÓGICA

Todo processo de investigação psicopedagógica acontece por meio de uma

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
entrevista inicial e, para Weiss (2012), ela é o ponto categórico para o sucesso
desse processo. Isso se deve, porque é por meio dela que podemos averiguar a
percepção da família acerca da história da criança, as expectativas, as angústias
relacionadas à não aprendizagem, os afetos, anseios, conhecimentos e o que se
espera do sujeito.
Nogueira e Leal (2013) apresentam os objetivos da entrevista inicial com
base no modelo de Jorge Visca. Nesse modelo, primeiramente, é esclarecido
como acontece o trabalho psicopedagógico, registram-se os dados de identifica-
ção tanto do sujeito quanto dos responsáveis e investiga-se o motivo da consulta,
ou seja, a queixa, o que levou a procurar esse tipo de atendimento. Depois, são
estabelecidos o contrato e as questões relacionadas a dia, horário, local, frequên-
cia e valor do atendimento. Com esses dados em posse, é necessário pesquisar a
respeito da aprendizagem do sujeito desde a mais tenra idade, verificar o nível
cultural e socioeconômico familiar, detalhar sobre as intervenções que já foram
feitas e analisar as expectativas da família e do sujeito em relação aos atendimen-
tos. Visca faz uso, também, da Entrevista Operativa Centrada na Aprendizagem
(EOCA), a qual discutiremos no tema avaliação psicopedagógica.
Já Weiss (2012) utiliza-se de dois tipos de entrevistas: a Entrevista Familiar
Exploratória Situacional (E.F.E.S.) e a entrevista de anamnese. A E.F.E.S. busca
compreender a queixa tanto na perspectiva da escola quanto da família, a fim
de perceber as relações e as expectativas da família em relação à aprendizagem
escolar. Não só, mas essa entrevista também visa entender como está a aceitação
e o comprometimento do sujeito e dos responsáveis acerca do processo de diag-
nóstico e, por fim, esclarece sobre o processo de diagnóstico psicopedagógico.

AVALIAÇÃO PSICOPEDAGÓGICA
129

Para o estudioso, a E.F.E.S. é a primeira etapa do processo de diagnóstico e as


informações levantadas serão importantes para a organização de hipóteses para
a próxima sessão, a anamnese.
A entrevista de anamnese é mais específica e pretende fazer um levantamento
mais minucioso sobre a história do sujeito no contexto familiar (passado, pre-
sente e projeções para o futuro), verificando a sua inserção na família e influências
de outras gerações. Outras informações importantes são acerca das primeiras
aprendizagens, seu desenvolvimento como um todo, dados históricos nucleares
e extensos da família, bem como a história escolar do indivíduo. Para tanto, é
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

importante estabelecer um clima empático para que possam expressar sentimen-


tos e pensamentos sobre o sujeito, apresentando os pontos cruciais relacionados
à aprendizagem (WEISS, 2012).
Fernández (1991) destaca que, na entrevista inicial, o psicopedagogo deve
estar atento à queixa, ou seja, o motivo do encaminhamento, pois ela pode não
só relatar o sintoma, mas trazer indícios para iniciar o processo de investigação.

Garret (1981) considera a arte de entrevistar como a arte de ouvir, perguntar


e conversar. Além disso, sustenta que ela requer habilidade e aptidão do
entrevistador, sendo o treinamento uma parte essencial que não dispensa,
contudo, o cuidado que ele precisa ter com a sua qualificação e sensibilida-
de no uso do recurso técnico.
Fonte: Macedo e Carrasco (2005).

Esse recurso é de fundamental importância para avaliação psicopedagógica e


deve ser realizado com muito cuidado e atenção, pois todos os dados coletados
terão sua relevância no resultado final da avaliação. Existem vários modelos de
entrevistas e anamneses, variando principalmente de acordo com a perspec-
tiva teórica que embasa o trabalho do psicopedagogo, e você poderá escolher
aquela com a qual mais se identifica. Lembre-se que o mais importante é criar
um ambiente de escuta e confiança.

Diretrizes Iniciais do Processo da Avaliação Psicopedagógica


130 UNIDADE IV

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
AVALIAÇÃO PSICOPEDAGÓGICA CLÍNICA

Buscaremos, agora, apresentar alguns modelos de avaliação psicopedagógica


clínica. No entanto, é necessário esclarecer que, em consonância com o que foi
explicado sobre a entrevista inicial, esse teste também deverá variar de acordo
com o embasamento teórico do psicopedagogo.
De acordo com o modelo de avaliação psicopedagógica da epistemologia con-
vergente de Jorge Visca (1987), esse processo se inicia desde o primeiro contato
com os responsáveis e o sujeito e terminará com a entrevista de devolução. De
acordo com Nogueira e Leal (2013), Visca segue um protocolo de atendimentos
para a avaliação, cuja primeira etapa é a entrevista inicial, a qual já discutimos
no começo desta unidade.
A segunda etapa desse processo é a Entrevista Operatória Centrada na
Aprendizagem (EOCA). Seu objetivo principal é o de esclarecer para o sujeito
a intenção do psicopedagogo em auxiliá-lo na superação de suas dificuldades e
que, para isso, será necessário conhecer a maneira com que ele aprende a fazer
o que lhe é ensinado, bem como o que gosta de fazer e como realiza o que gosta.
Nessa etapa da avaliação, é importante que o psicopedagogo realize a obser-
vação e registro das ações apresentadas pelo sujeito, bem como a sua reação
frente à consigna. Além disso, o profissional deve estar atento em como o sujeito

AVALIAÇÃO PSICOPEDAGÓGICA
131

apresenta seu vínculo com a aprendizagem escolar – conteúdos, conhecimentos,


conceitos etc. – e é essencial perceber se ocorrem resistências, defesas e fugas tanto
em relação às atividades referentes a escola quanto aos desafios (NOGUEIRA;
LEAL, 2013).
Participarão desse encontro, o psicopedagogo e o sujeito a ser avaliado,
mediante a apresentação da seguinte consigna: “o que você sabe fazer, o que lhe
ensinaram a fazer, o que você aprendeu a fazer” (NOGUEIRA; LEAL, 2013, p.
85). Assim, serão expostos materiais que possam estimular a resposta do sujeito,
tais como papel, lápis de cor, jogos, brinquedos, livros de história, palitos de sor-
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

vete e entre outros. O sujeito poderá escolher livremente o que irá utilizar, com
base nos elementos disparadores que estiverem disponíveis na mesa.
Algumas atitudes são relevantes durante esse processo, a saber:
■■ Não realizar perguntas que fujam da consigna proposta.
■■ Observar a postura corporal, os comportamentos expressos, a respira-
ção e a direção do olhar.
■■ Evitar o uso de materiais distantes do contexto sociocultural do sujeito.
■■ Manter uma conduta imparcial diante das atitudes do sujeito.
■■ Não nomear os objetos, nem pronunciar frases estimulantes ou esclare-
cer dúvidas.
A realização de tais ações é imprescindível, visto que esse momento é fun-
damental para o levantamento de hipóteses as quais auxiliarão na escolha
dos testes e provas que poderão ser aplicados nas mais diferentes faixas
etárias (NOGUEIRA; LEAL, 2013).

Nas sessões seguintes, são apresentadas as provas e testes, os quais são, segundo
Nogueira e Leal (2013):
■■ As provas operatórias: de classificação, de conservação e de seriação para
o pensamento global.
■■ As provas projetivas: são exemplos: par educativo; eu e os meus com-
panheiros; família educativa; os quatro momentos do dia; o dia do meu
aniversário; minhas férias.

Avaliação Psicopedagógica Clínica


132 UNIDADE IV

■■ Anamnese: realizada com os responsáveis, a fim de se verificar: os aspec-


tos gerais; a evolução das aprendizagens informais; o não aprender e o
grupo familiar; a evolução escolar; expectativa e diagnóstico; pessoas sig-
nificativas na vida do sujeito; interesses, habilidades e doenças da infância.
■■ Informe diagnóstico: apresentação dos resultados da avaliação e a indi-
cação, ou não, do atendimento psicopedagógico.

Ressaltamos que, além desse modelo de avaliação psicopedagógica, o psicopeda-


gogo poderá utilizar outros instrumentos para o levantamento das hipóteses, tais
como: a observação lúdica; avaliação específica da leitura, escrita e da matemá-

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
tica; avaliação da relação professor-aluno e aluno-escola; e avaliação psicomotora
(NOGUEIRA; LEAL, 2013).

O sucesso de um diagnóstico não reside no grande número de instrumen-


tos utilizados, mas na competência e sensibilidade do terapeuta em explo-
rar a multiplicidade de aspectos revelados em cada situação.
Fonte: Weiss (2004, apud NOGUEIRA; LEAL, 2013, p. 111).

Weiss (2004, apud NOGUEIRA; LEAL, 2013) enfatiza dois eixos fundamentais
que não podem deixar de ser investigados no processo de avaliação psicopeda-
gógica. O primeiro foi denominado de eixo horizontal a-histórico, que consiste
em uma visão do presente, no qual nos centramos nas causas que coabitam tem-
porariamente com os sintomas (cujo foco é o sujeito, suas produções e ações). Já
o segundo, o eixo horizontal histórico, investiga os processos de construção do
sujeito em situações e momentos diferentes (focado na historicidade das produ-
ções, ações e relações do sujeito).
Destarte, compreendemos que a avaliação é de fundamental importância
para o trabalho do psicopedagogo, o qual poderá utilizar diversos recursos e
técnicas nesse processo. No entanto, sua observação e análise são fundamen-
tados em uma teoria de base, a qual será fundamental para o êxito do trabalho.

AVALIAÇÃO PSICOPEDAGÓGICA
133
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

AVALIAÇÃO PSICOPEDAGÓGICA INSTITUCIONAL

Assim como percebemos, o psicopedagogo tem ampliado seu campo de atuação


nas instituições, não se restringindo ao contexto educacional, visto que a apren-
dizagem, foco de sua atuação, acontece nos mais diferentes ambientes. Segundo
Barbosa (2001, p. 135), o psicopedagogo, nesse contexto, deverá “construir um
olhar e uma escuta diferenciada, voltada para ensinar/aprender, possibilite o
conhecimento de sintomas, a análise dos mesmos e a busca de solução para os
problemas estudados”.
Ao avaliarmos uma instituição, iniciamos a nossa investigação pelo sintoma,
visto que ele é um sinalizador de como ocorre a dinâmica das relações, apre-
sentando como se configura essa rede de relacionamentos. Assim, o processo
diagnóstico busca identificar o sintoma, contextualizá-lo e referir a construção
histórica, discernindo seus aspectos, relações e características que compõem o
todo (OLIVEIRA, 2014).
Nesse processo, é fundamental o conhecimento acerca da matriz do pen-
samento diagnóstico, o qual se organiza em três pilares, a saber: diagnóstico,
prognóstico e indicações. Já seus princípios teóricos são o construtivismo, o
estruturalismo e o interacionismo (OLIVEIRA, 2014).

Avaliação Psicopedagógica Institucional


134 UNIDADE IV

Segundo Barbosa (2001), os aspectos são analisados na sequência, mediante


a análise acerca do contexto e leitura do sintoma, a fim de se observar a reali-
dade com base no contexto em que se está inserido. Nessa análise, deve-se ter
uma observação sistêmica, evitando a cristalização de ideais, princípios e visão
unidirecional.
Em seguida, deve-se buscar explicações para as causas que coexistem temporal-
mente com o sintoma, ou seja, na análise, deve-se considerar não só a historicidade
dos aspectos que compõem o sintoma, mas também as causas atuais. Dessa forma,
existem obstáculos das mais variadas ordens, as quais podem ser visualizadas

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
no Quadro 1:

Quadro 1 – Obstáculos que dificultam o trabalho institucional

Falta de conhecimento ou desconhecimento de determi-


Obstáculo da ordem nado tema, grau de coerência entre o discurso da proposta
do conhecimento político pedagógica da instituição e sua interpretação,
revelada pela prática do cotidiano.

Vinculação objetiva que se estabelece com as situações de


aprendizagem dentro da instituição e a comunicação que
se instala entre o protagonista do processo ensino apren-
Obstáculo da ordem
dizagem. Numa instituição, as relações que se estabelecem
da interação
entre as pessoas e entre estas e as situações de aprendi-
zagem podem gerar conflitos, dificultando a resolução de
problemas.

Obstáculos relacionados ao funcionamento da instituição


como um todo, que podem estar relacionados à admi-
Obstáculo de ordem nistração, à metodologia educacional vigente, ao grau
do funcionamento de filiação de seus elementos, à distribuição das funções,
aos espaços físicos e a tudo que se relaciona ao processo
ensino aprendizagem.

A forma com que a instituição está organizada, os níveis


Obstáculos de de hierarquia e relações previstas, os subsistemas e suas
ordem estrutural relações e o quanto auxiliam ou dificultam o processo de
ensinar e aprender.

Fonte: Barbosa (2001, p.135).

AVALIAÇÃO PSICOPEDAGÓGICA
135

A autora acrescenta, ainda, a importância da contextualização histórica tanto


do sintoma quanto dos obstáculos no processo de avaliação psicopedagógica
institucional. Diante disso, outro aspecto a ser considerado nessa avaliação é a
explicação da origem do sintoma e das causas históricas. Isso se deve, visto
que tal esclarecimento permite fazer uma relação causal e nexos entre circuns-
tâncias, precondições e/ou acontecimentos que direcionem para a intervenção
no contexto atual (BARBOSA, 2001).
Outro aspecto a ser considerado na avaliação é a análise do distanciamento
do fenômeno em relação aos parâmetros considerados aceitáveis. Dessa forma,
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

deve-se verificar os parâmetros que são estabelecidos pela própria instituição no


que se refere aos valores, usos, costumes e normas que perpetuam no tempo e
caracterizam a relação dos membros entre si e com a sociedade. Por isso, na ava-
liação psicopedagógica institucional, é imprescindível utilizar, como parâmetro,
a proposta político-pedagógica e a fundamentação teórico e filosófica da insti-
tuição (BARBOSA, 2001).
Barbosa (2001) acrescenta a necessidade de um levantamento de hipóte-
ses sobre a configuração futura do fenômeno atual, ou seja, um prognóstico.
Esse levantamento apresenta uma intervenção futura, a qual precisa estar fun-
damentada em princípios teóricos sólidos.
Finalizando o processo de avaliação institucional, é necessário apresentar
as indicações e encaminhamentos. Elas podem ser gerais, não estando relacio-
nadas aos aspectos psicopedagógicos, ou específicas, as quais são referentes à
intervenção psicopedagógica, exclusivamente (OLIVEIRA, 2014).
Para o desenvolvimento da avaliação psicopedagógica institucional, Barbosa
(2001) elaborou uma sequência de passos que podem auxiliá-lo neste processo
diagnóstico. O primeiro compreende a entrevista para a exposição dos moti-
vos, a qual deve se basear em um roteiro que inclua os principais pontos a serem
elencados, e dela participará a equipe dirigente, pelo fato de que a queixa se
relaciona com a situação do processo ensino-aprendizagem no contexto insti-
tucional. Nesse momento, é importante criar um clima de confiança e liberdade
para que o participante possa responder as perguntas. Além disso, o profissio-
nal deve estar atento à temática e à dinâmica dos participantes.

Avaliação Psicopedagógica Institucional


136 UNIDADE IV

Na entrevista, podem ser utilizados dois tipos de observação: a observação


temática, que possibilita, ao psicopedagogo, verificar a comunicação manifesta
(explícita) e a latente (acontece por meio de simbologia); ou a observação da
dinâmica, a qual está relacionada aos movimentos (de ordem física, cognitivo
ou afetivo) que acontecem durante a entrevista. Essas observações devem ser
relacionadas à queixa e ajudarão na proposta de intervenção (BARBOSA, 2001).
No segundo passo proposto por Barbosa (2001), temos o enquadramento
do processo diagnóstico, no qual são estabelecidos os objetivos e a justificativa,
bem como são delimitados o tempo a ser empregado na avaliação, os materiais

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
necessários, o espaço, os honorários e o planejamento das ações após o levanta-
mento das primeiras hipóteses. No entanto, o psicopedagogo deve ter em mente
que esse é um direcionamento flexível e, por isso, deve estar atento ao movi-
mento de aprender na instituição. Para tanto, a autora destaca a importância do
distanciamento instrumentalizado do fenômeno investigado, ou seja, envolver-
-se sem se misturar.
O terceiro passo tem, como base, a observação e análise do sintoma. Essa
etapa pode ser compreendida como algo que não está funcionando bem no
sistema, nesse caso, na instituição (OLIVEIRA, 2014). Assim, Carlberg (2000
apud OLIVEIRA, 2014) elaborou um instrumento de observação diagnóstica
o qual denominou de Entrevista Operativa Centrada na Modalidade de Ensino
Aprendizagem (E.O.C.M.E.A.), que objetiva perceber o que o grupo sabe, não o
que não sabe, analisando a dinâmica (expressões corporais), a temática (as falas
dos participantes) e o produto. Após a identificação do grupo a ser trabalhado,
o psicopedagogo deverá organizar as atividades de modo que se possa observar
o sintoma. Essa etapa é fundamental para o levantamento de hipóteses.
Passamos, então, para a organização do primeiro sistema de hipóteses, no
qual o psicopedagogo deverá analisar os motivos que coabitam junto aos sinto-
mas. Ao utilizar o E.O.C.M.E.A. como referência, são estabelecidas as primeiras
hipóteses, com o intuito de analisar a sua veracidade. Para o levantamento das
hipóteses, pode-se ter, como diretriz, questões relacionadas ao conhecimento,
interação, funcionamento e estrutura (matriz diagnóstica) (OLIVEIRA,2014).

AVALIAÇÃO PSICOPEDAGÓGICA
137

Outro ponto importante consiste na escolha dos instrumentos de investi-


gação. Não existe um modelo fixo para essa escolha, pois tudo dependerá das
hipóteses levantadas, mas algumas sugestões de instrumentos são: observações,
entrevistas, dinâmicas de grupo, análise do material escolar e entre outros. É
importante reforçar a necessidade essencial em se ter cuidado com a escolha do
instrumento que poderá auxiliá-lo na compreensão do que está acontecendo
na instituição, bem como com a leitura que se faz a partir dos instrumentos
(OLIVEIRA, 2014).
A partir disso, Oliveira (2014) explica que são separadas as hipóteses con-
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

firmadas e descartadas as que não foram validadas. A partir disso, forma-se o


segundo sistema de hipóteses, criando-se novas hipóteses por meio do mesmo
modelo de estruturação, considerando as dificuldades apresentadas.
Outro fato a ser considerado, segundo Barbosa (2001), é a pesquisa histó-
rica, que deve ser averiguada com os profissionais responsáveis pela instituição.
Ela pode ser realizada por meio de entrevista aberta ou fechada, análise dos seus
documentos ou questionários aplicados com funcionários que conhecem a história
da instituição, considerando o levantamento histórico da problemática, o “objeto
de queixa que originou o diagnóstico e no conhecimento histórico dos fatores
causais que foram base das hipóteses anteriormente” (BARBOSA, 2001, p. 168).
Em uma decantação das hipóteses anteriores, Oliveira (2014) chega ao ter-
ceiro sistema de hipóteses, o qual tem o objetivo de acertar a hipótese diagnóstica,
visando à entrevista devolutiva. Esse sistema funciona da seguinte maneira: 1)
são descritas as dificuldades acerca do funcionamento, conhecimento, interação
e estrutura da instituição; 2) são classificadas as causas (históricas e a-históri-
cas) relacionadas ao sintoma.
Por fim, chegamos à devolutiva e ao informe diagnóstico, momento muito
importante do processo. Isso se deve, pois, segundo Oliveira (2014), além da
entrega do documento escrito, será apresentada a devolutiva verbal, a qual divulga
um enfoque interventivo, a fim de levar a instituição refletir sobre o que foi indi-
cado pelo informativo. Essas indicações apresentam um prognóstico e as suas
implicações diante da sua efetivação ou não.

Avaliação Psicopedagógica Institucional


138 UNIDADE IV

O informativo deve ser escrito em linguagem adequada, especificando-se


os perfis institucionais referentes ao sintoma investigado.
Fonte: Oliveira (2014, p. 64).

Você deverá ter em mente que o diferencial conceitual que finaliza o processo

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diagnóstico é o que viabiliza as condições para que o psicopedagogo elabore o
seu plano de intervenção, construindo, assim, sua prática psicopedagógica inter-
ventiva (OLIVEIRA, 2014).
Oliveira (2014, p. 65) destaca, ainda, a importância da análise funcional
dos dados obtidos durante todo o processo, a qual propõe:
Não somente identificar aspectos que possam ser caracterizados
como potencialidades ou fragilidades institucionais, mas também a
identificar as relações entre os aspectos que configuram a dinâmica
institucional no que diz respeito à aprendizagem. Os grupos como
unidades de análise, usam estratégias e mecanismos interpsíquicos,
que se caracterizam como a aprendizagem intragrupal, sendo esse um
fator primordial de busca para o psicopedagogo construir sua matriz
diagnóstica, bem como traçar as estratégias de intervenção.

Diante disso, compreendemos a amplitude do trabalho de avaliação psicopeda-


gógica dentro do contexto institucional, destacando a importância de cada etapa
para a consolidação do informe e da devolutiva. Nesse processo, o psicopeda-
gogo deverá utilizar os instrumentos fundamentais que discutiremos a seguir: a
observação e os encaminhamentos.

AVALIAÇÃO PSICOPEDAGÓGICA
139
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

A IMPORTÂNCIA DA OBSERVAÇÃO E DOS


ENCAMINHAMENTOS

Para que você possa realizar uma boa avaliação psicopedagógica, seja na clínica,
individualmente, ou em uma instituição, com grupos, um instrumento essen-
cial depende exclusivamente de você, ou seja, a observação. É por meio dela que
o psicopedagogo poderá coletar dados importantes que não são apresentados
em testes ou em atividades propostas. Por isso, apresentaremos alguns aspec-
tos essenciais no processo de observação e encerraremos com o tratamento de
outro tema importante: os encaminhamentos.

OBSERVAÇÃO: INSTRUMENTO FUNDAMENTAL NA AVALIAÇÃO

De acordo com Danna e Matos (1986), a observação é um instrumento de coleta


de dados que permite a identificação das relações que podem existir entre o
comportamento e as diferentes situações ambientais. Por meio da observação,
o psicopedagogo poderá identificar quais são as dificuldades existentes, o que
pode estar afetando a aprendizagem e quais são os recursos que estão disponí-
veis no ambiente.

A Importância da Observação e dos Encaminhamentos


140 UNIDADE IV

O objetivo da observação é o levantamento de dados que possibilitem o


diagnóstico da situação problema, podendo, também, auxiliar na escolha e ava-
liação de procedimentos e técnicas. Por meio da observação, podem ser coletados
dados como: contatos físicos entre objetos e as pessoas, verbalizações, expres-
sões faciais, gestos, movimentações no espaço, direções do olhar, posições do
corpo, posturas e entre outros (DANNA; MATOS, 1986).
As autoras destacam, ainda, que a observação científica deve ser sistemática
(planejada e conduzida segundo um objetivo estabelecido a priori) e objetiva (ou
seja, limitar-se aos fatos verdadeiramente observados). No processo de registro

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
da observação, é fundamental a linguagem científica, garantindo a objetividade.
Para isso, é fundamental “eliminar todas as impressões pessoais e subjetivas que
o observador possa ter, ou interpretações que ele possa dar acerca dos dados”
(DANNA; MATOS, 1986, p. 24).
A observação científica depende de treino, para que você, enquanto psico-
pedagogo, possa ater-se ao que realmente está sendo apresentado no momento,
estando atento a tudo o que é perceptível por meio de seus sentidos (visão, audi-
ção, olfato, paladar e tato). Se bem utilizada, a observação é o melhor recurso
tanto na avaliação quanto na intervenção psicopedagógica.

ENCAMINHAMENTOS

A psicopedagogia, segundo Sobrinho (2016, p. 46), acontece em um contexto


interdisciplinar, a fim de buscar “uma pluralidade de saberes, integrando corpos
teóricos mais abrangentes e sistemáticos e permitindo, assim, uma compreensão
mais completa, porém não acabada, de uma realidade educativa”.
Considerando essa interdisciplinaridade, o psicopedagogo deve estar ciente
de seu campo de atuação. Isso é importante, para que, durante todo o processo
de atendimento ao sujeito com dificuldades ou transtornos de aprendizagem,
desde a avaliação até a intervenção, esteja consciente sobre a importância do
trabalho multiprofissional, verificando a necessidade de encaminhamento para
outros profissionais, quando se fizer necessário.

AVALIAÇÃO PSICOPEDAGÓGICA
141

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao fim de nosso estudo, podemos compreender a complexidade do processo de


diagnóstico psicopedagógico e a importância do conhecimento teórico-prático
do psicopedagogo na eficácia dessa atividade. Diante disso, é imprescindível que
o psicopedagogo tenha uma teoria de base para a realização da análise detalhada
dos dados coletados por meio da avaliação.
Foram apresentados alguns modelos de entrevistas iniciais que podem ser
utilizados nesse processo. Seguir um modelo já elaborado facilita o trabalho
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

do psicopedagogo, mas é importante que você esteja atento ao que acontece no


momento da entrevista e faça, se necessário, as adaptações que forem pertinentes,
para que você possa reunir o maior número de informações para a elaboração
das hipóteses.
A discussão sobre a avaliação psicopedagógica trouxe os elementos funda-
mentais a serem investigados durante esse processo. No que se refere às provas
e testes, é fundamental que o psicopedagogo considere a faixa etária do sujeito
avaliado e esteja atento aos instrumentos que lhe possibilitarão uma visão mais
específica acerca da dificuldade apresentada pelo indivíduo.
Quando passamos do entendimento individual para o institucional, perce-
bemos a complexidade do trabalho psicopedagógico dentro desse contexto, o
que exige a realização de várias ações e associação de ideias de diferentes gru-
pos. Tudo isso, visando ao entendimento não só das dificuldades, mas também
das potencialidades existentes e as que podem ser desenvolvidas.
Em todas as etapas, fica clara a importância de se realizar uma boa observa-
ção, pois ela trará subsídios importantes e que não estão explícitos nas respostas
ou nos testes e provas aplicados. Além disso, deve-se buscar sempre a utilização de
uma linguagem científica, evitando inferir naquilo que é apresentado pelo sujeito.
Os encaminhamentos feitos ao final da avaliação psicopedagógica devem
estar bem fundamentados, para que os responsáveis pelo sujeito ou pela ins-
tituição tenham clareza acerca das intervenções necessárias para o resgate do
processo de aprendizagem.

Considerações Finais
142

1. No processo de avaliação, é fundamental que o psicopedagogo identifique as


modalidades de aprendizagem do sujeito, pois isso poderá auxiliá-lo posterior-
mente na intervenção. Considerando as modalidades de aprendizagem sinto-
mática, analise as afirmativas a seguir:
I. Na sintomatização, ocorre uma assimilação pobre e baixa, resultando na po-
breza da relação com o objeto – hipoassimilação.
II. A acomodação consiste em adaptar-se para que ocorra a externalização –
hipoacomodação.
III. O exagero no processo de acomodação pode gerar uma precariedade no
contato com a subjetividade – hiperacomodação.
IV. A assimilação consiste no movimento de adaptação que permite a alteração
das informações fornecidas pelo meio, para que possam ser incorporadas
pelo sujeito. Na aprendizagem sintomatizada, pode ocorrer um exagero
desse movimento, de forma que o sujeito não se submeta ao aprender –
hiperassimilação.
É correto o que se afirma em:
a) I.
b) I e III.
c) II e IV.
d) III e IV.
e) I, III e IV.
2. Ao buscar explicações acerca das causas que coexistem temporalmente com o
sintoma, encontramos obstáculos das mais diferentes ordens. Podemos citar,
por exemplo, os obstáculos que podem estar relacionados com a administra-
ção, a metodologia educacional vigente, ao grau de filiação de seus elementos,
a distribuição das funções, aos espaços físicos e a tudo que se relaciona ao
processo de ensino-aprendizagem. Assim, essas características referem-se ao
obstáculo de ordem:
a) Estrutural.
b) Da interação.
c) Do conhecimento.
d) Do funcionamento.
e) Organizacional.
143

3. A observação é um instrumento de coleta de dados que permite a identificação


das relações que podem existir entre o comportamento e as diferentes situa-
ções ambientais. Diante disso, explique como deve ser a observação científica.
4. Tendo, como parâmetro, o modelo de avaliação psicopedagógica da episte-
mologia convergente de Jorge Visca, quais são as provas e testes que podem
ser utilizados nesse processo?
5. Considerando os objetivos da entrevista inicial, segundo o modelo de Jorge
Visca, é correto afirmar:
I. Objetiva estabelecer o contrato e as questões relacionadas a dia, horário,
local, frequência e valor do atendimento.
II. Objetiva pesquisar a respeito da aprendizagem do sujeito desde o momen-
to que vem apresentando dificuldades.
III. Objetiva registrar os dados de identificação apenas do sujeito, evitando
constrangimento dos responsáveis.
IV. Objetiva esclarecer como acontece o trabalho psicopedagógico.
É correto afirmar que:
a) Apenas as afirmativas I e II estão corretas.
b) Apenas as afirmativas II e III estão corretas.
c) Apenas as afirmativas I e IV estão corretas.
d) Apenas as afirmativas I, III e IV estão corretas.
e) Apenas as afirmativas III e IV estão corretas.
144

A LINGUAGEM CIENTÍFICA

A linguagem científica difere da que usa- Um escritor, um cientista e uma pes-


mos em nossa vida diária, a linguagem soa comum pretendem influenciar seus
coloquial, bem como da usada na litera- ouvintes e leitores, de maneiras diferen-
tura. O que determina a adequação das tes. Portanto, usam linguagens diferentes.
características da linguagem é o objetivo.

Psicólogos e cientistas do comportamento são pessoas comuns que usam linguagem


coloquial no seu dia a dia. Mas na sua atividade profissional, quando estão interessados
em descrever, explicar e alterar o comportamento devem usar uma linguagem científica.

Características da Linguagem Científica

Como já foi sugerido, a objetividade é a como, postura corporal, gestos, expressões


característica fundamental da lingua- exibidos pelo sujeito. Por exemplo, ao invés
gem científica. Pela objetividade, o relato de registrar “S está alegre”, o observador
científico se distingue dos demais. Sem registrará “S sorri”.
objetividade não teríamos bases sólidas
para estudar um fenômeno; estaríamos Atribuir intenções ao sujeito. Por exem-
estudando apenas a opinião das pessoas plo: “tenta pedir lugar aos passageiros”.
que supostamente estão “descrevendo” o Ao invés de interpretar as intenções do
fenômeno. sujeito, o observador deve descrever as
ações observadas. No exemplo, ao invés
A linguagem objetiva busca eliminar todas de registrar “tenta pedir um lugar aos pas-
as impressões pessoais e subjetivas que o sageiros”, o observador registrará “vira a
observador possa ter, ou as interpretações cabeça em direção aos passageiros”.
que ele possa dar acerca dos fatos.
Atribuir finalidades à ação observada.
Os principais erros contra a objetividade Por exemplo: “S fecha a porta porque venta”.
que devem ser evitados num relato são: Ao invés de interpretar os motivos que leva-
ram o sujeito a se comportar, o observador
Utilizar termos que designem estados deve descrever o comportamento e as cir-
subjetivos, tais como “cansada, triste, ale- cunstâncias em que ele ocorre. No exemplo,
gre, nervosa”, etc. Ao invés de utilizar termos em lugar de escrever “S fecha a porta por-
que exprimam uma impressão pessoal que venta”, o observador registrará “S fecha
acerca do estado do sujeito, o observador a porta. Venta lá fora”. É certo que S pode ter
deve descrever aquilo que observou, ou fechado a porta porque ventava, mas não
melhor, os indicadores comportamentais é objetivo dizê-lo, uma vez que o sujeito
de um estado subjetivo. Indicadores tais pode fechar a porta por outros motivos.
145

Outro aspecto que caracteriza um relato cien- invés de registrar “o menino brinca de bola”,
tífico é o uso da linguagem clara e precisa. o observador especificará cada uma das
Uma linguagem é considerada clara e precisa ações apresentadas pelo garoto, ou seja,
quando : a) obedece os critérios de estrutura “o menino anda em direção a bola, pega a
gramatical do idioma; b) usa termos cujo sig- bola, joga-a no chão, chuta com o pé” etc.
nificado, para a comunidade que terá contato
com o relato, não é ambíguo; isto é, as pala- Termos indefinidos ou vagos: isto é,
vras usadas são frequentemente aceitas na termos que não identificam o objeto ou
comunidade como referentes a certos fenô- identificam parcialmente os atributos
menos e eventos e não a outros; c) indica as do objeto. Por exemplo, os termos “bola
propriedades definidoras dos termos, forne- pequena”, “por algum tempo”.
cendo referências quantitativas e empíricas,
sempre que: o relato pode ser usado por Ao invés de utilizar termos indefinidos ou
comunidades diferentes (cientistas e/leigos vagos, o observador deve especificar o
de diferentes áreas de conhecimento, grupo objeto ao qual a ação é dirigida, e forne-
social, econômica e culturalmente diferentes) cer os referenciais físicos utilizados para
ou quando, mesmo para uma comunidade a descrição dos atributos do objeto; refe-
restrita, os termos sem a indicação dos refe- renciais relativos à cor, tamanho, direção,
renciais podem estar relacionados pelo leitor etc. Por exemplo, deixará de registrar “bola
e eventos de diferentes naturezas e magni- pequena”, e fornecerá o diâmetro da bola,
tudes. Por exemplo, termos como “longe, ou anotará o referencial de comparação
imediato, rápido, alto” etc, que dizem res- (bola menor do que as outras).
peito a aspectos mensuráveis da natureza
(distância, latência, velocidade, frequência Termos ou expressões ambíguas: isto é,
etc) devem em geral estar acompanhados quando numa expressão, um termo pode
da indicação da amplitude de valores à qual ser referente tanto ao sujeito da frase
se referem. quanto ao seu complemento, o observador
deve usar termos adicionais que indiquem
Para preencher os requisitos de clareza e precisamente a que ou quem o termo se
precisão na linguagem, o observador deve refere. Por exemplo: ao registrar “P amarra
evitar o uso de: o sapato. Encosta na parede”, alguém pode-
ria indagar: P encostou-se ou encostou o
Termos amplos: isto é, termos cujo signifi- sapato na parede? Cuidado semelhante
cado inclui uma série de ações. Por exemplo, deve ser tomado quando se usam pala-
“brincar” pode significar “jogar bola”, “jogar vras que podem ter vários significados. Por
peteca”, “nadar”, “pular corda” etc. exemplo, em algumas regiões do Brasil,
se alguém registra: “M quebrou as cadei-
Em lugar de utilizar termos amplos, o ras”, certamente se perguntará: quebrou
observador deve especificar os compor- móveis que servem de assento, ou fratu-
tamentos apresentados pelo sujeito. Ao rou os ossos ilíacos?
146

Para facilitar o trabalho de registrar o com- b) Termos que identifiquem os objetos ou


portamento e os aspectos do ambiente pessoas presentes na situação e suas carac-
com objetividade, clareza e precisão, o terísticas e referências;
observador deve usar:
c) Referenciais físicos.
a) Verbos que identifiquem a ação exibida
pelo sujeito;
Fonte: Danna e Matos (1986, p. 34-40).
MATERIAL COMPLEMENTAR

Psicopedagogia clínica: uma visão diagnóstica dos


problemas de aprendizagem escolar
Autor: Maria Lucia L. Weiss
Editora: Lamparina
Sinopse: este livro trata da aprendizagem humana e dos diversos
fatores que conduzem ao fracasso escolar. Para um diagnóstico
completo das causas dos problemas de aprendizagem da
criança/adolescente, é necessário avaliar diversos aspectos, a
saber: orgânicos, cognitivos, emocionais, sociais e pedagógicos.
Além disso, é necessário ter em mente que as dificuldades de
aprendizagem na escola podem ser causadas por um ou mais desses aspectos, os quais não são,
necessariamente, excludentes. Este livro, adotado em cursos de graduação, especialização e
pós-graduação, desmistifica a ideia de que o fracasso escolar seja sempre decorrente do aluno ou
da família. Muitas vezes, a maneira de a escola ensinar, o seu modo de explicar e a sua linguagem
podem ser os verdadeiros responsáveis pelo fracasso do aluno na escola.

Avaliação psicopedagógica
Autores: Manuel Sánchez-Cano, Joan Bonals e colaboradores
Editora: Penso
Sinopse: reunindo uma rica gama de instrumentos psicopedagógicos
e propondo uma metodologia consagrada pela reflexão e prática de
profissionais experientes e atualizados, esta obra é fonte de estudo
e consulta obrigatória para estudantes em formação e profissionais
preocupados com sua qualificação constante junto a crianças,
adolescentes e adultos com necessidades educacionais especiais.

Material Complementar
148
REFERÊNCIAS

BARBOSA, L. M. S. A psicopedagogia no âmbito da instituição escolar. Curitiba:


Expoente, 2001.
BATISTA, L. S.; GONCALVES, B.; ANDRADE, M. S. de. Avaliação psicopedagógica de
criança com alterações no desenvolvimento: relato de experiência. Revista Psico-
pedagogia, São Paulo, v. 32, n. 99, p. 326-335, 2015.
BOSSA, N. A. A psicopedagogia no Brasil: contribuições a partir da prática. 3.ed.
Porto Alegre: Artmed, 2007.
COLL, C.; PALACIOS, J. MARCHESI, A. Desenvolvimento psicológico e educação:
transtornos do desenvolvimento e necessidades educativas especiais. 2. ed. Porto
Alegre: Artmed, 2007.
DANNA, M. F.; MATOS, A. M. Ensinando observação: introdução. 2. ed. São Paulo:
EDICON, 1986.
FERNÁNDEZ, A. A Inteligência Aprisionada. Porto Alegre: Artes Médicas, 1991.
FERNÁNDEZ, A. Os idiomas do aprendente. Porto Alegre: Artes Médicas; 2001.
MACEDO, M. M. K.; CARRASCO, L. K. (Con)textos de entrevista: olhares diversos so-
bre a interação humana. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2005.
NOGUEIRA, M. O. G.; LEAL, D. Psicopedagogia clínica: caminhos teóricos e práticos.
Curitiba: Intersaberes, 2013.
OLIVEIRA, M. A. C. Psicopedagogia: a instituição educacional em foco. Curitiba: In-
tersaberes, 2014.
SILVA, K. C. da. Introdução à Psicopedagogia. Curitiba: Intersaberes, 2012.
SOBRINHO, P. J. Fundamentos da psicopedagogia. São Paulo: Cengage Learning,
2016.
VISCA, J. Clínica Psicopedagógica: epistemologia convergente. Porto Alegre: Artes
Médicas, 1987.
WEISS, M. L.L. Psicopedagogia clínica: uma visão diagnóstica dos problemas de
aprendizagem escolar. 14. ed. Rio de Janeiro: Lamparina, 2012.
149
GABARITO

1. A alternativa correta é a C.
2. A alternativa correta é a D.
3. A observação científica deve ser sistemática (planejada, sendo conduzida se-
gundo um objetivo estabelecido a priori) e objetiva (ou seja, limitar-se aos fatos
verdadeiramente observados). No processo de registro da observação, é funda-
mental a linguagem científica, garantindo a objetividade.
4. Na avaliação psicopedagógica proposta por Jorge Visca, podem ser utilizados as
seguintes provas e testes: as provas operatórias (de classificação, de conserva-
ção, de seriação, para o pensamento global); provas projetivas (ex: par educati-
vo, eu e os meus companheiros, família educativa, os quatro momentos do dia,
o dia do meu aniversário; minhas férias); anamnese (realizada com os responsá-
veis, verificando: aspectos gerais, evolução das aprendizagens informais, o não
aprender e o grupo familiar, evolução escolar, expectativa e diagnóstico, pessoas
significativas na vida do sujeito, interesses e habilidades e doenças da infância);
informe diagnóstico ( apresentação dos resultados da avaliação e a indicação ou
não do atendimento psicopedagógico).
5. A alternativa correta é a C.
Professora Me. Raquel de Araújo Bomfim Garcia

INTERVENÇÃO

V
UNIDADE
PSICOPEDAGÓGICA

Objetivos de Aprendizagem
■■ Compreender a importância da medição no trabalho do
psicopedagogo.
■■ Apresentar os diversos meios de intervenção que podem ser
utilizados no atendimento psicopedagógico.
■■ Distinguir o trabalho de intervenção realizado em contextos
diferentes.

Plano de Estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade:
■■ O papel do psicopedagogo como mediador
■■ Estratégias de intervenção utilizadas pela psicopedagogia
■■ Intervenção clínica e institucional
153

INTRODUÇÃO

Chegamos à última unidade de nosso livro. Nela, buscaremos lhe apresentar


a atuação efetiva do psicopedagogo, que acontece por meio das suas interven-
ções. As intervenções psicopedagógicas estão cheias de intencionalidade e visam
influenciar o processo de ensino-aprendizagem, seja de maneira individual ou
em grupo, para que ocorra uma mudança efetiva nesse processo.
Dessa forma, vamos apresentar o recurso principal do psicopedagogo: a
mediação. Para isso, exibiremos esse tema sob a visão de dois renomados auto-
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

res: Vygotsky e Feuerstein. É fundamental que você compreenda que o sucesso


na utilização de qualquer outro recurso de intervenção, seja material ou teórico,
vai depender de sua mediação. Por isso, esse tema é relevante para sua atuação.
Passamos, então, a trabalhar os principais recursos de intervenção psicopeda-
gógica que podem ser utilizados tanto no contexto clínico quanto no institucional.
Destaca-se a importância da ludicidade enquanto facilitadora em todos os tipos
de intervenção, auxiliando o aprendiz na aceitação desse processo, tornando-o
mais atrativo e prazeroso.
Você poderá encontrar e deverá buscar diferentes recursos para serem utiliza-
dos em seu trabalho de intervenção psicopedagógica, mas, aqui, apresentaremos
alguns que você não poderá deixar de utilizar. Por isso, destacamos a importância
da psicomotricidade, da expressão dramática e da caixa de trabalho psicopeda-
gógico. Você vai perceber que todos esses recursos poderão ser adaptados para o
trabalho institucional, mas ressaltamos algumas estratégias importantes a serem
adotadas nesse ambiente em específico.
Encerramos a unidade discutindo alguns aspectos relevantes acerca da atu-
ação do psicopedagogo tanto no contexto clínico quanto institucional. Na área
institucional, destacamos o trabalho no contexto educacional, mas enfatizamos
a sua aplicabilidade em outras instituições.
Desejo lhe um bom estudo!

Introdução
154 UNIDADE V

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

O PAPEL DO PSICOPEDAGOGO COMO MEDIADOR

A mediação é um termo muito comum no meio escolar e é de fundamental


importância no trabalho de intervenção psicopedagógica. No entanto, muitas
vezes, esse termo é utilizado em seu senso comum e é por isso que eu te convido
a aprofundar seus conhecimentos sobre esse tema, compreendendo a sua rele-
vância para o trabalho psicopedagógico. Para isso, destacamos o entendimento
acerca da mediação segundo os autores Vygotsky e Feuerstein.

INTERVENÇÃO PSICOPEDAGÓGICA
155

A MEDIAÇÃO NA PERSPECTIVA DE VYGOTSKY

De acordo com Vygotski (2009), a mediação tem um papel de grande relevân-


cia acerca da objetivação e da apropriação do conhecimento que foi acumulado
no transcorrer da história da humanidade, proporcionando o desenvolvimento
das funções psíquicas superiores do homem. A mediação simbólica permite
que o homem ultrapasse as suas reações instintivas, superando o esquema
estímulo-resposta por meio do uso de signos (utilizados para alterar o com-
portamento) e de instrumentos (usados para transformar a realidade). Diante
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

disso, Moura et al. (2010) acrescentam que a aprendizagem só acontece por


meio da mediação cultural, não sendo algo espontâneo e baseado nas carac-
terísticas biológicas do sujeito.
Moura et al. (2010) destacam, ainda, que, além dos signos, instrumentos e
técnicas culturais que fazem a função de mediação, é de fundamental importân-
cia, nesse processo, a ação humana. Em outras palavras, é por meio das interações
realizadas com o meio social e físico que o sujeito desenvolve, constrói, reconstrói
e apropria-se do conhecimento, potencializando, assim, suas funções psicológi-
cas superiores (VYGOTSKY, 1995; 1998).

As funções psicológicas superiores, também chamadas de funções psíqui-


cas superiores, são funções mentais que determinam o comportamento
consciente humano. Em outras palavras, elas definem os processos próprios
da espécie humana, tais como: atenção e lembrança voluntária; memória;
imaginação, memorização ativa; ação intencional; capacidade de planejar e
de estabelecer relações; elaboração conceitual; desenvolvimento da vonta-
de; representação simbólica das ações propositadas; linguagem; raciocínio
dedutivo; e pensamento abstrato.
Fonte: Maior e Wanderley (2016).

O Papel do Psicopedagogo Como Mediador


156 UNIDADE V

Sendo assim, a mediação baseada na Teoria Histórico-Cultural de Vigotsky se


diferencia de outras formas de mediação, devido ao fato de que a sua base filosó-
fica se pauta na ontologia do ser social, compreendendo o ser em sua totalidade.
Dessa forma, a mediação é entendida como uma característica tipicamente
humana, em que apenas o ser humano é capaz de realizar mediações tanto com
a natureza quanto com outros animais.
No processo educativo, a mediação é essencial, dado que não se concebe a
educação sem mediação. Dessa maneira, podemos considerar que o aluno se
encontra em um campo do imediato, enquanto o professor está no do mediato.

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Além disso, essa relação não é automática ou espontânea, pois a vivência do ime-
diato (cotidiano) pelo aluno é segura e bem-sucedida, e deixar essa condição
não é nada fácil. Por conseguinte, é função do professor auxiliá-lo na supera-
ção dessa relação imediata com mundo, buscando substituí-la por uma relação
mediatizada pelo conhecimento que foi elaborado historicamente(KITSUE;
BARROCO, 2016).
Assim sendo, torna-se de fundamental importância que, assim como o pro-
fessor, o psicopedagogo esteja atento, por meio da observação e investigação, aos
conhecimentos já adquiridos pelo sujeito, com o intuito de organizá-lo e elevá-
-lo a outro nível.
Para Vygotsky (1998), o conceito da Zona Proximal de Desenvolvimento
(ZPD) consiste na metodologia de trabalho de mediação a qual compreende
o espaço onde o profissional trabalha, com o intuito de se aumentar o conhe-
cimento do sujeito. Para que isso ocorra, é preciso, primeiramente, identificar
o que o indivíduo pode executar sem auxílio (Zona de Desenvolvimento Real
– ZDR) e o que não consegue realizar. Assim, o objetivo da mediação é o de per-
mitir que algo o qual foi realizado pelo sujeito na ZPD ocorra em breve na ZDR,
de maneira autônoma.
Por meio das relações interpsicológicas (atividade coletiva), estabelecem-se
os pilares para a estruturação intrapsicológica (atividade individual). Além disso:

INTERVENÇÃO PSICOPEDAGÓGICA
157

Toda função no desenvolvimento cultural da criança aparece duas


vezes: primeiro no nível social e, mais tarde, no nível individual;
primeiro entre pessoas (interpsicológica), e então dentro da criança
(intrapsicológica). Isso se aplica igualmente à atenção voluntária, à
memória lógica e à formação de conceitos. Todas as funções supe-
riores se originam como relações efetivas entre indivíduos humanos
(VYGOTSKY, 1998, p. 75).

Partindo dessa compreensão, Rego (1995) destaca a importância da interação no


contexto do grupo cultural para a aprendizagem do sujeito, possibilitando o seu
desenvolvimento. A autora afirma que, por intermédio da interação com outras
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

pessoas, o sujeito é capaz de realizar as suas atividades, solucionando problemas


por meio do diálogo, da imitação, da colaboração, da experiência compartilhada
e das informações e pistas que lhes vão sendo apresentadas. Vygotsky (1998) evi-
dencia a relevância da imitação no trabalho, na ZPD, explicando que o sujeito só
consegue imitar aquilo que já está em seu plano de desenvolvimento, podendo
ir além de suas capacidades.
Portanto, podemos constatar que, para Vygotysky, a mediação tem um papel
fundamental no processo de desenvolvimento do sujeito, principalmente no que
se refere às funções psicológicas superiores. Dentro dessa perspectiva, o psicope-
dagogo deverá atuar na Zona Proximal de Desenvolvimento (ZPD), mas sempre
partindo da Zona de Desenvolvimento Real (ZDR).

A VISÃO DE FEUERSTEIN SOBRE A MEDIAÇÃO

Para Feuerstein, a mediação é uma interação especializada e deve estar pautada


em critérios e em características próprias, as quais possibilitam uma postura qua-
lificada. Diante disso, o autor estabeleceu doze características para o processo
de mediação, as quais são internacionalmente reconhecidas (BUDEL; MEIER,
2012) e apresentadas a seguir:

O Papel do Psicopedagogo Como Mediador


158 UNIDADE V

Quadro 1: Características da mediação segundo Feuerstein

Nº AS DOZE CARACTERÍSTICAS DA MEDIAÇÃO


1 Intencionalidade e reciprocidade
2 Mediação do significado
3 Transcendência
4 Mediação do sentimento de competência
5 Mediação da autorregulação e do controle do comportamento
6 Mediação do comportamento de Compartilhar

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
7 Mediação da individuação e da diferenciação psicológica
8 Mediação da busca, do planejamento e do alcance dos objetivos
9 Mediação da busca pela adaptação a situações novas e complexas: o desafio
10 Mediação da consciência da modificabilidade
11 Mediação da alternativa positiva
12 Mediação do sentimento de pertença
Fonte: adaptado de Feuerstein e Rand (1997 apud BUDEL; MEIER, 2012, p. 126).

Iniciaremos tratando sobre a décima característica, a consciência da modifica-


bilidade, porque toda mediação depende desse princípio. Contudo, no que se
fundamenta a consciência de modificabilidade? Mediar esse tipo de consciên-
cia “significa que, em nossa ação de ensinar, precisamos agir de tal forma que o
aluno perceba que ele está crescendo, progredindo, melhorando e aprendendo”
(BUDEL, MEIER, 2012, p. 127). Assim, é necessário apresentar situações reais,
nas quais o sujeito possa perceber a sua evolução de maneira concreta, fazendo
que desenvolva a percepção interna de que ele é modificável, podendo aprender
e evoluir enquanto sujeito e aprendiz (BUDEL; MEIER, 2012).
Partindo desse pressuposto, Feuerstein e Rand apresentam cinco axiomas
de modificabilidade humana, a saber:
1) Todas as pessoas são modificáveis; 2) Esta criança específica que es-
tou educando é modificável; 3) Eu próprio sou um mediador capaz de,
efetivamente, ajudar essa criança a modificar-se; 4) Eu mesmo sou mo-
dificável; 5) A sociedade e a opinião pública podem ser modificadas”
(FEUERSTEIN; RAND, 1997, p. 5 apud BUDEL; MEIER, 2012, p. 127).

INTERVENÇÃO PSICOPEDAGÓGICA
159

Desse modo, é plausível afirmar que os autores acreditam na plasticidade cerebral


e no potencial de mudança do sujeito em relação à sua aprendizagem. Portanto,
confiar na capacidade de modificabilidade do indivíduo impulsiona a criativi-
dade e a inovação metodológica do mediador, destacando a sua importância
nesse processo (KITSUE; BARROCO, 2016).
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

O fenômeno de plasticidade cerebral, neural ou neuronal pode ser carac-


terizado como a capacidade do sistema nervoso central em adaptar-se em
resposta a mudanças ambientais, da experiência, do comportamento ou de
algum acometimento cerebral de modo duradouro, seja uma lesão ou uma
disfunção.
Fonte: Gindri et al. (2012, p. 349).

Partindo da consciência da modificabilidade, discorreremos, a seguir, sobre as


outras características da mediação destacadas por Feuerstein, iniciando com a
intencionalidade e reciprocidade. De acordo com Budel e Meier (2012), a inten-
cionalidade exige, do mediador, a capacidade de ir além dos objetivos planejados,
buscando todas as metodologias de ensino possíveis, a fim de que o aprendiz
possa compreender o conteúdo. Assim, o mediador deve criar ilustrações, exer-
cícios, exemplos e explicações que atendam a necessidade daquele sujeito com
dificuldades de aprendizagem.
No entanto, apesar da intencionalidade do mediador, algumas vezes, ele
não encontra a reciprocidade por parte do aprendiz. Nesses casos, é necessário
conquistar a vontade de aprender, elogiando, incentivando, provocando desequi-
líbrios e desafios para a aprendizagem. “A reciprocidade representa a disposição
do aluno a envolver-se na interação oferecida pelo professor” (BADEL; MEIER,
2012, p. 145).
Uma outra característica é a mediação do significado, que consiste em ensi-
nar com significado, possibilitando que o aprendiz realize conexões com os mais
diferentes contextos, ampliando as possibilidades de uso do conceito trabalhado,

O Papel do Psicopedagogo Como Mediador


160 UNIDADE V

bem como relacionando-o com outros. O conteúdo torna-se atraente quando


está carregado de significado, seja ele afetivo, social, político, cultural, religioso
etc. Assim, buscar o significado estimula a reflexão e a criatividade do sujeito
(BADEL; MEIER, 2012).
Já a transcendência acontece quando o sujeito consegue utilizar o conceito
que ele aprendeu em qualquer outra situação ou contexto. Para isso, o media-
dor busca transpor seu objetivo imediato, despertando, no aluno, a necessidade
de ir além (BADEL; MEIER, 2012).
Essas três características são consideradas fundamentais no processo de

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
mediação, mas Feuerstein explica que outras podem aprimorar ainda mais a
sua qualidade. Diante disso, apresentaremos algumas dicas importantes para o
processo de mediação que cada uma delas apresentam. Iniciamos pela media-
ção de sentimento de competência, na qual o mediador deve ater-se ao nível
de complexidade da atividade apresentada, para que a criança possa sentir-se
motivada a realizá-la, independentemente das histórias de fracasso vividas ante-
riormente (BADEL; MEIER, 2012).
Já a mediação da autorregulação e do controle do comportamento ajuda
o sujeito a planejar as suas ações, evitando a impulsividade. Para isso é impor-
tante entender as fases de uma ação, de acordo com Badel e Meier (2012):
1. Imput: fase de coletas de dados sobre o que precisa para a realização da
atividade.
2. Elaboração: nela, ocorre o planejamento da ação, sistematizando a sequ-
ência das ações.
3. Output: o sujeito apresenta os resultados solicitados na atividade, res-
pondendo apenas o que foi solicitado e, consequentemente, controla a
sua impulsividade.

Quando se trata da mediação do comportamento de compartilhar, Feuerstein


explica a importância de se incentivar a partilha no processo de ensino-aprendi-
zagem e nas estratégias de resoluções de problemas, destacando tanto as vitórias
quanto dificuldades, a fim de se estabelecer uma relação de confiança, respeito e
admiração entre mediador e sujeito (BADEL; MEIER, 2012).

INTERVENÇÃO PSICOPEDAGÓGICA
161

Na mediação da individuação e da diferenciação psicológica, o mediador


deverá valorizar as diferenças individuais, auxiliando o sujeito a compreender
que cada um tem ritmo de aprendizagem diferente. Saber trabalhar com a diver-
sidade é um desafio da educação atualmente (BADEL; MEIER, 2012).
No que se refere à mediação da busca, planejamento e alcance dos objeti-
vos, a teoria de Feuerstein esclarece a importância de saber onde se quer chegar
na aprendizagem do sujeito. Isso se deve, pois objetivos bem traçados estabele-
cem o caminho a ser percorrido e possibilitam a análise das estratégias utilizadas,
mudando-as quando for necessário (BADEL; MEIER, 2012).
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Acerca da mediação da busca pela adaptação a situações novas e comple-


xas: o desafio, Feuerstein estabelece dois eixos estruturantes para o desafio: o
da familiaridade – que consiste em desafiar o sujeito em atividades que estejam
em um nível de equilíbrio entre o fácil e o difícil – e o da complexidade – na
qual o desafio se baseia em oferecer atividades que não sejam nem tão simples,
nem tão complexas, buscando uma harmonia entre tais (BADEL, MEIER, 2012).
Quanto à mediação da consciência da alternativa positiva, Feuerstein pro-
põe um otimismo ativo, ou seja, a escolha por parte do mediador em acreditar
que vai dar certo. Para tanto, o profissional deve estabelecer os melhores cami-
nhos, fazendo de tudo para que o melhor aconteça. Não só, mas precisa auxiliar
o sujeito a optar por essa atitude também, ensinando-o a persistir, dedicar-se e
nunca desistir (BADEL; MEIER, 2012).
Por fim, Feuerstein elenca a mediação do sentimento de pertença, a qual
produz uma sensação de bem-estar. Nela, é fundamental que o mediador permita
que o sujeito conheça as suas qualidades e potencialidades, dando possibilidades
de participação em atividades nas quais tenha bons resultados e sinta-se valori-
zado (BADEL; MEIER, 2012).
Portanto, podemos verificar, em ambas as teorias, a importância do mediador
não só no processo de ensino-aprendizagem, mas também no desenvolvimento
do sujeito como um todo. Além disso, é necessário esclarecer que o processo
acontece o tempo todo e pode ser realizado pelo professor, pedagogo, psico-
pedagogo, psicólogo, família ou qualquer pessoa que se disponha a facilitar a
aprendizagem e o desenvolvimento do sujeito.

O Papel do Psicopedagogo Como Mediador


162 UNIDADE V

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
ESTRATÉGIAS DE INTERVENÇÃO UTILIZADAS PELA
PSICOPEDAGOGIA

Após ter realizado a avaliação e sabendo da importância da mediação no traba-


lho psicopedagógico, passamos para a etapa da intervenção. Nesse momento, o
psicopedagogo deverá escolher quais são as estratégias que serão mais adequa-
das para cada caso, respeitando as especificidades e necessidades de cada sujeito.
De acordo com Sobrinho (2016), a intervenção do psicopedagogo é do tipo
direta, atuando nas seguintes áreas: cognitiva (memória, pensamento, atenção,
linguagem e imaginação); acadêmica (proporciona recursos para o sujeito enca-
rar a aprendizagem de conteúdos acadêmicos); emotiva (motivação, sentimentos,
autoestima, interesse e autodeterminação); e social (o comportamento do sujeito
nos mais diversos contextos e grupos).
Na intervenção psicopedagógica, podemos destacar os três principais ins-
trumentos a serem utilizados pelo psicopedagogo, que são: a escuta, a visão
e a observação. Tudo isso, a fim de ouvir, tratar, traduzir e analisar os dados
(SOBRINHO, 2016).
Assim, vamos lhe apresentar algumas das principais estratégias que podem
ser utilizadas no processo de intervenção psicopedagógica.

INTERVENÇÃO PSICOPEDAGÓGICA
163

O LÚDICO: TRANSFORMANDO O CONTEXTO DO ATENDIMENTO


PSICOPEDAGÓGICO

Sabemos que as brincadeiras e jogos fazem parte do cotidiano da criança, associa-


dos a outros componentes lúdicos, tais como: músicas, literaturas, dramatização,
desenhos e as artes em geral. No entanto, temos que ter em mente que essas
atividades lúdicas por si só, nem sempre geram aprendizagem. Para que a apren-
dizagem ocorra, de fato, é necessário um mediador, para que ela seja planejada
e intencional (TEIXEIRA, 2018).
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

O brincar é uma das atividades essenciais para se desenvolver a autonomia


e a identidade. Isso se deve, visto que a criança inicia desde cedo a comunicação
por meio de gestos e sons, os quais, mais tarde, transformam-se na representação
de papéis em uma brincadeira, fazendo que seja desenvolvida a imaginação. No
contexto das brincadeiras, as crianças desenvolvem as capacidades fundamen-
tais, como a memória, atenção, imitação e a imaginação. A socialização também
pode se desenvolver por meio da interação, da experimentação e da utilização
de papéis e regras sociais (LOPES, 2006).
Além disso, de acordo com Kishimoto (2011), a brincadeira pode desper-
tar o desafio, levando ao pensamento reflexivo do sujeito. O autor ainda destaca
a importância do lúdico na preparação da criança para a vida, pois ele a auxi-
lia na assimilação da cultura do contexto em que está inserida, adaptando-se às
situações oferecidas pelo seu meio, aprendendo tanto a competir quanto a coo-
perar com seus semelhantes, convivendo como ser social.
De acordo com Teixeira (2018), as atividades lúdicas possibilitam o conhe-
cimento mais efetivo sobre a criança, pois oferece informações importantes que
podem auxiliar na elaboração de ações e estratégias de intervenção. Wallon (1968
apud TEIXEIRA, 2018) acrescenta que as atividades lúdicas, em geral, são fun-
damentais para a formação integral do sujeito, pois desenvolvem habilidades
essenciais (motoras, intelectuais e afetivas), bem como impulsionam a criati-
vidade e a atenção. Contudo, para que as atividades sejam identificadas pelas
crianças como lúdicas, elas devem possuir cinco qualidades: ser desafiadora,
criar possibilidades, ter um prazer funcional, possuir caráter simbólico e expres-
sar-se de modo relacional ou construtivo (MACEDO; PETTY; PASSOS, 2005).

Estratégias de Intervenção Utilizadas Pela Psicopedagogia


164 UNIDADE V

Criar um espaço lúdico no atendimento psicopedagógico, segundo Weiss


(2012), permite uma melhor compreensão acerca da situação real do sujeito
e do seu nível de desenvolvimento. No processo de intervenção psicopeda-
gógica, poderão ser explorados os jogos pedagógicos, visto que o brincar é
uma atividade universal e possibilita o rompimento dos limites entre o diag-
nóstico e o tratamento, pois, no próprio diagnóstico, passa a ter atributos
terapêuticos.
Souza, Dias e Ernesto (2017) acrescentam que, no planejamento do atendi-
mento, o psicopedagogo pode dispor desse recurso com o intuito de desenvolver

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a afetividade, o raciocínio, o convívio social, o ritmo, a percepção, a escrita,
memória, oralidade, entre outros aspectos. Além disso, nessa programação, o
profissional sempre deve ter como foco o sujeito da intervenção e suas especifi-
cidades, bem como o significado lúdico desse instrumento.
Na brincadeira, o psicopedagogo deverá saber diferenciar os momentos nos
quais deverá apenas observar ou quando deverá intervir, coordenando a brinca-
deira. Ele também pode integrar a brincadeira, participando e tornando-se um
mediador efetivo na interação com o sujeito (OLIVEIRA, et al. 1992).

Brincadeiras e jogos como instrumentos de intervenção psi-


copedagógica

Os jogos e brincadeiras são recursos essenciais no trabalho psicopedagógico,


visto que, se utilizados de maneira objetiva, podem auxiliar o sujeito no processo
de aprendizagem. A brincadeira apresenta a imaginação como sua característica
principal, tendo flexibilidade em suas regras, de acordo com a necessidade e o
desejo de quem brinca. Já o jogo, mesmo não abandonando a imaginação, enfa-
tiza as regras (BARBOSA, 2012).
Segundo Barbosa (2012), tanto o jogo quanto as brincadeiras estão carre-
gados de ludicidade e essa característica é fundamental para que as atividades
propostas não sejam vistas como exercícios técnicos e entediantes. Isso, porque
estão relacionadas ao divertimento, diminuindo o grau de resistência e auxi-
liando na superação das dificuldades e obstáculos.

INTERVENÇÃO PSICOPEDAGÓGICA
165

Para Vygotsky (1998, p. 117), o jogo é um elemento essencial na formação


da Zona de Desenvolvimento Proximal. Sendo assim, o:
Brinquedo cria uma zona de desenvolvimento proximal na criança. No
brinquedo, a criança sempre se comporta além do comportamento ha-
bitual de sua idade, além de seu comportamento diário; no brinquedo
é como se ela fosse maior do que é na realidade. Como no foco de
uma lente de aumento, o brinquedo contém todas as tendências do de-
senvolvimento sob forma condensada, sendo, ele mesmo, uma grande
fonte de desenvolvimento.

Dessa forma, o psicopedagogo, ao utilizar os jogos e as brincadeiras em suas


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intervenções, sejam elas individuais ou em grupos, deve ter em mente a impor-


tância da ludicidade, mas não pode focar exclusivamente no prazer. Para
isso, deve saber claramente os seus objetivos e quais são os recursos psico-
pedagógicos verbais ou corporais que serão empregados, a fim de promover
desequilíbrios, levando o sujeito a diminuir ou superar suas dificuldades
(BARBOSA, 2012).
Segundo Barbosa (2012), os jogos e brincadeiras podem ser utilizados de
diferentes maneiras. Assim, as brincadeiras podem ser classificadas em espon-
tâneas e disparadoras, enquanto os jogos conseguem tanto desenvolver quanto
instrumentalizar, aliviando tensões e servindo de intermediário na relação esta-
belecida com a aprendizagem.
Na brincadeira espontânea, o sujeito tem condições de estar desenvolvendo
questões relacionais, de criatividade e psicomotoras, bem como pode vivenciar
frustrações e conquistas. É nessa vivência que ele pode encontrar outras possi-
bilidades de entendimento e aceitação de sua existência. Ela também auxilia na
autoestima, pois, sem ir direto à dificuldade, o sujeito pode perceber, por meio
da brincadeira, a sua capacidade de realização (BARBOSA, 2012).
A brincadeira disparadora, conforme afirma Barbosa (2012, p. 188), já é
intencional, dado que o psicopedagogo cria uma proposta que visa:
Desequilibrar o aprendiz e provocar uma tensão tal que o leva a buscar
os caminhos para o equilíbrio e com isso descubra seu interesse por
determinadas coisas pelas quais não se interessava antes e desenvolva
funções e habilidades pouco desenvolvidas.

Estratégias de Intervenção Utilizadas Pela Psicopedagogia


166 UNIDADE V

Geralmente, busca-se tal tensão dentro do próprio repertório do sujeito, com


o intuito de ampliar, potencializar e especializá-lo dentro de um contexto tera-
pêutico com a ajuda do psicopedagogo.
Já o jogo apresenta diferentes significados. Enquanto recurso psicopedagó-
gico, buscamos entendê-lo como “um sistema de regras que possui uma estrutura
sequencial que ajuda especificar a sua função e a ação do jogador” (KISHIMOTO,
2000 apud BARBOSA, 2012, p. 195). No atendimento psicopedagógico, Barbosa
(2012) explica que os jogos podem ser utilizados com os mais diversos objetivos, a
saber: para desenvolver e instrumentalizar; aliviar tensões desencadeadas pela difi-

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culdade; preparar para outro trabalho; para construir ou modificar outros jogos.
Podemos destacar, ainda, a dimensão socializante dos jogos, visto que, quando
se joga em equipe, a fim de se alcançar objetivos, eles promovem a convivência
e o respeito com outros e a sua cultura. Além do mais, auxiliam na aquisição
e potencialização de habilidades manuais, estimulam o raciocínio (numérico,
verbal, abstrato e visual), possibilitam o desenvolvimento da lógica e do sentido
comum, desenvolvem a imaginação, favorecem a aquisição de conhecimentos e
oferecem condições para o sujeito explorar as suas limitações (BATLLORI, 2009).
Fernández (2008) trata sobre a importância da hora do jogo psicopedagó-
gica, explicando que ela possibilita a observação da dinâmica da aprendizagem
do sujeito. Dessa forma, ajuda a compreender os aspectos que podem ter desen-
cadeado as dificuldades de aprendizagem, visto que existe uma coincidência
entre o espaço de aprender e jogar. O modo com que o jogo se desenvolve e o
tratamento do objeto esclarecem como acontece a aprendizagem desse sujeito.
Sendo assim, o brincar desenvolve o significado de aprender, o qual a criança
apresenta por meio da ação lúdica.
O jogo é um aliado importante para o psicopedagogo, na medida que auxi-
lia “no enfrentamento de situações desconhecidas que provoquem tensões,
na medida em que jogar pode aliviá-las, minimizar os erros e as dificuldades”
(BARBOSA 2012, p. 198).
Na intervenção psicopedagógica, Jorge Visca (1987) explica que, ao utilizar
os jogos nos atendimentos, deve-se levar em consideração dois aspectos: o nível
desenvolvimento do sujeito e o seu conhecimento prévio sobre o jogo.

INTERVENÇÃO PSICOPEDAGÓGICA
167

PSICOMOTRICIDADE: A IMPORTÂNCIA DO MOVIMENTO

A psicomotricidade tem um papel relevante no trabalho do psicopedagogo pelo


fato de trabalhar com o corpo em movimento, o qual está vinculado ao afeto e
ao intelectual (OLIVEIRA; SILVA, 2017). Segundo Teixeira (2018), a psicomo-
tricidade compreende as ações de movimento que estão integradas com ações
psíquicas. Dessa forma, não se resume ao movimento corporal, envolvendo, tam-
bém, emoções, pensamentos e percepções que podem manifestar-se por meio
de gestos e posturas corporais.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

A atuação da psicomotricidade, de acordo com Fonseca (1995), acontece em


pequenos gestos e nas atividades em que a motricidade da criança está sendo
desenvolvida, buscando o domínio do seu corpo e o seu conhecimento. Sendo
assim, a estruturação da educação psicomotora é o alicerce tanto para o processo
intelectual quanto para a aprendizagem da criança.
Alves (2008), ao tratar da importância da psicomotricidade no processo de
aprendizagem, destaca alguns aspectos que todo sujeito envolvido com o pro-
cesso de ensino-aprendizagem deve ter em mente. Alguns deles são:
■■ O movimento tem influência na maturação do sistema nervoso.
■■ A psicomotricidade pode ser observada não só nos pequenos gestos, mas
em outras atividades que envolvem a motricidade do sujeito.
■■ Na busca pelo desenvolvimento global da criança, a psicomotricidade é
um instrumento fundamental e indispensável.
■■ A psicomotricidade é a base para a organização do processo intelectual
e de aprendizagem da criança.
■■ Alterações em quaisquer dos elementos básicos da psicomotricidade
podem dificultar a aprendizagem escolar.

No entanto, quais são os elementos básicos da psicomotricidade? De acordo com


Rosa Neto (2002), podemos considerar o esquema e a orientação corporal, a late-
ralidade, a coordenação global e a coordenação óculo-manual e fina enquanto
elementos essenciais da psicomotricidade. Se bem estruturados, eles agem de
maneira integrada, sendo pré-requisitos indispensáveis na aprendizagem acadêmica.

Estratégias de Intervenção Utilizadas Pela Psicopedagogia


168 UNIDADE V

Mora (2007) esclarece o quanto esses elementos são essenciais da psico-


motricidade, dizendo que são fundamentais no processo de aprendizagem e
que qualquer alteração em um deles poderá ocasionar dificuldades importan-
tes relacionadas à linguagem verbal e escrita, como também trocas e omissões
de letras, direcionamento incorreto da grafia, alteração na ordenação de sílabas
e palavras, entre outras.
A psicomotricidade é um dos recursos de intervenção mais completos e
interdisciplinares na prática psicopedagógica. Isso se deve, pois, para que o
sujeito explore o ambiente, percebendo a si mesmo e ao outro, é fundamental

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
que tenha desenvolvido as suas estruturas psicomotoras, tais como: equilíbrio,
esquema corporal, orientação espaço-temporal, tonicidade, lateralidade, coor-
denação motora e imagem corporal (FERNÁNDEZ, 2001).
Podemos citar alguns exemplos de atividades psicomotoras que auxiliam no
aprimoramento de vários âmbitos. Algumas delas são:
■■ No desenvolvimento da lateralidade: chutar bola com um pé e, depois,
com o outro, ou atividades com movimentos alternados.
■■ Coordenação visomotora: quebra-cabeças, blocos lógicos ou fazer dese-
nhos em diferentes superfícies.
■■ Aprimoramento do esquema corporal: desenho da figura humana, mímica
ou construção de boneco a partir das partes.
■■ Orientação temporal: organização de histórias em quadrinhos ou repro-
dução de ritmos com objetos ou com o próprio corpo.
■■ Equilíbrio: andar sobre uma corda ou linha, ou pular com um pé só.
■■ Coordenação: rolar no chão ou pular amarelinha.
■■ Orientação espacial: caça palavras, mapas, jogo de damas.

Inúmeras são as opções de exercícios e atividades psicomotoras que podem ser


utilizadas no contexto psicopedagógico.
No entanto, de acordo com Jakubovicz (2002), o psicopedagogo deve ser crite-
rioso na seleção das atividades psicomotoras, considerando:

INTERVENÇÃO PSICOPEDAGÓGICA
169

■■ Em qual nível de desenvolvimento o sujeito se encontra.


■■ Quais são as suas necessidades.
■■ Qual é a problemática relacionada.
■■ Qual é o objetivo que se quer alcançar, buscando aqueles que privilegiam
o desenvolvimento de diferentes valores e sentimentos.

Tendo consciência acerca da importância da psicomotricidade tanto no pro-


cesso de desenvolvimento quanto na aprendizagem acadêmica da criança, o
psicopedagogo deverá, após uma avaliação criteriosa dos elementos que a com-
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

põem, estabelecer um plano de atividades que possa auxiliar o sujeito a superar


essas dificuldades.

A EXPRESSÃO DRAMÁTICA: A MISTURA DA FANTASIA E A


REALIDADE

Quando tratamos sobre dramatizações, estamos nos referindo ao “faz de conta”, o


qual é tão presente nas brincadeiras infantis. Nessas atividades, as crianças repre-
sentam as situações do seu cotidiano como se fossem uma apresentação teatral,
independentemente de se ter plateia ou não (TEIXEIRA, 2018).
A expressão psicodramática possibilita, para a criança, a oportunidade de
superar obstáculos, principalmente os do seu desenvolvimento emocional, por
meio da imaginação. Assim, na representação dramática, por meio do teatro de
faz de conta, a criança age “fazendo de conta que” ou “como se”, expressando o
que alcança a sua sensibilidade e as questões que lhe causam prazer ou despra-
zer, receio ou vontade de aprender. Tudo isso apresenta o sentido do mundo para
ela (GONÇALVES, 1988).
Morais (1988), em um estudo realizado com crianças na pré-escola, chegou
a algumas constatações no que se refere ao brinquedo imaginativo. Uma delas é
o fato de que as crianças passam quase um terço de seu tempo em atividades de
faz de conta. O que chama a atenção nessa brincadeira é a concentração, bem
como o envolvimento que demonstram em sua participação e a maneira eficaz
como se comunicam nesse contexto imaginário.

Estratégias de Intervenção Utilizadas Pela Psicopedagogia


170 UNIDADE V

Ao passar da realidade para a fantasia por meio do faz de conta, a criança


se distancia do meio imediato, expandindo seu campo de percepção e atuação
tanto no espaço quanto no tempo (MATTHEWS, 1977 apud MORAIS, 1988).
Diante disso, é importante que o espaço para a realização desse tipo de
atividade lúdica dramatizada seja organizado de maneira que o sujeito possa
explorar a sua criatividade, oferecendo materiais diversos que possam ser uti-
lizados em uma encenação, bem como um espelho (TEIXEIRA, 2018). Nesse
contexto, poderão ser oferecidas roupas, maquiagens, perucas, sapatos, bolsas,
máscaras, entre outros.

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Segundo Cunha (2007, p. 23), por meio da representação de uma situação
em específico, “a imaginação é desafiada pela busca de soluções para problemas
criados pela vivência dos papéis assumidos. As situações imaginárias estimulam
a inteligência e desenvolvem a criatividade”.
Assim, devemos compreender que esse recurso de intervenção não está dire-
tamente relacionado com a aprendizagem, mas ajuda no autoconhecimento e
na autonomia do sujeito, bem como possibilita a restauração de sua autoestima
(MORAIS; FICSSHER, [s.d.] apud MELQUIDES et al., 2018). Apesar de não
estar diretamente relacionado com a aprendizagem, esse recurso é de grande
relevância para o psicopedagogo, por possibilitar o trabalho com aspectos que
estão correlacionados à aprendizagem.

CAIXA DE TRABALHO PSICOPEDAGÓGICO

Esse tipo de instrumento de intervenção psicopedagógica foi idealizado por Jorge


Visca e possui o intuito de oferecer, ao sujeito, materiais e brinquedos que pos-
sam representar o seu mundo interno, bem como fantasias diante do mundo. A
caixa deve ser organizada com objetos que foram escolhidos para o aprendiz, a
fim de possibilitar a superação ou minimizar as dificuldades relativas à apren-
dizagem (BARBOSA, 2001).

INTERVENÇÃO PSICOPEDAGÓGICA
171

Cada caixa de trabalho é única, não apenas porque será usada por único
paciente (individual ou grupal), mas também no sentido de que não há duas
caixas iguais, da mesma maneira que não existem dois indivíduos ou dois
diagnósticos iguais.
Fonte: Visca (1987, p. 29).
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Visca (1987) explica, ainda, que o sujeito traz, em seu mundo interno, conhe-
cimentos já compreendidos, alguns medos (da crítica, do novo e de perder
conhecimentos apropriados), talentos para dominar, determinados conteúdos,
inabilidades frente a outras pessoas, insensibilidade e sensibilidade etc. Ao orga-
nizar a caixa de trabalho psicopedagógico, é importante que os objetos colocados
representem os aspectos do mundo interno do sujeito e considerem o “estágio
de pensamento, interesses e motivações, déficits de aprendizagem, sexo, idade,
meio sociocultural, prognóstico e grau de focalização na tarefa” (VISCA, 1987,
p. 29). Dessa forma, segundo Barbosa (2001) a caixa é única, devido à sua espe-
cificidade e o seu significado para o sujeito, visto que os objetos que fazem parte
dela foram selecionados para ele.
Configuramos, aqui, algumas intervenções mais utilizadas no contexto de
atendimento psicopedagógico, as quais podem ser utilizadas no contexto clí-
nico e adaptadas para o contexto institucional. No entanto, ressaltamos que
existem muitos recursos de intervenção que podem ser adaptados para o traba-
lho psicopedagógico, conquanto que estejam em consonância com a avaliação
e a necessidade do sujeito. Assim, a criatividade no processo de intervenção é
fundamental.
É importante ressaltar que toda intervenção deve estar fundamentada em
uma linha teórica, a qual dará os subsídios para a compreensão de todo o pro-
cesso de aprendizagem do sujeito.

Estratégias de Intervenção Utilizadas Pela Psicopedagogia


172 UNIDADE V

ALGUNS RECURSOS ESPECÍFICOS PARA A INTERVENÇÃO


INSTITUCIONAL

Segundo Barbosa (2001), existem alguns recursos que podem ajudar no pro-
cesso de aprendizagem no contexto institucional, que são:
■■ Mudança de situação: ação operativa que busca surpreender para interceder.
■■ Informação: não devem ser oferecidas prontas, para que haja um movi-
mento para a realização da atividade.

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
■■ Acréscimo de modelo: oferece uma maneira diferente para que determi-
nada atividade seja efetivada.
■■ Modelo de alternativas múltiplas: respeita o conhecimento do outro, pro-
move outras reflexões, testes escolhas e conclusões.
■■ Mostra: apresenta, de forma não verbal, o movimento do indivíduo ou
do grupo, sem corrigir.
■■ Vivência do conflito: promove uma vivência de certo desequilíbrio e
ansiedade, a ponto que se impulsione o estabelecimento de novas metas
e mudanças de conduta.
■■ Problematização: apresenta situações-problema para que sejam estabele-
cidas as hipóteses, testando-as e as confirmando ou não.
■■ Destaque do comportamento: evidencia atitudes acertadas para que per-
cebam seu potencial para alcançar a meta.
■■ Explicação intrapsíquica: esclarece quais são os aspectos internos, tanto
afetivos quanto cognitivos, utilizados na situação em questão e que auxi-
liam na aprendizagem.
■■ Assinalamento: explicita as partes de uma conduta, dando ênfase à meta,
motivação e entre outras.
■■ Interpretação: apresenta a conduta em sua totalidade, enfatizando os
aspectos positivos.
Esses recursos podem ser adaptados para todas as instituições, não só a
educacional.

INTERVENÇÃO PSICOPEDAGÓGICA
173
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

INTERVENÇÃO CLÍNICA E INSTITUCIONAL

Na intervenção clínica, o psicopedagogo deverá oferecer ao sujeito um espaço


que favoreça a sua aprendizagem, proporcionando oportunidades para que ele
conheça esse contexto, bem como o que está impossibilitando a sua aprendizagem,
para que busquem, juntos, alterar essa trajetória de insucesso na aprendizagem
(BOSSA, 2000).
De acordo com Bossa (2007, apud SILVA, 2012, p. 54), a intervenção clínica
desenvolve-se “na relação entre um sujeito com a sua história pessoal e sua moda-
lidade de aprendizagem, buscando compreender a mensagem do outro sujeito”.
Sendo assim, o psicopedagogo clínico deve estar sempre fundamentado teori-
camente, principalmente no que se refere aos processos de aprendizagem, a fim
de promovê-lo com a excelência que o sujeito necessita.
Agora, quando nos referimos à intervenção institucional, contatamos que
ocorre um deslocamento do âmbito individual para o grupal. Dessa forma, ela
passa a considerar uma série de relações, voltando seu olhar para o contexto

Intervenção Clínica e Institucional


174 UNIDADE V

como um todo, compreendendo a realidade por inteiro. O individual não é esque-


cido, mas deverá ser compreendido de maneira contextualizada, verificando as
condições em que essas relações foram produzidas e quais delas foram estabe-
lecidas (OLIVEIRA, 2014).
A intervenção institucional deve ser baseada na história e nas características
que são inerentes à instituição, já que as mudanças ocorridas nos subsistemas da
empresa vão determinar o estado em que ela se encontra. Além disso, deve-se
entender que os subsistemas recebem influência tanto do meio interno quanto
do externo (CLARO, 2018).

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Deve-se auxiliar no resgate da instituição com o saber e, portanto, com a
possibilidade de aprender. A reflexão sobre o individual e o coletivo traz a
possibilidade da tomada de consciência e da inovação por meio da criação
de novos espaços de relação com a aprendizagem.
Fonte: Porto (2006, p. 116).

De acordo com Claro (2018), a intervenção no contexto institucional tem, como


característica, a prevenção, principalmente no contexto educacional, visando à
compreensão, à transparência e à modificação do processo educacional. Porto
(2006) acrescenta que o foco de intervenção do psicopedagogo, nesse contexto,
deve ser a prevenção tanto das dificuldades escolares quanto as do fracasso esco-
lar, considerando não só o aluno, mas todos os envolvidos nesse processo. Assim,
o profissional deve promover a melhoria das condições de aprendizagem e a
construção da autonomia tanto do aluno quanto do professor.
Monereo e Solé (2000 apud OLIVEIRA, 2014) destacam algumas tendências
na intervenção psicopedagógica, referindo-se, primeiramente, à individualização
do ensino, na qual a escola apresenta respostas que podem influenciar a situa-
ção dos seus alunos. Uma outra tendência explica que o objetivo da intervenção
psicopedagógica no contexto educacional visa:

INTERVENÇÃO PSICOPEDAGÓGICA
175

Potencializar ao máximo a potencialidade de ensinar dos profissionais


que a integram e a capacidade de aprender dos alunos supondo-se que
há um complexo emaranhado complexo em que aspectos estruturais e
organizacionais e as configurações relacionais intra e extrainstituições
interagem constantemente (MONEREO; SOLÉ, 2000 apud OLIVEI-
RA, 2014, p. 72).

Uma terceira tendência apresentada pelos autores busca auxiliar a escola a refletir
a respeito de sua finalidade, tornando-se compatível com os propósitos educa-
cionais que são socialmente estabelecidos pelas políticas públicas (MONEREO;
SOLÉ, 2000 apud OLIVEIRA, 2014, p. 72).
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Para Oliveira (2014), a intervenção psicopedagógica no contexto escolar


deverá abranger a dinâmica escolar em sua totalidade, intercedendo nas mais
variadas instâncias, a fim de possibilitar uma vivência crítica e reflexiva sobre
seu processo ensino aprendizagem.
Diante disso, é fundamental que o psicopedagogo se atente às diferentes
maneiras de funcionamento explícito ou implícito da instituição, pois isso é que a
caracteriza, uma vez que apresentam a sua forma de reagir aos desafios que lhe são
propostos em sua função específica, tanto na área física, quanto na administrativa
e humana (OLIVEIRA, 2014). É imprescindível destacar que esse pressuposto se
aplica a qualquer instituição na qual o psicopedagogo vai atuar, não só a escolar.

Intervenção Clínica e Institucional


176 UNIDADE V

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Assim como você pôde perceber no transcorrer desta unidade, o trabalho de


intervenção psicopedagógica exige, por parte do psicopedagogo, uma atitude
de escuta, visão e observação, para que possa atender o sujeito em todas as suas
necessidades, auxiliando e intervindo em seu processo de aprendizagem. A res-
ponsabilidade do psicopedagogo enquanto mediador é essencial, entendendo a
maneira com que o sujeito aprende e intervindo com os signos e instrumentos
necessários para que se efetive a aprendizagem.

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Dentro desse processo, destacamos a importância da ludicidade em todas as
atividades de intervenção, pois ela possibilita um ambiente menos tenso, dando
condições ao aprendiz para lidar, de maneira diferente, com suas dificuldades,
ajudando-o a superá-las. Esclarecemos, no entanto, que sua utilização deve estar
pautada em objetivos claros e embasados por uma teoria, a fim de que, ao final
da atividade, os alunos possam ser avaliados, verificando a sua eficácia.
Também estudamos a importância da psicomotricidade para a aprendiza-
gem, analisando o quanto o movimento, aliado ao psíquico, é essencial para que
a criança desenvolva as habilidades básicas para a sua alfabetização. Já a expres-
são dramática traz o faz de conta enquanto instrumento de intervenção, ou seja,
pela vivência ou imitação, o sujeito pode experienciar situações desafiantes e,
muitas vezes, temidas, favorecendo sua confiança e autonomia. Agora, a caixa de
trabalho psicopedagógico auxilia na organização tanto interna quanto externa
do sujeito, pois objetos, atividades, construções etc., os quais estão nela guarda-
dos, auxiliam na compreensão do seu processo de aprendizagem como um todo.
Sendo assim, encerramos esta unidade esclarecendo sobre a intervenção do
psicopedagogo no contexto clínico e institucional, ressaltando a importância
de se estabelecer um ambiente de confiança no qual o sujeito se sinta acolhido
e seguro para apresentar as suas dificuldades. Além disso, é imprescindível ter
ciência de que essas orientações podem lhe oferecer um direcionamento para a
sua prática enquanto psicopedagogo.

INTERVENÇÃO PSICOPEDAGÓGICA
177

1. Vygotski entende que a mediação tem um papel essencial na objetivação e


apropriação do conhecimento acumulado historicamente, fundamental no
desenvolvimento das funções psíquicas superiores do homem. Considerando
a compreensão desse autor sobre a mediação, é correto afirmar:
I. No processo de mediação, somente a ação humana é essencial.
II. As funções psicológicas superiores potencializam-se no sujeito por meio
das interações realizadas com o meio social e físico, desenvolvendo, cons-
truindo, reconstruindo e apropriando-se do conhecimento.
III. A mediação é fundamental no processo educativo, já que não é possível
conceber a educação sem mediação.
IV. Na perspectiva desse autor, a atuação do psicopedagogo deve ser sempre
na Zona de Desenvolvimento Real (ZDR).
É correto afirmar que:
a) Apenas a afirmativa I está correta.
b) Apenas as afirmativas II e III estão corretas.
c) Apenas as afirmativas I e IV estão corretas.
d) Apenas as afirmativas I, III e IV estão corretas.
e) Apenas as afirmativas III e IV estão corretas.
2. No que se refere à psicomotricidade, destaque quais fatores que todo profis-
sional envolvido com o processo ensino-aprendizagem deve saber.
3. De acordo com Feuerstein, a mediação constitui-se em uma interação espe-
cializada e pautada em critérios e características próprias, as quais possibili-
tam uma postura qualificada. Assim, o autor destaca doze características desse
processo de mediação. Baseado nessas características, julgue as afirmativas a
seguir com (V) para as Verdadeiras e (F) para as Falsas.
( ) A intencionalidade e reciprocidade consistem em ensinar com significa-
do, possibilitando que o aprendiz realize conexões com os mais diferentes
contextos, ampliando as possibilidades de uso do conceito trabalhado e
relacionando-o com outros conceitos.
( ) Na mediação da busca pela adaptação a situações novas e complexas,
destaca-se a importância de saber onde se quer chegar na aprendizagem
do sujeito. Assim, objetivos bem traçados estabelecem o caminho a ser
traçado e possibilitam a análise das estratégias utilizadas, mudando-as,
quando for necessário.
178

( ) A mediação do comportamento de compartilhar apresenta a necessidade


de se incentivar a partilha no processo ensino-aprendizagem e nas estra-
tégias de resoluções de problemas, destacando tanto as vitórias quanto
as dificuldades.
( ) Na mediação de sentimento de competência, o mediador deve ater-se ao
nível de complexidade da atividade apresentada, para que a criança possa
sentir-se motivada a realizá-la, independentemente das histórias de fra-
casso vividas anteriormente.
( ) A mediação do significado acontece quando o sujeito consegue utilizar o
conceito que ele aprendeu em qualquer outra situação ou contexto.
A sequência correta é:
a) V, V, F, F, F.
b) F, F, V, V, V.
c) V, F, V, F, F.
d) F, F, V, V, F.
e) F, F, F, V, V.
4. As atividades lúdicas, em geral, são fundamentais para a formação integral do
sujeito, pois desenvolvem habilidades essenciais (motoras, intelectuais e afe-
tivas). Diante disso, quais são as cinco qualidades que uma atividade lúdica
deve ter?
a) Estimular a atenção, proporcionar o desafio, promover o raciocínio, desen-
volver a criatividade e incentivar a interação.
b) Ser criativa, desafiadora, proporcionar prazer, auxiliar no desenvolvimento
de habilidades essenciais e ser construtivista.
c) Ser desafiadora, criar possibilidades, ter um prazer funcional, possuir caráter
simbólico e expressar-se de modo relacional ou construtivo.
d) Concentração, criatividade, raciocínio, resolução de problemas, interação
social.
e) Expressão relacional, simbolismo, desafio, concentração e criatividade.
5. Esclareça a principal diferença entre a intervenção psicopedagógica institucio-
nal e a clínica.
179

PSICOMOTRICIDADE E APRENDIZAGEM

Em 1925, através da sua análise sobre os Segundo Rosa Neto (2002), a psicomo-
estágios e os transtornos do desenvolvi- tricidade está relacionada a aspectos
mento mental e motor da criança, Henri psicológicos e cognitivos do movimento e
Wallon trouxe suas contribuições para a às atividades corporais na relação do orga-
psicomotricidade. Seu estudo foi funda- nismo com o meio em que se desenvolve.
mentado no desenvolvimento neurológico Na psicomotricidade, há elementos matu-
do recém-nascido e na evolução psicomo- racionais relacionados com os movimentos
tora da criança. Para Wallon, há uma relação e ações que se mostram quando a criança
entre motricidade e caráter, onde o movi- entra em contato com pessoas e objetos com
mento está relacionado ao afeto, à emoção, os quais se relaciona de forma construtiva.
ao meio ambiente e os hábitos da criança
(OLIVEIRA, 2009). De acordo com Oliveira (2009), o desen-
volvimento psicomotor evolui lentamente,
De acordo com Fonseca (1995), Wallon foi de acordo com experiências e oportunida-
o responsável pelo nascimento da reedu- des que a criança possui em descobrir o
cação psicomotora. Pode-se dizer que a ambiente no qual está inserida, portanto a
psicomotricidade atua nos pequenos ges- falta de habilidade motora pode ser muitas
tos e em todas as atividades que desenvolve vezes, resultado da falta de vivência corporal.
a motricidade da criança, visando ao conhe-
cimento e ao domínio do seu próprio corpo. A psicomotricidade deve ser compreen-
A estrutura da educação psicomotora é a dida como uma educação corporal básica
base essencial para o processo intelectivo na formação integral da criança, como um
e de aprendizagem da criança. meio de expressão que prioriza a dimensão
não verbal e as atividades não diretivas ou
A Associação Brasileira de Psicomotri- exploratórias em um período evolutivo con-
cidade (2012) define psicomotricidade creto, desde os primeiros meses até os 7 ou
como ciência que tem como objeto de 8 anos de idade maturativa (ARNAIZ, 2003).
estudo o homem, através do seu corpo em
movimento e em relação ao seu mundo De acordo com Vygotsky (1991), a transfor-
interno e externo. Está relacionada ao pro- mação de uma criança de um estágio de
cesso de maturação, em que o corpo é desenvolvimento para outro dependerá
a origem das aquisições cognitivas, afe- das necessidades que a criança apresenta
tivas e orgânicas. É sustentada por três e os estímulos que são eficazes para colocá-
conhecimentos básicos: o movimento, o -la em prática, sendo que a criança satisfaz
intelecto e o afeto. algumas necessidades no brinquedo.
180

De acordo com Rochael (2009), a estrutura criança apresenta dificuldades de aprendi-


da Educação Psicomotora é a base essen- zagem, a origem do problema, na maioria
cial para o processo de aprendizagem da das vezes, está no nível das bases do desen-
criança. O desenvolvimento transforma-se volvimento psicomotor.
do geral para o específico. Quando uma
O desenvolvimento funda-se em um processo de auto-
descoberta, onde cada qual tende a tomar consciência
do que sabe fazer e do que tem dificuldade, como poten-
cializar aquilo que faz bem e conviver, ou diminuir, com
efeitos daquilo que tem menos habilidade. O processo de
comparação pode ser doloroso, porém é eficaz e, às vezes,
inevitável. Porém, atividade lúdica pode compor este pro-
cesso de comparação de forma agradável, divertida e em
um clima de camaradagem. Quando a criança joga, ela
percebe suas possibilidades e a dos companheiros (DHO-
ME, 2003, p.124-125).

Quando se permite à ação intencional, a de representação da criança ou suas múl-


construção de representações mentais, a tiplas inteligências, que contribuem para a
manipulação de objetos e desempenho aprendizagem e o desenvolvimento infan-
de ações sensório motoras e as trocas nas til (KISHIMOTO, 2000).
interações, o jogo considera várias formas
Fonte: Pessanha, Cordeiro e Pinto (2015, p. 23-25).
MATERIAL COMPLEMENTAR

Atividades Neuropsicopedagógicas de Intervenção e


Reabilitação
Simaia Sampaio
Editora: Wak
Sinopse: as atividades contidas neste livro foram desenvolvidas
pela autora no contexto da intervenção psicopedagógica, com a
finalidade de estimular o raciocínio lógico, a linguagem, a atenção
auditiva e visual, a memória auditiva e visual, o rastreamento visual,
o desenvolvimento de estratégias, o planejamento, o treino de
orientação temporal e espacial, o controle inibitório, a coordenação
visório-motora, a lateralidade, a sequência, a classificação e o cálculo. Crianças com dificuldades
de aprendizagem (sem distúrbios específicos), com transtornos de aprendizagem (dislexia e
discalculia) e até mesmo aquelas com transtorno do déficit de atenção e hiperatividade podem
apresentar mau funcionamento em um ou mais desses componentes importantes para o seu
desenvolvimento acadêmico, merecendo especial atenção por parte de quem está envolvido em
seu processo de aprendizagem. Assim, o objetivo deste livro é servir como recurso de intervenção
psicopedagógica clínica complementar, pretendendo estimular áreas deficitárias, contribuindo
para um melhor desenvolvimento cognitivo.

Território do Brincar - Diálogos com Escolas


Documentário lançado em 2015 como objetivo de compartilhar o caminho de reflexão e diálogo
entre as escolas e o território do brincar. Trata sobre a importância de se resgatar a ludicidade no
contexto escolar.
Web: https://www.youtube.com/watch?v=ng5ESS9dia4.

Material Complementar
REFERÊNCIAS

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Expoente, 2001.
BARBOSA, L. M. S. Intervenção psicopedagógica no espaço da clínica. Curitiba:
Intersaberes, 2012.
BATLLORI, J. Jogos para treinar o cérebro: desenvolvimento de habilidades cogni-
tivas e sociais. 11. ed. São Paulo: Madras, 2009.
BOSSA, N. A. A psicopedagogia no Brasil: contribuições a partir da prática. Porto
Alegre: Artes Médicas Sul, 2000.
BUDEL, G. C.; MEIER, M. Mediação da aprendizagem na educação especial. Curi-
tiba: Intersaberes, 2012.
CLARO, G. R. Fundamentos de psicopedagogia. Curitiba: Intersaberes, 2018.
CUNHA, N. H. S. Brinquedoteca: um mergulho no brincar. 4. ed. São Paulo: Aqua-
riana, 2007.
FERNÁNDEZ, A. A mulher escondida na professora. 2. ed. Porto Alegre: Artmed,
2001.
FERNÁNDEZ, A. A inteligência aprisionada: abordagem psicopedagógica clínica
da criança e sua família. Porto Alegre: Artmed, 2008.
FONSECA, V. da. Manual de observação psicomotora: significação psiconeurológi-
ca dos fatores psicomotores. Porto Alegre: Artmed, 1995.
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185
GABARITO

1. A alternativa correta é a B.
2. Quando se trata da importância da psicomotricidade no processo ensino-apren-
dizagem, é fundamental que o psicopedagogo e outros profissionais da edu-
cação tenham em mente os seguintes fatores: o movimento tem influência na
maturação do sistema nervoso; a psicomotricidade pode ser observada não só
nos pequenos gestos, mas em outras atividades que envolvem a motricidade do
sujeito; a psicomotricidade é um instrumento indispensável e fundamental no
desenvolvimento global da criança e é a base para a organização do processo
intelectual e da aprendizagem da criança. Além disso, alterações em qualquer
um dos seus elementos básicos pode dificultar a aprendizagem escolar.
3. A alternativa correta é a D.
4. A alternativa correta é a C.
5. A diferença ocorre, porque, na intervenção institucional, ocorre um deslocamen-
to do âmbito individual para o grupal. Dessa forma, ela passa a considerar uma
série de relações, voltando seu olhar para o contexto como um todo, compreen-
dendo a realidade por inteiro. O individual não é esquecido, mas deverá ser com-
preendido de maneira contextualizada, verificando as condições em que essas
relações foram produzidas e quais delas foram estabelecidas.
CONCLUSÃO

Encerramos, aqui, os conteúdos da disciplina Princípios Teóricos da Psicopedagogia


com a certeza de que lhe foi apresentado um conteúdo que servirá de alicerce para
a compreensão do papel do psicopedagogo. Agora, você sabe o quão amplo e fun-
damental é esse trabalho, tanto no contexto individual quanto no grupo.
Espero que você tenha compreendido o compromisso do psicopedagogo com a
aprendizagem em qualquer âmbito, mesmo sabendo que, muitas vezes, você vai
se deparar com situações de não aprendizagem. Contudo, quando isso acontecer,
você já terá algumas diretrizes acerca do caminho que deve percorrer para ajudar o
sujeito ou o grupo a melhorar ou a encontrar um novo rumo.
Como percebemos, nesse trabalho, você vai precisar exercitar a observação e a es-
cuta, tendo olhos e ouvidos abertos, e muita sensibilidade e empatia. Exercite essa
capacidade de colocar-se no lugar do outro. Além disso, lembre-se sempre de que a
avaliação é a chave para a intervenção. Compreender como acontece a aprendiza-
gem do outro é um exercício diário, pois, muitas vezes, é mais fácil achar as dificul-
dades do que as facilidades, mas a última pode ser a base de todo o seu trabalho.
A criatividade e a ludicidade devem ser as suas parceiras quando o assunto for a
intervenção. Não abra mão dessas ferramentas de trabalho e sempre as fundamente
bem e as paute em objetivos pré-estabelecidos. Existem muitos recursos, mas você
deverá desenvolver a capacidade de selecioná-los de acordo com as necessidades e
especificidades do sujeito ou da instituição que você atende.
Termino a disciplina confiante de que você teve os apontamentos necessários sobre
a atuação do psicopedagogo tanto na área clínica quanto institucional, tendo em
mente as características de cada uma delas. Espero que o conteúdo apresentado
tenha fortalecido o seu desejo de ser psicopedagogo.
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