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#GOVERNOANTICULTURA1: GUERRAS CULTURAIS E

RETÓRICA DO ÓDIO COMO ATAQUE ÀS POLÍTICAS


CULTURAIS NO BRASIL

Diana de Oliveira Souza Reis2


Isadora Rodrigues Moreira da Silva3
Thaís Vinhas4

Resumo: O texto apresenta uma reflexão sobre o uso da técnica da retórica do ódio
como estratégia política para a instrumentalização da Guerra Cultural no Brasil atual, no
âmbito da gestão das políticas culturais. Como proposta analítica, buscamos identificar
características discursivas da retórica do ódio presentes em postagens publicadas na
mídia social Twitter pelo ex Secretário de Cultura do Governo Federal Mário Frias,
referentes a programas, projetos e pessoas relacionadas ao campo cultural brasileiro . O
método de análise utilizado se baseia na etnografia textual proposta por Rocha (2021),
que consiste na observação crítica de textos publicados em redes sociais, buscando
identificar as duas características estruturantes da retórica do ódio: a desqualificação
nulificadora e a hipérbole descaracterizadora. O estudo dos tweets indicam a utilização
da retórica do ódio como estratégia de fragilização de uma concepção democrática de
cultura, técnica amplamente utilizada pela extrema direita brasileira na atualidade.
Nesse sentido, torna-se necessário um aprofundamento analítico do uso das redes
sociais como arena que tem viabilizado a guerra cultural fundamentada na retórica do
ódio, para caracterizar seu funcionamento, desvelar suas técnicas de atuação, denunciar
seu autoritarismo e os impactos reais sobre a cultura brasileira.

Palavras-chave: Guerras Culturais; Retórica do Ódio; Políticas Culturais;

Abstract: The text presents a reflection on the use of the hate rhetoric technique as a
political strategy for the instrumentalization of the Cultural War in Brazil today, in the
context of the management of cultural policies. As an analytical proposal, we aim to
identify discursive characteristics of the rhetoric of hatred present in posts published on
the social media Twitter by the previous Secretary of Culture of the Federal
Government, Mário Frias, referring to programs, projects and people related to the

1
O título faz referência ao sistema de indexação utilizado por usuários na rede social Twitter, onde o
símbolo denominado Hashtag (#) tem como objetivo colocar um tema em evidência e ampliar sua
reprodução.
2
Bacharela interdisciplinar em artes pela Universidade Federal da Bahia (UFBA).
dianaosreis@gmail.com
3
Mestranda em Cultura e Sociedade pela Universidade Federal da Bahia (UFBA).
isadorafloress@gmail.com
4
Professora Assistente da Universidade do Estado da Bahia (UNEB)-Campus XVIII, Doutoranda em
Cultura e Sociedade pela Universidade Federal da Bahia (UFBA). tvinhas@uneb.br
brazilian cultural field. The analysis method used is based on the textual ethnography
proposed by Rocha (2021), which consists of the critical observation of texts published
on social networks, seeking to identify the two structuring characteristics of the rhetoric
of hate: nullifying disqualification and de-characterizing hyperbole. The study of the
tweets indicates that Mário Frias uses the rhetoric of hate as a strategy to weaken a
democratic conception of culture, a technique widely used by the Brazilian extreme
right today. In this sense, it is necessary to further analyze the use of social media as an
arena that has made cultural warfare based on the rhetoric of hatred possible, to
characterize its operation, unveil its operating techniques, denounce its authoritarianism
and the real impacts on brazilian culture.

Keywords: Cultural Wars; Rhetoric of Hate; Cultural Policies;

INTRODUÇÃO

O presente trabalho apresenta uma reflexão sobre o uso da técnica da retórica do


ódio como estratégia política para a instrumentalização da Guerra Cultural no Brasil, e
suas implicações para o campo das políticas culturais. Para tanto, utilizamos como
recurso analítico tweets do ex Secretário Especial de Cultura do Brasil, o ator Mário
Frias, para identificar os elementos discursivos de suas postagens que evidenciam
aspectos constituintes da guerra cultural em curso no país.

Como aporte teórico, utilizamos o conceito de Guerras Culturais a partir de


James Hunter (1992) e João Cezar de Castro Rocha (2021) para explicar de que forma a
postura autoritária adotada pelos representantes do governo federal, aliada a uma
retórica do ódio que foi amplamente difundida principalmente através das redes sociais
nos últimos anos no país, têm impactado as políticas de fomento à cultura. Esta
conjuntura é responsável por grandes retrocessos nas políticas culturais vigentes, com
implicações diretas nas noções de liberdade de expressão e de cultura e, portanto,
provoca tensões que serão analisadas a seguir.

É imprescindível atentar para o fato de que parte significativa deste embate vem
ocorrendo em plataformas digitais, que se consolidaram de forma paradoxal enquanto
espaço de posicionamentos políticos e morais tanto de membros do governo, quanto da
população de forma mais ampla. Em especial o Twitter, que mais recentemente vem
sendo acusado de lucrar com a viralização dos discursos de ódio. Neste sentido, há
também um beneficiamento dos movimentos conservadores que utilizam esta
plataforma para difundir ódio, teorias conspiratórias e textos desqualificadores de
agentes culturais e movimentos sociais. Uma análise do discurso que tem sido
construído sobre a cultura no Brasil pelo ex Secretário Mário Frias, recém desligado da
pasta, e que sintetiza as diretrizes práticas adotadas na condução da secretária que ele
foi responsável, torna-se de extrema relevância para compreender as disputas culturais e
o seu impacto nas políticas culturais na atualidade.

GUERRAS CULTURAIS NO BRASIL: CONSERVADORISMO,


ANTIPETISMO E RETÓRICA DO ÓDIO

A extrema polarização política ganhou força no Brasil com as eleições de 2014,


quando os candidatos Aécio Neves (PSDB) e Dilma Rousseff (PT) disputaram o cargo
de presidência da República. Naquele período, já se delineavam disputas políticas que
estavam além de aspectos puramente econômicos e administrativos, pautas tradicionais
dos debates públicos neste campo. Os discursos políticos passaram a fazer coro também
a um moralismo ascendente no país. No decurso do processo de redemocratização do
Brasil, foi possível abrir pequenas brechas para tratar de questões essenciais à
democracia como racismo, homofobia, misoginia e machismo. Essas discussões foram
inseridas de forma significativa na agenda governamental do PT, refletindo em
diferentes políticas públicas que possibilitaram práticas de reconhecimento, combate e
inclusão de grupos sociais historicamente discriminados, o que passou a gerar uma
reação dos setores conservadores, que sentindo-se ameaçados pelos avanços destas
discussões, trataram de reforçar a sua disputa por estas pautas em sentido contrário,
principalmente às políticas e ações propostas pelos governos petistas, consolidando no
país uma percepção sociopolítica divergente, pautada na dicotomia esquerda/direita.

Nesta conjuntura binária, um populismo de direita se consolida a partir de um


sentimento difuso cunhado como antipetismo. De acordo com Esther Solano, Pablo
Ortellado e Márcio Moretto (2017), este foi o fator de coesão que uniu pessoas de
grupos identitários diversos em prol do impeachment da presidenta Dilma em 2016,
convergindo em um grupo de oposição baseado em concepções de autoridade moral.
Um contexto muito semelhante é analisado por James Hunter (1992) nos Estados
Unidos, quando ele descreve e analisa os acontecimentos políticos e sociais na
passagem da década de 1980 para 1990, denominando o fenômeno como Guerras
Culturais.

Sinalizadas as contradições culturais pelas quais o mundo passa a partir de 1960,


com as transformações da ação política devido às lutas pelos direitos civis, das
mulheres, da livre expressão das sexualidades e da proteção ao meio ambiente,
movimentos que foram frutos dos processos de descolonização e emergência de novas
subjetividades, são constatadas reconfigurações nas relações sociais (GIDDENS, 1993).
A noção de igualdade que passa a predominar neste período é tomada como um ataque
ao modo de vida tradicional dos cidadãos conservadores, baseado no moralismo cristão
e na ideia de família heterossexual, matrimonial e patriarcal. A partir de então, uma
disputa pelo controle das instituições sociais e culturais se consolida entre progressistas
e conservadores e a Guerra Cultural se inicia, a princípio, nos EUA.

A difusão do discurso conservador decorre de um contexto de crises econômicas


que aumentam desigualdades sociais operadas pelo neoliberalismo. No entanto, a
percepção de significativa parcela da sociedade sobre este fenômeno não decorre da
realidade sistêmica e econômica na qual está inserida, e sim às mudanças culturais
ocorridas nas últimas décadas. Além disso, uma apropriação do texto de Hunter (1992)
é feita pelos movimentos de direita para validar uma instrumentalização estratégica
deste discurso polarizador.

No Brasil, a defesa de uma tradição conservadora ocorre em um cenário com


distorções perceptivas sobre a realidade brasileira, onde as elites econômicas incentivam
uma guerra ideológica para convencer que as políticas neoliberais são a única saída para
as questões sociais que estão sendo atravessadas, e que políticas de bem-estar social são
gastos desnecessários, bem como o incentivo à cultura, uma vez que esta estava a
serviço da esquerda para deturpar as tradições familiares e religiosas cristãs.

A votação do impeachment de Dilma, apesar de pautado oficialmente no crime


de responsabilidade fiscal, teve como principal justificativa a defesa dos ideais
conservadores e neoliberais, como ficou claro nos discursos dos deputados presentes na
sessão. Esta situação ficou ainda mais evidente com a posse do vice-presidente Michel
Temer (MDB), que ainda em sua gestão interina já apoiava pautas de caráter neoliberal
como as reformas do Ensino Médio, da Previdência, trabalhista e demais políticas de
austeridade. Se reestabelecia uma velha política conservadora em nome da defesa da
sociedade das fantasiosas opressões petistas, tal como as ditaduras comunista, feminazi
e gayzista. Nas palavras do senador Romero Jucá (MDB) em transcrição de áudio
divulgado posteriormente no Jornal eletrônico G1, em 23 de maio de 2016, era preciso
acabar com a classe política que havia se estabelecido com os movimentos sociais para
“construir uma nova casta” e para tanto foi preciso “um grande acordo nacional, com
o Supremo, com tudo”, para colocar Michel Temer na presidência e colocar em curso o
projeto ultraneoliberal no Brasil.

Esta disputa pelo controle do Estado é explicada por Bourdieu (2014, p.139)
como “uma espécie de reserva de recursos simbólicos, de capital simbólico que é ao
mesmo tempo instrumento para um certo tipo de agentes e objeto de luta entre esses
agentes". Esta disputa simbólica veio à tona desde as manifestações contra a Dilma,
quando imagens e discursos de alusão a estupro e demais formas de violências foram
utilizadas com naturalidade entre seus opositores. Este período também foi marcado
pelo aumento e o uso estratégico do que se cunhou como “fake news”, ou simplesmente
a divulgação de notícias falsas como o “kit gay” e a “mamadeira erótica”,
reiteradamente usadas como argumentos contra o governo PT desde 2014. Aliado a
estes aspectos, um movimento em prol de intervenção militar também ganha as ruas,
configurando uma característica derradeira ao caráter fascista e autoritário do que vinha
se delineando no país nos últimos anos. O retorno do velho “medo” de uma revolução
comunista é o estopim para que militares sejam convidados a assumirem o poder.

O pesquisador João Cezar de Castro Rocha (2021) comenta o ressentimento da


classe militar com a denominação dos seus anos de governo como ditadura e, baseada
na Guerra Cultural brasileira, encontra neste espaço a possibilidade de realizar o
trabalho ideológico de construir uma narrativa alternativa dos anos compreendidos entre
1964 e 1988 no Brasil. Este alinhamento militar à Guerra Cultural incrementa a noção
do opositor como inimigo a ser derrotado. Estabelece-se assim, uma política fascista
que tem como principal inimigo a cultura e os seus agentes.

No cenário brasileiro, é imprescindível que uma análise das Guerras Culturais


seja feita em articulação à construção de uma retórica do ódio, particularmente entre os
sujeitos da direita. Escritor de grandes jornais brasileiros desde os anos 1990, Olavo de
Carvalho tornou-se uma das principais referências teóricas para os movimentos
conservadores do país, contribuindo na difusão desta retórica. Seu principal meio de
divulgação foi a internet, onde promoveu cursos, divulgou vídeos, vendeu seus livros
sem qualquer fundamentação epistemológica, valendo-se da noção de livre expressão
exaltada nesse espaço e pelo setor conservador.

Desta forma, Carvalho estruturou em seu discurso elementos de uma teoria


conspiratória quanto à existência de uma ditadura marxista e uma hegemonia cultural da
esquerda, partindo de distorções de outros teóricos. É fundamental destacar que Olavo
de Carvalho foi ainda um dos principais mentores do programa governamental do
presidente Jair Bolsonaro. Suas publicações ao longo de quase vinte anos foram
compiladas no livro “O mínimo que você precisa saber para não ser um idiota”,
lançado em 2013, com uma linguagem popular e em certo grau bem humorada, que
atraiu muitos dos manifestantes contra o governo PT que foram às ruas naquele ano
fazer reivindicações políticas.

Rocha (2021) defende que a articulação de Carvalho principalmente entre jovens


através das redes sociais constituiu um sistema de crenças capaz de formar idiotas
eruditos, devido ao excesso de informações mal passadas e mescladas a teorias
conspiratórias. Este fato, somado ao funcionamento algoritmo das redes, alimenta um
ciclo vicioso de ilhas de ideias devido a ausência de mediação nos espaços virtuais. É
importante ressaltar ainda que, nesse sistema de crenças, o principal argumento
utilizado é a desqualificação e os insultos, fomentados e presentes desde os títulos de
suas publicações - O dever de insultar (2016), O imbecil Coletivo (1996), entre outros.

Consolida-se então uma retórica do ódio como forma de desqualificar o


adversário e esta segue sendo uma das principais armas dos setores conservadores, que a
partir de ofensas esdrúxulas impossibilitam qualquer forma de discussão nos campos da
política e da cultura, reduzindo os opositores a inimigos a serem derrotados. Evoca-se,
portanto, uma ação incisiva da população e dos novos governos pós-golpe para destruir
as instituições que formam estes inimigos: a Cultura enquanto instituição e expressão, e
as Universidades públicas, como apontava Olavo de Carvalho.
A ascensão de Jair Bolsonaro ao governo federal, político alinhado com essa
concepção ideológica, teve um impacto expressivo na gestão cultural no país. Assim,
uma das primeiras medidas do governo Bolsonaro foi extinguir o Ministério da Cultura,
pasta que já vinha sofrendo um desmonte sistematizado desde o governo de Michel
Temer (2016 a 2018).

Transformado por Bolsonaro em Secretaria Especial de Cultura vinculada ao


Ministério do Turismo, o antigo MinC vivencia na atualidade um momento síntese das
tristes tradições identificadas por Albino Rubim (2007) no percurso histórico de
institucionalização do campo cultural na esfera pública governamental: instabilidades,
ausências e autoritarismos.

As reiteradas ações de desarticulação de políticas e programas culturais de viés


democrático baseadas na ideia plural de cultura, os crescentes cortes orçamentários, a
imposição na agenda pública de um “resgate” de valores culturais alinhados às questões
morais cristãs, a concepção de gestão pública cultural baseada em uma noção elitista de
cultura, o uso abusivo do poder na intensificação da censura e do boicote às expressões
culturais, as constantes trocas de gestores da pasta, dentre outros fatores, compõem um
cenário onde a convergência das “tristes tradições” se articula com os elementos de uma
guerra cultural e de uma técnica discursiva agressiva e desqualificadora que tem
atingido de forma significativa a cultura brasileira.

PARA ALÉM DAS PALAVRAS: “RETÓRICA DO ÓDIO” E A GESTÃO


FEDERAL DA CULTURA NO BRASIL

A gestão de Mário Frias na Secretaria Especial de Cultura foi sintomática de


como a retórica do ódio definida por Rocha (2021) tem instrumentalizado a guerra
cultural e o desmonte institucional da cultura no Brasil. Simpatizante de longa data do
atual presidente da república, o ator Mário Frias fez coro à campanha de Bolsonaro,
produzindo e reproduzindo em suas redes sociais a ideologia conservadora defendida
pela extrema direita no combate a uma ideia plural de cultura. Sua atuação nas mídias
sociais teve repercussão positiva no grupo político bolsonarista, a ponto de ser
convidado para assumir a secretaria que tem como objetivo coordenar as ações no
campo cultural. Mario Frias foi o quinto Secretário Especial de Cultura do governo
Bolsonaro, após as gestões de Ricardo Braga, Roberto Alvim, o secretário interino José
Paulo Martins e Regina Duarte, abreviadas por polêmicas envolvendo temas sensíveis,
como apologia ao regime nazista, além de outros desgastes políticos.

À frente da pasta, Frias paradoxalmente utilizava e contribuía com o crescimento


de narrativas contra a cultura que ganharam força no país nos movimentos que
culminaram com o impeachment da ex-presidenta Dilma Rousseff. Essas narrativas
foram se moldando a ponto de criar uma sedimentação do discurso contra políticas de
fomento à cultura e circulação de bens culturais, sobretudo através da Lei Rouanet.
Emblemático o fato de que a Hashtag #RouanetNão chegou a figurar nos tópicos mais
comentados do Twitter em 2018, no ápice da onda antipetista vinculada à produção de
conteúdos alarmistas. Essas disputas discursivas continuaram sendo encampadas e
defendidas por Frias enquanto secretário especial de cultura, que utilizava da retórica do
ódio como estratégia de fragilização de uma concepção democrática de cultura, em um
retrato claro de como o discurso se converte em ação e impacta diretamente nas
políticas culturais do país.

Para esta seção, buscamos analisar características discursivas da retórica do ódio


presentes em postagens de Mário Frias enquanto era secretário de Cultura, referentes a
programas, projetos e pessoas relacionadas ao campo cultural brasileiro . Essas
postagens geralmente são compartilhadas na rede social Twitter e depois respostadas em
outros canais de comunicação e mídias sociais, o que amplifica o alcance das ideias
veiculadas.

O método de análise utilizado se baseia na etnografia textual proposta por Rocha


(2021), que consiste na observação crítica dos textos publicados nas redes sociais,
buscando identificar as duas características estruturantes da retórica do ódio: a
desqualificação nulificadora e a hipérbole descaracterizadora. Essas características
mapeadas pelo autor têm funções específicas na organização do discurso, e mobilizam
diferentes estratégias de negação do outro. A desqualificação nulificadora:

(...) reduz o adversário ideológico num outro tão absoluto que ele
passa a se confundir com um puro nada, um ninguém de lugar
nenhum. O efeito é assustador porque autoriza a completa
desumanização de todo aquele que não seja espelho de minhas
próprias convicções. (ROCHA, 2021, p.60)

No jogo da desqualificação que visa anular simbolicamente o outro, alguns


recursos são utilizados como a subversão paródica do nome da pessoa a ser atacada.
Nesse sentido, podemos observar o uso dessa técnica em um tweet de Mário Frias
publicado em novembro de 2021, quando ele rebateu uma crítica que o ator Wagner
Moura fez ao governo Bolsonaro durante sua participação no Programa Roda Viva,
quando publicou: "Esse Wagner 'Choura' é patético. Diga-me com quem andas e te
direi quem és! Chorão!"

A postagem foi seguida de fotos do ator Wagner Moura com os ex-presidentes


Lula e Dilma, na intenção de potencializar a crítica, correlacionando o ator aos governos
do Partido dos Trabalhadores, alvo constante das críticas bolsonaristas que se valem da
retórica do “aparelhamento ideológico da cultura” pelo governo durante a gestão do PT,
sem especificar ao certo quais os elementos que constituem esse aparelhamento e de que
forma ele foi utilizado. O trocadilho “Choura” é ratificado com o adjetivo chorão, em
uma busca por desqualificar os pontos de crítica evidenciados por Wagner Moura no
programa e que são atestáveis a partir de dados sobre atuação do governo Bolsonaro,
como o corte das verbas direcionadas à cultura e o desmonte institucional. No tweet, o
então secretário ainda denominava o ator como patético, em uma tentativa evidente de
desqualificar a fala, reduzindo o sujeito a uma imagem alegórica.

Esse não foi o primeiro ataque do secretário ao ator Wagner Moura. No


lançamento do filme Marighella, Mário Frias utilizou o argumento de aparelhamento
ideológico da cultura pelos governos petistas, acusando a ANCINE, órgão que tem um
trabalho reconhecido de desenvolvimento cinematográfico brasileiro, de estar a serviço
da distribuição não criteriosa do recurso público. Em seguida, adota a desqualificação
nuladora para caracterizar o longa dirigido por Wagner Moura, onde a importância e
qualidade do filme são anuladas em comentário feito em 7 de novembro de 2021, no
qual Frias afirma se tratar da história de um terrorista, e cuja realização só foi possível
porque estava a serviço da ideologia do governo petista:
Por muito tempo a ANCINE serviu como caixa eletrônico para financiar os
filmes panfletários da esquerda. O financiamento do Marighella, um terrorista
abominável, foi o ponto auge dessa criminosa política propagandista.

A desqualificação nuladora tem ainda uma outra particularidade: a


estigmatização, “que converte o outro numa mera caricatura, estimulando o seu
sacrifício simbólico.” (ROCHA, 2021, p.161). Mário Frias adotou essa tática ao criticar
o ator Marcelo Adnet, que em um quadro do seu programa humorístico fez uma
representação do secretário baseada em falas públicas que evidenciavam sua concepção
de cultura, expressas na campanha “Heróis Brasileiros”. Em tweet de setembro de 2020,
Frias retrata Adnet como:

Garoto frouxo e sem futuro. Agindo como se fosse um ser do bem,


quando na verdade não passa de uma criatura imunda, cujo o adjetivo
que devidamente o qualifica não é outro senão o de crápula. Um Judas
que não respeitou nem a própria esposa traindo a pobre coitada em
público e por pura vaidade. Um palhaço decadente que se vende por
qualquer tostão, trocando uma amizade verdadeira, um amor ou sua
história por um saquinho de dinheiro e uma bajulada no seu ego infantil
e incapaz de encarar a vida e as suas responsabilidades morais. Pior do
que isso: conta vantagem por se considerar melhor que as outras
pessoas. Mas isso tudo é só para esconder a solidão em que ele se
encontra. Quem em sã consciência consegue conviver no mundo real
com um idiota egoísta e fraco como esse? Onde eu cresci ele não
durava um minuto. Bobão.

A agressividade do texto, com adjetivos que desqualificam o sujeito, a referência


a um episódio passado da vida pessoal que trouxe repercussões negativas à Adnet, a
correlação com o traidor bíblico de Cristo e a caracterização do humorista como um
violador das virtudes morais, pauta preferencial do conservadorismo, evidenciam o
esvaziamento do argumento e a intolerância à crítica, ação que os indivíduos públicos
devem entender como parte do processo democrático. E no caso específico da sátira
apresentada por Adnet, a análise do humorista demonstra de forma clara a proposta do
Governo Bolsonaro em relação à cultura no país e que foi resumida no vídeo
interpretado pelo secretário de cultura
Há um projeto em curso para um apagamento da diversidade e da
diferença no país. Isso implica a destruição das políticas públicas
desenvolvidas, mas também a reconquista da memória pelas elites.
Bolsonaro pretende reescrever a história nacional, excluindo o povo
como agente da história e retomando o panteão dos dominantes. O
vídeo patético sobre os “heróis nacionais”, protagonizado por Mário
Frias, e a cópia do discurso nazista, feito Roberto Alvim, são duas
versões de um mesmo projeto. (TAVARES, 2021, p.75)

Uma terceira abordagem em relação à desqualificação nuladora como estratégia


discursiva diz respeito à eliminação do outro/diferente. Esse discurso de eliminação está
presente em diferentes falas difundidas por adeptos do bolsonarismo, sendo ratificada
pelo próprio Bolsonaro. É emblemática e tragicamente significativa a frase “Vamos
metralhar a petralhada” em plena campanha eleitoral. A tática da eliminação se
apresenta em forma de um discurso claro de extinção do adversário, o que pode ser
identificada na crítica a Adnet feita por Mário Frias, quando finaliza dizendo que no
lugar onde ele cresceu, o humorista “não duraria um minuto”, ou seja, a crítica não
aceita seria um caminho que justificaria o aniquilamento do outro.

A segunda característica estruturante da retórica do ódio definida por João Cézar


Rocha (2021, p.171) é a hipérbole descaracterizadora, expressa em um exagero
narrativo onde “a redundância torna-se uma forma autoritária, que inibe a crítica e
desmobiliza questionamentos”. O objetivo da hipérbole descaracterizadora é a
reiteração de uma ideia através do recurso linguístico. A hipérbole serve também para
superdimensionar ações ou características, na tentativa de impor determinada concepção
sobre alguma coisa ou algum sujeito. Nesse sentido, um tweet de Frias publicado em 04
de dezembro de 2021, tenta evidenciar o Decreto da Secretaria de Cultura que busca
garantir a acessibilidade para pessoas com deficiência a bens culturais , como resultado
de um esforço extraordinário da pasta e de seu gestor contra adversários poderosos.

A tentativa de eliminar da história todas as políticas públicas que construímos


na Secretaria Especial da Cultura mostra quantos interesses multibilionários
foram contrariados com a nossa chegada. Não desistiremos! A luta é árdua, mas
venceremos.
O exagero na ideia de uma suposta ação de eliminação do que ele denomina
“todas as políticas públicas”, sem identificar os possíveis autores da tentativa
eliminatória, se esbarra nos dados reais sobre a atuação da Secretaria Especial de
Cultura na gestão Bolsonaro, que enfrenta diversas problemáticas, principalmente
ideológicas e orçamentárias, para elaborar e efetivar projetos no campo cultural,
inclusive no período em que Frias estava em seu comando.

Podemos identificar também características da retórica do ódio quando o ex


secretário especial de cultura manifesta opinião sobre a promoção de novas políticas e
programas culturais, diante da necessidade institucional de apoio à cultura. No contexto
da pandemia, um grupo de parlamentares e setores organizados da cultura tensionou o
governo a adotar medidas de apoio ao campo cultural, que culminou com a
promulgação da Lei Federal nº 14.017/2020, que ficou conhecida como a Lei Aldir
Blanc, em referência ao compositor que morreu vítima de Covid-19. O objetivo dessa
lei, em um momento em que o isolamento social foi definido como importante medida
sanitária para a preservação da vida, foi o de viabilizar o pagamento de auxílio
emergencial para o campo cultural no período da pandemia, através de diferentes
iniciativas, como renda emergencial, auxílio aos espaços e instituições, editais e
prêmios. Na proposta de lei, os recursos destinados à operacionalização da Lei Aldir
Blanc seriam provenientes do Fundo Nacional de Cultura (FNC), ou seja, recursos que
já tinham como finalidade o apoio financeiro e institucional aos setores culturais, fator
que evidencia que a nova legislação não impactaria em outras áreas do orçamento
público. Em contrapartida, diversos projetos foram realizados no âmbito da Lei Aldir
Blanc, através de editais públicos.

Foi emblemática a forma como a Secretaria Especial de Cultura na gestão de


Mário Frias atuou em relação a determinados projetos aprovados na Lei Aldir Blanc,
onde o autoritarismo se consolidou na forma de ataque e censura, como ocorreu em
relação ao projeto Roda Bixa, que conta a história de vida de cinco artistas LGBTQIA+.
No desenvolvimento do projeto estava proposto a realização de um podcast denominado
“Criança Viada Show”, onde os participantes iriam relatar suas vivências e memórias de
infância. O projeto foi duramente criticado por Mário Frias, que no dia 14 de Maio de
2021 disparou o tweet:

É lamentável que os recursos, repassados devido a imposição da Lei Aldir


Blanc, sejam usados para fins políticos/ideológicos, e não para seu real motivo,
o financiamento da cultura.
Na crítica ao podcast o secretário definiu a lei como uma imposição,
evidenciando sua concepção contrária à aprovação e disponibilização legal de auxílio à
cultura, principalmente pela lei ser resultado de um movimento organizado pelos setores
progressistas. Em seguida, repete o discurso amplamente difundido pela ideologia
bolsonarista (ROCHA, 2021) de desvio de finalidade do recurso público pelos agentes
culturais. E na última mensagem publicada sobre o tema, finaliza utilizando-se do
recurso discursivo da desqualificação nuladora :

Roda bixa, roda hétero ou roda alienígena não tem relação com os aspectos e
manifestações da nossa cultura. Verificarei mais a fundo essa questão, para ver
como será juridicamente possível garantir que os recursos da cultura não sejam
aplicados para outros fins.
O uso comparativo do nome do evento com o adjetivo alienígena é uma
estratégia comum de desumanização das pessoas LGBTQIA+, considerando o outro tão
diferente que pode se enquadrar na categoria de não humano. O jogo das palavras usado
no tweet reforça, através do uso de um trocadilho grosseiro e de fácil compreensão, a
homofobia, pois “A reprodução dos preconceitos exige um discurso fácil e sintético,
uma vez que eles operam por generalizações grosseiras e remete ao senso comum não
refletido.” (MIGUEL, 2018, p.47).

O modo como o ex secretário se pronunciou nas mensagens se assemelha à


estratégia utilizada pelo denominado Movimento Brasil Livre- MBL na polêmica
envolvendo o cancelamento da exposição do Queermuseu em 2017. Mesmo sem
motivos plausíveis para o encerramento da mostra, ela se tornou possível pela proporção
que a polêmica tomou, a partir das redes sociais e do sentimento de indignação como
paixão política. Amossy (2017) aponta que quando é naturalmente levada por uma
mesma causa, a polêmica contribui com frequência para criar uma ilusão de unidade em
torno de um tema comum. Após os comentários públicos do do ex secretário Mário
Frias, o projeto “Roda Bixa” foi cancelado pela Prefeitura de Itajaí-SC, responsável pela
administração dos recursos da Lei no município onde o projeto foi proposto.

Apesar da resistência governamental às propostas de investimento e apoio


institucional à cultura, os impactos positivos da Lei Aldir Blanc sobre o setor cultural,
levou o senador Paulo Rocha (PT-PA) a propor o Projeto de Lei 73/2021, que foi
denominada de Lei Paulo Gustavo, em homenagem ao celebrado humorista brasileiro
também vítima da Covid-19. A proposta prevê o repasse pelo governo federal de cerca
de quatro bilhões para o auxílio emergencial à cultura enquanto perdurar a pandemia.
Mesmo sendo evidenciada a relevância da lei para a manutenção financeira de
trabalhadores e instituições culturais em um cenário emergencial, o então secretário
Mário Frias foi contrário à aprovação do projeto. Em 22 de junho de 2021, fazendo uso
da hipérbole descaracterizadora, afirma no Twitter:

O projeto sequestra os recursos federais da cultura e transferem para


estados e municípios gerirem, paralisando o que já está em andamento
e inviabilizando futuras ações. O projeto destrói a política pública
nacional, de responsabilidade do Governo Federal.
O ex secretário federal de cultura utilizou-se de um argumento primário para
convencimento da opinião pública de que uma lei tem o poder de destruição da política
pública. O exagero não é uma despretensão argumentativa, é manipulação clara da
informação, em um recurso muito utilizado na disputa narrativa bolsonarista, a
veiculação falseada da notícia, popularmente conhecida como Fake News. No combate
ao projeto de Lei Paulo Gustavo, ele afirmou em tweet de 24 de novembro de 2021:
“Projeto de lei absurdo. Sou radicalmente contra. Transformará o governo federal num
caixa eletrônico compulsório”, utilizando uma comparação que visa descredibilizar o
projeto legislativo e denotar um possível mau uso do recurso público, sem que houvesse
mecanismos institucionais de controle e fiscalização na utilização de verba pública
destinada à cultura.

Nessa breve análise sobre a relação entre as guerras culturais e a retórica do ódio
a partir dos tweets do ex Secretário Especial de Cultura, destacamos a função das mídias
na construção das polêmicas frequentemente acendidas no Twitter, uma vez que pela
brevidade dos textos é necessária uma concisão do assunto e uso de recursos que
possam dar destaque às publicações. Em Variações Sobre o Ethos (2020), Dominique
Maingueneau revela que na internet a análise do discurso é confrontada por novas
tecnologias da comunicação, que não se trata apenas de um modo tradicional de análise.
No caso do Twitter, o autor salienta a ênfase dada aos conteúdos, pela necessidade da
criação de conteúdos destacáveis, memoráveis, e que fazem emergir um ethos
ideológico identificável.
Nesse sentido, torna-se necessário um aprofundamento analítico do uso das
redes sociais como arena que tem viabilizado a guerra cultural bolsonarista
fundamentada na retórica do ódio, e seus impactos reais sobre a cultura brasileira. Para
tanto, é essencial empreender “a passagem da caricatura à caracterização” (ROCHA,
2021, p. 17). Isso significa compreender que, por mais absurda que seja a lógica de
atuação do bolsonarismo, não podemos negligenciar o projeto elitista e antidemocrático
que tem sido posto em funcionamento no Brasil. Caracterizar seu funcionamento,
desvelar suas técnicas de atuação, denunciar seu autoritarismo é o caminho possível
para a resistência.

CONCLUSÃO

Os constantes e incessantes ataques do governo Bolsonaro a projetos,


programas, políticas, pessoas públicas e entidades relacionadas ao campo cultural
brasileiro, configuram-se como a face mais proeminente de um modelo de gestão cuja
ideologia de combate às diferenças, em suas múltiplas formas de expressão, se estrutura
através da guerra cultural. Nesse processo, o que está em jogo é a negação de uma ideia
específica de cultura, que se baseia no reconhecimento da diversidade cultural como um
direito dos diferentes grupos e sujeitos, e que passou a orientar, de forma mais
sistemática, a atuação do Estado no campo cultural a partir de 2003, quando o PT
ascendeu ao poder. A atual guerra cultural no Brasil é antes de tudo um embate de
projetos políticos distintos, onde a dimensão cultural articula questões estruturais que
perpassam a realidade social brasileira, e se evidenciam através de diferentes
marcadores, como os raciais, sexuais, econômicos, dentre outros.

Em um recente estudo sobre a guerra cultural em curso no cenário brasileiro e


sua relação direta com a ascensão de Jair Bolsonaro ao governo federal, o pesquisador
João Cezar de Castro Rocha (2021) evidencia um elemento essencial desse processo: a
produção do que autor denomina de “retórica do ódio”, entendida como uma técnica
discursiva que tem como objetivo caracterizar os sujeitos que pensam e agem diferente,
como um inimigo a ser combatido. Essa prática discursiva mobilizou a direita e
extrema-direita nacional e permitiu a ascensão de Bolsonaro ao poder central. Assim,
Rocha (2021) propõe que o entendimento sobre o que ele denomina de “movimento
bolsonarista” e sua estruturação discursiva de combate à cultura e a democracia,
prescinde de uma análise atenta do material produzido e difundido pelos mentores e
adeptos desse movimento. Nesse sentido, a partir da caracterização da técnica discursiva
da retórica do ódio proposta por Rocha (2021), buscamos identificar elementos dessa
guerra cultural organizados em falas do então Secretário Nacional de Cultura.

O ator Mário Frias assumiu a Secretaria Nacional de Cultura no dia 23 de junho


de 2020 e foi exonerado do cargo no final de março de 2022, sendo o quinto secretário
a ocupar a função em cerca de dois anos e meio do governo Bolsonaro, o que demonstra
uma das instabilidades institucionais da pasta. Antes de assumir a secretaria, Mario
Frias já difundia no espaço público, dentre eles as redes sociais, seu alinhamento
ideológico ao bolsonarismo, especialmente em pautas relacionadas à cultura, como o
ferrenho combate à Lei Rouanet5.Enquanto secretário de Cultura, Frias adotou o mesmo
modus operandi da cúpula governamental bolsornarista para instrumentalizar a pauta
conservadora: uso das redes sociais como principal veículo de comunicação - inclusive
opiniões diretamente relacionadas ao cargo e pasta governamental que ocupava, e
utilização da retórica do ódio como técnica discursiva.

Nesse processo, apesar do discurso combativo a ideia plural e diversa de cultura


ser o meio e o fim de ações encadeadas por diferentes sujeitos que compõem lugares
estratégicos no governo, dentre eles o ex representante da Secretaria Nacional de
Cultura, passando pelos seguidores da ideologia bolsonarista que validam essas ações
no corpus social, não podemos restringir a guerra cultural ao espectro da cultura, pois
trata-se de um movimento mais complexo e que transcende a dimensão simbólica,
atingindo diretamente diferentes áreas da sociedade. Assim, a grande problemática da
construção dessas retóricas é que elas se materializam em diferentes formas de
violências, seja desestruturando institucionalmente mecanismos de avanços
democráticos, como assistimos nas ações da gestão de Bolsonaro em relação ao campo
das políticas culturais, seja no boicote a projetos específicos, como no caso do "Roda
Bixa - criança viada show, apresentado nesse trabalho.

5
Lei 8.313/1991, que prevê o apoio à cultura através do mecanismo de incentivo fiscal. Os limites e
controvérsias da Lei Rouanet têm sido evidenciadas por diferentes estudos, como os de CALABRE
(2009), RUBIM (2012) . Entretanto, vale evidenciar que os ataques do governo Bolsonaro à lei constitui
um desvirtuamento das críticas analíticas elaboradas por estudiosos da área, e se resume à retórica
superficial de que a lei beneficia artistas, que utilizam os recursos para enriquecimento ilícito.
Nesse sentido, torna-se imprescindível compreender que as práticas discursivas e
ações efetivas do governo Bolsonaro contra a cultura constituem um projeto deliberado,
intencional e articulado que mobiliza a guerra cultural como instrumento que visa “a
destruição de culturas democráticas, emancipatórias, laicas e republicanas, e a criação
em seu lugar de culturas autoritárias, fundamentalistas, terraplanista, elitistas e
moralistas do novo velho Brasil.” (RUBIM, 2021, p.47).

REFERÊNCIAS:
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BOURDIEU, Pierre, 1930-2002. Sobre o Estado : Cursos no Collège de France
(1989-92). São Paulo: Companhia das Letras, 2014.
FRIAS, Mario. Perfil no Twitter. Disponível em:
<https://twitter.com/mfriasoficial>
Acesso em 3.12.2021
G1. Em gravação, Jucá sugere 'pacto' para barrar a Lava Jato, diz jornal. Brasília,
23/05/2016. Disponível em: <http://g1.globo.com/politica/operacao-lava-
jato/noticia/2016/05/em-gravacao-juca-sugere-pacto-para-deter-lava-jato-diz-
jornal.html>
GALLEGO, Esther Solano; ORTELLADO, Pablo; MORETTO, Márcio. Guerras
culturais e populismo antipetista nas manifestações por apoio à operação Lava
Jato e contra a reforma de previdência. Em Debate: Periódico de Opinião Pública e
Conjuntura Política, Belo Horizonte, ano 9, n. 2, p. 35-45, ago. 2017. Disponível em:
http://bibliotecadigital.tse.jus.br/xmlui/handle/bdtse/4862
GIDDENS, Anthony. Transformações da Intimidade: Sexualidade, Amor e
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HUNTER, James Davison. Culture Wars: The Struggle to Control the Family, Art,
Education, Law, and Politics in America (New York: Basic Books, 1992).
MAINGUENEAU, Dominique. Variações sobre o Ethos. Tradução: Marcos
Marcionilo; São Paulo; Parábola Editorial, 2020 1a edição.
MIGUEL, Luis Felipe. O pensamento e a imaginação
no banco dos réus: ameaças à liberdade de expressão em contexto de golpe e
guerras culturais. Pol. Cult. Rev., Salvador, v. 11, n.
1, p.37-59, jan./jun, 2018.
ROCHA, João Cezar de Castro. Guerra Cultural e Retórica do Ódio (Crônicas De
Um Brasil Pós-Político). Editora Caminhos. Goiânia, 2021.
ROSSETO, Graça; CARREIRO, Rodrigo; ALMADA, Maria Paula. Twitter e
comunicação política: limites e possibilidades. Revista Compolítica, Rio de Janeiro,
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RUBIM, Antonio Albino Canelas. Balanço político-cultural do governo
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Rubim, Márcio Tavares (organizadores). – São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2021.

_________________________________. Políticas culturais no Brasil: tristes


tradições Galáxia, núm. 13, 2007, pp. 101-113 Pontifícia Universidade Católica de São
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SANTOS, Alan dos. As origens das guerras culturais no Brasil: desdobramentos
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