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Implementação de Políticas públicas

Sheila Cristina Tolentino

Discente: Júlia Almeida Menegassi

Articulação e implementação do programa minha casa minha vida: o nascimento


de uma política pública nacional

1. Introdução

O Programa Minha Casa Minha Vida foi criado pelo governo federal do Brasil e
lançado em março de 2009, durante o mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva,
como parte do Plano de Aceleração ao crescimento (PAC). A iniciativa foi desenvolvida
como uma resposta ao déficit habitacional do país e como uma estratégia para promover
a inclusão social por meio do acesso à moradia digna para a população de baixa renda.

Nesse sentido, o programa foi concebido com o objetivo de combater o problema


habitacional enfrentado por milhões de brasileiros, oferecendo subsídios e financiamentos
facilitados para a construção, aquisição ou reforma de moradias. A ideia era atender tanto
famílias que viviam em condições precárias, como favelas e áreas de risco, quanto aquelas
que tinham dificuldade em adquirir a casa própria devido à falta de recursos financeiros.

Diante disso, o presente texto busca trazer uma síntese da formulação e aplicação
nos primeiros anos do programa, uma vez que é de extrema importância compreender
essa política elementar para a política habitacional brasileira. Além disso, o programa foi
implementado em parceria com estados, municípios, empresas da construção civil e
instituições financeiras, buscando uma abordagem integrada para viabilizar a construção
e a distribuição de moradias populares, sendo possível entender como um fenômeno de
relacionamento Interorganizacional.

Fazendo uma breve síntese histórica o Programa Minha Casa Minha vida faz parte
de uma longa caminhada para a construção de uma política habitacional Brasileira, que
teve início no governo de Castelo Branco, em 1964, com a criação do Banco Nacional de
habitação (BNH). Contudo essa política pioneira que buscava conter o déficit habitacional
presente no país recém urbanizado falhou no sentido de que acabou dominado pelo setor
empresarial e acabou se voltando para financiar classes médias e altas. Com a
redemocratização, o direito à moradia se tornou um foco, sobretudo ao ser incluído na
Constituição federal e assim inicia uma caminhada intensa de movimentos sociais pela
reforma urbana, de um lado, e desenvolvimento de políticas urbanas na esfera
institucional, de outro lado. Em 2003, o Governo de Lula representa o auge dessa
caminhada, sobretudo com a criação do Ministério das cidades acompanhado do aumento
intenso de financiamentos voltados para o setor imobiliário.

Entretanto, o programa minha casa minha vida somente nasce no segundo governo de
Lula, em 2009. O mundo se deparava com uma crise que se irrompe internacionalmente
no ano de 2008, diante desse contexto, era necessário o desenvolvimento de um programa
que pudesse receber a mão de obra ociosa em grande quantidade bem como os diversos
investimentos da construção civil que haviam crescido exponencialmente no governo
anterior. Logo, surgiu uma pressão do setor empresarial para a alocação dessa oferta bem
como a necessidade do governo em manter estabilidade econômica e social, evitando
impactos profundos da crise financeira.

2. Articulação e implementação

Em oposição ao insucesso da primeira política habitacional do Brasil que tentou


promover a redução do déficit habitacional no Brasil, mas, encontrou dificuldades de
vingar, sobretudo em razão da centralização extrema e de pouco campo de decisão e
articulação para as políticas públicas diante do governo militar, a Constituição de 88
tratou de fortalecer o poder executivo, no sentido de ter prerrogativas exclusivas em
diversas matérias. Nesse sentido, é possível dizer o PMCMV foi desenhado pela alta
burocracia, ou seja, uma articulação no plano executivo que contava com a interação de
três ministérios: Fazenda, Cidades e Casa civil. Conforme o artigo DEMOCRACIA,
ARENAS DECISÓRIAS E POLÍTICAS PÚBLICAS, ao Ministério da Fazenda coube a
regulamentação das medidas necessárias para o lançamento do programa, em conjunto
com o Ministério das Cidades. Enquanto isso, à Casa Civil coube o papel de articulador
das demandas dos grupos empresariais e coordenador das políticas para dinamizar a
atividade econômica. (2013, p. 21).

Entender esse papel de articulação entre o executivo e sua aproximação com o


setor empresarial é de Extrema relevância para compreender como se deu a
implementação dessa política pública e quais foram seus limites e desafios. Isso porque,
como mencionado anteriormente, o programa minha casa minha vida nasce no segundo
governo de Lula, em que há uma reorganização de forças no sentido de formar uma
coalizão e proteger a base de apoio do governo. Logo, o Ministério das cidades, o
importante órgão que liderava a política habitacional do primeiro governo, orquestrava
pesquisas e análises técnicas no que tange o déficit habitacional brasileiro, sempre
motivado pelo compromisso com a transformação das cidades de Olívio Dutra, é entregue
à Marcio Fontes na negociação Ministerial. Logo, o Ministério da Fazenda definia as
normas da regulamentação do programa, a partir de negociações com o empresariado
conduzidas pelo secretário executivo, Nelson Barbosa, juntamente com o Ministério da
Casa Civil, chefiado por Dilma Rousseff. Entretanto, a secretaria de Habitação Social
(SNH), vinculada ao ministério das cidades prestou um importante papel ao herdar o
passado do compromisso com a reforma urbana de forma sua capacidade técnica teve
uma contribuição decisiva no sentido de conseguir incluir na proposta uma ideia de
habitação de interesse social e reforma urbana. Como colocado em DEMOCRACIA,
ARENAS DECISÓRIAS E POLÍTICAS PÚBLICAS, “esse órgão foi capaz, no momento
de crise, de oferecer ao governo alternativas (amadurecidas ao longo da elaboração do
planHab) para dinamizar a atividade econômica.” (2013, p. 18).

Dessa maneira, é interessante observar a interação do poder executivo em fazer


acontecer essa política pública que chega ao congresso como a Medida Provisória Nº
459/2009. Apesar da atuação forte e central da alta burocracia nesse contexto, é possível
refletir acerca do pensamento de Antônio Carlos Torrens, isso porque, apesar do executivo
ser o principal legislador, a maioria parlamentar interfere no processo decisório bem como
mecanismos constitucionais tais quais audiências públicas, Sabatinas, deliberação do
congresso sobre as medidas provisórias de forma que a arena de decisão apresenta
características institucionais interdependentes e complementares na definição de
políticas. (2013, p. 196)

Nesse contexto, cabe citar a atuação do legislativo nesse processo, tanto no início
com a reorganização de forças no governo lula a fim de formar uma base governista que
permitisse a governabilidade de seu segundo mandato, quanto na chegada da Medida
provisória na esfera legislativa em que o Congresso poderia atuar em seu papel
deliberador e fiscalizador do executivo. Nessa perspectiva, o parlamento marcou
profundamente a política pública ao adicionar uma emenda à MP para que a reserva de
recursos se estendesse também aos municípios pequenos, já que, inicialmente, o programa
estava voltado para municípios médio e grandes. A articulação do Relator, o deputado
Henrique Alves, foi decisiva para essa emenda, de forma que foi possível garantir uma
reserva de até R$ 1 bilhão como subvenção econômica para a extensão do PMCMV a
municípios com população de até 50 mil habitantes, como coloca o texto
DEMOCRACIA, ARENAS DECISÓRIAS E POLÍTICAS PÚBLICAS (2013 , p. 22)

Diante disso, cabe lembrar das relações intergovernamentais, que são interações políticas
e administrativas que ocorrem entre os diferentes níveis de governo em um país, como a
União, os estados e os municípios. Essas relações são fundamentais para a implementação
de políticas públicas, uma vez que muitas vezes essas políticas requerem a participação
conjunta e coordenada dos diferentes níveis de governo, seja por meio de acordos e
convênios entre as diferentes esferas de poder, da definição de políticas nacionais que
devem ser implementadas pelos governos estaduais e municipais, e da alocação de
recursos e responsabilidades para a implementação de políticas públicas.

3. Considerações Finais

No que tange o aspecto da aplicação da política em si, consoante a obra


DEMOCRACIA, ARENAS DECISÓRIAS E POLÍTICAS PÚBLICAS, tal qual outras
políticas públicas, no Programa Minha Casa Minha vida não há a separação clara entre
formulação e implantação, tanto em termos da participação de atores, como em relação
às decisões tomadas em seu curso. logo, parte do desenho da política foi redefinida no
momento de sua execução como resposta do governo e da burocracia gestora a demandas
sociais não contempladas, às restrições impostas por órgãos de controle e mesmo a
críticas de especialistas e de movimentos sociais. (p. 23)

Assim, o programa começa a ser aplicado em 2009, a primeira fase, com a meta
de contratar 1.000.000 de unidades habitacionais, e, apesar de atingida, visto que
chegaram a ser 1.004.257, conforme o TCU. Contudo havia muitas críticas tanto
provenientes de conselhos e organizações de arquitetura e urbanistas, como por exemplo
o Conselho Nacional de cidades e o Conselho Gestor do FHNIS, bem como de
movimentos sociais em prol da luta pela reforma urbana que indicavam que não foram
ouvidos nesse processo de desenho e implementação da política pública. De fato, o caráter
empresarial e econômico acabou por ter mais peso na arena decisória e não contemplou
outros grupos e demandas.
De forma que em 2011, vem a segunda fase, já atendendo novas demandas da ação
pública frente ao que estava sendo entregue. Nesse contexto, o governo Dilma se ocupou
em responder “as preocupações dos movimentos populares e às críticas de especialistas,
o governo tem atendido a questões mais pontuais e tomado providências para melhorar
os padrões técnicos das unidades habitacionais.”(Loureiro; Macário; Guerra, 2013, p. 27).
Um exemplo prático disso, por exemplo, foi o convite ao arquiteto João Filgueiras Lima,
presidente do Instituto Brasileiro de Tecnologia do Habitat, para desenvolver projetos
alternativos de habitação popular, diante de afirmações de especialistas de que “as casas
eram horríveis”, como coloca o autor. (2013, p. 27)

Portanto, a atualização contínua das políticas públicas é essencial para garantir que elas
continuem relevantes, eficazes e alinhadas com as necessidades e desafios em constante
mudança da sociedade.

Por fim, é importante lembrar que a centralização desse processo decisório ao


legislativo e sobretudo ao executivo permitiu que, embora a política fosse lançada
rapidamente, permitindo a alocação da mão-de-obra excedente, em meio à crise financeira
Internacional de 2008, evitando, assim, um impacto massivo na economia Brasileira, esse
mecanismo centralizador também impediu ação pública inserida de fato no debate na
formulação e na implementação desta política o que resultou em uma série de críticas,
que demandavam mais participação da ação popular, consultas públicas e outros
mecanismos que permitissem um diálogo mais amplo.
 Bibliografia

Loureiro, Maria Rita Macário, Vinicius Guerra, Pedro. Texto para Discussão (TD) 1886:
Democracia, arenas decisórias e políticas públicas: o Programa Minha Casa Minha
Vida. Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Disponível em:
https://repositorio.ipea.gov.br/handle/11058/2234

O’TOOLE JR., Laurence J. Administração pública Coletânea: Relações


Interorganizacionais no processo de implementação. (capítulo 10)

WINTER, Soren. Administração pública: Perpectivas de análise da implementação


(capítulo 9). Editora Unesp: São Paulo.

TORRENS,Antonio Carlos. Poder legislativo e políticas públicas: uma abordagem


preliminar. Disponível em:
https://www12.senado.leg.br/ril/edicoes/50/197/ril_v50_n197_p189.pdf

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