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Thiago Lourenço Pires

Notas de Cálculo Vetorial

Alegre, Brasil
2020
Sumário

1 FUNÇÕES REAIS COM VALORES VETORIAIS . . . . . . . 3


1.1 Motivação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 3
1.2 Funções vetoriais e Curvas parametrizadas . . . . . . . . . . . 3
1.2.1 A derivada de uma função vetorial . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13
1.2.2 Interpretação Geométrica da derivada . . . . . . . . . . . . . . . . 15
1.3 Aplicações ao movimento . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17
1.4 Comprimento de Arco . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 18
1.4.1 Parametrização pelo comprimento de arco . . . . . . . . . . . . . . 23

2 FUNÇÕES DE VÁRIAS VARIÁVEIS A VALORES VETORIAIS 26


2.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 26
2.2 Campos Vetoriais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28
2.3 Rotacional e Divergente . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33

3 INTEGRAIS DE LINHA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 38
3.1 Integral de linha de uma função escalar . . . . . . . . . . . . . 38
3.1.1 Motivação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 38
3.1.2 Definição . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 40
3.2 Integral de linha de campo vetorial . . . . . . . . . . . . . . . 43
3.2.1 Motivação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 43
3.2.2 Definição . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 44
3.3 Teorema de Green . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 54
3.3.1 Interpretação Física . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 63
3.3.2 Interpretação Vetorial . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 67
3.3.3 Campos vetoriais conservativos no plano . . . . . . . . . . . . . . . 68

4 INTEGRAIS DE SUPERFÍCIE . . . . . . . . . . . . . . . . . 72
4.1 Superfícies Parametrizadas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 72
4.1.1 Plano tangente e vetor normal . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 78
4.2 Área de Superfícies . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 81
4.2.1 Motivação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 82
4.2.2 Definição . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 84
4.3 Integral de superfície de uma função escalar . . . . . . . . . . 91
4.3.1 Motivação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 91
4.3.2 Definição . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 92
4.4 Integral de superfície de uma função vetorial . . . . . . . . . . 99
4.4.1 Superfícies orientadas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 99
4.4.2 Definição . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 101
4.5 Teorema de Stokes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 112
4.6 Teorema de Gauss . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 120
3

1 Funções reais com valores vetoriais

1.1 Motivação
Em um primeiro curso de cálculo o principal objeto de estudo são funções que têm
seu domínio e sua imagem contidos no conjunto dos números reais, isto é, funções
da forma

f : I ⊂ R −→ R
x 7−→ y = f (x).

O segundo curso de cálculo tem como objetivo principal generalizar os estudos do


primeiro para funções cuja imagem está contida no conjunto dos números reais,
mas tal que o domínio é um subconjunto do R2 ou do R3 , isto é

f : I ⊂ Rn −→ R
x 7−→ y = f (x) = f (x1 , x2 , . . . , xn ).

Do ponto de vista matemático, um passo natural na generalização desses conceitos


é estudar funções cuja imagem são subconjuntos do Rn , para n ≥ 2. Assim como
as funções estudadas anteriormente, esse tipo de função também possui aplicações
em diversas áreas. Vamos começar com o caso mais simples, isto é, funções cujo
domínio é um subconjunto dos números reais e a imagem é um subconjunto do Rn ,
para n ≥ 2.

1.2 Funções vetoriais e Curvas parametrizadas

Definição 1. Uma função cujo domínio é um subconjunto dos números reais e


cuja imagem é um conjunto de vetores é chamada função vetorial.
Capítulo 1. Funções reais com valores vetoriais 4

Uma função vetorial γ é usualmente denotada na forma

γ : I ⊂ R −→ Rn
t 7−→ γ(t) = (x1 (t), . . . , xn (t)) ,

onde, para cada i = 1, . . . , n, xi (t) são funções reais chamadas funções compo-
nentes.

Observação 1. Na maioria das vezes vamos nos restringir aos casos em que n = 2
ou 3. Nesse casos escrevemos

− →

γ(t) = (x(t), y(t)) = x(t) i + y(t) j ,

ou

− →
− →

γ(t) = (x(t), y(t), z(t)) = x(t) i + y(t) j + z(t) k .

Exemplo 2.

γ : [0, 2π) −→ R2
t 7−→ γ(t) = (cos t, sent) ,

Figura 1 – Função vetorial γ(t) = (cos t, sent)

O limite de uma função vetorial γ é definido pelo limite de suas funções coordenadas,
ou seja

Definição 3. Seja γ(t) = (x(t), y(t), z(t)). O limite lim γ(t) é definido por
t→t0
 
lim γ(t) = lim x(t), lim y(t), lim z(t) ,
t→t0 t→t0 t→t0 t→t0

se esses limites existirem.


Capítulo 1. Funções reais com valores vetoriais 5

Uma vez que o limite de funções vetoriais é dado pelo limite de funções reais de
uma variável em cada coordenada, é possível mostrar que os limites de funções
vetoriais obedecem as mesmas regras que os limites de funções reais. Da mesma
forma, podemos estender naturalmente a definição de continuidade:

Definição 4. Uma função vetorial γ(t) é contínua em um ponto t0 ∈ dom γ se

lim γ(t) = γ(t0 ).


t→t0

Assim, dizemos que γ é contínua em um intervalo I ⊂ dom γ se

lim γ(t) = γ(t0 ),


t→t0

para todo t0 ∈ I.

Observação 2. Note que, pela definição do limite de funções vetoriais. temos que
se γ(t0 ) = (x(t0 ), y(t0 ), z(t0 )), então

lim γ(t) = γ(t0 ),


t→t0

ocorre se, e somente se

lim x(t) = x(t0 ), lim y(t) = y(t0 ) e lim z(t) = z(t0 ).


t→t0 t→t0 t→t0

Quando γ(t) é contínua em um intervalo I, o ponto final do vetor γ(t) descreve


uma curva C em R3 . Nesse caso a equação γ(t) = (x(t), y(t), z(t)) é dita uma
parametrização da curva C, e a variável t é chamada parâmetro.
O conjunto imagem C da aplicação γ dado por

C = {(x(t), y(t), z(t)) ∈ R3 ; t ∈ I},

é chamado traço de γ.

Exemplo 5. Dada f : I ⊂ R −→ R uma função real contínua, o gráfico de f é o


subconjunto do R2 dado por

graf f = {(x, y) ∈ R2 ; y = f (x)}.


Capítulo 1. Funções reais com valores vetoriais 6

Como f é contínua, o gráfico de f determina um traço no plano. Esse gráfico pode


ser interpretado de maneira natural como o traço de uma curva parametrizada
escolhendo a variável x como parâmetro. Em outras palavras

γ : I ⊂ R −→ R2
t 7−→ γ(t) = (t, f (t)) .

descreve uma curva parametrizada cujo traço é exatamente o gráfico de f .

Exemplo 6. Considere as seguintes funções vetoriais:

γ1 : R −→ R2 γ2 : R −→ R2
t 7−→ γ1 (t) = (t, t2 ) , t 7−→ γ2 (t) = (t2 , t4 ) ,

γ3 : R −→ R2 γ4 : [0, 2π) −→ R2
t 7−→ γ3 (t) = (t3 , t6 ) , t 7−→ γ4 (t) = ( sent, sen2 t) ,

γ5 : R −→ R2 γ6 : R −→ R2
t 7−→ γ5 (t) = (−t, t2 ) , t 7−→ γ6 (t) = (−t7 , t14 ) ,

Observe que, se γi (t) = (xi (t), yi (t)), para todo 1 ≤ i ≤ 6, temos

yi (t) = xi (t)2 , ∀1 ≤ i ≤ 6.

Isso significa que os traços de todas essas parametrizações estão contidos no


gráfico da parábola y = x2 .
Para γ1 , γ3 , γ5 e γ6 temos que o traços das parametrizações cobrem toda a parábola
y = x2 . Para γ2 , como x2 = t2 ≥ 0, temos que a parametrização representa
apenas a metade da parábola tal que x ≥ 0. No caso de γ4 , como −1 ≤ x4 ≤ 1,
temos que a parametrização representa apenas a parte da parábola y = x2 com
x ∈ [−1, 1]. Analise a construção abaixo no geogebra, verificando a diferença de
cada parametrização.

Observação 3. Intuitivamente, uma curva C como dito acima, descreve a trajetória


contínua do movimento de uma partícula no espaço. Assim, quando estudamos uma
Capítulo 1. Funções reais com valores vetoriais 7

Figura 2 – Traço das parametrizações γi

curva dada por uma equação da forma

γ(t) = (x(t), y(t), z(t)) t ∈ I,

estamos estudando não só o conjunto C, isto é, o traço da curva, mas também


todos os aspectos relacionados ao movimento da partícula, como a velocidade,
aceleração, sentido do movimento e etc.

Note que no exemplo anterior, apesar de descreverem a mesma curva (parábola


y = x2 ), as diferentes parametrizações representam movimentos com diferentes
velocidades, aceleração e sentido (veja a construção no geogebra).
Vejamos mais alguns exemplos:

Exemplo 7. Seja γ(t) definida da seguinte forma

γ : [0, 2π] −→ R2
t 7−→ γ(t) = (a cos t, a sent) .

Observe que, para todo t temos

x(t)2 + y(t)2 = a2 ,

logo o traço da curva C determinada por γ está contido no círculo de centro (0, 0) e
raio a. Como t varia de 0 a 2π temos que, nesse caso, que o traço de C é exatamente
o círculo de centro (0, 0) e raio a.
Capítulo 1. Funções reais com valores vetoriais 8

Observação 4. No exemplo anterior a parametrização γ da curva C tinha como


ponto inicial γ(0) = (0, 0) = γ(2π).
Se uma função γ está definida em um intervalo I = [a, b], e γ(a) = γ(b), dizemos
que γ representa uma curva fechada.

Exemplo 8. Observe as diferentes parametrizações do círculo de raio r centrado


na origem:

• γ1 (t) = (r cos t, r sent) , t ∈ [0, π];

• γ2 (t) = (−r cos t, r sent) , t ∈ [0, 2π];

• γ3 (t) = (r cos 2πt, ra sen2πt) , t ∈ [0, 1];

• γ4 (t) = (r sent, r cos t) , t ∈ [0, 4π];


t t
    
• γ5 (t) = r cos , r sen , t ∈ [0, 2πr];
r r
• γ6 (t) = (r cos t, r sent) , t ∈ R;

A parametrização γ1 representa o semicírculo superior percorrido uma vez no sentido


anti-horário, e partindo do ponto inicial γ1 (0) = (r, 0);
A parametrização γ2 representa círculo completo percorrido uma vez no sentido
horário, e partindo do ponto inicial γ2 (0) = (−r, 0);
A parametrização γ3 representa o círculo completo percorrido uma vez no sentido
anti-horário, partindo do ponto inicial γ3 (0) = (r, 0);
A parametrização γ4 representa círculo completo percorrido duas vezes no sentido
horário, e partindo do ponto inicial γ4 (0) = (0, 1);
A parametrização γ5 representa o círculo completo percorrido uma vez no sentido
anti-horário, e partindo do ponto inicial γ5 (0) = (r, 0);
A parametrização γ6 representa círculo completo percorrido infinitas vezes no sentido
anti-horário, e partindo do ponto inicial γ6 (0) = (r, 0);
Capítulo 1. Funções reais com valores vetoriais 9

Observação 5. Embora diferentes, as parametrizações γ3 , γ5 e γ6 apresentam


características semelhantes. Você consegue perceber o que elas tem de diferente?
(veja a construção no geogebra)

Figura 3 – Geogebra: Diferentes parametrizações do círculo

Observação 6. Quando uma curva fechada é percorrida é percorrida no sentido


anti-horário dizemos que ela está sendo percorrida no sentido positivo.
Analogamente, quando uma curva fechada é percorrida é percorrida no sentido
horário dizemos que ela está sendo percorrida no sentido negativo.

Exemplo 9. Reta que passa pelo ponto (x0 , y0 , z0 ) na direção do vetor →



v = (a, b, c):

γ : R −→ R3
t 7−→ γ(t) = (x0 + at, y0 + bt, z0 + ct) .

Exemplo 10. A função vetorial γ dada por

γ : R −→ R2
t 7−→ γ(t) = (x0 + a cos t, y0 + b sent) ,

é uma parametrização da elipse


2 2
x − x0 y − y0
 
+ = 1,
a b
Capítulo 1. Funções reais com valores vetoriais 10

Figura 4 – Elipse γ(t) = (x0 + a cos t, y0 + b sent)

Exemplo 11. A função vetorial γ dada por

γ1 : R −→ R2
t 7−→ γ(t) = (x0 + a cosh t, y0 + b senht) ,

é uma parametrização do ramo da hipérbole


2 2
x − x0 y − y0
 
− = 1, (1.1)
a b
tal que x ≥ 0. Analogamente

γ2 : R −→ R2
t 7−→ γ(t) = (x0 − a cosh t, y0 + b senht) ,

é uma parametrização do ramo da hipérbole (1.1) tal que x ≤ 0. Assim, se chamar-


S
mos C1 o traço de γ1 e C2 o traço de γ2 , temos que C1 C2 é o traço da hipérbole
(1.1)

Observação 7. As funções cosh t e senht, chamadas respectivamente de, cosseno


hiperbólico e seno hiperbólico são definidas da seguinte forma:

cosh : R −→ R
et + e−t
t 7−→ cosh t = ,
2
e

senh : R −→ R
et − e−t
t 7−→ senht = .
2
Capítulo 1. Funções reais com valores vetoriais 11

Figura 5 – Hipérbole C1
S
C2

Além disso, é possível verificar (verifique!) que elas satisfazem a relação

cosh2 t − senh2 t = 1.

Exemplo 12. A curva C descrita por um ponto P sobre uma circunferência


quando ela gira ao longo de uma reta é chamada cicloide. Suponhamos que a
circunferência tenha raio a, e que o eixo x seja a reta sobre a qual a circunferência
gira. Consideremos P originalmente na origem quando centro da circunferência
está em (0, a). Determine uma parametrização para C.

Demonstração. Para determinar uma parametrização para C precisamos escrever


as coordenadas de um ponto P qualquer da curva C em função de um parâmetro a
ser determinado. Sejam x e y as coordenadas do ponto P . Observe a figura que
mostra a circunferência após o ponto P ter girado um ângulo de θ radianos.
Nesse caso temos

x = OT − P Q (1.2)
y = a − CQ.
Capítulo 1. Funções reais com valores vetoriais 12

Figura 6 – O círculo na posição inicial e após uma rotação de θ radianos.

Pelo triângulo retângulo CQP temos que

P Q = a senθ
CQ = a cos θ.

Além disso, temos que o segmento OT tem o mesmo comprimento do arco de


>
circunferência P Q, ou seja
>
OT = P Q = aθ.

Substituindo os valores de P Q, CQ e OT em (1.2) obtemos a seguinte parametri-


zação para C:
γ(θ) = (aθ − a senθ, a − a cos aθ) , θ ∈ R

Figura 7 – A cicloide determinada por P .

Exemplo 13. Determine uma parametrização para a curva C obtida pela interseção
do cilindro x2 + y 2 = 4 com o plano y + z = 2.
Capítulo 1. Funções reais com valores vetoriais 13

Solução. A projeção da curva C no plano xy é o círculo de equação x2 + y 2 = 4,


logo podemos escrever

x = 2 cos t, y = 2 sent, t ∈ [0, 2π].

Como os ponto da curva também satisfazem a equação do plano y + z = 2 temos

z = 2 − y = 2 − 2 sent.

Logo, uma parametrização para C é dada por

γ : [0, 2π] −→ R3
t 7−→ γ(t) = (2 cos t, 2 sent, 2 − 2 sent) .

Figura 8 – Interseção entre o Cilindro x2 + y 2 = 4 e o plano y + z = 2

1.2.1 A derivada de uma função vetorial

Definição 14. A derivada de uma função vetorial γ(t), t ∈ I é a função γ ′ (t) dada
por
γ(t + ∆t) − γ(t)
γ ′ (t) = lim ,
∆t→0 ∆t
nos pontos onde o limite existir.
Capítulo 1. Funções reais com valores vetoriais 14

Observação 8. Note que, se γ(t) = (x(t), y(t), z(t)), então

x(t + ∆t) − x(t) y(t + ∆t) − y(t) z(t + ∆t) − z(t)


!
γ (t) = lim

, lim , lim
∆t→0 ∆t ∆t→0 ∆t ∆t→0 ∆t
= (x′ (t), y ′ (t), z ′ (t)) .

Observação 9. Como a derivada de uma função vetorial é dada pela derivada da


função real em cada coordenada temos ela obedece propriedades similares as das
derivadas de funções reais. Em particular, dadas funções vetoriais γ(t) e σ(t), uma
função real f (t) e constantes a, b ∈ R, temos

d
(i) (aγ(t) + bσ(t)) = aγ ′ (t) + bσ ′ (t);
dt
d
(ii) (f (t)γ(t)) = f ′ (t)γ(t) + f (t)γ ′ (t);
dt
d
(iii) ⟨γ(t), σ(t)⟩ = ⟨γ ′ (t), σ(t)⟩ + ⟨γ(t), σ ′ (t)⟩.
dt
d
(iv) (γ(t) × σ(t)) = γ ′ (t) × σ(t) + γ(t) × σ ′ (t).
dt
Exemplo 15. Dada a função γ(t) = (et , t + 1, t3 + ln t) temos
1
 
γ (t) = e , 1, 3t +
′ t 2
.
t
Definição 16. Dizemos que a função γ(t) é diferenciável em I se γ ′ (t) existir
para todo t ∈ I. Dizemos que a função vetorial γ(t) é de classe C1 em I se γ é
diferenciável em I e γ ′ (t) é contínua em I.

Observação 10. A definição acima é equivalente a dizer que as funções coordenadas


de γ são funções reais de classe C 1 .

Observação 11. Da mesma forma dizemos que uma função vetorial γ(t) é de
classe C r se cada uma das suas funções coordenadas é de classe C r . Além disso,
se as funções coordenadas de γ possuem derivadas contínuas de qualquer ordem
dizemos que γ é de classe C ∞ .
Quando uma curva γ : I → Rn é de classe C ∞ em todo ponto dizemos que γ é uma
curva suave.
Capítulo 1. Funções reais com valores vetoriais 15

1.2.2 Interpretação Geométrica da derivada


Observe a figura abaixo:

Figura 9 – Interpretação geométrica da derivada

−→ −→
Seja C a curva definida por γ(t). Se OP e OQ são os vetores posição correspon-
−→ −→ −→
dentes a γ(t) e γ(t + ∆t), respectivamente, então o vetor P Q = OQ − OP é
1 −→
uma representação do vetor γ(t + ∆t) − γ(t). Logo P Q corresponde ao vetor
∆t
γ(t + ∆t) − γ(t) −→
, e tem a mesma direção do vetor P Q. Quando ∆t → 0, temos
∆t
1 −→
que Q → P , e o vetor P Q se aproxima de um vetor que tem uma de suas
∆t
representações tangente à curva C no ponto P . Por isso nos referimos à γ ′ (t) como
vetor tangente à C em P .

Definição 17. A reta tangente à curva γ, no ponto γ(t0 ) é a aplicação r : R → R3


dada por
r(t) = γ(t0 ) + tγ ′ (t0 ).

Exemplo 18. Determine a equação paramétrica da reta tangente a hélice dada por

γ(t) = (e−t cos t, e−t sent, t),

no ponto P0 (1, 0, 0).

Solução. Derivando γ obtemos

γ ′ (t) = (−e−t cos t − e−t sent, e−t cos t − e−t sent, 1).
Capítulo 1. Funções reais com valores vetoriais 16

A reta tangente à γ em P0 é uma reta que passa por P0 e cuja inclinação é dada
pelo vetor tangente à γ em P0 . Note que

P0 = (1, 0, 0) = γ(0),

logo, como γ ′ (0) = (−1, 1, 1), a equação da reta tangente em P0 é dada por

r(t) = P0 + tγ ′ (0)
= (1, 0, 0) + t(−1, 1, 1)
= (1 − t, t, t) t ∈ R.

Figura 10 – Hélice parametrizada por γ(t) = (e−t cos t, e−t sent, t)

Seja

γ : I ⊂ R −→ R3
u 7−→ γ(u) = (x(u), y(u), z(u)) ,

onde

u : R −→ R
t 7−→ u(t).
Capítulo 1. Funções reais com valores vetoriais 17

Se Im(u) ⊂ I = dom γ a função composta

γ ◦ u = (x(u(t)), y(u(t)), z(u(t))) ,

está bem definida e vale o seguinte teorema:

Teorema 19 (Regra da Cadeia). Se γ é uma função diferenciável em I e u é uma


função diferenciável real cuja imagem está contida em I, então
d dγ du
(γ ◦ u) (t) = (u(t)) · .
dt du dt
Demonstração. Se γ(u(t)) = (x(u(t)), y(u(t)), z(u(t))), então
!
d d d d
γ(u(t)) = x(u(t)), y(u(t)), z(u(t)) .
dt dt dt dt
Aplicando a regra da cadeia em cada coordenada temos
!
d dx du dy du dz du
γ(u(t)) = · , · , ·
dt du dt du dt du dt
!
dx dy dz du
= , , ·
du du du dt
dγ du
= (u(t)) · .
du dt

Observação 12. Na fórmula da regra da cadeia obtida no teorema anterior note


que
vetor escalar
z }| { z}|{
d dγ du
(γ ◦ u) (t) = (u(t)) · .
dt du dt

1.3 Aplicações ao movimento


Uma curva pode ser interpretada fisicamente como a posição de uma partícula
em um instante t. Nesse caso, a trajetória do móvel é a curva γ(t) percorrida no
sentido de crescimento de t.

− →

O vetor V = γ ′ (t) é chamado vetor velocidade, e A = γ ′′ (t) é chamado vetor
aceleração. A norma do vetor γ ′ (t), v = ||γ ′ (t)|| é chamada velocidade escalar,
e a = ||γ ′′ (t)|| é chamada aceleração escalar.
Capítulo 1. Funções reais com valores vetoriais 18

Exemplo 20. Considere uma partícula se movendo sobre a circunferência de


equação x2 + y 2 = a2 no sentido anti-horário, com velocidade angular constante
de uma revolução por segundo e partindo da posição inicial (a, 0) quando t = 0.
Determine:

(a) Uma parametrização para a trajetória tendo o tempo como parâmetro.



− →

(b) Mostre que o vetor velocidade V é ortogonal ao vetor aceleração A .

Solução. (a) Como a velocidade da partícula é de uma revolução por segundo,


então sua velocidade angular é dada por

= 2π rad/seg.
dt
Logo, θ(t) = 2πt + c, onde c é uma constante real. Como θ(0) = 0 temos
θ(t) = 2πt. Logo, uma trajetória é

γ(t) = (a cos 2πt, a sen2πt) , 0 ≤ t ≤ k, k∈R

se a partícula percorre a circunferência k vezes.



− →

(b) V (t) = γ ′ (t) e A (t) = γ ′′ (t), logo


V (t) = 2πa (− sen2πt, cos 2πt)


A (t) = −4π 2 a (cos 2πt, sen2πt) .

Nesse caso temos



− →

V (t) · A (t) = 0,

− →

e portanto A (t) e V (t) são ortogonais.

1.4 Comprimento de Arco


Tanto no estudo do movimento quanto no estudo das curvas como objetos matemá-
ticos abstratos, o comprimento de uma curva é um tópico importante. Do ponto
Capítulo 1. Funções reais com valores vetoriais 19

de vista matemático o estudo do comprimento é fundamental, uma vez que ele


nos dá uma maneira natural de medir a curva. No caso do estudo do movimento,
o comprimento da curva nada mais é do que o espaço percorrido pela partícula
em um determinado intervalo de tempo. O objetivo dessa subseção é determinar o
comprimento de uma curva γ qualquer. Para efeitos práticos, vamos fazer a conta
para curvas planas. O resultado em R3 é análogo.
Por definição, sabemos que comprimento de um segmento de reta ligando os pontos
A(x0 , y0 ) e B(x1 , y1 ) é dado por
q
L(AB) = (x1 − x0 )2 + (y1 − y0 )2 .

Seja

γ : I ⊂ R −→ R2
t 7−→ γ(t) = (x(t), y(t)) ,

parametrização de uma curva plana C de classe C 1 , e P uma partição regular de


ordem n do intervalo [a, b], isto é,

P = {a = t0 , t1 , ..., tn = b},
b−a
tal que ti+1 − ti = ∆t = , para i = 0, ..., n − 1.
n
Considere a linha poligonal Sn obtida ligando os sucessivos pares de pontos pi =
γ(ti ), pi+1 = γ(ti+1 ), i = 0, ..., n − 1. O comprimento de cada segmento é dado por
q
L (pi+1 , pi ) = ||γ(ti+1 ) − γ(ti )|| = (x(ti+1 ) − x(ti ))2 + (y(ti+1 ) − y(ti ))2
v
!2 !2
x(ti+1 ) − x(ti ) y(ti+1 ) − y(ti )
u
u
= t
+ ∆t.
∆t ∆t

Logo o comprimento total da poligonal é dado por


v
!2 !2
n−1
x(ti+1 ) − x(ti ) y(ti+1 ) − y(ti )
u
Xu
L(Sn ) = t
+ ∆t.
i=0 ∆t ∆t

O comprimento da curva C é o limite de Sn quando n tende para +∞, se esse


limite existir (note que n → +∞ é equivalente a ∆t → 0). Como γ é de classe C 1
Capítulo 1. Funções reais com valores vetoriais 20

Figura 11

temos que esse limite existe e


v
!2 !2
n−1
x(ti+1 ) − x(ti ) y(ti+1 ) − y(ti )
u
Xu
L(C) = lim L(Sn ) = lim t
+ ∆t
n→+∞ ∆t→0
i=0 ∆t ∆t
(1.3)
Z bq
= x′ (t)2 + y ′ (t)2 dt
a
Z b
= ||γ ′ (t)||dt. (1.4)
a
uma vez que (1.3) é uma soma de Riemman.
Temos então a seguinte definição:

Definição 21. Seja γ : [a, b] → Rn parametrização de uma curva C, de classe C 1 .


O comprimento de γ é definido por
Z b
L(C) = ||γ ′ (t)||dt.
a
Exemplo 22. Mostre que o comprimento da circunferência de raio r é dado por
2πr.

Solução. Consideremos a circunferência de raio r centrada na origem. Podemos


parametriza-la por

γ : [0, 2π] ⊂ R −→ R2
t 7−→ γ(t) = (r cos(t), r sen(t)) .
Capítulo 1. Funções reais com valores vetoriais 21


Logo γ ′ (t) = (−r sen(t), r cos(t)), o que implica ||γ ′ (t)|| = r2 sen2 t + r2 cos2 t = r.
Portanto temos Z 2π
L(C) = rdt = 2πr.
0

Observação 13. Observe que a definição apresentada para o cálculo do compri-


mento de uma curva C a princípio depende da parametrização utilizada. Uma vez
que, dada uma curva C, a parametrização de C não é única é razoável imaginar
que o cálculo do comprimento não dependa da parametrização.

No caso da circunferência de raio r do exemplo anterior, uma outra possível


parametrização é a seguinte:

σ : [0, 1] ⊂ R −→ R2
t 7−→ σ(t) = (r cos(2πt), r sen(2πt)) .

Nesse caso temos


σ ′ (t) = (−2πr sen(2πt), 2πr cos(2πt)) ,

o que implica

||σ ′ (t)|| = 4π 2 r2 sen2 t + r2 cos2 t = 2πr.

Portanto temos Z 1
L(C) = 2πrdt = 2πr,
0
que é o mesmo resultado obtido anteriormente.
Podemos considerar que as parametrizações γ e σ no exemplo anterior descrevem a
posição de duas partículas que se movem sobre a mesma curva C com velocidades
distintas. Tal fato não alterou (como era de se esperar) o comprimento da trajetória.
Vamos verificar que isso sempre acontece.

Definição 23. Sejam α : [a, b] → Rn e β : [c, d] → Rn duas parametrizações de


classe C 1 de uma curva C. Dizemos que α e β são parametrizações equivalentes
se existe uma função h : [c, d] → [a, b], bijetora e de classe C 1 tal que β(t) = α ◦h(t),
c ≤ t ≤ d.
Capítulo 1. Funções reais com valores vetoriais 22

Observação 14. Note que, como h é bijetora e contínua, então h é uma função
crescente (e portanto h′ > 0) ou decrescente (e portanto h′ < 0). Como, pela regra
da cadeia, vale
β ′ (t) = α′ (h(t)) · h′ (t),

temos que

• Se h′ > 0, então α e β tem o mesmo sentido;

• Se h′ < 0, então α e β tem sentidos opostos.

Teorema 24. O comprimento de uma curva independe das parametrizações equi-


valentes escolhidas.

Demonstração. Sejam Cβ a curva C com parametrização β : [c, d] → Rn , e Cα a


curva C com parametrização α : [a, b] → Rn . Pela definição (21) temos
Z d Z d Z d
L(Cβ ) = ||β (t)||dt =

||(α ◦ h) (t)||dt =

||α′ (h(t))|| · |h′ (t)|dt.
c c c

Mas Z d
||α′ (h(t))|| · |h′ (t)|dt =
c
 Z d
||α′ (h(t))|| · h′ (t)dt, se α e β tem o mesmo sentido, ou



= Zc d

 − ||α′ (h(t))|| · h′ (t)dt, se α e β tem sentidos opostos.
c

Fazendo a substituição h(t) = u temos


 Z b
||α′ (u))||du = L(Cα ) se α e β tem o mesmo sentido, ou



L(Cβ ) =  Zaa

 − ||α′ (u)||du, = L(Cα ) se α e β tem sentidos opostos.
b

Observação 15. Se C é o gráfico de uma função real com derivada contínua


f : [a, b] → R, então o comprimento de C é dado por
Z bq
L(C) = 1 + (f ′ (t))2 dt.
a
Capítulo 1. Funções reais com valores vetoriais 23

Exemplo 25. Calcule o comprimento da espiral C parametrizada por


 
α(t) = e−t cos t, e−t sent , t ∈ [0, +∞]. (1.5)

Solução. Derivando α obtemos


 
α′ (t) = −e−t cos t − e−t − sent, −e−t sent + e−t cos t ,

o que implica
q √ −t
||α (t)|| =

(−e−t cos t − e−t − sent)2 + (−e−t sent + e−t cos t)2 = 2e .

Seja Ct a curva determinada por α para u ∈ [0, t], onde t ∈ R. Nesse caso
Z t Z t√ √ √
L(Ct ) = ||α (u)||du =

2e−u du = − 2e−u |t0 = 2(1 − e−t ).
0 0

Logo, o comprimento da espiral para u ∈ [0, +∞] é dado por


√ √
L = lim 2(1 − e−t ) = 2.
t→+∞

1.4.1 Parametrização pelo comprimento de arco


No exemplo anterior, se chamarmos de s(t) o comprimento da espiral partindo de
uma posição inicial u = 0 até a posição dada por u = t temos

s(t) = 2(1 − et ),

o que implica !
s
t = − ln 1 − √ .
2
Substituindo o valor de t na parametrização (1.5) obtemos
! ! !!
s s s
β(s) = α(t(s)) = 1 − √ cos 1 − √ , sen 1 − √ ,
2 2 2
que é uma parametrização para a espiral C usando o comprimento de arco
como parâmetro (comprimento de arco = comprimento da curva).
Capítulo 1. Funções reais com valores vetoriais 24

Mais geralmente, observe que, dada uma curva C com parametrização γ(t) de
classe C 1 , γ definida de um ponto inicial P0 = γ(t0 ) até um ponto P = γ(t), temos
que o comprimento da curva C ligando P0 à P é dado por
Z t
s(t) = ||γ ′ (u)||du.
t0

A função s(t) é uma função crescente (consegue notar?) e, portanto, possui uma
inversa t = t(s). Essa função inversa nos permite reparametrizar C usando o
comprimento de arco como parâmetro, bastando fazer

σ(s) = γ(t(s)).

Exemplo 26. Seja α(t) = (r cos t, ρ sent), t ∈ [0, 2π] parametrização da circun-
ferência C de raio r centrada na origem. Determine uma parametrização para C
tendo o comprimento de arco como parâmetro.

Solução. Dada a parametrização α, temos que o comprimento da curva do ponto


inicial P0 = α(0) até um ponto P = α(t) é dado por
Z t
s(t) = ||α′ (u)||du.
0

Como
α′ (t) = (−r sent, r cos t) ,

temos ||α′ (t)|| = r2 cos2 t + r2 sen2 t = r. Logo
Z t Z t
s(t) = ||α (u)||du =

rdu = rt.
0 0

Assim temos
s
s = rt ⇒ t = .
t
Logo
s s
    
β(s) = α(t(s)) = r cos
, r sen ,
r r
é uma parametrização para a curva C utilizando o comprimento de arco como
parâmetro.
Capítulo 1. Funções reais com valores vetoriais 25

Observação 16. Embora a parametrização por comprimento de arco sempre exista


para curvas com parametrização de classe C 1 , como o seu cálculo depende do
resultado de uma integral, algumas vezes essa parametrização não pode ser escrita
usando funções elementares.

Do ponto de vista matemático, a parametrização por comprimento de arco é


extremamente útil, uma vez que o comprimento da curva é uma medida natural
do objeto, isto é, ela depende apenas da forma da curva e não do sistema de
coordenadas.
Do ponto de vista da curva parametrizada como movimento de uma partícula, a
parametrização por comprimento de arco representa o importante caso em que a
curva é percorrida com velocidade constante um. Mais especificamente vale
o seguinte resultado:

Proposição 27. Uma curva γ : I → R2 está parametrizada pelo comprimento de


arco se, e somente se, ||γ ′ (t)|| = 1.

Demonstração. (⇐) Observe que, se ||γ ′ (t)|| = 1, para todo t ∈ I, então


Z t Z t
Lγ (t) = ||γ (u)||du =

du = t − t0 ,
t0 t0

e portanto γ está parametrizada pelo comprimento de arco.


(⇒) Reciprocamente, se γ está parametrizada pelo comprimento de arco isto é, se

Lγ (t) = t + C, C constante,

como Z t
Lγ (t) = ||γ ′ (u)||du,
t0
derivando obtemos que
||γ ′ (t)|| = L′γ (t) = 1,

para todo t ∈ I.
26

2 Funções de várias variáveis a valores


vetoriais

2.1 Introdução
No capítulo anterior estudamos funções cujo domínio estava contido no conjunto dos
números reais, e cuja imagem era dada por um conjunto de vetores em um espaço
Rn . Uma evolução natural desse estudo é considerar funções de várias variáveis
(como as do cálculo II) cuja imagem é um conjunto de vetores (como as do capítulo
anterior). Mais precisamente temos:

Definição 28. Dados n e m números naturais diferentes de zero, uma função real
de n variáveis a valores em Rm é uma função

f : U ⊂ Rn −→ Rm
(x1 , x2 , ..., xn ) 7−→ f (x) = (f1 (x), fm (x), ..., f1 (x)) ,
| {z }
x

isto é, f leva x = (x1 , .., xn ) ∈ Rn em um vetor f (x) = (f1 (x), fm (x), ..., f1 (x)) ∈
Rm .

O conjunto U é chamado domínio de f , e o conjunto

Im f = f (U ) = {f (x1 , ..., xn ) ∈ Rm ; (x1 , ..., xn ) ∈ U },

é chamado imagem de f.
Existem vários exemplos de funções vetoriais interessantes para nós. Vejamos alguns
deles:

Exemplo 29. Seja φ : R2 −→ R3 dada por

φ(u, v) = (x(u, v), y(u, v), z(u, v)) ,


Capítulo 2. Funções de várias variáveis a valores vetoriais 27

onde 




x(u, v) = u

y(u, v) = v
z(u, v) = u2 + v 2 .


φ é uma função com domínio R2 e com valores em R3 . Note que sua imagem é o
conjunto
n  o n o
Im φ = u, v, u2 + v 2 ; (u, v) ∈ R2 = (x, y, z) ∈ R3 ; z = x2 + y 2 , (x, y) ∈ R2 ,

ou seja, a imagem de φ coincide com o paraboloide circular gráfico da função


z = x2 + y 2 .

Figura 12 – Paraboloide circular imagem de φ.

Exemplo 30. Considere a função φ(θ, r) = (x, y) dada por



 x = r cos θ
 y = r senθ,
e seja a uma constante real. Observe que a imagem da reta r = a pela função φ, é
dada por φ(θ, a) = (acosθ, a senθ), θ ∈ R, isto é, a função φ leva a reta r = a do
plano rθ na circunferência de raio a centrado na origem do plano xy.

Além disso, observe que a imagem pela função φ do retângulo [0, 2π] × [0, a] do
plano rθ é o círculo {(x, y) ∈ R2 ; x2 + y 2 ≤ a2 }.
Dentre as várias interpretações que podem ser dadas para funções de várias variáveis
a valores vetoriais destacaremos duas: As superfícies parametrizadas (como no
exemplo 29), que estudaremos posteriormente, e os campos vetoriais.
Capítulo 2. Funções de várias variáveis a valores vetoriais 28

Figura 13 – Reta r = a e sua imagem no plano xy.

Figura 14 – O retângulo [0, a] × [0, 2π] e sua imagem no plano xy.

2.2 Campos Vetoriais


Dado U ⊂ Rn , seja F : Rn −→ Rn uma transformação de U em Rn (note
que domínio e contra domínio tem a mesma dimensão). Dentro de determinados
contextos (físicos, geométricos e etc) será conveniente interpretar F (x), x ∈ U como
um vetor aplicado em x. Quando fazemos isso, chamamos F de campo vetorial,


e escrevemos F . Mais precisamente, temos a seguinte definição:


Definição 31. Um campo vetorial é uma função F : U ⊂ Rn −→ Rn , que


associa a cada ponto x ∈ U um vetor F (x) em Rn .

Exemplo 32 (Campo vetorial em R2 ). Um campo vetorial em R2 é uma função




F : U ⊂ R2 −→ R2 . Nesse caso, o campo vetorial pode ser escrito da seguinte
forma:

− →
− →

F (x, y) = P (x, y) i + Q(x, y) j = (P (x, y), Q(x, y)) ,


onde as funções P e Q, chamadas componentes do campo F , são campos escala-
res, isto é, funções reais de duas variáveis.
Capítulo 2. Funções de várias variáveis a valores vetoriais 29

Observação 17. A definição de campo vetorial em R3 é análoga, apenas acrescen-



− →

tando ao campo F uma componente R(x, y, z) na direção k , isto é

− →
− →
− →

F (x, y, z) = P (x, y, z) i + Q(x, y, z) j + R(x, y, z) k
= (P (x, y, z), Q(x, y, z), R(x, y, z)) .

− →

Exemplo 33. Represente geometricamente o campo vetorial F (x, y) = i = (1, 0).


− →

Solução. O campo F = i é um campo vetorial constante que associa, a cada


ponto (x, y) do plano o vetor i = (1, 0).

Figura 15 – Campo vetorial F⃗ = ⃗i.


− →
− →

Exemplo 34. Represente geometricamente o campo vetorial F (x, y) = x i +y j =
(x, y).


− √
Solução. Observe que nesse caso temos que || F (x, y)|| = x2 + y 2 , isto é, o módulo
(ou intensidade) do campo é constante para pontos de uma mesma circunferência


de centro na origem. Além disso, o vetor F (x, y) aponta na mesma direção do
ponto (x, y) com relação a origem.


− →


− x i +y j
Exemplo 35. Represente geometricamente o campo vetorial F (x, y) = =
! ||(x, y)||
x y
√ 2 ,√ 2 .
x +y 2 x + y2
Capítulo 2. Funções de várias variáveis a valores vetoriais 30

Figura 16 – Campo vetorial F⃗ = x⃗i + y⃗j.



Solução. Observe que nesse caso temos que || F (x, y)|| = 1, para todo (x, y). Além


disso, o vetor F (x, y) aponta na mesma direção do ponto (x, y) com relação a
origem. Dessa forma, esse campo é similar ao do exemplo anterior, mas com todos
os vetores tendo a mesma intensidade.

!
x y
Figura 17 – Campo vetorial F⃗ = √ 2 , √ .
x + y2 x2 + y 2

Exemplo 36 (Campo de Velocidade). Dado um líquido escoando uniformemente




em um cano, seja V (x, y, z) o vetor velocidade em um ponto (x, y, z). Nesse caso,


note que V associa um vetor a cada ponto (x, y, z) de um domínio D, que representa


o interior do cano. Dessa forma, V é um campo vetorial em R3 chamado campo
de velocidade.
Capítulo 2. Funções de várias variáveis a valores vetoriais 31

Figura 18 – Figura extraída do livro de James Stewart, Calculus, 5ª edição.

Exemplo 37 (Campo Gravitacional). A lei da gravitação de Newton afirma


que a intensidade da força gravitacional entre dois objetos com massas m e M é
dada por
mM G
|F| = ,
r2
onde r é a distância entre os objetos e G é a constante gravitacional. Suponha
que um objeto de massa M está localizado na origem em R3 , e seja x = (x, y, z)
a posição do objeto de massa m. Nesse caso r é a distância de x para a origem,
isto é, r = |x|. Além disso, a força gravitacional exercida no segundo objeto age em

→x
direção à origem, e portanto o vetor unitário em sua direção é dado por − |x| . Logo,
a força gravitacional agindo em x é dada por

− mM G →−
F =− x.
|x|3

Observação 18. Note que x = (x, y, z) no exemplo anterior aparece em dois


contextos diferentes. Em um momento estamos falando do ponto x = (x, y, z) ∈ R3 ,
e em outro momento do vetor → −x = (x, y, z). Assim, usamos a notação →−x para
indicar quando o objeto está sendo interpretado como um vetor, e apenas x quando
o objeto está sendo interpretado como uma posição no R3 .

Definição 38. Dada uma função escalar f : R3 −→ R de classe C 1 , o vetor


!
∂f ∂f ∂f
∇f = , , ,
∂x ∂y ∂z
Capítulo 2. Funções de várias variáveis a valores vetoriais 32

Figura 19 – Campo Gravitacional.

é chamado gradiente de f . Assim, fixada f de classe C 1 , observe que fica definido


um campo vetorial ∇f : R3 −→ R3 dado por
!
∂f →
− ∂f →
− ∂f →
− ∂f ∂f ∂f
∇f (x, y, z) = i + j + k = , , ,
∂x ∂y ∂z ∂x ∂y ∂z

chamado campo gradiente de f .

Exemplo 39. O campo gradiente de f (x, y) = 3x2 y + 2yz é o campo vetorial dado
por

− →
− →

∇f (x, y, z) = 6xy i + (3x2 + 2z) j + 2y k .


Definição 40. Um campo vetorial F é chamado campo vetorial conservativo


se ele for o gradiente de alguma função escalar, ou seja, se existir f tal que F = ∇f .


Neste caso, f é denominada função potencial de F .

Exemplo 41. Verifique que o campo gravitacional



− mM G →−
F =− x,
|x|3

é um campo vetorial conservativo.


Capítulo 2. Funções de várias variáveis a valores vetoriais 33



Solução. As funções coordenadas do campo F (x, y, z) são dadas por
x
P (x, y, z) = −mM G
(x2 + y 2 + z 2 )3/2
y
Q(x, y, z) = −mM G
(x2 + y 2 + z 2 )3/2
z
R(x, y, z) = −mM G .
(x2 + y 2 + z 2 )3/2


Para mostrar que F é conservativo devemos encontrar uma função escalar f (x, y, z)
tal que
∂f x
= −mM G (2.1)
∂x (x2 + y 2 + z 2 )3/2
∂f y
= −mM G (2.2)
∂y (x + y + z 2 )3/2
2 2

∂f z
= −mM G . (2.3)
∂z (x2 + y 2 + z 2 )3/2
Integrando (2.1) com relação a x obtemos
mM G
f (x, y, z) = √ + C1 (y, z). (2.4)
+ y2 + z2
x2
Analogamente, integrando (2.2) com relação a y, e (2.3) com relação a z, obtemos
mM G
f (x, y, z) = √ 2 + C2 (x, z) (2.5)
x + y2 + z2
mM G
f (x, y, z) = √ 2 + C3 (x, y). (2.6)
x + y2 + z2
Comparando as equações (2.4), (2.5) e (2.6), temos que, para C1 = C2 = C3 = 0, a
função f está bem definida, e portanto
mM G
f (x, y, x) = − √ .
+ y2 + z2
x2


é um potencial para o campo F .

2.3 Rotacional e Divergente


Assim como aconteciam com os outros tipos de funções estudadas anteriormente,
existem várias operações que podem ser realizadas com os campos vetoriais. Além
Capítulo 2. Funções de várias variáveis a valores vetoriais 34

das operações naturais, como a soma e o produto escalar, destacaremos aqui duas
operações essenciais nas aplicações do cálculo vetorial em diversas áreas, como o
eletromagnetismo, a mecânica dos fluidos e etc.
Comecemos com a seguinte definição:

Definição 42. Definimos o operador diferencial ∇ como


!
∂ ∂ ∂ ∂ →− ∂ →− ∂ →−
∇= , , = i + j + k.
∂x ∂y ∂z ∂x ∂y ∂z

Exemplo 43. O vetor gradiente é obtido aplicando o operador diferencial ∇ em


um campo escalar (isto é, uma função real) f , ou seja,
!
∂f ∂f ∂f
∇f = , , .
∂x ∂y ∂z

De maneira pouco rigorosa, podemos pensar no operador diferencial como uma


operação abstrata que recebe uma função (escalar) e retorna uma outra função
(vetorial).
Embora o operador diferencial seja um objeto matemático complexo cujo estudo
mais formal foge ao escopo desse curso, vamos usa-lo de maneira informal para
introduzir alguns conceitos importantes no estudo dos campos vetoriais.
Consideremos o campo vetorial

− →
− →
− →

F (x, y, z) = P (x, y, z) i + Q(x, y, z) j + R(x, y, z) k ,

definido em um conjunto aberto Ω ⊂ R3 . Suponhamos que P , Q e R admitem


derivadas parciais em Ω.

− →

Definição 44. O rotacional do campo F , denotado por rot F , é o campo vetorial


dado pelo "produto vetorial" do operador diferencial ∇ com F , ou seja,

− →

rot F = ∇ × F .
Capítulo 2. Funções de várias variáveis a valores vetoriais 35

Mais precisamente,
!

− →
− ∂ ∂ ∂
rot F = ∇ × F = , , × (P, Q, R)
∂x ∂y ∂z
 →
− − →
→ − 
i j k
∂ ∂ ∂ 
 
=

 

 ∂x ∂y ∂z 
P Q R
! ! !
∂R ∂Q → − ∂P ∂R →
− ∂Q ∂P →

= − i + − j + − k.
∂y ∂z ∂z ∂x ∂x ∂y


Observação 19. Quando F é um campo vetorial no plano, isto é,

− →
− →

F = P (x, y) i + Q(x, y) j ,


podemos calcular o rotacional de F eliminando o segundo e o terceiro termos da


última coluna da matriz obtida fazendo ∇ × F na definição anterior. Assim, temos
que !

− ∂Q ∂P → −
rot F = − k.
∂x ∂y

− →

Definição 45. O divergente do campo F , denotado por rot F , é o campo escalar


dado pelo "produto escalar" do operador diferencial ∇ com F , ou seja,

− →

div F = ∇ · F .

Mais precisamente,
!

− →
− ∂ ∂ ∂
div F = ∇ · F = , , · (P, Q, R)
∂x ∂y ∂z
∂P ∂Q ∂R
= + + .
∂x ∂y ∂z
Exemplo 46. Determine o rotacional e o divergente do campo

− →
− →
− →

F (x, y, z) = xy i + xyz j − x2 y k .



Solução. O divergente de F é dado por


div F = y + xz.
Capítulo 2. Funções de várias variáveis a valores vetoriais 36

O rotacional é dado por



−  →− →
− →

rot F = −x2 − xy i + (0 − (−2xy)) j + (yz − x) k

− →
− →

= −x(x + y) i + 2xy j + (yz − x) k .

Os próximos resultados decorrem das definições do rotacional e divergente.

Teorema 47. Se f = f (x, y, z) é uma função de classe C 2 (isto é, possui derivadas


de segunda ordem contínuas), então o rotacional do gradiente de f é o vetor nulo,
ou seja,


rot(∇f ) = 0 .

Solução. Para demonstrar esse resultado basta calcular o rotacional de


!
∂f ∂f ∂f
∇f = , , .
∂x ∂y ∂x
Temos então
→
− → − → − 

i j k 
 ∂ ∂ ∂ 
rot(∇f ) =  ∂x ∂y ∂z 
 


 ∂f ∂f ∂f 
 

∂x ∂y ∂z
! ! !
∂ 2f ∂ 2f →− ∂ 2f ∂ 2f →− ∂ 2f ∂2 →

= − i + − j + − k
∂y∂z ∂z∂y ∂z∂x ∂x∂z ∂x∂y ∂y∂x


=0.



Na definição 40 vimos que um campo vetorial é conservativo se F = ∇f para
alguma função escalar f . Vale então o seguinte corolário:

− →
− →

Corolário 48. Se F é um campo vetorial conservativo, então rot F = 0 .

− →

Assim, rot F = 0 é uma condição necessária para que um campo seja conser-

− →
− →

̸ 0 não é um campo vetorial
vativo, ou seja, qualquer campo F tal que rot F =
conservativo.
Capítulo 2. Funções de várias variáveis a valores vetoriais 37

Observação 20. Cuidado, a recíproca do teorema anterior é falsa, isto é, existem


campos cujo rotacional é o vetor nulo mas o campo não é conservativo. No entanto,


se F é um campo de classe C 2 sobre todo o R3 , a recíproca do teorema é válida.

Mais precisamente temos o seguinte resultado:




Teorema 49. Se F é um campo vetorial de classe C 2 definido em todo o R3 tal

− →
− →

que rot F = 0 , então F é um campo conservativo.

Demonstração. A demonstração desse teorema foge ao escopo do nosso curso mas


pode ser encontrada em livros de análise vetorial.

Outro resultado que será importante em nosso curso é o seguinte:



− →
− →
− →

Teorema 50. Se F = P i + Q j + R k é um campo vetorial de classe C 2 sobre
o R3 , então
 →
−
div rot F = 0.

Demonstração.
! ! !
 →
− ∂ ∂R ∂Q ∂ ∂P ∂R ∂ ∂Q ∂P
div rot F = − + − + −
∂x ∂y ∂z ∂y ∂z ∂x ∂z ∂x ∂y
2 2 2 2 2 2
∂ R ∂ Q ∂ P ∂ R ∂ Q ∂ P
= − + − + − = 0.
∂x∂y ∂x∂z ∂y∂z ∂y∂x ∂z∂x ∂z∂y

Exemplo 51. Determine se o campo vetorial



− →
− →
− →

F (x, y, z) = yz i + 2xyz j − x2 k ,


pode ser escrito como rotacional de algum campo vetorial G .

Demonstração. Como


div F = 2xz ̸= 0, (2.7)

− →

temos que F não pode ser escrito como rotacional de um campo G . Com efeito,

− →
− →

se existisse G tal que F = rot G teríamos

− →

div F = div(rot G ) = 0,
o que é um absurdo pois contradiz (2.7).
38

3 Integrais de Linha

3.1 Integral de linha de uma função escalar


3.1.1 Motivação
Assim como as integrais dupla e tripla, a integral de linha também é uma generaliza-
ção da integral de funções de uma variável. Nos casos anteriores essa generalização
se deu por uma mudança na dimensão da região de integração, isto é, passamos a
integrar em regiões bidimensionais ou tridimensionais ao invés de integrar ao longo
de um intervalo (unidimensional).
No caso da integral de linha, a generalização que faremos não se dará pela mudança
da dimensão do domínio de integração, mas sim por uma mudança na forma.
Substituiremos a ideia de integração sobre um intervalo pela ideia de integração
sobre uma curva.
Antes da definição matemática do conceito de integral de linha vamos considerar o
seguinte problema motivacional:

Problema 52. Seja C um fio cuja posição em R3 é definida pela função

γ : I = [a, b] −→ Rn
t 7−→ γ(t) = (x(t), y(t), z(t)) ,

e cuja densidade (massa por unidade de comprimento), em cada ponto é dada por
uma função f : R3 → R. Determine a massa total M do fio.

Solução. Sabemos que, dado um fio com comprimento L e densidade constante d,


sua massa M é dada por
M = d · L.

Como no problema proposto a densidade não é constante aplicaremos o seguinte


método:
Capítulo 3. Integrais de Linha 39

• Vamos subdividir o fio em n pedaços, cujos comprimentos são pequenos


o suficiente para que possamos considerar a densidade aproximadamente
constante em cada um. Em seguida vamos somá-los e calcular o limite quando
n tende a infinito.

Vejamos a conta:
Seja P uma partição regular de ordem n do intervalo [a, b] isto é,

P = {a = t0 , t1 , . . . , tn = b},
b−a
é tal que ti+1 − ti = = ∆t para i = 0, . . . , n − 1.
n

Figura 20

Dessa forma, obtemos uma decomposição de C em curvas Ci definidas em [ti , ti+1 ],


com i = 0, . . . , n − 1, e cujos comprimentos são dados por
Z ti+1
L(Ci ) = ∆si = ||γ ′ (t)||dt ∀i = 0, . . . , n − 1.
ti

Pelo teorema do valor médio para integrais, existe ui ∈ [ti , ti+1 ] tal que
Z ti+1
∆si = ||γ ′ (t)||dt = ||γ ′ (ui )||∆t ∀i = 0, . . . , n − 1.
ti

Observe que, quanto maior o valor de n, menor é o comprimento de ∆t, e portanto,


para n grande o suficiente, temos que f (x, y, z) é aproximadamente constante em
cada Ci , e é igual a f (γ(ui )) (pois ui ∈ [ti , ti+1 ]). Assim, temos que as massas Mi
de cada Ci são dadas por

Mi = f (γ(ui ))||γ ′ (ui )||∆t.


Capítulo 3. Integrais de Linha 40

Dessa forma, a massa total M é, aproximadamente


n−1
M ≈ Sn = f (γ(ui ))||γ ′ (ui )||∆t.
X

i=0

A soma Sn é uma soma de Riemann (note que ∆t → 0 quando n → +∞) da função


f (γ(t))||γ ′ (t)|| no intervalo [a, b]. Logo, se considerarmos f contínua em C, então
n−1
M = lim f (γ(ui ))||γ ′ (ui )||∆t
X
n→+∞
i=0
Z b
= f (γ(t))||γ ′ (t)||dt.
a

3.1.2 Definição
Motivados pela construção da seção anterior temos a seguinte definição:

Definição 53. Seja C uma curva em R3 com parametrização γ de classe C 1 dada


por
γ(t) = (x(t), y(t), z(t)) , t ∈ [a, b],

e seja f (x, y, z) uma função contínua ao longo de C. Definimos a integral de


linha de f ao longo de C por
Z Z b
f ds = f (γ(t))||γ ′ (t)||dt. (3.1)
C a

Observação 21. Na expressão


ds
Z Z b z }| {
f ds = f (γ(t)) ||γ (t)||dt,

C a

o termos ds = ||γ ′ (t)||dt é chamado elemento de comprimento, e pode ser


interpretado como o comprimento de um pedaço infinitesimal da curva C. Nesse
caso, ds é aproximadamente igual a hipotenusa de um triângulo retângulo, cujos
catetos são os comprimentos infinitesimais em dx e dy.
Capítulo 3. Integrais de Linha 41

Observação 22. A definição acima se estende naturalmente nos casos em que γ


é C 1 por partes (isto é, pode ser dividida em uma quantidade finita de partes de
classe C 1 ), ou que f ◦ γ é contínua por partes. Nesse caso a integral
Z
f ds,
C

é calculada dividindo-se o intervalo [a, b] em um número finito de intervalos fechados


onde f (γ(t))||γ ′ (t)|| é contínua.

Observação 23. No caso particular em que f (x, y, z) = 1 temos que


Z Z b
ds = ||γ ′ (t)||dt = comprimento da curva C.
C a
Z
Exemplo 54. Calcule xyzds, onde C é a hélice γ(t) = (cos t, sent, t), 0 ≤ t ≤
C
2π.

Solução. Derivando γ obtemos

γ ′ (t) = (− sent, cos t, 1) .

Logo γ é de classe C 1 em [0, 2π], e


√ √
||γ ′ (t)|| = sen2 t + cos2 t + 1 = 2.

Como f é contínua em R3 , por (3.1) temos que


Z Z 2π Z 2π √
f ds = f (γ(t))||γ (t)||dt =

f (cos t, sent, t) 2dt
C 0 0
√  2π 
√ Z 2π 2  t cos(2t) 1 Z 2π
= 2 t cos t sentdt = − + cos(2t)dt
0 2 2
0
2 0

π 2
=− .
2

Quando C é uma curva no plano xy com parametrização γ(t) = (x(t), y(t)), t ∈ [a, b]
de classe C 1 , e f (x, y) é uma função real contínua em C, a integral de linha de
f ao longo de C pode ser interpretada como a área do cilindro cuja base é C e a
altura em cada ponto é f (x, y).
Capítulo 3. Integrais de Linha 42

Figura 21 – Hélice γ(t) = (cos t, sent, t).

Exemplo 55. Calcule a massa do fio γ(t) = (cos t, sent), 0 ≤ t ≤ 2π, sendo
f (x, y) = x2 + 2y 2 sua densidade linear.

Solução. Derivando γ obtemos

γ ′ (t) = (− sent, cos t) ,

Logo γ é de classe C 1 em [0, 2π], e



||γ ′ (t)|| = sen2 t + cos2 t = 1.

Como f é contínua em R2 , por (3.1) temos que


Z Z 2π Z 2π
M= f ds = f (γ(t))||γ (t)||ds =

f (cos t, sent) · 1dt
C 0 0
Z 2π Z 2π
= cos2 t + 2 sen2 tdt = 1 + sen2 tdt
0 0

Z 2π
1 − cos 2t 3t sen2t
 
= 1+ dt = −
2 2 4 0

0

= 3π.
Capítulo 3. Integrais de Linha 43

3.2 Integral de linha de campo vetorial


3.2.1 Motivação
Vamos ao seguinte problema motivacional:


Problema 56. Suponhamos que F : Ω ⊂ R3 → R3 seja um campo de forças
definido em um aberto Ω, e que γ : [a, b] → R3 descreve o movimento de uma


partícula em Ω. Determine o trabalho realizado por F sobre a partícula entre os
pontos γ(a) e γ(b).

Solução. Faremos uma construção análoga ao exemplo motivacional anterior. Sa-




bemos que se F é constante e γ(t) é uma reta ligando γ(a) e γ(b), o trabalho W


realizado por F é dado por

W = F · (γ(b) − γ(a)) .


Suponhamos F um campo contínuo e γ uma curva de classe C 1 . Assim como
fizemos anteriormente, podemos aproximar o traço C da curva γ por uma poligonal
usando uma partição do intervalo [a, b]. Dessa forma, seja P uma partição regular
de ordem n do intervalo [a, b], isto é

P = {a = t0 , t1 , . . . , tn = b},
b−a
tal que ti+1 − ti = = ∆t, para i = 0, . . . , n − 1. Dessa forma, obtemos uma
n
decomposição de C em curvas Ci definidas em [ti , ti+1 ], com i = 0, . . . , n − 1.
Para n grande o suficiente, temos que ∆t é pequeno. Nesse caso, o deslocamento da
partícula de γ(ti ) até γ(ti+1 ) pode ser aproximado pelo vetor ∆si = γ(ti+1 ) − γ(ti )


e, como [ti , ti+1 ] é pequeno, temos que F é aproximadamente constante, e igual a
F (γ(ti )) no intervalo [ti , ti+1 ]. Além disso, pela definição de derivada, temos que

γ(ti+1 ) − γ(ti ) ≈ γ ′ (ti )∆t.

Portanto, o trabalho realizado para deslocar a partícula de γ(ti ) até γ(ti+1 ) pode
ser aproximado da seguinte forma:

− →
− 
F (γ(ti )) · ∆si ≈ F (γ(ti )) · γ ′ (ti ) ∆ti .
Capítulo 3. Integrais de Linha 44

Figura 22



Assim, o trabalho total de F é aproximadamente
n−1


W ≈ Sn = F (γ(ti )) · γ ′ (ti )∆t.
X

i=0


A soma Sn é uma soma de Riemann da função F (γ(ti )) · γ ′ (ti ) no intervalo [a, b].


Logo, como F é contínuo e γ ′ é contínua em [a, b], então
n−1


W = lim F (γ(ti )) · γ ′ (ti )∆t
X
n→+∞
i=0
Z b


= F (γ(t)) · γ ′ (t)dt.
a

3.2.2 Definição
Motivados pela construção da seção anterior temos a seguinte definição:

Definição 57. Seja C uma curva C em R3 com parametrização γ de classe C 1


dada por
γ(t) = (x(t), y(t), z(t)) , t ∈ [a, b],


e seja F (x, y, z) = (F1 , F2 , F3 ) um campo vetorial contínuo definido em C. Defini-


mos a integral de linha F ao longo de C por
dr
Z

− Z b

− z }| {
F · dr = F (γ(t)) · γ ′ (t)dt.
C a
Capítulo 3. Integrais de Linha 45

Observação 24. Se γ é fechada, isto é, γ(a) = γ(b), escrevemos


I


F · dr.
C



Observação 25. Considerando F = (F1 , F2 , F3 ) e γ(t) = (x(t), y(t), z(t)), pode-
mos escrever a integral componente a componente da seguinte forma:
Z

− Z b


F · dr = F (γ(t)) · γ ′ (t)dt
C a
Z b
= (F1 (γ(t)), F2 (γ(t)), F3 (γ(t))) · (x′ (t), y ′ (t), z ′ (t)) dt
a
dx dy dz
Z b z }| { z }| { z }| {
= F1 (γ(t)) x′ (t)dt +F2 (γ(t)) y ′ (t)dt +F3 (γ(t)) z ′ (t)dt
a
Z b
= F1 dx + F2 dy + F3 dz.
a
I


Exemplo 58. Calcule F · dr onde
C
!

− −y x
F (x, y) = , 2 ,
x + y x + y2
2 2

e C é a curva parametrizada por γ(t) = (cos t, sent), 0 ≤ t ≤ 2π.



Solução. Como F é contínua ao longo de C, e γ é de classe C 1 , a integral de linha


de F ao longo de C está bem definida. Temos então
I

− Z 2π →
− Z 2π →

F · dr = F (γ(t)) · γ (t)dt =

F (cos t, sent) · (− sent, cos t)dt
C 0 0
Z 2π 
− sent cos t

= , · (− sent, cos t)dt
0 cos t + sen t cos t + sen2 t
2 2 2
Z 2π
= sen2 t + cos2 tdt
0

= 2π.



Observação 26. No exemplo anterior, observe que F não é contínuo em R3 pois

− →

F não está definido em (0, 0), mas F é contínuo ao longo de C, e portanto a


integral de linha de F ao longo do traço de γ está bem definida.
Capítulo 3. Integrais de Linha 46

Da definição da integral de linha seguem as seguintes propriedades:



(i) Linearidade Dada uma curva parametrizada C, a e b constantes reais, e F


e G campos vetoriais definidos ao longo de C, temos
Z 

− →
− Z

− Z


a F + b G · dr = a F · dr + b G · dr.
C C C

(ii) Aditividade Se C admite uma decomposição em um número finito de curvas


C1 , . . . , Cn , isto é C = C1 ∪ . . . ∪ Cn , então
n Z
Z

− →

F · dr =
X
F · dr,
C i=1 Ci



onde F é um campo vetorial definido ao longo de C.

Demonstração. A demonstração de (i) segue do fato da integral de linha de um


campo ser definida através de uma integral de funções de uma variável.
Para verificar (2) basta observar que, se C tem parametrização γ : [a, b] → R3 , então
[a, b] pode ser particionado em n partes de modo que cada parte seja parametrização
de Ci para algum i.

Uma vez que tomamos o calculo do trabalho de uma força como motivação para a


definição da integral de linha de um campo F , e sabendo que em muitos sistemas
físicos o trabalho de uma força não depende da trajetória, mas apenas dos pontos


final e inicial, é razoável perguntar se dado um campo vetorial F vale
Z

− Z


F · dr = F · dr,
C1 C2

onde C1 e C2 são trajetórias distintas com os mesmos pontos final e inicial. O


exemplo abaixo no entanto mostra que isso nem sempre é verdade.


Exemplo 59. Calcule a integral de linha do campo F (x, y) = (x2 − 2xy, x3 + y)
de (0, 0) à (1, 1) ao longo das seguintes curvas:

(a) O segmento de reta C1 que liga (0, 0) a (1, 1).

(b) A curva C2 parametrizada por γ(t) = (t2 , t3 ), 0 ≤ t ≤ 1.


Capítulo 3. Integrais de Linha 47

Demonstração. (a) O segmento de reta C1 pode ser parametrizado por σ(t) =


(t, t), 0 ≤ t ≤ 1. Assim, σ ′ (t) = (1, 1) e

− →
−    
F (σ(t)) = F (t, t) = t2 − 2t2 , t3 + t = −t2 , t3 + t .

Portanto temos
Z

− Z 1

− Z 1 
F · dr = F (σ(t)) · σ (t)dt =

−t2 , t3 + t ) · (1, 1)dt
C1 0 0
" #1
4
Z 1
t t3 t2
= t − t + 1dt =
3 2
− +
0 4 3 2 0
5
= .
12
(b) Para C2 temos γ(t) = (t2 , t3 ), o que implica γ ′ (t) = (2t, 3t2 ) e

− →
−  
F (γ(t)) = F (t2 , t3 ) = t4 − 2t5 , t6 + t3 .

Portanto temos
Z

− Z 1

− Z 1 
F · dr = F (γ(t)) · γ (t)dt =

t4 − 2t5 , t6 + t3 · (2t, 3t2 )dt
C2 0 0
#1
5t6 4t7 t9
Z 1 "
= 2t − 4t + 3t + 3t dt =
5 6
−8
+ 5
0 6 7 3 0
25
= .
42



Uma outra pergunta relevante é se a integral de linha de um campo vetorial F ao
longo de uma trajetória C depende da parametrização utilizada. Vamos calcular o
item (b) do exemplo anterior utilizando uma parametrização diferente. Considere a
seguinte parametrização de C2 :

γ2 : I = [0, 1] −→ R2
 
t 7−→ γ(t) = t, t3/2 .

3
 
Nesse caso temos γ2′ (t) = 1, t1/2 , e
2


F (γ2 (t)) = (t2 − 2t5/2 , t3 + t3/2 ),
Capítulo 3. Integrais de Linha 48

Figura 23

e portanto
Z

− Z 1

− Z 1   3 
F · dr = F (γ2 (t)) · γ2′ (t)dt = t2 − 2t5/2 , t3 + t3/2 · 1, t1/2 dt
C2 0 0 2
9/2 1
3 3 5t 4t
" #
Z 1 3 7/2
t

= t2 − 2t5/2 + t7/2 + t2 dt = − +
0 2 2 6 7 3 0
25
= .
42
Acabamos de observar que no exemplo acima, que o valor da integral é o mesmo
para duas parametrizações distintas da curva C2 . Este resultado vale em geral, e é
uma importante propriedade das integrais de linha. Mais precisamente, temos o
seguinte resultado:

Teorema 60. Sejam α(t), t ∈ [a, b], e β(t), t ∈ [c, d] parametrizações C 1 por partes
equivalentes e Cα e Cβ seus respectivos traços. Seja h : [c, d] → [a, b] bijeção de
classe C 1 tal que β(t) = (α ◦ h)(t). Se h preserva a orientação, então
Z

− Z


F · dr = F · dr,
Cα Cβ

e se h inverte a orientação, então


Z

− Z


F · dr = − F · dr.
Cα Cβ
Capítulo 3. Integrais de Linha 49

Demonstração. Observe que é suficiente provar o teorema no caso em que α e β


são de classe C 1 (consegue ver?).
Como β(t) = α(h(t)), temos que
Z

− Z d

− Z d


F · dr = F (β(t)) · β ′ (t)dt = F (α(h(t)) · (α(h(t))) dt =
Cβ c c
Z d


= F (α(h(t)) · α′ (h(t))h′ (t)dt.
c

Fazendo a substituição u = h(t) temos


Z

− Z h(d) →

F · dr = F (α(u)) · α′ (u)du =
Cβ h(c)

Z b

− →

 Z
F (α(u)) · α (u)du

= F · dr se α e β tem o mesmo sentido, ou





 a Cα
=
Z a

− →


 Z
F (α(u)) · α′ (u)du, = − se α e β tem sentidos opostos.

F · dr



b Cα

Observação 27 (Notação). Dada uma curva parametrizada C, escrevemos C −


para simbolizar a curva parametrizada com o mesmo traço de C porém orientada
no sentido oposto.

Como caso particular do teorema acima temos que, dada C curva parametrizada e


F um campo vetorial definido ao longo de C, vale
Z

− Z


F · dr = − F · dr.
C− C

Observação 28. De maneira similar ao resultado anterior, é possível mostrar que,


no caso da integral de linha de uma função escalar, vale
Z Z
f ds = f ds,
Cα Cβ

sempre que α e β são parametrizações C 1 por partes equivalentes da curva C (ou


seja, para funções escalares não temos a troca de sinal com a mudança de sentido
da parametrização).
Capítulo 3. Integrais de Linha 50

Como vimos anteriormente, a integral de linha de um campo vetorial, em geral


depende da curva que liga os pontos final e inicial. No entanto, para campos
conservativos, temos que a integral de linha depende apenas dos pontos final e
inicial da trajetória.


Com efeito, suponhamos que F seja um campo conservativo definido em uma região


Ω ⊂ R3 , isto é, existe uma função escalar f (x, y, z) tal que ∇f = F , para todo
(x, y, z) ∈ Ω. Além disso, seja C uma curva definida em Ω, com parametrização
γ : [a, b] → R3 , tal que seu ponto inicial é o ponto γ(a) = A, e o ponto final é o
ponto γ(b) = B. Nesse caso temos
Z

− Z Z b
F · dr = ∇f · dr = ∇f (γ(t)) · γ ′ (t)dt
C C a
Z b
= (f (γ(t)))′ dt = f (γ(b)) − f (g(a))
a

= f (B) − f (A),

onde a passagem da primeira para a segunda linha é consequência da regra da


cadeia, e a igualdade na segunda linha é consequência do teorema fundamental do
cálculo.
Dessa forma, a conta acima demonstra o seguinte resultado, que pode ser considerado
uma versão vetorial para o teorema fundamental do cálculo:


Teorema 61. Seja F um campo conservativo contínuo, definido em um aberto
Ω ⊂ R3 . Se C é uma curva em Ω com ponto final B e inicial A, então
Z


F · dr = f (B) − f (A),
C


− →

onde f é a função potencial do campo F , isto é, ∇f = F .

Como consequência do teorema acima temos os seguintes corolários:

Corolário 62. Nas condições do teorema acima temos


I


F · dr = 0,
C

para toda curva C fechada e contida em Ω.


Capítulo 3. Integrais de Linha 51

Corolário 63. Nas condições do teorema acima temos que, se C1 e C2 são duas
curvas com os mesmos pontos final e inicial, então vale
Z

− Z


F · dr = F · dr.
C1 C2

Observação 29. Como consequência do teorema 61, temos três maneiras distintas
de calcular a integral de linha de um campo conservativo ao longo de uma curva C:

(a) Podemos calcular a integral de linha diretamente pela definição;

(b) Podemos substituir a curva C por uma curva que tenha os mesmos pontos
pontos final e inicial, na qual a integral seja mais fácil de ser calculada;

(c) Podemos calcular a integral através da diferença da função potencial do campo


nos pontos final e inicial da trajetória.

Uma vez que todas essas possibilidades invariavelmente envolvem o cálculo de


integrais, nenhuma delas é necessariamente melhor do que a outra em geral, e
portanto a melhor maneira de abordar o problema deve ser avaliada caso a caso.


Z 64. Seja F (x, y) = (e − 2x, −xe − seny) um campo gradiente.
−y −y
Exemplo


Calcule F · dr, onde C é qualquer curva C 1 por partes ligando A(π, 0) e B(0, π).
C



Solução. Como já sabemos pelo enunciado que F é gradiente vamos tentar calcular


o seu potencial. Seja f uma função escalar tal que ∇f = F . Nesse caso temos
∂f
= e−y − 2x
∂x
∂f
= −xe−y − seny.
∂y
Integrando a primeira equação com relação à variável x e a segunda com relação à
variável y obtemos

f (x, y) = xe−y − x2 + C1 (y)


f (x, y) = xe−y + cos y + C2 (x).
Capítulo 3. Integrais de Linha 52

Comparando as equações acima temos que, fazendo C1 (y) = cos y e C2 (x) = −x2 ,


uma função potencial para F é dada por

f (x, y) = xe−y − x2 + cos y.




Como F é contínuo, pelo teorema 61 temos que
Z


F · dr = f (0, π) − f (π, 0) = cos π − (π − π 2 + 1) = π 2 − π − 2.
C



Exemplo 65. Calcule o trabalho realizado pela força F (x, y) para deslocar uma
partícula do ponto A(0, 0) ao ponto B(1, 1) ao longo da curva y = x5 , onde

−  2 2

F (x, y) = (y + 2x2 y)ex +y + x cos x2 , (x + xy)ex +y + y 4 .


− →
− →

Solução. Como F está definido em todo o R2 e rot F = 0 , (calcule!) temos que

− →

F é conservativo, mas nesse caso, o calculo do potencial de F é não trivial, uma
vez que envolve integrais que não podem ser expressadas por funções elementares.
Portanto vamos prosseguir de maneira diferente ao exemplo anterior.
Seja C1 o trecho da curva y = x5 que liga os pontos (0, 0) e (1, 1), e sejam

C2 = reta que liga (0, 0) a (1, 0)


C3 = reta que liga (1, 0) a (1, 1).


Como a curva C2 ∪ C3 tem os mesmos pontos final e inicial da curva C1 , e como F
é conservativo, o corolário 63 nos diz que
Z

− Z

− Z


F · dr = F · dr + F · dr. (3.2)
C1 C2 C3

Consideremos as seguintes parametrizações para C2 e C3 :

C2 : γ2 (t) = (t, 0), t ∈ [0, 1]


C3 : γ3 (t) = (1, t), t ∈ [0, 1].

Dessa forma temos


Z

− Z 1

− Z 1
sen1
F · dr = F (t, 0) · (1, 0)dt = t cos t2 dt = , (3.3)
C2 0 0 2
Capítulo 3. Integrais de Linha 53

Figura 24

e
Z

− Z 1

− Z 1
1
F · dr = F (1, t) · (0, 1)dt = (1 + t)e1+t + t4 dt = e2 + . (3.4)
C3 0 0 5

Substituindo (3.3) e (3.4) em (3.2) obtemos


Z

− Z

− Z

− sen1 1
F · dr = F · dr + F · dr. = e2 + + .
C1 C2 C3 2 5

Exemplo 66. Seja C a fronteira do quadrado cujos vértices são (0, 0), (1, 0), (1, 1)
e (0, 1) orientada no sentido anti-horário. Calcule
Z
x2 dx + xydy.
C



Solução. Observe que o campo acima não é conservativo, uma vez que rot F =

− →

y k ̸= 0 , e portanto precisamos calcular a integral diretamente. Temos que
C = 4i=1 Ci onde, para i = 1, . . . , 4, as curvas Ci podem ser parametrizadas por
S

C1 : γ1 (t) = (t, 0), t ∈ [0, 1];


C2 : γ2 (t) = (1, t), t ∈ [0, 1];
C3 : γ3 (t) = (−t, 1), t ∈ [−1, 0];
C4 : γ4 (t) = (0, −t), t ∈ [−1, 0].
Capítulo 3. Integrais de Linha 54

Temos então
Z Z 1
1
Z 1
x dx + xydy =
2
(t , 0) · (1, 0)dt =
2
t2 dt = ,
C1 0 0 3
Z Z 1 Z 1
1
x2 dx + xydy = (1, t) · (0, 1)dt = tdt = ,
C2 0 0 2
Z Z 0 Z 1
1
x2 dx + xydy = (t2 , −t) · (−1, 0)dt = −t2 dt = − ,
C3 −1 0 3
Z Z 0
x2 dx + xydy = (0, 0) · (0, −1)dt = 0.
C4 −1

Logo,
Z 4 Z
1 1 1 1
x2 dx + xydy = x2 dx + xydy = + − +0= .
X
C i=1 Ci 3 2 3 2

Figura 25

3.3 Teorema de Green


O teorema de Green relaciona uma integral de linha ao longo de uma curva fechada
C no plano xy, com uma integral dupla na região limitada por C, e em certo sentido,
é uma generalização do teorema fundamental do cálculo para regiões planas. Além
disso, também pode ser visto como uma versão plana do teorema de Stokes, o
teorema mais importante da análise vetorial.
Antes de enunciá-lo vamos estabelecer algumas definições importantes.
Capítulo 3. Integrais de Linha 55

Definição 67. Dizemos que uma região D compacta do plano é simples se D


pode ser escrita como região dos tipos I e II simultaneamente.

(a) Região vista como tipo I. (b) Região vista como tipo II.

Figura 26

Definição 68. Dizemos que a fronteira ∂D da região D está orientada positiva-


mente, se a região D fica à esquerda ao percorrermos a fronteira de D.

Figura 27 – Regiões orientadas positivamente.

Observação 30. No caso de regiões anelares, a curva da fronteira que delimita a


parte interna do anel deverá estar orientada de maneira oposta à curva que delimita
a parte externa.

Teorema 69 (Teorema de Green). Seja D uma região compacta do plano xy


cuja fronteira está orientada positivamente, e é parametrizada por uma função


C 1 por partes, de modo que ∂D seja percorrida apenas uma vez. Se F (x, y) =
(F1 (x, y), F2 (x, y)) é um campo vetorial de classe C 1 , definido em um subconjunto
aberto que contém D, então
I

− Z Z
∂F2 ∂F1
F · dr = − dA. (3.5)
∂D D ∂x ∂y
Capítulo 3. Integrais de Linha 56

Demonstração. Vamos supor inicialmente que D é uma região simples, isto é,

D = {(x, y) ∈ R3 ; a ≤ x ≤ b; u1 (x) ≤ y ≤ u2 (x)} (3.6)


D = {(x, y) ∈ R3 ; c ≤ y ≤ d; v1 (y) ≤ x ≤ v2 (y)}. (3.7)

Como Z Z
∂F2 ∂F1 Z Z
∂F2 Z Z
∂F1
− dA = dA − dA,
D ∂x ∂y D ∂x D ∂y

vamos calcular cada integral separadamente. Por (3.7) temos que ∂D = C1− ∪ C2 ,
onde C1 e C2 podem ser parametrizadas por

C1 : γ1 (t) = (v1 (t), t), t ∈ [c, d]


C2 : γ2 (t) = (v2 (t), t), t ∈ [c, d],

Figura 28

cujas derivadas são γ1′ (t) = (v1′ (t), 1) e γ2′ (t) = (v2′ (t), 1). Assim, por um lado temos

Z d Z v2 (y) Z d
Z Z
∂F2 ∂F2
dA = dxdy = F2 (v2 (y), y) − F2 (v1 (y), y)dy, (3.8)
D ∂x c v1 (y) ∂x c
Capítulo 3. Integrais de Linha 57

e por outro lado


I Z Z Z Z Z
F2 dy = F2 dy = F2 dy + F2 dy = F2 dy − F2 dy
∂D C1− ∪C2 C2 C1− C2 C1
Z d Z d
= (0, F2 (γ2 (t))) · γ2′ (t)dt − (0, F2 (γ1 (t))) · γ1′ (t)dt
c c
Z d Z d
= (0, F2 (γ2 (t))) · γ2′ (t)dt − (0, F2 (γ1 (t))) · γ1′ (t)dt
c c
Z d Z d
= (0, F2 (v2 (t), t)) · (v2′ (t), 1)dt − (0, F2 (v1 (t), t)) · (v1′ (t), 1)dt
c c
Z d
= F2 (v2 (t), t) − F2 (v1 (t), t)dt. (3.9)
c

Comparando (3.8) e (3.9) obtemos


Z Z
∂F2 I
dA = F2 dy. (3.10)
D ∂x ∂D

Analogamente, usando (3.6), é possível mostrar que


Z Z
∂F1 I
− dA = F1 dx. (3.11)
D ∂y ∂D

Somando (3.10) e (3.11) obtemos o teorema de Green para regiões simples. No caso
em que D não é uma região simples, podemos a decompor em uma união finita
de regiões simples, isto é, escrevemos D = D1 ∪ D2 ∪ . . . ∪ Dn , onde cada Dk tem
fronteiras ∂Dk C 1 por partes.
Aplicando o teorema de Green em cada região obtemos
I

− Z Z
∂F2 ∂F1
F · dr = − dA,
∂Dk Dk ∂x ∂y
e consequentemente,
n Z Z n I
Z Z
∂F2 ∂F1 ∂F2 ∂F1 →

dA = dA =
X X
− − F · dr.
D ∂x ∂y k=1 Dk ∂x ∂y k=1 ∂Dk

Como as partes de cada ∂Dk que não fazem parte de ∂D são percorridas duas vezes
em sentidos opostos, temos
n I

− I
F · dr = F1 dx + F2 dy,
X

k=1 ∂Dk ∂D

e o teorema está demonstrado.


Capítulo 3. Integrais de Linha 58

Figura 29 – Região D decomposta em regiões simples.

Observação 31. Como


!

− ∂F2 ∂F1 →

rot F = − k,
∂x ∂y
− →
→ −
fazendo o produto escalar rot F · k obtemos
∂F2 ∂F1 − →
→ −
− = rot F · k ,
∂x ∂y
e portanto, a equação (3.5) do teorema de Green pode ser reescrita como
I

− Z Z
− →
→ −
F · dr = rot F · k dA. (3.12)
∂D D

Exemplo 70. Lembremos o seguinte exemplo da seção anterior:


Seja C a fronteira do quadrado cujos vértices são (0 , 0 ), (1 , 0 ), (1 , 1 ) e (0 , 1 )
orientada no sentido anti-horário. Calcule
Z
x 2 dx + xydy.
C



Solução. Como C é uma curva C 1 por partes e F = (F1 , F2 ) = (x2 , xy) é de classe


C 1 em R2 , (em particular F é de classe C 1 em C e na região limitada por C), pelo
teorema de Green temos
Z Z Z
∂F2 ∂F1
x dx + xydy =
2
− dA,
C D ∂x ∂y
Capítulo 3. Integrais de Linha 59

onde D é o quadrado limitado por C. Calculando os termos obtemos


∂F2 ∂F1
= y, e = 0,
∂x ∂y
e portanto
∂F2 ∂F1
− = y.
∂x ∂y
Além disso, como D = [0, 1] × [0, 1], temos
Z 1 2 1
Z Z 1Z 1
y 1Z 1 1
x dx + xydy =
2
ydydx = dx = dx = .
C 0 0 0 2 0
2 0 2

Exemplo 71. Calcule o trabalho realizado ao se mover um objeto ao longo da


circunferência x2 + y 2 = a2 , a > 0, no sentido anti-horário, se o movimento foi
causado pelo campo

−  
F (x, y) = senx − y, ey − x2 .

Solução. Seja C a circunferência x2 + y 2 = a2 , a > 0. C é uma curva suave que




limita uma região D compacta. Além disso, F é de classe C 1 em D, logo podemos
aplicar o teorema de Green à região limitada por C. Como
∂F2 ∂F1
= −2x, e = −1,
∂x ∂y

e como a região D pode ser escrita em coordenadas polares como

D = {(r, θ) ∈ R2 ; 0 ≤ r ≤ a, 0 ≤ θ ≤ 2π},

segue do teorema de Green que


Z

− Z Z Z 2π Z a
F · dr = −2x + 1dA = (−2r cos θ + 1) rdrdθ
C D 0 0
a
Z 2π r 2 2r3 Z 2π 2
a 2a3
= − cos θ dθ = − cos θdθ

0 2 3
0 0 2 3
#2π
2a3
"
a2
= θ− senθ
2 3 0

= πa 2
Capítulo 3. Integrais de Linha 60

Em alguns casos podemos usar o teorema de Green para calcular a integral de


linha em curvas abertas, usando curvas auxiliares para "fechar" a curva original.

Exemplo 72. Calcule


Z
ex senydx + (ex cos y + x)dy,
C

onde C é o arco de x2 + y 2 = 1 no 1º quadrante no sentido anti-horário.



Solução. Primeiramente observe que F é de classe C 1 em R2 . Seja C̄ = C ∪C1− ∪C2 ,
onde C1 é o segmento de reta parametrizado por γ1 (t) = (0, t), t ∈ [0, 1] e C2 o
segmento de reta parametrizado por γ2 (t) = (0, t) ∈ [0, 1]. C̄ é uma curva fechada
C 1 por partes, logo vale o teorema de Green, ou seja
I

− Z Z
∂F2 ∂F1
F · dr = − dA, (3.13)
C̄ D ∂x ∂y

onde D é o quarto de círculo limitado por C̄. Calculando os termos obtemos


∂F2 ∂F1
− = 1,
∂x ∂y
e portanto Z Z
∂F2 ∂F1 Z Z
π
− dA = 1dA = área(D) = . (3.14)
D ∂x ∂y D 4
Por outro lado
I

− Z

− Z

− Z


F · dr = F · dr + −
F · dr + F · dr. (3.15)
C̄ C C1 C2

Substituindo (3.14) e (3.15) em (3.13) obtemos


Z

− π Z → − Z


F · dr = − − F · dr − F · dr. (3.16)
C 4 C1 C2

Calculando as integrais auxiliares obtemos


Z

− Z

− Z 1



F · dr = − F · dr = − F (0, t) · (0, 1)dt
C1 C1 0
Z 1
=− cos(t)dt = − sen1, (3.17)
0
Capítulo 3. Integrais de Linha 61

Figura 30 – Região limitada por C ∪ C1 ∪ C2 .

Z

− Z 1


F · dr = F (t, 0) · (1, 0)dt = 0. (3.18)
C2 0

Substituindo (3.17) e (3.18) em (3.16) concluímos


Z

− π
F · dr = − sen1.
C 4

Também podemos, com o auxílio de curva(s) auxiliar(es), usar o teorema de Green


para calcular a integral de linha ao longo de uma curva fechada que delimita uma


região na qual o campo F não está bem definido.

Exemplo 73. Calcule a integral de linha do campo vetorial


!

− y x
F (x, y) = − , 2 + 2x ,
x + y x + y2
2 2

x2 y 2
ao longo da curva C de equação + = 1 no sentido anti-horário.
4 9


Solução. Note que, apesar de C ser uma curva fechada de classe C 1 , o campo F
não está definido na região limitada por C, logo não podemos aplicar o teorema de
Capítulo 3. Integrais de Linha 62

Green. Além disso, a integral também é complicada de ser calculada diretamente.


Vamos considerar então a seguinte curva auxiliar:

C2 : γ2 (t) = (cos t, sent), t ∈ [0, 2π].




Note que F é de classe C 1 na região D limitada por C ∪ C2− , portanto nessa região
podemos aplicar o teorema de Green, isto é,
Z Z
∂F2 ∂F1 Z

− Z

− Z


− dA = F · dr = F · dr + F · dr,
D ∂x ∂y C∪C2− C C2−
Z

− Z


= F · dr − F · dr,
C C2

o que implica
Z

− Z Z
∂F2 ∂F1 Z


F · dr = − dA + F · dr. (3.19)
C D ∂x ∂y C2

Calculando os termos obtemos


∂F2 ∂F1
− = 2,
∂x ∂y
e portanto
Z Z
∂F2 ∂F1 Z Z
− dA = 2dA = 2 · área(D)
D ∂x ∂y D

= 2 · (área da Elipse − área do círculo)


= 2(6π − π) = 10π. (3.20)

Por outro lado


Z

− Z 2π →

F · dr = F (cos t, sent) · (− sent, cos t)dt
c2 0
Z 2π Z 2π
= (− sent, 3 cos t) · (− sent, cos t)dt = 1 + 2 cos2 tdt
0 0

Z 2π
sen2t
= 2 + cos 2tdt = 2t +
2 0

0

= 4π (3.21)

Substituindo (3.20) e (3.21) em (3.19) obtemos


Z


F · dr = 10π + 4π = 14π. (3.22)
C
Capítulo 3. Integrais de Linha 63

Figura 31 – Região limitada por C ∪ C2 .

3.3.1 Interpretação Física


Seja C uma curva orientada parametrizada por γ(t) = (x(t), y(t)), t ∈ [a, b]. Nesse


caso, o vetor tangente unitário T é dado por
γ ′ (t) x′ (t) y ′ (t)
!


T = ′ = , ,
||γ (t)|| ||γ ′ (t)|| ||γ ′ (t)||
e o vetor
y ′ (t) x′ (t)
!


N = , − ,
||γ ′ (t)|| ||γ ′ (t)||
é chamado vetor normal unitário.


Agora, seja F um campo vetorial agindo sobre uma partícula que se move ao longo


de C. Vimos que a integral de linha de F ao longo de C é dada por
Z


F · dr.
C


e pode ser interpretada como o trabalho que a força F exerce sobre a partícula ao
longo de seu movimento.
Um ponto relevante sobre o cálculo do trabalho de uma força sobre uma partícula
em movimento é que o trabalho é calculado sobre a componente da força
que atua na direção do movimento.
Capítulo 3. Integrais de Linha 64

Assim, por exemplo, se uma partícula se move ortogonalmente a um campo de




forças, então o campo não atua no movimento, e portanto o trabalho de F é zero.
Com efeito, observe que
Z

− Z b

− Z b

− →

W = F · dr = F (γ(t)) · γ (t)dt =

F (γ(t)) · T ||γ ′ (t)|||dt
C Za a

− → −
= F · T ds,
C

− → − →

onde F · T é exatamente a componente do campo F tangente à C, pois

− →
− →
− →− → − →− →−
F = F · T T + F · N N.

Figura 32 – Decomposição de F⃗ em componentes tangente e normal à curva C.

Quando C é uma curva simples, fechada e orientável, a integral de linha


I


F · dr,
C

indica o quanto o campo tende a circular ao longo da curva C na direção da


orientação, isto é
I

− →

F · dr = circulação de F ao longo de C.
C

O teorema de Green permite o cálculo da circulação do campo usando uma integral


dupla na região interior de C em substituição ao cálculo direto da integral de linha.
Pela observação 31, temos que a função a ser integrada no interior de C é dada por
− →
→ −
rot F · k .
Como observado no capítulo anterior, o rotacional é dado pela soma das velocidades
angulares em um determinado instante, e portanto, em um certo sentido, o rotacional


nos dá a circulação infinitesimal de F . Dessa forma, a integral dupla
Z Z
− →
→ −
rot F · k dA,
D
Capítulo 3. Integrais de Linha 65

é a soma das circulações infinitesimais da região D.

Figura 33

Assim, podemos considerar que o lado esquerdo do teorema de Green é a circulação




macroscópica de F ao longo da fronteira, enquanto o lado direito é a soma das
circulações microscópicas infinitesimais, ou seja, o teorema de Green nos diz que

Circulação Macroscópica = Soma das circulações microscópicas. (3.23)

Observação 32. O sinal da integral de linha (isto é, da circulação) varia de acordo




com a comparação entre a orientação de C e o fluxo de F .



Por exemplo, seja F (x, y) = (y, −x) e C a elipse

x2 y 2
+ = 1,
9 25
orientada no sentido anti-horário.
Observe que no gráfico o campo parece circular no sentido horário, apontando na
direção oposta da curva. Assim é de se esperar que a circulação nesse caso seja
negativa.
De fato, parametrizando C como γ(t) = (3 cos t, 5 sent), e integrando obtemos
Z

− Z 2π →

F · dr = F (3 cos t, 5 sent) · (−3 sent, 5 cos t)dt
C 0
Z 2π
= (5 sent, −3 cos t) · (−3 sent, 5 cos t)dt
0
Z 2π
= −15dt = −30π.
0

Em alguns casos a circulação não é tão imediata. Por exemplo, considere o campo


F (x, y) = (−y, 0), e C o círculo de centro na origem e raio 1. Nesse caso, a princípio
Capítulo 3. Integrais de Linha 66

Figura 34 – Curva C e campo F⃗ = (y, −x)

o sinal da circulação não é imediato, uma vez que que existe uma variação maior
na relação entre a direção da curva e a direção do campo.
No entanto, examinando com cuidado a componente tangencial do campo, é possível
verificar que, na maioria dos pontos, a sua componente tangencial se alinha no
mesmo sentido da tangente da curva C.

Figura 35 – A componente tangencial de F⃗ tem o mesmo sentido do vetor tangente


γ ′ na maior parte do percurso
Capítulo 3. Integrais de Linha 67

Assim, calculando a integral de linha temos


Z

− Z 2π →

F · dr = F (cos t, sent) · (− sent, cos t)dt
C 0
Z 2π
= (− sent, 0) · (− sent, cos t)dt
0
Z 2π Z 2π
1 − cos 2t
= sin tdt =
2
dt
0 0 2
= π,

que é o resultado de sinal positivo que esperávamos.

3.3.2 Interpretação Vetorial


Seja D região compacta com fronteira ∂D, tal que ∂D esteja orientada no sentido
anti-horário, com parametrização C 1 dada por γ(t) = (x(t), y(t)), t ∈ [a, b], e vetor
tangente não nulo em cada ponto.


Se F = (F1 , F2 ) é de classe C 1 em um aberto que contém D, então
ds
I

− Z b

− Z b

− γ ′ (t) z ′ }| {
F · dr = F (γ(t)) · γ ′ (t)dt = F (γ(t)) · ′ ||γ (t)||dt
∂D a a ||γ (t)||
I

− → −
= F · T ds.
∂D

Assim, o teorema de Green toma a forma


I

− → − Z Z
− →
→ −
F · T ds = rot F · k dA,
∂D D

chamada forma vetorial ou teorema de Stokes no plano. Considerando o




campo G = (−F2 , F1 ) temos
ds
I

− Z b

− Z b

− →
− z }| {
G · dr = G (γ(t)) · γ ′ (t)dt = F (γ(t)) · N ||γ ′ (t)||dt
∂D Ia a

− → −
= F · N ds.
∂D



Aplicando o teorema de Green em G temos
I

− → − Z Z
∂F1 ∂F2
F · N ds = + dA,
∂D D ∂x ∂y
Capítulo 3. Integrais de Linha 68

que pode ser escrito como


I

− → − Z Z


F · N ds = div F dA,
∂D D

que é a versão em duas dimensões do teorema de Gauss, que veremos posteriormente.

3.3.3 Campos vetoriais conservativos no plano


Anteriormente definimos os campos conservativos, e vimos que para esses campos a
integral de linha ao longo de uma curva C depende apenas dos pontos final e inicial
da trajetória. O teorema a seguir utiliza o teorema de Green para caracterizar
totalmente os campos vetoriais do plano que são campos gradientes:


Teorema 74. Seja F = (F1 , F2 ) um campo vetorial definido em um domínio
simplesmente conexo 1 U ⊂ R2 . As seguintes afirmações são equivalentes:
I


(i) F · dr = 0, para toda curva fechada C 1 por partes contida em U .


(ii) A integral de linha de F do ponto A até B independe da curva C 1 por partes
contida em U que liga A até B.


(iii) F é campo gradiente de alguma função potencial f .
∂F2 ∂F2
(iv) = .
∂x ∂y

− →

(v) rot F = 0 .

Demonstração. A demonstração completa pode ser encontrada no livro-texto.


π →

  Z
Exemplo 75. Considere a curva γ(t) = e t−1
, sen , t ∈ [1, 2]. Calcule F · dr,
t C


onde F = (2x cos y, −x2 seny).
1
Um subconjunto aberto U ⊂ Rn é dito um domínio se dois pontos quaisquer de U podem ser
ligados por uma poligonal totalmente contida em U . Um subconjunto aberto U ⊂ R2 é dito
simplesmente conexo se, para toda curva fechada C em U , a região limitada por C está
totalmente contida em U . Intuitivamente, um aberto U é simplesmente conexo se não tem
"buracos".
Capítulo 3. Integrais de Linha 69



Solução. O campo F é de classe C 1 em R2 . Além disso, como


rot F = −2x seny + 2x seny = 0,


pelo teorema 74, temos que a integral de F independe do caminho. Como γ(1) =
(1, 0) e γ(2) = (e, 1) Podemos então substituir a curva C pela união dos segmentos
de reta

C1 : γ1 (t) = (t, 0) t ∈ [1, e]


C2 : γ2 (t) = (e, t) t ∈ [0, 1].

Temos então
Z

− Z

− Z

− Z e Z 1
F · dr = F · dr + F · dr = F1 (t, 0)dt + F2 (e, t)dt
C C1 C2 1 0
Z e Z 1 e 1

= 2tdt − e2 sentdt = 2
t + e cos t
2
1 0
1

0

= e cos 1 − 1.
2

Alternativamente, o cálculo da integral pode ser feito através da função potencial



− →

do campo F . Com efeito, temos F = ∇f , onde f (x, y) = x2 cos y, e portanto
Z


F · dr = f (e, 1) − f (1, 0) = e2 cos 1 − 1.
C

Figura 36 – Caminhos C e C1 ∪ C2 ligando os pontos (1, 0) e (e, 1).

!

− −y x
Exemplo 76. Considere o campo F = , 2 .
x + y x + y2
2 2
Capítulo 3. Integrais de Linha 70

Z


(a) Calcule F · dr ao longo de qualquer curva fechada C que envolve a origem
C
no sentido anti-horário.
Z (2,1)


(b) Calcule F · dr ao longo de y = (x − 1)2 .
(1,0)


− →
− →

Solução. (a) Apesar de rot F = 0 , como o campo F não está definido na
origem, o teorema 74 não pode ser aplicado na região delimitada por C. No


entanto, como F é de classe C 1 em R2 \ {(0, 0)}, podemos aplicar o teorema
de Green na região anelar limitada por C ∪ C1− , onde C1 é um círculo de raio
a > 0 centrado na origem contido na região limitada por C. Nesse caso temos
Z

− Z Z
− →
→ −

F · dr = rot F · k dA = 0,
C∪C1 D

o que implica Z

− Z

− Z


F · dr = − −
F · dr = F · dr.
C C1 C1

Como C1 pode ser parametrizada por γ1 (t) = (a cos t, a sent), t ∈ [0, 2π],
temos
Z

− Z

− Z 2π →

F · dr = F · dr = F (γ(t)) · γ ′ (t)dt
C C1 0
Z 2π 
−a sent a cos t

= , · (−a sent, a cos t)dt
0 a2 a2
Z 2π
= dt = 2π
0



(b) Apesar do campo F não ser de classe C 1 em R2 , ele o é em uma região
simplesmente conexa que contém a curva C. Portanto, pelo teorema 74, temos


que a integral de F independe do caminho. Podemos então substituir a curva
C pela união dos segmentos de reta

C1 : γ1 (t) = (t, 0) t ∈ [1, 2]


C2 : γ2 (t) = (2, t) t ∈ [0, 1].
Capítulo 3. Integrais de Linha 71

Figura 37

Temos então
Z

− Z

− Z

− Z 2 Z 1
F · dr = F · dr + F · dr = F1 (t, 0)dt + F2 (2, t)dt
C C1 C2 1 0
1
Z 1
2 t
=0+ dt = arctg
0 4 + t2 2 0
1
= arctg .
2

Figura 38 – Caminhos C e C1 ∪ C2 ligando os pontos (1, 0) e (2, 1).


72

4 Integrais de Superfície

4.1 Superfícies Parametrizadas


No curso de cálculo de várias variáveis vimos maneiras para descrever superfícies
no R3 através de equações matemáticas. Mais especificamente, vimos que uma
superfície S pode ser descrita como sendo o conjuntos dos pontos

S = {(x, y, z) ∈ R3 ; f (x, y, z) = 0},

onde f (x, y, z) é uma função em três variáveis.


Assim, por exemplo, vimos que a esfera de centro na origem e raio um pode ser
representada pelo conjunto dos pontos do R3 que satisfazem a equação x2 +y 2 +z 2 =
1.
No entanto existem outras maneiras de descrever superfícies no R3 . Da mesma forma
como representamos as curvas (objetos unidimensionais) através de uma função
vetorial à um parâmetro, podemos generalizar essa ideia para representar superfícies
(objetos bidimensionais) como funções vetoriais à dois parâmetros. Temos então a
seguinte definição:

Definição 77. Seja φ : D ⊂ R2 → R3 uma função definida em um subconjunto D ⊂


R2 . A imagem φ(D) é dita uma superfície parametrizada, e sua representação
paramétrica é dada por

φ(u, v) = (x(u, v), y(u, v), z(u, v)) , (u, v) ∈ D.

Observação 33. Por conveniência é comum se referir a φ como sendo a superfície


parametrizada φ(D).

Exemplo 78. A função φ : R2 → R2 dada por

φ(u, v) = (0, 2, 1) + u(1, −1, 0) + v(2, 0, 1), u, v ∈ R.

é uma parametrização do plano em R3 , passando pelo ponto (0, 2, 1) e paralelo aos


vetores (1, −1, 0) e (2, 0, 1) (ver figura 2).
Capítulo 4. Integrais de Superfície 73

Figura 39 – Superfície parametrizada φ(D).

Figura 40 – Plano passando pelo ponto (0, 2, 1) e paralelo aos vetores (1, −1, 0) e
(2, 0, 1).

Exemplo 79. Seja φ : D ⊂ R2 → R3 dada por

φ(u, v) = (x(u, v), y(u, v), z(u, v)) ,

onde 




x(u, v) = cos u

y(u, v) = senu
z(u, v) = v,


e
D = {(u, v) ∈ R2 ; 0 ≤ u ≤ 2π e 0 ≤ v ≤ 1}.

Nesse caso, a imagem de φ é um cilindro circular reto de altura um, em torno do


eixo z e com base no plano xy (note que, como x = cos u e y = senu, as funções
Capítulo 4. Integrais de Superfície 74

coordenadas de φ satisfazem x2 + y 2 = 1, 0 ≤ z ≤ 1).

Figura 41 – Cilindro x2 + y 2 = 1 com 0 ≤ z ≤ 1.

Existem muitos paralelos entre a parametrização de curvas e a parametrização de


superfícies. Observe o exemplo abaixo:

Exemplo 80. Determine uma representação paramétrica para o paraboloide elíptico

x2 y 2
z= + .
4 9

Solução. Se tomarmos x e y como parâmetros, obtemos a seguinte representação


paramétrica para o paraboloide:
!
x2 y 2
φ1 (x, y) = x, y, + , x, y ∈ R.
4 9

Assim como aconteciam com as curvas que eram também gráficos de funções de
uma variável, em geral, dada uma superfície gráfico de uma função z = f (x, y),
(x, y) ∈ D ⊂ R2 , ela sempre pode ser parametrizada naturalmente como

φ2 (x, y) = (x, y, f (x, y)) , (x, y) ∈ D. (4.1)


Capítulo 4. Integrais de Superfície 75

Essa parametrização no entanto não é única. Observe que, por exemplo, a função
φ dada por
 
φ2 (u, v) = 2v cos(u), 3v sen(u), v 2 , 0 ≤ v, u ∈ [0, 2π],

é tal que
x2 y 2 (2v cos(u))2 (3v sen(u))2
+ = + = v 2 = z,
4 9 4 9
ou seja, φ2 também é parametrização do paraboloide

x2 y 2
z= + .
4 9

x2 y 2
Figura 42 – Paraboloide elíptico z = + .
4 9

Exemplo 81 (Superfícies de Revolução). Seja S ⊂ R3 a superfície obtida ao


girarmos uma curva regular plana C do plano xz em torno do eixo z. Suponhamos
que C tenha a seguinte parametrização:

γ(v) = (f (v), 0, g(v)) , v ∈ [a, b].

Se u é ângulo de rotação em torno do eixo z, então a aplicação

φ(u, v) = (f (v) cos u, f (v) senu, g(v)) a ≤ v ≤ b e 0 ≤ u ≤ 2π,

é uma parametrização da superfície S (ver figura 5).

Exemplo 82. Parametrize a esfera S : x2 + y 2 + z 2 = r2 , r > 0.


Capítulo 4. Integrais de Superfície 76

Figura 43 – Superfície de revolução parametrizada.

Solução. Considere o semicírculo C do plano xz parametrizado por

γ(φ) = (r senφ, 0, r cos φ) , 0 ≤ φ ≤ π.

A esfera x2 + y 2 + z 2 = r2 pode ser obtida rotacionando C em torno do eixo z.


Assim, se θ é o ângulo de rotação de C em torno do eixo z, temos que

X(φ, θ) = (r senφ cos θ, r senφ senθ, r cos φ) , φ ∈ [0, π], θ ∈ [0, 2π],

é uma parametrização de S.

Observação 34. A parametrização da esfera como superfície de revolução usa


como parâmetros os ângulos φ e θ das coordenadas esféricas do R3 .

Exemplo 83 (O Toro). Um toro T é a superfície gerada pela rotação de um


círculo de raio r em torno de uma reta pertencente ao plano do círculo, e a uma
distância a > r do centro do círculo.

Seja C o círculo de raio r do plano yz centrado no ponto (0, a, 0). Nesse caso, a
equação de C é dada por (y − a)2 + z 2 = r2 , e a curva pode ser parametrizado por

γ(t) = (0, a + r cos t, r sent) , 0 ≤ t ≤ 2π.


Capítulo 4. Integrais de Superfície 77

Figura 44 – Esfera parametrizada como superfície de revolução.

Portanto, usando o exemplo 81, temos que o toro T obtido rotacionando C em


torno do eixo z pode ser parametrizado por

φ(t, θ) = ((a + r cos t) cos θ, (a + r cos t) senθ, r sent) , t ∈ [0, 2π], θ ∈ [0, 2π].

Figura 45 – O toro de revolução T .


Capítulo 4. Integrais de Superfície 78

4.1.1 Plano tangente e vetor normal

Definição 84. A função φ é dita diferenciável (respectivamente de classe C r ) se


x(u, v), y(u, v) e z(u, v) são funções diferenciáveis (respectivamente de classe C r ).

Seja S uma superfície diferenciável parametrizada por

φ(u, v) = (x(u, v), y(u, v), z(u, v)) , (u, v) ∈ D.

Fixando u = u0 obtemos uma função vetorial

I ⊂ R → R3
t 7−→ φ(u0 , v),

que define uma curva na superfície S. Nesse caso, se o vetor


!
∂φ ∂x ∂y ∂z
φv (u0 , v0 ) = (u0 , v0 ) = (u0 , v0 ), (u0 , v0 ), (u0 , v0 ) ,
∂v ∂v ∂v ∂v

∂φ
é não nulo, então (u0 , v0 ) é um vetor tangente à esta curva no ponto (x0 , y0 ).
∂v
Analogamente, fixado v = v0 , a função

I ⊂ R → R3
t 7−→ φ(u, v0 ),

define uma curva na superfície S tal que, se


!
∂φ ∂x ∂y ∂z →

φu (u0 , v0 ) = (u0 , v0 ) = (u0 , v0 ), (u0 , v0 ), (u0 , v0 ) ̸= 0 ,
∂u ∂u ∂v ∂u

∂φ
então (u0 , v0 ) é um vetor tangente à esta curva no ponto (x0 , y0 ).
∂u
Quando o vetor

− ∂φ ∂φ
N (u0 , v0 ) = (u0 , v0 ) × (u0 , v0 ),
∂u ∂v

− ∂φ
é não nulo temos que N (u0 , v0 ) é normal ao plano gerado pelos vetores (u0 , v0 )
∂u
∂φ
e (u0 , v0 ). Isso nos leva a seguinte definição:
∂v
Capítulo 4. Integrais de Superfície 79

Figura 46 – Curvas φ(u, v0 ) e φ(u0 , v).

Definição 85. Seja S uma superfície com parametrização φ : D ⊂ R2 → R3 .


Suponhamos φu e φv contínuas em (u0 , v0 ) ∈ D. Se

− →

N = φu (u0 , v0 ) × φv (u0 , v0 ) ̸= 0 ,

dizemos que S é regular em φ(u0 , v0 ) ∈ S. Neste caso, definimos o plano tangente


à S em φ(u0 , v0 ) = (x0 , y0 , z0 ) como sendo o plano gerado pelos vetores φu (u0 , v0 )
e φv (u0 , v0 ), cuja equação é dada por


N (u0 , v0 ) · (x − x0 , y − y0 , z − z0 ) = 0.

ou
(x, y, z) = (x0 , y0 , z0 ) + sφu (u0 , v0 ) + tφv (u0 , v0 ) s, t ∈ R.

Figura 47 – Plano tangente e vetor normal.


Capítulo 4. Integrais de Superfície 80

Uma superfície S é dita regular se é regular em todos os seus pontos. Intuitivamente,


uma superfície regular não apresenta "bicos", isto é, pontos onde o plano tangente
não está bem definido.

Exemplo 86. Dado D ∈ R2 , seja z = f (x, y) com (x, y) ∈ D, uma função de


várias variáveis. A superfície S gráfico de z pode ser parametrizado de maneira
natural pela função φ dada por

φ(x, y) = (x, y, f (x, y)) , (x, y) ∈ D.

Se f ∈ C 1 , então S é uma superfície regular.

De fato, como

φx (x, y) = (1, 0, fx (x, y))


φy (x, y) = (0, 1, fy (x, y)),

temos
 →
− →− →
− 
i j k
  →

φx (x, y) × φy (x, y) =  1 0 fx (x, y) = (−fx (x, y), −fy (x, y), 1) ̸= 0 ,
 

 
0 1 fy (x, y)

para todo (x, y) ∈ D. Nesse caso, o plano tangente à S em (x0 , y0 , f (x0 , y0 )) é dado
por
(−fx (x, y), −fy (x, y), 1) · (x − x0 , y − y0 , z − f (x0 , y0 )) = 0.

Observação 35. O plano tangente como calculado acima coincide com o plano
tangente ao gráfico de uma função z = f (x, y) definido no curso de cálculo de
várias variáveis.

Exemplo 87.

√ 2
Considere a superfície S do semicone z = x + y 2 . Essa superfície pode ser
parametrizada pela função
 q 
φ(x, y) = x, y, x2 + y 2 , (x, y) ∈ D,
Capítulo 4. Integrais de Superfície 81


mas com essa parametrização, S não é regular em (0, 0, 0), pois f (x, y) = x2 + y 2
não possui derivadas parciais em (x, y) = (0, 0). É razoável perguntar se existe uma
parametrização na qual S é regular em (0, 0, 0). Observe que S pode ser interpretada
como a superfície de revolução obtida rotacionando a reta x = z do plano xz em
torno do eixo y logo, pelo exemplo 81, temos que S pode ser parametrizada por

φ(x, y) = (t cos θ, t senθ, t) , t ≥ 0, θ ∈ [0, 2π],

mas nessa parametrização, S também não é regular em (0, 0, 0). Com efeito,
 →
− →
− →
− 

i j k 
φx (x, y) × φy (x, y) = 
 −t senθ t cos θ 0

 = (t cos θ, t senθ, −t) ,
 
cos θ senθ 1

que é nulo quando t = 0.


Figura 48 – Semicone z = x2 + y 2 .

Pergunta 88. É possível encontrar alguma parametrização na qual S seja regular


em (0, 0, 0)?

4.2 Área de Superfícies


O objetivo dessa seção é definir formalmente o conceito de área de uma superfície
e obter uma maneira efetiva de calcula-la. Aqui cabe a ressalva de que, embora
Capítulo 4. Integrais de Superfície 82

tenhamos um entendimento intuitivo do que seria a área de uma superfície, esse é


um conceito que precisa de uma definição. As ferramentas básicas de cálculo de
áreas que já estudamos referem-se a áreas de figuras planas, portanto o cálculo em
superfícies em geral é algo que ainda precisamos construir.

4.2.1 Motivação
O método que usaremos para motivar a definição da área de uma superfície é similar
ao utilizado para definir o comprimento de uma curva. Naquele caso, em resumo,
aproximamos a curva por uma poligonal (cujo comprimento pode ser calculado
já que é composta por segmentos de reta) e, fazendo quantidade de pontos da
partição ir pra infinito, obtivemos o resultado que usamos para definir formalmente
o conceito de comprimento.
No caso do cálculo da área de uma superfície vamos usar o plano tangente em cada
ponto para calcular o valor aproximado da área de pequenas porções da superfície,
e usar novamente a passagem ao limite para obter o que chamaremos de área da
superfície.
Dado D ⊂ R2 compacto, seja φ : D ⊂ R2 → R3 parametrização de classe C 1 de
uma superfície regular S.
Um retângulo de lados ∆u e ∆v em D é levado em um "paralelogramo curvilíneo"
ABCD contido em φ(D). Inicialmente vamos tentar estimar a área desse pedaço
da superfície.

Figura 49 – O retângulo de lados ∆u e ∆v e sua imagem pela função φ.


Capítulo 4. Integrais de Superfície 83

A área do paralelogramo do plano tangente a S no ponto φ(u, v), determinado


pelos vetores ∆uφu e ∆vφv é

||∆uφu (u, v) × ∆vφv (u, v)|| = ||φu (u, v) × φv (u, v)||∆u∆v.

Como temos que

∆u||φu (u, v)|| ≈ comprimento do arco AB,

e
∆v||φv (u, v)|| ≈ comprimento do arco AD,
então a "área" ∆S do quadrilátero ABCD pode ser aproximada pela área do
paralelogramo determinado pelos vetores ∆uφu e ∆vφv , isto é:

∆S ≈ ||φu (u, v) × φv (u, v)||∆u∆v.

Figura 50 – A área de ABCD pode ser aproximada do paralelogramo ∆uφu e


∆vφv do plano tangente.

Uma vez que particionemos o domínio em retângulos, essa partição induz uma
partição de S em pequenos "paralelogramos curvos", cuja área é aproximada por
paralelogramos do plano tangente.
Dessa forma, é razoável pensar na definição da área de uma superfície S como
sendo o limite da soma das áreas aproximadas dos paralelogramos infinitesimais do
plano tangente quando a quantidade de retângulos da partição vai para infinito.
Se Rij é o retângulo infinitesimal de vértice (ui , vj ) ∈ D, e Pij = φ(Rij ), temos
n−1
X n−1 n−1
X n−1
A(Pij ) =
X X
A(S) ≈ ||φui × φvj ||∆u∆v.
i=1 j=1 i=1 j=1
Capítulo 4. Integrais de Superfície 84

Fazendo n → +∞ na expressão acima, uma vez que temos uma soma de Riemann,
obtemos Z Z
A(S) = ||φu × φv ||dA.
D

4.2.2 Definição
Motivado pela construção da subseção anterior faremos a seguinte definição:

Definição 89. Dada S uma superfície parametrizada por φ(u, v), (u, v) ∈ D,
definimos área A(S) de S pela fórmula
Z Z
A(S) = ||φu (u, v) × φv (u, v)||dA, (4.2)
D

se essa integral existir.

Se S pode ser decomposta em uma união finita de superfícies Si , então sua área é
a soma das áreas de cada Si , ou seja
n
A(S) =
X
Si .
i=1

Observação 36. ∥φu (u, v) × φv (u, v)∥ é a norma do vetor normal




N (u, v) = φu (u, v) × φv (u, v),

logo podemos escrever Z Z




A(S) = ∥ N ∥dA.
D

Observação 37. Quando S pode ser definida explicitamente como gráfico de uma
função z = f (x, y), (x, y) ∈ D, usando a parametrização (4.1) temos
v
u !2 !2

− u ∂f ∂f
∥ N ∥ = ∥φu × φv ∥ = t + + 1,
∂x ∂y

logo a fórmula (4.2) pode ser reescrita como


v
Z Z u !2 !2
u ∂f ∂f
A(S) = t
+ + 1dA. (4.3)
D ∂x ∂y
Capítulo 4. Integrais de Superfície 85

Exemplo 90. Calcule a área da porção do paraboloide z = x2 + y 2 que está abaixo


do plano z = 4.

Solução. A porção do paraboloide z = x2 + y 2 que está abaixo do plano z = 4 pode


ser parametrizada da seguinte forma:
 
φ(u, v) = v cos u, v senu, v 2 , v ∈ [0, 2], u ∈ [0, 2π].

Dessa forma, temos os seguintes vetores tangentes:

φu (u, v) = (−v senu, v cos u, 0),

e
φv (u, v) = (cos u, senu, 2v).

Temos então
 →
− →
− →
− 

i j k   
φu (u, v) × φv (u, v) = 
 −v senu v cos u 0 

= 2v 2 cos u, 2v 2 senu, −v ,
 
senu cos u 2v

o que implica

∥φu (x, y) × φv (x, y)∥ = 4v 2 + 1v.

Assim, usando a fórmula 4.2 temos


Z Z Z 2π Z 2 √
A(S) = ∥φu (u, v) × φv (u, v)∥dA = 4v 2 + 1vdvdu
D 0 0
1 Z 2π 2 2 2 3 Z 2π 2 2 1 Z 2π √

= (4v + 1) du =
3/2
(4v + 1) du =
3/2
(17 17 − 1)du
8 0 3
0
4 0
0
12 0

17 17 − 1
= π.
6

Exemplo 91. Considere a superfície S obtida rotacionando a curva z = 2x, com


−3 ≤ x ≤ 3, em torno do eixo z. Determine a área de S.
Capítulo 4. Integrais de Superfície 86

Figura 51 – Porção do paraboloide z = x2 + y 2 abaixo do plano z = 4.

Solução. A curva z = 2x pode ser parametrizada por γ(t) = (t, 0, 2t), −3 ≤ t ≤ 3.


Dessa forma, a superfície S pode ser parametrizada por

φ(t, θ) = (t cos θ, t senθ, 2t) , (x, y) ∈ D,

onde
D = {(t, θ) ∈ R2 , −3 ≤ t ≤ 3, 0 ≤ θ ≤ 2π}.

Dessa forma, temos os seguintes vetores tangentes:

φt (t, θ) = (−v senu, v cos u, 0),

e
φθ (t, θ) = (cos u, senu, 2v).

Temos então
 →
− →
− →
− 

i j k 
φt (t, θ) × φθ (t, θ) = 
 cos θ senθu 2 

= (−2t cos θ, −2t senθ, t) ,
 
−t senθ t cos θ 0

o que implica

∥φu (x, y) × φv (x, y)∥ = 5|t|.
Capítulo 4. Integrais de Superfície 87

Assim, usando a fórmula 4.2 temos


Z Z Z 2π Z 3 √
A(S) = ∥φt (t, θ) × φθ (t, θ)∥dA = 5|t|dtdθ
D 0 −3
√ Z √ Z 2π t2 3

2π Z 3
=2 5 tdtdθ = 2 5 dθ
0 0 0 2 0
√ Z √ 2π


= 5 9dθ = 9 5θ
0 0

= 18 5π

Figura 52 – Superfície de rotação S.

Exemplo 92. Calcule a área da porção do cilindro x2 + y 2 = a2 compreendida


entre os planos z = 2x e z = 4x.

Solução. O cilindro x2 + y 2 = a2 pode ser parametrizada da seguinte forma:

φ(u, v) = (a cos u, a senu, v) , v ∈ R, u ∈ [0, 2π].

Seja S a porção do cilindro compreendida entre os planos z = 2x e z = 4x. Pela


simetria de S temos que
A(S) = 2A(S1 ),
Capítulo 4. Integrais de Superfície 88

onde S1 é a porção de S acima do plano xy. Para S1 temos 2x ≤ z ≤ 4x. Usando a


parametrização temos
2a cos u ≤ v ≤ 4a cos u.

Além disso, 2a cos u ≤ v ≤ 4a cos u implica cos u ≥ 0, o que ocorre quando


π π
− ≤u≤ .
2 2
Assim, a porção S1 do cilindro S tem a seguinte parametrização:

φ(u, v) = (a cos u, a senu, v) , (u, v) ∈ D,

onde
π π
 
D = (u, v) ∈ R , 2a cos u ≤ v ≤ 4a cos u, − ≤ u ≤
2
.
2 2
Dessa forma, temos os seguintes vetores tangentes:

φu (u, v) = (−a senu, a cos u, 0),

e
φv (u, v) = (0, 0, 1).

Temos então
 →
− →
− →
− 

i j k 
φu (u, v) × φv (u, v) = 
 −a senu a cos u 0 

= (a cos u, a senu, 0) ,
 
0 0 1

o que implica
∥φu (x, y) × φv (x, y)∥ = a.

Assim, usando a fórmula 4.2 temos


Z Z Z π/2 Z 4a cos u
A(S) = 2 ∥φu (u, v) × φv (u, v)∥dA = 2 advdu
D π/2 2a cos u
Z π/2 π/2

= 2a 4a cos u − 2a cos udu = 4a2 senu

π/2
π/2

= 8a 2
Capítulo 4. Integrais de Superfície 89

Figura 53 – Porção do cilindro x2 + y 2 = a2 entre os planos z = 2x e z = 4x.

Exemplo 93. Calcule a área da porção da esfera x2 + y 2 + z 2 = a2 situada no


interior do cilindro x2 + y 2 = ay.

Solução. Seja S a porção da esfera x2 + y 2 + z 2 situada no interior do cilindro


x2 + y 2 = ay. Pela simetria de S temos que

A(S) = 2A(S1 ),

onde S1 é a porção de S acima do plano xy. A porção da semiesfera x2 +y 2 +z 2 = a2 ,


z ≥ 0 no interior do cilindro pode ser parametrizada da seguinte forma:
 q 
φ(x, y) = x, y, a2 − x2 − y2 , (x, y) ∈ D,

onde

D = {(x, y) ∈ R2 , x2 + y 2 ≤ ay}
( )
a2
2
a

= (x, y) ∈ R , x + y −
2 2
≤ .
2 4
Capítulo 4. Integrais de Superfície 90

√ 2
Se f (x, y) = a − x2 − y 2 , pela fórmula (4.3) temos que
v
Z Z u !2 !2
u ∂f ∂f
A(S) = 2 t
+ + 1dA
D ∂x ∂y
Z Z
a
=2 √ dA.
D a2 − x2 − y 2
Aplicando uma mudança polar, e lembrando que J(r, θ) = r, temos que

D = {(r, θ) ∈ R2 , 0 ≤ θ ≤ π, 0 ≤ r ≤ a senθ},

e
Z π Z a senθ Z π √ a senθ
a
A(S) = 2 √ rdθdr = 2a − a 2 − r 2 dθ
0 0 a2 − r 2 0
0
Z π Z π
= 2a −a| cos θ| + adθ = 2a 2
1 − | cos θ|dθ
0 0
Z π Z π/2 Z π !
= 2a 2
1dθ + − cos θdθ + cos θdθ
0 0 π/2
 π/2 π 

= 2a2 π − senθ + senθ 


0 π/2

= 2a (π − 2).
2

(b) Região D.
(a) Porção da esfera x2 + y 2 + z 2 = a2 situada no
interior do cilindro x2 + y 2 = ay
Capítulo 4. Integrais de Superfície 91

Exemplo 94. Mostre que a área da superfície de uma esfera de raio r é 4πr2 .

Solução. Seja S a esfera x2 + y 2 + z 2 = r2 . S pode ser parametrizada da seguinte


forma:
X(φ, θ) = (r senφ cos θ, r senφ senθ, r cos φ) , (φ, θ) ∈ [0, π] × [0, 2π].
Dessa forma, temos os seguintes vetores tangentes:
Xφ (φ, θ) = (r cos φ cos θ, r cos φ senθ, −r senφ),
e
Xθ (φ, θ) = (−r senφ senθ, r senφ cos θ, 0) ,
Temos então
 →
− →
− →
− 

i j k 
Xφ (φ, θ) × Xθ (φ, θ) =  r cos φ cos θ r cos φ senθ −r senφ 
 
 
−r senφ senθ r senφ cos θ 0
 
= r2 sen2 φ cos θ, r2 sen2 φ senθ, r2 senφ cos φ ,
o que implica
∥Xφ (φ, θ) × Xθ (φ, θ)∥ = r2 senφ.
Pela fórmula (4.3) temos que
Z 2π Z π Z 2π π

A(S) = r2 senφdφdθ = −r2 cos φ dθ
0 0 0
0
Z 2π 2π

= 2r2 dθ = 2r θ
2
0
0

= 4πr 2

4.3 Integral de superfície de uma função escalar


4.3.1 Motivação
A definição da integral de superfície de uma função escalar possui uma analogia
com a integral de linha similar aquela entre o comprimento de curvas e a área de
superfícies.
Capítulo 4. Integrais de Superfície 92

Dada uma superfície S com parametrização φ(u, v), (u, v) ∈ D, onde D é compacto,
já vimos que um retângulo de lados ∆u e ∆v em D é levado em um "paralelogramo
curvilíneo" de área ∆S tal que

∆S ≈ ||φu (u, v) × φv (u, v)||∆u∆v. (4.4)

Se subdividirmos o domínio de φ em retângulos Rij com dimensões ∆u e ∆v, então


a superfície é dividida em regiões Sij cujas áreas satisfazem (4.4).
Dada w = f (x, y, z) definida sobre S, consideremos a soma de Riemann
n−1
X n−1 n−1
X n−1
f (Pij )∆Sij , ≈ f (Pij )∥φu (u, v) × φv (u, v)∥∆u∆v
X X

i=1 j=1 i=1 j=1

onde Pij é um ponto qualquer de Sij . Tomando o limite quando n → +∞, obtemos
n−1
X n−1 Z Z
lim f (Pij )∆Sij = f (φ(u, v))∥φu (u, v) × φv (u, v)∥dudv.
X
n→+∞ D
i=1 j=1

4.3.2 Definição
Motivado pela construção da subseção anterior faremos a seguinte definição:

Definição 95. Dadas S uma superfície parametrizada por φ(u, v), (u, v) ∈ D, e
f (x, y, z) uma função real definida em S, definimos integral de superfície de f
sobre S como
Z Z Z Z
f ds = f (φ(u, v))∥φu × φv ∥dudv (4.5)
S D

Se S é decomposta como união finita de superfícies Si , i = 1, . . . , n, então


Z Z n Z Z
f ds =
X
f ds.
S i=1 Si

Quando f (x, y, z) = 1, a equação (4.5) pode ser escrita como


Z Z Z Z
ds = ∥φu × φv ∥dudv = área(S).
S D

Dessa forma, o termo ds = ∥φu × φv ∥dA pode ser chamado de elemento de


superfície.
Capítulo 4. Integrais de Superfície 93

Observação 38. Assim como a integral de linha de uma função densidade permitia
o cálculo da massa de um fio, a integral de superfície de uma função densidade d
permite o cálculo da massa de uma superfície com densidade d.

Exemplo 96. Seja S a superfície do paraboloide z = x2 + y 2 com x2 + y 2 ≤ 4. Se


a densidade de S em cada ponto é o quadrado da distância do ponto ao eixo de
simetria de S, calcule a massa total de S.

Solução. A porção do paraboloide z = x2 + y 2 que está abaixo do plano z = 4 pode


ser parametrizada da seguinte forma:
 
φ(u, v) = v cos u, v senu, v 2 , v ∈ [0, 2], u ∈ [0, 2π].

Dessa forma, temos os seguintes vetores tangentes:

φu (u, v) = (−v senu, v cos u, 0),

e
φv (u, v) = (cos u, senu, 2v).

Temos então
 →
− →
− →
− 

i j k   
φu (u, v) × φv (u, v) = 
 −v senu v cos u 0 

 = 2v 2
cos u, 2v 2
senu, −v ,

senu cos u 2v

o que implica

∥φu (x, y) × φv (x, y)∥ = 4v 2 + 1v.

Dado P = (x, y, z) ∈ S, temos

d(P, eixo z)2 = x2 + y 2 ,

logo, a função densidade é dada por f (x, y, z) = x2 + y 2 . Portanto


 
f (φ(u, v)) = f (v cos u, v senu, v 2 ) = v 2 cos2 u + sen2 u = v 2 .
Capítulo 4. Integrais de Superfície 94

Usando a fórmula 4.5 temos


Z Z Z Z
f ds = f (φ(u, v))∥φu (u, v) × φv (u, v)∥dA
S D
Z 2 Z 2π √ Z 17 
t−1 √ 1

= 4v 2 + 1v 3 dudv = 2π t dt
0 0 1 4 8
π 2 5/2 2 3/2
Z 17 17
π

= t3/2 − t1/2 dt = t − t
16 1 16 5 3 1
π √
= (1 + 391 17),
60
onde na terceira igualdade integramos a função com relação a u, e fizemos a
substituição t = 4v 2 + 1.

Figura 55 – Porção do paraboloide z = x2 + y 2 tal que x2 + y 2 ≤ 4.

Exemplo 97. Seja S1 a parte superior da esfera de centro na origem e raio 2


√ 2 q
situada entre as superfícies S2 : z = x + y 2 e S3 : z = 3(x2 + y 2 ). Determine a
massa de S1 se a densidade for dada por f (x, y, z) = z.

Solução. A esfera S de centro na origem e raio 2 pode ser parametrizada da seguinte


forma:

X(φ, θ) = (2 senφ cos θ, 2 senφ senθ, 2 cos φ) , (φ, θ) ∈ [0, π] × [0, 2π].
Capítulo 4. Integrais de Superfície 95

Como S1 é a porção de S limitada por S2 e S3 , precisamos calcular essas limitações.


Temos então
q
S2 : 2 cos φ = (2 senφ cos θ)2 + (2 senφ senθ)2 = 2 senφ
π
⇒ tgφ = 1 ⇒ φ = ,
4
e q √
S3 : 2 cos φ = 3(2 senφ cos θ)2 + (2 senφ senθ)2 = 2 3 senφ
1 π
⇒ tgφ = √ ⇒ φ = .
3 6
Portanto S1 possui parametrização
π π
 
X(φ, θ) = (2 senφ cos θ, 2 senφ senθ, 2 cos φ) , (φ, θ) ∈ , × [0, 2π].
6 4
Conforme calculado em exemplos anteriores, temos

∥Xφ (φ, θ) × Xθ (φ, θ)∥ = 4 senφ.

Além disso, como d(X(φ, θ)) = 2 cos φ, por (4.5) temos


Z Z Z Z
M= dds = d(X(φ, θ))∥Xφ (φ, θ) × Xθ (φ, θ)∥dA
S D
Z π/4 Z 2π Z π/4
= 2 cos φ · 4 senφdθdφ = 16π cos φ senφdφ
π/6 0 π/6
#π/4 " √ ! √ !#
− cos2 φ 3 2
"
= 16π = 8π −
2 π/6
2 2
= 2π.

Exemplo 98. Seja S1 a superfície do cilindro x2 + y 2 = 2x, z ≥ 0, limitada pelas


superfícies z = 0 e z 2 = x2 + y 2 .

(a) Determine a área de S1 .



(b) Determine a massa de S1 se a densidade for d(x, y, z) = 2x.
Capítulo 4. Integrais de Superfície 96

Figura 56 – Porção da esfera S1 limitada por S2 e S3 .

(c) Determine a área da superfície do sólido W limitado por x2 + y 2 = 2x, z ≥ 0,


z = 0 e z 2 = x2 + y 2 .

Solução. (a) Seja S1 a porção do cilindro x2 + y 2 = 2x que está entre o plano


z = 0 e o cone z 2 = x2 + y 2 . S1 pode ser parametrizada da seguinte forma:

φ(u, v) = (1 + cos u, senu, v) , (u, v) ∈ D1 ,

onde

D1 = {(u, v) ∈ R2 ; 0 ≤ u ≤ 2π, 0 ≤ v ≤ 2 + 2 cos u}.
Dessa forma, temos os seguintes vetores tangentes:

φu (u, v) = (− senu, cos u, 0),

e
φv (u, v) = (0, 0, 1).
Temos então
 →
− →
− →
− 

i j k 
φu (u, v) × φv (u, v) = 
 − senu cos u 0

 = (cos u, senu, 0) ,
 
0 0 1
Capítulo 4. Integrais de Superfície 97

o que implica
∥φu (x, y) × φv (x, y)∥ = 1.

Usando a definição 4.2 temos


Z Z Z Z
A(S1 ) = ds = f (φ(u, v))∥φu (u, v) × φv (u, v)∥dA
S D1
Z 2π Z √2+2 cos u √ Z 2π √
= dvdu = 2 1 + cos udu
0 0 0
√ Z
s
2π u Z 2π
 
u
 
= 2 2 cos2
du = 2 cos

du
0 2 0 2
Z π Z 2π
u u
    
=2 cos du − cos du
 0 2 π

2
  π   2π
u u
= 4  sen − sen

2 0 2 π

= 4(1 + 1) = 8.

(b) Para calcular a massa de S1 podemos utilizar a parametrização e os intervalos



do item a, mas integrando a função densidade d(x, y, z) = 2x. Nesse caso
temos

d(φ(u, v)) = 2 + 2 cos u.

Usando a fórmula 4.5 temos


Z Z Z Z
m(S1 ) = ds = d(φ(u, v))||φu (u, v) × φv (u, v)||dA
S D

Z 2π Z 2+2 cos u √
= 2 + 2 cos udvdu
0 0
Z 2π 2π

= 2 + 2 cos udu = 2u + 2 senu

0 0

= 4π.

(c) O sólido W é limitado da seguinte forma:

(1) W é limitada lateralmente por S1 , a superfície cuja área (8π) foi calculada
no item a;
Capítulo 4. Integrais de Superfície 98

(2) W é limitada superiormente por S2 , onde S2 é uma porção do cone



z = x2 + y 2 com parametrização
 q 
φ(x, y) = x, y, x2 + y 2 , (x, y) ∈ D2 ,

onde
D2 = {(x, y) ∈ R2 ; x2 + y 2 = 2x}.
(3) W é limitada inferiormente por S3 , onde S3 é a porção do plano z = 0
tal que x2 + y 2 ≤ 2x.

A área A da superfície de W é dada por

A = A(S1 ) + A(S2 ) + A(S3 ). (4.6)

Como x2 + y 2 = 2x implica x2 + (y − 1)2 = 1 temos que S3 é a região

{(x, y) ∈ R2 ; x2 + (y − 1)2 ≤ 1},

do plano z = 0. Essa região é um círculo de centro (0, 1) e raio 1, portanto


A(S3 ) = π. Para calcular A(S2 ) vamos utilizar a fórmula (4.3). Para f (x, y) =
√ 2
x + y 2 temos
∂f x
=√ 2 ,
∂x x + y2
e
∂f y
=√ 2 .
∂y x + y2
Assim,
v
u !2 !2
Z Z Z Z u ∂f ∂f
A(S2 ) = ds = t
+ + 1dA
S D2 ∂x ∂y
v
u !2 !2
Z Z
x u y
= √ 2 t
+ √ 2 + 1dA
D2 x +y 2 x + y2
Z Z √ √
= 2dA = 2 · Área(D2 )
D2

= 2π.

Por (4.6) temos



A = A(S1 ) + A(S2 ) + A(S3 ) = (9 + 2)π.
Capítulo 4. Integrais de Superfície 99

Figura 57 – Sólido W limitado por S1 , S2 e S3 .

4.4 Integral de superfície de uma função vetorial


4.4.1 Superfícies orientadas
Antes de definir o conceito de integral de superfície de uma função vetorial precisa-
mos estabelecer o conceito de superfície orientada.
Ao escolher uma orientação para uma curva, a ideia inicial era estabelecer uma
direção para o movimento ao longo da curva. Esse processo era equivalente a, em
cada ponto, escolher entre os dois possíveis vetores tangentes.
Orientar uma superfície é um pouco mais complicado. Uma vez que a superfície é
um objeto bidimensional, não faz sentido pensar na orientação através da direção
de um movimento na superfície. Ao invés disso, vamos estabelecer a orientação da
superfície estabelecendo a direção de um movimento através da superfície.
Mais objetivamente, enquanto a orientação de curvas era dada pela escolha de uma
vetor tangente a curva, vamos orientar a superfície escolhendo um vetor normal
à superfície.
Capítulo 4. Integrais de Superfície 100

Seja S uma superfície parametrizada por φ(u, v), (u, v) ∈ D, onde D é compacto e
tem interior não vazio. Suponhamos que φ seja injetora e regular no interior de
D. A esta superfície estão associados dois campos contínuos de vetores normais
unitários dados por


− φu (u, v) × φv (u, v)
n1 (φ(u, v)) = , (u, v) ∈ D,
∥φu (u, v) × φv (u, v)∥
e


n2 (φ(u, v)) = −→

n1 (φ(u, v)).

Dizemos que S está orientada se fixarmos um campo de vetores normal sobre S.

Figura 58 – Vetores n⃗1 e n⃗2 de uma superfície orientada.

Observação 39. Nem toda superfície parametrizada pode ser orientada. O principal
exemplo de superfície não orientada no R3 é a faixa de Moebius. Uma faixa de
Moebius centrada na origem pode ser parametrizada por
v u v u v u
       
φ(u, v) = 1 + cos cos u, 1 + cos senu, cos (u, v) ∈ D,
2 2 2 2 2 2
onde D = [0, 2π] × [−1, 1].
Intuitivamente, podemos pensar na superfície orientada como uma superfície que
tem "dois lados".
Capítulo 4. Integrais de Superfície 101

Figura 59 – Faixa de Moebius.

4.4.2 Definição


Definição 99. Seja F um campo vetorial contínuo definido em uma superfície
orientada S parametrizada por φ(u, v), (u, v) ∈ D. Definimos a integral de


superfície de F sobre S por
Z Z

− → Z Z

− →
F · d−
s = F ·−
n ds.
S S

Observação 40. Note que


Z Z

− → Z Z

− →
F · d−
s = F ·−
n ds
S Z ZS


= F (φ(u, v)) · →

n ∥φu × φv ∥dudv
Z ZD


= F (φ(u, v)) · (φu × φv ) dudv. (4.7)
D

Assim como a integral de linha de campos vetoriais, a integral de superfície possui


aplicações em diversas áreas. Vejamos algumas:


Exemplo 100 (Fluxo). Seja F : W ⊂ R3 → R3 um campo de velocidades
associado ao escoamento de um fluido em cada ponto da região W .


Vamos calcular o fluxo ou taxa de escoamento por unidade de tempo de F através
de uma superfície S contida em W .
Capítulo 4. Integrais de Superfície 102



Se S é plana com vetor normal → −
n , e F é um campo constante, então o volume de

− −
fluido que passa através de S em cada tempo é ( F · →
n )Área(S). Logo, o fluxo Φ é
dado por

− −
Φ = (F · →
n )Área(S).

Figura 60 – Fluxo através de S plana.

Para o caso de uma superfície S não plana, podemos proceder de modo análogo ao
feito no estudo da área e da integral de linha de uma função escalar. Se φ(u, v),
(u, v) ∈ D é uma parametrização de S, particionando o domínio D, obtemos uma
decomposição de S em "paralelogramos curvilíneos".5cm Sk tais que o fluxo Φk em
cada Sk é, aproximadamente


Φk ≈ ( F (φ(uk , vk )) · −
→)Área(S )
nk k


≈ ( F (φ(uk , vk )) · (φu (uk , vk ) × φv (uk , vk )) ∆u∆v.

Quando n → +∞ o somatório
n


( F (φ(uk , vk )) · (φu (uk , vk ) × φv (uk , vk )) ∆u∆v,
X

k=1
Capítulo 4. Integrais de Superfície 103



converge para o fluxo total de F através de S. Portanto, o fluxo Φ é dado por
Z Z

− Z Z
− →
→ −
Φ= F (φ(u, v)) · (φu × φv ) dudv = F · ds.
D S

Embora a associação da integral de superfície com a mecânica dos fluidos seja a


mais comum, o conceito de integral de superfície aparece em várias outras situações
físicas.


Exemplo 101 (Fluxo elétrico). Se F é um campo elétrico, a integral de superfície
Z Z

− →
E · d−
s,
S


é chamada fluxo elétrico de E através da superfície S. Uma das leis mais
importantes da eletrostática é a Lei de Gauss, que diz que a carga total Q
englobada por uma superfície S é dada por
Z Z

− →
Q = ϵ0 E · d−
s,
S

onde ϵ0 é chamada constante de permissividade elétrica no vácuo.

Exemplo 102 (Fluxo de calor). Dada uma superfície S com temperatura em


cada ponto dada por u(x, y, z), o fluxo de calor é definido como o campo vetorial


F = −K∇u,

onde K é uma constante chamada condutividade da substância. A taxa de trans-


missão de calor através da superfície S é dada pela integral de superfície
Z Z

− → Z Z
F · d−
s = −K ∇u · d→

s.
S S
Capítulo 4. Integrais de Superfície 104

Observação 41. O fluxo de calor é um campo conservativo cujo potencial é dado


por −Ku(x, y, z).


Exemplo 103. Calcule a integral do campo vetorial F (x, y, z) = (x, y, −2z) através
da superfície S do paraboloide z = x2 + y 2 , 0 ≤ z ≤ 1, com normal apontando
para fora da concavidade de S.

Solução. A porção do paraboloide z = x2 + y 2 que está abaixo do plano z = 1 pode


ser parametrizada da seguinte forma:
 
φ(u, v) = v cos u, v senu, v 2 , v ∈ [0, 1], u ∈ [0, 2π].

Dessa forma, temos os seguintes vetores tangentes:

φu (u, v) = (−v senu, v cos u, 0),

e
φv (u, v) = (cos u, senu, 2v).

Temos então
 →
− →
− →
− 

i j k   
φu (u, v) × φv (u, v) =  −v senu v cos u 0  = 2v 2 cos u, 2v 2 senu, −v .
 
 
senu cos u 2v

Usando a fórmula 4.7 temos


Z Z

− →

Z Z


Fds = F (φ(u, v)) · →

n ∥φu (u, v) × φv (u, v)∥dA
S Z ZD


= F (φ(u, v)) · (φu (u, v) × φv (u, v)) dA
D
Z 1 Z 2π  
= (v cos u, v senu, −2v 2 ) · 2v 2 cos u, 2v 2 senu, −v dudv
0 0
Z 1 Z 2π Z 1
= 4v dudv = 2π
3
4v 3 dv
0 0 0
1

= 2πv
4
= 2π.

0
Capítulo 4. Integrais de Superfície 105

Figura 61 – Porção do paraboloide z = x2 + y 2 tal que x2 + y 2 ≤ 1.

No cálculo da integral de linha ao longo de uma curva C 1 por partes, orientamos


as partes da curva de modo que o ponto final de cada parte coincida com o ponto
inicial daquela que se segue.
Para integrar sobre uma superfície que é a união finita de superfícies coladas pelos
bordos comuns, precisamos de um conceito de orientação para a superfície a partir
da orientação de cada uma das suas partes.

Definição 104. Se S é uma superfície orientada por um campo de vetores normais


unitários →

n , dizemos que o bordo ∂S de S está orientado positivamente
se a superfície S está à esquerda de uma pessoa que caminha no bordo com → −n
representando sua posição vertical.

Para uma superfície fechada, isto é, uma superfície que é fronteira de uma região
sólida W , convenciona-se que a orientação positiva é aquela na qual os vetores
normais apontam para fora da região W .
Uma superfície S que é união finita de superfícies Si coladas pelos bordos comuns
está orientada, se é possível orientar cada parte Si , de modo que, quando os
bordos de suas partes estão orientados positivamente, tenhamos bordos comuns a
duas partes sendo percorridos no sentido contrário.


Exemplo 105. Determine o fluxo do campo F (x, y, z) = (x, y, 2z) através da
superfície do plano x + y + z = 1 situada no 1º octante. Especifique a orientação
Capítulo 4. Integrais de Superfície 106

Figura 62 – Borda da superfície S orientada.

Figura 63 – Superfície orientada formada pela união de superfícies coladas pelos


bordos.

escolhida.

Solução. A porção do plano x + y + z = 1 que está no 1º octante pode ser


parametrizada da seguinte forma:

φ(x, y) = (x, y, 1 − x − y) , (x, y) ∈ D,

onde D = {(x, y) ∈ R2 ; 0 ≤ x ≤ 1, 0 ≤ y ≤ x}. Dessa forma, temos os seguintes


Capítulo 4. Integrais de Superfície 107

vetores tangentes:
φx (x, y) = (1, 0, −1),
e
φy (x, y) = (0, 1, −1).
Temos então
 →
− →− →
− 

i j k 
φx (x, y) × φy (x, y) =  1 0 −1  = (−1, −1, −1) .
 
 
0 1 −1
Vamos orientar S com o vetor normal unitário orientado para baixo, ou seja,

− (−1, −1, −1)
n = .
3
Usando a fórmula 4.7 temos
Z Z

− → Z Z


F d−s = F (φ(x, y)) · (φx (x, y)) × φy (x, y))dA
S Z ZD


= F (x, y, 1 − x − y) · (−1, −1, −1)dA
Z ZD
= (x, y, 2 − 2x − 2y) · (−1, −1, −1)dA
D
Z Z Z 1 Z 1−x
= x + y − 2dA = x + y − 2dydx
D 0 0
1−x
Z 1
y2 Z 1
(1 − x)2
= yx + − 2y dx = (1 − x)x + − 2(1 − x)dx
0 2
0 0 2
1
Z 1
x2 3 x2 3
= 2x − − dx = 2x − −
0 2 2 2 2 0
2
= .
3



Exemplo 106. Determine o fluxo de F = (x − y, x + y, z 2 ) através de S, onde S é
superfície do sólido limitada por x2 + y 2 = 4, z = 1, z = 4 orientada positivamente.

Solução. A superfície S pode ser escrita como

S = S1 + S2 + S3 ,

onde
Capítulo 4. Integrais de Superfície 108

Figura 64 – Porção do plano x + y + z = 1 do 1º octante com normal apontando


para baixo.

(1) S1 é a porção do plano z = 4 tal que x2 + y 2 ≤ 4, e pode ser parametrizada


por
φ1 (x, y) = (x, y, 4) , (x, y) ∈ D1 ,

onde D1 = {(x, y) ∈ R2 ; x2 + y 2 ≤ 4};

(2) S2 é a porção do cilindro x2 + y 2 = 4 com 1 ≤ z ≤ 4, e pode ser parametrizada


por
φ2 (u, v) = (2 cos u, 2 senu, v) , (u, v) ∈ D2 ,

onde D2 = {(u, v) ∈ R2 ; 0 ≤ u ≤ 2π, 1 ≤ v ≤ 4};

(3) S3 é a porção do plano z = 1 tal que x2 + y 2 ≤ 4, e pode ser parametrizada


por
φ3 (x, y) = (x, y, 1) , (x, y) ∈ D3 ,

onde D3 = {(x, y) ∈ R2 ; x2 + y 2 ≤ 4}.

Como S limita uma região sólida e está orientada positivamente (isto é, normal
"para fora"), temos:
Capítulo 4. Integrais de Superfície 109

Figura 65 – Sólido W limitado por S1 , S2 e S3 .

(1) S1 tem vetor normal →



n1 = (0, 0, 1);

(2) Para S2 temos


φu (u, v) = (−2 senu, 2 cos u, 0),

e
φv (u, v) = (0, 0, 1).

Temos então
 →
− →
− →
− 

i j k 
φu (u, v) × φv (u, v) =  −2 senu 2 cos u 0  = (2 cos u, 2 senu, 0) ,
 
 
0 0 1

e portanto

− φu (u, v) × φv (u, v)
n2 = = (cos u, senu, 0) .
∥φu (u, v) × φv (u, v)∥
(para saber se o vetor normal correspondente a orientação escolhida é → −
n2 ,


como definido acima, ou −n2 , deve-se verificar qual dos dois aponta para fora
da região limitada por S).

(3) S3 tem vetor normal →



n3 = (0, 0, −1);
Capítulo 4. Integrais de Superfície 110



Como S = S1 + S2 + S3 , o fluxo de F através de S é dado por
(a) (b) (c)
z Z }| { zZ Z }| { zZ Z }| {
Z Z

− → Z

− → →
− → →
− →
Φ= F d−
s = F d−
s + F d−
s + F d−
s . (4.8)
S S1 S2 S3

Vamos calcular cada uma das integrais separadamente

(a)
Z Z

− →

Z Z


Fds = F (φ1 (x, y)) · →

n1 ds
S1 S1
Z Z


= F (x, y, 4) · (0, 0, 1)ds
S1
Z Z
= (x − y, x + y, 16) · (0, 0, 1)ds
S
Z 1Z
= 16 ds = 16 · Área(S1 ) = 16 · 4π
S1

= 64π.

(b)
Z Z

− →

Z Z


Fds = F (φ2 (x, y)) · →

n2 ds
S2 S2
Z Z


= F (2 cos u, 2 senu, v) · (cos u, senu, 0)ds
S2
Z Z
= (2 cos u − 2 senu, 2 cos u + 2 senu, v 2 ) · (cos u, senu, 0)ds
S
Z Z2
=2 cos2 u + sen2 uds = 2 · Área(S2 ) = 8π(4 − 1)
S2

= 24π.

(c)
Z Z

− → Z Z


F d−
s = F (φ3 (x, y)) · →

n3 ds
S3 S3
Z Z


= F (x, y, 1) · (0, 0, −1)ds
S3
Z Z
= (x − y, x + y, 1) · (0, 0, −1)ds
S3
Z Z
=− ds = −Área(S3 )
S3

= −4π.
Capítulo 4. Integrais de Superfície 111

Por (4.8) temos


Φ = 64π − 4π + 24π = 84π.



Exemplo 107. Determine o fluxo de F = (z, z, −x) através de S, onde S é a
superfície da esfera x2 + y 2 + z 2 = 4, z ≥ 0, orientada positivamente.

Solução. A superfície S é a parte superior de centro na origem e raio 2, e pode ser


parametrizada da seguinte forma:
π
 
X(φ, θ) = (2 senφ cos θ, 2 senφ senθ, 2 cos φ) , (φ, θ) ∈ 0, × [0, 2π].
2
Conforme calculado em exemplos anteriores, temos

∥Xφ (φ, θ) × Xθ (φ, θ)∥ = 4 senφ.

Além disso S fica orientada positivamente com a escolha do vetor normal unitário

− (x, y, z)
n = = ( senφ cos θ, senφ senθ, cos φ) .
2
Temos também que

− →

F (X(φ, θ)) = F (2 senφ cos θ, 2 senφ senθ, 2 cos φ)
= (2 cos φ, 2 cos φ, −2 senφ cos θ) .

Usando a fórmula (4.7) temos


Z Z

− →
Φ= F d−
s =
S
Z Z


= F (X(φ, θ)) · →

n ∥Xφ (φ, θ) × Xθ (φ, θ)∥dA
D
Z π/2 Z 2π
= (2 cos φ, 2 cos φ, −2 senφ cos θ) · ( senφ cos θ, senφ senθ, cos φ) 4 senφdθdφ
0 0
Z π/2 Z 2π
=8 cos φ sen2 φ senθdθdφ
0 0
Z π/2 2π

= −8 cos φ sen 2
φ · cos θ dφ

0 0

= 0.
Capítulo 4. Integrais de Superfície 112

Figura 66 – Porção da esfera x2 + y 2 + z 2 = 4 orientada positivamente.

4.5 Teorema de Stokes


O teorema de Stokes é um teorema que relaciona a integral de linha de um campo
vetorial ao longo de uma curva fechada C, com a integral de uma superfície S cujo
bordo é C.

Teorema 108 (Teorema de Stokes). Seja S uma superfície orientada parame-


trizada por φ(u, v), (u, v) ∈ D, onde D é uma região fechada do plano uv limitada
por uma curva C 1 por partes, e φ ∈ C 2 em um subconjunto aberto do R2 contendo
D.


Se F = (F1 , F2 , F3 ) é um campo vetorial de classe C 1 definido em um aberto que
contém S, e cujo bordo ∂S está orientada positivamente, então
Z Z

− − Z


rot F d→
s = F · dr. (4.9)
S ∂S

Ideia da demonstração. Consideremos S parametrizada por

φ(u, v) = (x(u, v), y(u, v), z(u, v)) , (u, v) ∈ D,


Capítulo 4. Integrais de Superfície 113

φu × φv
e orientada com campo de vetores normais →

n = , onde
∥φu × φv ∥
!
∂(y, z) ∂(z, x) ∂(x, y)
φu × φv = , , .
∂(u, v) ∂(u, v) ∂(u, v)
Da definição da integral de superfície temos
Z Z 

− −
rot F · →
n ds =
S

Z Z " ! !
∂F3 ∂F2 ∂(y, z) ∂F1 ∂F3 ∂(z, x)
= − + −
D ∂y ∂z ∂(u, v) ∂z ∂x ∂(u, v)
! #
∂F2 ∂F1 ∂(x, y)
=+ − dudv,
∂x ∂y ∂(u, v)
Para completar a demonstração basta verificar que
Z Z Z
∂F1 ∂(z, x) ∂F1 ∂(x, y)
F1 dx = − dudv,
∂S ∂z ∂(u, v) ∂y ∂(u, v)
Z Z Z
∂F2 ∂(x, y) ∂F2 ∂(y, z)
F2 dy = − dudv,
∂S ∂x ∂(u, v) ∂z ∂(u, v)
e Z
∂F3 ∂(y, z) ∂F3 ∂(z, x)
Z Z
F3 dz = − dudv.
∂S ∂y ∂(u, v) ∂x ∂(u, v)
As três equações acima são análogas, e a validade delas segue do teorema de Green
(ver livro-texto).

Observação 42. Como


Z

− Z


F · dr = F · T ds,
∂S ∂S

e Z Z

− →−
Z Z

− −
rot F d s = rot F · →
n ds,
S S
o teorema de Stokes nos dá
Z Z

− − Z


rot F · →
n ds = F · T ds,
S ∂S

ou seja, o teorema diz que a integral de linha em torno da curva fronteira de S, da




componente tangencial de F , é igual à integral de superfície da componente normal


do rotacional de F .
Capítulo 4. Integrais de Superfície 114

Observação 43. No caso em que a superfície S é plana e pertence ao plano xy




com fronteira orientada positivamente, o vetor normal unitário é k , a integral de
superfície é igual a uma integral dupla e o teorema de Stokes nos dá
Z

− Z Z

− − Z Z
− →
→ −
F · dr = rot F d→
s = rot F · k dA,
∂S S S

que é a forma do Teorema de Green dada pela equação (3.12).




Observação 44. Se F , S1 e S2 estão nas condições do teorema de Stokes, e S1 e
S2 tem o mesmo bordo ∂S, então
Z Z

− − Z

− Z Z

− −
rot F · →
n ds = F · dr = rot F · →
n ds.
S1 ∂S S2



Exemplo 109. Encontre o trabalho realizado pela força F = (3y + z, x + 4z, 2x + y)
ao longo da curva C obtida interceptando as superfícies S1 dada por x2 + y 2 + z 2 = 4
e S2 dada por y + z = 2. Especifique a orientação.

Solução. A projeção D da porção de S2 limitada por C no plano xy satisfaz



 x2 + y 2 + z 2 = 4
 y + z = 2,

ou seja D = {(x, y) ∈ R2 ; x2 + 2(y − 1)2 ≤ 2}. Assim, a porção de S2 limitada por


C pode ser parametrizada por

φ(x, y) = (x, y, 2 − y), (x, y) ∈ D.

(a) Região D.
(b) Porção de S2 limitada por C.
Capítulo 4. Integrais de Superfície 115

Além disso,
q √
∥φx (x, y) × φy (x, y)∥ = 1 + zx2 + zy2 = 2.


Como φ ∈ C 2 , e F ∈ C 1 em R3 , orientando S2 com o vetor normal apontando
para cima, pelo teorema de Stokes temos
Z

− Z Z

− →
F · dr = rot F · −
nF ds,
C S2

1 1
!


onde −
n→
F = 0, √ , √ , e rot F = (−3, −1, −2). Assim, o trabalho W realizado
2 2


por F ao longo de C é dado por
Z

− Z Z

− →
W = F · dr = rot F · −
nF ds
C S2
1 1
Z Z !
= (−3, −1, −2) · 0, √ , √ ds
S2 2 2
−3 Z Z −3 Z Z
=√ ds = √ ∥φx (x, y) × φy (x, y)∥dA
2Z Z S2 2 D

= −3 dA = −3 · Área(D)
D

= −3π 2.

Figura 68 – S1 e S2 .
Capítulo 4. Integrais de Superfície 116

Exemplo 110. Calcule Z




F · dr,
C


onde F = (z 2 , xz, 2xy), e C é a curva obtida como interseção das superfícies
z = 1 − y 2 , z ≥ 0, com o plano 2x + 3z = 6. Especifique a orientação.

Solução. A curva C não é uma curva fechada, logo a princípio não podemos usar
o teorema de Stokes. No entanto, se considerarmos C1 a reta ligando os pontos
(3, −1, 0) à (3, 1, 0) parametrizada por

γ(t) = (3, t, 0), t ∈ [−1, 1].

A curva C ∪ C1 é uma curva fechada com parametrização C 1 por partes.


Seja S a porção do plano 2x + 3z = 6 limitada por C̄. A projeção D da porção de
S, limitada por C no plano xy, satisfaz

 2x + 3z = 6
,
 z = 1 − y2

ou seja
3 + 3y 2
( )
D = (x, y) ∈ R ; 2
≤ x ≤ 3, −1 ≤ y ≤ 1 .
2
Assim, a porção de S limitada por C pode ser parametrizada por
2x
 
φ(x, y) = x, y, 3 − , (x, y) ∈ D.
3

(a) Região D.
(b) Porção de S limitada por C.
Capítulo 4. Integrais de Superfície 117

Além disso
s √
q 4 13
∥φx (x, y) × φy (x, y)∥ = 1+ zx2 + zy2 = 1+ = .
9 3


Como φ ∈ C 2 , e F ∈ C 1 em R3 , orientando S com o vetor normal apontando para
cima, pelo teorema de Stokes temos
Z

− Z Z

− →
F · dr = rot F · −
nF ds,
C∪C1 S

2 3
!


onde −
n→
F = √ , 0, √ , e rot F = (x, 0, z). Temos então
13 13
Z

− Z Z 

− →
F · dr = rot F · −
nF ds,
C∪C1 S

o que implica
(a) (b)
zZ Z }| { zZ }| {
Z

− →
− → →

rot F · −
 
F · dr = nF ds − F · dr . (4.10)
C S C1

Vamos calcular as duas integrais separadamente.

(a)
!√

− − Z Z 
2x 2 3 13
Z Z  


rot F · nF ds = x, 0, 3 − · √ , 0, √ dA
S D 3 13 13 3
Z Z Z 1 Z 3
=2 dA = 2 dxdy
D −1 (3+3y 2 )/2
! 1
Z 1
y3
=3 1 − y dy = 3 y − 2
3

−1
−1

= 4.

(b)
Z

− Z 1 →
− Z 1 →

F · dr = F (γ(t)) · γ ′ (t)dt = F (3, t, 0) · (0, 1, 0)dt
C1 −1 −1
Z 1
= (0, 0, 6t) · (0, 1, 0)dt = 0.
−1
Capítulo 4. Integrais de Superfície 118

Figura 70 – Interseção de z = 1 − y 2 e 2x + 3z = 6.

Por (4.10) temos Z




F · dr = 4 − 0 = 0.
C



Podemos relacionar o rotacional de um campo F com sua circulação. Seja P0 =
(x0 , y0 , z0 ) um ponto do fluido, e seja Sa um pequeno círculo de raio a e centro

− →
− →

P0 . Como rot F é contínuo, para a pequeno o suficiente temos rot F ≈ rot F (P0 ),
para todos os pontos de Sa . Dessa forma, pelo teorema de Stokes, temos que a
circulação em torno do círculo Ca fronteira de Sa pode ser aproximada da seguinte
forma:
Z

− Z Z

− −
F · dr = rot F · →
n ds
Ca
Z ZSa


≈ rot F (P0 ) · →

n (P0 )ds
Sa


= rot F (P0 ) · →

n (P0 ) · Área(Sa )


= rot F (P0 ) · →

n (P0 )πa2 .
Capítulo 4. Integrais de Superfície 119

Fazendo a → 0 temos

− 1 Z → −
rot F (P0 ) · →

n (P0 ) = lim 2 F · dr,
a→0 πa Ca



ou seja, a componente normal de rot F (P0 ) é a medida do efeito de rotação do
fluido em torno do eixo →

n . Dessa forma a circulação ao longo de Ca tenderá a ser

− →

maior se →−
n tiver o mesmo sentido de rot F (P0 ), ou seja, rot F (P0 ) determina o


eixo em torno da qual a circulação de F é a maior possível perto de P0 .
O teorema a seguir é análogo ao teorema 74, e caracteriza os campos conversativos
de R3 .


Teorema 111. Seja F = (F1 , F2 , F3 ) um campo vetorial de classe C 1 definido em
R3 , exceto possivelmente em um número finito de pontos. As seguintes afirmações
são equivalentes:
I


(i) F · dr = 0, para toda curva fechada C 1 .
C


(ii) A integral de linha de F do ponto A até B independe da curva C 1 por partes
contida que os liga.


(iii) F é campo gradiente de alguma função potencial f .

− →

(iv) rot F = 0 .


Exemplo 112. Sejam F = (yz + x, xz + 4y 3 , xy + sen(z)), e C a curva interseção
entre o paraboloide 2z = x2 + y 2 e o cilindro y = x2 . Calcule a integral de linha de


F ao longo do trecho de C que liga os pontos (−2, 4, 10) e (2, 4, 10).



Solução. O campo F é de classe C 1 em R3 . Além disso
 →
− →
− →
− 
i j k

− ∂ ∂ ∂
 
rot F = 
 
 
 ∂x ∂y ∂z 

yz + x2 xz + 3y 2 xy + sen(z)

− →
− →
− →

= (x − x) i + (y − y) j + (z − z) k = 0 .
Capítulo 4. Integrais de Superfície 120



Pelo teorema 111, temos que F é um campo gradiente, ou seja, existe f (x, y, z)


tal que F = ∇f . Além disso
Z


F · dr = f (2, 4, 10) − f (−2, 4, 10). (4.11)
C

A função potencial f deve ser tal que


∂f


 = yz + x
∂x



∂f


= xz + 4y 3

 ∂y
∂f


= xy + sen(z).



∂z
Integrando a primeira equação com relação a x, a segunda com relação a y e a
terceira com relação a z obtemos
x2
f (x, y) = xyz + + C1 (y, z)
2
f (x, y) = xyz + y 4 + C2 (x, z)
f (x, y) = xyz − cos(z) + C3 (x, y).

Comparando as equações acima temos que, fazendo C1 (y, z) = y 4 −cos(z), C2 (x, z) =


x2 x2 →

− cos(z) e C3 (x, y) = + y 4 , uma função potencial para F é dada por
2 2
x2
f (x, y, z) = xyz + + y 4 − cos(z).
2
Por (4.11) temos
Z


F · dr = f (2, 4, 10) − f (−2, 4, 10)
C
22 (−2)2
! !
= 80 + + 44 − cos(10) − −80 + + (−4)4 − cos(−10)
2 2
= 160.

4.6 Teorema de Gauss


Considere o seguinte exemplo:
Capítulo 4. Integrais de Superfície 121

Figura 71 – Interseção de 2z = x2 + y 2 e y = x2 .

Problema 113. Encontre o fluxo do campo



−  2

F = x + y 2 z 100 , y + ex z, z + cos(y 2 + 1)

através de S orientada positivamente, onde S é a superfície do cubo determinado


pelos planos z = 0, z = 1, x = 0, x = 1, y = 0 e y = 1.

Como a superfície S é formada pela união das seis faces de um cubo temos
6 Z Z
Z Z

− → − →
− →
F · n ds = F ·−
X
n ds,
S i=1 Si

onde cada Si é uma face do cubo.


Esse tipo de problema tem uma dificuldade operacional grande, uma vez que,
embora a superfície a princípio seja simples, ela exige que sejam feitas várias contas.


Além disso, dependendo dos termos do campo F , as contas podem se tornar muito
complicadas.
O teorema que veremos a seguir, que também é uma generalização do teorema de
Green, relaciona a integral em uma superfície S fronteira de uma região compacta
W do R3 com uma integral tripla em W .
Capítulo 4. Integrais de Superfície 122

Figura 72 – Superfície S.

Teorema 114 (Teorema de Gauss). Seja W um sólido compacto de R3 , e seja




∂W orientada positivamente. Seja F = (F1 , F2 , F3 ) um campo vetorial C 1 em um
aberto contendo W . Então
Z Z

− → Z Z Z


F · d−s = div F dV, (4.12)
∂W W

− ∂F1 ∂F1 ∂F1
onde div F = + + .
∂x ∂y ∂z

Ideia da demonstração. A demonstração é similar a do teorema de Green.


Como
Z Z Z

− Z Z Z
∂F1 Z Z Z
∂F2 Z Z Z
∂F3
div F dV = dV + dV + dV,
W W ∂x W ∂y W ∂z
e
Z Z

− →
F · d−
s =
Z∂WZ Z Z Z Z
= (F1 , 0, 0) · →

n ds + (0, F2 , 0) · →

n ds + (0, 0, F3 ) · →

n ds,
∂W ∂W ∂W
basta mostrar que
Z Z Z
∂F1 Z Z
dV = (F1 , 0, 0) · →

n ds,
W ∂x ∂W
Z Z Z
∂F2 Z Z
dV = (0, F2 , 0) · →

n ds,
W ∂y ∂W
Z Z Z
∂F3 Z Z
dV = (0, 0, F3 ) · →

n ds.
W ∂z ∂W
Capítulo 4. Integrais de Superfície 123

Supondo inicialmente que W pode ser escrita como região dos tipos I, II e III, a
demonstração das três partes é similar aquela do teorema de Green. Quando S não
é simples podemos decompô-la como uma união finita de regiões simples, isto é,
W = W1 ∪ ... ∪ Wn . Usando a fórmula de Gauss em cada região simples, obtemos
n Z Z
Z Z Z

− →
− →
div F dV = F ·−
X
n ds.
W i=1 ∂Wi

Observando que os vetores normais exteriores à fronteira comum de duas regiões


simples são opostos, concluímos que as integrais de superfície correspondentes são
simétricas e, portanto, se cancelam. Assim
n Z Z

− → Z Z

− →
F ·−
n ds = F ·−
X
n ds,
i=1 ∂Wi ∂W

o que conclui a demonstração.




Voltando ao problema 113, como F ∈ C 1 e S é fronteira de uma região compacta
do R3 , pelo teorema de Gauss temos
Z Z

− → Z Z Z

− Z Z Z
F d−s = div F dV = 1 + 1 + 1dV
S Z Z W
Z W

=3 dV = 3 · vol(W )
W

= 3.

Observação 45. O teorema de Gauss também é conhecido como teorema da


Divergência ou teorema de Ostrogradsky.


Exemplo 115. Seja F = (z, −xy, xz − z). Determine o fluxo através de S se:

(a) S1 é a superfície do sólido limitado por x2 + y 2 = 1, z = 1 e y + z = 4


orientada com normal para dentro.

(b) S2 é a lata cilíndrica sem fundo limitada pelas superfícies de (a) orientada
positivamente.


Solução. (a) S1 limita uma região compacta W do R3 , e F ∈ C 1 em R3 . Logo,
pelo teorema de Gauss
Z Z

− − Z Z

− − Z Z Z


Φ= F · n→
D ds = − F · →ds = −
n F div F dV.
S1 S1 W
Capítulo 4. Integrais de Superfície 124



Como div F = −1, e W em coordenadas cilíndricas é limitada por





0 ≤ θ ≤ 2π

0≤r≤1
1 ≤ z ≤ 4 − y = 4 − r senθ


Portanto
Z Z Z

− Z Z Z Z 2π Z 1 Z 4−r senθ
Φ=− div F dV = dV = rdzdrdθ
W W 0 0 1
Z 2π Z 1 Z 2π Z 1
= r(4 − r senθ − 1)drdθ = 3r − r2 senθdrdθ
0 0 0 0
Z 2π
3 senθ
= − dθ
0 2 3
= 3π.

(b) Se S3 é o fundo da lata cilíndrica S1 do item (a), então S1 = S2 ∪ S3 . Temos


então que Z Z

− → Z Z

− → Z Z

− →
F · d−s = F · d−s + F · d−
s.
S1 S2 S3
Pelo item anterior temos
Z Z

− −
F · n→
F ds = −3π,
S1

e portanto Z Z

− → −
Z Z

− →
F · d s = −3π − F · d−
s, (4.13)
S2 S3
onde S3 está orientada com a normal para baixo. S3 é uma porção do plano
z = 1 que pode ser parametrizada como

φ(u, v) = (v cos u, v senu, 1), (u, v) ∈ D},

onde D = [0, 2π] × [0, 1]. Temos então

||φu × φv || = v,

e
Capítulo 4. Integrais de Superfície 125

Figura 73 – Superfície S.

Z Z

− → Z Z


F · d−
s = F (v cos u, v senu, 1) · (0, 0, −1)vdA
S3 D
Z Z
= (1, −v 2 senu cos u, v cos u − 1) · (0, 0, −1)vdA
D
Z 2π Z 1
= (1 − v cos u)vdvdu
0 0
! 1
Z 2π
v2 v3 Z 2π
1 cos u
= − cos u du = − du

0 2 3
0 0 2 3

u senu
= − =
2 3

0

= π.

Por (4.11) temos Z Z



− →
F · d−
s = −3π − π = −4π.
S2

O teorema de Gauss nos permite obter uma interpretação para o divergente de




um campo vetorial F num ponto P0 . Dado P0 , seja Wr o sólido limitado por uma
Capítulo 4. Integrais de Superfície 126



esfera de raio r e centro em P0 , contido no subconjunto aberto do R3 no qual F é


de classe C 1 . Aplicando o teorema de Gauss ao campo F sobre Wr , obtemos
Z Z Z

− Z Z

− →
div F dV = F ·−
n ds,
Wr ∂Wr

onde →
−n representa o campo de vetores normais unitários exteriores a Wr . Pelo
teorema do valor médio para integrais temos que
Z Z Z

− →

div F dV = div F (P ′ )V (Wr ),
Wr

onde P ′ é um ponto de Wr e V (Wr ) é o volume de Wr . Isso nos permite escrever



− 1 Z Z →
− →
div F (P ′ ) = F ·−
n ds.
V (Wr ) ∂Wr

Fazendo r → 0, obtemos

− 1 Z Z →
− →
div F (P0 ) = lim F ·−
n ds,
r→0 V (Wr ) ∂Wr


− →

ou seja, o div F (P0 ) nos dá o fluxo do campo F por unidade de volume em P0 .


No caso em que F representa o fluxo de um fluido, então o teorema de Gauss diz
que a expansão total do fluido no interior de uma região W ∈ R3 deve ser
igual ao fluxo total do fluido para fora da fronteira de W.

Exemplo 116. Seja



− (x, y, z)
E =q ,
(x2 + y 2 + z 2 )3/2
o campo elétrico criado por uma carga q localizada na origem. Determine o fluxo


de E com normal orientada para fora nas seguintes superfícies:

(a) S1 a esfera de centro 0 e raio a > 0.

(b) S2 qualquer superfície que limita uma região W do R3 contendo a origem no


interior.

Solução. (a) Apesar de S1 limitar uma região compacta W do R3 não podemos




aplicar o teorema de Gauss pois F não está definido em (0, 0, 0) ∈ W . Vamos
Capítulo 4. Integrais de Superfície 127

calcular a integral diretamente. Sabemos que o vetor normal unitário da


esfera de raio a é
x y z
 


nf = , , ,
a a a
e portanto


− −→=q (x, y, z) (x, y, z)
F ·n f ·
(x2
+y +z )
2 2 3/2 a
q(x + y + z )
2 2 2
=
a(x2 + y 2 + z 2 )3/2
q
= √ 2 .
a x + y2 + z2

Figura 74 – Superfície S1 .

Para (x, y, z) ∈ S1 temos então



− −→= q,
F ·nf
a2
e portanto
Z Z

− − Z Z
q
Φ= F · n→
F ds = ds
S1 S1 a2
q q
= 2 Área(S1 ) = 2 4πa2
a a
= 4qπ.
Capítulo 4. Integrais de Superfície 128

(b) Como (0, 0, 0) está no interior de W , então existe a > 0 tal que a esfera S1
de raio a está contida em W . Apesar de não podermos aplicar o teorema
da Gauss na região W , podemos aplica-lo na região W̄ entre S2 e S1 , pois


F ∈ C 1 em W̄ , ou seja
Z Z Z

− Z Z

− →
div F dV = F ·−
n ds,
W̄ S2+ ∪S1−

onde S2+ é a superfície W orientada com normal pra fora e S1− é a esfera de


centro na origem e raio a com normal orientada para dentro. Como div F = 0,
temos Z Z

− →
+ −
F ·− n ds = 0,
S2 ∪S1

o que implica Z Z

− → −
Z Z

− →
F · n ds + F ·−
n ds = 0,
S2 +
S1−

e portanto Z Z

− → −
Z Z

− →
+
F · n ds = F ·−
n ds = 4qπ.
S2 S1+

Figura 75 – Uma superfície qualquer S2 e a esfera S1 .

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