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4 Laboratório Associado para a Sustentabilidade e Tecnologia em Regiões de Montanha (SusTEC), Instituto Politécnico de Bragança, Campus de Santa Apolónia, 5300-253 Bragança, Portugal
(*E-mail: prodrigues@ipb.pt)
https://doi.org/10.19084/rca.28027
Recebido/received: 2022.09.07
Aceite/accepted: 2022.11.02
RESUMO
A bebida láctea fermentada à base de leite de cabra é uma alternativa interessante para a diversificação dos produtos
lácteos, que possibilita o uso do soro oriundo da produção de queijo. O objetivo do estudo foi desenvolver e caracterizar
formulações de bebidas lácteas fermentadas a partir do leite de cabra com adição de 20%, 40% e 60% de soro. A caracte-
rização foi efetuada ao longo de 21 dias, avaliando: pH, acidez, composição nutricional, contagem de bactérias láticas,
bactérias mesófilas e psicrófilas aeróbias, bolores e leveduras, e aceitação sensorial. Todas as formulações apresentaram
redução significativa de pH e aumento da acidez nos primeiros 14 dias de armazenamento, seguidas de estabilização
até ao final da vida de prateleira. Os teores de proteínas, cinza e hidratos de carbono cumpriram os padrões legislados
no Brasil, sem diferença significativa entre as formulações de 20% e 40%, mas a concentração de lípidos das bebidas com
40 e 60% de soro foi inferior ao limite mínimo estabelecido. Todas as formulações apresentaram parâmetros microbioló-
gicos satisfatórios em relação ao padrão legislado no Brasil para bebidas lácteas pasteurizadas - utilizado como referên-
cia (7,5 x 104 UFC/mL), mas a formulação 60% foi rejeitada do ponto de vista sensorial. Considerando o aproveitamento
da maior quantidade de soro possível preservando as características das bebidas láticas fermentadas e a aceitação do
consumidor, a formulação de 40% foi a que mostrou melhor desempenho.
Palavras chaves: Produtos inovadores, consumidor, soro, laticínios, economia circular
ABSTRACT
The fermented drink based on goat’s milk is an interesting alternative to the diversification of dairy products, allowing
the producer to use cheese whey. The present study aimed to develop and characterize formulations of fermented dairy
drinks from Serrana goat milk with 20%, 40% and 60% whey added. The nutritional characterization was carried out
over 21 days based on the parameters: pH, acidity, proximate composition, lactic acid bacteria counts, aerobic meso-
philic and psychrophilic bacteria counts, mold and yeast counts, and sensory acceptance. All formulations showed a
significant decrease in pH and increase in acidity in the first 14 days of storage, followed by stabilization until the end
of the shelf life. Protein, ash and carbohydrate contents met the legislated standards, with no significant difference
between the 20% and 40% formulations, but the lipid concentration of the beverages with 40 and 60% whey was lower
than the established limit. All formulations showed satisfactory microbiological parameters, but the 60% formulation
was rejected from a sensory point of view. Considering the use of the largest possible amount of whey, preserving the
characteristics of fermented lactic drinks and consumer acceptance, the 40% formulation showed the best performance.
Keywords: Innovative products, consumer, whey, dairy, circular economy
Amostras
Parâmetro
Leite (g/100 g) Soro (g/100 g)
Humidade 86,93 ± 0,08 92,23 ± 0,21
Hidratos de carbono 5,30 ± 0,10 4,80 ± 0,20
Proteínas 3,40 ± 0,05 0,97 ± 0,01
Lípidos 3,66 ± 0,07 0,53 ± 0,04
Cinza 0,69 ± 0,1 0,49 ± 0,00
pH 6,22 ± 0,11 4,48 ± 0,43
Acidez (ácido lático) 0,17 ± 0,00 0,42 ± 0,01
Valor energético (Kcal/100g) 68 ± 1 37 ± 1
Quadro 3 - Evolução dos valores médios de pH das amostras de bebidas lácteas fermentadas ao longo de 21 dias de
armazenamento (n=3, média ± desvio-padrão)
Formulação pH
(% soro) 0 dias 7 dias 14 dias 21 dias
A1 (20%) 4,68 ± 0,01 Aa 4,42 ± 0,01 Bb 4,36 ± 0,01 Cb 4,36 ± 0,01Cb
A2 (40%) 4,68 ± 0,01Aa 4,37 ± 0,01Bc 4,33 ± 0,01Cc 4,37 ± 0,02Bb
A3 (60%) 4,70 ± 0,02Aa 4,44 ± 0,01Ba 4,43 ± 0,01Ca 4,45 ± 0,01Ba
Pr > F(Model) 0,122 <0,0001 <0,0001 <0,0001
Significância Não Sim Sim Sim
Nota: Letras maiúsculas diferentes na horizontal refletem diferenças significativas entre tempos de armazenamento, para a mesma formulação. Letras minúsculas
diferentes na vertical refletem diferenças significativas entre formulações, para o mesmo tempo de armazenamento.
Quadro 4 - Evolução dos valores médios de acidez (g ácido lático/100g) das amostras de bebidas lácteas fermentadas ao longo
de 21 dias de armazenamento
Quadro 5 - Composição nutricional das amostras de bebidas lácteas fermentadas (n=3, média ± desvio padrão)
Quadro 6 - Valores médios de aeróbios mesófilos, aeróbios psicrófilos e bolores e leveduras (n=3, média ± desvio-padrão),
expressos em UFC/mL
Alimentos do grupo dos leites fermentados, como com a avaliação da influência da adição do soro na
os iogurtes e as bebidas lácteas fermentadas com estabilidade destas bactérias e do produto ao lon-
adição de polpa de frutas e/ou açúcar, como é o go do tempo de vida útil. Com base nos resultados
caso das bebidas avaliadas neste estudo, são mais expressos no Quadro 7, é possível verificar que a
suscetíveis ao crescimento de leveduras (Silva et incorporação das diferentes concentrações de so-
al., 2010), no entanto, estas não foram detetadas nas ro não afetou significativamente o crescimento e a
amostras analisadas. De igual forma, não foram viabilidade destas bactérias, pois todas as formula-
detetados microrganismos aeróbios psicrófilos. ções apresentaram contagens de BAL viáveis den-
Não existem, na legislação vigente, limites estipu- tro dos padrões mínimos de 106 UFC/mL no final
lados para contagens de microrganismos aeróbios da vida de prateleira, conforme as exigências da le-
mesófilos em bebidas lácteas fermentadas. No en- gislação vigente (Brasil, 2005), e não apresentaram
tanto, utilizou-se como parâmetro o padrão legis- diferença significativa para nenhum dos tratamen-
lado para bebidas lácteas pasteurizadas - 7,5 x 104 tos avaliados.
UFC/mL (Brasil, 2005). Sendo assim, pode-se consi-
derar que as bebidas elaboradas no presente traba- Quadro 7 - Resultados obtidos para a contagem de
lho estão de acordo com o esperado para qualidade bactérias láticas nos tempos 0 dias e 21 dias de
microbiológica de produtos lácteos fermentados armazenamento (n=3, média ± desvio-padrão),
e apresentaram estabilidade ao longo do período expressos em log10 UFC/mL
analisado.
Formulação Contagem de bactérias láticas (log10 UFC/mL)
(% soro) 0 dias 21 dias
As análises para quantificação de microrganismos A1 (20%) 8,87 ± 0,41 Aa 8,34 ± 0,52 Aa
mesófilos, pscicrófilos, e bolores e leveduras em ali- A2 (40%) 9,06 ± 0,28 Aa 8,82 ± 0,45 Aa
mentos são utilizadas no controlo da qualidade do A3 (60%) 8,44 ± 0,68 Aa 8,01 ± 0,17 Aa
leite como um indicador de higiene e de qualidade Nota: Letras maiúsculas diferentes refletem diferenças significativas entre
geral, uma vez que em elevadas quantidades po- tempos de armazenamento, para a mesma formulação. Letras minúsculas
diferentes refletem diferenças significativas entre formulações, para o mesmo
dem indicar falhas na higienização de processos, tempo de armazenamento.
AGRADECIMENTOS
CONCLUSÕES
Os autores agradecem à Fundação para a Ciência
No presente trabalho, a incorporação de soro ca- e a Tecnologia (FCT, Portugal) e aos fundos nacio-
prino para a elaboração de bebidas lácteas fer- nais FCT/MCTES (PIDDAC) pelo apoio financeiro
mentadas apresentou-se como uma alternativa ao CIMO (UIDB/00690/2020 e UIDP/00690/2020) e
viável de ampliação do portifólio de produtos SusTEC (LA/P/0007/2020).
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