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Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

EDUCAÇÃO POPULAR NAS CARTAS DO EDUCADOR


CARLOS RODRIGUES BRANDÃO:
CONTRIBUIÇÕES PARA A PEDAGOGIA LATINO-AMERICANA

Fernanda dos Santos Paulo


Adriana Gaio

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Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

NOTA: Dado o caráter interdisciplinar desta coletânea, os textos publicados respei-


tam as normas e técnicas bibliográficas utilizadas por cada autor. A responsabilidade
pelo conteúdo dos textos desta obra é dos respectivos autores e autoras, não signifi-
cando a concordância dos organizadores e da editora com as ideias publicadas.
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19.02.1998, Lei dos Direitos Autorais).

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Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

Fernanda dos Santos Paulo


Adriana Gaio

EDUCAÇÃO POPULAR NAS CARTAS DO EDUCADOR


CARLOS RODRIGUES BRANDÃO:
CONTRIBUIÇÕES PARA A PEDAGOGIA LATINO-AMERICANA

Editora Livrologia
Chapecó-SC
2021

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Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

CONSELHO EDITORIAL INTERNACIONAL E NACIONAL


Ivo Dickmann - Unochapecó
Ivanio Dickmann - UCS
Jorge Alejandro Santos - Argentina Viviane Bagiotto Botton – UERJ
Francisco Javier de León Ramírez – México Fernanda dos Santos Paulo – UNOESC
Carelia Hidalgo López – Venezuela Cesar Ferreira da Silva – Unicamp
Marta Teixeira – Canadá Tiago Ingrassia Pereira – UFFS
Maria de Nazare Moura Björk – Suécia Carmem Regina Giongo – Feevale
Macarena EstebanIbáñez – Espanha Sebastião Monteiro Oliveira – UFRR
QuecoiSani – Guiné-Bissau Adan Renê Pereira da Silva – UFAM
Inara Cavalcanti – UNIFAP
Ionara Cristina Albani - IFRS

Esse livro passou pelo processo de revisão por pares


dentro das regras do Qualis Livros da CAPES

Apoio: CNPq - Chamada MCTIC/CNPq Nº 28/2018 - Universal/Faixa A

FICHA CATALOGRÁFICA

P331e Paulo, Fernanda dos Santos.


Educação popular nas cartas do educador Carlos Rodrigues Brandão:
contribuições para a pedagogia latino-americana / Fernanda dos Santos
Paulo, Adriana Gaio. – Chapecó: Livrologia, 2021.

ISBN: 9786586218817
DOI: 10.52139/livrologia9786586218817

1. Educação popular. 2. Brandão, Carlos Rodrigues, 1940-. I. Gaio, Adriana. II.


Título.

2021-0171 CDD 370.1150981 (Edição 21)


Ficha catalográfica elaborada por Karina Ramos – CRB 14/1056

© 2021
Permitida a reprodução deste livro, sem fins comerciais,
desde que citada a fonte.
Impresso no Brasil

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Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

SUMÁRIO

Carta-Prefácio ............................................................................................. 7
Carta-Pedagógica de Carlos Rodrigues Brandão ........................................ 10
APRESENTAÇÃO .................................................................................. 15
CAPÍTULO - 1 ......................................................................................... 18
PRIMEIRAS PALAVRAS ....................................................................... 18
CAPÍTULO - 2 ......................................................................................... 28
CAMINHOS METODOLÓGICOS PERCORRIDOS ............................. 28
SISTEMATIZAÇÕES DE EXPERIÊNCIAS ........................................... 35
2.1 CARTAS COMO DOCUMENTOS: RECUPERAÇÃO DO
PROCESSO VIVIDO ............................................................................... 37
CAPÍTULO - 3 REVISÃO DE LITERATURA: ANÁLISECRÍTICA DA
PRODUÇÃO TEÓRICA ......................................................................... 46
3.1 REVISÃO DE LITERATURA: CONTEXTUALIZANDO OS
ACHADOS .............................................................................................. 48
CAPITULO 4 ........................................................................................... 58
HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO POPULAR NO BRASIL ......................... 58
4.1MAPEAMENTO DAS CARTAS DO ACERVO DO EDUCADOR
CARLOS RODRIGUES BRANDÃO: PRINCIPAIS INTELECTUAIS DA
EDUCAÇÃO POPULAR ........................................................................ 71
4.1.1 Educação Popular presente no Acervo de Cartas do educador Carlos
Rodrigues Brandão: principais temas e ideias ............................................ 88

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Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

CAPÍTULO 5 .......................................................................................... 114


A HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO POPULAR E CONTRIBUIÇÕES PARA
A PEDAGOGIA LATINO-AMERICANA A PARTIR DAS CARTAS . 114
5.1 INDÍCIOS DE UMA PEDAGOGIA LATINO-AMERICANA NA
PERSPECTIVA DA EDUCAÇÃO POPULAR A PARTIR DAS CARTAS
PEDAGÓGICAS DE CARLOS RODRIGUES BRANDÃO ................. 120
5.1.1 Participação: Marcela Gajardo e Orlando Fals Borda ..................... 122
5.1.2 Socialismo democrático: pautas da Educação Popular. ................... 123
5.2 EDUCAÇÃO POPULAR E A PEDAGOGIA LATINO-
AMERICANA: MOVIMENTOS DE RESISTÊNCIA E ESPERANÇA 131
CONSIDERAÇÕES PARA CONTINUIDADE DOSDIÁLOGOS ........ 135
POSFÁCIO DE DANILO R. STRECK .................................................. 140
REFERÊNCIAS ...................................................................................... 143
SOBRE AS AUTORAS ........................................................................... 158

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Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

CARTA-PREFÁCIO

Breve carta para uma jovem pesquisadora (Adriana Gaio)


e para minha amiga e sua orientadora (Fernanda Paulo)

Olá, meninas, tudo bem? Participei da banca de dissertação da Adri,


participo do projeto de pesquisa com as Cartas de Brandão e acompanhei o
pós-doutorado de Fernanda. Assim, resolvi sistematizar o que li, acompa-
nhei e aprendi nessa carta pra vocês – e que bom saber que o resultado das
pesquisas resulta em um livro. Creio que assim sigo fiel ao movimento de
reinvenção do legado de Paulo Freire (um dos maiores escritores de cartas
pedagógicas) e parceiro do Carlos Rodrigues Brandão, mestre e amigo que
tenho tanta admiração.
Assim, penso que o trabalho que analisamos, e temos agora em
mãos como livro – resultado da versão final da dissertação em Educação, do
Programa de Pós-Graduação da UNOESC (universidade comunitária como
a Unochapecó) cumpre os requisitos solicitados pelo cânone da Academia: é
original, inédita (e viável), rigorosa, metodologicamente bem orientada e
com uma análise crítica das materialidades das cartas enviadas/recebidas
por Brandão (memória viva da Educação Popular latino-americana).
Além disso, conecta-se profundamente ao projeto aprovado junto ao
CNPq na chamada universal de 2018, que visava perscrutar as Cartas de
Brandão, dando uma contribuição importante para desvelar o que estava
guardado, revelar o não conhecido, publicizar os documentos que registram
diálogos que forjaram o que hoje chamamos de Educação Popular.
A originalidade do livro não está nas cartas, porque eles já existiam,
mas na forma como foram catalogadas, organizadas, analisadas. Ainda mais
nas sínteses, onde Adriana e Fernanda nos mostram de forma sintética os
grandes temas presentes nelas, produzindo ciência sobre a história da Educa-
ção Popular tomando como ponto de partida o discurso engajado dos sujei-
tos que produziram os encontros de formação, a alfabetização, as lideranças,
as entidades, as redes, as experiências esquecidas e as resistências necessá-

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Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

rias, entre tantas outras questões que emergiram da análise das cartas de
Brandão, remetendo ao inédito viável!
Debruçar-se sobre cartas escritas pelos sujeitos da Educação Popular
dos anos de 1960-1980 é produzir ciência nova, é fazer pesquisa arrojada,
rigorosamente amorosa e dialógica, redescobrindo e reinventando formas de
produzir conhecimento que dialogam por um lado com os princípios freiria-
nos da valorização do saber de experiência feito, do contexto concreto como
ponto de partida – fazendo o caminho, ou trânsito, como gostava Freire
nessa época, do senso comum a consciência filosófica-científica.
Uma carta como as analisadas nessa obra, podem ficar esquecidas
numa gaveta, contendo um conteúdo riquíssimo, registrando a gênese e o
desenvolvimento da Educação Popular, mostrando os sujeitos e ideias que
traduzem o tempo dos anos 1960-1980, mas também as lutas, a clandestini-
dade, as proibições, os cerceamentos, as censuras, os impedimentos... O que
esses sujeitos viveram devem servir de vitamina para nós, hoje em tempos
parecidos – mesmo que diferentes – precisamos tomar como ponto de parti-
da para nossa práxis de educadores/as, pesquisadores/as e produzir o novo,
sem ficar reproduzindo o produtivismo academicista, escrevendo sobre mais
do mesmo, sem inovação ou reinvenção.
Por isso, esse livro planta uma semente: produzir outros tipos de co-
nhecimento é possível. Podemos parar de usar a ciência positivista como
muleta para seguir produzindo academicamente. Precisamos avançar para a
invenção de um novo método, precisamos ousar como Freire e os pionei-
ros/as de 1960-1980.
Penso que temos que seguir as trilhas que esse livroabriu, avançar
nesse novo caminho com passos firmes e de mãos dadas, lançar redes nesse
mar que está a nossa frente, imenso, desconhecido, mas que se mostra aco-
lhedor, que aposta na amorosidade, na acolhida, na partilha, no diálogo, na
ternura, na intuição, na generosidade. Ou seja, que ultrapassa a impressão
dicotômica do ser humano somente racional, suprimindo a emoção, e incor-
pora o que já foi produzido pela Ecopedagogia de Cruz Prado e Gutiérrez;
do pensamento de Maturana (que dialogava com Freire por cartas com o
apoio do prof. Adriano Nogueira); da nova física quântica; da nova biologi-
amorfogenética que afirma que nossos genes são resultado da repetição dos
hábitos culturais (a genética é cultura repetida) ...

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Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

Enfim, meninas, acredito que a vantagem epistemológica dos opri-


midos afirmada por Freire, que redobra a dimensão ao tratar-se de mulheres
da classe trabalhadora, Adri e Fer, só podia surgir essa nova forma de pro-
duzir conhecimento do protagonismo dessas pesquisadoras, por terem a
vantagem de ver o que nós homens ainda não vemos, que a burguesia não
quer ver (mesmo sabendo que existe), e que a Academia possibilita resolver
isso dialeticamente, no relatório final da tua dissertação – que se tornou esse
livro.
Desejo que tenhamos mais obras como essa. Quero ler mais, e con-
vido a nos unir nessa luta/pesquisa.

Um grande abraço e força na luta!


Prof. Ivo.

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Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

CARTA-PEDAGÓGICA DE CARLOS RODRIGUES BRANDÃO

Do que falavam as cartas?


Do que vale lê-las agora?

Era um tempo em que o instrumento mais moderno para além do lá-


pis e da caneta, era a máquina de escrever. Paulo Freire, por exemplo, prefe-
ria escrever cartas e livros ―a mão‖. Assim aconteceu com Pedagogia do
Oprimido.
E escrevíamos entre nós muitas cartas, em tempos anteriores ao xe-
rox, ao comutador e à internet. Longas cartas algumas delas. E cartas de
Paulo Freire acabaram se convertendo em livros: Cartas á Guiné Bissau, Cartas
aos coordenadores de círculos de cultura de São Tomé e Príncipe, Cartas a Cristina e,
depois, Pedagogia da Correspondência.
Era comum escrevermos então cartas ―à máquina‖, especialmente
quando se tinha uma letra deplorável, como a minha. E muitas vezes usá-
vamos folhas de ―papel carbono‖, para obtermos uma cópia única de nossas
cartas enviadas a uma outra pessoa. Guardei muitas delas assim.
Depois vieram os tempos escuros da ―ditadura militar‖. Me lembro de
documentários dos tempos do domínio nazista na Alemanha e de outras
ditaduras em outros países da Europa. Livros queimados nas ruas e nas pra-
ças, como se não bastassem as tantas fogueiras da Idade Média. Mas então,
entre abril de 1964 e os muitos anos ―militares‖, éramos nós quem queimá-
vamos livros, cartas, documentos ―suspeitos‖, programas de alfabetização de
adultos, fitas gravadas, fotografias. Enfim, tudo o que os donos provisórios
do poder pudessem considerar como ―material subversivo‖. Afinal os ―agen-
tes do SNI – Serviço Nacional de Informação – estavam por toda a parte. E
um simples exemplar de Pedagogia do Oprimido em sua casa ou na mochila
poderia ser motivo para uma detenção policial.
Queimei um número enorme de cartas de outras pessoas, ou escritas
por mim e opiadas com ―carbono‖. Algumas delas teria sido os mais precio-

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Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

sos documentos do que eu vivia então. E vi ao meu redor, por toda parte,
outras pessoas e coletivos de pessoas como eu fazendo o mesmo.
Restaram algumas cartas menos ―comprometedoras‖ e as que troca-
mos após o final do regime militar no Brasil. Preciosas cartas restantes, jus-
tamente as mais ―inofensivas‖ então.
Há toda uma história apagada, silenciada, destruída durante os longos
anos da ditadura militar. Não foi a primeira vez e nem foi apenas aqui no
Brasil. Pessoas companheiras em países como o Uruguai, a Argentina, o
Paraguai e o Chile passaram pelos mesmos perigos, as mesmas fogueiras e os
mesmos sofrimentos. Não será um exagero lembrar que à diferença de outras
vocações pedagógicas, aquilo q que viemos a dar o nome de Educação Popu-
lar foi algo ao longo que boa parte da América Latina, criado, partilhado,
difundido e praticado entre pessoas perseguidas, presas, torturadas, exiladas.
Quase dezesseis anos exilado fora do Brasil foi o preço pago por Paulo Freire
por pretender criar uma modalidade de educação que ao invés de se servir
interesseiramente do povo, viesse a se colocar em seu nome e a seu serviço.
As pessoas que já ―surgiram no mundo‖ depois dos avanços incríveis
na eletrônica, e que desde cedo são usuárias dos recursos abertos pela inter-
net, dificilmente poderão imaginar o que eram os rituais de uma simples
carta. Escolher o papel, decidir se ―escrita a mão‖ ou com ―máquina de es-
crever‖, escrever ou datilografar. Colocar a carta dentro de um envelope e
endereçar. Levar a carta ao correio. Escolher a modalidade do envio: ―carta
simples‖, ―expressa‖ ou ―registradas‖. Colar os selos, escolhidos quando
possível também por critérios estéticos. Enviar enfim a cara. E esperar dias,
às veze meses por uma resposta. Vivi esses rituais durante décadas em minha
vida. E muitas dentre as cartas preservadas e algumas das que estão neste
livro são o que sobrou de tantos e tantos envios e recebimentos.
Esta não é a primeira vez e que eu sou desafiado a escrever o prefácio
de um livro do qual eu sou um dos personagens. É, na verdade, uma estra-
nha experiência. Mas convenhamos que é desde estranhas experiências que
vivemos os nossos grandes aprendizados.
Educação Popular nas Cartas do Educador Carlos Rodrigues Bran-
dão:Contribuições para a Pedagogia Latinoamericana é um livro que sucede um
outro trabalho que possui também cartas como algo mais do que apenas um
―objeto de pesquisa‖. E sendo eu o emissário da maior parte das cartas deste

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Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

livro, devo antecipar que na verdade o seu protagonista principal não sou eu.
É o professor e educador Paulo Freire. É desde a sua obra inapagável e desde
o seu legado, neste ano em que no mundo inteiro nos reunimos para celebrar
―Os 100 anos de Paulo Freire‖ que minhas cartas foram escritas e o que se
trabalha neste livro de Fernanda e Adriana foi pesquisado criteriosamente e
foi escrito. Assim, saibamos que este é um livro a respeito do legado de Pau-
lo Freire, através – também – de algumas cartas de Carlos Rodrigues Bran-
dão. Assim, este é um livro... ―através de‖.
De meus anos de convivência com Paulo Freire, posso acreditar que
ele sempre me pareceu gostar mais de falar ao redor de um círculo para um
grupo de pessoas do que de dar aulas em uma sala, para uma turma de alu-
nos (expressão que ele sempre evitava). E penso que ele gostava mais de
escrever carta do que de escrever artigos ou capítulos de livros.
Fernanda dos Santos Paulo e Adriana Gaio apresentam uma obra que
―origina-se da necessidade e importância de conhecermos uma parte da his-
tória da Educação Popular ainda não pesquisada – presentes em documentos
como Cartas/correspondências – as quais denominamos como ― Cartas
Pedagógicas. Identificamos e analisamos a Educação Popular presente no
acervo de cartas do educador Carlos Rodrigues Brandão, apresentando te-
mas, ideias e sujeitos presentes em correspondências datadas entre 1964 e
1980.‖ O livro é uma verdadeira Arqueologia nas minhas cartas. A obra é
resultado do projeto vinculado ao Grupo de Estudos e Pesquisas interinstitu-
cional ―Paulo Freire e Educação Popular‖, constituído a partir da Associa-
ção de Educadores Populares de Porto Alegre (AEPPA) e Movimento e
Educação Popular (MEP), da pesquisa do CNPq, da pesquisa de Mestrado
de Adriana e do Pós-doc de Fernanda. O livro de vocês está de fato... Anto-
lógico!
Quero dizer que nada que parece ―meu‖ é de verdade meu. Apenas
passa por mim e flui entre nós. E este é o valor de quem somos. Como uma
pessoa no mundo universitário há 60 anos, sempre gosto de dizer que os
nossos currículos ―lattes‖ ou ―vitae‖ deveria ser escritos de uma outra ma-
neira. Não tanto a coleção biográfica do ―quem somos e do que realizamos‖,
mas a memória de através de quem e do que acabamos sendo quem proviso-
riamente somos e logramos junto e através de outras pessoas, ―produzir‖ ou
realizar o que ilusoriamente imaginamos ser ―o que eu fiz‖.

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Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

Escrever um livro não é uma tarefa individual, pois em nossa escrita es-
tamos acompanhados de muitas mulheres e muitos homens que escre-
veram sobre temas que compõem nosso arcabouço teórico, e muitos/as
deles/as passam a ser nossos companheiros de vida, não apenas de es-
tudos ou de uma lista de referências bibliográficas

Quero contar queem 27 de abril de 1981 escrevi uma carta a Paulo


Freire. Era uma carta muito simples, e nela eu prestava contas de um livro
que coordenei e de que ele participou. Também tecia alguns comentários
sobre alguns livros que iríamos construir juntos, como de fato aconteceu: O
educador, vida e morte; Pesquisa participante; A questão política da educação popu-
lar. Em um parágrafo da primeira página da carta (ela tem três páginas, pois
naqueles tempos escrevíamos a mão ou a máquina de escrever... e escrevía-
mos longas cartas) eu digo o seguinte:

Ando muito preocupado em colocar em mãos das pessoas os textos de


que elas sentem necessidade para fazerem o seu trabalho com o povo.
Andamos todos muito impressionados com a deficiência de pessoal pre-
parado para trabalhos de educação popular. Alguma coisa precisa ser
feita com muita urgência, e isso não é só publicar não. É colocar as pes-
soas na prática, na práxis, na vida direta das questões e dos problemas.

Mas no parágrafo final da carta mudo de tom e concluo desta for-


ma:

Paulo, onde é que anda o tempo de a gente parar e viver um pouco da


vida entre os amigos? Às vezes parece que isso ficou muito longe. A in-
tensidade das solicitações e dos trabalhos de agora às vezes parece maior
do que nos nossos começos de 1960. Ou será que nós é que andamos nos
cansando?
E, no entanto, quase tudo está ainda por fazer. Será que algum cansaço
pode ser maior do que a fé e a esperança?
Um abraço arrochado. Até Mossoró, com Carne de Sol e o próprio sol
do Nordeste.Carlos.

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Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

Vejam que as minhas preocupações foram escritas há 35 anos. Paulo


nos deixou faz tempo, mas continua presente e vivo! E depois de tantos anos
acho que eu continuo fazendo para mim e pra toda a gente as mesmas per-
guntas.

Um abraço, novembro de 2021.


Carlos Brandão

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Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

APRESENTAÇÃO

Escrever um livro não é uma tarefa individual, pois em nossa escrita


estamos acompanhados de muitas mulheres e muitos homens que escreve-
ram sobre temas que compõem nosso arcabouço teórico, e mutos/as de-
les/as passam a ser nossos companheiros de vida, não apenas de estudos ou
de uma lista de referências bibliográficas.
Ao ler esse livro você, caro/a leitor/a, estará conhecendo um pouco
mais de nós, não apenas sobre as autoras, mas igualmente acerca de quem
está conosco. Um dos sujeitos presentes e protagonista do nosso livro e das
nossas pesquisas é o educador popular Carlos Rodrigues Brandão. Contudo,
como dissemos, anteriormente, o presente livro é fruto de um trabalho cole-
tivo que conta com a participação de mais de sessenta pesquisadores e pes-
quisadoras do Brasil, podendo ser constatado no livro intitulado ―Arqueolo-
gia nas cartas de Carlos Rodrigues Brandão: contribuições para a Educa-
ção Popular‖ e ―Cartas pedagógicas: tópicos epistêmico-metodológicos na
educação popular.”
O livro resulta do projeto de pesquisa financiada pelo CNPq através da
Chamada MCTIC/CNPq Nº 28/2018, intitulado como: ―Memória e Histó-
ria da Educação Popular a partir do levantamento e catalogação das cartas
de Carlos Rodrigues Brandão: contribuições para a Pedagogia Latino-
americana.‖ O projeto é coordenado pela professora Fernanda dos Santos
Paulo, educadora popular e professora do Programa de pós-graduações stricto
sensu em Educação (Mestrado e Doutorado) da Universidade do Oeste de
Santa Catarina: PPGEd/Unoesc. Compõe, igualmente, a pesquisa de Pós
doutoramento de Fernanda Paulo, sob supervisão de Danilo R. Streck, reali-
zada na Unisinos.
Este livro, no entanto, é resultado dessas pesquisas e, do mesmo modo,
vincula-se ao Grupo de Estudos e Pesquisas ―Paulo Freire e Educação Po-
pular‖ interinstitucional, constituido a partir da Associação de Educadores
Populares de Porto Alegre (AEPPA) e Movimento de Educação Popular
(MEP), o qual congrega dezenas de educadores/as com interesse em pesqui-
sas sobre Educação Popular em diferentes contextos educativos. A publica-
ção dessa obra origina-se da necessidade e importância de conhecermos uma
parte da história da Educação Popular ainda não pesquisada – presentes em

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Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

documentos como Cartas/correspondências – as quais denominamos como


―Cartas Pedagógicas”. Identificamos e analisamos a Educação Popular
presente no acervo de cartas do educador Carlos Rodrigues Brandão, apre-
sentando temas, ideias e sujeitos presentes em correspondências datadas
entre 1964 e 1980. Outro objetivo foi às contribuições das Cartas Pedagógi-
cas para a história da Educação Popular e para a Pedagogia Latino-
americana. À luz da pedagogia crítica, nos perguntamos: a partir das ideias e
dos temas educacionais apresentados nas Cartas de Carlos Rodrigues Bran-
dão, escritas entre os anos de 1964 e 1980, quais as contribuições para a his-
tória da Educação Popular e para uma Pedagogia latino-americana? A inves-
tigação, de abordagem qualitativa e com análise documental a partir das
cartas inéditas (documento de primeira mão), constitui-se como contributo
de Sistematização de Experiências da Educação Popular. O aporte teórico
deste estudo traz reflexões e aproximações sobre Educação Popular, Cartas
Pedagógicas e Pedagogia latino-americana. Quanto à fundamentação teóri-
ca, foram utilizados vários autores, entre eles: Jara (2006; 2007), Paulo
(2013; 2018), Camini (2012), Freire (1987; 1994), Brandão (2006), Paulo e
Dickmann (2020), Paulo e Dickmann (2021).
Para a sistematização dos temas, ideias e sujeitos que trocaram cartas
com Brandão, os dados coletados foram organizados em tabelas e quadros.
Constatamos que as Cartas Pedagógicas do educador Carlos Rodrigues
Brandão nos permitem revelar a transcendência da Educação Popular freiri-
ana, identificando seus desdobramentos, que embasam e dão visibilidade
para a pedagogia latino-americana: Educação Popular decolonial e Educa-
ção Popular multicultural. Dos indícios de uma Pedagogia Latino-
Americana, na perspectiva da Educação Popular freiriana, apresentados nas
seções anteriores, destacam-se: 1) Cartas Pedagógicas de Brandão e encon-
tros entre o passado e o presente; 2) Educação Popular das décadas de 1960
a 1980: 3) Experiência(s) contemporânea(s) da Pedagogia Latino-
Americana; 4) As novas pedagogias enquanto resistência política e de espe-
rança. As ideias e os temas encontrados, nos registros do acervo pessoal,
possuem uma relevância histórica e política para a formação docente, para
as reflexões sobre Educação Popular, também para pesquisas em cursos de
stricto sensu em educação, e para futuras investigações.

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Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

Assim, desejamos que esse livro possa contribuir para os estudos e con-
tinuidades de pesquisas, especialmente sobre a História da Educação Popu-
lar no Brasil - conectada com a história da Educação Popular latino-
americana – e, acerca de pesquisas com Cartas/correspondências, em espe-
cial as Cartas Pedagógicas.

Fernanda Paulo e Adriana Gaio

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Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

CAPÍTULO - 1

PRIMEIRAS PALAVRAS

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Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

Sou de um tempo em que nos escrevíamos


cartas. E quando digo cartas estou falando
de ―cartas de verdade. Uma carta de menos
de uma página escrita com ―máquina de es-
crever, para pedir uma simples informação,
ou fazer um breve comunicado, que não ti-
vesse pelo menos uma página inteira em
―espaço um, seria considerada um desres-
peito a quem fosse dirigida. [...] Mesmo
que fosse algo como ―um bilhete, as nossas
cartas de então eram as nossas conversas
por escrito. Eram longas confidências pes-
soais. Eram momentos de dizer a um alguém
algo sobre nossa filosofia de vida, nossas
ideais sobre o presente e nossos ideais
para o futuro. Veja os livros que contém
cartas de Paulo Freire, quando já no exí-
lio.
(Carlos Rodrigues Brandão)
Fonte:Cartas pedagógicas: tópicos epistêmico-
metodológicos na educação popular, 2020.

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Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

Esta obra, parte do Projeto de Pesquisa, financiado pelo Conselho Naci-


onal de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) intitulado como:
Memória e História da Educação Popular a partir do levantamento e catalogação das
cartas de Carlos Rodrigues Brandão (1964 a 1980): contribuições para a Pedagogia
Latino- Americana, coordenado pela professora - doutora Fernanda dos San-
tos Paulo – também resulta das pesquisas de mestrado de Adriana Gaio e do
pós-doutorado de Fernanda Paulo. No Programa de Pós Graduação em
Educação (PPGEd) da UNOESC, realizamos Grupos de Estudos e trabal-
gos, Seminários Temáticos, aprofundando o tema sobre Educação Popular e
seus desdobramentos. Nesse livro o recorte do tema é a identificação e análi-
sedas ideias, dos temas e dos sujeitos presentes nas cartas de Carlos Rodri-
gues Brandão e as possíveis contribuições para a história da Educação Popu-
lar e da Pedagogia Latino-americana.
As cartas de Carlos Rodrigues Brandão apresentam conteúdo político-
pedagógico, elas são trocadas por pensadores de renome no Brasil, o que
também representa uma contribuição para os impasses e retrocessos que
vivemos na atualidade desde a educação básica.
Outras dimensões que justificam a escrita do livro e a socialização do
mesmo, de forma gratuita na modalidade E-book, são:

1) As pesquisas documentais contribuem para o que Boaventura de Sousa


Santos (2009) chama de não desperdiçar a experiência – pouco explorados
em pesquisas;
2) A Sistematização de Experiências utilizando documentos como objeto
de análise – ainda não havíamos encontrados pesquisas de Mestrado e Dou-
torado utilizando apenas esse recurso metodológico.
3) A defesa do nosso Grupo de Estudos, orientados por Fernanda Paulo,
do uso de Cartas Pedagógicas como instrumento metodológico de Pesquisas
Participativas da Educação Popular.

A recuperação do processo vivido, a partir de cartas via Sistematização


de Experiências, é algo inédito e não localizamos o uso dessa metodologia
com análise de documentos. Sendo assim, essa publicação se apresenta como
inédita, pois reinventa a proposta metodológica apresentada por Oscar Jara.

20
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

Também constatamos que a Carta Pedagógica foi um instrumento metodo-


lógico da Educação Popular (acrescentamos de uma pedagogia de participa-
ção1 e de solidariedade2), mesmo que isso não tenha sido reconhecido por
eles e por elas na época. Importante destacar que Paulo Freire trocou corres-
pondências para problematizar e socializar experiências de Educação Popu-
lar – as quais podem ser verificadas em alguns dos seus livros. Brandão tro-
cou cartas com vários sujeitos, em especial no período do exílio (PAULO,
2018; PAULO; DICKMANN, 2020a), um dos sujeitos foi Paulo Freire –
mas essa carta não foi analisada porque não contempla o nosso recorte tem-
poral.
A análise de Cartas Pedagógicas, a partir da Sistematização de Experiên-
cias, não tinha sido, ainda, utilizada em pesquisas acadêmicas, mas, na his-
tória da Educação Popular, tanto Freire quanto Brandão utilizaram corres-
pondências como resistência política e pedagógica.
No total, estudamos 181 cartas, e, dessas, 94 apresentam temas da Edu-
cação Popular de modo explícito e implícito nos textos. Acreditamos que
essa pesquisa contribuirá para a história da educação, em especial no campo
da Educação Popular, uma vez que examinamos centenas de cartas inéditas,
ou seja, ainda não pesquisadas e analisadas na universidade (PAULO,
2018).
Desenvolvemos uma metodologia de análise documental embasada no
referencial crítico, inspirada na pedagogia crítica e em Paulo Freire. Espera-
mos que essa pesquisa, sob a perspectiva de análise crítica, venha a contribu-
ir para a continuidade da história da Educação Popular e da Pedagogia Lati-
no-americana. Os objetivos da pesquisa que realizamos foram:

a) Objetivo Geral:
Investigar as ideias, temas e sujeitos presentes nas cartas de Carlos Rodri-
gues Brandão que possam contribuir para a história da Educação Popular e
para a Pedagogia Latino-americana.

1
Conferir em Fávero (2006, p.209): ―O diálogo era um dos temas presentes em quase todos os
momentos de educação popular no período, principalmente no MEB e no grupo que iniciara o
trabalho com Paulo Freire‖.
2
Vale conferir Andreola (2001), que, inspirado em Freire, argumenta sobre a ética da solidarie-
dade humana.

21
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

b) Objetivos Específicos:
1. Identificar os temas e ideias educacionais abordados nas cartas de
Carlos Rodrigues Brandão, entre os anos de 1964 e 1980, e suas relações
com a Educação Popular.
2. Indicar os sujeitos que trocaram cartas com Carlos Rodrigues Bran-
dão entre os anos de 1964 e 1980.
3. Apresentar as contribuições, presentes nas cartas, para a Pedagogia
latino-americana a partir da Educação Popular.
Com relação às questões problematizadoras, que emergiram a partir da
escolha do tema de pesquisa, destacam-se:

1. Quais temáticas da Educação Popular foram discutidas nas cartas de


Carlos Rodrigues Brandão? Elas ainda são atuais?
2. Quais são as ideias educacionais presentes nessas cartas e quem são
os sujeitos que discutiram Educação Popular entre os anos de 1964 e 1980?
3. De que maneira essas cartas podem contribuir para a história da
Educação Popular e para a Pedagogia latino-americana?

Diante das questões acima, redigimos o seguinte problema de pesquisa: a


partir das ideias e temas educacionais apresentados nas Cartas de Carlos Rodrigues
Brandão, escritas entre os anos de 1964 e 1980, quais as contribuições para a história
da Educação Popular e para uma Pedagogia latino-americana?

O arquivo de Cartas de Carlos Rodrigues Brandão, entre os anos de 1964


e 1980, está assim organizado: 59 cartas entre 1964 e 1969; 56 cartas na
década de 1970; e 66 cartas no ano de 1980. Selecionamos apenas as cartas
escritas em língua portuguesa3 e aquelas que, explícita ou implicitamente 4,
possuíam discussões sobre ―Educação Popular‖. Então, das 181 cartas, fo-
ram selecionadas 94 para análise.

3
Há cartas em espanhol, em inglês e em francês. Muitas escritas à mão. Vamos utilizá-las para
pesquisas posteriores.
4
Fernanda Paulo (2018) traz expressões utilizadas como sinônimas de Educação Popular: educação
crítica libertadora, cultura popular, educação humanizadora, educação revolucionária.

22
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

Quadro 1 - Presença de ideias e temas da Educação Popular


Cartas/ Presença de ideias e temas da Educação Popular Nº de cartas
tempo identificadas
Década Rádio comunitária, cultura popular, poema popu- 32
de 1960 lar, MEB, práxis, diálogo/palavração, conscienti-
zação, IBRA, CELUSA, direitos sociais, alfabeti-
zação de adultos, pesquisa popular, desenvolvi-
mento comunitário socioeconômico, CEFRAL,
linguagem popular, revista práxis, educação indí-
gena, educação camponesa, trabalho popular na
América Latina, serviço comunitário, metodolo-
gia, IRA, INDA, COC, ditadu-
ra/polícia/delegacia, participação do povo, edu-
cação de adultos.
Década Poema, revista práxis, MEB, educação de adultos, 21
de 1970 educação indígena, literatura popular, arte popu-
lar, Educação Popular, CEDI, FUNARTE, reli-
gião popular, cultura popular, mudança social,
negro no Brasil,lutas, saúde, CEDI, poemas polí-
ticos, música popular, seminários sobre pesquisa
de saúde popular, NOVA, folclore, extensão uni-
versitária, catolicismo popular, pesquisa antropo-
lógica, IBRA, religiosidade, Trabalho com os
grupos religiosos, Rituais católicos populares,
Mudança social, Seminário sobre pesquisa de
saúde popular, Grupos de estudo sobre a educação
de adultos, alfabetização popular, terra, violência,
miséria, Levantamento sócio religioso e cultural,
Apostilas de Educação Popular, Trabalho de mu-
lher, Teóricos e práticos da Educação Popular, A
questão política da Educação Popular, Pós-
alfabetização, Livro sobre Educação Popular,
saber de classe, Educação Popular como nos idos
de 1964, Religião Popular no Brasil, Trabalho com

23
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

o Povo, Educação e Cultura Popular, limites Polí-


ticos da Educação, Problema Formal da Educação
Classe-saber, saberes populares, Questões do uso
político do saber, Conscientização, Educação de
classe, Educação do sistema, identidade étnica em
Goiás.
1980 Paulo Freire, Meio Grito, pesquisa com o povo, 41
Gadotti, CEDI, pesquisa participante, saber de
classe, saber popular, trabalho pedagógico, traba-
lho de alfabetização, escolarização popular, cultu-
ra popular, religiosidade popular, treino em alfabe-
tização, métodoPaulo Freire, formação de Educa-
dores Populares, pesquisa participante em Educa-
ção Popular, catolicismo popular, conceitos e
objetivos da Educação Popular, Saúde como uma
forma de Educação Popular, lutas políticas, iden-
tidade e etnicidade no México, as lutas do povo, a
questão da Terra, o trabalho operário, o índio, a
esperança de um outro mundo, ecumenismo po-
pular, teóricos e práticos da Educação Popular,
questão política da Educação Popular, poesia
popular, pós-alfabetização.
TOTAL 94
Fonte: Dados da pesquisa.

Assim sendo, o livro está organizado em cinco capítulos. No primeiro,


são expostos elementos gerais que caracterizam o tema da nossa pesquisa e
sua relação com as autoras. No segundo capítulo, apresentamos o caminho
metodológico percorrido para a realização desta pesquisa. Já no terceiro
capítulo, apresentamos o levantamento bibliográfico sobre a temática abor-
dada. No quarto capítulo, também de fundamentação teórica, é explanada a
História da Educação Popular, dialogando com o resultado da pesquisa.
Não destinamos um capítulo apenas para análise das cartas, ou seja,
dos dados empíricos. A opção por esse caminho decorre da nossa metodolo-
gia, da pedagogia crítica inspirada em Paulo Freire (PAULO, 2013). No

24
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

quinto capítulo, apresentamos e analisamos as ideias, os temas e os sujeitos


presentes nas cartas de Carlos Rodrigues Brandão que contribuem para a
história da Educação Popular e Pedagogia Latino-americana.
Finalmente, na última seção, apresentamos os apontamentos finais,
constituídos por aspectos emergentes e por lacunas encontradas no desen-
volvimento da pesquisa realizada entre os anos de 2018-2021. Para cada
parte do livro apresentamos um espaço denominado ―Pausa Pedagógica‖,
inspirado em Ivo Dickmann e Ivanio Dickmann (2019) – destinada ao leitor
e leitora para anotações e diálogos conosco. Para os autores ―A Pausa Peda-
gógica é um breve momento onde você deve parar, pensar e anotar as primei-
ras aprendizagens que o texto te proporcionou.‖, seguem explicando a ori-
gem do termo: ―A título de registro e gratidão queremos dizer pausa peda-
gógica não é uma invenção nossa. Tivemos contato com ela há alguns anos
através da educadora popular Helena Bins, num curso [...] desenvolvido pelo
CAMP de Porto Alegre, em 2006. (DICKMANN; DICKMANN, 2019,
p.12).

25
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

Síntese do Capítulo

Uma palavra
______________________________________________________

Uma frase
___________________________________________________________
___________________________________________________________
___________________________________________________________
___________________________________________________________
_______________________________________________________

Um parágrafo
______________________________________________________
______________________________________________________
______________________________________________________
______________________________________________________
______________________________________________________
______________________________________________________
______________________________________________________

26
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

―Tanto Brandão como Paulo Freire, autores a quem nos filiamos na con-
cepção de Educação Popular, possuem na sua trajetória teórico-prática
Cartas Pedagógicas que estabelecem diálogo com autores de-coloniais.
Interessante que, ao revisitarmos os livros Cartas a Guiné- Bissau e Dialo-
gando com a própria história, localizamos importantes narrativas, que nos
orientam nas reflexões epistêmicas e metodológicas da Educação Popular,
Pedagogia Latino-americana e suas relações com as Cartas Pedagógi-
cas.De partida, dois fundamentos epistêmico-metodológicos se fazem
presentes nas cartas, ambos coerentes com a concepção de Educação Po-
pular: a dialogicidade eaparticipação 5.‖

(Fernada Paulo e Ivo Dickmann)

5
Cartas pedagógicas: tópicos epistêmico-metodológicos na educação
popular. 1. ed. – Chapecó: Livrologia, 2020. (Coleção Paulo Freire; v. 2). Fernanda dos Santos
Paulo, Ivo Dickmann (organizadores)

27
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

CAPÍTULO - 2

CAMINHOS
METODOLÓGICOS
PERCORRIDOS

28
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

“A nossa intenção sempre foi a de estar utilizando instrumentos de pesqui-


sas coerentes com a Educação Popular (EP) e, com isso, na medida em que
íamos realizando o estudo, também aprendíamos que na Pesquisa Partici-
pante (PP) não havia receitas e que se aprendia praticando-a6.”.

(Fernanda Paulo).

6
PAULO, Fernanda dos Santos. Memórias e trajetórias: sistematização de experiências de
educação popular e de movimentos sociais. l.ed. - São Paulo: Diálogo Freiriano, 2019.

29
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

Na pesquisa qualitativa, fatos e fenômenos são relevantes, e, nesse senti-


do, Minayo (2001, p. 21) conceitua a pesquisa qualitativa como:

[...] responde a questões muito particulares. Ela ocupa, nas ci-


ências sociais, um nível de realidade que não pode ou não de-
veria ser quantificado. Ou seja, ela trabalha com o universo dos
significados, dos motivos, das aspirações, das crenças, dos va-
lores e das atitudes. Esse conjunto de fenômenos humanos é
entendido aqui como parte da realidade social, pois o ser hu-
mano se distingue não só por agir, mas por pensar sobre o que
faz e por interpretar suas ações dentro e a partir da realidade
vivida e partilhada com seus semelhantes

Freire (1981) declara que em Educação Popular pressupõem-se reinven-


ções metodológicas, colocando em prática métodos em que pessoas não
sejam meros objetos. No entanto, a categoria historicidade, atrelada à curiosi-
dade epistemológica, contribui para pesquisas qualitativas, com interpretações
reflexivas em relação à produção do conhecimento, partindo de uma visão
dialógica. Nesse sentido, pesquisas qualitativas, com referencial da pedago-
gia crítica, são coerentes com o pensamento de Paulo Freire.
Em vista disso, nos utilizaremos das contribuições da pedagogia crítica
de Paulo Freire, a qual dialoga com os seguintes pensamentos: o marxismo,
a fenomenologia crítica e o existencialismo cristão (PAULO, 2018). Concor-
dam com essa análise acerca do pensamento filosófico de Paulo Freire auto-
res como Torres (1997), Gadotti (1996) e Brutscher (2005).
No que se refere ao pensamento marxista, Paulo (2018, p. 168) afirma
que:
Pensamento Marxista: Em síntese, tomamos a linha mestra das
obras de Paulo Freire, que postula as dimensões política da
educação e educativa do trabalho. Encontramos em diversas
obras do educador categorias do referencial marxista, e uma de-
las é a de trabalho e a de totalidade, as quais utilizaremos nas
análises dessa pesquisa. Evidenciamos também, presente em
suas obras, o imperativo de problematizar o contexto social e
político da realidade brasileira, no qual o ser humano vive o

30
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

dramatismo do condicionamento econômico da infraestrutura


no condicionamento ideológico da superestrutura. Freire, con-
testando a educação e a política a serviço dos opressores, colo-
ca a necessidade de pensá-las a partir da perspectiva das classes
populares. Sendo assim, dessa influência, destacamos: huma-
nismo concreto, pensamento político socialista, fenômeno da
massificação e análise sobre a coisificação. Marx, Gramsci,
Marcuse, Kosik e Fromm foram alguns dos pensadores que te-
riam influenciado Freire. (Grifo nosso).

No tocante à fenomenologia, constatamos:

Pensamento da Fenomenologia: No livro ‗Professora sim, tia


não: cartas a quem ousa ensinar‘, contamos com uma passa-
gem do texto que coloca a necessidade de realizar, de forma
crítica, a leitura da palavra, do mundo e de contexto, como um
instrumento de organização política da classe popular, ou seja,
através do processo de consciência crítica e educação proble-
matizadora, o ser humano constrói sua consciência como in-
tencionalidade. Destacam-se nesse processo: a conscientização,
a revolução cultural, a educação como ação cultural, o ser no
mundo, a experiência e o mundo vivido. Entre os pensadores
que teriam influenciado Freire estão Edmundo Husserl e Mer-
leau-Ponty. (PAULO, 2018, p. 168).

Além desses, identificamos outros teóricos presentes nas obras de Freire


em um estudo realizado e publicado no livro: Paulo Freire: uma arqueologia
bibliográfica (PITANO; STRECK; MORETTI, 2019). Esse trabalho foi resul-
tado do projeto de pós-doutorado de Sandro de Castro Pitano (2017), deno-
minado ―Articulações teóricas e metodológicas do pensamento de Paulo
Freire: diálogos explícitos, implícitos e possíveis‖, contando com a participa-

31
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

ção de mais de 70 pesquisadores e pesquisadoras que estudam o pensamento


e a obra de Paulo Freire7.
Paulo (2013) revela as influências teóricas e metodológicas de Paulo
Freire, apontando que a filosofia freiriana é embasada pelo pensamento exis-
tencial, fenomenológico, marxista e hegeliano 8. Na sua tese, qualifica o exis-
tencialismo como cristão e destaca o personalismo de Mounier 9 – um desdo-
bramento da dissertação, em que discute o pensamento cristão progressista
presente nos livros de Paulo Freire (PAULO, 2018). Com relação ao existen-
cialismo:
Pensamento Existencial: O ser humano ―existe no e com o
mundo‖ (1981, p.53), compreendido enquanto um ser em cons-
trução, destacando-se, conforme esse autor, no método Paulo
Freire, o conceito antropológico de cultura e o de liberdade.
Alguns dos pensadores que teriam influenciado Freire foram:
Heidegger (estar no mundo), Mounier (ser com os outros), Ga-
briel Marcel e Sartre (ser humano nunca é fim). (PAULO,
2018, p. 167-168).

Nosso embasamento teórico-metodológico, inspirado em Paulo Freire,


sustentará nossas análises – as quais fazem um diálogo entre as correntes
explicitadas anteriormente – constituindo a Pedagogia crítica. Para a realiza-
ção da coleta de dados, utilizaremos a análise de documentos a partir da
Sistematização de Experiências explicitada por Oscar Jara Holliday (2006).

7
No segundo semestre de 2020 participei de um curso de extensão denominado ―Influências da
Filosofia na Pedagogia de Paulo Freire‖, oferecido pela UNINTER e ministrado pela professora
Drª Fernanda Paulo, cujo conteúdo tratou destas influências.
8
Brutscher (2005) expõe as raízes epistemológicas de Freire: mostra que Hegel, Marx e Husserl
foram inspirações de Freire. Em seu livro, encontramos o método dialético e histórico, o méto-
do ver-julgar-agir e o método fenomenológico, que congregam a dialética freireana. No prefácio
desta obra, encontramos a seguinte declaração: "Paulo Freire inspira-se na dialética hegeliana
do Escravo Senhor, mas ele a historiciza e tira daí as consequências para uma educação como
conscientização e emancipação" (GADOTTI, 2005, p.9).
9
Diz Balduino Andreola: ―Paulo Freire conclui Pedagogia do oprimido proclamando sua ―fé nos
homens e na criação de um mundo em que seja menos difícil amar‖. Nesse horizonte, por ele
vislumbrado, a ciência e a práxis humana atingem seus limites. O compromisso meramente
político é insuficiente. Cabe avançar nos horizontes da transcendência e da fé. Sem uma ética do
amor e do perdão, a reconciliação e a solidariedade humana parecem quimera vã. São perspec-
tivas que transitou Mounier e transitam hoje pensadores como Paul Ricoeur‖ (2001, p. 18).

32
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

Conforme Chartier (2001), os documentos não são transparentes, inocentes,


neutros, e não traduzem uma verdade e um significado por si só. Eles carre-
gam um conteúdo produzido por pessoas em determinado contexto históri-
co, cultural, político, e apresentam determinados interesses.
Com a Sistematização de Experiências, de Oscar Jara Holliday (2006;
2012), utilizando-nos da análise documental a partir de cartas inéditas (do-
cumento de primeira mão), nos é possível a busca por contribuições para o
trabalho com informações e questões presentes no objeto de estudo, ―que
ainda não receberam tratamento analítico por nenhum autor.‖ (HELDER,
2006, p.1). Em uma primeira observação, identificamos que essas cartas são
pedagógicas (CAMINI, 2012; FREIRE, 1994; PAULO; DICKMANN,
2020), pois revelam temas pedagógicos, intencionalidades e objetivos explíci-
tos concernentes a assuntos educacionais.
Acreditamos que as categorias marxistas historicidade, mediações e deter-
minações contribuem para o trabalho que desejamos realizar. Esse esforço de
dialogar com as perspectivas filosóficas de Paulo Freire perpassa pelo mar-
xismo, mas não se encerra nele. Isto é, o personalismo de Emmanuel Mou-
nier, em obras de Paulo Freire, contribui para a compreensão de ser humano
como pessoa – categoria importante para análise, pois, assim como Paulo
(2018) constatou, a Educação Popular se faz presente, nas instituições, a
partir de sujeitos individuais, que vão constituindo redes de intelectuais que
pesquisam e/ou estudam o tema (sujeitos coletivos). Ao longo do processo
de leitura das cartas do acervo pessoal de Brandão, observamos que ele cons-
tituiu uma rede de amigos que, mediante trocas de cartas, construíam proje-
tos, discutiam temas e narravam suas experiências. Ademais, havia a discus-
são sobre a necessidade de não separar o fazer do saber e a linguagem do
mundo. Na Pedagogia do Oprimido, observamos a presença do personalis-
mo:

Ninguém pode ser, autenticamente, proibindo que os outros se-


jam. Esta é uma exigência radical. O ser mais que se busque no
individualismo conduz ao ter mais egoísta, forma de ser menos.
De desumanização. Não que não seja fundamental – repitamos
– ter para ser. Precisamente porque é, não pode o ter de alguns
converter-se na obstaculização ao ter dos demais, robustecendo

33
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

o poder dos primeiros, com o qual esmagam os segundos, na


sua escassez de poder. (FREIRE, 1987, p. 43).

A concepção de sujeito/pessoa/ser humano, apresentada acima, é fun-


damental para a compreensão da nossa opção teórico-metodológica, sobre-
tudo porque objetivamos perquirir as ideias, os temas e os sujeitos presentes
nas cartas de Carlos Rodrigues Brandão (sujeito direto da nossa pesquisa)
que possam contribuir para história da Educação Popular e da Pedagogia
Latino-americana. A fundamentação ontológica presente em Paulo Freire
(1987), o ser mais para a humanização, compõe a acepção de ser humano que
busca a construção de projetos históricos de libertação – o que significa que
somos homens e mulheres em movimento (vir a ser), que, reconhecedores de
nossos condicionamentos, lutamos contra todas as formas de opressão.
A concepção de ser humano personalista não está em desacordo com a
concepção marxista de ser humano, a qual entende que somos sujeitos histó-
ricos inconclusos, pois estamos:

[...] sendo, como seres inacabados, inconclusos, em e com uma


realidade, que sendo histórica também, é igualmente inacaba-
da. Na verdade, diferentemente dos outros animais, que são
apenas inacabados, mas não são históricos, os homens se sa-
bem inacabados. Têm a consciência de sua inconclusão.
(FREIRE, 1987, p. 42).

Compreendemos que para Freire (1987) o ser humano, na sua incom-


pletude, pode - por meio de processos educativos críticos e emancipatórios -
libertar-se das amarras do sistema opressor-alienante e alienador. Daí a im-
portância de Freire (1987, p. 42), com o seu entendimento de que ―a educa-
ção se refaz constantemente na práxis. Para ser tem que estar sendo.‖, inspi-
rado por um viés marxista, como, por exemplo, pela obra: Filosofia da prá-
xis, de Sánchez Vázquez (1997).
Já no tocante à fenomenologia, nos livros de Paulo Freire (fenomenolo-
gia dialética), a descrição interpretativa dos fenômenos pode nos ajudar a
compreender as intencionalidades presentes no objeto de estudo, nas rela-
ções de subjetividade e objetividade:

34
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

Enquanto ser humano, jamais aceitei que minha presença e


minha passagem por ele fossem pré-estabelecidas. A minha
compreensão das relações entre subjetividade e objetividade,
consciência e mundo, prática e teoria foi sempre dialética e não
mecânica. (FREIRE, 2000a, p. 89).

Trabalhar com as cartas de Carlos Rodrigues Brandão, com base nessa


perspectiva freiriana, é tomar uma posição frente às nossas escolhas. Primei-
ro, acreditamos que Paulo Freire contribui com estudos metodológicos 10
(FREIRE, 1987; PAULO, 2018). Segundo, as suas inspirações filosóficas
não são antagônicas, isto é, podemos afirmar que existe na pedagogia freiri-
ana uma possibilidade de pensarmos uma Pedagogia Latino-americana em
uma perspectiva crítica, sem dogmatismos. Diante das opções, estamos asse-
guradas da importância das categorias historicidade, mediações11 e determinações
em nossas análises.
Decorrente da possibilidade de uma Pedagogia Latino-americana inspi-
rada na Educação Popular, Brandão (2006a) apresenta a pesquisa participan-
te como uma proposta, autenticamente, latino-americana12.
Expostos os posicionamentos metodológicos, as cartas de Carlos Rodri-
gues Brandão possuem conteúdos, que não tinham sido analisados ainda,
advindos de experiências vividas entre intelectuais13.

SISTEMATIZAÇÕES DE EXPERIÊNCIAS

O autor principal da Sistematização de Experiências é Oscar Jara Hol-


liday (2012), e incluímos algumas reflexões em torno da obra ―Educação
Popular e pesquisas participativas‖ (LIMA; PAULO; TESSARO, 2020).

10
Na tese de Fernanda Paulo (2018), ela apresenta a análise a partir da Pedagogia do Oprimido,
cuja dimensão é o olhar para a totalidade por meio da codificação-decodificação.
11
Encontramos na obra Pedagogia e conflito a argumentação sobre o conhecimento enquanto
mediação da relação educador-educando. Identificamos que esse conhecimento, construído via
mediação, é uma possibilidade da edificação do caminho de libertação em Freire.
12
Conferir no Verbete escrito por Brandão, denominado: Pesquisa Participante/Investigação-Ação-
Participativa, localizado no Dicionário Paulo Freire.
13
No livro Cartas a Guiné-Bissau (1978), na Carta 11, encontramos Gramsci, citado ao tratar do
papel dos intelectuais no processo revolucionário – intelectuais que trabalham com e não para o
povo.

35
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

Para Oscar Jara Holliday (2006, p. 21), as experiências são “carregadas de


uma enorme riqueza acumulada de elementos que, em cada caso, represen-
tam processos inéditos e irrepetíveis. É por isso que é tão apaixonante a tare-
fa de compreendê-las, extrair seus ensinamentos e comunicá-los‖.
Desse modo, a pesquisa com Sistematização de Experiências tem uma
proposta em cinco tempos (HOLLIDAY, 2012; HOLLIDAY, 2014):

1. O ponto de partida: ter participado da Experiência e possuir registro


dela.
2. As perguntas iniciais: questões problematizadoras.
3. Recuperação do processo vivido: reconstruir a história e organizar a
informação.
4. A reflexão de fundo: analisar, sintetizar e interpretar, criticamente, o
processo.
5. Os pontos de chegada: formular conclusões e socializações.

Nesses pontos, cabe ressaltar que fazemos parte das experiências a par-
tir do projeto de Pesquisa sobre Educação Popular, citado anteriormente. Na
inserção na pesquisa do CNPq, apresentamos trabalhos em Seminários de
Educação e escrevemos artigos e capítulos de livros sobre o tema. Além de
lives.
No segundo tempo construímos questões problematizadoras a partir do
acervo de cartas.
No tempo seguinte (recuperação do processo vivido): realizamos um
trabalho de sistematização das cartas por meio de tabelas e de quadros temá-
ticos que identificassem os temas, as ideias e os sujeitos em correspondências
datadas entre 1964 e 1980.
Em relação à reflexão de fundo, construímos tabelas para contribuir na
sistematização, na análise e na interpretação dos documentos (cartas). Refe-
rente aos pontos de chegada, a publicação deste livro é parte da divulgação
da nossa.
Para Oscar Jara Holliday (2012, p. 33), a Sistematização de Experiên-
cias é uma proposta ―enraizada na história latino-americana‖. E, nesse sen-
tido, reconhecer que a Sistematização de Experiências é considerada uma
ruptura metodológica, como trabalhamos no Seminário Temático: Educação

36
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

Popular e Metodologias Participativas, oferecido pelo Programa de Pós-


Graduação em Educação da UNOESC, por uma das autoras dessa obra
[professora Fernanda dos Santos Paulo], no primeiro semestre de 2020. Rup-
tura porque apresenta uma proposta metodológica embasada na pedagogia
de Paulo Freire e nas experiências de pesquisas participativas.
Estudamos, concomitantemente, o Seminário Temático: Paulo Freire e a
Educação na Atualidade, com a mesma professora citada no parágrafo anteri-
or, que situou as obras de Paulo Freire como autor referência desta disserta-
ção, incluindo-o no aporte metodológico, pois ele possui livros que tratam da
Sistematização de Experiências, tais como: Pedagogia da esperança: um reencon-
tro com a pedagogia do oprimido (2013), Pedagogia do oprimido (1987) e Cartas à
Guiné-Bissau: registros de uma experiência em processo (1978).
Em 2021, realizamos o Seminário História da Educação Popular a partir de
Cartas Pedagógicas, ministrado por Fernanda dos Santo Paulo. Também jun-
tas escremos um artigo sobre Cartas Pedagógicas e a Educação Popular, para
um livro organizado pela professora coordenadora desta pesquisa, com o
seguinte título: ―A História da Educação Popular no Brasil: uma conversa a
partir de Paulo Freire e Carlos Rodrigues Brandão‖.

2.1 CARTAS COMO DOCUMENTOS: RECUPERAÇÃO DO PRO-


CESSO VIVIDO

Primeiro, compreendemos que as cartas são documentos históricos e


importantes para recuperação de processos vividos na Educação Popular. E,
para manter a história em movimento, realizamos sistematizações desses
documentos, buscando conhecer quem são os sujeitos identificados nas car-
tas, pois este passado (correspondências de 1964 a 1980) constitui uma histó-
ria invisibilizada nas produções bibliográficas acerca do tema ―Educação
Popular‖.
Hobsbawm (1998, p. 13) diz que uma das características ―do final do
século XX é o presente contínuo, abandonando o passado, ou a destruição
do passado.‖. Nós queremos dar visibilidade às experiências de Educação
Popular, aos sujeitos e às ideias que se apresentam nesses documentos histó-
ricos, as cartas (1960 a 1980).

37
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

Sabemos, por meio de pesquisas realizadas através do Grupo de Estu-


dos e Pesquisa Paulo Freire e Educação Popular, que a Educação Popular ainda
ocupa lugar de menor privilégio nos cursos de formação docente, sendo que
quando discutido, normalmente, é em componentes curriculares voltados à
Educação de Jovens e Adultos.
É diante dessas reflexões que identificar e analisar as ideias, os temas e
os sujeitos presentes nas cartas de Carlos Rodrigues Brandão e as possíveis
contribuições para história da Educação Popular e da Pedagogia Latino-
americana se tornam um desafio interessante e provocativo. Isso porque a
recuperação do processo vivido, a partir de cartas via Sistematização de Ex-
periências, é algo inédito. Isto é, não localizamos o uso desta metodologia
com análise de documentos. Parece-nos que esta é a primeira pesquisa que
reinventa a proposta metodológica apresentada por Oscar Jara. Outro ponto
é que adjetivamos as cartas de Carlos Rodrigues Brandão como pedagógicas,
pois encontramos, nelas, conteúdo educativo-pedagógico. Concernente às
Cartas Pedagógicas, buscamos em Freitas (2020), Ivanio Dickmann (2020)
e Paulo (2020a) as suas características, as quais são:

1. Narrativa de situações observadas e/ou vivenciadas.


2. Questionamento problematizador.
3. Dialogicidade e participação como princípios.
4. Relações teórico-práticas.
5. Intencionalidade educativa.
6. Concepção epistemológica, metodológica, política, ontológica e pe-
dagógica.
7. Dimensão da Reflexão pessoal e conceitual.

Alusivo às Cartas Pedagógicas, no Brasil, quem têm discutido do ponto


de vista teórico são: Isabela Camini (2012), Ana Lúcia Souza de Freitas
(2020), Fernanda dos Santos Paulo (2013; 2018; 2019a; 2019b; 2019c; 2020)
e Ivo Dickmann (2020) e Ivanio Dickmann. Em termos gerais, tratando de
cartas, temos Freire (1977, 1993, 2000a; 2000b, 2003). No caso da Ana Lú-
cia Souza de Freitas, participamos - enquanto grupo de orientandos/as da
professora Fernanda Paulo - de duas atividades remotas (lives) sobre Cartas
Pedagógicas, as quais foram: 1) Aula aberta das Leituras Dirigidas sobre

38
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

Cartas Pedagógicas, promovida com as orientandas da professora Ana Cris-


tina Rodrigues, da Unipampa de Jaguarão, RS; e, 2) Cartas Pedagógicas:
experiências de Reinvenção na formação com educadores/as, promovida
pelo XXII Fórum de Leituras e Estudos Paulo Freire, pelo Programa de Pós-
graduação em Educação, da Universidade da Fronteira Sul (UFFS),campus
Erechim. Além disso, Fernanda Paulo compôs a lista de convidados para
entrevistas da Semana Paulo Freire de 2021, organizados pelos irmãos Ivânio e
Ivo Dickmann. Fernanda Paulo participou da atividade do dia 22/09/2021 –
com o tema ―Cartas Pedagógicas‖, entrevista disponível em:
https://youtu.be/Hxq6XQoZ9Lo. Na atividade são expostas as carcteristi-
cas de uma Carta Pedagógica.
Diante das características de uma Carta Pedagógica apresentadas, ratifi-
camos que as cartas de Brandão são pedagógicas.Em nossa pesquisa utiliza-
da as Cartas de Brandão como como documento histórico, enquanto ins-
trumento de recuperação da história da Educação Popular.Sugerimos o uso
de Cartas Pedagógicas como instrumento metodológico de pesquisas par-
ticipativas(PAULO, 2018; 2020),como documento histórico de recupera-
ção de experiências,enquanto“Metodologia de avaliação de caráter parti-
cipativo” (THIOLLENT, 1986, p. 90), como metodologia de ensino-
aprendizagem e como instrumento de atividades de dinâmicas de trabalho-
popular seja em contextos não escolares ou escolares.
No livro Cartas Pedagógicas: tópicos epistêmico-metodológicos na Educação Po-
pular (PAULO; DICKMANN, 2020a), localizamos textos que contribuem
para reafirmarmos o pedagógico nas cartas de Brandão.

Quadro 2 - Capítulos sobre Cartas


TÍTULO AUTORES/AS
Carta-Prefácio - Uma carta sobre Carlos Rodrigues Brandão (2020a)
cartas

Cartas pedagógicas: registro e me- Fernanda dos Santos Paulo e Ivo


mória na Educação Popular Dickmann (2020b)
Educação Popular como humaniza- Fernanda dos Santos Paulo (2020b)
ção

39
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

As dez características de uma carta Ivanio Dickmann (2020)


pedagógica
Educação Popular nas cartas de Adriana Gaio e Fernanda dos Santos
Carlos Rodrigues Brandão: temas, Paulo (2020)
ideias e sujeitos
Cartas de Carlos Rodrigues Brandão Fernanda dos Santos Paulo e Marcia
e a educação não escolar Selau dos Santos (2020)
Fonte: das autoras.

Em nosso texto (PAULO; GAIO, 2020), tratamos das principais questões


presentes nas cartas e suas temáticas centrais, bem como os sujeitos com
quem Brandão se relacionava, organizadas em quadros sinóticos. Os qua-
dros fazem parte da Sistematização de Experiências e da organização dos
dados coletados. Não realizamos a análise das correspondências, pois é uma
tarefa da dissertação. Nosso texto foi escrito em forma de carta, como pode
ser verificado na sequência:

Essa carta é o relato de como estamos procedendo com os nos-


sos estudos. Primeiramente, já de ponto de partida, destacamos
que as cartas documentais do acervo pessoal de Carlos Rodri-
gues Brandão demonstram que a história da Educação Popular
foi escrita e realizada por uma diversidade de pessoas, e muitas
delas ainda estão invisibilizadas na pedagogia latino-
americana. (GAIO; PAULO, 2020, p.73).

Ou seja, estamos trabalhando com a concepção de Cartas Pedagógicas


desde o primeiro contato com as Cartas de Brandão, em 2019. Em 2020,
retomei carta por carta para a construção dos quadros de Sistematização e
catalogação. A primeira carta que analisei foi destinada a Osmar Fávero,
grande amigo de Brandão, datada em 1976. Na carta, observei o diálogo de
Brandão com os seguintes sujeitos: Florestan Fernandes, Frei Laudovico,
Bráulio do Nascimento, Luís Eduardo Vanderlei, Porcharde e Dermeval
Saviani.
Constatei que o tema trabalho-educação foi ênfase no conteúdo da carta,
tratando de experiências pessoais dos sujeitos citados. Havia questionamen-

40
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

tos em relação à situação das universidades e a necessidade de contatos para


colaborar com amigos intelectuais que estavam desempregados. Além disso,
destaca-se a intencionalidade educativa nas cartas, sobretudo a partir da
necessidade de articulações para construção de projetos de pesquisa.
Com a leitura dessa correspondência, notamos as relações teórico-
práticas narradas por Brandão para Osmar Fávero. Outras características de
Cartas Pedagógicas podem ser localizadas no documento. Paulo (2018) pon-
tua que uma das características dos pioneiros/as da Educação Popular freiri-
ana é a solidariedade. Nessa carta, é visível a dimensão da solidariedade
presente, um dos atributos da Educação Popular e da trajetória de Brandão,
como avistaremos no decorrer do livro. As categorias historicidade, mediações
e determinações estão presentes na recuperação do processo vivido, registrado
em carta.
A recuperação do processo vivido, mediante análise e identificação das
ideias, dos temas e dos sujeitos presentes nas cartas de Carlos Rodrigues
Brandão, deu-se por meio dos seguintes procedimentos:

1. Leitura das Cartas.


2. Organização das Cartas por ano.
3. Construção das tabelas e quadros de Sistematização e catalogação.
4. Análise das cartas mediante a pedagogia crítica de Paulo Freire 14.
5. Sistematização em forma de texto.

As tabelas foram organizadas de dois modos:

1) Tabelas de Sistematização, com as seguintes informações (Apêndi-


ce A: GAIO, 2021):
a) Data.
b) Tema e ideias.
c) Destinatário/sujeitos diretos.
d) Sujeitos citados.

14
Após a construção das tabelas com temas e ideias, organizamos um quadro com os sujeitos,
excertos das falas e categorias que apareceram. Depois, identificamos categorias emergentes a
partir do quadro 1- apresentando-as no capítulo 5º.

41
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

e) Instituições citadas.
f) Cidades, estados, países citados.
g) Outras questões.

2) Tabela de Catalogação, com os seguintes dados (Apêndice B,


GAIO, 2021):
a) Designação da natureza do documento.
b) Data (ano-mês-dia).
c) Local de proveniência da carta.
d) Nome da pessoa a quem se dirige.
e) Nome do autor da carta.
Como modo de demonstração da nossa pesquisa, apresentamos um
―desenho‖ do nosso percurso metodológico:

42
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

Figura 2 - Sistematização de Experiências, de Cartas Pedagógicas entre 1964


e 1980.

Fonte: elaborado pelas autoras.

43
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

Síntese do Capítulo

Uma palavra
______________________________________________________

Uma frase
___________________________________________________________
___________________________________________________________
___________________________________________________________
___________________________________________________________
_______________________________________________________

Um parágrafo
______________________________________________________
______________________________________________________
______________________________________________________
______________________________________________________
______________________________________________________
______________________________________________________
______________________________________________________

44
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

―Oscar Jara (2001), nos provoca a pensar em como se pode fazer asistema-
tização de experiências nos colocando que não existe um receituário,mas
algumas propostas que podem contribuir para a realização desse registro-
teórico-prático. Para ele, existem aspectos que colaboram para o registro
dasexperiências e um deles é o da necessidade do sujeito que escreve e
pesquisa terparticipado da experiência, fazendo um recorte daquilo que se
quersistematizar.”
( Fernanda Paulo, 2019)

45
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

CAPÍTULO - 3

REVISÃO DE
LITERATURA: ANÁLISE
CRÍTICA DA PRODUÇÃO
TEÓRICA

46
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

História da Educação Popular

―Assim, almejamos, por meio do breve levantamento de materiais sobre


essa temática, possuir elementos políticos e teóricos que nos fortaleçam
para permanecer na luta pela EP [Educação Popular], acreditando na
possibilidade de construirmos uma nova pedagogia dialógica e popular
[...]15‖.
(Fernanda Paulo, 2013).

15
PAULO, Fernanda dos Santos. A Formação do (as) Educadores (as) Populares a partir da
Práxis: Um estudo de caso da AEPPA. 2013. 273 f. Dissertação (Mestrado) - Programa de Pós-
Graduação em Educação.Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre.

47
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

Neste capítulo apresentaremos reflexões advindas da análise de literatura.


A revisão de literatura é de suma importância para trabalhos realizados em
nível de mestrado e de doutorado, principalmente porque contribui na indi-
cação de produções acadêmicas realizadas na área de investigação e de pes-
quisadores que estudam temas semelhantes aos nossos, os quais constam em
Bases de Dados, como é o caso da Biblioteca Digital de Teses e Dissertações
e do Catálogo de Teses e Dissertações da CAPES. Em nosso caso, realiza-
mos uma revisão bibliográfica no banco de dados da Biblioteca Digital de
Teses e Dissertações.

3.1 REVISÃO DE LITERATURA: CONTEXTUALIZANDO OS


ACHADOS

A Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações nos apresenta


possibilidades de acesso a estudos e experiências sobre temas educacionais e
de outras áreas. Esse portal integra os sistemas de informação de pesquisas
existentes nas instituições de ensino e pesquisa do Brasil.
O interesse pela revisão de literatura, apresentado neste capítulo, versa
sobre o tema: História da Educação Popular. Serão expostos, em forma de
quadros (Apêndice C, GAIO, 2021), os resultados da investigação de caráter
bibliográfico realizada no primeiro semestre de 2020.
A Educação Popular é uma temática que surgiu no Brasil desde os anos
de 1920, mas pouco conhecida na área da educação. Entretanto, esse tema
está em expansão, sendo pesquisado em universidades, devido à sua impor-
tância histórica e metodológica. É um tema com várias definições e até am-
bíguo, no sentido de que os termos empregados são polissêmicos (PAULO,
2018). Alguns compreendem a Educação Popular como educação informal,
outros como educação para pobres, e há mais definições que merecem evi-
dência, como a de Paulo Freire (2013) e de Brandão (2006b). Na perspectiva
da práxis, ―a Educação Popular e mudança social andam juntas. [...]. A
Educação Popular buscava compreender bem juntos: o mundo do trabalho e
o mundo dos pensamentos escritos. [...] é aquilo que comumente denomi-
namos aproximação entre teoria e prática.‖ (FREIRE, 1989, p. 62).
Na compreensão dos sentidos e significados históricos, para Brandão
(2001), existem diferentes sentidos dados à expressão ―Educação Popular‖,

48
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

mas no Brasil e na América Latina se firmou como uma das concepções de


educação das classes populares.
Não há consenso sobre as definições, mas estudiosos de Paulo Freire e
da pedagogia crítica optam pela definição da Educação Popular como prá-
xis, não é só teoria e tampouco somente prática. Assim, com o objetivo de
clarificar as definições e compreender melhor a história da Educação Popu-
lar, buscamos encontrar aproximações e distanciamentos sobre os conceitos
de Educação Popular, e identificar aspectos históricos que venham contribuir
para essa pesquisa.
Concernente à Revisão de Literatura, mediante a busca de dissertações
e teses, produzimos alguns critérios de pesquisa avançada, os quais foram: 1)
descritor único: ―História da Educação Popular‖; 2) filtros por assunto e por
título; e, 3) Presença da expressão no resumo. Aplicados esses filtros, obti-
vemos 17 resultados, entre dissertações e teses. Na sequência, foi realizada a
leitura excludente dos trabalhos que não mencionaram a Educação Popular
no resumo. Após a análise dos mesmos, selecionamos 12 trabalhos. Os resul-
tados podem ser observados nos quadros 1 e 2 (Apêndice C, GAIO, 2021).
Dos trabalhos localizados, 4 são teses e 8 são dissertações. A análise das
dissertações e das teses foi desenvolvida em junho de 202016, em três fases:
1) Realizamos uma pré-análise (leitura prévia dos resumos e de alguns
capítulos);
2) Exploração do material localizado, observando os objetivos e os su-
jeitos participantes da pesquisa, as concepções de Educação Popular e as
referências bibliográficas das teses e dissertações.
3) Sistematização e interpretação da leitura dirigida das pesquisas.

No que se refere às regiões geográficas abarcadas nas pesquisas, obser-


vamos a abrangência de diferentes regiões do Brasil, como podemos verificar
na figura a seguir:

16
Para produção de artigo, posterior a defesa, desejamos atualizar a nossa pesquisa para 2020/2
e ano de 2021. Realizamos uma revisão sem recorte temporal, localizando uma pesquisa de
Fleuri (1988) e Christofoletti (1994). Observamos que em 2020/2 há mais uma pesquisa conten-
do o descritor ―História da Educação Popular‖: SCHLINDWEIN, Ian Gabriel Couto, A edu-
cação popular sob o céu da história: um estudo a partir da rememoração em Walter Benjamin.
2020. (188 p.) Dissertação (mestrado) - Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de
Educação, Campinas, SP.

49
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

Figura 3-Localização geográfica

Fonte: elaborado pelas autoras.

Tratando-se das regiões com maior número de trabalhos (sudeste e sul),


os estados que apresentaram temas tratando da Educação Popular foram:
São Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul. No tocante aos temas rela-
cionados à Educação Popular e aos procedimentos metodológicos, temos os
seguintes tópicos a serem destacados:

a) Sistematização de Experiências.
b) Análise documental.
c) Pesquisa bibliográfica.
d) Pesquisa Qualitativa.
e) Pesquisa Quali-quantitativa.

50
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

Com respeito aos participantes das pesquisas selecionadas, os estudos


contaram com:

a) 01 trabalho com a participação de alunos do ensino médio;


b) 01 trabalho com a participação de populações rurais;
c) 01 trabalho resultante de projetos comunitários;
d) 02 trabalhos com educadoras populares;
e) 03 trabalhos com a presença de comitês democráticos popu-
lares, movimentos e lutas sindicais, além de movimento educacional
latino-americano;
f) 03 trabalhos sobre o histórico da Educação Popular e sistematização
de experiências.
g) 01 trabalho sobre a Pedagogia Social.

Uma breve apresentação das doze pesquisas escolhidas, a partir de cri-


térios expostos anteriormente, demonstra alguns dos significados de Educa-
ção Popular:

1) Educação Popular como luta política. Educação Popular


como busca pelos direitos do povo e para o povo, em cooperação com os
Movimentos Sociais.
2) Educação Popular como processo de transformação social.
3) Construção do campo da Educação Popular no Brasil.
4) Histórico da Educação Popular no Brasil, ressaltando o
trabalho desenvolvido por Paulo Freire.
5) Constituição da Pedagogia Social como um subcampo da
educação no Brasil, seus fundamentos, origens e suas relações com a Educa-
ção Popular.
6) Experiências dos pioneiros e das pioneiras da Educação
Popular freiriana.
7) Educação Popular em Simón Rodríguez (1771-1854) e An-
tônio Carneiro Leão (1887-1966) - intelectuais da América Latina.
8) Relação da Educação Popular com o contexto sociopolíti-
co e econômico brasileiro das últimas décadas.
9) Educação Popular enquanto Movimento Social.

51
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

10) Resgate das lutas, associando-as à história dos Movimentos


Sociais Populares e da Educação Popular no Brasil.

Destacamos que alguns dos livros de Carlos Rodrigues Brandão, inte-


lectual da Educação Popular, são utilizados como referência nas pesquisas
analisadas. Identificamos que, na história da Educação Popular apresentada
nas pesquisas, são citados os movimentos: Movimento de Cultura Popular
(MCP), Movimento de Educação de Base (MEB) e Centro Popular de Cultu-
ra (CPC).
No que se refere ao Brandão, enquanto sujeito participante de pesqui-
sas, Paulo (2018) e Martinello (2010) entrevistaram-no para as suas pesqui-
sas, sendo que a primeira uma tese, e a outra, uma dissertação. No caso de
Paulo (2018), o tema central era a Educação Popular; já em Martinello
(2010), a Educação Popular foi citada, porém o recorte temático é o campe-
sinato brasileiro.
Com relação à escolha de categorias que podem vir a contribuir para a
pesquisa, selecionamos as que pudessem responder questões referentes às
características e definições de Educação Popular que ajudarão a compreen-
der sua história.
Verificamos que, em nível de Mestrado e Doutorado, há poucos estudos
sobre História da Educação Popular. No entanto, a nossa pesquisa pode
contribuir para a área da educação e, em especial, para essa temática. No
presente estudo, identificamos algumas demandas não exploradas pelas pes-
quisas analisadas, como a história da Educação Popular a partir de docu-
mentos, como é o caso das Cartas Pedagógicas.
Ressaltamos a contribuição de Paulo Freire e de outros intelectuais na
construção do campo da Educação Popular no Brasil, assim como as experi-
ências de outros intelectuais (pioneiros e de pioneiras da Educação Popular)
nas pesquisas. Percebemos que, ao longo da história, vem sofrendo mudan-
ças em seus fundamentos, origens e finalidades. Por isso, apresentamos,
anteriormente, os significados de Educação Popular localizados nestes traba-
lhos. A seguir, consta uma breve exposição das pesquisas analisadas.
Israel Soares de Sousa, em sua tese, defendida pela Universidade Fede-
ral da Paraíba, refletiu sobre o ensino da história e da Educação Popular
constituindo uma prática pedagógica em educação cidadã. Sua discussão foi

52
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

amplamente pesquisada em autores como: Paiva, Scocuglia, Souza, Beisie-


gel, Brandão, entre outros.
André Souza Martinello defendeu sua dissertação pela Universidade
Federal do Rio Grande do Sul, usando como fonte principal os escritos de
Carlos Rodrigues Brandão. Seu tema foi o desenvolvimento rural e o campe-
sinato brasileiro. Foram feitos estudos e reflexões sobre o trabalho de campo
realizado por Brandão.
Marcos Cesar de Oliveira Pinheiro, em sua tese, pela Universidade Fe-
deral do Rio de Janeiro, apresenta a resposta à pergunta ―o que é Educação
Popular?‖, guiado pelos estudos e pelas interpretações dos autores: Freire e
Nogueira, Paiva, Brandão, Machado, Mello e Streck.
Fernanda dos Santos Paulo apresenta sua dissertação pela Universidade
Federal do Rio Grande do Sul, em 2013, que representa não somente uma
pesquisa, mas também sua caminhada nos movimentos populares. Na disser-
tação, constam autores que discutem sobre Educação Popular, movimento
popular e formação de educadores (as), tais como: Freire, Brandão, Paludo,
Frigotto, Zitkoski, entre outros.
Michelle Suelen Neves Gonçalves construiu sua dissertação, pela Uni-
versidade Federal do Pará, sobre a Educação Popular na América Latina no
século XIX, utilizando os textos de Simón Rodríguez (venezuelano) e Antô-
nio Carneiro Leão (brasileiro) para revisar o conceito de Educação Popular.
A pesquisa de Mariana Pasqual Marques, pela Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo, está estruturada em uma análise do repertório da
Educação Popular, de 1960 a 1964, no Brasil. Nela, são apresentadas altera-
ções ocorridas no período de 1970 a 1980, somadas aos impasses a partir de
1990.
Elisabete de Lourdes Christofoletti, em sua dissertação, defendida pela
Universidade Estadual de Campinas, apresenta sua pesquisa como fruto do
processo vivido nos movimentos populares, através da retrospectiva encon-
trada nos trabalhos de autores como: Ana Maria Araújo Freire, Antônio
Merisse, Carlos H. Munoz, Carlos Rodrigues Brandão, Celso Rui Beisiegel,
Paulo Freire, Júlio Barreiro, Luiz Eduardo Wanderley, Miguel Arroyo, Mo-
acir Gadotti, Vanilda Pereira Paiva, Silvia Manfredi, entre outros, situando
historicamente os caminhos da Educação Popular.

53
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

Erico Machado Ribas procura, em sua pesquisa, compreender o percur-


so histórico da pedagogia social articulada à Educação Popular no Brasil,
suas origens e suas relações. Faz uso do conceito de campo, de Pierre Bour-
dieu, e cita Brandão (RIBAS; SEVERO; RODRIGUES, 2014).
Fernanda dos Santos Paulo, em sua tese de doutoramento, de 2018,
descreve suas experiências como educadora popular, com enfoque na histó-
ria teórica/prática de quem viveu e vem vivendo a Educação Popular no
Brasil desde os tempos de Paulo Freire, analisando fontes primárias (cartas) e
secundárias (documentos publicados de Osmar Fávero), estudos bibliográfi-
cos e entrevistas com pioneiros da Educação popular freiriana, entre eles
Carlos Rodrigues Brandão.
Antônio Carlos Rodrigues, em sua dissertação, defendida em 2004,
apresentou um resgate histórico dos Colóquios de Educação Popular reali-
zados no Município de Passo Fundo, no Rio Grande do Sul. Analisa o even-
to à luz dos movimentos sociais do país e da América Latina. O trabalho
assume a Educação Popular como uma teoria pedagógica que se comprome-
te com a classe que vive do trabalho. Fez uso de Brandão em suas análises.
Reinaldo Matias Fleuri faz críticas à extensão universitária de caráter
assistencialista, colocando que, no Brasil, as experiências se descomprome-
tem do seu compromisso social. Contudo, assinala que alguns setores de
universidades buscam inserir-se em processos de Educação Popular em diá-
logo com os movimentos populares. Sua tese traz reflexões de experiências
significativas realizadas na Universidade Metodista de Piracicaba (UNI-
MEP), a partir de 1978. Concluiu que as experiências de extensão universitá-
ria em Educação Popular, realizadas pela UNIMEP, abriram espaços para a
presença do movimento popular na universidade. O autor utiliza várias refe-
rências da Educação Popular, dentre elas artigos e livros de Brandão.
Sobre as pesquisas descritas, alguns apontamentos são importantes, e,
para tanto, elegemos 3 (três) dos estudos para expor, mediante nossos objeti-
vos e questões problematizadoras, onde nossa pesquisa se encontra inédita,
referindo-se à história da Educação Popular:

1) Atinente à Educação Popular latino-americana, na dissertação


de Gonçalves (2014), Simón Rodríguez (venezuelano) e Antô-
nio Carneiro Leão (brasileiro) são autores que apresentam con-

54
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

ceitos de Educação Popular que, embora se aproximem, não são


de mesmo significado de Paulo Freire e Brandão, que assumem
a Educação Popular libertadora enquanto práxis.
2) Marques (2008) investigou a construção do campo da Educação
Popular no Brasil, alicerçada em ONGs (movimentos de educa-
ção), através da atuação de militantes ao longo dos últimos qua-
renta anos no Brasil. A autora é uma educadora popular, tendo
atuação em Ongs e movimentos sociais no campo da Educação
Popular e direitos humanos. Esse trabalho cita os seguintes mo-
vimentos: 1) Movimento de Cultura e Educação Popular (1960-
1964); 2) Movimento de Educação Popular, Movimentos Popu-
lares e Comunidades Eclesiais de Base (1970-1980). Utiliza do-
cumentos e estudos pertinentes ao tema, porém não analisadas
cartas de primeira ou segunda mão.
3) Paulo (2018) estuda a história da Educação Popular no Brasil a
partir de pioneiros e pioneiros com atuação na universidade e
experiência de trabalho teórico-prático com Paulo Freire, além
de ter experiências com ele. Também, faz uso de cartas de
Brandão, mas apenas aquelas trocadas entre os pioneiros e pio-
neiras da Educação Popular freiriana (C. R. Brandão, O. Fáve-
ro, V. Paiva, C. Beisiegel, A. M. Saul, B.A.Andreola, Moacir
Gadotti). Apresenta um capítulo que trata dos sentidos e signifi-
cados da Educação Popular, abrangendo vários países, e não
apenas o contexto da América-latina.

Podemos ratificar a lacuna de estudos sobre a História da Educação


Popular no Brasil em pesquisa stricto sensu, sobretudo a partir de pesquisas de
documentos oriundos das décadas de 1960 a 1980. Porém, 12 trabalhos con-
firmam que, ao utilizarmos o tema da Educação Popular, o educador Carlos
Rodrigues Brandão é citado várias vezes como referencial acerca da temáti-
ca.
As pesquisas analisadas abrangeram parte da história da Educação Po-
pular, mas apenas uma tese trouxe algumas cartas de pioneiros e pioneiros
em tempos históricos. Esse trabalho é de Paulo (2018) – as demais pesquisas
discorrem sobre ideias, temas e sujeitos da história da Educação Popular,

55
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

como apontado anteriormente. Diante disso, essa pesquisa se torna inédita,


e, para uma síntese, apresentamos um desenho da categoria Educação Popu-
lar, localizada neste estudo de revisão bibliográfica:

Quadro 3-Educação Popular como categoria

Fonte: Elaborado pelas autoras

Com a análise de literatura, veio à tona a categoria Educação Popular


Transformadora, mas isso não nos surpreende, porque ela vem sendo utilizada
por vários autores, principalmente por Gadotti (2012). O que surge como
novidade é a Pedagogia Social como campo da Educação Popular – tema
que vem sendo discutido e analisado no Brasil, desde os anos de 2000 (MA-
CHADO, 2010). No entanto, esse não foi um tema discutido ou mencionado
nas cartas de Carlos Rodrigues Brandão entre os anos de 1964 e 1980.

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Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

Síntese do Capítulo

Uma palavra
______________________________________________________

Uma frase
___________________________________________________________
___________________________________________________________
___________________________________________________________
___________________________________________________________
_______________________________________________________

Um parágrafo
______________________________________________________
______________________________________________________
______________________________________________________
______________________________________________________
______________________________________________________
______________________________________________________
______________________________________________________

57
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

CAPITULO 4

HISTÓRIA DA
EDUCAÇÃO POPULAR
NO BRASIL

58
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

―Portanto, a EP [Educação Popular] não está desvinculada da história das


pessoas, das relações econômicas, políticas e sociais da sociedade, tam-
pouco separada do contexto da exploração e opressão produzidas pelos
ideais do capitalismo. Além disso, ela presume participação popular, curi-
osidade, coragem e esperança.‖
(FernadaPaulo)

59
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

Neste capítulo, trataremos de referenciar históricos da Educação Popu-


lar juntamente às Cartas de Brandão para elucidar as ideias, os temas e os
sujeitos que contribuem para a história da Educação Popular e para a Peda-
gogia Latino-americana. Posteriormente, na seção secundária (4.1), daremos
início a uma espécie de mapeamento das cartas do acervo do educador Car-
los Rodrigues Brandão, apresentando alguns dos intelectuais da Educação
Popular, presentes nas correspondências. Por fim, na seção terciária (4.1.1),
apresentaremos os principais temas e ideias da Educação Popular Presente
no Acervo de Cartas do Educador Carlos Rodrigues Brandão.
Sobre o contexto histórico (fases e experiências de Educação Popular
no Brasil), apresentamos, no Anexo A (GAIO, 2021) um quadro elaborado
por Paulo (2018) e atualizado em 2021, que ajudará situar os contextos, os
sentidos e os significados. Nossa intenção com o presente estudo é apresen-
tar, brevemente, a história da Educação Popular, para que, a partir desta
pesquisa, possamos atualizá-la por meio das cartas de Brandão.
Falar de Educação Popular é reconhecer que, no Brasil, há diferentes
educações. Ou seja, ―a expressão popular na educação tem sentidos e signifi-
cados diferentes, e até contraditórios. Nem sempre o popular esteve atrelado
aos projetos emancipatórios enquanto resistência aos preceitos dominantes
presentes em nossa sociedade.‖ (PAULO, 2018, p. 131).
A trajetória da Educação Popular no Brasil já foi contada em muitas
dissertações, teses e livros, tais como Brandão (2006a; 2006b), Gadotti e
Torres (1994), Freire e Nogueira (2001), Paulo (2018), Paiva (1973), entre
outros. Nesta obra, traremos reflexões teórico-metodológicas a partir de
estudos bibliográficos, visando entender a expressão ―Educação Popular‖
nas cartas de Brandão, tema da nossa pesquisa. É interessante observarmos
que o uso da Educação Popular tem a ver com a construção de uma educa-
ção para o povo brasileiro.

O ―popular‖ não é tomado aqui somente como um adjetivo de teor ideológico,


mas consideramos as condições materiais concretas das pessoas. Seguidos cen-
sos nacionais do IBGE têm demonstrado que entre mendigos, desempregados
crônicos, famílias abaixo do nível social da pobreza segundo critérios da ONU,
trabalhadores submetidos a salários-mínimos, as pessoas populares somam cer-
ca de 2/3 das e dos brasileiros. (BRANDÃO; ASSUMPÇÃO, 2009, p.88).

60
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

Outrossim, diz respeito, segundo Paulo (2018), ao processo de luta pela


educação pública, com diferentes vertentes: marxista, liberal, entre outras.
Ainda em conformidade com Paulo (2018), a Educação Popular tem muitos
sentidos e significados, inclusive como sinônimo de educação pobre para
pobre. De acordo com Brandão (2007), não há uma forma única, nem um
único modelo de educação, pois:

A escola não é o único lugar onde ela acontece e talvez nem seja o melhor; o
ensino escolar não é a sua única prática e o professor profissional não é o seu
único praticante. Em mundos diversos, a educação existe diferente: em peque-
nas sociedades tribais de povos caçadores, agricultores ou pastores nômades;
em sociedades camponesas, em países desenvolvidos e industrializados; em
mundos sociais sem classes, de classes, com este ou aquele tipo de conflito en-
tre as suas classes; em tipos de sociedades e culturas sem Estado, com um Esta-
do em formação ou com ele consolidado entre e sobre as pessoas. (BRAN-
DÃO, 2007 p.09).

Um conceito ampliado de educação, semelhante ao exposto acima, sur-


ge no Brasil com Paulo Freire e com os Movimentos Populares, entre os
anos de 1950 e 1960. Nesses anos, a educação compreendida por intelectuais
progressistas é sinônima de prática social, a qual deve lutar por uma socie-
dade igualitária (BRANDÃO, 2007).
Nos anos sessenta, houve iniciativas do povo pelas tradições populares
e, posteriormente na América latina, existiram os primeiros movimentos
culturais centrados na vontade do saber, originando a Educação Popular a
partir da luta pela alfabetização de jovens e adultos e por uma escola pública
compatível com as necessidades do povo. Podemos constatar esse movimen-
to de Educação Popular no fragmento que segue:

El pensamiento de Paulo Freire llega a Colombia a finales de la década de los


60. Década marcada por el surgimiento del movimiento popular independiente
y revolucionario; por la figura de Camilo Torres y sutrabajo político y educati-
vo a través del periódico Frente Unido, por el asistencialismo de muchas insti-
tuciones y por el gobierno/régimen del Frente Nacional (1958-1970). Se habla-
ba entonces de educación liberadora17. (CENDALES; MEJÍA; MUÑOZ, 2013,
p. 32).

17
Tradução livre: O pensamento de Paulo Freire chega à Colômbia no final dos anos 60. Década
marcada pela ascensão do movimento popular independente e revolucionário; pela figura de

61
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

Em outros países da América Latina, houve o movimento de Educação


Popular, e, conforme Paulo (2018), nem todos os sentidos e significados do
Popular na Educação são iguais. No caso do Brasil, segundo Brandão:

Pois entre os últimos anos 50 e os primeiros da década inesquecível dos 60, ha-
víamos posto no chão das práticas várias pequenas sementes de um trabalho
generosamente político, realizado através da cultura e por meio, também, da
educação. A ênfase estava posta sobre o que, desde muito antes, em todo o
mundo, vinha sendo uma Educação de Adultos, transformada em pouco tempo
e em nosso meio em múltiplos projetos de Educação Popular. De uma maneira
mais motivada, em pequenos Trabalhos de Alfabetização Popular. Foi a esta
modalidade de vivência pedagógica, que envolvia então não apenas professores
de vocação e educadores de carreira, e que julgo ser conhecida o bastante para
ser de novo descrita aqui, que denominamos genericamente de Cultura Popu-
lar.

Conforme Brandão (2007), ninguém escapa da educação, em casa, na


rua, na igreja ou na escola, de um modo ou de muitos, todos nós envolve-
mos pedaços da vida com ela: para aprender, para ensinar, para aprender e
ensinar. Para saber, para fazer, para ser ou para conviver, todos os dias mis-
turamos a vida com a educação.
Segundo Saviani (2013), na primeira república, a expressão Educação
Popular encontrava-se associada à instrução elementar que se buscava gene-
ralizar para toda a população de cada país, implantando escolas primárias,
pautadas no conceito de instrução pública. Para Paulo (2018, p.132):

Na história brasileira, é na primeira república que o termo da Educação Popu-


lar aparece enquanto luta pelo direito à educação escolar atrelada aos processos
emancipatórios. Francisco Mendes Pimentel, deputado mineiro do Partido Re-
publicano Mineiro, é quem propõe uma política de Educação Popular, defen-
dendo a instrução pública. [...]. Nas primeiras décadas do século XXI, Roma-
nelli (1987) e Alves (2008) denunciam que Manoel Bomfim considerava que a

Camilo Torres e seu trabalho político e educacional para através do jornal United Front, pelo
bem-estar de muitas instituições e pelo governo / regime da Frente Nacional (1958-1970).
Falou-se então de Educação Libertadora.

62
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

instrução popular não foi considerada um problema importante na Primeira


República, e que todas as reformas foram fracassadas em se tratando da Educa-
ção Popular. [...]. Manoel Bonfim acreditava que instrução popular e Educação
Popular eram sinônimas, sendo o termo popular compreendido como salvação
para os problemas daquela época, marcados pela inexistência de políticas edu-
cacionais de instrução pública.

Em uma concepção da pedagogia crítica, de acordo com Brandão


(1985, p.13):

Falar sobre Educação Popular é falar de uma educação que surge fora da escola
e da universidade, pois emerge com iniciativas das organizações populares. Po-
rém, as suas práticas e modo de ensinar tiveram tamanha repercussão que pas-
saram a fazer parte de diversos espaços de nossa sociedade, como escolas, uni-
versidades e grupos de pesquisa. Assim, ao olhar para a história da Educação
Popular e tentar reconstruir sua trajetória, é possível perceber que se trata de
uma tarefa bastante complexa, pois a mobilização em favor da educação do
povo brasileiro, ao longo da história de nosso país, faz parte e se ajusta à histó-
ria das mudanças no cenário político, econômico e das estruturas sociais.

Em consonância com Paulo (2018, p. 131),

[..] o significado do adjetivo popular refere-se à classe popular, ou seja, ao opri-


mido. Em outros escritos, Paulo Freire discute mais claramente o popular a par-
tir da realidade vivida pelos oprimidos, como é o caso do livro Ação cultural para
a liberdade (1981), em que a experiência da cultura do silêncio retrata a educação
bancária de invasão cultural, a qual é imposta pelos setores dominantes. Já em
Cartas à Guiné-Bissau: registros de uma experiência em Processo (1978) e Educação e
Mudança (1979 a), o popular refere-se à participação política dos setores popula-
res a fim de desencadear mudanças sociais, as quais são opostas aos processos
de exclusão social.

Apropriarmo-nos da História da Educação Popular é reconhecer a pos-


sibilidade de uma educação, para o povo e com o povo, que lutou contra a
alienação e a dominação das classes populares. Na obra Educação na cidade
(FREIRE, 1991), Freire afirma que lutar pela Educação Popular significa
construir ferramentas e formas de implementar um sistema de participação
das classes populares na construção de uma escola e de uma sociedade ver-
dadeiramente democráticas.

63
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

A Educação Popular que pretende libertar o homem deve ser um instrumento


que sirva ao trabalho político que semeia esta liberdade. Ela é a educação que
busca o compromisso de servir à prática política dos subalternos, como um es-
paço a serviço de pensar e instrumentalizar esta própria prática. Portanto, a
Educação Popular não deve possuir um projeto pedagógico próprio, definido
nos gabinetes do educador. Deve ser apenas uma das dimensões didáticas do
trabalho popular de esclarecer o seu próprio trabalho no dia a dia de quem afi-
nal o realiza. (BRANDÃO, 1982, p.21)

Entendermos o cenário da trajetória da Educação Popular é aproxi-


marmo-nos do longo período percorrido pelos movimentos históricos e polí-
ticos da construção de uma educação pública, não somente para elites. Daí
surge, sobretudo a partir da década de 1920, a discussão do Estado como
garantidor do direito à educação. Muitos governos criaram políticas que
incluíram as camadas populares nos bancos escolares (SAVIANI, 2013).
Segundo Brandão (2006b), o momento da luta pela escola pública foi influ-
enciado por ideais franceses e norte-americanos, e tinha seus fundamentos
em dois princípios: a educação escolar não era só um direito de todos os
cidadãos; e, o segundo, modificações fundamentais nas formas e na qualida-
de da participação de inúmeros brasileiros para a melhoria dos indicadores
de nossa situação de atraso e de pobreza, por meio da escola pública, laica e
gratuita. O movimento da época era a luta pelo acesso e a democratização
da educação para todos, devido à alta taxa de analfabetismo no país.

A Educação Popular no Brasil começa com a preocupação de escolarização,


mais precisamente, nos anos de 1920, trinta e um anos após o período republi-
cano ...o censo de 1920 mostrava a existência de 1.030.752 alunos matricula-
dos, com freqüência de 678.684, para uma população total do país de quase 30
milhões de habitantes, o que significa que – se considerarmos a população total
do país – o nível de atendimento escolar era quase o mesmo que em 1909
(1973, p. 84). O Movimento de luta pela democratização da escola pública se
articula para exigir o direito ao acesso à educação a todos os cidadãos, tendo
em vista o alto índice do analfabetismo. (BRANDÃO; ASSUMPÇÃO, 2009,
p.16).

Ao descrever o trabalho pedagógico dos primeiros missionários no Brasil,


o sociólogo e educador Fernando de Azevedo (1894-1974) associou o ensino

64
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

escolar que os jesuítas deram a crianças indígenas, mestiças e brancas com o


de uma Educação Popular no país.

Do período colonial até o final do século XIX, propostas ou experiências trata-


das como Educação Popular eram praticamente inexistentes, salvo atividades e
ações de cristianização praticadas por jesuítas e outros religiosos, com cunho
―educativo‖ e intuito de colonizar os indígenas e, posteriormente, os negros es-
cravizados. No entanto, em ambos os casos não se tratava de acesso ao sistema
formal de ensino, estando mais próximo de um processo de aculturação, prin-
cipalmente buscando a adoção da língua portuguesa e da religião cristã por par-
te destes povos explorados pelos colonizadores europeus. (PICCIN; BETTO,
2018, p.13).

Para Paulo, esse tipo de sentido ao popular é compreendido como ―edu-


cação popular, cristão-instrumental (2018, p.177, Grifos da autora).
No ano de 1930, a expansão da urbanização/industrialização fez com
que os donos das empresas construíssem escolas de alfabetização para os
funcionários, para que eles soubessem ler e escrever. Juntamente à necessi-
dade de escolarização dos trabalhadores, houve movimentos em prol da
valorização da cultura popular e de uma educação para o povo e pelo povo,
não como instrução somente. Um dos movimentos de luta em defesa da
educação dos trabalhadores foi o movimento anarquista (PAULO, 2013).
Importa salientarmos que, no início da década de 1900, surgiram os primei-
ros movimentos com características de sindicato no Brasil. Naquela época,
com a intenção de formação aos trabalhadores, esses movimentos desenvol-
veram uma metodologia chamada de Roda de Prosa, visando construir espa-
ços de conversas sobre a vida (futebol, família, trabalho etc.), até chegar nos
assuntos referentes à fábrica e à educação.
De acordo com Ferraro (2002), pesquisas apontavam que, nos anos de
1960, cerca de 40% da população brasileira era analfabeta. Nesse período, o
analfabeto não tinha direito ao voto, ou seja, metade da população brasileira
era impedida de participar das escolhas políticas. Nesse contexto, a alfabeti-
zação popular se tornou um instrumento de luta política e de busca de direi-
tos, tendo como ferramenta a popularização da cultura do próprio povo. Na
época, surgiram diversos movimentos favoráveis à Educação Popular. Na
carta de Brandão, escrita em 1980, verificamos o trabalho realizado pelo
Movimento de Educação de Base dos anos de 1960, através da ala progres-

65
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

sista da Igreja Católica. Eles desenvolviam atividades de Educação e alfabe-


tização Popular:

Figura 4 - Carta que Carlos Rodrigues Brandão recebeu em 1980.

Fonte:acervo de Cartas - Paulo e Brandão (documentos inéditos)

Na década de 1960, emerge fortemente a ideia de cultura popular, pela


valorização e pela promoção de uma cultura produzida pelo próprio povo e
não uma cultura que tem por objetivo perpetuar a dominação do povo. Co-
mo lemos no fragmento da carta acima, a Educação Popular de cunho críti-
co tem origem no trabalho realizado pelas pastorais e pelos Movimentos de
Educação de Base, espalhados pelo país. Identificamos que a cultura popular
era a base da Educação Popular, e que a escolarização popular estava asso-
ciada à politização (―uma arma de luta a mais‖).
Ou seja, na época citada, se fortaleceu a visão de que todos e todas pro-
duzem cultura, principalmente na interação um com o outro, no diálogo, e
aprendendo coletivamente. No livro Educação como prática da liberdade, Freire
(1967, p. 24) reafirma que ―o movimento de educação popular serviu [...]
muito mais à mobilização que à manipulação, que sempre criticou de manei-
ra bastante clara.‖. Assim, se pretendia que as classes populares produzissem
e tivessem acesso à cultura, mas sem ser através de uma cultura que repro-
duz a visão opressora, que fortalece a situação social de dominação e desi-
gualdade.

66
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

[...] o MCP de Pernambuco desenvolveu suas atividades a partir de 1960. Entre


setembro de 1961 e fevereiro de 1963, realizou uma experiência de educação
pelo rádio, com recepção organizada em escolas experimentais, e para a qual
foi preparado o Livro de Leitura do MCP, transmitindo programas de alfabeti-
zação (50 a 60 minutos de aulas noturnas durante os dias úteis) e de educação
de base (10 a 20 minutos). Aos sábados e domingos eram feitas transmissões
musicais e teatrais por intermédio da Divisão do Teatro do MCP, ou levadas
ao ar as novelas gravadas pela SIRENA. (PAIVA, 1973, p. 238).

Nesse sentido, o que passa a ser defendido, a partir da criação dos cen-
tros de cultura, é a reinvenção da cultura a favor das classes populares, e não
como um mecanismo que as mantém em condição subalterna, nas palavras
de Brandão (2001). Ainda conforme Brandão (2001, p. 28), ―uma prática
cultural libertadora deveria envolver trabalho intelectual de reelaboração dos
elementos ideológicos da tradição de um povo.‖. Nasce o Centro Popular de
Cultura (CPC), 1961-1964, incentivando e valorizando a cultura a partir do
conhecimento por meio das experiências de trabalho com os saberes das
classes populares. Foi o primeiro movimento que produziu festas folclóricas,
oficinas de leitura, de teatro e de cinema. Para Vanilda Paiva (1973, p. 236),
neste tempo,

Os Movimentos de Cultura Popular que, em menor escala que os CPCs, tam-


bém se multiplicaram pelo país, se originaram no MCP de Recife, criado em
maio de 1960 e ligado à Prefeitura de Recife. O movimento nasceu da iniciativa
de estudantes universitários, artistas e intelectuais pernambucanos, que se alia-
ram ao esforço da prefeitura da capital no combate ao analfabetismo e elevação
do nível cultural do povo, buscando também aproximar a juventude e a intelec-
tualidade do povo.

Referente à citação de Paiva (1973) e as experiências de Educação Popu-


lar, observamos que os Movimentos de Cultura Popular são sujeitos impor-
tantes na história da Educação Popular. Em trocas de e-mail entre Fernanda
dos Santos Paulo e Carlos Rodrigues Brandão (2020b, p. 1), ele diz: ―Exis-
tem pelo menos umas 3 a 4 teses de doutorado sobre o MEB-Nacional (Os-
mar Fávero e Luiz Eduardo Wanderley) [...] teve Escolas Radiofônicas do

67
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

MEB dedicadas à alfabetização de adultos 18.‖. Isto é, além dos relatos, al-
guns temas, experiências e ideias educacionais constam nas cartas de Carlos
Rodrigues Brandão. Abaixo, apresentamos uma correspondência que discor-
re a respeito de atividades realizadas por ele.

Figura 5 - Carta que Carlos Rodrigues Brandão recebeu em 1978.

Fonte:acervo de Cartas - Paulo e Brandão (documentos inéditos)

Considerando o contexto de intervenções militares da época, que res-


tringia os movimentos pela educação, tentando extinguir lutas pelas e das
classes populares, em conversa com Brandão, Paulo relata que ele dissera
que muitas cartas foram queimadas por conta das perseguições políticas,
como podemos conferir na sequência:

O MEB foi fechado em 1967, logo depois que Maria Alice e eu retornamos dos
estudos no CREFAL, no México. Foi encerrado pelo próprio D. Fernando,
bispo de Goiânia e grande amigo de Maria Alice até a sua morte (a dele). Hou-
ve acusações de que o MEB-GOIÁS estaria abrigando clandestinamente ações
de integrantes da Ação Popular. O que seria uma coisa boa! Ele foi fechado
por falta absoluta de trabalhos sob a ditadura militar, que chegou a Goiás em
1966. [...] Antes de o MEB-GOIÁS ser encerrado, a equipe passou dias e dias
queimando em fundos de quintais todo o material de anos e anos de trabalho
que poderia ser considerado subversivo e aprendido. (BRANDÃO, 2020b, p.
1. Grifos nossos).

18
Os e-mails fazem parte da pesquisa da professora Fernanda Paulo, minha orientadora – proje-
to do qual faço parte. Por conta da pandemia do COVID-19, foi inviável a realização de entre-
vistas presenciais e de visitas na casa do educador Carlos Rodrigues Brandão.

68
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

Outros movimentos buscam retomar a luta pela campanha de educação


de base feita pela igreja católica, sobretudo por iniciativa da Confederação
Nacional dos Bispos Brasileiros (CNBB). Conforme Brandão: ―Acredito até
hoje que o MEB foi o programa nacional de educação e alfabetização de
vocação freiriana mais completo e criativo entre todos.‖. (BRANDÃO,
2020b, p. 1).
Na década de 1970, o trabalho realizado pelas Comunidades Eclesiais
de Bases (CEBs), ligado à igreja católica, tinha como bandeira de luta os
processos de libertação via trabalho popular, mediados por militantes, asso-
ciações de bairro e comunidades, clube de mães, intelectuais - estes em opo-
sição ao militarismo;esses sujeitos deliberaram um trabalho em prol da resis-
tência contra o regime militar e em defesa da sua queda, bem como estive-
ram presentes no processo de transição e de construção de um projeto demo-
crático no país.
Na década de 1980, Paulo Freire assumiu a secretaria da cidade de São
Paulo, como secretário de educação, criando o Movimento de Educação de
Jovens e Adultos (MOVA), na gestão da prefeita Luiza Erundina 19. Foi a
primeira experiência de práticas pedagógicas após a ditadura militar onde as
classes populares participaram de forma democrática e participativa da alfa-
betização de adultos. Outras práticas foram realizadas em consonância com
experiências anteriores, tendo como base a educação libertadora:

Há várias experiências que buscaram e ainda buscam romper com a lógica do-
minante, mas aqui vamos destacar apenas as que se tornaram referências lati-
no-americanas por sua abrangência e por sua capilaridade em rede social: o
Movimento de Educação de Base (MEB), criado na década de 1960, que se in-
tegrou aos Movimentos de Cultura Popular; o Movimento de Alfabetização de
Adultos (Mova), criado em 1989; a Rede Educação Cidadã (Recid) e o MOVA-
Brasil, ambos criados em 2003. (PICCIN; BETTO, 2018, p.44).

19
A prefeita é vinculada ao Partido dos Trabalhadores (PT), e, assim como Paulo Freire, foi um
dos primeiros membros filiados. Sobre essa filiação, sugerimos o documento intitulado ―Órgão
do Comitê Eleitoral Unificado do Partido dos Trabalhadores - São Paulo, outubro 1982‖, no
qual Freire diz que o PT tem como tarefa combater a visão elitista, presente inclusive na classe
trabalhadora. Afirma que a política não é e não deve ser um privilégio das classes dominantes.

69
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

Para Freire, a Educação Popular é compromisso com a classe trabalha-


dora, isto é, ―estou convencido, e é óbvio o que vou dizer, de que adminis-
trações progressistas como as do PT não podem ficar distantes, frias, indife-
rentes à questão da Educação Popular.‖ (FREIRE, 1991, p.63, grifos nos-
sos). A acepção de Educação Popular libertadora, com a qual concordamos,
é:

Pela primeira vez surge a proposta de uma educação que é popular não porque
o seu trabalho se dirige a operários e camponeses prematuramente excluídos da
escola seriada, mas porque o que ela ―ensina‖ vincula-se organicamente à pos-
sibilidade de criação de um saber popular, por meio da conquista de uma edu-
cação de classe, instrumento de uma nova hegemonia. (BRANDÃO; AS-
SUMPÇÃO, 2009, p.32).

Esses projetos trouxeram a Educação Popular freiriana na pauta dos


governos populares. Era o Estado preocupado com políticas públicas estatais
com vistas à democratização do conhecimento por meio da educação como
direito.

[...] sustentamos nossos princípios político-pedagógicos sintetizados numa con-


cepção libertadora de educação, evidenciando o papel da educação na constru-
ção de um novo projeto histórico, a nossa teoria do conhecimento, que parte da
prática concreta na construção do saber, concebe o educando sujeito do conhe-
cimento e compreendendo a alfabetização não apenas como um processo lógi-
co, intelectual, mas também como um processo profundamente afetivo e social.
(BOFF, 2008, p. 63).

A Educação Popular crítica libertadora está presente na vida e na obra


de intelectuais como Paulo Freire e Carlos Rodrigues Brandão. Na presente
obra, identificaremos outros sujeitos que fazem parte da Educação Popular e
que trocavam cartas com Carlos Rodrigues Brandão, entre os anos de 1964 e
1980. Apresentaremos temáticas e ideias educacionais relacionadas à Educa-
ção Popular, que foram discutidas nestas correspondências, para darmos
visibilidade a uma história registrada em documentos, porém ainda não
publicada. Mediante estes estudos, perguntamo-nos como as cartas recebidas
e escritas por Brandão contribuem para a pedagogia latino-americana?

70
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

4.1MAPEAMENTO DAS CARTAS DO ACERVO DO EDUCADOR


CARLOS RODRIGUES BRANDÃO: PRINCIPAIS INTELECTUAIS DA
EDUCAÇÃO POPULAR

Esta seção secundária está composta pela apresentação de Carlos Ro-


drigues Brandão e por uma demonstração dos sujeitos presentes nas cartas
de seu acervo, bem como a descrição e a análise de conteúdos que constam
nas correspondências. Ademais, situamos as cartas de Brandão como Cartas
Pedagógicas – conceituando-as sob o olhar da Educação Popular. Conjun-
tamente, identificamos os principais temas e ideias presentes nas cartas, de
um modo geral.
Alguns destaques advindos do mapeamento são importantes para con-
textualizar esta seção e a posterior, bem como os demais capítulos. Desta-
camos que, no período histórico, de 1964 a 1980, ―os governos militares
pretenderam silenciar tudo o que existia ao redor de palavras tornada então
malditas, como ―Educação Popular‖ e ―Cultura Popular‖ (BRANDÃO,
1980, n. p). Percebemos a presença de uma fervorosa militância em municí-
pios brasileiros do centro oeste, sudeste e nordeste, onde intelectuais realiza-
vam trabalhos engajados em cursos e faculdades de educação, principalmen-
te trabalhando com o povo e para o povo na luta pela alfabetização popular e
religião popular.
Nas décadas de 1970 e 1980, vimos presente, através das cartas, a edu-
cação indígena e o negro como tema central de discussão, sobretudo a partir
de projetos populares de Educação Popular.
Inicialmente, apresentamos parte da trajetória do educador e pesquisa-
dor Carlos Rodrigues Brandão e sua defesa pela Educação Popular. Profes-
sor, psicólogo, poeta, antropólogo, mestre, doutor e pós-doutorado, conside-
ra-se um educador popular. Casado com Maria Alice, com quem troca cartas
até hoje. Esposo, pai e avô presente, além de ser um educador cercado de
amigos. Amigo dos movimentos sociais, e, no momento, faz parte do Institu-
to Paulo Freire e de outros movimentos populares. Em suas palavras:

Trabalhei no Movimento de Educação de Base. Tudo o que vivi e escrevi de-


pois sobre educação e movimentos populares vem destas primeiras experiências
com a cultura e a educação popular. Estudei Educação de Adultos no México,
em um instituto da UNESCO, em 1966. Vivi em Brasília e Goiânia, entre 1967

71
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

e 1975, trabalhando em movimentos sociais e como professor universitário, na


Faculdade de Educação da Universidade de Brasília. Tenho Mestrado em an-
tropologia social, na Universidade de Brasília. Ingressei na Universidade Esta-
dual de Campinas, em 1976 - aposentado como professor titular desde 1997,
mas continuei como professor colaborador voluntário. Fiz o doutorado em ci-
ências sociais na Universidade de São Paulo. Fui professor na Universidade Es-
tadual de Campinas. Realizei um programa de pós-doutorado na Itália (Uni-
versidade de Perugia) e na Espanha (Universidade de Santiago de Compostela).
Lecionei em universidades do Brasil e da Europa. Orientei várias teses e disser-
tações em Antropologia, na UNICAMP, e também no Programa de Pós-
Graduação em Geografia da Universidade Federal de Uberlândia. Tenho livros
publicados nas áreas de antropologia, educação e literatura. Divido a minha
vida com uma presença de mais de 54 anos junto a associações e movimentos
ambientalistas e de frentes de lutas populares. (Depoimento para Fernanda
Paulo, 201820).

Ainda sobre Carlos Rodrigues Brandão:

Carlos Rodrigues Brandão, nascido em 14 de abril de 1940, no Rio de Janeiro,


reconhecido pela participação militante nos movimentos de cultura popular a
partir dos anos de 1960, considera-se como educador popular e antropólogo.
Exerce a docência como profissão. Vem orientando trabalhos de mestrado e
doutorado nas pesquisas com ênfase em antropologia camponesa, antropologia
da religião, cultura popular, etnia e educação popular. Tem doutorado em Ci-
ências Sociais pela Universidade de São Paulo (1980), e atua como professor
universitário desde a década de 1970, tendo a Cultura e Educação Popular co-
mo temas de pesquisa. Estudou Educação de Adultos no México, em 1966,
sendo uma de suas áreas de estudo. (PAULO; ZITKOSKI, 2016, p. 49).

Brandão tem sido uma referência em cultura popular, em Educação


Popular, em pesquisa participante e em antropologia, sendo reconhecido
internacionalmente. Em nosso levantamento bibliográfico, observamos que
ele vem sendo inspiração para educadoras e educadores. Possui uma vasta
publicação na área da educação, sendo citado em artigos, dissertações e teses
(PAULO, 2018). O professor e educador popular:

72
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

Morou em vários estados do Brasil, como Brasília, Goiás e São Paulo e já tra-
balhou como professor universitário em várias universidades brasileiras, dentre
elas, na Faculdade de Educação da Universidade de Brasília e na Universidade
Estadual de Campinas, já aposentado desde a década de 1990. Seus textos são,
sobretudo, nas áreas de Antropologia e Educação, tendo dezenas de livros e ar-
tigos publicados acerca dos temas acima citados. Já no campo da Educação, a
ênfase de suas pesquisas e produções versa sobre Educação Popular. O educa-
dor carioca é, portanto, um andarilho do mundo e um militante apaixonado pe-
la escrita, pela poesia, pela música e pela Educação e Cultura Popular. (PAU-
LO; ZITKOSKI, 2016, p. 49).

Brandão estuda cultura e Educação Popular – sendo referência de mui-


tos pesquisadores e pesquisadoras brasileiras. Vimos, a partir de entrevistas e
depoimentos citados e por meio das Cartas Pedagógicas (acervo de Bran-
dão), que ele tem um trabalho que envolve educação e cultura popular, des-
de 1960. Iniciou um movimento de educação no país, e já andarilhou pelo
mundo falando de Educação Popular e de Pesquisa Participante. Suas raízes
no campo, na militância da Educação Popular, podem ser observadas no
trabalho no Movimento de Educação de Base (MEB). Nesse espaço, dirigiu
a Educação Popular basicamente, com educação de adultos em escolas radi-
ofônicas e atividades nas comunidades.
As suas produções sobre Educação Popular vêm contribuindo para en-
tendermos a educação que não separa a teoria da prática. A ação coletiva
junto a movimentos nas comunidades, para o educador, é instrumento de
lutas e de esperança, visando uma formação política com vistas à transfor-
mação social. Conforme Brandão (2006b, p. 41-46):

[...] não é uma variante ou um desdobramento da educação de adultos [...],


tampouco uma educação compensatória [...] ela emerge como um movimento
de trabalho político com as classes populares através da educação. [...] Tam-
bém, é considerada como um trabalho simbólico e político de transformação da
ordem social dominante [...]. Por isso, o lugar estratégico que funda a educação
popular é o dos movimentos e centros de cultura popular: movimentos de cul-
tura popular, centros populares de cultura, movimentos de educação de base,
ação popular.

Não é por acaso que localizamos nas cartas temas sobre Alfabetização,
Música, Poesia, Cultura, Movimento Popular e Arte como Movimentos de

73
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

Cultura Popular. Identificamos sujeitos de ações coletivas populares, como:


camponeses, operários, mulheres, indígenas e crianças. Nesse sentido, a
cultura popular:

Assume que a educação é um processo também cultural e de educação como


prática de liberdade que parte da realidade concreta enquanto compromisso
com a diversidade inserida em contextos sociopolíticos distintos. Tem a cultura
popular como ponto de partida, buscando valorizar os elementos importantes,
mas avançando para uma cultura orgânica de classe. Partir da realidade signifi-
ca também considerar a realidade concreta vivida em diferentes espaços e terri-
tórios geográficos, culturais, simbólicos, etc. A realidade e os sujeitos da ação
educativa estão localizados e constituídos pela pluralidade, pela diversidade e
por universos culturais multifacetários, com diferentes identidades e interesses e
os respectivos conflitos inerentes a essa realidade. A Educação Popular não
apenas reconhece essa alteridade, mas assume a afirmação das identidades e
das diferenças e as reconhece como componentes da própria diversidade socio-
cultural. (BRASIL, 2014, p.44).

As cartas recebidas de Brandão por Fernanda Paulo demonstram que,


desde 1960, temos registros de trabalhos de Educação Popular realizados por
sujeitos que, alguns, não constam nos livros da história da educação. As
Cartas possuem conteúdos importantes para a sistematização e a socializa-
ção dessas experiências. Os escritos possuem um conteúdo político e peda-
gógico, por isso são denominados por nós como cartas pedagógicas. Ou seja,
registros da caminhada e de percursos dedicados à educação popular, presen-
tes nessas cartas, nos permitem apresentar contribuições para a história da
Educação Popular e da Pedagogia Latino-americana. Em outras palavras:

A partir do mapeamento das cartas de Carlos Rodrigues Brandão tem sido pos-
sível identificar e analisar a história da educação popular em documentos inédi-
tos, as cartas. Estas são oriundas do acervo pessoal do educador Carlos Rodri-
gues Brandão, assentado em Poços de Caldas/Minas Gerais, e foram entregues
a mim em janeiro de 2019. São 488 cartas, as quais compõem nosso objeto de
estudo, possuindo relevância no campo histórico-educacional, mas nesse texto
apresentamos um breve estudo de 65 cartas, entre os anos de 1996 a 2001. Nos-
so estudo acerca do pensamento do educador Carlos Rodrigues Brandão medi-
ante cartas inéditas traz significativas contribuições para a Educação Popular,
sobretudo no atual contexto político-cultural do país; e 89 no cenário de transi-
ção histórica do país, desde os anos de 1960. (PAULO; DICKMANN, 2020a,
p.88).

74
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

Observamos que Portelli (1981, p. 104) já dizia que ―é impossível esgo-


tar toda a memória histórica de um único informante.‖.Podendo ser um dos
limites da nossa pesquisa. Contudo, temos as cartas escritas por Brandão e
dezenas de correspondências destinadas a ele. Diante disso, é inegável que as
ideias, os sujeitos, os temas e as experiências vividas por Carlos Rodrigues
Brandão, contidas nas Cartas, são instrumentos históricos de suma impor-
tância para a recuperação da nossa história.
Acerca dos intelectuais localizados nas cartas analisadas, os identifica-
mos como sujeitos diretos e indiretos. No primeiro caso, são aqueles que
trocaram cartas com Carlos Rodrigues Brandão, e, no segundo, sujeitos cita-
dos nas cartas recebidas ou escritas por ele. Nesta seção, apresentaremos os
sujeitos diretos (remetente e destinatário) das cartas. No Apêndice A (GAIO,
2021), é possível localizarmos o quadro de identificação de temas e sujeitos.
O intelectual mais presente nas cartas é Osmar Fávero. Temos cartas
para Paulo Freire, Nicole, Nazira Vargas, Roberto, Rubem Alves, Aldayr,
Miguel Arroyo e Bráulio do Nascimento – os mais presentes (entre 60 e 80).
Dentre esses intelectuais, destacaremos alguns; entre eles, os sujeitos diretos
(destinatários e remetentes) e indiretos (apenas citados com convivência com
Brandão):

a) Osmar Fávero/sujeito direto: reconhecido na literatura sobre Edu-


cação Popular. Segundo Paulo (2018, p.68), ele é um dos pioneiros da Edu-
cação Popular freiriana.

Osmar Fávero nasceu em 1933, em São Paulo. Formou-se em Matemática, pe-


la Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), em 1960. Depois, fez uma
especialização em alfabetização, Mestrado em Educação, pela Pontifícia Uni-
versidade Católica do Rio de Janeiro, tendo pesquisado a Educação de Adultos
em projetos rurais. Finalizou o curso em 1973. Em 1984, concluiu o Doutorado
em Filosofia da Educação, na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo,
tendo estudado ―Uma pedagogia da participação popular: análise da prática
educativa do MEB - Movimento de Educação de Base (1961-1966)‖.

Em uma rápida pesquisa na internet, sobre quem é Osmar Fávero, loca-


lizamos seu currículo, livros, artigos e sites que versam sobre a Educação de

75
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

Jovens e Adultos e a Educação Popular. Paulo (2018) lembra que o educador


foi ―um dos fundadores do Grupo de Trabalho denominado Educação Popu-
lar da Anped - Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Edu-
cação [...]. Tem experiência na área de Educação, com ênfase na educação
de jovens e adultos e educação popular‖, acrescenta que ―Osmar Fávero é
uma referência importante para pesquisadores, estudantes e militantes de
projetos de educação com método e materiais didáticos que visam o processo
de conscientização.‖ (PAULO, 2018, p. 284). Uma das suas principais obras,
relacionada à Educação Popular, é Cultura Popular e educação popular –
memória dos anos 60. Nos últimos anos, dedica-se à memória da Educação
Popular a partir de documentos, como pode ser verificado em Paulo (2018).
A autora coloca que, na pesquisa de Osmar Fávero, a primeira fase da Edu-
cação Popular datada em meados dos anos de 1947 até 1967. Nos anos de
1960, como foi analisado nas cartas de Brandão, são marcantes os movimen-
tos de cultura e o Movimento de Cultura Popular (MCP), além do Centro
Popular de Cultura (CPC) e do Movimento de Educação de Base (MEB).
Também sinaliza o trabalho de Paulo Freire com Alfabetização popular, e,
igualmente, as ações do MEB com educação de adultos. Verificamos que a
Educação Popular era chamada de cultura popular, tendo, fortemente, a
característica do método popular de trabalho.

Figura 6-Osmar Fávero

Fonte: Fóruns Eja Brasil (2019).

76
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

A respeito desses achados, identificamos semelhanças com os con-


teúdos das cartas que tratavam da Cultura popular, em algumas vezes acom-
panhados de um diálogo sobre o trabalho docente de ambos.

b) Júlio Barreiro/sujeito direto: ―Creio que na minha última carta eu


falava de um livro sobre Educação Popular, penso agora que a iniciativa de
vocês torna a minha ideia sem efeito. Ou, pelo menos, obriga a que ela seja
repensada e, quero saber se está prevista para algum ano próximo. Por aqui
voltamos a falar em ―trabalho com o povo‖ e em Educação Popular, como
nos anos de 1964. Queira Deus que tenhamos aprendido com as lições do
passado eagora medimos o tamanho de nossos gestos e os momentos de seus
limites. Paulo Freire está estes dias entre nós. Devo estar com ele quarta-
feira aqui na UNICAMP.” (fragmento da carta escrita por Brandão, 13 de
agosto de 1979).
c)
Figura 7- ―Carta de Júlio Barreiro para Brandão‖, de 1979.

Fonte: acervo pessoal de Paulo e Brandão

d) Marcos Arruda/sujeito direto: ―Os trabalhos de Educação Popular


multiplicam-se por aqui. As pessoas voltam de todos os cantos e há muita

77
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

coisa a fazer por aqui. Agora mesmo, estou editando um livro sobre A Ques-
tão Política da Educação Popular. Junto textos de Paulo Freire a Nazira
Vargas. Lá estamos oito de nós, um outro time de companheiros.‖ (fragmen-
to da carta escrita por Brandão, 2 de maio de 1980). Marcos Arruda é geólo-
go, economista e educador popular:

Educador formado em Economia e com doutorado em Educação pela Univer-


sidade Federal Fluminense. Estudioso do tema da Socioeconomia Solidária e
da cultura popular. Trabalhou com Paulo Freire no Instituto de Ação Cultural
– Idac, sendo referenciado, a esse respeito, em uma nota de rodapé nos livros:
Cartas à Guiné-Bissau: registros de uma experiência em processo e em Por uma
pedagogia da pergunta. (PAULO, 2019b, p. 248).

Trabalha como educador na socioeconomia popular na perspectiva da


emancipação individual e coletiva das pessoas, mediante práticas educativas
solidárias e autogestionárias que venham a contribuir para a criação de um
modo de desenvolvimento alternativo, centrado na vida21.

Figura 8- Marcos Arruda

Fonte: Supren (2016).

21
Conferir em: https://www.youtube.com/watch?v=TR5ktbQvR4w. Acesso. abril de 2021.

78
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

Para Marcos Arruda, a Cultura popular:

[...] foi o nome primeiro, a meu ver, que caracterizou todo o movimento de
múltiplas expressões culturais-artísticas promovidas pela UNE antes do golpe
de 1964. A educação popular surgiu neste contexto, e sintonizava com aquela
terminologia e conotação. O popular tinha a ver com o mundo do trabalho, dos
que vivem do seu trabalho e não de rendas do capital. Tinha a ver com os seto-
res pobres e oprimidos, excluídos do sistema educativo convencional, ou preca-
riamente integrados a ele. O ambiente cultural de origem do termo Educação
Popular era ligado à lógica do empoderamento daqueles atores sociais, portan-
to tratava-se de uma educação para a autogestão da luta de libertação do povo.
Fazia parte de um projeto político que visualizava o empoderamento para a
participação política do povo como Sujeito, não mais como objeto ou ator su-
balterno. Portanto, a cronologia do Carlos está correta: o conceito e a prática
da educação popular têm sua origem na década de 60, no caso do Brasil.
(BRANDÃO, 2015, p. 122).

e) Rubem Alves/sujeito indireto: ―Assim que recebi os seus livros


[Clodomir Monteiro], fiquei com um deles e entreguei o outro ao Rubem
Alves, que manda agradecer-lhe.‖ (fragmento de carta escrita por Brandão
para Clodomir, em junho de 1977). ―Faço tese de doutorado, como você.
Um ritual de passagem complicado e prolongado, e que, como diz o Rubem
Alves, só vale como carta de alforria. Quando você acaba, todo mundo para
de perguntar ―o que é que você está fazendo?‖ Mas acredite que consegui
fazer de minha tese alguma coisa que acabou me envolvendo a vida. Um
estudo sobre [...] religião e religiosidade popular [...].‖ (fragmento de carta
escrita por Brandão para companheiro, junho de 1977).
Rubem Alves (1933-2014), mineiro, teólogo, pastor, educador, psicana-
lista e escritor brasileiro, nos deixou livros de filosofia, de teologia e de histó-
rias infantis. Cursou Teologia no Seminário Presbiteriano de Campinas, em
São Paulo, e mestrado em Teologia pela Union TheologicalSeminary. Es-

22
Brandão criou um grupo de pessoas para dialogar sobre a questão advinda de Oscar JaraHolli-
day para ele: ―Enfin, elasuntoes que quiero saber a partir de cuándo aparece el uso del término
"Educación Popular". Paulo (2018) denomina esse diálogo como ―e-mail dialógico‖. Fernanda
Paulo (fernandaeja@yahoo.com.br) estava no grupo que iniciou com 8 integrantes: Oscar Jara,
Brandão, Osmar Fávero, Danilo Streck, Moacir Gadotti, Marcos Arruda, Eymard Vasconcelos,
Miguel Arroyo e Balduino Andreola. Depois, ingressaram outros educadores, como Marcos
Raul Mejia, Norma Mechi. A orientadora desta dissertação recuperou em seu e-mail os dados
para a nossa pesquisa.

79
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

creveu sua tese de doutorado com o tema ―teologia da libertação‖. Seu traba-
lho esteve voltado aos oprimidos. Assim como outros educadores progressis-
tas, foi perseguido pelo regime militar, acusado de subversivo.
Nas cartas de Brandão, Rubem Alves é citado como amigo e compa-
nheiro de trabalhos populares. As ideias presentes são: trabalho e religiosi-
dade popular a favor dos oprimidos. Os temas trabalho, religiosidade e educação
estão presentes, ao lado de referência a outros sujeitos, presentes nas cartas
de Carlos Rodrigues Brandão. Muitas vezes, não há o nome do destinatário,
sendo mencionados como: velho companheiro, irmão e pastor. Em uma
carta para Joel (abril de 78), Brandão descreve alguns diálogos com Rubem
Alves sobre sua amizade, companheirismo, trabalho popular e projetos futu-
ros.
No fragmento abaixo, carta destinada ao ―companheiro‖, em 1978, cita
Rubem Alves, que acompanhava o seu trabalho e dos muitos encontros no
Brasil e na América Latina.

Figura 9 - ―Carta de Brandão para companheiro‖, em 1978.

Fonte: acervo pessoal de Paulo e Brandão.

f) Miguel Arroyo/sujeito direto: ―Os planos de vocês coincidem mui-


to com o que eu pensava desde o começo. Não pensemos em um curso ‗ge-
ral‘ sobre o problema. Pensemos em um trabalho da oficina. Vamos nos
colocar à volta de uma mesa e discutir questões concretas que saem uma
prática concreta. Vamos discuti-las de um ponto de vista da crítica da educa-
ção, logo, dos usos e dos limites políticos da educação.‖ (Fragmento da Car-
ta de Brandão para Arroyo, 1980).
Em consonância com Costa, Paulo e Tessaro (2021, p. 136):

80
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

Miguel Arroyo é um educador brasileiro, Professor Titular Emérito da Facul-


dade de Educação, da Universidade Federal de Minas Gerais, autor de um con-
junto de obras que dialogam com o universo educacional, as quais oferecem re-
flexão sobre diversos temas, como a administração escolar, as políticas educa-
cionais e a profissão docente. Apresenta uma discussão pautada no poder, na
participação (ARROYO, 1979) e na luta contra a desigualdade, em favor de
uma vida digna e justa para todos (ARROYO, 2017; ARROYO, 2012). Foi se-
cretário adjunto de educação em Belo Horizonte, onde coordenou a implanta-
ção da Escola Plural (ARROYO, 2000). Em sua extensa trajetória para uma
educação que reconhece seus sujeitos e lutas em defesa da democracia, em to-
das as suas etapas e modalidades, propõe que ―o ser humano se forma na luta
incessante pela própria humanização‖ (ibidem, p. 247). Essa proposta de edu-
cação converge com Brandão e com Freire – autores interlocutores de Arroyo.

Figura 10 - Miguel Arroyo

Fonte: Educação&Participação (2017).

Sabemos que Miguel Arroyo fala de educação de jovens e adultos, de


garantia de direitos, de Paulo Freire, de educação integral, de pedagogia
libertadora, da importância da experiência, da formação de professor, de
currículo e de identidades (crianças pobres, negras, etc.), entre outros temas.
Podemos averiguar o conteúdo da carta, que traz o saber de classe – conceito
discutido por Brandão (2006a e 2007). Brandão (2006b) fala do saber que
circula, que é um saber de coletivos.

81
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

Figura 11- ―Carta de Brandão para Miguel Arroyo‖, em 1980.

Fonte: acervo pessoal de Paulo e Brandão.

Para Brandão (2006b, p. 51), ―A Educação Popular é, hoje, a possibili-


dade da prática regida pela diferença, desde que a sua razão tenha uma
mesma direção: o fortalecimento do poder popular, através da construção de
um saber de classe.‖ Na carta, observamos temas importantes acerca da
Educação Popular, cabendo o destaque para o trabalho de formação na
perspectiva da conscientização.
g) Paulo Freire/sujeito direto: O legado do educador Paulo Freire
(1921-1997), patrono da educação brasileira com reconhecimento internaci-
onal, dispensa apresentação do autor, mas citamos Gadotti (1996), para
quem deseja estudar a vida e obra do educador. Inicialmente, foi considera-
do importante pela criação de seu método de alfabetização; depois, pela
pedagogia do oprimido; sua vida e obra apresentam bases pedagógicas, polí-
tica e epistemológica de pedagogias libertadoras. Segundo Brandão (1984),
nos primeiros escritos de Paulo Freire, a Educação Popular é vista como
uma prática de liberdade em seu sentido político. A Educação Popular com
intencionalidades políticas e pensamento crítico marca a pedagogia de Paulo
Freire, pois suas reflexões teóricas e práticas estão comprometidas com a
causa dos oprimidos. É por isso que a radicalidade da Educação Popular tem
como base a perspectiva da libertação e da práxis. A construção do conhe-
cimento e a intervenção na realidade caminham juntas.
Nas correspondências de Brandão, Freire é citado 22 vezes, e, em feve-
reiro de 1980, escreveu uma carta para ele. Os assuntos abordados foram:

82
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

1) Convite recebido para substituir Freire no Conselho Mundial das


Igrejas e de que seus planos eram de ficar no Brasil
2) Relatou sobre o trabalho de Educação Popular na UNICAMP –
projeto de um mestrado em Educação Popular, cujo nome do Freire foi
mencionado pelo grupo.
O conteúdo dos itens 1 e 2 podem ser visualizados na imagem que se-
gue:

Figura 12 - ―Carta de Brandão para Paulo Freire‖, 1980.

Fonte: acervo pessoal de Paulo e Brandão.

Importa ressaltarmos que localizamos o que compreendemos por edu-


cador e por educadora popular ou intelectual engajado na perspectiva da
Educação Popular freiriana, nesta carta, quando Brandão escreve: ―[...] po-
deríamos compor uma equipe invejável entre teóricos e práticos da Educação
Popular, na UNICAMP.‖
Em 16 de junho de 1980, Brandão remeteu outra carta para Paulo Frei-
re, tratando dos temas:
1) Encaminhamento de texto prometido para Freire. Junto, canções de
militância.
2) Sobre o livro A Questão Política da Educação Popular (artigos, autores,
lançamento e conteúdo).

83
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

3) Relato do trabalho de Brandão com um grupo de animadores da


Diocese de Goiás, com Pós-alfabetização.
4) Acerca da notícia na folha de São Paulo, a notícia de seu prêmio na
Bélgica, que Freire receberia, e da felicidade dos amigos.
5) Da expectativa da sua chegada ao Brasil.

Figura 13 - ―Carta de Brandão para Paulo Freire‖, 1980.

Fonte: acervo pessoal de Paulo e Brandão.

Verificamos que as Cartas de Carlos Rodrigues Brandão, chamadas


aqui de pedagógicas, trazem contribuições para a história da Educação Po-
pular. As ideias, os sujeitos e os temas presentes revelam que pautas daquela
época ainda são emergentes, tais como: Educação Popular na universidade,
Educação Popular teórico-prática em todos os contextos educativos, e traba-
lhos de Educação Popular utilizando múltiplas linguagens são exemplos
pontuais. Como sabemos, escrever cartas está ligado à história da humani-
dade, se tornando uma tradição para contar, descrever, comunicar e infor-
mar, em diferentes culturas e povos, as pessoas; conforme Camini (2012,
p.35):

Em todos os tempos, entre diferentes povos, culturas e classes sociais, escrever


e receber cartas significou (e significa) um gesto amoroso e de gratidão entre as

84
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

pessoas. Isto é, escrever cartas sempre foi uma forma de se comunicar. De um


lado, as pessoas que escreviam, e, de outro, as que as recebiam e as liam, após
o tempo normal de sua espera. Eram cartas portadoras de notícias de pessoas
que desejavam comunicar-se com outras que viviam longas distâncias geográfi-
cas para lê-la, por mais de uma vez, buscando apreender a sua mensagem, mui-
tas vezes mais profunda que as próprias palavras, porque ―pensada‖ desde o
outro lado por uma pessoa que desejava se comunicar e ser entendida. Estas
cartas, geralmente escritas a punho e a tinta, com letra compreensível, conti-
nham os traços da emoção e dos sentimentos que o escritor carregava, no mo-
mento de sua redação. Para escrevê-las, dedicava-se um tempo, um cuidado
com a escolha das palavras e com o tipo do papel e caneta.

Os escritos dessas cartas de Brandão instigam a preocupação e os desa-


fios com a Educação Popular. Observamos que todos estão interessados em
refletir acerca de temas educacionais contextualizados em uma realidade
cultural, política, econômica e histórica, que deve der levada em considera-
ção. Outro destaque é a preocupação dos sujeitos interlocutores de Brandão
e dele mesmo em construir caminhos para mudanças e transformação do
espaço vivido, de forma mais humanizadora - enfrentando as exclusões soci-
ais. As reflexões, fundadas em um pensamento crítico, mostram que a Edu-
cação Popular ainda permanece um tema atual, importante e necessário:

O diálogo e a reflexão a respeito dessas questões permanecem relevantes tam-


bém na atualidade, na medida em que compreendemos que a Educação Popu-
lar ainda não cumpriu a sua intenção: a de propiciar a humanização e a liberta-
ção dos sujeitos que sofrem com as opressões políticas, econômicas e culturais.
É essa proposta que nos motivou, e continua nos motivando, a realizar e conso-
lidar ações e procedimentos para fortalecer as iniciativas populares da socieda-
de civil, considerando a diversidade e a particularidade dos envolvidos, para
enfrentar as opressões e as restrições impostas pelo Estado brasileiro e pela es-
trutura e dinâmica da sociedade contemporânea. (BRANDÃO, 2009, p. 10-11).

Partimos de uma reflexão acerca do conhecimento emancipatório, e,


fazendo uma relação entre Educação Popular e conscientização, as cartas
apresentam lutas, trabalhos e projetos realizados ou a serem realizados, ca-
pazes de unir conhecimento e mudança de mundo; conforme Paulo e Dick-
mann (2020a, p. 24):

85
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

Transformação social: uma educação que convida a refletir sobre a realidade e


produzir mudanças com vistas à libertação/emancipação. O conhecimento
construído a partir do conhecimento historicamente produzido e os saberes po-
pulares, os quais resultam em uma prática social que se realiza em movimen-
to/processo, considerando que educar, pesquisar e aprender envolvem um sen-
tido profundo de compromisso com a vida.

E, sobre essa reflexão acerca da educação para a transformação social,


os autores citados colocam que:

As Cartas Pedagógicas revelam um pensamento dialógico que compreende a


educação como processo de humanização dos seres humanos. Para tanto, a
educação é teórica e prática, ocupando-se em resolver problemas da vida con-
creta dos oprimidos [...]. Ou seja, as Cartas Pedagógicas, mais que ferramenta
de comunicação, são um convite a uma Pedagogia Engajada ética e politica-
mente (PAULO; DICKMANN, 2020a, p. 24-25).

Em consonância com a ideia supracitada, Camini (2012, p.35) mencio-


na:

[...] uma carta só terá cunho pedagógico se seu conteúdo conseguir interagir
com o ser humano, comunicar o humano de si para o humano do outro, pro-
vocando este diálogo pedagógico. Sendo um pouco mais incisivo nesta refle-
xão, diríamos que uma Carta Pedagógica, necessariamente, precisa estar grávi-
da de pedagogia. Portar sangue, carne e osso pedagógicos.

Sendo considerada educativa por ser um recurso de comunicação


educacional que visa propor diálogo, que comunica entre seres humanos,
que consegue interagir com o outro, que proporciona conhecimento e intera-
ção (CAMINI, 2012). As cartas pedagógicas também têm um cunho social,
pois ―no âmbito da troca de informações e de saberes, as epístolas pressu-
põem mais diretamente uma relação entre o eu e o outro‖ (MORAES; PAI-
VA, 2018, p. 11).
E, com isso, as contribuições para a história da Educação Popular, a
partir das ideias e temas educacionais apresentados nas Cartas de Carlos
Rodrigues Brandão, escritas entre os anos de 1964 e 1980, estão nas pautas
da Educação Popular numa perspectiva de mudanças da nossa realidade,
que nos permitem construir um mundo mais humanizado. Para isso, é im-

86
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

possível uma transformação social com a perpetuação de pedagogias opres-


soras e manipuladoras (PAULO; DICKMANN, 2020a), as quais precisam
ser enfrentadas e substituídas, de modo consciente, participativo e crítico,
pela

[...] concepção de Educação Popular humanizadora, de Paulo Freire, [cuja]


epistemologia relacional implica respeitar e problematizar os saberes populares
advindos dos educandos, saberes construídos pela nossa experiência existen-
cial, numa dinâmica epistemológica que não só não anula, mas também não se
limita a esses saberes. Isto, a partir de Freire e Brandão, é a possibilidade de
produção de um saber relacional, coletivo, solidário e transformador. Uma
Carta Pedagógica, nos pressupostos da Educação Popular como humanização,
representa um escrito encharcado de engajamento político. Em outras palavras,
a Educação Popular tem como projeto uma educação humanizadora, cujo ho-
rizonte é uma sociedade emancipadora, (PAULO, 2020, p. 30-31).

Por meio das cartas, podemos visualizar o caminho percorrido pelo


professor Carlos Rodrigues Brandão, observando os cursos, as palestras, as
rodas de conversa, os encontros e as viagens realizadas pelo educador – qua-
se todas relacionadas à Educação Popular; mesmo quando não explicita a
expressão, conseguimos localizá-la nas ideias colocadas nas correspondên-
cias. Então, ao analisarmos as cartas, redigidas no período de 1964 a 1980, e
a relação do professor Carlos Rodrigues Brandão com a Educação Popular,
através de escritos datilografados, na sua maioria, identificamos que essas
cartas são pedagógicas.
Mas o que são Cartas Pedagógicas? Entendemos, por cartas peda-
gógicas aquelas que possuem cunho pedagógico, sendo dirigidas a diversas
pessoas, com diferentes finalidades (VIEIRA, 2018) e cujo princípio é políti-
co-educativo. Encontramos, nas Cartas de Brandão, diálogos que narram
experiências educativas a partir de práticas sociais, identificando pessoas que
atuam na educação, referências teóricas, projetos e problemas educacionais.
São 180 cartas, e, nelas, constatamos narrativas e reflexões fundamentadas
sobre um tema educativo. Em geral, localizamos trajetórias de educadores
que escreveram sobre suas atividades educativas. Apreciamos, nas cartas,
uma ligação entre o autor e o surgimento da Educação Popular nos tempos
em que eclodiram o Movimento de Educação de Base e o Movimento de
cultura popular.

87
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

As cartas, entendidas como documentos, têm se tornado um instru-


mento de reflexão e de informações sobre a visão do autor e suas possíveis
ligações e contribuições para a história da Educação Popular. Também é
possível percebermos que a troca de cartas contém discussões relevantes
sobre a educação, especialmente a exemplo da preocupação com a educação
indígena, com o negro e as relações com o branco, assim como com o tema
da religiosidade popular.
Esses documentos também nos mostram uma forma de relembrar o
processo vivido e os registros dessa memória, sendo marcados por um en-
contro de ideias e de temas dialogados entre professores, alunos, estudiosos e
comunidades. A carta é um gênero textual que permitiu a comunicação entre
educadores, e torna-se pedagógica porque possui elementos que a caracteri-
zam como tal - características presentes em Paulo e Dickmann (2020a), Ca-
mini (2012) e Moraes e Paiva (2018).
A partir dos estudos com as cartas de Brandão, identificamos que
pesquisas documentais contribuem para aquilo que Boaventura de Sousa
Santos (2009) chama de não desperdiçar a experiência. Brandão, ao registrar
sua trajetória dialogada, nos permite refletir sobre as diversas formas de re-
gistro de uma experiência pedagógica e de como ela pode se tornar publici-
zada como teoria.

4.1.1 Educação Popular presente no Acervo de Cartas do educador Carlos


Rodrigues Brandão: principais temas e ideias

Nesta seção, tomamos como referência o Quadro 1 (Presença de ideias


e temas da Educação Popular nas Cartas de Brandão). Selecionamos, então,
os temas mais frequentes. Em seguida, organizamos uma amostra, no qua-
dro 3, sobre os temas mais tratados nas cartas:

88
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

Quadro 4 - Catalogação dos Temas


Emissor Destinatário Data Tema abordado com relação à
metodologia

Osmar Fáve- Carlos, Maria Alice 22 /06/ 1967 Metodologia do MEB.


ro

Carlos Ro- Meu velho e querido 18/01/1980 Ministrando curso sobre metodolo-
drigues mestre e pastor, gia de pesquisa em Goiás.
Brandão

Carlos Ro- Paulo Freire 10/ 02/1980 Educação Popular teórico-prática


drigues
Brandão

Carlos Ro- Marcos Arruda 02/05/1980 CEDI - trabalho popular.


drigues Trabalho de Educação popular.
Brandão Pesquisa Participante.

Carlos Ro- Paulo Freire 16/06/1980 Pós-alfabetização e método Paulo


drigues Freire
Brandão

Osmar Fáve- Carlos Rodrigues 20/08/1980 Trabalho do MEB e o projeto de um


ro Brandão escrito sobre Metodologia.

Carlos Ro- Nicole 08/11/1980 Trabalho e metodologia Educação


drigues Popular.
Brandão Movimentos Populares e participa-
ção política.

Nicole Carlos Rodrigues 29/11/1980 Agradecimentos sobre orientação


Brandão da observação participante com a
prática do caderno do campo.

Fonte: elaborado por Gaio e Paulo (2020).

Um tema presente nas cartas foi o método Paulo Freire ou o método de


levantamento com base na participação popular - discutido em muitos cur-

89
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

sos, entre amigos e em encontros da Educação Popular. Recordamos que


Freire foi citado dezenas de vezes nas correspondências de Brandão. Com
relação ao método, estão interligadas a observação e a pesquisa participante.
Essa conexão pode ser vista nas cartas trocadas entre Brandão e Nicole.

Figura 14 - Fragmento de Carta de Brandão para Nicole (querida irmã),


1980.

Fonte: acervo pessoal de Paulo e Brandão.

Conforme Brandão (2006a, p. 40), o método era aplicado da seguinte


maneira:

1º) em uma comunidade comprometida com um trabalho de educação popular


existem um ou mais círculos formados ou em formação, com o seu grupo de
educandos e o seu animador (um agente de educação ―do programa‖ ou um
educador já alfabetizado, da própria comunidade); 2º) foi feito um primeiro
momento do trabalho de pesquisa de descoberta do universo vocabular e/ou
(hoje em dia, mais e do que ou) do universo temático; 3º) todo o material da
pesquisa feita dentro e fora da comunidade (mas sempre sobre ela e a partir de-
la) foi reunido, organizado, discutido, inclusive com a gente do lugar; 4º) o ins-
trumental do trabalho de alfabetização foi codificado, transformado em símbo-
los de uso no círculo de cultura: palavras geradoras, cartazes e fichas com as
palavras, desenhos e fonemas, fotos, anotações com dados, etc. (e, conforme o
caso, muitos etc. que cada equipe saberá obter e criar); 5º) a equipe de trabalho
e, sobretudo, os animadores de círculos de cultura estão não só familiarizados
com o método e o seu material específico para trabalho no lugar, com a sua

90
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

gente, mas também treinados sobre o método a ponto de sabê-lo usar, ao mes-
mo tempo, com eficiência autônoma e criatividade.

Em nossa análise, a base da discussão do método Paulo Freire ou do


método do trabalho popular é compromisso profissional dos educadores e
educadoras. Algumas passagens acerca do método nas Cartas Pedagógicas
de Brandão são:

Figura 15 - ―Carta de Brandão para Osmar Fávero‖ - 1976

Fonte: acervo pessoal de Paulo e Brandão.

Acima, o recorte apresentado trata do método por meio da necessidade


de estudos sobre métodos audiovisuais para alfabetização de adultos na
perspectiva de Paulo Freire. Sendo assim, vamos destacar outros temas e
ideias presentes nas cartas do educador.
Nas cartas de Carlos Rodrigues Brandão, é possível observarmos a pre-
sença da importância da Educação Popular, por meio da luta pelo saber
popular e cultura popular naquela época. Também, reconhecemos a contri-
buição de vários países da América Latina e de sujeitos, além de instituições,
que produziram conhecimento teórico e prático na e com a Educação Popu-
lar. O contato com as cartas demonstrou que as participações em seminários,
cursos e viagens do educador tratavam de experiências de trabalhos de Edu-
cação Popular em diversas áreas e países.
O mestrado em educação e a escola de educação da Universidade Esta-
dual de Campinas (UNICAMP) eram citados como precursores na busca
pela igualdade de direitos juntamente ao Instituto Superior de Estudos da
Religião (ISER). Nota-se que na região nordeste, mais precisamente na Ba-

91
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

hia/Salvador, havia encontros sobre a cultura popular, cujo significado era o


mesmo da Educação Popular.
A respeito de instituições que possuíam espaços para discussões sobre
Educação Popular e que constavam nas cartas analisadas, citamos a Pontifí-
cia Universidade Católica de São Paulo, onde acontecem palestras com alu-
nos do curso de filosofia e encontros de educação. Na UNICAMP, teses e
artigos foram produzidos por alunos sobre saber popular e educação popular.
Osmar Fávero e Celso Beisiegel são referências importantes que estudaram e
pesquisaram a Educação Popular nesse período (PAULO, 2018). Outro
achado é a localização da presença do educador e filósofo brasileiro Paulo
Freire na luta pela educação popular. Brandão, em uma das cartas, faz um
relato sobre um convite que recebeu de Paulo Freire para trabalhar com o
Conselho Mundial das Igrejas (CMI).
O tema “trabalho popular‖ foi muito utilizado nos anos de 1960 a
1980, sobretudo na Educação Popular. Conforme Freire (1987), Brandão
(1981), Fávero (2006) e Paludo (2018), a metodologia do trabalho popular é
um desdobramento das ações realizadas junto à classe trabalhadora, princi-
palmente com aqueles(as) que estão em situação de exclusão social. Essa
metodologia segue os princípios da Educação Popular constituídos pelo
processo de formação conscientizadora, os quais são: participação, politici-
dade, diálogo, autonomia, liberdade, respeito, solidariedade, ética, compro-
metimento e práxis.
Observamos, por meio dos estudos das Cartas de Carlos Rodrigues
Brandão, que o educador possui um vínculo com o Movimento de Educação
de Base (MEB), o qual desenvolvia metodologias críticas e participativas,
que, mais tarde, foram reconhecidas como Educação Popular. Nas palavras
de Osmar Fávero (2006, p. 200):

Para apoiar o Programa de 1965, os manuais preparados anteriormente para


uso dos professores e produtores de programas radiofônicos foram refeitos.
Conservou-se o essencial da fundamentação do conjunto didático viver é lutar
e planejou-se o lançamento das bases teórico-metodológicas para uma análise
mais aprofundada da realidade brasileira. [...] Promoção Humana, subdividi-
da em: conscientização (o homem, o trabalho, comunicação, condicionamen-
tos culturais, meios de realização do homem como pessoa, na família e na soci-
edade); e organização (função social do trabalho, associativismo, cooperação
econômica, ação política).

92
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

A questão metodológica da Educação Popular aproxima-se da perspec-


tiva de Freire, especialmente a partir da Pedagogia do oprimido (FREIRE,
1987), e, mais tarde, o autor ressalta a metodologia dialógica como opção
teórica e prática a ser realizada em diferentes contextos educativos. Essa
abordagem crítica e politizada consta no livro Política e educação (FREIRE,
1993). Podemos citar algumas experiências que desenvolveram atividades
políticas e educativas com metodologias da Educação Popular. Paulo (2018)
apresenta uma breve trajetória da Educação Popular através de fases históri-
cas. Em seu entendimento, os movimentos que marcaram a Educação Popu-
lar freiriana (tendo como base a conscientização ético-política) são:

Entre 1959 e 1964: 1) Movimentos de reformas de base; 2) Educação Popular:


Alfabetização de Adultos. 3) Educação e Cultura Popular: Teatro, música, mís-
tica, etc. 4) Projeto Nacional de Educação Popular de alfabetização. Após 1964
até 1979 1) Comunidades Eclesiais; 2) Teologia da Libertação; 3) O jornal Pas-
quim se destaca como alternativo ao modelo autoritário. (Ver ANEXO); 4) Di-
tadura militar: prisões, exílio, censura, perseguição, repressão, etc.; 5) Ação
Popular, MEB e movimentos contrários à ditadura. Década de 1980: 1) EP:
Redemocratização e a militância nos Movimentos Sociais. Exemplos: Campa-
nha Diretas Já, mobilização pela Constituição Cidadã, de 1988, etc.; 2) Educa-
ção Popular na escola pública e na discussão de projeto de Partido; 3) Estado e
Educação popular (gestões do PT); 4) EP e MST: Ocupações e resistência no
campo e na cidade; 5) EP: A luta por direitos sociais básicos através de movi-
mentos populares; 6) EP: Criação da CUT - Central Única dos Trabalhadores -
e a retomada da formação política e reconhecimento do trabalhador enquanto
classe trabalhadora; 7) EP e a igreja Católica: Comissão Pastoral da Terra; 8)
EP na universidade; 9) Retorno do Freire e outros companheiros/as do exílio.
(PAULO, 2020b, p. 251-252).

Esses movimentos de Educação Popular revelam que o trabalho popu-


lar realizado pressupunha a conscientização no sentido de construir critica-
mente, e de modo politizador, o saber de classe. Para Brandão (2006b), a
Educação Popular tem pelo menos quatro sentidos, sendo que dois deles se
aproximam da perspectiva do trabalho popular, a saber:educação das classes
populares e da sociedade igualitária.
Pessoas, dessas épocas, conforme Paulo (2018), estavam comprometi-
das com trabalhos de Educação Popular, e, por isso, se indagavam a respeito

93
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

da questão da metodologia, pois buscavam uma educação problematizadora.


Isto é, uma prática educativa questionadora e reflexiva acerca da realidade
social, e que possibilitasse, dessa forma, a participação, a mobilização e um
plano político de intervenção. Paulo (2018, p. 46) discorre sobre essas rela-
ções com base na Educação Popular e nas Pesquisas Participativas, como
podemos observar a seguir:

Nos anos 60, vai surgir pesquisa participante, eu até costumo dizer que foram as
três experiências latino-americanas, basicamente, que acabaram repercutindo no
mundo inteiro, a educação popular, nos anos 60, a teologia da libertação, 60,70, e
a pesquisa participante; ainda agora eu estou vindo da Colômbia, do encontro in-
ternacional de pesquisa participante. (Entrevista, 2015 – grifo nosso).

A citação acima é parte da entrevista realizada por Paulo (2018) com


Carlos Rodrigues Brandão, em decorrência de sua tese sobre Educação Po-
pular freiriana e a Universidade. Conferimos a relação da metodologia da
Educação Popular na sua história com os temas e ideias educacionais escri-
tas nas cartas de Brandão.
Identificamos sujeitos (Quadro 2) que trocavam cartas com Carlos Ro-
drigues Brandão entre os anos de 1960 e 1980, nas quais a relação entre
Educação Popular e metodologia se fazia presente. Esses temas, em especial
das pesquisas participativas, têm sido pauta das discussões sobre as bases
teóricas da pedagogia latino-americana. A Educação Popular é uma dessas
bases, como vimos em sujeitos como Carlos Rodrigues Brandão, Osmar
Fávero e Marcos Arruda.
Dentre as temáticas da Educação Popular discutidas nas cartas de Car-
los Rodrigues Brandão, as metodologias participativas e o trabalho popular
ganham destaque. Os sujeitos que discutiram Educação Popular nos anos de
1964 a 1980 são diversos, homens e mulheres vinculados aos Movimentos
Populares, à ala progressista da Igreja Católica, educadores da escola públi-
ca, professores universitários, pesquisadores, familiares, amigos, alunos,
entre outros.
Um exemplo é a carta de Brandão para seu amigo Marcos Arruda, es-
crita em 1980, tratando de vários assuntos, dentre eles, destacam-se ―os tra-
balhos de Educação Popular multiplicam-se por aqui. [...] Agora mesmo
estou editando um livro sobre ―A Questão Política da Educação Popular‖.

94
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

Junto aos textos de Paulo Freire e Nazira Vargas. Lá estamos oito de nós,
um outro time de companheiros.‖ (Carta de Brandão).
No livro citado, A Questão Política da Educação Popular (BRANDÃO,
1980), os companheiros são: Paulo Freire, Luís Eduardo, Aída, Bezerra,
Vanilda Paiva e Brandão, conforme localizamos na carta de Brandão, escrita
para ―Querida Aldayr‖.
A publicação do livro ―A questão da educação política da Educação Popu-
lar”, em sete artigos, ocorreu na mesma época do retorno de Paulo Freire do
exílio. O livro também apresenta quatro cartas que contemplam a escrita dos
Círculos de Cultura de São Tomé e Príncipe, onde a política da educação
política popular é literalmente exposta em trabalhos de alfabetização e pós-
alfabetização, escritos por Paulo Freire.
Dos autores do livro, três deles pertencem ao Movimento de Educação
de Base, estando, entre eles, Bezerra, cujo texto reconstrói práticas anteriores
e faz críticas às práticas anteriores de educação popular. Luís Eduardo Wan-
derley foi da Equipe Nacional do MEB, e discutiu e avaliou as condições
concretas de uma educação popular democratizada.
Silvia Manfredi, Vanilda Paiva e Pedro Garcia participaram de traba-
lhos na Educação Popular, quando estudantes. Sílvia pesquisa problemas
teóricos e metodológicos da educação popular. Vanilda discute qual o alcan-
ce da educação estendida pelo estado às classes subalternas. Pedro Garcia
estuda o saber popular como matéria prima da Educação Popular. Carlos
Rodrigues Brandão, também autor do artigo A cultura do povo e a Educação
Popular: Sete canções de militância pedagógica, acompanhado de enunciados de
início e notas ao final, fala da Cultura Popular como conhecimento intelec-
tual do povo.
Outros apontamentos são de suma importância, os quais são:

Década de 1960: temos 59 cartas, e em nenhuma delas encontramos a ex-


pressão Educação Popular (ver quadro 1), mas identificamos aquilo que
Brandão vem afirmando ―o que hoje chamamos de educação popular era o
que chamávamos nos anos de 1960 de Cultura Popular.‖ (PAULO, 2018, p.
82). Contudo, nos deparamos com a Educação de Adultos na perspectiva da
libertação, com o que, mais tarde, Brandão e outros pioneiros da Educação
Popular vieram a chamar de Educação Popular. Inclusive, a Educação de

95
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

Adultos, em sua constituição teórico-prática, é o tema que mais dialogou no


contexto Latino-americano e ali estava a base da Educação Popular: meto-
dologias participativas, educação conscientizadora e projeto libertador das
amarras do sistema ditatório, antidemocrático e capitalista. O Movimento de
Educação de Base (MEB) destaca-se nas cartas desse período. De ―responsa-
bilidade do Episcopado Brasileiro, através de sua entidade representativa, a
Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), foi criado no início da
década de 1960‖, ele ―direcionou suas atividades para desencadear processos
de autoconscientização das massas, transformando decisivamente a realida-
de social com ações educativas e diretas nas comunidades rurais.‖ (SPIGO-
LON; SILVA, 2021, p. 141).

Conceito de Libertação presente desde os anos de 1960 nas cartas de Bran-


dão: Evidencia-se a Teologia da Libertação, influenciando o conceito de
libertação articulado ao de Educação Popular. Marca a influência direta do
Concilio Vaticano II, Concílio da Igreja Católica, foi de 1962, com Papa
João XXIII, até 1965, já sob o papado de Paulo VI. Para Paulo (2018, p. 60-
61):

Para compreender esse conceito, é necessário ir ao documento produzido na II


Conferência Episcopal Latino Americana, realizada em Medellín/Colômbia,
em 1968. O Documento de Medellín faz referência aos documentos do Concí-
lio Vaticano II (1962-1965); neles, é possível relacionar as concepções da Teo-
logia da Libertação. A educação libertadora contribuiria, nesse viés, para a de-
salienação do povo, a partir de uma visão teológica da igreja, a qual faz a op-
ção pelos pobres. A prática dessa nova visão passava pela ‗tarefa de educar‘ a
partir da leitura da realidade social opressora, acreditando e apostando na luta
que não separava a educação da religiosidade, na busca pela transformação so-
cial.

O Documento de Medelim23 é resultado da renovação específica da


Igreja na América Latina. Já a teologia da Libertação tem início a partir de

23
Medelimé resultado e adaptação da Igreja da América Latina ao VII. A Igreja Católica inicia
uma caminhada de renovação no Concílio Vaticano II. Ou seja, ―A Igreja assume de forma
clara o trabalho de inserção nas comunidades pobres. A educação passa a ser pensada numa
perspectiva libertadora e há a inserção dos religiosos nas comunidades de base.‖( SIQUEIRA,
BAPTISTA e SILVA (2018, 648).

96
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

ênfases desse documento. Assim sendo, a autora afirma que a ―Educação


Popular com base teórica-crítica na concepção de educação libertadora e
transformadora‖ (PAULO, 2018, p. 60) perpassa pela Teologia da Liberta-
ção.

Das 56 cartas na década de 1970: já encontramos A Educação Popular,


mesmo timidamente. Contudo, em 21 destas cartas, verificamos a presença
de ideias e temas da Educação Popular. Um exemplo pontual é, novamente,
a Educação de Adultos com sentido de Educação Popular. Em uma carta de
7 de setembro de 1976, para Jether (não tem o nome do destinatário), falan-
do da tradução para o português do livro de Júlio Barreiro, “Educación
popular y proceso de conscientização” (1979), está explícito o compromisso
social, a luta pela mudança e transformação (PAULO, 2018). Sobre Júlio
Barreiro e a relação com Brandão, indicamos o verbete de Souza, Ribeiro e
Pereira (2021). Lá, encontramos a contextualização da obra referida. Em
síntese, ―o pseudônimo Júlio Barreiro nasceu de uma escolha coletiva[...], o
pseudônimo é uma expressão de resistência subversiva à ditadura militar,
operante na época em nossa América Latina.‖ (SOUZA; RIBEIRO; PE-
REIRA, 2021, p. 112).

Décadas de 1970 a 1980: o Centro Ecumênico de Documentação e Infor-


mação (CEDI) aparece em várias das cartas associado a publicações na ―re-
vista Tempo e Presença, Publicação mensal do CEDI‖ (PAULO, 2021, p.
47). Também

O CEDI realizava cursos na área da educação, como para a Educação de Adul-


tos e sobre escolarização popular. [...] encontramos a temática sobre igreja po-
pular. Esses temas são abordados nas cartas de Brandão. Importante destacar
que Brandão realizou trabalhos de assessoria em entidades como o CEDI,
NOVA, IDAC e MEB. (PAULO, 2021, p. 48).

Década de 1980 – É o período que mais localizamos a expressão Educação


Popular, como pode ser constatado no quadro abaixo:

97
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

Quadro 5 – Expressão Educação Popular nas Cartas


Educação Destinatário Emissor Texto
Popular
1964-1980
17/07/1980 Nicole, minha Brandão Ouvi de longe alguma referência a trabalhos de
doce irmã Educação popular e, como essa tem sido minha
área, alguém disse que eu podaria ser chamado
até lá. Se for, estarei pronto, creia, e a alegria de
revê-la lá novamente. Pra todo lado há solicita-
ções agora sobre Educação Popular e Alfabeti-
zação Popular. De repente, o povo reaprende a
incorporar o "ler e escrever" em sua própria luta
pela libertação.
14/09/1980 Paulo Freire Brandão Sobre o futuro. De Goiânia mesmo encaminhei
um relatório de trabalhos e um projeto de ativi-
dades do CEDI na área da pastoral rural. Enca-
minhei também um projeto de trabalhos sobre
saúde como forma de Educação Popular;
13/10/1980 Brandão Irmão Fico contente com a segunda edição (que ainda
não recebi) da "Questão política da Educação
Popular" - nada como estar em boa companhia.
E ainda por cima ser vertido para o espanhol...
mamãe ficará muito orgulhosa.
02/08/1980 Yeda Brandão Ando pronto pra colaborar com vocês aí. Falei
com o Aidenor. Aviso o que é preciso e eu cum-
pro. Segue um longo poema, crônica, que andei
escrevendo por aqui. Segue também um livro de
educação popular. Mas nele tem um poema.
Leia, e a Marietn de Mossnmedes.
20 do agosto Miguel Arro- Brandão A Questão Política da Educação Popular (Brasi-
do 1980 yo, Sonia e liense); Júlio Barreiro (finalmente em Português)
Felipe Educação Popular e Conscientização? Equipe
do Idac - Vivendo e Aprendendo (O do Júlio é da
Vozes e o do Idac da Brasiliense. Mando pra
vocês dois exemplares do Cadernos do CEDES.
Reparem um artigo meu onde trabalho com a
ideia de educação de classe por oposição não só
da Educação do Sistema (a escola capitalista),
mas a própria Educação Popular. Creio que
podemos trabalhar em cima de categorias como:
prática de classe, educação de classe, saber de
classe, trabalho.

98
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

16 de junho Paulo Freire, Brandão Este poema faz parte de nosso livro A Questão
de 1980 mestre e amigo Política da Educação Popular. A Brasiliense vai
lançá-lo nas ruas ainda nesta semana. Ficou
muito sério e muito bonito. São sete artigos de
sete de nós. Começa com um prefacio de um
lavrador mineiro e termina com as suas 4 cartas
aos animadores de São Tomé e Príncipe. O livro
vai ser lançado na SDPC, onde espero vê-lo,
quem sabe? com calma e vagar.
8 de novem- Nicole, minha Brandão Por aqui há uma redescoberta da Educação
bro de 1980 doce irmã Popular. Na verdade, o pessoal do Sul não está
descobrindo nada demais. O que tem sido cha-
mado de Educação Popular a Igreja já fazia em
1962 no MEB, ou fazia, como Pastoral Popular,
em tantas dioceses, em tantos cantos, junto com
o povo.
[...] em janeiro ainda vamos ter três dias de
estudos para pensarmos o trabalho de Educação
Popular na Diocese.
01 de maio Queridas Brandão Na educação muita coisa acontecendo. O pessoal
de 1980 professoras do CEDES criou um grupo de Educação Popu-
lar. Eu preparo um livro para ser editado pela
brasiliense até julho. Coisa fina, com 8 autores.
Gente do nosso grupo quer começar consigo
(mesmo sem verba ainda) una parte da pesquisa
de saber popular. Acabo de acertar em Goiás
uma pesquisa participante na área da educação.
18 de janeiro Meu velho e Brandão Eu tenho muita vontade de viver uma experiên-
de 1980 querido mestre cia "de mundo", entrar em lugar do Paulo Freire
e pastor, e para trabalhar com Educação Popular é algo
que me motiva muito mesmo. Mas há muito a
conversar ainda. Qual o lugar onde eu seria mais
útil agora?
17 de janeiro Meu amigo Brandão O RELATO DE 0 MEIO GRITO - Paulo escre-
de 1980 Jether veu um longo relato explicando o que foi a pes-
quisa e como ela foi feita, desde o trabalho ante-
rior da equipe de pesquisa. Ficou muito bom e
muito útil. Neide vai escrever um texto sobre a
pesquisa participante, do ponto de vista da
Antropologia Social. Eu vou escrever um outro,
falando de pesquisa-participante como uma
forma de Educação Popular. Deverá ser publica-
do como um futuro Caderno do CEDI

99
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

10 de maio Paulo, compa- Brandão Falei com o pessoal do NOVA, no Rio de Janei-
de 1980 nheiro. ro. Eles me haviam convidado para um pequeno
(Freire) encontro interno sobre Educação Popular. Coisa
que fazem todos os anos. Haviam dado a liber-
dade para que eu escolhesse um outro convidado.
Indiquei o seu nome e ele foi muito bem aceito. É
o pessoal do NOVA que escreve os textos de
Educação Popular que o CEDI que publica. Este
é um encontro de umas 15 a 20 pessoas por 2
dias. Vai ser em 12 e 13 de junho, no Rio. Eles
confirmaram o convite a você pedindo que você
entre em contato com eles. [...]
Entreguei na Brasiliense um livro sobre Educa-
ção Popular. Uma coletânea de textos de 9
autores. Começa com um prefácio de um lavra-
dor [...]. O diretor o encomendou um pequeno
livro chamado Que é Educação? pra jovens.
Fiquei entusiasmado e devo fazê-lo até setembro.
29 de janeiro Pedro, irmão Brandão Ha promessas de uma volta a dedicação aos
79 estudos e trabalhos de Educação Popular a quem
tenho sido fiel há l6 anos e para onde quero
voltar de corpo e alma. Com a poesia e muito
mais do que com a antropologia acadêmica -
seria o meu modo de fazer alguma coisa.
13 de agosto Júlio Barreiro, Brandão Eva viu a Luta acaba de sair aqui no Brasil em
de 1979 amigo Educação e Sociedade (nº 3). Se interessa a
vocês, posso enviar um número da revista. Eu
fico feliz de saber que ela acompanha os profetas
o se veste de espanhol, o que é como ganhar uma
outra vida.
Creio que em minha última carta eu falava de um
livro sobre Educação Popular. Penso agora que a
iniciativa de vocês torna a minha ideia sem
efeito. Ou, pelo menos, obriga a que ela seja
repensada e, quero saber se prevista para algum
ano próximo. Por aqui voltamos a falar em
―trabalho com o povo‖ e em Educação Popular
como nos idos de 1964* Queira Deus que tenha-
mos aprendido com as lições do passado e sai-
bamos agora medir o tamanho de nossos gestos e
os momentos de seus limites. Paulo Freire está
estes dias entre nós. Devo estar com ele quarta-
feira aqui na UNICAMP.

100
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

14 de março Prezado com- Brandão O meu lado mais verdadeiro fazendo o trabalho
de 1978 panheiro de que o Rubem deve ter contado a você. Muitos
encontros no Brasil e na América Latina. Depois,
um livro, dizem os amigos que o melhor. Dizem
os mais radicais que o único bom (procure Júlio
Barreiro, Educação Popular e o Processo de
Conscientização, Siglo XXI). O outro lado
dividia-se entre um professor ocupado e um
psicólogo que nunca gostou de ser. Finalmente, o
mestrado. De algum modo, a redescoberta de
sinais e verdades.
21 de março Prezado Ro- Brandão Devo estar em julho na reunião da SBPC. É
de 1977 berto possível que participe de uma Mesa Redonda
sobre Educação Popular.
14 de outu- Brandão Vanilda E Campinas como vai? Agora com o Paulo
bro de 1980 Freire aí pode-se pensar mais realisticamente no
tal mestrado em Educação Popular. Quanto a
mim, sigo aguardando o contrato. Se sair no
começo de novembro, como espero, estarei por aí
dentro de umas 3 semanas.
2 de maio de Marcos Arru- Brandão Os trabalhos de Educação Popular multiplicam-
1980 da, se por aqui. As pessoas voltam de todos os cantos
e há muita coisa a fazer por aqui. Agora mesmo
estou editando um livro sobre A Questão Políti-
ca da Educação Popular. Junto textos de Paulo
Freire a Nazira Vargas. Lá estamos oito de nós,
um outro time de companheiros.
10 de feve- Prezado Paulo Brandão Estávamos combinando uma "concentração‖ em
reiro de Freire Educação Popular ou em Sociologia da Educa-
1980 ção para o mestrado. Falamos muito em seu
nome. Concluímos que, a partir de julho deste
ano, poderíamos compor uma equipe invejável
entre teóricos e práticos da Educação Popular, na
UNICAMP.
Fonte: Fernanda dos Santos Paulo, pesquisa Pós-doutorado, 2020.

Observamos, nesse quadro, as presenças explícitas da Educação Popu-


lar, como pode ser constatado no seguinte mapa temático:

101
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

Figura 16- Mapa Temático

Fonte: elaborado pelas autoras.

Nos anos de 1980, aparecem sujeitos da Educação Popular (pessoas e


instituições). No caso das pessoas, podem ser observadas no quadro 4. Já as
instituições, podem ser observadas na imagem ―mapa conceitual‖. Concer-
nente às instituições nesse período, se sobressaíram CEDI, MEB, IDAC,
CEDES, NOVA, UNICAMP e Pastoral popular. Apresentaremos, breve-
mente, o lugar que ocupam as instituições que se fizeram presentes, no ano
de 1980, em correspondências nas quais a Educação Popular apareceu expli-
citamente:

CENTRO ECUMÊNICO DE DOCUMENTAÇÃO E INFORMAÇÃO


(CEDI): ―Em 1974, nasceu o Centro Ecumênico de Documentação e Infor-
mação (CEDI), oriundo do Centro Evangélico de Informação (CEI) já exis-
tente desde os anos de 1960.‖ (PAULO, 2021, p.47); cabe ressaltar que:

O CEDI realizava cursos na área da educação, como para a Educação


de Adultos e sobre escolarização popular. Também encontramos a te-
mática sobre igreja popular. Esses temas são abordados nas cartas de

102
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

Brandão. Importante destacar que Brandão realizou trabalhos de asses-


soria em entidades como o CEDI, NOVA, IDAC e MEB. (PAULO,
2021, p.48).

Destacam-se os dois primeiros cadernos de Educação Popular I e II, or-


ganizados pelo Nova – pesquisa, avaliação e assessoria.

MOVIMENTO DE EDUCAÇÃO DE BASE (MEB): Segundo Spigolon e


Silva (2021, p. 141):

Foi instituído em março de 1961, pelo Decreto presidencial nº 50.370/1961,


que assegurou seu funcionamento com recursos financeiros do governo federal
para ―[...] ministrar educação de base [...] através de programas radiofônicos
[...] por meio de alfabetização de adultos em massa, cujos objetivos previam
[...] iniciação democrática e a formação profissional. Nesse período, com a
maioria da população vivendo no meio rural, o MEB direcionou suas ativida-
des para desencadear processos de autoconscientização das massas, transfor-
mando decisivamente a realidade social com ações educativas e diretas nas
comunidades rurais.

INSTITUTO DE AÇÃO CULTURAL (IDAC): Freire estava envolvido


em

Genebra, na Suíça (1971 a 1980), com a agenda no Conselho Mundial de Igre-


jas (CMI), com a criação do Instituto de Ação Cultural (IDAC), que ressignifi-
cou a ação política-filosófica da educação a partir da experiência do exílio e
mediou a inserção político-pedagógica na Itália, na Suíça e em África. (SPI-
GOLON, 2021, p. 66).

CENTRO DE ESTUDOS EDUCAÇÃO E SOCIEDADE (CEDES): sur-


giu em 1979, em Campinas (SP), como resultado de um trabalho de alguns
educadores preocupados com a reflexão e a ação ligadas às relações da edu-
cação com a sociedade. A partir daí, criou a revista Educação & Sociedade,
e atualmente edita também os Cadernos CEDES 24. Na tese de Paulo (2018),
podemos encontrar documentos em jornais, fotos e revista que trataram do
CEDES e a presença da Educação Popular. Uma foto de ―MaurícioTratem-

103
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

berg, Paulo Freire, Carlos Brandão, Moacir Gadotti, na Faculdade de Edu-


cação da UNICAMP, depois da reunião em que criamos o CEDES – Centro
de Estudos de Educação e Sociedade (1980 ou 1981).‖ (PAULO, 2018, p.
188-225).

NOVA – PESQUISA, ASSESSORIA E AVALIAÇÃO EM EDUCAÇÃO:


Um grupo de profissionais militantes (Aída Bezerra, Beatriz Costa, Letícia
Cotrim, Evandro Sales), reuniu-se, em 1972, e criou a instituição como espa-
ço de mobilização e de trabalho social (assessoria, cursos e produção de
textos sobre as experiências dos agentes populares) com apoio dos católicos
populares. Criaram os Cadernos de Educação Popular, a partir de 1981. Para
Paulo (2021, apud FÁVERO; MOTTA, 2015, p. 48):

Conforme Fávero e Motta (2015), o CEI e o CEDI publicaram muitos materi-


ais críticos sobre o contexto político brasileiro, articulando aos movimentos so-
ciais e o compromisso das igrejas com a justiça social. Também - destaca-se a
publicação de dois suplementos sobre educação popular, em 1977 e 1978, com
textos teóricos de fundamental importância, produzidos pela equipe do Nova –
Pesquisa e Avaliação em Educação.

Como vimos, as instituições trabalhavam em rede, estando interconec-


tadas.

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS (UNICAMP): A univer-


sidade está presente na vida e na obra de Brandão, em diferentes contextos,
como explicita Paulo (2021, p. 193): ―Brandão trabalhou na Unicamp, e, em
muitas cartas, a universidade é citada. Entre os anos de 1964 e 1980, a insti-
tuição foi citada 159 vezes nas cartas de Brandão. Entre 1981 e 1995, a
UNICAMP foi mencionada, nessas correspondências, 165 vezes.‖. Ainda
podemos verificar que

Um outro destaque, localizado nas catas de Brandão referindo-se a Unicamp, é


sobre o retorno do Paulo Freire ao Brasil, que iria trabalhar na PUC de São
Paulo e na Unicamp. Destacamos que Brandão reporta-se ao trabalho de Edu-
cação Popular que poderiam desenvolver na universidade. Sobre isso, locali-
zamos no Jornal da Educação do CEDES uma notícia que ratifica o que se dis-
cutia nas cartas de Brandão. (PAULO, 2021, p.194).

104
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

PASTORAL POPULAR: De acordo com Perani (1989, p. 14):

A Pastoral Popular situa-se como uma das presenças no grande mundo dos
movimentos sociais. Deu, está dando e continuará a dar sua contribuição para
o objetivo comum de uma sociedade nova, baseada sobre relações de justiça e
fraternidade. [...] Tem, também, sua especificidade no sentido de que se trata
de um trabalho de Igreja.

O mesmo autor relaciona a pastoral com a dimensão educativa, isto é:

Um outro aspecto é o nível muito acadêmico de vários cursos de formação ofe-


recidos pela pastoral e a absolutização da lógica do pensamento científico. Se-
ria importante abrir espaços maiores para a rica experiência da Educação Po-
pular dos últimos anos no Brasil, e para a emergência e desenvolvimento das
"lógicas" do pensamento popular, de suas informações e pontos de vista, de
seus sentimentos e emoções, de seus sonhos, frustrações e aspirações. (PERA-
NI, 1989, p. 19. Grifo nosso.).

Referente aos temas e ideias da figura 16, faremos referências analíticas:

TRABALHO E SAÚDE: como observamos, as 41 cartas do ano de 1980


analisadas trazem temas que se repetem e que estão interligados com os anos
de 1960 e 1970. Um exemplo é o projeto Meio Grito:

Nos Cadernos do CEDI, de nº 3, sobre O Meio Grito: pesquisa sobre a saúde


do povo foi feita por pessoas dele e do setor de saúde da Igreja de Goiás, com a
colaboração de alguns assessores do CEDI – Centro Ecumênico de Documen-
tação e Informação, Rio de Janeiro (CENTRO ECUMÊNICO DE DOCU-
MENTAÇÃO E INFORMAÇÃO, 1980, p. 2); contando com 21 pessoas en-
volvidas, dentre elas, encontramos nas cartas de Brandão: Totó (lavrador, pes-
quisador na Gameleira -Itapuranga), Paulo (médico, Ceres, da Coordenação de
Saúde, assessoria interna), Ozelita (lavadeira, pesquisadora em Britânia), Neide
(antropóloga, Rio de Janeiro, assessoria do CEDI) e Adauto (lavrador, pesqui-
sador em Novo Brasil). (PAULO, 2021, p. 134).

Nos anos anteriores, com o trabalho de Rádio comunitária, cultura po-


pular, do MEB, dos direitos sociais, da alfabetização de adultos, da pesquisa
popular, do desenvolvimento comunitário socioeconômico, do uso da lin-

105
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

guagem popular, via trabalho popular comunitário, com a participação do


povo, a saúde foi um tema discutido/pautado. O trabalho, nas cartas de
Brandão, é o trabalho concreto realizado com as pessoas e de Educação
Popular.
Na década de 1960, surgiu a ideia de Educação Popular crítica, huma-
nizadora e subversiva, mas o nome cunhado era Cultura Popular ou educa-
ção libertadora. Essa ideia de Educação Popular libertadora buscava romper
práticas educativas mecanicistas e autoritárias, apresentando um trabalho
popular com pesquisas participativas que visavam a participação na luta por
direitos sociais. Um dos direitos era a saúde, mas, nas cartas de Brandão,
verificamos que outras áreas se articulavam: educação, moradia, poesia e
arte, entre outros. Com isso, afirmamos que a Educação Popular a partir das
Cartas de Brandão é intersetorial. A intersetorialidade na Educação Popu-
lar é característica desde os anos de 1960, com o trabalho de educação de
adultos. Tratavam do trabalho de Educação Popular em rede conectiva des-
de a gestão dos projetos, dos programas e das políticas. A integração de faze-
res e de saberes se construía na luta por intervenção no enfrentamento dos
problemas sociais. No livro À sombra desta mangueira (1995), Freire trabalha a
intervenção como política, democrática e esperançosa, e, assim, pontua que
a mobilização popular e a organização das pessoas para intervir na realidade
tem de ser participativa enquanto sujeitos de mudança e não objetos de
mandatários. Por isso, o conjunto de mudanças não vai ocorrer apenas com
o saber técnico, mas sim com os múltiplos saberes e pessoas diversas, não
antagônicas, como explicita Paulo (2021b) no verbete ―Meio Grito‖, no livro
Arqueologia nas cartas de Carlos Rodrigues Brandão: contribuições para a
Educação Popular.

UNIVERSIDADE, ESTUDOS, LIVROS E MESAS REDONDAS: nas


cartas, evidenciamos a presença da Educação Popular em estudos científicos,
na universidade e em cadernos específicos sobre o assunto. Para exemplifi-
car, citamos um trecho da Carta de Vanilda Paiva para Brandão, escrita no
dia 14 de outubro de 1980: ―agora com o Paulo Freire aí pode-se pensar mais
realisticamente no tal mestrado em Educação Popular‖. Assim como essa
passagem demonstra a pauta da Educação Popular na universidade, verifi-
camos que Brandão escrevia livro sobre Educação Popular, dialogando com

106
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

pessoas e instituições e, até mesmo, convidando amigos e amigas para a


autoria coletiva. As conexões entre os temas podem ser conferidas no Qua-
dro 5 – Expressão Educação Popular nas Cartas.

ALFABETIZAÇÃO POPULAR, EDUCAÇÃO DE CLASSE E LIBER-


TAÇÃO: nos estudos das correspondências de Brandão, observamos que a
educação de adultos é uma temática presente desde os anos de 1960. Entre-
tanto, no ano de 1980, associa-se a Educação Popular aos temas alfabetiza-
ção, educação de classe e libertação. Educação de Classe e Educação Liber-
tadora são citadas por Brandão desde antes de ―Educação Popular e consci-
entização‖, escrito nos primeiros anos de 1970. Mas, é salutar retomar pas-
sagens desse livro, reconhecido na América Latina como significativa refe-
rência de Educação Popular:

Educação Popular e conscientização, de Carlos Rodrigues Brandão, que leva o


nome de Júlio Barreiro, seu amigo. O livro foi publicado, primeiramente, na
Argentina (em espanhol), e editado anos depois no Brasil. Esse livro foi escrito
originalmente em português, no período do governo militar, que considerava os
movimentos de educação Popular como subversivos. Na obra, localizamos o
resultado de um trabalho prático e teórico que contribui para discutirmos a
concepção de Educação Popular latino-americana. Numa visita ao sumário,
encontramos um capítulo que versa acerca de alguns pressupostos necessários
da Educação Popular numa dimensão política do trabalho educativo. Ao folhar
as páginas do livro, constatamos a opção teórica à qual o autor se filia, sobre-
tudo no vínculo entre conscientização e a Educação Popular. (PAULO, 2018,
p. 81).

Libertação é um conceito importante na Educação Popular, que pode


ser confirmado na carta ―Pra todo lado há solicitações agora sobre Educação Popu-
lar e Alfabetização Popular. De repente o povo reaprende a incorpora o "ler e escrever"
em sua própria luta pela libertação.‖ (Carta para Nicole, minha doce irmã,
1980). Em Paulo, a partir dos pioneiros e das pioneiras da Educação Popular
freiriana, dos quais Brandão faz parte:

A compreensão de universidade na práxis educativa desses educadores e edu-


cadoras é advinda das experiências de luta, resistências, transgressões e rebeldi-
as. Eles e elas vêm construindo, a partir da práxis, orientada pelas experiências-
mundo e pelos seus que fazeres engajados, experiências na universidade relaci-

107
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

onadas a um projeto de libertação na perspectiva da pedagogia crítica. (PAU-


LO, 2018, p.10).

A mesma autora posiciona-se na ―concepção da Educação Popular li-


bertadora, amparada por um novo ethos cultural, o da libertação‖ (PAULO,
2018, p.55), onde os educadores e educadoras progressistas apresentam suas
bases conceituais. A nossa síntese é a de que a Educação Popular nas cartas
de Brandão (quadro 1) tem voz, cor, classe e trabalho popular educativo-
conscientizador.

PESQUISA PARTICIPANTE, POESIA POPULAR E PAULO FREIRE:


foi comum encontrar o papel pedagógico da música e da poesia popular no
trabalho com a Educação Popular, bem como identificar esse trabalho com o
povo assinando as pesquisas participantes. Paulo Freire é mencionado pela
sua proposta de educação libertadora e transformadora como base da pesqui-
sa participante. Igualmente, a pesquisa participante, realizada com título ―O
Meio Grito‖ (PAULO, 2021b), é referenciada como uma experiência de
participação popular. Sobre a presença de Paulo Freire nas cartas, vejamos:

A educação em Paulo Freire está comprometida com a justiça social/ humani-


zação e emancipação humana. Existe uma aproximação de Brandão com Pau-
lo Freire para além das correspondências analisadas, mas aqui citarei as corres-
pondências remetidas ao Freire. Primeiro, vou destacar que nas Cartas entre
1964 e o ano de 1980 temos 22 vezes o nome ―Paulo Freire‖, abordando os se-
guintes temas: 1) Conselho Mundial de Igrejas e Paulo Freire – convite feito ao
Brandão para trabalhar em Genebra. 2) Participação dos dois no encontro na-
cional de supervisores educacionais em Goiânia. 3) Publicação de livros e ma-
teriais de Educação Popular. 4) Conversas com Paulo Freire, em São Paulo e
no Rio de janeiro. 5) Trabalhar com Freire no seu retorno ao Brasil (pós-exílio
de Freire). 6) Sobre Paulo Freire na Unicamp e contratação na PUC de São
Paulo. 7) Um projeto de Brandão de realizar uma pesquisa de Educação Popu-
lar com Freire sobre pesquisa com o povo, recuperando experiências do CEDI,
entre outras. 8) Brandão ir para Europa assumir o lugar de Freire a convite que
lhe foi feito. Precisava conversar com Freire e pessoal do CEDI sobre a propos-
ta. 9) Brandão dizendo que visitaria Paulo Freire na casa de Francisco Weffort.
10) Brandão falando que se fosse para a Europa, assumir o lugar de Freire, de-
sejava (e muito) realizar um trabalho de Educação popular. 11) Brandão, em
uma carta ao velho amigo pastor (sem nome), pede que agradeça ao Freire so-
bre a proposta de trabalho na Europa e da possibilidade de experiência de

108
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

mundo. 12) Sobre formação de pós-alfabetização utilizando Paulo Freire.


Brandão expressa que esse referencial é importante e necessário. 13) Em uma
carta de Brandão para Júlio Barreiro, de 1979, cita que Freire estaria indo reali-
zar uma atividade na Unicamp, e que estaria com ele. 14) Júlio Barreiro, desti-
nando uma correspondência ao Brandão (1979), versa sobre produções de Edu-
cação Popular e de Paulo Freire. 15) Acerca da revista Estudos Universitários
dedicada ao método Paulo Freire. Encontro uma correspondência de Brandão
para Freire (junho de 1980), cujos assuntos principais são: a organização do li-
vro ―A Questão Política da Educação Popular‖; a expectativa do retorno do
Freire ao Brasil, que estava por chegar; e o relato de Brandão sobre um traba-
lho que estava realizando na casa dele com um grupo de animadores da Dioce-
se de Goiás. (PAULO, 2021b, p. 162-163).

Com isso, validamos que a Educação Popular, nas Cartas de Carlos


Rodrigues Brandão, reafirma a sua base teórica presente em seus livros, mas
traz sujeitos e assuntos ainda não publicizados (Quadros 1, 3 e 4). Autenti-
camos os temas em conexões, pois as temáticas: a) trabalho e saúde; b) uni-
versidade, estudos, livros e mesas redondas; c) alfabetização popular, educa-
ção de classe e libertação; e d) pesquisa participante, poesia popular e Paulo
Freire se interligam. Chama a atenção essa conectividade temática da Edu-
cação Popular em que o conceito balizador é o de libertação. Freire, em
Pedagogia do Oprimido, vai colocar que a libertação é uma luta que vai se
dar de modo corajoso, dialógico e comprometido com a transformação soci-
al. Ele coloca o diálogo como princípio da libertação. Se retornarmos ao
quadro 1 (Presença de ideias e temas da Educação Popular - década de
1960), teremos a participação do povo presente nas cartas. Junto, encontra-
mos participação em diferentes contextos e de diferentes formas. Cabe frisar
o trabalho popular na América Latina com alfabetização de adultos, com
poema popular, com desenvolvimento comunitário socioeconômico e pes-
quisa popular, respeitando a linguagem popular mediante a participação do
povo. Ainda, encontramos o trabalho do MEB, das rádios comunitárias e o
diálogo como palavração. Seguindo a década de 1970, os temas dos anos de
1960 permanecem, e outros surgem, como Educação Popular abrangendo
literatura popular, Poema popular e político, arte popular, religião popular,
música popular, cultura popular, catolicismo popular, saúde popular, saberes
populares, entre outros temas, como Mudança Social, Conscientização,

109
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

Educação de classe, Educação do sistema, identidade étnica, negro no Brasil,


lutas, limites Políticos da Educação, entre outros.
Esses temas estão mediados pela Educação Libertadora, que pressupõe
palavração (FREIRE,1987). Na Pedagogia do oprimido (FREIRE, 1987), Frei-
re diz que é pelo diálogo que as pessoas se organizarão para a conquista de
sua libertação. Esse diálogo é crítico e problematizador.
Assim, a contextualização dos temas, das ideias e dos sujeitos contribu-
em para as categorias de análise: historicidade, totalidade, mediações e de-
terminações, apresentadas no nosso segundo capítulo. Buscamos realizar um
estudo das Cartas Pedagógicas de Bandão, na sua totalidade, contextuali-
zando-as e respeitando as categorias teóricas/práticas de análise: historicida-
de, mediações e totalidade. Uma outra categoria mencionada por nós foi a de-
terminação, que a entendemos como a realidade social que se insere nos nos-
sos estudos – a qual é uma realidade determinada pelo contexto político,
cultural, social, educacional e religioso da época. Porém, cabe ressaltar que a
categoria marxista ―determinação‖ foi questionada por Freire, em Pedagogia
da Autonomia, que nos ajuda a realizar uma leitura crítica a partir do traba-
lho de Educação Popular realizado pelos seus pioneiros e pioneiras no perí-
odo de ditadura, sobretudo através das instituições acima citadas. Para Frei-
re, somos condicionados e conscientes disso, podemos mudar a nossa reali-
dade. Se considerarmos que estamos determinados, não nos reconhecería-
mos como sujeitos em mudança, para o educador. Para melhor clarificar, a
categoria mediação nos é cara, pois, se observarmos a figura 16 (Mapa Temá-
tico), a categoria mediação é fundamental para ratificarmos que Carlos Ro-
drigues Brandão é um intelectual conectivo (PAULO, 2018). As cartas peda-
gógicas estabeleceram as conexões entre os diferentes aspectos que caracteri-
zam aquela realidade: tempo (1960 a 1980), sujeitos (pessoas e instituições) e
o espaço (Brasil, em diálogo com outros países).
A leitura crítica das cartas pedagógicas a partir da categoria totalidade
só é possível mediante as mediações, pelas quais as partes estão relacionadas
(Quadro 1) em uma série de determinações e condicionamentos. Uma de-
terminação era o contexto de ditadura, que proibiu, por exemplo, o livro de
autoria do Brandão Educação Popular e Conscientização de ser publicado, por
ser considerado subversivo (PAULO, 2018). O condicionamento histórico
possibilitou as brechas rebeldes, as de buscar alternativas possíveis. Vimos

110
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

asinstituições citadas e o trabalho que se realizava via MEB e a ala progres-


sista da igreja católica. Essas instituições e pessoas, pela história presente nas
cartas, comprovam que nenhuma realidade é determinada. Elas estiveram
condicionadas ao período ditatorial, mas, no silêncio imposto formalmente,
gritavam às escondidas, subvertendo o modelo autoritário e antidemocrático
da época.
Diante de todas as análises realizadas, a Educação Popular libertado-
ra/transformadora é subversiva, rebelde e transgressora. Mesmo com as
contradições presentes, como a de se calar perante o governo ditador que
proíbe publicações de livro e apreende a Cartilha do MEB (contexto de per-
seguição/polícia/delegacia) – visto que, na Educação Popular, nega-se a
educação silenciosa e imobilizadora – os educadores e educadoras se ―cala-
ram‖ para não morrerem. Do outro lado, clandestinamente, estiveram lu-
tando pela retomada da democracia via Educação Popular. As Cartas Peda-
gógicas de Brandão são resistências políticas, muitas delas foram queima-
das por conta da ditadura militar, das quais a cinza levou de nós parte da
história (registrada) da Educação Popular, que, aos poucos, está sendo recu-
perada por meio de projetos de pesquisas que buscam a descrição de memó-
rias vivas, via depoimentos orais de pessoas com trajetória na Educação
Popular no período duro da ditadura civil militar brasileira. Outro exemplo
são as lives que estão ocorrendo sobre o tema que Brandão tem participado,
e, nelas, conta histórias que não encontramos nos livros. Por questão do
nosso tempo de pesquisa e recorte temático, não conseguimos desdobrar a
pesquisa para a recuperação das memórias vivas da Educação Popular que
estavam nas cartas queimadas de Brandão.

111
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

Síntese do Capítulo

Uma palavra
______________________________________________________

Uma frase
___________________________________________________________
___________________________________________________________
___________________________________________________________
___________________________________________________________
_______________________________________________________

Um parágrafo
______________________________________________________
______________________________________________________
______________________________________________________
______________________________________________________
______________________________________________________
______________________________________________________
______________________________________________________

112
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

“Nesse sentido, esta pesquisa nasceu e se desenvolveu a partir de uma


intensa curiosidade epistemológica‟, advinda das „situações-limites‟ as
quais, enquanto educadores (as) populares, temos enfrentado, principal-
mente no que concerne às lutas pelo direito à formação em EP [Educação
Popular]”.

(Fernanda Paulo, 2019; 2013)

113
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

CAPÍTULO 5

A HISTÓRIA DA
EDUCAÇÃO POPULAR E
CONTRIBUIÇÕES PARA A
PEDAGOGIA LATINO-
AMERICANA A PARTIR
DAS CARTAS

114
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

Neste capítulo, vamos apresentar o que entendemos por pedagogia, ini-


ciando com a reprodução do quadro construído por Paulo (2020b), baseadas
no livro de Ghiraldelli Junior (2006). Depois, apontaremos indícios de uma
Pedagogia Latino-Americana na perspectiva da Educação Popular, por meio
das Cartas Pedagógicas de Carlos Rodrigues Brandão.

Figura 17 - Entendimentos sobre o que é Pedagogia

Fonte: elaborado por Paulo (2020b).

115
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

Em sua análise acerca dos autores e das compreensões sobre pedagogia,


Paulo (2020b) destaca que:

1- Pedagogias e Educação Popular – Dentre os autores que refletiram


sobre o tema, o que mais se aproxima da concepção de Educação Popular é
o pensamento de John Dewey. Com o início do movimento de defesa da
educação pública no Brasil, a Educação Popular era utilizada enquanto aces-
so da classe popular na escola (PAULO, 2018), e John Dewey foi uma das
bases teóricas que representou a necessidade de uma Escola Nova com pen-
samento pedagógico progressista (PAULO, 2020b).
Destacamos que John Dewey, citado por Freire, atuou, a partir do livro
―Democracia e educação‖, na defesa da educação e de país democráticos.
Isto é,

[...] Paulo Freire, balizado pela educação progressista libertadora (diferente da


educação progressista renovada de uma tendência liberal, de Dewey) represen-
ta uma educação conscientizadora, problematizadora da realidade e a luta pela
transformação radical da sociedade capitalista em uma socialista. (PAULO,
2020b, p. 30- 31).

2- Pedagogia socialista de Freire – Segundo Paulo (2020b, p. 31):

O socialismo democrático de Freire dialoga com a perspectiva de Dewey, que é


uma referência presente em três de seus livros: Educação como Prática da Li-
berdade, essa escola chamada vida e Educação e atualidade brasileira. Nessas
obras, Freire utilizou como referência bibliográfica o livro Democracia e Edu-
cação.

Vejamos que Freire dialoga com Dewey em seus primeiros escritos; de-
pois, na Pedagogia do Oprimido, verificamos autores da pedagogia crítica,
sendo Marx o mais citado no livro25. Ainda, para Paulo (2020b, p. 31), Frei-

25
Informação advinda do curso de extensão que participei: ―influência da filosofia na pedago-
gia de Paulo Freire: pedagogia de Paulo Freire e a sua concepção de ser humano - diálogo
entre o marxismo e a fenomenologia”, ministrado por minha orientadora, pelo Centro Univer-
sitário Internacional (UNINTER), com carga horária de 12 horas, nas datas de 23 e 24 de outu-
bro de 2020. Também tem o livro de PITANO, S. C.; STRECK, D. R.; MORETTI, C. Z. (org.).
Paulo Freire: uma arqueologia bibliográfica. 1.ed. Curitiba: Appris, 2019.

116
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

re, no livro Pedagogia da Esperança (1994), nos oferece uma importante refe-
rência da relação da pedagogia com a educação popular e o socialismo. Se-
gundo Freire (1994, p. 27), ―prescindiremos da luta, do empenho para a
criação do socialismo democrático, enquanto empreitada histórica.‖. Para
Paludo (2019, p. 405) ―[...] a perspectiva econômica, política, social e educa-
tiva de Freire não se confunde com os preceitos liberais e neoliberais e se
associa a um socialismo democrático.‖. Freire (2015, p. 37) tece críticas ao
―dogmatismo do socialismo autoritário‖ e reafirma a sua defesa pelo ―socia-
lismo realmente democrático‖ (FREIRE, 1995, p. 38.). Florestan Fernandes,
por exemplo, é citado por Freire em sua tese, especialmente em suas refle-
xões sobre a democracia e defesa do socialismo. Freire continuou nessa luta,
embasando-se em um projeto de socialismo democrático, em tempos de
constituinte (1986), da fundação do Partido dos Trabalhadores e da sua ges-
tão enquanto secretário de educação. Não foi diferente em Brandão, pois ele
cita Florestan Fernandes em várias cartas, como consta no livro ―Arqueolo-
gia nas cartas de Carlos Rodrigues Brandão: contribuições para a Educação
Popular‖, organizado por Paulo e Dickmann (2021). Ambos defendem uma
Pedagogia socialista democrática, apresentando asComunidades Eclesiais, a
Teologia da Libertação, o jornal Pasquim, a Ação Popular, o MEB, o MCP,
pesquisa participante e outros movimentos contrários à ditadura como expe-
riências democráticas e de Educação Popular. No século XXI, as experiên-
cias de Pesquisas Participativas em diferentes contextos educativos e dos
movimentos sociais contemporâneos (como o movimento feminista campo-
nês, movimento de educadores/as populares, entre outros,) vêm recuperan-
do a Educação Popular freiriana.
Para uma retomada dos dois apontamentos, o primeiro contribui para o
desdobramento do item 2, isto é, queremos retomar a origem do socialismo
democrático em Freire, que dialogou com John Dewey e Karl Marx:

Foi Anísio Teixeira quem introduziu o pensamento de Dewey no Brasil. Evi-


dentemente, Paulo Freire vai muito além do pensamento liberal de Dewey, na
direção de uma educação emancipadora e comprometida com um projeto de
sociedade de iguais e diferentes, como ele desenvolveria na sua Pedagogia do
oprimido, distanciando-se dele, sem negar a sua importância na defesa da edu-
cação democrática. (GADOTTI, 2019, p.17)

117
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

Em consonância com os estudos de Sandro de Castro Pitano, Danilo


Romeu Streck e Cheron Zanini Moretti (2019, p. 13), discorrem sobre as
referências utilizadas por Freire:

O mais recorrente, dentro dos critérios anteriormente apresentados, é Karl


Marx, citado em 22 obras (é importante mencionar que optamos por apresentá-
lo junto com Friedrich Engels), seguido de Amílcar Cabral, citado em 14 obras;
Frantz Fanon, Jean Piaget, Albert Memmi e Antonio Gramsci, citados em 10
obras cada um.

Queremos dizer que nossa metodologia de análise documental, emba-


sada pela pedagogia crítica de Paulo Freire, precisa ser compreendida através
das suas referências e suas raízes epistemológicas – sendo ele um dos autores
da Educação Popular no Brasil. Diante do exposto, partimos de um rastro
localizado nas obras de Freire para inferir que a Educação Popular e a Peda-
gogia Latino-americana bebem do socialismo democrático26.
Florestan Fernandes (1989, n. p), em ―Democracia e Socialismo 27‖, es-
creveu: ―tanto Rosa quanto Gramsci julgavam que a estatização e a sociali-
zação dos meios de produção conduziriam aos ideais democráticos e iguali-
tários do socialismo e do comunismo‖. Vimos na Pedagogia de Paulo Freire
essas ideias.
Sobre pesquisas recentes, no Brasil, que possam contribuir com nossos
estudos, ressaltamos os livros Fontes da pedagogia latino-americana I (2010) e II
(2019). Também, em uma pesquisa sobre produções de teses e dissertações a
partir do portal da Biblioteca de Teses e Dissertações (BDTD) 28, sem um

26
Sobre isso, Paludo afirma: ―Com efeito, o conjunto da obra freiriana mostra sua condição de
crítico do capitalismo. Ele também se opõe ao neoliberalismo como modelo econômico e ao
conservadorismo comoideologia política. Assim, ao criticar o socialismo realista como autoritá-
rio, Freire (1995) também critica o capitalismo como não sendo o futuro radiante a que já che-
gamos (1992). Ele acredita na possibilidade da construção de um socialismo democrático.‖
(2019, p. 403).
27 Texto sem paginação e sem ano da reprodução do texto, que conta com uma nota de rodapé
que explicita: ―Este texto, pertencente ao arquivo de Florestan Fernandes, foi escrito em fins
1989‖. Disponível em:
https://www.ifch.unicamp.br/criticamarxista/arquivos_biblioteca/artigo153_Florestan.pdf
Acesso: 15 de jun. 2021.
28
Disponível em: https://bdtd.ibict.br/. Último acesso em maio de 2021.

118
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

recorte temporal delimitado, com o critério de pesquisas apresentadas na


área da educação e defendidas em Programas de Pós-Graduação em Educa-
ção, selecionamos estudos que se referem à pedagogia latino-americana.
Moretti (2008) e Lodi (2019) apresentam suas dissertações, orientadas pelo
professor Danilo Streck, referência importante para nossos estudos.
Moretti (2008) apresenta uma dissertação com grandes aproximações
teóricas relacionadas à nossa pesquisa. Na pesquisa da autora, a insurgência
como princípio educativo da pedagogia latino-americana faz parte de um
movimento de resistência, apontando os espaços dos movimentos sociais
como espaço de processo de luta social e política. Indica, também, a impor-
tância de um programa (demandas e pautas de lutas intencionadas a partir
do diálogo com as demandas e as necessidades locais). A pedagogia latino-
americana se constitui a partir das muitas pedagogias, conforme Moretti
(2008). Cabem nelas a esperança, a dignidade, a liberdade, a autonomia, a
resistência e a insurgência.
Se observarmos o Quadro 1 (Presença de ideias e temas da Educação
Popular), podemos aferir semelhanças entre os temas tratados nas Cartas de
Brandão e o que Cheron (2008) apresenta como princípio educativo da pe-
dagogia latino-americana, o movimento de resistência.
Lodi (2019) aborda a pedagogia latino-americana a partir da poetisa e
professora Salomé Ureña de Henríquez (1850-1897), uma educadora que
apresenta escritos que anunciam e denunciam os conflitos internos de sua
pátria e seu anseio de um mundo melhor em seu país, cuja libertação do
povo oprimido era a luta prioritária. Em seu trabalho, Lodi revela as lutas de
Salomé Ureña acerca da necessidade de uma educação latino-americana que
significava a justiça social, principalmente, na busca pelo direito à educação
de mulheres dominicanas. Aqui, identificamos a Educação Popular feminis-
ta – não discutida, explicitamente, entre os anos de 1960 e 1980, nas Cartas
de Brandão, mas presente em algumas cartas. Outra aproximação ente Lodi
(2019) e o nosso trabalho de investigação é que encontramos nessa disserta-
ção a importância do poder da palavra como processo de libertação.

119
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

5.1 INDÍCIOS DE UMA PEDAGOGIA LATINO-AMERICANA NA


PERSPECTIVA DA EDUCAÇÃO POPULAR A PARTIR DAS CARTAS
PEDAGÓGICAS DE CARLOS RODRIGUES BRANDÃO

Em conformidade com Chartier (2009), a história é uma ciência que ar-


ticula diferentes tempos, e, em nosso estudo, não esquecemos que as relações
temporais nas cartas são construções produzidas pelos sujeitos que trocaram
correspondências com Brandão. Desse modo, interpretamos o conteúdo das
correspondências atribuindo sentidos, ressignificando, assim, o passado, para
identificar contribuições da história da Educação Popular para uma Peda-
gogia Latino-americana.
Em nossa revisão de literatura, observamos que os conceitos de Educa-
ção Popular que localizamos são identificados, em sua maioria, nas cartas de
Brandão, tal como luta política, como processo de transformação social,
como campo de atuação, como experiência de educação e enquanto Movi-
mento Social.
Ainda no capítulo 3, embora tenhamos verificado lacunas de estudos
sobre a História da Educação Popular no Brasil em pesquisas stricto sensu,
encontramos, nos 12 trabalhos que versavam sobre a Educação Popular, tem
a referência a Carlos Rodrigues Brandão. Além de ser um dos ―intelectuais
engajados/as da Educação Popular” (PAULO, 2018) é também um educa-
dor conectivo.
A análise das cartas Pedagógicas nos permite afirmar que Carlos Rodri-
gues Brandão é um intelectual conectivo (MAFRA, 2017; PAULO, 2018;
PAULO, ZITKOSKI, 2016). Por meio das correspondências, observamos,
através da Recuperação do processo vivido e da reflexão de fundo (HOLLI-
DAY, 2006), que a participação é um conceito presente nas correspondên-
cias, no que se refere ao tema da Educação Popular; além disso, a troca de
cartas entre os interlocutores de Brandão pressupunha a escrita como forma
de registro de vozes, ideias e projetos. Um exemplo é a quantidade de cartas
trocadas entre Brandão e Osmar Fávero; entre idas e vindas, podemos anun-
ciar que um dos pontos de chegada da Sistematização de Experiências é que
a Carta Pedagógica foi um instrumento metodológico da Educação Popular,
mesmo que isso não tenha sido reconhecido por eles na época.

120
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

Nesse sentido, a troca de Cartas Pedagógicas, como instrumento me-


todológico da Educação Popular, é uma forma de promoção da participa-
ção. Foi no processo de reconstrução da história da Educação Popular, por
meio das correspondências de Brandão, e na organização das informações
que reconhecemos que o conteúdo que estava ali foi vivenciado por diferen-
tes sujeitos, que traziam, pela escrita, ensinamentos e aprendizagens da prá-
tica de Educação Popular. As Cartas Pedagógicas, como uma pedagogia da
participação Popular (FÁVERO, 2006), eram uma forma de resistência
política e de esperança de construção de um projeto de país democrático.
Outra característica localizada nas Cartas Pedagógicas é a capacidade
com que Brandão e seus sujeitos interlocutores tinham de intervenção e de
criação de alternativas mediante o contexto da ditadura militar. Sobre esse
período, Paulo (2018, p. 251) coloca que a terceira fase da Educação Popular
no Brasil (após abril de 1964 até 1979) foi marcada por:

1. Comunidades Eclesiais;
2. Teologia da Libertação;
3. O jornal Pasquim se destaca como alternativo ao modelo autoritá-
rio.
4. Ditadura militar: prisões, exílio, censura, perseguição, repressão,
etc.
5. Ação Popular, MEB e movimentos contrários à ditadura.

Queremos dizer que há uma ―pedagogia da participação Popular‖ pre-


sente nas Cartas Pedagógicas, as quais estão marcadas por histórias de práti-
cas educativas interventivas ―que, coerente com o ser que estamos sendo,
desafia a nossa curiosidade crítica e estimula o nosso papel de sujeito do
conhecimento e da reinvenção do mundo (FREIRE, 1996, p. 124). Freire
contribuiu para a nossa identificação dos temas e das ideias da Educação
Popular trabalhadas nas cartas de Carlos Rodrigues Brandão entre os anos
de 1964 e 1980 e a relação direta com a constituição de uma Pedagogia Lati-
no-americana a partir da Educação Popular.
Esperança e participação estão presentes nas Cartas Pedagógicas de
Brandão – um intelectual conectivo – sobretudo nas que tratam da Educação
Popular. Desse modo, as Cartas Pedagógicas são uma espécie de ―andari-

121
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

lhagens‖ da Educação Popular. Era por meio delas que ideias, temas e sujei-
tos discutiam a Educação Popular, constituindo-se, a partir da nossa pesqui-
sa, como parte da história da Educação Popular brasileira.

5.1.1 Participação: Marcela Gajardo e Orlando Fals Borda

Observamos, nas cartas de Carlos Rodrigues Brandão, que Marcela Ga-


jardo e Orlando Fals Borda trocaram cartas com ele. Identificamos a Educa-
ção Popular e a Pesquisa Participante como temáticas tratadas (PAULO,
2020a). Esses dois autores compõem o quadro de educadores e educadoras
que versam sobre a Educação Popular no contexto latino-americano. Encon-
tramos nessas cartas práticas de Educação Popular enquanto resistência
política e de esperança da retomada de um projeto de educação democrática.
Insere-se, como pano de fundo, o conceito de participação e de ciência cons-
truída em diálogo com saberes populares. Outros temas tratados foram:

Em uma das cartas de Carlos Rodrigues Brandão, ele escreve para Marcela
Gajardo, perguntando quando ela viria para o Brasil encontrar Paulo Freire;
indica que ela não deixe de fazer o livro do IDAC, expondo que é um convite
irrefutável, vindo de ClaudiusCeccon. Na atualidade, segue como diretor do
Cecip, escrevendo, fazendo ilustrações para livros infantis, charges, tendo sua
vida atrelada a projetos de inclusão digital de escolas públicas, educação e ci-
dadania. (PESCADOR, 2021, p. 50. Grifos nossos).

Sobre um dos educadores pouco visibilizados na história da Educação


Popular no Brasil, citado por Brandão em uma Carta destinada a Marcela
Gajardo, ressaltamos Jomard Muniz de Brito:

[...] nasceu na cidade do Recife, em abril de 1937. Professor, poeta, cineasta,


músico e filósofo, formado em filosofia pela Universidade do Recife, atual
UFPE. Foi um dos integrantes do Serviço de Extensão Cultural (SEC) na equi-
pe inicial do Sistema Paulo Freire. O texto publicado e mais conhecido por
quem estuda a história da Educação Popular é de 1963, e consta na revista Es-
tudos Universitários. O título do artigo é Educação de Adultos e Unificação da Cultu-
ra. O conteúdo do texto trata das ideologias, formação em grupos, educação de
adultos, democratização da cultura e leitura de mundo. Inclusive, Paulo Frei-
re faz referência desse artigo no livro Educação como prática da liberdade (1967) e

122
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

em Educaçãoe mudança (1976). Na catalogação das Cartas de Carlos Rodrigues


Brandão, encontramos Jomard Muniz de Brito citado duas vezes: 1) Carta des-
tinada a MarcellaGajardo; 2) Carta destinada a Paulo Freire. Nas cartas, os
temas tratados são: trabalho popular, trabalho da equipe Paulo Freire, poemas
políticos, material do MCP do Recife ao MEB, e artigo na Revista Estudos
Universitários. (PAULO, 2021b, p. 102-103. Grifos nossos).

Encontramos o conceito de participação nos assuntos concernentes ao


trabalho popular, na proposta de Educação de Paulo Freire e da necessidade
de democratização da educação e da cultura. Juntamente, estava presente o
tema da pesquisa do universo vocabular (FREIRE, 1987), construída com as
pessoas. Para Freire (1987; 1996), os homens e as mulheres são sujeitos de
compromisso político e social. Ele coloca o compromisso com o mundo
humanizado, que significa compromisso histórico com a transformação
concreta da realidade, o qual se corporifica no engajamento político de edu-
cadores e educadoras.

5.1.2 Socialismo democrático: pautas da Educação Popular.

Uma das identificações entre o conteúdo das cartas de Brandão e a


compreensão de pedagogia latino-americana com base na Educação Popular
freiriana é: ―o projeto popular de educação, que pressupunha uma sociedade
mais justa, é o que aproxima a pedagogia socialista com a Educação Popu-
lar, cuja formação política em espaços coletivos tem como horizonte a
emancipação humana‖ (PAULO, 2020a, p.27). Em 1980, em uma Carta
escrita por Brandão para Paulo (velho amigo), localizamos a referência às
mulheres como objeto do capitalismo patriarcal. Vejamos o fragmento:

123
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

Figura 18- Carta Campinas (antiga Vila de São Carlos), 14 de janeiro de


1980.

Fonte: Acervo Brandão.

A carta trata de trabalhos de Educação Popular realizados por Brandão


e relatados para Paulo, que não é o Freire, mas sim um companheiro do
projeto Meio Grito. Nela, ele conta sobre a necessidade de financiamento
para um projeto sobre migrações. Relata que o valor necessitado para o pro-
jeto de pesquisa era gasto por homens capitalistas. Partindo da dissertação de
Lodi (2019), os pressupostos da Educação Popular estão comprometidos
com ações libertadoras, contra todo tipo de opressão. Também, o poder da
palavra escrita na carta supracitada demonstra a preocupação de Brandão
com uma linguagem inclusiva de gênero. Ainda, em consonância com Bran-
dão (1980, p.63), a ―educação feita de acordo com os interesses das classes
populares‖ – o que está explícito nessa correspondência e nas demais anali-
sadas. Temos aqui conceitos do Socialismo democrático: classe popular,
participação, projeto de sociedade não capitalista, linguagem inclusiva e
políticas sociais.
Sobre a Educação libertadora, transformadora/emancipatória, no diá-
logo com as mulheres, mesmo que na carta não trate de temas específicos da
Educação Popular feminista, vimos aproximações entre a proposta política e
pedagógica da Educação Popular com os feminismos – apontados por Mo-
retti (2008). A autora apresenta que a pedagogia latino-americana se consti-
tui a partir das muitas pedagogias, portanto, para nós, a Educação Popular
feminista faz parte dessas novas pedagogias, compondo o que chamamos de
Pedagogia Latino-Americana com base na Educação Popular freiriana.

124
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

Figura 19 - Educação Popular freiriana

Fonte: das autoras (2021).

A exemplo dessa carta (figura 18) e da categorização dos significados de


Educação Popular que identificamos nas demais correspondências, verifica-
mos que existe uma escrita pautada por movimentos de resistências (figura
19) – pressuposto da Educação Popular freiriana (PAULO, 2018). Além
disso, visualizamos, nas Cartas Pedagógicas, somadas às referências da Pe-
dagogia Latino-americana na perspectiva da Educação Popular, a importân-
cia da experiência (relatada, registrada e refletida).
Oscar Jara Holliday (2006) nos ajuda nesse ponto com sua proposta
metodológica de Sistematização de Experiências, e Josso (2004), compreen-
dendo que a experiência é formativa, ou seja, os conjuntos de experiências
relatadas nas correspondências, ao serem analisados, fazem parte de um
―itinerário de vida‖, enquanto ―experiências formadoras‖. Identificamos, à
luz dessa autora, que as Cartas Pedagógicas trazem para nós um olhar para o
presente ―articulado com o passado e com o futuro, que começa, de fato, [...]
que orienta a continuação da sua história com uma consciência reforçada
dos seus recursos e fragilidades, das suas valorizações e representações, das
suas expectativas, dos seus desejos e projetos.‖ (JOSSO, 2004, p.60-61).
Em nosso presente, sobretudo após o centenário de Paulo Freire reali-
zado em 2021 e os 50 anos de Pedagogia do Oprimido (1968 – 2018), a Edu-
cação Popular é tema pautado no seu contexto político, metodológico e his-

125
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

tórico atual – tempos de lutas para garantir a continuidade das conquistas


sociais e políticas que, com o atual presidente do Brasil (Jair Bolsonaro),
estão em duras disputas. Vivemos um Brasil de golpes e de retrocessos quan-
to à agenda da educação brasileira.
As Cartas Pedagógicas de Brandão possibilitam a recuperação de uma
história (passado) ainda não registrada por outros/as pesquisadores/as e nos
orienta para prosseguirmos na perspectiva da Educação Popular freiriana.
Vimos que a luta contra as opressões, golpes e ditaduras estiveram presentes
nas Cartas de Brandão durante as décadas de 60 e 80.
Observamos que os pensadores e pensadoras da América Latina busca-
ram trazer respostas decoloniais ao processo pedagógico, de construção do
conhecimento na acepção de Educação Popular freiriana. Streck, Moretti e
Adams (2019) e Streck (2010) contribuem para a recuperação das fontes
sobre a educação popular na América Latina. Porém, cabe frisar que nem
todos os sentidos e significados do popular são os mesmos de Brandão e
Freire, como podemos verificar com Paulo (2018; 2020a), sendo que os que
se aproximam com a Educação Popular freiriana são:

Quadro 6 - Pensadores Latino-americanos e a Educação Popular


Modernidade – colonialidade - raça:
Aníbal colonialidade do poder, globaliza-
Teoria crítica decolonial.
Quijano ção, eurocentrismo e a colonialida-
de.
Denunciava os interesses dos Esta-
dos Unidos no processo de coloni-
Teoria crítica. Pedagogia zação (expansão econômica sobre a
José Martí
Revolucionária. América Latina). Buscava unidade
social e política para os fins revolu-
cionários.
Paulo Educação como Prática da Liber-
Reglus Pedagogia da Libertação. dade, educação conscientizadora,
Neves Teoria crítica. Dialogicidade, Transformação
Freire social e humanização.
Teoria crítica. Filosofia da Faz crítica ao pensamento do centro
Enrique
Libertação desde a América – especialmente o europeu. Enfatiza
Dussel
Latina. a necessidade de práticas de liberta-

126
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

ção do oprimido latino-americano.


Teoria crítica. Pedagogia de
Frantz Fa- Eurocentrismo/visão de mundo
descolonização via solidarie-
non branca. Solidariedade e Libertação.
dade e libertação.
Carlos Ro-
Teoria crítica. Pedagogia da Educação Popular – pesquisa parti-
drigues
Educação Popular. cipante e Teologia da Libertação.
Brandão
A Investigação-ação Participativa e
a Educação Popular. Educação
Orlando
Teoria Crítica decolonial. Popular Latino Americana com
Fals Borda
uma ciência/pedagogia não eu-
rocêntrica.
Fonte: elaborado por Paulo (2020a).

Salientamos dois temas pedagógicos e metodológicos decoloniais, pre-


sentes nas Cartas Pedagógicas, os quais são: a Pesquisa Participante e a Teo-
logia da Libertação. As temáticas foram discutidas por vários interlocutores
de Brandão e pensadores latino-americanos (Quadro 6). Percebemos que o
conceito de libertação é o fio condutor dos dois temas, sendo as experiências
das Comunidades Eclesiais de Base e os Círculos de Culturas a representa-
ção do que chamamos de Educação Popular freiriana - indícios de uma pe-
dagogia latino-americana. Fica evidente, nas cartas analisadas, a importân-
cia dos oprimidos na construção dialógica do seu processo de libertação,
mediante uma pedagogia da luta, da resistência, da conscientização e da
emancipação. Destacamos, além da Teologia da Libertação, à luz do quadro
6, a Pedagogia e a Filosofia da Libertação – ambas apresentavam a partici-
pação popular como horizonte de uma educação política para a conscienti-
zação - enquanto práxis revolucionária de resistência.
Os sete autores são referências que dialogam com as temáticas da Edu-
cação Popular discutidas nas cartas de Carlos Rodrigues Brandão. Muitos
dos temas são atuais, como a importância de uma Pedagogia da participação
Popular e da democracia. As ideias educacionais presentes nas Cartas Peda-
gógicas contribuem para as discussões sobre Pedagogia latino-americana,
como podemos conferir a seguir:

127
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

O quarto tronco desta história da educação popular envolve projetos educativos


diversos ao serviço dos grupos mais desprotegidos da sociedade. Neste sentido,
Mejía cita o Padre José MaríaVélaz e seu intento de construir uma escola a par-
tir da educação popular integral, que encontra expressão no Movimento Fé e
Alegria, fundado em 1956, e ainda atuante. Esta Educação Popular integral
trabalha com as seguintes ideias: a) a educação visa romper as correntes mais
fortes da opressão popular mediante uma educação cada vez mais ampla e qua-
lificada; b) a democracia educativa tem que preceder a democracia econômica e
social; c) depois de tanta luta não podemos nos resignar a viver em uma justiça
média. Há que lutar pela justiça integral; d) Fé e Alegria nasceu para impulsio-
nar a mudança social por meio da educação popular integral. (MOTA NETO;
STRECK, 2019, p. 211).

Embora a instituição ―Fé e Alegria‖ não faça presença nas correspon-


dências dos anos analisados, localizamos temas convergentes (Quadro 1) –
entre eles, destacamos a Educação Popular integral. Baseada na perspectiva
da Educação Popular libertadora, base de Brandão (PAULO, 2020a), temos
a pedagogia emancipatória, usada como libertação política e social, com-
prometida com a formação integral do ser humano (RIBEIRO; BARBOSA,
2020).
Por isso, encontramos nas cartas de Brandão a compreensão de forma-
ção pedagógica integral (acepção da Educação Popular freiriana), a qual
precisa ser crítica, criativa, engajada com a prática e, sobretudo, construída
com as pessoas e no cotidiano dos sujeitos – característica da Pedagogia
Latino-americana na perspectiva da Educação Popular. A produção e a soci-
alização do conhecimento, na Educação Popular freiriana, deveria estar a
serviço da construção de uma ciência biófila - o que Freire chama na Peda-
gogia do Oprimido. É o que encontramos nas cartas de Brandão, principal-
mente nas questões relacionadas à Pesquisa Participante, à luta pela demo-
cracia, pela participação e pela liberdade, enquanto composição de uma ética
para a humanização como caminho para a transformação da realidade
(FREIRE, 2000b), necessitando de uma formação e de transformação social.
Educação Popular freiriana busca a transformação da realidade, refere-
se à reconstrução de um paradigma que contemple as diferentes realidades:
feminismos, raças, etnias, culturas, educações críticas; enfim, que se preocu-
pe com os processos e com as transformações da realidade que envolve a
pedagogia crítica. Por isso,

128
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

O resgate de fontes pedagógicas parte exatamente do esforço de reconhecer es-


sas experiências e conhecimentos considerados inferiores como resistências que
se propõem a superar a colonialidade do conhecimento e do poder. O controle
do conhecimento e da subjetividade fez submergir o seu contrário. O expansio-
nismo moderno/colonial com as diversas formas de dominação impôs uma
cultura do silêncio, reforçada pela verticalidade, o monólogo e uma metodolo-
gia universalizante. A educação libertadora está comprometida com as dinâmi-
cas presentes em diálogos que se produzem nas relações horizontais; para além
de dizer o mundo desde seu ponto de vista (individual ou coletivo), sua impli-
cação está na práxis social construída. A palavra dita, como insistia Paulo Frei-
re, é também palavra-ação. A pedagogia latino-americana está comprometida
com a construção de metodologias próprias, "emparelhadas" com o outro e
com a outra no processo de busca do inédito viável. (MORETTI, 2010, p.45).

Numa reflexão sobre a Pedagogia Latino-americana na perspectiva da


Educação Popular libertadora (Figura 19), desde as cartas de Carlos Rodri-
gues Brandão, a Teologia da libertação, a Pesquisa Participante, Educação
Popular e trabalho popular são marcas de um intelectual conectivo mediado
por relações estabelecidas por solidariedade e compromisso ético-político.
Consoante à Teologia da libertação, Boff (2008) coloca que o discurso
religioso se interliga com o analítico e pedagógico. Enfatiza que ―Paulo Frei-
re, desde o início, foi e é considerado um dos fundadores da Teologia da
Libertação.‖ (BOFF, 2008, p.17). Segundo Brandão, referindo-se à sua atua-
ção na década de 1960 (1983, p. 202):

Logo depois ingressei como um dos participantes da ―equipe de filosofia‖ da


Juventude Universitária Católica, a JUC. A JUC daquele tempo tinha pessoas
como Betinho, frei Betto; e outras pessoas que depois se tornaram muito co-
nhecidas. Eu sou da geração de toda esta gente: Marcos Arruda, Leonardo
Boff, um pouco mais velho, Paulo Freire (que nunca foi de Ação Católica e que
eu iria encontrar depois, na militância da educação popular). E, em 1962, no
ano seguinte, eu resolvi que não ia ficar em Filosofia, pois desde meu ingresso
na JUC eu me imaginava em uma profissão mais próxima ao ―social‖.

Vejamos que Brandão tem uma relação com a Teologia da Libertação,


Pesquisas Participantes e Educação Popular - cuja compreensão é a de que a
educação libertadora requer participação e formação para um conhecimento
libertador das opressões características de sociedades capitalistas. A pedago-
gia da Educação Popular visa propor conhecimento libertador – mais que

129
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

um saber sobre os direitos e deveres enquanto cidadão participante de uma


sociedade – requer produção do conhecimento conscientiza-
dor/emancipatório. Brandão coloca que sua relação com o MEB está atrela-
da à Educação Popular libertadora, isto é:

É através deste trabalho, que me carrega do ―mundo universitário‖ para o


―mundo da educação popular‖, que eu entro na educação. Ingresso no univer-
so da educação popular, que vai nascer para mim no MEB. (BRANDÃO,
1983, p. 205).

Sobre isso, esclarece Brandão (1983, p. 206):

Desde o começo os movimentos de cultura popular não são experiências ape-


nas no campo da educação. Tanto assim que a própria expressão: ―educação
popular‖ vai aparecer bem mais tarde. E ela vem, como as experiências pionei-
ras de cultura popular, em boa medida ―do campo para a cidade‖. Naquele
tempo, quando se perguntava a um cantor, a um ―poeta engajado‖, a um mili-
tante do Partido Comunista, da JUC, ou da Ação Popular, o que ele fazia, era
costume a resposta: ―eu estou militando com cultura popular.

Nas cartas, o MEB compõe a trajetória de Brandão e a influência das


ideias do catolicismo popular. Segundo Beatriz Costa ([entre 1970 e 1980], p.
3), ―a pastoral popular expressa hoje, por parte de muitos agentes de pasto-
ral, uma opção de unir-se aos setores populares para reforçar o processo de
transformação social.‖. No caderno “Pastoral popular: notas para um debate”,
há um artigo constituído por depoimentos de agentes que falam da Educação
Popular – um deles (Carlos) relata que: ―o trabalho de Educação Popular
não é desligado da análise ou da leitura de conjuntura global e local que se
faz. É essa visão de conjuntura que determina a prática educativa a ser de-
senvolvida‖ (COSTA, [entre 1970 e 1980], p. 27). Temos assuntos interes-
santes sobre a temática neste caderno (CEDI:1) e convergem com os temas e
ideias educacionais trabalhados nas cartas de Brandão e a relação direta com
a Educação Popular. Com relação à Educação Popular e Brandão, ele mes-
mo diz que foi um ―estudante e militante‖, e considera-se um educador po-
pular com militância na Educação Popular (PAULO, 2018), demonstrando
ter uma trajetória de intelectual conectivo e comprometido, perpassando
pelo quefazer radical, embasado pela práxis social transformadora.

130
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

A Pedagogia Latino-americana na perspectiva da Educação Popular


(constituídas por educações críticas) tem um papel fundamental na tarefa de
transformação das pessoas para transformar a sociedade. Com base na Edu-
cação Popular freiriana, a ciência biófila – oposta à educação bancária, tec-
nicista e neotecnicistas, que se baseia pela cultura da dominação e é desu-
manizadora (uma ciência necrófila) – sustenta a Pedagogia Latino-
americana.

5.2 EDUCAÇÃO POPULAR E A PEDAGOGIA LATINO-


AMERICANA: MOVIMENTOS DE RESISTÊNCIA E ESPERANÇA

Dos indícios de uma Pedagogia Latino-Americana na perspectiva da


Educação Popular freiriana apresentados nas seções anteriores, destacam-se:

1) Cartas Pedagógicas de Brandão e encontros entre o passado e o presen-


te: Documentos históricos e políticos que trazem contribuições para a
Educação Popular e a Pedagogia Latino-americana, sobretudo desde as
experiências do passado (quadro 1) e projetos ainda atuais, tais como: a)
a luta esperançosa e engajada por uma educação e sociedade democráti-
ca e socialista; b) a Educação para o desenvolvimento comunitário, que
contemple metodologias participativas e trabalho popular de conscienti-
zação; e, c) o Socialismo democrático, que se apresenta como base políti-
ca da Educação Popular.
2) Educação Popular das décadas de 1960 a 1980: No século XXI, retoma-
se as ideias, temas e experiências, tais como: pesquisa popular, luta pelos
direitos sociais, trabalho popular de base, movimentos sociais em defesa
da democracia, saúde, cultura e educação popular, trabalho como princí-
pio educativo, extensão universitária, escola popular, educação indígena,
educação camponesa, educação do negro, educação da mulher, religião
popular/teologia da libertação, educação de adultos participativa e dia-
lógica.
3) Experiência(s) contemporânea(s) da Pedagogia Latino-Americana: O
Conselho de Educação Popular da América Latina e Caribe (CEAAL) -
reconhecido como Movimento Social de Educação Popular desde a dé-
cada de 70, ―do qual Paulo Freire foi um dos fundadores e seu primeiro

131
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

presidente29‖ - representa um espaço que viabiliza as andarilhagens da


Educação Popular. No estatuto do CEAAL30, temos a seguinte informa-
ção: ―Somos um movimento de Educação Popular que, atuando em rede,
atua e acompanha os processos de transformação educacional, social, po-
lítica, cultural e econômica das sociedades da América Latina e do Cari-
be, em contextos locais, nacionais e regionais, em diálogo com o mun-
do‖. Traz dezenas de temas da Educação Popular, dentre eles, a justiça
social, a democracia, os direitos humanos, a igualdade de gênero, a inter-
culturalidade crítica e a opção por um projeto societário emancipatório.
4) As novas pedagogias enquanto resistência política e deesperança:
Apresentamos parte da história da Educação Popular no Brasil, desde o
olhar analítico advindo de Cartas Pedagógicas. Citamos algumas das
ideias e temas identificados que contêm discussões sobre a educação, os
quais corroboram para o que vamos denominar como Educação Popular
decolonial (religiosidade popular, cultura popular, literatura popular, tea-
tro popular, arte popular) e Educação Popular multicultural (educação
indígena, com o negro, das mulheres e dos pobres). Essas categorias
emergentes não foram descobertas inéditas, pois, na última década, esse
tema tem sido recorrente. O que é inovador é a nossa defesa de que essas
categorias emergentes não são fenômenos novos, elas originam-se na dé-
cada de 1960.

Sobre essas categorias (Educação Popular decolonial e Educação Popu-


lar multicultural), fundamentando-nos em Catherine Walsh (2006; 2009) e
Freire (2013), destacamos:

1. Educação Popular decolonial: ―Walsh, na perspectiva de uma edu-


cação popular decolonial, sinaliza não haver um caminho para a transfor-

29
Afirmação de SelvinoHeck: Membro de CEAAL Brasil, em nome do CAMP (Centro de
Assessoria Multiprofissional). Disponível em: https://sul21.com.br/colunasselvino-
heck/2019/10/freireando-porto-alegre/. Acesso 02/09/2021.
30
Retirado de um documento referente ao Estatuto do CEAAL – a ser aprovado em assembléia,
ainda neste ano ( 2021). O documento nãoestá publicado e tivemos acesso ao mesmo por conta
da Associação de Educadores Populares de Porto Alegre ( AEPPA), movimento que é associa-
do ao CEAAL e que eu faço parte do Grupo de estudos Paulo Freire e Educação Popular.

132
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

mação social sem criticidade‖ (SANTOS, 2019, p.33). Em Cartas à Guiné-


Bissau, encontramos críticas à educação e sociedade colonial.
2. Educação Popular multicultural:Walsh (2006; 2009) apresenta uma
concepção de interculturalidade crítica. Referente a isso, Freire coloca que a
―multiculturalidade jamais estará pronta e acabada‖. ( FREIRE, 2013,
p.156).
No quadro 5 (Aníbal Quijano e Orlando Fals Borda) e no Anexo A31
(PAULO, 2020), é possível identificar a Educação Popular decolonial. Ve-
jamos que Paulo (2020) apresenta a Educação Popular decolonial como
fenômeno desta década (século XXI). Entendemos que esse é um tema que
vem sendo deveras trabalhado nos últimos dez anos, sobretudo, utilizando
essa expressão (Educação Popular decolonial). Todavia, através das análises
das cartas, defendemos que a essência da Educação Popular decolonial é
oriunda da década de 1960.
Nas palavras de Dickmann (2021) e Paulo (2021, p. 11), a ―Reinvenção
é um conceito tão importante nas obras de Paulo Freire que consta desde a
sua tese intitulada como Educação e atualidade brasileira (1959) até o livro
Pedagogia da autonomia (1996)‖, em que podemos confirmar que as cartas
identificadas como Pedagógicas assumem ―a luta pela construção do inédito
viável‖. (FREITAS, 2001, p. 98). O inédito viável em Paulo Freire (1987)
retrata a palavração, resistência política, esperança e práxis educativa.

31
O anexo encontra-se na Dissertação de Gaio (2021).

133
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

Síntese do Capítulo

Uma palavra
______________________________________________________

Uma frase
___________________________________________________________
___________________________________________________________
___________________________________________________________
___________________________________________________________
_______________________________________________________

Um parágrafo
______________________________________________________
______________________________________________________
______________________________________________________
______________________________________________________
______________________________________________________
______________________________________________________
______________________________________________________

134
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

CONSIDERAÇÕES PARA

CONTINUIDADE DOS

DIÁLOGOS

135
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

O caminho percorrido na elaboração deste livro advém da análise de


Cartas Pedagógicas de Carlos Rodrigues Brandão, entre os anos de 1964 e
1980, e suas relações com a Educação Popular. Diante disso, as categorias
historicidade, mediações e determinações contribuíram para a compreensão
de que a Educação Popular presente nas cartas (temas, ideias e sujeitos) pos-
sui conteúdo produzido por pessoas e tempos de determinado contexto his-
tórico, cultural, político, e apresentam pautas coletivas.
A Sistematização de Experiências de Educação Popular, através de
análise documental de cartas inéditas (documento de primeira mão), consti-
tuiu-se como uma das formas de reinventar a pedagogia freiriana (ANDRE-
OLA, 1993; DICKMANN, 2021). A recuperação do processo vivido contri-
buiu para apresentarmos temas (quadro 1) e sujeitos que trocaram cartas
com Brandão (capítulo 4).
Osmar Fávero foi o intelectual que mais trocou cartas com Brandão, e
foi o mais citado. Um dos livros que ele escreveu versa sobre a pedagogia da
participação popular e a prática educativa do Movimento de Educação de
Base: nessa obra, a Educação Popular está presente; além disso, parte do
conteúdo que consta na publicação está presente nas cartas trocadas ente
Brandão e Osmar, com destaque para os conceitos de diálogo e participação
enquanto princípio educativo da Educação Popular.
O aporte teórico desta investigação é originário dos estudos sobre Edu-
cação Popular, principalmente em Andreola (2001), Barreiro (1980), Boff
(2008), Brandão (1980; 1982), Fávero (2006), Freire (1980, 1987, 1991),
Gadotti (2019), Holliday (2014), Paiva (1973), Streck (2010), Torres (1997),
entre outros. Com base na revisão de literatura, constatamos a carência de
estudos documentais que abordam a história da Educação Popular, princi-
palmente em se tratando de correspondências/cartas. Nossas pesquisas,
estudos e militância indicam o uso de Cartas Pedagógicas como intrumento
de coleta de dados, na perspectiva das Pesquisas Participativas, fundamen-
tadas pela Educação Popular.
Destacamos que a Educação Popular, na revisão de literatura, se apre-
sentou como campo de atuação (movimento social, universidade, escola,
pedagogia social) e como base teórica de pioneiros/as da educação do Brasil
e América Latina – contribuindo para reflexões do contexto social, político e
econômico da sociedade. Igualmente, enquanto luta política e transformação

136
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

social. Dessas acepções, emergiu a categoria Educação Popular Transforma-


dora – um conceito assumido, teórico-prático, pelos intelectuais engajados
da Educação Popular freiriana (PAULO, 2018). Identificamos categorias da
Educação Popular que contemplam o que chamamos de freiriana – que se
constituem como base para uma Pedagogia latino-americana (figura 19) e
estão em consonância com o quadro que consta no Anexo A (compreensão
de Educação Popular, em Gaio, 2021 e Paulo, 2018).
Referente às temáticas da Educação Popular que foram discutidas nas
cartas de Carlos Rodrigues Brandão (1964-1980), observamos temas atuais
de âmbito geral, como a importância de uma Pedagogia da Participação
Popular e da luta esperançosa e permanente pela democracia a partir dos
movimentos sociais populares. Outros temas específicos, a saber: defesa
pelos direitos sociais, incluindo a educação e suas modalidades, como por
exemplo, a educação de adultos, a educação indígena, educação camponesa,
etc.
Através das Cartas Pedagógicas, presenciamos encontros entre o pas-
sado e o presente da Educação Popular – sendo que aluta esperançosa, con-
tínua e engajada pelo socialismo democrático permanece sendo fundamento
político e ético de educadores progressistas (FREIRE, 2013).
Constatamos que a Educação Popular é carregada de ―memória de
muitas tramas, o corpo molhado de nossa história, de nossa cultura‖
(FREIRE, 2013, p. 17). No entanto, uma das características dos/as pionei-
ros/as da Educação Popular freiriana, como é o caso de Brandão, é o traba-
lho coletivo, participativo, dialógico e solidário 32 (PAULO, 2018), e esses
princípios políticos e pedagógicos constituem o que observamos, analisamos
nas cartas, e denominamos de Educação Popular decolonial e multicultural
– concepção de uma Pedagogia latino-americana. Essa, influenciada pelas
raízes epistemológicas de Paulo Freire e pela pedagogia emancipató-
ria/libertadora da Educação Popular, como vimos nos capítulos 2 (caminho

32
Para Paulo ―Outra característica da Educação Popular é a solidariedade na partilha de sabe-
res, apresentando-se como um movimento de educação que valoriza o trabalho coletivo, a
socialização de experiências e saberes e a construção de novos saberes a partir de uma Pedago-
gia Engajada. (PAULO, 2020a, p. (31).

137
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

metodológico), 3 (Educação Popular como categoria, no quadro 3), 4.1 (ma-


peamento das cartas) e 5 (história da Educação Popular e contribuições para
a Pedagogia latino-americana a partir das cartas).
Comprovamos e reconhecemos que cartas Pedagógicas apresentam
contribuições para a história da Educação Popular e para a Pedagogia latino-
americana, especialmente em tempos de políticas e projetos educacionais
neoliberais e ultraneoconservadores. Ao identificarmos a Educação Popular
decolonial e multicultural, vislumbramos a utopia freiriana (FREIRE 1987;
2013), que pressupõe uma mudança radical no projeto de educação em dife-
rentes contextos. Queremos ratificar que a Educação Popular decolonial e
multicultural, identificada nas correspondências, demonstra que as teorias e
as práticas educativas de Brandão e seus interlocutores estimulam ―a solida-
riedade social e não o individualismo, o trabalho baseado na ajuda mútua, a
criatividade, a unidade entre o trabalho manual e o trabalho intelectual‖
(FREIRE, 1980, p. 43). Essas acepções constam explícitas nas nossas análi-
ses, e simbolizam os desdobramentos da Educação Popular libertadora,
transformadora, emancipatória e crítica.
As vivências e as narrativas encontradas nas cartas são contribuições
para a continuidade da história teórico-prática da Educação Popular e para a
pedagogia Latino-americana. Um exemplo de movimento social Latino-
Americano é o Conselho de Educação Popular da América Latina e Caribe
– cujo atual presidente do CEAAL, Oscar Jara, tem reconhecido as cartas de
Brandão como importantes documentos da história da Educação Popular -
especialmente do Brasil, em diálogo com outros países. Essa aclamação está
registrada em ―Carta convite a leitura”, no livro organizado por Lima,
Paulo e Tessaro (2020 a). Levando em consideração as 181 cartas e as 94
analisadas por conta dos critérios estabelecidos no capítulo 1, identificamos a
demanda de aprofundamento dos estudos, tendo como horizonte o arquivo
de Cartas de Carlos Rodrigues Brandão. Um tema que merece aprofunda-
mento são as experiências de Educação Popular em outros países (França,
Argentina, México, Chile, Inglaterra, etc.), localizadas em cartas escritas em
língua estrangeira – demonstrando que Brandão, assim como Paulo Freire,
andarilhou pelo mundo a partir da Educação Popular – sendo considerado
um intelectual conectivo.

138
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

A finalização deste estudo dá-se em um tempo marcado por grandes


crises políticas, sociais, educacionais, humanitárias e econômicas - agravan-
do-se por conta da pandemia pelo Covid-19. Nesse sentido, a História da
Educação Popular encontrada nas Cartas Pedagógicas demonstra a impor-
tância da Educação Popular freiriana e seus desdobramentos (Educação
Popular decolonial e multicultural) enquanto instrumento de lutas, de prá-
xis pedagógica e de renovação da esperança.

139
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

POSFÁCIO

Caras Fernanda e Adriana,

O trabalho, que acabo de ler, deixa a bola quicando para a escrita


de uma carta que dirijo a vocês, mas que desejo compartilhar com todas as
leitoras e leitores do livro Educação popular nas cartas do educador Carlos Rodri-
gues Brandão: contribuições para uma pedagogia latino-americana. As primeiras
palavras não poderiam ser senão de gratidão. A vocês que fizeram um es-
plêndido trabalho de garimpagem em cartas de Carlos (vou tomar a liberda-
de de usar o prenome porque é assim que amigos e companheiros costumam
se tratar em cartas) que revelam uma faceta pouco explorada da educação
popular. Ao Carlos por abrir seus arquivos para tornar público um acervo
que compreende uma memória viva imprescindível para seguir reinventando
a educação a partir de princípios e práticas que hoje constituem o que cha-
mamos de educação popular.
O livro surge, não por acaso, no centenário do nascimento de Pau-
lo Freire. Nesse sentido, é também uma homenagem a ele, que ao longo de
todo o texto recebe uma atenção especial. O centenário mostra o vigor da
obra de Paulo Freire na constituição de uma pedagogia latino-americana,
como revelam as incontáveis livesem torno de sua vida e obra realizadas
nesse ano de pandemia. Paulo Freire sintetiza, como vocês mostram, o mo-
vimento pedagógico que se entende por educação popular, que muitos hoje
preferem identificar com o plural para expressar a diversidade de práticas e
de teorizações. Paulo Freire ocupa um importante lugar em quase todas elas,
servindo de referência ou de parâmetro para responder a outras e novas exi-
gências da realidade.
Mas o livro de vocês mostra também que a educação popular não
resulta do trabalho ou da cabeça de uma pessoa. Trata-se da ação de uma
rede colaborativa entre movimentos sociais, entidades religiosas, projetos de
educação de adultos, entre muitos outros. As cartas revelam esta intensa
mobilização que contava com a participação de educadores/educadoras e
intelectuais, como Osmar Fávero, Miguel Arroyo e Marcos Arruda, entre
centenas de outros e outras que no anonimato fizeram a educação popular,

140
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

em especial as mulheres também aqui muito invisibilizadas. As cartas reve-


lam a tecitura do movimento, que criava novos braços enquanto se enraizava
em contextos diferentes.
Carlos teve um papel destacado nessa construção. As cartas mos-
tram um educador engajado, como se dizia naquele tempo, sempre muito
atento para o que estava acontecendo. Vocês destacam com razão o caráter
conectivo do Carlos, articulando aqui e ali, não só através da escrita, mas
também através da presença física que era e continua sendo um encontro
prazeroso e de profundas aprendizagens pela sua capacidade de escuta, de
diálogo e de comprometimento com o que atualmente se traduz como justiça
socioambiental. Para isso contribui sua formação multidisciplinar, mas so-
bretudo seu olhar de antropólogo, que enxerga na cultura a pulsação da vida
em sua beleza, diversidade e generosa capacidade de resistência, luta e rein-
venção. Fernanda e Adriana, através da figura do Carlos, vocês penetram
nos bastidores da educação popular e encontram pessoas que amam, feste-
jam, vibram e sofrem com seu trabalho. A educação popular, seja qual for a
sua expressão, se funda nessa experiência de humanidade, sem a qual vira
letra morta em manuais ou prática a longo prazo inconsequente.
Quero ainda chamar atenção para as leitoras e leitores que eu achei
muito importante que vocês colocaram as cartas dentro de uma moldura
investigativa, sem perder de vista o tom comemorativo das memórias. Como
educador e pesquisador, aprendo com vocês a ver as cartas (pedagógicas)
como um documento muito especial paracompreender os momentos fundan-
tes de uma práxis. Quando não se escrevem mais cartas, teremos que apren-
der a fazer isso a partir dos grupos de whatsapp, facebooke outras plataformas
digitais, com um número maior de interlocutores e com outros estilos de
comunicação. O fato é que a rede continua sendo tramada com velhos e
novos fios.
E aqui entra a sistematização de experiências como uma metodo-
logia afinada com a educação popular. O exercício feito por vocês evidencia
que a sistematização de experiências não se reduz a um conjunto de técnicas
ou que ela não é compatível com suposto rigor acadêmico. No caso, são as
experiências expressas através da troca de carta entre companheiros de uma
jornada que aprendiam enquanto escreviam e com as quais continuamos

141
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

aprendendo quando as lemos. Por isso é justo que sejam adjetivadas como
pedagógicas.
Fernanda e Adriana, vocês nos ajudam a ver a força renovadora
do companheirismo em tempos difíceis, como foram esses abrangidos pelas
cartas e que infelizmente ainda não acabaram. Continuem vasculhando os
baús!
Um abraço amigo

Danilo R. Streck

142
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

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Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

SOBRE AS AUTORAS

158
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

FERNANDA PAULO

Doutora em Educação (2018), no Programa de Educação da Universidade


do Vale do Rio dos Sinos e Mestra em educação pelo Programa de Educação
da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Especialista em
Educação Popular e Movimentos Sociais. Graduação em Pedagogia e Filo-
sofia. Militante do Movimento de Educação Popular, da Associação de
Educadores populares de Porto Alegre (AEPPA) e do Fórum de Educação
de Jovens e Adultos do Rio Grande do Sul (FEJARS). Atualmente é profes-
sora-pesquisadora permanente dos Cursos de Mestrado e Doutorado do
Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade do Oeste de
Santa Catarina (UNOESC). Pesquisa Educação Popular nas suas diferentes
dimensões (histórica, filosófica, epistemológica e política) e em contextos
escolares e não escolares. Participa da Rede Nacional de Cidades que Edu-
cam. Membro do Fórum Estadual Popular de Educação do RSe compõem a
colegiada da CONAPE/RS 2022.

ADRIANA GAIO

Mestre em Educação. Possui Licenciatura em Geografia e em Pedago-


gia.Atualmente é professora do Estadode Santa Catarina. Tem experiência na
área de Geografia, com interesse em pesquisar relacionadas à Educação Ambi-
ental e processos de ensino-Aprendizagem. Desde o Mestrado tem interessenos
estudos acerca dos Direitos Humanos, Relações Étnico-Raciais e Educação
Popular, em especial no contexto da escola. Participa do Grupo de Estudos e
Pesquisa Paulo Freire e Educação Popular interinstitucional. Realizou o curso de
Mestrado em Educação no Programa de Pós-graduação em Educação da Uni-
versidade do Oeste de Santa Catarina (UNOESC) sob orientação de Fernanda
Paulo. Participou de atividades formativas realizadas pelo Movimento de Edu-
cação Popular do RS e pela Associação de Educadores Populares de Porto
Alegre (AEPPA), bem como de cursos acerca da Pedagogia freiriana durantes
os anos de 2019 a 2021.

159
Educação Popular nas Cartas do Educador
Carlos Rodrigues Brandão

Editora Livrologia
www.livrologia.com.br

Título Educação popular nas cartas do educador


Carlos Rodrigues Brandão: contribuições
para a pedagogia latino-americana

Autoria Fernanda dos Santos Paulo


Adriana Gaio

Assistente Editorial Nicole Brutti

Bibliotecária Karina Ramos


Projeto Gráfico Ivo Dickmann
Capa Ivanio Dickmann
Foto da Capa César Ferreira da Silva
Diagramação Ivo Dickmann
Preparação dos Originais Ivo Dickmann
Revisão Fernanda dos Santos Paulo
Formato 16 cm x 23 cm
Tipologia Calisto MT, entre 8 e 20 pontos

Papel Capa: Supremo 280 g/m2


Miolo: Pólen Soft 80 g/m2
Número de Páginas 162
Publicação 2021
Impressão e Acabamento META – Cotia – SP

160
Fernanda dos Santos Paulo & Adriana Gaio

Queridos leitores e queridas leitoras:

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