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Salvador | Bahia Março de 2023

PCB: 101 ANOS DA FÊNIX VERMELHA PG.2 PG.4 TRABALHO EM SAÚDE E LUTA SINDICAL

BAHIA LIDERA ÍNDICES DE COMUNIDADES TRADICIONAIS DO CERRADO


PG.6 PG.8
VIOLÊNCIA URBANA SÃO ATACADAS; A POLÍCIA É OMISSA

ENTREVISTA DO MOMENTO SE ELES NÃO NOS DEIXAM SONHAR, PRECISAMOS NÃO OS DEIXAR
PG.9 PG.13 DORMIR: REVOGAR O NOVO ENSINO MÉDIO (NEM), AVANÇAR PARA
FRAN REBELATTO A EDUCAÇÃO POPULAR

TRABALHADORES DA SAÚDE, UNI- O PARAÍSO É PARA POUCOS: MODERNIZAÇÃO


PG.14 PG.15 E SEGREGAÇÃO DO LITORAL BAIANO
VOS – PEC DA ENFERMAGEM

PELA REVOGAÇÃO DO NOVO CHACINA DA GAMBOA: 1 ANO


PG.16 PG.18
ENSINO MÉDIO SEM JUSTIÇA!

EXPOSIÇÃO GUERRA PURA E A MEMÓRIA


PG.20 PG.22
ARTE MARGINAL EM SALVADOR ELISA BRANCO BATISTA

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Edições nº 0032

EDITORIAL
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PCB: 101 anos da Fênix vermelha

Fundadores do PCB em 1922

Por Milton Pinheiro


O sentido político da atual quadra histórica é marcado burguês que apontou uma perspectiva de esperança social e
pela ideologia do anticomunismo. Agências políticas da autonomia política da classe operária.
extrema direita (partidos do balcão de negócios), canais Após a brutal repressão que se seguiu ao levante, em
organizados para divulgar fake News, mídia corporativa, igrejas virtude da perseguição do “Estado Novo”, o PCB organizou
neopentecostais do comércio da fé, ONGs e agrupamentos lutas de resistência contra o fascismo no Brasil e quando os
golpistas, etc., são instrumentos de ação cotidiana para ventos da derrota nazifascista, na segunda grande guerra
criminalizar e mentir sobre as ideias e práticas daqueles que percorreram o horizonte dos povos, o partido conseguiu
lutam em defesa da classe trabalhadora e da emancipação encontrar a luz no fim do túnel.
humana. O PCB se tornou, com a legalidade, um partido de
O Partido Comunista Brasileiro (PCB) completa 101 massas. Elegeu Luiz Carlos Prestes o senador mais bem
anos de uma presença indelével na história política do Brasil. votado do Brasil, assim como uma vigorosa bancada com
Desta longeva existência, 56 anos foram na mais violenta 14 deputados federais. Nas eleições seguintes, para as
clandestinidade e grande parte do período de legalidade Assembleias Legislativas dos estados em 1947, elegeu 46
ocorre após 1985, quando do fim da ditadura burgo-militar de deputados e mais dois deputados federais. Todavia, a ação do
1964. reacionarismo se impôs novamente e o partido foi colocado
O PCB surgiu para representar um projeto de classe na ilegalidade. O registro do partido foi cassado e depois os
e lutar pelo programa da revolução brasileira. A inspiração mandatos dos parlamentares federais e estaduais.
primeira, foi a vitória da revolução russa de 1917 que O partido voltou para à clandestinidade, todavia, agora,
representou o poder dos trabalhadores organizados em como um forte operador político da classe trabalhadora.
defesa das transformações estruturais e da humanidade. Esteve na greve dos 300 mil em São Paulo, na Campanha do
Os comunistas foram os revolucionários que deram Petróleo é Nosso, marcou a luta pela reforma agrária de forma
sentido às greves do começo do século XX, que marcharam revolucionária através dos levantes camponeses de Porecatu,
pelas ruas com manifestações em defesa dos direitos mais Trombas e Formoso. Organizou manifestações contra a
emblemáticos da classe trabalhadora, procurando se organizar presença de tropas brasileiras na guerra imperialista da Coréia,
para construir um operador político que daria sentido ao esteve onde a luta se fez necessária por todo o Brasil.
processo emancipatório. Com o Manifesto de agosto de 1950, constituiu novas
O partido, no desenrolar do século XX, esteve presente formas de luta em profunda conexão com a revolução
nas lutas mais profundas desse breve século. Participou da brasileira. Sindicatos livres, organizações populares e
organização dos instrumentos que agiram na luta de classes. proletárias sem o controle do Estado, organização das lutas
Mesmo com o “estado de sítio”, que afrontava a democracia na das mulheres e uma denúncia combativa e militante contra
década de 1920, foi criada uma combativa Imprensa Popular. o racismo. Um partido com sentido de defesa de classe e
Na década de 1930 esteve presente nas lutas proletárias e perspectiva de lutas por rupturas revolucionárias.
populares, mas também teve uma presença relevante nos O PCB teve a maior presença intelectual de todos os
quartéis das forças armadas. tempos; uma marca seminal na cultura brasileira. Afinal, na
Com essa forte presença entre os militares, realizou o história do século XX, lutaram dentro do partido as figuras
mais importante movimento de “assalto aos céus” da história mais importantes das letras, ciências, artes, música, mundo
brasileira: o levante antifascista e revolucionário de novembro artístico, teatro e do cinema.
de 1935, uma experiência de Poder Popular que durou quatro O partido foi a origem da esquerda brasileira, contudo,
dias em Natal (RN); ocorrendo também em Recife e no Rio de no tempo presente, ainda não se transformou em um grande
Janeiro. operador político desse campo ideológico. Porém, germinou
Essa experiência revolucionária foi derrotada por tropas no processo histórico brasileiro as lutas mais férteis dos
do Estado burguês, em aliança com coronéis locais e seus trabalhadores e iluminou, com passos seguros, nas trevas ou à
jagunços. Porém, mesmo com os erros desse processo, essa luz do dia, trilhas por onde as lutas que procuram o sentido da
experiência foi uma brava resistência política contra o Estado revolução brasileira.

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Ao completar 101 anos o PCB é uma Fênix da história, Filho (operário), Feliciano Eugênio Neto (operário), Lourenço
com erros e acertos. Esteve ao lado dos revolucionários que Camelo Mesquita (taxista) e José Pinheiro Jobim (diplomata).
construíram as revoluções anticapitalistas pelo mundo, a Mesmo com os equívocos do pré-1964, a luta
exemplo da União Soviética, China, Coréia, Cuba, Vietnam e das desenvolvida pelo PCB na construção dos movimentos
democraciaspopularesdolesteeuropeuedaÁfrica.Combateu populares e proletários, e na articulação da Frente
ao lado da luta anticolonial e das ações revolucionárias pelo Democrática, foram fundamentais para derrotar a ditadura e
mundo. Sempre foi um partido internacionalista que operou plantar um novo tempo de liberdades democráticas com o fim
em defesa da revolução mundial. do regime militar.
Nessa longa história de lutas, é importante reverenciar Os anos 1980 foram tempos de confusão política e
os fundadores, mas também os homens e as mulheres que ideológica, se configuram como o pior momento da história do
lutaram para que o PCB pudesse estar aqui hoje. Figuras PCB, quando o taticismo politicista tentou matar o operador
como Minervino de Oliveira, Octávio Brandão, Elisa Branco, estratégico. No entanto, a Fênix Vermelha soube operar sua
Giocondo Dias, Carlos Marighella, Lyndolpho Silva, Maria depuração e organizar a Reconstrução Revolucionária a partir
Aragão, Mário Alves, José Maria Crispim, Yeda Maria Ferreira, de 1992.
Osvaldo Pacheco, Câmara Ferreira, Antonieta Campos da O PCB voltou à centralidade das lutas proletárias e
Paz, Horácio Macedo, Ana Montenegro, Dinarco Reis, Paulo populares, colocou na ordem do dia a estratégia socialista
Cavalcanti, Iraci Picanço, Gregório Bezerra, Maria Brandão, como formulação central para orientar a ação tática. Construiu
Zuleika D’Alembert, Adalgisa Cavalcanti e o lendário Luiz instrumentos de combate à sociabilidade da ordem capitalista,
Carlos Prestes. a exemplo do Coletivo Feminista Classista Ana Montenegro
Em um momento de grande simbologia como o (CFCAM), Coletivo Negro Minervino de Oliveira (CNMO) e
presente, é preciso rememorar aqueles militantes históricos o LGBTComunista. Avançou na organização de frentes de
que tiveram seu sangue derramado quando lutaram em massas, a exemplo da União da Juventude Comunista (UJC) e
defesa da classe trabalhadora, das liberdades democráticas a Unidade Classista (UC).
e contra a opressão burguesa. Jamais serão esquecidos os Nesses 101 anos de luta o PCB soube fazer a autocrítica
43 mártires assassinados pela ditadura burgo-militar de necessária e reorganizar bandeiras e ações para operar nas
1964: Ivan Rocha Aguiar (estudante), Antogildo Pascoal Viana batalhas hodiernas das lutas de classes. O partido assumiu
(operário), Carlos Schirmer (operário), Pedro Domiense de seu compromisso histórico com as bandeiras anticapitalista
Oliveira (carteiro), Manuel Alves de Oliveira (militar), Newton antiimperialista, contra a exploração capitalista e as opressões
Eduardo de Oliveira (operário), João Alfredo (camponês), da sociedade burguesa, sempre na perspectiva da revolução
Pedro Inácio de Araújo (camponês), Israel Tavares Roque brasileira e da confirmação do projeto socialista.
(operário), Divo Fernandes D’oliveira (marítimo), Severino Hoje, os comunistas brasileiros, estão completando 101
Elias de Melo (militar), Inocêncio Pereira Alves (Alfaiate), anos de lutas que marcaram a história do Brasil e do mundo.
Lucindo Costa (funcionário público), João Roberto Borges de Afinal, muitos dos militantes comunistas lutaram na guerra
Souza (estudante), José Dalmo Guimarães Lins (jornalista), civil espanhola, na resistência francesa e nas batalhas da
Francisco da Chagas Pereira (militar), Epaminondas Gomes de segunda guerra mundial na Europa.
Oliveira (sapateiro), Ismael Silva de Jesus (estudante), Célio Durante essa longa jornada, o sangue dos militantes se
Augusto Guedes (dentista), José Mendes de Sá Roriz (militar), confundiu com o vermelho da bandeira comunista e adubou o
Davi Capistrano da Costa (militar), José Roman (operário), solo fértil das batalhas que a classe trabalhadora desenvolveu
João Massena Melo (operário), Luiz Ignácio Maranhão Filho no Brasil e no mundo.
(jornalista), Valter de Souza Ribeiro (militar), Afonso Henrique Com essa história e com a confirmação dessas bandeiras,
Martins Saldanha (professor), Elson Costa (caminhoneiro), o PCB ainda não é o maior partido da esquerda brasileira, mas
Hiran de Lima Pereira (administrador), Jayme Amorim de não ocorrerá lutas da classe trabalhadora sem a sua presença
Miranda (jornalista), Nestor Veras (camponês), Itair Veloso convicta. Afinal, o operador político da longeva história
(operário), Alberto Aleixo (operário), José Ferreira de Almeida brasileira, desde o começo do século XX, encontra sentido
(militar), José Maximino de Andrade Neto (militar), Pedro para sua práxis revolucionária na consigna Fomos, Somos e
Jerônimo de Souza (comerciário), José Montenegro de Lima Seremos Comunistas.
(estudante), Orlando Bonfim (jornalista), Vladimir Herzog Viva os 101 anos do PCB!
(jornalista), Neide Alves Santos (propagandista), Manoel Fiel

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EXPEDIENTE

Colaboradores desta edição


Jornalista responsável João Aguiar, Ellen Lis M. Melo, Hélio Messeder, Cheyenne
Milton Pinheiro MTB 72.595/SP Ayalla Brasil, Ágatha Luz, Camila Fernandes de Oliveira
Conselho de Redação Costa, Matheus Almeida, Wenderson Silva e Gabriel Galego
Camila Oliver, Milton Pinheiro, Rômulo Revisor responsável
Caires e João Abreu Rômulo Caires
Editora Colaboradores de revisão
Camila Oliver Gideão Gabriel Oliveira Feliciano e Matheus
Diagramação e Capa Almeida Lopes
João Abreu Colaboradores de redes digitais
Matheus Moreira, Rafael Requião
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TRABALHO EM SAÚDE E LUTA SINDICAL

Imagem: Sindsaúde Bahia

Sou camelô, sou do mercado informal


Com minha guia sou profissional
(Edson Gomes)

Por Rômulo Caires


Hoje em dia tornou-se lugar comum no colonial boa parte do “trabalho livre” era feito
campo progressista afirmar que a luta sindical por pessoas sem qualquer vínculo emprega-
está ultrapassada. Seja porque a classe traba- tício formal. Aqueles que vivem de “bicos” ou
de comércio no mercado informal não surgiram
lhadora brasileira e baiana se ocuparia majorita-
riamente de trabalhos informais, sem represen- apenas no século XXI, mas tal situação atraves-
tação sindical, seja porque as transformações sou a formação social brasileira ao longo de sua
ocorridas nas últimas décadas supostamente história. Se observarmos a história do Brasil no
modificou tão intensamente o mundo do traba- século XX notaremos que as múltiplas lutas sin-
dicais que foram construídas não dependeram
lho e as relações sociais, que a instituição sindi-
cal perdeu a sua razão de ser. necessariamente do vínculo de emprego formal
Uma rápida olhada nos noticiários de- e isso não impediu que a classe trabalhadora or-
veria no mínimo questionar tais formulações: ganizada efetivasse vitórias no campo sindical.
trabalhadores de aplicativos se organizando A luta sindical não delimita um espaço
em greves, trabalhadoras da enfermagem pa- homogêneo, mas constitui formas variadas que
ralisando suas atividades em prol da efetivação a classe trabalhadora encontrou para se defen-
do piso salarial, metroviários cruzando os bra- der das imposições cegas do capital. Por si só
ços por seus direitos, os exemplos poderiam se o movimento sindical não tem aspecto revolu-
estender muito mais. Neste escrito defendere- cionário e muitas vezes apenas reproduz um
mos a atualidade da luta sindical, questionan- tipo de consciência que poderíamos chamar
do o senso comum estabelecido sobre o tema. de “economicista”, ou seja, que não é capaz de
Partiremos da análise do trabalho em saúde e enxergar para além das condições econômicas
indicaremos o potencial organizativo do setor mais imediatas. E por que ainda sim a luta sindi-
como uma das vias de reoxigenar a luta sindical cal é importante para nós comunistas?
em nossos tempos. A partir da análise do trabalho em saúde
Ao adentrarmos na história da formação podemos iniciar uma resposta para tal questão.
da classe trabalhadora no Brasil um dos aspec- Como um primeiro aspecto é importante obser-
tos que salta aos olhos é que desde o período varmos que a luta sindical é uma das vias de po-
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litização da economia. Sendo a economia a pro- dicalização entre os médicos e iniciativas clas-
dução material da vida social, e sendo o modo sistas podem tensionar o corporativismo em
de produção capitalista fundamentado em uma direção a propostas de integração sindical com
economia refratária aos desígnios humanos, ou outras áreas da saúde.
seja, estruturada apenas para reproduzir o lu- O trabalho deve ser focado principal-
cro, sua continuação ocorre independente do mente entre trabalhadores do sistema privado,
sofrimento e da destruição das forças vitais da cada vez mais precarizados a partir de tercei-
classe trabalhadora. rizações e privatizações operadas por Organi-
Assim, o capital se reproduz naturalizan- zações Sociais de Saúde. A partir da crítica das
do a ordem social, transformando condições formas atuais de exploração é possível abrir
históricas em condições eternas. A politização vias para questionamentos mais amplos, que
da economia significa a possibilidade de ques- possam inclusive compreender as relações en-
tionar essas formas de naturalização e pere- tre SUS e capitalismo no Brasil ou a centralida-
nização do capital. A partir da organização da de negativa da categoria médica em relação às
classe trabalhadora em instrumentos próprios outras áreas.
de luta e independentes do capital é possível Apesar de ainda ser uma categoria muito
transformar a realidade dada, encontrar as ten- ligada ao “trabalho liberal”, a psicologia tam-
dências inscritas no tecido social que apontem bém possui potencial sindical e iniciativas do
para um modo de vida alternativo. tipo tem crescido no país. Os psicólogos tam-
Percebam que com essas definições não bém caem nos equívocos corporativistas, mas
apontamos para este ou aquele sindicato em os seus campos de atuação abrem a perspec-
particular, que sim podem estar tomados por tiva de questionar a relação entre sofrimento
pelegos e burocratas, mas indicamos uma forma psíquico e sociedade capitalista, além de possi-
imediata de defesa presente na própria socie- bilitar ações conjuntas com as outras categorias
dade capitalista, que tem potencial de criar ra- da saúde.
chaduras nos consensos e avançar para formas O maior potencial ao nosso ver está na
mais complexas de organização como um parti- categoria da enfermagem. Além de possuírem
do revolucionário. Nesse sentido, chamamos de salários inferiores à outras categorias, de viven-
luta sindical aquela que organiza trabalhadores ciarem jornadas extenuantes de trabalho, de
de um determinado setor com o intuito inicial reproduzirem os mecanismos de dominação de
de se defender da exploração capitalista, mas gênero (a inferiorização da mulher na socieda-
que pode avançar na produção de germens de de patriarcal conduz a naturalizações de posi-
uma consciência revolucionária. ções como o lugar do cuidado), a categoria da
Em texto anterior abordamos a impor- enfermagem tem sido cada vez mais atuante
tância do complexo da saúde nas formas con- na conjuntura atual. O enorme contingente de
temporâneas de acumulação de capital e a trabalhadoras da enfermagem, sua importância
necessidade de organizar este setor para uma no sistema privado de saúde, a superexplora-
autêntica ofensiva da classe trabalhadora como ção de sua força de trabalho etc., são motivos
um todo. Não retomaremos os detalhes da ar- que impulsionam as enfermeiras à luta, como
gumentação feita ali. Gostaríamos apenas de observamos nas jornadas a favor da efetivação
ressaltar que a organização sindical do trabalho do piso salarial nacional.
em saúde pode ser um momento fundamental Pela importância do complexo da saúde
dessa ofensiva. A maioria dos sindicatos em na sociedade, pelo grande contingente de tra-
saúde são sindicatos de categorias como mé- balhadores, pelos regimes de trabalho cada vez
dicos, psicólogos, enfermeiras etc. Há também mais precários, enfim pelo potencial organizati-
alguns sindicatos mais gerais como “sindicatos vo do setor saúde como um todo, devemos nos
de trabalhadores da saúde”, que integram múl- inserir cada vez mais nessas lutas, aumentar
tiplas categorias. nossa incidência nos sindicatos, agitar propos-
Os sindicatos de categorias padecem tas classistas, propagandear formulações que
do risco sempre presente de corporativismo. A possibilitem a politização das lutas econômicas
categoria médica é uma das mais afetadas por no sentido de fazer da classe trabalhadora da
esse tipo de perspectiva. Porém, ainda sim é saúde um momento importante da construção
importante ressaltar que nas últimas décadas da vanguarda revolucionária.
há uma tendência crescente de aumento da sin-

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BAHIA LIDERA ÍNDICES DE VIOLÊNCIA URBANA

Foto: Manu Dias/AGECOM

Por João Aguiar


No campo da segurança pública o Esta- na Bahia 5.124 mortes violentas no Estado,
do da Bahia ocupa grande destaque negati- durante o ano de 2022¹ considerando ho-
vo nos indicadores de violência. O jornal O micídios dolosos, feminicídios, latrocínio e
Momento - Diário do Povo, tem sistematica- lesão corporal seguida de morte. A Bahia é
mente divulgado notícias e análises sobre a o estado líder em mortes violentas no país,
crescente violência no estado. Como resul- em números absolutos, superando Estados
tado da lógica de segurança pública base- como Rio de Janeiro e São Paulo, com di-
ada na ampliação do aparato de repressão mensões populacionais muito superiores à
policial às comunidades de todo estado, do Bahia. Segundo parte do levantamento da
campo e das cidades, supostamente justifi- Rede Observatórios, em relação à violên-
cada para a assim chamada “guerra às dro- cia contra mulher, registra que a Bahia é“o
gas” - sendo de fato uma guerra aos pobres, estado com maior taxa de crescimento em
índigenas e povo negro. relação ao último boletim, com uma varia-
A partir dos dados colhidos pelo Moni- ção de 58%, com ao menos um caso por dia.
tor da Violência do G1, foram contabilizadas Além de ser o primeiro em feminicídios do
Nordeste com 91 registros”.²
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Mesmo com indicadores elevadíssimos, vereiro de 2023 Salvador e Região Metro-


predomina na cúpula do governo do Esta- politana registraram 118 tiroteios, com 79
do o negacionismo na segurança pública. mortes. Entre motivos dos tiroteios “37
O último Secretário de Segurança Públlica, ocorreram em ações e operações policiais e
Ricardo Mandarino, alegou em novembro 31 foram em meio a dispuas entre facções.
de 2022, que a Bahia dispunha de “padrão Seis pessoas foram vítimas de balas perdi-
nova-iorquino” e que tambéma teria dimi- das. Destas, uma foi morta e cinco ficaram
nuído continuamente nos últimos 13 meses feridas”⁴. Só com os dados mais recentes,
o número de homicídios - em matéria da Rá- podemos colocar que oficialmente, a polí-
dio Sociedade³, uma escancarada mentira. cia foi responsável no período analisado por
Seu sucessor e atual Secretário de Seguran- 1/3 das trocas de tiros, superando inclusive
ça Pública, Marcelo Werner, foi apresentado a guerra entre facções, elencados pela polí-
no site oficial da SSP-BA como quadro insti- tica oficial do governo como principal ques-
tucional qualificado por sua “experiência na tão a ser “combatida” pelo Estado. Em nome
repressão ao tráfico de drogas e ao crime da redução da violência, contraditoriamen-
organizado” e complementa a matéria “o te, as policias somente fizeram ampliar sua
novo gestor da pasta vai priorizar o com- participação na produção de mortes e ações
bate às organizações criminosas”, que na violentas, promovendo a ineficácia do PPV
prática representa uma esperada continui- na proteção à vida.
dade dos alicerces do governo de Jerônimo O terrorismo de Estado instituído no
Rodrigues (PT) para a segurança pública, tal desenvolvimento do PPV como programa
como seu antecessor Rui Costa (PT). norteador da segurança pública é condu-
Após o resultado do Monitor da Violên- zido à céu aberto pelo cinismo de seus co-
cia do G1, a SSP-B, desa vez através de um mandantes e quadros da cúpula de governo.
novo chefe, mas sem alterar seus procedi- A ampliação, ano após ano, das mortes vio-
mentos de negação da realidade, divulgou lentas é a confirmação da prática e a segue
através do seu site que a Bahia teve queda derrubando a cortina de mentiras. Comba-
de 4,5% no segundo semestre de 2022. A tendo com a verdade, não é possível falar
informação inclusive serve de base para o de proteção à vida desconectada à supera-
Programa de Desempenho Policial, que re- ção estrutural da organização da seguran-
munera as corporações mediante a produ- ça pública, cujos eixos imediatos são: 1. A
ção de suas ações: “gratificações faroreste”. desmilitarização das estruturas, instituições
Há um claro contraste entre os dados apre- e da atividade cotidiana da PM; 2. A depu-
sentados, bem como as alegações da SSP e ração do quadro de servidores agentes com
seus responsáveis, com a realidade subme- envolvimento em práticas violentas; 3. O
tida ao povo trabalhador da Bahia. controle civil com poder de deliberação, em
O Programa Pacto pela Vida, instituído todas as esferas, da segurança pública.
na gestão de Jacques Wagner (PT), em ju-
nho completará 12 anos de sua implemen- 1https://g1.globo.com/ba/bahia/noti-
tação. O programa, aprofundou o direcio- cia/2023/03/01/monitor-da-violencia-bahia-lidera-rankin-
namento da concentração de recursos e da g-de-mortes-violentas-no-brasil-pelo-4o-ano-consecutivo.
qualificação da atividade policial nas práti- ghtml
cas ostensivas, tipificadas como “repressão 2http://observatorioseguranca.com.br/violencia-mu-
qualificada ao tráfico de drogas” - especiali- lher-feminicidio/
dade do atual secretário. A realidade é que 3https://sociedadeonline.com/mandarino-rebate-cri-
o principal promotor da violência é o pró- ticas-a-seguranca-publica-na-bahia/
prio Estado, direcionando as ações das po- 4https://fogocruzado.org.br/dados/relatorios/gran-
lícias (principalmente a PM-BA) para opera- de-salvador-fevereiro-2023
ções com altos índices de letalidade e uma 5https://www.ssp.ba.gov.br/2023/03/13403/Bahia-
presença truculenta, legitimadas e incenti- -tem-queda-de-45-nas-mortes-violentas-no-segundo-se-
vadas pelos comandantes da coorporação, mestre.html
por parte de seus agentes - dentro e fora do
horário de serviço.
Por exemplo, somente no mês de fe-

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COMUNIDADES TRADICIONAIS DO CERRADO


SÃO ATACADAS; A POLÍCIA É OMISSA

Foto: Paulo Oliveira - CPT Bahia

Por Ellen Lis M. Melo

Não é novidade que, no interior baiano, da no passado e perdeu muita vazão. Com
as comunidades tradicionais são violenta- a nova supressão de vegetação, ela vai se-
das por assassinos de aluguel contratados car. Também tem a Cabeceira de Morrinhos,
por latifundiários. que está na mira do agronegócio. O licen-
Há por parte dos grandes empresá- ciamento liberado (pelo governo estadual)
rios o interesse nos 20% de terras latifundi- é de 2.226,9 hectares. Essas nascentes vão
árias que por lei estão destinadas enquanto desaparecer. Isso aqui é um grito de socor-
reserva legal, como é previsto pelo código ro. Já fizemos inúmeras denúncias para os
florestal. Por meio desses interesses, as co- órgãos competentes, e elas não surtiram
munidades são forçadas a se retirar não ten- efeito”. Foi relatado que também houveram
do, muitas vezes, sequer local onde morar. outras áreas na região em desmatamento:
“Os pistoleiros continuam lá, armados. Nós
A intensificação dos atos violentos que não estamos podendo ir aos fechos de pas-
ocorreram durante as eleições são marca- to. Estamos sabendo por informações de
dos por influências políticas. Mas o fator de outras pessoas que as máquinas estão tra-
maior peso é a omissão da polícia que, com balhando dia e noite, sem parar, destruindo
vários meses de operação contra as comu- tudo. Não vai sobrar nada do nosso territó-
nidades, ainda não realizou a prisão de ne- rio.”
nhum responsável pelos atos criminosos.
Graças a impunidade, o terror assola o oeste Para mais informações sobre o caso,
da Bahia. acesse: https://cptba.org.br/
Um morador da região denuncia em
suas redes sociais: “Está acontecendo uma
tragédia. Estão desmatando a Cabeceira
da Onça, local de maior suporte de água
do nosso território. Essa área foi desmata-
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ENTREVISTA DO MOMENTO
FRAN REBELATTO

Foto: Reprodução - Instagram


Por Milton Pinheiro
Fran Rebelatto – Cineasta, fotógrafa e professora de Cinema e Audiovisual da Universidade
Federal da Integração Latino-Americana (UNILA). Atua também como docente na pós-gra-
duação em Estudos Latino-Americanos na Unila. Jornalista e Mestre em Ciências Sociais pela
UFSM e doutora em Cinema e Audiovisual pela UFF. É diretora do ANDES-SN (gestão 2021-
2013), integra a Coordenação Nacional da Corrente Sindical Unidade Classista e o Comitê
Central do PCB. Candidata à Secretária-geral pela Chapa 1 Andes pela base: Ousadia para
Sonhar, Coragem para Lutar nas eleições do ANDES-SN.
O Momento - Você é uma pesquisadora de do com que novas contradições da realida-
cinema e fotografia, como examina o cine- de brasileira fossem reveladas pelo cinema
ma brasileiro no momento? nacional como é o caso dos filmes da pro-
Fran Rebelatto - O cinema brasileiro, as- dutora Filmes de Plástico de Cataguazes em
sim como todos os campos das artes, se viu Minas Gerais, o cinema de Kleber Mendonça
diante um cenário de muita apreensão nos revelando o avanço da especulação imobili-
últimos anos com o desmonte deliberado ária em Recife, o cinema de Adirley Queiroz
das políticas de incentivo à produção artísti- na periferia de Brasília, inclusive, com o re-
ca. Isso se deu depois de um processo rele- cente filme ‘Mato em Chamas’, ou o primeiro
vante de democratização da produção e de longa-metragem produzido no Acre, ‘Noites
sua descentralização para além dos grandes alienígenas’ que trata das facções nas peri-
centros urbanos tradicionalmente produ- ferias do Norte. Mais recentemente temos
tores de imagens do país. Com a reestrutu- acompanhado também a reivindicação e a
ração da Ancine e de políticas públicas de expressão do cinema negro brasileiro que
incentivo à produção nacional a partir dos tem ocupado as telas e também lutado por
anos 2000 foi possível ver novas histórias uma maior presença na frente e atrás das
emergindo desde o Brasil profundo. Com câmeras. Tem muita produção sendo feita
isso, a produção deslocou-se para o Nor- no Brasil, em especial, a partir da chegada
deste, para o interior de Minas Gerais, para das plataformas de streaming e da produ-
Brasília (para citar alguns exemplos) fazen- ção de séries, no entanto, se por um lado
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isso movimenta o mercado criando novos compor o cenário das expressões ‘artísticas’
postos de trabalho, também traz todas as vendidas aos turistas de passagem. O filme
contradições da precarização que segue à coloca lado a lado estas duas realidades:
risca o modo de produção capitalista, o queda mulher trabalhadora informal que car-
fez com que recentemente se organizasse rega mercadoria, com a mulher artista que
a campanha de luta pela #jornadajusta, se carrega sua arte e história do outro lado da
normalizou na produção cinematográfica fronteira. E mesmo massacradas pelo peso
e do audiovisual jornada que ultrapassam, de suas histórias de violência e de explora-
muitas vezes, mais de 12h diárias. É neces-ção, essas mulheres sonham, encontram-
sário estar atentos (as) e organizados (as), e
-se nas histórias de suas avós, mães, filhas
reconhecer que a produção cinematográfi- e seguem na luta e na labuta. O filme está
ca e audiovisual brasileira têm nos ajudadodisponível na Plataforma Itaú Play Cultural
a entender melhor o Brasil! E esse deve serpodendo ser acessado de forma gratuita e
o seu papel. também está à disposição para ser exibido
O Momento - Foi lançado recentemente junto ao bom debate por todo Brasil.
um filme de sua autoria, discutindo a vida O Momento - Para além de cineasta, você
das mulheres na tríplice fronteira. Quais é professora da Unila e militante do mo-
foram as abordagens que apresenta nes- vimento docente. Quais são as questões
se filme? centrais para se pensar a universidade no
Fran Rebelatto - O filme Pasajeras (2021) processo societário atual?
trata da vida das mulheres trabalhadoras Fran Rebelatto - Primeiro, é importante di-
que cotidianamente cruzam a fronteira en- zer que minha história de acesso à univer-
tre o Paraguai e o Brasil, nas cidades de Ciu- sidade pública é uma daquelas que corres-
dad del Leste e Foz do Iguaçu. São mulheres ponde à primeira pessoa da família a entrar
conhecidas como ‘paseras’, ou seja, que tra- num curso superior ou até mesmo a uma das
balham centralmente com o ‘leva e traz’ de poucas jovens de toda uma geração de uma
mercadorias de um país a outro. Há muitos pequena cidade do “interior” que teve pos-
anos pesquiso a relação entre os territórios sibilidade a esse acesso. Filha de trabalha-
de fronteiras e as imagens produzidas sobre dores pobres do campo no Rio Grande do
esses territórios pela imprensa, na fotogra- Sul, a universidade era muito distante, com
fia e no cinema. E nessas andanças por di- isso, algo que estava associado a um proces-
ferentes territórios entre Argentina, Brasil, so de emancipação. De fato, um ‘mundo’ se
Paraguai, Uruguai, Colômbia, dentre outros, abriu quando passei na UFSM no curso de
sempre me chamou atenção o papel das Jornalismo. No entanto, logo foi possível
mulheres trabalhadoras que estão localiza- entender os limites dessa universidade pú-
das nos trabalhos mais precarizados. Quan- blica que carrega em si muitas contradições
do cheguei a Foz do Iguaçu para dar aula na da própria sociabilidade capitalista. Ou seja,
Universidade Federal da Integração Latino- uma universidade, na maioria dos casos, com
-Americana (Unila) de imediato percebi que precárias condições de acesso e permanên-
também nesta fronteira são as mulheres a cia para os (as) estudantes, com infraestru-
carregar nas costas, nas caixas, nas bolsas turas que não dão conta das demandas de
a maior parte da mercadoria dos ‘desca- ensino, pesquisa e extensão, com professo-
minhos’. No entanto, em Foz do Iguaçu te- res (as) reféns do produtivismo ou da produ-
mos algumas outras contradições que se ção de conhecimento voltada aos interesses
colocam, considerando que se trata de um do mercado. Uma universidade ainda muito
dos principais destinos turístico do mundo. branca e elitizada, mesmo que esse quadro
Por ali, as mulheres, com destaque para as já tenha se alterado um pouco nos últimos
de nacionalidade paraguaia, não só cruzam anos, mas ainda de forma insuficiente, em
para transportar mercadorias, mas também especial no corpo docente. Instituições que
tem aquelas que cruzam com sua arte (dan- reproduzem processos de assédio e rela-
ças e músicas tradicionais paraguaias) para ções de trabalho que se alimentam com ló-

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gica da competitividade. Temos muito que sejam, as lutas por moradia, por emprego,
avançar para construir uma universidade por terra, contra a precarização do mundo
popular que vá além do seu caráter público do trabalho. Por isso, precisamos de um sin-
e gratuito, mas que possa ser uma univer- dicato capaz de intervir lado a lado com os
sidade discutida e construída à luz de um movimentos de juventude, movimentos so-
outro projeto societário, a partir de um pro- ciais e populares na realidade e transformar
jeto de emancipação e que, histórias como a nossas universidades, institutos e Cefets em
minha, não sejam exceções à regra, mas que espaços de organização das nossas lutas e
as (os) filhas e filhos da classe trabalhado- de formação humanizadora e crítica.
ra possam ocupar as nossas universidades e
O Momento - O ANDES-SN está come-
que possamos produzir conhecimento cole- çando um processo de disputa eleitoral e
tivo que atenda aos interesses do povo tra-
você está como secretária geral da chapa
balhador e que supere todas as formas de 1. Quais são os eixos gerais que confor-
opressão e exploração. mam a proposta dessa alternativa que
O Momento - Enquanto militante docente quer dirigir o sindicato nacional?
e dirigente do ANDES-SN, como desenvol- Fran Rebelatto - A Chapa 1 reivindica a his-
ver uma participação ativa em defesa dos tória de luta do ANDES-SN nos seus erros e
direitos da categoria? acertos e compreende que nosso sindicato
Fran Rebelatto - Um dos grandes desafios é um instrumento fundamental de luta no
que temos nesta quadra histórica que nos Brasil que tem se consolidado como um sin-
coube atuar como militantes da categoria dicato com independência de classe. Um sin-
docente é a necessidade de ampliar a mo- dicato autônomo, classista e construído por
bilização dos (as) professores (as) para que suas bases que hoje está enraizado em mais
se sintam parte de um processo coletivo de de 120 seções sindicais nas universidades
luta em defesa da universidade pública e federais, estudais e municipais, Institutos
referenciada nos interesses de classe, pela e Cefets em todo território nacional. Arti-
valorização da nossa carreira, por melhores culamos no programa da Chapa 1 as reivin-
condições de trabalho e de vida, com isso, dicações pelas condições de trabalho e de
ser contra as tentativas de transformação vida da nossa categoria docente que está
do espaço da educação presencial humani- na ativa, mas também as condições de vida
zadora e crítica em uma educação voltada dos (as) professores (as) aposentados (as); a
aos interesses exclusivos do mercado, de- defesa da universidade pública, gratuita, lai-
sumanizada, mediada somente por tecno- ca e referenciada nos anseios fundamentais
logias e pela lógica empresarial. Tudo isso do nosso povo trabalhador, para isso, defen-
associado à luta pela ampliação do acesso demos uma ciência e tecnologia popular e
à universidade, em especial, para os estu- com financiamento público, aliás, a questão
dantes negros (as), indígenas, da periferia, da recomposição do financiamento público
filhas e filhos de nossa classe. E isso depen- é algo central. Também, reforçamos a luta
de de instrumentos que tenham a capacida- pelas liberdades democráticas, contra o fas-
de de provocar a consciência crítica dos (as) cismo e pelo reconhecimento da necessida-
professores (as) como é o caso do sindica- de de contribuir para o processo de reorga-
to. Temos o desafio de transformar nossos nização da classe trabalhadora. Para nós, a
sindicatos de base, junto ao ANDES-SN, num classe trabalhadora não é uma abstração,
espaço de luta, debate, acolhimento e lugar tem raça, gênero, sexualidade, território e
de mobilização da nossa categoria. Entendo, cultura e isso nos exige uma atenção espe-
no entanto, que esse movimento não pode cial às lutas contra as opressões que enten-
estar descolado das lutas dos trabalhadores demos como estruturais ao modo de produ-
(as) técnicos, dos estudantes, dos (as) traba- ção capitalista brasileiro, por isso, nossa luta
lhadores (as) terceirizados (as), mais do que anticapitalista é antirracista, antimachista,
isso, tem que estar associado às pautas mais antilgbtfóbica e anticapacitista, pois en-
amplas do entorno da universidade, quais quanto houver exploração e opressão não

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é possível qualquer processo de educação ram pela constituinte. Fui pouco atuante no
emancipadora. Outra questão fundamen- movimento estudantil mais organizado, na
tal da nossa chapa é a compreensão de que universidade acabei me envolvendo muito
não podemos cair no encanto do adesismo mais com projetos de extensão em diferen-
às políticas do novo governo – que apresen- tes realidades de Santa Maria, foi então no
ta muitas contradições -, mesmo tendo re- cinema e na comunicação no RS que me re-
presentado uma vitória importante na luta encontrei com a militância política. Logo ao
contra o fascismo, ao mesmo tempo em entrar na universidade como docente, foi o
que, não podemos deixar de estar alertas à sindicato que me levou ao PCB, ao principal
ameaça permanente do avanço do fascismo operador político das lutas de nossa clas-
e das forças conservadores e de extrema- se nestes últimos 101 anos. Me orgulho e
-direita no país o que demanda esforços de sinto-me muito comprometida com a cons-
construção de unidade em nossas lutas, por trução do nosso partido, mais do que isso,
isso, também não podemos titubear diante movida pelos princípios que balizam nossa
de qualquer projeto político sectário que práxis.
nos impeça de seguir avançando em nosso O Momento - Em um momento de conden-
processo de reorganização. sação da crise capitalista no Brasil, qual
O Momento - Você também é militante e seria a principal bandeira que pode ser
dirigente do PCB, qual é o papel da práxis levantada para colocar a classe em movi-
comunista na sua trajetória? mento no atual cenário político brasilei-
Fran Rebelatto - Se bem o ideário comunis- ro?
ta se consolida em minha vida em período Fran Rebelatto - Precisamos intensificar
recente, fundamentalmente, depois de já nossa presença e intervenção no chão dos
estar organizada no movimento sindical do- nossos locais de trabalho, de estudo, na re-
cente e no PCB, os princípios que movem lação próxima com os movimentos popula-
nossa práxis comunista ancorada na cama- res de luta por moradia, por terra e por pão.
radagem, na necessidade de mudança radi- Estamos numa encruzilhada histórica que
cal deste estado de coisas, no sentimento nos exige esforços militantes e uma leitura
profundo de humanidade e solidariedade de conjuntura que nos levem a movimentos
de classe e internacionalista sempre estive- táticos no sentido da disputa da classe tra-
ram presentes na minha vida. Volto a men- balhadora massacrada pela desesperança
cionar um pouco da minha história: sou filha diante de um brutal cenário de exploração
de uma mulher campesina que sempre este- e opressão e distante dos espaços de orga-
ve envolvida na luta sindical, na organização nização coletiva, como os sindicatos. É mo-
do sindicato rural e das lutas feministas das mento de disputar essa classe trabalhadora,
mulheres no campo, sendo hoje, inclusive, de estar nas ruas, de apresentar com nitidez
presidenta do Sindicato Rural de Charrua. e entusiasmo as nossas bandeiras históricas,
Meu pai também sempre esteve presente com mediação tática, a partir das condições
na luta sindical, na luta pela agricultura fa- concretas da vida. É momento de reorgani-
miliar contra o avanço do agronegócio e no zação das nossas lutas, de assentar nossos
movimento contra as barragens. Me criei esforços na construção de um novo ciclo de
em uma comunidade rural onde os princí- luta, um ciclo que nos afaste do gosto amar-
pios de solidariedade comunitária sempre go da derrota histórica que sofremos e que
estiveram presentes, estudei até a 5º série nos permita avançar na construção de outro
em uma escola rural onde éramos responsá- modo de vida, que, na nossa compreensão,
veis pela autogestão do espaço coletivo da só será possível quando superarmos o ca-
escola. Nasci em 1984 e, como sempre me pitalismo. Até lá temos muito chão e boas
lembra minha mãe, com um ano de idade lutas para pavimentar. É momento de nos
ela me colocava dentro de uma ‘bacia’ e me reorganizar e de disputarmos com mais ên-
levava para os ‘movimentos’, me criei nos fase ainda os corações e mentes.
‘movimentos’ que, na década de 80, luta-

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SE ELES NÃO NOS DEIXAM SONHAR, PRECISAMOS NÃO


OS DEIXAR DORMIR: REVOGAR O NOVO ENSINO MÉDIO
(NEM), AVANÇAR PARA A EDUCAÇÃO POPULAR

Foto: Kenny Eliason


Por Hélio Messeder
Os alunos voltaram às aulas em 2023 e viram nos vesse enfrentando problemas pontuais.
seus horários um conjunto de componentes inusitado, Entre as tantas perversidades dessa nova refor-
para dizer o mínimo, que iriam cursar no ensino médio ma do ensino médio, já bem denunciadas, gostaria de
deste ano na Bahia. Disciplinas como: “Tira o pé do chão”, aproveitar estas poucas linhas para apontar uma que
“Do sol ao sabor”, “Faces de um mistério”, entre outras. me parece grave: trata-se de uma política educacional
Essas disciplinas eletivas ocuparão uma carga horária que impede a juventude de construir novos horizontes
considerável no currículo enquanto outras, como quími- de mundo. Sem as ferramentas das ciências da natureza,
ca, física, sociologia e filosofia, tiveram a sua carga horá- das artes e das ciências sociais, a burguesia poda na base
ria bastante reduzida. A ideia prevista no documento do a possibilidade dos jovens entenderem o mundo em que
Governo da Bahia, em alinhamento com o Novo Ensino vivem para além do imediato. O NEM, na sua estrutura,
Médio (NEM) em todo o país, é relativamente simples: mina a possibilidade dos jovens conhecerem os funda-
esses novos componentes de nomes diferentes terão mentos da realidade, forçando-os a aceitar que o mundo
ementas diversas, as quais permitirão ao estudante en- “é assim mesmo” e o que resta é “resignação”, “adapta-
tender melhor a realidade de forma interdisciplinar em ção”. O NEM contribui para que continuemos pensando
detrimento dos conhecimentos livrescos e ultrapassa- que outro mundo, melhor do que esse, é impossível.
dos das disciplinas básicas.
Mas, você pode se perguntar: a outra escola, an-
Na prática, como você já deve imaginar, principal- tes da reforma, permitia que sonhássemos com o novo
mente se for professor da escola básica, pois está viven- mundo? Eu direi que, sem sombra de dúvida, não. Contu-
do isso na pele, a escola pública baiana está um verda- do, o NEM aprofunda a desigualdade escolar e mexe no
deiro caos. Professores aumentaram exaustivamente a tempo-espaço necessário para que professores possam
sua carga de trabalho e agora precisam se virar para mi- atuar na construção de uma consciência crítica com seus
nistrar disciplinas em que não foram formados. Os estu- estudantes. Essa reforma é perversa porque atropela,
dantes não sabem do que se trata a reforma e vagam por mata a iniciativa da escola e oferece, no fim das contas,
entre as salas de aula querendo saber qual a razão em ir menos possibilidades para o estudante conhecer o mun-
à escola debater sobre iniciação científica ou sobre fazer do e ser autônomo. Faz inversamente aquilo que prome-
brigadeiro, visto que nem ciência eles tiveram a oportu- te fazer, piorando as condições do professorado.
nidade de aprender.
O NEM nos impede de sonhar com outro mundo,
A escola baiana segue sucateada, e os professo- outra escola. Mas, como nos ensina Galeano: se eles não
res com salários defasados, e o currículo pulverizado e nos deixam sonhar, nós não os deixaremos dormir. Que-
a atual Secretária da Educação, Adélia Pinheiro, dizendo remos a revogação do NEM, mas não para voltar ao que
em público que qualquer pessoa pode entrar na escola era antes. Queremos a revogação para construir uma
como “professor voluntário” para compartilhar a sua ex- verdadeira educação que interessa ao povo. Mas isso
periência. O Governo da Bahia segue fazendo chacota não acontecerá apenas com abaixo-assinados, com car-
com o professorado e os filhos da classe trabalhadora. tas contra o NEM ou com apoio legislativo. Precisamos
Não oferece condições de trabalho, não reconhece que tomar as ruas com a nossa juventude, de modo organi-
a docência precisa de especialização, apresenta uma re- zado. Nunca foi tão urgente que alunos e professores
forma vulgar e, sempre que pode, culpa os professores caminhem juntos.
e a direção dos problemas deste Novo Ensino Médio, os
Pela revogação do NEM agora! Pela construção de
sujeitos resistentes à mudança. A escola pública baiana
uma educação popular hoje!
sangra enquanto o governo petista segue como se esti-

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TRABALHADORES DA SAÚDE, UNI-VOS – PEC


DA ENFERMAGEM

Foto: Rafaela Araújo | Ag. A TARDE


Por Cheyenne Ayalla Brasil
No mês de setembro de 2022, Luís Roberto Barroso (mi- raça e gênero da categoria, entendendo que estão imersos
nistro do supremo tribunal federal, suspendeu a PL 2564/20, nas piores situações da luta de classes e por esse mesmo mo-
que consiste em estabelecer o piso salarial dos/das enfermei- tivo não tem nada a perder, pois sua vida depende de sua luta.
ros(as) em R$ 4.750,00, 70% aos técnicos(as) – R$ 3.325,00 – e Vale lembrar, Lênin em seus escritos reforça que o proletaria-
aos auxiliares de enfermagem 50% - R$ 2.375,00. O ministro do compreende sua questão econômica frente ao patrão, pois
do STF alegava inconstitucionalidade, Além disso, rombo no está intrínseco a seu cotidiano, por isso é necessário promover
orçamentos dos estados e municípios brasileiros em caso de espaços de análises conjunturais, elevar o discurso político,
aprovação do projeto de lei. Nesse mesmo pacote de leis há ampliar os arredores dentro dos trabalhadores da saúde em
também a PL 2295/00 que estabelece as 30h semanais de tra- geral para que a questão econômica se ligue e se complete a
balho para a categoria sem diminuição salarial. Vale lembrar, questão política, que se ampliaram durante o período pan-
que durante a campanha de 2022, Sofia Manzano, doutora em dêmico, aumentando e aprofundando a precarização do tra-
economia, colocou como uma de suas bandeiras principais as balho. Entretanto, para existir uma mobilização consciente e
30h semanais para toda a classe trabalhadora. definitiva é indubitável entrelaça-la com a questão política. Por
Nesse mês período do ano passado já começaram as exemplo, o caso da PEC das enfermeiras é um temática latente
mobilizações dessa categoria, ainda que de maneira insipiente porque engloba todos esses fatores que ao serem analisados
e com pouca adesão dos representantes legais a classe da en- ou vistos separadamente, o movimento enfraquece e morre
fermagem, classe trabalhadora, buscavam formas de se orga- em si mesmo.
nizar para derrubar esse veto. Passados praticamente 5 meses Estabelecer um diálogo de emancipação, participação e
após esse período de mobilização as categorias retornam as organização da classe trabalhadora frente ao cenário de preca-
ruas no dia 14/02/2023 de maneira muito mais concisa, organi- rização e sujeição que o capital executa à classe trabalhadora é
zada, com uma adesão massiva das entidades, representantes não só superar essa contradição como também tomar a fren-
e seus respectivos sindicatos através de uma paralisação na- te de vários tantos setores que pelejam com essa opressão.
cional. Ao Comparar ambas paralisações é possível entender O movimento sindical mesmo enfraquecido e cooptado pelo
o amadurecimento e desenvolvimento político de uma classe peleguismo surgirá novamente dos anseios do povo, porquê
diante dos seus problemas econômicos. Dessa forma, como sem ele não há movimento e sem movimentação nossa re-
marxistas-leninistas, é importante remontarmos aos escritos volução se tardará e a população brasileira continuará sujeita
e observações de Lênin sobre as reivindicações trabalhistas e as contradições do capital. Para além do próprio sindicalismo,
salariais, que serão amadurecidas pelo próprio cotidiano da é papel de Partido de Vanguarda organizar esse movimento
classe. No entanto, é necessário também analisar e entender frente aos golpes do neoliberalismo e contrarreformas no
as circunstancias políticas necessárias para a emancipação do mundo do trabalho, além disso, cabe ao Partido de vanguarda
proletariado. a responsabilidade de acompanhar as estratégias do setor e
Precisamos analisar quais escanteios políticos arrasta- organiza-lo nas lutas contra a dinâmica do capital. Consequen-
ram durante esses 5 meses, bem como o fortalecimento das temente, o movimento da enfermagem poderá ser uma faísca
entidades legais representativas da categoria (sindicatos). A de paralisação nacional diante das cadeias de precarização do
força dessa organização advém da parcela mais precarizada e mundo do trabalho.
proletarizada da categoria: os técnicos de enfermagem. Que Fontes:
para complementar sua renda se submetem de 2 a 3 empre- CANAL DE NOTÍCIAS DA C MARA DOS DEPUTADOS FEDERAIS
gos emendando seus plantões. Além disso, é imprescindível https://www.camara.leg.br/noticias/942225-piso-da-enfermagem-lidera-
-participacao-popular-nos-canais-da-camara-dos-deputados-em-2022/
ressaltar que essa população, sobretudo, moram nas perife- CANAL DE NOTÍCIAS DA C MARA DOS DEPUTADOS FEDERAIS ht-
rias do país, então sua jornada de trabalho e seu deslocamento tps://www.camara.leg.br/noticias/897828-CAMARA-APROVA-PEC-DO-PI-
para o local de trabalho, que em média, nas capitais brasileiras, SO-SALARIAL-DA-ENFERMAGEM-EM-2%C2%BA-TURNO
tem uma duração de 2 horas de deslocamento. CANAL DE NOTÍCIAS DA C MARA DOS DEPUTADOS FEDERAIS
Por isso, para entender a mobilização, mesmo que ini- https://www.camara.leg.br/noticias/763061-ENTIDADES-REIVINDICAM-
cialmente pouco politizada, é necessário entender a classe, -30-HORAS-SEMANAIS-DE-TRABALHO-PARA-PROFISSIONAIS-DA-ENFER-
MAGEM

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O PARAÍSO É PARA POUCOS: MODERNIZAÇÃO E


SEGREGAÇÃO DO LITORAL BAIANO

Imagem: Otávio Nogueira


Por Ágatha Luz
Figuras como José Roberto Marinho e Armínio ção rural no território durante os séculos anteriores —
Fraga planejam ocupar nada menos que um quinto da veem-se agora encurralados nos arredores da vila gra-
ilha de Boipeba com seu ambicioso projeto turístico-i- ças ao aumento do custo de vida, e passam a vender sua
mobiliário Fazenda Ponta dos Castelhanos, um com- mão de obra aos grupos empresariais que dominam a
plexo de empreendimentos de luxo com o potencial principal atividade econômica local atual, a turística.
de prejudicar imensa e irreparavelmente ecossistemas Gerações e gerações de trabalhadores se encontram
únicos à região. Acontece que, para esses bilionários, a numa posição contínua de desigualdade e servidão.
enorme destruição ambiental e profunda nocividade Além de afastar em abundância antigos mora-
às comunidades tradicionais que ali habitam há séculos dores das comunidades de pescadores tradicionais do
são um preço minúsculo a pagar em troca da manuten- município, as quais se viram praticamente desassistidas
ção do seu estilo de vida cerimonial e exclusivo. Apenas durante o todo esse crescimento econômico frenético,
um inconveniente sem maior relevância. a especulação imobiliária também traz consigo uma se-
O litoral da Bahia não desconhece grandes e da- quela imaterial violenta e degradante: o apagamento
nosas intervenções do mercado imobiliário e turístico, a da identidade local em favor da homogeneização da
exemplo das transformações históricas e socioambien- oferta de produtos e serviços de alto padrão. Enquanto
tais que moradores do município de Mata de São João o comércio da arte local se concentra no chamado Cen-
vivenciam paulatinamente desde 1970. Houve uma lar- tro de Artesanato, por exemplo, marcas internacionais
ga expansão da atividade imobiliária no litoral baiano ocupam a Alameda do Sol, principal via de circulação da
ao norte Salvador a partir das décadas de 1950 e 1960, Praia do Forte.
que alcançou a região de Mata na década seguinte após Ao longo da orla marítima baiana, pedaços intei-
a aquisição de grandes propriedades locais pelo empre- ros de Mata Atlântica, paraíso natural de valor inestimá-
sário paulista Klaus Peter e a chegada da BR-099. vel, são derrubados para se erguer ali condomínios de
Com a construção da BR-099 (ou “Estrada do luxo, clubes de golfe e afins. Tradições centenárias são
Coco”) na década de 1980, uma área antes apenas aces- forçadamente apagadas do rico imaginário cultural e
sada por balsa agora sai da condição de isolamento e cotidiano das comunidades locais em favor do estilo de
é, aos poucos, tomada por uma atividade turística cada vida requintado e excludente da classe dominante. Os
vez mais bem-sucedida. Tal prosperidade eventualmen- acontecimentos que ilustram história e fisionomia do
te atrai megaempreendimentos hoteleiros e visitantes litoral baiano desde a Linha Verde a Trancoso, Morro de
internacionais em peso e, logo, a infraestrutura do lo- São Paulo e possivelmente em breve Boipeba, nos fa-
cal se aperfeiçoa numa rapidez inacreditável. A simples zem indagar: a Bahia é, realmente, dos baianos? Quem
e isolada vila de pescadores, que há pouco abrigava se beneficia do progresso econômico estabelecido pela
ruas de barro, transforma quase que completamente atividade hoteleira? Quem desfruta as comodidades e
sua fisionomia para os olhos de investidores e turistas os serviços luxuosos que se ofertam ali? Questões es-
abastados. Em contrapartida, os grandes hotéis e esta- senciais como essas precisam ser postas em pauta com
belecimentos comerciais de elite passam a sediar com urgência, agora que mais um paraíso baiano arrisca se
proeza um cenário de segregação explícita. reduzir a um reduto de multimilionários.
Assim, propicia-se uma dinâmica curiosa, em que
muitos descendentes dos trabalhadores que serviram
aos grandes latifundiários — que dominavam a produ-

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PELA REVOGAÇÃO DO NOVO ENSINO MÉDIO

Foto: Brenda - UJC


Por Camila Fernandes de Oliveira Costa

Criada em 2013, durante o Governo Dilma, como facilitador das condições de exploração.
resgatada em 2016, sob aprovação do Governo A defesa dessa iniciativa neoliberal e anti-
Golpista de Michel Temer e em vigor desde o pedagógica foi apresentada em seu início como
ano passado (2021), a Contrarreforma do En- uma possível solução sobretudo para a "Crise
sino Médio caracteriza-se como um processo do Ensino Médio”. Coloca-se também como me-
pensado, investido e desenvolvido pelos seto- lhor alternativa diante das altas taxas de eva-
res privados a fim de instaurar ainda mais firme- são escolar. Isso parte de uma visão simplista
mente o conservadorismo na educação brasilei- e até mesmo desonesta acerca dos problemas
ra. No ano de 2022, passa a ser implementado enfrentados pelos estudantes brasileiros e dos
amplamente nas escolas, nomeado Novo Ensi- motivos que impedem a permanência dos mes-
no Médio. mos nos espaços educação da educação básica
Sendo uma tragédia para a educação do e técnica.
país, o Novo Ensino Médio existe graças ao in- Baseando-se em uma construção elitista
vestimento de capital de empresas privadas, a de pensamento, que desconsidera elementos
exemplo do Grupo Volkswagen, Fundação Ro- de raça, classe, gênero e ainda os recortes geo-
berto Marinho, Itaú, dentre muitas outras ins- espaciais que determinam completamente a
tituições privadas detentoras de muita riqueza possibilidade do alunado conseguir concluir sua
e que vislumbram benefícios próprios causados formação estudantil ou precisar deixar a esco-
pela Contrarreforma. la, a justificativa do Novo Ensino Médio define
Ou seja, na prática o objetivo atingido como causa da evasão escolar o desinteresse
pelo Novo Ensino Médio, bem como todas es- dos estudantes pelas disciplinas tradicionais,
sas empresas almejam, é eliminar e desarticular considerando-as ultrapassadas.
completamente a possibilidade de construção A partir disso, aponta como solução a maior
de um horizonte crítico na classe estudantil e autonomia dos alunos no processo de escolha
trabalhadora, a fim de formar uma geração de das disciplinas. Portanto, estes podem, em teo-
trabalhadores muito mais afastados das lutas ria, delinearem a grade curricular que seguirão,
sociais e da organização classista, fator que age de acordo com a "aptidão" que possuem por de-

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terminadas áreas. Essa proposta desconsidera política desrespeitosa para os professores e


completamente a infraestrutura das escolas, irresponsáveis para os estudantes, põe a con-
que na grande maioria das vezes não contam dição do “notório saber” em vigor: quaisquer
com laboratórios, bibliotecas, quadras polies- profissionais da educação se tornam aptos a
portivas e demais ambientes apropriados para lecionar os itinerários, ainda que não possuam
realização das atividades oferecidas, bem como formação específica que garanta a qualidade e
ludibria uma classe de estudantes que recebe o domínio sobre essas matérias.
uma grade curricular extremamente limitada Por fim, vale mencionar que os Itinerá-
e incompleta sob uma falsa premissa de maior rios Formativos possuem um perfil extrema-
profissionalização e independência durante sua mente tecnicista e conservador. Escolhidos ao
formação básica. início do ensino médio e sem possibilidade de
As problemáticas percebidas já nessa in- mudança dos secundaristas no decorrer dele,
terpretação inicial são inúmeras. É importante apresentam-se enquanto disciplinas que visam
pontuar o que o Novo Ensino Médio causa na a formação moral da juventude, moldando seus
Base Nacional Comum Curricular: possibilita a comportamentos, além de um perfil puramente
supressão de disciplinas, a exemplo do ensino profissionalizante, que desconsidera as dimen-
da filosofia e sociologia, bem como diminui a sões críticas e o exercício de reflexão.
densidade da presença de outras disciplinas, Agem, portanto, a fim de construir uma
como história e geografia, da grade curricular. geração que atenda aos interesses da burgue-
A ausência ou a presença superficial de sia, em um exercício de alienação que resulta
componentes responsáveis por trabalhar a con- na formação de uma atual e futura classe tra-
cepção crítica de análise da realidade brasilei- balhadora que naturaliza a ausência de direitos,
ra, assim como iniciar o processo de produção bem como as situações abusivas de exploração
científica nas áreas das ciências filosóficas, hu- de sua força de trabalho.
manas e sociais, não é nada senão um projeto O Novo ensino médio é um ultrage a qual-
de desmonte da educação; é a perversidade ca- quer vislumbre minimamente progressista para
pitalista atuando vorazmente pela destruição a educação brasileira. É necessário pautar e de-
dos veículos de organização do proletariado fender a educação popular, de produção de ci-
brasileiro e se posicionando contra qualquer ência, avanço nas lutas sociais e de um ambien-
mínima ferramenta de elevação intelectual de te que forme sujeitos pensantes e conscientes
seu povo. da posição social que ocupam no país. A ideia
Cabe ainda situar o caráter das novas disci- de enxergar cidadãos como mero produto de
plinas implementadas na grade curricular. Cha- mão de obra barata, como a utilização do siste-
mados de “Itinerários Formativos”, definem-se ma educacional como ferramenta para cumpri-
como conjuntos de disciplinas, projetos e ofici- mento dos interesses dos grandes capitalistas
nas elaboradas a partir da difusão e modificação precisa ser rechaçada e destruída em todas as
das disciplinas tradicionais. Esses itinerários são suas tentativas.
ofertados de acordo com o porte e as possibili- O horizonte dos movimentos dos estudan-
dades materiais de cada instituição. Em alguns tes e trabalhadores é a construção de uma edu-
casos, uma única disciplina é ofertada. cação como parte do projeto de emancipação
Isso significa dizer que enquanto institui- humana. Pelo fim do Novo Ensino Médio! Pelo
ções particulares passam a ter ainda mais op- fim dos processos seletivos nas universidades!
ções de qualificação, despondo de toda a estru- Por uma educação democrática e verdadeira-
tura e investimento possíveis e imagináveis, os mente popular!
espaços públicos precarizados passam a possuir
um ensino ainda mais limitado, aumentando a Referências:
disparidade de ensino no país, que já é abissal. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Brasília: Minis-
Esse processo é a materialização da elitiza- tério da Educação, 2022. Disponível em: http://
ção ainda mais acentuada dos espaços acadêmi- basenacionalcomum.mec.gov.br. Acesso em: 24
cos, distanciando ainda mais a universidade da mar 2023.
população e a inserindo mais cedo e em condi- BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR.
ções ainda mais desumanas na lógica de merca- Brasília: Ministério da Educação, 2022. Disponí-
do de trabalho. vel em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br.
É ainda precursor de uma máxima na des- Acesso em: 24 mar 2023.
valorização dos profissionais da educação, des-
locados de suas áreas de domínio e, em uma
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CHACINA DA GAMBOA: 1 ANO SEM JUSTIÇA!

Silvana dos Santos, mãe de um dos três jovens assassinados pela PM da Bahia na Gamboa,
em Salvador (BA) | Foto: Tailane Muniz/Ponte Jornalismo
Por Matheus Almeida
“Socorro, vão me matar!”, gritou jovem lacrimogêneo, resultando em consequên-
de 20 anos assassinado pela Polícia Militar cias graves sobre a vida de todos os presen-
da Bahia (PMBA)! tes. A Classe Trabalhadora, Negra e Periféri-
Em primeiro de março de 2023 comple- ca baiana pede socorro!
tou-se no Estado da Bahia um ano da Chacina A PMBA, na época comandada pelo ex-
da Gamboa. Na madrugada do dia primeiro, -governador Rui Costa, não relatou quantos
três jovens são assassinados na comunida- policiais participaram da chacina — nem se-
de Solar do Unhão, que se localiza na região quer informou se existia algum planejamen-
da Gamboa, em Salvador. Triste dia para a to que justificasse a dita operação! —, re-
região da Gamboa, que teve as vidas de Ale- correu aos argumentos de praxe, afirmando
xandre dos Santos, Patrick Souza Sapucaia e a necessidade de apurar as circunstâncias
Cleverson Guimarães Cruz ceifadas por uma dos fatos, que um inquérito seria instaura-
ação da PMBA, a qual alega que os jovens do e que os armamentos utilizados seriam
foram mortos em uma troca de tiros. encaminhados à perícia.
Em contrapartida ao costumeiro relato Nenhum dos envolvidos na chacina foi
de “troca de tiros”, os moradores da Gam- afastado de seu posto de trabalho, quanto
boa contestaram a versão e afirmam que a mais expulso da corporação. Além disso,
Polícia Militar da Bahia operou um trabalho para complementar a situação com maio-
truculento, baseado na lógica do confronto res requintes de crueldade e barbaridade, a
direto, atirando e jogando bombas de gás PMBA emitiu uma nota de repúdio no ins-

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tagram chamando os familiares e vizinhos prova abuso do uso da força por parte dos
das vítimas de acusadores irresponsáveis e policiais e que as armas que supostamente
levianos. foram usadas pelas vítimas apresentavam
“A polícia militar da Bahia repudia, ve- defeitos que impossibilitavam seu uso.
ementemente, afirmações levianas e ir- Apesar de tantas provas, nem sequer
responsáveis a respeito de conivência com existe uma ação em escala judicial em anda-
qualquer projetos de natureza criminosa mento. Um ano depois do ocorrido, os poli-
e genocida”, assim afirmou publicamente ciais envolvidos na chacina seguem em liber-
essa instituição, que deveria respeitar e ze- dade e trabalhando. Pior, seguem visitando
lar pelas vidas baianas. Entretanto, qual o a Gamboa! "Os agentes seguem cometendo
raciocínio lógico a ser inferido sobre esses as mesmas atrocidades e amedrontando a
casos recorrentes e desumanizadores se- comunidade", afirma moradora da comuni-
não a conclusão de uma polícia de natureza dade. E os moradores da Gamboa continu-
criminosa e genocida? am sendo vistos como inimigos do Estado.
Naturalmente, um estudo da rede de É preciso que haja justiça! O Estado não
Observatório de Segurança informa que a pode continuar a ser o ator principal da pro-
cada 100 mortos pela polícia da Bahia, 98 moção da violência e insegurança na Bahia.
são pessoas negras. Em 2022, dados graves Urge a desmilitarização da polícia, a cons-
são relatados: todos os mortos pela PM fo- trução de uma segurança pública pautada
ram pessoas negras. Problemática que se no zelo pela vida, com o direito das nossas
agravou graças à política de fortalecimento comunidades estarem envolvidas na sua re-
da polícia militar operada pelos governa- formulação!
dores do Partido dos Trabalhadores (PT), Justiça para todas as vítimas da violên-
sempre oferecendo cargos estratégicos da cia policial!
administração do Estado para os militares.
Além disso, cotidianamente aplaudindo e
fortalecendo o desenvolvimento de uma https://ponte.org/chacina-da-gamboa-mae-de-
polícia extremamente repressiva, pautada -um-dos-jovens-mortos-conta-como-agiu-a-pm-da-
na lógica da repressão e enfrentamento di- -bahia-do-governador-rui-costa-pt/
reto. https://ponte.org/pms-que-segundo-as-familias-
Porque as forças policiais no Estado -executaram-3-jovens-negros-em-salvador-seguirao-
Burguês existem com o propósito de alijar -trabalhando-nas-ruas/
a classe trabalhadora, negra e periférica do https://www.instagram.com/p/CanXsRMur-
nosso país, com a finalidade de conter seus 0J/?utm_source=ig_web_copy_link
impulsos e capacidades revolucionárias. https://revistaafirmativa.com.br/chacina-da-
Baseando-se em estratégias de enfrenta- -gamboa-1-ano-depois-caso-e-marcado-por-blinda-
mento interno, a sua razão de existir não é gem-dos-policiais-responsaveis-que-seguem-visitan-
proteger a população de inimigos externos do-e-ameacando-a-comunidade/
ao país, porém a própria população passa a https://noticiapreta.com.br/observatorios-da-
ser vista como potencial inimiga do Estado. -seguranca-contabilizou-20-mil-acoes-policiais/
Evidentemente, a polícia serve aos interes-
ses do Estado, logo, a classe trabalhadora é https://www.brasildefato.com.
vista como sua inimiga. br/2022/11/17/a-cada-100-mortos-pela-policia-da-
-bahia-98-sao-negros-afirma-relatorio
Na semana em que aconteceu a chacina,
https://www.correio24horas.com.br/noticia/
a Secretaria de Segurança Pública da Bahia nid/bahia-tem-a-maior-taxa-de-mortes-em-acoes-po-
(SSP-BA) informou que fora instaurado um liciais-do-pais/
Inquérito Policial Militar (IPM) para apurar o
caso por meio da Corregedoria da PM. Se-
gundo o parecer dado pela ouvidoria geral
da SSP, pelo menos um dos jovens foi vítima
de execução. Além disso, o inquérito com-
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ESPAÇO CULTURAL
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EXPOSIÇÃO GUERRA PURA E A ARTE


MARGINAL EM SALVADOR

Imagem: Reprodução Instagram


Por Wenderson Silva e Gabriel Galego
Do dia 26 de fevereiro ao dia 11 de março tivemos recicláveis, traz uma representação do mapa-múndi
a exposição “Guerra Pura”, que reuniu pinturas, que podemos interpretar como uma crítica ao colo-
esculturas, performances, projeção visual e paisa- nialismo, divisão internacional e racial do trabalho,
gens sonoras produzidas em Salvador por diversos que leva milhares de etnias e povos a miséria en-
artistas nordestinos. quanto enriquece nações da metrópole capitalista.
A expressão “Guerra Pura” é um conceito cunhado
pelo autor e ativista Hakim Bey, que faz referência
a uma forma de resistência cultural e social. Em seu
livro “Taz – Zona Autônoma Temporária”, Bey defen-
de a criação de espaços temporários e autônomos
onde indivíduos possam viver e experimentar mo-
dos de vidas, que escapem às normas e imposições
do “sistema dominante”.
A exposição, apesar de não se limitar ao universo do
Hip-hop, é fortemente influenciado pela cultura, es-
pecialmente no elemento do rap e do grafiti. Grande
parte das pinturas expostas eram grafitis e carrega-
ram a exaltação cultural da cultura negra, periférica
Artista: QUARCK - “Sem título” 2023
e marginalizada.
Outra escultura que nos chamou atenção foi a
Notamos isso na produção artística de Vírus Cari-
obra “A flor de trombeta” (2023), do artista VIVÃO.
nhoso, um dos jovens artistas mais talentosos de
Remetendo a uma situação ritualística, vemos três
Salvador, que além das pinturas, esculturas e per-
velas amarelas de sete dias dispostas numa mesa
formance com a feitura ao vivo de uma vestimenta
em formato triangular, com uma flor de trombeta
a partir de um grafitti coletivo, também cantou
no centro. A flor de trombeta, além de seus usos
algumas de suas músicas que tratam sobre a margi-
medicinais, também tem seu uso reconhecido por
nalização da música e cultura negra.
diversos povos tradicionais da América do Sul em
Entre as esculturas, destacamos a obra “Sem título” atividades rituais.
(2023) do artista QUARCK, em que com materiais

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ESPAÇO CULTURAL
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ta de expressão por volta do final de 2017. Nas


suas obras, sempre optou por reunir diferentes
linguagens em suportes variados, ressignifican-
do e transformando materiais, subprodutos,
resíduos, vestuário e telas de forma atípica.
• VIVAO é um diretor criativo e artístico na marca
Vivão Project em Salvador (BA), onde o lema é
acreditar que o futuro é o reflexo do hoje e a
melhor forma de construir um mundo novo é
observando as necessidades do agora, projetan-
do novos caminhos e possibilidades de entendi-
mento individual e coletivo, contribuindo com
processos de descoberta e expansão.
• H4WNEE é um artista de João Pessoa (PB) que
reside em São Paulo há 6 anos. Amante do ima-
ginário distópico e da cibercultura, utiliza sucata
eletrônica, mash ups, over processing e barroco
sci-fi nas suas obras.
• Gustavo "QUARK" é um cineasta e escritor de
filmes experimentais com uma estética poética
futurista e intenções narrativas atribuídas ao pa-
pel da montagem. Impulsionado pelos ideais de
um terrorista poético, busca propor uma visão
metafísica, ácida e política em suas obras, seja
em um ato na rua ou projetado sobre telas.
• Letricia, nascida em Salvador, traduz seu ca-
minho de corpo, alma e máquina em timbres
agressivos e atmosfera soturna. Em sua pesquisa
eletrônica, segue um percurso singular do expe-
rimentalismo rítmico, munida de sua Electribe,
fitas K7 e processamento de pedais, trazendo
composições mandingueiras e ambientes psi-
coativos aos ouvidos mais sensíveis com transe
circular e sonoridade rasteira.
• TRAZ é um artista brasileiro nascido em Salva-
Artista: VIVÃO – A Flor de Trombeta (2023) dor (BA), cujo trabalho pesquisa as potenciali-
dades das expressões contemporâneas perme-
Na obra, a flor é sintética, com fios de energia no
adas pelo canto, dança, ritual e performance,
centro; já as velas são cobertas por placas-mães de
expressões que transitam no poder inventivo do
computadores. De forma sutil, o artista retoma ao
artista, trazendo questionamentos de uma con-
debate que se desdobra initerruptamente em nossa
tracultura dissidente da sociedade atual, tendo
cultura desde os modernistas: as relações estabele-
seu corpo como principal objeto e ferramenta.
cidas entre a tradição e a inovação, entre o antigo e
o novo, entre o ancestral e o contemporâneo. • Vírus Carinhoso é um artista brasileiro nascido
em Salvador (BA) que pesquisa as potencialida-
Essa exposição inaugurou o espaço de galeria Rua
des das expressões contemporâneas permeadas
Urban Gallery, localizado na Orla do Rio Vermelho.
pelo canto, dança, ritual e performance, tra-
Espaços como esse, que fomentam projetos com
zendo questionamentos de uma contracultura
artistas independentes das diversas linguagens
dissidente da sociedade atual, tendo seu corpo
artísticas da cidade, além de propor levar a cultura
como principal objeto e ferramenta.
da rua soteropolitana para um espaço central da
cidade, é de fundamental importância para a produ- • Roy Constróy é um artista visual de Salvador,
ção cultural de Salvador. cuja carreira iniciou-se como galerista e agora
se expandiu para o campo das artes visuais. Em
Artistas que participaram da exposição:
suas obras, é evidente uma forte inclinação para
• Filipe Dantas, residente em São Paulo há 5 anos, a crítica social.
é um artista que começou a produzir suas obras
com o objetivo de utilizar a arte como ferramen-

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MEMÓRIA
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MEMÓRIA: ELISA BRANCO BATISTA

Imagem: Arquivos Nacionais da Romênia


Por Matheus Almeida
“Os Soldados, Nossos Filhos, Não Irão Para a Coreia”, Foi presa e conduzida ao DOPS. Ficou oito dias inco-
assim profetizou a comunista que evitou a morte de municável. Foi condenada a quatro anos e três meses
milhões de brasileiros em uma guerra imperialista. de prisão. Entretanto, foi aplaudida, reconhecida pela
Nascida em Barretos em 1912, filha do casal portu- multidão e evitou que os brasileiros fossem intervir em
guês Carolina e José, Elisa Branco Batista foi uma uma guerra de caráter imperialista. Seu apelo popular
importante militante comunista Brasileira, logrando era tão grande que após a sua prisão organizou-se um
reconhecimento internacional. Após o falecimento do amplo movimento pela sua libertação, campanha da
seu pai aos seus seis anos de idade, passa a viver com a qual participou até a Rádio Central de Moscou.
mãe e cinco irmãos na cidade de origem. Admiradora Nem mesmo a prisão foi capaz de abalá-la; Elisa alfa-
de Luís Carlos Prestes, se filiou ao PCB e fez parte da betizou detentas, ensinou corte e costura e higiene
Federação das Mulheres de São Paulo e do Movimen- pessoal! Após 1 ano e 8 meses em cárcere, foi liberada.
to Brasileiro dos Partidários da Paz. Além do mais, Ganha o prêmio internacional da paz,
Conforme explica ao jornal Inverta, órgão oficial do prêmio Lenin da paz, em 1953, no Palácio do Kremlin,
Partido Comunista Marxista Leninista (PCML): “Como em Moscou, na União Soviética.
aqui não tinha nada para a mulher trabalhar, fui para Em 1964, durante o Golpe Militar, foi presa novamen-
São Paulo onde aprendi a costurar com minha prima”. te, desta vez pelo DOPS e sem acusação. Em 1971,
Sendo assim, Elisa passa a residir em São Paulo na bus- nova prisão. Passou três dias desaparecida, até ser li-
ca de melhores condições de vida. berada por falta de provas. Contou à revista ISTOÉ “Os
É vasto o currículo de Elisa Branco Batista; Em 1945, bandidos do DOPS reviraram tudo e levaram um mon-
ao assumir o Departamento Feminino do Comitê do te de fotografias pessoais”.
Partido Comunista Brasileiro (PCB), é iniciada a sua mi- Elisa Branco Batista faleceu em 8 de junho de 2001,
litância política partidária. Além disso, em 1946, esteve aos 87 anos, em São Paulo. Sua militância é reconhe-
à frente de lutas de bairros através do comitê popular cida em trabalhos acadêmicos e livros, nacionais e in-
democrático da Fortaleza, na condição de Vice-presi- ternacionais. Conforme afirma Horista, sua filha, Elisa
dência. disseminou a ideia do comunismo: "Todos nós fomos
Além de ter sido presidenta de honra da Federação contagiados pela luta da minha mãe, mulher de cora-
das Mulheres de São Paulo e vice-presidenta do Mo- gem, que enfrentou, sem titubear, as autoridades da
vimento Brasileiro dos Partidários da Paz, desafiou o época e mostrou sua audácia ao levantar uma faixa
governo Dutra ao abrir uma faixa contra a participação contra a guerra."
do Brasil na guerra da coreia, em um desfile de 7 de Viva a baratense que desafiou o governo Dutra!
setembro, no Vale do Anhangabaú. Viva Elisa Branco Batista!!

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