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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA VARA CÍVEL

DA COMARCA DE APUCARANA – ESTADO DO PARANÁ.

ALDAIR APARECIDO PINTO, brasileiro, casado,


contador, portador da Cédula de Identidade, RG. sob nº 3.587.564-6/SSP/PR, inscrito
no C.P.F./M.F. sob nº 475.683.729-87, residente e domiciliado na Rua René Táccola, nº
708, centro, Edifício Residencial Daniela, apto. nº 502, 5º andar, CEP.86975-000, em
Mandaguari, Estado do Paraná, por intermédio de seu procurador judicial que
adiante assina, advogado devidamente inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil,
Seção do Paraná, sob nº , com escritório profissional estabelecido na Rua , na cidade
de, Estado do Paraná, onde recebe avisos, intimações e demais comunicados judiciais
(mandato incluso), vem à presença de Vossa Excelência, com o devido respeito,
propor

AÇÃO CONSTITUTIVA NEGATIVA PARA


ANULAÇÃO DE NEGÓCIO JURÍDICO

em face de:

WALTER CAMINHA, brasileiro, casado, comerciante,


portador da Cédula de Identidade, RG. sob nº 1.254.106/SSP/PR, inscrito no
C.P.F./M.F. sob nº 206.420.089-49, residente e domiciliado na Rua , em Apucarana,
Estado do Paraná, pelos fatos e fundamentos que adiante seguem:

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1 – DOS FATOS

1.1. Das atividades do Requerente

O Requerente prestou serviços profissionais na pessoa


jurídica de direito privado denominada Cocari – Cooperativa Agropecuária e
Industrial, antiga Cooperativa dos Cafeicultores de Mandaguari Ltda, no período
compreendido entre 15 de março de 1983 a 03 de dezembro de 1998, conforme se
infere da inclusa cópia autenticada de sua Carteira de Trabalho e Previdência Social
sob nº 15573, série nº 00002PR.

Naquela cooperativa, o Requerente trabalhou na


destilaria, no período compreendido entre os anos de 1983 a 1989; e na unidade de
rações, no período restante, ou seja, nos anos de 1989 a 1998.

E foi exercendo o último cargo, nas Rações Cocari, que o


Requerente, na função de coordenador da unidade, atingiu os melhores índices de
venda em tonelada para a ração de frango de corte no início da década de 90 (época
em que o frango foi inserido na cesta básica no plano real), além de impulsionar
aquela unidade, fazendo um competente trabalho.

Nesse período de quase dez anos, coordenando a


indústria de rações da Cocari, o Requerente adquiriu todo um aprendizado e
conhecimento (know how) atinente ao ramo de rações, que proporcionou a Cocari
qualificativos resultados naquele setor.

No ano de 1998, o Requerente, sentindo-se ameaçado de


ser demitido da Cocari, não por deficiência profissional, mas puramente pelas
dificuldades que aquela empresa vinha passando naquela época, passou a estudar
uma proposta de sociedade, para instalar uma unidade de rações na cidade de
Ivaiporã-PR.

1.2. Das atividades do Requerido

Por sua vez, o Requerido era construtor civil, e em razão


de que os negócios oriundos dessa área não estavam indo a contento, devido à
política habitacional do Governo, mudou-se para Mandaguari-PR, com o objetivo de
melhorar a sua situação. Porém, nesta cidade, também não logrou êxito naquela
atividade, devido à concorrência. Desta forma, retornou para a cidade de Ivaiporã-
PR, onde pelo menos já era conhecido no mercado imobiliário, retomando suas
funções de construtor civil.

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1.3. Da sociedade entre Requerente e Requerido. Criação
da empresa Rações Nutrivale Ltda

Assim, em razão da situação desagradável por que ambos


passavam, o Requerente e o Requerido uniram-se, para formar uma sociedade, com o
objetivo de construir uma fábrica de rações na cidade de Ivaiporã-PR, onde o
Requerente contribuiria com o know how adquirido após quase dez anos à frente da
unidade de rações da Cocari e, ainda, alguns recursos oriundos da venda de sua
rescisão de contrato de trabalho junto a Cocari, e o Requerido, por sua vez, investiria
o capital.

Dessa união, resultou a empresa Rações Nutrivale Ltda


(cópia do contrato social anexa), da qual ambos eram sócios em igualdade de
participação societária (50.000 quotas integralizadas para cada um, no valor de R$
50.000,00), onde a unidade foi construída em um barracão alugado de 600
(seiscentos) metros quadrados, e as atividades se iniciaram em janeiro/1999.

Já em agosto/2000 havia sido construído outro barracão


de 700 (setecentos) metros quadrados, onde funcionava a linha pet. No ano de 2001
definiu-se parceiros para o mercado pet, com o objetivo de atingir o mercado
nacional. Em agosto daquele ano, trabalhando em turnos ininterruptos, já se
comercializava em torno de 700 (setecentas) toneladas de rações para os Estados de
São Paulo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Minas Gerais, Mato
Grosso e Paraná.

Havia a necessidade de expansão, e em razão disso, os


sócios (requerente e requerido) obtiveram, junto ao Município de Cambira-PR, um
terreno de 15.000 (quinze mil) metros quadrados, com barracão de 1.000 (um mil)
metros quadrados, avaliados em R$ 250.000,00 (duzentos e cinqüenta mil reais).
Junta-se alguns recortes de jornais da época, demonstrando que o fato foi
amplamente divulgado na região, ante a importância que tinha, pela geração de
empregos que beneficiaria a população (docs. anexos).

De posse desse projeto ambicioso, o Requerido, em agosto


de 2.001, mudou-se para Cambira para coordenar os trabalhos de implantação do
barracão, equipamentos a serem adquiridos, infra-estrutura de água, energia, etc, já
que era construtor. A previsão de mudança de toda a unidade de Ivaiporã para
Cambira era novembro/2002. Porém, o Requerido, semanalmente, comparecia na
empresa em Ivaiporã, para avaliar os investimentos na futura instalação de Cambira,
bem como o ritmo da produção em Ivaiporã.

Obviamente que, em razão das dificuldades normais de


abertura de empresa e inserção do produto no mercado, desde a criação em Ivaiporã,
a empresa Rações Nutrivale, de propriedade do Requerente e do Requerido,
necessitava de recursos financeiros de terceiros para a sua movimentação a contento
e, também, para a expansão de sua linha de produção, visando competir com as
demais marcas já consolidadas no mercado. Sendo assim, em maio de 2000, os sócios

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Aldair e Walter obtiveram, por empréstimo, junto ao Sr. José Sespede, a importância
de R$ 127.352,00 (cento e vinte e sete mil, trezentos e cinqüenta e dois reais).

Em função da amplitude do negócio, havia, portanto,


sempre a necessidade de novos recursos, motivando o Requerido, por várias vezes, a
querer vender a empresa, porém não encontrava ninguém disposto a comprar.

No mês de junho de 2002, na sede da empresa Nutrivale,


em Ivaiporã, em razão das dificuldades financeiras para continuar o investimento, os
sócios Aldair e Walter, acompanhados do Sr. José Sespede, reuniram-se com o
objetivo de encontrar uma solução para o problema, ficando definido que iriam
conversar com o prefeito de Cambira, e que o término do projeto ficaria adiado para
o início de 2.003.

Após essa reunião, o Requerido decidiu investir a


importância de R$ 100.000,00 (cem mil reais), oriundos da empresa, na construção da
nova sede em Cambira, comprometendo ainda mais a situação financeira da
Nutrivale (Ivaiporã).

Em setembro de 2.002, houve alta no preço da soja (R$


300,00 para R$ 500,00 a tonelada) e no milho (R$ 14,00 para R$ 30,00) a saca, e a
inadimplência aumentou, totalizando a importância aproximada de R$ 230.000,00
(duzentos e trinta mil reais) de cheques sem fundos, acrescidos da retirada para
investimento em Cambira, no valor de R$ 250.000,00 (duzentos e cinqüenta mil reais),
perfizeram a importância de R$ 480.000,00 (quatrocentos e oitenta mil reais)
aproximadamente.

No dia 13 de setembro de 2002, o Requerente saiu de


Ivaiporã com destino a Mandaguari, ficando o Requerido no comando da empresa,
sabendo-se que a empresa tinha em caixa em torno de R$ 95.000,00 (noventa e cinco
mil reais) de cheques pré-datados.

No dia 14 de setembro, os sócios da empresa, ora


Requerente e Requerido, iam se reunir em Mandaguari com o representante de São
Paulo, para definir metas de trabalho. Porém, antes, o Requerido entrou em contato
telefônico com o Requerente, ficando combinado de ambos se encontrarem no Posto
Central, em Mandaguari, de propriedade do Sr. José Sespede. Naquele lugar, na
presença do Sr. José Sespede, Requerente e Requerido somaram o passivo da
empresa, chegando ao valor de R$ 397.840,00 (trezentos e noventa e sete mil,
oitocentos e quarenta reais), dividindo a dívida em duas parcelas iguais,
representadas por duas notas promissórias, cada qual assinada por um sócio.

Assinada as promissórias, o Requerido informou ao


Requerente que queria desfazer a sociedade, exigindo um posicionamento desse
naquele momento. Assustado e pressionado diante daquela situação, o Requerente
sugeriu que lhe fosse dado um prazo de quinze dias para pensar sobre o assunto.

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O Requerente, por sua vez, se encontrou com o
representante de São Paulo, explicou-lhe a situação, e pediu para que ele aguardasse
a solução para o caso.

1.4. Das ameaças de morte

No mesmo dia 14, e, ainda, no dia seguinte, antes de


vencido o prazo para resposta, o Requerido começou a difamar o Requerente e toda a
sua família, perante os familiares das esposas (elo de ligação entre eles), e dizendo
ainda que se o Requerente não aceitasse a dissolução da sociedade ele seria um
homem morto.

O Requerente, quando soube das ameaças, ficou perplexo


e assustado. Resolveu, então, no dia 16 de setembro, conversar com o Requerido, na
sede da empresa. Lá chegando, o Requerido se fazia presente, notou, também, que os
cheques pré-datados não estavam no caixa.

O Requerido, então, incutindo temor no Requerente,


diante as ameaças, formulou a seguinte proposta: ficaria sozinho com o barracão de
Cambira e os débitos com o Sr. José Sespede e o Requerente ficaria em Ivaiporã, num
barracão alugado, com todo o passivo da Rações Nutrivale, e, ainda, sem dinheiro
em caixa, ou seja, sem os cheques pré-datados.

Feita a proposta, no período de 20 a 23 de setembro de


2002, o Requerido, como forma de pressionar, mandava recado pelos familiares
afirmando que ou o Requerente aceitava as condições ou era um homem morto.

As condições da proposta feita pelo Requerido eram as


mais desproporcionais possíveis. Se o Requerente aceitasse, não suportaria um dia a
pressão dos credores.

No dia 23 de setembro daquele ano, o Requerente reuniu-


se com os funcionários Haroldo Cyriaco da Silva, Paulo da Pedra, Moacir Bolognesi,
Onivaldo Aparecido Bibim e o contador Jonas, expondo-lhes a situação.

Diante das constantes ameaças de morte feitas pelo


Requerido, utilizadas para coagi-lo a assinar a dissolução da sociedade, em data de
27 de setembro de 2002, conforme se infere do incluso Boletim de Ocorrência, o
Requerente comunicou a ameaça sofrida por ele e sua família ao Delegado de Polícia
da Comarca de Mandaguari.

Ainda assim, as ameaças continuaram, o Requerente,


temendo que algo grave lhe acontecesse ou a sua família, sentiu-se acuado e indefeso,
quando, em 09 de outubro de 2002, viu-se obrigado a assinar a seguinte
documentação, que segue anexa: 1) Segunda Alteração de Contrato Social, datada de
09 de outubro de 2002, onde os sócios Aldair e Walter (Requerente e Requerido)
cederam e transferiram todas as suas cotas no capital social da empresa Rações
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Nutrivale aos sócios ingressantes Jovanina Abreu de Amorim Rodrigues e Haroldo
Cyriaco da Silva; 2) Contrato Particular de Venda de Quotas de Sociedade, datado de
24 de setembro de 2002, onde o Requerente cedeu ao Requerido suas cotas partes no
capital social da empresa Rações Nutrivale, no valor de R$ 50.000,00 (cinqüenta mil
reais).

Porém, a alteração contratual assinada pelos sócios, além


da coação imposta ao Requerente, foi um negócio simulado, tendo em vista que os
sócios adquirentes não possuíam a menor condição de comprar as cotas, pois ambos
eram funcionários assalariados da empresa, conforme comprova a certidão da lavra
da Oficiala de Justiça da Comarca de Ivaiporã-PR, Sra. Joelma Périco Fabbi, juntada
às fls. 176, dos autos de execução sob nº 104/2003, em anexo. Na certidão, a Sra.
Jovanina afirma que trabalhava na firma Nutrivale como zeladora; que sua
profissão sempre foi na área da limpeza; que é pobre e nada possui para garantir a
dívida; que não conhece o outro a ser citado, Sr. Haroldo Cyriaco da Silva.

A alteração de contrato social e o contrato particular de


venda de quotas de sociedade, nas pessoas de Jovanina e Haroldo, pessoas estas da
estrita confiança do Requerido, já fazia parte do plano deste, visando renegociar as
dívidas com os credores, quando estivesse sozinho na condução da empresa. Tal
situação fica ainda mais evidenciada ao apreciarmos a procuração outorgada pelos
sócios ingressantes ao Requerido, juntada às fls. 200, da execução em anexo.

Com relação ao contrato de compra e venda, o Requerente


não recebeu nenhuma importância pela venda das cotas, sendo absolutamente
inverídico que tenha recebido R$ 50.000,00 (cinqüenta mil reais) à vista. Como dito,
assinou os documentos em razão da violenta coação moral que sofria, diante das
seguidas ameaças de morte do Requerido.

Efetivada a separação dos sócios, o Requerido ainda ficou


mais noventa dias em Ivaiporã, quando, então, inaugurou a sede da empresa em
Cambira. O Requerente, ao contrário, foi duramente criticado e difamado pelos
fornecedores.

O Requerente, diante da redução de sua vontade, pela


intensa ameaça de morte que vinha sofrendo, deixou para trás todo o conhecimento
adquirido na Cocari, produtos registrados no Ministério da Agricultura (Billy-dog,
Kiko, Lyon), parceiros definidos no mercado, ambiente minuciosamente estudado,
para colher frutos a longo prazo, bem como o investimento do recurso oriundo da
venda de sua rescisão trabalhista com a Cocari que havia aplicado na empresa,
passando por dificuldades que jamais imaginou que pudesse acontecer na sua vida.

O Requerido, ao contrário, ainda antes de dissolver a


sociedade, aumentava seu patrimônio pessoal em abundância. Em data de 30 de
agosto de 2002 (a alteração de contrato social é de 09/10/2002 e o contrato de venda
das quotas é de 24/09/2002), o Requerido, conforme se infere das inclusas certidões
imobiliárias, expedidas em data de 05/02/2003, pelo Cartório de Registro de Imóveis
– 2º Ofício da Comarca de Apucarana, Estado do Paraná, adquiriu para si 42
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(quarenta e dois) imóveis, mais precisamente um loteamento, representado pelas
seguintes matrículas: 17.198, 17.197, 17.196, 17.195, 17.194, 17.193, 17.192, 17.191,
17.190, 17.189, 17.188, 17.187, 17.186, 17.185, 17.184, 17.183, 17.182, 17.181, 17.180,
17.179, 17.178, 17.177, 17.176, 17.175, 17.174, 17.173, 17.172, 17.171, 17.170, 17.169,
17.168, 17.167, 17.166, 17.165, 17.164, 17.163, 17.162, 17.161, 17.160, 17.159, 17.158,
17.157, totalizando uma área urbana, no loteamento denominado Jardim Danielle, de
16.875,42 metros quadrados.

Os débitos da empresa não eram tão desesperadores


assim, conforme insistia em demonstrar o Requerido, haja vista que atualmente todos
os credores foram pagos, como por exemplo, o credor da execução em anexo.

Ressalte-se que antes da criação da sociedade, o


Requerido era construtor civil, passava por dificuldades no mercado, ante a
concorrência, mudou-se para Mandaguari, não logrando êxito, retornou para
Ivaiporã, mas continuava a sofrer com o enfraquecimento da construção civil.

Em abril de 2003, o Requerente ainda sofreu outras


ameaças de morte do Requerido, quando compareceu ao enterro de sua sogra.

Enfim, em conclusão, o fato em si, resumidamente, pode


ser assim relatado, o Requerido, detentor do capital, utilizou-se do conhecimento
adquirido pelo Requerente (know how), durante os quase dez anos em que este
esteve à frente da unidade de rações da Cocari, para erguer uma estrutura
cuidadosamente, por aquele planejada, a longo prazo, e quando notou que já poderia
assumir sozinho a empresa, ardilosamente arquitetou um plano para elimina-lo da
sociedade, pois não havia mais interesse em seus serviços profissionais.
Primeiramente expôs para o Requerente que a empresa passava por gravíssimas
dificuldades financeiras, ao passo que, simultaneamente, desviava o patrimônio da
Nutrivale de Ivaiporã, em grande parte, para a sua pessoa física, e a outra parte para
a construção de Cambira. Induzindo o Requerido em erro, passou uma situação de
derrocada da empresa. Como não conseguia fazer que o Requerente desistisse
espontaneamente do negócio, passou a utilizar outros artifícios, consistentes em
ameaças de morte, para incutir temor ao Requerente, obrigando-o a assinar
documentação da qual não era de sua vontade e que somente foi assinada em razão
da coação. E, ainda, simulou negociação de compra e venda.

Atualmente, o Requerido é sócio de fato da empresa


Rações NUtrivale, instalada em Cambira, conforme prova a inclusa cópia integral
dos autos nº 014/03, de Execução de Título Extrajudicial movida pela Inplac –
Indústria de Plásticos S/A contra a Rações Nutrivale, mais precisamente no acordo
de fls. 202/210, sendo de conhecimento que a empresa vem auferindo vultosos
lucros, está em boa situação financeira, paga em dia os credores, é sinônimo de
desenvolvimento, gera empregos, enfim, está em ótima situação.

O Requerente, porém, diante da coação que sofreu, não


ganhou absolutamente nada com o negócio onde investiu todo o conhecimento que
adquiriu, o dinheiro resultante de sua rescisão trabalhista com a Cocari, e, ainda, a
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própria casa onde residia, passou por dificuldades financeiras, e certamente estaria
em melhor condição se ainda fosse sócio da empresa.

Não havendo outra forma amigável de solucionar o


litígio, e, tendo em vista a necessidade de provar em juízo o vício contratual, para
anular os negócios jurídicos que dele resultaram, o Requerente ingressou com a
presente medida judicial, para que, uma vez provado o vício de consentimento,
sejam declaradas as modificações daquelas relações jurídicas anteriores, cessando as
suas eficácias, bem como a criação de outra nova, notadamente para o fim de restituir
o Requerente a figurar como sócio da empresa da qual foi coagido a sair, retornando
ao estado em que antes delas se achava, ou, de maneira alternativa e sucessiva, caso
não seja possível à restituição, que seja indenizado com o equivalente.

São os fatos Excelência.

2. DOS FUNDAMENTOS JURÍDICOS

A presente ação visa desconstituir os negócios jurídicos


acima descritos, ante as suas anulabilidades, por apresentarem vício de
consentimento, cessando a produção de seus efeitos a partir da sentença. Portanto é
ação constitutiva negativa.

Como característica da ação constitutiva, visa também,


uma vez modificada as relações jurídicas anteriores, criar relação jurídica nova,
consistente em restituir o Requerente ao estado em que antes delas se achava,
voltando a figurar na qualidade de sócio de direito da empresa Rações Nutrivale
Ltda, com metade da participação societária que detinha anteriormente, ou, assim
não entendendo Vossa Excelência, na proporção de 50.000 (cinqüenta mil quotas)
integralizadas que, coagido, cedeu e transferiu, por meio dos negócios extorquidos,
aos sócios Jovaniva e Haroldo.

Não sendo possível à restituição ao estado em que antes


da coação se achava, pretende, de maneira alternativa e sucessiva, seja aplicado a
parte final do artigo 182 do Código Civil, sendo o Requerente indenizado com o
equivalente.

Excelência, os fatos, por si só, demonstram a intenção do


Requerido em eliminar o Requerente da sociedade, porquanto percebeu que se
estivesse sozinho no comando da empresa teria lucro dobrado.

O Requerente, que já havia estruturado a empresa,


estudado em minúcias cada passo, utilizando-se de todo o know how adquirido nos
dez anos em que coordenou a unidade de rações da Cocari, não tinha mais espaço na
empresa (utilidade), pois o Requerido, além de ter toda a infra-estrutura construída e

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pronta por aquele, inclusive a de Cambira, já havia aprendido a lidar sozinho com
aquela atividade.

Imbuído desse pensamento, o Requerido traçou


detalhadamente seu plano para descartar o Requerente da sociedade. Primeiro,
apostou na especulação de que a empresa estava muito endividada, devido aos
recursos financeiros que haviam sido conseguidos junto a terceiros, como por
exemplo, o Sr. José Sespede. Procurava o Requerido passar uma imagem em
derrocada da empresa. Várias vezes o Requerido comentava que queria vender o
negócio.

Em contrapartida, o Requerido desviava todo o


patrimônio da empresa para a construção da nova sede em Cambira e, também, para
o seu patrimônio pessoal, que cresceu consideravelmente, como adiante se verá.

Porém, o Requerido percebeu que todo o seu esforço em


buscar que o Requerente espontaneamente desistisse do negócio não lograva
resultado na prática, tendo em vista que aquele objetivava sempre a recuperação da
empresa, pois tinha consciência do potencial da fábrica, notadamente porque
procurava conter os credores, expondo-lhes a situação desfavorável que lhe era
transmitida pelo Requerido.

Propôs, então, o fim da sociedade, porém o Requerente


pediu alguns dias para pensar.

Todavia, durante esse período, o Requerido, com o


objetivo traçado de afastar o Requerente da sociedade, utilizou-se de outra
artimanha, consistente em pressioná-lo a assinar documentos especialmente
elaborados para aquele fim, mediante ameaça de morte.

As ameaças de morte foram dirigidas primeiramente ao


próprio Requerente e depois a sua família, resultando, inclusive, na lavratura do
Boletim de Ocorrência sob nº 392/2002, de 27/09/2002, onde o Requerente relata
que:

“(...) está sendo ameaçado de morte pelo seu sócio Senhor Walter
Caminha, com que possui uma empresa de ração em sociedade na
cidade de Ivaiporã/Pr. Que coloca o reclamante em pauta, que
está em sociedade nessa empresa, com o Senhor Walter Caminha
há quatro anos e sempre houve bom relacionamento e que tudo
deu início em função de que seu sócio Senhor Walter Caminha,
pediu a separação da sociedade, dizendo que não mais queria ser
sócio com o reclamante e passou uma proposta. Que esclarece o
reclamante que diante de tal fato, pediu para o seu sócio um
prazo de quinze dias para pensar, quanto a proposta, mas antes
do prazo de resposta por parte do reclamante, o Senhor Walter
Caminha já disse para a família do reclamante já começou a
ameaçar, dizendo que iria matar o seu sócio, caso este não
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aceitasse tal proposta imposta pôr ele, isso ocorreu no dia
14.09.2002, um Sábado, e na Segunda-feira, dia 16.09.2002, o
Senhor Walter reafirmou a referida proposta, onde o reclamante
não disse nada, haja vista que este encontrava-se sob pressão, de
seu sócio. Que coloca o reclamante em tela, que a partir daí não
houve mais diálogo entre as partes envolvidas com relação a
sociedade, e somente pressão por parte do agressor, quando então
o Senhor Walter Caminha começou a ameaçar a família toda do
reclamante, dizendo à terceiros. (...)”

Em razão, única e exclusiva, da pressão exercida sobre o


Requerente para determiná-lo a concordar com os atos, consistente em ameaça grave,
injusta, iminente, que trouxe justo receio de um grave prejuízo, que iria recair sobre a
pessoa do Requerente ou sua própria família, este consentiu com atos não desejados,
assinando a segunda alteração contratual, datada de 09/10/2002, e o contrato
particular de venda de quotas de sociedade, datado de 24/09/2002, onde pelo
primeiro cedeu e transferiu 50.000 (cinqüenta mil) cotas que possuía integralizadas
na sociedade, no valor nominal de R$ 50.000,00 (cinqüenta mil reais) à sócia
ingressante Jovanina Abreu de Amorim Rodrigues; e pelo segundo, cedeu, mediante
pagamento à vista de R$ 50.000,00 (cinqüenta mil reais), ao Requerido suas quotas na
sociedade da empresa Rações Nutrivale Ltda, no importe de R$ 50.000 (cinqüenta
mil) quotas.

A coação, in casu, encontra-se perfeitamente caracterizada.

Foi a única causa do consentimento, pois se não houvesse


ocorrido o Requerente não teria cedido, muito menos vendido, suas quotas na
sociedade.

Foi extremamente grave, pois consistiu em ameaças de


morte, suficientes para provocar fundado temor. Um homem médio e normal, diante
da mesma situação, agiria da mesma forma. O Requerente é uma pessoa que possui
temperamento tranqüilo, e que ficou aterrorizado diante das ameaças, não podendo
se exigir comportamento diverso.

O constrangimento a que foi submetido foi injusto, onde a


ação volitiva foi reduzida e o consentimento não se manifestou livremente. Apesar
de haver licitude quanto aos elementos que formaram os negócios jurídicos (agente
capaz, objeto lícito e possível e forma prescrita em lei), a coação produziu resultado
não querido pelo Requerente, portanto, injusto. Através da coação, o Requerido
recorreu a um meio legal (negócios jurídicos) para colimar um resultado ilegal
(cessão e venda não querida das quotas).

As ameaças de morte eram iminentes, sendo o Requerido


persuadido pelo perigo que estava correndo caso não concordasse em assinar os
negócios jurídicos extorquidos. Embora a violência física não tenha existido, a coação
moral (dano iminente) também caracteriza o vício no consentimento.
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As ameaças foram dirigidas à pessoa do Requerente e a
sua família. A intensidade da ameaça é elevada, pois atentava contra a vida,
suficiente para reconhecer a existência do vício da vontade, convencendo Vossa
Excelência da ocorrência de um elemento violento que tolheu o querer do
Requerente, obrigando-o a consentir com um ato não querido.

Excelência, a ameaça de morte é suficiente para ter


coagido o Requerente a assinar, contra a sua vontade, os negócios jurídicos. O
Requerente tinha motivos suficientes para sentir-se ameaçado e pressionado. Ou ele
assinava os negócios jurídicos que lhe eram impostos a aquiescer ou ficaria a mercê
das ameaças do Requerido, temendo que a sua desídia causasse a morte de si próprio
ou de alguém de sua família. É uma situação complicada, qualquer pessoa na mesma
situação e com um pouco de consciência ficaria num dilema, que invariavelmente
penderia para o lado de proteger a sua vida e da sua família.

A ninguém foi dado o poder de conhecer o que se passa


na mente humana, portanto, era perfeitamente possível que o Requerido cumprisse a
promessa, o que incutiu ao Requerente fundado temor de dano iminente e
considerável (a morte) a sua pessoa ou a sua família.

E foi exatamente por isso que o Requerente, coagido,


assinou os negócios jurídicos que se pretende anular, e frise-se que absolutamente
contra a sua vontade, que foi tolhida pelas ameaças de morte.

O Boletim de Ocorrência praticamente, por si só,


comprova que as ameaças realmente ocorreram, porquanto foi lavrado antes da
assinatura da alteração contratual.

A coação incutiu tanto temor no Requerente que nem


mesmo a representação criminal pelo crime de ameaça foi ajuizada.

A coação fica mais evidenciada, ainda, pelo fato de que,


em condições normais, o Requerente jamais teria consentido nos negócios jurídicos.
O Requerente investiu na sociedade toda o dinheiro que recebeu por ocasião da
rescisão do contrato de trabalho com a Cocari, inclusive, vendeu sua casa. Com a
dívida que ficou ainda teve que vender seu carro, ou seja, ele não abandonaria um
investimento de toda uma vida tão facilmente, ainda mais para passar dificuldades.

Outros fatores, já demonstrados, contribuem


decisivamente para a prova da coação existente que foi a causa da assinatura dos
negócios jurídicos.

A mudança de sede da empresa Rações Nutrivale, de


Ivaiporã para Cambira, representava uma expansão considerável para os sócios. Os
jornais da região veicularam a notícia como um grande acontecimento. A partir daí o
Requerido começou a desviar o patrimônio da empresa para investimentos na

11
construção em Cambira, ao passo que os débitos iam se acumulando e a situação
junto aos credores agravava cada vez mais.

Coincidentemente, nesse ínterim, o patrimônio pessoal do


Requerido teve uma considerável elevação. Prova disso é que adquiriu, em data de
30 de agosto de 2002 (antes da alteração de contrato social e do contrato de venda das
quotas), conforme se infere das inclusas certidões imobiliárias, expedidas em data de
05/02/2003, pelo Cartório de Registro de Imóveis – 2º Ofício da Comarca de
Apucarana, Estado do Paraná, 42 (quarenta e dois) imóveis, mais precisamente um
loteamento, representado pelas seguintes matrículas: 17.198, 17.197, 17.196, 17.195,
17.194, 17.193, 17.192, 17.191, 17.190, 17.189, 17.188, 17.187, 17.186, 17.185, 17.184,
17.183, 17.182, 17.181, 17.180, 17.179, 17.178, 17.177, 17.176, 17.175, 17.174, 17.173,
17.172, 17.171, 17.170, 17.169, 17.168, 17.167, 17.166, 17.165, 17.164, 17.163, 17.162,
17.161, 17.160, 17.159, 17.158, 17.157, totalizando uma área urbana, no loteamento
denominado Jardim Danielle, de 16.875,42 metros quadrados.

Pergunta-se Excelência: Com que dinheiro o Requerido


adquiriu estes imóveis, sendo que antes da constituição da sociedade o mesmo
passava por dificuldades financeiras trabalhando como construtor civil, e a empresa
de Ivaiporã não estava conseguindo pagar os credores e a dívida ultrapassava R$
400.000,00?

A resposta é simples, o Requerido desviou o patrimônio


da empresa para si próprio, adquiriu um loteamento, reservou dinheiro, para depois,
uma vez atingido o seu objetivo de eliminar o Requerente da sociedade, aplicar
novamente o dinheiro na empresa de Cambira.

Excelência, o Requerido, quando assumiu o controle da


empresa, de maneira fática, tendo em vista que os sócios de fachada são Jovaniva e
Haroldo, em pouco tempo quitou todas as dívidas com seus credores. A própria
execução em anexo comprova o pagamento de uma dessas dívidas.

É fato incontroverso que os sócios ingressantes que


figuram na segunda alteração contratual, Sra. Jovaniva Abreu de Amorim e Sr.
Haroldo Cyriaco da Silva, são sócios de “fachada” da empresa. Os autos de execução
em anexo comprova essa assertiva, tanto pela certidão da Oficiala de Justiça (fls. 176),
quanto pelo acordo (fls. 202/210) e pela procuração (fls. 200).

O Requerido está à frente dos negócios da empresa


Rações Nutrivale, admitindo que é sócio de fato no acordo celebrado nos autos acima
mencionado.

O Requerente não recebeu absolutamente nada no


Contrato Particular de Venda de Quotas de Sociedade, ao contrário, como dito, foi
coagido a assina-lo.

A empresa atualmente está consolidada no mercado de


rações, apresenta enorme lucratividade, suficiente para pagar os credores, os
12
funcionários, sem atraso. O Requerido, desde a época da assinatura dos contratos,
obtém sozinho o lucro que por direito seria metade do Requerente, tendo em vista a
sociedade que mantinham era em igualdade de quotas no capital social. Todo o
investimento do Requerente foi em vão, ou melhor, está sendo usado pelo Requerido
na empresa.

É evidente que o Requerido pretendia, de qualquer forma,


afastar o Requerente da sociedade, primeiro passou a desviar o patrimônio da
empresa para a sua pessoa física e para a construção da nova sede em Cambira,
depois, vendo que o Requerente insistia na continuação do negócio, pressionou-o a
dissolver a sociedade, através de ameaças de morte, terminando por coagi-lo a
assinar os negócios jurídicos que se pretende, nesta ação, anular.

Além da coação que viciou o consentimento do


Requerente, houve vício social em ambos os contratos, consistente em simulação,
visto que, na alteração, os sócios ingressantes, na prática, não adquiriram nada, pois
eram funcionários da empresa, não tendo a menor condição de comprar as quotas na
sociedade; no contrato particular de venda, o Requerente não recebeu nenhuma
importância pela venda de suas quotas.

Enfim, Excelências, são vários fatores que contribuem


para provar a verificação da existência do vício de consentimento da coação que
inquinou sobre os negócios jurídicos objetos desta ação, permitindo-se que seja
declarada a extinção daquelas relações jurídicas, cessando seus efeitos a partir da
sentença, e, em conseqüência dessa declaração, a criação de nova relação jurídica,
consistente na restituição do Requerente à condição de sócio da empresa Rações
Nutrivale Ltda, com metade das quotas do capital social, conforme eram de sua
propriedade até o momento que foi coagido a cede-las, ou, alternativa e
sucessivamente, que venha a possuir 50.000 (cinqüenta mil) quotas integralizadas no
capital social.

Não sendo este o entendimento de Vossa Excelência, o


que se admite apenas por argumentar, considerando não ser possível à restituição do
Requerente ao estado em que se achava, por ocasião dos negócios jurídicos
resultantes da coação havida, o Requerente deve ser indenizado pelo equivalente,
conforme autoriza o artigo 182 do Código Civil, em sua parte final.

2.1. Dos fundamentos legais

A presente ação anulatória foi ajuizada no prazo legal,


pois o prazo decadencial é de quatro anos (art. 178, I, CC).

Segundo conceito criado por Maria Helena Diniz, a ação


constitutiva “é a ação de conhecimento que tem por fim a criação, modificação ou a extinção
de uma relação jurídica, sem estatuir qualquer condenação do réu ao cumprimento de uma
prestação, produzindo efeitos ex tunc ou ex nunc. Por exemplo, são ações desse tipo as que

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visam anulação de um negócio jurídico, por apresentar vício de consentimento (erro, dolo ou
coação) ou vício social (simulação e fraude) [...]1.”

No que concerne a coação, diz o artigo 151 do Código


Civil:

“A coação, para viciar a declaração da vontade, há de ser tal que


incuta ao paciente fundado temor de dano iminente e
considerável à sua pessoa, à sua família, ou aos seus bens.”

Preceitua o artigo 152 do mesmo diploma legal:

“No apreciar da coação, ter-se-ão em conta o sexo, a idade, a


condição, a saúde, o temperamento do paciente e todas as demais
circunstâncias que possam influir na gravidade dela.”

É anulável o negócio jurídico por vício resultante da


coação (art. 171, do CC).

Ensina Maria Helena Diniz2 que “a nulidade relativa ou


anulabilidade refere-se, na lição de Clóvis Bevilacqu, “a negócios que se acham inquinados de
vício capaz de lhes determinar a ineficácia, mas que poderá ser eliminado, restabelecendo-se a
sua normalidade” (RT, 622:202; RJ, 189:82, 187:60 e 159:61)”.

E ainda que “serão anuláveis os negócios se: a) praticados por


pessoa relativamente incapaz CC, art. 4º; RT, 622:202, sem a devida assistência de seus
legítimos representantes legais (CC, art. 1.634, C); b) viciados por erro, dolo, coação, estado de
perigo, lesão ou fraude contra credores (RT, 466:95 e 464:97; CC, arts. 138 a 165); e c) a lei
assim o declarar, tendo em vista a situação particular em que se encontra determinada pessoa
(CC, art. 1.650)”.

Silvio Rodrigues3 leciona que o “[...] o negócio jurídico é o


ato de vontade que, por se conformar com os mandamentos da lei e a vocação do ordenamento
jurídico, confere ao agente os efeitos por ele almejados. Assim, se a manifestação volitiva
provier de agente capaz, tiver objeto lícito e obedecer à forma prescrita em lei, gera ela os
efeitos queridos pelas partes e alcança a proteção do Poder Publico. Dessa asserção decorre
que, se, pelo contrário, o ato vem inquinado de algum defeito, se desatende ao mandamento
legal ou se divorcia da finalidade social que o deve inspirar, deixa de produzir os efeitos
almejados pelas partes, pois ou não adquire validade, ou pode ser declarado ineficaz. [...] A
nulidade, portanto, consiste apenas nisso, ou seja, no reconhecimento da existência de um
vício que impede um ato de ter existência legal, ou de produzir efeito.”.

1
CALDAS, Gilberto. A técnica do direito. P. 190.
2
Código Civil Anotado, 9. ed. 2003, Editora Saraiva, São Paulo, p. 171.
3
Direito Civil – Parte Geral – vol. 1 – Editora Saraiva – 33 ed. atual. – 2003 – São Paulo – pp. 283/284.
14
Ainda segundo ele4, “é a coação o terceiro dos vícios do
consentimento. Já foi dito que o negócio jurídico tem por substrato a manifestação da vontade
humana. Mas, para que a vontade alcance os efeitos almejados, é mister que ela se externe
livre e consciente. Se não é consciente, por se inspirar num engano, espontâneo ou provocado,
o negócio pode ser anulado, por vicia-lo o erro ou o dolo; se o querer não se manifestou
livremente, o negócio pode ser desfeito, por vicia-lo a coação. [...] Coação, na definição de
Capitant, é toda pressão exercida sobre um indivíduo para determina-lo a concordar com um
ato. [...].

De fato, para que a figura da coação se componha, e seja capaz


de invalidar o ato jurídico, é mister:

a) que a ameaça seja causa do ato;


b) que ela seja grave;
c) que ela seja injusta;
d) que ela seja atual ou iminente;
e) que traga justo receio de um grave prejuízo;
f) que o prejuízo recaia sobre a pessoa ou os bens do paciente,
ou pessoa de sua família.

[...]

A coação deve ser a causa do ato – Para possibilitar a anulação


do negócio jurídico, a violência deve ser a causa do consentimento.

Quanto à gravidade da ameaça leciona ainda o eminente


doutrinador que5 “para que vicie a vontade do contratante, a coação dever ser grave. Vimos
que esse vício do querer se caracteriza mediante um processo psicológico de escolha. A vítima,
ante a violência que procede do outro contratante ou de terceiro, deve escolher entre os efeitos
do ato extorquido as conseqüências do ato ameaçado. Haverá coação se a ameaça provocar o
aparecimento de um temor que vicie sua vontade.”

Quanto à injustiça da ameaça 6 “mister se faz que o


constrangimento a que é submetido o paciente seja injusto”.

Quanto à atualidade ou iminência da ameaça 7, “a coação


para viciar o consentimento deve ser capaz de incutir no paciente o temor de um dano
iminente”.

Quanto à direção da ameaça esta 8, “pode visar à pessoa da


vítima ou aos seus bens, bem como a pessoa de sua família ou aos bens desta”.

4
Op. cit. p. 199 e ss.
5
Op. cit. p.203.
6
Op. cit. p.208.
7
Op. cit. p.210.
8
Op. cit. p.211.
15
“Anulado o negócio jurídico, restituir-se-ão as partes ao
estado em que antes dele se achavam, e, não sendo possível restituí-las, serão
indenizadas com o equivalente”. (Art. 182, do CC).

Maria Helena Diniz9 leciona que “Com a invalidação do ato


negocial ter-se-á a restituição das partes contratantes ao status quo ante, ou seja, ao estado em
se encontravam antes da efetivação do negócio. O pronunciamento da nulidade absoluta ou
relativa requer que as partes retornem ao estado anterior, como se o ato nunca tivesse
ocorrido”.

E continua: “se for impossível que os contratantes voltem ao


estado em que se achavam antes da efetivação negocial, por não mais existir a coisa ou por ser
inviável a reconstituição da situação jurídica, o lesado será indenizado com o equivalente”.

Nossos tribunais vêm assim decidindo:

Tribunal de Justiça de São Paulo

CONTRATO - Coação moral - Ameaça de exercício de


suposto direito para obtenção de vantagem ilícita - Vício
caracterizado - Ato anulado - Embargos rejeitados. Considera-
se coação capaz de anular negócio jurídico, a ameaça do
exercício de suposto direito para obtenção de recontratação
vantajosa e ilícita. (Embargos Infringentes n. 26.267-4 - São
Paulo - 2ª Câmara de Direito Privado - Relator: Cezar Peluso -
11.04.2000 - M. V.)

Tribunal de Justiça de São Paulo

EMENTA
ATO JURÍDICO - Anulação - Vício de consentimento -
Hipótese que o termo de transferência do veículo foi assinado em
branco, mediante agressão física e psicológica - Coação
comprovada - Ações cautelar e principal procedentes - Sentença
mantida - Recurso não provido. (Apelação Cível n. 56.027-4 -
São Paulo - 1ª Câmara de Direito Privado - Relator: Guimarães
e Souza - 02.09.97 - V. U.)

TACivSP - ATO JURÍDICO -- Defeito -- Coação -- Prática


sob fundado temor de danos à própria pessoa, à família e aos
bens -- Uso irregular das vias de direito para extorquir ruinosa
declaração de vontade -- Legitimidade das ameaças alegada
frente à prática de crimes de ordem pública pelo coagido --
Inadmissibilidade -- Abuso de direito evidenciador do vício de
9
Código Civil Anotado, 9. ed. 2003, Editora Saraiva, São Paulo, p. 176.
16
consentimento -- Ação de anulação procedente -- Aplicação do
art. 98 do CC. (Site Revista dos Tribunais).

Assim, não falta amparo legal para julgar procedente a


presente ação.

3. DOS PEDIDOS

DIANTE DO EXPOSTO, verificada e provada a


existência da coação, requer a Vossa Excelência se digne em julgar procedente a
presente ação, para o fim de anular, cessando seus efeitos, com eficácia ex nunc, os
seguintes negócios jurídicos: 1) Segunda Alteração de Contrato Social, datada de 09
de outubro de 2002, onde os sócios Aldair e Walter (Requerente e Requerido)
cederam e transferiram todas as suas cotas no capital social da empresa Rações
Nutrivale aos sócios ingressantes Jovanina Abreu de Amorim Rodrigues e Haroldo
Cyriaco da Silva; 2) Contrato Particular de Venda de Quotas de Sociedade, datado
de 24 de setembro de 2002, onde o Requerente cedeu ao Requerido suas cotas partes
no capital social da empresa Rações Nutrivale, no valor de R$ 50.000,00 (cinqüenta
mil reais), declarando a extinção dessas relações jurídicas, e por conseqüência criar
situação jurídica nova, determinando que, a partir da data da sentença, o Requerente
volte a figurar na condição de sócio da empresa Rações Nutrivale Ltda, restituindo-se
ao estado que antes delas se achava, dividindo, em igualdade de quotas, a
participação societária, ou, de maneira alternativa e sucessiva, passando a ter
novamente 50.000 (cinqüenta mil) quotas integralizadas no capital social.

Não sendo este o entendimento de Vossa Excelência, o


que se admite apenas por argumentar, considerando não ser possível à restituição do
Requerente ao estado em que se achava, por ocasião dos negócios jurídicos
resultantes da coação havida, requer a Vossa Excelência, de maneira alternativa e
sucessiva, seja o Requerido condenado ao pagamento de indenização pelo
equivalente, conforme autoriza o artigo 182 do Código Civil, em sua parte final.

4. DOS REQUERIMENTOS

Isto posto, requer a citação do Requerido, para contestar,


no prazo legal, a presente ação, sob pena de, não o fazendo, incorrer em revelia, bem
como aceitar como verdadeiros os fatos alegados neste petitório (artigo 319 do CPC).

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5. DAS PROVAS

Prova o alegado por todo o gênero de provas em direito


admitidas, em especial pelo depoimento pessoal do Réu, sob pena de confissão, pelos
documentos acostados e juntada de novos, se necessário, pela oitiva de testemunhas
e pela prova pericial.

6. DO VALOR DA CAUSA

Atribui à causa o valor de R$ 50.000,00 (cinqüenta mil


reais).

Nestes termos,
Pede deferimento.

Mandaguari, 05 de outubro de 2004.

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