Você está na página 1de 11

A MUNICIPALIZAÇÃO DO ENSINO E A DESCENTRALIZAÇÃO DA GESTÃO: A

EXPERIÊNCIA DE DOIS MUNICÍPIOS PARAENSES1

Francisca Guiomar Cruz da Silva – UFPA/PPGED


f.guiomar@uol.com.br2

Resumo: Este texto é resultado das discussões levantadas durante a realização de minha dissertação de
mestrado e da participação em pesquisa realizada pelo GEFIN, pesquisas que tem como objeto de
estudo a municipalização do ensino fundamental no Estado do Pará3. É traçada uma contextualização
das discussões sobre municipalização do ensino no Brasil, revisão de literatura a cerca da
municipalização e descentralização e discussão dos resultados da pesquisa de campo em dois
municípios paraenses que tiveram o ensino fundamental municipalizado focando a análise nas
implicações para a descentralização da gestão.
Palavras-chave: municipalização; descentralização; gestão da educação.

DESCENTRALIZAÇÃO E MUNICIPALIZAÇÃO: CONTEXTUALIZANDO

Descentralização e municipalização são construções sociais que tem permeado a


história de nossa educação, temos iniciativas educacionais de caráter descentralizante desde o
império como é o caso do Ato Adicional de 1834. Este Ato Adicional promoveu uma
descentralização na administração da instrução primária, transferindo a responsabilidade por
este nível de ensino do governo central para as províncias sem, contudo, efetivar uma
descentralização dos recursos financeiros.
No período republicano este debate se intensifica, inicialmente com a realização das
Conferências Brasileiras de Educação organizadas pela Associação Brasileira de Educação –
ABE4, que trazem para o terreno dos educadores profissionais a discussão em torno da
política educacional, lançando o Manifesto dos Pioneiros da Escola Nova5.
Os Pioneiros ressaltam no Manifesto, a importância da aplicação da doutrina
federativa e descentralizadora para uma melhor coordenação e eficiência. Estabelecem uma
diferença entre unidade e centralismo destacando o papel de coordenação e, supletivo a ser
assumido pela União como podemos constatar a seguir:

(...). Ao governo central, pelo Ministério da Educação, caberá agiar sobre a


obediência a esses princípios, fazendo executar as orientações e os rumos geraes da
funcção educacional, estabelecidos na carta constitucional e em leis ordinárias,
soccorrendo onde haja deficiência de meios, facilitando o intercambio pedagogico e
cultural dos Estados e intensificando por todas as fórmas as suas relações
espirituaes. (Idem)
O texto já vem indicando a importância de um regime de colaboração que envolva
aspectos pedagógicos, culturais e financeiros para a efetivação da descentralização e
colocando a União na coordenação da política.
Temos em Anísio Teixeira, um dos Pioneiros da Escola Nova, a expressão de uma
concepção de municipalização como defesa da importância da regionalização e da ação local
como se pode perceber neste seu texto escrito originalmente em 1957.

A descentralização, assim, contingência da nossa extensão territorial e de nosso


regime federativo e democrático, é hoje uma solução, além de racional e inteligente
– absolutamente segura. Tenhamos, pois, o elementar bom senso de confiar no País
e nos brasileiros, entregando-lhes a direção dos seus negócios e, sobretudo, da sua
mais cara instituição – a escola, cuja administração e cujo programa deve ser de
responsabilidade local, assistida e aconselhada tecnicamente pelos quadros estaduais
e federais. (Teixeira, 1994:65).

Ao longo de sua obra trata de descentralização como um problema político e não


meramente circunscrito ao âmbito educacional como destacamos a seguir:

A descentralização, pois – insisto e friso – é uma condição de governo democrático


e federativo. Não uma tese educacional, mas uma tese política, parecendo ser
impossível não reconhecê-la como ponto incontrovertido – de letra e de doutrina –
da Constituição, que estabelece, além do mais, a federação dos Estados e a
autonomia dos Municípios. (Teixeira, 1999: 407).

Anísio coloca a questão da descentralização em seu eixo político, discutindo a estrutura


federativa do Brasil que é fixada na própria Constituição Federal que, para ele, era clara ao
indicar uma organização descentralizada.
Após mais um período de centralização política, a ditadura militar que se inicia em
1964 e entra em declínio no final da década de 1970, as expectativas com a volta democracia
segundo Arretche (2002) incluem a articulação dos Estados e Municípios em busca de maior
autonomia e de descentralização. Sendo necessária uma reorganização institucional e a edição
de uma nova Constituição Federal era o instrumento legal mais apropriado.
Com a promulgação da Constituição Federal, em outubro de 1988, a Federação
Brasileira passa a ser composta por uma tríade - União, Estados e os Municípios - estes
últimos passam a ter o mesmo nível de autonomia relativa dos outros membros federados. No
aspecto educacional, a Constituição Federal também foi o grande marco, pois os diversos
setores se organizaram para ver suas idéias transformadas em Lei.
No contexto internacional, a partir da década de 1970, o sistema capitalista passa por
uma crise estrutural que atinge a economia, as relações de produção e se configura, também,
como crise do Estado provocando questionamentos ao Welfare State - Estado de Bem-Estar
Social. Em seu aspecto econômico, a crise atinge o Estado levando à sua reestruturação em
um movimento político e ideológico como nos coloca Silva (2003) neste trecho:

No campo político-ideológico, a crise econômica resultou numa ofensiva contra o


modelo de Estado de Bem-Estar Social, principalmente ao sistema de proteção
social, colocando novamente em discussão as relações do Estado com a economia.
(Silva, 2003:54).

No campo político e social, o neoliberalismo vem propondo uma série de reformas


para o Estado que, por meio do discurso do equilíbrio fiscal, da previdência e das contas
públicas apontam para a redução dos direitos trabalhistas com a reforma sindical, o fim da
universalização das políticas sociais com a supervalorização das políticas focais e o discurso
da equidade ao invés da igualdade.
É construído no Consenso de Washington6 um arcabouço político, econômico e social
que faz parte das estratégias de reestruturação do capitalismo com o apoio dos governos
Thatcher na Inglaterra e Reagan nos Estados Unidos. Com o FMI e o Banco Mundial usando
a adoção das medidas do Consenso como requisito para a concessão de empréstimos aos
países periféricos.
Com isso as medidas que fazem parte deste Consenso passam a ser usadas por vários
países como forma de estancar suas crises internas e conseguir apoio internacional. É o que
alguns autores como Gentili (2002) e Shiroma (2002) chamam de aplicação do receituário
neoliberal.
É no governo de Fernando Collor de Melo que as Reformas Neoliberais começam a
servir de modelo começando com o apelo ao discurso da ineficiência do setor público para
justificar demissões e remanejamentos e, a caça aos marajás como forma de moralizar a
administração pública e diminuir gastos. Mas é nos dois mandatos de Fernando Henrique
Cardoso que as reformas de cunho neoliberal se consolidam
Em seu primeiro mandato Fernando Henrique Cardoso cria o Ministério da
Administração e Reforma do Estado – MARE, comandado por Luis Carlos Bresser Pereira
para promover e coordenar a Reforma do Aparelho do Estado Brasileiro, que serviu como
instrumento de orientação legal e de divulgação da reestruturação pela qual o Estado
Brasileiro iria passar nos anos seguintes.
Esta reforma tem como principais diretrizes o ajuste fiscal, a redução do papel do
Estado, a racionalização dos recursos, a profissionalização do serviço público e a focalização
das políticas sociais. O documento do MARE tenta estabelecer uma diferença entre as
propostas do governo FHC e o neoliberalismo, contudo, partem da mesma avaliação que
existe uma crise do Estado que é uma crise fiscal e sua solução exige uma redução do
tamanho do Estado, desregulamentação e privatização.
Para Silva (2003) a reforma do Estado Brasileiro segue as orientações neoliberais não
havendo diferenças entre ambos já que privilegiam o mercado e há preponderância do privado
sobre o público. No campo educacional, as políticas do país têm suas origens nas discussões
dos Organismos Internacionais7 que estabelecem uma Agenda Mundial para a educação.
Agenda pautada na Conferência Mundial de Educação para Todos, realizada em
Jomtien/Tailândia em 1990 que define objetivos e metas para um período de dez anos, com
um diagnóstico de crise no setor educacional que impediria o desenvolvimento das nações e
inserção na nova realidade mundial de globalização da economia e inovações tecnológicas,
ao fim da Conferência é aprovada a Declaração Mundial sobre Educação para Todos.
A focalização e a descentralização, diretrizes que emergem do debate internacional,
passam a orientar a política educacional brasileira presentes tanto na Lei de nº 9394/96 - a
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - como na Emenda Constitucional de nº 14 e
na Lei de nº 9424/96 que criam e regulamentam o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento
do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério – FUNDEF.
A focalização da política educacional no ensino fundamental já se mostra bem
definida no texto da atual LDB quando esta etapa da educação básica vem sendo tratada como
o ensino obrigatório com gratuidade garantida de acordo com o previsto no art. 4º, inciso I. O
texto da LDB, no tocante a descentralização, tem conteúdo menos explícito.
No entanto, o Título IV da LDB que trata da organização da educação nacional, define
a existência e as competências dos sistemas educacionais podem nos levar a concluir que
estão dadas condições para uma descentralização político-administrativa. Isto porque vem
tratando de sistemas educacionais o que significa a coexistência de sistemas, podendo
representar maior descentralização.
No caso do FUNDEF, este assumiu o papel de indutor da municipalização8 por meio
do aspecto financeiro, ao colocar como critério de retirada de recursos do Fundo o número de
matrículas em cada rede de ensino. Outro aspecto é o caráter normativo deste Fundo, posto,
que como Emenda Constitucional e Lei Complementar o seu apelo à municipalização assume
ares de imposição legal.

DESCENTRALIZAÇÃO E MUNICIPALIZAÇÃO: REVISITANDO CONCEITOS


Como podemos observar nesta breve contextualização da temática da
descentralização/municipalização na educação brasileira esses construtos sociais sofrem
influências de seu momento histórico, da situação política, econômica e social e, por isso, têm
seus significados alterados como nos coloca Rosar:

A descentralização pode significar a possibilidade de aumentar a participação não


dos indivíduos em geral, mas de determinados indivíduos e grupos. Para certas
conjunturas pode ocorrer o deslocamento do poder do governo central para os
governos locais que permita garantir a hegemonia dos grupos que detém o seu
controle. Em outras situações pode ser deslocando-o de uma instituição centralizada
para outra também centralizada e, ainda, em outras circunstâncias, pode ocorrer
deslocá-lo do governo para o setor privado. (Rosar, 1997: 113).

Quando analisamos estes significados tão diversos da descentralização torna-se


patente que a descentralização tem uma abrangência maior que a municipalização que pode
ser uma de suas faces. Outra conclusão são os determinantes conjunturais nas várias formas
de manifestação prática da descentralização.
Para este estudo interessa a conjuntura que vem se configurando com a Constituição
Federal de 1988 quando há um processo de descentralização direta, via constitucional e um
processo que decorre dos ajustes legais e administrativos pós-Constituição que o Estado
Brasileiro vem passando a partir dos anos de 1990.
No caso das circunstâncias derivadas do processo constitucional para autores como
Souza (2005) e Almeida (2005) tornar o município um ente federativo, nas mesmas condições
da União e dos Estados, demonstra a proposição de uma descentralização via
municipalização.
Quanto às circunstâncias advindas das reformas do Estado vale ressaltar que a
descentralização é uma das diretrizes das indicações dos organismos multilaterais para a
reorganização do Estado e da educação. Portanto, contextos que condicionam as
aproximações teórico-conceituais de descentralização e municipalização, além de
condicionarem a ação prática da política educacional.
É necessário deixar claro de qual descentralização estamos falando e, por isso,
partimos de uma visão de descentralização que deve ser entendida não só como transferência
de responsabilidades e encargos do Poder Central para Estados, Municípios e Escolas, mas,
também, leve à reorganização política, financeira, administrativa e técnico-pedagógica dos
sistemas educacionais, com vistas ao atendimento educacional de qualidade, democratizando
as várias instâncias de gestão e fortalecendo o Poder Local − entendido como o poder dos
dirigentes, das instituições e entidades da sociedade civil e da população em geral.
Desta feita, a descentralização assume um caráter político, pois transfere efetivamente
o poder de decisão inclusive sobre a os recursos financeiros. Para isso, a relação de igualdade
entre os entes federados, instâncias ou sujeitos é fundamental para o exercício efetivo da
autonomia política e da descentralização político-administrativa.
Como nos alerta Azevedo (2002), Souza e Faria (2004) e Viriato (2004) nessa
discussão, importa chamar atenção para o conceito de desconcentração que, por vezes, é
identificado como sinônimo de descentralização, apesar de se caracterizar por uma
redistribuição interna de competências, como por exemplo, do Presidente para os Ministros,
do Prefeito para os Secretários. Portanto, tem caráter mais operacional do que político.
Além disso, a desconcentração caracteriza-se pela centralização da decisão e controle
de resultados, tal como ocorre no âmbito das políticas educacionais atualmente, nas quais o
Governo Federal estabelece as regras e promove a avaliação, deixando para Estados e
Municípios a execução administrativa e financeira.
A municipalização do ensino consiste no atendimento por parte do município da
demanda educacional, devendo estar fundamentada em um regime de colaboração de acordo
com o previsto no art. Da LDB, cooperação esta que envolve os aspectos técnicos-
pedagógicos e financeiros sem ,contudo, ferir a autonomia do município, no sentido do
fortalecimento da participação da população favorecendo a gestão democrática.
No tocante à municipalização da educação a literatura especializada no assunto aponta
dois processo básicos, um que se refere a expansão do atendimento das matrículas pelos
municípios e outro que é resultado da transferência de atendimento dessas matrículas por
parte dos Estados para os Municípios.
No Brasil esta segunda forma de municipalização vem se tornando mais frequente ou
pela redução da oferta de vagas por parte do Estado – caso do atendimento de educação
infantil – ou pela assinatura de convênios entre Estados e seus Municípios que é o caso no
ensino fundamental. Esta transferência pode envolver além dos alunos, os prédios e os
trabalhadores da área de educação.
Assim como a descentralização pode ser incompleta atingindo apenas o estágio da
desconcentração, os críticos da municipalização apontam um processo de prefeiturização que
caracterizaria uma municipalização na qual a descentralização de poder, a participação e a
gestão democrática deixam de ser as diretrizes fundamentais. A prefeiturização envolve uma
nova forma de centralização.

A MUNICIPALIZAÇÃO DO ENSINO EM DOIS MUNICÍPIOS PARAENSES


Inicialmente, destacamos o fato deste estudo ainda se encontrar em andamento, porém,
estamos trabalhando com elementos da pesquisa documental e algumas entrevistas para
tentarmos estabelecer as implicações que o Programa de Municipalização do Ensino
Fundamental no Pará vem trazendo para a gestão educacional dos municípios paraenses. Para
tal iremos trabalhar com dois municípios na perspectiva de descrever e analisar esta
experiência.
O Programa de Municipalização no Pará se fundamentou no capítulo da Educação da
Constituição do Estado do Pará, promulgada em 1989, e no Plano Estadual de Educação –
1995/1999 – no qual assume o caráter de Diretriz Básica para a melhoria do Ensino no Pará
(SEDUC, 1995: 34 e 35). Contudo, é com a criação do FUNDEF em 1996 e sua
implementação no Estado do Pará, em 1997, que este Programa atinge o seu auge.
No documento de orientação da Secretaria de Estado de Educação – SEDUC, o
Programa de Municipalização do Ensino é concebido como uma medida descentralizadora
que possibilitará a reafirmação do poder local, tendo em vista tratar-se de um instrumento de
mobilização e participação na busca de soluções para os problemas da educação. Portanto,
uma municipalização com viés democratizante. (SEDUC, 1996: 30,31).
Como já indicamos trabalharemos com dois municípios, Município A e Município B,
ambos localizados no Nordeste Paraense característica que os aproxima, mas, que, contudo
não garante homogeneidades entre suas realidades concretas. São municípios de porte
populacional e econômico diferenciados, diferença que se repete no atendimento ao ensino
fundamental que é o objeto da municipalização.
O município A possue mais de 100 mil habitantes, com receita própria de
1.671.760,88 e um com cêrca de 33 mil alunos no ensino fundamental9, sua adesão ao
Programa de Municpalização se deu em março de 1998 . Já o Município B possue pouco
mais de 52 mil habitantes, receita própria de 757.153,45 e um atendimento no ensino
fundamental de cêrca de 14 mil alunos, aderiu a municipalização em outubro de 2001.
Outra diferença importante entre os dois município está nas possiblidades de terem
pessoal qualificado no próprio município para assumir as ações educacionais. O Município A
conta com um campus da Universidade Federal do Pará/UFPA com mais de 15 anos de
atuação e com a oferta do curso de Pedagogia além de outras Licenciaturas.
O Município B possue um convênio com a Universidade do Estado do Pará/UEPA que
forma profissionais para atuarem na educação infantil e nas séries iniciais do ensino
fundamental, curso modular que enfrenta dificuldades na sua execução por conta da
inadimplencia da Prefeitura junto à UEPA.
Para essa fase do estudo trabalhamos como varáveis de uma gestão descentralizada, i)
a existência de sistema próprio de educação; ii) a criação e funcionamento do Conselho
Municipal de Educação ; iii) a elaboração de Plano Municipal de Educação e, iv) processo de
escolha de dirigentes escolares.
No tocante a existência de Sistema Municipal de Educação, o Município A possui
sistema próprio e o B naõ conseguiu elaborar legislação criando o seu sistema colocando-o
sob a tutela do Sistema Estadual de Educação. Quanto a existência e funcionamento do
Conselho Municipal de Educação o Município A já tem o seu desde 1996 e o Município B
ainda esta discutindo a sua criação.
Quando se trata do Plano Municipal de Educação, os dois municípios da amostra ainda
não o elaboraram, porém, o Município A já está em processo de discussão/elaboração. Já a
forma de escolha de Dirigentes de Escola distancia os dois municípios, no A a escolha se dá
por eleição e no Município B é indicação do Secretário Municipal de Educação e políticos
com base eleitoral naquela área.
Como podemos observar os dois municípios possuem realidades diversas o que
condiciona os limites e as possibilidades de uma municipalização que realmente expresse uma
descentralização em suas multiplas dimensões conferindo um caráter mais democrático a
gestão seja dos sistemas de ensino ou das unidades escolares.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O Programa de Municipalização do Ensino Fundamental no Estado do Pará não tem


conseguido alterar o quadro das desigualdades intra-regionais, pois os municípios continuam
exibindo as mesmas condições educacionais que possuíam antes de aderirem ao Programa.
Outra conseqüência que vem se delineando neste processo é o estabelecimento de relações
diretas União/Municípios sem a mediação dos Estados o que traz implicações para o pacto
federativo.
E esta relação mais direta entre a União e os Municípios se origina em um processo
que se caracteriza pela centralização da decisão sobre as políticas educacionais no Governo
Central e a execução dessas políticas ficando a cargo dos Governos Sub-Nacionais, neste caso
os municípios.
Outro elemento a ser considerado neste estudo é o fato de que não houve
reorganização dos Sistemas de Ensino - Estadual e Municipais- no sentido de concretizar um
regime de colaboração que ultrapassasse o campo das intenções e definisse medidas claras
quanto as competências de cada ente federado e ações de assessoria técnica e financeira aos
municípios para que ousassem na formulação de políticas educacionais próprias.
A falta de assessoria técnica e financeira aos municípios se reflete na quase total
ausência de formulação de políticas educacionais para atendimento de demandas locais e,
inovações pedagógicas que valorizassem a história e a cultura dos municípios. Por fim, se
destaca o fato de que o Programa de Municipalização não teve como requisito básico a
observância das condições político-administrativas e financeiras de cada município no
processo de discussão e assinatura dos Convênios de Municipalização.
Ressaltamos que estas são conclusões preliminares, pois a este texto ainda não foram
incorporadas as discussões resultantes da análise das implicações das relações de poder
políticas e econômicas, características do Estado do Pará, no processo de municipalização e
organização e funcionamento dos sistemas municipais de educação.

NOTAS

1
Este texto é resultado das discussões levantadas durante a realização de minha dissertação de mestrado, cujo
objeto de estudo é a municipalização do ensino fundamental no Estado do Pará sob a ótica da descentralização e
da pesquisa “Financiamento da Educação – Atendimento às Matrículas da Educação Básica e Capacidade de
Financiamento dos Municípios do Estado do Pará” realizada pelo Grupo de Estudos e Pesquisa em Gestão e
Financiamento da Educação-GEFIN e coordenada pela Professora Doutora Rosana Maria Oliveira Gemaque.
2
A autora é Professora da Universidade do Estado do Pará e aluna do Mestrado Acadêmico em Educação do
Centro de Educação da Universidade Federal do Pará, vinculada ao Grupo de Estudos e Pesquisa em Gestão e
Financiamento da Educação-GEFIN
3
A pesquisa citada tem o título de “Financiamento da Educação – Atendimento às Matrículas da Educação
Básica e Capacidade de Financiamento dos Municípios do Estado do Pará” realizada pelo Grupo de Estudos e
Pesquisa em Gestão e Financiamento da Educação-GEFIN e coordenada pela Professora Doutora Rosana Maria
Oliveira Gemaque.
4
A ABE é uma associação formada por educadores anônimos e, também, educadores famosos por terem estado
à frente das reformas educacionais dos Estados como na Bahia, Ceará, Distrito Federal e Minas Gerais nos anos
da década de 1920. Desta instituição participavam não só os signatários do Manifesto dos Pioneiros da Escola
Nova possuíam ampla participação de educadores católicos se constituindo, portanto, em um espaço de disputa
das idéias educacionais.
5
A Escola Nova era um ideário educacional de âmbito internacional, pois se inspirava na Educação Científica
considerando principalmente as bases da Psicologia e da Biologia, defendida por educadores do mundo todo,
destacando-se John Dewey nos Estado Unidos, Maria Montessori na Itália e Lubienska na França.
6
Esta expressão foi cunhada por John Williamson pesquisador norte-americano e engloba um conjunto de ações
e discursos, principalmente no campo da economia, adotados por governantes e intelectuais de diferentes países
como alternativas à crise do capitalismo mundial. Tendo como suporte institucional organismos multilaterais
como o FMI e o Banco Mundial.
7
Temos como patrocinadores desta Agenda Organismos Internacionais como o Banco Mundial, a Organização
das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura - UNESCO, o Fundo das Nações Unidas para a
Infância - UNICEF e o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento - PNUD
8
GEMAQUE (2004), já aponta em suas conclusões sobre o FUNDEF no Estado do Pará que a sua edição foi
um grande indutor do programa de municipalização do ensino, pois ele passa a ser usado como justificativa
legal, além do discurso que o aumento das matrículas iria trazer mais recursos para o município por meio do
novo Fundo.
9
Estes são dados levantados junto ao Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística/IBGE, Secretaria Executiva
de Estado de Educação/ SEDUC e Tribunal de Contas dos Municípios/ TCM.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALMEIDA, Maria Herminia Tavares. Recentralizando a federação? Revista de Sociologia Política.


Curitiba, nº 24, p. 29-40, jun. 2005.

ARRETCHE,Martha. Relações federativas nas políticas sociais. Revista Educação & Sociedade.
Campinas, v. 23, n° 80, 2002 – número especial.

AZEVEDO, Janete M. Lins de. A educação como política pública. Campinas, SP: Autores
Associados, 1997. (Coleção polêmicas do nosso tempo; v. 56).

BARRETO, Elba Siqueira de Sá & ARELARO, Lisete Regina Gomes. A municipalização do ensino
de 1º grau: tese controvertida. Em Aberto, Brasília, ano 5, n° 29, jan./mar. 1986.

BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil. 40ª ed. São Paulo: Saraiva 2007. -
(Coleção Saraiva de legislação).

BRASIL, Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado. Brasília: MARE, 1995.

GEMAQUE, Rosana Maria Oliveira. Financiamento da educação: o FUNDEF na educação do estado


do Pará – feitos e fetiches. Tese de Doutorado. USP, Faculdade de Educação. São Paulo, 2004.

GENTILI, Pablo A. A falsificação do consenso: simulacro e imposição na reforma educacional do


neoliberalismo. 3ª ed. Petópolis,RJ: Vozes,2002.

GHIRALDELLI JÚNIOR, Paulo. História da educação. São Paulo: Cortez, 1990. (coleção Magistério
– 2° grau. Série formação do professor).

PEREIRA, Luiz Carlos Bresser. A reforma do Estado dos anos 90: lógica e mecanismos de controle.
Brasília: Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado, 1997. (Cadernos MARE da
reforma do estado; v. 1).

PERONI, Vera Maria Vidal. Política educacional e papel do Estado: no Brasil dos anos 1990. São
Paulo: Xamã, 2003.

SALLUM JR. Brasílio. Metamoforses do Estado Brasileiro no final do século XX. Revista Brasileira
de Ciências Sociais, v. 18; nº 52; junho/2003.

SEDUC. Secretaria de Estado de Educação. Plano Estadual de Educação: 1995/1999. Belém/PA,


1995.

______. Municipalização do Ensino Fundamental no Estado do Pará. Série Planos e Projetos


Educacionais, n° 2, versão atualizada. Belém/, 1996.

SILVA, Ilse Gomes. Democracia e participação na “reforma” do estado. São Paulo: Cortez, 2003.
(Coleção Questões da Nossa Época; 103.

SILVA JÚNIOR, João dos Reis. Reforma do Estado e da educação no Brasil de FHC. São Paulo:
Xamã, 2002.

SHIROMA, Eneida Oto et all. Política educacional: o que voce precisa saber sobre. – 2ª ed. Rio de
Janeiro: DP & A, 2002.
SOUSA, Celina. Federalismo, desenho constitucional e instituições federativas no Brasil pós-1988.
Revista de Sociologia Política. Curitiba, nº 24, p. 29-40, jun. 2005.

SOUZA, Donaldo Bello de & FARIA, Lia Ciomar Macedo de. Reforma do Estado, descentralização e
municipalização do ensino no Brasil: a gestão política dos sistemas públicos de ensino pós-LDB
9.394/96. Revista Ensaio – avaliação de políticas públicas educacionais. Rio de Janeiro, v. 12, n° 45,
out./dez. 2004.

TEIXEIRA, Anísio. Educação não é privilégio. 6ª ed. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 1994.
(comentada por Marisa Cassim).

_______. Educação é um direito. 2ª ed. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 1996. (apresentação de Clarice
Nunes e posfácio de Marlos B. Mendes da Rocha).

VIRIATO, Edaguimar Orquizas. Descentralização e desconcentração como estratégia para redefinição


do espaço público. In LIMA, Antônio Bosco de (0rg.). Estado, políticas educacionais e gestão
compartilhada. São Paulo: Xamã, 2004.

Você também pode gostar