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Introdução

O presente trabalho surge no ambito de uma palestra sobre o impacto do novo formato
institucional do Estado, na consolidação da democracia e desenvolvimento rural, a qual
participamos na qualidade de estudantes, e nos fora incumbida a tarefa de fazer uma análise
crítica sob ponto de vista da adopção e eficácia do novo formato de governação. Portanto,
servimos desta, para inicialmente, trazer aspectos básicos como conceitos que compõem este
tema, uma breve contextualização deste modelo, seus objectivos, desafios e no fim, um olhar
critico.
Contextualização

A governação participativa surge como uma forma de renovação da democracia, promovendo o


diálogo entre os cidadãos e o Estado, através de diversos mecanismos de participação pública,
procurando reforçar a legitimidade do exercício do poder político e promover a accountability
pública (Bevir, 2010).

Deste modo, Tavares (2019), explica que a governação participativa pretende incentivar, através
de novas formas de participação política, uma intervenção mais activa dos cidadãos nas decisões
políticas, por forma a aumentar a representação dos mesmos, bem como o sentimento de eficácia
da participação popular. É, neste sentido, que mecanismos como o Orçamento Participativo têm
vindo a demonstrar potencial.

No contexto moçambicano, as discussões sobre a governação participativa, começam no


contexto da descentralização político-administrativa, onde o Estado procede ao processo de
criação de autarquias dotadas com autonomia financeira, administrativa e patrimonial. Neste
âmbito, Canhanga (2009), acrescenta que as práticas de Governação Participativa em
Moçambique têm sido apresentadas com objectivo de aperfeiçoar e consolidar a democracia e o
Estado de Direito democrático. O processo de descentralização remonta desde a década 90, com
a introdução do multipartidarismo. Em 1991 verifica-se a primeira reforma, através da PROL,
Programa de Reforma de Órgãos Locais, o qual podemos recorrer a lei n ͦ 3/84 de 13 de
Setembro, em matérias ligadas a criação de distritos municipais, porém não fora implementado
porque a constituição não previa a figura do poder local. Portanto, em 1996, com a lei n ͦ 9/96 de
22 de Novembro, a AR aprovou a teria supracitada.

Em 1998 foram realizadas as primeiras eleições autárquicas. Em 2004 traz-se uma nova ideia de
alguns termos como: governador de provincial, e não provincial, sendo este um órgão da
descentralização, pois goza de autonomia financeira e administrativa. Esta constituição traz
igualmente a figura do secretário de Estado, que não e uma figura da descentralização, mas sim,
da desconcentração, pois e dependente dos órgãos centrais (matéria esta que se pode encontrar
no artigo 141 da CRM).
2. Conceitos Básicos

Descentralização
De acordo com MASSALILA a *descentralização* é definida como sendo “a transferência ou
delegação da autoridade judicial ou política para efeitos de planeamento, tomada de decisão e
gestão de actividades públicas do governo central às suas agências, à organização no terreno de
tais agências, unidades subordinadas do governo, empresas públicas semi-autónomas ou
autoridades de desenvolvimento regional, governos autónomos ou organizações não
governamentais”.

No mesmo entendimento, MAZULA define a descentralização como sendo a criação de


entidades autónomas distintas do Estado ou paralelas a ele, no entanto, desaparece a hierarquia
administrativa, surgindo um relacionamento entre pessoas jurídicas diferentes, com atribuições e
responsabilidades jurídicas definidas por lei.

Nestes termos, a descentralização reveste-se como sendo uma situação na qual os poderes
político-administrativos e económicos deixam de ser controlados pelos órgãos do poder central,
passando para o controle dos governos locais.

Desenvolvimento
Desenvolvimento é referenciado pelos clássicos da corrente liberal e socialista como sinónimo
do crescimento económico. Por um lado, a abordagem da corrente liberal incide no princípio de
que o crescimento económico permite a melhoria da qualidade de vida individual e suporta o
contínuo progresso das sociedades, dos principais ideólogos desta corrente, destacam-se Adam
Smith, Jean-Baptiste Say, Thomas Robert Malthus e David Ricardo. Em contrapartida, a corrente
socialista que faz alusão sobre as classes laborais e outras formas de organização social e de
mercado, assenta na transformação da organização social de modo que:

a) o direito de propriedade seja fortemente limitado;


b) os principais recursos económicos estejam sob o controle das classes trabalhadoras;
c) a sua gestão tenha por objectivo promover a igualdade social, através da intervenção dos
poderes públicos. Entre os teóricos socialistas ocupam o lugar central Charles Fouriere,
Robert Owen e Karl Marx.

Com o propósito de identificar os elementos imprescindíveis para a abrangência da definição de


desenvolvimento, GOMEZ refere que o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento e
a Sociedade Internacional para o Desenvolvimento propuseram, em 1990, critérios ou
indicadores básicos a serem tomados em conta, assim sumariados: a garantia de uma actividade e
autonomia económica suficiente; o acesso a uma alimentação básica e serviços de saúde; a
preservação dos ecossistemas locais e recursos necessários para as gerações actuais e futuras; a
protecção das pessoas de qualquer tipo de violência (guerra, tortura, abusos, etc.); a salvaguarda
dos valores e das culturas de comunidades e grupos minoritários e; a garantia dos direitos
fundamentais de todos os cidadãos.

No entendimento dos critérios ou indicadores acima referenciados, a noção de desenvolvimento


subjaz na soberania (enquanto país) e autonomia (enquanto unidade territorial integrada num
país), desenvolvimento humano e sustentável, incluindo o respeito pela dignidade da pessoa
humana. No contexto actual, torna-se necessário estabelecer uma teoria integrada de
desenvolvimento socioeconómico e reexaminar a noção de desenvolvimento na perspectiva de
adequá-la a uma determinada realidade territorial.

Relação entre Descentralização e Desenvolvimento Local

A descentralização promove o desenvolvimento local, pode ser utilizada como uma estratégia de
democratização do sector público. Por meio das unidades descentralizadas, pode se estabelecer
canais de comunicação com a sociedade, além de serem utilizadas como referência em processos
de orçamentos participativos e servirem como um canal para implementar acções de carácter
intersectorial, por meio da dimensão de serviços. Neste caso, ela surge como uma estratégia de
governação que procura aproximar profissionais de diferentes sectores entre si, e estes com os
cidadãos.

A descentralização e o desenvolvimento local são processos distintos e relativamente


independentes, embora quase sempre interligados e complementares. A descentralização trata de
um aspecto político institucional que decorre de decisões restritas à forma de organização da
sociedade e da administração pública no trato das políticas e programas.

No período decorrido entre 1997 a 2008, os municípios registaram um crescimento de 33 para 43


municípios, o que representa um incremento de municipalização na ordem dos 7.6%. O
crescimento das autarquias, acima referenciado, tem um papel fundamental no processo de
governação participativa que se materializa com a capacidade de representar os interesses do
cidadão, integrando-o em programas de administração e desenvolvimento local, com vista a
solucionar os problemas comunitários.

No entanto, a descentralização pode contribuir significativamente para o desenvolvimento


económico local resultante, normalmente, de iniciativas e capacidades endógenas das populações
locais e municipais e suas instâncias político-administrativas.

Neste sentido, apesar de representar um movimento restrito e independente, a descentralização


pode representar uma base importante para estimular e facilitar o desenvolvimento local, criando
um aparato institucional que visa a organização e mobilização das energias sociais e decisões
autónomas da sociedade. A descentralização é, por isso, considerada uma força motriz para a
redução da pobreza, já que favorece a democracia, a participação popular, a receptividade, a
responsabilidade e a equidade a nível local.

A mitigação da pobreza é um dos objectivos mais urgentes do governo moçambicano a todos os


níveis. Porém, a correlação existente entre a descentralização e o desenvolvimento económico
local não é linear, isto é, opera-se pela conjugação dos diversos factores (políticos, económicos,
sociais e culturais) dentro dos quais se insere o exercício da actividade administrativa, pois este
sistema pode ser institucionalizado com o mero intuito de estabelecer uma autonomia político-
administrativa entre o governo central e os OLE, funcionando, os segundos, como “sucursais” ou
legítimos representantes das aspirações políticas prevalecentes no governo do dia. Pode se
verificar, nestas situações, uma descentralização parcial, na medida em que os governos locais
terão a capacidade de auto-regulação, mas continuarão financeiramente dependentes do governo
central, limitando-se, por conseguinte, a sua capacidade de prossecução dos interesses e
satisfação das necessidades específicas das comunidades locais.
No entanto, é opinião mais ou menos generalizada que uma maior mobilização de recursos
através das novas autarquias locais e uma participação mais alargada das comunidades locais
poderiam ajudar à melhoria da situação de pobreza.

Objectivos da Descentralização

 Organizar a participação do cidadão na solução dos problemas da sua comunidade;


 Promover o desenvolvimento local;
 Aprofundar e consolidar a democracia no quadro de unidade do Estado Moçambicano.

Visão:

 O Estado moçambicano pugna por uma governação participativa em que as comunidades


e outros actores locais contam com o poder da iniciativa e capacidades para o combate à
pobreza, promovendo o desenvolvimento económico, social e cultural.

Objectivo Geral da Política de Descentralização:

 A prática da descentralização visa explicitar e integrar, de forma mais sistematizada,


várias acções, no domínio da descentralização, no país. Neste sentido o PED visa orientar
as intervenções do Governo e demais actores para organização da participação dos
cidadãos na solução dos problemas próprios da sua comunidade, promover o
desenvolvimento local e melhorar a prestação de serviços ao cidadão, no quadro da
consolidação da unidade nacional.

Desafios
No entender de Gaventa (2012), a governação participativa é um mecanismo de inclusão da
população nas estruturas de tomada de decisão sobre as políticas públicas que permite
incrementar e fortalecer as capacidades de intervenção das camadas sociais mais desfavorecidas
e superar as estruturas políticas e de poder tradicionais.
Porém, apesar dos avanços registados no quadro governativo das autarquias locais, no que
concerne a participação para o engajamento activo dos cidadãos na governação municipal
democrática, inclusiva e transparente, Merklein (2010) aponta para a existência de exclusão dos
cidadãos em momentos importantes da tomada de decisão.

Um dos inconvenientes que se verifica na Governação Participativa é a fraca participação dos


cidadãos no processo de tomada de decisão, permitindo assim a tomada de decisões não
contextuais e fora das necessidades dos cidadãos. Daí, nota-se que a participação dos cidadãos no
processo decisório é um instrumento de extrema relevância e um indicador da boa governação
para o desenvolvimento local, em Moçambique, assim como noutros países (Gaventa, 2012). O
desenvolvimento social é condicionado por factores como a má governação, fraca participação
dos cidadãos nas acções governamentais.

Desta forma, como resultado destes factores é o fraco nível de desenvolvimento e tomada de
decisões à margem das necessidades colectivas. Em Moçambique, há persistência de problemas
sociais associados à exclusão dos cidadãos na tomada de decisões e na implementação das
políticas públicas, esta fraca participação está aliada à falta de prestação de conta aos cidadãos,
falta de transparência ou informação, contrariando assim a lógica da Governação Participativa
que é a relação pautada em diálogo transparente e aberto com acesso à informação, promoção da
justiça e desenvolvimento local (Nguenha, 2009:8).

Desafios que se colocam em relação ao Modelo Adoptado

 No distrito existem as seguintes entidades: primeiro, três órgãos que fazem parte dos
órgãos de governação descentralizada distrital, Administrador de Distrito, Assembleia
Distrital e o Conselho Executivo Distrital; segundo, um Representante do Estado;
terceiro, o Representante do Governador Provincial no Distrito, e quanto aos Distritos
com autarquias, mais três órgãos autárquicos, o Presidente do Conselho Autárquico, a
Assembleia Autárquica e a Assembleia Autárquica. Esta situação tem um grande
potencial de gerar conflitos negativos e positivos de competências, havendo necessidade
de uma boa articulação, colaboração, coordenação e cooperação.
 Ao nível dos órgãos representativos teremos Deputados da Assembleia da República,
Membros da Assembleia Provincial, Membros da Assembleia Distrital e Membros da
Assembleia
 Municipal, o que dita a necessidade de uma melhor clarificação do papel de cada um no
âmbito do exercício da função fiscalizadora e representativa, bem como as formas de
articulação, coordenação e cooperação, para que haja complementaridade e não
sobreposição na sua actuação.
 A existência dos vários órgãos vai significar uma sobrecarga no Orçamento do Estado e
naturalmente para o cidadão.
 Antevendo que por hipótese podem existir Governadores de Província, Administradores
de Distrito e Presidentes de Conselhos Autárquicos sem maioria na Assembleia, significa
que deverá haver muito diálogo, negociações, alianças para garantir a
governabilidade,pois caso os órgãos executivos não tenham o apoio das respectivas
assembleias, dificilmente poderão governar sem o suporte necessário da assembleia.

CRÍTICA
O nosso pacote de descentralização foi concebido com o objectivo de controlar recursos. O
partido maioritário sentindo-se ameaçada pelos outros partidos da oposição em ganharem as
eleições em outras regiões do país, onde os recursos minerais e naturais estão em abundância,
elaboraram este novo formato para colocar pessoas a controlar tais recursos. No entanto, a
governação local pressupõe a existência de 2 órgãos. Portanto, consideramos que neste novo
pacote, existirão órgãos que vão gozar das mesmas atribuições e competências. Estamos face a
um conjunto de órgãos a nível local que vão exercer as mesmas actividades, o que origina o
conflito de competências e atribuições. No entanto, este conflito pode ser visto em 2 sentidos.
1- Positivo: quando todos órgãos estão engajados na resolução de um único problema.
2- Negativo: onde podemos ver que muitos procuram omitir-se face a uma determinada
demanda, o que de certa forma vai condicionar o desenvolvimento e o avanço do formato
institucional.
Conclusão

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