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CURSO

DE
INTRODUÇÃO A
FÍSICA
NUCLEAR E DE
PARTÍCULAS
ELEMENTARES

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE


CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS E
TECNOLÓGICAS
DEPARTAMENTO DE FÍSICA

Prof. Susana de Souza Lalic

2013
CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

Aula 1
Estrutura nuclear: propriedades dos núcleos
Meta
Introduzir os conceitos sobre as propriedades nucleares

Objetivos

Ao final desta aula, você deverá ser capaz de:


• Reconhecer a importância da física nuclear na atualidade
• Contextualizar historicamente as descobertas científicas ligadas às
radiações.
• Reconhecer as propriedades do núcleo atômico:
• Raio
• Número de massa
• Volume
• Densidade

Pré-requisitos
Pegue uma tabela periódica ou um livro de química do ensino médio e deixe-os
próximo para alguma consulta básica, se necessário

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CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

Importância da Física Nuclear


Também já soube que alguém com câncer se submeteu a uma radioterapia e que se curou?
Também já viu que armas nucleares são extremamente poderosas e perigosas?
Você já foi a um museu de arqueologia? Já parou para pensar como é que eles sabem datar
aqueles esqueletos?
Quais os princípios físicos envolvidos nessas “coisas”?

No último século (XX) a física nuclear produziu efeitos arrebatadores sobre a humanidade:
benéficos e maléficos. Você seria capaz de discutir com alguém sobre esses efeitos. Teria
argumentos a favor ou contra baseados em conhecimento científico? OU simplesmente é
contra tudo o que for “NUCLEAR” por que pode matar, poluir etc.

Veja bem: A opinião ideal é aquela baseada, não em emoções, mas em dados técnicos.
Vamos começar nessa aula a mostrar a você do que se trata esse assunto para que você
possa opinar com mais segurança!

O átomo
Não é de hoje que as pessoas perguntam: "Do que o mundo é feito?"
As pessoas concluíram que a matéria que compõe o mundo é na verdade um conglomerado de
alguns blocos fundamentais de construção da natureza.
A palavra "fundamental" é a chave aqui. Entendemos por blocos fundamentais de construção
objetos que são simples e sem estrutura -- não são constituídos por nada menor.
Mesmo na Antiguidade, as pessoas procuravam organizar o mundo ao seu redor em
elementos fundamentais, como terra, ar, fogo e água.
O pensador grego Empédocles foi o primeiro a classificar
os elementos como fogo, ar, terra e água, embora nosso
diagrama seja em homenagem à classificação de
Aristóteles.

Hoje nós sabemos que há algo mais fundamental que


terra, água, ar e fogo...

Por definição há cor,


Por definição há doce,
Por definição há amargo,
Mas na realidade há átomos e espaço.
-Demócrito (c. 400 AC)
Por volta de 1900, as pessoas pensavam nos átomos
como bolas permeáveis com pequenas quantidades de
carga elétrica vibrando internamente.

Mas o átomo é fundamental?


As pessoas logo perceberam que poderiam classificar os átomos
em grupos que compartilham propriedades químicas similares
(como na Tabela Periódica dos Elementos). Isso indicava que os átomos eram simples blocos
de construção, e que esses blocos em diferentes combinações é que determinavam quais
átomos teriam quais propriedades químicas.

Além disso, experimentos que "olharam" o interior de um átomo usando sondas de partículas
indicaram que os átomos tinham estrutura e que não eram somente bolas permeáveis. Esses

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experimentos ajudaram os cientistas a determinar que os átomos têm um minúsculo núcleo


-
denso, positivo e uma nuvem de elétrons negativos (e ).
O termo "átomo" é uma expressão errada. Por que?
Em grego a palavra átomo ("atomon") significa "que não pode ser dividido". Mas as entidades
que nós chamamos de átomos são feitas de partículas mais fundamentais!

O átomo
No final do século XIX, o elétron já estava estabelecido como partícula fundamental,
principalmente depois de 1897, ano em que J. J. Thomson determinou a sua razão
carga/massa.
E já se sabia que elétrons eram liberados por emissão termoiônica (de um metal a alta
temperatura), no efeito fotoelétrico e no decaimento β de certos elementos radioativos.
Desse modo, os elétrons já eram considerados como constituintes básicos dos átomos.

Segundo o modelo atômico apresentado em 1904 por J. J. Thomson, o átomo deveria ser
constituído por algum tipo de fluido de forma esférica, com uma distribuição contínua de carga
positiva, e de elétrons com carga negativa distribuídos no fluido em número suficiente para que
a carga total do sistema fosse nula.
O modelo exigia dos elétrons que tivessem movimentos oscilatórios ao redor de certas
posições que definiriam configurações estáveis para o sistema.
E como, segundo a teoria eletromagnética clássica, qualquer partícula com carga elétrica
em movimento acelerado emite radiação eletromagnética, o modelo também exigia que os
modos normais das oscilações dos elétrons tivessem as mesmas frequências que aquelas
observadas associadas às raias dos espectros atômicos.
Contudo, segundo a teoria eletromagnética clássica, não pode existir qualquer configuração
estável num sistema de partículas carregadas se a única interação entre elas é de caráter
eletromagnético.
Além disso, não foi encontrada qualquer configuração para os elétrons de qualquer átomo
cujos modos normais tivessem qualquer uma das frequências esperadas.
De qualquer modo, o modelo de Thomson foi abandonado principalmente devido aos
resultados do experimento de Rutherford.

Experimento de Rutherford
Na época em que J. J. Thomson propôs seu modelo, H. Geiger e E. Marsden estudavam o
espalhamento de feixes bem colimados de partículas α, que já se sabia serem núcleos de
átomos de hélio, por finas folhas de ouro, pelo que hoje se conhece como o experimento de
Rutherford.

Uma fonte radioativa emite partículas α que são colimadas, formando um feixe paralelo e
estreito, que incide sobre uma folha metálica muito pouco espessa. Para que fosse possível

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construir tal folha, a maleabilidade do metal deveria ser grande e, por isso, era usado
normalmente o ouro.
A folha é tão fina que as partículas a atravessam completamente com apenas uma pequena
diminuição no módulo da velocidade. Ao atravessar a folha, entretanto, cada partícula α sofre
muitos desvios devido a sua interação eletrostática com as cargas positivas e negativas dos
átomos da folha.
As partículas espalhadas eram detectadas por um microscópio com uma tela de sulfeto de
zinco (ZnS).

A tela de sulfeto de zinco cintila no local onde incide uma partícula α. O microscópio
permite identificar a cintilação de cada partícula a individualmente.
Os resultados experimentais de Geiger e Marsden mostraram que o número de partículas α
que eram desviadas com ângulos maiores do que 90 graus era muito maior que o esperado
pelo modelo de Thomson.
Em 1911, E. Rutherford mostrou que os dados de Geiger e Marsden eram consistentes
com um modelo atômico em que a carga positiva do átomo se concentrava em uma pequena
região que, além disso, continha praticamente toda a massa do átomo, com os elétrons
espalhados ao redor dessa pequena região (chamada núcleo).

Experiência de Rutherford

Em 1911, Ernest
Rutherford realizou
experiências
bombardeando uma
finíssima lâmina de ouro
(10 - 4 mm de espessura)
com partículas alfa, cuja
ca rga elétrica é positiva
(2+), emitidas pelo
polônio, um material
radioativo .

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Ele tirou as seguinte s conclusões do experimento:


A maioria das partículas alfa atravessa a placa ⇒ No átomo há
grandes espaços vazios.
Algumas poucas partículas alfa foram rebatidas. ⇒ No centro do
átomo existe um núcleo muito pequeno e denso.
As partículas alfa, que possue m carga positiva, quando passavam
perto do núcleo, eram repelidas sofrendo desvio em sua trajetória
⇒ O núcleo do átomo tem carga positiva.

Rutherford admitiu que havia elétrons girando ao redor do


núcleo para equilibrar sua carga positiva.

Proposta de Rutherford: A estrutura de um átomo é semelhante à do


Sistema Solar

O Núcleo
O raio de um núcleo típico é cerca de dez mil vezes menor que o raio do átomo ao qual
pertence, mas contém mais de 99,9% da massa desse átomo.

Por parecer pequeno, sólido e denso, os cientistas pensaram originalmente


que o núcleo era fundamental. Mais tarde, descobriram que ele era feito de
prótons (p), que são carregados positivamente, e nêutrons (n), que não têm
carga.
E então, os prótons e os nêutrons são fundamentais?

Os físicos descobriram que os prótons e os nêutrons são compostos de


partículas ainda menores, chamadas quarks.
Até onde sabemos, os quarks são como os pontos na geometria. Eles não são compostos de
nada mais.
Depois de testar extensivamente essa teoria, os cientistas agora suspeitam que os quarks e o
elétron (e algumas outras coisas que veremos na segunda parte do curso) são fundamentais.

Características Gerais do Núcleo

Componentes
O núcleo atômico é composto de partículas chamadas núcleons. Existem duas espécies de
núcleons: os prótons, com carga elétrica positiva, e os nêutrons, sem carga elétrica. Prótons e
nêutrons têm spin ½ , ou seja, são férmions e obedecem ao princípio de exclusão de Pauli.
O núcleo do elemento da tabela periódica de número atômico Z é constituído de Z prótons e
N nêutrons. No átomo neutro correspondente, existem, ao redor desse núcleo, Z elétrons.
A = N + Z é o número de núcleons ou, como também é chamado, número de massa.

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Massa
As massas nucleares são convenientemente expressas em unidades de massa atômica (u).
Uma unidade de massa atômica é definida como sendo exatamente um doze avos da massa
de um átomo de carbono 12. Em outras palavras, a massa de um átomo de carbono 12 é, por
definição, exatamente 12 u. Em termos numéricos:
-27
1u = 1,6605 x 10 kg
-27
(O melhor valor de u aceito atualmente é 1 u = 1,66053886(28) x 10 )

A massa de um átomo de carbono 12 vale:


-27 -26
m(C) = 12 ( 1,6605 x 10 kg ) = 1,9926 x 10 kg
e esse valor inclui as massas dos prótons, nêutrons e elétrons. A massa de um elétron é:
-31
m(e) = 9,1093 x 10 kg
de modo que a massa dos 6 elétrons do átomo de carbono 12 é:
-31 -30
m(6e) = 6 ( 9,1093 x 10 kg ) = 5,46558 x 10 kg
Dessa forma:
-26 -30 3
m(C) / m(6e) = ( 1,9926 x 10 kg ) / (5,4656 x 10 kg) = 3,6457 x 10

Assim, a massa dos elétrons é desprezível comparada à massa do átomo e a massa do


átomo pode ser considerada igual à massa do núcleo atômico.
Em termos da unidade de massa atômica, as massas do próton e do nêutron são:
m(p) = 1,0078 u
m(n) = 1,0087 u

Por outro lado, com os valores:


8
c = 2,9979 x 10 m/s módulo da velocidade da luz no vácuo
12
1 J = 6,2415 x 10 MeV relação entre J e MeV
2
Da conhecida relação de Einstein entre massa e energia, E = mc
2 2 2 2
1 uc = 931,4815 MeV m(e)c = 0,5110 MeV m(p)c = 938,7471 MeV m(n)c = 939,5854 MeV

Tamanho do núcleo
Os elétrons estão em constante movimento em torno do núcleo; os
prótons e os nêutrons vibram dentro do núcleo e os quarks vibram
dentro dos prótons e nêutrons.
Esta figura está bastante distorcida.

F Se o núcleo tivesse o diâmetro


de ~1 cm, a eletrosfera teria o
diâmetro entre 100 m e 1 km
Átomo de
ouro Elétron mais
externo
5,31 km
Sol e
núcleo de
ouro com
Terra
raio de 30
cm Planeta mais
65,5 m
externo
Sistema
solar 2,57 km
Plutão

Se fossemos desenhar o átomo em escala e fizéssemos os prótons e nêutrons com um


centímetro de diâmetro, então os elétrons e quarks deveriam ter um diâmetro menor do que o
de um fio de cabelo e o diâmetro do átomo inteiro deveria ser maior que o comprimento de
trinta campos de futebol!

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Uma vez que praticamente toda a massa do átomo está


contida no núcleo (devido aos prótons e aos nêutrons) e
que essa enorme região chamada eletrosfera (que contém
os elétrons) praticamente não tem massa :
99,999999999999% do volume de um átomo
é apena s espaço vazio!
Ao mesmo tempo que um átomo é pequeno, o núcleo é dez mil vezes menor que o átomo, e os
quarks e elétrons são pelo menos dez vezes menores que eles. Não sabemos exatamente
-18
quão menores os quarks e elétrons são; eles são definitivamente menores que 10 metros, e
podem ser literalmente pontos, mas nós não sabemos com certeza.
Também é possível que os quarks e os elétrons não sejam fundamentais de fato, e
eventualmente acabem sendo constituídos de outras partículas mais fundamentais.
As técnicas mais importantes para a determinação do raio
nuclear são aquelas que incluem o espalhamento de
nêutrons e elétrons.

Como os nêutrons não têm carga elétrica, não são


influenciados pela interação coulombiana nem com os
nêutrons nem com os prótons do núcleo. Mas como são
influenciados pela interação nuclear tanto com os nêutrons
quanto com os prótons do núcleo, os nêutrons espalhados
sondam a distribuição de massa do núcleo.

Por outro lado, os elétrons não são influenciados pela


interação nuclear nem com os nêutrons nem com os prótons
do núcleo. Mas, como têm carga elétrica não nula, são
influenciados pela interação coulombiana com os prótons do
núcleo e sondam, assim, a distribuição de carga do
núcleo.

Raio Nuclear
O raio de um núcleo com número de massa A, suposto esférico, é dado, com precisão
considerável, por:
1
[1] R = r0 A 3

onde A é o número de massa (ou o número de núcleons); ro é um coeficiente empírico, o


mesmo para todos os núcleos, com ro = 1,4 fm para a distribuição de massa e ro = 1,2 fm para
a distribuição de carga. Aqui se usa como unidade de comprimento o fermi:
-15
1 fm = 10 m
Esses números indicam que a distribuição de massa nuclear avança um pouco além da
distribuição de carga.

Volume Nuclear
4 3 1
Como o volume de uma esfera é dado por V= πR , e R = r0 A 3
3

4
o volume do núcleo pode ser escrito por: [2] V = π r03 A
3
A expressão [2] mostra que o volume nuclear é proporcional ao número de núcleons. Assim, o
número de núcleons por unidade de volume é constante.

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Densidade Nuclear
M Au 3u
A densidade da matéria nuclear fica: [3] ρ= = =
V 4π r0 A / 3 4π r03
3

3 (1, 6605 ×10−27 kg )


Em números: ρ= 3
= 1, 4447 ×1017 kg / m3
4π (1, 4 ×10−15 m )
Portanto, a densidade de núcleons é constante. Ainda, o fator de proporcionalidade na
expressão [2] é o mesmo para todos os núcleos, de modo que a densidade de núcleons é a
mesma para todos os núcleos.

A massa de um próton é muito próxima da massa de um nêutron. Então, não apenas a


densidade de núcleons, mas também a densidade de massa é constante e tem o mesmo valor
para todos os núcleos.

E mais, como a interação nuclear forte é independente da carga elétrica, os prótons e os


nêutrons estão distribuídos mais ou menos uniformemente no núcleo e a densidade de carga
também é constante e tem o mesmo valor para todos os núcleos.
Na verdade, nos núcleos com número de massa A grande, a densidade de carga na região
central aparece diminuída devido à repulsão coulombiana entre os prótons.
Um núcleo não tem, evidentemente, um raio exatamente definido como se poderia inferir da
expressão acima, nem uma densidade constante no interior da esfera definida por esse raio.
Na verdade, a densidade nuclear diminui até zero dentro de um intervalo radial cujo centro é
dado pela expressão mencionada.

Por exemplo, para as


distribuições de carga e de
massa do carbono 12:
1/3
Rc(C) =1,2 (12) fm 2,7 fm
1/3
Rm(C) =1,4 (12) fm 3,2 fm

e do cobalto 59:
1/3
Rc(Co) =1,2 (59) fm 4,6 fm
1/3
Rm(Co)=1,4 (59) fm 5,4 fm

Assim, a uma distância do


centro do núcleo de 2,7 fm
para o carbono 12 e de 4,6 fm
para o cobalto 59, a
densidade de carga tem a
metade do valor que atinge
na região central.

As formas de alguns núcleos afastam-se significativamente da forma esférica e


devem ser consideradas elipsoidais ou, mesmo, com a forma de uma pêra.

Exercício
O tipo mais comum de núcleo de ferro tem número de massa igual a 56. Calcule o raio, a
massa aproximada e a densidade aproximada desse núcleo.
Solução:
Utilizaremos duas idéias principais: o raio e a massa de um núcleo dependem do número de
massa A e a densidade é massa dividida pelo volume.
1/3 -15 1/3 -15
Usando a eq.[1] R = ro A = (1,2 x 10 m) (56) = 4,6 x 10 m = 4,6 fm

Como A = 56, a massa do núcleo é aproximadamente 56u


-27 -26
m ≅ (56 x 1,6605 x 10 kg ) ≅ 9,3 x 10 kg

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4 3 4 -15 -43 3
O volume é V= πR = π(4,6 x 10 m)= 4,1 x 10 m
3 3

E a densidade é aproximadamente ρ=m/V=

9,3 ×10−26 kg
−43 3
= 2,3 ×1017 kg / m3
4,1×10 m
3
Avaliação: a densidade do ferro sólido é cerca de 7000 kg/m . Logo verificamos que a
13
densidade do núcleo é mais que 10 vezes maior do que a densidade da matéria comum. Um
11
cubo com 1 cm de aresta com essa densidade teria a massa de 2,3 x 10 kg (230 milhões de
toneladas!). Densidades dessa ordem ocorrem no interior de uma estrela de nêutrons.

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Aula 2
Nuclídeos e isótopos; Spin Nuclear
Meta
Introduzir os conceitos sobre Spin Nuclear

Objetivos

Ao final desta aula, você deverá ser capaz de:


• Diferenciar características de isótopos, isóbaros e isótonos
• Representar corretamente um nuclídeo
• Identificar o spin nuclear
• Identificar momento magnético nuclear
• Compreender as bases da ressonância magnética nuclear

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Introdução
Vimos na primeira aula algumas características gerais dos núcleos.
Tamanho: aproximação por uma esfera - mas o núcleo não é uma esfera com superfície bem
definida. O raio encontrado nos dá a ordem de grandeza da localização da concentração dos
núcleons na maior parte do tempo. Alguns núcleos também podem ter formas muito diferentes
de esferas.
Massa: em geral as massas apresentadas nas tabelas correspondem ao átomo neutro (com
todos os elétrons), pois é muito difícil medir a massa apenas do núcleo. Note que se você
verificar as massas atômicas são menores do que a soma das massas das suas partes (Z
prótons, N nêutrons e Z elétrons). Na próxima aula isso será explicado.
Volume: O volume do núcleo é proporcional ao número de núcleons, o que sugere que os
núcleons estão dispostos juntos à distâncias médias fixas independentemente do número de
partículas.
3
O volume por núcleon é constante para qualquer núcleo (V/A= 4/3 π ro )
Densidade: a densidade nuclear é extremamente alta, com a compactação da matéria no
núcleo, o que implica que o espaço é essencialmente vazio.

Vamos continuar nessa aula com algumas outras características do núcleo atômico.

Átomos e elemento químico


O número atômico (Z)
• Até hoje são conhecidos 110 tipos diferentes de átomos
que, combinados entre si das mais diversas maneiras, vão
dar origem a todo tipo de matéria existente.
• Átomos de mesmo tipo são aqueles que possuem o mesmo
número de prótons (o número de nêutrons e o número de
elétrons não precisa ser o mesmo).
• Como o número de prótons define a espécie de átomo, ele
passou a ser denomina do número atômico.

Elemento químico é um conjunto de átomos com o mesmo


número atômico.
Exemplos:
Hidrogênio-- conjunto de átomos que possuem 1 próton.
Oxigênio-- conjunto de átomos que possuem 8 prótons.
Carbono-- conjunto de átomos que possuem 6 prótons.

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Número de massa
Denominamos o número total de núcleons (prótons e nêutrons) de um átomo de
número de massa, que é simbolizado por A.
É importante perceber que o número de massa A não é uma massa:
O número de massa A é um número inteiro que representa o total de partículas
(prótons e nêutrons) do núcleo de um átomo.
A = p+n ou A = Z+n
Exemplo:
Considerando-se um átomo que possua 11 prótons, 12 nêutrons e 11 elétrons,
seu número atômico Z será 11 (Z = p)
e seu número de massa A será 23
A = Z + n = 11+ 12 = 23

Símbolos dos elementos


químicos
• Cada elemento químico é representado por um símbolo, de
acordo com a IUPAC (International Union of Pure and
Applied Chemistry)

• O símbolo representa 1 átomo do ele mento químico.


Quando queremos representar um número maior de
átomos, colocamos esse número na frente do símbolo.
Exemplo:
H -- representa 1 átomo de hidrogênio.
2 H -- representa 2 átomos de hidrogênio .
Já vimos que os constituintes básicos do núcleo são o próton e o nêutron. Quando o átomo
está neutro, deve haver um elétron circundando o núcleo para cada próton. A estrutura
eletrônica do átomo, responsável pelas suas propriedades químicas é determinada pela carga
Z.e do núcleo.

Representação dos elementos

X é o símbolo químico do elemento


Z é o número atômico
A é o número de massa

Por exemplo, o núcleo de oxigênio com número de massa 17 é representado por


17
8 O ou
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O ou O-17
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O número atômico (Z) é o mesmo que o número de prótons no núcleo: ele


identifica um elemento químico, comandando seu comportamento em
relação aos outros elementos. Z pode ser omitido na representação do
nuclídeo, já que o símbolo do elemento químico já representa o valor de Z.

O número de massa (A) é a soma do número de prótons e de nêutrons


presentes no núcleo.

O número de nêutrons N não precisa ser representado porque N = A - Z.

Elementos químicos naturais e artificiais


Dos 110 elementos químicos conhecidos, 20 são artificiais:
• o tecnécio (Tc) Z= 43;
• o promécio (Pm) Z= 61;
• todos os elementos com número atômico maior que 92, isto é:
do neptúnio (Np) Z= 93 em diante.

Isótopos - Isóbaros - Isômeros -


Isótopos - são núcleos associados ao mesmo elemento da tabela periódica (mesmo Z), mas
com diferentes números de nêutrons. Como o responsável pelas propriedades químicas é
apenas o número atômico, os elementos formados por diferentes isótopos basicamente agem
quimicamente de maneira idêntica. Entretanto, os diferentes isótopos geralmente apresentam
propriedades físicas diferentes, tais como temperatura de fusão e de vaporização e taxas de
difusão. Átomos de um mesmo elemento químico com massas diferentes são
denominados isótopos. (mesmo Z, diferente N)

Exemplo: O hidrogênio tem 3 isótopos:

Por exemplo, ao elemento hidrogênio (Z = 1) estão associados isótopos com N = 0, N = 1


(deutério) e N = 2 (trítio), referidos, também, pelo número de massa: hidrogênio 1, hidrogênio 2
e hidrogênio 3. Esse é o único caso em que os isótopos recebem nomes distintos, sem citar o
número de massa. Todos os outros casos, diz-se o nome do elemento e o número de massa
para se referir ao devido isótopo.
Aos 112 elementos conhecidos estão associados uns 270 isótopos estáveis e mais de 2.000
instáveis.

Isóbaros - Isóbaros são núcleos associados a elementos diferentes da tabela periódica, mas
com iguais números de massa. Por exemplo, os núcleos berílio-10 (Z = 4, N = 6), boro-10 (Z =
5,N = 5) e carbono-10 (Z = 6, N = 4) são núcleos isóbaros. (mesmo A)

Isótonos - Isóbaros são núcleos associados a elementos diferentes da tabela


periódica mas com mesmo número de nêutrons. (mesmo N)

Isômeros - núcleos num estado excitado com um tempo de decaimento longo (estado
99m 99
isomérico) - núcleo não estável. Ex: radioisótopo usado na medicina Tc e seu isômero Tc.

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Nuclídeos
Um nuclídeo é um determinado núcleo com valores definidos de Z e N
A tabela periódica é pouco útil quando se trata de núcleos. Usa-se a carta de
nuclídeos, que mostra todos os núcleos estáveis e radioativos. Pode-se
facilmente visualizar os isótopos, isóbaros e isótonos.

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Momento Angular

Tal como no caso dos elétrons, também o P e N são partículas com spin e momento angular.
Isso vai gerar um momento angular no núcleo. Por razões históricas, o momento angular total
do núcleo é chamado de
spin nuclear (I), que é um número quântico.
OBS: Apesar de ser chamado de spin nuclear, I não implica que o núcleo esteja em rotação
como um sólido.

Lembrando que P e N são férmions:


ur
P e N possuem spin 1/2 (S )
ur
momento angular orbital ( L ), associado ao seu movimento no núcleo.

ur
O módulo do momento angular de spin S dos núcleons é:
ur ur
S = h s ( s + 1) S = h 1 ( 1 + 1) = h 3
2 2 4
Seu componente z é:

S z = ms h Sz = ± h
2

r ur
Lembrando que para 2 vetores s e L

r ur
O momento angular orbital total do núcleo (I) é uma combinação adequada dos s e L de
todos os núcleons.

r
I = h I ( I + 1)

A componente de I no eixo z

I z = mI h com mI = ± I , ±( I − 1),..., ± 1 ou 0 para I inteiro ou semi-inteiro


2

Portanto há 2I+1 orientações possíveis de I com valores de 0 até 7

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Como o spin dos núcleons é 1/2:


quando o número total de núcleons (A) é par I é inteiro
ímpar I é semi-inteiro

Resultados experimentais mostram que:


• Todos os núcleos em que Z e N são par (núcleo par-par): I = 0
núcleons idênticos tendem a acoplar seus momentos angulares
em direções opostas: “efeito de emparelhamento”

• Núcleos par-ímpar: I = semi-inteiro


Supõe-se que o spin nuclear coincide com o momento angular do
núcleon desemparelhado (válido para muitos casos).

• Núcleos ímpar-ímpar: I = inteiro (pois A é par)


há dois núcleons desemparelhados, mais é difícil predizer o
resultado experimental
Supõe-se que o spin nuclear coincide com o momento angular do
núcleon desemparelhado (válido para muitos casos).

Portanto, a teoria sobre a Força Nuclear deve contemplar esses valores experimentais de I.

Níveis de Energia / Spin


• quantizados
• determinados através de reações nucleares conhecidas
• ordem de grandeza: MeV
• modelo de poço infinito: estado mais baixo 2p e 2n
(princípio de exclusão de Pauli)
• spin nuclear: momento angular nuclear intrínseco
• prótons e nêutrons: número quântico de spin ½
• núcleos com número par de prótons e nêutrons tem spin nuclear nulo
• momento magnético nuclear intrínseco associado ao spin nuclear

Momento magnético
Basicamente, as contribuições do sistema a qualquer momento magnético pode provir de dois
tipos de fontes:
(1) movimento de cargas elétricas e
(2) o magnetismo intrínseco de partículas elementares, tais como o elétron.

O momento magnético líquido de qualquer sistema é um vetor soma das contribuições de um


ou ambos os tipos de fontes.

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CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

uur
A carga em movimento possui momento magnético orbital ML

uur q ur
ML = L
2m
Para prótons q = +e , então:
uur e ur
ML = L
2mp

uur ur
M L tem mesma direção de L
uur
Nêutrons não têm carga elétrica e, portanto, não têm M L

Para facilitar a compreensão, vamos lembrar o caso dos elétrons:


eh
Existe uma unidade natural de momento magnético µB = (magnéton de Bohr).
2me
Verifica-se que o módulo da componente z do momento magnético de spin do elétron é:

µsz ≈ µB
eV J
µB = 5, 788.10−5 = 9, 274.10−24
T T

Voltando ao núcleo: associado ao momento angular nuclear, existe um momento magnético


nuclear.
Para discussão sobre momento magnético nuclear, vamos definir uma grandeza análoga ao

magnéton de Bohr, o magnéton nuclear ( µn )


eh
µn = = 5,05079 ⋅10−27 J = 3,15245 ⋅10−8 eV
2mp T T

Como m p = 1836me e, portanto, o magnéton nuclear é 1836 vezes menor que o magnéton de
Bohr, podíamos esperar que

µsz = µn ERRADO!!
próton

O CORRETO: µsz próton


= 2,7928µn
E mais surpreendente, o nêutron possui momento magnético diferente de zero:

µsz nêutron = 1,9130µn

Isso indica que ele não é uma partícula elementar, pois não carrega carga líquida, mas ainda
sim interage com um campo magnético.

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CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

ur ur
O P tem carga +e µ próton é paralelo e de mesmo sentido que S próton
ur ur
O N não tem carga µ nêutron é antiparalelo a S nêutron
⇒ (o N se comporta como uma carga negativa)

O núcleo tem momento magnético da ordem de alguns µn


ur
Se colocarmos o núcleo em um campo B externo, surge a energia de interação:
ur ur
U = −µ ⋅ B = −µz B
Como os µz são quantizados, muitos níveis de energia surgem da interação.

Exercício
Os prótons estão submetidos a um campo magnético orientado ao longo do eixo Oz com
módulo igual a 2,30 T. a) Qual é a diferença de energia entre um estado no qual o momento
magnético de spin é orientado em sentido contrário ao do campo magnético? b) Um próton
pode sofrer uma transição entre um desses estados para o outro emitindo ou absorvendo um
fóton, cuja energia é igual à diferença de energia entre esses dois estados. Calcule a
frequência e o comprimento de onda de tal fóton.

Solução:
ur ur
a) Quando os componentes z de µ e S estão orientados no mesmo sentido do campo
magnético, a energia de interação é dada por  
eV
U = − µ z B = −(2, 7928)(3,152 ×10 −8 )(2,30T )
T
= −2, 025 ×10−7 eV
Quando eles possuem sentidos contrários aos do campo
magnético, a energia é:
-7
+2,025 × 10 eV
e a diferença de energia entre os dois estados é dada por

ΔE = 2(2,025 ×10−7 eV ) = 4,05 ×10−7 eV

b) A frequência e o comprimento de onda do fóton com energia correspondente são

ΔE 4, 05 ×10−7 eV
f = = −15
= 9, 79 ×107 Hz = 97,9 MHz
h 4,136 ×10 eV .s
c 3, 00 ×108 m / s
λ= = = 3, 06m
f 9, 79 ×107 s −1
Essa frequência está no meio da banda FM de rádio.

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CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

Quando uma amostra de H é colocada na presença de um campo magnético de 2,30 T e a


seguir irradiada com ondas eletromagnéticas com essa frequência, a inversão dos spins
dos prótons pode ser detectada pela absorção da energia da radiação.

- Irradiando os núcleos com fótons de energia


DE, parte deste núcleos é induzida a fazer uma
transição para o estado de energia mais alta
(inversão de spin) Absorção Ressonante
momento magnético é invertido
Ressonância Magnética
- A frequência na qual ocorre a inversão de
spin é dada por:
hf = ΔE = 2µ z B
- Depois que ocorre esta inversão, alguns prótons podem decair para o estado de menor

energia, e emitir fótons com a mesma energia que o fóton original -  em geral temos mais
prótons no estado de mais baixa energia, o que significa que o material absorve energia.

Ressonância Magnética Nuclear (RMN)


A inversão dos spins decorre do fenômeno chamado de ressonância magnética nuclear
(NMR). Uma aplicação disso possibilita a obtenção de uma imagem por ressonância
magnética (MRI), que discrimina diversos tipos de tecidos do corpo humano com base nos
diferentes ambientes dos prótons de cada tecido. Aplica-se um campo externo - diferenças
em campos locais são detectadas e processadas para dar origem a uma imagem.

- Para se manter a ressonância


magnética, pode-se manter fixa a
frequência (fótons incidentes) e
variar o Bext até conseguir a
inversão de spin = pico de
absorção (ou emissão).

Campos magnéticos: da ordem de 1 a 20 T


-4
(campo magnético da Terra da ordem de 10 T)

Frequências (radio frequências - RF): da ordem


de MHz, variando de 20 a 900 MHz, dependendo
da intensidade do campo magnético e do núcleo
a ser estudado.

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CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

O momento magnético de um núcleo é também uma fonte de campo magnético. Num


átomo, a interação entre o momento magnético do elétron e o campo magnético produzido
pelo núcleo produz desdobramentos adicionais nos níveis de energia dos átomos e nos
espectros atômicos, constituindo a estrutura hiperfina, usada para determinação direta do
spin do núcleo.

Conclusão:
O sistema nuclear é um sistema físico complexo composto de núcleons, ou seja, prótons e
nêutrons. As propriedades da mecânica quântica dos núcleons incluem o spin entre outros.
Desde momento magnético do núcleo depende do spin de cada núcleon individual, podem-se
verificar estas propriedades com medições dos momentos nucleares, mais especificamente, o
momento de dipolo magnético nuclear.
A maioria dos núcleos comuns existe em seu estado fundamental, embora alguns núcleos de
isótopos tenham vida longa em estados excitados. Cada estado energético de um núcleo de
um determinado isótopo é caracterizado por um momento de dipolo magnético bem definido,
sua magnitude é um número fixo, frequentemente medido experimentalmente com grande
precisão. Este número é muito sensível às contribuições individuais dos núcleons, e uma
medida ou previsão de seu valor pode revelar informações importantes sobre a função de onda
nuclear. Existem vários modelos teóricos que predizem o valor do momento de dipolo
magnético e um número de técnicas experimentais visando à realização de medições nos
núcleos ao longo da tabela de nuclídeos.

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CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

Aula 3 Energia de Ligação Nuclear


Meta
Compreender como a energia de ligação nuclear de um núcleo depende do
número de núcleons que ele contém

Objetivos

Ao final desta aula, você deverá ser capaz de:


• Calcular a energia de ligação de um nuclídeo
• Calcular a energia liberada em uma fissão e em uma fusão nuclear
• Identificar se uma reação nuclear é espontânea ou não
• Identificar núcleos favoráveis a fusão nuclear e os favoráveis a fissão
nuclear

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Introdução: Massa do átomo


• A massa do átomo deveria ser, a
princípio, a soma das massas
das partículas que o compõem.
Mas isso não é verdadeiro.
Quando prótons e nêutrons se
reúnem para formar um núcleo, W = massa das partículas
separadas
ocorre uma perda de massa γ = massa das partículas
que é transformada em juntas
energia.
Descobriu - se que e ssa energia é utilizada para manter
juntos os prótons e os nêutrons.

Energia de Ligação Nuclear


2
Da relação E = mc , que Einstein demonstrou em 1905 e que já está verificada por um grande
número de experimentos, sabemos que se um dado sistema ganha certa quantidade de
2
energia E, sua massa aumenta de uma quantidade dada por E/c , e inversamente, se um dado
sistema perde certa quantidade de energia E, sua massa fica diminuída de uma quantidade
2
dada por E/c . Aqui, c representa o módulo da velocidade da luz no vácuo.

Medidas experimentais comprovam que a massa total de repouso do núcleos é maior


massa dos seus núcleons separados.

A diferença de massa é chamada perda de massa ( Δ m )

Por que os n ú cleons se unem em um núcleo?


núcleo?
Porque nesse estado eles têm menor energia!
energia!
energia de
+
ligação

2 -27 8 2 12 2
1uc =(1,6605 x 10 kg) x (2,9979 x 10 ) 1J = 6,2415 x 10 MeV 1u=931,4 MeV/c

Einstein: E=mc 2 -- > a massa e a e nergia são duas formas


duas formas
da mesma entidade Diferença de massas:
massas:

Δ m=0,0304 u

Energia de liga ç ã o:
liga ç ã o:

2
E= Δ mc 2 = 28,3 MeV
MeV

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2
Considere o dêuterons (ou d), o núcleo do 1 H , formado por 1 próton e 1 nêutron.

A energia total das partículas separadas (em repouso) será dada pela energia de suas massas:
2 2 2
E = mp . c + mn . c = (mp + mn) c

Mas se as partículas se aproximam suficientemente para formar o dêuteron, qual será


sua massa?

Seja Ep a energia potencial nuclear. Os núcleons se movem ao redor de seu centro de massa,
portanto têm energia cinética Ek

A energia total do sistema formado é:


2
E´= (mp + mn) c + Ep + Ek

As forças nucleares são atrativas e, portanto, o zero da Ep está no infinito. Assim, Ep na


equação tem sinal negativo.

Como o dêuteron é um sistema estável ⇒ Ep > Ek . Portanto

(Ep + Ek) < 0

Assim, a energia do núcleo ligado (E´) é menor do que energia das partículas separadas (E)
E´< E

Portanto, para separarmos o nêutron e o próton do núcleo de dêuteron, deve-se aplicar energia
correspondente a

(E´- E) = Eb

Dado um núcleo qualquer, a energia liberada quando da sua formação a partir dos seus
prótons e nêutrons separados de uma distância infinita, ou a energia que deve ser fornecida a
esse núcleo para separar seus prótons e nêutrons de uma distância infinita é o que se chama
de energia de ligação (Eb) de tal núcleo.

• Eb é liberada quando o sistema se forma

• Eb é energia necessária para separar todos os núcleons

Então, sendo Eb a energia de ligação de um núcleo com Z prótons e ( A − Z ) nêutrons, de


massa M(Z,A), pode-se escrever:
2
[Z mp + ( A − Z ) mn - M(Z,A)] c = Eb
2
Ou Z mp + ( A − Z ) mn = M(Z,A) + Eb / c

onde mp e mn são, respectivamente, as massas do próton e do nêutron. Daí, a energia de


ligação fica:

• Se as massas são dadas em kg e c em m/s


2
Eb = [ Z mp + ( A − Z ) mn − M(Z,A) ] c Eb é dada em J
2
• Se as massas são dadas em u e sabendo que 1uc = 931,4815 MeV

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CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

Eb = [ Z mp + ( A − Z ) mn − M(Z,A) ] 931,4815 Eb é dada em MeV

Como as massas são determinadas experimentalmente, a energia de ligação de qualquer


núcleo pode ser determinada.

Exemplo: Calcule a energia de ligação do dêuteron, cuja massa é 2,0141 u

mp = 1,0078 u mn = 1,0087 u

Para as partículas separadas:

Z mp + ( A − Z ) mn = 1 . 1,0078 + 1 . 1,0087 = 2,0165 u

A perda de massa é: Δm = 2,0165 u - 2,0141 u = 0,0024 u

Ou seja, a [mp + mn] > m(d)

A massa perdida está na energia de ligação do sistema

Eb = 931,4815 . Δ m = 931,4815 . 0,0024 u = 2,2356 MeV

1
Comparando Eb (=2,2356 MeV) com a energia de ligação do átomo H (=13,6 eV),
6
(2,2356 x 10 eV/13,6 eV)
6
concluímos que a interação nuclear é ~ 10 vezes mais intensa do que a interação
eletromagnética!

Exemplo: Calcule a energia de ligação de um núcleo de lítio 6, cuja massa vale 6,0151 u:

Eb (Li) = [3 (1,0078) + 3 (1,0087) − 6,0151] × 931,4815 MeV) = 32,0430 MeV

Relativamente à dissociação completa, o núcleo de lítio 6 é mais estável do que a partícula α,


já que (Eb (Li) = 28,3 MeV). Contudo, as estruturas nucleares não se dissociam completamente
em seus núcleons individuais. No caso de um núcleo naturalmente radioativo (núcleo pai),
pode acontecer a dissociação espontânea em um núcleo menor (núcleo filho) e uma partícula
α.

Por exemplo:

226 222
88 Ra → 86 Rn + α

Como: m(Ra) = 226,0254 u m(Rn) = 222,0175 u m(α) = 4,0026 u

vem:

Eb (Ra) = [ 88 ( 1,0078 ) + ( 226 − 88 ) 1,0087 − 226,0254 ] 931,4815 MeV

Eb (Ra) = 1734,0460 MeV

Eb (Rn+α) = [ 88 ( 1,0078 ) + ( 226 − 88 ) 1,0087 − 222,0175 − 4,0026 ] 931,4815 MeV

Eb (Rn+α) = 1738,9828 MeV

Como a energia de ligação do núcleo de rádio 226 é menor do que a soma das energias de
ligação do núcleo de radônio 222 e da partícula α, Eb (Ra) < Eb (Rn+α)

Página 27
CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

226 222
a reação indicada 88 Ra → 86 Rn + α é realmente espontânea.

Deve-se observar que a massa do núcleo de rádio 226 é maior do que a soma das massas
do núcleo de radônio 222 e da partícula α:
226 222
m( Ra) > m ( Rn+α)

Então:

E(Ra) - E(Rn+α) = [226,0254 – (222,0175 + 4,0026) ] 931,4815 MeV = 4,9369 MeV


2
Levando em conta a relação E = mc , isto significa, que o sistema no estado inicial tem uma
energia maior do que no estado final, ou seja, o sistema passa de um estado a outro de menor
energia e, portanto, mais estável.

Por outro lado, em termos da energia de ligação, a diferença E(Ra) - E(Rn+α), sendo
positiva, indica que, para separar o sistema em seus constituintes básicos, a energia
necessária é maior no estado final e, portanto, este é mais estável.

De qualquer modo, a reação indicada acima é espontânea.

Agora, seja a reação:

107
47 Ag → 103
45 Rh + α

e sendo:

m(Ag) = 106,9041 u

m(Rh) = 102,9048 u

m(α) = 4,0026 u

A massa do núcleo de prata 107 é menor do que a soma das massas do núcleo de ródio 103 e
107 103
da partícula α. m ( Ag) < m ( Rh+α)

vem: Eb(Ag) - Eb(Rh+α) = [106,9041 – (102,9048 + 4,0026) ] 931,4815 MeV = − 3,0739 MeV
2
Levando em conta a relação E = mc , isto significa que o sistema no estado inicial tem uma
energia menor do que no estado final, ou seja, o sistema passaria de um estado a outro de
maior energia e, portanto, menos estável.

Por outro lado, em termos da energia de ligação, a diferença Eb(Ag) - Eb(Rh+α), sendo
negativa, indica que, para separar o sistema em seus constituintes básicos, a energia
necessária é menor no estado final e, portanto, este seria menos estável.

Assim, de qualquer modo que se pense a reação indicada não é espontânea.

O núcleo de prata 107 não pode decair espontaneamente por emissão de partícula α.

O que foi mostrado é que a radioatividade natural por decaimento α só pode acontecer
quando a massa do núcleo pai é maior que a soma das massas do núcleo filho e da
partícula α.

O mesmo tipo de argumento pode ser feito para discutir a emissão de elétrons ou
pósitrons no decaimento β.

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Energia de Ligação por Núcleon


Uma indicação da estabilidade nuclear resultante das interações coulombiana e nuclear
forte é dada pelo gráfico da energia de ligação por núcleon, Eb/A, em função do número de
núcleons, A. O gráfico de Eb/A contra A inclui tanto núcleos estáveis quanto núcleos
radioativos.

O núcleo com a menor energia de ligação por núcleon é o do deutério (H-2) e o núcleo com a
maior energia de ligação por núcleon é o do ferro 56. Assim, esse gráfico tem um máximo em A
56.
Os núcleons são mantidos juntos pela interação nuclear, de caráter atrativo, apesar do
efeito contrário da interação coulombiana, de caráter repulsivo, entre os prótons.

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Como Eb/A varia muito pouco com o aumento de A para núcleos não muito pequenos
(para A>10 Eb/A varia menos de 10%), cada núcleon deve interagir atrativamente pela
interação nuclear apenas com um certo número de outros núcleons de sua vizinhança
imediata, e esse número é independente de A.

A diminuição lenta de Eb/A para A > 56 é consequência do aumento do número de


prótons com o aumento de A e do alcance infinito da interação coulombiana, com cada
próton interagindo repulsivamente com todos os outros prótons do núcleo.
A diminuição é lenta, apesar de o efeito depender do número total de pares de prótons,
porque a interação coulombiana é cerca de 100 vezes menos intensa que a interação nuclear.

Por outro lado, para núcleos com A < 56, Eb/A diminui cada vez mais rapidamente com a
diminuição de A porque, então, diminui cada vez mais rapidamente o número de núcleons na
vizinhança imediata de qualquer núcleon, onde a interação nuclear é efetiva.

Assim, enquanto a interação nuclear contribui para a estabilidade do núcleo, a


interação coulombiana contribui para a sua desestabilização.

Como o gráfico da energia de ligação por núcleon em função do número de núcleons


apresenta um máximo em A 56, tanto processos de fusão de núcleos leves quanto processos
de fissão de núcleos pesados podem levar a liberação de energia. Podem, portanto, servir de
fundamento tanto para a construção de reatores de geração de energia quanto para a
construção de bombas com extremo poder de destruição.

Fusão Nuclear (favorável para núcleos pequenos A<56)


Fusão nuclear é o processo de formação de um núcleo a partir da colisão e posterior junção
de dois núcleos menores.
Os núcleos que colidem devem ter, inicialmente, uma energia cinética que lhes permita se
aproximar contra a repulsão coulombiana o suficiente para que a interação nuclear forte passe
a ser efetiva e mais importante.

Como a repulsão coulombiana é tanto mais importante quanto maior a carga elétrica dos
núcleos em colisão, a fusão nuclear pode ser provocada com mais facilidade entre núcleos
com número pequeno de prótons.
De qualquer modo, a fusão nuclear com liberação de energia só ocorre se o número de
núcleons do núcleo resultante é menor ou da ordem de 56.
A título de exemplo, seja a fusão de dois núcleos de oxigênio 16 para formar um núcleo de
enxofre 32:
16 16 32
O+ O S

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Pela observação do gráfico Eb/A contra A tem-se aproximadamente 7,8 MeV e 8,6 MeV,
respectivamente, para a energia de ligação por núcleon para os núcleos de O-16 e de S-32.
Assim, as energias de ligação dos sistemas inicial e final são:
Eb(O+O) = 2 ( 16 )( 7,8 MeV ) = 249,9 MeV
Eb(S) = 32 ( 8,6 MeV ) = 275,2 MeV

Ao passar do estado inicial para o final, o sistema sofre uma variação de energia dada por:
ΔE = Eb(S) − Eb(O+O) = 25,6 MeV

Como ΔE > 0, a energia de ligação do núcleo resultante é maior do que a soma das
energias de ligação dos núcleos iniciais.
Em outras palavras, como uma energia de 275,2 MeV deve ser fornecida ao sistema no
estado final (núcleo de S-32) para separá-lo em núcleons infinitamente separados e uma
energia de 249,6 MeV deve ser fornecida ao sistema no estado inicial (dois núcleos de O-16)
para separá-lo em núcleons infinitamente separados, o sistema deve ter perdido (liberado) uma
energia de 25,6 MeV.
Esse resultado se deve ao fato de as energias de ligação por núcleon dos núcleos iniciais
serem menores do que a energia de ligação por núcleon do núcleo final. Ou seja, a fusão
nuclear com liberação de energia só ocorre se o número de núcleons do núcleo resultante é
menor ou da ordem de 56, já que a curva Eb/A contra A tem máximo em A 56.

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Fissão Nuclear (favorável para núcleos grandes A>56)


Fissão nuclear é o processo de divisão de um núcleo em dois núcleos menores, de tamanho
comparável.
Os núcleos com um grande número de núcleons estão sujeitos à fissão espontânea, com
uma probabilidade muito pequena, e sujeitos à fissão induzida por captura de nêutrons, com
uma probabilidade maior.
A título de exemplo, seja a reação de fissão de um núcleo de U-235 em um núcleo de Rb-97
e um núcleo de Cs-137:
235 236 97 137
n+ U [ U] Rb + Cs + 2n
Pela observação do gráfico Eb/A contra A tem-se aproximadamente 7,7 MeV e 8,6 MeV e
8,2 MeV, respectivamente, para os núcleos de urânio 236 e rubídio 97 e césio 137. Assim, as
energias de ligação dos sistemas inicial e final são:
Eb(U) = 236 ( 7,7 MeV ) = 1817,2 MeV
Eb(Rb+Cs+2n) = 97 ( 8,6 MeV ) + 137 ( 8,2 MeV ) + 2 ( 7,7 MeV ) = 1973,0 MeV
Ao passar do estado inicial para o final, o sistema sofre uma variação de energia dada por:
ΔE = Eb(Rb+Cs+2n) − Eb(U) = 1973,0 MeV − 1817,2 MeV = 155,8 MeV

Como ΔE > 0, o sistema deve ter perdido (liberado) uma energia de 155,8 MeV.
Novamente, esse resultado se deve ao fato de a energia de ligação por núcleon do núcleo
inicial (o núcleo composto de U-236) ser menor do que a soma das energias de ligação por
núcleon dos núcleos finais e dos dois nêutrons, ou seja, a fissão nuclear com liberação de
energia só ocorre se o número de núcleons dos núcleos resultantes é maior ou da ordem de
56.
Este cálculo é aproximado e é o que se pode fazer a partir do gráfico considerado. Na
realidade, a energia total liberada na reação é maior porque os núcleos resultantes são
instáveis e decaem, posteriormente, por emissão de elétrons, neutrinos e raios γ.

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Aula 4
Propriedades da Força Nuclear e Modelo da Gota
Meta
Resumir as principais características da Força Nuclear descrevendo um
modelo semi-empírico para a mesma

Objetivos

Ao final desta aula, você deverá ser capaz de:


• Relacionar as principais características da força nuclear.
• Compreender a fórmula semi-empírica da força nuclear
• Discutir a estabilidade dos núcleos isóbaros e o decaimento β.

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Forças do núcleo atômico

Se cargas elétricas de mesmo sinal se repelem, o núcleo não deveria ser instável pela repulsão
elétrica dos prótons?

Todos os núcleos, exceto aqueles dos isótopos do hidrogênio, têm mais de um próton.
Então, deve existir, entre os núcleons, uma interação atrativa mais intensa do que a interação
coulombiana repulsiva entre os prótons, para a mesma separação. Mas qual seria essa força?

Vamos supor que a força que retém o núcleo é a Força Gravitacional. O módulo dela é dado
por

m1m2G
F=
r2
m1 e m2 são as massas de uma partícula e do núcleo (o restante), respectivamente; r é a
distância entre seus centros e G é a constante gravitacional.
O trabalho para remover a partícula do núcleo de uma distância R até o infinito é dado por:

∞ ∞ m1m2G ∞ dr mm G m1m2G
W = ∫ Fdr =∫ 2
dr =m1m2G ∫ 2 = − 1 2 =
R R r R r r R R
-24
Para remover um próton (m =1,67 x 10 g) da superfície de um núcleo (supondo A= 65 e raio
-13
R = 5 x 10 cm) até uma distância infinita:

1,67 ×10−24 × (1,67 ×10−24 × 64) × 6,67 ×10−8


W= = 1,5 ×10−35 MeV
5 ×10−13

Mas determinações experimentais mostram que W é muito maior. A energia de ligação é cerca
de 8 MeV por núcleon (W ≅ 8 MeV).
Portanto as forças que atuam no núcleo são muito mais intensas que a força gravitacional.
Portanto, ali está agindo outra força: a FORÇA NUCLEAR
Na verdade, as forças nucleares são cerca de 100 vezes mais intensas do que as forças
elétricas.
A natureza exata da força nuclear continua a ser um quebra-cabeça ainda está para ser
resolvido. Podemos enumerar as algumas propriedades da força nuclear com base em várias
observações e os fatos empíricos.

Página 34
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Propriedades da Força Nuclear


Vamos resumir as principais propriedades da força nuclear:

1) A força nuclear satura


O gráfico de Eb/A versus A mostra que a energia de ligação por núcleon é
aproximadamente constante para todos os núcleos, exceto os mais leves.

Assim, a energia de ligação de um núcleo é aproximadamente proporcional ao número de


partículas desse núcleo.
Eb α A
Se cada partícula do núcleo interagisse com todas as demais partículas do núcleo, E b
deveria ser proporcional ao número de pares de partículas, isto é, proporcional a A×( A - 1 ). E
2
como, para A grande, pode-se considerar A×(A-1)= A , a energia de ligação deveria ser
2
proporcional a A . Esse resultado está em contradição com o resultado experimental expresso
no gráfico Eb/A versus A.
A contradição desaparece quando se supõe que cada partícula do núcleo interage
apenas com um número limitado de outras partículas. Este é realmente um resultado da natureza de
curto alcance da força nuclear. Cada núcleon em um núcleo interage com os seus vizinhos apenas.
Como resultado, a energia de ligação por núcleon sobe rapidamente para núcleos de massa
leve e rapidamente satura. Além disso, temos a densidade da matéria nuclear
aproximadamente constante. Portanto, atribui-se à força nuclear a propriedade de saturação.

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2) A força nuclear é de curto alcance.


Se não fosse assim, todos os núcleons em diferentes núcleos se uniriam em um núcleo grande
e tudo, provavelmente, se tornaria um núcleo gigantesco, como uma super-estrela de nêutrons,
e não haverá mais uma variedade de elementos na natureza.
Se cada partícula do núcleo não interage com todas as outras partículas, mas apenas com
algumas partículas vizinhas, a força nuclear deve ser de curto alcance.
-15
Esse alcance é da ordem de 1 fm (10 m).
-14
Para distâncias > 10 m (dimensão do núcleo) a força nuclear é desprezível
-15
Para d ≤ 10 m domina a Força Nuclear
-14
Para d > 10 m domina a Repulsão Coulombiana

OBS: Se a Força Nuclear fosse como a Força Coulombiana ou a Força Gravitacional, qualquer
nêutron ou próton seria atraído independentemente da distância que estivesse do núcleo.
Portanto no núcleo, cada núcleon interage apenas com suas vizinhanças mais próximas.

3) A Força Nuclear tem caroço repulsivo


A força nuclear é sempre atrativa entre dois nêutrons, entre um próton e um nêutron e entre
dois prótons. Existência de nêutrons e prótons em um estado ligado (sob a forma de núcleos) é
em si uma evidência desta.
Mas, para distâncias muito menores do que o alcance de 1 fm, a interação nuclear é repulsiva.
A existência desse caroço repulsivo explica, por exemplo, o fato de que a distância média entre
núcleons é independente de A e o fato de que o volume nuclear é proporcional a A.
Essa determinação foi feita através de experimentos de espalhamento de nêutrons e prótons
pelos núcleos.

a) Para interações n-n ou n-p não há repulsão coulombiana


b) Para interações p-p há repulsão coulombiana

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CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

4) A Força Nuclear parece ser independente da carga elétrica


A interação nuclear é independente da carga elétrica, isto é, atua igualmente entre dois
prótons (interação p-p), entre dois nêutrons (interação n-n) e entre um próton e um nêutron
(interação p-n).
Interações p-p, n-n ou p-n são basicamente idênticas!
Confirmado devido ao fato da Eb/A ser a mesma independentemente da proporção de n
ou p no núcleo. Portanto p e n são equivalentes em relação à Força Nuclear (e por isso
designados núcleons)
Também a estabilidade do dêuteron (o núcleo com um nêutron e um próton) permite
concluir que existe interação nuclear entre nêutrons e prótons.

Núcleos grandes
O número de nêutrons cresce mais rapidamente que o número de prótons para núcleos
estáveis não muito pequenos. Isto permite concluir que existe interação nuclear entre nêutrons.
Com o crescimento do número de prótons, cresce o efeito anti-estabilizante da
repulsão coulombiana. Esse crescimento só pode ser contrabalançado pelo crescimento do
efeito estabilizante da interação nuclear. Como cada núcleon interage apenas com um número
limitado de outros núcleons, o excesso de nêutrons só pode contribuir para o crescimento do
efeito estabilizante se existe interação nuclear entre nêutrons.

Núcleos pequenos
Para núcleos estáveis pequenos, o número de nêutrons cresce junto com o número de
prótons. Este fato, mais a existência de interação nuclear entre nêutrons, permite concluir que
existe interação nuclear também entre prótons e com a mesma intensidade.
Se não existisse interação nuclear entre prótons ou se a interação nuclear entre
nêutrons fosse mais intensa do que a interação nuclear entre prótons, os núcleos estáveis
pequenos deveriam conter um número maior de nêutrons do que de prótons e não um número
aproximadamente igual de nêutrons e prótons como, realmente, acontece.
A independência da carga nas interações nucleares é, também, corroborada pelo fato
de que os resultados dos experimentos de espalhamento de prótons pelo núcleo são idênticos
aos resultados dos experimentos de espalhamento de nêutrons.

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CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

Para núcleos pesados,


nêutrons precisam ser
intercalados entre prótons
para manter o núcleo
estável (devido a interação
nuclear) e a repulsão entre
prótons não começar a
dominar. Por isso núcleos
pesados tem mais
nêutrons.

5) A Força Nuclear depende da orientação relativa dos spins dos núcleons


A Força Nuclear depende da orientação relativa dos spins dos núcleons em interação
relativamente à reta que passa pelos núcleons.
Confirmando pela experiência de espalhamento e análise de níveis de energia nucleares
Exemplo: E para sistema com 2 núcleons
E para spins ↑↑ ≠ E para spins ↓↑
Exemplo: dêuteron (n-p)
Estado ligado tem spins paralelos (I=1)
Mas não há estado ligado para spins antiparalelos (I=0)

6) A força nuclear não é de caráter completamente central


O momento angular orbital no dêuteron de ambos seus núcleons em relação ao seu
centro de massa não é constante (contrário a Forças Centrais). Para explicar o estado

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fundamental do dêuteron devemos usar uma combinação linear das funções de onda s (l = 0)

e d (l = 2).

Na Força Nuclear → a interação spin-orbita é forte


→ há força tensorial: parecida com interação entre 2 dipolos
Apesar de todas essas informações, a expressão correta da Ep nuclear ainda não é bem
conhecida.

Expressões propostas para a força nuclear


Foram propostas expressões como:
Potencial de Yukawa (1935)

E0 a − r a
E p (r ) = − e
r
Onde E0 e a são constantes empíricas. E0 é a intensidade da interação; a está relacionada ao
alcance da força nuclear.
−r
e a
→0 mais rápido que Ep elétrica (que cai com 1/r)
Há dúvidas se a Interação Nuclear pode ser descrita como função da Ep nuclear, como ocorre
com a força gravitacional e a eletromagnética.
A força nuclear é um efeito residual da interação forte entre os quarks que compõe os p e n.

OBS: Não podemos estudar a estrutura nuclear com a mesma amplitude que estudamos os
átomos e moléculas, pois não conhecemos a forma correta da Ep nuclear.

Fórmula Semi-Empírica da Energia de Ligação


Com o passar do tempo e na ausência de uma teoria detalhada para descrever a
estrutura nuclear, vários modelos foram desenvolvidos, cada qual correlacionando os dados
experimentais de um conjunto mais ou menos limitado de fenômenos nucleares.
Entre os modelos formulados estão o modelo de gás de Fermi, o modelo uniforme, o
modelo de partícula alfa, o modelo da gota líquida e o modelo nuclear de camadas.
Com o modelo da gota líquida foi desenvolvida a seguinte fórmula semi-empírica para o
cálculo da energia de ligação nuclear:
-1/3 2/3 2 -1 -1
Eb = av A - ac Z ( Z - 1 ) A - as A - ar ( A - 2Z ) A + api A
onde um dos possíveis conjuntos de valores (em MeV) para as constantes av, ac, as, ar e api,
obtidos por ajustes de curvas experimentais, é o seguinte:
av = 14,0 ac = 0,584 as = 13,1 ar = 19,4 api = 135 d
com d = +1 para núcleos par-par (Z par e N par), d = 0 para núcleos par-ímpar (Z par e N ímpar
ou Z ímpar e N par) e d = -1 para núcleos ímpar-ímpar (Z ímpar e N ímpar).

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O primeiro termo do lado direto da expressão dada corresponde ao termo de volume,


proporcional ao número de núcleons A, e está associado ao fato de ser mais ou menos
constante a energia de ligação por núcleon ou, o que dá no mesmo, ao fato de que cada
núcleon interage apenas com um número limitado e fixo de outros núcleons.
O segundo termo corresponde ao termo coulombiano, associado à repulsão
eletrostática entre os prótons do núcleo, e aparece com o sinal negativo porque o efeito de
repulsão tende a diminuir a energia de ligação.
Como os prótons interagem aos pares, esse termo é proporcional ao número de pares
de prótons do núcleo, Z (Z - 1), e como a interação é tanto menor quanto maior a distância
entre os prótons, esse termo é inversamente proporcional ao raio do núcleo, ou seja,
1/3
inversamente proporcional a A .
O terceiro termo corresponde ao termo de superfície e está associado ao número de
núcleons da superfície do núcleo. Se os núcleons do interior do núcleo interagem com um dado
número de outros núcleons, os núcleons da superfície interagem, em média, com a metade
desse número.
Como se considerou, no primeiro termo, que todos os núcleons interagem com igual
número de outros núcleons, deve-se descontar um termo proporcional ao número de núcleons
2/3
da superfície ou à área da superfície, ou seja, ao quadrado do raio, A .
O quarto termo corresponde ao termo de simetria. Para um dado valor de A, existe um
valor de Z que corresponde ao núcleo mais estável.
Para núcleos pequenos, onde o efeito da repulsão coulombiana é pequeno, esse valor
é Z = A/2 ou 2Z = A. Assim, na ausência da repulsão coulombiana, valores de A diferentes de
2Z levam a menor estabilidade, ou seja, a um valor menor para a energia de ligação nuclear e
2
esse efeito é representado, então, por (A - 2Z) . O quadrado serve para garantir que tanto e
excesso de nêutrons quanto o excesso de prótons levem a uma menor estabilidade.
E como esse efeito deve ser cada vez menor com o aumento do tamanho do núcleo,
ele deve ser inversamente proporcional ao número de núcleons, ou seja, inversamente
proporcional a A.
Finalmente, o quinto e último termo, corresponde ao seguinte efeito: dos núcleos
estáveis, aqueles com número par de prótons ou com número par de nêutrons são os mais
abundantes e, presumivelmente, os mais estáveis; núcleos com número ímpar de prótons ou
com número ímpar de nêutrons são os menos estáveis.

Fórmula semi-empírica da massa

Quando temos Eb, podemos também estimar a massa de qualquer átomo neutro (com os
elétrons).

A EB
Z M = ZM H + NmB −
c2

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O modelo da gota e a fórmula da massa deduzida a partir dele obtiveram grande êxito em
estimativas de massas nucleares. Porém outros processos como momento angular e estados
excitados são mais bem descritos com o modelo de camadas que veremos na próxima aula.

Decaimento β
A fórmula semi-empírica da energia de ligação nuclear permite também a discussão da
estabilidade dos núcleos isóbaros e do decaimento β.
Como primeiro exemplo, sejam os seguintes núcleos isóbaros com número de massa
A = 73 (ímpar): zinco, gálio, germânio, arsênico e selênio, cujas energias de ligação (em MeV)
aparecem na tabela a seguir. Nessa tabela aparecem, também, os correspondentes valores
absolutos (em MeV) dos vários termos da fórmula semi-empírica da energia de ligação.

73 73 73 73 73
Elemento 30 Zn 31Ga 32Ge 33 As 34 Se
av A 1022,000 1022,000 1022,000 1022,000 1022,000
-1/3
ac Z ( Z - 1 ) A 121,579 129,964 138,628 147,572 156,795
2/3
as A 228,818 228,818 228,818 228,818 228,818
2 -1
ar ( A - 2Z ) A 44,912 32,156 21,526 13,022 6,644
-1
api A 0,000 0,000 0,000 0,000 0,000
E 626,691 631,062 633,028 632,588 629,743

O gráfico da energia de ligação em função de Z é uma parábola. O núcleo de germânio 73 é o


mais estável porque tem a maior energia de ligação e aparece mais próximo do vértice da
parábola.

Os isóbaros com número atômico menor que o número atômico do isóbaro mais
-
estável (ramo esquerdo) decaem por emissão de um elétron (decaimento β ):

73 73 73
Zn30 Ga31 Ge32 (estável)
-
Em termos dos núcleons, o decaimento β é a transformação de um nêutron num
próton, com a emissão de um elétron e um antineutrino (ν*):

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-
n p + e + ν*
Analogamente, os isóbaros com número atômico maior que o número atômico do
+
isóbaro mais estável (ramo direito) decaem por emissão de um pósitron (decaimento β ) ou por
captura de elétron (K) ou por ambos:

73 73 73
Se34 As33 Ge32 (estável)
+
Em termos dos núcleons, o decaimento β é a transformação de um próton num
nêutron, com a emissão de um pósitron e um neutrino (ν):
+
p n+e +ν
A captura eletrônica é a captura, pelo núcleo atômico, de um elétron orbital. Se um
elétron da camada K é capturado, o processo é chamado captura K. Elétrons de outras
camadas podem ser capturados, mas com probabilidades menores.
Em termos elementares, a captura eletrônica fica:
-
p+e n+ν
Para isóbaros com número de massa A par, a discussão é um pouco diferente por
causa do termo par-ímpar da fórmula semi-empírica da energia de ligação. Esse termo é
positivo para núcleos par-par e negativo para núcleos ímpar-ímpar, de modo que existem duas
parábolas.
Como exemplo, sejam os seguintes núcleos isóbaros com A = 64 (par): cobalto,níquel,
cobre, zinco e gálio, cujas energias de ligação (em MeV) aparecem na tabela a seguir. Nessa
tabela aparecem, também, os correspondentes valores absolutos (em MeV) dos vários termos
da fórmula semi-empírica da energia de ligação.

64 64 64 64 64
Elemento
27Co 28 Ni 29Cu 30 Zn 31Ga
av A 896,000 896,000 896,000 896,000 896,000
-1/3
ac Z ( Z - 1 ) A 102,492 110,376 118,552 127,020 140,306
2/3
as A 209,600 209,600 209,600 209,600 209,600
2 -1
ar ( A - 2Z ) A 30,313 19,400 10,913 4,850 1,213
-1
api A (-) 2,109 (+) 2,109 (-) 2,109 (+) 2,109 (-) 2,109
E 551,486 558,733 554,826 556,639 542,772

Os gráficos da energia de ligação em função de Z são duas parábolas. A parábola


inferior corresponde aos núcleos ímpar-ímpar e a parábola superior, aos núcleos par-par.

Página 42
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Portanto, os primeiros são instáveis em relação aos segundos.


Pela curva correspondente aos núcleos par-par pode-se observar que existem dois
isóbaros estáveis com números atômicos diferindo por duas unidades.
Os núcleos com Z menor do que o Z do estado mais estável decaem por emissão de
-
elétron (decaimento β ) e os núcleos com Z maior que o Z de um dos núcleos mais estáveis
+
decaem por emissão de pósitron (decaimento β ), captura K ou ambos.
O isóbaro mais próximo do vértice da parábola ímpar-ímpar (o núcleo de cobre) pode
- +
decair por β , β ou captura K.

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Aula 5
A força nuclear: modelo de camadas
Meta
Descrever o modelo de camadas para o núcleo e prever o spin nuclear

Objetivos

Ao final desta aula, você deverá ser capaz de:

• Reconhecer o modelo nuclear de camadas


• Calcular a degenerescência dos níveis nucleares após interação spin-
órbita
• Fazer a distribuição dos núcleons de um nuclídeo nos níveis nucleares
• Interpretar os números mágicos
• Prever o spin nuclear

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Falhas do Modelo da gota


No modelo de gota líquida, os núcleons não são tratados de maneira individual, mas
seus efeitos são considerados por meio de valores médios associados às suas propriedades. O
modelo é bem sucedido no que diz respeito à determinação de algumas propriedades
nucleares como, por exemplo, a energia de ligação por núcleon. Entretanto, outras
propriedades nucleares, como por exemplo, as energias dos estados excitados nucleares ou os
momentos magnéticos nucleares, necessitam, para a sua compreensão, uma descrição que
leve em conta propriedades individuais dos núcleons que não são levadas em consideração
em um modelo de natureza mais coletiva como é o modelo de gota liquida.
O modelo de camadas foi proposto para tentar explicar essas propriedades
experimentais.

O modelo de camadas
O modelo de camadas é muito semelhante à aproximação de campo central usada na
física atômica, ou seja, ao que descreve os elétrons nos átomos. Ele considera o núcleo
atômico como um conjunto de nêutrons e prótons (núcleons) interagindo fracamente, mantidos
num poço de energia potencial, isto é, cada núcleon se move em um potencial que representa
o efeito médio de todos os outros núcleons.
O modelo de camadas supõe as partículas “suficientemente independentes umas das
outras” de tal maneira que possam ficar em uma “órbita” sem interferência das demais. São
estabelecidas “órbitas” no núcleo com números quânticos bem definidos.
A estrutura do modelo de camadas é determinada por meio de uma série de aproximações
sucessivas. Mas o núcleo apresenta mais dificuldades que o modelo atômico:
Ø Há dois tipos de partículas (prótons e nêutrons, que obedecem separadamente o
Princípio de Exclusão de Pauli);
Ø Ausência de força central dominante.
Considera-se, que cada núcleon se move em um campo médio de forças produzido pelos
outros núcleons, que em primeira aproximação é considerado central.

Caracterizamos cada núcleon por seu estado de energia (n, l )

Onde n = nível de energia; l = momento angular orbital.

Fazendo uma comparação com o modelo atômico, no caso dos elétrons:


n = 1, 2, 3, ..
As regras surgem da
l = 0, 1, ..., n-1
solução da Eq. de
Schrödinger e vêm da
forma particular do
potencial coulombiano
Página 1 ze2
V (r ) = 45
4πε 0 r
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ml= - l , - l +1, ..., + l

V = V(r)

Entretanto, isso não é válido para o caso dos núcleons. Sabemos apenas que a força é
aproximadamente central. Então, o potencial usado na Eq. de Schrödinger é V ≅ V(r). Portanto
não temos as mesmas soluções da equação que tínhamos no caso dos elétrons e, com isso,

as regras não existem para l dependente de n. Com esse tipo de potencial os estados

(funções de onda) dos núcleons não obedecem restrições.

Por exemplo:
Para elétrons

Se n=1 ⇒ l =0 (o estado só pode ser 1s)

Se n=2 ⇒ l =0,1 (estados possíveis são 2s e 2p)

Para os núcleons

Se n=1 ⇒ l = qualquer (o estados possíveis são 1s, 1p, 1d ...)

Se n=2 ⇒ l = qualquer (estados possíveis são 2s, 2p, 2d ...)

Não há restrição em l como no caso dos elétrons.

Números mágicos
No desenvolvimento do programa nuclear americano, muitos isótopos radiativos foram
produzidos. Depois de 1945, Maria Mayer começou a se preocupar com a sistemática das
energias de ligação (elétron-núcleo), e descobriu que aquelas energias indicavam a presença
de camadas completas nucleares.
Dados nucleares revelam que núcleos cujos números de núcleons, N ou Z,
correspondem aos números: 2, 8, 20, 28, 50, 82, 126, denominados “mágicos”, apresentam

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estabilidade pronunciada, com valores mais expressivos para sua energia de ligação quando
comparados a núcleos “não mágicos”. Os núcleos que contém ambos os prótons e nêutrons
com estes números são extraordinariamente estáveis. Por exemplo:
16 40 208
8O, 20Ca, 82Pb etc.
Os núcleos atômicos com 82 nêutrons são muito mais estáveis do que os com 81 ou 83, e
ainda mais estáveis do que aqueles com 80 ou 84, por exemplo.
O número de isótopos e isótonos com Z ou N mágicos é relativamente alto, sendo
esses nuclídeos mais estáveis, em geral. Outro fato importante é que a seção de choque de
captura de nêutrons desses núcleos com número mágico de nêutrons é extremamente baixa.
Isso indica um fraco vínculo do núcleon extra, ou seja, esse núcleo não “quer” um nêutron a
mais. Aparentemente estes números mágicos indicam algo semelhante à existência de
níveis, camadas ou sub-níveis de energia no núcleo.
É importante salientar que um comportamento similar ocorre no caso atômico, que deu
por sua vez origem ao modelo atômico de camadas. No caso dos elétrons, os gases nobres
são aqueles que têm suas camadas eletrônicas totalmente preenchidas. Corresponde
àqueles elementos com Z = 2, 10, 18, 36, 54 e 86, com o mesmo número de elétrons no
átomo neutro. Esses gases não se misturam a outros facilmente, pois não querem nem doar
nem receber elétrons.
No caso dos núcleos, estes fatos deram origem assim ao Modelo Nuclear de
Camadas. Núcleos com números mágicos exibem a energia de excitação do primeiro estado
excitado extremamente grande. Ou seja, se supusermos que existem níveis energéticos no
núcleo como existem para os elétrons no átomo, haveria um “gap” bastante largo entre o
último nível preenchido e o primeiro nível vazio. Isso explicaria bem os números mágicos.
Este modelo foi proposto em 1949, independentemente por Mayer e Jensen, que
receberam o prêmio Nobel por ele em 1963. Para explicar os números mágicos, Mayer e
Jensen postularam um termo adicional no potencial nuclear. Eles consideraram que, além da
força central média que os núcleons sentiriam dos outros núcleons, haveria uma interação
spin-órbita forte.
Vamos novamente lembrar o caso dos elétrons atômicos:
ü São carga girando em torno do núcleo, o que gera um campo magnético
ü O spin dos elétrons também gera campo magnético
ü Ambos os campos interagem (interação entre os dois momentos dipolares), o
que corresponde à interação spin-órbita de origem eletromagnética.
ur ur
ü Essa interação spin-órbita é proporcional a L⋅ S ¨
ur ur
Os núcleons também possuem spin S e momento angular orbital L bem definidos,
que, em geral, não são colineares.
ur ur
Assim, se supôs que haveria no núcleo interação spin-órbita proporcional a L⋅ S
como no caso dos elétrons. Como os nêutrons não têm carga, essa interação não seria
necessariamente de origem eletromagnética.

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CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

Os níveis de energia encontrados para os núcleos correspondentes apresentam

ü menor energia quando j = l + ½

ü maior energia quando j = l - ½

que é contrário ao observado no caso dos elétrons.

ur ur
Se a interação spin-órbita no caso dos elétrons é proporcional a L ⋅ S , vamos supor que aqui
também seja. Vamos descobrir os níveis energéticos dos núcleons:

ur ur ur
J = L+S
ur 2 ur ur 2 ur 2 ur 2 ur ur
J = ( L + S ) = L + S + 2 L.S
ur ur 1 ur 2 ur 2 ur 2
⇒ L.S = ( J − L − S )
2
ur 2 ur 2 ur 2
Substituindo os valores de J , L , S

ur ur ⎛ 1 3 ⎞
L.S = ⎜ ( j ( j + 1) − l (l + 1) − ⎟ h2
⎝ 2 4 ⎠

ur ur
S pode ser paralelo ou anti-paralelo a L j = l ± 1
2
ur ur ⎧ 1 2 1
L ⋅ S = ⎨ l h quando j = l +
⎩ 2 2
ur ur ⎧ 1 1
L ⋅ S = ⎨− (l + 1)h2 quando j = l −
⎩ 2 2

A separação entre dois estados com mesmo l, mas j distintos é:


Experimentalmente verifica-se que

1 2 ⎛ 1 ⎞ h2 ⎛ 1 ⎞ 2
l h − ⎜ − ( l + 1) h2 ⎟ = l h2 + = ⎜ l + ⎟ h
2 ⎝ 2 ⎠ 2 ⎝ 2 ⎠
⎛ 1 ⎞ 2 Que é contrário ao que ocorre com
⎜ l + ⎟ h ⇒ ×2
⎝ 2 ⎠ os elétrons

( 2l + 1) h2 ⇒ proporcional a 2l + 1

Portanto, a separação entre dois estados aumenta com l

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Preenchimento das camadas

A degenerescência de cada estado (n, l ,j) é 2j + 1, correspondendo a 2j + 1 possíveis

ur
orientações de J relativamente ao eixo z (Jz) (Lembre-se que mj = -j, -j+1, ..., +j). Então, de
acordo com o Princípio de Exclusão de Pauli, o número máximo de nêutrons (ou prótons) em

um dado nível (n, l ,j) (camada) é 2j +1.

r r r
Lembrando que j =l+s¨

para l =0 e s = 1/2 j=1/2

para l =1 e s = 1/2 j=3/2 ...

Tabela - Degenerescência das camadas nucleares


j 1/2 3/2 5/2 7/2 9/2 11/2 13/2 ...
o
N Max
de N ou 2 4 6 8 10 12 14
p
(2j+1)
Cada estado dos núcleons é designado por:
Números: 1, 2, 3 ... designando o número quântico n

Letras: s, p, d, f ... designando os números quânticos l = 0, 1, 2, 3, respectivamente

Valores semi-inteiros: designando o número quântico j


Resumindo:
§ Os níveis de energia (de 1 partícula) têm j semi-inteiro
§ Os níveis de energia têm degenerescência 2j+1= par

§ Um nível de energia pode conter 2j+1 núcleons: 1 núcleon em cada estado

Representação do estado nl j exemplo: n=1 l =0 e j =1/2 estado 1s1/2

Exemplo do desdobramento dos níveis de energia

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CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

Os núcleons podem ocupar várias órbitas, de


forma análoga aos elétrons no átomo, mas
constituindo dois conjuntos distintos – um para os
prótons e outro para os nêutrons. Há uma pequena
diferença entre os níveis de prótons e os de nêutrons
devido à interação coulombinana que existem entre os
primeiros.
No caso de núcleos que, além de uma camada
fechada, possuem alguns núcleons adicionais,
podemos ignorar, até certo ponto, os núcleons
individuais na camada fechada, e nos concentrarmos nos poucos núcleons que se encontram
fora dela. As interações entre esses núcleons externos é que devem ser levadas em conta. Em
núcleos pesados, com muitos núcleons fora da última camada fechada, os cálculos tornam-se
proibitivamente complexos, até mesmo para computadores modernos.
O modelo parte do pressuposto que os níveis de energia funcionam como nos elétrons
atômicos. Os níveis são preenchidos com núcleons (separadamente, um com prótons e outro
com nêutrons) de maneira sucessiva, partindo daqueles níveis de energia com valores mais
baixos aos de valores mais altos.

Aproximação de Campo Médio:


Cada núcleon move-se num potencial médio gerado por todos os outros núcleons
• Resolução da equação de Schrödinger de uma partícula com um potencial que admita
estados ligados
• Obtém-se uma série de estados ligados (Ei<0) que se ordenam segundo energias
crescentes
• Níveis preenchidos de acordo com o Princípio de exclusão de Pauli

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Figura – Camadas do modelo nuclear.

O que o Modelo de camadas explica

Assim como os elétrons, os núcleos são


partículas fermiônicas, e o princípio de exclusão de Pauli
é aplicado a eles. Isso significa que dois núcleons
idênticos não podem ocupar a mesma órbita. As órbitas
formam camadas ou conjuntos de órbitas com energias
similares, com grandes vazios entre elas. Núcleos com
uma camada fechada (cheia) de prótons ou uma camada
fechada de nêutrons, e especialmente aqueles com
ambas fechadas, apresentam grande estabilidade, assim
como os átomos de gases nobres, que possuem camadas fechadas de elétrons. Assim, o
modelo de camadas consegue explicar bem a existência dos números mágicos: 2, 8, 20, 28,
50, 82, 126.

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Além disso, o spin nuclear pode ser previsto utilizando o modelo de camadas.
Os núcleos par-par apresentam I = 0 em seu estado fundamental. No modelo de
camadas, podemos verificar o emparelhamento dos núcleons de núcleos par-par nas camadas
nucleares.
Para núcleos par-ímpar (ou ímpar-par) o spin nuclear (I) irá coincidir com o j daquele
núcleon desemparelhado.
Ao excitar o núcleon desemparelhado para um estado próximo, o spin nuclear do
estado excitado geralmente coincidirá com o novo j do núcleon excitado.
No caso de núcleons ímpar-ímpar é um pouco mais complicado prever o spin nuclear.
Lembre-se que só existem 4 nuclídeos estáveis do tipo ímpar-ímpar. Todos os valores inteiros

de I são permitidos no intervalo entre j p + jn e j p − jn .


(jp = j do próton desemparelhado e jn= j do nêutron desemparelhado)

Resumindo:
núcleos par-par I =0
núcleos par-ímpar I = j do núcleon desemparelhado

núcleos ímpar-ímpar I = inteiro entre j p + jn j p − jn

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O que o modelo de camadas não explica


Apesar de funcionar bem na explicação do spin nuclear e dos números mágicos,
quando comparamos o modelo com o caso dos elétrons, vemos que estes são mantidos em
órbita em torno dos núcleos pela força eletromagnética, que é realmente fraca. A força
predominante no interior dos núcleos é aproximadamente cem vezes maior (daí seu nome:
força nuclear forte). Técnicas teóricas capazes de descrever atrações fracas, como o
eletromagnetismo, não se aplicam a fenômenos tão fortes como a força nuclear. Além disso, os
elétrons são partículas elementares desprovidas de estrutura, ao passo que os prótons e
nêutrons são aglomerados complexos de partículas chamadas quarks e glúons. A força
existente entre esses núcleons não é uma força fundamental como a eletromagnética, cujas
equações são conhecidas com precisão. Pelo contrário, a atração nuclear entre os núcleons é
um complicado subproduto das interações entre os quarks e glúons que os constituem.
O momento de camadas não explica, por exemplo, as regras de acoplamento ou
emparelhamento dos momentos angulares. As regras são atribuídas à interação “residual”
(diferença entre a interação nuclear sentida pelos núcleons e as forças central mais spin-órbita
média). A interação residual contribui para a estabilidade nuclear por meio da energia de
emparelhamento.
O modelo de camadas falha também na explicação do momento de quadrupolo elétrico
dos núcleos (cujo valor calculado é muito pequeno). O acoplamento forte entre os núcleons
leva a vários efeitos coletivos do núcleo, não previsto nesse modelo.
Núcleons ocupando o caroço (camadas completas)
agem como uma gota, capaz de oscilações do seu
formato em torno da forma esférica de equilíbrio.
As oscilações são coletivas com volume constante -
cada núcleo pode ter vários modos normais de
oscilações. Os núcleons das camadas externas não
completamente preenchidas exercem um tipo de ação polarizante dando ao núcleo uma forma
de equilíbrio não esférica. Há deformações grandes principalmente nos casos 90<N<114 e
para z>88.
Esse momento de quadrupolo elétrico resultante é relativamente grande e não é
explicado pelo modelo de camadas.

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Apêndice
Interação Spin órbita

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Aula 6
Estabilidade Nuclear e radioatividade
Meta
Apresentar as formas mais importantes pelas quais os núcleos instáveis sofrem
decaimento radioativo.

Objetivos

Ao final desta aula, você deverá ser capaz de:

• Compreender como estabilidade de um núcleo depende do número de


prótons e nêutrons que ele contém.
• Reconhecer os tipos de partículas emitidas pelos núcleos radioativos
• Analisar o processo de instabilidade nuclear
• Calcular a energia liberada num decaimento nuclear e a viabilidade do
mesmo
• Identificar os espectros energéticos das radiações emitidas.

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INTRODUÇÃO
Nas aulas anteriores falamos da força que mantém os núcleos unidos.
Mas nem todos eles permanecem para sempre unidos. Há vários naturalmente
instáveis, além de vários produzidos artificialmente. Hoje falaremos das
radiações que podem ser provenientes de nuclídeos instáveis.

No dia a dia conhecemos mais as radiações eletromagnéticas, como os


raios X ou os raios solares. Mas há também outros tipos de radiações!

Espectro eletromagnético

Num sentido amplo, radiação é aquilo que irradia (sai em raios) de


algum lugar. Em física, o termo refere-se usualmente a partículas e campos
que se propagam (transferindo energia) no espaço (preenchido ou não por
matéria).

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A radiação pode ser de natureza particulada (de partículas) ou


ondulatória (de ondas). A radiação de natureza particulada é caracterizada por
sua carga, massa e velocidade: pode ser carregada ou neutra, leve ou pesada,
lenta ou rápida. Prótons, nêutrons e elétrons ejetados de átomos ou núcleos
atômicos são exemplos de radiação particulada. A radiação eletromagnética é
constituída por campos elétricos e magnéticos variando no espaço e no tempo,
sendo caracterizada pela sua amplitude (A) e pela sua frequência (f) (ou,
alternativamente, pelo comprimento de onda (λ)).
Lembrem-se E = h . f f=c/λ F E = h . c / λ
h = constante de Planck

A velocidade de propagação da radiação eletromagnética num dado


meio é sempre constante, atingindo seu valor máximo no vácuo (cerca de
300.000 km/s). Apesar de não possuir carga ou massa, carrega energia e
momento. A radiação eletromagnética é absorvida e emitida pela matéria em
“quanta” de energia. As ondas de rádio, a luz visível e os raios X são exemplos
de radiação eletromagnética.

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EMISSÃO RADIOATIVA
A radioatividade é um fenômeno natural pelo qual algumas substâncias
ou elementos químicos, chamados radioativos, são capazes de emitir
radiações. Desde o descobrimento da radioatividade em 1896 por Becquerel, já
se sabe que os átomos radioativos se desintegram espontaneamente em
átomos (radioativos ou não) diferentes. Se um átomo tiver seu núcleo muito
energético, ele tenderá a estabilizar-se, emitindo o excesso de energia na
forma de partículas e ondas, as quais têm a propriedade de impressionar
placas fotográficas, ionizar materiais, atravessar corpos opacos à luz ordinária,
etc.
As radiações emitidas pelas substâncias radioativas são principalmente
partículas alfa, partículas beta e raios gama. Assim, o decaimento radioativo ou
desintegração radioativa é a transmutação que ocorre quando o elemento
instável (chamado muitas vezes de átomo pai) emite uma partícula
transformando-se em outro elemento (denominado átomo filho).

emissão alfa emissão beta

Veja por exemplo o C-14 ou radiocarbono, que é um isótopo radioativo


natural do elemento carbono. Este isótopo apresenta dois nêutrons a mais no
seu núcleo que o isótopo estável C-12. Ele sofre desintegração radioativa

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emitindo uma partícula beta, transformando-se em N-14. Assim, após a


emissão da partícula, o elemento original (C-14) transforma-se em outro
elemento (N-14). A desintegração do C-14 pode ser representada por:

Os sub-índices dos elementos, 6 do C e 7 do N, representam o número


atômico e o sobre-índice 14 de ambos, o número de massa. Uma partícula beta
(β) é emitida na desintegração.
O homem sempre conviveu com a radioatividade. Nas rochas,
encontramos radioisótopos (isótopos radioativos), como o U-238 (isótopo
radioativo mais abundante da crosta terrestre), U-235, Th-232, Ra-226 e Ra-
228. Até mesmo em vegetais pode ser detectada a radioatividade: as batatas,
por exemplo, contêm K-40 e C-14. Nos nossos sangue e ossos encontram-se
K-40, C-14 e Ra-226.
Dentro do incrivelmente pequeno núcleo, as duas maiores forças da
natureza (nuclear e eletromagnética) são colocadas uma contra a outra.
Quando o balanceamento é quebrado, surgem de lá partículas e ondas com
enorme energia.

Gráfico de Segrè
Dentro de um total de 2500 nuclídeos conhecidos, menos de 300 são
estáveis. Não sabemos exatamente o porquê de alguns serem radioativos e
outros não, pois ainda não conseguimos fazer um modelo nuclear preciso. Mas
dispomos de uma pista: se dispusermos num gráfico cuja abscissa é o número
atômico Z e na ordenada o número de nêutrons N teremos uma figura como
mostrada a seguir. Um gráfico como esse é chamado de Gráfico de Segrè.
Quase todas as linhas com A constante passam através de um ou dois
nuclídeos estáveis. Não há nuclídeos estáveis com A = 8, pois eles preferem
se dividir em dois nuclídeos duplamente “mágicos” com A = 4 e Z = 2. Esse
mesmo nuclídeo duplamente mágico não tem interesse em receber mais um
núcleon, portanto, não é formado nenhum nuclídeo estável com A = 5.
Para nuclídeos com massa pequena, a região de estabilidade se
concentra em Z=N. A razão N/Z cresce gradualmente com A até cerca de 1,6.
Isso é devido influência da repulsão coulombiana entre os prótons. Nuclídeos

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fora dessa região buscam estabilidade fazendo alterações no número de


nêutrons e prótons nele contidos tentando se aproximar dessa região.

Gráfico de Segrè - Estabilidade dos núcleos. Os círculos cheios (x)


representam núcleos estáveis. A linha cheia corresponde a N=Z.

Acima da curva de estabilidade há excesso de nêutrons e abaixo


excesso de prótons. Nenhum nuclídeo é estável também com A>209 ou Z>83,
já que um nuclídeo é instável quando é grande demais. Também nuclídeos
com Z=43 e Z=61, tecnécio e promécio, respectivamente, não são estáveis.

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Partículas alfa
O decaimento alfa (α) acontece quando um núcleo (natural ou produzido
artificialmente), em geral pesado, emite uma partícula composta por dois
prótons e dois nêutrons, ou seja, por um núcleo de hélio.
O decaimento alfa é usualmente representado segundo o esquema:
A A− 4
Z X→ Y + 24 He 2+
Z −2

4
2 He 2+ = partícula alfa (α)
Um exemplo é o decaimento do amerício-241 em neptúnio-237:
241
95Am → 23793Np + 42He2+

Esse tipo de decaimento ocorre em geral para núcleos muito grandes para
serem estáveis. Ele só será possível se a massa do átomo neutro original for
maior que a soma das massas do átomo neutro final e da massa do átomo
neutro de hélio.
As partículas alfa são emitidas sempre com um espectro discreto, isto é,
238 235
as energias emitidas possuem sempre valores determinados. O U, U,
239
Pu e o 231Pa são exemplos de emissores alfa.

Decaimento beta (β)


A radiação beta é uma forma de radiação ionizante emitida por certos
tipos de núcleos radiativos semelhantes ao K-40. Esta radiação são elétrons de
alta energia (β−) ou posítrons (β+) emitidos de núcleos atômicos num processo
conhecido como decaimento beta.

Decaimento β− (emissão de elétrons)


O decaimento beta ( β − ) ocorre em nuclídeos com razão N/Z grande

demais para que haja estabilidade, ou seja, as partículas β − são emitidas por
núcleos instáveis que possuem um excesso de nêutrons. Os nêutrons não são
partículas fundamentais. O núcleo atômico pode diminuir essa quantidade
excessiva de nêutrons convertendo um deles em um próton:

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Por causa da lei de conservação do momento, o produto resultante de


um decaimento deve ter um momento total zero, e a energia deve ser
conservada. No caso do decaimento beta, apenas a emissão do elétron estaria
violando essas leis de conservação, pois o átomo e a partícula beta
normalmente não retrocedem em direções opostas. A fim de impedir a violação
das leis de conservação de energia e momento linear, Wolfgang Pauli postulou
a existência de neutrinos, partículas com um momento e energia cinética
apropriada para balancear o evento, mas que apenas muitos anos depois
foram determinadas experimentalmente.

Representação do decaimento β −

O neutrino foi assim denominado, pois a partícula deveria ter massa


muito pequena (ou zero) e carga nula. Dessa forma era muito difícil de ser
identificada. Como os neutrinos não têm carga elétrica quase nunca interagem
com quaisquer outras partículas. A maioria dos neutrinos passa direto através
da Terra sem ter sequer interagido com um único átomo dela.
O decaimento β − é usualmente representado segundo o esquema:
A
Z X → −10 β + Z +A1Y + 00 ν

OBS: ν representa a antipartícula do neutrino.


60
Ex: Co→−10β + 28
27
60
Ni + 00ν

Os elétrons assim obtidos são chamados de radiação beta e são idênticos aos
elétrons da camada eletrônica, diferindo destes apenas quanto à sua origem.
Pela lei de conservação de massa, para ocorrer esse tipo de decaimento a
massa atômica do átomo neutro original deve ser maior que a massa do átomo
neutro final.
90
Sr, 99Tc e 45Ca são exemplos de fontes de radiação beta.

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Decaimento β+ (Emissão de pósitrons)


Em núcleos instáveis que possuem relativamente poucos nêutrons em
relação a prótons, há a conversão de um de seus prótons em um nêutron:

A partícula emitida nesse caso é um pósitron (que tem mesma massa dos
elétrons, mas com carga positiva). O decaimento β + é usualmente
representado segundo o esquema:
A
Z X → +10 β + Z −A1Y + 00 ν
57
Ex: 27 Co→+10β + 26
57
Fe + 00ν
Pela lei de conservação de massa-energia, para ocorrer esse tipo de
decaimento a diferença entre a massa atômica do átomo neutro original e a
massa do átomo neutro final deve ser maior que duas vezes a massa de
repouso do elétron (ou seja, 1,022 MeV) para que haja a criação do pósitron, a
antipartícula do elétron.
Para cada tipo de partícula de matéria que nós encontramos, existe uma
partícula correspondente de antimatéria ou uma antipartícula. As
antipartículas se parecem com suas correspondentes partículas de matéria,
mas apresentam algum comportamento contrário, como no caso da carga
elétrica do pósitron em relação ao elétron. Por exemplo, um próton é
eletricamente positivo, ao passo que um antipróton é eletricamente negativo.
Uma partícula de matéria tem também a mesma massa de uma antipartícula.
A emissão do pósitron no decaimento β+ é sempre acompanhada por
radiação de aniquilação. A aniquilação de pares ocorre quando uma partícula
encontra a sua antipartícula e, na interação, desaparecem, produzindo
radiação eletromagnética. Na aniquilação do par elétron-pósitron, um pósitron
produzido, por exemplo, num decaimento nuclear, após perder sua energia
cinética, quando se encontra com um elétron, ambos desaparecem originando
um par de fótons (radiação gama) com uma energia de 0,511 MeV cada, que é
a energia correspondente a massa de repouso do elétron. Ou seja, são
liberados 1,022 MeV na aniquilação pósitron-elétron, que corresponde
exatamente a duas vezes a massa de repouso do elétron. Os fótons seguem a
180º um do outro para haver conservação de momento.

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Alguns dos radioisótopos emissores de pósitrons de interesse da


medicina são: C-11, F-18, N-22. Estes radioisótopos são amplamente utilizados
em medicina nuclear nos ultrasensíveis mapeadores tipo PET (Positron Emition
Tomography). No PET são detectados os gamas resultantes da aniquilação do
par elétron-pósitron.

Captura de elétrons (CE)


Quando um núcleo que possui relativamente poucos nêutrons em
relação a prótons (i.e, razão N/Z pequena demais para haver estabilidade) não
tenha energia disponível para a produção do pósitron, ou seja, a diferença
entre a massa atômica do átomo neutro original e a massa do átomo neutro
final é menor que 1,022 MeV, o núcleo original (núcleo pai) pode capturar um
de seus próprios elétrons, em geral da camada K, que é a mais próxima do
núcleo, e emitir um neutrino. Esse processo é chamado de captura eletrônica
(CE), que é usualmente representado segundo o esquema:
A
Z X + −1o e→ Z −A1Y + 00 ν
O decaimento por CE só ocorre, pela lei de conservação de massa, para
os casos em que massa atômica do átomo neutro original maior que a massa
do átomo neutro final.

Radiação gama
Geralmente, após a emissão de uma partícula α ou β o núcleo resultante
desse processo, ainda com excesso de energia, procura estabilizar-se,
emitindo esse excesso em forma de onda eletromagnética, da mesma natureza
da luz, denominada radiação gama.
Como a energia do movimento interno do núcleo é quantizada, um
núcleo típico possui um conjunto de níveis de energia, incluindo seu estado
fundamental e diversos estados excitados. Em geral, quando um núcleo emite
uma partícula α ou β, pode decair em um núcleo filho em um desses estados
excitados. O excesso de energia é liberado na forma de um fóton de raio gama
(γ). Como pode haver diversos níveis possíveis, o decaimento poderá ser feito
por variados caminhos.

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Diversos esquemas de decaimento nuclear.

Enquanto que na emissão das partículas α, β e outros processos


radioativos, o núcleo se transforma no núcleo de outro elemento químico, no
caso da emissão gama, emissão de radiação eletromagnética, o núcleo
remanescente será do mesmo elemento químico. Os raios gama são diferentes
dos raios X apenas pelo fato de que provém do núcleo, mas maioria deles tem
energia mais alta e, por isso, são muito penetrantes. É o mais útil tipo de
radiações nucleares para fins médicos, mas ao mesmo tempo é o mais
perigoso devido à sua capacidade de penetração nas grandes espessuras de
material.

Raios X característicos
Raios X também são produzidos em decaimentos radioativos. Por
exemplo, a CE deixa um "buraco" na camada eletrônica K. O rearranjo dos
elétrons orbitais para preencher este "buraco" provoca a emissão de raios X
característicos.

Emissão de raios X característicos após a CE.

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Conversão interna
Outro processo natural que produz a emissão de elétrons é a conversão
interna. Neste decaimento, energia de excitação do núcleo, que deveria ser
emitida como radiação gama, é transferida diretamente para um elétron orbital
que é ejetado do átomo com uma energia dada pela diferença entre a energia
de excitação EEx do núcleo e a energia de ligação do elétron na eletrosfera EB:
Ee = EEx – EB
137 109 207
O Cs, o Cd e o Bi são exemplos de fontes de elétrons de
conversão.
Novamente aqui serão emitidos Raios X característicos, pois esse
elétron ejetado essa deixa um "buraco" na camada eletrônica e haverá
rearranjo dos elétrons orbitais para preencher este "buraco".

Elétrons Auger
Embora esta energia liberada na trasição dos elétrons de níveis mais
energéticos para níveis menos energéticos ocorra às vezes na forma de um
fóton de raio X característico, essa energia pode também ser transferida
diretamente a um outro elétron orbital, que pode então ser ejetado do átomo,
sem haver emissão do fóton. Quando isso ocorre, os elétrons ejetados são
denominados de elétrons Auger.

ESPECTROS DE ENERGIA

Espectro de emissão alfa


A quantidade de energia total liberada nos processos de decaimento é
sempre correspondente diferença de massa entre o núcleo pai e os produtos
gerados, ou seja, a massa do núcleo inicial menos os produtos finais
(partículas emitidas e núcleo filho).
Devido às leis de conservação de energia e momento, no caso da
emissão alfa, podemos demonstrar que a energia total será dividida de modo
que cada produto (núcleo filho e He-4) irá receber uma quantia inversamente
proporcional a sua massa. (Lembre-se que K = p2/2m. Sendo assim, a partícula
alfa ficará com E = (A-4)/A.
α

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Esquema de decaimento alfa do Th-228: a esquerda, esquema de decaimento;


a direita, espectro de energia das partículas alfa discreto.

Espectro de emissão beta


No decaimento β − , como a massa do elétron é desprezível em relação
à massa do núcleo filho, toda a energia liberada poderá ser recebida pelo
elétron. Porém como já sabemos, há também a emissão de um anti-neutrino. O
elétron carregará uma fração da energia (Q) da reação que foi liberada; o
restante será carregado pelo antineutrino.
Em cada decaimento a fração de energia carregada pelo elétron poderá
ser diferente de outro decaimento de um nuclídeo exatamente igual. Assim, a
energia é dividida por ambos, podendo o elétron receber desde a energia total
liberada e o neutrino não receber nada ou o contrário, desde que a soma de
ambas as energias seja igual a energia total liberada (Q). O espectro de
energia do decaimento beta (do elétron emitido) será contínuo. A forma da
curva destas energias pode ser prevista a partir da teoria de Fermi do
decaimento beta.

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Espectro de emissão beta é contínuo.

No caso do decaimento β + , o processo será bem parecido com a


emissão do elétron. Mas nesse decaimento são emitidos pósitrons, e para criar
este último são necessários 1,022 MeV. Então, a energia máxima que um
pósitron poderá receber corresponde energia liberada (da diferença de massa)
menos 1,022 MeV, que é gasta para a produção do pósitron. O espectro de
energia do pósitron será também contínuo, pois ele também irá dividir a energia
disponível com o neutrino.

O espectro de energia dos pósitrons é contínuo.

A probabilidade do pósitron receber toda a energia liberada ou não


receber nada é bem pequena. O valor mais provável de energia recebida pelo
pósitron é cerca de 1/3 da energia máxima liberada. O mesmo ocorre com os
elétrons emitidos no decaimento beta negativo.

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Valor mais provável de energia recebida pelo pósitron é cerca de 1/3 da


energia máxima liberada.

No caso da CE só há a emissão de um neutrino. Sendo assim, toda a


energia disponível irá para essa partícula, e seu espectro será discreto.

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Aula 7
Aplicações da radioatividade e seus efeitos biológicos

Meta

Apresentar alguns dos benefícios e riscos biológicos do uso das radiações

Objetivos

Ao final desta aula, você deverá ser capaz de:

• Reconhecer a lei do decaimento radioativo


• Compreender e diferenciar a meia-vida e a vida média de um
radionuclídeo.
• Compreender as interações das diferentes radiações com a matéria
• Reconhecer os efeitos biológicos das radiações.

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Introdução
O homem sempre conviveu com as radiações. Na superfície terrestre pode ser
detectada energia proveniente de raios cósmicos e de radionuclídeos em rochas, plantas
e até em nós mesmos, além da radiação solar ultravioleta. Por exemplo, os raios
cósmicos são partículas carregadas e íons pesados de altíssima energia produzidos por
reações nucleares em toda galáxia e no Sol. Ao interagir com a atmosfera terrestre os
raios cósmicos produzem um “chuveiro” de partículas (múons, píons, káons, anti-
prótons, elétrons etc.) que atingem a superfície da Terra a uma taxa de
aproximadamente 500 partículas por metro quadrado por segundo. Não temos como
fugir disso. Mas podemos controlar outros tipos de fontes de radiação.
A radiação pode ajudar na detecção de uma doença, como em uma radiografia,
ou até curar, como é o caso da radioterapia. Mas ela também pode provocar
queimaduras, falha dos órgãos e até a morte. Então quais são os limites de exposição a
ela?
Para dar essas respostas precisamos conhecer um pouco mais das características
dos núcleos radioativos e das radiações emitidas, além das formas de interação com os
materiais. Depois de analisar o efeito de cada uma delas no corpo humano e na natureza
em geral, e finalmente poderemos estabelecer limites para a exposição. Isso é o que
vamos ver na aula de hoje.

Lei do decaimento radioativo e atividade


Em cada emissão de uma partícula alfa ou beta, há uma variação do número de
prótons no núcleo, isto é, o elemento se transforma em outro, de comportamento
químico diferente. Os núcleos instáveis de uma mesma espécie, não realizam todas as
mudanças ao mesmo tempo. As emissões de radiação são feitas de modo imprevisto,
não sendo possível adivinhar o momento em que um determinado núcleo irá emitir
radiação. Entretanto, para a grande quantidade de átomos existente em uma amostra é
razoável esperar-se certo número de emissões ou transformações em cada segundo. Essa
taxa de transformações é denominada atividade (A) da amostra.
Cada elemento radioativo se desintegra a uma velocidade que lhe é
característica. A probabilidade de que ocorra desintegração de cada núcleo de um dado
isótopo na unidade de tempo é dada pela constante de desintegração (λ).

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A lei do decaimento radioativo é uma função que descreve quantos núcleos


radioativos existem numa amostra a partir do conhecimento do número inicial de
núcleos radioativos e da taxa de decaimento. Ela é obtida a partir da hipótese de que o
número dN de núcleos que decaem num intervalo de tempo dt é proporcional ao número
de núcleos radioativos existentes e ao próprio intervalo dt:
dN = - λN dt,
onde λ é a constante de decaimento do material. Integrando-se a expressão acima se
obtém a lei do decaimento radioativo:
N(t) = N0 e- t
λ

onde N(t) é o número de átomos radioativos no instante t, N0 é o número de átomos


radioativos no instante t = 0 .
Experimentalmente se observa que a atividade de uma substância radioativa
diminui com o tempo. A atividade (A) de uma fonte é a taxa com que os núcleos
radioativos decaem, ou seja, a razão do número de desintegrações nucleares dN num
intervalo de tempo dt.
A = - dN(t)/dt
Quanto maior o número de nuclídeos radioativos da amostra, maior é o número de
núcleos que decaem em qualquer intervalo de tempo. Então, a atividade é diretamente
proporcional a N(t).
A = - dN(t)/dt = λ.N(t)
Substituindo a expressão para N obtém-se:
A = A0 e- t,
λ

Decaimento da atividade de amostra de I-131

onde A0 = λN0 é a atividade da fonte no instante t = 0. Portanto, o comportamento da


atividade é descrito matematicamente por uma lei exponencial. Na prática, o que se
mede é o número de contagens por unidade de tempo, registrado por um instrumento
(um detector de radiação). Destas, é possível obter a atividade.
Até recentemente a unidade utilizada era o curie (Ci), definido originalmente
como a atividade de um grama de rádio e depois padronizada como 3,7 × 1010
desintegrações por segundo (exatamente).

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Em 1977 a Comissão Internacional de Proteção Radiológica (ICRP) definiu


como unidade padrão de atividade o becquerel (Bq), definido como uma desintegração
por segundo (1 Bq = 1 s-1).

Meia vida (T1/2) e vida média (tm)


Qual o tempo que leva para que metade dos átomos radioativos presentes em
uma amostra se desintegrem? Esse tempo é denominado meia-vida (T1/2).
Todos os elementos radioativos têm uma meia-vida distinta e imutável. A meia-
vida é uma constante física que só depende do tipo de átomo que se desintegrará. Ela
não é alterada pela temperatura, pressão, presença de outros átomos etc. Cada elemento
radioativo tem uma meia-vida própria, que o distingue dos demais. A meia vida está
relacionada à constante de decaimento radioativo.

Lembrando que N(t) = N0 e- t λ

Se metade dos átomos radioativos presentes quando t = T1/2


Então
N0/2 = N0 e- λ
T1/2

½=
e- λ
T1/2

T1/2 = ln2 / λ = 0,693/λ

Já a vida média de um elemento radioativo é avaliada como sendo a soma das


idades de todos os átomos, dividida pelo número total de átomos. Ela está relacionada à
constante de decaimento através de:
tm = 1 / λ

Radioatividade versus raios X


O tipo mais penetrante de radiação são os raios gama. Os raios gama (γ) são
ondas eletromagnéticas (não possuem massa) como a luz, apenas de frequência e
energia bem maior, emitidos após um núcleo ter emitido uma partícula α ou β.
Muitas pessoas se confundem, pensando que os raios X e a radioatividade são a
mesma coisa. Como se viu na aula anterior, a radioatividade é uma propriedade dos
núcleos radioativos. Já os raios X, diferentemente, são devido a transições eletrônicas e
podem ser gerados com a aceleração de elétrons dentro de uma ampola de vidro em

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CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

vácuo (tubo de raios X). Quando o tubo é ligado, uma corrente elétrica em um filamento
faz com ele se aqueça e emita elétrons, que são atraídos e acelerados em direção a um
alvo, sendo desacelerados dentro dele. Parte da energia cinética (do movimento) dos
elétrons é transformada em raios X, que são também radiação eletromagnética como os
raios gama, mas em geral de energia menor. Assim, os raios X estão conectados com os
elétrons e, a radioatividade com o núcleo. Os efeitos provocados na matéria tanto pela
radiação gama (nuclear) quanto pela radiação X são comparáveis, levando-se em conta
a energia de cada uma.

Efeito da radiação sobre os materiais


As radiações podem ser classificadas em ionizantes ou não ionizantes. Quando a
radiação cósmica ou a radiação do ambiente ao redor do material ou que esteja dentro
do próprio material, o atinge, tanto as partículas, (como alfa e beta), quanto às radiações
eletromagnéticas (como gama e X) podem ceder energia aos elétrons da matéria, sendo
que alguns deles são liberados de seus átomos, tornando-os íons. Então, a ionização
acontece quando a energia da radiação incidente sobre um material é suficiente para
arrancar elétrons dos seus átomos. A radiação alfa, por exemplo, é muito ionizante,
porém pouco penetrante na matéria.
A radiação é dita não ionizante quando sua energia não é suficiente para arrancar
elétrons dos átomos. Mesmo quando a radiação é não ionizante ela pode promover
modificações atômicas. Neste caso pode ocorrer a excitação do átomo, em que elétrons
são levados a camadas mais externas do átomo, sem serem ejetados. Para a excitação de
um átomo, a energia fornecida pela radiação deve ser igual à diferença de energia entre
os níveis de origem e de destino do elétron. Este fato ocorre porque os elétrons se
encontram em níveis de energia bem definidos nas camadas eletrônicas dos átomos.

Radiação alfa
A principal interação das partículas alfa ocorre devido à interação coulombiana
com as camadas eletrônicas. Por ser aproximadamente 8000 vezes mais massiva do que
um elétron, ela é capaz de passar por eles sem sofrer muito deslocamento. Por isso, o
seu trajeto na matéria tende a ser linear.
No traçado do percurso da partícula alfa, podem aparecem ramificações
denominadas raios delta, que são elétrons ejetados com grande energia cinética, e que

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antes de retornarem aos seus orbitais perdem essa energia produzindo em seu trajeto
novos pares de íons.
Como a distância percorrida por uma partícula alfa em um dado meio é pequena,
ela é de fácil blindagem. Ela percorre cerca de alguns cm no ar ou alguns µm em tecido
biológico (menos que as camadas de células mortas). Portanto, quando uma pessoa é
irradiada com esse tipo de partícula externamente, ela em geral não é prejudicial. Mas
devido ao seu alto poder de ionização, ela é muito perigosa internamente ao corpo.

Radiação beta
Como para as partículas alfa, a principal interação das partículas beta ocorre
devido à interação coulombiana com as camadas eletrônicas. Elétrons ou pósitrons são
emitidos pelo núcleo com velocidade próxima a da luz (~1/3 c). Ao se aproximarem dos
elétrons de um átomo, são desviados e perdem energia. Por ser muito pequena, a
partícula beta sofre muito a ação dos campos nucleares e dos próprios elétrons orbitais,
e assim, sua trajetória não é linear como a partícula alfa. Além disso, ao passar próximo
a um núcleo, tem sua direção alterada, sofrendo desaceleração e, consequentemente,
emite radiação de freamento, ou seja, raios X.
Seu alcance depende da sua energia cinética e do n° de elétrons com o qual
interage, que por sua vez é proporcional ao n° de elétrons por unidade de massa, i.e.,
depende da razão Z/A. Quanto maior for o número de elétrons encontrados, mais
rapidamente a partícula beta cederá sua energia. São, então, moderadamente
penetrantes. Por exemplo, penetram cerca de até alguns metros no ar ou alguns
milímetros em tecido. São bastante utilizados em radioterapia, podendo ser colocada
uma fonte emissora de radiação beta diretamente em um tumor para destruição desse
tecido.

Nêutrons
Como se trata de uma partícula neutra emitida pelo núcleo pode ser muito
penetrante. Pode sofrer colisões elásticas e inelásticas com outros núcleos ou ser
absorvida por um deles. No caso de sua absorção, pode provocar reações nucleares que
podem liberar partículas ou radiação gama, as quais geram bastante ionização do meio.
Para proteção radiológica contra nêutrons é necessária uma blindagem especial.

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Radiação eletromagnética
Em geral as radiações ionizantes eletromagnéticas (raios X e gama) são muito
penetrantes (por ex. muitos metros no ar) e, por isso, de difícil blindagem, para a qual,
em geral, é utilizado o chumbo. Elas têm, porém, menor poder de ionização que as
partículas alfa ou beta.
Na escala atômica a radiação eletromagnética transfere para o meio sua energia
por quatro processos principais, a saber: efeito fotoelétrico, efeito compton, produção de
pares e fotodesintegração.
A radiação eletromagnética é a mais utilizada em indústria, hospitais etc. Pelas
suas propriedades é muito utilizada na formação de imagens médicas, por exemplo, ou
na radioterapia. Também é usada em radiografias industriais, como no caso de detecção
de fissuras em asas de aviões. Por seu grande poder de penetração, é a mais difícil de ser
blindada, e pode ocasionar graves acidentes radiológicos.

Efeito Fotoelétrico
A radiação incidente transfere sua energia total para um único elétron orbital
ejetando-o do átomo. O processo de troca de energia é dado pela equação:
Ec = h.f - Elig ,
Onde Ec é a energia cinética, (h.f) é a energia da radiação incidente e Elig é a
energia de ligação do elétron ao seu orbital.
O fotoelétron (elétron expelido do átomo) poderá perder a energia recebida
produzindo ionização em outros átomos.

Efeito Compton
Nesse caso, parte da energia da radiação incidente (λ) é transferida para o
elétron, que sai com velocidade v. O restante da energia é cedida para o fóton espalhado
(λ´). O fóton espalhado terá uma energia menor e uma direção diferente da incidente. O
principal efeito que ocorre entre os raios X e as pessoas (ou materiais) em um
radiodiagnósticos é o efeito compton.

Produção de pares
Ocorre somente quando fótons de energia igual ou superior a 1,022 MeV passam
próximos aos núcleos atômicos. Nesse caso, a radiação desaparece, dando origem a um
par elétron-pósitron com energia cinética.

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O pósitron e o elétron perderão sua energia cinética pela ionização e excitação


dos átomos. Ao perder toda sua energia cinética, o pósitron interage com um elétron do
meio, havendo aniquilação de ambos e a criação de dois fótons com 511keV de energia
cada um, saindo na mesma direção mas com sentidos opostos.
A figura abaixo mostra a probabilidade de ocorrência de efeito fotoelétrico, efeito
compton e produção de pares, em função da energia da radiação eletromagnética
incidente e do número atômico Z do absorvedor. Para fótons de baixa energia o efeito
fotoelétrico é dominante. A produção de pares pode ocorrer apenas com fótons com
energia superior a 1,022 MeV (que corresponde ao dobro da energia da massa de
repouso do elétron).

Fotodesintegração
O fóton gama interage diretamente com o núcleo atômico e cria tamanha
instabilidade no núcleo que o faz emitir próton, nêutron ou partícula alfa.
Para produzir reações nucleares é necessário que o fóton gama tenha energia
superior a 6 MeV. Por exemplo, nos alimentos irradiados e na esterilização é utilizada
uma fonte de 60Co, cujos fótons tem aproximadamente 1,25 MeV, ou seja, esse valor é
muito abaixo daquele necessário para produzir reações nucleares.

Absorção do feixe de radiação eletromagnética


Toda vez que um feixe de radiação eletromagnética incide numa lâmina delgada
ele sofre uma absorção, diminuindo-se exponencialmente sua intensidade em função da
espessura da lâmina. Essa diminuição ocorre devido aos processos de interação da
radiação com o meio, já citados anteriormente. Se a probabilidade de remover um fóton
do feixe for dada por µ, denominado coeficiente de absorção linear do material

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absorvedor, teremos a intensidade (I) do feixe após passar pelo absorvedor será dada
por:
I = I0exp(-µX)
Sendo I0 a intensidade do feixe antes de passar pelo absorvedor, µ o coeficiente de
absorção linear do material absorvedor e X a espessura do absorvedor.

Dose de radiação
Como já foi explicado, as radiações ionizantes podem ser perigosas aos seres humanos,
pois têm um potencial de causar vários tipos de efeitos biológicos. Perguntas como estas
são constantes em práticas que usam radiação ionizante:
• Há riscos associados ao uso de raios-X para fins médicos?
• A radioterapia causa “efeitos colaterais” devido ao uso de radiação ionizante?
• As usinas nucleares são perigosas?
Para garantir a segurança destas práticas, a Proteção Radiológica é fundamental.
Para isso, devemos ter parâmetros para calcular os efeitos das radiações. Vejamos
algumas grandezas associadas.
A Dose Absorvida ( ) é a medida da energia depositada pela radiação por
unidade de massa:

onde é a energia média depositada pela radiação ionizante na matéria de massa ,


num ponto de interesse.
O dano causado pela radiação depende da energia da radiação que é absorvida
pelo tecido. Por isso, a grandeza dose absorvida é muito importante em proteção
radiológica. Esta grandeza é aplicável a todos os tipos de radiações ionizantes. A
unidade atual desta grandeza é o gray (Gy):
1 Gy = 1 J/kg
Anteriormente, a dose absorvida era expressa em rad (radiation absorbed dose),
1 rad = 0,01 J/kg ou 10 mGy

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Para fins de proteção radiológica, são definidas grandezas específicas, que


permitem definir valores limitantes para garantir a segurança no uso das radiações
ionizantes. Uma das principais grandezas limitantes é a dose equivalente.
A Dose Equivalente (HT) é uma medida do dano biológico específico da
radiação nos seres humanos. A Dose Equivalente é dada por:
HT = DT.ωR
onde DT é a dose absorvida média no órgão ou tecido e ωR é o fator de ponderação da
radiação. Ou seja, a dose equivalente pondera as doses absorvidas pelo tipo de radiação,
considerando que o grau de toxicidade dos diferentes tipos de radiação é variável.
A unidade atual desta grandeza é o sievert (Sv):
1 Sv = 1 J/kg
Anteriormente, a dose equivalente era expressa em rem
1 rem = 0,01 Sv ou 10 mSv.
O grau de toxicidade da radiação ionizante depende do tipo de radiação.
Quanto maior a taxa de transferência linear de energia (LET), mais eficiente a radiação
é para produzir danos biológicos, que é dada numericamente pela RBE (Efetividade
Biológica Relativa da Radiação). RBE é uma medida relativa de efetividade de
diferentes tipos de energias de radiação em induzir um determinado dano à saúde.
O fator de ponderação da radiação reflete a eficiência de cada tipo de radiação de
causar danos biológicos e está diretamente relacionado ao LET. Por exemplo, as
partículas pesadas carregadas, como as partículas alfas, são mais perigosas do que os
fótons, como os raios gama e a radiação X. e isso deve ser levado em conta para efeito
da dose equivalente.

Tabela 1. Fatores de ponderação da radiação.


Tipo de Radiação ωR
Fótons 1
Elétrons e Múons1 1
Nêutrons < 10 keV 5
de 10 a 100 keV 10
> 100 keV a 2 MeV 20
> 2 MeV a 20 MeV 10
> 20 MeV 5
Prótons, exceto os de recuo, energia > 2 MeV 5
Partículas α, fragmentos de fissão, núcleos pesados 20

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Efeitos maléficos das radiações ionizantes


Os primeiros danos provocados pelas radiações ionizantes surgiram logo após a
descoberta da radiação X (1895) e da radioatividade (1896). Desde o início, a radiação
X foi utilizada para fins médicos, de diagnóstico e terapia, mas também foi utilizada
para fins não convencionais, como, por exemplo, a depilação.
A descoberta da radioatividade revolucionou o mundo científico, mas os malefícios
também ficaram evidentes. Os notáveis poderes curativos do rádio tornaram
primeiramente mais evidentes que a sua natureza destrutiva. Milhares de pessoas
compraram e usaram panacéias a base de rádio, que prometiam curar centenas de
doenças. Somente após muitas dessas pessoas adoecerem e morrerem devido à
exposição ao rádio, é que se compreendeu seu poder mortífero!

Exemplo de efeito maléfico da radiação

Os relatos de danos passaram a ser frequentes: eritemas, epilações, descamações,


infecções e dores fortes. Em muitos casos, já era tarde: os danos causados pelas
irradiações provocaram várias amputações de membros, induziram vários
aparecimentos de câncer e levaram alguns pesquisadores a óbito.
Desde então, a radiação ionizante figura como um dos mais estudados agentes
com potencial danoso aos seres humanos.
Embora ainda há muito a ser aprendido a este respeito, o que foi estudado até
agora é suficiente para que os profissionais de proteção radiológica possam manter as
práticas com o uso de radiação ionizante em níveis de risco menor ou igual às outras
práticas da saúde ou de tecnologia.
No Brasil, a norma regulatória de proteção radiológica é de autoria da Comissão
Nacional de Energia Nuclear (CNEN). As radiações ionizantes têm um potencial danoso
aos seres humanos indiscutível e, por isso, a proteção radiológica é essencial para o uso

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seguro deste tipo de radiação nos diversos fins pacíficos: medicina, indústria,
agricultura, segurança, pesquisa etc.

Contaminação
As exposições externas são caracterizadas por irradiações por fontes de
radiação posicionadas fora do corpo de pessoa irradiada. As radiações eletromagnéticas
ionizantes (radiação X e radiação gama) são as mais relevantes nas exposições externas,
devido ao seu alto poder de penetração. As partículas beta e, sobretudo, as partículas
alfa tem poder de penetração insuficiente para causar risco em exposições externas.
As exposições internas, por outro lado, são caracterizadas por irradiações por
fontes que se encontram no interior do corpo humano. Para que haja exposição interna,
é preciso que ocorra uma contaminação. A contaminação ocorre quando existe
presença de material radioativo em um local não indicado ou não esperado. Existem
várias rotas de entrada de material radioativo no corpo humano, sendo as três principais:
i. Inalação (Ar contaminado)
ii. Ingestão (bebida, comida, ou contato com a língua)
iii. Absorção (pele ou ferimento aberto).
O acidente radioativo com a capsula radioterápica de Cs-137 em Goiânia foi um
exemplo de um acidente com contaminação. O acidente com a usina Nuclear de
Chernobyl é outro exemplo famoso.
Os riscos associados a estes dois tipos diferentes de irradiação (interna e externa)
na são os mesmos. E devido às particularidades de cada uma dessas situações, os
métodos utilizados para controle dos riscos variam.

1. Partículas Alfa: devido ao seu baixo poder de penetração, este tipo de partícula não
atravessa a camada mais externa da pele. Por isso, considera-se que as partículas
alfa não apresentam risco associado a irradiações externas. O inverso ocorre em
irradiações internas. A partícula alfa se torna a mais perigosa de todas as radiações
por depositar toda sua energia no interior do corpo humano, tendo um grande poder
de ionização.
2. Partículas Beta: são mais penetrantes do que as partículas alfa e portanto podem
apresentar riscos de irradiação externa principalmente para dois órgãos e tecidos: a
pele e o cristalino dos olhos. Em ambos os casos, trata-se de um órgão superficial.
As partículas beta não apresentam risco aos demais órgãos quando as irradiações são

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externas, exceto em situações em que as partículas beta de alta energia interagem


com materiais de alto número atômico e geram radiação X de freiamento.
Internamente são moderadamente perigosas, já que irão provavelmente depositar
toda sua energia no corpo, porém apresentam um poder de ionização menor que a
partícula alfa.
3. Radiação Eletromagnética Ionizante (Raios X e Raios Gama): são radiações
capazes de atravessar o corpo humano e, portanto, apresentam risco a todos os
órgãos nas irradiações externas. Internamente são muito menos perigosas.
4. Nêutrons: também são capazes de atravessar o corpo humano, podendo depositar
energia por processos de interação com os tecidos (espalhamento). Podem ser
extremamente perigosos.

Efeitos da radiação
Os fenômenos associados à interação da radiação com a matéria são
absolutamente gerais no que diz respeito aos elementos químicos que formam o
material irradiado, seja biológico ou não. Destas interações surgem os efeitos biológicos
das radiações, que são as consequências posteriores à exposição.
Na primeira fase da interação da radiação ionizante com o tecido, ocorre a
transferência de energia. No processo de deposição da energia, a radiação incidente
provoca dois tipos de efeitos físicos: ionizações e excitações. Este fenômeno se
processa num intervalo de tempo muito curto, da ordem de 10-13 a 10-12 segundos.
Após os efeitos físicos, inicia-se uma fase de efeitos químicos, onde ocorrem
rupturas de ligações químicas nas moléculas, liberando radicais livres e produtos
moleculares. Esta fase se processa num intervalo de tempo de 10-10 a 10-9 segundos. É
nesta etapa que ocorre a radiólise da água, que é um fenômeno muito importante no
aparecimento de efeitos biológicos.
Após os efeitos químicos, podem surgir efeitos biológicos. As alterações
químicas podem provocar morte celular, impedimento ou retardo da divisão celular ou
modificações permanentes. O intervalo de tempo que esta etapa perdura é muito
variável: pode durar alguns minutos ou vários anos.
O aparecimento de efeitos biológicos não implica no aparecimento de doenças.
O organismo pode se recuperar dos efeitos biológicos, sem que haja um desequilíbrio
no organismo ou no funcionamento de um órgão. Entretanto, quando a quantidade e/ou

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a frequência dos efeitos biológicos é alta, o organismo não consegue reparar os danos e
surgem os efeitos orgânicos (ou doença). Esta etapa pode durar de horas a vários anos.
Os efeitos das radiações sobre os seres vivos são muitos e complexos. As
pesquisas sobre estes efeitos visam, em geral, correlacionar fatores tais como dose
recebida, energia, tipo de radiação, tipo de tecido, órgãos atingidos etc. Diferentes
tecidos reagem de diferentes formas às radiações. Alguns tecidos são mais sensíveis que
outros, como os do sistema linfático e hematopoiético (medula óssea) e do epitélio
intestinal, que são fortemente afetados quando irradiados, enquanto outros, como os
musculares e neuronais, possuem baixa sensibilidade às radiações.
Radiações ionizantes, no contexto biológico, são aquelas capazes de ejetar os
elétrons orbitais dos átomos de C, H, O e N. A quantidade de energia depositada por
uma radiação ionizante ao atravessar um material depende da natureza química do
material e de sua massa específica. É importante ressaltar que a absorção de radiações
ionizantes pela matéria é um fenômeno atômico e não molecular.
Em uma interação, a radiação cede a uma molécula certa quantidade de energia,
esta energia pode ser suficiente para arrancar um elétron orbital e conferir-lhe energia
cinética, provocando assim a ionização. Em outros casos a radiação não tem energia
suficiente para provocar ionização, mas consegue promover o elétron a um nível
energético superior, acarretando a excitação ou ativação. Existem também situações em
que a energia é muito baixa e apenas aumenta a velocidade de rotação, translação ou de
vibração da molécula.
A Tabela 2 mostra os primeiros potenciais de ionização para alguns elementos,
isto é, a energia necessária para que a radiação incidente possa arrancar o elétron de
valência, causando a ionização.

Tabela 2. Primeiros potenciais de ionização para alguns elementos


(em elétron-volts)
K 4,34 P 10,98
Na 5,14 C 11,27
Ca 6,11 Cl 12,96
Mg 7,65 H 13,60
Fe 7,80 O 13,62
S 10,36 N 14,55

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Qual exposição à radiação sofremos diariamente?

Médica Outras
15,0% 0,5%

Ingestão
9,5%

Radônio
50,0%
Cósmica
12,0%
Gama
13,0%

Fontes de Exposição à Radiação da


População Mundial
Dose Efetiva Anual média: 2,8mSv
(Artificial: 15,5% Natural: 84,5%)
(UNSCEAR, 2000 - adaptado de HPA, 2005)

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Apêndice

Um pouco sobre radiações não ionizantes

Radiações não ionizantes

Contexto biológico
Radiações não ionizantes são aquelas que não possuem energia suficiente para
arrancar elétrons dos átomos, porém podem quebrar moléculas e ligações químicas
através da excitação atômica.

No contexto biológico a radiação não-ionizante é aquela com energia


insuficiente para arrancar elétrons de dos componentes básicos de nosso corpo: C (11,27
eV ), H(13,60 eV), O (13,62 eV) e N (14,55 eV). Assim, as radiações eletromagnéticas
com energia menor que 12,4 eV (elétron-volt) são consideradas radiações não
ionizantes. Estão incluídas aí as radiações ultravioleta, infravermelha, radiofrequência,
laser, micro-uondas, luz visível.

Radiação Ultravioleta
A radiação ultravioleta (R-UV) é a parte do espectro eletromagnético referente aos
comprimentos de onda entre 100 e 400nm. De acordo com a intensidade que a R-UV é
absorvida pelo oxigênio e ozônio e, também pelos efeitos fotobiológicos costuma-se
dividir a região UV em três intervalos UVA, UVB e UVC.
Pode-se dizer que o Sol emite energia em, praticamente, todos os comprimentos
de onda do espectro eletromagnético permeados pelas diversas linhas de absorção. 44%
de toda essa energia emitida se concentram entre 400 e 700 nm, denominado espectro
visível de energia. O restante é dividido entre radiação ultravioleta (< 400 nm) com 7%,
infravermelho próximo (entre 700 e 1500 nm) com 37% e infravermelho (> 1500 nm)
com 11%. Menos de 1% da radiação emitida concentra-se acima da região do
infravermelho, como microondas e ondas de rádio, e abaixo da região ultravioleta, como
raios X e raios gama.

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Intervalo
Tipo espectral Características
(nm)
UVC 100 - 280 Completamente absorvida pelo O2 e O3 estratosférico e, portanto,
não atinge a superfície terrestre. É utilizada na esterilização de água
e materiais cirúrgicos.
UVB 280 - 320 Fortemente absorvida pelo O3 estratosférico. É prejudicial à saúde
humana, podendo causar queimaduras e, a longo prazo, câncer de
pele.
UVA 320 - 400 Sofre pouca absorção pelo O3 estratosférico. É importante para
sintetizar a vitamina D no organismo. Porém o excesso de
exposição pode causar queimaduras e, a longo prazo, causa o
envelhecimento precoce.

Índice Ultravioleta (IUV)


O Índice Ultravioleta (IUV) é uma medida da intensidade da radiação UV,
relevante aos efeitos sobre a pele humana, incidente sobre a superfície da Terra.
O IUV representa o valor máximo diário da radiação ultravioleta. Isto é, no
período referente ao meio-dia solar, o horário de máxima intensidade de radiação solar.
Como a cobertura de nuvens é algo muito dinâmico e variável, o IUV é sempre
apresentado para uma condição de céu claro. Isto é, para ausência de nuvens que, na
maioria dos casos, representa a máxima intensidade de radiação.
O IUV é apresentado como um número inteiro. De acordo com recomendações da
Organização Mundial da Saúde, esses valores são agrupados em categorias de
intensidades, conforme mostra a tabela abaixo:
CATEGORIA IUV
BAIXO <2
MODERADO 3a5
ALTO 6a7
MUITO ALTO 8 a 10
EXTREMO > 11

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Como o IUV é calculado


Alguns elementos são imprescindíveis para o cálculo do IUV:
Concentração de Ozônio: O ozônio é o principal responsável pela absorção de
radiação UV. A concentração de ozônio, medida em unidades Dobson (DU),
integrada na coluna atmosférica é utilizada como parâmetro de entrada no modelo
computacional utilizado para o cálculo do IUV. Essa concentração de ozônio é
distribuída verticalmente de acordo com perfis atmosféricos teóricos relativos a
posição geográfica da localidade. A concentração máxima de ozônio localiza-se na
estratosfera (entre 20 e 40km de altitude).
Posição geográfica da localidade: O fluxo de radiação UV diminui com o
aumento da distância ao Equador. Ou seja, regiões mais próximas à linha do
Equador recebem maior quantidade de energia solar.
Altitude da superfície: Quanto mais alta é a localidade, menor é o conteúdo de
ozônio integrado na coluna atmosférica e, consequentemente, maior a quantidade
de energia ultravioleta incidente na superfície. De acordo com perfis teóricos de
distribuição vertical, a quantidade de ozônio decresce em torno de 1% para cada
quilômetro; o que provoca aumento de cerca de 6 a 8% a quantidade de energia UV
incidente.
Hora do dia: Cerca de 20 a 30% da quantidade de energia UV no verão chega a
Terra em torno do meio-dia (entre 11h e 13h), e cerca de 70 a 80% entre as 9h e
15h.
Estação do ano: A irradiância (quantidade de energia por área) UVB diária em
torno de 20° de latitude aumenta cerca de 25% no verão e diminui de 30% no
inverno, em relação aos períodos de primavera/outono. Em zonas de maior latitude
(cerca de 40°), esses valores correspondem a + 70% e -70%, respectivamente.
Condições atmosféricas: A presença de nuvens e aerossóis (partículas em
suspensão na atmosfera) atenua a quantidade de radiação UV em superfície. Porém,
parte dessa radiação não é absorvida ou refletida por esses elementos e atinge a
superfície terrestre. Deste modo, dias nublados também podem oferecer perigo,
principalmente para as pessoas de pele sensível.
Tipo de superfície: A areia pode refletir até 30% da radiação ultravioleta que
incide numa superfície, enquanto na neve fresca essa reflexão pode chegar a mais
de 80%. Superfícies urbanas apresentam reflexão média entre 3 a 5%. Este
fenômeno aumenta a quantidade de energia UV disponível em um alvo localizado

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sobre este tipo de solo, aumentando os riscos em regiões turísticas como praias e
pistas de esqui.

Efeitos biológicos das radiações não ionizantes


Radiações que não são capazes de ejetar os elétrons da camada eletrônica para os
elementos considerados (C, H, O, N) são ditas não ionizantes (no contexto biológico).
Os efeitos dessas radiações nos organismos não são menos perigosos pelo fato de não
provocarem ionizações, pois elas não atuam só em nível atômico, como acontece com
radiações ionizantes, mas também em nível molecular, como acontece com a radiação
ultravioleta (UV) quando interage com a molécula de DNA (ácido desoxirribonucléico).
Os cuidados com as radiações solares são de suma importância na prevenção de doenças
como o câncer de pele (não melanoma). Deve-se evitar os raios solares entre 10h00 e
16h00 ou, caso inevitável, utilizar protetor solar com fator de proteção elevada e agir
com cuidado ao manusear frutas como o limão e figo (que contém furocumarinas) sob o
Sol pois podem ocorrer queimaduras gravíssimas e até fatais.

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Aula 8
Reações nucleares e fissão nuclear

Meta
Introduzir os conceitos sobre as reações nucleares e a liberação de energia
numa fissão

Objetivos

Ao final desta aula, você deverá ser capaz de:

• Reconhecer uma reação nuclear


• Compreender como é provocar uma reação nuclear
• Calcular a energia liberada ou necessária para uma reação nuclear
• Compreender como funciona um reator nuclear.

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CURSO DE INTRODUÇÃO A FÍSICA NUCLEAR – Professora Susana Lalic

Introdução

Nas aulas anteriores vimos os processos de decaimento dos nuclídeos instáveis


que emitem partículas alfa e beta, que podem ser seguida de emissão de radiação gama.
Esses processos são naturais, não fizemos nada pra iniciá-los e não podemos fazer nada
para controlá-los. Agora, ao invés de processos espontâneos, veremos alguns processos
que podem ser induzidos nos núcleos em nossos equipamentos, apesar de muitos deles
também poderem ocorrer na natureza.

Reações Nucleares
É possível modificar as propriedades dos núcleos bombardeando-os com
partículas energéticas. Essas transformações são chamadas de reações nucleares. Muitos
tipos de reações nucleares ocorrem em resposta à absorção de partículas, tais como
nêutrons e prótons. Outros tipos de reações podem envolver a absorção ou
espalhamento de raios gama.
Se um núcleo alvo X é bombardeado por uma partícula a e resulta em um núcleo
Y com a emissão de uma partícula b, isso pode ser escrito como:
a+X→Y+b ou X(a,b)Y
Se num evento as partículas a e b são idênticas, X e Y também serão, e o evento
é denominado espalhamento.
Pode-se caracterizar a energética da reação nuclear com a energia de reação Q,
que corresponde à energia liberada na reação. Essa energia da reação é dada por:
Q = (Ma + MX – MY – Mb)c2
Para levar em conta a contribuição dos elétrons, devemos usar as massas (M) dos
átomos neutros.

• Q > 0 se a massa total dos produtos é menor que a massa do projétil junto com a
do alvo, indicando que a energia total de ligação aumentou após a reação. Essa é
uma reação exotérmica ou exoenergética.
• Q < 0 se a massa total dos produtos é maior que a massa do projétil junto com a
do alvo, ocorreu uma reação endotérmica ou endoenergética. Nesse caso, a
reação só pode ocorrer se for fornecida ao menos uma energia igual a ⏐-Q⏐ ao

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sistema, denominada energia limite, que desencadeia a reação. Em geral essa


energia é fornecida dando energia cinética ao projétil (a) que atinge o alvo (X).
No caso dos espalhamentos:
• se Q = 0, a energia cinética é conservada, e a reação é chamada de espalhamento
elástico
• Se Q ≠ 0, a energia cinética não é conservada e a reação é chamada
espalhamento inelástico. Isso pode ocorrer, quando o núcleo atingido pela
partícula vai para um dos seus estados excitados, absorvendo parte da energia
cinética da partícula incidente.
Exemplos de reações nucleares

Para caracterizar a probabilidade de que uma determinada reação nuclear ocorrerá, é


habitual definir um tamanho efetivo do núcleo para a reação, chamado de seção
transversal ou seção de choque. Assim, a probabilidade de um dado tipo de reação
nuclear ocorrer é chamada de seção de choque (σ).σ é dada por:

A secção de choque tem unidades de área e é da ordem do quadrado do raio nuclear.


Uma unidade comum utilizada é o barn:

Devem ser conservados a energia, o momento, a carga total e o número de núcleons


numa reação nuclear.
Por exemplo, se um átomo de Li-7 é bombardeado por um próton, duas partículas
alfa são produzidas. A reação pode ser escrita como:

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1
H + 7Li → 4He + 4He ou 7
Li (1H,4He)4He
O número total de núcleons antes é (1+7)=8 e depois da reação também (4+4)=8. A
carga total é [(Z=1)+ (Z=3)]=4 antes e [(Z=2)+ (Z=2)]=4.
Considerado as partículas em repouso:
Q = (Ma + MX – MY – Mb).c2
ΔM = (1,007825 + 7,016004 – 4,002603 – 4,002603) = 0,018623 u
Então, Q = (0,018623 u) (931,5 MeV/u) = 17,35 MeV
Q>0, portanto a reação é exoenergética. Para conservação da energia, as duas partículas
alfa deverão ter energia cinética e o movimento deverá ser tal que conserve o momento.

Rutherford bombardeou N-14 com partículas alfa e obteve um núcleo de O-17 e um


próton. A reação pode ser escrita como:
4 14
He + N → 17O + 1H ou 14
N(4He,1H)17O
Rutherford usou partículas alfa de fontes radioativas naturais. Qual a energia cinética
mínima que essa partícula alfa deve ter para desencadear essa reação?
ΔM = (4,002603 + 14,003074 – 16,999132 – 1,007825) = -0,001280 u
Então Q = (- 0,001280 u ) (931,5 MeV/u) = -1,192 MeV
É uma reação endoenergética. Além das massas envolvidas, há a necessidade de mais
1,192 MeV de energia, que no experimento de Rutherford era provido pela energia
cinética das partículas alfa, pois o alvo estava e repouso.
Deve-se lembrar que deve haver a conservação da energia e do momento. Então,
quando a partícula alfa atinge o alvo em repouso, para haver conservação do momento,
parte da energia deve ser mantida em energia cinética das partículas, que não podem
ficar todas em repouso, para haver conservação do momento. A energia necessária é
ainda maior do que 1,192 MeV por esse motivo.
Mas também é possível fazer colidir dois núcleos ou partículas ambos em
movimento. Se um se move contra o outro, é possível conseguir uma proporção cujo
momento seja zero, e assim, toda a energia cinética pode ser transformada em massa,
não havendo necessidade das partículas criadas terem energia cinética para conservação
do momento. Esse é o método mais fácil de criar partículas mais pesadas, cuja energia
necessária seria muito maior, caso o alvo estivesse em repouso.

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Quando uma partícula com massa m e energia cinética K colide com uma
partícula em repouso com massa M, a energia cinética total (no sistema de referência do
centro de massa) disponível para produzir a reação é
Kcm= K . M/ (M+m)
(OBS: As energias cinéticas das partículas envolvidas são muito menores do que suas
energias de repouso).

No experimento de Rutherford, a energia cinética mínima será


1,192= K . 14,003074/ (14,003074+4,002603)
K =1,532 MeV

Bem, vejamos o que pode ocorrer no bombardeamento de partículas no núcleo:


Atração gravitacional – fraca
Atração pela força forte – somente em distâncias muito curtas
Força eletrostática – prótons (repulsão)

Para partículas carregadas como prótons ou alfa penetrarem no núcleo, elas devem ter
energia cinética suficiente para vencer a barreira coulombiana de repulsão.
Considerando o caso do próton bombardeando o Li-7. Vamos considerá-los
como cargas esfericamente simétricas. A distância entre seus centros quando se tocam é
de aproximadamente 3,5 × 10-15m. Calculando a energia potencial repulsiva:
U = (1/4πε0) (e . 3e)/r = (9,0 × 109 N.m2/C2) .3 . (1,6 × 10-19C)2/3,5 × 10-15 m
U = 2,0 × 10-13 J = 1,2 MeV
Portanto, mesmo sendo uma reação exoenergética, o próton deve ter energia
cinética mínima para atravessar a barreira de potencial coulombiano.
Já nêutrons não têm carga. Assim, a absorção de nêutrons é facilitada por não
haver esse potencial repulsivo.

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A absorção de nêutrons pelos núcleos constitui uma classe importante entre as reações
nucleares.
Ao se bombardear núcleos pesados com nêutrons pode haver diversas absorções (até
~25) alternadas com decaimentos beta, criando os elementos transurânicos, não
encontrados na natureza.
A técnica de ativação por nêutrons utiliza essa ferramenta analisando as emissões beta e
gama provenientes dos núcleos ativados. As emissões dependem do nuclídeo instável e
são usadas para sua identificação.

Fissão Nuclear
Fissão é uma reação nuclear é um processo de decaimento no qual o núcleo
instável se divide e que pode acontecer de forma espontânea ou provocada. Nessa
reação, um núcleo atômico, geralmente pesado, como o do urânio, por exemplo, divide-
se em duas partes de massas comparáveis (fragmentos de fissão), liberando grande
quantidade de energia.
Se um núcleo massivo como urânio-235 se rompe (fissiona), então não haverá
um rendimento líquido de energia porque a soma das massas dos fragmentos será menor
do que a massa do núcleo de urânio. Se a massa dos fragmentos é igual ou maior do que
a do ferro no pico da curva de energia de ligação, então as partículas nucleares serão
mais ligadas do que eram no núcleo de urânio, e a diminuição da massa sai na forma de
energia de acordo com a equação de Einstein (E=mc2). Ou seja, há conversão de massa
em energia nesse processo. A matéria só se converte em energia quando há um processo

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em que os constituintes iniciais de um núcleo atômico se rompem e a soma das massas


dos produtos é menor do que a massa de origem.

A fissão nuclear espontânea ocorre quando as oscilações naturais de núcleos


pesados fazem com que se quebrem em dois núcleos de massas semelhantes.
E a fissão nuclear induzida ocorre pelo bombardeamento de núcleos pesados, em geral
com nêutrons. A fissão de U-235 em reatores é desencadeada pela absorção de um
nêutron de baixa energia, muitas vezes chamado de "de nêutron lento" ou "de nêutron
térmico".

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Um nêutron lento pode ser capturado por um núcleo de urânio-235, tornando-o


instável para a fissão nuclear. Um nêutron rápido não será capturado, então os nêutrons
devem ser “moderados” para aumentar a sua probabilidade de captura em reatores de
fissão. Um único evento de fissão pode render mais de 200 milhões de vezes a energia
do nêutron que o desencadeou!
Se pelo menos um dos nêutrons liberados na fissão atinge um outro U-235, a
fissão novamente ocorre. A reação em cadeia é sustentada. Se a reação se auto-
sustentar, diz-se ser "crítica", e a massa de U-235 necessária para produzir a condição
crítica é chamada "massa crítica". A reação em cadeia crítica pode ser alcançada em
baixas concentrações de U-235 se os nêutrons de fissão são moderados para diminuir
sua velocidade, uma vez que a probabilidade de fissão com nêutrons lentos é maior.

Uma reação em cadeia de fissão produz fragmentos de massa intermediária, que


são altamente radioativos e produzem mais energia pelo seu decaimento radioativo.

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Alguns deles produzem nêutrons, chamadas nêutrons atrasados, que contribuem para a
reação de fissão em cadeia.
Enquanto o urânio-235 é o isótopo de ocorrência natural físsil, existem outros
isótopos que podem ser induzidos à fissão por bombardeamento de nêutrons. O
plutônio-239 é fissionável pelo bombardeamento com nêutrons lentos, e tanto ele como
o urânio-235 têm sido utilizados para a fabricação de bombas de fissão nuclear. O
plutônio-239 pode ser produzido a partir do urânio-238. O urânio-238, que compõe
99,3% do urânio natural, não é fissionável por nêutrons lentos. U-238 tem uma pequena
probabilidade de fissão espontânea, e também uma pequena probabilidade de fissão
quando bombardeado com nêutrons rápidos, mas não é útil como uma fonte de
combustível nuclear. O tório-232 é físsil, de modo poderia concebivelmente ser
utilizado como um combustível nuclear.
A fissão foi descoberta em 1938, por Otto Hahn e Lise Meitner, com o
bombardeamento de nêutrons em urânio. A radiação liberada não coincidia com
nenhuma outra proveniente de nuclídeos conhecidos e através da analise química dos
fragmentos de fissão, se concluiu que ocorria a fissão nuclear do urânio em dois
fragmentos menores.

A fissão em geral é assimétrica.


Os fragmentos não serão, na
maioria das vezes, exatamente
iguais.

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Como os núcleos pesados se dividem em núcleos menores, que necessitam de menor


quantidade de nêutrons, em geral, 2 a 3 nêutrons livres também são libertados e,
ocasionalmente, um nuclídeo leve como 3H pode ser liberado.

Combustível de urânio
O urânio natural é composto por 0,72% de U-235 (o isótopo físsil), 99,27% de
U-238, e uma quantidade traço 0,0055% de U-234. 0,72% de U-235 não é suficiente
para produzir uma reação em cadeia auto-sustentada. Para reatores de água leve, por
exemplo, o combustível deve ser enriquecido a 2,5-3,5% de U-235. A proporção deve
ser muito maior para haver uma explosão, como em uma bomba nuclear. Essa
proporção é maior do que 90% de U-235.
A reação controlada é usada nas usinas nucleares para a produção de energia
elétrica. A reação em cadeia descontrolada é utilizada nas bombas nucleares.

O urânio é encontrado
como óxido de urânio que,
quando purificado tem
uma cor amarela forte e é
chamado de "yellow
cake".

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Após a redução, o urânio deve passar por um processo de enriquecimento


isotópico. Mesmo com a necessidade de enriquecimento, ainda leva apenas cerca de
3 kg de urânio natural para abastecer as necessidades energéticas de um americano por
um ano. A quantidade necessária de outros tipos de combustível é muito maior.

Equivalência energética

História da fissão do U-235


Na década de 1930, os físicos/químicos alemães Otto Hahn e Fritz Strassman
tentaram criar elementos transurânicos bombardeando urânio com nêutrons. Ao
contrário do esperado, eles obtiveram vários produtos não identificados. Quando eles
finalmente identificaram um dos produtos como bário-141, eles estavam relutantes a
publicar o achado, porque foi tão inesperado. Quando finalmente publicaram os
resultados em 1939, isso chamou a atenção de Lise Meitner, uma física austríaca que
havia trabalhado com Hahn em seus experimentos nucleares.
Após a invasão de Hitler na Áustria, ela foi forçada a fugir para a Suécia, onde
ela e Otto Frisch, seu sobrinho, continuaram a trabalhar no problema de
bombardeamento de nêutrons. Ela foi a primeira a perceber que o bário de Hahn e
outros produtos mais leves dos experimentos de bombardeamento de nêutrons foram
provenientes da fissão do U-235. Frisch e Meitner realizaram novos experimentos que
mostraram que a fissão do U-235 produziu uma quantidade enorme de energia, e que a
fissão rendeu pelo menos dois nêutrons por nêutron absorvido na interação. Eles

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perceberam que isso tornou possível uma reação em cadeia com uma produção
energética sem precedentes.

Como funciona a geração de energia elétrica?


Numa hidrelétrica a água em queda gira as turbinas, ligadas por um eixo até o gerador.
Lá ocorre a indução eletromagnética, que cria corrente elétrica.

Uma termoelétrica utiliza a energia térmica para gerar vapor d’água que gira as pás da
turbina.
Como funciona uma usina nuclear?2
A usina nuclear, nada mais é do que uma termoelétrica, mas que usa a fissão do U-235
como combustível para gerar calor e esquentar a água.

http://www.eletronuclear.gov.br/Saibamais/Espa%C3%A7odoConhecimento/Pesquisaescolar/EnergiaNuc
lear.aspx

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A fissão dos átomos de urânio dentro das varetas do elemento combustível


aquece a água que passa pelo reator a uma temperatura de 320 graus Celsius. Para que
não entre em ebulição – o que ocorreria normalmente aos 100 graus Celsius -, esta água
é mantida sob uma pressão 157 vezes maior que a pressão atmosférica.
O gerador de vapor realiza uma troca de calor entre as águas deste primeiro
circuito e a do circuito secundário, que são independentes entre si. Com essa troca de
calor, a água do circuito secundário se transforma em vapor e movimenta a turbina - a
uma velocidade de 1.800 rpm - que, por sua vez, aciona o gerador elétrico.
Esse vapor, depois de mover a turbina, passa por um condensador, onde é
refrigerado pela água do mar, trazida por um terceiro circuito independente. A
existência desses três circuitos impede o contato da água que passa pelo reator com as
demais.
Uma usina nuclear oferece elevado grau de proteção, pois funciona com
sistemas de segurança redundantes e independentes (quando somente um é necessário).

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Defesa em Profundidade
É um conceito de projeto que envolve a criação de sucessivas barreiras físicas
que mantêm a radiação sob total controle.
1 – As pastilhas de dióxido de urânio possuem uma estrutura molecular que retém a
maior parte dos produtos gerados na fissão.
2 – As varetas que contêm as pastilhas são seladas e fabricadas com uma liga metálica
especial.
3 – O vaso do reator funciona como uma barreira estanque.
4 – A blindagem radiológica permite que os trabalhadores possam acessar áreas
próximas ao reator.
5 – O envoltório de aço especial, com 3 centímetros de espessura, é projetado para
resistir ao mais sério acidente.
6 – O envoltório de concreto, com 70 centímetros de espessura, conterá qualquer
material caso as demais barreiras falhem.

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Aula 9
Fusão nuclear

Meta
Introduzir os conceitos sobre as forma de fusão nuclear com a liberação de
energia

Objetivos

Ao final desta aula, você deverá ser capaz de:

• Compreender como é provocar uma fusão nuclear


• Entender como funciona um reator nuclear baseado na fusão.
• Reconhecer de como são gerados os resíduos da fusão nuclear.
• Reconhecer vantagens e desvantagens da produção energética por
fusão nuclear.

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Introdução

Na aula anterior vimos as reações nucleares e como podemos extrair


energia da fissão nuclear, produzindo energia elétrica nos reatores de potência.
Hoje veremos como funciona a fusão, e como a ciência está trabalhando para
tentar extrair energia da fusão nuclear.

Energia liberada por reações nucleares


Na fissão nuclear núcleos pesados (urânio, plutônio) liberam energia quando
eles se separaram. Os núcleos produto pesam menos do que o núcleo original.
E a energia liberada provém dessa diferença de massa.
Na fusão nuclear, núcleos leves (como hidrogênio, hélio) liberam energia
quando fundem. Os núcleos produto pesam menos do que os núcleos pai,
liberando energia.

A fusão usa principalmente o deutério, que é obtido da água (0,02% de todo o


hidrogénio é hidrogénio pesado ou deutério), e o trítio, que é obtido de lítio (um
metal leve comum na crosta da Terra).
Este ciclo de fusão (que tem a mais rápida taxa de reação) é de interesse para
a produção de energia
Deutério + Lítio → Hélio + Energia

O mundo, particularmente os países em desenvolvimento, precisa de uma nova


fonte de energia.
O crescimento da população mundial e o crescimento na demanda de energia
a partir da industrialização vão levar a um gap de energia que será cada vez

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mais difícil de preencher com os combustíveis fósseis. Sem melhorias na


eficiência vamos precisar de energia de 80% a mais em 2020.
Mesmo com melhorias de eficiência no limite da tecnologia, ainda assim
precisaremos de 40% a mais de energia.

Incentivos para o Desenvolvimento de Fusão


Poderes de fusão do Sol e as estrelas estão agora ao alcance para uso na
Terra. No processo de fusão elementos mais leves são "fundidos", fazendo
elementos mais pesados e produzindo quantidades prodigiosas de energia
A fusão oferece características muito atraentes:
• A energia de fusão pode ser usada para produzir eletricidade e
hidrogênio, e para a dessalinização
• É uma fonte de energia sustentável (para o ciclo DT)
• Não há nenhuma emissão de efeito estufa ou outros gases poluentes
• Não há risco de um acidente grave
• Não há produção de resíduos radioativos de longa vida.

Os volumes dos resíduos radioativos num reator de fusão são maiores do que
na fissão, mas menores do que para usinas térmicas a carvão de mesmo porte

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Desvantagens geração de Energia por Fusão


Reação de fusão é difícil começar! Altas temperaturas (milhões de graus) em
um ambiente puro de alto vácuo são necessários. São necessários reatores
tecnicamente complexos e de alto de custo. Mais investigação e
desenvolvimento são necessários para trazer um conceito rentável. A física
está bem avançado, mas requer um desenvolvimento sustentado em uma
escala de tempo longo (20 a 40 anos).

Reatores de Fusão Nuclear


Reatores de fusão nuclear, se eles puderem ser feitos, prometem potência
praticamente ilimitada para o futuro indefinido. Isto é porque o combustível, os
isótopos de hidrogénio, são essencialmente ilimitados na Terra. Os esforços
para controlar o processo de fusão e utilizá-lo para produzir energia estão em
andamento.

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Fig. 1. Um diagrama mostrando uma reação de fusão típica.


A fusão nuclear é a fonte de energia do sol e das estrelas onde as altas
temperaturas e as densidades permitem aos núcleos carregados positivamente
se aproximar o suficiente um do outro para que a força (atrativa) nuclear vença
a força (repulsiva) elétrica e permitir que a fusão ocorra. A Fig. 1 mostra uma
reação de fusão. A reação de fusão mais promissora
3
H + 2H → 4He + n + 17,6 MeV
envolve o nuclido de trítio radioativo (3H), disponível a partir da reação de
produção nuclear
6
Li + n → 3H +4He

Plasma
Um plasma é um gás
ionizado. Uma mistura de
íons positivos e elétrons
negativos com a
neutralidade de carga
geral. Plasmas constituem
o quarto estado da matéria,
e são obtidos a
temperaturas de mais de
100.000 graus.
Plasmas conduzem
eletricidade e calor.

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4
Os núcleos He (partículas α) carregam cerca de 20% da energia e
permanecem no plasma. Os outros 80% são levados por neutrons e podem ser
usados para gerar vapor.
O plasma torna-se auto-sustentável ou inflamável quando há uma potência α
suficiente para equilibrar as perdas do plasma.
Nas estrelas, as partículas do plasma (incluindo α) são essencialmente
limitadas pela força da gravidade e as densidades elevadas no plasma são
alcançadas
Na Terra, plasmas quentes e densos podem ser confinados em campos
magnéticos (fusão por confinamento magnético) e plasmas superdensos
podem ser obtidos implodindo bolinhas sólidas de deutério e trítio (fusão por
confinamento inercial).
Para produzir energia a partir da reação D+T, tanto o reator de confinamento
magnético com plasma de alta temperatura (um gás que tenha sido
completamente ionizado) quanto o reator de confinamento inercial (que utiliza
tecnologias de implosão de laser) foram investigados.

Confinamento inercial
A implosão do laser de pequenas pelotas (diâmetro 3 mm) sólidas de deutério
e trítio produz as condições de fusão.

O combustível é comprimido por um foguete do tipo sopro. A pressão obtida


corresponde a 200.000 milhões de atmosferas no núcleo. Com a compressão
pico, o combustível atinge a densidade de líquido 1000-10000 vezes por um
tempo extremamente curto (10-11 segundos). O núcleo é aquecido e a “faísca
de ignição” ocorre.

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Confinamento magnético
Campos magnéticos fazem as partículas carregadas girarem em espiral em
torno das linhas de campo. Partículas de plasma são perdidos para as paredes
dos vasos apenas por difusão relativamente lenta ao longo das linhas de
campo. O sistema toroidal (em forma de anel) evita que o plasma atinja o final
do recipiente. O dispositivo de Confinamento Magnético de maior sucesso é o
Tokamak (do russo para “câmara magnética toroidal” - toroidal'naya kamera s
magnitnymi katushkami)

Tokamak

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Quão grande é um dispositivo de fusão?


Para a fusão iniciar um plasma: deve haver uma densidade suficiente de íons
de deutério e trítio (ni); Os íons reagentes têm de estar suficientemente quentes
(Ti); A energia gerada na fusão com as partículas alfa deve ser confinada por
tempo suficiente (τE). τE aumenta com o quadrado do tamanho do dispositivo -
portanto uma máquina grande é necessária.

O produto de fusão tripla (niTiτE) e a temperatura dos íons (Ti) devem ser
suficientemente grandes (abaixo de uma determinada temperatura, a
probabilidade da reação de fusão é demasiadamente pequena)
• pressão (NiTi) ≥ 2 atm
• tempo de confinamento> 5 s
• temperatura do plasma de íons ≈ 100 - 200 milhões ° C

Temperaturas extremamente elevadas no plasma são necessárias no reator de


confinamento magnético e técnicas difíceis de implosão a laser são

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necessárias para o reator de confinamento inercial. Embora progressos


significativos tenham sido feitos nessas investigações, nenhum reator de
potência que produz mais energia do que consome foi construído. Infelizmente,
o financiamento para continuar este trabalho tem diminuído, e a pesquisa
avança a um ritmo mais lento.

Embora esses tipos de reatores não teriam o problema de eliminação de


resíduos do produto de fissão dos reatores de fissão, os reatores de fusão
gerarariam grande número de nêutrons rápidos, levando a grandes
quantidades de subprodutos radioativos.

Reações que liberam energia

O futuro da fusão nuclear


Outra abordagem para a fusão nuclear - uma abordagem que poderia levar a
potência aneutrônica (potência sem nêutrons) e energia nuclear não-radioativa
- utiliza o conceito de colidir feixes de fusão (CBF). Um dos métodos inclui a
reação 2H + 3He deixando os produtos 1H + 4He. No entanto, isso requer 3He,
que só tem disponibilidade limitada na Terra. A Lua é uma fonte potencial de
3
He produzidos por raios cósmicos de prótons que atingem a Lua diretamente e
não absorvidos por uma atmosfera como na Terra.
11
Outra abordagem possível para fusão é a reação B + 1H, que conduz a três
núcleos 4He. A libertação de energia tem a forma de partículas carregadas,
cuja energia cinética pode ser convertida em eletricidade com uma eficiência

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muito alta. A pesquisa atual prevê que esta fonte de energia tem um elevado
grau de pureza e eficiência.
Em todas as fontes de energia de corrente, aproximadamente dois terços da
energia é perdido na forma de calor residual ou poluição térmica. Na
abordagem CBF, não há praticamente nenhum desperdício. Este projeto
favorece tamanho pequeno para a maior eficiência (100 MWe ou menos), e
levaria a plantas de potência com vários reatores ou descentralização da
produção de energia.

ITER: International Thermonuclear Experimental Reactor


Projeto internacional com objetivo de demonstrar a viabilidade científica e
econômica de fusão nuclear
A União Europeia, Russia, Japão, USA, Índia, China, Coréia estão prestes a
construir o ITER - um TOKAMAK no sul da França, em Cadarache.-para
demonstrar a viabilidade científica e tecnológica da energia de fusão.

Caradache, França

O ITER vai produzir 500 MW de energia de fusão e o custo total do projeto é de


cerca de US $ 15B. O objetivo é produzir entre dez a cinco vezes mais energia
que o necessário para manter o plasma a temperaturas de fusão,
demonstrando assim a viabilidade da energia de fusão. A previsão é a
produção comercial da energia nuclear dentro de 50 anos.

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