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Bertha Lutz Marques
Bertha Lutz Marques
PARLAMENTARES
cida por Bertha Lutz, formou-se
em Biologia na França e em Direito no
Brasil. Servidora pública federal em
um tempo em que poucas mulheres
Câmara dos
PERFIS
atuavam na administração pública,
Deputados colaboradora da diplomacia brasi-
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leira em momentos cruciais (como
A experiência democrática dos últimos anos levou à crescente presença po-
a Conferência de São Francisco, em
pular nas instituições públicas, tendência que já se pronunciava desde a ela- 1945), sua trajetória política se con-
boração da Constituição Federal de 1988, que contou com expressiva parti- funde com a história do movimento
cipação social. Politicamente atuante, o cidadão brasileiro está a cada dia mais pelo sufrágio feminino no Brasil. Nes-
interessado em conhecer os fatos e personagens que se destacaram na forma- sa luta, chegou à condição de deputada
ção da nossa história política. A Câmara dos Deputados, que foi e continua a federal em 28 de julho de 1936 e dei-
ser – ao lado do povo – protagonista dessas mudanças, não poderia deixar de xou a Câmara em 10 de novembro de
corresponder a essa louvável manifestação de exercício da cidadania. 1937, quando a Casa foi fechada por
Getúlio Vargas, por ocasião da decre-
Teresa Cristina de Novaes Marques Criada em 1977 com o objetivo de enaltecer grandes nomes do Legislativo, tação do Estado Novo.
é historiadora, doutora pela Universi- a série Perfis Parlamentares resgata a atuação marcante de representantes A importância da contribuição de
dade de Brasília (UnB) e mestra pela de toda a história de nosso Parlamento, do período imperial e dos anos de Lutz para o Parlamento brasileiro não
Universidade Federal do Rio de Janei- República. Nos últimos anos, a série passou por profundas mudanças, na pode ser medida apenas pela extensão
ro (UFRJ). Desde 2005, é professora forma e no conteúdo, a fim de dotar os volumes oficiais de uma feição mais do seu mandato, mas pela ousadia das
da UnB, onde ministra cursos sobre o atual e tornar a leitura mais atraente. A Câmara dos Deputados busca, assim, propostas que defendeu em toda a sua
Brasil colonial e republicano. Já publi- carreira. Ao chegar à Câmara, após
homenagear a figura de eminentes tribunos por suas contribuições históri-
cou obras de história econômica, em uma longa campanha, iniciada em
especial sobre a indústria de cerveja no cas à democracia e ao mesmo tempo atender os anseios do crescente público
1918, pela franquia dos direitos polí-
Brasil e sobre práticas de crédito. Nos leitor, que vem demonstrando interesse inédito pela história parlamentar ticos às mulheres, Bertha Lutz trazia
últimos anos, vem se dedicando à his- brasileira. consigo as ideias e a energia política
tória parlamentar do voto feminino. necessárias para tornar viáveis polí-
ticas públicas que elevassem o status
jurídico e econômico das mulheres
brasileiras. O longo caminho por ela
percorrido na vida pública e suas ini-
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ciativas como parlamentar são exa-
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minados nesta obra da historiadora
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Teresa Cristina de Novaes Marques,
que se apoia em documentação con-
sultada no Brasil e no exterior.
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Transitando em um sistema político
predominantemente masculino, Lutz
deixou sua marca como defensora da
IS igualdade incondicional entre homens
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B ertha Maria Júlia Lutz, mais conhe-
cida por Bertha Lutz, formou-se
em Biologia na França e em Direito no
Brasil. Servidora pública federal em
um tempo em que poucas mulheres
atuavam na administração pública,
colaboradora da diplomacia brasi-
leira em momentos cruciais (como
a Conferência de São Francisco, em
1945), sua trajetória política se con-
funde com a história do movimento
pelo sufrágio feminino no Brasil. Nes-
sa luta, chegou à condição de deputada
federal em 28 de julho de 1936 e dei-
xou a Câmara em 10 de novembro de
1937, quando a Casa foi fechada por
Getúlio Vargas, por ocasião da decre-
tação do Estado Novo. Teresa Cristina de Novaes Marques
A importância da contribuição de é historiadora, doutora pela Universi-
Lutz para o Parlamento brasileiro não dade de Brasília (UnB) e mestra pela
pode ser medida apenas pela extensão Universidade Federal do Rio de Janei-
do seu mandato, mas pela ousadia das ro (UFRJ). Desde 2005, é professora
propostas que defendeu em toda a sua da UnB, onde ministra cursos sobre o
carreira. Ao chegar à Câmara, após Brasil colonial e republicano. Já publi-
uma longa campanha, iniciada em cou obras de história econômica, em
1918, pela franquia dos direitos polí- especial sobre a indústria de cerveja no
ticos às mulheres, Bertha Lutz trazia Brasil e sobre práticas de crédito. Nos
consigo as ideias e a energia política últimos anos, vem se dedicando à his-
necessárias para tornar viáveis polí- tória parlamentar do voto feminino.
ticas públicas que elevassem o status
jurídico e econômico das mulheres
brasileiras. O longo caminho por ela
percorrido na vida pública e suas ini-
ciativas como parlamentar são exa-
minados nesta obra da historiadora
Teresa Cristina de Novaes Marques,
que se apoia em documentação con-
sultada no Brasil e no exterior.
Transitando em um sistema político
predominantemente masculino, Lutz
deixou sua marca como defensora da
igualdade incondicional entre homens
e mulheres. Por tudo isso, ao acompa-
nhar seus passos, podemos conhecer
suas estratégias, suas ideias sobre o
papel do Estado e as resistências que
enfrentou em sua trajetória política.
MESA DA CÂMARA DOS DEPUTADOS
PresidenteRODRIGO MAIA
1º Vice-PresidenteWALDIR MARANHÃO
2º Vice-Presidente GIACOBO
1º SecretárioBETO MANSUR
2º SecretárioFELIPE BORNIER
3ª SecretáriaMARA GABRILLI
4º SecretárioALEX CANZIANI
Suplentes de Secretário
1º Suplente MANDETTA
2º Suplente GILBERTO NASCIMENTO
3ª SuplenteLUIZA ERUNDINA
4º Suplente RICARDO IZAR
Diretor-GeralLUCIO HENRIQUE XAVIER LOPES
Secretário-Geral da MesaWAGNER SOARES PADILHA
Câmara dos
Deputados
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DIRETORIA LEGISLATIVA
Diretor AFRÍSIO DE SOUZA VIEIRA LIMA FILHO
CENTRO DE DOCUMENTAÇÃO E INFORMAÇÃO
Diretor ANDRÉ FREIRE DA SILVA
COORDENAÇÃO DE ARQUIVO
Diretor VANDERLEI BATISTA DOS SANTOS
COORDENAÇÃO EDIÇÕES CÂMARA DOS DEPUTADOS
Diretora HELOÍSA HELENA S. C. ANTUNES
DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIA, REVISÃO E REDAÇÃO
Diretora ADRIANA PAULA FERREIRA DA SILVA
SÉRIE
Perfis Parlamentares
n. 73 PDF
Dados Internacionais de Catalogação-na-publicação (CIP)
Coordenação de Biblioteca. Seção de Catalogação.
CDU 328(81)(042)
PREFÁCIO 11
DISCURSOS
Discurso de posse no mandato de deputada federal, em 28 de julho de 1936 155
Discurso de Bertha Lutz na Comissão Elaboradora do Anteprojeto de
Constituição, em 9 de novembro de 1932 160
REFERÊNCIAS 165
ANEXOS
Anexo 1 – Manifestações de mulheres em favor do voto feminino e pela
não demissão de servidores públicos, em 1916 183
Anexo 2 – Medidas inseridas na Constituição pelo esforço de Bertha Lutz 194
Anexo 3 – Mulheres eleitas em outubro de 1934 195
Anexo 4 – Anteprojeto de criação do Departamento Nacional da
Mulher – Projeto de Lei nº 623/1937 197
Anexo 5 – Projeto no 736/1937 (Estatuto da Mulher) 202
9
APRESENTAÇÃO
Com a publicação deste perfil parlamentar de Bertha Lutz, a
Câmara dos Deputados oferece aos leitores análise detalhada da trajetó-
ria de uma das mais destacadas lideranças do movimento feminista na
primeira metade do século XX. Além de acompanhar os passos de sua
ação política, a obra reconstrói o contexto social e político mais amplo
no qual ocorre a luta pelos direitos das mulheres no campo da política
institucional. A conquista do direito ao voto feminino foi, nesse senti-
do, um momento fundamental – embora não o único – na batalha pela
redução das desigualdades que caracterizam as relações entre os sexos
na vida social do país.
A obra permite ao leitor compreender melhor os obstáculos trans-
postos pelas feministas para que suas demandas chegassem até as esferas
de elaboração das leis que afetariam diretamente suas vidas, visto que,
além do espaço doméstico, crescentemente participavam de diversos
domínios da vida social e do mercado de trabalho.
Antes de assumir o mandato parlamentar, Bertha Lutz participou
ativamente da fundação da Federação Brasileira pelo Progresso Femi-
nino (FBPF), em 1922, que tinha como propósito realizar o trabalho
de articulação política das feministas em torno de uma pauta de ação
comum na esfera pública.
Em 1933, na eleição para a Assembleia Nacional Constituinte, quan-
do ainda era primeira suplente do Partido Autonomista, Bertha Lutz
atuou juntamente com a FBPF para levar as propostas do movimento
feminista às discussões de elaboração de nova Constituição do país.
Em virtude do falecimento do titular do mandato do qual era su-
plente, Bertha Lutz ocupou uma cadeira na Câmara dos Deputados
entre julho de 1936 e novembro de 1937, contribuindo para levar ao
Parlamento não só pautas do movimento feminista, mas também de te-
mas relacionados a ciência, universidade e saúde pública. Nesse período,
apenas Bertha Lutz e Carlota Pereira de Queirós representavam as mu-
lheres na Câmara dos Deputados.
No trabalho parlamentar de Lutz, pode-se destacar a apresentação de
projeto com o objetivo de criar o Departamento Nacional da Mulher,
o qual teria competência para formular e executar políticas relativas ao
trabalho feminino e à assistência à mulher, à infância e à maternidade.
Rodrigo Maia
Presidente da Câmara dos Deputados
APRESENTAÇÃO
11
PREFÁCIO
Este volume da série Perfis Parlamentares examina as iniciativas po-
líticas da Federação Brasileira pelo Progresso Feminino (FBPF) e as de
sua líder, Bertha Maria Júlia Lutz, em um período de rápidas e drásti-
cas mudanças no país. Entre 1927 e 1937, esta organização feminista
integrou-se ao sistema político brasileiro para conquistar o direito de
voto e assegurar sua voz na elaboração de políticas públicas voltadas para
a população feminina.
No ano de 1927 entrou em pauta no Senado a segunda discussão do
projeto de lei que estendia o sufrágio às mulheres. O livro inicia-se, as-
sim, com este momento do movimento sufragista, quando a federação
buscava persuadir os senadores a apoiar a sua causa.
O ano de 1937, por sua vez, marca o final de um ciclo político tu-
multuado para o país, que resultou em significativos avanços nos direi-
tos das mulheres. O 10 de novembro não define unicamente o início
do regime autoritário de Vargas, mas também marca o encerramento da
experiência de Bertha Lutz como deputada federal, no curto mandato
iniciado em 28 de julho de 1936, dedicado a tornar reais as vitórias
alcançadas na Constituição de 1934, na qual a ação política feminista
assegurou redação favorável em vários artigos.
Uma das ideias desenvolvidas nesta obra é a de que o sufrágio femi-
nino não foi consequência inevitável da vida urbana e moderna, tam-
pouco uma mera concessão de Getúlio Vargas à pressão de um movi-
mento social. O direito ao voto foi o resultado de uma negociação árdua
entre as feministas e os atores políticos, de compromissos e derrotas.
Determinadas a se fazerem presentes na vida pública, em um momento
em que muitas correntes políticas faziam o mesmo esforço, as feministas
empenharam-se para fazer do voto a plataforma para avançar em outros
pontos na agenda política do movimento.
Este avanço enfrentou resistências. Assim, a dinâmica interna do
grupo próximo a Bertha Lutz precisa ser compreendida à luz dessas
circunstâncias e da forte instabilidade política naqueles anos, marcados
pela reconfiguração institucional e partidária. Em outros termos, é pre-
ciso entender a ação política da FBPF, as alianças que as ativistas esta-
beleceram e as propostas que defenderam no universo maior do debate
público vivido pelo país naqueles anos.
prefácio
BERTHA LUTZ:
AÇÃO FEMINISTA E SISTEMA
POLÍTICO BRASILEIRO (1927-1937)
15
1 Sobre detalhes do empenho de Bertha para preservar a memória do pai, Adolfo Lutz,
confira Benchimol et al. (2003).
Quando Bertha Lutz expôs suas ideias pela primeira vez na impren-
sa, ao final de 1918, o feminismo já era uma palavra conhecida no voca-
bulário político da capital federal. Desde alguns anos antes, a professora
Leolinda Daltro2 dizia-se feminista.
Na verdade, não estava claro o que o feminismo vinha a ser, em-
bora muitos procurassem sabê-lo. Em uma definição mínima, era a
consciência feminina de que algo estava errado na forma como a socie-
dade tratava as mulheres. Em uma ref lexão mais profunda, feminismo
seria a busca por igualdade de oportunidades (BECKER, 1981).
Grupos de mulheres na Europa, nos Estados Unidos e nas Amé-
ricas desenvolviam seu próprio entendimento sobre a palavra. Uns se
perguntavam se a igualdade de oportunidades seria mais importante
que procurar a igualdade jurídica e outros pensavam ser necessário co-
meçar por romper com as amarras que prendiam a mulher ao mundo
doméstico. Também havia muita controvérsia sobre o trabalho femi-
nino (WIKANDER, 1995). Convinha defender a proteção legal das
trabalhadoras ou a igualdade com os homens? Seria a igualdade de par-
ticipação política a grande razão de ser do feminismo? Os grupos polí-
ticos de mulheres formaram-se, cada um escolhendo uma prioridade e
entendendo o feminismo ao seu modo (RUPP, 1997).
Além dos propósitos políticos que justificavam agir em nome das
mulheres, os grupos organizavam-se de formas diferentes. Em alguns
deles, as decisões eram tomadas pela líder e observadas pelas seguido-
ras e, em outros, as decisões resultavam do debate coletivo. Também
sempre houve muita controvérsia sobre a melhor maneira de lidar com
a política masculina, o eterno dilema entre participar da política já exis-
tente, cooperando com os homens, e construir alternativas (ALBERTI,
1989). Tamanha discordância levou os observadores críticos da novi-
dade a constatar que as mulheres divergiam muito entre si. “Elas não
sabem o que querem”, diziam eles.
2 Embora a imprensa nomeasse a professora Daltro ora Leolinda, ora Deolinda, respeita-
mos a grafia de seu nome que consta da representação encaminhada por ela à Comissão
de Constituição, da Câmara dos Deputados, em 22-12-1916. Esse documento é assina-
do por Leolinda de Figueiredo Daltro e compõe o acervo do Arquivo da Câmara dos
Deputados.
A BATALHA NO SENADO
Quando, enfim, a Comissão de Justiça do Senado reuniu-se para
examinar o parecer apresentado pelo senador Aristides Rocha, a sala
estava repleta de mulheres, que assistiam aos trabalhos e aplaudiam
os oradores. Na véspera, dia 12 de novembro de 1927, a Federação
Brasileira pelo Progresso Feminino havia protocolado na secretaria da
Casa uma representação assinada por cerca de 2 mil mulheres, em favor
do sufrágio.
O esforço das feministas, combinado ao apoio da maior parte dos
integrantes da comissão à proposta, resultou na aprovação do parecer.
A certa altura, na reunião, o senador Adolfo Gordo sustentou que a
extensão do direito de voto às mulheres era uma questão de justiça. Tais
palavras não convenceram o senador cearense Tomás Rodrigues, que
prometeu apresentar voto em separado.
nha, Bertha e Maria Eugênia Celso viajaram a Natal, cidade que sobre-
voaram lançando panf letos. Para ambas, foi uma experiência nova na
campanha política pelo sufrágio, que resultou em imagens aproveitadas
nas páginas do suplemento feminismo do jornal O País, e em cartões-
-postais que a FBPF fez imprimir e distribuir pelo Rio de Janeiro, como
se vê adiante.
O fato político notável é que a aliança entre Bertha e Lamartine era
mutuamente benéfica, pois as feministas da FBPF ganhavam um aliado
em mais uma investida em favor do sufrágio feminino, ao passo que
Lamartine se projetava como um nome nacional.
que está no gozo dos seus direitos políticos e civis. Logo, quem não tem
direito de voto não é cidadão” (AS NOVAS..., 1911, p. 1).
Reação semelhante quase impediu a inscrição da primeira mulher a
ser admitida em cargo da administração federal, Maria José de Castro
Rebelo Mendes, inscrita no ano de 1918 em concurso no Itamaraty,
mediante a intervenção jurídica de Rui Barbosa. A própria Bertha Lutz
por pouco não conseguiu prestar concurso para cargo no Museu Nacio-
nal, em 1919 (LUTZ, 1971).
Dez anos depois, o súbito protagonismo de mulheres no Rio Grande
do Norte fez reacender os brios masculinos na região: mulheres também
ousaram se candidatar a postos de trabalho em repartições. Inutilmente,
as feministas da federação apoiaram a pretensão de mulheres da Paraíba
de trabalhar nos Correios, contra a decisão do diretor-geral da empresa
no estado. Em verdade, desde a admissão de Maria José, no Itamaraty,
multiplicavam-se pelo país os casos de mulheres impedidas de assumir
cargos na administração pública. Algumas o fizeram por força de manda-
dos judiciais. Era evidente que as restrições aos direitos políticos estavam
diretamente ligadas às oportunidades de trabalho para as mulheres. So-
mente uma solução com alcance nacional resolveria o impasse.
Em junho de 1929, falece Adolfo Gordo. As feministas sentiram o
golpe ao perder o aliado e patrocinador da causa sufragista no Senado,
tornando as perspectivas mais desanimadoras. O ambiente político do
país, usualmente tumultuado nos anos eleitorais, mostrou-se pior.
queria dizer que elas eram belicosas. A ata da reunião não registra res-
posta à esta fala do general.
Ao que parece, a comissão preferiu delegar à Assembleia Constituin-
te a responsabilidade de decidir sobre esta e outras questões delicadas.
A CAMPANHA
Durante a campanha da candidatura de Bertha, um incidente ex-
pôs o dilema das feministas. Ao final do mês de novembro de 1932, a
federação reuniu-se para discutir a plataforma da candidata, momen-
to acompanhado com especial interesse por jornalistas. Na reunião, as
associadas discutiam quais seriam as sugestões a serem apresentadas à
comissão do anteprojeto. Uma falou em defesa do magistério, outras
levantaram a tese da igualdade política e uma participante defendeu que
as mulheres prestassem o serviço militar na área de enfermagem. O en-
contro corria sem agitação até que a escritora e jornalista Raquel Prado
defendeu veementemente o divórcio.
Os jornalistas presentes esperavam que Bertha, que presidia a Mesa,
respondesse a Raquel, mas ela não o fez. Era mais astuto que outra pes-
soa falasse. Não sem demora, duas associadas veteranas pediram a pa-
lavra para sustentar que o divórcio não era matéria constitucional, e,
sim, uma questão da legislação ordinária. Logo, desviando o assunto da
pauta da candidata Bertha.
Essa mesma tese viria a ser defendida, solitariamente, pelo jurista João
Mangabeira, durante reunião da comissão de redação do anteprojeto em
março de 1933. De pouco adiantou. Parecia que o casamento indissolú-
vel era um item da agenda que a Igreja não estava disposta a negociar, e
seu apoio ao governo dependia disso (AZEVEDO, 1993, p. 702).
Conforme a campanha política acirrava-se, os jornais passaram
a insinuar que faltava algo na plataforma das feministas da federação.
Pairava um silêncio constrangedor sobre a questão do divórcio. Todos
os dias, Heitor Lima escrevia uma coluna no Correio da Manhã e nela
criticava Bertha, Carlota Queirós e quem mais não se manifestasse em
favor do divórcio. Heitor Lima não poupava ninguém. Isso não signi-
fica que o assunto jamais tivesse surgido nas conferências promovidas
pela federação desde 1922, menos ainda que Bertha fosse pessoalmen-
te contrária ao divórcio. Poucos dias depois da reunião na federação,
ela escrevia à amiga e conselheira Carrie Chapman Catt descrevendo
como a Igreja usava toda a sua força política para impedir a aprovação
do divórcio no Brasil (LUTZ, 1932c). O assunto retornaria à corres-
pondência que Bertha manteve com Carrie muitas vezes naqueles anos,
sem que a amiga norte-americana sugerisse outra estratégia para lidar
com o problema. O que Bertha fazia parecia ser acertado: desviar-se do
assunto. Simplesmente, as líderes da federação não viam como defender
o divórcio sem arcar com consequências políticas, não agora que o voto
ainda era uma conquista precária, a depender de a Assembleia Consti-
tuinte o reconhecer.
De modo pragmático, as feministas da federação buscavam se disso-
ciar da defesa do divórcio, realizando demonstrações públicas de apoio à
Igreja.6 Em outubro de 1930, por exemplo, o poderoso cardeal Sebastião
Leme retornou de viagem à Europa e foi recebido por Bertha e outras
feministas. Assim noticiaram os jornais. As próprias feministas produ-
ziam material de propaganda em que afirmavam contar com o apoio de
integrantes da Igreja, como se vê em texto reproduzido a seguir.
6 A exemplo do artigo de Lutz (1929, p. 6), no qual ela argumenta que não há incompati-
bilidade entre o feminismo e a religião católica.
Sabendo que não se ganha uma eleição apenas com o conteúdo das
propostas, era preciso traçar uma estratégia para fazer o melhor uso po-
lítico das ativistas. A federação vivia o ápice de sua mobilização. Jovens
OS RESULTADOS
Após todo o esforço de campanha eleitoral e a atenção permanente
das integrantes da Liga Eleitoral Independente, durante os longos meses
da apuração dos votos, chegou-se ao resultado final da eleição de 1933:
Bertha havia obtido 16.423 votos. Com essa votação e graças tam-
bém ao recurso apresentado pela advogada Maria Luiza Bittencourt,
em julho de 1933, ela foi proclamada a primeira suplente do Partido
Autonomista.
O resultado final da eleição no Distrito Federal informou que o úl-
timo candidato eleito para ocupar uma das dez cadeiras disputadas no
Distrito Federal recebera 17.794 votos, significando que, dentre as sete
candidatas à Constituinte no Distrito Federal, Bertha foi a que chegou
mais perto de ser eleita. Com 15.033 votos, a católica e não feminista
Georgina Azevedo Lima alcançou o 16º lugar na lista de candidatos,
ao passo que a socialista Ilka Labarte obteve 4.036 votos e Natércia da
Silveira, 3.458 votos. As demais candidatas, Leolinda de Figueiredo
Daltro, Julita Soares da Gama e Tereza Rabelo de Macedo, nem sequer
foram listadas entre os oitenta mais votados no pleito de maio de 1933.
A Constituinte
soubessem manobrar nas águas turvas dos blocos políticos que se for-
maram durante os trabalhos constitucionais (A AÇÃO..., 1935).
Entre a instalação da Assembleia, em 15 de novembro de 1933, e
a promulgação da Constituição, em 16 de julho de 1934, a dinâmica
instável das forças políticas ali representadas exigiu esforço permanente
de atenção dos interessados em fazer aprovar propostas. Neste parti-
cular, é útil tentar reconstituir a cronologia política dos trabalhos dos
deputados, servindo-nos dos debates parlamentares, da cobertura da
imprensa e de entrevistas de líderes de bancadas.
O mesmo exercício investigativo que conduz este capítulo pode ser
empregado para examinar numerosos temas importantes que também
provocaram choques de posições nas maiores bancadas, a exemplo da
ordem tributária, do alcance do poder da Presidência da República e da
organização da Justiça. Exploro matérias que os estudiosos da história
constitucional do país não costumam examinar: a igualdade jurídica
entre os sexos e as relações de trabalho. Esses temas compunham a pauta
das demandas feministas durante os meses dos trabalhos constituintes.
Esta é uma face da história política do país que ainda requer atenção.
O primeiro passo para entender o funcionamento da Constituinte é
saber quais deputados ocuparam posições de poder e como se compor-
taram as principais bancadas durante a votação das matérias relevantes
para os direitos da mulher.
Vejamos os classistas. Dias antes de a Assembleia ser instaurada so-
lenemente, aconteceram as sessões preparatórias no Palácio Tiradentes,
quando os deputados representantes de classes elegeram os seus líde-
res. O mineiro Euvaldo Lodi assumiu a liderança dos empregadores, o
alagoano Edvaldo Silva Possolo, representante dos empregados, tornou-
-se líder do seu grupo – já vimos no capítulo anterior que as feministas
tinham bom diálogo com Possolo – e Antônio Nogueira Penido, f lu-
minense, foi eleito líder da classe dos servidores públicos, para satisfa-
ção de Bertha Lutz, sua aliada e apoiadora. Restaram os classistas das
profissões liberais, liderados por Abelardo Marinho, alinhado ao Clube
3 de Outubro.
Os líderes da bancada dos classistas faziam parte da chamada Comis-
são dos 26, líderes das 21 bancadas estaduais somados aos 5 representan-
tes classistas. A matemática do processo decisório começou, assim, a res-
tringir o número de vozes que seriam consideradas durante os trabalhos
constituintes. Apesar disso, avançando no mês de dezembro, os jornais
DIREITOS SOCIAIS
Entre as inovações da Carta de 1934, esteve a incorporação de direi-
tos sociais ao texto constitucional. Assim como a questão anteriormente
examinada – sobre o serviço militar – a regulação das relações de traba-
lho provocou grande debate na assembleia, com a apresentação de nu-
merosas emendas ao texto do substitutivo, votações apertadas e discur-
sos inf lamados. Bertha e suas colaboradoras atuaram nos bastidores para
persuadir os constituintes a apoiar a licença-maternidade e derrubar a
proibição do trabalho noturno feminino, no que foram bem-sucedidas,
como se lê nos artigos relativos ao assunto:
A mobilização prossegue
Decálogo feminista
Toda mulher deve:
1º Exercer seus direitos políticos e cumprir seus deveres
cívicos.
2º Interessar-se pelas questões públicas do país.
3º Ter ocupação útil à sociedade.
4º Alistar-se e votar.
5º Votar consciente e criteriosamente.
6º Não entregar seu título eleitoral.
7º Dedicar-se à causa feminista, crente no triunfo dos seus
ideais.
8º Votar somente em quem for feminista.
9º Bater-se pela conquista e pleno exercício de seus direitos
sociais e políticos.
10º Trabalhar pelo aperfeiçoamento moral, intelectual, so-
cial e cívico da mulher.
9 O art. 103 da Constituição de 1934 previa que metade dos integrantes dos conselhos
técnicos a serem criados seria composta por integrantes fora dos quadros dos respectivos
ministérios.
O FEMINISMO E O ESTADO
De posse da cadeira na Câmara, Bertha reúne as colaboradoras para
distribuir tarefas, planejar as atividades no segundo semestre do ano de
1936 e refinar as propostas legislativas. Anunciaram que em outubro fa-
riam o III Congresso Nacional Feminista, no Rio de Janeiro. Puseram-
-se, então, a organizar o evento na expectativa de que a imprensa desse
a ele a mesma visibilidade que dera aos encontros anteriores.
Entretanto, o prestigioso jornal político Correio da Manhã vinha re-
duzindo as menções a Bertha e às atividades da FBPF desde os inciden-
tes ocorridos durante a apuração eleitoral. Quando há notícias sobre o
feminismo, elas surgem em lugares de pouco destaque, a exemplo das
matérias sobre o III Congresso Nacional Feminista, publicadas longe
das páginas dedicadas à política doméstica, em meio a anúncios dos fil-
mes em cartaz nos cinemas. Quando o Correio informa a relação dos in-
tegrantes da delegação brasileira à Conferência de Paz de Buenos Aires,
cita os nomes de todos, exceto o da enviada da FBPF à reunião. Diante
disso tudo, restou à federação recorrer ao jornal A Noite, que deu bas-
tante atenção a mais este encontro feminista.
No congresso, as participantes discutem o estatuto jurídico e econô-
mico da mulher, antecipando para o público as propostas que a deputada
Bertha se preparava para apresentar na Câmara. A advogada e agora
deputada na Bahia, Maria Luiza Bittencourt, conduz os debates sobre
os direitos civis durante o congresso, que conta com a participação de
representantes de vários estados. Pretendem, assim, demonstrar a coe-
são do grupo e a presença difusa da federação no país.
fato de que tanto a deputada paulista quanto o relator, Prado Kelly, não
apoiaram a criação do seguro maternal a ser administrado pelo departa-
mento, considerando que, nesses anos, o Ministério do Trabalho vinha
constituindo institutos de previdência das principais categorias funcio-
nais, reunindo, portanto, competência administrativa no assunto.
Ao examinar o lugar do departamento no conjunto da adminis-
tração, o parecer de Prado Kelly enfatiza que, pelo direito brasileiro,
cada ato do gestor público é submetido a um controle administrativo.
O deputado sugere que a criação do Departamento da Mulher disso-
ciado de um ministério implicaria excesso de poder do órgão. Além
disso, não caberia detalhar as atribuições das divisões internas do de-
partamento, porque esta seria uma competência exclusiva do Poder
Executivo. Neste particular, Carlota está de acordo com Kelly.
Contrariamente ao entendimento de Lutz, Kelly altera sua opinião
anterior e interpreta o princípio constitucional relativo à contratação
preferencial de mulheres habilitadas da seguinte forma: aos cargos téc-
nicos de prestação de assistência à maternidade e à infância, em servi-
ços que já existissem, dever-se-ia nomear preferencialmente mulheres
habilitadas, não cabendo criar um novo órgão com pessoal exclusiva-
mente feminino. Quanto ao Departamento da Mulher, seu papel na
administração pública seria o de apenas elaborar estudos sobre assuntos
referentes à população feminina do país.
Lutz manifesta-se veementemente contra o substitutivo de Prado
Kelly, pois entende ser indispensável dotar o departamento de funções
administrativas e executivas, sob pena de ver os artigos da Constituição
tornarem-se letra morta.
Em uma tentativa de conciliar as visões de Bertha e de Carlota,
Prado Kelly elabora um voto no qual apresenta uma nova versão para o
projeto. Desta vez, propõe que se constitua uma rede de conselhos: um
conselho geral a abrigar dois conselhos técnicos, que atuariam como
órgãos consultivos de ministérios. Haveria um conselho técnico do tra-
balho, lar e previdência social vinculado ao Ministério do Trabalho e
outro conselho destinado a orientar políticas públicas em favor da ma-
ternidade e da infância, vinculado ao Ministério da Saúde.
Bertha insiste na criação dos dois órgãos: o departamento e o conse-
lho. Simultaneamente, faz publicar a obra O trabalho feminino: a mulher na
ordem econômica e social, que servirá de suporte para a deliberação da Comis-
são de Finanças, que, em outubro, oferece parecer favorável ao projeto.
Pode-se ponderar que a tutela a que Lutz faz menção nas suas me-
mórias não se restringia unicamente às trabalhadoras, pois todo o con-
junto da força de trabalho no Brasil precisou se ajustar às diretrizes do
sindicalismo oficial, somado à repressão policial que pesou sobre as li-
deranças operárias.
Sem dúvida, uma das mudanças mais importantes que a Revolução
de 1930 trouxe para o sistema político foi colocar o trabalho no centro
das ações do Estado, que tomou para si a tarefa de mediar a relação en-
tre os empregadores e os trabalhadores. O resultado foi que, naqueles
anos, muitos se apresentaram ao debate público como tutores da classe
trabalhadora – desde Vargas, o Ministério do Trabalho, até as próprias
feministas. Certamente, o empenho de Lutz em fazer aprovar o Depar-
tamento da Mulher representa a mobilização das lideranças feministas
para criar um espaço de atuação política em que elas fossem as protago-
nistas, especialmente nas ações de fiscalização das condições de trabalho
das mulheres. Diferentemente dos poderes constituídos, os grupos femi-
nistas tinham sensibilidade para os problemas da população feminina e
interesse político em desenvolver ações específicas para as trabalhadoras.
Por essas razões, a Comissão do Estatuto da Mulher requereu o
exame do projeto sobre a Justiça do Trabalho, ainda ao final de 1936
(BRASIL..., 1936a). A comissão propôs ao projeto várias emendas,
dentre as quais se destacam duas:
Podia não ser a melhor técnica de redação legal, mas era um posi-
cionamento político. De um só golpe, Lutz pretende punir legalmente
a discriminação sexual e cultural. Ao mesmo tempo, torna sem efeito
amplos dispositivos do Código Civil, cuja premissa é aquela na qual
homens e mulheres têm diferentes capacidades jurídicas.
Não sendo suficiente enunciar a igualdade entre os sexos perante a
lei, Lutz retoma o assunto no título dedicado ao casamento:
Art. 94. Aos crimes por paixão amorosa não se aplica a dirimen-
te da completa perturbação dos sentidos e da inteligência, a não
ser que se trate de doentes mentais passíveis de internamento.
Parágrafo único. Tampouco será classificada a paixão amorosa
como paixão que as circunstâncias tornem escusável para o efei-
to de suspensão de pena (BRASIL..., 1937c, p. 46799).
Linha do tempo
149
inédito até o ano de 2008, quando foi publicado como livro pelo
Museu Nacional.
1932, julho – Getúlio Vargas nomeia a comissão responsável pela ela-
boração do anteprojeto de Constituição, a se reunir no Palácio
Monroe, sede do Senado. Bertha Lutz e Natércia da Silveira são
nomeadas para integrar a comissão ampliada, reunida no Palácio
Monroe. A subcomissão de redação do anteprojeto, composta por
ministros de Estado, reúne-se no Itamaraty e não admite a parti-
cipação de Bertha.
1932, outubro e novembro – A comissão de Monroe reúne-se para dis-
cutir o anteprojeto da Constituição.
1932, outubro – Filia-se ao Partido Autonomista, no Distrito Federal
(atual cidade do Rio de Janeiro).
Publica o livreto Os 13 princípios: sugestões ao anteprojeto da Constitui-
ção, contendo as propostas feministas para a Constituinte.
1933, 3 de maio – Eleição para a Assembleia Nacional Constituinte.
A candidatura de Bertha Lutz obtém 16.423 votos.
1933, 15 de maio – Cola grau de bacharel em Direito pela Universidade
do Rio de Janeiro.
1933, 25 de julho – Eleição de representantes classistas para a Assem-
bleia Constituinte. Almerinda Gama, presidente do Sindicato
dos Datilógrafos e Taquígrafos e associada à FBPF, vota como
delegada-eleitora.
1933, novembro – Integra a delegação brasileira na Conferência Inte-
ramericana de Montevideo, na qualidade de consultora técnica.
1934, junho – A II Convenção Nacional Feminista, realizada na Bahia,
promove a candidatura de mulheres à Câmara dos Deputados e
às assembleias constituintes estaduais. Também aprova resolução
com o seguinte teor: “Será constituída uma comissão que lançará
oportunamente um plebiscito sobre o divórcio à opinião pública
do Brasil”.
1934, 14 de outubro – Concorre à Câmara dos Deputados e alcança a
primeira suplência do Partido Autonomista. Obtém 39.008 votos.
Natércia da Silveira concorre para a Câmara Municipal do Distri-
to Federal e não se elege, apesar de obter 22.559 votos.
Linha do tempo
151
Linha do tempo
DISCURSOS
155
discursos
157
discursos
159
discursos
161
discursos
163
referências
169
referências
171
referências
173
referências
175
referências
177
referências
179
Anexo 1 – Manifestações de
mulheres em favor do voto
feminino e pela não demissão de
servidores públicos, em 1916
anexos
185
anexos
187
anexos
189
anexos
191
anexos
193
I – Direito à nacionalidade.
O que significa não poder ser retirada da mulher brasileira, mesmo
pelo casamento com estrangeiro, a proteção do seu país, medida esta
completada, agora, pela transmissão da nacionalidade aos seus filhos.
II – Igualdade política.
Com direitos idênticos entre os sexos quanto ao voto, elegibilidade,
participação nos conselhos técnicos, exercício de todas as funções do po-
der público.
III – Direito da mulher de ocupar cargos públicos e a eles concorrer
sem distinção de estado civil, não sendo possível demitir ou excluir a
professora ou funcionária casada, como algumas repartições e estados
têm feito ultimamente.
IV – Licença às funcionárias com vencimentos e sem perda das vanta-
gens decorrentes do exercício, durante três meses, para fins de maternidade.
V – Implementação dessas medidas antes da promulgação da Cons-
tituição, pelo digno e humanitário Sr. Interventor do Distrito Federal,
Dr. Pedro Ernesto, e seus colegas do Rio Grande do Sul e Mato Grosso.
VI – Participação e direção feminina, preferencial dos serviços de
assistência social ligados à maternidade, infância, trabalho feminino e
organização do lar.
VII – Medidas de assistência à mãe necessitada, assim como de defesa
da criança contra o abandono e a exploração física, moral e intelectual.
VIII – Isenção do serviço militar obrigatório para a mulher.
Obtendo todas essas vantagens para a mulher, não esmorece Bertha Lutz
nos seus propósitos de luta. O seu programa é extenso e pleiteia ela agora a
reforma do Código Civil, a defesa ampla do trabalho feminino e a criação
do Conselho Geral e do Departamento da Mulher e da Criança, bem como
outras medidas gerais em benefício do trabalho, do progresso e da paz.
[...]
anexos
195
Alagoas
Lily Lages
Amazonas
Maria Miranda Leão
Bahia
Maria Luiza Dória Bittencourt
Maranhão
Zuleide Bogéa
Rosa Castro
São Paulo
Maria Tereza Nogueira de Azevedo
Maria Tereza Silveira Barros Camargo
Francisca Rodrigues (suplente)
Santa Catarina
Antonieta de Barros
Sergipe
Quintina Diniz de Oliveira Ribeiro
CÂMARAS MUNICIPAIS
Amazonas
Raimunda Menezes de Vasconcellos Dias (vereadora no município
de Itacoatiara)
Benvinda Gonçalves Nogueira (vereadora no município de Coari)
Eurídice Ferreira Lima (vereadora no município de Fonte Boa)
Onísia Gomes (vereadora em município desconhecido)
Clotilde de Lima Motta (vereadora no município de Boa Vista do
Rio Branco)
Espírito Santo
Maria Felizarda Paiva (vereadora no município de Muqui)
Pará
Rose Blanche Freitas Correa (vereadora no município de Vigia)
Haydé Lima de Almeida (vereadora no município de Vigia)
Júlia Catunda dos Santos (vereadora no município de Curuca)
Egídia Rodrigues da Cunha (vereadora no município de São
Caetano de Oliveiras)
Pernambuco
Odete de Oliveira Antunes (vereadora no município de Jaboatão)
anexos
197
anexos
199
anexos
201
DISPOSIÇÕES PRELIMINARES
Art. 1º Na organização do Estado brasileiro, baseado na lei, na paz e
na justiça, é reconhecida a equivalência do homem e da mulher.
Parágrafo único. Os direitos e garantias fundamentais do indivíduo são
extensivos a todos os seres humanos, sem distinção de sexo ou estado civil.
Art. 2º Os direitos da mulher na ordem política, econômica-social,
cultural e jurídica são regulamentados por este estatuto, na conformi-
dade com os princípios de igualdade, as normas e as diretrizes estabele-
cidas na Constituição Federal.
TÍTULO I
ESTATUTO POLÍTICO
CAPÍTULO I
DOS DIREITOS E DAS GARANTIAS INDIVIDUAIS
Art. 3º Todos são iguais perante a lei. Não haverá privilégios nem
distinções de sexos.
Art. 4º Salvo para os efeitos militares, as expressões genéricas refe-
rentes a pessoas abrangem o homem e a mulher.
Art. 5º São abolidas as restrições existentes à capacidade jurídica,
política, econômica, social e cultural da mulher baseadas no sexo ou
no estado civil. Não são permitidas discriminações na aplicação prática
da lei.
Art. 6º A maternidade é fonte de direitos e obrigações para a mu-
lher; garante-lhe assistência médico-sanitária, previdência social-
-econômica e pátrio poder.
Art. 7º À mulher habilitada é assegurada preferência na orientação,
direção, execução, aplicação, fiscalização dos serviços no julgamento
das medidas, e na solução dos problemas decorrentes das condições bio-
lógicas especiais da mulher (art. 121, § 3º, da Constituição).
anexos
203
CAPÍTULO II
DA NACIONALIDADE
Art. 8º Os dispositivos constitucionais e ordinários, referentes à
nacionalidade dos cidadãos, à sua aquisição, transmissão e perda, são
aplicáveis a homens e mulheres, sem distinção.
Art. 9º A nacionalidade e a naturalização são um direito individual,
este último, voluntário, bona fide. A mulher não adquire, muda ou perde
a nacionalidade pelo casamento, ou pela mudança de nacionalidade do
seu cônjuge, na vigência da sociedade conjugal.
Parágrafo único. Na eventualidade de consórcio entre pessoas de na-
cionalidade diversa, ou de mudança de nacionalidade do cônjuge na
constância do casamento, à nubente ou à esposa será dado conhecimen-
to da sua situação futura quanto à nacionalidade. Nessa comunicação,
respectivamente, feita por ocasião dos proclamas, ou anteriormente à
concessão ou cassação do título de naturalização do marido, será acom-
panhada de informações práticas sobre a nacionalidade e a naturalização.
CAPÍTULO III
DOS DIREITOS POLÍTICOS
Art. 10. Os direitos políticos são assegurados aos cidadãos sem dis-
tinção de sexo ou de estado civil, sendo extensivos às mulheres que se
alistarem na forma da lei.
Art. 11. Todas as funções legislativas, executivas e judiciais são aces-
síveis às mulheres sem distinção de estado civil, observadas apenas as
condições outras que a lei estatuir.
Parágrafo único. Este dispositivo se estende aos órgãos consultivos e
judiciários criados nos artigos 103 e 122 da Constituição da República
e à representação de classes.
Art. 12. Todos os empregos públicos são acessíveis ás mulheres sem
distinção de estado civil.
Parágrafo único. É-lhes garantida preferência nos casos e nas condi-
ções previstas no art. 121, § 3º, da Constituição.
Art. 13. Não pode ser obrigada a se demitir a mulher funcioná-
ria por motivo de consórcio com funcionário da mesma ou de outra
repartição.
TÍTULO II
ESTATUTO CULTURAL
CAPÍTULO I
DO PREPARO DA MULHER PARA A
VIDA, O LAR E O TRABALHO
Art. 17. A toda mulher como a todo homem, capaz de recebê-los,
assiste o direito a:
I – instrução primária obrigatória e gratuita;
II – preparo obrigatório para uma ocupação remunerada que lhe ga-
ranta a subsistência.
§ 1º Paralelamente com a instrução geral, receberá ela preparo
doméstico-social que a habilite às funções de dona de casa e mãe.
anexos
205
CAPÍTULO II
DA MULHER COMO EDUCADORA E FATOR CULTURAL
Art. 22. À mulher habilitada na forma da lei, é garantida:
I – igualdade de oportunidades com remuneração e títulos idênti-
cos, aos do homem, em todos os ramos da instrução, educação e cultu-
ra, particulares ou públicas, quer no corpo docente ou técnico quer no
administrativo, consultivo ou fiscalizador;
II – participação nos cargos de direção, inclusive nos supremos pos-
tos, de todos os graus de instrução, proporcional ao seu número no cor-
po docente e técnico;
III – participação, em todos os conselhos e órgãos consultivos ofi-
ciais de educação e cultura, inclusive no Conselho Nacional e nos con-
selhos estaduais de educação;
IV – participação igual como o homem em todas as iniciativas
culturais, inclusive a elaboração de planos e execução de campanhas
educacionais;
V – preferência na direção e orientação técnica dos estabelecimentos
educativos e ramos de ensino vocacional destinados exclusivamente ao
sexo feminino, inclusive nos órgãos consultivos.
Parágrafo único. Os dispositivos deste artigo se estendem às institui-
ções científicas, artísticas e culturais em geral.
Art. 23. O ensino vocacional doméstico social será representado no
Conselho Nacional e nos conselhos estaduais de educação, por repre-
sentante feminino habilitada na forma da lei.
TÍTULO III
ESTATUTO ECONÔMICO
CAPÍTULO I
DOS DIREITOS ECONÔMICOS FUNDAMENTAIS
Art. 24. A toda mulher maior de 18 anos são extensivos os seguintes
direitos econômicos fundamentais:
I – liberdade de exercício de qualquer profissão ou atividade econô-
mica com objetivo lícito, independente de outorga;
II – liberdade de reunião e de associação;
anexos
207
CAPÍTULO II
DOS OUTROS DIREITOS ECONÔMICOS DA MULHER
Art. 25. À mulher que trabalha são garantidos ainda:
I – direito de participação em todos os órgãos legislativos consulti-
vos, administrativos, técnicos e judiciais, relacionados com a organiza-
ção do capital e do trabalho, inclusive os criados na forma dos arts. 103
e 122 da Constituição Federal;
II – preferência feminina naqueles que dizem respeito ao trabalho
da mulher;
III – participação nos cargos de direção e responsabilidade, propor-
cional ao número de mulheres pertencentes às classes respectivas;
IV – fiscalização feminina do trabalho da mulher menor ou adulta,
inclusive o domiciliar, o doméstico, agrícola, industrial, comercial de
balcão e de via pública;
V – criação de conselhos e departamentos de trabalho feminino ofi-
ciais e na ordem nacional e estadual;
VI – organização de conferências de trabalho feminino e partici-
pação feminina plenipotenciária nas conferências oficiais de trabalho,
internacionais, interamericanas e nacionais;
VII – não ratificação dos tratados e convenções, sobre a mulher tra-
balhadora cujas exigências sejam inferiores àquelas preconizadas pela
legislação brasileira ou contrariem os direitos por ela outorgados à
mulher;
VII – Extensão dos nos I, II e III às associações de classe de emprega-
dos, empregadores, funcionários públicos e profissões liberais.
Art. 26. Ficam abolidas as restrições ao trabalho feminino não pre-
vistas na Constituição da República, inclusive ao noturno e proibidas as
discriminações na aplicação prática da lei.
§ 1º É obrigatória a distinção entre o trabalho feminino adulto e
o trabalho de menor para todos os efeitos inclusive a elaboração e
CAPÍTULO III
DA REMUNERAÇÃO E CONDIÇÕES DE TRABALHO
Art. 28. À mulher é devida remuneração idêntica à do homem pelo
mesmo labor.
Parágrafo único. O pagamento será feito diretamente à trabalhadora,
que disporá livremente de todas as remunerações e emolumentos.
Art. 29. O salário mínimo é independente de sexo, baseado no in-
divíduo como unidade de produção.
Parágrafo único. São mantidas condições de igualdade entre homens
e mulheres quanto às colocações, abonos e vantagens concedidos em
virtude de encargos de família.
Art. 30. À dona de casa que administra o lar e não tem emprego
remunerado são asseguradas 10% da renda da família em consideração
ao seu labor.
Art. 31. À mulher que trabalha são extensivas todas as medidas
constitucionais referentes: ao salário mínimo, horário diário não ex-
cedente de oito horas; repouso hebdomadário; férias anuais remune-
radas; indenização por demissão injusta; assistência médica sanitária e
previdência a favor da velhice, da invalidez e nos casos de acidente de
trabalho ou morte; bem como a vantagens idênticas às do homem nas
convenções coletivas e regulamentação das profissões.
Art. 32. Os estabelecimentos onde trabalham mulheres ficam sujei-
tos, além das exigências do Departamento Nacional de Saúde Pública,
às normas apensas a este título do Estatuto da Mulher, com força de lei.
Parágrafo único. Mantém-se o quadro anexo ao Decreto no 21.417, de
17 de maio de 1932, revogado este.
Art. 33. As proibições constitucionais ao trabalho de menores
abrangem a empregada doméstica e a aprendiz de ateliês e oficinas.
anexos
209
CAPÍTULO IV
DAS GARANTIAS ECONOMICO-
SOCIAIS À MATERNIDADE
Art. 34. É instituída a Previdência Social Econômica à Maternida-
de, na forma dos arts. 121, § 1º, letra h; § 3º; 138, letra c; 141; 170, nº 10
da Constituição Federal constituída por:
I – licença de três meses, com vencimentos integrais, à gestante fun-
cionária do governo ou de empresa oficializada destinada ao serviço
público e não ao lucro particular; prorrogável em casos excepcionais
mediante laudo médico pericial;
II – licença idêntica à empregada da empresa particular, mediante
seguro maternal, custeado em partes iguais pelo empregador, emprega-
da e administração pública;
III – licença idêntica por período determinado pelo médico na oca-
sião de aborto necessário ou acidental;
IV – organização e administração feminina de um sistema de segu-
ro maternal e serviços congêneres decorrentes das garantias legislativas
e econômicas à mãe, em departamento subordinado ao Ministério do
Trabalho, ou em secretaria de Estado;
V – amparo médico-sanitário à maternidade e infância, mediante
ambulatórios, consultórios e maternidades;
VI – direito a 2 períodos de meia hora por dia de trabalho para ama-
mentação do filho, nos primeiros seis meses após o parto;
VII – organização de creches nos locais onde trabalham mais de 20
mulheres;
VIII – direito de trabalhadora braçal e de balcão de faltar dois dias
por mês sem desconto.
Art. 35. A percentagem instituída no art. 141 da Constituição
Federal, só será empregada mediante legislação votada nos termos do
arts. 121, § 1º, letra h; § 3º; e 138, letras c e e da Constituição.
anexos
211
CAPÍTULO V
DA PARTICIPAÇÃO FEMININA NA ORDEM SOCIAL
Art. 37. À mulher incumbe precipuamente a orientação da obra
pública, e a fiscalização da obra particular de:
I – proteção à mocidade feminina e á mulher anormal, contra a
crueldade, a exploração, e o abandono físico, moral e intelectual;
II – assistência à mãe, à infância e à população necessidade em geral;
III – formação de técnicos de assistência e vigilância social para a
execução dos nos I e II deste artigo.
Art. 38. À mulher é dada participação em todo órgão oficial de
previdência.
§ 1º Tem preferência naqueles relacionados com os objetivos do
art. 121, § 3º, da Constituição.
Art. 39. A mulher será, desde logo, incluída nos conselhos peniten-
ciários de assistência, de saúde pública e outros congêneres criados na
forma do art. 103 da Constituição Federal e do art. 149 do Estatuto da
Mulher.
TÍTULO IV
ESTATUTO CIVIL E COMERCIAL
CAPÍTULO I
DA CAPACIDADE
Art. 40. Toda mulher é capaz de direitos e obrigações na ordem
civil.
Art. 41. A mulher não terá a sua capacidade restringida em virtude
de mudança de estado civil. Ficam revogadas as restrições à capacidade
econômica e civil da mulher decorrentes de sexo e do casamento e proi-
bidas as distinções na aplicação prática da lei.
anexos
213
CAPÍTULO II
DA SOCIEDADE CONJUGAL
Art. 42. Podem casar as mulheres maiores de 18 anos que não este-
jam incursas nos impedimentos do Código Civil.
Parágrafo único. Na ocasião da habilitação para o casamento ser-lhes-á
fornecida explicação da legislação referente à sociedade conjugal, aos
direitos e obrigações dos cônjuges quanto às suas pessoas, filhos e bens.
Será dada sob forma de folheto; verbalmente só à mulher analfabeta.
Art. 43. A sociedade conjugal funda-se em bases de afeição, mútuo
respeito e igualdade de direitos e deveres entre os cônjuges.
§ 1º A ambos compete fidelidade, assistência recíproca, manutenção
do lar, guarda, sustento e educação dos filhos em comum acordo.
§ 2º Em caso de divergência grave haverá recurso para o juiz.
Art. 44. Compete a ambos os cônjuges a representação legal da fa-
mília, podendo, porém, um deles por delegação expressa do outro, re-
presentar também a este.
Parágrafo único. Não é permitido o mandato tácito.
Art. 45. A mulher casada, economicamente independente pelo seu
trabalho, bens ou rendas próprias, poderá exercer todos os direitos, pra-
ticar todos os atos e assumir todas as obrigações na vida civil.
§ 1º Quando exercer profissão lucrativa tem direito a praticar todos
os atos inerentes ao seu exercício e a sua defesa, bem como de dispor
livremente do produto do seu trabalho.
§ 2º Como o marido, será obrigada a contribuir, proporcionalmente
a sua renda, para a manutenção do lar e dos filhos menores comuns.
§ 3º Ao marido não é lícito proibir o exercício de profissão lucrativa
à mulher.
Art. 46. A mulher casada sem bens, rendas ou profissão lucrativa,
que administra o lar e cria os filhos comuns, terá direito de ser ouvida
sobre todos os problemas que interessam ao casal e aos filhos.
CAPÍTULO III
DOS BENS DA MULHER CASADA
Art. 48. Antes de celebrado o casamento serão obrigatoriamente
arrolados todos os bens e rendas de cada nubente.
Parágrafo único. Esta formalidade é indispensável para a validez da
celebração.
Art. 49. Feito o arrolamento aos nubentes é lícito estipularem con-
tratualmente qual o regime de bens que adotam.
Art. 50. Na falta de convenção ou sendo nula vigorará o regime de
comunhão limitada.
§ 1º O regime de comunhão universal de bens só é aplicável quando
os contratantes não tiverem bens.
§ 2º Fica abolido o regime dotal.
§ 3º As doações antenupciais só podem ser feitas pelos nubentes
maiores e não excederão a metade dos seus bens.
Art. 51. Seja qual for o regime adotado, ficam excluídos da
comunhão:
I – os bens e rendas pertencentes à nubente na ocasião do casamento;
II – os frutos civis do seu trabalho, ressalvado o disposto no art. 45;
anexos
215
CAPÍTULO IV
DA PROTEÇÃO À PESSOA DOS FILHOS DO
PÁTRIO PODER DA MÃE E DA FILIAÇÃO
Art. 58. A mãe, como o pai, deve a todo filho proteção, sustento e
educação na proporção das suas rendas, situação social e cultura.
§ 1º Como o pai, transmite o nome ao filho e sobre ele exerce o
pátrio poder.
Art. 59. O pátrio poder só poderá ser retirado à mãe, como ao pai,
por sentença ou mandato expresso do juiz, na forma da lei em vigor,
provado que ela, ou ele, não trata o filho convenientemente.
Art. 60. Durante o casamento o marido e a mulher exercem soli-
dária e conjuntamente o pátrio poder, competindo-lhes igualmente a
guarda, sustento e educação dos filhos.
§ 1º São, solidariamente, os administradores legais dos bens dos fi-
lhos que se achem sob o seu poder, salvo o disposto no art. 225 do
Código Civil.
§ 2º Em caso de divergência grave haverá recurso para o juiz.
Art. 61. A terminação da sociedade conjugal entre vivos não altera
as relações entre os pais e os filhos, salvo quanto ao direito de tê-los em
sua companhia.
§ 1º Quanto à guarda destes observar-se-á o que os cônjuges acor-
darem entre si.
§ 2º Se não chegarem a acordo poderá o juiz a bem dos filhos regular
a situação deles para com os pais.
Art. 62. Salvo motivos graves que o desaconselhem a bem do me-
nor, na opinião do juiz, ambos os pais terão direito de tê-los em sua
companhia por períodos sucessivos de duração igual, ficando entretan-
to os menores de sete anos sob a guarda da mãe.
Art. 63. A mãe que contrate nupciais não perde o pátrio poder
quanto aos filhos do leito anterior, legítimo ou não.
Art. 64. A obrigação de proteção, sustento e educação dos filhos é
extensiva aos filhos de pais ilegítimos, mas o pátrio poder sobre estes
compete à mãe.
anexos
217
CAPÍTULO V
DA TUTELA E DA CURATELA
Art. 69. Os dispositivos do direito civil referentes à tutela e curatela
se aplicam a homens e mulheres em igualdade de condições.
Parágrafo único. Ambos poderão escusar-se nos casos previstos do
art. 414, nº II, IV, V, VI e VII do Código Civil ou quando tiverem filhos
próprios menores em seu poder.
Art. 70. O direito de nomear tutor compete aos pais e aos avós e na
divergência ou falta destes ao juiz.
§ 1º Na falta de tutor nomeado pelos pais, incumbe a tutela aos pa-
rentes consanguíneos de menor por esta ordem:
I – aos avós;
II – aos irmãos;
III – aos tios.
§ 2º A preferência será estabelecida sem distinção de sexos, exclusi-
vamente no interesse de menor.
Art. 71. A mulher é de direito curadora do esposo interdito ou au-
sente e só na sua incapacidade será nomeado outro curador.
CAPÍTULO VI
DO DIREITO DAS OBRIGAÇÕES
Art. 72. A mulher, casada ou não, é capaz das mesmas obrigações
que o homem na ordem civil, sujeita a condições idênticas.
Art. 73. A mulher agravada em sua honra ou boa fama tem direito
de exigir do ofensor uma indenização que será arbitrada judicialmente.
Parágrafo único. Sendo ela menor e virgem e a ofensa física será a in-
denização duplicada.
Art. 74. O casamento do ofensor com a ofendida só extingue a
obrigação de indenizável:
I – se a ofendida sendo maior e capaz a ele consentir livremente;
II – se a ofendida maior de 16 e menor de 21 anos era noiva da vítima
e derem seu consentimento não só ela como também os seus represen-
tantes legais;
anexos
219
CAPÍTULO VII
DO DIREITO DAS SUCESSÕES
Art. 76. Os dispositivos do direito das sucessões se aplicam a ho-
mens e mulheres sem distinção.
§ 1º A mulher pode testar, herdar, receber legado a ser testamenteira
e nas mesmas condições que o homem, seja qual for o seu estado civil.
§ 2º Ficam abolidas as distinções atuais do Código Civil, entre ho-
mens e mulheres inclusive quanto à exclusão da sucessão e a deserdação.
Art. 77. A mulher sobrevivente no casamento celebrado sob o regi-
me de comunhão de bens ou economicamente dependente do marido é
meieira e continuará até a partilha na posse da herança.
Art. 78. A sucessão legítima defere-se na seguinte ordem:
I – descendente;
II – ascendentes;
III – cônjuge;
IV – colaterais;
V – a União, os estados e o Distrito Federal.
Art. 79. São herdeiros necessários os economicamente dependentes
do falecido que foram seus:
I – filhos e netos carnais menores de 18 anos;
II – pais maiores de 60 anos;
III – cônjuge ou companheira conjugal ilegítima dele dependente;
IV – irmãos carnais, civilmente incapazes ou fisicamente impossi-
bilitados de trabalhar.
Parágrafo único. Considera-se economicamente dependentes os que
não tiverem bens ou rendas próprias, pensão, aposentadoria ou profis-
são lucrativa que lhes garanta a subsistência.
CAPÍTULO VIII
DA COMPANHEIRA CONJUGAL ILEGÍTIMA
Art. 82. À companheira conjugal de homem desquitado, solteiro
ou viúvo, que, por ignorância da lei, simplicidade, rusticidade ou im-
possibilidade de contraírem casamento legítimo, com ele mantém ou
mantinha vida marital com ânimo definitivo, não se aplicam:
I – a ação reivindicadora de bens doados pelo companheiro;
II – a exclusão da sucessão deste por herança ou legado.
Parágrafo único. São-lhe extensivos os arts. 46 e §§; 58 e parágrafo
único; 59; 63; 64; 65; 71; 76; 77; 78 e 79 (Título IV) e os arts. 91, 94 e
95 (Título V) do Estatuto da Mulher e bem como o montepio e outras
medidas congêneres dos funcionários públicos e dos militares.
CAPÍTULO IX
DA MULHER COMERCIANTE
Art. 83. Podem comerciar no Brasil, todas as pessoas, sem distinção
de sexos que se acharem na livre administração dos seus bens.
Art. 84. O comerciante casado não pode alheiar, hipotecar ou gra-
var de ônus, os bens próprios do outro cônjuge.
Art. 85. Os bens de raiz comuns a ambos, só podem ser alheiados,
hipotecados ou gravados de ônus, mediante autorização expressa do ou-
tro cônjuge.
Art. 86. A outorga conjugal e o registro dos bens ficam sujeitos às
formalidades da lei em vigor.
CAPÍTULO X
DISPOSIÇÕES SUBSIDIÁRIAS
Art. 87. Em todos os contratos e documentos em que figurarem
as duas pessoas de um casal será inscrito por extenso o nome de uma e
outra, ficando abolida a fórmula “fulano de tal e sua mulher”.
anexos
221
TÍTULO V
ESTATUTO PENAL
I – PARTE GERAL
CAPÍTULO I
DA LEI CRIMINAL
Art. 89. A lei criminal aplica-se a toda a pessoa que a violar.
Parágrafo único. Salvo as exceções legislativas textuais decorrentes da
diferenciação biológica dos sexos, aplica-se a homens e mulheres em
igualdade de condições.
CAPÍTULO II
DA OFENDIDA
Art. 90. A ação repressiva do Ministério Público, além dos casos
previstos no código em vigor, será provocada pela mulher ofendida, nos
seguintes delitos: lesão corporal; contágio venéreo, crimes contra sua
honra e boa fama e infrações congêneres.
§ 1º A mulher menor, incapaz ou interdita, será substituída pelos seus
representantes legais ou pelos responsáveis pela sua segurança, inclusive
os que a tenham sob a sua guarda educativa, patronal ou doméstica.
§ 2º A representação será disponível na forma prevista pelo código
em vigor.
Art. 91. O crime é agravado quando cometido contra:
I – mãe, descendente;
II – irmã, ou parenta em grau que proíba o casamento;
III – noiva, cônjuge, companheira conjugal ilegítima, mulher com
quem o criminoso tenha tido relações carnais ou que a elas se recusasse;
IV – mulher inimputável ou de imputabilidade restrita, nos termos
dos arts. 98 e 99 deste estatuto;
V – menor ou incapaz que se ache sob o pátrio, tutela, curatela,
guarda ou autoridade, inclusive patronal, doméstica ou educativa do
criminoso ou dele dependa economicamente;
anexos
223
CAPÍTULO III
DA MULHER
Art. 97. À mulher imputável são aplicáveis as penas principais e
acessórias da lei.
Art. 98. Não é passível de pena, mas somente de medidas de se-
gurança, a mulher, com o homem, que carecer de imputabilidade no
momento de cometer o crime.
Art. 99. Carecem de imputabilidade:
I – a menor de 16 anos;
II – a psicopática;
III – a imbecil.
Art. 100. Têm imputabilidade restrita:
I – aquela cuja conduta é profundamente afetada por desvio psicopá-
tico, debilidade mental ou neurose;
II – a grávida e a puérpera;
III – a maior de 16 e menor de 18 anos;
IV – a surda-muda e a cega;
V – a senil.
Parágrafo único. A imputabilidade e o seu grau serão estabelecidos
mediante laudo pericial.
Art. 101. A ignorância da lei não exclui a responsabilidade, a ela
atenderá, porém, o juiz no caso de pessoa analfabeta, rústica e simples,
ou silvícola.
CAPÍTULO IV
DO CUMPRIMENTO DAS PENAS E
MEDIDAS DE SEGURANÇA
Art. 102. A mulher acusada, detenta, ou condenada a pena de pri-
são ou internamento como medida de segurança, será mantida sempre
sob vigilância feminina e isolada do homem que se achar em condições
idênticas.
anexos
225
II – PARTE ESPECIAL
CAPÍTULO V
DOS CRIMES CONTRA A VIDA, A SAÚDE E A
INTEGRIDADE CORPÓREA EM RELAÇÃO À MULHER
Homicídio
Art. 113. Aos crimes de homicídio, tentativa de homicídio prete-
rintencional cometidos contra a mulher aplicam-se em geral os disposi-
tivos do código em vigor e dos arts. 91, 92 e 94 deste estatuto.
Infanticídio
Art. 114. Àquela que durante o parto, ou ainda sob a inf luência
de estado puerperal, matar o filho recém-nascido serão extensivas as
dirimentes do art. 100, nº II, deste estatuto, sendo-lhe aplicada pena
de detenção mínima de seis meses aumentada até um ano, segundo o
seu grau de independência econômica, posição social e cultura e a sua
lucidez no momento.
Art. 115. Àquele que cometer o crime de infanticídio para esconder
o nascimento de filho ilegítimo, após a gravidez decorrida ocultamen-
te, para salvaguardar à honra de sua colateral ou descendente, se descon-
tará a pena por metade se a mãe não se opôs ao ato.
Aborto
Art. 116. A mulher que causar o próprio aborto, ou provocar a mor-
te intrauterina do feto, ou permitir que outrem a cause ou a provoque
será punida com detenção.
anexos
227
Art. 117. Aquele que causar o aborto de alguma mulher, ou lhe des-
truir no ventre o seu fruto, será punido com pena idêntica se o fez com
o seu consentimento, ou com prisão até cinco anos, se dele prescindiu.
Parágrafo único. A aplicação da pena regular-se-á pelo art. 115, quan-
do se verificarem as condições nele estabelecidas.
Art. 118. Aquele que causa a morte de alguma mulher por lhe haver
determinado o aborto, ou por lhe haver destruído no ventre do fruto
da concepção será punido com prisão por dois a seis anos, se provar ter
agido com o consentimento da vítima ou por três a nove anos, no caso
contrário.
Art. 119. Não será passível de pena o médico diplomado que para
salvar uma mulher lhe interrompa a gravidez.
Parágrafo único. O consentimento da grávida é necessário se ela for
capaz e estiver em condições de se pronunciar.
Art. 120. As penas de aborto não se aplicam à destruição do fruto do
pai, ou mãe, tarado ou ao feto resultante de crime de violência carnal.
Art. 121. Se o crime de infanticídio e o aborto cometido por mulher
menor, mentalmente deficiente ou economicamente dependente do
marido, companheiro ilegítimo, agressor, ou sedutor, foi consequência
de abandono por este, será ele processado por crime de abandono de
pessoa incapaz de defender-se, na forma dos arts. 136 e 138, deste esta-
tuto e subsidiariamente da lei em vigor.
Transmissão de doença
Art. 122. A pessoa que, ocultando estar contaminada transmita à
outra pelo contato libidinoso, qualquer doença venérea será punida com
detenção, por seis meses no mínimo e indenização da vítima.
Exploração exaustiva do trabalho
Art. 123. A pessoa que explorar o trabalho da mulher, submetendo-a
a regime tal que lhe faça perigar a saúde ou gravemente a prejudique, ou
que seja superior a sua idade e condição física, será punida com detenção
até seis meses ou com multa e indenização acumuladas.
§ 1º Se do regime a que tiver sido submetida resultar, para a vítima
doença incurável, inabilitação permanente para o trabalho, ou para a
maternidade, perda de órgão, membro, sentido ou função a pena será a
de prisão até quatro anos e no caso de morte, por dois a seis anos.
CAPÍTULO VI
DOS CRIMES CONTRA A HONRA E
A BOA FAMA DA MULHER
Calúnia – injúria
Art. 125. A pena nos crimes de calúnia será aumentada de um quar-
to quando agravar a honra sexual de alguma mulher.
Parágrafo único. Dispositivo idêntico se aplica à injúria.
Rapto
Art. 126. Aquele que, usando de violência, de ameaças, ou de ar-
tifícios, raptar alguma mulher, ou tolhendo-lhe a defesa, a retiver, será
punido com prisão por seis meses a dois anos, se tiver em mira o casa-
mento, ou por um a três anos, se tiver tido em mira comércio sexual
ilegítimo.
Parágrafo único. A pena de rapto será aumentada verificando-se algu-
ma das circunstâncias previstas no art. 91.
Art. 127. Quando ilesa na pessoa e sexualmente intacta, a vítima,
o raptor lhe restituir a liberdade espontaneamente, pondo-a em lugar
seguro, ou restituindo ao domicilio, poderá o juiz diminuir a pena até
metade ou convertê-la em detenção.
§ 1º Ao casamento do raptor com a raptada se aplica o disposto no
art. 93.
anexos
229
CAPÍTULO VIII19
DOS CRIMES CONTRA OS FILHOS
Art. 136. A mãe como o pai, maior, normal, com renda própria ou
profissão lucrativa será punida com detenção por 3 meses a 1 ano pelo
abandono ou exposição do filho, seja ele legítimo ou não.
§ 1º Se for inimputável ou de imputabilidade restrita, ou se o filho
for fruto de sedução ou violação carnal a pena se aplicará apenas ao pai.
Art. 137. Ao sonegamento pelos pais de proteção, sustento e edu-
cação aos filhos menores legítimos ou não aplica-se a pena de detenção
de 3 meses a 1 ano com indenização proporcional às necessidades dos
filhos, à situação econômica e social e ao grau de cultura dos pais.
Parágrafo único. Este artigo se aplica à mãe nos termos do artigo
anterior.
Art. 138. A obrigação de sustento do filho ilegítimo abrange a mãe
da criança durante a gravidez e o primeiro ano da vida infantil, bem
como as despesas de parto.
Parágrafo único. Da indenização devida pelo pai são deduzíveis a renda
própria e as contribuições de caixa de previdência que a mãe maior e
imputável tiver.
Art. 139. A obrigação de educação abrange a instrução que habilite
a prover futuramente a existência pelo trabalho honesto.
Art. 140. Agravante idêntica à prevista por lesão corpórea resultante
de crime de exposição e abandono, se aplica à violência carnal, sedução,
atentado ao pudor, ou corrupção de que a menor do sexo feminino for
anexos
231
CAPÍTULO IX
DOS CRIMES CONTRA O ESTADO CIVIL
Art. 141. A ação adultério e o erro essencial de pessoa é apenas civil.
Parágrafo único. Se o motivo determinante for crime poderá ser ins-
taurada ação penal concomitantemente.
Art. 142. Nos crimes de ocultação, substituição de recém-nascido,
e outros crimes contra o estado civil a pena será idêntica para o homem
e a mulher.
Parágrafo único. Excetuam-se os crimes de bigamia cometidos contra
a mulher nos quais à vítima é lícito instaurar processo de sedução mes-
mo quando ela for maior.
CAPÍTULO X
DAS INFRAÇÕES
Art. 143. Aquele que, por palavras que lhe dirija ou pela insistência
com que a siga, importunar alguma menina ou mulher em via ou logra-
douro público, será punido com detenção até dez dias.
Art. 144. Aquele que, sob qualquer forma, exibir em público anúncio
objeto ou representação gráfica, auditiva, ou fotocenográfica, inclusive
pessoa sua ou outra, em condições atentatórias à dignidade da mulher,
será punido com multa proporcional à ofensa e à amplitude de divulgação.
CAPÍTULO XI
DO JULGAMENTO
Art. 144.20 A mulher habilitada na forma da lei será obrigatoria-
mente incluída nas listas para sorteio do conselho de sentença.
Parágrafo único. Será assegurada obrigatoriamente a sua participação
no julgamento dos crimes em que a mulher for ré ou vítima.
CAPÍTULO XII
DO CONSELHO PENINTENCIÁRIO
Art. 145. À mulher será dada obrigatoriamente representação nos
conselhos penitenciários nacional e estaduais e nos conselhos de menores.
TÍTULO VI
DISPOSIÇÕES GERAIS
Art. 146. Para os efeitos deste estatuto, considera-se mulher toda
pessoa do sexo feminino, seja qual for sua idade, estado civil, ou
nacionalidade.
TÍTULO VII
DISPOSIÇÕES TRANSITÓRIAS
Art. 147. Este estatuto entrará em vigor logo após a sua sanção ou
promulgação.
Art. 148. Posto em vigor, proceder-se-á à organização dos órgãos
necessários à execução das medidas que institui.
Art. 149. Serão desde logo empossadas pelas autoridades compe-
tentes mulheres habilitadas na forma da lei, nos cargos consultivos que
competem à representantes do sexo feminino na forma deste estatuto e
dos arts. 103 e 121, § 3º, da Constituição.
§ 1º Não havendo vagas assistirão provisoriamente as reuniões dos
conselhos como vogais, com direito de voto.
§ 2º As primeiras vagas verificadas serão por elas preenchidas, ressal-
vadas as exigências da lei.
Art. 150. Revogam-se as disposições em contrário.
Bertha Lutz
EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS
A Carta Constitucional de julho, traduzindo a orientação liberal-
-democrática contemporânea, institui o princípio da igualdade política,
jurídica e econômica dos seres humanos, sem distinção de sexos.
Admite a mulher ao voto. Não permite a quem quer que seja obstar
o seu alistamento eleitoral, tornando-o pelo contrário, obrigatório para
a mulher que ocupa emprego público.
anexos
233
anexos
235
anexos
237
PARECER
O projeto de Estatuto da Mulher, elaborado pela relatora desta co-
missão, coordena os direitos de ordem política, econômico-social, cul-
tural, civil-comercial e penal da mulher.
Equivale a uma codificação desses direitos, em lex satura. À semelhan-
ça do estatuto da mulher em estudo na Sociedade das Nações, do código
da criança de que se cogita em Genebra, do Estatuto do Funcionário em
votação nesta Casa do Parlamento, codifica-os em relação ao sujeito do
direito, no caso vertente a mulher, biologicamente diferenciada.
É um critério perfeitamente admissível na opinião de juristas notá-
veis, como sejam o eminente mestre Cicero Peregrino. Segue os moldes
da primeira Declaração de Direitos, a Magna Carta, que os barões in-
gleses arrancaram ao rei João Sem Terra em 1225, dela fazendo o protó-
tipo das declarações de direitos e garantias fundamentais.
A matéria em apreço foi dividida em diversos títulos, que corres-
pondem respectivamente ao estatuto político; econômico-social; civil-
-comercial e penal da mulher.
O título correspondente aos direitos políticos consagra apenas os
dispositivos constitucionais e o direito eleitoral.
O estatuto econômico elabora as consequências da Constituição e
reafirma as proibições de discriminações econômicas contrarias à mu-
lher. Inclui igualmente as regras gerais, universalmente aceitas da Orga-
nização Internacional do Trabalho, excluídas aquelas que colidem com
o direito pátrio mais favorável à mulher. Acrescenta um certo número
de medidas aconselhadas pela experiência e pela observação das peritas.
A matéria social acha-se anexa a este título porque dada sua natu-
reza e origem foi estreitamente vinculada à matéria econômica, pela
constituição do Brasil e interessa principalmente à mulher como traba-
lhadora, como mãe de família e portanto como fator não só econômico
mas social.
Foi introduzido no projeto uma divisão correspondente ao título
da educação da Constituição brasileira, sob a denominação de Estatuto
Cultural. Prevê a educação e a orientação feminina, cultural, domésti-
ca, profissional e cívica, procurando indicar o caminho do preparo da
mulher para o lar, o trabalho e a vida.
anexos
239
Bertha Lutz
Bandeira Vaughan
Camillo Mércio
Aberlado Marinho
Rui Carneiro
Homero Pires
PARLAMENTARES
cida por Bertha Lutz, formou-se
em Biologia na França e em Direito no
Brasil. Servidora pública federal em
um tempo em que poucas mulheres
Câmara dos
PERFIS
atuavam na administração pública,
Deputados colaboradora da diplomacia brasi-
73
leira em momentos cruciais (como
A experiência democrática dos últimos anos levou à crescente presença po-
a Conferência de São Francisco, em
pular nas instituições públicas, tendência que já se pronunciava desde a ela- 1945), sua trajetória política se con-
boração da Constituição Federal de 1988, que contou com expressiva parti- funde com a história do movimento
cipação social. Politicamente atuante, o cidadão brasileiro está a cada dia mais pelo sufrágio feminino no Brasil. Nes-
interessado em conhecer os fatos e personagens que se destacaram na forma- sa luta, chegou à condição de deputada
ção da nossa história política. A Câmara dos Deputados, que foi e continua a federal em 28 de julho de 1936 e dei-
ser – ao lado do povo – protagonista dessas mudanças, não poderia deixar de xou a Câmara em 10 de novembro de
corresponder a essa louvável manifestação de exercício da cidadania. 1937, quando a Casa foi fechada por
Getúlio Vargas, por ocasião da decre-
Teresa Cristina de Novaes Marques Criada em 1977 com o objetivo de enaltecer grandes nomes do Legislativo, tação do Estado Novo.
é historiadora, doutora pela Universi- a série Perfis Parlamentares resgata a atuação marcante de representantes A importância da contribuição de
dade de Brasília (UnB) e mestra pela de toda a história de nosso Parlamento, do período imperial e dos anos de Lutz para o Parlamento brasileiro não
Universidade Federal do Rio de Janei- República. Nos últimos anos, a série passou por profundas mudanças, na pode ser medida apenas pela extensão
ro (UFRJ). Desde 2005, é professora forma e no conteúdo, a fim de dotar os volumes oficiais de uma feição mais do seu mandato, mas pela ousadia das
da UnB, onde ministra cursos sobre o atual e tornar a leitura mais atraente. A Câmara dos Deputados busca, assim, propostas que defendeu em toda a sua
Brasil colonial e republicano. Já publi- carreira. Ao chegar à Câmara, após
homenagear a figura de eminentes tribunos por suas contribuições históri-
cou obras de história econômica, em uma longa campanha, iniciada em
especial sobre a indústria de cerveja no cas à democracia e ao mesmo tempo atender os anseios do crescente público
1918, pela franquia dos direitos polí-
Brasil e sobre práticas de crédito. Nos leitor, que vem demonstrando interesse inédito pela história parlamentar ticos às mulheres, Bertha Lutz trazia
últimos anos, vem se dedicando à his- brasileira. consigo as ideias e a energia política
tória parlamentar do voto feminino. necessárias para tornar viáveis polí-
ticas públicas que elevassem o status
jurídico e econômico das mulheres
brasileiras. O longo caminho por ela
percorrido na vida pública e suas ini-
A
ciativas como parlamentar são exa-
T H
minados nesta obra da historiadora
BER Z
Teresa Cristina de Novaes Marques,
que se apoia em documentação con-
sultada no Brasil e no exterior.
LUT
Transitando em um sistema político
predominantemente masculino, Lutz
deixou sua marca como defensora da
IS igualdade incondicional entre homens
BERTHA
PE RF S
T ER e mulheres. Por tudo isso, ao acompa-
LUTZ
A
MEN
73
A
PA RL nhar seus passos, podemos conhecer
UE S
A RQ suas estratégias, suas ideias sobre o
ES M
DE NOVA papel do Estado e as resistências que
RIS T IN A enfrentou em sua trajetória política.
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Con livra Brasília
2016