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REALIDADE

SOCIOECONÔMICA E
POLÍTICA BRASILEIRA

Daniele Fernandes da Silva


Revisão técnica:

Luciana Bernadete de Oliveira


Graduada em Ciências Políticas e Econômicas
Especialista em Administração Financeira
Mestre em Desenvolvimento Econômico Regional

Lilian Martins
Especialista em Controladoria e Planejamento Tributário

Gisele Lozada
Graduada em Administração de Empresas
Especialista em Controladoria e Finanças

Alexsander Canaparro da Silva


Bacharel em Administração de Empresas
MBA em Marketing Práticas Avançadas
MBA em Comércio Exterior e Internacional
Mestre em Administração

R429 Realidade socioeconômica e política brasileira [recurso


eletrônico ] / Daniele Fernandes da Silva... et al.; [revisão
técnica: Luciana Bernadete de Oliveira... et al.]. – Porto
Alegre: SAGAH, 2018.

ISBN 978-85-9502-450-2

1. Economia. I. Silva, Daniele Fernandes da.


CDU 338

Catalogação na publicação: Karin Lorien Menoncin - CRB -10/2147


A ambientalização das
relações de consumo
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

 Identificar o consumo, o capitalismo e suas relações com o meio


ambiente.
 Reconhecer o conceito de desenvolvimento e consumo sustentável.
 Indicar as consequências das relações de consumo sobre o meio
ambiente.

Introdução
Neste capítulo, você vai aprofundar-se no estudo da complexa relação
entre o consumo e o meio ambiente, vendo o que significa consumo
sustentável e analisando as consequências dessa relação.

Consumo no capitalismo e os impactos


no meio ambiente
Desde a era de produção em massa, no início do século XX, estimulada pelo novo
modo de produção fordista, as relações de consumo passaram a apresentar uma
nova fase. A implementação de linhas de montagem automatizadas na fábrica
de automóveis de Henry Ford permitiu que os trabalhadores se especializassem
na produção de uma determinada etapa do processo produtivo. A esteira rolante
reduzia o tempo de transporte das peças ao longo do processo de produção, de
maneira que, com a repetição da mesma tarefa sucessivamente, o trabalhador
se tornaria cada vez mais ágil, aumentando a produtividade – a quantidade
de bens produzidos por hora aumentou consideravelmente (RIBEIRO, 2015).
O uso de máquinas transformou radicalmente a natureza da atividade
produtiva: o processo produtivo passou a ser rotinizado com a precisão de um
relógio e se esperava que tudo acontecesse com precisão no modo e no tempo
308 A ambientalização das relações de consumo

esperados. Assim, “as máquinas levaram” as organizações a se adaptarem às


suas exigências e o processo mecanizado passou a ditar as relações e o modo
como as pessoas se comunicam.
Contudo, o processo de produção vigente apresentava uma visão autoritária
de Ford, que tinha grande controle sobre os trabalhadores tanto durante quanto
após a jornada de trabalho. Isso se justificava pela necessidade de garantir a
resistência física dos trabalhadores, uma vez que se tratava de um processo
de produção intensivo. Porém, essa metodologia gerava insatisfação da classe
trabalhadora, tornando-se um ponto negativo para os resultados que Ford
esperava. Assim, uma das formas que o empresário encontrou para estimular
a adesão dos trabalhadores foi o aumento dos salários, que passaram a ser dos
maiores entre as grandes empresas da época. Ford identificou que era preciso
satisfazer necessidades dos trabalhadores para que eles interagissem melhor
com a empresa (RIBEIRO, 2015).
A produção aumentou significativamente e, mesmo com maiores custos
devido ao pagamento de maiores salários aos trabalhadores, bem como uma
quantidade de horas de trabalho diárias inferior, a lucratividade passou a
crescer consideravelmente com o novo método de gestão de Ford. Assim,
o sucesso desse modo de produção capitalista, em que o crescimento da
riqueza é resultado da exploração da força de trabalho, disseminou-se pelo
país e pelo mundo.
A partir do início do século XX, a produção em massa da indústria norte-
-americana, junto a maiores ganhos salariais, oferecia à sociedade maior poder
aquisitivo e maior quantidade de bens a preços mais acessíveis. Novas necessi-
dades de consumo passavam a ser criadas pelas empresas, estimulando ainda
mais o consumo; surgia uma nova mentalidade na sociedade norte americana.
A população passava a objetivar melhores condições de vida, introduzindo em
seus planos a aquisição da casa própria e do carro, que anteriormente eram
considerados bens de luxo, ao alcance de poucos indivíduos (RIBEIRO, 2015).
Os desejos dos consumidores passaram a ser moldados pela cultura de uma
sociedade capitalista e o que em tempos antigos era considerado necessidade,
passou a ser confundido com desejo. Por exemplo, para alguém que tivesse
sede, um copo de água seria o ideal; em uma sociedade capitalista, para satis-
fazer a sede, passa-se a desejar um copo de suco ou refrigerante (conforme a
característica de cada pessoa). Nota-se que desejo e necessidade passam a ser
confundidos entre a população: de acordo com Sandroni (2005), a necessidade
é a exigência individual ou social que deve ser satisfeita por meio do consumo
de bens e serviços. O desejo, segundo Jales (2017), é a vontade de comprar
aquilo que se quer (não o que se precisa).
A ambientalização das relações de consumo 309

As necessidades não são apenas fisiológicas, como representa a Figura 1,


pois envolvem também questões psicológicas e relacionadas às condições básicas
de vida.

Figura 1. As necessidades humanas.


Fonte: Andreasi (2011, documento on-line).

A pirâmide de Maslow, criada em meados dos anos 1950 pelo psicólogo


norte-americano Abraham Maslow, é uma representação de que as necessidades
humanas ultrapassam a esfera biológica. A teoria de Maslow organizou essas
necessidades em uma pirâmide, na qual, na base, encontram-se as necessi-
dades mais básicas, relacionadas à sobrevivência do indivíduo, como água e
comida, e, no topo, as mais complexas, envolvendo a autorrealização, como
o desenvolvimento pessoal e o talento (REZ, 2016).
Desse modo, sabendo que as necessidades das pessoas não se resumem
apenas a itens relacionados à própria sobrevivência, com o tempo, as empre-
sas passaram a adquirir cada vez mais espaços publicitários para conquistar
a atenção dos consumidores. Porém, diante de tamanha concorrência nos
anúncios, tornou-se difícil para uma marca se destacar entre as outras, o que
refletiu a menor eficácia da propaganda tradicional.
Para chamar e reter a atenção das pessoas, os anunciantes identificaram
que era preciso oferecer algo que se destacasse em todos os veículos de co-
310 A ambientalização das relações de consumo

municação: intervalo de televisão, outdoor, revista, ônibus, metrô, mensagens


no celular, e-mail e redes sociais.
Assim, o estímulo diário da propaganda sobre os desejos das pessoas torna
insaciável o consumo na sociedade. A questão que se levanta, nesse sentido, é
o impacto da aceleração do consumo sobre o meio ambiente, pois os recursos
para a produção dos bens e serviços são escassos e se confrontam com as
necessidades e desejos humanos, que são ilimitados e renascem diariamente.
Um adicional a essa pressão é o crescimento populacional e o aumento dos
padrões de vida, que aumentam o consumo absoluto e a pressão sobre a utili-
zação dos recursos escassos (VASCONCELLOS; GARCIA, 2014).
Alguns países já começaram a alertar a população em relação à utilização
racional dos recursos disponíveis, em especial aos métodos de produção das
indústrias, que podem provocar degradação do meio ambiente (ar, solo, rios,
por exemplo). Assim, cada vez mais, a satisfação do consumidor e a opinião
pública passaram a estar diretamente ligadas à participação das organizações
em causas sociais, e a responsabilidade social transformou-se numa vantagem
competitiva por parte das empresas (LEITE et al., 2007).

Desenvolvimento e consumo sustentável


O modo de produção capitalista, iniciado no século XX, tem como característica
principal o acúmulo de riquezas por parte dos donos dos meios de produção
e a exploração da força de trabalho. A produção em massa, resultado da
mecanização dos processos de produção, permitiu, também, o consumo em
massa: a maior quantidade de bens a preços mais populares representou um
avanço no desenvolvimento econômico.
Desenvolvimento econômico se distingue de crescimento econômico:
o primeiro está relacionado a questões qualitativas, ou seja, se o aumento
de riquezas está sendo distribuído de forma igualitária entre os indivíduos
daquela sociedade, gerando bem-estar – são exemplos de itens que provo-
cam aumento da qualidade de vida. Para Vasconcellos e Garcia (2014), o
crescimento econômico se refere à geração de riquezas em um país em um
determinado período – um país ser rico não significa que é desenvolvido, e
vice-versa. O crescimento é um dos principais objetivos dos governos em
todos os países do planeta, portanto, é inevitável que aconteça. Em alguns
casos, o crescimento ocorre de modo mais lento e, em outros, mais acelerado,
mas o importante é criar uma estrutura para suportá-lo e supri-lo de forma
sustentável. Isso significa dizer que, com o aumento da produção de bens e
A ambientalização das relações de consumo 311

serviços, é preciso dar importância às atitudes relacionadas à utilização dos


recursos do meio ambiente. Em relação ao consumidor, a sua tarefa está no
consumo consciente, para que a agressão ao meio ambiente seja minimizada
ou zerada (ARAÚJO et al., 2006).
Estimular o consumo significa aumento de produção, geração de empregos
e renda, crescimento e desenvolvimento. Assim, dado que o consumo de bens
é um dos itens que representa crescimento com desenvolvimento, configura-
-se como um elemento fundamental nas políticas econômicas dos governos,
mas gera preocupações em relação aos impactos no meio ambiente, pois os
recursos naturais são limitados.
A ameaça de escassez dos recursos disponíveis, tanto para a produção de
bens e de serviços quanto para o próprio consumo direto, tem recebido grande
atenção por parte dos governos e da população. O consumo e a utilização
racional dos recursos permitem que o desenvolvimento seja sustentável, ou
seja, que possa ser usufruído pelas gerações futuras – daí surge a ideia do
capitalismo sustentável. A sustentabilidade pode ser econômica, social e
ambiental, mas todas se preocupam com a utilização dos recursos existentes
de forma racional, para manter a subsistência das próximas gerações, confi-
gurando uma preocupação de longo prazo (BRASIL, 2005).
Para Philippi (2001), sustentabilidade é a capacidade de se autossustentar,
de se automanter. Quando se realiza uma atividade sustentável qualquer,
isso significa que a mesma pode ser mantida por um período indeterminado
de tempo. Uma sociedade sustentável é aquela que não coloca em risco os
recursos naturais necessários para a vida do ser humano, não comprometendo
a capacidade das gerações futuras de suprir as suas próprias necessidades.
O meio ambiente é motivo de preocupação, principalmente, desde as últimas
décadas do século XX, quando passou a fazer parte da agenda dos governos
de vários países, bem como dos diversos segmentos da sociedade civil or-
ganizada. Os dados revelam que os problemas ambientais têm se agravado
com as atividades produtivas e com o consumismo nas sociedades. A partir
da Revolução Industrial, com a possibilidade de produção em grande escala
e, posteriormente, com a produção em massa, permitida pela introdução da
linha de montagem automatizada por Henry Ford, no século XX, a poluição
no planeta se agravou (BRASIL, 2005).
Segundo o Ministério do Meio Ambiente (BRASIL, 2005), o modelo
atual de desenvolvimento econômico vem gerando enormes desequilíbrios
sociais. O mundo vem apresentando elevados níveis de crescimento econô-
mico, ou seja, de geração de riqueza, ao mesmo tempo em que se registra
o crescimento da miséria, da degradação do meio ambiente e o aumento da
312 A ambientalização das relações de consumo

poluição do planeta. Daí a importância do desenvolvimento sustentável, que


surge como uma forma de reduzir as desigualdades existentes, bem como
de dar continuidade às atividades que são essenciais para a vida humana.

Segundo o Ministério do Meio Ambiente (BRASIL, 2005), quando surgiu


a preocupação com o meio ambiente e a relação do mesmo com a busca pelo
desenvolvimento econômico nos diversos países, podia-se observar duas visões:

 Os possibilistas culturais (ou “tecnocêntricos” radicais): os possibi-


listas culturais defendiam que os benefícios gerados pelo crescimento
econômico eram maiores do que os custos do impacto sobre o meio
ambiente. Tais benefícios se resumem na eliminação das desigualdades
sociais na medida em que o crescimento econômico é alcançado, o que
constituía, para esses indivíduos, um bem maior quando comparado aos
impactos desse crescimento sobre as condições ambientais.
 Deterministas geográficos (ou “ecocêntricos” radicais): os determi-
nistas geográficos apresentavam uma preocupação máxima em relação
às condições ambientais, que sofriam grandes ameaças com a aceleração
do crescimento econômico. Para os mesmos, os limites do meio ambiente
são tamanhos que a humanidade estaria próxima de uma catástrofe.
Isso porque o crescimento econômico observado nas diversas regiões
do planeta exigia a expansão da utilização dos recursos naturais que
são limitados, levando-os ao esgotamento, ao mesmo tempo em que
os níveis de poluição aumentavam significativamente.

Assim, o ecodesenvolvimento surge como uma proposição conciliadora


entre o crescimento e os limites do meio ambiente, pois o relatório The limits
to growth (“Os limites do crescimento”), publicado em 1972, alertou sobre
a situação potencial do planeta, por meio da apresentação de cenários catas-
A ambientalização das relações de consumo 313

tróficos, caso o padrão de desenvolvimento utilizado na época continuasse.


Nesse sentido, o crescimento econômico estava limitado à capacidade dos
recursos naturais (BRASIL, 2005).
Para os ecocêntricos radicais, o crescimento se constituía em um processo
relevante para o progresso, mas não absoluto na erradicação da pobreza e
das disparidades sociais. Havia a necessidade de se conquistar um equilíbrio
global, estando-se atento aos limites do crescimento populacional, ao modo
com o que os países menos desenvolvidos buscavam o crescimento e desen-
volvimento econômico e, principalmente, aos impactos das ações do homem
no meio ambiente.
Desde então, outros relatórios passaram a alertar sobre a necessidade de
mudança no padrão de desenvolvimento que vigorava nos diversos países do
mundo. Assim, surge a necessidade de intervenção e o direcionamento do
desenvolvimento econômico, de forma a conciliar os níveis de crescimento
econômico com o uso prudente dos recursos naturais. Cabe à entidade su-
perior, o Estado, agir no sentido de estimular um consumo sustentável, com
base na criação de leis e na fiscalização adequada do cumprimento das regras
estabelecidas.
É na década de 1980 que o conceito de desenvolvimento sustentável surge,
a partir do relatório Our common future (“Nosso futuro comum”), que também
ficou conhecido como Relatório de Brundtland. Esse relatório foi divulgado
pela Comissão Mundial de Meio Ambiente e Desenvolvimento, criada em
1983, apresentando de forma detalhada os desafios a serem enfrentados pelos
diversos países, bem como os esforços a serem realizados por todos em relação
à paz, à segurança, ao desenvolvimento e ao meio ambiente (BRASIL, 2005).
Nesse relatório, encontram-se:

[...] estratégias ambientais de longo prazo para obter um desenvolvimento


sustentável por volta do ano 2000 e daí em diante; [...] maneiras para que a
preocupação com o meio ambiente se traduza em maior cooperação entre
os países em desenvolvimento e entre países em estágios diferentes de de-
senvolvimento econômico e social e leve à consecução de objetivos comuns
e interligados que considerem as inter-relações de pessoas, recursos, meio
ambiente e desenvolvimento; [...] meios e maneiras pelos quais a comunidade
internacional possa lidar mais eficientemente com as preocupações de cunho
ambiental; [...] noções comuns relativas a questões ambientais de longo prazo
e os esforços necessários para tratar com êxito os problemas da proteção e
da melhoria do meio ambiente, uma agenda de longo prazo para ser posta
em prática nos próximos decênios e os objetivos a que aspira a comunidade
mundial (COMISSÃO MUNDIAL SOBRE MEIO AMBIENTE E DESEN-
VOLVIMENTO, 1991, apud LAYRARGUES, 1998, p. 143-144).
314 A ambientalização das relações de consumo

A evolução do conceito de ecodesenvolvimento para o de desenvolvi-


mento sustentável foi resultado da maior abrangência deste último e da
ligação entre o crescimento econômico e as relações com o meio ambiente
no longo prazo:

[...] o fator diferenciador entre ecodesenvolvimento e desenvolvimento sus-


tentável reside a favor deste último quanto à sua dimensão, globalizante, tanto
desde o lado do questionamento dos problemas ambientais como da ótica
das reações e soluções formuladas pela sociedade. Ele não se refere especi-
ficamente ao problema limitado de adequações ecológicas de um processo
social, mas a uma estratégia para a sociedade que deve levar em conta tanto a
viabilidade econômica quanto a ecológica. Num sentido abrangente, a noção
de que a sustentabilidade leva à necessária redefinição das relações sociedades
humanas/natureza, portanto, a uma mudança substancial do próprio processo
civilizatório, introduzindo o desafio de pensar a passagem do conceito para
ação (OLIVEIRA FILHO, 2004, p. 8).

Para Vasconcellos e Garcia (2014), se as necessidades a serem supridas se


limitassem à esfera biológica, seria possível dizer que a quantidade de bens
disponível seria suficiente, solucionando o problema da escassez. Contudo,
as ilimitadas necessidades se expandem para fora da esfera biológica da so-
brevivência. Além disso:

 as necessidades se renovam diariamente, exigindo o contínuo suprimento


dos bens para atendê-las;
 enfrentamos a constante criação de novos desejos e necessidades mo-
tivados pela perspectiva de aumento do nível vida.

Observando que a necessidade abrange tanto a esfera biológica quanto a


psicológica, a sua satisfação, bem como a dos desejos humanos, está muito
longe de ser alcançada. Isso ocorre tanto em economias mais desenvolvidas
quanto em vias de desenvolvimento – o resultado disso é que o problema de
escassez se renova (VASCONCELLOS; GARCIA, 2014).
Com o passar do tempo e com a influência do Estado e das atitudes or-
ganizacionais sobre os impactos no meio ambiente, os indivíduos passaram
a se dar conta da necessidade do uso consciente dos recursos da natureza,
uma vez que eles são escassos e podem se esgotar. Assim, a noção de que
A ambientalização das relações de consumo 315

o desenvolvimento econômico deve ser sustentável se dissemina entre os


diversos países do planeta.

O consumo e o meio ambiente


Os danos ambientais provocados pelas indústrias para atender ao consumismo
existente estão entre as grandes preocupações que envolvem tanto os políticos
quanto a população em geral. O modelo de produção industrial em massa,
para atender o consumo em massa, inicialmente levou as empresas a deixarem
de lado as preocupações com os impactos na natureza, que se encontram
entre as externalidades negativas de sua atuação – o grande objetivo era a
acumulação de riquezas.

Quando uma transação econômica resulta em custos ou benefícios para terceiros,


ocorre uma externalidade negativa ou positiva (respectivamente). Se essas externa-
lidades resultarem em benefícios, chamamos isso de externalidade positiva; se os
impactos provocarem custos ou prejuízos, estaremos diante de uma externalidade
negativa (SANDRONI, 2005).

As ameaças ao meio ambiente e as pressões de organismos não governa-


mentais ligados ao meio ambiente influenciaram a legislação e o surgimento
voluntário de novas condutas ambientais por parte dos indivíduos e também
dos setores industriais. Todas essas questões modificaram a rotina das orga-
nizações, as quais passaram a adequar os seus processos de produção e de
prestação de serviços às novas regras e à nova visão dos consumidores em
relação às questões ambientais.
Os consumidores estão cada vez mais conscientes sobre suas próprias
atitudes, que podem impactar o meio ambiente, e têm se tornado mais exi-
gentes com relação à atuação das empresas nas questões sociais e ambientais
– muitos indivíduos acabam priorizando os produtos de empresas que estão
comprometidas com a questão ambiental.
316 A ambientalização das relações de consumo

Posto isso, a imagem das empresas em relação à sua participação nas


questões sociais e ambientais passou a ser fundamental nos seus planeja-
mentos estratégicos. A adoção de novas posturas entre os administradores e
empresários os levou a adequar os processos às novas exigências impostas
pela sociedade: minimizar ou zerar os impactos das atividades sobre o meio
ambiente passou a ser um diferencial na conquista de maiores fatias de mercado.
A inserção em novos mercados também passou a exigir que as empresas sejam
ecologicamente corretas.
Dentre as atitudes das empresas em relação à sustentabilidade ambiental,
destaca-se adequar a estrutura, assim como os colaboradores em geral e os
parceiros comerciais para que também sejam responsáveis pela questão da
sustentabilidade. Isso permite que se efetive o objetivo da empresa de minimizar
os impactos ambientais de suas atividades.
São exemplos simples de medidas sustentáveis que podem ser realizadas
nas organizações, segundo Grisotto (2015):

 economia no uso da energia elétrica;


 utilização racional dos materiais de expediente;
 redução no uso de materiais descartáveis;
 prática de reuso, reciclagem ou renovação de recursos.

O envolvimento de todos os colaboradores contribui para que as práticas


sustentáveis se multipliquem dentro e fora da organização. Segundo Marques
(2009), as organizações têm forte influência sobre o ambiente político social
no desempenho das suas atividades, assumindo novas responsabilidades
nesse âmbito. Além da melhora na imagem da empresa no mercado, as
práticas sustentáveis podem influenciar o aumento da lucratividade, uma
vez que ampliam o leque de consumidores que se preocupam com as ques-
tões ambientais.
O consumidor que opta por produtos e serviços de empresas que realizam
práticas sustentáveis acaba sendo um consumidor consciente que também rea-
liza o seu papel em relação à sustentabilidade ambiental. Uma das estratégias
utilizadas pelas organizações para conquistar esse tipo de clientela é o chamado
“marketing verde”, voltado ao processo de venda de produtos e serviços que
apresentam benefícios ao meio ambiente. É uma estratégia de vinculação
A ambientalização das relações de consumo 317

de marca, produto ou serviço a uma imagem ecologicamente consciente, de


uma empresa que faz sua parte perante a sociedade, ou seja, uma empresa
ecologicamente consciente (OLIVEIRA et al., 2015).
A empresa brasileira Natura é um exemplo de organização que apresenta
uma forte imagem no mercado relacionada à preocupação com o meio am-
biente. Desde o surgimento da empresa, na década de 1950, a questão de
sustentabilidade está presente nas suas práticas, que permanecem até os dias
atuais, sendo o seu grande diferencial (TERRA, 2009).
Apesar de ser uma preocupação mais atual na sociedade, a questão da
sustentabilidade sempre foi utilizada nas estratégias de marketing da Na-
tura. Atualmente, a empresa apresenta-se engajada nas causas sustentáveis
e, desde 2005, faz parte do Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE). O
reconhecimento de suas práticas em relação ao uso sustentável da biodiver-
sidade brasileira ocorre tanto no Brasil quanto no exterior (CARVALHO;
BARBIERI, 2012).
A influência das atitudes da Natura sobre a sociedade inicia no controle
das práticas sustentáveis dos próprios fornecedores. São diversas as estra-
tégias adotadas com foco sua cadeia de suprimentos; os seus fornecedores,
por exemplo:

 São induzidos a passar por processos de autoavaliação em relação à


qualidade, ao meio ambiente e à responsabilidade social.
 Passam por programas de capacitação de fornecedores para elaboração
de relatórios de sustentabilidade e quantificação e gestão de emissões
de gases de efeito estufa (CARVALHO; BARBIERI, 2012).

Em relação aos próprios produtos:

 Algumas linhas apresentam o uso de tecnologias limpas, as quais re-


duzem os impactos ambientais ao longo da cadeia produtiva.
 Existe um direcionador específico em relação às fórmulas dos produtos
da empresa, de modo a evitar a utilização de matérias-primas de origem
animal, mineral ou sintética em prol das alternativas de origem vegetal.
Com isso, a empresa busca reduzir os efeitos negativos do processo
produtivo em todo o ciclo de vida do produto.
318 A ambientalização das relações de consumo

Em 2008, a Natura implementou o Programa de Certificação de Ingredientes, de modo


a garantir que os insumos utilizados como matéria-prima no processo de produção
sejam extraídos de maneira sustentável, bem como promovam o desenvolvimento
social das comunidades extrativistas.
O principal exemplo do caso Natura é que é possível adotar inovações que gerem
benefícios sociais e ambientais ao longo de uma cadeia produtiva completa (CARVALHO;
BARBIERI, 2012).
A empresa Faber-Castell, líder mundial na fabricação de lápis de madeira reflorestada,
é outro exemplo de organização que realiza práticas sustentáveis. A fabricação dos
lápis, chamados de EcoLápis, é realizada com 100% de madeira reflorestada. Além
disso, existe um total aproveitamento da madeira e dos seus subprodutos que não
são utilizados na fabricação do EcoLápis e que são direcionados, por exemplo, para
a geração de energia, como substrato orgânico para plantas, para a fabricação de
chapas de aglomerado e em granjas de criação de frangos. A empresa assumiu um
compromisso com a sociedade e o meio ambiente que se estende a projetos socio-
ambientais para despertar a consciência da comunidade em relação à importância
de cuidar do ambiente natural, além de oferecer oportunidade para que crianças em
situação de desigualdade social desenvolvam sua criatividade (FABER CASTELL, 2018).

ANDREASI, D. Consumismo x pirâmide de Maslow: uma outra visão da teoria. [S.l.]:


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320 A ambientalização das relações de consumo

Leituras recomendadas
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FABER-CASTELL. Faber-Castell: a única empresa a plantar árvores para a produção
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