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Aula 8 – 24/04/2023

Literatura

Gêneros do discurso e Gêneros literários

Em casa, na rua, na escola, no seminário, todos nós, no dia a dia, circulamos entre textos e
discursos. O que é um texto? Uma conversa informal entre amigos é um texto? Será texto um
capítulo de novela, um outdoor, um debate político, um poema, uma canção? E, se são textos,
são também discursos? Ou o discurso equivale apenas a textos orais?

Leiamos os textos dispostos abaixo para refletir sobre a natureza de cada um deles:

Texto I.
Do seu Coração Partido
Sentada junto à sacada para que com a luz lhe chegasse a vida da rua, a jovem
costurava o longo traje de seda cor de jade que alguma dama iria vestir.
Essa seda agora muda – pensava a costureira enquanto a agulha que retinha nos dedos
ia e vinha – haveria de farfalhar sobre mármores, ondeando a cada passo da dama, exibindo e
ocultando nos poços das pregas seu suave verde. O traje luziria nobre como uma joia. E dos
pontos, dos pontos todos, pequenos e incontáveis que ela, aplicada, tecia dia após dia,
ninguém saberia.
Assim ia pensando a moça, quando uma gota de sangue caiu sobre o tecido.
De onde vinha esse sangue? perguntou-se em assombro, afastando a seda e olhando
as próprias mãos limpas. Levantou o olhar. De um vaso na sacada, uma roseira subia pela
parede oferecendo, ao alto, uma única rosa flamejante.
– Foi ela – sussurrou o besouro que parecia dormir sobre uma folha. – Foi do seu
coração partido.
Esfregou a cabeça com as patinhas. – Sensível demais, essa rosa – acrescentou, não
sem um toque de censura. – Um mancebo acabou de passar lá embaixo, nem olhou para ela. E
bastou esse nada, essa quase presença, para ela sofrer de amor.
Por um instante esquecida do traje, a moça debruçou-se na sacada. Lá ia o mancebo,
afastando-se num esvoejar de capa em meio às gentes e cavalos.
– Senhor! Senhor! – gritou ela, mas nem tão alto, que não lhe ficaria bem. E agitava o
braço.
O mancebo não chegou a ouvir. Afinal, não era o seu nome que chamavam. Mas
voltou-se assim mesmo, voltou-se porque sentiu que devia voltar-se ou porque alguém do seu
lado virou a cabeça de súbito como se não pudesse perder algo que estava acontecendo. E
voltando-se viu, debruçada no alto de uma sacada, uma jovem que agitava o braço, uma jovem
envolta em sol, cuja trança pendia tentadora como uma escada. E aquela jovem, sim, aquela
jovem o chamava.
Retornar sobre os próprios passos, atravessar um portão, subir degraus, que tão rápido
isso pode acontecer quando se tem pressa. E eis que o mancebo estava de pé junto à sacada,
junto à moça. Ela não teve nem tempo de dizer por que o havia chamado, que já o mancebo
extraía seu punhal e, de um golpe, decepava a rosa para lhe oferecer.
Uma última gota de sangue caiu sobre a seda verde esquecida no chão. Mas a moça
costureira, que agora só tinha olhos para o mancebo, nem viu.
(Marina Colasanti. 23 histórias de um viajante. São Paulo: Global. 2005. p. 157-9. by Marina
Colasanti)

Texto II.
Vale a pena investir em energia nuclear no Brasil?
Creio que ainda não temos estudos suficientes para o uso da energia nuclear, principalmente
em um país como o Brasil, onde a estrutura e segurança dificilmente são prioridades. Acho que
devíamos investir em outros métodos de energia, alguma energia sustentável e segura. Agora,
devemos nos preocupar um pouco mais com o planeta e com a segurança das pessoas, para
garantir um futuro.
(http://blogs.estadao.com.br/radar-economico/2011/03/18/vale-a-pena-investir-em-energia-
nuclear-no-brasil/)

Texto III.
Por que sentimos calafrios e desconforto ao ouvir certos sons agudos – como unhas
arranhando um quadro-negro?
Esta é uma reação instintiva para protegermos nossa audição. A cóclea (parte interna
do ouvido) tem uma membrana que vibra de acordo com as frequências sonoras que ali
chegam. A parte mais próxima ao exterior está ligada à audição de sons agudos; a região
mediana é responsável pela audição de sons de frequência média; e a porção mais final, por
sons graves. As células da parte inicial, mais delicadas e frágeis, são facilmente destruídas –
razão por que, ao envelhecermos, perdemos a capacidade de ouvir sons agudos. Quando
frequências muito agudas chegam a essa parte da membrana, as células podem ser
danificadas, pois, quanto mais alta a frequência, mais energia tem seu movimento ondulatório.
Isso, em parte, explica nossa aversão a determinados sons agudos, mas não a todos. Afinal,
geralmente não sentimos calafrios ou uma sensação ruim ao ouvirmos uma música com notas
agudas.
Aí podemos acrescentar outro fator. Uma nota de violão tem um número limitado e
pequeno de frequências - formando um som mais "limpo". Já no espectro de som proveniente
de unhas arranhando um quadro-negro (ou do atrito entre isopores ou entre duas bexigas de
ar) há um número infinito delas. Assim, as células vibram de acordo com muitas frequências e
aquelas presentes na parte inicial da cóclea, por serem mais frágeis, são lesadas com maior
facilidade. Daí a sensação de aversão a esses sons agudos e "crus".
Ronald Ronvald
Departamento de Fisiologia e Biofísica, Universidade de São Paulo
(Ciência Hoje, nº 282, p. 4.)

Texto IV.

1. O texto “Do seu coração partido” é narrativo, isto é, conta uma história. O texto
narrativo apresenta fatos em sequência: um fato causa um efeito, que dá origem a
outro fato, e assim por diante.
a. Uma jovem costurava um traje de seda quando uma gota de sangue caiu sobre
o tecido. O que esse fato provocou na moça?
b. O besouro conta à moça que a passagem de um mancebo partira o coração da
rosa. Que efeito essa explicação causa na jovem costureira?

2. Os textos II e III abordam assuntos ligados à realidade. Entretanto, cada um deles tem
uma finalidade diferente
a. Qual é a finalidade do texto II?
b. E a do texto III?

3. O texto IV é um anúncio publicitário relacionado à Copa do Mundo de 2014. Qual é a


finalidade dele?

4. Como síntese desta atividade, indique o texto cujo objetivo principal é:


a. Narrar uma história fictícia;
b. Expor conhecimentos formais, científicos;
c. Divulgar um produto ou uma ideia;
d. Argumentar para persuadir o leitor sobre um ponto de vista.

O que é GÊNERO DO DISCURSO?


Ao desenvolver a atividade anterior, você deve ter observado que os textos foram produzidos
em situações e contextos diferentes e que cada um deles cumpre uma finalidade específica.
Se o objetivo do locutor é, por exemplo, instruir seu interlocutor, ele indica passo a passo o que
deve ser feito para se obter um bom resultado. Se é expressar sua opinião e defender um
ponto de vista sobre determinado assunto, ele produz um texto que se organiza em torno de
argumentos. Se é contar fatos reais ou fictícios, ele pode optar por produzir um texto que
apresente em sua estrutura os fatos, as pessoas ou personagens envolvidas, o momento e o
lugar em que os fatos ocorreram. Se é transmitir conhecimentos, o locutor deve construir um
texto que exponha os saberes de forma eficiente.
Assim, quando interagimos com outras pessoas por meio da linguagem, seja a linguagem oral,
seja a linguagem escrita, produzimos certos tipos de texto que, com poucas variações, se
repetem no conteúdo, no tipo de linguagem e na estrutura. Esses tipos de texto constituem os
chamados gêneros do discurso ou gêneros textuais e foram historicamente criados pelo ser
humano a fim de atender a determinadas necessidades de interação verbal. De acordo com o
momento histórico, pode nascer um gênero novo, podem desaparecer gêneros de pouco uso
ou, ainda, um gênero pode sofrer mudanças até transformar-se em um novo gênero.
Os Gêneros do Discurso ou Gêneros Textuais são estruturas relativamente estáveis de
composição, com as quais realizamos intervenções sociais, tanto por escrito quanto por meio
da fala, ou seja, os gêneros são as ferramentas, os instrumentos que utilizamos para
podermos exercer os atos comunicativos em geral: uma curta mensagem via WhatsApp, e-
mails corporativos, produção de reportagens, entrevistas, contos, páginas de diário, receitas de
bolo, artigos científicos, seminários, teses etc.
Os gêneros adaptam-se às nossas necessidades de comunicação e remodelam-se, a depender
do tempo em que são produzidos. Antigamente, era comum que as pessoas enviassem
telegramas, caso quisessem velocidade na interação; hoje esse recurso tornou-se obsoleto,
pois temos tecnologias suficientes para comunicarmo-nos em um piscar de olhos.

Os gêneros discursivos ou textuais podem ser divididos em 5 tipos diferentes, que são:
 Tipo narrativo: o texto narrativo é um tipo de texto que esboça as ações de
personagens num determinado tempo e espaço. Geralmente, ele é escrito em prosa e
nele são narrados (contados) alguns fatos e acontecimentos. Exemplos de textos
narrativos: conto, crônica, fábula, diário, romance, relato, notícia etc.;
 Tipo argumentativo: o texto argumentativo é aquele que tem como principais
características defender uma ideia, hipótese, teoria ou opinião e o objetivo de
convencer o leitor para que acredite nela. Tem uma estrutura bem definida: apresenta
sua tese e depois utiliza justificativas e alegações com o propósito de persuadir a sua
audiência. Exemplos de textos argumentativos: artigo de opinião, editorial, crônica
argumentativa, dissertação argumentativa, resenha crítica etc.;
 Tipo descritivo: o texto descritivo é uma tipologia textual que oferece um retrato
verbal ao seu leitor sobre algo ou alguém. Sua composição apresenta verbos de
ligação e o uso recorrente de adjetivos, substantivos ou locuções. Ele geralmente é
utilizado juntamente do texto narrativo, no intuito de descrever certa ação ou
personagem. Exemplos de textos descritivos: relatos de viagem, currículos, cardápios
de restaurante, folhetos turísticos etc.;
 Tipo expositivo: o texto expositivo fornece fatos de uma forma educacional e objetiva.
Então, apresenta um tema a partir de vários recursos, como definição, descrição,
comparação, informação e enumeração. E assim, discutir e explicar sobre um
determinado tema. Exemplos de textos expositivos: palestras, aulas, seminários,
enciclopédias etc.;
 Tipo injuntivo: O texto injuntivo caracteriza-se por fornecer instruções para a
realização de uma ação desejada, logo, esse texto incita o leitor a realizar algo. Sua
aplicação é presente em manuais de instruções, pedidos, prescrição, propagandas,
receitas culinárias etc.

Os gêneros discursivos geralmente estão ligados a esferas de circulação. Assim, na esfera


jornalística, por exemplo, são comuns gêneros como notícias, reportagens, editoriais,
entrevistas e outros; na esfera de divulgação científica são comuns gêneros como verbete de
dicionário ou de enciclopédia, artigo ou ensaio científico, seminário, conferência.

OS GÊNEROS LITERÁRIOS
Entre os gêneros discursivos, existem aqueles que são próprios da esfera artística e cultural e
são utilizados com finalidade estética, artística: os gêneros literários. Como o escritor tem
liberdade para criar e recriar gêneros literários, é difícil traçar as fronteiras entre estes. Na
esfera artística, os gêneros se multiplicam ou se combinam e sofrem transformações quase
constantes.
Apesar disso, desde as primeiras tentativas de classificação feitas por Platão e Aristóteles, na
Grécia antiga, a literatura tem sido organizada por gêneros. De acordo com essa concepção
clássica, há três gêneros literários básicos: o lírico, o épico e o dramático. Ao longo dos séculos,
contudo, essa divisão foi sendo questionada por escritores e críticos, já que deixou de
corresponder à variedade dos gêneros existentes, uma vez que novos gêneros surgiam e
antigas formas se renovavam.
Veja, a seguir, as características básicas dos gêneros literários clássicos, segundo a classificação
aristotélica.

 Gênero lírico: Trata-se da manifestação de um eu lírico, que expressa no texto seu


mundo interior, suas emoções, sentimentos, ideias e impressões. É um texto
geralmente em versos, subjetivo, com predominância de pronomes e verbos na 1ª
pessoa e que explora a musicalidade das palavras;
 Gênero épico: Nas composições desse gênero há a presença de um narrador, que conta
uma história em versos, em um longo poema que ressalta a figura de um herói, um
povo ou uma nação. Geralmente envolvem aventuras, guerras, viagens e façanhas
heroicas e apresentam um tom de exaltação, isto é, de valorização de heróis e feitos
grandiosos. É um texto narrativo com verbos e pronomes na 3ª pessoa e que
pressupõe a presença de um ouvinte ou de uma plateia.
Os poemas épicos intitulam-se epopeias. As principais epopeias da cultura ocidental
são a Ilíada e a Odisseia, de Homero, a Eneida, de Virgílio, Os Lusíadas, de Luís de
Camões, Paraíso Perdido, de Mílton, Orlando Furioso, de Ariosto etc.
No Brasil, entre os vários poemas épicos produzidos – a maioria deles conforme o
modelo oferecido por Camões – destacam-se Caramuru, de Santa Rita Durão, e O
Uraguai, de Basílio da Gama
 Gênero dramático: Enquanto o gênero épico exalta as realizações humanas e os
grandes feitos de heróis, o gênero dramático expõe o conflito dos homens e seu
mundo, as manifestações da miséria humana
São do gênero dramático os textos escritos para serem encenados. Nesse tipo de texto,
em vez de ser contada por um narrador, a história é mostrada no palco, ou seja, é
representada por atores que fazem o papel das personagens. O texto se desenrola a
partir de diálogos, o que exige uma sequência rigorosa das cenas e das relações de
causa e consequência.

Gêneros narrativos modernos:


Além da concepção clássica de gêneros literários, há também uma concepção moderna, que
leva em conta outras modalidades de texto, que não existiam no tempo de Aristóteles. Entre
elas, encontram-se os gêneros narrativos modernos que guardam, em suas origens, um
parentesco com a epopeia e outras formas narrativas primitivas, pois, como estas, se prestam
a narrar uma história ficcional.
São gêneros narrativos modernos, por exemplo, o romance, a novela, o conto e a crônica.
Qualquer um desses gêneros tem como elementos básicos de sua estrutura os fatos narrados
numa sequência de causa e efeito, as personagens, o tempo, o ponto de vista do narrador.
De modo geral, procura-se diferenciá-los com base em critérios como tamanho, tempo e
espaço narrativo, tipo e número de personagens, número de conflitos, desenvolvimento da
ação, interiorização psicológica, meio de divulgação etc. Assim, supõe-se que um romance,
comparado a um conto, narre uma história na qual tempo e espaço são mais amplos, há várias
personagens e várias histórias organizadas em torno de uma história central. Já a crônica é
marcada pela brevidade temporal e apresenta episódios do cotidiano captados com
sensibilidade pelo cronista, que extrai deles momentos de humor e reflexão sobre a vida e o
mundo.
A distinção entre os gêneros modernos, entretanto, é bastante controvertida. Com frequência,
deparamos com textos que misturam gêneros, ou que quebram a sequência narrativa
tradicional, ou, ainda, que usam na prosa os recursos da poesia.

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