Você está na página 1de 226

L H A DO C O M P A N H E IR O C asteüani e R o d rig u e s

Cartilha do Companheiro
Coleção
]
Biblioteca
i
do Maçom

Cartilha do Companheiro
JO SÉ CASTELLANI
RAIMUNDO RODRIGUES

C artilha do
C om panheiro

Editora Maçônica “A TR O LH A ” Ltda.


Rua Castro Alves, 2 6 4 - Jd. Shangri-lá A -F o n e (43) 3337-1982
F ax(43) 3326-0915 - Cx. Postal 238
CEP 86001-970 - Londrina - PR

Londrina, junho de 2009


\

■■
Sumario

Apresentação I 9
Apresentação para a 4 a Edição I 11

I a PARTE - José Castellani


Dados Históricos do Grau de Companheiro Maçom I 15
Ontologia do Grau I 25
O Misticismo do Grau - 1 i 27
O Misticismo do Grau - II I 35
O Misticismo do Grau - UI I 47
O Misticismo do Grau - IV I 59
O Misticismo do Grau - V I 71
O Misticismo do Grau - VI I 83
Cobridor do Grau 1 87
Decoração da Loja e Paramentos I 93
Conjunto Esquadro-Compasso I 97
Os Painéis I 101
Obras do Autor I 111

2 a PARTE - Raimundo Rodrigues


A Filosofía é para nos Algo Indispensável I 117
Alerta sobre o Grau de Companheiro I 119
A Filosofía do Segundo Grau I 121
Das Desigualdades Sociais 1 129
Da Participação I 131
O Trabalho I 133
O Passo Lateral I 139
Copynghi © 2 0 0 9 dos autores Obediência; José CasteNani^ Grande Oriente do
iBrasil

Todos os di retios desta edição são reservados a Obediência: Raimundo Rodrigues-Grande Lofa
EDITORA MAÇÔNICA "A TROLHA” LTDA.
Rua Castro Alves, 2 6 4 - Jd. ShangrHá A Pioibida a reprodução total ou paroaJ desta obra, de

86070-670 - Londrina - PR qualquer forma ou por qualquer meio eieirômco,

C k . Postal 238 - CEP 86001 -970 mecânico, Inclusive através de processos xerográ-
floos, incluindo ainda o uso da internei, sem a
Fone (43) 3337-1932 - Fax (43) 332^0915
Site: wwiiV.airolha.oom.br permissão expressa da Editora UA TROLHA*f na

E-mall: redacao@atrdha.com.br pessoa de seu editor (Lei np9,610, de 19/2/1998),

Coordenação Geral:
Conselho Editorial

V Edição: 1998
2* Edição: 2002-Tiragem : 500exemplares
3* Edição: 2005 - Tiragem: 1,000 exemplares
4a Edição: 2 0 0 9 - Tiragem; 300exemplares

Projeto Gráfico e Díagramação:


Maristela Meneghetti

f Capa:
Ulisses Candreva

Revisão: Urvro revisado de acordo com o Dicionário da


V|rg ínia Cristina Audi Ayres A B L - Academ ia Brasileira de Letras

Impressão e acabamento:
Midlograí Artes Gráficas Ltda.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação


(CIP-Brasil) CATALOGAÇÃO NA FONTE

Ç348c Qa&iellani, José


Cartilha do Companheiro/José Castellar^ Raimundo Rodrigues, - 4 , ed, - Londri­
na: Ed, Maçônica "A TROLHA", 2009,
228 p,: 20,2 cm. - (Coleção Biblloieoa do Maçom).

ISBN: 85-7252-072-4- 1aedição


ISBN: 85-7252-148-8-2aedição
ESBN: 85-7252-194-1 - 3?edição
ISBN: 978-35-7252-265-6 - 4aedição

1. Maçonarfa- Filosofia. 2. Maçonana -Graude Companheira-Htetórla, LRodrigues,


Raimundo. II. T iluto. III. Série.

CDD 366J09
CDU 061.2366

índrees pa ra catálogo sistemático;

1. M açonarla-R losoíía • 7
061.236.6 (CDU)
2. Maçonaria - Grau de Companheiro - História
061.236.6 (CDU)
4 a Edlçao
I a Reimpressão: 2010 Tiragem: 600 exemplares
Castellar»! e Rodrigues

Evolução da Alquimia e da Cabala 1 143


A Cabala 1 149
0 Ser 1 153
Sobre a Dualidade do Ser e do Não Ser 1 159
Escada em Caracol 1 169
Sinal, Símbolo, Alegoria, Emblema 1 175
Do Sinal de Companheiro 1 181
A Letra G 1 185
A Luz 1 189
Estrela Flamejante 1 193
O Painel do Oriente 1 199
Tetrada Pitagórica 1 205
Tetragrama 1 213
O Número Cinco 1 215
; ,■ Orfeu 1 217
- ; Bibliografía 1 221
Obras do Autor 1 225
Cartilha do Companheiro

Apresentação

A qui está a segunda p a rte d o L ivro “C artilh a d o A pren­


d iz ”, escrita p elo au tor J o s é Castellani. A gora ele retorna com a
“C artilha d o G rau d e C o m p a n h eiro ”, juntam ente com o Irm ão
R aim undo Rodrigues, com o qu al já escreveu “C om en tários sob re
a C on stitu ição d e A n derson ”. Para a B ibliografia M açônica B ra­
sileira, qu e é tão carente d e Literatura d o G rau d e C om p an h eiro,
é m ais um a valiosa con tribu ição desses dois qu erid os Irm ãos.
O Irm ão R aim u n do R odrigues, qu e escreve a 2 “ parte, se
direcion a m ais p ara a parte filo só fica d o Grau. Pois a Filosofia em
geral, e M açônica, em particular, é sua esp ecialid ad e; inclusive já
está n o p relo um livro seu s o b re o tem a. J á o Irm ão J o s é Castellani,
com 53 títulos p u blicad os (e vendidos), ap rox im ad am en te 180 m il
livros vendidos - e isso, num país corno o nosso, o n d e se tem o m au
h áb ito d e dizer qu e o M açom brasileiro não lê - é um a trem enda de
urna façan ha, para d eix ar m uita gen te d e q u eix o caído. Inclusive,
h á um m ovim en to d e Irm ãos d e São Paulo e Brasília, d e co lo ca r seu
n om e e seu feito ex traordin ário n o L ivro Guiness.
Mas, para o leitor, o qu e interessa m esm o é o con teúdo deste
livro - e sob re ele n ão ten ho a m en o r dúvida d e qu e o Irm ão vai
encontrar o qu e d e m elh or existe na literatura m açôn ica.
M eu Irm ão, faz 2 0 an os q u e leio e p u blico livros e T rabalhos
desse autor. Se eu n ão tivesse o privilégio d e ler, d e graça, tudo o
qu e ele escreve - eu com p raria tu do para ter em m inha estante

9
Castetlani e Rodrigues
(com o ten h o, fa ç o uso desse m an an cial d e cultura m açôn ica, tod a
vez q u e necessito).
M eu m a io r p ro b lem a é n ão ser m uito repetitivo ao fa la r s o ­
b re esse autor. P ois sã o duas ed içõ es novas, p o r a n o , além das
reed ições, das quais, tam bém , eu fa ç o as apresen tações.
O outro p o n to p ositivo deste livro, é a particip ação d o m eu
qu erid o Q u éqité —R aim u n do A crean o R odrigues d e A lbu qu erqu e -
o Presidente da A ca d em ia M a çô n ica d e C iêttd as, A rtes e Letras
d e S ão P au lo - d a qu al tenho a h o n ra de pertencer. O P rofessor
R aim undo R odrigues, com sua im ensa cultura, fo i um a das m aiores
e m elh ores aqu isições qu e a M açon aria fez nas últim as décadas.
Sua particip ação n o m eio cultural m açòn ico é, realm ente, de
um a im portân cia tã o grande e tã o qu erida, q u e é difícil entender
co m o a M açonaria viveu sem a presen ça desse extraordinário Irm ão.
Que este livro, assim <x>mo os outros anteriores, tenha o m esm o
sucesso, a m esm a a ceita çã o e a m esm a utilidade.

, Londrina, n ov em bro de 1998.

X tco T rolha
Cartilha do Companheiro

Apresentação para a 4 a Edição

Em p erío d o s d e transição c o m o este, qu an d o m uitos insistem


qu e ocorrerá um a qu ed a brusca na leitura, qu e os M açons atuais
n ão gostam d e ler, d o ex cesso d e in form ação q u e en che as caixas
postais físicas e virtuais, qu e os livros n ão m ais serã o p rocu rados, e
lá se v ão análises futuristas alarm antes.
E nqu an to isso, sem alard e nenhum , lan çam os a 4 “ ed ição d o
livro “Cartilha d o C om pan heiro ” qu e continua sen d o im presso e
ven dido pelas form as con ven cion ais atuais.
E xistirão certam en te m uitas outras form as d e leitura, m as o
p ap el ainda carrega a p a ix ã o d e qu em gosta d e ler. Se doravante
hou ver m udanças qu e valham a pena, estarem os a q u i pron tos para
isso, m as h o je v am os seguindo co m um a das fo rm a s m ais ag rad á­
veis d e ler, p a p e l im presso em m áquinas offset, livro leve, hem
escrito e com conteúdo.

L on d rin a , m a io d e 2 0 0 9 .

Os E ditores

11
Castellani e Rodrigues

12
Cartilha do Companheiro

Jo s é Gasíe
Castellar» e Rodrigues
Cartilha do Companheiro

Dados Históricos do Grau de


Companlieiro Maçom

AS ORIGENS

Doutrinariamente, o Grau de Companheiro c o mais legítimo


Grau M açônico, por mostrar o Obreiro já totalmente formado e
aperfeiçoado, profissionalmente.
Historicamente, seria o Grau mais importante da Franco-
-Maçonaria, por ter representado, ainda que não como Grau, inicial­
mente, o ápice da escalada profissional, nas confrarias de artesãos
ligados à arte de construir, as quais tiveram o seu apogeu na Idade
Média, a partir do século X II, sendo conhecidas sob o título geral
de Maçonaria Operativa, ou Maçonaria de Ofício.
Na realidade, as corporações - que criavam Lojas para um
trabalho específico - possuíam apenas Aprendizes Maçons, divididos
em Antigos Aprendizes (Sênior Apprentices) e Novos Aprendizes
(Junior Apprentices), cabendo, os trabalhos de maior responsabili­
dade, evidentemente, aos Antigos, entre os quais, muitas vezes, era
escolhido o mestre da obra (Master). Em épocas mais recentes,
quando a Maçonaria inglesa já tomava a sua feição atual, com o
processo de aceitação, que se iniciara às portas do século XVII,
surgia o Grau de Companheiro Maçom, no último quartel desse
século. O Grau já é, portanto, da Maçonaria dos Aceitos', quando

15
Castellani e Rodrigues

a denominada Maçonaria Operativa entrava em decadência. Ante­


riormente, porém, o mais qualificado Aprendiz Antigo podia ser
assimilado ao Companheiro da época posterior. Era aquele que havia
servido por mais tempo e que havia sido reconhecido como um
oficial, um trabalhador qualificado.
Na Idade Média, quando as construções eram comissionadas
pela Igreja, ou pelos nobres, as organizações de ofício representavam
um lucrativo negócio, já que ser reconhecido como um oficial, pelos
operários, era um caminho seguro para uma participação no negó­
cio e para rendimentos garantidos. Daí a importância do Master2, o
Mestre da Loja, o mais antigo Aprendiz, ou Companheiro, o qual,
pelas suas funções e pelo respeito que merecia dos demais operários,
viria a ser o w orshipfu l m aster - Venerável Mestre - o máximo
dirigente dos Trabalhos3.
O Grau de Mestre Maçom somente surgiría na Maçonaria
totalmente “especulativa”, ou seja, totalmente ocupada por acei­
tos, em 1725, oito anos depois de fundada a Premier Grand Lodge,
e só seria efetivamenre implantado a partir de 1738. Por isso, era, o
Companheiro, o sustentáculo doutrinário e profissional dos círculos
maçônicos, ainda da fase de transição, não se justificando a pouca
relevância que muitos Maçons dão ao Grau, considerando-o uma
simples ponte entre o Aprendiz e o Mestre. Autores existem, inclusive,
que afirmam que, na fase de transição, ele era o único Grau, do qual
se destacou, para baixo, o de Aprendiz. E, para cima, o de Mestre, o
que, evidentemente, não representa a realidade, mas destaca a im­
portância do Companheiro, pois não pode ser considerado um Maçom
completo aquele que não conhecer, profundamente, o segundo Grau
da Maçonaria simbólica.

ETIMOLOGIA DA PALAVRA

A palavra C o m p an h eiro é de origem latina.


O seu significado tem provocado controvérsias quanto à sua

16
Cartilha do Companheiro

rlimologia, pois alguns autores sustentam que ela seria derivada da


preposição cum = com e do verbo ativo e neutro pan go (is, panxi,
actum, angere) = pregar, cravar, plantar, traçar sobre a cera e - 110
sentido figurado - escrever, compor, celebrar, cantar, prometer, con-
1r.1t ar, confirmar. Neste caso, específicamente, p an g o teria o sentido
de contrato, promessa, confirmação, fazendo com que a expressão
cum p a n g o - que teria dado origem à palavra Companheiro -
signifique com contrato, com promessa, envolvendo um solene
compromisso, que teria orientado as atividades das companhias
religiosas e profissionais da Idade Média e do período renascentista.
A origem mais aceita, todavia, é outra: o termo Companheiro
é derivado da expressão cum p añ is, onde cum é a preposição com
e p añ is é o substantivo masculino pão, o que lhe dá o significado de
p articip an tes d o m esm o p ã o . Isso dá a idcia de uma convivência
tão íntima e profunda entre duas ou mais pessoas, a ponto destas
participarem do mesmo pão, para o seu nutrimento.
Essa origem, evidentemente, deve ser considerada nos idiomas
derivados do latim: com p añ ero (castelhano), com p ag n o (italiano),
com pagn on (francês), com p an h eiro (português). A Enciclopédia
I.arousse, editada em Paris, por exemplo, registra o seguinte, em
relação aos vocábulos com p ag n on e com pag n on n ag e:
C om p ag n on - n.m. (du lat. cum = avec, et pañis = pain) -
Celui que participe à la vie, aux occupations d’un autre: compagnon
d’études. Membre d’une association de compagnonnage. Ouvrier.
Ouvrier qui travaille pour un entrepreneur (par opos a patrón).
C om pagn on n age - n.m. - Association entre ouvriers d’une
même profession à des fins d’instruction professionelle et d’assistence
mutuelle. Temps pendant lequel 1’ouvricrsorti d’apprentissage travaillait
comme compagnon diez son patrón. Qualité de compagnon.
Ou seja:
Companheiro - substantivo masculino (do latim cum = com,
e pañis = pão) - Aquele que participa, constantemente, das ocupações
do outro: condiscípulo, companheiro de estudos. Membro de uma

17
Castellao! e Rodrigues

associação de companheirismo. Operario que trabalha para um


empreiteiro.
Companheirismo - substantivo masculino - Associação de
trabalhadores de uma mesma profissão, para fins de aperfeiçoa­
mento profissional e de assistência miitua. Tempo durante o qual o
operario saído do aprendizado trabalhava como companheiro, em
casa de seu patrão. Qualidade de companheiro.
Nos idiomas não latinos, os termos usados têm o mesmo
sentido. Em inglês, por exemplo, o Companheiro, como já foi visto,
é o Fellow , que significa camarada, par, equivalente, correligioná­
rio, membro de uma sociedade, conselho, companhia, etc.. Daí,
temos as palavras derivadas, como: fellow laborer = companheiro
de trabalho; fellow m em ber - colega; fellow partn er - sócio; fellow
student - condiscípulo; fellow traneler - companheiro de viagem; e
fellow sbip = companheirismo. ■ :■

O COMPAGNONNAGE

Não se deve, todavia, confundir o Grau de Companheiro


Maçom, ou o Companheirismo Maçônico com o Compagnonnage
- associações de companheiros - surgido na Idade Média, em função
direta das atividades da Ordem dos Templários, ou Ordem da
Milícia do Templo4, e existente até hoje, embora sem as mesmas
finalidades da organização original, como ocorre, também, com a
M açonaria. O Compagnonnage foi criado porque os templários
necessitavam, em suas distantes comendadorias do Oriente, de tra­
balhadores cristãos; assim organizaram-nos de acordo com a sua
própria doutrina, dando-lhes um regulamento, chamado Dever. E
esses trabalhadores construíram formidáveis cidadelas no Oriente
Médio e, lã, adquiriram os métodos de trabalho herdados da Anti­
guidade, os quais lhes permitiram construir, no Ocidente, as obras
de arre, os edifícios públicos e os templos góticos, que tanto têm
maravilhado, esteticamente, a Humanidade.

13
Cartilha do Companheiro

O Compagnonnage, execrado pela Igreja, porque tinha sua


origem na Ordem dos Templarios, esmagada no início do século
XIII, por Filipe, o Belo, com a conivência do papa Clemente V,
acabaria sendo condenado pela Sorbonne. Esta, originalmente, era
uma Faculdade de Teologia, já que fora fundada em 1257, por
ilobert de Sorbon, capelão de S. Luís, para tornar acessível o estudo
da teologia aos estudantes pobres. E a condenação, datada de 14 de
março de 1655, contendo uní alerta aos Companheiros das organi­
zações de ofício (os Maçons operativos), tinha, em relação às práti­
cas do Compagnonnage, o seguinte texto:

Nós, abaixo assinados, Doutores da Sagrada Faculdade de Teo­


logia de París, estimamos:

1. Que, em tais práticas, existe pecado de sacrilegio, de impureza


e de blasfem ia contra os mistérios de nossa religião;

2. Que o juram ento feito, de não revelar essas práticas, m esm o


na confissão, não é justo nem legítimo e não os obriga de maneira
alguma; a o contrário, que eles se obrigam a acusar a si m esmos
desses pecados e deste juramento na confissão;

3. Que, no caso do m al-estar continuar e não possam (des


rem ediá-lo de outra form a, são obrigados, em consciência, a
declarar essas práticas ao s juizes eclesiásticos; e da m esm a
form a, se fo r necessário, aos juizes seculares, que tenham meios
de dar rem édio;

4. Que os C om panheiros que se fazem receber em tal form a


assim descrita não podem , sem incorrer em pecad o mortal, se
servir da palavra de passe que possuem , para se fazer recon he­
cer C o m p a n h e ir o s e p r a tic a r os m au s co stu m es d es s e
“C om pan heirism o

5. Que aqueles que estão nesse Com panheirism o não estão em


segurança de consciência, enquanto estiverem propensos a con­
tinuar essas más práticas, às quais deverão renunciar;

19
Castellar^ e Rodrigues

6. O iré oí jovens que não estão nesse “Companheirismo ”, não


podem neles ingressar sem incorrer em pecado mortal.

Paris, no 14° dia de março de J655.

Nada a estranhar! Era a época dos tribunais do Santo Ofí­


cio, da “Santa” Inquisição.
Para finalizar, é importante salientar que muitos dos Símbolos
do Grau de Companheiro M açom - os quais tanto excitam a
mente de ocultistas - foram a ele acrescentados já na fase da Ma-
çonaria dos Aceitos, pelos adeptos da alquimia oculta, da magia,
da cabala, da astrologia e do rosacrucianismo, já que os obreiros
medievais, os verdadeiros operários da construção, nunca adotaram
tais símbolos, límítando-se às lendas e aos mitos profissionais. Eram,
inclusive, adversários das organizações ocultistas, combatidas pela
Igreja, à quaí eles eram profundamente ligados, pois dela haviam
haurido a arte de construir e mereciam toda a proteção que só o
clero católico poderia dar, numa época em que o poder maior era o
eclesiástico.
Com o incremento do processo de aceitação, a partir dos
primeiros anos do século XV II, as portas das Lojas dos Franco-
-Maçons foram sendo abertas não só aos intelectuais e espíritos
lúcidos, que foram responsáveis pelo renascimento europeu, mas,
também, a todos os agrupamentos místicos e às seitas existentes na
época. Isso iria provocar uma verdadeira revolução nas corporações
de ofício e iria começar a delinear a ritualística especulativa do Grau,
baseada em símbolos místicos e nas doutrinas ocultistas, principal­
mente na Cabala e na Alquimia Oculta, abordadas em sequência.

NOTAS

1 Aceitos eram aqueles elementos não ligados ao ofício, ou à arte de cons­


truir, os quais tinham o seu ingresso admitido nas Lojas dos verdadeiros
obreiros da construção. O costume de admitir “aceitos” era muito antigo

20
Cartilha do Companheiro

e, praticamente, sempre existiu nas agremiações profissionais, corno ma­


neira cie distinguir algumas pessoas; e essa distinção podia ser uma sim­
ples honraria, ou, então, motivada por uma questão de sobrevivência e
de amparo, através da aceitação de nobres e aristocratas. A prática, toda­
via, era bastante restrita, e tais aceitos, em número diminuto, não eram
mais do que membros honorários das Lojas, não tendo, nelas, qualquer
atuação decisiva.
Com a decadência das corporações de ofício, estas começaram, de
maneira mais evidente e não mais como honraria, a aceitar elementos
estranhos ao ofício, para aumentar o enfraquecido contingente dos Fran-
co-Maçons. O primeiro caso conhecido é o de John Boswell, lord de
Aushjnleck, aceito na St. Mary’s Chapell Lodge - Loja da Capela de
Santa Maria - em Edimburgo, Escócia, em 1600. Essa Loja fora criada
em 1228, quando da fundação da Fraternidade de Construtores da
Capela de Santa Maria, que alguns autores consideram como núcleo
original do Rito Escocês, o que não parece viável. Durante todo o século
XVII, o processo iria se acentuar a ponto de, no seu final, o elemento
aceito superar, amplamente, o operativo, o que iria levar, em 1717, ã
fundação da Premier Grand Lodge, em Londres, a qual serve como
marco - um “divisor de águas” - entre a Maçonaria Operativa e a
moderna Maçonaria dos Aceitos.
As Lojas dos operativos eram formadas para proceder à construção de
obras de arte, obras públicas, ou templos católicos (é o caso, por exemplo,
da já citada Loja da Capela de Santa Maria). Concluída a obra, a Loja
continuava, pois, em construções com a envergadura daquelas, incluindo
as imensas e trabalhadas catedrais góticas, havendo a necessidade de
constante manutenção e eventuais reparos.
O título de Mestre da Loja, ou Venerável Mestre, dado ao presidente de
uma Oficina Maçônica, tem sua origem na Inglaterra, nos meados do
século XVII, quando já ia avançada a paulatina transformação da Maço­
naria de ofício em Maçonaria dos aceitos.
Derivado da palavra inglesa worship, que significa adoração, culto, reve­
rência - como forma de tratamento - quando usada como substantivo,
e venerar, adorar, idolatrar, quando usada como verbo transitivo, tem-se
o termo worshipful, que significa adorador, reverente, ou venerável (nes­
te último caso, como forma de tratamento).
Assim, o presidente da Loja tinha o título de Master (Mestre), ao qual se
adicionou, posteriormente, o tratamento reverente de worshipful

21
Castellani e Rodrigues

(Venerável) - pois, no início, o termo venerável era aplicado apenas às


corporações de artesãos - o que produziu a expressão worshipful master
{Venerável Mestre).
A expressão, todavia, não é muito utilizada nos países de fala inglesa,
onde se prefere, simplesmente, Master, dando-se o título de Past-Master
ao ex-Venerável Mestre. Nas Obediências latinas, ao contrário, é quase
abolido o termo Mestre, já que as referências ao presidente da Loja limi­
tam-se, quase sempre, a um simples Venerável, o queé altamente incorreto,
pois este vocábulo, no caso, é um adjetivo, que não pode set usado sem
o substantivo Mestre.
4 A Ordem dos Templarios foi criada em 1118 e foi a mais importante das
ordens religiosas militares da época (as outras eram as dos Hospitalarios
edos Cavaleiros Teutónicos). Ela foi fundada com a finalidade de garantir
a guarda dos lugares santos da Palestina e proteger os peregrinos; suas
regras e estatutos foram concebidos pelo abade de Clervaux, depois São
Bernardo. Tais regras, muito severas, impunham, aos cavaleiros, castidade,
pobreza e obediência, além de prever, entre outras coisas, que, durante as
guerras, eles deveríam aceitar combate de um contra três e não podiam
ser resgatados mediante pagamento, caso caíssem em mãos inimigas;
além disso, não lhes permitiam caçar nenhum animal, a não ser o leão,
Como as demais ordens, ela comportava três classes: os clérigos, que
eram os que recebiam ordenação sacerdotal, encarregando-se do serviço
religioso da corporação; os irmãos leigos, que representavam o papel de
escudeiros; e os cavaleiros, que representavam a força combatente da
Ordem e que deveríam ser recrutados, exclusivamente, entre os nobres,
cabendo-lhes o governo efetivo da corporação e de suas províncias.
Além das batalhas em que se empenhavam, com inexcedível destemor, os
templarios tornaram-se hábeis administradores, explorando a necessi­
dade que os governantes tinham de seus serviços. Assim, o ouro da
Europa fluía para seus cofres, províncias inteiras eram colocadas sob sua
guarda e suas comend ado rias estendiam-se por toda a Europa e por
todo o Oriente Médio, enquanto que o seu centro administrativo, em
Paris, chegava a ocupar um terço da cidade. Acabaram, assim, estabele­
cendo um grande sístenia bancário, que tornou a Ordem credora de reis
e nobres, tomando-a cada vez mais rica e poderosa. Além disso, empe­
nharam-se na construção de fortalezas, igrejas, estradas e pontes, sob
influência dos monges cistercienses e das associações arquitetônicas do
■ Oriente; entre os ofícios de cada comendadoria, havia o de “magisrer

22
Cartilha do Companheiro

carpentarius” - mestre carpinteiro - que era um verdadeiro arquiteto, a


dirigir e instruir os obreiros a serviço da Ordem.
Apesar de seu poder, a Ordem pouco durou, graças a uma certa animo­
sidade de seus devedores e, principalmente, à cobiça de algumas cabeças
coroadas, que desejavam os seus tesouros. Foi o caso do rei da França,
Filipe IV, cognominado Filipe, o Belo, que investiu contra a Ordem, com
a conivência do papa Clemente V, dominado por ele. Filipe reinava como
senhor absoluto, tendo submetido até o papado, ao instalá-lo, à força,
em Avignon; conseguira, inclusive, fazer com que o papa Bonifácio VIII,
antecessor de Clemente V, canonizasse seu avô, tornando São Luís o rei
Luís, que odiava mortalmente os judeus e os tinha perseguido, tenaz­
mente, durante o seu reinado.
Riqueza alguma escapava a Filipe e só a Ordem dos Templarios ousava
enfrentá-lo. Por isso, ele instaurou contra ela o mais vasto processo da
História, o qual durou sete anos, atingiu a cerca de 15.000 acusados e
perpetrou todos os tipos de infâmias. O pretexto para o processo por
heresia estava nas cerimônias iniciáticas da Ordem, que serviram para
que a Inquisição a acusasse de práticas demoníacas, feitiçaria e adoração
de ídolos, fazendo com que Clemente V a extinguisse, através da bula
“Vox in Excelso”, enquanto Filipe se apossava de seu ouro. Depois de
sete anos de prisão, sob torturas engendradas por Guilherme de Nogaret,
guarda-selos e secretário geral do reino, os principais líderes templarios,
como o Grão-Mestre Tiago De Molay - Jacques De Molay, para os fran­
ceses - e o preceptor da Normandia, Godofredo de Charnay, eram exe­
cutados nas fogueiras do Santo Ofício, em 1312.

23
Castellani e Rodrigues
Cartilha do Companheiro

Ontologia do Grau

A ontologia - do grego on tos = ser e lo g a s - estudo, saber -


é a parte da metafísica que trata do ser, em geral, e de suas proprie­
dades transcendentais, ou seja, que se ocupa do ser, da essência do
ser, no sentido mais extenso da palavra. É a teoria que pretende
explicar as origens das idéias, através de adequada intuição do ser
absoluto. Aristóteles a chamou a Filosofia Primeira e, posterior­
mente, a Metafísica.
SER, nesse caso, tanto pode significar existir, como designar
o ente. O princípio de identidade indica que O SER é e o NÃO SER
não é, conceito metafísico e cabalístico, que resume, em si, a grande
dúvida existencial humana. Tratando do ente, a ciência do Homem,
o conhecimento mitológico vai além do físico. O Homem, como ser
humano, não se satisfaz em só aprofundar-se no conhecimento do
EU, devendo ir mais além, preocupando-se com o NÃO EU.
O NÃO EU não significa, porém, necessariamente, a não
existência, mas sim, também, a existência do cosmos, ou seja, dos
mundos que cercam o EU. A preocupação primordial no Grau de
Companheiro é o conhecimento do NÃO SER, do NÃO EU, impor­
tando, portanto, a sociedade, em geral, com todos os seus integrantes.
Daí a luta constante que o Maçom deve manter, para acabar com
as barreiras da opressão c da injustiça, defendendo as liberdades
individuais, protegendo os desvalidos e erradicando os erros da mente
humana, sem jamais aceitar a escravização do homem pelo homem.

25
Castellani e Rodrigues

O Companheiro, ao se colocar em profundo contato com a


cultura social, entende a Sociologia como uma consciência coletiva
da sociedade, a qual nada mais é do que a união das consciências
individuais. Se a perspectiva ontológica do Grau de Aprendiz M a-
çom refere-se, essencial mente, ao EU, ou seja, ao conhecimento
individual - “nosce te impsum” - o Grau de Companheiro Ínteres-
sa-se pelo O U TRO , pela projeção do EU, ou seja, pela sociedade e
por seus integrantes.
Em seu estudo ontológico, portanto, o Companheiro deve
dar especial atenção a três normas, que regrarão a sua atuação:
1. Dar atenção aos seus semelhantes, além de se preocupar
consigo mesmo;
2. Sentir e considerar todos os demais como seres humanos,
que merecem carinho e amor fraternal;
3. Aceitar, conhecer e compreender os avanços científicos
como procedimentos que ensejam o progresso e o desen­
volvimento da Humanidade.
: Conhecendo aos demais, é possível, ao Homem, conviver
mais facilmente com eles, influindo em seu pensamento, em sua
maneira de ser, orientan do-os, quando possível, ou sendo orientado,
quando desejado. Permitindo, ao Companheiro, comparar o Homem
individual ao Homem coletivo, o Grau torna efetivo o lema
ontológico: pensar bem, sentir bem e agir bem.

26
Cartilha do Companheiro

O Misticismo do Grau —I
O Pitagorismo e os Misterios de Eléusis

OS MISTERIOS DE ELÊUSIS

As influencias místicas sobre a escalada iniciática da Maço-


naria, de maneira geral, vêm das antigas civilizações e dos agrupa­
mentos medievais. Entre as antigas civilizações, encontra-se a da
G récia arcaica, com os cham ados M istérios de Eléusis c o
Pitagorismo.
Os M istérios d e Eléusis são relacionados, primordialmente,
com o culto à deusa grega Deméter (a Ceres romana). Deméter era
irmã de Zeus (o Júpiter romano) e era considerada a deusa protetora
dos agricultores, dos campos e das colheitas de cereais e frutas,
sendo, por isso, representada com espigas de trigo nos braços. Ao
lado de Zeus, Hera (a Juno romana) e Posseidon (o Netuno romano),
era das mais antigas deusas gregas, ¡á que o seu mais antigo templo
(telesterion), em Eléusis, remonta à época micênica da Grécia Ar­
caica, cerca de 1.600 anos a. C.. Os chamados Mistérios de Eléusis
justapõem o culto agrario de Deméter, que ensina aos homens o
cultivo do trigo, ao culto de sua filha Perséfone, ou Coré (a Prosérpina
romana), cujo estágio hibernal nos infernos simboliza o ciclo de
nascimento e morte dos vegetais. Suas festas religiosas eram deno­
minadas eleusinias, porque eram realizadas no templo de Eléusis.
A lenda refere que, em certa ocasião, ao colher flores no

27
Castellani e Rodrigues

campo, Perséfone foi raptada por Hades (o Plutão romano), deus


dos infernos e senhor absoluto e sempre invisível das profundezas da
terra. Deméter buscou-a pelo mundo inteiro, dia e noite, até se encon­
trar com Apoio, deus do Sol, que a informou sobre o rapto da filha.
Tomada, então, de intensa cólera contra a terra, ela se negou a
permitir o crescimento de grãos e de frutos, o que fez com que Zeus
interferisse junto a Hades, para que este devolvesse Perséfone, esta­
belecendo, contudo, como condição, que ela não houvesse ingerido
nenhum alimento. Como, porém, d a havia ingerido os grãos de
uma romã, não lhe foi permitido voltar, definitivamente, sendo-lhe
permitido, apenas, que passasse seis meses do ano com sua mãe,
sendo, os outros seis meses, passados no inferno.
Dentre as muitas prerrogativas atribuídas a Perséfone, estava
a de que ninguém podería morrer, sem que eia lhe cortasse o fio de
cabelo, que fazia a ligação com a vida. Graças a isso, o seu culto
foi bastante desenvolvido: ela presidia aos funerais e os amigos do
morto cortavam os cabelos e os jogavam numa fogueira, em home­
nagem à deusa; acreditava-se, também, que ela ajudava a encontrar
objetos perdidos. Como seu rapto ocorreu ainda em sua adolescência,
os gregos deram-lhe o nome de Coré, que significa “a jovem”.
Devido à lenda, Perséfone sim boliza as sem entes, qu e p er­
m an ecem s o b a terra, durante m eio a n o e, d epois, frutificam so b re
d a . Esotéricamente, esse cicio de nascimento e morte dos vegetais
representa a eternidade e a imortalidade. Assim, os Mistérios de
Elêusis forneciam, aos iniciados, os segredos da morte e da ressur­
reição. Esses iniciados eram divididos em dois grupos, de acordo
com o seu grau de aperfeiçoamento: M istos e E poptas.
Aos Mistos, que usavam, como vestimenta, uma simples pele
de corsa, eram dados ensinamentos relativos à vida após a morte,
no mundo astral, intermediário entre os mundos material e espiritual;
recebiam, eles, também, instruções sobre a evolução do homem na
Terra e sobre a cosmogonia5. Os Epoptas representavam uma etapa
iniciática mais elevada, recebendo, por isso, instruções mais

28
Cartilha do Companheiro

profundas, sobre a origem do universo e do homem, sobre o domí­


nio da mente e sobre a alfa espiritualidade. O símbolo dessa etapa
era uma espiga d e trigo, que, além de representar a fartura - através
de Deméter - aludia, também, à ren ov ação sem p re constante da
vida, através das sucessivas mortes e ressurreições, corno no imutável
ciclo dos vegetais, representado por Perséfone. A vestimenta dos
Epoptas era um velo, ou velocino dourado, o que pode ter contribuído
para a lenda de Jasão e o velo de ouro6.
Embora mais desenvolvidos, os Mistérios de Elêusis pouco
diferem, cm sua essência mística, da lenda do deus Osíris7, dos
antigos egípcios, e do culto ao deus agrário Dumuzi, dos sumerianos,
que, a partir do V milênio a. C., começaram a se instalar no sul da
Mesopotâmia, junto ao Golfo Pérsico. Também a lenda do assassi­
nato de Dionisio (o Baco romano) pelos Titãs, seguido de seu
esquartejamento e de sua ressurreição dentre os mortos, abordada
nos Mistérios de Elêusis, é bem semelhante à lenda de Osíris.

O PITAGORISMO

O pitagorismo foi um movimento de reforma do orfismo,


que, através dele, chegou ao conhecimento da posteridade. O orfismo
- ou mistérios órficos - de contornos vagos, sendo mais uma dispo­
sição do espírito do que uma doutrina racional, insistia na oposição
da alma e do corpo e na responsabilidade individual, concebendo
um ideal de vida purificada, ascética e virtuosa, que a filosofia
pitagórica iria desenvolver.
Os gregos atribuíam a Orfeu a criação dos mistérios órficos.
Orfeu, segundo alguns, seria filho de Oedagro, rei da Trácia, e de
Calíope, musa da poesia épica; para outros, seria filho de Apoio e
de Clio, musa da História. Sua mulher, Eurídice, foi picada por
uma serpente, no dia do casamento. Orfeu, descendo ao inferno,
conseguiu reavê-la, sob a promessa de partir sem olhar para trás;
mas, ten do quebrado a promessa, perdeu-a para sempre. Segundo a

29
Castellani e Rodrigues

lenda, Orfeu era um hábil música e, ao som de sua citara, as feras


ficavam mansas, as aves silenciavam, os rios detinha m-se em seu curso
e as árvores dançavam ao ritmo da música. Ele participou da expedi­
ção dos argonautas, chefiados por jasão, e foi iniciado por seu pai nos
mistérios de Dionisio, tornando-se um pontífice, cuja sabedoria era
inspirada pelos deuses.
Em relação ao orfismo, o pitagorismo era mais científico em
seus princípios - através do papel dos números e da harmonia - e
mais místico em seus dogmas - através da crença na migração
astral das almas. A comunidade formada por Pitágoras3, na Itália
meridional, no século VI a. C. era, ao mesmo tempo, religiosa,
filosófica e política; e, com ela, começou o tratamento dedutivo-
-demonstrativo da matemática, ligado a uma forma peculiar de
misticismo.
Pitágoras afirmava que todas as coisas são constituídas de
números. Ele imaginava os números como pontos dispostos em forma
de figuras e, nesse caso, as coisas seriam harmoniosamente com­
postas de pequenas partículas, ordenadas em figuras numéricas.
Além disso, associou os números à música e à mística, derivando,
dessa associação pitagórica, as expressões matemáticas “média
harmônica” e “progressão harmônica”. Número, para a linguagem
pitagórica, era igual a harmonia e, em todo o universo, deve reinar
essa harmonia, que é a responsável pela sua existência e manuten­
ção. De acordo com esse conceito, o corpo humano saudável é uma
harmonia, cabendo, à Medicina, restabelecer essa harmonia, quando
ela for rompida.
Os pitagóricos concebiam uma Terra esférica, que seria uma
estrela entre as estrelas, movendo-se, todas, em torno de um fogo
central; a distância delas, em relação a esse fogo central, coincidia
com intervalos musicais, de maneira que ressoava, no universo, uma
harmonia das esferas. A partir das propriedades numéricas, as esco­
las pitagóricas buscavam sempre as analogias entre todas as coisas e
os números, chegando à concepção de uma mística numérica.

30
Cartilha do Companheiro

A maior contribuição científica das escolas pitagóricas,


através do próprio Pitágoras, ou de seus discípulos imediatos, teria
sido a demonstração relativa aos triângulos retângulos, provando
que a soma do quadrado dos catetos é igual ao quadrado da
hipotenusa1’. Mas, como crença religiosa básica, Pitágoras ensinava
a transmigração de almas e a abstenção de diversas práticas, inclu­
sive a de comer carne, já que os seus ensinamentos mostravam a
possibilidade da alma reencarnar em animais.
Assim como os seguidores dos mistérios de Elêusis estavam
divididos em duas categorias, os discípulos das escolas pitagóricas
dividiam-se em três: a k o u stik o i (ouvintes), m a th em a ü k o i (matemá­
ticos) e p h y sik o i (físicos). Os ouvintes participavam das reuniões,
mas guardavam absoluto silêncio, numa etapa que durava dois anos,
durante os quais limitavam-se a ouvir e aprender; os matemáticos,
numa fase mais adiantada, colocavam em prática o núcleo da dou­
trina pitagórica, relacionando os diversos ramos da Matemática
com a Música e descobrindo as correspondências entre as ciências;
os físicos entregavam-se ao estudo dos mistérios da natureza e da
vida interior do homem, já que, na Grécia clássica, a Física era a
filosofia natural, o estudo da natureza.
Consta que a comunidade criada por Pitágoras tinha, como
símbolo distintivo, uma estrela pentagonal, um símbolo da magia -
que Pitágoras praticava - o qual, desde a antiguidade, era utilizado
para representar os corpos celestes que, aparentemente, eram me­
nores do que o Sol e a Lua. Essa estrela de cinco pontas será anali­
sada a seguir.

PITAGORISMO, ELEUSÍNIAS E O GRAU DE


COMPANHEIRO

A Iniciação Maçônica, como, geralmente, ocorre com todas


as ordens iniciáticas, desde a antiguidade, representa a morte física
do Iniciado e o seu renascimento num plano superior. Há, aí, a

31
Casteltani e Rodrigues

aplicação dos ensinamentos dos eleusianos, sobre os mistérios da


morte e da ressurreição, fornecidos aos iniciados no cuito a Deméter
e a Perséfone. No segundo grau dos Mistérios de Elêusis, o dos
epoptas, assim como no Gran de Companheiro Maçom, o símbolo
é uma espiga de trigo, que, além de representar a fartura, consequên­
cia do trabalho, simboliza, também, a renovação sempre constante
da vida, através das sucessivas mortes e ressurreições, como no
ciclo dos vegetais, sendo, em última análise, a representação da
imortalidade da alma, pregada na doutrina mística da Maçortaria.
Como no pitagorismo, os três Graus Maçônicos representam
as três grandes etapas da evolução do pensamento humano: intui­
ção, an álise e síntese. O Aprendiz Maçom, ainda inexperiente, rea­
liza o seu trabalho empíricamente, guiado apenas pela intuição e
representando o alvorecer das civilizações, dominadas pelo empirismo
e sem métodos científicos; o Companheiro M açom, já tendo um
método de trabalho analítico e ordenado, simboliza uma fase mais
avançada na evolução racional do homem; e o Mestre Maçom,
juntando tudo o que está disperso, através da síntese, para a conclu­
são final da obra de luz, representa o derradeiro caminho da mente,
na busca da perfeição. ■
_ , ;. tJ ,,i ; , ....,

NOTAS T"

5 Cosmogonia é a designação das várias teorias, que têm por objetivo


explicar a formação do universo e do homem, seja do ponto de vista
místico, seja do científico.
6 Velo é a peie de carneiro, ou ovelha, com a lã. Jasâo, filho de EIson, rei de
laicos, chefiou a expedição dos argonautas, incumbida de conquistar o
carneiro do veio de ouro.
7 Foi Plutarco quem deu, no século I da era cristã, a melhor versão da lenda
de Osíris, confirmada, depois, pelos textos hieroglíficos. Em resumo, é o
que segue:
Osíris foi um grande rei, que ensinou ao povo o cultivo da terra, os
fundamentos da lei e o culto dos deuses. Enfrentava a inveja e a ambição
de seu irmão Set, personificação do mal. Este tramou uma conspiração

32
Cartilha do Companheiro

contra o rei, persuadindo outras pessoas a auxiliá-lo. Secretamente, ele


mediu o corpo dc Osíris c mandou fazer um caixão exatamente com as
mesmas medidas, levando-o para o centro de seu salão de banquetes,
onde entre outros convivas, estava Osíris. Em tom de brincadeira, pro­
meteu dá-lo de presente àquele cujo corpo se ajustasse a ele; todos os
convidados submeteram-se à experiência e nenhum se ajustou ao caixão.
Chegou a vez de Osíris e, quando este se deitou, Set e os demais conspira­
dores fecharam a tampa, soldaram-na com chumbo e o jogaram no rio
Nilo. Sua esposa, ísis, informada da tragédia, saiu à procura do corpo,
pois soubera que o caixão havia sido carregado até Biblos, no delta do
Nilo, onde se enroscara numa tamareira, que crescera, enormemente, em
torno dele, ocultando-o e fazendo com que o rei do lugar, diante do
grande tamanho da árvore, a cortasse, colocando-a como coluna dc
sustentação de seu palácio. ísis, em Biblos, empregou-se como ama dc um
dos filhos do rei e, em todas as noites, colocava a criança no fogo, para
consumir suas partes mortais e dar-lhe imortalidade, enquanto se trans­
formava numa andorinha, para lamentar a morte do marido. Certa oca­
sião, a rainha viu seu filho em chamas e gritou, angustiada, privando-o,
assim da imortalidade. ísis, então, revelou-se e pediu a coluna que susten­
tava o palácio. Atendida, ela voltou ao Egito e escondeu o caixão em local
secreto, enquanto procurava seu filho Hórus. Mas, por acaso, Set, en­
quanto caçava, certa noite, encontrou o caixão e, reconhecendo o corpo
de Osíris, cortou-o em quatorze pedaços, espalhando-os por todo o
país. Tomando conhecimento disso, Ísis construiu um barco de papiro e
tratou de juntar todos os fragmentos do corpo. Osíris, com seu corpo
reconstituído, voltou do além e apareceu a seu filho Hórus, ordenando-lhe
que lutasse contra Set. Hórus lutou contra o assassino de seu pai durante
vários dias, saindo, finalmente, vitorioso. Osíris, então, tornou-se o deus
e o juiz do reino dos mortos.
A lenda é totalmente decalcada nos mitos solares, pois, segundo ela,
Osíris foi morto no 17" dia do mês Hator, data que marcava o início do
Inverno. Assim, o Sol (Osíris) é morto pelas forças das trevas (Set), para
renascer depois, completando um novo ciclo. O mesmo ocorre na lenda
que é a origem dc todas as outras: a do deus agrário Dumuzi, dos
sumérjanos, que, ao representar o ciclo dc mortes c ressurreições anuais
dos vegetais, é o símbolo da eternidade e da imortalidade do espírito.
H Pitágoras (Pythagoras, ou Puthagoras) nasceu em Samos e foi para
Crotona, no sul da Itália, por volta de 513 a. C., provavelmente para

33
Castellar» e Rodrigues

escapar da tirania de Polícrates, governante de Sarrios. Etn Crotona, futí'


don uma sociedade religiosa, que conseguiu grande influencia política,
até que uma rebelião dos habitantes do lugar o forçou a mudar para
Meta ponto, onde faleceu. A associação - escola, ou escolas pitagóricas -
sobreviveram a ele, mas, na metade do século V a. C., novas perseguições
obrigaram os pitagóricos a se dispersar por varias regiões da Grecia.
Tudo em relação a Pitágoras, todavia, é incerto, mesmo as suas crenças,
pois ele não escreveu nenhum livro e os seus seguidores guardavam zelo-
samente os seus segredos. Muitas lendas em tomo dele cresceram tapida­
mente, enquanto que os pitagóricos posteriores, assim como os membros de
outras sociedades, atribuíam-lhe as suas próprias teorias, para dar-lhes
um cunho de autoridade. Em sua época, Pitágoras não era muito acata­
do, chegando o seu contemporâneo Xenófanes, poeta e filósofo nascido
na Jônia, a zombar dele, devido à sua crença na transmigraba o das almas.
s Essa demonstração ficou conhecida como teorema de Pitágoras. Mas, de
alguma maneira, o teorema já era conhecido e usado, muito antes, na
Babilônia. É provável que Pitágoras o tenha introduzido na Grécia, mas
é improvável que ele o tenha descoberto.
Segundo o teorema, em qualquer triângulo retângulo - com um ângulo
reto, ou seja, de 90° - a soma do quadrado dos catetos é igual ao quadrado
da hipotenusa; catetos são os lados do triângulo adjacentes ao ângulo
reto; e a hipotenusa é o lado oposto ao ângulo reto. Ele é de fundamental
importância para toda a atividade humana, já que não importa qual é o
comprimento de duas linhas, já que, desde que elas estejam em ângulo
reto, é possível saber, exatamente, qual é o comprimento da linha que une
suas pontas, seja na escala métrica, seja na escala astronômica. Por exemplo:
se houver uma linha de 3 unidades de comprimento e outra de 4, for­
mando um ângulo teto (são os catetos), a tinha que unirá as duas pontas
(hipotenusa) terá cinco unidades, já que o quadrado de 3 (3 x 3) é 9 e o
quadrado de 4 (4 x 4) é 16, cuja soma dá 25, que é o quadrado de 5 (5 x
5). Esse conhecimento é aplicado na navegação, para traçar rotas e medir
distâncias; é usado na delimitação de terras e na construção de estradas;
por ele, pode-se saber de que maneira dois grupos de trabalhadores,
começando, em lugares oposros, a cavar um túnel, poderão se encontrar
no centro; com ele, o homem mede as distâncias estelares e chega à sua
fronteira final: o espaço cósmico.

34
Cartilha do Companheiro

O Misticismo do Grau —II


A Estrela Pentagonal e a L etra G

A ESTRELA DE CINCO PONTAS E A MAGIA

A estrela de cinco pontas, ou estrela pentagonal, ou penta­


grama, é um dos diversos símbolos da magia e sempre surge nos
ritos de várias correntes místicas, tanto as dedicadas à magia branca
(teurgia), quanto à magia negra (goécia).
Teurgia, ou magia branca, é, essencialmente, a arte de fazer
milagres. É o ramo da magia que trata das influências benéficas e
da maneira de invocá-las; ela envolve, também, todas as obras
cujas idéias relacionem-se com o amor e o bem, investigando, espe­
cialmente, os fatos mais elevados da magia, os quais dependem do
mundo angelical, dando, assim, ao homem, os meios para se comu­
nicar com as chamadas potências celestiais. Os textos bíblicos
mostram diversos exemplos de teurgia.
Goécia, também chamada de magia negra, nigromancia, ou
feitiçaria, é a arte de realizar malefícios e encantamentos, represen­
tando a antítese da teurgia, pois se dedica às obras das trevas, en­
quanto a teurgia é uma obra de lua. Ela é a parte experimental da
magia, naquilo que se refere aos poderes que o homem pode desen­
volver em si, através de certos processos, e ao domínio que poderá
exercer sobre as entidades do astral, enquanto que a teurgia procura
ensinar ao homem o relacionamento com os planos superiores da

35
Castellani e Rodrigues

espiritualidade, abrindo-lhe o caminho para os grandes segredos do


esoterismo,
A estrela pentagonal, dependendo de sua posição, acompanha
os trabalhos de ambas as correntes da magia: com a ponta isolada
voltada para cim a, ela testemunha as obras de luz da teurgia,
conclamando as influências celestiais, que, por seu poder mágico,
virão em apoio do invoca dor; invertida, ou seja, com a ponta única
voltada para baixo, ela testemunha as obras das trevas e, de acordo
com as intenções do mago, atrai maléficas influências astrais,
O ocultista Eliphas Leví explica bem o significado da estrela
pentagonal:

O pentagrama é o sím bolo da onipotência e da autocracia inte­


lectual. O signo do Verbo feito carne e, segundo a direção de
seus raios, este sím bolo absolu to em m agia representa o bem ou
o mal, a ordem ou a desordem , o cordeiro bendito de Ormuz e
de São Jo ã o , ou o bod e de Mendés. É a iniciação o h a profan a­
ção, a vitória o h a m orte, a íuz ou a som bra. Elevado no ar, com
duas pontas para cim a, representa satã ou o b o d e da missa ne­
gra; com apenas um dos raios para cim a, é o Salvador. O
pentagrama ê a figura do corpo humano, com quatro membros
e uma única ponta, que deve representar a cabeça. Uma figura
humana de cabeça para baixo representa, naturalmente, o dem ô­
nio, ou melhor, a subversão intelectual, a desordem e a loucura.

Como símbolo mágico e necessário em todos os trabalhos de


magia, a estrela deverá, obrigatoriamente, ser composta de todos os
metais e, na sua consagração, devem entrar todos os elementos. A
consagração do pentagrama, na magia, é feita da seguinte maneira:
Inicialmente, ela deve ser soprada cinco vezes, uma em cada
ponta, molhando-se, em seguida, outras cinco vezes, com água
lustrai, e secando-se na fumaça dos cinco perfumes; incenso, mirra,
enxotre, aloés e flor de cânfora. A seguir, são sopradas, novamente,
as cinco pontas, enquanto são pronunciados os nomes dos cinco
gênios: Rafael, Gabriel, Samael, Anael e Orifiel10; depois, a estrela

36
Cartilha do Companheiro

i i olocada no chão, virando-se a ponta única, sucessivamente, para


11 Norte, o Sul, o Oriente e o Ocidente, ao mesmo tempo em que são
pronunciadas, em voz alta, as letras hebraicas iód , h é e vau, e, em
voz baixa, as letras alep h e ta n " . Depois disso, a estrela é colocada
Mib re <>altar das invocações, sendo rezadas as preces dos silfos, das
ondinas, salamandras e gnomos1’, enquanto as cinco pontas são
novamente molhadas e secadas na fumaça dos cinco perfumes.
Para todos os ocultistas, todos os mistérios da magia e da
alquimia mística, todos os símbolos da gnose e todas as chaves
i a balísticas da profecia resumem-se no pentagrama, que Paracelso
- cujo verdadeiro nome era Aurelius Teophrastus Bombastus von
I lohenhein - grande alquimista do século XV I proclamava como o
maior e o mais poderoso de todos os signos.
Quem deu, ao pentagrama, o nome de Estrela Flamejante,
loi o teólogo, alquimista e médico Enrique Cornélio Agrippa de
Ncteshein, natural de Kholn (Colônia), onde nasceu no final do
século XV, o qual era também dedicado à magia, à alquimia e à
filosofia cabalística.

O PENTAGRAMA E O GRAU DE COMPANHEIRO

A Estrela Flamejante, em Maçonaria, só foi introduzida nos


meados do século XVIII, na França, sendo um símbolo totalmente
desconhecido dos membros das antigas associações de construtores
medievais - da chamada Maçonaria de Ofício, ou Operativa - e
também dos primeiros Maçons aceitos e dos que criaram o sistema
obediencial, com a Premier Grand Lodge, de 1717.
Ela tem sido, nos meios m açônicos, mais associada ao
pitagorismo. Pitágoras, todavia, também era dedicado à magia e a
adoção do pentagrama - símbolo máximo da magia - como símbolo
distintivo de sua comunidade não deve causar estranheza. Sendo, a
prática maçônica, uma obra de luz, a Estrela Pentagonal, também
chamada de pentalfa13, existente nos Templos e que brilha nos

37
Castellani e Rodrigues

trabalhos do 2° Grau, tem a sua ponta única voltada para cima,


nela se inscrevendo, segundo todos os ocultistas, a figura de um
homem - por isso é chamada de Estrela Hominal - em posição
normal, representando, assim, os atributos da alta espiritualidade
humana, como no pitagorismo. Em posição invertida, ou seja, com
a ponta isolada voltada para baixo, nela se inscreve a figura de um
homem com a cabeça para baixo, ou a figura da cabeça de um
bode, representação, em ambos os casos, dos atributos da materia­
lidade e da animalidade,
Nas Lojas Maçônicas, a estrela pentagonal está colocada ao
Sul, pendente do teto, ou nele pintada, ocupando posição intermediá­
ria entre o Sol, que está no Oriente, e a Lua, que está no Ocidente,
como representação do planeta Venus, que sena o corpo celeste de luz
intermediária entre o Sol e a Lua. Mas há, também, uma explicação
mística pata isso: o 2o Vigilante, que ocupa lugar na Coluna do Sul, ou
do Meio-Dia, é, na correspondência das Dignidades e Oficiais da Loja
com os deuses do panteão greco-romano, assimilado a Afrodite (a Vênus
romana), deusa do amor, da beleza e do casamento.

A ESTRELA DE SEIS PONTAS COMO


ESTRELA FLAMEJANTE

Nem todos os Ritos, porém, utilizam a estrela pentagonal.


No caso do Rito de York, a “blazing star” (estrela flamejante) é a
de seis pontas, ou estrela hexagonal, ou hexagrama, formada por
dois triângulos equiláteros, cruzados pelas bases e opostos pelos
vértices.
A estrela de seis pontas, adotada pelo judaísmo como “magsen
David” (estrela de David), é, todavia, um símbolo antiquíssimo,
quase pré-histórico. Como ele é formado por duas figuras distintas
- triângulo de ápice superior e triângulo de ápice inferior - que se
unem, para formar uma figura totalmente diferente - a estrela -
sem que cada uma perca a sua individualidade (pois ambas são

38
Cartilha do Companheiro

distinguíveis na estrela), ela sempre foi o símbolo do matrimônio


perfeito, da procriação humana, quando se unem duas pessoas dife­
rentes - um homem e uma mulher - para gerar e formar um ser
distinto delas, sem que cada uma perca a sua individualidade. Cos­
tumava-se, inclusive, no nascimento de uma criança, presenteá-la
com um medalhão, no qual se inscrevia uma estrela hexagonal,
tendo, no centro, os símbolos do macho e da fêmea; nas seis pontas
da estrela e nos seis espaços entre as pontas, inscreviam-se os doze
signos zodiacais, com destaque para o signo do recém-nascido.
Mas ela tem, também, a sua interpretação mística, esotéri­
ca: o triângulo de ápice superior é o símbolo da espiritualidade, das
atividades do espírito humano, enquanto que o triângulo de ápice
inferior é o símbolo da materialidade, das atividades materiais do
homem. Em Loja composta, o triângulo da espiritualidade é formado
pelo Venerável Mestre e pelos dois Vigilantes, enquanto que o triân­
gulo da materialidade é formado pelo Orador, pelo Secretário e
pelo Cobridor.

A MISTERIOSA LETRA G

O significado da letra G, qne é inscrita no centro da estrela


pentagonal, tem sido, para os Maçons, objeto de amplas especula­
ções e de teorias místicas absolutamente arredadas da realidade e
até ridículas, no caso de algumas delas. Entre as teorias mais difun­
didas nos meios maçônicos, temos três principais:
1. A Ierra G correspondería a G him el, terceira letra do alfa­
beto hebraico, que encerraria, nela, um “ princípio de coagulação e
condensação”, simbolizando, portanto, Deus, o criador incriado.
Nada é explicado, ou as explicações são confusas, porque se trata
de mera especulação, sem qualquer valor e que, além de rudo, parte
de um erro grave, já que a correspondente mais próxima de Ghimel
é a letra C.
2. A letra G teria derivado, por algumas modificações, da

39
Castellani e Rodrigues

O roboros, a serpente que morde a própria cauda’4. Para os alquimis­


tas, essa serpente representava, assim como o círculo, a unidade da
matéria. A teoria é inconsistente porque a Oroboros não é símbolo
maçônico e, se o tosse, não haveria razão para transformá-la numa
letra G, tirando todo o seu significado original.
3. As escolas pitagóricas teriam colocado, no centro do
pentagrama, um esquadro de ramos desiguais, já que elas eram
dedicadas à Matemática. Os visitantes, sabendo que Pitágoras era
grego, poderíam ter confundido esse esquadro com a letra gam a, do
alfabeto grego; como gama corresponde à letra G, aí estaria a ex­
plicação para a presença desta letra no pentagrama. Isso é mero
exercício de imaginação, já que pouquíssimo se conhece de Pitágoras
e das escolas pitagóricas, que nada publicavam e que viviam em
segredo. Além disso, há, aí, um erro cronológico: a letra G, em
M aço na ri a, é um símbolo bem mais antigo do que a estrela penta­
gonal, que só foi introduzida nos trabalhos na metade do século XVIII,
enquanto que a letra G já era citada no século anterior.
Na verdade, desde os seus primeiros tempos, a letra G, em
M açonaria, em consideração ao Maçom construtor - literalmente,
no início, e, depois, figuradamente, como construtor social - signi­
fica GEO M ETRIA , conforme as antigas instruções da Ordem. O
“Master Key” de John Browne, mostra a prática das Lojas, por
volta de 1800:

For wby tuas you passeei a Feilow Craftí


For the sake o f tbe letter G?
What does that letter G den otei
Geometry, or tbe fifth Science, on wbich masonry is founded,
What is Geometry?
G eom etry is a science by whicb we are taugbt to fin d out tbe
conlents o f bodies unmeasured by comparing them witb those
already measured.
What are the fottr principies o f Geometry?
Magnitude and Extensión, o r a regular progression from a point
to a Une, a Une to a superfice, and from that to a solid.

40
Cartilha do Companheiro

What is a pointí.
A small tbing, the beginning o f geom etrical matter.
What is a line?
That point extended.
What is a superfice?
Length and breadth without determined thickness.
What is a solid?
Length and breadth with a determined thickness and form s a
cube''.

Em tradução livre, temos:

C om o passaste a Com panheiro M açom ?


Pela letra G (ou p o r am or à letra G).
O que significa a letra G?
G eom etria, ou a quinta ciência, na qual a M açonaria é baseada.
O que é G eom etria?
E uma ciência, através da qual som os instruídos a descobrir o
volum e dos corpos imensuráveis, através da com paração com
os já medidos.
Quais são os princípios da G eom etria?
A grandeza e a extensão, ou a m etódica expansão de um ponto
a uma linha, de uma linha a uma superfície e. desta a um sólido.
O que é um p on to?
Uma pequena coisa, o início da matéria geométrica.
O que é uma índia?
O ponto expandido, prolongado.
O que é uma superfície?
Comprimento e largura, sem uma determinada espessura.
O que é um sólido?
Comprim ento e largura, com determinada espessura, form ando
tam bém um cubo.

Entre os ingleses, todavia, além desse significado, citava-se


a “imagem da letra G ”, como o Grande Arquiteto do Universo e
Construtor do Mundo, ou seja: GOD (Deus), já que a palavra co­
meça com a letra G. Mas acabaram sendo literalmente inventados

41
Castellani e Rodrigues

outros significados, principalmente do agrado dos Maçons latinos,


todos iniciados, evidentemente, com a letra G: Gramática, Gravi­
dade, Gênio, Gnose, Geração, Glória a Deus, Grandeza ao Venerá­
vel, e assim por diante, “ad nauseam”, graças à mente inventiva de
Maçons lantasistas.
Ocorre, porém, coisa até mais estranha, pois, se é muito fácil
dizer que a letra G significa Deus, nos idiomas onde o vocábulo
começa com G - GOD, para a comunidade de fala inglesa, GOTT,
em alemão, GÚD e GUTT, em línguas nórdicas - não é muito fácil
defender essa ideia, onde a divindade é chamada de Dieu (em fran­
cês), Dio (em italiano}, Dios (em espanhol), ou Deus (em português).
Acabaram, por isso, os ritualistas e exegetas das práticas maçônícas,
apelando para verdadeiros malabarismos, para tentar imitar a
conceituaçâo inglesa. Entendeu-se, até, de tentar fazer uma distin­
ção entre os significados da letra G, de acordo com a figura em que
ela se encontrasse: quando no centro da Estrela Flamejante, o seu
significado seria Geometria, e, quando no centro do Delta, ela sig­
nificaria Deus, o que, diga-se a bem da verdade, é um conceito
forçado e artificial.
Chegou-se, até, para justificar a letra G representando Deus,
a considerá-la similar a IÔD, a décima letra do alfabeto hebraico,
inicial do nome de Deus em hebraico - iôd, hé, vav e hé (pronúncia
aproximada: IEVE) - e que, por isso mesmo, simboliza Deus, quando
inscrita no centro do Delta, Esse absurdo pode ser constatado, por
exemplo, ena rituais brasileiros de Obediências diferentes, citados a
seguir, sem nominar a Obediência que os gerou:

....sua atenção era despertada por certos caracteres hebraicos,


que, atualmente, sã o representados, em Loja, p or um triângulo
equilátero, tendo no centro a letra G (IÔD), qu e significa DEUS,
o Grande G eóm etra do Universo, a quem todos devem os nos
subm eter e a quem devem os, humildemente, venerar.

■- c ¡ O Delta, que vedes, tão resplendente de luz, vos oferece duas

42
Cartilha do Companheiro

grandes verdades e duas idéias sublimes. A letra IÔ D - que é o


m esm o que a letra G - traduz o nom e d o Criador incriado e
Auto divino, representando, tam bém , a Geom etria, que é a ciên­
cia da construção, fundam entada nas aplicações infinitas d o
triângulo.

A letra G é o m esm o que a letra IÔD e traduz o nom e d o Cria­


d or incriado e auto-Divino, e tam bém representa a Geom etria,
que é a ciência da construção....

Os dois últimos ainda falam de Geometria, mas o primeiro,


nem isso!
E o absurdo está em querer considerar a letra G como simi­
lar a IOD. Ora, a letra IÔD pode, quando muito, ser o mesmo que
a letra J (Jota), sendo pronunciada como jota, ou como a letra “i”
(em hebraico não existem vogais). Isso já pode ser verificado na P.\
S.'. do Grau de Companheiro Maçom - ou de Aprendiz, conforme o
Rito - JACHDM, ou 1ACHIN, que é o nome de uma das colunas do
templo de Jerusalém e onde a primeira letra é IÔD. E em outras
palavras, como: ÍOM (dia), IAVÉ, ou JAVÉ (o nome hebraico de Deus),
1ÁIN, ou JÁIN (vinho), IUDÁ, ouJUDÁ (louvor), IESOD, ou JESOD
(fundamento), IEHUDHI, ou JEHUDI II (membro da tribo e do Estado
de Judá, palavra da qual derivou a palavra latina JIJDAEU, origem
do termo judeu). E assim, por diante.
Pode-se, porém, chegar ao significado divino da letra G, sem
que, para isso, seja necessário apelar para esses expedientes indevidos
e para as fantasias e elucubrações, como se pode ver, a seguir:
A Geometria, de origem principalmente egípcia, foi levada à
Grécia antiga. Sendo a base da arte de construir, das relações trian­
gulares e do círculo, da Astronomia e da medida das terras férteis
às margens do rio Nilo, ela acabou servindo de fundamento filosó­
fico para os sábios gregos, levando aos conceitos de Ordem, Equi­
líbrio e Harmonia do Universo, os quais seriam tomados, já na
época inicial da Maçonaria dos Aceitos, como obras do Grande
Arquiteto do Universo, Deus, o Grande Geómetra.

43
Castellani e Rodrigues

Graças a isso, pode-se dizer que a letra G, que signiñca GE­


O M ETRIA , também simboliza Deus, o Grande Geómetra, por sig­
nificar a Ordem, o Equilíbrio e a Harmonia do Universo, que são
obras divinas.
Só isso! Não há necessidade de fantasias e de subterfúgios,
quando existe um fundamento racional e lógico.

NOTAS

10 São todos anjos da alta hierarquia.


11 Iôd, Hé e Vav (ou Vau) são as letras que formam o nome hebraico de
Deus, com a repetição da letra Hé, já que o tetragrama, lido da direita
para a esquerda, que é o sentido da escrita hebraica, é Iôd, Hé, Vav e Hé,
As letras Aleph e Tav (ou Tau) são, respectivamente, a primeira e a ultima
letra do alfabeto hebraico, simbolizando tudo o que existe (como alfa e
ômega, do alfabeto grego).
12 Silfo (do latim; sylfi, orum) é o ser macho sobrenatural, que, segundo
crenças celtas e germânicas, ocupava, no mundo invisível, posto interme­
diário entre o gnomo e a fada.
Ondina {do francês: ondine), na mitologia germânica e nórdica, é o gênio
do amor que vive nas águas.
Gnomo (neologismo criado pelo alquimista Para celso) é a designação
dada aos seres sobrenaturais, que, segundo os cabalistas, habitavam o
interior da terra, guardando seus tesouros e riquezas naturais.
Símbolo mitológico do fogo, a salamandra (do grego: salamandra, pelo
latim: salamandra) é nm animal fantástico, constituído de energia ígnea,
com a aparência aproximada de um lagarto, o qual vive em meio às
chamas; na alquimia, constitui um signo gráfico, representativo do ele­
mento fogo. Na natureza, salamandra é o nome genérico de anfíbios
urodelos da família dos Salamandrídeos.
” Pentaifa é palavra formada por penta (cinco) e alfa, primeira letra do
alfabeto grego e inicial dos vocábulos gregos utilizados para designar:
ver, ouvir, meditar, bem agir e calar (Arreo, Aisto, Adaiesque,
Agatopoeiro, Abaquidzi), cujo símbolo é a Estrela Flamejante. As cinco
virtudes que devem ornar o Companheiro Maçom são também simbo­
lizadas pelas iniciais do pentalfa, pois o perfeito Companheiro deve ser

44
Cartilha do Companheiro

amável, benéfico, incorruptível, casto e severo (Aganetos, Agelasos,


Agathoergos, Adiafithortos, Agnos).
14 Oroboros é um importante símbolo esotérico, cuja origem é imemorial,
e que é representado por uma serpente que morde a própria cauda,
significando que “todo começo contém em si o fim, e todo fim contém
cm si o começo”. Em seu sentido mais geral, é símbolo do tempo e da
continuidade da vida. Por sua forma circular, representa, também, o
movimento perpétuo e de trajetória circular, ou curva, que caracteriza
toda manifestação no universo. Ainda é emblema do caráter cíclico de
toda manifestação.
15 Apud Colin Dyer, in “Symbolism in Craft Freemasonry” - Lewis Masonic
- Londres - 1983 - pág. 86.

45
Casteliani e Rodrigues
Cartilha do Companheiro

O Misticismo do Grau —III


A Alquimia

ORIGENS

A lquim ia, do árabe al-khem i, é, de acord o com essa


etimologia, a química da natureza. É o conjunto de receitas e de
conhecimentos empíricos acumulados pelos precursores da moderna
Química.
Suas origens estão, provavelmente, nas práticas cultivadas
em Alexandria, no início da era cristã, associadas a outros tipos de
atividades e ciências, entre as quais se encontra a Astrologia. O que
lhe trouxe grande incremento, todavia, foi a sua introdução na Eu­
ropa, a partir do século VII da era atual, através do sábio e filósofo
Geber16, que era árabe, como todos os grandes sábios responsáveis
pela preservação da ciência dos antigos, no conturbado mundo me­
dieval, subjugado pelo obscurantismo eclesiástico, que deu origem
aos tribunais do Santo Ofício.
Toda a evolução da alquimia ocorreu com os árabes, pois,
além de Geber, destacaram-se: Al Ráziz, no século IX; o alquimista
e médico Ibn Sina (chamado de Avicena17, no mundo ocidental), no
século XI, quando a alquimia começava a ter maior aplicação na
Medicina; e, no século XII, Ibn Roschid (Averróes), a partir do qual
a alquimia passou a exibir características científicas e a se desen­
volver mais no mundo ocidental, principalmente a partir da Penín­
sula Ibérica, onde a expansão árabe era mais evidente.

47
Castellao! e Rodrigues

Depois disso é que surgiram os sábios cristãos, como o


franciscano Roger Bacon18, filósofo, físico e matemático, do século
XIII, e Nicolás Fíame 1, do século XIV, na época em que iria começar
a associação da alquimia com a cabala e a magia, gerando a alqui­
mia oculta.

OBJETIVO S

As três metas principais dos alquimistas eram: a pan aceia


universal, o elixir d a vida e o o u ro espargtrico. A panaceia, remé­
dio para todos os males, e o elixir da vida tinham por objetivo a
preservação da saúde humana e o prolongamento da vida, que são,
também, as metas das modernas Química e Farmacologia. E o in­
tenso trabalho relativo à transmutação dos metais inferiores, até
chegar ao ouro potável, acabaria dando origem a muitas descober­
tas, que embora tidas como conquistas da ciência moderna, já eram
conhecidas pelos magos e alquimistas da antiguidade.
Embora se afirme que o uso da eletricidade e do vapor d’água
sejam conquistas modernas, tais efeitos físicos já eram conhecidos e
utilizados em épocas muito remotas, como se pode comprovar, através
dos seguintes fatos: os magos etruscos conheciam a eletricidade e a
usaram como meio de defesa; o famoso alquimista e arquiteto
Anselmo de Tralle, construtor da catedral de Santa Sofia, em
Constantinopla - hoje, Istambul - já conhecia os efeitos do vapor
e os utilizava; o escritor romano Plínio já descrevia a morte de
Tullus Hostilius, causada pela eletricidade; o já citado Roger Bacon,
a quem é atribuída a invenção da pólvora (embora ela também seja
atribuída aos chineses), baseou suas pesquisas nos trabalhos de al­
quimistas anteriores a ele; o monge alquimista Pauselenas refere-se,
em suas obras, à aplicação da química na fotografia e ainda afirma
que autores jónicos já faziam referências ao mesmo processo, assim
como à câmara escura, à sensibilidade de placas e a aparelhos
ópticos. E assim por diante, pois os exemplos são muitos.

48
Cartilha do Companheiro

Esses fatos pertencem à alquimia prática, ou experimental,


que era diferente da alquimia oculta, ou mística.

A ALQUIMIA EXPERIMENTAL

A alquimia prática, ou experimental, pode ser estudada sob


três aspectos diferentes - o có sm ico, o hu m an o e o terrestre - que
admitem variadas interpretações. Esses três aspectos eram encon­
trados sob três propriedades alquímicas, o enxofre, o sal e o mercú­
rio, elementos necessários à Grande Obra da alquimia, que é a
transmutação dos metais inferiores em ouro. A Grande O bra era
também chamada de O bra do Sol, ou crisopeia (procura do
ouro), ou Arte R eal19, enquanto que a transm utação dos metais
em prata era a Pequena O bra, ou O bra da Lua, ou argiropeia
(procura da prata).
Desta maneira, a alquimia experimental trata das forças da
natureza e das diversas condições da matéria, nas quais essas forças
agem. Dando, aos iniciados alquimistas a ideia de um mistério
supremo - m ysterium m agnum - velado por símbolos, para que
não se tornasse perigoso em mãos profanas, o mestre alquimista
admitia, como condição primordial, a existência de um solvente
universal na substância homogênea, de onde foram evoluindo os
elementos, a que denominam ouro puro (sum m um m ateriac). Esse
dissolvente, também chamado de m enstruum universale, tem o po­
der de lançar para fora do corpo todo germe de doença, além de
renovar a juventude e prolongar a vida. E, assim, a verdadeira
Pedra Filosofal (Lápis P hilosophoru m ).
Pode-se dizer, de maneira geral e sintética, que a alquimia
experimental, ou terrestre, tem o objetivo de transmudar os metais
inferiores em ouro puro. Para os autores herméticos, ela é conside­
rada uma parte da filosofia natural, ensinando a formar os metais
sobre a terra, imitando as operações executadas pela natureza, no

49
Castellani e Rodrigues

subsolo, e aproximando-se, o mais possível, dessas operações. Para


o grande alquimista Paracelso, a alquimia é uma ciência que ensina
a transmudar os metais uns em outros. Mas, na realidade, a verda­
deira alquimia pode ser definida como a ciência e a arte de fabricar
um pó fermentativo, que transmude os metais inferiores em ouro e
que também sirva como remédio universal - panaceía - para todos
os males naturais dos homens, dos demais animais e dos vegetais.

A ALQUIMIA OCULTA

A alquimia oculta despreza o ouro material terrestre, pre­


ocupando-se com o ouro relativo ao plano espiritual e, por isso
mesmo, transcendental. Todos os seus esforços são dirigidos no sen­
tido da transmutação do quaternário inferior humano no ternario
divino, superior ao homem; esses, quando, finalmente, se unem,
formam um só. Os quatro elementos materiais da Terra - fogo, ar,
água e terra - comparam-se, na alquimia oculta, aos planos espiri­
tual, mental, psíquico e físico da existência humana, possuindo,
cada um deles, uma tríplice composição: fixa, inestável e volátil.
Na alquimia oculta, ou mística, é necessário considerar,
ainda, a Estrela Pentagonal, já abordada, que, para os alquimistas,
era o símbolo intermediário entre a Obra do Soí (Grande Obra) e a
Obra da Tua (Pequena Obra), assim como ela representa o corpo
celeste de luz intermediária entre o Sol e a Lua. Sendo, a prática
maçônica, uma obra de luz, a Estrela Flamejante dos templos está
em sua posição normal, de estrela Hominal, ou seja, com a ponta
isolada para o alto.
Além disso, o triangulo, como um dos máximos símbolos
esotéricos, tem sua correspondência na filosofia hermética dos al­
quimistas. De acordo com a ciência hermética, o todo tem três
ângulos. Os filósofos hermetistas dizem que a sua matéria, ou mer­
cúrio filosófico, é uma coisa que tem três ângulos em sua substância
- sal, enxofre e mercúrio- quatro em sua virtude - os quatro elementos

50
Cartilha do Companheiro

- dois em sua matéria - fixo e volátil - e um cm sua raiz - o caos,


de onde tudo surgiu.

A UNIDADE E O FOGO, SÍMBOLOS DA


DIVINDADE

O u m in d iv is ív e l, correspondente à m áxim a divindade,


cuja existência e ação são previstas nos Ritos Maçônicos, é previsto
e explicado por Cornélio Agrippa, em sua obra “Filosofia Oculta”,
onde ele se ocupa do valor e do significado dos números e onde
existe, também, muito da filosofia cabalística. Em relação ao nú­
mero um, Agrippa diz o seguinte:

O número não passa de uma repetição da unidade. O um é o


princípio de todas as coisas e todas elas vão até ele e, depois dele,
a nada. Tudo o que existe requer o um, porqu e tudo veio d o
um. Para que todas as coisas sejam as mesmas, é preciso que
participem do um. Assim, é preciso que tudo o que queira voltar
ao um, abandone a multidão. Um refere-se a Deus, que, sendo
um e numeroso, cria quantidade de coisas e as contém em si.
Existe, pois, um Deus, um mundo que é de Deus, um Sol para o
mundo, um fênix do mundo, um rei entre as abelhas, um chefe
dos rebanhos e um com andante nos exércitos. Existe um ele­
mento que excede e que penetra em tudo, que é o fogo. Existe
uma coisa criada p or Deus, que é objeto de adm iração geral e
que está nos céus e na terra: a alm a vegetal e mineral, que se
encontra em todas as partes, que ninguém conhece e nem cham a
pelo nome, mas que está oculta sob cifras, figuras e enigmas, e
sem a qual nem a alquimia nem a magia natural poderíam al­
cançar êxito.

O fogo, por ter sido o elemento impulsionador da civiliza­


ção, já que tudo o que existe é filho do fogo, tem, também, o seu
lugar na mística maçônica, não só como elemento cósmico purifica­
dor, sempre presente nas cerimônias iniciáticas, mas também como
o elemento renovador de tudo, conceito presente na máxima

51
Castellani e Rodrigues

hermética dos rosacruzes, introduzida na Maçonaria: ¡gne Natura


Renovatur Integra - o togo renova toda a natureza - cujas iniciais
I.N .R.I, já foram usadas com diferentes interpretações.
Assim como os discípulos de Zoroastro, na antiga Pérsia, os
hermetistas, alquimistas e rosacruzes consideravam o fogo como o
símbolo da divindade. Esotéricamente, ele é o único elemento cós­
mico, daí as denominações de fogo fluídico (ar), fogo líquido (água),
fogo sólido (terra) e fogo sideral (o próprio fogo) dadas aos quatro
elementos primordiais da Antiguidade. A Cabala aplica a expressão
fogo branco ao infinito incognoscível de Deus (Ein Soph) e fogo
negro à sabedoria e à luz absoluta, já que a cor negra é resultado da
absorção de toda a luz. Já os antigos rosacruzes possuíam uma ceri­
mônia denominada fogo novo, que era celebrada no sábado de
aleluia, em homenagem à ressurreição de Jesus.

HERMES TRIMEGISTO E A TÁBUA ESMERALDINA

Hermes Trimegisto (três vezes grande), alquimista e filósofo,


assimilado, pelos gregos, ao deus Totb egípcio, era considerado,
tanto por gregos quanto por egípcios e pelos antigos alquimistas, o
senhor de todos os segredos do universo. Ele pregava que a Terra,
tal como o homem, acha-se ligada a outras entidades celestes, pois
tudo é subordinado às leis da reciprocidade. Isso pode ser observado
através da leitura de seu testamento iniciático, um famoso texto,
que teria sido gravado pelo próprio Hermes, sobre uma grande
lâmina de esmeralda, encontrada por Alexandre M agno, nas
profundezas da grande pirâmide de Gizé, onde, segundo a lenda, os
sacerdotes esconderam o túmulo de Hermes. Muitos afirmam que,
nesse texto da tábua de esmeralda, se encontra a teoria da pedra
filosofal, o que parece verdadeiro, assim como a referência ao germe
das ordens iniciáticas. É o seguinte, o texto da tábua esmeraldina,
tirado da tradução francesa:

52
Cartilha do Companheiro

É verdade sem mentira e muito verdadeiro: tudo o que está aqui


em baixo tam bém está no alto; tam bém no alto está o que está
em baixo, pois tudo é obra de uma só coisa21’.

Todas as coisas vieram e vêm de uma, da qual tudo nasceu.

E à qual tudo se ajustou, pois tudo se adaptou a ela, a Causa


Única.

O Pai de tudo, que é a realidade, que é o querer d o universo,


aqui está com sua força total convertida em terra1'.

Se quiserdes saber o segredo dessa força suprema, deveis separar


a terra d o fog o, o fino e sutil do espesso e grande, suavemente e
com todo o cuidado22.

Sobe da terra a o céu e dali volte à terra, para receber a força do


que está em cim a e d o que está em baixo.

Assim, receberás a luz de todo o mundo e as trevas se afastarão


de ti2>.

Esta c a força de todas as forças, que vencerá tudo o que é sutil,


com o vencerá tudo o que é grande, e que penetrará em tudo o
que é sólido e palpável.

Portanto, o m undo pequeno está feito à sem elhança d o mundo


grande.

Assim, e desse m odo, ocorrerão mudanças prodigiosas.

Por isso m e cham am de Hermes Trimegisto, pois possuo as três


partes da sabedoria de todo o m undo2’’.

Terminado está o que disse sobre a Obra do Sol.

A VERDADEIRA ALQUIMIA COMO DEVE SER


ENTENDIDA

N o final da Idade M edia e com eço da Idade M oderna, a

53
Castellan¡ e Rodrigues

alquimia caiu em cerco descrédito, a partir do momento em que um


grande número de aproveitadores decidiu se aproveitar, em benefi­
cio próprio, para auferir dinheiro, poder, ou bens materiais, da boa
fé de um povo muico crédulo e ignorante. Os verdadeiros alquimis­
tas, todavia, jamais fizeram propaganda de sua ciencia e também
nào se apegavam ao dinheiro e aos bens materiais, dando, aos ne­
cessitados, parte desses bens; além disso, jamais vendiam os seus
segredos, só os comunicando aos seus discípulos, caso os julgassem
dignos de possuí-los e de usá-los.
Nenhum dos grandes alquimistas, como Geber, Espugnet,
Morien e Cornélio Agrippa (que também foi chamado de Trimegisto),
deixou, jamais, de pregar e ensinar o amor a Deus e a condenar os
falsos alquimistas, afirmando, com clareza, que os procedimentos
da verdadeira alquimia são os mesmos empregados pela natureza,
apenas abreviados pela arte. Assim a entende, também, a doutrina
maço nica, no caso da alquimia prática, como precursora da Quí­
mica e da Farmacologia e como forma de louvar a obra divina.
Assim a deve entender, também, o Companheiro Maçom,
sabendo, entretanto, que a alquimia mística pode ser aceita, também,
como a transmutação espiritual por que deve passar todo Iniciado,
mas não como a fantasia engendrada por alguns alquimistas místi­
cos e considerada segredo, para melhor poder ser negociada. Para
ele, a alquimia deve ser encarada como uma das sendas humanas
no caminho da evolução do pensamento racional, uma etapa fun­
damental no desenvolvimento da ciência, que, hoje, povoam o uni­
verso do conhecimento humano.
Uma prece do já citado alquimista cristão Nicolás Fia mel
aplica-se, bem, ao Grau de Companheiro Maçom:

Ó Pai da Luz, Deus Todo Poderoso, que nos envia todos os


bens e dons de perfeição, eu im ploro a Vossa infinita misericór­
dia. Permiti-me conhecer Vossa Sabedoria Eterna, que envolve
vosso Trono celestial, que tudo criou e realiza, e que tudo dirige
■A ‘-, e conserva.

54
Cartilha do Companheiro

Dignai-vos enviar-ma, de Vosso Santuário celeste, para que cia


se encarne em mim e em mim se opere, com o a mestra de todas
as artes celestiais e ocultas e com o senhora da Ciência e da
Inteligência de todas as coisas.

Fazei com que ela esteja sem pre com igo em todas as minhas
obras, que pelo seu espírito eu possa atingir o Verdadeiro C o­
nhecimento, que atue em mim perfeitamente, na N obre Arte a
que m e consagrei, na procura da Milagrosa Pedra dos Sábios,
que tendes ocultado d o mundo, mas que costumais entremostrar
aos vossos eleitos.

Que seja eu a com eçar essa Grande O bra que se realizará aqui
em baixo e que, satisfeito com ela, eu possa usufruí-la para
sempre.

A milagrosa pedra dos sábios é a Pedra Filosofal; a Grande


Obra é a Obra do Sol, ou crisopeia; a Arte Nobre, ou Arte Real, é,
também, para o Companheiro, a arte dos construtores, com a qual,
como Maçom aceito, ele constrói o seu templo espiritual, à procura
cia Sabedoria Eterna, que tudo dirige e conserva.

NOTAS

16 Jabir Ibn Hayyan, conhecido como Gcber, no Ocidente, nasceu, prova­


velmente, em Tus e escreveu numerosas obras alquímkas. Partindo do
princípio de que os metais tinham uma base comum, concluiu que era
possível realizar a sua transmutação. Foi o primeiro cientista a descrever
a preparação do ácido nítrico e descobriu a água régia, mistura dos
ácidos clorídrico e nítrico, destinada a dissolver o ouro.
17 Abu-Ali Al-Husain lbn Abdullah lbn Sina, ou Avicena (980-1037), nas­
ceu em Bukhara, na Pérsia Ocidental e teve decisiva influência na dissemi­
nação do pensamento de Aristóteles, nos séculos XII e XIII. Criou fama
como médico e filósofo, a ponto de suas obras sobre Medicina ainda
serem reimpressas, no Ocidente, no século XVII. Deixou uma obra em
21 volumes, que é uma verdadeira enciclopédia filosófica.
18 Roger Bacon (cerca de 1222 - cerca de 1292) nasceu em llchester, na
Inglaterra. Iniciou o estudo da meteorologia e realizou diversas

55
Castellar!i e Rodrigues

experiencias de Óptica e sobre a propagação das torças, sendo o primeiro


a aperfeiçoar lentes, espelhos e o uso de lentes corretoras para visão
(óculos), que os árabes haviam aprendido com os chineses. Sempre de­
fendeu a importancia da Matemática e da experimentação nas Ciencias
Naturais. Como, na época, dedicar-se à ciência era como se dedicar à
magia, foi perseguido pelo clero, sendo protegido pelo papa Clemente
IV, que, desde que era nuncio apostólico na Inglaterra, o admirava. Após
a morte do papa, porém, foi condenado e encarcerado durante 14 anos,
por determinação do Geral da Ordem Franciscana, à qual ele pertencia.
Suas principais obras são Opus Majus, Opus Mínus e Opus Terrium.
19 Na Idade Média e mesmo no inicio da Idade Moderna, muitas corpora­
ções designavam o seu mister como Arte Real, Arte Magna, ou Régia
Arte, para enaltecê-lo, não sendo, portanto, tal designação, privilégio
dos alquimistas. No caso destes - dedicados à transmutação de metais
inferiores em ouro - além do enaltecimento de sua ocupação, há a origem
num mito da Antiguidade, segundo o qual o lendário reí Midas, extre­
mamente ambicioso, teria recebido, do deus grego Dionisio, o poder de
transformar em ouro tudo o que tocasse; só se desencantou com o
presente divino, tão desejado, quando percebeu que morrena de inani­
ção, pois até os alimentos que tocava transforma vam-se em ouro; pediu,
então, sendo atendido, que Dionisio Ibe tirasse o malfadado poder. O
título de Arte Rea!, dado à Maçonaria contemporânea, não tem, toda­
via, nada a ver com os alquimistas, pois ele provém das associações de
consrrutores medievais, que eram algumas das que utilizavam o título,
para enaltecer o seu ofício.
20 É a doutrina binária dos opostos iguais. Alude, também, ao Um indivisível,
retomado por Cornélio Agrippa, ou seja, ao Criador - a Causa Única -
e à sua criação, com a fusão do todo no um.
11 Na ttadução francesa, consta théleme - palavra inexistente no idioma -
como o Pai de tudo. Tomando-se como um neologismo derivado do
grego telein, do verbo teleo = realizar, pode-se chegar ao conceito da
realidade como o Pai de tudo, o querer do universo.
12 A referência à separação dos elementos - previsão da análise e da síntese
- seria, segundo alguns, alusão à pedra filosofal; mas é, também, a
concretização da aspiração iniciática.
51 Referência às iniciações - religiosas, ou não - onde se caminha das trevas
em direção à Luz.
^ As três partes da sabedoria do mundo, podem ser relacionadas com o

56
Cartilha do Companheiro

triángulo equilátero, ou Delta, símbolo antiquíssimo e a figura geométrica


de maior equilíbrio e conteúdo esotérico. Ele simboliza os ternarios ou
tríades sagradas, conceito comum à maioria das religiões (Anu, Enlil, Ea,
dos sumen anos; Brahma, Vishnu e Siva, do hinduísmo; Yang, Ying e
Tao, do taoísmo, etc.). De natureza neutra, o triângulo equilátero repre­
senta o perfeito equilíbrio entre os três aspectos da divindade. Embora
alguns autores o apliquem também à trindade cristã, tal interpretação,
segundo vários outros autores, como René Guénon, é incorreta.

57
Castellani e Rodrigues

58
Cartilha do Companheiro

O Misticismo do Grau —IV


A C a b a la

GENERALIDADES

Cabala, ou, mais propriamente, c a b a la , significa trad ição e


é a essência do misticismo hebraico.
Como doutrina mística e metafísica, ela é muito antiga, en-
contrando-se, na Torá2S, traços da filosofía transcendental, que evo-
luiría, através dos tempos, sofrendo, constantemente, influência de
outras culturas, conservando, todavia, a sua primitiva originalidade
e a beleza de sua profundidade espiritual. Graças a essa profundi­
dade, ela só é acessível a poucos, ou seja, a uma pequena elite
intelectual, munida de elevado senso de espiritualidade. Doutrina
fundamentada no contato íntimo com a divindade, ela representa
um universo de conhecimentos profundos e um patrimônio, que,
transpondo as fronteiras do judaísmo, pertence a toda a humanidade,
que, lamentavelmente, ainda não soube penetrá-lo e aproveitá-lo
totalmente.

A METAFÍSICA NO TABERNÁCULO

O Tabernáculo - que seria o precursor do Templo de


Jerusalém, erigido por ordem do rei Salomão - era um templo por­
tátil, armado no deserto, durante os anos em que os hebreus se

59
Castellana e Rodrigues

deslocaram do Egito para a Palestina, no episodio conhecido como


Êxodo. Numa praça de 100 por 5 0 côvados (cerca de 50 metros de
comprimento por 25 de largura), cercada de sessenta postes, aos
quais se prendia uma cortina, com abertura na parte oriental, era
armado, na parte ocidental, o tabernáculo, ou tenda (em hebraico:
snká), tendo, à sua entrada, uma bacia de bronze, com água para
as abluções sacerdotais, enquanto que, no centro do recinto, ficava
urna mesa dos holocaustos, para o sacrifício cruento de animais,
com combustão de seu sangue, O tabernáculo, ou a tenda, composto
de quatro tendas sobrepostas, tinha duas divisões internas: a pri­
meira, o Santo (em hebraico: K o d e s b ), com a mesa dos perfumes, a
mesa dos pães propiciais e o candelabro de sete braços (em hebraico:
m enorá), e a segunda, o Santo dos Santos (em hebraico: K od esb b a
K odash m ), contendo a Arca da Aliança, com as Tábuas da Lei, a
urna do maná e a vara florida de Aarão.
No Tabernáculo já pode ser encontrada a metafísica aplicada
ao Cosmos, segundo Flávio josefo e Fílon, os principais memoria­
listas dos primeiros tempos do judaísmo. Suas três divisões - parte
externa, Santo e Santo dos Santos - representam as três divisões do
universo: céu, terra e mar. Os quatro tecidos, usados na confecção
das tendas, simbolizam os quatro elementos da Antiguidade: ar,
água, fogo e terra. O candelabro de sete braços representa os sete
planetas da Antiguidade e a luz dos astros, vindas do Sul; a mesa
dos doze pães propiciais simboliza os ventos setentrionais, que trazem
as chuvas, vivificando as plantações.
Além disso, as vestes do supremo sacerdote (em hebraico:
cohén gadol) podem ser analisadas do ponto de vista metafísico.
Sua sobrepeliz era azul e dourada, guarnecida com flores, romãs e
campainhas de ouro; no peito, havia doze pedras preciosas; nos
ombros, duas esmeraldas; e uma mitra, na qual estavam gravadas
as quatro letras do nome de Deus (iôd, hé, vav e hé). A cor azul da
sobrepeliz representa o ar, as romãs simbolizam a água (pela grande
quantidade de líquido) e as flores representam a terra, onde as

60
Cartilha do Companheiro

sementes germinam, as plantas crescem e as flores desabrocham; as


campainhas representam a harmonização entre a água e a terra,
que, só em conjunto e nunca isoladamente, podem gerar as plantas;
as doze pedras representam os doze signos zodiacais e as doze tri­
bos de Israel; as duas esmeraldas simbolizam as duas grandes lumi­
nárias terrestres (Sol e Lua), o dia e a noite e os dois hemisférios da
Terra; a mitra representa Deus, o m acrocosm o, sem o qual o
microcosmo, representado por todas as criaturas vivas, não poderia
sobreviver.
A Cabalá, portanto, é bastante antiga, embora se tenha con­
solidado apenas na Idade Média. Sua fonte principal é bíblica e os
essênios e fariseu s26 tran sm itiram -n a oralm en te. Na época
talmúdica, ou seja, a da consolidação do T alm ud, advindo da
M ishná17, nos séculos IV e V, a doutrina mística analisava o homem,
objeto da criação, em sua relação suprema com Deus e estudava o
cosmos sob dois aspectos principais: M a'assé B erechit (História
da Criação) e M a'assé M erk a b á (História do Carro, ou do Trono
de Deus).

OS TEMAS DO MISTICISMO JUDAICO

Os temas místicos do judaísmo e fontes do pensamento


cabalístico são:
1. O Apocalipse, cuja base está nas visões dos profetas, com
o fim de Israel e de toda a humanidade, ou seja, o fim dos tempos e
a hora do julgamento final. O tema é abordado em diversos textos
relativos aos profetas, como Ezequiel, Amós, Isaías, Joel, Zacarias,
Daniel e Malaquias, todos no Antigo Testamento, sendo retomado,
no Novo Testamento, no Apocalipse de S. João.
2. A Visão da M erkabá, descrita no primeiro capítulo de
Ezequiel. Ela narra a visão do Trono de Deus (ou do carro de Deus,
pois, na visão de Ezequiel, o trono tinha rodas). O Trono é o lugar
da mais alta glória de Deus, é o objetivo do caminho místico e da

61
Castellar» e Rodrigues

visão mística, a través dos H ekalot (palacios celestiais), chegando


ao sétimo céu.
3. A Halaká, alicerce e pilar dos principios religiosos. É o
comentário legislativo da parte jurídica da Tora e significa m od o
d e attdar, ou de proceder. Para todos os mestres do Talmud ela é de
extrema importancia. Moshé Ben Maimón (Maimónides), ura dos
maiores filósofos do judaismo ibérico, em sua obra máxima, “Guia
dos Perdidos”, enfatiza o caráter original e filosófico dos m itzvot
(mandamentos). Para os cabalistas, porém, cada m itzvá (singular
de mitzvot} mostra influencia sobre o dinamismo do universo.
4. A Hagadá, que significa len d as n arrativ a, alimentou, de
forma evidente, as fontes místicas da cabala. Ela envolve as nar­
rativas tecidas pela imaginação, ao longo de diversas gerações,
além dos relatos prodigiosos atribuidos aos místicos da era talmúdica,
que interpretaram os mistérios da Tora (sitrê tora). Apresenta, por­
tanto, sob a aparência de lenda, ou de conto romanceado, urna
atitude contemplativa e mística.
5. As A leg o rías, que, segundo os filó so fo s m ísticos
esclarecem os misterios da Tora. Os cabalistas enfatizaram o ca­
ráter transcendental da alegoria, que acabou por se revestir de um
significado puramente simbólico, levando a um simbolismo alta­
mente desenvolvido, que iría influenciar as sociedades secretas de
cunho místico. Segundo esse simbolismo cabalístico, o Criador e a
criatura, ou seja, o macrocosmo e o microcosmo, não são distintos,
são uma só coisa, numa fusão completa e íntima.

O SEPHER YETSIRA

Um dos dois principais textos da literatura cabalística, o


S epher Yetsira {L iv ro d a C r ia ç ã o ) é um curto tratado, com seis
sucintos capítulos, escritos em hebraico, entre os séculos IÍI e VI, na
Palestina, ou, segundo a crítica moderna, na Síria. De autor desco­
nhecido e escrito em estilo conciso e obscuro, é a primeira obra que,

62
Cartilha do Companheiro

do pomo de vista místico, revela uma concepção filosófica dos ele­


mentos formadores do universo, sem considerar o elemento étnico-
-religioso.
O Yetsira é o guia espiritual para a visão da Merkabá, tendo
se tornado clássicas a sua cosmología e a sua cosmogonia28:
A criação dos elementos formadores do universo está subor­
dinada aos dez números fundamentais - 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 0 -
que são as sep b iro t {plural de sephirá), e às vinte e duas letras do
alfabeto hebraico, que envolvem forças cósmicas inatingíveis, sub­
metidas a combinações, que variam através da criação.
As 22 letras do alfabeto hebraico são consoantes. Antes do
exílio na Babilônia (a partir de 586 a. C ) , os hebreus usavam um
alfabeto semelhante ao fenicio, do qual se originaram os alfabetos
grego e latino e, daí, os modernos. Depois do exílio, quando
passaram a se denominar judeus, usaram o aramaico, também sem
vogais e chamado de alfabeto quadrado, devido ao formato de suas
letras. Os m assoretos (de m assorá - sagrada escritura), cuja missão
foi assegurar a transmissão fiel da autêntica Torá, conseguiram
estabelecer uma vocalização gráfica, que consiste em acrescentar
pontos e traços, por baixo, por cima, ou entre as consoantes, sistema
que é usado em todos os textos hebraicos.
As 22 letras são, pela ordem: alep h , b etb , gim el, d aleth , bé,
vau, zayn , betb , tetb, iô d , k a f, lám ed , m en , nun, sa m ek , auin,
p e, tsadê, k ô p b , rêsb, sbin e tau.
As dez sephirot e as 22 letras formam as trinta e duas sendas
místicas com as quais Deus criou o universo, através de colocações
e permutas. E, assim, o Yetsira aborda as origens e as relações entre
as dez sephirot com a divindade: as quatro primeiras formam uni
encadeamento emanatista e as demais, ligadas às direções da mo­
rada celeste, emanam da aposição do sinete divino, representado
pelas letras iód, hé, vav e hé, formadoras do nome de Deus, que se
serve dos três elementos básicos - ar, fogo e água - para a criação
do mundo sobrenatural, ou metafísico.

63
Castellani e Rodrigues

O mundo nasce pela ação das 22 letras e as criaturas nascem da


permuta entre elas. Desta maneira, o poder do Verbo revelado produz
a criação a partir do nada, ou seja, a passagem do não-ser ao ser.
No Yetsira, as 22 letras estão agrupadas da seguinte maneira;
1. Três letras mães (imot): a le p b , m en e shiti.
2. Sete signos duplos, ou seja, de dupla pronúncia.
3. Doze signos simples, ou de única pronúncia.
As letras mães correspondem aos três elementos superiores
da natureza; o ar, o fogo e a água. O ar é o elemento central e os
outros dois são os que dele jorram e dependem: para cima, o fogo,
elemento do mundo celestial, e, para baixo, a água, elemento
material, ou do mundo terrestre.
Os sete signos duplos simbolizam os sete planetas conheci­
dos na Antiguidade - Sol, Lua, Mercúrio, Vênus, Marte, Júpiter e
Saturno - que não eram todos planetas, pois aí estão uma estrela, o
Sol, e um satélite, a Lua.
Essa divisão cosmológica das letras é aplicada ao tempo e ao
espaço, ao macrocosmo divino e ao microcosmo humano. Ao formar
uma tríade, assumem caráter antropológico e antroposófico29: o pri­
meiro grupo representa a cabeça humana, o segundo, o tórax e os
membros superiores, e o terceiro, o abdome e os membros inferiores.
O Sepher Yetsira possui um profundo alcance filosófico, mas
também se presta à teurgia e à magia, muito exploradas na Idade
Média, o que levou ao falso conceito de que a Kabalá é associada à
magia. Ela comporta três tipos de combinações de letras, em relação
com os números:

1. Notaricon
Palavra de origem grega, refere-se ao acróstico, que consiste
em reunir as letras iniciais e finais de várias palavras, para formar
uma só. O exemplo está nos chamados “conhecedores da graça
divina”, os iod ei b e n , para quem a primeira letra, b é, e a última,
num, formavam b o k m a b m istara, ou seja, sabedoria oculta.

64
Cartilha do Companheiro

2. Ternura
Palavra hebraica, significa permuta, ou transposição. Com
a permuta das letras de uma palavra, pode ser obtida outra, de
sentido oposto à primeira, embora formada pelas mesmas letras. O
exemplo clássico do Yetsira é a palavra on eg (prazer), que, através
da transposição de letras, com a primeira tomando o lugar da ter­
ceira, a segunda substituindo a primeira e a terceira tomando o
lugar da segunda, transforma-se em ncgá (pena), de sentido total­
mente oposto.

3. Guematria
Palavra de origem latina, refere-se à avaliação numérica da
palavra. É a combinação mais empregada entre todas e existem
exemplos de grande profundidade filosófica no Yetsira. Um exemplo
clássico é a palavra katit, que designa o óleo de oliva usado como
combustível para iluminação, no candelabro (m en orá); as duas pri­
meiras letras da palavra - lidas da direita para a esquerda, que é o
sentido da escrita hebraica - são k a f e tav (ou tau), enquanto que as
duas últimas são iô d e tau. As duas primeiras letras correspondem,
numericamente, a 4 2 0 , que é o número de anos em que o menorá
iluminou o segundo templo de Jerusalém, enquanto que as duas
últimas correspondem a 4 1 0 , que é o número de anos durante os
quais o menorá iluminou o primeiro templo de Jerusalém. O segundo
exemplo é a palavra iáin (vinho), que corresponde, numericamente,
a so d (segredo), significando que o vinho revela o segredo, ou que
quem está embriagado não sabe guardar segredos; é o correspon­
dente ao ditado latino “in vino veritas”.

O SEPHER HA ZOAR

O Sepher h a Z o a r (Livro do Esplendor) é o principal texto


cabalístico, pois é nele que se encontra, praticamente, toda a dou­
trina da Kabalá, o que o faz ser considerado, pelos místicos judeus,

65
Castellana e Rodrigues

como a obra canónica máxima, cuja importancia étão grande quanto


a da Tora e do Talmud.
A autoría do Zoar é, por tradição, atribuída ao rabí Simeón
bar Yohai, que viveu no século II e que, durante treze anos, teria
permanecido numa gruta, na Palestina, onde teria recebido a reve­
lação desse texto cabalístico. A crítica, todavia, reconhece Moshé
de León - que viveu entre 1250 e 1350 - como o compilador, ou
autor do Zoar, cujo texto surgiu em 1275, na Espanha. Escrito em
aramaico, é urna obra teológica e metafísica-0de grande profundi­
dade espiritual, a qual apresenta comentários sobre as principáis
passagens da Tora, entre as quais estão intercalados tratados parti­
culares e complementares.
O Zoar é, na realidade, um romance místico-filosófico, de­
senrolado na Terra Santa, que é, nele, vista como um belo e tranquilo
campo semeado de figueiras, vinhas e pés de romã, muito propício
à meditação, ao recolhimento e à elevação espiritual. Sua finalidade
é fazer a descrição da vida interior de Deus e traçar o caminho do
ser humano até à união mística com a divindade. Sua doutrina,
porém, não se mostra de forma ordenada e harmoniosa, como um
todo compacto, pois, muitas vezes, exibe um complexo intrincado
de pensamentos representados por símbolos de difícil compreensão.
Em suma, o Zoar mostra o infinito Incognoscível de Deus
(Ein Soph) em suas relações com o universo e com o homem, através
das sep birot, que, nesre caso, representam os dez atributos funda­
mentais da vida divina. De acordo com sua doutrina, existem dois
mundos ligados a Deus: o primeiro, relacionado com o Infinito (Ein
Soph), é completamente oculto e inacessível à mente humana, en­
quanto que o segundo, visto sob a forma dos atributos, enconrra-se
abaixo do primeiro, sendo acessível ã mente humana e permitindo
o conhecimento de Deus. Na realidade, os dois mundos formam um
só, embora o Ein Soph permaneça inconcebível, desconhecido e
intransponível, se bem que a sua atividade seja percebida. Essa
atividade manifesta-se nas sephirot, cuja potência mística permitiu,

66
Cartilha do Companheira

aos cabaliscas, fazer uso do antropomorfismo31, para o esclareci­


mento dos símbolos da Torá. Houve, assim, a transposição das
sephirot para a imagem de um homem.
Segundo o Gênese, o homem teria sido criado à imagem de
Deus e, por isso mesmo, existe um sopro da divindade nele, ou seja,
um pouco do Criador na criatura. O homem terrestre, cósmico,
todavia, possui, nele, muita materialidade e necessita de aperfeiçoa­
mento. O futuro homem aperfeiçoado, o Mechi’ ákh (o Messias, o
ungido) corresponde ao Adam Kadmon, reflexo da alta espiritua­
lidade, cujo corpo é considerado, no Zoar, como a marca da alma.
O microcosmo, que é o homem, sendo cópia do macrocosmo, que é
Deus, pode ter uma representação precisa; Deus, todavia, não pode
ser representado sob forma alguma e, desta maneira, é simbolizado
pela figura do Adam Kadmon, sob o aspecto das sephirot, que,
nesse caso, são as seguintes:

K ether C oroa
H okm á S abedoria
Biná Inteligência
H essed Graça
Tiferet Beleza
Din Justiça
Netsd Vitória
lesod Fundam ento
H ad M ajestade
M alkhut Reino

As nove primeiras sephirot formam três tríades: a primeira,


composta por Coroa (cabeça), Sabedoria e Inteligência, forma o
“mundo da inteligência” (olam b â m uscaí); a segunda, composta
por Graça, Beleza e Justiça, forma o “mundo do sentimento” (olam
há murgake); a terceira, composta por Vitória, Fundamento e M a­
jestade, forma o “mundo da natureza” (olam há mutba’a). A décima
sephirá, Reino, encerra as qualidades de todas as outras sephirot,
ou seja, da divindade, para transmiti-las ao homem. Através do

67
Castellan i e Rodrigues

Adam Kadinon a correspondencia entre Deus e o homem é absoluta


e a união mística é total.
Aínda segundo o Zoar, a alma humana é tripartida em alma
vegetativa (nefek), alm a intelectual (roua) e alma espiritual
(nechamá), correspondentes aos três graus da alma, em suas relações
com o mundo superior e o inferior. Nefek é a força vital do homem
e corresponde ao sangue, a alma vegetativa, que, nao sendo atributo
exclusivamente humano, é comum a todos os animais. Rouá corres­
ponde à vida interior, intelectual e mental da alma, sendo através
déla que é feita a união de nefek com nechamá. Nechamá corresponde
á alma superior, à mais alta espiritualidade, por cujo intermedio
ocorre a união do homem com o mundo celestial.
Há, no Zoar, urna constante preocupação com o homem e
seu destino, desde a chegada da alma ao corpo, por ocasião do
nascimento, que é visto como a descida da alma desde o Jardim
Celestial, superior, até ao Jardim do Edén, inferior, e, daí, a terra.
Ele complementa a grande dúvida existencial do homem, entre o
Ser e o Nao Ser, presente no Yetsira. N o Grau de Companheiro, que
é o mais cabalístico dos Graus Simbólicos, importa considerar a
dualidade do Ser e do Não Ser, do Yetsira, e a tríplice conotação da
alma humana (vegetativa, intelectual e espiritual) do Zoar.

NOTAS

15 Tora, em hebraico, literalmente, lei, conhecimento, é o no me coletivo


dos cinco primeiros livros - conhecidos, no Ocidente, como Pentateuco
- e das leis que eles contêm, básicas para o judaismo. Segundo os princi­
pios estabelecidos pelos estudiosos das leis mosaicas, tanto a revelação
oral, a Tora she bel al pe (Tora que está na boca), quanro a escrita, a
Torá she bikhtav (Tora que está no escrito) remontam ao Sinai, onde,
no monte Horeb, Moisés a teria recebido. A leí oral tem por finalidade
explicar e interpretar a lei escrita, adaptando-a às diversas situações; essa
explicação da Torá é o Midrash.
^ O templo erigido por Salomão, por volta de 380 a, C , foi destruido

68
Cartitha do Companheiro

quando da tomada de Jerusalém, pelos babilônios de Nabucodonosor


II, em 586 a. C. quando se iniciou o exílio na Babilônia, o qual só se
encerraria a 538 a. C., quando Ciro, rei da Pérsia, tomou a Babilônia.
Foi, então, reconstruído o templo e a vida religiosa em torno dele era
intensa, no sentido de preservar a pureza e a autenticidade da tradição
hebraica, ameaçada por invasores. As rivalidades e as divergências teoló­
gicas originaram três partidos, ou seitas religiosas: a dos saduceus, a dos
fariseus e a dos essênios.
Os saduceus formavam o partido dos sacerdotes e dos poderosos e
baseavam a sua conduta em intransigente fidelidade ao texto da Torá,
pugnando pela supremacia do povo eleito e pela grandeza espiritual do
templo, não aceitando interpretações e especulações sobre o texto da lei
do Sinai. Apegados ao templo, desaparecetam com ele, mais precisamente
com o terceiro templo, destruído pelos romanos, a 9 do mês av do ano
70 d. C.
Os fariseus (do hebraico: perushim = separados) admitiam, em torno
da lei escrita, uma extensa tradição oral, que permitia a interpretação do
texto da Torá, adaptando-o às circunstâncias. Eles definiram os concei­
tos religiosos do judaísmo, os quais iriam ser totalmente aproveitados
pelo cristianismo: a justiça divina e a liberdade do homem, a imortalidade
e o julgamento depois da morte, o paraíso, o inferno e o purgatório, a
ressurreição dos mortos e o reinado de glória. Sanio, que seria canoniza­
do pela Igreja com o São Paulo - o qual se dizia “fariseu, filho de fariseus”
- foi quem levou todas essas doutrinas para o cristianismo nascente.
Com a total destruição de Jerusalém, em 70 d. C , foi o movimento
farisaico que assegurou a sobrevivência do judaísmo.
Os essênios praticavam o monaquismo: homens e mulheres viviam agru­
pados, numa vida de isolamento e contemplação, de silêncio e de amor.
Esse monaquismo iria ser herdado, em grande escala, pelo cristianismo.
17 O povo hebreu sempre foi o povo do Livro (da Torá) e de sua exegese,
com a interpretação e a sistematização dos ensinamentos nela contidos.
As formas mais antigas de exposição e interpretação do texto são de
duas grandes correntes exegéticas, surgidas da fonte única do Verbo de
Deus: a Midrash Halaká e a Midrash Agadá. Midrash é o conjunto de
lendas, mitos e estudos da Torá, transmitidos por via oral, durante sécu­
los, e compilados nas yeshivot (academias) babilónicas, após o exílio.
Halaká, em hebraico, significa “modo de andar” (dentro da lei e da
moral). Agadá, em hebraico e aramaico, significa “conto”, “lenda” e é o

69
Castellani e Rodrigues

nome genérico da literatura que engloba lendas, contos e histórias tradi­


cionais. As duas correntes levaram à obra que é considerada a essência
do judaísmo talmúdico: a Mishná - que significa “ensino”, ou “repeti­
ção” - composta de seis Ordens (Sedarim), sessenta e três tratados
(Massekhtot) e quinhentos e vinte e três capítulos (Perakim).
Assim como os tanaim (docentes, professores) inrerpretaram a Torá,
produzindo a MLshná, esta também teve os seus estudiosos e
comentadores, os amoraim. Estes produziram a Guemará, que, em
hebraico e aramaíco, significa “complemento”. A junção da Mishná
com a Guemará, forma o Talmud, que, em hebraico, significa “ensina­
mento” e que segue o mesmo plano da Mishná. Ele reúne o pensamento,
a ciência, a legislação e a intelectualidade do judaísmo, investigando a
verdade e o conhecimento concreto do Verbo de Deus, na mensagem
sagrada da Torá.
28 Cosmología é a ciência das leis gerais que regem o universo. E - convém
relembrar - cosmogonia é a designação das várias teorias que têm por
objetivo explicar a formação do universo: órficas, peripatéticas,
pitagóricas, científicas.
25 Antropologia é a ciência qne estuda o homem, como ser social e animal.
Ancroposofia é o conhecimento do homem, o estudo transcendente da
natureza humana, em seus vários planos.
30 Teologia é a ciência de Deus, da religião, das coisas divinas; por extensão,
é a ciência que tem por objeto o dogma e a moral. Metafísica é a ciência,
ou o conjunto das ciências que estudam a essência das coisas, os primeiros
princípios e causa do que existe; é o inventário sistemático dos conheci­
mentos provenientes da razão pura; é a filosofia transcendental, a teoria
das idéias.
31 Antropomorfo é o que tem aspecto ou forma de ser humano.
Antropomorfismo, em Filosofia, é a doutrina que atribui, a Deus, forma,
ações, virtudes e defeitos humanos.

70
Cartilha do Companheiro

O Misticismo do Grau —V
Astrologia

GENERALIDADES

Embora a Astrologia seja muito antiga, remontando à época


dos sumerianos, que ocuparam o sul da Mesopotâmia, junto ao Golfo
Pérsico, a partir do V milênio a.C., foi somente na Idade Média que
ela cresceu de importância, após ter passado por um longo período
de obscuridade, nos primeiros tempos do cristianismo.
Na realidade, o primeiro livro astrológico moderno foi o
T etrabiblos, atribuído a Claudius Ptolomeu, no século II da era atual,
em Alexandria. Com a morte de Ptolomeu, em 180, a tradição clás­
sica também morreu, enquanto a astrologia começava a entrar em
declínio, que seria exacerbado com a queda do Império Romano do
Ocidente, quando ela desceria à condição de deturpada superstição.
Isso proporcionou os ataques da Igreja às suas práticas, apesar da
existência de muitas referências astrológicas no Novo Testamento.
Foi nessa época de obscurantismo que surgiram os árabes
conquistadores, motivados pela força de sua nova religião: o Islã. A
sobrevivência da ciência e da filosofia clássicas é devida, em grande
parte, à sua preservação e utilização pelas avançadas culturas ára­
bes, a partir do século VII, no Mediterrâneo oriental e no norte da
África. Habilidosos nos terrenos da Medicina, da Alquimia e da
Astronomia, desenvolveram extensos estudos astronôm icos, que

71
Castellani e Rodrigues

mostram acentuada orientação astrológica. Abu Maachar, conhe­


cido, no Ocidente, como Abumansur, foi o maior dos astrólogos
árabes, destacando-se por seu trabalh o “ Introductorium in
Astronomiam”, de nítida influência aristotélica, o qual foi um dos
primeiros livros a aparecer traduzido na Europa, no início da Idade
Média, sendo um dos responsáveis pelo renascimento da astronomia
e da astrologia.
Já perto do final do período medieval, muitos teólogos en­
frentavam o problem a de classificar a astrologia com o arte
divinatória proibida, ou como legítima ciência, cabendo a Santo
Alberto Magno (1200-1280) separar a astrologia de suas associa­
ções pagãs, percebendo o seu valor teológico, ao afirmar que, em­
bora os astros não pudessem influenciar a alma humana, eles pode­
ríam, certamente, influenciar o corpo e a vontade dos homens. S.
Tomás de Aquino, que foi considerado o maior dos teólogos do
cristianismo, consolidou a obra de Sto. Alberto, tornando-a digna
de estudo e afirmando que, em sua visão do universo, poderia ser
tomada como uma complementação da doutrina cristã.
A partir daí, a astrologia ganhou respeitabilidade acadêmica,
passando, então, a fazer parte do currículo de diversas universidades
europeias, não experimentando nenhum declínio com o advento da
Renascença. Com o seu desenvolvimento posterior, ela acabaria se
interessando menos pelos corpos aparentemente fixos (as estrelas) e
mais pelos moventes do Sistema Solar, que foram os primeiros a
chamar a atenção do homem, ainda na Pré-História.

A FÍSICA DO UNIVERSO E O ZODÍACO

O homem antigo desconhecia a física do universo, já que o


primeiro plano a esse respeito foi o formulado no século II d. C , por
Ptolomeu, que imaginava a Terra ocupando o centro do universo,
tendo, a mover-se em torno de si, o Sol, a Lua, Mercúrio, Vênus,
M arte, Júp iter e Saturno (os sete “ planetas” conhecidos na

72
Cartilha do Companheiro

Antiguidade), cada um num círculo perfeito, dentro de uma esfera


exterior sólida, à qual se fixavam as estrelas. Tal teoria manteve-se
intacta até ao século X V I, quando foi derrubada por Nicolau
Copérnico e, posteriormente, por Tycho Brahe e por Johannes Kepler.
Corria o ano de 1543, quando Copérnico horrorizou o aca­
nhado mundo da época, ainda sob tacão do clero e do absolutismo
monárquico, ao sustentar que o centro de nosso sistema era ocupado
pelo Sol e não pela Terra, o que representava uma heresia para a
Igreja da época. Posteriormente, Kepler, nos primeiros anos do sé­
culo XVUI, iria se encarregar de sepultar, definitivamente, o sistema
ptolomaico. Apesar disso, a Igreja só se rendeu à evidência dos
fatos em 1835, duzentos anos depois de Kepler, quando removeu a
obra do astrônomo de seu índex.
Embora, a partir desses estudos, se saiba que é a Terra que
gira em torno do Sol e não o contrário, isso pode ser ignorado
totalmente pela astrologia, pois o que importa, no caso, são as
posições que os planetas parecem ocupar no céu, pois seria a partir
dessas posições que eles agiriam sobre a vida terrestre; nesse senti­
do, tais posições são tomadas como reais. Assim, apenas do ponto
de vista astrológico, a esfera celeste mostra a Terra em seu centro e
rodeada pela eclíptica, que pode ser considerada como a órbita
aparente do Sol, ou como projeção da órbita terrestre na esfera
celesre. A faixa do Zodíaco, da mesma maneira, é puramente simbó­
lica, mostrando as constelações que o Sol atravessa em sua eclíptica.
Ao contrário das constelações celestes, cada signo zodiacal
ocupa um segmento fixo de 30" do círculo completo, que tem 360°.
Quase todos os planetas do sistema solar possuem órbitas que se
colocam praticamente no mesmo plano da órbita da Terra, com
exceção de Plutão, cuja órbita tem uma inclinação de 17° em relação
à Terra. Graças a essa coincidência em plano, os planetas movem-se
numa faixa definida do céu, a qual cobre todo o caminho e que é
chamada de Zodíaco, sendo centrada sobre a eclíptica.

73
Castellani e Rodrigues

O zodíaco divide-se, dessa maneira, em doze constelações, que


são percorridas pelo Sol uma vez por anoJ3: Aries (ou Carneiro),
Touro, G êm eos, C ân cer (ou C aranguejo), L eão, Virgem, L ibra (ou
Balança), E scorp ião, Sagitário (ou A rqueiro), C apricórnio, A quário
e Peixes.

O SISTEMA SOLAR E OS QUATRO ELEMENTOS


DA ANTIGUIDADE

Analisando os corpos móveis do sistema solar e suas relações


com os signos zodiacais, temos:
SOL - é o corpo mais poderoso do sistema e a força essencial
da vida, que não existiría sem ele. O Sol é ativo e relacionado,
astrológicamente, com a energia, o poder e a autoexpressão. Rege
Leão e é exaltado em Áries.
LUA - segue o Sol, em importância astrológica, embora seja
só um satélite. E relacionada com o instinto, agindo sobre os fluidos
da Terra e sobre diversas criaturas terrestres, cujo comportamento
rítmico é controlado por ela. Rege Câncer e é exaltada em Touro.
M ERC Ú RIO - é o planeta da mentalidade e da reação ner­
vosa, por se encontrar na região da coroa solar, onde a matéria é
sujeita a frequentes e irregulares mutações, e por ser o mais veloz
planeta do sistema. Mercúrio rege Gêmeos e é exaltado em Virgem.
VENUS - é associado com a harmonia e o uníssono, quali­
dades em acordo com sua constância física, já que Vênus tem, entre
todos os planetas, a mais baixa excentricidade orbital. Rege Touro
e Libra, sendo exaltado em Peixes.
M A R T E - é, astrológicam ente, o planeta do vigor, do
positivismo e da vivacidade; graças à sua cor avermelhada (causada
pela oxídação, com o, hoje, se sabe), foi associado com o calor,
embora se saiba que ele é bastante frio. Marte rege Áries e é exaltado
em Capricórnio.

74
Cartilha do Companheiro

JU PITER - por ser o maior planeta, existe uní paralelo entre


a sua natureza física e a sua proeminéncia astrológica, como força
expansiva. É importante fonte de radiações, cujos efeitos diretos
são fundamentais para a astrologia. Júpiter rege Sagitário e é exal­
tado em Cáncer.
SATURNO - sempre foi associado com a limitação, ou seja,
com o impulso de se manter dentro de certos limites, mesmo antes
dos seus anéis terem sido descobertos por Galileu Galilei. Rege
Capricórnio e é exaltado em Libra.
URANO - é considerado, astrológicamente, o planeta da
excentricidade e, em termos físicos, difere dos demais, num signifi­
cativo aspecto: sua inclinação axial é maior do que um ângulo reto,
o que implica extraordinárias condições atmosféricas; assim, um
dos pólos, primeiramente e, depois, o outro, possuem uma “noite”
que dura 21 anos terrestres. Diante disso, parece lógico que os as­
trólogos o tenham considerado como o planeta mais dotado de po­
deres sobre as gerações humanas do que sobre cada indivíduo, em
particular. Urano rege Aquário e é exaltado em Escorpião.
N ETU N O - foi descoberto só em 1846, mas as informações
referentes às suas influências astrológicas já estão completas há
muito tempo. É considerado um planeta nebuloso e rege Peixes,
sendo exaltado em Leão.
P I.U T Ã O -é o mais distante dos planetas do sistema e só foi
descoberto em 1930. Ele está tão afastado da Terra, que a sua in­
fluência é tida em conta de essencialmente impessoal e possuidora
mais de um efeito de massa, a não ser nos casos em que ele ocupa
uma posição destacada na carta natal de um indivíduo. Rege
Escorpião33.
Importa considerar, também, no estudo da astrologia os
quatro elementos fundamentais da teoria aristotélica - ar, água,
fogo e terra - já que os signos zodiacais são, também, associados a
eles, da seguinte maneira:

75
Castellar!i e Rodrigues

AR - G êm eos, L ib ra e A quário.
AGUA - Câncer, E scorp ião e Peixes.
FO GO - Áries, L e ã o e Sagitário.
TER R A - Touro, Virgem e C apricórnio.

AS CONSTELAÇÕES E OS MITOS A ELAS


RELACIONADOS

De maneira geral, existe algum mito em torno das conste­


lações zodiacais, ou alguma história baseada nos conhecimentos
e nas crenças da Antiguidade, difundida, principalmente, pelos
gregos:
ÁRIES - O signo é caracterizado pelo planeta Marre e pelo
elemento fogo. A história mitológica da constelação é a seguinte:
Frixos, filho de Nepele, falsamente acusado de violar Biadice, foi
condenado à morte, sendo, todavia, salvo por um carneiro doura­
do, que o carregou no dorso; alcançando a segurança, ele imolou o
carneiro a Zeus, que colocou a imagem do animal no céu.
T O U R O - O signo é caracterizado pelo planeta Vênus e
pelo elemento terra. A origem mitológica da constelação é a seguinte:
Taurus era o touro branco que cortejou Europa, carregando-a no
dorso; ele era, na verdade, Zeus disfarçado, o qual, quando
reassumiu sua forma normal, colocou o Touro no céu.
GEM EOS - O signo ê caracterizado pelo planeta Mercúrio e
pelo elemento ar. A constelação não está associada a algum mito,
em particular. Era conhecida, no Egito, como “As Duas Estrelas” e
tomou o nome das estrelas Castor e Pólux, as mais brilhantes da
constelação.
CÂNCER - O signo é caracterizado pela Lua pelo elemento
água. Como Caranguejo, Câncer, em sua origem, é babilónico, pois,
no Egito, a constelação era representada por duas tartarugas, ora
conhecidas como Estrelas d’Água, ora como Allul, uma criatura

76
Cartilha do Companheiro

aquática. Sua associação com a água é, portanto, bem antiga, em­


bora não haja um mito específico a seu respeito.
LEÃO - O signo é caracterizado pelo Sol e pelo elemento
fogo. Por tradição, o leão representado nessa constelação é o leão
de Nemeia, de pele à prova de ferro, bronze e pedra, o qual foi
morto pelo herói grego Héracles (Hércules, para os romanos), que
perdeu um dedo entre seus dentes.
VIRGEM - O signo é caracterizado pelo planeta Mercúrio e
pelo elemento terra. De acordo com Hesíodo, a história mitológica
da constelação é a seguinte: Virgem (também chamada de Astreia)
era filha de Zeus e de Temis; deusa da justiça, quando terminou a
idade áurea e o homem desafiou-lhe a regência, ela, desgostosa,
retornou ao céu.
LIBRA - O signo é caracterizado pelo planeta Vênus e
pelo elemento ar. Embora não exista mito antigo a respeito da
constelação, ela era associada, na Babilônia, com o julgamento
dos vivos e mortos, quando Zibaniru, a Balança, pesava as almas;
no Egito, a colheita era pesada quando a Lua estava cheia em
Libra.
ESCORPIÃO - O signo é caracterizado pelo planeta Plutão
(tradicionalmente, por Marte) e pelo elemento água. Sua história
mitológica é a seguinte: por ordem de Juno (Hera, para os roma­
nos), o escorpião ergueu-se da terra, para atacar Orion; levou,
também, os cavalos do Sol a disparar, quando eram conduzidos,
certa vez, pelo menino Faetonte. Zeus puniu-o duramente, atingin­
do-o com um raio.
SAGITÁRIO - O signo é caracterizado pelo planeta Júpiter
e pelo elemento fogo. A constelação tem a seguinte história mitoló­
gica: Sagitário, com suas duas partes, animal e humana, era o
centauro Quíron34, que educou Jasão, Aquiles e Enéas; famoso como
médico, profeta e estudioso, era filho de Filira e de Gronos (também
pai de Zeus); Cronos, surpreendido no ato gerador, transformou-se
num garanhão e partiu a galope, abandonando Filira, que, desgostosa

77
Castellar» e Rodrigues

com o filho metade homem e metade cavalo, transformou-se numa


tília.
CA PRIC Ó RN IO - O signo é caracterizado pelo planeta
Saturno e pelo elemento terra. As associações mitológicas da constela­
ção são incertas, embora haja uma leve referência a Pã (ou Pan), cuja
mãe saiu correndo ao ver-lhe a feiura, mas cujo sucesso com as ninfas
era indiscutível35. O antigo deus sumeriano Ea, rei dos oceanos, era
conhecido como “o antílope do oceano subterrâneo”, o bode com
cauda de peixe, chamado “kusarikku”, o bode-peixe.
AQUÁRIO - O signo é caracterizado pelo planeta Urano
(tradicionalmente, por Saturno) e pelo elemento ar. Não há mitos
evidentes relativos à constelação. O deus Hapi, vertendo água de
dois jarros, era um símbolo antigo do rio Nilo, enquanto que o deus
sumeriano Ea era, às vezes, chamado de “o deus com jatos de água”.
O nome babilónico de Aquário, Gula, era, inicialmente, associado
com a deusa do parto e da cura.
PEIXES - O signo é caracterizado pelo planeta Netuno (tra-
dicionalmente, por Júpiter) e pelo elemento água. A história mitoló­
gica da constelação é a seguinte: apavorados com o gigante Tifão,
Afrodite (Vênus, para os romanos) e Bros (Cupido, para os roma­
nos), atiraram-se ao rio Eufrates e transformaram-se em peixes;
Atená (Minerva, para os romanos), em lembrança do fato, colocou
os peixes no céu. Entre os babilônios, a constelação era conhecida
como Khun, ou as Caudas; também a conheciam como a Correia, à
qual estavam atadas as duas deusas-peixe, Simmah e Anunitum.

OS SIGNOS E A ESCALADA INICIÁTICA


MAÇÔNICA

Os signos zodiacais mostram estreita relação mística com as


sucessivas mortes e ressurreições anuais da natureza, simbolizadas
pelo ciclo imutável dos vegetais - das lendas de Dumuzi, dos
sumérjanos, e Deméter, dos gregos - e pela ave Fênix36, que renasce

78
Cartilha do Companheiro

das próprias cinzas. Graças a isso, os signos zodiacais, que mostram


as passagens desse ciclo anual da natureza, simbolizam, em Maço-
naria, todo o caminho místico percorrido pelo Iniciado, desde o seu
ingresso, como Aprendiz Maçom, até ao ápice de sua trajetória, no
Grau de Mestre Maçom.
Os signos relacionados com o Grau de Aprendiz são: Áries,
Touro, Gêmeos, Câncer, Leão e Virgem; o signo de Libra é relacio­
nado com o Grau de Companheiro; e os signos relacionados com o
Grau de Mestre são: Escorpião, Sagitário, Capricórnio, Aquário e
Peixes. Analisemos os seis primeiros, para chegar ao sétimo, Libra,
que é inerente ao 2" Grau:
ÁRIES - Representa o fogo construtivo do homem, a força
que estimula o crescimento e o desenvolvimento; é o passo inicial
da renovação da natureza pelo fogo. Por isso, sim boliza o fo g o
interno, o a rd or in con tido d o C an didato à In iciação, à p rocu ra da
Luz.
T O U R O - Representa a matéria na qual se efetua a fecunda­
ção, a elaboração interior, ou seja, natureza pronta para a fecunda­
ção. Por isso, mostra, simbolicamente, que o C andidato, d ep ois de
convenientem ente p rep a ra d o , fo i ad m itid o à p rovas da In iciação.
GÊM EOS - Representa a terra já fecundada pelo fogo, a
vitalidade criadora. Assim, sim boliza o recebim en to da Luz p elo
C andidato.
CÂNCER - Representa o renascimento da vegetação, a seiva
estuante de vida; o traço fundamental é a cautela e a tenacidade.
Por isso, sim boliza a instrução d o In iciado e a a b so rç ã o d o s co n h e­
cim entos iniciáticos, p o r p arte dele.
LEÃO - Representa a ação do fogo externo - o Sol - que
amadurece os frutos; o traço fundamental é o emprego da razão a
serviço da crítica. Simboliza, do ponto de vista iniciático, o juízo
crítico e racional, qu e o In iciad o faz s o b re to d o s os con hecim en tos
qu e adquiriu, apren d en d o, com m étod o, a selecion ar todas aqu elas
idéias qu e lhe pu derem ser úteis.

79
Castellani e Rodrigues

V IRG EM - Representa a esposa virginal do fogo, a colheita


dos frutos maduros; seu traço fundamental é o espirito analítico.
Simboliza, portanto, o aperfeiçoamento do Iniciado, ou seja: depois
d e ter ju lg ad o, racionalm ente, os ensinam entos qu e recebeu, o Inici­
a d o ja p o d e se d ed icar a o esqu ad rejam en to da p ed ra bruta, qu e é o
seu p ró p rio ap erfeiço a m en to m o ra l e espiritual.
LIBRA - Representa o equilibrio entre as forças construtivas
e as destrutivas, ou seja, o fruto na plena maturidade, quando há o
equilibrio entre o viço e o apodrecimento (as forças construtivas e
as destrutivas). Simboliza, portanto, a dualidade d o G rau d e C om pa­
nheiro M açam ; representa o C om pan heiro em plena m aturidade de
sua escalada, p ron to a desenvolver to d o o seu poten cial d e trabalho.

NOTAS

32 Na realidade, existem duas constelações, oficialmente não classificadas


como zodiacais, mas que entram na faixa zodiacal. Uma é Ofíúco
(Serpentario), que tem uma grande parte introduzida entre Escorpião e
Sagitário; a outra é Cetus (Baleia), que também se aproxima da eclíptica,
de maneira que os principais planetas podem passar por ela. Elas são
conhecidas há muito tempo, pois já eram relacionadas por Ptolomeu, em
seu catálogo de estrelas (150 d. C.). Os astrólogos, geral mente, não as
consideram significativas, embora uma minoria sustente que o zodíaco
astrológico deveria ser aumentado para 14 signos, para conter essas
duas constelações. Isso, porém, é irrelevante, pois, astrológicamente, as
constelações não têm importância primária, servindo como nomes para
os signos astrológicos fixos, com poderes simbólicos.
” Urano, Netuno e Plutão não eram conhecidos, na Antiguidade. Por isso
é que se falava em sete ‘‘planetas’', que eram os cinco planetas (fora a
Terra) e mais o Sol e a Lua.
33 Os centauros, na mitologia grega, eram seres fabulosos, metade homem
(na parte superior) e metade cavalo (na inferior). Eram filhos de íxion e
Nefeli e os antigos supunham que eles vivessem nas montanhas da Tessilia,
em estado selvagem e de libertinagem. Quíron era, pelo que se entende,
um centauro diferente dos demais, até pela filiação.

80
Cartilha do Companheiro

35 Pã, na mitologia grega, era o protetor dos caçadores. F.ra representado


como uma figura metade homem (do quadril para cima) e metade bode
(do quadril para baixo), possuindo cornos, como símbolos de sua força.
Era sempre representado com uma flauta, com a qual controlava os
seres da floresta. As ninfas eram deusas menores, que encarnavam as
forças vitais da natureza e protegiam os rios, bosques, montanhas e
florestas.
36 Embora sendo uma figura mitológica, a Fênix é representada por uma
ave que morre e renasce das próprias cinzas. A lenda refere que, quando
sentia próximo o seu fim, ela juntava um monte de madeira e palha seca
e o expunha aos raios solares, para que ardesse; em seguida, atirava-se
nas chamas. Da medula de seus ossos calcinados, nascia, então, um novo
pássaro, renovado e rejuvenescido. Graças a isso, a Fênix é o símbolo da
imortalidade da alma e, também, do caráter cíclico dos acontecimentos.
Ainda pela sua característica, ela representa, para a alquimia, a regenera­
ção eterna da vida universal.

81
Castellani e Rodrigues

82
Cartilha do Companheiro

O Misticismo do Grau —VI


Numerologia

OS NÚMEROS NA MÍSTICA HEBRAICA

Os hebreus consideravam cerros números corno sagrados e


outros como nefastos, mas to d o s eles vinculados à ideia do cosm os
e da divindade. Para os números fundamentais, existe uma grande
carga de atributos místicos:
ZERO - é símbolo da Eternidade, do não ser, e simboliza
tudo o que existe em estado latente e potencial. E, também, o sím­
bolo da morte, quando as forças vitais são transformadas. Repre­
sentado pelo círculo, simboliza o infinito, o universo, o todo.
UM - unidade indivisível é o símbolo de Deus, princípio e
fundamento do universo, sendo, por isso, considerado um número
sagrado. Significa o princípio ativo, a primeira manifestação da
energia criadora. Chamado de “o pai dos números”, é, também,
símbolo do Sol, que foi o primeiro dos deuses da humanidade,
antropomorfizado, ou não.
DOIS - símbolo do conflito de forças antagônicas, é conside­
rado um número nefasto, já que representa a dualidade, o ser e o
não ser, a grande dúvida existencial humana. Tal dualidade, basea­
da nos textos cabalísticos, não é referente ao corpo e à alma, mas,
sim, à dúvida entre existência e não existência. O número dois
simboliza, também, a dualidade positiva-negativa de tudo o que

83
Castellani e Rodrigues

existe, pois cada elemento, na natureza, tem o seu oposto: luz e


sombra; calor e frio; vida e morte; espírito e matéria.
TR ÊS - representado, graficamente, por um triângulo, é o
símbolo da síntese espiritual e a fórmula para a criação de cada um
dos mundos. Considerado um número perfeito, de grande significado
místico, é um dos números sagrados, já que representa a tríade
divina no processo de sua manifestação, a qual tem três atributos
fundamentais: criação, conservação, destruição. Como número per­
feito, ele surge, em diversas passagens dos textos bíblicos; três eram
os filhos de Noé, três, os varões que apareceram a Abraão, três, os
amigos de Jó , três, os dias de jejum dos judeus desterrados.
Q U A TRO - representado, graficamente, pelo quadrado e
pelo cubo, ou pela cruz de quatro ramos iguais, é considerado um
número cósmico, já que quatro eram os elementos tradicionais - ar,
água, terra e fogo - , quatro, as extremidades do mundo (representa­
das pelos quatro pontos cardeais), quatro, as estações e quatro, as
bestas do apocalipse. Esotéricamente, o número quatro simboliza o
caminho da realização espiritual.
CINCO - é considerado um número hominal, ou número do
Homem - cuja representação gráfica é a estrela de cinco pontas, a
Estrela Hominal —já que é referente aos cinco aspectos do ser hu­
mano: físico, emocional, mental, anímico e consciente, A idéia
central que o cerca é a do quinto elemento - que seria a quintessência
dos alquimistas - agindo sobre os quatro elementos da matéria. Ele
pode, também, ser representado por uma pirâmide, na qual cada
uma das bases simboliza uma área do conhecimento humano: ciência,
filosofia, arte e religião, enquanto que o ápice representa O conheci­
mento integrado de todas as áreas.
SEIS - é o símbolo do equilíbrio, da união entre espírito e
matéria, E representado pela união de dois triângulos equiláteros -
o positivo, do fogo, e o negativo, da água - os quais formam a
estrela de seis pontas, estrela hexagonal, também conhecida como
estrela de David (magsen David), que é o emblema da tríade espiritual

84
Cartilha do Companheiro

e da tríade material, unidas pela consciência (V. Estrela de Seis


Pontas, no capítulo “Painéis” ).
SETE - sendo o produto da união do ternario espiritual com
o quaternário material, era um número sagrado, para todos os povos
da Antiguidade, que lhe atribuíam grande valor astrológico e mágico:
sete eram os planetas conhecidos pelos antigos, sete, as notas musi­
cais, sete, as cores do arco-íris, sete, os pecados capitais, sete, as
esferas planetárias tradicionais, sete, os dias da criação. O povo
hebreu também o considerava sagrado: Deus santificou o sétimo
dia, sete eram os braços do candelabro (menorá), sete, os pães
ázimos, sete, os dias de consagração dos sacerdotes. A expressão
“sete vezes sete”, encontrada em muitas passagens bíblicas, indica
um indefinido número de vezes, o qual se entende perfeito e total.
O ITO - é o símbolo do Logos, ou do poder criativo univer­
sal; graças à sua forma, representa, também, o perene movimento
em espiral dos céus. A melhor representação gráfica dc seus atributos
é o caduceu de Hermes (Mercúrio, para os romanos), onde as duas
serpentes entrelaçadas, lembrando um oito, simbolizam o equilíbrio
dinâmico entre as duas forças opostas (masculina e feminina).
NOVE - encerrando a série numérica, antes do retorno à
unidade, é o número simbólico da Humanidade: nove meses leva o
homem para nascer e seu corpo tem nove orifícios, através dos
quais ele se comunica com o mundo. E o número de Adão.

NO GRAU DE COMPANHEIRO

Todos esses números estão ligados, em geral, com todos os


Graus Maçônicos e com a doutrina maçônica; mas alguns ligam-se,
especificamente, a um determinado Grau. No Grau dc Companheiro,
há dois números nessas condições:
DOIS - é o número místico do Grau de Companheiro Maçom,
onde interessa a dualidade do Ser e do Não Ser. Importa, também,
nesse caso, o dualismo - em oposição ao monismo - que é o termo

85
Casíellani e Rodrigues

que se aplica a todo sistema filosófico, ou religioso, que tenha seu


fundamento na coexistência de dois princípios opostos: o bem e o
mal, a luz e as trevas, o espírito e a matéria, e assim por diante.
CINCO - representado graficamente pela estrela pentagonal,
ou pentagrama, que é a Estrela Hominal dos pitagóricos, e simbo­
lizando os cinco aspectos do ser humano, é número ligado, fisica­
mente, ao Grau de Companheiro Maçom: cinco passos, cinco to­
ques, cinco luzes iluminando o templo, idade simbólica de cinco
anos. Embora, nesse caso, possa ser notada uma certa influência da
numerologia pitagórica, a que prevalece é a hebraica.
Considerando-se, porém, que a Estrela Hexagonal é a Estrela
Flamejante, para o Rito de York, deve-se incluir, aqui, também o
número SEIS, cuja representação gráfica é a estrela e cujo significado
é o equilíbrio entre o espírito e a matéria, como ocorre com a posição
do Esquadro e do Compasso no Grau de Companheiro (ver o capítulo
C onjun to E sq u a d ro -C o m p a sso - P osição n o Grau).

86
Cartilha do Companheiro

Coloridor do G rau

SINAIS

Como em qualquer dos outros Graus, os Sinais são dois: o de


ordem e a saudação, que os Rituais e instruções mostram como
devem ser feitos.
O Sinal de ordem, geralmente, é composto de dois movimentos
simultâneos - embora existam Ritos, em minoria, que usam apenas
um movimento - sendo um feito com a mão e braço direitos, que
compõem o sinal cordial, e outro feito com a mão e braço esquer­
dos, que compõem o sinal de súplica. O antebraço direito, em
posição horizontal, simboliza o Nível, enquanto que o antebraço
esquerdo, em posição vertical, simboliza o Prumo. Os dois ante­
braços - Prumo e Nível - juntos, formam um Esquadro.
O primeiro movimento do Sinal de ordem é chamado de
Sinal cordial, porque é feito sobre a região do coração. O segundo
movimento, o Sinal de súplica, é alusivo à passagem bíblica em
que Josué, em batalha contra os amorreus, que sitiavam Gabaon,
suplicava que o sol parasse, para que os seus comandados batalhas­
sem à luz do dia e conseguissem a vitória. A história está no seguinte
texto:

Josué falou a o Senhor no dia em que ele entregou os amorreus


nas mãos dos filhos de Israel, e disse em presença dos israelitas:
“Sol, detém-te sobre G abaon, e tu, ó lua, sobre o vale de A jalon”.

87
Castellani e Rodrigues

E o s o l parou e a lua. não se moveu, até que o p ov o se vingou de


sem inimigos. Isso acha-se escrito no Livro d o Justo'17. O sol
parou no m eio do céu e não apressou a pôr-se pelo espaço de
quase um dia inteiro. N ão houve, nem antes nem depois, um dia
com o aquele, em que o Senhor tenha obedecido à voz de um
hom em , porqu e o Senhor com batia por Israel. D epois disto,
Josu é, com toda a sua tropa, voltou para o acam pam ento de
Galgala. (JOSUÉ, 10 - 12 a 15}

Para descarregar o Sinal, o Obreiro desfaz, simultaneamente,


o Sinal cordial e o Sinal de súplica. Para a saudação, todavia, basta
o primeiro movimento, feito com a mão e braço direitos e que lembra
o juramento simbólico do Grau, pois é um contrassenso compor e
desfazer, rapidamente, os dois movimentos, principalmente quando
um Oficial, por dever de ofício, deve conduzir algum instrumento
de trabalho, ao circular pelo Templo.

PALAVRAS

No Grau existem as Palavras Sagrada e de Passe.


A Palavra Sagrada é o nome de uma das colunas do pórtico
do templo de Jerusalém - o primeiro, edificado pelo rei Salomão,
no século X a, C. - mais precisamente a da esquerda. Como a outra
coluna, B O A Z iS, homenageava um ancestral de David, o qual tinha
esse nome, J ACHIN (ou IACHIN} era, provavelmente, um alto
sacerdote, já que os hebreus haviam herdado esse costume do antigo
Egito, onde eles viveram durante cerca de 400 anos. Existem, porém,
correntes místicas, que defendem a ideia de que os dois nomes -
lidos da direita para a esquerda, que é o sentido da escrita hebraica
- formam uma frase propiciarória, ou de dedicação do templo a
Deus: como “jachin” significa “estabelecer, levantar, erigir” e “boaz”
significa “nele esta a força, a firmeza”, a frase seria “Deus estabe­
lecerá com firmeza o reino de David na Terra”. A hipótese mais
provável, porque não é fantasista, é a primeira w.

as
Cartilha do Companheiro

A Palavra de Passe é devida a uma passagem bíblica, narrada


no seguinte te x to , que trata da luta dos efraim itas co n tra os
galaaditas, liderados por Jefté:

Os efraimitas, su bleván dose, passaram a Safon e disseram a


Jefté: “Por que saíste a com bater os am onitas, sem nos cham ar
para irmos contigo? Por isso, vamos queim ar a tua ca sa”, je fté
respondeu: “Eu e meu p ov o tivemos graves contendas com os
amonitas; chamei-vos e vós não me livrastes de suas mãos. "Vendo
que n ão vínheis em meu so corro, arrisqu ei a m inha vida,
m archando contra os am initas; e o Senhor entregou-os nas
minhas mãos. Por que, pois, vindes contender com igo?

Jefté reuniu todos os hom ens de G alaad e com bateu contra


Efraim. Os habitantes de G alaad derrotaram os de Efraim, que
lhes haviam dito: “Vós sois fugitivos de Efraim, que habitais
entre Efraim e M anasses!”.

G alaad ocupou os vaus do Jord ã o e, cada vez que um fugitivo


d e Efraim queria passar, perguntavam-lhe: “És tu efraimita? ”,
ele respondia: “N ã o ”. Diziam eles, en tão: “Pois bem , diz
“sh ib olet””; e ele dizia “sibolet”, não poden do pronunciar cor­
retamente. Prendiam-no logo e o degolavam junto dos vaus do
Jordão. N aquele dia pereceram quarenta e dois mil hom ens de
Efraim. (JUIZES, 12 - 1 a 6)

A Palavra significa num erosos com o grãos de trigo e é sim­


bolizada por uma espiga de trigo à beira de uma queda d’água.

TOQUE

O Toque de reconhecim ento é dado de acordo com o núm ero


do G rau, sobre a primeira falange do indicador do Cobridor. O
procedim ento todo é similar ao do Grau de Aprendiz.

MARCHA

A M archa, geralmente, é feita, inicialmente, com os passos e

89
Castellani e Rodrigues

Sinal de Aprendiz, passando-se depois - sem fazer qualquer saudação


- aos passos complementares do 2° Grau, com o respectivo Sinal,
fazendo-se a saudação ao encerrar a Marcha.
Ao contrário dos passos de Aprendiz, que são dados em linha
reta, os de Companheiro saem da reta - que, na entrada, correspon­
de ao equador do templo - e voltam a ela40. Isso significa que o
Companheiro, mais evoluído do que o Aprendiz, é senhor de outros
caminhos e sabe voltar ao caminho da retidão, O passo oblíquo
tanto pode ser dado para a direita quanto para a esquerda, pois essa
variação demonstra, também, a versatilidade do Companheiro, em
seu discernimento.
Nos Ritos Escocês, Moderno, Adonhirantita e Brasileiro, a
marcha é feita dessa maneira, só variando o pé com que ela é rom­
pida (esquerdo, no Escocês e no Brasileiro, e direito, no Moderno e
no Adonhirantita). Já no Rito de York é dado o segundo passo regular
na Franco-Maçonaria, com o Sinal do 2° Grau, depois de ser dado
o primeiro passo regular, com o Sinal do I o Grau. E no Rito Schròder
não há Marcha padronizada: entra-se com passos normais.

ACLAMAÇÃO E BATERIA

No Grau de Companheiro a aclamação, variável de Rito para


Rito - e alguns nem a possuem - é igual à do Grau de Aprendiz.
A batería simples é feita de acordo com o número do Grau,
acrescentando-se duas batidas à batería de Aprendiz M açom, consi­
derando-se as diferenças de intervalos das batidas, existentes entre
os diversos Ritos.

NOTAS

17 O Livro do Justo é uma coleção de cantos patrióticos, hoje perdida.


ílf Embora muitos Rituais consignem a forma BOOZ, ela é errada, pois é

90
Cartilha do Companheiro

inexistente, em hebraico. Boaz, antepassado de David e de Salomão, era


filho de Salmón e esposo de Ruth.
39 Nos Ritos Moderno e Adonhiramira, há uma inversão e Boaz é a palavra
do 2a Grau.
40 É errado dar um passo para um lado e outro para o lado oposto, sem
voltar, portanto, à linha reta dos passos de Aprendiz (a linha do equador).
Fala-se em linha do equador, porque, sendo, o Templo Maçôníco, uma
seção da superfície da Terra, as duas colunas vestibulares marcam a pas­
sagem dos trópicos de Câncer (ao norte) e de Capricórnio (ao sul), tendo,
ao centro, o equador.

91
Castellani e Rodrigues
Cartilha do Companheiro

Decoração da Loja e Paramentos

A LO JA É SEMELHANTE À DO APRENDIZ

A decoração da Loja no 2" Grau é feita como no V Grau,


variando, apenas, o número de luzes que o iluminam: são cinco,
sendo três no Oriente (sobre o Altar), uma no Ocidente (na mesa do
I o Vigilante) e uma no Meio-dia, ou Sul (na mesa do 2" Vigilante)41.
Nos Ritos em que o 2" Vigilante ocupa posição similar ã do 1”,
pode-se dizer que existem três luzes no Oriente c duas no Ocidente
(ou, mais precisamente, uma ao noroeste e outra ao sudoeste). Deve-se
recordar que o Rito em que, realmente, o I o Vigilante ocupa posição
ocidental, exatamente de frente para o Venerável Mestre, sem pender
nem para o Norte e nem para o Sul, é o York.
Convém recordar que, no Grau de Aprendiz, as luzes que
iluminam a Loja são três: uma no Oriente, uma no Ocidente e uma
no Meio-dia.
As Colunas vestibulares serão sempre exteriores. O Pavi­
mento M osaico ocupa todo o solo da I.oja e, no centro do recinto,
fica o Painel do Grau, aberto sempre no Grau em que a Loja está
funcionando.

PARAMENTOS

O Avental, como no Grau de Aprendiz, é de pelica branca,

93
Castellar!i e Rodrigues

mas tem a abeta abaixada; em alguns Ritos, ele pode ter urna fina
orla azul (York e Schroder).
Ele lembra o Avental de couro usado, como proteção para o
corpo, durante o esquadrejamento da pedra bruta, pelos canteiros
medievais (trabalhadores em cantaria, esquadrejadores). No Apren­
diz, que, simbolicamente, se dedica a esse trabalho, ele tem a abeta
levantada. R ealizand o, o C om panheiro, um trabalho menos
traumatizante, pois está completo o esquadrejamento da pedra in­
forme, já não necessita da mesma proteção física dada ao Aprendiz,
O Avental é o símbolo do trabalho, em todas as suas formas, mas
foi no I o Grau que ele adquiriu o máximo significado, diante do
trabalho atribuído, simbolicamente, ao Aprendiz; aí, ele é o verda­
deiro Avental Maçônico, cuja cor branca simboliza a pureza. Foi só
durante o século XVIII que começaram a surgir os Aventais com
ornamentos distintivos de Graus e cargos.
Como o Avental do Grau de Aprendiz, o do Companheiro
também passou por exegeses místicas. Convém, para que seja com­
preendida essa adaptação mística, lembrar o misticismo que envolve
o Avental de Aprendiz, segundo duas correntes de ocultistas:
Segundo uma das interpretações místicas, acreditava-se, an­
tigamente, que a sede das emoções humanas era o epigástrio (“boca
do estômago” ), onde se encontra o importante plexo solar. Estando
levantada, a abeta do Avental cobriria essa região, impedindo que
as emoções do Aprendiz, ainda incontroladas, pudessem perturbar
os trabalhos.
Segundo a outra interpretação, o Avental do Aprendiz é com­
posto de duas partes: uma quadrada, formada pelo corpo da peça, e
outra triangular, formada pela abeta levantada, correspondente, em
visão estereoscópica, ou tridimensional, à Pedra Cúbica com ponta.
O quadrado simboliza a matéria, a obra física realizada pelo obreiro,
enquanto que o triângulo é a representação do espírito, que atua
sobre a matéria, para a concretização da obra. E, também, no caso,
não ha veria a integração do espírito com a matéria.

94
Cartilha do Companheiro

Já no Companheiro, mais aperfeiçoado, dizem os exegetas


místicos, existe a integração do espírito com a matéria, com o tri­
ângulo da abeta inserido no quadrado do corpo do Avental.

NOTA

41 Deve-se evitar o uso do termo “altar’7 para qualquer uma das mesas de
Dignidades e Oficiais (Vigilantes, Orador, Secretário, Chanceler, Tesou-
- reiro) pois Altar é só um, colocado no Oriente, ao qual tem assento o
Venerável Mestre. As outras são apenas mesas. Não se justifica, também,
um hábito que tem encontrado muitos adeptos no nosso meio maçônico,
que é o de fazer mesas triangulares; é uma verdadeira mania achar que
tudo o que é maçônico tem que ser triangular. Mesas são retangulares!
Triangular, no Templo é só o Deita radiante.

95
Castellani e Rodrigues
Cartilha do Companheiro

Conjunto EsquaJro-Compasso
Posiçao no Grau

SIMBOLISMO DO COMPASSO E DO ESQUADRO

Instrumentos necessários aos projetos de construção, o Es­


quadro e o Compasso possuem, em M açonaria, em todos os Ritos,
o mesmo significado, simbólico: o Esquadro simboliza a retidão
nas ações e o Compasso representa o comedimento nas buscas. Eso­
téricamente, todavia, o esquadro representa a matéria, ou o corpo
físico, enquanto que o compasso simboliza a mente, ou o espírito.
E, na interpretação cósmica, que mostra influência dos antigos
mitos solares, o compasso simboliza o Sol e o esquadro representa
a Terra.
Os dois instrumentos, em conjunto, entrelaçados e opostos
pelo vértice, são colocados sobre o Livro da Lei, ou Livro das Sa­
gradas Escrituras42, com o qual compõem as Três Grandes Luzes
Emblemáticas da M açonaria. Dependendo do Grau Simbólico em
que a Loja irá trabalhar, varia a posição de um instrumento em
relação a outro; assim, no Grau de Aprendiz M açom , os ramos do
Esquadro ocultam as hastes do Compasso, enquanto que, no Grau
de Companheiro, uma das hastes do Compasso está livre, colocan­
do-se sobre um ramo do Esquadro.

97
Castellani e Rodrigues

INTERPRETAÇÃO DAS POSIÇÕES

Cada uma das posições é revestida de um significado simbó­


lico. Considerando o significado esotérico do esquadro e do com ­
passo, há a seguinte interpretação mística, de acordo com o Grau:
no primeiro Grau, o Esquadro ocultando as hastes do Compasso,
significa que, no Aprendiz, ainda imperfeito e no início de seu ca­
minho em direção à Luz, a materialidade suplanta a espiritualida­
de; no segundo Grau, os instrumentos entrecruzados, com o Com­
passo tendo uma das hastes livre, simbolizam a evolução do Inicia­
do e mostram que, no Companheiro, já há um equilíbrio entre a
materialidade e a espiritualidade, à espera do triunfo desta, no Grau
de Mestre Maçom.

Há, porém, uma interpretação dita racion al, não mística:


no Grau de Aprendiz, as hastes do Compasso, presas sob os ramos
do Esquadro, simbolizam a mente humana, ainda subjugada pelas
paixões, pelos preconceitos e pelas convenções sociais, sem a neces­
sária liberdade para pesquisar e procurar a Verdade; no Grau de
Companheiro, libertando-se uma das hastes do Compasso. Isso sig­
nifica que o Iniciado já tem uma certa liberdade de raciocínio e está
no caminho da Verdade.
A Verdade, aí simbolizada, pode, também, ser interpretada
do ponto de vista místico, ou do ponto de vista material, físico. Na
interpretação mística, transcendental, a Verdade simbolizada pelas
hastes livres do Compasso, é a Verdade Divina, o atributo da mais
alta espiritualidade, só reconhecido na divindade, enquanto que a
Verdade simbolizada pelas hastes presas do Compasso, é a Verdade
humana, demonstrada como imperfeita, rústica, instável e subjuga­
da pelos preconceitos. Na interpretação racional, a Verdade conti­
da nas hastes livres do Compasso é a Verdade sempre renovada da
evolução científica, do raciocínio livre e do espírito crítico, que dá,

98
Cartilha do Companheiro

ao homem a liberdade de escolher os seus padrões morais e espirituais,


sem um paternalismo, que lhe mostre uma Verdade, imutável e
estática, transformada em transcendental e que, por isso mesmo, é
enigmática e inacessível.

NOTA

u O Livro da Lei, atendendo à diversidade de sistemas religiosos e à


heterogeneidade de crenças, eventual mente existente, entre os Obreiros
de uma Loja, pode ser a Bíblia, a Torá, o Corão, ou outros textos consi­
derados sagrados para as comunidades teístas. Lojas cosmopolitas, que,
habitualmente, recebem Obreiros de diversas partes do mundo e adeptos
dos mais diversos sistemas religiosos, costumam ter todos esses livros,
para satisfazer à crença de todos. Ritos ditos racionais como o Moderno
- costumam colocar, sob o conjunto Esquadro-Compasso, a Constituição
de Anderson (a original, de 1723), embora a Bíblia deva estar presente,
também. Registre-se, todavia, para que não permaneçam dúvidas, que a
Maçonaria não é, de maneira alguma, uma religião e nem prioriza uma
determinada religião em detrimento de outras, aceitando a todas elas,
indistintamente.

99
Castellani e Rodrigues

100
Cartilha do Companheiro

O s P ain éis

O PAINEL SIMBÓLICO

O Painel Simbólico do Grau de Companheiro Maçom c muito


parecido com o de Aprendiz, com algumas pequenas variações.
As semelhanças entre os dois Painéis são:
As duas Colunas vestibulares, ladeando o pórtico da entrada
do Templo;
As três janelas, que simbolizam as três etapas do dia, de
acordo com a marcha do Sol: aurora, meio-dia e crepúsculo;
A Pedra Bruta, a Pedra Cúbica e a Prancheta, que são os
materiais de trabalho, respectivamente, do Aprendiz, do Compa­
nheiro e do Mestre;
O Malho e o Cinzel, instrumentos necessários ao trabalho de des­
bastar a Pedra Bruta, inerente, simbolicamente, ao Grau de Aprendiz;
O Esquadro entrelaçado com o Compasso, simbolizando
o Venerável Mestre;
O Nível M açônico, simbolizando o I o Vigilante;
O Prumo, ou Perpendicular, simbolizando o 2" Vigilante;
O Sol e a Lua, as duas grandes luminárias terrestres, que,
além de representar o dia e a noite, simbolizam o Orador e o Secre­
tário, respectivamente;
A Corda de Nós - simbolizando a união que deve existir
entre Maçons - interrompida, ou aberta, em borla, junto à entrada,
indicando o caráter evolutivo da Maçonaria, sempre aberta às novas

101
Castellani e Rodrigues

idéias que possam contribuir para o aperfeiçoam ento do ser


humano;
A Orla Denteada, símbolo dos opostos e, também, da sabe­
doria, da moral e da ética da doutrina maçônica, penetrando nas
trevas da ignorância e dos maus costumes; simboliza, também, o
princípio da atração universal, que faz com que ao Maçons reú-
nam-se nas Lojas, para aprender a doutrina maçônica e difundi-la;
Constelações, que simbolizam a abóbada celeste, à qual se
tem acesso, simbolicamente, através da escada de Jacob; representa,
também, o universo e o caráter universal da Maçonaria.
As diferenças fundamentais são:
Ao invés de três degraus de acesso ao pórtico, existem cinco,
o que é uma alusão ao número do Grau;
O Esquadro e o Compasso estão na posição do Grau de
C om panheiro;
Entre as hastes do Compasso e os ramos do Esquadro, encon­
tra-se a Estrela Flamejante, com a letra G, de G EO M ETRIA , em
seu centro;
Surgem outros instrumentos de trabalho, como a Alavanca e
a Régua, inerentes ao 2o Grau;
Aparece o Pavimento Quadriculado, ou Mosaico, símbolo
dos opostos (primordialmente, o bem e o mal e o espírito e a matéria);
o P avim en to M o sa ico , a O rla D en tead a e a E strela F lam ejan te
s ã o os orn am en tos d a L o ja d e C om p an h eiro.
Surgem a espada e a colher de pedreiro, lem brança da
passagem bíblica da construção do segundo templo de Jerusalém
(chamado templo de Zorobabcl), quando os obreiros trabalhavam
com a colher em uma das mãos e a espada na outra, para enfrentar
os seus inimigos.

O PAINEL ALEGÓRICO

O Painel alegórico é de origem inglesa43 e mais aplicável,

102
Cartilha do Companheiro

logicamente, ao Rito de York, embora tenha sido adotado por ou­


tros Ritos.
Nele, podem ser vistas as duas colunas vestibulares Jachin
e Boaz, no pórtico de entrada do que seria o templo de Jerusalém, e,
na parte externa, a figura de uma espiga de trigo - mais propria­
mente, um pé de trigo, com suas espigas - e de uma queda d’água.
A espiga de trigo é o símbolo do trabalho e lembra, também, a
Palavra de Passe do Grau. A queda d’água representa a Fonte da
Vida, citada em diversas passagens bíblicas, tanto no Velho quanto
no Novo Testamento:

O botn-senso é a fon te da vida para quem o possui; o castigo


dos insensatos é a loucura - Livro dos Provérbios, 16 - 22.

Está feito! Eu sou o Alfa e o Omega, o princípio e o fim. Àquele


que tiver sede, dar-lhe-ei a beber, gratuitamente, da fon te da
água da vida. - Apocalipse, 21 - 6.

Jesus retorquiu: Quem bebe desta água voltará a ter sede; mas
quem b eb er da água que eu lhe der jantais terá sede, porqu e a
água que eu lhe der tornar-se-á nele uma nascente de água a
jorrar para a vida eterna - Evangelho de São João, 4 - 13 e
14.

À entrada, junto à parte interna, está a figura do obreiro, de


frente para o pórtico e de costas para uma grande escada-caracol,
sobre um Pavimento Mosaico, que ocupa todo o solo. No topo da
escada, há uma porta, que é a entrada do Santo dos Santos tendo,
no alto, a figura de uma pomba e o tetragrama hebraico - iôd, hé,
vav, hé - que é o nome de Deus. Bem no alto de todo o conjunto,
encontra-se uma estrela de seis pontas, com a letra G em seu cen­
tro: é a “blazing star” (Estrela Flamejante) do Rito de York.
O simbolismo da pomba entra naquele dos pássaros, em geral.
Em todas as escolas esotéricas, ou religiões, o pássaro tem impor­
tantes significados simbólicos. Como todos os seres alados, ele é o

103
Castellani e Rodrigues

emblema da espiritualidade e da alma humana. Nas escolas


místicas, representa, também, hierarquias angelicais, espíritos ou
forças espirituais, destinadas, geralmente, a auxiliar o homem. Para
os alquimistas, ele simboliza as energias em atividade. Por sua ca­
pacidade de viver na terra e nos ares, os pássaros possuem um outro
significado universal: são considerados os mensageiros dos deuses,
ou seja, intermediários aptos a estabelecer uma ponte entre o céu e
a terra. No caso do Painel Maçônico, a pomba representa a espiritua­
lidade, copiando, do catolicismo, a figura simbólica do Espírito
Santo.
A estrela de seis pontas é form ada por dois triângulos
equiláteros entrelaçados e opostos pelo vértice. Associada, também,
ao judaísmo, como “estrela de David” (Magsen David), é todavia
um símbolo bem mais antigo, remontando, praticamente, ao fim da
pré-história e início da idade dos metais, por volta de 6000 a. C.
(ver item A Estrela d e Seis Pontas c o m o Estrela Flam ejante, no
capítulo M isticism o d o G rau - II).

A ESCADA-CARACOL

A escàda-caracol, ou escada em caracol (em espiral), mereceu


não apenas um estudo especial, mas até um destaque do Painel,
passando, muitas vezes, a ser tomada com um novo Painel. Ela
nasceu de alterações do Painel original; este mostrava a escalada
iniciática simbólica do obreiro, até a entrada do Santo dos Santos
do templo de Jerusalém, situada no topo da escada. Mas, por muitas
imitações e reproduções, seguidas, obviamente, por deturpações,
acabou surgindo a figura da escada-caracol isolada, como um
detalhe do Painel original.
Essa figura mostra a escada, que se inicia no solo totalmente
recoberto pelo Pavimento Mosaico, estendendo-se até a figura de
uma paisagem iluminada pelo Sol (bem ostensivo na figura), a qual
toma o lugar da porta de entrada do Santo dos Santos do Painel

104
Cartilha do Companheiro

original. O primeiro lance da escada possuí um corrimão, sustentado


por cin co Colunas, representantes das cinco grandes ordens
arquitetônicas; dórica, jónica, corintia, compósita e toscana.
A escada em caracol também é uma alegoria de origem
bíblica:

A porta do an dar inferior encontrava-se d o lado direito d o


edificio. Sabia-se p o r uma escada em espiral a o andar d o m eio e
deste a o terceiro - Reis I, 6-8.

Ela é composta de três lances, com três, cinco e sete degraus,


respectivamente, a partir do solo. O primeiro lance, de três de­
graus, caracterizados pelo Prumo, o primeiro, pelo Nível, o segundo
e pelo Esquadro, o terceiro, simbolizam, respectivamente, os Graus
de Aprendiz, Companheiro e Mestre. Os cinco degraus seguintes
simbolizam os cinco sentidos humanos: audição (ouvir), o primeiro;
visão (ver), o segundo; tato (apalpar), o terceiro; olfato (cheirar), o
quarto; e paladar (provar), o quinto. Os sete degraus do terceiro e
último lance, simbolizam as sere artes liberais da Antiguidade: Gra­
mática, o primeiro; Retórica, o segundo; Lógica, o terceiro; Arit­
mética, o quarto; Geometria, o quinto; Música, o sexto; e Astrono­
mia, o sétimo. Ela simboliza o caminho tortuoso que o Iniciado
deve trilhar, para atingir a Luz: é um caminho em que é necessária
a cultura, o conhecimento, o equilíbrio, a retidão, a dialética e a
harmonia, sugeridas pelas sete artes.
E essa Luz é representada pela figura do Sol. Ponto focal e
centro do nosso sistema planetário, o Sol é o símbolo material-
-espíritual por excelência da divindade. Sua luz, do ponto de vista
místico, pode ser considerada como a manifestação visível do Deus
criador, que sustenta e conserva todas as formas de vida. Ele é,
também, o símbolo do Ser Real Interior de cada homem, ou seja, da
vitalidade, da vontade e dos sentimentos nobres como a lealdade.
As cinco Colunas são os pilares que, simbolicamente, sustentam

105
Castellani e Rodrigues

a Loja de Companheiro (as três primeiras, dórica, jónica e corintia,


sustentam a Loja de Aprendiz).
A Coluna dórica, sem base, tem um aspecto simples, mas de
forma bastante convincente. Já que a função principal de uma colu­
na é erguer-se, suportando o peso de um entablamento, a forma da
Coluna dórica confirma essa função arquitetônica, para cuja reali­
zação, todavia, colaboram alguns recursos sutis: o adelgaçamento
do fuste44, de maneira que, no topo, o seu diâmetro corresponda a 3A
daquele da base; o canelado que divide o corpo da coluna em sul­
cos, mediante profundas estrías verticais, separadas por agudas cris­
tas; e, finalmente, o capitel45, concretizando, com muita originali­
dade, a transição da força ascensional do fuste para o peso do
entablamento. Pela sensação de força que transmite - era o símbolo
da força do homem, na Grécia antiga - ela é a representação do 1°
Vigilante.
A Coluna jónica já apresenta um fuste mais alto e mais belo,
onde existem caneluras cavadas profundamente, separadas por listeis
planos, ao invés de arestas vivas. Além disso, ela apresenta uma
base circular, com bela estrutura, e um complexo capitel, cuja parte
inferior, com um ornamento de óvulos, assenta sobre o fuste; a ela
se seguem volutas, que se estendem, superficialmente, para a direita
e para a esquerda, em almofada arqueada, que se enrola, com força
elástica e tensa, em torno de um eixo. Na Grécia antiga, a sabedoria
era apanágio da mulher, assim como a força era a característica
do homem (a sabedoria tinha uma deusa: Atená, Minerva, para os
romanos); e a Coluna jónica era associada à sabedoria, por lembrar
o talhe feminino. Por isso, ela é a representação do Venerável
Mestre.
A Coluna corintia tem todas as características da jónica, di­
ferindo desta apenas no capitel, que tem uma rica decoração de
folhas de acanto (Acanthus spinosus), com suas gavinhas46. Há uma
lenda em torno dela: o escultor Calimaco (século V a. C.) teria
visto, em Corinto, sobre o túmulo de uma donzela, um cesto coberto

106
Cartilha do Companheiro

por folhas de acanto, que cresciam em torno dele, tendo, então, a


inspiração para com por o capitel corintio. Este, assim tem um núcleo
central, em form a de cesto, em torno do qual há folhas de acanto,
que crescem a partir da base do capitel, com oito gavinhas espiraladas,
nos cantos. Sím bolo da beleza, é a representação do 2" Vigilante.
Compósito designa aquilo que pertence a mais de uma ordem;
em arquitetura, é o capitel, ou a ordem arquitetônica em que entram
elementos jónicos e corintios. Assim, a Coluna compósita tem, em
seu capitel, elementos das Colunas jónica e corintia, enquanto que
o seu fuste e a sua base são iguais aos delas.
Toscana é a mais simples das ordens arquitetônicas rom anas,
sem quaisquer ornamentos; a Coluna toscana, bastante simples, apro­
xim a-se, em sua forma, da Coluna dórica.
Assim, a Loja de Com panheiro é sustentada por três Colunas
de ordens gregas e por duas de ordens romanas.

NOTAS

41 Depois que as duas Grandes Lojas de Londres, a primeira, de 1717 (a


primeira do mundo), e a segunda, de 1751, uniram-se, para formar a
Grande Loja Unida da Inglaterra, em 1813, John Harris, desenhista e
pintor, Iniciado em 1818, recebeu a incumbência de desenhar painéis
representativos de cada um dos três Graus Simbólicos.
Nos primitivos tempos da Franco-Maçonaria, quando os Obreiros reu­
niam-se em tavernas, os Símbolos Maçônicos eram desenhados no chão,
com carvão, ou com giz. Posteriormente, esses desenhos começaram a
ser feitos sobre pedaços retangulares de pano, do qual se originaram o
Tapete, de alguns Ritos, e a Tábua de Delinear (dos Maçons ingleses), ou
Painel. No início, porém, antes da criação da primeira Obediência Maçô-
nica - a Premier Grand Lodge, de 1717 - não havia uniformidade nesses
Painéis, já que as Lojas eram livres.
A primeira tentativa de fixação de Painéis padronizados, para os três
Graus Simbólicos, ocorreu em 1808, através do pintor e gravador William
Dight. L, a partir de 1823, esses Painéis foram aperfeiçoados por Harris

107
Castellar» e Rodrigues

e as figuras líeles comidas tornaram-se tradicionais na Maçonaria inglesa,


sendo adotadas por outras Obediências, inclusive Grandes Lojas prati­
cantes do Rito Escocês Antigo e Aceito. E o que causou essa adoção, que
mais parece uma confusão, foi o fato de os Painéis de Harris terem sido
adotados, logo, pela Grande Loja da Escócia, que os publicou em seu
“Scortish Standard Ritual” (Ritual Padrão Escocês), fazendo com que se
confundisse Rituais escoceses - ou seja, do Rito Escocês Antigo e Aceito
- com Rituais da Escócia, que trabalha no Rito de York.
Os desenhos de Harris foram muito reproduzidos e imitados, o que, em
consequência, acabou provocando alterações e deturpações, chegando-se
aos que hoje são utilizados.
44 Capitel (do italiano: capitello) é, em Arquitetura, a parte superior de
uma coluna, pilastra, ou balaústre; é o remate de coluna, o ornato que
coroa certas obras de marcenaria.
45 Fuste (do latim: fustis = lenha, bordão, bastão, vara) designa a baste, o
corpo, a parte do tronco da árvore desprovida de galhos. Em Arquitetura,
designa o tronco da coluna, ou seja, a região compreendida entre a base
e o capitel.
46 Acanto (do grego ákanthos = espinho), designa a planta espinhosa da
família das Acantáceas; em Arquitetura, é a imitação que se faz das folhas
de acanto, principalmente na decoração do capitel da Coluna corintia,
para distingui-la do capitel jónico.

ROTEIRO BIBLIOGRÁFICO

Muitas das teses comidas nesta obra são frutos de estudos e conclu­
sões pessoais do autor, a partir de informações técnicas, hauridas na literatura
mundial. Nem todas as obras relacionadas a seguir foram utilizadas, mas
constam neste rol como um roteiro para os que desejarem se aprofundar em
algum tema específico, inserido no contexto deste Trabalho.

LIVROS

1. ANKERBERG, J. & WF.LDON, J.. The Secrat Teachings o fth e Masonic


Lodges. Chicago: Moody Press, 1989.
2. ASSIS CARVALHO, E Sím bolos M açônicos e suas Origens. Londrina:
“A TROI.HA”, 1990.

108
Cartilha do Companheiro

3. _____. O Com panheiro Maçom. Londrina: “A TROLHA”, 1992.


4. AY MAR D, A & AUBOYER. L ’O rienl et la G rèce Antique (Hisroire
Genérale des Civilisations - I). Paris, 1953.
5. BOUCHER, J. La Sym bolique Maçonnique. Paris: Dervy, 1953.
6. CASTELLANI, j . Liturgia e R itu alístka d o Grau de C om panheiro
Maçom. S. Paulo: Gazeta Maçônica, 1976.
7. . A M açonaria e m a Herança H ebraica, Londrina: “A TROLHA”,
1993.
8. _____, Origens do Misticismo na M açonana. 2.ed.. S. Paulo: Gazeta
Maçônica, 1995.
9. _____. M açonaria e Astrologia. S. Paulo: Madras, 1997.
1 0 . CHOURAQUI, A. Histoire du judatsme. Col. “Qui sais-je” ?. Paris,
1960.
1 1 . CIRLOT, j . E. A Dictionary o f Symbols. Routledge and Kegan Paul,
1978.
12. DYER, C. Symholism in Craft Freetnasonry. Lewis Masóme. Pliniouth,
1986.
13. LE FORESTIER, R. UO ccuhism e et le Franc-Maçonnerie Ecossaise.
Paris, 1928.
1 4 . ___ . Le Eranc-Maçonnerie Occultiste au X V IIIe Siècle et 1‘Ordre des
Elus Coêns. Paris, 1928.
15. MACKENZIE, D. Egyptian Myth and Legend. New York: Bell Publishing
Co., 1978.
16. NAUDON, P, La Eranc-Maçonnerie et le Divtn. Paris, 1961.
1 7 . PETIT, P. Précis d ’Histoire Ancienne. Paris, 1962.
18. SCHUCHHARDT, W. H. Arqueologia, v. 12 da Enciclopédia Fischer,
traduzido do original alemão Bildende Kunst. Lisboa: Ed. Meridiano,
1972 ( I a Edição portuguesa).
19. SÉROUYA, H. La Kabbale. Paris, 1957.
2 0 . __Le Mysticisme. 2.ed. Paris, 1961.
21. SÉVERYNS, A. G rèce et Orient avant Honière. Paris, 1960.
22 VAROLI FILHO, T. Curso de M açonaria Simbólica, tomo II. São Paulo,
1956.
2 3 . WAITE, A. E. The Secret Tradition in Freemasonry. New York, 1911.
24. WIRTH, O. L e symbolisme Hermétique das ses Raports avec PAlcbimie
et la Eranc-Maçonnerie. Paris, 1931.

109
Castellar!i e Rodrigues

25. ___.. L a Eranc-Maçonnerie Rendue Intelligible à ses Adeptes (II - Le


Compagnon). Paris, 1931
26. ZANIAH. D iccionario Esotérico, Buenos Aires: Kier, 1971.

ARTIGOS

27. D eberes del C om pañero e interpretación de Jas joyas. Arce Chaves, L.


E. in Reflexiones Masónicas. Logia Renovación N° 12. La Paz.
28. O ntologia del G rado de Compañero, in Cuadernos Docentes. Segundo
Grado. Gran Logia de Chile.
29. Interpretación de los Sím bolos M asónicos. Guzmán, E. in Reflexiones
Masónicas. Logia Renovación NL‘ 12. La Paz.

110
Cartilha do Companheiro

O bras do Autor

I - LIVROS

1. Os Maçons que Fizeram a História do Brasil - Edit. A Gazeta Maçôni-


ca - S. Paulo - T ed. 1973; 2a ed. 1989.
2. Shemá Israel... - Edit. A Gazeta Maçônica - S. Paulo - 1977.
3. A Ciencia Maçônica e as Antigas Civilizações - I a ed. - Ed. Rese­
nha Universitaria - S. Paulo - 1977; 2a ed. - Traço Editora - 1980.
4 . Sao Paulo na Década de 30 - Ed, Policor - S, Paulo - 1978.
5. A Maçonaria e sua Política Secreta - Traço Editora - S. Paulo - 1981.
6. Origens do Misticismo na Maçonaria - T’ ed. - Traço Editora - S.
Paulo, 1982; 2a ed. - Ed. A Gazeta Maçônica - 1995.
7. Liturgia e Ritualística do Grau de Aprendiz Maçom - Ed. A Gaze­
ta Maçônica - S. Paulo - T1ed.: 1985; 2a ed.: 1990.
8. A Maçonaria Moderna - Ed. A Gazeta Maçônica - S. Paulo - 1986.
9 . Liturgia e Ritualística do Grau de Companheiro Maçom - Ed. A
Gazeta Maçônica - S. Paulo - 1986.
1 0. Consultório Maçônico I - Ed. “A TROLHA” - Londrina - T' ed.:
1987; 2a ed.: 1990.
1 1. Liturgia e Ritualística do Grau de Mestre Maçom - Ed. A Gazeta
Maçônica - S. Paulo - 1987.
12. José Bonifacio, um Homem Além do seu Tempo - Ed. A Gazeta Ma­
çônica - S. Paulo - 1988.
1 3 . 0 Rito Escocés Amigo e Aceito (História, Doutrina e Prática) - Ed.
“A TROLHA" - Londrina - 1988.
1 4. O Mestre Instalado - Ed. A Gazeta Maçônica - S. Paulo - 1989.
15. Dicionário de Termos Maçônlcos - Ed. “A TROLHA” - Londrina - T1
ed.: 1989; 2a ed.: 1994.

111
Casteílani e Rodrigues

16. A Maçonaria e o Movimento Republicano Brasileiro - Traço Editora


- S . Paulo- 1 9 8 9 .
17. Consultório Maçôuico II - Ed. “A TROLHA” - Londrina - 1990.
18. D icionário Etim ológico M açônico (vol. I: A, B, C) - Ed. “A
TROLHA” - Londrina - 1990.
19. Dicionário Etimológico Maçônico (vol. II; D, E, F, G) - Ed, ‘‘A
TROLHA” - Londrina - 1990.
2 0 . Rito Moderno; a Liberdade Revelada (coautoria com Frederico Gui­
lherme Costa) - Ed. “A TROLHA” - Londrina - 1991.
2 1 . Manual do Rito Moderno (coautoria com Frederico Guilherme Cos­
ta) - Ed. A Gazeta Maçônica - S. Paulo - 1991.
2 2 . Curso Básico de Ritualística - Ed. “A TROLHA” - Londrina - I a
ed.: 1991; 2a ed.: 1994.
2 3 . Origens Históricas e Místicas do Templo Maçônico - Ed. A Gaze­
ta Maçônica - S. Paulo - 1991.
2 4 . Dicionário Etimológico Maçônico (vol. n i: H, I, J , L) - Ed. “A
TROLHA” - Londrina - 1991.
2 5 . 0 Mestre Secreto (coautoria com Francisco de Assis Carvalho) - Ed.
“A TROLHA” - Londrina - 1991.
2 6 . A Conjuração Mineira e a Maçonaria que não Houve (coautoria
com Frederico Guilherme Costa) - Ed. Gazeta Maçônica - S. Paulo -
1992.
2 7 . Consultorio Maçônico III - Ed. “A TROLHA” - Londrina - 1992.
2 8. Dicionário Etimológico Maçônico (vol, IV; M, N, O, P) - Ed. “A
TROLHA” - Londrina - 1992.
2 9 . Cartilha do Aprendiz Maçom - Ed. “A TROLH A” - Londrina -
1992.
30. Os Maçons na Independencia do Brasil - Ed. “A TROLHA” - Londrina
- 1993.
3 1. Historia do Grande Oriente do Brasil (A Maçonaria na Historia
do Brasil) - Ed. e Gráfica do Grande Oriente do Brasil - Brasília - DF -
1993.
3 2. A Maçonaria e sua Herança Hebraica - Ed. “A TROLHA” - Londri­
na - 1993.
33. Dicionário Etimológico Maçônico (vol. V: P, Q, R, S) - Ed. “A TROLHA”
- Londrina - 1994.
3 4. A Cadeia Partida - Ed. “A TROLHA” - Londrina - 1994.

112
Cartilha do Companheiro

35. História do Grande Oriente de São Paulo - Ed. e Gráfica do Grande


Oriente do Brasil - Brasília - 1994.
3 6. As Cores Vermelhas do Rito F.scocês - Ed. “A TROLHA” - Londrina
- 1994.
3 7 . Consultório Maçônico IV - Ed. “A TROLHA” - Londrina - 1994.
3 8 . Dicionário Etimológico Maçônico (vol. VI: T, U, V, X , Y, Z) - Ed.
“A TROLHA” - Londrina - 1995.
3 9 . História da Cisão de 1927 (plaquete) - edição do Supremo Conse­
lho do Brasil para o R.'. E.'. A-'. A.'. - Rio de Janeiro - 1995.
4 0 . Análise da Constituição de Anderson (coauroria com Raimundo
Rodrigues) - Ed. “A TROLHA” - Londrina - 1995.
4 1. Manual Heráldico do Rito Escocês Antigo c Aceito (vol. 1 : Graus
1 a 18) - (coauroria com Cláudio Roque Buono Ferreira) - Ed. A
Gazeta Maçônica - S. Paulo - 199J.
4 2 . Do Pó dos Arquivos - Ed. “A TROLHA” - Londrina - 1995.
4 3 . Amizade: a Primeira Loja M açônica na H istória de S. Paulo
(coauroria com Claudio Ferreira) - Ed. Amizade - S. Paulo - 1996.
4 4 . Os Maçons e a Questão Religiosa - Ed. “A TROLHA” - Londrina -
1996.
45. Do Pó dos Arquivos - volume H- Ed. “A TROLHA” - Londrina - 1996.
46. Grande Oriente de S. Paulo, 75 anos - Um Resumo de sua História
(coauroria com Cláudio Ferreira) - Edição do Grande Oriente de São
Paulo - 1996.
4 7 . Manual Heráldico do Rito Escocês Antigo e Aceito (vol. 2: Graus
19 a 33) - Ed. Madras - São Paulo - 1997.
4 8 . O Cavaleiro Rosa-Cruz - Ed. “A TROLHA” - Londrina - 1997.
4 9 . Maçonaria c Astrologia - Ed. Madras - 1997.
5 0 . Histórias Pitorescas de Maçons Célebres - Ed. “A TRO LH A” -
1997.
5 1 . Consultório Maçônico V - Ed. “A TROLHA” - 1997.
5 2 . Os Maçons e a Abolição da Escravatura - Ed. “A TRO LH A” -
1998.
5 3 . Cartilha do Companheiro Maçom (coauroria com Raimundo
Rodrigues) - Ed. “A TROLHA” - 1998.
54. Peças de Arquitetura (coletânea de Trabalhos).
5 5 . Dicionário de Alegorias e Símbolos Maçônicos.
5 6 . Maçonaria e Cabala.
57. Consultório Maçônico VI - Ed. “A TROLHA” - 1998.

113
Castellani e Rodrigues

58. Fragmentos cia Pedra Bruta - vol. 1 - Ed. “A TROLHA” - 1999.


59. Supremo Conselho do Brasil para o Rito Escocês Antigo e Aceito - Síntese
de sua História - Ed. “A TROLHA” - 2000.
60. Consultório Maçônico VII - Ed. “A TROLHA” - 2000.
61. Fragmentos da Pedra Bruta - vo). 2 - Ed. “A TROLHA” - 2001.
62. A Maçonaria na Década da Abolição e da Repúblida -E d . “A TROLHA” -
2001.
63. A Ação Secreta da Maçonaria na Política Mundial - Ed. Landmark -
2001.
64. Consultório Maçônico VIII - Ed. “A TROLHA” - 2002.
65. Manias c Crendices em Nome da Maçonaria - Ed. “A TROLHA” -
2002.
66. Do Pó dos Arquivos - volume III - Ed. "A TROLHA” - Londrina -
2003.
67. Fragmentos da Pedra Bruta - vol. 3 - Ed. “A TROLHA” - 2003.
68. As Origens Históricas da Mística Maçônica - Ed. Landmark - 2004.
69. Loja de Mesa - Ed. “A TROLHA” - 2004.

II - PARTICIPAÇÕES EM COLETÂNEAS

1. Formação Social da Maçonaria - Edição da Academia Brasileira Ma­


çônica de Letras - Rio de janeiro - 1983.
2. Episódios da História Antiga e Moderna da Maçonaria - Edição da
Academia Brasileira Maçônica dc Letras - Rio de Janeiro - 1987.
3. História Política da M açonaria- Ed. da Academia Brasileira Maçônica
de Letras - Rio de Janeiro - 1987.
4. Caderno de Pesquisas Maçônicas t - Loja de Pesquisas “Brasil” - 1989.
5. Cadernos de Pesquisas Maçônicas 2 - 1990.
6. Cadernos de Pesquisas Maçônicas 4 - 1992.
7. Cadernos de Pesquisas Maçônicas 5 - 1993.
8. Coletânea de Trabalhos “A TROLH A” - Ed. “A TROLHA” - 1993.
9. Cadernos de Pesquisas Maçônicas 6 - 1994.
10. 20 de Agosto - Ed. “A TROLHA” - 1994.
11. A Cor Vermelha do Rito Escocês - Ed. “A TROLHA” - 1994.
12. Cadernos de Pesquisas Maçônicas 7 - 1995.
13. Cadernos de Pesquisas Maçônicas 10 - 1995.
14. Anuário da Loja de Pesquisas Maçônicas do G. O. do Brasil - 1995.

114
[R aim undo
iR o d rigu es
Cartilha do Companheiro

A Filosofia é para nós


Algo Indispensável

Nossa Augusta Ordem é uma Instituição em que o filosofar é


tarefa que requer, reclama todo nosso interesse e todo nosso esforço.
Em cada um dos Símbolos, detrás de cada um dos passos de nossos
Rituais e sobre o costado de cada etapa da História Maçônica,
temos sempre algum vestígio ou alguma indicação, algum princí­
pio de caráter filosófico. E por isso que, alcançada a Iniciação, não
se pode ser um Maçom autêntico sem entrar no estudo da filosofia e
suas projeções sobre nossos fins, nossos objetivos e sobre nossos
anseios, nossos Símbolos, nossos Rituais e nossa História. (Irmão
Prof. Moisés Mussa Battal, in “ L.ições de Filosofia Geral e Maçôni­
ca”, obra transcrita por Merary Castillo Venegas e traduzida por
Arnaldo Falcomer e Achile Forti Filho —Ed. Gazeta Maçônica, São
Paulo, s/d.)

117
Castellani e Rodrigues

118
Cartilha do Companheiro

A lerta sobre o Grau de Com panbeiro

Pelo seu conteúdo, quer simbólico, quer alegórico, este Grau


é de grande importância. Todavia, muitos o atingem e por ele
passam sem se dar conta de seu significado, tanto pessoal, quanto
coletivo.
O segu n do G rau está impregnado da mais pura e objetiva
filosofia. E xotéricam en te, caracteriza-se pelo seu amor à sabedoria
e preocupações científicas; esotéricam en te está impregnado dos co­
nhecimentos que nos legaram Sócrates, Pitágoras de Samos,
Parmênides de Eleia, Platão, Aristóteles, Descartes, Hegel e tantos
outros pensadores.
A excelente obra - Curso d e D ocen cia p ara Instructores
M asones, d e G ran L o g ia d e C hile, Santiago de Chile, 1995, pág.
435 - ensina que “Estando al servicio de un espíritu científico-filo­
sófico y de un pensamiento laico, libre, la doctrina masónica de
compañero:
a) Esencialmente antídogmática, pues no acepta, sino lo
probad o y p ro b a b le; y tod o lo som ete a exam en,
Ubérrimamente;
b) La mente que la sustenta es y está siempre abierta a todo
lo que trae consigo renovación y progreso;
c) Guían esta mente, y, por ende, las doctrinas que sustenta,
una Lógica Integral y la Dialéctica fecunda y no vacía; y
d) La duda, metódica y no escéptica, es siempre su punto de
partida”.

119
Castellani e Rodrigues

Isto nos aponta um só caminho: tomar consciência, todos


nós, os Mestres M açons, de que o 2° Grau deve ser estudado a
fundo, para que possamos transmitir, quando não, tudo, pelo menos
os fundamentos mais importantes da filosofia do Grau,
Avante, Irmãos! “Trabalhem os” o 2o Grau, conforme ele
merece!

120
Cartilha do Companheiro

A Filosofía do Segundo Grau

INTRODUÇÃO
(Sociologia e Política)

Existe urna grande diferença entre o Primeiro Grau e o Se­


gundo. O Gran de Aprendiz é personalístico e se estrutura e se ergue
sobre os alicerces de dois principios filosóficos inquestionáveis: “Co-
nhece-te a ti mesmo” e “Vence-te, se queres realmente vencer”.
Ao transpor os umbrais de um Templo Maçônico, o Candi­
dato à Iniciação ainda está preso a uma série de injunções que Ihe
tiram, muitas vezes, a liberdade de ver claramente o que se passa
dentro de si mesmo.
Por isso é que, envolto em trevas, ele pede a Luz.
Quando a Luz lhe é concedida (consumada a sua Iniciação),
ele tem nas mãos os meios e os modos de se libertar da escravidão
que o envolvia até ali.
O Neófito, pela Iniciação Maçônica, renasce, voltando ao
seu estado de pureza natural. Daí a maravilhosa alegoria da purifi­
cação pela água e pelo fogo.
Entretanto, é bom se diga que a Iniciação só produzirá reflexos
permanentes, através de seu conteúdo simbólico e místico, se o Can­
didato estiver preparado mental e espiritualmente para receber tais
benefícios.
O Aprendiz tem dois caminhos para se descobrir a si mesmo

121
Castellani e Rodrigues

e para compreender os mistérios de sua própria essência, e os misté­


rios do Universo: estudar, pesquisar e praticar a meditação.
Esses dois caminhos são difíceis de serem percorridos, por­
que, simbolicamente, cheios de espinhos, repletos de pedras pontia­
gudas, com abismos ínsondáveis em cada uma de suas margens.
Isto significa que a tarefa a que se propõe o Iniciando é muito
difícil, e exige coragem, e exige perseverança, e exige, sobretudo,
amor para que consiga a vitória, a grande vitória de se tornar um
Maçom verdadeiro. Daí a razão por que começamos por afirmar
que o Grau de Aprendiz é personalístico.
Já o Segundo Grau é social e político. Chega a ser um Grau
cognosdvel, porque exige uma interpretação objetiva, segura e in­
teligente da realidade física.
O Segundo Grau é, sob todos os aspectos, intrínsecamente
filosófico.
Antes de tudo, o Companheiro há que buscar os conhecimen­
tos sociológicos para casar equilibradamente os valores sociais com
os valores individuais.
É preciso perceber que, em Sociologia, o que marca os estu­
dos sobre a sociedade como um todo é a perspectiva finalista aliada
a um ponto de vista normativo. A perspectiva finalista visualiza
somente o ideal a realizar, enquanto que o ponto de vista normativo
estabelece regras e normas de ação.
Na Maçonaria isto se realiza sobretudo no Segundo Grau e,
mais uma vez, a Sublime Instituição comprova os acertos de sua
diretiva filosófica. Basta que se compulse a “República” ou as “Leis”,
de Platão', a “Política”, de Aristóteles2, ou, ainda, os “Tratados
Políticos”, de Spinozak e o “Ensaio sobre o Governo Civil”, de
Locke4, para que se saiba onde a M açonaria foi buscar boa parte
dos ensinamentos que ela procura passar aos Companheiros.
Aliás, os escritores Maçons, mormente os que se propõem a
fazer a exegese filosófica dos Graus Simbólicos, deviam dedicar-se
ao estudo dessas obras, além de outras de filósofos mais próximos

122
Cartilha do Companheiro

de nossos dias, para se conscientizarem de que a sociologia política


está presente na M açonaria, fiel aos pontos de vista finalista e
normativo a que atrás nos referimos.
A filosofía nos ensina que o fundamento principal do conhe­
cimento é a consciência, a a u toco ascienda. Por isso mesmo, o Com­
panheiro há de ter sempre diante dos olhos que o fundamento de sua
aprendizagem é a atenção, arrimada à vontade. É claro que não se
pode deixar de lado a memoria e, sobretudo, o entendimento. Neste
ponto, a filosofía do Segundo Grau bebe, em largos haustos, a filo­
sofía de Platão. O grande filósofo nos ensina que é o entendimento
que gera o conhecimento. Daí a razão por que se pode concluir que
certeza só pode ser produto do espirito. Já Aristóteles afirma que
nada existe no entendimento do homem que antes não tenha passado
pelos sentidos. Há os que defendem a tese aristotélica dizendo que
isto é fácil de entender desde que se pense que o homem nada mais
é que una conjunto materia-espirito.
O Companheiro não pode aceitar concepções apriorísticas
sem que antes examine o seu conteúdo de verdade.
Neste Grau, busca-se a certeza, a evidência do fato. Foge-se
daquilo que é ilusório. A “Alegoria da Caverna”, de Platão, traz-nos
ensinamentos de grande magnitude, mostrando-nos que aquilo que
é pura ilusão pode, de certo modo, parecer realidade.
Nessa alegoria, Platão resume a aprendizagem do homem,
buscando as verdadeiras idéias no m undo m aravilhoso do
incognoscível. Ali, o filósofo estabelece comparação entre o mundo
ilusório e o mundo real. Para tanto, lança mão de sombras que se
projetam no fundo de uma caverna escura, quando, pela sua entrada,
passam objetos iluminados pela luz que vem de fora.

Imagina, diz ele, alguns homens vivendo em uma moradia em


forma de caverna com uma grande abertura do lado da luz.
Encontram-se eles ali desde a sua meninice, iodos presos por
cadeias que os imobilizam totalmente e de tal modo que não
podem nem mudar de lugar, nem volver a cabeça e não veem

123
Castellani e Rodrigues

mais qu e aquilo que lhes está na frente. A luz lhes vem de um


fo g o aceso a uma certa distância, p o r trás deles, em uma em i­
nência do terreno. Entre esse fogo e os prisioneiros, há uma
passagem elevada, ao longo da qual imagine-se um pequeno muro,
sem elhante aos balcões que o s ilusionistas levantam entre si e os
assistentes e p o r cima dos quais mostram os setts prodígios.
Pensa agora qu e a o lado desse muro alguns hom ens levam o b ­
jetos de todos os tipos. Tais objetos são levados acim a â a altura
d o muro e os homens que os transportam alguns falam , outros
seguem calados. Os prisioneiros, nessa situação, jam ais viram
outra coisa senão as som bras, jam ais ouviram outra voz senão
os ecos que reb oam no fundo da caverna. Falarão das sombras
com o se elas fossem objetos reais e terão os ecos com o vozes
verdadeiras. Esses estranhos prisioneiros são sem elhantes a nós,
homens. Pensa, agora, no que lhes acontecerá se forem liberta­
dos das cadeias que os prendem e curados da ignorância em
que jazem. Se um dentre eles se levantar e volver o p escoço e
caminhar e erguer os olhos para o lado da luz, certamente tais
movimentos o farão sofrer e a luz lhe ofuscará a visão, impedin­
d o que veja os objetos cuja som bra enxergava há pouco. Ficará
deveras em baraçado e dirá que as sombras que via antes são
mais verdadeiras que os objetos que lhe sâo agora m ostrados. E
se tal prisioneiro arrancado à fo rça d o lugar on de se encontra,
fo r conduzido para fora, para plena luz d o sol, p or acaso não
ficaria ele irritado e os seus olhos feridos? D eslum brado pela
luz, porventura não precisaria acostum ar-se p ara ver o espetá­
culo da região superior? O que a principio mais facilm ente verá
serão as som bras, depois as imagens dos hom ens e dos demais
objetos refletidos nas águas e, finalmente, será capaz de ver os
próprios objetos. Então olhará para o céu. Suportará mais fa ­
cilmente, à noite, a visão da lua e das estrelas. Só mais tarde será
capaz de contem plar a luz d o sol. Quando isso acontecer, reco­
nhecerá que o sol governa todas as coisas visíveis e também
aquelas som bras no fundo da caverna. Lem brando-se, então,
de sua primeira m orada, da sabedoria que nela se processa, de
seus com panheiros de cativeiro, alegrar-se-á com sua mudança
e lastimará a sorte deles. N ão sentirá ciúmes das honras, louvores
e distinções que lã se distribuem. Preferirá, com o o herói de
Cartilha do Companheiro

H om eros, ser apenas um trabalhador da roça, a serviço de um


pequeno lavrador, e sofrer tudo no mundo, a voltar às suas
antigas ilusões, e viver com o vivia. Supõe que o nosso hom em
volte ti caverna e vá sentar-se em seu antigo lugar. Nessa passagem
da luz clara para a obscuridade não lhe ficariam os olhos com o
que subm ersos em trevas? E se, enquanto tivesse a vista confusa,
pois bastante tem po se passaria até que os olhos se acostum as­
sem novamente à obscuridade, tivesse que dar opinião sobre as
som bras, numa conversa com seus com panheiros, não lhes p ro ­
vocaria risos de m ofa e não diríam eles que, tendo ido para a
região superior, voltou com a vista defeituosa de sorte que não
vale a pena subir até lá? E .se insistisse e tentasse soltá-hs e levá-los
para o alto, eles não haveríam de pegá-lo e matá-lo? (República,
VÍI, 5Ma-517e).

Essa alegoria desenvolve um pensamento metafórico e retrata


bem a figura do Iniciado que, depois de “receber” a Luz, começa a
visualizar a teoria da verdade. É no Segundo Grau que se parte
para a busca da interpretação lógica da significação dessa simiíitude
da iuz com a ideia do Bem, A luz material nos permite ver os objetos
que nos rodeiam, porém, a outra luz, a da inteligência que, no
Segundo Grau, é representada alegóricamente pela Estrela Flame­
jante, é que nos faz enxergar interiormente, revelando-nos belezas
que não julgavamos existissem. A visão da inteligência nos propor­
ciona paisagens novas.
Essa alegoria é, para o Companheiro, um largo caminho que
o levará a paragens que ele antes não pensava pudessem existir.
As sombras projetadas no fundo da caverna representam o
mundo ilusório, o único percebido pelos não iniciados. Os prisio­
neiros nada mais são que o homem profano, agrilhoa do ao erro, à
superstição, e à ignorância. Aquele prisioneiro que se liberta, que
sai do fundo da caverna e atinge o espaço superior representa o
Iniciado, que busca livrar-se da ignorância, procurando aperfeiço-
ar-se moral e intelectualmente, através do estudo atento dos Rituais,
através da pesquisa séria, do esforço diuturno, buscando no todo

125
Castellani e Rodrigues

filosófico que M açonaria lhe proporciona tudo aquilo que possa


levá-lo ao encontro da Verdade.
Prisioneiro da ignorância saí da obscuridade em procura da
Juz. Primeiro, da luz que ilumina as coisas exteriores, materiais;
depois, ele busca a luz espiritual, aquela que lhe iluminará o caminho
que o transportará às regiões mais puras da sabedoria maçônica.
É certo que, se o Companheiro Maçom persistir na busca do
saber, alcançará, sem dúvida alguma, aquele mundo onde brilha o
sol da sabedoria e estará apto a “erguer templos à virtude e cavar
masmorras ao vício” ,

NOTAS

’ Platão - Nasceu em Atenas em 427 a. C., Foi discípulo de Sócrates, a


quem conheceu aos dezoito anos de idade, tendo-o acompanhado du­
rante dez anos, até 399, quando Sócrates morreu.
Em 387, Platão fundou a sua escola, nos jardins de Academus, época em
que iniciou a composição de suas obras.
Estudando-se as principais obras de Platão verifica-se ter ele sofrido
grande influência de Parmênides de Ele ia, bem como de Sócrates. Sócrates
é, pode-se dizer, o descobridor do conceito. Sabe-se, mais, que o interesse
primeiro da filosofia socrãrica é a moral. Sócrates deseja que a moral
possa ser aprendida e possa ser ensinada, como se aprende e se ensina
gramática. Plarão abraça a ideia de conceito esposada por Sócrates. Só
que ele amplia a ideia de conceito. Para Platão essa ideia não se circuns­
creve apenas ã virtude, mas abarca tudo, todas as coisas em geral.
Para Platão, o que existe de real é a ideia. Afirma ele que as coisas da
Natureza nada mais são que “cópias de idéias que a elas preexistem” .
Muitas das obras de Platão chegaram até nós. Diga-se, de passagem, que
ele presenteou a humanidade com um acervo de obras que se constitui no
mais seguro meio para aqueles que desejam realmente viajar pelo grande
“mare nostrum” da filosofia grega, Conbecem-se trinta e quatro obras
de Platão. Sete delas são consideradas apócrifas, os críticos afirmam que
tais obras foram escritas por discípulos do grande ateniense.
Entre suas obras, convém destaquemos as seguintes: “República” (dez
livros), “Fédon” (a imortalidade da alma), “Apologia de Sócrates”, “O

126
Cartilha do Companheiro

Sofista” (o ser), “Banquete”(o amor), “Timeu” (a natureza), “Fecho” (a


beleza), “Mênon” (a virtude), “Parmênides” (as idéias) e “As Leis”.
Platão faleceu em 347 ou 348 a. C..
2 Aristóteles - Nasceu em 384 a. C. numa cidade da Macedônia chamada
Estagira e que ficava a uns duzentos e setenta quilômetros ao norte de
Atenas. Seu pai era o médico do rei Amintas, avô de Alexandre. Foi
discípulo de Platão.
Em 346 a. C., Felipe, rei da Macedônia, encarregou Aristóteles da educa­
ção de seu filho Alexandre. Durante sete anos o estagirira foi o preceptor
do futuro conquistador do mundo.
Como Platão, fundou uma escola bem diferente daquela fundada pelo
mestre. Na Academia, cuidava-se principalmente das matemáticas, da
filosofia política e da filosofia especulativa, enquanto que no Liceu, o
ensino pendia mais para a biologia e as ciências naturais. A escola tomou
o nome de Liceu porque o lugar onde Aristóteles passeava com seus
alunos, enquanto ministrava seus ensinamentos, era um campo que fazia
parte do terreno onde estava o Templo de Apoio Liceu, protetor dos
rebanhos contra os lobos.
Até boje, ao expirar do séc. XX , ele 6 considerado o filósofo por excelência.
Sua obra é muito extensa e abarca uma infinidade de assuntos: ciências
naturais, moral, biologia, matemática, ciência política, meteorologia, re­
tórica, lógica, psicologia, ética, metafísica e a crítica literária, cujos funda­
mentos foram lançados por ele. E o fundador das ciências baseadas na
observação, sobretudo a biologia. Antes dele a ciência jazia em embrião.
Nasceu com ele.
A teologia tomista da Idade Média se inspirou na metafísica de Aristóteles
que aceita Deus como o motor primeiro. Aristóteles é o inventor da
lógica. A força da lógica aristotélica se fundamenta em três princípios que
são evidentes por si mesmos:
a) princípio da identidade;
b) princípio de não contradição; e
c) princípio de terceiro excluído.
Aristóteles morreu na Ilha de Eubeia, onde buscara abrigo para escapar
da perseguição de grupos políticos que passaram a dominar Atenas, no
final do Governo de Alexandre. Eurímedon, Sumo Sacerdote, acusou-o
de ensinar que de nada valiam as preces e os sacrifícios dedicados aos
deuses. Ao se ver na iminência de ser julgado por assembléias hostis,
abandonou Atenas, afirmando que não proporcionaria aos áulicos o
ensejo de um segundo golpe contra a filosofia. Morreu em 322 a. C..

127
Castellani e Rodrigues

3 Spinoza (Baruch Spinoza) - Natural de Amsterdã, nasceu em 1632 e


morreu em 1672, Apesar de racionalista, a filosofia de Spinoza define
uma doutrina de sentido dinâmico que se consubstancia num monismo
claramente panteísta. Através da unificação da realidade pela tríade “subs­
tância, Deus e natureza”, o método filosófico de Spinoza é, nada mais
nada menos, que uma tentativa de eliminação de qualquer vestígio
sobrenatural.
Para ele, a substância é o ser em si, concebido por si mesmo, que se
identifica com Deus - em tudo e por tudo, ser perfeiro, infinito que se
expressa como natureza: “Deus sive natura”.
Suas obras mais importantes são: “Princípios da Filosofia de Descartes e
Meditações Metafísicas”, “Breve Tratado sobre Deus e o Homem”,
“Tratado sobre a Religião e o Estado”, “Ética”.
4 Locke (John Locke) - Filósofo inglês. Nasceu em 1632 e faleceu em 1704.
Fundador do Empirismo, doutrina que ensina que todo conhecimento
(com exceção do lógico e do matemático) deriva da experiência; a verdade
autônoma não existe.
Locke discorda de Descartes quanto ao possuirmos idéias inatas. O co­
nhecimento, para ele, provém unicamente das experiências que surgem
durante a vida.
Lutou incessantemente pela liberdade civil, religiosa e polírica. Neste sen­
tido escreveu o “Ensaio sobre a Tolerância”, publicado em 1667. Sua
obra principal é “Ensaio a Respeito do Conhecimento Humano”. Esse
tratado se compõe de quatro Livros, No primeiro, argumenta contra
Platão, Descartes e os Escolásticos, procurando provar que não há idéias
inatas, Nos outros três, fórmula sua teoria positiva.
3 Homero - Poeta semilendário, um dos maiores gênios literários que
a humanidade produziu. Não se sabe ao certo se nasceu em Quios ou em
Smirna, Deve ter vivido no século X antes de Cristo. Atribui-se-llie a
autoria dos dois grandes poemas épicos: “Ilíada” e “Odisséia”, que para
alguns críticos são as obras que iniciam a literatura grega. Dizem os
críticos que esses dois poemas são os maiores entre todos os que o homem
produziu.
A “Ilíada” (24 cantos, 15.000 versos) conta a história da guerra entre
gregos e troianos com a vitória dos primeiros. A “Odisséia” (24 cantos,
12 mil versos) narra as aventuras de Ulisses (Odisseus), rei de Itaca.
Foi o tirano Pisístrato que mandou compilar esses dois inconfundíveis
monumentos literários, talvez os dois maiores poemas da humanidade.

128
Cartilha do Companheiro

Das Desigualdades Sociais

O Segundo Grau nos ensina que é necessário praticar a


filantropia e tudo fazer para a pronta erradicação da tirania, do
fanatismo, de tudo, enfim, que sirva de empecilho ao pleno desen­
volvimento intelectual e espiritual do ser humano.
É preciso que se compreenda que nada existe no mundo que
seja superior ao homem, que valha tanto quanto o homem.
É mister sejamos visceralmente contra a maneira vesga ele
enxergar a criatura humana como um elemento secundario sobre a
térra, porque, na prática e, para muitos, o dinheiro, as proprieda­
des, os bens terrenos valem muito mais que o homem.
O Companheiro, como elemento eminentemente social, há
de valorizar o ser humano como criatura de Deus, dando-lhe o
valor que ele realmente tem.
Há de empenhar-se para que todos os homens possam ter a
mesma dignidade e sejam chamados de filhos de Deus, irmãos entre si.
Há de lutar para que seja abolida da face da terra essa desi­
gualdade intolerante que divide a sociedade em camadas, de acordo
com o poderio monetário e, às vezes, até intelectual das pessoas.
Quando se fala em igualdade entre os homens, fala-se na
igualdade de direitos e igualdade de condições iniciais. É preciso
que todos os homens tenham o mesmo direito ao mesmo p o n to d e
p a rtid a . Os atletas não chegam todos, ao mesmo tempo, ao p on to

129
Castellar!¡ e Rodrigues

d e ch eg a d a , mas todos tiveram o direito de iniciar a corrida do


mesmo ponto de partida.
Seria possível fazer que todos os homens fossem absoluta­
mente iguais? Não! Mas não custa tentar. Mesmo que se admita
que é impossível estabelecer-se a igualdade entre os seres humanos,
a tentativa não deixaria de ser uma maneira inteligente de atenuar
os efeitos das desigualdades.

130
Cartilha do Companheiro

Da Participação

O Companheiro lutará para que a busca da paz entre os


povos seja a grande meta a ser perseguida. Tudo fará para que a
fome seja abolida da face da terra; tudo fará para que o homem dê
valor à vida, conscíentizando-se e buscando conscientizar os outros
de que nada neste mundo vale mais do que a vida. A ação do Com­
panheiro há de ser eminentemente participativa.
Não existe Maço na ria sem participação.
E certo que o Companheiro não se realizará como homem, e
muito menos como Maçom, se tiver apenas que cumprir aquilo que
lhe for proposto. E alguma coisa, mas está longe de ser tudo. Ele
tem que ir além. Para tanto, necessário se torna que seja eminente­
mente participativo.
Participando, o Companheiro sentir-se-á seguro, pois é sabido
que, na maior parte das vezes, a insegurança é produto da não
participação.
Voltamos a repetir: o Segundo Grau é fundamentalmente so­
cial, daí a razão por que o Companheiro há de participar para que
possa inserir-se dinamicamente no meio social.
A participação confere a vontade de construir algo de bom
para a sociedade.
O verdadeiro construtor social sente o gosto de viver.
O tédio, a insatisfação são produtos da não participação.

131
Castellani e Rodrigues

132
Cartilha do Companheiro

O Trabalho

O ração e trabalho são os recursos mais poderosos na criação


m oral d o hom em . A oração é o íntimo su blim arse d a alm a pelo
contato com Deus. O trabalho é o inteirar; o desenvolver, o
apurar das energias do corpo e d o espírito, m ediante a ação
contínua de cada um sobre si m esm o e sobre o mundo onde
labutamos. O indivíduo que trabalha a c e r c a s e continuamente
do autor d e todas as coisas, tom ando na sua obra uma parte,
de que depende tam bém a dele. O Criador com eça e a criatura
acaba a criação de si própria. Quem quer, pois, que trabalhe,
está em oração a o Senhor. O ração pelos atos, ela em parelha
com a oração pelo culto. Nem p o d e ser que uma ande verdadei­
ramente sem a outra... Mas, quando o trabalho se junta à ora­
ção, e a oração com o trabalho, a segunda criação d o hom em , a
criação d o hom em p elo hom em , sem elha às vezes, em maravi­
lhas, à criação do hom em pelo divino Criador (Rui Barbosa’, in
Oração aos Moços).

De início, o homem considerava o trabalho como um casti­


go. A palavra bíblica, “tu tirarás dela o teu sustento à força de
trabalho” (Gênesis, 17), durante muitos e muitos anos, durante sé­
culos, imprimiu ao trabalho um sentido de algo inferior, de algo
que deveria ser exercido também por homens de categoria inferior,
o escravo, por exemplo.
Até mesmo alguns filósofos afirmavam que o trabalho trazia
consigo uma desonra, um estigma social.
E é bom não nos esqueçamos que essa maneira de encarar o
trabalho perdurou por toda a Idade Média.

133
Castellar/ e Rodrigues

O “ora et labora” era um incentivo que se dava aos religiosos


para que pudessem evitar e, até mesmo, vencer as tentações. Assim,
durante séculos, o trabalho, sobretudo o trabalho manual, só era exer­
cido por escravos.
Tal modo de encarar o trabalho passa a se modificar com o
advento do humanismo e, de modo mais radical, com a chegada do
Renascimento. Foi com o nascimento da ciência moderna que, então,
o trabalho assumiu um caráter de algo absolutamente necessário.
Fíoje, o trabalho é considerado como uma espécie de essên­
cia da vida. Poetas, filósofos, oradores criaram frases de exaltação
ao trabalho, que correm mundo, repetidas sempre que alguém a ele
se refere em termos de exaltação: “O trabalho a tudo vence”, “a
paz está no trabalho”, uo trabalho honra e dignifica o homem”, “o
trabalho é o criador e o educador da vida”, “o trabalho é o amor
feito realidade”, “cessar de trabalhar é morrer”, “o homem que
não trabalha, não vive, vegeta”.
Não restam dúvidas de que o homem não pode ser apenas
conhecimento; o homem tem que ser, acima de tudo, ação.
É pelo trabalho que o homem se transforma num semideus,
criando obras maravilhosas, tanto no campo material, quanto no
campo intelectual e artístico.
Nada pode ficar inerte. Só a morte imobiliza. O próprio Uni­
verso é exemplo vivo de trabalho. Tudo está em constante e perene
movimento. E o movimento é uma das mais avançadas formas de
trabalho.
O aforismo “aquele que não age, não existe”, um dos funda­
mentos da doutrina de ação incorporada ao Grau de Companheiro-
-Maçom, é da autoria do filósofo Leibniz, um dos responsáveis pelas
modificações dos símbolos herdados dos alquimistas e, sobretudo,
dos cabalistas.
O Maçom é um trabalh ad or, razão por que ele é chamado de
O b reiro, e o seu local de trabalho, O ficina. Contudo, é no Segundo
Grau que a a ç ã o e o trabalh o fundamentam toda a sua estrutura,

134
Cartilha do Companheiro

por isso a doutrinação filosófica desse Grau enfatiza sempre o valor


do trabalh o e da ação.
A divisão que a Maçonaria faz dos Graus é, nada mais, nada
menos, que o escalonamento de um trabalho que deve ser feito de
maneira constante e segura, em moldes de um congraçamento fraternal,
pela participação filosófica.
Na M açonaria, a participação é uma constante que não pode
ser posta de lado por nenhum de seus membros, esteja ele no Grau
em que estiver.
O homem que trabalha não se sente solitário; antes, pelo
contrário, sente o gosto de viver, pois ele é, antes de tudo, um ser
participante.
O Companheiro deve atentar bem para esta afirmativa: não
pode haver M açonaria sem iniciativa e participação.
Trabalhar é criai; é crescer, é elevar-se acima das pequenices
humanas. O trabalho deve ser vocação do homem, pois trabalhar é
abrir possibilidades, é ampliar a visão espiritual sobre o que existe de
melhor e de mais sublime.
Por aí se vê a grande responsabilidade que o Companheiro-
-Maçom leva sobre os ombros.
Tanto o trabalho como qualquer boa ação criativa são ope­
rações essenciais dentro da Ética e do Simbolismo Maçônico, mor­
mente se atentarmos para os seguintes aspectos, segundo os melhores
autores:
1. na sua fase inicial, a Maçonaria era operativa. O trabalho
exercido pelos construtores - igrejas, conventos, castelos —, era al­
tamente criativo e qualificado. Muitas dessas magníficas constru­
ções (a maioria delas), estão aí, de pé, para atestar o alto poder de
criatividade de seus obreiros;
2. a partir de 1717, a Maçonaria deixa de ser operativa e passa
a ser especulativa, uma vez que o trabalho executado por seus membros
já não se configura como material, passando a ser de caráter filosófi­
co, espiritual e social;

135
Castelíaní e Rodrigues

3. os locais onde os Maçons se reúnem passam a denominar-se


Templos ou Oficinas;
4. a vestimenta do Maçorn é o Avental, símbolo maior do
trabalho;
5. os Maçons passam a denominar-se Obreiros;
6. a atividade exercida por eles, em Loja, denomina-se
trabalho;
7. o Segundo Grau é especialmente dedicado ao trabalho, às
ciências, à filosofia e às artes.
O trabalho e a ação criativa são, portanto, os principais meios
de que dispõe a M açonaria para alcançar os seus objetivos. Daí
poder-se afirmar, com segurança, que a filosofia da Maçonaria é a
filosofia do trabalho.

nota ' " ; ..'

1 Rui Barbosa (Rui Caetano Barbosa de Oliveira) nasceu em Salvador, BA,


em 5 de novembro de 184.9 e faleceu em Petrópolis, RJ, em T de março
de 1923.
Aos quinze anos de idade, concluiu o curso preparatório. Em 1870, com
21 anos, terminou, em São Paulo, o curso de Direito.
Rui Barbosa foi deputado, senador, Ministro de Estado. Dentro e fora
do Brasil foi reputado como uma das mais pujantes mentalidades das
Américas.
Foi pensador profundo, dotado de vasta e variada erudição, jurisconsulto
abalizado, poliglota, político, escritor de primeira água e grande orador.
No dizer de um seu crítico, “como escritor é correto como Vieira, melo­
dioso como Castilho; na riqueza e variedade do vocabulário e propriedade
dos termos só o podemos comparar a Camilo”.
Foi grande defensor do idioma português, que manejou com incomparável
destreza. Sua linguagem foi sempre inconcussa, intemerata.
Desde jovem entregou-se à campanha abolicionista. Jáem 1866, fundara
em Recife, com Castro Alves e outros estudantes da Faculdade de Direito,
uma sociedade abolicionista.
Em 4 de abril de 1870, em São Paulo, apresenta à consideração do Grande

136
Cartilha do Companheiro

Oriente do Brasil, através da Loja “América”, da qual era Obreiro, o seu


famoso Projeto Abolição.
Nesse Projeto, através dos artigos 5° e 6", ele se antecipa à famosa Lei 28
de setembro de 1871, de autoria do Visconde do Rio Branco. Senão
vejamos:
Art. 5" - Nenhum indivíduo poderá mais obter o título e os privilégios de
Maçom sem que primeiramente, antes de receber a Iniciação, declare
livres todas as crianças do sexo feminino que daí em diante lhe possam
provir de escrava sua.
Art. 6° - Todos aqueles que já se acham Iniciados em qualquer Oficina
Maçônica do Brasil ficam igualmente obrigados, logo que for promulgada
esta lei, a lavrar um compromisso em que declarem livres todas as crianças
do sexo feminino, filhas de escrava sua, que possam vir à luz desse mo­
mento em diante.
Em 1907, durante o Governo Afonso Pena, Rui Barbosa representou o
Brasil na Conferência de Haia, atendendo a um convite do Barão do Rio
Branco. Tão bem se houve durante aquela Conferência que de lá voltou
com a antonomasia de “Águia de Haia”.
Em 1910, dedicou-se à Campanha Civilista, quando disputou a Presi­
dência da República, tendo como adversário o Marechal Hermes da
Fonseca. Sua plataforma política, apresentada em sessão pública, no
Politeama Baiano, na noite de 15 de janeiro de 1910, é um verdadeiro
monumento literário, através do qual Rui demonstra todo o seu conhe­
cimento dos problemas brasileiros.
Naquele importante documento, ele põe a nu todas as mazelas que afligiam
o País e aponta os remédios para escorraçá-los, dc uma vez por todas, da
vida nacional.
Para que se possa aquilatar a visão que ele tinha do futuro, basta que se
leia um curtíssimo trecho de sua Plataforma:
Em matéria de vtação não m e animarei a prometer-nos para o Brasil estradas
de rodagem eletrificadas. Presumo que muito mais cedo teremos a guerra
no espaço aéreo pelos aeroplanos e dirigíveis. Eliminada porém a eletrifica­
ção, não recuso meu voto aos caminhos de rodagem. Evidentemente são
indispensáveis. M¡js a circulação arterial, de que depende a vida nos Esta­
dos modernos, especialmente nas inúmeras extensões territoriais de países
com o o Brasil, não se faz senão pelas estradas dc ferro (o grifo é nosso).
No entanto, Rui foi eleitoralmente derrotado, tendo vencido apenas nos
Estados da Bahia e São Paulo.

137
Castellani e Rodrigues

Rui Barbosa foi, realmente, um grande homem. Sua memória continua


sendo cultivada, na casa onde morou, na Rua São Clemente, em Botafogo,
no Rio de Janeiro, hoje um museu - A Casa de Rui Barbosa.
OBRAS: O Papa e o Concilio (tradução), 1877; Cartas de Inglaterra,
1896; Parecer sobre a Redação do Código Civil, 1902; Réplica, 1904;
Discursos e Conferências, 1907; Páginas Literárias, 1918; Queda do
Império, 1920; Oração aos Moços, 1921 e dezenas de outras obras
sobre os mais variados assuntos, além da Plataforma Política de 1910.

138
Cartilha do Companheiro

O Passo Lateral

Enquanto o Aprendiz caminha em linha reta, dando passos


dirigidos, sempre na mesma direção, o Companheiro avança um
passo na linha oblíqua, saindo da trajetória a que estava obrigado,
o que significa que ele já pode e deve variar seus caminhos em
busca da verdade.
Quando o Companheiro abandona o eixo, quando se desvia
do reto traçado a que estava obrigado como Aprendiz, é porque já
lhe é concedido o direito de observar, de procurar, de experimentar,
de quantificar os métodos que lhe são colocados ao alcance para
aprender e apreender o que a filosofia adotada pelo Segundo Grau
aponta e ensina.
Por isso é que já há uma mudança no posicionamento das três
grandes luzes emblemáticas: a perna do Compasso acha-se libertada
do jugo do Esquadro, significando que o Obreiro, no Segundo Grau,
já inicia a sua caminhada pelos caminhos da verdade, em busca do
saber, livre de preconceitos, de superstições, sobretudo de certas con­
venções que lhe prejudicavam os movimentos espirituais.
Caminha o Companheiro na procura de novos conhecimentos
que lhe ensejem forças para se libertar inteiramente do jugo da
carne, para dominar as inclinações menos dignas.
Daí a razão por que o entrelaçamento do Esquadro e do Com­
passo se constitui em um dos Símbolos mais importantes do Segundo
Grau.
No Grau de Companheiro é necessário que se lance mão da
dedução e da indução. A dedução não deve e não pode ser esquecida,

139
Castellani e Rodrigues

apesar de a indução fhe ser superior, uma vez que o conhecimento


obtido a partir da realidade, subindo aos conceitos, às normas e aos
princípios é superior a qualquer outro.
Conforme já ficou dito, o Segundo Grau é altamente filosófico.
E é de ver-se que a filosofia que lhe alicerça todo o edifício prepara
caminho para o Terceiro Grau que esposa, abertamente, a filosofia
de Descartes1, de Spinoza e de Leibniz2, entre outros. E a chamada
filosofia racionalista para a qual a única fonte do conhecimento é a
razão. Para o racionalista, as idéias explicam claramente aquilo
que a experiência entremostra. Aliás, o conhecimento estribado na
razão não admite mistérios, não aceita dogmas. A fé deve subme­
ter-se à razão, deve submeter-se ao estudo, ao exame, quiçá à prova.
Esre é o m o d o de pensar dos racionalistas.
Entretanto, é necessário ter-se cuidado. Nada impede e c até
salutar que se adote cautela como norma de busca. Pois esta, quando
feita de afogadilho, sem as devidas precauções, pode determinar
uma conceituação vaga e até mesmo errônea, como as que temos
visto aparecer, com modos diferentes e em épocas também diferentes,
em diversos sistemas filosóficos. Como exemplo, pode-se apontar o
que aconteceu, com certos núcleos de reflexão metafísica daqueles
que presumiram ser possível tirar conclusões sobre a formação do
Universo, baseando-se tão somente em comparações, na maior parte
das vezes estapafúrdias.
Somos de opinião que deve ficar bem claro que, para o Segundo
Grau, deve prevalecer o entendimento, urna vez que o conhecimento,
para o Companheiro, é a resultante das abordagens do entendimento
e dos sentidos.
A ninguém pode passar despercebido que, para o homem,
tudo se rege pela vontade e pelo entendimento. Por isso é que
Heráclito afirma: “Unamos o completo e o incompleto, o conver­
gente e o divergente, o toante e o destoante. De todas as coisas
UMA, e de uma, TO D A S”.
Daí a razão por que o Companheiro deve procurar descobrir

140
Cartilha do Companheiro

como seriam as verdades da razão nascidas da experiência. O ra, se


tais verdades fossem oriundas só da experiência, nada mais seriam
que filhas de “fatos” . N ão seriam verdades originadas da razão,
portanto, não seriam verdades de verdades, mas verdades contin­
gentes, acidentais, sem nenhuma base concreta. Isto dificultaria so­
bremaneira o entendimento, porque a grande verdade é que as
verdades de razão são inatas, não são adquiridas. As verdades de
razão vêm estereotipadas em nosso espírito. Ao contrário, as verdades
de fato, oriundas da experiência, como atrás já ficou dito, estão fixadas
em nós unicamente pela percepção sensível. Elas têm, não se pode
negar, certa objetividade, mas não são de todo necessárias.
Há duas coisas de que o Companheiro há de recordar-se. A
primeira é a de que tudo o que existe tem lógica; deste modo, a
lógica é o guia mais seguro que pode existir. Todavia, é preciso que
ninguém se esqueça de que suas faculdades são limitadas, necessi­
tando, muitas vezes, de poderes de raciocínio mais poderosos que
os seus para a resolução de certos problemas. A segunda é a de que
o Companheiro deve gniar-se a si mesmo, uma vez que o seu principal
objetivo é o autodomínio. Ninguém pode gozar de inteira segurança
interior, se não for capaz de governar-se a si mesmo. Esta talvez
seja a mais dura tarefa a ser enfrentada pelo homem-Maçom. É
fácil comandar os outros; o difícil é impormos obediência a nós
mesmos.

NOTAS

1 Descartes (René Descartes) - Nasceu em La Haye, na Touraine, Fcança,


em 1596 e faleceu em Estocolmo em 1650.
É, sem dúvida, um dos maiores filósofos da Europa e considerado como
sendo o criador da moderna filosofia.
Ao mudar o aspecto do método, através da excelente obra “Discurso
sobre o Método”, provocou verdadeira revolução nos arraiais da filoso­
fia. Para os filósofos da Antiguidade e para os da Idade Média o método

141
Casteílani e Rodrigues

era aplicado depois de obtida a intuição, ao passo que, na Idade Moderna,


a partir de Descartes, o método passa a ser exercitado antes de se obter a
intuição e como meio de se chegar a ela.
Descartes apresenta quatro postulados como regras básicas para chegar
à verdade, que ele estipula como sendo para ele mesmo:
1. nño admitir como verdadeiro aquilo que ele não reconheça como tal
(Regra de Evidencia);
2. qualquer problema que se apresente ao sen espirito deve ser resolvido
de tal forma a não deixar nenhuma dúvida sobre sua solução (Regra
da Análise);
3. recompor as realidades discernidas pela análise;
4. fazer o trabalho de maneira completa, sem nada esquecer ou omitir.
2 Leibniz (Gottfried Wilhelm Von Leibniz) - Nasceu em Leipzig em 1° de
julho de 1646. Sua filosofia se alicerça em dois princípios: o da substân­
cia e o da razão suficiente. Da razão suficiente depende a existência das
verdades existenciais que, consequentemente, são contingentes. Afirma
ainda que tudo o que existe é composto de “mónadas”, isto é, partículas
de força, invisíveis, sem extensão, em perene movimento, possuidoras em
si mesmas da propriedade de todas as coisas do Universo.
Leibniz apresenta quatro argumentos para provar a existência de Deus:
1 ° - Argumento ontológico;
2° - argumento cosmológico;
3 °-argumento das verdades eternas;
4 ° -argumento da harmonia preestabelecida que, em se generalizando,
pode transformar-se no argumento desígnio, chamado depois, por
Kant, de argumento físico-teológico.
Leibniz deixou vasta produção filosófica, onde se pode distinguir trabalhos
de alta reflexão. Boa parte de sua filosofia é de cunho popular, como se
pode ver nos “Essais de Théodicée sur la Bonté de Dieu, la Liberté de
PHomme et la Origine du M al”; “La Monadologie”; “Principes de la
Nature et de la Gráce, Fondés en Raison”.
Nessas obras, cumpre se destaquem dois aspectos fundamentais: otimismo
e atomismo metafísico.
Leibniz faleceu em 14 de novembro de 1716.

142
Cartilha do Companheiro

Evolução da Alquimia e
da Cabala

O gue existe de veíd ad e sobre suas


influências na A rte R eal

Toda alquimia se baseia no princípio fundamental que segue: O


que está em cima é com o o que está em baixo. (O que o céu
mostra tam bém a terra frequentem ente possui.) In “A Obra
Secreta da Filosofia de Hermes Trimegistos”, de Jean D’Espagnet,
p. 16.

Que é alquimia? Se consultarmos o dicionário, ele nos dirá:


ALQUIMIA s.f. Arte quimérica que procurava descobrir o
elixir da vida e a pedra filosofal; química da Idade Média. Do
árabe alkimia.
O excelente “Dicionário Etimológico M açônico” de José
Castellani, traz o seguinte:

ALQUIMIA - Substantivo fem inino (do árabe: alkim ia), é a


arte que teve seu apogeu na Idade Média e que procurava des­
cobrir a pan aceia para curar todos os males, e a pedra filosofal,
para transmudar todos os metais em ouro e prata. Ela fo i pra­
ticada desde tempos muito antigos, no Egito, na Pérsia, na China,
na índia e na Grécia arcaica, atingindo seu pon to m áxim o na
época medieval, quando fo i introduzida, pelos árabes, n o Oci­
dente (no século VII). Em bora qualquer referência a essa arte
sem p re seja a alqu im ia prática, precu rsora d a qu ím ica e

143
Castellani e Rodrigues

estabelecida p elo m édico suíço Teophrastus Bom bastus von


H obenheim , mais conhecido com o Paracelso (1493-1S41)1, exis­
tia, tam bém , a alquimia mística, muito associada à magia. A
Maçottaria, para a concretização de sua doutrina, sofreu grande
influência da alquimia, já que, em determinada época, já no final
d a Id a d e M édia e c o m eço da era M oderna, os alquim istas
infiltram-se nos agrupamentos m açônicos, que lhes davam li­
berdade de associação e de m ovim entação, tâo cerceada, na
época, p o r soberanos absolutistas, senhores feudais e dignida­
des eclesiásticas. Na doutrina m açônica e no cerimonial de muitos
ritos são encontrados os quatro elementos aristotélicos {ar, água,
fogo e terra), além das substâncias necessárias à G rande Obra,
ou O bra do S ol (transmutação dos metais em ouro): sal, enxofre
e mercúrio.

Alquimia é o conjunto de conhecimentos empíricos, adquiri­


dos pelos precursores da química.
Há dois tipos de alquimia: a prática ou experimentai e a
mística.
A primeira se entregava, de corpo e alma, à busca do elix ir
d a lon ga v id a e a ver se conseguia transformar metais secundários
em ouro e em prata. Quanto à segunda, pregava que o homem
precisava renascer e partir em busca da gnose.
Com a invasão árabe do Egito, por volta do século VII, e
depois da Síria e da Pérsia, a alquimia ficou sendo conhecida também
no Ocidente.
Para evitar perseguições, como aconteceu muitas vezes com
todos aqueles homens que, no transcurso da evolução, por se en­
tregarem à investigação dos mistérios da vida, os alquimistas viram-se
obrigados a esconder seus ensinamentos, usando linguagem simbó­
lica, lançando mão de termos como enxofre, mercúrio, sal, azoto,
nitrogênio. Tais palavras, eminentemente enigmáticas para o povo,
em geral, acobertavam ensinamentos de origem cósmica, da mais
alta significação.
A alquimia prática, também chamada de experimental, teve

144
Cartilha do Companheiro

os seus mestres como, por exemplo, jabir ibu Hayyan que aceitava
a teoria dos quatro elementos e acrescentava-lhes dois elementos
especiais: o mercúrio e o enxofre.
Para Hayyan, o o uro seria formado de mercúrio puro; já a
prata nada mais era que o resíduo obtido através da fusão da galena.
Pa tacei so e seus discípulos ensinavam que o mercúrio, o en­
xofre e o saí constituíam o trio fundamentai (tría prima).
Os alquimistas estabeleciam relacionamento entre os Anjos
lunares, que governavam as marés, e o Sal; entre os espíritos de
M arte e o enxofre; entre os senhores de Mercúrio com o metal M er­
cúrio. Esta simbólica representação tinha o fito de fazer com que os
alquimistas se livrassem da intolerância religiosa. A grande m assa
da população não tinha nem cabeça e nem meios para entender as
verdades contidas na filosotía hermética.
Penetrando na Espanha, os árabes trouxeram para a Europa
os seus conhecimentos de alquimia. Daí por diante, as Universidades
passaram a ministrá-la em seus cursos ao lado das matemáticas e
da filosofia grega.
Pensa-se que as origens da alquimia têm suas raízes na
Alexandria, onde surgiu nos primeiros séculos de nossa era.
E interessante a com paração que Francis Bacon faz da
alquim ia:

A alquimia p od e ser com parada a o hom em que disse a os filhos


que lhes deixara ouro enterrado em algum lugar na sua vinha;
cavando nesta, não encontraram o ouro, mas devido a revol­
verem a terra junto às raízes da vinha tiveram abundante vindima.
D o m esm o m odo, as investigações e tentativas p ara fa zer
ou ro deram origem a muitas d escob ertas úteis e experiências
instrutivas.

Alguns símbolos alquimistas e cabalistas foram introduzidos


na Maçonaria no século XVII.
A busca incessante dos alquimistas era gerada pela curiosi­
dade e pela dúvida.

145
Castellani e Rodrigues

Por falar em duvida, é bom lembrar que no Grau de Compa­


nheiro é ensinado que a duvida é uma das forças de ação do homem.
Daí por que é preciso buscar, é preciso agir.
O aforismo de Leibniz - o que não age não existe - é um dos
fundamentos das doutrinas do Segundo Grau.
Cabe ao Companheiro, de dúvida em dúvida, partir em busca
da sabedoria. Deve, no entanto, lembrar-se que a inteligência, por
si só, é incapaz de chegar à sabedoria. A inteligência não pode ser
negligente no que respeita à espiritualidade. Alguém já disse que “a
luz da mais brilhante inteligência deixará de brilhar se for abando­
nada pelos raios da vida do sol espiritual”.

NOTA

1 Paracelso (Philippus Aureolas Thophrastus Bom ba st von Hohenheim)


- Nasceu em Basiléia, a 17 de dezembro de 1493 e faleceu em Salzburg, a
24 de setembro de 1541. Sua morte ocorreu em circunstâncias bastante
obscuras.
Paracelso foi médico, filósofo, hermetista e alquimista. Levou uma vida
errante e, tendo voltado a Basiléia, tornou-se professor na Universidade
onde estudara, Foi coguominado de “Lutero da medicina” por ter quei­
mado as obras de Galeno e de Avicena. Isto, ele o fez, na rua, em frente ao
edifício da Universidade e em meio a aclamação dos estudantes. Tai gesto
lhe proporcionou um grande número de inimigos, razão por que teve
que fugir de Basiléia, em 1528.
Paracelso não só se opôs às teorias de Galeno e Avicena, mas a toda
medicina praticada no passado e àquela que era praticada no seu tempo,
procurando impor seus próprios métodos de cura. Adquiriu fama com
a publicação do livro “Grande Tratado de Cirurgia”.
E considerado o fundador da moderna ciência da medicina, tendo sido o
inspirador da “Teoria magnética de Mesmer”, Inspirou, ainda, idéias
como “teoria dos corpos astrais”, adotada pelos espíritas.
A verdade é que Paracelso envidou esforços para promover o progresso
da medicina. Os fundamentos de seu sistema estavam arrimados em urna
filosofia de tendências neoplatônicas, através da qual a vida do homem é
vista como algo inseparável do Universo, revitalizando, deste modo, a

148
Cartilha do Companheiro

concepção, nascida na Grécia clássica - a idéia de que o ser humano é um


microcosmo.
Para ele, o corpo humano era, primariamente, um composto de enxofre,
sal e mercúrio. As doenças surgiam quando acontecia a separação desses
elementos.
Além do mais, Para celso queria que o médico conhecesse a alquimia, as
ciências físicas, a astronomia, a filosofia e a teologia, pois além do corpo
e do espírito, havia no ser humano um terceiro elemento, criado por
Deus, a alma.
Por aí se vê que Para celso, às vezes, se torna bastante obscuro, misto de
cientista e de mago.
Para muitos estudiosos, Paraeelso conserva o prestígio de sábio, iniciado
nos mais altos e valiosos segredos.

147
Castellani e Rodrigues

148
Cartilha do Companheiro

A C a b a la

Alguns estudiosos creem e outros afirmam peremptoriámente


que a essência da cabala é o alicerce sobre o qual se apruma o
edificio majestoso da Arte Real. Existe alguma exagera çã o em tal
afirmativa, não se podendo, entretanto, negar que o Segundo Grau
apresenta alguns resquicios da influencia cabalística, sobretudo onde
se projeta com todo vigor a dualidade do SER e do NÃO SER.
Apesar de ter sofrido influencias dos iluministas, alquimistas,
cabalistas, não se deve perder de vista que a Maçonaria Especulativa
é uma continuação da M açonaria Operativa, da qual conservou
práticas, usos e costumes.
Theobaldo Varoli Filho, na sua excelente obra (Curso de M aço­
naria Simbólica, Tomo II, pág. 34) afirma que a cabala é tipica­
mente judaica.
Já Fulcanelli, na sua monumental “As Mansões Filosofais”,
pág. 90, escreve:

A cabala hermética era conhecida no Egipto, pelo m enos pela


casta sacerdotal, com o é testemunha a invocação d o P apiro d e
L ey d e:

Invoco-te a ti, o mais p oderoso dos deuses, que tudo criaste; tu,
nascido de ti mesmo, que tudo ves, sem pod er ser insto... Invo­
co-te pelo nom e que tens na língua das aves, na d os hieróglifos,
na dos judeus, na dos egipcios, na dos cinocéfalos... na dos
gaviões, na Kngua hiem tica.

149
Castellani e Rodrigues

C astellan i, com a p ro ficiên cia que ihe reconhecem os


(Dicionário Etimológico M açônico), ensina:

Cabala - substantivo fem inino - (do hebraico: K abbalá - tradi­


ção), é a essência do misticismo hebraico, com o interpretação
esotérica da Torá (os cinco primeiros livros bíblicos , o Penta­
teuco). Com o doutrina mística é muito antiga e, apesar da influên­
cia de outras culturas, conservou sem pre sua primitiva origina­
lidade e toda a beleza e profundidade espiritual.

Alguns filólogos afirmam que a raiz de que se deriva a palavra


cabala significa receber. Daí se poder concluir que o verdadeiro
significado do termo seria receb er p o r trad ição. Portanto, a doutrina
cabalística representaria um sistema de ensinamentos orais, trans­
mitidos de geração a geração de sacerdotes.
A cabala judaica é vista por muitos como a única e universal
fonte de sabedoria e nela estão contidos os segredos dos mistérios
metafísicos e divinos da natureza, sobretudo os mistérios contidos
na Bíblia cristã.
O Sepher h a Z o h a r (Livro do Esplendor) seria, assim, o te­
souro esotérico de todos os mistérios do Evangelho, enquanto que o
S ep h er Yetsira (Livro da Criação) seria a luz que dissipa toda a
obscuridade, a chave de todos os enigmas da natureza.
Através da cabala as profecias podem ser entendidas e pode-se
ter a noção exata da existência do Grande Arquiteto do Universo.
Há quem ensine que a cabala era uma introdução ao estudo
de todas as ciências.
O mais erudito cabalista da Idade Média, Paracelso, asse­
gura que a linguagem numérica dos livros cabalistas ensina não
as verdades de uma religião em particular, mas as verdades
universais.
Varoli (op. cit.) diz:

Voltando à cabala a verdade é que ela fo i enxertada nos ensina­


m entos m açôn icos. Seu desen volvim en to se p ro cessa com

150
Cartilha do Companheiro

cim ento de doutrinas egípcias, persas e gregas e de pensadores


partidários da conciliação das filosofias grega e mosaica.

Conforme dissemos, a doutrina cabalística representaria um


sistema de ensinamentos orais, passados de uma a outra geração de
sacerdotes, como aconteceu com a doutrina dos brâmanes, antes de
se tornar manuscrito.
Temos como certo que os judeus herdaram dos caldeus os
ensinamentos cabalísticos.
Seria vã uma discussão em torno da época em que surgiu o
Z ohar. um século antes de Cristo? N o primeiro século de nossa
era? O que é certo e inquestionável é que sempre existiu, entre os
judeus, uma literatura cabalística e, embota não se possa diagnos­
ticar-lhe a história, a não ser a partir da época do cativeiro, sabe-se
que os documentos dessa literatura, desde o Torá ao Talmude, fo­
ram sempre transmitidos numa linguagem diferente e até mesmo
misteriosa, formando, na realidade, uma sucessão de memórias sim­
bólicas que os judeus haviam copiado nos santuários caldeus e egíp­
cios e adaptando-as ao seu próprio uso.
Alguns cabalistas, talvez sem se firmarem em base séria, afir­
mam que a sabedoria cabalística foi transmitida oralmente durante
séculos e séculos, todavia é impossível negar que antes do primeiro
século de nossa era nada se escrevera sobre os conhecimentos que se
encontram na cabala.
Os ensinamentos do Zobar foram publicados pela primeira
vez entre os anos 70 e 110. Esses escritos se perderam, ficando o seu
texto disperso em alguns manuscritos, até o século XIII. Foi Moisés
Leon (1250-1305) quem compilou o atual livro Zohar.
Concordamos com os autores, inclusive Varoli, que m uitas
in terpretações ca b a lística s (diriamos alg u m as interpretações) fa­
zem parte da doutrina secreta maçônica, uma vez que são perfecta­
mente adequadas aos intuitos maçônicos de construção social.
O que não se pode desconhecer é que as conclusões dos
cabalistas, no que toca à natureza dos mistérios ensinados no Zohar

151
Casteilani e Rodrigues

são, varias vezes, desencontradas, chegando mesmo a contradizer-se.


Todavia, isto é per feita mente explicável, visto que os antigos alqui­
mistas não deixaram a chave de seus escritos, transformando-os em
mistérios embutidos, em mistérios mais antigos. Assim, a interpre­
tação da cabala é feita tão somente à luz que os místicos medievais
projetaram sobre ela.
De fato, é necessário que se atente bem para o significado de
certos termos empregados no Zohar, porque nem sempre se tem certeza
se sua significação é denotativa ou conotativa. Vejamos um exemplo:

A criação (o Universo m anifestado) é a vestimenta daqu ele que


n ão tem n om e (o grifo ê nosso), a vestim enta tecida com a
p ró p ria substância d a D ivindade... (idetn). Porque, em bora
o Oculto dos Ocultos, para se manifestar a nós, produzisse as
dez em anações (Sephiroth) cham adas a Form a d e Deus, a For­
m a do H om em celeste, esta luminosa Form a era dem asiado
ofuscante à nossa vista e p or isso ele assumiu outra Forma, pôs
outra vestimenta, que é o Universo. Portanto, o Universo ou
Mundo visível é uma expansão posterior da Divina Substância, e
a cabala o chanta A. Vestimenta d e Deus (Zohar, I, 2'1).

N ão se pode negar que a interpretação do texto acima apre­


senta dificuldades sem conta.
Varoli, estudioso do assunto, afirma;

... não há estranhar que grande parte dos Sím bolos M açônicos
do Grau de Com panheiro seja sem elhante a tantos outros da
velha m agia, d a alqu im ia m ística, da c a b a la hebraica, da c a ­
b a la cristã ou mista, do ocultismo ou de outras correntes d o
pen sam ento m ágico. A M açonarta consen>ott tais Sím bolos,
mas não lhes adotou os m esm os significados, respeitando-lhes,
entretanto, o caráter histórico e a influência que exerceu na
evolução d o pensam ento (op. cit., p. 10/11).

É de ver-se, no entanto, que a Maçonaria somente sofreu tais


influências a partir do séc. XV II, conforme afirmam alguns bons
autores, inclusive o próprio Varoli.

152
Cartilha do Companheiro

O Ser

Para que se possa compreender o capítulo seguinte que abarca


a Dualidade do SER e do NAO SER, é necessário façamos um
pequeno passeio pelos campos da Ontologia.
Ontologia é a parte da metafísica que reflexiona sobre os
seres em geral.
Usada no plural, a palavra seres indica tudo o que existe. No
singular, ser é o ente, o vívente, o organismo, a pessoa física ou
moral.
A questão do ser, pode-se afirmar, é a menina dos olhos da
filosofia. Já os primeiros filósofos, os pré-socráticos todos, se debru­
çaram sobre o problema, procurando decifrar-lhe os mistérios. E,
especialmente no Segundo Grau, não há como fugir do tema.
A filosofia se constitui de três momentos: do ser, do co n h ec i­
m en to , da linguagem .
Por aí, pode-se aquilatar a importância do ser; sem o ser não
existiría o conhecimento, não existiría a linguagem. E é necessário
que não se perca de vista que o problema do ser se consubstancia no
problema do pensar. Para que se busque o ser c necessário pensar. E
pensar significa, sem dúvida alguma, conhecer.
Já Anaximandro de M ileto1, o segundo dos filósofos jônios,
discípulo de Tales, tinha a primeira intuição ou, talvez, a primeira
visão do SER, quando afirma que o á p eiron - para ele, a substân­
cia geradora de todas as coisas - é algo incriado e impereeível.

153
Castellani e Rodrigues

Pode-se perfeitamente intuir que algo que é incriado é porque não se


originou de nenhuma outra substância; se é im perecível, é porque é
eterno, não terá fim.
Temos, de nós para nós, que esta maneira de raciocinar de
Anaximandro modificou completamente toda a trajetória do pensa­
mento grego. Nasce, aí, a necessidade da busca. E, hoje, sabemos
que tudo se resume na busca. Quando se busca, aprende-se. Portanto,
o conhecimento é o resultado da busca. Para que se busque, é neces­
sário que se pense. E o pensamento é o caminho que nos leva ao
conhecimento do SER.
A primeira coisa que nos ocorre quando nos vemos diante da
teoria do ser é a pergunta: que é o ser?
Formulada a pergunta, espera-se que uma resposta seja ¡media­
tamente engendrada e traga em seu bojo a verdade da afirmação.
Entretanto, a resposta não é tão fácil quanto se possa, à pri­
meira vista, imaginar.
Além da pergunta - que é o ser?, outras podem ser formula­
das, como, por exemplo, quem é o ser?
Primeramente, vejamos o que se pode responder, quando a
pergunta é - que é o ser?
Para alguns filósofos essa pergunta é irrespondível, pois não
existe conceituação mais geral que a de ser. E é certo que não existe
conceituação na qual não caiba o ser.
Para HegeE (só para exemplificar), o conceito do ‘‘ser” se
identifica com o conceito do “nada”, exatamente porque do “ser”
nada se pode predicar. E Hegel acrescenta que do “nada” não pode­
mos predicar nada. E ajunta: “E, de outra parte, do ser podemos
predicar tudo, o que equivale exatamente a não se poder predicar
nada”.
O filósofo Garcia Morente3 analisa a pergunta “quem é o
ser?” da seguinte maneira:

‘ Se refletirmos sobre esta pergunta: “quem ê o ser? ” verificaremos

154
Cartilha do Companheiro

que esta pergunta implica algo estranho e curioso. Perguntar


“quem é o ser ” parece querer dizer que não sabem os quem é o
ser, que não conhecem os o ser, e, ademais, que há diferentes
pretensões, mais ou m enos legítimas, a ser o ser, que diferentes
coisas pretendem ser o ser e que nós nos venios obrigados a
examinar quai dessas coisas p odem ostentar legítimamente o
apelido de “ser", A pergunta quem é o ser, supõe, pois, a distin­
ção entre o ser que o é de verdade e o ser que não o é de verdade;
supõe uma distinção entre o ser autêntico e o inautêntico ou
falso. Ou, com o diziam os gregos, com o dizia Platão, entre o ser
que é e o ser que não é, Esta distinção é, com efeito, algo que está
contido na pergunta: quem ê o ser? E com o poderem os, então,
descobrir quem é o ser, se são vários os pretendentes a essa
dignidade? Pois poderem os descobri-lo, quando aplicarm os a
cada um desses pretendentes o critério das duas perguntas (“Fun­
damentos de Filosofia”, pág. 61).

Pelo que aí fica podem os menos habituados às lides da filo­


sofia pura verificar as razões por que os livros que tratam do Segundo
Grau falam pouco ou nada da Dualidade do SER e do NÃO SER.
Parece-nos que não há por que fugir do assunto que é, sem dúvida
alguma, fascinante.

NOTAS

1 Anaximandro - Nasceu em Mileto na segunda metade do século VII a. C.


e morreu no século VI a. C.. E o segundo entre os filósofos da Escola
Jónica, tendo sido discípulo de Tales de Mileto.
É de sita autoria o livro “Acerca da Natureza”, do qual alguns fragmentos
chegaram até nossos dias. O que causa admiração é ele ter lançado mão
da prosa, em uma época em que só a poesia era utilizada.
Anaxiniandró não aceitou os ensinamentos de Tales que afirmava ser a
água a substância de que tudo se gerara; para ele, as coisas se haviam
originado de uma substância etérea, invisível e infinita que, por sua vez,
não se originara de nada. Para ele esta coisa era algo material, mas não era
nada que se pudesse determinar e, sim, algo indefinido que ele batizou de
ápeiron, A argumentação de Anaximandro foi realmente extraordinária.

155
Castetlani e Rodrigues

Se o âpeiron era incriado, é porque não se originara de nenhuma outra


substância; se era imperecível, é porque não teria fim. Tal maneira de
pensar modificava roda a trajetória do pensamento grego no campo da
divindade, fugindo completamente da tradição mítica.
Apesar de não possuir uma tradição filosófica atrás de sj, Anaximandro
apresentou um sistema tão completo, com aspectos quase geniais, que,
em muitos pontos, não foi ultrapassado no período pré-socrárico.
- Hegel (George Wilhelm Friedrich Hegel) - Nasceu em Stuttgart em 1770.
Foi professor das Universidades de Heidelberg e de Berlim, tendo chegado
a Reitor desta última. Faleceu em 1831, vítima do cólera morbo que
então assolava a Europa.
Flegel é o filósofo da “Razão absoluta”. Ensina que o absoluto - que
deve ser sempre o ponto de partida - é a razão. Enquanto alguns filósofos
ficam perturbados diante do problema do absoluto, o mesmo não acon­
tece com Hegel. Diz ele: “Os homens, atônitos ante a dificuldade em
conceber o SER, que tudo abrange, têm procurado a sua essência, justa­
mente fora da realidade, isto é, fora das contradições que ELE não pode
deixar de encerrar. Assim é que os Eleatas não aceitam senão um Ser
imóvel, e declaram constituírem ilusões o movimento e a mudança. Daí as
antinomias insolúveis que se têm sucedido na História do Pensamento.
Talvez a parte mais construtiva da obra de Hegel resida na sua concepção
- e aí ele acompanha Herãclito - do dinamismo universal, no seu empenho
em reafirmar que os processos da natureza obedecem a uma sequência
racional. Para ele, a Metafísica é falsa quando foge ou desvirtua a realida­
de. Só pode ser aceita se considera a realidade em todos os seus elemen­
tos, em todos os seus aspectos, inclusive em suas contradições.
E marcante a presença de Hegel no campo da hisroriografia, assunto que
é por ele tratado com grande competência na sua obra “Filosofia da
História”.
É justo, afirma ele, exigir que toda história, qualquer que seja o seu
objetivo, exponha os fatos imparcial mente, sem que se pretenda impor-lhe
nenhum interesse particular, nenhum fim especial.
Foi um insistente pregador da tolerância, tanto no campo da religião
quanto das idéias políticas.
Obras: “História da Filosofia”, “A Ciência da Lógica”, “Filosofia da
História”, “Enciclopédia das Ciências Filosóficas”, “Fundamentos da
Filosofia do Direito”, etc.
J Mótente (Manuel Garcia Morente) - Filósofo espanhol; nasceu em 1886

158
Cartilha do Companheiro

c faleceu em 1942. Foi catedrático dc Ética na Universidade de Madri.


Notável filósofo e excelente professor. Traduziu Descartes, Kant, Spengfe);
Bergson e vários outros autores.
Estudando Garcia Morente, como muito bem diz seu tradutor para a
língua portuguesa, assiste-se ao desdobramento histórico dos dois pro­
blemas fundamentais da Ontologia: o da realidade e o do ser enquanto
ser, enquanto “é algo em si”, enquanto “é”, enquanto “algo” e enquanto
“em si”.
Em 1937, ministrou na Universidade de Tucumán, na Argentina, um
notável curso de filosofia, cujas aulas foram reunidas em livro, publicado
na Espanha, com o título de “Leciones Preliminares de Filosofia”, tradu­
zido para o nosso idioma pelo filósofo Guilhermo de la Cruz Coronado,
com o título de “Fundamentos de Filosofia” e publicado pela Editora
Mestre Jou, de São Paulo, em 1964; de lá para cá várias edições já foram
tiradas da notável obra de Morente.

157
Castellani e Rodrigues

158
Cartilha do Companheiro

Sobre a Dualidade do Ser


e do N a o S er

Para iniciarmos a análise filosófica da dualidade do SER e


do NÃO SER, vejamos o que nos diz José Castellani, na sua exce­
lente obra “A Ciência Maçônica e as Antigas Civilizações”, às pá­
ginas 73:

Toda a filosofia mística da Cabala é baseada no conhecim ento


do absoluto, do impenetrável, da sabedoria cristalizada no A dão
Kadm on, que representa o m icrocosm o da especie Inimana,
perante o m acrocosm o divino. A instituição m açônica segue
essa filosofia cabalística, na sua busca incessante da verdade e
da sabedoria, baseada nas conotações da alm a humana em suas
relações com o infinito (En-Soph). Dos Graus Simbólicos, o
mais cabalístico é o d e Com panheiro, onde interessa a dualidade
do SER e NÃ O SER, do Yetsira, e a tríplice com posição da alm a
humana, do Zóar.

Um estudo cm profundidade nos revela a influência de vários


e grandes filósofos na feitura dos alicerces sobre os quais se ergue o
m ajestoso edifício do Grau de Com panheiro: os Pitagóricos,
Parmênides', Platão, Sócrates2, Aristóteles, Duns Scot2, Ockham4 e
muitos outros.
Mas vamos à dualidade do SER e do NÃO SER, representada
no Grau de Companheiro pelo número 2.
Antes de mais nada, vejamos o que significa, em filosofia, a
palavra ser.
O filósofo William de Ockham, na sua obra “Suma de Toda

159
Castellani e Rodrigues

a Lógica”, I, cap. 38, diz que “Acerca do ser, convém primeiramente


saber que se pode tornar ser de dois modos. Um primeiro sentido,
entende-se por essa palavra ser algo ao qual corresponde um con­
ceito comum a tudo e predicável de tudo quanto à essência, da
mesma maneira como um predicado pode ser predicado essencial­
mente... Não obstante haver assim um conceito comum de todo ser,
a palavra s e r é equívoca porque não se predica segundo um só
conceito de todos os sujeitos, quando tomados significativamente,
mas diversos conceitos correspondem a essa denominação. Que,
porém, alguma cois a não é s e r essencialmente e outra acidental­
mente, patenteia-se logo, pois não há coisa alguma que não seja
substância ou acidente, e tanto substância como o acidente são ser.
Igualmente o ser se distingue em ser potencial e ser atual. Isso não
significa que algo não existente na natureza das coisas, mas que
pode existir, seja verdadeiramente ser ou que alguma coisa além do
que há na natureza seja também ser”.
O primeiro filósofo a tratar da questão do SER foi Parmênides
de Eleia, talvez o maior entre os pré-socráticos e considerado o
maior espírito de seu tempo.
Examinando a filosofia de Heráclito5, Parmênides descobre
que, por ela, o SER e o NÃO SER são a mesma coisa. Conclui que
isto se constitui num verdadeiro absurdo. Raciocina: ora, como é
que o ser q u e é, deixa de ser o que é para ser outra coisa? Se tal
acontecesse, o ser que se transforma em outra coisa poderia deixar
de ser essa outra coisa, para se transformar em outra. E o filósofo
faz a seguinte indagação: como é possível que o que é não seja, e o
que não é seja? E conclui: o SER é, o Não SER não é. Parmênides
descobre, então, o princípio lógico do pensamento, formulando-o
em termos definitivos.
Conforme já dissemos, um dos fundamentos da doutrina de
ação incorporada no Grau de Companheiro é o célebre aforismo de
Leibniz - o q u e n ã o a g e n ã o existe!

160
Cartilha do Companheiro

A dualidade do SER e NÃO SER exige do Companheiro-


Maçom que ele use constantemente a meditação, o pensar.
Se quisermos falar do ser, se desejarmos discutir o ser, se dese­
jarmos penetrar na essência da dualidade do SER e NÃO SER, preci­
samos pensar. Pensar é urna arte e a arte de pensar não é fácil.
Um dos pilares que sustentam a filosofía do Segundo Grau é
o aforismo do filósofo francés René Descartes: se duvido, penso; se
penso, existo.
O pensar tem sempre o ser como alvo principal. Quando se
pensa, o ato de pensar estará sempre ligado ao ser e acreditamos
que se não existisse essa ligação, não existiría o pensar, haveria,
talvez, um simples refletir.
Somos obrigados a pensar fundo quando nos entretemos no
estudo do SER em contraposição ao NÃO SER. O único caminho
certo, neste caso, é o uso do pensamento. É preciso que se pense
para que se chegue a saber que o q u e é, é, já que o SER é, e o NÃO
SER não é.
Para que se entenda até onde vai o pensamento filosófico de
Parménides, vejamos o que diz Garcia Morente (op. cit., pág. 75):

Se fizerm os o balanço dos resultados obtidos p o r Parménides,


encontrar-nos-em os verdadeiram ente m aravilhados diante da
colheita filosófica deste hom em gigantesco. Ele descobre o prin­
cipio da identidade, mas, além disso, afirm a im ediatam ente a
tese de que, para descobrir que é o que é na realidade, não
tem os ou tro guia que n osso pen sam ento lógico e racional.
Q uer dizer, assenta a tese fundam ental de que as coisas fo ra de
mim, o ser fora de mim é exatam ente idêntico a o meu pen sa­
m ento do ser. A quilo que eu não puder pensar p or ser absurdo
pensá-lo, não pod erá ser na realidade e, p o r conseguinte, não
necessitarei p ara conhecer a autêntica realidade do ser, sair de
mim m esm o, m as som ente tirando a lei fundam ental d e meu
pensam ento lógico, fechan do os olhos a tudo, som ente pen­
sando um p ou co coerentem ente, descobrirei as propriedades
essenciais d o ser.

161
Castellani e Rodrigues

O estudo, a pesquisa, o trabalho, a luta, tudo gira em torno


do homem, em torno do ser (ente). Filosoficamente sabemos que a
existência humana pressupõe a questão do ser. E não nos devemos
confinar em Parménides ao buscar a verdade sobre se o SER é, o
NÃO SER não é. Muitos séculos depois, Tomás de Aquino6 (in De
potentia, 7, 2 ad 9) preceitua que ao ser não se pode acrescentar
nada que lhe seja estranho, com exceção do NÃO SER, que não
pode ser nem forma nem materia.
É de ver-se que o assunto está muito bem definido por Platão
(Fedon, 103 d). Nesta obra o grande filósofo grego estabelece a
diferença que há entre os modos de participação da essência no
sensível que claramente se manifesta no governo das essências entre
si. Isto nos leva à conclusão, não raras vezes, que, de certo modo, o
NÃO SER se entrelaça ao SER.
Contudo, Platão, na obra citada, argumenta como poderla
ser tal coisa possível, quando se sabe que já Parménides afirmara
com toda a força de sua sabedoria que o SER é, que o NÃO SER
não é?7
Entretanto, para alguns filósofos modernos, não seria neces­
sário grande argumentação para provar que “sob um certo ângulo,
o NÃO SER existe e que, por sua vez, o SER, de alguma maneira,
não existe” .
Por aí se vê que o Companheiro-Maçom há de se dedicar a
fundo ao estudo da questão do ser que, sem dúvida alguma, é a que
mais polémicas tem levantado nos campos da filosofía.
Cumpre ainda assinalar que alguns entre os primeiros grandes
filósofos usaram a palavra para identificar Deus, como, v. gr., Lao
Tse*1 (in Tao Te King, trad. de Huberto Rohden, 3a ed., pág. 15,
1979):

Tudo o que existe egressa do Ser


E regressa a o Ser.
O Ser é o insondável Tao.
Das profundezas d o Ser

162
Cartilha do Companheiro

Nascem todos os seres que existem.


O Ser, porém ,
É o abism o d o N ão existir.

Para terminar, vejamos o que nos diz Mestre Varoli (op. cit.,
pág. 48):

A compreensão do mistério da união do SER, ou EJJ-SUPREMO


(Ani) com o NÃ O SF.R (Ain) num limite indizível, está em terceiro
ponto ou em três... Importante para o Com panheiro-M açom é
o binário Ser e N ão Ser (Ain) bem com o a com posição tentaria
d a alm a hum ana, com o o Z ohar a entende. Nephesh é a alm a
vegetativa ou material. N esham a, oposta à primeira, corres­
ponde à alm a espiritual.

NOTAS

1 Pamiênides - Nasceu em Eleia, colônia grega situada na Magna Grécia.


Segundo alguns autores, sua vida teria transcorrido entre 530 e 444
a.C.. E considerado como um dos maiores filósofos da Grécia antiga.
Influiu decisivamente na filosofia de Platão e na de Aristóteles. É a maior
figura da Escola de Eleia.
A filosofia de Parmênides se contrapõe à de Heráclito. Descobriu o prin­
cípio lógico do pensamento e formulou-o em termos definitivos: o SER E;
o NÃO SER, não É! Garcia Morente assinala que Parmênides imprimiu
ao pensamento uma trajetória que se mantém até hoje no mesmo rumo,
apesar de transcorridos vinte e cinco séculos. Vários fragmentos de sua
obra chegaram até nós.
2 Sócrates - Nasceu em Atenas em 469 a.C.. Uma das mais fascinantes
figuras, não só da filosofia grega, como da História Universal. Nunca
escreveu uma linha sequer. Sua filosofia chegou até nós através de
Xenofonte, Platão e Aristóteles. Sobretudo, através de Platão.
Sócrates fez do “conhece-te a ti mesmo”, máxima inscrita no frontispicio
do Templo de Delfos, a viga mestra de seu pensamento. Toda a sua
filosofia se baseia naquela inscrição, não com a simples significação de
um mero conhecimento pessoal, mas de um conhecimento que o levasse
à própria essência de seu espírito.

163
Castellani e Rodrigues

Segundo Aristóteles, Sócrates é o inventor do raciocínio indutivo» sendo,


assim, o iniciador da metafísica. Sócrates lançou mão da maicuI‘ca e da
ironia para confundir os sofistas e para transmitir o que sabia. Acusado
de faltar com o respeito aos deuses e de corromper a juventude» foi
condenado a morrer, bebendo cicuta, o que aconteceu em 399 a-C..
Como já ficou dito, Sócrates não escreveu uma só linha, mas a sua vida e,
sobretudo, a sua morte são o grande e eterno poema da filosofia do bem
e da moral.
3 Duns Scot - Nasceu em Roxburgo, na Escócia, em 1265. U*11 dos
maiores expoentes da filosofia escolástica, famoso pela originalidade do
seu sistema filosófico. Procurou realizar, e conseguiu, uma síntese filosó­
fica que fosse capaz de conciliar o que havia de melhor no arisfotelisnl°
com o que havia de melhor no agostinismo.
Sua obra contém 26 volumes, in folio, o que é surpreendente para c)uem
viveu apenas 43 anos. A maior parte de seus livros versa sobre comentá­
rios à obra aristotélica e à obra de Pedro Lombardo. Duns Scor faleceu
em 1308.
■* Ockham (William of Ockham) - Nasceu em Ockham em 1290- Para os
seus biógrafos, Ockham é a última grande figura da filosofia medieval e
aquele que preparou o fim da filosofia escolástica, repudiando os alicerces
sobre os quais ela se erguia: o valor universal do conhecimento humano
e a harmonia entre a fé e a razão.
Existe uma frase de Ockham que ficou célebre e que o colocou ef1 choque
aberto com a Igreja: Pluralistas non est ponenda sine necessita^ (Não se
deve multiplicar os seres sem necessidade). Convidado a apreseftar-se 30
Papa (Ockham era franciscano) não o fez, recebendo, então, 3 Pena dc
excomunhão. Baseado no princípio da desnecessária multiplicação dos
seres, critica duramente tanto Tomás de Aquino quanto Duns Scot-
Ockham entendia que Aristóteles estava sendo compreendido pel° avesso,
mormente por ter sido muito mal-interpretado por Duns Scot e seus
seguidores. Faleceu em 1349.
s Heráclito - Nasceu em Éfeso, na Ásia menor no séc. VI a.C.. fc filósofo
de renome; chegou a antecipar vários e muitos temas da filosofia contem­
porânea. Os fragmentos que dele se conhecem pertencem à 51,3 obta»
cujo título é o mesmo de obras de outros pré-socráticos: “Acerca da
Natureza”. Pelo lado da crítica, Heráclito segue a mesma estrada
palmilhada por Xenófanes de Cólofon. Criticou os grandes poetas

164
Cartilha do Companheiro

Homero e Hesíodo, afirmando que des não tinham o saber, não eram
donos do conhecimento. Abriu também polêmica contra Pitágoras,
Xenófanes e Hecateu.
A maior contribuição de Herãclito à filosofia é, sem dúvida nenhuma, a
afirmativa de que no Universo tudo está em contínuo movimento, em
eterna mudança. É dele a célebre frase: “É impossível banhar-se alguém
duas vezes no mesmo rio". Para ele, tudo é vir-a-ser, tudo muda, tudo se
transforma. Nada existe que seja permanente. Todas as coisas procedem
do fogo, devido aos movimentos ascendente e descendente. O fogo se
condensa e vira ar, água e terra, quando o movimento é descendente; ao
contrário, quando o movimento é ascendente aqueles elementos se rare-
fazem e voltam ao estado de fogo. Existe uma lei que regula esses movi­
mentos, é o logos, causa da ordem e da harmonia das coisas.
6 Tomás de Aquino - Nasceu no castelo de Roccasecca, no burgo de
Aquino, na Itália, em 1225. Começou seus estudos com os frades
beneditinos de Monte Cassino. Durante seis anos frequentou a Universi­
dade de Nápoles, para onde ingressara em 1239. Apesar da oposição da
família, ingressou na Ordem Dominicana, tornando-se discípulo de
Alberto Magno, o mais eminente aristotélico entre os filósofos da época.
Foi muito grande a influência exercida por Alberto Magno sobre o jo­
vem dominicano, sobretudo no que diz respeito à preparação filosófica.
Tendo obtido o grau de mestre em teologia, foi para Paris, onde passou
a ensinar essa disciplina, na Sorbone.
Naquele tempo, a reitoria da Universidade não via com bons olhos os
dominicanos devido ao seu aristotelismo. A filosofia aristotélica estava
sob suspeita herética e os filhos de São Domingos eram acusados de
nutrir simpatia pelos seguidores de Avetróis que, em grande número,
frequentavam a Sorbone.
Os seguidores de Averróis, baseados na interpretação que eles mesmos
faziam de Aristóteles, defendiam a tese de que a alma, enquanto individual,
não era imortal. Diziam eles que a alma nada mais era que o princípio vital,
e definiam-na como sendo a essência (material do corpo humano e que a
imortalidade pertencia tão somente ao intelecto,
Quando se viram em palpos de aranha, pois a tal doutrina foi considerada
herética, porque contrária à fé católica, inventaram algumas desculpas e
buscaram abrigo no subterfúgio da “dupla verdade”: uma, baseada na
filosofia; outra, baseada na revelação. A primeira, portanto, tinha por
alicerce a razão, e a segunda, a teologia.

165
Castellani e Rodrigues

Diante disto, Aristóteles ficou sendo olhado com desconfiança e o grande


trabalho de Tomás de Aquino era o de tentar desfazer o mal causado pela
adesão, sem maiores estudos, às doutrinas dos árabes, E, nisto, saiu-se
maravilhosamente bem.
E Tomás de Aquino tinha meios de sair vitorioso dessa empreitada por­
que, ao contrário de seus predecessores, conhecia já, a fundo, os ensina­
mentos de Aristóteles.
Começou por defender a tese de que não existia o tal "intelecto da huma­
nidade” de que todos os homens eram partícipes, como ensinavam os
seguidores de Averróís. Fê-lo de maneira clara, alicerçado em argumenta­
ção difícil de ser contrariada, partindo do princípio de que cada homem
possui inteligência independente, o que faz com que haja unicidade entre
a alma e a pessoa. Contestou, outrossini, as heresias todas existentes na
época e fez tudo, aplicando a lógica aristotélica, que considerava como
sendo a regra segura para quem parte à procura da verdade.
Além de tudo, não foi pequeno seu empenho em persuadir a igreja de que
deveria preferir o sistema aristotélico ao sistema de Platão, para servir de
base à filosofia cristã.
Depois de alguns anos em Paris, Tomás de Aquino regressou à Itália e
passou seus últimos anos de vida no convento de Nápoles. Foi por esse
tempo que compôs a Suma Teológica.
Em janeiro de 1274, dirigia-se a Lion, para tomar parte no Concibo que
ali se realizaria, atendendo a convite do Papa Gregorio X. Ao chegar a
Fossanova, e estando em casa de uma sobrinha, sentiu-se mal. Pediu que
o levassem para o claustro dos monges cistercienses, onde veio a falecer
em 7 de março de 1274. Perdia a Igreja e perdia o mundo um dos maiores
filósofos de rodos os tempos.
Os escritos de Santo Tomás de Aquino englobam os mais variados assuntos
e são divididos em quatro grupos: obras sistemáticas, questões disputadas,
comentários filosóficos e comentários sobre a Sagrada Escritura.
1. Obras sistemáticas: In quartuor libros sententiarum (Sobre os Quatro
Livros das Sentenças), Suma contra gentiles (Suma contra os Gentios),
Summa Teológica (Suma Teológica).
2. Questões disputadas: De veritate (Sobre a Verdade), De potentia (So­
bre a Potência), De maio (Sobre o Mal), De anima (Sobre a Alma), De
virtutibus (Sobre a Virrude).
3. Comentários filosóficos: A Física, A Metafísica, A Ética, A Política,
Analíticos posteriores. Além desses comentários sobre as obras de

166
Cartilha do Companheiro

Aristóteles, Tomás de Aquino escreveu mais dois ensaios filosóficos: De


ente et essentia (Sobre o Ser e a Essência) e De regimine principium (Sobre
o Governo dos Príncipes). Este é um tratado sobre política e aquele, um
tratado sobre metafísica.
' Um dos últimos livros de Platão é o “Sofista”. Neste livro, no que diz
respeito ao Ser, em muitos pomos, Platão contradiz as suas doutrinas
anteriores, coisa perfeitamente normal para quem estuda e que, por vezes,
vê-se forçado a abandonar o que antes julgara certo.
s Lao Tse - Viveu no 6“ séc. a.C., não se sabendo com certeza onde e
quando nasceu. Sabe-se que os primeiros 40 anos de vida, ele os passou
na corte imperial cbínesa, onde exerceu os cargos de bibliotecário e histo­
riador. Ao atingir a idade madura, abandonou a vida que levava na corte
e tornou-se eremita, passando a viver em uma floresta, meditando e
estudando.
Sua obra Tao TeKing (O Livro que Revela Deus) apresenta em seus 81
curtos capítulos (curtíssimos alguns) a mais profunda sabedoria, Lao
Tse professa um saber filosófico só comparável àquele dos grandes
avatares da humanidade. Aliás, ele pertence àquela elite espiritual quer
do Oriente, quer do Ocidente, que mais fundo penetrou nos mistérios
mais avançados da cultura espiritual da humanidade.
É interessante verificar-se que a filosofia de Lao Tse é um constante cami­
nhar em busca do Tao, numa conceituação bem clara do Deus-cósmico.
Por isso ele diz:
Quem é em polgado pela alma do Universo, alarga o seu coração;
e o hom em de coração aberto é tolerante.
E o hom em tolerante é nobre e cumpre a determinação da ordem
cósm ica, identifica-se com o TAO, é imortal com o o TAO
e não fica à m ercê d o destino.
Com o passar do tempo, sobre a ideia do Tao elaboraram-se técnicas,
visando aumentar o poder individual e atingir a imortalidade. Daí a
transformar a filosofia taoísta em teligião, foi um pulo.
O taoísmo cresceu como religião sobretudo na época das Seis Dinastias,
ocasião em que as paixões políticas e religiosas multiplicaram as seitas.
Para os crentes, Lao Tse é tido como um deus e o taoísmo religião de
salvação para todos.

167
Castellar» e Rodrigues
Cartilha do Companheiro

Escada em C aracol

Os Rituais de Segundo Grau das Obediências referem-se à


Escada em Caracol da seguinte maneira:

d lenda da Estrada em Caracol p ode, tam bém , ser considerada


com o alegoria, na qual um jovem , tendo passado a adolescência
co m o A pren diz e a virilidade co m o C o m p an h eiro, len ta,
ousadamente, avançar e subir, apesar do cam inho tortuoso e
da subida difícil, na esperança de, pela diligência e pela perseve­
rança, chegar à idade madura conto um mestre esclarecido.

Há várias interpretações sobre o significado da Escada em


Caracol.
Antes de dizermos alguma coisa sobre a Escada em Caracol,
devemos avisar ao irmão Companheiro que há quem se insurja
contra essa Alegoria (Escada em Caracol é uma alegoria e não um
símbolo), negando-lhe qualquer valor dentro do Grau. Deixamos
de discutir se havia ou não a tal escada no Templo de Salomão.
Contudo, é preciso não esquecer que existem alegorias e Símbolos
na Maçonaria que nada têm a ver com o Templo de Salomão.
Para que serve a Escada em Caracol? Para que o Compa­
nheiro suba por ela até alcançar a porta que o levará à Câmara de
M eio. Por que Escada em Caracol? Ela representa as grandes difi­
culdades que alguém, na Maçonaria, tem para estudar, compreen­
der e aprender rudo o que é necessário saber para alcançar o Grau
de Mestre.
O Companheiro-Maçom que já pode livremente buscar os

169
Castellan ¡ e Rodrigues

seus caminhos, certamente encontrará varios e muitos obstáculos,


quando tentar compreender e interpretar os Símbolos e as alegorías
que for encontrando, à medida que for abrindo as portas da inteli­
gencia na procura dos conhecimentos que o Segundo Grau lhe pode
oferecer.
Assim como não existe segura aprendizagem sem acurado
estudo, também não é possível que se aprenda, com segurança,
alguma coisa, sobretudo nos campos da filosofia, sem que se tope
uma série de dificuldades. E estas dificuldades não devem ser con­
tornadas, mas devem ser transpostas. Em outras palavras: todo es­
tudo sério oferece óbices muitas vezes difíceis de serem vencidos.
Por isso é que Varoli (op. cit,, p. 132) afirma: “...a Escada-Caracol
simboliza o difícil caminho para o Maçom atingir a exaltação das
Virtudes, o Grau de Mestre”.
Conforme se vê no Painel da Loja de Companheiro, a Escada
em Caracol está dividida em três lances distintos.
O primeiro lance tem três degraus. Ao primeiro degrau cor­
responde o Prumo; ao segundo, o Nível e, ao terceiro, o Esquadro.
Assim, aí estão presentes os três Graus da Maçonaria Simbólica:
Aprendiz, Companheiro e Mestre.
O segundo lanceé formado por cinco degraus. Cada um deles
corresponde a um dos cinco sentidos do homem: audição, visão,
tato, olfato e gosto.
Os sete degraus formadores do terceiro e último lance repre­
sentam as artes liberais da Antiguidade: o Irivium, ou seja, Gramá­
tica, Retórica e Lógica; o qu adriviu m - Aritmética, Geometria,
Música e Astronomia.
Varoli (op. cit., p. 135) afirma ainda que

... a figura da Escada-Caracol é uma das mais sugestivas para o


Companbeiro-Maçom, o qual, para chegar a Mestre, Grau da Fra­
ternidade, deverá subir p or degraus, até chegar, e esperar, à entrada
dos Santo dos Santos ou à entrada da (Sámara da Sabedoria.

170
Cartilha do Companheiro

Filosoficam ente é importante verificar-se a presença dos


sentidos na Escada que leva ao conhecimento.
já Aristóteles ensinava que “nada existe em nossa inteligên­
cia que anteriormente não tenha passado pelos sentidos”. Por aí se
vê que é muito importante a percepção sensorial que Aristóteles
liga aos cinco sentidos.
A matéria tem agitado o mundo filosófico e Kant' joga uma
pá de cal no assunto.
Diante do racionalismo que enfatizava o valor da razão como
demento primordial e quase línico na aprendizagem filosófica, di­
ante do empirismo que negava a primazia da razão, substituindo-a
pela experiência e pelos sentidos, Kant se põe em campo para provar
que é necessário unir razão, sentidos e experiência se se quiser chegar
a atingir a meta do conhecimento e do saber, Não se pense que Kant
tenha se preocupado em criticar a razão pura, pelo simples gosto da
crítica em si. O que ele fez, e fê-lo muito bem, foi demonstrar que a
razão, sem a ajuda dos sentidos, pouco ou quase nada produz de
útil. O que ele pretendia era mostrar as limitações a que estaria
exposta a razão sem a ajuda dos sentidos. E de ver-se que, de início,
ele se atira contra a pregação filosófica daqueles pensadores mais
próximos do seu tempo. Haja vista que começa por negar que o
conhecimento proceda exclusivamente dos sentidos. Na certeza de
que os sentidos podem, muitas vezes, transmitir sensações do mundo
exterior. Daí por que, apesar de admitir que o conhecimento começa
com a exp eriên cia, nem por isso ele se originaria todo da
experiência.
Entenda-se que o Companheiro passou por um período de
adaptação e agora, através da pesquisa, do trabalho, da contem­
plação, encontra o caminho, sinuoso é bem verdade, que o levará
ao conhecimento, ao bem, à paz interior.
Subindo a Escada em Espiral o Companbeiro-Maçom se en­
trega livremente à busca, se bem que silenciosa e solitária, de co­
nhecimentos embutidos filosoficamente nos Símbolos, alegorias e

171
Casíellan i e Rodrigues

emblemas, que a Arte Real lhe oferece para serem examinados pela
sua inteligencia, arrimada nos seus sentidos,
A Escada em Caracol simboliza, acima de tudo, a inteligencia
na procura constante do aprimoramento cultural e moral.
O Companheiro tenha sempre em mira que a busca do saber
é a obrigação maior do Maçom, sem contudo olvidar que a qualidade
supera a quantidade. E melhor saber pouco, mas bem, do que alar­
dear conhecimentos que, muitas vezes, não existem verdadeiramente.
O estudo da filosofia é muito importante. A filosofia abre a
mente de quem a estuda, libertando-lhe o espírito de superstições e
crenças vãs. O conhecimento filosófico liberta realmente o homem
e lhe dá forças para que tenha o verdadeiro autodomínio.

NOTA

’ Kant (Emanuel Kant) - Nasceu em Koenigsberg, na Prússia, em 1724 e


faleceu em 1804. Era descendente de escoceses. Estudou em sua cidade
natal, tendo-se licenciado ali em filosofia, matemática e física. Dedicou-se
ao estudo da filosofia, debruçando-se, com grande interesse, sobre os
ensinamentos de Leibniz e de Hume, Segundo alguns críticos Hume foi o
grande inspirador de Kant.
Exceto durante algum tempo em que lecionou geografia e etnologia
em uma aldeia vizinha, Kant nunca abandonou sua cidade natal. Du­
rante pouco mais de quinze anos, trabalhou como livre-docente na
Universidade de Koenigsberg, tendo assumido a cátedra somente em
1770,
Durante quinze anos, silenciosamente, elaborou os seus dois gran­
des monumentos filosóficos: Crítica da Razão Pura e Crítica da Razão
Prática. Foi em 1781 que Kant sacudiu a Europa e o resto do mundo
culto com a primeira daquelas obras. Nela, ele trata da análise crítica da
razão humana, em si mesma, portanto pura. Antes que ela esteja traba­
lhando sobre os conhecimentos, antes que ela se misture com os possí­
veis dados seosoriais, isto é, dados que lhe sejam remetidos pelos senti­
dos. Faz ainda um estudo sério sobre o que de mais profundo existe em
filosofia do conhecimento. Tal estudo ele o faz de forma inédita até então.

172
Cartilha do Companheiro

Para Kant, não há possibilidade de afirmar com inteira sinceridade que a


Razão pode levar-nos a compreender a ideía de Deus.
Em A Crítica da Razão Prática, Kant continua apresentando uma filosofia
que chamaríamos revolucionária e de difícil entendimento.
Indiscutivelmente, Kant é o maior filósofo da Idade Moderna.

173
Castellani e Rodrigues

174
Cartilha do Companheiro

Sinal, Símbolo, Alegoria, Emblema

Antes de mais nada, queremos repetir que a Maçonaria se


alicerça, se estrutura e se ergue sobre Símbolos e alegorias. Tudo,
absolutamente tudo, em nossa Ordem ou é simbólico, ou é alegórico.
Antes de estudarmos essas palavras com os olhos voltados
para os significados maçônicos, vamos mostrar a m u ltid ã o de sig­
nificados que elas possuem na linguagem comum.
Comecemos pela palavra sin al que alguns estudiosos afirmam
ser derivada de sig n alis. Não conhecemos tal palavra em latim, e
os bons dicionários latino-portugués, com o, por exem plo, o
“Torrinha” - Dicionário Latino-Português, de Francisco Torrinha,
3a edição, Editora Maranus, Porto, 1945 - não traz esse sig n a lis. O
que encontramos ali é: Signum-i, n., sinal, marca distintivo, insíg­
nia, estandarte, selo, sinete, presságio, prognóstico, sintoma, gesto,
senha, pegadas, vestígios, figuras em relevo, favores feitos a cinzel.
E o dicionário traz vários exemplos de uso da palavra: sig n o d a t o
(a um sinal dado); sign a iu ssit (ordenou fosse dado o sinal); sign a
ta b ellis im p rim ere (por selos na tabuinha), etc., etc.
Por aí se vê que o termo, em português, tem os mesmos signi­
ficados que tem em latim.
Trazemos à baila a palavra s in a l porque, como veremos
adiante, ela se faz presente quando tivermos que tratar das divisões
do símbolo.
O que estamos pretendendo é, em primeira plana, verificar o
sentido semântico das palavras. Para os menos avisados, queremos

175
Castellar!í e Rodrigues

lembrar que sem ân tica é a ciencia que estuda a significação das


palavras de uma língua, incluindo as possíveis modificações de sen-
tido que elas podem sofrer no tempo e no espaço.
Abramos o Dicionário Brasileiro Contemporâneo, organizado
por Francisco Fernandes e publicado pela Editora Globo, de Porto
Alegre, em 1956. Ali se lê:
Alegoria, s.f. Exposição de um pensamento sob forma figu­
rada; obra artística ou literária, que representa uma coisa para dar
ideia de outra; su cessão de metáforas exprimindo, por alusão, ideia
diferente da que se enuncia. (Do gr. Allegoria.)
Emblema, s.m. Figura simbólica; divisa; insígnia; símbolo;
alegoria; distintivo. (Do lat. emblema.)
Símbolo, s.m. Emblema ou figura representativa de um objeto;
imagem com que se designa, de modo sensível, uma coisa puramente
moral...
Além desses significados, o dicionário aduz mais dez outras
significações, quase todas devidamente explicadas.
A palavra símbolo é de origem grega, conforme iremos ex­
plicar, mas chegou ao português por intermédio do latim sym bolus
e significa, na língua de Cícero, marca; sinal; sinete; cunho; selo.
Fizemos todo este preâmbulo porque temos visto Irmãos que,
por se apegarem ao significado semântico das palavras, têm alguma
dificuldade em entender o verdadeiro sentido esotérico de certos
termos, provocando, às vezes, discussões inúteis e que não levam a
nada. Ffaja vista o que acontece com as palavras tem plo, lo ja e
o fic in a .
Determinada corrente filosófica designava de signo (sinal)
aquilo que facilmente revelasse algo, ao passo que denominavam
de símbolo aquilo que indicava algo, mas que não se manifestava à
primeira vista.
Em grego, o vocábulo s y m b o lo m se deriva do verbo
sym bollein. Os gregos chamavam de símbolo a qualquer objeto
partido em dois. Com o passar do tempo, a palavra passou também

176
Cartilha do Companheiro

a significar parceíros, contratantes, amigos. Chegou ao portugués,


como já vimos, a través do latim sym bo fa s.
Jung', o grande estudioso do assunto, afirma que símbolo é a
expressão de alguma coisa relativamente desconhecida, que não
pode ser transmitida de outro modo.
Isto nos lembra o que está escrito no Zohar: “Aquilo que é
visível é o reflexo daquilo que é invisível”. Aí, nós alcançamos o
verdadeiro sentido que a Maçonaria empresta ao termo.
Já houve quem afirmasse, e é verdade irrefutável, que, se
existem segredos na Maçonaria, esses segredos estão em seus Símbolos
e alegorias. E, o que é sobremodo importante, é saber-se que a signi­
ficação desses Símbolos, de todos eles, dessas alegorias, de todas
elas, revela uma filosofia profunda e uma ciência universal jamais
excedida pelo homem.
A Maçonaria transmite seus conhecimentos (esotéricam ente)
através de Símbolos e alegorias, preservando, dessa forma, os ver­
dadeiros fundamentos de sua doutrina, sem o temor de que venham
a ser desvirtuados. Usando tal sistema, só os que são iniciados che­
garão, depois de muito estudo, de muita pesquisa, de muita medita­
ção, ao pleno conhecimento daquilo que ela transmite. Os não Ini­
ciados podem até ler obras maçônicas e pensar que se estão apos­
sando dos segredos da Arte Real. Ledo engano. Por mais inteligentes
e cultos qne sejam não chegarão jamais a captar o sentido verdadeiro
daquilo que é o essencial em nossos augustos mistérios.
Didaticamente, a sublime instituição lança mão, conforme já
estamos fartos de sabei; de Símbolos, alegorias, emblemas e Sinais.
Tentemos verificar as diferenças de sentido que a Maçonaria
dá a essas palavras.
José Castellani, no seu Dicionário Etimológico Maçôníco,
depois de apresentar a grande variedade de sentido da palavra sím­
bolo diz:

Os Símbolos Maçôt ticos representam a maneira veiada através

177
Castellani e Rodrigues

da qual a instituição maçônica dá aos seus Iniciados as lições de


moral e ética, que fazem parte de sua doutrina, E eles são, de
maneira geral, os instrumentos ou figurações ligados à arte da
construção, e tanto podem ter uma interpretação alegórica ou
mística.

Em outras palavras, diriamos nós, símbolo é a retratação de


alguma coisa relativamente desconhecida para muitos e que não
pode ou não deve ser transmitida de outra maneira.
Já emblema nada mais é que um sinal convencional que nos
leva à identificação de algo, com facilidade, e sem a necessidade de
explicá-lo ou fazer-lhe a exegese.
Alegoria, para nós M açons, é uma forma de representar fi­
gurativamente coisas ou idéias que podem ou não ter conteúdo sim­
bólico. Normalmente a alegoria envolve ensinamentos morais.
Daí por que a Maçonaria, muitas e muitas vezes, lança mão
de parábolas, de lendas, verdadeiros relatos simbólicos que encerram
preceitos morais e que não oferecem oportunidade pata várias in­
terpretações como acontece com o Símbolo.
O Símbolo se caracteriza pela necessidade de ser interpretado;
logo, é mister haja alguém devid am en te p rep a ra d o para lhe fazer a
exegese. Que fique bem claro que esse preparo, no nosso caso, só
pode ser obtido pela Iniciação.
O Símbolo, é normal, oferece aos Iniciados um sem número
de interpretações.
Há quem diga e até ensine que o símbolo sempre revela algo
que, ao mesmo tempo, procura ocultar. A nós nos parece que, na
verdade, o que ocorre é que o próprio objeto que é apontado pelo
símbolo, oculta-se a si próprio.
Cada interpretação do símbolo tem um valor individual e
pode até mesmo ocorrer que, para um determinado símbolo, possam
acontecer várias interpretações, susceptíveis, inclusive, de serem
modificadas.
Semánticamente, com o já vimos, a palavra símbolo tem

178
Cartilha do Companheiro

diversas significações e pode apresentar, em certos momentos, aiguma


coisa de convencional. N o entanto, na acepção em que a Maço na ria
o usa, é algo que expressa uma relação e isto de maneira necessária,
precisa e clara.
Lafuente estabelece três funções capitais para o símbolo; diz
ele:

El sím bolo (o m ás exatam ente ¡a form a-sím bolo) p osee tres


funciones:

a) C om o un m edio especial de expresión de su ob jeto (lo sim ­


b o liz a d o }.

b) C om o nn m edio especial (un vehículo, un vínculo) de vivencia


en común del sentido o de los diversos sentidos d e sn objeto.

c) Com o especial de acceso a un cierto tipo de conocim iento, el


conocim iento sim bólico.

Este conocim iento sim bólico no es un conocim iento directo de


las cosas (o Universo en sentido estricto), sino un conocim iento
q u e viene del fo n d o de lo hum ano, tal com o éste surgió de las
ra íces p rim itivas d el h o m b r e (Esquema Filosófico de la
Masonería, Madrid, 1" ed., 1981, pág. 171).

O que de melhor se conhece como subsídio ao estudo dos


símbolos é a doutrina do psicólogo Cari Gustav Jung. O próprio
Lafuente, na obra aquí citada, deciara:

C om o señala Jung:

L os sím bolos considerados desde el punto del realism o non


constituyen verdades exteriores, p ero son p sicológ icam en te
verdaderos, pues servieron y sirven d e puente que conduce a
todas las grandes conquistas de la hum anidad (Símbolos de
transformación, Buenos Aires, 1“ ed., 1962, pág. 2 4 4 ¡.

Para Jung, o homem está sempre à procura de alguma coisa


que, talvez, tenha ficado para trás, na poeira dos tempos.

179
Castellani e Rodrigues

Rose miro Pereira Leal assinala que:

Tanto em }ung, quanto na Maçonarta, há um pon to com um de


p esq u isa : a procu ra d e uma d efin iç ã o p ara os sím b o lo s
milenares, aceitos com o realidade ou condensação material de
mensagens de uma civilização intangível p ela história e ciência
convencionais. O esforço filosófico para reviver situações não
registradas na história linear profana, numa busca incansável
da identidade de outras dimensões capazes d e resolver a tor­
mentosa problem ática humana. Nessa esteira, podem os supor
que a hum anidade se degenerou através de guerras doutrinárias
impingidas por invasores de forrnação social beligerante (Pes­
quisa em Maçonaria, Beto Horizonte, 1978, pág. 91/92).

Não percamos de vista que o simbolismo maçônieo não se


afasta do simbolismo geral, do qual se deriva; apenas sabe usá-lo
de forma inteligente, transformando-o no que de mais importante
existe em sua doutrinação.
Conforme já dissemos e nunca é demais repetir, existe uma
grande verdade em torno da significação simbólica: a maior parte
dos símbolos oferece várias interpretações, não contraditórias. Que
isto sirva de alerta àqueles “velhos” Maçons que a c h a m que só as
suas interpretações são corretas.

NOTA

1 Jung, Cari Gustav - Nasceu em Basiléia, Suíça, a 26 de junho de 1875 e


faleceu em Küssanacht no dia 6 de junho de 1961. Formou-se em medi­
cina e dedicou-se à psicologia e à psiquiatria. E o fundador da “psicolo­
gia analítica” que se contrapõe decididamente à opinião de Freud, segundo
o qual todos os fenômenos inconscientes se explicam por influências in­
fantis de instinto sexual. Fez um notável trabalho de pesquisa sobre os
símbolos, Deixou várias obras, entre as quais cumpre destacar “Aion,
Estudo sobre a História dos Símbolos”.

180
Cartilha do Companheiro

Do Sinal de Com panheiro

Os Rituais das várias Obediências explicam quase que da


mesma maneira o significado do Sinal de Companheiro. Dizem
eles:

A m ' , dr. sobre o e :. lem bra o com prom isso ile am ar fervorosa
e dedicadam ente a seus llr m :. e recorda o juram ento prestado;
a m e : . levantada, reafirma a sinceridade da prom essa feita.

Diante de uma segunda pergunta, se, porventura, a atitude


do Companheiro, quando à ordem, não faria lembrar segredos es­
peciais do Grau, aparece a seguinte resposta:

,4 m :. es. levantada parece fazer apelo às forças astrais, energias


superiores, que a ms. ds. crispada se esforça para conter no c :.,
onde elas se devem acumular. Prestes a arre. o c :., o Iniciado,
além disso, proclam a que soube dom inar seus sentimentos e que
não cederá jamais a um movimento irre fie tido.

Deve-se ressaltar que o que está nos Rituais é pura e simples­


mente aquilo que alguns autores procuram explicar.
Jules Boucher (La Symbolique Maçonnique, p. 326} depois de
afirmar que o Sinal de Companheiro, que ele chama de pectoral,
difere nos Ritos Escocês e Francês, transcreve as explicações de Oswald
Wírth, inseridas em “Le Livre du Compagnon”, p. 99. Diz Boucher:

Wirth écrit: “En portant la main droite sur le coeur, je prenãs

181
Castellani e Rodrigues

Vengagetnent d ’aimer mes frères avec ferveur et dévouem ent; eu


élevant la mam gauche, j ’affirm e la sincérité d e m a promesse, et
en décrivant une équerre de la mam droite, je m ontre que tous
mes actes s ’inspirent de la justice et de l'¿quité”.

Wirth põe a palavra na boca do Companheiro que afirma


colocar a m.'. sobre o c.'. para assumir a obrigação de amar os
Hrm.'. fervorosa e devotadamente e o levantar da tn.‘. e.'. significa
que ele está confirmando a sinceridade de sua promessa, ajuntando
inais que, ao descrever o esq-*- com a mão direita, quer demonstrar
que todos seus atos se inspiram na justiça e na equidade.
Continuemos a acompanhar a citação que Boucher faz de
Wirth:

La mam gauche levée, sem ble faire appel aux forces extárieures,
énergies captées, que la droite crtspée s ‘efforcé ensuite de conten ir
dans le coeur, ou el les s ’accumulent. Uinitié, prét a s ’arracher le
coeur, proclam e en outre q u ’il a su dom pter ses sentiments et
q u ’il nc cederá jam ais a un entramem ent irréflécki.

O que Wirth afirma é exatamente o que vem escrito nos R i­


tuais das Obediencias: A m.'. e.'. levantada apela para as forças
exteriores, energias aprisionadas, que a m.'. d '. em concha procura
segurar no coração, onde elas se acumulam. O Iniciado prestes a
arrancar o coração proclama, além do mais, que soube domar seus
sentimentos e que não cederá nunca a um arrebatamento irrefletido.
Varoli (op. cit., pág. 67) chama o Sinal de Companheiro de
Sinal Cordial e explica:

A m e . sobre o es. representa o desprendimento e a Coragem de


Atnar ao Próximo com o a si mesmo. E também um gesto de soli­
dariedade corno manda a Fidelidade aos princípios maçônicos.
Em determinados Ritos, a atitude lembra o juramento; mas o sen­
tido oculto da m crispada é a Coragem de arrancar o próprio
cr. e oferecê-lo à Fraternidade Universal. Com o se vê o Sinal
Cordial varia com os Ritos mas, de qualquer m odo, ele repre­
senta a Coragem, de cor, ou coração.

182
Cartilha do Companheiro

Tudo isso no que diz respeito á m**. sobre o c-'- que pode
perfeitamente lembrar ao Compan hei ro-M açom que o c-*. é a sede
do amor e que, portanto, não pode abrigar o ódio, a inveja, a vaidade,
a ambição, o orgulho, o fanatismo, os preconceitos. O c ' . do Ma-
çom deve estar aberto a todas as coisas boas, acalentando, não só o
amor aos Ilrni.'-, mas a toda a humanidade.
E preciso que o Companheiro não esqueça que o cérebro go­
verna o corpo, todavia ele é governado pelo c.'..

183
Castellani e Rodrigues

184
Cartilha do Companheiro

A Letra G

O G ocupa um lugar eminente na Maçonaría e, segundo


alguns bons autores, essa letra é um dos mais antigos lindeiros da
Ordem. Podemos afirmar que o G é, ainda, um dos mais sagrados
emblemas maçônicos.
Mesmo aparecendo no centro da Estrela Flamejante, sua exis­
tencia entre os Símbolos Maçônicos é muito mais antigo que o
pentagrama pitagórico, apesar da opinião em contrario de Wirth.
As vezes, o pesquisador se vê em palpos de aranha diante da
afirmativa de autores respeitáveis que afirmam coisas que entram
em choque com os mais antigos e legítimos documentos.
Aldo Lavagnini (Magister), por exemplo, em “El Secreto
M asónico”, escreve onze páginas sobre a letra G. De início, tudo
bem. Ele afirma que a significação da letra é Geometria. Depois,
através de verdadeiras lucubrações filosóficas, arranja mais dois
significados: gênese e gravidade.
Ju les Boucher, na sua “Symbolique Maçonnique”, começa
citando Ragon. Diz ele:

Pour Ragon, la lettre G, cinquième consonne de Palpbabet, est


1’initiale de la cinquième Science: géomêtrie... C ’est d'elle et des
matematiques que l’on emprurtte 1’éclat de cetle verité lumineuse
que doit se rêpandre sur toutes les opérations de l ’esprit. (Para
Ragon: a letra G, quinta consoante d o alfabeto, é a inictal da
quinta ciência. E dela e das matemáticas que se empresta o brilho

185
Casteliani e Rodrigues

dessa verdade luminosa que deve expan dirse sobre todas as


operações d o espírito.)

Depois Boucher cita os Rituais modernos que trazem signifi­


cações por vezes bastante extravagantes.
Jean Palou (in “ A Franco M açonaria Simbólica e Iniciática”,
pág. 16) escreve:

A arte d o pedreiro livre apoia-se na G eom etria e esta palavra é


usada com um ente para designar a Maçonaria.

Mais adiante e na mesma página, ]ean Palou acentua:

Som os de parecer que a letra G que desem penha um grande


papel no sim bolism o da M açonaria Especulativa, e sobre a qual
se tem feito freque ntem ei ite muitas e excessivas divagações,
representa apenas a inicial da palavra Geom etria.

O Irin-*- Assis Carvalho, no seu livro ‘‘Companheiro Maçom”,


prova à saciedade e baseado em antigos e legítimos documentos
que a letra G só tem um significado - GEO M ETRIA.
É necessário que os Companheiros saibam que a única coisa
que nos move é a busca da verdade histórica. Se assim não fora
cruzaríamos os braços ou nada diriamos sobre o assunto.
É interessante cotejarmos dois tópicos do livro do Xico Trolha.
O primeiro, às páginas 98 e o segundo, às páginas 101. Senão
vejamos:

A Letra G com o é explicada na maioria dos catecism os e Rituais


em língua inglesa (onde aparece, quase sem pre, na segunda L ei­
tura da Tábua de Traçar), leva o significado de Deus, o G A '.
D '- I J . Todavia, já encontramos mais de uma dúzia de signi­
fic a d o s, os mais estap afú rd ios - Gnose, Glória, Geração,
Gênio, Gravitação, Grandeza, God, Gut, Geometria, Gimel,
etc.. E Geometria é o único que corresponde a origem dessa
letra na Maçonaria.

O segundo tópico diz o seguinte:

186
Cartilha do Companheiro

Dessa form a a ciência da G eom etria, a Quinta Ciência, e a


Maçonaria, se tornaram, virtualmente, sinônimos, nos nossos
mais antigos documentos. D aí a letra “G ”, inicial d e G eom e­
tria, significar, apenas, Maçonaria e n ão Deus, G nose e outras
coisinhas mais que os nossos llrm.'. antepassados - mais recen­
tes - nos tentam fazer crer. E esse tema era tratado com tal ênfase
que não deixa a menor dúvida de que essa é a base do mais antigo
significado da letra G. E é por isso, p or esses fatos históricos, que
concluímos que a letra G apareceu em uso na Ordem Maçônica,
não com o uma alusão a Deus, mas, sim, à Geom etria - a Quinta
Ciência, das Sete Artes e Ciências Liberais.

É de ver-se que o Irm-'. Assis Carvalho escreveu isso que aí


está, baseado em documentos que merecem fé.
Porém, como ficamos nós, que somos obrigados a respeitar e
a obedecer (o que devemos fazer sempre) aos R ituais dc nossas
Obediências?
Os nossos R ituais ensinam, afirmam e “juram” exatamente
o contrário, senão vejamos:
Ritual e Instruções dc Companheiro Maçom do Rito Es­
cocês Antigo e Aceito - Aprovado e oficializado pelo Colégio
de Grão-Mestres da Maçonaria Brasileira - 1976 - Grande O ri­
ente de Santa Catarina - pág. 48:
Ven-'. - Que significa a letra G?
1° Vig.'. - Geometria, Gravidade, Gênio e Gnose.
Ritual do Segundo Grau (adotado pela M açonaria Sim­
bólica Regular do Brasil) - Brasil - 1975 - Sereníssima Grande
Loja do Estado de São Paulo - pág. 58:
Ven.'. - Que significa a letra G?
1” Vig.'. - Geometria, Geração, Gravidade, Gênio e Gnose.
Ritual - Rito Escocês Antigo e Aceito - 2° Grau - Com­
panheiro - 1985 - Grande Oriente Paulista - pág. 32:
Ven.'. - Que significa, Irm.'. 2° Vig.'., a letra G?
2° Vig.'. - Geometria, Geração, Gravidade, Gênio, Gnose.
O Ritual de 2° Grau da Grande Loja Maçônica do Estado de

187
Castellani e Rodrigues

São Paulo, edição de 1987, pág. 46, repete a mesma resposta, inserta
na edição de 1975.
O Grande Oriente Independente de Pernambuco publicou e
adotou, em 1994, novos Rituais, ao que parece, com a intenção de
extirpar tudo o que não estivesse de acordo com o Rito Escocês
Antigo e Aceito. No Ritual do 2o Grau, para gáudio nosso, encon­
tramos, às páginas 46, o seguinte:
Ven-'- - Por que consentistes em ser recebido Companheiro?
1” Vig-*- - Porque tinha desejo de conhecer os mistérios da
Natureza e da Ciência, bem como o significado da letra G.
Ven-'. - Que significa a letra G?
I o Vig-*- - Geometria.
Ven-1- - De que Geometria se trata aqui, Irm-'- 2o Vig.'.?
2" Vig -*■ - Da aplicável à construção universal; da que ensina
a polir o homem e torná-lo digno de ocupar seu lugar no edifício
Social.
O significado do G não pode ser outro que Geometria e está
ligado diretamente a essa ciência que é básica quando se trata de
construção. Daí por que o Supremo Criador, o Grande Arquiteto
também é cognominado pelos Maçons de Grande Geómetra.
A Geometria é a ciência que nos leva ao estudo matemático
das propriedades e leis que governam as diferentes figuras lineares,
planas e sólidas que podem existir nas três dimensões do espaço que
conhecemos, como muito bem assinala Aldo Lavagnini.
O Maçom há de ser o construtor social, mas, antes de tudo,
o construtor do seu próprio templo interior.
Diante do significado místico do G e interpretando-o conforme
a filosofia que ele encarna, o Companheiro-Maçom aprenderá e se
esforçará por amoldar sua vida de acordo com o plano divino.

188
Cartilha do Companheiro

A Luz

E Deus disse: Faça-se a luz, e a luz foi feita...


(Gênesis I: 3-4)

El objecto interior, iniciático y filosófico hacia el cual converge


todo el simbolismo masónico, puede resumirse en las palabras
búsqueda o revelación de la luz. (Aldo Lavagnini - Magister)

A Luz é o símbolo da v erd ad e e do saber. E, para a Maçona-


ria, o mais importante de todos os Símbolos. E, nisto, a Arte Real
segue os passos do mais antigo sentimento religioso, pois a luz sempre
foi considerada como objeto da realização e concretização das metas
principáis dos antigos mistérios.
Castellani afirma que:

a Luz figuradamente designa ilustração, esclarecimento, o que


esclarece o espírito, claridade intelectual. A Luz, não a material,
mas a do intelecto e da razão, é a meta máxima do Iniciado
Maçom, que, vindo das trevas do Ocidente, caminha em dire­
ção ao Oriente, onde reina o Sol, havendo, aí, sem dúvida, uma
influência dos mitos solares da Antiguidade, principalmente o
de Mitra (persa) e o de Apoio (grego). Graças a essa busca da
Verdade, do C onhecim ento, da Razão é que os M açons
autodenominam-se Filhos da Luz; e talvez não tenha sido por
acaso que a Maçonaria, em sua forma atual, a dos aceitos, nas­
ceu no Século das Luzes, o século XVIII.

E, no Oriente, que, todas as manhãs, a luz jorra magnífica,

189
Castellani e Rodrigues

clareando os campos do mundo, alegrando os pássaros, concedendo


às plantas o milagre fantástico da fotossíntese, enchendo de vida a
tudo o que existe. O Sol, luz e vida da terra, brilha igualmente
sobre todos, sem distinções de raças, de cores ou de credos.
Os Maçons sabem que o Oriente, fonte da Luz material, é
um dos Símbolos da Arte Real, pois eles sabem que a Ordem contém
em seu bojo a pura Luz da verdade.
E, se no mundo físico, a luz do Sol é a grande dádiva da
Natureza, vivificadora distribuição de energia e fonte de vida,
também isto acontece no mundo espiritual e no mundo moral.

Quando a noite intelectual, nos tempos primitivos, pairava por


sobre o mundo, foi do Antigo Sacerdócio, que vivia no Oriente,
que a grande lição sobre Deus, a Natureza e a Humanidade foi
primeiramente emanada, e dirigindo-se para o Ocidente revelou ao
hom em seu destino futuro e sua dependência de um poder superior.

Era a Luz vivificadora do Espírito que, do Oriente, esparzia


luminosidade, através dos sábios persas, gregos, árabes e judeus,
modificando inteiramente a visão dos que buscavam e ainda buscam
o s a b er , na ânsia incontida de encontrar a Verdade. Daí por que
Luz - sinônimo do Conhecimento e da Verdade - se contrapõe às
trevas - sinônimo da ignorância, da mentira e da falsidade.
Em todos os antigos mistérios religiosos a Luz era o que todos
buscavam, tal qual hoje na Maçonaria.
Entre os egípcios, Osíris, a principal divindade, era o nome
do Sol. Entre os hindus, as três manifestações de sua divindade
suprema - Brama, Shiva e Vishnu - eram os símbolos do Sol: Brama,
o Sol no nascente; Shiva, o Sol no zênite; Vishnu, o Sol no poente.
E tem mais:

A roda solar, conto arma de Vishnu, com o sím bolo Cakravàrtin e


com o a lei que o Buddha p ôs em movimento, procede, p or sua vez,
de um simbolismo solar antiquíssimo e muito difundido. Luís XIV
da França imitou a fórmula, chamando a si mesmo Rei Solar: le

190
Cartilha do Companheiro

Roí Soleil. O Sol, luz e vida do mundo, brilha igualmente sobre


todos nós (Heinrich Zimmer, “Filosofías das Indias”, pág. 100).

A significação emblemática da Luz, na M açonaria, está pre­


sente em todos os Graus e em todos os Ritos.

Em todos os sistemas antigos essa reverência pela luz, com o sím­


bolo da verdade, era predominante. N os mistérios de todas as
nações, o candidato passava, durante suas iniciações, p or cenas
da mais profunda escuridão e, por fim, terminava suas pro vas
pela entrada num santuario espléndidamente iluminado, onde
lhe diziam que tinha alcançado a luz pura e perfeita e onde
recebia as instruções necessárias para investí-!o do conhecim ento
da Verdade Divina, cuja consecução fora o ob jeto d e todos os
seus trabalhos, e cujo fornecim ento constituía o designio da
in stitu ição em q u e fo r a in iciado, (Mackey, in Swiiibume
Clymmer - “Antiga Maçonaria Mística Oriental”, pág. 113.)

FIAT LUX

No principio, urna incógnita, um segredo,


Cammha-se em com pleta escuridão...
Ouvem-se vozes, a incerteza, o m edo,
No peito, pulsa forte o coração.

Toda urna historia cuja helo enredo


N os traz à mente grande confusão...
Às vezes, caminhando, às vezes, quedo,
Envolve-nos estranha solidão.

Mas, de repente, alguém que nos conduz,


O bedecendo u’a ordem imperiosa,
N os auxilia a recobrar a luz...

E chega a o fim a bela liturgia,


E aquela encenação maravilhosa.
Diante d a qual a alm a se extasia.

Quando o Candidato diz querer a Luz, ele que está imerso

191
Castellan i e Rodrigues

em profunda escuridão, não está implorando a luz física, mas a Luz


superior, a Luz do saber para que possa, iluminando os caminhos
da sua inteligencia e do seu espirito, buscar uma outra vida, a través
da qual ele possa transforma r-se em outro homem, passando de
Profano a Maçom.
O que ele busca realmente é aquela luminosidade que Ihe
dissipará a escu rid ão da ignorancia moral e mental, colocando-lhe
diante dos olhos da inteligencia as verdades maravilhosas da Filo­
sofia e da Ciência, cujos ensinamentos se consubstanciam na grande
meta da Maçonaria.
O Sol, a Lua, a Estrela Flamejante, as luzes que iluminam os
altares ali estão com uma significação muito além daquela que lhes
emprestamos no mundo material.
Se a luz material nos informa, através de nossa visão, tudo o
que existe ao nosso redor, há outras formas de lu2 que nos proporcio­
nam uma visão de muito maior valor para a nossa vida, iluminando
a estrada da existência espiritual que haveremos de percorrer, como,
por exemplo, a Luz da inteligência que, na M açonaria, é represen­
tada simbolicamente pela Estrela Flamejante, representação do
Homem, de suas faculdades e sentidos. Esta é a Luz que nos faz
enxergar os problemas interiores e os meios para enfrentá-los e, às
vezes, corrigi-los ou vencê-los. A Luz da inteligência é aquela que
ilumina o mundo interior da consciência e da razão. Podemos chamá-la
de Luz espiritual.
Necessário é que não desfilemos os olhos de uma terceira
Luz, talvez mais importante que as duas primeiras: Luz Divina.
E preciso que o Maçom lance mão de todos os seus esforços,
de todos os meios que a Maçonaria lhe fornece para conseguir ilu­
minar o seu interior. Com o trabalho e o estudo diuturnos ele alcan­
çará aquela claridade indicadora do seu progresso intelectual e,
sobretudo, moral, e estará cumprindo fielmente as metas que a Arte
Real lhe traçou: através do esforço de cada M açom em busca do
seu aperfeiçoamento interior, conseguir-se-á o progresso moral e
espiritual da humanidade.

192
Cartilha do Companheiro

Estrela Flamejante

- Sois C o m p :. M açom ?
V :.A :.E :.F :.

Antes de tudo, devemos dizer que o que nos interessa, neste


capítulo, é analisar as várias significações que os bons exegetas
atribuem ao Pentagrama.
Corno se sabe, e nunca é demais repetir, toda a ritualística do
Segundo Grau gira em torno da letra G, da Estrela Flamejante e do
número 5.
Os Rituais das diversas Obediências ensinam que a Estrela
Flamejante é o Símbolo do Companheiro porque:

O C om panheiro é cham ado a tornar-se um fo c o ardente, uma


fon te de Luz e Calor. A generosidade de seus sentimentos deve
incitá-lo a o devotam ento sem reservas, mas com o discernimen­
to de uma inteligência verdadeiramente esclarecida, porqu e está
aberta a todas as compreensões.

Note-se que falta ao vocábulo d ev otam en to a complemen-


tação. Devotamento a quê? Pensamos que o Companheiro deve
devotar-se, sem reservas, ao estudo ao seu aprim oram ento fi­
losófico e espiritual, mas, sobretudo, aos seus semelhantes. Isto por­
que o Segundo Grau é, antes de mais nada, social. Daí por que é
necessário que ele saiba ser compassivo e tolerante com o próximo
sem, todavia, abrir mão de certos princípios morais e éticos. Sobre
ética, falaremos ao fim deste capítulo.

193
Castalia ni e Rodrigues

Uma outra coisa que se lê nos Rituais é a explicação das


razões por que a Estrela Flamejante se constitui de cinco pontas:

Para figurar os quatro m em bros do hom em e a cabeça que os


governa. Esta, com o centro das faculdades intelectuais, domina o
quaternário dos Elementos ou da Materia. Assim, a Estrela Fla­
mejante é mais particularmente emblema do poder da vontade.

Lavagnini (op. cit., pág. 72) ensina que:

En un prim er lugar podem os ver en ia Estrella de cinco puntas,


una imagem del cuerpo del hom bre, con las d os piernas y los
brazos abiertos, en corresponden cia con sus cuatro puntas
laterales e inferiores, mientras la punta superior se halla en
relación con la cabeza. Es una postura de equilibrio activo y de
capacidad expresiva, p or m edio de la cual el hom bre se hace
centro de su vida, y con su actividad, irradia de sí m ism o su
propia luz interior, exactam ente com o lo hace la estrella en el
espacio.

Essa explicação de Lavagnini é, normalmente, a que se vê


em quase todos os autores que procuram explicar o Pentagrama,
que também é chamada de Estrela Hominal.
É pena que na maioria das vezes os escritores maçônicos se
prendam, nao sabemos por que razões, a urna lógica muito conven­
cional de pesquisa e de busca, praticando os mesmos métodos, al­
gumas vezes nada ortodoxos, que norteiam a busca e a pesquisa das
ciencias profanas. Pensamos que o buscador, o pesquisador, o estu­
dioso Maçom não pode e não deve ficar preso a determinadas
metodologias que encarceram o pensamento e levam, não poucas
vezes, a invencionices que tentam apresentar com selo de verdade.
A Maço na ria nos dá plena liberdade de exegese. Não temos neces­
sidade de inventar. Necessário é que nos libertemos de certos valores
só aplicáveis às ciências profanas.
Enquanto que na maioria dos Ritos é adotada a Estrela de
cinco pontas, no Rito de York está presente a Estrela de seis pontas

194
Cartilha do Companheiro

ou hexagonal. E ncontram os m uito pouca coisa que nos forne­


cesse, com exatidão, o verdadeiro significado da estrela de seis pon­
tas que nos pudessem auxiliar na justa interpretação de seu signifi­
cado. O próprio Varoli, um dos maiores pesquisadores da Ordem
no Brasil, disse quase nada a respeito.
Voltando à Estrela de cinco pontas, devemos dizer que existe
ainda outra interpretação; aquela que faz alusão aos cinco sentidos
do homem,
Varoli (op. cit., pág. 81) escreve:

As cinco pontas da Estrela ainda lem bram os Cinco Sentidos


que estabelecem a comunicação da Alma com o Mundo Material
- Tato, Audição, Visto, O lfato, G osto, dos quais, para os Ma-
çons, três servem à com unicação fraternal. Pois é p elo Tato que
se conhecem os Toques. Pela A udição se percebem as Palavras e
as Baterias, e pela Vista se notam os Sinais. Mas não há esquecer
que p elo G osto se conhecem as bebidas amargas e doces, hem
com o o sal, o pão e o vinho. Finalmente, pelo OLFATO se
percebem a fragrancia das flores e os aromas do Altar dos
Perfumes.

Ao estabelecer uma relação das pontas da Estrela com os


sentidos humanos, preferimos concluir que a Estrela Flamejante in­
corpora duas interpretações: a primeira sobre o m icrocosm o físico
que se prende ao domínio da forma, e a segunda, ao m icrocosm o
p síq u ico que se relaciona com o domínio da consciência.
Jules Boucher (op. cit,, pág. 229) não aceita essa relação das
pontas da Estrela Flamejante com os cinco sentidos. Diz ele:

. . . e t quand on eut fix é les cinq sens à ses cinq pointes, la


malheureuse étoile n’en eut plus aucun... de sens!!! (.,, e quando
relacionaram os cinco sentidos às suas cinco pontas, a pobre
estrela não teve mais nenhum sentido!!!)

“Tot caput, tot sensus”, dizemos nós.


N ão podemos esquecer-nos que, acima de tudo, a Estrela

195
Castellani e Rodrigues

Flamejante representa o H O M EM IDEAL, que deve ser a grande


aspiração do Companheiro-Maçom.
Não olvidemos nunca que estrela é LUZ e a luz é o grande
símbolo da Verdade e do Saber.
O Sol, a Lua, a Estrela Flamejante têm, na Maçou a n a, uma
significação bem diferente daquela que lhes é atribuída no mundo
profano.
Se a luz material nos transfere informações através de nossa
visão, sobre o que existe ao nosso redor, as Luzes que cultuamos na
Maçonaria nos proporcionam uma outra visão, muito mais abrangente
e de muito maior valor para a nossa vida, pois que das iluminam a
estrada de nossa existência, no campo mental e espiritual.
A Estrela Hominal serve de alerta ao Companheiro-Maçom
sobre a sua responsabilidade de a uto melhoramento, não se deixando
dominar por paixão alguma, evitando todo e qualquer excesso.
Quando a Maçonaria aconselha aos seus filhos de - ou v ir
sem pre, fa la r p o u c o e tr a b a lh a r bem , está apontando sua ética e,
neste ponto, aproxima-se e muito dos ensinamentos dos filósofos
estoicos, que cultivavam uma filosofia de cunho essencialmente
moral, muito próxima daquela ensinada por Sócrates.
Os estoicos se afastam dos ensinamentos de Platão e de
Aristóteles no que diz respeito ao conhecimento humano, sobretudo
em relação aos modos de conceber a verdade. Para os dois grandes
filósofos gregos a verdade consiste na total correspondência entre a
representação mental e a situação real das coisas; para Zenão1, o
pai do estoicismo, a verdade consiste na total compreensão do objeto
que a mente é obrigada a analisar.
O estoico visava, antes de tudo, o domínio sobre si mesmo.
Isto lembra ao Companheiro-Maçom que ele tem um compromisso
do qual não se pode afastar e que assumiu a partir do momento em
que, como Aprendiz, iniciou o seu próprio desbaste de defeitos pes­
soais, o que exige domínio sobre si mesmo. Neste ponto, ele há de
ser “estoico”.

196
Cartilha do Companheiro

Logo, é preciso que procure distinguir sempre as diferenças


que existem entre - p a ix ã o , e m o ç ã o e sen tim en to. A paixão é inad­
missível no M açom ; é perigosa e deve ser afastada sempre porque é
irracional e conduz perigosamente ao fanatismo.
Isto significa que tudo se resume numa única palavra:
virtude.
O Maçom há se ser virtuoso. Mas o que é virtude? Virtude é
uma disposição íntima pela qual a alma se põe em harmonia consigo
mesma.
Para os estoicos, a prática da virtude consiste na anulação
das paixões e na superação do próprio Ego.
Se a ética dá ao Companheiro uma ideia de força íntima é
porque a razão se apoia no sentimento e não na paixão ou na emoção,
Quando a Maçonaria q u er que a P ed ra B ru ta se transforme
em Pedra C ú bica, ela está lembrando ao Iniciado que ele deve manter
uma luta progressiva e sem tréguas pelo domínio de si mesmo,
colocando o próprio EG O sobre o mais absoluto controle.
Que o Companheiro ao fitar a Estrela Hominal se lembre
que quando conseguimos o controle total sobre nós mesmos, torna-
mo-nos inteiramente livres e responsáveis e estamos realmente pre­
parados para o exercício da Arte Real. Isto é difícil de ser alcançado,
daí a necessidade de que a luta seja diuturna e sem esmorecimentos.
Leibniz, filósofo que viveu no século X V III, já dizia: “Só
D eus é p e r fsitam ente lít/re; as criaturas o serão, m ais ou m enos, na
m ed id a em qu e se co lo q u em acim a d a p a ix õ e s ”.
O Pentagrama pode comportar, simbolicamente, várias in­
terpretações; todavia, e antes de mais nada, ele representa a luz da
inteligência que nos faz enxergar os problemas interiores e os meios
para enfrentá-los, e, por vezes, corrigi-los ou vencê-los.
A Estrela Flamejante é “a luz espiritual que faz com que o
Companheiro pesquise, trabalhe e compare as virtudes e os conhe­
cimentos adquiridos”.

197
Castellani e Rodrigues

Para terminar este capítulo, nada melhor que transcrever as


palavras de Aldo Lavagnini (op. cit., pág. 82};

Com o fu en te de Luz, lã Estrella es principio inspirador de todo


lo que puede haber de Bello, N oble y Verdadero; el mismo prin­
cipio deI Bien en su form a más elevada.

NOTA

1 ZENÃO DE CITIUM - Nasceu em 336 e faleceu em 274 a.C.. Afirmam


alguns historiadores que o fundador do Estoicismo não era grego e sim
fenicio, o que constiruiria uma exceção entre os numerosos pensadores
que viveram em Atenas no período helenístico.
O vocábulo estoico se deriva da palavra grega “stoa”, pórtico. Isto por­
que Zenão propagava suas idéias, não numa praça esportiva como era o
costume da época, mas sob um pórtico (stoa) guarnecido de colunas.
Dos três movimentos filosóficos do período chamado helenístico -
estoicismo, epicurismo, ceticismo - o estoicismo foi o mais original e
também o que teve duração mais longa. Foi fundado no final do século
IV a.C., tendo florescido até o III século d.C.. E vale dizer ainda que
muitos filósofos crisrãos da Idade Média se diziam herdeiros e, mesmo,
continuadores da Escola de Zenão.
Um dos elementos mais positivos da Escola criada por Zenão de Cirium
é a lei da obrigatoriedade do cumprimento dos deveres do magistrado e
do cidadão.
Essa concepção dos deveres dava toda Ênfase ao modo de as pessoas se
tratarem com respeito e justiça.
Zenão enfatizava a noção estoica da virtude e dava novas diretrizes à
convivência entre os homens, estabelecendo que ela não devia depender
de cidadania e, muito menos, de estado social.
Na sua obra “República”, Zenão afirma que todos os homens devem ser
livres e iguais.
O Estoicismo é uma doutrina filosófica essencial mente moral. Prega o
endurecimento da oposição entre vício e virtude a ponto de excluir “tanto
a possibilidade de progresso como as variações do mérito, da culpabili­
dade e da responsabilidade que inegavelmente ocorrem na vida moral”.
O Estoicismo possui grandes representantes no mundo latino de outrora.

198
Cartilha do Companheiro

O P a in e l do O r ie n te

O Símbolo mais importante da Maçonaria é o Delta luminoso,


colocado entre o So! e a Lua, no Painel do Oriente.
Nos Ritos teístas o Oriente é a representação do p la n o esp i­
ritu al, enquanto que nos Ritos deístas, ele representa o p la n o d a
s a b e d o r ia .
O Sol nasce no Oriente, portanto o Oriente é a fonte de Luz
natural, o nascedouro de onde jorra luminosidade que dá vida a
tudo quanto existe.
Foi também do Oriente que provieram as grandes idéias, os
grandes movimentos da inteligência, que ensejaram ao homem esse
progresso fantástico no campo das artes, das ciências, da filosofia e
da literatura.
A filosofia surgiu no Oriente sete séculos ante de Cristo. Os
primeiros filósofos eram hindus, chineses e os gregos nascidos no
Oriente Médio que era, naqueles tempos, colônia da Hélade.
Na índia, Vardhamana1 organizou a Escola Jaina, talvez até
anterior às manifestações filosóficas dos Upanishades. Na China,
os primeiros grandes filósofos - Kong-fu-Tse? (latinizado Confucius),
Lao-Tse e M ên cio’ surgiram exatam ente na chamada era das
perturbações.
Ninguém ignora que a China é um dos mais antigos impérios
da Terra. Sua história, longa quanto bela, apresenta três grandes
períodos: a interminável dinastia do período CHOU, precedeu à

199
Castel/ani e Rodrigues

dinastia do período TSIN (aliás, o vocábulo China se deriva do


vocábulo TSIN). Entre esses dois períodos houve uma fase feudal
anárquica, conhecida como E ra d a s p ertu rbações. Foi exatamente
nesta fase de grande anarquia que surgiram, como acima ficou dito,
os grandes filósofos chineses. Essas convulsões sociais tiveram, pelo
menos, o condão de despertar o pensamento filosófico, talvez até
por buscarem os seus pensadores unia resposta para a pergunta —
como se obterá a liberdade? Confúcio verificou que a liberdade
deve ser perseguida, não pela abolição das leis, mas pelo seu aper­
feiçoamento. Para ele só o aperfeiçoamento das leis pode evitar que
elas interfiram na espontaneidade individual.
A índia, imenso caldeamento de raças e de culturas, se voltou
em busca de algo que lhe mostrasse o caminho para a salvação do
homem. E assim surgiu um extraordinário sistema filosófico. Sua
portentosa literatura - Vedas - possui, exata mente em sua parte
final, uma grande exposição filosófica - Vedanta ou Upanishads. É
indiscutível: esta obra é o marco da filosofia hindu,
O pensamento filosófico grego surgiu na região mais comer­
cial da Hélade, a Jônia, situada na Ásia Menor, onde nasceram Tales de
Mileto, Anaximandro e Anaxímenes, consideradas os fundadores da
filosofia ocidental.
Por aí se vê que não foi apenas a luz natural que nasceu,
nasce e continuará nascendo no Oriente. Lá surgiu também a Luz
da inteligência e do saber.
O mundo material sempre foi iluminado pela luz natural. O
mesmo não ocorreu, durante muito tempo, com o mundo moral e
espiritual que vivia imerso em terrível escuridão intelectual, até
que surgiram a s lu zes a que atrás nos referimos.
É coisa absolutamente certa que o Império do Saber e da
Verdade caminhou do Oriente para o Ocidente.
Isto significa que a Maçonatía tem razão quando afirma que
a Luz é sinônimo de Verdade e de Saber, enquanto que as trevas
significam ignorância e obscurantismo.

200
Cartilha do Companheiro

O homem sempre esteve voltado para a Luz, daí por que a


Luz sempre foi o objeto primordial das realizações de todos os antigos
Mistérios religiosos.
São três as luzes que devem servir de ponto básico de meditação
para o Companheiro-Maçom: a Luz natural, a Luz humana e a Luz
divina,
O Painel do Oriente é formado pelo Sol, pelo Delta Luminoso
e pela Lua.
O delta luminoso ou radiante deve estar colocado atrás da
cadeira do Venerável, no alto, para que possa ser visto de qualquer
lugar do Templo.
Ele representa a presença de Deus e deve ser saudado pelos
Maçons sempre que cruzarem o equador da Oficina.
Varoli (op. cit., pág. 279) para evitar malévolas insinuações,
afirma que:

O M açom não faz do Delta um sím bolo de adoração. A Maña­


naría adm ite os Símbolos com o recursos m nemónicas ou meios
de inspiração, e não com o prática de idolatria.

O Sol corresponde ao Orador, enquanto que a Lua, que deve


estar representada em quarto-crescente, corresponde ao Secretário.
O Delta - formato da letra grega que leva esse nome - é um
triângulo equilátero.
Desde priscas eras, o triângulo equilátero tem simbolizado
as tríades divinas, bem como a Trindade cristã. Vários foram os
nomes que lhe foram aplicados no correr dos tempos: ternario, tría­
de, trimúrti, trindade.
Normalmente, o Delta luminoso tem no seu interior a figura
de um olho esquerdo (o olho que tudo vê) que, antigamente, era tido
como a visão anuladora do tempo e do espaço.
Para vários exegetas, o Olho, no plano físico, simboliza o
astro que ilumina a Terra - o Sol - glória do Senhor e dispensador
de luz e de vida.

201
Castellani e Rodrigues

No plano intermediário, o Olho é a representação do Logos


_ Princípio criador.
No plano espiritual, o Olho que tudo vê representa o Grande
Arquiteto do Universo.
O Delta pode trazer no seu interior o tetragrama IEVE, es­
crito em caracteres hebraicos, ou somente a letra IOD.
O Companheiro deve acostumar-se a meditar sobre a Luz
que vem do Oriente e a que brilha na Estrela Flamejante. E verá
como crescem e como se ampliam os seus conhecimentos sobre esses
maravilhosos Símbolos que a Maçou a ri a lhe oferece. Aliás, este é
um dos aspectos mais importantes que a filosofia do Grau lhe põe
diante dos olhos.
Em nenhum outro Grau chega a ser mais importante a análise
sobre a Luz do Oriente, porque ela reparte os valores da sabedoria e
da bondade; além do mais, ela dá ao Companheiro os meios de es­
magar a ignorância, própria daqueles que vivem imersos nas trevas.
Por outra parte, é necessário que o Companheiro nunca perca
de vista que, se a luz material, através de nossa visão, nos informa
sobre tudo o que existe ao nosso redor, as Luzes simbólicas da Ma-
çonaria nos proporcionam uma visão muito mais importante para
nossa vida, porque ela ilumina, espiritual mente, a estrada que ha­
veremos de percorrer.
A Luz espiritual é que nos faz enxergar os problemas interiores
e nos faz ver ainda quais os meios para enfrentá-los, corrigi-los ou
vencê-los. Essa Luz espiritual é a Luz da inteligência, aquela que
ilumina o mundo interior da consciência e da razão.

MOTAS

1 Vardhamana Mahavira (540-468 a.C.) - Considerado como o funda­


dor de Jaina, entretanto, Heinrich Zimnaer, na sua excelente obra “Filo­
sofias das índias”, pãg. 138, afirma: “A fundação do jainismo tem sido
atribuída, pelos historiadores ocidentais, a Vardhamana Mahavira, con­
temporâneo de Budha fsíei que morreu por volta do ano de 526 a.C.. No

202
Cartilha do Companheiro

enramo, os ¡amistas consideram que Mahavira não foi o primeiro mas o


último de uma longa série de Tirthankara. O número tradicional destes é
vinte e quatro, e supõe-se que a linhagem provém, através dos séculos, de
tempos pré-históricos”.
Zimmer adianta que Mahavira nasceu em um lugarejo chamado
Kundagrama, nos arredores da cidade de Vaisali e acrescenta: “Mahavira
viveu e ensinou na época relativamente bem documentada de Budha...
Podemos, sem maiores empecilhos, imaginá-lo movendo-se entre monges
e mestres daqueles tempos de fermentação intelectual e, tanto nos textos
budistas quanto nos ¡amistas, encontramos reflexos de sua presença e
influência” (op. cít., pág. 158).
1 Mêncio (Meng-Tzu) - Filósofo chinês que deve ter vivido entre .371 e 2 89 a.C.
A doutrina de Confúcio influenciou-o grandemente, tanto que, partindo
do conceito confuciano da benevolência, desenvolveu, de maneira simples
e em linguagem também simples, uma doutrina que estabelece que a
bondade é inata no homem.
Depois de muito estudar chegou à conclusão de que os princípios morais
do homem são também os princípios que regem o Universo. Não podia
aceitar que a maldade se escondesse no coração do homem. Referia-se ao
ser humano com muita condescendência, disposto sempre a perdoar-lhe
os deslizes.
} Confúcio (551-479 a.C.) - Famoso filósofo chinês, cujas idéias exerceram
profunda influência sobre a civilização de toda Ásia Oriental.
Pouco se sabe de sua vida privada a não ser que descendia da nobreza
decadente e que seu nome de família era K’ung. Confúcio é a forma
latinizada de K’ung Fu-Tse.
Embora o confucionismo seja considerado uma religião, Confúcio não
foi um líder religioso no líder sentido usual do termo.
E considerado o fundador da filosofia chinesa. Confúcio rejeitava o
superna turalismo, atribuindo pouca atenção à metafísica, à epistemología
e à lógica.
Sua teoria do conhecimento apresentava certas semelhanças com aquela
que serve de fundamento à ciência moderna, pois era não dogmática e
empírica.
O tema central de sua filosofia era a humanidade. “A virtude”, dizia,
“consiste em amar os homens; a sabedoria, em compreendê-los”.
Confúcio é, sem sombra de dúvida, uma das maiores figuras que a hu­
manidade produziu.

203
Castellani e Rodrigues

204
Cartilha do Companheiro

♦ *

Tetrada Pitagórica

Nosso objetivo, neste capítulo, é fazer uma análise mais


aprofundada do simbolismo dos números que devem ser estudados
no Grau de Companheiro,
É de ver-se que tem sido olvidado, com raras exceções, o
estudo conceituai do UNO (Mónada), bem como a interpretação
filosófica dos números, na iniciática da diada, o mesmo acontecendo
com os opostos.
Essa matéria deve ser, tem que ser levantada, pesquisada e
estudada no Segundo Grau, devendo tal estudo arrimar-se, sobretudo,
naquilo que os pitagóricos nos deixaram, colocando-se de lado as
invencionices que pululam por aí.
Para tanto, além dos ensinamentos pitagóricos, iremos
pesquisar um outro grande filósofo que estudou a fundo exatamente
boa parte da matéria que interessa ao Segundo Grau. Assim, estu­
daremos os ensinamentos da Escola Itálica e aqueles que Plotino'
legou aos seus seguidores da Escola Neoplatônica.
Às vezes, topamos com afirmativas que nos parecem corretas,
mas ficamos em dúvida. E isto é bom, porque se a dúvida nos assalta,
é nossa obrigação procurar dírimi-la.
Assim é que para os pitagóricos, os números ímpares conte-
riam o perfeito e os números pares abrigariam a imperfeição.
Até onde iria a verdade dessa afirmativa?
Os autores que se têm dedicado ao estudo da Escola Itálica
afirmam, sem meio termo, que os pitagóricos atribuíam ao número
4 determinadas propriedades que o distinguiam de todos os outros

205
Castellani e Rodrigues

números, atribuindo-lhe um papel de grande destaque, como veremos


mais adiante.
O estudo dos números, mormente sua interpretação filosófica,
oferece, sem dúvida alguma, muitas dificuldades a quem se disponha
a enfrentá-lo.
P or isso mesmo, é bom term os sempre diante dos olhos o que
escreveu D escartes {Discurso sobre o M étodo, pág. 98):

E, de fato, vos farei ciente de que o pou co que até aqui tenho
aprendido nada é em com paração com o que ignoro, e que eu
n ão tenho d esespero d e p o d e r ap ren d er (o g rifo é nosso);
porquanto dos que pouco a pou co descobrem a verdade nas
ciências se pode dizer quase o mesmo que dos que, com eçando a
ficar ricos, custam menos a fazer grandes aquisições do que cus­
tavam anteriormente, sendo mais pobres, a fazer muito menores.

Para os pitagóricos, o Uno era a coisa mais importante por­


que, para eles, o Uno era o princípio de todas as coisas. Ensinavam
que o Uno era o criador, a ger atriz do primeiro movimento ou diada,
o 2, que, por sua vez, gerou o 3, primeiro número e que se constitui
num símbolo do cosmo.
O 3, símbolo também das três dimensões - menor quantidade
numérica - é o primeiro número real, enquanto que o Uno e a diada
são criadores de números, mas não são números.
Como explicam os pitagóricos tal afirmativa?
Segundo eles, o Uno agiu sobre a diada e deu origem à série
numérica. Tal ação foi concebida como uma relação muito seme­
lhante àquela que existe entre forma e matéria. O Uno ou mónada
constituía o princípio masculino ou formal e a diada, o princípio
feminino ou material.
Portanto, para os pitagóricos, o Uno era a entidade suprema,
equiparado a Zeus, o deus dos deuses.
Finalmente, talvez por necessitarem provar o improvável,
eles terminam por contrapor o Uno à diada, diante da necessidade

206
Cartilha do Companheiro

de arranjar um oposto ao Uno, para poderem explicar de que modo


o cosmo e os outros números vieram a existir, pois ensinavam que o
cosmo se constituía numa unidade de opostos, harmonia de elementos
finitos e infinitos.
O Uno seria a origem do finito, ao passo que a diada seria o
criador do infinito. Pi tá goras2 via o Uno como um deus, ou como o
bem; por outro lado, a diada ou 2 era considerado mal, razão por
que era denominado k a k o s daitnon, ou seja, espírito maligno.
Aristóteles (Metafísica I, 3,4 - Coimbra, 1969) apresenta a
lista dos opostos, compendiada pelos pitagóricos:

“Também eles (os pitagóricos)" diz Aristóteles, “parecem ad ­


mitir o número, quer com o matéria d os seres, quer com o (cons­
tituintes das) suas m odificações e hábitos; e que o número (sejam
elementos) o par e o impar; sendo destes o ímpar, finito, o par,
infinito e procedendo a unidade destes dois elem entos (é pois ao
m esm o tem po par e ímpar), mais o número da unidade, e sendo
números, com o se disse, o Céu inteiro. Outros, porém , dentre
estes (filósofos), admitem dez princípios, coordenados aos pares:
finito e infinito, ímpar e par, uno e múltiplo, direito e esquerdo,
m acho e fêm ea, m óvel e imóvel, reto e curvo, luz e trevas, bem e
mal, quadrado e retângulo

Observe-se que os opostos alinhados pelos pitagóricos são


dez, sendo que, para eles, o dez é o número mais perfeito para
representar o limite do cosmo.
O filósofo Álvaro dos Penedos (“Introdução aos Pré-Socrá­
ticos, pág, 59) assinala:

E muito provável que estes pitagóricos tivessem concebido o


Universo com o form ado p or nove corpos celestes, havendo um
fogo central que irradia a luz e o calor, ocupando a Terra um
lugar periférico... Segundo alguns historiadores, a ideia de um
décim o corpo celeste, a anúterra, teria pertencido aos pitagóricos
da segunda metade do século V

As três dimensões representadas pelo número 3, conforme já


vimos, indicava o mundo da matéria.

207
Castellani e Rodrigues

Por ser o primeiro número, o 3 era associado, pelos pitagóricos,


à pluralidade e à multiplicidade. Eles afirmavam que “no processo
de formação do mundo tridimensional dos objetos sólidos o 3 cria o
plano, e, em seguida, o 4 completa o sólido geométrico, acrescen­
tando a terceira dimensão.
O número 4 (ou tetraktys) era o segundo em importância
(após o Uno, ou mónada) porque de todos os números que compõem
a década sagrada, ele é o que possui o maior número de valores
simbólicos.
Depois que os pitagóricos descobriram - talvez ao medir em
um monocórdio os comprimentos da corda - que os principais inter­
valos musicais são expressos em proporções numéricas simples, entre
os qu atro primeiros números inteiros, passaram a considerar que a
soma dos quatro primeiros números, a década, tinha importância
decisiva em tudo o que ocorria ao seu redor.
Por que os pitagóricos consideravam o número 4 perfeito?
Pelos fragmentos deixados por alguns dos discípulos de
Pitágoras (nada se conhece que tenha sido escrito por Pitágoras)
chega-se à conclusão de que os pitagóricos acreditavam que por ser
a soma dos quatro primeiros números (1+2+3+4) igual a dez, o 4
era o 10 ou a década disfarçada.
Sobre o assunto, escreveu Peter Gorman (“Pitágoras - Uma
Vida”, pág. 164):

Desse m odo, a tetraktys, ou 4, na realidade, a década, pois a


som a das unidades dos quatro prim eiros números inteiros é
igual a dez.

O mesmo autor acrescenta:

Era também pelo 4 sagrado que os pitagóricos faziam o jura­


m ento de sua sociedade - juro por aqu ele que transmitiu à
nossa mente o 4 sagrado, as raízes e a origem d o fluxo eterno da
natureza.

208
Cartilha do Companheiro

Referindo-se à década, Varoli (op. cit., pág. 129) escreve:

d Década, porém , era a H ova Unidade, a expressão m áxim a do


Perfeito e do Total ou reunião de M ónada, 1 +2x3+4; a í tem os
, -- o UNO, a Contradição, a Perfeição e a Realização, som ados, de
acordo com especulações posteriores a o pitagorismo.

Varoli não diz, mas a conclusão a que se chega é que, para


ele, o Uno representa a Inteligência. Daí podermos concluir que a
nossa psique é formada de q u a tro faculdades - Inteligência, Opi­
nião, Conhecimento e Sensação - o que faz com que sejamos dife­
rentes dos outros animais.
Para Plotino, o Um é a realidade suprema. Às vezes chamado
Deus, outras vezes o Bem, Do Um se originam todas as coisas.

O Um, afirma ele, é a potência de todas as coisas; se ele não


existisse, nada existiría; nem a inteligência, nem a vida primeira,
nem a vida universal. O qu e é acim a da vida é causa da vida; a
atividade da vida, que ê todas as coisas, não é anterior a ela, mas
brota dela com o de uma fonte. Imagine-se uma fonte que não
tenha princípio e que se espalhe por todos os rios, sem que os
rios a esgotem, e que perm aneça sem pre tranquila. Os rios que
saem dela correm todos juntos antes de se separarem em dire­
ções diferentes, mas cada um já sabe para onde a correnteza o
levará. Ou imagine-se a vida de uma árvore enorm e que a per­
corre toda, enquanto seu principio perm anece imóvel, sem se
dispersar p o r toda a árvore, p orqu e reside na raiz. Ele dá à
planta toda a sua multíplice vida, mas, não sendo múltiplo e,
sim, o principio da multiplicidade perm anece im óvel (Enéadas
III, 8,10).

NOTAS

1 Plotino - Nasceu no Egito, na cidade de Licópolis, no ano 205. Viveu no


Egito até os quarenta anos de idade, quando se transferiu para Roma,
onde fundou uma Escola que obteve grande ressonância.
Plotino é o fundador e o expoente máximo do neoplatonism o.

209
Castellani © Rodrigues

É importante saber-se que o principal objetivo do neoplatonismo era dar


às classes cultas uma visão geral da vida. Deixou obra de grande valor
filosófico. Sua linguagem é vigorosa e de rara beleza estilística. Serviu-se
dela para levar às últimas consequências as noções fundamentais da
filosofia de Platão. Procurou conciliar as noções que Platão expendeu
sobre o Ser Uno e Supremo e sobre a pluralidade percebida pelos sentidos
e pensada pela inteligência.
Numerosos foram os discípulos e seguidores de Plotino, sendo justo
destacar Porfirio, Jâmbio, Teodoro e Prodo.
Plotino faleceu em 270, na sua vila em Campanha.
Porfirio recolheu os escritos todos do Mestre e dividiu-os em seis grupos
de nove livros cada um, razão por que a obra recebeu a designação de
Enéadas.
1 Pitágoras de Samos - Nasceu na Ilha de Samos, na Jônia, no VI século e
alcançou o V século a.C.. Alguns historiadores dizem que ele nasceu em
582 e morreu em 497 a.C.. Apesar de alguns autores terem semeado
dúvidas em torno da vida de Pitágoras, pode-se rer certeza de sua existên­
cia, pois é citado, inclusive, por filósofos que viveram no seu tempo,
como é o caso de Heráclito.
Sabe-se que ele teve alguns mestres de renome. Mocinho, quando ainda
vivia em Samos, foi discípulo de Hermódamas. Em Siros, já aos vinte
anos, ouviu as palestras de Ferácides e chegou a ouvir os ensinamentos
de Tales e de Anaximandro, em Mileto.
Pitágoras esteve na África, na Ásia e Egito. Foi iniciado em Mênfis pelo
pontífice Sonquis. Vejamos como Edouard Schuré (in “Os Grandes Ini­
ciados - Pitágoras”, pág. 24) narra essa passagem da vida do grande
filósofo: “Polícrates jactava-se de proteger os filósofos, tanto como pro­
tegia os poetas. Apressou-se, pois, a dar a Pitágoras uma carta de reco­
mendação para o faraó Amásis que o apresentou aos sacerdotes de
Mênfis. Não o receberam. Os sábios egípcios desconfiavam dos gregos,
que tachavam de leves e inconstantes. Fizeram de tudo para amedrontarem
o jovem samiano. O noviço submeteu-se, porém, às lentidões e às provas
por que o fizeram passar com uma paciência e uma coragem inquebran-
táveis. Ele sabia de antemão que não atingiría o conhecimento senão
mediante a submissão de todo o ser à sua vontade. A sua iniciação durou,
pois, vinte e dois anos sob a direção do pontífice Sonquis”.
Quando o Egito foi invadido por Cambises II, o déspota persa, Pitágoras
e alguns sacerdotes foram presos e enviados para a Babilônia. Ali, não só

210
Cartilha do Companheiro

tomou conhecimento da doutrina de Zo roas tro, como teve oportunidade


de entrar nos arcanos da antiga magia.
Da Babilônia, Pitágoras retornou a Samos e pouco tempo depois foi para
Crotona, cidade encravada numa das extremidades do golfo de Tarento,
que ao lado de Sibáris era uma das mais florescentes cidades da Itália
Meridional. Tentaria fundar em Crotona o que não conseguira em Samos:
uma instituição onde pudesse, a partir de uma iniciação, transmitir co­
nhecimentos que se baseavam numa ciência experimental. E, assim, num
clima que lhe era inteiramente favorável, fundou a sua confraria de inici­
ados laicos. Desse modo, surgiu a escola pitagórica.
Na escola pitagórica vigorava a lei do silêncio, sendo proibido a seus
membros divulgar os ensinamentos ali recebidos. Esta é a principal razão
por que, muitas vezes, é difícil separar o que pertence realmente a Pitágoras
e o que pertence a seus discípulos.
Não era fácil ingressar na escola de Pitágoras. Os escolhidos faziam pri­
meiro uma espécie de noviciado e depois eram iniciados no grau de apren­
diz. Este era o grau da preparação e se estendia pot cinco anos.
Os iniciados eram chamados de esotéricos, isto é, os de dentro. Aos não
iniciados, isto é, aos d e fora d a E scola, dava-se-lhes o nome de exotéricos.
Quando a fama de Pitágoras estava no auge, começaram a surgir inimigos
da instituição, incitados por um tal Cilo que fora candidato á iniciação e
não conseguira seu intento por ser de gênio muito irascível. Despeitado,
Cilo organizou uma espécie de clube, cuja finalidade era combater os
esotéricos. Pouco a pouco, conseguiu que os principais líderes do povo
se voltassem contra o filósofo e sua Escola. De tal maneira cresceu a
animosidade dos crotonenses que terminaram por incendiar o local onde
Pitágoras estava reunido com seus discípulos. Alguns autores afirmam
que, consumidos pelas chamas, morreram trinta e oito pitagóricos e o
próprio Pitágoras, rendo escapado apenas Arquipo e Lísis, este o autor
dos "Versos de Ouro” . Para a maioria dos historiadores Pitágoras
escapou da morte e fugiu para Metaponto, onde faleceu muito tempo
depois.

211
Castellar» e Rodrigues

212
Cartilha do Companheiro

Tetragram a

Te tr agram a é a palavra formada de dois vocábulos gregos


(tetra e grama) significando “quatro letras” que são pronunciadas
sempre separadamente: IOD, H E, VAU, HE.
Neste tetragramaton - divino nome, de quatro letras - os
seguidores dos pitagóricos descobriram algo que foi introduzido na
M açonaria, a tétrada hebraica IHVH. Quando, ao ler o texto sa­
grado, alguém encontrava a tétrad a sa g ra d a , substituía-a ¿media­
tamente pela palavra Adonai, que significa Senhor.

213
Casíellani e Rodrigues
Cartilha do Companheiro

O Número C inco

Assim com o o três é o emblema sim bólico do Grau de


Aprendiz, o c in c o é o emblema simbólico do Segundo Grau.
Para o Companheiro, tudo é 5: cinco viagens; cinco passos;
cinco pontos de toque; cinco anos de idade; cinco luzes; cinco colunas;
cinco instrumentos de trabalho; Estrela de cinco pontas.
Os pitagóricos consideravam o 5 um número importante por
ser a metade de 10. E interessante saber-se que o 5 recebia também
o nome de m atrim ôn io por conter um número ímpar (masculino) e
um número par (feminino): 3+2=5.
Para Platão, o 5 representava as cinco formas dos sólidos:
pirâmide, cubo, octaedro, icosaedro e dodecaedro que, para ele,
representavam, respectivamente, o fogo, a terra, o ar, a água e o
éter, este último, a substancia formadora do círculo zodiacal.
O número cinco oferece varias significações simbólicas; união,
vida manifesta, existencia material e objetiva, o centro, etc...
Ao que se sabe, os pitagóricos tinham o 5 como representante
dos cinco planetas então conhecidos, bem conto as cinco zonas terres­
tres que, segundo afirmam alguns historiadores, foram descobertas
por Pitãgoras,
O número 5 designa a quintessência universal e simboliza a
essência vital, o espirito animador.
As Colunas que sustentam a Loja de Segundo Grau são cinco;
Jónica, Dórica, Corintia, Compósita e Toscana.

215
Castellar» e Rodrigues

Sabemos que as três Colunas do Grau de Aprendiz refercm-se,


respectivamente, ao Venerável Mestre, ao 1“ Vigilante e ao 2 o Vigi­
lante. No Grau de Companheiro, acrescente-se mais a Compósita,
que se refere ao Orador, e a Toscana que se refere ao Secretário.
Apontemos alguns dados interessantes sobre o número 5:
5 eram os planetas conhecidos pelos antigos: Saturno, Júpite
Marte, Venus e Mercurio.
5 especies de animais: os homens, os quadrúpedes, os répteis,
os peixes e os pássaros.
5 partes principáis no interior do corpo: o cérebro, o coração,
os pulmões, o fígado e os rins.
5 partes das plantas: a raiz, o tronco, a folha, a flor e a
semente.
5 géneros de mistos: as plantas, os animais, os zoófitos, as
pedras e o metais.
5 divindades nupciais: Júpiter, Juno, Vênus, Suada e Diana.
5 divisões da arte: plástica, rítmica, fónica, cinética e psíquica.
5 livros de Moisés (Pentateuco): Gênese, Éxodo, Levítico,
Números e Deuteronómio.
5 partes do m u n do: Europa, Ásia, África, América e Oceania.
5 sentidos: visão, audição, olfatação, paladar e tato.
5 dedos em cada mão e era cada pé do homem.
5 pomas da Estrela microcósmica.
5 pontos de felicidade na Maçonaria de adoção: amar, adorar,
trabalhar, interceder e socorrer.
Cartilha do Companheiro

O ríeu

O Segundo Grau está todo impregnado de influencias filosó­


ficas. Há autores, e bons autores, reconhecemos, que afirmam que
o Segundo Grau se destaca pelo seu pitagorismo e por sen orfeísm o.
Há outras influências, quiçá maiores do que as duas apontadas.
Sobre Pitágoras, fala-se muito. Sobre Orfeu, pouco se ouve em Loja,
Quem foi Orfeu? Orfeu existiu realmente?
Pitágoras e até Platão falavam de Orfeu como um homem
divino, mas muitos entre o povo, inclusive os sofistas, diziam que
tudo não passava de uma lenda para explicar a origem da música.
O argumento para negar a existencia de Orfeu era o seguinte: se
nem Homero e nem Hesíodo jamais se referiram a Orfeu como é
que ele podia ter existido?
Por outro lado, havia os que defendiam a existencia de Orfeu
e alguns se diziam seus discípulos.
Quando os autores falam em influencias pitagóricas e órficas,
esquecem-se de dizer que a mística órfica entrou na filosofia grega
justamente por intermedio de Pitágoras, que nada mais foi que um
reformador do orlismo, assim como Orfeu, actedita-se, tenha sido o
reformador da religião de Dionisio.
Ninguém, em sã consciencia, pode afirmar com certeza quem
foi Orfeu. Apesar de todas as lendas que circulam em torno de sua
existencia, a figura de Orfeu é bascante interessante. Lendas à parte,
há quem afirme ter sido ele uma personagem real; outros juram que

217
Castellani e Rodrigues

O rfeu era um deus; o u tro s ain d a o têm com o um herói


im aginário.
Orfeu teria vindo da Trácia, com Baco; os que não aceitam
tal hipótese, afirmam que Orfeu (ou o movimento místico ligado ao
seu nome) teria sido originário da Ilha de Creta. Há também aqueles
estudiosos que afirmam que as doutrinas do orfismo são de origem
egípcia. Lemos em um historiador da filosofia que Orfeu fora grande
reformador que teve um fim trágico: teria sido estraçalhado por
ménades frenéticas, instigadas pela ordoxia báquica.
Alguns dizem ter sido ele grande amante da música. As lendas
antigas dão pouco valor a este detalhe, o que não acontece com as
versões mais novas.
Quais seriam os ensinamentos órficos?
Se Orfeu existiu ou não, é coisa discutível, O que não se
pode discutir é sobre a veracidade dos ensinamentos órficos. Eles
acreditavam na transmigração das almas e tinham como ponto certo
que podiam gozar da bem-aventurança eterna ou sofrer terríveis
castigos, de acordo como tivessem vivido aqui na terra. Sua religio­
sidade era grande e aspiravam tornar-se puros, sem máculas, e,
para tanto, tomavam parte em cerimônias de purificação, além de
evitarem qualquer tipo de contaminação. Só comiam carne em certas
ocasiões, quando o ritual o exigia, como se fora uma espécie de
sacramento. Havia uma certa ligação com Baco e tinham como
certo que Baco nascera duas vezes, uma de sua mãe Sámele e outra,
da coxa de Zeus, seu pai.
Sobre sua origem, o mais corrente é que era filho de Oedagro,
rei da Trácia e da musa Calíope. Existe uma outra versão: Orfeu
seria filho de Apolo e da musa Clio.
Conforme já frisamos, correm mundo muitas lendas em torno
da existência de Orfeu. A mais conhecida é aquela em que ele é tido
como apaixonado por Eurídice. Ficaram noivos; ocorre que a noiva
morreu no dia do casamento. Orfeu se desespera e resolve descer à
mansão dos mortos a ver se conseguia rever a noiva querida e,

218
Cartilha do Companheiro

quem sabe, trazê-la de volta. Desceu pelo Tenaro tocando sua lira;
alcançou as águas do Estige. O som que tirava da lira era tão
melodioso que sensibilizou Plutão e Proserpina, os deuses da man­
são dos mortos que, emocionados, lhe deram permissão para levar
Eurídice de volta à mansão dos vivos.
Entretanto, uma condição lhe foi im posta para que pudesse
lograr êx ito na viagem que iria em preender com a noiva: enquanto
estivesse dentro dos lim ites da m ansão dos m ortos, não poderia,
em hipótese nenhum a, em bora guiando a noiva, contem plar-lhe
as faces.
Partiu Orfeu, seguido de Eurídice. Ele ansiava por contemplar
aquele rosto querido.
Já perto de ultrapassar os limites da mansão dos mortos,
Orfeu não resistiu... contemplou, embevecido, o belo rosto da bem-
-amada.
Eurídice rolou pela escarpa que, de repente, aparecera por
trás dela e sumiu, desaparecendo, para sempre, nas profundezas do
abismo.
Mais uma vez, Orfeu tangeu sua lira, tirando dela suavíssima
melodia. Suplicou aos deuses nova permissão para rever a idolatrada
noiva. Plutão e Proserpina, inflexíveis, não se comoveram com os
apelos do apaixonado Orfeu que teve que regressar sozinho à mansão
dos vivos.
Conta outra lenda que, depois de sua morte, a cabeça de
Orfeu foi lançada ao rio que a levara até o mar, chegando à Ilha de
Lesbos. Os lábios não paravam de se entreabrir, pronunciando o
nome de Eurídice; era um lamento triste que reboava pelas praias
distantes e o eco repercutia pela encosta das montanhas e se perdia
longe, lá bem longe, nas fimbrias do horizonte.
O crime das ménades, tendo ficado impune, fez desabar sobre
aquela região toda sorte de maldições e, finalmente, o povo foi
atacado pela peste que ceifava centenas e centenas de vidas.
Consultado o Oráculo, ele respondeu que o terrível flagelo

219
Castellani e Rodrigues

só haveria de extinguir-se no dia em que fossem prestadas honras


fúnebres à cabeça de Orfeu.
Um velho pescador encontrou-a, ainda com sua beleza intacta,
na foz do Rio Meles, na Jônia. Trazida para o Templo que havia
sido construído em sua honra, Orfeu passou a ser venerado como
um deus.
Diz a lenda que as mulheres foram proibidas de ingressar no
Templo de Orfeu.
Os habitantes de Dium, na Macedônia, vangloria vam-se de
Orfeu ter morrido lá, mostrando um túmulo e dizendo que, ali,
Orfeu tinha sido exumado. Afirmavam mais: que ele aperfeiçoara a
citara, acrescentando-lhe duas cordas, além das sete já existentes.

220
Cartilha do Companheiro

Bibliografia

1. AQUINO, T. O Ente e a Essência (in Os Pensadores). São Paulo, 1985.


2. _____ . Questões Discutidas sobre a Verdade (in Os Pensadores). São
Paulo, 1985.
3. BATTAL, M. M. Lições de Filosofia Geral e M açônica (trad. do espa­
nhol). São Paulo.
4. BOUCHER, J. L a Sym bolique M açonnique. Paris, 1985.
5. CARVALHO, A. Companheiro Maçam. Londrina: “A TROLHA” 1992.
6. _____ . Símbolos M açônicos e suas Origens. Londrina: “A TROLHA”,
1990.
7. CASTELLANI, J. A Ciência Maçônica e as Antigas Civilizações. São
Paulo, 1977.
8. _____ A M açonaria e sua Herança H ebraica. Londrina: “A TROLHA”,
1993.
9. _____. Dicionário Etim ológico M açônico (vol. A-B-C). Londrina: “A
TROLHA”, 1990.
10. CASTELLANI, J. e Rodrigues, R.. Análise da Constituição de Anderson.
Londrina: “A TROLHA”, 1995.
1 I . DE SAINT-DIDIER, L. O Triunfo Hermético. São Paulo, 1976.
12. DESCARTES, R. Discurso sobre o M étodo (trad. do original francês).
Rio de Janeiro, 1952.
13. D’ESPAGNET, J. A O bra Secreta da Filosofia de Hermes Trismegistos
(trad. do original francês). São Paulo, 1976.
14. DURANT, W.. História da Filosofia (trad. do original inglês). São Paulo,
1938.
15. FIGUEIREDO, J. G. Dicionário de M açonaria. São Paulo, s/d.
16. FULCANELLI. As Mansões Filosofais (trad. do original francês). Lis­
boa, 1990.

221
Castellan i e Rodrigues

17. GRAN LOGIA DE CHILE, varios autores. Curso de Docencia para


Instructores Masones. Santiago de Chile, 1995.
1 8 . HEGEL, G. W. F. Lecciones sobre la Historia de la Filosofía, México,
DE, 1955.
19. LA FUENTE, F. E, Esquema Filosófico de la Masonería. Madri, 1981.
2 0 . LAVAGNINI, A. El Secreto Masónico. Buenos Aires, 1980.
21. LEAL, R, P, Pesquisa em M açonaria. Belo Horizonte, 1978,
22. LOBO, R. H. A Filosofia e sua Evolução, Sao Paulo, 1979.
23. M ONTALVAO, A. 500 Biografías dos Maiores Vultos da Humanidade.
São Paulo, 1976.
24. M ORENTE, M. G. Fundam entos de F ilosofia (trad. do original
espanhol), São Paulo, 1976.
25. PALOU, J. A Franco-Maçonaria Simbólica e Iniciática (trad. do original
francês), São Paulo, s/d.
26. PENEDOS, A. Introdução aos Pré-Socráticos. Porto, 1984.
2 7 . RAGON, J. M. Ritual do Grau de Com panheiro (trad. do original
francês). São Paulo, 86.
29.SENNA, V, de. Landmarques. Rio de Janeiro, 1981.
29. SPOLADORE, H., Paschoal, E $. e Carvalho, A. Instruções para h oja
de Companheiro. Londrina: “A TRO LHA", 1994.
30. VALENTIN, B. As D oze Chaves da Filosofía (trad. do original latino).
Sao Paulo, 1976.
31. VAROLI FILHO, T.. Curso de M açonaria Simbólica:
I Tomo (Aprendiz). São Pardo, 1974,
II Tomo (Companheiro). Sao Paulo, 1976.
3 2 . VERNEAUX, R,. Textos de los Grandes Filósofos. Barcelona, 1982.
33. CADERNOS DE PESQUISAS MAÇÔNICAS DE “A TROL.HA”
N° 9. Londrina: “A TROLHA”, 1995.
N“ 10. Londrina: “A TROLHA”, 1995.
N" 11. Londrina: “A TROLHA”, 1996.
34. REVISTAS: diversos números:
1. A Verdade - São Paulo
2. “A TROLHA” - Londrina
3. Acacia - Porro Alegre
4. O Prumo - Florianópolis
5. Consciência - Campo Grande
35. RITUAIS DE COMPANHEIRO:
1. GOSP - Rito de York - 1975

222
Cartilha do Companheiro

2. GLESP - Rito Escocês - 1975


3. GOSC - Rito Escocês - 1976
4. GOPSP - Rito Escocês - 1985
5. GLESP - Rito Escocês - 1987
6. GLRJ - Rito Escocês - 1987
7. GOIPE - Rito Escocês - 1994
Castellani e Rodrigues

224
Cartilha do Companheiro

Obras do Autor

Raimundo Rodrigues

1. Riachão (romance) - 2a edição, Ed. Marco Markovitch, São Paulo,


1998.
2. Trovas - Edição da Academia de 1.etras do Triângulo Mineiro, Uberaba,
1965 (edição esgotada).
3. Gramática História - 5a edição, Ed. José Bonifácio, São Paulo, 1972
(edição esgotada).
4. Literatura Portuguesa - 3a edição, Ed. José Bonifácio, São Paulo, 1970
(edição esgotada).
5. Cadernos de Literatura Brasileira - Ed. José Bonifácio, São Paulo, 1970
(edição esgotada).
6. Análise Sintática - Editora José Bonifácio, São Paulo, 1971 (edição
esgotada).
7. Trovas do Ontem e do Hoje - Edição do Autor, São Paulo, s/d.

OBRAS MAÇÔNICAS

8. Análise da Constituição de Anderson (coautoria com José Castellani),


Ed. “A TROLHA”, Londrina, 1995.
9. Cartilha do Companheiro (coautoria com José Castellani), Ed. “A
TROLHA”, Londrina, 1998.
10. A Filosofia da Maçonaria Simbólica - Ed. “A TROLHA”, Londrina,
1999.
11. A Filosofia da Maçonaria Simbólica, vol. 2 - Ed. “A TROLHA”, Lon­
drina, 2000.

225
Castellani e Rodrigues

12. Maçonaria - Filosofia & Doutrina - F.d. GLESP, São Paulo, 2000.
13. A Filosofia da Maçonaria Simbólica, vol. .3 - F.d. “A TROLHA”, Lon­
drina, 2001.
14. Visão Filosófica da Arte Real - Ed. “A TROLHA”, Londrina, 2002.
15. Sutilezas da Arte Real - Ed. “A TROLHA”, Londrina, 2003.
16. A Maçonaria e o Hábito da Virtude - Ed. “A TROLHA”, Londrina,
2004.

PARTICIPAÇÃO EM COLETÂNEAS

• Coletânea de Poesias “A Praça é do Povo”, Uberaba, 1967.


• Cadernos de Pesquisas Maçônicas 9 - Loja de Pesquisas “Brasil”, Lon­
drina, 1995.
• Cadernos de Pesquisas Maçônicas 10 - Loja de Pesquisas “Brasil”,
Londrina, 1995.
• Cadernos de Pesquisas Maçônicas 11 - Loja de Pesquisas “Brasil”,
Londrina, 1996.
• Anuário de Pesquisas Maçônicas, vol. I, GOB, Brasília, 1996.
• Cadernos de Pesquisas Maçônicas, Loja “Fraternidade Brazileira” de
Estudos e Pesquisas, Londrina, 1997.
• Seleção de Trovas Maçônicas, Academia Maçônica de Letras do Estado
do Ceará, 1998.
• Anuário da Loja de Pesquisas Maçônicas “Quatuor Coronad”, vol. II,
GOB, Brasília, 1999.
• Instituto Brasileiro de Pesquisas e Estudos Maçônicos “Fernando Salles
Paschoal”, INBRAPEM, vol. 2, Londrina, 2001.
• Cadernos de Pesquisas Maçônicas 19 - Academia Maçônica de Artes,
Ciências e Letras - AMACLE - Londrina, 2001.

O autor está presente em:


Estudos de Literatura do Triângulo Mineiro, de Edson Prata, 1967.
A Poesia em Goiás, de Gilberto Mendonça Teles.
Estante do Escritor Goiano, do Serviço Social do Comércio.
Estudos Literários de Autores Goianos, de Mário Ribeiro Martins.

É verbete:
Na Enciclopédia de Literatura Brasileira, Edição do Ministério de Educação
de Cultura (MEC), edição de 1990.

226
Cartilha do Companheiro

No Dicionário Biobibliográfico de Goiás, de Mário Ribeiro Martins, edição


de 1999.
No Dicionário Biobibliográfico do Tocantins, de Mário Ribeiro Martins,
edição de 2001.

227

Você também pode gostar