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Caracterização Tecnológica do Urânio

André Eugenio1
Iarquison1
Marcelo Silveira¹
Wesley¹
Clovis Carvalho¹
Reneu Junior¹
Diego Acir²

Resumo
Este estudo trata da caracterização tecnológica do urânio, desde as suas
propriedades químicas, mineralógicas, bem como das rochas onde é encontrado, de
forma a destacar os pontos relevantes no tocante a determinação das formas de
extração, lavra e beneficiamento.

Palavras-chave: Urânio, propriedades, caracterização tecnológica, rochas.

Abstract
This study deals with the technological characterization of uranium, from its
determined, mineralogical characteristics, as well as the rocks extracted where it is,
in order to highlight the relevant points regarding the determination of the forms of
collection, mining and processing.

Keywords: Uranium, technological characterization, rocks.

1. Introdução

Minério de urânio é toda concentração natural de minerais na qual o urânio


ocorre em proporções e condições tais que permitam sua exploração econômica,
dentro de um contexto estratégico. O urânio, cujo nome faz uma alusão ao planeta
Urano, tem uma distribuição diversificada sobre a crosta terrestre, mas as reservas
1
Graduando em Engenharia de Minas pela UNIPAM

² Professor do curso de Engenharia de Minas da UNIPAM


2

economicamente atrativas dependem do teor da substância presente no minério,


além da disponibilidade tecnológica utilizada para a extração e beneficiamento. No
Brasil, o urânio, um metal radioativo e considerado estratégico, tem sua mineração
controlada pela União, através da CNEN (Comissão Nacional de Energia Nuclear),
autarquia criada em 1956 e atualmente, vinculada ao Ministério de Ciência e
Tecnologia. De acordo com a Lei Nº 4.118, de 27 de agosto de 1962, constituem
monopólio da União a pesquisa e a lavra das jazidas dos minérios nucleares, o
comércio e a produção de materiais com características nucleares. Atualmente este
monopólio está sendo amplamente questionado pelos diversos órgãos e
representações ligados ao setor mineral. Com o arrendamento da jazida de Santa
Quitéria pela INB no Ceará já podemos observar uma flexibilização no monopólio
estatal. (HEIDER, 2007)
Todo urânio presente no sistema solar teve origem a partir de uma ou mais
supernovas. Uma supernova é um evento astronômico onde ocorre a explosão de
uma estrela no qual a energia emitida é elevada por um fator 10 bilhões. Esta
explosão ocorre no momento da queima final de uma estrela e é capaz de emitir um
brilho muito intenso. O urânio pode ser encontrado em diversos tipos de meios, tanto
em temperatura ambiente como em temperatura magmática, em diferentes fluídos
com pressão e composição variadas. A quantidade de urânio no Sol é extremamente
pequena, com apenas 10-¹² da abundância de hidrogênio, e nos meteoritos sua
abundância é de 8 μg/kg. A abundância do urânio na Terra é próxima à do
molibdênio e do arsênio e um pouco maior que o mercúrio, antimônio, tungstênio e
cádmio. O urânio é o elemento de ocorrência natural que possui a maior massa
molar; sua concentração na crosta terrestre é de cerca de 3 mg/kg (0,0003%); na
água do mar, seu teor é de aproximadamente 3 μg/L. (MAIA,2017)
Na natureza são encontrados três isótopos do urânio: 234U, 235U e 238U.
Todos estes isótopos possuem as mesmas propriedades químicas, pois possuem o
mesmo número de prótons (92), e todos também apresentam atividades radioativas,
porém estas atividades são diferentes para cada isótopo (Tabela 1). A atividade
radiológica depende do tempo de meia-vida, e dentre os três isótopos de ocorrência
natural o 238U apresenta o maior tempo de meia-vida, consequentemente é o mais
abundante na natureza e possui a menor atividade radiológica. Por outro lado, o
isótopo de menor abundância na natureza é o 234U que também apresenta a maior
atividade radioativa e o menor tempo de meia-vida. Devido a esse equilíbrio os
3

isótopos 234U e 238U têm a mesma contribuição na radioatividade do urânio de


ocorrência natural. (MAIA,2017)
Tabela 1 - Características dos isótopos de urânio de ocorrência natural. Fonte: MAIA, 2017.

Isótopo Meia-vida (anos) Abundância Atividade


relativa (%) específica [Bq g-¹]
234U 2,46x10⁵ 0,006 231x10⁶
235U 7,04x10⁸ 0,72 80,011
238U 4,47x10⁹ 99,28 12,455

A oxidação do urânio acontece facilmente em contato com o ar. Devido a


essa característica a maior parte do urânio ocorre na natureza em forma de óxido. A
substância mais comum encontrada nas minas de urânio é o óxido UO8, pois é a
forma termodinamicamente mais estável dos óxidos de urânio, e contém cerca de
85% em massa do metal. A ocorrência do urânio se dá em aproximadamente 5%
dos minerais conhecidos e alguns exemplos são o lignito, a monazita, em rochas e
fertilizantes de fosfato. Em minérios, a ocorrência do urânio se dá na uranita como
óxido UO2, e na pechblenda como U3O8. Também pode ocorrer em alguns minerais
secundários como óxidos complexos, silicatos e vanadatos. (MAIA,2017)
A aplicação do óxido de urânio natural para a fabricação de vidros e
cerâmicas amareladas data de 79 a.C., muito tempo antes da descoberta do próprio
elemento. Diversos artefatos de vidro desta época foram encontrados no ano de
1912 em uma vila próxima à cidade de Nápoles, na Itália, e o vidro amarelado
continha aproximadamente 1% de óxido de urânio. Algum tempo depois, durante a
Idade Média, o mineral pechblenda era extraído de minas de prata na região da
Bohemia, atual República Tcheca, e era igualmente utilizado como agente de
colorização na indústria de vidros. O uso do urânio era pouco explorado antes da
descoberta da radioatividade e até mesmo por algum tempo depois, além de ser
empregado em pequenas quantidades para a fabricação de vidros amarelados e
para a vitrificação de objetos produzidos com cerâmica. Ele ainda era aproveitado na
fabricação de filamentos para lâmpadas de luz de palco, e também para melhorar a
aparência de dentaduras, assim como na indústria de couro e madeira e como
corante, para o tingimento de lã e seda. Alguns sais de urânio também foram
empregados na fotografia para a produção de papéis fotográficos, os quais foram
comercializados até pelo menos o final do século XIX, sendo substituídos,
4

posteriormente, por halogenetos de prata, devido à sensibilidade superior destes. No


entanto, um toner fabricado pela Kodak entre as décadas de 1930 e 1950,
comercializado pelo nome de Kodak T9, continha nitrato de urânio hexa-hidratado;
até hoje alguns fotógrafos alternativos continuam utilizando processos baseados em
urânio para a revelação de fotos. Após a descoberta da radioatividade e o
isolamento do rádio a partir da pechblenda, realizado por Marie Curie, a produção de
urânio para fins de extração do rádio se elevou enormemente. O rádio era utilizado
para pintar os ponteiros do relógio e em tratamentos médicos e de embelezamento,
dentre outros usos. O aumento do uso do rádio também aumentou
significativamente a quantidade de urânio disponível, pois para a obtenção de 1 g de
rádio, eram necessárias cerca de 7 toneladas de pechblenda. Com isso, os materiais
de cerâmica que continham urânio em sua composição se tornaram abundantes e
de custo acessível, sendo encontrados em diversas casas da época. Quando a
radioatividade do urânio foi descoberta, ele passou a ser utilizado em práticas
científicas, e devido ao elevado tempo de meia-vida do 238U, ele passou a ser
utilizado para estimar a idade das primeiras rochas ígneas. (MAIA, 2017).

2. Por que utilizar a energia do urânio?

O Urânio é comercialmente um dos principais elementos para obtenção de


energia. O potencial energético do urânio ultrapassa as possibilidades do petróleo e
de outros materiais físseis: aproximadamente meio quilo de urânio é capaz de
fornecer tanta energia quanto 1.360 toneladas de carvão. Um quilo fornece a energia
de 10 toneladas de petróleo.
O Urânio é transformado em pastilhas e em seguida elas são inseridas em um
tubo de zircaloy para formar o elemento combustível. Duas pastilhas de diâmetro e
tamanho de um centímetro são suficientes para gerar energia por um mês para uma
casa com 4 pessoas.
Um quilo desse elemento gera 300MW de energia elétrica, e para produzir o
mesmo utilizando outras fontes de energia, seria necessário cerca de 2.720
toneladas de carvão, ou 168Km quadrados de área alagada para usina hidroelétrica.
Além disso o urânio produz uma baixa emissão de CO2, diferentemente de
combustíveis como petróleo, gás natural e carvão mineral.
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O urânio é o único elemento encontrado na natureza capaz de sofrer fissão


nuclear, mas somente um de seus isótopos, o de massa 235, se fissiona após
absorver um nêutron (Figura 1). O isótopo de massa 238 não sofre fissão nuclear,
mas ele pode ser transformado em um elemento passível de fissão, sendo por isso
classificado como um isótopo fértil. Após ser bombardeado por um nêutron e emitir
duas radiações beta, o urânio-238 se transforma em plutônio-239, isótopo físsil que
possui tempo de meia-vida de aproximadamente 24 mil anos. (MAIA, 2017).

Figura 1 - Exemplo da reação em cadeia iniciado pelo impacto de um nêutron em um átomo de


urânio-235. Fonte: Blog Parque da Ciência.

Grande parte dos reatores para produção de energia nuclear utiliza urânio
natural enriquecido como combustível. O urânio enriquecido tem a concentração de
urânio-235 elevada de 0,7% para aproximadamente 3% m/m ou mais. Essa
quantidade de urânio-235 é suficiente para dar início à reação de fissão em cadeia
que será sustentada pela produção de plutônio-239. O urânio-233 também é capaz
de sofrer fissão nuclear, e apresenta tempo de meia-vida de 160 mil anos. Ele pode
ser produzido a partir do tório natural (massa 232). A meia-vida do tório é de 13,9
bilhões de anos. Ele é muito abundante na crosta terrestre, cerca de três vezes mais
que o urânio. Alguns reatores experimentais que empregam o tório como
combustível já foram testados, e a utilização desse elemento se mostrou muito
favorável. Além disso, o urânio-233, produzido a partir do tório, é de fácil detecção e
apresenta maiores dificuldades para transporte em relação ao plutônio-239,
limitando a chance de ser desviado para fins bélicos. Outra vantagem de se utilizar o
tório como combustível nuclear é devido aos resíduos gerados, que apresentam
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radioatividade significante por apenas algumas centenas de anos, possibilitando seu


armazenamento e monitoramento.

3. Produção Brasileira – Indústrias Nucleares do Brasil (INB)

No Brasil, a constituição de 1988 determina o monopólio estatal para a


pesquisa, lavra, o enriquecimento e reprocessamento, a industrialização e o
comércio de minérios nucleares e seus derivados. A INB (Indústrias Nucleares do
Brasil) mantém um empreendimento mínero-industrial que está localizado na região
sudoeste do Estado da Bahia, a nordeste da Cidade de Caetité.
A partir de 1978, com a implantação do Projeto Lagoa Real e a
sistematização da pesquisa, trabalhos de reconhecimento, sondagem, cubagem e
avaliação econômica de várias anomalias, os resultados obtidos foram sendo
tratados e as reservas geológicas de urânio, no âmbito da província, tiveram seus
volumes calculados (MAIA, 2017). Atualmente, são consideradas como
jazidas/depósitos, dez áreas (doze anomalias) que possuem trabalhos de pesquisa
suficientes para uma avaliação confiável, apresentando um total geral de 100.770
toneladas de U3O8, com teor médio de 2100 ppm. Um demonstrativo das anomalias
detectadas e suas respectivas cubagens é apresentado na Tabela 1.

Tabela 2 - Demonstrativo das anomalias detectadas e suas cubagens. LR - Lagoa Real.


Fonte: COSTA, 2005.

Anomalias Classe de Reserva Tonelada U3O8 Teor Médio (ppm)


aproximado
LR -13 – Fazenda Medida 12010 3400
Cachoeira Indicada 8450 3600
Total 20460 3500
LR - 08/11 – Fazenda Medida 2800 1600
das Quebradas Indicada 1780 1500
Total 4580 1550
LR- 01- Baixa do Inferida 600 2700
Almeida Total 600 2700
LR – 02/12 – Inferida 2200 2200
Monsenhor Bastos Total 2200 2200
Medida 8310 1800
LR – 03 - Da Rabicha Indicada 15000 2600
Total 23310 2200
LR – 04 – Umbu Inferida 370 3650
7

Total 370 3650


LR – 05 – Brejal Inferida 2700 1000
Total 2700 1000
Medida 2950 2150
Indicada 580 1500
LR – 06 – Laranjeiras
Inferida 900 1650
Total 4430 1900
LR – 07 – Modesto Medida 4760 1200
Indicada 9730 1200
Total 14490 1200
LR – 09 – Fazenda do Medida 12390 1900
Engenho Indicada 15240 2000
Total 27630 1950
Medida 43220 2000
Total Acumulado Indicada 50780 2050
Aferida 6770 2250
Total Geral 100770 2100

A área do empreendimento está inserida no contexto tectônico do Cráton São


Francisco, sendo objeto de diversos estudos geológicos, entre eles os realizados
pela CPRM pelo convênio NUCLEBRAS / Secretaria de Minas e Energia da Bahia e
pelo projeto RADAMBRASIL. (COSTA, 2005).
Regionalmente, as feições estruturais que se destacam são: Falhamentos de
orientação NW-N/SE-S, de caráter transcorrente ou de empurrão; Os lineamentos e
a foliação cataclástica presente nos litotipos do Complexo Lagoa Real.
No âmbito restrito das anomalias uraníferas da Planície Uranífera de Lagoa
Real, afloram rochas metamórficas-metassomáticas do embasamento cristalino, com
estrutura cataclástica, notadamente granitóides, microclina plagioclásio augen-
gnaisses e albititos, parcialmente sob cobertura de sedimentos terciários
quaternários.
Os granitóides localizam-se mais precisamente nas imediações das
anomalias AN-02/12 (Monsenhor Bastos) e AN-09/13 (Engenho/Cachoeira) e ainda
nas regiões de São Timóteo. Segundo Moraes et al, são rochas isotrópicas a semi-
isotrópicas, de coloração cinza a cinza-rosada, de granulação fina a média,
localmente grossa a pegmatítica, tendo como minerais máficos dominantes a biotita
e a hornblenda. Em alguns casos apresentam estrutura augen e em outras estrutura
gnáissica, devido à atuação de esforços cisalhantes. Em muitos locais, esses
granitóides exibem uma textura granoblástica poligonizada, com 28 claros sinais de
orientação cataclástica, e ainda fortes indícios de ação metassomática. Os
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microclina plagioclásio augengnaisses são rochas metamórficas quartzo-feldspáticas


bandeadas, geralmente encaixantes dos albititos portadores de mineralização
uranífera. Apresentam granulação fina a média, coloração acinzentada a
esbranquiçada e exibem comumente evidências de intensa ação cataclástica. Esses
gnaisses são caracterizados, de um modo geral, pelas suas proporções variáveis de
microclina e plagioclásio. O quartzo está presente nessas rochas em percentagens
da ordem de 5 a 20% e os máficos dominantes são a biotita e o anfibólio. (GEISEL
SOBRINHO et alii., 1972) classificaram essas rochas por critérios de campo e para
fins de mapeamento de detalhe, como “Metassomatitos”.
9

A figura 2 demontra uma visão da geologia local e da localização das


anomalias na Planície Uranífera de Lagoa Real.

Figura 2 – Província Uranífera de Lagoa Real. Mapa geológico com alocação de


anomalias
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O dobramento é incipiente e posterior ao cisalhamento dúctil. As dobras


existentes são intrafoliais, do tipo e bainha (“sheath folds”.), todas as dimensões são
decimétricas. Na Mina Fazenda Cachoeira, foi individualizada uma megadobra de
200 metros de largura (ápice composto por duas ondulações), do tipo reclinado
(eixos de forte mergulho), considerada como uma dobra intrafolial do tipo em bainha,
com eixo paralelo à direção de estiramento máximo. Na região de Monsenhor
Bastos, a oeste da AN-02/12, a CBPM mapeou uma estruturação do tipo antiforme
de dobras abertas (ângulos de 100-200), com eixos submeridianos. No restante da
área da Província Uranífera, predominam ondulações suaves, com planos axiais
empinados de direção em torno de NE (COSTA, 2005).
A foto 1 dá uma ideia da conformação estrutural na Mina Fazenda Cachoeira.

Foto 1 – Mina Fazenda Cachoeira. Fonte: INB (2004).


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4. Processo de Produção do Urânio

O empreendimento objeto deste estudo não é enquadrado como uma


atividade de mineração convencional. Os trabalhos mineiros na Província Uranífera
de Lagoa Real são regidos pelo regime de monopólio estatal. O complexo mínero-
industrial da Unidade de Concentrado de Urânio-URA é classificado como Instalação
Nuclear. Esta classificação traz consigo uma série de restrições e cuidados não
requeridos à mineração de outros bens minerais. Além da legislação aplicável a
qualquer empreendimento mineral, aplica-se a uma instalação nuclear, legislação
própria devido ao caráter das operações realizadas. Possui como atividades
principais a extração de urânio e a produção de Diuranato de Amônio (DUA),
conhecido como “yelow-cake”. As fases que compõem o conjunto de atividades
passam pela pesquisa, lavra e beneficiamento de minérios de urânio. A foto 2
apresenta uma visão geral das instalações de concentração de urânio. A mina se
apresenta à direita.

Foto 02 – Vista aérea das instalações de concentração de urânio. Fonte: INB 2001.
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A principal aplicação comercial do urânio é como fonte de energia nuclear


para geração de eletricidade em reatores nucleares (IAEA, 2002). Outras utilizações
são encontradas em várias áreas das atividades humanas: emprego na Medicina
(tratamento de câncer, diagnóstico clínico); na Agricultura (conservação e melhoria
da qualidade de alimentos), etc.
O processo operacional executado na Unidade de concentração de Urânio
(URA) vai da mina ao entamboramento do yellow cake, que segue para ser
enriquecido. A figura 2 ilustra esse processo.

Figura 2 – Processo operacional (fluxograma)


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5. Extração do Urânio

A lavra é realizada a céu aberto em bancos de 5m, prevendo-se para a cava


final, bancos com altura de 10 m (INB, 1996). A Mina Fazenda Cachoeira é
composta de três corpos mineralizados denominados de Corpo 1, Corpo 2 e Corpo
3, conforme demonstrado na figura 3. Atualmente a Mina Cachoeira está esgotada.
De 2000 a 2015, a INB Caetité produziu 3.750 toneladas de concentrado de urânio a
partir da extração a céu aberto de uma dessas jazidas – a mina Cachoeira (INB,
2022).
Para a lavra, os blocos (5x5x5m) de minério são definidos através de
acompanhamento litológico e radiométrico e do conhecimento da distribuição dos
teores de urânio na jazida.

Figura 3 – Vista horizontal dos três corpos da mina cachoeira.


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A foto 3 ilustra a visão geral da operações de lavra.

Foto 3 – Vista da cava em operação na mina cachoeira. Fonte: INB (2004)


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As figuras 4 e 5 apresentam o modelamento dos corpos mineralizados, de


blocos e cava final, respectivamente, da Mina Fazenda da Cachoeira, gerados pelo
software GEMCOM.

Figura 4 – Os blocos mineralizados da na mina cachoeira. Fonte: INB (2004)

Figura 5 – Vista em cada dos blocos mineralizados da na mina cachoeira. Fonte: INB (2004)
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Abaixo, as tabelas 3, 4, 5 e 6 apresentam parâmetros e características


relativas ao material extraído na mina e programação anual de produção (INB,
1996). O minério apresenta a composição mineralógica descrita na tabela 7. Por fim,
a tabela 8 descreve as características físico/químicas do minério.

Tabela 3 - Parâmetros Geométricos da cava INB, 1996.

Ângulo médio do talude final 58º


Ângulo da face dos bancos 75º
Altura dos bancos Em operação 5m
Na cava final 10 m
Largura das bermas de proteção 5m
Largura mínima de funda da cava 30 m

Tabela 4 - Parâmetros das estradas e acessos. Fonte: INB (1996)

Rampa máxima 10%


Largura 12 m
Raio de curvatura mínimo 30 m
Tabela 5 - Programa de Produção Anual Projetada. Fonte INB (1996).

Minério 200.000 t
Estéril 1.200.000 t

Tabela 6 - Características físicas dos materiais na mina cachoeira. Fonte: INB (1996)

Peso específico do minério seco “in situ” 2,78 t/m³


Unidade natural média (minério e estéril) 4%
Peso específico do minério úmido “in situ” 2,89 t/m³
Peso específico aparente do estéril seco (“in situ”) 2,7 t/m³
Peso específico aparente do estéril (“in situ”) 2,81 t/m³
Fator de empolamento (FE) 1,50
Ângulo de Repouso 35º
Índice de trabalho (Wi) (britagem) 7,75 kwh/st

Tabela 7 - Composição do minério. Fonte: INB (1996).

Albita 65 a 75%
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Piroxênio 10 a 20%
Granada 2 a 5%
Epidoto 2 a 5%
Magnesita 1 a 3%
Carbonatos 1 a 2%

Tabela 8 - Características físico/químicas do minério. Fonte: INB (1996).

Densidade Real 2,74 t/m³


Densidade Aparente 1,6 t/m³
Umidade 4%
U3O8 0,29%
SiO2 57%
Al2O3 15%
Análise química
Fe2O3 3,5%
CO3 1%
TiO2 0,3%

O estéril da mina é constituído, basicamente, por gnaisses, e material com


teores de urânio abaixo do limite econômico da lavra, que é de 800 ppm. Apresenta
composição mineralógica semelhante ao minério (albitito mineralizado), exceto
quanto ao conteúdo de U3O8. Basicamente, sem quantificar, o estéril é composto de
albita, piroxênio, granada, epidoto, magnetita, carbonatos e uraninita (INB, 1996).
A disposição do estéril da Mina Fazenda Cachoeira, consorciado com o rejeito
sólido das pilhas de lixiviação, é realizada à jusante da cava da mina, na margem
direita e sem qualquer interferência com o Riacho Cachoeira, pelo método de pilhas
construídas de forma ascendente, com disposição em módulos (INB, 1996).
A britagem compreende a fase relacionada ao processo físico de cominuição
do minério, divide-se em: britagem primária, britagem secundária e britagem
terciária. Todas essas fases de britagem são controladas por uma sala de controle.
Após percorrer os três estágios de britagem, o minério cai sobre um
transportador que recolhe a granulometria menor que 10 mm da peneira vibratória e
ambos são conduzidos até a uma moega.
A Cominuição compreende três estágios de britagem que convergem em uma
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granulometria em torno de 3/4 de polegada, visando na sequência à formação das


pilhas de lixiviação e exposições dos minerais de urânio ao ataque de ácido
sulfúrico.
Após percorrer todo o trajeto do britador primário à moega, o minério é
homogeneizado e lançado no pátio de lixiviação através de stackers, conforme se
verifica nafoto 4, formando pilhas trapezoidais com altura aproximada de 5 metros.

Foto 04 - Vista lateral do pátio de lixiviação. Fonte: INB, 2004)

Após formação das pilhas é montada toda uma rede de tubos finos
interligados a um tubo de diâmetro maior que tem a função de ser o tronco principal
ao processo de irrigação da solução ácida.
A solução é transmitida ao tronco principal e este à suas ramificações, que
por sua vez vão ser distribuídas na massa de minério da pilha, conforme mostrado
na figura 05.
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Foto 05 – Tronco irrigando a pilha de lixiviação com ácido sulfúrico. Fonte: INB (2003)

A lixiviação em pilha é sem dúvida uma alternativa econômica frente aos


métodos convencionais e menos agressiva ao meio ambiente. A experiência tem
mostrado que a lixiviação in situ provoca danos de grande magnitude ao conjunto
das águas subterrâneas, devido a ser um processo que tem interface direta com
este tipo de água.
O sistema utilizado para a lixiviação em pilha consiste na montagem de pilhas
de minério que são submetidas à lixiviação por ataque de ácido sulfúrico (por
aproximadamente 3 dias), seguida de recirculação do licor efluente destas (por
aproximadamente 20 dias) e uma etapa final de lavagem (por aproximadamente 6
dias). Após esse período, as pilhas lixiviadas são removidas e transportadas para as
pilhas de estéril/rejeito. A área impermeabilizada é então novamente utilizada para a
montagem de uma nova pilha, repetindo-se o processo.
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A lixívia coletada das pilhas passa, a seguir, por uma etapa de clarificação
que tem como objetivo produzir licor uranífero com as características necessárias
para o tratamento por extração com solvente.

O licor proveniente das pilhas, contendo urânio em solução, é enviado para


etapa de clarificação. O licor é então clarificado com adição de floculantes, para
separação de micro partículas de minério ainda presentes na lixívia e que podem
prejudicar a extração de urânio pela fase orgânica. Após a clarificação, o licor ácido
é filtrado em filtros de carvão e enviado para a área de extração por solventes, onde
o urânio da fase aquosa é extraído em células de extração para a fase orgânica,
constituída de uma mistura de alamina, tridecanol e querosene.
Esta extração, além da purificação, permite o aumento da concentração de
urânio na fase orgânica. Da extração, a fase orgânica é enviada a reextração de
urânio, onde este é extraído por uma solução de cloreto de sódio. As fases de
extração e reextração de urânio permitem que se consiga um aumento na
concentração de urânio de 36 vezes à inicial.
Após estas etapas, a solução ácida de cloreto de sódio carregada com urânio,
é enviada para a unidade de precipitação, filtragem e secagem de diuranato. Nessa
unidade, o urânio é precipitado com solução de hidróxido de amônio à temperatura
de 70oC, em dois reatores em série para a formação de diuranato de amônio.
Em seguida a precipitação, a lama contendo diuranato de amônio é
espessada em um decantador e enviada a um filtro esteira horizontal a vácuo. Para
evitar a contaminação do produto pelo sódio, que estaria presente como diuranato
de sódio, o precipitado passa por uma lavagem, no filtro esteira, com solução de
sulfato de amônio onde ocorre a troca iônica dos íons Na+ pelos íons NH+.
Da descarga do filtro, a lama de diuranato de amônio é enviada para o
sistema de secagem onde a umidade é reduzida. Na unidade de secagem a
umidade do DUA é reduzida de 50% para menos de 1%, retirando a água presente
através da troca térmica com vapor saturado de 10 Kgf/cm2, encamisado no interior
do secador.
Da secagem, o diuranato de amônio é levado por transporte pneumático para
o silo de estocagem conforme apresentado na foto 06.
Deste silo, com capacidade de 20t, o Diuranato de Amônio é descarregado
periodicamente em tambores de 200 litros.
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O overflow do espessador, juntamente com os filtrados, são enviados para a


unidade de Estocagem e Preparação de Reagentes para a preparação da solução
de cloreto de sódio.
Para evitar perdas de produto e poluição ambiental, todos os sistemas de
manuseio de sólidos são conectados a um sistema de despoeiramento por via seca.
Para transporte do yellow cake, o produto é armazenado em tambores de 200
litros (processo denominado de entamboramento) até a totalização de 15 a 17t para
embarque rumo ao porto de Salvador. Uma a amostra primária é, periodicamente,
retirada para controle de qualidade do produto final.

Foto 06 – Etapa final do processo de produção do


yellow cake. Fonte: INB (2003)

O produto obtido é o diuranato de amônio. A tabela 9 abaixo dá uma visão


geral do produto (INB, 1996).

Tabela 9 - Características do produto. Fonte: INB (1996)

Densidade real 1,14 a 1,4 t/m³


Densidade aparente 6 a 8 t/m³
Umidade < 5% máxima
Análise Química U3O8 84%
V2O5 3,2%
PO4 0,0028%
Fe 0,0021%
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Ca 0,001%
SO4 3,2%
K 0,05%
6. BENEFICIAMENTO

 Mineração e beneficiamento – depois de retirada do capeamento de solo,


a rocha contendo urânio é triturada; em seguida, ela é submetida a um
processo químico que separa o urânio de outros materiais a ele associados
na natureza. O resultado desta primeira etapa do ciclo do combustível é o
concentrado de urânio (yellowcake). Esta etapa é realizada atualmente na
Unidade de Concentração de Urânio em Caetité/BA.

 Conversão – o concentrado de urânio é dissolvido e purificado, e então


convertido para o estado gasoso, o hexafluoreto de urânio (UF 6), e é
somente em forma de gás que ele pode ser enriquecido, passando para a
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próxima etapa do ciclo do combustível nuclear. Esta etapa ainda não é


realizada no Brasil.

 Enriquecimento – é o aumento da concentração do urânio o que torna


possível a sua utilização como combustível. Essa concentração do isótopo
U235 passa de 0,7%, como ele se encontra na natureza até 5% (suficiente
para que ele gere energia). O Brasil utiliza a tecnologia da
ultracentrifugação para enriquecer o urânio na Fábrica de Combustível
Nuclear da INB em Resende/RJ.

 Reconversão – o gás enriquecido após passar por diversos processos, é


reconvertido em pó de dióxido de urânio (UO 2). Esta etapa é realizada na
Fábrica de Combustível Nuclear da INB em Resende/RJ.

 Fabricação de pastilhas – é com o urânio enriquecido sob a forma de pó


que são fabricadas pastilhas com cerca de um centímetro de diâmetro.
Esta etapa é realizada na Fábrica de Combustível Nuclear da INB em
Resende/RJ.

 Fabricação do combustível nuclear – as pequenas pastilhas de urânio


enriquecido são colocadas dentro de varetas de uma liga de aço especial –
o zircaloy. Em seguida, as varetas são organizadas em feixes, formando
uma estrutura firme de até 5 metros de altura - o combustível nuclear. Esta
etapa é realizada na Fábrica de Combustível Nuclear da INB em
Resende/RJ.

 Geração de energia – é a fissão dos átomos de urânio que estão contidos


no combustível nuclear dentro do núcleo do reator que gera calor,
aquecendo a água, e transformando-a no vapor que faz movimentar as
turbinas, gerando assim energia. Esta etapa do ciclo do combustível
nuclear é realizada nas usinas nucleares em Angra dos Reis/RJ, pela
Eletrobras/Eletronuclear.

7. REJEITOS

Em todas as etapas da produção e do enriquecimento do urânio existem


materiais e insumos que precisam receber tratamento especial em razão do perigo
que causam à natureza e à vida. A começar pelas grandes pilhas de estéril
formadas graças à baixa concentração do mineral nas jazidas (mesmo as
consideradas com concentrações altas) e pelas águas que saem poluidas depois do
processo de lixiviação, e devem ser tratadas antes de retornar à natureza.
Aventais, jalecos, luvas, vidrarias de laboratórios, por exemplo, são
considerados materiais de baixa atividade, e devem ser armazenados em barris
especiais por períodos de 50 a 300 anos. Com relação aos restos dos combustíveis
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utilizados, os quais são considerados materiais de alta atividade, estes devem ser
armazendos por milhares de anos em barris especiais. O material que sobra dos
processos de enriquecimento é conhecido como urânio empobrecido, e também
deve ser armazenado por centenas ou milhares de anos em barris especiais.
Os barris contendo tais rejeitos deverão ser mantidos em depósitos
subterrâneos, em alguns casos, em grandes profundidades.

Foto divulgada pela Eletrobrás/ Eletronuclear


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Rejeitos de baixa atividade enterrados no deserto de Nevada

8. Considerações Finais

Atualmente o urânio ainda ocupa uma parcela pequena na produção nacional


de energia, totalizando apenas 2,2% da matriz elétrica (EPE-2021). Entretanto há
uma dependência do mercado exterior quanto ao enriquecimento do urânio. Hoje em
dia funcionam as usinas de Angra 1 e Angra 2 (total de 1.990 MW). A produção
nacional atende somente 60% da demanda de Angra 1 (CNN-2021).
Do ponto de vista energético, mesmo que a parcela de energia nuclear na
matriz seja reduzida, deverá ser incentivada, considerando sua contribuição para a
diversificação da matriz energética, o que, consequentemente favorece a segurança
contra o desabastecimento e melhoria da tarifa. Além disso, sabe-se que a energia
proveniente da queima de combustíveis fósseis é tradicionalmente de valor mais
elevado, e já não se dispõe de bacias hidráulicas suficientes para novos grandes
empreendimentos de energia hidrelétrica.
Tendo em vista os recentes conflitos na Europa que colocam em questão a
segurança energética dos países, seria interessante que o Brasil se tornasse
autossuficiente na produção do enriquecimento do urânio para a geração de energia
nuclear a fim de evitar que algum conflito externo ou outro tipo de disputa comercial
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possa prejudicar nossa produção de energia. A INB está implantando uma Usina de
Enriquecimento de Urânio na já existente fábrica de combustível nuclear (FCN) em
Resende/RJ e prevê que o Brasil se tornará autossuficiente na produção do material
em 2033.
As jazidas brasileiras de urânio possuem recursos de ordem de
aproximadamente 300 mil toneladas, o que no estágio atual de produção, estima-se
uma vida útil de dois mil anos. Além disso, há indicativo de novas jazidas em regiões
inexploradas.
O projeto da Usina de Angra 3 que levaria o Brasil a produção total de 3.395
MW de energia nuclear ainda carece de aprovação do orçamento de 15 bilhões de
reais. (BBC-2019). O fim do monopólio da produção de urânio pela estatal brasileira
poderia ser um caminho para o desenvolvimento deste tipo de energia.
Entretanto, há uma série de eventos que devem ser considerados,
especialmente com relação ao meio ambiente. Para que o urânio seja enriquecido,
uma grande quantidade de mineral é empobrecida, além da questão da
radioatividade, que deverá ser armazenada por centenas de anos em depósitos
subterrâneos. Jalecos e materiais utilizados em laboratórios, assim como todos os
insumos utilizados nos processos de enriquecimento e beneficiamento e também na
produção da energia nuclear, precisam ser armazenados de acordo sua categoria de
atividade, podendo ser classificados em baixa, média ou alta. Esse passivo pode
ser bastante oneroso, porque várias gerações futuras deverão manter os depósitos.
Embora os assuntos abordados sejam de extrema importância, não podemos
deixar de observar a relevância da caracterização tecnológica dos minérios para
justificar a implementação de uma planta de beneficiamento de urânio ou de uma
usina de energia nuclear, tendo em vista que esses processos minerários ou de
enriquecimento do mineral exigem profissionais extremamente qualificados e bem
remunerados. Se não houver um bom planejamento com relação ao aproveitamento
econômico desse mineral, há uma grande probabilidade de se criar um passivo difícil
ou impossível de ser resolvido, tendo em vista que nem sempre o problema fica
restrito às questões financeiras.
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Referências
1. HEIDER, Mathias. Urânio. Disponível em
https://www.gov.br/anm/pt-br/centrais-de-conteudo/publicacoes/serie-
estatisticas-e-economia-mineral/outras-publicacoes-1/2-3-uranio . Acesso em
10 de junho de 2022.

2. MAIA, Vinicius. Urânio Depletado – Vantagens e Desvantagens de uma


Aplicação Tecnológica. Disponível em
https://pantheon.ufrj.br/bitstream/11422/5769/1/Vinicius%20de%20Souza
%20Barbosa%20Maia.pdf . Acesso em 08 de junho de 2022.

3. COSTA, Flávio Luiz. Plano Conceitual de Fechamento de uma Mina de


Urânio – Estudo de Caso: A Unidade de Concentrado de Urânio da INB
em Caetité, Bahia. Dissertação de pós-graduação UFOP em 2005.

4. INB Caetité, http://www.inb.gov.br/A-INB/Onde-estamos/Caetite,


acesso em 21 de junho de 2022.
5. Relatório Síntese 2021. Empresa Brasileira de Pesquisa Energética
(EPE).
https://www.epe.gov.br/sites-pt/publicacoes-dados-abertos/publicacoes/
PublicacoesArquivos/publicacao-601/topico-588/BEN_S
%C3%ADntese_2021_PT.pdf, acesso em 21 de junho de 2022.
6. Brasil aumentará a produção de urânio para energia nuclear.
Disponível em https://www.cnnbrasil.com.br/business/brasil-aumentara-
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producao-de-uranio-para-geracao-de-energia-a-partir-de-novembro/,
acesso em 21 de junho de 2022
7. Angra 1 e 2, e porque são diferentes de Chernobyl. Disponível em
https://www.bbc.com/portuguese/brasil-48683942, acesso em 21 de
junho de 2022.
8. Enriquecimento, INB. Disponível em https://www.inb.gov.br/Nossas-
Atividades/Ciclo-do-combustivel-nuclear/Enriquecimento, acesso em 21
de junho de 2022.
9. https://jornal.usp.br/artigos/rejeitos-radioativos/

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