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Tratamento da epicondilite lateral com


órtese dorsal estática do punho em 10º
de flexão

Eduardo Angeli Malavolta Mariana Miranda Nicolosi

Mauro Emilio Conforto Gracitelli Jorge Henrique Assunção

Maria Cândida de Miranda Luzo Arnaldo Amado Ferreira Neto

Marília Sândalo Trevelin

'10.37885/220308324
RESUMO

Objetivo: Descrever os resultados clínicos do tratamento da epicondilite lateral com


utilização de órtese dorsal em 10° de flexão do punho. Métodos: Série prospectiva de
pacientes submetidos ao tratamento conservador com órtese dorsal em 10° de flexão
do punho, associada a medidas de analgesia, alongamento e fortalecimento. A órtese
foi utilizada por 23 horas ao dia nas primeiras 4 semanas, seguido por uso noturno até
o fim do tratamento. Resultados: Foram avaliados 12 pacientes. O questionário DASH
decresceu de 53,3 (IQ, 37,0-57,3 para 24,1 (IQ, 12,7-27,0) (p=0,002). A EVA ao repouso
passou de 5,0 (IQ, 1,8-8,3) para 1,5 (IQ, 0,0-6,5) (p=0,025), enquanto durante a resistência
de 5,0 (IQ, 3,8-7,5) para 3,0 (IQ, 0,8-5,3) (p=0,028). A força de preensão e extensão não
se modificou (p=0,754 e 0,683, respectivamente). Conclusão: O uso de órtese dorsal
em 10° de flexão do punho, associada a analgesia, alongamento e fortalecimento, pro-
picia melhora funcional e da dor no tratamento da epicondilite lateral. Não observamos
diferenças na força de preensão e extensão.

Palavras-chave: Epicondilite Lateral do Úmero, Cotovelo de Tenista, Órteses, Avaliação


de Resultados (Cuidados de Saúde).

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INTRODUÇÃO

A epicondilite lateral é causa comum de dor no cotovelo, com incidência anual de 1 a


3% da população(1). Movimentos repetitivos em extensão do punho e movimentos alterna-
dos de pronação e supinação estão relacionados ao início dos sintomas(2). Cerca de 80%
dos casos apresentam melhora sintomática em 1 ano(3–5). Apesar disso, de 4 a 11% dos
pacientes apresentam sintomas prolongados e necessitam de tratamento cirúrgico(5–7).
O tratamento de escolha da epicondilite lateral é não operatório(8). Existem diversas
opções de tratamento não operatório, com resultados variáveis na literatura(8). Dentre as
diversas opções, a mais utilizada em nosso meio consiste na reabilitação tradicional com
repouso, alongamentos, crioterapia, cintas elásticas no antebraço, seguido de fortalecimento
da musculatura extensora do antebraço(9). Apesar das opções de tratamento não operatório,
o controle dos sintomas é difícil a curto prazo e a melhora da dor pode demorar a ocorrer(10).
O uso de órteses com limitação da extensão ativa do punho é uma opção para o alívio
da dor e tem como objetivo reduzir a tensão na origem do extensor radial curto do carpo(8).
Entretanto, existe controvérsia em relação ao uso de imobilização na epicondilite, com estu-
dos mostrando resultados favoráveis(11,12), desfavoráveis(13) ou indiferentes(14). O objetivo
deste estudo é descrever os resultados clínicos do tratamento da epicondilite lateral com
imobilização do punho com órtese dorsal em 10° de flexão do punho.

MÉTODOS

Foi realizada uma série de casos prospectiva, formada por pacientes com epicondilite
lateral submetidos a tratamento conservador com o uso de órtese dorsal estática com o pu-
nho em flexão de 10º. Os pacientes foram atendidos no ambulatório de Ombro e Cotovelo
e no setor de Terapia Ocupacional de nossa instituição, entre 10/09/2013 e 20/06/2014.
Os critérios de inclusão foram dor na face lateral do cotovelo, dor à extensão do punho
contra resistência e à flexão passiva do punho, exames de imagem (ultrassonografia ou res-
sonância magnética) confirmando o diagnóstico, mínimo de 2 semanas de evolução e idade
entre 18 e 80 anos. Os critérios de exclusão foram fratura ou luxação prévia no cotovelo,
sinais clínicos de síndrome compressiva dos nervos radial, mediano ou ulnar, osteoartrose ou
cirurgia prévia no membro superior ipsilateral, epicondilite medial associada, tendinopatia do
ombro ou do punho, infiltração durante o seguimento ou nas 4 semanas anteriores ao início
do acompanhamento, incapacidade para compreender ou preencher as escalas funcionais
e não adesão ao protocolo de reabilitação. Caso houvesse acometimento bilateral, apenas
o membro mais sintomático seria incluído no protocolo.

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Intervenção

O tratamento foi baseado no uso da órtese dorsal estática com o punho em 10º de
flexão (Figura 1), por um período de 23 horas por dia, durante 4 semanas. A recomendação
era de retirar o dispositivo apenas para realizar a higiene pessoal. Após esse período, o
uso passou a ser noturno até o fim do tratamento. Não houve recomendação em restringir
as atividades de vida diária desde que o paciente permanecesse com a órtese. Foi reali-
zado acompanhamento semanal por um terapeuta ocupacional. Durante as sessões, eram
realizados massagem, ultrassom de 1 MHz em 0,4 watts/cm2 de modo pulsado por 4 minu-
tos com aparelho Sonopulse III (Ibramed, Amparo/SP), crioterapia e alongamento passivo
dos flexores e extensores do punho. A partir da quarta semana, foram iniciados exercícios
de fortalecimento e propriocepção. Os pacientes foram orientados a realizar diariamente
os alongamentos.

Figura 1. Órtese dorsal estática do punho em 10º de flexão. A: visão lateral; B: visão dorsal; C: visão volar.

Desfechos

O desfecho primário foi a avaliação do questionário Disability of Arm, Shoulder and


Hand (DASH)(15). Foram desfechos secundários a escala visual analógica da dor (EVA) 724
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ao repouso, a EVA durante o movimento de extensão do punho contra resistência (partindo
de neutro para a extensão máxima), com antebraço em pronação e cotovelo em extensão,
a força de preensão e a força de extensão, mensuradas em quilograma-força (kgf) através
de dinamômetro digital Jamar® (Preston, Jackson, Michigan, EUA). Os pacientes foram
avaliados antes do início do tratamento e ao final de 3 meses.

Outras variáveis analisadas

Pesquisamos ainda as seguintes variáveis: sexo, idade, lado acometido, dominância,


tempo de sintomas, tabagismo, atividade profissional, necessidade de afastamento das ativi-
dades laborais, atividade esportiva e necessidade de afastamento de atividades esportivas.

Análise estatística

Submetemos as variáveis contínuas à avaliação da normalidade, através do teste de


Kolmogorov-Smirnov, e da homogeneidade, através do teste de Levene. Devido à distribuição
não-paramétrica os dados foram expostos por mediana e intervalo interquartil (IQ). As va-
riáveis categóricas em valor absoluto e percentual.
A comparação entre antes e após o tratamento, no que diz respeito às diferentes variá-
veis, foi realizada pelos testes de Chi-quadrado ou exato de Fisher, nas variáveis categóricas.
Nas variáveis contínuas, pelo teste de Wilcoxon.
Utilizamos para análise dos dados o programa SPSS versão 20.0 e nível de sig-
nificância de 5%.

RESULTADOS

Foram avaliados 12 pacientes. Seis (50%) eram do sexo feminino, todos destros, e 83%
(10/12) com acometimento no lado dominante. A mediana da idade foi 50 anos. Apenas 1
paciente era tabagista (8%). Três pacientes (25%) realizavam atividades braçais e 4 (33%)
realizavam atividades esportivas amadoras (tênis, natação, ioga e ciclismo). Nenhum pa-
ciente precisou ser afastados das atividades laborais ou esportivas.
O questionário DASH apresentava mediana de 53,3 (IQ, 37,0-57,3) antes do tratamento
e de 24,1 (IQ, 12,7-27,0) ao final dos 3 meses (p=0,002). A EVA ao repouso evoluiu de 5,0 (IQ,
1,8-8,3) para 1,5 (IQ, 0,0-6,5) (p=0,025), enquanto durante a resistência de 5,0 (IQ, 3,8-7,5)
para 3,0 (IQ, 0,8-5,3) (p=0,028). A força de preensão foi de 23,7 kgf (IQ, 18,2-31,0) no início
do tratamento e de 24,5 kgf (IQ, 16,5-30,7) ao final (p=0,754), enquanto a de extensão foi,
respectivamente, 3,7 kgf (IQ, 1,5-5,7) e 2,2 kgf (IQ, 2,0-6,4) (p=0,683). Nenhuma complica-
ção foi observada. Os dados referentes aos desfechos podem ser observados na Tabela 1.
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Tabela 1. Avaliação clínica dos pacientes antes e após o tratamento.

EVA durante resis- Força de Força de


DASH EVA ao repouso
tência preensão (kgf) extensão (kgf)

Inicial Final Inicial Final Inicial Final Inicial Final Inicial Final
Mediana 53,3 24,1 5,0 1,5 5,0 3,0 23,7 24,5 3,7 2,2
Quartil1 (25%) 37,0 12,7 1,8 0,0 3,8 0,8 18,2 16,5 1,5 2,0
Quartil 3 (75%) 57,3 27,0 8,3 6,5 7,5 5,3 31,0 30,7 5,7 6,4
p 0,002 0,025 0,028 0,754 0,683

DISCUSSÃO

Nossos resultados demonstram que o uso da órtese dorsal estática com o punho em
10º de flexão, por um período de 23 horas por dia, em associação a medidas de analgesia,
alongamento e fortalecimento, propicia uma melhora significativa da função na epicondilite
lateral, de acordo com o questionário DASH, e da dor ao repouso e durante a resistência,
de acordo com a EVA, ao final de 3 meses de tratamento. Entretanto, a força de preensão
e de extensão não foi alterada de maneira significativa. A melhora da função e da dor com
o tratamento com órteses é relatado por outros autores(12,14). Entretanto, a ausência de
melhora na força discorda de resultados prévios(12,14).
O uso de órteses é citado por alguns autores no tratamento da epicondilite lateral, com
resultados conflitantes. Garg et al.(11), em um ensaio randomizado comparando cinta elás-
tica com órtese, observaram resultados funcionais semelhantes, porém com maior alívio da
dor no grupo órtese. Altan et al.(12), num estudo comparando órteses com cintas elásticas
demonstraram menor dor ao repouso ao final de 2 semanas no grupo órtese, sem diferença
nos demais parâmetros avaliados. Por outro lado, Derebery et al.(13) demonstraram em um
estudo coorte que as órteses geram maior limitação no trabalho, tempo de tratamento mais
prolongado e mais custos, enquanto Van der Streek et al.(14) evidenciaram que as órteses
não são superiores às bandagens em um estudo randomizado.
A posição ideal para a imobilização do punho com a órtese no tratamento da epicondilite
lateral ainda não foi estabelecida. Os estudos que citam essa forma de tratamento utilizam
a extensão de 15 a 35º(11,12,14). Borkholder et al.(16), em uma revisão sistemática sobre
o assunto, não relata o uso de órteses com o punho em flexão e, no nosso conhecimento,
esse é o primeiro estudo a utilizar esse método. A escolha por essa posição se deve a dois
fatores. Em primeiro lugar, a experiência clínica do nosso serviço de terapia ocupacional,
sendo que uma das profissionais (MCML) tem a percepção que a posição em flexão discre-
ta leve a maior alívio sintomático do que em extensão. Além disso, já foi demonstrado que
graus menores de extensão levam a maior força de preensão(17) e que o uso de órteses
em extensão diminui em apenas 6% o potencial elétrico dos extensores do punho(18).

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Nosso estudo possui algumas limitações. A série possui uma amostra pequena, o que
acreditamos ser o motivo da ausência de diferença na força antes e após o tratamento.
Apesar disso, a diferença significativa encontrada no desfecho primário e na dor valida os
nossos dados. Devido ao fato de existirem poucos estudos sobre o tema, consideramos o
mesmo importante para aumentar a discussão e o conhecimento do ortopedista geral sobre
as formas possíveis de tratamento da epicondilite lateral. Lembramos que esta é uma afecção
de tratamento preferencialmente não operatório(8,9,16) e a técnica descrita nesse artigo
aumenta o arsenal terapêutico disponível. Outra limitação é não termos realizado um dese-
nho comparativo. Esse estudo é a primeira etapa de uma linha de pesquisa. Nossa série de
casos buscou determinar a viabilidade da proposta de tratamento. Um estudo randomizado
foi iniciado e visa comparar a órtese com outras opções de tratamento.

CONCLUSÃO

O uso de órtese dorsal estática com o punho em 10º de flexão, em associação a medi-
das de analgesia, alongamento e fortalecimento, propicia melhora funcional significativa no
tratamento da epicondilite lateral, de acordo com o questionário DASH, e da dor ao repouso
e durante a resistência, de acordo com a EVA. Entretanto, não observamos diferenças na
força de preensão e extensão.

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