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Academia Nacional Superior de Orquestra

Recensão Crítica
2019/2020

Grito (1893) de Edvard Munch (1863-1944)

Sara Rodrigues de Sá
3ºano
Professora: Inês Thomas Almeida
Intitulado Sentimento à Flor Da Alma, o capítulo três pertencente ao livro Cores
e Sons da autora portuguesa Teresa Castanheira, publicado em 2015 pela editora “Livros
Horizonte”, é um capítulo bastante esclarecedor e de acessível compreensão.

Teresa Castanheira, licenciada em Ciências Musicais pela UNL, desempenhando


atualmente o cargo de professora de História da Música no Conservatório Nacional e
tendo sido crítica musical no Semanário Expresso, parece assumir bastante credibilidade
e um bom conhecimento sobre o material abordado no seu livro Cores e Sons alusivo à
pintura e música desde a Idade Média até ao modernismo, em meados do século XX.

No capítulo em questão, Sentimento à Flor da Alma, a autora aborda


principalmente a nova corrente vanguardista, o Expressionismo, na pintura e na música.

A autora começa por enquadrar esta corrente que pertence ao modernismo, surgida
no século XX, que tem como cerne uma fuga à realidade, através da exteriorização das
angústias e medos do indivíduo, muito em parte, causada pelo grande período de
industrialização vivido, surgindo também como uma oposição ao impressionismo, este
com um objetivo de desumanizar a arte, é inteiramente o oposto a esta nova arte, onde o
ser humano passa a ser o centro da criação.

Aborda também a forma como este movimento será protagonizado na Europa,


nomeadamente em Dresden, 1905, com a criação do grupo Die Brücke, que mais tarde
virá a torna-se no Der Blaue Reiter, fundado por Franz Marc (1880-1916) e Wassily
Kandinsky (1886-1944), com o objetivo de conceber independência nas artes e romper
com as tradições.

Por outro lado, na Áustria, encontra-se Sigmund Freud (1856-1939) a


protagonizar a mais recente teoria da psicanálise, e Arnold Schoenberg (1874-1951) na
música, com as primeiras tentativas do que viria a ser o atonalismo musical. Já nas artes
plásticas, temos como protagonistas Oscar Kokoschka (1886-1980) e Egon Schiele
(1890-1918).

Incidindo na temática musical, Schoenberg terá sido sem dúvida o compositor


mais influente do expressionismo musical, defendendo que a arte deve retratar o interior
do indivíduo e a sua libertação pessoal. Em 1911, com o seu “Tratado da Harmonia”,
estabelece já premissas que permitem a superação da harmonia clássica e estabelecem
bases teóricas e metodológicas que permitirão o desenvolvimento, no futuro, do
dodecafonismo.

O dodecafonismo, uma técnica revolucionária criada por Schoenberg em 1921, é


elaborada durante os anos da guerra, onde Schoenberg se absteve de compor, e estuda a
hipótese de uma técnica que não o leve à tonalidade. Esta técnica resulta na escolha do
compositor pela ordem que deseja 12 notas diferentes, essa será a sequência original (P)
mas, começando essa sequência de trás para a frente, temos a sequência retrógrada. Ainda
se podem inverter os intervalos da sequência original, ficando com a inversão (I) e depois
podemos ter essa inversão de trás para a frente - retrógrada da inversa (RI). Estas 4
sequências podem ser transpostas respetivamente para as 12 notas existentes. Então,
podem existir numa peça 48 sequências.

A autora destaca das principais obras de Schoenberg o Quarteto de cordas nº2


(1908); Três peças para piano opus.11 (1909); Cinco peças orquestrais opus. 16 e obras
com texto Erwartung (1909); Die Glückliche Hand (1910) e Pierrot Lunaire (1912).

Resultante desta “nova música”, Schoenberg juntamente com os seus discípulos,


Anton Webern (1883-1945) e Alban Berg (1885-1935), criam a “Segunda Escola de
Viena”, baseada nesta nova técnica dodecafónica.

No que diz respeito à pintura, a autora faz grande ênfase ao pintor Wassily
Kandisnky (1866-1944), que também fora um revolucionário com a introdução do
abstracionismo e a “(…)negação em absoluto da representação figurativa” (Castanheira,
2015). Influenciado principalmente pela música, procura também encontrar uma maneira
de o conduzir a uma abstração mais expressiva.

A autora faz também referência a Scriabine (1872-1915), onde este tenta também
realizar uma quebra com a tonalidade. Baseado num conjunto de seis notas cria o “acorde
místico”, utilizado na sua obra Prometeus, em 1910, fazendo também bastante uso do
trítono e utilizando um sistema de terceiras ao invés das tradicionais quintas.

Por fim, a autora faz uma pequena alusão ao panorama português, onde evoca
Mário Eloy (1900-1951) na pintura, e Fernando Lopes Graça (1906-1994) na música.
Contudo, afirma que o meio cultural português não permitiu a um maior desenvolvimento
desta nova estética.
No meu ponto de vista, penso que a autora podia ter incidido mais na questão da
crise da linguagem musical atravessada, onde após a minha leitura do capítulo “A Crise
da Linguagem Musical e a Estética do século XX”, do livro a “Estética da Música” de
Enrico Fubini, que aborda a crise e a dissolução do sistema tonal tradicional, percebe-se
como viria a nascer uma nova proposta de linguagem musical.

A racionalidade e a natureza da harmonia constituíam a conclusão do pensamento


dos teóricos clássicos, a tonalidade como algo eterno e a harmonia como expressão mais
perfeita, completa e imutável, por ser baseada na série de harmónicos, contudo, a
linguagem harmónica complica-se em demasia no século XIX. As regras são quebradas
com frequência, e são feitas exceções ao tratado de harmonia de Rameau, que juntamente
com estudos sobre música antiga e oriental, faz surgir a ideia de que o sistema tonal não
é o único sistema no mundo, e que não é eterno ou infalível.

Assim, toda a técnica, modo expressivo ou estilo musical estão sujeitos a um


desgaste, o que impõe à música uma permanente renovação das suas formas, não sendo
necessariamente uma rotura com o passado, mas uma música “moderna” à luz de
esquemas estéticos do passado, segundo alguns teóricos.

Por outro lado, achei também necessário uma melhor clarificação do que foi esta
dicotomia entre o movimento Impressionista e Expressionista. Recorri então ao segundo
capítulo do livro de Robert Morgan: Some transitional figures, in Twentieth-Century
Music, onde é possível obter uma compreensão mais detalha desta corrente que surgiu em
Paris nos finais do século XIX, e incidindo num dos principais compositores, Claude
Debussy (1862-1912).

Como uma tentativa de fuga à influência germânica, grande parte devido à derrota
da França na guerra Franco-Prussiana entre 1870 e 1871, é criada a “Société Nationale de
Musique”, que tem como objetivo inspirar uma renascença musical francesa, adotando
modos medievais renascentistas e modos barrocos, principalmente da época de Lully.

Muitas vezes associado ao Impressionismo, relaciona-se o Simbolismo, como


uma ideia de impressão, onde há algo que não é dito, mas assim subentendido, ambíguo.
Muitas vezes associa-se o compositor francês Claude Debussy (1862-1912) a este
movimento, uma vez que este recusa rotular as suas obras de “Impressionistas” e faz uso
de muitos textos simbolistas no seu reportório, contudo, segundo o autor, não é razão
assegurada para considerar Debussy como um compositor simbolista.

No que diz respeito ao meio cultural, Paris era alvo de inúmeras exposições
universais, sendo assim, um importante centro de partilha de ideias e pensamentos entre
as diferentes culturas. Nomeadamente em 1867, com a participação japonesa neste
evento, os pintores desta época criaram um interesse especial pela sua arte exótica. Como
é possível também denotar mais tarde, em 1889, onde Debussy escutou uma orquestra
japonesa da “Ilha de Java”, que fazia imenso uso de escalas pentatónicas e modais,
suscitando um interesse em Debussy pela sua música oriental. Também Debussy tinha
uma grande admiração pela música russa, nomeadamente pelo compositor Modest
Mussorgsky (1839-1881).

Assim, em traços gerais, o impressionismo tende a representar essencialmente a


natureza, os ócios de Paris, procurando a captação do momento efémero, e uma evocação
mais poética do estado de espírito, bem como a “impressão” da realidade, com figuras
não totalmente definidas, utilizando uma luminosidade que desempenha um papel muito
importante no significado da pintura.

Por último, examinando o artigo de Teresa Castanheira no seu todo, a meu ver, a
autora podia também ter incidido mais no meio cultural português, uma vez que faz
apenas uma pequena alusão, nem chegando a ser bastante esclarecedor. No que diz
respeito ao restante conteúdo, para além de orientar a uma compreensão bastante
elucidativa daquilo que foi o movimento expressionista na música e na pintura, há
também uma vasta alusão a personalidades imensamente relevantes e influentes ligadas
a esta corrente.

Dada a pertinência e a forma como os assuntos foram tratados neste capítulo,


considera-se que o presente artigo deverá ser verdadeiramente considerado por aqueles
que desejem um melhor esclarecimento e aprofundamento daquilo que foi esta nova
corrente, o Expressionismo.
Bibliografia

• Castanheira, T.,“Sentimento à Flor da Alma”, Cores e Sons, (Livros Horizonte,


Lisboa, 2015), pp.41-49

• Fubini, E., A Crise da Linguagem Musical e a Estética do século XX”, Estética


da Música, (Edições 70, 2008)

• Morgan, Robert P., "Some transitional figures", in Twentieth-Century Music


(Nova Iorque: Norton, 1991), pp. 40-61

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