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Turma: B1 e C1
Sala: B.2.3
Lição nº
Tema: os direitos reais de gozo
Sumário: A posse

Antecedentes históricos da posse moderna

A posse é um produto histórico do Direito romano. Os romanos desenvolveram a ideia de

posse para descrever a situação de alguém que tem o poder de facto sobre uma coisa, o

senhorio sobre ela, a sua dominação, num sentido físico ou material, independentemente

da existência de título de aquisição, quer dizer, da titularidade de um direito real sobre a

coisa, e mesmo que essa situação de facto haja sido criada ilicitamente, por exemplo,

através do furto.

Etimologia

Possessio (posse) deriva de possidere (possuir). A palavra possidere teria derivado de

sedes (assento), vincando a ideia de domínio sobre a coisa, outros autores fazem derivar a

palavra de pes, pedis (pés), sugerindo a ideia de pisar, calcar a coisa.

Os filósofos modernos propõem outros étimos de possidere: pot-sum (poder), potis-sedeo

(eu sento-me como senhor), potestas, potiri ou simplesmente posse.

Todas estas eventuais etimologias inculcam uma relação de senhorio, de dominação da

pessoa sobre a coisa, correspondente a locuções das fontes como tenere (ter), possidere

corpore (possuir com o corpo), retinere (reter).

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Noção legal de posse

Artigo 1251.º do CC.

A posse cumpre duas funções: (i) protege o possuidor enquanto não houver certeza sobre o

verdadeiro titular do direito real a cujo exercício corresponde, concedendo-lhe a

necessária tutela; (ii) constitui um caminho de acesso a esse direito real. Por isso,

considera-se que a posse é um bem no presente e um sinal no futuro: um índice do próprio


direito, para o qual se encaminha.

Pode-se com isto dizer, a luz destas funções, que a posse assegura a paz jurídica quando

há dúvidas sobre o direito; serve valores de organização e de continuidade da coisa

possuída na esfera do domínio em que se encontra, e ainda, é também um valor de

conhecimento, porque é normalmente um sintoma de que se tem um direito sobre coisas.

Elementos da posse

Segundo a doutrina subjectivista, formulada por Windscheid e Savigny, a posse é

integrada por dois elementos: o Corpus, elemento material, que consiste no domínio de

facto sobre a coisa, ou seja, no exercício efectivo de poderes materiais sobre ela ou na

possibilidade física desse exercício (é a detentio), e o Animus possidendi, elemento

psicológico, que consiste na intenção de exercer sobre a coisa o direito correspondente

àquele domínio de facto.

O corpus e o animus, não se podem entender como coisas separadas. Funcionam numa

espécie de interferência, de tal maneia que se pode falar numa relação semelhante àquela

que se verifica entre o corpo e o espírito.

Para a doutrina objectivista, defendida por Ihering, atende não à intenção com que se

exerce a posse, mas ao próprio poder que se exerce. Apesar deste argumento, Ihering,

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reconhece que sem vontade não há posse. Simplesmente considera que este elemento está

implicitamente contido no poder de facto que se exerce sobre a coisa possuída. Isto quer

dizer, para o autor, que corpus e animus são entre si, como a palavra e o pensamento. Na

palavra incorpora-se o pensamento que até aí se manteve puramente interno; e no corpus,

a vontade que até aí se manteve puramente interior.

Objecto da posse

Artigo 1302.º do CC.

O nosso Código Civil, limitou a posse ao exercício aparente do direito de propriedade ou

de outros direitos reais que incidam sobre coisas corpóreas. Sobre o conjunto de coisas não

pode haver uma posse. Esta apenas pode recair relativamente a cada uma das coisas que

compõem o conjunto.

Vários argumentos suportam a limitação da posse a coisas corpóreas:

 A protecção das situações em que as relações do titular com a coisa afastam a

possibilidade de existirem outras situações por parte de outros indivíduos;

 Já a propriedade intelectual, porque incide sobre coisas não corpóreas, pode ser

exercida por um número ilimitado de pessoas, por exemplo, sobre a mesma obra

literária podem ser feitas diversas edições e constituírem-se várias formas de

utilização simultânea ou independente;

 O regime da protecção da propriedade intelectual mostra que o legislador afastou

os regimes da tutela da posse e da transmissão com base na usucapião;

 A aplicação do regime da posse aos direitos de autor ou à propriedade industrial

atingiria profundamente o regime fixado nesses diplomas;

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Em relação aos direitos reais de garantia, o problema é discutível. Porém, há quem admita

que o Código Civil não lhes quis dar abrigo no instituto da posse. Refere-se, por um lado,

que se trata de direitos acessórios de direitos de crédito, concebendo-se dificilmente que se

possam constituir independentemente dos direitos de que dependem.

Por isso, afirma-se que o legislador individualizou, para efeitos de usucapião, os direitos

reais de gozo, artigo 1287.º do CC, deixando de fora os direitos reais de garantia, “pois

estes, implicam o controlo material da coisa sobre que incidem e dão, seguramente, lugar
a posse”, Menezes Cordeiro.

Vide artigo 670.º, al. d) do CC.

Também nos direitos reais de aquisição se considera que a posse está igualmente excluída,

por se tratar de direitos que se extinguem com o seu exercício e, portanto, não podem

originar situações de exercício duradouro que a posse pressupõe.

Afastados os direitos reais de garantia e de aquisição, ficam-nos os direitos reais de gozo

que constituem o campo de eleição da posse, embora nem todos e nem com a mesma

amplitude. No primeiro caso, estão as servidões não aparentes que apenas são susceptíveis

de posse quando esta se funde em título provindo do proprietário serviente ou de quem

lho transmitiu, artigo 1280.º do CC. Justifica-se que assim seja, porque tais servidões

correspondem, em regra, a actos de mera tolerância ou praticados ocultamente e, por isso,

não devem poder impor-se ao proprietário.

No segundo, encontramos os direitos reais de gozo, cujo âmbito fica aquém do direito de

propriedade. Há, no entanto, direitos em que a posse é relevante para efeitos de tutela

possessória, mas não para usucapião. É o caso, do direito de uso e habitação, artigo 1485.º

do CC.

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Composse

Há Composse quando a posse de uma coisa tem vários titulares (são compossuidores os

herdeiros do possuidor; duas ou mais pessoas que compram um prédio a non domino e

entram na respectiva posse). Pode existir em relação a qualquer direito real susceptível de

posse e, se este direito for divisível (a propriedade e o usufruto), ou indivisível (uma

servidão predial), também a Composse o será.

Em relação ao seu exercício, deve obedecer aos princípios que disciplinam a comunhão do

direito a que a posse corresponde, artigo 1286.º, n.º 3 do CC. E quanto à sua defesa, cada

um dos compossuidores pode recorrer, contra terceiro, aos meios que protegem a posse,

artigo 1286.º, n.º 1 do CC. Nas relações entre compossuidores não é permitido o exercício

da acção de manutenção, artigo 1286.º, n.º 2 do CC, porque cada possuidor tem a posse e,

portanto, os seus actos turbativos são incaracterísticos. A usucapião por um dos

compossuidores aproveita aos demais, artigo 1291.º do CC.

Natureza jurídica

Pergunta-se se estamos perante um facto ou direito? Este debate se prolonga, pois, no

direito romano existem fontes que permitem suportar qualquer das posições.

Para algumas doutrinas, a posse é um facto, sustentando que a própria natureza da posse

é contrária à ideia do direito, porque não há direito que não seja moral, que não seja justo e

a posse é, muitas vezes, o efeito do dolo, da violência, da injustiça.

Para outras a posse é um direito subjectivo porque, há um poder, um interesse e uma

garantia jurídica.

Olhando para todas as doutrinas, importa referir que, a posse é um poder que se exerce

directa e imediatamente sobre a coisa corpórea certa e determinada, produz efeitos

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jurídicos, satisfazendo o interesse do possuidor, e é tutelada pelo ordenamento jurídico,

embora enquanto o possuidor não for convencido na questão da titularidade do direito a

que a sua posse corresponde.

Por isso, e sem afastar a verdade que existe em qualquer das teorias, é mais acertada a

doutrina que considera a posse, um direito real de gozo, embora provisório.

Espécies de posse

Artigo 1258.º a 1262.º do CC.

Posse titulada e posse não titulada

A posse titulada é aquela que se funda em qualquer modo legítimo de adquirir,

independentemente, quer do direito do transmitente, quer da validade substancial do

negócio jurídico, artigo 1259.º, n.º 1 do CC. Tem a sua causa num negócio abstractamente

idóneo para transferir a propriedade ou outro direito real de fruição (o contrato de compra

e venda, de doação, o testamento...).

Dispensa-se o direito do transmitente (aquisição a non domino) e não é afastada por vício

de fundo que não exclua o animus de a adquirir (o dolo, erro obstáculo, coacção moral,

etc.). Assim, tratando-se de coacção física ou absoluta, o coagido está na condição de puro

autómato, sem liberdade de acção. Vide artigo 246.º do CC. Portanto, a coacção absoluta

não serve para titular a posse.

Estão afastados os vícios formais, por isso, se o negócio for nulo por vício de forma, artigo

875.º e 220.º, por exemplo, a posse que daí deriva não se considera titulada. Quanto a

simulação absoluta ou relativa. Há quem entenda que o adquirente não é possuidor

porque, intervindo no acordo simulatório, não tinha qualquer espécie de animus de

adquirir um direito sobre a coisa.

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Quanto à simulação relativa, porque destruído o acto simulado, fica a descoberto o acto

dissimulado, se este for nulo por vício de forma, existe posse não titulada. Porém, também

há quem, embora reconheça que está é uma situação geral, não afaste a possibilidade de o

simulado adquirente agir intencionalmente como beneficiário do direito e, neste caso, a

posse dever-se-á considerar titulada.

Vide artigo 1255.º do CC.

Outrossim, o título tem efeito imediato. Faz presumir a boa-fé, artigo 1260.º, n.º 2 do CC.

Trata-se de uma presunção relativa. Quanto a sua existência, o título não se presume. Por

isso, deve ser provado por quem o invoca, artigo 1259.º, n.º 2 do CC. Foi afastada a teoria

do título putativo (considera-se putativo o título que só existe na convicção do possuidor).

Posse não titulada ou mera posse. É aquela que não se funda em qualquer modo legítimo

de adquirir, artigo 1295.º e 1296.º e 1260.º, n.º 2 do CC.

Posse de boa-fé e posse de má-fé

A posse de boa-fé é aquela cujo possuidor ignorava, ao adquiri-la, que lesava o direito de

outrem, artigo 1260.º, n.º 1 do CC. O Código Civil considera de boa-fé a posse titulada e de

má-fé a posse não titulada, sendo neste caso uma presunção relativa, artigo 1260.º, n.º 2 do

CC, e considera sempre de má-fé a posse adquirida por violência, mesmo quando seja

titulada, sendo neste caso, uma presunção absoluta, artigo 1260.º, n.º 3 do CC.

A posse de má-fé é aquela cujo possuidor conhece, quando a adquire, que adquire, que

lesa o direito de outrem.

Outrossim, a boa-fé exige o cumprimento de deveres de diligência e de cuidado, por isso,

se o possuidor os descurou, está de má-fé.

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O desconhecimento de que se lesa o direito de outrem resulta da convicção de que se está

a exercer um direito próprio, ignorando-se os vícios da aquisição, embora não se afaste a

possibilidade de o possuidor conhecer esses vícios e, todavia, estar de boa-fé. Se os co-

herdeiros fizerem a partilha dos bens da herança sem a forma legal e entrarem na posse

dos bens que lhes couberem; se se vender um prédio e a escritura for adiada para

momento posterior.

Se a posse for adquirida por intermédio de um representante, a boa-fé deve apreciar-se na

pessoa deste, salvo se, na constituição da posse, tiver sido decisiva a vontade do

representado ou este tiver de má-fé, artigo 259.º do CC. Se a representação for legal, só

interessa a situação do representado.

Quanto ao momento em que a boa-fé deve existir, é necessário atender ao da aquisição da

posse, artigo 1260.º, n.º 1 do CC. No entanto, a posse de boa-fé passa a má-fé a partir do

momento em que o possuidor tome consciência de que a sua posse lesa outrem, artigo

1270.º, n.º 1 e 2 do CC.

A existência de boa-fé é importante para vários efeitos:

 O prazo para usucapião é menor, artigo 1294.º a 1299.º do CC;

 O possuidor só faz seus os frutos até ao dia em que souber que está a lesar, com a

sua posse, ou seja, até cessar a boa-fé, o direito de outrem, 1270.º, n.º 1 do CC;

 O possuidor de má-fé deve restituir os frutos até ao termo da posse e responde,

além disso, pelo valor dos frutos que um proprietário diligente poderia ter obtido,

artigo 1271.º do CC;

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 O possuidor de boa-fé pode levantar as benfeitorias voluptuárias se o levantamento

não causar detrimento da coisa, enquanto o possuidor de má-fé as perde, em

qualquer caso, artigo 1275.º do CC.

Posse pacífica e posse violenta

A posse pacífica é a que foi adquirida sem violência, artigo 1261.º, n.º 1 do CC. Violenta, a

posse quando, para obtê-la, o possuidor usou da coacção física, ou da coacção moral nos

termos do artigo 255.º e 1261.º, n.º 2 do CC. Estão afastadas a ameaça lícita (exercício

normal de um direito) e o temor reverencial.

A distinção entre posse pacífica e violenta é muito importante, esta não pode ser registada,

1295.º, n.º 2 do CC, e não conduz à usucapião, artigo 1297.º e 1300.º, n.º 1 do CC.

Posse pública e posse oculta

A posse pública é a posse que se exerce de modo a poder ser conhecida pelos

interessados, artigo 1262.º do CC. Considera-se oculta a posse que estes não podem

conhecer. É pública a posse de cujo exercício se teria apercebido uma pessoa de diligência

normal, colocada na situação do titular do direito. Por isso, não basta, para que a posse

seja oculta, a simples intenção ou propósito de ocultar. É necessário que os actos

possessórios sejam praticados em termos que possibilitem o seu conhecimento pelos

interessados. Importa referir que na voz de Orlando Carvalho, “a posse é pública não

propriamente quando é conhecida de toda gente, mas tão-só do interessado directo ou

indirecto, trata-se de uma relação mais com o próprio interessado do que com o público
em geral”.

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A posse oculta, que é frequente nos móveis e rara nos imóveis (ocorre na construção de

aquedutos subterrâneos, na exploração subterrânea de minas), produz diversas

consequências:

 Os prazos para usucapião só começam a contar desde o dia em que se torne

pública, artigos 1297.º e 1300.º, n.º 1 do CC e;

 O registo da posse só pode ser feito fazendo-se a prova da sua publicidade, artigo

1295.º, n.º 2 do CC.

Posse precária ou detenção

Artigo 1253.º do CC.

A posição do possuidor precário ou detentor corresponde à situação de quem, tendo

embora o corpus da posse, não exerce o poder de facto com o animus de exercer o direito

real que lhe corresponde.

Olhando para o artigo em questão, na alínea a) cabem os casos de posse em nome alheio,

sucede, com os empregados ou trabalhadores do proprietário ou usufrutuário do imóvel.

E na alínea c) são considerados detentores quantos possuem em nome alheio, é o caso do

representante, o mandatário, o locatário, o comodatário, o depositário, o credor

pignoratício, o titular do direito de retenção, o curador, etc.

Outras modalidades de posse

Estas correspondem a uma classificação doutrinal:

 Posse causal: é a posse em que o possuidor é simultaneamente titular do direito

real a cujo exercício a posse corresponde. Exemplo desta situação, é a posse do

proprietário, do usufrutuário e do superficiário. É certo que, sendo a propriedade

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difícil de provar, frequentemente o proprietário-possuidor invoca a posse e não o

seu direito de propriedade. Simplesmente, nesta hipótese a posse desmembra-se

deste direito real, surgindo como posse formal ou autêntica;

 Posse formal: é a posse autêntica, autónoma, ou seja, aquela em que o possuidor

não tem, ou não invoca, a qualidade de titular de um direito real a que corresponde.

Por isso, é protegida pelo direito como um bem no presente e um bem para o

futuro.

 Posse efectiva: é a posse que implica um controlo material sobre a coisa. A lei

refere-a, por vezes, falando de posse actual, artigo 1278.º, n.º 3 do CC;

 Posse não efectiva (também denominada de posse ficta): é a posse que se conserva

por via puramente jurídica, sem controlo corpóreo. Constitui exemplo a posse do

esbulho durante o ano subsequente ao esbulho, artigo 1283.º do CC e a posse que se

transmite ao herdeiro e se mantém enquanto a herança não for aceita, artigo 1255.º e

2050.º do CC;

 Posse imediata: é a posse que se exerce imediatamente, sem mediador;

 Posse mediata: é a posse que se exerce através de outrem. Sucede, com a posse que

se exerce através do comodatário, do depositário e do locatário.

Efeitos

A posse confere a presunção de titularidade do direito a cujo exercício corresponde, artigo

1268.º, n.º 1 do CC. Tem a sua importância porque o titular de um direito real nem sempre

dispõe de elementos que lhe possibilitem a prova desse direito. Assim, esta presunção

permite-lhe que, fazendo apenas a prova de que possui, obtenha a tutela possessória,

cabendo-lhe ao terceiro o ónus de impugnação, aquela presunção, artigo 350.º, n.º 1 do CC.

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Vide também o artigo 1268.º, n.º 1 do CC. A situação de possuidor é, para certos efeitos,

mais vantajosa que a de titular do direito. Vide ainda o artigo 1301.º do CC. É o contrário

do princípio posse vale título.

Frutos

Importa distinguir o seguinte:

 Se o possuidor estiver de boa-fé, pertencem-lhe os frutos naturais colhidos até ao

dia em que a boa-fé cessar, ou seja, em que souber que está a lesar, com a sua posse,

o direito de outrem. Pertencem-lhe também os frutos civis correspondentes ao

mesmo período, artigo 1270.º, n.º 1 do CC;

 Se a boa-fé cessar quando os frutos ainda se encontram pendentes, estes pertencem

ao titular do direito sobre a coisa frutífera, embora seja obrigado a indemnizar o

possuidor das despesas de cultura não superiores ao valor dos frutos que vierem a

ser colhidos, artigo 1270.º, n.º 2 do CC;

 Artigo 1270.º, n.º 3 do CC; No caso de colheita prematura de frutos, o possuidor de

boa-fé deve restituí-los, se ainda os não consumiu, mas tem direito a ser

indemnizado das despesas de cultura, desde que não sejam superiores ao valor dos

frutos, artigos 214.º e 215.º do CC;

 Se estiver de má-fé, artigo 1271.º do CC. Importa, colocar esse proprietário diligente

nas circunstâncias em que o possuidor de má-fé actuou, ou seja, este não responde

por frutos não produzidos se provar que não poderiam ser no caso concreto, isto

porque as condições atmosféricas (seca, praga de aves ou insectos, doenças das

plantas, etc.) não permitiram.

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Perda ou deterioração da coisa

Artigo 1269.º, 807.º, n.º 2 e 805.º, n.º 2, al. b) do CC. Ao possuidor cabe, no entanto, o ónus

de fazer esta prova, artigo 807.º, n.º 2 do CC.

Encargos

1272.º do CC. Trata-se de despesas feitas não para evitar a perda, destruição ou

deterioração da coisa (benfeitorias necessárias), mas dos encargos normais que

correspondem ou estão adstritos à sua fruição (contribuições, foros, juros, amortizações


etc.).

Benfeitorias

Porque as benfeitorias podem ser diferentes, importa distinguir as que são necessárias,

úteis e voluptuárias:

 Benfeitorias necessárias: artigo 1273.º, n.º 1 do CC. Assim, se evita o

locupletamento injusto do titular do direito real sobre a coisa benfeitorizada

porque, sendo indispensáveis à subsistência da coisa, eram despesas que o titular

do direito teria de fazer. Outrossim, vide artigo 1274.º do CC;

 Benfeitorias úteis: 1273.º, n.º 1 e 2, 754.º e 756.º, als. a) e b) do CC. O detrimento

verifica-se sempre que as benfeitorias se tenham constituído partes componentes da

coisa possuída. Por isso, não se podem retirar sob pena de destruição. Se se

traduzirem em partes integrantes, como, pára-raios, instalação eléctrica em relação

a prédios urbanos, são distraíveis materialmente. E sucede mesmo com as partes

acessórias.

 Benfeitorias voluptuárias: artigo 1275.º, n.º 1 do CC.

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Usucapião

Constitui um efeito particularmente importante da posse porque permite que, verificados

determinados requisitos, o possuidor adquira a titularidade de certos direitos reais de

gozo, artigo 1287.º do CC.

Para usucapião deve existir dois elementos: a posse e o tempo. A posse deve ser pública e

pacífica, artigo 1293.º, al. a), 1297.º e 1300.º, n.º 1 do CC. o tempo, além de depender do

carácter móvel ou imóvel da coisa possuída, depende também de outras características da

posse: ser de boa ou má-fé, titulada ou não titulada e estar ou não registada. Por outro

lado, podem ser adquiridos por usucapião os direitos reais de gozo, exceptuando as

servidões prediais não aparentes e o direito de uso e habitação, artigo 1293.º do CC.

Quanto a capacidade, artigo 1289.º, n.º 1, 1266.º, 1290.º, 1252.º, n.º 1 do CC.

Em relação aos prazos, distingue-se a posse de coisas imóveis e de coisas móveis. Em

relação as coisas imóveis:

 Com título de aquisição e registo, artigo 1294.º do CC;

 Sem título de aquisição, mas registo da mera posse, artigo 1295.º do CC;

 Falta de registo do título e também da mera posse, artigo 1296.º do CC.

 Posse violenta ou oculta, artigo 1297.º do CC.

Em relação à usucapião de coisas móveis, importa distinguir os móveis registáveis e

móveis não registáveis. Assim:

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Móveis registáveis:

 Há título de aquisição e registo: os prazos são de dois a quatro anos, contados

desde o início da posse, respectivamente se o possuidor estiver de boa ou má-fé;

 Não há registo: o prazo é de dez anos, independentemente da boa ou má-fé do

possuidor e da existência de título.

Móveis não registáveis, artigo 1299.º, 1300.º, n.º 1 do CC.

Aquisição

A aquisição pode ser originária ou derivada. A aquisição originária decorre duma relação

de facto entre o adquirente-possuidor e a coisa, sem intervenção do antigo possuidor. Por

isso, a posse do adquirente não está dependente nem quanto à existência nem quanto à

extensão da posse anterior. Trata-se dum poder ex novo.

A aquisição derivada caracteriza-se pela transferência da posse do anterior para o novo

possuidor. Por isso, além do negócio jurídico, é também necessária a existência dos

elementos material, corpus, e intencional, animus.

Tem capacidade de adquirir a posse, artigo 1266.º do CC.

Aquisição originária

Artigo 1263.º, al. a). Assim:

 Prática reiterada: não basta a prática de um único acto, como, a passagem eventual

pelo terreno vizinho, a colheita de alguns frutos, uma sementeira que se fez e

abandonou, etc., embora os actos possam ser diferentes, ou seja, quem faz uma

sementeira em terreno alheio vai praticando actos sempre diferentes até a colheita.

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No entanto, é possível que um só acto baste para evidenciar a posse, como, lavrar

ou semear num terreno ou nele construir uma casa.

 Publicidade: os actos materiais devem ser susceptíveis de conhecimento pelos

interessados. Por isso, não merecem protecção os actos possessórios clandestinos;

 Actos materiais: só têm interesse os actos que incidam directa e materialmente

sobre a coisa, ou seja, actos que traduzam o corpus, como, actos de uso, de fruição

ou de transformação. Orlando Carvalho, entende, porém, que os actos podem não

ser materiais, mas devem revelar um poder empírico e não o mero poder jurídico;

 Correspondência com o exercício do direito.

Inversão do título

Artigo 1265.º do CC. Trata-se, portanto, de conversão duma situação de posse precária

numa verdadeira posse, de forma que aquilo que se detinha a título de animus detinendi

passa a deter-se a título de animus possidenti. A inversão do título pode ocorrer por dois

meios:

 Oposição do detentor contra aquele em nome de quem possuía: o caso mais

corrente é o do arrendatário que, em certo momento, se recusa a pagar a renda,

afirmando que o prédio lhe pertence.

 Por acto de terceiro capaz de transferir a posse: sucede, se o arrendatário comprar

o prédio a um terceiro. A compra e venda inverte o título precário de arrendatário,

sendo igualmente necessário que este passe a comportar-se como possuidor,

deixando, por exemplo, de pagar a renda ao senhorio.

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Aquisição derivada

Artigo 1263.º, n.º 1, al. c) do CC.

 Tradição material: há uma actividade exterior que se traduz nos actos de entregar e

receber;

 Tradição simbólica: tudo se passa a nível da comunicação humana, sem directa

interferência no controlo material da coisa. A tradição simbólica pode ocorrer por:

 Tradicio longa manu: a coisa não é materialmente entregue, mas é posta a

disposição do adquirente através da sua indicação à distância. Constitui exemplo a

tradicio de um fundus por meio da sua indicação ao adquirente, do alto de uma

torre, ou a entrega de um automóvel que as partes fazem numa janela, apontando-o

de longe;

 Traditio breve manu: realiza a conversão da detenção em posse por acordo entre o

detentor e o possuidor. Sucede quando o proprietário possuidor vende a coisa

depositada ao depositário ou o prédio arrendado ao arrendatário. Esta traditio tem

grande vantagem de, encontrando-se alguém na posição de detentor de coisa que

pertence a outrem, não ser necessário que volte às mãos deste para depois a

entregar àquele;

 Traditio ficta: consiste na entrega de um símbolo ou realização de um acto que

simboliza a coisa cuja posse se transfere. São exemplos, a entrega de chaves de um

armazém que funciona como traditio das coisas aí depositadas, e a entrega de um

documento que justifica a traditio da coisa que titula.

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Constituto possessório

É uma forma de aquisição da posse solo consensu, ou seja, sem necessidade de acto,

material ou simbólico, de entrega da coisa. O Código Civil, considera duas espécies:

 O titular do direito real e possuidor transmite o seu direito a outrem e reserva, para

si, a detenção, artigo 1264.º, n.º 1 do CC;

 O possuidor transfere o seu direito a outra pessoa, mantendo-se o seu detentor.

Sucede, por exemplo, no caso em que o proprietário-possuidor vende a coisa

depositada e pretende-se que o depósito continue, ou um prédio arrendado é

vendido, mantendo-se o arrendamento.

Sucessão mortis causa

Artigo 1264.º, n.º 1 do CC.

Acessão

É a faculdade de, para efeitos designadamente de usucapião, o possuidor juntar à sua a

posse do seu sucessor, artigo 1256.º do CC.

Conservação

Artigo 1257.º, n.º 1 do CC. Para a conservação da posse não é necessária a mesma energia

que para aquisição, que é um acto de conquista.

 Acção directa: artigo 336.º e 1277.º do CC;

 Legítima defesa: 337.º do CC

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Acções possessórias

 Acção de prevenção: artigo 1276.º do CC. O receio de turbação ou esbulho deve ser

sério, não basta uma simples apreensão ou receio mais ou menos vago, e deve

apoiar-se em razões objectivas. Tais actos devem ser materiais. Tratando-se de actos

judiciais, a reacção opera através dos embargos de terceiro com função preventiva.

 Acção de manutenção: artigo 1278.º, 1281.º, n.º 1, 1282.º, 1037.º, n.º 2, 1125.º, n.º 2,

1133.º, n.º 2 e 1188.º, n.º 2 do CC.

 Acção de restituição: artigo 1278.º do CC. Estamos diante de uma hipótese de

esbulho que supõe a privação, total ou parcelar, da posse, embora não seja essencial

que o esbulhador tenha o animus spoliandi. O acto de esbulho consiste no facto de

o possuidor ficar privado do exercício ou da possibilidade de exercício dos poderes

correspondentes à sua posse.

 Quanto à legitimidade activa, a acção de restituição de posse pode ser intentada

pelo esbulho ou seus herdeiros não só contra o esbulhador ou seus herdeiros, mas

ainda contra quem esteja na posse da coisa e tenha conhecimento do esbulho, artigo

1281.º, n.º 1 do CC.

 A legitimidade passiva do terceiro de má-fé justifica-se por ser possível, em muitos

casos, reaver a coisa das mãos do esbulhador. A acção de restituição não pode ser

intentada contra o mero detentor que possua em nome do esbulhador, mas sim,

contra o terceiro que esteja na posse da coisa e tenha conhecimento do esbulho.

A acção de restituição caduca, artigo 1282.º do CC. A justificação dada na acção de

manutenção, junta-se outra, se o esbulhado não reage prontamente contra o autor do

esbulho é porque reconhece a posse de outrem. Tratando-se de esbulhos sucessivos, o

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prazo deve contar-se a partir do último, ou seja, há um novo facto, com o seu prazo

próprio.

Acção de restituição havendo esbulho violento

Artigo 1279.º do CC

Embargos de terceiros

Artigo 1285.º do CC

Defesa da Composse

Artigo 1286.º do CC. O afastamento, entre os compossuidores, da acção de manutenção,

justifica-se: se qualquer dos compossuidores pode exercer, em relação à coisa, os actos

materialmente correspondentes ao direito possuído, os actos turbativos são

incaracterísticos. Diferente é o caso de esbulho quanto à acção de restituição: o

exclusivismo de um dos compossuidores, conseguido através do esbulho, afecta a posição

jurídica e dos direitos dos restantes.

Efeitos

Se as acções de manutenção e de restituição da posse forem julgadas procedentes, aplica-se

o artigo 1284.º do CC, ou seja, é havido como nunca perturbado ou esbulhado o que foi

mantido na sua posse ou a ela foi restituído judicialmente. A restituição da posse é feita à

custa do esbulhador e no lugar do esbulho.

Esta disposição tem a sua importância sobretudo para efeitos de usucapião, artigos 1294.º

a 1296.º, 1298.º e 1299.º do CC, pelo facto de se contar o tempo decorrido entre a turbação

ou esbulho e a sentença que manteve a posse ou restituiu. Por outro lado, o possuidor

mantido ou restituído, tem direito a ser indemnizado do prejuízo que tenha sofrido, artigo

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1284.º, n.º 1 do CC, aplicando-se neste caso o regime geral das obrigações de

indemnização, artigo 562.º e seguintes. A indemnização em dinheiro, cuja fixação

obedecerá às normas dos artigos 563.º e 564.º só terá lugar nos termos do artigo 566.º do

CC.

Perda

São várias as formas de extinção da posse, artigo 1267.º, 1308.º (seria totalmente estranho

que, desaparecendo estes, continuasse a posse), 1281.º, n.º 2 (pois a posse é sensível ao não

uso nos precisos termos em que o sejam os correspondentes direitos reais). Vide artigo

1281.º, n.º 2 do CC.

Assim:

 Abandono: artigo 1267.º, n.º 1, al. a), é definido como a cessação voluntária do

controlo possessório sobre a coisa. Pressupõe, um acto material intencional de

rejeição da coisa ou do direito, por isso, abandonada a coisa possuída, desaparecem

os dois elementos constitutivos da posse. Em consequência do abandono, o

apossamento por terceiro não constitui esbulho.

 Perda ou destruição da coisa: artigo 1267.º, n.º 1, al. b), a perda da coisa é a sua

saída fortuita do poder do possuidor, por isso, falta o elemento intencional de

rejeição que existe no abandono. Mas é importante tomar a seguinte nota: não perde

a posse quem se esquece de um objecto, enquanto puder encontra-lo, artigo 1257.º,

n.º 1 do CC, o que significa dizer que, se dias depois, for encontrado por terceiro,

cometerá esbulho se recusar a sua entrega ao possuidor. Quanto a destruição,

entende-se que deve ser total, pois doutro modo, a posse irá continuar sobre o que,

dela, resultar.

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 Cedência: artigo 1267.º, n.º 1, al. c), traduz a perda da posse para o cedente, por

isso, constitui, em rigor, a outra face da tradição material ou simbólica.

 Posse de outrem por mais de um ano: artigo 1267.º, n.º 1, al. d) e n.º 2), artigo

1278.º, n.º 2 e 1282.º do CC.

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