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Aulas Práticas Direito Processual Civil I

05.11.2020
Caso Prático 1

«Alberto circulava no passado dia 10 de agosto numa das avenidas principais de


Aveiro quando, num cruzamento, um veículo conduzido por Bernardo embateu no
lado direito do veículo conduzido por Alberto. Do choque resultou a produção de
danos patrimoniais correspondentes a 3.000€ (decorrentes da destruição de parte da
chaparia externa, bem como de uma das jantes).
Alberto refere também ter sofrido danos não patrimoniais que imputa em 1400€, em
virtude da lesão que, em consequência do embate, sofreu na perna direita e no ombro
direito.
Alberto pretende ser ressarcido pelos danos sofridos e dirige-se a si, na qualidade de
advogado, perguntando-lhe que direitos lhe assistem. Em que sentido lhe
responderia.»
RESPOSTA:
Vivemos atualmente num contexto de Estado de Direito, sendo que os conflitos que
surgem entre os vários indivíduos resolvem-se – sistema de justiça pública. Isto significa
que os conflitos são resolvidos por uma entidade pública, os tribunais – exercem a função
Estadual jurisdicional.
Sendo por esta via que, em princípio, se resolvem os conflitos, foi superado já há muito
tempo o sistema de justiça privada, através do qual se resolviam conflitos através da força,
o que não garante qualquer dimensão de justiça, não há qualquer justiça nesse meio de
resolução.
Não podendo ser os próprios indivíduos a resolver os seus próprios conflitos, então teve
de se disponibilizar a todos os cidadãos um meio para os gerirem e resolverem – o sistema
de justiça pública.
Do artigo 1.º resulta a proibição do recurso à justiça privada (esta regra tem exceções:
este mesmo artigos salvaguarda os casos e dentro dos limites declarados na lei –
autodefesa por exemplo).
Art. 2.º CPC + art. 20.º CRP → garante a proteção jurídica do acesso aos tribunais a todos
os cidadãos.
«A todo o direito (…) corresponde a ação adequada» → direito material/substantivo

Direito material vs. Direito Processual


O direito material é o direito com base no qual se determina quem tem ou não razão (no
nosso caso, é o direito que vai determinar se Alberto tem ou não direito àquela
indemnização).
No entanto, só depois de realizado e executado todo o direito processual – um conjunto
prévio de fases instrumentais, conjunto de atos e regras – é que o juiz estará em condições
de decidir quanto ao direito material
O direito processual cria as condições para que o direito material/substantivo se
efetive.

In casu:
Direito substantivo – direito de crédito que Alberto invoca (direito este que está regulado
no CCivil – para alguém ter direito a uma indemnização é necessário que outra seja
condenada a título de responsabilidade civil extracontratual).
Direito processual – para que o Alberto possa ver satisfeita aquela sua pretensão, e veja
o seu direito de crédito (direito à indemnização) efetivado, ele tem o “Direito de Ação”,
consagrado no art. 2.º do CPC, que pode invocar perante os tribunais judicias, e que se
exercer contra o Estado.
A relação jurídica substantiva que existe entre Alberto e Bernardo é diferente da relação
jurídica processual em que estes intervêm, pois esta ultima tem carácter “triangular”, pois
desenvolve-se entre:
- Autor (Alberto)
- Réu (Bernardo)
- Estado (representado através dos tribunais judiciais)
Direito de requerer ao tribunal que resolva o conflito em causa.
Sob o ponto de vista legal, ao nível da ação declarativa, existem 3 tipos fundamentais de
atividades:
AÇÃO DECLARATIVA
- Ação Declarativa de simples apreciação
Pede-se ao tribunal que este apenas esclareça determinada dúvida que se instalou, isto é,
se o autor tem ou não tem razão, se existe ou não um dado direito, se ele existe ou
determinada situação de facto.
- Ação Declarativa constitutiva
Aqui não impõe nada ao réu, não se impõe que este faça alguma coisa. O que difere em
relação à ação condenatória é que aqui o tribunal altera a situação jurídica que existia
entre partes, modifica aquilo que antes existia.
A ação de que se lança mão para exercer direito potestativos (direitos que se impõem
inelutavelmente na esfera jurídica de outrem pera simples vontade do titular destes
direitos).
- Ação Declarativa condenatória
Pede-se, nestes casos, ao tribunal que este declare a existência ou inexistência de um dado
direito ou situação.
Quando falamos em tipos de ações falamos do tipo de atividade que se pode pedir ao
Tribunal.
Atividade judicial essa composta por um conjunto de atos, por uma sequência de atos
articulados entre si → que é o processo civil.
Arts. 552.º e ss. CPC→ vamos aqui estudar apenas o processo comum.
Existem ainda as formas de processo especiais (arts. 878.º e ss. CPC).
Vimos que nos termos da lei, a todo o direito corresponde uma ação, no entanto para
que um processo tenha início é necessário um requerimento, um pedido nesse
sentido, dirigido ao Tribunal → vigora, no âmbito do processo civil, o Princípio do
pedido. – art. 3.º/1 CPC.
CONCLUSÃO: A serem verdadeiros os factos por ele alegados, ele tem em primeiro
lugar um direito de crédito (direito substantivo decorrente da responsabilidade civil
extracontratual), sendo que, para exercer esse direito, tem ainda o direito de ação (tendo,
neste âmbito, direito a todas fases processuais). No caso concreto, a ação que tem de pedir
em tribunal será uma ação declarativa condenatória.

12.11.2020

«Alberto é proprietário de um prédio urbano sito em Braga. No verão do ano passado


permitiu que Carlos, seu amigo, usa-se o espaço durante o mês para férias com a família
deste (Carlos).
Sucede que Carlos não mais abandonou o prédio, sendo que Alberto necessita com
urgência de a ele aceder, em virtude de ter sido profissionalmente deslocado para Braga,
e de não dispor de outro local nessa cidade para sua habitação.
Alberto consulta-o, na qualidade de advogado, perguntando-lhe se pode reagir e em que
termos.»

RESPOSTA:
Foi abandonado um sistema de justiça pública, portanto temos, desde logo, de referir que
Carlos não pode recorrer à força, empregar a força para
Teria, portanto, de informar Alberto que lhe assiste o direito de ação, consagrado no artigo
2.º do CPC, isto é, de intentar uma ação judicial perante o Estado, que atua por meio de
um tribunal judicial.
Que tipo de ação pode interpor? -> artigo 10.º CPC
Alberto tem de intentar uma: Ação Declarativa Condenatória.
Não está em causa uma simples apreciação judicial de um direito ou existência de uma
situação de facto ou de direito.
Há aqui, ainda assim, uma incerteza que tem de ser definida, mas ainda há um pedido de
condenação do réu – o autor pretende que o tribunal imponha/condene o réu numa
ação ou numa omissão (a fazer ou a não fazer algo).
Quando falamos de ações declarativas de simples apreciação, condenatórias ou
constitutivas, estamos a falar da tutela processual principal. A par desta temos, ainda,
uma tutela processual cautelar- destina-se a “prestar apoio” numa ação principal.
A justiça é constituída por duas dimensões:
- Só há justiça se se proferir a decisão certa, justa.
- Para que não haja uma ausência de efeito útil da decisão do tribunal, no âmbito
da ação principal, é necessário, muitas vezes, meios de auxílio do procedimento
processual principal.
Visa-se, assim, acautelar o efeito útil da decisão a proferir na ação principal.
«Periculum in mora» = “perigo na demora” da ação principal
Se a decisão da ação principal for proferida num momento futuro em que a decisão já não
terá efeito útil, é requerida uma tutela cautelar.
Existem vários procedimentos cautelar:
- Procedimento Cautelar Comum
- Procedimento Cautelar Especificados (foram pensados para casos concretos bem
definidos e bem recortados) -> sempre que a situação que se quer acautelar se inserir num
destes procedimentos especificados na lei, é a estes que se recorre. Se não se subsumir
em nenhum deles, então irá haver lugar ao procedimento cautelar comum.

Procedimentos Cautelares Especificados (arts. 377.º e ss.)


✓ Arresto
✓ Arrolamento
✓ Alimentos provisórios
✓ Arbitramento de reparação provisória
✓ Restituição provisória da posse
✓ Embargo de obra nova
✓ Suspensão de deliberações sociais

Procedimento Cautelar Comum (arts. 362.º a 376.º CC)


Pressupostos dos procedimentos cautelares:
1. PERICULUM IN MORA
Tem de se demonstrar que é necessário intervir rapidamente, pôr em funcionamento estes
meios especiais, de forma a tutelar o efeito útil da ação principal.
Os procedimentos cautelares têm caráter urgente.

2. FUMUS BONI JURIS


Traduzido à letra significa “fumo de bom direito” -> Ora, para que o juiz conceda uma
providencia cautelar ele não tem de ter a certeza absoluta quanto à existência do direito
que o autor invoca, mas tem de ter uma convicção de que existe uma elevada
probabilidade de que o requerente seja, efetivamente, titular do direito que invoca.
• Procedimento cautelar – o caminho a percorrer para a obtenção
• Providência cautelar – é aquilo que o requerente visa obter no final desse
caminho processual.
Trata-se, aqui, de uma convicção menos profunda daquela que o juiz tem de ter no âmbito
de uma ação principal.

3. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE ou da mínima ingerência

Para que a decisão possa ser rápida, o tribunal não vai fazer uma análise profunda, mas
sim uma análise mais superficial, pelo que há aqui um risco mais elevado de erro por
parte do juiz na sua decisão.
Como há uma maior probabilidade de erro, o legislador fixa margens de riscos. PORÉM:
quando as desvantagens que possam resultar da concessão da providencia cautelar para o
requerido forem desproporcionalmente superiores às vantagens da concessão dessa
providencia para o requerente → não deve o juiz conceder tal providência cautelar.
Em cada procedimento cautelar, o juiz tem de considerar:
- As vantagens que a providencia representa para o requerente
- As desvantagens que a concessão da providencia representa para o requerido

Artigo 362.º/1 do CPC + Artigo 368.º/1/1.ª parte → Fumus Boni Juris


Artigo 368.º/1/2ª parte → Periculum in mora
Artigo 368.º/2 CPC → Princípio da Probabilidade – não se aplica no âmbito dos
procedimentos cautelares especificados (Artigo 376.º/1 CPC).

Características dos procedimentos cautelares:


• Procedimentos urgentes, por força da lei (pelo que corre mais rapidamente, de
forma a que se obtenha uma decisão de forma mais célere) – art. 363.º CPC
Prazos para decisão – regra: prazo máximo que o tribunal dispõe para proferir decisão no
âmbito de um procedimento cautelar é de 2 meses (em certos casos, é de 15 dias: casos
em que o contraditório é diferido).

• Dependência – em relação à ação principal. – artigo 364.º/1/2ª parte CPC


Artigo 364.º/1, in fine:
Providência preliminar da ação → Providencia cautelar requerida anteriormente ao
surgimento da ação principal.
Incidente (providencia incidental)→ Providencia cautelar requerida simultaneamente ou
na dependência da ação principal.
• Não influência da decisão proferida na providencia cautelar na ação principal
A decisão da providência cautelar não vincula o juiz da ação principal, ou seja, não tem
influência no âmbito da decisão da ação principal, este pode decidir de maneira diferente.
- Artigo 364.º/4 CPC
Efetivamente, o tribunal pode conceder a providencia cautelar, mas depois considerar a
ação principal improcedente, tal como pode não conceder a providencia cautelar e depois
vir a considerar a ação procedente. – Acima da celeridade está a adequação da decisão

IN CASU…
Para além da ação declarativa condenatória, Alberto deve requerer uma tutela cautelar,
pôr em marcha um procedimento cautelar.

Neste caso, o procedimento cautelar mais adequado não seria procedimento cautelar
especificado da “restituição provisória da posse” (art. 377.º CPC), ainda que, à partida,
pudesse parecer que fosse esse, porque há aqui uma particularidade, é que esse
procedimento cautelar só se aplica quando haja violência, quando privação da posse
tenha ocorrido mediante a aplicação de violência.

➔ Assim, o procedimento cautelar mais adequado seria aqui o procedimento


cautelar comum. – é o que resulta do artigo 379.º CPC:

Alberto, além de propor a ação principal – que seria uma ação declarativa condenatória -
teria, portanto, de dar inicio a um procedimento cautelar comum, em ordem a obter a
restituição provisória da posse do apartamento que diz ser seu. Sabendo que este
procedimento se daria na dependência da ação principal, sabendo ainda que o
procedimento cautelar é um procedimento urgente e que a decisão que venha a ser
proferida no procedimento cautelar não vincula o juiz na ação principal: ou seja, até pode
ser ordenada a restituição da posse na providencia cautelar, mas depois vir a ser
considerada improcedente a ação principal, tal como pode ser considerada improcedente
o pedido de concessão de medida cautelar, mas depois ser concedida procedência na ação
principal.
Sabendo tambem que tal providencia só será concedida se se verificarem,
cumulativamente os requisitos necessários para que seja concedida uma medida cautelar:
- Fumus Boni Juris → ou seja, Alberto tem de conseguir demonstrar
minimamente que é titular do direito de propriedade sobre aquele imóvel
- Periculum in mora → tem ainda de demonstrar que o facto de ficar a aguardar
pela decisão da ação principal retiraria o efeito útil (total ou parcialmente) na decisão da
ação principal.
- Princípio da proporcionalidade → seria, por fim, necessário ainda que os
danos que para o requerido resultassem da concessão da providencia não fossem
consideravelmente superiores aos danos que para o requerente resultariam da não
concessão da providência.

19.11.2020
CASO PRÁTICO

«Daniel celebrou com Ernesto um contrato de compra e venda de material


informático, tendo ficado convencionado que Daniel procederia à entrega do
material em janeiro deste ano, e que Ernesto procederia ao pagamento em 3
prestações, no valor de 2.000€ cada, nos meses de fevereiro, março e abril,
respetivamente.
Apesar das várias interpelações de Daniel, Ernesto não procedeu ainda a qualquer
pagamento, e tomou, entretanto, conhecimento de que, sendo Ernesto proprietário
de um apartamento e de dois automóveis, procedeu já à venda dos dois automóveis
e encontra-se em situação de incumprimento perante outros credores que, à
semelhança de Daniel, também não conseguem ver satisfeito o seu crédito.
Admita que Daniel o contacta na qualidade de advogado no sentido de ser
esclarecido quanto à melhor forma de obter tutela para a sua situação. Em que
sentido o aconselharia.»

No âmbito da tutela processual distinguem-se:


● Tutela principal da ação a propor:
- Ações declarativas de simples apreciação
- Ações declarativas condenatória
- Ação declarativa constitutiva

● Tutela cautelar:
Procedimento cautelar comum
Procedimento cautelar especificados

In casu, justifica-se o recurso à tutela cautelar visto que o devedor (Ernesto) está a dissipar
o seu património, o que poderá inviabilizar a possibilidade de o credor, Daniel, vir a
executar o património de Ernesto, de forma a ver satisfeita a sua dívida.

A relação jurídica é constituída por vários elementos:


- Sujeitos
Daniel e Ernesto
- Facto jurídico
A relação jurídica entre Daniel e Ernesto teve por facto jurídico a celebração do contrato
de compra e venda, que foi de onde emergiu a relação jurídica (no caso, obrigacional)
entre os dois sujeitos da mesma.
- Objeto (conteúdo da relação jurídica)
O objeto da relação jurídica em causa é: do lado do Daniel, a obrigação de entregar a
coisa e, do lado de Ernesto é a obrigação de pagar.
- Garantia
A garantia assegura que, na falta de cumprimento voluntário, se possa fazer algo para
suprir esse incumprimento. Assim, a garantia consiste nos meios necessários para
realização coerciva dos direitos, no fundo, para a sua efetivação.
Hoje, esta não é uma garantia pessoal – não afeta fisicamente a pessoa do devedor - mas
é uma garantia patrimonial, uma vez que é o património de devedor que servirá de
garantia ao credor em caso de incumprimento (de falta de cumprimento voluntário).
Para tal será necessário que, na esfera jurídica do devedor, existam bens penhoráveis para
satisfazer a dívida do credor.
Quando está em causa uma obrigação de pagar, se o devedor não cumprir
voluntariamente, recorre-se à penhora do património – os bens do devedor serão
apreendidos para depois serem vendidos, sendo que, com o produto obtido dessa venda,
pagar-se-á ao seu credor. → É esta a garantia que pode assegurar a Daniel a satisfação do
seu crédito.
Porém, Daniel apercebeu-se de que Ernesto está a alienar os bens do seu património.
Pode, portanto, suceder que Daniel intente uma ação declarativa condenatória, em que
seja efetivamente proferida uma sentença condenatória, mas que até à data da sentença
Ernesto dissipe todo o seu património, ficando Daniel sem qualquer garantia para a
satisfação do seu crédito. → Nesse caso, a sentença condenatória, apesar de justa e
correta, poderá já não produzir qualquer efeito útil, pelo que se justifica, neste caso, o
recurso à tutela cautelar.

Vimos que existem:


Procedimentos cautelares especificados
Procedimento cautelar comum
➔ Temos, então, de procurar na lei se existe algum procedimento cautelar
especificado que tenho aqui aplicação.
Dentro do leque de procedimentos cautelares especificados, aquele que é aqui aplicável é
o arresto, consagrado e regulados nos artigos 391.º e ss. do CPC.
Arresto ≠ Arrolamento
• Arresto (arts. 391.º e ss CPC) → tem lugar quando o credor tem interesse no valor
dos bens, ou seja, não tem um interesse nos bens em si, mas porque esses bens
podem são uma forma de satisfazer o seu crédito– há um interesse instrumental
nesses bens, mas eles não são o fim em si mesmo.
Daniel quer que se exerça uma providencia cautelar sobre o apartamento de Ernesto (dado
que este já alienou os dois automóveis que constituíam o seu património e, no momento,
é o único bem penhorável do seu património, mas isto claro, se Ernesto não o dissipar
também do seu património como fez com os automóveis).
No caso do arresto, os bens são uma “ponte” para se atingir o objetivo, que é a satisfação
de um crédito.
• Arrolamento (arts. 403.º e ss. CPC)→ o requerente da providencia quer o próprio
bem que se arrola.
Exemplo: A encontra-se casada com B. Entretanto, com a rutura do casamento, A
saiu de casa, ficando na casa quer os seus bens próprios, quer os bens comuns do
casal. A, com receio que B (cônjuge) aproveite o facto de A estar fora de casa para
alienar os bens que lá se encontram e aquando do divorcio, quando houver partilha
de bens, já não houver bens para partilhar, requer uma providencia cautelar de
arrolamento dos bens, porque alega ter direito àqueles bens.
O artigo 403.º/1 é uma concretização do requisito geral do periculum in mora (“justo
receio”).
Subdivisão:
- Arrolamento aplicável à generalidade dos casos em que alguém entende ter
direito sobre um determinado bem ou bens. → exige-se a prova do “justo receio”.
- Arrolamentos especiais – prescinde-se do requisito do “justo receio”, desta
concretização do periculum in mora, porque presume-se simplesmente que ele existe, não
sendo necessário fazer-se prova dele.
o Arrolamento pedido numa ação judicial de separação de pessoas e bens
o Arrolamento pedido numa ação de divórcio
o Arrolamento pedido numa ação para nulidade ou anulação de casamento

RESPONDENDO AO CASO…
O credor-requerente, para que lhe seja concedida a providencia cautelar de arresto, tem
de provar:
1. Que é credor – se o arresto se destina a assegurar a conservação do património
do devedor para satisfação de um crédito, então é conveniente que se comece por
demonstrar que existe um crédito de que se é titular.

2. Pressupõe a demonstração de que se não for concedida a providencia cautelar, o


efeito útil da ação principal poderá precludir ou ficar seriamente afetado - tem de
estar preenchido o requisito do «Periculum in mora» – que aqui se traduz no
perigo de perder a garantia patrimonial do seu crédito.
O objetivo é apreender os bens para que, se e quando vier a ser proferida a ação
condenatória, se o réu (Ernesto) não pagar, se poder intentar uma ação executiva no
âmbito da qual se penhoram os seus bens. → A ação declarativa condenatória servirá de
título executivo à ação de execução.
O que o arresto faz é antecipar este efeito da penhora (o efeito de apreensão de bens
para depois serem vendidos) → porque o que o arresto permite é que essa apreensão
ocorra logo, e que os bens do património do devedor se conservem apreendidos até que
chegue o momento da penhora. → Nesse momento, o arresto converte-se em penhora e,
a partir daqui, seguem-se os tramites da ação executiva: os bens do património do devedor
são vendidos e, com o montante obtido com a venda desses bens, satisfaz-se o crédito do
credor.
O arresto não é uma penhora, mas antecipa um dos seus efeitos, pelo que se aplicam,
neste âmbito, as disposições relativas à penhora, segundo o artigo 391.º/2

3. Ideia de proporcionalidade no sentido de que o arresto se deve limitar aquilo que


e estritamente necessário para tutelar o direito do credor – art. 393.º/2 CPC.
No ato do arresto vigora o regime especial em matéria de princípio do contraditório
(próxima aula).
CONCLUSÃO: Daniel deveria propor uma ação declarativa condenatória e seria
altamente conveniente que essa ação se fizesse acompanhar de uma providencia cautelar
de arresto (de seguida: noção e explicitação sucinta quanto ao arresto).
Aula suplementar dia 18.12 (16h30)

CASO PRÁTICO

«João e Isabel são casados e residem num apartamento integrado num edifício constituir em
propriedade horizontal.
Na qualidade de condóminos estão vinculados a pagar anualmente o valor total de 4500€.
Sucede, porém, que em 2019 e em 2020, João e Isabel não procederam a esse pagamento,
pelo que o condomínio do prédio onde residem intentou contra eles uma ação declarativa no
sentido de garantir a realização do pagamento.
Sucede também que o condomínio tomou, entretanto, conhecimento de que João e Isabel
não têm quaisquer outros bens para além do referido apartamento, e se encontram em vias
de proceder à sua venda.
1. O condomínio consulta-o no sentido de saber se a sua iniciativa processual é
suficiente para adequada tutela da sua posição jurídica. Que lhe diria?
2. Pronuncie-se quanto aos termos de exercício do contraditório, por João o Isabel na
eventualidade de entender ser de requerer alguma providencia cautelar.
3. O condomínio pergunta-lhe se, no âmbito da tutela cautelar, existe alguma
possibilidade de o procedimento decorrer sem se encontrar na dependência de uma
ação principal. Que lhe diria?»

Identificação da ação que deve ser proposta.


Foi proposta de uma ação declarativa, mas não nos é dito que tipo de ação declarativa.
Ora, deveria, in casu, ser intentada uma ação declarativa condenatória, nos termos do
previsto no artigo 10.º/3/ al. b), com vista à condenação dos réus na realização do dever
corresponde ao direito declarado e reconhecido no âmbito dessa ação declarativa, ou seja,
na realização do pagamento do montante em dívida. → Esta seria a ação adequada no
plano da tutela principal.
Ora, posto isto, há que atentar no facto de que a ação é aqui proposta por um
condomínio, contra duas pessoas (Isabel e João).
O condomínio tem uma particularidade - não é uma pessoa física singular, nem é uma
pessoa coletiva.
Nem todos os entes podem figurar numa ação como partes, ou seja, o juiz antes de entrar
na apreciação do pedido, antes de se conhecer do mérito da causa, há que fazer uma
análise de natureza processual.
O tribunal não vai conhecer do mérito (da substância) sem primeiramente verificar se
estão reunidos os requisitos para que a ação possa ser intentada. Trata-se de requisitos
indispensáveis, sem os quais o juiz não pode conhecer do mérito da causa – são eles
pressupostos processuais.

Pressupostos processuais
Relativamente às partes
1. PERSONALIDADE JUDICIÁRIA
Suscetibilidade de ser parte. Quem pode figurar como autor e como réu numa ação
judicial (no fundo, é a possibilidade de ser parte).

Critérios de atribuição de personalidade judiciária


❖ Critério de base – critério da personalidade jurídica (conceito de natureza
substantiva)
Diferente de personalidade judiciária (que é um conceito de natureza processual).
- Quanto às pessoas singulares o surgimento de personalidade jurídica dá-se com
o nascimento completo e com vida (regulada no Código Civil).
- Já para as pessoas coletivas só surge no momento do registo.
Interessa isto para o Direito Processual porque o legislador processual determinou que
quem tem personalidade jurídica terá também personalidade judiciária. Porém, sucede,
em alguns casos, que entes que não tenham personalidade jurídica, mas já lhes seja
reconhecida personalidade judiciária.
Isto funda-se no facto de, nos termos do artigo 2.º/2 do CPC, a todo o direito
corresponder uma ação, logo, se uma pessoa é titular de um determinado direito
subjetivo/substantivo (e, por isso, tem personalidade jurídica), então é-lhe atribuído o
correspondente direito de fazer valer esse direito substantivo num tribunal. → Portanto,
quem é titular de um direito substantivo há também de ser titular do direito de ação: isto
equivale a dizer que quem tem personalidade jurídica há também de ter personalidade
judiciária.

❖ Critério suplementar
O legislador processual foi mais generoso do que o legislador substantivo porque atribuiu
esta possibilidade de alguém figurar como parte numa ação, não só a quem tenha
personalidade jurídica, mas também a outros entes (extensão da personalidade
judiciária).
Pode afirmar-se, nos dias de hoje, que a personalidade jurídica é a base da personalidade
judiciária, mas não tem a personalidade jurídica como medida, pois a medida da
personalidade judiciária é maior, é mais extensa (há, de facto, uma extensão da
personalidade judiciária).
A relação entre a personalidade jurídica e a personalidade judiciária resulta do artigo 11.º
do CPC.
Artigo 11.º do CPC - «Conceito e medida da personalidade judiciária».
Artigo 12.º CPC – «Extensão da personalidade jurídica»

Herança Jacente - é uma herança/património cujo titular já faleceu, mas que ainda não
está encabeçado em pessoa jurídica (quando o herdeiro seja desconhecido ou porque os
herdeiros legítimos ou testamentários tenham renunciando à herança, após requerimento
— artigos 1039.º a 1041 do CPC).

2. CAPACIDADE JUDICIÁRIA
3. LEGITIMIDADE
4. PATROCÍNIO JUDICIÁRIO
5. INTERESSE EM AGIR

Relativamente aos tribunais


COMPETÊNCIA
Interna
Internacional

IN CASU:
Ora, no nosso caso, estende-se, ao abriga do artigo 12.º/al. e) do CPC, a personalidade
judiciária ao condomínio.
Condomínio = propriedade comum (em conjunto).
➔ O condomínio é, portanto, uma estrutura organizativa que, apesar de não ter
personalidade jurídica, visa administrar o património comum (celebração de
contratos de celebração de serviços: para assistência dos elevadores, limpeza dos
espaços comuns, serviços de segurança etc.), uma vez que seria absurdo pensar
numa administração feita em conjunto por cada condómino, pelo que é importante
conceder-lhe a possibilidade de ser parte em juízo

CONCLUSÃO:
O condomínio beneficia da qualidade de ser parte e tem personalidade judiciária, ou seja,
pode figurar como parte na ação.
Posto isto, desde que estivessem preenchidos todos os outros pressupostos processuais, o
juiz já podia avançar e conhecer do mérito do pedido, do mérito, da substância (da
matéria) da ação.

Ora, tratando-se de uma ação declarativa condenatória o juiz pode:


- Dar razão ao autor, condenando os réus no pedido.
- Ou pode verificar-se a absolvição dos réus do pedido.
Se não estiver verificado o pressuposto da personalidade judiciária, isto é, se se chegar à
conclusão de que o autor não tem personalidade judiciária, → então há absolvição dos
réus da instância, pois não chega a haver conhecimento do pedido, isto é, do mérito da
causa por parte do juiz, logo os réus não são absolvidos do pedido (dado que este não
chegou sequer a ser conhecido), mas sim da instância processual.

No caso:
O condomínio tomou conhecimento de que João e Isabel não teriam no seu património
qualquer outro bem, a não ser o apartamento onde residem. Para além disso, tomaram
conhecimento de que João e Isabel estão a negociar a venda do apartamento, pelo que a
qualquer momento ele pode ser alienado, deixando assim de fazer parte do património, e,
consequentemente, o condomínio perdia a garantia patrimonial do seu crédito, a única
possibilidade de ver satisfeito o pagamento da dívida.
Ora, enquanto advogada, aconselharia o condomínio a requerer uma providência
cautelar de arresto, nos termos dos artigos 391.º e ss. do CPC.
EM SUMA: a tutela principal deveria aqui ser complementada pela tutela cautelar de
arresto.
2. Pronuncie-se quanto aos termos de exercício do contraditório, por João o Isabel
na eventualidade de entender ser de requerer alguma providencia cautelar.

Convoca-se aqui o princípio do contraditório – artigo 2.º/3 CPC


Em nome do princípio da igualdade (no sentido de uma igualdade material), autor e réu
tem as mesmas oportunidades, tem de ser tratados da mesma forma
Ora se o autor tem a possibilidade de se pronunciar e fazer ouvir perante o tribunal, então
deve ser dada essa mesma oportunidade de pronuncia à contraparte, ou seja, ao réu.
► Objetivo do autor quando se pronuncia na petição inicial– fazer valer a pretensão que
consta do pedido, no sentido da condenação do réu.
► Objetivo do réu se pronuncia na contestação –visa influenciar o juiz, procurando que o
juiz decida em seu favor, no sentido da sua absolvição.
Contraditório no âmbito das ações principais
Regra – é que o contraditório aconteça antes da decisão final ser proferida (é o que
sucede, como regra, no âmbito das ações principais).

Contraditório no âmbito dos procedimentos cautelares


Regra – é a de que primeiro se pronuncie o requerente (artigo 365.º/1 CPC), e depois se
proceda ao contraditório, isto é à audiência do requerido, antes de ser proferida a decisão
final– artigo 366.º/1, 1.ª parte do CPC.
Exceção - Contraditório diferido (em momento posterior), em que primeiro é ouvido o
requerente e logo depois é proferida a decisão relativa à providencia cautelar requerida e
só depois, então, é ouvido o requerido – artigo 366.º/1, 2ª parte CPC.
➔ Ora, para que haja diferimento do contraditório, isto é, para que o requerido seja
ouvido só depois de proferida a decisão, é necessário que se demonstre que a
audiência põe em sério risco o fim ou a eficácia da providência.
O contraditório será diferido num de dois casos:
1. Contraditório legalmente obrigatório – em que é imposto pelo legislador, o
diferimento do contraditório está legalmente previsto (o juiz não tem de fazer
avaliação nenhuma)
2. Nos restantes caos, é o juiz que tem de avaliar se o contraditório coloca ou não
em risco a utilidade, o objetivo, a eficácia da providencia, de forma a determinar
se deve ou não o contraditório ser diferido.

Contraditório diferido obrigatório, por força da lei (imposto por lei)

O contraditório exigido por lei, surge em relação a dois procedimentos cautelares


tipificados:
a. Arresto (artigo 393.º/1 do CPC) → o legislador impõe que o juiz imponha
primeiro o arresto e só depois se ouve o requerido

b. Restituição provisório da posse (artigo 378.º, in fine do CPC) → visa castigar,


punir o requerido por ter recorrido à violência (a restituição provisória da posse
supõe que tenha havido esbulho violento), quando, entre nós, é expressamente
proibida a justiça privada (artigo 2.º/1 CPC).

Na maioria dos demais casos é o juiz que faz uma avaliação quanto ao contraditório.
Assim, quando se procede ao contraditório diferido, aquilo que verdadeiramente se quis
foi adotar a providencia sem que o requerido pudesse impedir a sua eficácia. Ora, após
decretada a decisão do juiz, é ouvido o requerido para se perceber se realmente a
providencia conferida é ou não fundada. Contudo, mostrava-se necessário “prevenir” e
por isso se decretou a providencia antes mesmo de ouvido o requerido.
Ou seja, depois de decretada a providência cautelar, procede-se ao contraditório (audição
do requerido) e, posteriormente, há uma nova decisão, que revoga o arresto ou a
restituição provisória da posse, caso, em sede de contraditório, se reúnam provas de que
afinal a providencia cautelar não era fundada, no caso.

▪ Quando há diferimento do contraditório e o requerido é notificado, ele pode não


concordar com a decisão por uma de duas razões diferentes:

1. Porque, apesar de concordar com a decisão que fora tomada pelo juiz perante os
elementos que tinha, isto é, que lhe foram fornecidos pelo requerente, ele detém
agora novos elementos que podem dar origem à formulação de uma nova e
diferente decisão judicial. → Neste caso, aquilo que o requerido deduz a sua
oposição (art. 372.º/1/b) CPC).

2. Porque, de facto, não concorda com a decisão que foi tomada: casos em que o
requerido entende que o juiz não soube desempenhar adequadamente as suas
funções. → Nesta situação, o que o requerido faz é interpor recurso da decisão,
vai recorrer do despacho que decretou a providencia cautelar (artigo 372.º/1/a)
CPC).
Ora, em rigor, o recurso não é uma forma de contraditório, mas antes uma forma de influir
na construção da decisão.
Em suma: trata-se de um caso, no âmbito do arresto, em que o diferimento do
contraditório é obrigatório e, portanto, em que o juiz primeiramente decretaria o arresto
(caso entendesse que estavam verificados os pressupostos para tal), João e Isabel seriam
depois notificados da decisão e aí poderiam reagir contra ela: a) deduzindo oposição se
tivessem novos dados/elementos relevantes para a decisão em causa, ou b) não tendo
novos elementos, mas discordando da decisão poderiam lançar mão da interposição de
recurso de apelação.

3. O condomínio pergunta-lhe se, no âmbito da tutela cautelar, existe alguma


possibilidade de o procedimento decorrer sem se encontrar na dependência de uma
ação principal. Que lhe diria?

O objetivo dos procedimentos cautelares é assegurar o efeito útil da ação principal, então
a sua razão de ser gira em torno da existência desta ação, pois o fim da providencia
cautelar não é resolver o litigio em si, o qual será resolvido no âmbito da ação principal.
Ora, o artigo 364.º/1, 2.ª parte do CPC consagra em si o caráter dependente do
procedimento cautelar.
A afirmar e a sublinhar esse carater dependente da providencia cautelar (medida cautelar
decretada) temos o artigo 373.º/1, a) do CPC, nos termos do qual, a providencia cautelar
decretada caduca quando se esteja no âmbito de um procedimento cautelar preliminar, no
prazo de 30 dias, pois se não houver propositura da ação principal, então o procedimento
cautelar em si perde a sua razão de ser, uma vez que é, em regra, dependente da ação
principal.
PORÉM, há um caso em que, pontualmente, o legislador admitiu a possibilidade de a
providencia subsistir por si só, independentemente de qualquer ação principal.→ é o caso
da INVERSÃO DO CONTENCIOSO (artigo 369.º CPC).
Neste caso, a providencia cautelar (e o procedimento que lhe subjaz) têm caráter
independente.
Assim, se o juiz formar convicção segura acerca da existência do direito do requerente
da providencia cautelar, decretando, portanto, a providencia requerida e dispensando o
autor de propor a ação principal (a providencia cautelar vai como que “servir” de ação
principal, em que a pretensão do requerente fica completamente satisfeita com o
decretamento da providencia cautelar).
Pode haver inversão do contencioso em que aquele que era aqui réu tem 30 dias para
propor, ele próprio (que antes era réu e agora aparece na veste de autor) uma ação
autónoma em que pede que o direito acautelado daquele que anteriormente era autor seja
destruído, para impugnar a existência do direito acautelar. → Só tem lugar esta inversão
do contencioso quando se trate de providencias cautelares antecipatórias.
Por força do artigo 376.º/4 do CPC, a inversão do contencioso é aplicável aos seguintes
procedimentos cautelares:
- Restituição provisória da posse
- Suspensão de deliberações sociais
- Alimentos provisórios
- Embargo de obra nova

Logo, por exclusão de partes, não pode haver inversão do contencioso quanto:
- Arresto
- Arrolamento
- Arbitramento de reparação provisoria
- Quanto aos procedimentos cautelares comuns, depende do tipo de providencia
que seja requerida: se for uma providencia suscetível de compor definitivamente o litigio,
é admitida a inversão do contencioso, se não for, então não se admite a inversão do
contencioso.

REQUISITOS
• Necessidade de requerimento - Tem de haver pedido de uma providencia
cautelar referente a algum dos procedimentos elencados no artigo 376.º/4 CPC
(esse requerimento pode ser apresentado até que a audiência final encerre).
• É ainda necessário que o juiz possa formar uma convicção segura quanto à
existência do direito.
Em regra, basta que se prove o fumus boni juris, isto é, que se demonstre a elevada
probabilidade de existência do direito, mas não é necessário que o juiz forme um
convicção segura, basta uma convicção mais leve), porém, para se compor
definitivamente o litigio através da providencia cautelar, é necessária uma convicção mais
“forte”, uma convicção segura – artigo 369.º/1 CPC.

• É ainda necessário que a natureza da providencia cautelar decretada seja


adequada a realizar a composição definitiva do litígio, ou seja, quando os
procedimentos cautelares especificados são os que estão previstos no artigo
376.º/4 do CPC (quando esteja em causa o requerimento de uma providencia
cautelar antecipatória).
A inversão do contencioso é aplicável quando o ex-requerido, tendo perdido a providência
cautelar, fizer surgir uma ação autónoma, no prazo de 30 dias, com a pretensão de
impugnar o direito subjetivo que foi acautelado na providencia cautelar, a qual tem de se
tornar definitiva.
Assim, segundo a figura da “inversão do contencioso”, se o requerente de uma providência
cautelar requerer a inversão do contencioso, o juiz poderá dispensa-lo de intentar a ação
principal, desde que forme a convicção segura acerca da existência do direito a acautelar e
a providência decretada seja adequada a realizar a composição definitiva do litígio.
Decretada a inversão do contencioso, o requerente fica dispensado de intentar a ação
principal, sendo que se o requerido, para o qual foi transferido o ónus de propor a ação
principal, não a intentar no prazo para o efeito, a providência decretada compõe
definitivamente o litígio.

Há, portanto, inversão do contencioso quando o juiz declara que a providencia que decreta
tem natureza independente, isto é, que regulará definitivamente o litígio, a não ser que a
ação principal seja proposta pelo requerido. No fundo, inverte-se o ónus de quem tem o
ónus de propor a ação principal, isto é, inverte a posição dos sujeitos da ação
Quando há inversão do contencioso, há uma declaração de definitividade condicional,
porque se, uma vez notificado da decisão, o requerido se conformar com ela, então a
providencia cautelar decretada assume natureza definitiva. Pelo contrário, se o requerido
não concordar com a providencia conferida, então este pode requerer a ação principal
(fica com o ónus de propor a ação principal).
A decisão cautelar (objeto da inversão do contencioso) é definitiva, salvo se o requerido
der ele próprio início a uma ação principal para impugnar o direito acautelado com tal
providencia cautelar, nos 30 dias subsequentes à notificação, sob pena de a providencia
decretada se consolidar como composição definitiva do litigio.– artigo 371.º/1 do CPC.

Casos em que há diferimento do contraditório:


Nestes casos, é muito pouco provável que, sem ouvir o requerido, o juiz possa formar
convicção segura quanto à existência do direito. E, portanto, é muito pouco provável que,
nestes casos, se verifique o requisito da convicção seguro que é necessário para que seja
decretada a inversão do contencioso.

CASO PRÁTICO

«Dalila tem 15 anos e é proprietária de um prédio rústico sito em Anadia. No mês passado,
Ernesto e Fernanda, casados entre si sob o regime de comunhão de bens, invadiram o
referido prédio e nele iniciaram a prática agrícola alegando serem proprietários do mesmo.
Perante tal conduta, Dalila intentou contra Ernesto uma ação declarativa condenatória
requerendo a condenação deste a abandonar o imóvel em causa e a abster-se de qualquer
prática agrícola ou de outra natureza no mesmo.
1. Pronuncie-se quanto à regularidade da instância.
2. 15 dias depois da propositura dessa ação, Ernesto e Fernanda iniciaram a construção
de um edifício no referido prédio, tendo a autora tomado conhecimento desse facto
no passado fim de semana. Dalila Consulta-o perguntando-lhe se existe alguma via
processual de reação contra este comportamento.
Na resposta às questões antecedentes tome em consideração o facto de o prédio ter o valor
de 40.000€.»

RESPOSTA:
1.
Está aqui em causa a questão dos pressupostos processuais, desde logo, quanto às partes.
Entre eles, temos os pressupostos da personalidade e da capacidade judiciária.
Personalidade judiciária é, nos termos do artigo 11.º/1 CPC, a suscetibilidade de ser
parte em juízo. Já a capacidade judiciária consiste na suscetibilidade/idoneidade para se
estar/sr parte em juízo, por si só, autonomamente.
Sabemos que, por força do artigo 11.º/2 do CPC (que estabelece uma equiparação),,
quem tem personalidade jurídica tem necessariamente personalidade judiciária (já o
contrário não é verdade, pois há uma extensão da personalidade judiciária – artigo 12.º
CPC).
➔ Assim, nos termos do artigo 66.º do CC, Dalila tem personalidade jurídica,
pois teve um nascimento completo e com vida, pelo que pode ser titular de direitos
e deveres. Deste modo se conclui que, efetivamente, Dalila pode ser proprietária
daquele prédio rústico.
Por seu turno, sabemos que, por ser menor, Dalila não tem capacidade para o exercício
de direitos, não tem capacidade jurídica.
➔ Ora, sendo que, nos termos do artigo 15.º/2 CPC, só tem capacidade judiciária
quem tem capacidade jurídica, então conclui-se que Dalila não tem capacidade
judiciária.
Para além disso, sendo suscetível de ser titular de direitos, então Dalila também pode
propor a ação em causa, pode, portanto, ser autora, o que não pode é fazê-lo por si só,
autonomamente, pois, carecendo de capacidade jurídica, não tem capacidade judiciária.
– Só tem capacidade judiciária quem tem capacidade jurídica, logo a capacidade jurídica
é simultaneamente a base e a medida da capacidade judiciária.

Posto isto, deve ter-se em conta que a primeira forma de suprir a incapacidade
judiciária é, nos termos do artigo 16.º CPC, é através dos seus representantes. → Assim,
Dalila, que é menor sujeita a representação, pode suprir a sua falta de capacidade
judiciária.
Verificamos, portanto, que falta este pressuposto processual. Ora, sendo os pressupostos
processuais as condições sem as quais o juiz não poderá conhecer do mérito da ação, o
juiz irá proferir um despacho no sentido de convidar os pais a intervirem na ação
em representação da menor (Dalila), deixando esta questão de ser um impedimento
quanto ao conhecimento do fundo, do mérito da ação.

Do lado passivo…
Dalila só intentou ação contra Ernesto, porém, sendo este casado com Fernanda pelo
regime de comunhão de bens, então o prédio rústico em causa pertencendo a Ernesto,
também pertencerá a Fernanda.
É, neste âmbito, de notar que não basta que a ação seja proposta contra quem tem
personalidade e capacidade judiciária, é ainda necessário que a ação seja intentada contra
a pessoa que figura e que faz parte da versão da história que o autor conta e consagra no
pedido.
Há casos em que a lei impõe que a ação seja proposta contra mais do que uma pessoa –
litisconsórcio passivo necessário – artigo 33.º CPC. Nestes casos, o autor não é
livre de propor a ação apenas contra um réu, pois impõe-se que a ação seja proposta contra
mais que um réu.

3 fontes possíveis (do litisconsórcio necessário):


▪ Legislador – litisconsórcio necessário legal
▪ As próprias partes – Litisconsórcio necessário convencional
▪ Para boa decisão da ação – Litisconsórcio natural (este é residual, só se recorre
quando a própria lei ou as partes já não o preveja).

No caso, se ambos – Fernanda e Ernesto – são alegadamente proprietários, então ambos


têm o direito de, na ação, tentarem obter a tutela do seu direito – trata-se aqui de um caso
de litisconsórcio passivo necessário legal, por força do artigo 34.º do CPC, que, na parte
final do seu n.º 3, determina que a ação deve ser proposta contra ambos os cônjuges
nas ações prevista no n.º1 do artigo 34.º, ou seja, quando esteja em causa “ações de que
possa resultar a perda ou a oneração de bens que só por ambos (os cônjuges) possam
ser alienados”.
EM SUMA: no termos do artigo 34.º/3 em articulação com o n.º1 desse mesmo preceito
legal, a ação deve ser proposta contra Ernesto e contra Fernanda, sob pena de não se reunir
o pressuposto processual relativo à legitimidade passiva e, portanto, de o juiz absolver o
réu da instancia, não conhecendo o mérito da causa.

2. 15 dias depois da propositura dessa ação, Ernesto e Fernanda iniciaram a construção


de um edifício no referido prédio, tendo a autora tomado conhecimento desse facto
no passado fim de semana. Dalila Consulta-o perguntando-lhe se existe alguma via
processual de reação contra este comportamento.

RESPOSTA:
Poderia ser aqui requerida uma providencia cautelar conservatória, nomeadamente, o
“embargo de obra nova”, nos termos dos artigos 397.º e ss. do CPC, pois Ernesto e
Fernanda começaram a construir um edifício no prédio rústico pertencente a Dalila –
Dalila possui sobre aquele prédio, um direito de propriedade que é o direito mais intenso
dentro dos direitos reais de gozo.

REQUISITOS
Requisitos de natureza objetiva
o Tem de ter início uma obra, um trabalho ou um serviço novo. – artigo 397.º/1, 2.ª
parte do CPC.
o É ainda necessário que esta atividade se revele passível de causar prejuízo.
o Para além disso, esse prejuízo tem de o ser relativamente a alguém que se julgue
ofendido no seu direito de propriedade, ou em qualquer outro direito real ou
pessoal de gozo ou da sua posse. – artigo 397.º/1, 1.ª parte.

Dentro da categoria ampla dos direitos reais de gozo, a propriedade é o direito mais
intenso, que importa mais faculdades.
Neste caso, o possuidor (Ernesto e Fernanda) não é titular de um direito de propriedade
ou de qualquer outro direito real de gozo, mas comporta-se como se fosse e com a
convicção de o ser – a posse consiste precisamente nestes dois elementos: o animus e o
corpus.
Requisitos subjetivos
1. Requisito negativo – Não é possível o recurso a este tipo de providencia se estiver
em causa o Estado ou outras pessoas coletivas publicas, pois estas entidades só
podem recorrer a esta forma de procedimento cautelar especificado se não tiverem
competência para decretar o embargo administrativo. Neste âmbito o recurso ao
processo civil é subsidiário. – artigo 398.º/1 CPC

2. Requisito negativo – Se a obra for realizada pelo Estado ou outras pessoas


coletivas públicas, por concessionários ou serviços públicos, ou seja, quando
esteja em causa uma relação jurídico-administrativa não é possível recorrer a este
procedimento que deve ser garantida através dos meios próprios do direito
administrativo – artigo 399.º CPC.
Requisito de natureza temporal
O ofendido tem o ónus de recorrer a este procedimento cautelar no prazo máximo de 30
dias a contar do conhecimento do facto. Se o interessado nada fizer dentro deste prazo, o
seu direito a requerer o embargo de obra nova caduca. – artigo 397.º/1, parte final CPC.
O Estado e outras pessoas coletivas publicas podem convocar este se não se tratar de um
caso sujeito a embargo administrativo, não estão sujeitos a este prazo de 30 dias. – artigo
398.º/2 do CPC.

Objetivo desta providencia cautelar – suspensão da obra que está a ser realizada (artigo
397.º/1, in fine CPC).
Isto é importante, porque o procedimento cautelar de embargo de obra nova só se aplica
nos casos em que a obra ou trabalhos ainda não tiverem sido concluídos, porque se assim
não for já não haverá nada a embargar.

Modo de realização do embargo de obra nova


Relativamente aos de mais procedimentos cautelares, o embargo de obra nova tem uma
particular: é que ele pode realizar-se por via judicial ou extrajudicial.
No primeiro caso diz-se estar em causa um embargo de obra nova extrajudicial. No
segundo caso, trata-se de um embargo de obra nova judicial.

❖ Embargo extrajudicial – artigo 397.º/2 CPC


Neste caso, é a parte requerente, a título pessoal (no caso, através do seu representante
legal ou de representante forense a quem confira poderes para esse efeito), que procede
diretamente ao embargo.
Posto isto, nos termos do artigo 400.º do CC:
O requerente dirige-se à obra acompanhado de 2 testemunhas, notificando
oralmente/verbalmente o dono da obra, dizendo-lhe que a obra está embargada
(suspensa). Se, porventura, na obra não estiver presente o seu dono, esta notificação pode
ser feita ao encarregado da obra ou de quem o substitua.
O requerente deve ainda produzir um documento (auto) no qual que descreve o estado-
situação em que a obra se encontrava no momento em que procedeu ao embargo da obra.
Este auto deve ser assinado por quem o faz, pelo dono da obra (ou por quem o substitua)
e também pelas testemunhas.
Note-se, porém, que obter embargo de obra nova pela via extrajudicial não significa
conceder-lhe tal providencia cautelar definitivamente, pois conferir tal poder a um
particular, sem mais, seria impensável, pelo que é necessário controlar se esta ordem de
suspensão foi dada pelo particular correta e adequadamente.

Ora, para isso, o requerente (aquele que realizou o embargo extrajudicial) tem, nos termos
do artigo 397.º/3 do CPC o prazo de 5 dias para requerer a ratificação judicial, isto é,
para comunicar ao tribunal que houve embargo extrajudicial e para requerer que o tribunal
declare se, de facto, o embargo se deve manter ou não. Isto é, para que o tribunal declare
se concorda com a medida adotada ou não.
Assim:
➢ Se o tribunal decidir em sentido oposto, aquele que se encontrava a realizar a obra,
pode dar continuidade à obra.
➢ Já se o tribunal concluir que o particular efetuou bem o embargo, ratifica-o e,
portanto, a obra permanece suspensa, ou seja, o requerido não pode dar
continuidade à obra.

❖ Embargo judicial
Se o requerente optar por um embargo de obra nova judicial, ou seja, se lançar mão deste
procedimento cautelar junto do tribunal, tudo se passa nos termos gerais.
Ora, quando, nos procedimentos cautelares especificados não existem normas que
respondam a perguntas que relevem quanto a eles, aplicam-se subsidiariamente as regras
que valem quanto ao procedimento cautelar comum (artigo 376.º/1, 2.ª parte do CPC).
- Dá-se, então, o início do processamento, nos termos do artigo 365.º/1 do CPC,
com uma petição que oferece prova.
O artigo 365.º/3 CPC esclarece que aos é subsidiariamente aplicável aos
procedimentos cautelares o disposto nos artigos 293.º a 295.º.
- Ou seja, o requerente solicita ao tribunal a concessão da providência cautelar de
embargo de obra nova e o requerido será, em princípio, notificado para deduzir
oposição (exercer o contraditório). → Haverá também, em princípio audiência de
julgamento, sendo que o tribunal se pronuncia, depois, quanto à concessão ou não
da providencia cautelar.
- Se o tribunal decidir conceder a providencia cautelar requerida (com base nos
requisitos e nos termos baixo indicados), há também lugar à elaboração daquele
auto.
Para que o tribunal conceda o embargo ou o ratifique, tem de verificar se se encontram
ou não reunidos os requisitos para a concessão de uma providencia cautelar: fumus boni
juris e periculum in mora.
1. Fumus boni juris – o juiz tem de formar uma convicção, ainda que perfunctória
(superficial), quanto à existência do direito de propriedade invocado pelo
requerente.
2. Periculum in mora – o juiz tem ainda de verificar a existência de periculum in
mora, isto é, de que pode haver perigo na demora” da ação principal, isto é, de
que, no caso, há perigo de que, sendo a decisão da ação principal for proferida
num momento futuro, essa decisão já não ter efeito útil.
Quanto ao requisito da proporcionalidade (artigo 368.º/2 CPC), este vale apenas
quanto ao procedimento cautelar comum e não quanto aos procedimentos cautelares
específicos (artigo 376.º/1, 1.ª parte do CPC). Assim, para os procedimentos cautelares
especificados apenas valem os requisitos fumus boni juris e do periculum in mora.
No entanto, há alguns procedimentos cautelares especificados relativamente aos quais
vale um juízo de proporcionalidade próprio – é o caso do embargo de obra nova.
O tribunal pode conceder/ordenar o embargo da obra, porém, o requerido, depois de
embargada a obriga, pode fazer um pedido especial ao tribunal para que autorize a
continuação da obra – o requerido tem o ónus de requerer ao tribunal que autorize a
continuação da oba.
Ou seja, pode suceder que o requerido venha, então, solicitar a continuação da obra, com
base num dos seguintes fundamentos, previstos no artigo 402.º do CPC:
➔ Se o tribunal concluir que a demolição da obra restitui o embargante ao estado
anterior,
➔ Ou quando se apure que o prejuízo resultante da paralisação da obra é
consideravelmente superior ao prejuízo que pode advir da sua continuação → Ora,
é precisamente aqui que reside aquele juízo de proporcionalidade próprio.
Assim:
1. Se o juiz concluir que, ainda que a obra continue, se na ação principal se vier a
dar razão ao requerente, a obra pode ser demolida e essa demolição coloca o
requerente na situação em que se encontrava antes (não é perigoso permitir que a
obra continue, pois mesmo que ela continue, pois a situação do requerente pode
vir a ser restituída através da demolição da obra). É preciso que o juiz se convença
que o ato de continuação da obra, não prejudica o requerente, pois este, mais tarde,
pode ver a sua situação reconstituída através da demolição.
Se, se verificarem prejuízos para o requerente m com a demolição o legislador impõe que,
para que o juiz possa autorizar a continuação da obra, o requerido/embargado tem ainda
de prestar caução que cubra o valor da demolição total, para o caso de ela vir a ser
necessária (artigo 401.º/1.ª parte do CPC).
2. Se o juiz concluir que os prejuízos resultantes para o requerido da paralisação da
obra são consideravelmente superiores aos prejuízos que podem advir da sua
continuação para o requerente, então o juiz pode autorizar a continuação da
realização
Só será autorizada a continuação da obra, se o requerido prestar caução que cubra os
prejuízos que possam advir para o requerente com a continuação da obra (artigo 401.º/2.ª
parte CPC).
Caução – destina-se a salvaguardar a posição do requerente.
Incumprimento da providência cautelar
No caso de o embargo da obra ser concedido ou ratificado, sendo a obra
suspensa/embargada, e o requerido não cumprir a ordem contida na providência de
embargo, então é o beneficiário da providência que tem o ónus de comunicar o
incumprimento do ónus ao tribunal.
➔ O requerente tem de demonstrar que a obra efetivamente, através da comparação
da situação em que a obra se encontrava no momento em que o embargo foi
concedido e o momento em que o interessado – ora, esta comparação é possível
mediante o recurso ao auto que foi realizado (quer no âmbito do embargo judicial,
quer do embargo extrajudicial).
Assim, se se demonstrar que o embargado inovou indevidamente a obra, então o
tribunal irá ordenar a destruir a parte inovada, a que ele deu continuidade após ter sido
notificado para suspender as obras – artigo 402.º/1 do CPC.

Se, mesmo assim, o requerido não demolir voluntariamente aquilo que inovou, ou seja,
se mesmo assim o requerido continuar a não cumprir, será necessário recorrer a meios
coercitivos, ou seja, será necessário recorrer a uma ação de execução: neste caso, um
terceiro irá, por ordem do tribunal – que designa um terceiro para destruir as inovações
realizadas indevidamente na obra – artigo 402.º/2 CPC.

17.12.2020
CASO PRÁTICO

Dalila circulava no passado dia 3 de janeiro na A1, quando numa área territorial de
Coimbra um veículo que circulava á sua frente se despistou, vindo a embater no seu
veículo, nele causando danos que importam em não menos de 5 mil euros. O veículo
lesante era conduzido por Fernando, também seu proprietário. Dalila reside no Porto e
Fernando reside em Lisboa.

1- Identifique o tipo de ação declarativa adequada para tutela da posição jurídica de Dalila.
2- Identifique o tribunal competente para efeitos de conhecimento da presente ação.
3- Admitindo que a ação foi proposta por Dalila contra Fernando, pronuncie-se quanto á
regularidade da instância.

4- Admitindo que Fernando tem nacionalidade francesa, pronuncie-se quanto á


competência dos tribunais portugueses para conhecerem da identificada ação.

RESPOSTA:
1- Identifique o tipo de ação declarativa adequada para tutela da posição jurídica de Dalila.

Existem vários tipos de ações declarativas:


o De simples apreciação – não há a exigência de prestação de coisa.
o Condenatórias – há a exigência de prestação de uma coisa;
o Constitutivas – não há a exigência de prestação de uma coisa.
Sempre que haja a violação de um direito, a ação tem de ser condenatória?
Por exemplo, quando se intenta uma ação de simples apreciação não está em causa a
violação de um direito? Não existe perigo para algum direito? → A grande distinção
entre as ações declarativas, é que a exigência de prestação de coisa apenas consta das
ações declarativas condenatórias.
Neste caso concreto, trata-se de uma ação declarativa condenatória.

2- Identifique o tribunal competente para efeitos de conhecimento da presente ação.

Em que consistem os pressupostos processuais? Requisitos que tem de estar


previamente preenchidos para que o Tribunal possa conhecer do mérito da causa. Esta
característica é comum à personalidade e capacidade judiciárias, à legitimidade e à
competência. Quando analisamos a competência, o nosso objetivo último, de entre as
várias centenas de tribunais em Portugal, selecionar um só, aquele que será o tribunal
certo para decidir esta causa.
Existe um conjunto de passos que tem de ser tomados, de forma metódica, para resolver
este problema, dentro da competência interna:
► Competência em razão da matéria;
► Competência em razão do valor;
► Competência em razão da hierarquia;
► Competência em razão do território.
Devemos começar por qual?
É preferível começar pelo critério territorial.

COMPETÊNCIA EM RAZÃO DO TERRITÓRIO


Portugal está distribuído em várias células administrativas, mas também em várias
células judiciais – as Comarcas.
O território português encontra-se repartido em Comarcas.
É raro, um determinado caso não ter ligação com mais de uma Comarca. Ou seja, por
regra, uma mesma situação litigiosa, mantém conexão com mais do que uma Comarca.
Como iremos escolher a Comarca, que tenha o elo mais forte, aquela que tenha uma
ligação mais intensa com a relação jurídica?
Artigo 70º e ss. do CPC, “Competência em razão do território” – a resposta é nos dada
pelo Código de Processo Civil, nos artigos 70º e seguintes, que regulam a competência
territorial; são estes artigos que tem os critérios que permitem responder a qual comarca
relevante em cada caso.
Não existe um só critério, o elemento de conexão varia com o tipo de ação.
► Exemplo: Neste conjunto de normas, qual é o critério de conexão por exemplo, quando
esteja em causa uma ação de divórcio? Será o domicílio do autor, para este tipo de ações
temos um critério especial, o que releva é o domicílio do autor, mesmo que a relação
jurídica pode ter ligação com várias Comarcas. O que importa, de acordo com a lei, é o
elemento de conexão relacionado com o domicílio.
► Imaginemos por exemplo, que está em causa uma ação de execução específica -
exemplo: A celebra com B um contrato-promessa nos termos do qual A promete vender
a B um prédio de que é proprietário em Coimbra. No âmbito deste contrato-promessa, é
estabelecido entre as partes que, o contrato de compra e venda (contrato prometido)
deveria ser celebrado 2 meses depois. O promitente vendedor recusa-se a comparecer na
data marcada para a escritura. Verificadas certas circunstâncias, pode o promitente
comprador recorrer a tribunal, no seguinte sentido: de acordo com o contrato promessa,
o direito de propriedade deveria ser transferido de A para B, através da celebração do
contrato de compra e venda (contrato prometido), em que do cruzamento da declaração
de venda e a declaração de compra sopraria o efeito translativo. Não havendo declaração
de venda por parte do promitente vendedor, esse efeito não se verifica.
Nesta medida, na ação de execução específica, aquilo que o autor (o promitente
comprador) pede ao Tribunal, é que o Tribunal emita uma declaração, através da qual, se
produza o efeito que resultaria da declaração voluntária do promitente vendedor, é o
tribunal em substituição dele declara que o direito se transfere para a esfera do promitente
comprador (promitente comprador, no âmbito do contrato-promessa; comprador no
âmbito da transferência do direito de propriedade).
Não se trata de uma ação executiva, no verdadeiro sentido (não se trata de uma ação de
execução, mas sim numa ação declarativa), trata-se de uma ação declarativa, através da
qual o autor obtém aquilo que pretende através da mera declaração judicial, sendo que
esse efeito implica a alteração da sua esfera jurídica. Esta é uma ação declarativa
constitutiva, porque a esfera jurídica, isto é o efeito que o autor pretendia obter na sua
esfera jurídica, de alteração da mesma, de nela ingressar o direito de propriedade, opera
por mera declaração judicial, trata-se na verdade do exercício de um direito potestativo.
Neste tipo de ações, que tem com toda a probabilidade, ligação a mais do que um ponto
do território nacional, qual é o elo de conexão? Como selecionamos a comarca que
represente o elo mais forte? É o tribunal da situação dos bens, que consta do artigo 70º,
onde se encontra a execução específica. O legislador teve o cuidado de selecionar elos de
conexão específicos para determinados tipos de ações.
► Quando esteja em causa uma ação que não seja uma destas, há um critério geral, uma
espécie de cláusula de abrangência geral para as ações que não estejam reguladas
expressamente no CPC, com elos próprios – qual o critério geral de competência
territorial? Não será o artigo 71º, porque este está pensado para ações específicas. O artigo
70º vale para as ações que tenham por objeto bens.

➢ O critério geral consta dos artigos 80.º e 81.º do CPC – quando estejam em
causa pessoas singulares – Tribunal de Domicílio do Réu – quando estejam em
causa pessoas coletivas – Tribunal da Sede da pessoa coletiva.
Primeiramente, devemos verificar os critérios especiais, que são os que antecedem o
artigo 80º; caso não encontremos nenhum critério especial, aplicaremos o critério geral –
do artigo 80º (se estiver em causa uma pessoa singular) – o artigo 81º, caso esteja em
causa uma pessoa coletiva.

Neste caso prático


Temos de recorrer ao artigo 71.º do CPC que define o elemento de conexão relevante
em matéria de responsabilidade civil.
No âmbito da responsabilidade civil, há duas grandes categorias:
1) Responsabilidade civil contratual (decorre o dever de indemnizar na sequência
do não cumprimento de um contrato);

2) Responsabilidade civil extracontratual (dela decorre o dever de indemnizar


pelos danos provocados na sequência do não cumprimento de uma obrigação com
fonte não contratual).
IN CASU, estamos perante um caso de responsabilidade civil extracontratual, visto
que entre Dalila e Fernando não existia nenhuma relação contratual, o que existia era o
direito de propriedade de Dalila sobre o seu veículo automóvel (direito real que se impõe
erga omnes, impõe-se perante todos), e portanto, Fernando tinha o dever de respeitar esse
direito e não o ofender, dado que o direito de propriedade é um direito real, e estes são
direitos absolutos aos quais se contrapõem deveres gerais de abstenção.
Qual o elemento de conexão relevante, que o legislador escolhe? Não será o do artigo
71º/1, pois este está pensado para a responsabilidade civil contratual.
O que relevará será artigo 71.º/2 CPC, de acordo com o qual o tribunal competente será
o do lugar onde o facto gerador da responsabilidade civil extracontratual ocorreu, neste
caso, onde o embate ocorreu (facto gerador do dever de indemnizar é o embate), o facto
ocorreu em Coimbra → portanto será competente um Tribunal da Comarca de Coimbra.
Sabemos que municípios estão envolvidos nesta comarca, através da consulta do Anexo
II da LOSJ.
Como é que sabemos se uma determinada área do território pertence a uma determinada
Comarca? Teríamos que observar o anexo II da Lei n.º 62/2013 – para associar o
Município à Comarca a que diz respeito – sendo uma área territorial de Coimbra – e,
portanto direcionava-nos logo para Coimbra, apenas teríamos de identificar o artigo do
CPC onde se refere como elemento de conexão o local onde o facto ocorreu. Será
competente um Tribunal da Comarca de Coimbra, já sabemos os municípios que estão
envolvidos nesta Comarca. Existem vários Tribunais em Coimbra e apenas um deles
poderá resolver esta questão – com competência em Coimbra, para além dos tribunais de
primeira instância, temos 1 Tribunal da Relação e temos o Supremo Tribunal de Justiça,
que detém competência em todo o país, tem naturalmente competência em Coimbra.
IMPORTANTE: A resolução destas hipóteses práticas em que está em causa o
pressuposto processual da competência, implica que mobilizemos não só o Código de
Processo Civil, mas depois quando queremos saber qual é a Comarca, para saber quais os
municípios que a integram, devemos ter sempre presentes dois outros diplomas: Lei da
Organização do Sistema Judiciário (Lei nº62/2013 de 26/08) - anexo II -, e o Regime
da Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais (DL nº49/2014 de 27/03).

COMPETÊNCIA EM RAZÃO DA HIERARQUIA

Sob o ponto de vista hierárquico, na pirâmide judiciária, que Tribunais existem? Em 1


instância, os tribunais instalados na Comarca de Coimbra, em 2 instância o Tribunal da
Relação de Coimbra e por último, o Supremo Tribunal de Justiça.
Os tribunais da Relação, neste caso de Coimbra, e o Supremo Tribunal de Justiça, podem
receber ações, isto é, se só julgam em recurso ou se podem dar neles, entrada de ações.
Não julgam só em recurso, neles dão entrada em primeira instância ações, mas não tem
nada a ver com o valor da ação. Como sabemos que há ações que dão entrada na Relação
e no Supremo?
Ver a este propósito - Lei 62/2013 de 26/08 – artigo 73º e 55º (ações que devam dar
entrada no Supremo Tribunal de Justiça). Iremos chegar à conclusão de que como
primeira competência da relação, julgar recursos, e depois nas alíneas seguintes, conhecer
de ações que neles dão diretamente entrada, em primeira instância. A competência mais
frequente dos tribunais da relação será o julgamento de recursos.
Se não forem nenhumas ações que se integram no artigo 73.º/ b) e seguintes, e também
se não for nenhumas ações do artigo 55º, deverão dar entrada em primeira instância nos
termos do artigo 79º e 80º.
Assim: nos termos do artigo 79.º da LOSJ, os tribunais judiciais de primeira instância
são, em regra, os tribunais de comarca.
Só conhecerão questões em primeira instancia os tribunais superiores, quando esteja em
causa algum dos litígios previstos nos artigos 73.º e 55.º da LOSJ.
➢ E, portanto, in casu, trata-se de uma matéria que não é da competência em 1ª
instância dos Tribunais Superiores, verifica-se a regra maioritária de que, as ações
devem dar entrada em 1ª instância, logo do ponto de vista hierárquico, a ação
deveria dar entrada num Tribunal de 1ª instância da Comarca de Coimbra.
Já eliminámos várias Comarcas, mesmo dentro da Comarca de Coimbra, já eliminámos a
possibilidade de a ação dar entrada nos Tribunais Superiores, então agora teremos de
selecionar, dentro dos Tribunais de 1ª instância da Comarca de Coimbra, aquele que seria
competente, porque só pode dar entrada num Tribunal.
Agora precisamos de saber que Tribunais existem em Coimbra, onde podemos conhecer
a estrutura da Comarca de Coimbra (que não serão os mesmos, que os localizados no
Porto, em Lisboa ou em Braga, cada comarca tem um perfil próprio de Tribunais) – DL
nº49/2014 de 27 de março, no artigo 75.º/1do CPC refere-se â instância central, onde
existem várias secções; e o n.º 2 refere-se à instância local, onde existem também várias
secções.

No âmbito dos tribunais judiciais de 1.ª instância, em sede de competência em razão da


matéria. A ponderação a fazer respeita à existência de tribunais de competência
especializada (cuja competência é expressamente conferida por lei) e de tribunais de
competência genérica, que dispõem de competência residual – artigos 130.º e ss. LOSJ.

TRIBUNAIS DE COMPETÊNCIA ESPECIALIZADA compreendem:


► Juízos de competência especializada (artigo 81.º/3 LSOJ)
► Tribunais de competência territorial alargada (art. 83.º LSOJ)

- Juízos de competência especializada


Artigos 117.º a 130.º LOSJ.
► Juízos centrais cíveis
Competência para preparar e julgar as ações declarativas cíveis, cuja causa tenha valor
superior a 50.000€.
Competência para exercer, no âmbito das ações executivas de natureza cível de valor
superior a 50.000€, as competências previstas no CPC, em circunstâncias não abrangidas
pela competência de outro juízo ou tribunal.
► Juízos centrais criminais
► Juízos de Instrução criminal
► Juízos de família e menores
► Juízos de trabalho
► Juízos de comércio
► Juízos de Execução

- Tribunais de competência territorial alargada


A sua competência não é só atribuída em razão da matéria dos litígios, é também em razão
do território, porque eles têm competência na totalidade do território português (tirando
os tribunais marítimos e os de execução de penas).
1. Tribunal da propriedade intelectual - Artigo 111.º LOSJ
2. Tribunal da concorrência, regulação e supervisão – Artigo 112.º
3. Tribunal Marítimo – Artigo 113.º
4. Tribunal de execução de penas – Artigo 114.º
5. Tribunal Central de instrução criminal – Artigo 116.º (*este não nos interessa*).

Como distinguimos as ações que pertencem à instância local ou à instância central? É a


partir de um determinado valor, como se pode concluir, pela Lei nº62/2013 de 26-08,
onde consta a referência concreta ao valor, feita no artigo 117.º/1 LSOJ:
➔ Será da competência do juízo central cível as ações de valor superior a 50 mil
euros, pelo que, da conjugação entre o artigo 117.º, n.º 1, al. a), e o artigo 130.º,
n.º 1, será da competência do juízo local cível, precisamente as outras ações, cujo
valor seja igual ou inferior a 50.000€.
No nosso caso, a ação tinha valor inferior a 50 000 euros (era de 5 000 euros), entra no
âmbito dos juízos locais. Se voltarmos ao artigo 75. º/2 DL nº49/2014 veremos que no
Tribunal de Coimbra, existem várias secções da instância local: a secção que está prevista
na alínea c) – seria competente a secção de competência genérica, neste caso, em matéria
cível, que tem sede em Coimbra.

COMPETÊNCIA EM RAZÃO DO VALOR


Porque não havia aqui um problema de competência em razão da matéria, não se tratava
de uma matéria, por exemplo, de família e de menores, ou de direito do trabalho, que
conduzisse à competência de um Tribunal desse tipo.

3- Admitindo que a ação foi proposta por Dalila contra Fernando, pronuncie-se quanto
á regularidade da instância.

Personalidade judiciária – suscetibilidade de figurar como parte numa ação judicial.


Tem personalidade judiciária quem tem personalidade judiciária (já o contrário não é
sempre verdade). Assim, Dalila terá aqui personalidade judiciária, uma vez que também
tem personalidade jurídica (teve um nascimento completo e com vida), nos termos do
artigo 11.º do CPC.
Capacidade Judiciária – consiste na suscetibilidade de estar, por si só, em juízo. Ora,
tem capacidade judiciária quem tem capacidade de exercício de direitos (artigo 15.º/2
CPC). Uma vez que Dalila tem licença de condução, então Dalila será maior de idade,
pelo que terá capacidade de exercício de direitos e, portanto, terá capacidade judiciária.

Legitimidade processual – Têm legitimidade processual as partes da relação material


controvertida, tal como ela é configurada pelo autor. Ora, no caso, Dalila … min15. Pelo
que Dalila tem capacidade para figurar na ação como autora, nos termos do artigo 30.º/3
CPC.

Interesse processual – Este pressuposto processual tem uma característica especial, pois
não está mencionado no CPC. Existe interesse em agir (interesse processual) quando há
uma situação de carência de tutela jurídica. A falta deste pressuposto processual dá
igualmente lugar a uma exceção dilatória (artigo 577.º CPC onde diz “entre outras”). No
caso, pelas razões supramencionadas, é possível concluir que Dalila tem interesse
processual.

Patrocínio judiciário – consiste no apoio judiciário que é prestado, em tribunal, às partes


no processo. Há casos, expressamente previstos na lei, em que o patrocínio judiciário é
obrigatório, e outros em que é facultativo, não sendo, assim, pressuposto processual.
Exige-se, assim, nos casos previstos na lei o patrocínio judiciário, pois as partes devem
dispor de um conjunto de conhecimento jurídicos que lhes permitam atuar com lucidez,
clarividência e perfeito conhecimento das consequências dos atos que pratiquem. Assim,
a necessidade de domínio dos conhecimentos jurídicos é uma das razões deste
pressuposto processual enquanto tal.
Outra razão prende-se com o seguinte: mesmo que as partes fossem, todas elas, providas
de conhecimentos jurídicos, ainda assim teria utilidade a intervenção de um terceiro,
porque é bom que entre os litigantes, entre as partes em conflitos existam terceiros que
sirvam de “intermédio” /de mediadores entre as partes, de forma a criarem a serenidade
e a objetividade necessárias para o normal decurso do processo judicial.

Ora, o patrocínio judiciário apenas é obrigatório nos casos previstos e indicados no artigo
40.º/1 do CPC:
a) Nas causas de competência de tribunais com alçada, em que seja admissível
recurso ordinário.
Alçada – Valor até ao qual o tribunal decide sem admissibilidade de recurso.
Nos casos em que o valor da causa seja inferior à alçada do tribunal que profere a
sentença, então a decisão do juiz do tribunal em causa será a última decisão sobre o litígio
em causa, pois não há admissibilidade de mais recursos.
Se o valor da ação for até 5.000€, isso significa que o valor da ação não supera o valor da
alçada, pelo que, nesse caso, o patrocínio judiciário não é obrigatório.
Artigo 44.º/1 da Lei n.º 62/2013 (LOSJ).
c. Há casos em que a interposição de recurso é sempre obrigatório,
independentemente do valor da causa. – artigo 629.º/2 e 3 CPC.

d. Em sede de recurso, e nas causas que sejam propostas nos tribunais superiores, o
patrocínio judiciário é sempre obrigatório (artigo 40.º/1/al. c) CPC).

Assim, no presente caso prático é-nos dito que os danos decorridos do acidente não foram
inferiores a 5 mil euros, este é um conceito indeterminável passível de duas soluções,
conforme seja o caso em causa:
- O valor dos danos pode ter sido igual a 5.000€
- Ou foi de valor a 5.000€
➢ Se não tivesse excedido os 5.000€ → então o valor da causa não excede o valor
da alçada do tribunal → pelo que o patrocínio judiciário não seria obrigatório.

➢ Se excedesse os 5.000€ → já ultrapassaria o valor da alçada do tribunal de primeira


instância → e, portanto, o patrocínio judiciário já seria obrigatório e, portanto, tido
como pressuposto processual.
Caso se verificasse a falta deste pressuposto processual, o réu seria absolvido da
instância.

Já se fosse Fernando a não constituir advogado, sendo obrigatório, esclarece o artigo 41.º
do CPC que o juiz convidaria Fernando a constituir advogado. No entanto, na
circunstância de, mesmo assim, Fernando não constituir advogado, apesar de a
consequência regra da falta de pressuposto processual ser a absolvição do réu da instância,
a verdade é que, neste caso, a defesa ficaria sem efeito, pois se bastasse simplesmente
não constituir advogado para que fosse absolvido o réu da instância, então ele
simplesmente não constituiria advogado. Assim, a solução neste caso é que, mesmo que
o réu conteste, tudo se passa como se ele não contestasse – assim determina o artigo 41.º,
in fine CPC.

4- Admitindo que Fernando tem nacionalidade francesa, pronuncie-se quanto á


competência dos tribunais portugueses para conhecerem da identificada ação.

O facto de Fernando ser francês, cria aqui um nexo da relação material controvertida com
uma ordem jurídica estrangeira.
Quando uma relação jurídica só tem conexão com o território português, não haverá
qualquer dúvida de que será um tribunal português a julgar o litígio.
O problema da competência internacional surge quando entram em questão outros
Estados (países).
Assim, sendo Fernando Francês, põe-se um problema de competência internacional, de
saber se não terão aqui também os tribunais judiciais franceses competência para
conhecer desta questão ou se serão competentes os tribunais portugueses. Põe-se,
portanto, um problema de competência internacional.
Nestes casos, há que mobilizar:
• Regulamento europeu (no caso de ser aplicável ao caso)
• Artigo 59.º CPC
• Artigo 62.º CPC (é o mais relevante)
• Artigo 63.º CPC

Só lançamos mão dos artigos 62.º e 63.º se na situação jurídica em causa não for
convocável uma norma de fonte não interna, como sucede com os regulamentos europeus,
pelo que o CPC é, a este nível, uma fonte subsidiária.

Âmbito de aplicação do Regulamento (UE) n.º 1215/2012

Ao nível objetivo, o regulamento apenas é aplicável em matéria cível e comercial. E


mesmo no âmbito civil e comercial, e mesmo assim, só se aplica a matérias que não as
que constam do artigo 1.º/2 do CPC.

Organização do regulamento
Artigos 4.º a 6.º → critérios gerais de atribuição de competência.
o Artigo 5.º → as pessoas domiciliadas num Estado-Membro só podem ser
demandadas nos tribunais de outro estado-membro nos termos das regras
enunciadas nas secções 2 a 7 do presente capítulo.
Em regra: serão competentes os tribunais do lugar do domicílio do réu.
Regras especiais relativas à competência (artigos 7.º e ss. do Regulamento).
No nosso caso, Fernando, apesar de ser francês, está domiciliado em Portugal, não
estando, portanto, em causa nenhum Estado que não pertença à União Europeia. →
Aplica-se, assim, o Regulamento (UE) n.º 1215/2012.
Assim, de acordo com a regra geral do artigo 4.º, de acordo com o domicílio do réu,
competentes, seriam aqui os tribunais portugueses.
Regra especial aqui aplicável – artigo 7.º/2 do Regulamento, porque se trata de uma
ação em que está em causa matéria extracontratual.
Assim, de acordo com este artigo o ordenamento jurídico competente para julgar a causa
seria o português porque o facto danoso ocorreu em Portugal (o acidente em causa
ocorreu em Portugal).
Quando existe um problema de competência internacional, a resposta só nos permite
concluir se os tribunais portugueses são competentes ou não. Concluindo ser competente
um tribunal português, há que apurar a competência interna, em razão da hierarquia, da
matéria, do território e do valor e forma da causa.
➢ Conclui-se assim ser competentes para conhecer da causa, os tribunais
portugueses – têm aqui jurisdição os tribunais portugueses.

4. E se Fernando fosse Brasileiro?

Neste caso, já não estaria em causa um Estado membro da União Europeia, porque o réu
já não residiria num Estado da União Europeia.
Ora, não sendo aplicável o regulamento europeu, aplica-se a fonte normativa subsidiária,
ou seja, o artigo 62.º do CPC (por força do que determina o artigo 59.º do CPC).
• Alínea a) – Princípio da coincidência
• Alínea b) – Princípio da causalidade
• Alínea c) – Princípio da necessidade

In casu, aplica-se o artigo 62.º/alínea b), isto é, lançar-se-ia mão do princípio da


necessidade, porque o facto danoso se verificou em Portugal.
É, no entanto, de sublinhar que só ocorreria esta hipótese caso o réu não tivesse domicílio
num Estado-membro.

5. Poderiam as partes (Dalila e Fernando) celebrar contrato no sentido de


alterarem as regras de determinação da competência internacional e da
competência interna, criando os seus próprios critérios de competência?

No que respeita à competência interna:

Nos termos do artigo 95.º CPC as partes podem, de facto, convencionar as regras da
competência interna apenas em certos casos e de acordo com determinados critérios – são
os chamados pactos de competência. Assim, não se pode afastar, por vontade das partes,
as regras de competência relativas à:

 Competência em razão da matéria


 Competência em razão da hierarquia
 Competência do valor da causa
Mas já lhes é permitido afastar, através de convenção expressa entre as partes:

✓ As regras de competência em razão do território (exceto nos casos a que se


refere o artigo 104.º CPC).
Mas mesmo nos casos em que é admissível que as partes afastem as regras da
competência, há certos requisitos previstos no artigo 95.º/2 do CPC que têm de verificar-
se:
- O acordo tem de ser reduzido a escrito e deve satisfazer os requisitos de forma do
contrato;
- Deve o acordo designar as questões a que se refere;
- Deve determinar o critério de definição do tribunal competente.

No que respeita à competência internacional:


► Relativamente à competência internacional, o artigo 94.º CPC vem regular os
chamados pactos de jurisdição (podem ser atributivos ou privativos de jurisdição)
através dos quais as partes alteram as regras de competência internacional, quando essas
regras sejam as normas do CPC. Ou seja, quando um problema de competência
internacional deva ser resolvido de acordo com as regras do CPC, as partes só podem
afastar essas regras nos termos previstos no artigo 94.º/3 CPC – o qual prevê um conjunto
de requisitos cumulativos.

► Nos casos em que estejam em causa normas do Regulamento 1215/2012 aplica-se o


disposto do artigo 25.º do mesmo, que estabelece os requisitos que têm de verificar-se
para que o pacto de jurisdição seja válido.

6. Suponha, finalmente, que Dalila havia intentado a ação em tribunal


incompetente. Explicite as consequências dessa circunstância
considerando os vários tipos de incompetência admissíveis.

Há dois tipos de incompetência:

➔ Incompetência absoluta (artigo 96.º/ a) do CPC):


o Incompetência em razão da matéria
o Incompetência internacional
o Incompetência em razão da hierarquia

➔ Incompetência relativa (por exclusão de partes):


o Incompetência em razão do território
o Incompetência em razão do valor da causa e da forma do processo

Caso em que haja lugar a violação de um pacto de competência ou de um pacto de


jurisdição – trata-se de um caso de incompetência relativa nos termos do artigo 102.º
do CPC.
Dado que as normas de competência que estão envolvidas na competência absoluta são
normas que tutelam bens jurídicos mais intensos do que aquelas que estão previstas na
incompetência relativa, faz com que as consequências sejam também mais graves quando
a incompetência seja absoluta. Podemos retirar esta conclusão dos seguintes preceitos
legais:
► Incompetência absoluta, em princípio, é conhecida oficiosamente pelo tribunal, ou
seja, mesmo que o réu não a invoque o tribunal pode dela conhecer (a este propósito:
artigo 97.º CPC).
➢ EFEITO:
O efeito da incompetência absoluta é, nos termos do artigo 99.º/1 do CPC: a
absolvição do réu da instância ou o indeferimento em despacho liminar, quando
o processo o comportar.

► Já no âmbito da incompetência relativa a regra é a da necessidade de invocação pela


parte (artigo 103.º CPC).
➢ EFEITO:
Quanto à incompetência relativa a consequência é a remessa para o tribunal
competente, nos termos do artigo 105.º/3 CPC.

7. E se, Fernando tivesse embatido não apenas em Dalila, mas também no


automóvel de Gabriela. Poderiam estas, em conjunto, intentar uma ação
declarativa condenatória contra Fernando, requerendo a condenação dele
no pagamento dos danos provocados pelo embate?

Surge aqui um problema de legitimidade ativa, de saber se Dalila e Gabriela podem,


conjuntamente, intentar uma mesma ação contra Fernando.
Poderão conjugar na mesma ação o pedido de ambas, visto que o lesante foi o mesmo e
no âmbito do mesmo acidente de viação.
Trata-se aqui de um problema de coligação (e não de litisconsórcio) que está regulado
artigos 36.º a 38.º do CPC.
Neste caso, estamos perante uma hipótese em que a causa de pedir é a mesma, e em que
a procedência dos pedidos depende essencialmente da apreciação dos mesmos factos,
pelo que, verificando-se esse pressuposto no presente caso e não se verificando nenhum
dos obstáculos contemplados no artigo 37.º do CPC, a coligação seria admissível.
CASO PRÁTICO

«Eva, celebrou com Fernando um contrato de compra e venda de equipamento


sonoro destinado a ser instalado no escritório de Fernando, tendo as partes fixado
como valor correspondente ao preço o montante de 15.000€.
Ambas as partes residem em Coimbra, o contrato foi celebrado em Coimbra,
sendo esse também o local do cumprimento do contrato.
Fernando, porém, não procedeu ainda ao pagamento do preço, não obstante ter
sido fixada como data limite para a entrega do valor em causa o dia 27 de Fevereiro
do ano passado.
1. Admita que é advogada de Eva (vendedora). Identifique a forma de reação
que lhe parece processualmente adequada para tutela da posição jurídica
da sua constituinte, bem como o ente competente para proferir decisão.
2. Poderiam, em alternativa, as partes recorrer à arbitragem? Justifique.»

RESPOSTA:

1. FORMA PROCESSUAL ADEQUADA


Está em causa um contrato de compra e venda de bens móveis, não tendo sido efetuado o
pagamento do preço convencionado entre as partes.
Ação declarativa condenatória – artigo 10.º/ 3/ al. b) CPC
Visto que esta é o meio adequado à obtenção da condenação de Fernando ao pagamento
do preço devido, que tinha sido convencionado entre as partes. Digo isto, pois a ação
declarativa condenatória é aquela que visa «exigir a prestação de uma coisa ou de um
facto, pressupondo ou prevendo a violação de um direito». Ou seja, tem por fim exigir a
prestação de uma coisa ou dum facto, no pressuposto de estar a ser violado ou ser iminente
a violação de um direito, no caso, Eva pretende, desde logo, que o tribunal declare o facto
de ela ser titular de um direito de crédito de que é devedor Fernando.
Assim, o autor (Eva) arroga-se na titularidade de um direito – in casu, de um direito de
crédito – que afirma estar a ser violado, e pretende não apenas que o órgão judiciário
declare a existência ou ameaça dessa violação, mas também que condene o réu
(Fernando), neste caso concreto, ao pagamento de quantia certa – que é o preço devido
(15.000€) pela compra daquele equipamento sonoro.

ENTE COMPETENTE PARA DECIDIR


A autodefesa é proibida pelo artigo 1.º do CP, pelo que a via alternativa à autodefesa, de
que as partes devem lançar mão é a via jurisdicional, isto é, que a decisão do conflito
seja tomada por alguém que, assumindo a qualidade de terceiro imparcial e independente,
a quem o Estado confere poderes decisório, em termos vinculativos e definitivos.

DENTRO DA VIA JURISDICIONAL (tribunais), há uma subdivisão entre:

Tribunais Estaduais
- Tribunais Judiciais
- Julgados de Paz

Tribunais Privados
Que são os Tribunais arbitrais – são constituídos por pessoas que não são juízes
estaduais.
Mas a Constituição e o legislador ordinário reconhece aos tribunais arbitrais o poder de
julgar em termos praticamente iguais aos tribunais estaduais.

JULGADOS DE PAZ
Lei 78/2001, de 13 de junho

Especificidades dos julgados de paz


Características do juiz decisor

O juiz dos tribunais judiciais é um juiz selecionado/recrutado através de um concurso


público, no âmbito do CEJ.
Diferentemente sucede com os juízes de paz que são recrutados no âmbito de um concurso
diferente, que não passa pelo CEJ.
Requisitos para o recrutamento dos juízes de paz (artigos 23.º e 24.º LJP):
✓ Tem de ter nacionalidade portuguesa
✓ Tem de ter idade superior a 30 anos
✓ Tem de ser licenciado em direito.
✓ Não pode exercer qualquer outra atividade (de natureza pública ou publica).
✓ Não pode ter sido condenado nem estar indiciado da prática de crime doloso.

Âmbito de competência
Âmbito de competência dos julgados de paz é delimitado quer do ponto de vista objetivo,
quer do ponto de vista quantitativo, visto que os julgados de paz conhecem apenas de
alguns domínios do direito e não de todos – artigo 9.º/1 Lei.
Mesmo dentro conjunto limitado de matérias, o julgado de paz só pode conhecer da ação
se ela tiver um valor que não ultrapasse os 15.000€ - artigo 8.º Lei.

Estas limitações, em razão da matéria e do valor, são cumulativas. Ou seja, para sabermos
se um determinado conflito pode ou não ser julgado por um Julgado de Paz temos de
verificar se se cumprem os dois requisitos em simultâneo.

TRAMITAÇÃO

É outra especificidade dos julgados de paz, desde logo, porque esta tramitação obedece a
regras muito próprias que vão no sentido da maior simplicidade e celeridade do processo
a observar.

► Estes tribunais são, desde logo, concebidos e orientados por princípios de simplicidade,
adequação, informalidade, oralidade e absoluta economia processual.
Ora, os princípios enunciados de forma geral no artigo 2.º/2 da LJP encontram
concretização na tramitação processual regulada nos artigos 41.º e ss.
No que respeita ao artigo 43.º da LJP que regula o início do processo, através da
apresentação de um requerimento, no n.º 2 deste artigo prevê-se que o requerimento possa
ser apresentado verbalmente ou por escrito. → Já nos tribunais judiciais o requerimento
tem SEMPRE de ser apresentado por escrito.
► Não é admitida a citação edital (o que não sucede, em regra, nos tribunais judiciais) –
artigo 46.º/2 LJP.
► Não é admitida reconvenção (que é uma forma de contestação).
► MEDIAÇÃO – Posteriormente à contestação do réu, abre-se aqui um período através
do qual se pretende obter um acordo das partes – pretende-se que as partes sejam
colocadas num contexto que lhes permita adotar uma solução consensual para evitar que
o conflito seja resolvido por um juiz de paz – isto acontece através do chamado “processo
de mediação”.
Note-se, porém, que as partes não são obrigadas a adotar o processo de mediação.
Artigo 31.º - Requisitos para que se possa ser mediador de paz (são menos exigentes do
que para se ser juiz de paz).

PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
Artigos 10.º a 14.º → Regras de competência territorial

Se as partes chegarem a acordo, esse acordo vai ser reduzido a forma escrita, assinado
por todos os intervenientes e será submetido a homologação pelo juiz de paz → uma vez
homologada a decisão, esta passa a ter o valor de sentença.
Caso as partes não cheguem a acordo, ou só cheguem a acordo parcialmente, então o
conflito não ficou resolvido ou não ficou totalmente resolvido – pelo que o mediador vai
comunicar essa frustração da tentativa de acordo ao juiz de paz, que marcará audiência
para julgamento, a realizar-se no prazo máximo de 10 dias (celeridade e economia
processual).
Artigo 57.º e ss. → Regulam o julgamento.
3 objetivos fundamentais da audiência de julgamento:
1. Audição das partes
2. Obtenção de provas (artigo 59.º)
3. Prolação da sentença
► As partes não podem ter mais do que 5 testemunhas, enquanto que nos tribunais
judiciais a regra é das 10 testemunhas.
► A realização da prova pericial atrasa muito a realização do processo, e, como este é
um processo especialmente célere, se o juiz de paz entender que a prova pericial é
realmente pertinente, manda remeter os autos para o tribunal judicial. E só depois de
produzida a prova é que os autos voltam a ser remetidos para o Julgado de paz para a
realização do julgamento – artigo 59.º/3 da Lei.

►A sentença é proferida na própria audiência, o que, por regra, não sucede no âmbito
dos tribunais judiciais, que é decidida depois da audiência de julgamento e notificada às
partes.

IN CASU
• No que diz respeito à matéria trata-se de matéria prevista no artigo 9.º/1/al. i) da
LJP.
• Quanto ao valor, a ação não ultrapassa os 15.000€.
Como se verificam cumulativamente os requisitos relativos à competência em razão da
matéria e quanto ao valor, podemos concluir que estamos perante uma ação de
competência do Julgado de Paz de Coimbra, visto que toda a relação contratual tem
conexão com Coimbra.
Porém, Eva pode querer intentar a ação num tribunal judicial de Coimbra e não num
Julgado de Paz. Será obrigatório intentar esta ação num Julgado de Paz? – Ac. 11/2007
STJ, publicado no DR n.º 142/2007, na 1.ª séria (25 de Julho de 2007) → decidiu que a
competência dos julgados de paz não é obrigatória, mas antes meramente
alternativa/facultativa.
Portanto, Eva, seguindo o entendimento ditado por este acórdão, tem aqui a possibilidade
de escolher entre um Tribunal de Judicial ou um Julgado de Paz.
Dr. Remédio Marques – entende que os Julgados de paz foram criados com o objetivo
de aliviar a carga dos tribunais judiciais. Ora, se é dada a parte a possibilidade de escolher,
então a parte fica com o poder de afastar aquele que é o objetivo da criação deste tipo de
tribunais.

2. PODEM AS PARTES RECORRER À ARBITRAGEM ?


Os tribunais arbitrais são tribunais privados.

COMPETÊNCIA
No que diz respeito à competência não há qualquer limite de valor. Mas só podem decidas,
no âmbito da arbitragem, questões/litígios respeitantes a interesses de natureza
patrimonial (os interesses têm natureza patrimonial quando as partes possam celebrar
transação sobre o direito controvertido, isto é, quando possam chegar a acordo quanto a
essa matéria) – artigo 1.º/ 1 e 2da Lei da Arbitragem Voluntário.
No entanto, isto não basta, sendo ainda necessário que as partes tenham chegado a acordo
quanto a essa forma de resolução do conflito – acordo este que toma a designação de
«Convenção de Arbitragem».
Convenção de arbitragem –é um negócio jurídico processual celebrado entre as partes,
que pode assumir uma de duas formas:
• Compromisso arbitral – o compromisso arbitral é um negócio jurídico que surge
depois do conflito surgir, ou seja, há um compromisso arbitral quando já existe
um litígio. – artigo 1.º/3 da LAV

• Cláusula compromissória – é anterior ao surgimento do conflito (é uma


cláusula de salvaguarda) – assim, para a hipótese eventual de surgir um conflito,
as partes deixam desde logo determinado que a entidade competente para decidir
será um tribunal arbitral.

TRAMITAÇÃO
Independentemente de a competência do tribunal arbitral surgir de um acordo ou de outro,
a tramitação processual no âmbito dos tribunais arbitrais obedece a regras diferentes dos
tribunais judiciais, porque nestes as regras de tramitação processual já estão determinadas
legalmente, podendo, porém, o juiz, em alguns casos, ao abrigo do princípio da gestão
processual e da adequação formal, proceder a uma adaptação da tramitação ou até criar
uma tramitação nova se assim achar adequado.
► Já no âmbito da arbitragem, podem ser as partes a criar uma tramitação processual
própria, dentro de certos limites (não são absolutamente livres de o fazer): há que
assegurar o núcleo essencial previsto no artigo 30.º/1 da LAV.
Conjunto de regras fixada a título supletivo, para a hipótese de as partes não fixarem elas
mesmas a tramitação do processo – artigo 34.º/1 LAV (por exemplo).

►A decisão do tribunal arbitral tem a mesma força vinculativa de uma decisão de um


tribunal judicial.
► No que diz respeito à possibilidade de recurso: supletivamente não há lugar a recurso.
Ou seja, só haverá lugar a recurso da decisão do tribunal arbitral quando as partes hajam
convencionado nesse sentido – artigo 59.º/1/al. e) + artigo 39.º/4 LAV.
Artigo 42.º/7 LAV → Se não houver recurso esta sentença tem o mesmo carater
obrigatório que a sentença de um tribunal estadual transitada em julgado e a mesma força
executiva que a sentença de um tribunal estadual.
No que diz respeito aos critérios de decisão, por regra, os árbitros julgam segundo o
direito vigente. PORÉM, as partes podem, por acordo (na convenção de arbitragem),
determinar que os árbitros julguem segundo a equidade. → Se assim determinarem,
depois já não podem convencionar que é admissível recurso – Artigo 39.º/1 e 4 LAV.

IN CASU
Para que possa haver recurso à arbitragem é necessário:
o Tem de estar em causa um interesse patrimonial – no caso, este requisito está
cumprido.
o Para além disso, as partes têm de ter chegado a um acordo quanto à entidade que
vai decidir o conflito, ou seja, têm de ter acordado que o ente competente para a
resolução do litígio será um tribunal arbitral.
- Esse acordo pode constar do próprio contrato de compra e venda celebrado entre
Eva e Fernando, através de uma cláusula compromissória reduzida a escrito (nos
termos amplos que a lei da arbitragem voluntária permite).
- Ou, ainda que não tivessem incluído essa clausula no contrato de compra e venda,
depois de ter surgido o conflito, se as partes acordassem que os litígios deveria ser
resolvido nos tribunais arbitrais e não nos tribunais judiciais, então celebrariam um
compromisso arbitral.

► A LAV é muito generosa no que diz respeito à observância de forma escrita da


convenção arbitral, pois prevê-se que a convenção deve adotar a forma escrita, porém o
legislador considera que se observa de forma escrita mesmo quando está em causa a troca
de cartas, meios de telecomunicação em que fique prova escrita, etc. Ou seja, a forma
escrita é aqui admitida de uma forma muito ampla - Artigo 2.º/1 da LAV.

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