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LUA DE LÓTUS

JANICE KAISER
"Lotus Moon"

Os deuses marcaram para sempre a vida de um homem e uma mulher.

Uma névoa de mistério envolvia o passado de Buck Michaels. E isso deixava


Amanda mais fascinada ainda por aquele homem que tinha uma obsessão na vida:
encontrar a filha desconhecida que tivera de sua amante, na Tailândia, durante a
Guerra do Vietnã.
Amanda sabia que a sua felicidade dependia do aparecimento de Lua de Lotus,
uma garota de treze anos, filha de Buck e Dameree, uma linda asiática, delicada como
uma flor. Nas noites perfumadas de Bancoc, uma dúvida assaltava o coração de
Amanda: Buck ainda amava Dameree?

Digitalização: Tinna
Revisão: Jaque
Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

Título original: "Lotus Moon"

Copyright: © by Janice Kaiser

Publicado originalmente em 1986 pela Harlequin Books, Toronto, Canadá.

Tradução: Maria Cristina F. da Silva

Copyright para a língua portuguesa:


1986 Editora Nova Cultural Ltda. — São Paulo — Caixa Postal 2372

Esta obra foi composta na Artestilo Compositora Gráfica Ltda. e impressa na


Companhia Lithographica Ypiranga

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

CAPÍTULO I

Era uma segunda-feira, e Buck Michaels estava fazendo algo que não fazia há pelo
menos seis anos: estava tirando um dia de folga. Recostando-se na espreguiçadeira no
convés de seu veleiro, ele fechou os olhos de um azul-claro e brilhante e procurou relaxar
ao som da água que batia no casco do barco. Se Kelly Wallace não houvesse ligado do
escritório avisando-o da chegada de um telex de Bangcoc, Tailândia, já teria se posto ao
mar há um bom tempo. Em vez disso, contudo, encontrava-se ancorado no seu
embarcadouro, esperando ao sol, tentando aproveitar a carícia da brisa leve que soprava
em Newport Bay.
Bangcoc. O telex tinha que ser de Kupnol Sustri. Vários meses, já haviam se
passado desde que Buck enviara o dinheiro a Sustri, e o telex tinha que ser o relatório
encomendado ao agente oriental — sem dúvida um relatório repleto de informações que
terminavam num beco sem saída, cheio de desculpas. E tudo por causa de uma mulher...
Buck soltou um suspiro de frustração ao lembrar-se das abafadas e mormacentas
noites carregadas de perfumes do Oriente, do rio. Tudo acontecera muito tempo atrás,
mas ele começara a pensar de novo sobre o assunto no decorrer do último ano. A mulher,
a criança desconhecida, Bangcoc. Estava se tornando um sentimental, e tinha
consciência disso.
— Olá, Buck! — gritou de repente uma voz feminina vinda de alguma distância.
Ele virou-se em direção a casa, mas não avistou ninguém no embarcadouro ou no
gramado que se estendia até a beira da água.
— luuu-huuuu! Buck!
Desta vez, conseguiu localizar a origem do chamado. Vinha da praia, à esquerda.
Levantou um pouco o corpo e viu Helene Daniels deitada ao sol, usando o biquíni
favorito, minúsculo, acenando para ele.
— Oi, Helene. Como vai?
— Bem, obrigada. Mas a pergunta é "como vai você"? Eu nunca o vi em casa num
dia de trabalho.
— Estou apenas tirando uma folguinha.
— Pensei que o editor e jornalista responsável pelo Tribune jamais tirasse folga.
Afinal, comentam por aí que o jornal não funciona sem você!
— Ora, quem lhe disse isso?
— Bernie, claro. Quem mais poderia ser?
Bernard Daniels, vizinho de Buck, além de bom amigo era também membro do
quadro de diretores do Tribune. Infelizmente, Helene era uma pedra no sapato no que
se referia à amizade entre os dois homens. Desde que Buck se divorciara, há seis anos,
a mulher não perdia uma única oportunidade de paquerá-lo. Buck procurava ignorá-la

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ao máximo — sem, contudo parecer grosseiro —, mas nem isso a fazia desistir do
desagradável flerte. A tática preferida de Helene consistia em ir tomar sol no jardim,
usando biquínis provocantes, sempre que via seu atraente vizinho no gramado ou
mexendo no barco. E quando Bernie saía da cidade, ela se mostrava ainda mais ousada
em suas tentativas de sedução.
Buck observou-a com discrição, pensando no esforço que ela devia fazer para
conservar um corpo bonito assim aos quarenta anos. Helene se deitara de bruços,
expondo suas curvas firmes e exuberantes e, a julgar pelo modo como encarava seu
vizinho, percebia-se que seu marido estava ausente de casa.
Enquanto Helene Daniels se pavoneava, Buck fechou os olhos e, forçando seus
pensamentos a se desligarem de assuntos tipo mulheres e trabalho, tentou concentrar-
se apenas no calor gostoso do sol sobre o seu corpo bronzeado. Sua mente deixou-se levar
pelo grito das gaivotas e pelo cheiro do mar. Depois de alguns minutos, relaxou e
começou a cochilar.
— Ei, Buck!
Ligeiramente irritado, ele levantou a cabeça e olhou para a insistente Helene,
perguntando:
— Sim, o que você quer?
— Vai jantar sozinho esta noite?
— Por quê?
— Bem, eu me esqueci de que Bernie estava viajando e tirei comida demais do
freezer. Talvez você pudesse me acompanhar num jantar a dois, para eu não ter que
desperdiçar um delicioso filé ao molho madeira.
— Obrigado, eu gostaria muito. Mas já tenho um compromisso para logo mais à
noite — respondeu ele, mentindo.
— Oh, que pena... O convite fica para outra ocasião, então.
— É, acho melhor. De qualquer modo, mais uma vez obrigado por ter se lembrado
de mim.
Helene deu um sorriso sem graça, acenou e virou-lhe as costas.
Buck examinou-a com uma certa tristeza. Sua vizinha sempre o fazia recordar-se
de Carolyn, embora as duas não fossem nem um pouco parecidas. Sua ex-esposa era a
típica mulher de Beverly Hills, uma beldade que usava óculos de sol e vestidos de Unho
branco como uma armadura elegante. Tudo o que haviam tido em comum em seus anos
de casamento fora o dinheiro e o mesmo meio social. E agora Carolyn tinha metade do
dinheiro, incluindo a casa no bairro mais chique de Los Angeles.
Cerrando os olhos pela terceira vez, ele tentou retornar ao estado de relaxamento
em que se encontrava antes de ser incomodado por Helene. Estava quase cochilando de
novo quando ouviu passos sobre o embarcadouro de madeira. Virou-se e viu sua
secretária, Kelly Wallace — uma mulher jovem e inteligente, de cabelos castanhos e
corpo esbelto — atravessando a prancha de embarque. Surpreendeu-se ao notar que ela
carregava uma bandeja com uma garrafa de cerveja e um copo, os lábios curvados num
sorriso irônico.
— E imaginar que certas secretárias reclamam de ter que servir café aos seus
chefes! — argumentou Kelly, brincando. — Na época do próximo aumento de salário,
lembre-se de que fui eu quem precisou dirigir de Los Angeles até aqui para servir-lhe
uma bebida gelada no barco.

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— O que aconteceu com Luísa? — indagou Buck, rindo, referindo-se à sua


governanta.
— Está lá dentro, limpando a cozinha. Como eu vinha mesmo para cá, ofereci-me
para trazer a sua cerveja.
— Só a cerveja? E quanto ao...
— Ao telex? Calma, aqui está ele. Tome.
— Obrigado. Por que não se acomoda enquanto eu leio e verifico se necessita de
alguma resposta?
Aceitando a sugestão, Kelly sentou-se numa segunda espreguiçadeira. Buck abriu
o envelope que continha o telex transmitido através do centro de comunicações do jornal;
como suspeitara, o remetente era Kupnol Sustri. Sustri fora seu tradutor, secretário e
gerente de escritório durante os anos em que trabalhara como correspondente do
Tribune no Sudeste da Ásia, na época da guerra do Vietnã.
"Tenho feito muitas pesquisas sobre Dameree. Nenhum sucesso ainda. Acredito
que ela esteja morta ou tenha saído de Bangcoc. Impossível que esteja na cidade e eu
não a tenha encontrado. Gastei os quinhentos dólares que recebi para procurá-la. A
maior parte do dinheiro usei para subornar pessoas que pudessem ter alguma
informação valiosa sobre o caso. Posso continuar as buscas se necessário, mas não tenho
grande esperança de achar Dameree.
"O mesmo vale para a criança, que deve estar já bem grande. A menina poderia
estar vagando pelas ruas, vendida para alguma família ou coisa pior. Mas não se
desespere. Através do irmão da primeira família de Dameree, descobri que a criança
esteve num daqueles orfanatos que envia bebês tailandeses para os Estados Unidos. Fui
até o orfanato, mas nem subornos conseguiram boas informações. O administrador diz
que meu cliente americano deve falar com a responsável pela agência americana do
orfanato em Los Angeles, Califórnia. A responsável é uma senhora chamada Amanda
Parr. Você a conhece? Ela já tem muitos bebês na América. Se você tiver sorte, á filha de
Dameree está aí, nos Estados Unidos.

Parecendo esquecido da presença de Kelly Wallace a seu lado, Buck Michaels ficou
por um longo tempo encarando o telex, um ordinário pedaço de papel saído de uma das
impessoais máquinas no prédio do Tribune. Mas, apesar da imparcial natureza do meio
de comunicação, a mente e a perícia de Kupnol Sustri estavam claramente em evidência.
Buck dirigiu seu olhar para as águas que cercavam sua casa em Balboa Island, mas as
notícias de Sustri haviam levado seus pensamentos de volta a Bangcoc.
Três meses antes, Buck fora ao Japão e à China para cobrir a visita oficial que o
presidente dos Estados Unidos fizera aos dois países. No final da viagem, que durara
uma semana, aproveitara a chance para deslocar-se até Bangcoc, procurando encontrar
Dameree e a criança — embora já houvessem passado doze anos desde que perdera o
rastro das duas. Não demorou muito para perceber que as pistas sobre a mulher eram
ainda mais frágeis e insignificantes do que esperara, e a experiência apenas serviu para
aumentar a frustração que sentia a respeito do desaparecimento delas.
Buck dera um jeito de encontrar Sustri, que montara um escritório de consultoria
para auxiliar japoneses e americanos que possuíam negócios na Tailândia. O oriental,
como o seu ex-chefe, subira consideravelmente na vida, mas mesmo assim se mostrara
disposto a prestar um "favor" por quinhentos dólares e tentar localizar Dameree.

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Voltando a olhar para o telex em suas--mãos, Buck procurou ler nas entrelinhas da
mensagem. Sustri não era do tipo que recusava comissões, mesmo que isso significasse
criar falsas esperanças. Outros quinhentos dólares seriam aceitos com grande alegria, e
sem dúvida alguns esforços seriam despendidos para justificar o recebimento do
dinheiro; mas Buck pressentiu que o pessimismo do tailandês era uma tentativa sincera
de desencorajá-lo a insistir na busca.
Lendo de novo o telex, ele começou a imaginar se o desencoraja mento implícito nas
informações refletidas não seriam uma espécie de fraude. Sabia que Sustri seria capaz
de aceitar dinheiro do lado "perseguido" para relatar um resultado negativo das buscas.
Talvez o oriental tivesse encontrado Dameree, e ela — ou algum protetor — o tivesse
pago para esconder o fato. Doze anos antes Buck pedira a Sustri que o ajudasse a
procurar a mulher. A fraude poderia ter tido início desde aquela época.
Buck Michaels esfregou o queixo com as costas da mão e seguiu com o olhar um
avião que se afastava em direção a oeste, sobre o Pacífico. "É estranho", pensou ele, "o
quanto uma pessoa pode se deixar levar pelo espírito oriental de intriga apenas
permitindo que os próprios pensamentos se voltem para o passado..." Seus anos no
Sudeste asiático haviam sido cheios não só de intriga mas de muitos perigos também.
Tal associação o fascinava.
Tornou a reler o último parágrafo do telex e percebeu que Sustri se mostrava bem
mais otimista em relação à menina, embora a pista sugerida estivesse nos Estados
Unidos, e não na Tailândia. Três possibilidades lhe ocorreram. Primeira, a história podia
ser verdadeira. Segunda, o telex podia ter como objetivo dirigir sua atenção para longe
da Tailândia. Terceira, Sustri podia estar se sentindo culpado por ter gasto os
quinhentos dólares sem ter nada para relatar e por isso forjara esperanças falsas. O
nome da mulher que o oriental indicara, Amanda Parr, podia não ser nada além de uma
pista simbólica, um frágil subterfúgio para aplacar a consciência de Sustri ou confundir
Buck. Mas, por outro lado, talvez a informação fosse verdadeira e, neste caso, merecia
ser verificada.
Kelly Wallace aproveitara o prolongado silêncio para encher o copo de cerveja e
servi-lo a seu chefe, que agradeceu sorrindo:
— Obrigado, Kelly. Você é um anjo.
— Ora, de nada. Você parecia estar com sede.
— Parecia estar com sede?
— Sim; no escritório, sempre que você fica quieto por muito tempo, pensativo, toma
quase um litro de café depois. Avaliando os seus períodos de silêncio, aprendi a perceber
quando você deseja tomar algo.
— Puxa, mas que terrível ter por perto uma mulher que me compreende tanto!
— Bem, provavelmente eu o conheço melhor que ninguém, Buck, exceto sua mãe e
sua ex-esposa.
— Talvez você já tenha passado para o segundo lugar, à frente de Carolyn.
— Hum... não sei se gosto desta "honra". E agora, pode me dizer o que resolveu?
Vai responder ao telex ou não, Buck?
— Não, mas você vai fazer outra coisa para mim. Tem papel e caneta aí com você?
— Tenho, pode falar — respondeu Kelly, tirando os objetos mencionados da bolsa.

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— Há uma mulher em Los Angeles chamada Amanda Parr — P-a-r-r — que


trabalha numa agência que cuida de órfãos vindos do Sudeste asiático. Não sei o nome
da agência e nem onde fica, mas quero entrar em contato com ela.
— Vai ser difícil encontrar a mulher e o lugar com tão poucos dados, chefe.
— Deve existir algum anuário ou lista de registro com o nome de todas as
instituições do gênero. Ou então... Ah, já sei como você pode descobrir o que quero!
Lembra-se daquela série de reportagens que publicamos no verão passado sobre órfãos
de guerra, filhos de soldados norte-americanos?
— Sim, lembro. Você falou uma semana sem parar sobre o assunto.
— Pois pergunte a Norm Harris quem escreveu as matérias, pois eu já me esqueci
quem foi, e converse com o repórter. Talvez ele conheça a Srta. Parr.
— Ok, Buck.
— A propósito, aquela série foi realmente muito boa. Eu gostaria de conversar com
quem a escreveu, se a pessoa ainda estiver trabalhando conosco. Tome nota disto para
mim, Kelly, por favor — pediu Buck, ficando sério de repente.
A secretária examinou o rosto de seu chefe, parcialmente escondido atrás de óculos
escuros, e comentou:
— A situação daqueles órfãos o abalou bastante, não é?
— Sim, confesso que sim.
— Você é um velho sentimental, sabia?
— Hum, não conte muito com isso para conseguir um aumento, moça — respondeu
ele, rindo.
— Você é quem manda, chefe. Mais alguma ordem por hoje?
— Não, é só. E obrigado por ter vindo até aqui para me trazer o telex, Kelly.
— De nada, mas lembre-se de mim no Natal, ok? E agora, antes de eu ir, permita-
me comentar que a sua vizinha da esquerda deve ser uma curiosa de primeira. A mulher
não tirou os olhos de nós desde que eu cheguei!
— Oh, não se incomode com Helene. Ela tem um interesse lascivo por tudo o que
acontece na minha casa.
— Talvez ela pense que sou a sua nova namorada.
— Não há nenhuma nova namorada... pelo menos no presente momento.
— E quanto a Jillian, Buck?
— Nós somos apenas bons amigos.
— Ah, sei... a desculpa de sempre... Mas não se vanglorie demais, chefe. Mais cedo
ou mais tarde você vai acabar sendo fisgado por uma das beldades que circulam por aí.
— É melhor você esperar sentada que isso aconteça!
— Será? — indagou Kelly, pondo-se de pé. — Bem, isso não é da minha conta. E se
tenho que encontrar essa tal de Srta. Parr para você, acho bom eu ir andando.
— Eu a acompanharei até a porta.
— Não precisa, obrigada. Fique aqui sentado e relaxe. Sei o caminho da saída. Até
amanhã, chefe.
Assim que sua secretária se foi, Buck olhou distraidamente para o mar. Já era
muito tarde para sair com o veleiro, restavam apenas umas duas horas de sol. Por que

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não aproveitar então a oportunidade para descansar e permitir que a mente voltasse ao
passado, à Tailândia?
Amanda Parr parou na entrada sombreada do jardim e observou as crianças
brincarem. As menorzinhas estavam no gramado, divertindo-se com uma bola vermelha.
Os adolescentes — duas garotas e um rapaz — encontravam-se sentados num banco,
conversando em voz baixa. A enfermeira tailandesa responsável pelo grupo, acomodada
num outro banco, sorriu de modo amigável ao avistar Amanda.
As crianças, todas filhas de mulheres asiáticas e soldados norte-americanos,
pareceram a Amanda bem mais tranqüilas e relaxadas do que quando as vira pela
última vez. Elas já estavam nos Estados Unidos há uma semana e mostravam-se um
pouco mais ajustadas ao seu novo ambiente. A situação devia ser mais difícil ainda para
os adolescentes, também mestiços; seus rostos jovens aparentavam incerteza e
insegurança ao conversarem entre si, sem dúvida sobre o que os aguardava além dos
muros do jardim.
O grupinho infantil parou de jogar bola quando Amanda saiu das sombras para o
sol. Um ar de encantamento tomou conta das pequenas faces de olhos amendoados ao
encararem a mulher alta e esbelta com cabelos ruivos, à altura dos ombros, e brilhantes
olhos verdes.
Uma menina de dois anos, que brincava sozinha quase no final do gramado, virou-
se para ver o que atraíra a atenção dos outros e, ao fazê-lo, caiu sentada de mau jeito.
Seu rostinho torceu-se numa careta de dor e susto, e ela começou a chorar. Amanda
aproximou-se e pegou-a no colo, enxugando-lhe as lágrimas com a ponta dos dedos e
murmurando algumas palavras doces em tailandês. Quando a garotinha parou de
chorar, Amanda caminhou, alguns passos e sentou-se com ela no colo ao lado da
enfermeira.
— Boa tarde, Mai.
— Olá, Srta. Parr — retrucou a mulher com forte sotaque oriental.
— Parece que o nosso grupo já está se sentindo mais à vontade aqui.
— Sim, senhorita. Boas crianças. Aprendem depressa.
— E como vão os mais velhos, Mai? Eu me preocupo mais com eles que com o resto.
— Estão bem, senhorita. Sentem só um pouco de medo. Fazem muitas perguntas,
mas sabem que foi bom virem para os Estados Unidos.
— Bem, acho que se sentirão melhor quando tiverem aprendido inglês o suficiente
para poderem se comunicar, não é?
A enfermeira concordou com um gesto de cabeça e sorriu. Amanda encarou a
menina sentada em seus joelhos e disse em tom carinhoso, afagando-lhe os cabelos
negros e lisos:
— Você parece um anjinho, mas é tão séria... Não sabe sorrir?
Mai murmurou algumas palavras em tailandês e a criança virou o rosto,
encabulada.
— Ela nunca viu moça bonita como a senhorita antes — comentou a enfermeira.
— É, eu sei que o meu cabelo ruivo espanta um pouco as crianças — argumentou
Amanda. — E os adultos também, devo admitir. Sempre que vou à Ásia recebo olhares
curiosos do povo.
— Mas não é só por causa do cabelo, Srta. Parr. Sua altura e sua pele branca como
marfim tornam a senhorita exótica e atraente aos olhos orientais.

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— Obrigada, Mai. Os tailandeses são muito bonitos também, na minha opinião. E


estas crianças mestiças, então, têm uma beleza deslumbrante.
A enfermeira concordou com um gesto.
A garotinha começou a se contorcer, impaciente, no colo de Amanda, que a colocou
no chão e observou-a afastar-se correndo antes de perguntar:
— Falta muito para terminarem os exames médicos, Mai?
— Mais um dia, diz o doutor.
— Ótimo. Tenho certeza de que as crianças. ficarão contentes de se verem livres
dos testes. Bem, agora acho que vou lá para dentro. Vou me encontrar daqui a pouco
com uma mulher do Tribune.
— Oh! Mulher de jornal? Talvez a senhorita seja famosa...
— Não, eu não vou ser entrevistada, Mai — respondeu ela, rindo. — Para ser
sincera, nem sei por que a tal mulher quer me ver. Mas vou descobrir logo, e falo com
você mais tarde. Com licença.
Amanda atravessou o jardim sob o olhar atento das crianças e adolescentes, e
lembrou-se de uma experiência pela qual passara em Bangcoc num orfanato. Uma
pequena menina abandonada lhe perguntara se ela era uma princesa de contos de fadas,
porque se parecia demais com os desenhos dos livros da escola... Mas embora seu
trabalho, às vezes, fosse de despedaçar o coração, ver as crianças seguras no país de seus
pais fazia o serviço valer à pena. Amanda atravessou o portão do jardim e, ao ver um
menininho de short azul acenando adeus, respondeu ao aceno e entrou no escritório da
clínica.
Kelly Wallace ouviu a porta no fim do corredor abrir-se e virou a cabeça na direção
do ruído. De seu lugar na área da recepção da clínica, pôde ver uma linda mulher
entrando e imaginou se aquela seria Amanda Parr.
A ruiva sorriu amigavelmente para Kelly ao entrar na sala e dirigiu-se para a mesa
da recepcionista, uma simpática senhora de meia-idade que ergueu os olhos da máquina
de escrever e encarou-a dizendo:
— Oh, aí está você, Amanda. A Srta. Kelly Wallace veio vê-la.
Kelly levantou-se para cumprimentar Amanda e gostou do brilho cordial nos belos
olhos verdes dela.
— Olá, Srta. Parr. Obrigada por me receber, e desculpe-me por ter marcado um
encontro tão em cima da hora.
— Não há por que se desculpar, Srta. Wallace. Eu precisava mesmo vir até a clínica
hoje, e este é um lugar conveniente para nos vermos.
Amanda terminou de falar e virou-se para a recepcionista, que antecipou sua
pergunta e disse:
— Pode usar a sala do Dr. Boyd, querida. Ele só vai voltar daqui a algumas horas.
Pegando sua pasta de cima da mesa de recepção, Amanda levou Kelly até uma sala
próxima e convidou-a a sentar-se.
A secretária de Buck notou o bom gosto da camisa de seda branca, da saia de Unho
cinza e dos sapatos pretos de Amanda, que se acomodou na cadeira do médico e
comentou:
— Pelo que me disse ao telefone, suponho que a senhorita não esteja aqui para uma
entrevista.

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— Exato. Sou secretária executiva do Tribune, e não jornalista.


— Compreendo.
— A razão que me trouxe aqui não tem nada a ver com os negócios do jornal. Vim
a pedido do meu chefe, o Sr. Michaels.
— Sr. Michaels? A senhorita se refere à Preston Michaelis, dono do Tribune?
Kelly sorriu ao ouvir Amanda usar o nome de batismo de seu chefe. Todos no jornal
o chamavam de Buck — ou de Sr. Michaels — e ele gostava de dizer que as únicas
pessoas que o chamavam de Preston eram sua mãe, estranhos e futuros amigos.
— Bem — argumentou Kelly após uma fração de segundo —, Buck não é
exatamente o dono do Tribune, é apenas o editor e jornalista responsável pela
publicação, mas pode-se dizer que a família dele possui a maioria das ações do jornal.
— Acho que sei muito pouco a respeito do Sr. Michaels, Srta. Wallace, exceto o que
li nos jornais. O que não é muito, devo acrescentar.
— É verdade, Srta. Parr. Buck detesta publicidade, embora trabalhe na imprensa.
— Poderia me explicar então o interesse que um homem como o Sr. Michaels tem
na nossa organização?
A resposta a essa pergunta era filantropia, mas depois de conhecer Amanda, Kelly
teve certeza de que Buck se interessaria mais pela beleza dela do que em ser caridoso.
De fato, se precisasse descrever o tipo de mulher que seu chefe preferia, poderia
descrever Amanda Parr dos pés à cabeça.
"Oh", pensou a secretária com seus botões, "eu gostaria de ser uma mosca para
assistir de camarote ao primeiro encontro de Buck com a Srta. Parr".
Subitamente consciente de que Amanda esperava por uma resposta à sua
pergunta, Kelly apressou-se em dizer:
— A senhorita já deve ter ouvido comentários a respeito do grande interesse de
Buck por obras de caridade...
— Para ser sincera, não. Nunca ouvi nada sobre o assunto. Mas desde que somos
dependentes de doações públicas, estou sempre disposta a fazer contatos com pessoas
que se preocupam com o bem-estar alheio.
— Buck tomou informações sobre a Fundação para Crianças Amerasiáticas e
passou a admirar o seu trabalho, Srta. Parr. Ele pediu que lhe entregasse isto.
Kelly tirou da bolsa um envelope branco e entregou-o a Amanda, que arregalou os
olhos ao ver o valor do cheque que ele continha e comentou:
— Quanta generosidade! Por favor, transmita os meus mais sinceros
agradecimentos ao Sr. Michaels.
— Sim, claro. Aliás, Buck também me pediu para avisá-la de que está considerando
outras doações futuras, mas para isso ele gostaria de ver o relatório anual e outras
informações disponíveis sobre a fundação.
— Tudo bem. Posso dar-lhe uma pasta com o material requisitado para entregar
ao Sr. Michaels.
— Obrigada, Srta. Parr. Hum... Só mais uma coisa. Buck gostaria de lhe pedir um
favor.
— Um favor?
— Sim. Ele... gostaria de discutir pessoalmente com a senhorita certos aspectos.
— Que aspectos, Srta. Wallace?

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— Bem, meu chefe não mencionou nada de específico. Mas sei que Buck se
preocupa bastante com a questão dos órfãos de guerra, e sabe muita coisa sobre Vietnã
e Camboja, visto que já passou alguns anos lá.
— Eu compreendo. E o que o Sr. Michaels tem em mente?
— Buck é um homem muito ocupado e me pediu para perguntar-lhe se seria
possível que o encontro fosse no prédio do Tribune. Ele imaginou que a senhorita precise
ir à cidade de vez em quando e...
— Quanto a isso não há problema. O Sr. Michaels foi muito generoso com a
Fundação e ficarei feliz em encontrá-lo no horário que lhe for mais conveniente. Quando
é que ele gostaria de me ver?
— Buck estará disponível qualquer dia desta semana após as cinco horas, exceto
na sexta-feira. Ele prefere, se a Srta. não se importa, marcar um encontro no escritório
depois do horário de serviço, quando todos já tiverem ido embora, pois o ambiente fica
mais tranqüilo para conversar.
— Hum... deixe-me ver minha agenda... Ah, veja! Vou me encontrar com amigos
para jantar hoje à noite em Santa Mônica. Poderia passar antes no escritório do Sr.
Michaels, que tal?
— Perfeito. A que horas?
— As seis, se não for muito tarde.
— Ok, as seis está bem. Obrigada e até logo, Srta. Parr. Acho que já tomei muito
do seu tempo.
— Eu é que lhe agradeço, Srta. Wallace.
Amanda acompanhou Kelly até a porta, num gesto de gentileza. Mais uma vez a
secretária examinou-a discretamente como se a estivesse vendo com os olhos de Buck
Michaels e imaginou se valeria à pena fazer uma hora extra de trabalho só para ver a
reação de seu chefe diante da incrível beleza da ruiva.
— Hoje? Puxa, a mulher não perde tempo, hein? — comentou Buck assim que Kelly
lhe relatou o combinado.
— A Srta. Parr tem um compromisso em Santa Mônica e quis aproveitar para
matar dois coelhos com uma cajadada só.
— Oh, pensei que tanta presteza em me ver fosse por causa dos mil dólares.
— Mil?! Você deu a ela mil dólares?
— Sim. Afinal, é quase uma viagem vir de Long Beach até aqui.
— Buck, se eu soubesse que havia tanto dinheiro dentro daquele envelope, teria
exigido uma comissão.
— Comissão? Ora, Kelly, você demorou tanto para ir e voltar do encontro com a
Srta. Parr que eu.deveria obrigá-la a ficar trabalhando até mais tarde para compensar!
Mas agora chega de conversa fiada e me conte, como é a tal mulher?
— Oh, você sabe, do tipo que trabalha com serviço social: blusa branca, saia cinza...
— Tão mal assim?
— Eu diria que não — comentou Kelly disfarçando um sorriso maroto. — A Srta.
Parr foi muito gentil e demonstrou muita gratidão pelo recebimento do dinheiro. Ela me
pediu para lhe expressar "seus mais sinceros agradecimentos" pela doação.
— Céus, ela fala como minha tia Grace. A Srta. Parr é velha?

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— Não... não muito. As pessoas que fazem esse tipo de serviço são... eu não sei...
"eternos", talvez — respondeu a jovem secretária, mordendo a língua para não cair na
risada por causa da peça que estava pregando em Buck. — Quer mais alguma
informação, chefe?
— Não, obrigado, pode ir. E, por favor, fale com a turma da segurança e peca-lhes
para acompanhar a Srta. Parr até aqui quando ela chegar. Os elevadores já estarão
fechados às seis horas.
— Tudo bem. Tchau, Buck, até amanhã.
A porta do elevador abriu-se, dando para o corredor do andar das salas dos
executivos. O guarda saiu, seguido por Amanda, e indicou-lhe o caminho:
— O escritório do Sr. Michaels é logo ali, senhorita, no fundo do corredor à
esquerda.
Depois de agradecer ao homem por tê-la acompanhado, Amanda dirigiu-se para a
sala indicada, sentindo-se um pouco nervosa por causa do encontro iminente. Defrontar
pessoas ricas e importantes como Preston Michaels não era uma experiência nova para
ela, no entanto, o aspecto suplicante da angariação de fundos sempre a desagradava.
Tendo já passado pela área de recepção e outras ante-salas, Amanda deparou-se
com uma série de escritórios com paredes de vidro, que ofereciam uma vista espetacular
de Los Angeles. Era outubro, e o sol estava se pondo, tingindo o céu e a cidade com tons
alaranjados e rosados. Embora as luzes no teto do corredor compensassem a pouca luz
diurna, os escritórios individuais pelos quais passou encontravam-se comparativamente
escuros e desertos. Apenas um deles mostrava-se iluminado e Amanda encaminhou-se
até ele.
O grosso carpete que cobria o chão permitiu-lhe aproximar-se sem que sua
presença fosse notada, e ela aproveitou a chance para observar em silêncio o interior da
sala. Sentado numa confortável poltrona atrás de uma grande mesa de mogno
encontrava-se um homem em mangas de camisa, lendo alguns papéis espalhados à sua
frente. Uma moderna luminária iluminava o rosto bronzeado e másculo.
A figura de Preston Michaels agradou a Amanda, que se surpreendeu com a beleza
dele. Continuou a observá-lo sem ser vista, e a ilusão de poder que isso lhe deu a fez
retardar por mais alguns segundos o anúncio de sua presença.
O homem dava pequenos sorrisos — talvez em silencioso diálogo com os papéis que
lia — e de vez em quando tamborilava os dedos no tampo da mesa. Seus cabelos negros
como carvão, com mechas grisalhas nas têmporas, o encaixavam na faixa dos trinta
anos.
Absorvida por estas e outras observações, Amanda acabou levando um susto
quando Preston Michaels ergueu a cabeça e a encarou direto nos olhos.

CAPÍTULO II

— Sim, em que posso ajudá-la? — perguntou Preston Michaels pondo-se de pé e


sorrindo.
Com seus belos olhos azuis fixos nos dela e com seu corpo musculoso silhuetado
pela luz da luminária, ele oferecia uma imagem tão atraente que Amanda ficou
momentaneamente aturdida, sem fala; só depois de alguns segundos conseguiu
gaguejar, sem graça:

12
Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Sr. Michaels, eu... eu sou Amanda Parr, da Fundação para Crianças


Amerasiáticas.
— Você é a Srta. Parr?!
— Sim. O senhor estava me esperando, não estava?
— Oh, claro, mas... eu a imaginava um pouco diferente — disse Buck,
aproximando-se e tomando-lhe as mãos para cumprimentá-la.
Amanda sentiu-se lisonjeada com o inesperado interesse com que ele a examinava
dos pés à cabeça, mas ao mesmo tempo sentiu-se pouco à vontade. Retirando as mãos
das dele, perguntou intrigada:
— Diferente? Como assim?
— Quer saber a verdade? Eu estava certo de que a senhorita fosse uma réplica
perfeita da minha tia Grace.
— Sua tia?
— Exato. Minha tia Grace é uma senhora encantadora de setenta anos, do tipo que
sempre expressa seus "mais sinceros agradecimentos" ao receber um favor.
Sorrindo ironicamente, Buck apertou um interruptor na parede, acendendo as
luzes que iluminavam um grupo de três pequenos sofás situados perto da parede de
vidro da grande sala.
Tomando Amanda pelo braço, guiou-a até um dos sofás e convidou-a a sentar-se.
Ela acomodou-se, em silêncio, enquanto Buck permanecia de pé observando-a com uma
expressão divertida no rosto e comentando:
— Suponho que a imaginei mais velha por causa do que a minha secretária disse
a seu respeito. Acho que foi "muito gentil" a expressão que ela usou.
— A Srta. Wallace foi muito simpática — argumentou Amanda, corando.
O editor e jornalista responsável pelo Tribune sentou-se na ponta do sofá oposto ao
de Amanda. Ela se sentiu mais uma vez examinada dos pés à cabeça, embora estivesse
evitando encarar de frente o brilhante par de olhos azuis.
— Apreciei muito o seu gesto de vir me ver tão depressa — disse Buck, suavemente.
— Fiquei contente em poder vir, Sr. Michaels. A sua doação foi muito generosa.
— Ora, devemos fazer tudo o que for possível por uma boa causa. E a sua é uma
boa causa. Mas, por favor, vamos dispensar esta história de "senhor". Meus amigos me
chamam de Buck.
— Sim, eu percebi que a Srta. Wallace se referia ao senhor como Buck. Presumi
que fosse um apelido.
— Um apelido que ganhei jogando futebol. Hoje em dia apenas minha mãe me
chama de Preston.
Ele parecia amigável, apesar de mostrar-se confiante demais. Sua maneira gentil
e despretensiosa de falar era apaziguante. Mas o modo quase possessivo com que olhava
e tocava Amanda a fez ficar preocupada e encabulada. Reunindo toda a sua coragem,
ela o encarou de frente; não estava bem certa se era a sua vez de falar ou se devia
permanecer em silêncio. Buck resolveu seu dilema, perguntando:
— Posso lhe oferecer um drinque, Amanda? Tenho um barzinho aqui na minha
sala.
— Oh, não, obrigada, senhor... Buck. Eu prefiro não...
— Ora, vamos lá, tome um licor de cerejas pelo menos. Detesto beber sozinho.

13
Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Eu aceito o licor então, por favor.


Buck atravessou o escritório até o pequeno bar situado numa das estantes das
paredes e voltou poucos minutos depois com um cálice de licor e um copo de uísque on
the rocks. Colocou os drinques, guardanapinhos de papel e um pote de nozes sobre uma
mesinha de centro e sentou-se ao lado de Amanda no sofá. Sentindo-se constrangida
pela proximidade dele, Amanda pegou o cálice. Buck moveu seu copo como quem oferece
um brinde e murmurou:
— À minha tia Grace e a outras surpresas agradáveis. Tomara que existam outras.
O perfume de Buck, em conjunto com seu tom de voz, perturbou Amanda; a
intimidade sugerida por tal sensação deixou-a alarmada. Agitada, tomou um gole de
licor maior que o pretendido. Quase engasgou e, para disfarçar, comentou com um
sorriso:
— A Srta. Wallace me contou que você já passou alguns anos no Sudeste asiático.
Por acaso é este o motivo básico do seu interesse pela nossa agência?
— De certo modo, sim. Eu me preocupo com as pessoas carentes em geral, mas o
problema desses órfãos mestiços me atinge mais particularmente.
— Pobres crianças! Por sorte temos sido capazes de ajudar algumas delas.
— Eu dei uma olhada no material que você deu para Kelly me trazer e confesso
que fiquei impressionado.
— Obrigada, mas ainda há muito a ser feito, em especial no Vietnã. A situação por
lá é terrível.
— Diga-me, Amanda, há quanto tempo você trabalha na Fundação para Crianças
Amerasiáticas?
— Três anos.
— Não é muito.
— Não se você levar em conta que a agência funciona ha pelo menos quinze anos.
— Gosta do seu trabalho?
— Adoro — respondeu ela, observando Buck tomar um gole de uísque e comer
algumas nozes; "sim, o homem realmente tem charme", pensou com seus botões antes
de dizer: — A Srta. Wallace comentou que você está considerando a possibilidade de
fazer mais doações à fundação. Gostaria de alguma informação extra sobre os nossos
serviços antes de se decidir?
— De informações não, obrigado. Eu... Bem, talvez seja melhor eu lhe contar o que
me levou a querer vê-la, Amanda. Ontem à tarde recebi um telex de um antigo associado
que tive em Bangcoc, um homem chamado Kupnol Sustri. Ele é uma espécie de
investigador particular que está fazendo um trabalho para mim. Sustri sugeriu que você
poderia me auxiliar na minha investigação.
— Eu?!
— Sim. Aparentemente você é muito conhecida e benquista por vários diretores de
orfanato em Bangcoc, e é num orfanato que as minhas pesquisas se encontraram num
beco sem saída.
— Não compreendo. O que isso tem a ver comigo?
Buck comeu mais algumas nozes antes de encarar Amanda com seus penetrantes
olhos azuis e continuar a falar.

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Estou tentando localizar uma criança amerasiática, uma menina de mais ou


menos treze anos, não estou bem certo quanto à idade. Meu contato supõe que ela pode
ter sido trazida para os Estados Unidos através da sua organização.
— Oh, eu entendo.
— Como as pistas sobre a garota parecem ter esfriado na Tailândia, achei que com
a sua ajuda eu seria capaz de encontrá-la aqui nos Estados Unidos.
— Foi por isso que deu tanto dinheiro à nossa Fundação, Sr. Michaels? — indagou
Amanda, percebendo de repente por que Buck doara mil dólares e por que estava
jogando tanto charme em cima dela.
— Pode continuar me chamando de Buck, mesmo que o assunto "dinheiro" tenha
surgido — argumentou ele, sério.
— Desculpe-me se pareço grosseira. Mas você tem que admitir que a minha posição
diante da sua colocação é racional.
— Ok, concordo. E peço-lhe desculpas por ter dito algo que soa como uma sórdida
troca de favores. Mas é que eu simplesmente não me senti no direito de pedir o seu
auxílio sem antes fornecer alguma... colaboração. No que se refere à minha doação, devo
acrescentar que acredito no seu trabalho e gostaria de ajudar de um modo ou de outro.
— Buck, o que é que você quer de mim, afinal?
— Que me ajude a encontrar a menina.
— Sr. Michaels, nós apenas promovemos serviços de adoção. A nossa organização
não localiza pessoas desaparecidas.
— Sei disso, Srta. Parr.
Amanda observou Buck pegar o cálice e o copo, já vazios, e levá-los para o bar para
reenchê-los. Teve a nítida impressão de que Preston Michaels pretendia usá-la, e que
seu charme e generosidade estavam sendo utilizados com este propósito.
Quando ele voltou com os drinques e sentou-se de novo, sua expressão parecia dizer
"espero que nos entendamos". A arrogância de Buck a desagradava tanto quanto a sua
atração a intrigava.
— Não quero soar mal-agradecida, Buck, mas a Fundação tem obrigações éticas e
legais não só em relação às crianças, mas aos seus pais adotivos também. Revelar as
informações que você quer não é uma coisa fácil ou automática de se fazer.
— Amanda, permita-me dizer, se isso for de alguma ajuda, que o meu objetivo é
simplesmente localizar a garota e verificar o seu bem-estar. Se ela se encontrar nos
Estados Unidos, em segurança, num bom lar, não precisarei mais me preocupar em
procurá-la na Tailândia.
Tomando um gole do seu licor, Amanda refletiu que ele fizera uma doação mais do
que generosa à Fundação, e portanto merecia um mínimo de consideração. Suspirando
fundo, perguntou numa demonstração de interesse pelo problema:
— Seria muita indiscrição de minha parte indagar da natureza do seu interesse a
respeito dessa menina?
— Se você não se importar, eu direi que há um certo número de pessoas envolvidas
neste caso, o que não me dá muita liberdade para entrar em detalhes mais profundos no
presente momento. Mas não se preocupe, quando chegar a hora certa você saberá de
tudo que for necessário — argumentou ele, mais uma vez examinando-a dos pés à cabeça
com um olhar apreciativo, o que a deixou desconcertada.

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Mas, se você me contar as particularidades do caso agora, eu já poderei ir


confirmando se a nossa agência recebeu a menina, o que adiantaria o serviço.
— É este o problema. Não sei nada a respeito da garota, nem mesmo o seu nome.
— Como quer que eu o ajude, então? Sem um mínimo de dados não vejo como
resolver o assunto — retrucou Amanda, encarando-o com um misto de curiosidade,
atração e antipatia.
— Não se esqueça de que Sustri está procurando reunir as informações básicas
para mim. Talvez ele possa me dar uma lista com os dados de que você necessita.
— A coisa não é tão simples assim, Buck. Localizar uma criança pode ser muito
difícil. Muitas vezes elas chegam até nós com pouca ou nenhuma informação sobre o seu
passado... Se você conseguisse, contudo, descobrir o orfanato que a recebeu e a data em
que a menina foi enviada para cá, talvez haja uma esperança de encontrá-la.
— Eu me sinto como se você estivesse me mandando voltar a Bangcoc para
procurar a garota.
— Ouça, infelizmente eu... — Amanda hesitou; mas então, lembrando-se dos mil
dólares que ele doara, decidiu apaziguá-lo. — Irei a Bangcoc no final da próxima
semana, e visitarei alguns orfanatos. Se pudesse me fornecer todos os detalhes do caso,
eu teria a oportunidade de fazer algumas pesquisas sobre o caso para você. Gostaria que
eu fizesse isso?
— Claro que sim! Muito obrigado, apreciei a sua oferta. E enquanto você não viaja,
eu me comunicarei com o meu agente em Bangcoc para ver em que pé estão as coisas.
Buck terminou de falar e caiu num silêncio profundo, durante o qual comeu
distraidamente uma porção de nozes. Amanda bebericou seu licor enquanto aproveitava
para observá-lo com discrição. Ficara surpresa ao ouvi-lo pedir para localizar uma
criança. Qual seria o interesse dele numa menina de treze anos? Seria sua filha? Esta
hipótese não era improvável, visto que Buck passara algum tempo na Ásia. Além do
mais, as mulheres tailandesas estavam entre as mais bonitas do mundo...
Erguendo os olhos de. repente, Buck notou que Amanda o examinava e sorriu, sem
graça.
— Desculpe-me pelo instante de silêncio. Mas é que sempre que estou preocupado
com alguma coisa tendo a ficar calado, esquecendo-me da presença de outras pessoas a
meu lado. Uma mania desagradável, não é? Aliás, outra das minhas manias é comer
nozes; se eu fizer as contas na ponta do lápis, acho que devoro uma tonelada delas por
ano. E por falar em comer, estou morto de fome. Sabe que horas são? Quase oito da noite.
Por que não terminamos a nossa conversa num bom restaurante...
— Obrigada, Buck, eu gostaria muito. Mas já tenho um compromisso para o jantar.
— Oh, é verdade. Kelly me disse que você tinha um encontro com amigos em Santa
Mônica, mas eu nem me lembrei disso.
— Tudo bem. Agora, acho melhor eu ir andando. Não quero mais tomar o seu
tempo. Você deve ter milhões de coisas importantes a fazer.
— E tenho mesmo, mas nem se eu trabalhasse vinte e quatro horas por dia
conseguiria pôr o serviço em dia. Portanto, não se preocupe comigo.
Amanda levantou-se, seguida de perto por Buck, e suas mãos se tocaram. O contato
inesperado provocou um arrepio de prazer nela, que se afastou bruscamente, tentando
disfarçar suas emoções.
Buck fingiu não perceber o fato e, tomando-a pelo braço, disse sorrindo:

16
Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Eu a acompanharei até o elevador.


Durante a curta caminhada, Amanda sentiu o toque másculo em sua pele com
maior intensidade ainda. No entanto, como não havia nenhuma maneira delicada e sutil
de livrar-se da mão de Buck em seu braço, acabou por se resignar e não esboçou
nenhuma reação.
Ao alcançarem a porta do elevador, Buck finalmente soltou-a e apertou o botão de
chamada. Em seguida, encarou-a em silêncio por alguns segundos antes de falar.
— Eu vou dar uma festa na minha casa, em Balboa, no próximo sábado. Vários dos
meus amigos filantropos estarão lá, Amanda. Por que não comparece também e
aproveita para conseguir mais algumas doações para a sua Fundação?
O convite desnorteou-a. A mulher que havia dentro dela tornou-se instintivamente
cautelosa, ao passo que seu lado profissional não pôde deixar de considerar a
oportunidade que se apresentara. Hesitante, não querendo dar a Buck a impressão de
que podia ser manipulada, Amanda acabou por responder:
— Agradeço o convite, Buck. Mas, por favor, não se sinta na obrigação de...
— Ei, que bobagem é essa de "obrigação"? Eu apenas gostaria de vê-la de novo.
Além disso, poderíamos conversar um pouco mais a respeito da menina. Vamos, aceite.
Vai ser uma reunião informal, divertida. Você pode até levar um acompanhante, se
quiser.
— Está bem, eu irei — respondeu ela ao mesmo tempo em que o elevador chegou.
— Obrigada por ter me convidado.
— Foi um prazer. Pedirei a Kelly que telefone para você e lhe dê o meu endereço,
ok?
— Ok. E, mais uma vez, obrigada pela sua generosidade. Amanda estendeu a mão
para despedir-se; Buck tomou-a entre as suas num gesto quase íntimo, que mais parecia
um abraço a distância entre dois amantes. Gorando, ela soltou-se com uma certa
brusquidão e entrou rapidamente no elevador, irritada com a arrogância de Buck e
zangada consigo mesma por não saber como lidar melhor com a situação.
Parecendo ler os pensamentos de Amanda, ele sorriu com uma expressão divertida
e triunfante no rosto másculo e bronzeado, comentando:
— Obrigado por ter vindo me ver.
— Eu é que tenho de agradecer, Buck.
— Nós nos veremos no sábado, então?
— Sim. Até logo.
Buck observou as portas de aço do elevador se fecharem e ficou prestando atenção
no ruído do carro descendo pelo poço até não ouvir mais nada. O silêncio envolvia o
prédio vazio. O delicado rosto de porcelana de Amanda Parr não lhe saía da mente,
acompanhado por uma pontada de dúvida: por que Amanda parecera não gostar dele?
Voltou a passos lentos para a sua sala, pensando na pureza da beleza de Amanda
e na sensação de abandono que a partida dela lhe causara. Suspirando, esperou de
coração que ela houvesse concordado em ir à festa por causa dele como pessoa, e não por
causa dos mil dólares que doara à Fundação.
No sábado à noite Amanda tomou a Highway Coast e dirigiu-se para Newport
Beach. Chegara a considerar a idéia de convidar alguém para acompanhá-la à festa de
Buck, mas rejeitara a hipótese quando sua lista de possíveis acompanhantes mostrou-
se pobre e sem graça. Seu companheiro mais freqüente nos últimos poucos meses fora

17
Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

um jovem advogado com pretensões a se tornar roteirista de cinema, chamado Steve


Wilsey. Amanda sabia que Steve. possuía a classe necessária para comparecer ao seu
lado numa reunião patrocinada por Buck Michaels, mas mesmo assim lhe faltava
maturidade e charme. No fim das contas, ela acabara resolvendo ir sozinha, dirigindo
seu Honda Accord.
Pensando no último encontro que tivera com Buck, Amanda sentiu-se perturbada.
Ele a inquietara tanto que terminara se comportando como uma tola, o que a fez ficar
zangada consigo mesma por não ter conseguido se controlar melhor. Embora odiasse
admiti-lo, não podia negar que se deixara afetar por Buck; aliás, a explicação para tal
fato era a mais simples possível. Ele era incrivelmente bonito e atraente, e o clima do
encontro fora provocante, com os dois sozinhos na sala do Tribune.
Mas Amanda sabia que a atração que sentira por Buck não significava nada de
importante. Afinal,;, não pretendia se envolver com um homem que esperava que todas
as mulheres se derretessem diante de um sorriso insinuante. A única coisa que a
incomodava mais era que a doação de mil dólares que a Fundação recebera a colocara
numa posição na qual não pudera recusar o convite para a festa. Mas, enfim, Buck
Michaels não era o primeiro a tentar aproveitar-se dela e, a vida sendo como é,
provavelmente não seria o último. Este pensamento a consolou... mas não muito.
Balboa Island, onde Buck morava, era um condomínio fechado. Uma pequena
ponte o ligava ao continente, atravessando o estuário que o cercava, qualificando-o como
uma ilha legítima. Newport Harbor era considerado a capital nacional do iatismo, com
mais embarcações de passeio por metro quadrado que qualquer outro porto dos Estados
Unidos. A ilha em si era cheia de casas milionárias; caríssimas maravilhas da
arquitetura moderna, todas com embarcadouros particulares para veleiros ou lanchas
de grande porte.
Saindo da Coast Highway e atravessando a ponte que levava à ilha, Amanda
seguiu as indicações fornecidas por Kelly pelo telefone e logo encontrou a casa de Buck.
Estacionou seu carro ao pátio da frente e caminhou na direção das vozes alegres e da
música suave. O ar estava fresco e agradável, típico de uma noite do começo do outono.
Ainda demoraria um mês para que a época das chuvas começasse.
Amanda deu uma pequena parada diante de uma janela de vidro para checar sua
aparência pela última vez. O vestido de voai de comprimento chanel e as sandálias de
salto alto davam-lhe um ar elegante que a deixou satisfeita. As únicas jóias que colocara
eram um par de brincos de ouro e uma delicada gargantilha de pérolas. Só depois de se
examinar com atenção foi que tocou a campainha.
Precisou esperar alguns segundos até ser atendida, e, quando a porta finalmente
se abriu, surpreendeu-se ao ver uma linda jovem loira que parecia saída de uma revista
de moda. Seus cabelos longos estavam penteados para o lado, numa profusão de cachos.
Seu vestido, tomara-que-caia, era de um tecido fino que mais revelava do que escondia
o corpo.
— Boa noite. Entre, por favor — disse a jovem com um sorriso deslumbrante.
— Obrigada. Eu sou Amanda Parr.
— Prazer em conhecê-la. Meu nome é Jillian.
Amanda apertou a mão que a jovem lhe estendeu, refletindo sobre a maneira como
ela dissera o próprio nome, Jillian. A maneira diferente de pronunciá-lo por acaso
significaria algo especial, como "Jillian, a namorada de Buck"? A resposta não demorou
a vir.

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Não sei onde Buck está, Amanda. Posso chamá-la de Amanda, não posso? Bem,
de qualquer modo, entre e fique à vontade. Os salgadinhos para a festa chegaram tão
tarde que estou até agora na cozinha tentando arrumá-los para serem servidos.
Terminando de falar, Jillian fechou a porta assim que Amanda entrou e dirigiu-se
para o interior da casa.
Amanda surpreendeu-se com a pontada de ciúme que sentiu da intimidade que a
jovem parecia desfrutar ao lado de Buck, e, para esconder de si mesma um sentimento
tão absurdo, distraiu-se examinando o ambiente que a cercava.
Encontrava-se numa enorme sala cheia de vasos de plantas, cujo centro era
dominado por um saguão de dois andares de altura com teto de vidro. Spots localizados
em pontos estratégicos iluminavam árvores tropicais e palmeiras variando de dois a três
metros de altura. O chão fora rebaixado por volta de trinta centímetros em relação às
outras salas vizinhas, e era coberto por pedras polidas. Vários grupos de pessoas
estavam espalhados pelos diversos ambientes — os homens usando blazers ou camisas
esportivas, as mulheres usando vestidos elegantes e caros.
Amanda atravessou o majestoso vestíbulo, passando ao lado de uma grande gaiola
dourada que continha um belo papagaio emplumado. A nova sala em que entrou também
era enorme, mas o teto era baixo; aqui e ali havia sofás de couro e cadeiras estofadas em
tecidos de cores quentes, criando um clima aconchegante. Havia mais pessoas no local,
conversando e rindo, mas nenhuma delas prestou muita atenção em Amanda.
Ela dirigiu-se para perto de uma das portas de vidro que davam para fora da casa
e observou encantada o embarcadouro de madeira e o veleiro ancorado. Diversos casais
encontravam-se no jardim, tomando drinques e aproveitando o ar fresco da noite.
— Com licença, senhorita. Aceita uma bebida? — indagou uma jovem copeira
mexicana trajando um impecável uniforme ao aproximar-se de Amanda.
— Sim, por favor. Um copo de vinho branco.
— Chablis, Chenin Blanc ou Chardonnay?
— Chenin Blanc.
— E para mim um uísque duplo, por gentileza — disse um homem colocando um
copo vazio sobre a bandeja da jovem mexicana e em seguida virando-se para Amanda:
— Olá. Acho que ainda não tive o prazer de conhecê-la.
Amanda encarou o homem grisalho que lhe dirigira a palavra e sorriu consigo
mesma; os modos dele indicavam sem sombra de dúvida um solteirão à cata de
aventuras.
— Olá. Como vai? — disse ela, por fim.
— Ouça, você não é a Jillian, é?
— Não. Suponho que Jillian esteja na cozinha.
— Oh, ótimo. Ainda não conheço a nova namorada de Buck, e portanto preciso
tomar cuidado para não dar nenhum fora.
— Que tipo de fora?
— Bem... — começou, o homem, rindo. — Certa vez eu me excedi um pouco na
bebida em uma das festas de Buck e, sem querer, acabei dando em cima da namorada
dele. Só percebi a minha gafe quando já era tarde demais. Por sorte ninguém se ofendeu
com a brincadeira...
— Eu compreendo.

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— E agora, que tal nos apresentarmos? Eu sou Alex Hamilton.


— Meu nome é Amanda Parr.
— Encantado em conhecê-la, querida.
Com a sutileza de um elefante entrando numa loja de cristais, Alex examinou-a
dos pés à cabeça com uma expressão maliciosa no rosto.
Forçando um sorriso, Amanda olhou ao redor esperando, ironicamente, que Buck
surgisse em seu socorro.
— É a primeira vez que vem a uma festa aqui? — perguntou Alex, puxando
conversa.
— Sim. Não faz muito tempo que conheço Buck.
— Você trabalha, Amanda?
— Trabalho. Estou no campo do serviço social.
— Fala sério? Imaginei que fosse modelo, ou algo parecido. A copeira mexicana
voltou com os drinques pedidos e serviu-os. Amanda sentiu-se grata pela interrupção, e
começou a imaginar um meio de se livrar da desagradável companhia. Olhou na direção
do jardim e, de repente, vislumbrou Buck Michaels em meio aos convidados. Apesar de
tê-lo visto no começo da semana, não estava preparada para sentir o arrepio de emoção
que a percorreu ao notar a presença dele. Buck parecia ainda mais bonito e atraente que
da última vez. Vestia uma calça branca, uma camisa pólo azul e sapatos também azuis.
Movia-se com uma graça masculina e uma elegância de gestos que a fez observá-lo por
alguns minutos, totalmente fascinada. Ao perceber o que estava fazendo, Amanda
precisou morder o lábio para se controlar. "Vá com calma, mulher", disse a si mesma;
"não se esqueça de que não quer se envolver com homens do tipo de Buck Michaels".
Alex reparou que algo havia atraído a atenção de Amanda e virou-se para ver o que
era.
— Oh, lá está Buck — comentou, tentando parecer simpático.
— Sim, eu ainda não me encontrei com ele esta noite. Ambos observaram seu
anfitrião aproximar-se, caminhando por entre as pessoas espalhadas pelo jardim,
parando de vez em quando para conversar com alguém. Assim que entrou na sala, Buck
avistou Amanda e foi até ela.
— Amanda, que bom vê-la aqui!
Sem a menor hesitação, Buck beijou-a no rosto, demorando seus lábios na pele
macia mais tempo que o necessário.
— Olá, Buck — disse Amanda, corando. — Como vai?
— Bem, obrigado. Hum, vejo que já conheceu Alex. Sabe, ele é uma das pessoas
que eu queria mesmo apresentar a você.
— Alex, Amanda trabalha para uma maravilhosa organização de caridade que
ajuda órfãos desamparados. Eu a convidei para a minha festa porque pensei que ela
podia encontrar-se com gente disposta a doar dinheiro para a Fundação para Crianças
Amerasiáticas. Eu próprio já doei mil dólares, talvez você e alguns outros se interessem
em fazer o mesmo.
Alex tomou um grande gole de uísque e deu um sorriso amarelo, dizendo:
— Bom saber que você gosta de ajudar órfãos, Buck. Isso o faz subir um ponto no
meu conceito. Hum... se me derem licença, vou buscar outro drinque e volto logo.

20
Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Não acha que foi direto demais ao assunto? — indagou Amanda assim que Alex
se afastou.
— Ora, eu não estava falando sério. Alex não é um "doador de dinheiro" em
potencial, é pão-duro demais para isso. Eu só estava querendo me livrar dele, e parece
que consegui.
— Que bom! Pensei que você fosse usar esta técnica de aproximação com todos!
— Não, fique tranqüila. Não espantarei os que realmente estiverem dispostos a
contribuir com a sua organização...
Amanda ainda estava rindo do tom de conspiração de Buck quando ele perguntou:
— Já conheceu mais alguém aqui na festa?
— Sim, conheci Jillian.
— Ah, sei...
— Ela é muito bonita e simpática, não?
— É verdade.
— Engraçado, a princípio Alex pensou que eu fosse Jillian.
— Jura? Acho que ele já descobriu então o tipo de mulher que me agrada.
Mesmo sabendo que estava entrando em terreno perigoso, Amanda não resistiu a
provocá-lo mais um pouco e perguntou, com voz doce:
— Você quer dizer que me acha parecida com Jillian, sua namorada?
Buck, no entanto, não caiu na armadilha e mudou de assunto.
— Venha comigo, Amanda. Temos que conversar a respeito do meu projeto antes
que os meus convidados comecem a brigar à sua volta para ver quem vai doar mais
dinheiro.
Um segundo mais tarde ambos já estavam no jardim, de onde desceram até o
embarcadouro. Buck fez questão de ignorar as pessoas que cruzaram seu caminho e
levou Amanda direto para o barco.
— Pronto, aqui podemos conversar em paz.
— Arrastar mulheres até o seu veleiro é o seu modo habitual de tratar de negócios?
— indagou ela, irritada.
Fora obrigada a acompanhá-lo sem reclamar para não dar um escândalo no meio
da festa, mas agora que se encontravam sozinhos podia dizer o que pensava.
— Por acaso não gostou de eu tê-la trazido até aqui?
— Bem... confesso que não.
— Eu sinto muito. Não era minha intenção desagradá-la. Amanda enrubesceu.
Perturbava-a o fato de Buck atraí-la tanto. Querendo safar-se logo da situação incômoda
em que se encontrava, resolveu deixar seus sentimentos pessoais de lado e dispensar a
Buck a atenção que ele merecia por causa da generosa doação que fizera.
— O que é que você quer conversar comigo, afinal?
— Só direi se você me responder uma coisa antes: não gosta mesmo de estar aqui
sozinha no veleiro comigo?
Enquanto falava, Buck acariciou-lhe o rosto com a ponta dos dedos. Em seguida,
acariciou-a na nuca sem deixar de encará-la um só segundo bem dentro dos olhos.
Amanda ainda tentou esboçar uma reação de protesto, que de nada adiantou. Os
lábios de Buck aproximaram-se devagar e cobriram os dela numa carícia suave,

21
Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

saboreando-a como a uma fruta doce e suculenta. Amanda ficou momentaneamente


paralisada pela ternura do beijo, mas quando a realidade do que estava acontecendo
atingiu o nível de sua consciência, criou coragem e afastou-se de Buck, indignada.
— Por que fez isso, pode me dizer?
— Porque... senti vontade. Ouça, eu sinto muito. Interpretei mal a situação e...
— Interpretou mal porque quis! Eu não lhe dei nenhum sinal de que aceitaria os
seus avanços!
— Tem razão. Desculpe-me, não pretendi ofendê-la. Na verdade, meu beijo foi mais
um cumprimento... uma homenagem à sua beleza. Mas, por favor, não vamos discutir
por causa disto. Preciso conversar com você a respeito de algo mais importante.
— E o que é?
— Passei a semana toda trocando telex com Bangcoc, mas não cheguei a lugar
nenhum. Você sabe em que ritmo são feitas as coisas por lá. Decidi, contudo, que não
devo me desesperar. Com a sua ajuda e a de meu contato na Ásia, sei que tenho boas
chances de encontrar a garota. "
Buck falava como se nada houvesse acontecido há poucos instantes; sua voz
apresentava um tom amigável e seguro ao prosseguir:
— O que tenho em mente é ir com você a Bangcoc na próxima semana para tentar
reunir eu mesmo os pedaços do quebra-cabeça. Presente ao local onde tudo começou,
acho que posso ser bem-sucedido.
— Buck, não concordo nem um pouco com a sua idéia. Eu...
Amanda parou a frase no meio, desconcertada, o cérebro fervilhando com mil
perguntas. Um segundo atrás estava sendo beijada por Buck, que agora lhe propunha
viajarem juntos por metade do mundo! Será que ele a convidara para a festa para pedir
sua colaboração em relação ao caso da menina desaparecida ou por que tinha outros
propósitos em mente? Estaria tentando seduzi-la ou era apenas o tipo de homem que
não resistia à oportunidade de passar uma cantada numa mulher só porque se
encontravam sozinhos? Seria ele tão arrogante a ponto de pensar que com um mero beijo
a teria caída a seus pés? Antes que pudesse formular em voz alta qualquer dessas
perguntas, Amanda ouviu uma voz feminina vinda do outro lado do barco, chamando:
— Buck? Você está aí?
Ambos viraram-se e deram de cara com Jillian, que dera a volta na cabine do
veleiro e parará espantada ao avistar Amanda.
— Olá, Jillian. Nós estávamos conversando sobre a Tailândia. Você já conhece
Amanda, não é? — indagou Buck, procurando disfarçar seu embaraço.
— Sim, já — respondeu Jillian, abraçando-o pela cintura num gesto possessivo. —
Mas está muito frio para vocês ficarem conversando aqui fora. Por que não vão lá para
dentro?
— Ótima idéia — argumentou Amanda, aproveitando a deixa. — Se me derem
licença, vou entrar para tomar um drinque.
Buck observou-a sair do barco e maldisse seu azar... e sua falta de jeito para lidar
com a situação. Não podia culpar Jillian por ter aparecido de repente e atrapalhar sua
conversa com Amanda. Pobre Jillian, tão ciumenta... e nem namorados "de verdade" eles
eram...
Mas o que o preocupava era Amanda, e não Jillian. A indiferença da primeira o
perturbava, magoava; gostaria de poder falar com ela, explicar-se, pedir desculpas.

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

Sabia que a ofendera, mas seu beijo fora espontâneo, não fora dado com segundas
intenções, embora Amanda não soubesse disso. De qualquer modo, por que achava tão
importante que ela compreendesse sua atitude?
Pelo modo como desapareceu em meio aos outros convidados, era óbvio que
Amanda não queria mais falar com ele. Depois de vinte minutos Buck notou que ela fora
embora e, desolado, percebeu que não podia culpar ninguém além de si mesmo por isso.
E agora, o que faria com a vontade que tinha de vê-la de novo?

CAPÍTULO III

Depois de permanecer na fila por algum tempo, Amanda percebeu aliviada que
chegara a sua vez de ser atendida. Colocou sua bagagem sobre a balança — como
sempre, não carregava excesso de peso — e apresentou seus documentos ao funcionário
do aeroporto.
— Ah, Srta. Parr! — exclamou o homem após examinar a passagem e o passaporte
dela. — Eu estava mesmo esperando pela senhorita. Sinto informar-lhe que houve um
pequeno problema com a sua reserva.
— Que tipo de problema?
— Por favor, não se preocupe. A senhorita tomará o avião, mas terá que ser
transferida para uma poltrona na primeira classe.
— Ora, mas isso não é um problema, muito pelo contrário. É uma surpresa
bastante agradável!
— Suponho que sim. Só que infelizmente a senhorita terá que embarcar por último
por causa disso. Fale com o agente da companhia aérea que lhe reservou a passagem no
portão 8 e ele lhe dará informações mais precisas. Aqui estão os seus documentos e um
passe especial. Pode ir, e faça uma boa viagem, senhorita.
Colocando os papéis que o funcionário lhe entregara no bolso da jaqueta de seu
conjunto de brim caqui — que combinava com a camisa esporte e os tênis verdes que
usava —, Amanda dirigiu-se para o portão 8. Apenas meia hora mais tarde, quando
todos os outros passageiros já haviam embarcado, foi que o agente da companhia deu-
lhe permissão para ir até o avião, onde foi recebida por uma jovem e bonita aeromoça
chinesa com uma flor nos cabelos.
— Por aqui, por favor. Queira me acompanhar, senhorita — disse a aeromoça,
pegando sua bagagem de mão e levando-a até a ala da primeira classe.
Enquanto a bela jovem chinesa colocava sua bolsa e sua sacola num compartimento
acima do assento, Amanda tirou a jaqueta e examinou seu vizinho de poltrona, sentado
perto da janela. O rosto do homem estava virado para o outro lado, mas o formato de
sua cabeça e os cabelos negros grisalhos nas têmporas pareciam familiares.
Ou melhor, mais que familiares. Pertenciam a Buck Michaels que, ao virar-se e vê-
la, exclamou sorrindo e fingindo surpresa:
— Amanda! Mas que coincidência agradável!
Ela não demorou mais que um milésimo de segundo para perceber o que havia
acontecido. O homem que fizera questão de ignorar a semana inteira acabara de
manobrá-la como a uma marionete! Começou a ficar irritada, mas o sorriso e o charme
de Buck ajudaram a suavizar sua indignação. No fundo, foi obrigada a admitir que

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

estava até se sentindo lisonjeada, mas não podia dar o braço a torcer. Forçando-se a
manter o rosto sério, perguntou com voz fria:
— Não lhe ocorreu que talvez eu não quisesse me sentar a seu lado, Buck?
— O inferno não conhece fúria igual à de um homem rejeitado.
— Ora, vamos, eu não rejeitei você.
— Como não? Você não atendeu a um só dos meus telefonemas durante toda a
semana.
— Não falei com você pessoalmente, é verdade, mas minha secretária conversou
com Kelly. Eu estava muito ocupada. Além disso, eu sabia por que você estava ligando.
Já lhe disse, Buck, que estou disposta a ajudá-lo. Mas não queria viajar com você.
— Sim, você me deu essa impressão. Aliás, foi por isso que resolvi lidar com a
situação a meu modo.
— E o que foi que você teve que fazer? Comprar todas as companhias de aviação
com linha para Bangcoc?
— Oh, não. Apenas pedi a Kelly que cuidasse do problema para mim, e ela sabe
como resolver pedidos inesperados.
— Pelo visto você está sempre pedindo a ela que resolva problemas inesperados.
— Amanda, por favor! Juro que esta é a minha primeira incursão no ramo da
pirataria aérea!
— No ramo dos raptos, eu diria — argumentou ela, incapaz de reprimir uma risada
diante do fingido ar de inocência ultrajado no rosto de Buck.
A aeromoça chegou para perguntar o que os dois iam beber, e Buck optou por
champanhe, comentando quando a jovem se afastou:
— Depois de eu ter pedido champanhe para nós, espero que você não saia dizendo
por aí que trato mal as minhas vítimas...
— Sei que você espera que eu me mostre grata por tantas mordomias, Buck, e de
certo modo devo confessar que estou gostando do conforto que você está me
proporcionando. Mas não posso deixar de acrescentar que detesto ser manipulada desta
maneira. Você ignorou completamente a minha vontade própria, numa atitude que não
me agrada.
— Você tem razão, e peço desculpas pelo meu comportamento. Mas não tive outra
alternativa. Compreenda, esta viagem para Bangcoc é uma excelente oportunidade para
eu resolver o meu problema. Estou convencido de que a sua ajuda será essencial ao caso.
Quero, preciso encontrar aquela criança da qual lhe falei.
Mais uma vez vinha à tona a história da misteriosa criança. Amanda teve a
incômoda sensação de que não podia confiar por completo em Buck. Sentia que ia ser
usada de um modo ou de outro, e o charme do qual estava sendo vítima só servia para
piorar as coisas, fazendo sininhos de alarme soarem em sua mente.
— Eu já disse que o ajudaria, Buck, mas não vejo por que temos de viajar juntos.
Quero que você saiba que tenho de cumprir uma série de compromissos em Bangcoc. Eu
o auxiliarei, tudo bem, mas há certos limites quanto ao que posso fazer ou não.
— Sabe do que eu gosto em você, Amanda? O fato de ser bonita e ao mesmo tempo
inteligente.

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

Ambos pararam de conversar quando a aeromoça passou anunciando que todos


deviam colocar seus cintos de segurança para a decolagem. Depois que o avião levantou
vôo, o champanhe foi servido.
Buck ergueu sua taça num brinde, dirigindo a Amanda um sorriso sedutor.
— À sua saúde, e ao sucesso da nossa viagem!
— Saúde... Buck, se você é um homem tão ocupado, como pôde deixar o jornal para
viajar assim tão de repente?
— Primeiro, a minha decisão não foi repentina; tive uma semana para me preparar.
Segundo, acho que mereço umas férias depois de trabalhar tantos anos seguidos sem
descanso. Terceiro, confio na capacidade dos meus funcionários fazerem um bom serviço
mesmo sem a minha supervisão constante. Quarto, imaginei que dentro de um avião, a
mais de nove mil metros de altura, seria difícil você fugir de mim como fugiu na festa.
— Eu não fugi de você.
— Tem certeza? Ouça, eu já me desculpei pelo que fiz no veleiro. Por que não
esquecemos este pequeno incidente e nos tornamos amigos?
Quando Buck se inclinou em sua direção para tocar sua taça na dela, num novo
brinde, Amanda sentiu seu perfume másculo e um arrepio sensual a percorreu.
Tentando disfarçar sua emoção, obrigou-se a sorrir e disse:
— Concordo em ser sua amiga, mas quero deixar bem claro uma coisa: a amizade
é um sentimento mútuo.
— Como assim?
— Simples: eu não serei um brinquedo nas suas mãos.
— Ok... Mensagem recebida e entendida. Não precisa mais se preocupar, Amanda.
Entre um champanhe e outro, tanto Amanda como Buck foram relaxando e
aproveitando a trégua. Conversaram sobre o passado de cada um, mas não sobre o
Sudeste asiático. Buck divertiu-a com histórias do mundo jornalístico, mas sem assumir
uma atitude tipo "só os outros cometem erros engraçados e eu sou o bom"; contou
brincando várias gafes que cometera e vários encontros importantes que tivera com o
presidente dos EUA e outras personalidades famosas. Amanda, por sua vez, também
soube entretê-lo e o fez rir diversas vezes com histórias da sua juventude e do seu
trabalho como assistente social.
Depois da quarta taça de champanhe, ela já se sentia feliz e à vontade na
companhia de Buck. Encará-lo como um simples amigo — em vez de um conquistador
em potencial — era fácil e agradável, além de não fazer soar os sininhos de alarme.
Voando para oeste como estavam, o avião parecia estar perseguindo o sol, o que
prolongou o entardecer. As horas entre o almoço e o jantar passaram despercebidas, num
misto de tagarelice íntima, camaradagem e muitas risadas. Buck tornou-se um amigo,
do tipo que só o isolamento forçado de uma viagem pode produzir.
Pouco a pouco, no entanto, a conversação foi dirigida para assuntos mais sérios.
Assim que terminou de contar a Amanda o trauma que sofrerá ao ter que assumir a
direção do jornal após a morte do pai, Buck permaneceu calado por alguns segundos
antes de pedir:
— Fale-me sobre a sua família, agora.
— A minha família se resume em mamãe e eu — disse Amanda, com pesar. — Ela
mora em San Diego, mas embora nos amemos muito, não nos vemos com a freqüência
desejada. Temos ambas uma vida muito agitada, e portanto...

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Seu pai morreu?


— Sim; ele tinha o coração fraco, mas como era médico sempre soube se cuidar. No
entanto, não resistiu à notícia da morte de meu irmão, que faleceu no Vietnã.
— Eu sinto muito.
— Papai gostava muito de Chris, que era doze anos mais velho que eu. Meu irmão
também era médico, cirurgião da Marinha; ele foi morto durante a ofensiva do Tet em
Da Nang.
— Você devia ser bem jovem quando perdeu seu irmão.
— Eu estava terminando o primário quando Chris foi morto e papai teve um ataque
cardíaco fulminante.
— Com uma diferença de idade tão grande, suponho que você e seu irmão não
tivessem muito contato.
— Bem, eu o considerava um herói, de qualquer modo. Chris costumava me
escrever do Vietnã de vez em quando, me contando sobre as suas experiências com as
crianças de lá. Ele quase chegou a se especializar em pediatria, pois adorava crianças.
— Acha que seu irmão a influenciou a trabalhar com órfãos de guerra?
— Sim, sem dúvida. Envolver-me com serviço e assistência social foi uma maneira
de validar o sacrifício de Chris. Depois da minha primeira viagem à Tailândia, confirmei
a minha vocação. Sabe, de vez em quando releio as cartas de meu irmão... Os anos da
guerra do Vietnã foram uma época muito difícil para a minha família e para o país. Para
todos nós.

Amanda terminou de falar com os olhos úmidos de lágrimas e permaneceu calada.


Buck também caiu num: silêncio profundo. O simples nome "Vietnã" o fizera voltar
ao passado, aos anos que vivera no Sudeste asiático. Melancólico, olhou pela janela e
percebeu que o avião finalmente estava perdendo sua corrida com o sol; a noite começara
a cair sobre o Pacífico. Com um suspiro, resolveu que chegara a hora de falar a Amanda
sobre a menina que procurava. Não podia mais evitar o assunto.
— Amanda... Se você pretende me ajudar na minha busca, talvez seja melhor saber
de todos os detalhes da história.
— Pode confiar em mim, Buck.
— Ok... A garota que estou procurando é filha de uma mulher chamada Dameree.
Eu a conheci quando morei em Bangcoc quinze anos atrás.
— Dameree? Que nome bonito.
— Sim, e ela era uma bonita mulher.
— Tailandesa?
— O nome é tailandês, e ela era de nacionalidade tailandesa; mas, etnicamente
falando, Dameree era chinesa. Eu não soube disso a princípio, pois ela tinha vergonha
da sua origem chinesa.
— Vergonha? Por quê?!
— O caso de Dameree é singular. Ao ficar órfã, ainda bebê, foi vendida por uma tia
a uma família tailandesa.
— Vendida! Que horror!

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Calma, não precisa ficar tão indignada. "Vendida", neste caso, significa mais
uma espécie de adoção. Dameree foi aceita na nova família como se fosse uma filha
verdadeira, e passou a gostar tanto de seus pais adotivos que tentou cortar todos os laços
com o seu passado chinês, talvez por se ressentir de ter sido abandonada.
— Mas ela tinha uma vida feliz?
— Não sei. Felicidade nem sempre quer dizer a mesma coisa para pessoas de
culturas diferentes. A família tailandesa de Dameree era respeitável, mas muito pobre.
O chefe da casa vivia doente, e morava com a esposa e os filhos numa casa minúscula,
sobrevivendo graças a uma pensão do governo. Dameree era a "filha" mais velha do
casal, por isso caiu sobre os seus ombros a responsabilidade de trabalhar e sustentar os
outros. Como você deve saber, na Tailândia e na maioria dos países orientais, a família
é uma instituição sagrada. Dameree arranjou um serviço para dar de comer aos irmãos
e poder mandá-los para a escola.
— Puxa, que devoção. Ela parece uma santa.
— Esta é a ironia da coisa, Amanda. Dameree ganhava dinheiro trabalhando numa
profissão de péssima reputação.
— Ela era prostituta?
— Não, mas quase. Trabalhava numa casa de massagens.
— Uma massagista?
— Sim, eu a conheci numa das velhas casas de banho de Bangcoc. Apesar do que
você possa estar pensando, a tal casa de banho era a princípio um lugar respeitável. Não
havia trancas nas portas das salas de massagens, e se alguma garota prestasse "favores
extras" aos clientes, era imediatamente despedida.
— Neste caso, por que você comparou massagistas a prostitutas?
— Porque uma massagista, mesmo sendo honesta e decente, é considerada uma
serviçal de nível por demais inferior. Pode ser um trabalho lucrativo se a garota
conseguir uma clientela regular, mas não é uma profissão da qual ela se orgulhe e saia
falando por aí. A maioria das massagistas, pelo que sei, são camponesas que vieram do
interior do país, isoladas em Bangcoc de suas famílias e por isso não dão muita
importância à sua reputação. A família de Dameree nunca soube que ela era massagista.
Todos pensavam que trabalhava numa loja ou outro lugar parecido.
Amanda observou a expressão de Buck, ao mesmo tempo triste e nostálgica, e
imaginou qual teria sido a relação dele com Dameree. Era óbvio que a história o estava
deixando comovido.
— Era uma vida muito difícil — continuou Buck. — Dameree trabalhava doze
horas por dia, do meio-dia à meia-noite, seis dias por semana. Ela ganhava cinqüenta
centavos por massagem de aproximadamente uma hora. Às vezes ela ficava sem clientes
por horas a fio. Eu me tornei um dos seus fregueses habituais; a princípio, ia vê-la uma
ou duas vezes por semana, depois comecei a ir com mais freqüência, pois sabia o quanto
ela precisava de dinheiro.
Buck fez uma pausa para tomar um gole de champanhe e então prosseguiu:
— Compreenda, as casas de banho na Tailândia eram pontos tradicionais de
encontros sociais. As massagistas se tornavam amigas de seus clientes, suas
confidentes. Os tailandeses costumavam ir às casas de banho só para conversar e tomar
um drinque gelado com a sua garota preferida.
— Mas as relações nunca iam além da amizade?

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Bem, às vezes sexo e romance entravam no relacionamento. Uma garota podia


começar a sair com um freguês, mas naquela época, antes da guerra do Vietnã, ela
precisava ser muito discreta.
— Essa situação mudou depois?
— Sim, e como! Com a chegada de milhares de soldados americanos de licença em
Bangcoc, a demanda por algo mais que massagens se tornou imensa. Em pouco tempo
as casas de banho se transformaram em sinônimo de bordel. A prostituição tomou conta
da maior parte dos lugares.
— E o que aconteceu a Dameree, Buck?
— Quando o local em que trabalhava se transformou num bordel disfarçado, ela
pediu demissão. A princípio, tentou encontrar outro tipo de trabalho, mas não tinha
experiência necessária para um serviço no qual ganhasse tanto quanto no anterior.
Acabou pedindo ajuda a amigos e antigos clientes, inclusive eu. Que tristeza... Dameree
foi uma vítima da sociedade. Apesar do seu desespero, seus valores morais a impediam
de conseguir dinheiro fácil.
— Entrando para a prostituição, você quer dizer.
— Sim, prostituição. Milhares de outras garotas na mesma situação sucumbiram
à tentação.
— Mas Dameree não.
— Não realmente. No entanto, mais tarde, eu descobri que ela havia "saído" com
alguns fregueses quando era massagista.
Amanda sentiu vontade de perguntar a Buck se Dameree chegara a sair com ele
também, que tipo de relação havia existido entre os dois. Mas não quis ser indiscreta, e
indagou apenas:
— Se Dameree não se tornou uma prostituta, o que passou a fazer para ganhar a
vida?
— Ela me procurou num momento crítico. Sua família descobriu onde ela tinha
estado trabalhando, provavelmente quando o dinheiro acabou. Como explicar o fato de,
tendo saído de uma loja, não conseguir arranjar emprego em outra? A verdade é que
ninguém queria mais uma massagista séria, honesta. De qualquer modo, Dameree teve
que abandonar a sua casa, e eu a convidei para ir morar comigo. A guerra já tinha
começado no Vietnã, então, e o nosso correspondente do Tribune em Saigon tinha sido
morto. Eu passava mais tempo lá do que na Tailândia. Dameree cuidava da casa na
minha ausência, quase como uma governanta. A princípio nós nos víamos apenas duas
ou três vezes a cada duas semanas. Quando arranjamos outro correspondente em
Saigon, voltei para a Tailândia de vez, e neste período eu e Dameree dividimos a casa.
Esta situação perdurou por quase um ano.
— E depois disso, o que aconteceu? — indagou Amanda, curiosa, tentando imaginar
o que Buck quisera insinuar com "dividir a casa"; por acaso os dois teriam sido amantes?
— Um dia precisei retornar ao Vietnã para cobrir a retirada dos soldados norte-
americanos do país e acabei envolvido num acidente de helicóptero. Fiquei muito ferido
e fui levado primeiro para Cam Ranh Bay, e depois para Tóquio. Alguns meses se
passaram antes que eu ficasse em forma o suficiente para ao menos pensar em Bangcoc.
No hospital, em Tóquio, escrevi uma carta para Dameree. Não obtive resposta e escrevi
de novo. Quando me recuperei o bastante para ser removido, os médicos me enviaram
para os Estados Unidos, e foi lá que finalmente recebi notícias de Dameree.

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Ela lhe mandou uma carta?


— Mandou, dizendo que estava grávida, e que o meu acidente, com o conseqüente
retorno aos Estados Unidos, era um presságio. Sabia que não podia contar comigo pelo
resto da vida, particularmente agora que ia ter uma criança. Ela disse que tinha chegado
a hora de nos separarmos e que ela e o bebê iriam cuidar de si mesmos dali para a frente.
— Céus, Buck! E o que você fez?
— Escrevi a ela de imediato avisando que voltaria para a Tailândia tão logo
estivesse recuperado. Eu estava fazendo fisioterapia e sabia que ainda demoraria alguns
meses para poder cumprir a minha promessa. Dameree não respondeu à minha carta.
Nunca mais ouvi falar dela.
— Ela... simplesmente desapareceu?
— Nunca deixei de seguir os passos de Dameree, mesmo quando me encontrava no
hospital, em Tóquio. Havia um homem que trabalhava para mim em Bangcoc, Kupnol
Sustri. Ele cuidou dos meus negócios por um tempo, inclusive no que dizia respeito a
Dameree. Minhas cartas a ela eram enviadas através de Sustri, junto com uma certa
soma de dinheiro para despesas gerais. Fiquei sabendo, pelo meu agente, que Dameree
permaneceu na minha casa até &, nascimento da criança, seis meses depois de eu ter
partido de Bangcoc. Ela nunca respondeu às minhas cartas, mas Sustri me contou que
o bebê era do sexo feminino, uma garotinha mestiça. Mandei mil dólares para Dameree
depois do nascimento da criança, na esperança de que ela continuasse na minha casa
até eu poder ir vê-la. O dinheiro foi recusado, devolvido a Sustri. Logo depois deste
acontecimento, Dameree desapareceu, sumiu do mapa.
— E este é o fim da história?
— Não. Retornei a Bangcoc dez meses depois do acidente de helicóptero. Eu tinha
sofrido um sério ferimento na espinha, e os ossos do meu braço direito e de ambas as
pernas tinham quebrado. Os médicos conseguiram me deixar inteiro de novo, quase tão
bom quanto novo, mas isso demorou bastante, incluindo as diversas cirurgias plásticas
que precisei fazer nos anos subseqüentes. De qualquer modo, quando finalmente voltei
a Bangcoc, não encontrei mais pistas de Dameree. Passei seis semanas procurando por
ela, sem sucesso. Por fim convenci-me de que se Dameree estivesse viva e ainda na
Tailândia, saberia que eu estava tentando localizá-la, mas tinha resolvido se esconder
bem. Não queria que eu a visse.
— Por que não?
— Não sei.
— E então você desistiu das buscas.
— Sim, não me restou outra alternativa. Retornei a Los Angeles, comecei a
trabalhar no jornal e, depois de poucos anos, acabei me casando.
— Você se esqueceu de Dameree até que as reportagens sobre órfãos aguçaram o
seu interesse, foi isso que aconteceu?
— Bem, muito tempo se passou. Eu tinha minha carreira para me preocupar.
Bangcoc se transformou numa memória do passado. Eu decidi que já tinha feito todo o
possível para localizar Dameree e que ela não podia ou não queria me ver. O que as
reportagens do jornal fizeram foi atrair a minha atenção para a criança, filha de
Dameree. Eu sempre pensei nas duas como uma unidade. Ocorreu-me de repente que
elas poderiam estar separadas. Ter uma criança mestiça, naquela época, trazia muitos
problemas a uma mulher. Foi isso o que me fez ir a Bangcoc no verão passado. Eu

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

pretendia procurar a criança, tendo em mente a idéia de que Dameree talvez tivesse
coberto a sua pista, mas não a da filha. Talvez esta nova aproximação do caso ainda dê
resultados. Sustri está procurando a menina, e agora também tenho você para me
ajudar. — Buck terminou de falar e sorriu, envolvendo Amanda com um olhar profundo
e lânguido. — E mesmo que eu não encontre a menina, a minha viagem terá valido a
pena...
O olhar de Buck e sua última frase fizeram Amanda se lembrar da expressão dele
antes de beijá-la no barco, dias atrás. Um arrepio sensual percorreu-a, uma emoção à
qual não podia se render. Resolveu que o melhor antídoto contra o novo rumo que a
conversa tomara seria ignorar a atração física que sentia pó? Buck e continuar com uma
postura prática e eficiente.
— Agora começo a entender a sua urgência em descobrir o paradeiro da garota.
Admito que a sua história pôs a minha imaginação para funcionar. Era esse o seu
intento?
— Não sei. Eu só quis que você soubesse a história toda, já que trabalharemos
juntos no caso.
— Bem, obrigada por ter me contado sobre Dameree. Buck pareceu aceitar sem
reservas o comentário de Amanda e, suspirando fundo, reclinou o encosto da poltrona.
Ambos haviam conversado por horas a fio, e Amanda percebeu que a história da mulher
tailandesa abalara um pouco as emoções de Buck, que pelo visto precisava de alguns
momentos consigo mesmo para se refazer.
A noite já havia caído, embora alguns últimos resquícios da luz do dia teimassem
em tingir o longínquo horizonte. Amanda fechou os olhos, sabendo que se estivesse em
Los Angeles já teria ido para a cama há horas, mas seu corpo não deu sinais de querer
dormir.
As longas e agradáveis horas de conversação que tivera com Buck passaram-lhe
pela mente. Gostara muito da companhia dele, mas seus pensamentos continuavam
dirigindo-se para a mulher misteriosa, Dameree. Buck lhe contara quase tudo, mas
deixara de fora o ponto mais importante de todos — se ele havia sido amante da mulher
e se a criança era filha dele também.
Amanda achava que a resposta às suas dúvidas eram afirmativas. De que outro
modo explicar o interesse de Buck, quase uma obsessão, em encontrar a menina?
Curiosa, ela virou a cabeça e estudou o rosto de Buck, relaxado numa expressão
tranqüila e serena. Examinou com atenção os belos contornos da face máscula, o nariz
reto, os lábios cheios e sensuais, a linha firme do queixo e do maxilar. Mesmo em estado
de relaxamento, a boca de Buck estava curvada num ligeiro sorriso, como se soubesse
que estava sendo observado.
E naquele exato momento, ele abriu os olhos e apanhou-a em flagrante,
examinando-o.
— No que está pensando enquanto olha para mim, Amanda?
— Para ser sincera, eu estava imaginando quais seriam os motivos reais que o
estão levando a fazer esta viagem.
— Chegou a alguma conclusão?
— Não, mas há algumas perguntas que me vieram à mente...
— Que perguntas?

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Bem... Por exemplo,.. Por que, depois de todos esses anos, você de repente
recomeçou a procurar a menina?
— Ora, não foi tão de repente assim. Primeiro saiu aquela série de reportagens que
me fizeram ficar pensando no assunto, e depois veio a minha viagem à Ásia e...
— Mas isso tudo é muito recente, Buck. Não serve como motivo.
— Hum... Talvez você tenha razão. No fundo, suponho que eu esteja num estágio
da minha vida onde tenho que saber a verdade, antes que seja tarde demais, antes que
a filha de Dameree tenha o seu destino traçado para um lado ruim. Mesmo eu tendo
tentado encontrá-la doze anos atrás e gasto um monte de dinheiro no processo, sem
resultado, fui capaz de racionalizar o meu insucesso. O mesmo não acontece agora.
— Buck... Você é o pai da filha de Dameree?
— Quer uma resposta honesta? Pois bem, eu não sei. Dameree nunca me falou
sobre o pai de sua filha, e não respondeu à carta na qual eu fazia a mesma pergunta que
você me fez agora. E é esta incerteza que preocupa, tanto quanto o destino da menina.
— E é muito dolorosa essa sensação de incerteza?
— Eu diria que ela é mais frustrante que qualquer outra coisa...
— Você não tem outros filhos?
— Não, graças a Deus. Carolyn era egoísta demais para gostar de crianças, para
ter um filho.
Por que você disse "graças a Deus"? Por causa do divórcio? — Sim. Num processo
de separação, os filhos geralmente se transformam em "coisas", com os pais brigando
por sua posse como pela posse de um carro, ou de uma casa.
— Há quanto tempo você está divorciado?
— Por volta de seis anos.
— E você sente falta de estar casado?
— Ora, que pergunta estranha! Não, acho que não. Por quê?
— Não sei, mas... À vezes me parece que você está procurando por alguma
continuidade, alguma estabilidade para a sua vida. Talvez pela família que nunca teve.
— Talvez... Quem sabe? — argumentou Buck, reclinando-se contra o encosto da
poltrona e fechando os olhos.
Amanda observou-o por alguns instantes, pensativa. A animosidade que sentira
contra ele por sua arrogância e convencimento parecia ter sumido diante da ternura que
vira nele durante a viagem. Aparentemente existia um segundo lado na personalidade
de Buck Michaels — um lado que a tocava e. comovia.
Ele agora parecia menos vil e maligno que antes, quando tentara usar seu charme
para convencê-la a ajudá-lo. Amanda, porém, não se iludia. Era lisonjeador saber que
Buck se sentia atraído por ela, mas isso não significava nada importante. O melhor modo
de agir em relação a ele seria conservar em mente o fato de que eram — e continuariam
sendo — simplesmente amigos.
Por alguma razão inexplicável, o beijo trocado no veleiro voltou à memória de
Amanda. Sentiu nos lábios a lembrança da delicadeza e doçura com que fora beijada.
Sim, Buck sabia como agradar uma mulher... Mas o seu charme não era acidental; devia
ter sido adquirido à custa de muito treino, muitas conquistas...
As luzes do avião diminuíram de intensidade, criando um clima aconchegante e
lânguido. Imersa em seus pensamentos, Amanda foi pouco a pouco relaxando, sonolenta.

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

Apenas vagamente percebeu que a aeromoça se aproximou dela para cobri-la com um
cobertor leve. E, meio -acordada, meio dormindo, não resistiu quando Buck a puxou
contra si e a fez repousar a cabeça em seu ombro.
Se o calor gostoso daquele corpo másculo contra o seu era um sonho, Amanda
queria mais era continuar sonhando...

CAPÍTULO IV

Quando a limusine que Buck alugou no aeroporto alcançou a periferia de Bangcoc,


já passava das onze da noite. Exausta e sonolenta por causa da longa viagem, Amanda
quase nem se deu conta dos pedestres, ciclistas e samlors que iam deixando para trás
na estrada. E embora o elegante veículo em que se encontrava tivesse ar condicionado,
era impossível não se sentir afetada pelo pesado e quente ar tropical da região.
— Espero que não se importe por eu ter reservado um quarto para você no mesmo
hotel em que ficarei — disse Buck de repente.
— O quê? Mas eu já reservei acomodações para mim no Manobra, onde sempre
fico! — exclamou Amanda, surpresa. — Cheguei a pagar duas diárias adiantadas, lá.
— Podemos ligar para o Manobra pela manhã e cancelar a sua reserva, sem
problemas.
— E se eu preferir me hospedar no Manobra?
— Por quê, não gosta do Oriental?
— Gosto, mas isso não interessa. Tenho meus próprios planos, Buck, e pretendo
segui-los.
— Não seja teimosa, Amanda. Será muito mais conveniente ficarmos os dois no
mesmo hotel. Além do que, não foi fácil reservar boas acomodações para nós assim, em
cima da hora.
— Boas acomodações para você, pois eu ficarei no Manobra.
— Não, não ficará.
— Buck, por favor, não insista!
— Ouça, Amanda, eu só estou tentando ser prático.
— Mas não percebe que isso vai contra os meus desejos... mais uma vez?
— As minhas intenções não são maliciosas.
— Grande vantagem! Buck, será que não entende que você não pode simplesmente
fazer só o que lhe agrada, passando por cima da vontade de outras pessoas, obrigando-
as a aceitar os seus desejos?
— Muita gente que conheço não sé importaria de "ser obrigada" a se hospedar no
Hotel Oriental, um dos melhores de Bangcoc.
— Pois não faço parte desse grupo, sabia? Eu me importo, e muito!
A discussão terminou com olhares zangados de ambas as partes, no mesmo
instante em que o chofer estacionou a limusine diante do Oriental. Buck desceu do
automóvel deixando a porta aberta para que Amanda o seguisse, o que não aconteceu.
Irritada, ela permaneceu no carro disposta a continuar a viagem até o Hotel Manobra.

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

Do lado de fora da limusine vários empregados do hotel cercaram Buck, que, depois
de conversar com eles e com o motorista, entregou-lhes um pequeno maço de dinheiro.
Em seguida, Buck voltou para perto do automóvel e perguntou, encarando Amanda:
— Não vai descer?
— Não. Como já lhe disse, estou indo para o Manobra, onde fiz reserva.
— Sinto informar-lhe, mas esta limusine não vai até lá.
— Não? Tudo bem, tomarei um táxi.
— Infelizmente, acho que esses táxis parados aqui na frente já foram reservados
por outras pessoas.
— Oh, Buck, você é impossível! Aposto que subornou todo mundo! Não tem
vergonha? Droga, onde está a minha mala? — indagou ela descendo da limusine, furiosa.
— Os carregadores já a levaram lá para dentro.
— Buck...
— Por favor, Amanda, por que não entramos e continuamos a nossa discussão
tomando uma boa xícara de chá?
Sem deixar de demonstrar seu desagrado, Amanda pegou a bolsa e a bagagem de
mão e entrou no hotel. Sentou-se na primeira cadeira que viu no saguão de entrada e
deu um suspiro de desânimo quando Buck puxou outra cadeira e acomodou-se a seu
lado, argumentando:
— Ouça, Amanda, eu sinto muito. Minhas intenções foram boas, e... Para ser
sincero, pensei que você fosse ficar agradecida.
— Se você tivesse lidado de modo diferente com a situação, talvez eu tivesse ficado
agradecida.
— Mas eu não o fiz, e peço desculpas por isso. Por favor, me dê mais uma chance.
Vamos começar tudo de novo, ok? — pediu ele, com um sorriso cativante nos lábios.
Mas, ao ver que Amanda parecia não estar convencida de suas palavras, insistiu:
— Sei que está aborrecida comigo e não posso culpá-la por isso. Reconheço que sou
um homem mimado, acostumado a ter as coisas do jeito que quero. É uma reação natural
para eu ajeitar a situação a meu modo, mas, se tal atitude a desagrada, prometo tentar
não agir mais assim.
Cansada e com fome, Amanda percebeu que não teria forças para prolongar a
discussão. Resignada, acabou dizendo a Buck que concordava em ficar no Oriental. Com
um sorriso vitorioso, ele dirigiu-se ao balcão de recepção e voltou poucos minutos depois,
comentando com ar embaraçado:
— Para manter a minha promessa de levar em consideração as suas vontades,
talvez seja melhor eu lhe explicar que tipo de reservas fiz para nós. Não sei se você sabe,
Amanda, mas aqui há maravilhosas suítes chamadas de Residência do Autor e...
— Suítes?
— Antes que você pense que estou com más intenções, deixe-me dizer que teremos
quartos independentes, portanto, não precisa ficar preocupada. É que existem apenas
quatro dessas suítes, que em geral são reservadas com meses de antecedência. Eu sou
apaixonado por elas, e houve um cancelamento de última hora quando Kelly estava
fazendo as nossas reservas.
Amanda começou a falar, mas, antecipando a pergunta dela, Buck argumentou:

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— O hotel está lotado. Eu já verifiquei, não há outros quartos disponíveis. Vamos,


por que não dá pelo menos uma olhada na suíte?
Instantes mais tarde, um mensageiro do hotel guiou-os através do saguão e levou-
os por um corredor com piso de mármore até a entrada da suíte. Durante o caminho,
Buck explicou a Amanda a origem do nome Residência do Autor.
— As quatro suítes são chamadas deste modo em homenagem a escritores famosos
que se hospedaram aqui: Conrad, Coward, Maughan e Michener. Ficaremos na suíte de
Noel Coward.
O mensageiro abriu duas grandes portas duplas e Amanda viu-se de repente no
aposento mais bonito que já conhecera em toda sua vida: uma sala decorada em tons de
verde-esmeralda e azul-pavão. O teto era recoberto por um tecido estampado de seda
tailandesa, e a mobília consistia em grande parte de peças orientais entalhadas.
Diversos vasos com flores de cores alegres haviam sido distribuídos por toda parte.
— Nossas malas deverão estar aqui em poucos minutos, portanto, se você quiser se
refrescar um pouco, fique à vontade.
Amanda pareceu não ouvir a sugestão. Estava encantada com a sala, que mais se
assemelhava a um sonho, e entendia agora por que Buck insistira em hospedá-la no
Oriental. Mas, no fundo, não conseguia deixar de pensar se a reserva da suíte privada
não estaria escondendo um propósito mais obscuro que o da simples conveniência e
praticidade.
Como se houvesse lido os pensamentos de Amanda, Buck ofereceu, gentil:
— Quer escolher primeiro em qual quarto vai ficar? Veja, aqui temos um aposento
com paredes verde-jade, móveis de madeira e vidro, cadeiras de veludo azul... E aqui,
deste outro lado da sala, temos o quarto maior: mais azul que o outro, com duas camas
em vez de uma. Qual deles prefere?
— O menor, se não se importa.
— Ah, excelente escolha! Você combina mesmo mais com a cor verde. E agora, posso
ligar para o Manohra e cancelar a sua reserva lá?
Amanda sorriu, incapaz de resistir às táticas diplomáticas de Buck, e concordou
com um aceno de cabeça. Depois que as malas chegaram, retirou-se para o seu quarto e
colocou uma roupa mais fresca, após lavar o rosto e pentear-se.
Meia hora mais tarde encontrava-se em companhia de Buck caminhando pelo
terraço do lado de fora do hotel sob o pesado ar tropical. Embora já fosse quase meia-
noite, várias pessoas estavam sentadas nos bancos do terraço, observando as luzes dos
barcos que singravam as águas escuras do rio Chão Phraya. Durante o dia, o rio
assemelhava-se a uma estrada congestionada, uma das artérias principais do comércio
da cidade; mas à noite, ele era um repositório da alma exótica e romântica de Bangcoc.
— O restaurante Verandah fecha à meia-noite, por isso acho melhor nos
apressarmos — disse Buck, tomando-a pelo braço e apertando o passo.— Eu telefonei ao
restaurante avisando que estávamos a caminho, mas é bom não facilitarmos muito, ou
corremos o risco de irmos dormir com fome.
Ao chegarem pouco depois ao Verandah, o maitre, um jovem e bonito tailandês,
esperava-os à porta com um sorriso amigável no rosto.
— Boa noite, Sr. Michaels, é um prazer tê-lo conosco de novo — cumprimentou o
jovem, virando-se em seguida para Amanda: — Boa noite, madame; a sua beleza honra
o nosso humilde restaurante.

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Após a troca de gentileza, o maitre levou-os a uma mesa com vista para o rio.
— Espero que não se importe, Amanda, mas quando liguei para cá avisando que
vínhamos, aproveitei para pedir o prato que íamos comer, para não perdermos tempo.
Você gosta de curry, não gosta?
Percebendo que Buck estava beirando o exagero, tomando mil cuidados para não
desagradá-la, Amanda decidiu que dependia dela amenizar a situação, afinal, quem
discutira com tanto ardor na limusine para ter suas vontades respeitadas?
— Sim, gosto muito — respondeu ela, por fim. — Mas não consigo deixar de lado a
sensação de que deveríamos estar tomando o café da manhã, e não jantando.
— Sempre achei que o melhor modo de se adaptar o corpo à mudança de fuso
horário é entrar direto no novo esquema de tempo. É por isso que não costumo dormir
muito no avião quando venho para o Oriente.
Assim que os pratos à base de curry foram servidos, junto com duas cervejas bem
geladas, a conversa foi interrompida. Ambos comeram com grande apetite e, após o
término da refeição, relaxaram, apreciando a bela paisagem do rio.
— Que tal voltarmos agora para o hotel? — sugeriu Buck. — Se dormirmos um
pouco, talvez amanhã estejamos preparados para um verdadeiro café da manhã.
Caminharam de volta ao Oriental pelas margens do Chão Phraya e, para surpresa
de Amanda, Buck pegou-lhe a mão. Foi um gesto carinhoso, sem dúvida um mudo apelo
de paz, e por isso ela se permitiu aceitá-lo. A sensação de proximidade e familiaridade
que os dois haviam compartilhado no avião envolveu-a mais uma vez, e, apesar de tudo,
foi obrigada a admitir que gostava disso.
Deixando que ele lhe segurasse a mão, Amanda sabia que estava aceitando a
amizade que lhe era oferecida. Uma amizade mesclada a um certo apelo sensual, o que
a fez ficar preocupada em relação ao que aconteceria quando estivessem na suíte e
chegasse a hora de dizer boa noite. Mas como não adiantava muito preocupar-se com
antecedência, decidiu relaxar e aproveitar o passeio.
Passaram diante de um pequeno cais no qual estavam ancorados dois compridos
barcos brancos, imponentes e brilhantes.
— Estes são os barcos de passeio do hotel, o Orchid Queen e o Oriental Queen.
Precisamos fazer uma viagem pelo rio com eles, antes de irmos embora — comentou
Buck.
Enquanto permaneciam parados observando as belas embarcações, um homem que
se encontrava sentado no embarcadouro levantou-se e aproximou-se, sorrindo,
inclinando o corpo segundo a maneira oriental de cumprimento.
— Este é o guarda-noturno — explicou Buck para tranqüilizar Amanda, e em
seguida saudou o homem: — Sawat dee khrap, boa noite!
O sorriso do guarda aumentou, e ele curvou-se de novo. Buck disse mais algumas
frases em tailandês, com um pouco de dificuldade, mas o homem apenas continuou
sorrindo e curvando-se.
— Parece que ele não quer entender o que digo — comentou Buck.
— E o que foi que você disse? — indagou Amanda, curiosa.
— Perguntei se podíamos ir a bordo conhecer os barcos. Vou insistir mais uma vez,
quem sabe adianta.
Buck voltou a falar na melódica língua oriental, enfatizando as frases com alguma
mímica.

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O guarda respondeu, por fim, com poucas palavras e alguns gestos largos. Primeiro
apontou para o próprio pulso, como se usasse um relógio, e em seguida encostou o rosto
nas mãos unidas indicando uma pessoa dormindo.
— Ele está dizendo que já deveríamos estar na cama — traduziu Buck, rindo.
Amanda também riu, argumentando:
— Diga a ele que são apenas dez horas da manhã na Califórnia.
— Tudo bem, mas como se diz "acabamos de mudar de fuso horário" em tailandês?
— Não sei. O poliglota aqui é você, não eu.
— Bem, nesse caso tenho a impressão de que se quisermos conhecer os barcos esta
noite teremos que bancar os piratas.
— Pelo que me lembro, você é um pirata experiente... Buck riu da brincadeira e,
depois de se despedir do guarda noturno, puxou-a pela mão em direção a uma grande
árvore em meio a um gramado nas margens do rio. Ao pararem sob os galhos frondosos,
Amanda sentiu-se abraçada pela cintura e puxada de leve de encontro ao corpo másculo
de seu acompanhante. Percebeu de súbito que estavam completamente sozinhos, e
experimentou um pouco de medo. No fundo, estivera esperando que Buck tomasse
alguma iniciativa do gênero, mas agora que isso estava acontecendo, sentia-se
estranhamente despreparada.
Estremeceu ao lembrar-se da insistência de Buck para que ficassem juntos no
Oriental, dividindo uma suíte. Seria isso uma indicação do que ele teria em mente?
Buck abraçou-a com gentileza, mais com carinho do que com intentes sexuais.
Amanda foi relaxando pouco a pouco, aconchegando-se ao corpo forte e quente que a
segurava. Buck percebeu a reação dela e encarou-a com um brilho afetuoso nos olhos.
Amanda devolveu o olhar, com um pouco de medo e expectativa: como não percebera
antes o quanto estava ansiosa por ser beijada? Como que em resposta ao seu desejo
secreto, Buck beijou-a com ardor, excitado.
Amanda correspondeu ao beijo com paixão, oferecendo sem reservas seus lábios e
língua. A deliciosa sensação das bocas unidas provocou carícias mais ousadas, mais
sensuais. Ao ver que não era rejeitado, Buck deslizou as mãos pelas costas e nádegas de
Amanda, pressionando-a contra seus quadris. Ao sentir o membro rijo e másculo contra
seu ventre, ela se deu conta de que o desejo de Buck chegara a um ponto que ainda não
estava preparada para aceitar. Reunindo toda a sua força de vontade, lutou para afastar-
se dele que, sem entender o motivo de uma reação tão brusca, perguntou surpreso:
— O que foi, Amanda? O que houve?
— Eu... eu não deveria tê-lo deixado me beijar. — Por que não?
— Não era isso o que eu queria.
— Não? Pois juro que, nesse caso, você me enganou direitinho.
— Talvez a culpa não seja sua, e sim minha. O fato é que não quero que você tenha
uma impressão errada de mim. Ao concordar em dividir uma suíte no Oriental com você,
eu não estava concordando automaticamente com... com qualquer outra coisa.
— Que "outra coisa"?
— Ora, você sabe muito bem.
— Não, não sei. Pode responder à minha pergunta, por favor?
— Buck, eu não sou Jillian.
— Jillian?! O que ela tem a ver com a história toda?

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Eu não fiz esta viagem só para ser sua parceira de cama.


— Eu não a encaro como uma futura "parceira de cama", Amanda. E não precisa
se preocupar com Jillian, também. Nosso relacionamento é casual e amigável agora,
embora já tenhamos sido mais íntimos um dia.
— Jillian não parecia nem "casual" nem "amigável" naquela festa na sua casa!
— Ok, sei que ela ainda gosta de mim e sente ciúme das mulheres que conheço,
mas o que posso fazer? Bancar o grosso e dizer a Jillian para sumir da minha frente?
Amanda calou-se, embaraçada. Que direito tinha de recriminar Buck por sua
relação com outras mulheres? Desejando não ter tocado jamais num assunto tão delicado
e que não era da sua conta, esperou que Buck dissesse mais alguma coisa, o que não
aconteceu. Reconhecendo que fora um pouco indelicada demais, ela sugeriu num tom de
voz suave de quem pede desculpas:
— Não seria melhor voltarmos para o hotel?
— Acho que sim — respondeu ele, pensativo. — Mai pen mi.
Amanda conhecia a expressão, que era praticamente a filosofia nacional da
Tailândia e que queria dizer: "Não importa, o que tiver de ser, será"...
Na manhã seguinte, Amanda saiu de seu quarto e encontrou Buck sentado na sala,
numa mesa perto da janela. Por um breve instante carregado de eletricidade, ambos
ficaram se olhando em silêncio.
Desde que acordara, ela não parará de pensar um só segundo sobre a discussão da
noite anterior, mas ao ver Buck em carne e osso esqueceu-se de tudo para concentrar-se
apenas na beleza dele. Vestindo uma camisa azul, aberta até a metade do peito coberto
por pêlos negros — Buck apresentava uma imagem, por demais atraente e sensual.
Ao atravessar a sala em direção à mesa, Amanda sentiu que era observada de alto
a baixo pelos penetrantes olhos azuis de Buck, que examinaram com interesse sua calça
comprida de linho branca, sua blusa cor-de-rosa sem mangas e seu pescoço
— exposto pela primeira vez por causa dos cabelos presos num elegante coque
devido ao forte calor tropical.
— Eu não sabia o que você ia querer como café da manhã, por isso pedi um pouco
de tudo — disse Buck, indicando-lhe uma cadeira, amigável como sempre, como se nada
de desagradável tivesse acontecido na noite anterior.
Amanda sorriu, embaraçada, e corou ao comentar:
— Sinto desapontá-lo, mas nunca sinto muita fome ao acordar.
— Ora, vamos, há tanta coisa gostosa aqui! Nenhuma a atrai? Veja: frutas, sucos
naturais, doces, ovos Benedict, canapés de caviar... Ou você prefere uma xícara de café
apenas?
— Sim, por favor. Aceito o café. Buck serviu-lhe uma xícara e perguntou:
— Quais são os seus planos para hoje?
— Tenho que ir ao Ministério das Relações Exteriores e dar entrada na
documentação do próximo grupo de crianças que será enviado aos Estados Unidos.
— Conhecendo a burocracia tailandesa, eu diria que você vai gastar a maior parte
do dia no ministério.
— É possível que sim.

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Eu vou me encontrar com o meu agente, Kupnol Sustri, hoje. Isso também é
capaz de me ocupar a maior parte do dia. Nem queira saber como é difícil obter uma
história completa é simples dele.
— Como assim?
— Bem, antes de continuar com as minhas investigações, quero ter certeza de que
não estou sendo enganado com informações falsas.
— Você não confia no seu agente?
— Até certo ponto, sim. Mas só até certo ponto. E agora, já que pelo visto vamos
ter muito o que fazer durante o dia, por que não jantamos juntos, à noite?
— Agradeço o convite, Buck, mas... não se sinta na necessidade de bancar o
anfitrião completo para mim. Sei me virar sozinha, esta não é a primeira vez que venho
para cá, você sabe.
— Não a convidei por obrigação, Amanda, e sim porque gosto da sua companhia.
Gostaria de jantar no Normandie Grill, comigo, às oito horas? Esse restaurante tem a
melhor cozinha francesa de todo o Sudeste asiático, e seria um pecado você não
experimentar a comida de lá.
— Bem, se é assim... obrigada pela consideração, Buck. Aceito o convite.
— Ótimo! Um ponto para mim, oba! — brincou ele, sorrindo vitorioso.
Amanda não resistiu e caiu na risada também.
Seguindo seu caminho pelas vielas estreitas da cidade, o táxi brigava por espaço
com dúzias de samlors, as estranhas motocicletas de três rodas, cobertas, que
congestionavam o trânsito de Bangcoc. Enquanto Amanda, sentada no banco traseiro do
automóvel, observava o caótico movimento de veículos nas ruas, Buck, acomodado a seu
lado, aproveitava a chance para examiná-la. Ela era uma criatura adorável, e cada vez
que a via Buck a desejava mais e mais; ansiava por acariciá-la, por tocar em sua pele
rosada e macia. No entanto, sabia que devia esperar para satisfazer sua vontade. O
incidente da noite anterior provara que Amanda não era uma mulher fácil, o que não
deixava de agradá-lo.
O mais intrigante, contudo, era que não sentia apenas desejo físico por ela. Desde
que haviam se conhecido, Amanda despertara nele emoções há muito escondidas no
mais fundo de seu ser, emoções que faziam um homem querer mais que o simples corpo
de uma mulher. Buck sentia-se de novo como um adolescente disposto a descobrir os
mistérios do primeiro amor, da primeira namorada.
Enquanto Buck pensava nisso tudo, Amanda virou-se e encarou-o por um breve
instante, antes de voltar a prestar atenção ao movimento da rua. Ele não se importou
de ter sido apanhado em flagrante, observando-a; a experiência lhe ensinara que um
olhar de admiração franco e honesto era o elogio mais eloqüente que uma mulher podia
receber. E, além de tudo, Buck pressentia que Amanda estava começando a gostar da
atenção de que era alvo. A princípio, parecera até gostar do beijo que havia recebido nas
margens do rio e isso poderia acontecer de novo.
Amanda encarou-o mais uma vez e, quando seus olhos se encontraram, ela sorriu
e disse:
— Foi muita gentileza da sua parte oferecer-se para me dar uma carona, Buck.
Mas espero que confie em mim o suficiente para permitir que eu volte sozinha para o
hotel. Do jeito que você está me mimando, é bem capaz que eu me torne mesmo uma
incompetente.

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

Buck riu do comentário, mas a beleza dos olhos verdes de Amanda o fez esquecer-
se de responder à brincadeira. Incapaz de se controlar, deixou que seus dedos
acariciassem a nuca de, Amanda. Mas, pelo visto, a carícia foi considerada íntima
demais; com uma expressão mista de desagrado e preocupação, ela virou-se e continuou
a observar a rua.
Buck sorriu consigo mesmo, sabendo que mais cedo ou mais tarde a relutância de
Amanda seria superada. Afinal, como sempre, tudo se resumia numa questão de orgulho
feminino. E não custava nada demonstrar respeito por este orgulho, até o momento de
vencê-lo.
O único problema, contudo, era que Amanda parecia estar rejeitando os avanços
de Buck por considerá-los simplesmente um desejo de conquista. As mulheres, em geral,
tinham a mania de interpretar cada gesto masculino como uma agressão implícita
quando, na verdade, o objetivo real era uma procura de satisfação mútua.
"Mas não vou permitir que isso me perturbe", refletiu Buck; "um relacionamento
fácil demais impede que se possa avaliar bem a personalidade da parceria escolhida". E,
levando em consideração o fato de que seus piores relacionamentos tinham sido aqueles
nos quais as mulheres só haviam demonstrado interesse por suas qualidades na cama e
pelo seu dinheiro, Amanda até que prometia uma relação mais gratificante. Ela dava a
impressão de não ligar particularmente para nenhuma dessas duas coisas e, apesar de
suas discussões, parecia gostar dele com sinceridade.
Buck estava sentindo um grande prazer em observá-la e percebeu que de certo
modo tornara-se uma vítima da sua beleza.
Uma beleza que o forçara a agir com mais rapidez do que a prudência permitia.
Naquele instante, por exemplo, precisou se esforçar ao máximo para não tomá-la nos
braços e beijar-lhe as orelhas delicadas, murmurando o quanto a desejava.
— Você sempre se sente perturbada quando está sendo examinada por um homem?
— perguntou Buck de repente, ao reparar que ela estava começando a ficar nervosa sob
o seu olhar atento.
— E quanto a você, Buck, gosta de provocar as mulheres?
— Provocar? Por que uma observação franca e direta seria uma provocação?
— Porque eu tenho a impressão de que você aprecia o fato de fazer as pessoas se
sentirem perturbadas.
— Não, não aprecio. Este é só um jeito meu de conhecer melhor as pessoas e me
tornar conhecido. Apenas faço isso com quem me interessa muito, com as pessoas com
as quais me preocupo.
— Devo me sentir lisonjeada com as suas palavras, por acaso?
— Bem, pelo menos não se sinta ofendida. Você tem uma certa tendência para
interpretar mal tudo o que eu digo.
— E como eu deveria interpretar o que diz?
— Sem nenhum mistério. Eu a admiro, Amanda. Considero você uma mulher
inteligente e bonita. Mas sinto que algo... não sei o que é... está se interpondo entre nós.
— Talvez esse "algo" sejam os nossos interesses divergentes.
— Pode ser. No entanto, duvido que você saiba quais são os meus interesses.
— Não é minha função julgá-lo pelos seus interesses, Buck, quer eu os conheça,
quer não. Só o que me cabe fazer é definir a minha posição. Você foi mais que generoso
comigo, até agora. Tenho aceitado a sua hospitalidade, com certa relutância, admito,

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

mas considero a nossa relação como profissional apenas. Não quero lhe dar uma
impressão errada a meu respeito.
— Amanda, se você acha que existe alguma intenção oculta por trás do que já fiz
em benefício da sua Fundação, deixe-me lhe dizer que está redondamente enganada.
Não espero nada de você além de civilidade e amizade. Mas, por outro lado, não pense
que tenho medo de dizer o que sinto. Eu a considero uma mulher por demais atraente,
você sabe. E, o mais importante, eu gosto de você.
Amanda não conseguiu reprimir um sorriso diante de tais palavras. Buck
aproveitou a chance para pegar-lhe a mão e afirmar:
— Não sou um homem que se detém facilmente, mas eu a respeito o bastante para
agir de acordo com a sua vontade, sem forçá-la.
O táxi parou por fim diante do prédio do ministério. Amanda abriu a porta do carro,
corada, parecendo ansiosa por escapar de Buck e de suas frases de efeito. Embaraçada,
despediu-se dizendo:
— Obrigada pela carona. Nós nos veremos no jantar.
Buck sorriu com seus botões, sentindo-se já vitorioso. Pedindo ao motorista do táxi
que esperasse um pouco, ficou observando Amanda até que ela desaparecesse no interior
do edifício do governo. Sabia que, agora, a desejava mais do que nunca...

CAPÍTULO V

O sorriso de Kupnol Sustri foi diminuindo pouco a pouco diante do interrogatório


a que Buck o submeteu, mas- qualquer sinal de ressentimento ou raiva permaneceu bem
escondido.
— Acredite-me, irmão, estou numa posição muito difícil — disse o oriental, num
tom implorante. — Dei minha palavra de honra ao cavalheiro. Ele não quer mais falar
deste assunto.
— Ele pode não querer, mas eu quero. Não estou lhe pedindo que quebre uma
promessa, Kupnol. Só desejo que você diga ao homem que as informações que ele me deu
sobre a menina não foram suficientes. Jamais a encontrarei com tão poucos dados.
— Buck, você é meu amigo. Faço o possível para ajudá-lo, sabe disso. Acredito que
o cavalheiro não possa lhe dizer mais nada. Talvez não exista mais nada a ser dito.
— O menor detalhe pode ser importante neste caso. A data em que Dameree levou
a criança para o orfanato, por exemplo. Ou um nome. Talvez ele saiba o nome que
Dameree usou ao deixar a criança.
— Não, ele não sabe nenhum nome, tenho certeza. Eu mesmo perguntei isso várias
vezes, sem sucesso.
A jovem chinesa que era a secretária de Sustri entrou na sala neste instante,
interrompendo a conversa. A moça serviu refrigerante e docinhos a cada um dos homens
e em seguida retirou-se com um sorriso educado.
Depois de tomar um gole da sua Coca-Cola gelada, Buck suspirou e prosseguiu:
— Ouça, Kupnol, não chegaremos a lugar algum, a menos que eu fale pessoalmente
com o irmão de Dameree. Peça a ele para se encontrar comigo, por favor.
— Não sei se conseguirei encontrá-lo de novo.

40
Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Ora, vamos, não seja tão pessimista. É provável que o homem esteja na cidade,
bem debaixo do nosso nariz. Ele é um comerciante chinês, não é?
— Sim, mas não sei a que ramo de negócio ele se dedica. E mesmo que eu o
encontre, não sei se concordará em ter um encontro com você.
— Pois diga o seguinte a ele: não me interessa ver Dameree. Só estou interessado
na menina. Se ele se encontrar comigo, disposto a cooperar, eu lhe darei quinhentos
dólares para gastar no que quiser. E você também receberá dinheiro se conseguir este
encontro para mim, Kupnol.
O Sr. Chin não fala muito bem o inglês, Buck — argumentou o oriental, sorrindo e
inclinando a cabeça polidamente. — Se ele quiser, eu me oferecerei para ir junto ao seu
encontro como intérprete.
— Excelente idéia. Bem, voltarei agora para o meu hotel, estou no Oriental, e
esperarei notícias suas. Eu gostaria de resolver este assunto o mais depressa possível,
Kupnol. Se o horário for conveniente para o Sr. Chin, leve-o ao Oriental hoje mesmo, à
tarde ou à noite. Diga a ele que o tempo é um fator importante neste caso. Devo dar
início às minhas buscas imediatamente.
Minutos mais tarde Buck saiu do escritório de Sustri e, para aliviar sua ansiedade,
decidiu voltar a pé para o hotel. Seria bom absorver um pouco da atmosfera de Bangcoc,
que um dia já fizera parte de sua vida. Caminhou olhando distraidamente as vitrines
das lojas, sem pressa. Como não tinha nada a fazer até se encontrar com o irmão de
Dameree, podia aproveitar as horas livres que tinha pela frente com bastante calma.
Enquanto andava pela rua de um dos bairros comerciais da cidade, viu-se pensando
de repente em Amanda, e uma surpreendente onda de emoção o envolveu. A imagem de
Amanda provocou-lhe uma sensação deliciosa, mais de afeição que de desejo sexual, que
o fez querer tocá-la e abraçá-la ali, naquele momento.
Droga! O que poderia fazer para tirar o relacionamento deles do marasmo em que
parecia atolado? Pensativo, parou diante de uma joalheria e considerou a possibilidade
de dar um presente a ela, mas descartou a idéia logo a seguir. Amanda poderia
interpretá-lo mal, como já acontecera tantas vezes.
Continuando a caminhar, Buck refletiu que talvez fosse melhor mudar de tática
em relação a Amanda, mostrar-se indiferente e distante para atraí-la pela curiosidade.
Acabou descartando também esta idéia, por considerá-la falsa e mesquinha. Se sentia
afeição e desejo, era exatamente isso que mostraria a Amanda. Não pretendia ser
rejeitado por tomar uma atitude desonesta e precipitada.
Passando perto dos portões de um templo, Buck viu uma barraquinha de rua
vendendo um petisco do qual costumava gostar nos velhos tempos. Sorrindo divertido,
imaginou se seu estômago ainda aceitaria tanto os padrões sanitários da barraquinha
do vendedor como a mistura de sabores do petisco. Decidido a arriscar-se a uma
intoxicação alimentar, comprou um pacotinho contendo um tablete de camarões cozidos,
cebola moída, lima, gengibre, coco, amendoim e pimenta-malagueta.
Em seguida, voltou a misturar-se à multidão de pedestres na calçada, sem
conseguir deixar de imaginar se Amanda gostaria ou não do tablete que estava comendo
com tanto gosto.
Assim que o táxi parou em frente ao Oriental, Amanda desceu do automóvel com
os braços carregados de pacotes. Entregou as compras a um dos mensageiros do hotel,
que se adiantara para ajudá-la, pagou o motorista do táxi e entrou no Oriental. Ao
passar pelo balcão de recepção, recebeu um recado dizendo que Buck se encontrava no

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

terraço e esperava por ela para tomarem um drinque juntos. Encantada com a idéia de
Buck estar à sua espera, dirigiu-se para a suíte com um sorriso radiante no rosto.
Já em seu quarto, abriu o maior dos pacotes, o qual continha um cheongsám de
seda verde e azul — uma espécie de vestido justo e longo com mangas morcego e gola
tipo mandarim. Comprara o traje oriental num impulso, para vesti-lo no jantar daquela
noite. Em outro pacote havia um par de delicadas sandálias de tirinhas de seda, que
combinavam à perfeição com o cheongsám. Comprara também algumas peças de tecidos
exóticos, mas o vestido a excitara de maneira especial.
Depois de pendurá-lo num cabide para desamassá-lo, imaginando qual seria a
reação de Buck ao vê-la usando uma roupa tão sensual e feminina, tomou um banho
rápido e foi para o terraço do hotel encontrar-se com Buck Michaels.
Passou por várias mesas, todas ocupadas, antes de avistá-lo sentado perto da borda
do terraço, lendo um jornal. Enquanto se aproximava, aproveitou para examiná-lo do
mesmo modo como l fora examinada naquela manhã, no táxi. Sim, ele era muito bonito
e sofisticado, além de másculo por inteiro — física, mental e psicologicamente. Amanda
nunca conhecera um homem que representasse de modo tão completo um contraponto a
cada aspecto de sua feminilidade. E foi então que compreendeu por que o considerava
tão atraente e ameaçador ao mesmo tempo. Nenhuma parte sua podia sentir-se segura
em relação a ele. Ao ver que Amanda se aproximava, Buck largou o jornal e sorriu,
amigável. A expressão de prazer que lhe iluminou o rosto assemelhava-se à de uma
raposa que houvesse acabado de caçar um coelho indefeso.
— Olá, Amanda. Fico feliz em ver que chegou a salvo ao hotel. Por favor, sente-se
e conte-me como foi o seu dia.
— Meu dia foi muito bom, obrigada. Demorei menos do que esperava no ministério,
e quando saí de lá resolvi fazer umas comprinhas.
— Ah... Encontrou alguma coisa interessante nas lojas?
— Sim. Aliás, comprei um vestido novo para o nosso jantar de hoje.
— Só por minha causa?
— Só por sua causa... — respondeu ela, resolvida a provocá-lo um pouco.
— Puxa, isso merece uma comemoração! Tomaremos uma garrafa do melhor
champanhe que houver no restaurante, ok?
— Ok, você é quem sabe.
— Ótimo, ótimo. E agora, gostaria de tomar um drinque gelado aqui fora ou prefere
ir lá para dentro saborear um delicioso chá?
— Chá é uma excelente idéia, aceito.
Dirigiram-se para o elegante salão de chá do hotel, um aposento grande com teto
de vidro, móveis de cana-da-índia e vasos floridos. Buck sentou-se ao lado de Amanda e,
antes que ela pudesse esboçar qualquer reação, beijou-a de leve no rosto e no pescoço. O
instante de carinho foi interrompido por uma jovem garçonete que, sorrindo, perguntou:
— Vão tomar chá?
— Devo dizer a ela que já encontrei o pote de mel que adoçará o meu chá? —
murmurou Buck ao ouvido de Amanda.
— Não se atreva! — respondeu ela em voz alta, enrubescendo.

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A jovem garçonete não conseguiu evitar uma risadinha discreta diante da cena que
se desenrolou diante de seus olhos. Buck também acabou rindo e, depois de examinar o
cardápio que lhe foi oferecido, fez o pedido.
Enquanto o chá era servido, quatro músicos entraram no salão com seus violinos e
violoncelos e, subindo no pequeno palco a um canto, começaram a tocar uma composição
clássica. Aos acordes da música européia, interpretada com dedicação e suavidade
orientais, Buck e Amanda relaxaram e deram início a uma conversa em voz baixa, para
não atrapalhar os músicos.
— E, então, como foi o seu encontro de hoje? — indagou ela tomando um gole de
chá de jasmim.
— Difícil dizer. Apesar de achar que Kupnol está sendo honesto comigo, tenho
certeza de que ele sabe mais do que quer admitir.
— Você supõe que ele sabe onde se encontra a menina?
— Oh, eu não chegaria a tanto. Ele apenas conseguiu localizar o irmão de Dameree,
que foi quem lhe deu a informação de que a menina teria sido mandada para os Estados
Unidos através de um orfanato.
— Nesse caso, qual é o problema?
— A informação me parece vaga demais. Talvez o irmão de Dameree possa me dizer
mais alguma coisa, pelo menos é o que espero. Pedi a Kupnol que me arranjasse um
encontro com o homem, hoje mesmo se possível.
Amanda tomou mais um gole de chá, pensando na menina desaparecida e em
Dameree, que fora amante de Buck quinze anos atrás. Será que ele a amara de verdade?
Estaria procurando realmente pela garota... ou pela mãe dela?
Curiosa, observou Buck pegar um canapê e enfiá-lo distraidamente na boca.
Lembrou-se daquela tarde em que fora vê-lo no escritório e de como ele comera um
monte de nozes com a mesma distração e compulsividade. Haviam conversado sobre a
menina misteriosa naquele dia, também...
— Buck, o que vai fazer se o irmão de Dameree não quiser se encontrar com você?
— perguntou, de súbito, preocupada.
— Eu irei atrás dele, se necessário. Se isso não der resultado, verei o que posso
descobrir nos orfanatos. E é neste ponto que espero poder contar com a sua ajuda,
Amanda.
— Começarei as minhas visitas amanhã. Você pode ir comigo, se quiser.
— Eu gostaria muito, obrigado.
Amanda terminou seu chá em relativo silêncio, fingindo prestar atenção na música,
mas, no fundo, sentindo-se frustrada por causa de Buck. Era tão difícil saber como lidar
com ele... Buck parecia ser vários homens ao mesmo tempo — patrão, cliente, amigo,
adversário, amante —, e isso a perturbava.
— Sabe — começou Buck de repente —, quando saí do escritório de Kupnol, resolvi
voltar a pé para o hotel. Eu queria sentir de novo a atmosfera de Bangcoc e trazer à tona
certas lembranças do passado. Parei numa barraquinha e comprei um petisco que
costumava comer nos velhos tempos... Isso me fez pensar no quanto eu gostaria que você
partilhasse comigo as minhas experiências aqui no Oriente.
O tom emocionado da voz de Buck comoveu Amanda, que lhe acariciou o rosto,
murmurando:

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— Eu... gostaria que você soubesse que estou feliz por estarmos fazendo esta
viagem juntos.
Embaraçado, ele comeu outro canapê e deu uma piscadela, comentando:
— Estou louco para ver o seu vestido novo. Por que não vamos para a suíte
descansar um pouco antes de sairmos para jantar?
— Ótima idéia. Vamos, então?
Já em seu quarto, com a porta trancada, Amanda tirou toda a roupa, exceto a
calcinha, e deitou-se para repousar. Sem saber por quê, lembrou-se da sensação de ter
os dedos de Buck acariciando sua nuca no táxi, naquela mesma manhã. Na hora, a
carícia a desconcertara, mas agora que voltava a pensar no assunto o gesto lhe parecia
agradável e sensualmente evocativo. Cada toque, cada encontro com Buck Michaels era
menos assustador e mais emocionante que o anterior. Começava a perceber, pelas
atitudes dele, que o que parecia um simples desejo masculino de conquista estava se
transformando em genuína afeição. Não sem uma certa preocupação, imaginou se essa
mudança de sentimentos a faria ir para a cama com Buck. Afinal, estava desenvolvendo
também um sentimento mais profundo por ele.
Tentou imaginar as conseqüências de se apaixonar seriamente por Buck, e por
instantes viu-se na casa dele não como Amanda Parr, mas como Amanda Michaels...
Descartou a imagem no segundo seguinte, assustada. Estava sonhando alto demais, e
poderia acabar se machucando...
Perturbada, decidiu tomar um refrescante banho de imersão para afastar da mente
pensamentos tão perigosos.
Buck sentou-se numa das cadeiras da sala da suíte e olhou ansioso para a porta do
quarto de Amanda, imaginando se ela já estaria vestida ou se estaria nua numa
banheira cheia de espuma. A segunda hipótese o deixou excitado e o obrigou a refletir
sobre o estranho efeito que Amanda tinha sobre ele. Não apenas a desejava, como sentia
vontade de conhecê-la melhor. Além de querer — e muito — que ela também o
conhecesse a fundo.
Lembrou-se de quando Amanda lhe perguntara se "sentia saudade do tempo de
casado", e sorriu. Nunca sentira falta do casamento — até que ela surgira em sua vida...
Mas ainda assim a idéia de se comprometer mais uma vez o perturbava; estaria disposto,
agora, a derrubar todas as barreiras emocionais que construíra contra o casamento?
Impaciente, olhou de novo na direção do quarto de Amanda. Gostaria de ir até lá e
bater à porta, exigindo que ela saísse do jeito que estivesse só para aplacar sua imensa
vontade de vê-la. Mas não podia bancar o ridículo, lógico. Na tentativa de acalmar-se,
começou a andar de um lado para outro da sala até que o telefone tocou. Atendeu,
irritado, e ouviu a voz de Kupnol Sustri do outro lado da linha.
— Apenas agora encontrei o Sr. Chin, irmão — disse o oriental. — Depois de muita
conversa, finalmente o convenci a se encontrar com você. Mas ele continua afirmando
que não tem mais nenhuma informação útil além das que já lhe forneci.
— Não faz mal, Kupnol, quero ver o Sr. Chin de qualquer maneira. Diga a ele que
agradeço a consideração e pergunte-lhe quando e onde poderemos nos encontrar.
— Nós estamos aqui perto, Buck. Se preferir, podemos ir ao seu hotel em cinco
minutos.
— Excelente idéia, Kupnol. Ficarei esperando por vocês, então. Estou na suíte Noel
Coward, ok?

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Assim que Buck desligou o telefone Amanda saiu do quarto. Estava tão bonita que
ele quase engasgou ao vê-la.
Amanda sorriu, radiante. O tecido de seda do cheongsam moldava-lhe o corpo,
revelando suas linhas esguias e ao mesmo tempo voluptuosas. Prendera o cabelo num
coque elegante, enfeitado por um vistoso pente japonês, e colocara dois pequenos brincos
de brilhantes. Tivera a clara intenção de provocar admiração ao arrumar-se com tanto
esmero, e ficou feliz ao perceber que alcançara seu objetivo.
— Céus, você está linda! Magnífica! Maravilhosa! — exclamou Buck encantado,
não medindo elogios. — Nunca vi uma mistura tão perfeita e bonita de Ocidente e
Oriente!
— Que bom que você gostou, Buck.
— Se eu gostei? Puxa, eu adorei! — disse ele, aproximando-se e abraçando-a pela
cintura.
Amanda encarou-o, embaraçada. Tons de verde-jade e esmeralda, azul-turquesa,
royal e pavão estavam por toda parte — nos olhos dela, em sua roupa, na sala,
contrastando com a brancura de sua pele e seus cabelos ruivos.
Buck não resistiu a um conjunto tão belo e, incapaz de se controlar, beijou Amanda
com ardor. Ao final do beijo, ele murmurou, num tom de voz tristonho:
— Droga, acho que cometi um erro.
— Que erro? — quis saber Amanda, curiosa.
— Acabei de convidar Kupnol e o Sr. Chin, irmão de Dameree, para virem se
encontrar comigo aqui.
— Bem, você queria mesmo vê-los, qual o problema? Este é um encontro
importante, não é?
— Não tão importante quanto isso... — argumentou Buck beijando-a no pescoço.
Uma batida na porta interrompeu o instante de paixão.
— São eles, droga! Infelizmente, os orientais nunca se atrasam.
— Receba seus convidados, Buck. Fique à vontade, eu irei para o meu quarto.
— Não, fique comigo. Por favor.
— Ok. Deixe-me apenas dar um retoque na maquilagem e no cabelo, está bem?
Voltarei logo para a sala. E agora vá abrir a porta, antes que batam de novo.
Quando Amanda se retirou, Buck atendeu seus convidados. Kupnol entrou
acompanhado por um homem baixo e gordo, que apresentou como o Sr. Chin. Depois dos
cumprimentos gerais, Buck pediu-lhes que se sentassem e ofereceu-lhes drinques.
Kupnol aceitou um refrigerante, e o Sr. Chin aceitou um uísque com gelo. Assim que as
bebidas foram servidas, Buck virou-se para o Sr. Chin e disse:
— Agradeço muito a sua consideração em ter vindo me ver, senhor. Estou certo de
que Kupnol lhe explicou por que eu queria vê-lo.
Buck parou de falar, esperando que Sustri traduzisse o que acabara de dizer, mas
o homem chinês argumentou antes:
— Por favor... senhor... Eu... entendo... sua língua. Só... só não sei... falar direito.
— Falarei mais devagar então, Sr. Chin. Bem, eu gostaria que soubesse que sua
irmã Dameree foi minha amiga. Sempre tentei ajudá-la, e quando ela teve a menina
fiquei preocupado com ela. Não vejo Dameree há mais de quinze anos, e nem sei se ela

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ainda está viva ou se já morreu. Se estiver viva, sei que tem sua vida própria e respeito
isso. Meu propósito não é vê-la ou interferir na sua vida particular.
— Eu... compreendo — afirmou Chin depois de trocar algumas palavras em chinês
com Sustri.
— Estou apenas interessado na filha de Dameree — prosseguiu Buck. — É
importante para eu verificar se a menina está bem, se não está passando por
necessidades. Só não tratei deste assunto antes porque sou um homem muito ocupado,
e só agora tive a oportunidade de me ausentar do meu trabalho para procurar a garota.
Chin falou com Sustri por um momento, e em seguida o tailandês disse:
— O Sr. Chin diz que entende os seus propósitos. Ele afirma que a sua família não
é rica e que, muitos anos atrás, sua irmã enfrentou algumas dificuldades e resolveu
levar a menina a um orfanato que envia bebês tailandeses para os Estados Unidos. O
Sr. Chin afirma que, como a criança era mestiça, Dameree julgou que a América seria o
melhor lugar para sua filha. Os Estados Unidos são um país rico, e a menina teria
melhores chances de vida se fosse para lá, em vez de ficar aqui, que é um país pobre.
Buck encarou o chinês e indagou:
— Tem certeza de que a menina foi para os Estados Unidos?
— Sei apenas... que... a criança... foi levada para o...
— Orfanato — completou Kupnol Sustri.
— Qual orfanato?
— O or... orfanato da Missão Cristã.
— Aqui em Bangcoc?
— Sim.
— Quando, Sr. Chin? Em que ano a menina foi levada para o orfanato?
— Talvez... dez anos atrás. Não sei... Sinto... muito. Buck suspirou, sentindo-se
frustrado. Embora fosse difícil ter certeza, Chin parecia estar sendo sincero. Mas será
que estaria disposto a conversar com a irmã dele e obter maiores detalhes? Obviamente
Dameree saberia a resposta para todas as perguntas sobre o caso. Mas, se desse tal
idéia, Buck sabia que a sugestão seria mal interpretada. Chin pensaria que ele estava
interessado em Dameree, e não na criança. A única solução possível para o problema era
encontrar um modo de fazer com que o homem confiasse nele e em suas intenções.
Foi, então, naquele exato instante, que Amanda saiu do quarto. Os homens
levantaram-se e, quando Buck viu a expressão de curiosidade no rosto de Sustri, teve
uma idéia brilhante.
— Amanda, querida, venha conhecer meus amigos. Ela aproximou-se, sorrindo.
— Querida, deixe-me apresentar-lhe o Sr. Chin... E este é Kupnol Sustri, um ex-
associado meu, agora apenas meu amigo, i Cavalheiros, esta é minha esposa, Amanda.
Amanda, que já se surpreendera ao ser chamada de "querida"; duas vezes, ficou
ainda mais espantada ao receber o título de; "esposa".
Para disfarçar a expressão chocada de Amanda, Buck abraçou-a pela cintura e lhe
deu um beijo no rosto, murmurando ao seu ouvido:
— Por favor, entre no jogo.
Em seguida, ele se virou para os dois outros homens e í comentou:
— Nós nos casamos recentemente.

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— Muito recentemente... — disse Amanda baixinho, para que só Buck a escutasse.


— Meu irmão! Uma esposa! — exclamou Sustri, sorridente. — Que boa notícia!
Meus parabéns! Pensei que você fosse um homem ainda sozinho, divorciado.
— Graças a Deus tive a sorte de conhecer Amanda, que veio preencher a minha
solidão — replicou Buck começando a gostar da brincadeira. — Mas, por favor, sentem-
se, cavalheiros... Amanda, querida, quer um drinque?
— Não, obrigada, "querido".
— Então, se nos der licença, eu e meus amigos continuaremos a nossa conversa.
Senhores, como podem ver, sendo casado, as minhas intenções em relação ao assunto
que estávamos discutindo são as mais honrosas possíveis. Devo acrescentar que, é
evidente, minha esposa também está ansiosa por certificar-se do bem-estar da menina.
— Eu... compreendo — afirmou Chin.
— Se é assim, o senhor tornaria a situação mais fácil para mim se pudesse me
fornecer informações mais completas sobre o caso. Por exemplo, por que não conversa
com outros membros da sua família? Talvez alguém saiba a data exata em que a menina
foi levada para o orfanato, ou o nome dela. Estes dados me seriam muito úteis.
— Sr. Michaels... Farei perguntas à minha... família... mas... não posso... prometer
nada.
— Tente, pelo menos, Sr. Chin. Se descobrir alguma coisa importante, poderemos
completar o arranjo financeiro que discuti com Kupnol.
Chin fez um gesto com a cabeça e pôs-se de pé. Kupnol seguiu-lhe o movimento,
dizendo:
— Já tomamos muito do seu tempo, irmão. Iremos embora agora.
— Muito obrigado por terem vindo — agradeceu Buck estendendo a mão para
despedir-se dos dois homens. — Foi uma grande generosidade de a sua parte terem se
incomodado em vir conversar comigo.
— Ora, não foi nada. Se precisar de algo, é só chamar, Buck — afirmou Sustri antes
de virar-se para Amanda e dizer:
— A senhora é muito bonita, Sra. Michaels. Meu amigo Buck tem muita sorte... e
muito bom gosto.
— Obrigada, Sr. Sustri.,
Assim que os orientais se retiraram, Amanda colocou as mãos na cintura e encarou
Buck com uma expressão mista de zanga e divertimento, perguntando:
— Sr. Michaels, quer me explicar que história é essa de sermos casados?
— Sabe de uma coisa, Sra. Michaels? Você é a melhor esposa que já tive — retrucou
ele ignorando a pergunta que lhe fora feita e abraçando-a.
— Preston Michaels, você é um demônio!
Quando Buck caiu na gargalhada, Amanda não resistiu e também começou a rir.

CAPÍTULO VI

Buck Michaels estava começando a exercer uma certa fascinação sobre Amanda, e
isso o tornava perigoso, muito perigoso. No entanto, o perigo era doce e convidativo, do
tipo que uma mulher não consegue ignorar com facilidade. Amanda já estava tendo

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problemas para subjugar a forte atração que sentia por ele, e isso a perturbava. Mas o
pior de tudo era o fato de gostar dele — gostar além dos limites de segurança...
Sentindo-se observado, Buck pôs seu copo de vinho sobre a mesa do restaurante —
no topo da torre do hotel — e encarou Amanda com um sorriso provocante nos lábios.
— É estranho como uma cidade pode afetar as pessoas, não é? — indagou ele.
— Sim, muito estranho. Você gosta de Bangcoc, Buck?
— Gosto, e você?
— Eu também. Ela é tão exótica, tão... -
— Romântica?
— Exato, romântica... E agora, mudando de assunto... fico me perguntando se você
apreciou contar aquela pequena mentira ao Sr. Chin e a Kupnol Sustri.
— Claro que sim. Quem não apreciaria?
— Bem, ter uma esposa por apenas um dia é uma fantasia masculina, não
feminina.
— Suponho então que você não tenha gostado da mentira.
— Não é uma questão de gostar ou não. Eu percebi o que você estava fazendo, e por
isso entrei no jogo. Você queria deixá-los seguros em relação aos motivos da sua procura
da filha de Dameree.
— É verdade, mas isso não me impediu de me divertir com a farsa toda.
— Muito bem, você tem direito às suas fantasias, e eu às minhas, Buck.
— Seria indiscrição minha perguntar quais são as suas fantasias?
— Ora, ora... Você se tornou surpreendentemente interessado no que eu penso. Se
não estou enganada, quando nos conhecemos você parecia não se importar nem um
pouco com as minhas preferências!
— Talvez eu tenha mudado por causa do efeito que você provoca em mim. A
propósito, Amanda, esta é a sua noite. O que gostaria de fazer agora que já terminamos
o nosso jantar?
— A noite pode ser minha, mas a cidade é sua. Por que não decide por nós dois o
que faremos a seguir?
— Você me acompanharia de boa vontade?
— Sim. Mas dentro de certos limites, é lógico.
Buck sorriu e permitiu que seu olhar passeasse pelo cheongsam de Amanda pela
centésima vez. Ela pressentiu que seu acompanhante estava considerando seus "limites"
dentro do contexto dos próprios desejos dele e também sorriu, ao mesmo tempo maliciosa
e triunfante.
— Você gostaria de conhecer um pouco da magia que traz a Bangcoc pessoas do
mundo todo? — indagou Buck, por fim.
— Que tipo de magia?
— Eu a descreveria como sensual... e lúgubre.
— Hum... Parece que você está me sugerindo uma dose de iniqüidade.
— Iniqüidade é uma palavra meio forte, mas pode ser aplicada ao caso. No entanto,
digamos apenas que eu gostaria de lhe mostrar o que os executivos japoneses chamam
de "diversão" quando vêm a Bangcoc.
— Acho que já imagino o que é.

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Se não estiver a fim, tudo bem, Amanda. Só pensei que este não é tipo de
programa que você faz quando vem sozinha a Bangcoc e então... Comigo você poderia ir
a certos lugares sem ser molestada.
— Em outras palavras, lugares aonde uma mulher iria com seu marido, e só com
ele.
— Acertou em cheio — disse Buck, rindo e chamando o garçom.
Em poucos minutos ambos encontravam-se num táxi seguindo a rua New
Petchburi, cheia de automóveis e pedestres. As luzes, sons e aromas que invadiam a
noite eram uma evidência da rica e vibrante vida que permanecia oculta ao calor do dia.
Como o resto da maioria da população, Amanda e Buck dirigiram-se para um bairro
onde várias casas noturnas, de bordéis a boates, abriam suas portas para os que queriam
se divertir..
Embora a coxa de Buck pressionasse a de Amanda no exíguo espaço do banco
traseiro do táxi, ele permaneceu discretamente distante, numa atitude atenciosa e não
agressiva. O resultado, sem dúvida calculado e esperado, foi que Amanda se sentiu
ainda mais atraída por Buck e pela segurança que ele representava.
A boate na qual resolveram entrar ficava numa viela estreita mas bem iluminada.
Depois de serem recepcionados à porta por um porteiro oriental vestindo um uniforme
branco, adentraram uma sala tipo cabaré, lotada, enfumaçada e escura. Um comprido
balcão estilo americano ocupava uma das paredes, e o resto do ambiente fora decorado
com mesinhas e cadeiras de veludo vermelho. Um pequeno grupo de jazz estava tocando,
enquanto num pequeno palco no canto do salão um casal dançava ao som da música. Os
dançarinos, nus, requebravam-se com sensualidade, encenando uma quase que
completa relação sexual.
— Eu escolhi um dos lugares mais "familiares" do bairro. — disse Buck ao notar a
expressão ligeiramente chocada de Amanda. — Eu não queria assustar você.
Naquele exato instante o maitre apareceu e guiou-os até uma mesa próxima ao
palco. Um pouco assustada com os olhares cobiçosos que recebera dos homens na boate,
Amanda sentou-se logo, tão perto de Buck quanto pôde, e segurou-lhe o braço.
O casal de dançarinos começou a dar os giros finais de seu ato de amor, a poucos
metros de Amanda e Buck. A mulher, jovem e bonita, movia-se com graça e leveza.
Embora fosse tailandesa, e bastante esguia, seus seios eram grandes e cheios. Ela se pôs
de joelhos e inclinou as costas para trás, até que seus longos cabelos negros tocassem o
chão. O homem, também tailandês, era alto e musculoso; seu corpo suado curvou-se
sobre o de sua parceira e seu peito forte tocou-lhe os seios eretos.
A princípio Amanda assistiu ao espetáculo com um certo embaraço, sentindo-se
como alguém que entra de repente no quarto dos pais e os pega fazendo amor. Depois de
alguns minutos, contudo, começou a relaxar e a apreciar a cena no palco. Estava tão
absorta no casal de dançarmos que acabou levando um susto quando o garçom colocou
um pequeno cálice de bebida à sua frente.
— O que é isso? — perguntou a Buck, num sussurro.
— Absinto. Eu pedi duas pequenas doses para nós.
— Hum, tem um gosto esquisito. É verdade que esta bebida é considerada um
afrodisíaco?
— Sim, já ouvi comentários desse tipo por aí.

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

Com unia expressão de desagrado, Amanda afastou o cálice e voltou a olhar para
os dançarinos.
Um instante mais tarde Buck pegou a mão de Amanda e começou a acariciá-la na
palma com o polegar. Com os dançarinos movendo-se num ritmo frenético de paixão
simulada, Amanda começou a sentir com ainda mais intensidade a corrente de excitação
que o toque de Buck lhe despertara. Quase sentiu vontade de tomar um gole de absinto,
mas controlou-se a tempo.
O ato erótico no palco chegou ao fim, e Buck, atencioso, sugeriu:
— Está quente aqui dentro. Gostaria de tomar alguma coisa gelada? Uma cerveja?
Um refrigerante?
— Uma cerveja, por favor.
— Ok. Garçom! Duas San Migueis bem geladas, por favor. Enquanto o garçom
atendia ao pedido, Buck tomou um gole de absinto. Ao ver que Amanda lhe dirigiu um
olhar reprovador, comentou sorrindo:
— Não se preocupe, é preciso que alguém beba pelo menos dois litros disto aqui
para ficar "aceso"...
O próximo número foi uma dançarina do ventre, anunciada como a "Jóia do Oriente
Médio", mas para Amanda a mulher parecia ter vindo de algum lugar mais próximo,
talvez da Indonésia ou da Malásia. O show da mulher foi bom, até que ela mudou os
movimentos tradicionais da dança para improvisações de cunho sexual. Buck mostrou-
se tão desapontado com o número quanto Amanda, e quando a dançarina do ventre foi
substituída por duas mulheres que apresentariam um show erótico, ele decidiu que já
era hora de saírem dali.
Fora da boate, passearam um pouco entre as barracas dos vendedores ambulantes
até se cansarem e tomarem um táxi. Ainda era cedo, e como a noite estava fresca e
agradável, resolveram descer do táxi um pouco antes do hotel e caminhar a pé os
setecentos metros que os separavam do Oriental. Seguiram devagar pela rua New
Petchburi e, de repente, todas as luzes da rua e do bairro se apagaram, deixando-os no
meio de uma escuridão total.
— Ah, um black-out! — exclamou Buck segurando Amanda pelo braço.
Um crescente murmúrio de vozes se elevou na noite. As pessoas na rua, assim como
aquelas que saíam dos edifícios próximos, conversavam excitadas. Os poucos veículos
que passavam lançavam fachos de luz sobre a calçada e sobre o asfalto negro.
Várias crianças surgiram, como que caídas do céu, com lanternas e tochas nas
mãos. Buck chamou um garotinho com uma lanterna e pediu-lhe que os guiasse até o
hotel.
Ao chegarem ao Oriental, Buck deu ao menino uma gorjeta generosa. No grande
saguão de entrada do hotel, vários funcionários esperavam pelos hóspedes para levá-los
até seus quartos. O ambiente estava iluminado por diversas velas distribuídas em
luxuosos candelabros, dando ao elegante local um ar religioso de templo.
Guiados por um jovem mensageiro, Amanda e Buck finalmente voltaram à sua
suíte. O rapaz deixou-os com um candelabro e, desejando-lhe boa noite, tirou uma
lanterna do bolso e afastou-se.
Amanda aproximou-se do sofá e viu, na mesinha lateral, uma garrafa de
champanhe dentro de um balde de prata cheio de gelo.
— Ei, veja só isso! — exclamou ela.

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Deve ser um presente da gerência, uma espécie de pedido de desculpas por causa
da inconveniência da falta de luz — disse Buck.
— Quanta gentileza, não?
Terminando de falar, Amanda olhou Buck de frente pela primeira vez desde que
haviam voltado da rua. A luz trêmula das velas pareciam acentuar os contornos do rosto
masculino e realçar o brilho sensual no belo par de olhos azuis. Amanda desejou, de
súbito, que não estivessem sozinhos, mas seus temores foram aplacados quando Buck
perguntou num tom suave e controlado:
— Posso lhe oferecer uma taça de champanhe?
— Sim, obrigada.
Enquanto ela se acomodava no sofá, Buck abriu a garrafa e serviu duas taças da
espumante bebida. Em seguida, sentou-se também e tomou um gole do delicioso vinho.
Ambos permaneceram calados por alguns instantes, imersos nas sombras da sala.
Reparando que Buck a observava com o canto dos olhos, Amanda sentiu-se tão trêmula
quanto a luz das velas do candelabro. Perturbada e nervosa, colocou sua taça sobre a
mesinha ao lado do sofá antes que acabasse derrubando a bebida sobre o seu cheongsam.
Depois de seguir o gesto de Amanda e abandonar sua taça, Buck tocou-a de leve no
rosto com a ponta dos dedos, prolongando a carícia até a nuca. Em seguida, beijou-a com
gentileza na testa. Amanda encarou-o, surpresa, um segundo antes de ser beijada na
boca.
O beijo foi terno e suave, fazendo-a duvidar dos fogosos desejos que imaginara ter
visto nos olhos de Buck. Num abandono sensual, não resistiu à doçura dos lábios e da
língua quente que lhe exploravam a boca.
Mas, de repente, ao perceber o que estava fazendo, sentiu medo. Levantou-se do
sofá e começou a andar de um lado para outro da sala, até parar perto da janela,
banhada pelo luar que se filtrava através da fina cortina.
Procurou não olhar para Buck, pois sabia que estaria sendo examinada. Mas não
resistiu à tentação. Incapaz de se controlar, encarou-o de frente, pálida e trêmula.
Embora nenhuma palavra fosse dita, Buck entendeu o convite mudo contido na
expressão do rosto de Amanda e caminhou até ela, ciente de que não seria rejeitado.
Tomou-a nos braços e beijou-a com paixão, cheio de desejo. Amanda correspondeu,
excitada, aceitando com prazer a língua que invadia sua boca e as mãos que percorriam
suas costas.
Dando vazão às suas emoções há tanto tempo reprimidas, Buck abriu o zíper do
cheongsam até a cintura de Amanda, e em seguida desabotoou o fecho do sutiã, que
impedia carícias mais ousadas.
Amanda por sua vez, encontrava-se tão inflamada pelo toque másculo das mãos de
Buck em seu corpo que nem sequer protestou quando ele a deixou nua da cintura para
cima, expondo seus seios firmes ao luar que entrava pela janela.
Com um gemido de êxtase, fechou os olhos e inclinou a cabeça para trás quando
Buck abaixou-se e acariciou com movimentos circulares da língua os mamilos rijos de
seus seios.
— Amanda, querida... — murmurou ele com voz rouca. — Nunca desejei tanto uma
mulher quanto desejo você...
Apesar do tom carinhoso de Buck, Amanda não pôde deixar de captar as
implicações contidas nas palavras dele ao dizer "nunca desejei tanto uma mulher". Sabia

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

que isso era um elogio, uma comparação que lhe era favorável, mas a simples idéia de
estar sendo comparada a outras a perturbou profundamente. Sentiu seu corpo ficar
rígido ao notar que se encontrava seminua nos braços de Buck.
— O que foi, não gostou de eu me sentir atraído por você? — indagou ele, beijando-
a na testa.
— Sim... Quer dizer, não. Eu... estou lisonjeada, mas... Isso não importa. Eu não
posso fazer amor com você.
— Não pode?
— Ou melhor... eu não quero. Pelo menos, não agora.
— Tudo bem, Amanda. Desculpe-me se apressei o curso natural das coisas, mas
você consegue me tirar do sério.
— Eu... Não foi minha intenção tirar você do sério.
— Eu sei. Mas como me controlar, se você é irresistível?
— Não sou irresistível. Foi o champanhe e a falta de luz que...
— Ora, vamos, não seja tão modesta...
— Buck!
— Desculpe, eu só estava querendo agradar. Encabulada, Amanda virou-se de
costas, ergueu o vestido e abotoou o sutiã.
— Deixe-me ajudá-la com o zíper — ofereceu-se Buck. Antes de fechar o zíper,
contudo, ele encheu-a de beijinhos nas costas e na nuca.
— Buck, por favor! — protestou Amanda.
— Não gosta das minhas carícias?
— Isso não vem ao caso.
— Como não? Se você gosta, não vejo por que...
— Buck, você é um homem atraente e charmoso. Como mulher é óbvio que me sinto
atraída pela sua masculinidade. Mas isso não significa que devo sucumbir a esta
atração.
— Tenho a ligeira impressão de que você está me acusando de algo, mas não consigo
descobrir do quê. Por acaso tem alguma coisa contra os meus sentimentos por você?
— De jeito nenhum. Eu só não quero ser um brinquedo nas suas mãos.
— Amanda, por favor! Já discutimos isso antes e...
— Ok, deixe-me ser mais direta, então. Não estou interessada em ter o meu nome
na sua quilométrica lista de namoradas. Entendeu, agora?
— Entendi que você não quer se envolver comigo sem ter garantias!
— Como assim?
— Ora, afinal não é isso o que as mulheres sempre dizem? "Não sou o tipo de garota
que vai para a cama com um homem sem amor, sem compromissos", etc., etc.
— Resolveu bancar o sarcástico comigo, Buck?
— Não estou sendo sarcástico. Eu simplesmente não sigo a lógica do pensamento
feminino.
— Ora, mas isso é óbvio!
— Amanda, diga a verdade. É tão mau assim sentir atração por alguém e querer
demonstrá-la?

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Não, Buck. Você é livre para viver como bem o desejar, só não quero que me
obrigue a cooperar com você!
— Está certo, você tem razão. Sinto muito, eu não queria ofendê-la. Acredite em
mim.
A sinceridade expressa na voz de Buck era tão intensa que Amanda baixou a
cabeça, envergonhada, e murmurou:
— Eu acredito em você.
— Amanda, querida... conte-me, que tipo de compromisso está procurando?
— Puxa, isso soa como se você estivesse perguntando o preço de um carro.
— A minha pergunta foi séria. Não vai respondê-la?
— Buck, ouça... Eu não quero garantias ou promessas, se é isso que o preocupa.
Apenas acho que numa situação dessas deve existir um sentimento mais profundo entre
o casal. Uma sensação de que ambos querem a mesma coisa e lutam pelos mesmos
ideais.
— Ok. Neste caso, como é que você se sente?
— Cansada.
— Ótimo! Partilhamos a mesma sensação, então, pois também estou exausto —
argumentou ele, rindo. — Que tal irmos para a cama?
— Você para a sua e eu para a minha?
— Exatamente! Viu, estamos pensando cada vez mais parecido.
Amanda não conseguiu reprimir um sorriso e acabou dando um casto beijo de boa
noite em Buck.
Na manhã seguinte, quando Amanda entrou na sala da suíte, Buck já estava
tomando uma xícara de café. Ele a encarou dos pés à cabeça e comentou, sorrindo:
— Você está encantadora nesse vestido branco.
— Obrigada.
— Quer que eu peça o seu café aqui ou prefere comer no terraço?
— Acho que vou sair sem comer nada, Buck. Tenho um compromisso no ministério
dentro de meia hora, e já estou atrasada.
— Nesse caso, farei uma refeição mais completa no terraço, mais tarde. Bem, quais
são os seus planos para hoje?
— Irei ao Orfanato da Missão Cristã que o Sr. Chin mencionou na noite passada.
— Eu também pensei em dar uma passada por lá. Posso ir com você?
— Claro que pode.
— Ótimo. Você voltará para almoçar aqui?
— Sim, é o que pretendo.
— Então por que não almoçamos juntos, vamos ao orfanato e depois passeamos um
pouco por aí?
— Hum... Excelente idéia. Bem, agora preciso ir. Tchau, Buck — disse ela pegando
a pasta e a bolsa que deixara sobre a mesa.
— Amanda... Eu gostaria que você não precisasse sair... O tom da voz de Buck a
comoveu. Depois do que acontecera na noite anterior, chegou a sentir-se feliz e
agradecida por ele não lhe ter guardado rancor. Aliás, pelo contrário, Buck estava se

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

mostrando um perfeito cavalheiro. Emocionada, Amanda deu-lhe um beijo carinhoso no


rosto e disse, antes de sair:
— Obrigada por você ter sido tão compreensivo ontem. Obrigada mesmo. Eu... eu
o verei na hora do almoço. Tchau.
Assim que Amanda se foi, o primeiro pensamento que ocorreu a Buck foi o de que
ela havia mudado, que sua resistência estava começando a se dissolver. Mas depois de
refletir um pouco, chegou à conclusão de que ele também havia mudado.
Lembrando-se da conversa que tivera com Amanda logo depois dos seus avanços
serem rejeitados, percebeu que o que estava sentindo por ela não era uma simples
atração comum. Amanda Parr o afetava de modo diferente das outras mulheres que já
conhecera.
A idéia de levá-la para a cama não vinha sozinha, mas acompanhada do desejo de
protegê-la, de dar-lhe carinho e atenção.
O toque insistente do telefone interrompeu-lhe a corrente de pensamentos.
Atendeu ao aparelho, irritado, mas acabou ficando contente quando ouviu a voz de sua
secretária do outro lado da linha. Kelly deu-lhe algumas notícias sobre o Tribune, fez
uma ou duas perguntas referentes a negócios e em seguida indagou:
— Como vão as coisas com a Srta. Parr, chefe?
— Bem.
— Nossa, que resposta seca!
— Esta não é uma viagem de recreio, Kelly. Vim para cá tratar de assuntos
importantes. Além do mais, você sabe como são as mulheres do serviço social; vão cedo
para a cama, etc., e tal.
— Vão para a cama com quem?
— Kelly!
Em geral, as provocações de sua secretária em relação ao assunto mulheres não o
aborrecia, e por isso Buck surpreendeu-se ao ver que não desejava que Amanda se
tornasse motivo de piadinhas maliciosas.
— Ei, desculpe, chefe. Esqueça a brincadeira, ok? E... pode me dizer quando é que
voltará para Los Angeles? Você vai voltar, afinal, não vai?
— Sim, Kelly, logo que tiver resolvido o meu problema aqui.
Ele prometeu ligar no dia seguinte e desligou o telefone, sentindo de repente uma
fome enorme.

CAPÍTULO VII

Buck deliciou-se com um lauto.café da manhã no terraço, observando o tráfego de


barcos no rio Chão Phraya. Assim que terminou a refeição e a mesa foi tirada, ele pediu
a um dos mensageiros do hotel que lhe comprasse uma cópia da edição asiática do Wall
Street Journal. Gostaria de ver uma cópia de seu próprio jornal, o Los Angeles Tribune,
mas estas eram mais raras e, quando encontradas, datavam de pelo menos cinco dias
atrás.
Depois de ler quase todo o jornal, Buck viu com o canto dos olhos que alguém se
aproximava de sua mesa. Erguendo a cabeça, deparou-se com um chinês trajando um
terno ocidental, parado a seu lado.

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Sr. Michaels, posso falar com o senhor? — indagou o homem em voz baixa.
— Eu o conheço, por acaso? — retrucou Buck, estudando o rosto do estranho e
pressentindo que seus propósitos não eram amigáveis.
— Não, mas isso é irrelevante, Sr. Michaels.
— Para o senhor, talvez, mas eu gosto de saber com quem falo. A menos, claro, que
o senhor só esteja interessado em discutir se hoje vai chover ou não em Bangcoc.
O chinês não se deixou abater pela resposta sarcástica e argumentou:
— Quero conversar com o senhor a respeito da menina que está procurando. Seria
inteligente de sua parte ouvir o que tenho a lhe dizer.
— Sendo assim... Queira sentar-se, por favor.
— Obrigado, Sr. Michaels, permita-me ser o mais objetivo possível. O fato de o
senhor estar em busca da menina tornou-se embaraçoso para um certo cavalheiro que...
— Quem é este "certo cavalheiro"?
— Isso não importa, no momento. O que interessa agora é que esse cavalheiro
gostaria que o senhor parasse com as suas investigações. Compreenda, Sr. Michaels,
esse homem tem ligações importantes nos círculos governamentais. Ele é muito
influente, e detesta ser contrariado...
— E por que o fato de eu estar procurando uma menina amerasiática incomodaria
ou contrariaria alguém?
— Por que não deixa a curiosidade de lado, Sr. Michaels? Se o seu interesse é,
aparentemente, encontrar a menina, é suficiente que o senhor saiba que ela não se
encontra mais na Tailândia. Ela está nos Estados Unidos. Portanto, não precisa mais
procurá-la aqui. — Como posso ter certeza?
— Asseguro-lhe que não tenho o menor motivo para enganá-lo. Minha intenção é
apenas tornar a situação mais fácil para o senhor.
— Por que eu confiaria no senhor? Nem ao menos quer me dizer quem é, ou por
que devo abandonar as minhas buscas.
Uma expressão irritada assomou ao rosto do chinês, que permaneceu calado.
— Será o senhor o misterioso cavalheiro? — perguntou Buck, mostrando sua
própria impaciência.
— Não, eu só fui enviado por ele.
— Por que o tal homem não veio pessoalmente, se me considera um problema tão
importante?
— Sr. Michaels, o senhor faz muitas perguntas, mas parece não entender que estou
aqui por pura cortesia do meu patrão. Por favor, aceite os meus conselhos e volte para
Los Angeles ou então contente-se em apreciar as muitas maravilhas do meu país.
— Do que é que o seu patrão tem medo?
— Quanta insistência, Sr. Michaels... Bem, eu lhe direi apenas uma coisa: o
cavalheiro deseja proteger sua esposa contra certas lembranças que a sua busca da
menina poderia despertar.
— A esposa dele? Refere-se a Dameree?
— Eu já disse tudo o que tinha a dizer, Sr. Michaels, exceto que é de seu interesse
seguir os meus avisos.
— E se eu não os seguir?

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Acho que sua esposa tem muito apreço pelo trabalho que faz em nosso país. Seria
uma grande infelicidade se o governo tailandês decidisse que os esforços dela não são
mais desejáveis. Tenho certeza de que a Sra. Michaels ficaria muito desapontada. Mais
uma vez, por favor, aceite os meus conselhos, senhor. Pelo bem de sua esposa, senão pelo
seu.
Buck procurou controlar ao máximo a irritação que se apoderou dele. Se soubesse
que uma reação violenta fosse resolver a situação, teria pulado sobre o chinês e lhe dado
um soco. Mas de que adiantaria isso? O homem não passava de um mero agente. Pelo
visto., Dameree ou alguém que lhe era próximo soubera da procura da menina através
de Chin. No entanto, o que mais perturbava Buck era o fato de Amanda ter sido
envolvida no negócio.
— Será que o seu patrão e a esposa dele têm consciência de que o meu único
propósito é encontrar a menina e certificar-me de seu bem-estar?
— Meu patrão só quer que o senhor abandone as suas investigações e deixe o país
antes que haja algum... problema.
— O senhor me daria informações que ajudassem a localizar a menina nos Estados
Unidos?
— Não possuo tais informações. Apenas sei que ela saiu da Tailândia.
— Mas alguém deve saber de algo! Com certeza Dameree...
— Sinto muito, Sr. Michaels, mas não posso lhe dizer mais nada — afirmou o chinês
levantando-se de repente. — Pelo bem de sua esposa, esqueça o assunto e volte para o
seu país, por favor. Senão...
Buck observou o homem afastar-se pelo terraço após um breve sinal de despedida
e desaparecer dentro do hotel. Sentiu-se louco de raiva e frustração. Ameaçar Amanda
era chantagem, um truque por demais barato... mas que funcionava. Quem quer que
estivesse por trás do agente chinês sabia o que estava fazendo.
Desde o começo Buck percebera que Amanda era uma peça-chave para se descobrir
a menina, mas agora ela estava provando ser também o seu calcanhar-de-aquiles.
Depois de pensar por certo tempo sobre o assunto, convenceu-se de que não poderia
ocultar dela o que acabara de acontecer. Afinal, eram o trabalho e carreira de Amanda
que estavam em jogo...
Naquela mesma tarde, ao voltar para o hotel, Amanda estava ansiosa por ver Buck,
ansiosa por ver se as condições favoráveis de seu relacionamento continuariam. Durante
a longa espera no ministério, pensara em pouquíssimas outras coisas além de Buck
Michaels. Ele estava começando a ter uma imagem diferente a seus olhos, fazendo-a
duvidar de suas convicções a respeito do tipo de homem que era. Buck a fazia sentir-se
especial, agora, e parecia sincero. Como pudera se enganar sobre ele, antes? Ou estaria
mesmo enganada, no fundo?
Uma sensação agradável a percorreu ao encontrá-lo esperando por ela na suíte
quando chegou, mas o sorriso feliz que lhe enfeitava os lábios desapareceu ao perceber
a expressão sombria no rosto de Buck.
— Como passou o seu dia? — perguntou, preocupada.
— Bem. Aliás, uma coisa muito interessante aconteceu.
— O quê?
— Um cavalheiro anônimo veio conversar comigo enquanto eu tomava o café.
— Conversar? Sobre o quê?

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

Buck a fez sentar-se e contou-lhe toda a conversa que tivera com o homem
misterioso.
— Buck, isso é terrível! — exclamou Amanda ao se inteirar da história toda. —
Como alguém pode se aborrecer tanto só porque você está procurando uma menina? Você
acha que foi Dameree quem enviou o agente chinês? Acha que ela seria capaz de ameaçá-
lo assim?
— Não sei, mas suponho que seja possível.
— Céus! Por quê?
— Não faço a mínima idéia. O homem se referiu o tempo todo a um certo
"cavalheiro", como se fosse o marido, e não a esposa, que estivesse contrariado. Não
consigo imaginar quem mais seria a tal esposa além de Dameree.
— Talvez seja outra mulher — alguém que recebeu a menina de Dameree — uma
mãe adotiva, quem sabe.
— Sim, isso é possível também.
— O que fará agora, Buck?
— A decisão é mais sua do que minha, Amanda.
— Você... acha que as ameaças foram a sério?
— Pode ser que sim, pode ser que não. Mas, do meu ponto de vista, ameaças inúteis
são mais comuns no Ocidente que no Oriente.
— Oh... Mas será que realmente devemos acreditar que o governo da Tailândia me
poria para fora daqui só para satisfazer os propósitos vingativos de um homem?
— Coisas mais estranhas que essa já ocorreram. Só depende do tipo de influência
que o nosso "cavalheiro" tem.
— Se é que ele tem alguma.
— Considerando os riscos, Amanda, talvez devamos levar a sério as ameaças,
— Bem, o homem pode ter ameaçado você, mas não ameaçou a mim. Não há nada
que impeça que eu procure a filha de Dameree.
— Não se esqueça de que pensam que somos casados. Uma ação sua seria
equivalente a uma de minha parte.
— É, .. Parece que eu não lhe dei muita sorte como "esposa", não?
— Se essas pessoas misteriosas atrapalharem o sucesso das minhas buscas, não
será por sua causa, e sim porque alguém claramente não quer que eu encontre Dameree
ou a menina... ou ambas.
Amanda percebeu que a influência da garota na sua relação com Buck seria muito
significativa. A menina havia, de certo modo, aproximado os dois.
— Buck, ouça — disse ela por fim, decidida a tomar uma atitude. — Sei que esse
seu problema pode ter sérias conseqüências para mim e para a Fundação, mas eu me
recuso a ser chantageada. As ameaças que você recebeu podem justificar uma cautela
maior da nossa parte, mas não uma derrota.
— Como assim?
— Hoje mesmo irei descobrir tudo o que puder sobre o assunto no Orfanato da
Missão Cristã e, se preferir, venha comigo. Se isso ofender alguém dos altos escalões,
azar!

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Sabe de uma coisa? Adoro a sua coragem — comentou Buck, tomando-a nos
braços e lhe dando um beijo.
O toque másculo despertou a excitação de Amanda. Pela primeira vez sentiu-se
ligada de verdade a Buck, sentiu uma proximidade que só duas pessoas em busca do
mesmo objetivo podiam partilhar. Ao ser beijada de novo, com paixão, desejou ter o poder
de descobrir a menina que tanto obcecava Buck.
As crianças brincavam sob a sombra de uma árvore bho, evitando o calor do sol da
tarde, inconscientes de que Amanda e Buck as observavam através da janela da sala de
recepção. O quintal do orfanato, cercado por muros altos, continha, pouco mais além da
árvore, uma pequena trilha de terra e alguns bancos de madeira espalhados aqui e ali.
— A maioria das crianças parece ser tailandesa — comentou Buck, pensativo.
— E é — replicou Amanda. — Há apenas duas crianças amerasiáticas aqui, no
momento. Dois garotos. Um de oito anos, outro de cinco. Hum... Veja, lá está o garoto
mais velho, aquele com os cabelos mais claros.
— Há quanto tempo estão aqui? Por que ainda não foram enviados para os Estados
Unidos?
— Estes dois são novos no orfanato, foram encontrados há apenas quatro semanas,
nas ruas, esmolando.
— Por que não foram trazidos para cá quando bebês?
— Difícil dizer. Em geral as mães só percebem tarde demais o quanto a vida pode
ser cruel para com os seus filhos mestiços. Por isso, muitas mães só deixam as suas
crianças quando já estão grandes. Com bastante freqüência estas mulheres são
prostitutas, e não têm muita responsabilidade; vai daí...
— Odeio pensar que a minha... que a filha de Dameree esteve aqui.
— Ei, calma, Buck. As crianças são bem tratadas no orfanato, se considerarmos a
vida delas nas ruas.
— Você acha que Dameree abandonou a filha dela nas ruas?
— Não sei, mas tudo indica que a menina foi mandada para os Estados Unidos
através de um orfanato, talvez este mesmo em que estamos. E as chances são de que ela
tenha sido colocada num bom lar.
— A menina é praticamente uma mocinha agora, Amanda. Imagine... Eu já perdi
toda a infância dela...
Notando a tristeza contida na voz de Buck, Amanda acariciou-lhe o braço numa
tentativa de consolo. Mas, ao mesmo tempo, forçou-se a trazê-lo de volta à realidade.
— Buck, o seu objetivo não é recuperar a filha de Dameree. Lembre-se de que você
só quer verificar se ela está nos Estados Unidos; num bom lar. Caso contrário, sairá
ainda mais magoado no final dessa história toda.
— Você tem razão, claro. Entendi e aceito o que acaba de me dizer, não se preocupe.
Mas ela se preocupava. E muito...
Houve uma comoção geral no quintal, e Buck e Amanda se viraram para a janela
a tempo de ver as crianças reunidas em volta da árvore, rindo e gritando, excitadas.
— Parece que elas encontraram um bichinho de estimação — comentou Buck,
sorrindo.
— Que bichinho?
— Um lagarto. Veja, ali no tronco da árvore, perto dos galhos.

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Uh! Chama aquilo de lagarto? Para mim mais parece um dragão!


— Um dragão inofensivo, se isso a tranqüiliza.
Vários dos meninos mais velhos decidiram pegar a criatura e começaram a subir
um no ombro do outro para alcançá-la. Todas as outras crianças riam e gritavam. A
própria Amanda não conseguiu reprimir o riso diante da ação dos garotos. Finalmente,
o lagarto se escondeu entre a folhagem da árvore e a caçada foi abandonada.
Pouco a pouco as crianças foram retornando a seus jogos e grupos. Amanda reparou
que o menino amerasiático de oito anos parecia preferir ficar sozinho, e imaginou se isso
seria resultado de uma timidez natural ou uma conseqüência das suas experiências de
vida fora do orfanato.
— O garoto amerasiático não me parece bem aceito pelos outros — comentou Buck
de repente, como se tivesse lido os pensamentos de Amanda. — Por que será?
— Talvez isso aconteça porque ele é novo aqui, e ainda não teve tempo de se
adaptar.
— Mas o menorzinho não parece estar enfrentando as mesmas dificuldades.
— Bem... a situação é sempre mais fácil para os menores.
— Será que eu poderia ir lá fora e conversar um pouco com o garoto, sem
problemas?
— Claro, pode ir. A Srta. Pakorn vai me atender logo, e de qualquer modo acho
melhor falar sozinha com ela, primeiro. Pedirei informações sobre a filha de Dameree,
não se preocupe.
Buck saiu para o quintal e brincou com várias das crianças, até aproximar-se do
menino mestiço, que o encarou com suspeita. Minutos mais tarde, contudo, Buck
pareceu ter ganho a confiança do garoto, que começou a rir e a falar.
Amanda sorriu, admirando o interesse dele pela criança. E então uma das portas
que davam para a sala de recepção se abriu e a Srta. Pakorn, diretora do orfanato, a
chamou:
— Srta. Parr! Que bom vê-la de novo, como vai?
— Bem, obrigada. E a senhorita?
— Estou ótima. Desculpe-me pela curiosidade, mas o que é que estava observando
lá fora com tanto interesse? — A mulher olhou pela janela e exclamou: — Oh, um
cavalheiro!
— Aquele é o Sr. Michaels. Ele veio comigo, espero que não se importe.
— Sr. Michaels? Pensei que a Sra. Michaels estivesse em sua companhia, a serviço
da sua agência.
— Como? — indagou Amanda, perplexa.
— Recebi uma carta esta manhã, endereçada à Sra. Michaels da Fundação para
Crianças Amerasiáticas. Pensei que fosse uma das suas associadas, Srta. Parr, e por isso
estou surpresa de ver o cavalheiro lá fora. Ele é casado, talvez?
— Oh, acho que estou entendendo tudo agora — comentou Amanda, rindo. — A
carta que a senhorita recebeu é para mim.
Foi a vez da Srta. Pakorn ficar perplexa.
Achando que a carta deveria estar ligada de algum modo ao Sr. Chin, a Kupnol
Sustri ou ao misterioso visitante de Buck naquela manhã, Amanda resolveu num
impulso continuar com a farsa iniciada na noite anterior.

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Srta. Pakorn, Buck e eu nos casamos recentemente.


— Mas que maravilha! Meus parabéns, Srta. Parr! Quero dizer... Sra. Michaels.
Que boa notícia!
— Ora, obrigada... Bem, já que meu marido parece estar gostando da companhia
das crianças, talvez a senhorita pudesse me mostrar a carta depois de conversarmos um
pouco.
— Claro, claro. Vamos ao meu escritório, por favor, Sra. Michaels.
Amanda seguiu a mulher para dentro de uma sala próxima, e sentou-se diante de
uma grande mesa antiga, coberta de documentos e desenhos religiosos. A Srta. Pakorn,
sentada do outro lado da mesa, entregou-lhe cerimoniosamente um envelope selado.
— Aqui está a sua carta, Sra. Michaels.
— Importa-se se eu a ler agora? — perguntou Amanda, incapaz de conter sua
curiosidade.
— Pois não, fique à vontade.
Amanda sorriu, abriu o envelope e tirou de dentro dele uma única folha de papel
coberta de alto a baixo por uma letra feminina e delicada. O conteúdo da carta era:
"Prezada Sra. Michaels,
Escrevo-lhe esta carta na esperança de que, como mulher, saiba me compreender.
Fico feliz pelo seu casamento com Buck e envio-lhe os meus mais sinceros parabéns.
Desejo aos dois tudo de bom e muitas felicidades.,
Sei que Buck está procurando por minha filha, o que me deixa muito triste. Eu
esperava que ele já tivesse se esquecido desta história, porém parece que me enganei.
Quero ajudá-lo, claro, mas isso não é fácil para mim por causa de meu marido, que muito
me protege. Ele nem sabe que eu sei que a senhora e Buck estão em Bangcoc procurando
minha filha. Como vê, eu devo ser cuidadosa.
Não posso me encontrar com Buck para dizer a ele as coisas que deseja saber. Mas
desde que a senhora é esposa dele e uma mulher com quem posso conversar, gostaria de
me encontrar com a senhora para responder às perguntas de seu marido. Se concordar
com a minha proposta, não fale sobre ela com ninguém, para que meu marido não saiba
e não se zangue comigo. Por favor, não diga nada a Buck também.
Se aceitar o que lhe proponho, poderemos nos ver amanhã cedo na antiga cidade
de Ayudhya, que fica perto do rio, não muito longe de Bangcoc. Lá é um lugar tranqüilo
e seguro para conversarmos. Uma jovem telefonará para o seu hotel para saber a sua
resposta.
Por favor, Sra. Michaels, pelo bem de seu marido, mantenha o nosso encontro em
segredo.
Sua amiga, Dameree"
Amanda dobrou a carta, recolocou-a no envelope e encarou o rosto sorridente da
Srta. Pakorn. Retribuindo o sorriso da mulher, olhou ansiosa na direção da porta da
sala.
— Gostaria que o Sr. Michaels se juntasse a nós? — perguntou a diretora do
orfanato.
— Não é preciso, obrigada, acho que já está na hora de eu ir embora. Talvez
possamos conversar mais no final da semana, para discutir o problema dos dois garotos.
Vim hoje aqui mais para ver os meninos e pedir à senhorita que mande a documentação

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

deles para o ministério assim que for possível. A senhorita sabe o quanto demora
preparar a papelada toda, não é?
— Sim, e sei também o quanto o seu tempo é precioso.
Fique sossegada, Sra. Michaels, faremos tudo para apressar as coisas.
— Obrigada, a senhorita é muito prestativa.
— Não faço mais que a minha obrigação. Quer que eu a acompanhe até a porta,
agora?
— Por favor.
Quando as duas mulheres saíram da sala, Buck aproximou-se vindo do quintal.
— Oh, aí está você querido — disse Amanda ao vê-lo. — Deixe-me apresentar-lhe
à diretora da Orfanato da Missão Cristã. Srta. Pakorn, este é meu marido, Buck
Michaels. Buck, esta é a Srta. Pakorn, a responsável por toda a maravilhosa assistência
que recebemos aqui em Bangcoc.
— Como vai, senhorita? — indagou Buck estendendo a mão à mulher, ao mesmo
tempo em que olhava interrogativamente para Amanda.
— Bem, obrigada, Sr. Michaels. Permita-me dar-lhe os parabéns pelo seu recente
casamento.
— Obrigado, Srta. Pakorn. Casar-me com Amanda foi uma alegria tão grande que
já nem me lembro mais de como é a vida de solteiro.
— Sua esposa é uma mulher encantadora, gostamos muito de trabalhar com ela.
Espero que o senhor permita que ela continue vindo à Tailândia a serviço da Fundação.
— Admiro bastante o trabalho de minha esposa, senhorita, e por isso pode ficar
tranqüila. Não a impedirei de continuar ajudando a causa das crianças desamparadas.
E agora, se nos der licença, temos outros compromissos. Precisamos ir embora. Está
pronta, querida? — indagou ele virando-se para Amanda.
— Sim, vamos. Até outra hora, Srta. Pakorn.
Ao saírem do orfanato, tiveram sorte de encontrar quase que de imediato um táxi
livre. Ao entrarem no automóvel, Buck teve um ataque de riso. Abraçando Amanda,
puxou-a de encontro a si e perguntou, brincalhão:
— O que foi que aconteceu? Será que a idéia de sermos casados a agradou tanto a
ponto de fazê-la estender a farsa a outras pessoas?
Amanda encarou-o com um sorriso malicioso, mas, no fundo, sentiu-se num dilema.
Não tinha certeza do que ia dizer a Buck. Seu instinto a aconselhou a contar a ele sobre
a carta de Dameree, mas seu senso de responsabilidade lembrou-a de que a carta pedia
segredo sobre o futuro e provável encontro.
Além do mais, depois da visita ameaçadora que Buck recebera naquela manhã,
Amanda decidiu que envolvê-lo no assunto poderia colocá-lo numa situação ainda mais
difícil. Achou melhor não falar nada sobre a carta, pelo menos por enquanto. Obteria as
informações necessárias sozinha, e só então o poria a par do que acontecera.
— Vamos, diga. Por que mentiu à Srta. Pakorn, afirmando que tínhamos nos
casado? — insistiu Buck, ainda rindo.
— Porque alguém andou tirando informações no orfanato a respeito da Sra.
Michaels, que trabalha para a Fundação para Crianças Amerasiáticas.
— Quem foi essa pessoa?

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Não sei, mas presumi que fosse alguém ligado ao Sr. Chin ou ao seu misterioso
visitante de hoje cedo. Em vez de levantar suspeitas, preferi continuar com a mentira e
dizer que nos casamos recentemente.
A expressão de Buck se tornou sombria e Amanda sentiu-se mal. Odiava mentir,
mas agora era tarde demais, Além do mais, que outra saída 1he restava?
— Descobriu alguma coisa sobre a menina?
— O caso não soou familiar aos ouvidos da Srta. Pakorn, mas ela prometeu dar
uma olhada em seus arquivos assim mesmo — mentiu Amanda, de novo.
— Oh, compreendo. Bom... Sejamos otimistas e encaremos a situação do seguinte
modo: se a notícia do nosso casamento chegar à sua Fundação e ao Tribune, talvez
tenhamos que realmente nos casar só para salvarmos as aparências...
— Puxa, mas este é um ótimo motivo para passarmos agora mesmo num cartório
civil!
— Seria divertido, não seria?
— Obrigada, Buck, mas me tornei a Sra. Michaels apenas por uma questão de
caridade. Continuo gostando de ser a Srta. Parr, por enquanto.
Os dois voltaram a rir, mas Amanda não conseguiu evitar um certo sentimento de
culpa. Para disfarçar seu embaraço, olhou pela janela do táxi e observou a rua
ensolarada, percebendo que cada vez mais Buck Michaels tomava conta de seus
pensamentos o tempo todo.

CAPÍTULO VIII

O dia estava insuportavelmente quente. Amanda, corada por causa do calor e com
os cabelos molhados de suor, deu um suspiro de alívio ao entrar no saguão do Oriental,
onde os aparelhos de ar refrigerado funcionavam a todo vapor. Sentiu-se contente por
retornar ao hotel, apesar de preocupada; ainda tinha que inventar uma história para
contar a Buck sobre os seus planos para o dia seguinte, antes que ligassem para
confirmar o seu encontro com Dameree.
— Não sei quanto a você, mas eu estou louco para tomar umas cervejas geladas —
disse Buck, encarando-a com um sorriso.
— A idéia é boa, mas eu prefiro tomar um banho gelado antes.
— Por que não pedimos então ao serviço de quarto que nos leve algumas cervejas?
Desse modo podemos beber e tomar banho ao mesmo tempo.
Amanda concordou com a sugestão e, juntos, foram para a suíte. Assim que
entraram o telefone começou a tocar, e Buck atendeu.
— Alô! Alô? Que estranho, ninguém respondeu do. outro lado — comentou ele
colocando o fone no aparelho.
Imaginando que a chamada fosse da amiga de Dameree, que se assustara e
desligara ao ouvir uma "voz de homem, Amanda argumentou:
— Estou esperando uma ligação, Buck. Talvez o telefonema fosse para mim.
— Ora, por que não me pediram para chamá-la, então?
— Estou no meio de um caso muito delicado envolvendo uma criança amerasiática,
para dizer a verdade. A ligação que espero é para confirmar um encontro que marquei
para amanhã cedo em Ayudhya.

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— Ayudhya? Que lugar estranho para um encontro.


— Nunca fui até lá. O que há de estranho no local?
— É uma mistura de sítio arqueológico, santuário e cidade. Ayudhya era a antiga
capital do Sião.
— Mas fica perto de Bangcoc, não fica?
— Fica a uns cinqüenta ou setenta quilômetros daqui, não tenho muita certeza.
— Hum... E como chego até lá? De ônibus?
— De barco, subindo o rio, ou de trem. A que horas é o seu encontro?
— De manhã, mas preciso confirmar o horário exato.
— Neste caso eu a aconselharia a ir de trem, pois a viagem de barco é muito
demorada. Ouça, se você não tiver nenhuma objeção, eu poderia ir junto. Depois do seu
compromisso, passearíamos um pouco e voltaríamos para Bangcoc num dos barcos do
hotel.
— Bem... Acho que seria melhor se eu fosse sozinha, Buck — disse Amanda, vendo
sua teia de mentiras crescer cada vez mais.
— Puxa, a situação é tão delicada assim? Sei que não há necessidade de eu
participar do seu encontro, mas que problema existiria em apenas viajarmos juntos para
Ayudhya?
— Buck, eu... -
— Eu poderia visitar o museu local enquanto você resolve os seus negócios.
— É, talvez... Mas este caso é realmente muito delicado. Minha credibilidade está
em jogo.
— Acredite ou não, Amanda, até mesmo um jornalista sabe ser discreto.
Quando Buck a encarou com olhos que demonstravam todo o seu desejo por ela,
Amanda sentiu uma necessidade súbita de se retirar da sala para tomar um banho.
Pondo-se de pé, anunciou:
— Vou me refrescar um pouco.
— Não vai esperar pelas cervejas?
— Não, mas guarde uma para mim, por favor — pediu ela, indo para o seu quarto.
Amanda estava acabando de sair do chuveiro quando ouviu uma batida na porta.
— Sim, o que é? — perguntou enquanto pegava uma toalha.
— Telefone para você, Amanda!
— Já vou, Buck! Peça à pessoa para esperar um pouco na linha! — pediu ela,
enxugando-se rapidamente, passando um pente nos cabelos molhados e vestindo o
penhoar curto de seda que levara para o banheiro.
Ao entrar na sala usando um traje tão íntimo, esperou que Buck tivesse a decência
de retirar-se para o quarto dele ou pelo menos ignorá-la. Infelizmente, contudo, Buck
permaneceu sentado no sofá ao lado do telefone. Ao ver que Amanda se aproximava,
olhou-a surpreso e encantado com o que viu. Um brilho instantâneo de desejo surgiu-lhe
no rosto, e Amanda arrependeu-se de ter resolvido atender à ligação naquele instante.
Encabulada, pegou o fone:
— Alô?
— Sra. Michaels?
— Sim, sou eu.

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— Estou ligando em nome de uma amiga, sabe quem é?


— Sei. Eu estava mesmo esperando a sua chamada.
— Sra. Michaels, pode encontrar-se amanhã cedo, com certeza, com a minha
amiga?
— Posso, claro.
— Ótimo. Vá para Ayudhya e... A linha ficou muda de repente. Amanda desligou o
telefone, comentando:
— A ligação caiu.
— Isso acontece com freqüência aqui em Bangcoc. O sistema telefônico ainda é
meio precário nesta região. Por que não senta um pouco e espera que a pessoa ligue de
novo?
Havia um toque de malícia na voz de Buck, e Amanda sentiu-se vulnerável, embora
não com medo. Sentou-se no sofá, procurando ficar o mais longe possível de Buck. Mas
sua tática não funcionou. Ele se aproximou sem perda de tempo e começou a acariciar-
lhe os cabelos úmidos.
— Adoro a cor dos seus cabelos, sabia? Aliás, adoro você inteirinha.
— Pare de brincar, Buck. Nem sequer estou arrumada, acabei de sair do banho.
— Eu já tinha reparado nisso. Hum... Eu também gosto do seu cheiro... —
completou Buck tocando-a no rosto e inclinando-se para aspirar-lhe o perfume.
Amanda olhou ansiosa para o telefone, refletindo que seria mais prudente retirar-
se logo para o seu quarto antes que a situação escapasse ao seu controle. Mas antes que
pudesse se levantar, o aparelho tocou de novo.
— Alô! — disse ela pegando no fone, sentindo as mãos de Buck em sua cintura.
— Sra. Michaels, sinto muito. A ligação foi cortada àquela hora.
— Tudo bem, não se preocupe. — Amanda estremeceu sob o toque dê Buck, ao
mesmo tempo gostando das carícias e sentindo-se vulnerável. — Vamos marcar o local
exato e o horário do encontro?
— Sim, vamos.
— A senhora pode estar em Ayudhya às dez da manhã?
— Posso, sem problemas.
— Então pegue o trem que sai de Bangcoc às sete.
— Ok — concordou ela, arrepiando-se quando Buck beijou-a no pescoço.
— Ao chegar a Ayudhya, vá para os jardins do templo Pa-nan Chang e espere aos
pés da grande estátua de Buda que existe no local. Eu a encontrarei lá às dez horas e a
levarei até a minha amiga.
— Como poderei reconhecê-la?
— Eu a localizarei, Sra. Michaels, fique tranqüila. A senhora é uma mulher alta
com cabelos vermelhos, não é?
— Como disse? — perguntou Amanda, tão distraída pelos carinhos de Buck que
nem ouviu o que a jovem falou.
— Eu afirmei que a senhora é alta e rui vá, por isso não será difícil reconhecê-la.
— Oh, sim, claro.
— Nós nos veremos amanhã, então, Sra. Michaels. Adeus. Amanda desligou o
telefone e, soltando-se dos braços de Buck, argumentou com certa irritação:

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— Mas que falta de consideração! Você nem deixou que eu conversasse direito!
— Pode ter sido falta de consideração minha, mas eu me diverti bastante. Não se
esqueça de que, como seu "marido", tenho certos direitos sobre a sua pessoa, Sra.
Michaels.
— Se isso significa o que estou pensando, Sr. Michaels, acho que vamos nos
divorciar dentro de pouquíssimo tempo!
— Mas até o divórcio, o fato de você ter o meu sobrenome me dá certas
prerrogativas...
Terminando de falar, Buck abraçou-a e percorreu-lhe o pescoço com a língua.
Todos os músculos do corpo de Amanda ficaram tensos, e ondas de desejo a
envolveram. Isso nunca lhe acontecera antes, tão rápido a ponto de deixá-la confusa,
Sem perder tempo, Buck tomou-lhe o rosto entre as mãos e beijou-a. Subitamente,
Amanda desejou ser possuída por ele. Queria-o agora, naquele exato instante, como
jamais quisera qualquer outro homem.
Quando o beijo terminou, Buck soltou-a e ambos ficaram se olhando por alguns
segundos, calados. De repente, Buck colocou-lhe as mãos na cintura e desamarrou o
cinto do penhoar, abrindo-o em seguida, seus dedos acariciaram de leve a cintura nua e
feminina e foram subindo até encontrar os seios.
Ao ser tocada numa região tão sensível, Amanda pensou que fosse desmaiar de
prazer. Queria ser beijada, abraçada, mas ele continuou simplesmente a brincar
eroticamente com seus mamilos, até deixá-los rijos.
E então abaixou a cabeça e começou a beijar os seios de Amanda, a lamber os
mamilos róseos com movimentos circulares e lentos. Quando ela gemeu, excitada, Buck
endireitou o corpo e beijou-a nos lábios, no mesmo instante em que lhe tirava o penhoar,
deixando-a completamente nua.
Sem hesitar, tomou-a nos braços, sussurrando:
— Quero você, Amanda. Agora...
Amanda sabia que este era o momento em que ele, como um cavalheiro, entregava
a decisão da situação em suas mãos. Era ela quem deveria resolver o que aconteceria a
seguir, mas sua mente só conseguia pensar no quanto queria ser abraçada por Buck, no
quanto parecia certo desejá-lo e ser desejada por ele. Qualquer sinal de dúvida, qualquer
indício de negativa que tenha passado pela sua cabeça desvaneceu-se por completo
diante da magnitude de seus sentimentos. Sabia que era chegada a hora de entregar-se.
E Buck sabia disso também.
Pegando-a no colo, levou-a para o quarto dele e deitou-a com extrema gentileza na
cama. Amanda enfiou-se debaixo das cobertas enquanto Buck tirava a camisa, os
sapatos, a calça; foi percorrida por um tremor sensual ao observar aquele corpo
desconhecido, que trazia consigo promessas de prazer e intimidade. E quando já
inteiramente nu ele se deitou a seu lado, seu coração começou a bater forte dentro do
peito.
— Você é linda — murmurou Buck acariciando-a nos cabelos, nos ombros, nos seios.
Amanda estremeceu de prazer sob o toque daquelas mãos másculas, fortes, e não
conseguiu reprimir um gemido sensual quando a língua quente de seu parceiro lambeu-
lhe a orelha e o pescoço.
— Oh, Buck, você está me torturando — murmurou, sorrindo.

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Também sorrindo, de modo carinhoso, ele forçou-a de leve a virar-se para que
ficassem deitados de lado e de frente, e retrucou:
— Torturando você? Pensei que estivesse lhe dando prazer.
Entrando na brincadeira, Amanda fingiu que ia beijá-lo; acariciou-o com seu hálito
morno e perfumado, afastando seus lábios dos dele no último instante. Em seguida,
curvou as costas para trás até que seus seios quase tocassem o peito másculo, e então
repetiu o gesto de afastar-se antes do contato final.
Cansado do jogo que ele mesmo provocara, Buck suspirou e gemeu baixinho.
Segurou Amanda pela cintura e puxou-a de encontro a si, pressionando-a contra suas
coxas e quadris, fazendo-a sentir a força de seu membro rijo de excitação. Depois
começou a beijá-la no pescoço e nos ombros, descendo para os seios. Mordiscou-lhe os
mamilos, de leve, até deixá-los mais uma vez eretos. Seus dedos dirigiram-se, ávidos,
para o meio das coxas de Amanda, que abriu as pernas para aceitar o toque alucinante.
Ao atingir o centro da feminilidade de Amanda, úmido e pulsante de excitação,
Buck começou a mover seus dedos com suavidade, numa carícia enlouquecedora.
Arrepios de prazer percorreram todo o corpo de Amanda, fazendo-a estremecer e gemer.
Procurando incendiar ainda mais as ondas de paixão que despertara em sua
parceira, Buck mais uma vez acariciou-lhe os seios com os lábios e a língua, sem parar
um só instante de provocá-la no ponto de êxtase entre as pernas. Tal combinação foi
demais para Amanda, cujo corpo contorceu-se num espasmo incontrolável.
— Oh... Oh... Céus... — gemeu ela, percorrida por sensações indescritíveis.
Buck aumentou o ritmo das carícias. Incapaz de se controlar, Amanda ergueu os
quadris e começou a movimentá-los de modo a acompanhar o ritmo dos dedos que
invadiam sua intimidade de uma maneira tão deliciosa e maravilhosa. Sentiu seu corpo
caminhar inexoravelmente em direção ao gozo total, e seus gemidos e suspiros devem
ter indicado que o clímax estava próximo pois, de repente, Buck interrompeu as carícias.
Com carinho e gentileza, deitou-se sobre Amanda e penetrou-a. Ela deu um suspiro
e estremeceu. Buck esperou que um segundo se passasse antes de fazer nova investida,
sem pressa.
A sensação de estar sendo possuída era maravilhosa, incrível. Sem nem mesmo
perceber, Amanda levantou os quadris e abraçou Buck com as pernas, forçando uma
penetração mais profunda. Ele gemeu baixinho e, incapaz de se controlar diante de tal
iniciativa, iniciou os movimentos que levariam ambos ao auge do prazer.
Acompanhando o ritmo frenético de Buck, Amanda sentiu-se mais uma vez
invadida pelo delírio sensual de alguns momentos antes, e desta vez soube que atingiria
mesmo o gozo. Ao perceber que a explosão final de intenso prazer aproximava-se, gritou,
excitada:
— Oh, Buck! Agora!
Juntos, alcançaram o êxtase da união sexual. Exaustos, suados e satisfeitos,
entregaram-se ao relaxamento do depois.
Sentindo o membro de Buck ainda dentro de seu corpo, Amanda maravilhou-se
com os espasmos de deliciosas sensações que se irradiavam do centro de sua
feminilidade. Buck a fizera experimentar algo novo, grandioso, e por isso sentia-se feliz.
O desejo que a torturara por tantos dias fora finalmente aplacado.
— Oh, Buck, eu não sabia que... que podia ser tão... tão bom assim — murmurou
ela abraçando-o, emocionada, sabendo que nunca mais seria a mesma mulher de antes.

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— Quem teria imaginado que temos a mesma paixão por comer na cama? —
perguntou Buck, divertido, tentando espetar com o garfo o último camarão no prato de
Amanda.
— Certas coisas eu dividirei com você, querido, mas o meu último camarão não! —
retrucou ela dando-lhe um tapa na mão. — Pelo menos, não quando estiver com a fome
que estou agora!
— Pois saiba que gostei muito do que dividimos agora há pouco. Para ser sincero,
amei mais do que gostei...
Buck estava realmente falando a verdade, mas tinha consciência de que suas
palavras não eram suficientes para exprimir seus sentimentos em relação a Amanda. O
sexo era uma invenção sensacional, sem dúvida alguma, e ele jamais se cansara dos
jogos amorosos; a única coisa que o aborrecia, na maioria das vezes, eram as suas
parceiras de cama. Amanda Parr, no entanto, provocara nele uma reação bem diferente
do aborrecimento e do tédio. Ao terem uma relação mais íntima, ela lhe despertara ainda
mais desejo. Não apenas desejo físico, sexual, mas uma vontade profunda de conhecê-la
melhor como pessoa, como ser humano.
— Em que está pensando, Buck? Você parece tão longe daqui... Por acaso está com
raiva de mim por eu não ter lhe dado o meu camarão?
— Não. De certo modo eu estava pensando no meu passado...
— Pensando em outras mulheres?
— Pode-se dizer que sim. Eu estava fazendo comparações.
— Puxa, você não é nada lisonjeiro, hein?
— Calma, Amanda, deixe-me acabar de falar. Eu estava pensando no quanto me
sinto... diferente... a seu lado.
— Diferente? Como?
— Andei refletindo sobre algumas das coisas que você me disse nos últimos dias
e...
— E?
— Bem, o que quero dizer é que pensei no que você me falou a respeito de "não se
importar com compromissos formais, e sim com os sentimentos que a ligam a outra
pessoa. Desse modo, gostaria que você soubesse que o fato de termos feito amor não a
inclui na lista de mulheres fúteis que já conheci até hoje.
— Obrigada por me ter dito isso, Buck. Suas palavras me deixam muito feliz —
agradeceu Amanda, emocionada, antes de finalizar, quebrando a tensão do momento: —
Mas isso não significa que eu vá repartir o meu último camarão com você!
Rindo, Buck estendeu o garfo para espetar o pomo da discórdia, mas Amanda foi
mais rápida; com um gesto ligeiro, enfiou o enorme camarão na boca, segurando-o com
os dentes:
— Ora, ora, que gulosa! Vai conseguir comer tudo sozinha, por acaso?
Amanda tentou respondeu mas, com a boca cheia, só pôde emitir murmúrios
incoerentes.
— O que você disse? Que o camarão é muito grande e você quer reparti-lo comigo?
— Nãooooo!
— Ok, querida, se você faz tanta questão, eu a ajudarei.

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— Sem parar de rir, Buck pegou a metade do camarão que estava para fora e
comeu-o. Em seguida, lambeu os dedos, murmurando:
— Hum, que delícia!
Amanda mastigou e engoliu o pedaço que estava em sua boca e depois pulou sobre
Buck, fingindo-se de brava.
— Seu... seu ladrão! Merece uma mordida pelo que acaba de fazer!
Juntando a ação às palavras, deu uma mordida no pescoço de Buck. Depois da
mordida deu um beijo para apagar as marcas de seus dentes da pele dele. E então deu-
lhe outro beijo, e mais outro, e mais outro e...

CAPÍTULO IX

Depois de tantos beijos, que culminaram mais uma vez em um delirante ato
amoroso, Buck logo pegou no sono.
Apesar de apreciar a proximidade e o calor aconchegante do corpo másculo
abraçado ao seu, Amanda, por sua vez, demorou a dormir. Sozinha com seus
pensamentos na escuridão do quarto, aproveitou para refletir sobre os novos rumos de
seu relacionamento com Buck. Procurou não se preocupar com as conseqüências trágicas
que poderiam advir do fato de ter ido para a cama com ele, concentrando-se mais nas
possíveis alegrias que talvez encontrasse à sua frente.
Recordou-se de cada minuto passado ao lado de Buck desde que o conhecera;
lembrou-se das conversas e das brigas que haviam tido, das horas de companheirismo,
das vezes em que haviam se provocado e rido juntos.
Pensou também na missão que o trouxera para a Tailândia, na menina e na
mulher, Dameree, a quem encontraria no dia seguinte. Como seria a mulher oriental, a
ex-amante de seu atual companheiro?
Com a cabeça pesada de sono, Amanda começou a imaginar a aparência de
Dameree, construindo mentalmente uma imagem parecida à da bailarina que vira na
boate — de uma beleza exótica, misteriosa e cheia de delicadeza e graça femininas.
Por fim, vencida pelo cansaço, acabou dormindo com a mente povoada por visões
etéreas e desconexas. Horas mais tarde, estava imersa num sonho fantasmagórico no
qual dançava junto com Dameree em meio a uma floresta densa, quando sentiu que
duas mãos fortes a sacudiam de leve pelos ombros. Acordou assustada, abriu os olhos e
viu Buck encarando-a com ar preocupado.
— Amanda, o que foi? — indagou ele. — Sente-se bem? Você estava gemendo tanto
enquanto dormia que acabou me acordando.
— Eu... eu só estava sonhando... com Dameree. Estávamos dançando na selva.
— Mas você nem a conhece, como pode sonhar com ela?
— Imaginação, óbvio.
— Tem razão. Estranho... para falar a verdade, nem eu mesmo sei se reconheceria
Dameree agora. Não a vejo há tantos anos...
Amanda reparou na expressão longínqua que tomou conta do rosto de Buck e
imaginou o que ele faria se soubesse que o seu encontro naquela manhã seria com
Dameree. Sonolenta, olhou para os primeiros raios de sol que invadiam o quarto através
das f restas da janela e perguntou:

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Que horas são agora, você sabe?


— Cinco e quinze.
— Oh!, céus...
— Temos que pegar o trem das sete horas, lembra-se? Acho melhor irmos nos
levantando.
Sentindo vergonha de levantar-se nua, Amanda esperou que Buck se vestisse e
saísse do quarto antes de colocar seu penhoar e voltar para os seus próprios aposentos.
Enquanto tomava um banho e se aprontava, pensou no que acontecera na noite anterior.
Buck fora o amante perfeito; gentil, afetuoso, cuidadoso. Era tão cheio de vitalidade
e sensualidade que conseguia transformar o menor gesto de carinho numa carícia
apaixonada, enlouquecedora. No final das contas, sua missão de procurar a menina
desaparecida forjara um laço entre ele e Amanda, fornecendo a base mínima para um
relacionamento mais profundo.
Mas, apesar disso, Amanda decidiu refrear suas esperanças otimistas e continuar
sendo cautelosa. Ainda havia muitas incertezas no ar, e não existia um modo seguro de
adivinhar se os sentimentos de Buck resistiriam à passagem do tempo.
Quando Amanda se dirigiu para a sala da suíte, poucos minutos antes das seis
horas, Buck já se encontrava à sua espera. Ao vê-la chegar, serviu o café que pedira com
antecedência e examinou-a de alto a baixo com um olhar de admiração.
— Você está linda nesse vestido, Amanda. E agora que já recebeu a sua cota diária
de elogios, por que não se senta um pouco e toma um café rápido para sairmos logo? Eu
gostaria de lhe mostrar uma coisa interessante antes de pegarmos o trem.
— Mostrar-me uma coisa interessante, a esta hora? O que é?
— Um espetáculo que só as pessoas que gostam de se levantar cedo têm a
oportunidade de assistir. Suponho que ainda não o tenha visto pois, pelo jeito, você é do
tipo que prefere ficar na cama até mais tarde. Vamos, tome o seu café para podermos
sair.
Pouco depois estavam fora do hotel. As ruas ainda se encontravam desertas e
quietas, exceto pelo porteiro do Oriental e por dois motoristas de táxi que cochilavam
dentro de seus automóveis. Buck acordou um dos motoristas e deu-lhe algumas
instruções antes de entrar no veículo em companhia de Amanda. Cinco minutos mais
tarde, o táxi parou em frente a um dos vários templos budistas da cidade.
Amanda reparou que muitos monges — de cabeça raspada e usando mantos
alaranjados — deixavam o templo'. Como um pequeno exército de formigas coloridas,
eles se espalharam rapidamente pelas ruas.
— O que é que os monges vão fazer? — perguntou, curiosa.
— Coletar comida — explicou Buck. — Vê a tigelinha que cada um deles carrega?
Ela serve para receber os alimentos.
— Quer dizer que... os monges mendigam comida?'
— Mendigar não é a palavra exata. Compreenda, esse ritual todo faz parte do
sistema aqui. As comunidades religiosas são sustentadas pelo povo. As famílias da
cidade têm a responsabilidade de contribuir para o sustento dos. monges. Está vendo as
mulheres nas portas das casas? Todas as manhãs, às seis horas, elas esperam pelos
monges para darem a sua contribuição diária.
Amanda observou um velho monge parar na porta de uma casa próxima, onde uma
jovem mulher com uma grande panela na mão lhe serviu uma colherada de comida.

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

Nenhuma palavra foi trocada entre os dois. Depois de dar sua contribuição, a jovem fez
uma reverência e ajoelhou-se para rezar antes que outro monge se aproximasse para
receber a sua parte.
— Puxa, mas que incrível! — exclamou ela. — E o que os monges fazem na hora do
jantar? Saem à rua de novo?
— Não. Eles só se alimentam de manhã, e passam o resto do dia meditando e
estudando.
— Céus! Com uma perspectiva de vida tão frugal e rigorosa, como é que há tantos
monges por aí?
— Basicamente, todo homem tailandês passa uma parte de sua vida como monge
ou noviço nos templos. É uma espécie de obrigação patriótica.
Depois de permitir que Amanda observasse por mais algum tempo o exótico
espetáculo, Buck falou de novo com o motorista e o táxi pôs-se em movimento.
Logo chegaram à estação ferroviária, uma velha construção em estilo europeu,
àquela hora já cheia de camponeses, religiosos e trabalhadores que iam para o serviço.
Após comprarem dois bilhetes, Amanda e Buck dirigiram-se para a plataforma de
embarque. Quando o trem chegou, cinco minutos atrasado segundo o horário oficial,
ambos entraram e tomaram seus assentos no lado esquerdo do vagão, perto de uma
janela. Desse modo poderiam apreciar a vista do rio durante a viagem e ao mesmo tempo
evitariam tomar direto no rosto o sol que castigava as janelas do lado direito.
Assim que o trem deixou a estação, Amanda sentiu um arrepio de excitação, como
se estivesse começando uma aventura. Ao virar-se para Buck para fazer um comentário,
percebeu que ele a encarava sorrindo. Num acordo mudo, deram-se as mãos e trocaram
um beijo leve, sentindo-se livres e felizes.
Já estavam viajando há uma hora e meia quando Buck olhou seu relógio de pulso
e anunciou que não se encontravam muito longe de Ayudhya.
— Afinal, com quem é que você vai se encontrar lá? — indagou ele, curioso.
— Uma pessoa envolvida num caso bastante delicado do qual estou cuidando —
respondeu Amanda, sentindo-se subitamente culpada.
Sabia que estava sendo evasiva, mas preferia não acrescentar mais nenhuma
mentira às que já contara. Bastava-lhe o fato de estar sendo desleal com Buck ao
esconder dele que iria encontrar-se com Dameree.
Buck, por sua vez, não exigiu uma resposta mais completa. No entanto, não pôde
deixar de notar que Amanda ficara um pouco nervosa com a sua pergunta. Havia algo
de muito estranho nessa viagem a Ayudhya. Tudo começara com a história de Amanda
ter se fingido de Sra. Michaels no orfanato e com o telefonema que recebera no hotel
pouco depois. A intuição masculina de Buck lhe dizia que tudo isso tinha algo a ver com
o homem misterioso que o abordara durante o café da manhã naquele outro dia. Mas o
que obrigara Amanda a ir sozinha a um encontro envolto em mistério? Por que ela não
confiara nele?
Buck ficou preocupado com a idéia de Amanda pensar que o estava protegendo
contra algo. E, afinal, o que seria esse "algo", se é que ele existia? Alguma atitude
violenta contra a sua pessoa?
Quando o trem finalmente chegou a Ayudhya, Buck chamou um samlor assim que
saiu da estação ferroviária com Amanda. Pediu ao motorista que parasse primeiro no

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museu local, onde ficaria, e depois seguisse para o bairro onde Amanda dissera que
queria parar. Durante o caminho para o museu, Buck insistiu:
— Tem certeza de que não quer que eu vá com você ao seu encontro tão misterioso,
Amanda?
— Tenho, obrigada — respondeu ela forçando uma calma que na verdade não
sentia.
Diante do museu, Buck desceu do samlor e pagou o motorista. Em seguida, virou-
se para Amanda.
— Não precisa dar mais nenhum dinheiro ao motorista. Já dei a ele inclusive uma
boa gorjeta, ok? E... acha que vai conseguir voltar para cá depois, sem problemas?
— Buck, por favor, pare de me tratar como uma criança incompetente. Sei cuidar
bem de mim mesma. Como pensa que me virei nas outras vezes em que estive na
Tailândia, sozinha?
— Bem, desculpe-me, mas...
— Esqueça. Sinto muito se pareci grosseira e ingrata. E obrigada por você se
preocupar comigo.
— Hum, nós nos encontraremos na entrada do museu ao meio-dia, então?
— Combinado. Mas não precisa ficar aflito se eu me atrasar um pouco, certo?
— Certo. Tchau, e boa sorte no seu encontro.
Ao ver o samlor se afastar com Amanda, Buck tentou convencer-se a deixá-la ir
sozinha. Seu instinto, contudo, obrigou-o a segui-la. Sem perda de tempo, parou um táxi
que passava e pediu ao motorista que fosse atrás do samlor com a mulher ruiva.
Sentindo-se como num filme policial, o motorista obedeceu ao pedido com toda a rapidez.
A discreta perseguição terminou às margens do rio. Dentro do táxi, Buck observou
Amanda descer do estranho veículo oriental de três rodas e dirigir-se para um
embarcadouro próximo. Entregando um maço de notas para o motorista, sem se
preocupar com o troco, Buck desceu do automóvel e continuou a observá-la de longe. Ao
vê-la tomar um barco para atravessar o rio, percebeu que teria de fazer o mesmo sem
perder um só segundo. Se Amanda chegasse à outra margem antes dele, jamais
conseguiria encontrá-la de novo para continuar a segui-la. Precisava achar alguém que
o ajudasse a atravessar o rio, e depressa!
Agitando uma nota de cem dólares no ar, acenando na direção de um bote a remo
cheio de homens, não foi difícil conseguir esse alguém.
Ao chegar à outra margem do rio, Amanda perguntou ao barqueiro que a ajudara
a fazer a travessia — e que compreendia um pouco de inglês — onde ficava o templo
Panan Chang e seguiu na direção apontada pelo homem.
Caminhou dez minutos até chegar aos portões externos do templo, que davam
entrada para um grande e bem cuidado jardim. Sentindo seu nervosismo aumentar a
cada passo, dirigiu-se para perto do enorme Buda de dezoito metros de altura que a
amiga de Dameree mencionara e pôs-se à espera.
Distraiu-se por alguns minutos observando um grupo de jovens que tiravam a sorte
em palitos de bambu sob a sombra de uma árvore próxima, até que ouviu uma voz suave
chamá-la pelo seu "nome de casada":
— Sra. Michaels?

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Sim, eu sou Amanda Michaels — respondeu ela à jovem mulher que lhe sorria
com timidez.
— Venha comigo, senhora, por favor.
A jovem levou-a para um pequeno jardim particular no interior do templo, cercado
por altos muros de pedra e um pesado portão de madeira e em seguida retirou-se com
discrição. A um canto do jardim encontrava-se uma linda mulher de mais ou menos
trinta anos, usando um cheongsam de seda vermelha e examinando de perto algumas
flores.
A mulher sorriu ao avistar Amanda e aproximou-se com um sorriso, dizendo:
— Obrigada por ter vindo me ver, Sra. Michaels.
— Foi um prazer atender ao seu pedido, Dameree.
— Obrigada, mais uma vez, pela gentileza. Não quer sentar-se, por favor? —
perguntou ela indicando a Amanda uma cadeira almofadada.
— Sim, obrigada.
— Gostaria de tomar uma xícara de chá, Sra. Michaels?
— Gostaria muito. E pode me chamar de Amanda, se preferir.
Dameree concordou com um gesto de cabeça e tocou uma sineta pendurada nos
galhos de uma árvore-anã. No mesmo instante surgiu um homem de uniforme branco,
e os dois começaram a conversar.
Amanda aproveitou a chance para examinar sua anfitriã. Dameree tinha a pele
branca como porcelana, cabelos e olhos negros, longas unhas pintadas de vermelho;
usava várias correntes de ouro no pescoço e um grande anel de brilhante na mão
esquerda. Sua beleza era delicada como a de uma flor, o que tornava difícil imaginá-la
como tendo sido um dia uma massagista comum.
Depois de dispensar o homem de uniforme branco, Dameree voltou-se para
Amanda, atenciosa.
— Como vai Buck, seu marido? Ele está triste por causa da criança?
— Sim, ele está muito aborrecido por não ter encontrado a menina até agora.
— Pobre Buck, deve ter muitas perguntas a me fazer... Foi por isso que lhe pedi
para vir aqui, Amanda. Meu marido não quer que eu veja Buck, mas não disse nada a
respeito de eu não poder ver você, uma mulher. Não contou ao seu marido sobre o nosso
encontro, contou?
— Não, mantive tudo em segredo como você pediu — respondeu Amanda sentindo-
se duplamente culpada por enganar Buck e Dameree ao mesmo tempo.
O homem de uniforme voltou com um bule de chá, duas xícaras e uma linda flor de
lótus numa bandeja, que foi colocada sobre uma mesinha baixa entre as duas mulheres.
Dameree fez-lhe um sinal para que se retirasse e em seguida serviu o chá, entregando
uma das xícaras a Amanda. Depois de tomar um gole da bebida quente e perfumada,
disse com ar tristonho:
— Sei que você gostaria de saber onde está a criança, Amanda. Infelizmente,
contudo, nem eu sei onde ela está.
— Você a mandou para os Estados Unidos? Esta foi a informação que eu e Buck
recebemos até agora.

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Muitos anos atrás, a irmã de meu marido levou meu bebê para o Orfanato da
Missão Cristã em Bangcoc. Nunca mais vi minha filha, mas espero que já esteja nos
Estados Unidos, num bom lar.
— Você pode me dizer algo que nos ajudasse a identificar e localizar sua filha?
— Sim, existe esta possibilidade. Mas eu gostaria de lhe pedir um favor, antes.
— Peça o que quiser, Dameree.
— Embora eu tenha me separado da minha filha e ela não esteja mais nos meus
pensamentos, ela está sempre no meu coração. Tenho dois filhos com meu marido, e eu
os amo muito, mas meu coração chora de saudade do meu primeiro bebê. Eu lhe peço a
gentileza de me mandar notícias de minha filha quando a descobrir. Se você puder me
enviar uma carta por ano, contando sobre a vida dela, eu contarei a você tudo que sei.
— É claro que ficarei feliz em mantê-la informada sobre o que eu e Buck
descobrirmos, mas mesmo com a sua ajuda não temos certeza absoluta de encontrar a
menina. Além disso, existem certas obrigações em relação à criança e seus pais adotivos.
Já expliquei isso a Buck, também.
— Eu compreendo. Você é uma mulher honorável, Amanda.
— Obrigada, Dameree. Poderia me contar agora algo sobre a sua filha?
Lágrimas surgiram nos belos olhos orientais da ex-amante de Buck, que com
grande esforço controlou sua emoção e respondeu:
— Nem sei o que dizer a você...
Amanda sentiu os próprios olhos se encherem de lágrimas diante da voz
embargada daquela mãe há tantos anos separada da filha. Desde que trabalhava para
a Fundação para Crianças Amerasiáticas, esta era a primeira vez que conversava com
a mãe natural de uma criança.
— Por que decidiu separar-se do seu bebê? — indagou Amanda gentilmente.
— Eu... eu não tive outra escolha. Por favor, entenda. Eu era muito pobre e a minha
família estava sofrendo. Quando meu bebê tinha alguns meses de idade, conheci um
homem a que comecei a amar. Ele era chinês, muito rico, e me tornei sua amante. Ele
também me amava, mas não lhe contei sobre a minha filha. Eu ainda morava na casa
de Buck, e inventei uma história para enganá-lo.
Dameree tomou um gole de chá para acalmar-se antes de prosseguir:
— Um dia, meu amante me disse que estava triste porque me amava, mas como eu
não era chinesa não podia casar-se comigo. A família dele jamais aceitaria que a esposa
de um filho não fosse chinesa. Fiquei feliz ao ouvir isso porque, de nascimento, sou
chinesa, e não tailandesa como a minha segunda família. Quando contei a verdade ao
meu amante, ele se mostrou muito contente e foi junto com o pai conversar com a minha
família chinesa, minha família verdadeira. Nosso casamento foi marcado.
— Mas ele continuava não sabendo que você tinha uma filha?
— Continuava. Para ser uma boa esposa, eu sabia que precisava contar a ele sobre
o meu bebê, e foi o que fiz. Ele não ficou zangado comigo, mas como minha filha era
também americana e não uma chinesa pura... a família dele não a aceitaria. Chorei
muitos dias e muitas noites, mas acabei concordando quando ele sugeriu que o bebê
fosse mandado para os Estados Unidos, seu país por parte de pai. Eu queria tanto me
casar... Isso tudo aconteceu há doze anos. Minha filha agora já é quase uma mocinha.
— Deve ter sido uma decisão muito difícil para você, Dameree.

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Sim... Muito difícil.


Amanda observou Dameree enxugar furtivamente uma lágrima e pensou em Buck
e em sua tristeza, que se assemelhava à da mulher oriental. Parecia óbvio que ele era o
pai da criança, embora Dameree não o tivesse admitido. Pelo bem de Buck, Amanda
sabia que não poderia ir embora dali sem descobrir a verdade completa sobre o assunto.
— Quando mandei milha filha para o orfanato, pensei que talvez um dia eu
quisesse procurá-la para encontrá-la de novo, por isso prendi na sua roupinha um
bilhete com o seu nome — continuou Dameree.
— E qual foi o nome que você lhe deu?
— Lua de Lotus...
— Que bonito!
— Obrigada. Este era o nome de minha avó. Eu o escrevi em inglês, no bilhete,
para que pudesse ser compreendido nos Estados Unidos.
— Espero que consigamos encontrar Lua de Lotus nos registros de algum orfanato
americano.
— Registros nem sempre são seguros e completos, Amanda, e não é sempre que
podemos confiar nas pessoas. Por causa disso eu mandei fazer uma pequena tatuagem
no tornozelo esquerdo da minha filha. Uma tatuagem com uma flor de lótus e uma lua
crescente. Desse modo, eu sempre a reconheceria em qualquer lugar, mesmo daqui a
vinte anos. — Dameree tocou na flor de lótus sobre a bandeja e comentou: — Hoje haverá
uma lua crescente no céu. Isso é um bom sinal...
— Obrigada por ter me contado tudo, sei o quanto deve ser triste para você
relembrar o passado — disse Amanda num tom de voz suave, compreensivo. — Buck lhe
será eternamente grato por este favor.
— Buck é um bom homem, Amanda, Transmita a ele tudo o que eu disse a você e
explique por que não pude vê-lo pessoalmente. Acho que meu marido chegou a criar
problemas para Buck, e sinto muito por isso. Meu marido me ama e só quer me proteger
e me fazer feliz; mas, como homem, não entende que um filho nunca morre no coração
de uma mãe. Espero que você e Buck o perdoem por isso.
— Claro, Dameree, claro. O importante agora é que temos dados mais concretos
para encontrar sua filha e verificarmos se ela está num bom lar. Bem, já é tarde. Talvez
seja melhor eu ir embora.
Dameree concordou com um aceno de cabeça e as duas se puseram de pé.
— Lembre-se da promessa que me fez, Amanda. Por favor, mande-me notícias de
minha filha.
— Eu mandarei, não se preocupe.
— Aqui está o endereço de meu irmão — disse a mulher chinesa tirando um
papelzinho do decote do cheongsam. — Envie as cartas para ele, para que meu marido
não saiba do que combinamos. E... se você algum dia se encontrar com Lua de Lótus...
diga a ela quê a amo e... que nunca a esquecerei.
Depois de trocarem um abraço espontâneo e emocionado, Amanda e Dameree
caminharam lentamente em direção ao portão do jardim. Amanda sabia que tinha de
perguntar se Buck era o pai de Lua de Lotus, mas até o momento não havia conseguido
pensar em nenhum modo delicado de abordar o assunto. Talvez, quando estivessem se
despedindo.
— Obrigada por ter me convidado para esta conversa, Dameree.

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Você é.que foi muito gentil em ter vindo, Amanda. Desejo a você e a Buck muitas
felicidades.
As duas se abraçaram mais uma vez e em seguida Amanda abriu o pesado portão
de madeira do jardim, formulando mentalmente a pergunta final e reveladora. Quando,
por fim, criou coragem para falar, virou-se para Dameree e surpreendeu-se ao.perceber
que ela empalidecera terrivelmente. Sem entender o que estava acontecendo, voltou-se
e olhou para trás.
Do lado de fora do jardim, a menos de dois metros de distância e encostado ao
tronco de uma árvore encontrava-se Buck Michaels.

CAPÍTULO X

— Pelo amor de Deus, o que é que você está fazendo aqui?! — Perguntou Amanda,
ao mesmo tempo incrédula e zangada.
Dameree, que dera um gritinho de surpresa ao avistar Buck, virou-se e começou a
correr de volta para o templo.
— Espere! Por favor, espere, Dameree! — pediu Buck, ignorando a pergunta que
lhe fora dirigida por Amanda e segurando a mulher oriental pelo braço. — Sinto muito,
mas eu preciso falar com você. Apenas algumas palavras, eu lhe imploro.
— Eu já contei tudo o que era importante e necessário à sua esposa, Buck —
respondeu ela de cabeça baixa, com voz trêmula, recusando-se a encará-lo de frente.
— Tudo? Tem certeza? Por acaso contou a Amanda se a menina é minha filha
também?
— Não, mas... eu... sim, Lua de Lotus é nossa filha... Buck soltou o braço de
Dameree, pálido, parecendo incapaz de compreender a verdade da afirmação.
Finalmente criando coragem, a mulher oriental ergueu os olhos e encarou-o. Por um
breve momento Amanda pôde perceber no olhar trocado pelo casal a enorme dor que
sentiam. Ambos assemelhavam-se a duas almas desesperadas, reunidas após anos de
separação por um intenso instante de angústia e sofrimento — os pais de uma criança
perdida... Os dois continuaram se olhando por algum tempo até que, como nada mais
fosse dito, Dameree se afastasse com lágrimas a escorrer-lhe pelas faces.
Amanda olhou pela janela do Orchid Queen, tentando inutilmente distrair-se com
a bela paisagem das margens do rio; como apreciar a bela vista com tranqüilidade se
Buck encontrava-se tão melancólico e cabisbaixo a seu lado? Tinha que consolá-lo de
algum modo.
Depois de terem caminhado em silêncio do templo até o embarcadouro, onde o barco
do hotel fazia uma de suas várias paradas, Amanda o abraçara pela cintura e procurara
confortá-lo. Buck acabara se alegrando um pouco com a atitude dela, mas, um vez dentro
da embarcação, voltara a mostrar-se triste.
— Vamos, deixe-me comprar-lhe mais uma cerveja — disse Amanda, tentando
animá-lo mais uma vez.
— Ok, compre outra cerveja — retrucou Buck, sorrindo de modo um tanto forçado.
— Ei, feuck, por favor, não fique assim. Pensei que você fosse ficar feliz com as
informações que Dameree nos deu. Pelo menos sabemos, agora, que a sua filha não foi
abandonada como mendiga nas ruas de Bangcoc.

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Sim, é verdade. Ouça, desculpe-me por estar bancando o chato com você. Sei que
não estou sendo uma boa companhia no presente momento, mas... mesmo esperando por
uma resposta afirmativa de Dameree, não estou conseguindo me dar bem com a idéia
de ter uma filha de treze anos que é uma completa.desconhecida para mim.
— Eu compreendo, não se preocupe. E sei que também foi um trauma para você
reencontrar Dameree após todos esses anos, não é?
— Sim, foi. Apesar de saber que ela não queria me ver, eu tinha que vê-la para
fazer a pergunta que me torturou por tanto tempo.
— Tenho certeza de que Dameree não o levou a mal, Buck. E agora pare de se
preocupar, por favor. Nenhum dano permanente foi causado.
— Você está certa, Amanda. Mas pense no quanto da vida da menina eu já perdi.
Minha própria filha... e eu nem mesmo a conheço.
— No entanto, o seu propósito não é conhecer Lua de Lotus; é apenas verificar se
ela está bem, lembra-se? Não fique obcecado com o que você perdeu, procure encarar
isso como um fato consumado. Tome cuidado para não se envolver emocionalmente com
objetivos errados, Buck.
— Eu tentarei, prometo.
— Ótimo. E eu, por minha vez, prometo fazer todo o possível para verificar o bem-
estar de sua filha quando voltarmos aos Estados Unidos. Por favor, convença-se de que
isso é tudo o que você precisa, ok?
— Ok, Amanda. E agora, que tal irmos comprar aquela cerveja?
Encarando os belos olhos azuis de Buck, ela sorriu e puxou-o pela mão para irem
até o barzinho do barco.
Quando o Orchid Queen chegou ao Oriental Hotel, o sol estava começando a baixar
no horizonte, Era cedo demais para jantar e, reparando que Buck parecia ainda inquieto,
sem vontade de permanecer fechado na suíte, Amanda sugeriu:
— Que tal darmos uma volta? Poderíamos ir a um parque andar um pouco. Você
conhece algum que seja bonito e não fique muito longe?
— Conheço o Parque Lumpini, no lado ocidental da cidade, perto da estrada Rama
IV. De táxi, em poucos minutos estaremos lá. Gostaria de ir?
— Claro!
Pouco tempo depois encontravam-se na entrada do parque. Buck pegou a mão de
Amanda ao caminharem pelo gramado florido, procurando refugiar-se do calor em meio
à sombra das árvores. Acabaram por sentar-se num confortável banco de madeira com
vista para um vasto campo aberto, onde vários homens e meninos estavam reunidos
para algum tipo de atividade.
— O que é que eles estão fazendo, Buck?
— Acho que estão se preparando para empinar papagaios. Provavelmente farão
um treino para o grande festival que se realiza na primavera. A briga de papagaios pode
ser considerada o esporte nacional da Tailândia.
— Já ouvi falar sobre essas "brigas", mas nunca vi nenhuma. Você sabe como os
papagaios lutam.
— Bem, a brincadeira é meio erótica, para ser sincero. As brigas são entre
papagaios fêmeas e machos.
— Importa-se se eu perguntar como se distingue um do outro?

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— É simples. Você nem precisa virá-los de barriga para cima como se faz com
filhotes de cão ou gato — respondeu Buck, rindo.
— Ora, seu bobo! Vamos, me explique a diferença!
— Ok, ok. Vê aquele papagaio em forma de estrela que está sendo empinado pelo
homem de camisa azul? Aquele é um papagaio macho.
— Hum... Ele parece hostil e agressivo.
— Tem razão. A fêmea nunca é tão assustadora, mas pode ser traiçoeira em lugar
disso.
— Buck, você se refere a papagaios ou a pessoas?
— Ora, Amanda, não seja impertinente! — respondeu ela, no mesmo tom
brincalhão da pergunta. — E agora, deixe-me ver se localizo uma fêmea para você... Ah,
olhe lá! Vê aquele papagaio branco, quadrado?
— Sim.
— É uma fêmea.
— Mas é simples demais, não tem nenhum enfeite!
— Espere até vê-la no ar, em movimento. É uma beleza!
— Como é uma briga de papagaios, afinal? Você ainda não me explicou.
Sorrindo, Buck abraçou-a carinhosamente antes de responder:
— Os tailandeses chamam estas brigas de "o poema de amor dos deuses", ou
qualquer coisa parecida. É o princípio masculino-feminino levado a cabo em pleno céu.
— É a isso que você se refere quando diz que é uma luta erótica?
— Exato. Veja aquele pequeno papagaio fêmea. Reparou como ele se agita na ponta
da linha? Seus movimentos são frívolos e sedutores, se comparados aos do macho. Olhe
aquele, grande e vermelho. Note como seus movimentos são majestosos e largos.
— Talvez as diferenças que você mencionou existam porque foram homens que
construíram os papagaios e os colocaram no ar. A interpretação de uma mulher poderia
ser bem diferente.
— Os tailandeses são mais sutis do que você pensa, Amanda. Você não viu os
papagaios machos e fêmeas brigarem, ainda. O ritual se parece muito com a vida real.
— Não sei se me atrevo a perguntar o que você chama de "vida real"...
— O melhor jeito de descrever a briga é uma interpretação aérea das forças de vida
masculina e feminina — o yin e o yang, respectivamente. O esporte consiste em uma
fêmea tentar se posicionar acima do macho e descer sobre -ele, enrolando sua cauda na
dele, arrastando-o para o chão.
— Oh, sim, igualzinho à vida real, não é, Buck?
— Bem, você tem que admitir...
— Admitir o quê? Que Buda ou Confúcio — ou seja lá quem inventou a mística da
briga de papagaios — era um homem?
— Ei, calma! Imaginei que a idéia de uma fêmea procurando dominar um macho a
agradaria. Não é melhor isso que ser subjugada?
— Tal idéia atrai você, por acaso?
— Hum... Sou obrigado a confessar que o seu lado yin me atrai bastante...

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— É mesmo? Ora, ora, quem diria. Quando é que você vai parar de me surpreender?
E agora, se não se importa, Sr. Yang, permita-me pôr um fim a essa discussão filosófica.
Meu estômago detesta conversas, ele prefere comida! Eu estou morta de fome, sabia?
— Fome de quê? —"indagou Buck, brincalhão, beijando-a nos lábios.
— Depois da noite passada, pode apostar que não é fome de camarão! — retrucou
ela, rindo.
Ao entrarem no saguão do hotel, o recepcionista chamou Buck.
— Sr. Michaels, por favor! Recebi um telex para o senhor — disse o homem
entregando-lhe um envelope.
Assim que terminou de ler a mensagem, o rosto de Buck ficou sombrio.
— Más notícias? — quis saber Amanda, curiosa e aflita.
— Infelizmente sim. O jornal está passando por uma crise. Um dos principais
editores pediu demissão e houve um problema com o banco que cuida da nossa conta.
Os agentes financeiros do Tribune estão enfrentando sérias dificuldades. Tenho de voltar
para Los Angeles.
— Quando?
— O mais breve possível. Deve haver algum avião saindo de Bangcoc pela manhã,
eu suponho.
Observando a expressão preocupada no rosto de Buck, Amanda lembrou-se da
primeira vez em que o vira, trabalhando em sua sala, ocupado com uma pilha de papéis.
Percebeu de repente que aquele homem no escritório do jornal era o verdadeiro Buck
Michaels, e que este homem que a provocava, ria e fazia amor com ela era apenas um
homem aproveitando suas férias, uma pessoa que, por um certo período, tivera
prioridades diferentes das de um homem de negócios.
Buck ergueu os olhos do telex que voltara a ler e, reparando na cara triste de
Amanda, acariciou-lhe a face dizendo:
— Sinto muito por ter de partir. Eu estava planejando uns dias de folga para nós,
agora que encontramos a pista certa para descobrir Lua de Lotus e no entanto... Não
quer ir embora comigo, amanhã?
— Não posso. Tenho pelo menos mais três ou quatro dias de trabalho pela frente.
— Puxa, que pena. Mas não desanime; três ou quatro dias passam logo. E agora,
que tal irmos jantar? Não me esqueci de que você está morta de fome.
Na mente de Amanda, a palavra "jantar" soou como "a última refeição que faremos
juntos" e ela se sentiu subitamente muito triste — como alguém que é acordado com
rudeza de um belo sonho. Os maravilhosos dias que passara com Buck Michaels haviam
sido bem isso, um sonho. Pensar nele em Los Angeles, no jornal, sugeria uma realidade
bastante diversa da que haviam compartilhado até aquele instante.
Depois de tomarem banho e trocarem de roupa na suíte, Amanda e Buck foram ao
Verandah Restaurante, onde haviam jantado na noite em que chegaram. Como na
primeira vez, pediram um prato à base de curry. Mas nenhum dos dois parecia estar
com muito apetite; Amanda sentia-se triste, e Buck mostrava-se preocupado.
— Está pensando no Tribune? — perguntou ela abandonando o garfo ao lado do
prato.
— Sim. Sinto muito, sei que estou sendo aborrecido, mas...

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Eu compreendo, fique tranqüilo. Deve ser difícil para você não se afligir por
causa do jornal. Está arrependido de ter vindo e largado as suas responsabilidades para
trás?
— Não, nem um pouco. Esta viagem foi maravilhosa para mim. Nunca tive
companhia tão agradável quanto você e, se não fosse pela sua ajuda, eu jamais teria
obtido informações sobre Lua de Lotus. Obrigado por tudo, você foi incrível comigo.
Sentindo o coração pesado de mágoa, Amanda não deu muita importância às
palavras de Buck, decidindo que ele estava apenas sendo gentil só porque iam se
separar. Tentou imaginar como ele realmente estaria se sentindo, e então seus
pensamentos voltaram-se para os papagaios machos no parque, procurando esquivar-se
das caudas dos papagaios fêmeas. Talvez Buck tivesse razão. Talvez a briga de
papagaios representasse mesmo a vida real.
— Embora a minha viagem esteja terminando prematuramente — comentou Buck
acariciando-lhe a mão —, não posso negar que ela foi ótima para mim. Acho até que
devíamos fazer uma comemoração, uma festa de despedida.
Amanda não conseguiu evitar de encará-lo com um ar tristonho.
— Ora, vamos, anime-se — pediu ele. — Que tal fazermos também uma festa de
boas-vindas quando você retornar a Los Angeles?
— Boa idéia — respondeu Amanda, forçando um sorriso. — Não me esquecerei de
cobrar essa promessa de você.
— Não vai ser preciso cobrar... E agora, o que acha de começarmos a nossa
despedida com uma garrafa de champanhe?
Amanda se colocou em frente ao espelho da porta do guarda-roupa, como se
estivesse questionando o reflexo triste de seu próprio rosto. Já tirara as sandálias, mas
ainda usava o vestido |. amarelo-claro que pusera para ir jantar. Buck, que a estivera
observando a distância, deixou sua taça de champanhe sobre o criado-mudo e
aproximou-se, atraído pela beleza feminina.
Amanda encarou a imagem dele no espelho, sorrindo ao ver que dois braços
másculos a enlaçavam por trás, pela cintura.
— Como uma mulher tão bonita pode estar com uma carinha £ tão tristonha? —
indagou Buck, beijando-a na nuca.
— Hoje foi um dia carregado de emoções, é por isso.
— Refere-se a Dameree?
— Sim, e à sua partida, também.
— Mas não precisa ficar desse jeito. Logo estaremos juntos de novo.
— Será?
— Claro que sim! A menos que você planeje voltar para casa via China e acabe
resolvendo ficar por lá, abandonando sua nacionalidade norte-americana...
— Você está brincando, ou quer mesmo me ver quando estivermos de volta aos
Estados Unidos?
— Lógico que quero! — insistiu Buck, abraçando-a com mais força. — Por quê, você
não quer?
— Não é o que queremos agora que importa. i
— Como assim, Amanda?

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Bem... Nós passamos dias maravilhosos juntos, aqui em Bangcoc. Tudo


aconteceu como num conto de fadas. Mas já vivi o suficiente para saber que a vida não
é um conto de fadas.
— Você tem medo de que soem as doze badaladas da meia-noite, Cinderela?
— Para ser sincera e objetiva, temo que o Buck Michaels que conheci aqui na
Tailândia não seja o mesmo que conheci em Los Angeles.
— Você não me conheceu direito em Los Angeles — replicou ele, lambendo-a no
pescoço, excitado.
— Não foi isso o que eu quis dizer.
— Não? O que foi, então?
— Nós dois levamos uma vida atribulada, com prioridades distintas. Não sei se
teremos tempo e espaço para ficarmos juntos lá como ficamos aqui, em Bangcoc.
— Não posso garantir o seu lado, mas pelo meu devo dizer que sei para o que tenho
tempo e espaço — argumentou Buck, começando a desabotoar o vestido de Amanda,
dando-lhe suaves beijinhos nas costas.
— Buck, você está me ouvindo? Eu estou falando sério!
— Ouvi cada palavra sua, minha querida. Só não consigo entender por que você
está querendo criar um caso por causa disso, em vez de aproveitar a bela noite que temos
pela frente! Amanda, confie em mim. Às vezes os contos de fadas se tornam realidade...
Permanecendo calada, Amanda levantou o braço para trás e acariciou-o no rosto.
Buck beijou-lhe os dedos delicados e depois desabotoou-lhe o sutiã, escorregando as
mãos para dentro da abertura do vestido e apertando-lhe os seios de leve, até que os
mamilos ficassem rijos.
— Oh, Buck...
— Querida... Você estava tentando me dizer que por causa do seu trabalho não
poderia me ver mais?
— Não... Mas eu pensei que...
Aliviado com a resposta, Buck cobriu a boca de Amanda com a sua, saboreando a
doçura dos macios lábios femininos. Incapaz de resistir por mais tempo, tirou sem
demora o vestido e o sutiã de Amanda. Usando apenas uma calcinha de renda, ela virou-
se numa atitude recatada, cobrindo parcialmente os seios com os braços.
Buck abraçou-a, acariciando-lhe as costas, os quadris, as nádegas, ficando cada vez
mais e mais excitado. Desejou que suas próprias roupas desaparecessem num passe de
mágica, para não ter que adiar mais um segundo sequer o prazer de sentir por completo
aquele corpo perfumado junto ao seu.
Mas não era só o corpo de Amanda que o atraía e deixava louco de paixão; queria
possuir também a mulher que existia dentro dela, tão meiga, inteligente e alegre como
nenhuma outra que já conhecera. Talvez Amanda tivesse razão — três ou quatro dias
era um tempo longo demais para ficarem separados.
— Venha para a cama comigo. Quero fazer amor com você — sussurrou ele com a
voz enrouquecida, puxando-a gentilmente pela mão.
Minutos mais tarde, Amanda já estava deitada, nua sob os lençóis, observando
Buck se despir. Quando ele se deitou a seu lado, abraçou-o com força, mas não quis
começar de imediato o ato amoroso e pediu, baixinho:
— Vamos ficar assim um pouquinho, antes?

80
Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Como quiser, minha querida.


Aninhada naqueles braços quentes e fortes, Amanda sentiu-se mais uma vez
invadida pela tristeza. O fato de estarem juntos apenas a fazia recordar-se da iminente
separação. No fundo do coração sentia medo, apesar de Buck ter-lhe garantido que
continuariam a se ver nos Estados Unidos.
Ele, por sua vez, pareceu perceber a insegurança de Amanda. Carinhoso, acariciou-
lhe os cabelos e tentou animá-la, indagando:
— Por que não começamos a planejar a sua festa de boas-vindas?
— Buck, obrigada por tanta gentileza. Mas não precisa me tratar com luvas de
pelica. Não sou mais uma criança.
— Sei que não é. No entanto, um pouco de carinho e atenção extras nunca fizeram
mal a ninguém,
— Eu é que devia estar consolando você, afinal. Foi você quem passou por um dia
carregado de emoções fortes.
— Ora, que bobagem...
— Bobagem nada! Não precisa bancar o durão na minha frente, Buck. Diga a
verdade. Como está se sentindo agora?
— Muito bem, obrigado. Eu só gostaria que você se calasse por um minuto para
podermos nos beijar.
— Você não está aborrecido... com nada?
— Não. Acredito firmemente na idéia de que os pensamentos de uma pessoa são a
melhor indicação do que ela está sentindo. E, neste exato momento, prefiro pensar no
quanto é bom estar na cama com você..
— Oh, Buck... Querido...
Sem dizer mais uma só palavra, ele a acariciou nos seios e beijou-a na orelha e no
pescoço. Em seguida, sua língua quente penetrou-lhe a boca ávida de beijos, enquanto
uma de suas mãos dirigia-se para as coxas de Amanda, buscando o recanto úmido e
secreto entre elas.
Assaltada pelo fogo da paixão, Amanda puxou Buck ao encontro de si. Abriu as
pernas para recebê-lo, gemendo de prazer ao ser penetrada, tão emocionada que seus
olhos se encheram de lágrimas. Como era bom tê-lo a seu lado, ouvi-lo murmurar de
prazer, senti-lo atingir o gozo. Gostaria de conservá-lo assim, perto, para sempre. Mas,
do fundo de sua mente, uma pergunta surgiu para torturá-la: será que Buck a amava?

CAPÍTULO XI

Amanda chegou de volta ao Oriental quase na hora do almoço. O porteiro saudou-


a com um sorriso que não foi retribuído. Ela não se sentia nem um pouco alegre, pelo
contrário. Estava sozinha e cansada.
Fazendo um leve aceno para o homem, entrou no saguão do hotel e dirigiu-se à
recepção para pegar a chave de seu quarto.
— Algum recado para mim? — perguntou, embora não tivesse nenhuma razão para
estar esperando por uma mensagem.
— Não, Srta. Parr, nenhum.

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

Desanimada, foi para a suíte que dividira com Buck — que naquele exato instante
deveria estar sobrevoando o Pacífico de volta para os Estados Unidos. Examinando o
ambiente que se lhe tornara tão familiar nos últimos dias, avistou uma cópia da edição
asiática do Wall Street Journal sobre o sofá e percebeu, de repente, o quanto estava
sentindo a falta de Buck.
Sentou-se numa cadeira e tirou os sapatos que lhe apertavam os pés inchados de
tanto andar. Tivera que ir até o Ministério das Relações Exteriores para completar as
formalidades necessárias à transferência do próximo grupo de crianças órfãs e em
seguida passara no Orfanato da Missão Cristã para conversar com a Srta. Pakorn. A
visita ao orfanato fora bastante penosa, pelo simples fato de ter sido obrigada a
continuar a agir como Sra. Michaels.
No fim das contas, a pequena mentira que servira para ajudar tanto Buck quanto
Dameree acabara se voltando contra ela mesma. Precisaria entrar em contato com a
Srta. Pakorn durante os próximos meses e, talvez, durante os anos seguintes. Teria que
arranjar um jeito de, mais dia menos dia, contar toda a verdade à diretora do orfanato.
No entanto, não se sentia capaz de encontrar nenhuma justificativa aceitável para a
mentira que pregara.
Inquieta, olhou para seu delicado relógio de pulso, dourado, e viu que já era meio-
dia e meia. Lembrou-se com um sobressalto de que ficara de se encontrar com Kupnol
Sustri no terraço entre quinze para a uma e uma hora, para entregar ao oriental um
envelope com dinheiro que Buck deixara em seu poder.
Buck... Ele já se fora há algumas horas, que mais pareciam séculos. Enxugando as
lágrimas que teimavam em turvar-lhe a visão, Amanda tomou um banho rápido e desceu
para o terraço do hotel.
Enquanto esperava por Sustri sentada a uma das mesas, bebericando um delicioso
chá gelado, observava o tráfego de embarcações no rio. Um dos barcos do Oriental
acabava de deixar o embarcadouro cheio de turistas, e ela lembrou-se da noite de sua
chegada a Bangcoc, da conversa de Buck com o guarda-noturno dos barcos e do
melancólico cruzeiro de volta de Ayudhya no dia anterior. Sim, passara por uma semana
cheia de emoções e excitação.
Mas e quanto ao seu futuro com Buck? Haveria mesmo um futuro para o
relacionamento de ambos ou será que as palavras tranqüilizadoras dele antes de partir
haviam sido apenas uma tentativa de melhorar uma situação difícil?
— Com licença, Sra. Michaels. Permite que eu me sente? Amanda virou-se,
surpresa, arrancada de seus devaneios, e viu Kupnol Sustri de pé, a seu lado.
— Oh, olá, Sr. Sustri, boa tarde. Por favor, sente-se.
— Obrigado. Sinto muito incomodá-la, mas Buck me pediu para vir vê-la.
— Sim, eu estava esperando pelo senhor. Buck me encarregou de lhe entregar este
envelope, contendo a sua comissão e a do Sr. Chin.
— Obrigado, Sra. Michaels — agradeceu Sustri, pegando o envelope e guardando-
o no bolso do paletó. — Sabe, foi realmente uma pena Buck precisar ir assim tão de
repente para Los Angeles. Eu gostaria de tê-lo convidado, e à senhora também, para
jantarem comigo uma noite dessas.
— Quanta gentileza de sua parte, Sr. Sustri. Buck teria ficado encantado em
aceitar o seu convite — argumentou Amanda mal acreditando em suas próprias
palavras ao ver que se comportava como uma verdadeira "esposa".

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Buck teve problemas no jornal?


— Sim, mas nada de grave, felizmente.
— E a senhora, voltará em breve para os Estados Unidos?
— Dentro de poucos dias, espero.
— Imagino que esteja se sentindo triste e sozinha aqui, agora que seu marido foi
embora.
— Eu estou, Sr. Sustri, pode apostar que estou.
— Seu marido e eu passamos muitos, muitos meses juntos quando ele morava em
Bangcoc. Nós nos tornamos bons amigos. Aprendi a conhecê-lo bem, e por isso acho que
a senhora deve ser uma pessoa especial para ter sido escolhida por Buck. Pude ver no
rosto dele o quanto gosta da senhora.
— Oh, eu... Obrigada, Sr. Sustri.
— Não conheci a primeira Sra. Michaels, mas tenho certeza de que ela não era tão
boa quanto a senhora. Me contaram que ela não gostava de crianças, e talvez seja esta
a razão pela qual Buck não começou a procurar a menina antes. A senhora, por sua vez,
deve ser uma esposa boa e compreensiva, para ajudar seu marido a encontrar a filha
dele com outra mulher.
— Mais uma vez obrigada pelos elogios, Sr. Sustri, mas quando ficou sabendo que
Buck é o pai da filha de Dameree?
— Eu sempre soube, Sra. Michaels, ninguém precisou me contar.
Amanda estudou o rosto de Sustri disfarçadamente. Estava curiosa a respeito do
que o velho confidente de Buck poderia dizer-lhe sobre o passado. Já ouvira duas versões
da mesma história: a de Buck e a de Dameree. Talvez agora tivesse a oportunidade de
escutar uma terceira versão.
— Sr. Sustri, poderia me contar como era a vida de Buck aqui em Bangcoc?
— Temos um ditado aqui na Tailândia que diz: "A língua de um homem às vezes é
maior que sua memória". Eu não deveria lhe contar coisas que não são da minha conta,
Sra. Michaels, mas como só tenho coisas boas a dizer de Buck, talvez não exista
problema algum em falar.
— Eu sei que... meu marido... foi amante de Dameree, é lógico, mas ele teve outras
mulheres também, não teve?
— Sim, muitas. Mas a senhora conhece melhor do que eu o charme de seu marido,
Sra. Michaels. E, é claro, tudo isso já aconteceu há muitos anos.
— Por que Dameree não respondeu às cartas de Buck depois que ele sofreu o
acidente e foi levado de volta para os Estados Unidos?
— Ah, quem consegue entender a mente de uma mulher, Sra. Michaels, além dela
mesma? Não sei responder a esta pergunta, mas posso dizer-lhe que as pessoas orientais
são muito fatalistas. Acho que Dameree sabia que não era seu destino casar-se com
Buck, e pensou que seria melhor cortar relações com ele de vez.
— Mas ela e Buck se amavam, com certeza.
— Sim, mas... o amor tem muitas faces, Sra. Michaels.
— É verdade...
— E agora Buck ama a senhora.
— Como sabe?

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Ora, ele se casou com a senhora!


— Isso não significa que Buck me ame, apenas significa que o senhor é um bom
diplomata ao afirmar que ele me ama. — Desculpe, mas nunca fui diplomata... ou
diplomático, Sra. Michaels. Sou sincero, nada mais do que isso.
Ambos riram, embaraçados, até que Sustri indagou:
— Buck continuará a procurar a filha dele nos Estados Unidos?
— Sim, Buck quer se certificar de que a menina está com uma boa família, numa
boa casa.
— Quer dizer que a menina não vai morar com a senhora e seu marido?
— Não, por quê? Pensou que a intenção de Buck fosse esta?
— Bem... Meses atrás, quando Buck esteve em Bangcoc, pude ver o quanto ele
queria encontrar a menina. Insistiu para que eu descobrisse qualquer pista que nos
levasse até sua filha, sem descanso. Buck parecia... um cachorro atrás do seu osso
enterrado.
— Buck é um homem persistente, Sr. Sustri.
— Eu sei. Meu amigo sempre sabe o que quer, e quer tudo para ontem. Ele jamais
seria um bom tailandês. Bem, Sra. Michaels, já tomei muito do seu tempo e devo ir
embora, agora. Agradeço a sua cortesia e... diga a seu marido, por favor, que eu e o Sr.
Chin agradecemos a "comissão" — disse o oriental, indicando o bolso em que pusera o
envelope com o dinheiro. — Adeus, Sra. Michaels. Desejo-lhe muitas felicidades no seu
casamento.
— Obrigada, Sr. Sustri — retrucou Amanda, esforçando-se por sorrir diante das
palavras do oriental.
O resto da semana demorou a passar. Desde a partida de Buck os dias pareciam
mais quentes, longos, aborrecidos e vazios. Amanda já estava começando a ficar irritada
com tudo: com suas visitas aos orfanatos e até mesmo com os simpáticos tailandeses.
Não via a hora de voltar para os Estados Unidos e encontrar Buck Michaels.
Quando a sexta-feira finalmente chegou, Amanda já terminara seu trabalho no
Oriente — pelo menos, por aquela vez. Arrumou as malas e, enquanto esperava que um
dos carregadores viesse buscar sua bagagem, percorreu todos os cômodos da suíte, numa
despedida silenciosa. Ali estava a mesa onde tomara café da manhã com Buck, o sofá
onde fora seduzida, o telefone, a cama em que haviam feito amor.
Amanda engoliu o nó que se formou em sua garganta, sabendo que sua partida
cortaria todos os laços remanescentes com a maravilhosa semana que passara com Buck.
Chegara a hora de voltar para casa e encontrar-se não com o homem que conhecera na
Tailândia, mas com x diretor do jornal que, ela temia, ainda estaria obcecado por Lua
de Lotus.
Já era noite quando o avião proveniente de Bangcoc pousou na pista do Aeroporto
Internacional de Los Angeles. Amanda olhou para fora, pela janela do aparelho, e
estremeceu ao pensar que logo veria Buck. Como agiria ele? Seria agradável o encontro
dos dois? Ou melhor, será que Buck fora mesmo esperá-la? Ele prometera ir aguardá-la
no aeroporto, mas algo poderia tê-lo impedido de cumprir a promessa.
Amanda percebeu que estava se preparando para uma decepção, mas, no fundo, o
que queria de todo o coração era que as coisas continuassem como haviam sido em
Bangcoc.

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

Desceu do avião junto com os outros passageiros, passou rapidamente pela


alfândega e logo desembocou no saguão do aeroporto. Havia gente por toda parte,
saudando os conhecidos que chegavam, carregando malas, rindo e falando alto.
E então Amanda viu Buck, encostado a uma das pilastras do saguão. Ele já a
avistara- também, e foi em sua direção abrindo caminho por entre a multidão.
— Bem-vinda, querida — disse Buck ao parar perto dela e dar-lhe um beijo
carinhoso no rosto. — Fez boa viagem?
— Sim, mas estou exausta.
— E vai continuar exausta por mais alguns dias. Eu, por exemplo, só agora me
sinto recuperado da viagem.
Amanda o encarou sem conseguir dizer nada, feliz por estar de novo a seu lado,
ouvindo sua voz, sentindo-lhe o perfume másculo.
Percebendo o quanto ela estava emocionada, Buck tomou-a nos braços,
murmurando:
— Querida... Quase morri de saudade de você!
— Oh, Buck... Eu também senti tanto a sua falta!
— Que bom que agora estamos juntos de novo, não é? E agora, se você conseguir
ficar acordada por tempo suficiente para chegarmos até o estacionamento onde deixei o
meu carro, eu a levarei para a minha casa e lhe proporcionarei um descanso de rainha!
Vamos?
No caminho para Newport Beach, Buck contou a Amanda os problemas que o
aguardavam no Tribune ao voltar da Tailândia e perguntou-lhe sobre o resto de sua
estada em Bangcoc. Mas ela estava tão cansada que a conversa foi quase que unilateral.
E embora estivesse contente por se encontrar na companhia de Buck de novo, sentiu-se
aliviada quando finalmente atravessaram a ponte para Balboa Island.
Buck deixara todas as luzes de sua casa acesas, o que lhe deu um aspecto quente e
hospitaleiro ao entrarem. Amanda foi levada para a suíte principal, que não tivera a
oportunidade de conhecer na noite da festa. Os aposentos da suíte eram tão
espetaculares quanto o resto da casa. Eram enormes, e muito bem decorados. Havia
vasos de plantas por toda parte e móveis em tons variáveis de marrom, o que criava um
clima elegante e agradavelmente masculino.
Na sala de estar da suíte havia duas confortáveis poltronas em frente a uma
lareira. Em seguida, subindo-se alguns degraus, encontrava-se o quarto — no qual havia
uma grande cama de casal, cadeiras almofadadas, uma mesa e uma espreguiçadeira
forrada de veludo.
— Que quarto maravilhoso! — elogiou Amanda, sentando-se na espreguiçadeira.
— O melhor de tudo é que o seu quarto de hóspedes será ao meu lado na cama —
murmurou Buck, acariciando-lhe as faces.
Amanda encarou-o sorrindo, feliz com a idéia de adormecer nos braços dele.
— Sei que está cansada — continuou Buck —, mas antes de deixá-la ir para a cama
quero que faça algo que vai lhe assegurar um sono mais tranqüilo do que a simples
exaustão.
— O quê?
— Venha comigo e eu lhe mostrarei.

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

Buck puxou-a pela mão até o banheiro, ainda mais suntuoso que o resto da suíte.
Todas as peças eram do mais puro branco, à exceção das torneiras e toalheiros, que eram
dourados. Uma das paredes, de vidro, dava para um pequeno solário ajardinado no
centro, no qual encontrava-se uma luxuosa banheira de hidromassagem, cheia de água
quente e sais de banho perfumados.
— Dez minutos aí dentro e você estará pronta para dormir como um anjo, acredite
— argumentou Buck.
— Hum, a idéia de um banho relaxante realmente me atrai.
— Pois vá em frente, então. Tire as coisas de que vai precisar da mala, e enquanto
isso pode usar um dos meus roupões atoalhados. Ah, quase me esqueci! Ainda tenho
uma surpresinha para você. Volto em cinco minutos, ok?
— Ok, eu espero.
Pouco depois, assim que Amanda acabou de entrar na banheira, Buck voltou com
uma garrafa de champanhe e duas taças.
— Aqui está algo para você molhar um pouco a garganta — disse ele entregando a
Amanda uma taça cheia do delicioso vinho espumante gelado.
— Oh, obrigada, quanta gentileza!
— Ora, de nada, E agora, importa-se de eu bancar o salva-vidas e ficar olhando
você enquanto saboreio o meu champanhe?
— Por favor, fique à vontade. Afinal, você é o meu anfitrião.
Sentindo todas as suas energias serem sugadas pela água quente e borbulhante,
Amanda esvaziou rapidamente sua taça e, fechando os olhos, encostou a cabeça na borda
da banheira. Minutos mais tarde Buck ajoelhou-se a seu lado e colocou-lhe um pano
embebido em água fria na testa, perguntando:
— Como se sente, querida?
— Completamente relaxada e absolutamente incapaz de fazer o menor movimento
que seja.
— Ótimo, isso significa que já está na hora de você sair daí.
— Por que não me deixa dormir aqui mais um pouquinho?
— Porque o que é bom para lagostas não é necessariamente bom para jovens
senhoritas retornando de viagem. Vamos, é melhor você sair da banheira agora.
Amanda saiu da água sentindo-se mole e um pouco zonza. Ao reparar que ela
estava a ponto de dormir em pé, Buck pegou uma enorme toalha branca e felpuda e
tomou a seu cargo a tarefa de enxugar o belo corpo feminino.
De tão cansada que estava, Amanda nem sentiu vergonha de estar sendo tratada
como uma criança mimada. Perecia-lhe natural encontrar-se nua na frente de Buck, que
lhe passava a macia toalha nos ombros, nas costas, nos seios, nas pernas. Vestiu, com a
ajuda dele, a calcinha e a camisola que tirara da mala e, momentos mais tarde, foi levada
para a cama onde caiu de imediato num sono profundo.
Ao acordar no dia seguinte, Amanda sentiu-se como se estivesse saindo de um sono
induzido por drogas. Não fazia a menor idéia de quantas horas haviam se passado desde
que encostou a cabeça no travesseiro na noite anterior, e demorou alguns segundos para
lembrar-se de onde estava. Examinou o quarto à procura de Buck, mas ele não se
encontrava por perto.

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

Levantou-se e caminhou até a janela aberta, encantada com a vista que se


descortinava ante os seus olhos: o sol brilhava sobre as águas da baía e vários veleiros
cruzavam a paisagem marinha, tão silenciosos quanto as gaivotas que voavam no céu.
Decidida a procurar por Buck, uma vez que também não o avistara lá fora, Amanda
foi até o banheiro arrumar-se. Tomou um banho, lavou os cabelos e secou-os com um
secador que encontrou numa das gavetas do armário sob a pia. Voltou para o quarto,
vestiu uma calça de linho branco e uma camiseta, calçou sapatilhas baixas, da mesma
cor da camiseta, e, após se examinar ao espelho uma última vez, saiu da suíte para
procurar Buck. Acabou por achá-lo na cozinha, tomando uma xícara de café.
— Bom dia! Dormiu bem? — indagou ele assim que a viu.
— Dormi como um anjo! O que você colocou no meu champanhe, alguma "poção do
sono"?
— Não. Foi apenas a combinação de cansaço, banho de imersão e champanhe que
a afetou. E agora que está acordada, o que prefere? Tomar café da manhã ou almoçar?
— Almoçar? Que horas são?
— Quinze para o meio-dia. E, então, o que vai comer? Sei fazer ovos fritos com
bacon, ovos mexidos, omeletes com presunto e cogumelos...
— Bem, visto que o cardápio se resume a ovos, acho que vou querer uma omelete
—disse Amanda, brincalhona.
— Ok, uma omelete saindo!
Enquanto observava Buck cozinhar, em silêncio, Amanda pensou consigo mesma
que, sem dúvida, o aparecimento daquele homem em sua vida fora a melhor coisa que
já lhe acontecera nos últimos tempos. Sua recepção de boas-vindas fora maravilhosa,
absolutamente incrível. Estava se sentindo como uma rainha, mas, mesmo assim... o
que isso significava? O que Buck pretendia com tantas gentilezas e mordomias?
— E, então, como vão as coisas agora que se encontra em casa, Buck? — indagou
ela, curiosa. — Ou tem estado ocupado demais para pensar em qualquer outro assunto
que não o Tribune?
— Refere-se à minha filha, Amanda?
— Sim, refiro-me a Lua de Lotus.-
— Ah... Você supõe que as pessoas a chamem por este nome, onde quer que ela
esteja?
— É difícil saber, mas suponho que não. A menos que a criança já tenha uma certa
idade ao ser adotada, a maioria dos pais prefere dar a ela um nome americano. Como
Lua de Lótus foi enviada para cá ainda bebê, é provável que tenham lhe dado um nome
diferente.
— Quanto tempo levaremos para descobri-la?
— Começarei a verificar as pastas com a documentação das crianças na segunda-
feira de manhã, quando for para o escritório.
— Ótimo, ótimo. Estou ansioso para descobrir o que aconteceu com a minha filha.
— Buck, por favor, vá com calma. Ainda não temos certeza de que a encontraremos,
e mesmo que a encontrarmos, não existe nenhuma garantia de que obteremos algo além
de informações superficiais.
— Talvez as pastas de documentação contenham apenas informações superficiais,
mas nós... bem... poderíamos tentar investigar o caso mais a fundo.

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Talvez não, Buck.


— E por que não?
— Como eu já lhe disse antes, os direitos e desejos dos pais adotivos de uma criança
devem ser respeitados. A Fundação para Crianças Amerasiáticas é apenas uma
fundação intermediária. A agência que trata diretamente das adoções pode não querer
cooperar conosco nesta busca.
— Hum, eu não tinha pensado nisso.
— Buck, eu também já lhe disse isso, mas acho melhor repetir mais uma vez: não
se deixe envolver emocionalmente neste assunto.
— O que vai querer na sua omelete, madame? — perguntou ele de repente, numa
clara intenção de mudar de conversa. — Cebola e queijo, além de presunto e cogumelos?
Amanda percebeu que não adiantaria forçar a situação e, com um sorriso
resignado, pediu em tom -de brincadeira:
— Quero tudo a que tenho direito, cozinheiro: cebola, queijo, presunto e cogumelos!

CAPÍTULO XII

Buck e Amanda tomaram o desjejum ao ar livre, sob o sol de novembro. Embora o


Dia de Ação de Graças estivesse próximo, o tempo ainda estava agradavelmente quente.
Amanda, contudo, pedira um agasalho emprestado a Buck para proteger-se da brisa
fresca que soprava da direção da baía. Ela estava acomodada numa espreguiçadeira,
observando o movimento do mar, quando Buck surgiu de dentro da casa trazendo uma
garrafa térmica com café.
— Quer um pouquinho? — ofereceu ele.
— Hum, aceito, obrigada.
Buck serviu duas xícaras do líquido fumegante e saboroso, entregou uma a
Amanda e comentou, sorrindo:
— É bom ter você aqui em casa comigo, sabia?
— E é bom estar aqui com você, querido — retrucou Amanda, sentindo uma
vontade enorme de abraçá-lo e beijá-lo.
Buck dirigiu-lhe um olhar afetuoso, mas ela não pôde deixar de perceber um brilho
de incerteza no fundo dos belos olhos azuis. Seria capaz de jurar que naquele exato
instante ele estava refletindo sobre o relacionamento de ambos, imaginando qual seria
o fim daquele "namoro" que o pegara tão desprevenido.
Amanda sentiu-se solidária com a reação íntima de Buck, pois às vezes imaginava
a mesma coisa. Em certas horas chegava a ter medo de entregar-se por completo à onda
de amor que a levava em direção a Buck.
— O que gostaria de fazer hoje? — indagou ele de repente, arrancando-a de seus
devaneios.
— Na verdade, eu deveria ir para casa. Estou me sentindo como uma andarilha,
carregando na mala apenas roupas de verão.
— Que tal se eu a levasse até a sua casa e a ajudasse a trazer para cá o seu guarda-
roupa de inverno?
— Ora, mas eu não preciso de um guarda-roupa, apenas de uma muda de roupa.

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— De qualquer modo acho que você precisa deixar algumas calças, camisas e
malhas aqui na minha casa. Afinal, nunca se sabe quando você terá necessidade delas.
— Buck Michaels, o que é que você está me propondo?
— Para ser sincero, eu diria que não sei a resposta para o que acaba de me
perguntar.
— Então é melhor não dizer mais nada. Talvez tenhamos que nos conhecer melhor,
ainda.
— É isso que você quer? Que não apressemos as coisas?
— Bem...
— Pois eu quero você aqui comigo, Amanda.
— Pelo menos nos fins de semana?
— Amanda...
— Uma amiga minha costumava dizer que o grau de envolvimento que se tem com
um homem pode ser avaliado pelo número de malas que você precisa para carregar os
seus pertences ao deixá-lo — argumentou ela, rindo.
— Hum! Não achei essa filosofia tão engraçada quanto você parece achar.
— Ok, ok. Vamos discutir então o que faremos para passar o dia.
— Não, vamos falar sobre esta noite. Gostaria de dormir aqui hoje?
— Ah!
— O que foi?
— Minha amiga diria agora que você está me propondo um relacionamento tipo
"sacola de mão para passar a noite fora".
— E isso a incomoda? Pois traga três malas, se preferir! Ambos caíram na risada,
até que Amanda argumentou:
— Falando sério, Buck, eu preciso mesmo ir para casa.
— Só se for para mudar de roupa, ouviu? Pretendo levá-la para velejar esta tarde,
depois jantaremos juntos e só então discutiremos a agenda para o domingo.
— Não poderei deixar de modo algum de ir para casa amanhã à noite, Buck. Tenho
que me organizar para recomeçar a trabalhar na segunda-feira.
— Tudo bem, falaremos sobre isso amanhã cedo. Já velejou alguma vez? — indagou
ele apontando seu veleiro ancorado perto do embarcadouro.
— Uma ou duas, apenas.
— Só? Mas que pecado! Venha, vamos remediar o problema agora!
Como não havia tempo para uma viagem mais longa até Catalina Island, pois logo
anoiteceria, os dois se contentaram com um pequeno passeio até Laguna Beach. A
princípio Amanda ficou sentada ao lado de Buck, perto do leme, sentindo o fresco ar
salgado bater-lhe no rosto e observando as cintilações do mar.
Mais tarde, quando começou a sentir frio, abrigou-se do vento e ficou de longe
olhando Buck pilotar o barco.
Ele estava usando óculos escuros e um velho boné de capitão, surrado e desbotado,
que o transformava numa caricatura do homem que realmente era. Mas, pelo visto, ele
não dava a mínima para a sua aparência quando velejava, e, de certo modo, parecia
mais feliz dentro de um barco do que em qualquer outro lugar.

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

Amanda percebeu, de súbito, que o que mais desejava — caso seu relacionamento
com Buck se tornasse mais sério — era que ele se sentisse tão confortável e em paz com
ela quanto se sentia com o veleiro. A seu ver, estes eram os fundamentos básicos para o
relacionamento de um casal: honestidade, respeito e companheirismo.
— Tudo bem com você aí? — perguntou Buck, erguendo a voz para se fazer ouvir
acima do barulho do vento batendo nas velas do barco.
— Tudo bem!
— Está com frio?
— Um pouquinho!
— Nesse caso, chega de velejar! Que tal irmos para casa tomar um conhaque?
— Ótima idéia!
Já de volta ao embarcadouro, Amanda desceu do veleiro e surpreendeu-se consigo
mesma ao ver o quanto se sentiu desequilibrada em terra firme. Precisou apoiar-se em
Buck para não tropeçar e cair, pois, além de "mareada", suas pernas estavam
entorpecidas por terem ficado tanto tempo expostas ao vento frio.
— Acredite se quiser, mas a cura para isso que você está sentindo agora é a mesma
que utilizei ontem para ajudá-la a relaxar do cansaço da viagem: uma hidromassagem
quente.
Minutos mais tarde Amanda estava se deliciando na banheira, quando Buck
apareceu usando um roupão atoalhado azul-marinho e carregando uma garrafa de
conhaque junto com dois copos especiais para aquele tipo de bebida. Encheu os dois
copos e colocou-os ao lado da borda da banheira, acendeu as velas de um delicado
candelabro dourado, que até aquele instante só servira de enfeite, e apagou a luz elétrica
do ambiente. Em seguida, tirou o roupão e entrou na banheira, perguntando:
— Como é que a minha pequena lagosta está se sentindo agora?
— Maravilhosa.
Tocando-lhe os pés por debaixo da água, Buck riu ao comentar:
— Vejo que não está mais morrendo de frio. Quer se esquentar ainda mais com uns
goles de conhaque? Aqui está o seu copo.
— Obrigada.
— E agora, ergamos um brinde a um novo conjunto de malas! — disse ele com ar
misterioso, sorrindo.
Amanda, por sua vez, com um brilho malicioso em seus belos olhos verdes, deixou
de lado seu copo e pegou um dos pés de Buck, começando a massageá-lo. Depois
aproximou-se mais e foi subindo a massagem para o tornozelo, para o joelho, para a coxa
musculosa.
Ao mesmo tempo em que recebia as deliciosas carícias, Buck começou a brincar
com os seios de Amanda por debaixo da água, até que os mamilos ficassem eretos de
prazer. Chegou ainda mais perto de Amanda e enroscou sensualmente as suas pernas
nas dela.
Excitadíssima, sentindo o delicado centro de sua feminilidade pulsar de desejo,
Amanda não conseguiu se controlar. Num gesto ousado, tomou o membro ereto e
pulsante de Buck nas mãos e acariciou-o devagar, alternando movimentos de pressão e
relaxamento.

90
Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

Dessa vez quem não conseguiu se controlar foi Buck. Depois de beijar Amanda com
um ardor até então desconhecido por ele mesmo, tomou-a nos braços e, após embrulhá-
la numa enorme toalha macia, levou-a para o quarto.
Amanda passou a manhã de segunda-feira pondo em dia a correspondência que se
acumulara durante a sua ausência. Precisou retribuir também alguns telefonemas que
recebera e voltar a acostumar-se com a rotina do escritório. Pediu à sua secretária, Cleo,
que procurasse nas pastas de documentação das crianças algo referente a uma menina
chamada Lua de Lotus, mas decidiu não devotar muita atenção ao assunto até que já
tivesse resolvido os problemas mais urgentes que a aguardavam.
Ao meio-dia Cleo bateu à porta de sua sala para anunciar que Buck Michaels se
encontrava ao telefone.
— Alô, Buck?
— Como vai a minha lagosta tailandesa preferida?
— Bem, a não ser pela pilha de papéis que tenho de assinar, e pelos telefonemas
que tenho de retribuir. E você?
— Ótimo, a não ser pela saudade que estou sentindo de você. Quer jantar comigo,
hoje?
— Hoje? Bem, eu...
— Se não aceitar, não terá o prazer de ser convidada para jantar na noite de Ação
de Graças comigo e com minha mãe. Ela está simplesmente louca para conhecer a jovem
senhorita que cativou o coração de seu filho. A propósito, você não tem nada contra
reuniões familiares, tem?
— Não, Buck, tanto que estava pensando em passar o Dia de Ação de Graças com
minha mãe e uma tia.
— Sua mãe se importaria muito se você não fosse passar o feriado com ela? Afinal,
sua tia estará lá e...
— É provável que mamãe não fique chateada, Buck, mas de qualquer modo acho
melhor falar com ela antes de combinar alguma coisa com você.
— Claro, fale com ela. Depois você me dá a resposta.
— Eu... eu gostaria muito de conhecer sua mãe, Buck. Farei o possível para poder
aceitar o convite.
— Ok, querida. E, agora, permita que eu lhe faça duas perguntas antes de desligar
e deixá-la em paz. Primeira: jantamos juntos hoje, às sete?
— Por mim, tudo bem. r
— Ah, perfeito! Segunda pergunta: descobriu alguma coisa sobre Lua de Lotus?
— Ainda não tive tempo para tratar pessoalmente do assunto, Buck, mas pedi à
minha secretária que já fosse dando uma espiada nos arquivos para mim.
— Oh, eu compreendo...
Ao ouvir o tom de desapontamento na voz dele, Amanda apressou-se a dizer:
— Não se preocupe, querido, eu mesma darei uma olhada nas fichas mais tarde.
Prometo fazer no mínimo um relatório preliminar para você esta noite.
— Desculpe-me, Amanda, acho que sou eu quem está ansioso em excesso para ter
notícias da minha filha. Talvez no fundo eu estivesse esperando que ela aparecesse bem
debaixo do nosso nariz só porque já estamos de volta aos Estados Unidos.

91
Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

A nota de expectativa contida nas palavras de Buck deixou Amanda perturbada.


Ele falava como se a menina fosse tornar-se parte de sua vida, e isso a preocupava. De
certo modo, talvez estivesse até prejudicando Buck ao se mostrar tão cooperante, dando-
lhe tantas esperanças. Se não o amasse, com certeza não faria nada além de confirmar
o fato de que a Fundação cuidara do caso de Lua de Lotus. Queria evitar, a qualquer
custo e antes de mais nada, que ele se envolvesse emocionalmente demais com o
assunto...
— Sua ansiedade é mais que compreensível, Buck — disse ela, por fim. — Verei o
que posso descobrir para você até a hora do jantar.
— Obrigado, querida. E... boa sorte.
— Nada, não encontrei nada. Não existe nenhuma referência a uma criança
chamada Lua de Lotus nos arquivos, Amanda.
— Oh, céus, bem que eu temia que isso acontecesse. Mas talvez devêssemos nos
concentrar mais na data, em vez de no nome. Se checássemos a documentação das
meninas que trouxemos para cá há doze anos...
— As informações individuais sobre cada criança só vão até cinco anos atrás nos
arquivos, Amanda. Talvez tenhamos que procurar direto nas pastas de documentação,
que não são poucas...
— Uh, mas que droga...
— Escute, quem é afinal esse cara tão importante que quer desenterrar um caso
tão velho?
— Um homem que já deu valiosas contribuições à Fundação e que, além de tudo, é
meu amigo.
Cleo sorriu e afastou da testa uma mecha de cabelo. Ela tinha mais de quarenta
anos e era irreverente como um adolescente, mas possuía um coração de ouro. Amanda
gostava muito de sua secretária.
— Amigo até que ponto? — indagou Cleo, curiosa.
— Até o ponto de fazermos o melhor possível por ele, gastando o tempo que for
necessário na tentativa de descobrirmos o que ele quer saber.
— E se mesmo assim não encontrarmos nada?
— Continuamos procurando mais um pouco.
— Ah, já entendi. O homem é muito seu amigo...
— Cleo, por favor, deixe de bobagens! Vamos dividir as pastas para examiná-las
agora, ok? Desse jeito iremos mais rápido.
Após quarenta e cinco minutos na sala de documentação olhando pastas velhas,
nenhuma das duas encontrou nada.
— Alguma sugestão? — perguntou Amanda, desanimada.
— Para dizer a verdade eu tenho uma, sim. Por que não liga para Eleanor Harbold
e pergunta se ela lembra do caso? Afinal, era a diretora na época em- que a menina deve
ter passado por aqui.
— Boa idéia! Você tem o telefone de Eleanor? Não falo com ela há pelo menos dois
anos, e como troco de agenda a cada ano...
— Sim, tenho. Espere por mim na sua sala, eu levarei o número do telefone para
você.

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

Pouco depois Amanda entrou em contato com Eleanor que, ao ouvir a história toda,
disse não se lembrar de nada.
— Sinto muito, Amanda, mas o nome Lua de Lotus não me é familiar. Já se
passaram tantos anos...
— Eu compreendo, Eleanor. E desculpe-me por incomodá-la, só liguei porque
realmente ainda não descobri nada que pudesse me ajudar a elucidar o problema.
— Se ao menos existisse algo de curioso no caso, Amanda, talvez fosse mais fácil.
Mas pelo que você me falou...
— Algo de curioso? Bem... A menina tinha uma tatuagem no tornozelo esquerdo,
com -o desenho de uma flor de lótus e urna lua crescente.
— Hum, não adianta, não me lembro mesmo de nada. Recebemos tantas crianças
naquela época, por causa da guerra, que nem conseguíamos distinguir uma da outra.
Mas por que você não tenta dar uma olhada nas fichas médicas? O doutor que examinou
a menina pode ter feito alguma anotação sobre a tatuagem, mesmo que o nome tailandês
dela não conste dos arquivos.
— Obrigada pela idéia, Eleanor, mas isso significa que terei de examinar montes
de fichas médicas...
— Bem, apenas você pode decidir se vale a pena se dar a tanto trabalho por causa
de um doador generoso da Fundação.
Amanda suspirou, desejando que o caso fosse assim tão simples.
Buck Michaels estacionou seu Mercedes cor de cinza em frente à casa de Amanda,
um pequeno mas elegante sobrado de tijolos aparentes. Buck achava ótimo que ela
morasse ali, pois o sobrado ficava a meio caminho de seu escritório em Los Angeles e da
sua casa em Balboa Island, além de se localizar perto do mar.
Ele desceu do carro quase correndo, ansioso por ver Amanda. Sempre que não
estavam juntos, sentia-se vazio e solitário. Gostava muito da companhia dela, e estava
disposto a deixar que o relacionamento entre eles se tornasse mais sério.
Quando Amanda atendeu à campainha, usando um vestido de lã azul-safira, Buck
encarou-a boquiaberto antes de murmurar, sorrindo:
— Uau, você está linda, querida!
— Obrigada. E, então, quer entrar ou prefere ficar aí fora olhando para mim? —
perguntou ela, brincando.
Quando Amanda virou-se para fechar a porta, Buck, já do lado de dentro, permitiu
que seu olhar se deleitasse com a visão da nuca branca e feminina onde algumas mechas
de cabelo ruivo brincavam depois de terem escapado do pequeno coque em que haviam
sido presas.
Incapaz de resistir ao desejo que o assaltou, abraçou Amanda por trás e,
acariciando-lhe o ventre com as mãos, beijou-lhe sensualmente a nuca. Sentiu-a
estremecer sob o seu toque e respirou fundo, aspirando a doce fragrância do perfume de
Amanda. O contato do corpo dela contra o seu, aliado ao delicioso perfume, deixou-o
ainda mais excitado, e ele percebeu que seu membro enrijecia.
— Já entrei em maus lençóis com você antes por causa de uma situação parecida
com esta — sussurrou Amanda de repente, sufocando uma risadinha.
— Hum, mas que lembrança agradável...
— Posso me virar agora?

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Ainda não — murmurou ele subindo as mãos do ventre para os seios cheios e
macios.
— Buck! Nós não íamos sair para jantar?
— Mas, Amanda, o que posso fazer se acho você irresistível?
— Sr. Michaels, tenho certeza de que sua mãe não o educou para ficar agarrando
senhoritas indefesas! — brincou ela, libertando-se dos braços de Buck. — Talvez eu deva
ter uma conversinha com a Sra. Michaels na quinta-feira a respeito do filho dela.
— Oh, é verdade. Fico feliz por você poder ir passar o Dia de Ação de Graças comigo
e minha mãe.
— Kelly lhe deu o recado, então?
— Sim, deu.
— Ótimo. Quer sentar-se e tomar um drinque ou já está na hora de sairmos?
— Acho que ainda temos tempo para beber algo, desde que não demoremos muito.
— Um uísque para você?
— Sim, com bastante gelo, por favor.
Enquanto Amanda ia até a cozinha- preparar os drinques, Buck sentou-se e
examinou o ambiente que o cercava. A decoração da sala de estar era bastante atraente
e aconchegante, toda em tons de bege e azul. Os móveis eram simples, mas elegantes e
confortáveis, e ajudavam a realçar os vasos de plantas colocados em posições
estratégicas para ampliar o espaço. Numa mesinha ao lado do sofá em que se instalara,
ele viu uma foto de um jovem fuzileiro naval abraçando.uma garotinha de mais ou
menos dez anos. Pegou a foto para examiná-la melhor e percebeu que a menina era
Amanda — o rapaz com certeza era o seu irmão morto na guerra. Lembrou-se de como
ela falara do irmão com lágrimas nos olhos durante o vôo até Bangcoc e sentiu-se
comovido.
Amanda era uma boa pessoa, um ser humano com um coração e uma sensibilidade
enormes, e isso o fazia desejá-la ainda mais.
Depois que Kelly lhe dera o recado de que Amanda passaria o Dia de Ação de
Graças com ele, Buck ligara para a mãe e a avisara de que teriam uma convidada para
o jantar. Aproveitara a ocasião para contar-lhe que a menina tailandesa que estava
procurando era mesmo sua filha e, portanto, neta dela.
Acabou se surpreendendo ao notar a calma com que a mãe recebera a notícia de
que Lua de Lotus estava sem dúvida alguma viva e morando em algum lugar dos
Estados Unidos. Nem ele mesmo conseguira ficar calmo ao saber disso, muito pelo
contrário; a cada dia que passava sentia-se mais e mais ansioso.
Esperou que Amanda tocasse logo no assunto, pois passara a tarde toda agoniado,
temendo que, após tantos esforços, as pistas sobre a menina tivessem desaparecido de
novo.
Amanda voltou logo da cozinha, com uma bandeja nas mãos, anunciando:
— Um uísque com bastante gelo para você... e também algumas nozes!
— Puxa, você realmente se lembra de todos os meus "pecados", hein?
— Alguns deles são difíceis de esquecer, Buck.
— Ora, vamos, até que eu não sou tão mau assim.,
— Pode apostar que é! — brincou ela, sentando-se ao seu lado e beijando-o no rosto.
— Ei, vai passar a noite inteira me provocando, por acaso?

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Não estou provocando ninguém, estou apenas sendo... amigável.


— Pois permita-me erguer um brinde à sua atitude "amigável" e aos seus pecados!
Ambos riram e tomaram um gole do drinque, após o que Buck perguntou,
ligeiramente embaraçado:
— E então, como foi o seu dia?
— Está querendo parecer sutil, Buck Michaels?
— Bem... pelo menos eu tentei.
— Pois sinto desapontá-lo, mas temo não ter muito o que dizer sobre o assunto que
o interessa tanto.
— Não?
— Infelizmente não consta dos nossos arquivos nenhuma criança chamada Lua de
Lotus. Cheguei até a ligar para a ex-diretora da Fundação, a mulher que trabalhava lá
na época em que sua filha foi transferida para os Estados Unidos. Mas ela não se
lembrou do caso.
— E o que isso significa?
— Significa que, se formos continuar com as investigações, teremos que procurar
informações sobre Lua de Lotus nas pastas mais antigas, que já foram relegadas à "sala
dos documentos esquecidos".
— O que você pretende fazer, Amanda? Estaria disposta a perder mais tempo por
minha causa?
— Você sabe como me sinto em relação ao caso, Buck. Acho importante que você
mantenha uma certa distância emocional de Lua de Lotus. Mas farei o que me pedir. Se
quiser que eu continue procurando, eu continuarei.
— Obrigado, querida, eu realmente apreciaria se você procurasse mais um pouco.
Já chegamos tão longe. Seria uma pena parar agora.
— Oh, Buck. Examinarei as pastas mais antigas. Mas eu gostaria de perguntar-
lhe também o que é que você quer, afinal, e quando se dará por satisfeito.
— Só quero saber o que aconteceu com minha filha, Amanda.
— E isso é tudo?
Buck sabia que Amanda queria que ele dissesse que sim, que isso era tudo. Mas,
no fundo, sabia que queria algo mais. Embora detestasse desapontar Amanda, foi
obrigado a admitir para si mesmo que não tinha outra escolha. Precisava encontrar Lua
de Lotus.

CAPÍTULO XIII

Amanda permaneceu parada ao lado de Cleo enquanto o carregador trazia oito


grandes caixas cheias de pastas para a sua sala. Quando o homem terminou de
transportar tudo e retirou-se, ela olhou desanimada para a sua secretária e deu um
suspiro.
— Olhe só para tudo isso, Cleo. Que horror...
— Você deve ter concordado em revirar estas pastas velhas num momento de
fraqueza, aposto.

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Não, não foi bem assim. Eu apenas acho difícil dizer não quando alguém me
pede alguma coisa.
— Minha mãe sempre me dizia que uma garota que não sabe dizer "não" sempre
arranja problemas da pior espécie.
— Sua mãe tinha toda a razão.
— Já que concorda, ponha os pés no chão e aprenda a dizer "não".
— É mais fácil falar do que fazer, Cleo. E, para dizer a verdade, no fundo me sinto
solidária com a situação pela qual o meu... amigo está passando. Afinal, está procurando
pela filha dele.
— O que é que ele quer, exatamente?
— Ah, esse é o ponto crucial da questão. Ele diz que quer apenas verificar se a
menina encontrou um bom lar e se está sendo bem tratada. Mas, no fundo, temo que ele
queira algo além disso.
— Se tem tanto medo assim, por que não dá um basta total ao que está
acontecendo? Invente uma mentira, diga que não encontrou nada e ponto final.
— Não posso fazer isso, Cleo, eu acabaria me sentindo culpada. E, depois, não quero
magoá-lo.
— Puxa, você se envolveu para valer com esse cara, hein?
— Sim, esse é o problema.
— O negócio é sério, Amanda?
— Não sei. Eu fico esperando... aguardando que o balão estoure, mas ele só cresce
cada vez mais. O namoro vai de vento em popa, exceto por causa deste assunto da
menina.
— Você o ama?
— Também não sei. Tenho vontade de estar com ele o tempo todo, e me sinto feliz
quando estamos juntos. Isso nunca me aconteceu antes.
— O sujeito tem muito dinheiro?
— Bem, sim...
— Nesse caso, você o ama.
— Cleo, não seja cínica! Para ser sincera, a princípio eu até pensei que isso serviria
para impedir um relacionamento mais sério entre nós.
— "Isso" o quê? O dinheiro?
— Não só o dinheiro, mas tudo. O estilo de vida, o trabalho, os valores, as atitudes
dele. Mas depois fui percebendo que nós nos dávamos bem em relação às coisas que
realmente importam na vida e... Ora, você deve estar achando que sou uma idiota —
disse Amanda corando, embaraçada pela confissão que acabara de fazer.
— De jeito nenhum, Amanda. Não a considero idiota, desde que você aja assim
porque ama esse homem e não porque quer agarrar um cara qualquer.
— Cleo, onde você arranja estas "pérolas de sabedoria"? — perguntou Amanda,
sem conseguir evitar uma risada.
— Ora, Amanda, depois de três divórcios já aprendi todos os truques da coisa.
— Nesse caso, por que não está casada e feliz agora?
— Esse é o problema, aprendi truques demais. A,ignorância é um pré-requisito
para a felicidade, pode acreditar em mim. Bem, mas você não deve deixar que as minhas

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

experiências fracassadas de vida a assustem. Às vezes os contos de fadas se


transformam em realidade!
— Que engraçado. Uma vez eu disse a Buck que a vida não era um conto de fada.
— E o que foi que ele respondeu?
— Acho que ele não me levou muito a sério na ocasião.
— Quer saber de uma coisa, Amanda? O tal cara está apaixonado por você, sou
capaz de jurar.
Amanda encarou sorrindo a sua- secretária, gostando do que ela acabara de dizer.
Mas então seu olhar caiu sobre as caixas empilhadas a um canto e, voltando à realidade,
sugeriu com um suspiro de desânimo: — Vamos examinar logo de uma vez esta droga
toda, ok?
Examinar as pastas foi ainda mais trabalhoso do que Amanda imaginara. Entre
telefonemas recebidos, cartas a serem respondidas e visitas de assistentes sociais do
governo e de outras instituições particulares, ela e Cleo conseguiram dar conta de
apenas cinco das oito caixas.
Logo depois do almoço, Buck telefonou para avisar que precisaria ir para Seattle a
negócios e que só voltaria na quarta-feira à noite. Conseqüentemente, decidiram já
deixar combinado o que fariam na quinta-feira, Dia de Ação de Graças. Buck passaria
para pegá-la em casa, à uma hora, e juntos iriam para a casa da mãe dele, em Beverly
Hills. Depois de prometer que ligaria de Seattle, mais tarde, Buck desligou, e Amanda
ficou triste com a idéia de não poder vê-lo por vários dias.
Às quatro e meia ela olhou para a pilha de pastas a serem examinadas ainda e
resolveu atacá-las de vez. Foi separando as pastas gradativamente; primeiro as das
meninas com idade aproximada à da filha de Buck; em seguida as de idade um pouco
acima ou abaixo, mas que haviam passado pela Fundação na mesma época.
Amanda ainda estava firme no trabalho quando Cleo foi embora, às cinco e meia,
e decidiu ficar até mais tarde para adiantar o serviço. Duas horas mais tarde, já
verificara duas vezes todas as pastas sem encontrar nenhuma referência ao nome de
Lua de Lotus.
Depois, saiu para comer um sanduíche na lanchonete da esquina e tomar um café,
voltou e continuou a trabalhar. Imaginando que ela e Cleo poderiam ter passado pela
pasta de Lua ide Lotus sem perceber, examinou de novo todas as pastas das cinco caixas
já vistas. Mais uma vez não encontrou nenhuma informação sobre a filha de Buck.
Às nove e meia da noite, chegou à conclusão de que a única esperança de descobrir
a menina recaía sobre as fichas médicas, que talvez contivessem uma referência à
tatuagem. Como tal serviço demoraria no mínimo de três a quatro horas, resolveu ir
embora para casa e deixar a procura para o dia seguinte. Já estava saindo quando o
telefone tocou.
— Alô?
— Amanda, sou eu, Buck. Ainda está no escritório? Por que tanta dedicação? Vai
pedir um aumento ao seu patrão?
— Não, estou apenas tentando encontrar uma menina para um amigo meu —
respondeu ela, rindo.
— E conseguiu descobrir alguma coisa?
— Bem, até agora não achei nenhuma pasta com referência a Lua de Lotus.
— Nenhuma?

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Calma, não desanime, querido. Amanhã darei uma olhada nas fichas médicas
para ver se acho alguma referência à tatuagem.
— Céus, odeio estar dando-lhe tanto trabalho, Amanda.
— Eu prometi ajudá-lo de livre e espontânea vontade, Buck, por isso não se
preocupe comigo.
— Você é um amor, sabia? Eu... estou sentindo a sua falta aqui, querida.
— Eu também já estou com saudade.
— Querida, nós nos veremos na quinta-feira, então?
— Sim, na quinta.
— Cuide-se até eu voltar, ok?
— Ok. Tchau, Buck.
Assim que desligou o telefone, Amanda sentiu-se invadida por uma enorme solidão.
Gostaria de estar indo para casa encontrar-se com Buck, mas em vez disso teria que se
contentar com um bom banho quente e algumas merecidas horas de sono. Lutando
contra a tristeza, pegou a bolsa e saiu do escritório.
— Ei, você está sensacional! — exclamou Buck ao chegar à casa de Amanda no Dia
de Ação de Graças à uma hora da tarde.
Ela corou com o elogio e, como uma adolescente envergonhada, deu uma volta para
que Buck pudesse ver melhor seu vestido de seda cor de champanhe, de mangas
compridas e com um discreto decote nas costas.
— Gosta, querido? Eu o comprei ontem, por causa da visita à sua mãe.
— Você está linda, e muito elegante. Mamãe vai adorá-la.
— Espero que sim.
Já no Mercedes de Buck, a caminho de Beverly Hills, Amanda rompeu o silêncio
que se abatera sobre eles, dizendo:
— Não tenho boas notícias para você, querido.
— Refere-se a Lua de Lotus?
— Exato. Não encontrei absolutamente nada sobre ela nas pastas. Nenhuma
referência ao nome ou à tatuagem.
— Droga!
— Verifiquei tudo duas vezes, inclusive as fichas dos meninos e das meninas mais
velhas, na suposição de que a documentação dela pudesse estar misturada com outras.
Mesmo assim... nada.
— Acha que isso significa que minha filha não veio para os Estados Unidos? —
perguntou Buck parecendo pronto a dar um soco de raiva no volante do Mercedes.
— Não. Acho que ela veio para cá e que uma das crianças nos nossos arquivos é
Lua de Lotus. Mas sem referências ao nome ou à tatuagem, fica difícil saber qual das
crianças é sua filha.
— Você não poderia encontrar a pasta certa através de um processo de eliminação?
— Já pensei nisso, Buck. Fui separando as fichas que poderiam ser dela e, quando
terminei de fazê-lo, contei quarenta fichas.
— O que poderia ser feito para descobrirmos qual das quarenta meninas é minha
filha?
— Praticamente nada, Buck. Seria uma tarefa impossível.

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Impossível?
— Bem... quase, eu diria. Teríamos um trabalhão enorme pela frente, sem garantia
alguma de que descobriríamos o que você quer saber — retrucou Amanda, lembrando-
se de que Cleo lhe sugerira dar um basta na situação.
— Ok, mas o que poderia ser feito de concreto, neste caso?
— Buck!
— Não se zangue, por favor, estou apenas pensando em hipóteses.
— Hipóteses? Ah! Desde quando você pensa em hipóteses no que se refere a Lua
de Lótus Buck? — indagou Amanda num tom de voz cheio de ceticismo — Por que não
esquece este assunto dê uma vez por todas? Estamos num beco sem saída, não há mais
nada a fazer! Por que não reconhece e aceita isto?
— É o que você quer, Amanda? Encerrar o assunto para sempre?
— Não se trata de eu querer ou não, Buck. É mais uma questão de se aceitar os
fatos. Continuar se atormentando com essa história só o fará sofrer mais ainda. Você já
viveu quase quinze anos sem saber nada sobre sua filha. Por que não se contenta agora
em saber que ela está nos Estados Unidos, provavelmente num bom lar?
— Não me interessa o "provavelmente". Quero ter certeza! E, tratando-se de uma
hipótese ou não, eu gostaria de saber como verificar aquelas quarenta pastas.
Amanda suspirou, ao mesmo tempo cansada e irritada, e encarou a estrada à sua
frente ao responder:
— Primeiro, você precisaria da minha colaboração — o que não vai ser fácil
conseguir, deixe-me avisá-lo. Segundo, você precisaria da cooperação das agências de
adoção. Terceiro, você precisaria do consentimento dos pais adotivos. Quarto, teria que,
existir algum tipo de informação específica sobre a sua filha nas fichas das agências de
adoção, como o nome ou uma referência à tatuagem.
— Supondo que eu conseguisse a sua colaboração, não acha que valeria a pena
fazer pelo menos uma última tentativa?
— Buck, pelo amor de Deus, quando é que você se dará por satisfeito?
— Quando eu for bem-sucedido.
— Você me faz lembrar das palavras de Kupnol Sustri a seu respeito: "Meu amigo
Buck parece um cachorro atrás de um osso".
— Ele disse isso? — perguntou Buck, começando a rir. — Pois Kupnol se esqueceu
de dizer também que não se ensinam truques novos a um cachorro velho.
— Se eu soubesse que você era um cachorro tão velho assim, teria pensado duas
vezes antes de me envolver com você — retrucou Amanda, também rindo.
— Querida, sabe o que eu mais gosto em você?
— O quê?
— Adoro o modo como você me faz duvidar da minha própria irresistibilidade...
A casa de Cynthia Michaels era a maior residência particular que Amanda já vira.
Um alto muro branco cercava por todos os lados os terrenos da mansão, e o Mercedes de
Buck só pôde atravessar os portões de entrada depois que ele se identificou através de
um sistema de intercomunicação com a casa.
— Não se assuste — disse Buck ao ver a expressão de Amanda quando os portões
se abriram por controle remoto —, a entrada é a pior parte. Minha mãe é uma ótima
pessoa, e na casa não existem leões, de estimação nem empregados misteriosos com cara

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

de "filme de terror". Aqui trabalham apenas Dunstan, o mordomo, e Adriana, a


cozinheira. Ambos estão com mamãe há anos.
— Quer dizer que só três pessoas moram neste lugar imenso?
— Sim. Q pessoal da limpeza, os jardineiros e a secretária de minha mãe só ficam
aqui durante o dia.
Buck estacionou o carro no pátio em frente à casa e comentou, apontando para um
Lincoln Continental:
— Owen Kenner deve estar aqui. Ele é médico aposentado, um velho amigo de
mamãe. Os dois ficaram viúvos quase na mesma época, não sei por que ainda não se
casaram.
— Talvez não estejam em sintonia total para isso.
— Mas nós estamos em sintonia, não estamos? — indagou ele beijando-a de leve
nos lábios antes de descer, do carro e abrir a porta do outro lado para Amanda. — Vamos,
quero dar uma olhada no peru que mamãe preparou para nós e que, como sempre, deve
estar uma delícia.
Ao tocar a campainha da casa, Buck percebeu um certo nervosismo em Amanda e
sorriu-lhe de modo animador numa indicação de que tudo daria certo. Logo em seguida
Dunstan atendeu à porta.
— Oh, boa tarde, Sr. Michaels! — cumprimentou o mordomo, calorosamente, antes
de virar-se para Amanda: — Boa tarde, madame.
— Feliz Dia de Ação de Graças, Dunstan — disse Buck.
— Obrigado, senhor. Por favor, entrem. A Sra. Michaels e o Dr. Kenner encontram-
se no salão.
Oferecendo o braço a Amanda, Buck levou-a para um grande salão de piso de
mármore coberto por tapetes persas.
— Olá, mamãe. Oi, Owen — disse Buck ao se aproximar do casal de meia-idade
sentado em um confortável sofá de couro ao lado da lareira do aposento.
— Olá, querido. Feliz Dia de Ação de Graças — retrucou Cynthia Michaels dando
um beijo no filho. — Suponho que a sua linda acompanhante seja a Srta. Parr.
— Sim. Amanda, esta é minha mãe... e este é Owen Kenner.
— Muito prazer, Sra. Michaels — disse Amanda polidamente, estendendo a mão
para cumprimentar Cynthia.
— O prazer é todo meu. Mas, por favor, pode me chamar de Cynthia.
— Obrigada. E pode me chamar de Amanda, se preferir. — Em seguida, virou-se
para Owen Kenner: — Como vai, doutor?
— É um prazer conhecê-la, Amanda. E o meu nome é Owen, ok?
— Obrigada.
Depois dos cumprimentos, Cynthia e Owen voltaram a sentar-se no sofá, enquanto
Amanda e Buck preferiram acomodar-se em duas poltronas colocadas juntas. Um fogo
alegre crepitava na lareira, dando ao ambiente um ar aconchegante e íntimo.
— Dunstan trará o seu uísque habitual logo mais, Preston. E você, Amanda, o que
vai tomar? —perguntou Cynthia, comentando rapidamente ao perceber a expressão
divertida de Amanda: — Oh, não se assuste, querida. Sei que todo mundo chama meu
filho de Buck, mas Preston foi o nome que eu escolhi, e prefiro referir-me a ele deste
modo.

100
Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Não a culpo por isso, Cynthia. Eu também prefiro Preston.


— Desde quando? — indagou Buck, espantado.
— Desde que me disseram que a única pessoa que o chama assim é sua mãe. Um
grupo bastante exclusivo, eu diria.
— Pois junte-se a mim se quiser, Amanda, e será bem-vinda — argumentou
Cynthia.
— Gostou da idéia, Preston? — perguntou Amanda virando-se para Buck.
— Hum, não muito. Uma só mãe já é suficiente. Todos riram.
Dunstan entrou no salão e aproximou-se da dona da casa.
— Deseja alguma coisa, madame?
— Traga dois uísques e dois sherrys, junto com alguns canapés, por favor. E não se
esqueça das nozes de Buck.
— A sua reputação chega longe — comentou Amanda brincando, dirigindo-se a
Buck.
— Sim, não é terrível esta mania dele por nozes? — indagou Cynthia depois de
dispensar o mordomo.
— Ainda bem que Buck veleja, se não já teria perdido a linha — retrucou ela,
sorrindo.
Cynthia também sorriu.
— Ainda bem que você veio, querida. Eu estava mesmo sentindo falta de uma
companhia feminina.
— Obrigada, Cynthia.
— Sabe, Amanda antes de você chegar eu estava tentando explicar a Owen o que é
que você faz. Mas Preston me falou de modo tão vago sobre o assunto que temo não ter
entendido direito qual é a sua profissão.
— Sou diretora da Fundação para Crianças Amerasiáticas, em Long Beach. O que
na verdade significa que dirijo uma pequena agência de serviço social que repatria
crianças amerasiáticas do Sudeste asiático para os Estados Unidos.
— É você mesma que traz as crianças para cá?
— Não, apenas faço os contatos. Os órfãos são trazidos para o nosso país por
enfermeiras tailandesas, vietnamitas ou cambojianas, primeiramente por causa de
problemas lingüísticos.
— Sim, eu compreendo.
Assim que Dunstan trouxe as bebidas e os salgadinhos, Cynthia ergueu um brinde:
— Ao seu trabalho, Amanda, e... ao seu bom gosto em relação aos homens.
— Este parece mais um brinde dirigido a mim, mamãe — argumentou Buck, rindo.
— Que bobagem, Preston, eu estava pensando em mim mesma. Afinal, se não fosse
eu...
— Eu não estaria aqui agora — completou Buck.
— Oh, céus, devo estar ficando velha. Vejo que já começo a me repetir.
— Não, eu é que comecei a adivinhar o que vai dizer, mamãe. Cynthia encarou
Amanda, fingindo uma expressão magoada e comentou:

101
Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Pouco tempo atrás Preston mal conseguia acompanhar as minhas brincadeiras,


e agora... espero que você seja mais bem-sucedida que eu em certos pontos, querida. Meu
filho é um homem muito teimoso.
— Mamãe, por favor! Desse jeito vai acabar destruindo a boa imagem que demorei
tanto a construir para mim!
— Ora, Preston, uma mulher de verdade não se deixa iludir por "imagens". Ela
sempre preferirá um homem de personalidade que lhe desperte emoções fortes, não é,
Amanda?
— Sim, e um homem com o qual possa se identificar espiritualmente.
Cynthia Michaels sorriu de modo aprovador. Amanda notou a reação da mulher e
esperou de coração que ela tivesse uma opinião favorável a seu respeito. Mas sabia que
ainda era cedo demais para que a mãe de Buck desse alguma indicação concreta de que
gostara realmente dela. Precisava ter paciência.
Owen Kenner estivera ouvindo a conversa em silêncio, e Amanda procurou
incorporá-lo à conversação para que não se sentisse deslocado.
— Qual era a sua especialidade, Owen?
— Radiologia.
— Que coincidência! Meu pai também era radiologista.
— Verdade? Onde é que ele trabalhava?
— Em San Diego.
— Vamos ver... O seu sobrenome é Parr, certo?
— Sim. Papai chamava-se Howard Parr.
— Howard Parr... o nome me parece familiar. Nós, radiologistas, formamos um
grupo meio restrito. Sem dúvida devo ter conhecido seu pai de passagem, em algum
congresso. Pelo modo como você se refere a ele suponho que já tenha falecido.
— Sim, papai faleceu há quase dez anos. Eu tinha um irmão médico, também, que
foi morto no Vietnã enquanto trabalhava num hospital de base.
— Sinto muito, Amanda. Eu estava na Europa durante a Segunda Grande Guerra,
como cirurgião, e sei o que é trabalhar num hospital de base.
— Você passou da cirurgia para a radiologia?
— Bem, digamos que os alemães me forçaram a mudar de especialidade. A unidade
a que eu pertencia estava em franca retirada durante a batalha do Bulge, quando foi
atacada por um bombardeio aéreo. Sofri ferimentos no braço e na mão direita e então...
adeus carreira de grande cirurgião.
— Oh, que pena. Eu sinto muito, Owen.
— Tudo bem, já superei, o trauma há um bom tempo — depois de uma breve pausa,
ele prosseguiu: — Pelo pouco que sei do que aconteceu no Vietnã, me parece que a
geração de seu irmão conseguiu salvar mais vidas na guerra do que o pessoal na Europa.
— Sim, tanto por causa das melhorias nas técnicas de evacuação dos feridos quanto
por causa dos avanços na área técnica — argumentou Buck entrando na conversa.
— É o que eu acho — concordou Owen. — Mas eu jamais pensei que você fosse
exaltar as virtudes de uma viagem de helicóptero.
— Pelo amor de Deus! — exclamou Cynthia — não vamos falar sobre isso agora.
Ainda tenho pesadelos por causa dessa história de helicópteros! Amanda, querida,
poderia me dizer se obteve sucesso na procura da minha neta misteriosa?

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Oh, eu... bem...


— Não precisa ficar embaraçada. Sei que este não é o tipo de coisa que um filho
normalmente conta à sua mãe, mas Preston e eu não temos segredos um para o outro.
Sei da existência da minha neta desde que Preston voltou ferido do Vietnã.
— Eu compreendo. E para ser sincera, Cynthia, as minhas tentativas de descobrir
Lua de Lotus chegaram a um beco sem saída. Acho que não seremos mais capazes de
encontrá-la agora.
— Se bem conheço meu filho, ele não deve estar nada satisfeito com isso.
— Acertou em cheio, mamãe — argumentou ele, intrometendo-se. — Amanda até
me acusou de ser um "cachorro atrás de um osso", de tanto que insisti para continuarmos
procurando a minha filha.
— A comparação é estranha, mas muito acurada. E talvez Amanda tenha razão,
Preston. Não vejo por que prosseguir com a busca, só para matar a sua curiosidade.
— Existe um certo perigo na situação, também. Quero dizer, corre-se o risco de cair
numa armadilha emocional — completou Amanda.
— Concordo plenamente — disse Cynthia. — Você me parece ajuizada, Amanda.
Gosto disso.
— Mamãe!
— O que foi, Preston?
— Eu estava mesmo esperando que você e Amanda se dessem bem, mas não
precisam exagerar! Que história é essa de unirem as suas forças contra mim?
Todos riram, até que Cynthia sugeriu:
— Owen, por que não vai com Preston para a biblioteca discutir o mercado de
ações? Eu e Amanda gostaríamos de ter uma conversinha a sós.
Buck saiu relutantemente da sala em companhia de Owen. Amanda sorriu,
pressentindo que a vitória estava ao alcance de sua mão. Olhou para Cynthia Michaels
e, pela primeira vez, imaginou como seria tê-la como sogra.

CAPÍTULO XIV

— Vamos para a minha casa ou para a sua? — perguntou Buck, acomodando-se no


assento do motorista.
— Buck! Ainda nem saímos da frente da sua mãe! — recriminou-o Amanda, ao
mesmo tempo em que acenava adeus para Cynthia Michaels, parada na porta da casa.,
— Eu sei. Perguntei de propósito, para pegá-la desprevenida — retrucou ele, dando
partida no Mercedes e pondo o carro em movimento.
— Oh, você é mesmo terrível! Sua mãe tem razão ao chamá-lo de teimoso.
— Quer saber de uma coisa? Eu já estava começando a me sentir incomodado com
a camaradagem conspiratória de vocês duas.
— Nós apenas concordamos em tudo que diz respeito a você, e isso é tudo.
— O caso não é tão simples assim. Sou filho de minha mãe por um acidente da
natureza, mas você me escolheu de livre e espontânea vontade...
— Eu escolhi você? Ora, Buck, faça-me o favor!

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— É verdade! Antes de nos conhecermos eu estava vagando por aí, disponível, como
um daqueles papagaios machos de Bangcoc. E então, de repente, você despenca em cima
de mim, enrolando a sua cauda na minha.
— Coitadinho, tão indefeso... — murmurou Amanda, rindo.
— Buck também riu, divertido, antes de comentar:
— Minha mãe e Owen gostaram muito de você.
— Que bom, isso me deixa feliz. Sua mãe é um amor de pessoa, e Owen é um
verdadeiro cavalheiro. Também gostei muito deles.
Ambos permaneceram calados por alguns minutos, pensativos. A noite terminou
de cair ao entrarem na estrada, e Amanda disse, de repente:
— Não quero tocar em assuntos desagradáveis, Buck, mas confesso que gostei de
sua mãe ter concordado comigo no que se refere a Lua de Lotus. As coisas que você me
falou antes me deixaram preocupada, e acho que devemos discutir agora o que
acontecerá daqui para á frente, pelo seu bem e pelo bem do nosso relacionamento.
— Como assim? Você considera Lua de Lotus um problema?
— Não exatamente um problema, mas... esta sua busca desenfreada da garota
está... se interpondo entre nós.
— No que se refere a mim, nada se interpõe entre nós, Amanda.
— Euck, tente entender. Eu me encontro numa posição muito difícil, posto de você,
e quero ajudá-lo no que for possível. Compreendo os seus sentimentos, mas, se quer a
minha opinião profissional, eu não acredito que seja direito continuar a procurar a
menina. Acho que chegou a hora de você esquecer esta história toda.
— Pensa mesmo assim?
— Penso. Sinto muito se a minha opinião o desagrada, mas eu estava esperando
que com o apoio de sua mãe a minha posição pudesse ser mais... persuasiva.
— Minha mãe não dirige a minha vida, Amanda.
— Claro que não. Mas ela o ama e, além disso, como avó da sua filha, tem um certo
interesse pessoal no caso. Eu tinha esperanças de, com a ajuda dela, convencer você a
desistir de procurar Lua de Lotus.
— Aprecio a sua preocupação, Amanda. Mas você parece não entender o quanto eu
preciso saber o que aconteceu à minha filha.
— É lógico que eu entendo, Buck! Acredite!
— Bem, então ouça a proposta que lhe farei. Estive pensando nela desde que você
me deu as más notícias enquanto estávamos indo para a casa de minha mãe.
Amanda suspirou, desanimada ao reconhecer o tom insistente da voz de Buck. Era
como se ele não houvesse escutado uma só palavra do que dissera.
— Tenho aqui, no meu bolso, um envelope que eu pretendia lhe dar hoje antes
mesmo de conversarmos. É um cheque de mil dólares, destinado à sua Fundação.
— Buck, por favor...
— Deixe-me terminar, Amanda. Sei que você tem trabalhado bastante no meu
interesse, o que de certo modo a afastou um pouco de outros serviços também
importantes. Permita-me dizer que é minha intenção, com este cheque, compensar a
Fundação pelo tempo que você tem perdido comigo. Devo acrescentar que não sei se
compreendo bem quais as chances de sucesso que teremos com essas quarenta pastas
que você mencionou, mas eu gostaria de checar as informações que elas contêm até onde

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

for possível. Se depois que as examinarmos não chegarmos a lugar algum, aí sim eu
concordarei em parar com as investigações.
— Oh, Buck... É tão difícil para mim dizer "não" a você.
— Não diga.
— Mas neste caso seria minha obrigação recusar a sua proposta.
— Antes de decidir se vai aceitá-la ou não, vamos discutir o problema por um
momento, vamos analisar as nossas opções. Suponha, por um instante, que Lua de Lotus
se tornou uma questão de vida ou morte para você. Que medidas tomaria para encontrá-
la?
Amanda suspirou fundo e não respondeu. Buck insistiu:
— Por favor, discuta o assunto comigo. Prometo que depois disso deixarei essa
questão de lado e lhe proporcionarei uma noite maravilhosa. Não falaremos mais sobre
a minha filha e nos divertiremos bastante, só nos dois.
— Ok, Buck, você venceu. O que quer saber?
— Como podemos descobrir qual daquelas quarenta meninas é a minha filha,
Amanda? O que você faria, se tivesse de encontrá-la?
— Eu escreveria para as agências envolvidas na adoção das meninas. Pediria aos
responsáveis que examinassem as suas fichas internas sobre cada caso, procurando
referências sobre o nome de Lua de Lotus ou da tatuagem.
— E quais seriam as chances de sucesso?
— Não sei. Uma em dez, talvez.
— Por que uma estimativa tão pessimista?
— Porque essas agências estariam menos motivadas a ajudá-lo do que eu, Buck.
As pessoas que trabalham com este tipo de negócio não saem por aí reabrindo velhos
casos à toa. Muitas vidas podem ser afetadas por tal atitude.
— Mas eu não quero interferir. Só quero saber.
Amanda sentiu-se ansiosa por chegar logo em casa e aproveitar a noite
maravilhosa que Buck lhe prometera. Relutante, suspirou e comentou:
— O que você quer não interessa muito, compreenda. Esta é uma matéria de ética
profissional, de lei e de justiça, que envolve o bem-estar de uma jovem adolescente.
— De quantas agências de adoção estamos falando, afinal?
— De umas doze, mais ou menos.
— Muito bem, eu lhe darei doze cheques de quinhentos dólares para você mandar
junto com as suas cartas pedindo para investigar as quarenta pastas. Acha que isso
ajudaria?
— Talvez, Buck. Mas a questão principal é: o que você espera dessas agências? Se
for apenas uma verificação dos casos, podemos ter uma chance de sucesso.
— Eu apenas desejo saber se minha filha está bem, num bom lar, com pais adotivos
decentes e amorosos. Ei, acabo de ter uma idéia excelente! Ouça, pode dizer nas suas
cartas que a agência que localizar Lua de Lotus receberá mais mil dólares. Que tal?
— Buck, isso me cheira a manipulação pura e simples. Será que não entra na sua
cabeça que as agências de adoções têm certos valores e princípios a serem seguidos? Elas
não visam lucro, apenas ajudam pessoas.

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Mas não estou sugerindo nada impróprio ou antiético, Amanda. Só estou


interessado em atrair a atenção das agências para o meu caso.
— Bem... talvez você tenha razão.
Buck deu um sorriso vitorioso e Amanda percebeu, mais uma vez, que perdera a
batalha. Um silêncio pesado caiu sobre o carro, até que Buck disse, para quebrar a
tensão:
— Tenho uma pequena surpresa para você, querida.
— Uma surpresa? O que é?
— Um presente que está no porta-malas do meu carro.
— No porta-malas? Para mim? Buck, o que é?
— Não posso contar, senão estrago a surpresa. Mas não se afobe, ao chegarmos à
sua casa eu lhe mostro o que é.
— Não vai me dar nenhuma pista?
— Não. Quero que você morra de curiosidade, antes.
Amanda riu, encantada. Não conseguia nem se lembrar da última vez que ficara
tão excitada com a idéia de receber um presente. Beijou Buek no rosto, toda contente,
mal vendo a hora de chegarem à sua casa.
Assim que Buck estacionou o Mercedes, Amanda saiu correndo do carro, ansiosa
como uma criança em noite de:,Natal.
— Vamos, Buck, mostre-me logo o que é a surpresa!,
Ele desceu do automóvel devagar, fazendo suspense. Demorou alguns segundos
para encontrar a chave certa do porta-malas, numa espécie de tortura brincalhona.
Quando finalmente ergueu a tampa traseira, Amanda pôde ver um jogo de oito malas,
caríssimo, de couro azul-claro.
— Buck, que lindas! Oh, são maravilhosas!
— São malas para Mercedes. Vê como elas se encaixam perfeitamente no
compartimento de bagagens?
— Mas... eu tenho um Honda.
— Quem sabe, talvez um dia você tenha um Mercedes. De qualquer modo, a idéia
de um relacionamento tipo "mala pequena para uma noite só" nunca me agradou.
O simbolismo da frase atingiu-a em cheio. Emocionada, jogou-se nos braços de
Buck.
— Obrigada, querido. Muito obrigada!
— Ora, de nada. E agora, por que não entramos para você encher as suas malas
novas de roupas?
— Pensei que você gostaria de passar a noite aqui comigo...
— Bem, esse é um convite irrecusável. Aceito a sugestão. Instantes mais tarde
ambos estavam na sala.de estar da casa de Amanda que, depois de agradecer mais uma
vez o lindo presente, ofereceu:
— Quer tomar um drinque, Buck?
— Não. Eu quero você.
Não foi preciso dizer mais nada. Em menos de um segundo estavam se beijando,
abraçados, acariciando-se. Amanda suspirou, incapaz de lidar com as fortes emoções que

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

a invadiram. Amava Buck, demais, e pressentia que ele também a amava. Tudo era
maravilhoso e, ao mesmo tempo, assustador.
— Quer um cálice de sherry? — murmurou ela, numa tentativa de recuperar o
autocontrole.
— Hum, aceito.
— Então, com licença, vou buscar.
Amanda foi até a cozinha e, quando voltou com dois cálices de sherry para a sala,
Buck tirara a jaqueta e soltara a gravata. Encostado à cornija da lareira da sala, com
um sorriso de contentamento nos lábios, esperou que Amanda se aproximasse para
tirar-lhe os cálices das mãos e abraçá-la.
— Senti a sua falta, querida.
— Quando, agora?
— Sim.
— Mas não demorei nem um minuto na cozinha!
— Um segundo já é tempo demais.
— Oh, Buck, você é tão romântico e carinhoso. Adoro estar com você.
— Hum, posso dizer o mesmo em relação a você. E, agora, responda uma coisa:
quando foi me ver lá no meu escritório, naquele primeiro dia, chegou a pensar que
acabaríamos nos envolvendo?
Amanda recordou-se da primeira impressão que tivera dele e respondeu, com uma
risadinha maliciosa:
— Não, nunca pensei que seríamos capazes de nos envolver.
— Não?!
— Bem, confesso que o achei atraente desde o princípio. Mas daí a termos um
caso... já foi outra história.
— Quanto a mim,.posso afirmar que a desejei após os primeiros cinco minutos de
conversa.
— Aposto que pensou em me levar para a cama!
— Não foi só isso. Eu me senti atraído fisicamente por você, claro, mas não só no
sentido... glandular e erótico. A sua beleza tocou mais o meu lado emocional.
— Acho que as mulheres são diferentes dos homens, neste ponto. Quero dizer, uma
mulher também se sente atraída fisicamente pelos homens, mas não é isso que a faz
aproximar-se deles. Como sua mãe comentou esta tarde, as mulheres são mais afetadas
pela força da personalidade de um homem — o que implica conhecê-lo bem, antes de
mais nada.
— E quando foi que você começou a se interessar por mim?
— Foi uma coisa gradual, lenta. Uma frase, um gesto, um pensamento...
— Querida, estou tão feliz por estarmos juntos!
— Eu também.
— Oh, Amanda.
Erguendo-lhe o rosto, emocionado, Buck beijou-a. A princípio com suavidade,
depois com mais exigência. 4
Amanda sentiu o coração começar a bater mais forte quando, após o beijo, ele
desceu o zíper nas costas de seu vestido, ansioso por despi-la, por tocar-lhe a pele nua.

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

Amanda não sé deixou ficar nua na sala. Puxando-o pela mão, levou-o em silêncio até o
quarto.
O aposento era pequeno se comparado à enorme suíte de Buck, mas tinha um
charme todo especial. A decoração era bem feminina, em tons de azul e amarelo-claro.
Pequenas almofadas enfeitavam a cama com cabeceira de metal e, sobre o criado-mudo
havia fotos de sua família, um vasinho com uma única rosa amarela e uma pequena vela
perfumada num castiçal de porcelana.
Amanda esperou que Buck acendesse a vela e só então aproximou-se, abraçando-
o. Ele acariciou-lhe.o rosto com gestos delicados, deu-lhe um beijo no rosto e recomeçou
a despi-la.
Para sua surpresa, sob o vestido Amanda usava uma combinação rendada e, em
vez de meia-calça, cinta-liga e meias de seda.
— Hum, que sexy — murmurou ele, com um sorriso.
— Acha mesmo?
— Acho. Como adivinhou que gosto de cintas-ligas e meias de seda?
— Intuição feminina. E quanto a você, não quer se pôr mais à vontade? — indagou
ela com ar malicioso, tirando-lhe a gravata.
Ainda sorrindo, Buck permitiu que Amanda fosse lhe tirando a roupa até deixá-lo
só de sunga. Em seguida, acariciou o peito másculo com os lábios e a ponta dos dedos.
As carícias excitaram Buck de imediato, fazendo seu membro ficar rijo.
Amanda, que ia começar a tirar-lhe a sunga, corou, embaraçada.
— O que aconteceu, perdeu a coragem? — perguntou Buck, brincando.
Sem esperar pela resposta, ele livrou-se sozinho de sua última peça de roupa e
puxou-a com suavidade para a cama. Observou-a, deitada, sob a trêmula luz da vela, e
murmurou com voz rouca:
— Você é tão linda. Parece uma deusa.
— Uma deusa não, querido. Sou uma mulher de carne e osso, ansiosa por tê-lo nos
meus braços...
Buck não esperou por um segundo convite. Ajudou-a a tirar a combinação,
surpreendendo-se mais uma vez ao ver que ela não usava calcinha. Incendiado de
paixão, acariciou-a entre as coxas até fazê-la gemer de prazer; lambeu-a nos seios até os
mamilos se enrijecerem de excitação e depois beijou-a na boca, com ardor.
— Oh, Buck, você me enlouquece.
— Querida, posso fazer amor com você sem tirar a sua cinta-liga e as meias?
— Sim... se você quiser...
— Amanda, eu te desejo tanto...
Depois de trocarem mais um beijo ardente, Buck deitou-se sobre ela, que abriu as
pernas para recebê-lo.
Amanda gemeu de prazer ao ser penetrada e, incapaz de se controlar por mais
tempo, deu início aos movimentos rítmicos que os levaria ao êxtase. Buck acompanhou
o ritmo de sua parceira, sem deixar um só instante de beijá-la no pescoço e na nuca, de
acariciá-la nos seios com uma das mãos.
E, então, como se fossem um só, ambos atingiram o gozo final e total. Após um
momento de silêncio, Buck saiu de cima de Amanda e deitou-se a seu lado, ofegante,
murmurando palavras de carinho.

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

Amanda permaneceu calada, observando a dança brilhante da luz da vela no teto,


ainda envolta numa aura de prazer e delírio amoroso. Finalmente, quando se refez por
completo da forte emoção que experimentara, virou-se e encarou Buck.
Ele beijou-a no rosto, os olhos brilhando de felicidade, e sussurrou-lhe ao ouvido:
— Eu te amo, querida.
— E eu te amo, Buck — murmurou ela com a voz embargada de emoção, sentindo-
se mais feliz que nunca.
— Amanda, minha doce Amanda — disse Buck abraçando-a, puxando-a para mais
perto de si.
Diante de tais palavras, que expressavam tanta ternura, Amanda não resistiu;
duas lágrimas rolaram por suas faces e caíram sobre o travesseiro.

CAPÍTULO XV

Na segunda-feira seguinte ao prolongado feriado do Dia de Ação de Graças,


Amanda estava em seu escritório, pensando que nunca passara dias tão felizes ao lado
de Buck, quando Cleo entrou, curiosa, querendo saber as novidades.
Depois de contar a história de seu aparente sucesso com Cynthia Michaels,
Amanda ainda teve que responder às perguntas de sua secretária sobre até onde o seu
relacionamento com Buck iria chegar.
— Cleo, só porque ele me levou para conhecer a mãe, não significa que esteja a
ponto de pedir a minha mão. Para ser sincera, eu diria até que Buck evita tocar no
assunto — explicou Amanda, pacientemente.
— Então ele procura não falar sobre casamento? Hum, é assim que os homens
sempre agem. Primeiro gostam de refletir sozinhos sobre uma decisão tão importante,
para depois...
— Buck não mencionou casamento, mas me deu um conjunto de malas feito em
especial para o porta-malas do carro dele — disse Amanda de repente, só para ver a
reação de sua secretária.
— Ora, ora! E você ainda duvida que ele vai pedi-la em casamento?!
— Ok, Cleo, não se empolgue demais. Buck me deu as malas apenas porque
comentei com ele, certo dia, que uma amiga minha costumava dizer que se pode medir
o grau de relacionamento com um homem pela quantidade de bagagem que uma mulher
leva embora ao deixá-lo.
— Isso confirma ainda mais o que acabei de falar, me parece. O presente que você
ganhou foi uma boa indireta!
— Cleo, talvez Buck esteja disposto a ter um relacionamento "de oito malas"
comigo, mas...
— Amanda, não seja teimosa! Vocês vão se casar mais dia, menos dia, quer apostar?
— Sinto muito, querida, mas você está sonhando alto demais dessa vez. Buck não
falou nada sobre casamento. E além do mais, não se esqueça de que temos um grande
problema a resolver antes de sequer começarmos a pensar em algo mais sério..
— Refere-se a Lua de Lotus?
— Exato.
— Mas por que a menina é um problema para a relação de vocês dois?

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Porque Buck está obcecado por ela, não descansará enquanto não a encontrar.
Tentei mostrar-lhe várias vezes os perigos de agir assim, a destrutividade da situação,
mas não consegui convencê-lo do meu ponto de vista.
— Vocês brigaram por causa disso?
— Bem, não chegamos a brigar... por enquanto.
— Oh, agora começo a entender tudo.
— E o mais estranho, Cleo, é que o nosso relacionamento é maravilhoso em todos
os outros aspectos. Quando não discutimos sobre a menina, o nosso romance vai de vento
em popa.
— Hum...
— Não sei o que fazer. Forço o assunto e provoco uma briga definitiva ou deixo que
a natureza siga o seu curso? É tão difícil decidir!
— Eu deixaria que a situação se resolvesse sozinha, Amanda. Afinal, vocês podem
nem encontrar Lua de Lotus.
— Mas, e se a encontrarmos? Tenho medo da reação de Buck. Será que ele se
contentará em apenas receber notícias da filha ou será que vai querer vê-la
pessoalmente e...
A pergunta pairou no ar por um instante, enquanto as duas mulheres se
entreolhavam com expressão preocupada. Segundos depois, Cleo, sem saber como
responder à questão, saiu da sala com um sorriso sem graça, afirmando que precisa
trabalhar.
Assim que se viu a sós, Amanda deu um suspiro de desânimo e decidiu cuidar de
uma vez por todas do assunto que a perturbava. Contudo, ao começar a escrever para
as agências de adoção — na esperança de que esta fosse a última fase da procura de Lua
de Lotus — sentiu-se cheia de dúvidas. Como justificar o fato de pedir ajuda a outros
profissionais para resolver um assunto que, afinal, era de ordem pessoal?
Gastou quase um bloco de papel rascunhando o conteúdo da carta, até encontrar
finalmente as palavras certas para atingir o objetivo desejado, dentro dos seus padrões
de honestidade e integridade.
Naquela noite, quando Buck lhe entregou os cheques que acompanhariam as cartas
— onze, ao todo — mostrou-se eufórico e otimista.
— Tenho a impressão de que a nossa tática vai funcionar — disse ele, animado.
"Por que, vai funcionar? Só por causa do dinheiro?", foi o que Amanda teve vontade
de perguntar na hora. No entanto, permaneceu de boca fechada. Era importante manter
uma atitude construtiva em relação ao assunto e auxiliar Buck no que fosse possível,
acontecesse o que acontecesse.
Quando as cartas foram enviadas, por fim, Amanda procurou esquecê-las, sem
sucesso. Começou a se sentir tão ansiosa por uma resposta quanto Buck, que se
mostrava a cada dia mais tenso.
Na quarta-feira ele precisou viajar a negócios para Washington e, como da outra
vez, sentiu-se vazia e triste com a ausência do homem que amava. Na quinta-feira à
noite Buck telefonou.
— Já recebeu algumas notícias das agências?
— As cartas foram mandadas há apenas dois dias, Buck. Ainda é cedo para
começarmos a receber respostas.

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Eu pensei que talvez alguém pudesse já ter telefonado.


— Buck, não estamos numa corrida contra os ponteiros do relógio, sabia? Estou
certa de que a possibilidade de..receber uma doação extra de mil dólares interessou ao
pessoal das agências, mas ninguém está tão ansioso para ser o vencedor da "gincana" e
pegar o dinheiro quanto você está ansioso por encontrar sua filha!
— Pelo visto, Amanda, você não aprova a minha atitude em relação à menina, estou
certo?
Ao perceber o tom magoado da voz de Buck, ela se arrependeu de ter sido tão
durona e desculpou-se.
— Sinto muito, querido. Não foi minha intenção bancar a grosseira com você.
Por sorte Buck não quis prolongar a discussão. A conversa tomou outros rumos e
terminou quando os dois combinaram passar o fim de semana juntos, em Balboa.
Amanda desligou o telefone, aliviada.
Na tarde do dia seguinte Amanda recebeu um telefonema da diretora de uma
agência de adoções da Pensilyânia. A mulher afirmou que nenhuma das seis crianças
que passaram por lá tinha alguma tatuagem ou marca especial, pelo menos de acordo
com os registros. No entanto, demonstrou muito boa vontade em entrar em contato com
os pais adotivos das meninas para confirmar se não existia mesmo nenhuma tatuagem.
Amanda surpreendeu-se com tanta solicitude e imaginou se, no final das contas, a
estratégia de Buck não estaria funcionando.
Ao encontrá-lo naquela noite, depois que ele voltou de Washington, Amanda
contou-lhe a boa nova por se sentir na obrigação de mantê-lo informado sobre o assunto.
No fundo, entretanto, teria preferido passar pelo menos uma noite sem falar a respeito
de Lua de Lotus.
Buck gostou da notícia, claro, mas não pôde deixar de notar a preocupação de
Amanda ao mencionar o assunto. O que estaria acontecendo, afinal? Imaginou que
talvez ela pudesse estar com ciúme da menina, mas descartou a hipótese como absurda
no segundo seguinte. Aliás, resolveu descartar o assunto pelo resto da noite e por todo o
fim de semana.
Gostava de Amanda, e muito, por isso achou melhor esquecer-se da filha por pelo
menos dois dias em benefício do relacionamento gratificante que mantinha com a
mulher que amava.
— Puxa, você está com uma aparência ótima! — exclamou Cleo ao ver Amanda na
manhã de segunda-feira. — Se Buck é o responsável por isso, por que não se casa com
ele de uma vez? Desse modo nunca mais precisaria gastar dinheiro em cremes de beleza.
— Cleo, Buck não me pediu em casamento. Acho que já conversamos sobre isso,
não?
— Ok, ok. Mas pelo menos me conte como foi o seu fim de semana.
— Oh, foi maravilhoso! Viajamos no sábado até Catalina Island, e no domingo
passamos o dia na praia e depois fomos jantar em Laguna Beach.
— Bem, se Buck não fala em casamento pelo menos não leva você para ver jogos
de futebol. Isso é um bom sinal.
— Também acho, Cleo. E, agora, diga-me o que temos na agenda para esta semana.
— Hum, deixe-me ver... você tem quatro encontros com industriais que telefonaram
dispostos a fazer doações para a Fundação, uma entrevista com aquela jornalista que
quer publicar, uma matéria sobre serviço social, vários compromissos menores e... ah,

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

no final da semana chegam os dois meninos provenientes do Orfanato da Missão Cristã


de Bangcoc.
— Nossa, quanta coisa! Acho melhor começarmos a trabalhar já, ou não
cumpriremos metade dos compromissos.
A semana foi passando de modo tranqüilo. Na quinta-feira a diretora da agência
da Pensilvânia ligou para dizer que nenhuma das suas crianças tinha tatuagem. No dia
seguinte, chegaram duas cartas. Uma dizia que nenhuma das três crianças que haviam
passado por lá era a procurada; a outra se recusava a fornecer qualquer informação
alegando problemas éticos. Amanda ficou preocupada ao pensar que Lua de Lotus
pudesse ser uma das duas meninas adotadas através dessa última agência, mas não
estava bem certa se sentia alívio ou desapontamento por isso.
Relatou o resultado do telefonema e das duas cartas a Buck, por telefone. Embora
conversassem uma ou duas vezes por dia — graças a Graham Bell —, ambos estavam
tão ocupados com o trabalho que mal tinham tempo de se ver.
— Quando é que vamos nos ver, afinal? Estou morto de saudade — reclamou Buck
na quinta-feira, quando ligou.
— Que tal hoje à noite?
— Hoje não posso, tenho um jantar com o pessoal da editoração. Por que não nos
encontramos amanhã?
— Amanhã quem não pode sou eu. Terei que ir até o aeroporto receber dois garotos
que virão de Bangcoc. Você os conhece, são aqueles dois meninos que vimos no Orfanato
da Missão Cristã quando fomos conversar com a Srta. Pakorn, lembra-se?
— Claro, cheguei até a conversar com o mais velho deles. Ouça, por que não me
convida para ir até o aeroporto com você? Eu gostaria de ver os garotos de novo... e
aproveitaria para ver você também.
Amanda hesitou, refletindo que qualquer coisa que o fizesse recordar Lua de Lotus
poderia ser problemática. Mas então percebeu que não poderia continuar protegendo-o
para sempre, evitando tocar no assunto crianças órfãs.
— Tudo bem, Buck, está convidado. Apreciarei muito a sua companhia.
— Obrigado, querida. A que horas passo na.sua casa para apanhá-la?
O correio da tarde trouxe mais três cartas com respostas negativas envolvendo oito
crianças, e um telegrama perguntando qual era o propósito de se encontrar uma menina
há tanto tempo adotada. O telegrama era curto e grosseiro, mas Amanda recusou-se a
ficar irritada e forçou-se a respondê-lo da maneira mais educada possível.
Em seguida ligou para Buck e contou-lhe as novidades.
— Parece que não estamos tendo muito sucesso, não é? — comentou ele meio
desanimado.
— Calma, Buck, calma. Recebemos resposta de apenas sete agências, ainda faltam
quatro. E a agência que mandou o telegrama não pode ser descartada por enquanto.
— Tem razão, acho que teremos de aguardar mais um pouco pelas outras respostas.
Só espero que Lua de Lotus não esteja incluída nas agências que se recusaram a nos dar
informações.
Percebendo um certo tom de tristeza na voz dele, Amanda procurou animá-lo.
— Ei, Buck, o Natal está próximo. Não havíamos combinado fazer a decoração
natalina da sua casa?

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Nos dois últimos anos eu contratei um profissional para fazer este trabalho.
— Puxa, mas que falta de inspiração! Deixe comigo, este ano eu o ajudarei a
enfeitar a casa. Podemos até sair para comprar um pinheirinho, bolas coloridas e tudo
o mais, que tal?
— Tudo bem, como quiser. Você vai passar o fim de semana comigo para fazermos
isso, então? Poderia levar três malas grandes para a minha casa, em vez de uma sacola
de mão.
— Vou adorar fazer isso, querido. Um beijo para você, até amanhã. Eu o espero em
casa para irmos juntos para o aeroporto.
Amanda desligou sentindo-se feliz e satisfeita. Conseguira deixar Buck pelo menos
um pouco mais animado.
Na sexta-feira de manhã ela estava verificando a documentação dos dois garotos
que iam chegar da Tailândia quando Cleo lhe entregou um maço de cartas que acabara
de chegar pelo correio.
Ansiosa, Amanda separou do maço três cartas que traziam endereços de agências
de adoção. Duas delas afirmavam que nenhuma criança com as características de Lua
de Lotus estivera sob seus cuidados. A terceira, contudo, dizia coisa bem diferente:
"Prezada Srta. Parr,
É minha agradável tarefa comunicar-lhe que a menina que a senhorita procura foi
adotada através de nossa agência.
Os registros médicos dela mencionam uma pequena tatuagem no tornozelo
esquerdo, com o desenho de uma flor de lótus e uma lua crescente. A idade e a descrição
geral da menina também correspondem aos dados que a senhorita nos enviou.
Atendendo ao seu pedido, é com prazer que lhe mando as informações permitidas
pelos nossos estatutos internos e pela lei do Estado. A menina está agora com treze
anos,.e goza de boa saúde — de acordo com as notícias de nosso último contato feito com
a família adotiva, há três anos. A menina recebeu o nome de Laura, e mora com os pais
no Estado de Kansas. O casal que a adotou não tem outros filhos, tanto naturais quanto
adotados.
Laura possui uma inteligência acima da média e se interessa muito por música e
bale. É bem ajustada socialmente, e não existe nenhuma indicação de problemas de
qualquer tipo por causa de sua origem mestiça.
Seus pais adotivos pertencem à classe média e gozam de boa posição financeira,
embora não possam ser considerados ricos. Tudo indica que Laura se encontra num
ótimo lar.
Qualquer informação adicional que a senhorita ou o seu cliente queiram só poderá
ser dada com o consentimento dos pais. Eu ficaria feliz, contudo, de poder ajudá-los neste
caso se for necessário.
Espero que a minha carta lhe seja útil. Por favor, agradeça ao seu cliente, em nome
da nossa agência, a generosa contribuição que recebemos.
Sinceramente, Madeline Wagner, Diretora"
Amanda releu a carta duas vezes, mal acreditando que Lua de Lótus fora
finalmente encontrada. E acabara recebendo informações mais completas do que
esperava, o que era ainda melhor. Talvez Buck ficasse satisfeito, agora. Incapaz de se
conter, pegou o telefone e ligou para ele. Após ouvir a notícia, Buck murmurou numa
voz chocada:

113
Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Meu Deus, de algum modo pensei que jamais encontraria a minha filha...
— Está feliz, agora?
— Bem, estou aliviado, pelo menos... mas... sim, posso dizer que estou feliz.
— Fico contente por você e por Lua de Lotus, ou melhor, Laura.
— Acha que deveríamos chamá-la de Laura? Já estou tão acostumado com o nome
Lua de Lotus que...
— O que foi? Não gostou do nome que lhe deram, Buck?
— Sim, gostei. Mas como não conheço minha filha, tenho dificuldade em relacioná-
lo a um rosto ou... sabe, sempre imaginei que a menina fosse parecida com Dameree.
— Esperamos que seja mesmo, não é? Dameree é uma mulher linda. Laura vai se
dar bem com os rapazes se puxou à mãe.
— Sim, suponho que sim.
Um silêncio pesado tomou conta da ligação telefônica. Desejando poder adivinhar
o que Buck estava pensando, Amanda perguntou:
— Você ainda quer ir comigo buscar os meninos no aeroporto?
— Quero, claro. Passo para apanhá-la em casa às cinco e meia, está bem?
— Ok, querido, até mais tarde.
Buck sentou-se em uma cadeira de plástico no escritório de imigração do Aeroporto
Internacional de Los Angeles enquanto Amanda revia a documentação dos meninos em
companhia de um oficial. Enquanto esperava, ele pensava em Lua de Lotus — Laura.
Que belo nome. Sua filha tinha agora treze anos. Deixara a Tailândia com um ano,
e na certa não se lembrava de nada: de Dameree, do orfanato, da viagem para os Estados
Unidos. O que faria ela se soubesse que seu pai verdadeiro morava no mesmo país e era
dono de um jornal famoso? Mas será que Laura pensava em seus pais verdadeiros?
Afinal, sua família agora era um casal de classe média que morava no Kansas.
Buck imaginou-a alta e esbelta, com longos cabelos negros e olhos amendoados,
numa exótica mistura de raças. Sim, ela deveria ser muito bonita. E sensível, também,
uma vez que gostava de música e bale. Música... Será que Laura tocava algum
instrumento? Piano, talvez?
Enxugando furtivamente uma lágrima que teimou em escorrer-lhe pelo rosto, Buck
forçou-se a mudar os dolorosos rumos de seu pensamento. Levantou-se quando Amanda
terminou de conversar com o oficial da imigração e, como um sonâmbulo, acompanhou-
a até o portão de desembarque por onde os garotos chegariam dali a vinte minutos.
— No que é que está pensando, querido? — indagou Amanda, encarando-o com
curiosidade, enquanto aguardavam a chegada do avião. — Em Laura? Você está com
uma expressão tão séria...
— Eu... sim, estou pensando em Laura.
— Você ficou contente com as notícias que recebeu dela, não ficou?
— Fiquei, mas... pena que o último contato da agência com a família adotiva de
minha filha tenha sido há três anos, já. Quero dizer, a família pode ter tido problemas
de lá para cá e... — Buck interrompeu a frase no meio ao perceber que Amanda ia
começar a ficar zangada e tentou consertar o que dissera. — De qualquer modo, nunca
poderei ter certeza completa, não é?
— Levando-se em consideração tudo o que aconteceu, suponho que Laura esteja
realmente num bom lar, levando uma vida normal, sadia e feliz — argumentou ela.

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

Buck olhou na direção da pista de pouso do aeroporto. E se em vez de estar


esperando por dois garotos praticamente desconhecidos estivesse esperando por sua
própria filha? Ao pensar nisso, viu o perigo contra o qual Amanda o alertara várias
vezes, desde o princípio. Mas não foi capaz de reprimir sentimentos que trazia no
coração. No fundo, sabia que teria de ver sua filha de qualquer modo.

CAPÍTULO XVI

Durante o fim de semana, o tempo tornou-se frio e chuvoso. A primeira tempestade


da estação veio dos lados do Pacífico. Buck e Amanda passaram a manhã de sábado na
casa de Balboa Island, vendo a chuva cair torrencialmente do lado de fora. Buck acendeu
o fogo da lareira e Amanda fez café, levando duas grandes e fumegantes canecas cheias
para a sala.
— Você parece a própria imagem do contentamento — comentou ela, sorrindo, ao
ver Buck instalado confortavelmente no sofá.
— Me sinto bem quando você está comigo — disse ele, puxando Amanda pelo braço
e fazendo-a sentar-se a seu lado,
— Parece que fomos feitos um para o outro, não é? Buck concordou com a cabeça e
pegou a caneca que ela lhe oferecia, comentando:
— Você foi maravilhosa com os garotos ontem à noite. Falar em tailandês com Lon
o deixou à vontade. Creio que conseguiu um amigo.
— O pobre garoto estava assustado. Eu apenas gostaria de falar melhor a língua
dele. Esqueci quase todo o tailandês que sabia.
No exterior da casa, rajadas de vento jogavam a chuva com grande força contra a
janela. Eles olharam para fora, mal conseguindo ver as outras casas ao longo da praia.
Amanda estremeceu e Buck segurou o braço dela carinhosamente.
— É um ótimo dia para se estar aqui dentro. Lembra-se daquelas noites quentes e
calmas em Bangcoc? — ele perguntou.
— É difícil de acreditar. E em poucas semanas será Natal... — após um momento,
ele indagou: — Você pretende passar a noite de Natal com sua mãe?
— Normalmente nós duas ficamos juntas nesta data. Por quê?
— Seria muito inusitado convidar sua mãe para passar a noite aqui? Afinal, o Natal
é uma noite de festa que as famílias costumam comemorar juntas. Posso até convidar
minha mãe para vir para cá, também. Faremos uma grande festa, que tal? — sorriu um
tanto sombriamente. — Só faltarão crianças na nossa comemoração.
Buck não precisou dizer mais nada para que Amanda percebesse que ele estava
pensando em Laura. Olhou para aqueles melancólicos olhos azuis, que nunca haviam se
mostrado tão nostálgicos como naquele instante.
— Pode ser bom reunir as nossas mães, tenho certeza de que se darão bem. Mas
acho que isso seria um pouco demais, Buck.
— Por quê? Nós nos gostamos, queremos estar juntos, e queremos a companhia
delas também. A idéia me parece bastante razoável.
— Bem, pensaremos no assunto, Buck. Mas a primeira coisa a fazer é decidir como
vamos decorar esta casa. Vou lhe dizer como. Vamos dar uma olhada nos enfeites que
você tem e planejar como fazer para este lugar ficar realmente festivo.

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

Buck sorriu ante a provocação e levou as mãos dela até os lábios, beijando-as
suavemente.
— Tem certeza de que não prefere relaxar e cuidar disso mais tarde? — perguntou
ele com um tom insinuante na voz.
— Oh, não, você não vai conseguir me distrair, Sr. Buck Michaels! Nada de táticas
evasivas! Vamos deixar esta casa pronta este fim de semana. E vou fazer você entrar no
espírito do Natal mesmo que tenha de morrer para conseguir isso.
Buck riu e a puxou para perto de si. Ela resistiu por um momento, mas a suave
carícia dos lábios dele acabou vencendo.
Amanda segurava com força a mão de Buck enquanto andavam pelo corredor
decorado com luzes brilhantes e com os vermelhos, verdes, prateados e dourados
característicos do Natal. O shopping center estava abarrotado de.gente e inundado pelos
gritos e risadas das crianças, além de inúmeras músicas de Natal.
— Já está sentindo o espírito do Natal? — Amanda perguntou, sorrindo.
Buck, riu, comentando:
— Francamente, os shoppings não foram feitos para mim.
— Quando fizermos a decoração da casa, você ficará mais bem disposto.
Continuaram andando, de mãos dadas, até chegarem à pequena vila construída
para às crianças, tendo como atração principal o próprio Papai Noel. Olharam por uma
janela e viram uma criança sentada no colo do velhinho. A pequena menina olhava
ansiosa para os lados, quase à beira das lágrimas. Amanda olhou alegremente para
Buck, que fitava a cena com os olhos perdidos na distância. Ela sentiu-se desabar.
Pegou-o pelo braço e voltaram a caminhar.
Alguns minutos depois, passaram por uma loja de brinquedos e, após um instante
de hesitação, Buck disse:
— Vamos entrar por um minuto.
Amanda o seguiu para o interior da loja e ficou olhando enquanto ele vagava entre
as prateleiras.
— Você tem alguma criança na sua lista de presentes? — perguntou quando ele
parou em frente às bonecas.
— Não, creio que não.
Saíram em silêncio da loja e Amanda concluiu que a carta de Kansas City, ao invés
de ser um fim, aparentemente significava um novo começo.
Fizeram o caminho de volta em silêncio. Supostamente estavam ouvindo a fita de
música de Natal que Buck pusera no toca-fitas, mas na realidade Amanda não prestava
atenção na melodia. Não conseguia parar de pensar no novo e perturbador rumo que o
comportamento de Buck estava tomando. Quando chegaram em casa e passaram da
garagem para a cozinha, ele deixou os pacotes na mesa ao mesmo tempo em que Amanda
perguntava:
— Você serviria um cálice de sherry para mim, Buck? E se estiver disposto, eu
gostaria de sentar e falar com você por um minuto.
Amanda dirigiu-se à sala e, um momento depois, Buck seguiu-a com dois cálices de
sherry. Sentou-se na poltrona em frente à ocupada por ela, seu rosto indicando que sabia
qual seria o assunto da conversa.
Olharam um para o outro.

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— É Laura, não é, Buck? Ele concordou com a cabeça.


— Qual o problema? O que você quer, afinal?
— Não consigo tirá-la da cabeça, Amanda. Preciso ver a menina.
As palavras de Buck não a surpreenderam, mas assim mesmo seu coração acelerou.
Encarou-o sem saber o que dizer, combatendo a irritação que a tomava, sentindo-se
traída mas ao mesmo tempo entendendo a mágoa e a frustração que ele sentia. Baixou
a cabeça e fechou os olhos, antes de voltar a olhar o rosto do homem que amava.
— Eu não posso ir atrás dela, Buck, não posso. Detesto ir contra a sua vontade,
mas tenho de fazê-lo! Impassível, ele não disse nada, apenas encarou-a. — Você entende
a minha posição, Buck? Não vai me odiar por causa disso?
— Não, é claro que não.
— Mas obviamente não gosta da minha atitude.
— Não, suponho que não.
— Buck, por favor, compreenda. Passei cinco vezes mais tempo cuidando deste caso
do que já o fiz por qualquer outra pessoa. Se não fosse o que sinto por você, não teria
feito tanto. Acho que seria ruim para Laura, ruim para os pais.dela e ruim para você.
— Mas eu já lhe disse que não quero interferir. Quero apenas vê-la, mesmo que
seja a distância.
— Não, Buck! Ponha isso na sua cabeça. Por favor!
— Poderíamos pedir a permissão dos pais adotivos de Laura para vê-la.
— Eu me nego a fazer isso! Como profissional, estou convencida de que você está
errado, e seria um ato irresponsável de minha parte deixar que os meus sentimentos
por você interferissem no meu julgamento.
— Perguntar não ofende, Amanda! Se Laura ou seus pais forem contra a minha
idéia, eles o dirão. Mas como pode você decidir por eles?
— Eu teria de pedir permissão à diretoria da agência em Kansas City primeiro, e
tenho certeza de que ela não concordaria.
— Ela disse na carta que transmitiria qualquer pedido por informações.
— Mas o que você quer não são informações!
— Tudo que eles podem fazer é dizer não.
Amanda começou a ficar preocupada. A teimosia dele a perturbava, principalmente
quando usava argumentos desapaixonados, lógicos. Começou a se sentir cruel e
arbitrária, mesmo sabendo que estava certa.
— Buck, você pode terminar esta história com uma tremenda frustração!
— Do que é que está com medo?
— Não quero ver ninguém magoado, incluindo você!
— Eu me preocupo comigo, e vamos deixar aquelas pessoas em Kansas se
preocuparem consigo mesmas.
— O que você quer realmente, Buck? Não percebe que não fica satisfeito nunca?
Toda vez que eu faço algo, você quer sempre mais, e isso não tem fim! Para ser honesta,
acho que você só ficará satisfeito até que essa garota esteja morando aqui nesta casa!
Amanda sentiu o rosto enrubescer ao terminar de falar. Suas palavras haviam sido
mais ásperas do que pretendera.
— Eu sou tão mau assim, Amanda? — Perguntou ele com a voz baixa e calma.

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Sinto muito, Buck. Não queria atacá-lo pessoalmente...


— Ouça, sei que continuo querendo mais e mais, e sei que do seu ponto de vista
acha que estou manobrando você, mas não é nada disso. Quero agora o mesmo que
sempre quis. Quero ter certeza de que Laura está bem. Quero vê-la com os meus próprios
olhos.
— Você nunca disse isso antes, Buck.
— Eu sei. Creio não ter percebido antes que saber informações esparsas não será
jamais suficiente. A cada momento que soube de coisas novas a respeito de minha filha,
isso serviu apenas para criar novas dúvidas. Por isso preciso ir até o fim. Por mim
mesmo, agora.
— Ok, entendo isso, mas o seu é um desejo f útil. Esse tipo de aproximação que
você quer não deve ser feito. Sou pessoalmente contra a sua posição.
— Então é isso. Você não.vai mais me ajudar...
— Não. Quanto a esse assunto, não.
Olharam-se através do pequeno espaço que os separava. Amanda sentiu próximo
um rompimento total entre eles, e odiou a situação a ponto de querer chorar. Olhou para
Buck, amando-o apesar do desapontamento e raiva que sentia.
— Suponho que seja o fim, então — disse ele com a voz fria, aborrecida.
— Buck, se soubesse o quanto estou magoada. Não posso suportar a sua pressão —
argumentou ela, quase implorando.
— Não estou ofendido com você, Amanda.
— Não mesmo?
— Bem, confesso que estou desapontado, mas entendo a sua posição.
— De verdade?
— É claro.
— Não acredito em você — disse ela, sentindo que começava a perder o controle.
— Amanda...
. Tarde demais. As lágrimas jorraram, e ela escondeu o rosto entre as mãos. Buck
aproximou-se imediatamente, ajoelhando-se a seus pés.
— Amanda, me desculpe. Eu fui um egoísta. Não devia ter dito nada.
— Você não pode mudar o que sente, não adianta — ela soluçou.
— Vamos lá, querida, eu amo você. E isso é mais importante que tudo.
— Não, não é. O que pode ser mais importante que a sua própria filha?
— Eu não estava pensando em você e nos seus sentimentos, Amanda. Eu estava
errado.
— Não, você não está errado. Isso é apenas natural.
— E o que vamos fazer? Ficar tentando provar um ao outro que o outro é quem tem
razão?
— Eu não disse que você está certo. Disse apenas que compreendo o que está
sentindo.
Os dois acabaram rindo.
— Bem — disse Buck, afagando o rosto dela —, que tal esquecermos este assunto?
Amanda concordou com a cabeça, desejando de todo coração que o conseguissem.

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

Embora Buck evitasse o assunto pelo resto do fim de semana, Amanda não se
esqueceu da conversa que haviam tido. Toda vez que olhava para Buck, sentia-se mal,
como se houvesse cometido uma terrível injustiça, mesmo sabendo que assumira a
posição correta.
Na segunda-feira de manhã estava sentada em seu escritório, pensando em Buck
e em Laura, uma garota morando em algum lugar do Kansas e que não tinha
conhecimento da confusão que provocara na vida de duas pessoas desconhecidas da
Califórnia. Se não fosse triste, teria achado a situação engraçada.
Com esforço tentou analisar o caso tão desapaixonadamente quanto possível. Uma
coisa estava clara, acima de tudo: tinha de encontrar um modo de mostrar a Buck que
Laura estava bem. As chances de permitirem que ele visse a filha eram de uma em um
milhão, mas imaginou que talvez a deixassem ver a criança, já que trabalhava na
agência que cuidara do caso no início. Talvez os pais concordassem em recebê-la para
uma visita na casa da família. Num impulso, ligou para Madeline Wagner, em Kansas
City.
— Não sei, Amanda. Normalmente não realizamos investigações tanto tempo
depois de uma criança ter sido adotada. Mas... creio que posso indagar.
— Eu apreciaria muito o favor, Madeline.
— Acho que o melhor seria ser absolutamente franca com os pais adotivos, neste
caso.
— Claro, eu entendo. Tudo que você fizer será bem-vindo. Aguardarei notícias suas,
então.
Amanda decidiu não dizer nada a Buck sobre sua iniciativa. Estava dando um tiro
no escuro, e não queria desapontá-lo se sua estratégia não desse em nada. Durante a
semana, estiveram juntos uma vez para almoçar e duas para jantar. Buck tivera uma
agenda cheia, de modo que passaram apenas uma noite juntos, mas o relacionamento
entre ambos estava mais melancólico do que nunca.
Não fizeram amor naquela noite. Buck apenas abraçou-a, dormindo logo depois.
Ela, por sua vez, fechou os olhos, imaginando se tudo voltaria a ser como antes.
A discussão que haviam tido no último fim de semana ainda pairava no ar e, apesar
de nada ter sido dito, a briga ainda os afetava — pelo menos era assim que Amanda se
sentia. Tinha vontade de contar a Buck sobre o contato que estava tentando fazer com
os pais de Laura, mas não o fez. Não podia confiar em algo tão tênue para melhorar o
humor de Buck, e o melhor seria ficar de boca fechada para não criar falsas esperanças.
Na sexta-feira, Madeline Wagner ligou com boas novas.
— Nem posso acreditar, Amanda. Imagine, os pais de Laura concordaram com a
visita e sugeriram que você fosse vê-los no próximo sábado. Vai poder ir nesse dia?
'— É claro que sim, Madeline. Puxa que notícia ótima!
— No entanto, deram algumas condições para o encontro. Ninguém deve saber
quem eles são além de você.
— Sem dúvida isso é aceitável.
— Ótimo. Sugiro que venha até Kansas City, então. Falo com você aqui para
acertarmos todos os detalhes da visita.
Amanda sentiu-se extasiada. Pensou em como iria contar a Buck a maravilhosa
novidade, e ao lembrar-se de que haviam combinado se ver naquela noite, decidiu
convidá-lo para ir jantar em sua casa. Faria do encontro uma ocasião especial, um jantar

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

à luz de velas regado a champanhe, e depois daria a ele a grande notícia. O projeto a
deixou excitada, e ela ligou apressadamente para Buck a fim de fazer o convite.
— Então esta é uma noite especial? — perguntou Buck, com um pouco de sua
antiga alegria na voz.
— O que o faz pensar isso? — caçoou Amanda. — O fato de estarmos aqui, juntos,
não é motivo suficiente para tomarmos champanhe?
— Tenho sido negligente com você a esse ponto?
— Não, estou apenas me sentindo feliz esta noite.
— Por quê?
— Tenho uma boa notícia.
— Realmente? E qual é?
— No próximo fim de semana vou ao Kansas ver Laura e seus pais.
— Como conseguiu isso? — indagou ele, perplexo. Depois de ouvir a história toda,
Buck balançou a cabeça, incrédulo.
— Amanda, você me surpreende!
— Não está contente?
— É claro que estou. É quase tão bom como se eu mesmo fosse até lá.
— Sei que gostaria de ir, Buck, mas esse foi o único modo que consegui arrumar.
— Entendo.
Abriram o champanhe, e Amanda ofereceu um brinde a Laura. Buck retribuiu,
fazendo também um brinde.
— A você, Amanda, a mulher que eu amo.
Depois do jantar, levaram o resto da garrafa para o quarto e a terminaram entre
beijos. A atmosfera da tensão que se abatera sobre eles na última semana se dissipou, e
Amanda sentiu que reconquistara o homem que amava.
Buck Michaels estava na sala de reuniões, ouvindo os editores discutirem qual
seria a matéria da primeira página do Tribune para o dia seguinte. De vez em quando
alguém lhe dirigia um olhar, esperando pela reação a um comentário ou outro, mas todos
eram capazes de perceber que sua mente estava distante dali.
Buck pegou-se de repente sonhando com Amanda e Laura, a família que carregava
nos pensamentos, e forçou-se a prestar atenção no que seus editores diziam e a fazer
uma pergunta inteligente, para não parecer tão desinteressado do assunto.
Quando a reunião terminou, por fim, Buck aproximou-se da mesa de Kelly.
— Alguma chamada? — perguntou ele.
— Não, chefe, a Srta. Parr ainda não ligou esta manhã. Havia um sorriso travesso
no rosto da secretária, que ele procurou ignorar ao dirigir-se para o seu escritório.
Um minuto depois Kelly o seguiu levando um cafezinho. Ela pôs a xícara sobre a
mesa, mas não saiu da sala. Buck acabou por reparar na presença de sua secretária e
encarou-a, curioso. A expressão- no rosto de Kelly indicava que ela estava esperando por
algo.
— Há alguma coisa que queira me dizer, Kelly?
— Não, mas acho que você quer falar. O que o está incomodando, Buck? Quer
desabafar?
— É assim tão óbvio?

120
Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Eu diria que sim, chefe. O que o preocupa? Amanda Parr ou a menina?


— As duas, eu creio.
E então Buck contou à secretária a viagem de Amanda ao Kansas.
— Você deve estar contente com isso, Buck — comentou Kelly.
— E estou. Mas também me sinto frustrado.
— Por não poder ir junto?
— Sim.
— Deve ser mesmo terrível ficar sentado aqui, sabendo que chegou tão perto de
conseguir vê-la.
— Se não fosse por Amanda, eu tomaria providências para encontrar a garota. Pelo
menos para vê-la a distância.
— Mas se não fosse por Amanda, você não teria chegado tão perto.
— Eu sei. Desde o início, esse foi um problema para nós dois.
— E o que vai fazer agora?
— Me conformar e deixar as coisas acontecerem. Não tenho outra escolha, tenho?
À medida que a semana passava e se aproximava o dia da viagem, Amanda
começava a se sentir mais e mais tensa. Começava a temer o encontro com os pais de
Laura, não porque estivesse querendo desistir de ir, mas porque Buck não iria. A razão
lhe dizia que estava agindo do modo certo, porém seu coração não tinha lógica nenhuma.
Buck parecia estar bem, mas ela sabia que ele também estava sofrendo. Afinal,
fora apanhado entre dois fogos: seu amor por Amanda e o respeito às decisões dela e o
desejo de ver Laura.
Numa tarde, próxima ao fim de semana, Cleo chegou com o sanduíche que Amanda
lhe pedira para trazer quando voltasse do almoço.
— Não me lembrei se você queria mostarda ou maionese, por isso trouxe o
sanduíche com os dois — disse Cleo, entregando-lhe o saquinho da lanchonete.
— Tudo bem, eu gosto de ambos.
— Ótimo. Sou alérgica a coisas sem tempero. Prefiro sempre pecar por excesso do
que por falta.
— Filosofia interessante a sua.
— Experiência, isso sim. Tive três maridos sem nenhum tempero.
— Você conseguiu mais sabedoria com o casamento do que qualquer outra mulher
que conheço, Cleo — disse Amanda, rindo.
— Nenhum dos meus maridos era rico, por isso a experiência foi o único lucro que
tirei dos meus antigos relacionamentos. Mas agora falemos de você, querida. Por que
está assim, com essa cara tão triste? — Oh, Cleo, estou tão confusa! Não sei o que fazer...
— Está preocupada com a viagem?.. — Sim, e muito.
— Sua cabeça lhe diz para fazer uma coisa, e o coração, outra?
— Exato.
— E não existe nenhuma chance de as duas partes entrarem num acordo?
— Não que eu consiga ver.
— Você vai se casar com Buck?

121
Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Tudo leva a crer que sim — admitiu Amanda —, mas é muito cedo para ter
certeza. Temos esse assunto entre nós.
— Não sei o que é certo e o que é errado em situações como essa, Amanda, mas sei
que se uma relação significa alguma coisa, ela deve ter precedência sobre tudo o mais.
Algumas vezes você tem que se sacrificar, fazer coisas que não faria normalmente.
Ponha os seus sentimentos em primeiro lugar, é o que eu digo.
— Ele gostaria de ir comigo ao Kansas, eu sei, mas isso não daria certo. Tudo
poderia terminar de modo tão desagradável.
— Não há um modo de pedir àquelas pessoas que deixem Buck ver a garota?
— Eles deixaram claro que não querem isso, Cleo. Mas mesmo que eles
concordassem com a idéia, não sei se isso seria bom para a menina... e para Buck.
— Há algum problema em perguntar? De qualquer modo, a garota não precisa
saber quem ele é, certo? Ele não quer apenas vê-la?
— É o que Buck diz.
— Talvez você ainda consiga um modo de resolver a situação, Amanda. Não se
desespere.
— Vou tentar, Cleo, vou tentar.
Na quinta à noite outra tempestade caiu. Amanda estava parada à janela da casa
de Buck, olhando para a baía escura através da cortina de água que escorria pelo vidro,
pensativa.
— O que há de tão interessante lá fora? — perguntou Buck, aproximando-se por
trás e dando-lhe um beijo na orelha, depois de abraçá-la.
Amanda não respondeu e estremeceu involuntariamente. Passara toda a noite sem
saber como tocar no assunto da viagem, e percebia no olhar de Buck que ele notara algo
errado.
Após ficarem por um longo tempo à janela, olhando a chuva e as cintilações das
luzes na baía, Amanda virou-se e encarou-o, hesitante. Buck esperou pacientemente,
dando a ela tempo para reunir coragem.
— Buck... — sussurrou ela por fim, com a voz falhando, — você gostaria de ir ao
Kansas comigo?
— Gostaria, mas... pensei que eu não pudesse ir.
— Bem, tecnicamente não pode, mas vou tentar encontrar um meio de conseguir
ao menos que veja Laura.
— Como assim?
— Penso que posso perguntar aos pais de Laura se seria possível que você a visse.
Se eles concordarem e você estiver por perto, então...
— Amanda, tem certeza de que quer isso?
— Tenho. Mas não há garantias, Buck. Eles podem não concordar. E quero a sua
promessa solene de que não vai interferir em nada. Se for comigo, vai ter de fazer
exatamente o que eu disser, e nada mais. A tentação e a frustração podem ser
insuportáveis, por isso quero a sua palavra.
— O que a fez mudar de idéia?
— Eu te amo — disse ela, beijando-o no queixo.
— Você descobriu isso só agora?

122
Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Não. Descobri as implicações disso. Se eu não puder confiar em você, Buck, então
a nossa relação estará em perigo. Estou fazendo tudo que posso por você e confio que
cuidará para que ninguém saia ferido.
— Não quero causar problemas para Laura. Ou para seus pais adotivos.
— Sei que não quer.
Ela puxou o rosto dele e beijou-o com ardor. Então, olhando dentro daqueles olhos
azuis, sentiu lágrimas surgirem nos seus.
— Juntos, Buck, vamos fazer o melhor que pudermos.
— Eu te amo, Amanda. Eu te amo demais, sabia?

CAPÍTULO XVII

O vôo até Kansas City lembrou, de certo modo, a viagem que haviam feito juntos a
Bangcoc. Só que, em vez do azul do oceano Pacífico, sobrevoavam montanhas cobertas
de neve e planícies áridas. Dirigiam-se não para um lugar tropical e exótico, mas para o
centro dos Estados Unidos. Em vez de procurarem por uma criança desconhecida e
misteriosa, estavam indo ver uma adolescente de treze anos, que gostava de música e
dança — a filha de Buck Michaels.
Buck apertou levemente a mão de Amanda quando o avião pousou em Kansas City.
Assim que deixaram o aeroporto, alugaram um carro e foram de imediato para o prédio
na Roeland Park, onde ficava o escritório da agência de adoção. Tendo decidido não
contar a Madeline que Buck a acompanhava, Amanda foi falar sozinha com a mulher,
enquanto ele a esperava numa cafeteria próxima da agência.
Uma hora depois, Amanda e Buck se dirigiram para Hiawatha, uma pequena
cidade no extremo nordeste do Estado. Tomaram a auto-estrada U.S. 73, passando por
algumas cidades e por vários quilômetros de. fazendas cobertas por plantação de milho.
O dia terminava quando chegaram a Hiawatha. Buck cruzou a cidade de ponta a
ponta duas vezes, antes dizer:
— Bem, parece que podemos escolher entre dois hotéis: qual você prefere, o
Sunflower ou o Best Western Lodge?
— Tanto faz, pode escolher.
Buck escolheu o Best Western Lodge, que tinha uma aparência melhor. Lá
chegando, foram para o quarto, que era espaçoso e limpo.
— Não é como o Oriental — disse Buck, com um sorriso, voltando do banheiro —,
mas é tudo muito limpo, e isso é tudo o que importa.
— A cama pelo menos é boa — comentou Amanda experimentando o colchão.
— Que tal um jantar antes de assistirmos à TV e irmos dormir? O restaurante do
hotel me pareceu simpático.
— Boa idéia.
Buck tocou o rosto dela afetuosamente, e então se dirigiu à janela, comentando:
— Este é um belo lugar, não? Aposto que no outono todas as árvores da cidade
ficam com as folhas douradas. E eu não ficaria nada surpreso se tiverem por aqui um
bom time de futebol. Buck virou-se para Amanda. — Você acha que Laura é uma líder
de torcida de futebol?

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

Amanda sorriu e fez que sim com a cabeça, maravilhada com o sentimentalismo de
Buck e pensando no quanto estava feliz desde que o conhecera. Depois de vestirem o
casaco foram para o restaurante.
Uma garçonete de meia-idade aproximou-se assim que Buck e Amanda sentaram-
se em um reservado junto à janela.
— Boa noite — disse a mulher, pondo um copo de água gelada e um cardápio na
frente de cada um; em seguida, reparando nos grossos agasalhos que usavam, perguntou
sorrindo: — Nossa, estão com tanto frio assim? Vocês não são daqui, são?
— Não, viemos de Los Angeles — respondeu Buck.
— Puxa, fizeram uma longa viagem! Bem, vou dar-lhes alguns minutos para
escolherem o que vão querer comer. Fiquem à vontade.
Após uma refeição tranqüila com salada, frango, purê de batatas e legumes,
pediram tortas de maçã.
— Hum — disse Buck ao terminar sua torta —, se esse tipo de coisa for genética,
Laura deve estar feliz com as deliciosas tortas que fazem por aqui.
Amanda sorriu calorosamente. Naquele momento, mais que nunca, viu Buck como
um pai, e desejou de coração conseguir que ele visse a garota.
Na manhã seguinte, enquanto Buck saiu para passear, Amanda ligou para a casa
dos pais de Laura, Jay e Betty Springer, e marcou uma entrevista para a uma e meia da
tarde.
Após o almoço Buck e Amanda voltaram ao hotel, apreciando aspecto diferente da
cidade durante o dia. Já no quarto, Buck. ligou a TV para ver um jogo de futebol, pois
sabia que Amanda sairia logo. Jogou-se na cama, tentando mostrar-se calmo, mas
Amanda sabia que ele estava sufocado pela frustração.
Ela dirigiu-se para a porta.
— Boa sorte — disse Buck, e ficou olhando enquanto ela saía no frio dia de
dezembro.
Amanda pegou o carro e dirigiu-se para o sul, segundo a orientação de Betty
Springer. A casa dos Springer ficava num pequeno terreno, com a entrada marcada por
enormes árvores.
Amanda olhou para á casa por um momento, atônita com o fato de que uma procura
que começara três meses antes terminaria ali, na rua Minnehaha, em Hiawatha,
Kansas... Desceu do carro e caminhou até a casa. Tocou a campainha.
Um minuto depois a porta foi aberta por uma mulher de mais ou menos trinta e
cinco anos, com cabelos pretos e curtos, rosto rosado e uma boca larga e carnuda. Parecia
ter se vestido especialmente para a ocasião, pois trajava uma saia de lã marrom e uma
elegante blusa bege, de náilon, com um grande laço solto. Ela sorriu.
— Você deve ser a Srta. Parr.
— Sim. E você é a Sra. Springer?
— Em pessoa. Entre, por favor.
Amanda entrou em uma pequena mas aconchegante sala decorada para as festas
de fim de ano, com uma árvore de Natal encimada por um anjo prateado.
Um homem estava sentado, lendo jornal, em uma confortável poltrona. Vestia uma
camisa branca leve e calça de lã. Era magro, mas.com um rosto agradável.

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— Jay, esta é a Srta. Parr, da agência de adoções — disse Betty. — Este é meu
marido, Jay Springer, Srta. Parr.
Amanda deu a mão ao homem, que a cumprimentou de um modo tímido e amigável,
e pediu:
— Por favor, chamem-me de Amanda.
— Neste caso, chame-nos de Betty e Jay. Aqui, Amanda, sente-se no sofá. É o lugar
mais confortável.
Ela sentou-se, sorrindo para ambos, tentando deixá-los à vontade.
— Fico contente por terem consentido esta visita, especialmente nesta época de
festas.
— É o melhor momento para visitas — disse Betty, sentando-se ao lado de Amanda.
— As pessoas estão imbuídas do espírito de Natal. Ou pelo menos, deveriam estar.
Jay concordou com a cabeça.
— Numa bela cidade como a sua tenho certeza de que o espírito de Natal é mais
profundo do que nas grandes metrópoles, Betty — disse Amanda.
— De onde você é, Srta... Amanda?
— Los Angeles. Long Beach, atualmente.
— Você fez toda essa viagem apenas para nos ver? — perguntou Jay.
— Sim. Em geral, não é costume das agências acompanhar a vida das crianças
depois de adotadas. Mas no casos de vocês, pensei que seria bom checar a situação, pois
conheci o pai natural de Laura recentemente nos Estados Unidos e encontrei a mãe dela
na Tailândia, numa viagem que eu fiz até lá.
Betty olhou preocupada para Amanda.
— Eles não mudaram de idéia, não é? Ou vão querer Laura de volta?
— Oh, não, não é nada disso!
— Mas querem saber como Laura está?
— Exato. Ambos reconhecem que Laura jamais poderá fazer parte da vida deles,
mas gostariam de certificar-se do bem-estar da menina.
— Então você quer apenas reunir informações para garantir a eles que Laura está
bem?
— Este é um dos propósitos da minha visita; tenho também interesse profissional
em ver como as crianças amerasiáticas se desenvolveram e adaptaram depois de tanto
tempo no nosso país. Posso fazer algumas perguntas sobre Laura?
— É claro — respondeu Betty.
— A minha maior preocupação sempre foi entender como uma criança mestiça se
sente à medida que envelhece. Creio que Laura é única numa comunidade como esta.
Ela teve, ou tem problemas de relacionamento com as pessoas daqui?
— Bem, Hiawatha não tem padrões modernos como as grandes cidades, mas a
maioria das pessoas são decentes. No meu modo de pensar, uma única pessoa diferente
é tratada de modo melhor que um grupo minoritário. Não tivemos problemas, Amanda.
Laura é tratada do mesmo modo que as outras crianças.
— Ou talvez melhor — completou Jay.
— Ela sempre foi muito popular entre as crianças. Tem tantos amigos quanto as
outras garotas da sua idade. Ou mais, posso dizer.

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— Isso é ótimo. Então ela é sadia e feliz?


— Oh, sim. Poderá ver logo mais. Ela está na casa de um vizinho. Queríamos
conversar antes com você.
— Fico contente com isso. O quanto Laura sabe do seu passado? Ela sabe por que
estou aqui?
— Contamos a ela tudo que sabíamos sobre a sua origem, o que não é muito. Para
ser honesta, achávamos que seu pai era desconhecido. Quando a Srta. Wagner disse que
ele morava na Califórnia, foi uma surpresa.
— Para ser sincera, a história toda só foi esclarecida nos últimos meses. O pai
desconfiava que a mãe tinha tido um filho, mas estiveram separados durante a guerra,
e apenas recentemente ele teve certeza de que a criança era mesmo sua — explicou
Amanda.
— Não dissemos a Laura que sabíamos quem é seu pai e que ele vive na Califórnia.
Pensamos que ela é muito jovem para lidar com isso — Betty olhou para Jay. —
Discutimos o assunto, mas ainda não decidimos quando dizer a ela toda a verdade.
Provavelmente quando for velha o suficiente para decidir por si mesma se e quando vai
querer conhecer o pai.
O coração de Amanda saltou. Já esperava por essa reação, e achava que era a
melhor possível, mas continuava querendo que Buck pudesse ao menos ver a filha.
Resolveu arriscar e disse:
— O pai de Laura quer vê-la, é claro, mas ele sabe que a decisão é toda,de vocês.
— Achamos que Laura ainda é muito jovem para isso, Amanda.
— Eu entendo.
— Imaginamos que isso poderia ocorrer — disse Betty — e selecionamos algumas
fotos de Laura, pensando que ele poderia gostar de vê-las.
Betty levantou-se e foi até a mesa de jantar, pegou um envelope lacrado e entregou-
o a Amanda.
— É muita atenção e consideração de sua parte. Obrigada. — disse Amanda, tocada
pelo gesto.
— Há espaço para que outras pessoas, além de Jay e eu, amem Laura.
— O pai vai gostar das fotos, tenho certeza.
— Não sabemos se a mãe também está interessada, mas você pode lhe mandar
algumas fotos, se quiser.
— Farei algumas cópias — disse Amanda, lembrando-se da sua promessa a
Dameree.
— Gostaria de ver o quarto de Laura? Pode ser melhor agora do que quando ela
estiver aqui, pois você sabe como as garotas de treze anos são tímidas quando se trata
de mostrar o seu "mundinho particular".
Betty levou-a por um corredor até um quarto típico de uma adolescente americana.
Havia posters de cantores de rock na parede e animais de brinquedo e bonecas sobre os
móveis, numa clara indicação de que Laura estava no ponto crítico entre a infância e a
idade adulta.
Pendurado num cabide na porta do quarto, havia um traje de bale.
— Soube que Laura gosta de música e dança. Esta é uma das suas roupas? —
perguntou Amanda.

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— Sim. Ela está ensaiando uma apresentação na escola. Será esta tarde.
— Betty fez a roupa para Laura — disse Jay do corredor. A mulher tirou o traje do
cabide, mostrando-o a Amanda, claramente orgulhosa.
— É lindo, Betty. Soube que você é costureira.
— Sim, em geral faço coisas especiais, como vestidos de noiva.
Ela voltou a pendurar a roupa e olhou para o marido.
— Por que você não liga para os Ducketts, Jay, e. chama Laura para conhecer
Amanda?
Ele foi telefonar enquanto as mulheres voltavam à sala. Pouco depois a porta de
entrada abriu-se e Amanda viu entrar uma bela garota de cabelos negros e lisos que
vestia um grosso casaco vermelho. Ela sorriu timidamente para Amanda, mostrando o
aparelho nos dentes. Era bonita, tendo reunido o melhor das duas raças. Sua cor era
branca como o leite, e seus olhos, amendoados, eram negros como os da mãe.
— Laura, querida — disse Betty, — esta é a Srta. Parr, da agência de adoção, da
Califórnia.
— Olá — disse a garota, embaraçada.
— Olá, Laura. Estou muito contente em conhecê-la. Amanda descobriu-se olhando
a garota com os olhos de Buck.
— Tire o casaco e sente-se conosco — disse Betty. Obediente, Laura sentou-se no
sofá, entre as duas mulheres.
— Soube que você vai se apresentar num bale, hoje à noite — comentou Amanda.
— Sim, vamos dançar o Quebra-Nozes — respondeu Laura.
— Que ótimo. Que papel você vai dançar?
— A Fada dos Doces.
— Laura estuda bale há seis anos. Seu professor disse que ela é uma das melhores
alunas que já passaram pela sua academia de dança — explicou Jay, orgulhoso.
— Isso é maravilhoso! — comentou Amanda, tocando a mãe da menina.
Sentiu-se ansiosa, imaginando o que significaria para Buck estar ali naquele
momento.
Conversaram por mais alguns minutos, e então Amanda resolveu ir embora.
Agradeceu aos Springer pela gentileza, cumprimentou Betty por sua bela casa e disse a
Laura:
— Boa sorte,hoje à noite.
— Obrigada, Srta. Parr.
— Você vai voltar a Kansas City hoje? — perguntou Betty.
— Não, provavelmente vou amanhã de manhã.
— Gostaria de assistir ao espetáculo? Será no colégio, na região leste da cidade.
Amanda viu no convite a possibilidade de Buck ver a filha e não resistiu.
— Estou viajando com o meu noivo. Seria possível levá-lo também?
— Claro, se ele puder pagar o preço da entrada, que custa cinco centavos...
Todos riram e Amanda despediu-se finalmente, emocionada com o fato de que Buck
finalmente veria Laura, mesmo que apenas num palco. Correu para o hotel, onde ele
continuava na cama vendo TV num tal nível de ansiedade que nem sabia quanto estava
o jogo de futebol ao qual assistia.

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Chegaram cedo ao auditório do colégio, desejando pegar um lugar perto do palco,


mas o teatro já estava meio cheio e tiveram que ficar no meio da platéia.
O auditório lotou; havia no ar a habitual tensão antes de um espetáculo, e
finalmente as cortinas se abriram..Ambos esperaram com impaciência pela cena em que
a Fada dos Doces apareceria pela primeira vez.
E então Laura surgiu no palco, vestindo a roupa que Amanda vira durante a tarde.
Estava linda, uma pequena mulher cheia de graça juvenil. Amanda olhou para Buck,
que fitava fixamente o palco, como se presenciasse um milagre.
Quando a cena terminou e Laura deixou o palco, Amanda olhou novamente para
Buck. Seus olhos estavam cheios de lágrimas e, pela primeira vez, ela teve realmente
consciência do presente que acabara de dar a ele.
Quando o bale chegou ao fim, a audiência moveu-se lentamente para fora do teatro.
Buck e Amanda juntaram-se ao grupo que saía quando ouviram uma voz chamar:
— Srta. Parr!
Amanda virou-se e viu Betty Springer, num brilhante vestido vermelho, vindo na
direção deles. Jay estava com ela, num terno azul com gravata.
— Você viu Laura? — perguntou a mulher com o rosto resplandecente de orgulho.
— Sim, ela estava sensacional! — elogiou Amanda.
— Não estava linda na roupa que Betty fez? — perguntou Jay.
— Maravilhosa, absolutamente maravilhosa. E agora... Betty e Jay, quero que
conheçam meu noivo, Buck Michaels. Buck, estes são os pais de Laura, Betty e Jay
Springer.
— Gostou do bale, Sr. Michaels?
— Muito. Sua filha é uma grande bailarina, Sra. Springer.
— Sei que parece orgulho de cidade pequena, mas os garotos atuaram muito bem,
não acha? — indagou Jay.
— Para a idade deles, fizeram um excelente trabalho — replicou Amanda — foi um
projeto muito ambicioso.
Um breve e desajeitado silêncio se abateu sobre o grupo.
— O senhor está de férias, Sr. Michaels? — perguntou Betty, de repente.
— Sim, e Amanda me convidou para vir junto. Eu já conhecia Kansas City, mas
nunca tinha vindo para Hiawatha.
— Não há nada por aqui além de fazendas — disse Jay. — A produção toda desta
região é basicamente agrícola.
— Me pareceu uma área de plantio de milho — notei isso quando passamos pela
estrada.
— Sim, nós somos a "terra do milho". Há bastante chuva por aqui, e o milho cresce
muito. Milho e alfaia.
— Ah, ali está Laura! — exclamou Betty, interrompendo a conversa dos homens.
Os quatro viraram-se na direção do palco, observando a garota caminhar na direção
deles.
Amanda olhou para Buck, que tinha os olhos fixos na menina, e sentiu uma
pontada de temor; agora que os dois estariam frente a frente, algo poderia sair errado.

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

Olhou para Betty e notou que ela também percebera algo na expressão de Buck, mas a
mulher disfarçou e virou-se para a filha.
— Você esteve magnífica, Laura querida! — elogiou a mãe.
— Uma grande atuação — disse Jay, tocando o ombro da filha.
— Obrigada, mamãe! Obrigada, papai!... Oh, olá, Srta. Parr!
Amanda apertou a mão da garota:
— Congratulações pela sua atuação brilhante. Você estava linda!
— Obrigada, Srta. Parr. Fico contente que tenha gostado.
— Laura, quero que conheça meu noivo, Buck Michaels.
— Olá, Laura — disse Buck, estendendo a mão.
A garota hesitou, e então pôs sua mão na dele. Amanda olhou para Betty, que
mostrava na face um toque de alarme. Seria medo de um estranho ou a mulher
percebera algo?
— Você esteve incrível — elogiou Buck. — Nunca tinha visto o Quebra-Nozes tão
bem executado, nem com uma bailarina tão sensacional.
Laura virou-se para seus pais, corando de orgulho. Betty pôs um braço ao redor do
ombro da filha, mas seus olhos estavam em Buck. Ele não notou, pois toda sua atenção
se voltava para a menina.
— Você vai ser uma bailarina quando crescer, Laura? — perguntou Buck.
— Gosto muito de dança, mas é preciso ser realmente boa para fazer disso uma
profissão. Eu penso em ser escritora.
— É um bom trabalho. Conheço um pouco do assunto, pois trabalho num jornal.
Talvez você seja uma repórter, um dia.
— Isso deve ser divertido,
Buck olhou para os pais de Laura e notou as linhas de tensão no rosto deles. Laura
também pareceu perceber a tensão que pairava no ar e, sorrindo sem graça, começou a
se despedir:
— Com licença, tenho que voltar para o palco para tirar umas fotos. Mãe, pai,
esperem por mim aqui, por favor. E... tchau, Sr. Michaels. Tchau, Srta. Parr. Foi um
prazer conhecê-los.
— Também gostamos de conhecê-la — retrucou Amanda.
O rosto de Buck estava cheio de emoção, e Betty parecia tão preocupada com isso
quanto Amanda. Mas a única reação que ele teve foi sorrir enquanto a garota se virava
e voltava para o palco.
Amanda sentiu seu coração bater na garganta. Betty encarava Buck, que tinha os
olhos presos na menina, acompanhando-a até que ela saiu do auditório. Pela expressão
no rosto de Betty, Amanda soube que tudo havia desmoronado.
— Sr. Michaels — disse Betty, por fim, com a voz trêmula. — O senhor é o pai de
Laura, não?
Buck olhou ansioso para Amanda. Por um instante, fixaram os olhos um no outro,
sem se moverem, dominados pelo espanto e pela incerteza.
Jay mostrou-se irritado.
— Mas que droga! Tínhamos combinado que... A mulher segurou o braço do marido,
acalmando-o.

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Superomance 60 - Lua de Lótus - Janice Kaiser

— Está tudo bem, Jay. — Ela voltou-se para Buck. — Compreendo o que fez, e sou
grata por não ter dito nada a Laura. Não foi fácil, eu sei.
Os olhos dela, assim como os de Buck, estavam marejados.
— Obrigada — continuou a mulher —, obrigada por deixar Laura conosco. Um dia,
talvez, Laura possa saber que você é o pai dela.
Betty terminou de falar e voltou-se para o marido, em silêncio. Ele deu a mão a
Buck e cumprimentou Amanda com a cabeça. Tomou então o braço da esposa e saíram
do teatro.
Quando Buck e Amanda saíram na noite fria de dezembro, havia blocos de neve no
ar. O estacionamento da escola estava uma confusão de carros saindo. Buck, tomando a
mão de Amanda, conduziu-a em outra direção.
— Vamos andar um pouco?
Passaram por um prédio e uma área aberta, cercados pela neve. Abraçaram-se.
Andaram em silêncio até chegarem a um campo de futebol. Buck olhou para cima, para
a noite, inspirando profundamente o ar cristalino.
Amanda perscrutou o rosto de Buck, que tinha nos lábios um meio sorriso.
— Não foi maravilhoso conhecê-la? — sussurrou ela.
— Sim. Era o que eu precisava.
— Sente-se melhor, agora?
— Muito melhor, como se todo o peso do mundo tivesse sido tirado dos meus
ombros.
— Estou contente por termos vindo, por você a ter visto.
— Foi um presente maravilhoso, Amanda. Serei sempre grato a você por isso.
— E o que pretende fazer agora, Buck?
— Creio que seria uma boa idéia oferecer a Betty e Jay um fundo para ajudar na
educação de Laura, se eles aceitarem a idéia.
— Tenho certeza de que aceitarão. Querem o melhor para a filha deles, como bons
pais.
— Sim, posso dizer que são ótimas pessoas.
— Então está contente com a situação de Laura?
— Sim, muito — disse Buck, beijando-a nos lábios. Quando o beijo terminou,
Amanda abriu os olhos e viu que ele estava feliz. Mas havia algo de estranho em sua
expressão.
— O que foi, Buck?
— Durante todo o ano passado, quis encontrar Lua de Lotus mais do que qualquer
outra coisa. Embora esteja feliz com você agora, e mesmo te amando como amo, isso foi
uma terrível prova para mim, Amanda.
— Sim, eu sei...
Amanda abraçou-o, adorando sentir o calor do corpo dele contra o seu.
— Oh, querido, eu te amo tanto...
— Amanda, querida... você quer se casar comigo?
— Oh, Buck! — exclamou ela, beijando-o com ardor. — Sim, Buck! Oh, sim!

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Os dois riram e, abraçados, começaram a girar, lentamente a princípio, depois cada


vez mais rápido, até ficarem com vertigens e sem fôlego, e suas risadas ecoaram no ar
cristalino da noite.

FIM

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