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918.1.S725 C.

1
O Cear a no come co do
Stanford University Libraries

3 6105 048 666 387


The Branner Geological Library

LELAND STANFORD JVNIOR- VNIVERSITY


918.1

5725
In or Joe hay racktite ,

Cearn , My 191

O CEARÁ b
76

NO

COMEÇO Do seculo XX

POR

THOMAZ POMPEO DE SOUSA BRASIL

Presidente da Academia Cearense e Instituto do Ceará ; vice dire-


ctor da Faculdade Livre de Direito do Ceará, lente de
economia politica na mesma faculdade, lente em
disponibilidade da Escola Militar do Ceará ,
lente aposentado do Lyceu do Ceará,
socio do Instituto historico da
Bahia, etc.

FORTALEZA

TYPO-LITHOGRAPHIA A VAPOR
Rua Barão do Rio Branco--68
1909
211572
r

PREFACIO

Proponho-me, nas paginas que se vão lêr, expôr as con-


dições physicas, economicas e moraes do Estado do Ceará,
baseado em estudos pessoaes e informações escrupulosamente
recolhidas no proposito de apurar a verdade.
A forma que dei a este trabalho é, porventura, nova, mas
as investigações concernentes ao modelado do sólo nos seus li-
neamentos geraes - aspecto e physionomia propria- datam de
longos annos e foram feitas por uma serie de observadores sa-
gazes, cautos e veridicos .
O resultado dessas investigações, condensado até 1862 no
extenso e consciencioso Ensaio Estatistico da Provincia do Ceará,
do Senador Thomaz Pompeo de Sousa Brasil, publicado na-
quelle anno, precisava ser ampliado, completado, posto em dia
pelas que se lhe seguiram.
Uma vista synthetica, mostrando a interdependencia dos
differentes phenomenos physicos, conjugados em acção recipro-
ca, tal como - o territorio, suas modalidades, accidentes e as-
pectos, o clima e a sua influencia immediata sobre a physiono-
mia da paisagem, e recursos vegetativos da terra, isto é—o con-
juncto da vida physica peculiar a região cearense, exigia a
refundição ou o retoque dos trabalhos anteriores.
Nesses ultimos quarenta annos o numero daquelles inves-
tigadores augmentou consideravelmente, e grande parte dos
seus trabalhos foi dado a publicidade nas revistas do Instituto
do Ceará, e da Academia Cearense.
Contorno maritimo, ourela arenosa de dunas, taboleiros
IV

sertanejos, serras e serrotes de altura mediana, ravias flexu-


osas, feição vegetativa de cada um desses trechos do sólo, em
estações differentes do anno - foi o que procurei descrever, tão
real e verdadeiramente quão suggestivos foram os factos que
serviram de documentação.
Ao problema capital do nordeste brasilico, isto é -o da in-
stabilidade ou irregularidade das chuvas na estação propria -e
meios de corrigir ou minorar os seus effeitos economicos - de-
diquei a mor parte deste estudo.
Os que o compulsarem comprehenderão os intuitos que me
levaram a minuciar factos, e nelles insistir, sobre as medidas
apresentadas como attenuantes aus effeitos desastrosos e anti-
economicos das seccas.
Excluida a sentimentalidade, produzida pela feição im-
pressionante das crises climatericas, que se reproduziram ami-
ude nos ultimos trinta annos, por falsear o juizo sereno no seu
estudo, tentei provar com exemplos de regiões topogra-
phicas e climatericas analogas, senão identicas, as do Ceará,
que os meios até hoje empregados, racional e praticamente,
consistiram em aproveitar as proprias dadivas de clima, com o
amanho do sólo para recolher-lhe os beneficios.
O registo das chuvas, cahidas por espaço de 60 annos,
demonstrando que sua media annual se eleva no littoral a 1.400
millimetros, e no sertão a 800, comprova irrefragavelmente que
a zona cearense ao em vez de ser um fragmento do Sahara, este-
ril, secca, impropria a vegetação tropical e a habitação humana.
é uma das mais favorecidas pelos agentes atmosphericos elabora-
dores da vida vegetal e animal. E se assim não fôra, mal se ex-
plicara o desenvolvimento excepcional da população cearense ,
cuja densidade kilometrica , após tão repetidos exodos e desas-
tres climatericos, occupa o quarto lugar entre os 20 Estados da
União brasileira, tendo conquistado o segundo no censo de 1872 .
Completar a acção dos phenomenos meteorologicos por
meio de obras que reprezem as grandes massas dagua que em
breves dias ou poucos mezes se despejam das nuvens no sólo,
e se vão lançar improficuamente no mar ou com minguado
proveito para lavoura, deve ser o objectivo dos poderes publi-
cos, interessados em fomentar as fontes de riqueza desta região ,
e minorar os esmagadores encargos, que lhes traz cada uma
daquellas crises.
V

Não se trata de serviços custosos, superiores as forças or-


dinarias da nação, nem de panaceas ou remedios desconheci-
dos, senão de obras maduramente estudadas, adoptadas ou exe-
cutadas com proveito immediato na India ingleza, Egypto, Al-
geria, Espanha e Estados Unidos da America do Norte. Refiro-
me aos grandes açudes com a capacidade necessaria para re-
presarem centenas de milhões de metros cubicos dagoa, e
resistirem a evaporação annual, e as seccas, proporcionando a
milhares de hectares, de excellentes terras, a humidade necessa-
ria, na quadra vegetativa mais conveniente, e a preço modico,
que permitta ao lavrador tirar da irrigação o maximo proveito .
A dispersão dos recursos orçamentarios em pequenas obras,
em açudes minusculos que a evaporação põe a secco ou reduz a
insignificante massa dagua, em poços custosos que não irrigam
sequer 3 a 4 hectares de terra, é mais do que um desacerto por
importar em obstinação criminosa contra a evidencia dos factos.
Por outro lado, as estradas de ferro de penetração, só por
si, desacompanhadas de agentes que fomentem a producção
agricola, arrastar-se - hão penosamente, com oscillações maca-
breas nas receitas, soffriveis em annos pluviosos regulares, más
nos de chuvas inconstantes, e se converterão em pesado encargo
para o thesouro nacional, desilludido de melhor futuro.
O capital, que alenta as industrias, em particular a agri-
cola, cujo predominio nesta parte da America será talvez secu-
lar. não achando amparo na renda da terra, sujeita a ruinosas
variações climatericas, retrahir - se-ha , deixando por assim dizer
inculta a zona nordeste brasileira, a debater- se nas alternativas
de annos abundantes, ferteis, e outros de esterilidade e miseria ,
sem dar um passo seguro e decisivo para a cultura methodica
racional do sólo.
No primeiro volume do Ceará no seculo XX reuni e con-
densei grande copia de informações tendentes a solução deste
magno problema, e pondo de parte a legitima satisfação de
quem a na a patria, não com amor platonico, ordinariamente
infecundo, mas com o pensamento sempre voltado para as suas
necessidades della, creio haver trasido ao conhecimento do pu-
blico maior somma de factos sobre esse assumpto do que outro
qualquer contemporaneo ou antecessor.
Não me for dado tirar todo o proveito dos dados reunidos,
já por terem vindo ao meu conhecimento- uus fragmentados e
+

VI

outros tardios, já pela brevidade com que escrevi este trabalho,


concluido desde Junho do anno findo, na esperança de ser
presente a exposição do Rio de Janeiro.
E' um mero ensaio, material um tanto informe, que mais
tarde, poderá servir de alicerce a um edificio util ao Ceará .
Tal como está, representa apenas os bons desejos que me ani-
maram de prestar minguado serviço a minha terra natal, mos-
trando-a tal qual é, ou virá a ser proximamente, mediante o es-
forço humano, e a acção methodica dos poderes publicos.

TH. POMPEO

Fortaleza, Dezembro de 1909.


PARTE PHYSICA

POSIÇÃO ASTRONOMICA . - Não accordam os autores


sobre a posição astronomica do Ceará. O Senador Pompeu, na
Estatistica do Ceará, dá 2° 45'- 7° 11' de latitude meridional,
e 2° 30' - 6º 40 de longitude oriental do meridiano do Rio de
Janeiro.
Dão as cartas de
LAT. MERID. LONG. ORIENT. DO RIO
Paulet 2° 45'-7° 40′ 1° 18'- 6° 13'
Conrado (comp . ) 3° 5' -7 ° 19′ 2° 30′ - 6° 26'
(geral) 2° 45'-7° 11' 2° 30'- 6° 24/
Theberge 2° 45 ′--7° 35' 1° 55'- 6° 7'
Villiers 2° 58' - 8° 24' 0º 6 ' 5° 48′
H. de Mello 29 48-7° 47' 1° 47'-5° 50'

LIMITES. E' limitado ao N. e a NE. pelo Atlantico ; a


L. pelo Rio Grande do Norte ( 1 ) : ao S. pela Parahyba e Per-
nambuco, e a O. pelo Piauhy (2 ) por uma linha que, partindo
da barra do Timonha, situada a 20 5 46 ″ de latitude meri-
dional e 20 8' 7" de longitude oriental do Rio de Janeiro, se-

(1) Ha contestações entre o Ceará e o Rio Grande do Norte


relativamente aos limites dos dous Estados na parte da fregue-
zia do Pereiro que extrema com a do Páu-Ferro : bem como
a da posse de Grossos, a margem do rio Mossoró .
(2) Os limites com o Piauhy pela serra de Ibiapaba não
estão bem demarcados. A lei nº 3.012 de 22 Outubro de 1880 ,
que annexou ao Ceará o termo de Cratheús traçou a linha di-
visoria, aliás pouco precisa.
6

gue pelo rio S. João da Praia acima até a barra do riacho, que
vai para Santa Rosa, e dahi em rumo direito á serra de Santa
Rita até o pico da serra Cocal, termo do Piauhy, continuando
pela Serra Grande ou de Ibiapaba até a dos Cariris Novos,
onde o solo deprime- se para, com o nome de Serra do Araripe,
Já a SO., limitar-se com Pernambuco.
DIMENSÕES .- O litoral é bastante desenvolvido : mede
cerca de 700 kilom., desde a foz do Mossoró á do Timonha.
Deste ponto, pela Serra Grande, até a parte mais meridional
(7° 11') cerca de 1100 kilom., e dahi até Mossoró 600 kilom .
SUPERFICIE. -Variam as avaliações. O Senador Pompeu
dá- lhe 4681 leguas quadradas, o naturalista Silva Feijó 6 a 7000
leguas quadr.. Millet, no Dicc. Geogr. do Brazil, 4600 , corres-
pondente a 200736 kilom. quadrados : o Dr. José Joaquim de
Oliveira 3625, tomando por base a carta chorographica de Con-
rado (equivalente a 111,940 kil. quad. ), Villiers 3704, o Dr. Vi-
riato de Medeiros 5475, o calculo da carta geral 104.250
kilom. quadr. Depois destas avaliações o Ceará adquerio o vas-
to territorio de Cratheús, que anteriormente pertencia ao Pi-
auhy. E' provavel que a superficie actual do Ceará exceda de
120.000 kilom. quadrados.

CONFIGURAÇÃO DO SOLO

A configuração do Ceará é a de um triangulo agudo , de


lados desiguaes, tendo por vertice o Jardim ao S., e por lados
as linhas montanhosas ou de elevações que deste ponto vão ter
ao Mossoró a L. , e ao Timonha a O. A cordilheira circular,
que o envolve, ergue-se, na orla occidental da Serra Grande, em
forma de muralha, de penoso acceso até o boqueirão do Poty,
proseguindo para o sul com mediocre elevação até as ver-
tentes dos Bastiões, onde a serra baixa consideravelmente para
tornar a erguer-se com o nome de Araripe, ao S. No Jardim
morrem os contrafortes do Araripe, que se deprime para dei-
xar passar o riacho dos Porcos, sub-affluente do Jaguaribe .
Pela margem direita do Rio Salgado as serras do Camará e Pe-
reiro apertam a bacia do Jaguaribe, cujo declive rapido e
alcantilado envia apenas alguns pequenos tributarios ao gran-
de rio. O solo é geralmente accidentado a S. L. e O. , descen-
do gradualmente para o litoral en forma de taboleiros mais
7

ou menos extensos, alternados por serrotes seccos e graniti-


cos. No planalto, limitado pelas serras do Araripe e Gran-
de, a altura acima do nivel do mar é de 430 metros no - Crato :
612 em Brejo Secco, 500 no Tauhá. A descida para o litoral
faz--se, a principio, rapidamente, de sorte que á 100 kilome-
tros do Crato, no rio Jaguaribe, a differença nivelar é de 200
metros, de 300 no rio Bastiões a 50 kilometros do Brejo Secco,
e depois mais docemente, desde o Jaguaribe ao litoral, con-
servando o solo certa horisontalidade, com declives que va-
riam apenas de 40 a 50 metros por espaço de 200 kilom. A orla
maritima, bem que baixa, não é pantanosa, nem completa-
mente alagadiça, salvo na embocadura de alguns rios, como
a do Jaguaribe, Choró, Ceará, Curù, Acarahú, etc.

LITORAL

Extende - se da foz do rio Mossoró ao Timonha, por cerca


de 700.000 metros. E' geralmenté arenoso, formado de medões
de areia, que se movem e deslocam conforme os ventos rei-
nantes. Essas dunas apparecem ao norte do rio Mossoró, onde
se erguem de alguns metros acima do nivel do mar, até a
barra do Jaguaribe, cujo canal de navegação muda de fundo,
aterra-se em alguns logares á acção das areias movediças. Ao
norte do Jaguaribe, e por alguns kilometros, a costa abate-
se, alaga-se nas marés de aguas vivas, que destroem os comoros
de areia, ou levam n'os mais para o norte, onde se erguem a
grandes alturas (60 a 80 metros) em forma de monticulos, cujas
bases são, as mais das vezes, banhadas por essas marés. Em
alguns sitios, como na orla costeira entre Cascavel e Aqui-
raz, e ao norte da Fortaleza, no Cauhipe, etc., as barras
de alguns rios estão obstruidas, formando lagunas, mais ou me-
nos profundas, como as do Catú, as Capangas, a do Cauhipe,
etc. A nordeste do Estado , em face ao rio Acarahú, os como-
ros de areia foram em parte carreados pela corrente, deposi-
tados no mar, do qual emergem em baixios extensos, propicios
á pesca. A baixada intermediaria, entre as dunas e a praia, é
completamente esteril, alagadiça, impropria para cultura agri-
cola : nella estão as salinas. A que se extende para o centro,
arenosa, do outro lado destas, se intromette as vezes por al-
guns kilometros pelas terras argilosas que formam os valles,
outras seguem o curso das correntes, acompanhando a horison-
talidade do solo . Nellas medram as plantações de algodão ,
milho, feijão, canna de assucar e de muitas arvores fructiferas.
Banhada pelos ventos humidos do litoral. formada de argila
e silica, na sua maior parte, presta-se admiravelmente a estas
culturas, com especialidade a do algodão, chamado herbaceo,
especie de longa seda ou sea island da Georgia (E. Unidos).
O Dr. Katzel ( 1 ) descreve o litoral nos seguintes termos :
"A região das "praias" na contextura de sua paizagem,
pelo menos na parte central dos 700 kilometros, mais ou menos,
que formam o Actiun atlantico do Ceará, differe não pouco
das costas dos Estados que demoram mais ao norte, pois a
guarnição de mangues ou fallece de todo ou está mui parca-
mente desenvolvida.
"A costa é geralmente aberta, o terreno e a arrebentação
tão fórte, que particularmente nas vasantes, mesmo pequenos
bótes não pódem atracar, e pessoas e frétes têm de ser carre-
gados para terra.
"Porto soffrivel não possue infelizmente. (2 ) Ao longo
da costa estira-se um paredão de dunas, que as vezes alcança
á altura de 10 metros. Pelo lado do mar defronta este pare-
dão uma praia esteril e arenosa que attinge largura conside-
ravel nas barras de rios. Nellas, particularmente nas cercanias
de Aracaty, no rio Jaguaribe, existem salinas, nas quaes sem
trabalho, graças á evaporação natural, se produz quantidade de
sal de cozinha. Tambem as dunas em sua parte interior, até
onde a maré alcança, não tem vegetação. Os comoros de areia
que o vento ajunta no terraço inferior, apparecem, entretan-
to, nas planicies mais extensas, raiadas de gramma resistente,
moitas e troncos de cactus . A superficie do paredão de du-
nas é a trechos algo humosa, e aqui póde haver até pobres
roças. As propriedades mais frizantes, porém, das praias são
esterilidade e monotonia. Bem diverso é o aspecto das baixas

( 1 ) Frid . Katzer no Globus de Brunschweig, Julho de 1902.


(2) O illustre geologo austriaco, labora em erro por desco-
nhecer o porto de Camocim, um dos melhores da costa septen-
trional do Brasil.
9

frescas que se seguen ás praias, e o destas fazem ainda par-


te das tarras de rios . São de dupla origem estas baixas.
"De facto, do lado interno do paredão das dunas, a plani-
cie é inundada em vastas extensões por chuvas, e aqui, duran-
te a maior parte, ás vezes durante o anno inteiro, conservam-
se lagoas ou alagadiços, encantoados em terreno verdejante.
Existem aqui extensas plantações , principalmente de canna e
fumo, legumes e fructas, assim como grandes cajueiros, de
cujo fracto succulento se extrae o vinho apreciado. Ha aqui
vastas pastagens, cobertas de moitas e arvoredo, atravessadas
de renques de palmeiras, animadas de consideraveis rebanhos
de gado. Esta baixada fresca avança com interrupções ao lon-
go de toda a costa e penetra para o interior 10 a 30 kilo-
metros".

VALLES

"De conformação semelhante, porém mais ferteis ainda.


são as varzeas das barras de rios, particularmente no Jagua-
ribe.
"A rigor o Ceará não possue corrente constante que se
possa chamar rio ; possue apenas valles numerosos que em tem-
po de chuva se enchem de agua, e no verão se dissolvem em
tanques e poços, e não tardam a seccar de todo.
"Nos cursos inferiores e nas barras onde a agua do mar
represa a agua doce , é onde mais dura , como facilmente se com-
prehende, a humidade do solo . Aqui se acham tambem as mais
bellas plantações de algodão, fumo, canna, milho. etc.. e os
terrenos não cultivados assignalam-se tambem pela roupagem
exhuberante.
"A trechos nessas varzeas verdejantes desenrolam -se qua-
dros de belleza arrebatadora, em que cabe parte saliente á
Carnaúba (Corypha ceryfera) que se levanta áquem salteada ,
além em carnaúbaes a perder de vista.
"Esta baixa palmeira da leque, passa pela arvore mais
util do Ceará e ha disposições legaes para protegel-a .
"Além da preciosa cêra que fornece, dá tambem tronco,
raizes, fructos e folhas, para empregos industriaes". (1 )

( 1) F. Katzer— Obra citada,


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O engenheiro J. J. Revy, commissionado pelo governo


geral para estudar os locaes mais apropriados a construcção
de grandes açudes, exprime- se nestes termos em relação ao
valle do Jaguaribe : (1 )
"Ao longo do curso deste importante rio a formação geo-
logica varia frequentemente, e dá ao valle aspectos mudaveis
e differentes ; assim, em algumas partes, as margens do rio
formam por cem ou mais kilom . desfiladeiro continuo de col
linas rochosas, com constantes elevações e quédas de super-
ficies de terreno, e o canal do rio é cortado na rocha solida ;
emquanto que em outros cem kilom. as margens do rio são
formadas de ricas planicies alluviaes com espessas camadas
de depositos ; os outeiros e montes retiraram-se a muitos kilom.
das margens e o canal do rio é cavado na areia, sem vestigio
de rocha em parte alguma.
"As grandes planicies do valle estão situadas entre Araca-
ty e a cidade do Limoeiro, estendendo- se mesmo alem até um
logar denominado Boqueirão do Cunha, a 150 kilom. do Ara-
caty. Formam uma superficie ininterrupta de terreno com a
largura de cerca de 10 kilometros em todo este comprimento.
Em dois terços, pelo menos, de sua area, são tão lisas estas
planicies como a superficie de uma mesa. A terra é formada
pelo mais bello solo de alluvião com a espessura media de 4
a 3 metros.
"Este deposito alluvial descança sobre areia limpa e gros-
sa , identica a do Canal de Jaguaribe, perto das ditas planicies.
Ha nesta parte do valle pelo menos 80.030 hectares de magni-
fieas terras planas, de riquissima qualidade, excepcionalmente
aptas para a agricultura superior, que será invariavelmente
garantida pela irrigação .
“Os declives desta planicie são brandos : não ha elevação
nem quéda perceptivel : sendo a media desta, entre o Boquei
rão do Cunha e o Aracaty de 1 em 2500. A partir do porto
do Aracaty, pelo valle acima, a sabida nos primeiros 15 kilom.
até a Passagem das Pedras é mu perena ; a superlcie do
terreno é ondulosa e occasionalmente arenosa ; a elevação ge-
ral da terra é de 5 a 6 metros acima do nivel do mar.

( 1 ) J. J. Revy -- Relatorio sobre o açude de Lavras.


11

"Depois de atravessar o Jaguaribe na Passagem das Pe-


dras começam as grandes planicies e estendem-se 100 kilom.
pelo valle acima, com a elevação uniforme de cerea de 1 em
2000, isto é, 1,2 metro por kilom .
“O centro da planicie acha-se perto da cidade de S. Ber-
nardo das Russas a 75 kilometros do Aracaty.
"Estas planicies são, portanto, favoravelmente situadas
para a cultura de productos agricolas, taes como algodão, assu-
car, fumo, etc., que o fertil solo, com soccorro de irrigação, pro-
duziria com abundancia.
"A superficie das ditas planicies está actualmente coberta
com um denso matto de carnahúba.
"Algumas pequenas nesgas de terra são cultivadas e sup-
prem as necsesidades immediatas da população. Uma pequena
superficie de terra é sufficiente para produzir o algodão, man-
dioca, assucar, milho, etc., para consumo interior , e em tem-
pos ordinarios estes productos se obtem com grande facili-
dade.

"As difficuldades nascem sómente quando as chuvas não


são regulares, porque a producção agricola destas planicies de-
pende inteiramente da regularidade das chuvas, visto que as
planicies não recebem humidade alguma de foutes.
"De facto, a sua formação natural exclue a possibilidade de
qualquer agua ou humidade chegar a sua superficie senão por
meio da chuva.
"O terreno alluvial destas planicies é principalmente com-
posto de barro e areia bellissima, e é quasi impermeavel ; sua
profundidade é de 4 a 5 metros, e elle descança sobre uma ca-
mada de areia.
"Todas as fontes passam, portanto, na areia embaixo do
dito deposito alluvial. Poços podem- se fazer em qualquer parte
destas planicies perfurando o dito deposito .
"No Boqueirão do Cunha, a 115 kilom. do Aracaty, termi-
nam as grandes planicies da bacia inferior do valle. A elevação
destas planicies no Boqueirão é de 50m , 66 acima do nivel do
. mar.
"Subindo o valle do dito Boqueirão, o canal do Jaguaribe
é logo limitado por uma serie de estereis e rochosas collinas ;
12

o leito do rio é em toda a parte rocha solida, com grandes es-


porões projectados, e por muitos kilom. acima do Boqueirão :
o canal do Jaguaribe é virtualmente uma continua cacho-
eira. Por toda a parte encontra-se rochedo na superficie do
terreno ; ha somente pouca vegetação e poucas e pequenas
arvores e arbustos. E' uma região selvagem de terreno rocho-
so e ondulado.
"Com excepção de alguma nesga de terra propria para
cultura, póde dizer- se que a extensão situada entre o Boquei-
rão do Cunha e a villa de Jaguaribe- merim, com a distancia
de 45 kilom. , é um deserto de rochedos , de nenhum valor
para fins agricolas.
"As planicies do Icó estão a 225 kilom. do Aracaty e
143m acima de nivel do mar , são situadas na confluencia dos
rios Salgado e Jaguaribe. As planicies do Icó tëm semelhan-
ça frisante com as grandes planicies do valle inferior do Ja-
guaribe em Russas e Limoeiro. Bem como estas, a sua super-
ficie é tão lisa como uma mesa, e extremamente fertil. O solo
é inteiramente formado de um rico deposito alluvial. A área
é de cerca de 10.000 hectares. No centro destas planicies está
a bella cidade do Icó, bem construida, com uma população
de 12.000 almas e importante commercio de algodão, couros,
assucar, etc. Não póde haver localidade mais favoravelmente
situada para a irrigação, porque ha ahi uma área considera-
vel de excellentes terras e grande população agricola, prompta
a utilisar estas planicies em qualquer extensão, uma vez que
a agua seja supprida para regar as suas plantações durante a
estação secca do anno.
"Deixando os campos do Icó e subindo o rio Salgado a
configuração do terreno muda rapidamente das planicies allu-
viaes para uma região selvagem de rochedos e montanhas ;
estas limitam o dito rio em ambas as margens até o boquei-
rão de Lavras, 50 kilom . da cidade do Icó. Nesta extensão o
canal do Salgado é em quasi toda a parte cortado em rocha.
Perto da Serra do Boqueirão o rio passa por uma garganta
chamada - Boqueirão de Lavras-, que divide esta serra en
duas montanhas separadas, a leste e a oeste do dito rio. A in-
clinação do valle do Salgado entre as planicies do Icó e o Bo-
queirão de Lavras é de 1 em 780 ; nivel do poço no dito bo-
13

queirão é de 207m acim do nivel do mar, na distancia de 275


kilom. do Aracaty."
Em relação ao valle do rio Satiá, em cujas nascenças foi
construido o açude de Quixadá, escreve ainda o Sr. Revy .
"A formação geologica deste districto é excepcional : den-
tro de poucos kilometros encontram-se montanhas pertencen-
tes a formações muito differentes ; as do granito verdadeiro
acham se juntas a outras compostas quasi todas de feldspa-
tho immediata a estas apparece a formação calcarea de ro-
cha densa e dura ; tambem se encontra junto marmore bran-
co e então uma variedade de formação de grés.
"O rio Satiá nasce em um planalto chamado "Livramen-
to" cerca de 30 kilometros acima de Quixadá, e correndo ao
longo da Serra do Estevão. recebe diversos grandes tributa-
rios até que, a uns 5 kilometros acima de Quixadá, passa en-
tre montanhas de rocha núa; que surgem de repente do valle
chato de depositos alluviaes. A bacia do valle do Sitiá é consi-
deravel e muito raza : no norte e noroeste é limitada por um
sertão embaixo de collinas ondulosas, cobertas por densa mat-
ta de sabiás e catingueiras ; a leste, sul e oeste é cercada por
altas montanhas ". ( 1 )
A configuração dos valles das principaes bacias hydrogra-
phicas cearenses obedece aos traços geraes bosquejados pelos
dous scientistas, cujas descripções ficam transcriptas.
Nas regiões superiores, montanhosas das quaes fluem o
Jaguaribe, com os seus grandes affluentes - Salgado e Baua-
buyú, o Acarahú e o Camocim, o curso fluvial abrio caminho
por encostas mais ou menos inclinadas, ora estreitas, cortadas
em ribanceiras a pique, como entre Arneiróz e Saboeiro, no
Jaguaribe ora em declives menos abruptos, embora apertados
entre collinas.
Nesta parte os valles são exiguos e formam como que um
canal de limitadas proporções, pouco apropriados a cultura
agricola.
Ordinariamente á acção carreante das chuvas, as encostas
destes valles ( estreitos ) estão desnudadas, e a não ser nas suas

(1) J. J. Revy- Reservatorio de Quixadá- relatorio prelimi-


nar apresentado ao conselheiro J. Antonio Saraiva- 1882.
14

quebradas inferiores, onde os obstaculos naturaes impediram


o escoamento rapido dos detrictos vegetaes para o leito do rio,
o solo endurecido é relativamente esteril, semelhante ao dos
sertões creadores
Na parte media e inferior dos valles, onde as enchentes
dos rios se espraiam e depositam o limo trazido das regiões
aleantiladas o terreno vegetal, humoso, é geralmente abundante
e rico, não raro de excepcional fertilidade .

SERTÃO

A poucos kilometros do litoral o solo torna-se argiloso ou


compõe -se de terrenos schistosos, decomposição de rochas pri-
mitivas, nos quaes predominam mica e feldspatho. A argila
vermelha ou amarella salienta-se nos valles e logares baixos,
nas encostas das serras, que se inclinam para as bacias dos
grandes rios. Em geral, de envolta com a argila, vêm se rochas
sedimentarias e granito, e nos baixios, levada pelas torrentes,
areia grossa proveniente da degradação do quartzo. Os seixos
rolados, os quartzitos são frequentes nos valles apertados ou
nas encostas de collinas e serrotes pedregosos. O aspecto de
sertão é pouco variado -á pequenas planicies, mais ou menos
visinhas dos rios, succedem-se as quebradas. ora em forma
de collinas alongadas, de argila, ora de serrotes baixos , emer-
gentes do solo em forma de lagedos .
Esses terrenos estão pela mór parte cobertos de hervanço,
de mimosaceas ou de capim rasteiro, e são apropriados á
creação do gado.
Aqui e ali, abrem-se clareiras, bordadas de arvores fron-
dosas e seculares, ou de carnahubal basto. Outras vezes , mes-
mo no coração do sertão, orla verdejante, de vigorosa pujan-
ça, que serpeia em planos inferiores, ao longo do curso dos
regatos ou pequenos rios, contrasta com o matagal baixo, en-
fesado, que limita a campina deslavada, sem vegetação na qua-
dra estival.
A margem do Jaguaribe, e em geral na de todos os rios,
os terrenos de alluvião, negros, pantanosos nos invernos co-
piosos, poeirentos no verão. alagam-se, muita vez por 4, 6, 8 e
mais kilometros de cada margem do rio .
15

Humedecidos pelas chuvas ou pelas represas [ açudes], pro-


duzem prodigamente todos os generos tropicaes.
Logo após as chuvas, quando as moscas varereiras e OS
insectos damninhos são varridos pelos ventos frios e seccos,
o gado pode nutrir-se socegadamente, abundantemente, adqui-
rindo corpulencia e gordura. O pasto em todo o seu vigor,
menos aquoso, offerece alimento são e vigoroso á creação .
Um brazileiro illustre, que muito viajou pelo Ceará e Per-
nambuco, o Dr. Silva Coutinho, dá -nos a seguinte descripção
que completa a do Dr. Katzer cuja transcripção segue a
daquelle .
"O sertão é o pampa do norte, a região do cactus, das
bromeliacéus e catingueiros.

"Mais rara que no agreste, a vegetação despe - se das fo-


lhas em grande parte durante o anno, conservando-se entre-
tanto verdes algumas especies . como o joaseiro , a catingueira,
o bonome e outras.
O terreno é mais secco que o do agreste, e durante o ve-
rão seccam os rios, conservando-se apenas alguns poços, onde
qualquer obstaculo impede o escoamento das aguas.
"O terreno é geralmente apropriado á criação de gados,
mas cultiva-se o algodão com grande proveito, e assim os le-
gumes necessarios ao consumo.
"Nos aunos de grande secca, a penuria é geral no sertão ;
morre o gado, principalmente por falta de alimento, e morre
tambem o homem extenuado em busca da vida, que lhe foge
com os recursos.

"Em cahindo as primeiras chuvas, o aspecto do paiz muda


completamente ; rapidamente desenvolvem-se os legumes, o ga-
do se avisinha das casas, abunda o leite e em breve amadure-
ce o milho e o feijão ; a felicidade é geral ; e o homem, es-
quecido das calamidades passadas e alegre no meio da abun-
dancia, não inveja a sorte dos habitantes das regiões mais fa-
vorecidas.
"Seccam os rios tão rapidamente, em consequencia de
achar- se o terreno quasi despido de vegetação . Nestas condi-
ções, caindo as chuvas directamente no solo, correm as agoas
16

para os rios, em quasi sua totalidade, sendo absorvidas pelo


terreno uma quantidade insignificante.
"Essa pequena camada, absorvida, conserva- se mais ou me-
nos inalteravel durante a epoca das chuvas, mas logo que
ellas cessam , evapora-se rapidamente, achando-se o terreno
exposto aos raios directos do sol. " [ 1 ]
"Paizagem que de todo contrasta com as varzeas ainda
verdejantes em tempo de secca, é o sertão, isto é, a planura
ondulada, a trechos coberta principalmente de gramas. de
moitas e arvores tortas semelhando steppes, que occupa a
maior parte do Ceará. Subindo gradualmente desde a baixada
littoranea. eleva-se no centro do Estado, nas cercanias de
Quixadá e Quixeramobim, a uns 150 metros acima do nivel
do mar. No sertão os extremos de clima exercem a maior acção
exterior.
"Mar verdejante em epocha de chuvas, o sertão se transfor-
ma na estação secca em deserto de areia e pedra, de effeito
tanto mais desconsolador quanto o aspecto arido de páos tor-
tos e arbustos destacados, joazeiros soltos que verdes se con-
servam apezar da secca infinita e ás vezes tambem de cactos
altos , semelhando columnas, rematando em flores vistosas,
"Ao sul do Ceará, nas divisas de Pernambuco, o sub-sólo
é formado de camadas mesozoicas [ greda ou zura ] e apparen -
temente tambem de rochas paleozoicas ; a maior parte do ter-
ritorio consta, porém, de gueiss. Nesta a decomposição pene-
tra muitas vezes 10 e 20 metros não produz laterite, mas a
origem gneistica se conhece claramente mesmo na rocha alta-
mente degradada. Os productos frouxos da degradação que fi-
cam na superficie são em partes levados pelas inundações, mas
principalmente varridos por ventos. As massas mais resisten-
tes da rocha, principalmente os quartzos procedentes de
gneiss, com o varrimento dos detritos de barro e areia fina,
são descarnados e amontoão- se em grandes trechos do sertão.
Assim, acha-se quartzo roseo, quartzo côr de agua clara,
quartzo leitoso com delicadas veias limoniticas [muito seme-

[1 ] Dr. Silva Coutinho. Estudos definitivos de Una á Bóa


Vista, da estrada de ferro do Recife a S. Francisco , 1875.
17

lhante a um quartzo aurifero ], do tamanho da mão ou da ca-


beça, e ás vezes em blocos de metros, principalmente no ser-
tão que fica entre Junco e Cangaty e a cidade de Baturité
em grande parte é calçada destes quartzos.
"Estes pedregaes do sertão difficilmente seriam ferteis,
mesmo se o clima fosse menos secco, e é para admirar que em
taes condições exista ainda vegetação escassa . Os lugares mais
baixos do sertão, particularmente aos flancos dos largos val-
les com seu solo argilo- arenoso , poderiam seguramente ser
cultivados, apascentar gado ou dar o despretencioso algodão
cearense, de fibra grosseira, se pudessem ser sufficientemente
irrigados. Tanto se tem reconhecido isto, que se fallou em
construir com dinheiros publicos alguns àçudes, de que um ,
em Itacolomy, regaria a região de Palma e Viçosa, acima da
Granja, outro, no rio Salgado, serviria ao territorio de Lavras,
armazenando ao mesmo tempo agua bastante para os annos de
secca. Não me consta que taes açudes tenham sido construi-
dos : sei apenas que, depois de muitos desastres e desacertos ,
fez -se uma importante repreza do rìo Satiá junto a Quixadá
que cuba cento e trinta cinco milhões e meio de metros, for-
nece agua á cidade e presta -se á irrigação de 5.000 hectares, rio
abaixo, até a distancía de 26 kilometros.

"No sertão do centro do Ceará, especialmente na região de


Quixadá, empinam - se alguns serrotes solitarios, que constituem
elementos extraordinariamente caracteristicos da paisagem.
Erguendo-se immediatamente do plano produzem, apezar de
sua pouca altura de 100 a 200 metros, impressão imponente ,
para que concorre não só seu isolamento como a peculiarida-
de de sua superficie. Na maior parte são cabeças semelhando
sinos, de paredes ingremes, tendo a um lado um sócco escala-
do, produzido pela degradação desigual. Em Quixadá constam
de syenito porphyriforme : alhures, como por exemplo entre
Floriano Peixoto e Uruquê, constam de granito ; em Quixera-
mobim, de gneiss -granito . [ 1 ]

[ 1 ) Nos sertões os unicos terrenos apropriados a cultura


são os baixios, as coroas ou margens dos rios, alguns açudes e
as serras frescas.
18

SERRAS

"A todos os respeitos, porém, os mais caracteristicos são


os serrotes de syenito. ( 1 ) Suas paredes ingremes são cobertas
de sulcos e caneluras verticaes e parallelas e as encostas menos
despenhadas, qualquer superficie mediocremente inclinada de
saliencia de uma rocha, principalmente acaba em forma de
sócco escalado, são semeados de Karrus entremeados de cristas
rocheas. Todos os typos das formas genuinas de Karrus : pa-
tena, bacias, cubas, caldeiras, poços que a sciencia moderna
só conhece em montanhas caleareas ou delomiticas , aqui se
desenvolveram no rijo syenito, e se os arranhões possuem as
vezes formas mais arredondadas, em todo caso apparecem su-
perficies esbrugadas que, segundo a linguagem scientifica só
se podem chamar Karren felder. A causa unica deste pheno-
meno é a acção lavante e escavante da chuva, que durante o
curto inverno cae com violencia, em milhares de cascatas do
alto dos serrotes. Os serrotes no todo são inteiramente escal-
vados, mas da terra que a chuva ajunta no sopé brotam jun-
cos durante a secca e em alguns lugares nascem cactus.
"Do mesmo modo que estas formas ôeas, escavadas pelas
aguas, tambem as formas devidas á erosão do syenito e gra-
nito de varias serras do sertão têm uma nitidez e um cerceio
que commumente só se vê em climas temperados, com a de-
gradação de rochas molles como delamito, cal e grês. Nestas
regiões, por exemplo, na serra do Cedro , ao fundo do açude
de Quixadá, insurgem-se cristas, torres, cumieiras e blocos, que
junto ás exquisitas formas ôcas dão ao serrote um aspecto
selvagemente dilacerado.
"Ao contrario, as serras mais altas e mais extensas do
Ceará possuem contornos geralmente tranquillos. Succede isto.
tanto com as serras graniticas de cerca de 700 metros de al-
titude (serras de Cauhipe, de Maranguape, de Aratanha) que,
qual muralha, limitam a região esteira pelo interior, como
tambem com a serra de Baturité, gneiss -granitica, situada
mais no interior, que é o ponto mais elevado do territorio.
"Estas serras, de facto, representam um typo de paisa-

( 1 ) F. Katzer - Obra citada.


19

gem particular, cujo caracter geral, abstrahindo da vegetação


tropical, assemelha-se muito ao das montanhas medias da Eu-
ropa.
"Em geral não possuem cumiada bem desenvolvida, mas,
sobre uma infrastructura larga assentam diversas serranias ,
separadas entre si por depressões e gargautas.
"Em complexos maiores, cobertos de matas seguidas, pos-
suem extensos terrenos que servem á agricultura.
"A serra de Baturité possue grandes cafesaes, algodoaes,
cannaviaes : a serra de Maranguape e as serras de Pacatuba ,
extensos sitios de laranjeiras e ananaz, cria -se tambem gado
em proporção notavel.
"As serras altas do Ceará não tem muitas aguas, mas a
agua sufficiente e por isso estão sempre cobertas de vegetação
verdejante .
"Seu clima muito salubre pode chamar-se quasi tempera-
do. pois, nas primeiras horas a temperatura baixa por vezes a
15 e de dia raro sobe de 25.
"Quem , sem passar pelo sertão abrazado, fosse transpor-
tado immediatamente para uma serra do Ceará, difficilmente
acreditaria achar-se nos tropicos. " (1 )
Particularisando a serra da Ibiapaba, escreveu o P.e Anto-
tonio Vieira no seculo XVI que
"Os dias nos povoados das serras são breves, porque as
primeiras horas do sol cobrem-se com nevoas, que são conti-
nuas e muito espessas. As ultimas escondem-se antecipadamen-
te nas sombras da serra, que para parte do occaso são mais
visinhas e levantadas.
"As noites, com ser tão dentro da zona torrida, são fri-
gidissimas em todo o anno, e no inverno com tanto rigor, que
Igualão os grandes frios do norte, e se podem passar com a
fogueira sempre ao lado. ” (2)

(1 ) Fried. Katzer-- in Globus de Braunschweih,


(2) P. Antonio Vieira - Relação da missão da serra da
Ibiapaba- VIII .
20

Um outro observador, membro da Commissão scientifica,


enviada pelo governo geral ao Ceará, em 1858. para estudal-a ,
o Dr. Raja Gabaglia, ennuncia-se nestes termos :
O clima das serras é mais temperado que o do sertão e
acontece que os terrenos d'aquellas frequentemente são me-
nos permeaveis ou que, pela disposição propria, alimentam na-
turalmente regos copiosos e prolongados ; d'ahi provém que
em geral os terrenos das elevações são mais preferidos para
cultura, attendendo a habitual seccura das baixas. Porquanto
se deve ter presente que nas serras, em geral, os reservatorios
d'agua são perennes, alimentada por uma geada ou neblina
abundante, que precede de mezes as chuvas annuaes.
"Condições tão vantajosas fazem que as serras se tornem
os principaes celleiros da alimentação, produzindo o pão do
povo e os legumes, emquanto que os sertões são aproveitados.
principalmente na criação dos gados, fornecendo as pasta-
gens necessarias ou tambem para alguma producção agricola,
na qual deve -se apontar, como principal, todos os recursos for-
necidos pelos cocaes e carnahubaes.
"O clima das serras é optimo : fresco, salubre e proprio
para alimentar uma cultura constante. As baixas ou sertões
cortados por muitas ribeiras, com temperatura media superior
de varios gráos á das serras, possuem, além do clima sadio,
tudo quanto é conveniente para desenvolver em vasta escala a ·
criação de rebanhos, boiadas e cavalhadas." ( 1 )

OROGRAPHIA

Depois da descripção topographica do solo cearense. no


seus traços mais caracteristicos e salientes, especialmente da
configuração orographica, feita pelo geologo allemão F. Katzer,
transcripta nas paginas anteriores, particularisarei seu estudo

( 1 ) Dr. G. Raja Gabaglia- Ensaio sobre alguns melhoramen-


tos tendentes a prosperidade da provincia do Ceará-- Rio de Janeiro,
2ª edição 1877.
21
(

resumindo o que um observador consciencioso ( 1 ), nas suas


investigações pessoaes, escreveo como contribuição a Carta
Geral do Brazil.
"CORDILHEIRA CIRCULAR DE IBIAPABA. Esta cordilheira
não é muito elevada segundo os calculos do naturalista Feijó
varia de 2000 a 2400 pés sua altitude. Sua configuração, pelo
lado oriental ( do Ceará) . affecta uma curva que rodeia a pro-
vincia de NO. a SS. , com terminações rudes ou de declives ra-
pidos, faldas escarpadas e ladeiras difficeis, o que, junto á sua
elevação, caracterisa uma verdadeira serra ou cordilheira e
não simples plató, como alguns pretendem, por causa de sua
terminação suave e pouco sensivel ao occidente (para o Piauby)
com que extrenia o Ceará.
Não é continua ; na altura de 5º, no lugar chamado Cratheús,
soffre uma interrupção brusca perpendicular, escarpada, pouco
larga, que dá passagem ao rio Poty, affluente do Parnahyba.
Deste ponto, em direcção a sudoeste, abate -se e estende
ramos com diversas denominações aos sertões de Maria Perei-
ra, Inhamuns, etc., alem do qual torna a elevar-se, formando o
fertil valle do Cariry com o nome de Araripe.
Na altura de 600'30" bifurca-se, formando um angulo
quasi recto ; um ramo segue rumo de SSO. com o nome de
Dous Irmãos, entre as provincias de Piauhy e Pernambuco e
em algumas cartas, com o de Burburema, vai ligar-se ás cor-
dilheiras centraes, que separam as aguas de Goyaz. Bahia e
Maranhão, até á altura das vertentes, que Balbi đá O nome
de cordilheira occidental.
Outro, ramo com o nome de Araripe, circumda parte do
Ceará, seguindo a direcção de ONO. a ESE., extremando esta
provincia da de Pernambuco por uma extensão approximada
de 240 a 300 kilometros por um terreno alto, especie de pla-
tó com colos e declives, mais ou menos rapidos. que interrom-
pem por vezes sua continuidade, desde os limites do Jardim,
onde se abate, até o nivel do solo, no lugar chamado Baixio-
das-bestas, formando o divortium aquarium entre o riacho dos
Porcos ( affluente do Salgado a E. do Jaguaribe ), e o riacho da
Brigida (affluente do São Francisco).

( 1 ) Senador Th. Pompeo - Memoria sobre o Ceará para carta


geral.
22

Alem desse baixio, a serra continúa mais ou menos inter-


rompida e baixa com diversos nomes : de Camará, Pereiro, até
o plató chamado serra do Apody, que com a largura de 50 a
80 kilometros vae ao litoral, perto da foz do Mossoró, e ter-
mina, em forma pyramidal, um pouco ao norte da serra do
Pereiro.
CORDÃO CENTRAL. - A 25 kilometros a noroeste da
capital, junto da costa, começa o cordão central, de serrotas
mais ou menos ligadas ou separadas por valles e depressões
com diversas denominações - de Cauhype ou Japoara ( 380m ),
Camará, Tucunduba, Maranguape ao O. , onde attinge a alti-
tude de 900 metros, separado da Aratanha ( 780m ) a SO. ,
Acarape, em direcção mais a O., que se liga por contrafortes
a Baturité ( 852m ) mais a O. formando por si só um nucleo
de 120 kilometros de extensão sobre uma largura variavel de
25 a 50 kilometros, cuja extremidade septentrional toma o
nome de Boticario.
De sua extremidade sudoeste, por valles mais ou menos
extensos, corre uma corda de serrotas pequenas com diversas
denominações de Marianna, Santa Maria, Machado (alta e
fresca) e dahi em rumo de O., outras mais baixas e seccas,
com pequenas interrupções, chamadas Picada, Jatobá, até li-
gar-se ao grupo mais occidental das serranias baixas, quasi
na extremidade occidental da provincia, onde formam o ex-
tenso plató ou alto sertão de Quixeramobim, ponto culminante
das aguas que descem ao sul para a bacia do Jaguaribe, ao
norte para a do Acaracú e ao oeste para a da Parnahyba, pelo
Poty.
Neste grupo de serranias, que fica quasi no centro da pro-
vincia, alem de outras serrotas pedregosas, acham -se as ser-
rotas Branca, Serrinha, Mattinhas, Telha, Bestas, Almas, San-
ta Rita, Barbalha. Catolé, Estevão, Preguiça, separadas umas
de outras por valles mais ou menos estreitos e quasi todas de
cultura, principalmente Santa Rita, mais occidental, bastante
fertil e cultivada.
Este grupo , que pode medir 120 kilometros de norte a sul,
com 240 kilometros de leste a oeste, vai prender- se na extre ·
midade occidental á Ibiapaba por dois ramos um ao norte,
pouco saliente e menos extenso até o Tamboril, e outro ao sul
23

chamado Serra da Joanninha circumda o chamado sertão de


Cratheús, valle largo e extenso e quasi circular, pertencente á
provincia de Piauhy ( 1 ), encravado nos limites naturaes do
Ceará, por onde corre o Poty, cortando a serra da Ibiapaba e
vai ao Parnahyba.
Ao sudoeste deste grupo occidental, da ponta de Santa
Rita continúa o cordão de serrotas baixas com os nomes de
Mombaça, Mattas, Bôa- Vista e outras, que fecham a sueste o
alto sertão, chamado dos Inhamuns, com os nomes de serra do
Mucuim , Penha. Flamengo, etc., até ligarem-se a sudoeste ás
dos Bastiões e Araripe.
As aguas que correm desse systema central dividem a pro-
vincia em duas bacias desiguaes : uma a sueste, que compre-
hende dous terços da provincia e forma a bacia ou grande
estuario do Jaguaribe, e outra ao noroeste, formando a do
Acaracú.
CORDÃO SEPTENTRIONAL."- A 130 kilometros ao 0.
da capital e a 20 kilometros de costa corre a serra de Urubu-
retama, com 100 kilometros, mais ou menos, de extensão, sobre
uma largura desigual de 25 a 70 kilometros. Esta serra, alta
e fresca, liga-se ao cordão central por uma serie de serrotas
esparsas, baixas e pedregosas, que se succedem uma a outras
até á serra do Machado.
Nesta mesma direcção, de NO. , a 360 kilometros da capital
e a 100 do oceano , e a 36 ao NO . da cidade de Sobral corre a
serra de Meruoca [ 830m ] com 40 a 50 kilometros de extensão
e ao SE. desta a serra do Rosario, de menor extensão, que se
prende, por uma continuação de serrotas, as faldas occidentaes
da Ibiapaba.
CORDÃO DO SUESTE .- Da barra do Jaguaribe corre
uma serie de serrotas ao NO . interrompidas, das quaes se ele-
va a 50 kil. a SE. de Baturité a serra Azul, notavel por altitude
e ferro mineral que nella abunda : d'ahi em rum SO . até
perto do Icó, margeando o rio Jaguaribe, ao qual corta no
lugar chamado Oróes, segue o cordão de varias serrotas com
os nomes de Oróes, Flamengo, etc. a 24 kil. do Icó .
SERRA DO CARIRY. - A SE . do alto sertão dos Inha-

(1) Hoje Ceará.


24

muns e acompanhando a falda oriental da serra de Araripe


fica o extenso e fertil valle do Cariry, separada do resto do ser-
tão por serras mais ou menos baixas pelo lado oriental, e do
lado oriental e meridional pela cordilheira do Araripe, que o
separa das provincias do Piauhy e Pernambuco.
Notam-se ahi para o lado do Ceará as serras Quinquncá.
S. Pedro, S. Maria, etc.
Particularisando a physionomia cultural de algumas des-
sas serras, e que apresentam actualmente algum interesse eco-
nomico, começarei pela mais extensa e de maior porte :
A da IBIAPABA offerece a vista, a quem a contempla de
alguns kilometros, uma cinta perfeitamente horisontal, como
se fôra tirada a cordel e nivelada.
Quando vista de perto semelha a dous immensos paredões,
superpostos, talhados quasi a pique, de subidas ingremes, al-
cantiladas .
Sua chapada é fresca, coberta parcialmente de matta, re-
gada por correntes, entremeiada de pantanos ou alagadiços
para parte sul, entre S. Pedro e Campo Grande, onde se abrem
valles ferteis, como a Sussuana. Para o lado nordeste, da ci-
dade de Viçosa, o solo deprime- se, estreita -se, formando, como
diz o Senador Pompeu ( 1 ) "antes uma successão de serrotes

(1 ) Th. Pompeo - Ensaio Estatistico da provincia do Ceará –


Vol. 1, pag. 17.
O Dr. A. Arruda, redactor chefe d'A Republica, da Forta-
leza, conhecedor desta região por ter sido juiz de direito e fa-
zendeiro em Viçosa, escreveo a meu pedido o que se segue :
"A cordilheira da Ibiapaba estende -se do Norte a Sul, em
linha quasi recta, interrompida por vezes na parte oriental por
pequenas curvas que ganham esta uniformidade.
Dir-se-ia uma gigantesca muralha, apresentando na sua
formação inferior, do lado oriental, pronunciada declividade,
que lhe facilita o accesso até a altura de 500 metros. Aqui
nota-se uma assentada, a que vulgarmente dão o nome de ---
Cinta , da largura de 15 metros mais ou menos, baixa de ter-
ra fertilissima, onde com muito proveito, se faz o plantio de
canna e café.
A enorme muralha ergue- se então quasi a prumo , attin-
gindo a altura maxima de 950 metros no municipio de Ibiapi-
na. Não fossem alguns espigões no bloco colossal de pedras
que se superpoem e da cinta em diante a ascensão seria im-
25
(

ou cabeços pouco ferteis, ou seccos, como quebradas de serra”,


indo terminar entre os rios Timonha e Camoropim.
A região serrana pertencente ao Ceará, em virtude do
disposto na Lei de 22 de Outubro de 1882. que apenas confir-
mou o uti possidetes, comprehende a parte escarpada, alta e
fertil. Descendo para a bacia do Parnahyba desaparece a
feição typica da Ibiapaba, o solo inclina- se insensivelmente,
em vasto lençol collector das aguas tributarias do rio piau-
hyense, confunde-se quer pela vegetação, quer pelo aspecto
geral com os sertões altos.
De S. Gonçalo até a serra do Araripe a chapada estreita-se,
ora varzeando e com alguns piquiseiros, ora coberta de matto
baixo, carrasquento, e geralmente destituida d'agua. E' total-
mente inculta e deserta, mas abundante de caças.
"No Araripe. até a sua terminação alen. do Jardim, a cha-

praticavel. Por essas arestas que constituem os meios de com-


municação, trabalhadas pelas constantes erosões das aguas e
pela acção perseverante do homem, galga -se o cimo da mon-
tanha , que se apresenta ao observador em uma planura. que
na largura de 5 legoas apenas tem accidentes de alguns valles
ou antes baixios por onde correm para o Piauby os rios Inussi
e Pejuaba, e outros pequenos ribeiros.
Em toda a extensão desta planicie. que se deprime profun-
damente no lugar Quatiguba, municipio de Viçosa, a natureza,
exuberante e prodiga, manifesta-se em toda a sua plenitude
por uma temperatura que vacilla entre 18 a 23 gráos centi-
grados.
Onde o trabalho não penetrou com o seu braço destruidor,
veem-se grandes mattas virgens, das quaes se destacam bel-
lissimos bosques de palmeiras.
A parte mais fecunda e que se presta a cultura de todos
os cereaes, de fumo e do café, é a que se dilata do tope da ser-
ra no ponto denominado- Carrasco - onde a vegetação esmo-
rece pela natureza arenosa do solo. Começa, então, a desappa-
recer a planura, e a surgir a successão de serrotes, montes e
morros, que vão minguando de altura até as margens do Par-
nahyba.
A cordilheira da Ibiapaba termina assim nessa serie irre-
gular de valles e montes, verdadeiros socalcos, que servem de
descida para as vastas campinas do Piauhy. "
26

pada alarga-se, ( 1 ) o terreno é arenoso, quasi horisontal, for-


mando apenas no meio uma pequena depressão, mas geral-
mente falta d'agua, abundante de piquiseiras e de muitas ar-
vores fructiferas silvestres e de plantas forrageiras. As aguas
apparecem ou rebentam nas faldas em meia serra : então são
abundantes as fontes, que dão origem a diversas correntes,
que tornam os terrenos de Cariry muito ferteis e feracissi-
mos de toda a cultura. Na Serra Grande ( de Viçosa a S. Gon-
çalo) as aguas vêm da cumiada, donde descem em corregos
aos valles adjacentes : no Araripe as aguas nascem de meia
serra, não havendo na chapada uma só fonte. ( 2 )
O Dr. Freire Allemão Sobrinho ( 3 ) observa que no Ceará
a vegetação faz um salto da região litoral para a das chapa-
das arenosas de Araripe, Ibiapaba, cujas cintas ou encontros,
de onde nascem arroios perennes, se acham revistadas de
plantas florestaes da região dos dryades, as quaes se ligam as
dos sitios botanicos elevados de 600 a 700 metros sobre o nivel

(1 ) A montanha do Araripe forma. em seu cimo, uma pla-


nura lisa não ha nella indicio algum de areia, nem de ro-
chas, que só apparecem nos escarpamentos, os quaes sendo
inteiramente cobertos de altas florestas deixam de apresentar
o aspecto de fortaleza . A maior largura conhecida da chapada
é a que se acha em face do Crato e do Exú , a qual conta
15000 braças ( 33 kilom. ), medidas pelo Tenente Coronel José
Victoriano Maciel seu comprimento é calculado em mais de
60 leguas a contar dos pontaes do Jardim a ponta da serra
das Pombas, no Piauhy. A montanha do Araripe não termina
nestes dous pontos. Do lado do Oeste ella continua a enca-
deiar-se com o systema que corre parallelo ao S. Francisco,
fazendo baixada nimiamente accidentada. no caminho que pas-
sa pelas fazendas da Serra, Salgado , Terra Nova e Olho d'Agua .
deixando ao norte o pontal do Araripe, donde verte o rio Itay,
affluente de Canindé, que vem da Serra dos Dous Irmãos.
A Oesnordeste dá-se na Varzea da Vacca o encadeiamento com
a Ibiapaba, e a leste, no baixio das Bestas. a 10 leguas do
Jardim, o entroncamento com a Borburema, que se liga as
cadeias que costeam o Atlantico pelo sul do Brasil.
M. A. Macedo -- Observações sobre as seccas do Ceará, pag. 54
(2) Senador Th. Pompeu - Ob. cit., pag. 18 .
(3) Relatorio apresentado ao Instituto hist. e geogr. do Rio de
Janeiro.
27

do mar nas serras graniticas de Baturité, Meruoca, Urubure-


tama, Azul, Mattas, Machado, etc. ( 1]
A SERRA DO PEREIRO apresenta do lado occide ntal, em
face a Jaguaribe-merim, escarpa rochosa, granitica, com-
posta de dous soleacos, distanciados de poucos kilometros um
do outro. A primeira barreira a partir do valle do Jaguaribe
ergue-se a algumas dezenas de metros, attingindo, talvez, uns
120 a 150 metros no ponto culminante, baixa em seguida for-
mando pequeno e estreito valle até o grande soleaco, que
constitue o corpo da serra para a qual se sobe por caminho
ingreme aberto na rocha.
A serra dilata-se em largura por 15 a 50 kilometros de
nordeste a sueste com a elevação de 500 a 700 metros. Seu
solo geralmente argiloso presta-se a todas culturas tropicaes,
mas não é abundantemente regado por mananciaes. Aqui e
alli surgem olhos d'agua, que constituem a riqueza de seus
possuidores. Nas anfractuosidades do terreno construiram-se

[ 1 ] O Dr. Marcos de Macedo, espirito observador, illustra-


do e que viveu longos annos no Cariry, descreve nestes termos
o Araripe :
"A superficie do Araripe forma uma chapada perfeitamente
nivelada, desde a ponta do Jardim até a serra das Pombas,
na comarca de Jaicós, comprehendendo uma extensão de mais
de 350 kilom. sobre uma largura variavei entre 15 e 30 kilom.
A terra, de uma uberdade prodigiosa, é tão esponjosa e per-
meavel que os fortes aguaceiros, como sabem despejar as nu-
vens intertropicaes, se infiltram apenas, se acham com ella
em contacto. Este phenomeno é tão caracteristico , e effectuado
tão precipitadamente que um viajante, por exemplo, que, no
meio de uma batega, se quizesse desalterar não poderia reter
agua sobre o filtro da terra senão anteparando- a. Isto acon-
tece até as bordas da montanha, onde começam a apparecer
as rochas e as palmeiras, o que se não encontra em parte al-
guma da chapada do Araripe, a qual é toda coberta de diffe-
rentes essencias florestaes, intermeadas de risonhas empinas,
onde abunda deliciosos fructos, que constituem a abundancia
natural do paiz. Auscultando - se attentamente na chapada de
Araripe, na altura da cidade do Crato, ouve-se am surdo
ruido cavernoso, produzido pela corrente das aguas, que for-
main as nascentes - M. A. de Macedo. — Observações sobre as sec-
tas do Ceará e meios de augmentar o volume das aguas nas corren-
ces do Cariry. Stuttgart 1871, pag. 54.
28

açudes, alguns dos quaes prestam relevantes serviços a po-


pulação serrana, como o da villa do Pereiro, situado num dos
planatos mais amenos da serra. Para sudoeste, em demanda do
Icó ou do rio Salgado o solo vai baixando suavemente, ladea-
do pelos altos de S. Miguel a oeste e por contrafortes baixos
da serra geral a Oeste, formando como que um grandioso pla-
no inclinado de 15 a 20 kilometros. ( 1 ]
A do APODY, que é o prolongamento da serra circular,
apenas intervalado pelo rio do Figueredo, forma um planalto
elevado, especie de sertão agreste, de 50 a 70 kilometros de
largura por 120 a 130 de extensão , coberta de mattagal carras-
quento, de cactaceas, deserto, pouco abastecido de fontes,
quasi secco e de difficil traversia.
No cordão central a 25 kilometros da Fortaleza, para
Oeste. erguem-se as serras do Caulipe, [ 2] Camará, cobertas de
mattas, em geral seccas, tendo apenas raros olhos dagua. Es-

( 1 ) A serra do Pereiro toma no seu prolongamento, de sul


a norte, os nomes de Pintos e Sebastião, desde o povoado de
Santa Cruz, districto do Icó, até perto da barra do Figueiredo
com a extensão superior a 38 leguas [ 220 kilometros].
Na parte sul é que se tem desenvolvido mais a agricultura,
devido não só a densidade da população e praticabilidade de
caminhos como a natureza do terreno.
A serra é secca e o solo muito desigual.
...... Até 1860 a serra era muito fresca, os invernos
abundantes e regulares, devido as mattas então existentes :
hoje apenas encontram-se algumas no sitio Balsamo, serra
Branca, e Alagoa.
A madeira que mais abunda é páu darco, angico, cedro,
timbaúba, sabiá, aroeira e pereiro.
Dr. Antonio Augusto de Vasconcellos - Municipio de Pereiro
-apud a Revista do Instituto do Ceará de 1888, pag. 238.
O Dr. A. Augusto parece ter sido mal informado em rela-
ção as condições de humidade da serra, autes de 1850, pois que
nesta epoca o Senador Pompeu, descrevia a dos Cosme
e Damião ou Pereiro como sendo em parte fresca e cultivada
de cannas e legumes - Ensaio Estat. do Ceará, pag. 141 .

[2] Ponto culminante 380 metros.


29

treito collo separam-nas da de Maranguape, a SO . da Forta-


leza. Composta de terreno argiloso, regada por muitos corren-
tes, coberta de denso mattagal, tem sido explorada desde
longa data com a cultura do café, canna de assucar, arvores
fructiferas, cereaes, plantas forrageiras, etc. Devido a estas la-
vras, grande parte do seu solo acha-se desnudado, como que
esterilisado para o cultivo do café. O volume d'agua dos seus
correntes tem minguado depois da secca de 1877 ; e em con-
sequencia talvez da pouca humidade, desenvolveo -se o piolho
branco no laranjal, reduzindo-o a menos de um quarto do que
era dantes.
A serra ergue-se rapidamente até 920 metros, com ligei-
ras depressões a 500 metros, por onde se opera o trajecto de
uma para outra encosta . Na oriental, voltada para cidade de
Maranguape estão os melhores estabelecimentos agricolas, por
ser a mais abundante de correntes. A descida para o occi-
dente é menos abrupta, e na sua parte inferior semelha ao
alto sertão.
A serra da Aratanha. separada da de Maranguape por
um valle fertil, em grande parte cultivado, de 12 á 18 kilom.
no qual viceja a maniçoba, tem a forma triangular e a exten-
são de 18 kilom. de Leste a O. , e de 23 de norte a sul. E' como
a de Maranguape, argilosa, e relativamente mais plaua, po-
rém menos abastecida dagua, se bem que fertil e porventura
mais cultivada . ( 1) Seu ponto culminante attinge 780 metros.

(1) Fronteira a Maranguape, separada por um estreito


valle, fica a serra da Aratanha, da mesma formação granitica,
constituindo uma cordilheira que as vezes mergulha no ser-
tão, para em pequena distancia surgir de novo n'aquelle com-
plexo que abrange as serras de Acarape e Baturité, que dei-
tam as aguas para o Pacoty. Choró, Curù. Esta serra é nota-
vel pela direcção constante de muitos dos seus valles, que
dão saida as aguas do rio Acarape, o qual pelas cascatas de
Paracupiba, precipita-se na planicie, e posto que mais extenso
que seus visinhos Aracoyaba e Carióca. leva menos agua do
que este por causa da direcção de suas margens. " -Th . Pompeu.
-Ensuio Estatistico do Ceará, pag. 42.
Não só nas suas chapadas de Maranguape, Aratanha,
Acarape e Baturité ) e faldas, aliás muito frescas, se plantam
canna e café, como principalmente nos terrenos adjacentes, hu-
30

A serra do Acarape é o prolongamento da de Pacatuba ,


da qual se distancia por um valle de 20 kilometros. Apresenta
a mesma physionomia que as duas anteriores, estando, po-
rém , mais coberta de mattas. [ 1 ]
A de Baturité alonga-se por 100 a 120 kilom. de extensão
e por 20 a 40 kilom . de largura. Sua chapada, que excede de
cem legoas quadradas, segundo affirma o Senador Th. Pom-
peu. [ 2 ] presta-se a todas as culturas intertropicaes, e pela
amenidade do clima ao de algumas plantas do sul da Europa.
E bastante povoada, bem culturada, mas pouco provida de
mattas, devido a extensa lavra de café e de canna, que por
mais de 30 annos domina as demais culturas. Em consequen-
cia da baixa no preço do café, irregularidade das estações,
nos ultimos 10 anos, e do cansaço das terras, vão os seus
lavradores adoptando ontras culturas, prevalecendo a da ma-
nicoba.
No Jugar Macapá, proximo a villa de Guaramiranga, ella
attinge a altura de 810 metros [ 3 ].
A serra do Machado continúa a cadeia divisoria entre as
bacias do Quixeramobim, sub-affluente do Jaguaribe, do Curú
e Aracaty-assú. Cortada por valles mais ou menos extensos e
profundos. prende a parte meridional da serra de Baturité
com a denominação de Serra da Marianna de solo secco, mas
coberto de mattas, inflexionando-se para oeste e nordeste . at-

medecidos pelas correntes, que dellas descem e correm por al-


guma extensão. Estes terrenos chamam-se vulgarmente Ypús
e são um barro preto, massapê, que tem muito humus vegetal
ou decomposição vegetal e animal que as aguas acarretam
das serras e por isso muito substancioso. E' nestes ypús ou
valles que se fazem as maiores plantações de canna .
Ibid- pag. 140 .
(1) Da serra do Cauhype a do Acarape medem , segundo
o Dr. José Pompeo 105 kilom. sobre 700 kilom. quad.
(2) Ensaio Estatistico da provincia do Ceará ― Vol. I, pag. 201 .
(3) Os pontos mais elevados da serra de Baturité são
Monte - flor 852 metros, Guaramiranga 828 metros, Bôa - Vista
820 metros, Boa-agua 815, Macapá 805. Pernambuquinho 795,
Bom Successo 785, Brejo da Cruz 772, Pendencia 714, Páo
d'Alho 709.
31

tingindo ahi a sua maior altura, depois de haver formado o


planalto, onde assenta o povoado de S. Gonçalo. A serra é
fresca, abastecida de olhos dagua. mal cultivada . [ 1 ] Seguem
outras serrotas de menor importancia. seccas ou quasi seccas,
que continuam a linha divisoria até a serra circular da Ibia-
paba.
A SERRA DA URUBURETAMA é o prolongamento norte da
do Machado por uma serie de serrotas baixas, pedregosas e
estereis . Extende se por 90 kilometros de L. a O. por 20 a 60
de largura, com o relevo atormentado, desigual : ora ergue- se
em planaltos elevados , ora deprime-se em valles cavados. Me-
nos frescos que a de Baturité, presta - se as mesmas culturas. [ 2]

(1 ) O grupo de serrotes denominados -Mariana, Santa


Maria, Machado, Picada, Jatobá, Branca, Serrinha, Telha, Matti-
nhas, Bestas, Almas, Santa Rita, Barbalha. Catolé, Estevão. Pre-
guiça pode occupar, segundo o Dr. José Pompeu , na sua — Cho-
rographia do Ceará pag. 89 -uma área de 120 kilom. de norte a
sul, sobre 240 de leste a oeste.

(2) O senador Pompeu classifica na sua obra- Ensaio Es-


tatistico - em tres especies as terras altas do Ceará : serrotes seccos,
incapazes de cultura, serras baixas, cultivaveis : e serras frescas,
capazes de toda a cultura.
Dos serrotes seccos, alguns são cobertos de arvores , princi-
palmente de um matto especial, que só nasce entre pedras, cha -
mado páo de mocó, que nunca despe a folhagem verde, passando
por venenoso. Não ha plantação alguma e são de ordinario a
morada dos morcegos, cobras e onças.
As serras cultivaveis contem terra ou barro arenoso, em-
bora não possuam aguas correntes, conservam bastante frescu-
ra para se poder plantar nellas, na estação invernosa, milho,
feijão, mandioca e algodão. As principaes são 1 Ibiapaba , de
S. Gonçalo ao Araripe, 2 Cauhipe, 3 Juá, 4 Camará, 5 Torre,
6 Manoel Dias, 7 Lagedo, 8 Gado , 9 Palmeira, 10 Mariana , 11
Machado, 12 Jatubá, 13 Picada, 14 Mattas, 15 Branca, 16 Te-
Tha, 17 Cabagi. 18 Barbalha, 19 Catolé, 20 Joanninha, 21
Bôa-vista, 22 Rosario, 23 Bastiões, 24 Freicheiras, 25 Trapiá,
26 Brigada, 27 Quencoqué, 28 Penha, 29 Estrella, 30 S. Ma-
ria, 31 S. Pedro, 32 Carás, 33 Vargea Graude, 34 Cosmes,
35 Mucuim. 36 Mombaça, 37 Flamengo.
Serras frescas. - Maranguape, Aratanha, Acarape, Baturité,
Uruburetama, Santa Ritta, Ibiapaba.
32

HYDROGRAPHIA

O conselheiro Beaurepaire Rohan ( 1 ) diz que durante a


secca de 1827, em viagem da Bahia para o Piauhy, teve oc-
casião de notar que a palavra rio nem sempre exprime nessas
paragens a idéa de um curso d'agua permanente. Entendem
tambem por ella as grandes torrentes que se formam na es-
tação pluvial. " Verdade é, accrescenta elle, que essas torrentes
tomam então dimensões consideraveis, que as tornam bem
semelhantes aos mais caudalosos rios : mas, logo que cessam
as chuvas que as alimentavam accidentalmente, sem que nenhum
obstaculo se opponha a sua corrente, a pouco e pouco vão di-
minuindo as aguas, até desapparecerem completamente, á ex-
cepção de certos logares mais depressos do leito, nos quaes,
por effeito da impermeabilidade do terreno, se conservam al-
guns mezes e se tornam o unico recurso da população ambi-
ente. "

Este phenomeno não é peculiar ao Ceará e a região me-


dianeira entre o rio S. Francisco e o Parnahyba ; em Goyaz
assignala-o Cunha Mattos (2) na parte nordeste do Estado.
Em região mais favorecida pelo clima e condições topographi-
cas, ao sul do curso medio e baixo do S. Francisco, na Ba-
hia, a do rio Vasa - Barris apresenta o mesmo facies hydrogra-
phico . " Este é um rio sem afluentes, diz o Sr. Euclydes da
Cunha (3 ). Falta- lhe conformidade com o declive da terra.
Os seus pequenos tributarios, volvendo aguas transitorias, den-
tro dos leitos rudemente escavados, não traduzem as depres-
sões do solo.-- São, antes, canaes de exgotamento, abertos a
esmo pelas enxurradas-correntes velozes que, adstrictas aos
relevos topographicos mais proximos, estão, não raro, em
desharmonia com as disposições orographicas geraes ... .....
..
"As mais das vezes [ o Vasa-Barris] cortado, fraccionado em

( 1) Considerações acerca dos melhoramentos de que em relação


as seccas são susceptiveis algumas provincias do norte do Brasil-
Rio de Janeiro, 2ª edição, pag. S.
(2) Coronel Cunha Mattos -Itinerario - tomo 2º , pag. 2.
(3) Euclydes da Cunha- Os Sertões-2ª edicção, pag. 32.
33

ganglios estagnados, ou secco, á maneira de larga estrada


poenta e tortuosa, quando cresce, empazinado, nas cheias,
captando as aguas barrentas e revoltas, extinguindo -se logo,
em exgotamento completo, vasando, como o indica o dizer
portuguez, substituindo-lhe com vantagem a denominação in-
digena. E' uma cnda, tombando das vertentes da Itiuba , mul-
tiplicando a energia da corrente no apertado dos desfiladeiros,
e correndo veloz, entre barrancos, ou entalada em serras.”
Salvo a desconformidade entre as condições orographicas
geraes e o despenho das aguas canalisadas, os rios cearenses
são essa larga estrada poenta e tortuosa, fraccionada em gan-
glios estagnados, descriptas pelo illustrado autor dos Sertões.
No Ceará a drenagem das aguas pluviaes opera-se quasi sem
tropeços, nem accidentes topographicos, devido a inclinação
rapidas do solo, sem gradações ou socalcos montanhosos que
The impeçam o escoamento para o grande collector maritimo.
Chapadões de formação cretacea que funccionem como
filtros e reservatorios para essas aguas e capteem as conden-
sações diarias que ahi se formem pelas differenças de tempe-
ratura diaria e nocturna, derivadas da sua altitude e de basto
mattagal, sempre virente, fallecem quasi por completo na re-
gião cearense.
A chapada do Araripe, que deveria ser o grande arma-
zen. subterraneo a alimentar as nascenças de rio perenne,
parece inclinar o melhor de seu leito impermeavel para bacia
do S. Francisco. A descida, a céo aberto, pelos riachos da Bri-
gida e Terra Nova para vertente meridional semelha a rampa
suave, intercalada de nodosidades serroticas, que lhe não per-
turbam o perfil geral. As precipitações meteoricas deslisam
sem embaraços por esses largos pannos, reunindo-se nos sul-
cos flexuosos abertos á menor resistencia do solo pelas bate-
gas volumosas e possantes das chuvas torrenciaes. Para ver-
tente norte do Ceará, a corrosão desses agentes, des de uma
edade geologica, ainda inderminada, mas que o barão de Ca-
panema opina ser a jurassica ( 1 ), Gardner, Agassiz e Orville a
cretacea, talhou a serra em paredes verticaes ou ligeiramente
desaprumadas até meia encosta para o valle do Cariry. Esta

(1) Capanema- Apontamentos geologicos.


34

obra cyclopica que denuncia a possança das forças hydricas


na elaboração do grande suleo aberto entre o Araripe e a serra
de S. Pedro, explica até certo ponto a impetuosidade e volu-
me da corrente do outr'ora rio Salgado, demolindo cerca de
cem kilometros ( avaliação do barão de Capanema ) da massa
serrotica, e abrindo no boqueirão de Lavras, ( 1 ) a funda bre-
cha por onde desceu ao valle do Jaguaribe. Destruidos os an
teparos de sua formação tumultuaria, a corrente deslisou em
leito inclinado, liso , quasi sem talveg. aflorando os contrafor-
tes extremos da serra do Pereiro e serrote do Apody pelo
lado direito, e aos dos Orós e Francos pelo esquerdo. Nascente
pobre, mal alimentada. leito desimpedido em alcantil-eis a
explicação do regimem hydrographico do Jaguaribe, aliás o mais
bem apparelhado na topographia cearense para desempenhar
o papel de rio perenne.
A serra da Ibiapaba, que seria um segundo factor a ger-
minação de uma ou mais fontes caudalosas, apresenta, como
ficou dito, o aspecto de dous socalcos, talhados em paredões,
para vertente oriental , desenrolando -se em chapadas, alterna-
das de cabeços ou serrotas baixas para o valle do Parnahyba.
em gradações doces a se confundirem com os altos taboleiros
do sertão piauhyense. A esta bacia aproveitam as suas con-
deusações e precipitações aguosas, pouco ficando das mesmas
para o custeio dos plainos serranos, por onde se dilatam as
culturas. A caracteristica geral, uniforme, desoladora, dos gran-
des dreños pluviaes do Ceará é a de sulcos mais ou menos
largos e extensos, cheios na estação invernosa, seccos na es-
tival.
As bacias desses cursos d'agua, devido a configuração
orologica do solo, estão delimitadas com alguma precisão, e
formam as de sueste, oriental. norte e noroeste.
BACIAS DO SUESTE -JAGUARIBE -Na conjuncção dos
contrafortes da serra de Mombaça, denominada serra da Gua-
riba, de S. Joaquim e Joanninha, nasce o Carrapateira (2) , cujo

(1) J. J. Revy - Açude de Larras.


(2 ) Veja-se Senador Th. Pompeu - Ensaio Estatistico da
Provincia do Ceará- Vol. I. pag. 27.
35

curso sinuoso e torturado, em meio de serrotas, recebe diffe-


rentes riachos, dos quaes o Tricy, a direita, e o Farella a es-
querda, são os mais extensos. Desta confluencia, logo abaixo
do Tauá, toma o nome de Jaguaribe, dirigindo-se a sudeste
até Arneiróz, onde, por um talhado a pique na rocha, transpõe
a serrota Mucuim ou de Arneiróz. inflexionando - se para leste.
. entre altos que lhe estreitam a bacia, até proximo a S. Ma-
theus. D'ahi até a serra dos Orós, por 70 kilometros, desata-se-
The a margem septentrional em planuras pantanosas. no cen-
tro da qual se acha a cidade de Iguatú. Transposto os Orós,
por garganta rochosa, recebe logo abaixo o rio Salgado, que
the imprime a direcção de sul a nordeste, seguindo por um
leito, estreitado no boqueirão do Cunha , proximo a Jaguari-
be- merim. Recebe a esquerda o Riacho do Sangue e a direita o
Figueiredo, bifurcando-se em seguida e formando com a sua
sinuosidade algumas ilhas, em uma das quaes fica a cidade do
Limoeiro e noutra a villa da União. Quasi em face d'aquella
cidade recebe a esquerda o seu grande affluente Banabuihú, e
alguns kilometros abaixo o Palhano. Após o boqueirão do Cu-
nha a margem esquerda baixa, torna- se alagadiça, formando
os bellos e ricos terrenos alluviaes do Limoeiro e Russas.
Os seus affluentes pela margem direita são : o Più 22 kilom.
abaixo do Tauhá ; o Jucá 5 kilom . abaixo de Arneiróz ; o
Conceição, que nasce do angulo formado pela Ibiapaba com o
Araripe e despeja pouco abaixo do Saboeiro : o Bastiões, en-
grossado pelo Curihú, atravessa terrenos ferteis , despeja 3
kilom. abaixo de S. Matheus ; o Salgado, formado de duas
correntes que descem da serra do Araripe - o Ytaitéra, que bro-
ta da quebrada por nome Loanda e corre por 15 kilom . rece-
bendo o Grangeiro, que banha a cidade do Crato e em seguida
o Miranda e o Ponta já reunidos ; dahi continua cortando uma
planicie de 16 kilom. por 1 a 2 kilom. de largura, passa pela
villa do Joaseiro. recebe o riacho Cará, juntando-se depois ao
Salamanca, que passa por Barbalha. A 3 kilometros de Missão
Velha, no sitio Cachoeira, onde as aguas fazem notavel corre-
deira, na estação invernosa, toma o nome de Salgado, receben-
do a 16 kilom, abaixo o riacho dos Porcos, que nasce em uma
quebrada da serra do Araripe, proximo a cidade do Jardim.
O Salgado banha a villa da Aurora, nas proximidades da
qual passa sobre um extenso leito granitico, perfurado de po-
36

ços, desce suavemente até Lavras, onde 6 kilom . abaixo talba


a serra, rasgando o bello boqueirão do seu nome, e por altos
embolados, tombadores, como são chamados, prosegue até a ci-
dade do Icó, indo 18 kilometros abaixo reunir-se ao Jaguaribe,
depois de um curso superior a 300 kilometros.
Antigamente, diz Pompeu ( 1), o Salgado era perenne, e
raras vezes cortava até Venda ; hoje mal corre, na estação
secca, até Missão Velha, por serem as suas aguas dis-
trahidas com a irrigação dos terrenos adjacentes, que se
prestam grandemente a cultura da canna, e mesmo porque
tem diminuido pela derribada das mattas nas faldas e chapa-
da do Araripe.
O rio Figueredo é o ultimo das grandes affluentes, a di-
reita, do Jaguaribe : nasce na falda elevada, oriental, da serra
do Pereiro, recebe as correntes da mesma, entre as quaes o
que passa ao sul da villa do Pereiro, dirije - se para norte,

(1 ) Th. Pompeu - Ensaio Estatistico da Provincia do Ceará—


Vol. 1, pag. 30.
Segundo a tradição, escreveu o Dr. Marcos de Macedo-
Obra citada, pag. 87, o Jaguaribe, nos annos regulares, não
seccava totalmente, como acontece em nossos dias, e quando
cortava, como dizem no paiz, tão numerosos eram os poços
que quasi se não apercebia a falta da corrente ...... Este es-
tado de perennidade era alimentado pelo rio Salgado, visto
que o Jaguaribe em suas cabeceiras sempre seccou pelo verão,
como acontece presentemente. Em 1816 as aguas do rio Salga-
do ainda corriam , todo o anno, até a cidade do Icó. "
"O rio Jaguaribe corria em outro tempo, ainda que pobre,
até a villa do Aracaty ; depois da secca dos tres annos até
1792, chamada vulgarmente a secca grande, entrou a chegar
até 40 leguas no verão, hoje não passa de 15, e vai diminuin-
do em proporção que suas aguas tem sido divertidas no Crato
por augmento de cultura.
Antonio José da Silva Paulet - Descripção geographica abre-
viada da capitania do Ceará.
Esta memoria subscripta por Paulet, sem data, presumivel
de 1811 , é pelo Sr. Barão de Studart, attribuida ao ouvidor Ro-
drigues de Carvalho e devia ter sido escripta em 1816 –Veja
Revista do Instituto do Ceará do 1º trimestre de 1898 , pag. 32.
37

banha Iracema (Caixaçó ) serpeando por entre o planalto do


Apody e serra do Pereiro. [ 1 ]
Os affluentes da margem esquerda são :
O Jucó, que vem das serras de Mucuim e Flamengo e
se lança abaixo de Arneiróz :
O Trissy e Cunqué, que fluem da serra do Flamengo e se
juntam proximo a sua foz, um pouco abaixo de Iguatú :
O Faiel de pequeno curso ;
O Riacho do Sangue ;
O Banabuyhú, cuja área, extensão e volume iguala a do
Salgado ; nasce ao sul da serra de Santa Rita, corre de oeste a
leste, atravéz do sertão de Mombaça. banha Maria Pereira e
Senador Pompeu, recebendo a 60 kilom. da cidade de Quixe-
ramobim o rio deste nome, e a uns 65, logo abaixo, o Satiá, ba-
nhando em seguida Morada Nova. Depois de ter recebido o
Quixeramobim, atravessa os serrotes do Sellado por um bo-
queirão apertado.
Seu affluente - Quixeramobim -com uma bacia mais larga
e horisontalada , nasce no grupo central, divisorio das aguas do
Piauhy. corre por entre as serras das Bestas. Serrania, Catolé,
Telha, penetra no sertão, ladeando a serra do Calogy, banha
Bôa-Viagem, recebe pela margem esquerda o Boa Viagem e, a
4 kilom. a oeste da cidade de Quixeramobim, corta a serra do
Boqueirão, formando uma garganta estreita.

[1] O Figueredo, affluente do Jaguaribe, forma-se das


aguas que descem do sul e da falda oriental da serra [ do Pereiro ].
Sua pequena bacia comprehende os riachos S. João, Enge-
nho, Alagoa, Boaventura, João Ribeiro, Contendas, Motta, Baixa-
verde e Baião, que despejam no Thomé Vieira a 1 legua do Sacco
da Orelha.
O Thomé Vieira, depois de juntar-se ao riacho Remedio,
que se forma do Genipapeiro, Logradouro, Bóa- vista e Gerimum,
continúa seu curso com esse nome, recebendo as correntes ,
Páu -ferrado, Campos, Milagres, Melancia, Rajada, Forquilha, Can-
tinho, Açude, Riacho da Serra e Carnahubinha.
Do Caixa-só descem para o Figueredo os riachos -Peccado,
Foz, Milha, Amoré, Logradouro, Grossos, Fazenda, Curral do meio,
Atraz da serra, Arara e Timbaúba.
Dr. Antonio Augusto de Vasconcellos --Municipio do Pe-
reiro-apud a Revista do Instituto do Ceará-4º trimestre de 1888,
Pag, 237.
38

O PALHANO- nasce proximo da serra Azul e despeja no Ja-


guaribe junto a cidade de Aracaty.
As pequenas bacias entre o Aracaty e a cidade da Forta-
leza, são :
O PIRANGY- nasce na serra Azul, corre do sudoeste para
nordeste por um terreno pouco fertil. Na sua foz acham-se ri-
cas salinas ;
O CHORÓ - desce da serra do Estevão, contornando- a pelo
lado norte. recebe em face do Caio Prado o Cangaty, que vem
da quebrada das serras do Cangaty e Santa Catharina. e 30
kilom . abaixo o Aracoyaba , que desce da serra de Baturité,
entrando no Oceano por duas barras, depois de um curso de
270 kilom :
PACOTY- nasce na extremidade meridional da serra de Ba-
turité. banha Acarape, recebe o Bahú, corre do sul a norte, ba-
nha o Aquiraz, lançando-se no mar depois de um curso de
150 kilom ;
Cocó - ribeirão que nasce na serra da Aratanha e despe-
ja no Oceano, a 12 kilom. a L. da Fortaleza.
Bacias ao noroeste :
CEARÁ- nasce na serra do Rato e a das duas encostas da
serra de Maranguape ; banha a cidade deste nome, e com a
denominação de Maranguape se reune perto de Soure ao
braço occidental, que contorna a ponta da serra e reunido
ao braço oriental, lança-se ao mar a 12 kilom . a NO. da For-
taleza, formando uma barra que está em parte aterrada, e na
qual ha projecto de fazer-se o porto da capital (1).

( 1) Este rio, segundo o Dr. G. Studart, nasce no termo


de Maranguape, e forma-se da juneção do riacho Bom Prin -
cipio, que nasce nos montes dos Salgados, com o Jandahyra.
que vem do serrote do Marinheiro, a 35 kilom. da cidade de
Maranguape e 6 kilom . da serra de Baturité.
O riacho Jandahyra antes de entrar no termo de Soure
toma a denominação de Jaramateira, atravessa a fazenda S. Luiz
e reúne -se então ao Bom Principio. Transposta a fazenda Ro-
deador, o rio Ceará é engrossado pelo riacho da Tucunduba,
recebe abaixo da estrada de Soure o Maranguapinho, que é
formado pelos riachos Sapupara, Jererahú, Gavião e Pirapora.
Dr. Guilherme Studart- O rio Ceará- apud a Revista do
Instituto do Ceard - 1º trimestre de 1889, pag 52.
39

CAUHYPE- E - nasce ao sul da serra do Joá, corre por terreno


plano, varzeado, coberto de carnahubas e despeja no Oceano,
depois de um curso de 70 kilom . Sua foz , devida a obstrucção
das areias, forma grande represa.
S. GONÇALO - nasce na falda occidental da serra de Batu-
rité, corre a NL. e depois de um curso superior a 150 kilom.
entra no Oceano, formando uma pequena enseada. ( 1 )
CURÚ ― desce da parte septentrional da serra do Machado,
corre a nordeste até o povoado do Jacú, inclina- se para nor-
deste até Pentecoste, onde recebe o Canindé, que vem da serra
da Mariana, dirige-se ao norte , recebendo diversos affluentes
vindos da falda occidental de Baturité, passa em Canindé,
abaixo da qual, 60 kilom. , faz barra no Curú, proseguindo na
direcção sul para norte até o Oceano, onde forma o porto de
Parazinho, depois de um curso de 250 kilom.
MUNDAHÚ -nasce na parte meridional da serra da Urubu-
retama, ladeia-a a leste, e depois de um curs de 160 kilom.
se lança no mar formando 0 pequeno estuario do seu
nome :
ARACATY -ASSÚ--nasce de uma ramificação da serra do Ma-
chado, por nome serra Verde, corre de sul a norte por um
solo accidentado, pedregoso, salitrado, recebe as aguas da ver-
tente occidental da Uruburetama e depois de um curso de
240 kilom . lança- se no mar.
ACARAHÚ-é o segundo rio do Estado, por seu curso e im-
portancia : nasce no centro do grupo central na serra da Te-

(1) O S. Gonçalo -que tem a principio o nome de riacho


da Monguba, e não o de Boticario, como diz o Diccionario 10-
pogr. e stat. do Ceará, nasce na serra do Lagedo, uma das ra-
mificações da de Baturité, lado norte, nos sitios S. Bento e
Monguba, recebe as aguas da Serra Verde, dos Pocinhos, ba-
nha o pequeno valle do Rato, passa na povoação da Cruz ,
corre para norte, passa junto aos serrotes do Boticario e S. Lu-
zia e desemboca no Atlantico, 14 legoas a noroeste da cidade
da Fortaleza.
São- lhe tributarios - o riacho S. Luzia, ૧a leste : e o Moço a
oeste.-- Dr. G. Studart- ibid —pag. 51 .
40

lha, proximo das nascenças do Quixeramobim, corre do oriente


para occidente, banhando Tamboril. até as faldas da serrota
do Feiticeiro, volta-se para o norte, passando por Entre- rios.
recebe a esquerda o Jatobá, o Juré, e o Jaibara, a margem do
qual assenta a cidade de Sobral, e a direita o Groayras, cujo
affluente Jacurutú passa por S. Quiteria : banha as cidades de
S. Anna e Acarahú, onde se lança no mar por duas boccas
depois de um curso de 370 kilom . Sua foz dá entrada a peque-
nos navios e está situada a 2º, 52′, 36″ de Lat. sul e 3° 0′ 12′,
de longit. oriental do Rio de Janeiro .

CAMOCIM ou Curyahú -nasce na falda orienta! da Ibiapa-


ba, corre para nordeste, banha a cidade de Granja e entra no
mar, formando o melhor porto do Ceará. Sua foz está situada
aos 20 53′ 41 ″ de lat. sul e 2° 31'8" de long, oriental do Rio
de Janeiro.

TIMONIA- ribeirão que desce da parte oriental da Serra


Grande, banha a cidade de Viçosa, e depois de um curso de
150 kilom., entra no Oceano, formando pequena euseada, pro-
ximo a qual se dilatam extensas salinas. Sua foz jaz a 20,54′ 46 ″
de latit. merid. e 20, 8 ' 7" de long. orient. do Rio de Ja-
neiro.

LAGOAS

O empino do solo em declive doce, sem fracturas, numa


horisontalidade, apenas quebrada por serrotas ou serras, o
plexus sinuoso em multiplos drenos a collectarem as aguas
pluviaes, a seccura atmospherica favorecida por ventos alísios.
de uma constancia inquebrautavel, os verões prolongados e as
evaporações rapidas, contribuem para a escassez d'agua em
grandes depositos, sob a forma de lagoas. Em geral as existen-
tes são de proporções minguadas, razas, superficiaes. verda-
deiros caldeirões em terrenos abertos, cobrindo raramente va-
les profundos. Na estação pluvial, quando o inverno é abun-
dante, as superficies alagadas se expraiam por alguns kilome-
tros, formando vastos alagados, marginados por atoleiros.
Na orla maritima, onde a duna impellida pelo vento barra
a corrente dos riachos, formam- se represas mais ou menos
41

profundas, que são destruidas pelos grandes invernos e pelo


esforço do senhorio marginal, cujas terras ficam submersas. ( 1 )
As lagoas mais importantes pelo volume de suas aguas
são do Coronel, do Matto e da Matta, Sacco da Velha, no mu-
nicipio do Aracaty : Patos, Tronco -entre os rios Pirangy e Pa-
Thano ; Catú no rio de seu nome, entre Aquiraz e Cascavel
Mecejana a 12 kilom. da Capital : Porangaba a 7 kilom . da Capi-
tal ; S. Gonçalo proximo a barra do rio deste nome ; Trahiry
no rio do mesmo nome ; Timbaúbu, Castellanos e Pesqueira, en-
tre os rios Acarahú e Camocim- todas proximas ao littoral.
No valle do Jaguaribe, ao poente da cidade do Iguatú, acham-
se as lagoas do Iguatú e Barro Alto ; Conceição no Riacho do
do Sangue ; Grande perto da confluencia do Figueredo com
Jaguaribe ; Camorupim na Granja.

LITORAL MARITIMO

A costa é geralmente uniforme, sem articulações, apenas


interrompida por pequenas pontas, ordinariamente rochosas e
por enseadas ou estuarios que dão abrigo a navegação.
A Ponta Grossa, ao sul, ergue-se em grande penedia a pi-

(1) Um observador assim descreve as lagoas de Cauhype :


"O grande reservatorio do rio Juá, que resultara da obstruc-
ção da sua foz pelas areias, tinha um perimetro de cerca de
4 leguas, e ameaçava conquistar mais terreno, a par de uma
profundidade tal que submergio toda a matta da preciosa car-
nahuba, cujos esterpes erectos e ornados de verdes leques The
cobriam o leito argilosc . Era um mar d'agua doce ao lado do
Atlantico.
Alimentava enorme quantidade de peixes : a trahira , o
cará, o cangaty pescavam- se aos montes.
Offerecia soccorro perenne contra as calamidades de que
tem sido tantas vezes victima o Ceará. Toda a população de
Soure, e ainda mais a adventicia, remia a vida na , abundancia
do seu peixe e na fertilidade de suas margens.
E' pena que, a pretexto de ir o lago invadindo alguns si-
tios, aliás de pouco valor. e que bem podiam ser indemnisados,
se tenha desfeito esta grande obra que a natureza exponta-
neamente offerecera a essa laboriosa população.'
Em 1895 foi arrombada a parede de areia pelos senho-
rios prejudicados, depois de terem em vão recorrido ao go-
42

que, visivel a 21 ou 22 milhas, [ 1 ] bastante saliente e mais


alta que o solo circumvisinho, serve de anteparo aos ventos
que sopram de SE. para a enseada.
A 4° 25' 35' de lat. merid. a duna de areia, que vem lade-
ando a costa, ergue-se em colina, sem arvores, abatendo -se
para dar passagem ao rio Jaguaribe. Pela margem esquerda
deste a ribanceira de argila vermelha se alonga até a ponta do
Maceió, cuja forma singular, especie de penedia, semelh , no
dizer de Mouchez, a um canhão a sair pela escotilha de um na-
vio, tal o solapamento que o mar ha produzido no sopé da
rocha.
Da barra do Aracaty ao cabo Iguape, a costa se desenrola
por uma linha sem inflexão, quasi recta. Este cabo, situado a
3° 56′ 45″ de lat. sul, é visivel a 23 milhas, ergue-se a 123 me-
tros ; é formado por grande morro que desce para NE. em
lenções de areia movediça. A oeste do cabo, a praia se encurva,
em forma de pequena bahia, na qual podem ancorar navios em
fundo de 5 a 6 metros a 1 milha da terra.
Do Iguape a ponta do Mucuripe o alinhamento costeiro per-

verno para cederem suas terras mediante uma indemnisação


modica.
"A agua. prosegue aquelle observador, escoou se con
uma rapidez incrivel para o mar. O local occupado ou-
tr'ora pelo reservatorio tornou- se um sitio de desolação e de
tristeza ; a passarada retirou - se o gado e outros animaes pro-
curaram pastagens alhures : o caçador não saciou mais a fome
dos seus filhos e nem o pescador conseguio deitar as suas re-
des ; acabaram-se as fructas, seccaram as plantações e tudo
alli agora é tristeza e desolação.
"Felizmente os agentes atmosphericos continuam constan-
temente o seu trabalho de recomposição e d'aqui a poucos
annos, vencido o jogo da maré, veremos fechado o boqueirão,
que tem cerca de 100 metros de largura.
"O morro tem na base, approximadamente, 200 metros de
espessura e já soterrou uma parte na foz do rio, e grande
quantidade de coqueiros de um pequeno sitio adjacente.
E' provavel que não havendo invernos rigorosos , haja
obstrucção completa por estes tres annos.
Barra do Cauhipe. -Tive o praser de visital-a a 24 de Abr 1
de 1895, dia em que foi arrombada.
"Mais bella e profunda do que a do Juá com maior vo-
[1 ] Mouchéz- Côtes du Brésil.
43

de a directriz uniforme, rectilinea rompe-se em sinus multi-


formes, ouriçados por morros arenosos de 50 a 80 metros de
altura. Esta ponta , que é o prolongamento da duna , ahi pro-
tegida pelo recife, adianta -se pelo mar, quebra a monoto-
nia da costa com a reentrancia que forma, dando - lhe a encurva-
ção de uma meia elipse alongada, onde se abre o porto da For-
taleza.

As dunas maritimas proseguem para nordeste, menos alta-


neiras, e menos movediças, baixando gradativamente aqui e alli
para dar passagem as correntes fluviaes.

Particularisando os portos e enseadas abrem- se na costa :


CAMOCIM ( 1 ) situado a 5,960 metros da foz do estuario do
seu nome ou Curiaú. Bem abrigado, espaçoso, e com a capa-
cidade para admittir os vapores do Lloyd, precisando ser

lume d'agua (pois tinha cerca de 8 leguas de perimetio), po-


dia rivalisar, senão exceder ao açude de Quixadá. Difficilmente
conseguiram arrombar a enorme montanha de areia, que lhe
servia de barragem.
"A medida que, iam fazendo o sulco, desabavam as bar-
reiras, impedindo o curso das aguas ; um dos trabalhadores
quasi morria por occasião de desabar uma dellas.
Utilizaram -se, porém, de umas barricas desprovidas de
tampas, e enfileiradas umas após outras, conseguiram fazerem
tubo afim de melhor guiar a agua. Continuaram o trabalho e
pouco tempo depois a agua estava toda no mar, que fica a 1
kilom. de distancia.
"O lago do Cauhipe, muito mais precioso que o do Juá de
nma fertilidade espantosa, alimentava fartamente todos os ha-
bitantes do municipio, de legumes, peixes e fructas de que
faziam grande commercio de exportação .
"Era invencivel a abundancia de peixes de varias especies :
a saborosa curimată (de familia de salmões), o piau, a trahira;
o cará, o cangaty, etc. como tambem as plantações de man-
dioca e dos cucurbitaceos : melões, abobaras, melancias .
"Actualmente o morro que é formado pela reunião de
grandes dunas, unidas pelas bases. tem 55 metros de talude
e 770 na corôa. Talhado quasi verticalmente, formando diver-
( 1 ) Veja-se Th. Pompeu -Ensaio Estatistico da provincia do
Ceará Vol. I.
Dr. José Pompeu - Corographia do Ceará― pag . 24.
44

desembaraçado em sua barra de lages submarinhas. Suas ma-


rés oscillam de 2.m 95 uas aguas vivas a 2 mem aguas mortas.
No equinocio vão de 3m 20 a 1m 85.
O estabelecimento do porto é as 5 horas e 30 minutos da
tarde.
A media da profundidade da barra, em baixa- mar de aguas
vivas, é de 1m 80c. Nas aguas vivas pode dar passagem a na-
vios calando 4m 15, e nas aguas mortas 3m 20.
Nas epocas de equinoxio pode dar franca entrada a navios
calando de 4m 40 .
Jericoaquara- formado por grande enseada, e abrigado
pela ponta do mesmo nome, a 72 kilon.etros a O de Acarahú,
situado a 20, 47' 10" de latitude sul e 20, 45′ 46″ de longitude
oriental do Rio de Janeiro. E ' pouco frequentado. E' notavel por

sas concavidades e saliencias, é de uma belleza extraordinaria,


e ameaça soterrar novamente a foz do rio Cauhipe, ligando - se
ao morro opposto, de forte declive.
O boqueirão é mais largo do que o da barra do Juá ; con-
tudo, senão fôra a maré fechar-se-ia em poucos annos. Entre
os dous morros existe um poço, pouco profundo.
Barra do Periquara. - A barra é proxima a povoação de
Siupé. O lago era de pouca largura perto da barragem ( de 25
metros de talude e 129 de corôa , mas em compensação muito
profundo e extenso. Já do Siupé a S. Gonçalo, onde occupa-
va extensa área, tinha volume d'agua mais ou menos igual ao
do Cauhipe.
Era tão piscoso e util quanto os dous lagos que acabamos
de descrever.
O rio S. Gonçalo que despejava no reservatorio, já perden
a foz, sua corenteza não tem mais força para arrastar os de-
trictos, forma actualmente extenso lagamar, domicilio de myria-
des de peixes e de grandes ophidios, como a sucuriúba, verda-
deiro monstro aquatico.
Por motivos, já apontados, abriram o morro, escoando- se
a agua para o mar, a pequena distancia.
A acção dos ventos é tão activa alli como nas praias dos
Pacheco e Cauhipe, e o boqueirão, que é estreito, mais uma vez
fechará.
Vae-se ao boqueirão por dous caminhos : um fluvial, pelo
lagamar, outro por terra.
“José Pinheiro -Barras de Soure-na Revista do Instituto do
Ceará-anno XVI, 1902 - pag. 84 e seguintes.
Um historiador das seccas do Ceará, meu velho amigo Ro-
45

ter sido no começo do seculo XVII visitado pelos francezes,


que entretinham relações com os indios da Ibiapaba, e por
ter nelle ficado por mais de anno a primeira expedição de Je-
ronymo de Albuquerque, em 1613, com destino a S. Luiz .
ACARAHÚ—na foz do rio do seu nome, formado pelo bra-
ço maior do rio, dando accesso a navios de pequeno calado,
em marés d'agua viva. Sua barra está parcialmente obstruida
por bancos de areias, ficando a cidade de Acarahú a 6 kilo-
metros a montante do rio. "Presume - se, diz Th . Pompeu,
que se tapando o braço menor do rio, as grandes enchentes
poderão rasgar ou desobstruir a barra removendo os bancos
de areia." O estabelecimento do porto é as 5 h.
BARRA DOS PATOS . ALMOFALA . PORTO DO BARCO e FER-
NANDO são pequenas enseadas, que offerecem fundeador a na-
vios de 130 toneladas.
PERNAMBUQUINHO - pequena enseada frequentada por jan-
gadas e barcos de pescadores.

dolpho Theophilo, referindo - se no seu livro ( Seccas do Ceará,


pag. 54) ao arrombamento destes pantanos, escreve :
Um dos maiores erros ou o maior crime do seu governo
(do Coronel Freire Bizerril ) foi o arrombamento dos lagos do
Couhype e do Catú. Esse crime de lesa-humanidade, praticado
na terra das seccas, bastaria por si só para a sua condem-
nação. O que de algum modo pode ainda attenual o é a influ-
encia que sobre o seu espirito exerceu o Sr. Dr. Thomaz Pom-
peu de Souza Brasil, que pela imprensa, em repetidos artigos,
propalava a inutilidade dos lagos do Caulype e tambem o
perigo a saude publica".
A accusação é formal. Nunca protestei contra ella, pelo
simples facto de não contraditar o que se diz de mim.
Os homens publicos devem ser julgados pelos seus actos, e
não por accusações infundadas. Na hypothese vertente, basta
a reproducção dos artigos alludidos para se ver como eu en-
tendia a questão das lagôas. E por ser assumpto interessan-
te aqui os reproduzo na sua integra :

AS LAGOAS FORMADAS PELA OBSTRUCÇÃO DAS


AREAS NA BARRA DOS RIOS

Com os annos de inverno escassos desde 1877 a 1892 al-


guns dos pequenos rios que despejam entre o Choró e ɔ Catú
46

MUNDAHÚ -fundo e abrigado , formado pela represa do


mar na barra do rio de seu nome ; é frequentado por sumacas,
hiates e barcaças. "Sua situação proxima a serra da Urubure-
tama. num terreno fresco e proprio para lavoura, promette
dar- lhe grande importancia futura". Infelizmente esta predicção
se não realisou . Os pequenos portos vão sendo abandonados
pelas difficuldades de fundeadouro para os vapores costeiros.
PARASINHO - formado pelo estuario do Curú.
PECEM- sem importancia, especie de estuario de pouco
fundo.
CEARÁ- ou Barra do Ceará, formado pelo rio do seu nome,
a 12 kilom. a noroeste da Fortaleza, profundo e espaçoso , mas
o canal que lhe dá entrada é muito estreito e pedregoso, quasi
obstruido por baixios ou bancos arenosos.
E' objecto de estudos por parte da commissão, nomeada
pelo ministro da industria, Dr. Calinon, para construcção de
um porto na capital do Ceará.

não adquerirão bastante agua para transpor o deposito de


arêa que os ventos poseram em suas barras.
A acção cada vez mais energica dos ventos, erguendo me-
dões de areia em toda a costa, conseguio formar em algumas
dessas barras altas collinas que jamais poderão ser desmoro-
nadas pelas aguas pluviaes trazidas pela corrente dos rios.
A repreza formada foi-se avolumando a proporção que a
estação invernosa proseguia, inundando extensas baixas de
terreno alluvial, em grande parte cultivadas, e productoras
de cereaes.
Emquanto os invernos não excederam da media normal, o
prejuiso causado por taes inundações foi facilmente reparado
e até compensado pela frescura e limo que as aguas deixararı
nas terras, permittindo o alargamento das culturas até o
meiado do verão.
Em vez de queixas, os proprietarios ribeirinhos de taes
correntes açudados, agradeciam tamanha protecção ao traba-
lhador cego e inconsciente que lhes proporcionava gratuita.
mente tantos beneficios.
Presentemente, a dadiva das nuvens ultrapassa os limi-
tes do util, e vai produzindo ruinas aonde dantes derramava
proveitos. As inundações cobriram dezenas de kilometros,
destruiram casas, cercas, plantações e as demais bemfeitorias,
penosamente adqueridas com o trabalho de alguns annos.
Tudo isto pouco ou quasi nada seria si do mal de alguns
47

Parece que a commissão julga possivel a sua adaptação


ao trafego maritimo da Fortaleza.
FORTALEZA-forma uma enseada alongada, a começar da
ponta do Mucuripe a leste, desenvolvendo- se por mais de 7 ki-
lometros para ONO. A Coroa Grande, a meia milha a norte,
serve-lhe de quebra-mar.
O aterramento progressivo e ininterrupto do porto pelas
dunas movediças inutilisaram completamente as obras do me-
lhoramento da companhia ingleza , baseadas nos estudos do
engenheiro Haukshaw. O quebra -mar, construido a 200 metros
do litoral, foi prompto e rapi lamente invadido pelas areias,
tendo de ser abandonado.
O governo mandou posteriormente construir uma ponte
com a extensão de 150 metros, ligada a alfandega, e pela quaj
se faz o desembarque de mercadorias e de passageiros. Come-
ça a aterrar-se.
No baixa-mar o ancoradouro interno é abrigado pelo reci-

resultasse o proveito de muitos : porque aquelle promptamente


seria remediado por meio de indemnisações rasoaveis, e os be-
neficios se tornariam permanentes.
Effectivamente a repreza d'agua, alem de certos limites,
á ninguem aproveita, prejudica a muitos agricultores.
A barragem formada pelas areias é tão proxima ao mar
que abaixo della se estende apenas uma faxa estreita de ter-
renos de areias soltas, de praia, esteril e incapaz de ser utilisa-
da na lavoura..
Não havendo terrenos a irrigar, a abundancia d'agua.
alem das necessidades de aguada e das vasantes, redunda em
prejuizo das lavras que ficam a margem de taes represas. E
essas lavras não são de pouca valia : constam de plantações de
canna, arroz, milho, feijão, mandioca, etc.
Meu parecer seria que não tocassem em taes barra-
gens, se ellas estivessem de terrenos ferteis, aproveitados ou
aproveitaveis, para as culturas, porque então representariam
vastos depositos d'agua, construidos pela natureza, capazes de
os irrigar.
A agua empoçada, só para o prazer da vista, em prejuizo
de muitos agricultores. cujos terrenos ficam inundados, nunca
foi o desideratum dos que entendem ser o açude o maior
beneficio que o Ceará poderá receber.
Certamente não convem destruir taes reprezas : já, como
48

fe, que representa o papel de quebra-mar, por uns 360 metros


de extensão.
O estabelecimento do porto é as 5 h. 30 m.
A oscillação das marés é de 2.5 nas aguas vivas , 1m 6
nas mortas, e de 2m nàs ordinarias.
O fundo do porto no Meirelles e Mucuripe é formado de
rochas desiguaes, anfractuosas ; no ancoradouro da Fortaleza
predomina a areia e mais adiante saibro.
MUCURIPE --é o prolongamento extremo oriental do porto da
Fortaleza ; desprotegido dos ventos de NNO. e ONO . e Oeste.
A ponta, sobre a qual assenta o pharol, é rochosa, forma-
da de grés. O pharol está situado aos 30 41 ' 10" de latitude sul
e aos 4° 34′ 36″ de longit. oriental do Rio de Janeiro. O appa-
relho de luz é dioptrico, de 4 ordem com eclipses de 1 minuto.
O plano focal acha-se a 33m 36 acima do nivel, sendo visivel a
luz a 12 milhas em tempo claro.
IGUAPE-a 18 kilom. a nordeste de Aquiraz, forma grande

disse, porque servem de aguada para animaes e usos domesti-


cos, já porque refrescam as suas margens.
Ha um meio termo entre a total destruição e a inundação
inconsiderada de terrenos cultivados - é fazer-se escoar a agua
prejudicial por meio de sangradouro, aberto propositalmente
na altura conveniente.
Para isto tem o governo estadual uma repartição de obras
publicas com profissionaes capazes de superintender tal obra.
Talvez seja possivel, si a mobilidade das areias permittir,
construir-se um sangradouro de alvenaria que facilite, du-
rante os invernos, o escoamento, sem perigo de destruição, das
aguas superabundantes.
Asseguram-me que os proprietarios ribeirinhos da repre-
sa do Catú se offereceram á municipalidade de Aquiraz para
abrirem a custa delles o sangradouro, e que esta não só recu-
sara este concurso, como prohibira que se tentasse qualquer
remedio para minorar os damnos causados pela inundação.
A ser isto exacto, é mais uma falsa interpretação que as
novas instituições dão a doctrina constitucional que garante
a propriedade cidadã em toda a sua plenitude.
Quer pela constituição do Imperio, quer pela vigente, os
poderes publicos garantem auxilios e soccorros aos que sof-
from graves prejuizos em virtude de inundações . epidemias,
seccas, ete.
A camara do Aquiraz. não só infringe o preceito consti-
49

enseada, abrigada por dunas arenosas. Sua entrada é franca


mas pouco frequentada. Nella ancorou a esquadrilha de Jero-
nymo de Albuquerque em 1C13.
ARACATY- formado a barra do Jaguaribe por uma corôa
arenosa que serve de quebra-mar a sua entrada. Sujeita a oscil-
lações de nivel pelas correntes do rio e ventos propulsores das
dunas, torna-se o nivel da barra e mesmo o do ancoradouro in-
certo, variavel, carecido de repetidas sondagens e de especial
praticagem aos navios que o demandam.
Depois da grande enchente, em 1875 , diz o Dr. José Pom-
peu, a altura d'agua na corôa. em baixa-mar regular, reduzio-
se Om , 88. "Em 1876 e 77 a agua na mesma corôa, attingio
gradualmente a altura de 2 , 13 na vasante. O canal é recti-
lineo com a largura superior a 100 metros.
"Durante o verão , seis mezes proximamente, o volume do
Jaguaribe conserva- se sem alteração sensivel. ( 1 ; Quando o nivel
do mar se eleva com a enchente, que attinge cerca de 2 me-

tucional, como attenta contra o direito de propriedade, não


permittiudo que os possuidores de terrenos, de lavras e habi-
tações, resgatem-nos das forças destruidoras da natureza.
Se a municipalidade entende que resulta para o municipio
grande proveito com a represa illimitada do Catú, embora a re-
ducção dos terrenos prestadios, deve proceder. de accordo com
a lei, desappropriando- os aos donos os inundados, mediante
indemnisação.
Ha, porém, a considerar que despezas deste genero são
quasi injustificaveis, pois o que as legitima aos olhos do
contribuinte e o seu destino proveitoso e urgente. Ninguem
dirá conscientemente que essas grandes massas liquidas, que
não servem para irrigação, e excedem as necessidades da
agoada e dos usos domesticos, que não melhoram os terrenos
marginaes . porque a área de suas filtrações não vai alem de 30
metros, difficultando alem disto o transporte nas estradas ca-
recidas de pontes, occupando o melhor dos terrenos de allu-
vião, sejam de proveito geral.
Nos pequenos rios, que vão ter ao mar, as terras de allu-
vião, compostas de humus, não se alargam das suas margens
mais de 10.0 a 1500 metros. Ora, desde que essas áreas ficam

(1 ) Dr. José Pompeo - Corographia do Ceará - pag. 30, que


bebeo estas informações no Relatorio do Sr. Revy sobre o açu-
de de Lavras pag . 28.
50

"Nas enchentes extraordinarias, o Jaguaribe apresenta um


volume dagua excedente de 4500 metros cubicos, em frente a
cidade do Aracaty. A corrente transporta grande quantidade
de areia e alarga o canal, que passa de 4500 metros e a mais.
Diminuindo a velocidade, a areia deposita-se na corôa, obstru-
indo o canal e elevando- o de alguns metros.
"Quando termina a cheia do rio, a altura d'agua sobre
a corôa está muito reduzida : e, segundo as circumstan-
cias e os novos bancos de areia formados durante a enchente,
a maré abre pouco a pouco novo canal na corôa e o cava, em-
quanto não se dá o equilibrio entre a força de erosão da cor-
renteza e a resistencia das areias no fundo.
"O canal attinge dimensões regulares. Na ponta do sota-
vento da barra está o pharol dioptrico, de 5 ordem : luz fixa,
alcançando 18k500 . Está situado aos 4° 24′ 20 ″ de latitude
sul e 5° 22′ 20″ de long. orient. do Rio de Janeiro .

inutilisadas on cobertas d'agua, perde-se uma riqueza, pois


tanto importa a luxuriante producção dos mesmos. Os terre-
nos que lhe ficam a cavalleiro, acima do nivel das grandes
inundações, são geralmente compostos de quartz ou gneiss em
desaggregação , arenosos, quasi improprio á cultura dos cereaes
e plantas que exigem solo profundo e compacto. Geralmente
são destituidos dos saes nutritivos, que as enxurradas carreiarão
para baixo.
Alem deste inconveniente, que eu chamarei de natureza
geologica, ha outro. porventura mais sensivel e desastroso, qual
seja o de abrir a porta a indemnisações, cujo termo e quantia
ninguem poderá prever.
Terá a municipalidade em cofre as quantiosas sommas
que ellas requerem : será licito ao Estado subsidiar taes obras ?
Queira Sr. redactor publicar essas linhas que, supponho, tra-
duzem o modo de pensar do povo cearense. Do muito agradecido,
assignante,
THOMAZ POMPEO.
16 de abril de 1894.
AS LAGOAS DO CAUHYPE

O Sr. Dr. Thomaz Pompeu nos enviou o seguinte :


Julho de 1894.
Sr. Redactor. O que todos previamos infelizmente realisou-
se : a inundação de vasta zona cultural, occupada na quasi to-
51

tros, um certo volume d'agua passa por cima da corôa até onde
seu estuario chega a preamar. Dando-se depressão do nivel, ra
vasante, volta a agua para o mar. Esse fluxo e refluxo abre
um canal na corôa de areia , para alli conduzida pelo vento
E, que sopra ao longo da costa, revestida de dunas, mudan-
do de volume e de posição, conforme a força e direcção dos
ventos.

O estabelecimento do porto é as 4 h. 45 m.
RETIRO GRANDE - a 50 kilom, a L. da barra do Aracaty,
forma uma enseada, protegida pela Ponta -grossa, que se pro-
longa pelo mar, abrigando- a dos ventos e ondas. Era funda,
porém, actualmente muito aterrada e desabrigada da forte
arrebentação que difficulta sobremodo o embarque e desem-
barque. Sua communicação com o Aracaty faz - se atravéz de
morros e areias movediças, não permittindo transito regular
de carroças.

talidade por sitios plantados de cannas e de fructeiras, no Cau-


hype.
Da obstinação, mal entendida e prejudicial, da camara de
Soure, segundo me informam, em não consentir que abrissem
a barragem formada de arêas movediças a embocadura do rio
S. Gonçalo, resultaram não pequenos prejuizos á lavoura, e a
penuria de muitos agricaltores laboriosos, cujas terras, casas,
machinas e utensilios agricolas ficaram debaixo das aguas
represadas.
Difficilmente se penetra os intuitos administrativos da-
quella corporação, cuja missão principal é facilitar a expansão
da vida agricola no municipio e não concorrer para a ruina
e desbarato da fortuna particular, salvaguardada pelas leis da
nação.
E' convicção minha que em qualquer paiz, cuja proprie-
dade seja garantida pelos tribunaes e não mero artigo consti-
tucional, os prejudicados por actos dessa natureza seriam in-
demnisados dos prejuizos soffridos, e os representantes muni-
cipaes responsabilisados pelos damnos causados á salubridade
publica e aos interesses economicos do municipio .
Quem teve a infelicidade de percorrer a zona costeira que
se dilata desta capital ao Curú, na quadra actual, depois da
rigorosa estação invernosa, mal comprehende como se procure
impedir o escoamento natural das aguas empoçadas. Os terre-
52

ILHAS

A costa aberta não offerece senão pequenas ilhas forma-


das por alluviões dos rios ou desaggregadas do litoral pelas
enchentes destes. As principaes ficam na costa ladeiante ao
Acarahú.
BOIS -com 400 m. de circumferencia em frente a Almo-
fala.
VACCAS -de iguaes dimensões, nas proximidades desta.
GUAJERÚ- com 3 kilom. de extensão, na costa de Almofala.
MANGUE SECCO -na mesma costa, com 4 kilom. de com-
primento .
FERNANDO- -com 300 metros de extensão, na mesma costa.
MOSQUEIRO - com a mesma extensão e na mesma costa.
RATO -Com 600 m. de extensão e 400 de largura.
COKOA GRANDE - com 700 m. de comprimento por 90 de
largura.
MOSQUITO - proximo a cidade do Acarahù, com 9 kilom.
de comprido poa 6 de largura, 9 kilom. do litoral.

nos planos ou de pouca inclinação estão egualmente converti-


dos em pantanos, lodaçaes, que interrompem o transito das
estradas e por ellas se estendem por kilometros e kilometros,
tornando penosa a marcha dos animaes de carga e insalubre a
travessia.
Esses terrenos precisam ser drenados, porque, como estão,
nem servem para cultura, nem permittem a creação. O pasto
que brotou apodreceu debaixo d'agua . A drenagem natural
fazia - se por meio dos riachos ou correntes que despejam nos
rios ou corregos, que actualmente estão barrados, formando
bellas lagoas on pantanos para recreação da vista dos poucos
que procuram gosar esse espectaculo, não inteiramente inno-
cente, porque as suas exhalações miasmaticas produzem febres
palustres, e as nuvens de mosquito , importunações menos
agradaveis.
A unica serventia que taes lagoas podem ter, é servirem
de aguada ; mas comprehende-se facilmente que a propria es-
tensão da area coberta d'agua, em vez de tornal-a de facil
accesso para os animaes, convertem -na em enorme paúl. Com
a evaporação, que se opera rapidamente, as aguas retiram-se
das margens da lagôa, deixando -as descobertas e convertidas em
lamaçaes, tanto maiores quanto mais planas e argilosas são.
Para aguada deviam procurar sitios apropriados, ampara-
53

CONSTITUIÇÃO GEOLOGICA

Segundo o parecer do professor Orville Derby (1 ) a base


do grande planalto brasileiro consta de antigas rochas meta-
morphicas, que formam a quasi totalidade das montanhas e
apparecem isoladas nas provincias, especialmeute nos pontos em
que as planicies teem sido profundamente desnundadas.
Dividem-se em duas grandes series. A mais antiga, consta
de rochas altamente crystallinas, como granito, syenito, gueiss
e micaschito. Hartt referio-a ao systema laurenciano, referen-
cia confirmada pelo encontro em varios pontos do Eozoon ca-

dos, dos raios solares por vegetação ou serrotes, e não os ter-


renos embrejados, abertos, cujas aguas se evaporam rapida-
mente no tempo em que ellas são mais necessarias.
Nos aunos mais seccos, de 1877 e 78, nunca faltou agua
para o gado em todo o Cauhype e praias adjacentes, tendo
sido a região littoral a mais procurada pelos sertanejos para a
retirada dos gados do interior do Estado.
A preoccupação, portanto, de aguada em região que requer
a deseccação dos brejos para ser aproveitada, revella a ignorancia
das suas condições topographicas, senão grave erro economico .
Carencia de comprehensão do phenomeno da agua para
agricultura, mostra quem confunde a necessidade dos açudes
de irrigação com o empoçamento de aguas que não podem ser
aproveitadas na lavoura, quer pela situação da represa em re-
lação as terras marginaes, quer pela natureza da barragem.
Tão benefica é a agua derivada de um açude nas occa-
siões em que as regas são necessarias, quão nocivas as que
demoram em tempo inopportuno ao pé das plantas, que re-
querem calor, luz e ar para vegetarem e que delles estão par-
cialmente privadas por esse empoçamento .
Os agricultores, prejudicados com o aterramento da bar-
ra do Cauhype, por mais de uma vez tem procurado obter
consentimento para abrirem- na , á exemplo do que se fez com
a do rio Catú. Menos felizes do que os ribeirinhos deste, não
conseguiram obter tal licença, que, a meu vêr, não precisa-
vam pedir, tratando -se de uma calamidade publica como é a
da inundação.
Não contesto a municipalidade o direito de expropriar
por motivo de utilidade publica qualquer propriedade parti-

(1) Wappaeus - Geographia do Brasil- trad. etc. por Ca-


pistrano de Abreu , pag. 45.
54

nudense que o caracterisa . (1 ) A segunda serie, menos perfeita-


meute crystallina , compõe- se de quartzitos, schistos, minereos
de ferro e calcareos, e pode referir- se com certeza quasi igual
ao systema huroniano.
A bacia do Parnahyba é quasi exclusivamente occupada
por uma grande formação de grés, na qual existem nodulos
calcareos que conteem bellas amostras de peixes fosseis da
edade cretacea . A mesma formação apparece no Estado do
Ceará, um tanto retirada dos limites da bacia.

cular, mas para isto precisa seguir os transmites processuaes


do nosso direito .
O que lhe vedam as leis naturaes e todos os codigos é a
usurpação desta propriedade, sob qualquer que seja o pretexto ,
pois tanto importa consentir na inutilisação dos terrenos de
lavoura submergidos pela agua por obstinação em não con-
sentir na destruição de barragens extemporaneas, inuteis e pre-
jndiciaes.
Parece que a municipalidade visa exasperar esses paci-
ficos lavradores, que tão resignadamente pedem, supplicam.
aquillo a que teem incontestavel direito, e para o que concor

(1 ) A existencia do Eozoon, depois de muito controvertida


na sciencia, parece definitivamente julgada. Eis o breve his-
torico da questão : Em 1863 Mac Mullen achara, na mais alta
das tres faixas calcareas do archeano inferior, um calcario ser-
pentinoso, imbricado, formado de camadas alternativas de ser-
pentina ou de pyroxeno e de carbonato de cal. Estudando esses
systemas de membranas (cloisons) Dawson, Carpenter e Rupert
Jones acreditaram trajar-se duma estructura organica, devida
a um foraminifero. que recebeo o nome de Eozoon canadense.
Em seguida Gümbel annunciou o descobrimento do Eozoon ba-
varicum nos calcareos archeanos da Baviera, encontrando o mes-
mo fossil nos marmores serpentinosos da Finlandia, Saxe, Sile-
sia e Hungria. Outros encontraram no na Bohemia, Pyrenéos.
Afinal King e Rowney que encontraram a mesma estructura
num ophicalce moderno da ilha de Skye, Perry e Burbank.
que affirmavam que o Eozoon de Massucheserts se continha num
verdadeiro veio calcareo, deram golpe mortal no supposto fo-
raminifero . " Segundo os palenteologistas mais competentes, diz
Lapparent (Traite de geologie pag. 731 ) o estudo minucioso a
que se entregou Möbins parece ter feito descer definitivamente
o Eozoon a classe de um simples accidente mineralogico , sus-
ceptivel de produzir- se em todas as misturas intimas de calcito
cola a serpentina ou o pyroxeno."
55

O barão de Capanema, nos Apontamentos geologicos, pu-


blicados no Rio de Janeiro, em 1868 ( 1 ) refere - se em algumas
partes de sua obra a constituição geologica do Ceará, e como
sejam poucas as traslado para aqui :
"No Crato, diz elle, distante cento e vinte leguas do lito-
ral. existem os restos de uma vasta camada de sedimento que
constituem a serra do Araripe : por baixo da massa arenosa
apparecem stractos argilosos inteiramente identicos aos de
Itaparica (Bahia) contendo os mesmos crystaes de galena e de
pyrites : ainda aqui não apparece fossil algum Logo abaixo

rem com a quota de impostos necessarios a serem manu-


temidos na posse dos bens que as leis lhes garantem.
Contra uma corporação que só tem direitos, e esquece os
deveres, que usurpa sem ter quem lhe ponha embargos ao
acto, que caprichosamente recusa satisfação as necessidades
mais instantes da população, que fazer ?
Essas pobres victimas estão na situação daquelles bretões
de que nos falla Tacito, perseguidos pelos barbaros que os im-
pelliam para o mar, e repellidos por este que os entregava aos
inimigos.
TH. POMPEU .

AS LAGOAS DE CAUHYPE

Não pretendia voltar a este assumpto depois das razões


de conveniencia publica que eu artigos anteriores expuz, nas
columnas deste periodico, acerca da abertura da barra do Cau-
hype.
Receiava, sobretudo, que procurassem desviar a questão, a
que se prendem interesses geraes, inclusive o dos cofres do
Estado, dos seus estrictos limites para o da polemica pessoal.
desvirtuando por esta forma a discussão , e forçando-me a ba-
ter em retirada ao primeiro rebate do doesto.
O longo parecer da camara municipal de Soure, inserto n'A
Republica do dia 2 do corrente mez, já por sua procedencia, já
por algumas das allegações que apresenta. carecidas de ana-
lyse, senão de contradicta , me demove d'aquelle proposito,
afim de apurar se a conveniencia ou não da conservação da
lagoa do Cauhype.
O parecer discorre sobre assumptos de importancia um

( 1) Capanema -Apontamentos geologicos- pag. 45.


56

se encontram calcareos em estractificação parallela ao tauá.


Esses calcareos conteem grande numero de pequenos crusta-
ceos do genero Cypris, que abunda na formação do Wealden
e na do Jura. Por consequencia o tauá é ou jurassico, ou de
formação mais recente, cretaceo.
"Gardner qualificou o Araripe de cretaceo : 1º porque na
chapada achou soccavões cheios de materia branca de que se
serviam para caiar casas, e que elle sem mais exame tomou
por greda (giz) , restos das antigas camadas que jaziam sobre
o planalto arenoso e que foram levados pelas aguas. Foi um
descuido, muito natural em viajante tão consciencioso como
Gardner. Elle se enganou completamente, o seu giz não passa
de tabatinga, confundio cal com argila. O 2º argumento deve-
ria ser mais concludente. Elle encontrou peixes fosseis entre
a camada arenosa e a argilosa, e Agassiz os classificou de cre-

pouco ligeiramente, e por affirmações categoricas, sem adduzir


à meu ver, razões poderosas que destruam o que escrevi sobre a
inutilidade da conservação da grande represa , sem os seus cor-
rectivos.
Quer as considerações acerca da natureza e prestabilidade
do solo alagado, quer as que entendem com a economia das
populações marginaes, peccam pela observação incompleta dos
factos, uma vez que não as devo attribuir á parcialidade ou
proposito de illudil- os .
Relativamente a cultura, diz o parecer, "o sólo d'aquelle
rio ( Cauhype ) só tem prestabilidade com a permanencia do
lago, porque sendo os terrenos da pessima natureza, pobres
de humus, sem uberdade alguma, estando descoberto , e sendo
lavados pelas aguas pluviaes, cada vez mais fracos fieam . "
"Ao contrario, a estagnação das aguas impede que os
estrumes sejam levados para baixo, e pelo apodrecimento
delles as terras vão adquirindo capacidade para plantação.
"A medida que as aguas diminuem, os terrenos vão fican-
do descobertos, e sendo utilisados para toda especie de lavou-
ra que produz de modo espantosamente vantajoso ."
A simples confrontação do primeiro periodo com o ultimo
patenteia a contradicção de suppor que os terrenos alludidos
são de pessima qualidade, sem uberdade alguma e ao mesmo
tempo, quando descobertos ou livres da inundação, "aptos para
toda a especie de lavoura, que produz com espantosa vantagem.”
Os proprietarios prejudicados não desejam outra cousa
senão ver os seus terrenos desembaraçados d'agua, afim de
conseguirem essas tão espantosas vantagens.
57

taceos. Admitto que tenha toda a razão, mas esses ichtyol-


thos são rolados, alheios aos dous sedimentos ; em vez de es-
clarecimento trazem duvida, que cresce de ponto pelo achado
que fiz de uma planta incontestavelmente jurassica de So-
lenhofen (uma Arthrotascites) .
"Na encosta da serra da Ibiapaba, na subida de Villa Vi-
çosa, ha uma rocha quartzitica stractificada. Em Lavras ha um
morrete em que o rio Salgado fez um córte profundo, ou bo-
queirão, de pedras verticaes . Esse morrete é uma massa isola-
da do mesmo quartzito stractificado com grande porção de
laminas de ferro micaceo. (Pag. 6).
"Um exemplo notavel apresentam as rochas de gneiss em
muitos lugares da serra da Uruburetama, da beira do rio em
Sobral e na fonte tepida do Carnahupagé. Alli cessando a chu-
va, apparece efflorescencia de sal de cosinha. Admittir infiltra-

Comprehende-se facilmente o que vae de erroneo na affir-


mação sobre a inferioridade dos terrenos alagados, desde que
se attende um pouco á formação e natureza dos mesmos. A
área, actualmente alagada, forma uma bacia alongada na di-
recção do rio, tendo por talweg o leito deste. E ' provavel que
em periodos anteriores, as dunas que se alteiam na praia. e que
mais de uma vez he têm barrado a fóz, hajam occasionado
lagos mais ou menos extensos, cujos limites extremos, pela
parte mais alta, não ficarão muito acima dos actuaes. A con-
sequencia disto é que a natureza, por trabalho secular, deve
ter accumulado neste valle um grande deposito de detrictos or-
ganicos e mineraes em ordem a formar o que na linguagem
ordinaria se chama terreno de alluvião. E isto mesmo se infe-
re do parecer da camara, quando diz -que o valle do rio é
composto de terreno poeirento e frouxo, transformando-se em
lamaçal e atoleiros logo que as aguas o descobrem.
Acredito que elle se compõe de uma boa parte de argila,
de terra calcarea e de espessa camada de humus, talvez intre-
meiada com pequenos seixos rolados, o que o torna altamente
apto as differentes culturas do Ceará, e particularmente a
da canna.
Os atoleiros resultam geralmente da excessiva humidade
ou da imperfeita drainagem de um sólo de alluvião, composto
na sua mór parte de terra vegetal ; porque, quando elle é sim-
plesmente argiloso, a agua não o penetra senão superficial-
mente, reseque e endurece rapidamente sob a influencia di-
recta dos raios solares. Quando de envolta com argila e
58

ção em tempos anteriores, seria possivel, porém, mais proba-


bilidade ha a favor da injecção e vapores de chlorureto de so-
dio vindos do interior. ( Pag. 19).
"O carvão nunca teve grande sympathia pelas rochas crys-
talinas primitivas, apparece em quantidade menos que ho-
meopathicas, em estado de diamante encravado no itaculemi-
to... ; depois apresenta-se ainda em alguns gueiss do Riacho
do Sangue, de Baturité, em estado de graphito . Além disso nos
calcareos eruptivos encerrados no gneiss da Serra do Araripe,
tambem apparecem crystaes muito pequenos, o que concorre
para provar que o calcareo estava exposto a temperatura de
2.500. (1)
No Ceará é frequente a turmalina, e fronteiro a Pacatu-
ba fui ver um lugar em que diziam existir carvão de pedra :
por tal houveram engenheiros nossos, grossos fragmentos da-

humus existe calcareo, logo que o sólo secca se desprende uma


poeira fina, que é varrida pelos ventos nas varzeas dos rios.
Nenhuma razão ha para suppor - se que a alluvião do valle
do Cauhype seja differente da dos demais rios do Estado, e
sabe -se por exame feito pelo Dr. J. J. Revy que a do rio Ja-
guaribe attinge 1 a 2 metros de espessura.
A riqueza do valle de Cauhype, além destas razões que
chamarei theoricas, por procederem de argumentos tirados da
analogia, evidencia- se pela larga cultura de canna que nelle
se faz. Muitos sitios de canna e de fructeiras, servidos por en-
genhos de ferro, de madeira. alambiques, casas e machinas
agricolas, estão em parte ou totalmente descobertos pela inun-
dação, occorrendo me lembrar os que seguem, dos quae3 tive
informações :
1º de Manoel Ferreira da Rocha Motta com engenho de
ferro, alambique. casas, etc. avaliado em 30 : 000$000 : 2º de
Antonio Rodrigues Vianna, idem , idem, avaliado em 25: 0004000 :
3º de Vicente Alves Ferreira, idem, idem, avaliado em 6 con-
tos : 4º de Francisco Carlos Borboleta, idem, idem, idem, idem,
avaliado em 5 contos ; 5º de Joaquim Lopes de Araujo, idem .
idem, avaliado em 5 contos : 62 de Julião da Rocha Moraes,
com engenhos de madeira, avaliado em 2 a 3 contos : 7º de
Luiz Gomes do Nascimento, 8º de Estevão Ferreira da Rocha,
9 de Francisco Julião, 10º de João Gomes .

(1) Capanema -Apontamentos geologicos, pags. 34 e 35, 44-


45, 46, 52-33 e 61 .
59

quelle mineral. No morro da Raposa, perto de Baturité, exis-


tem os mesinos listões ainda mais caracteristicos.
"No Ceará são frequentes os amphibolitos puros.
"As mais das vezes, porém, é em terrenos de sedimento
onde as erosões se tornam mais consideraveis pelos grandes
desmoronamentos que alargam os suleos, fornecendo muito ma-
terial ao transporte, do que vemos exemplos notaveis na serra
do Araripe, no Ceará, que representa o resto de uma immensa
planicie de sedimento, já removida : e da mesma forma a Ibia-
paba. Representa aquella uma immensa fortaleza com paredes
a prumo de 200 palmos de altura. Ibiapaba pelo seu nome
indica terra cortada, por causa do paredão voltado para ori-
ente.
"No Ceará emergem do gneiss camadas empinadas do
schisto argiloso : em Baturité, além do Icó, e em uma encosta
da serra da Meruóca ; repugna realmente considerar essas pe-
quenas inserções como material primitivo de vastas regiões ao
passo que reputal-as zonas de erupção de gazes é mais natural.
Na Meruóca observa - se mais alguma cousa, que vem confirmar
a nossa theoria. ( Pag. 61).”
Segundo o professor Orville A. Derby, já acima citado, a
constituição geologica do Ceará é de formação terciaria na
costa, rochas laurencianas no centro, terreno cretaceo 110
sul. (1 )
João da Silva Feijó, na Memoria sobre a capitania do
Ceará. diz nos §§ 21 a 23 o seguinte :
"Observam--se
s a beira- mar camadas argilosas de diversas
côres, mais ou menos puras, sobrepostas em bancos de crés ou
pedras molares, e cobertas de ordinario de comoros de areia
solta que os ventos de continuo movem e transportam de uns
para outros lugares com não pequeno prejuiso das embocca-
duras dos rios, onde commumente se formam bancos de areia,
que impedem as embarcações e seu transito .
"Em outras partes se descobre este crês, mais ou menos
consolidado, até mesmo no cimo da Serra Grande e algumas
vezes cheia de conglutinações de fragmentos de ostras petrifi-
cadas do mesmo modo se mostram dispersas grandes mas-

[ 1 ) Veja José Pompeo -Corographia do Ceará, pag. 33.


60

sas de pedras on rocha viva, ou em pedaços ou em volumes


immensos, constituindo a superficie da maior parte das mon-
tanhas isoladas, em cujos vertices se notam de ordinario anti-
gas crateras vulcanicas afuniladas, que provam terem sido pro-
duzidas de erupcções subterraneas. encontrando-se nellas mui-
tas sortes de lavas, basaltos e schorls, uns vagos e outros en-
gastados em crystaes de quartz bancos, etc.
"Não são muito frequentes nestas montanhas do interior
do paiz, entre as camadas das argilas, os veios de amiantos
de muitas especies, terras bullares de diversas côres, albica, o
spato calcareo, a pedra pesada, o spato fluor, os cristaes mon-
tanos, as ametistas, mais ou menos coradas e apinhoadas, as
granadas vulcanicas, e por isso sem luzimento nem solidez.
Não são tambem raras nas abas da Seria Grande os etites,
cheios de ascidos de todas as côres. "
O terreno predominante é constituido por varias rochas
cristalinas em decomposição (1) principalmente gneiss, (2) e
forma um vasto lençol em toda a superficie do solo, ora a des-
coberto, ora acamado de terra, que em muitos pontos méde
apenas 22 centimetros de espessura.
Os montes do sertão são formados de micaschitas ( 3) dis-
postos em camadas, como que eristalisadas, diversamente in-
clinadas, de granitos variados. de silex ou geralmente areia

(1) Veja-se - Th . Pompeo - Ensaio estatistico, Vol. I , pag. 40.


José Pompeo - Corographia do Ceará, pag. 54. O Dr. José
Pompeo reproduz quasi textualmente o que o Senador Pompeo
escreveo, apoiado nos estudos do Barão de Capanema e Dr.
Silva Coitinho . Sirvo -me literaln.ente da sua exposição,

(2) O gneiss tem a mesma composição do granito (quartz.


feldspatho e mica) , do qual se distingue pelo parallelismo das la-
minas de mica e, em geral, pelo alongamento dos grãos de
quartz, que tomam a forma lenticular. Veja-se Lapparent-
Traité de geologie, pag. 701. Alem disto os elementos de feldspa-
tho attingem raramente nelle as dimensões que apresentam no
granito. P. de Séde - Conferences sur l'hist. natur. pag . 236 .

(3 ) O micaschito é essencialmente formado de quartz e


de mica, as mais das vezes de bistite, dispostos em zonas alter-
nadas.
61

grossa, e seccas de siler, quartz rolados, ( 1 ) rochas porphyricas


variadas, e em muitas partes calcareo primitivo. E' escasso o
terreno secundario.
FORMAÇÕES TERCIARIAS. -Parece que as formações ter-
ciarias são raras no Ceará, como em geral no Brasil, ou re-
vestem caracteristicos indeterminados que as tornam diver-
gentes da forma classica no continente europeu. O Dr. Lund
opinara não somente pela inexistencia de terrenos terciarios,
como a dos secundarios no Brasil. Castelnau, se bem que
cautelosamente, como se exprime o barão do Rio Grande (2),
corrobora a mesma opinião. Talvez chegaremos um dia a
conclusão de que a maior parte quente e baixa da America
do Sul seja mais antiga do que as terras elevadas em soleva-
mento da Cordilheira. (3)
O professor Hart inclina-se a erer na existencia destes
terrenos, pelo que se lê na sua Geologia. [ 4 ) " Durante o perio-
do terciario a parte mais alta do paiz ( Brasil ) esteve 3000 pés
abaixo do nivel actual do mar, tendo sido a submersão geral
ou quasi continental. Os terrenos que então se formarão, no-
meadamente as grês da chapada central e das extensas lom-
badas, assim como algumas argilas mais antigas, são terrenos
terciarios, não só por que não se observam nelles nenhuma
perturbação estratigraphica, como por não ter sido esta estra-
tificação perturbada pelos depositos inferiores do cretaceo, e

(1) Uma cousa curiosa é a grande quantidade de seixos


rolados que cobre inteiramente uma grande extensão de terre-
no ao pé do serrote da kola ( a 4 kilom . da cidade de S. Anna)
pelo lado oriental. Dir-se- ia uma vasta depressão cheia com-
pletamente de pedras pequenas arredondadas. Quem se appro-
xima do serrote, pelo caminho que vai de S. Anna, tem de
andar algum tempo sobre seixos soltos . As pessoas, com quem
iamos disseram - nos que em certos lugares esses seixos chega-
vam a profundidade igual a altura de um homem.
João Franklim de Alencar Nogueira -na Revista do Instit.
Hist. e Geogr. brasil. - 1893.
(2) B. do Rio Grande - O fim da creação, pag 412.
(3) Castelnau - Viagem, etc., T. III , pag. 278.
(4) Hart- Geologia, pag. 139.
62

ainda por se achar alastrada, por cima, de camadas de drift ou


cascalhos alluviaes da idade glacial."
E. Liais ( 1 ), cuja autoridade em geologia brasilica não pode
ser invocada com segurança, chega a conclusão de que a falta
absoluta de documentos provenientes de exames fosseis, somen-
te considerações estratigraphicas podem fixar a idade dos ter-
renos de que se trata . Mas ainda assim esta fixação não dei-
xa de ser muito vaga, pois que tudo o que se pode fa-
zer, é reconhecer que essas formações pertencem ao periodo
terciario, sem se poder determinar a epoca deste periodo a
que ellas se devem referir,
O professor Branner não só indica os terrenos secunda-
rios do Brasil, como os terciarios. São suas estas affirmações :
"No planalto central as camadas cretaceas apresentam-se
com a espessura de cerca de 300 metros formando chapadas
que caracterisam especialmente a região entre o rio S. Fran-
cisco e os rios Jaguaribe, Parnahyba e Tocantins. Entre estas
chapadas a mais bem conhecida é a da Serra do Araripe, em
enja base se encontram concreções calcareas contendo peixes
fosseis. bellamer.te conservados. (2) Depois de se referir a ser-
ra do Araripe, região cretacea typica, como elle a chama , ac-
crescenta que “desta região estendem-se diversas chapadas que
pela semelhança nos caracteres topographicos parecem per .
tencer a mesma formação : supposição esta que se acha de cer-
to modo confirmada pela occurrencia de madeiras petrificadas
de typos que não devem ser mais antigos do que a cretacea
na região de Therezina, no valle do Parnahyba e na Indaia,
no alto S. Francisco. Uma destas chapadas com O nome de
serra do Apody estende-se na zona limitropha dos Estados do
Ceará e R: G. do Norte e tambem alcança o mar. (3 )
"No Brasil as rochas terciarias cobrem uma zona estreita

(1 ) E. Liais- Geologie du Brésil, pag. 95.


(2) John C. Branner - Geologia elementar —Rio 1906, pag. 273.
George Gardner - Geological notes made during a journey
from the cost into the interier of the province of Ceará-Edimburgh
1841.

[ 3] J. C. Branner - Geologia elementar , pag. 274 .


63

ao longo da costa desde as visinhanças da Victoria ( Espirito


Santo) até o valle do Amazonas. Em diversos lugares esta
zona está muito estreitada ou mesmo completamente destruida.
Em Ilhéos, por exemplo, não existem rochas terciarias na costa.
Ao norte de Ilhéos a zona continúa estreita e quasi sem in-
terrupção até perto do cabo de S. Roque.
"A nordeste do Cabo de S. Roque esta zona estreita, de se-
dimentos terciarios, se estende ao longo da costa do Ceará. ( 1 )
Esta penuria de rochas terciarias na America do Sul le-

[i ] Ibid pag. 279 -Em outra obra do il'ustre geologo ame-


ricano Branner-A geologia cretacea e Terciaria da bacia do Brasil.
traduzida em portuguez pelo Dr. Manoel dos Passos e publi-
cada em Sergipe en 1899, lê- se a pag. 97 :

"O que conhecemos das camadas cretaceas do interior da


provincia do Ceará deriva quasi exclusivamente das observa-
ções e collecções de Gardner feitas ha 50 annos. Com excepção
de Capanema, delle é que houve suas informações a maioria
dos escriptores que se referem a taes camadas.
Os factos mais importantes, apontados por Gardner, são
a secção geologica da serra do Araripe, que, começando na
base, consta de camadas horisontaes de lignite calcareo, grês,
giz e silex, formando o strato da grês a massa da chapada.
A espessura total da secção é de 1200 a 1500 pés. A rocha
subjacente parece ser ardosia, provavelmente paleozoica. Os
peixes fosseis, encontrados occorrem em concreções difundidas
junto a superficie, que, se suppõe, terem sido gastos pelas
aguas. Não se conhece a exacta posição dos fosseis na secção .
Gardner acredita terem sido expostos da camada de grês,
mas Hart, que entretanto nunca visitou a localidade, é de opi-
nião que elles provém de uma camada abaixo da grês, que
elle attribue ao terciario, juntamente com outras camadas sub-
jacentes. A serra dirige- se do NNE . e é uma elevada chapada
de cerca de 30 milhas de largo, separa-se um pouco abrupta-
mente em ambos os lados, sendo o valle do lado do Ceará um
pouco mais baixo do que do Piauhy. A destribuição geogra-
phica que Gardner attribue a essas camadas, a saber, desde
este ponto até o Maranhão, não é assegurada já por factos
dados por elle, ou por qualquer outro que subsequentemente
tenha vindo a luz. Os peixes fosseis, colleccionados no Crato e
em suas immediações por Gardner, foram descriptos por Agas-
64

vou Ch. Darwin ( 1) a attribuil - a, na costa Occidental do Con-


tinente sul americano a circumstancia de estar ella em via de
solevamento. Esta razão, porém, não prevalece em relação a
costa oriental, sendo necessario recorrer a acção degradante dos
agentes meteoricos e a outros mechanicos para explicar o facto .
FORMAÇÕES CRISTALLINAS. -Em muitos lugares a emersão
gneissica ou granitica acha - se agrupada em cabeços e serro-
tas, que no dizer do Senador Pompeo são como ilhas do ser-
tão. Tal é o agrupamento das serras Camará e Joá, separa-
das pelo Boqueirão da Arara da de Maranguape, a qual,
segundo diz o barão de Capanema, é notavel pela vegetação,
que tem muitos representantes identicos a do Rio de Janeiro,
vegetando da mesma forma em barro vermelho, procedente
da decomposição da rocha ; alli abundam fetos arborescentes
do genero alsophila. Na serra visinha (Aratanha é outra a
vegetação, sendo igualmente differente o producto da decom-
posição rochosa : pela mór parte é um terreno acinzentado,
cheio de grãos de quartzo e crostas feldspathicas ainda intactas.
A maior parte da formação da serra de Baturité é gneissica.
com camadas que correm aproximadamente de L. a 0 ; mas nas
proximidades da cidade de Batu rité as rochas são schistosas (2) ,
sis que acredita pertencerem a idade cretacea, ( a ) Deve - se to-
davia mencionar nesta connexão que o Dr. J. S. Newberry e o
Dr. E. D. Cope têm esses peixes como da idade jurassica. (b)
(a) Edimburg New Philosop. Journ. Janeiro 1841 .
(b) Deve-se accrescentar que é possivel haver equivoco em
se attribuir ao Dr. Newberry esta opinião, por quanto em uma
recente conversa commigo referio -se a esses fosseis como da
idade cretacea.
( 1 ) Ch. Darwin- Origem das especies, cap. 9. § 5.
(2) O schisto é uma rocha metamorphica, que, como tal,
soffreu na sua contextura e composição mineralogica modifi-
cações posteriores a sua formação . As causas determinantes
destas modificações são multiplas, mas as principaes podem
ser referidas a duas : acções chimicas ou calorificas exercidas
das pelas rochas eruptivas por occasião do seu derramamento
(èpanchement ) sobre os terrenos atravessados : acções pura-
mente mecanicas nas regiões de enrugamento (plissées ) -Ch.
Vélain - Geologie stratigraphiq te, pag. 210.
O que caracterisa o schisto é o alinhamento dos seus compo-
nentes - argila, detrictos cristalinos, etc. em acamamentos sedi-
mentarios.
65

e quasi exclusivamente schisto silicoso e quartzito ( 1 ) com mica,


e as vezes tambem micopsamitico com algumas apparencias de
itacolomito em raros lugares .
Algumas paragens, nas encostas, revestidas de terra ver-
melha, são auriferas, porém tão pobremente que não vale a
pena exploral-a.
O cabeço mais alto desta serra (de Baturité), chamado—
Brejo de pedras-é todo composto de quartz e quartzito.
A nascente da serra se lhe encurvam dous contrafortes
para formar os valles do Candéa e Acarape. Um estreito valle
separa-o do grupo de Cantagallo, onde affloram os calcareos,
que mais para leste se acham na Giboia de envolta com do-
lomitos. (2)

(1) Os quartzitos são aggregados cristallinos e compactos


de quartz em grãos irregulares ou em cristaes bem formados.
Alguns tomam a textura schistosa, devido a pequenas laminas
de mica : esses quartzitos schistosos podem ser considerados
como micaschitos pobres de mica.
Entre os quartzitos micaceos, convem citar a grês flexivel
do Brasil, impropriamente chamado Itacolumito por diversos
autores. A mica branca e o quartz, acompanhados de sericito
ou de chlorito, acham-se ahi entremeiados de tal modo que as
placas da rocha são completamente flexiveis - Lapparent-
Traité de geologie 1905, pag. 707.
(2) A transformação das rochas calcareas em dolomia, fre-
quente nas regiões quentes, é explicada por Lapparent no seu
bello tratado de geologia, pag. 337 , nestes termos :
"O sulfato de magnesia, que a agua do mar contem, exerce,
nas regiões quentes, acção particular sobre as rochas calcareas,
sobretudo quando o carbonato de cai está no estado de ara-
gonite (que é o caso das construcções coralinas. ] Neste caso
a reacção mutua das duas substancias engendra ao mesmo
tempo sulfato de cal anhydro ou anhydrito e um carbonato du-
plo de cal e de magnesia, que pouco a pouco se torna dolomia.
Para que esta reacção se opere é mister que a agua do
uar se concentre nas bacias fechadas e superaquecidas pelos
raios solares. Verifica- se nos laboratorios que é a partir de 600
que o sulfato de magnesia começa a agir sobre o aragonite em
presença de soluções saturadas de chlorureto de sodio. Esta
transformação mostra como, na natureza, a dolomia é frequen-
temente acompanhada de anhydrito. Alem disto, as dolomias
formadas pela alteração de um calcareo magnesio são po-
rosas.
66

No Cantagallo surge uma serie de penedos bastante exten-


sos de calcareo e gneiss [ 1 ] que reveste aquelle e se acha em
decomposição ; mais adiante, na povoação de Acarape, o calca-
reo enche uma fenda de gneiss, contendo fragmentos do mesmo.
Este calcareo cristallino [ sacaroide eruptivo] apparece em
muitas partes do Ceará, acompanhado de rochas graniticas.
Outro calcareo, de formação sedimentaria, fossilifero, encontra- se
no Araripe. Variedade de sacaroide acha- se na Serra Grande.
De Baturité a Quixadá predomina o gneiss, mais ou menos
intervallado de granito. Nesta região erguem- se rochas desnu-
das, isoladas, já muito degradas por agentes meteoricos, de
forma singular, ora em degraus horisontalados, culminados
por cabeços arredondados, ou rendilhados, semelhando alguns
a assentos [ cadeiras ], ora em socalcos gretados e cavados
formando caldeirões onde as aguas pluviaes se empoçam. Estes
penedos são syenitos. [ 2]

[ 1 ] Se bem que o Senador Pompeo, levado por informa-


ções de Capanema e Coutinho, haja escripto isto, não posso
comprehender bem a genese deste phenomeno. Como pôde o
gneiss, rocha cristallina, envolver o calcareo, sacaroide, que em
taes casos age por injecções ou derramentos pelas fendas
abertas do gueiss ?
[2] A denominação de syenito foi empregada por Plinio a
rocha de Syena no Egypto, que é de granito amphibolico ;
mas o uso prevaleceo de se dar este nome, como o fez Wer-
ner, a uma rocha de orthose e de amphibole - Lapparent-
obr. cit. pag. 629.
A familia dos syenitos é formada de rochas a que falta o
quartz livre. mas nas quaes o elemento branco é quasi ex-
clusivamente constituido por um feldspatho alcalino, potassico
ou sodico - Lapparent-ibid. pag. 640.
O syenito normal é um verdadeiro granito sem quartz, eu-
jos elementos fundamentaes são a orthose e a amphibole horn-
blende.
A apparição do syenito em Quixadá, onde predomina, so-
bretudo nas rochas do Cedro e Faladeira, do açude gneiss, ro-
cha quartzosa, é singular, digna de estudo mais aprofundado.
Tratar-se -a de rochas eruptivas, explosivas, semelhantes
as descriptas pelo Sr. Orville A. Derby [ On nepheline Rocks in
Brazil] de Agua Suja, perto de Bagagem no Estado de Minas
Geraes, e porventura de formação post-permiaua ?
67

Nas suas proximidades, [ de Quixadá] a Serra Branca é


toda granitica, ao pé da qual havia uma lage, que produzia
estanho, e que estancou desde que alli fizeram fogueira para
quebrar a rocha. ] 1 ]
Em Quixeramobim as lages superficiaes de granito, que
se veem no rio, contem porção de cristaes de um mineral
verde.
De Quixeramobim ao Icó encontra -se o gneiss em stractos
quasi aprumados, e outras vezes approximando-se ao micaschi-
to : em varios lugares é essa rocha abundante de graphito.
Na visinhança do Icó a formação muda de aspecto, os ter-
renos primitivos são em algumas partes interrompidos pelos
schistos argilosos de transição, sobretudo no caminho do Igua-
tú. Os morros e collinas são de quartzitos de gran fina , as ve-
zes compactos, sem accessorios. Perto da cidade as collinas são
de schistos silicosos.
Na direcção do Crato, rio Salgado acima, acha-se o bo-
queirão de Lavras, aberto numa rocha de quartzito com degra-
dações angulosas que tornam os penhascos soltos, despren-
didos, semelhantes as vezes a enormes fragmentos de feldspa-
tho ; essa degradação foi proseguindo interiormente e continua
ainda hoje, de modo a formar uma gruta de 200 metros de ex-
tensão, em cujo fundo se apagam as luzes e o thermometro
sobe á 380 cent. e o psychrometro a 37°. (2)
"O fundo do Boqueirão, diz o Sr. Revy, [3 ] forma agora
parte do canal ordinario do rio, e as aguas correm pelo Bo-
queirão com a mesma facilidade como por outras partes do
seu leito ; não ha nenhuma ruptura consideravel de declivida-
de no leito e na superficie do rio : em outras palavras, nenhum
esforço especial é necessario para forçar a passagem do Bo-

[ 1 ] E' um facto que requer maior averiguação.


[2] Percorri esta caverna, cujo aspecto de ruinas parece
ser o resultado de convulsões ou degradações profundas.
Do tecto pendem a cair blocos enormes de pedra, apenas pre-
SOS por estreitas ligaduras. O solo acha-se juncado destes
fragmentos, o que torna sobremodo penoso o seu percurso.
[3 ] J. J. Revy - Relatorio sobre o açude de Larras, pag. 10.
68

queirão. Mas o caso era muito differente ha seculos. Sua his- •


toria está indelevelmente escripta em suas paredes rochosas, e
estas trazem a prova clara das tremendas lutas e das enormes
forças que estiveram em acção para desembaraçar a Serra do
Boqueirão de todos os rochedos que impediram o curso re-
gular do rio, qualquer que tenha sido a resistencia daquella
barreira rochosa.
A serra do Boqueirão é uma montanha de rocha de quartz :
suas camadas elevam-se para NE. da formação de grês do
valle, em angulo de 30 a 400,
No lugar do Boqueirão a montanha attinge a altura de 93
metros, elevando- se para leste a algumas centenas de metros .
Na altura de 93 metros a garganta tem paredes de roches
verticaes, que formam a margem direita e esquerda do rio :
estas paredes por uma extensão consideravel ficam afastadas
quarenta metros uma da outra.
Nestas paredes, e particularmente na occidental ipor causa
da inclinação das camadas para sudoeste ), a luta entre
as aguas do rio o as rochas da serra está archivada em innu-
meraveis perfurações que os redemoinhos do rio fizeram na
massiça rocha quartzitica : estas perfurações variam em dia-
metro de uma fracção de metro a muitos metros.
Parte das perfurações permanece nas solidas paredes, par-
te rolou no leito do rio e desappareceu.
As perfurações restantes são todas polidas no interior ;
são conicas : na boca tem de um a muitos metros de diametro,
e no fundo terminam frequentemente em ponta : sua pro-
fundidade é de 5 a 10 metros.
Onde as camadas da montanha não foram alteradas por
outras causas, a superficie da parede é uma unica massa de
restos destas perfurações.
Isto é particularmente o caso com a parede occidental
onde, em consequencia de inclinarem-se as camadas para den-
tro da massa montanhosa, os rochedos não escorregaram para
o precipicio : emquanto que, no parede oriental, que forma a
margem direita do rio , todo o rochedo. solapado pela base.
escorrega para o precipicio e cae no rio : desapparecendo,
portanto, as recordações, da luta em taes lugares.
69

Seguindo as linhas de perfurações na subida ingreme la-


teral, da parede occidental, observei grande numero destas na
montanha, restos de perfurações muito antigas, que provavel-
mente pertencem a uma outra epoca geologica.
Estes restos são as partes que foram moidas em forma de
lages de solido quartz : as que contem mica se desfizeram no
lapso de dezenas de millesimos.
Encontrei a mais alta destas lages de quartz que contem
parte desta perfuração correspondendo a um diametro de
3m 15, e 41,731 de altura, acima do nivel actual da agua no
poço do Boqueirão , ou, em numero redondo - 38 metres acima
do nivel da mais alta enchente conhecida do Salgado. Por-
tanto, em um tempo remoto as aguas deste rio estiveram uma
vez ao menos 38 metros acima do nivel actual da cheia do
rio, e como a maior parte das terras do valle de Lavras está a
muitos metros abaixo deste nivel, segue se que, durante aquelle
remoto tempo no qual esta perfuração foi feita, o valle de
Lavras estava coberto d'agua, e era pois um lago interior.
A inclinação de terreno no valle de Lavras é quasi um metro
por kilometro ; portanto as aguas deste lago estenderam-se
por valle acima uma distancia de pelo menos 38 kilom . do Bo-
queirão ; até aqui a cadêa de provas é completa ; seus élos são
factos claros e não fica logar para duvida a respeito da con-
clusão.

E' provavel que em algum tempo o nivel daquelle lago foi


mais alto do que o da dita perfuração, e é possivel que suas
aguas chegassem até a cachoeira perto da villa da Missão Ve-
lha, 85 kilom. do Boqueirão de Lavras.
O nivel do dito lago subio até que achasse uma sa-
hida para as
aguas que desciam das montanhas em torno.
Esta salida achou-se numa depressão, na linha de cumieira da
serra, em um lugar situado acima do presente Boqueirão .
As aguas, transbordantes do lago, descendo pelos ingremes
flancos da montanha em uma serie de cataractas e redemoinhos,
pelas tremendas correntezas devidos a sua quéda carregaram
comsigo pedras grandes e pequenas para os buracos formados
delos rochedos destacados, e as massas d'agua, redemomhando
com estas pedras, reduziram-nas a pó e niceram esses bura-
70

cos em circulo, cada vez mais fundos, até passarem atravez


uma camada do rochedo, minando e destacando massas de
rochas e carregando-as para o canal do rio. Assim, pedra so-
bre pedra foi destacada do leito do monte quartzito pelas
aguas do lago, que roeram e cavaram seu proprio canal cada
vez mais fundo atravez da montanha, abaixando ao mesmo
tempo o nivel do lago : até que com o curso de seculos o ca-
nal por cima da montanha foi escavado até o nivel das terras
e rochedos situados acima e abaixo da serra do Boqueirão-
então o lago desappareceu, e o actual valle de Lavras ficou a
nú com as ricas terras alluviaes, que o dito lago havia depo-
sitado em epoca anterior.

A primeira vista parece apenas crivel que a agua escavas-


se uma garganta atravez de uma montanha, como a do Bo-
queirão, composta da rocha mais dura que se conhece, na
qual o aço ordinario não faz mossa. Mas convem lembrar que
justamente como o diamante é talhado e polido com O sen
proprio pó, assim o Boqueirão de Lavras foi cortado e polido
pelos destroças de suas proprias rochas quebradas e pulveri-
sadas : -houve alem disso abundancia de força mechanica para
executar esta operação, o que se torna claro pelas seguintes
considerações.

As enchentes de epocas passadas foram maiores do que as


de agora : ha ampla prova scientifica em favor desta hypo-
these . Mas, suppondo que o volume das enchentes provenientes
das estações chuvosas dos tempos passados tenha sido o mes-
mo, qual é, e calculando somente a força de enchentes regu-
ares, que medem 31 i 2 m . cubicos por segundo, o effeito me.
canico produzido pela descida daquella massa de agua do ni-
vel do antigo lago, 38 metros acima do nivel da cheia do
rio abaixo do Boqueirão, seria igual a força de 150.000 caval-
los em numero redusido, trabalhando constantemente durante
a cheia e occupados em esmigalhar os rochedos que obstruem
o canal. A obstrucção tinha naquelle tempo uma extensão de
cerca de 200 metros com a largura media de 60 metros, e
apresentava uma superficie de cerca de 12.000 metros qua-
drados. Havia, pois, para cada metro quadrado do funda ro-
choso do Boqueirão uma força de mais de 12 cavallos, empre-
71

gada em moer e reduzir a obstrueção rochosa, produzindo


actual Boqueirão . " (1)

Nas faldas da Serra do Boqueirão existe em alguns luga-


res terra vermelha aurifera, e á pequena distancia da cidade
de Lavras estão os entulhos das antigas lavras de ouro que ahi
se fizeram.
TERRENOS SEDIMENTARIOS . --Pelo Salgado acima, onde en-
tra o rio dos Porcos, muda a formação do terreno, passa de
granito a psamenito (grés e areia), talvez até as extremas onde
antigamente devia ter chegado a serra do Araripe .
Perto de Missão Velha encontra-se vasto lagedo de pedra
schisto argiloso. Sua superficie é lisa e polida, e em certos lo-
gares vermelha, compacta e muito dura, com o aspecto de
jaspe é atravessada de fendas capillares, carcomidas pelas
aguas. O rio precipita-se ahi de mais de 7 metros.
Ondulações de terreno, ora de barro vermelho , ora graniti-
co, monticulos em torno dos quaes se sedimentaram as aguas,
que em outros tempos as deviam ter coberto, formam a ba-
cia do Crato Os intervallos destes oiteiros são cortados por
muitos corregos, que chegam a empoçar ; mas Os extensos
brejos de que ainda ha tradicção estão aterrados por detrictos
vegetaes, massas de turfa, fluctuante em alguns sitios, que
hoje estão cobertos por escassos cannaviaes.
Uma rampa, devida a longa desnudação, encosta nos bar-
rancos verticaes cheios de sinuosidades de grande desenvolvi-
mento, que forma a serra do Araripe. Esta serra, toda careo-
mida, diz o barão de Capanema, é um insignificante resto de
um colosso de areias que alli foram depositadas.

(1) O engenheiro P. Omeara . que estudou posteriormente


o valle de Lavras e o local preferido pelo Sr. J. J. Revy para
o açude, confirma as asserções deste na parte concernente a
descripção do valle :
"Whilst confirming the general accuracy of his descri-
ption of the Lavras Gorge, of the site of the reservoir basin
(irrespective of its hypothetical state in former ages ) and also
of the extent and admirable quality of the plains of the Ja-
guaribe Valley.-(Irrigation of the Jaguaribe Valley. pag. 6)
72

O largo valle que a separa da serra do Salgadinho (90


kil. ) era occupado por ella , pois que sobre esta cordilheira
granitica se acha ainda algum psamenito. A parte superior da
serra é toda composta de psamenito avermelhado com nodu-
los azulados, e raras vezes negros acontece ser em alguns
lugares a argila perfeitamente branca, e della se servem para
caiar casas. [1]

(1) Este grandioso phenomeno de desnudamento pode a


primeira vista parecer exagerado. Os geologos, porém, que
têm estudado o Brasil não attribuem a outra cousa o quasi
desaparecimento das formações terciarias. O professor J. C.
Branner -pensa que “a actual distribuição do terciario, a ho-
risontalidade das suas camadas e os elevados angulos das suas
margens expostas, tudo mostra que a desnudação das roenas tem
sido e vai ainda se operando rapidamente, qualquer que
seja a causa. A erosão e desnudação ainda estão em progresso,
e algumas das causas podem ser estudadas no solo . As cama ·
das terciarias formam frequentemente facies de seccas e este-
reis planaltos ou terras chás conhecidas por-chapadas e tabo-
leiros. Em alguns sitios essas chapadas são quasi baldas de ve-
getação, estão profundamente rasgadas em quebradas, bar-
rancos e gargantas com uns duzentos pés de profundida-
de. Taes sitios são muito communs as margens desses pla-
naltos.
A grande desnudação das camadas terciarias é devida as
cinco principes causas seguintes :
I Impenetrabilidade da superficie argilosa ;
II Esterilidade do solo, resultante da nudez de vegetação , e
por conseguinte da falta de protecção do mesmo ;
III Natureza irresistente das rochas ;
IV Grande precipitação concentrada dentro de alguns mezes
do anno. augmentando em razão geometrica o poder des-
truidor e arrebatador da agna :
V Temperatura da agua consideravelmente elevada sobre as
nuras e quentes argilas da superficie.- [ J. C Branner-
Geolog. Terciaria do Brasil, pag. 120].
Mais adiante [ pag. 125] accrescenta Brauner :
Todavia, em geral, a erosão das camadas terciarias não
parece andar tão rapidamente quanto outr'ora, e com effeito
não cremos que a extensa desnudação do terciario, occorrida
no Brasil, seja somente attribuida a erosão sub-aerea. Parece
provavel que a mór parte deste trabalho foi feito pelo tempo
e immediatamente após a emergencia dessas camadas do fun-
73

O Araripe é nimiamente jurassico ( 1 ) diz o Dr. Marcos de


Macedo-uma circumstancia notavel apparece para que o geo-
logo classifique em duas divisões, bem distinctas, o terreno do
Ceará.

Por toda a parte, no interior da provincia, se encontran.


depositos calcareos cristalisados, o que não se vê no Cariry,
nem em torno do Araripe, onde este mineral se apresenta,
seja em grandes e pequenas estratificações, seja em formas
prodyposas, tal é a pedra de cal de Milagres. No Carry e em
todo o terreno visinho do Araripe se encontra de envolta com
calhaus rolados, depositos de peixes fosseis e ossadas de ma-
miferos de familias extinctas. Segundo parece, a baze do Ara-
ripe é formada de grandes camadas de estractificações cal-
careas e de pedras de cantaria, a que os geologos inglezes
chamam-lias-e os canteiros portuguezes escrevem lioz, os
quaes se mostram nas escavações feitas por aguas correntes,

do do oceano, quando ellas eram mais molles do que actualmaen-


te. e primeiro que a vegetação cobrisse a superficie . Em mui-
tos lugares a erosão do terciario, onde a vegetação é densa,
tornou-se praticamente mil, (nenhuma ). A grande largura da
maioria dos valles e as precipitadas faces das cordilheiras ter-
ciarias que os debruam, levam a pensar que esses montes fa-
ziam face ao Oceano ou foram praias de bahias nos tempos
da elevação de terra do fundo dos mares terciarios.

(1) Dr. Marcos A de Macedo - Observações sobre as seccas


do Ceará - cit. pag. 51.
Em um estudo especial do Dr. Marcos de Macedo sobre a
serra do Araripe, lê-se :
"Ainda não se fez um estudo especial sobre a natureza
geognostica desta serra : porém se vê ao primeiro aspecto que
a sua formação é puramente mecanica, e de descimento . Em
geral as subidas são talhadas a pique, e a rocha que parece
dominante é formada de greda com nodulos ferruginosos e
oca encarnada.
E sobre a banda oriental desta mesma serra que tenho
feito algumas observações sobre as formações geoguosticas,
porém não são ellas sufficientes para dar um verdadeiro co-
nhecimento de sua natureza,
Logo que se acaba de descer a serra, apparecem nas lom-
badas adjacentes duas naturezas de terrenos, que pelas suas
estractificações, fosseis e ruinas, se conhece perfeitamente
74

de envolta com diversas formações de grés, de tauá. de calea-


rios oolithicos, globulos de pedras ferruginosas ; jazigos de
authracito e de tabatinga : rochas de formação ignea, como as
pedras gigantescas, que se veem na caverna da povoação do
Cajueiro, as quaes são arredondadas pelo transporte, nas di-
versas revoluções do globo
Todas essas formações de bazes heterogeneas, extrahidas
e transportadas de seus jazigos nataes, formam o deposito
immenso do Araripe e repousam sobre leitos de argilla im-
permeavel, os quaes sendo inclinados para leste e norte dão
lugar a corrente das aguas accumuladas pela infiltração das
chuvas, que caem na superficie da mesma montanha e em
outros lugares de elevação superior, as nascentes do Ca-
riry."
Por baixo do grupo psametitico, que contem nodulando
grandes massas de pedra do Mucuripe, estende- se uma camada

que são de mares antigos, a que os geologos custumam chamar


Pelagicos. A primeira divisão, que se acha mais visinha da
serra, parece pertencer ao systema jurassico, tendo por limi-
tes superiores as formações de greda, os calcareos concretos,
grandes bancos de marne (marga ) em estractificações pouco
inclinadas e sulfato de ferro. Todo esse terreno compõe - se de
uma successão de collinas arredondadas, que se vão levantan-
do e formam a base do Araripe : delle sae um sem numero
de ribeiros, que regam a comarca do Crato, sendo o princi-
pal o Batateira. Antigamente esses ribeiros ao desprenderem-
se da montanha formavam pequenos lagos, que hoje se acham
deseccados pela cultura, em alguns dos quaes vê-se uma espe-
cie de turfa de formação prediluviana.
Todos os calcareos, que apparecem nesse terreno, são
concreções, mais ou menos grosseiras. apezar de que se desco-
bre acima da cidade do Crato. As septanarias e as camadas
de calcareos, de que falei, formam banco de 30 e mais palmos
de altura em estratificações, que pouco se afastam do plano
horisontal, e parecem conter noophytos.
Toda essa rocha é dividida em laminas, mais ou menos
grossas, de que principiam a fazer uso os habitantes do Crato
para calçadas. Creio que não será da rocha chamada graphito,
porém talvez pertença a ordem das concreções jurassicas, en-
tre as quaes apparecem laminas com veios azues e encarnados :
entre essas camadas de rocha alguns pyritos e a soda em
75

calcarea, excessivamente foleacea ; e lugares ha, como Saut'An-


na, onde ella é de gram fina que pode servir para lithographia.
Serve de leito a este calcareo uma camada de Tana negro,
entremeado de lages de palmo de espessura, de um psamenito
azulado durissimo, que contem veias de pyritos e de sulphu-
reto de chumbo (galena), outras vezes alternado com schisto
muito betuminoso, contendo os mesmos sulphuretos e nodu-
los esphericos. (1) Ainda mais abaixo apparecem psamenitos
menos argilosos (2) que. parece, pertencem ao systema permico.
A parte superior, de certa altura, pertence a formação cretacea.

efflorescencia. Tambem apparecem nesses terrenos peixes fos-


seis.... Acima do terreno jurassico existem algumas caver-
nas, abertas no talhado da serra e que a penetram mais ou
menos. . . . Continuando a deixar a serra, depois dos terrenos
jurassicos, apparece o lias, que se reconhece pelo aspecto ca-
vernoso do terreno e suas formações sempre grosseiras e de
sedimento a rocha dominante desse terreno e o grés. O terre-
no entre Milagres e a serra do Mãosinha, no lugar denominado
S. Pedro, contem minas de zinco, que parecem abundantes.
Depois do lias vem os plutonicos, onde prine piam os
granitos e outras rochas, de igual formação . Ahi se vê ( nas
approximações de Missão Velha ) um vulcão extincto, por cuja
cratera se precipita o rio Salgado, formando uma cachoeira bas-
tante alta e curiosa.
Do lado do Exú apresenta - se um grande espaço coberto
por uma só rocha granitica, bastante curiosa, porque o espath
predomina em forma de moidos de prata, algumas dos quaes
de grande tamanho, a superficie superior dessa rocha, que está
ao rez da terra, e que se plana, e com os raios do sol forma
uma vista encantadora..- Marcos Antonio de Macedo - Crato,
8 de Janeiro, 1855.
Descripção dos Terrenos carbonianos da comarca do Crato.—
Do Diario de Pernambuco

( 1 ) Este schisto bituminoso foi tido por carvão de pedra,


mas, segundo o Dr. Capanema , só serve para producção de
oleo para illuminação. -Th. Pompeo. - Ensaio Estatistico do
Ceará, pag. 48.
(2 ) Em S. Pedro o Dr. Gonçalves Dias achou na rocha ma-
deira fossil que com a semelhança da descoberta no Egypto
deixa suppor que esta rocha inferior pertence ao systema
permico, que na bacia do Sousa é representado, diz o Dr. Ca-
panema, por dous conglomeratos. - Th. Pompeo, ibid.
76

Na ponta do Araripe, voltada para S. Pedro, ha uma


montanha meio isolada, onde se acham grandes porções de ro-
chedos de gesso vitroso (sulphato de cal) . Nas camadas calca-
reas affloram alguns saes de soda e potassa, e até sulphato de
alumen. (1)
Na costa maritima até certa distancia para o interior,
consta o solo de grandes agglomerações arenosas impellidas
pelo mar ás praias, e d'alli pelos ventos, que assim formam
esses comoros de areia movediça. Na opinião do barão de Ca-
panema é da serra do Araripe em decomposição que vem essas
areias, as quaes são levadas pelas correntes ao mar. (2) Em
muitos pontos essa areia foi penetrada por um cimento que a
transforma em rochedo, como na barra do Pacoty : alli, como
na Bahia do Rio de Janeiro, se veem provas do levantamento
da costa . No Mucuripe consolidam-se com o auxilio do oxido
ferruginoso e argila, e formam uma baze dura, cheia de feu-
das verticaes, cortando- se em diversos sentidos, o que a torna
identica ao psamenito do Araripe, logo que as aguas levem o
oxydo de ferro.
Afastando -se do litoral, por baixo das areias se acham
terras aluminosas de diversas naturezas, e debaixo destas as
mesmas areias grossas sobrepostas a rochas primitivas que de
espaço em espaço, principalmente nas proximidades da serra,
surgem á superficie.
O sabio professor L. Agassis, no pensamento de que o pe-
riodo glacial se estendeo até a zona intertropical, diz (3 ) que

(1 ) Segundo o Dr. Capanema só se encontram na provincia


essas camadas de sedimento realmente impermeaveis, porém
horisontaes, e por isso não se prestam a poços artesianos : as-
sim como as não argilosas do Icó por serem quase verticaes.
As camadas da Serra Grande (Ibiapaba) tambem não lhe po-
deram dar esperanças de poços artesianos, salvo para o lado
do Piauhy, por onde ellas mergulhão .-- Th . Pompeo - obr . cit..
pag. 48.
(2) Segundo o Dr. P. Berthot as areias litoraes do Ceará
são trazidas d'Africa pela corrente pelagica : esta opinião é
tambem a de Moreau do Jonnés. -Antille physique. - Th . Pom-
peo- obr. cit., pag. 49.
(3) Apud M.me Agassiz - A journey in Brasil, capitulo so-
bre o Ceará.
77

"pelo exame da estructura geologica da serra da Monguba


verificou que todos os seus valles tiveram geleiras, e que estas
arrastaram das fa'das das collinas á superficie das planicies.
blocos, calhaus, restos de toda sorte .
"Na serra d'Aratanha os phenomenos glaciarios são tão
legiveis como em qualquer valle do Maine ou nas montanhas
do Cumberland (Inglaterra).
E evidente que houve uma geleira local formada pelo en-
contro de dous ramos, que desciam de duas depressões, si-
tuados a direita e a esquerda da parte superior da serra , e
juntaram -se abaixo no fundo do valle. Grande parte da mo-
rena mediana, formada pelo encontro destes dous ramos, pode
ser ainda seguida até o centro da planicie. Uma das morenas
lateraes está perfeitamente conservada : o caminho da villa
a corta, e esta ( hoje cidade ) ergue-se dentro da morena ter-
minal que a contorna em forma de crescente, em frente da
mesma. E' facto curioso que no centro da morena mediana,
occupada por uma pequena corrente, abrindo caminho por
entre escombros rochosos e blocos, encontre -se deliciosa bacia
cercada de larangeiras e palmeiras."

A nota de Agassiz, communicada a sua mulher, e que esta


transcreve diz : " Empreguei o resto do dia em examinar a
mcrena lateral direita e parte da morena marginal da geleira
de Pacatuba. Meu fim era verificar se o que parece ser uma
morena, a primeira vista, não era simplesmente um dos espi-
gões da serra, ahi decomposto. Subi a aresta de pedras até
sua origem, depois a atravessei numa depressão adjacente, im-
mediatamente abaixo do sitio do capitão Henrique, onde achei
outro fundo de geleira de menor dimensão, e cujo gelo não
deve ter attingido o nivel da planicie. Por toda a parte, nas
filas de pedras que formam a montante essas depressões, ha
tal accumulação de materiaes de transporte e de grandes blo-
cos incrustados na argila e areia, que seu caracter não é des-
conhecivel. E ' effectivamente uma morena. Em certos lugares
orde uma camada de rocha subjacente mostra-se a super-
ficie, em consequencia das desnudações que arrastaram
drift, a differença entre a morena e a rocha decomposta no lu-
gar reconhece- se immediatamente. E' igualmente facil discer-
nir os blocos que, aqui e alli , rolaram do alto da montanha e
78

esbarraram na morena. As tres cousas acham-se lado a lado


e podiam ser confundidas ; mas, com um pouco de applicação
e de pratica, chega-se logo a distinguil-as.
No lugar em que a morena lateral se curva para enfrentar
a antiga geleira, proximo ao ponto em que o riacho da Paca-
tuba o corta, e um pouco a occidente deste riacho, existem
blocos gigantescos, apoiados nella, e que provavelmente es-
corregaram de sua cumeiada.
Perto do cemiterio, a morena frontal consiste quasi inteira-
mente em seixos de quartz, entre os quaes alguns bem volumo-
sos. A morena mediana está pouco mais ou menos ao centro da
villa, emquanto a morena lateral esquerda jaz fóra de Pacatu-
ba, na sua extremidade oriental, e é atravessada pela estrada
para Fortaleza. Não é impossivel que mais para leste, um ter-
ceiro tributario se tenha juntado a principal geleira de Paca-
tuba. Posso dizer que em todo o valle do Hasli , não ha accom-
mulação de materiaes provenientes de morenas, mais caracte-
ristico de que o encontrado por mim aqui, nem mesino perto do
Kirchet. " (1 )

( 1) Como pôde o illustre naturalista, que na sua patria


(Suissa) tanto estudou este assumpto, enganar -se tão ingenua-
mente ! Estudos posteriores, de seus discipulos Hartt, Örville,
Branner, e outros, vieram mostrar seu engano.
Hart declara que "o professor Agassiz não baseou a sua
estructura do Amazonas inteiramente nos seus proprios es-
tudos ; informações incorretas o enganaram. Não vi no valle
do Amazonas nenhum vestigio da acção das geleiras, que elle
suppoz terem existido. Se elle tivesse visto metade dos factos
que eu tive a felicidade de descobrir, estou convencido de que
não teria apresentado a sua theoria. " Vêja - se a sua Geologia e
Geographia physica do Brasil.
Liais combate por considerações theoricas a supposta
existencia de geleiras no Brasil. onde elle não reconheceo
o menor vestigio. Pensa, ao contrario, que a temperatura da
zona torrida foi mais alta no periodo glacial do que é actual-
mente.
O Sr. Orville A. Derby, no capitulo intitulado Estructura
geologica e mineraes, da Geographia do Brasil de Wappaens-
pag. 35, escreveu : "Não está provada a existencia no paiz de
verdadeiros depositos glaciaes. Alguns geologos, porém, tem
79

Resumindo os caracteres primordiaes da constituição es-


tratigraphica do Ceará, escrevi na Revista do Ceará. ¡ 1 )
Sejam, porém, quaes forem as divergencias acerca dos ter-
renos predominantes na geognose cearense, são mais ou me-
nos uniformes as opiniões dos geologos, que a estudaram, em
assignalar a existencia a certa profundidade de uma rocha
granitica ou mais propriamente gneissica, que constitue a
ossatura sobre a qual se empinam ou se horisontalam em es-
tractificações mais ou menos delgadas as formações poste-
riores.
Se em virtude de erosão violenta, resultante de agentes
meteoricos de grandiosa possança, quaes soem produzir as
prolongadas e intensas bategas pluviaes, ficaram as rochas
gneissicas desnudadas, emersas sob formas esqueleticas, aqui
e alli, como no Quixada, os terrenos sedimentarios, que as re-
vestiam, deveriam ter sido carreados por força gravitatoria
para os baixios do solo, e particularmente depostos no curso
inferior, senão medio, das grandes ravinas, a que impropria-
mente chamamos rios, formando ahi estensas planicies allu-
viaes, cujos sedimentos se alternam de grés fina e aggluti-

referido a acção de geleiras certos depositos superficiaes cuja


origem é ainda problematica. "
"Ha tempos levantou-se a hypothese, diz o Sr. J. C. Bran-
ner-na sua Geologia elementar, pag. 13. - de que estes boulders
(blocos de pedra arredondados) haviam sido espalhados no
Brasil pelas geleiras durante a epocha glacial - um periodo
frio que se sabe ter existido nas regiões mais proximas dos
pólos. Entretanto, estudos posteriores mostraram que esses
boulders se originaram, proximo ou mesmo no proprio lugar
onde se encontram, pelos processos de exfoliação e decompo-
sição. " Veja-se tambem J. C. Branner-" The supposed glaciation
of Brasil Chicago 1893 ; A. de Lapparent- Traité de geologie-
Paris, 1906 - pag . 1689.
Acerca da existencia de suppostos terrenos artezianos no
Ceará― veja-se o que escrevi no Vol. V da Revista da Academia
Cearense, pag . 210.
Ainda sobre as Formações quaternarias do Ceará leia - se o
que escrevi sobre o assumpto na Revista do Ceará.

(1) Th. Pompeo -A proposito das formações quartenarias do


Ceará - Revista do Ceará n?, pag. 10.
80

nante, especie de loess, de seixos rolos, cascalho, argila feldspa-


pathica, decomposições organicas, sobretudo vegetaes, hu-
miferas, que constituem as terras ricas, prodigiosamente ferteis
das margens do Salgado, no Icó, do Boqueirão do Cunha a
Aracaty, no Jaguaribe, e em geral es de todos os rios cea-
renses. 1
Os terrenos quartenarios não são tão delgados no Ceará,
1
como parece entender o illustrado Dr. Alvaro Fernandes, e se
bem que o chamado alluvial ou terra vegetal seja de recente
formação, attribuindo -se -lhe apenas alguns decimetros de es-
pessura (1 ) , cumpre acreditar, como observa o autor do Fim
da Creação (2) , que a sua presença na superficie terrestre não
é um privilegio da nossa idade, mas que todas tiveram sua
terra vegetal.
Em abono desta opinião, isto é, de que a camada humi-
fera apresenta nas planicies cearenses espessura superior as
identicas da mór parte do mundo, citarei as sondagens feitas ao
longo do Salgado e Jaguaribe pelo Sr. Revy em sitios distantes
e afastados de muitas leguas uns dos outros. [ 3 ]
A horisontalidade. quasi perfeita dessas planicies. que-
brando a declividade geral do solo, mostra de modo palpavel
que ellas se formaram das degradações (gneissicas ] da rocha
predominante, e de uma vegetação exhuberante, de extraordi-
naria pujunça, reduzida, como acontece actualmente, a pó im-
palpavel sob a influencia do calor solar, muito mais pode-
roso aqui do que nos continentes norte. Não é difficil se
reconstruir mentalmente a obra dos agentes meteoricos, chi-
micos e mecanicos nessa elaboração.
Se acreditarmos o que ensina a geologia, as alluviões
anteriores, designadas com o nome de dilurium cinzento, são
devidas as grandes correntes d'agua, mui vastas e extensissi-
mas, que se deveriam elevar de 40 a 50 metros acima do ni-
I

( 1 ) J. J. Revy - Reservatorio de Larras, pags. 5 e 7.


(2) Visconde do Rio Grande- O fim da creação, pag. 483.
(3) Cumpre accrescentar as do engenheiro Omeara, já ci-
tado.
81

vel actual nos rios, que lhes occupam o fundo , e onde elles
proseguem a obra do erosão . [ 1 ]
Se em climas de lenta evaporação, quaes os temperados,
foi possivel a formação de aguas pluviaes de tão grande vo-
lume, não se pode recusar á zona occupada pelo Ceará a mesma
possibilidade.
Assim, admittido o agente liquido como demolidor da
antiga rocha, acceitar- se- ha consequentemente a sedimentação
de taes desmoronamentos em sitios baixos até o nivel da pro-
xima barreira.
Por outro lado , a falta, senão ausencia completa de conchas
e fosseis vegetaes nesses depositos faria suppor ou que a sua
formação precederia a epoca paleosoica, podendo ser referi-
do ao periodo devoniano, como pensa Humboldt em relação
a grés vermelha , que occapa grande parte do continente sul-
americano, o que si não compadece com a hypothese, que ve-
nho aventando, de serem esses depositos producto de recente
sedimentação, ou que a sua formação, á semelhança do que
o professor Agassiz assegura se ter dado no valle amazonico,
se operou no fundo da vasta lagoa d'agua doce, -ou , o que é
mais verosimil, a seu aberto por acamações de detrictos orga-
nicos ou rochosos, lenta e secularmente como acontece actual-
mente.
A carencia de fosseis na camada inferior desses depositos
alluviaes explicar-se-ia pela presença do oxydo de ferro, que
segundo Ch. Lyll exclue ou extingue os vestigios organicos na
formação das rochas. [2 ]

[ 1 ] Ch. Vélain- Geologie stratig.. pga. 545 .


[2 ] O professor J. C. Brauner diz - ser uma forma pe-
culiar ao terciario brasileiro, que exceptuadas algumas plantas
encontradas no Amazonas, não se tem encontrado fosseis nelle.
E' certamente digno de admiração que os fosseis não tivessem
sido preservados em camadas da tanta espessura e de tão
larga destribuição, compostas de estractos de areias e argilas
variadamente n.isturadas. Este facto tem sido frequentemente
discutido e explorado pela supposição de se não terem feito
a tal respeito cuidadosas indagações. E' sem duvida altamente
provavel que ainda possam ser encontrados fosseis : mas de-
balde temos procurado em umas mil amostras traços reconhe-
civeis de remanescencia organica.
Differentes hypotheses insinuam-se de si mesmos, em ex-
82

Accresce, como ensina Thaer, citado por Boussingantt [ 1 ]


que a argila se combina com o humus de maneira intima e
chimica, por tal modo que este parece perder as suas proprie-
dades, assemelhando- se por fim mais áquella do que a terra ve-
getal [humus].
A argila, que por assim dizer cobre duas terças partes do
solo cearense, servindo de assento aos recentes depositos al-
luviaes, não apresenta em sua constituição, pelo menos de
modo predominante, signaes de formação marinha ou lacustre.
por lhes faltar o elemento constitutivo fosseis de uma ou ou-
tra procedencia .
E' sabido que quando a massa dos detrietos vegetaes per-

planação do não fossilifero das rochas. Depois de examinar


a geologia da região amazonense, Agassiz concluio que uma
enorme geleira fôra outr'ora arrastada para aquelle valle, e
levantara ohi gigantesca morena : de sorte que, derretido o
gelo, as formações que agora são consideradas terciarias fo-
ram depositadas por aguas frias e lodosas a correrem da ge-
leira para um grande lago. Quanto a nós, isto tambem explica
a ausencia de restos organicos com excepção de folhas, nessas
camadas. Mas, quando mesmo a theoria de Agassiz sobre a
origem destas camadas fosse acceitadas, não explicar se - ia a
ausencia de fosseis nas mesmas rochas na costa sul-oriental
do Brasil.
Surgem duas hypotheses : 1 essas camadas foram depo-
sitadas tão rapidamente, e por agua tão sobrecarregada de
materia mecanicamente suspensa, que tornou- se nellas impos
sivel a vida animal . Pode- se dizer em relação a esta theoria
que emquanto a maioria das camadas terciarias é de natureza
a poder supportal-a, ha muitas camadas de argila e areia
finissima que foram duramente depositadas com rapidez ou
por correntes poderosas : 2ª essas camadas, contiveram outr'ora
restos organicos, que foram dissolvidos pelas aguas que se in-
filtraram. - J . C. Branner- A geologia cretacea e terciaria do Bra-
sil, pag. 116 .

a) A theoria de Agassiz nunca foi acceita pelos geologos


que conhecem a geologia amazonica, e conta-se que elle aban-
donara a da glaciação antes da sua morte. Veja - Shaler e
Daris-Glaciers.

[ 1 ] Boussingault-Principes d'agriculture.
83

manece a sombra das arvores ou se conserva enxarcada


dagua mantem a sua natureza vegetal, mas depois que lhe
falta a sombra daquellas ou secca a agua, deixando -a exposta
aos raios do sol, poucos annos leva para se converter em ar-
gila. (1 )

Assim, como ficou dito, a acção mecanica das aguas e o


calor solar explicam a transformação lenta dos depositos re-
centes em sedimentos de apparente vestutez, que induzem a
acreditar-se na inexistencia de espessas camadas areno-argilo-
humiferas revistidoras do solo cearense.
Excluidas as efflorescencias gneissicas, de rochas sedi-
mentarias, de grés, disseminadas em complicado plexus, emer-
gentes, á superficie dos terrenos cearenses, são estes em geral
argilosos, nos taboleiros extensos que se dilatam entre serras
e serrotes, silico argilosos nas baixadas e planicies ravinaes, e
areno- silicosos no litoral.

Mesmo á proximidade dos estuarios ou foz dos rios, como


no Aracaty, "a terra é formada do mais bello solo alluvial,
da espessura media de 4 a 5 metros, com a largura de 10 ki-
lometros e acima de 15 kilom . d'aquella cidade até o Bo-

(1) O autor do Fim da creação dá uma explicação enge-


nhosa da transformação das plantas em areias silicosas.
"As areias do Brasil, diz elle a pag. 313, se destacam das argi-
las, produzem-se como estas, e procedem da vegetação, pois é
sabido que todas as plantas contem silice, e que algumas ha,
como as gramineas que se fazem notaveis pela grande abun-
dancia desse mineral. Ora, é facto conhecido que a silice, quau-
do dissolvida ou disseminada na massa de outras substancias,
se mostra dotada de uma efficaz tendencia para della separar-
se molecularmente e se reunir em cristaes ou concreções dis-
tinetas. Nada, pois, obsta que consideremos os grãosinhos si-
licosos das argilas como diminutas concreções da silice que,
disseminada no tecido das plantas, passa depois que estas mor-
rem, para terra vegetal onde se concreta quando esta se mi-
neralisa A igualdade dos grãosinhos arenosos, que fazem par-
te da argila, todos do mesmo tamanho e da mesma forma es-
pherica ou espheroidal, revelam, com effeito, autes uma acção
chimica, do que a acção mecanica das aguas que é sempre
desigual.
84

queirão do Cunha, ella descança sobre areia limpa e grossa.


Ha nesta parte do valle ao menos 80.000 hectares de magnificas
terras planas de riquissima qualidade ; excepcionalmente aptas
para agricultura superior".

Outras provas de algum valor, especialmente referentes


á fimbria maritima, fornece-nos a commissão americana que
ha uns 14 annos se propoz furar poços artezianos nas proxi-
midades da Fortaleza.
Estes trabalhos, minuciosamente referidos na monogra-
phia do engenheiro Saint-Clair ( 1 ), constam de perfurações
feitas no Bemfica, Mecejana, Canafistula , a profundidades va-
riantes entre 25 e 51 pés. Nessas sondagens, a camada imper-
meavel ou supposta tai, só foi encontrada a profundidade su-
perior a 7 metros.

"Effectivamente , diz o Sr. S. Clair, já a areia na protun-


didade de 12 metros começava a alterar o quartzito schisto-
so carregado de mica verde, analogo as amostras que retira-
mos do Bemfica, com micas- chistos duros, que gastavam rapi-
damente as picaretas, fazendo-se necessario o emprego de ex-
plosivos '.

Posteriormente a esses malogrados, ensaios de perfurações


artesianas e com os mesmos instrumentos deixados por aquella
commissão, numerosos poços profundos tem sido abertos na
Aldeiota, Barro Vermelho, Jacare anga e outros sitios, dentro
e nos suburbios da Fortaleza ; e do seu resultado verifica -se
que a camada sedimentaria, composta de areia. argila grossa,
vermelho - amarella, argila fina, agglutinante, branca, de pedrisco,
cascalho até o lençol d'agua, varia de 9 a 30 metros, corres-
pondente na sua maior profundidade ao nivel medio das ma-
rés atlanticas, da costa.
Este facto, approximado ao da irregular conformação to-
pographica da Fortaleza, assente em planura baixa. circumva-
lada de depressões a sudeste, sul, oeste, especie de ilha,

(1 ) Saint-Clair de Miranda - Memoria sobre poços artezianos


no Ceará, pags. 10 e seguintes.
85

como faz sentir o Sr. Gow Bleasby (1 ) , poderia induzir -nos


a attribuir sua constituição geologica, ao menos શ da argila
fina e brancacenta, a rocha granitica inferior, a um periodo
mais antigo do que se suppõe, talvez ao devaniano.
Para se ter dados mais concludentes em favor desta hy-
pothese, seria mister verificar ser a camada a que alludo
(a da argila fina) , uniforme, horisontalada, demonstrativa de
sua disposição alluvial em leito maritimo ou lacustre, porque
as alluviões do periodo actual, a ceu aberto, se destinguem
daquellas, não só pelos fosseis, que lhes são proprios, como
por acamamentos muita vez discordantes, discontinuos e, não
raro, inclinados, amolgados a declividade do solo sobre que
assentam. Aliás, esta facies do deposito antigo (2 ) se com-
prehende desde que se attender ao modo lento e gradativo
como elle se operou em bacia calma no fundo de um lago ou
do mar, abaixo da acção agitante das ondas, contrastando
com o das oscillações bruscas, determinadas pelas degradações
mecanicas (ventos, chuvas, ete. ) da epocha presente .
A conclusão a tirar sobre o adelgaçamento da camada al-

(1 ) G. Bleasby- Projecto sobre o abastecimento d'agua em


Fortaleza.
(2) Estavam escriptas essas considerações sobre a forma-
ção do periodo quartenario, quando li a obra de Branner so-
bre a Geologia terciaria do Brasil. Referindo- se a post-terciario,
diz elle, que essa formação desenvolve - se sobre montes e val-
les em forma de fino emboço de seixos rolados, pedriseos e
areia, umas vezes soltos, outras cimentados em pedra-puding
de uns dez pés de espessura, e quando expostos ficam man-
chados de preto. Cobre o chão dos planaltos terciarios ou aз
suas saliencias, e, frequentemente espalha - se para os lados das
collinas e accumula-se nos valles. Não confina com os limites
geographicos do cretaceo ou o terciario, mas encosta-se muito
para o interior e muito alem dos limites actunes dessas forma-
ções. Por toda a parte é mais ou menos irregular em espessura,
e em parte alguma se pode dizer que é universal ou continuo.
Um dos caracteristicos accentuados dessa formação post-
terciaria, é que ella é muito mais grosseira para o interior, e
torna-se mais fina ao approximar-se a costa. A explicação
deste material gasto pelas aguas parece ser que o periodo ter-
ciario foi cerrado por uma depressão ao longo da costa
actual, que puxou a linha da margem para o interior, ou que
ella já era ali. Segue-se, então, uma gradual emergencia duran-
86

luvial é que ella occupa maior extensão e declividade do que


parece a primeira vista, seja qual for o processo geaguosico
que se lhe attribua. ( 1)
E' uma camada composta de larga baixa arenosa, de al-
guns metros de profundidade, sobreposta a argila grossa ou por
esta intervallada.
Na Fortaleza, com excepção dos pequenos trechos argi-
losos do Benfica e Barro Vermelho, predomina a areia sili-
cosa, talvez trazida pelas correntes que descem das proximas
serras para o mar e dahi repellidas pelas marés e ventos alisêos .
Difficilmente se formam empoçamentos a sua superficie ,
mesmo depois de chuvas prolongadas, porque as depressões
que orlam a cidade servem de drenos ás aguas estagnantes,
quando porventura resistam a evaporação activa dos raios
solares, auxiliada pelos ventos constantes da zona tropical.
No trabalho - The stone of Brasil, their geological and geogra-
phical relations, with a chapter on coral reefs do Sr. J. Casper
Branuer-projecta-se alguma luz sobre a formação dos reci-

te a qual toda a agua agora coberta por esse material, largamente


destribuido. passara gradualmente pela condição de uma mar-
gem sobre as rochas soltas, anguladas da superficie onde fo-
ram arredondadas em fragmentos, seixos e pedriscos que ago-
ra são encontrados no lugar. Emquanto a ressaca foi batendo
e gastando as duras ro has cristallinas e metamorphicas do
interior, tornou- se incapaz de produzir effeito manifesto na to-
pographia da região : mas quando, no decurso da emergencia
da terra, as camadas molles areientas e argilosas do terciario
foram trasidas a seu aleance, a obra da esculptura da terra
tornou-sé capaz de augmentar enormemente .

( 1 ) J. da Silva Feijó -na sua Memoria sobre a capitania


do Ceará § 27 diz que "todo o terreno em geral é coberto mais
ou menos de uma codea de terra vegetal, ainda mesmo a
beira- mar, donde provem a actual fecundidade d'aquelles ter-
renos areientos, a primeira vista aridos e seccos ; e á propor-
ção que se caminha para o interior do sertão observa- se nas
escavações dos rios que esta camada de terra vegetal se
augmenta em espessura e côr preta, a qual não pode deixar de
ser devida á dissolução continuada da immensidade de folhagens
e das mesmas arvores, que pelos ventos ou velhice tem ca-
hido e apodrecido, visto que se não pode duvidar que uma
tão grande quantidade ha tantos seculos accumulada não pos-
sa produzir uma mais grossa gamada.
87
nad
fes da nossa costa, mostrando a possibilidade de haver sido a
Fortaleza , e grande parte da costa, immenso lago ,? barrado
por altas dunas , atravez das quaes filtravam as aguas doces
até a praia, situada em plano inferior.
Os recifes do Rio Grande do Norte ao Amazonas devem
ser de grés, segundo pensa Branney : "Estes recifes ( de grés)
são approximados, mas não distinctamente rectileneos. Suas
camadas inclinam-se para o mar com o mesmo angulo commum
as praias. A rocha endurecida do recife tem tres a quatro
metros de espessura. Os materiaes subjacentes são : areias,
conchas e argilas, em successão irregular. Quanto ao proces-
so de formação, o caracter e a estructura des recifes mostra
que elles são antigas praias consolidadas pelo carbonato de
cal. o seu estado rectilineo indica que elles são formados de
uma linha natural da prata, fixa e permanente.
"O problema mais difficil que apresentam esses recifes é
a da sua consolidação por meio da deposição de carbonato
de cal.
"A hypothese de endurecimento das praias de areia pela
acção da agua pluvial e pelo escapamento do dioxydo de
carbono contido na agua do mar é admittido como possivel,
mas posta de lado como insufficiente para explicar todas as
phases do phenomeno. Uma causa mais efficiente parece ser a
da passagem d'agua doce carregada de acidos organicos, pro-
venientes da decomposição de materias vegetaes, accumuladas
nas lagoas e correntes represadas, por traz das elevações das
praias. Os recifes occorrem ao longo de uma se ção da costa.
batida por ventos e correntes constantes e em condições geo-
logicas e climatericas taes, que muitos dos riachos são tem-
porarios ou permanentemente obstruidos pelas areias accumu-
ladas que se formam em suas boccas. Deste modo, o unico ca-
minho que as aguas têm para attingir o oceano é a percola-
ção atravez das barreiras arenosas da praia.
"Em conclusão, parece provavel que a consolidação dos
recifes de grés não teria lugar caso á queda dagua de chuva
fosse sufficientemente abundante e constante de modo a man-
ter as boccas dos riachos abertos e as suas aguas puras. (1 )

( 1) Orville A. Derby - Noticia inserta no Jornal do Com-


mercio, do Rio de Janeiro, de 15 de Abril de 1905 .
88

PHENOMENOS VULCANICOS

Levado pelo aspecto afunilado que apresentam algumas


serras deste Estado, o naturalista Feijó affirma que em geral
o terreno é vulcanico, composto de massas irregulares de
lavas e outras sustancias terreas primitivas, mais ou menos
alteradas por força do fogo, constituindo o seu amago ou nu-
eleo universal uma rocha viva, azulada, saxoza, vitrescente e
durissima ." (1 )
O barão de Capanema, que visitou demoradamente o
Ceará em 1858 a 1860, não vio vestigio de acção vulcanica ,
salvo um tronco de basalto, que encontrou na margem do rio
Curú,
O senador Pompeu observa, porém, que este illustre sabio
não examinou, como o naturalista Feijó, os diversos serrotes
do sertão.
Os estudos geologicos feitos pelos especialistas neste ramo
scientifico, no Brasil, induzem a crer que a acção vulcanica
é sem valor ou nulla na constituição do seu solo. O Sr. Orville
A. Derby (2) affirma categoricamente que não existem vulcões
no Brasil, e de vulcões extinctos não ha vestigios na parte
continental. “A pequena ilha montanhosa de Fernando de No-
ronha é o unico ponto conhecido de origem vulcanica no terri-
torio brasileiro. "
Em contraposição, o sabio geologo americano J. C. Bran-
ner (3) diz que "existem muitos restos de lavas no Brasil en-
tre as rochas antigas. Ao norte do Cabo de S. Agostinho ha
um cabeço conhecido por Pedras Pretas onde um antigo len-
çol de lava trachytica está exposto ao longo da costa. A ilha
de Santo Aleixo, ao largo da costa de Pernambuco, em frente a
Barra de Serinhaem, é formada tambem de rochas eruptivas. "
Aponta mais a principal ilha dos Abrolhos, lugares em Pira-

( 1 ) João da Silva Feijó - Memoria sobre a capitania do Ceará,


inserta na Revista do Instituto do Ceará- do 1º trimestre de
1889, 20 , pag. 11.
(2 ) Orville Derby- na Geographia do Brasil de Wappeus
pag . 59.
(3) J. C. Branner- Geologia elementar, 1906 , Rio de Janei-
ro, pag. 99.
89

cicaba, Santa Barbara, Rio Claro, Limeira etc. em S. Paulo, no


Paraná, Santa Catharina, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro,
nos quaes apparecem rochas eruptivas.
A duvida do Senador Pompeu é, portanto, bem cabivel.
TREMORES DE TERRA

Os phenomenos sismicos, considerados até pouco tempo


como manifestações eruptivas, devem ser referidos a uma das
formas mecanicas da formação das montanhas. (1) Sob a
acção das pressões lateraes, a crosta solida é submettida a
esforços que não podem deixar de provocar, de tempos a tem-
pos, rupturas de equilibrio dando logar as deslocações e a
fracturas acompanhadas do deslise das paredes, que determinam
abalos capases de se propagarem mais ou menos longe. Isto
quando se trata de oscillações extensas ou intensas do solo.
O Sr. Lapparent observa com justeza , que os ensinamen-
tos fornecidos pelo teor habitual das curvas isosistas, e pelo
facto de que a mór parte dos sismos de alguma importancia
se produzem nas regiões onde se não exerce a acção vulea-
nica, mostram que os tremores da terra tem causa differente .
Não se deve excluir completamente a influencia vulcani-
ca dos movimentos oscillatorios terrestres. Na visinhança das
crateras em actividade o solo treme á irrupção dos gazes.
Mas, onde não ha focos irruptivos, deve procurar-se a causa
do phenomeno em agentes externos.. A lenta acção das aguas
infiltrantes, por exemplo, nas regiões montanhosas, dissolven-
do ou arrastando materiaes de certas camadas, umas soluveis.
outras moveis, pode provocar desmoronamentos mais ou me-
nos subitos, que abalam em derredor delles, regiões mais ou
menos extensas . (2)
O Sr. J. C. Branner (3 ) assignala-lhe as tres causas se..
guintes :
I Fractura de rochas sob esforço :
II Escorregamento ou reajustamento das rochas umas so-
bre outras ;

( 1 ) Veja- se Dana e Hoernes - Manual of geology, 4º edição,


pag. 373. Lapparent - Traité de geologie, 5º edição, pag. 562.
(2) Lapparent - Obra cit., pag. 559.
(3) J. C. Branner- Geologia clementar, pag. 104.
90

III Explosões dentro da crosta terrestre nas visinhanças


de vulcões, provavelmente pela formação e collapso do va-
por. ( 1)
Não se deve, pois, attribuir a forças vulcanicas os pheno-
menos sismicos do Ceará.
Na sua obra Ensaio Estatistico do Ceará, o Senador Pom-
peu registra os seguintes terremotos :
A 8 de Agosto de 1807 em todo o valle do Jaguaribe, es-
tendendo -se ao norte até a Fortaleza ( 30 leguas), ao sul do
Ics (50 leguas) e a leste a igual distancia no Mossoró e serra
do Martins, no Rio Grande do Norte .
Em 1810, na Granja, quinta-feira santa, e nos annos de
1816, 1852 e 1855.
No Aracaty a 2 de Dezembro de 1852,
Em 1824 abrio- se a terra, fazendo uma larga greta , desde
o pé da serra de S. Pedro até o Jardim, na extensão de 5 le-
guas com largura de 1 palmo. mais ou menos, e com uma pro-
fundidade insondavel.
Perto de Granja, um terreno pantanoso, em alguns annos
a terra racha, fazendo profundas gretas por onde exhala fumo
quente : talvez simples emissão de gazes de decomposições
organicas.
No morro do Cumbe dão -se estrondos, acompanhados de
ebulição e extremecimento das areias . (2)

(1) O deslocamento de uma particula ou ponto na super-


ficie do solo na occasião de um abalo de terremoto não é tão
grande como geralmente se imagina. Raras vezes monta a
mais de tres a quatro millimetros ; algumas vezes é apenas uma
fração de millimetro . -J. Branner - Obra cit., pag. 105.
(2) Não será devido a mesma causa que no Mississipe
forma os muds lamps ? Humphreys e Abbot pensam que esses
montes de lama, que se formam no delta do grande rio são er-
guidos pela força que se desprende do gaz hydrogenado pro-
veniente das alluviões do Mississipe. As grandes massas de
productos vegetaes, trazidas pela correnteza e detida nos ban-
cos para serem cobertos por camadas de lama, entram em
fermentação e produzem gazes que acabam por entumecel as
e formar os cones (muds lamps) donde se escapam gazes.
No Jaguaribe, é provavel que a sua vegetação marginal,
mais basta nos pequenos furos em que se eile bifurca na fóz,
seja coberta por areias movediças, formando - se internamente,
91

No terrao de S. Quiteria ha um serrote escarpado, em for-


ma de agulha, todo pedregoso, em cujo cimo bastante alto
parece haver uma planicie. Em alguns annos durante a esta-
ção chuvosa tem apparecido incendiado esse pico, cuja luz é
avistada de 50 a 60 kilometros de distancia . Descem pelas
encostas massas ardentes, mas ninguem as foi examinar de
perto. (1 )
Segundo o testemunho do padre Telles (autor de um livro
inedicto offerecido ao principe D. João) na Uruburetama ha
tambem um picão que por vezes tem ardido.

nos sitios mais apropriados, pequenos centros de decomposi-


ções gazozas.
Eis o que um observador refere sobre este phenomeno :
"No Cumbe ha um lugar onde os superticiosos dizem estar
encantado o rei D. Sebastião : essa superstição nasce do ruido
que se ouve em certas epocas, semelhantes ao rufar de tambor.
Grande parte dos terrenos alt são antigos brejados, e nel-
les fazem-se plantações de canna. Tem- se visto, precedidos de
fortes ruidos subterraneos parte desses terrenos que se com-
poem de barro lamacento se elevar de repente com as res
pectivas plantações a alturas de vinte e trinta palmos.
Tive eu proprio occasião de vêr um destes acontecimentos
pouco tempo depois de se haver dado o phenomeno .
Relataram -me então que seriam 11 horas da noite, mais
ou menos, quando se ouviram estrondos no centro da terra,
e pela manhã do dia seguinte via-se uma daquellas planta-
ções com o cercado elevada á altura referida. Vi em outro
ponto no mesmo lugar um cajueiro e outras arvores mortas
sobre uma porção daquelle barro todo revolvido : tinha sido
um outro facto identico.
Attribuo este phenomeno ao peso dos morros de areia
que se formaram sobre aquelles brejos por não acharem um
solo ainda bem consolidado, descem produsindo esses deslo-
camentos.
Alipio Luiz Pereira da Silva - Considerações geraes sobre as
provincias do Ceará e R. G. do Norte - Rio de Janeiro, 1885 , pag. 41 .
(1 ) Este phenomeno que apparece raro, é recebido pelos
sertanejos como um presagio de bom inverno . A' ultima appa-
rição foi no inverno de 1829 depois de uma grande trovoada.
Podia ser a communicação de uma faisca electrica a alguma
materia inflammavel. Desta vez durou uns 20 dias, e era per-
feitamente visto de Sobral a 14 leguas. Por baixo deste serro-
te ha uma vasta caverna. - Senador Pompeu - Obr. cit. , pag. 52.
92

No termo do Acarahú consta tambem que um anno destes


ardeu um serrte. Na serra da Barriga ( a 30 kilom . a leste de
Sobral) tem por vezes apparecido desmoronamento e chammas
acompanhadas de fumo, e sempre depois de grandes chu
vas. (1)
No leito do rio Pirangy, lugar denominado Lóló, distante
do Cumbe seis leguas. tem se ouvido ruidos semelhantes aos
deste sitio.

No lugar, denominado Salina Redonda, refere o Sr. Alipio


P. da Silva ( 2 ) , entre a foz do rio Jaguaribe e Cumbe, ouvio-
se um pequeno ruido, e no dia seguinte foram encontrados di-
versas fendas sobre o barro revolvido . de envolta com uma
substancia parecida com o enxofre ; do mesmo modo vio -se de
repente aterrado um braço do rio Jaguaribe, que por alli pas-
sava, de quatro a seis braças de profundidade.
O mesmo Sr. Alipio conta que em 1878 a Camara Munici-
pal do Aracaty mandou abrir um poço no lugar Bemfica, deu-
tro da cidade. Depois de ter-se cavado a profundidade neces-
saria, auxiliado por meio de uma bomba , mediam-se no dia
seguinte 40 palmos dagua, mas com verdadeiro espanto, no
dia seguinte, tinham desapparecido 18 palmos , sem se ter ti-

( 1 ) Eis o que a este respeito communica o Rvd. Nogueira :


"A serra é composta de massas irregulares de grandes rochas.
é bastante alta e extensas. Em fevereiro de 1842. depois de
copiosa chuva, pelas quatro horas da tarde vio-se sahir de
uma grande pedra um fumo preto e espesso, e este fumo
succederam chammas, que cobriram todo o serrote, queimando
os arbustos que alli se achavam.
A 22 de Fevereiro de 1859 reproduzio-se o mesmo phe-
nomeno, mas em lugar differente, a 200 braças mais ao sul do
primeiro. Precedoram grandes chuvas, seguio-se a irrupção
com grandes estampidos e estalos horriveis, atirando ao lon-
ge grandes pedras o fogo dominou extensão superior a 150
braças. e deixou muitos buracos que se veem de longe.
Em 1861 o Dr. Capanema, visitando esta serra diz que
nada encontrou que justificasse este phenomeno, predominando
na serra o gneiss e o granito. A serra tem mais de duas leguas.
-Senador Th. Pompeu-Ens. Estat., pag. 52.

(2) A. L. P. da Silva - Considerações sobre a provincia do


Ceará, etc., pag. 42.
93

rado uma gotta dagoa : no dia subsequente reappareceram no-


vamente os 40 palmos, e dahi em diante foi diminuindo dia-
riamente meio palmo até seccar totalmente : e tendo se tenta-
do nova escavação encontrou -se pedra, que obstou a conti-
nuação do trabalho, sendo de pessima qualidade a agua que
minava.

CAVERNAS

Em varias serras encontram-se cavernas mais ou menos


interessantes, algumas dignas de estudo por suas curiosidades
estructuraes.

Na parede de talhado da serra do Araripe abrem- se al-


gumas, que tem sido visitadas e descriptas.
No lugar Cajueiro, escreve o Dr. Marcos de Macedo ( i )
visitei uma gruta na qual não vi signal algum de rochas cal-
careas, assim como não pude examinal- a circumstanciada-
mente por ser o seu interior muito acanhado. A do Brejinho,
abaixo do nivel da anterior, é summamente celebre e eu-
riosa por conter salões immensos, a cujo fim não se tem ainda
podido chegar, sendo flanqueados por galerias de arcadas,
formadas de stalactites e stalagmites. Affirmam-me que ahi
não habita vivente algum, a excepção de uma especie de nieto-
rianos, que defendem a sua entrada, e por isso permanecem
indeleves as pegadas das pessoas que a percorrem por ser
o seu pavimento aleatifado de um pó de differentes cores, que
parece ser o resultado das formações de greda com terra fer-
ruginosas." [2]
A caverna do Boqueirão de Lavra, é formada por desag-
gregação da rocha quartzito, segundo o barão de Capanema.
Fica a 22m 64 c. acima do Poço do Boqueirão. O seu terreno,

( 1 ) M. A. Marcos de Macedo- Descripção dos terrenos car-


boniferos da comarca do Crato, apud. Revista do Instituto do Ceará
-Tomo XIII, pag. 109 .

[2] O barão de Capanema visitou posteriormente esta ca-


verna, e se bem que a achasse admiravel, não a julgou tão
bella quanto o Dr. Macedo.
94

diz o Snr. J. J. Revy ( 1 ) eleva - se com inclinação geral da ca-


mada : seu comprimento não é conhecido, se bem que consi-
deravel.
Esta, bem como outras menores immediatas a ella. foram
escavadas pelas torrentes d'agua vindas do antigo lago, as
quaes minavam as camadas neste lugar, cujos rochedos escor-
regavam para o precipicio abaixo . "
A caverna tem a forma de uma abobada achatada, incli-
nada ligeiramente para um dos lados. Do tecto não pendem
stalactites parece revestido de granito como nos tuneis de
estradas de ferro. Grandes blocos de pedra quadrangulares
formam seu revestimento, não cimentado, deixando ver as
fendas de cada um. Em alguns lugares tem-se a sensação de
que um desses blocos vae cahir, tal parece a desaggregação da
rocha a que estão presos .
Este fraccionamento, cujos escombroз se vêem por todo o
solo da caverna. alastrando-a com blocos de differentes ta-

[1 ] J. J Revy-- 0 açude de Lavras— pag. 15.


No dia 20 de Novembro de 1884, eu e alguns amigos visi-
tamos esta gruta. Dos meus apontamentos de viagem, destaco
a descripção que se segue : Pelas 512 h. da manhã partimos
de Lavras para o Boqueirão . A estrada segue por ligeiras on-
dulações, um tanto pedregosas até a garganta da serra : Ten-
tamos subil-a por varios caminhos, mas o empino da rocha não
nos permittio a realisação deste desejo. Resolvemos atravessar
em balsa o poço ou braço do rio, que ahi tem a largura de 40
a 45 metros : um homem a nadar impellio o tosco batel até o
pé da serra, a certa distancia da garganta, onde desembarca-
mos. Esta ergue - se então quasi verticalmente. . .
Por un talhado ingreme, e de gatinhas, chegamos a gruta,
que fica a altura de uns 100 palmos acima do nivel do poço,
(Segue-se a descripção que veem no texto acima) . O Coronel
Manoel Carlos, nosso companheiro, que ha 12 annos a visitara,
assegura-nos que n'aquelle tempo não havia taes pedras a
juncarem o solo da gruta.
Isto causon-nos receio de proseguir para seu inte-
rior, ameaçados como estavamos do desprendimento de al-
gum dos blocos pendentes do tecto. Minha curiosidade, porém,
veuceo o medo de incerta catastrophe, e só, fui tão longe quan-
to possivel. A escassez de luz e o convulsionado do caminho.
tendo de subir e descer pedras a cada momento, obrigaram-
me a retroceder ."
95

manhos, alguns de um metro cubico, é relativamente recente,


a acceitar-se o testemunho de pessoas, que anteriormente a vi-
sitaram.

No serrote Cantagallo por onde passa a estrada de ferro


de Baturité, proximo a esta cidade, ha grandes cavernas for-
madas sob enormes massas de rochas calcareas. ( 1 )

No serrote do Picão, em S. Quiteria, ha uma immensa


gruta por baixo da massa granitica ou quartzitica do monte.
Na Uruburetama ha varias, sendo notavel uma perto de
S. Francisco, formada por grande lage enterrada no chão,
tendo pequena abertura horisontal por onde mal pode pene-
trar uma pessoa ; dentro acha-se vasto salão com altura suffi-
ciente para sɔ andar em pé ; a pedra da abobada é fendida
ao meio por onde penetra luz . Encontron- se nessa caverna
grande copia de ossos humanos bem conservados, de diversos
tamanhos. O Senador Pompeu aventa a hypothese de ter ella
servido de cimiterio aos indios do lugar.
Na comarca de Inhamuns, ao pé da Serra- Grande, ha ex-
tensa gruta, que ainda não foi examinada.

A gruta de Ubajarra, proximo a S. Benedicto, no serrote


ao pé da Serra- Graude, è a mais digna de nota por suas pro-
porções. E' aberta no cume da montanha e muito profunda ;
embaixo encontra- se um salão formado por extensa abobada,
alta, que se não pôde medir. Presume-se que se estende por
baixo da serra. E' atravessada por uma corrente de agua
limpida, que corre no seu fundo, e desapparece adiante : do
tecto e incrustados nas paredes, pendem stalactites de formas
caprichosas, que vistos ao clarão dos talhos produzem na
imaginação das pessoas ignorantes, que alli descem já preoccu-
padas do maravilhoso, effeitos phantasticos. ( 2)

(1) Veja-se o Ensaio Estatistico do Senador Pompeu, pag.


54, do qual colhi estas informações .

[2] O Dr. Raja Gabaglia, da commissão scientifica , envia-


da pelo governo imperial em 1858 ao Ceará, examinou du-
rante uma semana esta curiosa gruta e deu della interessante
descripção. ( Senador Pompeu - ob. cit., pag. 55. )
96

Na serra do Pereiro encontram-se muitos talhados pro-


fundos, até hoje insondaveis. Ao lado occidental a serra apre-
senta uma grande fissura cuja causa attribuem os naturaes a
uma manga d'agua , parecendo antes ter sido effeito de algum
terremoto , como o de 1807 que houve nessa fronteira e no valle
do Jaguaribe. [ 1 ]

MINERAES

Na enumeração dos productos mineraes do Ceará, confessa


o autor do Ensaio Estatistico [2 ] que se limita a mencional - os ,
tendo se servido para isto das memorias de Feijó, e informa-
ções dos Drs. Capanema, Theberge, boticario Mamede e outros.
Depois da publicação de seu trabalho [ 1862 ] nenhum estudo
profissional foi feito, pelo que, ainda nesta secção tenho de
me guiar pelo que elle escreveo .
O fascies geral e caracteristico do solo cearense é, como
ficou dito, composto de rochas cristallinas e metamorphicas ,
predominando o gneiss, granito, porfiro, quartz, micachito, ou sedi-
mentarios, como schistos argilosos, ardosias etc.: raras rochas
irruptivas como basalto e marmore sacharoide.
BASALTO, em massas estratificadas, encontra- se no Crato,
S. João do Principe [ Tauá ], serrote Cantagallo e leito do Choró.
Da Cachoeira de Missão -Velha, no Salgado, até o Icó exis-
tem formações basalticas, muitas cristallisações calcareas, etc. (3)
GRANITO E GNEISS - abundam em todas as pedreiras do
Estado. Ao longo da Estrada de ferro de Baturité, especial-
mente em Maracanahú. Monguba, Itapahy ; e de Quixadá a Se-
nador Pompeu o granito de gran fina, resistente, foi empre-
gado em pontilhões, boeiros, encontros de pontes, etc. A For-
taleza abastece - se das pedreiras de Maracanahú.
CALCAREO E MARMORE - abunda nos serrotes proximos ao
littoral, de 25 a 35 kilom. para o interior, de boa qualidade .
A pedreira do Itapahy produz marmore de gran- fina e com-
J

( 1 ) Dr. Antonio Augusto de Vasconcellos - Municipio do


Pereiro, apud "Revista do Instituto" -Tomo II , pag. 238.
(2 ) Th. Pompeu- Ens. est. do Ceará, pag. 144.
(3) Dr. José Pompeu - Corographia do Ceará, pag. 50 .
97

pacta, propria para construcção. A estatua do general Sam-


paio, a praça Castro Carreira, é de rocha desta procedencia
(serrote de Cantagallo). ( 1 ) Do serrote Giboia , proximo de Pa-
catuba, 15 kilom. de Moaguba, extrae- se grande parte da cal
empregada nas construções da Fortaleza, possue bancos de
marmore branco e listado de preto, de envolta com dolomias
(carbonato de cal e magnesia) . No districto de Soure encon-
tra-se marmore encarnado na antiga fasenda Nunes de Mello ,
(Tabapuá) a 7 kilom. da villa.
No Aracaty e no Crato existem grandes massas de mar-
more de cores variadas. ( 2)
Estes calcareos ( do Crato) são concreções mais ou menos
rudimentares.
Em Sant'Anna do Brejo, a 40 kilom . da cidade do Crato ,
no sitio em que assenta a villa, o solo é formado de laminas
marmoreas, cobertas por ligeira camada de argila. As casas e
calçadas são construidas com esta pedra, que, as vezes, é de
gran tão fina que pode ser aproveitada para pedra lithogra-
phica .
De um recife, que fecha a enseada do Mundahú, extrae se
pedra calcarea, conhecida pelo nome de Cabeça de carneiro. (3)
PSAMMITICO é o terreno, que se encontra, a partir de gra-
nito, que começa do ponto de confluencia do riacho dos Porcos
e corrente do Salgado e se estende até onde se considera o limi-
te antigo da serra do Araripe, bem como o da parte superior

(1 ) O barão de Capanema diz que o calcareo do Cantagallo


é branco, em algumas partes ligeiramente denegrido e raras
vezes amarellado. Encontra -se de gram bastante fina algum
pedaço isolado, no geral, porém, a gram é grossa. Em varios
accessorios acha- se grammatito, no lugar Raposa, e no alto da
serra com graphito em cristaes. Em outros lugares encontra-se
talco - Senador Pompeu -ob. cit. , pag. 145.
(2 ) O Dr. P. Theberge encontrou no Cariri cal carburetada,
schistosa, em grandes massas, formando bancos e abrindo - se
em folhas horisontaes mais ou menos espessas, como lousas,
proprias para ladrilhos, mesas etc. Senador Pompeo - ob. cit.
pag. 145.
(3) Dr. José Pompeo -ob. cit. pag. 53.
98

desta serra, tendo a cor amarellada com nodulos azulados e


raras vezes negros.
Apparece tambem abaixo do calcareo de gram fina, que se
encontra em S. Anna do Brejo, azulado. durissimo, contendo
veias de pyrites e de galena (sulfureto de ferro e de chumbo. ) [ 1 ].
GESSO -- Na ponta do Araripe, voltada para S. Pedro, ha
uma montanha, meio isolada, onde se acham grandes massas de
gesso fibroso (o sulfato de cal, de que falla o barão de Capane-
ma). Segundo o Dr. Marcos de Macedo é elle encontrado em
muitos logares da mesma Serra.
GYPSO -no Cariry.
LOUSA- no Inhamuns.
SILEX, pedra para amolar —encontra-se em muitos lugares.
FELDSPATIO , porphyros, quartzitos-muito abundante.
ARGILAS ―abundam em todas partes, do litoral ao extremo
sertão, excepto na orla das praias onde, aliás, em alguns pon-
tos são encontradas abaixo da camada de areia frouxa. Servem
a fabricação de tijolos, telhas, louça e ordinariamente acham -se
misturadas com oxydos ferruginosos anhydro oligisto ) que lhes
dão a coloração vermelha, oxydo hydractado [ limonito] , que as
tornam amarellas.
No Mondubim existe argila plastica da melhor qualidade,
infusivel, de que se faz tijolo refractario.
No leó e no Crato encontra- se argila negra ; na Viçosa e
Crat conereções de argila ferruginosa.
Em Mecejana ha uma argila plastica conhecida com o no-
me de tabatinga. (2)
SALITRE Encontra-se em muitos lugares, notadamente
em Tatajuba (entre S. Quiteria e Quixeramobim) onde já houve
uma officina do governo ( 3) ; na Pindoba, no municipio de Vi-

(1) Dr. José Pompeo - Corograph. pag. 53.


(2) Dr. José Pompeo - ob. cit- pag. 58.
(3 ) Por ordem regia fundou se um laboratorio na Tata-
juba em 1779 sob a direcção do naturalista J. da Silva Feijó. O
laboratorio funccionou por 22 mezes e produzio 379 arrobas e
27 libras de Salitre. Em Dez? de 1803 mandou o governo sus-
pender os trabalhos, passando o laboratorio por nova ordem
para Pindoba em Julho de 1804, cessando em Fevereiro de 1805.
Despenderam - se 10:430$ 720,
99

çosa, em Tagicioca, no Curú ; no Carnahubal, a 60 kilom .


de S. Pedro ; no Boassú, na Granja ; na Conceição, no Cu
rú ; em Pirangy, no Choró ; e nas serras de Araripe (Jardim ) ,
Uruburetama, Bastiões (S. Matheus ) Ipû. ( 1 )
SAL - MINERAL- Encontra-se em varios sitios do Jardim.
no sertão, e especialmente no Aracaty-assú, onde as aguas são
tão impregnadas deste mineral, que os charcos ou poços rasos
cristallisam ; os animaes estranhos ao lugar não as bebem, e
os passaros as repugnam. (2)
SAL MARINHO ( chlorureto de sodium) -Em toda a costa
baixa do Estado extrae-se sal por processos rudimentares, pela
represa das aguas do mar nas altas marés e subsequente
evaporação. No lugar Canoé proximo do Fortinho, á barra do
Jaguaribe fundou-se em 1905 uma companhia para a explorar
estas salinas, com apparelhos aperfeiçoados, linhas ferreas, etc.
Depois de haver fabricado grande quantidade de sal, da me-
lhor qualidade, foi abandonada para não concorrer com OS
productos do Rio Grande do Norte, syndicados pela compa-
nhia Sal e Navegação. No Cocó, a 5 kilom . da Fortaleza, em
Granja, no Charal perto de Camocim, no lugar Capim Grosso,
no sertão do Aracaty-assú, existem minas que produzem excel ·
lente sal.

SAL MURIATO -Encontra no Boassú ( Granja).


PEDRA-HUME ( sulfato de alumino e potassa) -Existe uma
mina abundante no termo do Inhamuns, lugar Cajueiro, oe-
eupando vasta area (3), e tambem no Araripe, segundo o ba-
rão de Capanema .

(1) Geralmente nas serras encontra-se o salitre no estado


de florescencia nas grutas, ou fissuras da rocha - Senador Th.
Pompen-ob. cit. pag. 148.

(2) No sertão encontram-se frequentemente terras salitro-


sas que deixam florescer o sal a sua superficie. Os gados cos-
tumam lamber com avidez estas terras, ordinariamente argi-
losas, de modo a fazerem escavações notaveis - Senador Pom-
peu, ibid. 148.

(3) J. da S. Feijó -Memoria sobre a capitania do Ceará, apud.


Revista do Instituto -Tomo III, pag. 16.
100

MAGNESIA encontra-se no lugar Cafundó, termo do Jar-


dim, e no Tauhá.
ALVAIADE -acha- se uma mina abundante no serrote Tres
Irmãos em S. Matheus .
CAPARROSA- Encontra-se muita na Serra Grande. em Ga-
meleira do termo do Jardim ; na serra de S. Pedro, no Boassú,
a duas leguas a oeste, na escarpa de um serrote , e num riacho
que foi descoberto por Feijó.
SODA NATIVA-no Ipú.
POTASSA--encontra- se uma camada mui abundante no Ipú
(Serra Grande) a que o povo chama vulgarmente sabão de
pedra ; outra jasida no lugar S. Gonçalo , freguesia de Arnei-
roz, e no Crato ( Araripe ) segundo o barão de Capanema.
AMIANTO - Encontra-se em varias partes do Cariry em
grandes veias, bem como no sertão e principalmente um gran-
de banco em Quixeramobim, na fazenda Junco, e perto de
Lavras,
SCHISTO BETUMINOSO— acha-se em varias partes do Cariry.
quasi a superficie da terra, visivel a grande distancia. Segun-
do o Dr. P. Theberge arde bem e dá bastante calorico.
LIGNITO -no riacho da Palha, em Quixeramobim.
CARVÃO MINERAL - hulha -Ha noticias de sua existencia
na Granja, Serra Grande ( Ipú) e no Crato, lugar Bispo e Ca-
fundó, termo do Jardim, na serra da Mãosinha, Araripe, es-
pecialmente no logar Salobro. (1)

( 1 ) O Dr. Marcos de Macedo remetteo ao Museo do Rio de


Janeiro 6 volumes de amostras de carvão (hulha) extrahido
dos seguintes logares : Fundão, no arroio Batateira a 3 kilom .
da cidade do Crato ; são as melhores ; as outras de pontos dif-
rentes.
O Dr. Tompson, na Inglaterra, vendo uma amostra desta
rocha, que eu havia mandado com outros objectos a um ami-
go, julgou-a da melhor qualidade. As do logar-Bispo entre as
serras do Mãosinha e Araripe, e as do Olho d'agua do milho são
inferiores. Entre todas é notavel uma no logar Salobra, que me
informaram conter uma camada de 15 a 20 pés de altura- Dr.
M. A. de Macedo --Descripção dos terrenos carboniferos da comarca
do Crato.
101

OURO- Vestigios de ouro apparecem em muitos lugares


do Cearà, em grãos e palhetas, particularmente nos seguintes
pontos :
Municipio de Granja - no termo da cidade acham -se pa-
lhetas de ouro, não tendo, comtudo, havido exploração.
Baturité no lugar Marés encontram-se pedras em cu-
jos veios ha ouro em grãos . Alguns curiosos conseguiram ex-
trair oitavas delle.
Crato-no logar Cachorro, extrema do Jardim com Per-
nambuco, tiram os habitantes por meio de lavagem palhetas
de ouro fino.
Milagres no districto Cuncas, do termo de Milagres,
extraem por este mesmo processo, de ha muitos annos, porção
de ouro .
Ipú-nos riachos Curimatan, Bom Jesus e Juré, de mui-
to tempo que o tiram, bateando-lhe as palhetas . ( 1)

[ 1 ] Diz Feijó que o ouro de Curimatan é de cor amarel-


la, bem carregada, e o do Juré, de qualidade superior.
Por falta d'agua deixou o Coronel Diogo Salles de explo-
rar as minas do Juré, depois de algumas tentativas sem re-
sultado.
Sobre a mina do Bom Jesus, a 12 kilom. a leste da cidade
do Ipú, examinada em 1856 por dous engenheiros inglezes
consta o seguinte :
Abriram um poço de 6m , 6 de profundidade e 8.8 de
circumferen ia, e ficaram satisfeitos com o resultado da expe-
riencia . - Dr. José Pompeu, Corographia do Ceará, pag. 72.
Ein 1868 o lavrador Teixeira, do Ipú, contractou um pro-
fissional inglez para estudar a mina por elle descoberta. De-
pois de demorado exame, este profissional concluio pela bôa
qualidade do ouro e as vantagens de sua exploração.
A difficuldade de haver agua para esta mineração impe-
diram os seus progressos .
Em fins do seculo passado, um engenheiro operoso, Dr.
Heraclito de Carvalho, associado a Teixeira, organisou uma
companhia com pequenos capitaes, entregou-se ardorosamente
ao trabalho, mas ao cabo de poucos mezes, arruinada a saúde
teve de abandonal- o.
O governo imperial concedeo privilegio por 30 annos a
Teixeira para a exploração de minas de ouro, chumbo , soda e
outros mineraes por Dec. nº 3779 de 12 de Janeiro de 1867,
rivalidado pelo de nº 4876 de 24 de Janeiro de 1872.
102

"Nestas mesmas montanhas, diz Feijó [ 1 ] não são pouco


communs os vestigios de ouro, pois que se encontram al-
gumas nas betas de tauás e viveiros de cristal, assim como solto
em particulas mais ou menos subtis pelos riachos, misturado
com o esmeril, e entre cascalho e algumas vezes em folhetas
de mais de 12 oitava de pezo, sendo o mais superior em qua-
lidade o do lugar Juré, perto da vila de Sobral (Ipú] e das
antigas lavras da Mangabeira [ Lavras], e o mais ordinario
pela cor desmaiada o que se encontra no sitio Curimatan.
A falta, porém , de aguas correntes é o maior obstaculo ao seu
aproveitamento, quando este fosse permittido .”
Assegura ainda o mesmo naturalista em uma das suas
Memorias que "de ouro encontram-se mais ou meuos vestigios
por todos os riachos, corregos e vertentes de montanhas, que
formam as costaneiras da Serra- Grande, desde o Timonha até
Cariris, com particularidade nas vertentes do Salgado, Aca-
rahú e Jaguaribe, no Inhamuns, Banabuiú, Quixeramobim e
cabeceiras do Juré. Em todas essas vertentes e terrenos visi-
nhos basta lavar a terra que se acha debaixo de cascalho para
pintar o ouro."
Nas margens do Salgado , desde Missão Velha até Lavras ,
abundam os terrenos auriferos . Encontra -se o ouro em pó
subtil, em grãositos ou em folhetos , misturado com esmeril
negro mui brilhante e attractivel ao iman , e tambem engas-
tado em veios de quartz. [2]

[ 1 ] J. S. Feijó - Memoria sobre a capitania do Ceará, apud.


Revista do Instituto do Ceará, vol . III, pag. 14.
[2 ] Fez ahi antigamente importante mineração uma com-
panhia de mineiros de Jacobina e de outras partes, sob as
vistas de uma guarnição militar vinda de Pernambuco, cujo
commandante era o fiscal recebedor do quinto . Parece, diz o
Senador Pompeu, que deram pouco lucro esses trabalhos, se-
gundo a ordem regia que as mandou prohibir em 12 de Se-
tembro de 1758 como desvantajosa ao erario publico e por
outra carta regia do mesmo mez e anno se mandou prohibir
qualquer exploração na capitania.
Segundo o estado e sitio em que se encontram esses ves-
tigios de ouro, parece que todo elle é accidental. e condusido
pelas torrentes e alluviões antiguissimas, o que faz presumir,
diz Feijó , a possibilidade de encontrarem-se as matrizes na ca-
103

O Barão de Eschwege, na obra -Pluto Brasiliensis, publica-


da em Berlim, em 1833, refere - se as noticias dadas por Feijó so-
bre as jazidas auriferas no Ceará. ( 1 )
"Na provincia do Ceará, por exemplo, encontra -se, não
raro, ouro em veios de quartz e tambem nas regiões alagadas
e no leito dos rios e riachos e, frequentemente, em fragmen-
tos de peso de 1/2 oitava, o que indica grande riqueza dos de-
positos originarios.
O ouro mais fixo é encontrado nas visinhanças de um lu-
garejo chamado Juré, perto de Sobral, etc.
"Igualmente encontra-se ouro em certo lugar da ribeira
do Acarahú, chamado Turri, na freguezia de S. Gonçalo da
Serra dos Cocos."
O Dr. José Pompeu (2), apreciando as razões de Feijó so-
bre a hypothese de poder-se achar na Serra Grande as ma-
trizes do ouro encontrado em alluviões de differentes ribeiros,
pondera que :
"O ouro não se acha na natureza senão em estado na-
tivo, ora sob a forma de cristaes, de laminas mais ou menos
extensas ou de filamentos : ora em palhetas, em grãos e em
fragmentos, as vezes bastante volumosos. Encontra-se muitas

dea da serra- Grande, donde foi destacado e transportado pelas


aguas e levado as margens dos rios e ribeiros. - Senador Pom-
peu- Ensaio Estat., vol. I, pag. 153.
Meu velho amigo -Barão de Studart, em longo e minu-
cioso trabalho sobre “ A exploração das Minas de S. José dos Ca-
riris durante o governo de Luiz Joseph Corrêa de Sá, inserto no
Vol. 6, pag. 5, da Revista do Instituto do Ceará, discute com do-
cumentos interessantes esta questão, restabelecendo a verdade
historica sobre o papel representado pelo explorador Jeronymo
Mendes Paz.

[ 1 ] E ' claro que o sabio allemão houve estas informações,


como acima fica dito , de Feijó . Seu testemunho não traz, por-
tanto, maior esclarecimento sobre o assumpto.
A traducção deste trecho foi communicada pelo Sr. Alfre-
do de Carvalho ao Instituto do Ceará, que o publicou na sua
Revista, tomo XIX , pag. 123.

(2) Dr. José Pompeu - Corographia, pag. 73.


104

vezes em veios, nas rochas quartzosas do terreno primitivo ;


algumas vezes se apresenta em diversas jazidas dezentiferas.
Mas a matriz mais geral do ouro, no Brasil, a substancia em
que este metal se acha mais abundantemente espalhado é uma
rocha quartzosa, avermelhada e ferruginosa, chamada Jacotinga.
PRATA-AS noticias relativas a existencia e exploração
deste metal, no Ceará, carecem de melhores testemunhos com-
prabatorios. O que se sabe de positivo não autorisa conclu-
sões affirmativas e seguras. O Senador Th. Pompeo recolheo
as seguintes informações :
Dizem que na serra de Maranguape, lugar Taquára, ain-
da se veem escavações. fornos e mais signaes de uma anti-
guissima exploração, tentada pelos hollandezes, de 1637 a 1640,
tempo em que aqui estiveram.
Por uma provisão regia de 14 de Dezembro de 1754 foi
concedido por el- rei D. José ao Capitão -mór Luiz Quaresma
Dourado privilegio para explorar as minas de prata de Uru-
buretama e Maranguape, que o impetrarte dizia haver des-
coberto. Não se sabe hoje onde ficam, e não consta que se
fizesse exploração a não ser a da Taquara, de Maranguape.
O regimento dado ao governador do Maranhão em 1654
recommenda especialmente a exploração das minas de prata
do Ceará descobertas pelos hollandezes. Ha a tradição da Ta-
quára, em Maranguape, mas o Dr. Capanema, que examinou
este sitio nada encontrou que justificasse trabalho de minera…
ção antiga. [ 1 ]

[ 1 ] No Diario da Expedição de Mathias Beck, ao Ceará em


1649, encontrado pelo Dr. José Hygino, no Archivo da Compa-
nhia das Indias Occidentaes, traduzido pelo Sr. Alfredo de Car-
valho e inserto na Revista do Instituto do Ceará, de 1903, ha
muitas referencias a esta exploração. A 10 de Abril escreveu
que o velho indio F. Caraya lhe dissera [ a Beck] que o monte
onde existe a verdadeira mina é chamado Itarema, junto ao
n.onte Maraguaba, sendo esta a mina da qual o velho Gaspar
Paraupaba , den noticia aos Nobres e Poderosos Senhores, e
affirmou que não havia memoria de outra, senão desta donde
dizem que os portuguezes, e especialmente Martins Soares Mo-
reno, retiraram mineral que era rico em prata : quanto a mina
que João d'Albuquerque declarou chamar - se Ussuapaba, sou de
opinião que deve ser muito productiva , disse que era um mon-
105

No serrote Ubajarra na ponta oriental da Serra Grande,


foi explorada por concessão regia, uma mina, no meiado do se-
culo XVIII , por uma companhia de mineiros e fundidores, que
em 1750 vieram de Lisboa, cujo trabalho foi abandonado por-
que o resultado não correspondeu a despeza . [ 1 ]

te situado ha bôas 80 leguas d'aqui [ Fortaleza] para o lado de


Camossy.
As primeiras amostras, remettidas pelo commissario Hans,
que se installara no lugar e déra começo a exploração, foram
analysadas pelo ourives Jonas, a 29 de Abril, que não achou
prata.
No dia 30 recebeo Beck um saquinho com mineral, remet-
tido pelo Hans, extrahido do monte Itarema. A 1 de Maio de-
clarou o ourives que das 7 libras do mineral apenas podera ex-
trahir meia libra de prata.
Neste mesmo dia pelas 4 horas da tarde chegou o commis-
sario Hans, com os mineiros, trazendo algum mineral para
mostrar-me que o mesmo, indicava a existencia, nas proximi-
dades, de ricos veios de prata, cuja descoberta dependià apenas
de aprofundarem -se as escavações.
Até 9 de Setembro continuavam as informações, com mais
ou menos exito.
Na memoria : Minas de Ouro e prata no Brasil Oriental—ex-
[ 1 ] Diz Feijó que ainda em 1805 vivia em Villa Viçosa um
francez -Mr. Fontenelle, bastante velho, que veio nessa expe-
dição mineralogica. Conversando com elle a este respeito soube
que de facto da mina de Ubajarra tirou-se um metal que cha-
mavam prata, mas em muito pequena quantidade, de modo que
apenas chegou para com ella se pagar o ordenado do Intendente.
[Senador Pompeu- Ensaio est. V. I pag. 154.
O negociante Teixeira, do Ipú, que obteve no anno de 1857
um privilegio para explorar as minas da provincia, entre outras
amostras, que me apresentou, havia uma de um metal branco
que parecia prata, tirada da Serra Grande ; mas não sei se esse
metal será o mesmo da mina de Ubajarra, a qual diz Feijó , que
a examinou não apresenta outros vestigios de prata, e sim del-
gados veios de sulphato de cobre em bancos de pedra rija, vi-
drenta e côr de cinza. Estes bancos se estendem pela serra da
Ibiapaba, apparecendo aqui e alli pelas fronteiras da montanha
até a parte oeste, já na provincia do Piauhy, estrada do Cam-
po-maior, lugar -Porteiras.—-onde os moradores visinhos tiram
pela simples fusão um metal branco e rijo, a que chamam prata,
e de que fazem arreios para animaes, esporas, etc. Segundo o
mesmo naturalista parece cobre com mistura de outro metal.
talvez nikel-Ibid. - pag. 154.
106

COBRE- Na Serra Grande, termo de Ipú ha uma mina, cuja


amostra apresentada pelo negociante Teixeira, revela riqueza
do minerio.
Em Viçosa, Serra Grande encontra -se a mina, cuja propri-
edade é disputada ha uns 25 annos pelos Snrs. Boris frères e
Barão de Ibiapaba.
O cobre extrahido della e analysado em Paris é abundante
e de boa qualidade. Infelizmente este pleito tem retardado a
exploração definitiva da mina.
Na serra de Cantagallo, cabeceiras do riacho deste nome,
acha- se uma mina, e no lugar-Cachorro, termo de Jardim,
outra. [1]

plorações hollandezas do seculo XVII, do Snr. Alfredo de Car-


valho, publicada na Revista do Instituto do Ceará, tomo XIX
pag. 110 - lê- se acerca desta mina :
" Iniciados os trahalhos de mineração por dous profissi-
onaes allemães -Hans Simplisel de Cassel, e Carel Helbach de
Christuach, auxiliados por alguns escravos negros e muitos in-
digenas, foram as primeiras amostras da rocha extrahidas sub-
mettidas ao exame do ourives mestre Jonas, que repetidas ve-
zes apresentou pequenos fragmentos de prata de lei aparados
da mesma.
" Por varias vezes tambem foram porções do minerio ana-
lysados no Recife. chegando-se a retirar de tres libras delle
cerca de quatro soldos de prata e igualmente foram examina-
das, com resultado promettido, amostras provenientes do Ca-
mossy.
· Mas a exploração systematica limitou-se ao monte Itare-
ma, onde se realisaram profundas e extensas escavações, e don-
de foram remettidas para Hollanda barricas e mais barricas de
minerio, que apezar de não apresentar a riqueza esperada, pa-
ricia indicar a proximidade de veios preciosos.
.. E a procura destes continuou
perseverantemente Mathias
Beck até que chegando ao Ceará a noticia da capitulação de 27
de Janeiro de 1654, abandonou a empreza e refugiou-se com a
sua gente na ilha de Barbados. "

[1 ] Na Serra Grande, na ladeira que se diz Acarape, ha


umas antigas escavações, donde se extrahia uma mina, que alli
ha de cobre, na persuação de ser prata, cujo trabalho decahio
depois de conhecido o engano, e talvez por se haverem consu-
107

ZINCO -- No lugar- Catinga Grande, nas visinhanças de S.


Pedro, entre a serra de Mãosinha e Milagres, ha uma mina de
zinco, que parece abundante, no dizer do Dr. Marcos de Mace-
do. Consta a existencia de outras em S. Felippe e Santa Rosa
no Jardim. 1)
CHUMBO -Ha noticias de uma mina rica . perto do Ipú (Ser-
ra Grande). mas que alguns dizem ser de plombagina e outros de
chumbo ou galena argentifera. Os habitantes extraem-no por
meio de simples fusão.
Em Quixeramobim, na fazenda -Olho d'Agua, ha outra
mina de chumbo.
Não longe de Villa Nova tirou-se sulphureto de antimonio,
e amostras de molybdoto de chumbo , que estão no museo do
Rio de Janeiro, segundo o testemunho de barão de Capanema.
Existe tambem uma combinação de chumbo, o alvaiade
(carbonato de chumbo) numa mina abundante no serrote Tres Ir-
mãos, no municipio de S. Matheus.
PLOMBAGINA--(graphito ). E ' encontrada em alguns riachos
que desaguam no Curú e Acarahú, segundo Feijó. (2)
Consta haver uma em Baturité, outra em Quixeramobim,
no riacho Jaburú, na serra de Baturité, e o mais importante na
Serra Barbados, proximo ao riacho Cangaty, do municipio de

mido dinheiros sem preveito. Esta mina de cobre se encontra


em estado de sulfato. em veieiros, em uma pedra cinzenta, vi-
trescivel e rija, cujo banco decorre para sueste até onde se cha-
ma Ubajarra ; e ali entranhando- se pela Serra, vai apparecer 6
leguas a oeste da Villa Nova de El-rei [ Ipú] no lugar que se
chama- Carcondos - já pertencente ao Piauhy.
[J. da Silva Feijó -Memoria ete. § 30.

( 1 ) Diz o Dr. Theberge que encontrou perto de Milagres


grande quantidade de blende (sulphato de zineo ), tão abundante
em certos sitios que foi bastante a queima de um roçado para
fundir este metal, que correu para lugares baixos, donde se apa-
uharam libras.

(2) Da mesma sorte parece digna de se aproveitar outra


mina de plombagina que, alem de outras deste semi-metal, se en-
contra nas abas da serra dos Côcos, onde se diz -Descida da mi-
na, a qual é havida ali por mina de chumbo Feijó-
ob. cit. § 31.
108

Baturité . Forma nidulações no gneiss ou em diminutas palhetas


nos calcarios sacharoides ( eruptivos).
ARSENICO - Ha no Inhamuns.
VERMELHÃO- (sulphato de mercurio ) Diz o Dr. P. Theber-
ge que lhe apresentaram, extrahido da serra do Araripe, um pe-
daço deste metal pesando mais de meia libra.
FERRO - E ' abundanto no Ceará encontra - se em muitos
lugares e sob diversas formas, ora oxydado em forma oligistica,
umas vezes em grandes massas, outras misturado com terras
aluminosas, formando ocres mui variados de cor, e aproveita-
veis para pintura, ora combinado com enxofre ou com acido sul-
phurico a ponto de tornar a agua de certas ribeiras impotavel. ( 1 )
Ha minas no lugar Jaburú, termo de Quixeramobim ; Ar-
neiroz, na freguezia do mesmo nome ; Santa Quiteria, no termo
de S. Quiteria , no lugar- Lagoa, ás fraldas da Serra do Jardim
(Araripe ) cuja qualidade dá 80 por cento de ferro puro ; Ipú.
proxima a cidade de seu nome, cujo teor metalico é de 80 a 90 %
de ferro puro e de grão fino.
No Choró existem massas de forma quais espherica , seme-
lhantes a balos de artilheria. [2]

(1 ) Nestas, como nas demais informações sobre a physica


do Ceará. sigo o que escreveu meu pai no seu Ensaio Esta-
tistico do Ceará.

[ 2] Aconselha o naturalista Feijó, como de grande provei-


to, a exploração deste metal no Ceará, attenta a riqueza de suas
minas e sua qualidade superior. Recommenda particularmen-
te as minas do Cangaty e a do boqueirão do rio Salgado ( La-
vras), encontrando- se neste lugar o ferro em fragmentos es-
parsos . Ha abundancia delle a superficie da terra. Encontra-se
tambem em veios mais ou menos grossos por entre bancos da
pedra, que formam a serra de Baturité e Uruburetama.
Sob a mina do Cariry escreveu Feijó :
FERRO ESPECULAR ― mineralisado, cristalino, em laminas
especulares que pelo golpe do martello se quebram em cristaes
ou palhetas mais ou menos delgadas tirando a rhomboidaes.
lusentes e côr de aço na fractura .
"A superficie externa é desigual preta e ferruginosa ,
como que soffreo acção do fogo e em partes suja de oxido
roxo.
"Seu pó é denegrido, tirando a roxo escuro.
"A sua massa é dura de maneira que fére fogo com o fu-
109

CRISTAL DE ROCHA- encontra se no Crato.


TURMALINA- no leito do rio Gurayras, entre Quixeramo-
bin e Santa Quiteria.
FOSSEIS

No valle do Jardim, serra do Araripe, e em varios pontos


da Serra Grande encontram -se em abundancia as mais raras
petrificações de peixes e de amphibios. Em muitas a petrifi-
cação forma uma especie de estojo ou caixa, externamente lisa
ou ligeiramente rugosa, bipartida, em laminas, dentro das
quaes se acha incrustado o animal com toda a sua carcassa.
O revestimento ou crosta rochea parece calcarea. ( 1)

sil, e risca o vidro. E' emfi refractario ao magnete e fusi-


vel ao fogo do maçarico com o soccorro do carvão, dando um
vidro escuro .
LOCAL-Acha- se esta mina distante da Fortaleza 35 le-
guas, mais ou menos, a sudoeste, na margem oriental do ria-
cho denominado Cangaty, onde se chama Barbadas, sertão
junto as cabeceiras do rio Choró.
Entre o Choró e o riacho Cangaty corre na direcção de
noroeste a sudeste uma cadeia de montanhas, cuja ossada é de
granito, denomina - se ao Norte - Serra da Guariba, e ao Sul--
das Barbadas, cujas aguas, correndo ao nascente, vão entrar no
rio Choró. e para o poente formam o riacho Barbadas, que
vae entrar no Cangaty, na fazenda Bom Jesus, onde correm
juntos por espaço de 4 leguas até despejar no Choró, junto a
povoação de Itans. E' neste riacho, Barbabas, duas leguas aci-
ma de Bom Jesus, que principia a apparecer esta mina de
ferro, na fazenda Contendas, occupando o espaço de 2 leguas
para mais quadrados do terreno até a serra .
JASIMENTO - Acha-se o ferro nesta mina , ora avulso e es-
palhado, ora amontoado aqui, ali, já pela superficie do terre-
no, já mais ou menos enterrado, parte inglu inado, e como
engastado uma codêa de granito susceptivel de separar-se, que
na grossura de pollegada e meia cobre a rocha gneiss, a qual
escalvada, se deixa ver sobrepujando em lombadas a superficie
do terreno e muito mais visivelmente no alveo do riacho e
quebradas.
ORIGEM - Estes pedaços de mina de ferro parecem lança-

[ 1 ] O Dr. P. Theberge diz que esses fosseis se acham um


pouco abaixo dos talhados do Araripe, em valles e corregos
fundos, cujo alveo é calcareo, schistoso, ou enterrados num
barro misturado com muita cal, extraordinariamente viscosa.
110

Tem se encontrado em varias escavações grandes ossadas


de animaes antedi'uvianos-mammuth, mastodonte, megathe-
rios, etc.
No Cariry, segundo o testemunho do Dr. P. Theberge, en-
controu-se numa escavação uma ossada de proporções prodi-
giosas cada omoplata tinha oito palmos de comprimento.
O Dr. Marcos de Macedo remetteo para o museu nacional
[do Rio] varios caixões de ossos.
O Sr, J. J. Revy, quando director do serviço de construcção
do açude de Quixadá, enviou tambem alguns caixões com os-
sadas gigantescas para dito museu de uma escavação proxima
a Quixada.

dos e arrojados em alluvião por effeito de alguma força acti-


va, occasionada talvez por alguma irrupção vulcanica antiga.
em que aquella codêa de granito se achava em estado liquido,
ficando por isso partes desses pedaços nelle embutidos, ser-
vindo-lhes de nova ganga, quando outra porção arrojada se
espalhou desigualmente pela mais superficie do terreno ; o que
parece verificar- se pela semelhança e identidade de uns e
outros pedaços e pela fraca firmeza ou liga da codêa de granito
com rocha.
NATUREZA DO SOLO - O solo de todo aquelle lugar e circum-
visinhança, e até das serras, é argiloso, vermelho, arido e co-
berto ou semeado de pedregulhos quartzosos, de granitos e
ordinariamente em fragmentos conglutinados e mais ou me-
nos consolidados com os de outros, de ferro de basaltos pretes,
mica, etc., formando pedaços de uma rocha, semelhante a que
os mineralogistas denominam brecha, ou poudings, mais ain-
da pelo estado actual e desordenado de composição exterior
das mesmas montanhas ou serras visinhas as quaes se notam
confusamente retalhadas com profundos vallos, cavernas, pre-
cipicios, o que indica antigas crateras vulcanicas, vendo - se
ainda longe, de tempo em tempo, particularmente depois das
primeiras chuvas, do seu interior estrondosos estampidos,
pasmosos rugidos, o que os moradores attribuem a existencia de
minereos auriferos.
E', pois, abundantissima a mina de Barbadas e com pouco
trabalho se pode colher diariamente avultada porção de ferro,
principalmente do que está espalhado pelo terreno. E na vi-
sinhança de 3 a 4 leguas e mais acham -se outros logares mais
on menos abundantes de ferro, especialmente nas serrotas
do Pinda, Piraçunga que ficam a oeste, onde na encosta que
ollia para ENE ha outra riquissima mina magnetica. ”
111

No lugar Santa Catharina [lagôa ]. sitio Cronzó, ao pé da


serra da Ibiapaba, no Inhamuns, encontrou- se grande ossada.
Entre Cratheùs e Quixeramobim descobrio-se outra num
Doço.
Na freguesia de Arneiróz, ao pé da serra da Ibiapaba, no
logar Timbaúba, descobrio -se ha tempos uma cujas juntas
vertebras podiam servir de assento a uma pessoa. Em Su-
catinga, proximo a Cascavel, escavando -se uma grande bacia,
formada por lagedos de pedra , depois de poucos palmos de
profundidade, foi encontrada uma ossada, da qual parte re-
mettera para o museo nacional.
Em 1854, no lugar Rapina, termo de S. Cruz, numa pe-
quena lagoa formada por dous serrotes, que a cercam em po-
sição tão elevada, onde só pode receber agua das encostas
dos serrotes, pelo inverno, inacessivel ao gado, achou-se uma
grande ossada, cujos restos foram distrahidos por algumas
pessoas, e parte remettida ao museo nacional. Um pedaço da
canella tinha quatro palmos e meio de comprido e duas de lar-
gura.
No municipio de Massapê foi encontrado uma legua da
villa deste nome, no lugar Canafistula, do Snr. Coronel Fran-
cisco Olegario Carneiro, em fins de 1903 um osso, que o Major
Francisco d'Artagnan Carneiro suppõe ser uma omoplata hu-
mana, mas que antes parece a apophyse lombar de outro ani-
mal. (1)
CONCREÇÕES —Na Serra Grande, termo do Ipú, encontram-
se conereções espherieos (clites), cujo nucleo está cheio de
oxydos metalicos de differentes côres.
No museo nacional existe uma bella collecção destas con-
ereções .

FONTES MINERAES E THERMAES

São raras no Ceará- Na Fortaleza ha uma com duas veias


approximadas, das quaes uma deita agua ligeiramente tepida e
a outra fria- no quintal da casa do lado direito da Sé.

[1 ] O Snr. Major d'Artagnan ao remettel- o para figurar na


Exposição nacional (de 1908 ) escreveu : " Segundo me parece
tem este osso, grande valor anthropologico, pois para chegar ao
estado actual devem ter decorrido muitas centenas de annos" .
112

No Pagé, a uns 25 kilom. de S. Quiteria, no meio de uma


varzea secca, ao pé de um pequeno serrote escalvado, rebenta um
olho d'agua abundante, bastante quente, 35 gráos centigr. , e
visinho outro com 28° . E' o mais importante do Ceará.
No Crato encontram-se algumas fontes thermaes e até ga-
zogas, carregadas de substancias mineraes, segundo o testemu-
nho do Dr. P. Theberge.
No Aracaty existe uma, no sitio Beirada, tepida, de cheiro
sulphuroso, abundante, muito frequentada por pessoas da ci-
dade (Aracaty) que lá vão tomar banho.
No Tamboril, cabeceiras do rio Acarahú, ha uma fonte sul-
phurosa, pouco conhecida.
Na freguezia de S. Quiteria ha um afamado olho d'agua,
chamado Salitre, que fica por baixo de uma extensa lage, for-
mada por incrustações da mesma fonte. Esta agua é salgada e
corre abundartemente. ( 1 )

FLORA [ 2]

Póde-se considerar na superficie do Ceará tres regiões


botanicas bem caracterisadas, a do littoral, a das serras, e a do
sertão, (3) as quaes comprehendem sub- regiões, etc.

[ 1 ] Não consta que se tenha examinado chimicamente a


agua dessa fonte : mas asseguram que é ligeiramente ferrea e
muito medicinal ; muita gente a procura . Os donos de sitio
fizeram dous grandes tanques, que recebem as aguas, um da
fonte quente, e outro da fonte fria para uso dos banhos e agu-
ada dos gados : ha mais uns doze minadores d'agua na mesma
linha da fonte principal.
No Satiá , em 1855, abrio -se uma cacimba no riacho Cai-
cara, dentro de um roçado de José Bartholomeu de Queiroz ,
cuja agua é limpida e sem gosto notavel : todas as pessoas que
della beberam sentiram incommodo no ventre, seguidos de de-
jecções sanguinolentas.
(2) Este capitulo é da lavra do Conselheiro Francisco Freire
Allemão ; extrahido do seu Relatorio ao Instituto historico, geo-
graphico e ethnographico do Rio de Janeiro, em 4 de Dezembro
de 1861.
(3) A palavra sertão refere- se, em geral, a todo o terreno
que não se acha comprehendido nem na zona do littoral, nem
na região das serras, e que se presta perfeitamente á criação
dos gados.
113

As condições que assim limitão e modificão a vegetação,


aqui como em qualquer parte, são : a composição mineralogica
do solo, sua configuração e relevo, a latitude do lugar, e altura
do sitio sobre o nivel do mar, a abundancia ou escassez das chu-
vas, etc.
O Ceará, olhado por alto, offerece uma superficie rasa, lar-
gamente ondeada, semeada de montes e serrotes. Fecha- o no
fundo a vasta mole da Serra- Grande, que como um maro o se-
para do Piauhy e de Pernambuco ; e pelos lados da Parahyba
e Rio Grande do Norte limitão - no as serras do Camará e Apodi.
Estas serras repartem entre as provincias confinantes as suas
aguas, que, engrossadas na proporção das chuvas, escasseão e
desapparecem quando aquellas faltão.
Destituido de grandes serranias, que em seu ventre accu-
mulem largo deposito d'agua, o Ceará não tem um só rio que
valha esse nome. Durante a estação das chuvas, copiosas e
diarias, borbulhão por toda a parte innumeras ribeiras, que
juntando - se dão lugar a caudalosas e medonhas torrentes ; mas
estas ao aceno do estio somem-se. Só pelas serras permanecem
pequenos arroios, que apenas descem ás vargens são absorvi-
dos.
Referirei aqui um phenomeno providencial , que se passa
nos grandes rios do Ceará . Quando elles seccão , deixão como
se prevê, de espaço a espaço poços de tamanhos variaveis, cujas
aguas são um grande recurso para o povo. Darão por muito
tempo, e mesmo por toda a sêcca, se esta não excede os limites
ordinarios ; e não se corrompem por isso que de uns pocos para
outros inferiores se estabelece uma corrente occulta, e sub- are-
nosa, como já o havia notado o Dr. Pedro Theberge, distincto
medico francez, que reside actualmente no Icó, e a quem eu
communiquei esta minha observação. E' esta corrente occulta
que dá agua por quasi todo o leito do rio, quando sêcco, fazen-
do- se- lhe pequenas excavações, que se chamão cacimbas. A agua
d'estas cacimbas é má logo que se tira ; mas guardada em vaso
de barro um ou dous dias, torna - se pura, fresca e excellente .
Nos annos regulares as chuvas deixão as terras bastantemente
embebidas, para nos seis ou sete mezes de sêcca alimentarem
d'agua a todos os viventes animaes e vegetaes.
Farei ainda aqui uma observação.- No sertão as arvores
largão as folhas, seccão ; mas não morrem. - E' que n'esse solo
114

arido e pedregoso não vivem senão as plantas, que por sua na-
tureza podem passar parte do anno sem folhas. A larangeira, o
mesmo cafézeiro não vivem alli . Sem duvida que a nimia sec-
cura do ar do sertão accelera a queda das folhas, e retarda o
apparecimento de novas ; mas quando isso não fosse, as arvo-
res que alli vivem não deixarião de despir- se . O phenomeno é
o mesmo que se passa nos paizes frios, e o mesmo que aqui tem
lugar no nosso inverno legitimo ou astronomico.
Nos bons annos apparecem algumas chuvas vagas, incertas
nos mezes de Outubro e Novembro, a que chamão churas de cajú.
Mas o verdadeiro inverno, ou mais propriamente a estação das
chuvas, começa em fins de Janeiro ou principios de Fevereiro ;
sua força é de Março a Abril, e acaba em Junho. Elle consis-
te em grossos chuveiros, quasi diarios, ás vezes repetidos, mas
deixando sempre parte do dia livre para o trabalho : raro é o
dia ou noite de chuva constante no Ceará. O céo , de admiravel
pureza e lucidez no tempo sêcco, vê - se durante o das chuvas
quasi sempre carregado de grupos de densas nuvens dispersos
ou condensados, e pejados de electricidade ; e as chuvas são de
ordinario precedidas de commoções electricas.
Ao concurso d'estas circumstancias, e á composição e con-
figuração de seu solo deve a provincia a sua fertilidade, e a bel-
la vegetação que a cobre, ainda que não com igualdade por toda
ella, o que depende das condições atraz referidas.
Assim as montanhas granitico-argilosas, humedecidas por
fontes perennes, como as de Baturité, Maranguape , Aratanha,
etc. , estão cobertas de uma vegetação pomposa, sempre verde .
Suas corpulentas arvores são em grande parte as mesmas das
florestas fluminenses, pricipalmente nas alturas excedentes
de 800 pés [ 264.m ] sobre a face do mar. Suas principaes arvo-
res são : massarandubas, páos d'arco amarellos, pirauás, ange-
lins, mamalucos, louros, jatobás, páos d'oleo, balsamos, jitós,
canafistulas, coração negro, jacarandás, palmeiras, etc.
Pelas faldas das serras e lugares circumjacentes, cujo solo
formado pelos detritos e alluviões, que vem de cima, nutre
uma vegetação vigorosa e sempre verde, a que se dá o nome de
matas de pé de serra ; suas especies principaes são : cedros, páos
d'arco rôxos . juremas brancas, angicos, camusés, piqueás, ma-
niçobas, tatajubas, pajaús, pacotés, páos d'oleo, almecegas, tim-
115

baúbas, mutambas, condurús. inharés, mororós, catandubas,


genipapos , pequis, faveiras, visgueiros, catolés, etc.
São estes bosques das serras, e de seus contornos, cheios
de excellentes madeiras de construcção, os que constituem o que
chamo região das serras.
A região do sertão abrange quasi toda a provincia : seu ter-
reno montuoso, pedregoso, arido, é revestido de mattas denomi-
nadas catingas . As arvores de catingas [ 1 ] são realmente de
pequenas dimensões, e largão as folhas no tempo secco. Suas
especies caracteristicas são : sabiás , juremas, pereiros, imbura-
nas, mufumbos, catingueiras, etc. Estas formão massiços do
meio dos quaes se levantão sobranceiras e dispersas muitas ar-
vores de bôa estatura, e de optimas madeiras, como são as se-
guintes : aroeira, páo d'arco rôxo, angico, gonçalo-alves, mar-
fim, cumarú, violete, coração negro, braúna, páo branco, etc., etc.
Se em certos lugares as condições do terreno empeiorão
tornando -se elle mais pedregoso, mais arido, e mais sário que o
das catingas, os vegetaes empobrecidos, colhidos em seu desen-
volvimento fazem- se anões, emperrados, garranchosos, e se des-
folhão na estação sêcca, sendo os mais communs os seguintes :
umari-bravo, mufumo de carrasco, marmeleiros. ameixeiras,
canuelas de veado. etc. , etc ..
Esta é a vegetação chamada de carrasco, que com a de
catingas constituem a região do sertão , na qual se deve tambem
contemplar a vegetação dos cobertos e das beiras, onde, como
já vimos, ha varias arvores, que conservão sempre suas folhas .
Toda a beira mar da provincia (ao menos aquella que vi
é rasa, e na arrebentação do mar bordada de dunas move-
diças, para dentro das quaes se alargão mais ou menos tabolei-
ros arenosos, e cobertos d'uma vegetação baixa, rala, e sempre
frondosa, e constando principalmente de : cajueiros, cajazeiras,
mangabeiras, manapuçás, ubaias, muricís, guajerús, cauassús,
janagubas, barbatimão, lacre, embiriba, batiputá, candêa,
jetahi, peroba, páo-ferro, paraiba, sambaiba, etc. Sobre ellas
se revolve um grande numero de enrediças pertencentes ás fa-

[1 ] Palavra da lingua guarani, e quanto a mim não é com-


posta de caa e tinga matta branca, como se diz, mas de caŭ e ti-
ning matta sêcca.
116
milias seguintes : Leguminosas , Convolvulaceas , Dilleniaceas ,
Apocyneas , Passifloreas , Bignoniaceas. Trigoneaceas , etc.
E' esta a cinta de terra que constitue a região do littoral .”

O Dr. Freire Allemão Sobrinho espraiou -se sobre o mes-


mo assumpto, nos capitulos que passamos a transcrever abai-
xo, de seu Relatorio apresentado tambem ao Instituto Histori-
co Geographico do Rio de Janeiro.
Elle amplia n'esse importante Documento, e completa
mesmo a rapida exposição de seu tio e mestre, Conselheiro
Francisco Freire Allemaɔ.

São de diversa natureza os sitios botanicos que se encon-
trão no Ceará ; e differentes pois as fórmas de vegetação que
n'elles se podem estudar. A cada genero de estação correspon-
dem plantas medicinaes que lhe são peculiares : indica- la-
hemos fazendo um rapido exame de todas ellas.
Apresentão -se n'essa provincia as fórmas de vegetação ,
que o Dr. Martius descreveu como caracteristica das regiões de
dryades e de hamadryades e a ellas se deve accrescentar a que
no relatorio do chefe da secção botanica se acha indicada
sob o nome de região littoral. Esta reapparece no interior do
Ceará com pequenas modificações constituindo -se a região das
chapadas nas serras psammiticas , que separão o Ceará de Per-

nambuco e do Piauhy .
As plantas da região littoral (o Dr. Capanema liga muita
importancia a esta observação ) pela maxima parte se acham
representadas na chaa arenosa e dilatada d'aquellas serras ; e
as fórmas de vegetação repetem -se do mesmo modo, havendo
similaridade entre os carrascos e taboleiros de uus e de outros
sitios, tão bem como entre as mattas que revestem as encostas
abrigadas dos comoros e dunas proximas ao mar, e as das de-
pressões ou tópes frescos do Araripe e da Ibiapaba . (1 )

[ 1 ] Observando o Dr. Martius que se encontrão na distri-


buição geographica das plantas do Brasil especies communs ao
littoral- as restingas -e a sitios internos do paiz, cujo chão
arenoso provém da decomposição de rocha itacolumitica ou
granitica , tendo - se assim para os mesmos vegetaes duplices es-
tações separadas pela serra do mar, por outra, ou por tractos
de sertão , faz a respeito da primitiva origem d'esses seres as se-
117

A fórma de vegetação , que caracterisa as restingas do Rio


de Janeiro, a do littoral do Ceará, e a das chapadas de suas
serras limitrophes, por um seguimento de modificações, dá -nos
passagem gradual para a que constitúe a região das oreades do
Dr. Martius, da qual são todas bem distinctas.
Na provincia do Ceará a vegetação faz pois um salto da
região littoral para a das chapadas arenosas do Araripe. Ibia-
paba, e Borborema, cujas cintas ou encostas, de onde nascem
arroios perennes, se achain revestidas de plantas florestaes da
região das dryades, as quaes se ligam ás dos sitios botanicos ele-
vados de 600 a 700 metros sobre o nivel do mar nas serras gra-
niticas de Baturité, Meruóca , Uruburetama, Azul, Mattas, Ma-
chado, etc. Todas estas partes das mesmas regiões são separa-
das pelos sertões da provincia, nos quaes predominam as ca-
tingas, proprias da região das hamadryades.
E ' pela borda do mar, na extensão de meia a uma legua
terra a dentro, que se estende a vegetação littoral, que dámos
como semelhante á das restingas do Rio de Janeiro . São ta-
boleiros, carrascos e mattas pouco vultuosas de vegetação con-
tinua ou sub- continua, que tem estreita affinidade com os tabo-
leiros, carrascos e mattas das serras psammiticas do interior . 1
N'estes sitios botanicos vivem as mouririas, os platihymenium,
stryphnodendron, chrysobalanus, hancornia, caryocar, parkia, ana-
cardium, byrsonima, etc. Tem plantas medicinaes que lhes são
peculiares, como ɔ murici rasteiro, o manapuçá, o milome ar
borescente, a sambaiba, a cajarana, etc. 1

guintes conjecturas : elles são ou vegetaes psammophilos crea-


dos nas formações sedimentarias ; ou membros d'alguma pri-
mordial região de dryades , que d'essa estação florestal transmi-
grárão para as regiões menos abrigadas ou mais descobertas
do littoral. onde tomárão novas formas e varião do typo pri-
mitivo. Parece provavel ao professor allemão, que certas espe
cies creadas em terrenos graniticos, centro primitivo e antiquis-
simo das formações vegetaes no Brasil, d'ahi passárão -se para
sitios de origem psammitica, superpostos áquelles e talvez im-
mediatos em formação geologica e então perderão na propor-
ção das partes, no porte, no tempo de vegetação, modificando-
se assim para harmonisarem-se com as novas condições physi-
cas em que vivem.
118

Dos taboleiros e carrascos do littoral a substituição por


catingas, carrascos e mattas de cobertos e baixios . todos de ve-
getação intermittente, e que pertencem ao sertão, faz-se por
uma gradação de fórmas, que chamamos mattas de transição, ca-
racterisada especialmente pelo predominio da piptadenia monili-
forme [catandubu]. Nas mattas de transição abundam as sima-
rubas, magonias, parkias, etc.; e alli as plantas de taboleiros se
vão tornando raras á proporção que augmenta- se o numero de
pés da cerneira cebiá, dos mororós, das cipaubas, e dos outros
componentes das mattas de cobertos ou do sertão .
No Ceará a região do sertão é caracterisada pela completa
intermittencia da vegetação . Existem tambem lá as fórmas de
taboleiros, carrascos, eatingas e mattas nos baixios. As plantas
que se associam para formar essa região são as hamadryades do
Dr. Martius . E' notavel que as mesmas especies possam con-
stituir uma ou outra fórma de vegetação : a mesma qualidade
de arvoreta fórma aqui taboleiros, acolá catingas mais ou me-
nos cerradas, e em outra parte póde, emfim, aparrar- se, aca-
nhar-se e reduzir-se ao porte mingoado de um frutice carras-
quenho. Apezar pois de possuir as fórmas de vegetação cita-
das, e demais a de baixios que devem ser collocados no mesmo
pé em que as mattas dos cobertos, pelo facto de serem communs
a todos estes generos de sitios botanicos differentes plantas do
sertão, deve se reconhecer que elles ponca variedade apresen-
tam . Com effeit , a flora do sertão, pouco rica em especies, tem
certa monotonia, producto da continua repetição de individuos
da mesma natureza : extensas catingas contêm quasi unicamen-
te o cebiá ; muitos taboleiros são formados apenas pela jurema.
As plantas medicinaes peculiares são o pereiro [ aspidosperma
pyrifolio. Mart.], o corongo (gomphrena leucocephala. Mart), o cipó
(bignoniacea sarmentosa, purgativa) , a jurema (especie de mimosa).
São -lhe communs com outros sitios os juazeiros, as poains, ba-
tatas de purga (ipomwa altissima. Mart. ? ), pratudo (rawolfia de
Blanchet ), a excecaria (purga de leite), etc.
Os carrascos e catingas do sertão fundem -se nas mattas
virentes das serras bem regadas pela fórma de vegetação
de cobertos, ou pelos mattos dos pés de serra, caracterisados
apenas pelo vulto dos seus componentes e pela época tardia da
desfolhada [ de Outubro]. N'esta região, rica de vegetaes preci-
osos, como a mimosa [ angico ], o cebiá [ m. cæsalpinœfolia), as cœ-
119

salpinias e cordias cerneiras, os nyracrodruon, astronium, tecoma,


platimiscium, é n'esta região, diremos, que vegeta a utilissima
jatropha de que se extrahe o cautchuc no Ceará.
As mais bellas florestas do Ceará, as que supportam per-
feita comparação com as mais ricas mattas do Brasil, acham-
se nas serras sempre verdes de Baturité, Maranguape, Ara-
tanha, Meruóca, Uruburetama, etc. , nas cintas das serras do
Araripe e Ibiapaba, e na primeira zona de vegetação da cha-
pada d'esta ultima serra, formada pelos sens cimos prolonga-
dos em estreita nesga sobre os talhados, e denominada pelos
habitautes tópes da serra. E' n'essas paragens, região das
driades de Martias, que vivem promiscuamenta laurineas,
melastomaceas, piperaceas, scitamineas, aroideas, myrtaceas,
sapotaceas, ao lado de mimoseas, cordiaceas, apocyneas, papi-
lionaceas, rhamneas, etc.; caracterisando aquellas familias a
flora das serras.
N'esses sitios se encontram as palicoureas, hamelias, pro-
caradas como muri-ou canicidas : as apimentadas renealmias ;
os jaborandis, tanto os do genero esenbekia, que são emprega-
dos na Meruóca e Serra-Grande, como a serronia ou a mon-
nieria. Sómente d'alli se podem obter no Ceará as acidas bego-
nias, os balsamiferos myrospermum, as resiniferas borrichias, os
gitós, as guararemas, o cyanifero pygeum, etc.
Ficou-nos como ultima região a considerar a dos tabo-
leiros, carrascos, e mattas das serras psammiticas das extremas
da provincia. As fórmas de vegetação e mesmo OS compo..
nentes são mais ou menos semelhantes aos da flora do littoral.
N'estes sitios tornamos a vêr os anacardium, parkias, caryocar,
stryphnodendron, piptadenia, platihymenium, hancornia, etc.
As plantas medicinaes que d'alli se podem tirar são os
cissampelos, os milomes (leptolobium), as kramerias, as boudi-
chias, citriosmas, xanthoxylum, a catuaba (erythroxylum), o aleas-
sus [periandra].
Como sitios botanicos, que sem caracterisar regiões. se
achão simplesmente dependentes das condições physicas que
Thes são elementos, temos ainda de considerar no littoral da
provincia do Ceará as camboas, com a sua vegetação quasi flo-
restal de mangues, e a cujas margens vegetão os batis, sessu-
rium, achyrantes, plantas todas crassas e saliferas ; e as capon-
120

gas, esteiras de areia humida, diuturnamente alagadas e desa-


lagadas durante o inverno. por cujo meio corre á guisa de re-
gato uma fiada d'agua, e onde vegetão as stemodias, os hedyotis,
eriocaulon, burmannias, xyris, utricularias, sauvagesias, genliseas,
hervazinhas que vição e florão quasi simultaneamente ao remata-
rem-se as chuvas do verão de Março. D'estes sitios menciona-
remos apenas as antiherpeticas xyrideas, que lhes são pecu-
liares. No sertão representão o mesmo papel que as capongas
no littoral, as créas dos rios, e as rasantes tanto dos seus leitos
como dos ypús. As bordas frescas dos rios, que seccão pelo
verão de Outubro, conservão o verdor das arvores, que as
guarnecem, e n'essas orlas, denominadas cróas, vegetão os oitis,
os odorantes mufumbos, os lycium, butinerias, que se associam
a plantas do sertão.
E' de casante vegetação estival propria dos leitos arenosos
dos rios e bordas de lagos, que desseccão- se, conservando al-
guma humidade, e constituem- na as alastradoras ipomaas, os
aphanosthephus, os riter, glinos, angelonias, euphorbias, rhabdias,
stemodias, cryptocalix, heliophytum, etc. A planta medicinal mais
commum e mais procurada n'estes sitios é a glandulifera e
melosa -macella, amargo-aromatica e muito melhor succedanea
das macellas exoticas do que a achyrocline flaccida. etc.. que
é empregada no Rio de Janeiro e nas Alagoas ; além d'esta,
da juripeba (ou jurubeba ), do fedegoso, etc., deve-se fazer
menção especial de uma planta caracteristica das vasantes,
a jaramataia, o rilex de Gardner, que ao modo da sua con-
génere -a taruman-usa-se como resolutiva.

Reparte-se o anno em duas estações nas provincias do nor-


te do Imperio : a pluviosa e a secca. Nos terrenos aridos . que
não conservam humidade, a vida vegetal passa por uma appa-
rente suspensão no tempo do verão. Pouco antes de começar a
estação pluviosa é a época de decahirem as chuvas intermitten-
tes e pouco constantes denominadas chuvas de rama. Estas fal-
lham todas as vezes que os ventos geraes continuam a soprar
com intensidade durante todo o verão. Então as nuvens nim-
bosas, alevantadas do mar, atravessam a atmosphera da provin -
cia do Ceará, e vão precipitar -se nos terrenos das provincias
121

austraes ou occidentaes. Exactamente durante os mezes da es-


tação pluviosa na do Piauhy, de Agosto a Janeiro, é a atmos-
phera do Ceará varrida por ventos impetuosos do quadrante de
L. Assim como esta intensidade das correntes atmosphericas,
que constituem os ventos proprios da quadra de calor sêcco,
póde impedir a quéda das chuvas de rama, do mesmo póde
retardar o apparecimento das chuvas denominadas de inverno
n'essa provincia. Tem lugar o começo da estação pluviosa desde
que os ventos do mar hão perdido muito da intensidade com
que sopram no verão. Durante toda quadra de calor humido ou
inverno, as correntes atmosphericas são de ordinario pouco
violentas. Emfim as ultimas chuvas são logo seguidas do appa-
recimento de ventos impetuosos do quadrante de L., que des-
seccando o terreno e sovando a rama das arvores vem podero-
samente contribuir para a producção dos phenomenos da desfo-
lhada. São pois ordinariamente dous os tempos pluviosos no
Ceará. O primeiro periodo é de cerca de 6 mezes, e denomina -
se lá inverno apezar de ser um verão excessivamente quente e
humido . O segundo consiste apenas na quéda de algumas
aguas pluviaes no meio do verão, de Setembro a Novembro
ou Dezembro : e são denominadas chuvas de rama, porque en-
tão a vida vegetal desperta-se de subito, as arvores abrolham,
muitas florescem, e enfolham - se ; e como seja um recurso
para o criador a producção de rama nas arvores forrageiras, por
esse tempo em que os prados naturaes estão talados, d'ahi tira-
ram o nome, com que designam as chuvas d'essa quadra . Va-
mos vendo, então, que duas devem ser as epocas da florescen-
cia no Ceará. As plantas de carrascos, taboleiros e catingas do
sertão, onde a vegetação é constantemente intermittente, flo-
rescem durante a estação pluviosa, algumas por quasi todo o
inverno, em differentes épocas d'elle, ou no fim outras. De novo
enfolhadas, pelo tempo das chuvas de rama, em Setembro, Ou-
tubro, Novembro ou Dezembro, algumas das plantas, que flores-
cem durante a primeira parte do anno, ainda repetem uma pro-
ducção es assa de flôres. Porém , n'esta quadra sómente, floram
algumas arvores dos sitios onde a vegetação é intermittente .
Os pereiros, as cynophallas, os juazeiros, umaris, carvceiros,
imburanas, aroeiras etc. , desenvolvem então os seus orgãos de
reproducção e prepáram-se para fructificar. Nas serras selvgsas,
onde a vegetação é perenne, dá- se a floração em cada especie
122

segundo a sua natureza. Em geral as arvores d'alli desfolham-


se para logo resvestirem-se, ou brótam ao mesmo tempo que
perdem as suas folhas velhas, pelos mezes de Setembro a Outu-
bro. Exactamente quando os vegetaes dos sertões se acham
sêccos e reduzidos aos seus troucos com os galhos nús, por essa
época pois, a flora das serras orna-se das suas mais bellas galas,
eriando novo alento os seus sêres, tomando nova vestidura e
desabrochando as suas flores. Das arvores que desfolham-se,
florescem antes de vestirem- se algumas,-como os páos d'arco ;
ao mesmo tempo, que brótam outras, como os pirauás, arapira-
ca ; ou depois e durante a estação pluviosa . Neste caso estão
as lauraceas das serras (louros) , que florescem no principio do
inverno ; as mirtaceas, que o fazem nos ultimos mezes d'esta
estação ou logo nos primeiros do verão.
Depois d'estas considerações poderemos estabelecer as re-
gras, que se deve seguir, na colheita dos vegetaes medicinaes
da flora cearense. Varia o tempo proprio para a colheita con-
forme a natureza do sitio botanico em que tenha de ser fei-
ta. Em geral, para o sertão, póde se tomar pelo melhor o da
terminação das chuvas, o do começo do verão, quando se
trata de cascas, raizes e mesmo de ramas. Com effeito, devem
ellas ser tiradas quando o vegetal está em pleno desenvolvi-
mento, pouco antes da florescencia ou depois da fructificação.
E como aconteça frequentemente na provincia do Ceará, que
cs invernos não sejam bastante prolongados, que o appare-
cimento dos ventos geraes, a cessação subsequente das
chuvas, o começo do verão, em uma palavra. venham tolher
ao desenvolvimento da vida vegetal, cessando ella, antes de
haver- se completado o cyclo das suas transformações organi-
cas, prefere-se fazer a colheita das cascas dos vegetaes medi-
cinaes durante o verão, pela razão de estarem então os succos
vegetaes mais perfeitamente elaborados, bem apurados, con-
centrados e quasi sêccos nas partes das plantas que se to-
mam para uso . E' por exemplo n'essa estação que se tira a
casca do pereiro (tonico subnarcotico), ou da raiz do leptolo-
bium ( milome), a da catinga ou marmeleiro branco (croton,, as
raizes dos marmeleiros, velames, do corongo, do teiu- iá, etc,
Pelo decurso dos ultimos mezes da estação pluviosa faz-
se a colheita das ramas e folhas . Estas ultimas partes das
plantas são pouco empregadas. De Maio a Junho colhem-se as
123

partes herbaceas da fragrante pluchea, que deuominam ma-


dre-cravo, as folhas do marmeleiro de cerne ou quebra-facas
(croton fragrantissimo ), a rama da canella do matto (outra
especie de croton), a de uma lippia ( chá de taboleiros), a cidri-
lha de botões (pectidio citriodóro do sertão) , o velame de chei-
ro, etc.

Para as raizes e bolbos ha dous tempos de colheita : du-


rante o verão, ou logo ao primo despontar das flores ou fo
lhas no tempo vernal. Assim os bolbos das amaryllis, succeda-
neos da scilla no norte do Imperio, poderão ser colhidos de
Julho a Outubro ( e para fazêl - o então com facilidade seria ne-
cessario cultivar a planta ), ou então de Dezembro a Janeiro
assim que deitem as hasteas floriferas, antes de enflolharem-
se. Entretanto deve se preferir o primeiro proceder ao se-
gundo, sempre que se procure obter um producto de efficacia
constante e capaz de conservação. O movimentos da nutrição
vegetal, nos climas calidos, desde que se estabelecem as con-
dições necessarias para o seu começo, fazem -se por um verda-
deiro arrojo : de um dia para o outro, ao favor de alguma boa
chuva, carregam- se as plantas de seiva e abrólham. Então os
bolbos das amaryllis, ao despontar das flores, estão mais ou me-
nos refeitos de humidade, tem perdido um tanto de sua ef-
ficacia e muito mais no tempo do eufolhamento da planta :
n'estas condições o povo os tem por ensoados e fracos, o que
reconhece-se pela consistencia do humor, que dissora o topo
dos bolbos cortados, devendo elle filar entre os dedos, para ser
considerado em bom estado o producto. D'aqui se conclue que
as cebolas-brabas, se vierem a ser empregadas em pharmacia,
só o poderão com segurança se se tornarem objecto de cultura,
como já dissemos .
A mesma regra de se colherem as partes medicinaes no
começo do tempo sêcco ou durante o verão, applica-se ás rai-
zes. Assim as do corongo ou pratudo, as das aristolochias, que
denominam papo - de -perú, jarrinha, angelico , as da papaconha
(itubû), do cardiospermum, conhecido pelo nome de baúna no
Rio, de cipó-pratudo ou rama de vaqueiro no Ceará, as do
carrapicho (krameria tomentasa), etc., devem-se colher de Junho
a Setembro.
Pelo que havemos dito da veracidade de épocas em que
124

florescem os vegetaes no Ceará, conforme os sitios em que


vegetam, comprehende- se quanto devem variar as regras para
a colheita das flores. Os mufumbos, nome de origem talvez
africana que dão os cearenses a diversas plantas sarmentosas,
de flores excessivamente odorantes, os mufumbos, que se pres-
tam á extracção de essencias e de aguas distilladas ou alcoola-
tos aromaticos, devem ser colhidos no começo do inverno e
só então (as tetraceras dos taboleiros), ou do meio até o fim
d'essa estação ( os combretos), ou em fim no verão, que é quan-
do flora o nectarifero mufumbo da beira do rio.
Apanham-se as flores bechicas da cas lpinia bracteosa. Tul.
(a catingueira) durante os primeiros mezes do inverno : as da
outra especie do mesmo genero ( o jucá) de Abril a Maio ; as
da contarea (quinaquina) que são empregadas ao modo das ro-
sas rubras, de Fevereiro a Abril em differentes épocas da es-
tação pluviosa as da angelica do matto ( a guettarda), as dos
camarás.
A macella do sertão, synantherea do genero aphanoste-
phus, que Gardner citára como especie de grangea, colhe- se flo-
rescida não só pelo cabo do inverno, como pelo decurso do
verão, vegetando ella então nas vasantes dos leitos dos rios.
N'esses dous tempos pois são differentes os sitios em que se
encontra a planta . As de vasantes, tanto as espontaneas
como as cultivadas, dão productos de Novembro a Dezem-
bro.
As exsudações resinosas fazem - se abundantemente durante
o verão. Pelos mezes da estação sêca é rendosa a procura
das resinas dos jatobás, aroeiras, balsamos, imburaua de chei-
ro, de espinhos, do camará de frechas, almecegas. etc.
Entalham-se os troncos das arvores, e elles exsudam de per si
as resinas procuradas. Estão no mesmo caso as gommas das
acacias, as gommas-resinas, como a do angico, do cebiá, do
pajaú.
E' durante os mezes do verão, que se faz a apanha de
cantchuc, producto do leite da maniçoba. Os mezes de Outubro
a Dezembro, por mais rendosos, segundo a expressão dos col-
lectores, são o tempo da apojadura das arvores ; apezar de coin-
pletamente desfolhada. o tronco da maniçoba ao menor córte
verte abundancia de latex que em doze horas coagula- se.
125

(Para extrahil-o lavram os sarnambieiros superficialmente


a casca da arvore e deixam escorrer o liquido sobre a face do
tronco, cahindo mesmo no chão, e o apanham de mistura
com a maravalha peridermica, com a terra, ficando assim de
máu aspecto e muito conspurcada a chamada resina de sarnain -
bi. Os collectores mais cuidadosos reunem-se em grupos, pas-
sando adiante os sujeitos, que vão incisando a casca das jatro-
phas, e seguindo - os a distancia os apanhadores, que tiram o
leite com colheres. Para coagular- se depositam-no em espathas
de catolé, que chamam capemas ou carrascas, onde vem a for-
mar-se uma massa plano-convexa, interiormente laculnosa. de
côr amarella encardida, com cheiro especial em fresca , e que se
corta ao meio para melhor seccar : é a resina de carrascas, que
vale o dobro da primeira sorte. }
A extracção da resina das hymenœas, que abundam tanto
no Ceará, poder-se- hia fazer com o mesmo proveito que a do
cautehue, pois que igualam-se em valor commercial. Em me-
lhores condições se acha a almacega, cujo preço é superior ao
da gomma -elastica ; as especies de icica, que a produzem, vi-
vem na região littoral, na das chapadas e nas serras,
Temos pois visto, que durante o verão de Março, impropri-
amente chamado inverno, ewquanto os vegetaes, repletos de
seiva, brótam, enfolham-se e poem- se a florescer, são elles pouco
activos, ou por não estarem ainda formados alguns dos seus
principios immediatos, ou por se acharem diluidos na grande
quantidade de humidade, que as plantas então contêm. A casca
do marmeleiro branco, colhida durante o inverno, não tem o
principio corante que abunda n'elle desde o fim do inverno até
ao cabo do verão. A casca do velame despegada no tempo
do verão dissóra uma seiva ferruginea, adstringente ; nos me-
zes de inverno é pouco sapida, incolora a seiva ou liquor que
se acha no entre - casco d'esse croton . O mesmo acontece ao sau-
gue de drago eá rucurana [ euphorbiaceas fluminenses] , que nem
sempre tem a seiva colorada. [ 1 ]
Os principios immediatos, que a arte da tinturaria procu-
ra uos organismos vegetaes, não se encontram formados em to-
das as épochas de vegetação. Mesmo quando a vida vegetal está
em pleno desenvolvimento, ao tempo de operarem as folhas

(1 ) Dr. Capanema, comm. verbal.


126

como orgãos elaboradores da seiva. que diffundindo -se por


todos os apparelhos da planta, vai n'elles prestar substratum ás
formações da chimica physiologica, mesmo n'essa época os prin-
cipios tincturiaes se não acham totalmente formados. Existem
então nas plantas substancias, que se pódem modificar pela
simples influencia da atmosphera, talvez todas por uma fixação
de oxygenio, e produzir o principio corante caracteristico. E
d'esse modo, que póde haver, nas plantas indigoferas, anil no
estado incoloro, o qual sob a influencia do gaz oxygenio tran-
sforma se em indigo colorado. Sabe -se pela analyse chimica ,
que n'esse caso consiste o phenomeno da mudança n'uma sim .
ples oxygenação, da qual resulta a deslocação de uma propor-
ção de agua de cada equivalente de anil. E' provavel que se
expliquem do mesmo modo os factos, que se observam em mui-
tas partes vegetaes carregada de princípios tincturiaes. O que
ha nas indigoferas ou polygonum, isatis, cupatorium , cissus, e solanum,
é o anil incoloro . Não se encontra na casca das araribas, e es-
pecialmente na do Ceará, o pereiro de tinta, não se encontra
(dizemos ) o principio corante senão sob a modificação incolora .
Logo que se expõe ao ar a casca d'estas arvores, o seu livrilho
córa-se em pouco tempo, envermelhece. A casca e lenho do ci-
pó-camarão [ arrabidaa indet. ] são brancos ; sob a influencia de
uma temperatura eleva la, e ao ar, tomam a côr rubra. A ta-
piranga [vignonia das serras do Ceará ] pela simples dessecca-
ção torna-se vermelha. Estas modificações pelas quaes passam
os principios corantes sob a influencia da atmosphera, produ-
zem-se naturalmente pelo proseguimento dos movimentos nu-
tritivos do vegetal. Em geral, as plantas, que contém principios
corantes da modificação incolora, quando chegam á época em
que hão terminado a sua vegetação ; quando têm acabados e
perfeitos os fructos, maduras as folhas, estes orgãos de nutrição,
o entrecasco mesmo, tomam a côr do principio, que é particular
á especie ou ao genero . E, pela observação da côr, que tomam
as folhas em maduras, póde-se presumir a existencia ou inexis-
tencia do principio corante nas plantas, e a sua abundancia . As
cassias, que dão principio corante amarello [ e uma d'ellas, a ca-
ninana da Meruóca, observada pelo Dr. Capanema, é commum
no Ceará], as cassias têm as flores amarellas, e as pela maturi-
dade toman essa côr. A folhagem dos crotons torna-se amarel-
lo- alaranjada ou vermelha ; e as plantas d'esse genero servem
127

para tingir- se de amarello, de amarello-alaranjado, ferrugineo,


e vermelho -amarellado. Ficam amarellas, mais ou menos ala-
ranjadas ou vermelhadas. as folhas dos muricis ; e o rasteiro
tinge de alaranjado-encardido. As das lasiandras ao amadure-
cerem tornam se rubras. Amaranthaceas, que dão tinta rôxa ,
ficam com as folhas e até os talos d'essa cor . Os solanos, que
dão anil, as coiranas, caavuranas tomam a côr rôxo - denegrido
em seus orgãos de nutrição, quando tendem a cahir . Emfim ,
nas plantas em que não ha vestigios de principio corante, ad-
quirem a côr parda ou a de palha essas partes, quando estão
para terminarem- se as suas funcções. A' presumpções da mesma
ordem leva nos a observação das côres das flôres. que têm al-
guma relação com as das folhas maduras. N'uma especie, cujas
flôres, sejam amarellas, podendo- se encontrar principios coran-
tes d'essa côr. ou alaranjados, ou rubros, não é provavel que
tenha ella o azul o rôxo : se as flôres fossem azues, os princi-
pios corantes variariam d'ahi até o violaceo, porém não chega-
riam ao rubro nem ao amarello. Vemos, pois, que estas côres
se circumscrevem a duas series : a cyanica e a xanthica. O ama-
reilo e o azul, que são o começo de cada serie, estão separados
na faxa espectral [ da luz decomposta] pelo verde, que é a medi-
ana das sete côres. A serie xanthica occapa uma parte, a cya-
nica outra no espectro. Ora, se notarmos que as partes verdes
dos vegetaes respiram por um modo diverso da dos orgãos ap-
pendiculares de outra côr, e que, pois, os seus principios coran-
tes são de diversa natureza, poderemos dizer que o verde con-
stitue na faxa espectral uma linha definitoria entre as duas series
xanthica e cyanica. Os solanos, que pertencem á serie cyanica,
não têm flôres amarellas ; as suas corollas variam do azul ao
rôxo e branco. As cassias, da xanthica, têm flôres só amarellas .
Não pódem ser azues as da tapiranga. Nos muricis são amarel-
las ou vermelhas. O conhecimento das côres das flôres tão bem
como o das folhas maduras póde pois levar-nos a suspeitar a
existencia e natureza de principios corantes nos vegetaes a que
ellas pertençam, e a julgar da sua prestabilidade na arte da
tinturaria.
Tornando ao objecto de que nos afastámos para esta di-
gressão, concluimos que formando- se os principios corantes só-
mente durante o periodo da plenitude das funcções vegetaes, é
depois d'essa época que se deve fazer a colheita das partes das
128

plantas que são exigidas pela arte da tinturaria. Aos exemplos


adduzidos é desnecessario juntar outros desde que se estabelece
a regra geral de colherem - se essas plantas no tempo da flores-
cencia acabada ou da fructificação. "

" § 1º Tão numerosas são as plantas medicinaes no Brasil,


diz o Dr. Martius, que em vez de sentir a falta de remedios ve-
getaes, encontra antes o medico embaraço na escolha do mais
presentaneo d'entre os que se apresentam com iguaes direitos
a serem empregados em cada caso especial ; riqueza. que os
medicos europeos parecem não invejar por entenderem que pela
maior parte são inoperosos. Tal não é no emtanto a opinião do
celebre professor bavaro a este respeito, e procurando conciliar
as suas crenças com as duvidas dos medicos scepticos faz entrar
em linha de conta as condições especiaes, em que se acha a me-
dicina no Brasil, explicando por ellas a efficacia de remedios
analogos aos que se mostram inactivos. quando administrados
a doentes civilisados. No Brasil, e especialmente no centro do Im-
perio, diz o Dr. Martius, o doente torna -se uma entidade á
parte na familia ; separa-se d'ella : colloca- se fóra das condi-
ções habituaes de excitação vital ; impede- se- lhe o accesso da
luz ; deixa-se ficar em abstinencia de alimentos ; veda- se -lhe o
commercio com amigos ; e isolando- o tanto assim, impossibili-
tando - o de falar com pessoas, que não sejam as encarregadas
do seu tratamento, e especialmente com as mulheres no estado
de gestação ou de evolução, provém d'ahi accumulação de exci-
tabilidade ; e ao favor d'estas condições excepcionaes medica-
mentos pouco activos operam com vigor, o que se não pode dar
para com o doente europêo, cujas condições são totalmente con-
trarias ás das do caso precedente, e que pois necessita de mo-
dificadores muito mais energicos. A theoria é acceitavel como
theoria geral : porém infelizmente as observações sobre que se
basea a sua applicação á gente do Brasil são inexactas. E' isso
inexacto pelo que diz respeito ao modo de proceder - se em fami-
lia, nos casos de molestia, mesmo na nossa mais baixa classe, e
ainda no centro do Imperio : porque em vez do apartamento
imaginado pelo autor allemão, é, pelo contrario, n'essa occasião
que o doente se vê mais procurado pelos que lhe querem de-
129

monstrar affeição ou se interessam pelo seu restabelecimento.


constituindo muitas vezes por suas observações inopportunas e
repetidas um abraço ao medico ; é inexacta pelo que se refere
á alimentação, ao uso rigoroso da diéta, porquanto a gente do
povo, como se ainda partilhasse os erros da medicina brunoni-
ana, pécca antes por abuso de alimentos, do que pelos rigores
da abstinencia. Se a quizessemos applicar aos nossos indigenas,
veriamos ainda que as observações de Martius são desencontra-
das com as noticias de autores sinceros, que estiveram em rela-
ções immediatas com os indigenas e escreveram o que observa-
ram . Baste- nos citar o Lery, que no capitulo XIX de sua obra
diz o seguinte : " Mesme quelque grieue que soit la maladie,
"les autres qui sont en santé, suyuant leur coustume ne lais-
" seront pour cela, beuvans, sautans & chantans de faire bruit,
" autour du pauvre patient : le quel aussi de son costé sachât
" bien qu'il ne gagneroit rien de s'en fascher aime mieux auoir
" les oreilles rompues que d'en dire mot ." O Dr. Martius deve-
ria referir - se unicamente aos casos de empeçonhamento. Então ,
mas só então, seriam exactas as suas reflexões. O empeçonha-
do reclusiona-se ; isola se ; evita as emoções moraes ; foge a
toda sorte de incitação ; e entrega-se todo aos cuidados da sua
meditação. E' então, que se suppõe nociva a presença da mu-
lher em gestação ou ovulação : é então que a menor commoção
de corpo ou de espirito faz exacerbarem-se todos os symptomas
ou determina o seu apparecimento, se ainda não existiam.
A condição subjectiva do doente, que o professor Mar-
tius suppunha commum , apresenta - se pois apenas em alguns
casos. As razões adduzidas por elle a proposito de nossas
plantas medicinaes e do juizo que d'ellas formam os medicos,
da sua efficacia, não são as verdadeiras. Depois das escanda-
losas reformas (Lordat), que a descoberta da irritabilidade in-
troduzio na medicina, depois da destruição de todos os sys-
temas antigos, antes da restauração do edificio da sciencia ,
deve haver um periodo de duvida , de incerteza. N'elle está-
mos actualmente. O scepticismo occupa o throno da medicina.
Ora no emtanto, que os medicos antigos fiavam-se na sim-
ples observação, os modernos exigem como complemento in-
dispensavel d'aquella a experiencia. A respeito pois das nos-
sas plantas , sobre as quaes os processos experimentaes de ana-
lyse ainda não foram ensaiados, tem toda a razão de for-
130

mular duvidas a medicina rigorista e hesitativa de nossa


época.
Presentindo talvez a insufficiencia de suas razões, pro-
cura o professor de Munich explicar a efficacia das mezinhas
brasilicas pelo emprego dos vegetaes frescos. Admitte elle,
que nos remedios vegetaes frescos ha un quid de vital, uma
compleição especial, um certo nexo organico com conserva-
ção de espirito vital, que perde- se pela desseccação, diminuin-
do-se assim a força do remedios . Não se sabe bem ainda quaes
são as alterações porque passam as partes vegetaes seccando-
se. Suppõe -se em geral, que ellas consistem em perda de hu-
midade, de principios volateis, resirificação de algumas essen-
cias, modificação ligeira dos principios gommosos e protei-
cos . Dando toda a importancia ás observações do botanico
allemão sobre o emprego de plantas frescas, bem que não
adopte o seu ontologismo, e considerando a difficuldade de
obter em toda a parte os sumos, as folhas verdes, flôres fres-
cas, bolbos e fructos succosos, o unico meio de obvia-la pa-
rece -nos 0 emprego dos diversos modos de preparação e
conservação pharmaceuticas. Assim os principios volateis sob
a forma de hydrolatos ou alcoholatos sómente se conservam ;
e d'esse modo se póde obter no Ceará os do mossambé de chei-
ro, das flôres de pereiro, do mofumbo, da angelica do matto,
da de rama, das folhas de limão do matto, da laranginha
braba, etc. Devendo -se associar ou conservar associados os
principios aromaticos aos fixos das plantas deve - se recorrer
ao alcool como vehiculo e ao processo das alcoholadas (alco-
holature fr. ) como meio. Assim se preparariam as alcoholadas
antiescorbuticas dos rebentos da braúna ( zanthoxyca arb. ) ;
da casca da cynophalla ou feijão-brabo ; as alcoholadas es-
timulantes da casca, lenho e brotes do máu- visinho, limãozi-
nho de espinhos, I aranginhas, especies congeneres das tin-
guacibas : as narcoticas da jurema preta a nevrosthenica do
cravo de urubús ( porophyllum), das cascas de balsamc, cu-
marú e merendiba de cheiro. Os extractos de todas estas
plantas não tem estas propriedades em gráo tão apre-
ciavel .
§ 2º-A medicina popular não emprega indifferentemente
qualquer forma pharmaceutica em seus preparados. Os princi-
pios activos das plantas são extrahidos pela decocção, pela
131

maceração a frio ou ao sereno , ou pelo alcool. E' pelo methodo


da maceração, ou por um processo semelhante ao da fabri-
cação pos hydrolès (soluções), que se preparam as chamadas
purgas de juá, de limãozinho, do cipó de cruz, da timbaúba,
cabacinha obtém a raspa, deitam-na em agua a serenar,
tiram a decoada, batem-na em quanto deita espuma, e esper
diçando esta, dão a beber o soro, que fica. Assim tambem se
empregam a casca de gitó, a de brandão, que usa - se sómente
em clysteres, não espumam e são purgativos energicos . Pela
simples maceração obtem - se ainda os principios activos do
decantado manacá, e do bordão de velho ou páo-podre o qual
se acha indicado na obra de Piso sob o nome de gaibipo-
caiva (calliandra tubolosa. Bith . ) , os da paraiba, da caja-
rana.
Requerem o processo da infusão todas as plantas aro-
maticas.
Os extractos são pouco empregados. Muito mais o são os
xaropes, os mellitos, que fazem ordinariamente com as plantas
frescas.
Raras vezes toma-se como excipiente de conservação
o vinagre : e apenas menciono o jupicai, planta de ca-
pongas, de que se prepara a acetolada (acêtolature, Bé-
ral).
O alcool é muito usado. Preparando-se as tincturas com
as plantas frescas, obtem-se verdadeiras alcoholadas (alcohola-
ture fr. ) muito mais operosas de que as tincturas propriamente
ditas. Pelo processo das alcoholadas se extrahem [ como já dis-
semos ] os principios antiescorbuticos da braúna e da cyno-
phalla [capparis], os nevrosthenicos do mossambê de cheiro
[ dactylena ], os estimulantes das especies de zanthoxilum, co-
nhecidas pelos nomes de limãozinho de espinhos , máu-vizinho,
laranginha braba. que tem as propriedades das tingacibas
do Rio, etc. E' de rigor o emprego do alcool para excipiente
na preparação dos remedios antidotaes. Ora reparando- se em
que, de provincia a provincia, e mesmo de lugar a lugar, va-
riam extremamente as plantas empregadas, como alexitereas ;
e no entanto que em toda a parte se encontra a prescripção
de alcool, como vehiculo ; considerando- se, que muitos dos
vegetaes empregados são pouquissimo activos [e sirva de
132

exemplo a balsamonia [ cuphoa], planta que não passa de ser


um ligeiro aperiente], póde-se achar justeza na opinião , que
concede ao alcool um papel importante, como elemento phar-
maceutico d'esses preparados para nós, como alexitereo, te-
mos que vale elle muito mais, do que os principios variaveis,
de que é considerado excipiente.
Os amylos medicinaes, as féculas impuras, verdadeiros ex-
tractos feculaceos, são muito frequentemente prescriptos na
medicina popular. Do mesmo modo porque na Europa prepa-
ra-se e administra-se o amylo da bryonia, utilisa-se no Bra-
sil os do poarchen, de ipomæas, diocteas, dolichos, anchieteas, etc.
Taes preparados são defeituosos pela incerteza da dosagem.
Esses amyios, quando bem lavados, apenas poderão ser consi-
derados como meros analepticos, e n'este caso estão os dos
jacatupês, das mucunans, do maririçô, etc. Conforme o nu-
mero de lavagens, por que passam, perdem elles mais ou me-
nos e mesmo completamente o principio purgativo, e é por
essa razão que a dóse operativa varia de 2 a 4 ou mais co-
lheres.
Das anchieteas, sparattospermas, baúnas, caraúbas, velames.
extrahe-se um polme chromulifero, que se deposita de uma
malaxagem das partes das plantas pisadas ou roladas em agua
pura. São estes os que eu chamo extractos feculaceos, de
dosagem menos incerta, que os verdadeiros amylos ; porém
constituem uma fórma de remedios menos agradavel.
A medicina popular emprega frequentemente os banhos
medicinaes, ora com o escópo da producção de uma acção in-
terna e geral. como quando se prescrevem os banhos de pipi,
os da guararema, do alecrim [baccharis], dos camarás e tingua-
cibas, etc., como estimulantes ; os de angelicó, milome, perei-
ro, canudo amargoso, como tonicos ; os de capeba, sucupira,
nabatenô, como adstringentes ; os das coiranas e camapús
como lenientes, etc. ; ora visando unicamente a uma acção to-
pica, como a que se espera da paraiba nas dermatoses, e
mesmo na affecção acarifera ; do guaranatimbó nos mesmos
casos, do cipó de mico ou cipó de macaco, como insecticidas
todos .
Empregam-se fumigações, que se fazem com as partes
aromaticas das plantas. São usadas frequentemente as do ce-
dro ; e na medicina veterinaria constitue talvez o unico tra-
133

tamento, que se applica aos animaes affectados do mal triste,


o emprego das fumigações da catingueira. E' notavel que na
Europa, segundo Tessier empreguem no curativo do sang-de-
rate, affecção muito semelhante ao mal triste, o mesmo pro-
cesso das fumigações.

40

E' natural a passagem de plantas medicinaes ás toxicas.


Muitos vegetaes da flora cearense são reconhecidos como ve-
nenosos , e a tradição conserva alguns conhecimentos sobre
essas propriedades, constituindo o que chamamos a toxicologia
popular. Aqui porém são mais raras as observações, os factos
mais duvidosos , e os motivos de criterio falham muito. Diver-
sas plantas são empregadas, no Ceará, como parasiticidas : den-
tre ellas devem-se discriminar as que são simplesmente de-
tersivas, como o juá, os pacaris, as bonanias, das que são legi-
timas insecticidas ; e entre estas occupam os primeiros lugares
os stenolobium, especialmente o relutino, as simarubas, o pereiro,
os quaes, empregadas, ao modo do guaraná- timbó no Rio, con-
tra a affecção pedicular dos animaes, e para destruir o para-
sitismo de acarideos dos generos sarcoptes, ixodes, etc. , tem
ainda propriedades ichtyotoxicas semelhantes ás da camptosema
fluminense. As substancias ichtyotoxicas denominam -se tinguis
ou barbascos e correspondem no Norte do Imperio aos timbós
do Rio de Janeiro.

[ Sendo usado o processo de pescar envenenando ou em


barbascando as aguas, empregam os Cearenses muitas plantas
como tinguis. Fazem-se estas pescarias nos depositos d'agua
que ficam durante a secca pelo leito dos grandes rios da pro-
vincia, ou nas lagoas, que com elles communicam. E' nos an-
nos de aturado e vigoroso inverno [ chuvas copiosas], que esses
sitios se tornam piscosos. A razão é a seguinte . Quando as
chuvas do tempo proprio têm alagado todos os terrenos do
Ceará, quando os rios correm com grosso volume de aguas, as
lagoas, os açudes sangram ; e as mesmas ypueras, os banhados
adjacentes poem- se em communicacão com essas grandes es-
teiras fluviaes, e por ellas com o mar. Tem então lugar a arri-
bada de peixes, que procuran. as partes superiores d'essas tor-
rentes, chegando quasi até às suas nascenças. Peixes do mar,
134

que habitam as barras excessivamente piscosas dos rios da pro-


vincia, sobem para a desóva, e quando de Junho a Julho as
communicações dos differentes depositos de agua se acham
cortadas, os açudes, as lagôas, os poços, os banhados conser-
vam não só peixes de agua doce, como muitos do mar, que não
descem a tempo. E' d'este modo que todos os depositos do
agua tanto do littoral como do interior do Ceará se acham em
condições de fazerem- se n'elles productivas pescarias pelo de-
curso do verão. Reservam o emprego dos tinguis para os ba-
nhados, ypueras ou pequenos poços, seguindo nas grandes la-
gôas outros processos menos nocivos de pescaria. )
Muitas plantas ( dissemos) não são empregadas como tin-
guis : as mais activas são o tingui de bolas, tingui-capêta, ou
timbó- peba, especie de magonia, cujas partes usadas são as
raizes, casca e lenho amassados ou quebrados.
(Os pescadores dentro d'agua ou em balsas batem o tin-
gui com agua dentro de uma vasilha de páo : a agua, que se
torna espumosa, vão lançando ao poço e continuam até julga-
rem sufficiente. Seguem o mesmo processo com o barbasco ou
tingui da praia (jacquinia armilaris), que vegeta sómente nas
immediações do littoral ].
Nas vizinhanças das serras de vegetação continua usam
do pucahi (phyllantus) , do jaborandi (ottonia), que obram com
violencia mesmo em aguas correntes e são comparaveis em ef-
ficacia ao camptosema fluminense ( timbó de raiz. ]
São estimados, como ichtyotoxicos energicos, a tintaúba
ou tamboril [ enterolobinm] , cuja casca é a parte procurada : o
araçá de tinguijar, especie de diospyros. de que tomam a rama.
Menos activos se dizem o guardião [ bryonia), o tajujá (sycios);
a catáia, o cipó de macacos (stenolobimm velatinum . Bth. ) deno-
minado tingui de piranhas por supporem-no affectar especial-
mente aos serrasalmos ; a casca do sapindus comestivel ( pitom-
beira] ; a casca e fructos do sapindus desvaricado ; a rama da
jatropha, que produz a gomma elastica ; a de uma especie de
canavalia [fava de rama]. Em terceiro gráo de efficacia collo-
cam os Cearenses ao mossambê, a herva moira, e a uma espe-
cie de polygonum, que chamam fumo bravo.
O tingui de bolas passa por ter a propriedade de alimpar
as aguas dos poços, as quaes depois de seu emprego tornam- se
claras, limpidas e potaveis. Esta planta parece pois ter as qua-
135

lidades do nirmuli da India [ strychnos potatorum. L., f. ] , de que


usam os fructos contusos, para fazer precipitarem- se as impu-
ridades da agua e tornau-la propria para beber-se : da nossa
magonia poder-se-hia empregar a raspa, a serragem ou o lenho
amassado.
Os tinguis tem quasi todos a propriedade de fazer espu-
mar a agua. Em alguns d'elles, como no sabonete e na pitom-
ba, está demonstrada a existencia de saponina. E' a este prin-
cipio ou a outros do mesmo genero, que devem as soluções ve-
getaes a qualidade de espumarem, como agua de sabão, quando
batidas.
Parece que existe a saponina em algumas cucurbitaceas ;
e a momordica do Senegal, planta perfeitamente acclimada o
commum no Brasil, tem a serventia de vegetal saponifero nas
mãos das lavadeiras : a macerada dos fructos da bucha, agitan-
do-se, espuma muito ; e é, depois de bem espumada, que to-
mam como purgatívo o liquido restante. As partes novas e a
casca da timbaúba espumam tambem e são empregadas para
substituir o sabão . Será pois a saponina o principio toxico d'es-
tes tinguis ? Só pela analyse chimica póde se decidir esta ques-
tão, tanto mais importante, que se verificassemos a existencia
de saponina n'estes e n'outros vegetaes nossos, adquiririam elles
grande valor, como plantas industriaes. Os fructos dos sapin-
dus, empregados de tempo immemorial na India. são objecto
de commercio. As cascas saponiferas de Panamá, de Quillay
são levadas pelo commercio ás fabricas européas . E' de crer- se,
pois, que as plantas saponiniferas do Brasil se tornem tambem
objectos de commercio. Póde se suspeitar a existencia d'esse
principio, além dos vegetaes já citados, no limãosinho (myrsinea),
em polygalas (pacaris), nas securidacas denominadas pacarivás,
na monnina das serras dos sertões do Ceará, nas bonanias [sabo-
netes de cipó], na reissekia smilacina [ cipó das lavadeiras ou
herva de Santa Eugenia], em algumas especies de solanum,
cestrum e acnotinus.
A classificação de ichtyotoxico não deve fazer suppor, que
os tinguis sejam nocivos a toda a sorte de animal : mesmo aos
peixes muitos d'elles, mesmo dos fortes, não matam e sómente
entontecem. Alguns tinguis são plantas forrageiras, como a
maniçoba, a fava de rama. Os fructos do diospyros, que são
empregados para tinguijadas no Ceará não são comestíveis : ha
136

porém uma outra especie dos mesmo genero, cujo fructo deno-
minado marmelada é appetecido pela gente dos Caryris.
Como vegetaes veneniferos, citamos já a tipuana. de cuja
raiz a casca compacta e friavel reduzida pó deixa perder- se por
lavagens successivas os principios toxicos, que contém. Estes,
se não são de todo extrahidos, obram como irritantes, determi-
nando a producção de uma gastro- enteritis, com enterorhagia,
d'onde póde vir como subsequencia o emaciamento, o marasmo
e a morte. A farinha da raiz de mocó é, como a usam, um ali-
mento grosseiro , que ingerem de mistura com o leite. Já nos
referimos tambem nas paginas precedentes ás mucunans, coro-
nhas e jacatupês, plantas toxiferas de cujas raizes e sementes
extrahe-se purissimo amylo. A esclepiadea voluvel, que conhe-
cem no Ceará pelo nome de angelica de rama, por amor do
cheiro activo das suas flôres, e de mata- cães por ser venenosa,
a schubertia multiflora. M. , está no caso dos jacatupês e mucu-
nans ; e pelos mesmos processos extrahe- se amylo alimentar de
suas raizes tuberosas.

D'entre os generos de plantas venenosas, citaremos apenas,


como representadas na flora cearense, as undiras, que são narco-
ticas-acres ; os abrus, de sementes venenosas e excessivamente
irritantes ; as simarubas, cuja casca passa por ser narcotica ; as
tephresias, das quaes uma especie que vegeta na região littoral,
o anil brabo ou tingui do Cayenna, é empregado como ichtyo-
toxico ; as xawolfias ; as mimosas e a acacias, cujas sementes
passam por venenosas, e em alto gráo as do angico, e cronha- criz.
D'esta ultima, a vachellia, acredita a gente do Ceará, que a in-
gestão da infusão ou decocto brando da raiz (parte da pl. dota-
da de pronunciado cheiro alliaceo) destróe os effeitos nocivos
das sementes ; tradição que menciono, por ser commum a ou-
tras mimosas, como os caaiús, juquiris, e ao juquerionano no
Rio. Ora como a raiz da espongeira ou cronha- criz é tida em
conta de alexipharmaca, parece-me que aquella crença popular
procede de haver- se assimilado o envenenameuto com o empe-
çonhamento.
Mencionaremos ainda entre as plantas nocivas do Ceará
a coorana, sapotacea leitosa indeterminada e veneno muito
acre ; o imbú- im ou ximenia ; a sesbania dos lagos, que passa
por canicida ; o sapindus comestivel, deletereo ás aves de
137

criação : o pereiro ; o manacá ; e a jurema (mimosa), que pa-


rece representar entre nós o papel do pango na India.
Sendo na provincia frequente o apparecimento da raiva
canina, o meio prophylactico, com cuja efficacia contam OS
Cearenses, consiste no emprego de venenos vegetaes para ma-
tar os cães. Algumas plantas dão productos que são empre-
gados com este escopo . Existem especies do genero omphalo-
bium no Ceará : não são as que no Rio de Janeiro empre-
gam-se como canicidas ; lá porém nenhuma das uativas é
usada para semelhante fim. Servem para isso as sementes do
angico, os fructos das palicoureas, da herva da costa [ shabertia],
as folhas pisadas da parahiba.
São no Brasil genericos e applicaveis a grupos de plantas
venenosas os termos timbó e tingui, empregados tanto para
designar as plantas ichtyotoxicas, como os vegetaes, que usa-
dos como forragem produzem intoxicação ; e taes são no Rio
algumas especies de cardiospermum, timbós de rama, que af-
fectam ao gado vaccum e caprino, e no Ceará o tingui, es-
pecie de hyræa, muitissimo commum nos baixios. Além d'es-
tas, que são propriamente deletereas, ha vegetaes, que se tor-
nam innocuos pelo suetudismo. Está n'este caso o canudo do
lago, mata-cabras, especie de calonyction, que tem muita affi-
nidade com a planta descripta por Martius sob o nome de ipo-
mæa fistulosa, e de que differença-se por ter as folhas em am-
bas as faces pubescidas e as sementes pilosas. Como vegetal
toxifero, affecta especialmente ao gado cabrum. Os cavallos
adquirem o suetudismo d'esta sorte de alimento e comem a
sua rama durante o verão : quando porém não estão acostu-
mados, produz - lhes diarrhéa , narcose e morte. As vaccas e
cabras em estado de gestão abortam frequentemente pelo seu
uso. A iguaes accidentes estão sujeitos os animaes, que pas-
cem a rama da ipomaa capripede ou salsa. A esta affazem- na
porém com mais facilidade ; e chamam-se mesmo salseiros os
que costumam nutrir-se com as suas folhas e hasteas herba-
ceas. —Além d'estas duas convolvulaceas, na lista das plantas
forrageiras suspeitas, contam -se no Ceará a maniçoba [jatro-
pha da gomma elastica ] , cuja rama verde é innocente , e opé.
ra como noxia desde que murcha : a rama do juazeiro, que
só é bem supportada pelos animaes crescidos : as portulacas,
que são purgativas e passam em toda a provincia por vene-
138

nosas. Nos primeiros casos, e especialmente para com o juá,


supponho que se deve adoptar, para explicar a acção perni-
ciosa d'estes vegetaes, a opinião do Dr. Capanema o qual acre-
dita na producção do meteorismo, como causa da morte. A
proposito da maniçoba póde-se pôr ainda a hypothese da for-
mação de algum principio toxico por fermentação ; quanto
ás beldroegas, e mais ainda a respeito da salsa, creio que é
a diarrhéa produzida por esses alimentos a razão sufficiente
do seu perecimento
Não é porém pela falta de plantas forrageiras no Ceará.
que os auimaes vão alimentar - se com essas plantas nocivas :
mas pelas condições especiaes em que ellas vegetam. Os mo-
rorós (bauhinias), que são a melhor forragem para o gado
vaccum, desfolham-se logo que cessam as chuvas, e bem
que as suas folhas secens não hajam perdido as propriedades
natrientes, ellas estragam- se pelo chão, e o calor secco as re-
duz a pó ; está claro que ninguem as colhe para reserva ; nem
procuram disseminar a planta pelos baixios frescos, onde po-
deria continuar a vegetar durante os primeiros mezes do ve-
rão, e revestir-se outra vez pelas chuvas de Outubro a No-
vembro. O páo branco, as especies de mimosa, que denominam
cebia e malicia do gado, estão no mesmo caso, etc.
Porém n'essa época em que as catingas se a ham com-
pletamente desfolhadas, o calonyction, que vegeta gregario nos
ypús, a salsa que alastra com a sua rama oS areaes frescos
dos leitos dos rios offerecem aos animaes alimento verde. que
elles então preferem ; d'ahi os accidentes. O meio de obvia -
los é destruir todas as hervas nocivas e cultivar nos baixios
as plantas forrageiras. Entre estas merecem menção a teleian-
thera polygonoide, o stephanophyso asperapo, o dipteracantho me-
loso. uma especie de bastardia, que chamam melosa de gado,
a cynophalla, a canna-fistula (acacia), o umary, especies de
phaseolus, canavallia, cratydia, que denominam feijão de pom-
bas, favas de rama, camaratuba. rama de prata, etc.
[D'estas considerações resultaria que a fazer-se, algum dia,
a cultura das plantas forrageiras, deverá ella ser executada
com as de paiz, que são em grande numero e se prestam a
uma escolha facil, tanto das gramas que possam dar feno.
como das hervas, ramas e mesmo arvores. O Dr. Capanema
prepara um trabalho sobre este objecto, cujas conclusões são
exactamente as mesmas, que as minhas . ]"
139

PLANTAS VASCULARES ( 1 )

As plantas, de que trata esta enumeração, formam a maior


parte de uma collecção, que fiz durante as ferias de um mez
passado, por causa de minha saúde, no Estado do Ceará. Como
é sabido, esta antiga provincia do Brasil pertence, em toda a
sua extensão, á região geobotanica, que Martius designou pelo
nome de Hamadryadas, caracterisada especialmente por mattas
de arvores de pequeno tamanho, de folhas caducas, appellida-
das Caatingas pelos brasileiros . Esta região estende - se , segun-
do Martius (veja - se sua Tabula geographica Brasileira, dada como
supplemento á Flora brasiliensis) , por todo o Nordéste do Bra-
sil, comprehendendo o valle superior do Rio S. Francisco, que
pertence ainda ao Estado de Minas Geraes, uma grande parte
do Estado da Bahia, as antigas Provincias [ hoje Estados ] de
Pernambuco, Alagoas Parahyba, Rio Grande do Norte, Ceará,
Piauhy, a parte septentrional de Goyaz e a meridional do Ma-
ranhão. E' excusado dizer que esta grande superficie não é oc-
cupada exclusivamente pelas Caatingas : estas alternam-se, con-
forme as descripções dos naturalistas viajantes, principalmente
Martius Gardner, com Carrascos e Taboleiros ou Campos,
mais ou menos cobertos de arvoredos ou arbustos , ás vezes até
com paysagens de aspecto e vegetação quasi desertica .
No Ceará mesmo, cuja vegetação foi objecto d'um estudo ,
ainda pouco conhecido, de uma commissão de exploração bra-
sileira, pode - se distinguir trez principaes elementos de flora :
1-A flora do littoral, que occupa uma faixa mais ou me-
nos larga ao longo da costa, representada por uma vegetação
sempre verde, correspondente ás Restingas da costa brasileira,
e encerrando muitas especies de larga destribuição e alguns
typos especiaes.
2 -A flora do sertão e dos planaltos do interior, represen-
tada nas caatingas, carrascos e taboleiros por plantas xerophilas,
ou de vegetação interrompida durante os mezes de sêcca (Junho

( 1 ) J. Huber- Plantas do Ceará-lista de plantas vasculares


colhidas no Ceará em Setembro e Outubro de 1897 por J. Hu-
ber- na Revista do Instituto do Ceará -anno de 1907 .
Sendo este o trabalho mais recente sobre a flora cearense
dou aqui o que se acha publicado.
140

a Dezembro. E' nesta que abundam os typos genericos e espe-


cificos proprios da região dos Hamadryadas, alguns dos quaes
chegam até á praia, misturando- se com os representantes da
primeira categoria.
3ª A flora das Serras de Baturité, Maranguape, Urubure-
tama, sobretudo do Araripe, etc. Sem entrar em minudencias
sobre um assumpto, que me proponho a tratar em trabalho es-
pecial, nóto apenas que estas cordilheiras de montanhas, eleva-
das bruscamente aqui e acolá no meio da planicie, attingem al-
turas pouco inferiores a 900 m. , e ostentam, sobretudo nas ver-
tentes orientaes e septentrionaes, uma vegetação completamen-
te differente da das planicies. São mattas sempre verdes, gra-
ças á humidade levada pelos ventos do mar subindo ao longo
das ladeiras.
Encontram-se alli elementos de uma flora sem similhantes
nem na região baixa, que rodeia essas montanhas, nem os pla
naltos, que separam o Ceará da bacia do Rio S. Francisco . E'
uma flora dryada, essencialmente analoga, e em parte identica.
á das montanhas costeiras do Brasil ( Serra do Mar e a sua con-
tinuação), que começaria, conforme a planta de Martius, somen-
te ao sul da bacia do Rio de S. Francisco.. E' esta a riqueza da
flora do Ceará a presença de uma flora dryada no meio da
vegetação hamadryada. Para caracterisal-a basta citar algumas
familias representadas por numerosas especies, que faltam, ou
quasi não existem nas regiões planas, como bem os Fétos, as
Araceas, Musaceas, Maranthaceas, Zingiberaceas, Piperaceas,
Begoniaceas. Em certas familias os representantes da planicie
e das montanhas pertencem a tribus differentes ; assim encon-
tramos, na familia das Melastomaceas, as Tibouchineas nas pla-
nicies, as Miconieas nas serras ; na familia das Rubiaceas as
Spermacoceas nas planicies, as Fsychotrieas nas montanhas ; na
familia das Leguminosas : a mór parte das Papilionaceas e das
Mimosas nas planicies, as Ingás nas serras. Não é preciso con-
tinuar a enumeração ; a lista , posto que pequeno o contingente
das especies que ella encerra, fornecerá outros exemplos. Nella
se encontrará um certo numero de especies das montanhas do
Rio de Janeiro e da Bahia, que alcançam nas montanhas do
Ceará seus limites septentrionaes. Outras formas são represen-
tativas, distinguindo - se ás vezes de seus similhantes da Serra
do Mar somente o que permitte uma separação como varieda-
141

des. O isolamento das montanhas do Ceará deve aliás favore-


cer evidentemente a formação de novas especies. Cumpre men-
cionar algumas especies dryadas das montanhas do Ceará, que
são communs ás da Bahia ou do Rio, e não se encontram senão
muito longe, ao pé dos Andes : taes são por exemplo : Mohlana
nemoralis Mart., Miconia cecidophora Naud. , Miconia calvescens
DC. , Lundia cordata DC. As localidades mencionadas na enu-
meração seguinte correspondem aos tres periodos de minha vi-
agem e ao mesmo tempo ás tres regiões botanicas do Ceará :
1 -Arredores da Fortaleza e a zona comprehendida en-
tre essa capital e o arrabalde Bemfica . Este campo de excur-
sões está incluido na zona do littoral, e compõe-se, alem de
dunas muito desenvolvidas, de planicies pouco ondulantes,
occupadas por prados e charcos, que alternam com lugares
arenosos de vegetação herbacea bastante esparsa. mas rica de
especies e com mattos de 2 a 4 m . de altura , formados de ar-
bustos e algumas arvores.
2º -Serra de Baturité a cerca de 100 kilom. da costa com
uma altitude pouco inferior a 900 m. O centro das minhas
excursões foi a pequena villa de Guaramiranga [ Conceição],
situada no coração da montanha n'uma altitude aproximada
de 800 m. Infelizmente a cultura do cafeeiro causou ali a des-
truição das mattas em quasi todos os pontos mais accessi-
veis ; a vegetação primitiva, entretanto, ainda se encontra
quasi intacta nos corregos, sobretudo no do Riacho do Capim
que varias vezes visitei.
3 -Sertão, ao pé da serra de Baturité, nas visinhanças
cidade do mesmo nome, e a uns cincoenta kilometros ao su-
doeste nos arredores da cidade de Quixadá . E' para lamentar
que a estação já muito adiantada não me permittisse fazer co-
lheitas d'alguma importancia.
A collecção original das plantas enumeradas se acha no
Hervario geral do Museu de Historia natural e Ethnographia
Goeldi ; duplicatas foram remettidas para o Hervario Boissier-
Barbey, onde se fez á determinação das plantas.

MONOCOTYLEDONEÆ

ALISMACEE -ECHINODORUS SUBALATUS Griseb. [ Alisma


subalatum Mart. , Flora bras. ]
142

BUTOMACEA -HYDROCLEIS HUMBOLDTII Endl. (Limno-


charis Humboldtii Rich. )
GRAMINEE - ARISTIDA CAPILLACEA , L.
CHLORIS ORTHONOTON, Doll.
Parece muito visinha da Ch. virgata Sw. ( Bahia ) da qual
se distingue principalmente pelo dorso recto da valvata infe-
rior da flor hermaphrodita.
ERAGROSTIS BARBATA Trin. (forma prostrata).
ERAGROSTIS spec. ex aff. E, BARBATA Trin. com folhas bi-
liformes e espigas com um pedunculo mais ou menos com-
prido.
1CHNANTHUS CANDICANS , Nees.
E ' para mim impossivel de assemelhar com certeza esta
planta a uma das numerosas variedades desta especie. Ella pa-
rece se distinguir de todas um pouco pelos talhos relativamen-
te finos, quasi filiformes.
OLYRA LATIFOLIA, L.
PANICUM CRUS GALLI , L.
Nosso exemplar é notavel pelo facto, que elle têm ligulas
ciliares tão nitidas como o P. spectabile, Nees.
PANICUM LATIFOLIUM, L. "Taboquinha".
PANICUM LEUCOUнEUM, H. B. K.
PANICUM LOLIACEUM, Lam.
PAOICUM NERVOSUM, Lam.
PANICUM SULCATUM. Aubl.
PANICUM VILFOIDES, Trin . (forma pygmea).
PASPALUM CAPILLARE, Lam.
PASPALUM PARVIFLORUM, Rhode var. B humile Nees.
Doll [ Flor . bras. ] disse desta especie : segundo meu pa-
recer não merece O nome de variedades. Conforme a des-
eripção do typo ha, porém, uma differença notavel no aspects.
que é muito singular na variedade. Nossas amostras têm a
forma de pequenos ramalhetes mui regulares, sustentados por
um, dois ou tres talos que se ramificam somente á meia altu-
ra. Uma pianta de Calcutta vista por mim no hervario Bois-
sier não parece differente da nossa variedade.
CYPERACEÆ -CYPERUS POLYSTACHYOS, Rom et Schulth
143

[ Pycreus polystachyos Palis. [in Flor. bras. ] Forma reconhecida


com inflorescencia contrahida .
ECEOCHARIS CAPITATA R. Br. [ Eleogenus capitatus, Nees.
Flor. bras. ]
FIMBRISTYLIS SPATHACEA, Rottb. [ F. glomerata Nees. Flor.
bras . )
FUIRENA UMBELLATA, Rottb .
RHYNCHOSPORA PTEROCARPA, Roem. et Schult. [ Haplostylis
barbata Nees. Flor. bras . )
RHYNCHOSPORA ABERRANS, C.B. Clarke in Monogr. Cyper.
inedit. tab. LXVII, fig, 9-11.
Esta especie particular e propria do Ceará, onde ella foi
encontrada por mim , por Gardner, será descripta mais tarde
por M. Clarke, que teve a bondade de me dar antecipadamen-
te a determinação.
SCLERIA ARUNDINACEA, K. [ Schizolepis latifolia Sw ., Flor.
bras. )
SCLERIA REFLEXA . H. B. K. ( Mastigo-cleria reflexa Mees.
Flor. bras. )
ARACE - SYNOGONIUM AFFINE. Schott.
Nossa planta está bem de accordo com a descripção de
S. affine Schott, somente os peciolos não são duas vezes mais
compridos que o limbo, mas apenas com o comprimento d'a-
quelles do S. Vellozianum Schott.
XYRIDACEE -XYRIS PALLIDA, Mart.
ERIOCAULACEE -PAPALANTHUS LAMARCKII, Kth.
PÆPALANTHUS CEARENSIS Ruhl. ( Das Pflanzenreich, Erio-
caulaceeæ, p . 161 ) .
PHILODICE HOFFMANNSEGGII, Mart.
TNINA FLUVIATILIS , Aubl.
BROMELIACEE -TILLANDSIA USNEOIDES. L. Samam-
baia".
Na região amazonica não encontrei ainda esta planta, em-
bora seja mui frequente ao norte e ao sul desta região.
COMMELINACE - COMMELINA AGRARIA K.
PHOSPHAERIUM PERSICARIOFOLIUM [ DC ] Clarke var-ru-
fipes [Commelinn rufipes Senb. in Flor. bras. )
144

A outra variedade B. scabrata se acha na Guyana e no


Perú cisandino.
PONTEDERICE -EICHHORNIA PANICULATA [ Spreng]
Solms. [ Eichhornía tricolor Senb. Flor. bras. ]
EIGHHORNIA PAUCIFLORA Seuh.
AMARYLLIDACE.E -FOURCROYA GIGANTEA Vent. "Cra-
uatá, Pita".
IRIDACEA-CIPURA PALUDUSA, Aubl.
MUSACEÆ-HELICONIA PENDULA, Wawra "Pacavira gran-
de".
HELICONIA PSITTACORUM, L. f.
CANNACEE -CANNA CEARENSIS, Hub. nov . espec.

Muito alta [ 2-3 m . ] Folhas estreitamente ovaes - lanceola-


das. glabras, esverdiuhadas, com ponta lentamente estreitada
agudas, um pouco inequilateraes. Inflorescencia paniculada
com ramos na base com bractea linear ( 8 em comprida. 9 mim.
larga ] um pouco obtusa. caduca, e tres préfolhas, das quaes
as duas inferiores são 3 cm. compridas, a superior egual á
bractea. As 3 ou 5 flores em cada ramo da panicula são cur-
tamente pediculadas. O tubo da corolla é mais curto do que
o calice, das sepalas são duas obtusas e uma aguda, as pe-
talas erectas, patentes e agudas. As 3 alas lanceoladas, mais
compridas que as petalas. A capsula tuberculada. As sementes
ellipsoides.
CANNA PANICULATA, Ruiz e Pav.
MARANTHACEΠ-CTENANTHE SETOSA, Eichl.
STROMANTHE TONCKAT Eichl. var. latifolia Hub. nov. var .
glabra, com folhas maiores (5.18 cm. , compridas, 3-7 largas)
ovaes ou ovaes-oblongas, distinctamente aguçadas, a inflores-
cencia ou simplesmente racemosa ou pouco paniculada.
ORCHIDACE -NOTYLIA spec .
ONCIDIUM BARBATUM Linddl. Collect. bot. t. 27.

DICOTYLEDONEE RACHICHLAMIDEÆ

PIPERACEE -PIPER HUBERI C. DC . sp . nov. foliis modi-


ce petiolatis ovato-lanceolatis basi leviter inæquilatera acutis
apice longiuscule acuminatis acnmine acuto supra glabris sub-
145

tus ad nervos hirtellis, nervo centrali fere ad 1/2 longitudinis


nervos alternos ascendentes utrinque 4 mittente, petiolo paulio
ultra basin vaginante extus hirtello, pedunculo puberulo petio-
lum æquante, amento per anthesin quam petiolus fere triplo
breviore ex apice basin persus florente, bracteæ breviter oblon-
gæ dorso velutino-hirtellaæ vertice truncato- subpeltato margine
velutino-birtello, filamentis rhachi insertis, antheris ovatis quam
filamenta brevioribus, ovario glabro apice sat longe stilifero.
Frutex altus ramis pendulis. Ramuli minute puberuli ,
amentiferi 2 mm . crassi collenchymate continuo zona interna
libritormi, fasciculis intramedullaribus 1 - seriatis. Limbi in sic-
co membranacei crebre pellucido- punctulati ad 16 1/2 cm. longi
et. ad 6 cm. lati. Petioli circiter 1 cm. longi. Amenta per anthe-
sin fere 5 cm. longa fere 2 mm. crassa. Ovarium basi ad rha-
chin elongatum. Stamina adulta fere 2 mm. longa. Stigmata
oblonga, 2 longitudinalia vel rarius 3.
PIPER CORCOVADENSE [ C. DC. Prodr. v. 16 , I. p. 255] vulgo
"Jaborandi".
PIPER OBUMBRATUM ( C. DC. Prodr. v. 16, I. p . 265 ).
PIPER TUREKCULATUM ( Jacq. ic. rar. v. 2, p. 2, t . 210) .
PIPER GIGANTIFOLIUM ( C. DC . Prodr. v. 16, I , p. 303 ) B
brevipedunculatum var . nov., pedunculo quam petiolus multo
breviore 3 cm. lougo, bractea dorso deuse villosa.
PIPER UMBELLATUM ( L. Sp . p. 43, var. subpeltatum Willd .
Sp . 1. p . 166.
PEPEROMIA CAULIBARBIS ( Miq. Syst. p. 98 ) Jimenesana (C.
DC. in Dur. et Pitt. Primit. fasc. II, p. 284), forma limbis in
sicco tenuibus et pellucidis.
PEPEROMIA ORICULARIS [ C. DC. Prod. v. 16, I, p. 465).
ARTOCARPACEE - POUROUMA ASPERA Tréc. "Lixa".
Essa determinação, que se funda unicamente sobre folhas,
não é absolutamente certa, porém muito provavel pelos caracte
res salientes da forma e da structura das folhas. As folhas são
largamente lobadas, obtusas ou mui curtamente acuminadas, e
a face superior é tão aspera que se usa como lixa.
UROSTIGMA (aff. ) EUOMPHALUM Miq. “Mium ".
URTICACEE -PILEA GUAYANENSIS Wedd. forma foliis
basi subcordatis.
146

URERA BACCIFERA Gaudich. "Ortiga".


LORANTHACEÆ -PHORADENDRON CORIACEUM Mart.
PHORADENDRON CRASSIFOLIUM (Pohl) Eichl.
PHTHIRUSA PYRIFOLIA [ H. B. K. ) Eichl.
Forma de folhas mui grossas (foliis haud tenuiter, sed crasse
coriaceis.
STRUTHANTHUS SYRINGIFOLIUS Mart.
POLYGONACEE -TRIPLARIS BATURIT ENSIS Hub. nov.
esp.
Arbor mediocris vel elatus ramulis haud fistulosis. Folia
subcoriacea ovato-vel oblongo- lanceolata ( 17-20 cm. longa , 5-6
cm . lata, basi in petiolum attenuata, supra glabrescentia , infra
id nervis venisque adpresse pilosa, venis supra vix, infra leviter
prominentibus. Panicula terminalis ampla, fulvo - sericea. Bra-
cte deciduæ late triangulares. Calices fructiferi [ floriferi non
adsunt) 5-5,5 cm . longi, tubo dense piloso, ad 1,5 cm. longo. 1
em. lato, sinubus obtusis introrsum plicatis. lobis exterioribus
fere exacte linearibus 3. 5-4 cm. longis basi 5 mm. latis, trientem
superiorem versus leviter ampliatis apice obtusis, lobis interio-
ribus subulatis tubo medio adnatis eoque longioribus nuculam
obovatam vel fere orbicularem quasi duplo superantibus, faciebus
Luculæ trialatæ (7-8 mm. diametro metientibus) flabellatim
nervosis .
E bastante commum na margem de pequenos riachos na
Serra de Baturité e no pé della ( 170 ).
Esta especie é muito visinha de T. tomentosa Wedd [ Bahia ],
T. Fachau Mart. [ Bahia] e T. Gardneriana Wedd. [ Ceará] as
quaes deve - se talvez reduzir á ordem das sub - especies. A nossa
planta distingue - se de todas estas especies pelos lobulos do ca-
lice mui compridos quasi lineares e pela fruta arrondada, que
se contrahe bruscamente no estylete.
AMARANTACEÆ AMARANTUS SPINOSUS L.
Os nossos exemplares têm quasi todas as flores agrupadas
em novellos bem densos no sovaco das folhas.
CHAMISSOA ALTISSIMA H. B. K.
GOMPHRENA DEMISSA Mart. var. [ ? ] " Quebra panella”.
O unico exemplar colhido por mim tem folhas menores do
que a planta de Martius [ 12 mm. sobre 4 mm. em lugar de 20
mm. sobre 10 mm . ]
147

GOMPHRENA GARDNERI Moq. var. Cearensis Hub. nov. var .


differt a typo indumento potius villoso quam hirtello et fila-
mentorum lobis lateralibus hand angustissime subulatis, sed
ligulatis.
IRESINE POLYMORPHA Mart.
TELANTEKA DENTATA Moq.
TELANTHERA POLYGONOIDES var . erecta Moq.
Muito frequentemente nas catingas do sertão e nos lugares
abertos [sobretudo nos cafésaes ] da Serra de Baturiié [ 149] .
PHYTOLACCACEE - MOHLANA NEMORALIS Mart.
NYMPHÆACEÆ NYMPHÆA AMAZONUM var. [ ?]
Sem annel cabelludo na ponta do peciolo e com nervos mui
pouco visiveis [ como na N. tenuinervia Casp. ], mas os lobulos da
folha se cobrem.
ANONACE -UVARIA BRASILIENSIS Vell.
LAURACEE -CASSYTHA AMERICANA Nees var. b
puberula Meissn. "Cipó de chumbo".
CAPPARIDACEE - CLEOME SPINOSA L.
CRATEVA TAPIA L. "Trapiá".

A nossa planta distingue-se do typo um pouco pelas folhas


mais largas .
PODOSTEMACEE -- TRISTICHA HYPNOIDES
Spreng.
DROSERACEE - DROSERA SESSILIFOLIA St. Hil.
LEGUMINOSEE MIMOSOIDEE -INGA IN-
GOIDES Will. "Ingá".
Como eu não vi as frutas, a determinação não é definitiva;
varias outras especies do § Euinga tendo flores semelhantes [ I.
bahiensis Benth., I. spuria H. B. K. I. vera, etc ].
INGA LEPTANTA Benth.
INGA MARGINATA Willd . " Ingahy" .
MIMOSA MALACOCENTRA Mart. "Unha de gato".
MIMOSA NIGRA Hub. nov. spec. ( subgen. Habbasia, ser.
Leptostachya) "Jurema preta".
148

Frutey glaber bimetralis vel trimetraiis [ 1 ], Ramuli graci-


les cortice nigro obtecti apice leviter glutinosi, aculeis sparsis
ad 5 mm. longis paulo sursum incurvis. Folia 5-8 cm. longa,
pinnis 4-7 jugis . Foliola multijuga parva linearia subsessilia,
apice obtusa vel breviter acutata basi oblique truncata, in
sicco nigrescentia, glaberrima. Spice axillares subsessiles, den-
se cylindraceæ. Flores albi , glabri, alabastris obovatis. Legu-
men stipitatum 4 cm. longum glabrum.
Esta especie se aproxima um tanto á M. Cabrera Karst .
[Colombia], differe entretanto pela sua pubescencia e suas
maiores dimensões. M. acutistipula Bth. [ Brasil ] distingue- se da
nossa especie pelos maiores foliolos e seus ramos mais compri-
dos que mostram só cá e lá um espinho .
MIMOSA SOMNIANS H. B. K.
MIMOSA STUDARTIANA Hub. nov. spec. [ 2 ] [ Subgen. Eumi-
mosa, Ser. Pudica] Herba perennis prostrava radice palari in-
crassata. Caules elongati usque ad 2 dm. longi graciles pilis
longis patentibus hirsuti vel apicem versus villosi, basi glabres-
centes, aculeis infrastipt laribus singulis recurvis debilibus. Sti-
pula lineari-lanceolatæ longi ciliatæ. Folia petiolo gracili paten-
ter piloso vulgo 1,5 cm. longo instructa pinnis omnibus I -jugis
1,5-3, sæpissime 2 cm. longis. Foliola 6-8 juga oblonga (6-8
mm. longa, 2,5 mm. lata ] asymetrica , basi valde inæquilateralia
apice obtusiuscula, supra glabrescentia, subtus margineque pilis
adpressis substrigosa, haud marginara. Pedunculi folia superau-
tes gracilis pilis patentibus hirsuti. Capitula globosi absque
staminibus 7 mm . diametro æquantes. Bractea spathulato -lan-
ceolatæ corolla breviores dimidio superiore setoso - ciliataæ. Flores
rosei callee paleaceo ultra medium 4-iobo, lobis fimbriatis Co-
rolla 4- mera. Legumen 2-4 articulatum 1-2 cm. longum, 5 mm.
latum, apice breviter acuminatum fere planum breviter adpres-
se setosum.

[1 ] No sertão de Cachoeira e Riacho do Sangue encontrei


exemplares de 5 até 7 metros de altura.- (
) TRADUCTOR .
[2 ] E' com prazer que dedico esta bella especie ao Snr . Dr.
Guilherme Barão de Studart, medico e historiador distinctissimo
em Fortaleza, que teve a bondade de me servir como guia desde
o principio de minha morada nessa cidade.
149

Esta especie bem singular, lembrando no aspecto bastan-


temente a serie das Hirsuta e especialmente M. barbigera Benth. ,
não pode ser collocada senão entre a serie das Pudica por causa
dos espinhos, que faltam á serie das Hirsuta. Trata-se aqui sera
duvida duma fórma intermedia semelhante aquella que M. ner-
vosa. Bong. representa entre as Pudica e as Pedunculosa.
PIPTADENIA BIUNCIFERA Benth . "Surucucú”.
LEGUMINOSE CÆSALPINIOIDEE- BAUHININIA RU-
BEGINOSA Bong.
CÆSALPINIA FERREA Mart. var. Cearensis Hub. nov. var .
foliolis typo majoribus [ 3-4 cm. longis ] et paucioribus [ 8-10 in
pinna ] “Jucá”.
CASSIA CHRYSOCARPA Desv.
CASSIA HOFFMANNSEGGU Mart. var. Gardneriana Benth.
Esta especie distingue -se mui nitidamente do typo pelos
foliolos symetricos e glaucos.
CASSIA QUINQUEANGULATA Rich.
CASSIA TORA L.
Forma de foliolos pequenos e quasi orbiculares. Bastante
commum no districto da Capital.
CASSIA HISPIDULA Vahl.
PARKINSONIA ACULEATA L.
KRAMERIA TOMENTOSA St. Hil. var. Elliptica Hub. nov .
var.: folhas de forma elliptica mais exacta, mais largas e mais
obtusas do que na figura da Flor. bras. e em todas as amostras
por mim vistas .
LEGUMINOSE PAPILIONATE - ABRUS PRECATO-
RIUS L.
AESCHYNOMENE VISCIDULA Mich.
CENTROSEMA BRASILIANUM Benth.
CENTROSEMA PASCUORUM Mart. var. prostratum Hub. nov .
Caules patenter pilosæ prosttratæ haud volubiles.
CLITORIA CEARENSIS Hub. nov . spec.
Caulis basi lignescenti ascendens, 15-30 cm. altus, parce
ramosus, superne ferrugineo- pilosus vei villosus. Stipulæ ova-
taæ acuminatæ [ 4-5 mm. longæ ] striatæ glabræ, margine cili-
atæ. Folia 5-10 cm, longa, 3-foliolata, petiolo ferrugineo - piloso
a 3 cm. longo. Foliola ovata vel elliptica ( 3-6 cm . longa, 1,5-3,5
em. lata) apice obtusa vel rarius acutiuscula sæpius tenuiter
muerunulata supra nitidula fuscescentia, subtus canescentia
150

nervis prominulis ochraceis. Pedunculi biflori, petiolo subæqui-


longi vel sæpius dimidio brevioribus, bracteclis ovato-lanceo-
latis acuminatis (3-4 mm. longis). Calyx 14-15 mm. longus par-
ce ferrugineo-pilosus, lobis ovato-triangularibis acutissimmis .
Legumen [ 3,5 cm . longum. 9 mm. latum ] subfalcatum, longuis
[7 mm. ] cuspidatum, glabrum valvulis convexis costatis .
Esta planta aproxima-se pela forma e dimensões das fo-
lhas á C. glycinoides DC., da qual se distingue principalmente
pela sua forma erguida e pelos calices menores. Provavelmente
constitue uma especie intermedia entre a forma voluvel C. gly-
cinoides e as formas completamente erguidas, notadamente C.
guyanensis [ Aubl . ] Benth. e C. cajanifolia Bth. as quaes entre-
tanto tem as folhas mais compridas e mais estreitas. Infelizmen-
te as nossas amostras não tem mais flôres, as quaes somente
permittiriam fixar definitivamente o lugar que esta especie deve
occupar no genero.
CRATYLIA FLORIBUNDA Benth.
CRATYLIA MOLLIS Mart. (?)
A determinação não é absolutamente certa, por terem os
exemplares as flores em máo estado.
DIOCLECEA LASIOCARPA Mart.
ERYTHRINA VELUTINA Willd . " Malungú".
Distingue-se por flôres menores dos exemplares da E. re-
lutina de Cuba, que eu vi.
INDIGOFERA MICROCARPA Des.
PLATYMISCIUM BLANCHETI Benth. ( ?)
O unico exemplar colleccionado por mim é sem frutas. As
flores quadram bem com aquellas do P. Blancheti, mas os folio-
los são somente 5 em lugar de 7 e assemelham-se mais aos de
P. floribundum Vog. var. latifolium.
SEMMERINGIA SEMPERFLORENS Mart.
STENOLOBIUM CERULEUM Benth.
STYLOSANTHES ANGUSTIFOLIA Vog.
STYLOSANTHES CAPITATA Vog.
STYLOSANTHES GRACILIS H. H. K. [ S. guyanensis Sw. var.
B. gracilis Vog.
STYLOSANTHES HUMILIS H. B. K.
STYLOSANTHES SCABRA Vog.
STYLOSANTHES VISCOSA Sw.
TEPHROSIA CINEREA Pers. "Anil bravo”.
151

ZORNIA CEARENSIS Hub. nov. spec.


Caulis prostrati e basi sublignosa radiatim expansi [ 10-15
cm. longi ] linea pilosa notati vel demum glabrescentes.
Folia 4 -foliolata petiolata (petiola parce piloso 1 cm . longo].
foliolis oblongo -lanceolatis [ 7-15 mm. longis] apice acutiuscula
vel breviter cuspidatis, raro obtusiusculis, basi sensim contra-
ctis parceque pilosis. Spice satis densæ [ 1,5-2 cm. longæ] bra-
cteis subim bricatis. Bracto late ovatæ 11 mm. longæ, 4 mm .
late ] apice obtusæ vel sæpius acutiusculæ, basi oblique cordata,
reticulato-venoæ et in areolis punctatæ, margine ciliatæ.
Legumen 3-4 articulatum, retrorsum scabrum, bracteam
paulo superans.
FILICES ( det. H. Christ. 1898).
ALSOFHILA ARMATA Prsl.
ADIANTUM TENERUM Sw.
ADIANTUM MACROPHYLLUM SW.
ADIANTUM TETRAPHYLLUM Sw.
PTERIS ( Doryopteris ) PEDATA L. var . Huberi n . var.
Typo multo major, stipite 20 cm. longo fronde 15 cm . lon-
ga 25 cm. lata, latissime deltoidea, pinnato-hastata, lobis haud
ad costam principalem incisis, lobis simplicibus elongato- acutis,
infimis brevibus deorsum versis, secundis longissimis patentibus,
tertiis et quartis iterum diminutis, terminale elongato
Muito particular pelos seus lobulos simples, não entalha-
dos. Poderia se dizer uma combinação do P. sagittifolia Radd .
ou mais ainda do P. hastata Raddi com P. pedata L.
Talvez uma boa especie.
PTERIS AQUILINA L. v . caudata L.
BLECHNUM OCCIDENTALE L
ASPLENIUM SERRATUM L.
ASPLENIUM OBTUSIFOLIUM L.
ASPLENIUM AURICULATUM Sw.
ASPLENIUM FORMOSUM Wild.
DIPLAZIUM SHEPHERDI ( Spreng. ).
ASPIDIUM MACROPHYLLUM SW.
Exemplar com estipite e rachis bruno polido.
ASPIDIUM CARIPENSE Hoock.
PHEGOPTERIS CRENATA Sw.
152

POLYPODIUM LYCOPODIOIDES Sw.


POLYPODIUM VACCINIFOLIUM L, Fisch.
POLYPODIUM LANCEOLATUM L. v. elongatum (Gymnogramme
elongata Hook. ).
POLYPODIUM GYROFLEXUM n. sp. [ 120 ].
A P. lanceolato differt rhizomate brevi, vix repente, radices
multos valde tomentosos prehensibiles emittente, foliis nudis
caespitoso -fasciculatis numeris subsessilibus succulentis coria-
ceis 12 cm . longis 1 1/2 ad 2 cm. latis versus basin decurrenti-
bus acuminatis, costa nitida valde prominente, folio plicato, in-
curvato-gyroflexo grosse crenato-repando, soris magnis margi-
nalibus rotundatis brunneis, receptaculo versus paginem infe-
riorem immerso foveam formante.
Mais largo que P. lanceolatum, rhizoma como de um An-
trophyum, frondes numerosas, fasciculadas, quasi sessis, absolu-
tamente destituidas das escamas peltadas de P. lanceolatum, for-
temente crenuladas carnosas, curvadas em semi-circulo, muito
agudas ; soros marginaes Sub- especie de P. lanceolatum.
POLYPODIUM ELASTICUM Rich.
POLYPODIUM AUREUM L.
POLYPODIUM SORORIUM H. B. K.
ACROSTICHUM SORBIFOLIUM L. , var. Japurense ( Mart. ).
GLEICHENIA DICHOLOMA Willd.
ANCIMIA PHYLLITIDIS SW.
LYGODIUM VENUSTUM Sw.
LYCOPODIUM CERNUUM L.
SELAGINELLA ERYTHROPUS Spreng.
Os exemplares d'esta planta são em parte já passados e em
pilha, em parte muito novos, de 5 cm. de comprimento, a fron-
de não sendo completamente desenvolvida formando um pe-
queno triangulo com lobulos obtusos, cujas pequenas folhas
ainda são imbricadas em massa compacta de côr encarnada
muito viva na visinhança do estipilete.

Resumindo o que aqui fica dito sob a forma summaria


duma nomenclatura, pode-se dizer que as principaes plantas do
Ceará são :
153

PLANTAS MEDICINAES (1 )

Acafrão - Crocus sativus, L.


Agrião, vulgarmente do Pará, Spilanthes olerocia.
Aguarapé ou golfão - Nimphéa .
Alcaçuz , nativo - Periandra dulcis.
Alecrim do campo- Lantana microphila, Mart.
Alface -Lactuca sativa, L.
Alfavaca do campo - Ocinium incanescens, Mart.
Algodoeiro- Gossypium vitifolium. L.
Almiscar.
Amaniçobas.
Ambayba, ambauba, ymbaúba, arvore da preguiça - Cecro-
pia palmata, Nilld.
Ananazeiro- Amassa sativa, Lindl.
Angelim- Andira anthelmintica, Benth.
Anil-Indigofera.
Anil assú ou Tassuana- Eupatorium.
Anil trepador - Cissus tinctoria, Mart.
Altéa-Althea officinalis, L.
Angico -Acacia angico, Mart. (2 )
Araruta-Maranta indica ou arundinacia .
Araticú do matto - Rollinea silvatica , Mart.
Ariticú do rio -Annona spinescens, Mart.
Aroeira-Ibatan astronium.
Arrebenta-boi—Ranivolfiæ.
Arroz - Orisa sativa, L.
Arruda--Ruta graveolens, L.
Andá-assú—Andá brasilienses. (3)
Acataia ou pimenta dagua.
Acatiá ou herva de bicho -Polygossum antihemorroidæ, Mart
Avenca -Adiantum.

(1 ) Esta nomenclatura é extrahida do Ensaio estat. de meu


pai Senador Pompeu.
(2) Angico e Aroeira--arvores que abundam em todo o ser-
tão e junto as serras.
(3) Anda-assu-drastico semelhante ao oleo de croton .
E' conhecido com as denominações de purga de gentio. purga
dos paulistas, fructa da arara.
154

Angelica brava- Guettarda angelica, Mart .


Ascisca -Herenlia [ especie de]
Amendoa brava ou merendiba (caroços venenosos).
Angelicó-Aristolochia (especie de )
Baraúna--Melanoxcylon baraúna , Schott.
Balsamo -Myrospermum erythro xylum, F. All.
Barbatimão- Striphnodendron barbatimão, Mart .
Barba de camarão, especie de Strychnos.
Batiputá - esp. de Gromphia.
Batata de purga -Ipomea operculata, Mart.
Bonina, Boas-noites, Maravilhas- Marabilis dichotoma, L
Baunilha- Vanilla aromatica . Siv.
Batata da costa- Ipoméa moritima, R. Br.
Cabacinho -Momordica bucha, S. Paio.
Cafeeiro Coffea arabica, L.
Camará branco e vermelho- Lantana involucrata Lant ca-
mará, L.
Canna de assucar-Sacharum officinarum, L.
Cannafistula - Cassia fistula, L.
Capeba ou periparoba - Piper umbellatum, L.
Cajueiro-Anacardium occidentale. L.
Cajueiro bravo- Cusatella jambaiba.
Carrapicho- Triumpheta lapulla, Vill.
Caninana (sipó ) Chiococa racemosa, Jacq.
Capeba .
Cardo Santo - Mexirona argemone mexicon.
Carɔba- Cybistax anti syphilitica, Mart.
Caraúba ou Carayba
Canudo de lagoa-- Calonyction .
Cateiro.
Cumarú-Dipterix odorata, W.
Carnahúba.
Colombi de lagôa —Shrankia.
Catingueira, Oiticica -Pleragina umbrosissima, Aw.
Cravos (diversos ).
Chanana -Turnesa.
Cebola sensem— -Allium
, cepa.
Cebola brava -genero amaryllis.
Cedra- citrus-medica.
Coerana ou Canema - Cestrum nocturnam.
155

Coité-Crescentia.
Contraherva-Dontenia cordifolia, L.
Cabaceiro- amargo.
Copahyba- Copaifera officinalis, L.
Cordão de frade—Leonotis nepetafolia, Bonth.
Corindiba- Sponia micrantha.
Grista de gallo- Triaridium elongatum, Lehm.
Cravo de defuntos - Tagetes glandulifera. Schran.
Catolé, cocos.
Colés- Convolvulus.
Cardeiro, corôa de frade, chiqui-chiqui, mardacarú, palma-
toria -Cactus.
Douradinha dos campos- Waltheria douradinha, S. Hil.
Endro-Anethum graveolens, L.
Fedegoso- Cassia occidentalis, L,
Fumo- Nicotina tabacum, L.
Feijão guandú - Cajanus flarus, D. C.
Favella.
Gameleira-Ficus doliaria , Mart.
Gengibre-Zingiber officinalis, Roab.
Genipapeiro- Genipa brrailiensis, Mart.
Gerbão- Verbena jamaicensis, L.
Gergilim bravo- Crotalariae, Ap.
Giquirity Abrens-precatoriens.
Gitirana-- Convulvuli varii.
Gitahy ou jatahy, jutahy, jatubá Ittn. -Illymena stilbo
carpa, Hayne .
Gitó-Guarca purgans, S. Ibitt.
Goiabeira-Psidium guayara, Rad.
Gravatá ou coroatá- Bilbergia tinctoria, Mart.
Grumixama-Eugenia brasiliensis, La m.
Guajerú—Chrisobolanus icaco, L.
Guandú-- Cajanus flavus, D. C.
Gramma da praia- Stenotaphrum glabrum, Trin.
Guardião- Bryoniæ, esp.
Herva-babosa -Aloe vulgaris, Lin.
Herva cidreira - Melissa Cispia.
Herva de cobra —Mikaniu opifera, Mart.
Herva de lanceta - Solidogo vulneria, Mart .
Herva moura- Solanium_nigram, L.
156

Herva de passarinho - Loranthus.


Herva de rato - Policurea nicotiane folia, Cham .
Herva lombrigueira - Spigeha .
Herva de S. Maria ou Bamborral -Chenopodium ambrosioi-
des, L.
Herva de chumbo ou sipó de chumbo - Cuscuta, Lusit,
Herva pimenta- Menta piperita, L.
Hortela do matto - Peltodon radicans, Bent.
Jasaseira ou cajaseira -Spondia venculosa, Mart.
Imbira- Xilopia brasiliensis, Mart.
Imburana -Bursera leptophlaveos, Mart.
Ipecacuanha preta ou poaia - Cephaclis ipecacuanha.
Ipecacuanha branca-Ionidium, ipecae.
Jaboticabeira- Eugenia cauliflora, D. C.
Jacarandá - diversos.
Jaracatiá- Carica dodecaphyla, Vill.
Jasmins.
Jatobá, Jutahy, Jetay, Jetay-erva -Hymonca stilbocarpea.
Jaborandy- Ottonia anisum, Spreng.
Junça.
Jurema Acacia jurema, Mart.
Joaseiro- Jisiphus joaseiro, Mart.
Jurubeba ― Solanum jubeba,
Jucá.
Jeremataia Vitex gardneriamy.
Icó- Colicodendron icó.
Larangeira- Citrus aurentius, Ress.
Limão- Citrus limonum- Ress.
Lingua de vacca -Elephantopus Marti.
Lirio.
Loco -Plumbazo scandens, L.
Losna- Arthemisia absinthum, L.
Macaxeira ou aipim-Manihot apy.
Macella, esp. de aphanostephus.
Malva-Malva silvestres, L.
Malvarisco ou guascinea - Urena lobata, Cav.
Malmequer.
Malmeleiro.
Mamoeiro -Carica papaya. L.
157
&

Mamona-Ricimus communis, L.
Mandioca -Jatropha manihot.
Mangabeira brava- Hancornia pubescens, Mart.
Mangerioba - Cassia occidentalis.
Mangerona do campo - Glechon spathulatus.
Maniçoba -Jatropha glasiovii.
Matapasto -Cassia sericea, Sw.
Massaranduba.
Mentrasto -Ageratum conyzoides, L.
Milho -Zea mais.
Milhomens ou jarrinha -Aristotochia trilolabata, Will.
Milhome - Dalbergia ( arvore)
Mimosa , sensitiva .
Murici-Byrsonima verbascifolia, D. C.
Mulungú--Erythrina.
Mutambeira -Guazuma ulmifolia. L.
Mussambê- Cleorne.
Melancia da praia.
Melão de S. Caetano - Momordica cherantia, L.
Malicia ou sensitiva .
Mucunam-Dioclea.
Mufumbo --Combretum, tetraceva.
Manacá-Franciscea uniflora.
Mella pinto ou herva tostão -Boerharia hirsuta.
Oiti-Mogilia grandiflora, M.
Pau- ferro - Cassia.
Páo de lacre ou caapiá-- Visma guianensis
Pereiro -Aspedosperma.
Páo marfim.
Pé de gallinha.
Pimenta d'agua-Potignum acre.
Pinheiro de purga ou pinhão bravo -Jathropha curcas, L.
Pitanga Eugenia uniflora, L.
Purga de quatro - patacas - Allamanda violacea.
Parietaria.
Paratado -- Gomphrena officinalis.
Peroba- Tecoma.
Páo-d'arco - Pecoma ipé, Mart.
Papo de perú ―Aristolochia orbicolata, Vill.
Pão de mocó - Machoriune.
158

Potó.
Páo Branco- Cordia.
Quina-Contarea.
Retirante - Acanthospermum.
Rosas, diversas.
Sipó de chumbo - Cusenta ombeltata, Hum.
Sipó de fogo ou de vaqueiro.
Sipó de tayná - Trianosperma taypuá, Mart.
Sipó timbó -Paulinia pinata, L.
Sipó-peringa.
Soldanella.
Sambabaia ou samambaia-Polypodium
Siceo.
Saúma.
Stramonio ou figueira do inferno —Datura estramonium —L .
Salva- Salca officinalis.
Tamarindo - Tamarindus indica - L.
Tançagem--Plantago major, L.
Trapia-- Crataera tapia. L.
Tatajuba- Maclusa tinctoria.
Trevo aquatico -Menyanthes trifoliata. L.
Teajú ou sipó de leite.
Tejuassú ou sipó de tijuassú- Garco spicæflora , Juss.
Tinhorão - Caladium bicolor, Vant.
Tingui, diversos .
Tipi-Petiveria tetandra, Gom.
Tucum--Astrocaryun vulgare, Mart.
Trapiá.
Tuy sipó (antidoto de veneno da cobra).
Tacora.
Umary- Geoffrea spinosa , L.
Urtiga - urtica caravellana.
Urucú- Bira orellana, L.
Vassoura -- Sida carpinifolia, L.
Velame do campo - Croton campestris, S. Hil.
Plantas medicinaes. —Seguindo a classificação do Dr. Freire
Allemão Sobrinho, as plantas desta natureza que se encontram
no Ceará são :
1º Ordem dos tetanicos -barbas de camarão [ cipó ].
159

2º Ordem dos convulsivos.—Amendoa brava, Camurú. Bal-


samo, Jeriquiti, Coronha cris, Angico, Barbatimão, Sensitiva,
Mulungú, Ameixa brava.
3º Ordem dos delirantes narcoticos . Cardo Santo , Suê on
herva moura, Zabumba ou Trombeta e Manacá.
4º Ordem dos narcoticos nauseantes.- Herva do rato, Canina-
na, Parahyba, Cajarana, Angelim, Cajueiro, Jaborandi, Pimen-
ta-longa, Maracujá, Pitomba. Cinamomo, Herva lombrigueira,
Espirradeira, Tibi.
5º Ordem dos anodynos.-- Suê, Camapú. Coirana, Pango.
Catuaba, Jurema, Manacá, Tingu- capeta, Cascaveleira , Barbas
co, Anil, Herva da costa, Canudo de lagoas.
Co Ordem dos estimulantes. -Columba brava, Pimenta - longa,
Canella, Cravo do matto, Gengibre, Pimenta, Oyapona, Capim-
Santo, Jaborandi, Alfavaca de cobras .
70 Ordem dos anti- escorbuticos. -Agrião do Pará, Picão, Mus-
tarda, Limãosinho, Laranginha brava. Braúna, Aroeira, Mas-
truz, Marmeleiro, Grelos de imbú, Azedinha.
S Ordem dos carminativos.- Cardomano, Imbiriba , Pimen-
ta-longa.
9 Estimulantes aphrodisiacos. - Angico, Catuaba, Raiz de
cipó, Grelos de Mangabeira, folhas de Abacate.
10. Ordem dos emmenagogos. - Raizes de cipo de escada, cas-
ca e folha de Umariseira, casca de páu de piranhas, casca e
brotes de Atta-brava, rebentes de Cajaseira, raiz de Mandacarú,
Crávo de urubús, Contra-herva, Milhôme.
11. Ordem dos estimulantes necros - thenicos. -Jarrinha, Milho-
me, Papo de perú, Contra-herva, Marcella , Mentrasto, Velame
de cheiro, Alfazema brava, Cedrilha, Herva cidreira , Cravo de
urubús, Betonica, Chá de taboleiro, Marcella do Sertão, Coro-
nha criz, Angico, Espinheiros, Estaracoeira, Cumarú, Balsamo,
Quitoso e Camará.
12. Ordem dos diaphoreticos e sudorificos. - Lingua de vacca,
Mentrasto, Jaborandi , Tipi, Alfavaca de cobras, Mangerioba,
Pau- d'arco roxo, Caraúba, Larauginha brava .
13. Diaphoreticos nevros- themicos . -Retirante. Páu cardoso,
Açapeixe, raizes de Carnahúba, de Japecanga, de Jerubeba,
160

Carobinha, Caroba, Sucupira, Cravinho bravo, Mutamba, Sa-


bonete de cipó.
14. Ordem dos espectorantes. —Alcaçus do Brazil, raiz de Ji-
riquiti, de Vassourinha, Avenca .
15. Peitoraes calmantes. - Flores de Angelica brava, de Ca-
mará branco, cabeças de Perpetua, raiz de Mangerioba, flores
de Mororó, de Catingueira, pontas de Toré.
16. Antihemoptoicos. - Flores de Quinaquina, cascas de páu-
cardoso, polpa de Coité, flores de Bredo de estudante.
17. Incisivos. - Capim Santo, Marmeleiro, Lingua de Vacca,
Cebola. Raiz de Corongo, Poaya branca, Leite de Pinhão- bra-
vo, Mossambê.
18. Ordem dos aperientes. - Manacá, Herva de rato, Canina-
na, Ipepacunha, Carnaúba- amarella, verde . Joaseiro, Capeba,
Pariparoba, Pegapinto, Juripeba, Orelha de Onça, Açapeixe,
Carnaúba. Japecanga, Chá de Cayenna, Gergelim bravo, Ma-
tafome, Bordão de Velho . Camará branco, Pimenta d'agua,
Feijão bravo, Sambaiba, Trapiá.
19. Aperiente anti - blenorrhagico. - Mossambé, Gergelim bra-
vo, Canna de macacos, Marianinha , Pegapintos, Pimenta longa ,
Imbiriba, Copamo, resina de Mangueira.
20. Diureticos.--Raizes de Taboca, de Gramma, talos de
Marianinha.
21. Diureticos desobstruentes. - Raiz de Anil , de Gergelim
bravo, de Urucú, de Juripeba, Herva de camapû, Bordão de
Velho, Cipó de fogo , Ruti, Urtiga branca.
22. Diureticos contra estimulantes. -Carambas, Capeba milho .
me, Açapeixe, Japecanga, Caninana, Herva de rato, Carnahuba.
23. Diureticos incisivos. -Cebola brava, Jaborandi, Mossam-
bê, Mastruz.
24. Diureticos tonicos. - Raiz de Paratudo , de Páu-pratudo,
Pau d'arco , Orelha de Onça.
25. Ordem dos emeticos. - Cebola brava, Ipepacunha, Coron-
go, Joá, Pereiro, Herva de rato, raiz de Cobra, Mané-molle,
Sensitiva.
26. Ordem dos purgantes. —Cipó, Cabacinha, Purga de leite,
Brandão, Gameleira, Janaguba, Limãosinho, Velame, Batata,
Bonina, Caraúba, Gito, Tajuja, Cardo Santo, Guardião, Lacre.
161

27. Tonicos. -Juripeba, Camapú, Jarrinha, Capeba, Perei-


ro, Paraiba. Cajarana, Nabateno, Catuaba, Jucá, Angelica, Qui-
naquina, Mangabinha. Bordão de Velho.
28. Adstringentes. -Augico, Barbatimão, Guagerú, Carrapi-
chos, Murici, Puçá, Mangue. Oiti, Sucupira , Pau cardoso.
PLANTAS DE CONSTRUCÇÃO . - Aroeira. Coração de Negro,
Páu-ferro, Jatubá, Páu- d'arco, Accende - candeia , Cumarú, Ara-
piraca, Pereiros, Páu- branco, Páu- d'arco, Angelim, Canella pre-
ta, Cedro, Condurú, Massaranduba, Peroba-branca, Sapucaia,
Sucupira, Tatajuba, Piroá, Barbatimão, Jatahy, Louro da Serra,
Louro do sertão, Páu-branco, Sipaúba, Goiabinha, Merindiba ,
Curiguri, Cajueiro bravo. Carnahuba, Braúna, Manapuçá, Ra-
bugem, Pequiá, Joá, Molungú, Timbaúba, Mangue, Sapateiro,
Sabonete, Peroba, Inharé, Sabiá. Canafistula, Genipapeiro, Ga-
meleira, Oiti, Jucá, Umari.
PALMIFERAS. -Côco da praia, Catolé, Tucun, Burity. Ma-
caluba, Pate, Anajá.
PLANTAS OU ARVORES DE MARCENARIA. - Gonçalo Alves, Ra-
bugem, Violeta. Jacarandá, Páu branco, Cedro, Pau-santo,
Louros, Merindibas, Amarello, Cumarú, Pereiro, Arapiraca ,
Angico, Condurú, Coração de negro, Jatahy, Jatubá, Carnahú-
ba, Tatajuba, Marfim, Jurema-branca, Pau d'oleo, Botingas,
Bilros, Gitó, Amarellinha da Serra, Umari,
PLANTAS TINCTURARIAS. - Catingueira, Pau-branco, Jucá,
Pau-d'arco, Rabugem, Piuba, Catinga-branca, Tapiranga, Ta-
tajuba, Anil, Coreana, Gengibre amarello, Murici, Jitahy, Uru-
cú, Marmeleiro, Pereiro, Jucá, Coronha, Sapiranga, Tassuna,
Anil trepador, Jangadeira, Catinga brava.
PLANTAS OLEIFERAS, RESINIFERAS E TEREBENTHINIFERAS.-
Copaúba, Balsamo , Jatubá . Aroeira , Emburana, Cumarú, Alma-
cegas. Tinguacibas. Lacre , Camará de leite, Angico, Cajueiro,
Sabiá, Pajeú, Andiroba, Cocos de todas as qualidades, Batiputá,
Gameleira, Oiticica, Arvore de cebo, Maniçoba.
PLANTAS FIBROSAS. - Sabiá, Friga, Mororó. Capabode, Pa-
cote, Inbyratanha, Imbira-branca, Imbiribas, Malvas de imbiras,
Pinho bravo, Carnaúba, Puiba, Gargaúba, Gravatá ou Coroatá,
Carúa, Palmeiras diversas, Macambira, Cipó de escada, Barri-
guda.
162

PLANTAS TUBERCULOSAS. —Aipim, Mandioca e suas espe-


cies , Batatas doces, Inhames, Cará, Cascos, Casquinho, Amario
branco e rôxo, Bilros, Colé, Ananê, Naprê, Cajazeira, Imbirata-
nha, Umbú, Mucuna, Maniçoba , Pau de mocó, Chique - chique,
Macambiras, Carnaúba, Palmeiras, Herva da costa, Mandioca
brava, Meringongo.
PLANTAS FLORIFERAS. -Jasmín , Roseiras, Rosedás, etc.
PLANTAS FRUCTIFERAS SILVESTRES . -Ateira (anona , Man-
gaba, (hancornia). Piqui [caryocar], Joá [ Zizíphus joaseiro], Car-
naúba [ corypha cerifera], Umari, Marmeleiro do Araripe e Ibi-
apaba (diospyri), Saputi [ achras], Puçá ( mourenice), Maracujá
de differentes especies [ passiflora ] . Massaranduba [mimusopi],
Ubaia, Bacopari (clusiacea), Sipoatas [ anthodi], Pitomba, Cajú,
Cajuhi, Maria preta [diospyrí], Guabiraba, Jaboticaba, Amorei-
ra do matto [ brosymo ] , Goiaba [ psidium]. Inharé [brosymi], Jato-
bá (hymenea), Araticus, Ananaz, Ameixas, Araçás, Bacamichá,
Burity, Cajazeira, Camapú, Camboim, Urubú, Jaramataia, Gua-
gerú, Melancia da praia, Camutá, Gravatá, Catolé, Umbú, Ge-
nipapeiro, Gerequitá, Murici, Mapirunga, Murta, Ingá, Maca-
hiba, Oiti, Pimenta, Pitomba, Cajarana, Trapiá, Manapuçá,
Mamãe.

Plantas fructiferas exoticas cultivadas. - Amoreira, Abacate,


Aboboras, Ananaz, Araçá, Goiaba . Abacaxi, Coqueiro, Bananei-
ra. Larangeira, Limeira, Cidreira. Limoeiro, Mamoeiro, Me-
lancia, Meloeiro, Jaqueira, Mangueira, Tamarineira, Casta-
nheiras, Cacaueiro, Condeceira, Figueira, Jambeiro, Mudubim.

Plantas alimenticias. —Mandióca, Arrcz. Milho, Feijão, Mo-


dubim, Canna, Café.
Plantas industriaes. -Algodeiro, Canna de assucar, Cafeei-
ro, Momona, Milho, Feijão, Mandióca, Arroz.
Plantasforrageiras. - Mororó, Feijão -bravo, Canafistula, Pau-
branco, Sabiá, Umari, Joá, Jucá, Chique-chique, Macambira,
Fava de rama, Feijão de pomba, Melasso, Hervanço, Junco,
Bamborral. Capins e Carnaúba.
Plantas saponiferas. -Andiroba, Joaseiro, Sabonete, Timba-
úba, Sabão de soldado , Sabonete de cipó, Limãosinho de pur-
ga, Pitombeira. Tingué capeta.
163

FAUNA

MAMIFEROS. -Boi, cavallo, asno, ovelha, cabra, cão, gato,


porco, taes foram os introduzidos pelos europeus. Os indigenas,
são : anta (já rara ) [ 1 ] capivara [ 2] cutia, cuem, gato montez .
guará, guaxinin, maritacaca, (3) guariba, macaco, mocó, onça [ 4]
ouriço, caitatú, queixada, (5 ] paca, preá, preguiça, raposa, po-

[ 1 ] Diz o Senador Pompeo- Ens . Est. pag. 211 que an-


tigamente encontrava-se este animal nas serras de Marangua-
pe até Baturité e nas praias do Mondahú, onde tambem havia
a capivara. A anta [ tapyra dos indigenas ] é o maior qua-
drupede brasilico. E' do tamanho de um bizerro e muito seme-
lhante ao poreo na configuração do corpo. O pello é curto :
encontram -se de todas as cores, porém as escuras e louras são
as mais communs. As pernas são muito curtas e grossas, os
pés tem tres unhas como as do porco e as mãos quatro : a
cauda tem apenas 3 polegadas de comprida, a cabeça grande
e comprimida, os olhos pequenos, o beiço superior é uma
especie de tromba, que estende até 4 pollegadas, a bocca é
guarnecida de formidavel dentadura : pasta como o cavallo ;
ainda que pesada, é velocissima na carreira, muito timida e
inoffensiva ; não persegue nem os cães, senão quando se não
pode mais defender ; mergulha espantosamente. Sua carne é
como a do boi, a pelle é muito espessa.

(2 ] Capivara [ Hydrocherus capivara ] é um pouco amphi-


bio, pequeno, cabello curto e aspero, os pés como os de porco ;
porém com membranas entre os dedos ; vive quasi sempre
n'agua.
[3 ] Maritacaca (Mephitis ulester)--genero de marta. de
bello aspecto, mas dotada de uma rara propriedade, qual a
de expellir de glandulas proprias, quando perseguida, uma
materia tão fetida que ninguem resiste, nem mesmo os outros
animaes, alguns dos quaes ficam asphyxiados.
[4 ] Onça (Genero felix )-Ha varias especies ; preta ou ti-
gre, pintada (jaguar), ruiva ou sussuarana (cagoar) : chamam
tambem cangaçús a umas de pintas ou malhas grandes, que di-
zem ser filhas das pintadas com sussuaranas ; é o leopardo do
Brasil.
[5] Caitatus, queixadas Dycotyles torquatos labiatus)--
São porcos bravios, andam em magotes ou varas, e são ferozes
quando atacados, mas susceptiveis de domesticar- se. Raros no
Ceará.

1
164

naré, catita , ratos, [ 1 ] tamanduá . [ 2 ] tatûs, [ 3 ] timbú, veados,


- quandú, papamel, quati, saguim, morcegos . (4)
AVES RAPACES. -Urubú rei, tinga, camiranga , carcará, ga-
viões. corujas, caboré, jacurutú, acahuam.
PASSAROS. -Andorinha, araponga, annun- preto, alma de ga-
to, azulão, beija-flôr, bicudo, bom- é. cardeal, canario, cancão,
currupião, casaco de ccuro, cabeça de rubim, encontro, graúna,
lavandeira, pintasilvo, patativa, papa- arroz, papa- capim, rouxi-
nol, sanhassú, sabiá , chechen.
TREPADORES . - Pica- pau, tucano, papagaio, periquito, ara-
ras, canindés, ararunas, maracanāns, jandaias.
GALLINHACEOS.-- Pombo, perdiz, pavão, jacú, gallinha de
guiné, perú, ema, zabelê, ganso , sariema , nhambú, pombas, aza-
branca, rolinha, cascavel, jurity, tocaes, rola de bando. [5]

[ 1 ) Ratos- Ha de 4 especies : punaré ou rabudo, que mora


nas pedras e ôco de paus, guaberú, vindo da Europa com os
primeiros colonos, vermelho e catita, o mais roedor .
[2] Tamanduá [Myrmecophaga tamanduá] havia duas es-
pecies o assú ou bandeira, e o mirim ou pequeno. Hoje é ra-
rissimo o da primeira.
[3] Tatus ( Dasypus ) -Havia o Canastra, grande. cujo casco
pedia levar mais de uma quarta de legume, e que hoje já não
é encontrado ;:-o
- verdadeiro , de carne saborosa ; o peba e o bola
(4 ) Morcego [ Vespertilio murinus ] -Damnoso as plantações
fructiferas e a criação.
[5 ) Rolas de arribação -- Vivem em grandes bandos, sobre-
tudo no tempo da postura, que é no fim do inverno. Então os
euxames são tão prodigiosos que formam nuvens de milhas de
extensão, voando sempre na mesma direcção, e juncando cada
dia os campos por onde passam de uma profusão de ovos in-
comparavel. Nesta operação ellas percorrem as vezes uma zo-
na de muitas legoas, porque todos os dias vão avançando em
linha recta. Apanham -se ovos em cargas, animaes de toda es-
pecie affluem para devoral-os, e todavia não abalam. E' mister
presenciar uma scena destas no sertão para acreditar em tal
phenomeno ! Não obstante a devastação que homens e animaes
fazem aos ovos, grande parte vinga e em poucos dias novas
pombas nascem desses ovos, as quaes ainda implumes no cam-
po servem de pasto aos carnivoros de toda a especie : mas
ainda assim em muitas ribeiras apanham-se essas pombas, ou na
bebida ou no pouso, em tal quantidade que as seccam e levam
cargas para vender pelas serras.
165

PALMIPEDES. -Gaivotas, pato, marrecas, patori , putrião.


pecaparra, curicaca e mergulhão.
RIBEIRINHOS. - Maçarico, garças, gazola, jaburú, socó, jaça-
nan, gallinha d'agua, tamatião, petiú, maranhão, sericória .
CHELONIOS, SAURIOS, REPTIS, BACTRACIOS. - 1º Chelonios,
[1]-Ha 4 especies de tartarugas :
Saurios. Camaleão, tejuassú, calangro, papa-vento, teju-
pim , jacaré.

Ophidios. - Cascavel, jararaca, córal, saramanta, suricucuú


preta, caninana, papa -ovos, cobra d'agua , verde, de cipó , de duas
cabeças, de veado e sucurujuba.
Bactracios. -Gia, cururú, rã, etc.
PEIXES. -As costas do Ceará são extensas e piscosas. Nos
baixos, sobretudo nas embocaduras dos rios, abundam especies
estimadas. Nas lagoas e poços dos rios são procurados pelo seu
sabor os bagres e curimatans.
Os peixes mais conhecidos são : acará, agulha , alvacó, ar-
raia, badejo, bagre, baicú, beijupirá, baleia, barbudo, batata,
bicudo, bocca de velha, bonito, bôto, bodião, branquinho, cabe-
ça- dura, cação anequim, cação bagre, cação bicado, cação cha -
pe, cação de areia, cação de dente, cação de espadarte, cação
golphim, cação moenda, cação tintureiro, cação pata, cação vi-
ola, cambuatá, caldeirão, camorɔpim, cangaty, caraunha, cara-
pá, carapeba, caratinga, cautoá, cavalla, chareu, curiman, eor-
vina, curumatan, dardo, dourado, enxova, espada, gallo, garou-
pa, cangulo, jamanta, jundiá, jeriquity, jacundá, manjuba, per-
na de moça, maracapeba, mero, morêa, morobá , murucutuca,
olho de boi, olho de ceu, pampo, pargo, pargo penna, parú, pei-
xe boi, peixe fila, peroá, pescada, piáu, pirambú, robalo, robali-

[1 ] Tartaruga - Ha 4 especies no mar, das quaes a chama


da verdadeira se vende por 100 $ a 130 $ . E' rara e seria util
tentar a sua criação artificial nas lagoas a beira-mar . Cada
tartaruga põe 500 ovos nas dunas, quando nascem as peque-
nas, correm para o mar. Os carcarás os perseguem, e nagua os
peixes, carangueijos e zoophitos os aguardam, de modo que
poucos escapam.
166

to, roncador, sauiba, sainé, samuenda, cara, sambetara, sarda,


sargo de beiço, sargo de dentes. salema, sardinha, serra , se-
rioba, tainha, tapucá, trahira, ubarana, vermelho, voador, peixe
gallo.

INSECTOS. O Senador Pompeu , no seu Ensaio Estatistico


do Ceará, d'onde colho estas noticias, diz que são notaveis por
sua propriedade perniciosa as seguintes especies : Carrapato, pa-
rasita que vive nas folhas e que em certas épocas augmenta e .
agarra-se a pelle dos animaes, principalmente do gado vaccum.
e, em tal quantidade que em pouco tempo tiram-lhe a sustan-
cia e causam grandes estragos ; pulgas, percevejos, bicho de pé, que
se introduz na carne do homem ou dos animaes : formingas de
varias especies ; cupim, estragador dos moveis, edificios e dos
pés de milho, da roça : traças, aranhas, escorpião, cigarra, piolho
de cobra, tiranaboia, moscas, de especies variadas, sendo as mais
prejudiciaes as mutucas que perseguem o gado nos sertões, mu-
ruinhas, mosquitos, potó, que injecta um liquido caustico na fe-
rida que faz, pimentão, cascudos, pirylampos, besouros, maribondos,
gafanhotos, borboletas, mariposa, cochonilha, emboá, mofo, grilo, gur-
gulho, etc.

ABELHAS . - Si bem que se encontrem no Ceará variedades


apreciaveis pela delicadeza do mel e virtudes medicinaes deste.
comtudo, a industria da creação de abelhas não se acha desen-
volvida ; está na sua phase primitiva, entregue aos simples
cuidados da natureza. As especies mais conhecidas são : en.xú,
enrni, cabassú, tiuba, urussú amarello e preto, pobiła, moça branca.
manuel de abreu, tataira, preta e amarella, mosquito cupira, sa-
naharão, bocca de barro, mombucca, trombeta canudo, jandaíra.
arapuá.
CRUSTACEOS . - Nas praias e rios encontram - se : caranguei-
jos, guaimun, aratú, camarão, lagarta, pitu-assú, aratanha.
VERMES OU ANNELIDES. - Sangue-suga, minhócas, plana-
rias, umboás.
MULLUSCOS. - Ostras, mariscos, polvos. Nos rios e lagôas,
uruás, itans.
ZOOPHITOS. - Asteria ou estrella do mar, esponja, actinias.
nemertinas e galerdas .
167

CLIMA [ 1 ]

E' mu difficil, diz Becquerel ( 2 ) dar definição exacta do


elima, tão numerosos são os elementos que concorrem para a
sua constituição : pode -se entretanto, dizer com Humboldt, que
o clima de uma região é a reunião dos phenomenos calorificos,
aquosos, luminosos, sonoros e electricos, que lhe imprimem ca-
racter meteorologico definido, differente do de outra região col-
locada na mesma latitude e nas mesmas condições geologicas .
Nesta accepção, geralmente acceita [ 3 ] é difficil em tudo
completo de climatologia cearense. As observações meteorolo-
gicas que lhe devem servir de base são incompletas umas, ou-
tras sem a continuidade precisa, salvo os que se referem ao
Quixeramobim, cujo registo é feito por instrumentos automati-
cos, que de 15 em 15 minutos imprimem em papel as་ modifica-
ções dos phenomenos atmosphericos.
Como seja este um dos mais importantes assumptos que
interessem o desenvolvimento economico desta parte do terri-
torio brasileiro, procurarei dar-lhe o maior desenvolvimento,

[ 1 ] Este capitulo mereceo -me mais attenção e por isto teve


maior desenvolvimento por se prender a questão vital e pri-
mordial do Ceará. Condensei os dados que obtive e me propuz
demonstrar a relativa bondade das condições climatericas cea-
renses.
(2) Becquerel - Des climats - Paris - 1853 pg. 1 Considera-
se o calor como exercendo a maior influencia ; e successivamen-
te a quantidade d'agua caida nas diversas estações do anno, a
humidade ou a seccura do ar, os ventos dominantes, o numero
e a distribuição das tempestades no decurso do anno, a sereni-
dade ou a nebulosidade do ceu, a natureza do solo e a da vege-
tação que o cobre, segundo é espontanea ou o resultado da cul-
tura.

[3 ] Mohn, director do Instituto real meteorologico e pro-


fessor na universidade de Christiania, define. -"O estado habi-
tual da temperatura ou gráo do calor do ar, da quantidade do
vapor dagua que elle contem, da pressão atmospherica, movi-
mento do ar ou vento, forma das nuvens, sua quantidade e a
precipitação aquosa, e em geral dos elementos meteorologicos
de um lugar dado e o conhecimento de suas variações regulares
diurnas e annuaes -constitue o que se chama clima deste lu-
gar. -Les ppenomenes de l'atmosp 、 pg. 3.
168

dentro dos limites de uma noticia geral, servindo -me de todos


os subsidios a meu alcance .
O clima cearense é geralmente quente e secco no verão, hu-
mido no inverno, variando de intensidade segundo a situação
topographica e accidentes locaes.
Solo de inclinação rapida, quebrado por fracos contrastes
na sua horisontalidade, não interrompido por cordilheiras ou
serras de elevação superior a 900 metros, mal offerece obstaculo
a curso rapido, regular, dos ventos, que periodicamente so-
pram em determinada, senão uniforme direcção .
Do solesticio de Dezembro ao equinoxio de Março, ficando
o maior foco de calor ao sul da linha equinoxial, o appeilo dos
ventos das regiões septentrionaes, mais frios, opera-se na direc-
ção de nordeste para sudoeste. Depois de atravessarem o equa-
dor thermal. esses ventos . saturados de humidade, perdem
grande parte de sua baixa temperatura e raramente chegam
as latitudes do Ceará com a precisa para produzirem rapidas
condensações atmosphericas e consequentes precipitações aquo-
sas. Provém dahi a irregular seccura dos verões.
Quando a actividade solar é quebrantada por densos ne-
voeiros ou por causas que escapam ao nosso conhecimento, en-
tre as quaes não será descabida a maior ou menor extensão e
aggrupamento das manchas solares em posição fronteira a
zɔna cearense, a circulação atmospherica repercute- a nos seus
movimentos menos rapidos, na somnolencia com que as nuvens
saturadas do vapor aquoso, —cumulos, deslisam no céo, se ap-
proximam, se esbarram e se fundem, dando origem as chuvas
de Dezembro e Janeiro, em annos de inverno temporão.
E' phenomeno de observação frequente que essas chuvas
são seu.pre precedidas de ventanias, quaes lufadas, que abran-
dam gradativamente até paralisarem,quasi subitamente, do qua-
drante nordeste, volvendo - se, como viração fresca, para su-
deste.
A proporção que o Sol, na sua marcha apparente, se diri-
ge para o tropico de Cancer, e vai, conseguintemente deslocan-
do o foco de maior calor para o norte, passando em Março
pelo Ceará, as correntes atmosphericas, solicitadas pelo adel-
gaçamente das suas camadas rarefeitas, ao contacto do solo su-
169

peraquecido, precipitam-se no sentido do grande vortice de


aquecimento, chocam-se ahi, reproduzindo a zona de calmas
onde quer que esta acção deixe de ser contrariada por circum-
stancias locaes.

E' a occasião dos calores abafantes, de activa evaporação,


que lentamente sobe em nuvens, adensando-se em formas fran-
jadas, superpostas no horisonte, semelhando paizagem monta-
nhosa, do extremo sul ao norte, abraçando todo quadrante.
As bategas d'agoa caem as vezes ininterruptamente, com
breves intervallos, por dez e doze horas, senão por dias.
E' raro que as chuvas se prolonguem por dous a tres dias.
Ordinariamente, depois de uma copiosa queda d'agoa, de 2 a
3 horas, sobrevem a neblina fina por curto espaço, para re-
começarem as chuvas grossas, intervalladas por mais ou me
nos tempo por novas neblinas. O céo adquire então limpidez e
azul sem macula, de fugaz duração. Solo, edificios, arvores,
tudo enfim quanto se acha exposto as intemperies satura- se
de humidade .
O Senador Catunda apreciando este aspecto da natureza
cearense, escreveu :

"Os invernos, incertos, escassos e breves, são excepcional-


mente copiosos e longos ; caem por vezes chuvas torrenciaes
que em poucas horas alagam os campos e fazem transbordar
os rios. E' então que apparecem as tempestades, fracas no li-
toral, fortes no interior. No alto sertão, é sempre á tarde que
ellas desabam. O céo se reveste de azul-desmaiado ; o calor
suffoca. Immensa nuvem plumbeo- carregada, em forma de tor-
re, apparece no oriente ; um vento forte passa, ás lufadas,
agitando violentamente as arvores que se estorcem convulsas.
Caminha o grande castello, approxima-se, vinga as regiões do
espaço. Em sua orla superior scintilla fugace uma luz aver-
melhada ; segue- se um ruido surdo, longinquo, como que sub-
terraneo, em breve mais distincto, mais forte . Dir- se -ia o rolar
de muitos carros que se approximam. Aos poucos invade o
céo a escuridade, a natureza se recolhe, calam todas as vozes,
excepto o vento que redobra de violencia . Subito lam.peja uma
grande luz de um branco sinistro e lugubre ; estampido forte
como o desparar de canhão enorme, como que abala o solo e
170

coa o pavor em todos os seus seres vivos. Começa a tempesta-


de. Corusca o ar, ribomba o trovão, a chuva cae em torrentes.
Ao amanhecer o dia seguinte, o céo azula e recobra a serenida -
de, rebuça a nevôa o cume das serras, e brizas frescas e ma-
cias acordam a vida amortecida na vespera.

"E' na estação invernosa que sob essas latitudes se alen-


ta a natureza ; a seiva circula com força, desponta a verdura.
frondescem as arvores, verdes alfombras tapetam os campos.
Aos troncos se enredam as convalvulaceas e tecem longas sa-
nefas de verdura onde brilham suas corolas azues ; zum-
bem os insectos, adejam nos prados uma infinidade de borbu-
letas grandes, pequenas, que recreiam a vista com a extraordi-
naria variedade de seus matizes ; a matta, até então silenciosa
e triste, se enflora e se enche de sons e de harmonias. A paï-
sagem se anima , colora, cambia, e a vida sorri por momentos
nos campos tocados de flores que saturam o ambiente de per-
fumes .
Nessa ressurreição geral resfolga a provincia de longas
agonias." (1)
A esta estação que ora vai de Janeiro a Maio, com o vera-
nico de Fevereiro, ora de Março ao meado de Junho , succede
a intermedia, da verdadeira primavera, de Junho a Agosto ,
durante 60 a 80 dias . A vegetação por toda parte activa , ape-
nas finda a floração de Abril e Maio, começa a fructificar.
Quer as plantas industriaes, como o algodão, a canna. a mani-
çoba, etc., quer os cereaes, como o milho, feijão, arroz , etc.,
ou as fructiferas, como a larangeira, limeira, abacateiro, sa-
poti, etc., estão na sua plenitude, cujos productos podem ser
colhidos, e desde logo apropriados ao consumo. A criação, na
sua pujança de engorda , ostenta individuos comparaveis aos
melhores das zonas mais favorecidas, pelo leite abundante ,
queijo, carne, etc. A temperatura ainda banhada pelas emana-
ções humidas das agoas dos rios, das lagoas, dos poços e ven-
tos frios do sul, prodigalisa a alegria de viver, a satisfação de
gozal- a, que uma vegetação luxuriante, pomposa, favorece com
a sua doce e discreta sombra embalsamada de effluvios. Pela

[ 1) J. Catunda-Estudos sobre a hist. do Ceará - Ceará 1886


-pags . 17 a 19.
171

manhã a viração fresca aviventa e tonifica o organismo huma-


no, alenta os nervos, estimula ao trabalho, então o mais afa-
noso, da colheita , ou da ceifa, derramando a abundancia e o
bem estar em todas as classes.
Não raro desce o thermometro no sertão a 16 % centigra
dos pelas 5 e 6 horas da manhã. Os campos cobrem-se de um
tapete de hervanças, pastagens preciosas, que semelham ondu.
lante mar verde e pardo até que os rigores do verão as creste
e as reduza a pó negro.
Grande é o contraste desta primavera com o estio, que se
The segue. Desde fins de Agosto, os dias se vão tornando cada
vez mais calidos, os ventos, qual viração e arfar brando, a prin-
cipio, desencadeam-se para Setembro em rajada singulares
que em breve se generalisam, salteando de sudeste para nor-
deste, com intermittencias mais ou menos violentas. Pela ma-
nhã, frescos e brandos até 10 ou 11 horas, adquirem depois
grande intensidade até meio dia. quando serenam para reco-
meçar pelas 2 e 3 horas da tarde suas evoluções caprichosas e
rapidas, erguendo nuvens de poeira, arrastando folhiço e outros
detrictos com estrepito, que lembra, nos seos doudos redemoi-
nhos, a approximação da chuva.
No sertão fallecem as vezes durante o dia essas depressões
barometricas, conservando-se relativamente calma a atmosphe-
ra, arfando brandamente, fresca pela manhã, calida, quasi
suffocante, de 11 horas ás 3 da tarde. No lapso de tempo que
intermedeia o pôr do sol e a noite, á hora do crepusculo, o ar
é geralmente abafado pelas evaporações que pouco se ele
vam, qual fumo, quando a temperatura baixa e a viração pa-
ralisa.
A noite os ventos geraes readquirem todo o seu imperio.
solicitados pelo fóco diurno que se transporta para occidente .
Conforme a distancia , chegam as 7, 8, 9 horas aos sertões mais
afastados, com tal impetuosidade que parecem vir arrazando
tudo em sua passagem. Com alguns minutos de antecedencia
o ruido de temerosa onda que se quebra na praia vai cres-
cendo até o rolar de monstruosa artilheria , que se approxima ,
emquanto espessa nuvem de poeira, de folhas, evola- se em
contorsões choreographicas, de caprichosas voltas, varrendo os
caminhos ou invadindo as casas e ruas dos povoados.
172

O impeto da corrente é tamanho que todos se abrigam,


por não serem envolvidos nos redemoinhos poeirentos, ou para
evitarem a rapida queda da temperatura, que se lhe segue,
sempre nociva a saúde. O fragor do phenomeno meteorico lem-
bra os versos do epico portuguez :

" Os ventos eram taes, que não puderam


Mostrar mais força de impeto cruel,
Se para derribar então vieram
A fortissima torre de Babel. "

Passada a rajada, estabelece - se franca e fresca ventilação,


que amenisa sobremodo as noites serenas e iguaes de todo o
sertão. E' uma compensação ao calor acabrunhador das tardes.
Excusado é accrescentar que esses ventos são seccos on
carregados de vapores humidos, dispersos por aquecimento nos
vastos campos abertos, denudados, que elles atravessam na sua
passagem.
A vegetação começa desde Agosto a crestar a folhageni,
transmudando-se-lhe a tonalidade verde escuro pelo verde pal-
lido, por gradações cada vez mais claras até o amarello de ouro
ou de Siena . Nesta phase, os ramos se despem pouco e pouco .
das folhas, se fendem ao açoite dos ventos ; os galhos, esque-
leticos, enrugam- se, ennegrecem-se ou cobrem-se de uma erosta
esbranquiçada, aqui e acolá, retocada por pinceladas de nankin
cu de amarello oca.
O solo matisa- se de fina poeira, negra nas varzes dos rios,
amarellada nas quebradas dos serrotes, cinzenta nos sertões,
patenteando em sua nudez as grotas ou sulcos abertos pela
contracção desigual das rochas, escalvado pelas chuvas da pre
cedente estação, semeado aqui de seixos rolados de variado fei-
tio e volume, alli de cotos de plantas rasteiras, que o gado apa-
rou, ou o fogo e a derruba do machado deixou em pé para assi ·
gnalar a actividade humana .
Mais resistentes de que outras, certas arvores, como o jo-
azeiro, a oiticica, a carnahuba, conservam a fronde verdejante,
quasi solitarias no mortuario cemiterio de tantas. despidas, see-
cas, em estivação , especie de floresta dantesca, donde por vezes
se escapam gemidos ou rangidos ao perpassar da viração, tra-
173

zendo a memoria do viajor a lembrança de dias menos tristes,


ou de natureza menos desoladora, esteril e aspera em suas mu-
tações estivaes. ( 1 )
As fontes nativas diminuem de volume eu se estancam : os
rios, reduzidos a escoadores mais ou menos largos e profun-
dos por onde correm as agoas pluviaes para o mar, apresen-
tam , nos seus alveos, poços intervallados, onde se refugiam os
peixes e se conserva o liquido no decurso da estação secca ,
quando abrigado dos ventos reinantes. As lagoas e açudes vão
igualmente minguando a area coberta d'agoa, deixando em
suas margens o canniço enfezado, e perdendo por evaporação
quantidades de liquido, cujo coefficiente não se póde ainda de-
terminar com precisão. São dignos de nota as lagoas e açudes
que hão resistido um, dous e mais annos de secca .
O senador Catunda, em linguagem imaginosa, assim des-
creve essa quadra do anno :
" Demorado e ardente é o verão ; estende-se ordinariamen-
te de Junho a Março. O calor é intenso ; no sertão a media das
maximas é de 35 ° c á sombra. Amarellece e morre a verdura,
as arvores perdem as folhas, seccam os rios. O campo toma
aspecto tristonho e desolador. Ventos ardentes sacodem com
violencia as franças hirtas das florestas rachiticas e estioladas
do sertão. Por vezes se encontram, embatem e redemoinham
essas correntes atmosphericas, quebram, desarraigam arvores, e
com grande arruido, levantam, em forma de espiral, uma co-
lumina de pó e de folhas mortas.
" Em periodos quasi regulares, determinada por causas

( 1 ) A elevada temperatura do verão é exactamente suavi-


sada pelos ventos geraes, que sopram constantemente nesta
época em consequencia de ser o ar muito secco, o calor torna-
se menos sensivel, porque o liquido que vem á superficie do cor-
po pela transpiração, evapora - se immediatamente. Ainda du-
rante as horas mais quentes, sente -se fresco á sombra das arvo-
res, ou em casas convenientemente ventiladas. São frescas quasi
sempre as noites, e dorme-se no campo impunemente, sem ha-
ver exemplo de molestia adquirida por este motivo. Epidemias
não se conhecem no sertão : a população é forte, apezar da irre-
gularidade da alimentação e uso de agoas que raramente são
potaveis. ( Silva Coutinho.- " Relat. sobre o prolongamento da Es-
trada de ferro do Recife a S. Francisco pag. 26-1875 ).
174

kosmicas . vem uma grande secca devorar as pequenas fortunas


accumuladas pelo trabalho e economia. Essa temerosa calami-
dade condemna o Ceará ao ingrato martyrio de Sysipho : eleva
com dolorosas privações o rochedo da sua prosperidade, e de
subito o vê rolar e ruir- se em um oceano de poeira. Nem uma
gotta de chuva ; nada germina no solo colimado dos raios so-
lares. Somem- se as agoas, morrem os animaes e com elles os
sêres humanos que não emigram ou buscam os logares soccorri-
dos do governo imperial. O sertão se transforma em vasta for-
nalha que tudo devora ; morna solidão invade os povoadós, de
que se retiram o movimento e a vida. Começa então o grande
oxodo dos cearense, e a Niobe americana, envolta em crépe de
pó ardente, chora os filhos, condemnados á expatriação e á
morte. Figuras esqualidas, macilentas, de todas as edades e se-
xos, de olhos encovados, vista empanada, voz sunida , pelle so-
bre os ossos, imagem da fome, se cruzam em todas as direcções,
e se atropelam em todas as estradas. Romeiros do infortunio,
eil- os, vão sem saber onde, em busca talvez, da sepultura , em
provincia estranha ...
66 Durante o
verão são as calnias diurnas temperadas pela
acção constante dos alizios. As noites são sempre claras e agra-
daveis ; até mesmo nas brumas do inverno ha sempre toques de
luz na atmosphera que permittem a percepção dos objectos a
distancia . O céo, de uniforme serenidade, se constella por ve-
zes com os explendores e magnificencias das latitudes quen-
tes." ( 1 )
Outro observador sagaz, que dedicou grande parte da sua
vida ao estudo das questões agricolas, o Dr. Marcos de Macedo,
enuncia-se nestes termes :
" A estação das chuvas, annunciada pelas chuvas de cajú,
principia em Janeiro e termina em Maio. Nesse tempo os ven-
tos regulares, que giram constantemente de leste a oeste, paral-
lelos ao equador e em suas visinhanças, parecem abaixar- se e
diminuir a rapidez de sua marcha ordinaria. Neste estado elles
exercem grande pressão sobre as camadas do ar, visinhas a
terra, produzindo uma sorte de represa na atmosphera, da qual
resulta o excesso da electricidade, que muitas vezes se observa :

(1 ) J. Catunda - Estudos sobre a hist. do Ceará- pag. 19


a 21.
175

cumulos de nuvens e as chuvas. Então apparecem os ventos


irregulares e variaveis, que importam os vapores aquosos do
oceano e os incorporam aos que se desprendem dos ventos con-
stantes ou geraes, como vulgarmente lhes chamam, e purifleam
o ar dispersando, pelo espaço, os miasmas delecterios, accumu-
lados na superficie da terra.
" Na estação da secca, isto é, de Maio a Janeiro, os ventos
regulares se elevam e em sua marcha, de 100 a 120 kilometros
por hora, encadeam e arrastam todos os vapores aquosos e dei-
xam o Ceará na mais limpida e serena calmaria . Nesta carreira
violenta, os ventos regulares só encontram obstaculo na cordi-
lheira dos Andes, que por sua gigantesca elevação, os obriga a
despejar o excesso de vapores, que haviam accumulado, desde
as costas desabrigadas do Ceará até o Perú. Isto é tanto mais
positivo quando se observa que além dos Andes, como em Lima
e em geral na costa peruana, a chuva é desconhecida. As chu-
vas que se formam e caem entre o rio Parnahyba e a mesma
cordilheira, são devida a circumstancias especiaes, como sejam
a immensa accumulação de vapores e a desaggregação das mo-
leculas gazozas das camadas inferiores , que acompanham as
camadas superiores, dos quaes se desprendem e caem por seu
peso especifico. O Pará e o Maranhão escapam dos rigores desta
theoria, tanto por se acharem fóra da linha em que giram os
ventos regulares, como por servirem de receptaculo ao immenso
deposito dos vapores, que subindo aos Andes. pela via area,
descem ao Atlantico, transformados em agua pluvial, pela co-
lossal arteria do Amazonas e seus innumeraveis affluentes.

" Findas as calmas, os rios do Ceará pouco se demoram em


lançar suas agoas no Oceano, de maneira que no mez de Junho
pode se atravessar a pé enxuto, não só ribeiros menos con side-
raveis, como o proprio Jaguaribe, desde a sua origem até
junto do Aracaty, onde chegam as marés.
" Orio Salgado, antes de 1816, corria todo o anno até a
cidade do Icó, porem depois daquella epoca os habitantes pri-
vados de agoas vivas, durante a secca, recorrem ao processo
das cacimbas, geralmente adoptado na provincia. As lagoas
seccam myriades de aves aquaticas emigram ; os peixes se re-
colhem aos poços, alimentados por uma tenue corrente subter-
ranca, que se observa no leito reseccado dos rios, entre os sub-
176

solo impermeavel e a camada de area, que o cobre. As plantas


annuaes desfallecem e morrem prematuramente, e as vivaces,
perdendo as folhas e os renovos apresentam a imagem da tris-
teza e da desolação. Os ventos irregulares se retiram, e encor-
porando-se as correntes superiores levam comsigo os vapores
accumulados no ar, durante o tempo chuvoso , removem para
logares longinquos as forragens, chamadas mimosas, que consti-
tuem o primor da alimentação dos gados, e deixam os campos
varridos como pela impulsão da vassoura. O solo desnudado
e secco se fende em numerosas gretas, afim de dar passagem a
humidade, que serve de alimento aos vegetaes. A terrra neste
estado agonisante, cujo quadro apenas esboçamos, parece não
mais prestar- se ao favor da habitação humana. " (1)
Ser-me- hia facil documentar mais abundantemente com
observações de illustres scientistas a feição geral da climatolo-
gia cearense ; mas nos seus lineamentos caracteristicos, bastam
os que ahi ficam para se comprehender approximadamente ast
modalidades do phenomeno primordial, senão vital. desta re-
gião sul-americana.

Particularisei a analyse dos elementos, até o presente estu-


dados, do clima cearense, a começar pelo mais importante.

TEMPERATURA

Os caracteristicos predominantes do ar são : o calor e a


humidade. Na região litoral estes dous elementos confundem- se
e mesclam- se tão intimamente que um completa o outro. A tem-
peratura quente, secundada por excessiva humidade, particu-
larmente na estação pluviosa, torna se esgotante, deprimente do
organismo humano. Dada a latitude e a situação geographica
da costa ceerense, o calor é mencs nocivo, e mais supportave.
do que era de esperar. Os ventos alizios, que a varrem durante
todo anno com intensidade maior no verão, trazem de outras
regiões mais favorecidas, por sobre a massa liquida do Oceano,
a frescura, reforçada pela brisa constante que sopra do mar

(1 ) M. A. de Macedo - Observações sobre as seccas do Ceará--


Stuttgart 1891 - pags. 37 a 40.
177

Nos sertões, os ventos invernaes, entre Março e Junho, são


tão saturados de humidade, que se tornam frios, agradaveis,
restaurantes. A's noites, a viração marha traz tal abranda-
mento de temperatura. que esta se torna doce, mesmo deliciosa,
depois das lufadas aquecidas do dia.
A humidade augmenta naturalmente no inverno, maxime
nos lugares mal drenados, onde as aguas pluviaes formam la-
goas ou simplesmente alagados . Estes sitios são, aliás, raros, de
pouca importancia, salvo nas margens baixas dos rios, que dão
enchentes anormaes .

A acção evaporante dos raios solares e dos ventos basta


para em poucos dias modifical-os, restituindo ao solo a sua
primitiva seccura, quando este não está protegido por basta
vegetação. No verão, alem da perpendicularidade dos raios
solares sobre a terra, despida de sua natural protecção (a ver-
dura das arvores) e do superaquecimento causado pela refle-
xão e intensidade da luz , accrescem as queimadas dos campos
para a cultura e pastagens, ou por accidentes, as quaes con-
correm para ainda mais resequir o solo e o ar ambiente, ape-
nas beneficiados pela irradiação nocturna.
Nas serras, a elevação de 120 a 130 metros faz baixar de
um gráo centigrado a temperatura, bem como a sua maior
exposição aos ventos reinantes, e a arborisação, que nos pon-
tos mais altos, conserva a folhagem verde.
Em algumas, como na Ibiapaba e em Baturité, o thermome-
tro desce a 14 graos, subindo a 25 nos mezes de Maio a Agos-
to. Os dias são relativamente frios.

Mesmo nos mezes de maior calor, Novembro a Março, as


manhãs e tardes são mito frescas, e como as neblinas ou
chuvas caem nellas mais frequentes, os dias tornam-se ame-
nos.

Pode se dividir em tres zonas distinctas as variações do


clima no Ceará, segundo a diversidade dos factores que o
modificam. (1)

[1 ] Senador Pompeo -Ensaio estat. , vol. I, pag. 57 .


178

1º-O do litoral, comprehendendo uma zona de 12 a 24


kilometros, é quente e humido, e mais constante.
2-0 das serras, mais fresco que o do litoral, porém me-
nos humido em geral.
3-0 do sertão, mais secco e quente.

As observações meteorologicas, sobre as quaes se baseiam


as seguintes conclusões. procedem de differentes fontes, como
em lugar competente indicarei.
TEMPERATURA NO LITORAL. - A uniformidade da
temperatura na Fortaleza é apenas alterada por ligeiras oscila-
ções que se fazem sentir diariamente com a marcha apparente
do sol e annualmente com a posição mais ou menos vertical
dos raios solares em relação a ella Fortaleza.

VARIAÇÕES DIARIAS. -As differenças horarias, por dia.


parecem obedecer, segundo o que se vê da tabella nº 1 , extra-
hida de documentos officiaes [ 1 ] a uma marcha ascendente,
cujo minimo se acha entre os mezes de Setembro a Dezem-
bro com as de 6º ,4 a 6º, 6 em 904 ; Outubro a Dezembro com
6º,5 ; e o maximo em Fevereiro e Agosto com 7º, 6 e 10º,5.

Não ha exemplo de variação diaria superior a 10,5 gráos


centigrados ; raras attingem ao 10°, 4 [ 16 de Agosto 904 ] , pou-
cas a 8° [ 23 e 24 de Março de 1905, 15 e 20 de Junho, 17 e
18 de Julho e 16 de Agosto de 1904]. ( 2 )
Nos mezes de verão ( Novembro, Dezembro, Janeiro e Fe-
vereiro] as oscillações maximas attingem 7° a 7,6 ; nos de
calmaria e chuvas [ Março, Abril, Abril, Maio], vão de 6º ,5 a
8,6 ; nos de primavera [ ou inverno meridional ], Junho a
a Agosto chegam ao maximo, como se pode verificar na se-
guinte tabella [nº 1 ].

[1 ] Resultados obtidos na estação meteorologica de Forta-


za, na capitania do porto - annos 1903 a 907.

[2 ] Seria preciso ter- se uma serie de annos para se verifi-


car se effectivamente este phenomeno é constante, ou se oc-
correo tão somente no espaço indicado. Infelizmente faltam-
me dados para fazel - o.
179

Tabella n. 1 .
TEMPERATURA DA CIDADE DA FORTALEZA
VARIAÇÕES MAXIMAS DIARIAS
1903 Dia Max. Min. Diff. 1904 Dia Max. Min. Diff
( 27 30,5 21,4 9,1 28 31,2 23,5 7,7
Maio
29 29,3 20,6 8,7 18 30,4 24,2 6,2
Março 15 30,7 24,4 6,3
( 25 29,8 20,5 9,3 19 30,7 24,6 6,1
19 29,1 20,3 8,8
Junho 11 29,2 21,0 8.2 27 31,7 24,8 6,9
21 30,0 22,0 8,0 | Abril 1 31,0 24,3 6,7
7 30,6 26,6 8,0 29 29,8 23,6 6,6
2 30,4 21,4 9,0 21 28,0 21,5 6,5
Julho Maio 23 29,0 22,7 6.3
5 30,0 21,4 8,6
19 29,4 21,0 8,4 28 30,2 23,9 6,3
15 30,0 21,2 8,8
9 30,2 20,3 9,9 Junho 20 29,4 20,8 6,6
10 30.0 20.5 9.5
29 30,0 22,0 8,0
12 29,5 19,8 9,7
Agosto 8 29,8 20.5 9,3 17 29,8 21,3 8,5
7 29.0 19.8 9.2 Julho 18 29,4 21,0 8,4
18 29,2 21,0 9,2 20 28,9 21,0 7,9
6 30.6 20,2 10,4
7 27,3 18,4 8.9
4 28,2 20,3 8,0
Setembro 26 29.4 22,4 7,0 Agosto
16 29,4 21,4 8.0
21 30.5 23.8 6,7
30 29,4 23,0 6.4
24 30,0 23,0 7,0 15 29,8 23.4 6.4
Outubro Setembro
12 29,8 23,0 6,8 20 28,9 22.8 6,1
20 29,5 23,0 6,5 ( 16 29,3 24,3 6,
1 28,8 22,3 €,5 17 30,0 23,4 6,6
Novembro 21 29,9 23.8 6,1 Outubro 12 29,2 23,0 6,2
2 28,6 22,8 5,8 2 29,6 23,3 6,1
5 29,6 23,3 6,3 15 30,0 22,5 7,5
Dozembro 1 30,4 25,0 5,4 Novembro 18 29.8 22.4 7.4
9 30.2 24,8 5,4 17 29.8 22,5 7,3
Dezembro 4 30,2 23,1 7,1
1904 23 30,4 23,6 6.8
21 30,3 23.8 6,5 1905
Janeiro 23 31,0 24,5 6,5 Janeiro S 6 30.7 23,5 7.2
2 30.0 23,6 6,4 4 30,5 23,5 7,0
21 29,0 18,5 10.5 Fevereiro ( 19 30,6 23,0 7,6
16 32,0 23,2 8,8 { 9 30,7 23,6 7,1
Fevereiro
17 32,0 23,4 8,6 23 31,4 22,8 8,6
Março
18 30,6 23,6 7,0 ( 24 30,8 22.5 8,3
ou idoza
BUIRI ORSRAJƏSULA
duv

OBSERVAÇÕES

20 O computo dos ven-


I 63 tos foi feito pelo
30 numero de obser-
117 vações horarias .
171
73 NOTA. - No mez de
105 Dezembro não foi
184 observada a eva-
45 poração até o dia
167 17 , por ter-se que-
68 brado o evapori-
8 metro.

951
.
ALEZA

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RRRS
2330

16 4€
6 13 35
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p até
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OGICA DE

ia dade
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RVAÇÕES ESPECIAES
qua
Tempestuoso

Vizibilidade

dade de Força do ven-


por hora to por hora
Sombrio

12hp

12hp
gha

ghp
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6.8 5.61 5.1 4.3 3.5


17
8.2 9.6 2.3 3.6 2.4
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4
6.6 4.2 2.1 3.2 2.1
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par
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do.
cot
da
me
m
1
181

VARIAÇÕES MINIMAS. A media das temperaturas mais


baixas, a sombra, observadas na Fortaleza, nos annos de 1851 ,
1858, 1859 e 1860 - foi de 239,1 [ 1 ] occorrida das 5 as 7 h. da
manha; no de 1887 a 88 [ 2 ] foi de 26,03 as 9 h. 25 m. da ma-
nha ; no de 1904 a 905, as 9 h. da noite, de 23,74 [3 ]
Do confronto destes dados resultariam taes oscillações em
torno das temperaturas minimas, que fariam suppor profundas
alterações nas suas condições. Nas media 239,1 a 26,3
e a 23,74, nos periodos acima, ha realmente differenças con-
sideraveis, explicaveis pelas respectivas oscillações horarias da
observação. Refere-se a mais baixa as 5 até 7 horas da manhã,
a mais alta [ 26 ° 3 ] as 9 h . 25 m. do dia, e a ultima (23.74) as 9 h.
da noite.
A despeito de causas puramente locaes, o clima da Forta-
leza não experimentou mudança apreciavel desde que se fazem
observações meteorologicas.
Convém notar que o modo de observar e recolher os dados
meteorologicos pode - se prestar a erros de alguma importancia
que os falsearão, não representando a verdade em toda a sua
expressão. [ 4 ]

• [ 1 ] Do Ensaio Estat. do Ceará do Senador Pompeu.


[ 2] Da Corograp. do Ceará do Dr. José Pompeu.
[ 3] Das observações da Estação meteorolog, da Fortaleza .
[ 4] A determinação da temperatura propria do ar é um
problema assaz complexo e que exige certas precauções. Collo-
cado um thermometro num recinto escuro em estado de equi-
librio, marcará exactamente a temperatura ambiente ; mas si,
nas mesmas condições, a temperatura é crescente ou decres-
cente, o thermometro não seguirá senão mais ou menos longe
a variação que elle deveria accusar. A oscillação dependerá
da rapidez da mudança e tambem do volume, da fórma e da
natureza do instrumento. Se o recinto é alem disto atravessado
pelos raios do dia, uma nova causa de erro virá se juntar a pri-
meira. O ar, effectivamente, é dotado de grande transparencia
para os raios do calor luminoso emanados do sol, que podem
atravessar sem o aquecer directamente de modo sensivel. To-
dos os corpos opacos oppostos a esses raios absorvem lhe ao
contrario uma parte notavel que eleva sua temperatura acima
da do ar ambiente. Durante o dia, todos os thermometros,
mesmo a sombra, têm por isto tendencia a indicar um gráo
mais elevado que o do ar ambiente. [Annuaire meteorolog de
1875. )
182

Referidas as horas determinadas, nos dias de maior depres-


são thermometrica, as medias da temperatura nos 12 mezes de
Abril de 1904 a Março de 1905 dão o seguinte resultado : as 9
h . da manhã : 24 ° , 23 : a meia hora do dia 25,8 ; as 9 h. da noite
24,6 . Estas medias resultam do conjuncto dos dias mais frios
de cada mez, as horas acima, como se vê da tabella nº 3.

VARIAÇÕES MAXIMAS.-A media das temperaturas maxi-


mas, a sombra, nos quatro annos ( 1851 e 1858 a 60 ) —foi de
30°4, do meio dia as 3 h. da tarde ; em 1887 a 88 [ em 9 mezes
de observações ] -de 27,7 as 9 h . da manhã ; em 1904-905 de
29.56 nas 3 horas de observação - 1/2 dia, 9 h. m. e 9 h. da n.

Em relação as temperaturas extremas nos dias de maior


calor do anno 1904-905, acham-se para as 9 h. da manhã
29,29; para 1/2 dia 30.17 e para as 9 h. da noite 26,69.

VARIAÇÕES MEDIAS. - O calor medio [ normal] em 1851 foi


de 26,5 as 7 h. da manhã, 28,6 a 1 h. da tarde, 26,5 as 6 h. da
tarde dando o annual de 27. Tomando-se conjunctamente
as medias annuaes de 1851 e 1858 a 60 acha-se a de 26,6 ° a
sombra ; nos 9 de mezes de 1887 a 88 : 27 ° ,7 as 9 h . da manhã ;
nos 12 mezes de 1904 a 905 : 260,61.

A differença da temperatura entre o verão e o inverno é


nas medias de 25 °, 82 a 270,87 ou de dous gráos ; nas maximas
de 28,68 a 30,58 ; nas minimas de 220,33 a 240,64.

Ao sol a variação é maior, pois que mesmo em Julho mar-


ca 21 ° as 6 h. e 42 ° de 1 para 2 h.. mas no rigor da esta-
ção secca oscilla entre 25° pela manhã a 44° pelas 2 h. da
tarde . (1 )

O termo medio das variações diarias a sombra é de 6º e


ao sol de 190,5.

A menor temperatura occorre entre 4 e 5 horas da manhã,


a maior de 1 as 3 h . da tarde. A principio lentamente, preci-
pita- se das 7 as 10 h . da manhã, enfraquecendo até meio dia,

[ 1] Senador Pompeo - obra citada, pag. 59.


183

para attingir o maximo entre 1 1/2 e 3 h . da tarde, conforme


a estação. Dahi desce lentamente até as 5, e rapidamente com
o pôr do sol. [ 2 ]
Pela tabella seguinte se apprehende melhor o conjuncto
dessas oscillações.

[ 2 ] A comparação da marcha thermometrica da Fortaleza


com a das Antilhas mostra tal semelhança entre as respectivas
temperaturas, embora a differença da latitude, que se pode
applicar aquella as observações feitas por Moreau de Jonnes
em relação a estas.
O termo medio da variação thermometrica diaria, diz elle,
é quasi de cinco gráos : é menor na estação fria.
O minimo do calor occorre ao raiar do sol. O maximo mu-
da de hora segundo a estação ; as 2 h. 2 1/2 ou tres horas, se-
gundo o sol está no tropico do Capricornio, no equador ou no
Cancer. E' evidente, para a época do dia que o apresenta, que
elle não resulta da acção immediata dos raios solares, mas da
accumulação do calor nos corpos que estão expostos.
Esta accumulação não se faz por uma progressão regular .
E' lenta quando o sol começa a se erguer no horisonte ; pelas
dez horas da manhã sua marcha torna-se rapida, modera ao
meio dia, continuando a approximar- se do maximo que deve
attingir. No decrescimento do calor, o resfriamento da atmos-
phera é a principio sensivel, mas adquire grande rapidez logo
que o sol se occulta ; durante a noite segue com mais regulari-
dade e lentidão, e é somente uma ou duas horas antes do nas-
cer do sol que elle experimenta ordinariamente uma acceleração
que se faz sentir, produsindo então , sensação de frio mais ou
menos penivel.
Moreau de Jonnes - Historia das Antilhas pag. 165 ,
185

Tabella n. 4.

Temperaturas extremas na cidade da Fortaleza

MAXIMA MINIMA MEDIA


Diff.
1904 entre os
Gráo extr.

FORECL
Dia Dia Gráo Gráo
cent.

Abril 27 31.7 13 22.9 27.12 7,80


Maio 30,3 22 21,5 26,63 8.80
Junho 12 30.2 5 20.5 26.44 9,70
Julho 15 30,7 30 22.8 25.94 9.90
Agosto 6 30.6 6 20,2 25,85 10.40
Setembro 15 29.8 10 20.8 26.36 7,00
Outubro 17 30.0 12 23.0 26,57 7.00
Novembro 14 30,7 18 22.4 26.91 8,30
Dezembro 30,6 31 23,0 26,24 7.60

1905

Janeiro 16 31.4 28 23.0 27.37 8.40


Fevereiro 25 31,4 18 22.8 27,50 8,60
Março 9 31.6 19 22.0 26,75 9,60

VARIAÇÕES MENSAES E ANNUAES

MINIMAS. A differença entre as medias do calor minimo


mensal, durante o anno, é apenas de 3 1/2 a 40,2 gráos. Em
1851 nos mezes mais frios [Junho e Julho] desceu a media a
240 e nos mais quentes, Março e Outubro ( as 7 h. da manhã ), a
270. Em 1858 o thermometro marcou 240 em Julho e 260,5 em
Outubro em 1859 -Julho 230 , Janeiro 26,5 ° : em 1860 -Julho
21,4 e Novembro 2506 : em 1887 -Agosto 240,3 e Dezembro
270,4 : em 1903 a 905 - Agosto 220,10 e Dezembro de 903-25,26
ou 3016 de differença.
MAXIMAS . - AS mais altas temperaturas mensaes em 1851
[as 12 h. do dia] oscillaram entre 280 [ Maio e Junho ] e 300,5
[Outubro, Novembro, Janeiro e Abril ] ; em 1858 - entre 290
[Junho e Julho ] e 300 [ Outubro, Novembro e Dezembro ] ; em
1859 -de 280 -- [Junho ] a 30 ° ,5 [ Janeiro e Setembro ] ; em 1860
186

-de 280,5 [Julho ] a 30,02 [ Janeiro e Fevereiro ] ; em 1887-88


-de 290 ( Dezembro e Abril ] a 280,3 [ Agosto ].-A differença
maior entre as maximas, em 24 mezes 1903 a 908 - foi de 31,02
em Abril 903 a 280,68 em Agosto 904.
MEDIAS. -A variação entre as medias mensaes é insignifi-
cante. Em 1851 a media de Julho e Agosto, as 7 h. da manhã,
foi de 250; nos mezes de Janeiro, Março e Outubro de 27,5 ;
em 1859 a media de Julho foi de 24,2 e a de Outubro de 27,5 ;
em 1860 a media mais baixa foi de 240,3 em Agosto, e a mais
alta de 26,3 em Novembro.
As differenças mensaes da temperatura obedecem a mar-
cha apparente do sol, salvo quando influencias locaes ou mete-
oricas as vêem modificar, como acontece quando chuvas fre-
quentes mantém a atmosphera fresca.
E' em Julho ou Agosto, quando o foco de aquecimento se
ha demorado nas immediações do tropico do Cancer, que a
queda na columna thermometrica mais se acusa. Os raios obli-
quos do sol, quebrantados pelas chuvas de Março a Julho, an-
teparados pela basta verdura das plantas e auxiliados por fraca
evaporação, não compensação a irradiação do calor perdido. A
temperatura desce ao minimo annual para ir progressivamente
readequirindo intensidade a proporção que se opera a transição
entre o equinoxio de Setembro e o de Março seguinte. De 250,95
ou 260,36 em Agosto o calor sobe a 26,34 em Setembro, 26,60 em
Outubro . 26,91 ou 27,07 em Novembro, 26,24 ou 27,47 em Dezem-
bro para attingir o maximo em Janeiro a Fevereiro com 27,34 a
270,50. São estas as differenças medias, que effectivamente se
tornam mais sensiveis attendendo - se as oscillações diarias.
Melhor se verifica o que aqui fica dito pela tabellà 5,
187

Tabella n. 5.

Temperatura a sombra-na Fortaleza, Medias .

1903 MAX. MIN. MEDIA 9 H. M. 21 H. M. 9 H.M.

Abril 31,02 24,89 27,70 27,90 29,32 27,16


Maio 30,47 24,0 27,53 28,03 29,48 | 27,17
Junho 29,60 22,97 26,53 27,48 28,91 26.18
Julho 29.30 22,94 26,42 27,62 28,58 25,58
Agosto 29,19 22,10 25,95 27.37 28,59 25,59
Setembro 28,69 23,54 | 26,34 27,52 28,28 25,42
Outubro 29,25 23,68 26,60 27,92❘ 28,82 25,47
Novembro 29.45 24,54 27,07 28,44 29,13 25.65
Dezembro 29,86 25,26 27,49 28,57 29,34 26.12

1904

Janeiro 30,28 25,15 27.50 28,36 29.63 26.26


Fevereiro 30,30 24,45 27.34 27,66 29.38 26,54
Março 29,75 21,73 27,06 27.44 28.82 26,35
Abril 29.67 24,24 27,12 27,80 29,14 26.64
Maio 29,34 23,72 26,63 27.29 28,87 26,30
Junho 29.22 23,30 26,44 27.05 28,80 25,97
Julho 28,95 22,71 25,94 26,67 28,02 25,39
Agosto 28.68 22,33 25,82 26,88 28.04 25.38
Setembro 28.92 23,76 26,36 27.27 28,28 25,44
Outubro 29.21 23,74 26,57 27.87 28,53 25,43
Novembro 28,82 23,56 26.91 28.62 29,28 25.60
Dezembro 30,16 24,41 | 26,24 28,50 29,39 25,85

1905

Janeiro 30,58 24,64 27,37 28.23 29,51 26.21


Fevereiro 30,50 24,62 27,50 28,65 29.57 26.25
Março 29,68 23,88 26,75 27,30 28,20 25,87

Media dos
24 mezes . 290,66 230,96 26,81
Differenças
extremas . 20,34 30,5
" mensaes . 50,64

A maior differença mensal foi entre Abril de 1903 — com


31,02 [ maximo] e 220,10 [ minimo] em Agosto de 1903, dando a
Tabella
.n
6
1851
Fortaleza
em
da
cidade
observada
na
atmospherica
temperatura
Da
no
exposto
centigrado
thermometro
s
livre
ar
,ao
cuberta
ob
188

15
.
mar
nivel
do
acima
metros

MAXIMO
CALOR MINIMO
CALOR CALOR
MEDIO

t1
h
6
.m
77.22h
MEDIA
MENSAL

Janeiro 30,5
28,5 27.5 26,5 28,5 ,27 27,5 29.5 27,3 28.1
Fevereiro
,
27 ,29 28
, 25 25
,2 6 ,26 28.5 27
, 27,2
Março 28 30 27,5 ,
27 29,5
,
27 27,5 29.7 27,2 28,1
Abril 28 30,5 .
29 26 28 27 ,
27 29.2 ,28 28
,
mo dia, como se vio pela tabella nº 2 .

Maio 27,5 29,5 ,


27 26 28 26 26,7 28,7 26,5 27.3
Junho 26 28 26
, 25 27 26 25,5 ,
27,5 26 26,3
Julho 26 28 ,
26 24 26 25 ,
27 25.5 25,8
Agosto 26 29 ,
26 24 27,5 23
. 28.2 25,5 26,3
Setembro
27 29 26,5 26 26 ,26 27.3
,26 27,6
Outubro28 30,5 28
, 27 29 27 27,5 29.7
27,5 28.2
Nopembro
28 30,5 ,
28 26 29,5 27 ,
27 30
, 27,5 28,1
Dezembro
27 29,5
27,5 26 ,
27 26,5 26,5 28,2 27 27.3
scientifica e a 14- do Observatorio astronomico do Rio.

Medias 30,5
27.5
28.5 24 26 25 26,2 28,6 26.7 27,2
As tabellas ns. 6, 7, 8, 9, 10, 11, 12 e 13 são da commissão
differença de 80,92 , quasi equivalente a que se opera nnm mes-
Tabella
.n
7

:1858
de
anno
sn
,Fortaleza
da o
cidade
a
aombra
centigrado
Thermometro

CALOR
MAXIMO CALOR
MINIMO MEDIO
CALOR
MEDIA VARIA-
ÇÃO
MENSAL
.h
.t
6
1
m
7
th7.h
.n 2h
2h
7.2

Junho .
27 .
29 27,5 24,5 20,5
.
26 25.7 27,7 26,7 26,7 4.5
Julho ,29
26.5 27
. .
24 25
.
26,5 25,7 27.7 26
. 26,5
Agosto 26,5
29.5 26,5 24,5 ,24,5
27 28,2 25,5 26.4
Setembro ,
29 27
, 27
,25,5 ,
28 26,2 26.8 3,5
Outubro ,28,5
30 27.5 ,
29
26,5 26,5 27,5 ,
27 ,
28
Novembro ,
30 27.5 25,5 26,5 26
, 26,5 26,7 27,1 4,3
,
27
Dezembro 30
, 27,5 .
25,5 27 26,2
26,5 28,5 27
, 27,2 4.5

Extremos
e 29.5 27.2 23,1 27,07 25,7 26.2 28,21 26.4 27,2
27,1 !
anedios
189
199
Tabella
8
.n

cidade
s
a
centigrado
Thermometro
,n ombra
a
Fortaleza
.da
1859
de
anno
o
190

MAXIMO
CALOR MINIMO
CALOR MEDIO
CALOR
MEDIA VARIA-
ÇÃO
MENSAL
7
6
m
1. 2
.th t12h
h
6
m
.7

Janeiro 328
, 0,5 ,
28 26,5 29,5 ,29 27,2 ,30 27,5
28,2 ,
4
27
,
Fevereiro 27
,30 25
, 26
,2 6 ,26 28
, 26,5 26,8 ,5
Março ,
27 ,
30 ,
28 ,
25 25,5 ,
26 27,5 26,5 26,6 .
5
Abril 2
,7 29,5 ,
27 ,
25 ,
25 ,
25 ,
26 27,5
26,5 26.6 4,5
Maio .26 29
, 27,5,
24 25,2 27. 26,2 26,1 4,5
Junho .
26 27
,28. 24,5 ,25 25,2 26,5 ,26 26,2 3,5
Julho 25,5
,
29 ,
23 24,2 27
, ,
26 25,7 ,
6
Agosto ,2269 ,
26 ,
24 25
,27,5 ,
25 28,5 25,5 26,1 .5
326
,Setembro
0,5 ,
27 .
24 26,6 ,
25 28,4 26
, 26,4 6,4
Outubro27, 29.2 27
, 24,5 27,5
,26 27,5 28,3 26,5 26,8 4,7
Novembro
,
27 29,6 27
, 25.4 28,2
,
26 26,2 28,9 26,5 27,2 4,2
27
,Dezembro 29,6 27,2 25,2 28
, ,
26 26,1 28.8 26,6 27,2 4,4
Termos
ex-
,
28 29,5 28
, 24,6 26,5 25,5 25,8 29
, 26,5
26,3 6.5
tremos
Tabella
.9
n

Fortaleza
.,n
c
s
a
Annoombra
a
Tent
1860
dehermt

MAXIMO
CALOR CALOR
MINIMO CALOR
MEDIO
VARI-
MEDIA
MENSAL
AÇÕES
.m
t12
6
h
7 m
t7
h
.6
112
.2

Janeiro 27,5 ,
30,2 28 25 28 25,8 26,2 28,1 26.9 27,4 5,4
Fevereiro 27,2 30,2
27.4 24 26 26,2 25,6 28,1 26,3
26,5 6.2
Março ,
27 29,5 25
27,6 27 25,2 ,26 28.25
26.4
26.6 ,
5
Abr
. il 26,8
29,5 27,8 24,5 25,2 25,8 25,6 27,4 26,8 26,6 ,5
Maio 26,6
,
29 27,4 23,4 24,4 25,2 25
, 26.7 26,3 26
, 6,2
Junho
.. 26
, 28,6 26,6 23
, 25 .
21 24,5 26,8 25.2 25,2 5,6
Julho ,
26 28,4 26,4 21,4 24,2 25
. 23,7 26,3 25,7 25,2 8.2
Agosto 25,6 28,6 ,
26,6 23 27,2
25.8 24,3 27,9 26,2 6,2
Setembro
. ,2
269 26,6 23 27,4 .
26 28,2
24,5 26,3 26.3 6,2
..
Outubro 26,4 26,8 24,6 26,4 25,8 27,7
25,5 26.3 26,8 4,5
Novembro
27
, 29,4 27,2 25,6 28,4 27 26,3 29,1 27,1
27,5
Dezembro27,4 30 27,6 25 ,
28 26 26,2 ,29 26,8 27,3 ,5

Extrem
.
m os26,6 29,3 27.1 24,1 26.4 25,6 25,3 27,8 26.3 26,4 5,6
191

.. annual25,5 30,2 27,8 27,8 24,2 24 25,3 27


26 ,8
,3
26,4
192

Tabella
1
.n0
.na
Fortaleza
sol
ao
Thermometro
1859--
de
Anno

MAXIMO MINIMO CALOR


VARIA-
ÇÕES
Meio M .h .h .
Md .h
1 .
h
3
3d
.1h 1 3
dia

Maio 36 36 41 30,5 34 33 32,2 35 37 11,5


Junho 36 36 38 ,30 30 34 ,
33 35 36 8
Julho 35
24.5 38 26
, 27 28 30.2 31 33 12
Agosto 34 37 41 28
30,8 30 32,4 35.5 35,5 11
Setembro35,6 41 41 30,5 33 31 33
. 37
, ,36 10,5
Outubro42
, 43 44 ,33 33 34 37.5 38 41 11
Novembro
40 42 44 ,
32 31 36 ,
36 36,5 40 13
Dezembro
40 42 43 35 36 39 37,5 37 36 8
Tabell
.1
n1 a
de
D
-
1859
Anno
dias
e
maximo
minimo
sol
ao
calor
meio
ee
dia
da
tarde
as
horas
4

MAXIMO MINIMO

Dia Hora Altura Dia Hora Altura

Maio
.. 27 31 410 19 1 30,5
Junho 17 2 38 15 2 ,30
Julho 31 12 34.5 16 12 ,
26
Agosto 9 12 34 8 12 30,8
Setembro
. 26 3 40 10 3 ,
31
Outubro
.. 14 31 44 4 37
Novembro 13 3 40 16 34
.
Dezembro 13 3 43 16 38
193
Tabella
.12
.n
1860
.de
anno
n o
Fortaleza
,da
cidade
na
sol
ao
centigrado
Thermometro
194

CALOR
MAXIMO MINIMO
CALOR CALOR
MEDIO
MEDIA
VARIAÇÕES
MENSAL
Meio meio meio .h
.h
1 .h
2 .h
1 .h
2 h
.1 2
dia dia dia

Janeiro 42 42 44,5 28 28 28 35 35 36,2 35,6 17,5


Fevereiro
42 42 44 28 27 27 35 34,5 35,5 35 19,5
Março 41 42 43 28 26 26 35,5 34 34,5 34 18
Abril 40 41 42 28 26 26 34 33,5 33 35,5 17
Maio 40 41 40 27 26 26 33
, 33 33,2 16,5
Junho 38 38 40 29 29 32 33,5 33.5 36 34.3 16
Julho 39 40 40 28 27 27 33,5 33.5 33 18
Agosto 38 39 39 34 35 32 36 37 35,5 36,4 16
39
Setembro 41 41 33 33 29 36 37 35 36 17,2
Outubro39 40 40 31 32 28 35 36 34 36 16,4
39
Novembro 40 41 32 32 32 35,5 36 36,5 35,6 16
39
Dezembro 40 40 31 30 29 35 34 34,5 34,2 15

. ed
m
Extr 39,6 40,5 41,2 29,7 28,5
29,18 34,7 34,8 34,8 34,6 17,3
Tabella
n
,13
1851
em
annual
media
,Temperatura
1
e
T
- 858
859
860
Fortaleza
na
c
s
.aent
ombra
herm

PRECEDENTES
TABELLAS
DAS
RESUMO

Termos
extre-
1851
1858
1859
1860
m
eedios
mos

horas
manhã
da
.7 28,5 28.5 28 27,5 28,1
Maior t
1"12
a
" arde 30,5 30,5 30,5 30,2 30,4
calor t"666arde 28 28 28 28 28
ཉྙ

hmeio
De
3
as
dia
oras
sol
.ao 388
44 44,5 44,2

horas
.7
manhã
da 24 24 23 21.4 23,1
Menor tarde
1hora
a
dia
Meio
.da 26 25 25 24 25
calor tarde
horas
6
da
.. 25 24,5
25 24 24,7
བཟླསྶ

2595
3
as
dia
meio
De
.horas
sol
ao 26 26
3953

da
h
.7
manhã
oras 26,8
25,8
26,2 24,4 26
Calor 1hora
a
dia
.Meio 28,6
28,2 28 27,1 28,15
medio tarde
6
horas
.da 26,7 26,5 26,3 26 26,45
meio
De
as
dia
h
3
sol
.aooras 36 34,8 35,4
9333

:
anno
do
media
Temperatura
sombra
.A 27,2 26.8
26,4
26.4 26.2
195

sol
Ao 35,3 34,0 29,9
Tabella n . 14.

Observações na cidade da Fortaleza - dados fornecidos pelo Dr. Cruls.


do Observatorio :

PRESSÃO
TEMPERATURA HUMIDADE RELATIVA
BAROM.
VENTO
1887 CEO
DOMIN.
Media Max. Min. Media Media Max. Min.

7es

96865
Agosto 26,9 28.3 24,3 63,5 87 46 SE claro

b
=
Setembro 28.0 28, + 27, 766,° 755 91 57 SE
Outubro 27,7 28,4 26.2 757,4 64, 81 55 SE nublado
Novembro 28, 28.6 27. 766,2 63,1 77 57 SE
Dezembro 28,3 29. 27,8 767,7 62,8 97 61 SE clars

1888

Janeiro

885
Fevereiro 27.5 28,7 24,8 767,° 73.6 92 60 SE Nublado
Março 26,9 28,6 25, 766,5 78.7 92 65 Se SE

77
Abril 28.2 9 27.4 767,4 72.9 79 67,1 SE
Maio 27,8 28,4 27,4 767,7 70,9 76 65,8 SE " ecla

Media 29,7 28.6 26,3 766,9 69,4 85.6 69,9 SE

Observações as 9 h. da manhã.

Media das pressões barometricas- medias 766,9


maximas 768.4
99 minimas 765,4
23 media
da temperatura 27,
99 maxima 28.6
minima 26,3
humidade relativa media 69.4
" 99 ་་ maxima 85.6
་་
minima 60,6
Vento dominante Sueste
Tabella n . 15 .

Observações a O h. m. de Greenwich

Estação de Quixadá Estação da Fortaleza

BAROMETRO
BAROMETRO

as 9 h. a Fevereiro de 1906 as 9 h. e 29 m. m.

HUMIDADE
HUMIDADE

RELATIVA
RELATITA
+
THERMOMETRO THERMOMETRO

VAPOR

VAPOR
m

TENSÃO

TENSÃO
a+i
700

°m00
SECCO

SECCO
°=

DO
/m

DO

a
0
0

7
a
DIAS

t-
t-

'
'

m m / m ‫ מון‬m O m m

O
1 41.16 27.6 3.6 73.0 19.96 60.22 30.1 2.7 80.4 25.46
2 40.92 29.6 5.2 63.4 19.53 60.06 30.4 2.6 81.0 26.17
3 42.06 28.4 4.8 65.0 18.71 61.22 30.0 2.7 80.1 25.30
4 42.06 28.6 4.6 66.0 19.34 60.96 30.3 2.2 84.0 26.89
=
5 41.16 27.6 3.6 73.0 19.96 60.70 30.6 2.5 82.0 26.71
6 40.73 27.8 3.6 73.0 20.24 60.38 29.7 1.9 85.9 26.60
7 41.13 27.8 2.8 79.0 21.42 60.51 29.4 2.6 80.8 24.57
8 41.01 27.8 4.4 67.4 18.69 60.93 30.3 2.8 79.5 25.56
9 41.59 28.8 4.0 70.8 19.83 60.25 30.1 2.1 84.5 26.77
10 41.93 29.0 2.4 82.0 24.40 60.66 28.4 1.7 86.8 25.03
11 41.16 27.6 3.0 77.0 21.17 60.27 30.8 3.5 75.1 24.81
12 41.71 28.0 3.4 74.6 20.92 60.67 28.8 1.7 87.0 25.61
13 43.81 22.8 1.4 88.0 18.11 63.01 22.8 0.0 100.0 20.62
14 42.23 27.0 4.0 70.0 18.42 61.42 30.1 3.0 78.1 24.80
15 43.07 26.0 2.0 84.0 20.95 62.06 23.6 0.0 100.0 21.67
16 43.23 27.0 2.4 81.0 21.54 62.21 29.7 2.9 78.5 24.44
17 43.75 27.0 2.4 81.0 21.54 61.96 25.8 0.4 97.0 23.86
18 42.83 27.6 3.0 77.0 21.17 62.36 29.2 3.3 75.5 22.77
19 42.88 26.6 1.6 87.0 22.56 62.68 25.4 1.6 87.0 20.94
20 44.89 26.4 1.6 87.0 22.32 63.34 25.4 1.0 92.0 22.13
21 43.23 27.0 2.0 84.0 22.31 62.19 29.3 3.1 77.1 23,36
22 42.90 26.4 3.4 73.C 18.79 62.36 246 1.1 90.7 20.86
23 43.77 27.4 4.4 67.0 18.17 62.85 29.3 4.2 70.0 21.09
24, 43.18 27.4 3.4 74.0 20.08 62.68 25.3 1.3 89.0 22.74
25 43.00 25.6 2.0 83.6 20.43, 61.34 27.4 2.2 83.0 22.47
26 42.95 26.0 2.2 82.0 20.57 61.29 29.2 3.3 75.5 22.77
27 42.88, 26.6 3.0 76.6 19.82 61.75 26.1 1.4 88.7 22.30
28 42.90 20.4 2.0 84.0 21.51 61.72 29.2 3.1 77.0 23.21

42.48 27.173.06 76.65 20.43 61.56 28.21 2.19 83.63 23.81


Tapella n . 16.

Observações a O horas da manhã de Greenwich


na estação de Quixadá na estação de Fortaleza
Latit. 4,57'34'S- Julho de 1906 Latit. 30,43'38'S
Long. 390,22'03" W,9 Gr. Long. 380,30/23 / W. Gr.
BAROMETRO

BAROMETKO
Altitude 199 m. Altitude 1m 20.

HUMIDADE
HUMIDADE
RELATIVA

RELATIVA
EPOCAS TERMOMETRO THERMOMETRO
LOCAL

mm

00
HORA

°=00

/+
VAPOR

VAPOR
+

°=
m

TENSÃO
TENSÃO

a0
7
7a
0

SECCO
SECCO

DO
DO
DIAS

t'-

t'-
m 0 n 0/ m 111
--- 0 %
E

1 43.98 23.8 2.877.0 16.77 62.82 25.5 1.8 85.0 20.69


2 43.95 24.0 5.0 60.0 13.28 63.63 24.8 3.4 72.416.88
3 43 82 25.0 4.0 68.0 16.04 62.74 27.7 4.6 66.0 18.18
4 43.96 24.0 4.0 67.0 14.94 63.46 27.8 4.0 70.0 19.46
5 44.94 24,2 4.2 66.0 14.81 64.15 27.8 4.8 65.0 17.93
6 45.1522.4 2.677.8 15,55 64.18 28.0 4.2 68.8 19.34
7 44.79 25.4 4.4 66.0 15.79 63.84 27.6 4.6 66.0 18.05
8 43.79 25.4 5.458.0 14.08 63.53 27.4 3.0 77.0 20.89
9 43.84 25.0 4.0 68.0 16.04 63,16 26.6 3.2 75.0 19.43
10 43.82 25.2 5.457.8 13.84 63.02 25.9 1.4 88.5 22.02
11 42.99 23.8 2.8 77.0 16.77 61.89 27.3 3.0 77.0 20.75
12 43.96 24 0 5.0 60.0 13.28 63.40 28.2 3.4 74.821.20
gha

13 43.8624.8 4.8 62.0 14.44 63.61 27.6 2.6 80.0 21.94


14 43.84 25.0 3.0 76.0 17.81 63.37 27.4 3.0 77.0 20.89
.

15 44.28218 1.0 91.0 17.66 62.62 28.4 3,0 77.4 22.25


16 43.07 23.2 4.2 65.0 13.77 62.17 26.4 3.4 73.0 18,79
17 43.35 25.0 4.0 68.0 16.04 63.26 27.8 2.8 79.0 21.42
18 44.96 24.0 3.075.0 16,65 64.35 23.8 1.4 88.0 19.28
19 44.08 23.0 2.6 78.0 16.23 63-34 26.5 2.8 78.0 20.07
20 43.07 23.2 2.2 81.0 17.14 62.73 27.0 2.4 81.021.54
21 43.47 24.0 5.0 60.0 13.28 62.69 26.4 2.4 81.0 20.70
22 44.08 23.0 4.0 60.0 13.89 63.16 27.2 2.2 83.0 22.19
23 43.96 24.0 4.0 67.0 14.94 63,37 27.8 50 63.0 17.54
24 42.73 26.0 5.0 62.0 15.42 62.82 26.9 3.2 75.0 19.82
25 43.85 25.0 5.0 61.0 14.32 63.59 27.3 1.8 86.0 23.14
26 43.96 24.0 3.075.0 16.65 63.77 27.2 2.0 84.0 22.59
27 43.94 24.0 5.0 60.0 13.28 63.51 27.8 5.0 63.0 17.54
28 44.84 25.0 6.649.4 11.72 64.15 27.8 5.2 61.6 17.18
29 45.03 23.2 3.471.8 15,03 63.91 26.0 3.0 76.0 19.04
30 44.23 22.0 1.0 91.0 17.88 63.51 26.8 3.8 71.0 18.54
31 44.99 24.0 4.0 67.0 14.94 64.27 27.3 4.8 64.5 17.30

Medias 44.01 24.08 3.87 68.75 15.25 63.35 27.03 3.26 75.12 19.90
Tabella n . 17.

Observações meteorologicas feitas as 9 horas da manhã


no mez de Novembro de 1906 nas
BAROMETRO

Estação de Quixadá 9 h. m. Estação da Fortaleza 9, 29.m


EPOCAS

THERMOMETRO THERMOMETRO
mm
° 00
+
0
7

SECCO
DIAS

O m/m O !
in 7mm

O
O

%
1 42.38 28.2 7.2 50.0 14.07 61.47 28.8 4.5 67.1 19.82
2 42.66 29.2 8.2 45.0 13.45 61.91 28.7 4.6 66.1 19.48
3 42.47 28.6 7.0 51.6 14.91 61.91 29.3 4.5 67.4 20.52
4 42.13 27.8 6.6 53.2 14.68 61.36 28.9 4.4 68.0 20.16
5 41.83 27.0 4.6 65.4 17.31 61.09 28.9 4.6 66.3 19.76
6 42.23 27.0 5.0 63.0 16.58 61.56 29.1 4.8 65.3 19.64
7 42.76 27.6 5.6 59.0 16.21 61.39 28.9 4.1 70.3 20.27
8 42.23 27.8 5.8 58.0 16.08 61.32 28.7 4.3 68.7 20.08
9 42.11 28.0 6.0 57.0 15.95 60.87 29.2 5.3 62.4 18.79
10 42.08 28.2 6.2 56.0 15.84 61.18 29.3 2.9 78.5 23.79
11 42.11 28.0 5.4 60.6 17.05 61.57 29.1 4.3 68.9 20.64
12 42.13 27.8 5.4 60.4 16.81 61.31 29.6 4.8 65.8 20.34
13 41.17 27.8 5.0 63.8 17.54 60.61 28.8 4.3 68.7 20.08
14 40.22 27.2 5.6 58.6 15.77 59.35 28.4 3.8 71.6 29.68
15 40.61 26.4 4.4 67.0 16.95 60.13 28.7 4.5 67.1 19.68
16 40.85 26.8 4.2 67.6 17.79 59.56 29.2 3.6 73.6 22.16
17 40.00 29.0 7.2 50.8 15.03 59.17 29.4 2.4 82.0 25.01
18 40.76 28.4 7.4 49.0 13.94 60.10 28.9 4.3 68.8 20.36
19 42.11 28.0 6.2 55.8 15.64 60.89 28.9 4.2 69.7 20.57
20 41.18 27.4 5.8 57.6 15.64 60.39 28.8 3.2 76.0 22.41
21 41.71 28.0 6.6 53.4 14.92 60.54 29.4 3.7 73.2 22.24
22 42.66 28.4 6.4 55.0 15.72 61.29 29.3 3.3 75.5 22.94
23 42.73 27.8 5.2 61.6 17.18 61.58 28.9 2.8 79.0 23.40
24 40.52 29.6 6.6 55.0 16.82 50.98 29.6 4.3 69.1 21.31
25 40.93 27.0 4.0 70.0 18.42 59.78 29.7 4.8 65.9 20.48
26 41.01 28.8 5.8 59.0 17.31 60.50 29.9 4.9 65.5 20.52
27 41.93 26.2 3.2 75.C 18.91 61.32 29.3 4.7 66.1 20.12
28 41.81 28.0 5.2 61.8 17.42 61.13 29.6 5.2 63.4 19.53
29 42.91 27.2 4.8 64.4 17.18 62.46 29.5 5.2 63.3 19.39
30 42.68 28.2 5.8 58.4 16.56 61.62 29.0 5.8 59.2 17.57

41.77 27.855.75 58.77 16.26 60.91 29.134.27 69.08 20.72


Tapella n. 18.

Observações meteorologicas feitas as 9,26 m. da ma-


nhã nas estações do mez de Dezembro de 1906

Quixadá as 9 h. m. Fortaleza 9, 26.m


BAROMETRO

EPOCAS TERMOMETRO THERMOMETRO


mm
° 00
+
=
a
0
7

SECCO
DIAS

O O O
m/m % /mm/m % m /m
1 42.73 27.8'6.0 56.8 15.77 61.39 29.4 5.7 60.218.28
2 41.18 27.45.2 61.2 16.70 60.41 28.7 5.4 61.3 17.95
3 42 11 28.06.2 55.8 15.64 61.11 29.2 5.4 61.8 18.60
4 42.62 29.68.2 45.4 13.93 61.64 29.2 5.2 63.0 18.97
5 41.94 29.48.4 44.0 13.33 60.83 29.4 5.3 62.6 19.05
6 42.06 28.4 7.0 51.4 14.67 60.96 29.3 4.9 64.9 19.71
7 41.11 28.05.4 60.6 17.05 60.36 29.2 4.5 67.3 20.30
843.14 24.42.0 83.4 18.91 61.91 28.9 3.7 72.721.54
9 44.67 28.25.8 58.4 16.56 63.21 28.5 3.6 73.0 21.22
10 42.92 29.6 7.8 47.8 14.66 61.84 29.3 5.2 63.1 19.11
11 41.73 27.8 6.0 56.8 15.77 60.32 28.4 3.7 72.3 20.88
12 42.66 28.46.2 56.2 16.08 61.34 29.1 5.2 62.9 18,85
13 43.65 28.44.8 65.0 18.71 63.67 27.8 2.8 79.0 21.42
14 42.71 28.05.6 59.4 16.69 61.86 29.2 4.0 71.021.35
15 42.78 27.44.4 67.0 18.17 62.44 29.2 4.9 64.8 19.67
16 41.41 28.0 6.0 57.0 15.96 61.33 29.5 5.4 62.118,99
17 41.53 27.04.6 65.4 17.31 61.01 29.4 5.0 64.419.65
18 41.36 26.24.2 68.0 18.30 61.18 29.4 5.6 60.8 18.47
19 41.09 28.46.8 52.6 15.03 60-53 29.4 5.1 63.8 19.45
20 41.17 27.8 6.4 54.4 15.04 60.42 29.2 5.6 60.6 18.21
21 40.54 28.67.6 48.0 13.82 59.16 29.4 5.9 59.0 17.85
22 40.09 28.26.2 56.0 15.84 59.33 28.9 5.2 63.7 18.71
23 40.19 27.45.0 63.0 17.06 60.05 26.6 5.0 64.6 19.93
24 42.41 28.0 5.8 58.2 16.32 59.98 29.2 5.2 63.0 18.97
25 42.18 27.45.4 60.0 16.33 61.18 28.2 3.6 73.0 20.80
26 41.85 26.84.4 66.4 17.43 60.59 29.4 5.2 63.219.25
27 42.08 28.2 6.6 53.6 15.16 60.54 28.5 4.8 65.0 18.84
28 41.68 28.2 5.6 59.C 16.93 60.65 29.8 5.1 64.2 20.01
29 43.80 27.2 5.0 63.2 16,82 62.36 29.4 4.9 65.0 19.85
30 42.78 27.4 6.4 54.0 14.56 61.83 29.3 5.0 64.3 19,51
31 42.18 27.45.0 63.0 17.06 61.40 29.8 5.4 62,4 19.41

Medias 42.09 27.84 5.81 58.43 16.18' 61.14 29.17 4.88 65.16 19.51
1
Tabella n. 19 .

Observações meteorologicas feitas as 9 horas 26 m. da manhã


Dezembro de 1905
BAROMETRO

BAROMETRO
Estação de Quixadá Estação da Fortaleza
EPOCAS

HUMIDADE
HUMIDADE

RELATIVA
RELATITA
THERMOMETRO THERMOMETRO

/m00

VAPOR
VAPOR

TENSÃO
TENSÃO

+
002

0
°a
7

SECCO
SECCO
=
+0/1"

DO
DO
DIAS

'-
t

-
'1
t
m/m mimn m !m
O

O
O
C

1 61.93 29.1 3.7 72.9 21.82 43.01 28.8 3.8 72.0 21.20
2 61.97 27.4 3.2 75.2 20.49 43.21 | 27.2 4.2 68.0 18.30
3 61.57 28.8 4.0 70.8 19.83 42.71 28.0 4.0 70.0 18.71
461.57 28.9 3.6 73.3 21.74 42.54 29.4 5.4 62.0 18.85
5 61.49 27.9 2.9 78.0 21.55 42.73 27.1 4.2 67.9 18.15
6 61.82 28.7 4.2 69.5 20.29 43.16 27.6 6.0 56.6 15.53
7 61.86 27.9 3.3 75.1 20.98 43.08 28.2 6.6 53.6 15.16
8 61.41 28.7 3.8 71.9 21.10 42.68 28.2 4.8 65.0 18.45
9 60.54 27.8 3.1 76.3 21.25 41.71 28.0 6.0 57.0 15.95
10 61.26 27.7 3.5 73.6 20.30 42.18 27.4 4.4 67.0 18.17
11 60.18 28.2 3.8 71.1 20.40 41.09 24.8 2.4 80.0 18.66
12 60.44 28.2 3.6 73.0 20.80 41.16 27.6 3.6 73.0 19.96
13 61.12 28.5 3.7 72.4 21.02 42.22 23.8 1.2 90.0 19.64
14 61.27 27.9 3.0 77.0 21.59 42.40 25.6 2.6 79.0 19.28
15 61.48 27.9 3.0 77.0 21.59 42.37 25.8 2.4 80.4 19.93
16 61 93 29.04.5 67.2 20.10 43.35 26.0 3.0 76.0 19.04
17 62.08 28.2 3.4 74.8 21.20 43.11 | 28.0 4.6 66.0 18.57
18 63.14 28.6 3.3 75.5 21.93 43.30 , 26.4 2.4 81.0 20.70
19 62.28 29.0 3.9 71.5 21.27 42.83 27.0 3.4 73.6 19.57
20 62.31 28.4 3.5 73.9 21.28 43.35 26.0 2.6 79.4 19.80
21 62.17 28.6 3.5 74.0 21.52 43.21 27.2 3.6 72.6 19.45
22 61.57 27.4 2.7 79.3 21.49 42.83 27.0 3.0 77.0 20.33
23 62.03 28.8 4.8 65.0 19.22 42.90 26. i 2.4 81.0 20.70
24 51.89 28.1 3.6 73.0 20.66 43.13 28.0 3.0 77.0 21.69
25 62.19 28.6 3.7 72.4 21 16 43.82 27.0 3.6 72.4 19.19
26 62.37 29.1 4.5 67.3 20.24 43.89 26.4 4.6 64.8 16.63
27 62.07 29.2 4.6 66.C 20.20 43.63 28.6 4.6 66.0 19.34
28 61.98 28.9 4.5 67.2 19.96 43.18 27.4 5.2 61.2 16.70
29 60.83 29.4 | 4.5 67.4 20.66 41.71 28.0 5.0 63.0 17.80
20 60.46 28.7 3.7 72.5 21.26 41.90 26.4 4.4 66.0 16.95
31 61.52 29.4 4.3 69.0 21.03 42.76 27.6 5.6 59.0 16.21
197

VARIAÇÕES LOCAES. -Nas tres zonas , que caracterisam o


relevo do solo cearense, a temperatura varia, segundo as con-
dições topographicas peculiares a cada uma dellas.
No litoral, domina o clima quente e humido, que ficou es-
tudado na cidade da Fortaleza.
Nas serras o abaixamento do calor opera- se a razão de
um gráo centigrado por cada 100 a 130 metros de elevação.
Na serra de Maranguape, a 300 m. acima do nivel do mar,
observei nos mezes de Outubro, Novemhro, Dezembro e Ja-
neiro que o thermometro apresentava a differença de 3 gráos
para menos da temperatura da Fortaleza. A 580 m. , em Dezem-
bro e Janeiro de 1891 e 92, o maior calor nos dias 31 de Ja-
neiro, 2, 5 e 7 de Fevereiro attingiu a tarde a 27°, regulando a
media durante o dia 240. Pela manhã a temperatura nunca
excedeu de 22,50.
Em Baturité, na villa de Guaramiranga, situada a 750 me-
tros acima do nivel do mar, a temperatura media annual é de
20°, descendo o thermometro a 150 em Julho e subindo a 28°
nos dias de maior calor.
Na serra do Araripe registei em Janeiro de 1891 pelas 2 h.
da tarde a temperatura de 210 C , quando no Crato se elevava a
27° C.
Na villa do Pereiro, situada a uns 600 metros acima do ni-
vel do mar, na serra do seu nome a temperatura é secca desce
a 180 gráos e raramente excede de 28° nos dias de maior calor .
Em geral o clima das serras é tanto mais agradavel por
sua frescura quanto menos desguarnecida de mattas. Ordina-
riamente, nas orientadas de norte a sul, as vertentes orientaes
são muito mais frescas do que as occidentaes. como acontece
com a de Maranguape.
O clima do sertão é mais variavel, sujeito a oscillações ra-
pidas, a temperaturas relativamente extremas.
Entre 9 horas da manhã e as 4 da tarde, os dias são muito
mais quentes do que no litoral, as manhãs e noites muito mais
frescas. No Ico, Sobral, Quixeramobim, o thermometro a som-
bra, na hora mais calida, attinge 370.
Parece, porém, que a temperatura media de alguns luga-
res sertanejos não se distancia muito da do litoral. As tabellas
15 a 19 seguintes das Estações meteorologicas do ministerio da
marinha , no Ceará, situadas na Fortaleza e em Quixadá, mos-
198

tram que nos mezes de Fevereiro, Julho, Novembro e Dezem-


bro de 1906 as temperaturas diarias destes dous lugares va-
riaram para menos calor, no coração do sertão cearense. Na For-
taleza a media de Fevereiro foi de 280,21 contra 270,17 no Qui-
xadá : em Julho de 270.03 naquella contra 240,08 : ( 1 ) em No-
vembro de 270,85 em Quixadá contra 290,13 ( Fortaleza ) ; em
Dezembro de 270,84 ( Quixadá ) contra 290,17 ( Fortaleza ). Compa-
rando-se os dados das tabellas nº 5 com os de n.os 17 a 19
obtem-se o seguinte :

1903 1904

Forta- Quixa- Quixera Forta- Quixa- Quixera-


leza dá mobim leza dá mobim

Janeiro 28,2 27,90 27,50 28,0 27,93


Fevereiro 26.8 26,89 28.54 2) 29,2 28,16
Março 27.0 26,83 27,06 26,5 26,38
Abril 27,70 27,5 27.91 27,12 25.7 27,23
Maio 27,53 27,8 27.71 26,65 24.8 26,39
Junho 26,53 27.8 27.21 26.44 24.6 26,14
Julho 26,42 27,5 27.04 25.94 24.4 25,64
Agosto 25,95 30.5 27,06 25,82 24.0 25,68
Setembro 26,34 27,2 27,38 26,36 25.7 27,10
Outubro 26,60 28.2 27,88 26.57 26.0 27.39
Novembro 27.07 28.2 28.20 26,91 26.7 27,69
Dezembro 27.49 27,7 28,82 26.24 26,7 27,94

27,86 27,57 26.41 26.02 26,97

Como se vê, as variações se pronunciam, no sertão, para


mais nos mezes de verão e para menos nos de inverno.
As tabellas seguintes mostram as variações horarias :

(1) Não pude conseguir os boletins mensaes destas duas


estações senão de alguns mezes.
(2) Os dados destas duas columnas não concordam com os
do boletim das tabellas 15 e 16, talvez por se referirem a horas
differentes.
Tabella
.2
n0

Quixadá
)de
Cedro
. çude
s(a
Observatorio
do
noombra
media
Temperatura

1904
1906
1905
1901
1903
1902
1897
1900
1898
1894
1896
1895
1891
1893
1892

Jaueiro 29,3
28,7
28,4
26
22,44
26,69
26.91
99 27.2
228,5
, 6,7
28
28,2
27,3
28.6
26,5
26,30
27,26
26,90
27,02
25,76
Fevereiro 29,2
27.2
26,8
27,5
29,3
Março 26,6
26,33
25,83
25,97
25.74
26,70 28.4
26,7 27,2
27,2
26,6
26,5
27,0
27,8
Abril 26,3
25,89
25,68
26,11
24,95
24,58 27.0
26,1 26,1
26,6
27,3
25,7
27,5
27,6
Maio 28,1
25,7
25,8
25,06
25,89
26,47
25,46
25,18 26,3
26,0
27,4
24,8
27,8
26,6
Junho 27,5
24,0
24,9
24.64
24,83
23,60
26,75
25,38 26,2
26,8
26,7
24.6
27,8
24,62
24,83
23,67
26,83
25,21
Julho 26,3
27,5
27,4
26,5
23,0
27,7
27,0
25,96
26,0
26,35
25.75
26,19
27.74
25,61
Agosto 26,7
27,5
27,8
24,0
30,5
27,4
27,6
27,8
27,33
26,57
26,90
26,09
28,11
30,94
Setembro 27,4
26,9
25,7
27,2
27,7
28,0
28,6
27,8
27,90
25,0
27,73
28,63
28,32
26,29
28,15
Outubro 28.2
27,8
26,0
28,4
28,2
28,7
28,75
28,6
28,34
28,30
28.78
28,66
Novembro
27,04 25,7
27.3
28,2
29,3
28,5
29,0
27,90
28,8
28,45
28.83
28,63
28,07
Dezembro
26,90 27,7
27,1
26,7
29,0
28,9
28,0
28,3

Media 27,6
26,49
28,18
28,01
26,55
27,45
26,12
25,87
27,30
26.62 26,02
26,75
27,05
27,86
27,93
,1
,2
3,75
231Extremos
|5,8
,3
5.86
4,14
1,83
2,55
7.34 3,7
27
1,5
5,2
1,4
mensaes
1895
de
Janeiro
em
22,44
mensal
baixa
mais
Media
199

66 .6 alta 66 30,5 .. 1903


de to
Agos
200

VARIAÇÕES LOCAES -- Horarias. —Graças ao observatorio me-


teorologico de Quixeramobim, cujo os apparelhos registram
de 15 em 15 minutos as modificações atmosphericas, pode-
mos conhecer as variações horarias da temperatura numa
das regiões mais quentes e seccas do Ceará, chamada por
isto e por sua situação topographica-o coração da Provin-
cia.

As tabellas 21 e 22 reproduzem a media horaria de cada


mez no decurso de 1896 a 1905. Vê-se por ella que a marcha
da temperatura acompanha parallelamente a apparente do sol,
augmentando mais rapidamente de calor com a verticalidade
de seus raios, baixando da mesma fórma logo apoz a sua occul-
tação do sol). A partir do minimo, das 5 as 6 h. da manhã, no-
ta-se a seguinte gradação :

Diffe- Diffe-
Horas Gráos c. Horas Gráos
rença rença

5 as 6 m. 23.77 - 0,224 as 5 t . 31.78 - 0,09


7 23.97 + 0,20 6 " 31,12 0,66
6 24.78 + 0.81 7 16 29,93 1,19
9 25,88 +1.10 8 66 28,49 1,44
10 " 27.06 +1.18 9.66 27,25 1,24
11 66 28,22 +1.16 10 " 26,29 0,96
12 66 29.24 + 1.02 11 25,59 - 0.70
:

1 t. 30,19 + 0,95 12 .. 25,11 - 0,48


24 31.02 + 0,83 1 m. 24,79 0,67
3" 31.60 + 0,58 26 24,61 - 0,18
4 " 31,87 +0,27 3 " 24,42 - 0,19
4 " 24,19 0.23
56 23,99 0.20

As temperaturas extremás occorrem das 5 as 6 h. da ma-


nha, com o minimo de 230,77; e das 3 as 4 h. da tarde, con o
maximo de 310,87, mostrando a differença media diaria de 80,10.
Esta differença nos 12 mezes do anno vai de 60,44 em Fe-
vereiro e Março á 9 ° , 88 em Outubro. A minima é constante
entre 5 e 6 h. da manhã, em todos os mezes, emquanto a maxi-
201

ma se desloca nos mezes de Setembro e Dezembro para hora


seguinte. 4 as 5 da tarde, como se pode verificar no seguinte
apanhado da tabella 20.

Diffe-
Hora Minimo Hora Maximo
rença

Janeiro .... 5 a 6 m. 24°,91 3-4 h . t. 33,98 8.17


Fevereiro 16 24,93 66 31,41 7.02
Março • 24.09 30.53 6.44
Abril 66 23,92 30.36 6.44
Maio 23,56 30,18 6,62
Junho.. 22.83 30,39 7,56
Julho ... 22,58 30,89 8,31
66 22,89 31,58 8,69
Agosto
Setembro.... 66 23.55 4-5 33.01 9,46
Outubro..... 23,83 3-4 33.71 9,88
Novembro 24.27 66 33,96 9.69
Dezembro ... 24,64 4-5 33,62 8,98

Media ... 66 23,77 31,87 8,10

Assim , nos mezes pluviosos a temperaturu mantem- se mais


igual, devido talvez ao abrandamento das correntes aereas, a hu-
midade do solo e a vegetação dos campos, alem de outras cau-
sas secundarias.
1
Tabella

HORAS JANEIR
1234

1m -0.34
-0.20
-0.14
-0.29
-0.00
66. -0.19
7 +0.08
8 +0.68
9 +0.93
10 +1.19
11 +1.22
26
12 .. +1.
+0.97
+0.83
+0.66
+0.35
-0.09
-0.46
-0.07
8 -0.43
9 -1.35
10 -1.09
-0.90
12 -0.56

Medias
203

VARIAÇÕES MENSAES. -A amplitude thermometrica media ,


diaria, nos 10 annos acima ( 1896-1905 ) deu o maximo de
90,88 e o minimo de 60,44 : a absoluta, porém, é muito maior,
como se vê das tabellas 23, 24, 25, 26 e 27. Em 9 annos ( 1896
a 1904) o maximo de calor foi attingido em Fevereiro de 1896
com 370,5, regulando a media das maximas absolutas em 360,23
no mesmo periodo. A frequencia dos días de mais alta tem-
peratura se manifestou em Dezembro com a media de 350.93,
Novembro com 350,78, Janeiro 350,67 e Novembro 350,54 : a
das minimas em Julho com 220, 12, Junho 220,28 e Agosto 220,46.
O dia de menor calor foi em Julho de 1896 com a tempe-
ratura 180,10. ( 1 )
A amplitude absoluta annual apresenta a seguinte marcha :
Dia

Annos Mez Max. abs . Mez Min. abs. Ampli-


tude

1896 22 Fevereiro 37.30 20 Junho 18.10 19.20


1897 15 Dezembro 36.15 4 Julho 19.95 16.20
1898 9 Janeiro 35.90 19 Julbo 19.00 16.90
1899 23 Dezembro 35.75 25 Maio 18.75 17.00
1900 14 Março 36.25 24 Junho 20.45 15.80
1901 9 Dezembro 36.55 30 Julho 18.85 17.70
1902 7 66 36.55 30 18.85 17.70
1903 16 Novembro 36.25 25 Junho 19.30 16.95
1904 24 35.35 7 Agosto 19.35 16.00

Medias 37.30 18.10 19.20

Sendo a media das maximas absolutas de 320,42, oscillan-


do entre 300,79 em Maio e 340,23, em Novembro conforme a
tabella 24 e a das minimas de 230,43 em a amplitude de
220,12 em Julho para 240,58 em Janeiro, ( tabella 25) as diffe-
renças entre as temperaturas extremas, são de 10 °, 30 e 9 ° , 66.
A temperatura media mensal é de 27° , 32, oscillando entre
26º, 17 em Junho e 28,962 em Dezembro (tabella 26 ).

(1 ) Em 1906 a temperatura baixou a 140 , em Junho.


204

Parece que a temperatura do Icó, da qual não tenho senão


os dados fornecidos pelo Dr. João M. da Silva Coitinho, da
commissão scientifica de 1858 a 60, pouco diverge da de Qui-
xeramobim. A tabella 28 dá apenas alguns dias de observação
em um dos mezes mais quentes, mostrando a media de 35º ,25
nas maximas e 26º, 66 nas minimas.

No Crato a media das maximas é de 32º,36 das 3 1/2 as 5


horas da tarde ; e a das minimas, as 6 horas da manhã , de
23,51 , sendo a media diaria de 27°,95 conforme as tabelias 29,
30 e 31.

Estudando o phenomeno do augmento de calor, no sertão ,


diz o Senador Pompeu, que a lei, que este segue, explica -se
pelas variadas circumstancias que se dão nas differentes loca-
lidades. O terreno do sertão fica todo a descoberto durante o
verão e é geralmente composto em sua parte superficial de ro-
chas cristalinas, quer ein grandes massas, formando serrotes
seccos, quer em pequenos fragmentos. Esses terrenos, receben-
do directamente os raios do sol, adquirem uma temperatura
elevadíssima, e tanto que no lieito de alguns rios seccos, entre
as pedras, o thermometro se eleva até 61º . ( 1 ) () ar expirado
do litoral para o interior vae aquecendo pouco e pouco, par-
ticipando do calor dos logares por onde passa , sendo conse-
quentemente sua temperatura nos limites do sertão muito mais
elevada do que no litoral. Como a temperatura das serras limi-
trophes é muito mais baixa que a do sertão visinho, o ar desce
das serras, obedecendo ao foco do aquecimento, e na região
quente encontra- se com o qe vem da costa : ahi as duas cor-
centes elevam-se em consequencia de grande calor, e o ar vae
caminhando rarefeito em sentido contrario, e superior ao que
desce das serras mais frio e mais denso. Nas serras parte
delle se condensa, perdendo o excesso de colorico que trasia, e
o que sobe mais alto salva por sobre a cordilheira, e perde - se
nas chapadas do Piauhy. Os rodemoinhos, tão frequentes no
sertão, pela secca, são consequencia immediata da expiração
do ar pelo grande calor. ”

(1) O professor Katzer achou 62º, 05 C as 11 horas do dia 4


de Setembro de 1897 no leito do rio Choró, a 8 metros de pro-
fundidade, em Cangaty.
Tabella
3
.n0
Temperatura
1859-1860
Quixeramobim
de
cidade
na

C ENTIG
.THERM DIFFERENÇA H
THERM
. UMIDO
Dias
H .
Min
..
Max
.H Min
. H Max
.
Min
.H.

33.5
1859
Dezembro
21
t.
3 12.
t.5 8 24.1 t.1
22 " 34.4 25.3
.6
m 13.4
4
44 6
.m .22 .21
9m t.
4
23 34.4 25
41 41
13.6 2.2 43 22.844 20.8
44 •
25 34.6 25 51 13.6
5 3.6
5 22.2 2 t. 1 5
26 3
.3 41
24.9 10.5 4.2 24.24 " 41
20.5
27 .
34 31 24.5
51 "
12.45 3.3
5 23.6 2
1
"0.9
10.m
28 66 39 "
4 23.8
6 11.94 1.8 .. 23.2 121.6
10

344303+

5839353
+12+
29 25
. 6 3.3 6
" 21.
"
9
30 66 33.6 25.16 11.5 2.8 6
2
"2.8 2
8m
. 1.6
10 ..
31 66 32.4
2 " 25 . 6 10.6 3.3 • 22.6 .t4 "
21.411
1 JS60
33
Janeiro 66 25 6 12.24
" 3.4 .. .
21.9 9m 20.8
"
4

999

+24
:::
454569996

Media
geral 334 3.7
33.58
5.6
24.86
43.19
12.25
22.94
5.6
11
13
21.08
das
"
medias 29.22 7.72 21.76
.239.8
.m
h
Temperaturas
6
as
28
extraordinarias
.. 25
h
.t5 342,6
dagu
dos 28
205

poço.sa
. 66 ,
°
5
31
n
.Tabella
1860
oueiro
.de
J-
Icó
do
cidade
ua
centigrado
T9ermometro
206

C
. ENTIGRADO
PHERM DIFFERENÇA THERM
.CENTIGRADO
Dias
Max
.Hora H
. ora
Min Max
.H
Min
ora Hora H .
. ora Min
Max Hora

,30 t.4 4 12.5 t.4 22,5 t.4


34
. 3 27.8 51/2
.m 13.4
3 6,7 51/
.m 2 22,66
" 20,6 3 .
t
35,2 1
.. 27,8 6 66 13,33" ,7 .
6 .6 .23 216 20,9 6m .

789
13 ,
35 3 25,76 66 13 "
3 6 23,2
.10
m 20,76
14 35
. 166 27 6 66 ,i1
11 " 6 66 23,6 1 t. 21,8 6
"
15 .
34,52 27 6 26 66
5 12,3 "
6 23.4
2 66 22
, 64
16 35,2 36 24.6 51/2 36
13,6 4,3 1/2 22,412
.
m 20.3 51/2
.
m
35,7
17
24 627 266
14,4 "6 .7 7
23, 21,3 .2t
19 3
37,3 14,4
36
20 3.4
35,6 26,6 666 13,2"3 4,6 666 66 "
12
23.6 |6
.21,6
m

21/2
26,68
Med
.365,25 13,15
.
t
'3 5,22 6
.m t21,15
1/2
.23,44
m
11

manhã
da
1
5
as
16/2
extraordinari
240,6sas
Temperatura
.. 66 370,3
da
tarde
3 oras
h19

66 d'agua
dos
poços 290,5
scientifica
commissão
.,d
daa
Coitinho
Silva
Martius
João
Dr.
pelo
feitas
Observações
32
n
.Tabella
.-
1
do860
Crato
cidade
da
Temperatura

CENTIG
.THERM DIFFERENÇA .HUMIDO
THERM
Dias
Max
Min
.H .
. Min
. H Max
. H
.M .
Hin

25 Janeiro33.4 t.5 24 t.
5 t
.4
26 . .
33 "
4 23.7 6.
13.8 4t. 22.6
2.3 6.m 1.
20.2 6.m
27 66 33.54 "
6
22.3 11.2 2.5 2
"3.4
6 1
2
"9.86
28 33 31 6 .. .10 5 .. 2.2 65
.2 2"1
.4 "6
29 66 30.8 6 .. 7.6 3.8 23.6
24
"1.26
66 30.8 24.66 7.8 4.2 20.6
623.112.m "
6
86 31.2 22.26 .. 9.2
4 2.4 6 .. t.21.8
4 19.8 666
Fevereiro
32.3
4 23.46
" 20.46 ..

1: ཀ དེ ཀ : ི ེ དེ བྱ ཌ
Media
.. 32.38
4 " 9.93
23.51
646. 2.9 6
" 23.3534 11.m
20.42
.
geral 27.95 6.416 21.893

h
4
.t26 °,
as 34
extraordinari
Temperatura sas
31 .. .m
h
6 23.3
207

Agua
Grangeiro
rio
do .23
°3
33
n
.Tabella

1860
de
Temperatura
.na
,Fevereiro
Crato
do
cidade
208

THERM
C
. ENTIG DIFFERENÇA .HUMIDO
THERM
Dias

Min
H .
.Max
Max H
.Min
Max
..
H. Min
.H.

2 Fevereiro 22.4 6.m 20.4 6.m


3 .
27 1t.21.9 6 .. .3 12.m 6.m
1.1 24.3 t.1 20.66
4 28
. 222 6 .4 5.8 t.2 1.
6 22.4 t .1 21.46
10 30
. 2
.5 6 .
7 t.l
2 1.3 6 23.8 t.6 22.88..
11 26.2 422.5
"
7 3.5 1t. 1.5 23.5 .
240.78
12 12.
23.3
27.26
" 3.8 12.m 1.3 6 .
24 "
6
.22 6 ..
14 .
28 2
t. 3.6 t
3.6 2 .Ꭵ 7 .. .3.22.67.6
24.4
1999797

Medi
.. a 27.73
2
t.63.01 4.45 "
1.24 6 23.73
34
5
21 64
25.373 2.825 22.616

Temperatura
extremas
10
2
.as
h 3
°
,0 s
.. .. 36
.
h 219,9
Tabell
3
.n4 a

Mtemperatura
Da
Crato
do
-arço
1860
.de

THERM
C
. ENTIGRADO DIFFERENÇA .CENTIGRADO
THERM
Dias

Min
H
.Max
ora
Max Max
.Hor
H
Min
. ora
Min a

21 27.6
Março
t.
4 23.6 7
m
. 3.6 31/2
.t 23.8 t.6


22 28.6 .. 4.3 23.8 3
"
23 66 29.4 .. 22.4 m
.6 5.7 .1.7
m
6 23.6 2
" 20.7 .161
24 28.2 5
" 5.2
. 23.9 m .11
27.6 4
. 3.2 24.6 .t4

434 33 3
28 28.1 22 8
.m

ོ བསམ
444543
....
Media t.
28.25 4 22.6 7
m
. 4.40 3 /4
31.7 m
.6 23.96
33/4 6
20.7 .m
.. geral 23.458 3.05 22.33

-
extremas
Temperaturas
290.4
dda
h
4
as
23
tarde
oras
. ia
66 29
"
866 .. manha
220
.-
209
210

PRESSÃO ATMOSPHERICA ( 1)

As observações barometricas, na Fortaleza, não permit-


tem chegar-se a conclusões definitivas sobre as oscillações ho-
rarias da pressão atmospherica. Alem de se limitarem a 3 ho-
ras diarias, estas não representam os momentos de maior oscil-
lação na columua de mercurio. Sem as observações constantes
de um barometro registrador não se pode traçar a curva das
differentes pressões.
Nas regiões intertropicaes a variação mensal é insignifi-
cante, a diurna cessa de diminuir, como acontece na Batavia,
para começar a augmentar a 3 h. e 40 minutos da madrugada,
quando attinge o minimo. A partir desta hora augmenta até 9
h. 8 m. da manhã, quando attinge o maximo, recomeçando a
descer até 3 h. 40 m. da tarde, quando attinge o seu segundo e
menor minimo. Torna a subir e attinge o seu segundo maximo
as 10 e 22 m. da noite, para voltar ao ponto de partida. A am-
plitude maxima da oscillação é de 2 mm. , 7 (2)

( 1 ) Sabe -se que o peso normal da atmosphera equivale a


1 , 33 gr. por centimetro quadrado de superficie , corresponden-
te a camada de mercurio, de 76 centim. de espessura, que
envolve a terra.
A pressão que o corpo humano supporta é superior a 16000
kilos.
Esta grande pressão da atmosphera, que se exerce em
todos os sentidos sobre o corpo humano, é indispensavel a vida .
No inverno, durante os frios seccos, a atmosphera está mais
condensada e pesa mais sobre todos os pontos do nosso corpo,
dahi o sentirmo-nos mais sustentados e adquirirem os nossos mo-
vimentos mais vivacidade e energia, porque esta energia dos
musculos só pode resultar de uma resistencia. No verão, ao
contrario, quando o ar está dilatado pelo calor, sua pressão di-
minue. Sentirmo-nos então menos sustidos, e uma sorte de fa-
diga e de abatimento apodera- se do corpo ". [ H. de Hon- L'as-
tronom., la meteor. - pag. 151 ].
(2) H. Mohm - Os phen. da atmosp. cap. III.
Nas regiões intertropicaes, accrescenta este autor, o peri-
odo diurno se reproduz diariamente com uma regularidade tal
que poderia servir de relogio. A amplitude da oscillação é re-
lativamente consideravel.
A explicação deste phenomeno -variação diurna de pres-
211

As duas tabellas nº 34 e 35, de annos differentes , 1859 e


1903 a 1905, juxtapostas, mostram que em Maio a oscillação ba-
rometrica segue as seguintes phases -7 h. da manhã 759 ; 9 h.
m. - 759,37 ( 1903 ), 761,13 ( 1904) : ao meio dia 758,9 ( 1859), 759
(1903) . 761,20 ( 1904 ; as 6 h. da tarde 759,7 ( 1859), as 9 h. da
noite 758,85 ( 1903), 760,35 ( 1904 ) —tendo um maximo pelas 9 h .
da manhã, um minimo mal accentuado a meio dia, um outro ma-
ximo pelas 6 h. da tarde e outro minimo as 9 h . da noite.

são está na falta de coincidencia entre a quantidade do vapor


dagua e a temperatura ambiente. Se o minimo de quantidade
do vapor dagua no ar coincidisse sempre com a epoca do mini-
mo da temperatura, e seu maximo com o desta, as duas oscilla-
ções no mesmo sentido, que se produzem na columna barome-
trica, passando do verão para o inverno e vice- versa. sob as in-
fluencias distinctas do ar secco 9 do vapor, essas duas oscilla-
ções seriam simultaneas, se addicionariam, e a oscillação resul-
tante augmentaria por superposição. Assim não acontece por
algumas razões. A formação do vapor dagua é phenomeno que
se produz lentamente, porque exige muito calor. A quantidade
do vapor presente em um momento dado no ar é a continuação
de effeitos superpostos, cujo maximo está sempre atrazado em
relação ao de sua causa. Alem disto, é sobretudo a custa do ca-
lor do solo que se produz o vapor, e este calor [ do solo ] é tam-
bem um dos phenomenos sempre em atrazo do maximo da
causa que os produz. Ao contrario, a temperatura do ar é ef-
feito rapido, quasi immediato.
Em todo caso, basta-nos, para o raciocinio que as phases
não sejam as mesmas . Se não o são, a oscillação descedente
do verão, produzida pela influencia do vapor dagua, ficará atra-
zada em relação a que provem da acção do ar secco, e fará baixar
a curva no momento em que, se não fosse o vapor dagua, re-
começaria a subir. Haverá, pois, dous maximos, em vez de
um, durante a estação fria ou a noite. [ Duclaux - Cours de phy-
sique et de metereol. - pag. 293.
Com o raiar do sol, o solo e a camada do ar em contacto
com elle começam a se aquecer. A elevação da temperatura do
ar produz necessariamente um ou outro dos effeitos seguintes: ou
o gaz dilata-se e torna-se menos denso , ou, se é impedido de
dilatar - se, augmenta sua força elastica . Emquanto o ar aquece
recebe o vapor dagua fornecido pelo solo. Ou este vapor dagua
occupara lugar no ar que elle dilata e do qual diminuirá a den-
sidade ; ou, então, se o ar é impedido de dilatar- se, accrescerá
sua força elastica a do gaz, que crescerá em quantidade corres-
pondente.
212

A amplitude entre os extremos mensaes foi de 6 mm. em


Junho e de 5 em Maio de 1859, de 11,69 em Abril ( 3), 6,31 em
Dezembro, 6,27 em Setembro de 1903 .
As variações entre o inverno e o verão são de 764,25 em
Agosto [mais fresco] para 760,86 em Março ( 1904 ) . O mez em
que a columua do mercurio mais sobe, as 9 h . do dia, é o de
Agosto e o de menos pressão, na mesma hora, o de Janeiro.

" O ar para se dilatar pela manhã é obrigado a recalcar as


correntes do ar superiores, e estas oppoem, em virtude de sua
inercia, certa resistencia a deslocação. A força elastica au-
gmentará pois a superficie do solo até que as camadas superi-
ores tenham cedido a pressão das subjacentes. Concebe-se fa-
cilmente, desde então, que o maximo barometrico da manhã se
propagará successivamente de baixo para cima na atmosphera ;
e vêmol- o apparecer, effectivamente, tanto mais tarde e tanto
mais fraco quanto se sobe nas mais altas montanhas.
.
Uma vez estabelecido o equilibrio das pressões na verti-
cal de um lugar, o enfraquecimento de densidade, devido a di-
latação do ar e a maior quantidade do vapor que elle contém,
produz seu effeito ordinario e de modo tanto mais pronunciado
quanto o ar, assim superaquecido, tende a subir na atmosphera.
E' na hora mais quente do dia que o minimo barometrico
deveria occorrer se só se levasse em conta as pressões do peso
do ar ; mas é mister contar tambem com a força da velocidade
adquirida, porque o ar, continuando a subir, mesmo depois que
a força que o impelle cessou de agir, faz o barometro descer
ainda depois da hora da maior temperatura . Pouco a pouco
esta velocidade enfraquece e se esgota, sua influencia desaparece
e o barometro sebe. A noite a temperatura baixa e o ar tende a
contractar-se. Se o resfriamento começasse pelas camadas em
contacto com a superficie terrestre, seu primeiro effeito seria
uma diminuição de elasticidade nessas camadas e por conse-
guinte uma baixa da columna mercurial até que as camadas su-
periores se tivessem deslocado para vir preencher a differença ;
mas o resfriamento começa pelas camadas elevadas, porque o
solo é lento em perder o calor : é do alto que o movimento des-
cendente do ar tende a se estabelecer, age no mesmo sentido
do augmento da densidade pelo frio e o barometro continúa a
subir. Em breve, a radiação terrestre progredindo , é o solo, cuja
temperatura mais baixa: o proprio ar despoja - se de uma parte
de seu vapor, que se depõe em orvalho : um vacuo e uma bai-
xa barometrica occorrem nas regiões inferiores até que a acção
dos raios solares se tenha podido fazer sentir ; dahi o segundo
minimo. -Marié Davy -Mourem , de l'atmosp. pag. 186.
(3) Creio haver erro de registro .
Tabella
.3
n5

atmospherica
Pressão
7
=
0
a
n
/
m a
. 00
Fortaleza

MEDIAS MAXIMAS MINIMAS


1859 VARIA-
MEDIA
MENSAL
ÇÕES
.6
m2
t7
h
.1 t
6
.7
b t
6
h
.12

Maio 759
759.7
758.9
161 160.5
161.4 157 156.4
159 759.25
Junho 59.8
59.2
60.5
63 61.5 60.7 58 57.0
59 59.8
6
Julho 60.0
59.1
59.5 61.8
60.0 60 58.2
59.0 58.2 59.5 3.6
Agosto 59 59.4
59.0 60.8 60.2 59.8 58.5
59.0 59 59.4
2.8
Setembro 59.3
58.2
58.8 .2
61 61.0 59.7 56.7
57.5 50.8 59.4
44
Outubro
58.2
58.8 60.6 60.5 58.7 56.0
57.0 55.8 58.1
4.8
Novem
58.0
57.9 bro 57.8 59.7 59.5 58.7 56.3
56.4 57 59.9 3.4
58.0
Dezembro
57.6 56.9 59.2 58.0
58.8 56.8 58.8
56.4 59.5 3.4
213
em Quixeramobim nos annos de 1896 a 1905.

7 h. 8 h. 9 h. 10 h. 11 h . 12 h. Medias MEDIA
MENSAL
3 h . t.
66 740.96 741 .60742.31 742.94 743.26743.28 742.56
341.82 42.39 43.10 43.70 43.97 43.91 743 12
36 41.37 41.93 42.54 43.11 43.44 43.50 742.54
$2 41.96 42.54 43.15 43.60 43.84 43.82742.97
$ 142.79 43.33 43.89 44.34 44.50 44.50 743.73 65 . 72.2
35 43 78 44.34 44.85 45.32 45.54 45.61 744.84
343.87 44.43 44.98 45.48 45.73 45.76745.08
)9 43.42 43.95 44.60 45.15 45.42 45.55744.88
29 42.72 43.36 44.11 44.77 45.15 45.12744.39 70 . 73
34 41.80 42.59 43.35 44.01 44.68 44.16 743.49 72 . 78.2
10 41.01 41.64 42.45 43.01 43.26 43.14742.52 74 . 82.6
50 41.08 41.83 42.60 43.13 43.39 43.34742.66 75 . 85.2
74742.22 742.82,743.49,744 .04744.32 744.30763.57 76 . 81.3
75 . 80.5
66 . 66.5
64 . 70 .
60 . 67.5
72 . 75 .

60 . 75.8

82 85.6
88 90.4
88 91 .
77 89.6
85 93.1
84 89.1
78 86.3
75 80.8
57 64.5
69 74 .
73 67.3
71 75.9

77. +4 88.1

bella, confessa
Saussure não
Tabella n. 43.
Humidade relativa na Fortaleza. (1 )

MEDIAS MAXIMAS MINIMA


MEDIA
MENSAL
7 h. 12 h . 6 h . t. 7 h. 12 h . 6 h. t. 7 h. 12 h . 6 h. t.

INTERESSEN
CRETO
1858

Dezembro 73.2 66.5 73.9 84.5 73. 82.8 62 60 65 . 72.2

1859

Janeiro 74.0 65. 77.0 84. 68 84 . 64 62 70 . 73

@
Fevereiro 80.5 74.7 81.5 87. 80 91 . 72 69.5 72 . 78.2
Março 83.0 80 . 82.2 96. 90 90.4 70 69.2 74 . 82.6
Abril 86.2 83. 85.7 97.5 92 96.4 75 74. 75 . 85.2
Maio 84.0 77.5 84.3 90 . 84 92.6 78 71 . 76 . 81.3
Junho 81.5 76.5 77.5 98. 89 80 . 75 73 . 75 . 80.5
Agosto 70.0 61 . 72.0 76 . 67 78 . 64 55 66 . 66.5
Outubro 74.5 64 . 65.5 83 . 71 67 . 66 64 . 70 .
Novembro 70.5 64. 67. 75 . 60 74 . 66 60 60 . 67.5
Dezembro 79.0 70.5 79 . 85 . 77 86 . 73 64 72 . 75 .

CERC228
Extremos 89.7 73.5 97.5 92 92.6 62 55 60 . 75.8
POONOP98888

76.3
CR32
1860
BEE99998

Janeiro 85 . 83.5 88.5 95 . 94 95 81 73 85.6


Fevereiro 90 88. 92.5 97 . 97 97 83 79 90.4
Marco 95.5 89 89.5 98 97 91 88 91 .
Abril 96. 85 87. 100 98 97 92 89.6
Maio 95 . 94 91.5 98 97 92 93.1
Junho 93.5 85.5 88.5 93 93 90 78 89.1
Julho 91 . 85.5 85.8 94 93 88 77 78 86.3
Agosto 83.5 79.5 80 . 86 85 78 73 75 80.8
Setembro 72 60.5 61.5 67 66 69 54 57 64.5
Outubro 78 66.5 74 . 81 79 73 52 69 74 .
Novembro 75 60 . 75 68 65 52 73 67.3
Dezembro 80.5. 70 79 85 77 63 71 75.9

Media 86.2 79.2 82.7 91.2 88.2 88.5 86.5 69.4 77.4 | 88.1

( 1 ) O Senador Poupeu, de quem tomamos os dados desta tabella, confessa


que essas observações carecem de exactidão porque o hygrometro de Saussure não
foi rectificado.
Tabella n. 44.

Humidade relativa na Fortaleza - Estação do Porto .

1903 MEDIAS ΜΑΧΙΜΟ MINIMO

MEZES 9 h. a 12 h . 9 h. p 9 h. a 12 h . 9 h. p 9 h. a 12 h . 9 h. p

Abril 80.83 71.85 82.94 96.00 96.0 96.0 66.83 51.5 67.5
Maio 74.66 67.01 , 81.64 89.00 74.4 94.0 65.0' 48.7 67.5
Junho 73.61 65.72 85.00 98.00 75.0 100.0 63.6 52 0 79.4
Julho 71.81 69.10 85.14 81.70 77.7 93.0 52.5 58.0 71.4
Agosto 73.66 73.60 91.39 88.80 81.0 100.0 68.0 61.2 83.0
Setembro 75.92 74.30 86.12 84.00 79.0 95.0 68.0 62.5 69.2
Outubro 71.74 67.73 84.25 S7 74 86.4 95.0 63.0 57.3 77.8
Novembro 67.29 63.78 81.69 80.00 71.7 88.0 60.8 59.5 77.8
Dezembro 68.80 64.99 79.85 84.00 70.4 84.0 62.0 59.0 73.0

73.14 68.64 84.22 87.69 79.06 93.88 62.74 56.63 74.06

1904

Janeiro 69.76 63.36 81.47 80.0' 75.0 90.0 63.3 53.1 75.0
Fevereiro 74.27 66.93 80.74 97.0 95.0 90.0 61.8 56.0 72.2
Março 76.27 69.44 83.05 97.0 92.0 93.0 63.0' €2.2 75.0
Abril 77.18 68.40 82.10 93.0 84.0 84.0 59.2 56.0 78.9
Maio 79.25 70.46 83.66 95.0 84.0 93.0 64.0 61.2 78.0
Junho 72.98 65.96 81.90 95.0 78.0 91.0 58.0 54.0 74.0
Julho 75.54 70.78 84.54 93.0. 88.0 96.6 63.0 57.0 76.0
Agosto 74.88 71.43 84.26 93.0' 85.2 93.0 58.5 59.0 76.0
Setembro 67.95 63.83 78.75 91.0 76.5 83.6 57.0 59.0 71.9
Outubro 64.05 63.13 78.51 73.0 69.5 85.2 52.0 57.0 74.0
Novembro 65.41 62.81 82.81 70.0 68.0 92.0 58.8 58.4 71.0
Dezembro 67.41 63.86 79.39 83.5 73.0 85.0 61.4 57.6 76.0

72.07 66.69 81.76 88.37 80.68 88.81 60.0 57.54 74.83

1905

Janeiro 73.54 68.14 83.28 95.0 87.0 90.0 64.2 56.4 76.0
Fevereiro 75.18 72.54 85.60 95.0 87.0 92.0 67.0 63.8 78.0
Março 81.93 77.91 88.16 98.0 97.0 98.0 64.0 64.0 81.0

Media dos
73.08 68.19 83.17 89.07 81.28 91.24 61.67 57.68 74.98
24 mezes
215

As observações barometricas da Estação meteorologica de


Quixeramobim permittem deduções mais completas.
Pela marcha horaria, registrada de 1896 a 1905, vê -se que
o primeiro minimo diurno cae entre 3 e 4 horas da manhã, com
743,53 a 743,54. e o segundo das 4 as 5 h. da tarde com 741,50
a 741,46 ; o primeiro maximo entre 9 e 10 h. da manhã com
745,23 , e o segundo das 11 as 12 da noite com 744,32 a 744,30—
conforme a estação . A differença do que se tem observado na
Batavia e em outras regiões equatoriaes é insignificante e mais
apparente do que real, pois resulta da hora precisa da obser-
vação.
O barão de Humboldt demonstrou por longas e precisas ob-
servações que sob o equador o maximo da altura corresponde a
9 h. da manhã e o minimo as i h. tarde : depois novo maximo
as 11 h. da noite, e segundo minimo as 4 h. da manhã .
A tabella 36 mostra a quasi coincidencia entre as observa-
ções do sabio barão e as recolhidas pelo observatorio de Quixe-
ramobim .

As tabellas 23, 37, 38 , 39 , 40 , 41 precindem de maior desen-


volvimento, porque por sua inspecção se tem o conjuncto da
pressão atmospherica no decurso de alguns annos, na cidade de
Quixeramobim .
O director do observatorio desta cidade, o Snr. Oswaldo
Weber, observa que a pressão barometrica alcança sua quota
maxima com 744,95 m/m em Julho, em todos os annos, o que
não acontece com a curva minima que nos annos chuvosos se
pronuncia em Novembro com 742 , 14 e nos seccos em Março
com 742,12 , " /m ; sendo, portanto, no fim dos annos chuvosos
que cae a minima barometrica, continuada com ligeira altera-
ção até Março, o que constitue anno secco . Ao contrario, no fim
dos annos seccos a curva barometrica cae vagarosamente, con-
servando -se sempre mais alta do que nos aunos chuvosos, até
Março seguinte, o que constitue anno chuvoso . Importa isto
dizer que os annos seccos coincidem com a minima barometrica,
e os invernosos com a maxima . Esta differença de curva se
accentua particularmente no mez de Fevereiro com 743,14 m/m
para os annos chuvosos e 742,31 m/m para os annos seccos,
dando a differença de 000,83 mm para menos nos annos seccos.
216

As differenças das medias annuaes da pressão barometrica ·


são menos sensiveis , devido ao numero maior de medias durante
annos inteiros, de maneira que se tem somente uma de 0.33 m
para o 1º semestre e 0,07 para o segundo.
Para os sete annos de 1896 a 1902 a differença ainda é
menor ; pois temos para o primeiro semestre 49,98 mm e para
o segundo 50,02 mm, pressões quasi iguaes nos dous semestres .
Nas medias horarias de pressão barometrica vê - se que
as do 1º semestre dos annos chuvosos são mais altas de que a
dos seccos, com excepção da 10 , 11 e 12 p. m.

As medias das 24 horas dão para annos chuvosos ......
743,30 m/m e para os seccos 742,97 mm ; dando 0,33 m 111 menos
para os ultimos .
No 2º semestre a differença da pressão barometrica entre
annos chuvosos e seccos é menos accentuada - 0,07 m m menos
para os ultimos . ( 1 )

(1 ) Oswaldo Weber-Relat. das observações meteorolog.-- de


Quiveramobim.
217

Como elemento comparativo junto a oscilação diurna do


barometro nos seguinte : [ 1 ]

ALTURA OSCIL.
LUGARES LATITUDE MEDIA DIURNA

Lima .. 12°3' S 741.72 2m.m71


Caracas . 10.31 N 681.93 2 " 17
Payta 5.6 S 757.96 2 " 08
Bogatá.. 4.36 N 759.90 201
4.28 66 658.70 192
Ibaguê
Calcutá . 22.35 66 758.86 1. 84
Cumana.. 10.28 66 756.15 16 78
Rio de Janeiro . 22.54 S 764.95 1 6. 70
Mexico.. 19.26 N 583.13 1 " 59
Cairo ... 30.2 757.2S 1 54
Roma 41.54 66 761.24 1 " 00
Basiléa.. 47.34 66 738.79 0 " 85
Bruxellas. 50.50 66 757.06 0 " 80
Paris ... 48.50 66 755.82 0 " 72
Franfort . 50.8 66 752.47 0 .. 55
Dresda.. 51.7 66 744.42 0 " 47
Berlim 52.33 • 758.63 0 " 34
Cracovia .. 50.4 66 742.38 0 " 30
Edimburgo... 55.55 66 746.90 0 66 21
Koeningburgo . 54.42 760.88 0 " 19
59.56 66 759.31 0 " 13
S. Petersburgo..

HUMIDADE

Entende - se em meteorologia por humidade absoluta a quan-


tidade do vapor dagua no ar ou a sua tensão ; e humidade rela-
tiva a relação que existe entre a quantidade do vapor que con-
tem realmente o ar e a que elle poderia conter na temperatura
do momento ; ou o que é a mesma cousa, a relação entre a ten-

11 ] Veja-se Flamarion L'atmosphère pag. 347.


A altura barometrica ao nivel do mar é, segundo Maury,
para as latitudes de 0 ° a 5º de 759,82 m/m ; segundo Humbaldt
de 762,518 m/m para a latitude 1 : 761,99 - para 2; 761,525 para
a 3: 761,231 para 4.
218

são actual do vapor dagua realmente contida no ar e a que elle


teria si, numa mesma temperatura, o ar estivesse saturado. [ 1 ]
HUMIDADE RELATIVA. - AS tabellas nº 43 e 44 mostram que
a humidade relativa na Fortaleza attinge o seu maximo a noite
e o minimo ao meio dia. A marcha horaria, media pelas 3 ho-
ras de observações, começa por 68,19 as 12 horas do dia, au
gmentando rapidamente até 9 h. da noite, quando attinge 83,17
para decrescer pelas 9 h. da manhã com 73,08.
A oscillação mensal obedece, não tanto a acção immediata
dos raios solares, nos equinacios, mas a relativa paralisação das
camadas aereas, logo apoz a passagem dos mesmos.
Tomando- se a media horaria , de 9 h. da manhã, observa - se
que é entre Março e Maio que a humidade relativa se mantem
mais alta 81,93 [ Março de 905 ] e 76.27 [ Março de 904] a 79,25
[ Maio de 904 ] e 74,66 [ Maio de 903 ] . Ao meio dia é nos mezes
de Agosto e Setembro que attinge o maximo , as 9 h. da noite é
em Julho e Agosto.
A amplitude horaria, mensal, é de 51.5 a 96 em Janeiro,
48,7 a 94 em Fevereiro, 52 a 100 em Março, 52,5 a 93 em Abril,
61,2 a 100 em Maio, 62,5 a 95 em Junho e assim por diante,
como se vê das tabellas seguintes :
[ 1 ] Mohn- Obra cit.
A atmosphera recebe a humidade da superficie terrestre .
Os vapores que se desprendem em consequencia da evaporação
tendem a estender- se, por camadas, acima da terra e a encher o
espaço como faz o ar atmospherico. Se o ar não offerecesse re-
sistencia a livre circulação dos vapores, ou então, se o are o
vapor dagua podessem permanecer em estado de repouso e de
equilibrio, elles se penetrariam riciprocamente, e as particulas
desses dous gazes tomariam a posição que elles teriam se não
houvesse senão um gaz, de sorte que ellas formariam realmente
duas atmospheras independentes, uma do ar e a outra do vapor
dagua . Neste caso, o vapor dagua não exerceria pressão algu-
ma sobre o ar, e vice-versa - o ar nenhuma pressão faria sobre
os vapores : estas duas atmospheras teriam a maior densidade
nas suas camadas inferiores e tornar-se-iam mais diaphanas e
mais leves a medida que a altura fosse maior, isto sempre inde-
pedentes uma da outra. Mas esta hypothese não se realisa na
natureza ; porque, de um lado o ar offerece resistencia a pas-
sagem dos vapores, de tal forma que estes não se podem espa-
lhar senão lentamente, e, do outro, a atmosphera nunca se acha
em estado de repouso tão completo que os vapores possam es-
palhar-se como seria mister para que houvesse equilibrio.—
Mohn. -obr. cit. pag. 110.
219

Tabella n . 45.

MEDIA DAS MEDIAS


MEDIA AMPLI-
DE 4 AN-1
NOS TUDE
1859 1860 1903 1904 1905

Janeiro 72 85.66 74.98 73.32 76.49 12.34


Feverei 78.9 90.16 73.98 77.77 80.20 16.18
Março 81.73 91.33 | 76.25 82.66 82.99 15.08
Abril 84.96 89.33 78.45 75.89 82.15 13.44
Maio 81.93 93.50 74.43 77.79 81.91 19.07
Junho 78.50 89.16 74.77 73.61 79.01 15.55
Julho 87.33 75.35 76.95 79.87 11.98
Agosto 81.00 79.55 76.85 79.13 4.15
Setembro 67.66 64.66 78.78 70.17 70.31 14.12
Outubro 68.00 72.86 74.57 68.56 70.99 6.57
Novembro 67.16 70.00 70.92 70.34 69.60 3.76
Dezembro 76.16 76.50 71.21 70.22 73.52 5.94

Por esta tabella vê- se que a humidade augmenta a medi-


da que se approxima o equinocio de Março. activando-se pela
evaporação nos dous mezes que se lhe seguem para ir pouco
a pouco diminuindo até attingir o minimo nos tres mezes de
Setembro a Novembro. O equinocio de Setembro, sempre prece-
dido dos grandes ventos de Agosto e Setembro já encontra o
solo tão resequido que não lhe dá bastante humidade para
augmentar a da atmosphera. Só depois das chuvas de Novem-
bro e Dezembro recomeça a marcha ascendente.
IMO

h. 9 h. p

.82 19.62
.69 19.38
88 19.80
.19, 17.92
.82 19.65
.71 19.69
.17 18.89
.69 18.89
1.46 18.28

* .15 19.23

5.13 19.69
.84 18.93
* .84 19.69
3.23 20.26
0.00 19.81
3.09 17.69
5.95 19.04
* .31 17.93
3.81 17.81
2.06 17.69
.43 17.44
7.84 18.77

7.34 18.72

3.48 19.04
0.09 20.45
) .75 19.65

7.57 19.04
7.57

Tabella n . 46.

Tensão do vapor na Fortaleza .

MEDIAS MAXIMO MINIMO


1903

9 h. a 12 h . 9 h. p 9 h. a 12 h . 9 h. p 9 h. a 12 h . 9 h. p

Abril 22.57 21.60 22.15 26.68 28.73 26.68 19.62 15.82 19.62
Maio 20.94 20.43 21.80 24.12 22.95 23.01 18.19 15.69 19.38
Junho 19.92 19.35 21.48 24.55 21.45 23.38 18.04 15 88 19.80
Julho 19.72 19.90 20.79 21.46 22.01 21.97 14.91 17.19 17.92
Agosto 20.74 21.34 21.54 22.76 23.00 23.55 17.80 17.82 19.65
Setembro 20.68 20.96 20.84 22.07 22.81 22.41 19.27 18.71 19.69
Outubro 20.06 19.88 20.44 24 74 26.03 22.93 17.80 17.17 18.89
Novembro 19.35 19.11 19.99 21.28 20.82 21.76 17.56 17.69 18.89
Dezembro 19.91 19.72 20.12 20.95 21.26 21.38 18.32 18.46 18.28

20.43 20.25 21.01 23.17 23.22 23.00 17.92 17.15 19.23

1904

Janeiro 19.98 19.52 20.63 21.20 21.40 21.65 18.19 16.13 19.69
Fevereiro 20.38 20.19 20.82 21.94 23.12 22.07 18.06 17.84 18.93
Março 20.62 20.38 21.17 22.42 23.00 22.68 18.97 17.84 19.69
Abril 21.28 20.49 21.32 22.56 22.07 22.12 19.37 18.23 20.26
Maio 21.28 20.79 21.26 23.31 23.00 22.27 19.09 19.00 19.81
Junho 19.35 19.31 20.44 23.65 21.35 22.07 16.0% 16.C9 17.69
Julho 19.59 19.81 20.45 22.56 23.25 22.14 16.65 15.95 19.04
Agosto 19.69 20.81 20.44 22.50 23.25 22.93 15.42 17.31 17.93
Setembro 18.20 18.24 19.04 20.00 19.96 20.57 15.42 16.81 17.81
Outubro 17.90 18.33 18.99 19.22 20.29 20.95 15.35 17.06 17.69
Novembro 19.08 18.97 20.25 20.02 20.30 , 21.57 17.04 17.43 17.44
Dezembro 19.66 19.99 19.67 21.20 20.70 21.07 18.08 17.84 18.77

19.75 19.73 20.32 21.71 21.80 21.84 17.31 17.34 18.72

1905

Janeiro 20.72 20.74 21.03 23.06 23.42 22.68 19.37 18.48 19.04
Fevereiro 21.89 22.25 21.63 23.13 24.20 23.26 20.52 20.09 20.45
Março 22.05 22.04 21.90 23.67 23.28 23.79 19.90 20.75 19.65

Media geral 20.23 20.17 20.75 22.46 ′ 22.56 22.44 17.89 17.57 19.04
dos 12 mezes
Tabella n. 47

Amplitude
Amplitude
1896-1905. Osc

horas
oscil-
oscil-

em
24
da
da
lação
2a

dia
do
p. m Medias

=
MEZES

E
mensaes

lação
a zero
medias

horas

Janeiro 10.574.23 4.26 742.56


Fevereiro 10.454.02 4.09 743.17
Março 10.443.96 4.01 742.54
Abril 10.383.82 3.88 742.97
Maio 10.383.60 3.65 743.73
Junho 10.533.66 3.70 744.84
Julho .. 11.053.93 3.9 745.08
Agosto 11.034.32 4.31 744.88
Setembro 10.544.82 4.8 744.39
Outubro 10.404.91 4.9 743.49
Novembro 10.454.59 4.6 742.52
Dezembro .. 10.504.43 4.4 742.66

Annuaes 10 .554.19 4.2 743.57

Amplitude diurna

tu- Novem- ezem.


ELEMENTOS METEOROL. Ja ro bro bro Auno

Prossão barometrica 491 4.61 4.43 4.22


Temperatura centigrada 946 10.25 9.72 8.95
Tensão do vapor em m/m 543 6.27 6.42 5.73
Humidade relativa em % 4474 48.74 47.30 43.71

Pressão barometrica 1.55 7.61 7.51 7.48


Temperatura centigrada. 18.11 13.04 13.16 12.64
Tensão do vapor em m/m 11.80 11.15 11.70 11.38
Humidade relativa em % 7.15 68.78 69.59 65.70
221

Comparando- se o estado hygrometrico da Fortaleza com o


de Belem e Manáos ( 1 ) temos :

BELEM FORTALEZA MANAOS

Max, Min. Max. Min. Max. Min.

Janeiro 93.0 66.3 9028


8 53.1 97.0 57.3
Fevereiro 99.0 69.4 95 56.0 96.0 60.9
Março 99.0 65.9 98 62.2 97.3 67.0

Media 97 67.2 94.3 57.1 96.7 61.7

Abril 99.0 68.7 96 51.5 96.0 54.0


Maio 93.0 65.9 95 48.7 98.0 58.0
Junho 90.0 55.7 100 54.0 96.0 56.5

Media 94 63.4 97 51.4 96.6 56.16

Julho 91.0 55.9 96.6 52.5 98.0 49.9


Agosto 89.0 54.6 100.0 58.5 96.0 46.14
Setembro 90.0 55.9 95 57.0 97.0 49.3

Media 90.0 55.4 97.2 56.0 97.0 48.44

Outubro 92.0 55.2 95.0 52.5 $6.0 44.0


Novembro 95.0 55.2 92.0 58.4 95.5 47.5
Dezembro 95.0 56.3 85 57.6 98.0 48.9

Media 94.0 55.5 90.7 56.0 96.5 46.8

Media geral 93.75 60.37 94.9 55.13 96.7 53.27

Na Fortaleza a humidade relativa maxima é maior do que


em Belem nos mezes de Maio a Outubro, e do que em Manáos
em Junho. Nesta cidade as minimas se pronunciam mais do
que em Fortaleza nos mezes de Julho a Dezembro.

( 1 ) Os dados relativos a Belem e Manáos são extrahidos


da obra : Apontamentos para a climatologia do valle do Amazonas
-por Torquato Tapajós - Rio 1889 .
222

As indicações hygrometricas seguem marcha ascendente


quando o thermometro baixa e vice-versa. A razão disto é que
o ar mais aquecido, por muito secco que pareça, acha- se
sempre carregado de humidade absoluta, ao passo que um ar
mais frio, por muito humido que apparentemente se nos moS-
tre está, no entretanto, menos carregado de vapores aquosos.
A tensão do vapor dagua segue a da temperatura, porque
a uma elevação desta corresponde um augmento de evapora-
ção.
Em Batavia a tensão inedia do vapor, resultante da media
dos doze mezes do anno. adquire um maximo as 6 h. da ma-
nhã e dá 19,9 do valor, augmenta depois até 9 h. da manhã
quando attinge 20m, 9 , dahi até 11 horas desce a 20.m/m9, de-
pois augmenta novamente até attingir 21,3 as 7 h. da noite,
recommeçando a descer. O que ha de notavel neste periodo,
observa Mohn, é que o maximo da tensão não coincide com o
maximo da temperatura, pois que a tensão é menor durante
as horas mais quentes do dia qual não o é pela manhã e a
noite.
Nas estações situadas no interior das terras pode - se expli-
car este phenomeno por não possuir a superficie terrestre
o gráo de calor necessario para que a evaporação e a tempe-
ratura marchem de par . Esta explicação, bôa para verdadeiros
desertos, seria insustentavel em relação aos lugares situados,
como Batavia, a borda do mar. Deve-se procurar a verdadeira
causa do phenomeno, causa bem differente da precedente, nas
correntes de ar ascendentes que se produzem em consequen-
cia do crescimento da temperatura durante o dia : essas cor-
rentes levam naturalmente comsigo parte do vapor dagua e
roubam ás camadas inferiores uma parte das que estas deve-
riam conter, dada a temperatura do momento. A tensão maxi-
ma do vapor dagua nos pontos mais elevados produz-se um
pouco depois de meio dia, como nas costas. A corrente ascen-
dente adquire então sua maior intensidade por ser a hora de
maior calor ; a tarde, a sua intensidade vai diminuindo até de-
saparecer completamente : e, consequencialmente tambem. os
vapores que enchem e saturam as camadas inferiores da atmos-
phera não sobem mais. ( 1 )

] ] Mohn.-Ob. cit. pag. 129.


223

Kaemtz verificou que é antes do levantar do sol que a


quantidade do vapor attinge o minimo, e a humidade o maximo ;
e a medida que o sol se vae alteando no horisonte, accrescida a
evaporação, o ar adquire mais quantidade de vapor . Mas como
o ar oppõe obstaculo cada vez maior a formação deste vapor, o
ar se afasta do ponto de saturação, tornando - se assim a humi-
dade relativa mais fraca. Esta marcha continúa com interru-
pção até o momento em que a temperatura attinge o seu ma-
ximo. [1 ]
O Senador Pompeu [2 ] . guiado por observações pessoaes
seguidas, diz que "quando o estado hygrometrico da atmosphe-
ra não soffre alguma perturbação, que o altere repentinamente,
a maior seccura acontece de meio dia as 2 h. da tarde . Para as
3 ou 4 h. a agulha do hygrometro torna-se retrogada, á prin
cipio de maneira quasi insensivel, depois com rapidez crescente,
que marca o augmento de humidade do ar ; das 5 as 6 h. e as
vezes até as 7 h. da manhã ella chega ao maximo deste cresci-
mento dessa hora em diante volta para o termo de seccura .
" A differença psychrometrica entre os thermometros secco
e humido é maxima das 10 h. até as 2 da tarde, sendo então de
4 a 6 gráos : as 6 h . da manhã regularmente a differença é de 2
a 3° e as vezes a 7 h. ainda o abaixamento é maior. Observa-
se este phenomeno em todos os lugares que têm arvoredos na
visinhança , ou outra qualquer vegetação, porque depois do sol
fóra é que começa a evaporação do orvalho que cahio a noite, e
por isso o ar satura - se de maior quantidade de humidade.
Nas proximidades das serras d'Aratanha, Maranguape, Ba-
turité e outras nota -se o mesmo phenomeno, e assim tambem
no sertão, emquanto os campos estão verdes.
" A agulha do hygometro leva 6 a 8 horas para percorrer
os gráos que vão da humidade extrema ao termo de maior sec-
cura, e gasta 16 horas para volver ao ponto de partida.
" Isto prova que o crescimento da humidade do ar é me-
tade menos rapido que a formação do calor e ventos na acção
de dissolver e diminuir os vapores aquosos da atmosphera.

[ 1 ] Tapajós. - Ob. cit. pag. 24.


[2] Pompeo. -Ensaio estat. pag. 88.
224

" Na estação invernosa , e principalmente depois das gran-


des chuvas, quando a terra está coberta dagua, e é dardejada
pelo sol ardente, que faz levantar forte evaporação, o hygrome-
tro marca os graos proximos a maxima humidade, e até o ra-
dical, a qualquer hora durante grandos chuvas, e ainda depois
destas.
" Ao nascer do sol a humidade varia de 740 a 940 até o
radical, conforme o temp ; de meio dia até 2 h e meia entre
55 e 920, as 6 h. da tarde entre 65 e 969, quando se não dão
causas perturbadoras ; portanto a maxima variação diaria é de
270 a 45°.
225

A maior variação do hygrometro dá-se nos mezes de sec-


ca, de 10 a 29 gráos e, nos chuvosos, de 70 a 220 durante o dia .
HUMIDADE RELATIVA NO SERTÃO . -As observações do Üb-
servatorio de Quixeramobim habilitam -me a tirar conclusões
mais positivas acerca deste phenomeno.
A tabella 46 mostra a marcha mensal da humidade relativa
de 1896 a 1904. - Comparada com a 45 , da Fortaleza, vê- se que
no geral o sertão é mais secco e as suas alternativas, isto é, sua
amplitude annual mais pronunciada . Emquanto no littoral as
variações medias vão do minimo 69,60 [ em Novembro ] ao ma-
ximo 82,99 [em Março ], dando a differença de 13 ° ,39 ; em Qui-
xeramobim entre a minima 54,94 [ em Outubro ] e o maximo
72,57 [ em Abril ] ha a de 17° , 63 , cerca de 32 % para mais de
amplitude.
As variações mensaes nos 9 annos ( 1896 a 1904 ) são mais
francas e accentuadas em Quixeramobim do que na Fortaleza .
A amplitude media é de 570,32 para 69,97, equivalente a 12 ° 65,
a minima em Novembro é de 53 ° para 60,32. igual a 79,32 ; a
maxima de 25 ° , 19 no mez de Maio [57,74 para 820,93. ] Melhor
se vê do exame dos dados :
226

MENSAL
MEDIA MINIMA MAXIMA
9
A04
96
DE AMPLITUDES
DAS
MEDIAS DAS
MEDIAS

Quix
.Fort
. Fort
Q
..Fo
Quix
. rt
. uix .
Fort .
Quix
a
][4
9nnos

Janeiro 76.49
61.37 57.44 73.32 GS.83 85.66 12.34
11.39
Fevereiro 67.51 58.69
80.20 73.98 78.28 90.16 16.18 19.59
Março 71.73
82.99 60.77 76.25 79.16 91.33 15.08 18.39
+
Abril 82.15
72.57
62.28 75.89 81.19 89.33 13.44 14.91
Maio 81.91
71.32 57.74 74.43 82.93 93.50 19.07 25.19
Junho 58.67
79.01
66.11 80.57
73.61 89.16 15.55 21.90
Julho 79.87
63.22
54.89 75.35 74.63 87.33 11.98 19.74
Agosto 60.16
52.58
79.13 76.85 81.00
69.56 4.15 16.98
Setembro 55.98
70.31
52.05 64.66 61.61 78.78 14.12 9.56
Outubro 70.99
54.94 49.91 68.00 58.23
74.57 6.57 8.32
Novembro
69.60
56.79 53.00 67.16 60.32 70.92 3.76 7.32
56.08
Dezembro 73.52 53.35 70.22 69.41 76.50 5.94 7.33

Media
61.15 77.18 55.94 72.48 72.06 84,02 12.65
11.51
annual
227

Annualmente a humidade na Fortaleza é 22,2 % maior do


que em Quixeramobim, apresentando a maxima de 93 ° ,50 em
Maio, e a minima de 68° em Agosto, emquanto no Quixeramobim
a maxima em Maio attinge apenas a 82,93 e a minima em Agosto
desce a 49,19.
A tabella 46 ainda mostra que a graduação de um para
outro mez é lenta no verão, passando de 55,98 em Setembro
para 54,94 em Outubro e depois a 56,79 e 56,08 em Dezembro .
Nos mezes de inverno, de Janeiro 61,37 a Abril 72,57 a marcha
é de 11 °.
As variações horarias da humidade relativa em Quixe-
ramobim, nos 10 annos de 1896 a 1905, segundo a tabella
49, apresentam o minimo as 4 h. da tarde e o maximo as 5 da
manhã.

1º MINIMO 1° MAXIMO

Gráos Horas Gráos Horas


14434

Janeiro 40.30 5 h. t. 78.78 6 h. m、


Fevereiro 48.26 81.69 5 64
Março 54.17 .6 84.76 6 66
++++ 10 10 10 10 10

Abril 55.07 84.97 5e6 h . "


Maio 52.74 84.00 5 h. 66
66 66
6 :5

Junho 45.33 81.71


Julho . 40.77 80.67
Agosto 36.60 78.91
Setembro 32.04 74.21
Outubro . 30.19 72.72
Novembro 32.19 75.69 6
Dezembro . 33.43 75.62

Media 41.96 4 79.32 5


Amplitude 24.88 12.32

Ha, pois, concordancia entre a marcha horaria da Forta-


leza, atraz referida, segundo as observações do Senador Pom-
peu, e as recolhidas pelo Sur. Oswaldo Weber em Quixeramo-
bim .
1
8 h. t. 9 h . t. 10 h. t. 11 h. t. 12 h. t. Medias

16.25 16.91 17.20 17.59 18 14 16.88


17.42 17.88 17.98 18.24 18.63 17.64
18.75 18.74 18.73 18.85 19.04 18.44
18.76 18.83 18.81 18.91 19.09 18.46
17.80 17.85 17.94 18.04 18.30 17.71
15.70 15.88 16.29 16.96 17.40 16.06
14.49 14.99 15.79 16.56 17.04 15.31
13.72 14.54 15.78 16.60 17.20 14.99
13.48 15.15 16.01 16.52 17.02 14.66
14.43 15.78 16.03 16.50 17.05 14.71
15.10 15.95 16.14 16.67 17.37 15.42
15.22 15.94 16.30 16.80 17.50 15.59

15.93 16.53 16.85 17.35 17.82 16.32


229

HUMIDADE ABSOLUTA OU TENSÃO DO VAPOR [ 1 ]

VARIAÇÕES ANNUAES. -A tensão do vapor é tanto maior


quanto mais alto é o gráo de humidade atmospherica. Aos me-
zes mais humidos corresponde a maior tensão. Assim a maior
e a menor tensão occorrem nos seguintes mezes :

MAXIMO MINIMO AMPLI-


TUDE

1896 Março . 19.80 Setembro.. 15 07 4° .10


1897 Maio.. 20.08 66 15.32 4.76
1898 Abril 19.09 Outubro... 14.32 4.77
1899 Abril . 19.13 66 15.73 3.40
1900 Fevereiro.. 17.45 Agosto.... 13.51 3.94
1901 Março 18.97 Outubro... 15.09 3.88
1902 Abril . 18.72 66 14.03 4.69
1903 Março 18.38 Agosto.... 13.83 4.55
1904 Março 17.41 Setembro.. 14.03 3.38
Medias Março 18.46 Setembro.. 14.76 3.70
dos 9 annos

A maior tensão cae em Março com variantes para Feve-


reiro. Abril e Maio ; a menor de Agosto a Outubro

[ 1 ] E ' sabido que a tensão do vapor augmenta com a tem-


peratura. Assim a 0° ella é de 4 °, 60, isto é- -sua força equilibra
um peso de mercurio igual a 4 mill e 60 ; a 10 ° de calor a tensão
é de 9 mill 7 ; a 15 ° é de 12 mill 70 : a 20 ° é de 17 mill 39 ; a 25
é de 23 mill ; a 26 ° é de 25 mill ; a 27° é de 26 mill
230

VARIAÇÕES MENSAES.--As variações mensaes são, como se


vẻ da tabella 48, quasi tão amplas quanto as annuaes . Assim
temos para os 9 annos da tabelia :

AMPLI-
MAIOR MENOR MEDIA
TUDE

Janeiro 19.24 1896 15.75 1903 16.99 3.49


Fevereiro 19.87 1897 16.05 1904 17.79 3.82
Março 19.85 1897 17.01 1900 18.46 2.84
Abril 19.84 1897 16.77 1903 18.37 3.07
Maio 20.08 1897 15.76 1900 17.78 4.32
Junho 18.33 1897 14.37 1900 16.12 3.96
Julho 17.27 1897 14.03 1903 15.46 3.24
Agosto 16.92 1899 13.51 1900 15.24 3.41
Setembro 16.14 1899 13.85 1900 14.76 2.29
Outubro 15.91 1897 13.53 1900 14.81 2.38
Novembro 16.57 1898 14.35 1900 15.53 2.22
Dezembro 16.32 1898 14.44 1904 16.70 1.88

Estas variações mostram alternativas de 1,88 para 4,32.


E' nos mezes de viração que ha mais regularidade no estado
atmospherico em relação a quantidade do vapor dagua.
VABIAÇÕES HORARIAS. - A tabella 50 mostra que a menor
tensão horaria do vapor occorre entre 4 e 5 h. da tarde e a
maior as 2 horas da manhã, sendo sua marcha lenta, gradati-
va a partir de 4 h. da tarde. A esta hora a pressão do vapor
é de 14,34, as 5 de 14,34, as 6 de 14,55 ; as 7 de 15,10 ; as
as 8 de 15,93 ; as 9 de 16,53 e assim por diante.
A amplitude maxima horaria de um mez para outro não
attinge 2/5, e no mesmo mez, a horaria não excǝde de
5 entre as horas de maxima e de minima pressão.
t os
SEMESTRE
1º SEMEST
29 RE ANNOS
TOTAL

mostra
1
A 903
() 905

12h
h
.9 .h
9 2h
1h.r 12h
h
.9

TOTAL
TOTAL
Freq%

E
N. 9 3 3 N.
E 0
9.05
E
N.
E. 12 32 14 15 E.
,E
N 34
1.73
E. 1 8 1 3 4 8 E. 15
0.76

27
E
S.
E. 41
94 161 30 77 149 56
171
83 S.
E.
E 15.80
310
S.
E 150
97
102 349
123
150
144 300
241
417
E.
S.
225 39.02
766

བ12། རྟ
SS
.E 137
99
65 301
119
169 95 218
383
a seguinte frequencia :

E306
S160
S . 134.90
684


30 14 53 8 17
15
38 S.
13 68 3.47
SW
S. 28 35 11 39
15
3 8 S.
S
W. 50 2.55

*
W
S. 7 14 3 3 10 6 1 W.
S. 17 0.87
W
S.
W. 0 3 0 W.
S.
W 3 0.02
Calma 6 7 60 Calmo 07.03
obs
Não
6
.0 60 120 6
03 121
118 0
Não
123
obs 241

0-0
VENTOS - PHENOMENOS AEREOS

Total 367
363
362
1.092
374
370,368
1.112
736
,738
730 2.204
231

A constancia com que sopram os ventos de sueste com vari-


ações para Ee S caracterisa a corrente aerea do litoral cearense.
Da Abril de 1903 a Março de 1905 a direcção destes ven-
232

O vento dominante é o Sueste, que soprou em 349 horas no


1º semestre e 417 no segundo, prefazendo, 766 h. num total de
1963 horas de observação- ou 39 por cento. Segue -se o Susueste
com 301 horas no 1º semestre e 383 h. no segundo. Em terceiro
lugar vem o Essueste com 161 h. no 1º e 149 no 2º semestre.
VARIÇÕES MENSAES -A tabella 50 mostra que as oscilla-
ções mensaes na direcção dos ventos são de pouca importancia
e mal pronunciadas, Em resumo apresenta :
WS
Cal
W.
.W
S.

0214300 =
S.

7
Cal

3
0

1.41
4.16
co
CO

50.0 17
1

S
0
0

2
6

131
ΟΙ6

10
8

0
0
0
4

5.7
57
75
11
S. S.

|
2.831.25
F89
180000
S.
E

1613

25.58
63.83
766

Appeara
307
E.
S.

60

50
00

15
I

+2
23
N.. E.

4
0
3

0
3

1
E.N.
NW
E.
E

34
0

0

7
O
0
0
0

==
0

0
0

6
0
0

0
0
0

I0
0
0
0

1
0

Amplitude
0

0
0

0
0

1
1

Media
233

O vento E. S. E attinge o minimo em Agosto e o maximo


em Novembro, mantendo -se entre Dezembro 9 Março numa
media em torno de 30. O de S. E cae ligeiramente em Março e
Maio, mantendo-se em mais ou nienos igualdade de Julho a
Fevereiro.
O S. S. E apresenta marcha mais regular, cae de Novem-
bro a Março, ergue - se em Abril, augmenta de Maio a Agosto,
attingindo o maximo em Setembro. O S. attinge o maximo en
Março, conserva se quasi inalteravel até Junho, desaparecendo
quasi de Setembro a Janeiro. As maiores variações dão - se em
Março, Fevereiro e Abril.
VARIAÇÕES HORARIAS . - -A maior constancia dos ventos do-
minantes dá-se ao meio dia. O S. E, por exemplo, soprou nos
dous annos de observação 300 horas ao meio dia e 241 as 9 h .
da manhã, 225 as 9 h . da noute ; o S. S. E 306 ao meio dia ,
218 as 9 h . da manhã e 160 as 9 h . da noute. Ao contrario o
ES. E é fraco pela manhã ( 56 ), augmenta ao meio dia [ 83 ] e
attinge o maximo a noute ( 171 h .).
BRISAS. AS observações da Estação do porto não com-
prehendem as horas matinaes, começam as 9 h. da manhã,
quando a brisa de terra tem abrandado. E' este um vento con-
stante em todas as regiões do litoral maritimo, onde quer que
as differenças da temperatura se façam sentir entre o mar e a
terra.
VENTOS NO SERTÃO. - Em Quixeramobim as observações
relativas a este phenomeno alcançam dez annos, periodo razo-
avel para o conhecimento das suas modalidades. A tabella 50
sobre a frequencia e velocidade dos ventos neste lugar, de 1896
a 1905, mostra que a direcção predominante dos mesmos é a do
E, representada por 18.723 horas em 87.648 h. de observação,
equivalente a 21,4 %. Segue-se-lhe a de E. S. E com 16.391
horas ou 18.7 % , depois a de E. N. E com 14.819 horas ou
16.9 % a de S. E com 11.465 h., ou 13. %, a de N. E com
9.746 horas ou 11.1 ; a de S. S. E com 5.524 h. ou 0.63, e ou-
tros menos frequentes.
Comparados com os do littoral, vê- se que, ao contrario do
que a primeira vista parece, elles apresentam mais variações,
devido, talvez, a frequencia das observações.
Na capital como ficou dito, o registro meteorologico faz - se
as 9 h. da manhã, as 12 h. e as 9 da noite ; em Quixeramobim
234

os apparelhos automaticos gravam de 15 em 15 minutos, dia e


noite, os mesmos phenomenos. [ 1 ]
Sejam, porém, quaes forem as causas da differenciação.
esta se manifesta pela forma seguinte, segando a frequencia

LITORAL SERTÃO
% 0 %0

N. 1.2
N. N. E. 2.8
N. E. 0.04 11.1
E. N. E. 1.70 16.9
E. 1.76 21.4
E. S. E. 15.64 18.7
S. E. 39.04 13.1
S. S. E. 34.86 6.3
S. 3.47 2.6
S. S. W. 2.59 0.8
S. W. 0.86 0.6
W. S. W. 0.01 0.4
W. 0.4
W. N. W. 0.4
N. W. 0.6
N. N. W. 0.7
Calma 0.03 2.0

Auno 100.00 100 .

Os ventos do quadranto N., salvo a porcentagem de 1,74 %


de E. N. E. e N E -não sopraram as horas da observação
meteorologica no litoral ; no Quixeramobim representam 33,7 %
do total, contra 42,5 % do sul, em quanto na Fortaleza a por-
centagem dos ventos deste quadrante eleva -se a 96,47 %.

[1] Os instrumentos registradores do observatorio de Qui-


xeramobim são :
Meteorographo Theorell-(do P. M. Sonensen - Stokolmo )
1 Anemometro
2 Barometro •
3 Anemoscopio
4 Psychrometro
235

E' provavel que esta divergencia se prenda a direcção


dos ventos nocturnos, cuja intensidade decresce de 7 horas até
meia noite, quando se estabelece o equilibrio atmospherico,
para em seguida se reduzir com o terral ou brisa da terra.
A primeira vista, levando em conta tão somente as leis
meteorologicas conhecidas sobre a direcção das camadas aereas,
parece que este appello um tanto energico do vento do litoral
para o interior das terras, uma a duas horas, depois do pôr
do sol, contradisem as indicações barometricas e áquellas leis.
Sabe-se que o vento sopra das regiões em que a pressão
atmospherica é elevada para as de menor pressão. "Em torno
de um maximo de pressão o vento sopra para fóra, em todas
direcções .
Uma segunda lei -é que não só a direcção do vento não é
completamente perpendicular as isobaras [ 1 ], indo das maiores
as menores pressões, mas se inclina a direita no hemispherio
boreal e a esquerda no austral.
A consequencia a tirar-se dahi é que no hemispherio aus-
tral, e em torno de um maximo de pressão, os ventos remnantes
sopram na parte norte de um rombo entre o sul e leste ; na

5 Thermometro de Negretti & Zambra ( Londres )


6 Atmometro •
7 Actinometro maximo no vacuo
8 Actinographo de R. Fup. Berlim .
9 Pluviometro registrador, systema Hottinger- Zurich
10 66 de Negretti & Zambra
10 Osanometro de 6. 66
12 Barometro normal de R. Fup.
O Meteorographo está er communicação electrica com
os 5 primeiros apparelhos, e registra automaticamente em pa-
pel e por algarismos dia e noite, de 15 em 15 minutos o se-
guinte :
Velocidade do vento em metros por segundo.
Direcção do vento com 32 pontos
Pressão barometrica até 0.05m/m
Temperatura na sombra e indicação do thermometro hu-
mido até 0,050.

(1) São as linhas de igual pressão atmospherica.


236

parte occidental entre o leste e o norte : na parte sul, entre o


norte e o occidente : na parte leste, entre o oeste e o sul.
Em torno de um minimo de pressão, no hemispherio austral
-o vento sopra, na parte norte, entre o norte e oeste ; na parte
oeste, entre oeste e sul ; na parte sul, entre sul e leste ; e emfim
na parte leste, entre leste e norte. [ 1 ]
No litoral cearense, situado a leste do hemispherio sul, os
ventos derivados da maior pressão barometrica tenderiam a so-
prar segundo as leis expostas do quadrante oeste- sul : e como
um dos maximos de pressão [ segunda] cae entre 10 1/2 e 11 ho-
ras da noite. a direcção dos ventos deveria ser-lhe parallela. Isto,
porem, não se dá ; os ventos noturnos, o aracaty, como é chamado
no sertão, sopra invariavelmente de E, ora para S, e raro para
N. Quero crer que o aquecimento, cada vez mais intenso das
terras occidentaes pelos raios solares, occasiona a chamada das
camadas mais pesadas da atmosphera, as quaes em sua marcha
para aquelle ponto, baixam e precipitam outras no percurso,
do litoral ao centro de insolação.
Acontece ainda que a região baixa cearense se acha ladea-
da ao sul por serras e planaltos que correm do nordeste para o
sudoeste, ao norte pela cadeia da Ibiapaba que vem do norte
para sul. com ligeira inflexão de leste.
Acompanhando a encosta da divoria das aguas ao sul, abre
o valle do Jaguaribe com os seus affluentes vasto campo á pe-
netração dos ventos alizeos, solicitados pelo superaquecimento
de todo o sertão durante o dia.
E ' por esse largo canal, entre serras e planaltos , que se
precipitam as camadas atmosphericas, as vezes subitamente
com o ruido de furacão, outras precedidas de viração branda .
VARIAÇÕES MENSAES NO SERTÃO. — As variações mensaes são
bem accentuadas em relação a estação chuvosa. Os ventos do
quadrante N. com os seus variantes para Le W attinge neste
periodo o seu maximo, decrescendo logo apoz . Assim o N.
que parte de Setembro com 15 e chega a Janeiro com 43, attinge

(1 ) Exemplificando a sequencia destas leis, Mohn ensina


que -para o hemispherio austral- voltar as costas ao vento, a
pressão mais elevada ficará a rossa esquerda e um pouco atraz, e a
pressão mais baixa ficará a vossa direita, um pouco para frente.
237

em Fevereiro 143, em Março 197. Abril 184 e Maio 154 para


decrescer rapidamente até Setembro. O N. N. E e o N. E. se-
guem quasi a mesma marcha ; attingem o maximo em Março e
o minimo em Junho e Julho. O E e o E. S. E correm de par.
diminuem de Fevereiro a Junho, augmentando de Julho a De-
zembro. O S. E, S. S. E e S tem quasi as mesmas alternativas,
partem de um minimo em Novembro e Dezembro, augmentam
lentamente até Maio quando sobem bruscamente, permanecendo
alto até Agosto, declinando em seguida. O S -S - W, W- S— W,
W- S -W, W, W - N - W , N- W , N - N - W não sopram ae
Setembro a Novembro, salvo excepcionalmente e pouco em Se-
tembro os 3 primeiros , e o W em Novembro : em Dezembro
aparecem fracamente, sobem insensivelmente em Janeiro, mais
rapidos em Fevereiro, attingem quasi bruscamente em Março o
maximo, permanecem frequentes em Abril e Maio , menos em
Junho e Julho, raros em Agosto.
INTENSIDADE MENSAL DOS VENTOS. -E' porventura o melhor
criterio para se conhecer a approximação da estação pluviosa .
Nos mezes seccos os ventos adquirem grande velocidade . A
partir do minimo em Abril com 2,16, seguem a marcha ascen-
dente de 2,19 em Maio; 2,51 em Junho : 2.85 em Julho : 3,31 em
Agosto ; 4,40 em Setembro, attingindo o maximo em Outubro
com 5,11 . A inversa começa neste mez , em Dezembro desce a
5,02 ; em Janeiro a 3,88 ; Fevereiro a 2,87 ; Março a 2,46 até
voltar ao ponto de partida. As tabellas 51 , 52 e 53 mostram
parallelamente a frequencia e intensidade dos mesmos por anno
e por mezes num periodo assaz longo.
238

VARIAÇÕES HORARIAS. -Não possuo observações sobre a


direcção horaria dos ventos, factor de alguma importancia para
explicar e confirmar as leis meteorologicas da marcha dos mes-
mos. As que se referem a velocidade em metros por segundo
mostram haver certa regularidade na marcha e producção do
phenomeno. Durante o dia ha, como na pressão barometrica,
duas phases de maximas, e duas de minima velocidade. Nos me-
zes de Abril e Agosto estas alternativas obedecem a regra tão
uniforme que dantemão podem ser previstas.
Não só as duas minimas e as duas maximas caem em ho-
ras certas, as mesmas, como as suas velocidades são progressi-
vamente proporcionaes.
Assim observa- se que occorrem as :

1 MIN . 1 MAX. 2 MIN. 2 MAX.

7 h . do dia Meio dia 8 h. noite 11 h . noite

Abril .. 1m.02 3m.25 1.78 (7 h. ) 2.42


Maio... 1.04 3.51 1.29 2.50
Junho 1.15 4.09 1.21 2.99
Julho .. 1.46 4.33 1.46 3.43
Agosto 1.91 4.32 1.85 4.70

De Setembro a Janeiro, mesmo até Março , essas oscilla-


ções, se bem que menos uniformes, apresentam certa regulari-
dade, como se vê dos seguintes dados :

1ª MINIMA 1ª MAXIMA 2ª MINIMA 2ª MAXIMA

Setembro 3.67 4 h. m. 4.95 10 h. m. 2.69 7 h . n . 6.69 10 h. n.


Outubro 4.323 5.84 8 .. 3.717 7.59 10 ..
Novembro 3.926 " 6. 5.74 9 ་་ 4.276 ་་66 8.01 9 66
Dezembro 3.60 3 . " 5.10 S .. 4.335 " 7.32 9 " 66
Janeiro 12.635 " .. 4.61 9 3.70 7 " 66 5.88 10 "
Fevereiro 1.67 7 " 66 3.51 10 2.888 .. 3.7710 * 66
Março 1.347 “ 3.71 9 .. 2.26 7 . 66 66 ..
3.01.10
239

Os ventos nocturnos são mais impetuosos e constantes . As


duas minimas são, na quadra interequinoxial ( Abril a Agosto)
intervalladas de 13 horas [ 7 da manhã as 8 da noite), as duas
maximas de 11 horas [ meio dia as 11 da noite ). De Setembro a
Março as maximas se reproduzem dentro de 12 a 13 horas ( 3 a
10 da manhã as 9 e 10 da noite ) .
A tabella 54 patenteia claramente não só a gradação ho-
raria da velocidade do vento, como a sua marcha mensal, de-
crescente de Janeiro a Abril e Maio, ascendente até Outubro
estacionaria, com tendencia a minorar, em Novembro e Dezem-
bro.
Na estação secca são frequentes os redemoinhos de vento,
resultantes do choque de duas correntes aereas em sentido con-
trario, produzindo rotação espiral, em forma de tromba cy-
lindrica, cuja base, as vezes de muitas toesas, diz o Senador
Pompeu, se arrasta pela terra, rodopiando no seu vertice todos
os objectos que por sua força pode arrebatar, e levantar aos
ares para os atirar a grande distancia. Ha alguns que arran-
cam arvores, derribam casas e percorrem grande espaço ; du-
ram as vezes meia hora.
E' preciso notar que este phenomeno com o caracter de
cyclone não tem a intensidade que apresenta nos climas tempe-
rados.
No Ceará os redemoinhos que derribam arvores são raris-
simos.

EVAPORAÇÃO

O estudo deste phenomeno será necessariamente muito in-


completo pela falta de observações ou pela imperfeição destas.
No entretanto, o conhecimento exacto da quantidade d'agua
evaporada do solo e das massas liquidas, doces ou salgadas,
diria muito mais sobre a seccura e humidade atmospherica do
que o registro das chuvas e dos hygrometros.
O conde de Gasparin, preoccupado com este assumpto, eria
não se dever tomar por base da humidade de um clima a quan-
tidade de chuva caida no decurso do anno, pela razão sim-
plissima de que esta quantidade podia ser mais consideravel
numa região secca do que em outra havida por humida, como
acontece no sul da França e nas costas orientaes da Inglaterra.
240

O gráo de humidade tambem não pode ser invocado por


que é influenciado pelo resfriamento nocturno, maior no Sul do
que no Norte, variando segundo o hygrometro está collocado
perto do solo, a certa altura, a Norte ou ao Sul. As differentes
camadas de ar não possuem a mesma temperatura, não tem o
mesmo gráo de humidade. Fica- se, pois, reduzido a tomar a eva-
poração como criterio dos climas humidos ou seccos, porque
ella está em relação com o gráo hygrometrico do ar. Pode -se
effectivamente dizer que dous climas, em relação a seccura, em
temperaturas iguaes, estão entre si como as quantidades dagua
evaporada : pois onde é maior a evaporação, necessariamente
o clima é mais secco . [ 1 ]
Das experiencias de Gasparin [ 2] resulta que a relação en-
tre a evaporação á superficie d'agua e a da terra, completa-
mente embebida , por uma temperatura de 23 a 240, é a se-
guinte :

EVAP. EM MILL D'AGUA EVAP. DA TERRA EM


AO AR MILL.

1º dia 15,0 4.1


20 13.17 2,5
ვი .. 11,5 1,8
40 12.0 1,3
50 11.7 1,3
6º 11.0 1.2
79 9.4 1.3

A evaporação terrestre, em Genebra, observada por Mau-


rice foi de 0,61 % da chuva caida , o que não corresponde ao ter-
ço da evaporada a superficie dagua.
Dada a quantidade de chuva caida, as observações relati-
vas a evaporação terrestre são discordantes conforme o obser-
vador. Assim, na Inglaterra, Dalton, Dickenson e Charnock che-

(1) Becquerel - Des climats - Paris 1853 pg. 119.


(2) Gasparin- Cours d'agriculture-pag. 114.
241

garam a conclusões differentes- como se vê dos seguintes da-


dos :

QUANTIDADE EVAPORAÇÃO FILTRAÇÃO


DE CHUVAS DA TERRA ABSOLUTA

Charnock 629 mill. 503 126


Dalton 852 638 214
Dickenson 665 66 381 284

Estas differenças devem ser attribuidas a variação das


circumstancias experimentaes. ( 1)
Resumindo as melhores experiencias sobre a evaporação e
infiltração, [2 ] temos :
3022225

ANNOS PORCENTAGENS

OBSERVAÇÕES DA EVAPOR. DA FILTRAÇÃO

Dalton ... 75.0 25.0


Dickenson 57.5 42.5
Maurice 61.0 39.6
Gasparin 80.0 20.0
Risler . 70.0 30.0
Greaves 73.4 26.6
Lawes 71.4 28.6

No Ceará só ha dados referentes a evaporação d'agua


pelo evaporimetro de Piche.
No litoral [ Fortaleza ] as observações recolhidas, de 1903 a
1905, não permittem tirar-se deduções completas acerca da
marcha mensal do phenomeno. Em 1903 a quantidade media
mensal evaporada cresceu de Abril a Julho, conservando -se
com ligeiras alternativas estacionaria até Novembro. Em 1904
a escalla ascendente foi de Maio a Setembro, mantendo- se es-
tacionaria para o fim do anno.
E' na estação secca [ de verão ] que a evaporação mais se
activa, sobretudo quando a velocidade dos ventos augmenta e o
brilho solar se prolonga.

(1) Debauve - Meteorologie, pag. 103 .


(2) Ronna- Les irrigations - vol. I, pag. 75 .
242

Na tabella 55 acham-se grupadas comparadamente, por


mez, as medias de cada um destes agentes.
Não ha, ao menos a primeira vista, perfeita concordancia
entre a evaporação, a velocidade do vento e as horas do brilho so-
lar. No conjuncto, porém, ella se manifesta com approximações
que induzem a crer- se na relação de causa a effeito entre ellas .
Tabella n . 55.
Evaporação a sombra na Fortaleza em 24 horas.

VELOCIDADE HELIOGRAPHO- HO-


1903 EVAPORAÇÃO DO VENTO RAS DO BRILHO SOLAR

Abril ... 2.99 4.1 234.06


Maio 3.59 4.8 283.84
Junho . 4.00 4.7 284.46
Julho 5.56 5.0 310.58
Agosto 4.44 3.0 316.41
Setembro . 4.25 5.1 287.18
Outubro .. 4.27 4.8 322.36
Novembro 4.26 5.0 299.59
Dezembro 3.99 3.4 260.31
4.05 4.87 288.75
1904
Janeiro .. 3.76 4.6 261.32
Fevereiro 3.68 4.6 208.17
Março .. 3.28 5.2 232.20
Abril . 3.52 5.1 237.95
Maio . 2.85 4.5 235.84
Junho . 3.58 4.6 246.48
Julho 3.75 5.2 256.77
Agosto 3.97 5.2 296.83
Setembro 4.88 5.6 255.87
Outubro 4.60 5.2 256.54
Novembro 4.12 5.i 282.56
Dezembro 5.2 263.51
3.81 5.0 252.83
1905
Janeiro . 2.87 5.4 250.24
Fevereiro 2.94 5.3 183.57
Março .. 1.65 4.1 124.65
Media 2.48 4.9 186.15
Media de 24 mezes 3.73 4.9 257.97
Total de 24 mezes 6.191.29
905 1906 Total Media

1
25.5 183.6 3.357.3 239.83
16.4 116.6 2.358.9 168.49
37.5 105.1 2.055.9 146.85
09.1 80.8 1.697.1 121.22
13.3 66.9 1.930.2 137.87
$4.6 121.4 2.331.0 166.50
5. 190.9 3.051.9 203.71
1. 242.8 3.483.5 232.22
5.4 232.8 3.739.4 249.29
{ 0. 4.206.0 300.42
5.9 3.890.7 277.91
5.1 4.022.8 287.34

S.8 2.531.64 217.97



t
243

Salvo defeito nos apparelhos ou no modo de fazel- os func-


cionar, as observações relativas a evaporação em Quixeramo-
bim e Quixadá, simultaneamente, apresentam contrastes que
requerem explicação. [ i ] Assim vê-se que no mesmo mez e
anno as quantidades d'agua evaporadas num e noutro lugar,
no coração do sertão, apenas distanciados por uns 50 kilome-
tros, variam em proporções considerabilissimas.
Sendo as condições meteorologicas quasi identicas, sopran-
do os mesmos ventos, com intensidades iguaes, regulando o
calor, a pressão atmospherica e a humidade quasi com coeffici-
entes equivalentes, como explicar taes variantes ?
Eis o facto com todas as suas modalidades :
Evaporação ao sol em millimetros.

1897 1898 1901

Quixera. Quixa- Quixera Quixa- Quixera Quixa-


mobim dá mobim dá mobim dá

Janeiro 351.7 389.2 337.8 399.9 302.9 199.3


Fevereiro 149.0 200.4 208.3 232.2 189.4 143.2
Março 168.4 195.8 337.9 307.6 148.5 115.4
Abril . 151.1 156.2 226.6 190.4 146.0 107.0
Maio. 138.0 133.4 296.1 298.9 125.2 102 .
Junho 152.3 134.3 290.4 345.6 141.2 124.5
Julho .. 227.0 151.3 332.0 300.7 136.3 134.8
Agosto 281.7 213.6 360.9 401.1 325.8 163.9
Setembro. 421.1 359.1 391.6 381.7 363.4 165.1
Outubro.. 457.1 320.5 418.5 406.8 357.5 192.1
Novembro 468.6 319.4 344.5 396.6 324.1 201.0
Dezembro . 508.7 399.9 286.1 330.5 360.8 281.0

Total ....... 3.474.72.873.43.830.73.994.22.921 .11 .929 .9

( 1 ) As divergencias resultantes dos apparelhos são conhe-


cidas. O engenheiro Ruinet provou que entre dous evaporame-
tros, um de 2 metros, outro de 0m30 do lado, no mesmo lugar e
tempo, a evaporação foi-de 0,088 no maior e de 0m, 134 no
menor, donde a differença de 0,046 durante 30 dias.
244

As variações mensaes foram em Quixeramobim de 138 a


508 em 1897, no Quixadá de 133 a 399 : no anno seguinte a mi-
nima naquella cidade desceo a 208 e a maxima attingio a 418 .
contra 190 e 406 em Quixadá ; em 1901 a minima em Quixera-
mobim foi de 125 e a maxima de 363 contra 102 e 281 no Qui-
xadá.
A marcha da evaporação segue mais ou menos a mesma
escalla numa e noutra cidade. Em ambas o mez de mais fraca
evaporação é o de Abril e o de mais alta Outubro. Nos 5 mezes
de inverno ( Fevereiro a Junho) a evaporação eleva-se no Qui-
xadá a 741 , m03 ou 148,m2 por mez, contra 1.787m,72 nos 7 me-
zes de verão ou 255,38 por mez. Nesta quadra, portanto, a
evaporação é 72 % mais activa de que no inverno.
Em Quixeramobim os 5 mezes de inverno dão 977,5 con-
tra 2.195,8 no resto do anno, ou as medias mensaes de 195,5
contra 313,68 . A evaporação no estio é 60 % mais energica.
Annualmente no Quixadá a evaporação eleva - se a 2.531,64
e em Quixeramobim a 3.173.3 . Esta differença não me parece
justificavel. Se bem que este ultimo sertão seja mais aberto e
desabrigado dos ventos reinantes não posso crer que a evapo-
ração ahi exceda de 25 %. E' provavel que o instrumento re-
gistrador não dê a expressão real do phenomeno. E' o proprio
director do observatorio, o Sr. Oswaldo Weber, quem observa
em seu relatorio ser a evaporação alli condicional, pois se ve-
rifica que ella excede a queda d'agua, como por exemplo em
1898 e 1903 , 9 vezes, o que. no seu modo de pensar, significaria
que quanto mais secco fosse o anno tanto maior seria ella
[evaporação ] se agua houvera.
Em relação a Quixadá, o Dr. Piquet, chefe da commissão
de açudes, surprehendido com o registro da evaporação , pro-
curou pelos meios a seu alcance verificar a verdade .
Eis como elle expõe o processo da verificação : " Passando
ao estudo do volume perdido por evaporação, infiltração e
absorpção, verificamos no- -Quadro de observações desta commis-
são--que a evaporação registrada era extraordinaria e que só
em 1898, anno de secca, ella fora de 4052 mm. Duvidando de
taes algarismos, começamos, logo ao aqui chegarmos, a obser-
var o decrescimento das aguas do açt de, decrescimento que
corresponde as tres causas de perdas apontadas e não somente
a evaporação. A primeira observação foi feita em 28 de No-
!

245

vembro de 1898 e a altura da agua era de 5m 830 Na segunda


observação, em 9 de Fevereiro de 1899, 74 dias depois. era de
5,550 ou um abaixamento de 280m /m o qual corresponde a
3.78m/m por dia. Nesse mesmo periodo de tempo o observato-
rio registrava 707,58 m/m de evaporação ou 9,56 m/m por dia.
Cumpria, por conseguinte, por de lado este ultimo resultado.
E foi o que fizemos, não obstante continuarmos as observações.
Poder-se - á objectar que, durante o periodo estudado houve
chuvas com a altura de 242 mm que elevaram as aguas, ou
pelo menos perturbaram a marcha decrescente observada. A
essa objecção responderemos, em primeiro lugar, que os riachos
que desaguam neste açude, só depois de muitas e successivas
chuvas é que tomam agua, o que então não se deu, apezar dos
242mm registrado : e em segundo lugar, que, mesmo que
aquellas chuvas influissem, não já pela agua que descessem dos
rios e terrenos adjacentes, mas directamente, ainda assim,
descontando - os de 707,58 m/m dariam 405,58 m/m ou seja
6,29 m/m por dia, resultado aínda muito superior ao observado
directamente. Do dia 10 de Fevereiro de 1899 em diante, chuvas
abundantes nos impediram de continuar as observações da
baixa, observações que as começamos em 1º de Agosto,
collocando um evaporimetro perto das aguas ao sol, e outro a
sombra, ambos em lugar ventilado, mas impedidos de oscillar.
Eis o resultado obtido :

EVAPORISAÇÃO
ΑΒΑΙΧΑ . ΤΟ
DAS AGUAS
MEZES CHUVAS
AO SOL A SOMBRA
MILL.
EM MILL. EM MILL.

Agosto m 190.03 158.27 110


Setembro 349.77 279.70 195
Outubro 381.61 274.35 195

Media 307.13 237.59 166.66


246

EVAPORAÇÃO MEDIA DIARIA ABAIXAMENTO


MEZES MEDIO DIARIO
AO SOL A SOMBRA DAS AGUAS

Agosto 6:13 m/ 5.12 m


m/m 3,5 m
Setembro 11,65 9,3 .. 6,5
Outubro 12.31 66 8.866 6,5 ..

Deste resultado deduzimos :


Relação entre as medias mensaes da baixa e da evapora
166,66
ção ao sol : = 0,543.
307.13
Relação entre as medias mensaes da baixa e da evapora-
166,66
ção a sombra : = 0.701
237,59
Estabelecidas estas duas relações, podemos achar qual
tem sido a baixa das aguas em outra qualquer epoca.
"Basta para esse fim que conheçamos a evaporação nessa
epoca e que a multipliquemos por aquellas relaçõe . Assim, por
exemplo, sendo a evaporação registrada em nossa séde, no
anno de secca de 1898, de 4.052 , 25 m/m ( 1 ) multiplicando pela
relação, obtem-se : 4052,25 + 0,543 = 2.200 m /m que é a baixa
em um anno.
As observações feitas em Quixeramobim, no mesmo auno,
accusam 3380,7mm ao sol e 1512,9m /m a sombra ; multiplican-
do- se respectivamente pelos quocientes acha-se 3830.7 ×
0,543 = 2080 mill. e 1512 × 0,701 = 1060 m. Pondo de parte este
ultimo resultado, da baixa, por discordante da observação di-
recta, verificamos que o valor registrado em um anno de ma-
xima evaporação corresponde aqui a um abaixamento de
6,02 m/m por dia e em Quixeramobim a 5,69 mm, resultados
esses que se approximam do observado directamente no pro-
prio açude, e que foi de 6,5 min (2 )
Estas considerações bastam para comprovar o que ficou
dito ao encetar este capitulo.
Eis as tabellas que se referem a evaporação e ao brilho do sol:
(1) Maximo registrado desde 1891. Cumpre-nos, porém, di-
zer que as observações não eram bem feitas, porquanto o
instrumento oscillava, estava em lugar baixo e exposto ora ao
sol, ora a sombra. [ Nota do Dr. Piquet].
(2 B. Piquet Carneiro - Açude de Quixadá- Fort.. 1906,pag. 7.
Tabell

Annos Janeiro
!

1896
1897 207.2
1898 229.7
1899 264.9
1900 196.3
1901 280.3
1902 256.4
1903 245.5
1904 203.4

Medias 235.4
Tabella
.n
.61

%
100
D
de
- ias
Quixeramobi
)e
I m
nsolação
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Outu- SOM-
Setem-
Agos
Julho
Março
Abril
Junho
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ΤΟ reiro to bro bro
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1896
1897 0 0
1898 0 0
1899
1800

1900 6
1901 0
1200
63240

1902 0 0 4

ละ
+ 03029a

1903 0 7
1904 L 0 0 1 12
36
O12140022

117213 +071
168884000

0001000OT
1
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0 4 6 8 8
10 3 47
2
Medias
00
00

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247
248

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Feve- Julh
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1896
1897
1898
1899
1900 0
1901
1902
1903 1 0 0 0
1904 2 0 1 0 0 0 0
02104030 60 2110 Ca

COOOO0000

oooo0000
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0
Medias1 00 00 0
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guante

Mill.

187
248
348
57.5
150 .
115.8
110.5

1.216.8

229.4
210.4
214.0
399.7
208.1
208.3
1 207.4
249

CHUVAS

E' o assumpto cujo conhecimento mais importa ao Ceará .


A anciedade com que annualmente é esperada a estação
chuvosa, da qual depende o bem estar ou as privações dos seus
habitantes, mostra a subida importancia que exerce nos desti-
nos desta região.
Farei, primeiramente, o historico dos annos seccos, tal como
a tradição oral e escripta nol- o transmittio, completada pelas
observações recolhidas desde 1849 até o presente na Fortaleza .
Nesta exposição seguirei o trabalho do Senador Pompeo-
Clima e Seccas no Ceará ( 1 ), no qual foram compendiados todas
as noticias relativas à esta magna questão.

SECCAS NO CEARÁ

[ 1614.-[2 ] O Barão de Studart diz em sua obra Datas e


Factos para a Historia do Ceará [ 3 ] que neste anno houve gran-
de secca no Ceará.
[ 1692. —E' a data da primeira secca verificada. D'ella diz
Gama nas Memorias Historicas de Pernambuco [ 4] "Na grande
fome que houve n'aquelle tempo em Pernambuco por causa da
secca constantemente o soccorreu ( o bispo), mandando a sua
casta conduzir em barcos farinha para destribuir com a po-
breza]
1711.-A primeira secca de que resta vaga tradição , em
memorias fóra da provincia, foi a de 1711 , que extendeu-se ao
norte até o Maranhão, pois que em 19 de Abril desse anno a
camara de S. Luiz representou ao governador sobre a fome 9
penuria que soffria o povo nesse anno por falta de chuva.
Quasi nada se encontra nos archivos do Ceará desse tempo,
pois que infelizmente tudo foi destruido.

( 1) O que accrescentei a este trabalho vai entre parenthe-


ses [ ]. Como se verá comprehende duas terças partes do texto
primitivo.
[ 2 ] As noticias intercaliadas são de minha lavra as demais
da obra do Senador Pompeo Clima do Ceará.
[ 3 ] Dr. Guilherme Studart- Datas e Factos para a historia
do Ceará.- Fortaleza 1896 - pag. 23 .
[4] Gama- obra citada, vol. 4º, pag. 27.
250

(0 Dr. Cezar A. Marques na Memoria do Maranhão expri-


me-se nesses termos : " Em 19 de Abril de 1711 os officiaes da
camaia representaram ao governador Christovão da Costa
Freire mostrando o miserando estado em que se achava todo o
povo desta cidade, e suas capitanias por a grande fome, que
havia neste anno por falta de chuvas”.
Em carta do Padre Mestre Manoel de Aguiar ao governa-
dor da Parahyba, lê- se : Meo Sur., isto agora é dizer a v. s. o
que tenho ouvido. Queixa-se já publicamente, todo este povo,
que no tempo em que os pobres (que todos podem ter este
nome) estão por decreto divino padecendo tão grande falta de
mantimentos, que se tem comido por mantimentos muitas fru-
etas bravas do mato, experimentando se extremas necessidades,
tenha v. s. tomado a empreza de soccorrer a uns homens amoti-
nados " . ]
( 1721. -Conta Rocha Pitta ( 1 ) que neste anno "abrasava
o sol com excessivo ardor toda a nossa America, seccando as
aguas, estagnando as fontes, esterilisando as lavouras e ma-
tando os gados, de modo que além da falta de todos os viveres
era maior a da farinha de mandioca, pão commum dos mora-
dores deste Estado, chegando por esta causa o preço della nas
provincias de Pernambuco e Rio de Janeiro a 3$200 e a 7$000
o alqueire, a carne, da qual havia a mesma esterilidade, a
1 $600-24000. Os visinhos das provincias do Ceará e Rio Gran-
de se ausentaram das praças e foram habitar as margens dos
rios para não acabarem ao rigor da sède.
Ainda sobre a secca deste anno e seguintes, diz Accioly [ 2 ]
que as provincias do Ceará , Rio Grande, Pernambuco e Rio de
Janeiro foram assoladas da fome, oriunda das extraordinarias
seccas que os flagelavam desde 1721. Vasco Fernandes não só
soccorreo com abundancia de maatimentos ; mas até mediante
o desenvolvimento das maiores providencias, fez com que na
Bahia superabundassem todos os viveres" ) .
1723-1727. Nos annos de 1723 a 1727 deu - se grande
secca : E' propriamente a primeira de que se encontra noticia
em documentos officiaes da provincia.

[ 1 ] R. Pitta- Historia da America portuguesa. 2. X, nº 69 .


[ 2 ] Accioly- Memorias historicas du Bahia, vol. I , pags. 158
a 159.
251

Esta secca, que começou em 1723 ou 1724 extendeu -se até


1727, durante 3 a quatro annos, e comprehendeu não só a re-
gião de que falo, mas até a Bahia e Piauhy, porque segundo as
memorias historicas de Accioly, na Bahia seccaram até as fon-
tes.
As tradições escriptas, a que me refiro, não avaliam os es-
tragos que então produziu . Nessa épocha o Ceará era ainda ra-
ramente povoado por colonos europeus, ou seus descendentes .
E' porém, certo que o gentio, que dominava em quasi todo o
interior, soffreu muito, e emigrou para as serras mais frescas .
No valle do Cariry, o terreno aliás mais fertil e abundante
de agua no Ceará, é onde se conserva maior tradição dessa sec-
ca, que em 1725 fez desseccar todos os brejos e correntes, obri-
gando os habitantes de Missão Velha a mudar- se por falta d'a-
guas. Segundo a tradição, corrente entre velhos respeitaveis do
Cariry, a grande secca da provincia não foi precisamente em
1723 a 1727 ; nesses annos houve o que se chama repiquetes,
máos invernos, ou mesmo seccas pouco intensas.
O anno de grande secca foi o de 1722, em que não só mor-
reram numerosas tribus indigenas, como o gado ; e até as féras
e as aves se encontravam mortas por toda parte.
O sol foi tão abrasador, que fez seccar todas as fontes, fi-
cando apenas uma ou outra ; profundas e largas fendas se abri-
ram no solo, por uma extensão de muitas leguas.
Nos annos seguintes, de 1723 a 1727, a secca tornou-se en-
tão horrivel nos sertões de Pernambuco e Bahia, e affectou até
a capital da Bahia. Morreu muita gente, tanto em 1722 no Ce-
ará, como no triennio seguinte nos sertões de Pernambuco e
Bahia.
[Em Accioly, referido pelo Senador Pompeu , se nos depara
o seguinte trecho ( 1 ) das Memorias Historicas da Bahia :
No dia 4 de Janeiro de 1824 das 7 para as 8 da manhã,
se ouvio na capital ( Bahia) um assustador estrondo subterraneo,
ao que seguiu-se immediatamente pequeno tremor de terra, que
durou cousa de dous segundos ... e delle tiraram cousa os pre-
sagiadores para reputarem como precusor da grande secca, que
assolou a provincia, chegando até a estagnar as fontes da ca-
· pital . "]

[ 1 ] Accioly-obra citada, vol. VII, pag. 129.


252

(0 Coronel João Brigido dos Santos referindo - se no seu


Resumo chronologico para a historia do Ceará (1 ) diz que o povo
de Missão Velha foi obrigado a abandonar o arraial á falta
dagua e passar-se para o lugar, que se ficou chamando Mis-
são- nova. Esta calamidade, accrescenta elle, só teve fim em
1728, occasiouando grandes perdas nos gados, muito pereci-
wento da população india, e a dispersão do resto pelos ser-
tões, que offereciam mais abrigo. )
[ 1736-1737. Algumas memorias, e communicações dos
capitães-mores, falam vagamente de uma secca nos annos de
1736-1737, que flagelou a criação de gados : mas não dão no-
ticia de sua intensidade. ]
[1738. -Por haver grande penuria de viveres neste anno o
Senado do Icó prohibio a saida da farinha do termo. ] (2)
[ 1744. - A 24 de Setembro, ao meio dia, e tempo claro, se
ouvio am trovão subterraneo e immediatamente tremeu a terra.
dando mais balanços compassados que causaram grande susto
em todos os lugares de Matto Grosso e Cuyabá. Já neste tem.
po dominava a secca que durou até 1749 ; todos os viventes
padeceram fome e outras calamidades de que morreo uma
grande parte. ] (3 )
[ 1745-1772 - Nos annos de 1745-1746 e 1772 encon-
tram-se tambem noticias de secca, que atravessou a criação
dos gados : mas apenas vagamente falam della os capitães- mo-
res em seus officios. ]
[Em 1745 houve secca, segundo refere o jesuita Johann
Brener (4 ) e confirmam as actas da camara da Fortaleza. (5 )
[1754- Houve secca na capitania] (6 ).
Entretanto os annos de 1775-76 tinham sido de invernos
diluviaes.
O anno de 1784 foi tambem secco, não tanto quanto os
precedentes ; morreu muita criação, e só chuvcu em Maio.

(1) J. Brigido dos Santos - Resumo chronologico - Paris-


1887, pag. 73.
(2) G. Studart - Datas e factos. etc.- pag. 196 .
(3) Ayres do Casal - Corographia, artigo -Matto Grosso-
vol. 1º pag. 260-217.
(4) J. Brigido -ebr. cit., pag. 89.
(5) G. Studart -- obr. cit. , pag. 220.
(6) G. Studart - obra cit., pag. 264.
253

[ 1760 -Este anno foi de grande penuria na capitania e o


Senado taxon a farinha de mandioca em 800 por alqueire. se-
gundo o Coronel J. Brigido. ] ( 1 )
[1776 Uma secca abrasadora e depois a sua terrivel e ne-
cessaria consequencia-a fome -veio completar o castigo que
a justiça divina decretara. ] (2)
[ 1777-1778, Outra grande secca, que deixou mais tra-
dicções, officiaes e particulares, foi a do anno de 1777--1778 .
Segundo as communicações.do Capitão-mór e do provedor da
Fazenda a El- Rei, o gado da então capitania ficou reduzido a
menos de um oitavo : e fazendeiros (estancieiros ) que recolhiam
mil bezerros não ficaram com 20 nos annos seguintes. )
Segundo a tradição de velhos fazendeiros do Cariry e Qui-
xeramobim, apenas cairam no anno de 1784 ligeiras chuvas de
Janeiro até Abril, que nem legumes, nem pastos seguraram .
Contavam já com uma grande calamidade, como a de 1777 ,
quando a 7 de Maio, durante uma noite sombria, desabou em
toda a provincia uma chuva tão forte e extensa , que no
dia seguinte todos os rios estavam abarrotados, todas as lagoas
cheias, etc. Morreu muita criação com a pancada d'agua, e cor-
rente dos rios ; porem esta grande chuva , com poucos chuvis-
cos em Julho, bastou para segurar a pastagem para o resto do
anno, bem como a plantação de legumes nas serras,
1790-1795. A secca que abrange o periodo de 1790-93,
chamada secca grande, que em algumas partes durou tres annos,
em outras quatro, foi a que deixou mais tradições tristes na
provincia,
Havia chuvido escassamente em 1790 , menos em 1791 ,
nada em 1792 e pouco em 1793. Foi o periodo secco mais longo ,
de que ha noticia, na região do norte , Esta secca extendeu- se,
não só a toda antiga capitania geral de Pernambuco, como a
Bahia, Sergipe ao sul ; Piauhy e Maranhão ao norte, com mais
ou menos intensidade .
Os rios e fontes seccaram, e algumas ribeiras ficaram com-

(1) J. Brigido - obra cit., pag. 102.


[2 ] F. Gama- Memorias historicus de Pernambuco, vol. 4,
pag. 398. Parece haver engano de anno. A secca foi no anno
seguinte.
254

pletamente assoladas : segundo o memorial dirigido a El - Rei


pela viuva do Capitão Francisco Nobre de Almeida (de Per-
nambuco), e informações da Provedoria, pereceram á fome e
sêde os animaes domesticos e as feras silvestres dos sertões :
muitas pessoas, familias inteiras, que não poderam a tempo
emigrar, forão encontradas mortas pelos caminhos e casas.
O capitão Nobre, proprietario rico do Recife, que possuia
muitas fazendas nos sertões da Parahyba e Ceará, e havia ar-
rematado em praça o disimo triennal desse tempo, tendo vin-
do aos sertões com sua familia, morreu com toda a sua comiti-
va. victima da secca.
As fazendas ficaram desertas por terem morrido os gados.
e emigrado, senão morrido tambem os vaqueiros e donos. Ay-
res de Casal, na sua Corographia, diz que sete freguezias das
que então (erão poucas ) existiam , no Ceará, ficaram desertas.
Ha , talvez , exaggeração : mas é certo que a maior parte
do sertão ficou literalmente deserto !
[A referencia de Ayres de Casal encontra-se no vol . 2 pag.
192 da 2ª edição, quando assegura que esta secca durou até 1796
e fez perecer todos os animaes domesticos e muita gente á min-
gua, e foi tambem a causa de muitas epidemias que varreram
muitas mil pessoas por toda provincia. Os povos de sete paro-
chias desertaram sem ficar uma só aima . ]
Segundo uma informação do capitão geral de Pernambuco
a El- Rei, pereceu em toda a capitania mais de um terço da po-
pulação !!
O Padre Joaquim José Pereira, natural do Rio Grande do
Norte, vigario, testemunha occular, em Memoria que dirigio ao
ministro Dr. Rodrigo de Souza Coutinho, e que corre impressa
na Revista do Instituto, refere que alem da calamidade da secca
que tudo devorou, appareceu nos sertões do Apody (Rio Gran-
de do Norte ) uma tal quantidade de morcegos ( vampiros ) que
mesmo de dia atacavam as pessoas e animaes, que já inauidos
pela fome, não tinham mais força, nem animo de affugental- os .
Nas estradas, pousadas, e mesmo em casas, encontravam -se
tropas de pessoas, homens, mulheres e crianças mortos, ou mo-
ribundos, arrastando -se exangues pela fome e pelos morcegos
"Não era raro, diz a Memoria, encontrar- se habitação, onde
a par de cadaveres em putrefacção, se achavam miseraveis ain-
255

da vivos, prostrados no chão ou no leito, cobertos de morcegos,


que as victimas não podiam sequer enxotar. "
A fabula de vampiros da Hungria, que mereceu uma histo-
ria de D. Calmet, acharia nessas seenas lugubres uma triste re-
alidade, de que todavia ninguem mais se lembrou !
A secca matou quasi todo o gado da Capitania, de sorte
que, quando chuveu em 1793, os que poderam foram ao Piau-
hy vêr semente de.gádo, para recomeçar a criação.
De uma memoria existente no archivo municipal da cidade
do Aracaty, por ordem do antigo conselho, extrahi o seguinte :
"No anno de 1790 , principiou , além de outras mais moderadas, uma
secca tão horrivel e rigorosa, que durou quatro annos : porém
em 1791 e 1792 tornou -se tão excessiva, que assolou , destruio e
matou quasi todos os gados dos sertões, e por isso veio a desap-
parecer o commercio das carnes seccas, e já não houve gado
para o consumo em 1793 a 1794 ; e toda a população perecia
de fome, se de Piauhy não viesse gado. A fome durante a secca
foi horrivel !
No Aracaty, onde sempre chegaram por mar soccorros
de Pernambuco e Maranhão , a farinha poz- se a S$000 o alquei-
re (antes o preço era 240 réis. )
66 Os moradores do sertão abandonaram suas moradas e
bens para virem-se refugiar nas praias, e no caminho encon-
traram a morte. Comiam corvos, carcarás, ratos, cobras, couros
de boi, chique- chique, raizes de matto . Não consta porém, que
no Aracaty morresse alguem de fome.
[ No archivo da camara da cidade de Natal (Rio Grande do
Norte) existe o seguinte documento :
No anno de 1723 houve uma tão rigorosa secca que pere-
ceram muitas creaturas humanas á fome e á necessidade ; e ou-
tras escaparam sustentando- se em couros e bichos immundos .
Presenciei igual secca em 1791 , 92 e 93 em que alguns dos ha-
bitantes destes reconcavos e sertões falleceram á fome e a ne .
cessidade e outros dos mesmos sertões regressaram para estes
agrestes, em cujas jornadas tambem falleceram alguns. Fica-
ram desolados os gados de toda a especie e os preços dos
mantimentos cresceram a preços nunca escogitados, especial-
mente do primeiro alimento. Cidade do Natal, 28 de Dezembro
de 1795. Eu Ignacio Nunes Correia Barros, escrivão da camara,
o escrivi. O vereador Domingos José Rodrigo Paulino".
256

[Ha neste teor outras memorias. D. Thomaz José de Mello


escreve a 25 de Maio de 1792 a Martinho de Mello e Castro his-
toriando a epidemia que assolava a Granja e Sobra' , cuja morte
foi de 723 pessoas e as despeza de 3.426 $. ( 1 )
[ 1803. -Em Janeiro deste anno a camara de S. Luiz de Ma-
ranhão pedio ao governador do bispado que mandou fazer
preces afim de evitar - se a fome que estava ameaçando á falta
de chuvas. (2)
[ 1804. - A secca que em todo este anno tem padecido esta
capitania, me tem obrigado a recorrer a Pernambuco para haver
o sustento da tropa assim como da maior parte do povo da capi-
tania e tem sido tão felizes minhas deligencias e tão bem secun-
dadas pela actividade do capitão general Caetano Pinto de Mi-
randa que temos tido abundancia de farinha de mandioca tanto
para o sustento da tropa como para o do povo, que sem estas
necessarias providencias teria certamente perecido de fome, não
tendo produzido esta capitania neste calamitoso tempo com que
se sustentasse a centesima parte de sua população ( Officio do
governador João Carlos d'Oynhausen ] (3 )
1809. - O anno de 1809 é tambem notavel pela secca e
mortandade dos gados no sertão, principalmente ao norte do
Ceará, desde Quixeramobim. Riacho do Sangue, até Cratheús e
Acarahú. A fome foi tambem intensa: mas nem foi tão igual na
provincia, nem consta que morresse alguem de fome.
Um velho respeitavel, creador intelligente do sertão do
Acarahú, contou-me, falando desta secca, bem como de outras—
que durante a estação chuvosa cairam apenas duas chuvas, que
não seguraram as forragens ( pastos dos campos) : mas que du-
rante o anno inteiro o céo conservou- se coberto de um nevoeiro
fino e alto, que amortecia os raios do sol, tornando es dias frios.
Assegurou me que, vespera de S. Luzia [ 12 de Dezembro
de 1808) appareceu o "éo encoberto por este nevoeiro fino, o
que, apezar dos chuveiros pequenos que cairam em Março e
Abril, sempre conservou-se essa especie de serração, e só um
anno depois, em Dezembro de 1809 , reappareceu o sol claro, e o
eco limpo.

[1 ] G. Studart - Datas e Factos -- etc. pag. 402 .


(2 ) Dr. Cezar Marques- Memorias de Maranhão pag. 15.
[3] G. Studart - Notas para historia do Ceará pag. 426, 427 .
257

[ Desde 1808, diz Paulet, que passei à capitania de Pernam-


buco, tem havido nos paizes que demoram entre o rio S. Fran-
cisco e o Parnahyba, sempre mais intensa nesta capitania do Ce-
ará e Parahyba uma secca em 1909 e 1810 , outra em 1814. Muitas
fazendas ficaram inteiramente desertas de gados. principalmente
nas villas de S. João do Principe, Icó e Quixeramobim. Este
anno ( 1816) ha outra mais ou menos rigorosa em uma ou outra
villa.
Em algumas já não existe gado, porque a gente se tem re-
tirado para outros lugares, e o gado para as serras e sitios pa
It dosos. Em tal extremo os habitantes do sertão morrem a min-
gua por falta total de mantimentos e até dos meios de os ir
buscar aos portos do mar, donde sempre os ha. vindos de Per-
nambuco faltam animaes de transporte, e em taes apertos tem
se visto sustentar os povos de carne seccas, que ficavam de on-
tros annos : na falta de farinha ralavam quantas raizes encon-
travam . [ 1 ]
[ 1810 .-" Durante minha estada no Ceará, refere o viajante
H. Kostel (2) a secca havia sido tal que se temia a fome, e teria a
miseria attingido ao cumulo se não houvesse chegado do sul um
navio carregado de farinha de mandioca. O preço ordinario deste
genero era de 640 por alqueire, mas a carga deste navio foi ven-
dida por dez vezes mais.
As chuvas começaram em Janeiro 1811. ]
1816 a 1817-0 anno foi escasso de chuvas, o de 1817 foi
secco até os fins de Março e quasi secco. [3 ] Causou serios re-
ceios a mortandade de gado em muitas ribeiras do sertão .
Segundo um relatorio do governador Sampaio ao ministro,
a secca de 1817 parecia ser forte e ameaçadora de effeitos tão
graves. quanto a de 1792. Houve porém exaggeração na asser-
ção do governador : segundo as tradições de contemporaneos
dessa secca, ella apenas prejudicou parte da criação em varias
ribeiras.

( 1) Paulet - Memoria sobre a cap, do Ceará.


[2 ] H. Koster- Travelers in Brazil— vol. I, cap. 7º
[3 ] A secca deste anro é tão extrema que, a não chuver em
Dezembro acabará a raça do gado, e será preciso conduzil- o de
outra paate para começar a povoar as fazendas. Paulet — ib.
258

1824 a 1825. - A grande secca deste seculo, que deixou tra-


dição mais dolorosa por toda a provincia foi a de 1825,
O anno de 1824 fôra escasso, e o de 1825 secco ; mas não
tanto que não chuvesse em algumas ribeiras, ainda que pouco.
e levantasse algum pasto, insufficiente para manter os gados du-
rante o anno.
O que, porém, aggravou os effeitos da calamidade physica
foi o concurso de causas moraes, e depois a peste.
Desde os annos de 1821 que certa agitação começou a aba-
lar o espirito publico por causa da revolução portugueza, e em
seguida , pela independencia do Brazil, em 1824 pela revolução
republicana, e pela reacção monarchica que se extendeu por
todo o anno de 1825.
O anno de 1824 legara ao seu successor, não só a escassez
de inverno, já a penuria, e a desolação pela guerra civil, e mor-
ticinios.
O- de 1825 , começou, e continuou sobre a influencia da
triplice calamidade, secca e fome, guerra civil e morticinio ; e
mais logo a peste da bexiga. Este cortejo de calamidades foi
ainda aggravado pelo recrutamento extenso e horrivel dos
braços validos restantes da provincia.
As fazendas de gado arrasaram- se, e o que escapou á secca,
não escapou aos ladrões. Muitas fazendas ficaram abandona-
das, immensos tractos do sertão ficaram completamente deser-
tos .
A mortandade do povo no centro e nos povoados, mesmo
na capital, foi horrivel. Todavia nos maiores povoados as
vietimas da fome foram raras, porque a alimentação veio de
fora da provincia ; porém a agglomeração de povo, immigrado
do centro concorria para augmentar a mortalidade. [ 1 ]
Estima-se em um terço da população a que morreu, quer
de guerra, assassinatos, peste, fone, e que emigrou ou foi re-
crutada..
Na secca de 1825 observou -se um phenomeno botanico.

[1 ] Na Camara dos Deputados se disse em 1826 que em


1825 a fome levou alguns infelizes a anthropophagia, que até
mães devoraram filhos.
Não pude verificar, pela tradição na provincia, semelhante
facto.
259

que não me consta se tenha reproduzido, ao menos com tanta


abundancia. O Joazeiro (sysyphus), arvore que reverdece no
rigor da secca, e que abunda nas varzeas e margens dos rios,
e nunca perde a folha, distillava das folhas mel em tal quanti-
dade que a gente pobre colhia-o para alimentar- se e vender.
Não consta que a publica administração tomasse, durante
a calamidade de 1825, o menor interesse em minorar a desgra-
ço do povo.
O centro da provincia ficou quasi deserto de todos os
criadores, ou fazendeiros, que procuraram na capital, Sobral,
e maiores povoados, refugio contra a fome e quadrilheiros ,
que em bandos armados talavam o sertão, e se apoderavam
das propriedades alheias, como em pleno communismo.
Os infelizes, que fugiam aos ladrões e á fome corriam em
bandos aos grandes povoados ; e pelas estradas, campos, praças,
e ruas iam deixando insepultos os cadaveres dos que não po-
diam resistiry
A intervenção official, que em Sobral, capital, e provavel-
mente em outros grandes povoados se exerceu, consistio em
mandarem a municipalidade cercar de estacas um campo para
nelle fazer-se sepultar os cadaveres, que se encontravam nas
ruas e praças .
A peste da variola, que se seguio ou acompanhou a fome
no principio do anno de 1826 , acabou de anniquilar a popula-
ção mendiga que correra a Capital.
A falta de chuvas em 1825 não foi tão absoluta, que em
algumas ribeiras não fisesse pasto , e escapasse pelo meno s
decima parte do gado.
O governo geral só em fins de 1826, ou já em 1827, quan-
do o mal passava, mandou alguma farinha para o Ceará, que
não aproveitou.
O producto de uma avultada subscripção, promovida no
Pará pelo virtuoso D. Raymundo, digno arcebispo da Bahia,
foi entregue na capital a certo negociante, que segundo em
um officio ao ministro do Imperio disse então o presidente Bel-
fort, ficou-se com ella, mandando seus diversos devedores do
interior [ que nada tinham] destribuir com os pobres soccorros
por conta de seus debitos.
1827-0 anno de 1827 foi senão secco , muito escasso : como
porém succedera ao de 1826 , que foi muito chuvoso, e Os ga-
260

dos restantes da grande secca erão poucos, não foi sensivel a


criação. Nas serras, que ainda estavam humedecidas de grande
inverno precedente, não faltou de todo o legume .
1830-0 anno de 1830 , e depois o de 1833, foram escas-
sos, as chuvas tardias. depois de graves prejuizos na criação
dos sertões, porém , não foram propriamente seccos.
(Em virtude da secca que assolava a provincia de Pernam-
buco e as limitrophes, os governadores do bispado, então vago,
dirigem aos diocesanos uma exortação. que foi impressa e pro-
fusamente espalhada. [ ]
(Em 20 de Janeiro de 1833 a camara de Maranhão pedio ao
Rvd. Bispo ( D. Marcos Antonio de Souza ) para mandar fazer
preces por causa da secca que ameaçava os habitantes deste
municipio. (2)
1844-45 - A segunda grande secca deste seculo, experi-
mentada no Ceará, foi a de 1849-1845 . O inverno de 1844 foi
escasso, insufficiente em varias ribeiras para pastos e legumes,
de sorte que no fim desse anno começou a sentir-se geralmente
o effeito da secca, e a morrer o gado, principalmente nas ri-
beiras do Acarahû e Inhamuns.
Nos ultimos dias de Dezembro de 1844 a apparição de um
cometa, semelhante ao que o povo tinha notado em 1825, foi to-
mado por máo agouro. Entrou certo desanimo no espirito do
povo, que contava como certa uma repetição de 1825 .
Em Dezembro de 1844 e Janeiro de 1845 cairam em alguns
dias, por varias partes, ligeiras chuvas, que fizeram apenas
brotar os mattos. Em Fevereiro chaven tambem pouco nos
dias 9 e 14 : e depois de 24 de Março a 7 de Abril, porém chu-
vas finas.
As plantações foram todas á terra, e os pastos nos sertões
não amadureceram .
Os gados, todavia , sustentaram- se até Outubro, quando co-
mecaram a morrer por toda a parte, por falta absoluta de ali-
mentação, até Fevereiro do anno seguinte de 1846, quando
reappareceram as chuvas continuadas.
Algumas chuvas extemporaneas, que cairam no mez de Ju-
nho a Julho, contribuiram para aggravar a calamidade, por

[1 ] Teixeira de Mello - Ephemerides nacionaes.


(2 ) Dr. Cezar Augusto Marques Memoria sobre o Maranhão,
pag . 16.
261

que vieram apodrecer a pouca pastagem, que tinha vin-


gado.
Nesse anno observou-se um phenomeno meteorologico, que
ignoro tivesse precedente.
No principio de Janeiro pela manhã apparecia a atmos-
phera carregada de uma cinzeira esbranquiçada, menos densa
que a cerração dos mares do sul do Brazil, a qual cobria as ar-
vores e edificios, como uma neblina fina.
Os objectos, dia e noite, appareciam revestidos desse im-
menso véo branco.
Esse nevoeiro secco amortecia os raios do sol, e descia até
o solo : durou por todo o mez de Janeiro.
Parece que o phenomeno era mais cosmico do que atmos-
pherico.
Na secca as ribeiras que mais soffreram foram as dos Ce-
ará, Curú, Jaguaribe mirim, Acarahú, Riacho do Sangue, Qui-
xeramobim e Canindé.
Todavia o prejuizo nos gados não foi tanto quanto, ao me-
nos relativamente, nas seccas, de 1792 e 1825 .
Em tempo de penuria o terror influe mais do que a reali-
dade do mal. O povo com as recordações das grandes seccas de
1792 e 1825 desanimou em grande parte, e emigro", affluindo
as praias e ás cidades, principalmente á capital.
Essa agglomeração de população adventicia, que na capi-
tal elevou-se a mais de 30000 pessoas, concorreu para a carestia
dos generos, e logo para certo estado de miseria .
Em geral, não morreu ninguem á fome. A caridade parti-
cular e publica não faltou. De varias provincias chegaram soc-
corros, e o governo foi solicito desta vez. Porem, a má alimen-
tação, agglomeração do povo em habitações insufficientes, fize-
ram logo desenvolver molestias, que causaram muitas vietimas .
A imprudencia do governo foi não aproveitar o serviço :
commetteu o grande erro de preferir dar ao povo a esmola ,
em vez de serviço e salario.
O presidente da provincia, homem muito honesto, porém
de espirito muito acanhado, consentio na agglomeração de de-
senas de immigrantes, que durante muitos mezes viveram da
1
destribuição diaria de farinha, etc.
262

Nisso houve muito abuso e perda de um grande capital,


que podia ser melhor aproveitado em obras publicas. ( 1 )
1877-1879.- 0 anno de 1876 se bem que chuvoso durante
os primeiros mezes, tornou -se secco de Junho em diante. Em
Dezembro não cahiu gotta d'agua : em Janeiro de 1877 apenas
nos ultimos dias algumas neblinas ; em Fevereiro, em 3
dias 16 mill. , em Março 84, em Abril 40. em Maio 101 , em Juuho
84, em Julho 43, em Agosto 46 , em Setembro 20, em Novembro 8,
total 467 millimetros, quando a media annual excede de 1.400 .
Cahiu por conseguinte apenas um terço da chuva ordinaria. Em
Março já o sertão accusava falta de chuvas e em Abril. perdidas
as esperanças de inverno, começou o oxodo dos habitantes do
interior para o litoral. Os gados morriam a falta de aguadas, as
lavouras extinguiram se, e a ligeira provisão de viveres, conser-
vada como reserva por muitos sertanejos, afinal exgotou -se.
De Setembro em diante a fome generalisou - se, os soccorros
publicos, mal administrados, não chegaram regularmente aos
lugares mais affectados : quem possuia algum bem ou valor
desfasia- se delle a troco de farinha ou de outro genero de pri-
meira necessidade. As poucas e afastadas aguadas, como açudes
e poços formados nos leitos dos rios depois das cheias, evapora-
ram-se, raras subsistindo em um outro ponto da provincia. Pes-
soas, reputadas abastadas, receiosas de ficarem bloqueadas, sem

(1 ) Segundo uma nota da thesouraria geral, a despeza que


se fez na provincia com soccorros por conta do Estado, e de
subscripções particulares foi a seguinte :
Do Rio de Janeiro vieram 6 barcas, 7 bergantins, 5 bri-
gues, 1 vapor, 1 transporte e 3 patachos, conduzindo 36:396 sac-
cas de farinha, 500 de arroz , 60 de feijão, 14 de milho, total ...
37.095 saccas . Custo, fretes e despezas na provincia ……….
298: 514$165 .
De S. Catharina vieram 1 brigue e 1 transporte conduzin-
do 1295 saceas de farinha, 274 de arroz, 227 de feijão, total
1.796 saccas. Custo, fretes, etc. 11..70$700
De Pernambuco vieram 1 barca-canhoeira, 1 brigue- esen-
na, e 1 patacho, conduzindo 2.099 saccas de farinha 1 € de ar-
roz, 115 de feijão, 156 de milho, total 2.386 saccas. Custo. fre-
tes, etc. 11.258$964.
T
Do Maranhão vieram 2 brigues, 9 vapores, 3 brigues-es-
cuna, 2 patachos e um hiate, conduzindo 8.712 saceas de fari-
nha, 159 de arroz, 66 de feijão, 272 de milho , total 9209. Custo,
45.213$902.

1
263

communicação com o litoral, longe de qualquer auxilio, fugiram,


desampararam suas casas e fazendas. O sertão tornou - se quasi
deserto.
O governo. mal inspirado. recusou em fins de 1877 en-
viar soccorros para o interior, forçando por esta forma a pro-
curarem o litoral os que até então esperavam o inverno do
anno seguinte.
O exodo generalisou - se . Para a capital, Aracaty, Sobral.
Granja, Camocim e outros povoados do litoral affluiram milha-
res de pessoas.
Em todos elles a população adventicia triplicou. quadru-
plicou, e até decuplicou, a estavel: e como faltassem casas para
accommodal- a, permaneceo ao relento, debaixo das arvores
ou amontada en sitios estreitos . As consequencias deste re-
gimem não tardaram ; febres de máo caracter, variola, prosti-
tuição, vadiagem, com todos os seus consectarios, desenrola-
ram-se triste, dolorosa e funestamente./
O anno de 1878 encontrou a provincia desorganisada, mas
embora de difficil reconstrucção, ella se operaria se as chuvas
viessem cedo. Em Janeiro cairam apenas 39 mill. d'agua, em
Fevereiro 82. em Março 97, em Abril 62, em Maio 191 , em Ju-
nho 27 -total 498 mill.

Compras feitas na provincia - 32.022 saccas de farinha, 82


de arroz, 315 de milho, total 32.419 saccas. Custo 160.811 $852.
Ao todo 45 navios - 80.523 saccas de farinha, 1.031 de ar-
roz, 468 de feijão, 883 de milho ; total 82.905 saccas. Custo fre-
tes, etc., 526:969$593 .
Desses generos foram vendidos : 67.203 saccas, na impor-
tancia de 273:011$937.
Foram distribuidas gratuitamente 15.902 saccas, que impor-
taram em 72:233$066.
Differença entre o valor dos generos e o da sua venda e
distribuição gratuita 180:724 $590 ..
Soccorros enviados de diversas provincias :
Rio de Janeiro. - Subscripção promovida na
Côrte pela commissão da Praça do Commercio .... 1:331$140
Producto de uma loteria na provincia do Rio. 11: 100$000

12:431$040
Bahia. Subscripção promovida pelo Arcebis-
po D. Romualdo, depois Marquez de S. Cruz ... 5:554$160
264

A ultima chuva do anno foi a de 26 Junho. O céo conser-


vou-se sem nuvens, azul, limpido, de uma impassibilidade atroz .
Perdidas as esperanças de inverno, o abandono ou emi-
gração do sertão foi completo ; villas inteiras, d'antes prospe-
ras, ficaram com duas a tres casas sómente habitadas, e estas
mesmas porque o governo, já outro, e mais bem inspirado, en…
vidára todos os esforços para soccorrel -as . Fazendas, ou estancias
de 280 , 300 e 500 rezes reduziram-se a nada. Os fazendeiros
que tentaram as retiradas do gado para o Piauhy ou perderam-
no por molestias on pelo furto e extravio. Pelas estradas mor-
reram de fome, familias inteiras e muitas que conseguiram at-
tingir o litoral, tão escaveiradas e enfraquecidas vinham, que
caiam moribundas pelas calçadas e praças da capital e de ou-
tras cidades maritimas.)
De 25 a 26.000 contos . em quanto era avaliado o valor do
gado vaceum, desceu a menos de 200 contos. }
A emigração para o Amazonas, Espirito Santo, Rio de Ja-
neiro e S. Paulo incrementou-se enormemente. Centenas e mi-
lhares de cearenses foram apinhados no convez dos vapores e
ravios que demandavam aquellas provincias, sem o minimo cui-
dado hygienico, soffrendo muitos delles atrozes privações de
estomago, principalmente por falta d'agua potavel.j
No Rio Grande do Sul. - Subscripção promo-
vida pelas camaras municipaes de S. José do Nor-
te, Piratinim, Jaguarão e Pelotas... 5:424$760
Pará. Subscripções promovidas na capital :
pela camara municipal da Barra do Rio Negro e
Juiz municipal de Vigia, Dr. Pedro Pereira da Sil-
va Guimarães 2:062$826

Total ...... 14:477$666


Esse dinheiro teve o seguinte destino :
Distribuido pelos indigentes das 29 freguezias .
que então existiam na provincia ... 17:968$466
Applicado á construcção do hospital de cari-
dade da capital .... 7:501$320
Conta geral da despeza feita pelo Estado :
Soccorros em dinheiro e generos á população
necessitada . 94:784$395
Vestuario 1:008$490
Construcção de palhoças para abrigo e enfer-
maria 1:450$735
265

Dos fins de 1878 até meado de 1879, especialmente em De-


zembro de 78 e Janeiro de 79, a bexiga attingio a proporções
nunca vistas. Em mais de um dia o nº de victimas excedeu, na
capital, de 1.000 . Os corpos ficavam insepultos, a morte estava
por toda parte, o lucto em todos os lares. Nenhum isolamento ,
medida alguma para preservar a multidão acantonada fôra to-
mada, a tempo, talvez pela marcha inopinada e intensa da
peste.
Havia, então, na capital cerca de 180.000 pessoas, 100.000
no Aracaty e nesta proporção em Pacatuba, Arronches, Granja,
Camocim, etc.1
A todos se afigurava que o anno de 1879 viria pôr termo a
tanto soffrimento, e foi com verdadeiro jubilo que saudaram os
primeiros dias do anno. Em Janeiro cairam 65 mill. de chuva.
em Fevereiro 48, em Março 171 , em Abril 87, em Maio 116, em
Junho 26, em Agosto 15, em Setembro 10 , em Outubro 28, em
Novembro 15, em Dezembro 11 , total 592 mill,
Mais um anno cruel, de terriveis provações.
Como quasi nada havia que perder no interior , a secca
nenhuma repercussão teve. No litoral, os auxilios do governo, a
melhor accommodação dos emigrantes, já então aclimades,

Curativos, medicamentos, dietas, etc.. 7:668$990


Transporte e alimentação de emigrados para
outras provincias .. 2:358$500
107:211$110
Differença entre o valor dos generos remetti-
dos e comprados na provincia e o da venda e dis-
tribuição gratuita dos mesmos . 180:724$590

Total....... 287:935$ 700


Pels soccorros particulares enviados de di-
versas provincias :
Distribuição em dinheiro aos necessitados das
freguezias da provincia .... 17:968$446
Total....... 305 :904$ 146
E' preciso attender- se que nesse tempo a população da pro-
vincia era computada em 310.000 habitantes, e hoje ( 1877 ) ele-
va-se a 800.000 ; e os generos então vendiam-se pela terça parte
dos preços de hoje.
266

tendo atravessado a quadra epidemica, produsiram resultados


beneficos.
A população ficara reduzida, talvez, de um terço : cerca de
200.000 pessoas haviam fallecido ou emigrado.
O governo geral despendera 72 mil contos, dos quaes cerca
de 30 mil com a provincia do Ceará, afóra os subsidios da cari-
dade particular. [ 1 ]
( A provincia ficou arruinada : sua principal industria — a eri-
ação do gado - quasi extincta, a população dispersa e reduzida;
a flóra em parte morta : só a Capital augmentara, devido em
grande parte a affluxo de emigrantes e ao desenvolvimento do
commercio de generos alimenticios.
Os dous primeiros mezes de 1880 foram desanimadores, o
de Março pouco chuvoso, o de Abril bastante. Terminara a
grande secca para recommeçar ...
[ Em 1888. - Os annos anteriores foram de invernos escas-
sos ; por toda a parte as aguadas estavam fundas, difficeis, o
solo resequido. Em Janeiro d'este anno cairam, em 4 dias, 57
mill. d'agua ; em Fevereiro 102, em Março 112, em Abril 196,
em Maio 72 , em Junho 111 , em Julho 54 , em Agosto 17, em

[ 1 ] O Sr. Rodolpho Theophilo calcula em mais de 1.000.000


de saccas a farinha de mandioca importada no Ceará nos 3
annos de secca.
Se o governo, diz elle, comprou na Fortaleza e no sul
818.718 saccas, os particulares deviam ter inportado mais de
200.000, afim de retalharem na capital e vendel-as para o in-
terior.
A principal fonte de desproporção entre a farinha impor-
tada e a comprada pelo governo, foram os "arregamentos com-
prados sobre mar e feitos seguir para o norte e sul da provin-
cia, e das quaes a Alfandega não podia tomar conhecimento.
As despezas effectuadas com a secca no Ceará, de Abril de
1877 a 30 de Novembro de 1879 foram :
Dinheiro entregue a diversas commissões
de soccorros publicos de Abril 77 a 30 de No-
vembro 79 3.085.261 073
Obras geraes, provinciaes e municipaes 413.380$280
Generos alimenticios e outras despezas 23.198.797$893
Despezas por pagar em 30 Novembro 79 924.718$164
Total.... 27.622.157 $410
R. Theophilo - Hist. ibid. - pag. 473.
7
a
de
s
a 9
1877
ecca
durante
Ceará
no
importados
generos
dos
demonstrativ
TABELLAS as
:anterior
n
a
refere
se
q ue
aota

1877-78 1878-79 1879-80

GENEROS
Kilos
official
Valor official
Valor
Kilos
official
Kilos

530.072 150
||$
53.065 303.488 30.490
8
$ 00 562.465 89.955
300
$
eBacalhão
, tc.
3.360 511.150 000
$
98.230 10.380 200
$
2.076
Xarque
12.905 672$000
$
5.162
000 47.966
) 8
$00
27.140 59.242 6
$00
32.957
Toucinho
..e. tc
c
eereaeses 4.196.389 3.277.635
1
|11.518.341
2$00
421.038 $00
368.115
.152.1278000 7
Legum
Farinh
de
trigo
.. a 1.468.362 2.146.
9171.81
60
$1.431.
117.46 8031
48030 125.200.100
397
52.829 1 $00
21.918 $49.675
00
99.646
5193.837 400
$
23.569
f
., umos a
Farinh

410
$
]619.324 130
$
1.579.449 661.874
300
$
267
,
cabotagem
por
Importação
268

1877-78 1878-79 1879-80


GENEROS

Kilos Kilos
official
Valor official
Valor Kilos official
Valor

Arroz
. 202.528 38.8848046
273.583 33.855
$
555 30.619 4.425
460
$
Assuca
. r i.376.990 329.870
892
$
1.435,476 272.322
7
$ 52 754.170 140.119
4$72
.
Café 159.098 10
281.830
5
$
70.618 134.759
$
980 20.762 800
$
10.140
Xarque 2.345.339 970
$
699.617
3.541.185 550
$
964.838 971.944 257,2644342
Milho 2.116.494 $235.847
251.552
2.460.594
76
62
71.758.033
105.076
840
428
1.978.821
16.897.237
mandioca
de
Fariuha
7
$
1.342.495
19.634.611
85
8421.502.8623,046,931
Feculos 9.590 1.281
9
$ 80
34.012 500
$
19.734 300 53
$
500
,etc.
Feijão 478.743 2.618.392
84.6634026 $
538.835
2.169.822
1349.346
460
90
Rapadura 300 30.000
Toucinho 15.252 530
$
8.090
Gado
rvacum
)( ezes 100 7.000
0
$00 2.300 1.07
0
:$00

3.454.726,114 2.201,922
$
589
5,284,152 026
Ceará
.no
1871-74
sde
aecca
durante
alimenticios
generos
Importação

1877--78 1878-79 1879-80


GENEROS
EX
JA
DES-
TRANGEIROS
PACHADOS Kilos Valor
'
officia official
Valor
Kilos official
Valor
Kilos

Bacalháo 1.235.584 $
53.640
00
0141.279 217.003 000
$
47.321
Xarque 282.778$100
2.669.657 3.089
|.830
903.029
900
$ 587.450
1.043.2684070 129.483
$
000
Toucinho
.,banha 75.840 4 60
$39.229
55.347 600
$
26.390 65.708 38.888
600
$
,cereaes
Legumes
.. 3.714.910 6$40
777.155 937.208 0$00
121.673
Farinh
de
trigo
.. a 539.934 $260 4.456.648
896.131 1.343.248
600
$
220.474 4
|$40
265.149 535.990 $000
83.747
Feculos
e, tc. 27.222 000
$
15.405 45.213 5128.129
$
10.020
50 000
$
8.775
300
$
|2.175.624 429.8874000
2.016.969$320
directa
Importação 410
$
619.324 130
$
1.579.449 641.874
3
$00
cabo
por tagem 3.454.725
114
$ 2.201.922
$
589
Generos
extrangeiro
do 320
$
12.016.969 5.284.152 $026|
2.175.624
320
|$ 000
$
429.887
16.091.019
8
$44 19.039.225
456
|$ $889
3.273.683

1877-78 6.091.019
$844
1
.RESUM O9
: 878-7 9.039.2250456
1879-80 3.273.683
889
$
Total 189
18.403.929
$
269

Dags
p
-
Theophilo
R.
por
secca
da
Historia
.()4 69–71
a
270

Outubro 3, em Dezembro 14 ; total 738 millimetros, metade da


quéda ordinaria.
De Agosto em diante começou a morrer gado, e a popula-
ção sobresaltada e soffredora a pedir soccorros ou a emigrar
para o litoral. Exiguas, como forão as chuvas, não deixaram de
beneficiar alguns tratos de terreno, produzindo pastos, razão
pela qual os fazendeiros fizeram transportar seus gados para
taes sitios, aliás nem sempre bem inspirados, porque do accum-
mulo de rezes resultou o rapido consumo da pastagem e a sub-
sequente penuria. A mortandade do gado foi , comtudo. pequena .
O governo geral, solicito em accudir aos clamores da popu-
lação faminta, soffredora, veio em auxilio da provincia, orde-
nando intelligentemente alguns serviços mais urgentes de utili-
dade publica , como a abertura de poços, a construcção de açu-
des, de estradas, empedramento de ruas na capital, abrigos ou
pousadas nas estradas, etc. 03 quaes ministraram, desde logo ,
meios de subsistencia a população indigente.
A emigração para as provincias do norte e sul não se fez
em larga escala. ]
[ 1889. Só a 14 de Janeiro, depois de 6 mezes de verão
secco, durante o qual houve apenas 9 dias pluviosos com 85 mill .
d'agua, cahiu a primeira chuva de 14 mill. , e no decurso do mez
39 mill., distribuidos por 6 dias pluviosos. O mez de Fevereiro
annunciou-se promettedor. fazendo crer que o inverno iria co-
meçar. A uma batega d'agua, pesada, no dia 1º, que attingio a
50 mill. , succederam descargas electricas pela madrugada. No
dia 2 cairam 2 mill., no dia 30. 6 mill. Rigoroso verão seguio-
se até o dia 11 , quando recomeçaram as chuvas, fracas até o
fim do mez, cujo total foi de 10 dias pluviosos com 106 mill.
Em Março cahin chuva fina no dia primeiro, reinando durante o
mez calor canicular, apenas interrompido pelas chuvas copiosas
de 24 (54 mill. ) 26 [ 53 mill.. ] e outras até 31 .
Dos 7 dias 24 a 31 -- houve 6 chuvosos com 212 mill . d'agua.
Em Abril, que é por excellencia o mez de chuvas abundantes,
representando ordinariamente um terço do total annuo, apenas
registou o pluviometro 62 mill. em 12 dias. O longo verão de
Março e a escassez de Abril occasionaram a perda dos cereaes
plantados em Fevereiro, de modo que mais um anno climatico
veio juntar-se a serie fatal do ultimo quartel do seculo .
A criação pouco soffreu, não só por não ter faltado pasto
271

ou rama, como por estarem os campos mal povoados do gado,


em consequencia das ultimas seccas, e offerecerem elles bas-
to sustento ao que se salvára.
A pobreza era geral : augmentara. porém, já por se não ter
refeito a provincia dos estragos causados pela secca de 1877 a 79,
já por não dispor dos recursos que n'aquella epocha existiam ,
entre os quaes avultava a propriedade escrava.
O governo geral, com louvavel solicitude, continuou a dis-
pensar soccorros a população indigente. proporcionando- lhe,
quanto possivel, trabalho a troco de modico salario.__}
A emigração, estimulada pela imprensa e favores do go-
verno, tomou grande incremento, sobretudo a partir de Setem-
bro do anno anterior.
O desfalque na população, occasionada por aquella, levado`
em conta somente o registo imperfeito das sahidas por via ma-
ritima , excedeo de 30000 pessoas. A morte e a emigração ter-
restre deverão ter subtrahido outras 30000, resultando o pre-
juizo de 50 a 60.000 habitantes no povoamento da provincia.
O governo geral dispendeo mais de 15000 contos com soc-
corros as victimas da secca. )
[ 1891. -Durante sete mezes, a contar de Junho de 1890, a
quantidade de chuvas caídas attingio a 171 mill , distribuidas
por 26 dias. Depois de um verão tão secco, só a 17 e 18 de Janei
ro, pela lua cheia, voltaram as chuvas em quedas de alguma
importancia ( 16 e 23 mill. ) tendo sido as posteriores, até 28 de
Fevereiro, finas, insignificantes, sem resultados para lavoura .
Neste ultimo dia o pluviometro marcou 26, 6 mill. e no dia se-
guinte. 1 de Março, 38 mill. Na primeira decada deste mez
houve 5 dias pluviosos com 123 mill. e nos ultimos 21 dias mais
precipitações com 27 mill . Em Abril chuveu escassamente,
mas com alguma regularidade, em Maio continuaram as chuvas
até o dia 15 com relativa abundancia.
Em Junho , Julho e Agosto cairam chuvas finas . O 1891
foi de inverno escasso, representando quasi metade da quanti-
dade ordinaria, media, dos annos regulares . )
[ 1898. Se bem que o inverno de 1897 tivesse sido copioso,
comtudo, em Agosto apenas houve 2 dias chuvosos, em Setem-
bro 3 dias, Outubro 1 , Novembro 4 e Dezembro 1 , ao todo - 11
dias em 133 dos 5 mezes do verão deste anno.
Só a 14 de Janeiro cahiu a primeira chuva com 6 mill., vol-
272

tando a 29 e 30 para dar o total do mez 3 dias com 17 millime-


tros. Exceptuando o dia 3 de Fevereiro com 22 mill. , foi ainda
este mez de chuvas finas, verdadeiras neblinas. Março teve dous
dias chuvosos ( 23 e 24 ) com 38 mill.. dous ( 27 e 28 ) com 20, e o
restante de neblinas ou chuviscos. Abril teve 19 dias chuvosos
com 229 mill., Maio 7 dias com 25, Junho 4 dias com 37. A
quantidade total do 1º semestre foi de 58 dias chuvosos com
471 mil.. a do segundo 22 dias com 48 mill. , e a do anno 80 dias
com 519 mill.
O governo estadoal na mensagem com que abrio o con-
gresso, depois de externar conceitos geraes acerca dos flagellos
climaticos, refere -se nesses termos ao do anno de 1898 : "A falta
de chuvas regulares nos mezes de inverno, a suspensão brusca
das agoas meteoricas desde fins de Abril, reduzindo a estação
invernosa a pouco mais de dous mezes, quando nos annos ordi-
narios ella se dilata por cinco e seis, occasionou a perda de
quasi todo plantio de cereaes, escapando somente o de algumas
serras frescas ou o de terrenos humedecidos por filtrações de
açudes. E tão minguada foi esta producção que, apenas appa-
recida nas feiras em Maio, já em Junho desapparecera para dar
logar a importação de cereaes de outros estados.
" Quando se cogita no longo espaço de tempo que medeia
entre o dia de hoje e aquelle em que o proximo inverno trará as
premicias de sua fertilisação, dando as classes indigentes meios
de subsistencia, fica-se pesaroso e perplexo sobre a sorte que as
aguarda, se por uma fatalidade inexplicavel falharem os soccor-
ros garantidos pelo pacto fundamental.
" Interpretes das necessidades da população cearense, mui-
tos de vós acabais de percorrer o Ceará em direcções diversas
e visto com os proprios olhos a misera condição a que se acham
reduzidos os seus habitantes : podeis attestar perante o paiz as
pungentes scenas da desolação, de miseria das localidades attin-
gidas de mais perto pela escassez das chuvas e predizer o que
acontecerá as demais, durante a estiagem dos proximos 8 me-
zes . . . Os dados que pude colligir, attinentes ao assumpto,
demonstram de modo irrefutavel que a escassez das chuvas em
1898 foi apenas excedida pelas do anno de 1877, primeiro da
grande secca que roubou ao Ceará mais de um terço da sua po-
pulação. "
Depois de dar o quadro das medias quinquenes dos dias e
273

quantidade das chuvas em millimetros nos cinco primeiros me-


zes dos annos de 1849 a 1893, tira o autor da Mensagem as se-
guintes conclusões ;
" Foi, portanto, a media dos dias de chuvas nos 50 annos
ultimos, inclusive os cinco primeiros mezes do corrente anno,
de 68,1 e a da quantidade d'agua caída de 1137,4 millimetros ou
de 15,6 mill. por chuva.
" Comparando - se a media geral dos 50 annos com a quan-
tidade total do corrente, vê- se que no mez de Janeiro o numero
dos dias de chuva foi de menos da metade e sua quantidade
millimetrica quasi cinco vezes menor : em Fevereiro o numero
dos dias foi apenas maior em fracção, mas a quantidade tres
vezes inferior ; em Março os dias de chuvas ficaram abaixo da
media geral e a quantidade d'agua inferior de metade en
Abril, os dias de chuvas foram tambem inferiores em fracção a
media geral, mas a quantidade 37 % menor : em Maio o nume-
ro de dias chuvosos foi de menos da metade e a quantidade 9
mezes menor ; no total 54 dias de chuva para 68 da media ge
ral, 434 millimetros para 1.137,4 desta media, como dos alga-
rismos que se seguem .

1849 a 1898

DIAS MILL. DIAS MILL.

Janeiro 6.9 76.4 3 17


Fevereiro 11.6 160.7 11 56.5
Março 15.7 285.1 14 102
Abril 19.4 263.4 19 229
Maio 14.5 271.5 4 29.5

Total : 68.1 1.137.4 54 434


Quantidade por chuva 16.6 8

Para se encontrar medias tão baixas no meio seculo ultimo,


é mistér approximar do anno actual os excepcionaes de 1877,
1878, 1879, 1888, 1889 e ainda mais, só o primeiro da serie apre-
274

senta quantidades inferiores ac de 1898, como se verifica com a


simples inspecção occular dos dados abaixo :

ANNOS
Janeiro Fevereiro Março Abril Maio
166464185

3108577
PEERSTE
dias mill. dias mill. dias mill. dias mill. dias mill.

270824
1877 4 21 i6 16 84 10 40 12 101
1898 3 17 11 265 14 102 19 229 29.5
1878 39 82 97 8 62 6 191
1888 57 102 112 9 196 72
1889 39 106 212 12 62 12 166
1867 10 62 251 24 172 167
1891 12 71 42 151 19 298 9 151

Sendo de 1.137 millimetros a media da quantidade de


chuvas caidas nos cinco primeiros mezes do anno e de 68,1 ö
n de dias de chuvas, ficaram muito aquem destes algarismos
os annos da serie enumerada , como melhor se apreciara do se-
guinte resumo :
Quantidade total nos mezes de Janeiro a Maio

ANNOS DIAS MILLIMETROS


325

1877 45 265
1898 54 434
1978 33 471
1879 47 487
1888 38 539
1889 48 585
1867 60 652
1891 56 713
1861 61 743

"Se entrarmos mais intimamente na historia meteorologi-


ca dos annos acima , chegaremos a conclusão de que, se em
1877 as chuvas foram mais espaçadas, algumas cairam mais co-
275

piosas do que no corrente anno. Em 1877 houve 3" dias de


chuvas superiores a 27 millimetros (de 5 a 6 de Maio 46, 21 de
Junho 34, a 1 de Agosto 27) , em 1898 apenas 1 a 7 de Abril
[32 mill. ]: em 1878-4 dias [ 22 de Fevereiro 48 mill.. 5 de Março
60, 1 de Maio 101 e 3 de Maio 42 ) ; em 1879 seis, (a 23 de Fe-
vereiro 28, a 17 de Março 19, a 23 de Março 31 , a 20 de Abril
74 inill.”
42. a 2 de Maio . ‫ י‬57, a 11 e 12 de Maio
་་
Desde Abril começou a affluir indigentes a capital [ Forta-
leza], sendo em Agosto muito crescido 4 o seu numero. Nos su-
burbios e até nas praças da cidade, onde quer que houvesse ་་་
abrigo ou sombra de uma arvore, existia asilada uma ou mais
familia de emigrante .
A emigração para e Norte e Sul, solicitada pelas promes-
sas de agentes estadoaes do Pará e Matto Grosso, e por tran-
sporte gratuito, tomou grande incremento. Em 1897 sairam
7.312 pessoas para o norte e 1787 para o sul : em 1898 attingio
a 25872 pessoas para o norte, e 3043 para o sul.
A corrente, uma vez estabelecida, não se pôde estancar,
continuando o Ceará a perder numerosos braços nos annos se-
guintes. No primeiro semestre de 1899 emigraram 17045 pes-
soas, só para o norte.
A caridade particular foi aburdante e como nos annos an-
teriores o commercio e as industrias cearense, tinham logrado
proveitos importantes, mais de 20 mil contos sairão do Ceará
para pagar a importação de cereaes ou generos de primeira
necessidade. O empobrecimento do Estado tornou-se mais vei-
xatorio, se bem que o prejuizo em gado fosse quasi nullo.
O inverno, abundantissimo de 1899, poz fim a esse marty-
aiologio para recomeçar no anno seguinte . ]
[ 1900 -Se bem que naturalmente desassocegada, como soe
acontecer a população loboriosa do Ceará quando termina o
verão e deve começar a estação pluviosa, estava ella longe de
esperar mais um anno escasso , senão secco, em 1900.
A um to inverno copioso succede ordinariamente inverno fra-
co, mas nunca penuria quasi total de aguas meteorologicas.
O Estado, já empobrecido com a drenagem das suas econo-
mias para compra de generos de primeira necessidade, ficou
reduzido a serias veixações. A abastança desapparecen, o com-
mercio, apertado pela carencia de capitaes e pela repercussão
da crise economica monetaria em todo o paiz, restrigio-se as
276

permutas indispensaveis, fazendo ponto cerca de 50 estabeleci-


mentos na Fortaleza e muitos outros em Sobral, Baturité, Ara-
caty e Crato.
O mez de Janeiro teve um dia de chuva com 43 mill. [a 61
e 6 com neblinas : Fevereiro dous [ 4ə 5] com 35 mill. 1 ( 19 )
com 12 mill., e 4 com chuvas finas ; Março 2 (26 e 27) com
com 21 , e 6 com o total de 21 mill.; Abril só 1 18 ) com 11
mill. Maio 1 (2) com 8 mill. e 5 com o total de 11.
Comparando-se 1900 com os dous mais seccos registados ,
1877 e 1898 vê-se que estes o forão menos :

1900 4877 1898


77866

dias mill. dias


+399219 mill. dias mill.

Janeiro 58,5 4 24, 3 17.


Fevereiro 61 , 16, 11 56,5 ་
Março 42.5 16 84. 14 102,
Abril 14.5 10 40, 10 221 ,
Maio 19. 101 , 29,5

Total 195,5 45 265, 54 426,

Accresce que os dous mezes, em 1900, mais chuvosos -Ja-


neiro e Fevereiro -são os mais fracos nos invernos regulares.
A differença contra 900 é ainda maior se o paralello fôr
feito com os mezes que caracterisam a estação pluviosa - Mar-
ço a Maio - como se segue :
Dias mill.
1900 20 76
1877 38 225
1898 40 351,5

Em 1900 chuveo em quantidade d'agua cerca de 5 vezes


menos do que 1898 e 3 vezes menos do que 1877 ; em dias de
chuvas, 50 % menos que em 1898 , e 48 % menos que em 1877.
Vê-se por esses dados que o seculo XIX fechou o cyclo
das seccas com o anno mais escasso de chuvas, verificado no
277

registo pluviometrico. Suas consequencias não foram tão desas-


trosos quanto as de 1877 : não só porque o anno anterior
havia sido excepcionalmente invernoso, tendo produzido abun-
dantissimas pastagens e cereaes, como por se não ter prolon-
gado o verão annuo alem de Dezembro, seguindo - se-lhe imme-
diatamente inverno mais que regular.
O governo estadoal manifeston bõas intenções de soccorrer
a população indigente, e de balde esforçou- se perante o fede-
ral por angariar meios com que minorar os desastres da inex-
perada calamidade.
O governo geral, obedecendo a preoccupação de economia,
limitou-se a facilitar o despovoamento do Ceará, pondo a dis-
posição dos retirantes 300 passagens por cada vapor do Lloyd
que zarpasse da Fortaleza para os portos do norte ou sul do
Brazil .
Ameaçadores , como se affiguraram os males da secca,
desamparado o governo do Estado, sen meios de acudir a mi-
seria publica, foi com mostras de agradecimento que a popu
lação soffredora recebeu este presente de gregos, e as offertas
no mesmo sentido dos governadores do Pará e Amazonas.
Os soccorros particulares, promovidos pelo Centro Cearense,
no Rio, pela Associação Commercial da Fortaleza, no Recife,
Bahia, etc. concorreram, embora em pequena escala, para mi-
norar tanta penuria .
/ A mensagem do governador Dr. Pedro Borges ao abrir a
Assembléa legislativa, em 1º de Julho de 1901. pinta com
côres vivas o painel dos infortunios cearenses nessa quadra de
geral penuria.
"Ao desembarque, diz o Dr. P. Borges, se me deparou logo
o mais tocante e vivo testemunho da infeliz situação dos reti-
rantes de varios pontos do interior do Estado, agglomerados
na praia, nas praças, sob as arvores, em completo desabrigo ,
expostos aos raios de um sol abrasador, a compungir, na
crueza do quadro que se offerecia, o aspecto da nudez, da fome ,
da miseria que a todos attribulava.j
Não tendo havido absolutamente inverno apenas ligeiros
agaaceiros ) na estação de Janeiro a Junho, perdida toda a es-
perança de colheita de cereaes e legumes , não havendo deposi-
tos d'agua no leito dos rios, seccos os pequenos açudes cujo vo-
278

lume das aguas desappareceu com a evaporação, despidos os


campos das pastagens para sustento da criação de gado, que
definha e morre, anniquilando a principal industria do Estado,
esgotados os recursos da provisão destinada a alimentação hu-
mana, mormente das classes que vivem da pequena cultura,
destruidos os recursos naturaes e fructas silvestres que na re-
gião sertaneja brotam do solo e servem como soccorro de oc-
casião aos desvalidos, faltando em summa tudo isto, o flagello
da secca não póde achar-se mais caracterisado, ameaçando o
Estado com perdas irreparaveis.
[" A prova mais cabal da phase aguda, que a calamidade vai
tocando, está na emigração sempre crescente e ruinosa, que se
tem produzido, porque ninguem abandona o seu lar e expõe
sua familia a longas e penosas jornadas, em busca de um refu-
gio desconhecido, senão na ultima extremidade.
" Já tem seguido para a região Amazonas avultadissimo
numero de cearenses, e já se accumula nesta Capital uma popu-
lação adventicia calculada em 12000 pessoas, todas, pela sua in-
digencia, implorando a earidade publica, sem alojamento, abri-
gadas sob as arvores, dentro e nos arredores da cidade, aban-
donadas de todo o cuidado hygienico. com grave perigo para
1 saúde publica.

" Dia a dia entran caravanas de retirantes, em busca de


soccorros junto ao governo ou de passagem para fóra do Es-
tado. "
Dirigindo- se aos presidentes do Senado e da Camara, tele-
graphava, o presidente do Estado nos seguintes termos :
" A secca que assola este Estado desde Março deste anno,
quando se dissiparam todas as esperanças de inverno, tem at-
tingido tal grao de intensidade que reclama a maxima atten-
ção e patriotica solicitude dos poderes publicos da União .
· Desde então, e continuadamente. tem chegado de todos
os municipios do Estado communicações officiaes das Camaras
e autoridades locaes em que, descrevendo as condições lastima-
veis dos seus habitantes, pedem providencias em favor de sua
numerosa população , reduzida á mais extrema situação, sem
trabalho, desprovida inteiramente de meios de subsistencia,
consternada, tocando ao desespero, abandonado o lar e o domi-
cilio, em lucta contra o mais inclemente dos flagellos .
279

Nesta capital existe já grande agglomeração de retiran-


tes, que tem occasionado prafunda alteração na salubridade pa-
blica
..
Para outros pontos do litoral convergem caravanas do
interior que ali e aqui, offerecem o aspecto mais desolador . Mo-
lestias reinantes, proprias da quadra calamitosa que o Estado
atravessa, reclamam providencias inadiaveis. Do sul ao norte }
do Estado são incessautes as reclamações de soccorros publicos,
mediante prestação de serviços em obras de utilidade geral,
que, occupando milhares de braços inactivos, conjure o perigo
imminente que ameaça o Estado, e, de perdas irreparaveis, a
sua população. "
Já no fim do anno, a 20 de Novembro, autorisou o governo
da União ao Dr. Piquet a encetar os serviços de açudagem em
Baturité e Maranguape, e ao Dr. João Thomé em S. Anna, e
Sobral.
Para as obras de açudagem em Baturité e Maranguape foi
aberto o credito de 500 contos, para as de Acarahú- mirim 180
contos. Forão effectivamente iniciadas as obras dos açudes
Papára, em Maranguape : Acarahú- mirim em S. Anna, a con-
clusão do Jordão, na serra do Rosario, no municipio de Sobral :
as do açude do Riachão do Panta, em Baturité.
Na opinião do governo estadoal estiveram empregados nes-
ses serviços 23.052 individuos, sobre a população reunida dos
tres municipios, na totalidade de 53.508
Limitado a 5 municipios a execução de serviços de utili-
dade geral, como meio indirecto de assistencia publica , e exis-
tindo no Estado 79 municipios, ficaram 74 municipios privados
dos beneficios dos soccorros prestados pela União.
“ O resenceamento do Estado em 1890 produzio 805.089
habitantes : tomando por base este numero, com o incremento
de 1 1/2 % ao anno, segue-se que a população nos 10 annos de-
via ter augmentado de 129.836 habitantes, perfazendo o tota.
de 935.022 habitantes. Admittindo-se, na melhor hypothese!
um terço d'esta população, isto é, 311.674 pessoas reduzidas a
penuria e nas condições de ser soccorridas, temos ainda que so-
mente 24.112 habitantes forão amparados pelos soccorros a
cargo do governo federal, contra 289.498 habitantes. que não
poderam ser contemplados nos auxilios da assistencia publica,
por parte da União ."
280

O Ceará, já empobrecido pelas seccas anteriores e particu-


larmente pela ultima, de 1898, perdeo grande uº de braços vali-
dos, muitos capitaes, esgotando as economias accumuladas para
haver os generos alimenticios de que carecia afim de supprir a
defficiencia da producção indigena . Cerca de 30 mil contos emi-
graram para o estrangeiro e para outros estados.
As epidemias, que em taes crises costumam dar a nota tra-
gica, não se alastraram, salvo a da variola, que generalisando - se .
não produzio, comtudo, os effeitos desastrosos de outras epochas.
O desfalque na população pode- se computar em 40.000 pessoas.
Como em phases analogas, passada a acuidade da crise .
forão descurados os trabalhos iniciados. ficando a mór parte in-
conclusos. ] (1)

(1 ) Os generos importados pelo porto da Fortaleza em


1900, segundo os dados fornecidos pela alfandega foram :

Por cabotagem Directamente

GENEROS
Valor offi- Valor offi-
Kilos Kilos
cial cial

Farinha mandioca 13.640.280 4.092 .084$


Arroz. 3.754.880 1.501.952 $ 3.786.8383.114.735$
Feijão 3.077.400 1.538.700$ 769.910 384.955$
Milho 4.120.860 1.236.258$ 782.307 234.692$
Total ... 24.593.420
26 88.368$
. 994$ 5.339.05513.734.882 $

Pelo porto de Camocim Aracaty


GENEROS
Valor offi- Valor offi-
Kilos Kilos
cial cial

Farinha 3.031.442 909.432$ 2.931.300 879.390$


Arroz 1.666.414 666.565$ 129.552 51.820$
Milho . 1.590.670 477.201$ 694.260 208.278$
Feiiño 1.090.240 545.120$ 64.400 30.200$
Total .... 7.378.766 2.598.318$ 3.819.5121.169.688$
281

[1902. O verão de 1901 foi escasso.


De 15 de Julho a 2 de Setembro , em 49 dias, caíram apenas
14 mill. dagua : nesta data e no dia seguinte 22 mill., dos 43
mill., de todo o mez. Em Outubro houve uma chuva no dia 4 a 5.
que produzio 59 mill.. em Novembro e Dezembro apenas nebli-
nas. Em Janeiro de 1902 o pluviometro recolheu 15 1-2 mill. no
dia 4, --5 no dia 11, -11 no dia 25 e 71 no ultimo dia. Em Feve-
reiro só a 28 cahio bôa chuva de 34 mill. Em Março, salvo uma
chuva de 34 mill. no dia 8, outra de 22 no dia 23 e a ultima de
46 a 26 as demais foram insignificantes. No 1º semestre apenas
690 mill.. no 2º - 161 -todo o anno - 96 dias chuvosos com 851
mill., representando a media de Sm , 8 por chuva. Foi um anno
escasso, no qual entretanto não houve prejuizos de gado pela
distribuição mais regular das chuvas. ]
[ 1903. Anno ainda mais escasso. Alem do inverno do
anno anterior ter sido insufficiente para fazer aguadas, isto é –
encher os agudes, produzir enchentes nos rios e lagoas, accresce
que o verão de 1902 foi excessivamente secco. O solo estava re-
sequido, os campos nus de vegetação, o gado enfraquecido. a
producção agricola minguada, e por cumulo a população activa
apprehensiva, senão na espectativa de mais uma calamidade
climaterica . Em 21 , 22 e 23 de Janeiro cahiram chuvas copi-
osissimas ( 191 mill. ) que vieram alentar o espirito cearense .
Infelizmente as sementes plantadas não puderam resistir a
longa estiagem de quasi 26 dias. quando novas quedas dagua
( 84 mill. ) a 26 , 27 e 28 de Fevereiro tornaram a dar boas espe-

Total dos generos importados em 1900 :

GENEROS Kilos Valor official

Farinha de mandioca . 19.603.022 5.870.916$000


Arroz 9.337.684 5.335.072$000
Feijão 5.001.950 2.498.975$000
Milho. 7.188.097 2.156.429.000

Total 41.130.753 15.861.392$000

R. Theophilo - Seccas do Ceará - Ceará 1901 , pags. 236 a 238 .


282

ranças. Março, bem que parco em chuvas, não soffreu longas


estiagens. Em Maio terminava o inverno, produzindo no 1º se-
mestre 768 mill . , no 2º 22 , ao todo 71 de chuvas e 790m/m.
[Os annos de 1904 e 1905 ficaram abaixo da media normal.
Foram escassos.
[ O de 1907 foi regional ; na região norte do Estado as chu-
vas deram para sustentar o gado e a producção agricola : no
valle de Jaguaribe e no litoral até Mundahú, foram fracas, e a
lavoura apenas deo minguada messe. Em Novembro e Dezem
bro o sertão estava secco, as retiradas de gados se faziam para
sitios mais frescos ; começando a despeito disto, a mortandade
do mesmo.
Na Fortaleza os poços, que haviam resistido as maiores
seccas desde 1877. ficaram seccos , as cacimbas attingiram a
profundidades até então desconhecidas. ]
No decurso de 216 annos soffreu o Ceará 5 grandes seccas:
em 1723 a 24, 1777-76. 1790-94, 1824-25, 1877-79 ;
8 intensas, de effeitos desastrosos para os habitantes, cre-
ação e lavoura, as de 1692, 1711 , 1810, 1845, 1888-89 . 1891 .
1898 e 1900 ; e *།
7 parciaes, cuja intensidade não é conhecida, mas que pa-
rece ter sido fatal a lavoura e a creação, as de 1736-37, 1744-46.
1772, 1784, 1816-17 , 1827 , 1830-33, alem de alguns annos de
invernos escassos ou topographicos ou de chuvas tardias.
Eis chronologicamente as datas desses annos climatericos.
euja memoria perpetuou-se na população cearense :
1614 -secca [1 ]
1692 intensa [2]
1710-11 [3]
1721 que assolou até a Bahia [ 4]
1723-27 --grande secca [5 ]

[1 ] Guilherme Studart- Datas e factos para a hist. do Ceará .


[2] Gama- Memorias historicas de Pernambuco, vol. 4º pag .
27.
[ 3 ] Dr. Cezar Marques - Memorias do Maranhão, pag. 15 .
[4] Rocha Pitta -Historia da America Portugueza. Livro X
nº 66, e Accioly- Memorias historicas da Bahia, vol . I, pag. 158 .
[5 ] Serador Th. Pompeu- Climas e seccas do Ceará, pag. 15.
e Accioly - Memorias hist. da Bahia, vol. 6. pag. 159. - Parece
que a de 1721 é a mesma de que fala Accioly.
283

1736-37 -secca parcial [ ! ]


1744 [2 ]
1745-46 e 1772 66
[3]
1776 66
[4]
1777-78 -grande secca [ 4]
1784 -secca parcial [ 4]
1790-93 -grande secca [ 4]
1804 -secca parcial [5]
1809 [6]
1810 [7 ]
1816-17 66
[6]
1824-25 grande [6]
1827 parcial [6]
1830-33 66
[8]
1844-45 intensa [6]
1877-79 -grande secca [9]
1888-89 66
[9]
1891 -secca parcial [ 9]
1898 66
[9]
1900 66 [9]
1902-3 66
[9]
1907 [9]

Os intervallos entre esses annos calamitosos forão de

1692 a 1711-19 annos


1710-11 a 1723-12 66

[ 1 ] Senador Pompeu - Climas e seccas do Ceará.


[ 2 ] Ayres de Casal- Corographia, vol. I, pag. 216.
[3] Gama- Obra citada, vol . 4, pag. 389.
[ 4] Senador Pompeu - Obra citada, e Ayres do Casal - Coro-
graphia, vol. 2, pag. 192.
(5 ) G. Studart -Notas para hist. do Ceará, pog. 426 .
(6) Senador Pompeu - Climas e Seccas do Ceará.
(7) Koster- Travelers in Brasil, vol . I , cap . 7 .
(8 ] Teixera de Mello - Ephemerides.
(9) Veja-se o meu trabalho O Ceará na Exposição de Chicago,
pag. 83 e seguintes.
284

1723-26 a 1736-13 annos


1736 a 1745-9 ..
1845 a 1876-31
1876 a 1892-16
1893 a 1810--17 66
1810 a 1816-6
1810 a 1825-15
1825 a 1833-8
1825 a 1845-20
1845 a 1877-32
1879 a 1888-9
1889 a 1891- 2
1891 a 1898-7
1891 a 1900- 9
1900 a 1902-2
1903 a 1907-4
1692 a 1792-1891
1710 a 1810-
1723 a 1824-
1744-46 a 1845 ---
3777-8 a 1877 a 79
Alem do periodo cyclico de 100 anos, ha outros de me-
nor praso. Uma phase decennal, com ligeiras variantes para
mais ou menos attrae particularmente a attenção .
1867-833 mill,
10 annos.
1877-467 11
1878-501
1879-596 10 66
1888-737 ་་ 11
1889--780
1898--510 10 ..
1907-664 9
O Senador Pompeu suppõe que a devastação das mattas.
as queimadas e o maior roteamento dos campos concorrem
para frequencia destes annos escassos.
Na Europa onde se ha estudado com certa continuidade o
phenomeno climatologico em todos as suas modalidades, não
se tem achado fundamento solido para affirmação tão cate-
gorica:
285

"Admittimos que a temperatura, na superficie do globo,


pode variar com as revoluções astronomicas ; mas não que a
charrua do lavrador , nem o machado do lenhador, que arra
nham apenas a epiderme do nosso planeta, exerçam acção sen-
sivel sobre a temperatura da atmosphera . [ 1 ] .
O simples elencho desses annos, desacompanhado dos ne-
cessarios commentarios. induz a crer- se que essas perturbações
meteoricas se vão ameudando, com frequencia cada vez mais
ruinosa, para o desenvolvimento economico do Ceará. Verdade
é que taes perturbações têm assumido nesses ultimos annos im-
portancia capital na vida desta provincia, não tanto pela ca-
rencia absoluta de chuvas, mas por circumstancias diversas,
que concorrem para tornar mais intenso e menos toleravel o phe-
nomeno cosmico.
Por causas mais ou menos conhecidas, o desdobramento
da população operou-se aqui rapidamente. excedendo porven-
tura as previsões estatisticas. De par com este incremento des-
envolveu-se a riqueza agricola e mais salientemente a pastoril.
Os campos sertanejos, se não attingirão o maximo da creação
que podiam comportar, ficaram pela mór parte replectos
de gado, salvo numa ou outra localidade reputada inferior para
tal destino. A' pequena demora das chuvas, os pastos resequi-
dos, entregues a todas as intemperies, as vezes queimados pela
incuria dos lavradores, outras por malevolencia, recalcados pe-
las patas dos animaes, arrancados e arrastados pelos redemo-
nhos ventosos, lavados, se não apodrecidos por chuvas espora-
dicas e intempestivas, tornam se insufficientes ao sustento das
grandes manadas de gado, ordinariamente mal aclimadas por
terem sido recentemente importadas do Piauhy. A isto' ac-
cresce a temperatura abrasadora dos campos, augmentada pela
irradiação em estios prolongados, o desabrigo em que fica a
criação pela carencia de vegetação e escassez d'agua, força-
da a longas e penosas caminhadas para havel-a, quasi sem-
pre profunda, em poços alcantilados, ingrimes, entre ribancei-
ra3. com liquido lodoso, viciado por dejectos de toda espe-
cie, etc. Não surprehende, pois, a mortandade que ceifa o gado.
sobretudo quando a verão se prolonga alem de certos limites.

(1 ) Cezanne - Etude sur les torrentes des Hautes- Alpes.


286

Por sua vez, e quasi como consequencia desta ruinosa de-


vastação da principal riqueza sertaneja, soffrem as populações
campesinas, privadas ex -abrupto dos recursos primordiaes a
sua substencia. As lavras, que nessas longinquas paragens são
subsidiarias e apenas sufficientes para o consumo local, se ex-
ceptuarmos o algodão, aliás em redusida escala pelas difficul-
dades e carestia de transporte, vegetam ou medram em um
e outro sitio abrigado dos ventos seccos, quasi sempre prote-
gido por accidentes do solo, em valles relativamente humidos.
apenas refrescados pela rerencia ou desaguadoro açudal, ou
nas vasantes ribeirinhas, em corôas de rios, isto é, nas ilhas
baixas formadas pela alluvião. Raras são as lavras que suppor-
tam delongas pluviaes, se exceptuarmos as alimentadas por
vertentes nativas, nas quebradas de serras ou nos pequenos ala-
gadiços proximos as praias.
A producção destes sitios excepcionaes é tão excassa que
mal dá para sustentar os seus possuidores, em taes estações.
sobrecarregados com população adventicia ou com os proprios
aggregados. menos favorecidos.
A proporção que a estiagem se prolonga , vai gradativa-
mente a vida vegetal minguando , extinguindo - se nos logares
abertos, batidos pelos ventos quentes, para refugiar- se nas serras
ou a margem dos raros olhos d'agua, de que acima fallei.
Fosse possivel prever - se com antecedencia de 8 a 10 me-
zes a approximação de tão alongada estivação, e pouco soffre-
ria a população .
Verdadeiramente fallando, o que se ha appellidado -- secca
não passa de uma perturbação meteorica, caracterisada por
estios longos, intervallados por precipitações aquosas, umas ve-
zos escassas, outras extemporaneas, se bem que copiosas. Sue-
cede que a planta , sequiosa de humidade, definha á erapo-
ração dos ventos veranicos, e quando recebe borrifos d'agoa,
neblinas, mal desperta sua seira e já o estio a exhaure, a desec-
ca. Quando a batega pluvial e copiosa opera- se a revivecencia
grammal e arborea, succedida em breve por estiolação rapida
á irradiação solar, elevada a temperaturas caniculares. Fugaz
esperança, cruel desillusão assalta então o sertanejo !
Não fossem tão inconsciente e prodigamente mal barata-
das as cargas d'agua, que as chuvas despejam no nosso tão in-
criminado solo por quem as podera represar, e certamente não
287

assistiriamos ao espectaculo deprimente da miseria avassalar fa-


zendas, sitios, arraiaes e outros centros populosos, levando seus
habitantes ao extremo de succumbirem a falta de recursos ali-
menticios ou emigraren por sertões e caminhos invios, despro-
vidos dos mesmos, até o litoral onde ordinariamente a caridade
particular ou publica lhes vai em soccorro.
Agua para as necessidades culinarias e até para bebida
de gado nunca faltou no coração regiona! sertanejo, nas seccas
mais intensas e prolongadas. O sub- solo fornece-a, e jamais
a recusou com algum trabalho de escavação . A camada aqui-
fera jaz a 30, 40 e 60 palmos de profundidade, exigindo em iu-
gares argilosos difficil e laboriosa penetração para attingil-a.
Um systema mais racional de poços para o gado, como por
exemplo, o que o Dr. Marcos Antonio de Macedo lembra (1)
ou melhormente a applicação de cataventos simples de 4 a 6 pa-
Thetas, accionando as bombas de carnahuba, tão baratas e de
facil manejo, fabricadas no Aracity, evitaria grande parte do
prejuizo causado a criação, sendo porventura possivel. por

[ 1 ) Depois de esboçar o quadro da vida sertaneja, o Dr.


M. de Macedo prosegue :
6.
Este é o estado de prosperidade dos sertões do Ceará,
nos annos regulares Mas quando as seccas se manifestam, isto
é, quando deixa de chuver um, dous e tres annos. tudo muda
de aspecto. A penaria se manifesta com todos os seus horrores.
O povo começa por dirigir preces a Deus pedindo chuvas ; de-
pois commette a barbarią de degradar as imagens, collocando-
as como refens em desterros longinquos, com o fim de exci-
tar a piedade divina . Porém a atmosphera a nada se commove.
Guiada pelas leis geraes, que regem a ordem da natureza, só
dá chuva quando os vapores são accumulados no ar e caem.
convertidos em agua, por seu peso especifico. Exgotado o re-
curso das preces, começam as procissões e os cilicios, os ani-
maes definham e morrem de inanição, e os povos se retiram.
seja para o Cariry e outros pontos da Ybiapaba, seja para as
serras de Baturité e Aratanha, seja para as praias do mar.
"Depois dessas grandes emigrações forçadas pela penuria.
depois de muito trabalhar dos jornaes e da administração pro-
vincial o governo geral remette esmolas ao povo faminto, mas
nunca se lembrou de despender um ceitil, no tempo da abun-
dancia, com a instrucção, sobre os meios de precaver as gran-
des calamidades. De maneira que as grandes seccas dos ser-
288

meio de cultura intensa nas suas proximidades obter - se cereaes


nutritivos, como o feijão, a batata, etc. em quantidade suffici-
ente para attenuar parcialmente a penuria das seccas, nas fa-
zendas.
GRANDES INVERNOS E INUNDAÇÕES
Os grandes invernos ou inundações que tambem têm sido
fataes ao Ceará, de que a tradição, os documentos officiaes e a
propria experiencia dão noticia, são os seguintes
1728. [ A irregularidade da estação do anno de 1727 e
alguns anteriores, durante os quaes a secca foi bastante preju-
dicial, succedeo um extraordinario inverno. que occasionou con-
sideraveis damnos a cultura do assucar, sendo tal a inundação
que chegou a demolir alguns engenhos com perda de escravos e
gados : era a maior cheia de que até então havia memoria, e
toda safra reunida a de Sergipe, unicamente produzio 1132 cai-

tões do Ceará só acham lenitivo nos principios da consolação


religiosa, justamente derramados pela egreja e nas esmolas do
governo. Quanto ao mais é tudo confiado a natureza, que nem
sempre está disposta a servir afincadamente os homens.
"Sobre a applicação dos principios da reza e esmolas, como
meios preventivos da secca, acho conveniente a citação de um
dialogo, por mim percebido sendo estudante no collegio da
Boa Esperança ( creado e mantido gratuitamente por mais de
40 annos. pelo sabio e bemfeitor Padre Marcos de Araujo Costa)
dialogo, que teve logar por occasião de uma grande secca, en-
tre o mesmo padre e um dos seus sobrinhos -o Alferes Marcos
Francisco de Araujo Costa, possuidor da fazenda Cannabrava,
margem do Itayn, a tres legoas da Boa Esperança, e como
esta, em face da moutanha do Araripe . Eil-o :
· Padre Marcos --Tenho notado que tu não perdes mais
uma missa aos dias santos. Este sacrificio, no tempo calamitoso
em que nos achamos, não pode ser agradavel a Deus.
Alferes Marcos - Meu padrinho, eu não poupo sacrificios .
Venho a missa todos os domingos e agora nem perco mesmo os
dias santos. Dou esmolas aos arretirantes que passam pela es-
trada e me batem a porta. Com minha familia tenho feito,
nestes dous mezes, 14 novenas, seguidas de procissões. Agora
só me falta mudar as imagens, para ver se assim se applacam
as iras de Deus, pois já tem morrido mais da metade dos nossos
gados.
Padre Marcos -Quantos aguadas contas, presentemente em
tua fazenda ?
Alferes - Só me resta o tanque da porta que ainda não sec-
289

xas de assnear, continuando as chuvas em maior ou menor


quantidade, em todos os quatro annos successivos áquelle de
1728.) (1)
[ 1732.--Parece ter havido grade inverno. Segundo diz o
Dr. Guilherme Studart (2 ) o Aracaty foi inundado,
[ 1741. - O Aracaty foi inundado. (3)
[ 1743. -0 Jaguaribe deo grande cheia. (4)
1748. Foi rigorosa a estação pluviosa, desabaram casas,
muros, etc., na Bahia. (5)
1776. No anno de 1776, segundo a tradição, confirma-
da por documentos officiaes, chuveu tanto, e por tantos mezes
no Ceará, que obstou a cultura dos generos alimenticios, e cau-

cou. Abandonei as cacimbas por se acharem em grande pro-


fundidade .
Padre Marcos - Na Boa Esperança ainda não morreu uma
só cabeça de gado por motivo da secca, entretanto que tens já
perdido metade dos teus gados esta fazenda continha de 6 a
8000 cabeças de gado contra 500 a 800 da Canna brava). E a
razão é porque rezas e eu trabalho. Enquanto fazes novenas,
eu abro cacimbas, de maneira que conto, presentemente, 60 be-
bidas novas, rasgadas no leito do rio, nos riachos e em todos os
logares apropriados. Os meus tanques da porta, do riacho do
Padre e dos Pombos se acham seccos. Eu fiz desmoronar ban-
cos de areia até chegar o nivel d'agua subterranea. As cacimbas
antigas, em vez de serem despresadas, foram de novo rasgadas
e preparadas as subidas afim de não cançar e esmorecer o gado
em sua ascensão diaria. Em muitos logares tive de mandar
romper o salão ( subsolo impermeavel) afim de achar nova ca-
mada d'agua subterranea . Tenho pessoas encarregadas de en-
chotar o gado das bebidas para ir procurar fora dellas outros
alimentos. Sem esta precaução as rezes se deixam accommetter
de inanição e morrem ao lado das cacimbas."
Leia- se todo o dialogo nas Observações sobre as seccas do Ce-
ará por M. A. de Macedo - Stuttgart- 1871 , pags. 66 e seguin-
tes .

( 1) Accioly - Memorias historicas da Bahia, vol. 1. pag. 167 e


seguintes : pag. 183.
(2) Dr. G. Studart-- Datas e factos para a historia do Ceará,
pag. 186 .
(3) Dr. G. Studart- Obr. cit. pag. 206.
(4) Dr. G. Studart - Obr. cit. pag. 218.
(5) G. Studart--Datas e factos, etc.- pag. 387.
290

sou grande prejuizo á criação, por causa dos atoleiros nos eam-
pos e transbordamento dos rios e ribeiros.
[ 1788. -Inundação de alguns rios e grandes chuvas na For-
taleza a ponto de se não poder reunir o Conselho e de cair a
parede da frente da Camara. ( 1)
1782. O inverno do anno de 1782 foi tambem tão forte
e extenso, que os campos embrejaram, os gados morreram ato-
lados nos tremedades : os rios levaram as plantações e as casas
sitas nas margens, e com ellas as criações miudas.
( 1789. - Neste anno houve grande inundação no Araca-
ty. ( 2 )
1797. O anno de 1797 foi tambem calamitosamente in-
vernoso.
O capitão-mór, em officio ao capitão-general de Penedo.
dizia, que tanto chovera, que se perderam as plantações ; e
para se não perderem as sementes, ordenara em Maio que as
camaras obrigassem a fazer plantações de legumes.
1805. O inverno de 1805 deixou tradição tão geral, e
penivel, quanto a secca de 1792.
Os campos permaneceram por mezes embrejados, as ribei-
ras dos grandes rios Jaguaribe, Quixeramobim, Acarahú. etc..
ficaram completamente inundadas, os povoados vizinhos, as ci-
dades do Aracaty e Sobral tambem o foram completamente :
assim como os campos de Jaguaribe em extensão de muitas le-
guas.
Este inverno foi quasi tão fatal á criação, quanto a secca
anterior.
1819. O anno de 1819 tambem assignalou-se por um
inverno de grandes inundações, posto que não tão fatal quanto
o de 1805 .
1826. - Depois dos annos seccos de 1824, 1825, veio em
1826 um inverno copioso, extenso de mais de 5 mezes que não
foi de fataes consequencias á criação do sertão, porque a secca
precedente tinha deixado muito pouco gado.
[Em 1826 appareceu abundancia de chuvas, dando-se a
singularidade de chuver todas as noites e durante o dia appa -

( 1 ) J. Brigido - Resumo chronologico, pag. 120.


(2) G. Studart -obra cit., pag. 393.
291

recer muito bem sol -Dr, Cezar Marques - Memorias do Mara-


ahdo , pag. 16. )
1832-1839 - Os annos de 1832 e 1839 ficaram tambem
assignaladas pela extensa estação chuvosa de muitos mezes, e
grandes inundações em todos os campos, e povoados vizinhos .
Aracaty e Sobral, duas importantes cidades á margem do Jagua-
ribe e Acarahú. pagaram mais um tributo á essa calamidade .
1842. Tres annos depois do ultimo grande inverno, em
1842, repetiu-se essa calamidade, com uma extensão, e intensi-
dade, que, além das inundações causou grandes prejuizos de ga-
dos do sertão. (No Aracaty a enchente attingio ao sobpé da casa
da camara.)
1866. -Dos ultimos tempos foi o de 1866 o mais forte,
se bem que não tão extenso quanto outros. O pluviometro na
capital medio 2.453 millimetros, o que ainda não se tinha ob-
servado.
(0 rio Jaguaribe deo grande enchente invadindo a cidade
do Aracaty: foi a maior inundação de que ha exemplo, segundo
o testemunho de velhos moradores d'alli,que assistirão as de 1839.
42, e 66. Na casa da camara, em cujo andar terreo está a ca-
deia, a agua subio meio metro acima do rez do chão : sendo
para notar- se que ella fica em um dos pontos mais elevados da
cidade.
As ruas, convertidas em canaes, erão trafegadas por meio
de canôas. A inundação durou poucos dias, declinando depois
de uns 3 a 4, formando perigosas corredeiras nos beccos que
dão para o rio . )
1872. ---- O inverno de 1872 foi um dos mais extensos :
começou na capital a 25 de Novembro de 1871 , e quasi sempre
sem interrupção, sendo as chuvas do Natal de 1871 torrenciaes,
coutinúando intenso até Junho, causando grandes inundações.
1873. Este inverno , de 1873, tambem foi fatalmente ex-
tenso, e em seguida ao anterior. Começou em Dezembro de
1872, e estendeu-se até Julho de 1873.
Um phenomeno hygienico observa -se na região do noro-
este, ou ribeira do rio Acarahú, desde o grande inverno de 1866.
O sertão do Ceará, em geral a região que demora a leste e
sueste da cordilheira de Ibiapaba, sempre passou por muito
saudavel.
Havia uma tradição antiga de que, em um dos grandes
292

invernos do seculo passado, a ribeira de Acarahú e cidade de


Sobral foram accommettidas de febres intermitentes, que rei-
nam na provincia de Pianhy, principalmente nos valles dos rios
Poty e Parnahyba.
Depois do grande inverno de 1866 reappareceu na ribeira
do Acarahú, de certa altura, inclusive a cidade de Sobral, até a
barra, a epidimia das febres intermitentes que neste anno levou
muitas vietimas, e perdurou até o fim da secca.
Este phenomeno reapparece desde então em todas as esta-
ções invernosas, principalmente nos grandes invernos subse-
quentes.
Dizem os moradores dos logares, invadidos do mal, que ap-
pareceu quasi instantaneamente, depois de uma grande chuva de
1866, impellida por forte temporal soprado de noroeste ; isto é,
da região de Piauby : e que, sempre que o vento muda de rumo,
soprando do noroeste, o inverno é mais prompto, mais intenso,
e com elle a febre intermitente de Piauby. (1)
A influencia do vento desse rumo sobre as chuvas no Ceará
é incontestavel, e explicavel pelos principios meteorologicos, de
que mais adiante tratarei ; porém que, a par dos vapores aquo-
sos impellidos da serra de Ibiapaba, traga tambem o principio
deleterio, que desenvolve a peste, deixo ao juizo dos homens
da sciencia : entretanto o facto parece tambem explicavel por
essa circumstancia. Na verdade attribuir o apparecimento e de-
senvolvimento das febres palustres em toda a ribeira do Acara-
hú, ou antes da corrente das aguas que descem da falda oriental
da serra de Ibiapapa, sómente ao facto da inundação, mais ou
menos prolongada por esses logares, não resolve a questão : por-
que, por muitas vezes esses sitios têm passado por extensas
inundações sem o apparecimento da febre ; assim como outras
muitas regiões mais apartadas soffrem as mesmas inundações,
e nunca nellas appareceu a febre. O vento do noroeste naquella
região pode trazer os miasmas palustres dos rios Poty. Longá e
Parnahyba, onde constantemente reinam as febres intermi-
tentes.

(1) Com os conhecimentos que a sciencia tem hoje, explica-


se este phenomeno facilmente pela proliferação dos mosquitos
(anopheles) transmissores do hematosoairo de Laveran, trasidos
pelos ventos e alimentados nos pantanos da traversia.
293

1874-1876 --O inverno continuou mais ou menos in-


tenso e extenso nos annos seguintes de 1874 , 1875 e 1876.
O de 1874 principiou em Janeiro com grande intensidade
pelo sertão. Na ribeira do Quixeramobim, e Pedra Branca ca-
hiu a 30 de Janeiro uma chuva tão forte, que no dia seguinte
os rios estavam nas varzeas, e matava quantidade enorme de
gado.
O de 1875 começou tambem em Janeiro e extendeu-se co-
piosamente até Junho.
O de 1876 começou por meiados de Janeiro na capital, com
pouca intensidade : mas nos tres mezes de Abril a Maio cahi-
ram chuvas torrenciaes e duradouras, que muito prejudicaram
as lavouras.
[ 1880 -As chuvas de Janeiro a 16 de Março foram escassas.
Desta data a 25 de Julho chuveu seguidamente com curtas es-
tiagens. Em 131 dias, dentro destas datas, foram pluviosos 8
com 138 millimetros : dando o anno 1538.8 mill. em 133 dias.
[1890-0 inverno começou a il de Janeiro, terminando a 8
de Junho. Dos 148 dias decorridos entre essay duas datas, 83
foram pluviosos com 1392.8 mill. e 65 de verão. O total do
anno foi de 1530 mill. com 104 dias chuvosos.
( 1894 - Cairam as primeiras chuvas a 3 de Janeiro, vera-
neando de 6 a 22 deste mez, quando ellas se ameudaram, quasi
sem interrupção, em bategas mais ou menos copiosas até 30
de Junho. De 23 de Janeiro a 30 de Junho ( 160 dias ) foram re-
gistados 2.592 millimetros em 110 dias pluviosos. No mez de
Abril o rio Jaibaras penetrou em Sobral até o mercado, o Sal-
gado deu grande enchente, e nesta capital ( Fortaleza ) cairam
muitas casas, como o templo maçonico a rua Senado " Pompeu , e
grande parte do Seminario episcopal, tendo morrido na rua da
Boa Vista em riacho formado pelas chuvas uma pessoa afoga-
da. Dos pontos mais elevados da cidade, como a Praça de Pe-
lotas e Rua Senador Pompeu , etc. desceram correntes d'agua
para o Pajéhú e Jacarecanga, inundando por todo o mez de
Maio grande parte do Boulevard do Imperador. Durante o anno
cairam 2726 mill. em 162 dias. Foi um dos maiores invernos
registados.
Uma descommunal enchente arrebatou a grande ponte da
Estrada de Ferro de Baturité na villa de Aracoyaba, arrastando
294

em seu desmoronamento grande nº de pessoas algumas das .


quaes pereceram afogadas .
[ 1895. O verão de 1894 foi curto e não conseguio evapo-
rar todos os alagados do inverno. Em Novembro, mez ordina-
riamente secco, chuveu por 15 dias. O anno de 1895 annunci-
ou se propicio com chuvas finas de Janeiro até 12 de Feverei-
ro desta data em diante ellas se amiudaram copiosas com bre-
ves estiagens até 26 de Julho [ 167 dias] , elevando - se a 2150 mill.
nos 118 dias pluviosos ou 18.2 mill. por cada dia. As fracas es-
tiagens não temperaram o excesso das chuvas, pelo que tornou-
se desastroso para a criação miuda e para lavoura, que em par-
te foi devorada pela lagarta, chamada de chuva.
[ 1896. - Ainda foi invernoso, sobretudo depois de dous an-
nos de chuvas copiosas e de inundações. Os terrenos encharca-
dos, não receberam felizmente senão chuvas finas em Janeiro e
Fevereiro.
De 9 de Março a 31 de Maio [ 82 dias ] caíram 1302 mill .
em 60 dias chuvosos , ou 21,7 mill . por dia.
Durante o anno 1930 mill. em 133 dias .
[ 1897. Mais um inverno rigoroso a accrescentar á serie
começada em 94. De 26 de Janeiro a 21 de Junho [ 146 dias ] hou-
ve 82 dias pluviosos com 1620 mill . , ou 19,7 mill . por dia ; du-
rante o anno 1943 mill. em 110 dias.
[ 1899. - Os ultimos dias do anno anterior forão chuvosos.
mas durante o mez de Janeiro as chuvas tornaram -se finas, se
bem que repetidas . De 25 de Janeiro a 30 de Junho [ 157 dias]
caíram 2309 , 4 mill . em 90 dias ou 24,6 mill. por cada um . Foi,
portanto, o mais rigoroso, desde 1849 em relação a quantidade
media por dia pluvioso. Durante o anno houve 147 dias com
2770 mill. ]
Da noticia supra das estações no Ceará, resulta, que, de-
pois de 1845, [ 1 ] os annos invernosos têm sido mais continuos.
regulares, e mesmo mais frequentes as inundações. Ao passo
que a população tem mais que duplicado, a criação crescido na
mesma proporção, e os incendios dos campos, e roteadura das
poucas matas augmentado . Somente tambem tem augmentado
consideravelmente o numero dos açudes ou represas de agua

( 1 ) Em bem de verdade deve - se accrescentar que a par dos


invernos copiosos , os annos seccos se hào succedido mais a
miude.-[Thomaz Pompeu . ]
295

pelo sertão, e sopés das serras. Esta massa de agua, porém,


parece muita limitada para poder exercer influencia ou alterar
as condições physicas do clima, a ponto de tornar as chuvas
ou estações mais favoraveis .
VARIAÇÕES ANNUAES. - A tabella seguinte mostra as alter-
nativas annuas das chuvas om Fortaleza .

1º sem. 2º sem. Total

dias mill. dias mill. dias mill.


RERWR

1849 79 1750 . 21 153 100 1.903 .


282

1850 61 765 . 10 92.3 71 857.3


1851 76 1.569.2 147 98 1.716.2
1852 82 1.267.5 16 29 98 1.296.5
1853 70 1.079.8 35.3 1.115.1
88.4
&

Media 73.6 1.286.8 14.8 91.3 1.377.6


29288

1854 79 1.532.2 21 58.2 100 1.590.4


588

1855 43 1.160.5 17 116 . 60 1.276.5


1856 79 1.572.5 40 200 . 116 1.772.5
1857 1.686.8 10 46 1.732.8
1858 1.001.3 29 372.2 84 1 373.5
8
5

Media 61.6 1.390.6 23.4 158.4 85 1.549.1

1859 83 1.275 . 13 91 . 96 1.338 .


1860 99 1.474.5 38 240.5 137 1.715 .
8

1861 91 1.177 . 20 268 . 111 1.445 .


1862 106 1.400 . 13 68 . 119 1.468 .
1803 103 1.344 . 28 118 . 131 1.452 .
89828

Media 96.4 1.328.5 22.4 157.1 118.8 1.483.6


SANE

1864 70 998 . 10 100 . SO 1.098 .


1865 65 978 . 40 260. 105 1.238 .
1866 86 2.340 . 27 118. 113 2.458 .
1867 73 170.5 42.5 84 833 .
1868 1.220.5 58 168 . 146 1.388.5
R

Media 76.4 1.265.4 29.2 137.7 | 105.6 1.403.1


296

1º sem. 2º sem. Total

dias mill. dias mill. dias mill.


2287
õess
388

***

1869 95 1.375.5 24 103.5 119 1.479 .


..
*9

1.526.5 101 .
6

1870 92 17 109
p
8
ã

1.625 .
8
2
7
9

1871 69 955 . 38 504 . 107 1.459 .


1872 126 1.940 . 38 361.5 164 2.301.5
1873 103 1.897.8 18 159 121 2.056.8

Media 1.548.9 27 245.8 124 1.784.1

1874 68 1.153 . 86 1.153 .


1875 98 1.369..5 24 156.5 122 1.526 .
1876 100 1.460.6 18 111.3 118 1.572.2
1877 54 350.1 19 117.6 73 467.7
1878 34 473.9 6 27.4 40 501.3
PRES

Media : 70.8 961.4 16.7 103.2 89.8 1044 .


GE

1879 515.1 21 81.2 71 596.3


2
R

1880 89 1.286.1 44 252.5 133 1.538.6


1881 81 1.177 . 29 234.8 110 1.411.8
1882 94 1.078.5 17 173.9 111 1.252.4
1883 80 . 1.423.1 3 9 83 1.432 .

Media 78.8 1.095.9 22.8 150.2 101.6 1.246.2

1884 1.050 26 107 . 99 1.157 .


1885 1.106 . 28 108.5 91 1.215 .
1
1886 71 1.329 . 16 66.4 87 1.395 .
1887 74 1.293 . 6 26.4 80 1.320 .
1888 41 652 85 54 741 .

Media 65.2 1.086.8 17 79.42 82.2 1.171.5

1889 711 . 12 64.2 67 775 .


1890 86 1.395 . 18 135. 104 1.530 .
1891 67 731.6 19 100.6 86 832 .
1892 63 933.4 25 284.4 91 1.268 .
1893 1.345 . 35 173. 117 1.518 .

Media 70.6 1.040.8 . 21.8 151.5 93 1.184.6


297

1º sem. 2º sem. Total

98222
33525
dias mill. dias mill. dias mill.

329
1894 115 2.644 . 47 126. 162 2.759 .
8
1895 118 1.940.2 58 461.5 176 2.401.7
1896 106 1.558 . 32 371.3 133 1.929.3
9897 88 1.653 . 20 255. 110 1.922 .
1898 58 471.5 20 48.3 78 520 .

Media 96.6 1.653.3 35.4 252.5 132 . 1.906.4

1899 2.464.2 36 306.5 147 2.770.7


1900 42 268.5 22 95 . 64 563.5
1888

1901 86 1.309.5 28 228 . 114 1.537.5


1902 63 690.5 36 161 . 96 851.5
1903 59 768 12 22.5 71 790.5
2

Media 72.4 1.100.1 38.8 162.6 98.4 1.302.7


RRRR

1904 913 22 220.5 95 1.133.5


1905 70 974.5 159 . 97 1,133.5
es

1906 76 1.527.3 34 48.5 110 1.456 .


8

1907 73 510.5 27 134.5 100 654 .


1908

Quantidade total nos 54 annos ( 49 a 905) :


Total 4.443 ] 70.437.9 1.318 8.734 5.758 79.582.6
Media 77.9 1.235-7 28 153.24 101 1.396.1
As variações de um para outro anno são as vezes extre-
mas. Entre o inverno de 1899 com 2770 mill. e os de 1898 com

511 e de 1877 com 469 mill., ha verdadeiro salto, cuja diffe-
rença sobe a 2.300 mill. , quasi o duplo da media annual.
O primeiro semestre do anno é o mais chuvoso : a differen-
ça no numero de chuvas e quantidade de agua entre os dous
é muito notavel.
Os annos mais invernosos deste periodo foram o de 1899,
que deu 2.770,7 mill., o de 1894 com 2.759, mill., o de 1866
com 2.458, o de 1895 com 2.401,8 mill., o de 1872 com 2.301,5
mill. e o de 1873 com 2.056,8 ( observação incompleta deste
anno):
298

VARIAÇÕES MENSAES. - Um diagramma em que estivesse


graphada a marcha apparente do sol , do tropico Capricornio
ao equador e deste ao de Cancer mostraria , senão a perfeita
concordancia entre a maior quantidade e dias mais pluviosos
occorridos no Ceará com a approximação d'aquelle astro até o
solisticio do verão em Junho, ao menos tal coincidencia entre
os dous phenomenos que desde logo suggeriria ao pensamento
attribuir--se
se o segundo ( chuvas ) a acção immediata do primeiro.
Examinando o mappa mensal da destribuição das chuvas
na Fortaleza, vê - se que ha dous periodos bem caracteristicos-
o pluvioso-que comprehende os mezes de Fevereiro a Maio,
representando 77.47 % do total das chuvas no anno, e o secco
ou de estio, que vai de Junho a Janeiro [ 8 mezesj , prefazendo
22.53 %.
A marcha mensal pelas medias é gradativa e uniforme a
partir do minimo [Outubro], ao maximo [ Abril].
A ascensão opera-se mais rapidamente de Outubro a Mar-
ço, quasi em proporção geometrica : descendo de Abril a Ou-
tubro ainda mais rapidamente .
A media annual dos dias pluviosos foi em 55 , 75 annos de
103,2 e o das chuvas recolhidas de 1.428,15 mil. , dando por-
tanto, a media de 13 mill. 81 por cada precipitação. Na tabella
seguinte se acompanhará melhor esta demoustrāção.

Quantidade absoluta de dias e chuvas em millimetros. na


Fortaleza de 1849 a 1907 :

MEDIA ANNUAL IM MILLIMETROS


MEZES DIAS TOTAL
MILL. POR CHU-
ANNOS DIAS
VAS

Janeiro 406 4.437.0 [ 60] 6.75 73.95 10.92


Fevereiro 680 9.727.6 [60 ] 11.33 162.12 14.30
Março 944 16.800.0 [59] 16.00 284.74 17.79
Abril 1.075 19.407.7 [59 ] 18.22 328.94 18.05
Maio 826 13.572.2 [ 58 ] 14.24 234.00 15.42
Junho 554 6.713.8 [58 ] 9.55 115.75 12.12

Total .. 4.485 70.658.3 [59 ] 76.101.199.50


Media 6mezes 76.01 1.357.2 12.64 198.22 15.75
299

MEDIA ANNUAL EM MILLIMETKOS


MEZES DIAS TOTAL
POR CHU-
ANNOS DIAS MILL.
VAS

Julho .... 302 3.050.8 [50] 6.04 61.01 10.01


Agosto... 204 1.459.8 [ 52 ] 3.92 28.07 7.15
Setembro 194 890.4 [54 ] 3.59 16.48 4.53
Outubro 197 774.8 ]54 ] 3.64 14.30 3.93
Novembro... 149 738.3 [50] 2.98 14.76 4.95
Dezembro ... 234 2.047.2 [55] 4.23 37.22 8.73

2º semestre .. 1.280 8,961.3 52.5 24.30 171.84


1º 4.48570.658.3 59 4.06 28.64

Media mensal 5.765,79.619.6


Annual 103.41.428.15 55.75 100.4 13.81 13.81

A porcentagem mensal em millimetros


T

MEZES MILL. % DIAS %

Janeiro 5.28 655


Fevereiro 11.57 10.97
Março 20.41 15.60
Abril 23.5 17.65
Maio 16.71 13.79
Junho 8.21 9.25

1º semestre . 85.68 73.81


20 14.32 26.19
300

Grupando os mezes pela 4 estações obteriamos as seguin-


tes quantidades nos annos de :

DEZEMBRO MARÇO JUNHO SETEMBRO


A A A A

BEES
FEVEREIRO ΜΑΙΟ AGOSTO NOVEMBRO

Dias Mill. Dias Mill. Dias Mill. Dias Mill.

:GABG
Bao
DE
RARE
38929

IN
+2
1849 61 1.295 30 445 5 13
1850 26 190 35 610 14 190 10 12
1851 27 320 48 910 21 175 4 12
1852 31 382 57 990 12 140 5 9
1853 11 33 46 827 14 155

WE
99

Total 95 925. 247 4.632 91 1.105 24 46


Media 19 185 49.5 926.4 18.21 221 4.8 9.2

WERE
98539

1854 12 210 45 990 32 432 7 11


1855 7 55 890 10 40 9 16
1856 27 600 51 '1.020 14 75 20 75
1857 24 450 28 1.140 20 225 6 17
1858 10 159 42 790 16 200 16 130
87

20

Total 80 1.474 205 4.830 92 972 5S 249

འཙ
Media 18 294.8 41 966 18.4 194.4 11.6 49.8

འག་
8895

3300ER

1859 25 278 727 25 347 4

ཧྥེའི
ག་
1860 22 341 1.030 35 285
1861 43 507 655 13 83 ཆོ
ཆོ
1862 37 576 914 16 143
1863 21 245 65 1.032 29 299
88

Total 148 1.974 1290 4.358 118 1.157 40 137


Media 29.6 389.4 58 871.6 23.6 231.4
99895

1864 24 292 672 11 134 3


1865 16 157 610 19 306 28 153
1866 21 158 1.923 14 290 19
1867 14 84 590.2 19 153 3
1868 22 352 57 753.3 26 202 20 61

Total 97 1.043 251 4.548.5 89 1.085 73 295


Media 19.4 208.6, 50.2 909.7 17.8 217 14.6 59
301

DEZEMBRO A FE- MARÇO A MAIO JUNHO A AGOSTO SETEMBRO A DE-


VEREIRO ZEMBRO

38282
Dias Mill. Dias Mill. Dias Mill. Dias Mill.

34886
1869 35 425 64 1.021 20 89 23
1870 26 266 58 1.172 12 95 12 42
1871 16 190.5 51 S03 331 16 56
1872 48 746 67 1.105 474 13 62
1873 42 683 57 1.145 163 13 SO
Total 167 12.229.5/297 5.246 103 1.152 59 263
Media 33.44.445.9 59.4 1.049.2 20.6 230.4 11.8 52.6
1874 39 356 28* 637 16* 220
1875 17 176 68 1.113.5 13* 454.5 10 101
1876 43 259.5 56 1.163.5 22 146.5 9 46
1877 8 41.2 38 225.2 24 173.4 28.2
1878 15 121.2 18 350.7 7 31.4
22686

Total 122 953.5 208 13.489.91 82 1.025.8 23 175.2


Media 24.4 188.7 41.6 696.9 16.4 205.1 4.6 35

རཱ་
1879 5 31.5 17

དྷསྶདྷ
14 113.6 32 375 54.3
1880 , 12 54.7 .139 39 262 15
1881 24 471.S 892 32 376 3* 4.2 32
in
1882 : 18 161 60 742 29 343 6* 10.5
1883 19 342.7 57 1.140 56 3
#

Total 87 1.143.8266 4.288.5111 1.068.5 44


Media 17.4 228.7 53.2 857.7 22.2 213.7 8.8 25.8
17827

1884 15 155 53 853 13 74.5 16


1885 7 79 53 986 13 91.8 17
1886 21 269.4 46 1.016.9 12 94.8
1887 9 221.6 50 1.034 12 69.8 4.2
1888 12 159.2 26 381 12 182.8
Total 64 884.2228 4.270.9 62 513.7 44 146.2
Media 12.8 176.8 45.6 854.1 12.4 102.7 8.8 29.3
1889 19 159.8 32 441 10 128.7 3
1890 32 249 42 1.141.9 16 104.6 6
1891 23 154 37 601.6 20 121.2 8
1892 11 116.8 ' 41 710.8 22 152.3 9
1893 35 581.2 52 753 14 93.3 12 39.5
Total 120 1.260.8 204 3.648.3 82 600.1 38 172.5
Media 24 252.1 40.8 729.6 16.4' 120 7.6 34.5
302

DEZEMBRO MARÇO JUNHO SETEMBRO


A Α A A
FEVEREIRO MAIO AGOSTO NOVEMBRO

Dias
98569 Mill. Dias Mill. Dias Mill. Dias Mill.

1894 42 753. 70 1.685.3 24 299 31 84.5


1895 36 204.5 71 1.493.5 47 591.1 25 125.7
1896 27 144.5 64 1.331.5 32 408.7 11 65 .
1897 25 422 48 1.078 . 28 368.5 7 71
1898 15 77.5 40 352 . 41.5 11
98

Total 145 1.601.5 293 5.940.3.136 1.708.8 82 357.2


Media 29 320.3 58.61.188 . 27.2. 341.7 16.4 71.4
SHARE

1899 46 740.8 64 1.615.2 34 416 17 23 .


1900 17 128. 20 76 18 159 1 3.5
1901 32 531.558 903.5 19 186.5 13 115 .
1902 13 155. 24 499. 22 150 15 32.5
1903 18 290 40 477.5 9 13 . + 20 .

Total 126 1.845.3 224 3.541.2102 924.5 50 194 .


Media 25.2 369. 44.8 708.2 20.7 . 184.9 10 38.8

1904 24 195.5 44 653 24 243. 3 14.4


1905 18 099. 48 842.5 18 86.5 13 105.5
1906 18 327 47 1.106.5 25 126.8 12 14.5
1907 36 233.3 41 395. 16 166.5 12 | 41.5
1908 22 145.5 49 623 .

Total 118 1.000.3 229 3.620 . 83 622.8 40 175.9


Media 23.6 200. 45.8 724 . 20.7 155.7 10 43.96

Total 1.369 16.307.7 2.942 52.413.5 1.55 ! 11.905.3 575 23.40


Media
60 an-
nos 22.81 271.79 49.03 873.55 19.52 202.29 9.74 39.66

(*) Observações incompletas.


Total das chuvas neste periodo -dias 6.037
* .. mill. 82.996 .
Medias dos dias de chuva por anno 101.2
de mill . 1.395
1
JANEIRO FEVEREIRO
MARÇO ABRIL MAIO S EMESTRE
1JUNHO
ANNOS
dias
.d
.mill
mill
ias dias
,mmill
.dias
.dmillias
.dill
ias

1849 155
16 215 24 690 390
21 18 315 39 1760
1850 6
135 80 13 16
210
320 10 140 940
51 18 12
260 250 20 360
16 300 110 79 1320
52 20
285 400 17 260
20 330 130 1485
86

+8+

1838
53 + 11
23 21 11
387 200 120
970
59

89000
240

69988

FREER
Media
2 171.6
13.4
10
237 ,17
103.7 11.2
286 1295
73.6
163

19
1854 10 195 100
11 18 490
16 400 390 1510

21
55 50
250
16 600 40 20 960
56 130 16 21
390 22
290 630 100 5 40 1560
78
57 8
275 293 12
505
18 340 18 200 1700
confirma plenamente esta affirmativa.

ོ ད- :
gata

2+
58 145 45
18 365 18 380 85 1030

C0026

28888

2:58
2015
Media 8.6 12.4
207 18.2
196
10.4
504 225
11.6 145 1352
FORTALEZA DE 1840 A 1908

+
?
1859 15
17
239 15
242 20
209 15
276 87
236 1211
60 15 18
366 21
281 384 24 365 1512
99
141
61 27 335 100 20
382
175 98 81 1171
91

འ ╗ དེ
62 19 295 23
401
222 291 13 139
102
1188
cha do sol do equinoxio de Março ao solesticio de Junho.

63 15 210 26
167
19 20
455
ེ ས༤╗
210
19 1312
239
103
Been

2298.
67784
12000
303

14.8 1320.8
96.4
163
MAPPA DA QUANTIDADE DE CHUVA CAHIDA NA CIDADE DA

Media
96.2
9.8 21
253.2
17.8
230 14.4
248
330.4
19.2
O mappa seguinte com as respectivas medias quinquenaes,
As variações mensaes, como ficou dito, acompanham a mar-
JULHO SETEMBRO OUTUBRO
AGOSTO NOVEMBRO 2º
DEZEMBRO DO
SEMESTRE TOTAL
ANNO
ANNOS
304

dias
.dias
mill millias
.d,mill
dias dias
.
mill

1849 2
110
40 5 23 147 1907
112
1850 20 21 82 76 1022

21.00
51 17 24 94 103 1414
52 10 26 29 1514
102

12212110
=i

2161732
10:00
53 64 1005
c⪜SSU

STE7:
:

+ :

::

8474 O
:

S
Media
5.6 1.4 2
3
5.4 1.6
2.8 6 77.4
10.4
17.8 91.41372.2

10

&
1854 1 2
51 58 1568
160

21
55 80
17 116 66 1076
56 10 30 90 41 200 119 1760
57 2 10
+ 46 78 1746
38 6 70 10 50
: 1+ ཧྨཋ1 > 31
30 275 87 1305

CLOUD CON
Bae Bar to
+10242110

12311-

ataT
1019094

+0228

CEKEE
Media
4.4 28 2.4 4
20.2
3.8
19.4 12 17.6
3.4 5.6
'41.8 24 139 90
1491


2

18
1859 84 196 1337
101
60 114 241 1753
137
61 210 253 1426
111
62 7 18 3 63 1466
114
63 43 17 28 131
118
1430
29401

21302121+

4712+
102000

11010010

1321-

#
5050010
12975
WEEK

28-37
3.6
Media
49.8 18.6
3.6 11.6
3.6
9.22.2
6.6
2 174.6118.41480.4
22.4
61.4
JANEIRO FEVEREIKO MARÇO ABRIL ΜΑΙΟ JUNHO 1
SEMESTRE
ANNOS
dias dmill
.Mill
ias .dias
mill dias .dias
mill .mill

1864 34 237
12
162
12- 19 372 138 9 55 998
65 45 8
13
100 80 15 233 298 9 204 975
66 20 133
13
21
19
629 634 20 660 10 260 2336
67 10 62 11 251 24 172.5 14
13
157
128 790.5

7004
27
68 188 22
1768
15 416 109
13 126
11 12:23

LOUBE

ལོ + ནཌ །
HARER
Media
5.6 10.8
8
58
1264.4
76.4
156.6
10.4
274.4
14.C
365.4
20.8
271.8
14.8
138.8

ེ = 1╗ དེ
+


PRED
5
བྱ་

1869 13 50 16
345 198
21
448 375 14 1430
70 12
102
158 17
490 19
407 275
10 93 1525

བས
71 31 33.5
18
13
20
295
303 205 77 954.5
72
149
14 18
20
29
568
201 336 264
126
17 1940
422
23
309
73
15
285 19 14
426
24 301
163
106
11 1902
418
ཿ ཎྜན་

2000+

3882

228
Pavēl

དེབ

RARE
445.4
21.6
248.7
17
,1
11.6
Media
2128.2 122.2
9.4
1550.2
305.4
97.6
298.4
16.8


2

འ་ྲརྩེ །
56
1874 12 38 258 359
14 278 16 78
220 1153
75 17 176 387
25
22 372 21 13
354.5 454.5
98 1469.5
ii
76 19 41.5
18 20
421 18
290.5 14 100
84.5 1455
77 3
24.2 16 16 10
84 12
40.2 452
101 84.4
53 349.4
R349

སྨྲངྒེ ༤

ཅིག
78 39 10 82.2 97.2 6 1
191.5 3
+4 475.9

22
62

22+
1
305

Media 208.5
72.5
169.4
10.6
219.8
11.4
6.4
14.8
269.6
15.4
134.7
14.2
33.2 980.5
OUTUBRO
AGOSTO
SETEMBRO NOVEMBRO 2º
SEMESTRE
DEZEMBRO TOTAL
JULHO ANNO
DO
ANNOS
306

ias
inill
dmill
.mill
dias mill
dias
.

1864 21
1 S 6 1
800 1077
82

1
1865
7 3 44 60
15 91 40 260 1233
110
66 6 37 12 24 118 117 2453
67 1
25 2
7 8 11 42 84 853
10
26
13
45 31 30
6 51 167 1390
139

11818
15514

18698
ཨ་ སྐུ
12424

* - ***
24 199
22325

688
Media 4.2 3.2
37.2
5.2 6 7.4
21.4 3.3
3.2
4.6 12.226.8 106.4
1405.2
137.4


2


1869 47 28
10 20 6 24 104 118
1534
70 2 33 4 19
45 89 1614
111
71 12 225 29 34 20 2 ~+ 175 37 485 1440
106
72 16 50 11 89 38 361 167
2290
73 4 2 74 60 18 140 124
2042

276621
33217

ARRES
2406450

1+

8229 :
600000

: 9948: 58
986664
Media 7.6 89.8
3.6
18.44 31.2
75.
4.4
16.8
3.2
17.2
4.6
18.6 1744
235.8
125.2

8:56 .
1874 13 73 855
9

:
75 154
23
53 121 1614
76 5 L 6 114
36 1637
10110
77
11 43 46 3 20.2 8 19
117 74 469.8

1:34
78
6 27.4 6 27 40 500
.
**

100 * 00 **
:210* *
1920 *
:8080
4995

Media 10.8
2.8
23.8
1.8
5.4
5.84
1.2
10.6
1.4
25. 1015.1
84.4
66.8
JANEIRO FEVEREIRO MARÇO ABRIL ΜΑΙΟ JUNHO 1º
SEMESTRE
ANNOS
.
mill
dias dias
.mill .dias
mill
dias dias
.
mill dias
.
mill dias
.
mill

1879 65.4 48.5 19


171.1
16 87.9 116 4 26.5 50 515
1880 14.8 28 18 28
193.5 652 16 294 18 105 89 1286
81 16 12 10.8 19 183 21 409 15 300 10 160 81 1176
82 116 33 13 160 22
315 25 267 198 94 1072
83 221.5 390
i06.2
18 28
545 11 205 6
56 80 1424

8888
+3020

9247∞
67279
79332
Media6 81.7 109
11.6
236.4
21.6
14.8
401.8
16.8
219,5
6
84 1094.6
78.8

00
1884 31 10 124 351
19 20 323 14
177 42 73 1050
85 67 10 167 28 604.515 214.5 1106
53.5
63
86 163.5
11 89.4 16 520 16 269.8 222.5 61 71 1329
87 139 .
73 17 433 23 458 133 1293
74
47.5
88 57 102.29 112.6
9 196.4 72 111.441 651.6
4E2108

22408
6789 51
POLIE

+
86648
Media 6.4 78.1 6.8 163.8
371.2
12.2
318.7
19.2
91.1
14.2 6.4 63.3
64.4
1087

1889 6 39 10 106.2
8 212.2
12 166.2
12
62.6 125 55 711
90 li 15
81.7 23
138.1 14
494.4 5
329.5 .
318 8 86
33.6 1395.3
91 12 71.2 46.8
9 18
155.8 310.3
9 8
151 9 52.6
64 787.8
92 3 8
9.8 201
444.8
20
12
107.
89.9
11 11 105.8
65 958.3
93 15 305.413 233
189.
.273.1
230.2
12
16
20 6 59.2
82
1290.2

CHERR
307

Media 9.4
.
245
14.2
209.9
10.6
101.2 16 214
259.2
10 8.2 75.2
1028.5
70.4
JULHO AGOSTO
OUTUBRO
SETEMBRO NOVEMBRO DEZEMBRO SEMEST
2º RE DO
TOTAL
ANNO
ANNOS
308

dias
.
mill .ddias
mill
ias .dmill
ias
'mill
dias .
mill
dias

1879 15 10.7 28.6 15 21


.9 81.2 71 596
80
15 129 28 30 10 44 252 1530
133

848
81 180 35.5 4.2 15 29 236 110
1412

39 *
82 135 13
6 10.5 15 174.
1250
111

** LO CO
83 + 9 83
1433

1670 *
18380
1 + 973

Co

8888
Media 7.6 3
88.9 18.3
1.2
11.8
5.6
8.4 5.4
3.4 134.2
1244.2
101.6
18.6
17.2

21
84 7.4 25.1
13
+ 19 30 12 26 107 99 1157
85 35.3 3.
30
10 20 4 28
16.5 108.5 1215
91
A

86 8.2 25.6+ 6 12 9.6


16 66 87
1395
87 2.8 19.5
1 2.7 26.5 1320
80
8+ 2 *

5
88 54.22 17.2 3 3 9
.6 89 54 741
• * 1000 A
*

∞ 421 -

6143 61
དྨེང་ོ་

88855
CIILE
21.00.00 * 20

Media 3.2
21.5
2.8 18 10
3.8 .2 9.8
,1 .8 9.2
2.2
17
10.5 82.21171.5
79.4

89 3.7 15 16 2
,1 2
69.2 64.1
67
775
90 62 9 12 .40 18 135 104
1530
91 31 37.4 6 1 22 19 101 832
86
92 28.21 18.3 24.5
+ 17 4.5 18.7
25 284.4
1268
91
93 6.5 2.5 113. 1.5 1
12
5.5
43.5 42.5
1332.7
94
1831

H8479

3277-
ཥྭཱ 2 f ic
23232

14222121

4644 CO
Media 4.0
25.5
3.4
2
10.18 14.1
2.0
9.5
1.8 20.2.17.2
7.0
3.6
88.4
125.4
i147.5
MARÇO
FEVEREIRO
JANEIRO ABRIL ΜΑΙΟ SEMESTRE

JUNHO
ANNOS
.. ias
mill
dMill
dias dias
.dias
mill

1894 335 19 301.6


23 29
410.8 823 19 507 16 2.648.4
271.
114
95 22.9
17 23
160.5 599
27
3 468 24 425 16 262.1
117 2.037.8
96 14
52.5 22
80.5 578.5
23 478
18 259 101
103. 1.551.5
97 83.5
17 13
337.0 258.5
17 455.5
17 17
366.5 1.687.5
88
186.5
98 17.
11 56.5
14 19
102. 7
229. 29.7 37.
58 481.2

1274

81108
Media 23
388.2
19.2
187.2
15.6
102
7.8 490.7
17 13
317.4 95.61.681.2
171.9

1899
13 70.
22 638.3
24 23
676. 17
553.2 386 141 112
2.464.5
900 58.3
7 8
61.0 6
42.5 C
14.5 19 8 73 42 268.5
901 14
42.0 29
284.0 16
411.5 223.5
13
268.5 80 86 1.309.5
902 105.3
6 43.0
18 17
212. 100.5
12
212.6 43 65 716.4
903 20
. 3 8 13
73.5 186
. 13 7
162.5
.93 742.0
44
54
5
3397610

37766
Media 7.8 305.6
15
18.4
219.9
95.7
13.4 160.4 7.8
10.2
242.2 71.81.100.1
76.2

1904 14
27. 12
155. 318.5
17 15
133.5 201 9 73
78 913
905 9
40. 21
55. 11
556. 173.5
16 112.5
8 70
37 974
906 25.5
12 210 20
12
297.5 15
428.5 15
468. 76
97.8 1.527.3
907 15 14 120.5
16
128
19 188.5
6 78.5
6 68
78.5 609
.
908 60.5
11 230
17
81. 15
210. 183
10 76
145.5 .
910

1276
309

Media 5.2 986.6


72.6
87.5
9.6
208.6
226.8
16.8
288.5
15.6
141.8
12.4
33.6
JULHO AGOSTO OUTUBRO
SETEMBRO NOVEMBRO DEZEMBRO SEMESTRE
2º DO
TOTAL
ANNO
ANNOS
mill
dias
.d
. ias dias
.
mill
310

.
mill
dias dias
mill
.

1894 6 25
. 3 10
6.5 16.5
62.0
16 21.0
49 133.5
163
2.781,9


13
265.3
18
95
63.5 32.7
11 30.0 63.0 58
1.0 465.5
2.503,3
175
96 160 8
144.8 40.0 13.0 12.5 1.5 1.923,3
133
371.8
97 156 24 30.01 20.0 21.0 20
4.0 255.0
1-942,5
108

21 པོ
98 4.5 7.0 2
3.6 1.5
12 32.8
20 529.6
78
48.4

11119

27341

23821
6733 30
Media
9 5.6
23.1
4.8
47.9
5.2
121.2
6.2
16.4 32.0
5 39.8
14 254.8
131.4
1.936,1

1899 14
125.2 150 12.05 6.0
2 5.0 8.5
36 2.771,2
148
306.7

10
900 60.5 25.5
1 3.5 11 205.5
22 295.0
563,5
64
901 98 6
8.5 43.0
4 1
60.0
43.0
3 6.5
29 1,539,0
115
229.5
902 65 9 42 11.0
7 15.5
2 36
22.0 161.0
877.4
101
903 6.5 13.0
1.5 13.5
12 42.5
784.5
66

44441

79873
Media 6.2 71.1
45.7
6.4 4 1.6
16.6
3.4
16.5
27
51.2
5.4
5.8 98.81.307.1
206.9

1904 96.5
8
68.5 29.0 11.5 13.0
,2 2 219.0 1.132.0
95
905 6 .15 27.5 796.5 29.03 3 27
4.0 159.0 1.133,0
97
906 14.5 14 5.5 9 3 28
5.0 48.5
104
1.575,8
907 5 .
44 44
5 5 10 23 8.5 8.5 4.0
27 734,5
125.5
95
4474
2405

78110
100101010
908

101011
Media
311

VARIAÇÕES DIARIAS.- No litoral, influenciado pela brisa, as


maiores precipitações pluviaes occorrem á noite ou mais pro-
priamente pela madrugada, quando a temperatura desce ao
gráo mais baixo, produzindo as condensações. Não ha observa-
ções seguidas descriminando as chuvas entre os dias e as noites.
mas das que forão registadas vê- se que a porcentagem noctur-
na è superior a 60 % do total. (1)
Ordinariamente no começo da estação chuvosa as quedas
d'agua são mais frequentes de meia noite ás 6 h. da manhã :
dos fins de Maio ao termo do inverno ellas se tornam mais ma
tinaes do que nocturnas. Em Abril e Maio chove indistincta-
mente, sendo, porém, mais copiosas as da noite. Não raro desde
5 horas da tarde começam, nestes mezes, chuvas que com inter-
vallos breves se prolongam pela noite e madrugada. A's horas

(1) Eis as observações do Senador Pompeu em 1860 .

Dia Mill. Noite Mill. Total

Janeiro ... 5 18 . 5 17 . 35 .
Fevereiro 8 84.5 10 122.5 306.5
ထား

Março 134.5 11 146.5 281 .


Abril . 20 161.5 12 186.5 348 .
Maio.. 12 118 . 18 247 . 365
Junho 4 45 . 11 96 . 141 .
Julho . 6 67 . 16 57.5 114.5
13806

Agosto 2. 5 26.5 29.5


0102

Setembro 8. 0. 8.
Outubro.... 15 . 1.5 16.5
Novembro 0. 0. 0.
Dezembro .. 67 . 5. 72 .

Total . 87 711.5 81 1000.5 1.753

No 1º semestre de 1899, em 111 dias de chuvas, medindo


2,461,7mm a quantidade caída a noite foi de 1.767,mm6 contra
603,ining durante o dia. Em todo o anno a chuva nocturna foi de
1.920.mm,2 contra 848,inin,2 num total de 2,718,mm ,4 - ou 31,2 %
contra 68,8 %.
312

mais calidas do dia , de 1 as 3, ellas cessam ou enfraquecem para


recomeçarem, as vezes violentamente ao pôr do sol. (1)
Quando são pesadas e prolongadas, a differença entre o
dia e a noite é consideravel. Na de 16 de Abril de 1855, por-
ventura a maior medida no Ceará, começou a meia noite e já
as 6 h. da manhã o pluviometro transbordava, accusando então,
ao medir-se -240 mill. Nos dias seguintes 17-85 mill. , 18-
85 mill .

(1 ) Em Abril de 1894 as differenças foram nos :

Dias Dia Noite Total


PRI2K4

9 6 96 102
10 0 4.4 4.4
11 23.1 67.5 90.6
12 4.5 5.2 9.7
13 6.6 3.8 10.4
14 0.6 1.4 2.
18 8.5 18.8 27.3
19 0. 50.5 50.5
20 23.0 13 . 36 .
21 25 . 81.5 106.5

Em todo o mez 19 dias chuvosos, medindo 224.m, e 26 noi-


tes com 596,5.
Em Março de 1896 : 1

Dias Dia Noite


2222
1231E

10 5
12 16 127
13 1.5 62
14 52 92
15 0

79.5 282 .
313

As chuvas do verão são quasi sempre matinaes e raramen-


te se prolongam além de 10 horas da manhã. [ 1 ]
Nas serras, mais do que no litoral, ellas são nocturnas e
matinaes, e quando caem entre 11 e 3 horas da tarde vem de
ordinario finas.
No sertão é nas horas de maior calor, entre meio dia e 3
horas, quando os ventos abrandam ou paralisain, e a evapora-
ção activa-se, que as condensações se formam para se resolver
em aguaceiros, precedidos e acompanhados de descargas elec-
tricas mais ou menos fortes. Com os ventos nocturnos - o Ara-
caty-assim chamado por soprar do litoral pelas varzeas do Ja-
guaribe, ou de Aracaty-assú pela ribeira do Acarahú, —as nu-
vens se dissipam ou se resolvem promptamente, voltando a at-
mosphera a serenidade habitual.

(1) Para se poder melhor conhecer a distribuição diaria das


chuvas no decurso dos ultimos 50 annos organisei as seguintes
tabellas, que embora não sejam rigorosamente exactas, em re-
lação a alguns mezes de verão, habilitam ao leitor curioso a ti-
rar as suas deduções. Juntei a cada mez as phases da lua, no
pensamento de verificar a influencia que ellas podiam exercer
sobre a intensidade das chuvas. Depois de um trabalho minuci-
oso é paciente cheguei as conclusões que vão adiante.
Das tabellas relativas a descriminação das chuvas por dias
e noites, que só obtive depois de escripto este capitulo, parece
resultar contradicção entre o que affirmo sobre a maior fre-
quencia das chuvas a noite e pela manhã comparadas as do dia.
As tabellas comprehendem como dia o decurso de 5 h. da ma-
nhã as 6 da tarde : e é precisamente entre 3 e 6 h . da manhã e
de 8 da noite as 3 da madrugada que as chuvas são mais fre-
quentes e pesadas.
As tabellas descriminando as chuvas por dia e noite vão
adiante.
27
225

309
22 23 24 26 28

26
27 29

88
31 TOTAL

dias 111

3732
676
22 47
80
10
10 15

1725
99

LO 10 15 45 5 25 120
10 6.7 0.1 20 56.8
10
10 45

36 2 19 34 27 335
Tabella
.6
n4

dias
De
chuva
de
ep
.da
lua hases

guinte :

computado.

CRESCENTE
NOVA
LUA LUA
CHEIA MINGUANTE

MEZES
dias .
mill dias
.
mill dias
mill dias mill
.

Janeiro 109 1.046.6


71 707.5 94 1.204.2 1.135.3
guante, 81 dias e 1.135 mill.

Fevereiro
148 2.3
2.1
16638.
57.5
3 136
2.157.3
18 1.921.9
Março 204 3.586 219
3.5
20795.3 217
4.505.0 4.137.3
Abril 114 2.5
164
2.1
3.0
131
2.8 99.
95 53
76
64.5
Maio 2.98
178
3.21
195 2.8
1 3.0
2.9
184
17920
39
Total 11.870.6
720
12.518.2
770 13.039.5
822
13.009.7
749

Junho 143 2.048.1


1.351.8
121 113 1.158 134 1.654.2
Julho 73 747.3
67 664.1
66 589 641.1
Agosto 36 262.8
38 283.4
54 235 60
69 452.0
Setembro
50 254.5 42 210.3
44 157.1
50 151.6

Total 15.831
1.072 14.380.21.099
988
1.06215.908.6
16.078.6
315

Neste quadro os dias das phases são precedidos e segui-


dos de 3 outros dias. A phase cae no 4º dia, sendo de 7 o total
da lua cheia, em 94 dias, cairam 1.204 mill .; nos do quarto min-
phase : nos do quarto crescente, em 74 dias, houve 707 mill.: nos

Vêem-se mais facilmente essas differenças na tabella se-


Do conjuncto das observações deduz- se que no mez de Ja-
neiro os 7 dias da lua nova, 3 antes e 3 depois da phase, dão
1.046 mill. de chuva, caindo o maximo nos 3 dias anteriores a
15.414.8
316

3.075. 5
CHEIA
GUANTE

890
172
AIN-

mill
M

3.577.2
259
dias

155
219

13.799.7
85
CRESCENTE

876
AHEIA

mill
.
C

dias

15.032.S
3.689.3
4.817.3
3.122.7
2.716,3

687.2
CRES-
NOVA

79
1
mill
CENTE

$
A

.
TABELLA
RESUMO

181

14,369,5
MINGUANTE

dia
DA
65
:

879
mill
AOVA

.
N

dias

194

As duas tabellas anteriores, referidas aos mezes de Janei-


ro a Maio, não concordam completamente, porque a 1ª parte
do dia da phase para o seguinte, a 2ª de 3 dias antes para 3
depois da phase. Os dados da segunda são intermediarios en-
tre as phases.
Pelos da tabella 64 a frequencia das chuvas se manifesta na
Lua cheia (Janeiro a Maio) 822 dias 13.939,5 mill.
6.
Quarto minguaute ( ) 749
99 94 13.009,5
Lua nova ( 66 ) 77 0 ་་ 12.518,2 .
Quarto crescente ( 66 ) 710 .. 11.870,2
317

PELA TABELLA 65
66 66 .6
Cheia a minguante ( ) 890 15.414,8
66 66
Nova a crescente ( ) 879 15.052.8
• 66 14.369,5 .6
Minguante a nova ( ) 879
66 ) 876 66 13.799,7
Crescente a cheia (
Resulta dessas observações que a lua cheia exerce mani-
festa influencia sobre a frequencia das chuvas, sendo no quarto
crescente que ella apresenta o minimo .
Comparando -se este resultado com o achado pelos obser-
vadores, que mais tem estudado esta questão - Schübler, Pil-
grim e Glaisher, vê -se que ha concordancia em relação a fre-
quencia das chuvas na lua cheia, divergindo quanto aos quar-
tos .
Para se verificarem essas conclusões dou em seguida o re-
sumo das observações alludidas.
Numero de dias de chuva em 20 annos :

Da lua nova ao primeiro quarto ... 764


Do primeiro quarto a lua cheia .. 845
Da lua cheia ao ultimo quarto .... 761
Do ultimo quarto (minguante ) a lua nova ……. 696

O maximo apresentou- se entre o primeiro quarto (crescen-


te ) e a lua cheia, o minimo entre o quarto minguante e a lua
nova. Examinando separadamente os dias, Schübler achou que
para 10.000 dias chuvosos, houve na
Lua nova .. 306
Quarto crescente .. 325
Lua cheia .... 337
Quarto minguante ... 284

Observações feitas durante 20 annos em Munich, Stuttgart


e Augsburgo por Schübler.
Em Vienna d'Austria, Pilgram notou em 100 observações
da mesma phase :
Lua nova.. 26 chuvas
Medias dos dous quartos .. 25 66
Lua cheia ... 29

Gasparin, comparando as observações feitas em tres pon-


318

tos da Europa, Paris, Carlsruhe e Orange, achou que do quarto


dia depois da lua nova ao quarto depois da lua cheia caem :
Em Paris ... 612 chuvas
66 Carlsruhe 674 66
66 Orange 342 66
No minguante até o quarto dia depois da lua nova cae
apenas :
Em Paris 578 chuvas
Carlsruhe . 630 69
313 66
Orange
Estes resultados. pondera Flammarion , concordam em mos-
trar que chove mais entre o primeiro (crescente) quarto e a
lua cheia do que em outro qualquer tempo.
Alargando as observações Schübler achou :

NUMERO DE DIAS EM 16 ANNOS

Serenos Cobertos Chuvas em "/ m す


3598

Lua nova . 31 61 674


Quarto crescente .. 38 57 625
4 dias antes da lua cheia .. 25 65 679
Quarto minguante . 41 496

Glaisher reunio na Inglaterra, 19726 dias, de 10 de Janei-


ro de 1815 a 12 de Janeiro de 1869 ; e verificou que a idade da
lua exerce influencia sobre a frequencia e intensidade da chu-
va. As chuvas mais copiosas cairam do vigesimo primeiro ao
vigesimo sexto dia da lua e do quinto ao nono ; as mais fra-
cas vieram na lua nova.
A chuva é mais frequente durante a semana que precéde
e segue a lua cheia, e menos frequente durante a primeira e a
segunda semana de lunação : o maximo precéde a lua cheia e o
minimo a nova.
No perigeo chove mais do que no apogêo.
Flammarion, procurando reconhecer a influencia da lua
sobre à atmosphera , pergunta ;
Qual a natureza desta acção ? Não é uma maré aerea ana-
319

loga a do oceano, como acabo de mostrar. Será uma acção calo-


rifica ? Segundo as esperiencias minuciosas de Melloni, Piazzi,
Smyth, lord Rosse, Marié Davy, o calor dos raios lunares que
attinge ao fundo da atmosphera, que respiramos, é apenas
igual a 12 milionesimos do gráo. No pico de Tenerife, sob cama-
da menos espessa da atmosphera, achou -se que elle era igual
ao terço do de uma véla collocada a 4 m, 75 de distancia. E ' fra-
quissimo. Mas se os raios calorificos da lua são apenos sensiveis
aqui, não acontece o mesmo com os luminosos , que são assas
intensos para dissipar a obscuridade das noites, e dos seus raios
chimicos que são sufficientemente poderosos para permittir pho-
tographar instantaneamente e com as suas minucias a geogra
phia do nosso satellite. Assim, se dividirmos o espectro lunar
(como o solar) notaremos que, das tres especies de raios, os
mais fracos são os mais lentos, os calorificos. e que a intensi-
dade vai augmentando da esquerda para direita do espectro ,
sendo a sua luz mais forte do que o seu calor, e seu poder chi-
mico mais forte do que os dous.
Pode-se, pois, admittir que a lua tenha influencia chimica
sobre as delicadas reacções que operam durante a noite nas
folhas e orgãos vegetaes. Pode-se tambem admittir que nas
alturas aereas, dadas certas situações das nuvens em que baste
uma causa extremamente fraca para as modificar, a Lua as
pode comer, como diz o proverbio popular. Eu mesmo observei
algumas vezes nas minhas viagens em balão, que certas nuvens
se dissolvem rapidamente a influencia da lua cheia,
Flam. Atmosphère-pag. 779-81.
3

6
11 71
I
}

Chuvas
Fortaleza
na
General
rua
Sampaio
.a
195

1895 1896 1897 1898

Total
Noite
D.
Dia
Total

Janeiro 11 52.8
38.6
14.2
3
2
79.5
9.5
82
8.8
7 16.3
Fevereiro 14 79.5
254.8
14
80.7
56.5
15
334.3
24.6 73
56.1
16.5
Março 257.1
84.6
172.5
18
578
430.8147.3
23
105.5
54.2
51.3
15
Abril 48.2470.1
421.9
28
128.2
336
25
358.3
19
464.2
64.7
423 1 10 10
Maio 553.1
24
43.8
209.3
18
426.1
73
109.4
257.6
22
253.1
367
Junho 29.9262.8
232
16
176.7
17
104.2
11.1
93.1
13
242.2
65.5

68 .4483.21705.6
1222
99
1533
1139.5393.5
104 204.3

Julho 187
18 78.3
15
265.3
93
68.5 32
139.5
11
161.5
171.5 .5 0.5
Agosto 15
45.6
16
56.7
104.5
10
60.5 161.2
4
16 5 21 4.5
Setembro
16.2
7 22.7
5.5
6 31 31.0
5 29 29 1 8
Outubro 14.8
29.8
1
8
65 13 13 27 27 2.6 2.6
Novembro
4
8
.63.4
]16
47.4 8 8 5 9 1.5 1.5
Dezembro
1
11.5
10.3
4
1.2 2 4 4 12 8.6
23 31.6

139.9453.2
312.4
161
42
173
97
164.5
26
376.7
203.7 261.5
22 9.6
39.1 48.7
321

129 1461312.5597.2
1909.7
580.21967.1
1386.9
125 253.5
322

CHUVAS NO SERTÃO . - Salvo as rapidas referencias feitas


ao regimem pluvial das serras e do sertão, o que ficou escripto
diz respeito somente a cidade da Fortaleza ou ao litoral.
No sertão o regimem pluvial differe consideravelmente.
não se lhe devendo applicar a taxa do litoral senão com o aba-
timento de 40 a 56 % , isto é, com a minoração de metade ou
menos.
O quadro da quantidade das chuvas em Quixeramobim ,
Quixadá e Icó, comparada com a da Fortaleza, mostra nitida-
mente as respectivas variantes. Assim nos annos de 1896 a 1899
e 1901 a 1905, cujos registos estão completos, o total recolhido
foi de 12.591 mill. na Fortaleza
5.774 66 em Quixadá
5.528 .6 " Quixeramobim.
7.444 .. no lcó.
Ha, portanto, diminuição nas precipitações pluviaes a pro-
porção que o lugar tomado por termo de comparação se dis-
tancia do litoral. A razão de ser disto procede do maior tra-
jecto que as nuvens humidas, de chuvas, têm que fazer atra-
vez de regiões aquecidas, nas quaes ellas ( nuvens ) perdem par-
te do vapor e a menor capacidade de se condensarem. ( 1 ) Obser-
va-se mesmo que a differença para menos cresce quando o
anno anterior foi secco, e o solo ficou despido de vegetação,
contendo menos humidade.
A quantidade annual de chuvas no sertão é de 44 a 59 %
da registada na Fortaleza. Em torno desta media, os desvios
são fracos : o parallelismo, guardada aquella proporção, man-
têm -se quasi uniforme entre as tres estações escolhidas, como
se verá melhor da seguinte tabella :

( 1 ) Flamarion capitula este phenomeno como uma lei meteo-


rologica "uma segunda lei, diz elle, nota-se na proporção das
chuvas é a sua diminuição segundo a distancia do mar, me.
dida na direcção dos ventos dominantes. E' facil comprehen-
der que as nuvens não se podendo mais reformar no interior
dos continentes, tornam - se cada vez mais raras e dão tanto me-
nos chuvas quanto mais afastadas do Oceano. A evaporação
produzida nos rios, lagos, lagoas, planicies humidas, dá nasci-
mento a nuvens. mas como insignificante fonte de chuva com-
parada a do Oceano.
(Flamarion - L'atmosphère, pag. 630.
323

FORTALEZA QUIXADÁ QUIXERAMOBIM ICÓ

Dias Mill. Dias Mill. Dias Mill. Dias Mill .

1891 86 832 79 344.5


1892 91 1.268 . 99 598.4
1893 122 1.564.8] 86 760.1 50 960
1894 163 2.726.3 115 1.367.9 68 1.344
1895 172 2.404.9 105 1.191.4 58 1.001

Total 634 8.796 . 484 4.262.3

1896 133 1.899.3 60 833.6 69 890.6 59 1.061


1897 109 1.943 . 78 1.257.2 80 1.022.1 47 1.095
1898 78 511.8 32 303. 41 433.3 39 741
1899 147 2.770.5 53 749.5 90 1.048.5 67 1.219
1900 64 563.5 [ 2] [ 9 ] 37 438. 36 617
1901 115 1.539.5 56 655 . 58 635.8 52 789
1902 101 877.4 38 341.4 46 342.9 50 726
1903 66 784.5 27 369.8 32 313.4 27 526
1904 95 1.132 . 35 637 .5 37 458.1 46 615.5
1905 97 1.133 . 53 627.9 51 383.3 46 601.5

Total 1.005 13.154.5 432 5.774.9 541 5.966.0 469 7.991

91-905 1.639 21.950.5 918 10.046.2

Nos 9 annos de 1896 a 99 e 1901 a 905


DIAS CHUVA
Fortaleza 941 12.591 ( 100. %
Quixadá 432 5.774.9 45.8 %

Quixeramobim 504 5.528 43.8 %


Icó .... 433 7.374 59 .
[ * ] Excluido da somma total.
324

Pela tabella anterior parece que o Icó faz excepção a esta


regra, pois ficando a distancia do litoral mais ou menos corres -
pondente a Quixeramobim, recebe, comtudo, maior quantidade
de chuva, cerca de 38 % mais . A razão deste phenomeno pa-
rece obedecer a duas cousas primordiaes -a primeira decor-
rente da planura do valle do Jaguaribe pelo qual as nuvens
carregadas do vapor são levadas sem tropeço até encontrarem
o primeiro obstaculo ; a segunda pela barreira da serra do Pe-
reiro e Camará que forma a cinta circular ao poente do Icó.
e serve de anteparo a transposição de parte dos mesmos va-
pores, que ahi se condensam e se precipitam .
325

As variações annuaes das chuvas no sertão, pelo breve de-


curso das observações recolhidas, são menos amplas do que no
litoral . Entre o anno mais escasso e o mais chuvoso, em Quixe-
ramobim-a differença é de 313 mill. para 1048 - cerca de 331 %;
em Quixadá é de 303 mill. para 1367 - cerca de 451 % : no Icó
de 470 para 1344 ou 350 %, e na Fortaleza de 511 mill. para
2-726-5-cerca de 533 %.
As variações mensaes absolutas são de 0 para 285 em Qui-
xerambim. O para 324 no Quixadá, 0 para 315 no Icó, 0 para
893 na Fortaleza . Referida ao mesmo mez, em annos diffe-
rentes, a maxima amplitude occorreo em Quixeramobim, de
Dezembro de 1900 [ 167 mill. ] a Dezembro de 1901 ( 0 ), e em
Maio de 1897 ( 285 mill. ) a Maio de 1905 [20 mill. ] ; no Qui-
xadá em Fevereiro de 1899 caíram 358 mill. contra 22 mill. em
1892 ; em Dezembro de - 1893-113 mill. -contra 0 em muitos
annos no Icó -0 em Dezembro ( 94. 97. 99. 901, 904 a 5) para
Dezembrode 1900 ( 195 mill. ) : 0 em Novembro para 135 em No-
vembro 1894: 28 em Fevereiro de 1908 para 351 em Fevereiro de
1899 ; na Fortaleza 823 mill. em Abril de 1894 contra 14 mill .
em Abril de 1900 : 335 em Janeiro de 1894 contra 0 em Janeiro
de 1885, 1875 e 1855.
As variações diarias são naturalmente maiores no litoral, onde
ha exemplos de chuvas diluviaes de 240 mill. em 24 horas . ( 1 )

[ 1 ] Eis o registo das chuvas de mais de 100 millimetros na


Fortaleza :
244 mill. 20 de Março de 1870 - em 11 horas .
240 .. 16 .. Abril .. 1855 -de 12 h. da m.
as 6 h . m . o
pluviometro
transbordou.
186 .. 24 de Janeiro .6 1894- de 3 h . m. até
12 h . t.
180 66 21 Março .6 1866
::::::::::

178 .. 27 Fevereiro 66 1899


156 46 15 Fevereiro "6 1851
151 28 Março ་་ 1866
148 1 Abril 66 1892
146 66 30 66 1899
Março
145 66 1 Abril ་་ 1893
144 14 Março 66 1896
143 66 14 . Maio 1880
140 15 " Abril 1866
326

A distribuição horaria das chuvas em Quixeramobim, de


1896 a 1905. segundo a tabella nº 68 mostra que no primeiro
semestre o maximo das precipitações cae das 4 para 5 h. da
manhã [ 6,3], havendo um segunde maximo entre 8 e 9 h. da
noite ; o minimo das 11 para 12 h. da manhã . No segundo se-
mestre o maximo cae entre 12 e 1 h. da madrugada e o minimo .
as 8-9, 10 as 11 m. e 3 as 4 da tarde.

140 mill. 266 Abril 66 1854


138 66 23 . 66 1887
Março
135 66 12 Abril 66 1885
135 6 " Maio 1851
LL
2323
132 6 . Dezembro 1861
130 66 18 .6 Abril 66 1851
129 66 19 Maio 66 1894
127 66 29 .. Março 1874
127 6. Janeiro 66 1903
126 .. 24 " Janeiro 1883
124 66 66 Abril 1895
120 6. 1466 Abril 1857
114 11 + Fevereiro 66 1851
112 66 166 Abril 66 1887
110 13 " Abril 66 1856
110 28 6 Março 1899
108 66 12 W Abril 1863
108 7 .6 Abril 66 1873
108 66 26 " Abril 1883
107 2466 Dezembro 66 1871
107 66 3 Março 66 1904
106 66 21 Abril 1894
105.7 66 6 6 Fevereiro .. 1857
105 7.66 Março 1899
105 66 8 ". Maio 1854
104 66 25 " Março 66 1872
104 . 66 24 6 Abril 66 1880
103 26 56 Março 66 1887
102 +6 24 66 Maio 1873
100 . 16 Abril .6 1864
100 6. 29 66 Março 1855
100 • 7 .. Fevereiro " 1856
100 1 "
. Abril 1856
100 4 " Fevereiro " 1872
100 .6 1 . Março 1872
100 66 1 . Março 1873
100 22 . Março 1883
327

Das chuvas superiores a 100 millimetros caíram em :


Janeiro ... 3 186 em 94-127 em 903-126 em 83.
Fevereiro . 6 178 em 89-156 em 51-114 9m 51-105 em
57-100 em 56-100 em 72.
Março .... 16 244 em 70-180 em 86-151 em 66-146 em
99-144 em 96-138 em 87-127 em 74—
110 en 99-107 em 904-105 em 99-104
em 72-103 em 87-100 em 55-100 em 72
-100 em 83 .
Abril ..... 18 240 em 55-148 em 92-145 em 93-140 em
66-140 em 54-135 em 85-130 em 51-
-124 em 95-120 em 57-112 em 87-110
em 56-108 em 63-108 em 73-108 em 83
-106 em 94-104 em 80-100 em 64-100
em 56 .
Maio ..... 5 143 em 80-135 em 51-129 em 94-105 em
54-102 em 73 .
Dezembro . 2 132 em 61-107 em 71 .
50 chuvas.
Destribuidas pelos seguintes annos temos :
1851 1 chuva com 535 mill .
1854 2 66 66 244 66
1855 2 .6 66 340 66
1856 2 66 200 66
1867 1 105 66
1861 1 132
1863 1 108
1864 1 66 100
1866 3 471 66
1870 1 244 66
1871 1 107
1872 3 304
1873 3 400
1874 1 127
1880 2 247
1883 3 334 66
1885 1 135 66
1887 3 353 66
1892 1 148 66
1893 1 145
1894 3 421 66
1895 1 124 66
1896 4 144 66
1899 4 66 66 539 .
1903 1 66 66 127
1904 1 107 66
1

1
329

Por esta tabella (68) evidencia-se que as chuvas são muito


mais frequentes a noite, isto é, entre o pôr e o nascer do sol,
do que durante o dia, embora as condensações sejam maiores
uas horas mais calidas.
A tabella seguinte (69) particularisa esta distribuição, dan-
do a porcentagem do dia e da noite por cada mez nos dez
annos de 1896 a 1905.
Distribuição das chuvas em Quixeramobim.

MILLIMETROS PARA O DIA E A NOITE

Noite Dia
Total da chuva ca-
MEZES
Mill. Mill. ída em mill. %
% %

71784
Janeiro 225.4 53 197.4 47 422.8
Fevereiro 458.5 49 519.0 51 977.5 16
Março 1.095.1 68 523.1 32 1.618.2
Abril 690.2 64 380.9 36 1.071.1
Maio 518.6 64 285.7 36 804.3
Junho 325.3 75 107.5 25 432.8 7
Julho 182.9 71 49.0 29 231.9 4
Agosto 82.2 63 49.1 37 131.3
Setembro 14.9 68 7.1 22.0
Outubro 0.9 43 1.2 2.1 1
Novembro 5.5 45 6.7 55 12.2
Dezembro 207.8 88 27.3 12 235.1 4

10 annos 3.807.3 64 2.154.0 36 5.961.3 100

ESTAÇÃO CHUVOSA. - Nos dez annos ( 1896 a 1905 ) houve


quatro de inverno e seis seccos : n'aquelles as chuvas começa-
ram do meiado de Janeiro ao de Fevereiro, e terminaram entre
Julho e começo de Agosto. Verdadeiramente só se deve contar
com a estação invernosa quando o rio começa a correr e o fim
quando cessa a corrente.
A bondade do inverno afére - se pelo lapso de tempo de-
corrido entre estes extremos. Assim. pelos dados abaixo, o me-
lhor inverno foi o de 1899, no qual o rio Quixeramobim come-
çou a correr a 9 de Fevereiro, cessando de o fazer a 6 de Se-
330

tembro, tendo durado portanto 6 mezes e 29 dias, ( como da


tabella nº 69 ) .
Sem querer alongar estas informações, junto os dados com-
parativos dos phenomenos meteorologicos observados em Qui-
xeramobim . Por estes dados grupados no sentido de salientar
os annos chuvosos dos seccos, ver- se-ha que as suas indicações
fornecem elementos valiosos que permittem tirar- se previsões
mais ou menos proximas em relação ao phenomeno capital das
seccas. Por ora são factos, em si preciosos, cujo aproveita-
mento futuro muito concorrerá para a solução do grande pro-
blema cearense, se como pensava Laplace -a menor molecula de
ar está sujeita nos seus movimentos a leis tão invariaveis quanto as
que regem os corpos celestes no espaço.
E' mister, portanto, para se attingir o desiderato do autor
da Mecanica celeste que as observações se multipliquem, se ge-
neralisem por innumeros pontos da superficie terrestre, se tor-
nem simultaneas e successivas, em ordem a ser compara-
das, seguidas em suas modalidades e afinal darem a conhe-
cer as suas causas ou antecedentes proximos.
No pensamento de recolher as observações, que correm es-
parsas em jornaes antigos e outras, que me foram communica-
das particularmente, reuni nas seguintes tabellas as que che-
garam ao meu conhecimento.
Imperfeitas, fragmentadas e sem a precisa continuidade,
ellas confirmam a lei da menor frequencia e quantidade de chu-
vas a proporção que ellas se afastam do litoral na direcção dos
ventos reinantes.
NVEMBRO DEZEMBRO ANNO TOTAL ( 1)
27222

Dis Mill . Dias Mill. Dias Mill. Dias Mill.

0.4 2 79 344.52 89 338.9


9 12.7 131.2 99 598.46 89 598.8
4 13.1 113.5 86 760.10 78 756.4
3.1 24 95.0 115 1367.96 115 1139.2
44.0 20.0 105 1191.40 105 1195.1
60 833.60 55 863.6
78 1257.20 1275.7
885330

78
6 23.0 32 303.00 32 312
53 749.50 56 837.5
(*) 2 (*) 9.00 18 149
2 56 655.00 57 680
4.0 341.40 37 378
27 369.8 38 405.4
1 4 637.5 41 659.7
3.1 3 16.2 627.9 69 628.1
54665.4 76 665.5

24 80.4 35 406.9 972 10311.74 1033 11073 .9


7
3.4 11.49 3.8 H.49 64.66 702.66.65.3 680.2
?
Tabella
73
.n
Chuvas

.Aracoyba
Camara
João
Coronel
pelo
registada

1882 1883 1884 1885 1886 1887 1888

.Dias
.Dias
Mill D ias
Mill
.Dias

Janeiro 3 13
27 121
14 50 133
610 129 14
Fevereiro 144
15 193
10 84 109 4 67 9 64 32
Março 12 20
160 316
17 216 309
20
35 14 248

ཁྐྲ ོ མྦྷ
Abril 18 250 16 234
16 318 45
54
2095 19 316 39
..
Maio 17 305
7 156
5 91 204
9 86 81 14
Junho 15 166
5 37 4 61 1 6 94 14 26


13ཎྜཌ ཧྨ

semestre
.1º 73 1.057
76
1052
66 820 43 1.238
69
815 882 28 238

082878 R
ིི

348742 G

LOCUST 8
74R72 85

Julho
. + 11 36 3 11 39
21
68888

Agosto
. 54 29 i4

+++
==
.
Setembro 3
Outubro
.. 3 6 2 2
Novembro
3 10 13 4 39 3 9
848180

33124
Dezembro 7 4 42 11 68 1
22222+
262

semest

. re 14
125 2 10
13 43 13 129 21 125 8
39 17
331

Total 1.171
87 1.066
78
79 863 56 944 1.363
90
36
60
921 255
8
2188
332

Tabella n. 75.

Chuvas em Porangaba .

1893 1898 1899 1900 1901 1902

Dias

Dias
Dias
Dias
MEZES

Dias

Dias
Mill

Mill

Mill
Mill
Mill

Mill
.
.

.
.

.
Janeiro ... 9 16 13 91 8 51
Fevereiro 14 62 21 466 10 84 15 285
Março 11 144 27 576 7 82
Abril . 19 262 23 501 4 15 19 454 15411
Maio 9 50 20 420 6 11 14 351 10159
Junho 2 8 16 145 8 54 9 156
Julho .. 7 163 5 53
Agosto 14 188 54
Setembro . 6 18 5 24
Outubro 6 15
Novembro ,
Dezembro . 10 ‫ان‬ 4 24

1º semestre 82 1296 56 537 120 2199 42 302


2º 66 18 147 18 77 37 408

Total . 100 1443 74 614157 2607

Chuvas ao norte do Ceará .


ANNOS

Pitombei- S. Qui-
Camocim Granja Sobral
ras teria
Dias

Dias

Dias
Dias

Mill
Mill

Mill
Mill

Mill
.
.
.

.
.

1892 40 415 57 714 35 633 53 767


1893 65 1016 89 1427 84 1257 92 1365
1894 67 * 1504 * 611 1240 * 56 * 844 * 85 * 1266 1342

(*) 1º Semestre somente.


1904 1905 1906 1907 1908
FREE

22-764
5.5 11 157.5 8 46.5 12 126.5 36 . 10 212 .
Jan3.5
15 216.5 9 172.5 13 193.0 12 233.5 15 291.5
Fev1.5 24 250.5 12 26.5 24 367.5 9 118 . 1
Ma5.0 15 343.0 13 156 . 14 181. 17 394 .
Ab.5 12 118. 18 357 . 3 55 . 141.5
Mai . 6 107 . 19 189 . 9 202.5 33.5
Jur

8
88

83 1.192.5 79 947.5 75 1.125.5 50 956.5


103.
001040

42200
1. 2 47.5 8 86 . 3 32.5 5 129 .
Jul 1 5. 5 104.5 7 24 . 10 34.5
***

Ag) . 4 19 . 5 21 . 17 133 . 11.5


Se3.5 3 9.5 4 18.5 6.
43

Ou1 . 4 16.5 24.5 4 20 . 3 16 .


Nc3 . 10 106.5 3 14 . 8 119 . 3 19 .
De
2579

135
**

3.5 24 204 . 250 43 347 . 25 216


203.0 83 1172.5 947.5 75 1.125.5 50 956.5

19

1.5 107 1.396.5 104 1.197.5 113.1.472.5 75 1.172.5


A
86

Mill.

1.397

1.363
333

CHUVAS E SUAS CAUSAS NO CEARÁ. - O Ceará jaz no li-


mite meridional da zona das sub calmas equatoriaes, onde se
opera o encontro das correntes atmosphericas ou ventos geraes,
chamados alisios. Esta zona abrange 3 a 5 gráos de latitude.
sendo pelas constantes estagnações aereas sujeita a altas tem-
peraturas, saturadas de densos vapores, que a tornam de peni-
vel habitabilidade. ( 1 ) Acompanhando a marcha apparente do
sol, ora se desloca para norte, ora para sul, afflorando em cer-
tos annos as extremas norte e noroeste do Ceará ou o envol-
vendo em sua faixa de calmarias e de espessas condensações.
E' bem de vêr- se que a coincidencia deste ultimo pheno-
meno com a estação pluviosa, no Ceará. nos dá a explicação
clara e precisa das suas causas proximas. Si, porém, a zona das
calmas se desloca para norte, transpondo as latitudes septen-
trionaes desta região, os ventos, soprando em sua generalida-
de parallelamente a costa, sem anteparos de serras ou de cor-
rentes oppostas, impellem as evaporações pelasgicas até o pon-
to de resistencia, onde vão avolumar as condensações locaes,
satural-as de humidade, a se resolverem em precipitações
aquosas. Talvez que alem do agente mechanico dos ventos,
outros factores, mal conhecidos ou apenas entrevistos, coope
rem para formação desta zona de chuvas torrenciaes.
Parece não ser estranha á deslocação periodica desta zona,
a marcha ascendente e decrescente das manchas solares, cuja
ligação com os meteoros electricos já constitue uma acquisição
importante para sciencia. Não sendo aqui a melhor opportuni-
dade para elucidar tal assumpto o consigno tão somente como
ponto interrogativo.
Abro um parentheses para transladar as opiniões de dous
illustres cearenses sobre as causas deste phenomeno .
O conselheiro Alvaro de Oliveira, na Memoria sobre seccas do
Ceará, manifesta -se nos seguintes termos :
"Normalmente chove de Janeiro a Junho, pouco nos tres

(1 ) A zona media das calmas equatoriaes ( comprehendida


entre o 2º e 4º de latitude N e S ) é onde, durante o anno, inin-
terruptamente, alternam fortes calores e calmarias com bate-
gas pluviaes e tempestades nocturnas. Ao lado desta zona ha
outra (4° a 10 ° de Lat. ) onde este estado se não apresenta se-
não no verão ou no inverno, e o alizeo traz céu sereno.
Flamarion - L'atmosphere, pag. 486 .
334

primeiros mezes. mais abundantemente de Abril a Maio ; em


Outubro caem as chuvas de cajú, principalmente no litoral e
no valle do Cariry. Os ventos dominantes nos annos regulares
são : no inverno ( Janeiro a Junho) dos quadrantes SO e NO ;
no verão (Julho a Dezembro) dos quadrantes NE e SE. ( 1 )
"As latitudes, que abrangem o Ceará, são : 2º, 45′ e 7° 11′
sul.
"A periodicidade mais ou menos regular das chuvas ex-
plica-se facilmente pela circulação intertropical da atmos-
phera.
"O ar aquecido na zona equatorial, dilatando -se, sobe e se
divide nas partes superiores em duas correntes dirigidas para
os polos ; ao passo que, nas camadas inferiores da atmosphera,
outras correntes se estabelecem das regiões temperadas para o
equador.
"Em virtude do movimento de rotação de O para L do
nosso globo, as camadas inferiores do S. e do N. para o equa-
dor, tomam respectivamente as direcções S. E. para N. O. e
N. E. para S. O., e as correntes superiores as direcções de N. O.
para S. E. e de S. O. para N. E. As primeires [ as inferiores ] são
os alizeos, as segundas [ as superiores ] os contra-alizeos : Cada
alizeo de S. E. ou N. E. e o respectivo contra- alizeo de N. O. e
S. O. formam um circulo de cada lado do equador thermico.
"A massa do ar, que se eleva perpendicularmente á super-
ficie da terra na região equatorial e a qual vem ter os alizeos
dos dous hemispherios, chama -se a zona das calmas equatoriaes,
Esta zona é mais ou menos irregular na superficie do Atlanti-
co e no Pacifico, longe das correntes maritimas e das costas,
mas na visinhança das correntes, principalmente do Gulf Stream
e nos contínentes a zona é muito regular, não só nas dimensões
e inflexões, como nos deslocamentos de um e outro lado do
equador, divido a excurção annual do sol.
"E' claro que os ventos aliceos e contra-alizeos não tem pelas

(1) Ha engano nesta affirmação . Os ventos reinantes, con-


forme o registo da Estação meteorologica da Fortaleza. como
ficou dito, são de Abril a Junho o S. E.: de Julho a Agosto S.E.
e o E. S. E .: de Setembro a Dezembro o E.S. E.: o E. de Janei-
ro ʼn Março - o S. E. , o E. S. E.; em Março o E. S. E. e o
E. N. E.
335

mesmas causas, que alteram as zonas das calmas, a regularida-


de que ellas apresentariam, se a superficie da terra fosse uni-
forme.
"Grande parte do Ceará está em latitudes, que são alcança-
das pela zona das calinas, em sua oscillação do lado do Sul do
equador. (1 ) Em virtude das diversas influencias, que aponta-
(
mos, aquella zona não se acha no hemispherio austral senão
de Janeiro a Junho , em vez de Outubro a Março, como devia
acontecer, se só o movimento de rotação da terra determinas.se
o movimento oscillatorio
"A estada da zona nas calmas sobre o Ceará coincide com
o que se chama o inverno naquella provincia. As chuvas caem
por este tempo , porque os ventos alizeos de S E, que se carre-
gam de vapores aquosos, atravessando o Atlantico, vem es-
barrar na zona de calmas, onde os vapores se condensam e se
resolvem parcialmente em chuvas.
"Mas parte dos vapores condensados é levado sobre a for-
ma de nuvens pelo contra - alizeo de N O na direcção de S E.
Se então parar de S E, esse contra- alizeo se abaixará ; e as nu-
vens se resolverão em chuvas, em todas as paragens onde as
circumstancias forem favoraveis a tal resolução ; isto é, ( 2)

(1 ) Esta affirmação é completamente erronea, porque a ZO-


na das calmas, nos annos de maior deslocamento para o sul,
mal attinge o equador : fica ao norte deste.
O que se dá é uma sub- zona de ventos menos velozes, de
que nos falam alguns meteorogistas e da qual adiante me occu-
parei.
(2 ) Não posso comprehender bem o alcance desta demon-
stração. O contra-alizeo é o ar dilatado , aquecido nas camadas
inferiores da atmosphera em contacto ou proximo a superficie
solo, e que por sua expansão e leveza se eleva as regiões su-
periores tomando direcção contraria a dos alizeos, frios e baixos.
Parece plansivel que na sua marcha ascensional o contra-alize)
vá deixando atravez da atmosphera parte do vapor quente sob
a forma de nuvens. No caso, figurado, de uma paralisação das
correntes aereas, a evaporação augmentaria até a saturação
atmospherica, donde ao menor agente condensador nas cama-
das superiores desta, a precipitação sob a forma de chuva.
Esta condensação opera -se. não pela parte inferior da nuvem ,
mas pela superior á acção dos cirrus gelados que determinam
o abaixamento da temperatura .
336

onde houver abaixamento da temperatura, augmento de pres-


são ou nova formação de vapores. A parada do alizeo poderá
realisar-se, alem de outros casos, se houver no solo cearense,
mesmo por causa das chuvas continuadas um abaixamento de
temperatura, que venha obstar a chamada do ar dos tropicos
para o equador- chamada essa que é precisamente o que pro-
duz os ventos alizeos,
"Além das causas para a chuva no Ceará- presença da zo-
na das calinas e abaixamento do contra-alizeo de N O ( 1 ) pode
cair a chuva em consequencia de correntes de ar, da terra
para O mar em relação á terra. Quem souber que o Gulf
Stream acompanha a costa do Ceará, no rumo que vae do cabo
de S. Roque ao mar das Antilhas, não se admirará do esta-
belecimento destas monções, as quaes vindo ao encontro dos
aliseos, determinam a subida e, portanto, a condensação dos
vapores aquosos, de que estes se carregaram no Oceano Atlan-
tico, desde o Cabo de S. Roque, no trajecto sobre a corrente
equatorial, de que faz parte o referido Gulf Stream.
"As chuvas, chamadas de cajú, são devidas as duas ultimas
causas, que indicamos .
"Eis a explicação das chuvas nos annos regulares. "
Antes desta explicação, já o fallecido Senador Thomaz
Pompeo, cuja devotação pelo Ceará não teve limites, nem mes-
mo no leito mortuario, quando arfando com as torturas de
suffocante dispnéa, endemaciado, quasi cego, escrevia em favor
do solo natal no Cearense, preconisando a açudagem, como
meio de minorar os desastres das seccas- o Senador Th. Pom-
peu havia investigado no seu precioso livro Memoria sobre o
clima e seccas no Ceará as causas determinantes das chuvas na
zona cearense.

] 1 ] Já ficou demonstrado serem erroneas estas causas. Me-


nos comprehensivel é a existencia destas monções, que o Dr.
A. de Oliveira presuppõe soprarem de terra para o mar. na
direcção , talvez, de N. W ou S. W.; occasionando as chama-
das chuvas de cajús. Nos 3 annos, 1903 á 905, de observações,
os ventos de N. W. e N. N. W. sopraram apenas 2 vezes em
Março e Abril , e os de S. S. W. 39 vezes no primeiro semestre
e nada de Setembro a Dezembro. Os factos contradizem forma-
Imnete a hypothese do illustrado professor.
337

"Os aliscos, escrevia elle, sopram constantemente dos qua-


drantes do nordeste e sueste com intensidade desde o solisticio
de Junho Pelo equinoxio de Setembro, moderam ou fazem
alguma parada. E' então que os vapores aquosos se condensam
e caem pelo litoral, principalmente nas serras as chuvas de
cajús.

"Continúam depois até o solisticio de Dezembro ; então


começam as chuvas precursoras do inverno, chamadas de Santa
Luzia e Natal, quando os ventos param ou moderam, ou mes-
mo mudam de rumo.

"Se pelo solisticio de Dezembro, os aliseos param , e reina


a calmaria, ou os ventos variam de rumo, principalmente se
sopram do oeste e noroeste, entia francamente a estação chu-
vosa.

E' principalmente nas proximidades, e depois do equino-


xio de Março, que a estação chuvosa se torna mais forte e in-
tensa.

" D'aqui vem a convicção do sertanejo, de que se o inverno


não começa francamente por S. José [ 19 de Março] a secca está
declarada.

"Isto está conforme a theoria de Maury. Com effeito, a zo-


na das calmas equatoriaes, que acarreta o annel de nuvens
equatoriaes, e oscilla ao norte e sul do equador, segundo a de-
clinação do sol, acha- se no hemispherio do sul de Março a Abril
no do norte de Junho a Agosto : e como, por onde passa o
annel de nuvens de zona das calmas, começa a estação chuvosa,
por isso nos mezes de Março a Abril, em que essa zona toca
os gráos de 2º ao norte e 4º ao sul, deve ser, e é, o tempo mais
chuvoso da estação invernosa do Ceará.

" Observando- se pois a marcha das chuvas no Ceará, não


se pode desconhecer a influencia que exerce n'esse phenomeno
a marcha do sol ou a rotação da terra, á que acompanham as
correntes aereas. Estas correntes, porem, que cortam a face da
provincia quasi parallelamente, são ora mais intensas, constan-
tes e violentas, ora menos, e mais variaveis.
" D'esses dous factos, cuja causa primordial me escapa, de-
338

pendende principalmente a maior ou menor abundancia de


chuva. (1 )

CAUSA DAS CHUVAS PELOS ALIZEOS.-"Os vapores aquosos.


que os alizeos nos quadrantes de nordeste, leste e sueste tiram
em tão grande massa do oceano e conduzem d'essa direcção, se
passassem sempre sobre o solo do Ceará, se condensariam e se
resolveriam em chuva . Mas, como se sabe, pelas leis physicas,
os vapores só se condensam quando encontram temperatura
mais baixa ou são cumprimidos. Ora os alizees de Junho em
diante se elevam consideravelmente do solo, adquirem uma vi-
olencia de 120 kilometros por hora , e não encontrando em toda
a provincia , nem grandes mattas, lagos ou rios que por sua
acção façam baixar a temperatura na altura em que os ventos
Jevam os vapores. e nem tambem serras altas que os resfriem
ou detenham a sua marcha e os accumulem e comprimam , es-
ses vapores transpõem as regiões do Ceará, e vão esbarrar nas
cordilheiras dos Andes, que os represam , ou em outras re-
giões, onde causas condensadoras, como serras altas, grandes

( 1 ) Diz Maury Geog Physica § 118 :

A forma da America do sul é approximadamente a de um


triangulo, cuja base se acha ao oeste sobre o Pacifico, formando
os dous lados um angulo recto pelo cabo de S. Roque, estes es-
tão collocados de modo que os alizeos do sueste sopram perpen-
dicularmente ao lado do sul, e os alizeos do nordeste perpendi-
cularmente ao do norte.

Estes dous ventos procedentes do Atlantico são carregados


de humidade, e deixam cahir chuvas abundantes, que nesse fa-
voravel clima desenvolvem prodigiosamente a vida vegetal e
animal."

O facto é exacto com relação a base do triangulo, que é


formada pelas serras dos Andes e outras no centro da America,
onde os aliseos vão despejar os vapores aquosos que levam : mas
a respeito da região baixa , e desguarnecida de mattas, lagos e
rios que atravessam os aliseos desde o cabo de S. Koque até as
altas serras occidentaes, as chuvas falham muitas vezes. porque
os vapores não se condensam por falta de temperatura baixa ou
de focos de condensação.
339

rios , lagoas e mattas os fazem condensar e resolver em


chuva. (1 )
Mas de Janeiro a Junho os alizeos ou baixam mais para
o solo ou moderam e mudam de rumo ; então os vapores, que
elles acarretam , achando - se em uma camada pouco elevada da
atmosphera, ficam sujeitos a maior pressão ; do attricto das
moleculas do vapor e do ar resulta a electricidade atmospherica,
que se observa por esse tempo ; e os vapores, represados pelas
serras, onde a temperatura é mais baixa, e sujeitos a grande
pressão , se condensam em cumulos e nimbus, e se resolvem em
chuva no solo da provincia.
As chuvas ordinariamente começam pela região do Ara-
ripe e Ibiapaba, e em geral pelas serras mais altas.
" A causa d'essa prioridade resulta parte do obstaculo que
a cordilheira oppõe aos ventos, quando elles baixam o seu nivel ;
e parte de serem essas serras fócos mais ou menos condensado-
res, pela temperatura baixa, que nellas reina.
" Assim pois, a proporção que a condensação do lado de
oeste e sudoeste vem se extendendo a leste e nordeste, as chu-
vas vão se extendendo tambem por toda a provincia.
" E' facto constantemente observado, que nas regiões ou
tractos de terreno mais seccos e rochosos da provincia é onde
chove mais tarde e menos. Assim, a região que fica entre a
serra do Machado ao sul, serra da Uruburetama ao norte, rios
Curú a leste e Acurahú a oeste, essencialmente pedregosa ,
semeada de serrotes baixos em campos abertos, é onde chove
mais tarde e menos, ao norte da provincia : bem como na região
central chamada -Riacho do Sangue -que fica entre o Jaguaribe
ao sul, rios Quixeramobim e Banabuiú a leste e norte e alto ser-
tão do Inhamuns ao oeste ; este tracto de terreno apresenta ca-
racteres mineralogicos semelhantes ao primeiro.
(1 ) "O elima, diz Maury [ obra citada § 42 ] de cada paiz é influ-
enciado pela extensão de suas montanhas, sua elevação, seu afasta-
mento do mar e direcção com relação aos ventos reinantes. ”
D'aqui a lei geral, que elle formula [§ 112 ].
Que " Em todos os paizes onde as estações são alternacti-
vamente chuvosas e seccas - a estação chuvosa chega, quando
esses paizes têm o vento do mar : e a secca quando o vento sopra
de terra para o mar : -isto é no 1º caso, quando os ventos domi-
nantes sopram do mar, como em Bombay durante a monosão do
sudoeste ; no 2º caso, quando o sopra de terra para mar."
340

" As condições physicas e mineralogieas desses sertões na-


turalmente influem nos phenomenos atmosphericos.
" Ambos são destituidos de mattas, pedregosos, ondulados
de serrotes ; baixos, de rochas núas, syeniticas, graniticas, quar-
tzozas. adquirem durante o dia elevadissima temperatura, a
qual deve rarefazer os vapores, dilatal-os e obstar a sua con-
densação, como succede nas regiões da Arabia, Persia, junto ao
golfo de Aden, e grande parte das regiões africanas. (1 )
" Os vapores aquosos não se elevam a grande altura por-
que a baixa temperatura das regiões elevadas as faz condensar ;
e tambem as correntes aereas que os acarretam não transpõem
grandes elevações, senão depois de terem, pela condensação,
expellido a humidade que levam nos vapores aquosos ; é por
isso que a immensa massa de vapores, que o calor intertropical
arranca do oceana , levada pelos alizeos atravez das nossas re
giões baixas do cabo de S. Roque para o norte, vae esbarrar
necessariamente nos flancos da grande cordilheira andina, onde
é represada, refluida e condensada sobre os terrenos adjacentes:
d'ahi, esses immensos rios que formam as duas grandes bacias
ao norte e sul da America meredional e oriental. " (2)

[ 1 ] Alem destas causas, que até certo ponto explicam a me-


nor frequencia das chuvas nesses sertões, accresce o seu afasta-
mento do litoral. •
Naturalmente os sertões que demoram nas proximidades
de serras ou sertões elevados que difficultam a marcha das cor-
rentes aereas, devem ser mais beneficiados por chuvas, suppos-
tas as demais condições topographicas semelhantes.
[ 2] "Os ventos dominantes da America do sul, que fazem
parte da bacia do Amazonas e de seus affluentes vem de leste .
Elles levam para ahi as chuvas, depois de se terem sobrecarre-
gado de vapores aquosos, passando sobre o Atlantico. A' me-
dida que avançam nesta magnifica região, derramam chuvas em
ondas, que muitas vezes lhes sobrevem pela evaporação. Attin-
gem assim o cimo das montanhas, que absorvendo o calor a leste
determinam a condensação acompanhadas de violentos fura-
cões, durante os quaes a chuva, a saraiva, a neve caem em
abundancia.
Privados então de sua humidade e não encontrando mais
mares, florestas, rios ou lagos, que possam ceder- lhes de novo ;
esses ventos, quando attingem as planicies do Perú , são seccos,
e não produzem mais chuvas. " [ Maury-Geog. Physica .]
341

" E' pela mesma razão que no Perú, no cimo e ao occidente


da grande cordilheira. nunca chove, e até no litoral do Pacifico
extende-se o arenoso deserto de Atacama : porque as correntes
aereas que transpõem o cimo das cordilheiras, tem já perdido
toda a humidade.
" As nuvens accumuladas pela pressão que supportam nas
serras, onde são represadas, não podem elevar-se acima das cor-
dilheiras dos Andes, em quanto os alizeos, conservando-se perto
do solo, moderam sua intensidade ou mudam de direcção, e en-
tão se resolvem em chuvas nos flancos dos Andes".
Da exposição dos dous scientistas cearenses vê- se que elles
dão como causa principal das chuvas, nessa região, as correntes
atmosphericas que sopram continuadamente com o nome de
alizeos de S. E para a terra.
A causa ou formação destes ventos mostrará se effectiva-
mente a elles se deve attribuir a influencia capital na distribui-
ção das chuvas.
Sirvo-me da magistral exposição feita pelo eminente astro-
nomo francez Faye. [ 1 ]
"Se a atmosphera estivesse subtrahida a acção do calor
solar, permaneceria em equilibrio ; suas camadas successivas
se ordenariam segundo as superficies de nivel, e encorporar-
se-iam, por assim dizer, com o globo terrestre : pelo menos se-
guir-lhe-iam a rotação até nas partes mais altas.
O calor solar perturba constantemente este equilibrio, in-
troduz movimentos tanto mais curiosos quanto não destroem
essencialmente a estratificação normal das camadas atmosphe-
ricas. O ar collocado acima do hemispherio, actualmente acla-
rado. dilata-se nas suas camadas baixas, onde a opacidade das
poeiras aereas e sobretudo o vapor dagua absorvem tão gran-
de parte dos raios calorificos. A intervenção deste vapor, dagua,
que sobe verticalmente de camada em camada, tem ainda por
effeito tornar sensivel a variação diurna da temperatura em
alturas a que ella não attingiria se a atmosphera fosse secca,
O maximo desta dilatação geral occorre na zona torrida sob os
raios verticaes do sol. Desta forma, o centro de gravidade das
camadas baixas sobe verticalmente ; estas levantam as camadas

[ 1 ] Faye - Annuaire du bureau des longitudes - 1875.


342

superiores raras, seccas e transparentes, por consequencia pou-


co sensiveis aos raios solares. Todas as camadas, successivas,
assim transportadas acima das suas superficies, do nivel natu-
raes, tendem a deslisar [ couler ] com movimento accelerado,
por essas superficies para os dous polos cuja temperatura per-
manece relativamente baixa. Este effeito é ainda augmentado
pela marcha propria ao vapor d'agua cuja condensação se
opera principalmente nos polos, donde ella volta ao equador
por outra via que não a da atmosphera, afflorando em estado
liquido a superficie do globo."
Neste movimento circulatorio os ventos quentes deslisam
na região superior da atmosphera, em quanto os frios, mais pe-
Sados, baixam e correm proximos ao solo. São estes ultimos,
chamados alizeos, que partidos de extremos oppostos se vêm
encontrar na região equatorial, produzindo ahi a paralisa-
ção atmospherica ou a zona das calmas. (1 )

( 1 ) A região das calmas dilata- se, conforme a estação ; no


verão abrange os grãos 3° , 15" a 130 Norte, em Fevereiro 1015
a 60 N.
Kaemtz - Cours de meteorologie -pag. 37.
No Atlantico o alizeo de S. E. extende -se até o norte do
equador. Prévost pretende explicar esta anomalia fazendo no-
tar que o hemispherio austral é mais frio do que o boreal :
sendo no seu pensar, limitada a região das calmas, por duas
faixas cuja temperatura media seria a mesma, devendo o ali-
zeo de S. E. ultrapassar o equador. Esta explicação, pondera
Kaemtz, acolhida no seu tempo com muito favor, está sujeita,
entretanto, a difficuldades reaes. Primeiro, no grande Oceano, o
equador forma o limite dos ventos alizeos ; depois, se a expli-
cação de Prevost fosse justa , seguir - se -ia a consequencia ab-
surda de dever que o inverno do hemispherio boreal ser mais
quente do que o verão no austral, porque nesta estação o ali-
zeo S. E. sopra sempre ao norte do equador.
E' mister procurar com Humboldt a solução deste proble-
ma na configuração da bacia do Atlantico A parte da Ameri-
ca do Sul, situada ao norte do equador, apresenta-nos as monta-
nhas elevadas da Colombia que separam o mar das Antilhas do
Pacifico. Quando o sol está ao sul do equador e por conse-
guinte durante o inverno no hemispherio norte, esses mares
estão já mais quentes do que o continente ; mas a corrente
que se vae lançar no mar das Antilhas, e que é, por assim di-
zer, a fonte do Gulfstream , eleva ainda a temperatura. Esta cir-
343

CHUVA. - Ninguem ignora a causa proxima da chuva : mas


nem todos sabem como se opera a condensação das nuvens
carregadas do vapor até se resolverem em gottas que por seu
proprio peso se precipitem sob a forma liquida.
Quando a atmosphera se acha saturada do vapor d'agua,
ou este se dissipa por dilatação, ou se condensa incompleta-
mente , a saturação não é total e a condensação opera- se a
influencia dos ventos baixos e frios. Sendo a saturação comple-
ta ou proximo disto, qualquer gráo centigrado de abaixamento
pode produzir rapida condensação e subsequente precipitação .
E' por isto que na passagem das serras as nuvens, em contacto com
a baixa temperatura destas, se resolvem facilmente em chuva.

cumstancia seria já sufficiente para determinar uma corrente


de ar do sul para o norte, a qual, combinando - se com o vento de
leste, engendra o de S. E. que neutralisa o vento N. E. antes
que este tenha attingido o equador. Accrescente-se que a di-
recção geral da costa é de S. E. a N. O. , o que favorece singu-.
larmente a extensão do vento sudeste.
Kaetz - obr. cit. , pag. 38.
Pelas Novas cartas de meteorologia nautica. de L. Brault, da
marinha franceza, fundadas em observações feitas durante
20.000 dias de navegação e 239.876 observações, sobre a direc-
ção dos ventos, no Atlantico norte, chega- se a seguinte conclu
são relativa a questão das calmas equatoriaes. No verão essas
calmas estão presas entre 5º e 10° de latitude N. e 320 e 42
de Long. Occ. de Paris ; no inverno, avisinham - se da costa
d'Africa.
Tudo faz presumir, diz Ragona, que existe a cada instante,
no equador, uma parte de ar em estado de repouso, constitu
indo um centro de calmas. Como o equilibrio é instavel, este
centro desloca - se. Está em A por exemplo a primeiro de Julho,
em A' a 2, em A" 3 e assim por diante, de tal sorte que se
em cada mez, examinar -se o lugar diario deste centro, achar- se- á
uma faixa de calmas no equador. Foi o que aconteceu a Mau-
ry ; encontrou uma faixa de calmas no equador, e concluio
que esta faixa existia a superficie da terra.
Nota de Ragona, director do observatorio de Modena, a
obra de H. Mohn- Os phenomenos da atmosphera - trad. franc. de
Decaudin Labesse - Paris, 1884, pag. 204.
Se notar-se nas mesmas cartas os ventos chamados ali-
zeos de N. E., ser-se-á desde logo impressionado (frappé) pela
regularidade com que elles se recurvam e se convertem em
ventos N. E. e E. N. E. e se engolfão, com a direcção E., no
344

Ha, porem, uma condição essencial, que a muitos esca-


pa, e que Flamarion explica claramente nestes termos :
A chuva é a precipitação do vapor aquoso que forma as
nuvens. Para que este vapor se precipite, isto é, forme gottas
cheias que, por seu peso, caíam atravez da atmosphera e pro-
duzam chuva, é mister que o estado molecular da nuvem seja
modificado por uma causa exterior.
Esta modificação é produzida pela influencia das nuvens
superiores, nuvens de gelo.

mar do Mexico. Alem disto, estes alizeos do N. E. se convertem


em ventos N. N. N. O. e mesmo em ventos N. O., O. N. O. e
O. na costa d'Africa. Succede o mesmo com os alizeos de S. E.
que nesta epoca sopram ao N. do equador. Tornam -se successiva-
mente E. S. E e E. ao se approximarem das Antilhas, e se
voltam em sentido contrario, e se convertem em ventos
S. S. E., S., S. S. O. e mesmo S. O. nas proximidades d'Africa.
Tudo se passa como se existissem duas immensas chaminés de
aspiração no Sahara e no golfo do Mexico, que são, como se
sabe, duas maximas thermometricas.
(Ibid. pag. 203).
Referindo-se a deslocação da zona das calmas equatoriaes,
escreve Marié Davy. "que esta particularidade (descer a calma
até 4° (a) ou a 2º, segundo outros -sempre ao norte do equador )
foi objecto de explicações diversas, que attribuem aos conti-
nentes papel importante na producção do phenomeno. Pela con-
figuração de suas costas occidentaes, o antigo continente abri-
ga, effectivamente, contra os ventos do nordeste toda a parte
oriental do Atlantico, emquanto os alizeos de suestes podem,
ao contrario, se desenrolar ahi livremente. Esta circumstancia,
junta a superioridade da velocidade do alizeo do sudeste sobre o
de nordeste leva para o Norte a zona onde essas duas correntes
se fundem na esteira ascendente. A inclinação das costas ameri-
canas, que correm ao longo do equador, de sueste a nordeste, é
igualmente a causa da inflexão para Norte da região das calmas
nessas paragens ... Não admittimos entretanto que a inclina-
ção das costas na linha meridiana seja a unica causa do des-
vio das zonas das calmas equatoriaes. A questão das tempe-
raturas occupa nella grande espaço, mostrando que a zona
das calmas segue todas as inflexões do equador thermico.
Marié- Davy-les Mouvements del'atmosphere-pag. 196.
(a) A zona das calmas equatoriaes vae um pouco acima do
equador, entre 60 e 140 : no inverno ellas descem com o sol en-
tre 0 e 80 de latitude norte.
(A. Debauve - M. de l'ingin- meteorol.- Paris 1875, pag. 47. )
345

Ha situações taes, que a menor circumstancia as perturba


profundamente e as destroe.
Tal é o caso dos cumulos saturados : o menor resfriamento
condensa e precipita em chuva uma parte mais ou menos
grande de vapor vesicular que os éompõem.
A condição ordinaria da producção da chuva consiste pois
na existencia das duas camadas de nuvens superpostas, sendo
a superior que determina a precipitação da inferior. E' uma ob-
servação que todos podem verificar facilmente quando estão
previnidos ; de ha alguns annos teubo examinado o céu por oc-
casião da chuva, sem jamais ter podido uma só vez achar fal-
tosa esta condição.
Monck Mason, nas suas excurções aeronauticas, notou que
quando o céo, completamente coberto de nuvens, dá chuva, ha

As zonas de ventos e de calmas são , na verdade, limitadas, '


mas tão vagamente, como as das monções e das brisas terraes
e maritimas. No que diz respeito ás zonas de calmas, estes li-
mites, em vez de comprehenderem sempre uma largura de
muitos grãos, se approximam algumas vezes a ponto de não fi-
carem separados senão por milhas.
Quando o annel de nuvens equatorial, que se extende por
cima da zona de calmas e segue-a na sua oscillação annual, co-
bre tal ou qual região, traz para ella a estação das chuvas. Esta
chega no Panamá, que é situado a 9° de latitude norte. no estio
ou no outomno, ao passo que em Guayaquil , que está a 3 ° de
latitude, corresponde ao inverno tardio e a primavera precoce
dos paizes europeos.
Sabe-se que este annel é formado pelo vapor continuamen-
te extrahido da superficie dos mares pelos dous ventos geraes, e
espalhado nas zonas de calmas intermediarias. Aqui este vapor
ergue-se com o ar que o conduz, dilata- se e resfria-se, e é for-
çado a abandonar durante a ascenção uma parte do seu colorico
latente, condensando se em nuvens e chuvas. Por ser esta ope-
repetida todos os dias a chuva é quasi constante debaixo do
ração annel equatorial. Este annel tem um movimento oscillato-
rio ao norte e sul do equador. Em Março ou Abril, a orla sul do
annel de nuvens acha- se na latitude de 3° a 4° sul ; o seu limite
septentrional eleva-se em Agosto ou Setembro a altura das pa-
rallelas de 15° a 20° .

Maury- Geographia physica. - Rio de Janeiro - 1873 - pag.


59-60.
346

sempre uma ordem ( camɛ da ) de nuvens semelhantes, situada por


cima, a certa altura : e ao contrario, quando não chove, ainda
que o céu apresente inferiormente a mesma apparencia, o es-
paço situado immediatamente por cima offerece por caracter
dominante grande extensão do céu claro com um sol claro, não
mascarado por nuvem alguma. ( 1)
Observações identicas já haviam sido feitas por Sau-
soure, nos Alpes ; por Hatton , Peltier, etc. O commandante
Rozet concluio de uma longa serie de observações que as chuvas
e tempestades resultam do encontro dos cirrus com os cumulus,
do vapor gelado com o vapor vesicular .
Kaemtz e Martins adoptam a mesma theoria. Renou ac-
crescenta que a agua pode descer sem gelar a 15, 20, 25 gráos
abaixo de zero , no estado de extrema divisibilidade que constitue
os nevoeiros e as nuvens, e que a chuva e a saraiva são devidas a
mistura dos cirrus gelados com os cumulos ainda liquidos sob
a influencia variavel da temperatura.
Se bem que quasi todos os meteorologistas concordem em
attribuir a deslocação das camadas aereas, particularmente aos
ventos de que me venho occupando, á differenças de tempera-
turas, deve-se levar em conta a desigualdade de pressões baro-
metricas, embora não se tenha ainda chegado a descobrir a con-
nexão entre ellas e os ventos geraes da zona equatorial. O Te-
nente general R. Strachey [ 2 ] occupando - se das causas physicas
das fomes indianas já observava que - itis a common but erro-
neous mode of stating the efficient cause of wind to refer it to
difference of temperature of tow contiguous areas : namely,
that cold air being more dense and heavier, necessarily displa-
ces hot air, which is lighter, the accompanying motion being
wind. Indirectly, no doubt, the difference of temperature often
operates in this manner ; but the true cause of all movements
of the atmosphere which we discribe as wind is wholly mecha-
nical, being difference of pressure at neighbouring places, and
the facts cannot be properly dealt with if this is lost sight of ."

[1 ] Flammarion - L'atmosph. - pag. 627–28.


(2 ) R. Strachey- A Lecture delivered befoe the Royal Institu-
tion of Great Britain -pag. 2.
347

Seja, porem, qual for a causa determinante dos ventos ali-


zeos, alem da rotação do globo, é certo que, na hypothese de obra-
rem mecanicamente, como propulsores, levain as nuvens da re-
gião maritima para o interior das terras, onde elles attingem certa
estabilidade, relativa. pelas pressões encontradas dos mesmos ;
ahi qualquer differença de temperatura, produzida por cor-
rente fria ou pelo abaixamento nocturno e matinal do ar, opera
rapida condensação.
A zona das calmas não coincide, como atraz ficou dito, com
a região topographica do Ceará ; ha, porem, a zona media, como
The chama um meteorolista francez, da qual a oscillação austral
attinge o 5 gráo de latitude sul. [ 1 ]
Comprehende-se a existencia desta zona como uma especie
de prolongamento da primeira, não tão caracteristica e comple-
ta, mas relativa, isto é, de calmas fracas e intermittentes.
Só ella explica a natureza singular, e mais frequente do
que se suppõe, da estação pluviosa no Ceará . Ordinariamente é
a região sul, do valle do Jaguaribe, a que mais soffre escassez
de chuvas, pela simples razão de ficar mais afastada da zona
dessas calmas. O norte, alem de jazer sob a influencia destas,
é orlado pela extensa e alta cordilheira da Ibiapaba, que serve
de paravento, e funcciona como agente condensador das nuvens.
Pergunta-se, porem, porque razão a zona das calmas expe-
rimenta taes oscillações, ora approximando-se da região cea-
rense, ora dilatando-se para norte ?
No estado actual dos conhecimentos meteorologicos, labo-
ramos em hypotheses mais ou menos ingenhosas e plausiveis .
Verdadeiramente não se pode chegar a conclusões rigorosamen-
te scientificas. O Tenente- general Strachey, a quem já me referi,
diz sensatamente que -on the whole, our knowledge of the
immediate causes of rainfall is very rudimentary ; and though
there be no present appearence of success in the solving the in-
tricate probleme that an inquiry into those causes must involve,
it can only be by help of a careful examination in detail of all
the facts that it can become possible at all . Such a collection
of facts has at length been seriously commenced ; but what

[ 1 ] Seja zona media ou de calma , como quer Maury, o phe-


nomeno é o mesmo.
348

I have arready said will indicate the great complexity of this


subject, and the many difficulties that will have to be encounte-
red in grasping it in a satisfactory way.
Entre as causas assignaladas a producção deste phenomeno
[o da deslocação da zona das calmas] sobreleva a que o astrono-
mo Meldrum, do observatorio de Mauricia, pretende ter desco-
berto pela comparação das chuvas caídas em Mauricia, Adelaide
e Brisbane com a evolução das manchas solares.
Se ha coincidencia entre a maior actividade solar e a fre
quencia das chuvas, é licito attribuir-se aquelle phenomeno a
causa da maior oscillação da zona das calmas, dentro ou pro-
ximo das quaes se dão as precipitações pluviaes.
Seja pelo maior aquecimento da zona equatorial, em con-
sequencia da acção directa dos raios calorificos do sol, augmen-
tando a evaporação e alargando a area da dilatação das cama-
das inferiores da atmosphera nesta região ; seja por um accres -
cimo de resfriamento, produzido pela extensão das manchas, se
admittir-se que estas minoram o calor e a consequente facili-
dade de condensações, o facto da equipolencia no accrescimo
destas manchas coin a frequencia pluvial é bastante significa-
tivo em si mesmo, para se precisar recorrer, na sua explicação, a
hypotheses mais ou menos engenhosas.
Sabe- se que as manchas solares são perturbações locaes do
envolucro gazozo ou nebuloso que rodeia o sol. ( 1 )
Variam as opiniões dos astronomos sobre a natureza dellas .
O padre Secchi pensa com Wilson. que são fendas ou abertu-
ras, aliás pouco profundas, cavadas na photosphera solar pelas
perturbações tempestuosas, de que esta é séde, e pela força
de erupção dos vapores, rasgões cheios de vapores metallicos.
densos e opacos, pelos quaes as massas photosphericas se pre-
cipitam para fóra.
"A mancha, diz elle, ( 2 ) é formada pela propria materia
que a erupção projecta sobre o disco solar ; a região obscura
é devida a absorpção exercida pelos vapores que sairam do seio
do corpo solar e se interpuseram entre o observador e a pho-
tosphera. "

( 1 ) L. Buchner - 0 sol nas suas relações com a vida - Lisbôa


1889, pag. 54.
(2) A. Secchi - Le Soleil - Paris 1877, vol . II , pag, 184.
349

Kischoff, Sporer, Weber pretendem que ellas (manchas)


são nuvens de fumo produzidas pelas faculas solares. Reis quer
que sejam nuvens de ferrugem formadas por oxydações ferru-
ginosas, mantidas, graças a attracção do sol, quasi sem modi-
ficação durante certo tempo. Faye, Zolnner, Gautier, etc. ad-
mittem que ellas são massas immensas de escorias semi arre
fecidas, primeiro rudimento de uma crosta em via de forma-
ção, produzida por um resfriamento geral.

Estas camadas, de escorias, depois de algum tempo submer-


gir- se-iam por seu proprio pêso nas regiões mais quentes do
envolucro gazoso. Spiller, esposando opinião media, crê que
as manchas solares são escorias on massas de escorias semi ar.
refecidas por um abaixamento local da temperatura, mas so-
brecarregadas e envoltas por nuvens devidas a combustão, que
produz a penumbra.

O padre Secchi sustenta, em abono de sua opinião, que as


manchas solares desenvolvem mais calor do que as outras par-
tes da superficie solar, ( 1 ) e Buchner accrescenta que outros
factos parecem pleitear em favor da theoria de Secchi, taes
como os véos vermelhos ou linguas de fogo, que correspondem
as protuberancias roseas, e que se vêem surgir muitas vezes do
interior das manchas ; as faculas solares ou accumulações de
luz, que rodeiam as ditas manchas e invadem as vezes uma me .
tade do disco solar, finalmente o facto de que no proprio lugar
em que hoje se produzem as erupções formidaveis de protu-

[ 1 ] Em contrario á doctrina do P.e Secchi, o astronomo


Langley observou que a sombra de uma mancha emitte appro-
ximadamente 54 por 100, e a penumbra cerca de 80 por 109 do
calor que emitte a superficie correspondente da photosphera.
A conclusão a tirar-se é que o effeito directo das manchas con-
corre para esfriar a Terra.
Flammarion . porém, diz lhe parecer, segundo as expe-
ríencias acerca do calor solar, que este varia na razão do nu-
mero das manchas, isto é, quanto maior fôr o numero destas tanto
maior será o calor solar.
350

berancias gigantescas, se vêem apparecer grandes manchas no


dia seguinte. ( 1)
Daqui se conclue que o sol é, como se exprime F. J. Klein,
theatro immenso da luta encarniçada dos elementos, luta de
grandeza selvatica, de que a imaginação humana não seria ca-
paz de fazer ideia.
Do seio do mar de vapores incandescentes, que constitue a
superficie solar, surge incessantemente, ora num ponto, ora
noutro, jactos immensos de hydrogenio abrazado , cuja circum-
ferencia excede a do globo terrestre. Dessa atmosphera de
fogo arrojam-se elles até a altura quasi igual a distancia que
vae da lua a terra. Essas massas incandescentes, de volume
norme, cuja força de projecção bastaria para varrer o nosso
globo como a corrente fluvial arrasta um pedaço de cortiça,
recaem em seguida em curvas gigantescas.
Esses movimentos são testemunhas da energia solar, e
se bem que não coincidam entre si, e pareçam, como pretende
Flammarion, [ 2 ] até certo ponto independentes uns dos outros,
no seu conjuncto , apresentam a curiosa fluctuação undecenal.
Este mesmo astronomo aventa a hypothese de ser a acti-

(1 ) A opinião autorisada mais recente sobre as manchas so-


lares, a do P.e Moreux, exposta no seu livro -Le Probléme Solai-
re, não diverge essencialmente da de Faye. El'e pensa que es-
ando a massa solar em estado gazoso e os corpos dissociados
no interior do Sol, diminuindo o calor a medida que se appro-
xima da photosphera, opera -se nas phases ascencionaes uma
selecção nos gazes que se podem combinar entre si, devendo
apresentarem - se novas combinações em cada nivel determinado
. assim os vapores metalicos chegam á superficie da photos.
phera, condensam- se sob a forma de particulas solidas e incan-
descentes, e esta poeira, depois de ter brilhado alguns instantes-
torna a descer em virtude de sua densidade para o interior da,
massa, apta para tornar a subir quando o calor a tiver dissociado
novamente. Daqui, diz o P.e Moreux, a affirmação , á primeira
vista paradoxal, de que a luz do Sol tem a sua causa numa di-
minuição de calor na periferia sendo o seu interior obscuro em
virtude dum consideravel augmento de temperatura.
Veja- se o Anno Scientifico [ 1905 ] de Abreu de Vasconcellos
--Porto 1906, pag. 14.
(2) Flammarion- Astronomia popular--pag. 424 da trad.
portugueza .
351

vidade solar devida a attracção de Jupiter, cuja revolução em


derredor do sol é de 11 annos e 85. Durante o curso da revolu-
ção sua distancia ao sol passa por variação notavel.
Essa distancia, que em media é de 5.203 ( sendo a da Terra
1 ) desce no perihelio a 4.95 e sobe no aphelïo a 5.456.
A differença entre estes extremos é de 0.506 , isto é, un
pouco mais de metade da distancia da Terra ao Sol . Girando
em torno do sol, diz Flammarion, o planeta exerce sobre este
uma attracção que é facil de calcular, e desloca constantemente
o seu centro de gravidade, o qual não pode por consequencia
coincidir com o centro da figura da esphera solar, que está sem-
pre puxado excentricamente e para o lado de Jupiter. A attracção
dos outros planetas faz que esta acção não seja regular, mas não
pode impedir que se torne dominante ...
" Podia ser muito bem que esse movimento da massa solar.
nol-o revelassem as manchas, e que houvesse por exemplo um
maximo de manchas quando Jupiter attrae mais ou attrae me-
nos o centro solar.
" Se Jupiter não volta ao perihelio senão passados 11
annos 85, o maximo das manchas volta passados 11 annos 11 .
isto é, 74 centesimos de anno ou 200 dias antes. Esta conta é e
resultado do confronto de todas as observações. Existe no sys-
tema solar uma segunda causa capaz de forçar o phenomeno a
adiantar-se dessa maneira ao perihelio de Jupiter ?
Flammarion conclue pesarosamente dever prescindir de
Jupiter.
Examinemos, porem, as opiniões expostas pelo sabio astro-
nomo Norman Lockyer ( 1 ) favoraveis a correlacção das man-
chas com as chuvas.
Sendo o calor a fonte de energia ou da força, e o sol o cen-
tro deste calor, é licito suppor- se que a producção das energias
terrestres se pienda ao grande reservatorio , de todo o systema
plenetario.
Partindo deste presupposto, procura Lockyer saber se os
cyclos de actividade solar coincidem com os cyclos atmospheri-
cos. As investigações neste sentido foram dirigidas a cinco clas-

[1 ] J. Norman Lockyer, W. W. Hunter e C. D. Archibald


-The cycle of Sun- spots and of Rainfall in Southern India.
352

ses de phenomenos terrestres. Primeiro -as variações periodi-


cas no magnetismo terrestre e da actividade electrica ; segundo
—as variações periodicas da temperatura ; terceiro -- a periodi-
cidade na distribuição dos ventos, furações e cyclones ; quarto—
a periodicidade no accumulo de nuvens : e quinto-a periodici-
dade nas chuvas.
Lockyer mostra com as observações da agulha magnetica,
feitas por Edward Sabine, por Gaus, Arago e outros, que as fluc-
tuações espasmodicas da mesma são mais frequentes nos annos
de maior actividade das manchas solares. [ 1 ]
Quanto ao augmento da temperat ura, o astronomo inglez
lembra, entre outras provas, o resultado da Radiação Solar do
Observatorio de Oxford de 1856 a 1864 , pelo qual se evidenciou
estar a intensidade da luz solar sujeita a mudanças periodicas:
correspondendo com a maxima e minima da mesma frequencia das
manchas solares.
Quanto ao terceiro phenomeno -o da periodicidade e dis-
tribuição dos ventos, posto as provas sejam menos abundantes.
são comtudo mais uniformes. A frequencia desta distribuição
na epoca da maxima de manchas solares foi observada inde-
pendentemente por dous meteorologistas em sitios oppostos da
Terra, na região tropical .
Relativamente a quantidade de nuvens em connexão com a
frequencia das manchas, Schwab verificou em trinta annos de pa-
ciente observação que esta frequencia andava associada a ne-
bulosidade de preferencia ao bom tempo.
Ao quinto objecto das investigações, isto é, ao da corre-
lação das manchas solares com as chuvas, o Dr. Carl Jelinek
de Vienna, pelo exame de quarenta estações, de 1833 a 1869,
verificou haver coincidencia em 52 casos, e discorda ncia em 42 .
Gustav Wex, dando nova direc ção a esses estudos, chegou a
conclusão de que de 1800 a 1867 as ma ores cheias dos rios El-
ba, Rheno, Oder, Danubio e Vistula occorreram nos annos de
maximo de manchas solares.

( 1 ) Wolf, director do observatorio de Zurich, chegou pela


simples inspecção da agulha magnetica a calcular o numero das
manchas solares.
Arago fez o mesmo em relação as auroras boreaes .
353

O professor John Brocklesby, no American Journal of Science,


mostrou a connexão entre as variações na área das manchas e a
chuva annual -augmentando esta acima da media quando a
area das manchas augmenta : diminuindo quando estas dimi-
nuem .
Em 1877 Meldrum recolheo os dados de 128 estações me-
teorologicos da Europa e da America, chegando a conclusão se-
melhante obtida por Allan Brown, isto é, que a media das
chuvas em todas estações, nos annos de maxima de manchas so-
lares, excede a da epoca opposta em cerca de duas pellegadas
(50 millim. ).
Norman Lockyer, no estudo a que me venho referindo ( The
cycle of Sun-spots and of Rainfall) resume nos seguintes termos
as suas observações : " As duas monsões são os grandes factores
da queda das chuvas em Madras, e suas fluctuações são distin-
ctamente assignaladas no terceiro elemento da comparação —a
chuva total por anno. Em cinco dos seis annos do minimo de
manchas solares a chuva annual caío justamente na media, cal-
culada em 64 annos. O anno excepcional de 1843 foi devido a
chuva tempestuosa de Maio. Mesmo incluindo este anno, os seis
do minimo de manchas dão uma media de chuvas inferior a
34 1/2 pollegadas contra a media ordinaria de 48 1/2 pol. , calcu-
lada em 64 annos.
A conclusão final é que a media annual de chuva em Ma-
dras excede de 40 por 100 a dos annos do minimo de manchas;
havendo um cyclo undecenal de chuvas que coincide com o das
manchas solares.
Elucidando esta affirmação, apresenta o seguinte quadro :
.em
Madras
solares
d
chuvas
manchas
deee
undecenal
Cyclo
ANNUAL
DE
MEDIA
354

Madras
em
Chuvas W.
S.
de
Monsões
No
manchas
de °em
N
de
Monsões
1813-76 Mad
em ras
1810-75 Madras
813-76
pollegadas
em 1812-76

4 1
§6.3 37.03 18.76 15.78
'5
3
,4 3
212
1810
grupo
Menor
65
,76 12.6 40.39 23.92 14.65
. 55
1811
64.
,432 6
32 10.8 42.07 26.49 14.08
,1812
Terceira
23uarta
eq
series
6
46
,5
34 7
5 48.6 49.12 32.87 14.89
,6
24
5
386
7
4
5
1813
3
,265
1814
series
seexta
Quinta
59
,6
47 8 88.3 54.64 31.48 19.68
7
,5
4890
6
327.
1815
a
1816
de
series
o
Septima 18.93
eitava 65.3 52.36 30.64
7
a 2
1817
d
,ee
71
series
7
a
1818
de
(
Nona
d3
e ecima 27.67 18.53
38.5 49.02
7
a
1819
d4
e e ?
1810
1876
a
Undecina
serie 16.3 37.03 18.76 15.78
m
i
p
a aximo
ntermedio
manchas
e,de
minimo
do roximidade
ttendendo
forma
outra
por
Grupando
cyclo
Minimo
,1º
e2grupo
do
anno 12
.6 40.39 23.92 14.65
Intermediario
66 ]9
°e
13º,409 0 43.5 49.07 30.27 16.71
Maximo e
8,6
,7
5º 76.8 53.50 31.06 19.13
355

O director do serviço meteorologico do governo da India-


Henry F. Blanford , ( 1 ) submettendo a critica as conclusões do
Dr. Hunter, identicas as de Norman Lockyer, cuja exposição
acabo de fazer, recorreo a observação de 7 estações : Madras
(desde 1813 ), Bengalore ( 1837 a 76), Mysore ( 37 a 76), Bom-
bay ( 1817-76 ), Nagpur (1855-76), Jubbulpore ( 45 a 76) , e
Calcutá ( 1829-76) ; depois de approximar a quantidade das
chuvas a das manchas solares para achar a correlação entre
ellas, diz que, tomando toda a India tropical, as chuvas estão
sujeitas a uma certa variação cyclica que coincide em extensão
periodica com o da frequencia das manchas solares , porem que
esta variação é inferior a 5 por 100, abaixo ou acima da media .
O Sr. Oswaldo Weber, [ 2 ] director do observatorio mete-
orologico de Quixeramobim, em o seu relatorio de 1902 , refere a
seguinte opinião do Dr. Stephan Zach :
66
" O effeito principal dos raios solares que caem sobre a
Terra consiste na evaporação da superficie liquida que forma
duas terças partes da superficie total do globo. Se a emissão
calorica do sol augmentar nas occasiões das maximas de man-
chas a formação de vapores tambem deve ser maior do que no
tempo das minimas. Com a evaporação mais forte a atmosphe
ra ficará mais depressa saturada de vapor dagua, a nebulosi-
dade do céu será maior, as chuvas mais abundantes e as aguas
dos rios mais altas do que no tempo das minimas ". ( 3)
O Sr. Weber pondera que, comparando a frequencia e a
velocidade dos ventos em 1899 de N sobre W para S. , que são
sempre acompanhados de chuvas, observou nestes dous factores
um accrescimo muito importante, a saber : 132.5 % x 1.34
ventos contra 59.7 % × 1.54m, nas medias dos 2 annos ante-
riores.

[1] Blanford - The cycle ofSun-spots and ofRainfall - pag. 31 .


[2 ] Oswaldo Weber- Relatorio ao ministro da agricultura.
[3 ] Schuster, citado pelo Dr. Brigido, declara que durante
100 annos, até 1867, as melhores colheitas de uvas, pela belleza
e qualidade, coincidiram com as minimas de manchas solares ,
e os directores do Lloyd de Hamburgo notam pelos seus livros
que os annos de maximas de manchas são os que obrigam ao
pagamento do maior numero de sinistros maritimos- [ Dr. Vir-
gilio Brigido, discurso a 22 de Novembro de 1900. - Rio, 1901-
pag. 14].
356

66 Os ventos do N. sobre W. até S. , vindos do interior do


nosso continente e principalmente da bacia do Amazonas, tra
zem para o Ceará chuvas com a probabilidade de 100 %.
Incidentemente, sem querer desviar- me do estudo compa-
rativo entre as manchas solares e as chuvas no Ceará, parece-
me que a explicação da mudança de ventos de N a W para S.
com certa frequencia e menos velocidade é mais uma prova dɛ
existencia da zona relativa de calmas, abaixo do equador .
Aquelles ventos, de direcções diametralmente oppostos aos de
S. E e S. S. E, ou alizeos , reinantes em todo o Ceará, vindo ao
encoutro destes, chegam a uma zona em que as forças contra-
rias se hão de neutralisar e produzir a estagnação das camadas
atmosphericas. E como isto occorre de Março a Abril, quando
a evaporação, activa, é, por um lado, transportada para o inte-
rior das terras, por outro soffre a influencia dos ventos frios de
N. e W. , não parece extraordinario que as condensações se tor-
nem mais frequentes e se precipitem em forma liquida.
Examinemos se em relação ao Ceará verifica - se a coinci-
dencia achada alhures entre o phenomeno solar e o atmosphe-
rico. [1]
As observações pluviometricas, na Fortaleza, foram inici-
adas pelo Senador Pompeu em 1849 e continuadas até 1864 por
elle. Desta data em diante elle as proseguio por si, e na sua au-
sencia por outros até 1876. Em alguns annos deixou de haver o
preciso cuidado no registo das chuvas.
Ainda assim é talvez o mais completo que existe no norte
do Brazil.
Confrontando -se os dados pluviometricos e os grupos de
manchas solares reconhece-se pela simples inspecção occular a
perfeita coincidencia entre o maximo destas e os grandes inver-
nos : e o minimo com as seccas ou chuvas escassas. Refiro - me
ao periodo comprehendido entre aquellas observações, na Forta-
leza , e a tabella do Wolf, como se verá dos dados seguintes :

(1 ) Veja- se Barão de Capanema - Seccas no Ceará, inserto


no Jornal do Commercio de 23 de Outubro de 1877.
Orville A. Derby-As seccas e as manchas solares inserto no
Diario Official de 8 e 9 de Junho de 1878.
357

Maximo de Chuva em Minimo de Chuva em


manchas mill. manchas mill.

1849 239 a) 1.908 1855-28 1.076 (g.


1860 211 b) 1.753 1867-25 832 (h
1871 204 1.468 1877-48 36 467 (i=485
1772 292 c) 2.301 503
1883 1.155 grup. d) 1.433 1888 741 S
29
ì894 ( 1 ) e) 2.782 1889 773 { (i=758
1905 (1) . f) 1.133 1900-64 563 ( k

[a ] Foi o anno de maior inverno até 1866.


[b] Entre 1849 e 1866 só foi excedido de alguns millimetros
pelo de 1856.
[c] De 1849 a 1894 foi o maior inverno, exceptuado o de
1866.
[d] De 1875 a 1890 foi apenas excedido pelo de 1880.
[ e] Foi o maior inverno registado em 58 annos.
[f] De 1899 em diante só foi excedido pelo de 1901 .
[g] 1849 a 1867 não houve inverno mais escasso, tendo si-
do os de 50 , 53 e 55 iguaes .
[h ] De 1849 a 1877 foi o mais secco .
[i] De 1849 a 1898 foram os annos mais seccos.
[j] De 1879 a 1898 66 66 66 66
[k] Exceptuado o de 1877 e 78 foi o mais secco registado .

Não tenho o registo regular das manchas solares senão até


1881 ; d'ahi em diante os autores a quem recorri dão -nas por
aggrupamentos e pela superficie que occupam na photosphera
solar. Considerando somente esses elementos, obtemos para os
33 annos decorridos de 1849 a 1881 a media annual das man-
chas solares de 143 1/2 e a da quantidade de chuva em milli-
metros de 1.332. Approximados destas medias os 3 annos
de maximas de manchas [ 1849 a 72 ] dão a media de 272 man-
chas, e de 1848 mill. , isto é 128,5 manchas e 516 mill . mais do

( 1) Não tenho o nº manchas dastes annos.


358

que a ordinaria annual. Em relação as 5 minimas de 1855 a


1900 mostram as manchas a media aunual de 34 corresponden-
tes a 749 mill. de chuvas. ou 169,5 manchas e 583 mill. me-
nos da media ordinaria.
Grupando ainda os dous proximos annos que se seguem
40 periodo das maximas, temos :
PERIODOS UNDECENAES DE MAXIMAS

DE MAXIMAS 1 anno depois 2° anno depois

N': de Nº de Nº de
manchas . Mill. manchas Mill. manchas Mill

1849 239 1.908 1850 186 1.022 1851 141 1.414


1860 211 1.753 1861 204 1.426 1862 | 160 1.466
1871 304 1.468 1872 292 2.301 1873 215 2.062
...... 1884 - 1.157, 1885 1.264
1883 1155 1.433 1895 2.503 1896 1.923
1894 + 2.782
1905 754 1.133

Total 10.477 682 7.409) 516 8.529


Media 251 1.496.7 227.1.481.8 172 1.705

PERIODOS DE MINIMAS :

1855 28 1.076 1856 34 1.760 1857 99 1.746


1867 832 1868 101 1.390 , 1869 198 1.533
1878 503, 1879, 49 596 1880 165 1.539
1889 775 1890, 1.530 1891 833
1900 563 1901 1.535 1902 851

Total 170 3.749 184 6.811 462 6.502


Media 34 749 61 1.362 ) 160 1.300

A coincidencia é tão completa quanto se pode comparar os


dados existentes, não só em relação a phase das maximas,
como a das minimas.
Nos annos em que o sol manifesta maior actividade, bem
como nos dous que se lhe seguem, as medias de manchas e de
chuvas excedem as normaes, com ligeira inflexão em alguns
359

annos immediatos a esta phase [ maxima] quanto a quantida-


de das chuvas. O descrescimento das manchas, como o da fre-
quencia das chuvas é lento nos tres primeiros annos depois
da phase maxima ; o crescimento de umas e outras é rapido
depois dos annos de minimas.
Relativamente a annos anteriores, de resultados bene-
ficos ou maleficos pela abundancia ou escassez de chuvas, o
seu conhecimento assenta na tradicção ; não sabemos até que
ponto foram elles influenciados pelo phenomeno meteorologico e
pelo abandono, desleixo, imprevidencia do governo e dos par-
ticulares.
Quanto ao de 1825, do qual tinha o Senador Pompeo re-
cordações pessoaes, diz elle terem sido mais nocivas as dissen-
ções politicas, a rapinagem e as pestes do que a propria secca .
Aproveitando o que nos referem os chronistas e confron-
tando as suas observações com as tabellas das manchas de
Wolf, eis o resultado :

ANNOS DE MAXIMAS E INVERNOS MINIMAS E SECCAS

1727.5 1728 1723 1723 a 25


1750 1748 1733 1736
1761.5 1745 1745
1770 1755.7 1754
1779.5 1779 1766.5 1760
1788.5 1797 1775.8 1776 a 78
1784.8 1784
1804 1805 1798 1793
1816.8 1819 1810 5 1810 a 11
1828 1826 1823.2 1824
1837.2 1839 1843.7 1845
1844.7

Em relação as minimas a concordancia é quasi perfeita, se


exceptuarmos o anno de 1798, que, não sei porque aberração.
saío da phase undecenal cyclica das manchas. Em 8 annos
houve coincidencia, e só em 2 discordancia. Quanto as maximas,
deve se levar em conta, que a phase undecenal nem sem-
pre se pronuncia caracteristicamente, havendo, muitas ve-
zes, durante dous e tres annos lento decrescimo no seu nu-
360

mero. Assim os desvios nesse lapso de tempo não invalidam a


regra capital. Com essas restricções, cujo fundamento facil-
mente se verificará inspeccionando as tabellas de Wolf, aquel-
les desvios se explicam, por não aberrarem de dous annos
alem da phase capital.
Os dados, portanto, tradicionaes e recolhidos de 1849 para
cá, abonam a hypothese da influencia solar na producção des-
se phenomeno meteorologico.
Creio mesmo que um estudo mais completo de ambos-
manchas e chuvas - mostrará a connexão intima entre elles,
apenas entrevista .
Por emquanto os elementos sujeitos a este exame são in-
completos : só de poucos annos para cá foram as manchas ob-
servadas, não fragmentadas, mas por sua extensão, posição,
evolução, de accordo com outras manifestações da actividade
solar , como as erupções gazosas de luz encarnada, penumbras,
faculas, etc.
Comprehende-se que a extensão das manchas e sua posi-
ção, relativamente a este ou aquelle hemispherio terrestre, deve
actuar de modo differente quanto a evaporação pelasgica,
direcção dos ventos, condensações ou chuvas.
Quem nos poderá affirmar que as discordancias de alguns
dos factos apontados [ manchas e chuvas] não resultam da im-
perfeição no estudo da actividade solar em suas particularida-
des locaes ?
A sciencia aperfeiçôa diariamente os processos de investi-
gação, e augmentam os observadores com a melhora de instru-
mental.
De anno para anno novas acquisições entram para o seu
dominio, não sendo a astronomia e a meteorologia as menos fa-
vorecidas .
A meteorologia nasceo hontem, está na infancia. embora
já comece a prestar relevantes serviços a navegação .
Alem do cyclo undecenal da actividade soiar, manifestado
pelo augmento de manchas na sua superficie, verificou- se ulti-
mamente haver verdadeiras superexcitações daquella actividade
em periodos mais longos.
No quadro da frequencia de chuvas na Fortaleza observa-
se igualmente, alem das oscillações de 10 a 12 annos, o augmen-
to das mesmas em phases de 23 a 26 annos.
361

Em 1848 e 49 os invernos foram excepcionaes, superiores


a 1900 mill . , o de 1866 attingio esporadicamente a 2453, entre
dous annos escassos de chuvas ; mas 23 annos depois daquella
phase outra ainda mais copiosa se manifesta, 1872 com 2301
mill. , 1873 com 206% mill.: decorridos outros 22 a 23 annos re-
produz-se o phenomeno com maior intensidade, dando 2.782
mill . em 1894, e 2503 mill . em 95, 1923 mill. e 1942 mill. em
96 e 97.
Em relação aos annos de chuvas escassos observam-se as
mesmas coincidencias : ao da secca de 1845 succede 22 annos
depois [ 1867 ] o menos provído, desde então, com 832 mill. ; e
em seguida os do triennio 77 a 79, indo ao completar nova phase
de 21 annos (1877 a 1889) reproduzir-se com 741 mill. em 1888
e 775 mill. em 1889.
De 1877 a 1898– ( 21 annos ) e depois dos grandes invernos,
de 1893 a 1897 , que pareciam assegurar a continuidade da esta-
ção pluviosa, caem no anno cyclico [ 1898 ] as chuvas de 529 mill.
e as de 566 mill, em 1900, com o intervallo de 23 annos. (1 )
Se bem que este assumpto seja interessante como discus-
são theorica, limito me a assignar-lhe o alcance sem entrar em
analyse mais extensa, por não o comportar a natureza deste tra-
balho.
O que delle se deve colher como resultado pratico, não tem
por ora alcance popular ; é do dominio da especulação scienti-
fica, e nelle permanecerá por algum tempo.
Não quero. porem, fechar esse capitulo sem lembrar as ten-
tivas de previsão suggeridas pelos meteorologistas, referentes ao
bom e mau tempo. Sem um valor scientifico de bom quilate,
servirá, talvez, como adjuvante aos que pedem a mobilidade at-

[ 1] As passagens das maximas para as minimas são acom-


panhadas por uma circumstancia muito curiosa : quanto mais
proximo está a minima, mais as manchas se formam ao pé do
equador ; depois, quando o numero vai crescendo apparecem
numa latitude mais alta. Demais disso , os dous hemispherios
solares não sãe iguaes de ambos os lados do equador , ora é o
hemispherio do sul o que tem manchas em maior numero, ora
é o hemispherio norte : as epocas das maximas e das minimas
não são as mesmas para ambos os hemispherios . De 1883 a 1889 ,
por exemplo, o numero relativo das manchas foi de 64 por 100
para o hemispherio Sul e de 36 por 100 para o do Norte.
362

mospherica conselhos, ensinamentos, norma do proceder para o


emprego da propria actividade e fazenda.
Compendiando as previsões populares sobre o bom tempo
e a chuva, assignalam os meteorologistas os seguintes prognos-
ticos :
Os halos e as coroas que apparecem em derredor da lua an-
nunciam que o céu estará coberto no dia seguinte, e provavel-
mente chuvoso, chuva fina de longa duração.
O sol posto por traz de nuvens escarlates e vaporosas, que
produzem esses maravilhosos effeitos de purpura carregada e co-
lorem toda a paizagem, annuncia a chuva .
A transparencia do ar, que approxima os objectos afastados
e permitte distinguir minucias singulares a leguas distantes, an-
nuncia tambem a chuva.
Os maus cheiros de certos lugares. esgotos, cisternos, etc..
são dividos a diminuição da pressão atmospherica e a condições
hygrometricas que annunciam igualmente chuva.
Os nevoeiros que descem annunciam bom tempo, os que
sobem a chuva.
Dous ventos de direcção opposta, que se succedem, trazem
ordinariamente chuva .
Nuvens ligeiras de contornos indecisos annunciam bom
tempo e brisas moderadas ; nuvens espessas, de contornos bem
definidos, vento. Nuvens ligeiras. que correm rapidamente em
sentido inverso das massas espessas, annunciam vento e chuva.
Céu acamado precede ordinariamente a um céucoberto e
chuvoso . [ 1 ]
Quando as nuvens não são sustidas por correutes ascenden-
tes, ou dissolvidas pela visinhança de um ar mais secco, ellas se
resolvem , como os nevoeiros, em gottas finas que crescem pouco
a pouco na sua queda.
Si a nuvem é brancacente, e o céu azul carregado nas
aberturas [éclaircies ] é porque as gottas dagua que compõem o
nevoeiro são pequenas e o ar ambiente desprovido de vapor .
Será razão dupla para se não receiar chuva. Mas se as nuvens
são pardas e o céu baço nos intervallos, é porque as gottas são
grossas e o ar humido : a chuva será muito provavel ,
A nuvem effectivamente não se resolve antes que as gottas

[ 1 ] Flammarion- L'atmosphére.
363

dagua que a compoem tenham attingido certo volume. E' nessas


gottas que se formam as coroas que apparecem a noite, nas nu-
vens, em derredor e proximo da lua. Se as gottas são pequenas,
o diametro da corôa é maior ; se ellas são grandes, ao contra-
rio, a corôa estreita - se, approxima-se do astro, que ella parece
tocar.
Assim as corôas annunciam chuva quando são estreitas .
Quando largas, a nuvem nada tem de ameaçador.
Mas acontece ver- se frequentemente coroas largas estrei-
tar- se progressivamente ; neste caso pode prever -se que dentro
de poucas horas as nuvens se resolverão em chuva. ( 1 )
O sabio americano Loomis, em uma nota, publicada no
American Journal of Science, sobre a causa das chuvas, chegou as
seguintes conclusões :
As grandes chuvas resultam :
1º Do encontro dos alizeos do N E com os do S. E :
20 Das perturbações atmosphericas das latitudes medias .
A trajectoria media das grandes depressões barometricas não é
assignalada por excesso de chuva bem pronunciado : mas, não
obstante, as borrascas mostram tendencia a inclinar- se para as
regiões em que a chuva é mais abundantes :
3º Das cadeias de montanhas que tendem a augmentar a
chuva na vertente mais exposta aos ventos humidos ;
4º Da visinhança do mar, especialmente quando o vento
dominante sopra para terra (continente ).
5º Os cabos e promontorios, que se prolongam pelo mar,
recebem mais aguas do que a região visinha .
A causa das pequenas chuvas são :
1º A direcção quasi constante do mesmo vento durante o
anno, notadamente na região dos alizeos ;
2º Cae pouca agua nas planicies em que o vento dominan-
te transpõem anteriormente montanhas elevadas ;
3º As cadeias de montanhas orientadas de maneira a im-
pedir o livre movimento das camadas inferiores da atmosphera,
para uma região central :
4º O afastamento do Oceano medido na direcção donde
vem o vento.
5º A latitude elevada.

[1 ] Houzeau- Traité elem . de meteor. Mons. 1880 , pag. 165.


REMEDIOS PROPOSTOS PARA ATTENUAR
OS EFFEITOS DAS SECCAS

No exame das differentes medidas propostas para comba-


ter o phenomeno complexo, que se chama secca, terei de consi-
derar a parte tomada pelos poderes publicos, desde os seus pri-
mordios, bem como a dos scientistas, sociedades profissionaes e
homens politicos, mostrando qual o remedio que se me affigura
mais concentaneo as condições climatericas e topographicas do
Ceará, comparadas com a de outras regiões igualmente as-
soladas por estivações prolongadas.
ACÇÃO ADMINISTRATIVA. -A inconstancia das chuvas
no periodo proprio, mais do que a sua escassez , têm preoccu-
pado os poderes publicos desde muito. O Senador Alencar, quan-
do presidente do Ceará, foi o primeiro a enfrentar este grave
problema encaminhando a acção administrativa no sentido de
animar a construcção de açudes:
Com a secca de 1845, a attenção do governo, solicitada
pelos effeitos desta calamidade começou a preoccupar-se com
este assumpto, investigando os meios de minorar os effeitos das
crises climatericas por medidas lembradas nas Falas ou Rela-
torios presidenciaes. dirigidos as Assembléas legislativas,
A 1 de Julho de 1847 , o presidente Ignacio Correia de Vas-
concellos manifestava-se nestes termos aos membros da Assem-
bléa provincial : " Além disto, despida absolutamente de lagos e
rios : sem possuir essas grandes mattas que, conservando o solo
sempre molhado e humido. purificando os ares, e attrahindo a
electricidade, desafia e faz produzir as chuvas, a provincia tem
despresado um dos pontos mais importantes em que se deveria
366

occupar, e visto com olhos de indifferença suas poucas mattas


eahirem ao golpe destruidor do machado do agricultor ignoran-
te ! Disto tem resultado a esterilidade de nossos invernos, e
por conseguinte a penuria e a miseria com que muitas e muitas
vezes nos temos visto á braços .......
" A nossa primeira necessidade é certamente a agua : e já
que não tivemos a ventura de possuir lagos e rios perennes
para refrescarem os nossos campos, ao menos conservemos as
poucas mattas que temos e procuremos crear outras. " (1 )
Em outra parte do seu relatorio diz que uma das primeiras
necessidades da provineia é a construcção de açudes, e neste
sentido havia mandado reparar o de Pagehú, na Fortaleza. "Nas
lagoas de Mecejana, Jererahú e Maraponga, accrescenta, man-
dei fazer represas para conter as suas aguas, afim de beneficiar
o publico ; ellas se acham concluidas e permittem longa dura-
ção.
Havendo vós decretado a quota de 300 000 para construc-
ção de um açude na lagoa dos Fundões, estrada da Imperatriz,
nomeiei para sua direcção uma commissão composta de eida-
dãos prestantes, fazendo logo entregar -lhes dita quantia. Con-
fio que na sessão vindoura vos poderei dar conta do seu estado.
Aqui, Surs., não me posso dispensar de pedir-vos algum quan-
titantivo para ser pelo governo applicado em obras semelhan-
tes naquelles logares que mais as reclamarem. Entendo que
esta é a primeira necessidade da Provincia, e ministrando vós
a Presidencia os meios necessarios para nesta parte ir prepa-
rando-lhe um melhor futuro, contai que ella obrará de maneira
que não desmerecerá da vossa confiança. "
Em 1848, o Dr. Fausto Augusto dé Aguiar, ( 2 ) dando eon-
ta das obras do açude de Campos, em Imperatriz (Itapipoca)
concluio : " Não terminarei este artigo sem vos pedir habiliteis
a Presidencia com alguma quantia ainda que pequena, para
mandar construir alguns açudes nos lugares onde forem mais
precisos, para que assim sejam minorados os desastrosos effei-
tos das seccas, que continuamente pesam sobre esta provincia."

(1 ) Ig. Correia de Vasconcellos - Relatorio apresentado a as-


sembléa provincial do Ceará em 1º de Julho de 1847. pag. 4 e 18.
(2) Relatorio apresentado a assembléa legislativa a 1º de Julho
de 1848, pag. 21.
367

No decurso de 1848 a 1852, tendo havido invernos regula-


res, deixou de serem lembradas nos relatorios presidenciaes as
medidas preconisadas contra as seccas. A escassez de chuvas
em 1853 despertou de novo o governo, que se apressou em
expor a assemblea provincial as medidas tomadas para minorar-
Ihes os effeitos, sem comtudo indicar outras para previnir a
repetição do mal.
O longo verão de 1855 impressionou o espirito do 1º vice-
presidente da provincia, o qual, dirigindo- se a Assembléa em
1 de Julho de 1856, lembrava "a conveniencia que se deve ter
em vista para moderar os terriveis effeitos da secca de construir
açudes.”
O Dr. Silveira de Souza ( 1 ), no seu relatorio de 1858, alarga-
se sobre este assumpto e informa que, pelas respostas as suas
circulares de 23 de Setembro de 57 e 17 de Fevereiro de 58 ás
camaras municipaes, via- se que existiam no municipio de Ba-
turité 27 açudes, a mor parte dos quaes nenhum serviço presta-
va ; no de Canindé 14 , no de Sobral 17, dos quaes apenas o
da Serra da Meruoca offerecia vantagens consideraveis ; no
de Granja 30, dous terços dos quaes não mereciam este nome ;
no de Acarahú 1 começado ; no de S. Quiteria 9 : no do Pereiro
2 grandes e outros pequenos ; no do Icó 60, dos quaes um ter-
ço de parede de cal, e 28 com paredes de terra bem construi-
dos. Em outros municipios tambem haviam açudes, mas as
camaras nada informaram.
Na zona littoral existiam açudes formados de lagoas na
emboccadura dos rios.
"Estou persuadido que outros muitos ha na Provincia.
mas pela maxima parte ou são pouco espaçosos ou mal construi-
dos, e não prestam senão utilidade mediocre e passageira por
não conservarem agua de inverno a inverno. Mesmo entre os
melhores creo que poucos resistirão a uma secca declarada.
Passa depois a ennumerar os pedidos dirigidos pelas ca-
maras municipaes de Acarahú, Aquiraz, Cascavel, Baturité,
Canindé, Granja, Ipú, Maria Pereira, Pereiro, Milagres, Qui-
xeramobim, Sobral, S. João do Principe e outras no sentido de

(1 ) Relatorio apresentado a assembléa provincial ão Ceará em


1858.
368

serem construidos em cada uma das suas circumscripções um


ou mais açudes , cujos locaes ellas aconselham e designam.
Ao concluir esta parte do relatorio, exprime-se nesses ter-
mos : "E' para mim fóra de duvida a necessidade de continuar-
se a auxiliar pelos cofres publicos a construcção de seme-
lhantes obras na Provincia : e mesmo mais para adiante será
preciso talvez emprehendel- as directamente a sua .custa.
Esses acudes contribuirão de modo muito poderoso para
sanar -se o mal das seccas e dos invernos escassos que nos affli-
gem, pois é sabida a influencia que os grandes e multiplicados
depositos dagua, principalmente quando bem circumdados de
arvoredos, exercem na formação e quedas das chuvas. "
No relatorio do anno seguinte ( 1 ) repete : "Não me cança-
rei em repetir-vos o que então vos disse sobre a importancia
de semelhante assumpto em uma provincia, como esta, onde a
falta d'agua, a irregularidade periodica dos invernos e as sec-
cas, poem tantas vezes em sustos e perigos todas as fortunas
particulares e a publica, e são um perpetuo motivo de atrazo
para todas as suas industrias."
E accrescenta melancolicamente : "Um plano de construe-
ção simultaneo ou mesmo successivo de taes depositos d'agua,
e de arboricultura em escala sufficiente, suppòe recursos não
só pecuniarios mais de muitas outras especies que não pos-
suimos.
"Os trabalhos e estudos preliminares sobre a natureza e
condições de nosso terreno, a organisação de um systema ao
mesmo tempo profiquo e economico para a execução dessas
obras, o pessoal necessario para a sua direcção, administração
e conservação em muitas localidades, distantes, quasi isoladas
e privadas de tudo, são cousas que seguramente só com grande
dispendio e muito tempo se poderão conseguir e que excedem
muito as forças unicas dos cofres da provincia.
"O governo imperial tem por sua parte comprehendido
tão claramente como nós a importancia desta questão, de que
está dependente todo o futuro do Ceará, e creio não estar longe
o tempo em que se empenhe deveras na sua solução . "

(1 ) Dr. João Silveira de Souza- Relatorio apresentado a as-


semblea provincial do Ceará em 1859. pag. 23.
369

O Dr. Lafayette ( 1 ) diz, no relatorio com que abrio a


assembléa provincial em 1864, ser impossivel evitar as seccas ,
mas não estava fóra do poder humano attenuar alguns dos
seus effeitos.
Por esta breve exposição evidencia- se que a acção official
só se fez sentir nos annos calamitosos, e , esmaecidas as recorda-
ções dos quadros dolorosos que elles desenharam na memoria
de todos , não mais a preoccupou esse magno problema.
Nas proximidades de 1845 ou quando receiavam a volta de
anno secco, os presidentes da provincia preconisavam como
medida de maxima importancia a construcção de açudes e o
plantío de arvores .
Com a secca de 1877. o governo imperial e o paiz, surpre-
hendidos pela intensidade da crise climaterica, e na espectati
va angustiosa de annos semelhantes. enfrentaram seria-
mente este problema, no intuito de descobrir - lhe as causas e
minorar-lhe as consequencias desastrosas.
Por acto de 7 de Dezembro de 1877 , o governo geral no-
meou uma commissão de engenheiros, incumbida de percorrer
o Ceará e de estudar os meios de abastecel - o d'agua, de modo á
facilitar a população, nos annos seccos, a quantidade necessa-
ria para seu uzo pessoal e o serviço da lavoura por meio da ir-
rigação. Compunham -na - o Conselheiro Henrique de Beaure-
paire Rohan, os Drs . Antonio Paulino Limpo de Abreu, Alfre-
do José Nabuco de Araujo Freitas, Ernesto Lassance Cunha.
Julius Pinkas, Henrique Foglare, Adolpho Shwarz e Leopoldo
Schrimer.
Esta commissão chegou a Fortaleza a 13 de Janeiro de
1878, sob a direcção interina de engenheiro Julius Pinkas, dei-
xando de vir o Conselheiro B. Rohan e Limpo de Abreu .
Não permittindo as circumstancias da provincia , como se
exprime o Dr. José Julio, (2 ) que os engenheiros se dirigissem
logo para o interior a proceder aos estudos, foram incumbidos
de examinar a possibilidade de realisar o melhoramento do
porto, segundo o plano de Hawskaw.

(1) Lafayette Rodrigues Pereira - Relatorio ao abrir a as-


sembléa provincial a 1º de Outubro de 1864.
(2) Dr. José Julio de Albuquerque Barros - Falla com que
abrio a assembléa provincial em 1º de Ontubro de 1878, pag. 56.
370

Em 16 de Janeiro o chefe da commissão informou que,


consistindo aquelle plano na construcção de um quebra- mar de
670 m. de comprimento por 10 m. de largura, na parte supe-
rior, e 7 m . de altura media, ligado ao litoral por um viaducto
de ferro de 250 m. de comprimento e 10 m. de largura, era
necessario para execução da obra :
1º Formar uma camada inferior de pedras relativamente
pequenas [ de 300 kilos pelo menos ] que poderiam ser transpor-
tadas do Mucuripe em jangadas, calculando em 30.000 m. cu-
bicos o volume de pedra precisa para isto ;
2º Fabricar 10.000 m. cubicos de blocos de concreto e
transportar 25.000 m. c. de grandes pedras de granito de peso,
pelo menos, de 10 toneladas cada uma para a conclusão su-
perior :
3 Abrir grandes pedreiras na Monguba e no Mucuripe,
ligando as primeiras a via ferrea :
4 Construir uma ponte provisoria no lugar do viaducto,
ou construir logo o proprio viaducto, ligando- o a estação cen-
tral da via -ferrea :
5º O fornecimento de 8.000 m. correntes de madeira de
lei, 4 lanchões e 500 m. de trilhos para a ponte, alem do mate-
rial para uma linha ferrea provisoria de 2.200 m. e mais os ap-
parelhos para o trabalho das pedreiras e fabrico do concreto :
6º Despeza approximada de 1.200 contos.
Não havendo verba para essas despezas, o presidente da
provincia encarregou a commissão de estudar os meios de evi-
tar as inundações da cidade do Aracaty, e de abastecer dagua a
Fortaleza, aproveitando os mananciaes da serra de Marangua-
pe. O primeiro destes estudos foi feito pelos engenheiros Fo-
glare e Lassance, que levantaram a planta da foz do Jaguaribe
e dos terrenos inundaveis, e organisaram um plano. O segundo
não foi incetado por deficiencia dos mananciaes da serra de
Maranguape .
Em Fevereiro, o chefe da commissão mandou explorar
numa zona de 20 a 30 leguas do littoral, o systema hydrogra-
phico da provincia, afim de conhecer a possibilidade de con-
struir grandes reprezas ou uma serie dellas no curso de cada
rio, de modo a conservar, durante as seccas, agua sufficiente
para a lavoura e criação de gados.
371

No relatorio, apresentado ao governo pelo engenheiro Pin-


kas, chefe da conmissão, pronuncia- se elle nos seguintes ter-
mos :
"Os açudes como meios propostos de reter aguas pluviaes
e irrigar terrenos da circumvisinhança formam um excellente
meio para evitar em grande parte os effeitos terriveis de uma
secca, como tambem das inundações, sendo elles construidos
por quasi todas as nações contra um ou outro mal.
"Cito os grandes reservatorios construidos na França e In-
glaterra para a destribuição das aguas e contra as inundações
annuaes, os da Espanha construidos ha 300 annos e prestando
serviços immensos ; e os ultimamente construidos na Algeria e
India contra os effeitos da secca, que já deram excellentes re-
sultados , e já citados pelo presidente da commissão, o Exm
Conselheiro Baurepaire Rohan.
Alem disto a idéa dos açudes já tem raizes muito fortes na
provincia, tendo os que foram construidos em uma escala tal
para resistirem a mais de um anno de secca prestado grandes
serviços, salvando quasi todos gados e parte da plantação aos
respectivos proprietarios, como me consta, entre elles, o do
Exmo Snr. Dr. José Julio de Albuquerque Barros, actualmente
presidente da provincia, o do Snr. José Antonio de Moura Ca-
valcanti, e mais outros bem conhecidos na provincia, que não
seccaram.
"Não temos ainda motivo algum para dizer que os açades
tenham prejudicado a salubridade da circumvisinhança .
"Os açudes que se tiver de fazer no curso de realisar -se
esta idéa, serão construidos por meio de uma barragem de al-
venaria, munido de um evacuador para limpeza dos mesmos
açudes e um desaguadouro para as aguas surperfluas, e nunca
serão inferiores a 10 m. de altura ou um circuito de 1 milhão
de metros cubicos.
"Nos casos em que o solo não offerecer resistencia bastan-
te para supportar o peso de uma muralha, construir-se - ha bar-
ragens de aterros, sendo calçado do lado dagua e tendo um ta-
lude de metro e meio, pelo menos.
"Estas barragens não serão superiores a 15 metros e terão
um evacuador e um desaguadouro construidos de alvenaria.
"Admittindo 20 metros como altura media de barragens de
alvenaria teremos, segundo o perfil typo por mim calculado,
372

135 m. cubicos por metro corrente de muralha . orçando - se uma


muralha de 100 metros de comprimento em 270 contos de reis .
"Dotando- se cada municipio com um açude destas dimen-
sões elevar- se-hão as despezas totaes a 8.000: 000$000 e no ma-
ximo a 10 mil contos, somma orçada pelo Dr. Buarque de Ma-
cedo.
Entrando nas particularidades sobre as obras contra as
seccas, prosegue :
AÇUDES . -Custo - 8 a 10 mil contos : effeito a irrigação
dos campos e por conseguinte suppressão absoluta de qualquer
soccorro por parte do governo nas repetições da secca, que du-
rar menos de tres annos. Accresce que, alem da suppressão dos
soccorros por parte do governo, o mesmo tirará lucro do usofru-
cto dos açudes e da pesca.
E' claro que as nossas vistas se dirijam a esta ultima
proposta apresentando ella todas as vantagens desejaveis para
evitar os effeitos de uma secca.
6. Mas teremos uma resolução melhor deste problema, ad-
mittindo-se alem da construcção de açudes, a de tres linhas
ferreas primarias que sempre prestaram secviços immensos nos
flagellos como o actual e que nos tempos ordinarios exploram
as inesgotaveis riquezas naturaes desta provincia.
" A vista do que acabo de expor, tenho a honra de propor
a V. Ex as seguintes medidas a tomar :
A construcção de ( 30 ) açudes que resistam a 3 annos de
secca, não contendo menos de 1 milhão de metros cubicos da-
gua.
"
Estes açudes terão apparelhos proprios para a limpeza, a
qual se tem de proceder de tempos em tempos, e outros para
facilitar a distribuição das quantidades da agua necessaria a ir-
rigar os terrenos.
" O governo desappropriará o terreno do açude como tam-
bem uma area em redor delle.
" Este terreno será declarado propriedode do Estado e o
usufructo da pesca e pastagem será arrematado durante as es-
tações ordinarias .
• Quando a secca se declarar fica o respectivo contracto
sem effeito e entrarão os terrenos em uso publico, servindo da
mesma maneira, como actualmente serve a lagoa Jijoca que sus-
373

tenta 33 familias por meio da pesca. conforme declara o enge-


nheiro encarregado desta zona.
Será creada uma direcção que regule o serviço dos açu-
des.
O custo dos açudes não se elevará a mais de dez mil con-
tos no maximo, sendo a construcção realisada em 10 annos por
meio de uma verba de 1000 contos por anno.
" O governo fornecerá gratuitamente, por meio dessa com-
missão, todas as indicações necessarias para construcção de pe-
quenos açudes, aos particulares que o requererem .
30 A construcção de estradas de ferro da Fortaleza a Ba-
turité, do Acarahú para Sobral e do Aracaty ao Icó, recom
mendando-se em primeiro lugar o prolongamento da estrada de
ferro de Baturité . "
De accordo com o parecer desta commissão o governo en-
campou a estrada de ferro de Baturité e proseguio no seu pro-
longamento, começando tambem a do Camocim para Sobral.
O Dr. José Julio manifestando sua opinião sobre estas
medidas, apoia o prolongamento da Baturité e o inicio da de
Sobral ao Ipú, discorrendo nestes termos :
.. A preferencia, em relação as estradas,
cabia por todos os
motivos a de Baturité, a mais central, já começada. já estudada
em parte do prolongamento projectado. ligando o porto da ca-
pital a fertil e muito cultivada serra de Baturité, e devendo ex-
tender-se até a cordilheira geral que circumda a provin-
cia, e sendo talvez possivel prolongal- a até o S. Francisco.
Duas outras eram tambem muito recommendaveis, a de
Sobral, ligando o melhor porto da Provincia. o Camocim, a par-
te mais fertil e cultivada da Serra de Ibiapaba e ao valle do
Ipú, com o percurso de pouco mais de 200 kilom. , e passando
por aquella cidade junto a serra da Meruoca muito productiva ;
e a do Aracaty as cidades do Icó e Crato, situada esta no valle
do Cariry, o mais fertil do Ceará.
• Quanto ás represas, ainda não ha accordo a respeito do
melhor systema de construcção, e só profissionaes distinctos.
depois dos convenientes estudos, poderão decidir se são mais
proveitosos os açudes nos grandes valles, ou series de barragens
moveis nos leitos dos rios, como propoz o Dr. Gabaglia, no pen-
samento de formar canaes que ao mesmo tempo fornecessem
374

agua para a irrigação dos terrenos marginaes e facilitassem os


transportes. Parece difficil a conservação, nos annos de secca,
do nivel d'agua sofficiente para a consecução daquelles fins .
A serem preferidos os açudes, conforme opinião mais ge-
ral, converia, a meu ver, dividil-os em quatro classes : 1º Os pe-
quenos açudes destinados aos uzos das fazendas de criação e de
lavoura, a cargo dos particulares ; 2º os açudes destinados a
fornecer agua para uso dos habitantes de uma cidade, villa ou
povoado, a cargo das municipalidades ; 3º os açudes a margem
das estradas para uso dos viandantes, a cargo da provincia, 4º
os grandes açudes destinados a formar lagos, que facilitem a
cultura dos vastos terrenos, arrematados durante os annos de
inverno regular, destribuidos, durante os annos de secca, gra-
tuitamente ou por modica renda, entre os necessitados de soc-
corros, que podessem lavral-os. mediante um systema aperfei-
çoado de irrigação que fosse estabelecido. Estes só o Estado
pode construir, e converia que ficassem a cargo da administra-
ção geral, tendo a provincia extensos valles ainda pouco habi-
tados, e cuja desapropriação seria barata, onde se pode formar
reservatorios de centenas de milhões de metros cubicos d'agua,
por meio de uma muralha que ligue os serrotes circumdantes
nos portos mais approximados das ribeiras que correm entre
elles, como me parece muito exequivel no boqueirão de Lavras,
e no de Quixeramobim, nas comarcas destes nomes ; no de Ar-
neiroz, na comarca de S. João do Principe ; no de Santa Maria,
no municipio de Aracaty-Assu : no de Itacolumy, na comarca
de Granja ; e em um ou outro da serra das Mattas, na comarca
de Tamboril. "
A commissão de engenheiros, alem dos trabalhos de pro-
longamento da estrada de ferro de Baturité, apresentou parecer
ao governo sobre o estabelecimento de observatorios meteorolo-
gicos, construcção de um canal para ligar o S. Francisco ao Ja-
guaribe, estradas de ferro. cisternas, poços artezianos e arbo-
risação.
Pelos membros da commissão foram organisadas plantas
de açudes projectados no valle de Gererahú, Quixadá, Qui-
xeramobim, Sobral, Granja e Acarahú.
Em 22 de Junho de 1878 foi esta commissão dissolvida.
As differentes obras feitas por conta dos soccorros publicos
375

na Fortaleza e noutros lugares consta dos relatorios presiden-


ciaes do tempo ( 1 )
ACÇÃO PARTICULAR. - De par com a acção official e ser-
vindo-lhe como que de suggestão, appareceram na imprensa.
no parlamento, em associações scientificas, em folhetos, estudos
ou indicações mais ou menos pensados.
Em 1859, meu pai (2 ) emprehendeo uma campanha em
favor da conservação das mattas no Ceará, como meio de mino-
rar a escassez das chuvas ; o Dr. Viriato de Medeiros, em arti-
gos, no Correio Mercantil do Rio de Janeiro, de 8, 9 e 13 de Ja
neiro de 1860, discutio os meios até então propostos para neu-
tralisar o effeito da seccas, e em parte estudados pelo enge-
nheiro Raja Gabaglia numa memoria que apresentou ao gover .
no por parte da commissão scientifica, da qual elle fez parte em
1858 a 60.
Como esta memoria (3 ) é a mais antiga a explanar o assum-
pto, vou dar ao leitor o transumpto do que nella se contem, isto
é, o parecer de um profissional, a quem o governo imperial con-
fiou tão importante estudo .
• Segundo uns, diz elle, o Ceará é o Job do norte, condem-
nado por phenomenos superiores á vontade do homem, deven-
do confessar-se vencido pela natureza e dizer--observarei e fu-
gire . Segundo outros. empregando esta ou aquella medida au-
xiliar administrativa, se cortaria o mal. "
" Um, perplexo, duvída do remedio para o mal ; o outro,
queixoso, arrepella-se, censurando a indifferença e a deshuma-
nidade de quem o pode sanar. E a verdade severa e invariavel
que subsiste é que cada anno se passa entre sustos, e em an
ciosa expectativa a espera das chuvas de Janeiro a Maio, as
quaes, faltando, motivan ruina do commercio e o infructifero
desapparecimento de muitas centenas de contos de réis, repre-

[ 1 ] Dr. José Julio de Albuquerque Barros - Falla com que


abrio a Assmblea provincial a 1º de Novembro de 1878 - pag. 50
a 69.
Ibid - Falla da abertura da Assembléa etc. , 1880 - pag. 50 .
[2] Thomaz Pompeo de S. B. - A necessidade da conservação
das mattas.
[3 ] G. R. Gabaglia- A questão das seccas. ( 1861 ) impresso
na typ. nac. em 1877.
376

sentados por milhares de cabeças de gado, e pela inesperada


mesquinhez das culturas em seguida, de perto, surge a fome
com o cortejo horroroso de miseria e de corrupção. ”
Depois de examinar as condições topographicas, as cultu
ras, methodo de criação, e o regimen pluvial, assegura que ao
Ceará não faltam chuvas, e sim meios de retel-as e aproveital as..
Lembra como medidas apropriadas :
Fontes artezianas .
Poços.
Açudes.
Canaes.
Qual destes recursos é prefirivel, pergunta ? Responde :
As fontes artesianas seriam insufficientes e dispendiosas , em
todo o caso de resultados secundarios e só para effeitos parciaes .
66 Os poços e cacimbas, classifico-os na economia admissi-
vel de trabalho para os particulares e em pequenas lavouras ,
mas de pouco alcance será o soccorro prestado para o territorio
completo da provincia.
66
Os açudes constituem auxilio importante, cuja vantagem
porem, é mais proficua para os abastados e predilectos da for-
tuna de que para a massa do povo e fora nimiamente dispen-
dioso ao governo fazel-os em numero sufficiente para toda a
provincia ; digo mais, a distribuição motivaria conflictos e dif-
ficuldades que seriam insupperaveis ou que reverteriam apenas
em utilidade de uma pequena porção da população , talvez jus-
tamente daquella que menos precisão tem. Accresce tambem
que para desenvolver em grande escala a construcção de açudes
proprios a resistirem muito tempo e com grandes proporções,
ha necessidade de muita mão de obra e da reunião de numero-
sos trabalhadores, o que não é facil conseguir sem grandes dis-
pendios e provaveis interrupções . Reconheço, portanto, nos
açudes o melhor recurso que cada proprietario deve possuir
para garantir suas condições de fortuna ; mas como salvação
geral da população cearense, torno a dizer, é meio demasiado
limitado e de tardia conclusão.
"Restam os canaes : estes são o grande recurso, o unico
proporcional e possivel para o fim desejado, e. assevero que o
mais economico.
"Eis o que proponho :
"Tosamente limpar de vegetação perniciosa o fundo ou
377

leito de taes rios, nos quaes, arbustos agrestes têm vingado de


maneira viçosa e potente ; esta mesma vegetação, cravada em
ramos, entrelaçados e plantados com a conveniente disposição
nas margens, as quaes se lhes deve dar os necessarios taludes
ou disposições dependentes de terrenos com o fito de evitar es-
boroamentos das margens do canal, e mais, fachinal- os, fariam
que se reunissem simultaneamente os tres trabalhos de limpas,
revestimento e aterros, onde se julgasse indispensavel.
Pelos meios mais faceis e economicos, os quaes reduzem -se
a pequenos regos ou vallas, procurar que todas as aguas dos
regatos accidentaes, em terrenos não cultivados, fossem lançadas
nos rios proximos ou riachos e fazer que as aguas destes
igualmente buscassem cursos mais volumosos ou depositos de
grandes lagoas.
"O nivelamento do leito dos cursos de agua e vallas com-
parado de grandes distancias com os pontos sensivelmente
mais baixos e mais altos das margens, daria sufficiente conhe-
cimento da linha, limite extremo das represas e principio das
aguas de inundações Estas secções transversaes de nivelamen-
to. necessarias para o calculo das aguas depositadas, tauto
quanto para as alturas das represas, se fariam nas distancias
de uma a outra de 500, 1000 e 2.000 braças, e mesmo mais, se
gundo as margens dos rios. Os lugares mais apertados e fun-
dos, de preferencia aos abertos e rasos, abundam nas primeiras
condições ; em todos os rios, mesmo no Acarahú, Mundahú, etc.
por meio de grossas vigas de secção rectangular, cujas extre-
midades se apoiassem em calhas tambem de madeira e solida-
mente assentadas nas margens ou paredões lateraes, se fariam
barreiras ou tapagens dos rios, avançando successivamente das
cabeceiras para a foz, represando as aguas no volume que se
julgasse conveniente, o qual dependeria do numero de vigas
que se mantivessem sobrepostas.
"Nos grandes rios, como chaves de todas as tapagens, se
fariam em dous ou tres lugares represas collossaes, proporcio-
nadas aos fins, pelo systema de barrage mobille, simples, de
prompta manobra e economico. Mas estas obras, sendo de ele-
vado custo e proximas a foz, para regular as grandes massas
de agua retidas, deveriam ser construidas mais tarde, quando
os engenheiros de acordo decidissem o lugar e melhor meio de
378

construcção em unanimidade de opiniões e com a sanção da


experiencia.
"O que se disse para os rios, como meio de represar, guar-
dadas as proporções devidas, se applicaria as correntes nas
proximidades das montanhas e aos regatos de alguma força .
"O systema. aconselhado e primitivo nas construcções de
canaes, é tão simples e facil na pratica que, fixados os lugares
das represas ou barragens, qualquer sertanejo vendo-o fazer
uma vez, não só o percebe, como é capaz de o executar ; qual-
quer tronco falquejado de modo a assentar bem sobre outro
inferior solve a difficuldade principal. Por estes termos expo-
nho o plano geral e unico que prevejo possivel de satisfazer a
questão que tanto tem preoccupado os interessados pela sorte
desta provincia, digna de todas as prosperidades.
"Com a explicação do systema proposto e a vista do re-
gular excesso de chuvas na razão de dez annos a favor contra
um secco, com os canaes ou rios represados, consegue-se :
1º Formar os depositos continuos de agua na extensão
de muitas leguas, que poderiam resistir a um ou dous annos
calamitosos.
2º A rega natural dos terrenos se faria com mais regula-
ridade, evitando-se tantos atoleiros e conservando as terras
mais humidas pelas represas.
3º Cessariam em parte as enchentes extemporaneas, que
frequentemente tem os principaes rios da provincia, sem fim
ntil : porquanto seria possivel graduar devidamente o volume
liquido abastecido pelos affluentes. ( 1 )
Taes são as ideias do Dr. Gabaglia, que não explica clara-
mente donde procurará agua para a alimentação desses canaes.
Parece que elle confia esta função as represas collossaes, de
que fala, salvo a pretença derivação das aguas do rio S. Fran-
cisco, lembrada por alguns. Na hypothese das represas, a ques-
tão reduz- se a denominar de canaes, o que outros chamam
açudes, pois trata -se precisamente do mesmo processo, de ar-
mazenamento das aguas pluviaes, por meio de barragens.
O Dr. Veriato de Medeiros. em artigos do Correio Mercantil
em 1860, e posteriormente no Jornal do Commercio do Rio de Ja-

(1 ) G. R. Gabaglia -Memoria cit., pags. 52 , 53.


379

neiro, em 1877, combate algumas das medidas propostas, par-


ticularmente a açudagem, fundamentando os seus argumentos
em factos e deduções, victoriosamente contradictos pelo Conse-
lheiro Rohan, Senador Pompeu, e em geral por todos os conhę-
dores das condições physicas do Ceará.
Os seus principaes argumentos baseam-se nas seguintes
conjecturas :
1 Se os rios e valles fossem açudados, isto é, se grandes
paredes forem construidas atravez delles, de modo a tornal- os
quasi correntes, por mais engenhosamente construidas que se-
jam, as innundações, nas grandes cheias, tomarão proporções
de um diluvio parcial ; nas estações de chuvas regulares serão
muito mais fortes e prejudiciaes do que aquellas, que só appa-
recem a longos intervallos, e das quaes com razão tanto se
queixam os cearenses .
"Estas innundações serão tanto mais frequentes e perigo .
sas, quanto estes açudes pluviaes, a poderem conservar- se, fica-
riam no decurso de poucos annos completamente obstruidos
pela grande quantidade de areias trazidas pelas aguas, e que
agora, sem obstaculo algum, no curso destas, cobrem os alveos
dos rios com uma camada de dezenas de palmos de profundi-
dade."
Quem conhece o regimen dos rios cearenses, sabe que os
seus transbordamentos, causadores de innundações nos terre-
nos marginaes, são produzidos por successivas chuvas diluviaes
em um certo trecho de seu curso, o qual não podendo dar va-
zão rapida as aguas, já pelas obstrucções de seus alveos, occu-
pados em parte por basta e densa vegetação, já por desnivela-
mento de suas margens, é transposto pelas aguas que se ex-
praiam pelas planicies adjacentes.
Desde, pois, que uma barragem, capaz de reprezar, não
uma, mas algumas dessas trombas dagua, se erga no leito do
rio, toda a região que lhe ficar a jusante será preservada do
excesso das mesmas, pois só gradualmente por meio do jogo
das comportas se lhes dará vazão . As enchentes são acciden-
taes, duram poucos dias, ordinariamente 2 a 5, tempo sufficien-
te para a descarga das aguas excessivas de um grande açude.
Accresce que os trabalhos de irrigação, alargando a zona da
infiltração e de abastecimento destas aguas, as dispersará por
380

grandes áreas de terreno por canaes dotados da capacidade cal-


culada para as maximas cargas. O leito, propriamente do rio,
será antes um collector das aguas servidas, do que um canal 19
irrigação : em muitas partes precisaria ser ractificado, melho
rado para não damnificar as culturas marginaes. Nestas con-
dições ficará apto a receber maiores cargas dagua do que actual-
mente, obstruido e disnivelado, como se acha.
O perigo das innundações decrescerá com a multiplicação
das grandes barragens, dos canaes de irrigação, do preparo no
eito dos rios, etc.
Nas regiões alcantiladas da França e da Italia, têm sido
construidas reprezas desta natureza para o fim de previnir as
innundações e regularisar o regimen dos rios. Esta primeira
objecção, portanto, é carecida de fundamento.
Quanto ao envasamento dos açudes, questão de alta mon-
ta nos de pequena capacidade, da Argelia e d'Espanha, nenhu-
ma difficuldade offerecerá nos de grandes proporções com ap-
parelhos apropriados a remoção da vasa . A abertura das por-
tas de limpeza nos começos do inverno bastará para mantel-os
com a relativa capacidade, e evitar seu desaproveitamento,
A pressão dagua, a velocidade da corrente e outros meios me-
canicos varrerão o alveo dos rios com a maxima facilidade e
promptidão.
Se esta objecção tivesse valor real, os governos inglez ,
francez, italiano, etc., não comprometteriam crescidos capitaes
na India, Argelia, Espanha e Italia na construcção de açudes
collossaes, qualquer delles inferior ao menor projectado no
Ceará.
Vejamos se a terceira objecção, opposta pelo Dr. Veriato
a estas obras. assenta sobre base mais solida.
"Para que taes represas, diz elle. ( 1 ) dêm inexhaurivel ali-
mento aos açudes é essencial que por sua vez sejam inexhauri-
velmente alimentados ; mas tanto os açudes nos rios, como
as represas nas gargantas, são somente alimentados por agua
caída das nuvens ; se esta não apparece, e não ha fontes nati-
vas, que a suppram em su falta, nos sertões, é claro, que tan-

(1) Veriato de Medeiros - Ponderações sobre a memoria do


Dr. André Rebouças - Rio 1877, pag. 12 .
381

to uns como outros seccarão sob os raios de um sol abrasador


actuando durante vinte e mais mezes. E' isto simples questão,
de tempo, não difficil de calcular- se.

"Com effeito, conforine affirma o Dr. Buist, nas Transactions


of the Bombay Geographical Society, vol. 9, a evaporação das
aguas, devida unicamente aos agentes naturaes, em Bengala, é
de uma pollegada diaria ou 30 pés annuaes.
"Suppondo que a evaporação seja apenas de 30 pés, segue-
se que ainda construidos os açudes e as represas, que devem
alimental - os , podendo conter em toda a sua extensão uma ca-
mada dagua de quasi 30 pés de profundidade, em uma rigoro-
sa secca, extraordinaria, de 20 mezes, ficarão completamente
esgotados. E, se a falta de chuvas estender-se a tres annos, de
que ha exemplos, será necessario que estes açudes tomem
dimensões de verdadeiros mares dagua doce, tendo 90 pés ou
135 palmos de fundo para resistirem no que ninguem cogita
on deve cogitar. ·
Se a secca fôr somente a ordinaria. commummente
de 8 mezes, uni açude de 20 pés ou 30 palmos de profun-
didade ficará no fim daquelle tempo sem a minima gotta
d'agua. "
"A pequena agricultura ao longo desses canaes de irriga-
ção pouco ou nenhum resultado apresentaria, pela absorpção
constante das aguas em um solo sedento, sob uma insolação
de temperaturas espantosamente elevadas.
"A grande agricultura seria impossivel por maioria de ra-
são, e impossivel tambem a producção de pastagens nas cam-
pinas, em milhares de leguas quadradas para alimentarem mi-
lhões de cabeças de gado : este fóra de duvida. não morreria
á sede, mas a fome com certeza o mataria."

O Conselheiro Rohan ( 1 ) responde a esta objecção dizendo


que ella teria todo o fundamento , se a considerassem em rela-
ção a pequenos depositos, mas não a uma grande massa
dagua. Em apoio desta opinião, cita um dos açudes de

( 1 ) B. Rohan -- obra cit., pag. 9.


382

Campina-Grande, o qual poderia resistir a tres annos de


secca. (1)
A hypothese formulada pelo Dr. Veriato de Medeiros en-
volve varias questões de subido alcance, cuja solução deman-
da maior desenvolvimento.
A primeira é a do coefficiente da evaporação, a segunda a
dos grandes e pequenos açudes, a terceira refere-se a área irri-
gavel, dado o quantum d'agua represado ; além de outras de
que me occupei no correr deste capitulo.
Coefficiente DE EVAPORAÇÃO . —O Dr. Medeiros partio de
uma base conjectural, admittindo como inteiramente applica-
vel ao Ceará, em todas as suas zonas, a evaporação verificada
em Bengala por Buist . Para que o simile fosse completo seria
preciso suppor que as condições topographicas, constituição
geologica, velocidade dos ventos, temperatura e outros pheno-
menos meteorologicos, no Ceará, eram identicos ou ao menos
analogos aos daquella parte da India.
Em vez, porém, de dados puramente hypotheticos, temos
para responder a questão do Dr. Veriato observações directas.

(1 ) Poderia citar muitos outros. No coração da secca de 79


o chefe da commissão, Pinkas, em documento official, cita alguns
que ainda conservavam agua. O Sr. R. Theophilo cita os de Ja-
guaribe-merim que resistiram admiravelmente ao flagello, alimen-
tando a sua população e conservando os seus rebanhos: e apezar
de infestada de retirantes mendigos, teria podido fazer face á
calamidade, se em vez dos seus quatrocentos açudes, tivesse
qúatrocentas cisternas ?
Rodolpho Theophilo - Hist. da secca do Ceará de 1877 a 1879,
pag. 481 .
Estamos em Fevereiro de 1884. depois de um verão de 9
mezes ; temos a vista dous açudes de Pacatuba que conservam
volume d'agua capaz de resistir a mais 12 mezes de verão.
A profundidade destes açudes é inferior a 30 palmos e não são
alimentados por fontes perennes. Não são unicamente os dous
depositos de Pacatuba. Em toda a provincia, desde o meiado
de Maio de 1883 não chove. Em alguns lugares o inverno foi
tão escasso que não creou legumes, fazendo crer na reproducção
da secca de 1784. Entretanto do litoral e sertão os açudes
acham-se a nado em sua maioria.
R. Theophilo -Ibid pag. 489.
383

feitas em duas estações centraes do Ceará, no coração do Esta-


do, conforme se vio no capitulo anterior.
Essas observações, tomadas em Quixadá e Quixeramobim.
e posteriormente contrastadas pelo Dr. Piquet ( 1 ) no leito do
açude do Cedro, deram para aquella localidade 6,02 mill . por
dia, e para Quixeramobim 5,69 m/mn. As perdas do açude de
Quixadá, nos annos mais seccos, computadas a evaporação, in-
filtração e absorpção são na media de 7 mill. por dia (exagera-
damente pondera o chefe da commissão de açudes) , o que dá
para todo o anno 2.500 millimetros : media superior a dos cli-
mas seccos e aridos do sul da Espanha, de Murcia, por exem-
plo, cuja evapora ção foi de 2.045 mill. entre 1863 e 1867. e da
Algeria, cuja porcentagem admittida nos projectos de açuda-
gem orça por 2.250 mill.
Uma barragem, portanto, de cerca de 7 metros, figurada
pelo Dr. Veriato, poderia resistir a quasi tres annos de secca, se
as suas aguas não fossem distrahidas para irrigação.
Diga-se, entre parentheses, que os açudes de 7 metros de
parede nunca foram, nem são aconselhados como medida eco-
nomica contra as seccas. Os projectos organisados até o pre-
sente, quer pelo engenheiro J. J. Revy, quer pelo Dr. Piquet.
tem no minimo 15 metros , elevando - se o de Lavras a 45 metros.
Para o de Quixadá, os calculos do Dr. Piquet respondem
o que se devera esperar delle, se os mananciaes, que o alimen-
tam , tivessem maior curso ou se as chuvas, escassas nesses ul-
timos annos, se avolumassem a encherem - no.
"Sendo a altitude do sangradouro 14 m 5 , e não havendo
na bacia do açude correntes permanentes, claro é que o nivel
dagua não póde, como se suppunha, manter-se em 15m, mas
sim em 14m5 ; e descerá mesmo rapidamente a 14 m 40 devido
as ondulações da agua.
"Em rigor, por consequencia, não devemos contar com um
volume superior a 125.694.200 metros cubicos dagua, corres-
pondente áquella altura e calculado por interpolação entre os
volumes relativos a 13 e 15 metros.
"Acceitos estes dados, vamos fazer uma hypothese desfa-
voravel, suppondo que, após haver distribuido, no ultimo verão,
o volume de 25 milhões de metros cubicos dagua, anterior-

[ 1 ] Dr. B. Piquet -Açude de Quixadá, pag. 9.


384

mente represado, sobrevenha uma secca de tres annos. Admit-


tamos tambem que destribuimos nesses tres annos igualmente
25 milhões de m. por anno e estudemos o abaixamento das
aguas no açude.
"Nesse estudo devemos ter em consideração duas cir-
cumstancias, verdadeiros dados, que assim eunuciamos :
a] Mesmo nos annos de secca ha sempre chuvas que muito
podem auxiliar a irrigação e trazer economia dagua.
Por exemplo nos tres annos da grande secca de 1877 a
1879, registrou- se na Fortaleza 1877-74 dias de chuvas com 470
mill., 1878--40 dias com 500 mill . , 1879-71 dias com 596 mill.
ou um total de 1566 mill. , os quaes, admittindo a relação de
50 % entre as chuvas do sertão e as do littoral, correspondem
no Quixadá a altura de 783 mill. Estas chuvas, que não fo-
ram sufficientes para impedir que o Ceará ficasse quasi com-
pletamente aniquilado, e que portanto, isoladas de nada vale-
rão a lavoura e a creação, alliadas á irrigação teriam sido
muito aproveitaveis e poderiam dispensar ao mesmo tempo o
emprego desta por espaço de, nunca menos, um mez em cada
anno. Effectivamente é intuitivo e todos aqui sabem [ no Ceará]
que uma chuva de 30 mill., que, isolada , é perdida, é no en-
tanto de um effeito util notavel, quando precedida ou se-
guida, com intervallo de 1 a 10 dias, de uma outra chu-
va, ou de uma irrigação. Isto prova que a irregularida-
de na successão das chuvas é tão prejudicial como a sua es-
cassez . Justificam nosso dizer quanto aos annos de 1891 e de
1898 pela sua seccura , dando aquelle apenas 338 mill, Entretan-
to não é apresentado como anno de calamidades [ o de 1891 } ,
ao passo que o de 1898, a que assistimos, foi terrivel, até
crianças morreram a mingua. A razão desta differença de ef-
feitos é justamente a que acabamos de assignalar.
"A irrigação vae ser, portanto , o -GRANDE REGULADOR
das chuvas, muito ou irregularmente espaçadas, recebendo ao
mesmo tempo dellas valioso auxilio ; e não é exagerado admit-
tirmos que 250 mill. de chuvas, mesmo muito subdivididos.
deem para substituir 4 irrigações, em um anno de secca, ou, o
que equivale, a irrigação de um mez.
"A outra observação é esta :
b] As chuvas não ces am completamente em Junho e começam
geralmente antes 5 de Janeiro.
385

Effectivamente, examinando - se o quadro de observações


mensaes do Senador Th. Pompeo e o da commissão, verifica- se
que nos annos ordinarios e mesmo em alguns de secca, os me-
zes de Julho e de Dezembro são ordinariamente chuvosos : e
como adiante mostraremos, ainda que não chova em Julho, a
terra nesse mez conserva ainda baştante humidade para dis-
persara irrigação . Assim, portanto, apesar de contarmos o
verão como de 6 mezes, & irrigação não se faria geralmente
senão durante 4 mezes, e em alguns annos, durante 5. Propo-
mos para base 5.
Tomando essas observações em consideração, eucetamos a
irrigação, com o volume de 125.694,200 m. cubicos. Suppondo ,
o que é em geral de nossa hypothese, que a quantidade des-
tribuida no primeiro anno, de Agosto a Dezembro, seja a mes-
ma em todos os mezes, temos por mez 5 milhões de metros cu-
bicos. Procurando a altura d'agua, que no agude corresponde a
este volume achamos os seguintes valores :
NIVEL D'AGUÁ ALTURAS
Entre 15 e 13 metros 253 millimetros
་་ 13 e 11 318
Para cada 11 e 9 416 66
9e 7 571
5 milhões 7e 5 827 66
5e 3 1.329
3e 1 2.507 66

Juntando a estas alturas a correspondente as perdas diver-


sas, 7 mill. por dia ou 210 por mez, resulta :
Entre 15 e 13 metros 463 mill .
13 e ll 528
11 e 9 66 626 66
9 e 7 66 781
7 e 5 46 1.037 "
5 e 3 1.539 .
3 e 1 5.717 66

Por conseguinte a altura dagua que era de 14 m , 4 será :


No fim do mez de Agosto de [ 14,400-0,463 ] = 13m , 937
66 66 " Setembro [ 13m, 937-0 ,m463 ] = 13m ,474
66 66 " Outubro [ 13m ,474-0,m463 ] = 13,011
66 6. Novembro [ 13m,011-0.m463 ] = 12m ,483
:

66 Dezembro [ 12m, 483-0,463 ) = 11m, 955


386

"O volume correspondente a esta ultima altura é de


81.661.707 m. cub, e portanto despendeu-se no 1º anno .....
44.032.493 m. 3.
"Temos, pois, ao entrar no 2º anno, que é conforme a nos-
sa hypothese, o primeiro da grande secca, um volume de
81.661.707 m, 3 com a altura de 11m.955.
Tres são então os modos que se offerecem de continuar a
destribuição ; ou irriga-se durante o anno inteiro toda a zona
já canalisada, ou irriga - se apenas durante os mezes de Janeiro
a Maio, em que as chuvas falharão ou então e finalmente, du-
rante os mezes de Agosto a Dezembro, como nos annos ordi-
narios.
"Examinando o primeiro modo reconhece-se logo que não é
acceitavel, porque a agua não chegaria nesse caso para os tres
annos, a menos que não se reduzisse a zona irrigavel e já ca-
nalisada, o que seria odioso e injusto pelas preferencias a dar.
"O segundo é evidentemente vantajoso para o agricultor
que não perde as sementes já compradas ou semeadas, nem os
cercados feitos ; alem de muito economico para o serviço de irri-
gação, porque, como já provamos, ha nesta quadra sempre o
auxilio de chuvas irregulares. Sendo assim, prejudicado fica o
terceiro alvitre e explicado porque preferimos irrigar durante
os mezes de Janeiro a Maio, nos casos de secca.
"Isto posto, admittamos que seja Fevereiro, mez chuvoso ,
mesmo nas seccas, o que, conforme a observação, dispense a
irrigação, havendo, durante elle somente perdas por causas di-
versas, ou 210 mill. de abaixamento.
Temos então, no 2º anno, o 1º da secca :
No fim de Janeiro [ 11,955-0,528] = 11m,427
66 " 66 Fevereiro [ 1,427—9,210 ] = 11,217
66 66 66 Março [ 11,217-0,528 ] = 10,689
6. . Abril [ 10m,689--0,626 ] = 10m, 063
.. Maio
་་ [ 10m,063-0,626 ] = 9m,437
"O volume correspondente a 9 m. 437 c. é de 47.878.647 m . c.
sendo, portanto, o gasto até Maio, de 33.783-060 m. cub.
A esse periodo de irrigação seguem-se 7 mezes de perdas
geraes, que fazem as aguas baixar de 1m,470, ou 7x0m ,210.
isto é, a 7m967, reduzindo o volume represado a 33-582.052 m.
387

cubicos . Por conseguinte, durante todo o 2º anno houve um


gasto de [ 81.661.777-33 582.052 ] -48.079.655 m. cubicos.
"Aqui reconhecemos ser desnecessario continuar o estudo
da hypothese feita, visto o volume restante de 33.582.052 m. c.
não dar evidentemente para mais dous annos de secca. Então,
fizemos nova tentativa, reduzindo a 20 milhões o volume a
destribuir no primeiro anno, ou a 4 milhões por mez, e organi-
samos esta outra tabella :
NIVEL D'AGUA ALTURAS
Entre 15 e 13 metros 203 millimetros
13 e 11 66 255 66
Para 4 11 e 9 .6 333
9 e 7 64 457
milhões 7 e 5 66 662 64
5 e 3 1.064 66
3 e 46 2.006 66

Juntando a estas ultimas a correspondente a perdas diver-


sas, 7 mill. por dia ou 210 mill. por mez, obtivemos :
Entre 15 e 13 metros 413 mill.
66 13 e 11" .6 465
66 11 e 9 66 543 66
66 9 e 7 6. 667 66
66 7e 5 872 66
66 5 e 3 66 1.274 66
66 3 e 1 66 2.216 66

Em consequencia sendo, ao começar a irrigação, 14m,40 a


altura das aguas será :
No fim de Agosto [ 14m.400 0m,4131-13,987
.. 66 ..
Setembro [ 13,987- 0m,413 ] = 13m , 574
66 66 " Outubro [ 13m,574- Om,4131 = 13m, 161
60 66
" Novembro [ 13m, 16 ! —( 1 ) 0m,465] = 12m.696
66
" Dezembro [ 12m, 696- 0m,465 ] = 12m,231
Esta ultima altura corresponde a 85.996.701 m. cub.
No 2º anno, ou primeiro da secca, o volume a destribuir é
de 5 milhões por mez, desde Janeiro até Maio.

( 1 ) 0m,465 é exagerado, mas ha assim mais segurança no


resultado.
388

Servindo-nos da tabella da pagina 13 e notando que em


Fevereiro ha apenas perdas geraes, obtivemos :
No fim de Janeiro [ 12m ,231-0m,528 ] = 11,703
66
་་ Fevereiro [ 13m ,703—0m,210 ] = 11m.493
.6 66 Março [ 11m.493-0m,528 ] = 10m, 965
.. Abril [ 10m,965-0,626] = 10m.339
Majo [10m, 339-0,626] = 9.713
De Maio até Dezembro a baixa de 0,210 por mez reduz
esta ultima altura a 8m,243, cujo volume corresponde a
35.998.708 m. c.
Novamente reconhecemos assim a impossibilidade de irri-
gar por mais dous annos de secca, a razão de 25 milhões por
anno : e, se comparamos este volume de 35.998.708 com o acha-
do na 1 hypothese em igual periodo de tempo - 33.582.052 ,
ainda reconhecemos que a economia de 5 milhões, realisada no
1º anno, fica reduzida logo no fim do 2º a 2.416.655 . E' que
nesta 2 hypothese é maior a perda em evaporação, devido a
ser maior tambem a superficie dagua que o açude apresenta, no
primeiro anuo principalmente.. A planta do contorno das cur-
vas de nivel. para as differentes alturas dagua, mostra- nos
quão grande é essa differença.
Reconhecida assim a impossibilidade de fazer uma distri-
buição racional, durante um periodo de 3 annos de secca, sem
prejudicar a irrigação no verão dos annos ordinarios, resolve-
mos estudal- a para um período de 2 annos apenas.
E haverá inconveniente maior em assim proceder ?
Não serão mesmo melhor aproveitadas as aguas, cuja eva-
poração é tão grande ?
E o que vamos verificar, começando por estudar a pe-
riodicidade das seccas no Ceará--na obra citada do Senador
Thomaz Pompeo. Ahi vemos que, desde 1711 até hoje, houve
3 seccas maiores de 2 annos, a de 1723 a 25 ou 27, a de 1790 a
93. a de 1877 a 79, sendo o espaço entre as duas de 63 annos e
entre as ultimas de 84.
No mesmo periodo houve 7 seccas de 2 annos e 5 de 1
anno.
Se portanto , a vista destes dados. insistimos em guardar
uma reserva dagua para as seccas de 3 aunos, teriamos, espe-
rando uma secca sempre incerta. que sacrificar, por muitos
389

annos, a irrigação ordinaria annual, do que perder muitos mi-


lhões d'agua, em evaporação e outras causas, sem obter, entre-
tanto, um resultado compensador, porquanto, uma vez que so
tenha agua para 2 annos de secca e que se faça a irrigação
completa, em 5 mezes nesses 2 annos, a unica colheita habitual
pode ser repetida. ( 1 )
O que representa indubitavelmente reserva para mais um
ou dous annos de secca. Não ha por conseguinte maior incon-
veniente em fazer a distribuição annual, contando apenas com
2 annos de secca ; e vamos assim fazel-o, suppondo que se
empregue 25 milhões durante 5 mezes, ou seja 5 milhões por
nez, quer se trate de um anno ordinario, quer de um anno de
secca, com differença apenas de que no estudo deste ultimo
devemos ter em vista a observação.
Vimos que o volume inicial era de 125.694.200 m. c. , e que
destribuindo 25 milhões nos ultimos 5 mezes ( de verão) do 1º
anno ordinario, chegamos ao fim com 81.661.707 in . c. , 11a
altura de 11m,955. No 2º anno ou 1º de secca, em Fevereiro,
de accordo com a observação, só ha perdas geraes ou 210 mil.,
e nos outros mezes as baixas dadas pela tabella. Assim temos :
No fim de Janeiro [ 11m,955-0,538 ] = 11m,427
66 6.
" Fevereiro [ 11,427-0,210 ] = 11m,217
66 66 66 Março
[11m.217-0m, 626] = 10m, 591
66 66 ** Abril [ 10m,591-0m, 626 ] = 9m,965
66 66 " Maio [ 9m,965-0m, 626 ] = 9m,339
A altura 9m ,339 corresponde ao volume de 46.700.932 m, c.
Neste mesmo anno, até Dezembro, ha uma baixa nas aguas,
por perdas geraes de 7x0m,210 ou 1,470 , que deduzida de 9.339

(1 ) A hypothese de 4 irrigações por mez é o maximo ne-


cessario nesta especie de calculos ; na pratica verificar-se - ha e
opportunamente demonstraremos que os volumes disponiveis
dão francamente para 6 mezes. Basta aqui notar-se que o milho
é colhido na Algeria depois de 4 irrigações (Debauve -18º fasci-
culo) nos dias 5 e 25 de Maio, 15 e 30 de Junho ; no Mexico é
colhido 4 vezes no anno ; no Egypto irriga-se 6 vezes, durante
2 mezes e meio. Ronna- (Irrigations, 3 vol., pags. 129 e 137 ) .
A alfafa na A'geria dá 6 córtes em 5 mezes Debauve, pag.
174) . Entre nós o milho, denominado ligeiro e o feijão de moita
dão em 75 e em 60 dias.
390

dá 7.869, altura correspondente a 32.723.964 m. c. com os quaes


entramos no 3º anno ou o 2º da secca. Neste anno é o seguin-
te o movimento da baixa :
No fim de Janeiro [ 7,869-0m, 781 ] = 7m , 088
..
Fevereiro [ 7,088-0,210 j = 6m , 878
.. Março [6.878-1m, 037 ) = 5m , 841
་་Abril [5,841-1m, 037] = 4m , 804
.. Maio
[4m.804-1m.539 ] = 3m,265
Esta altura, de 3m,265, corresponde a 6.497,665 m. c. De
Maio até o fim do anno ha novamente o abaixamento de 1m ,470
Ꮎ as aguas chegam ao nivel de 1m 795 correspondente a
3.098.230 m . c .
Este volume, restante no fim do periodo estudado, não é
perdido.
E' a garantia de vida da enorme quantidade de peixes
que o açude já contém, caso a secca se prolongue por alguns
mezes ; e essa garantia é bastante necessaria, por quanto é
provavel que nos 9 a 10 annos já decorridos a vasa tenha
substituido o volume de agua que propositalmente deixou - se
abaixo da ultima comporta. E' esse volume, restante, que ha de
equilibrar as perdas que a agua ainda soffre em seu percurso
pelo canal. E' finalmente necessario por que, como opportuna-
mente verificaremos, abaixo da cota de 2,596 as comportas
existentes não podem dar a descarga de 3.000 litros por segun-
do."
Do que fica dito conclue -se :
1º Que o açude de Quixadá com a capacidade effectiva de
125.694.200 m . c. pode fornecer para o serviço de irrigação,
aunualmente. e pelo menos durante 5 mezes de verão , 25 mi-
lhões de m. cubicos dagua..
2a Que se sobrevier uma secca, ainda pode fornecer por es-
paço de 2 annos, durante, pelo menos, os 5 primeiros mezes,
agua sufficiente para toda a zona ordinariamente irrigada, sem
prejuizo do viveiro de peixes existente .
3º Que a irrigação deve ser iniciada com o açude cheio,
em 14,50 de altura ; paral- a nos annos ordinarios, quando
as aguas descerem á cota de 11,955 ; no 1º anno de secca,
quando desceram a 9m,339, e no 20 a 3m, 625 . ”
Depois desta demonstração , que eu não quiz abreviar para
391

se poder acompanhar todas as hypotheses figuradas com os res-


pectivos algarismos comprobatorios, seria dispensavel addu-
zir novos argumentos para refutar as conjecturas do Dr. Ve-
riato de Medeiros acerca da imprestabilidade dos açudes por
não armazenarem agua sufficiente nos annos de secca .
Esta objecção, porém. foi reproduzida com apparencias
mais scientificas por engenheiros notaveis, como são o Dr. Ama-
rilio de Vasconcellos e H. Foglare .
Depois de preconisarem os pequenos açudes, procuram
demonstrar que a agua represavel no de Lavras não seria suf-
ficiente para a irrigação nos annos de secca.
"Calcula o Snr . Revy ( 1) fazer distribuir as aguas do re-
servatorio na razão de 20.000 m. c. por hectare e por anno :
mas não justifica esta hypothese. o que seria indispensavel,
visto que elle pretende quintuplicar ou decuplicar a producti-
vidade do solo,
"Parece a primeira vista muito plausivel este calculo :
pois 20.000 m. c. por hectare e por anno correspondem a 2 m.
de altura, equivalentes mais ou menos á quantidade dagua que
cae em forma de chuva nos annos regulares.
"Isto, porém, não se ha de verificar por muitas rasões, entre
as quaes, especificaremos de preferencia as que se deduzem da
observação e experiencia de seculos.
"Segundo as melhores obras hydraulicas, que consultamos.
nas irrigações se deve contar 1 a 2 pés cubicos por 0.36 hecta-
res e por segundo, isto durante 50 a 60 dias no anno : e é facto
observado que na Lombardia se destribue por hectare e por
segundo 6,023 m3 ou 715000 m3 por anno, o que está muito longe
dos 20000 m³ que o Snr. Revy pretende destribuir.
"Tomando por base esses 715000 m3 por hectare e por an-
no, no que nada ha de arbitrario, e refazendo o calculo acima,
a conclusão, rigorosamente necessaria, vem a ser que o sçude
de Lavias será apenas sufficiente para irrigar os campos do
Icó por menos de 2 mezes e meio, e o valle do Jaguaribe por 9
dias apenas ! "
A serem verdadeiros as bases deste calculo -1º não haveria

( 1 ) Amarilio de Vasconcellos e Henrique Foglare -0 pro-


longamento da estrada de ferro de Baturité e os açudes no Ceará—
Fortaleza 1882, pag. 31 .
392

açudes para irrigação, sendo inuteis todos os da India, Argelia


etc ; 2º seria uma loucura, verdadeiro esbanjamento dos di-
nheiros publicos, realisal-os.
Vejamos, porem, a que elles realmente se reduzem . E' o
proprio Snr. Revy, tão rudemente atacado. quem me vae dar
a refutação.
"E' facil de ver, diz este engenheiro, no relatorio que apre-
sentou ao Conselheiro M.el Alves de Araujo a 8 de Fevereiro
de 1882, ( 1 ) que na asserção acima os pamphletarios confundi-
ram as duas especies de irrigação que descrevi, e posto que os
seus algarismos possam ser correctos e sem risco duplicados e
quadruplicados, tomando como base do calculo a pratica da ir-
rigação na Normandia, por exemplo, a applicação destes alga-
rismos a obras de irrigação no Ceará seria viciosa e prejudicial
as ferteis planicies do Icó, porque submergeriam e affogariam
estas terras em vez de dar- lhes somente a humidade necessaria
a vegetação.
Para remover qualquer duvida , sobre este assumpto, do es-
pirito de leitores illustrados, porem não profissionaes, despirei
a questão de todas as expressões technicas, como litros por se-
gundo e por hectare, etc, ... e basearei o resultado nas regras
por todas acceitas do senso commum, sem referir-me a França,
Argelia, Italia, Egypto, India ou qualquer outro paiz.
Sabe- se que as planicies do Icó, Limoeiro e Russas são as
mais ferteis com que a natureza tem dotado qualquer paiz.
E' tambem notorio que essas planicies carecem só de chu-
vas a intervallos regulares para produzir tudo com perfeição e
abundancia.
"A chuva annual de bons annos verificou -se ser considera-
velmente inferior a 1 1/2 metro de altura. Sabe- se tambem , e de
facto vê-se todos os annos pelas cheias dos rios, que parte mui
consideravel das aguas de chuvas se escoam para o mar. Nu-
merosas observações scientificas, assentarem, que mesmo em re-
giões de solo poroso mais de duas terças partes das chuvas an-
nuaes vão pelos rios e canaes subterraneos. e que a teria absor-
ve e retem menos de 1/3. Naquellas planicies, pois, em bous

(1) J. J. Revy--ibid, pag. 16.


393

annos, quando muito, a terça parte da agua de chuva, isto é,


meio metro ( 1 ) é absorvido pelo solo.
Ha quatro mezes de chuva [um terço do anno] e 8 mezes
de secca. Si, pois, não se deixasse escapar agua alguma pelos
rios, se a agua da chuva, que agora vai para o occeano, podes-
se ser retida e destribuida durante a estação secca do anno, tal
quantidade seria sufficiente para humedecer estas planicies du-
rante 8 mezes de secca dos annos ordinarios, absolutamente do
mesmo modo como se a estação chuvosa tivesse continuado sem
interrupção durante o anno inteiro. Destas considerações se-
gue-se que 1 1/2 metro dagua de altura sobre a área dessas
planiceis seria ampla provisão para repartir pelos mezes do
anno.
Uma área de terra de 100 m. de comprimento por 100 de
largura [ 10000 m. quad. ] chama- sə 1 hectare , e esta superficie
coberta com uma camada dagua de 1 1/2 mettos de altura cor-
responde ao volume de 1500 metros cubicos.
Um supprimento de 15000 m. c. por anno seria sufficiente
para estas planicies ; e este algarismo é confirmado pelos en-
genheiros de todas as partes do mundo, como conveniente para

irrigação de paizes quentes , tendo por fim dar humidade a ve-
getação, e corresponde quasi a 1/2 litro por segundo e por hec-
tare ; o que por um anno seria igual a 15.768 m. c. A pratica
real em obras modernas de irrigação mostra que a quantidade
necessaria é inferior a 1/2 litro por segundo e por hectare.
Os 10.000 hectares das planicies do Icó seriam amplamen-
te suppridos com 15.000 m. 3 dagua por hectare annualmente,
isto é a sua área inteira seria amplamente supprida com
150.000 m. 3 durante 12 mezes de secca continua ; ou em uma
grande secca de 3 1/2 annos, com 525.000 m. 3. O reservatorio
de Lavras com os seus 1.500.000.000 m. 3 no começo de uma
grande secca teria, pois, agua em abundancia para regar mais
do duplo da área das planicies do Icó.
Mas, uma vez declarada a secca, o que sempre se conhece
no fim de Maio de cada anno, isto é, 9 mezes depois do fim da
estação chuvosa precedente, tão luxurioso supprimento não
continuaria, mas seria limitado ao absolutamente necessario.

( 1 ) Para ser mais exacto, deveria dizer 300 mill., porque a


media dos invernos nos sertões é de 900 mill.
394

As plantações que exigem mais agua cessariam, e a popu-


lação limitar- se- ia a producção dos generos de consumo local,
de mantimertos para o povo e animaes domesticos ; e para
taes plantações, metade do luxurioso supprimento dagua acima
dito seria completamente sufficiente.
A distribuição dagua do reservatorio de Lavras durante
uma secca de 3 1/2 annos seria a seguinte :
Nos 3 primeiros mezes, até declarar-se a grande secca,
em fius de Março, já se teriam gasto com o supprimento com-
pleto 1.250,3 m . c. dagua por hectare e por mez , ou nos 9 me-
zes- 11.250 m. 3 por hectare. Durante os 33 mezes restantes
com o supprimento reduzido de 625 m. 3 por mez e por hecta -
re, a agua gasta seria de 20,625 m. 3 por hectare, o gasto total
nos 3 1/2 annos elevar-se - hia pois a 31.875 m . 3 por hectare
de terra irrigada. O reservatorio de Lavras perderia por
evaporação e infiltração nos ditos 3 1/2 annos menos de
500.000.000 m. 3 dagua ; e o seu volume aproveitavel para a
distribuição excederia de mil milhões de metros cubicos.
Este volume dividido pelos 31.875 m. 3 necessarios por hectare
mostra que, descontada a evaporação nos canaes, cerca de
30.000 hectares poderiam ser constantemente irrigados durante
todo o tempo de uma grande secca : 25.000 hectares desta área
produziriam todo o necessario para meio milhões de pessoas
ou quasi a presente população da provincia do Ceará e nem
uma cabeça de gado morreria por falta de alimentação ; as for-
ragens artificiaes, usadas na Europa, e em grande parte nos
Estados Unidos, produzidas por meio da irrigação no valle do
Jaguaribe, conservariam o gado em excellente condição , de
modo a supprir leite, manteiga e queijo para toda a população.
Convem lembrar que só por figura de linguagem se diz
que, durante a secca de 1877 a 79, não caìo gotta de chuva ;
o facto é que em Quixadá, por exemplo, em 1878 e 1879, caío
bastante chuva para produzir bom pasto, mas o gado já havia
morrido nos 18 mezes anteriores.
Houve fortes chuvas em Itacolumy durante os meus tra-
balhos ali, em Abril e Maio de 1879, tanto que o rio Itacolumy
correu ; mas todas estas chuvas não podiam resuscitar a vege-
tação extincta e o gado morto .
Taes chuvas seriam de valor para a agricultura. se encon-
395

trassem a vida animal e a vegetação em pleno vigor em terras


irrigadas. Alem disto suppririam alguma agua aos reservato-
rios, e reduziriam as perdas causadas pela evaporação e infil-
tração."
Respondida a principal e unica objecção valiosa contra os
açudes- ipso facto -deixa de ter importancia a impugnação do
Barão de Capanema, baseada no mesmo presupposto.
Nos artigos do Correio Mercantil de 1860, o Dr. Veriato de
Medeiros aponta as seguintes medidas para combater as seccas :
1º Estando fóra do alcance humano fazer cessar as seccas,
e sendo ellas tão fataes quanto as leis atmosphericas,
2 Nem fontes artesianas, nem canaes, nem arborisação
fariam minorar e prevenir as seccas.
3º O melhor meio de evitar os seus effeitos, (das secras
extraordinarias), que são periodicas, seria conhecer-se o perio-
do em que ellas apparecem, fuudando -se em observações me-
teorologicas, e conhecido elle fazer-se o que vai em seguida
copiado ipsis verbis :
"Se as seccas forem preditas 3 ou 4 mezes antes, que im-
mensos beneficios não tirará a provincia do Ceará desta pre-
dição. Os criadores, conhecendo que o mal é certo, não se con-
servarão immoveis com uma funesta esperança de bom tempo,
e farão opportunamente a retirada do seu gado para os luga-
res onde as seccas não chegam .
"O lavrador deixará de vender o excedente de sua colhei-
ta não perderá as sementes, que uma ou outra chuva espo-
radica o faz muitas vezes lançar no solo ; aproveitará as plan-
tações, que o fazem viver, antes que a secca as torne inaptas,
para dellas tirarem-se materias alimenticias .
O negociante, em lugar de fazer transações, cujos bons re-
sultados dependem das estações chuvosas, dellas abster-se - ha.
A parte da população que só pode existir, quando todos
os ramos da industria florescem, poderá, sem temor de encon-
trar a morte, a cada momento, emigrar ou approximar -se dos
pontos da costa, onde o soccorro é possivel, é certo.
O governo, pressuroso pele bem estar do povo, fará vir
de antemão os viveres.
E as demais medidas todas na supposição de que a previ-
são se fará por meio de observações meteorologicas ! "
396

E' pasmoso que uma intelligencia enlta pareça ignorar os


rudimentos da sciencia, que ella preconisa como salvadora.
Ainda hoje, depois de decorridos tantos annos, quasi meio
seculo, as predições, fundadas em observações meteorologicas,
de milhares de estações europeas e norte americanas, não al-
cançam mais do que algumas horas : menos de um dia. [ 1 ] Como
pretender que em 1860 esta sciencia podesse prever a secca ?
O Dr. Veriato para mostrar a plausibilidade de sua these
affirma que na India ingleza o Sur. Blanford pôde, pelo estudo
das leis meteorologicas, predizer as estações pluviosas, bem co-
mo as grandes seccas, dando com isto ensejo ao governo in-
glez de previnir- se em tempo com os soccorros necessarios as
populações flagelladas.
Dahi conclue que não ha razão alguma para suppor-se que
as mesmas leis, sendo estudadas entre nós com o devido crite-
rio, para nada sirvam sob o ponto de vista pratico .
Já em outra parte, ficou assignalada a opinião do Snr.
Blanford sobre a correlação entre as manchas solares e as chu-
vas na India, diametralmente opposta a tal predicção. Elle nada
affirma de positivo. mostrando, pelo contrario, por tabellas
de chuvas em 7 estações da India, as anomalias que restrin-
gem a applicação da theoria do Snr. Hunter (da connexão da
actividade solar com a frequencia das chuvas) . São suas estas
expressões : "The above is perhaps sufficient to shew that the

(1 ) O problema da previsão do tempo consiste em obser-


var as deslocações da corrente aerea, apanhar os primeiros
signaes de chegada de cada movimento rotatorio, determinar
a extensão e intensidade do meteoro, a distancia em que elle
deve passar da região considerada, a direcção que deve seguir,
a velocidade com que se transporta. Até ahi, por emquanto, se
detem o poder da sciencia do tempo ( Marié Davy -Mouvements
de l'atmosph., pag. 434. )
Por sua vez diz Flaumarion -Não será possivel prever a
a marcha do tempo senão quando multiplas observações em todo
o globo permittirem analysar os movimentos meteorologicos
mensaes e diurnos .... A sciencia chegará a dominar as leis in-
variaveis e as forças constantes que regem esses movimentos ,
por mais complicados e obscuros que elles ainda nos pareçam—
L'atmosph. pag. 480.
397

generalisations on rainfall of Dr. Hunter's pamphlet probably


require some modification and limitation, etc. ( 1 )
Em outro trabalho (2), o mesmo autor, depois de se haver
referido aquella theoria, conclue : There are, however many
anomalous oscillations, and the existing data are far from
sufficient to allow of our estimating the numerical probability
of a failure of either winter or summer rainfall in any given
year. "
Daqui se vê quão differente é a verdade, [ a opinião de
-Blanford da que lhe attribue o Dr. Veriato !
Como este, são os remedios que elle propõe, cuja analyse
succinta foi feita pelo Conselheiro Rohan e Senador Pompeo
nos escriptos a que já me referi. Dou aqui a summula :
1º Os criadores fariam opportunamente a retirada dos seus ga-
dos para os lugares onde as seccas não chegam.
Quem conhece o systema de criação do gado no Ceará com-
prehende desde logo a difficuldade, senão impossibilidade des-
sas retiradas, como são chamadas pelos vaqueiros Depois de
um longo verão, o gado está enfraquecido, as aguadas espaça-
das ; e os sitios melhores, isto é, menos attingidos pela carencia
de chuvas, algum olho d'agua ou pequena fonte ao sopé de ser-
rotas, ordinariamente afastados. E' para elles que se fazem as re-
tiradas, cujo proveito, nos annos verdadeiramente seccos, é quasi
nenhum, não só porque a agglomeração do gado reduz dentro
em pouco a pastagem a quantidade insufficiente para sua ma-
nutenção, como pelas epizootias que se desenvolvem, e o breve
estancamento das aguadas. Não ha sitio privilegiado, indem-
ne de seccas em tal emergencia. Só a margem dos grandes
açudes se poderiam abrigar levas crescidas de gado .
E, observa judiciosamente o Conselheiro B. Rohan, se um
criador tivesse a felicidade de alcançar um lugar onde as seccas
não chegam, devemos pensar que jamais teria o mau pensa-
mento de voltar áquelle donde uma nova secca o veria re-
pellir.
2º O lavrador deixaria de vender o excesso da sua colheita ;
encheria seus celleiros para dous ou tres annos.

(1) Henry F. Blanford -The cycle of sun-spots and of rain-


fall, pag. 30.
( 2 ) H. F. Blanford- Note of the Rainfall of India, pag. 12.
398

A proposição em si não requer longo commentario. Se os


observatorios meteorologicos podem prever as seccas com 4 a 5
mezes, seria em Novembro que elles teriam de dar aviso aos
agricultores para se acautelarem. Nesta epoca todos já teriam
vendido as suas colheitas, e quando não o tivessem, como espe-
rar que pobres homens, cajo trabalho é quasi pessoal ou au-
xiliado por algum aggregado, tivessem produzido mantimentos
alem das necessidades domesticas por tempo maior do que o
ordinario ? Sem accommodações para a conservação de cereaes,
enstosamente preservados das influencias destruidoras, [ bichos,
bolor, etc. ] onde iria de um dia para outro obtel-as ? [ 1 ]
E' com o excedente das colheitas que elles adquirem ferra-
menta, vestuario e outros objectos de uso ou necessidade do-
mestica, não produzidos por sua lavra.
3. Os melhoramentos materiaes ganharão muito com a mudan-
ça dos povos do interior para o litoral, porque a administração pu-
blica teria a sua disposição muitos braços a empregar, etc.
Isto é simplesmente phenomenal ! O alojamento de 200 ,
300 a 500.000 pessoas de ambos sexos e de todas as idades na-
da seria ! A secca de 1877 a 79 mostrou como isto foi detri-

[ 1 ] Acerca do armazenamento de forragens oppõe o Snr.


Rodolpho Theophilo argumentos de valor. tirados das condições
do creador cearense .
"Por um momento acreditemos praticavel, diz elle, a
colheita e conservação da forragem. Supponhamos que um
eriador, possuindo 2.000 rezes, tentado pelas idéas do Dr. Capa-
nema, as queira pôr em pratica.
"Antes de tudo é preciso construir os depositos para forra-
gem. Grandes armazens devem ser feitos, com capacidade de
receber e guardar alimento para 2.000 rezes durante 6 mezes,
tempo que dura a secca annual [ verão ], isto é, quando as ´esta-
ções são regulares.
"A ração diaria de uma rez, sendo de 6 kilos de capim
secco, que, convenientemente enfardado, occupa o espaço de
meio metro cubico, podemos saber ao certo as dimensões dos
depositos para as 2.000 rezes.
Tem que alimentar este gado por 180 dias, para o que se-
rão precisos 2.160-000 kil. de capim secco, volume que occupa
um espaço de 180.000 metros cubicos.
"Admittindo -se que excesso da forragem dê para fazer tão
grande deposito, o que é impossivel por ser excessivo o nu-
mero de rebanhos para a pastagem que os campos podem pro-
399

mentoso para os cofres publicos, para a moralidade e desenvol-


vimento social do Ceará. O governo não poderá jamais dar oc
cupação restricta no litoral a tal massa de gente ; as primeiras
despezas de estabelecimento serão crescidas, e um exercito de
funccionarios publicos, ad hoc creado, terá de superintender os
serviços improvisados por 6 a 8 mezes.
Um desastre a accrescer a calamidade climaterica.
Vê-se a que se reduzem as medidas propostas - Vejamos se
os fundamentos scientificos com que pretende explicar o phe-
nomeno das seccas são mais valiosos.
"Os ventos do S E., diz elle, que em relação as outras pro-
vincias do Brasil e ao S. do cabo de S. Roque têm uma direc-
ção perpendicular a sua costa, em relação a do Ceará teem
uma direcção parallela, por formar o gisamento da costa un
angulo de 90 °, e por isso, quando as calmas equatoriaes se
movem para o norte, ellas deixam sobre o mar a maior parte
dos vapores que deviam beneficial -o, e eutão apparecem as
mesquinhas chuvas de Maio e Junho. Nestes dous mezes, as
provincias a S. e a S O. , que por sua posição a respeito das evo-
luções atmosphericas são constantemente banhadas por fre-
quentes e fortes chuvas, estão em sua temperatura geral dis-
criminada, e o Ceará, com o seu solo arenoso, calcareo e emi-

duzir, vejamos quanto vai custar ao criador a construcção dos


depositos necessarios a armazenagem daquella quantidade de
forragens.
"Calculemos as despezas com a construcção de um arma-
zem que comporte 4.000 fardos de capim , tendo. portanto, de
40, 60/100 m. de comprimento, 10 60/100 m . frente e 5 m . de
altura. Este deposito, que não ficará por menos de 1.6574000,
obtendo-se tijolo de alvenaria a 6$ o milheiro e madeiras tosca-
mente preparadas, só comportará rações para dous dias a
2.000 rezes. Para 180 dias serão precisos 90 armazens que cus-
tarão 140 : 130$090 occupando o espaço de 3.654 m., mais de
meia legua.
"Tal experiencia, alem de cara , não seria praticavel, pois
difficilmente se encontrar a um criador, no Ceará, que tivesse
aquella quantia entre titulos realizaveis. As 2.000 rezes vendi-
das ao preço de 50000 cada uma, dariam 100:000 $000 ou me-
nos 49 contos do que a sua salvação. Para evitar um prejuizo
teria outro maior.
Rodolpho Theophilo - ibid. , pag. 484.
400

nente absorvente, e mais baixo do que o dellas, supporta os


effeitos de um sol que tudo evapora, e que mostraria tempera-
turas incriveis, se observações meteorologicas fossem feitas e
registradas.
"Em taes circumstancias, qual é a consequencia natural ?
Estabelecer-se -hão correntes de ventos das terras mais frias
para as mais quentes. Estas correntes, contrarias aos ventos de
S. E.. que sopram parallelos a costa, fal-os desviar de seu ca-
minho, e então extinguem- se de todo em fracas chuvas, que
borrifam a provincia : não cae uma só gotta dagua, e eis a sec-
ca se extendendo até Janeiro e Fevereiro do anno seguinte.
quando vêm as calmas equatoriaes, que, mais poderosas do
que as correntes contrarias, as rechaçam. e nos mimoseam com
as fortissimas chuvas, que transformam a aridez do deserto em
amenidade do paraiso“
Custa-se a crer que o exposto tivesse sido escripto por es-
pirito culto, versado em estudos meteorologicos, taes são us
erros accumulados em tão breve espaço.
Devo protestar, incidentemente, que o solo do Ceará não é
arenoso, calcareo e eminente absorvente, como affirma o escrip-
tor. A fóra o litoral, e raro trecho do sertão, a quasi totalidade
de sua superficie é argilosa. Mesmo nos valles, a vasa é tão du-
ra, que só depois de chuvas frequentes amolece e forma ato-
leiro.
Quanto a temperatura , o registro meteorologicos do obser-
vatorio de Quixeramobim, um dos quatro registradores exis-
tentes no mundo, de systema sueco, mostra, como atraz ficou
dito, que ella é muito mais toleravel e menos alta do que de
Maranhão as Antilhas.
O parallelismo da costa não poderá influir em relação aos
ventos aliseos, porque estes acompanham a marcha apparente
do sol ; penetram pelas terras a dentro até os Andes a propor-
ção que o grande fóco de dilatação e calor se desloca para W.
As observações de Quixadá e de Quixeramobim , já registadas .
mostram a sua frequencia.
A corrente, portanto, de ventos, dos lugares frios para os
mais quentes, contrarios aos de S. E. , em vez de desviar os mais
frios, como suppõe o Dr. Veriato, os deteriam, e do encontro de
ambos, formar - se-ia uma zona de calmas, de estagnação at-
mospherica, resultante do embate de forças oppostas, produ-
401

zindo aquelles ventos, condensações tanto mais rapidas quanto


os ventos de S. E. forem mais aquecidos e saturados de vapor.
Em vez, pois, de um vento desviar o outro de sua marcha,
concorreria para augmentar a frequencia das chuvas.
Refutando o argumento do parallelismo costeiro, oppõe o
conselheiro B. Rohan considerações de valor. fundadas em que
a direcção da costa do Pará é, com pouca differença, a mesma
que a do Ceará, porque, se esta na parte comprehendida entre
o cabo de S. Roque e a enseada de Jericoacoára, segue a di-
recção indicada, é tambem certo que deste ponto em diante,
comprehendendo a costa do Piauhy, Maranhão e Pará. corre ao
W. N. W. com pequena variante para o W.
E ainda que, sendo o Pará tambem muito calido , é de crer
que as mesmas causas actuem em ambas as provincias para
que os ventos contrarios aos de S. E. produzam os mesmos re-
sultados, tanto mais que é mui pequena e as vezes nulla, segun-
do os pontos a que se attender, a distancia de suas latitudes
respectivas. Entretanto, se o Pará tem, como o Ceará, um inver-
no e um verão, nem por isto deixa de chover todos os mezes do
anno, como o attestam as observações feitas em 1857. na cidade
de Belem.
Finalmente, se é ao parallelismo dos ventos do S. E. que
devem ser attribuidos os phenomenos meteorologicos que se
observam no Ceará, como explicar os que occorrem ao S. e ao
S. W. do cabo de São Roque ? Aqui já não é o parallelismo,
é o quasi perpendicularismo que se observa ; e, não obstante
esta disposição da costa da Parahyba e de Pernambuco, relati-
vamente aquellas correntes, não deixa o interior destas provin-
cias de soffrer nas mesmas estações e nos mesmos annos em
que a falta de chuvas assola o Ceará.
Como acaba de ver- se, as opiniões do Dr. Veriato, quer
aconselhando medidas protectoras contra as seccas, quer inves .
tígando as causas destas, são inconsistentes, sem base em fac-
tos ou principios scientificos.
Vejamos o parecer de outros doutos, externado na discus-
são travada no Instituto Polytechnico do Rio de Janeiro, a 18 de
Outubro de 1877.
O Dr. Zozimo Barroso disse :
"Tenho por mim que na construcção de açudes está o
principal remedio ao mal. Superficies de evaporação, entreten-
402

do em certo gráu de humidade a atmosphera , além de produzi-


rem permanentemente grande bem a vegetação, formarão os
vapores aquosos necessarios a formação das chuvas, e ainda
que em certos aunos os ventos tendam a dispersal- os, a cons-
tancia do supprimento desses vapores assegurarão mais cedu
ou mais tarde ( dependendo do restabelecimento das convenien-
tes condições atmosphericas ), a queda dos mesmos sob a forma
de chuva na região onde existirem taes superficies d'agua.
No men entender a construcção de açudes é obra de gran-
de alcance, muitissimo necessaria, e que merece toda a attenção
do governo.
A provincia do Ceará deve ter um serviço especial de açu-
des assim como a Hollanda tem o seu serviço de diques, e o
Estado deve tratar com todo o interesse de promover directa e
indirectamente a construcção de açudes.
Directamente, tomando a si a grande construcção dos re-
servatorios nos valles, que podem ser facilmente fechados com
muralhas apropriadas, represando- se e conservando- se as aguas
que hoje se escoam e desapparecem rapidamente.
Indirectamente, auxiliardo os fazendeiros e pequenos pro-
prietarios de terras, fornecendo-lhes minuciosas instrucções
acerca da construcção de açudes. forma e dimensões das mu-
ralbas, comportas e sangradouros, etc., e estabelecendo um pre-
mio pecuniario, baseado na superficie d'agua creada, o qual se-
ria pago com promptidão e boa vontade a todo proprietario que
construisse açudes em suas terras. ”
O Conselheiro Rohan aconselhou o estabelecimento, em
larga escala, de açudes e a plantação de arvoredo em torno
d'elles formando dessa sorte especies de oasis á semelhança dos
que se observam nos desertos. Devem ser preferidas as arvores
fructiferas que possam servir de alimentação ao homem.
O Dr. Coutinho mostrou-se favoravel á construeção de al-
guns grandes açudes de uma a duas leguas de extensão, açudes
que serião considerados como centro d'abastecimento, sendo
para esse fim escolhidas localidades convenientes, citando o bo
queirão de Quixeramobim como um dos sitios apropriados. Lein-
brou a conveniencia de guardar os cereaes dos annos de safra
abundante para os de carestia e de secea, e de acostumar-se o
gado a comer á forragem secca, preparando-se o feno de capim
pe pasto. Acreditava que com 200 contos se poderiam construir
403

4 açudes desses. Julgava de bôa politica o replantio das mattas.


O Conselheiro Buarque de Macedo entendia que no estudo
dessa questão havia dous pontos a examinar as causas e a
origem das seccas, e os meios de minoral-as.
Quanto ás primeiras, estavam dependentes de leis naturaes
superiores a vontade humana ; quanto aos segundos, não con-
cordava com o estabelecimento de observatorios astronomicos,
porque, além do mais, serviriam para alarmar as populações e
fazel- as fugir para o littoral. Pensava que a questão do melho-
ramento das condições climatericas do Ceará era de mais facil
solução do que se presume. Opinava pelo açude e estrada de
ferro ; cerca de 200 açudes com capacidade cada um não infe-
rior a 100 milhões de litros e com o dispendio de 10.000 :000 $000 .
O Dr. Alvaro de Oliveira disse que era dos açudes que se
deveria tratar, não de 5 ou 6, mas de muitos por toda parte. No
seu modo de pensar "os açudes devem ser feitos nos valles dos
rios, nos sitios, uas fazendas, em todos os pontos do sertão, em
todo territorio da provincia, de modo que possam influir como
fócos de evaporação e condensação. ”
Não queria que o governo tomasse a si a construcção dos
açudes, nem que fossem nomeadas commissões para estudar as
melhores localidades ; pertencia isto ao povo cearense, que sa-
be construir açudes e conhecer os logares mais convenientes :
O geverno auxiliasse os particulares e animasse por meio
de premios a iniciativo individual.
Esses açudes, espalhados em todo Ceará, determinarião o
desenvolvimento das pastagens, dispensando a preparação de
feno para sustento do gado, cuja morte é devida durante as
seccas, não á sêde, mas a falta de pastos.
Como medida complementar, insistia no plantio de novas
florestas e na conservação das actuaes.
O engenheiro Rebouças preconisava : a prompta execução
das vias - ferreas, a desapropriação dos terrenos marginaes a es-
ses estradas para serem divididos em lotes e nelles fixados os
emigrantes : execução de obras e melhoramentos de portos
maritimos e fluviaes notoriamente o da Fortaleza, Mucuripe,
Aracaty, etc., etc. , abertura de poços indianos e instantaneos ,
construcção de cisternas venesianas , preparação de silos algeria-
nos, estabelecimento de pescarias na fóz dos rios do Ceará e
404

melhoramento da fóz dos rios para prevenir innundações nas


epocha das chuvas.
Em outra reunião, na Associação Brazileira de Acclimação,
presidida pelo Conselheiro Beaurepaire Rohan, em 20 de Outu-
bro de 1877, sustentava o Barão de Capanema que as tentati-
vas de plantio de arvoredo importavão uma acclimação de in-
certos resultados. attendendo ao clima do Ceará.
"Arvoredo, dizia elle, existe em abundancia, principalmen-
te leguminosos, que crescem nos terrenos seccos e pedrego-
sos ; vicejam emquanto chove, depois perdem a folha, e per-
mittem a acção do sol sobre terrenos com toda a intensida-
de.
Sobre os açudes, dizia que elles occupariam grandes super-
ficies, tendo uma pequena orla de infiltração, que poderia em
todo tempo produzir lama : porém, em proporção muito peque-
na em relação á area estragada pela agua, exposta á violenta
evaporação e servindo para desenvolver infusorios e algas inu-
teis.
Devia ser conservada a agua em reservatorios onde podesse
ser aproveitada para consumo. "Com agua, mantimentos e for-
ragens guardadas, arrosta-se qualquer secca. Aproveitar, com
criterio o que a natureza dá, é o unico meio efficaz ; ir de en-
contro a ella é tentativa perdida.”
O Dr. Glaziou inclinava-se a pensar com o Conselheiro
Rohan na efficacia de açudes, acompanhados de grandes grupos
de arvores, cujo fim seria a formação de humidade, a protecção
dos tanques e de seus peixes.
"Construir florestas artificiaes, mesmo em terrenos pessi.
mos, a intelligencia humana o consegue quasi facilmente com
tempo e perseverança." Submetteu a Associação de Acclimação
estas considerações :
"Em logar de principiar á plantar isoladamente vegetaes
já formados, seria mais prudente proceder por via de semen-
teiras, e antes de tudo, pelas especies mais communs nos cam-
pos do Ceará, mas em larga escala. Em semelhante caso. por
exemplo, no Egypto, na Algeria, a pratica veio mostrar que é
preciso semear mil sementes para obter uma arvore segura ;
demais é preciso que estas arvores nasçam juntas afim de se
protegerem reciprocramente contra as vicissitudes do tempo e
os numerosos accidentes a que estão expostas. “
405

O Dr. Caminhoá aconselhava o plantio de arvores de gran-


de crescimento nos logares elevados.
O Dr. Barbosa Rodrigues disse que lhe constando ser (
interior da provin ia do Ceará de grés com a camada supe-
rior em decomposição, sendo a potencia desta muito diminuta.
julgava que as seccas e a falta de vegetação provinham, desta
circumstancia.
As aguas não se poderiam demorar, e grandes enxurradas
havia de haver, pelo que resultaria a secca e a leva das semen-
tes, tornando mais ou menos esteril o lugar, por não encontrar
a vegetação nem terra apropriada, neni espaço sufficiente para
as raizes se aprofundarem. O encontro destas com a rocha viva.
esquentada pelo sol do verão, atrophiará as plantas, que então
não resistirão e perderão as folhas por falta de seiva. No caso
de se construirem açudes, suggeria o plantio da Samammeira
(Eriodendron samahumma ) que oferece as seguintes vantagens :
uma só arvore cobrir um espaço de alguns metros em diame-
tro. ter raizes horisontaes, dar paina e abundar em sementes.
A Mauritia flexuosa -Mart, pa'meira social, seria conveniente
por sua propriedade de attrahir a si a humidade.
O commendador Azevedo opinava pelo plantio de arvores,
como a Amoreira branca para a criação do bicho de sêda, a
Tamareira e a formação de florestas semelhantes a da Tijuca, no
Rio de Janeiro.
O Dr. Nicoláu Moreira entendia que o plantio de arvore
apropriadas á natureza do clima, as quaes guarneçam as cabe-
ceiras dos rios e suas margens, o sombreamento de lagos e
açudes por ellas, dariam cabo das seccas. Disse que Becquerel
e Voillant reconheceram que o sólo florestal recebe um quarto
mais d'agua de chuvas do que outros terrenos : Boussingault
demonstrou que um hectare de terreno plantado produz tanto
vapor aquoso, que condensando - se , transforma-se em 30 me-
tros cubicos dagua, sendo a quantidade multiplicada se a cul-
tura é de arvores frondosas. Não ha clima . por mais ruim,
accrescentava , que não possa ser beneficiado e habitavel Na
Australia Occidental as chuvas levavam 8 a 10 annos para ap-
parecer ; actualmente, com o plantio das florestas, vão se tor-
nando frequentes os aguaceiros e começam a patentear -se cor-
regos e regatos que até então não existiam. O Baixo Egypto
406

tinha uma temperatura insupportavel : a plantação de milhões


de arvores, mandada fazer por Mahomet-Alli, deu áquelle paiz
um calor compativel com a existencia humana.
Encerrada a discussão, resolveram os membros da Asso-
ciação de Acclimação propor ao Governo as seguintes providen-·
cias :
1 -Conceder ás províncias flagelladas minoração nos di-
reitos de exportação e nos de importação de generos alimenti-
cios.
29-Aconselhar a cultura intensiva com arado e estrumes.
a drenagem, a irrigação, a estabulação e o aproveitamento de
todes os productos bovinos, segundo os processos adoptados na
Suissa e Estados Unidos.
3º -Promover a creação de engenhos centraes de assucar
de canna e a cultura da batata doce de fazendas centraes de
café e a cultura do cacáu, borracha, fumo, etc.; fundação de
fabricas de tecidos de algodão, mediante garantia de juros do
Governo Geral, e bem assim de fabricas de sabão e cortumes
mediante alguns favores.
40-Promover a cultura do chá.
5% -Introduzir a cultura do trigo.
6 --Industriar as populações na construcção de sibs oa
depositos de conservar cereaes, animando-as com premios ra-
soaveis.
70 -Fundar escolas agricolas.
8 -Estabelecer pescarias e salgas de peixes nas costas das
provincias, contratando praticos para esse fim na Terra Nova.
9º -Crear saladeiros a imitação dos do Rio Grande .
Foram esses os votos dos destinetos brazileiros que trata-
ram da magna questão das secas.
O fallecido Senador Pompeu , apoiado em observações suas
e no estudo accurado desses phenomenos, chegou a estas con-
clusões :
1º -Que se de todo não é dado obstar as seccas que depen-
dem de causas superiores, ainda não inteiramente sujeitas á
acção humana , é todavia possivel modificar seus effeitos, neu-
tralisando - os e pelo menos restardando- os.
20 -Que os meios, verificados pela experiencia e approva-
dos pela sciencia, consistem na modificação e melhoramento do
clima.
407

3 -Que o clima póde modificar- se, conseguindo -se obter


os vapores aquosos, augmental- os e condensal -os sobre o sólo.
4 -Que os vapores pelasgicos, que em tão grande massa
passam sobre a provincia, arrancados do oceano pelo calor in-
tertropical e levados pelos aliseos, podem ser retidos e conden-
sados por fócos de condensação.
5 -Que esses fócos podem crear-se, conservando e plan
tando florestas ; e por meio de massas d'agua que se podem
reunir.
6º-Que essas massas d'agua podem ser obtidas por açudes
em qualquer parte, por meio de reprezas nos rios e principal
mente por comportas nas correntes perennes que descem das
serras.
Além destas medidas insistia, n'um trabalho erudicto , so-
bre a necessidade da conservação das mattas e de sua repro-
ducção.
O Dr. Marcos Macedo, n'uma publicação avulsa feita em
Stuttgard, em 1871 , discutio com proficiencia e vantagem esta
questão, mostrando a utilidade dos açudes, a praticabilidade
das comportas e a necessidade do plantio das arvores .
No mesmo sentido pronunciou-se o Dr. Adolpho Bezerra
n'um opusculo publicado no Rio de Janeiro em 1877, e o Dr.
José Avelino em artigɔs no Brazil, em 1872.
O Barão de Capanema diverge, porém, d'essa solução, por
entender que o açude serve antes de fóco miasmatico, resul-
tante de detrictos organicos, vindo prejudicar a salubridade
publica, do que de aguadas e agente fertilisante do solo. Pro-
punha, porém, a construcção de cisternas e o preparo do feno
como meio d'attenuar os effeitos da secca.
Os Drs. Amarillio e Foglare, n'uma monographia que corre
impressa sobre - Os açudes no Ceará, assim se exprimem sobre
as suas vantagens : "Em grande numero e á pequena distan-
cia uns dos outros, elles serviriam de natural refrigerio aos
viajantes, tanto nos annos regulares, como nos da secca . A
pouca extensão dos terrenos que elles são destinados a fertili-
sar e que de ordinario não vae muito além das adjacencias da
vasante, dispensará de grandes trabalhos de conservação, o
auxilio de um engenheiro, etc. , bastando aberturas de regos
de pequena dimensão , de facil execução, por quanto, para o que
408

não se exige mais que a simples intelligencia do proprietario e


os braços de que este possa dispor, estamos certos que elle não
deslembrará os meios que o habilitem a conservar tão preciosa
propriedade, isto sem a minima dependencia do governo.
"Não seria difficil estabelecer os meios de se construir por
conta do Estado uma grande quantidade de pequenos açudes,
continuam elles, mas cumpre partir d'um principio, e vem a ser
que o povo cearense não pode e não deve ficar inactivo e em
mera espectativa na presença de uma ideia, que tão intima-
mente se relaciona com os seus mais vitaes interesses. Ninguem
attribuirá ao Estado a obrigação de construir para cada um
o seu açude, quando a acção do governo nesta materia deve li-
mitar-se aos meios indirectos, taes como : o ensino, premios, e
certas regalias franqueadas em leis especiaes, que despertem o
estimulo individual, subvenções e auxilios technicos em certos
e determinados casos ."
Finalmente, o Dr. Revy assim se pronuncia : " As planicies
do Icó, Limoeiro e Russas. são as mais ferteis com que a natu-
reza tem dotado qualquer paiz . E' tambem notorio que estas
planicies carecem só de chuvas a intervallos regulares para
produzirem tudo com perfeição e abundancia . Ha 4 mezes de
chuvas e 8 de secca. Si , pois, não se deixasse escapar agua al-
guma pelos rios, si a agua da chuva que agora vae para o ocea-
no podesse ser retida e destribuida durante a estação secca do
anno, tal quantidade seria sufficiente para humedecer essas
planicies durante 8 mezes de secca dos annos ordinarios, abso-
lutamente do mesmo modo como si a estação chuvosa tivesse
continuado sem interrupção durante o anno inteiro .
A introducção de obras de irrigação modernas nas ferteis
planicies dos valles da provincia mudaria completamente a si-
tuação. Introduziria os progressos da agricultura moderna :
mudaria os costumes e o modo de vida do povo.
As plantações regadas pelas obras de irrigação no valle do
Jaguaribe acommodariam bem a metade da população da pro-
vincia. O povo se mudaria e se estabeleceria nestas planicies,
nos tempos ordinarios, e formaria novos centros, novas aldeias,
novas villas. Pouco a pouco, retirar- se-ia do arido sertão , e
quasi é desnecessario dizer que na occasião da proxima grande
secca nās haveria emigração alguma, porque o povo já estaria
estabelecido nas planicies irrigadas dos valles. "
409

Em outra parte assegura o Dr. Revy, que no valle do Ja-


guaribe ha pelo menos 90.000 hectares de magnificas terras
planas, de riquissima qualidade, excepcionalmente aptas para
a agricultura superior. No entretanto só uns 2.000 hectares são
aproveitados.
"Nessas condições a experiencia aconselha lançar mão em
larga escala das obras de irrigação que barrem as aguas dos
correntes e as destribua na estação secca, methodica e intelli-
gentemente pelas culturas melhoradas.
"A introducção dos trabalhos systematicos de irrigação ha
de melhorar sem duvida o actual processo agricola que é pri-
mitivo. Exemplificando vou referir-me a um dos ramos d'aquel-
la industria no Ceará. O algodão, que é de excellente qualidade,
superior ao de Nova-Orleans, é cultivado quasi em toda a pro-
vincia por milhares de pequenos agricultores que por isso a-
doptam ainda hoje os processos primitivos.
"Creio mesmo que não ha plantação regular desse producto
em toda a provincia, feita segundo os principios modernos e
aperfeiçoados, e é de admirar que, sendo assim, possa elle toda-
via competir nos mercados europeos com vantagem de qualida-
de e preço .
"Esta circumstancia parece demonstrar a riqueza do sólo e
o clima da provincia favoravel ao cultivo do algodão, -planta
delicada e de grande valia. Todas as plantações que te-
nho tido occasião de ver são superficiaes. a applicação do arado
é ainda praticamente desconhecida no Ceará, e posso assegurar
que a cultura systematica e profunda do algodão não foi ainda
ensaiada. Apezar disto, um hectare de terreuo pode aqui, duran-
te a estação propria, produzir cerca de 250 kilogrammas. En-
tretanto si se fizesse a cultura aprofundada e systematica por
meio de plantio, segundo os processos modernos, como se pra-
tica nos Estados - Unidos e em outros pontos, mediante a appli-
cação do arado -conditio sine qua non -a producção do algodão
poderia augmentar até o quintuplo, e dez vezes mais si, alem
do que fica dito, houvesse irrigações e o preparo da terra com
extrumo.
"Por outras palavras, a media do algodão exportado desta
provincia, que em cultura superficial, ora empregada , é de
30.000 fardos annualmente, contendo cada fardo 200 kilogr .
(6.000;000 k . ), subiria si se adoptassem os melhoramentos mo .

1
410

dernos a 160.000 fardos ( 32.000 ; 000 kilogrammas ) em área


identica, e com a irrigação, o extrumo de terras e o augmento
da área plantada poderia a exportação da provincia exceder de
50.000 :000 kilogrammas de algodão annualmente" (1)
ACÇÃO OFFICIAL - Depois do periodo critico da grande sec-
ca de 1877 a 79, o governo imperial mandou proceder a estu-
dos em algumas zonas do Ceará, como Itacolomy, proximo a
Serra Grande, Lavras e Quixadá -pelo engenheiro J. J. Revy.
Em 1884 foi iniciada a construcção do açude de Quixadá
que após ennumeras difficuldades, ficou concluido com as res-
pectivas obras de irrigação em 1906.
Em 1888 e 89 o governo imperial, urgido pela secca deste
periodo, mandou construir alguns pequenos açudes, melhora-
mentos de estradas, etc. que não exerceram grande influencia
na economia da provincia.
Os açudes, feitos sob a pressão da necessidade de dar tra-
balho aos indigentes, ou não foram concluidos ou ficaram mal
acabados ; salvo um ou outro. Pequenos, insufficientes para ga-
rantir a exploração agricola, sem obras de irrigação supplemen
tares, apenas serviram de aguadas, sendo aproveitadas as suas
margens para o plantio de vasantes. Entregue as municipalida-
des, sem regulamento ou posturas que lhes garantissem certa
renda para occorrer ao custeio delles, em breve foram descura-
dos, suas barragens minadas pelas formigas, e afinal derruidas
pela agua. Quasi todos desappareceram ou se inutilisaram.
E o problema das seccas a ficar insoluvel pela improfiqui-
dade de medidas inadequadas. em pura perda para os cofres
publicos, e sem beneficio algum para a região assolada ; antes
trazendo o descredito para as unicas que a experiencia, o bom
senso e a sciencia aconselham.
Os governos, que se tem succedido de 1888 até o presente.
se hão preoccupado intermittentemente com esta magna questão,
aliás a de maior gravidade e importancia de quantas interessam
o futuro do Ceará.
Na mensagem com que o Dr. A. Pinto Nogueira Accioly
abrio o congresso estadual a 1º de Julho de 1905 discorre elle

[ 1 ] J. J. Revy -Exposição sobre açudes —appenso ao Relat .


do Senador Leão Velloso a 30 de Junho de 1881.
411

largamente sobre as medidas a adoptar, pronunciando- se aber-


tamente pelos grandes açudes . Taes são os seus conceitos :
"A nossa e a extranha experiencia indicou , de ha muito,
com a maxima nitidez , o unico remedio efficaz- a extensão das
grandes obras de irrigação e a construcção de ferro- vias de pe-
netração, que de par com o augmento da producção agricola
lhe dêm facil e prompto accesso aos mercados consumidores.
O governo inglez, cuja situação na India tem sido rude men-
te posto á prova repetidas vezes, recommendou aos governado-
res de Bombay e Madras por occasião da secca de 1876 que or-
ganizassem pequenas obras de soccorro ( small relief works ), em
numero sufficíente para empregar toda população indigente dos
destrictos flagellados, o mais proximo possivel dos domicilios.
afim de trabalharem homens, mulheres e creanças. De prefe-
rencia foi escolhida a construcção de estradas ( roads), açudes
(tanks), poços (wells).
Prolongando-se alem do termo esperado os effeites da ca-
lamidade, o governador de Bombay lembrou ao governo metro-
politano a utilidade de dar a taes obras um caracter mais geral
e permanente.
Lord Salisbury com a visão peculiar ao estadista, depois de
rigoroso inquerito, firmado nos pareceres dos mais notaveis e-
conomistas, engenheiros, administradores, industriaes e agri-
cultores, conhecedores da situação indiana, endereçou ao go-
vernador geral da India, em 10 de Janeiro de 1877, a notavel
mensagem, que se tornou o codigo fundamental da assistencia
publica na grande colonia.
"As obras de irrigação, escreveu o chefa do governo in-
glez a seu delegado, são naturalmente os remedios mais effica-
zes para supprir a deficiencia das chuvas, e nenhuma duvida
pode haver quanto ao beneficio que ellas produzem onde quer
que sejam construidas ...
"O governo da India ha despendido e continua a gastar
crescidas sommas na construcção de taes obras . Mais de lb.
16.000.000 (256.000 contos ao cambio actual) foram gastas, e as
obras em via de construcção, sanccionadas, cujos projectos es-
tão approvados, attingirão a quantia superior a lb. 6.373.000
[102.000 contos ] antes de ficarem concluidas.
"Os resultados financeiros destas emprezas variam consi-
deravelmente. As obras mais antigas, especialmente as cons
412

truidas em localidades já escolhidas para tal fim pelos respec-


tivos administradores. têm sido excepcionalmente proveitosas .
Segundo as estimativas que ora tenho presente, o canal orien-
tal do Jumua ha produzido 36 % e o do Jumna occidental 27 %.
As obras irrigatorias uas baixadas de Madras ( AÇUDES ) tambem
produziram crescidos lucros. The irrigation works in the low co-
untry, have been singulary profitable) ...
"Em vista das frequentes fomes de annos recentes deve ad-
mittir-se que o valor de um projecto de irrigação não é abso-
lutamente negativo pela prova de que não produzirá subidos
lucros sobre seu ensto. Comprehende - se que um canal que paga
pouco ou mesmo nenhum juro em anaos ordinarios , pode nos
de secca proteger tão copiosa população que repagará ao go-
verno o custo de sua construcção por uma equivalente diminui-
ção nas despezas de soccorros . Neste assumpto, o essencial é
fazer que as obras irrigatorias se tornem aptas a proteger as
populações contra a fome em escala correspondente a seu custo
(The essencial matter is to ascertain how for irrigation works are pra
cticable which shall be capable of giving protection against famine in
the degree at all correspånding to their cost) .
A notavel commissão nomeada pelo governo para estudar
in loco as necessidades da população indiana, attingida pela sec-
ca, concluio no relatorio que apresentou [ Report of the famine
commissioners Cap . V, part. II] por esses termos : "entre os
meios adequados a proteger a India contra as seccas, devem ser
preferidas inquestionavelmente as obras de irrigação [ Amoong
the means that may be adopted for giving direct protection from
famine arising from drought the first place must inquestionable be
assigned to the works of irrigation. ]
Uma autoridade valiosa, o major de engenheiros Baring,
tambem recommendava, desde 1886 ao governo metropolitano
que "o total ou ao menos tres quartos do credito votado para
as obras protectoras contra as seccas indianas fossem de prefe-
rencia ás estradas de ferro empregados nas obras de irrigação
(the whole or nearly the whole of the three quaters of a crore allotable
to protective works should be spent on irrigation in preference to rail-
ways ) (Report. C. VII pg. 330].
No mesmo sentido pronunciou - se a commissão encarregada
de estudar a secca de 1898 na India, dizendo que em seu modo
de pensar a mor parte, senão todo o credito aberto, deveria ser
413

consagrado ás obras protectoras de irrigação ( to protective irriga-


tion works ).
Ser-me-hìa facil apresentar- vos ainda inumeros testemu-
nhos de autoridades inglezas depondo uniformemente no senti-
do de dar preferencia a obras de irrigação sobre outras quaes-
quer ; bastam os que acabo de lembrar para mostrar quão
amadurecida é a convicção de que as obras destinadas a supprir
agua á lavoura em annos de invernos escassos são as mais a-
daptadas aos fins visados.
Entre nós, infelizmente, os capitaes empregados em obras
deste genero não produziram tudo quanto dellas se esperava,
não porque se frustassem as previsões da sciencia em relação á
sua utilidade, mas por um conjuncto de circumstancias, das
quaes se deve salientar a construcção do açude de Quixadá pro-
ximo ás nascenças dos rios que lhe formam a bacia hydrogra-
phica. Devido á exiguidade de seu perimetro e ás fracas chu-
vas caidas depois da conclusão da barragem, apenas tomou in-
significante quantidade d'agua, insufficiente para alimentar a
área irrigavel já apta a recebel-a.
O fracasso parcial de tão importante tentativa, e as idéas
inveteradas entre pessoas que não tiveram bastante lazer para
estudar a magna questão da açudagem, hão produzido particu-
lar corrente de opinião em favor dos tanques ou pequenos açu-
des, como obras protectoras contra as seccas.
Do exposto, vistes qual o proceder do governo inglez rela-
tivamente a esta questão , pois tendo ordenado a construcção de
pequenas obras no começo da secca de 1876. foi logo depois
forçado a proseguir nos grandes trabalhos de irrigação, como
meio efficaz de aproveitar os soccorros e prevenir a extensão de
futuras calamidades.
Das vantagens auferiveis deste genero de obras, methodi-
camente expostas por um profissiona que lhes consagrou toda
a vida e actividade, poder-se-á fazer o confronto entre os gran-
des e os pequenos açudes. E' A. Llaurado quem escreve na
sua preciosa obra - Aguas y Kiégos : "o systema de depositos
permitte dar maior alcance ao aproveitamento das aguas para
regas :
1º alargando o beneficio das aguas ás regiões que por sua
topographia se não prestam ao estabelecimento de cannes de
extenso desenvolvimento ;
414

2º facilitando a applicação ordenada e methodica das


aguas correntes de regimen mui inconstante, mediante o arma-
zenamento durante o periodo abundante em que menos valem,
e sua distribuição mais util e vantajosa na quadra escassa ;
3º regularizando as precipitações repentinas ou intermit-
tentes produzidas pelas chuvas ;
4 facilitando o mais util emprego dos pequenos mananci-
aes, insufficientes por seu volume para darem resultados conti-
nuados.
Referindo-se particularmente á açudagem na Espanha ,
prosegue o mesmo profissional : "a importancia geral do syste-
ma de irrigação por meio de açudes (pantanos) que se depre-
hende da simples enunciação do que acabamos de apontar, re-
vela-se ainda com caracteres mais pronunicados em nosso paiz
sujeito por condições meteorologicas, dependentes de causas
distinctas e prolongadas, a seccas e a chuvas torrenciaes ou ir-
regulares em sua distribuição annual, e cujos rios por não se-
rem alimentados em suas nascenças por grandes lagos que lhes
regularisem o curso, e por manancias perennes como os que
nascem nas regiões geladas dos Alpes, apresentam exiguo re-
gimem de estiagem, fracção insignificante, em geral de gasto
ordinario nas epocas em que as aguas são reclamadas pela cul-
tura.
Como vèdes, as condições topographicas da Espanha asse-
melham -se quanto ao regimem pluvial as da região nordeste
brasileira ; e se nella os resultados colhidos pelas obras de ir-
rigação são maravilhosos, economicamente productivos, nen-
huma razão ha para não sel -o no solo cearense.
A controversia a cerca da proporção a dar-se a taes obras
deve cessar em presença dos factos e da experiencia adquerida
nos paizes em que ellas existem secularmente.
Depois de pronunciar-se abertamente pela adopção dos
grandes açudes, fundamentando explanativamente as razões
desta preferencia, o Dr. Accioly refere-se ao abandono em que
ficaram os pequenos reservatorios construidos nas seccas ante-
riores, a sua consequente invalorisação e ruina por falta de
custeio e cuidados technicos, ponderando em conclusão que :
" Insisti nestas considerações para chegar á conclusão de
que as obras, destinadas a preservar o Estado das consequen-
415

cias desastrosas das seccas, são por demais custosas e impor


tantes para serem proveitosamente tentadas por elle.
"Os reservatorios que por sua exiguidade aproveitem a
um proprietario ou a um numero limitado delles , são por seu
destino da competencia particular e portanto devem ser con-
fiados á iniciativa privada .
Na impossibilidade em que se acha o Estado, de realizar
as unicas obras, que, a juizo de todos os profissionaes, concor-
rerão efficazmente para abrigar da fome grande massa de in-
digentes nos annos seccos oa de inverno irregular, e nas epo-
cas normaes quintuplicar, senão decuplicar, sua producção
agricola, melhorada com os recursos de uma cultura methodi-
ca, intelligente, guiada por processos scientificos ; na deficien-
cia de meios, repito, para subsidiar as grandes obras irriga-
torias, a que estão por assim dizer intimamente ligados seus
ulteriores destinos, sua prosperidade economica, sua importan-
cia social na communhão nacional, resta -lhe a faculdade de
preparar os elementos, para alcançar esse desideratum , facili-
tando o estudo dos sitios apropriados áquellas obras, afim de
que no momento critico e sob a pressão da necessidade se não
tenha de construir barragens em logares inadequados, como
infelizmente aconteceu entre nós mais de una vez.
Neste sentido solicitarei o concurso do governo federal
para que seja organizada uma ou mais commissões permanen-
tes de engenheiros, conhecedores desse ramo de serviço, com
a missão especial de completar os estudos iniciados no valle de
Lavras, rectificar o traçado da muralha, divergente entre as
propostas do Sr. J. J. Revy, que a projectou por proposta do
governo brazileiro, e a do fallecido O' Meara por sua iniciati-
va ; os orçamentos das differentes secções da obra, e veri
ficar, com a precisão que ellas comportam, a capacidade do a-
çude, sua bacia hydrographica, sua area irrigavel, etc., ficando
por esta forma habilitados os poderes publicos a resolver com
pleno conhecimento do assumpto a sua construcção. Alem des-
te estudo, outros devem ser iniciados no curso medio das gran
des arterias fluviaes para se verificar a possibilidade de barral-
as com proveito economico para o valle a jusante e certeza de
uma boa collocação financeira, de uma applicação intelligente
dos capitaes nacionaes.
416

Com o vosso apoio e conselhos, esforçar -me- hei por adop-


tar um plano, maduramente pensado, de combinação com o go-
verno federal, que será resolutamente proseguido, embora sua
execução exija o concurso orçamentario do Estado.
A exemplo dos governos estadoaes e federal norte ameri-
canos, impõe - nos a solidariedade, o amor patrio, o dever de fa-
cilitar ás gerações vindouras a exploração intensa e larga do
solo, proporcionar-lhes os meios de subsistencia, que a concor-
rencia mundial torna de anno para anno mais escassos e preca-
rios.
No decurso do anno findo organizou aquelle governo com-
missões de engenheiros com o fim de estudarem , nas regiões
seccas e actualmente incultivadas do Oeste americano, os sitios
mais apropriados á construcção e extensão das obras de irriga
ção, afim de alargar-se a cultura do solo, accrescer-se a produc-
ção de cereaes na espectativa do augmento gradativo da po-
pulação.
O que alli é acto de previsão para occorrer ás necessidades
futuras, mas afastadas, aqui é caso urgente, a que as frequen-
tes e proximas irregularidades climatericas dão um cunho im-
perioso e inadiavel.
A excepcional salubridade do solo cearense, sua inesgota-
vel productividade, sua proximidade dos grandes centros con
sumidores, são coudições primarias de bom exito, ás quaes não
será indiffereute o capital desde que se consiga regularisar o
supprimento d'agua á lavoura, systematica e continuamente,
como já alcançaram os povos asiaticos, alguns dos quaes re-
putados inferiores por sua organização politica e intellectual.
Seja-me permittido elucidar esta proposição, trazendo- vos
o exemplo de um desses povos :
"Na Asia central, diz-o Moser (L'irrigation en Asie centrale),
as chuvas são raras durante os labores agricolas, a geada qua-
si desconhecida, e a secca foi quasi supprimida pela irrigação
artificial. Graças a esta, ás qualidades do solo, aos adubos das
terras, etc., a colheita é abundante e pode medir-se com as me-
lhores da Inglaterra, obtidas por processos scientificos experi-
mentalmente mais aperfeiçoados, Si bem que as fomes, no sen-
tido europeu do termo, sejam por assim dizer impossiveis de
se produzir no Turkestan, o valor das colheitas varia, entretau-
417

to, segundo a qualidade do solo, a quantidade de adubos.


sendo influenciadas consideravelmente por causas accidentaes
e locaes pela irrigação intempestiva, tardança na sementeira
ou insufficiente preparo do solo. "
Animador é este exemplo ; mas para um povo, cuja agri-
cultura está á mercê dos agentes meteoricos, completamente
dependente da regularidade das chuvas na estação propria .
será estranho que se lhe diga haver regiões onde os habitantes
despresam com sobranceiria, tendo -os por seres inferiores, os
que se não libertam desta contingencia . E' ainda Moser quem o
diz : "O homem da pianicie, o Sarta, habitante do oasis, des-
presa os cultivadores dos terrenos altos, não irrigados, expro-
brando-lhes a falta de independencia. O oriental, no pensar de
Middendorf, descobre alguma cousa de humilhante para o ho-
mem na dependencia absoluta do agricultor aos caprichos do
tempo, que rebaixam o campo da cultura ao nivel de um tape-
te verde, onde o bom exito da colheita se torna mero jogo do
acaso. "No pensa delle ( homem da planicie ) fornecer agua
aos campos não é dever do céu , senão do agricultor, que por
isto se torna senhor dos proprios esforços e pode fixar com cer-
teza o resultado do seu trabalho.
"Effectivamente o asiatico (do centro) não reconhece senão
um campo de cultura digno deste nome, qual seja -o irrigado
por meio de canaes ou por aryks, independentes d'agua plu-
vial, aos quaes chama obi ou teramoi."
E' para este desideratum, tão simples, tão racional, tão op-
portuno, que todos os esforços devem convergir, pois um dia
se comprehenderá, servindo - me das ponderosas palavras do
economista Lecouteux (La culture améliorante), que a collo- .
cação mais lucrativa que um paiz poderá fazer, no actual esta-
do de cousas, será entregar a maior quantidade possivel d'agua
á agricultura, organizando-se vasto systema de canalização
pela linha das alturas e não pela dos talwegs."
Desta longa exposição deduz -se a importancia das gran-
des obras de irrigaço, destinadas a supprir a falta ou a irre-
gularidade das chuvas em regiões semelhantes ao Ceará.
Não se poderá acoimar o governo inglez, tão ponderado
no methodo de soccorrer a India, de precipitação nas medidas
tomadas, e a principal, na qual foram despendidas maiores
418

quantias, concerne a construcção de açudes e de canaes para


irrigação.
Quero crer que o maior obstaculo ao desenvolvimento de
obras identicas no Ceará provem da noção incompleta que se
faz dellas. Como não existe no Brasil, ao menos systematica-
mente, a cultura irrigada, e, geralmente, fora da sua zona nor-
deste, as estações alteruam regularmente, de modo que as chu-
vas vêm ua epoca necessaria, difficilmente se pode crer que
uma lavoura carecida de tal auxilio, seja renumeradora ou lute
vantajosamente contra aquella.
Cumpre, pois, mostrar que a irrigação é um facto e uma
necessidade nos paizes seccos, principalmente nos de tempe-
ratura elevada ; que ella melhora as terras, multiplica as co-
lheitas, regularisa a producção, compensa fartamente o lavra-
dor, assegura remuneração ao capital empregado na agri-
cultura, fixa o campesino ao solo, eleva a instrucção e os me-
thodos de cultura , desenvolve o capital, e transforma os habi-
tos do operario, etc.
No desenvolvimento desta these, terei de appellar para
a autoridade dos profissionaes, reconhecidamente mestres no
assumpto.
Depois estudarei nas regiões já servidas pela irrigação os
seus resultados economicos, rigorosamente verificados.
ACÇÃO DA AGUA SOBRE OS VEGETAES.- A agua é uma
substancia indispensavel, sob certas relações. á vida das plan-
tas : céde a estas os seus elementos ; entrando na formula chi-
mica de muitos principios immediatos importantes, como a ce-
lulose, a fecula, a destrina, a glucose ; já prestando tão so-
mente o hydrogenio a assimulação mediante um trabalho de
reducção analogo ao que serve para a fixação do carbono.
Conservando a sua propria natureza, encontra - se a agua em
todos os tecidos, aos quaes proporciona a turgidez conveniente
para que as cavidades celulares possam desempenhar as func-
ções proprias do organismo vegetal. Esta agua, que se pode
chamar de vegetação, entra sempre por uma fracção importante
no peso da planta viva, e em alguns casos constitue a sua parte
mais consideravel.
A agua, circulando no organismo vegetal desde as radi-
culas. pelas quaes é absorvida, até o apice da planta e appen-
dices foliaceos, onde experimenta uma evaporação activa sob
419

a influencia da luz, serve de vehiculo aos principios nutritivos


tanto aos de natureza mineral que extrahe do solo, como
aos da natureza organica que resultam da elaboração da seiva
nos orgãos foliaceos, e que, levados pela seiva descendente, ser-
vem immediatamente á nutrição dos tecidos e dos orgãos.
Daqui segue-se que quanto maior for a quantidade d'agua que
circule pelo vegetal, tanto maior será tambem a quantidade de
principios que deposita, e tanto mais activa a nutrição mais
rapido o seu crescimento. (1 )
Velleroy ainda é mais explicito, quando diz :
Por toda parte em que ha agua, pode se crear um prado e
obter herva. Como diz o proverbio : a agua faz a herva. Posto
que a agua produza herva em todos os terrenos, a sua acção
sujeita-se a variações que dependem da composição do solo so-
bre o qual passa .
"A agua nutre as plantas, estimula a vegetação, dissolve-
protege a herva contra as influencias atmosphericas. Em fim
preserva o prado de muitos inimigos do reino animal on vege-
tal.
1—A agua nutre as plantas— A agua entra com parte consi-
deravel na composição de todas as plantas, e por seus elemen-
tos toma parte no crescimento , mas a agua empregada na
irrigação produz ainda outro effeito sobre os prados. E' mister
procural- o sobretudo na faculdade que tem a agua de dissol-
ver os principios nutritivos que se acham no solo. A agua é o
dissolvente mais poderoso dos principios nutritivos das plan-
tas que existem na terra não dissolvidos.
Este poder dissolvente é muito auxiliado pelo acido carbo-
nico e pelo ar atmospherico que se acham n'agua em maior
ou menor quantidade. A agua das fontes contem sempre em
grande quantidade ar atmospherico e acido carbonico ; é talvez
a esta circumstancia que se deve attribuir os effeitos nota-
veis de certas fontes. Sabe - se que a agua tira da atmosphera
acido carbonico e oxigenio e isto explica porque numa su-
perficie extensa irrigada, o effeito d'agua torna- se menor á me-
dida que ella se affasta da sargeta (rigole) de irrigação, e a
herva é sempre menos desenvolvida na parte inferior do que

(1) A. Llaurado - Aguas y Riégos, vol. I, pag. 29 e 30 .


420

na superior. A mesma agur usada, como dizem os irrigadores.


pode recobrar as suas propriedades fertilisantes , se ella se
acha por algum tempo em contacto com a atmosphera, corren-
do lentamente em fôsso descoberto. (1)
A agua augmenta a quantidade e dimensões des folhas e
diminue o rendimento dos grãos .
A acção d'agua sobre as raizes é geralmente sensivel.
Augmenta o cabello (radiculos) e por conseguinte os suga-
dores que alimentam a planta.
O augmento de humidade que uma planta pode suppor-
tar é limitada, mas cremos que exageram se os seus inconve-
nientes, attribuindo á aguas, em geral, os maus effeitos da
agua estagnada.
Com effeito, para que a agua seja util as plantas das nos-
sas culturas, é mister que ella esteja em movimentos e seja
bem arejada . Estagnada, perde o ar que contem em dissolução
e torna-se nociva. Alem disto, faz-se, preciso que ella seja
dada a terra por intervallos para que as raizes possam exer-
cer a importante funcção de absorver o oxygenio do ar.
"A agna pode activar, se não faltar calor, a vegetação de
um modo notavel. (2)
"As aguas d'irrigação são uma fonte de estrumação imme-
diata que produz, por cada centenas de mil metros cubicos
d'agua empregada o equivalente de um boi de açougue. O me-
nor de nossos rios leva por hora ao mar, sem nenhum proveito
o valor de algumas rezes gordas, e alguns milhares por anno. ( 3)
FIM DAS IRRIGAÇÕES. — A irrigação tem um duplo fim . Ser-
ve primeiramente para dar as plantas a humidade que lhes é
necessaria para se desenvolver. A planta exala incessante .
mente, mas sobretudo, sob a influencia do calor e da luz, gran-
de quantidade de vapor d'agua Quando o solo não lhe fornece
essa quantidade d'agua indispensavel, a planta vegeta misera-
velmente, estiola- se e acaba morrendo . As primeiras experien-
cias sobre a transpiração das plantas são devidas a Hales, que
verificou por experiencia e calculo que as arvores plantadas

(1 ) Villeroy e Muller - Manuel des irrig., pg. 23.


(2) Raphael Pareto - Irrigation, vol. I, pag. 93.
(3 ) Hervé Mangon- L'emploi des eaux en agriculture.
421

num hectare de terreno podem perder por transpiração até


20.000 kilog. d'agua por dia de 12 horas. A actividade das
funcções da planta depende da regularidade desta transpiração.
Por outro, as aguas empregadas na irrigação contem em
suspensão ou em dissolução notavel proporção de substancias
uteis a vegetação, as quaes, conservadas em suspensão, são
depositadas no solo cultivado, ao menos em grande parte, em
quanto a agua o cobre. As que estão em dissolução são intro-
duzidas na terra vegetal pela agua que nella penetra. ( 1 )
"Pela irrigação, diz Thaer, o grande reformador da agri-
cultura contemporanea, nós nos appropriamos de um extrume
que não haviamos produzido, e conseguimos uma produção que
nos dá um novo extrume, sem que ella nos tenha custado es-
forço para obtel -a."
A irrigação é, sem contestação, dil- o tambem Boussin-
gault, o meio mais economico, mais efficaz para augmentar a fer-
tilidade do solo pelos adubos que são a consequencia desta
producção.
Uma terra só é fertil. não cançamos de repetil- o , quando
conserva uma provisão d'agna que baste por um lado ao enor-
me consumo que faz a transpiração vegetal, e por outro, ao
entretenimento da vida das baterias do solo, e que a despeito
desta alta dose de humidade, a circulação do ar seja segura .
Resumindo, as terras são estereis quando lhes falta agua :
a medida que a provisão de humidade augmenta, cresce
a fecundidade : as mais bellas colheitas nascem em terras hu-
midas, que é mister drenar ; finalmente a mais productiva das
culturas, a de hortalice só é possivel em terras baixas onde
abunda agua. (2 )
SUPERIORIDADE DAS IRRIGAÇÕES SOBRE AS AGUAS DE CHU-
VAS. Reparte-se a chuva pelos dias do auno de modo desi-
gual e caprichoso. Se em certos momentos a agua é tão abun
dante nos campos que o lavrador tem de lhe dar escoamen-
to, ha, pelo contrario frequentes periodos sem chuvas durante
os quaes a vegetação linguece e como que fica suspensa .

( 1 H. Sagnier -dicc. de pedagogia de Buisson — art-irrigat


(2) P. P Deherain - La science, et l'agric. cap . IV. - Revuedes
D. M. 1 Juin 98.
422

Além disto, se nas regiões meridionaes fossem as chuvas


regularmente repartidas, ainda assim estariam longe de bas-
tar, ao menos para as terras permeaveis e para as culturas de
raizes pouco profundas, ao entretenimento de uma vegetação
sempre activa e vigorosa.
E' então que a irrigação intervem de modo feliz ; e com-
prehende se facilmente que é especialmente nos climas em que
calor e a luz superexcitam no mais alto gráu o poder da
assimilação nos orgãos das plantas, nos climas em que a eva-
poração foliacea consideravel requer uma corrente proporcio-
nal de seiva ascendente, que a agua produz maravilhas. (1)
"A agua de chuva tem dous inconvenientes ; primeiro a
sua irregularidade, segundo - a grande quantidade de corpos
estranhos que ella precipita nas tempestades e aguaceiros.
Para remediar estes inconvenientes, ha casos em que se pode
sem grandes despezas, por exemplo nas ravinas ou entre monta-
nhas, estabelecer reservatorios onde a agua deposite as mate-
rias estranhas de que está sobrecarregada, e nos quaes se
conserve até que se lhe offereça o momento favoravel para
irrigar. De tempos a tempos retira-se desses reservatorios a
vasa que nelles se depositou, e ella fornece um bom estrume
depois de ter ficado algum tempo exposta as influencias atmos
phericas. (2)
Neste mesmo sentido, e apoiado em factos, pronuncia se
Moser, referindo - se a Asia central :
O facto desta dependencia por um lado e independencia
por outro, dos campos de lavoura em relação a agua do céu ,
facto inconstante, tem mais importancia do que se crê a
primeira vista. As culturas lalmi ( dependentes de chuvas ) de-
terminam na região quer a abundancia, quer a penuria. Ora a
penuria nestas regiões em que os meios da communicação são
precarios e o intercurso commercial muito restricto, torna se
uma calamidade muito mais grave do que nas nossas regiões
occidentaes onde a abundancia de uma suppre a deficiencia
da outra.
Na Asia a fome arrasta após si o sombrio cortejo das epi-

(1) J. C. de Cossigny- Hydraul.. pag. 4.


(2) Velleroy et Muller - Manuel des irrigatims, pag. 15.
423

dimias mortiferas, e a miseria que primeiro se pronuncia


no estado politico do paiz, provoca o resentimento contra a
impotencia do poder politico, provocando alevantamentos .
E ' por esta razão que a colheita dos campos lalmi deve ser
constante assumpto de preoccupações para a administração .
Por outra parte, a terra irrigada torna -se, em lapso de
tempo relativamente bréve , propriedade immovel, de ren-
dimento constante , seguro , susceptivel de divisão repetida
e de facil partilha . D'aqui resulta uma facilidade de parcela-
mento equivalente a da multiplicação dos fogos e do nume-
ro dos proprietarios territoriaes , ligados , estes ao solo, de mo-
do solido , e achando na sua existencia, ao lado do desejo de
arredondar seu pedaço de terra menos motivos de desconten-
tamentos e de aborrecimentos a crear a administração . A pe-
quena propriedade constitue se mui facilmente pela irri-
gação facultativa e o homem preso ao solo torna -se força viva
cuja somma adquire capital importancia sob o aspecto eco-
nomico .
E' curioso verificar-se quão pouco é mister para crear- se
assim dominios ferteis quando a quantidade d'agua de irri-
gação e o campo a irrigar, parecem desproporcionados. Ora,
basta um canal da largura de um pé
e mesmo de menos
para irrigar um superficie de 2 tenaps, cerca de 2 geiras
de terreno .
O fim da irrigação visa, effectivamente, menos fornecer
um excedente sem medida a agua que cae do céu, tão parcimo-
niosamente, do que substituir certa quantidade na medida apro-
priada as necessidades da planta cultivada. Esta norma é de 2
centimetros no maximo, fornecidos pelas chuvas mais copio-
sas; a irrigação tem por missão repartir igualmente pela su-
perficie dos campos de culti ra, esta quantidade maxima d'a-
gua que o céu recusa. Nas condições de meio que a Asia
apresenta cada parcella de terreno, com uma secção de ca-
nal conveniente, não requer na media, alternativamente, se-
não uma hora de despejo do canal. Excedido este tempo, a
irrigação transforma o terreno em lama, resfria a terra, e
consequentemente retarda a vegetação. (1)

(1 ) H. Moser - Irrig. en Asie Cent. - pag. 193–94.


424

IMPORTANCIA DAS IRRIGAÇÕES . -Mostrarei mais adiante.


com o exemplo e a pratica de paizes em condições identicas ou
analogas as do Ceará, a influencia exercida pela irrigação no
augmento da producção agricola, no seu valor commercial e
o impulso por ella dado ao povoamento regional do solo e a ri-
queza publica.
Aqui apenas assignalarei as vantagens geraes, que podem
ser referidas :
1- Estabilidade da riqueza individual, pela certeza decor-
rente do elemento capital a producção agricola, isto é, da quan-
tidade dagua necessaria a tal ou qual genero de cultura, inde-
pendente dos agentes meteoricos, por sua natureza instaveis .
Desde que o homem se fixa ao solo , e consegue, quasi materia-
ticamente, produzir o quantum de safra possivel em certa uni-,
dade territorial ; desde que esta producção compensa regular
senão fartamente os gastos de custeio e o empate do capital
inclusive os labores pessoaes de superintendencia on de ope-
rariato, retirando a um tempo a subsistencia propria e a da
familia, nenhum motivo ha para que elle se lance em emprezas
de exito duvidoso, desviando -se dos trabalhos enlturaes, já de s
attractivos. [ 1]
Não é isto simplesmente phenomeno psychico, do dominio
da simples conjectura e possibilidade. Viajantes, governadores
e economistas, conhecedores do assumpto, são acordes em de-
por no mesmo sentido .
Moser, que viajou a Asia Central, surprehendido, senão
maravilhado com os admiraveis beneficios da irrigação, diz con-
vencidamente : [2]
· As irrigações são fontes de riqueza que se obtem tão fa-

[ 1 ] La terre irrigué devient, dans un espace de temps re-


lativement trés court, une proprieté immobilière á rendement
constant, assuré, susceptible de division répétée et de partage
facile.
Moser- L'irrigat. en Asie cent.. pag. 183.
La petite proprieté se constitue trés aisément pour le fait
de l'irrigation facultative et l'homme attraché solidement au
so devient une force vive an point de vue économique,
Moser- ibid. pag. 184.
[ 2 ] H. Moser - L'irrigation en Asie Centrale, pag. 124.
425

cilmente e tão rapidamente que o homem que as praticou lhes


fica sempre fiel. Vë passar o despotismo e os turbilhões revo-
lucionarios sem ser arrastado por elles, e fica de pé, com a en-
xada na mão, prompto para o trabalho quando a tempestade
cessa.
2a -Melhoramento das terras -- A irregularidade das estações
pluviosas, no tampo em que as culturas de cereaes on outras
exigem supprimentos de chuvas, não permitte o desenvolvi-
mento agricola, que no Ceará ha de continuar a ser feito quasi
individualmente para prover as necessidades domesticas, sem
o estimulo do lucro e da riqueza . Não ha capitalista sensato
que, achando collocação a 10 ou a 12 e mais por cento ao anno
para o seu dinheiro, ' ente a lavoura em larga escalla, com dis-
pendios de habitação confortavel, de cercas, rotação cultural,
instrumentos agrarios, etc., na incerteza de bom exito . Pode
acontecer que a um anno de inverno escaso succeda outro ain-
da peior, e que afinal, uma secca prolongada venha desmoro-
nar todo o seu edificio economico.
Mesmo nos annos regulares, o preparo das terras não pode
ser senão o mais rudimontar : as cercas apenas abrigos contra
o gado, e a habitação a mais simples e barata, porque do ter-
ceiro anno em diante aquellas, reduzidas a capoeiras, tém de
ser abandonadas por outras de mattas. a derribar. O esgota-
mento do solo exige essa cultura extensiva e semi nomade.
Não assim com a irrigação. Para que a terra produza o
maximo de colheita é mister ser previamente preparada, des-
tocada, aplainada, revolvida. Um afolhamento racional, fructo
da experiencia, ensinará o melhor meio de aproveital -a em
toda a sua extensão, e como o seu custo será naturalmente
crescido, este aproveitamento redundará na sua melhoria ou
valorisação. [1 ]
Os factos comprobatorios são innumeros, como mostrarei

[ 1] Um facto demonstra até que ponto a agua constitue


a verdadeira riqueza do paiz (Asia central) -é que certas
communas percebem os impostos, não segundo a natureza e
extensão do solo, mas proporcionalmente a agua que os con-
tribuintes tem o direito de exigir.
Moser- obra citada, pag. 183.
426

Aqui apenas referirei as apiniões em synthese . Eis o que es-


creve um escriptor russo, a vista de um valle do Turkestan :
"A vista é tão encantadora dos sitios e paizagens (do valle
irrigado de Zerafchana ) que se crê sonhar ... E toda esta bel-
leza, esta magnificencia, o homem a deve unicamente a agua,
que, em fios de prata, percorre o Steppe e o transforma em pa-
raiso. (1)
O engenheiro hydraulico francez Charpentier escreve :
“E ' sabido que a irrigação augmenta pelo menos o valor
das terras de metade mais do que tinha, que frequentemente
triplica ou quadruplica e não raro decuplica ...
A lentidão com que a França progride quanto a obras de
irrigação obedece a causas multiplas ; o estado de sua legisla-
ção, a divisão da propriedade. os direitos adquiridos por usi-
nas ao gozo dos rios. Mas nisto, como em tudo o mais, o maior
obstaculo ao progresso é sempre a ignorancia.
Quando todos os lavradores e proprietarios ruraes. que
formam a parte mais numerosa da população , estiverem defini-
tivamente convencidos das vantagens importantes que elles e o
paiz poderiam tirar das irrigações, as pequenas difficuldades
actuaes cederiam a uma pressão irresistivel. Por outro lado, as
novas praticas agricolas não podem ganhar terreno senão pelo
exemplo de alguns homens de escól que se encarreguem de for-
necer a multidão provas materiaes e palpaveis ; ora esses mes-
mos homens têm necessidade de se esclarecerem em questões
ainda novas. Vulgarisar o conhecimento das irrigações, seria
obra de actualidade, essencialmente util.” (2)
Esse melhoramento do solo attinge quasi ao poder de
transformal o ; e terras maninhas foram rapidamente transfor-
madas em prados ricos ; a esterilidade cedeo a productivida-
de e a riqueza .
"Por toda a parte, diz Locouteux [ 3 ]. a irrigação tem a
vantagem de poder transformar em bons prados as terras in-
gratas, os depositos pedregosos, o cascalho, que a chartua, ao

[1] Radioff- citado por Moser, obr. cit., pag. 155.


(2) J. Charpentier de Cossigny - Hydraulique Agricole-
Paris - 1889, pag. 23.
(3 ) Lecouteux - Culture ameliorante - Paris - 1851, pag. 157.
427

remover, tornaria ainda mais esteril ; mas que a rega ferti-


lisa sobsecarregando de detritos organicos . "
Não é pois extraordinario que esta transformação traga
como consequencia a valorisação da propriedade territorial,
subordinando o seu valor a abundancia e facilidade da irri-
gação. Em alguns lugares as terras valem apenas o que lhes dá
este unico meio artificial de aproveitameato.
FRANÇA. Hervé Mangon, ex - ministro da agricultura em
França, na obra Des eaux en irrigation apresenta-nos os seguin-
tes resultados :

1º Um canal construido por Herberys com o fim de deri-


var as aguas do Severiasse rega cerca de 1.800 estereos de ter-
ras. Cada estereo custava, antes da construcção do canal, 40.
francos : vale hoje 800 francos. A differença entre o valor
actual da terra irrigada e o primitivo é de 1 para 368-000
francos !
2º Em diversos trabalhos executados na Touraine por Pa-
reto foram despendidos 165.66 por hectare ; o augmento médio
da renda liquida foi por hectare de 66,25 francos, resultado
que equivale a um emprego de capital a 42 %.
3º M. Puvis, no Aisne, irrigou 92,43 hectares de antigos
prados empregando o capital de 19,000 francos ; o augmente
da producção foi de 207.000 kilog. de feno superior ao que
era antes da irrigação .
4º A Campina Belga. extensa região encravada nas pro-
vincias de Anvers e Limbourg, formando um planalto acima
das bacias do Mosa e do Escalda , apresenta um exemplo nota-
vel dos effeitos beneficos da irrigação e de excellentes resulta-
dos financeiros . O terreno desta região era coberto de immen-
sas charnecas e vastissimos areaes. Em 1835 vendia - se difficil-
mente a 15 francos o hectare. O governo belga, a despeito da
forte opposição do partido retrogado nas Camaras , emprehen.
deu os trabalhos de irrigação necessarios. Hoje o preço do
hectare excede de 450 francos.

Os milagres que a irrigação pode produzir. transformando


em prados ferteis terrenos cobertos de arêa e seixos, diz o
Agricultor pratico, de Maio de 1847, estão demonstrados pelos
resultados obtidos no departamento de Landes, no Crau, na
428

Provença. Segundo uma nota do engenheiro Remondini, di-


rector dos principaes canaes das provincias de Navara e Lome-
lina, no Piemonte, nas terras fracas a irrigação faz duplicar a
producção, e nas fortes triplicar.
"Mr. Noville, proprietario suisso, comprou na communa de
Logueville e Taon, perto da cidade d'Epinal. 100 hectares de
terreno á razão de 200 frs. cada um . Depois de irrigal os , con-
verteo-os em prados naturaes : de areas e seixos rolados que
erão, valem hoje 3 · 000 a 4.000 frs . por hectare. ( 1 )
Os areas das margens do Moselle, antes de pradificados.
nada rendiam ; os respectivos proprietarios os vendiam á ra-
zão de 100 a 200 francos por hectare ; reduzidos a prados va-
tem 3.000 a 4,000 frs. pela mesma área, regulando as despezas
da preparação do terreno para as irrigações, comprehendida a
abertura dos canaes, em 1.200 frs. por hectare ; obtem-se por
tal modo o beneficio liquido de 1.300 frs. por cada um, augmen-
o de mais de 14 vezes o valor primitivo de taes terrenos.
Nas provimidades de Dié chegam os melhores prados a
vender-se á razão de 7.000 frs. por hectare, e o preço dos ter-
renos arenosos, quando não gozam do beneficio das irrigações
regula por 2.000 frs. " [ 2 ]
Os terrenos das proximidades de Carpenteras offerecem
um exemplo palpitante do augmento de seu valor por meio
das irrigações : por isso que, sendo mui delgados e carregados
de pedras, se vendiam entre 500 e 1.500 francos cada hecta-
re, ao passo que agora se vendem á razão de 3.000 a 5.000
francos, tendo por conseguinte n'estes terrenos quadruplicado
seu valor. O rapido melhoramento dos terrenos neste departa-
mento tem procedido não só das irrigações, como da limona-
gem trazida pelas mesmas.
"A preparação de 1 hectare de terreno para as irrigações,
não comprehendida a abertura de canaes, computa -se na Fran-
ça, termo medio em 240 ou 300 francos. " (3)

(1) Bento Fortanato de Moura - Memoria sobre as irrigações


na França, Italia, Belgica e Espanha, pag. 16.
(2 ) Bento Fort. - Obra cit., pag. 15.
[3 ] Bento Fortunato- Obra cit., pag. 18 .
429

Morin de Sainte -Colombe exprime-se desta forma : "Em


certas localidades as irrigações formam a base do valor primi-
tivo da propriedade ; dobram-no e algumas vezes decupli-
cam -no. (1 )
Talayer, em St. Laurent [ Rhône], conseguio crear com 0
desembolço de 20.000 frs. um prado de 33 hectares, cujo pro-
ducto annual é de 10.000 frs . Antes desta operação o terreno
não rendia mais de 1.200 frs.
Em Pierrelate, diz Gasparin, vi nesses ultimos annos 14
hectares de terra pedregosa e arenosa que havia custado 18.000
frs., produzir, num só anno, por meio de irrigações - 350.000
kilogr. de alfafa (luzerne) valendo 18.000 frs., e terras da pla-
nicie d'Orange, argilo - calcareas, de custo de 132 , arrendarem-
se por 323 frs . , quando irrigadas. (2)
A irrigação, bem conduzida com boas agoas, pode dobrar,
quadruplicar os productos da terra : é de alguma forma uma.
créação que está no poder do homem. E accrescenta Puvis.
como exemplo, que perto de Epinal um prado de 18 hectares
valia antes de irrigado 300 a 400 frs. por hectare, e depois
6000 8000 frs. (3 )
Young (4) estabelece a seguinte relação entre o preço das
terras irrigadas e as seccas ; em Perpignam como 10 para 6 ;
em Campan como 30 para 6.
E' o que confirma Puvis, antigo sub- frefeito de Tarascon,
arrondissement que vio, depois da introducção das irrigações,
a fecundidade enriquecer este immenso planalto de pudingue,
coberto de delgada camada inconsistente ; tal foi, então, a bo-
nificação que emquanto o hectare de terra não regado se ven-
dia por 25 francos, o irrigado custava 500 francos . (5 )

(1 ) Morin de Sainte Colombe -Maison rustique du XIX siécle.


vol. I, pag. 338 .
(2) Gasparin- Cours d'agriculture. V. IV pag. 488.
[ 3] Puvis- De la méthode d'irrigation des prés dles Vosges,
pag. 1.
[4] Young - Voyage en France, pag. 363.
[5 ] Morin de Sainte- Colombe - Maison rustique du XIX
siécle, T. I , pag, 238.
430

Auxiliados por uma derivação, os Snrs. Dutacq e irmãos es-


tabeleceram. ás portas de Epinal, um prado de 18 hectares ;
começaram estes trabalhos ha 12 ou 15 annos, e esta superficie
que se compunha de areias, seixos, más pastagens, tornou -se
excellente prado, que produz 5 a 6000 kilos de feno da melhor
qualidade por hectare.
No seu antigo estado de areia valia o hectare 3 a 400 fran-
cos ; actualmeute vale 6 a 8000 frs. , tendo variado as despezas
de 200 a 600 frs. por cada hectare. (1)
Na Provença, a margem do Crau, deserto calçado de sei-
xos, vende -se o hectare irrigado por 4000 frs. Nos Vosges os
terrenos arcientos, sem vegetação, do Mosella, e por conse-
quencia desvalorisados . adquiriram pela irrigação o valor de
5000 frs. por hectare , em Autun, terras que valiam apenas .
ha 5 annos, 900 frs. , se venderiam hoje, que ellas são irrigadas ,
no minimo por 5000 frs. ( Relatorio do ministro da agricultura á
Camara dos deputados em França, em 1845, citado por Polon-
eeau. [2]
A parte sujeita ás irrigações, no Orange, dá prados que
são ceifados tres e quatro vezes e arrendados a 850 frs. por
hectare. Em Vaison e em Malancéne, a rega elevou o preço
de graude numero de terrenos, naturalmente inferiores, a 12
e 14000 frs. o hectare. Em Cavillon, donde se colhe do solo
productos tão variados, e onde o trigo produz pelas irrigações
as mais avultadas riquezas, a agua do Durance decuplicou em
alguns logares o valor do solo Terras incultas. que apenas va-
liam 500 frs. por hectare, se vendem hoje por 5000 frs. Em
Sorgue uma lande esteril que mortificava a vista do viajante.
centuplicou de preço ! (3 )
No valle do Pia, proximo de Perpignan, a mais rica terra
aravel é vendida. quando não regada, por 1.252 frs. o hectare,
emquanto que o terreno irrigado se vende por 2.086 frs., isto
é, os dous valores estão entre si como 6 : 10 .
Em Campan, onde as terras têm agua a farta, custam

(1 ) Puvis- De la methode d'irrigat., pag. 11 ,


(2) Polanceau -Des eaux relativement à l'agriculture, pag. 6 .
( 3) A. de Gasparin - Rapport adressé en 1835 à la Societé
royale d'agriculture.
431

2.867 frs. por hectare ; não sendo irrigadas valem apenas 1.911 .
Estes valores estão entre si como 6 : 4. ( 1 )
Na Bretanha o hectare de landes, que era carissimo por
300 frs. ha alguns annos, se venderia facilmente hoje, depois
de irrigado, por 3000 frs. [2]
Refere V. Yvort o seguinte, que resumo : Em 1772 o pla-
nalto do Valgodemar apresentava o aspecto de uma aridez re-
pellenta, sem arvore e quasi sem agua. Herbeys conseguio.
construir um canal de 28 kilom. , e cada alqueire de terreno que
antes valia 40 frs. adquirio no primeiro anno 300 frs. e logo
depois 800 frs. [3 ]
Em 1827 o Sur. d'Augeville transformou 40 hectares de
terras sem fertilidade em prado irrigado por meio de 3 açudes,
que despejam um no outro as suas aguas. Antes de irrigados
produziam 36 frs. de renda por hectare, depois 96 frs. liqui-
dos. [4]
Nos arrondissements de Semur e d'Avalon, terrenos cujo
hectare tinha o valor locativo de 12 a 70 francos, attingiram
pela irrigação 75 e 180 frs.
Ficou admittido, de conformidade com os trabalhos ou
Commissão superior para a utilisação das aguas, em França,
publicado em 1879 pelo Ministerio das obras publicas :
Que a irrigação produz, na media, o accrescimo de renda
liquido de, pelo menos, 200 francos por hectare, feitas as de-
duções de todas as despezas resultantes da rega ; que o aug-
mento de valor territorial adquirido por um terreno, submet-
tido a irrigação, pode ser avaliado em cerca de 4.000 frs. por
hectare, podendo mesmo attingir cifra mais alta para as terras
de má qualidade. (5 )
Barral resume nestes termos as deduções feitas em 40
monographias de propriedades cultivadas por meio das irriga-
ções. [6]

(1) A. Young - Voyage agronomique.


(2) Relatorio do minestro da agrie. as Camaras francezas em
1845.
(3) V. Yvort- Excurtion agronomique en Auvergne, pag. 187 .
[4 ] Nadault de Buffon - Traité des Irrigations. T. III , pag.
499.
(5) Durand - Claye - Hydr agric., vol. II , pag. 547.
(6) Barral- Rapport, 1876.
432

Vio - se desde logo que o producto bruto das terras irri-


gadas nas Bocas do Rhodano é de 1.500 a 3.500 francos por
hectare, em vez de 200 a 500 ou 600 francos apenas para as
melhores terras não irrigadas.
"A renda liquida do hectare das terras irrigadas é de 200
a 500 frs. e mesmo mais, muitas vezes o quintuplo das terras
similares não irrigadas. "
ITALIA- NO Piemonte conta- se que a irrigação augmen-
ta, na media, o producto liquido das terras de 50 frs. por
hectare e na Lombardia de 76 frs . (1 )
BELGICA- Na Solongue os prados naturaes produzem no
maximo 2000 kilogr. de feno por hectare : quando irrigados dão
até 8.000 kilogr.
As charnecas da Campina belga valiam de 15 a 20 frs. por
hectare em 1835 : transformadas em prados por meio da irriga-
ção se vendem até 400 frs . ( 2 )
HESPANHA - "Cuando, siendo favorables las condiciones
económicas y fisicas de la produccion, sólo falta el seguro y
oportuno auxilio del agua para que se desarrollen los gérme-
nes de la riqueza latente, la diferencia entre el producto de am-
bas as classes de cultivo puede adquirir proporciones considera-
bles. Una hectárea de cañaveral, por ejemplo, da en las privile-
giadas tierras de la costa de Málaga 4.200 arrobas câña dulce,
de un valor medio de 8.400 reales, obtenido com un gasto de
2.800, siendo por lo tanto de 5.600 el producto liquido : mientras
que esta misma hectárea, destinada à un cuitivo de secano, dista
mucho de dar por término medio un producto liquido que llegue
à la décima parte. (3 )
A relação mais commum na Espanha entre os preços das
terras analogas seccas ou regadas é de 1 para 3. Concebe - se,
não obstante, as immensas vantagens que podem resultar da
opportuna applicação das aguas á réga das terras. com o fixar
somente a attenção no prodigioso effeito produzido pela agua
no cultivo do vergel de Murcia e no central do Ebro ; em am-

(1) Nadault de Buffon - Traité des irrigations - Tomo 3 , pag.


473. R. Pareto -Les irrigations -VI pag. 828 .
(2) Laboulaye - dicc. des arts et manufactures.
[3] A. Llaurado - Aguas y Kiegos - Vol. I pag. 22.
433

bas o steppe arido e nú foi transformado em rico e florescente


vergel, cuja vegetação explendida contrasta vigorosamente com
o quietismo e aridez dos pellados cerros que os rodeam ”. ( 1 }
INGLATERRA - O melhoramento da terra pela irrigação , diz
Middleton, é da maior importancia : por toda parte em que a
agua deste condado [ Middlesex ] fôr espalhada, e depois drenada
produzi á herva em qualquer que seja a terra, mesmo pauper-
rima ; e pela applicação de régas será elevada a maior perfeição
de que é susceptivel um prado. Alem desta melhora, operada
desde logo sem estrume, é para notar-se que ao terreno não fal-
tará adubo, ou que elle receberá pelo menos o que a agoa for-
necer.
O producto annual de um terreno pradificado neste conda-
do é de 611 frs 71 c. por hectare ; o que está sendo trabalhado ,
de qualidade ordinaria, é de 489 frs. 37 , o terreno leve, cercado,
de 795 frs. 22 ; todos estes sólos produziriam 921 frs. 56 se fos-
sem de prado irrigados. (2]
O Snr. Templer, de Stover, no Devonshire, arrendava ter-
ras afastadas a 30 frs. 58 por hectare ; valorisou-as, por meio
da irrigação, a 122 frs. 32 e 183 frs. 48 por hectare, resultando
1
o augmento da renda aunual de 152 frs. 90 por hectare. [ 3 ]
EGYPTO - No Egypto as terras irrigadas produzem 60 %
mais por hectare do que as simplesmente submersas pelo Nilo .
Barrois diz que pelă substituição do systema de irrigação ao das
bacias, a renda liquida por hectare elevou- se a 183 francos ,
equivalente ao augmento de 70 % sobre os resultados obtidos
com os antigos modos de regas e de cultura . [4]
TURQUESTAN - Facto recente prova com que extraordinaria
facilidade certas partes de um paiz , reputadas desertas, podem
ser transformadas em oasis florescentes por meio da irrigação .
Em 1858 um certo Mat-Nios, filho de um usbeg e de uma escra-
va russa, fazendo -se notar. do Khan de Khiva por sua intelli-
gencia e iniciativa, este poz sob as suas ordens 1200 ki-
bitkas com a missão de colonisar e de valorisar 2000 tenaps de

(1 ) A. Llaurado - Aguas y Riegos- Vol. I pag. 22-23.


(2 ) W. Tatham -National irrigation, pag. 178 da trad. fr.
(3 ] W. Tatham - Nation, irrig. pag. 234.
[4 ] Barrois - Les irrigations en Egypte, pag. 118 e 121.
434

terrenos incultos, situados hoje na provincia do Amu- Daria .


Pouco depois, vieram usbegs se reunir ao nucleo de colonos e o
deserto foi transformado em oasis . O centro florescente actual
da provincia do Amu- Daria deve-se, por esta forma, a intelli-
gencia e energia de um só homem.
Eis outro facto mais recente.
Em 1883, os dunganos e os tarantchis, fugitivos ás repre-
salias sanguinolentas dos chinezes do Kuldja, passaram em nu-
inero de 75.000 do territorio chinez para o russo, da provincia
do Semiretchiê. O governo russo gastou a somma de 50.000 ru
blos para crear, no steppe, canaes de irrigação afim de constituir
para os emigrados terrenos de cultura. Sob a administração de
um engenheiro russo, poseram- se estes a obra e elles proprios
estabeleceram os seus canaes de irrigação. ( 1 )
ESTADOS UNIDOS - Terras desvalorisadas por sua aridez
tornaram-se nos Estados - Unidos da A. do N. verdadeiros cen-
tros de attracção para os agricultores americanos pelo simples
implemento da agua de réga, miristrada por trabalhos de irri-
gação, a ponto do engenheiro Newell, chefe do Board ofirrigation
investigar a razão deste facto ,
Porque se liga mais interesse ao Oeste (terras aridas ) do
que as terras humidas orientaes, onde se não precisa de sup-
plemento artificial dagua para agricultura ? A resposta, diz elle,
está em que o Governo é grande proprietario da metade do
Oeste dos E. U., e interessa a todos os habitantes dessa região
que essas terras sejam cultivadas por quem as possua como
proprias ; mais ainda , porque a agricultura na região arida pro-
duz resultados maiores do que nos climas humidos ou de inve-
rificada humidade.
Nas regiões em que o sol esbate diariamente, o desenvolvi-
mento da vida vegetal, auxiliado por apropriada humidade , é
maior do que nas regiões ennuvadas ou de chuvas occasionaes .
A producção por acre é maior, e onde a temperatura é fa
voravel as colheitas se succedem nesses annos . Com a luz solar
illimitada e humidade regularmente empregada o lavrador con-
tará com uma larga, segura e mais remuneradora occupação do
que no Oriente ( Leste americano).
A irrigação intelligentemente praticada produz a cultura

(1) Moser Irrig. en Asie cent. pag. 185.


435

intensiva, melhora nos limites do possivel o cultivo do solo e di-


versifica as colheitas . A área que um só homem pode em taes
condições cultivar é menor e a producção por acre correspon-
dentemente maior. Nas mais bem irrigadas regiões americanas as
lavouras são mui pequenas , regulando a média de suas áreas no
Utah em menos de 30 acres . As pequenas lavouras e a econo-
mia que se pode fazer na captação dagua concorrem para con-
densar comparativamente a população rural . No sudoeste Ca-
formano os terrenos irrigados de pomares e vinhedos são tão
exiguos que a região agricola toma as apparencias de commu-
uas suburbanas .
Segundo Gasparin, a relação do producto das terras irriga-
das e cultivadas de trigo para as que não o são, é de 3, 4 para 1
(1) .
Nos terrenos irrigados a producção de madeiras de pinho
é, segundo Chevandier, 3 vezes maior do que nos seccos, ou me-
lhor de 11 , 57 para 3, 43. (2)
O ideal de uma terra perfeita não se separa da possibilida-
de da irrigação. (3)
A agua corrente, para a industria manufactureira, pode
ser supprida pelo vapor, pela força animal, algumas vezes mes-
mo pelo vento, em quanto que, sob um clima quente, o beneficio
da irrigação não pode ser substituido nem compensado por ou-
tra cousa. [4]
Não ha terra , qualquer que seja, sobre a qual a irrigação
não tenha bom effeito ; não obstante o resultado não é igual-
mente vantajoso em todas as partes [ Moll ].
Posso dizer, ao fechar esta exposição, o que Pareto escre-
via no seu livro ; isto é, que ser-me- ia facil multiplicar indefini-
tamente exemplos e citações de milagres produzidos pelas irri-
gações, porque poucos autores ha, dos que escreveram sobre a
agricultura, que não refiram alguns ; mas julgo dispensavel ad-
duzir novos factos.
Alem da melhoria e valorisação adquirida pelas terras irri-

[1 ] Gasparin- Cours d'agriculture - T. IV, pag. 403.


[2] Chevandrier- Recherches de l'influence de l'eau sur la vege-
tation des forêts.
[3 ] De Gasparin - Obr. eit. vol. I, pag. 374.
(4) Nadault de Buffon -- Obr. cit.
436

gadas, accresce que por este meio todas as aguas pluviaes, ac-
tualmente desaproveitadas, serão captadas, recolhidas a depo-
sitos, e opportunamente distribuidas .
No inverno, diz Lecouteux, a agua superabunda : ha excesso
não só nos riachos, como nos fossos e drenos que sulcam as ter-
ras cultivadas . Em toda a parte, nas ruas das cidades e villas.
nos sulcos dos caminhos, nos regos de saneamento, circulam
aguas mais ou menos fertilisantes que seria proveitoso utilisar
em irrigações antes de irem engrossar os rios, onde occasionam
cheias perigosas . Duplo resultado se consiguiria : reter as
aguas para agricultura e tornar os rios menos torrenciaes, me-
nos devastadores no inverno. (1)
Por esta forma realisar- se-ia o voto de Anderson - o de não
se deixa correr uma gotta dagua para o mar sem ter sido pre-
viamente estendida no solo para fertilisal o.
O facto de operar-se a transformação agricola pela cultura
intensiva, servida pela irrigação , importa o do augmento da po-
pulação rural e o de seu bem estar.
Em todos os tempos, diz Cossigny, e em diversas latitudes.
reconheceo- se que a irrigação traz como consequencia um rapi-
do crescimento da população rural, o desapparecimento da mi-
seria e o augmento do bem estar . O cultivador, sentindo que
seu trabalho, sem vêr excessivo, é para si e sua familia uma
fonte de abastança , prende- se mais a terra, e a propria morali-
dade da população melhora . Mesmo na Belgica , na Campina,
onde a irrigação só se applica aos prados, ella tranformou com-
pletamente a região, e fez da mais miseravel povoação do reino
uma das mais prosperas .
As consequencias indirectas de tal estado de cousas se es-
tendem alem dos limites dos terrenos irrigados, influem sobre o
commercio nacional e até nas rendas do Estado . ( 2 )
A superioridade da cultura irrigada é tão manifesta e im-
põe-se por tal forma a quem a compara com a ordinaria, não
irrigada, que os agricultores americanos deixam os sitios proxi-
mos do mar, ricos e populosos, por outros longiquos, apenas dota-
dos daquelle melhoramento pela certeza de lucros mais avultados.

[ 1 ] Lecouteux-- La culture ameliorante - pag. 170.


(2) J. C. de Cossigny-Hydr . agric. - pag. 29.
437

As casas, em vez de ficarem separadas por milhas , como


nos prados e planicies da região central, demoram a poucas
varas (rods ) uma das outras. A communicabilidade social esta-
belece- se, boas estradas são mantidas, bem como a communi-
cação rapida por linhas electricas .
"Cultivation of arid lands by means of irrigation results
in a far higher type of civilization than is possible on isolated
and lonely farms. Diversified agriculture, the raising of ve-
getables and small fruits, and the keeping of various domestic
animals also necessitate greater mental as well as physical acti-
vity continuous employment for all the members of a family,
and many minor industries impossible where attention is con-
centrated upon a single crop, such as wheat, corn, or cot-
ton. (1 )
"E' impossivel cultivar com proveito, se previamente se
não preparou a rega e a drenagem das terras consoante as cir-
cumstancias locaes ; e o armazenamento d'agoa, na accepção
mais extensa, constitue a base de toda agricultura racional. " ( 2 )
QUANDO SE FAZ PRECISA A IRRIGAÇÃO - Não é tanto a es-
cassez de chuvas quanto a sua irregularidade que prejudica a
lavoura, porque ordinariamente onde isto acontece a estação
pluviosa é ora abundantissima e mais que sufficiente para to
das as culturas, ora faltosa , minguada e nem sempre oppor-
tuna, caindo a longos intervallos de modo que entre as suas
precipitações a pullulação dos vermes damninhos ou a estiva-·
ção prolongada leva a devastação, senão a morte, a toda vege-
tação. (3)

( 1 ) T. H. Newell -Irrigation - no Annual Report of the Bo-·


ard of Regents of the Smithsonian Inst. para 1901 -pag. 422.
(2 ) C. Berti - Pichat -Istituzione scientifiche tecniche―t. II .
(3) O fim da irrigação, effectivamente, é menos fornecer
um excedente, sem medida, a agoa que cae do céu tão parci-
moniosamente, diz Moser, que substituir esta na medida ap-
propriada as necessidades da planta cultivada. Esta norma é
de 2 centimetros no maximo, fornecidos pelas maiores chuvas :
a irrigação tem por missão repartir, igualmente, pela super-
ficie dos campos de cultura, esta quantidade máxima dagua
que o céu recusa .
Moser- Obra citada, pag. 193.
438

Foi para corrigir este regimem de incertezas que se es-


tabeleceu a irrigação por grandes bacias, no pensamento de
captar-se as aguas pluviaes, no periodo abundante, para dir- •
tribuil-as, posteriormente , no escasso.
O testemunho de profissionaes abona o que venho affir-
mando.
In the majority of irrigation countries, diz Flynn, it was
not the deficiency of rainfall throughout the year, but the
fact that the rain fell at unsuitable times, that rendered irriga-
tion essential. In some famine years in India, the aggregate of
the rainfall throughout the year was more than ample to ma-
ture the crops, but it was almost useless for purposes of cul-
tivation, as it fell at the wrong time. ( 1)
Em relação aos Estados- Unidos, este facto é mais preciso,
segundo o testemunho de Deakin.
"Não é o numero total de chuvas, diz elle, que indica suf-
ficientemente a necessidade de um supprimento artificial
d'agua, nem tambem a estação em que ellas caem é levada em
conta.
"Em algumas partes do Dakota e do Minnesota, onde a
media das chuvas é tão somente de cerca de 20 pol., a cultura
das terras seccas não cessa ; ao passo que em districtos do Te-
xas, onde as cousas se passam do mesmo modo, seria impossi-
vel obter os memos resultados sem irrigação. A explicação é
que no Dakota cerca de 25 % das chuvas caem na estação em
que o lavrador precisa dellas, contra 50 % approximadamente
no Texas.
Na verdade observa- se uma gradação nesta escalla de N.
para S .; no Kansas 65 % das chuvas caem na primavera e ve-
rão, emquanto no extremo S. ,, como S. Diogo, somente meta-
de de todas as chuvas, que caem na primavera, são logo uti-
lisadas na agricultura. Ha alguma irrigação no Dakota, como
tambem no Iowa e Wyoming, porém não tanto como nos esta-
dos meridionaes, nos quaes, mesmo quando as chuvas são como
acima, a sua distribuição tornal- as-ia insufficientes. (2 )

( 1 ) Flynn's Irrig. canals —California , 1892 , art. 61 , pag. 206′


( 2) Alfred Deakim -Irrigation in Western America, Egypt
and Italy.
439

"Acontece o mesmo com as regiões occidentaes dos Estados


Unidos da America . Fóra dos valles, nenhuma cultura é pos-
sivel sem irrigação ; a queda d'agua pluvial attinge no Ne-
vada a media de 0m,20, no Colorado 175 millim, na California
230 millim. , e assim por mezes inteiros ; faltando a agua na
planicie, reina o deserto .
"Os immensos territorios do Texas, do Wyoming, do Mon
tana, do Nebrasba , consagrados a creação de gado, desde o
mez de Novembro até Abril seguinte, são povoados de mi-
lhões de animaes que pastam, limitados apenas pela falta
d'agua.
"Como o gado deve beber pela manhã e a tarde é mister
que elle vá e venha duas vezes em 24 horas para saciar a sêde
no regato ou ribeiro . Cessadas as chuvas a herva amarellece
como se o fogo a tivesse crestado, e os rebanhos, impellidos
pela falta d'agua e de alimento , são conduzidos aos ranchos das
montanhas Rochosas para alli passarem o estio. Onde não ha
agua a terra é sem valor.
" A irrigação faz com que nessas immensas regiões , desher-
dadadas de chuvas, se consiga cultivar o trigo e a cevada e
produzir feno como nas nossas melhores terras araveis. "
Na Australia repete -se o mesmo phenomeno.
"Na Victoria a difficuldade resulta pela mór parte em ser
o supprimento d'agua insufficiente por alguns mezes, noutros
irregular, ou distribuido de tal forma a insupprir a colheita neste
periodo particular. A estação torna- se geralmente critica quan-
do a colheita amadurece pelos fins da primavera e começo do
verão. Um relance de vista para a estatistica de nossas chuvas,
nos ultimos quatro annos dá para Horshain a media de quasi
16 poleg. para Kerong de quasi 10 ", das quaes a primeira
pouco mais, e a segunda pouco menos de 22 % cae nos tres
mezes de Setembro a Novembro.
"Se nesta occasião se conseguisse sempre agua, os nossos
lavradores do norte teriam certeza da colheita, mas como se
passa, correm o risco de completa perda em cada dous ou
tres annos. No que diz respeito, portanto, a chuvas, a Victoria
parece offerecer bôas condições como um dos estados irrigaveis,
exceptuando a parte septentrional de Kansas. Chove bastante.
para que se calcule a diminuição material da quantidade d'agua
440

precisa ao supprimento artificial, e, em annos excepcionaes,


a desnecessidade da irrigação .
"Posto que tenha havido poucos annos, a longos intervallos,
nos quaes este estado de cousas haja occorrido na America de
sudoeste, forão tão raros que pouco affectaram a media.
"O solo dos seos districtos terá do ser cuidadosamente exa-
minado, pois nos devemos lembrar de que a licção da ex-
periencia americana é que os solos reputados pelo lavrador
seccos (dry farmer), como de fraca productividade, têm prova-
do ser extremamente ferteis, quando expostos a frequentes sa-
turações e a cultura continua. " [ 1 ].
Na Espanha e sul da Europa as mesmas causas aconse-
lharam o mesmo remedio
"E' nos paizes do sui da Europa, escreve Blerzy, [ 2 ] que
se deveria ter experimentado mais a necesssidade de armazenar
as aguas correntes para regar terrenos deseccados pelo ardor
do sol. Montanhosa, como é a Espanha, onde os regatos são
torrentes, conheceu esses trabalhos primeiro que o resto da Eu-
ropa a barragem de Alicante, construida no seculo 16, ainda
existe ; consiste em um muro de alvenaria que não tem menos
de 42 metros de altura .
"Em 1788 o governo espanhol projectou a construcção de
um açude na serra de Guaderrama para abastecer d'agua a ci-
dade de Madrid . O muro da barragem deveria ter 72 metros
de espessura na base e 93 metros de altura ; mas foi levado por
uma cheia antes de concluida, e aquelle não teve coragem de
recomeçar a empreza .
"E' que obras deste genero, embora não se trate de alvena-
ria bruta, exigem toda a sciencia do engenheiro ; requerem
calculos das suas dimensões afim de que a pressão da agua
nunca exceda a resisteucia dos materiaes, o computo do des-
pejo do rio para conhecer-se qual o volume liquido que a es-
tação pluviosa fornece, a escolha do local segundo os accidentes
topographicos , etc. "
"A mór parte da fertil planicie da Italia não rende senão
pequenissima fracção do fruto que poderia produzir, se na esta-

(1 ) Walter Bell - obra citada.


[ 2] Blerzy- Les riviéres et les cananx de France.
441

ção quente aguas abundantes de irrigação infundissem -lhe nova


vida, e tornassem na capaz do cultivo que requer mais hu-
midade. " [1]
VOTOS PELA IRRIGAÇÃO — As vantagens resultantes da ir-
rigação, reconhecidas e verificadas nos grandes paizes agrico-
las, deveria induzir as populações campesinas a exigir sua
applicação onde quer que ella fosse praticavel.
No sul da França, desde o meiado do seculo passado, pro-
nunciou- se um movimento na opinião publica favoravel a obras
deste genero, que se traduzio por meio de petições das as-
sociaçõos, conselhos geraes de agricultura e do commercio, ao
governo.
Nestas petições, que são numerosas. e de que apenas re-
produzo algumas para mostrar a importancia em que é tida a
irrigação, encarecem -se os seus resultados como verdadeiros
salvaterios para lavoura .
O que é alli um voto, para o Ceará torna-se uma condi-
ção vital, o ponto de apoio ao seu desenvolvimento eco-
nomico.
Eis como se pronunciaram as differentes associações fran-
cezas :
Do Conselho geral de agricultura em 1845 :
"Para que a nossa população em crescimento diario seja
mais bem alimentada, vestida, forte, feliz. em uma palavra, é
mister que o solo da França produza mais gado, fundamento
da prosperidade agricola. Torna-se necessario encorajar no-
vas irrigações ou autes creallas
a ; porque ellas são apenas pra-
ticadas em alguns departamentos.
"E' hoje a melhor maneira de testimunhar interesse pela
irrigação precisar, em termos claros. o que se reputa util ao
desenvolvimento daquelle genero de alimentação " pois é tem-
po de traduzir por factos os numerosos escriptos publicados
sobre esta materia."
Do Conselho geral do commercio :
"A questão das irrigações é uma das mais importantes e
vitaes para o paiz."
Do Conselho geral dos manufactores :
Um dos elementos mais proprios para desenvolver no

(1) G. Torricelli -Dei grandi bacini.


442

mais subido gráo o poder e a riqueza nacional, um dos meios


mais efficazes de melhorar a sorte das classes que soffrem.
consiste na utilisação completa das aguas que se perdem."
Votos de conselhos geraes dos departamentos
Dos Basses Alpes :
Les effets désastreux de la sécheresse qui désole les cham-
pagnes sous le climat du Middi, font vivement sentir les bien-
faits qu'on pouvait retirer d'un systéme d'irrigation mettant à
profit les nombreux cours d'eau dont le pays est sillonné.
Mais livrés á eux-mêmes, les habitants ne pouvent obte-
nir que des résultats trés- restreints. L'action puissante du gou-
vernement pourrait seule changer cet état de choses deplora-
ble, en facilitant l'établissement de canaux d'irrigation, sur
une grande échelle, et en contribuant à leur dépense.
Dos Hautes -Alpes :
Na sessão de 1847 o conselho teve de examinar projectos
preparatorios resultantes dos estudos que elle havia exigido.
Verificou delles que com uma despeza approximativa de i
milhão 507.700 francos regar- se -hiam 11.937 hectares, o que da-
ria para cada hectare o custo de 126 frs.
Reconheceu- se que esta despeza , que deve parecer mini-
ma, quadruplicaria o valor do solo.
QUAL O SYSTEMA DE IRRIGAÇÃO PREFERIVEL PARA O CEARÁ ?
--Depois da demonstração que venho fazendo sobre as vanta -
gens da irrigação, cumpre -me mostrar qual o systema prefe-
rivel ou adequado as condições topographicas e meteorologi-
cas do Ceará.
Como ficou dito, as correntes que tomam o nome de rios,
neste Estado, rão são senão extensas valas por onde se escoam
as aguas pluviaes, que ordinariamente em Agosto ou Setem-
bro deixam de correr, cortam, segundo a expressão popular, per-
manecendo estagnadas em poços, no seu leito até Outubro ou
Novembro. Esta massa liquida, que na estação das chuvas é
drenada e perdida para lavoura, indo ter an oceano, seria
mais que sufficiente para alimental-a durante o verão, se fosse
aproveitada methodicamente.
Para isto basta attender-se a rapida e exhuberante pro-
ducção do sólo nos annos regulares, quando a media pluvial,
443

nos 4 mezes de inverno, ou mais verdadeiramente nos 3 me-


zes de Março a Maio, attinge a 600 millm.
E' sabido que dous terços dessas aguas se perdem pela
evaporação e deslise á superficie do sólo duro, compato, ar-
giloso, do sertão e dos valles a que vão ter, restando apenas
para todas as necessidades da vegetação 200 millimetros ou
pouco menos, distribuidos sem regularidade, e nem sempre na
occasião opportuna,

Em Julho a maturação e colheita devem estar concluidas, e


se esta se demora é por motivos de economia ou por não haver
conveniencia em apressal -a.

O solo fica, portanto, inactivo, sem o menor prestimo deste


mez a Janeiro, isto é, por 7 mezes, por faltar - lhe a humidade
necessaria á vida vegetal. E como é esta a epoca de calor mais
intenso, elle apressaria a evolução de todas as plantas, espe-
cialmente das tropicaes, se fosse auxiliado pela humidade. Se-
gue-se que em vez de uma colheita precaria, de inverno, o solo
irrigado poderia dar tres, das quaes duas em excepcionaes con-
dições de productividade.
Por sua vez, o melhor preparo da terra convidaria o lavra-
dor a uma rotação de culturas racional e economica, de par
com a segurança e aperfeiçoamento da criação, alimentada
convenientemente na estação secca, quando o gado perde a
gordura por falta de forragem verde e aguada facil.
Pode dizer-se que, guardadas as proporções, sem levar em
conta os methodos agricolas adiantados, a producção triplica-
rá, augmentando o bem estar geral da população por meio de
cereaes frescos, carne sã, legumes e fructos em todo O anno,
alem do accrescimo de riqueza resultante do excesso disponi-
vel desta producção .
Si, portanto, na mesma área cultivada fossem recolhidas
e armazenadas as chuvas que a fertilisem, o excedente, não
aproveitado, e que presentemente corre para o mar causando
as vezes innundações, daria fartamente para a colheita inver-
nal e as duas do verão.

Mas, não se trata somente de impedir que essas aguas se


escoem inutilmente da área limitada a uma simples cultura,
444

senão de captar as que descem de vertentes pedregosas, este-


reis, incultivaveis, dez a cem vezes mais extensas do que aquel-
la ; o que importa accrescer outras tantas vezes o volume li-
quido armazenavel para annos de peuuria pluvial, e assegurar
a regularidade do seu supprimento as necessidades agricolas
de modo indefinido .
Qual o meio de conseguir este desideratum, de forma a
compensar directamente o capital nelle empregado . a amorti-
sal-o em praso rasoavel e a permittir, pela barateza d'agua. sua
mais vasta applicação ?
Varias tentativs têm sido feitas, no Ceará, no sentido de
verificar-se o melhor processo ou systema irrigatorio, apro-
priado as suas condições ; e por seu exame chegarei a conclu-
são do que é mais racional e pratico, e se impõe pela logica
dos factos.
Examinarei os mais aconselhados , a começar pelos
POÇOS ARTESIANOS- (1 ) O governo federal, suggestionado
pelo exemplo dos Est. Unidos da A. do Norte, e talvez por
conselho de profissionaes, que não conhecem as condições geo-
logicas do Ceará, nomeou uma commissão para perfurar poços
artesianos, que ha mais de anno procura debalde o veio liqui-
do precioso com que espera enriquecer alguns trechos do solo
cearense.
Parece que os dous aspectos pelos quaes a applicação des-
ta medida devia ser encarada e estudada, não o foram suf-
ficientemente. Refiro-me as faces economica e geologica que
ella apresenta, cuja importancia é simplesmente intuitiva.
A commissão iniciou os trabalhos de perfuração sem O
previo estudo das camadas estructuraes do solo, guiada em-
piricamente por apparencias topographicas.
E quando palmo a palmo a historia e natureza das cama-
das rochosas se ia revelando, a proporção que se aprofunda-
vam as perfurações, cumpria ao profissional, especialmente in-

(1) En. carta escripta pelo notavel geologo J. C. Branner


ao Sr. Barão de Studart e estampada na Kepublica, vejo com
desvanecimento que este illustre sabio approva as minhas
conclusões sobre a questão dos poços artesianos no Ceará .
445

cumbido deste estudo, acompanhar-lhe a marcha, afim de pre-


parar elementos para o conhecimento geologico das mesmas, e
uma vez firmado nelles propor um plano scientifico, capaz de
orientar a acção administrativa neste particular.
A dispersão desses elementos de estudo, seguida da impro-
ficuidade ou fracasso dos resultados de taes obras, concorrerá
para se formar, na opinião menos esclarecida do publico, aliás
a mais numerosa, senão preponderante, a convicção da ineffi-
cacia de qualquer remedio attenuador das consequencias desas-
trosas das crises climatericas.

Despezas feitas sem methodo. aventurosas, na esperança


de resultados problematicos, pesarão com todo o seu fardo de
sacrificios orçamentarios sobre a região flagellada pelas seccas,
e serão levadas a conta da communhão nacional, creditadas
em favor desta, e nunca descontadas como erros e ensaios
mallogrados de quem as malbarateou . (1)

( 1 ) Depois da publicação destas observações na Revista da


Academia, o illustrado deputado Calogeras, et notavel discurso
pronunciado na Camara dos deputados em Outubro de 1908
sobre o orçamento da Viação e industria fez considerações ju
diciosas, que secundam o meu modo de pensar. Eis o resumo
feito pelo o Jornal do Commercio do Rio de Janeiro.
Ao iniciar suas observações sobre as obras emprehendi-
das contra a secca, lembra o orador que a área sobre a qual
se estende o flagello, do norte de Minas ao Piauhy, bem ca-
racteriza a questão como problema nacional e não permitte se
viva a especular com o dizer que tal serviço é puramente lo-
cal. Por outro lado, não convém que as soluções adoptadas fi-
quem à mercê de por vezes mal comprehendidos interesses re-
gionaes, como já tem acontecido. O primeiro objectivo a satis-
fazer está em conhecer de facto, e não por simples impressões
sentimentaes em annos climatericos, a região flagellada. Será
uma zona desertica ? modificavel ? por que meios ? Eis tres in-
terrogações ás quaes pouquissin o se póde responder por falta
de systematisação, ou mesmo por falta de estudos serios sobre
o case . A primeira cousa a fazer, portanto, é estudar o regi-
men das aguas, tanto na rêde hydraulica apparente, como nas
precipitações atmosphericas. Serviço é este que ainda não
existe, ou antes, só aqui alli, sem nexo : absolutamente indis-
pensavel, entretanto, apparece uma ou outra série de apon-
446

A simples prudencia senão experiencia, já adquirida em


obras desta natureza, no Ceará, aconselharia, se ainda fosse
preciso levar a evidencia sua improficuidade, a adopção de
medidas economicas, rigorosamente reduzidas ao minimo de
despezas. Neste presupposto, em vez de serem taes obras con-
fiadas a uma commissão, composta de engenheiros, profissio-
nionaes de alto valor scientifico. que naturalmente exigirão
estipendio compativel com os seus esforços, era preferivel con-
tratar com alguma companhia americana, já pratica neste
serviço, a perfuração de alguns poços, como ensaio, sob as vis-
tas de fiscaes do governo.
O proprio chefe da commissão, nomeado pelo governo, o
Dr. Antonio Olyntho, aponta no relatorio sobre irrigação e po-
ços artesianos, que apresentou ao Dr. Lauro Muller. a norina
seguida pela União americana.

tamentos meteorologicos. Cumpre methodisar primeiro taes


trabalhos. As medições dos rios, puramente praticas a princi-
pio, darão indicações preciosas sobre as aguas disponiveis na
superficie, e, nos rios que cortam, facilitarão o estudo das cor-
rentes liquidas subterraneas. Os estudos meteorologicos forne-
cerão o primeiro dado sobre a agua existente no sub- solo ;
o volume das chuvas caidas sobre o solo. Parte dellas se in-
filtra e constitue o reservatorio que talvez possa solver o pro-
blema da secca. Para sabel-o , um unico modo pratico existe :
indagar das condições geologicas para a determinação dos ho-
rizontes aquiferos.
Este resultado só se obterá mediante investigações de es-
pecialistas e não com o trabalho de perfuração de poços ás ce-
gas, sem orientação scientifica, serviço de operarios sondado-
res inexpertos e nunca de engenheiros. Da mesma fórma, não se
estudam e projectam barragens unicamente porque a topogra-
phia de um valle offerece pontos convenientes para a construc-
ção da muralha ; sim após verificação exacta das condições
minimas da bacia hydraulica, afim de se não repetirem os
desastres do Quixadá, nem se planearem reprezas de 4.000 con-
tos para collectar 450.000 metros cabicos de agua apenas,
de uma zona não estudada hydraulicamente, conforme affirma
Purioso telegramma recente sobre um novo açude entre Pa-
rahyba e Rio Grande do Norte.
Dos trabalhos feitoa contra a secca nos tempos ultimos só
se salva o que foi executado por essa benemerita commissão
do serviço geologico, tão modesta, tão ignorada do publico, de
117

O governo americano, diz elle (1) . se incumbe de estudar


o solo por meio de sua repartição geologica, e publica nume-
rosas monographias e mappas, indicando a natureza do terre-
no e as rochas onde mais commumente sao encontrados abun-
dantes supprimentos de agua, determinando por meio de son-
dagens ou da inclinação das camadas, & maior ou menor pro-
fundidade onde esses podem ser alcançados."
Não foi isto o que se fez e nem o que se está fazendo no
Ceará. Do estudo intimo do solo, no proposito de se lhe co-
nhecer as vantagens economicas, quer para mineração, quer
para agricultura, ainda se não cogitou.
Dadas, porém, as condições meteorologicas do Ceará, caso
se consiga encontrar nelle lençol artesiano, será convenieate a
adopção dos poços profundos para irrigação ?
Pelo estudo do Dr. A. Olyntho, a que me acabo de referir,
a mór parte destes poços, nos Estados Unidos, não são jor-
rantes , requerem o auxilio de bombas a vapor ou a vento no
aproveitamento de suas aguas. As despezas de perfuração,

tão grande valia pratica, entretanto, para as cousas do Brasil.


Graças a ella, a ella tão sómente, póde-se agora começar a ter
orientação precisa nos esforços da luta contra a falta de agua
nos sertões do norte. São as investigações de Branner e de
Crandall que permittem ter um fio de Ariadne na treva abso-
luta em que se moviam os salvadores do problema. Parece lo-
gico, portanto, entregar a direcção da luta contra a secca a
uma secção daquelle serviço, extinguindo a commissão espe-
cial. que tão pouco tem justificado a sua propria existencia.
E tanto mais lucrará com isto a zona assolada, quanto a maior
parte da verba, mais ainda do que geralmente se suppõe,
ten. sido desviada de seu fim natural para ser empregada na
Exposição da Praia Vermelha. Como vê a Camara, não allu-
de o orador aos prolongamentos de vias ferreas e outros tra-
balhos da mesma natureza, custeados por tal verba, porque
não são senão palliativos contra os soffrimentos das popula-
ções, permittindo movimental -as para regiões menos flagella-
das, ou levar-lhes alimentos e outros recursos. Dependem mais
propriamente de um serviço de soccorros publicos, do que de
um conjuncto de providencias contra um mal de origem cos-
mica.
(1) Antonio Olyntho - Rel. sobre irrig. e poços artezianos-
Rio de Janeiro, 1906 - pag. 7 .
448

moinhos de vento. canaes e sua conservação encarécem por tal


forma o custo destas aguas que seria impossivel o seu emprego
na agricultura cearense.
Os poços pouco profundos ficam por mais de 1,000 dollars
cada um, o que quer dizer que no Ceará custariam 4 a 5 con-
tos.

O Dr. Olyntho poucas informações dá sobre o custo de


taes obras. Catando-os no seu relatorio encontram- se os se-
guintes dados : no Massassussett 5 poços de 30 a 80 m. de pro-
fundidade, dando 157 litros por segundo, custaram $2.540 : no
Conneticut 1 de 160 m., dando 75 litros , custou $1.273 , no
Alabama 1 de 800 m. e 260 litros custou $26.000 .
Na Argelia a media de 1 poço de 70 metros é de 4.000
frs . (1 )
Os 5 poços do Massassussetts, cujo despejo não chega a
1.500 litros diarios, custaram ao cambio actual 8.382 $, sem
falar nas obras complementares de irrigação .
No Ceará cada poço com catavento, na melhor hypothese,
custará 2 a 3 contos, sujeito a desarranjos e concertos no
moinho de vento, entupimento dos canos, etc. Os 8.000 litros
dagua que elles dão diariamente, havendo vento, irrigarão 5
hectares de terreno. (2 )

(1) Segundo o engenheiro Jus contavam -se na região do


Ued- Birh, em 1885, 114 poços forrados francezes e 492 indi-
genas. A profundidade media dos poços varia entre 50 e 72
metros. ficando cada metro pelo preço de 62 francos.
J. Dybowski - Traité pratique des cultures tropicales - Paris
1902, pag 133.

(2) Existem na Fortaleza alguns poços profundos cujas


aguas são extrahidas por moinhos de vento. Não ha um só que
irrigue mais de 2 hectares de plantas fructiferas. Estes poços
com os moinhos, encanamentos, etc. orçam pelo custo acima,
não tendo prefundidade superior a 30 metros.
Na Argelia, onde muitos poços dão 4000 litros dagua por
minutos ou 4.720.000 litros em 24 horas, Dybowski acha que
esta agua fica muito cara, e pode apenas irrigar 60 hectares.
Dybowski - Obra citada, pag. 133.
449

Verdadeiramente, a irrigação tentada por aguas de taes


poços nos arredores desta cidade ( Fortaleza ) deu resultado ne-
gativo, a despeito dos esforços e gastos dispensados. ( 1 )
Mas concedido que cada poço possa irrigar 2 hectares.
seriam precisos 50.000 poços para os 100.000 hectares que o
grande açude de Lavras com os seus 1.500 milhões de metros
cubicos irrigará. Importa dizer que cerca de 150 mil contos se-
rão precisos para se ter uma irrigação minguada, sujeita a
mil contratempos, como o abaixamento da camada aquifera, a
obstrucção da tubulagem, a usura das bombas, o estrago dos
moinhos de vento, etc., etc., quando com a decima parte ter-
se-ia com aquelle açude um perfeito serviço irrigatorio .
Ainda mesmo reduzido o custo da construcção e demais
despezas a metade ou mesmo a um terço da que acima se ve-
rifica e supposto que o lençol dagua subterraneo, no valle do
Jaguaribe, possa alimentar essa irrigação, e o solo permitta a
perfuração espaçada e methodica de poços que aproveitem
toda a zona cultural, ninguem seriamente pensaria em adoptar
tal systema, já pelo seu alto custo, já por não ser remune-
rador . (2)
Nas proximidades de centros populosos , movimentados ,
para irrigação de pomares e jardins ou como alimentador de
caldeiras a vapor na grande industria, comprehende -se o seu
uso, em falta de outro mais barato . (3)
Na Argelia e nas regiões americanas em que elle é empre
gado, nenhum outro meio de captação de aguas seria possi

(1 ) O Sur. João Albano tendo a seu dispor o riacho do


Alagadiço e possante catavento, não obteve resultado compen-
sador a tentativa feita de irrigação de horta por este sys-
tema .
(2) As applicações de aguas artesianas na irrigação são
rarissimas em França ; a explicação é simples : os poços arte-
sianos custam caro, seus resultados são incertos.
Durand Claye -Hydraulique agricole, vol. 2, pag. 379.
(3) Foi somente no sul da California que as fontes arte-
sianas foram utilisadas para irrigação apoz despezas conside-
raveis quasi ruinosas ás companhias e particulares.
Como as culturas mais lucrativas da vinha, das arvores
fructiferas, larangeiras, legumes, podem supportar preço dagua ·
muito alto, os californianos não hesitaram recorrer aos poços
450

vel, ou quando o fosse, ficaria por preço superior as forças da


producção. Nestas regiões a media annual de chuvas é infe-
rior a 400 millimetros, sendo na Argelia sahariana de 100 a 200.
Como armazenar abi as aguas pluviaes se ellas apenas
caidas são evaporadas ?
Estes exemplos não podem ter applicação ao Ceará, cuja,
zona litoral recebe annualmente 1.500 mill. , e o sertão mais lon-
ginquo 800 mill.
Não pode haver competencia entre os dous processos ir-
rigatorios, fontes artesianas e reservatorios ou canaes, porque
só se recorrem aquellas quando estes sãe impossiveis. Or-
dinariamente o aproveitamento das aguas subterraneas faz- se
onde as chuvas são tão escassas, que não permittem sua capta-
ção a ceu aberto, ou o solo, por demais infiltrante e poroso,
não as pode reter.
As bacias artesianas. por extensas que pareçam , são limi-
tadas, não supprem senão quantidades certas de liquido . ( 1 )

forrados para haver agua que os rios ou canaes distribuiam


em quantidade mui reduzida e mediante preços excessivos.
Só no condado de los Angelos contam-se, em explorações
medianas, 550 poços tubulados, de profundidades variantes en-
tre 15 e 150 metros. O despejo medio não passa de 5 litros
por segundo e cada poço serve para irrigar na media de 12 a
15 hectares.
O preço medio de cada poço sendo orçado em 2.000 fran-
eos (1.260$. ) o luxo da irrigação não se pode justificar senão
pela excepcional renda das culturas a que é applicada.
A' pag. 42 do Vol. I diz Ronna : "Salvo em algumas re-
giões excepcionaes, como apresentam a Algeria, a California,
a China, parece que as fontes artesianas não podem satisfazer
as necessidades de uma irrigação extensa. "
E mostra que no antigo reino de Napoles, na Espanha, na
Grecia, na propria França não deram resultado .
A. Ronna - Les irrigations - Vol. I, pag. 420.
(1) Não é impunemente que se queira abrir numa mesma
bacia grande numero de poços artesianos. Por mais extensa
que seja a superficis de infiltração, ella não pode ser alimen-
tada senão por pequena fracção das aguas pluviaes. Destas, os
dous terços pelo menos são levados pela evaporação ; do res-
tante a deduzir-se a parte das fontes e da que escorre, não
fica senão pouco para as camadas profundas.
Lapparent-Traité de geologie, pag. 203.
451

Seria, portanto, imprevidencia. senão loncura, suppor que


em região geologicamente inexplorada, como o Ceará, fora
possivel sentar solidamente os alicerces de sua prosperidade
agricola, amparal-o contra as calamidades das secças, por
meio da perfuração de algumas dezenas de poços deste ge-
nero. (1)
A condemnação do processo artesiano resulta da propria
exposição que delle fez o illustrado ministro da viação ( Dr.
Calmon) (2) no seu relatorio de 1907. São seus os seguintes
conceitos :
"Ha sido, a miudo, lembrado o aproveitamento das aguas
subterranas, como recurso adequado para tornar essa região
desolada capaz de sustentar uma população muito mais densa
do que a actual, e de fornecer grande producção agricola, me-
diante irrigação .
"Não são bastante conhecidas as condiçães meteorologicas
e geologicas do territorio em questão, para que se julgue, de
antemão, até que ponto é a espectativa bem fundada : mas
sem grande risco de erro, se póde affirmar que deve, desde
já, ser posta de lado, para generalidade de zona, que, sómente,
em certos tratos, comporta tal solução . Mesmo nestes, a obten-
ção de agua em abundancia, para a irrigação generaliza da,
deve ser tida como irrealizavel, visto que em parte alguma do
mundo, tém as aguas suberraneas se apresentado em quanti-
dade sufficiente para regar mais do que limitada fracção de
superficie circumvisinha. Na melhor hypothese, poderão ser-
vir para tornar mais numerosas e constantes as aguadas para
OS usos domesticos do homem e sustento dos animaes, dando
em alguns pontos pequeno excesso applicavel á irrigação de
área circumscripta.
"E' condição para a existencia de aguas subterraneas. sus-
ceptiveis de ser utilizadas por meio de poços, que haja, em

(1) Quando ás fontes artesianas e aos poços, o exame geo-


logico dará informações precisas. São estudos que demandam
cuidado e exactidão, pois para o melhoramento sensivel do
nordeste seriam precisos talvez milhares de poços, etc.
Francisco Bhering - O problema do corte.
(2) Dr. Calmon de Almeida -Relatorio apresentado ao E.
Sur. Presid.-- em 1997.
452

profundidade razoavel, uma camada rochea permeavel, encai-


xada entre outras impermeaveis. ( 1 ) Para que se torne apro-
veitavel em área de consideravel extensão, faz - se preciso que
a camada aquifera, ou lençol de agua, como se diz commu-
mente, seja, o mais possivel, horizontal. Isto quer dizer que o
aproveitamento de aguas subterraneas depende da estructura
geologica ; sendo favoraveis [ no caso de reunir as outras
condições necessarias, mas de importancia secundaria] as áreas
constituidas nas partes superficiaes, por formações geologicas
estratificadas, em posição proximamente horizontal, e desfavo-
raveis as em que as formações geologicas não são estratifica-
das, ou se apresentam em posição sensivelmente inclinada. (2)
Não sendo conhecidas, senão de modo muito perfunctorio,

[ 1 ] Esta proposição formulada tão categoricamente não


é completamente exacta . Não é necessario , diz o grande mestre
Lapparent, no seu Tratado de geologia, cap. III§ 2º, como ge-
ralmente se crë, para que o lençol dagua jorre que este se
ache contido entre duas camadas impermeaveis. Basta, se o lençol
é profundo , que elle seja comprimido por uma só camada de
argila que mantenha a sua superficie superior porque em vir-
tude do estado de saturação da crosta terrestre a agua do len-
çol nenhuma razão tem para ser attrahida para baixo.
(2 ) As tentativas de irrigação que se tentem com a ex-
tracção do lençol da agua subterranea devem ser feitas com
cautela, precedendo estudos sobre a profundidade em que se
encontra esse lençol e rectificando as osciliações da sua super- 1
ficie para mais ou para menos, afim de reconhecer se não ha
1
corrente de infiltração subterranea para o mar o que é facil dar-
se em terrenos de alluvião e arenosos : é o que se observa em
caminhos á beira das praias do Ceará exemplo o Aquiraz,
contendo agua doce que repelle a salgada, tendente a infiltrar
para o terreno.
Barão de Capanema --A Secca do Norte, 1903 .
Notavel exemplo tenho, mesmo a respeito do Ceará : quan-
do uns Americanos se propuzeram a abrir poços artesianos em
terreno granitico, que en conhecia, fui abelhudo em dizer ao
ministro que essa tentativa era um absurdo : expliquei -lhe por
que . S. Ex respondeu-me que as theorias modernas provam
o contrario, ensinando que as rochas compactas encerram ca-
vidades, contendo agua. Magister dixit -e curvei-me ante a
sua autoridade.
Barão de Capanema - ibid. in fine.
453

as feições geraes da estructura geologica da região secca do


norte do Brazil, impossivel é indicar, com precizão, as zonas e
districtos onde se deva contar com o aproveitamento das
aguas subterraneas para o melhoramento , em larga escala, das
condições de habitabilidade e de producção. ”
O Dr. Calmon pensa, porém, que se deveria examinar este
assumpto mais detidamente, pelo que pondera no seu relatorio :
"Ha, comtudo, algumas zonas mais promissoras do que
outras, e que, por isso, merecem ser examinadas sob este as-
pecto :
1 , a zona baixa, de formação relativamente recente, que
acompanha o littoral e se estende pelo fundo dos valles. em
• distancia maior ou menor, até ao interior do continente ;
2º, a zona de sedimentos horisontaes, de idade terciaria e
secundaria, que, com algumas interrupções, margeia o littoral,
em faixas mais ou menos longas, desde o Espirito Santo até o
Pará ;
3º, as chapadas elevadas do sertão.
"As tres regiões acima mencionadas abrangem apenas uma
parte, quiçá menos de metade, do territorio semi-arido da Re
publica. Na outra parte, só excepcionalmente é permittido.
contar com aguas subterraneas. e os trabalhos por fazer ahi
devem visar ao melhor aproveitamento das aguas superficiaes.
armazenando -as na estação chuvosa para serem utilizadas na
estação secca.
"Isto já se faz em pequena escala, e graças à iniciativa
particular, por meio de açudes e cacimbas ; e tentou-se fazer
em maior gráo, com os grandes açudes destinados á irrigação.
O exemplo de Quixadá demonstra que a açudagem de cursos de
agua intermittentes, nem sempre dá segurança de bom exito.
isto é, de se conseguirem, sobre grandes áreas, condições cul-
turaes que permaneçam durante estações seccas successivas.
"A' vista deste exemplo, não será de bom alvitre empre
hender obras semelhantes sem estudos prévios, prolongados e
minuciosos. Enquanto procedermos a estes em lugares onde
se encontre probabilidade de fazer vingar novos nucleos de po-
pulação e producção , poder -se-ha ir, com obras menores e es-
parsas, melhorando as condições de vida e transito da po-
pulação. "
454

Não posso penetrar os fundamentos scientificos que leva-


ram o illustrado ministro a excepcionar as zonas - litoral. se-
dimentaria e a das chapadas sertanejas- do conjuneto geolo-
gico do solo cearense.
A zona baixa, costeira, não formada pelos sedimentos are-
nosos, é em geral na orla maritima do Cabo Frio ao Pará de
origem terciaria, como ficou dito a pag. 62 deste trabalho. Cre-
taceo que fosse este terreno, repousando sob eamada meta-
morphica ou cristallina abaixo do nivel maritimo, dado o em-
pino do solo cearense, não poderia armazenar aguas cujo de-
clive para o oceano deslisasse sem tropeços, isto é, sem a inter-
posição de rochas impermeaveis. ( 1 )
Por sua vez, as chapadas elevadas do sertão , ou são
interrompidas e sulcadas pelos drenos fluviaes para os quaes
fluem as aguas, ou formam trechos solitarios , limitados , de área
minguada , pedregosos , entre serrotes incultivaveis , onde, por
ventura , ellas se podem barrar em proveito das regiões mais
baixas que se lhes avisinham .
Em relação ao açude de Quixadá ainda os conceitos do
Exm? Snr. Ministro da Viação pedem reparo. O exemplo deste
açude não demonstra, como suppõe S. Exa , que a açudagem
de cursos dagua intermittentes deixe sempre de garantir bom
exito, isto é, de se conseguirem, sobre grandes áreas, condições
culturaes que permaneçam durante estações seccas succes-
sivas.
A conclusão a tirar- se , não seria a negação de factos ir-
recusaveis sobre a efficacia dos grandes açudes, em geral, e sim
que o de Quixadá por sua collocação, proxima as nascenças
de riachos de breve curso, só nas estações pluviosas abundan-
tes poderá armazenar agua.
A verificação desta singularidade facilmente se fará ao re-
lancear a vista para qualquer carta topographica do Ceará.
Ver-se- ha que o rio Satià não offerece curso apreciavel, des-
cendo de encostas seccas por umas 2 a 3 leguas até a barra-
gem, tendo, aliás, ao lado, e a poucos kilometros, o boqueirão
de Quixeramobim, proximo a cidade de seu nome, dando vazão

[1 ] Veja o meu trabalho -As pretenças fontes artesianas do


Cocó, na Revista da Acadomia Cearense.
455

a uma bacia fluvial cem vezes maior que a do rio Satiá. Mais
adiante, a do Boqueirão de Lavras por onde corre o rio Salga-
do depois de um curso superior a 300 kilom. e de drenar as
aguas da maior bacia cearense. Estes dous rios nunea deixa-
ram de correr, mesmo nos annos de maior secca.
A insegurança do bom exito não resulta da obra em si.
e sim da impropriedade do local escolhido. ( 1)
Examinemos a medida recentemente preconisada da
LAVOURA SECCA - Este systema cultural, empregado nas
terras aridas americanas, legitima -se pela escassez de chuvas
ou de aguas nestas regiões. Seu regimen pluvial não excede de
500 millimetros, descendo a 300 ; donde a certeza de uma ca-
mada maxima dagua não excedente de certa quantidade. [ 2 ]
O solo, por meios adquados a reter a humidade, é quasi
scientificamente preparado para receber até o maximo das
precipitações pluviaes. A tantos centimetros abaixo da super-
ficie cultural estende - se a camada artificial ou natural, for-
mada de argila compacta, sobre a qual se adelgaça outra afo-
fada. destinada a cultura. A capillaridade traz do reservato-

[1] Veja-se adiante o capitulo em que eu trato destes lo-


caes.
[2] A media aunual da chuva entre as faldas das Monta-
nhas Rochosas e o centesimo meridiano é quasi de 15 pollega-
das [380 mill. ]
John L. Cowan cultura das terras seccas.
A media das precipitações aquosas, que varia de 20 pol.
[510 mill. ] na margem oriental do districto semi - arido a 10 pol.
[255 mill. na occidental, não é simplesmente pequena, mas
tambem irregular. Ha annos em que a media é quasi cortada
em duas partes, e ha mezes sem uma nuvem, e dias, especial-
mente no sudoeste, em que os ventos são como o sopro de
uma fornalha -tão quente e secco que mudam campos verdes
de milho em talos seccos e estralantes, em 24 horas. Um es-
tudo da variação na queda annual mensal da chuva nesta re-
gião, feita pelo Bureau Meteorologico, mostra que em cada
logar houve ao menos dous annos seccos nos dez annos obser-
vados.
Informações do ministerio da agricultura dos Estados Unidos
da A. do Norte.
456

rio subterraneo á raiz da planta a humidade necessaria a sua


vegetação.
Entre a superficie lavradia e a camada subterranea, im-
permeavel, deve existir uma faixa de terra, calculada appro-
ximadamente para conter o maximo de aguas pluviaes, sem
prejuizo da planta . Esta faixa não pode ser reduzida, nem ac-
crescida caprichosamente, ao talante de cada um, por motivos
de facil comprehensão. Se fôr reduzida, a agua armazenada
abeberá o terreno, empapal -o -ha, suffocando as sementes ou
putrefasendo as raizes ; se espaçada, ficará muito em baixo,
perdendo os seus effeitos beneficos, porque a capillaridade não
attingirá ao ponto desejado. (1)
Destas considerações . resulta que a LAVOURA SECCA só dará
resultados onde o regimen pluvial não oscillar entre extremos
superiores a 200 ou 300 mill.
Ora, compulsando - se as tabellas das chuvas em Quixadá,
Quixeramobim e Icó, vê- se que em Quixadá a amplitude milli-
metrica é de 303 ( 1898) para 1367 ( 1894) : no Quixeramobim
de 313 ( 1903 ) a 1049 ( 1899 ) ; no lcó de 394 [ 1900 ] a 1194

( 1 ) Eis como o Snr. John L. Cowan descreve este systema


de cultura :
"O solo é arado a profundidade de mais ou menos duas
pollegadas abaixo da superficie. O terreno é em seguida cai-
cado e depois gradado repetidas vezes para afofar e pulveri-
sar o solo superficialmente, formando uma "camada superficial”
que impedirá a evaporação de toda a humidade da terra, e ao
mesmo tempo receberá e absorverá toda a chuva que cahir, em
lugar de deixal-a correr pela superficie.
Depois de cada chuva forte, a "camada superficial" deve ser
gradada varias vezes, de modo que se conserve fôfa e em bôas
condições. Si deixarem-ua endureeer, a capillaridade trará para
superficie a humidade que se filtrou pela camada superficial e
esta humidade depressa evaporar-se -ha com O ar quente e
secco. No fim dos mezes de verão a relva estará completamente
apodrecida, e a terra deve ser de novo lavrada, cortando - se
desta vez duas ou tres pollegadas mais fundo, que da primeira.
Depois usa-se um instrumento conhecido como grade de
discos do sub- solo, designado especialmente para ser usado
nos terrenos seccos de Oeste. Este instrumento tem dez rodas
em forma de V, ou cambas em forma de cunhas, que cortam
fundo no solo, pulverisando todos os torrões, tanto em baixo
457

[1894], extremos que a simples enunciação excluem qualquer


idéa de um aproveitamento systematico do solo de accordo
com as necessidades daquelle methodo cultural.
As mesmas incertezas que trazem o animo do agricultor
indeciso, sujeito a inconstancia das estações, perdurarão aqui
com a aggravante das despezas crescidas, porventura exces-
sivas, attento a resistencia do solo no sertão a qualquer lavra ,
no preparo do mesmo ; pois se num anno dado, a faixa -reser-
vatorio [dagua], calculada para um certo quantum de chuvas,
digamos 600 mili. representativo da media de 12 annos, rece-
ber 1.200 mill., resultará a sobre carga de 600 mill. , não pre-
vista, que inutilisará todo o terreno, convertendo -o em exten-
so lodaçal, viveiro do paludismo, emquanto não fôr drenado
ou verões seccos não o alliviem do empapaшento. Se na pre-
visão de maior carga liquida, adoptar-se um espaço capaz de
receber 700 ou 800 mill. , e as chuvas apenas produzirem 400,
a acção capillar será insufficiente para trazer a planta a hu-
midade necessaria. Em ambos os casos insuccesso, grandes
despezas e condemnação do remedio.

como em cima, e reduzindo as raizes, as hervas e as palhas a


uma massa compacta com o terreno solido em volta. Isto
augmenta a capillaridade do solo e a sua capacidade para
guardar a agua, ajuda a rapida decomposição da materia ve
getal e colloca o terreno na condição physica propria para
germinação da semeute e desenvolvimento das raizes das
plantas
Em seguida vem a grade de discos e outra vez a grade de
dentes, passada repetidas vezes sobre o solo, para garantir qué
as duas pollegadas da superficie do terreno fiquem aptas a pro .
teger a humidade dentro delle e receber e conservar toda a
chuva ulterior.
Antes de plantar deve-se passar de novo o arado numa
profundidade de pelo menos 7 pollegadas, gradar com a grade
de disco de sub- solo a camada superficial formada por repetidas
gradagens, feitas com grades de dentes, e então enterrar a se-
mente com bastante profundidade, de modo que esta descan-
se em baixo da camada fôfa sobre o terreno endurecido pela
grade de discos.
Após o plantio a camada superficial deve ainda ser afofada
em seguida a cada chuva. Isto é tão importante, que a repe-
tição do conselho parece necessario.
458

Eis como uma medida boa em si, e porventura nnica ap-


plicavel a certa região, tornar- se- ha desfavoravel e perniciosa
em outras.
Na adaptação deste e de outros remedios, suggeridos pela
imaginação de medieos empiricos, que esperam curar doentes
sem os conhecer, tem havido taes facilidades, diria inconsci-
encia, que admira não terem provocado a irritação e o clamor
geral da gente sensata.
Experiencias diletantes hão contribuido para desviar a
attenção dos poderes publicos de assumptos serios e funda-
mentaes a solução de problema tão vital para o Ceará.
Meu pensamento é encaminhal- a, restituindo-a a seus de-
vidos termos.
Antes de qualquer outra consideração, cumpre não perder
de vista o facto que domina esse problema, qual seja a fre-
quencia de chuvas, mais ou menos copiosas em certa quadra
do anno, no litoral e no sertão, mesmo nas phases cyclicas das
seccas.
Não se trata de região sahariana ou mesmo semelhante as
planicies seccas e aridas dos Estados Unidos da America do
Norte, pobremente favorecidas de aguas pluviaes : mas de ter-
ras fartamente humedecidas no litoral, ou sob um regimen de
meteoros aquosos, no seu hinterland, superior, senão igual ao
dos paizes agricolas mais ricos.
" Parece, diz o Dr. Orville. que se pode dizer da região
secca do norte do Brasil o que o articulista citado pelo Jornal
do Commercio (1) diz da região correspondente nos Est. Unidos,
isto é :
"A real difficuldade na maior parte da America ( Brasil!
arida não consiste em falta , mas na impossibilidade de utilisar
a humidade que cae. Se effectivamente se verificar que para as
culturas apropriadas ao sertão do Ceará bastam 20 polegadas
(500 mill. ) de chuva annual, somente 4 dos 16 annos, de 1891 a
1906, eram necessariamente annos de colheita escassa, e entre
estes somente 2, ou em rigor somente [ 903] de absoluta pe-
nuria.

( 1 ) Orville Derby — O regimen das chuvas nas regiões seccas


do norte do Brasil, publicado no Jornal do Commercio de 17 de
Maio de 1907.
459

Com estes caracteristicos a estação chuvosa normal apre-


senta boas condições para plantas annuaes. A sua duração é
sufficiente para a manutenção de todas as culturas usuaes,
mesmo no caso em que a sua entrada esteja anormalmente de-
morada ; o seu periodo inicial com chuvas de pouca frequen-
cia e intensidade relativas é favoravel ao preparo do terreno e
da germinação das sementeiras, sendo igualmente favoraveis
o periodo medio de maior frequencia e intensidade na epoca
de maior crescimento das culturas, e o final de diminuição
gradual das chuvas no da maturação e colheita. Quando, po-
rém, a estação corre anormalmente, as culturas podem soffrer
ou mesmo falhar completamente, ainda que não seja deficien-
te a quantidade total da chuva annual. A anormalidade mais
perigosa é provavelmente a de um intervallo demasiado grande
entre as primeiras chuvas e o inicio das chuvas seguidas, e
assim chamado "veranico ” -uma especie de saida falsa do
inverno .
Concluindo diz o Snr. Orville Derby : ( 1 )
Tanto quanto se pode julgar pelos deficientes dados cli
matologicos á mão, as condições conhecidas do sertão secco
do norte do Brasil são taes que offerecem muitas probabili-
dades de que a magna questão do seu aproveitamento para a
lavoura possa ser resolvida pelos processos desenvolvidos
pelos lavradores norte americanos em circumstancias seme-
lhantes." (2)
Do mesmo parecer é o illustrado professor da Escola po-
lytechnica de S. Paulo. (3 )
"A julgar, com effeito, diz elle, pelos dados climatolo-
gicos conhecidos e relativos ao sertões e ao littoral, entre os
quaes ha em quantidades de chuvas a differença approximada
de 50 por cento, pode-se dizer que as chuvas que cahem no
sólo dos tres Estados do nordeste não podem ser considera-
das escassas, comparativamente ás que o céu concede ás ter-

(1) O regimen das chuvas etc.


(2) As circumstancias são differentes, como devem ser os
meios de aproveitar as terras ricas do sertão.
(3) Francisco Bhering -- O problema do norte, no Jornal do
Commercio de 11 de Março de 1907.
460

ras áridas da America do Norte e da India. Os dous outros


factores, o topographico e o geologico concorrem, entretanto,
para que a agua procure, em sua quasi totalidade, o oceano.
Torna-se, portanto, necessario que a engenharia, que tan-
to tem feito em outros paizes em materia de irrigação, pro-
cure corrigir, tanto quanto possivel, o tremendo mal, que,
comtudo, raramente dura mais de dous annos . Parte das aguas
que celeremente demandam o oceano precizam ser obrigadas
a estacional ." ( 1 )

[ 1 ] O problema de reter a agoa de chuva para a agricul-


tura impõe-se em quasi todas as regiões quentes e seccas da
Terra. Na Italia elle apresenta quasi as mesma difficuldades
que no Ceará. A solução que lhe propõe um dos seus mais no-
taveis engenheiros -Giacomo Torricelli - não differe da que
eu apresento . Por serem opportunas as suas considerações,
transcrevo-as em seguida :
"Infelizmente poucos são os rios de curso perenne na
Italia ...
Numerosas são as torrentes que, das duas vertentes dos
Appeninos, descem em rapida inclinação á planicie, rica então
de agua invernal sujeita a chuvas desastrosas e á seccas do
verão.
Porque, pois, como aconselham tantos autores. e bão feito
desde os tempos mais remotos com os melhores resultados na
India. Espanha, França e recentemente La Algeria e alhures,
não tentamos recolher a agua que no outomno, inverno e pri-
mavera tornou -se inutil e as vezes damnosa para distribuil-a
no verão pelos nossos campos aridos ?
"Sem duvida são custosas as obras colossaes que isto re-
quer, mas que solução, exceptuando esta, se pode dar ao pro-
blema agrario na Italia ? Consideremos a immensa extensão
de terreno privado do beneficio da irrigação que existe no
nosso paiz, e confessemos que a tenue quantidade d'agua que
se pode aproveitar dos nossos rios e correntes de outro modo
que não seja o açude, não pode ser senão ligeiros palliativos,
e não verdadeiro remedio ao mal immenso.
E effectivamente o que se propõe geralmente ? Pequenas
derivações de poucos litros, utilisação de agua subterranea fil-
trante, poços artificiaes, etc. que podem em casos excepcionaes
compensar as grandes despezas que requerem, mas que rara-
mente são economicas, e só irrigam poucos hectares de terreno.
Giacomo Torricell - Dei grandi bacini per irrigazione - pag
11-12 .
461

E' esta a unica solução -reter as aguas que se escoam im-


productivamente para o oceano.
Dous meios apresentam-se : 1º a construcção de barra-
gens altas, que represem consideraveis massas dagua ; 2. a de
pequenas barragens que empocem menores superficies , e se pos-
sam multiplicar por todos os sitios depressos e prestadios a
taes construcções.
Examinarei, antes de entrar no estudo comparado destes
dous typos de açudagens, as vantagens em geral deste systema
irrigatorio.
Apoiar-me -hei, de preferencia, na autoridade dos mestres,
que explanaram lacidamente este assumpto. Assim, Llaura-
do [ 1 ] se exprime categoricamente sobre a excellencia das re-
presas em geral, nestes termos :
AÇUDES - Suas vantagens. - " Um dos systemas mais vanta-
josos a reunião de aguas destinadas a irrigação consiste na
formação de depositos ou lagos artificiaes, já por meio de bar-
ragens de alvenaria nas gargantas que frequentemente apre-
senta o alveo dos rios e arroios ao atravessar as regiões mon-
tanhosas, ou já armazenando numa depressão do terreno as
aguas desviadas do seu leito natural durante o periodo de abun-
dancia com o proposito de utilisal-as, ou accumulando em sitios
apropriados as que, procedentes de pequenos mananciaes ou
ministradas directamente pelas chuvas na bacia da recepção res-
pectiva, hão de ser distribuidas na epoca e pelo modo que as
circumstancias particulares exigirem.
"El sistema de depositos permitte dar maior alcance al
aprovechamento de las aguas para riego : 1º , estendiendo el
beneficio de las aguas á las regiones que por su topografia no
se prestan al estabelecimiento de los canales de largo de-
sarrollo (desenvolvimento) ; 2º, facilitando la applicacion or-
denada y metódica de las aguas corrientes de régimen muy
inconstante, mediante su almacenamiento durante el periodo
de abundancia en que tienem mános valor, y su distribucion
más útil y vantajosa en el de escassez : 3 , regularisando el
desagüe repentino ó intermitente que producen las lluvias
aturbonadas y mal distribuidas ; y 4º, facilitando el más útil

[ 1 ] A. Llaurado - Aguas y Riegos - Vol. I, pag. 176.


462

empleo de los pequenos mananciales, insuficientes por su


eorto caudal para dar lugar á un disfructe continuo.
E accrescenta, como que prevenindo a objecção levantada
da seccura do clima :
"La importancia general del sistema de riegos por medio
de pantanos que se desprende de la simple enunciacion de
los hechos que acabamos de apuntar, se revela aún com ca-
racteres más marcados em nuestro pais. sujeto por condiciones
meteorológicas dependientes de distintas causas á prolongadas
sequias, y á lluvias aturbonadas ó irregulares en su distribu-
cion dentro del periodo annual, y cuyos rios, por carecer ev
su' origen de grandes lagos que regularicen su desagüe y de
manantiales perennes de alimentacion, como los que nacen en
las nevadas regionaes de los Alpes, ofrecen un exiguo régi-
men de estiage, fraccion insignificante en general del gasto
ordinario en las épocas del año en que las aguas son reclan.a-
das con ménos insistencia por el cultivo . ( 1 )
Um outro profissional - Flynn- ( 2 ) referindo -se a Califor-
nia, região sob alguns aspectos semelhante ao Ceará, pronun-
eia-se formalmente a favor dos agudes, mostrando como em
annos seccos os seus beneficios pagam sobejamente as suas
despezas de construcção ; comparando -as com os canaes sali-
enta as vantagens dos açudes, isto é, a superioridade delles
sobre outros quaesquer modos de irrigação.
Diz elle :
"Em certas circumstancias, em annos seccos, é evidente
que não haverá agua sufficiente para salvar a lavoura só de-
pendente do seu supprimento. Em tão deploravel emergencia o
prejuizo para o districto em um anno de grande secca será
maior do que o custo total do reservatorio. (In such a deplo-
rable state of affairs the loss to the district in a year ofgreat drought
would be more than the total cost of the reservoir).
O açude é destina lo a assegurar o supprimento d'agua
lurante a vasante do rio, e a prevenir a fome d'agua nas ter-

(1) A. Llaurado -águas y Riegos, Vol. I, pag. 177.


(2) Flynn's - Report on the proposed works of the Tulore
rrigat. district -California, 1890.
463

ras irrigaveis do Tulore and to prevent a water famine on the ir-


rigable lands of the Tulore Irrig. District).
The canal alone no doubt will bring a supply during years
of average or more than average rain fall, but it is sure to fail
when most required in seasons of great drought, for the suffi-
cient reason that will be no water supply.
During this years there is an abundance of water availa
ble, but it is well to remember that we are after having a most
unusual wet winter, and it is of still more importance to re-
member that extraordinary seasons of drought happen periodi-
cally, and that in only one such season the use of the storage
water from the reservoir will more than repay the expenditu-
re incurred on the dam. Without a reservoir in such a year
the canal will be a dry channel unable to supply the perishing
crops with water."
A estas razões de importancia pratica, e cuja applicação
ao Ceará têm a mais perfeita opportunidade por se tratar de
estações estivaes prolongadas. de chuvas escassas e incertas,
devem se adduzir as que eu chamarei theoricas ou de impor-
tancia geral, por demonstrarem a superioridade do açude.
dada a concorrencia com outros systemas irrigatorios.
Raphael Pareto ( 1 ) as synthetisa nas seguintes palavras :
De todos os meios de haver agua para irrigação , prefiro o
açuđe, pelas seguintes vantagens que offerecem ...
"Os canaes derivados dos rios não podem geralmente irri-
gar grande faixa de terreno senão em pontos muito afastados
da captação d'agua, e com a divisão das propriedades que
existe em França, segue - se que cada proprietario não pode
quasi irrigar por este meio senão poucos prados, collocados em
logares baixos e muito humidos. A's terras altas que, cultiva-
das em prados, dão as melhores forragens, e não aproveitam
essas irrigações, etc ....
"As aguas recolhidas a um açude melhoram e se aque-
cem ao sol , depositam nelle as materias nocivas que estão em
suspensão.
"Os açudes permittem irrigar terrenos altos e por esta
forma transformar em prados as landes e charnecas completa-

()1 R. Pareto - Irrigation, pag. 361.


464

mente improductivas. Sendo o tamanho da represa, que se


constroe, proporcional ao terreno que se quer ou se pode irri-
gar, segue -se que não é mister gastar muito para colher re-
sultado insignificante. As aguas de açude, construido segun-
do o meu modelo, ficam menos caras do que as de outra qual-
quer procedencia."
Alem destas vantagens, já de si importantes, accrescenta o
mesmo autor :
"A agua pluvial armazenada nos açudes para ser depois
espalhada em irrigações apresenta ao cultivador grandes van-
tagens. Fica perfeito senhor de sua agua e pode empregal-a
como lhe pareça melhor. Estando armazenada na totalidade,
pode, querendo, augmentar a sua quantidade na rega em tem-
po secco e diminuil-a quando humido, sem perdel- a, porque a
agua não empregada fica no açude para ser gasta mais tarde."
O primeiro destino dos grandes açudes foi o da irrigação,
especialmente nos logares em que a agna escasseava, diz Crug-
nola. ( 1 ) Elles permittiam o seu armazenamento na epoca em
que abundava, quando as chuvas erão frequentes ou operava-
se o degelo, o conserval- as em represas para depois servirem
nas quadras seccas, quando os terrenos têm necessidade de ser
irrigados.
Uma outra autoridade, C. Cossigny, (2) capitulando as
vantagens do açude, exprime- se nestes termos :
"Quer se procure a agua por um ou outro methodo [ aguas
pluviaes ou subterraneas ]. quer se queira aproveitar um sim-
ples riacho ou mesmo algum desses cursos d'agua torrenciaes
que frequentemente permanece secco parte do anno (como no
Ceará) -o estabelecimento de um açude será sempre uma
operação util que melhorará as condições de um sitio a ir-
rigar :
1 -Quando se tratar de fracos escoamentos, embora pe-
rennes, a irrigação só é materialmente possivel quando a
agua tiver sido anteriormente represada. Esvasia-se esta em

(1) Caetano Crugnola - Serbatoi d'acqua e laghi artificiali—


Turin, 1890. pag. 2.
(2 ) J. C. de Cossigny -Hydraulique agricole- Paris, 1889,
pag. 37.
465

tempo mais breve do que levou a juntar-se , e é por este arti


ficio que se obtem corrente assaz consideravel para fazer - se
chegar a agua até os pontos extremos dos terrenos a regar ;
2º -Todas as vezes que o meio empregado para haver
agua está sujeito as vicissitudes das estações e das circumstan-
cias meteorologicas, o irrigador não pode ser completamente.
senhor das suas operações senão quando as aguas estiverem
armazenadas num açude, do qual as possa retirar a vontade
no tempo preciso ;
3º-Nas regiões afastadas dos rios, os reservatorios per-
mittem recolher agua das grandes chuvas e temporaes, preve-
nindo ao mesmo tempo os estragos que possam causar as chu-
vas torrenciaes ;
4º-Independentemente do objecto especial em vista do
qual os diversos reservatorios são construidos, poderião, se fos-
sem mui vastos ou multiplos em uma região, exercer influen-
cia salutar sobre o regimen dos rios dessa região. ”
Seria um meio de minorar a desnudação das montanhas.
a escavação de ravinas, o levantamento do ieito das correntes
nas planicies, e talvez mesmo as inundações.
"Em certas regiões, cujos rios são torrenciaes, como na
Algeria e Espanha . diz Durand-Claye, os açudes constituem
o mais poderoso e por assim dizer o unico meio de propagar
a pratica das regas. ( 1 )
O testemunho dos mais distinctos profissionaes, que acabo
de invocar, dispensa-me de insistir na demonstração da supe
rioridade do açude sobre outros quaesquer meios irrigato-
rios, dadas as condições climatericas do Cearà.
Em relação ao typo a adoptar-se, como meio de ampa-
rar a população nas quadras climatericas, e de preparar a

( 1 ) Durand- Claye - Hydraul, agric., Vol. II, pag. 315. Na


região franceza limitada a Le N pelo Garonna, a O pelos de-
partamentos de Landes e Adour, e ao S pelo planalto de Lan-
nemezan. o Neste e o Garonna seccam no verão, os moinhos
param, e falta agua para os usos ordinarios da vida.
Para alliviar a esta falta o governo francez mandou con-
struir o açude d'Orédon, cuja capacidade é de 7.269.000 m. cub. ,
tendo a parede 30 metros de altura por 26 m. na base.
466

transformação da cultura extensiva e exgotante para a rota-


toria ou de afolhamentos, compativeis com a natureza do solo.
cumpre estudar - se desde logo qual o mais efficaz e econo-
mico nos seus resultados, na hypothese de um ou mais annos
de chuvas escassas ou completamente seccos, na a cepção ha
bitual deste termo.
Neste assumpto, o essencial é, segundo as expressões tex-
tuaes de Lord Salisbury em referencia a secca de 1876 na India,
"to ascertain how for irrigation works are practicable which shall
be capable of giving protection against famine in the degree at all
corresponding to their cost" fazer que as obras de irrigação se
tornem aptas a proteger a população contra a fome em escala
correspondente a seu custo. ( 1 )
Impõe -se desde logo a cogitação dos que têm a respon-
sabilidade na applicação dos dinheiros publicos o investigar
qual deva ser preferido, se o pequeno ou o grande açude ; se
as multiplas barragens disseminadas a formar depositos dagua ,
se uma ou poucas represas, em forma de lago, a dominar as
regiões que lhe fiquem a jusante.
As controversias a este respeito têm sido estereis ou sem
valor pratico, por não consultarem aos verdadeiros termos do
problema.
Em primeiro lugar é difficil demarcar os limites que cir-
cumscrevem o reservatorio grande, de um pequeno, não ha-
vendo criterio certo para differencial- os. Se tomar-se como
classificador a capacidade dagua armazenada, pode acontecer
que uma parede relativamente pequena e pouco dispendiosa.
dada a topographia da bacia hydrographica, represe dez vezes
mais metros cubicos dagua do que uma maior, e mais custosa.
Não será, portanto, o custo da obra o principio differenciador.
Em geral deve-se ter como grande o reservatorio, cuja
capacidade exceda de alguns milhões de metros cubicos dagua
empoçada, 15, 20, 25 ou o que se convencionar.
(
) Dr. Accioly, na sua mensagem ao congresso estadual
em 1905, occupou- se extensamente deste assumpto, demonstran-

(1) Lord Salisbury, -Mensagem ao Governo da India em 10


de Janeiro de 1877.
467

do com argumentos claros e factos conhecidos a vantagem


dos grandes sobre os pequenos açudes .
Se attendermos somente a lição da experiencia ella nos
dirá que nunca o Ceará teve tão grande numero de pequenos
açudes como nesses ultimos annos, cerca de 3 a 4 mil. espa-
lhados pelo seu territorio, sem que um só tenha prestado nas
phases criticas das ultimas seccas os serviços que os advoga-
dos deste typo de obras irrigatorias esperam delle.
Multipliquem-se por dezenas ou centenas de milhar esses
pequenos depositos e os resultados serão os mesmos.
Se o inverno for escasso e o verão prolongado, raro resis-
tirá a evaporação, activada pelos ventos geraes na quadra do
anno em que a necessidade de agua mais se faz sentir. Já em
Outubro a mór parte delles estará reduzido a pantano loda-
cento, e em Novembro completamente secco .
O problema, portanto, do melhoramento cultural nenhuma
solução terá recebido, porque a lavoura e a creação continuarão
a definhar e a soffrer as consequencias da secca, aggravada
com os gastos não pequenos na construcção e conservação
destes agudes.
Avaliados um por outros em 10 contos de réis cada um,
os 10.000 açudes construidos com dous a tres metros de bar-
ragem, empoçando 200 a 300.000 metros cubicos dagua, ens-
tariam 100.000 cortos e conteriam, dispersadamente, 2 a 3
bilhões de metros cubicos , sem que um só delles se preste ao
serviço regular e systematico de irrigação, já por lhes faltar o
o apparelhamento necessario, como -portas dagna e de deri-
vação, canaes, etc., já pela minguada quantidade dagua re-
presada.
Na hypothese de um anao secco, depois da estação estival .
poucos seriam os açudes que conservariam alguma agua ;
pois, como já ficou dito, sendo a evaporação equivalente a uma
camada liquida de 2 1/2 metros annualmente, e os pequenos
açudes tendo 2 a 3 ou mesino metros de barragem, preci-
sariam só para estas perdas. independente dos gastos com a
irrigação, ter paredes de 2 1/2 metros para o primeiro anno ,
5 m. para o segundo e assim por diante. A menor distracção
das suas aguas bastariam para reduzir-lhes a coefficiente in-
significante a capacidade de resistencia á evaporação .
468

Bem se vê que não pode ser pensamento dos poderes pu-


blicos distribuir por milhares de proprietarios territoriaes obras
desta natureza, cujo custo ascenderia a alguns mil contos, so-
mente para os presentear com aguadas mais abundantes do
que actualmente possuem, sem a possibilidade de ver ampara-
da da fome uma parte da população.

Dir-se-ha que entre o grande e o pequeno açude ba typos


intermedios aproveitaveis, de onus menos gravosos aos cofres
publicos.

Ainda em contrario militam razões economicas e techuicas


de grande valor, não sendo de somenos importancia as deri-
vadas do custo dagua para irrigação e a dos sitios raros e ex-
cepcionaes onde os açudes devam ser construidos.

Em lugar competente farci a respectiva demonstração.

Antes, porém, de minuciar as razões que militam em fa-


vor da adopção do grande açude, como o unico consentaneo
um regimen irrigatorio proveitoso, capaz de incrementar a
producção agricola e por ella a riqueza do Estado, bem como
de alliviar de futuro os encargos exigidos pelas crises clima-
tericas, espero mostrar, amparado no parecer dos mais illus-
tres mestres da hydraulica contemporanea, a inferioridade das
pequenas barragens em confronto com as grandes para os fins
agricolas.
E' questão capital, que deve ser resolvida antes do go-
verno tomar definitivamente, não por experiencias e ensaios,
mas por base da acção administrativa , o proseguimento des
obras contra as seccas .

OS GRANDES AÇUDES : - 1º Ocupan en general ménos ter-


reno para un mismo volúmen de agua ; y en igualdad de eir-
cunstancias suelen experimentar menos perdidas por evapora-
cion y filtracion en el embalse que las correspondientes al con-
junto de varios depósitos parciales .
2 El coste de una presa de fábrica de gran altura es ge-
neralmente menor que el de varias, de cuyo conjunto ofresca
la misma capacidad. En efecto, en un mismo embalse las ca-
bidas de agua desde el fondo hasta las distintas superficies
469

odere
de nivel pueden considerarse como sensiblemente propor-
riaes cionales à los cubos de las alturas correspondentes. ( 1 )
confox
"Em igualdade de condições, accrescenta Llaurado , expe-
ndartes "
rimentam menos perdas pela evaporação e filtração na base
er amp
do que os que correspondem ao conjuncto de muitos depositos 1
parciaes, sendo o custo de uma repreza de grande altura ge-
ba ralmente menor que o de varias, cujo total offereça a mesma
A95 capacidade. " (2)
O Sr. J. J. Revy, empenhado em comparar as vantagens
e teeb reciprocas dos dous typos (grandes e pequenos açudes) chegou
ia as d as seguintes conclusões :
Taros e "Os pequenos açudes de typo commum, nesta provincia
(Ceará), não só são mais dispendiosos relativamente á pequena
porção d'agua contida-o que é a medida de seu valor - como
tração. se tornam inuteis durante as seccas excepcionaes, pela perda
Zam emá d'agua evaporada.
onsenta "Julgam alguns erradamente que esses grandes reservato-
rementar rios (refere-se ao de Itacolomy) , dos quaes a provincia não po-
bem deria possuir muitos, iriam prestar serviço a mui poucas lo-
ises eli calidades ; entretanto, comprehende- se facilmente que grandes
mais ils reservatorios, como o de Lavras e Itacolomy, suppririam pra-
ridade ticamente quantidade illimitada d'agua a todo o valle em cuja
Dara os fis cabeceira o mesmo estivesse situado. Assim o reservatorio de
Lavras suppriria com abundancia d'agua o valle do Jaguari-
be, de Lavras até o Aracaty, e o Jaguaribe conservar - se-ia
tes do r
corrente todo o anno, ainda mesmo que não fosse regular a
e ens
estação chuvosa . O reservatorio de Lavras dará mais agua para
mento d
a fertilização do terrono do dito valle do que MIL dos maiores
açudes que ordinariamente se fazem na provincia, e que alli
ménos fossem localisados.

ad de e Em snmma, seu poder fertilizador será maior do que to-
r evapors dos os que até hoje tenham existido no Ceará."
tes al fot Comentando esta exposição escrevi ( 3 ) "o que ahi fica

Cura es
( 1 ) A. Llaurado-- Aguas y riegos -Madrid, 1884, vol. II.
to ofre pag . 184.
Ise las a (2 ) A. Llaurado-Aguas y riegos, Madrid, 1884, vol. II.
ic
superf (3) Th. Pompeo- 0 Ceara na exposição de Chicago, pag. 60.
470

dito é de facil verificação. Um açude ordinario, de parede de


argila e areia, com 5 metros de alto, em condições vantajosas
de local, pode represar até 500 mil metros cubicos d'agua.
Custando a represa a media de 8 contos, cada mil metros cu-
bicos d'agua ficarão por 164000 .
"Suppondo que as filtrações e evaporações consummam
apenas 20 % dagua represada, restarão 400 mil metros cubicos.
os quaes divididos á razão de 15 mil metros cubicos por
hectare, irrigariam apenas 26, dado que o açude estivesse cheio.
depois de inverno regular. Em outros termos, a irrigação de
26 hectares de terreno, nesta hypothese, custará 8.000$000 ou
3074000 por hectare.
"Com o açude de Lavras, cuja capacidade é de 1.500.000.000
metros cubieos ( 3.000 vezes maior do que aquelle) e o custo
de 5.633:000 000. o preço de 1.000 metros cubicos não exce-
derá de 3$755. Sendo a evaporação de 8 % e a filtração in-
significante, perder -se-iam 120.000.000 metros cubicos , ficando
disponiveis, depois de 12 mezes, 1.380.000.000, os quaes dis-
tribuidos á razão de 15.000 metros cubicos por hectare irriga-
rão 92.000 pelo preço maximo de 61 $228 réis per hectare.
"A differença de 61$228 réis d'agua para irrigação de um
hectare num grande açude para a de 3074000 num pequeno,
é 5 vezes mais fraca, isto é, 500 % menor.
"Neste calculo admittimos a hypothese de que o açude de
argila e areia esteja dotado de apparelhos de irrigação, quan-
do a verdade é que nenhum dos existentes
no Ceará os
possue.
"O custo e assentamento de taes apparelhos encareceria
de 50 % a mais taes açudes e proporcionalmente o preço
dagua.
"Actualmente taes açudes só irrigam pelas filtrações da
parede ou pelo desaguadouro, e não aproveitam sequer á de-
cima parte de terrenos que elles poderiam irrigar na hypo-
these figurada. Em regra ficam inutilisados pela evaporação e
filtrações logo depois de Outubro on Novembro, e raro con-
servam agua até o proximo inverno, e esta mesma em cal-
deirões fundos, lamacentos, donde não pode ser aproveitada
para aquelle fim.
471

"Taes açudes servem somente de deposito d'agua por al-


gum tempo para o gado, e parte de suas margens, a que
chamam casantes, para o plañtio de legumes.
"Quando o verão se prolonga, a evaporação vae pouco e
pouco deixando a secco as margens, até concentrar toda a hu-
midade na parte mais profunda e abrigada do sol e ventos
reinantes. Essas margens, a principio lodacentas, endurecem ,
gretam -se ao calor solar, pulverisando -se em particulas te-
nues á superficie, sempre lavadas pelos ventos quentes do
sertão.
“A vegetação, si houve, perece, não deixando vestigio de-
pois de 8 10 mezes de rigorosa estiagem."
Alem das razões expostas em favor do grande açude.
muitas outras importantes podem ser adduzidas . ( 1 )
Demorado envasamento -os açudes menores, devido á pe-
quena altura da parede e a area submergivel, diminuem an-
nualmente de capacidade pelos successivos depositos de vasa
que alli se accumulam .
"Observan.os, escrevem Zoppi e Torricelli (2) , que o ra-
pido aterramento deste açude ( do Sig) e de outros pequenos
da Algeria aconselha abandonar-se o systema das pequenas
bacias, e construir -se somente as grandes por serem mais re-
muneradoras e não estarem sujeitas a rapido envasamento
(che sono più rimuneratori, e in cui l'interrimento non si fa cosi
presto avvertire").
Servir de moderador-ás grandes correntes formadas por
chuvas continuadas e torrenciaes. Depois de grandes e demo-
radas bategas d'agua pluvial, os terrenos ficam encharcados e
os rios torrenciaes transbordam produzindo damnosas inun-
dações. Sendo a corrente contida por alta barragem e a agua
solta gradativamente por meio de comportas, os perigos da
inundação são praticamonte fracos, porque na peior hypothese
a altura destas barragens permitte armazenar, não uma, ma ;
repetidas enchentes esporadicas. Nos açudes pequenos basta
ás vezes uma chuva copiosa para enchel - os ; e como não estão

(1 ) Mensagem do presidente Dr. A. P. Nogueira Accioly em


1905 , pag. 51 .
(2) Zoppi e Torricelli -Laghi artificiali, art. 88.
472

apparelhados com portas d'agua, faz - se o seu escoamento pelo


sangradouro e nenhum serviço podem prestar nesse sen-
tido. (1 )
FISCALIZAÇÃO E CUSTEIO MAIS ECONOMICO :-A experien-
cia tem mostrado no Ceará que a conservação dos pequenos
açudes ou é inteiramente desconhecida, entregue à acção de-
molidora do tempo, ou exige cuidados incessantes e custosos,
que mal compensam os poucos beneficios produzidos.
"Os açudes construidos pelo governo geral nas duas eri-
ses de 77 e 88, entregues ás municipalidades, inutilizaram-se
dentro de praso relativamente curto, ou ficaram na sua maioria
destruidos por falta de conveniente conservação. Accresce
que sem os apparelhoos apropriados á distribuição d'agua, sem
canaes de irrigação, taes obras não se prestam a fomentar a
lavoura confiada á orla marginal dos mesmos, progressiva-
mente reduzida, á medida que a evaporação vae rarefazendo
o liquido." [2]

(1 ) Outra vantagem que traz o grande açude é o de ser-


vir de moderador nos rios e de contribuir em outros casos
para evitar os damnos terriveis das inundações.
Caetano Crugnola- Serbatoi d'aqua artificiali, Turim, 1890 ,
pag. 83.
A ideia de armazenar as aguas de enchentes em reser-
vatorios artificiaes, de modo a augmentar a duração do escoa-
mento e por conseguinte diminuir a altura maxima da enchen-
te, é muito natural ... A efficacia dos lagos ou açudes para
diminuir as enchentes dos rios é evidente. Mas os lagos são
raros e os açudes não são possiveis senão em certos logares
apropriados ; para construir açudes é mister achar planicies
formadas por desfiladeiros, que se possam barrar, sendo ainda
necessario que essas planicies tenham grande valor.
Para serem efficazes. devem os açudes possuir grandes di-
mensões ; os pequenos não se podem applicar senão a corren-
tes dagua elementares, como torrentes de grande declive, gar-
ganta estreita e fraca capacidade ; além disto o atterro traz
dentro em pouco o levantamento do fundo. Um açude peque-
no exerce insignificente acção sobre o curso dagua principal
e seria difficii manobrar em tempo opportuno uma serie de
reservatorios attinentes ao mesmo fim.
Durand-Claye -Hyd. ogricole et genie rurale, Paris, 1890,
Vol. I, pag. 394,
(2) Dr. Nogueira Accioly -Mensagem ao Congresso em 1905.
473

Para preservar esses açudes de total destruição e apro-


prial-os á irrigação dos terrenos a jusante, seria preciso do-
tal- os de comportas e torres de tomada dagua , de cauaes dis-
tribuidores e de outras obras complementares, organisar um
serviço completo de conservação com directoria technica, au-
xiliares, jornaleiros, e as respectivas officinas dirigidas por
mestre, etc. A differença de direcção entre um grande e um
pequeno açude será relativamente insignificante, e as despezas
dahi resultantes, referidas a unidade d'agua disponivel, serão
tanto mais crescidas quanto menor for esta.
Corroborando estas conclusões, isto é, que as despezas ge-
raes com o custeio de um grande e de um pequeno açude
pouco differem, observa o notavel engenheiro Caetano Crug-
nola : [1]
"Como a construcção de um grande açude é obra assaz
custosa, e a mór parte de sua despeza quasi constante, e não
proporcionada a quantidade dagua armazenada, para que esta
traga vantagens economicas é necessario que a superficie a
irrigar tenha certa extensão. geralmente não inferior a 8.000
hectares, se a parede da bacia fôr de alvenaria, e 4.000 hec,
se de terra.
"Augmentando a extensão crescerão as vantagens, pois
que diminuirá o custo dagua, mas crescerão apenas as des-
pezas com a transformação agricola da zona a irrigar.
"Vê-se daqui quão complexo é o problema, e como deve
o engenheiro ser cauto e acurado no exame de todos estes
factos."
Tenho invocado de preferencia as autoridades profissionaes
de paizes cujo regimen pluvial e natureza do solo mais se as-
semelham ao do Ceará.
Sendo analogas as causas que aconselham a construcção
de taes obras, os factos assignalados por muitos annos de ex-
periencia em abono das mesmas são quasi decisivos para
solução do problema das seccas no Brasil .
A Italia, a Argelia, a região arida dos Estados - Unidos da
America do Norte, a India e a Australia offerecem notaveis

[ 1 ] Caetano Crugnola - Serbatoi d'aqua e laghi artificiali,


Turin, 1890, pag. 3.
474

pontos de semelhança com o Ceará em relação a inconstancia


das estações, despenho do solo, mingua de chuvas, etc.
E', pois, nestes paizes que devemos estudar a applicação
dos varios methodos de irrigação, e quaes os resultados co-
lhidos.
Em lugar competente farei breve analyse de cada um. Por
emquanto, apenas desejo mostrar que ha quasi unanimidade
no modo de considerar o grande açude como o mais economico
o proveitoso, dadas as condições topographicas que permittam
o sua construcção.
E' , assim que o engenheiro australiano Walter Bell, depois
de referir-se ao regimen fluvial de sua terra, sujeito a variações
quasi tão bruscas como o das ravinas cearenses, aconselha
prudentemente algumas medidas, cujo feixe é a adopção das
grandes muralhas reservatorio.
Diz elle (1 ) que a " irrigation is chiefly resorted to in cli-
mate where the summer is hot, and the rainfall for that season
either deficient or irregular."
E' o caso da zona nordeste brasileira.
E mais accentuadamente frisa que "In the art of irriga-
tion the first great point is to maintain in the soil that unifor-
me degree of moisture by which plants grow and flourish
in warm climate ...
"But to the Australian, perhaps the most forcible ar-
gument in favour of irrigation is in preventing those disas-
trous failures of crops which occur every few years, and in
giving the agriculturist a certain return for his labour, inde-
pendent ofthe incertain rainfall. The irrigation is, in fact. in
the position of a man who can control his rainfall. " [ 2]
Walter Bell [ 3 ] prosegue dizendo que, tendo de se apro
veitar as aguas pluviaes e de torrentes o seu volume deverá ser
cuidadosamente determinado por uma serie de annos afim

(1 ) Walter Bell -Irrigation for farmers and engineers, Mel-


hourne. 1890, pag. 36.
(2) Walter T. Bell - Irrigation for farmers and engineers, Mel-
bourne, 1890, pags. 2 e 3.
(3 ) Walter Bell-Irrigat, pags 69 e 70.
475

de conhecer-se a media, e estatuir-se a capacidade da re-


presa. (1)
O local do reservatorio será explorado minuciosamente ,
preferindo -se o leito de antigos lagos. Quando isto não seja
possivel, se escolherá um valle atravessado por curso d'agua,
de pouca inclinação, e em garganta apertada se erguerá mu-
ralha.
Dá preferencia as muralhas mais elevadas, aos grandes
açudes, nestes termos :
"The embankment ought to be at least 40 feet high, and
higher is better, as every foot added to the height of the bank
means one foot more of water over the entire surface of re-
servoir : besides, the deeper the reservoir the less will be the
rate of loss by evaporation, although this will be largely coun-
ter-balanced by the increased area for evaporation. " O muro
deve ter ao menos 40 pés de altura e quanto mais alto me-
thor, porque cada pé accrescentado a altura da parede signi-
fica um pé mais d'agua para toda a superficie do reservato-
rio : além disto, quanto mais fundo for este , menor será o
valor da perda pela evaporação , posto que esta fique larga-
mente contra-balançada pela area accrescentada de avapo-
ração.
Finalmente o notavel engenheiro italiano G. Torricelli re-
puta de tal importancia a superioridade do grande sobre o
pequeno açude que são estas as suas proprias expressões :
"E saró pago e soddisfatto dell' ingente tatica che ebbi a
sostenere, se questo tenue lavoro sia per riescire di qualche
vantaggio, e possa mostrare che i grandi bacini, da tanti il-
lustri autori raccomandati, sono ormai l'unico veramente pra-
tico e conveniente sistema di derivazione." (2)
No Brasil, porém, houve e ha algumas pessoas, pouco co-
nhecedoras deste assumpto e ainda menos das condições locaes

[ 1 ] Foi o que se não fez no Ceará, por faltarem dados


relativos ao regimen pluvial de Quixadá. Hoje possuimos 13
annos de observações pluviometricas em Quixeramobim, e 16
annos no Icó, proximo a Lavras,
(2) Giacomo Torricelli-Dei grandi bacini di irrigazione,
pag. 4.
476

cearenses, que proclamam a superioridade das pequenas ba-


cias sobre as grandes, levadas, umas pela desconfiança no exito
da medida, infelizmente applicada até o presente sem methodo
nem estudo consciente, quasi empiricamente ; outras, talvez ,
pela differença para menos no custo das pequenas obras, pela
barateza, que sempre exerceo singular attracção sobre os es-
piritos menos observadores. [ 1 ]
Os dous açudes construidos em Quixadá e no Acaraú-
mirim não têm produzido os resultados esperados : aquelle
por sua construcção tão proxima á nascença dos riachos que
deviam servir de collector as aguas pluviaes para sua bacia
que só em annos de inverno chuvoso poderá ser abastecido ;
o de Acarahú-mirim pela illusão ou fascinação d'agua, não im-
porta como e onde armazenada. Lá está esta grande bacia de
80 milhões de metros cubicos, no custo de mil contos, servin-
do tão somente de aguada, sem o minimo proveito para irri-
gação, ( 2) uma vez que se não cogitou de saber se á jusante de
sua parede existiam terras em condições de serem fertilisadas e
aproveitadas para lavoura por meio de regas systematicas.

[1 ] E' assim que um espirito lucido e sinceramente devo-


tado ao estudo do problema das seccas, o illustrado engenhei-
ro Raymundo Pereira da Silva diz, numa monographia que
publicou em 1907 com o titulo-O PROBLEMA DO NORTE, no
Rio de Janeiro :
"O conhecimento ainda que perfunctorio das condições to-
pographicas do sertão nortista faz abandonar a idea de pro-
curar uma solução para estes serviços [ irrigação ) na execução
das obras colossaes a que nos referimos, e hoje parece perfei-
tamente reconhecido que para assegurar a agua necessaria á
garantia das culturas e ás outras necessidades de toda a zona
é precizo pedil- a a um conjuncto de obras abrangendo a gran-
de e a pequena açudagem ; a installação de poços instantaneos
e adaptaveis aos moinhos de vento. [ Pag. 16 ] .
[ 2] Se o objectivo era armazenar agua para bebida do
gado ou para viveiro de peixe muito mais economico ficariam
as lagoas do Cauhype, que a natureza se incumbiu de con-
struir, algumas das quaes podem conter 100 a 190 milhões de
metros cubicos dagua com o dispendio de 50 a 60 contos para
indemnização dos terrenos cobertos pelas aguas e feitio de
desaguadouros, como acaba de demonstrar um dos engenheiros
da Commissão de Açudes no Ceará, segundo se lê na Republica
de 15 de Maio do 1908.
477

O que aconteceo em Acarahú-mirim foi ficarem cobertos


dagua os terrenos de vasante, outrora cultivados. porque as
enchentes do riacho, apenas attingido certo nivel, logo baixa-
vam, deixando-os a descoberto, saturados de limo, aptos ao
plantio de cereaes. Actualmente, o que não foi occupado
pelas aguas, é quasi esteril, desnudado, e pedregoso . O terre-
no, que lhe fica abaixo ( da represa ), corre apertado entre ri-
banceiras formando o leito do riacho, alaga- se na estação plu-
viosa, tornando- se improprio a qualquer plantio regular. Ha
para além, baixadas que se prestam a irrigação, mas para at-
tingil-as, seriam precisas obras darte custosas e demoradas.
como canaes abertos na rocha, tuneis, etc.
Ensaios desta natureza são verdadeiros disperdicios dos
dinheiros publicos, e pode affirmar-se, sem receio de contra-
dicta, que as experiencias e tateamentos destes ultimos annos,
feitos por ordem do governo, nenhum proveito tem trasido ao
Ceará ; ao contrario, alem da dispersão dos recursos, que se-
riam mais bem empregados na construcção de um vasto reser-
vatorio, como o de Lavras on de Quixeramobim , verdadeiros
salvaterios e rendosa applicação de capitaes, hão concorri-
do para firmar a erronea opinião da irremediabilidade do
grande mal ou fatal condemnação desta zona á repetição pe-
riodica das tremendas calamidades da fome e da miseria com
todo o seu cortejo da peste, prostituição, e perda da riqueza
particular.
Examinemos os fundamentos economicos e technicos so-
bre que assentam os argumentos oppostos aos grandəs açu-
des por dois notaveis engenheiros - Foglare e Amarilio de
Vasconcellos, num folheto que corre impresso sob o titulo-
O Prolongamento da Estrada de Ferro de Baturité e os acudes na
Provincia do Ceará.
"De um certo tempo a esta parte, dizem estes engenhei-
ros (1 ), apresenta-se uma transformação nas ideias em favor
dos grandes açudes, inexplicavel para aquelles que desconhe-
cem a sua verdadeira origem e tanto mais lamentavel quanto
sob as apparencias de deduções scientificas e amparados em

(1 ) Henrique Foglare e Amarilio de Vasconcellos --- 0 pro-


longamento da estrada de ferro, etc , Fortaleza, 1881 , pag. 10.
478

argumentos que illudem á primeira vista, vae exaltando de


tal forma a opinião que pode conduzir o espirito dos que
dirigem os destinos da provincia a um grande erro, que se-
ria expiado pela maior decepção.
"E' manifesta, portanto, a urgencia com que deve ser
exclarecida essa questão tão palpitante de interesse.
"Para enunciar com certo methodo as nossas ideias sobre
a materia examinaremos preliminarmente as seguintez ques-
tões :
"Qual a utilidade dos grandes açudes ?
"São elles destinados a servir nos annos regulares ou nos
annos de secca ?
"A resposta mais natural e logica, quanto a segunda
questão, que envolve a primeira, é que elles devém servir em
ambos os casos ; porque se a sua utilidade somente se veri-
ficasse nos annos regulares, não se teria adiantado um passo
no sentido de melhorar as condições da provincia durante os
annos criticos ; se fossem exclusivamente destinados para
estes, não se conceberia o absurdo de empatar capitaes im-
mensos com a construeção e conservação de uma obra que ser-
viria apenas 3 ou 4 vezes durante um seculo.
"E' tão palpavel esta verdade que não nos dariamos ao
trabalho de enuncial-a, se não visse mos que um dos enge-
nheiros, que mais tem escripto sobre este assumpto, esquece e
confunde constantemente aquelle duplo ponto de vista para
preconisar os grandes açudes, sem attender as graves conse-
quencias de suas conclusões, manifestamente dissonantes da
theoria, da pratica e da bôa logica.
"Para quo não fique sem as necessarias provas o que fica
dito, seja nos licito confrontar as vantagens relativas dos
grandes e dos pequenos açudes para depois, servindo -nos dos
dados que se encontram nos Estudos da Commissão de Açudes,
demonstrar a exactidão do nosso raciocinio :
"Tres factos, diz o engenheiro Revy, militam a favor dos
grandes açudes :
1 -Que os pequenos açudes são mais dispendiosos relati-
vamente a quantidade dagua que contêm ;
2º-Que se tornam inuteis durante as seccas duradouras ;
39-Que cada um serve apenas a um individuo.
479

Quanto ao primeiro pode -se responder theoricamente :


"Supponham-se dous açades, um dez vezes maior que o
outro em todas as suas dimensões, e situados ambos em terre-
no perfeitamente semelhantes.
"Da comparação resultaria neste caso que o comprimento
e altura das paredes será na proporção de 1 para 10 .
"O seu volume, que eresce na razão cubica, será de 1 para
1,000.
"Igualmente serão os volumes dagua reprezada na razão
de 1 para 1.000 .
"As superficies de vasante da zona de infiltração e dagua
reprezada crescerão na proporção do quadrado, e serão na
razão de 1 para 1.000 .
"Destes dados resulta :
1 -Que sendo os volumes de alvenaria necessaria e de
agua reprezada na mesma proporção. o preço da unidade
d'agua será o mesmo em ambos os casos ;
2º - Que crescendo o preço da obra na razão de 1 para
1.000, e a superficie irrigada somente de 1 para 100 , segue - se
que no caso de um açude 10 vezes maior a despeza por uni-
dade de terreno irrigado é tambem 10 vezes maior ;
3 -Que comparando os volumes dagua com as super-
ficies, os pequenos açudes têm comparativamente 10 vezes
mais superficie exposta a evaporação que um grande. "
Respondendo a esta critica, diz o Snr. Revy ( 1 ) :
"Passo a demonstrar como a theoria do Dr. Amarilio, aci-
ma citada e dogmaticamente affirmada, é completamente falsa ;
que a sua conclusão sob . n. 2 está em terrivel collisão com a
sua propria conclusão sob n 1 ; que a conclusão é absurda. "
Entra na desenvolvimento historico das barragens, e pro-
segue :
"O typo normal de secção para uma barragem de 5 me-
tros de profundidade d'agua é o seguinte : espessura do muro
no alto -2 metros ; na base- 4 metros : raio da curva da face
anterior do muro no plano da secção vertical- 13 metros ;

(1) J. J. Revy- Relat. apresent, as Conselh. Alves de Araujo


em 1883, pag. 10.
480

raio da curva do muro do lado exterior do reservatorio no


mesmo plano, tambem 13 metros : área da secção do muro
14,28 m2 ; pressão maxima sobre o muro por centimetro qua-
drado, com o reservatorio vazio - 0.82 kilogr.: o reservatorio
cheio- 1,45 kilogr.
"O typo normal de secção para uma barragem de 50 me-
tros de profundidade é o seguinte : grossura do muro no alto
-5 metros : na base -56 12 metros : raio da curva do nuro
do lado interior do reservatorio no plano vertical - 91 metros ;
raio da curva do muro do lado exterior no mesmo plano-
43 3/4 metros : área da secção do muro 1.117.29 metros ; pres-
são maxima sobre o muro por centimetro quadrado, com o
reservatorio vazio 5,97 kilogr. e com o reservatorio cheio 5.71
kilogr.
"Estes typos preenchem a condição de terein ambas a
mesma estabilidade, e que em circumstancia alguma a pressão
seja maior do que 6 kilog. por centimetro quadrado sobre
qualquer outra parte do muro.
"Da comparação dos algarismos acima, resulta não haver
semelhança geometrica entre estes dous typos normaes ; os
seus contornos são completamente differentes.
"Empregar, pois, para todas as barragens o mesmo typo
normal, seria desastroso para segurança e estabilidade do
muro.
Isto pode ser demonstrado immediatamente.
"Se tomassemos o typo do muro de barragem para 5 me-
tros de profundidade dagua como typo universal para todas
as barragens, teriamos uma barragem para 50 metros de pro-
fundidade dagua, multiplicando todas as dimensões da 1ª por
10. Neste caso a barragem de 50 metros teria as seguintes di-
mensões : grossura do muro no alto - 20 metros ( em logar de
50 metros como no typo verdadeiro ) ; grossura do muro na
base-10 metros ( em logar de 56 1/2 metros como no typo
verdadeiro ) : área da secção do muro 1.428 m. quad. ( em lo-
gar de 1.117 m. quad ., como no typo verdadeiro) ; pressão ma-
xima por centim . quad . do muro com o reservatorio cheio 22
kilogr . ( em vez de 5,97 kilogr. no typo verdadeiro) . Assim a
a segurança e estabilidade do tal muro estariam em perigo, e
alem disto elle teria por metro linear de comprimento de pa-
481

rede um excesso de 311 metros cubicos de alvenaria, inteira-


menté superfluos e até prejudiciaes para o muro.
"Pois que as diversas dimensões lineares da secção dos
muros não crescem na razão de sua altura, mas seguem le
mui differente, é claro que as áreas de secção da barragem
de differentes alturas não podem augmentar -se na razão do
quadrado dessas alturas, nem por consequencia os volumes de
alvenaria podem crescer na razão dos cubos dessas alturas
Portanto a regra estabelecida pelo Sn r. Amarilio : "o seu vo
lume, que cresce na razão cubica, será de 1 para 1.000 " é real-
mente erronea, e os resultados e conclusões tiradas d'ellas na
turalmente o são tambem.
"A prineira deducção do Snr. Amarilio, n. 1 , de que 0
preço de unidade dagua empoçada por duas barragens , das
quaes uma tem dez vezes mais altura do que outra, é o mes
mo em ambos os casos, é, portanto, falsa, ainda na sua hypo
these theorica de serem ambos os açudes situados em terrenº
perfeitamente semelhante.
"Tratando desta questão analyticamente e pelo aspect
scientifico, obtemos o seguinte resultado : se o volume da al
venaria da barragem crescesse na razão cubica de sua altura,
preço de unidade dagua seria constante em localidade se-
melhante e representado por uma linha recta parallela as abs.
cissas onde as alturas das diversas barragens tivessem sido
marcadas, segundo uma escalla arbitraria, a partir do ponto
de intersecção com a linha das coordenadas . Tomando, po-
rém , os verdadeiros typos das barragens, estabelecidas pelas
autoridades scientificas atraz referidas, o preço de unidade
dagua segue, na verdade, linha mui differente Partindo, por
exemplo, do ponto que representa o preço dagua de uma bar-
ragem de 5 m. de altura, a verdadeira linha do preço dagua
para os typos normaes desce rapidamente, em lugar de cor-
rer parallelamente as absciss as Quando se chega a uma bar-
ragem de 10 metros o preço dagua diminue de 25 %. A li-
nha continua a crescer e chegar a um ponto mais baixo, a seu
minimo, na barragem de 25 m. de altura. e então o preço
de unidade dagua é de 35 % menor do que numa barragem
de 5 m. de altura . D'ahi a linha verdadeira recomeça a subir
constantemente, porém pouco. Em outras palavras : o preço
de unidade daguu vai crescendo á proporção que a linha
482

chega ás barragens 30, 40, 50 m. : mas mesme na barragem de


50 m. o preço de unidade dagva é ainda de 20 % menor do
que na barragem de 5 m.
"Este resultado é facilmente obtido pela analyse geome-
trica dos dous typos normaes de barragens de varias alturas ;
diverso, porém , é obter estes resultados da pratica. Dos typos
modelo qualquer engenheiro póde tiral- os em 5 minutos ; na
pratica effectiva, em um grande reservatorio, isto lhe custará,
pelo menos. 6 mezes ; no caso do reservatorio de Lavras, cus-
tou 2 annos de arduo trabalho determinar a curva que repre-
senta o preço de unidade dagua em uma localidade dada. En-
trei no amago desta questão no caso do reservatorio de Itaco-
jomy e peço a V. Exc. referir-me ao desenho n. 8 que contem
os diagrammas analyticos. e particularmente ao diagramma
n. 6, no qual resumi o resultado final, e mostrei a lei que re-
gula o custo da unidade dagua em annos ordinarios, e a lei
que regula este eusto em seccas extraordinarias, que descem
até 3 1/2 annos . Estas leis condemnam os PEQUENOS reserva-
torios : condemnam em Itacolomy uma barragem de 15 m
de altura, que produziria no reservatorio um volume de 14 mi-
lhões de m. cubicos dagua, posto que tal reservatorio seria
muitas vezes maior do que o reservatorio que jamais existio no
Ceará ; estas leis o condemnam, principalmente pelo custo ex-
cessivo da unidade dag ua. A curva deste diagramma, que re-
pre enta o custo dagua no reservatorio de Itacolony para va-
rias barragens de 5 a 35 m. de altura parece- se muito com a
curva resultante da analyse dos typos-modelo de barragens.
Em Itacolomy o custo minimo da unidade dagua cae numa
barragem de 22 1,2 m. de altura, em vez de uma de 25 m..
como na hypothese theorica da semelhança perfeita das bacias
para barragens de differentes alturas. No de Quixadá a curva
que representa o custo da unidade dagua é bastante diffe-
rente. O custo minimo ahi se mostra em uma barragem de 20
m.: no de Lavras a curva, que representa o custo da unida-
de dagua ainda não pode ser determinada.
"Passarei agora a deducção de Sr. Amarilio n. 2— “ que
crescendo o preço da obra na proporção de 1 para 1.000 , e
a superficie irrigada somente na de 1 para 100, segue-se que,
no caso de um açude 10 vezes maior, a despeza por unidade de
terreno irrigado, é 10 vezes maior. "
483

"Esta segunda lei está em perigosa collisão com a que elle


mesmo acabara de estabelecer no n. 1 , no qual diz que o pre-
ço de unidade dagua será o mesmo em ambos os casos, isto é
com um açude 10 vezes maior o custo da unidade dagua será
o mesmo que em um dez vezes menor.
"Se pois cada unidade de area irrigada exige certa quan-
tidade dagua , não importa quanto ou quão pouca, é claro que
seria indifferente ser esta agua tirada do açude grande ou
pequeno ; porque, segundo a lei n. 1, o custo da unidade dagua
seria o mesmo em ambos os casos .
"A sciencia, parece-me, respo nderá provavelmente que
ambas as leis são falsas ; mas emquanto a primeira apenas
envolveria um erro talvez de 35 % em theoria, e de numero
indefinido de por centos na pratica-- 100 % no caso do reser-
vatorio de Lavras, a segunda lei é errada sem circumstancias
attenuantes.
Que tem a altura de uma barragem com as terras que lhe
ficam abaixo ? Esta altura affecta unicamente as terras que
The ficam acima por terem de formar a bacia ou o empoçamen-
to do reservatorio. "
Como se vê desta cabal demonstração o que encarece ou
barateia a construcção de um reservatorio, dadas as condições
de identidade topographica, é a sua maior ou menor capaci-
dade de represar certo volume d'agua , porque se este volume
for reduzido ou insignificante, o preço d'agua para irrigação
attingirá a custo tão alto, que tornará impossivel ou irreme-
diavel a cultura que della tenha de fazer uso .
Ha, pois, um preço regulador que não deve ser ultrapas-
sado ; e na melhor hypothese, a pequena bacia raramente ou
nunca fornecerá agua para irrigação em condições remunera-
doras.
E' esta a base geralmente adoptada na construcção de taes
obras.
Em toda a parte a altura das represas é estudada, como
fez o Sur. Revy, de conformidade com a massa dagua a ar-
mazenar e as " despezas de sua construcção. Assim é que pelo
projecto do engenhei ro francez Souleyre para o alteamento
da parede do açude Djidinia, na Algeria, quasi atterrado, foi
o calculo baseado nesta base.
484

Pelo primeiro projecto para eleval- a a mais 2 metros, sen-


do utilisados 1.600.000 m. cub. d'agua a despeza seria de
100.000 frs.; pelo 2º, em 6 metros de altura, os 4.000.000 de
m. c. armazenados custarião 265.000 frs. ; pelo 3?, com a pa-
rede de 8 m. e a despeza de 330.000 frs. serião utilisados
5.000.000 de m. cub,
O preço d'agua (1 m. cubico) no 1º será 0,025 frs.., no 2º
de 0,011 , no 3º de 0.009.
O açude do Oued Meurad, na Algeria, confirma melhor a
vantagem dos açudes grandes em relação a sua barateza, isto
é, ao custo ou preço porque sae a agua armazenada, nas duas
hypotheses.
"Qusto serbatoi ci dimostra, come le piccole riserve d'acqua.
benchi attenute con dighe in terra, siano sempre molto costose. Si
spese infatti di primo impianto , compresa tutta la rete dei ca-
nali lire 400.000.
"Dividendo pel numero dei m. e. d'aqua immagazzinati, si
ha il costo per metro cubo d'acqua di lire 0,45 prossimamente.
montre all'Hamiz tale prezzo é di sole lire 0,23, e all'Habra
almeno per la prima costruzione, fu di lire 0,133.
"L'acqua vendesi attualmente in ragione di lire 6 all'anno
per una portata di 5 litri e per 2 ore la settimana, ossia m. c.
36 allta settimana."
Suppondo -se que a irrigação dure 5 mezes, ou 20 sema-
nas, dão-se 720 m. e, por anno, o que significa que o metro
cubico de agua vende-se por 0,0083 fr. E se supposermos que
são necessarios 5.000 m. c. por auno para irrigação de 1
hectare correspondente ao fluxo continuo de um litro por 0.5
a 1 segundo, como no Hamiz, teremos que o preço d'agua em
Marengo sairá por quasi 41 francos por hectare. ( 1 )
Um outro tratadista de obras de irrigação diz que "em
geral as despezas de construcção de um açude diminuem com
o augmento da capacidade do mesmo, o que torna conveniente
construir-se açudes muito grandes. "
O custo d'agua armazenada para os açudes francezes, com
parede de alvenaria varia de 0 fr. , 2144 a 0 fr., 9937. e na me-
dia 0 fr,, 4521. Para os da Argelia os extremos são 0 fr., 0724

(1) Zoppi e Torricelli - Laghi artificiali, pag. 123.


485

e 0 fr., 4 e a media de 0,2254 ; emquanto os hespanhóes os-


cillam entre 0 fr. , 070 e 0 fr. , 4112 com a media de 0 fr. , 1645.
Exceptuando o açude de Elda , que é pequeno, a media na Es-
panha é de 0 fr. , 0822.
Nos açudes de parede de terra, o custo maximo d'agua
(1 metro cubico ) é em França de 0 fr. , 3125 e o minimo de
0 fr.. 0870 com a media de 0 fr.. 2157 ; na Inglaterra a media é
de 0 fr. 375 : na India o maximo attinge 0 fr. , 0598 o minimo
0 fr., 0233 e a media 0,0447 ; na America o menor custo é de
O fr., 0043.
Estas considerações de maior peso, reforçadas pelo estudo
do Snr. Revy sobre a determinação do menor preço dagua na
barragem de Itacolomy, são decisivas , confirmam os factos
conhecidos, da improficnidade dos pequenos açudes no Ceará,
já denunciados pelo presidente Dr. Nogueira Accioly na sa
mensagem de 1905 ao congresso estadual.
Ponho termo a esta demonstração referindo as opiniões
do Dr. Bernardo Piquet. chefe ha uns dez annos da commis-
são de irrigação no Ceará, bem como as do Dr. Lassance Cu-
nha, antigo director da ferro - via de Baturité .
Aquelle illustre profissional (Piquet ) estudioso e severo
no desempenho de suas funcções, diz :
"Quanto a preferencia em construir este ou aquelle açude
grande, ou mesmo dous menores e profundos, a um maior e
mais raso, a incerteza não é hoje mais possivel. Assim como a
extensão de linha. seu custo kilometrico e differentes outras
"unidades -kilometro" mostrão qual o traçado preferivel em
estradas de ferro, assim tambem entre açudes o custo de 1.000
metros cubicos d'agua indica qual o açude ou açudes prefe-
riveis a construir.
Influem ainda poderosamente n'esta escolha a grandesa
da superficie de evaporação, a profundidade e a permeabilida-
de do solo, porque a agua verdadeiramente utilisada é a que .
se pode empregar na irrigação durante uma crise climaterica :
o mais, isto é, os terrenos marginaes ao açude, aqui chama-
dos de vazantes, o peixe e até mesmo a utilisação da agua
para outros fins, tem tudo relativamente tão pouco valor que
não deve ser tomado em consideração n'aquelle calculo. " (1)

(1 ) Dr. B. Piquet-- Carta ao Dr. Alvaro da Silveira.


486

O Dr. Lassance Cunha, que demorou-se muitos annos no


Ceará, e o conhece melhor do que outro qualquer engenheiro .
se manifesta nestes termos :
"Varias vezes tem-se discutido qual o typo preferivel de
açudes a adoptar se devem ser adoptados os grandes com
exclusão absoluta dos pequenos ou vice- versa.
"A these proposta apresenta se immediatamente uma in-
terrogação : Que são grandes e pequenos açudes ?
"Açude é a represa de um rio ou de aguas pluviaes por
meio de uma ou mais paredes construidas de alvenaria ou
puramente de argilla.
"Desta arte constitue um reservatorio para irrigação dos
terrenos por qualquer systema conhecido.
"Parece-nos, pois, que a classificação de grandes e de pe-
quenos só pode ser baseada na capacidade da bacia e , conse-
guintemente no volume dagua que esta possa fornecer para as
irrigações.
"Ficam, portanto, excluidas da discussão as pequenas re-
prezas construidas pelo sertanejo, proprias para desalterar
o gado, mas de utilidade insignificante para lavoura, que se
aproveita apenas das margens humedecidas da bacia, e da
parte tambem humedecida a jusante com a infiltração pela pa-
rede, a que denominam —revencia—, a qual determina em bre-
ve tempo a sua rotura.
"Abondonanda a classificação de grandes e pequenos açu-
des, os dividiremos nas seguintes classes :
1ª Açudes com capacidade superior a 100.000.000 metros
cubicos dagua ;
2a Açudes com a capacidade de 50 a 100.000.000 metros
cubicos ;
3? Açudes com capacidade de 10 a 5.000.000 m. c.;
42 Açudes com capacidade de 3 a 10.000.000 m. c. ;
Adoptando a classificação supra , entendemos que os açu-
des da 1ª e 2a classe devem ser construidos pelo governo geral,
attentas as suas condições orçamentarias, ficando os de 3 e 4ª
para serem construidos pelos cofres estadoaes.
"Somos de opinião que sem perda de tempo deve o gover-
no cogitar da construcção dos açudes de 12 ordem, que são as
seguintes :
Boqueirão da Lavras, Poty, Itacolomy. Construidos taes
487

açudes e completado o de Quixadá ficarão abrigados dos effei-


tos das seccas :
A) Pelo do Quixadá, os sertões do Sitiá, Quixeramobim ,
Baturité, Cascavel, Riacho do Sangue e parte posterior do ter-
mo de S. Bernardo das Russas.
B) Pelo Poty ficarão abrigados ainda parte do sertão de
Quixeramobim, Ipù. Tamboril, Principe Imperial, Independen-
cia e parte do Acarahú :
c) O açude do Boqueirão de Lavras abrigará todos os
municipios ribeirinhos do Jaguaribe, a partir de Lavras, na
extensão a 360 kil. a saber - Lavras, Icó, Jaguaribe- mirim, Li-
moeiro, Russas e Aracaty.
D) O de Itacolomy, finalmente, abrigará os sertões de Ita-
colomy, Granja , sopé da Ibiapaba, Sobral, toda a margem da
estrada de ferro deste nome." ( 1 )
Vencida a questão de preferencia nas dimensões a dar-se
ao açude, vejamos quaes os locaes apropriados aos poucos a se-
rem construidos no Ceará.
Na escolha destes locaes, como que indicados pela topo-
graphia do solo, ha a considerar não somente as facilidades
technicas que elles possam offerecer, mas ainda e, sobretudo ,
ao seu regimen pluvial, e as facilidades de aproveitamento
das aguas represadas a cultura de terrenos uberosos e bem
situados em relação ao açude .
Foi por se não haver consultado ao regimen pluvial na ba-
cia do açude de Quixadá que esta grande obra ha permanecido
sem proveito immediato. como já ficou dito : foi por se não
ter attendido as condições do solo, a sua prestabilidade a irri-
gação, que o lago de Acarahú-mirim ficará inaproveitado e fa-
lho a seu destino.
Attendendo a estas considerações escrevi na Revista do
Ceará (1 ) o que se segue :
OS LOCAES APROPRIADOS A AÇUDAGEM : —0 solo acciden-
tado do Ceará em ondulações serroticas que formam a trama

(1 ) Dr. A. Lassance Cunha -As Seccas do Ceará, Porto


Alegre, 1900. pag. 25.
(2 ) Th. Pompeo- Irrigações no Ceara, na " Revista do Ceará"
nº 6, 1905 , pag. 3.
488

flexuosa e complexa da sua superficie, producto em grande


parte da acção erosiva de aguas meteoricas ou marinhas, of-
ferece multiplos sitios. apropriados á formação de vastas e
grandiosas represas em correntes fluviaes, mediante barragens
de alvenaria ou de areia. economica e facilmente construiveis.
Pode assegurar- se, com innumeras probabilidades de acer-
to, que em quasi todas as grandes arterias fluviaes do Estado,
nos rios Jaguaribe e Acarahú, e mesmo em bacias secunda-
rias, e nos tributarios d'aquelles, deparam-se locaes com a
conveniente declividade , extensão e anteparos a jusante da
corrente, que se prestam a outros tantos reservatorios de aguas
pluviaes com a capacidade precisa para fertilisarem os terre-
nos marginaes e baixos, que formam as bellas e uberosas pla
nicies, utilisadas polo sertanejo quando a estação invernosa
deslisa regularmente .
O estudo systematico e continuado da topographia cearen-
se por profissionaes competentes, que de par com a instrucção
theorica reunam conhecimentos praticos sobre o emprego
d'agua nas irrigações da zona tropical, qual a do Ceará, im-
põe -se aos poderes publicos, não somente como obrigação pri-
maria, fundamental, na previsão de calamidades climatericas,
que amiude voltam á zona nordeste do Brazil, destruindo, em
mézes, o resultado de alongados annos de economia, varrendo.
qual cyclone, a fortuna particular, mas ainda como medida eco-
nomica de resultados certos e productivos.
Üs estudos feitos até o presente, urgidos por necessidades
momentaneas, com o fim de proporcionar trabalho a indigen-
tes, salvo os do Itacolomy pelo engenheiro J. J. Revy e os do
Acarape pelo Dr. B. Piquet, não offerecem bases seguras, in-
formações completas acerca da bacia hydrographica e regimen
fluvial a represar, nem quanto ao custo e meios de levar a ef-
feito a construcção de taes açudes.
Nos proprios relatorios com que os engenheiros, incumbi-
dos de taes estudes, deram contas ao governo dos trabalhos
realisados, lê- se a confissão clara on implicita do muito que
lhes faltou verificar para tirarem conclusões satisfactorias e
firmarem orçamentos minudenciados, merecedores de toda con-
fiança . Sem ir longe, basta abrir a substancial exposição com
que o Sur. Revy instruiu os estudos feitos no Boqueirão de
Lavras, para se ter a confirmação dessa deficiencia.
489

"A respeito das dimensões exactas da bacia e dos niveis


das terras do valle de Lavras, ainda continuam (não forão con-
cluidas , e eu tenho por ora de cingir-me a indicações ge-
raes ." ( 1 )
Sobre o ponto magno da localisação da barragem, as du-
vidas ou obscuridades são porventura ainda maiores, como se
deprehende da seguinta exposição que transcrevo da pag. 19
do referido relatorio :
"A barragem mais curta seria contida entre paredes de ro-
cha quasi verticaes, porém ha contra esta localidade nume-
rosas e serias objecções : mencionarei somente algumas das
principaes :
"1 As paredes de rocha em um e outro lado da monta-
nha não estão sãs ; particularmente a parede oriental que está
abalada e suas camadas são frouxas. Seria difficil dizer quan-
tas dezenas de metros de parede deveriam ser removidas an-
tes de se chegar á solida e nativa camada da rocha. A celebre
“Furna" na visinhança immediata mostra, com evidencia, a
que grande profundidade a estractificação tem sido afrouxada
na parede oriental.
"2 Seria difficil haver-se com as enchentes annuaes do
Salgado , sendo as obras limitadas por um espaço tão estreito,.
e havendo de passar grandes volumes de agua com extrema
velocidade.
"3 A natureza inaccessivel da localidade, que envolveria
grande despeza na construcção de obras preliminares, e a in-
certeza a respeito do custo das fundações."
Despresado este e outro traçado que o Snr . Revy indica
no projecto sob nº 7, na linha OP, pelos inconvenientes apon-
tados, e depois de amiudada e cuidadosa inspecção das pa-
redes rochosas do Boqueirão, segundo elle diz, conclue por
adoptar uma barragem circular, fóra deste, envolvendo a boc-
ca da garganta
"Exigiria, prosegue o Relatorio á pag. 20, um volume
maior de alvenaria do que o das outras linhas estudadas, po-
rém o custo da alvenaria por metro cubico seria menor ... Uma
barragem da altura de 40 metros acima do nivel do Poço do

( 1 ) J. J. Revy - O reservatorio de Lavras, pag. 17.


490

Boqueirão, e de 45 metros acima do fundo rochoso do río, te-


ria 285 metros de comprimento no alto, e a extensão da parte
pesada da barragein atravez do rio e no pé da montanha se
limitaria a cerea de 160 metros. A barragem teria a forma
circular, uniria a parte oriental da montanha com a occidental.
evitando as partes mais baixas do Boqueirão. O volume de al-
venar ia attingiria a 150.000 metros cubicos, e o custo da bar-
ragem, incluindo todas as obras accessorias de um tunel para
desaguar, comportas. tanques, estradas, juros durante a con
strucção, e grande margem para as eventualidades, principal-
mente nos alicerces, no desvio das aguas nas cheias, seria
inferior a 5.333 contos."
Esta simples exposição, deixa a perceber quão incomple-
tos ficaram esses estudos, por não ter o seu autor, na occasião
meios de verificar o custo de muitas das obras projectadas.
Mas onde se faz sentir a deficiencia, e esta capital por
comprometter a solidez da parede, isto é, sua resistencia ao
empuxo das aguas, é quando o autor do projecto trata do
fundo em que deverão sentar os alicerces do dique ou mura-
lha, destinada a represar as aguas do rio Salgado.
"As posições da lage de rocha e das sondagens mais pro-
fundas são portanto conhecidas com precisão ( 1 ) ; porém estas
mesmas sondagens, tendo em quasi todas as partes mostrado
"area", não dão informação precisa, necessaria para a construcção
de obras de barragem Exculpando-se por não fazer verifica-
ções mais acuradas, diz o Snr. Revy haver telegraphado ao
ministro das obras publicas ( Dr. Buarque de Macedo). pedin-
do-lhe instrumentos de perfuração indispensaveis para de-
terminar a natureza e o contorno exacto de bases aptas á
construcção da barragem principal, não os tendo recebido 6
mezes depois.
"Esta circumstancia, -são palavras suas. - tem contribuido
não pouco ao embaraço em que me acho para obter resulta-
dos certos a respeito de uma questão tão importante."
Comprehende - se que em obra de tal magnitude, na qual
se empenhariam milhares de contos, não era hicito fiar de ap-
parencias, sem o conhecimento previo do solo sobre o qual

(1 ) Revy- Relatorio citado. pag. 39.


491

deveria se erguer a muralha de retenção, e executal- a aventu-


rosamente em menospreço do simples bom senso .
A experiencia em tantas lições dolorosas acerca da facili-
dade com que taes diques se hão construido sobre terreno are-
noso, embora fundamente estaqueado, como aconteceu com
o mais importante reservatorio da Espanha, o de Puntes, pro-
ximo de Madrid, não permitte, no actual estado dos conheci-
mentos technicos, que taes obras se construam senão sobre ro-
cha solida, resistente, sobejamente verificada.
Assim o perfil dado á principal barragem de Lavras, nes-
se projecto. é simplesmente conjectural : não inspira a confi-
ança precisa para induzir os poderes publicos a acceitarem- no
como definivo.

Si a confissão desse illustre profissional, sobre ponto tão


importante, for contrasteada com o que o engenheiro O' Mea-
ra verificou em exane posteriormente feito, e com os concei-
tos suggeridos por este exame, comprehender- se-ha o alcance
dos estudos preliminares, baseados em multiplicas e successivas
experimentações.
" Surprehende-me, diz O' Meara, ( 1 ) a pertinaz tenacidade
com que o Snr. Revy recommenda um local especial para a sua
projectada parede sem o conhecimento previo dos seus funda-
mentos, sendo, aliás, este essencial na construcção de taes obras .
Em Outubro ultimo ( 1893 ) verifiquei com os instrumentos pre-
cisos que este local devia ser abandonado por se não prestar as
fundações em vista da impropriedade do solo (the site recommen-
del must be abandoned on the ground of insustable foundations) ; —
mas deparou -se - me um sitio fóra do Boqueirão, por não o haver
encontrado dentro, cujos lados são verticaes, no qual se poderá
construir uma parede em rocha solida, á profundidade de 2 1/2
a 7 metros abaixo do nivel.
“ Não adoptei a forma circular, tida como a mais resistente
á pressão, por pensar que em paredes pesadas o beneficio a co-
lher della é todo imaginario. A parede poderá ser construida
em linha recta atravez da corrente ou em curva contra esta, se
daqui resultar economia no emprego da alvenaria”.

(1) O' Meara - Irrigation ofJaguaribe Valley, pag. 5.


492

Divergencias tão radices, quer na planta fundamental do


muro de retenção , quer na direcção deste, estão a mostrar a ne-
cessidade de investigações acuradas, scientificamente procedi-
das, com o animo de apurar toda a verdade.
Estudos desta natureza envolvem serias responsabilidades
da parte de quem os faz e ainda maiores de quem os acceita
como base para a construcção das grandes e quantiosas obras
irrigatorias.
Não se comprehende, pois, a facilidade com que elles são
acceitos nas quadras calamitosas, quando a extensão e pressão
dos desastrosos effeitos destas forçam os poderes publicos a to-
mar medidas urgentes, de effeitos immediatos em relação á po-
pulação soffredora.
Estudos incompletos, feitos ás pressas, sem se attender a
complexidade do asssumpto, especialmente ao regimen pluvial
do logar, impossivel de conhecer-se durante a estação secca, e
exigindo. ao contrario, observações demoradas, ininterruptas
por alguns annos ; a estructura do solo, sua composição e na-
tureza. quer na parte a montante da represa, para se determi
nar a resistencia das respectivas rochas á pressão das agoas,
quer a jusante destinado ás canalisações e culturas ; a bacia hy-
drographica para o calculo da massa liquida a armazenar- se e a
determinação da altura do muro de represa : a facilidade do
local quanto ao material de construcção, e tantas outras condi-
ções á factura e economia de taes obras, ao seu aproveitamento
como propulsor da producção agricola, e efficaz auxilic ás po-
pulações em luta contra as contingencias climatericas, -taes es-
tudos requerem especial organisação technica, investigações se-
guras e prolongadas, direcção concentrada, extreme de quaes-
quer sentimentos ou preoccupações de interesse particular.
O exemplo dado pelo governo americano, cuja interferen-
cia em assumptos desta natureza sempre foi cautelosa, prefe-
rindo as mais das vezes entregar á iniciativa particular a con-
strucção e exploração de obras attinentes ao proveito publico , é
porventura um dos melhores argumentos em favor da obrigação
que corre ao Estado ou á União de chamar a si o prosegui-
mento systematico e methodico do serviço irrigatorio.
O presidente Roosewelt . cuja competencia estadistica nin-
guem contesta, disse ha pouco, tratando deste serviço que
493

the is propely a national function and that it is as rigth for the


National Government to make the streams and rivers. of the arid re-
gion useful, by engineering works for water storage, as it to make
useful the rivers and harbours of the humid regions by engineering
works of another kinder" . As obras de irrigação são propria-
mente uma funcção nacional : incumbe ao governo nacional
fazer com que as correntes e rios sejam aproveitados nas
regiões aridas, por meio de açudes construidos por engenhei-
ros, á semelhança do que elle faz com os rios e portos nas re-
giões frescas por obras technicas de outra natureza ." (1 )
Obedecendo a esta comprehensão dos deveres naciones
no que concerne a serviços custosos, de geral interesse, conse ;
guiu o governo americano dilatar a area de irrigação nos Es-
tados aridos, cujo regimen pluvial não attinge a media annual
de 500 millimetros d'agua, de 4.115.000 acres, que era em 1890 ,
a 7.500.000 em 1900.
Foi em 1888 que o Congresso dos Estados Unidos da Ame-
rica do Norte incumbio a commissão Geologica de começar o
estudo das terras aridas susceptiveis de serem aproveitadas
pela irrigação. Nos annos seguintes, mediram- se systematica-
mente correntes, verificaram-se os sitios apropriados á açu-
dagem, formando- se um corpo de engenheiros hydraulicos de
alta capacidade e competencia.
O principal movel do governo americano não foi attender
as necessidades presentes da população nacional, pois para
tanto a producção das terras cultivadas nos Estados é não só
sufficiente e abundante, como apresenta consideravel exceden-
te, que constitue o principal ramo de exportação.
A preoccupação dos estadistas norte- americanos é appa-
relharem todas as terras susceptiveis de cultura com os ele-
mentos principaes, que lhes faltam, para se tornarem não só
agentes da riqueza, augmentando actualmente a somma dos
productos exportaveis, como, na previsão do rapido incremen-
to da população , servirem mais tarde de celeiro nacional·
O problema da irrigação não tem alli a importancia que
assume em relação a vasta zona nordeste brasileira, a mais
approximada dos grandes mercados consumidores , a mais
apropriada ás grandes culturas industriaes, como o algodão, a

(1) Veja-se -Irrigation- por F. H. Newell, 1901 .


494

borracha, em regiões facilmente accessiveis, ricas de elementos


vegetativos, é que apenas precisam de humidade para as pro-
duzirem da melhor qualidade e abundantemente.
Na União americana a aridez das terras, actualmente
transformadas em bellissimos prados e hortas, era quasi abso-
Juta : pois que a media annual das precipitações pluvines, ahi
caidas, não attinge sequer ao minimo observado no Ceará ( 490)
mil. em 1877 ). E', portanto, uma região secca, afastada dos
portos em centenas e milhares de kilometros, irrigada pelo der-
retimento dos gelos das montanhas Rochosas un quadra esti-
val, suleada, como o Ceará, de fundas raviuas por onde se es-
coam as aguas descidas das montanhas na estação quente, simu-
lando rios caudalosos, que logo depois ficam a secco ou apenas
deixam correr nos seus talwegs filetes de um liquido escasso .
No Ceará, e em toda zona comprehendida entre a bacia
de S. Francisco, Tocantins e l'arnahyba, a quantidade d'agua
pluvial caida annualmente representa uma massa liquida tres
a quatro vezes maior que a das terras situadas entre a Cit-
deia maritima da serra Nevada e as montanhas Rochosas, nos
Estados Unidos da America do Norte. e o duplo da que alimen-
1a a riqueza vegetal da França, Allemanha e Europa Central.
Não é a carencia de chuvas que torna infecunda e preca-
ria a agricultura da região brasileira, senão a sua distribuição
irregular, e principalmente a prodigiosa quantidade dellas es-
coada sem utilidade e não raro prejudicialmente para o mar,
nos dois mezes invernosos de Março e Abril.
E' com pequenas variantes o caso do Egypto. Com a en-
chente media do Nilo, seu despejo suppre as necessidades agri-
colas ; mas acontece frequentemente que este não excede de
250 m. cubieos por segundo na estiagem, tornando- se insuffici-
ente ás exigencias culturaes.
No inverno, de Novembro a Março, quando se não faz
sentir a carencia d'agua, o despejo do Nilo attinge ordinaria-
mente a 20.000.000.000 m³ . , perdendo - se quasi todo por inu-
nos annos seccos o volume d'agua invernal não é
til. Mesmo no
inferior a 5 bilhões de m. c. Armazenar uma parte da corren-
te invernal para distribuil-a na estação precisa pelas terras
cultivadas tal é o grande (problema, que os inglezes procuram
solver represando em Assuan as aguas do rio. Computa- se em
495

4 bilhões de metros cubicos a quantidade d'agua necessaria


a fertilisação dos terrenos já entregues á lavoura e dos que se
podem aproveitar em futuro mais ou menos proximo, nos
mezes de Abril a Junho,
"No projecto primitivo da barragem de Assuan, diz o
Cosmos (1 ), os engenheiros inglezes haviam previstos uma alta
do Nilo na cota 112 acima do nivel do mar, que corresponde-
ria a represa de 26 metros de altura e o volume d'agua repre-
sado de 2,600 milhões de m2 . Cedendo as reclamações das
sociedades archeologicas, decidiram baixar o plano d'agna a
represar na cota 106, conservando, comtudo, as dimensões da
barragem calculada para a maxima tepresa. Por esta modifica-
ção, a parede ficou redusida a 20 m. e o cubo d'agua armaze-
nado a 1.000 milhões de m³ ".
Neste exemplo nota - se a paridade existente entre a região
africana e a brasileira quanto as necessidades d'agua á agri-
cultura, sua abundancia em quadras normaes, e a possibili-
dade de represal- as nesta sazão para distribuil-as na estival.
O contraste, porém, se torna frisante no modo de solver o pre-
blema. No Ceará estudos incompletos deram em resultado o
quasi malogro da unica obra de irrigação emprehendida pelo
governo, ao passo que no Egypto, os grandes trabalhos hy-
draulicos, maduramenfe resolvidos e adoptados, têm transfor-
mado o solo em verdadeiro jardim , decuplicando sua riqueza e
producção agricola.
O conhecimento minucioso e exacto das condições topogra-
phicas e economicas locaes impõe - se aos poderes publicos como
uma obrigação tão formal, quanto o estudo preliminar dos por-
tos, ora em construcção no Brasil.
Dos estudos até o presente feitos para a localisação dos
grandes açudes vê -se que, exceptuados os de Itacolomy e de
Acarape, os demais requerem novas investigações.
AÇUDE DE LAVRAS -Quanto ao de Lavras, que por sua
situação topographica e dimensões está destinado a exercer
influencia decisiva nos destinos economicos do Ceará. as di-
vergencias entre os dous professionaes que o estudaram ( Revy

(1) Cosmos- de 30 de Setembro de 1905 .


496

e O'Meara, requerem rectificações complementares em ordem a


aproveitar-se a licção de ambos.
Relativamente ao regimen pluvial do rio Salgado, alem
das observações do Sur. Revy, possuimos hoje o registro plu-
viometrico da cidade do leó, proximo ao Boqueirão de Lavras,
a contar do anno de 1898.
Vejamos quaes as suas condições topographicas, techai-
cas, e economicas.
Topographia. - Approximando- se do Boqueirão o rio Sal-
gado cinge a serra e lhe corre parallelamente, fazendo uma
volta brusca de 1800. Ao entrarem na garganta as aguas se
despejam abruptamente com uma volta de 78 ° directamente
no Boqueirão entre cujas paredes o canal do rio Salgado for-
ma linha recta com largura quasi uniforme. Transposto este,
o rio volta se brandamente para NO e desce ao valle que con-
duz ao Icó.
A bocca do Boqueirão tem 40 m . de largura . Na distancia
de 30 metros estreita - se até 25 metros, que é a sua largura mais
apertada.
As paredes de rocha, neste logar estão somente cerca de
10 metros acima do Poço. ( 1 ) Nesta extensão os rochedos for-
mavam a ultima barreira e sua remoção é de data comparati-
vamente recente. Em seguida o Boqueirão alarga-se repentina-
mente a 40 m., e sua largura vai crescendo gradualmente a
55 metros.
Nesta parte do Boqueirão as paredes verticaes da serra
foram construidas pelas torrentes do antigo lago que desciam
da serra de La W nesta localidade .
O comprimento da parede oriental é de 240 m.; o da pa-
rede occidental é de 210 m. A largura media do Boqueirão no
nivel dagua nas cheias regulares é de 4135 num cumpri-
mento central medio de 225 metros ; a área dentro destes limi-
tes é de 9304 m.
Durante a estação secca, quando não ha agua corrente
no rio, o poço dentro do Boqueirão conserva agua:
O nivel deste poço muda pouco, sua evaporação é quasi
compensada por pequenas fontes subterraneas. Este poço es-

(1 ) J. J. Revy - Açude de Larias, pag. 14.


497

tende-so por distancia consideravel acima e abaixo do Bo-


queirão, cujo fundo é, com poucas excepções, formado de areia
fina. Ha um grande baixo de areia quasi no meio da garganta
e outros menores.
Muitas sondagens (207) foram feitas no poço para se Co-
nhecer a profundidade dagua.
A determinação , exzeta da posição de cada sondagem ti-
nha por fim obter informações precisas sobre o contorno e a na-
tureza do fundo do poço em relação a construcção de uma
barragem .
Quasi todo o fundo é coberto de area ; rocha encontrou-
se somente dentro do Boqueirão na entrada, na parte mais
estreita e ao centro do canal. Este fundo rochoso foi descober-
to por sondagens. A profundidade dagua acima da rocha
varia de 2,64 a 3 , 4 , as sondagens adjacentes dão cerca
de um metro mais de fundo, de areia .
Em todas as outras partes o fundo do Boqueirão está co-
berto de area. A maior profundidade dagua foi encontrada
nas mesmas linhas de sondagens que mostraram a rocha.
A mais profunda acha se junto da parede oriental, e mede
7m,90 sobre um fundo de area. A altura media dagua no poço
é pequena ; excepto na entrada do Boqueirão , onde chega a
quasi 8 metros. A rocha quartzitica do fundo do Boqueirão
está quasi em toda a parte coberta de area . Nas grandes en-
chentes uma parte da arêa é varrida pela correnteza ; logo
que a cheia passa e a correnteza diminue nova arën é depo-
sitada. Somente sondagens systematicas podem mostrar o con-
torno massiço do fundo do Boqueirão.
BACIA DO AÇUDE .-A unica sahida das aguas que se ajun-
tam nos valles de Lavras e Cariry é pelo Boqueirão de La-
vras . Fechando -se esta sahida, estas aguas seriam detidas no
valle de Lavras, e formariam um açude.
As dimensões deste dependeriam da altura da barragem e
da extensão e nivel das terras situadas abaixo do nivel da dita
barragem .
O rio principal do valle é o Salgado. O curso deste rio tem
sido estudado numa extensão de 50 kil. sua posição, e seus
niveis tem sido determinados. Em geral o curso do rio é de
sul para norte.
498

A linha mais baixa do valle, desde o Salgado tem forma-


do o seu canal, visto do Boqueirão tem a inclinação magnetica
de 80,26′ a O do ponto sul, ou usando da expressão mais con-
veniente - 188 °26′ do norte magnetico.
O declive do terreno ao longo da linha mais baixa do valle
é por uma distancia consideravel uniforme, não havendo ele-
vação, nem quedas rapidas. Ha numerosos pequenos pocos no
leito do rio ; e o nivel destes poços tem sido determinado em
cada kilometro em uma distancia de 30 kil. do Boqueirão.
Os declives geraes no leito do ro são os seguintes : nos
primeiros 10 kilom. do Boqueirão a elevação media do rio é
de 0,638 por kilom., nos segundos 10 kilom . é de 0,554 : e
nos terceiros 10 kilom. é de 0.551 por kilometro. A inclina-
ção geral do terreno no valle, nesta parte do rio, é de 1,003
por kilom., quasi 1 por 1.000 .
O principal tributario do Salgado no valle de Lavras é o
riacho Rosario : desagua no Salgado 12k 350m acima do Poço
do Boqueirão, distancia medida no canal do Salgado . Este tri-
butario tem sido estudado por uma distancia de 30 kilom . sen-
do o seu curso geral de SO : desce da serra de S. Pedro e tem
um curso de cerca de 60 kilom. atravez de um valle fertil . Ha
muitos tributarios menores, dos quaes os mais importantes tem
sido estudados.
As dimensões geraes como se vê desses dados, podem
ser determinados :
Uma barragem no Boqueirão, de 40 metros de altura acima
do nivel do Poço, produziria um reservatorio do comprimento
de 30 e tantos kilom. pelo valle acima ao longo do Salgado .
Este reservatorio teria a largura media de agua de mais
de 3 1/2 kilometros com uma altura media d'agua de 15 me-
tros, e portanto conteria um volume d'agua de 1.500.000.000
de metros cubicos . ( 1 )
DADOS TECHNICOs. — Alem do que ficou transcripto a pag ……….
do relatorio do Snr. J. J. Revy acerca da locação da barragem
mais curta e das objecções que ella suggere, quaes o da fra-
gibilidade da rocha nos encontros do muro, incapaz de re-

(I) Estes dados são extrahidos do Relatorio do Snr. Revy,


a que me venho referindo
499

sistir as enchentes annuaes do rio, a incerteza quanto ao


custo das fundações e das obras preliminares ; accrescem Ou-
tras, entre as quaes a difficuldade de se fazer um escuadouro
sobre a rocha solida para dar vasão as aguas sobresalentes do
açude.
Estas considerações levaram o Snr. Revy a abrir mão
deste local, embora o menor velume de alvenaria exigida pela
respectiva barragem.
A outra linha, diz o mesmo profissional, na qual se pode-
ria fazer uma barragem é a do ponto ( 1 ), na linha O P ; sob
alguns respeitos esta linha teria uma situação mais favoravel
do que a precedente : was todas as objecções enumeradas a
respeito da anterior barragem se applicam mais ou menos a
esta linha ; e o volume da alvenaria maior.
Depois de amiudada e cuidadosa inspecção das montanhas
de ambos os lados do Boqueirão chega -se (2) a conclusão
de que a localidade mais favoravel para uma barragem fe-
char a garganta seria fora do Boqueirão em uma linha circu-
lar cercando a bocca da garganta. Nesta localidade em toda
a parte a barragem descançaria e se apoiaria em rochas mas-
siças e inalteraveis. Exigiria um volume maior de alvenaria
do que as duas outras barragens alludidas, porem o custo da
alvenaria por metro cubico seria menor, e todas as objecções
indicadas não teriam razão de ser. Uma barragem na altura
de 40 metros acima do nivel do Poço do Boqueirão, e de 45 m.
acima do fundo rochoso do rio, teria 285 metros de compri-
mento no alto, e a extensão na parte mais pesada da barra-
gem atravez do rio e ao pé da montanha limitar-se-ia a 160
metros desta barragem, seria de forma circular, unindo a par-
te oriental da montanha com a occidental, evitando as partes
mais baixas da bocca do Boqueirão. O volume de alvenaria
seria de 180.000 m. cubicos e o custo da barragem, incluin-
do todas as obras accessorias de um tunel para desaguar,
comportas, tanques, estradas, juro durante a construcção e
grande margem para as eventualidades, principalmente nos
alicerces, no desviamento das aguas nas cheias, seria inferior
a 5.353 contos. O custo de cada 1.000 m. de alvenaria hydrau-

( 1) Refere- se a uma linha traçada no seu plano.


(2) J. J. Revy-- Relat. cit.. pag. 20.
500

ica em Lavras seria consideravelmente superior ao do Reserva-


torio de Itacolomy por causa da maior distancia da costa ?
Lavras estando a 300 kilom. no interior, occasionando portan-
to maior despeza com o transporte de cimento de Portland,
machinismos, etc. O custo de cada 1.000 m. dagua empoçada
neste açude para o serviço de irrigação seria muito menor do
que em Itacolomy pela sua grande extensão, e de barragem
comparativamente pequena necessaria para empoçar tão gran-
de volume dagua. O custo de cada 1.000 m. cubicos d'agua
em Lavras, incluidas todas as despezas de obras e de expro-
priação seria inferior a 3.755, contra 7.269 em Itacolumy.
Menciono estes algarismos , prosegue o Snr. Revy, porque
nada pode mostrar com mais força as vantagens excepcio-
naes da localidade do valle de Lavras para a construcção de
um reservatorio, no qual a agua armazenada para irrigação-
que é no fim de contas a verdadeira medida do valor -não cus-
taria a metade daquella [ em Itacolamy} ; embora o custo to-
tal das obras, expresso por metros cubicos de alvenaria da
barragem seja pela maior distancia de um porto ou da es-
trada de ferro duas vezes maior em Lavras do que no Itaco-
lumy.
No orçamento do custo do açude de Lavras os algarismos
representam quantias que, salvo bôa e regular administração ,
não deveriam por causa neuhuma ser excedidas na pratica.
No orçamento o custo não deve ser baseado em proba-
bilidades, mas em factos , sempre que estes poderem ser obti-
dos. Ver-se-ha pelo orçamento, que, sem contar as verbas pu-
ramente financeiras, como juros durante a construcção, me-
tade de todo o custo do reservatorio é representado por ci-
mento de Portland entregue no lugar da barragem. A avaliação
do custo do cimento assenta no do transporte tal qual é actual-
mente para mercadorias, carregadas do Aracaty a Lavras em
carroças de bois. Não tenho duvida de que com a estrada
melhorada e com melhores meios de conducção o custo do
transporte e portanto do cimento de Portland em Lavras será
muito mais redusido ( 1 ), porém não posso contar agora [ 1884 ]
com melhoramentos futuros para organisar orçamento.

[ 1 ] E' o que deve acontecer agora com a approximação da


estrada de ferro.
501

Eis o orçamento minuciado :


1 -Melhoramento das estradas de Aracaty a Lavras 150:000$
2º -Corte de pedras para os alicerces na rocha com-
pacta 100:000$
3 -Obras preparatorias, officinas, armazens 50:000$
4 - Alvenaria do muro da barragem a 122.776 m.
cubicos 184:000$
61.334 m . cub. de argamassa hydraulica ...
Cimento Portland 15.334 m. cubicos ...... 2.361:000$
Pedras quebradas e areas 46.000 metros cubicos 92:000$
5º--Trabalho, construcção do muro .. 552:000$
6 -Boeiro de desaguamento …… 120:000$
7°-Represas 100:000$
8 -Machinismo .. 150:000$
9 -Madeiras 60:000$
10— Serviço de engenharia durante 3 annos a 41 /2 %
ao anno sobre as verbas precedentes .... 529:000$
11 -Juros do capital das quantias precedentes do
orçamento durante a construcção a 6 % ao anno 400:000$
12 -Eventuaes relativas principalmente aos alicer-
ces, 10 % sobre o total precedente .. 485:000$
13 -Expropriação da cidade de Lavras 200:000$
14-Expropriação das terras cobertas pelo reserva-
torio .. 100:000$

Total 5.633:000$
Antes de passar a analyse das condições technicas cum-
pre-me ventilar desde logo a questão orçamentaria, uma das
principaes, se não a primordial neste assumpto.
O orçamento acima foi severamente condemnado pelos
engenheiros Amarilio e Foglare [ 1 ], que alem de acoimal-o de
errado, ju'gam- no muito deficiente.
Eis o que estes professionaes escreveram :
"Rectificaremos esse orçamento, tanto quanto for possi-
vel. de modo a estabelecer um seguro ponto de apoio ás obser-
vações que temos a fazer.

[1] Amarilio e Foglares -0 prolongamento da estrada de fer-


ro etc.. pag. 22 .
502

"O orçamento de Sur. Revy consta de


1 -Melhoramento , etc., como atraz .. 150:000$
2 -Corte de pedras, .. .. 100:000$
3º -Obras preparatorias 50:000$
4 -Alvenaria de muro [ Aqui figura o enigmatico
184: 000 $ que tomado por erro typographico pode
ser 1.840:000$ e deve sel- o , visto que se refere
a 122: 776 m . cub. de alvenaria, que não é pos-
sivel seja feita a 1 $498 rs,, mas a 140$980
e neste caso deve prevalecer o maior algarismo ) 1.840 : 000$
61.334 m. cub. de argamassa (Isto se refere pro-
vavelmente a mão d'obra que é 34000 por me-
tro cubico, representando 184 : 000 $. mas a im-
portancia ficou em branco, o que nos dá o di-
reito de incluil -a .. 184:000$
Cimento de Portland .. 2.361:000$
Pedras quebradas 92:000$
5º-Trabalho de construcção do muro . 552:000$
6º -Boeiro de desaguamento 120:000$
7 --Represas .... 100:000$
S - Machinismo 150:000$
9 -Madeiras .. 60:000$
Sommadas as parcellas até aqui temos ... 5.759:000$
10 -- Serviço de engenharia durante 3 annos a 4 1/2
sobre a somma precedente ...... 777:000$
Antes de calcular os juros do capital durante a
constracção convem adoptar logo a importancia
das desapropriações, porque não seria justo
inundar terras antes de indemnisar as perdas
resultantes
11 - Empropriação Lavras 200:000$
12 -Idem das terras .. 100:000$
13-Juros de capital durante 3 annos a 6 % 1.230:000$
8.066:000$
14- Eventuaes 10 % 806:000$
Somina 8.872:000$
Tomamos a liberdade de accrescentar para os
estudos feitos 100:000$
Total 8.972:000$
Somma redonda 9.000 : 0004000 .
503

"Este orçamento approxima-se a verdade e adopta-se a


uma obra de tão collossaes proporções, embora pareçam ex-
cessivamente baixos certos preços que ahi figuram. Em todo o
caso é fora de duvida que a porcentagem, referente ao servi-
ço de engenharia e juros do capital por 3 aunos não é suffi-
ciente .
Como se vê do exposto, a divergencia entre o orçamento
Revy apresentado ao ministro da agricultura e o que os Srs.
Foglare e Amarilio recnicaram é enorme, quasi 60 % a mais.
Vejamos como aquelle professional se explicou, defen-
dendo - se :
"O Snr, Amarilio adopta as tres primeiras ferbas como
estão. A de nº 4 refere-se exclusivamente aos materiaes em-
pregados na construcção do muro da barragem, explicando os
seus detalhes. O primeiro sob a letra a ) refere -se a pedra bru-
ta com o volume de 122.776 m . cub. ao preço de 184 contos :
o segundo, sob letra b) a argamassa hydraulica empregada
na construcção do muro, composta de 15.334 m . c. de cimento
de Portland, a 2.361 contos de reis, e 46.000 m. c. de pedra
quebrada a 92 contos de reis -- cepresentando assim os mate-
riaes do muro, da verba nº 4. uma despesa total de 2.637 con-
tos de reis. A verba nº 5 representa a mão d'obra somente, é
portanto de 3.189 contos de reis, ou sobre os 184.000 m. c. do
muro, 17.331 reis por metro cubico, o que me parece bom pre-
ço para semelhante massa de alvenária (concentrada num
objecto, sem contar o custo da superintendencia technica. juro
durante a construcção e eventuaes. Incluindo estas no custo
definitivo das obras de engenharia o preço do muro por me-
tro cubico será 28.983 , quasi 29 mil reis, isto é, quasi o triplo
que obras semelhantes custam em França, e creio que nenhum
engenheiro de experiencia dirá que o meu orçamento foi baixo.
"O Snr. Amarilio, porem, aproveitando -se de um engano
na posição de cifrão no algarismo sob a letra a) na verba 4.
que no Diario Official tem a forma 184.0000400 em lugar de
184:000$000 chama a isto um algarismo enigmatico , e no seu
modo caracteristico diz-que a alvenaria do muro não se po-
dia fazer por 1 $498 por m. cubico, mas por 144980, multiplica
o meu algarismo por 10 e em vez de 184 contos põe no mea
orçamento a quantia de 1.840 contos de reis, conservando to-
504

das as outras verbas, exactamente como si os 1840 contos ti-


vessem sido esquecidos pelo Diario Official, que elle apenas
rectifica.
"Depois de accrescentar ao meu orçamento estes 1.840
contos, de sua invenção, toma então 4 1/2 % annualmente so-
bre esta somma, para superitendencia technica, e assim ac-
crescenta outros 248 contos ao orçamento. Depois toma o juro
durante a construcção sobre as quantias precedentes por elle
inventadas e alem disto um grave erro no calculo desses ju-
ros, accrescenta mais 830 contos ; depois toma 10 % eventuaes
sobre todas as suas precedentee invençdes e sobre o seu erro,
e assim ajunta mais outros 321 contos, e finalmente toma a li-
berdade de crescentar 100 contos para as despezas dos estu-
dos do reservatorio de Lavras até esta data, quando o credito
inteiro foi de 30 contos somente, e não foi esgotado . Assim
passo a passo elle faz addições a pretexto de rectificar erros
typographicos e omissões e consegue augmentar o total de
meu orçamento de 3.339 contos de reis, apresentando estas
suas alterações como sendo o meu orçamento para o reserva-
torio de Lavras.
Alem disto o Snr. Amarilio tomou numerosas liberdades
com a sciencia e com as regras de sua profissão. Analysarei
uma destas liberdades :
"O maior mathematico pode entre milhares de algarismos
confundir um 3 com um 5, e tal engano nada tiraria a sua
illustração e actividade. Mas se alguem disser successivamente
3 vezes 3 fazem 6, 3 vezes 4 fazem 7, 3 vezes 5 fazem 8, será
evidente que estes erros não são descuidos mas que quem diz
assim não sabe o que é multiplicação, imaginando que basta
addicionar os factores entre si . Com estas premissas vou agora
demonstrar que o Snr. Amarilio ignora regras simples, ele-
mentares de sua profissão ; que não sabe por exemplo calcu-
lar o juro sobre o capital gasto durante a construcção das
obras, peior ainda, mostrarei que elle effectivamente zomba
de um exemplo correcto num de semelhante calculo e nem
suspeita a verdadeira regra.
1º caso-diz
- o Sur. Amarilio a pag. 24 :
Transporte 6 - S36 : 000 $ , § 13 , juros do capital durante 3
annos a 6 % -1.230.000 $. Ora 6 % sobre 6.836 : 000 $ em um
505

anno fariam 410.000$000 de juros em numero redondo, em tres


annos fariam 3 vezes esta quantia ou 1.230: 000000, exacta-
mente o algarismo do § 13. Não ha ali, pois, erro typo-
graphico.

"Todos os calculos do pamphleto do Snr. Amarilio são


baseados em tres annos para a construcção das obras, isto é,
no pensamento de que as obras propostas sejam acabadas em
tres annos. Isto resulta da pag. 3 §. 10 e de outras.
2 caso- Na pag. 29, nº 5 (esta citação é do projecto do
proprio Snr. Amarilio para obras de irrigação, com Os seus
proprios calculos para os mesmos) . "Trabalho de engenharia"
(mesmo na hypothese de contar-se somente 3 anuos na
construcção) 10 % 1.218:000 $ .- N. 6. Eventuaes 10 %-
1.218:000$ : somma 14.616:000$. ( Agora segue - se o ponto a que
me refiro) : N. 7 - juros do capital 6 % durante 3 aunos
2.631: 000$. O capital representado pela precedente somma sen-
do de 14.616: 000$ --6 % sobre esta quantia fariam em um
anno 877:000$ de juros em numero redusido, e em 3 annos
2.631 :000$, exactamente o algarismo do nº 7 para o juro du-
rante a construcção.
“Não ha, pois, erro typographico. Qual é. pois, a regra do
Snr. Amarilio para calcular o juro do capital desembolçado
durante a construcção ?
A sua regra parece ser pagar a somma interior de seu
orçamento para as suas obras de irrigação 14.616:000$ desde
o primeiro dia da inauguração dos trabalhos, com grande sa-
tisfação, sem duvida, dos empreiteiros, engenheiros e trabalha-
dores que todos receberiam o pagamento para tres annos adi-
autadamente. Para achar o premio do capital gasto durante a
construcção toma-se a quantia total orçada, e calcula- se o pre-
mio segundo a taxa do juro pela qual podem ser levantados os
fundos necessarios para metade do tempo da construcção.
Posso assegurar, conclue o Snr. Revy, que o meu orça-
mento de Lavras representa pois a despeza maxima que pode
haver no Boqueirão, e eu sustento o meu orçamento integral-
nente, no total de 5.633:000 $ como representando verdadeira-
mente a maxima despeza possivel, que com toda a probabili-
dade não seria necessaria."
506

O Sur. O'Meara, que veio ao Ceará propositalmente veri-


ficar os estudos do Sur. Revy, depois das investigações pro-
cedidas no local, propoz ás seguintes modificações ( 1 ) :
"Em Outubro passado examinei o sitio proposto pelo Snr.
Revy para parede do açude de Lavras, e de volta atravessei as
planicies alluviaes. que elle descreveo, visitando tambem os lo-
gares que elle indicou para desaguadouros e bem como as ci-
dades de Limoeiro e Russas, e o porto do Aracaty. Reco-
nhecendo geralmente a fidelidade de sua descripção do Boquei-
rão de Lavras, do local appropriado a bacia do agude [abstra-
hindo do seu estado hypothetico em tempos anteriores] e bem
assim da extensão e admiravel qualidade das planices do valle
do Jaguaribe, achei conveniente propor outro local e projecto
differente para parede e seus accessorios.
"Mantendo no meu projecto a altura maxima de 40 metros.
reccommendado pelo Snr. Revy, propouho a construcção da
parede em duas secções -a primeira de 30 metros de altura,
represando metade d'agua calculada ; a segunda, cuja construc-
ção poderá ser deferida , se julgarem conveniente, até a con-
clusão da primeira , terá 40 metros, afim de armasenar 1,500
milhões de metros cubieos d'agua. Proponho tambem construir
as obras de destribuição, exceptuando o canal de desagua-
douro ou anicuts, em duas secções, consistindo a primeira num
canal central de irrigação pelo valle do Jaguaribe com 100 ki-
lometros [ 62 milhas ] de extensão da tomada dagua de S. João
ao Araraty, a segunda em dous canaes lateraes, partindo ain-
bos da tomada d'agua e seguindo cada um por uma das mar-
gens, diminuindo gradualmente de eapacidade a proporção
que descer o valle
"Sabendo que semelhante destribuição d'agua forma parte
essencial de qualquer eschema irrigatorio e vendo por isto que
ella custará quasi duas vezes tanto quanto o proprio açude,
fico perplexo em explicar porque o Sur. Revy omitte- a no seu
orçamento da taxa d'agua, (2 ) bem como do preço d'agua re-

(1) O' Meara- Irrigação no valle do Jaguaribe.


(2) Em outro relatorio de que parece não ter tido conhe
cimento o Snr. O'Meara, o Sur. Revy especifica minuciosa-
mente as despezas a fazer com os trabalhos de irrigação . Te-
rei occasião de referir-me a estas despezas em logar opportuno .
507

presada, e porque elle pensa que taes obras podem ser satis-
factoriamente entregues a industria particular. Porém mais
me surprehende a pertinaz tenacidade com que recommenda
um local especial para sua projectada parede sem o conhe-
cimento previo dos seus fundamentos, sendo, aliás este essen-
cial na construcção de taes obras. Em Outubro ultimo veri-
fiquei com os instrumentos precisos que este local devia ser
abandonado por se não presta as fundações em vista da im-
propriedade do solo, mas deparou- se-me um fóra do Boqueirão,
por não tel-o encontrado dentro deste, cujos lados são ver-
ticaes, sitio no qual se poderá construir uma parede em ro-
cha solida , na profundidade de 2 a 55,7 metros abaixo do ni-
vel, e tenho razões para acreditar que o poço neste ponto,
pode ser esgotado, em poucas horas, sem o emprego de ensec-
cadores, na profundidade precisa para assentar os alicerces no
secco.
Inclui no orçamento desta obra somma crescida para re-
moção da rocha, que possa rachar ou não resistir a pressão a
que estiver exposta, do local em que deverá ser construida a
parede.
"Não adoptei a forma circular. tida como a mais re-
sistente a pressão, por pensar que em paredes pesadas o bene-
ficio a colher della é todo imaginario. A parede pode ser
construida em linha recta atravez da corrente ou curva contra
esta, se daqui resultar economia no emprego da alvenaria . Em
vez de dirigir as aguas em massa para as extremidades da pa-
rede e forçal- as a transbordar pelos lados quasi verticaes da
garganta que lhe fica proxima, como propõe o Sur. Revy, um
pouco em contradição com a sua crença nos effeitos estupendos
de taes cataractas, tão preconisados em seu relatorio, pro-
ponho que se dirijam as aguas sobre a parte central da pro-
pria parede, emquanto permanecer esta a altura de 30 metros,
num "travesseiro d'agua" ou poço mantido com a profundida-
de precisa por meio de uma parede menor, construida mais
abaixo da corrente [ further down the stream], sendo os lados
e o fundo do poço revistidos de concreto. Esta queda d'agua,
todavia, dispensar-se- ha, ulteriormente, desde que a parede
for elevada a 40 metros, quando deve ter sido construida outra
a uma milha de distancia da parede na parte occidental do
boqueirão.
508

Todas estas auterações de posição e projecto produzem


grande economia nas despesas de construcção.
"CAPACIDADE IRRIGATORIA DO AÇUDE. —A "área da bacia"
do Salgado e do seu principal affluente o riacho dos Poreos,
que supprirá d'agua a bacia do reservaterio depois das chu-
.....
vas, mede cerca de ………… . kilom. quadrados. As estatisticas das
ehuvas deste destricto não as possuo, porém, como é reputado
ser o mais pluvioso do Ceará, [ 1 } e de raramente ou nunca
soffrer as seceas que causam tanta devastação periodicamente
no resto do Estado, pode-se admittir como equivalente as da
Fortaleza, as que teem ' sido cuidadosamente registadas e pu-
blicadas nesses ultimos 44 annos. No decurso daquelles annos
somente duas vezes as chuvas não attingiram meio metro, isto
é, 0,469 em 1877, e 0,5 em 187S, e só 8 vezes, inclusive es-
tas, menos de 1 metro, regulando a media annual 135 centi-
metros 53 pol . ) . Para que o reservatorio encha basta um
volume dagua igual ao destribuido na área mencionada com
a altura de 6 centim . [ 12 1/2 pol . ] attingindo então o nivel de
30 metros, e de 12 cent. ou 5 pol . para o de 40 metros o mais
alto nivel proposto. Parece haver pouca probabilidade do re-
servatorio não encher num anno, pelo que é improcedente qual-
quer objecção contra a utilisação de quasi toda agua represa-
da annualmente, reservando-se pequena quantidade para uso
do gado e criação de peixe na bacia , o que constituirá uma
das fontes de receita da empresa.
"Deve-se abater largamente dos 1.500 milhões de metros
cubicos, que o açude represará, a evaporação na sua bacia, e
no percurso das aguas do rio ao atravessarem extensas plani-
ces, bem como as perdas pelo uso ou gasto nas captações
dagua e pelas filtrações do perimetro nos canaes destribuido-
res e pela quantidade dagua reservada. como já ficou dito .
"A evaporação será inferior a verificada em regiões quen-
tes e seccas, que as planices da India, porque a temperatura
no Ceará raramente excede de 930 no Aracaty, o 96° no Icó,
que é o logar mais calido do valle, não descendo abaixo a
media da humidade do destricto, que está na zona das nu-
vens equatoriaes. Não obstante, como o solo da planice ê con-

[ 1[ Refere- se a região do Cariry, donde desce o Salgado.


509

sideravelmento absorvente, as filtrações serão provavelmente


grandes a principio, podendo cessarem um a dous annos de-
pois. Admitti 500 milhões de metros cub. como segura appro-
zimação ao fixar a capacidade do reservatorio e a extensão das
terras irrigaveis com as guas represadas. A experiencia que
se poder ganhar depois da construcção da primeira secção da
obra e antes de iniciar- se a segunda , indicará a altura mais
conveniente a dar-se a parede para completar o açude, não
se esquecendo que i metro addicionado a ella, em altura,
além dos projectados 30 metros, augmentar-lhe-ha a represa de
105 milhões de metros cub. dagua.
ORÇAMENTO - O que se segue é a estimativa cuidadosa-
mente elaborada do custo da irrigação de todas as terras allu-
viaes do valle do Jaguaribe e dos meios apropriados ao
transporte dos productos consequentes da irrigação . Pro-
paz contruir o reservatorio e as obras de distribuição em
duas divisões, das quaes a execução da primeira armazenaria
750 milhões de metros cubicos no açude para a irrigação de
50.000 hectares de terra, e a segunda os restantes 750 milhões
exigidos para completa irrigação das terras do valle, avaliadas
em 100.000 hectares. A primeira divisão das obras do reser-
vatorio represará agua a altura de 30 metros, a segunda, a al-
tura total de 40 metros. A primeira divisão das obras de distri-
buição consistirá principalmente em um canal central de 120
kilometros de extenção, correndo de S. João ao Aracaty quasi em
linha recta e atravessando o principal afluente do rio duas
vezes, por aqueductos de ferro fundido ou aço sobre columnas
de ferro fundido : a segunda divisão de taes obras consistirá na
construcção de canaes lateraes, em cada margem do Jaguaribe,
ladeando ás extremas das terras alluviaes.
Despesa em Equivalente ein Despesa Total redusi-
Descripção- brasileira
moeda dinheiro es- em lb. do a dinhei
terl. cambio 10 ro esterl.
Desappropria-
ção e estudos 552.000$ lb. 6.000.0.0
Reservatorio
e machinismos 4.177.464$ 55.123.4.0
Canal central
e trabalhos de
destribuição 6.226.118$ 121.421.0-0
Icó ( canal) & 315-494$ 5.040.0.0
11.371.076 $ £ 469.628.364 £ 187,584.40 £ 457.212.7.4
510

ORÇAMENTO 2. SEGUNDA DIVISÃO DOS TRABALHOS .


Despesa em Equivalente ein Despesa em Total em
Descripção - moeda moeda esterl. dinheiro d.° esterl.
brasileira esterlino
Parede do açu-
de e novo sangr. 1.685.168$ 18.465.12.0
Canaes later.
e obras de des . 4-325.227$ 41.070.0.0

6.008.395$ £ 253,349.16.0 58.533.12.0 £ 311.885 8.C

ORÇAMENTO 3. CUSTO TOTAL DOS TRABALHOS DE IRRIGAÇÃO .


-Parede do açude a obras de distribuição 17,279-471 $
£722.977.19.4-246.117.16.0-969.095.15 £ .

N. B.- Não estão incluidos nos orçamentos acima os ju-


ros durante a construcção. Estão incluidos nelles, comtudo 20 %
para as despesas geraes, isto é, 5 % para administracção, 5 %
para engenheiros, 10 % para eventuaes .
O custo d'estas obras de irrigação é favoravel comparado
com as referidas na recente obra de Ronna sobre Irrigação
[Vol. III. pagina 373] para quasi nm milhão de hectares irri-
gados em Bengala e nas provincias do Noroeste da India. At-
tinge a £ 9.69 por hectare. e representa o valor capitali-
zado de 58 £ 1 ou 1.5 francos por anno e por hectare contra
a media de 23 francos por hectare para o custo annual na In-
dia. E' necessario, sem duvida, augmentar o custo no Ceará
de 12 a 18 % para juros durante a construcção, e para uma con-
sideravel porcentagem, talvez 33 % para a proporção das terras
incultas annualmente, porem em compensação, os proventos da
irrigação no Ceará serão mais elevados, uma vez que as plani-
ces do Jaguaribe estão de 500 a 1000 milhas mais approxima-
das do litoral do que as referidas Indianas, e consequentemen-
te as terras poderão pagar mais elevada taxa d'agua. Deve - se
tambem notar que, tomando dois terços do supprimento total
do reservatorio como o quantum a ser effectivamente gasto du-
rante 10 mezes por anno, na irrigação, esta somma equivale a
uma camada media de 38,052 litros por segundo, cujo preço
pago annualmente a 38 francos por litro seg. attingirá o custo
acima mencionado. E' um pouco menor do que 38 fr. 8 custo ,
511

sobre 437,000 hectares referidos pelo Sur. Rouna na mesma pa-


gina, para um litro d'agua por segundo . ( 1 )
Até aqui chegam as informações do relatorio do Sr. O'
Meara. Completando-as, junto a carta que este illustre profis-
sional me dirigio em Fevereiro de 1894.
"Havendo entrado em negocios com capitalistas para a for-
mação de uma companhia empreiteira em Londres para cons-
trucção do grande açude de Lavras e obras accessorias neces-
sarias para a applicação das aguas de represa na pro-
ducção agricola, achei tão bem recebida a minha proposta, se-
cundada pelas descripções detalhadas do distincto engenheiro
J. J. Révy , que aceitei a commissão de visitar em pessoa o
lugar, para verificar e additar os estudos do dito Engenheiro
de modo a apresentar- se ao Governo do Brazil, no anno proxi-
mo futuro, planos preliminares sufficientes para dar as bases
para fixar se o capital maximo que tem de se levantar, com ga-
rantia de juros, no mercado de Londres.
"Procedi sem demora, visitando o Boqueirão de Lavras, a
bacia do açude proposto e os terrenos do Valle do Jaguaribe,
tenho a satisfacção de dizer- lhe que achei perfeitamente prati-
cavel a construcção do grande açude, com applicação a irriga-
ção. porem em condições mui differentes das indicadas no des-
enho do Sr. Revy, não somente quanto a posição e dimensões
da obra, mais tambem a respeito do orçamento dos trabalhos
a executar.
"Felismente não me parece necessario gastar no açude. nos
primeiros annos da empresa, quantia superior a do orçamento
Revy, considerando mais prudente proceder a construcção em
duas secções, limitando no principio a quantidade da agua de
represa á metada, e a área de irrigação na mesma proporção.
Por isso desenhei a muralha de modo a servir á parte central
de sangradouro para as aguas superfluas das enchentes, e pres-
eindir da construcção do tunnel e dos dois sangradoures late-
raes do desenho do Dr. Revy, collocando as comportas na
muralha sobre a rocha massiça do fundo, como se faz agora nɔ
açude de Quixadá, e podendo justificar a necessidade d'uma tal
mudança na propria descripção do dito engenheiro com refe-

[1] O. Meara -Irrigatira in Valley of Jaguarib.


512

rencia aos estragos que pode fazer a força enormissima das


aguas da represa nas paredes das obras por elle projectadas, es-
tragos que serão mui faceis de evitar seguindo se o meu desenho.
" Confessa o Sr. Révy, no seu relatorio supplementar de
1881. que são indispensaveis instrumentos de perfuração para
determinar a natureza e o contorno exacto das bases aptas para
a construcção de uma barragem magna, e que a falta delles
contribuiram por o embaraço seu em obter resultados certos a
respeito dos alicerces da obra , a parte alias a mais importante
de todo o desenho .
Furei com instrumento de 8 metros de comprimento no
lugar da muralha indicado na sua planta n. 1 obtendo resulta-
dos sufficientes para mostrar a despeza mui grande da construc-
ção de uma parede na posição por elle escolhida : despeza, que
me parece muito superior a quantia das eventuaes fixada no seu
orçamento, e de um caracter prohibitivo, attenta sua elevação .
Escolhi, porem outro lugar ao norte do Boqueirão , onde a
rocha se acha em toda parte a menos de 5,5 metros abaixo do
nivel da agua na parte central, elevando - se rapidamente em
sentido lateral. As paredes do Boqueirão neste lugar estão es-
tragadas na superficie, e acho necessario excavar até descobrir
rocha solida e incluir no orçamento, alem das eventuaes
de , costume, o custo de 15,000 metros cubicos de pedra
removida, acrescendo a quantidade de alvenaria na obra,
proporcionalmente. Não duvido que se o Sr. Révy tivesse op-
portunidade de conhecer a natureza das fundações nas duas lo-
calidades teria modificado o seu desenho, locando a barragem
no ponto que eu prefiri.
"Julgo da primeira vantagem, se não de necessidade, jun-
tar ao projecto o custo da construcção dos canaes lateraes, de
ordem n. 1. que servem para conducção da agua até mui per-
to des terrenos irrigaveis e de modo a não necessitar qualquer
obra de arte senão o registro de medição e fosso de corte ou
aterro em terra ordinaria, assim como nos diques que se hão
de construir nos pontos de represa perto do Icó e no Boqueirão
do Cunha. para desviar as aguas do leito do rio para os campos
adjacentes.
"Pode construir - se um destes canaes da 1ª ordem, de modo
a servir de leito a uma estrada de ferro entre o Boqueirãe do
513

Cunha e o porto do Aracaty, precisando para isso estudos sim-


plesmente preliminares afim de fixar- se o custo approximativo
ou maximo ; e sou de opinião que a contrucão de uma Estrada
de ferro assim collocada, extendendo -se até Lavras, trará van-
tagens enormes ao desenvolvimento da grande empresa de irri-
gação em todo o Estado, que talvez não seja muito impulsiona-
do pelo açude de Quixadá [ 1].
Como se vê da exposição feita dos projectos dos Srs. Revy
e O'Meara não ha concordancia entre elles quanto ao local
da parede, e respectivos orçamentos em relação ao custo to-
tal da parede do açude e das obras de irrigação .
Quanto a locação da barragem é evidente que nada po-

[ 1 ] Sendo mais pessoal a conclusão da carta do engenheiro


O. Meara dou-a aqui em nota .
"Acho pois conveniente incluir em nossa petiçãa ao gover-
no a concessão para a construcção de uma tal estrada, conclu-
indo- a dentro do tempo fixado para conclusão de açudes, etc.,
e assim tornando a empresa remunerativa aos productores e
sem onus para o governo, visto o custo enormemente reduzido
do transporte.
Va Sa me prestará um grande favor, fornecendo - me um
parecer sobre as vantagens que o Estado pode auferir e a Em-
presa. da producção de algodão, capim, arroz, milho, feijão
mandioca, joá, fumo e frutas resultantes da irrigação, e sobre a
capacidade do sertanejo, em pequena escala, para o uso de irriga-
ção, sendo a agua fornecida para seu campo, recebida na divisa.
Dirá tambem a despesa da producção, e colheita acima
referida :
1 Em grandes lotes com o minimo de despeza de cultivação.
2 Em lotes menores, sem estrume.
3 Em pequenos lotes, com cultivo intenso e despeza a
mais larga.
A primeira questão tem referencia a possibilidade de a
companhia, nos primeiros annos, no caso de não se apresenta-
rem compradores, achar conveniente plantar os terrenos com
algodão, arroz ou capim em grande escala mas sem cultivação
se não a minima possivel, em lotes de 1000 hectares ou maiores.
A segunda indicará o custo da producção actual, incluido
o das cercas, guardas, etc. , sendo empregado capital cearense, e
cultivando - se lotes até 10 ou 20 hectares.
A terceira indicará o valor do trabalho dos sertanejos po-
bres, não excedendo os lotes de 1 hectare, cultivando -se mandi-
oca, milho, frutas etc., etc. em pequena escala.
514

derá ser emprehendido sem um novo e minucioso exame das


condições technicas do Boqueirão ; quanto ao orçamento das
obras. se bem que a divergencia pareça grande, o desvio real
é relativamente insignificante."'
O Snr. Revy orça em 5.633 contos a construcção do açude
de Lavras, e em 80$250 cada hectare de obras de irrigação ou
sejam 8.025 contos para os 100.000 hectares de Lavras ao Ara-
eaty : resultando o total de 13.658 contos. O Snr. O'Meara
calcula em £ 969.095 o conjunto de todos os serviços ou sejam

E finalmente, a quantidade approximadamente de eada


colheita por unidade de terreno, em cada uma das tres varieda-
des de cultivação acima indicadas.
Quanto a duração da construcção, visto que a quantidade
de alvenaria não excede muito a da de Quixadá, podia a de La-
vras executar- se em 4 annos, caso se possa obter a devida
quantidade de cimento de Portland na razão de 80 a 100 tone-
ladas por semana, mas este periodo só póde contar- se do prin-
cipio dos trabalhos, depois de preencherem-se todas as forma-
lidades das leis do Brazil. Com a boa vontade do ministro da
industria, etc., será possivel acabar com estas durante o
anno de 1894, e passados outros seis meses em formar a com-
panhia, providenciar pessoal, machinas, etc., póde ter lugar a
inauguração dos trabalhos na primavera de 1895, e a conclu-
são das obras nos primeiros mezes de 1899 ou antes, sendo ao
mesmo tempo preparadas as obras de destribuição das aguas,
de modo a iniciar- se regularmente a producção.
Acho que já ha no Valle do Jaguaribe carroças em nu-
mero sufficiente para o transporte da metade, ao menos, do
cimento, visto que geralmente ellas não voltão vasias do Araca-
ty, e que pode fazer se ao mesmo tempo, conducção por Qui-
xadá, 1guatú, Canôa, etc., em costas de animal, assim acaban-
' do com a questão vital e mui vexada do transporte de cimento
e machinas.
Bem conhecendo o grande interesse que V. S.. desde muitos
annos tem mostrado em adiantar a importante questão da irri-
gação no Ceará, estou com plena confiança de obter de V. S. o
apoio que desejo e que tem o mais grandė valor perante o go-
verno, com o fim de promover a construcção rapida e segura do
açude collossal de Lavras e das obras accessorias para a irri-
gação do Valle de Jaguaribe.
Agradeço a V. S. com antecedencia, ficando
O att am obr?,
P. O' MEARA.
E. Inst. C. E.
515

á cambio de 15 d (cerca 15.500 contos). A differença de 1.812


contos resulta da taxa do cambio, que ao tempo em que o
Sur. Revy fez seus estudos era de 20 d por 1 $.
E' provavel que este preço possa ser redusido, dada a
maior facilidade do transporte para cimento e machinismos
pela estrada de ferro, actualmente muito approximada de La-
vras .
O Sur. O'Meara propõe, porém, a construcção da obra
por secções, sendo a primeira para represar 750 milhões de m.
cubicos dagua e irrigamento de 50.000 hectares de terreno. Nesta
hypothese o custo total elevar-se- ia a £ 657.312 ou 10.500
contos.
Se circumscrever- se nos primeiros 6 annos de trabalhos a
irrigação ás planicies do Icó , esta despeza poderá ainda ser mi-
norada, pois que a parede de 35 metros para represar 750
milhões de m. c. dagua está , calculada em £ 230.000 ou
3.680 contos, a cambio de 15 e os 10.000 hectares irrigaveis a
£ 8.2s por hectare em £ 80100. O total elevar- se -ha de 310 a
315.000 libras esterlinas, ou 5.000 contos, arredondando os
algarismos.
O Snr. O. Meara não dá as bases do seu orçamento, os
preços particularisados nas obras do açude, e nas de irrigação,
como faz o Sr. Revy. Quanto ao açude e obras complementares
já vimos como este os decompõe. Vejamos como elle orça os
trabalhos dos canaes destinados a irrigação.
São suas as considerações seguintes [ 1 ] .
Antes que se possa fazer qualquer projecto de obras de ir-
rigação, é necessario conhecer o genero de plantação a irrigar,
e a proporção relativa das varias especies dos generos agrico-
las a cultivar nas terras irrigadas.
Nas obras de irrigação moderna ha somente duas especios
de canaes permanentes, e a experiencia tem mostrado que estes
devem ser feitos pelo governo e ficarem sob a sua administração.
São o canal principal e os secundarios : aquelle para conduzir
toda rassa dagua tirada do reservatorio ou de outros pontos
do supprimento : os secundarios para levar do canal principal

(1) J. J. Revy - Kel. cit., pag. 20 e seguintes .


516

a agua necessaria a irrigação das terras. Cada secção deve ter


um canal secundario.
Se a secção está dividida em grande numero de pequenas
parcellas. pertencentes a muitos proprietarios, a experiencia ha
mostrado que em taes circumstancias o canal secundario não
deve conduzir mais de 55 litros dagua por segundo e em muitos
casos, metade desta quantidade, porque em um dia dado da
semana por um certo nº de horas o supprimento inteiro do ca-
nal fica sempre a disposição de um proprietario e em peque-
nas culturas os proprietarios podem dispor somente de poncos
braços, e não pode utilisar um supprimento maior dagua sem
grande disperdicio do mesmo.
Para taes pequenas culturas a secção não deveria ser maior
de 1000 hectares, porque o supprimento medio dagua para plan-
tação do verão e do inverno não é mais que de 1/4 de litro por
sǝgundo e por hectare por todo o anno.
Para grandes plantações, de syndicatos ou companhias.
como as de algodão, canna, fumo, arroz , etc. , onde se pode ap-
plicar cultura systematica com abundancia de braços, o canal
secundario pode conduzir 125 litros por segundo e até mais.
Em anno ordinario de producção, de inverno e de estio, taes
plantações consumiriam tambem na media 14 de litro por se-
gundo e por hectare. A grandeza da secção para taes plantações
seria de cerca de 500 hectares, sendo aliás maiores na Argelia.
Os pequenos canaes de destribuição para levar agua por
toda a área de plantação , chamados rigoles, são sempre feitos
pelo proprio laviador, quando prepara as terras com o arado,
etc., para a especie de producto que pretende cultivar. A ex-
periencia tem mostrado que para plantações maiores e syste
maticas os canaes secundarios devem estar intervallados de
400 metros, de sorte que cada hectare de taes plantações exige
25 metros lineares de extensão de canaes. Para as pequenas
plantações de horticultura a distancia entre os canaes secunda-
rios deve ser reduzida a cerca de 200 metros, e nestas cir-
cumstancias cada hectare exige cerca de 50 metros de caual
do typo menor.
O custo do metro linear de um canal secundario de typo
maior é inferior a 200 reis, e para 25 metros de comprimento
necessario para 1 hectare, seria inferior a 5000 por hectare de
517

terra irrigada etc. canaes de typo menor custa pouco menos,


'e tomando para estes a mesma despeza dos maiores, 50 me-
tros de canal para horticultura custariam 10$000 . Cada 10 hecta-
res de terra precisam alem disto de um tanque para a distri-
buição d'agaa, que custa menos de 404000 , ou por hectare me-
nos de 44000. Estes algarismos representam a despeza total
para o estabelecimento da rêde de cannes secundarios nas obras
modernas de irrigação.

"Supponhamos, para demonstração, que a commissão espe-


cial tenha chegado ao resultado de que 10.000 hectares de terras
irrigaveis das planicies do Icó devem ser devididas em 7.500
hectares de grandes plantações de horticultura : então o custo
dos canaes secundarios para irrigação destas planicies varia de
34000 para a primeira e de 14$000 para a segunda classe de
plantações por hectare, inclusive tanques e comportas, ou o
preço total de seu estabelecimento por toda área dessas pla-
nices seria de 10$250 por hectare.
"O comprimento, dimensões e custo dos canaes primarios
não podem ser determinados de antemão pelas regras que se
applicam aos canaes secundarios, porque dependem de outras
condições, como a fórma dos terrenos, contorno das planicies.
Pela inspecção que fiz das planicies do Icó parece provavel que
conviria dividir o canal principal em 4 ramos, conduzindo
cada um cerca de 1/4 do volume total d'agua a supprir a estas
planicies, e que o comprimento total destes 4 ramos seria in-
ferior de 80 kilom . A quantidade dágua a supprir pelo canal
principal é de menos de 5.000 litros por segundo ; mas augmen-
tando as dimensões do canal de 50 % , afim de ter sempre
amplo supprimento, mesmo em circumstarcias excepcionaes,
a quantidade d'agua que o canal principal teria de conduzir
seria inferior a 8m3 d'agua por segundo. Esta quantidade, di-
vidida entre os 4 ramos do canal principal, daria para cada
um a media de 2m3 por segundo, com a velocidade media de 3/4
de metro por segundo ; variando de 1/2 a 1 m., como aconselha
a experiencia, daria para a área medida da secção menos de
3m3 para os canaes transversaes. Semelhante canal teria no
fundo 1 1/4 de m . , e na superficie d'agua 3 1,3 m. e 2 de profun-
didade d'agua : o movimento de terra media para todo o com-
primento do canal seria inferior de 3 m. cubicos por metro li-
518

near de comprimento. O total do movimento de terra dos ca-


naes principaes seria inferior a 240.000 m. cubicos, o que a
1$500 por m. representaria uma despeza de 360: 000 $ ; por cada
hectare de terras irrigadas o custo seria de cerca de 364000
para as planicies do Icó.
O estabelecimento de canaes principaes e secundarios nes-
tas planicies, com os seus tanques e comportas para a distri-
buição d'agua requer, portanto , a despeza de 46 $250 por
hectare. A pequena barragem de alvenaria, que atravessa o
canal do Salgado para elevar a agua até o canal principal te-
ria menos de 3.000 m. cub. de alvenaria de cimento de Por-
tland, e custaria o metro cubico menos de 30$ : isto é, a despe-
za total seria inferior a 90 contos de reis . O tanque para dis-
tribuir a agua polos canaes principaes, com comportas, edifi-
cios, etc. custaria menos de 50:000 $, e admittindo para com-
portas nos canaes principaes, boeiros, estradas, etc:, a grande
quantia de 200: 000$. o preço total destas obras seria inferior de
340: 0004000, ou por hectare de terra irrigada menos de 34$000.
A' despeza para obras de irrigação nas planicies do Icó
com a installação completa, mas sem o reservatorio de Lavras
seria a seguinte :
1º Para canaes primarios e secundarios por hectare 46$250
2º Para obras de barragens, tanques, comportas,
əstradas, etc. por hectare 34$000

Total por hectare 80$250


Passando a tratar do modo de construir essas obras, pro-
segue o Snr. Revy ( 1 ) :
"Se o solo é alluvial. quasi impermeavel, em declive bran-
do e regular, a instalação de obras de irrigação exige apenas
alguns conductores intelligentes. Mas se o solo é de estratificação
variavel permeavel, com inclinações fortes e irregulares, estas
obras apresentam innumeraveis difficuldades, sua construcção
acarreta despezas crescidas e incertas, e depois de acabadas,
rara vez satisfazem ; seus canaes perdem muita agua por
filtração ; o terreno humedecido por esta agua facilmente es-

(1) Relatorio apresentado ao ministro da agricultura a 8 de


Fevereiro de 1882 -pag. 28.
519

correga, necessitando interminaveis concertos ; a rede de ca-


naes precisa ser muito maior por hectare ; em summa, em ter-
reno máo não convem emprehender obras de irrigação.
A conservação de taes obras em bom terreno é facil e
importa em menos de 4 % ao anno do capital da construcção ;
em máo terreno pode elevar- se a 20 %.
A administração das obras de irrigação exige pequeno nu-
mero de empregados ; para cada 1.000 hectare - 1 guarda-
agua, e um escriptorio central com inspector e alguns em-
pregados para a contabilidade, correspondencia, etc. Nos cam-
pos do Icó, sendo a área de 10 000 hectare, a despeza da admi-
nistração seria de menos de 10 % da receita bruta da taxa
d'agua.
No meu relatorio sobre o reservatorio de Lavras estabe-
leci claramente que os campos do Icó são extremamente favo-
raveis a construcção de obras de irrigação.
Os engenheiros de nosso tempo tão pouco copiam as py-
ramides do Egypto ou os aqueductos romanos, como copiaram
o systeina de canaes de irrigação dos egypcios ou a antiga ca-
nalisação da Lombardia, e o custo destes trabalhos não po-
deria servir de guia para determinar o custo de obras do sys-
tema moderno de irrigação.
Canaes no curso do tempo alteram o seu fundo, e ro
curso de uma geração pode tornar-se necessario limpar e
aprofundal os. Chuvas torrenciaes estragam os taludes dos ca-
naes ; mas estragam-nos muito menos que os de ferro- vias,
porque os taludes de canaes estão sempre cobertos de luxuri-
ante vegetação e raras vezes tem mais de 2 metros de altura ;
enquanto nas ferro- vias os taludes são frequentemente duas
ou tres vezez mais altos, são seccos, e, por sua maior altura.
os effeitos destruidores das chuvas torrenciacs se multiplicam
na sua base.
A supposição de que um muro de barragem possa ceder
é imaginaria ; porque a experiencia de milenios tem provado
que muros de barragem fundados sobre rocha jamais cedem. "
RESULTADOS ECONOMICOS. - Do que fica dito se conclue que
a irrigação é a condição primaria de uma cultura methodica
e productiva do solo em regiões de regimen pluvial inconstan-
te, que o açude resume e concentra todas as vantagens de um
520

systema irrigatorio perfeito, e que em relação ao Ceará, o


grande reservatorio é o mais vantajoso sob o aspecto techni-
co e economico.
Vejamos se a lavoura irrigada uo nosso clima, dadas as
condições topographicas do valle do Jaguaribe e os generos
cultivados em parallelo com a existente, não regada, offerece
vantagens reaes e compensadoras ao capital a empregar- se
em taes obras.
Estudemos, pois :
O VALLE DO JAGUARIBE E O EFFEITO DAS IRRIGAÇÕES
SOBRE AS SUAS CULTURAS-- Passando a tratar das vantagens
que resultariam da irrigação destas planicies, descriptas, assim
se exprime o Sr. Revy, em relatorio cujos trechos acabo de
transcrever :
"A construcção de canaes de irrigação nas planicies do Icó
não offerece difficuldades, e obras de irrigação executadas em
taes terras não seriam despendiosas : porque o terreno é em
toda a parte alluvial e quasi impermeavel. Alem d'isto estas
planicies tem declives brandos e uniformes.
Por um boeiro no Boqueirão supprimento constante e
quantidade determinada d'agua seria levada para o leito
actual do Salgado abaixo do Boqueirão. Quasi até o Icó o leito
do rio consiste em toda a parte de rocha . Em um logar convenien-
te, alguns kilometros acima da planicie do Icó, um pequeno
dique de alvenaria de 6 metros de altura seria lançado atravez
do leito do rio para elevar o nivel d'agua a esta altura e por
meio de um canal lateral e de comportas a agua seria conduzi-
da por um canal principal deste dique ás planicies do Icó para
ser destribuida pelos varios canaes de irrigação.
A irrigação completa das planicies do Icó exigiria cerca de
meio litro por segundo e por hectare para algodão, fumo , mi-
lho, feijão, etc., e si em anno de secca nenhuma gotta de chuva
cahisse durante o anno inteiro, a quantidade d'agua necessaria
por hectare seria inferior a 16000 metros cubicos.
Mas dando 20000 metros cubicos annualmente, em um
anno de secca de 12 mezes consecutivos, as planicies do Icó se-
riam suppridas abundantemente com um volume de duzentos
milhões de metres cubicos d'agua, o que deixaria disponivel
um saldo de mais de 1.000.000.000 de metros cubicos para a
521

irrigação de outras terras, depois de feito o devido desconto


para a evaporação e outras perdas durante 12 mezes de secca
continua.
Durante uma secca de 12 mezes, a evaporação e outras
perdas seria de cerca de 15 % no reservatorio de Lavras (que
deveria conter 1500 milhões de metros cubicos d'agua e custar
5.333 contos ou 3$755 por mil metros cubicos) ; portanto o cus-
to d'agua no reservatorio, disponivel para o serviço, elevar- se-
hia a 4$418 por mil metros cubicos.
Dando para cada hectare, termo medio, o supprimento de
20000 metros cubicos para um tal auno. o capital empregado
para o supprimento d'agua seria de SS$360, e contando 7 %
pelo juro e amortisação do dito capital, basta uma taxa dagua
de 6$185 por hectare e por anno, equivalente a 3$090 por mil
metros cubicos, para cobrir toda a despeza feita com a
construcção do reservatorio.
Isto seria uma taxa d'agua tão insignificante, que nas con-
tas dos lavradores seria considerada como nada.
Observo, porem, que esta insignificante taxa poderia so-
mente ser proposta, quando toda a agua do reservatorio dis-
ponivel para a destribuição fosse effectivamente empregada
para a irrigação de terras.
Mas esta taxa é tão pequena que. si depois de acabadas
as obras somente uma decima parte d'agua fosse empregada
utilmente para a irrigação, e que se elevasse proporcionalmen-
te a dita taxa ao duplo. para cobrir os juros e a amortisação
do dito capital, ainda assim seria uma taxa moderada : seria
então 61$850 por hectare de terra regáda annualmente ou
30$920 por mil metros cubicos d'agua suppridas : isto se torna
evidente pela comparação com taxas d'agua na Europa, Africa
e India.
E' um facto bem estabelecido que a lavoura pode suppor-
tar uma taxa d'agua de 20 francos por mil metros cubicos :
a de 15 francos seria uma taxa modica : de sorte que a taxa
d'agua assim de 34$092 seria menos de metade de uma taxa
leve, e com tudo pagaria toda a despeza em que o governo in-
corresse pela construcção das ditas obras, deixando nas mãos
do governo um saldo de 90 % d'agua disponivel para o desen-
volvimento gradua! da agricultura do valle.
522

Até uma secca de dois annos não affectaria essencialmen-


te a questão, porque em taes circumstancias o supprimento
d'agua seria limitado as necessidades absolutas, e acautelar- se-
hiam contra todo o disperdicio, logo que um anno de secca se
declarasse.
Ja notei que a população agricola do Icó é grande.
Dentro de um raio de 58 kilm. haveria, com direcção
e instrucção conveniente , mais de 50.000 pessoas promptas a
tomar a irrigação das planicies em suas mãos : e , creio que o
successo de seus trabalhos agricolas pode ser considerado
como certo".
Quanto a irrigação das planicies do Limoeiro e Russas
pronunciou - se o Snr. Révy em termos não menos animadores.
Sac estas as suas palavras :
"Reservei a consideração da irrigação destas planicies
para um capitulo especial, ainda que as terras do Limoeiro e
de Russas sejam semelhantes as do Icó.
"Sua posição. comtudo, é algum tanto differente, e por isso
a questão merece ser tratada especialmente.
"A distancia do reservatorio de Lavras ás planicias que
começam no Boqueirão do Cunha é de cerca de 150 kim.
A agua para a irrigação destas planicies sahiria do reser-
vatorio de Lavras para o leito do Salgado, passaria por cima
do dique deste rio, construido para tirar o volume d'agúa ne-
cessario para as planicies do Jeó e continuaria o seu curso no
leito do Salgado e do Jaguaribe quasi até o Boqueirão do
Cunha. Ahi se construiria um dique atravez do leito rochoso
do Jaguaribe semilhante ao do Icó : somente seria maior por
causa da maior largura do rio ; elevar - se-ia o nivel d'agua neste
ponto do leito cerca de 6 metros, e como nos arranjos já des-
criptos para a irrigação das planicies do Icó, a agua seria levada
de cima do dique por um canal lateral sobre as planicies do
Limoeiro e Russas .
"A distancia do reservatorio nestas planicies é considera-
vel, e alguma agua se perderia por evaporação.
"Considerando, pois, que mesmo nas actuaes circumstan-
eias muitos grandes poços se conservaram no leito do rio
· mesmo durante a ultima grande secca, nutridos por fontes
subterraneas, é claro que a perda se limitaria a differença en-
523

tre a área dos actuaes poços e a superficie do rio, quando le-


vasse as aguas do reservatorio para a irrigação .
Tomando ainda uma vez em consideração uma secca de
12 mezes continuos, o reservatorio de Lavras, depois de supprir
agua neccessaria para as planicies do Icó, teria uma reserva
para as planicies do Limoeiro e de Russas, superior a ......
1.075.000.000 m. cubicos de agua, isto é quasi 3.000.000 de me-
tros cubicos por dia durante o dito periodo ou cerca de 34
metros cubicos por segundo, o que se pode considerar como
um bello volume de secca para um rio artificial. A largura
media do canal do rio que conduziria este volume d'agua den-
tro do leito do Jaguaribe, seria inferior a 58 metros ; portanto
a superficie d'agua no rio em 150 km. seria inferior a 7 1/2 kil.
quadrados, é a evaporação total seria maior de 20.000.000 de
m. c. ou abaixo de 2 % do volume d'agua produzida .
Mil milhões de metros cubicos chegariam, pois, segura-
mente do reservatorio de Livras ás planicies do Limoeiro e de
Russas para servir a irrigação durante os ditos 12 mezes, garan-
tindo um supprimento abundante de agua para a irrigação de
50.000 hectares de terra. Estes numeros são tão grandes e de
tal peso, que deve pesar na contemplação do effeito que taes
obras produziriam sobre o futuro da provincia do Ceará.
"Existe uma outra fonte de supprimento de agua, que
merece attenção. Na descripção destas planicies notei que nel-
las o deposito alluvial é de 4 a 5 metros de espessura, descansa
sobre uma camada de arêa, que sempre contém um abundan-
te supprimento d'agua.
N'estas circumstancias poderia se tirar agua desta camada
d'arêa por meios artificiaes, principalmente por força de vapor
para canaes de irrigação, e assim obter- se-ia um supprimento
d'agua in locɔ. Supposto que a agua fosse elevada de 5 metros
abaixo da superficie do terreno á 2 metros acima delle para
um caual principal, então com a melhor combinação mecanica
e installação das machinas a vapor e bombas, mil metros cu-
bicos dagua custariam mais de 5$000, somente pelo combusti-
vel, sem o juro do capital empregado nas obras, o gasto de ma-
chinismo e a despeza com o pessoal de engenheiros e homens
necessarios para o serviço do estabelecimento.
"Não se pode tomar em seria consideração o supprimento
524

temporario de lenha das mattas de carnauba das planicies.


por que estas mattas bem depressa desapareceriam si tivessem
de supprir combustivel para grandes estabelecimentos desta
qualidade. O custo da agua supprida desta fonte seria , pois.
muitas vezes, maior do que o custo da agua supprida pelo re-
servatorio de Lavras. Convem tambem considerar que esta-
belecimentos de bombas, supprindo annualmente algumas cen-
tenas de milhões de metros cubicos d'agua, abaixariam consi-
deravelmenie o nivel d'agua na dita camada de arêa, o que de-
veria augmentar as proporções destes estabelecimentos por
causa do accrescimo de força necessaria e portanto de maior
despeza de combustivel : consequentemente tambem augmenta-
ria o curso d'agua levantada para os fins de irrigação. Toda-
via estas fontes merecem cuidadosa attenção : trabalhos de
irrigação poderiam ser montados nestas planicies em pequena
escala, sem perda de tempo, tirando o seu supprimento d'agua
destas fontes ; estes trabalhos poderiam servir de escola para
a educação da população agricola do valle do Jaguaribe.
"A população agricola estabelecida nestas planicies, a sa-
ber, a das comarca do Aracaty, Russas e Limoeirc , excede
actualmente a 50.000 almas e não haveria dificuldade em attra-
hir outras 50.000 das comarcas visinhas para o serviço de
extensos trabalhos de irrigação, estabelecidos nas planicies de
Russas e Lavras".
Rematando as considerações com que expôz os serviços
de sua commissão, o Sr. Revy tira as seguintes conclusões :
"Nas actuaes circumstancias, os recursos agricolas do valle
do Jaguaribe jazen dormentes, principalmente porque suas
ferteis planicies são privadas do supprimento necessario d'agua
durante a estação secca do anno, e periodicamente durante
alguns annos consecutivos, causando calamidades á provincia
e serios embaraços ao Estado.
"O supprimento total d'agua provindo de chuvas ê em
regra abundante, a quantidade d'agua que o valle annualmen-
recebe é muito superior as necessidades da mais alta agricul-
tura estendida a cada hectare de suas vastas e ferteis plani-
cies ; mas esta quantidade de agua chega ao valle de um modo
que prejudica a sua agricultura, havendo excesso em um tem-
po e falta em outro.
525

Assim, em annos regulares, chuvas torrenciaes e enchen-


tes formaw a rega durante 3 mezes ; durante 6 mezes não ha
chuva alguma de valor para a agricultura, e neste tempo as
terras ficam queimadas e a vegetação torna e impossivel em
grandes e forteis áreas de terreno.
"A lavoura do valle é actualmente limitada a áreas insigni .
ficantes, que tem alguma humidade. em consequencia de seu
nivel mais baixo ; assim a propria área do leito do rio Jagua-
ribe é cercada e cultivada , e produz mandioca, feijão, arroz,
batatas, etc.. para uma grande população, emquanto que as
magnificas planicies alluviaes adjacentes, 5 metros acima do
nivel d'aquella área, jazem abandonadas e formam um deser-
to de densas mattas de carnahubas.
"Procurei mostrar que a irregularidade no supprimento
d'agua para a agricultura destas planicies pode ser corregida
pela construcção de grandes reservatorios, empoçando o exces-
so d'agua da enchente durante a estação chavosa para o be-
neficio da agricultura durante a estação secca.
"Tenho tambem mostrado que o valle de Lavras offerece-
ria facilidades especiaes para a construcção de um reserva-
torio grandioso por ter sido o valle ha seculos um vasto
lago interior. Procurei tambem provar que o custo d'agua em-
poçada n'aquelle reservatorio seria pequeno ; que uma taxa
d'agua muito modica por hectare de terra regada cobriria o
juro e amortisação do capital empregado pelo governo na
construcção de taes obras, que o valle tem grandes áreas de
magnificas planicies alluviaes de riquissimo solo ; que ha uma
grande população agricola em ou perto destas planicies,
prompta para emprehender as irrigações ; que finalmente es-
tão prehenchidas as principaes condições para garantir o re-
sultado das obras que formariam a base de todo o trabalho
agricola no dito valle, dando um regular, abundante e infalli-
vel supprimento de agua para fertilisar as ditas planicies, sem
dependencia das irregularidades na quantidade e nos perio-
dos das chuvas em annos, quer regulares, quer extraordinarios.
"A população actual do valle é de cerca de 200.000 al-
mas e esta população immediatamente lucraria com taes obras.
"A introdução da irrigação nas ditas planicies ELEVARIA
EM MENOS DE DEZ ANNOS A POPULAÇÃO A UM MILHÃO e este exer-
526

cito de trabalhadores agricolas, com seu util e pacifico traba-


lho, produziria todas as necessidades e commodidades da vi-
da para ao menos dous milhões de habitantes .
"A riqueza da provincia augmentaria, pois, grandemente
de anno em anno, contribuindo não pouco para vantagem e
segurança do Estado, pelo augmento de sua renda annual e
pelo contentamento de sua população. ”
Até aqui o resultado dos estudos do Sur. Rev y, que, como
se acaba de ver, daria só por si cabal e inteira satisfação
a generalidade dos quesitos formulados pelo illustrado Sur.
O'Meara .
O exito de uma empreza, qual a do reservatorio de Lavras'
é senão indiscutivel, ao menos de facil e rapida intuição. No
entretanto, para satisfazer ao illustre professional, cujos tra-
balhos de irrigação e outros nos Estados Unidos da America
do Norte, Africa e Asia testemunham bem alto em pról de sua
competencia, e somente para corresponder a confiança que
poz nos meus esforços, procurarei particularisar cada um
dos seus quesitos dand o -lhes a solução que julgo mais acer-
tada.
ACTUAL VALOR DA PRODUCÇÃO NO VALLE DO JAGUARIBE.-
A descripção do valle do Jaguaribe feita pelo Snr. J. J. Revy
mostra qual a aptidão de suas vastas planicies para todas as
culturas intertropicaes , particularmente para aquellas que já
são conhecidas e explora das commercialmente no Ceará.
A riqueza, tão justamente gabada, do solo que por uns 70
kilometros e 2 a 3 de largura se dilata entre as serras do Ara-
ripe, S. Pedro e as demais que formam o valle do Cariry,
consiste na camada de 1 a 2 metros de terras alluviaes, banha-
das por correntes que as fertilisam ou lhes dão a humidade de
que precisam para produzir viçosa canna de assucar, arroz,
milho, arvores fructiferas, etc.

No entretanto, a quantidade de agua pluvial, caida no val-


le do Cariry, não é sensivelmente maior que a dos terrenos
altos, que formam os sertões alem, nas cabeceiras do Jagua-
ribe e nos seos grandes tributarios. Não fossem as aguas, aliás
escassas, que o Itayteira e o Grangeiro despejam, a razão
de 1 metro cubico por segundo, sommadas todas as telhas
527

d'agua do valle ( 1 ), e este pouco ou nada deferiria daquelles á


falta de correntes perennes. Ninguem põe em duvida a supe-
rioridade do Cariry como solo cultural e prodigalisador de
beneficios aos seus felizes moradores. E tal é a fascinação que
a sua uberdade exerce sobre os sertanejos das suas immedia-
ções, que nas quadras calamitosas, de seccas, converte-se em
refugio de dezenas e dezenas de mil pessoas que a elle vão pe-
dir a subsistencia recusada pelo sertão.
O valle do Cariry é relativamente estreito, mas como área
cultural deve -se lhe addicionar as encostas das serras até
onde attingem as aguas correntes.
Mas em parte, e não pequena, essas ercostas, já por sua
inclinação, já pelo desuudamento, produzem menos do que o
brejo.
A irrigação feita pela mór parte dos lavradores é imper-
feita e as vezes nociva á vegetação das plantas. A agua corre
sem cessar por canaes ou levadas, dos quaes ellas transbor-
dam ou filtram dia e noite. Em muitas partes a saturação
acaba por enfraquecer a vegetação.
Seja como fôr, a área irrigavel do Cariry não passa de
14.000 hectares, e nem toda está aproveitada.
Mas tal qual é, produz muito alem do necessario para
manter a sua população e dar- lhe certas facilidades de exis-
tencia, tornando -a farta e alegre .
E' preciso notar que, como toda a irrigação sem methodo,
a de valle do Cariry está sujeita a irregularidades, que se tor-
uam nocivas nos mezes de chuvas copiosas, quando embrejam
os terrenos baixos, roubando-os a laboriosidade do agricultor,
e convertendo -os em viveiros de mosquitos na estação quente.
Não precisavamos de prova ou argumento mais robusto
em prol dos beneficios da irrigação do que o deste fertil e
ameno valle, onde não é a agua de chuva , directamente, que o
fecunda mas a que a serra do Araripe armazena nas suas en-
tranhas para dal-a regradamente depois.
Outras e muito mais vantajosas são as disposições topo-
graphicas dos valles do Icó, Limoeiro e Russas. Em vez de 12

1 ) No Crato a agua destes rios é medida pela unidade-


TELHA- Correspondente a pouco mais ou menos 18 millimetros
cubicos.
528

a 14.000 hectares irrigaveis, em terreno accidentado, esses


valles contam 100 a 110.000 hectares appropriados a todas as
culturas, com pequena inclinação e uma camada de humus de
mais de metro, attingindo em alguns logares 2 e 4 de espessu-
ea, sem rival talvez no mundo, se exceptuarmos o puzta hun-
garo ou as terras negras do sul da Russia.
Pelo systema de irrigação que o grande reservatorio im
põə, os leitos do Salgado e do Jaguaribe conservarão constan-
temente bastante agua, em ordem a formar corrente perenne
sem o perigo ou inconvenientes das innundações.
A quantidade d'agua no rio, e a que deverá servir para as
irrigações nos canaes lateraes, será 20 vezes mais volumosa
que a de todos os correntes do valle do Cariry, com a vanta-
gem de que os deste, no seu curso superior, pouco ou nenhum
limo carream. e os do grande reservatorio trarão, quando pre-
ciso, en suspensão, todos os saes nutritivos de que carecem as
plantas.
Luz, humidade, calor, terrenos superiores, eis as condi-
dições de exito facil e indiscutivel para a mais extensa e lu-
crativa lavoura no bello valle do Jaguaribe.
Que valem, porém , actualmente estas ricas planicies , dil - o
o menos preço em que são tidas e a sua quasi incultura.
Pode-se affoutamente affirmar que a área entregue a lavoura
ás margens do Salgado, abaixo do Icó e no Jaguaribe, em Li-
moeiro e Russas, não attinge a 5000 hectares. Geralmente as
melhores lavras estão na parte do leito do rio que logo apoz
ás enchentes fica á secco, a que chamam vasante, e em alguns
trechos das suas margens baixas (ribeiras) humedecidas na es-
tação invernosa.
O solo, de composição argilo silicioso, endurece, greta -se
e pulverisa -se, quando a acção directa dos raios solares lhe
exhaure toda a humidade superficial ; ou alaga-se, quando as
agua pluviaes não acham escoamento para o canal do rio, e
mais tarde converte- se em vasa ou atoleiro insalubre .
Seria difficil estimar em moeda o valor actual destas p'a-
nicies, não só pela variedade de preços dos terrenos, segundo
a sua situação topographica, como pela falta absoluta de al-
guma cousa que semelhe a cadastro ou mesmo a registo da
propriedade territorial .
529

Nas proximidades da cidade do Icó, e porventura do Limo-


eiro e Russas, os melhores terrenos vendem-se de 8 a 10$000
por braça corrente com o fundo de 400 a 500 braças. Não é
raro achar- se, mesmo em situação bôa, uma braça [ 10 palmos ]
com 2 ou 3 kilm. de fundo por 3$000 , 28000 e menos. Toman-
do a media de 2$ por braça com o fundo de um terço de le-
gua on 2 kil. [ preço que me asseguraram ser superior ao
normal] teremos para valor do hectare 4$500 e pelos 100000
hectares 450 contos, afóra as bemfeitorias, como casas, lavras,
etc. que poderão ascender á outrotanto dando, o total de
900.000 000 contos.
Parece, á primeira vista, que as 50 legoas marginaes do
Jaguaribe, do Aracaty ao Icó, deverão valer mais do que dá o
calculo acima : mas considerando - se que excluo d'elle mais de
100 kilm. ou 20 legoas, e só levo em conta 30 abaixo de lcó ou
160 kilm. e que as melhores terras do sertão se vendem á razão
de 2:500 000 por 5 kilm . e no maximo a 4:000$000, vê-se que
não peco por deficiencia, senão por excesso. As 30 ou 35 legoas
de uma margem e as 35 da outra préfazem 70 legoas ao longo
do Jaguaribe e do Salgado, as quaes á 4:000 $000 sommam
336:000 000 , somma muito inferior a que produz o calculo acima
de 900 contos.
Computando, grosso modo, em 700 contos o valor da pro-
priedade marginal destes valles e o juro deste capital á 8 %,
seria preciso para compensar osgastos da producção agricola,
levar a conta do passivo esta importancia, desfalcando -a por-
tanto dos lucros liquidos do lavrador.
Supponhamos que dos 110.000 hectares irrigaveis e nas
melhores condições de laboragem, uns 6000 estejam aproveita-
dos : quaes serão os lucros do agricultor por hectare ?
Antes de tudo devo confessar que a despeito do gran-
de desejo que tenho de acertar e das pesquizas repetidas
que fiz para obter esclarecimentos minuciosos sobre este
assumpto, não dou por incontroversos os dados sobre os quaes
pretendo basear a minha argumentação. Mas acredito que elles
se approximam muito da verdade, e salvo excepções mui locaes,
representam a media, com tendencia ao exagero, para mais de
que para menos, na parte relativa as despezas das explorações
agricolas.
530

O serviço preliminar do lavrador é abater o matto quando


finda a colheita, reunil -o em aceros e queimal - o, afim de prepa
rar o solo para receber as sementes . Apoz isto segue -se até as
proximidades das chuvas a construcção de cercas toscas, apro-
veitando o matto abatido. Geralmente a braça de cerea custa
de 300 a 400 rs. e a derruba e queima de matto não demanda.
para 3 hectares, mais de alguns dias.
São estas as bemfeitorias a que acima me referi quando
computei no duplo o seu valor sobre o das terras.
Um roçado com 3 hectares de terreno [ area de 10 tarefas]
plantado de algodão e milho, pode produzir 10 a 12:000 litros
de milho e 200 a 250 arrobas de algodão em caroço ou 65 ar-
robas de algodão em pluma.
Regulando a 50 rs . o litro de milho ter-se - ha 500$000 para
os 10 mil e á 7$500 a arroba de algodão - 487$000 para as 65
arrobas. A renda , afóra a criação miuda , o feijão etc., para uso
domestico, ascende, pois, a I :000 por 3 hectares ou 300$000 a
3334000 por hectare. Os 6.000 hectares plantados deverão pro-
duzir 1.500 a 2.000 contos de reis brutos.
As despezas serão, em primeiro lugar, como já vimos, o
juro do capital empregado em terras e bemfeitorias, ou 56
contos a 8 % sobre 700 eontos ; depois as sementes, limpas,
conservação de cercas , colheita . e transporte até o mercado
consumidor.
As sementes custam pouco e não valem mais de 2$000,
no maximo, por hectare: as limpas são dadas nas lavras de algo-
dão duas vezes por safra, uma no meiado do inverno, quando
a vegetação estranha começa a impedir o crescimento da plan-
ta cultivada, outra depois para facilitar mais tarde a colheita.
A primeira limpa é feita á enxada e requer o serviço de 1 ho-
mem por 5 a 6 dias por cada hectare ou cerca de 3 semanas
pelos tres hectares, o que expresso em dinheiro. equivale á
224000 rs.
A conservação das cercas será a importancia dos 8 a 10
annos que ellas duram.
A razão de 400 por braça, importarão os 800 m. dos 3
hectares em 1464000 ou 18$200 por anno. Quanto a colheita,
tomarei por base a do algodão.
531

Um homem laborioso pode colher por dia 3 arrobas de al-


godão em carôço [ 1 ].
Para as 250 arrobas dos 3 hectares serão necessarios 66
dias e outro tanto para a colheita do milho ; ao todo 132, os
quaes á razão de 1 $200 prefazem 1584000. O transporte deve
ser computado por metade, porque faço o seu preço com os
descontos da venda in loco. Pode - se accrescentar para o acondi-
cionamento e frete até o mercado 10 % do preço de venda ou
100 $000 pelos 3 hectares.
Resumindo, tem- se para esta área a seguinte despeza-
semente 6$000 , limpas 228000 , conservação de cercas 18 $200 ,
colheita 158 000. despezas complementáres, transporte 100$000
total - 304$000 ou 101 $333 por hectare.
Assim as despezas com a cultura dos 6.000 hectares im-
portarão em 608 contos e com os 56 do juros do capital em-
pregado nas terras e bemfeitorias, 664 contos. Sendo a recei-
ta de 1.900 a 2.000 coutos, ficam liquidos, 1.300 com que sub-
sistem cerca de 35 a 40.000 pessoas, destribuidas pelo
Aracaty 12.000 pessoas
Russas 7.000 66
7.000 66
Jaguaribe
R.do Sangue 1.000
Icó 8.000

35.000
das 50.759 das respectivas comarcas, das quaes nos dá conta o
recenseamento de 1900 - Resulta destes calculos que o liquido ,
por pessoa, dedusida em parte a alimentação obtida pelas so-
bras das culturas, é de 35 a 37+000, comprehendidos neste com-
puto os jornaleiros que receberam o respectivo salario .
E' preciso não esquecer que esses dados se referem aos
annos regulares, quando a agricultura nenhum tropeço encon-
tra no seu desenvolvimento. Effectivamente o saldo por pes-
sôa é maior, não só porque deduzi os avanços feitos ao jorna-

[1 ] No Egypto 1 homem trabalhando bem não pode colher


mais de 100 rotolis de algodão em caroço , o que corresponde a
45 kilos, uma menina 20 a 25 kilos.
Henri Lecomte - Le coton en Egypte- Paris - 1905 — pg . 66.
532

leiro, como por comprehender no calculo os menores que re-


presentam cerca de 30 % da totalidade dos habitantes, sendo as
suas necessidades mui reduzidas.
A creação do gado é sem duvida mais productiva nos
annos regulares, e se bem que exija maiores capitaes e mais
terras, demanda por outro menos trabalho. Infelizmente on
felizmente é a industria do abastado : sendo a lavoura a
do pobre .
Raras são as grandes lavras exploradas com intuito
industrial.
O sertanejo vive sobriamente, contentando- se com a ali-
mentação, em grande parte vegetal, que lhe dá sua roça, com a
pequena creação domestica de aves e gado miúdo, não tendo
grande necessidade de roupagens grossas ou pezadas para pre-
servar-se das intemperies ou rigores do clima, como nas zonas
frias. As suas vestes são de algodão fiado em casa em teares
grosseiros. Só nas povoaçõees, onde prevalecem os costumes
tomados ao europeu é que as suas necessidades augmentam.
Mas um facto que observei muitas vezes. é que apparen-
temente indifferente aos confortos da civilisação , o sertanejo
raramente se afferra a rotina : ao contrario, aceita com facili-
dade qualquer melhoramento, imita - o, e com a lucidez de intel-
ligencia que o destingue afaz-se depressa aos novos habitos ou
a nova condição.
A prova disto está nas crescidas levas de emigrantes que
deixam o solo cearense em busca de contestadas vantagens
em paragens longinquas e doentias.
E' bem certo que a necessidade se torna a principal mes-
tra da vida, a fonte donde manam os engenhos mais proveito-
sos creados pelo homem. A necessidade de subsistir nas epo-
cas calamitosas das seccas, que infelizmente se tornaram frequen-
tes, depois de 1888, forçou o sertanejo a desampaiar os lares
patrios por outros menos rudes . Estabelecida a corrente, nunca
mais foi possivel estançar.
O melhor proveito, apar de muito males causados por esta
emigração, foi o dilatar os horisontes ao camponio em contacto
com civilisações adiantadas.
O receio de insucesso, portanto, que em outros partes ,
particularmente na India ingleza, assalta os poderes publicos
533

ou emprezas de melhoramentos pela ignorancia e opposição


do povo, é de todo ponto vão no Ceará.
Pode-se com certeza contar com o concurso sempre crescen
te das populações ribeirinhas do Jaguaribe, e, pelo exemplo ,
com o daquellas que se entregam hoje aos azares da cultura
em terras seccas, apenas humedecidas na estação pluviosa .
Eis em substancia o que concerne a agricultura do vale do
Jaguaribe.
AS CHUVAS E AS IRRIGAÇÕES IMPERFEITAS EM RELAÇÃO A
LAVOURA DO CEARÁ O Sr. Omeara, nos quesitos que me di-
rigio, procura saber quaes as vantagens que o Ceará e a Em-
preza do Açude de Lavras poderão auferir da producção do
algodão, capim, arroz, milho, feijão , mandioca , fumo , etc. , re-
sultante da irrigação das terras que actualmente são humede-
cidas pelas chuvas na estação propria.

Preciso para responder - lhe devidamente expôr o modo


como presentemente se faz a cultura do algodão e das demaes
plantas apropriadas a zona irrigavel do açude de Lavras , e
qual os melhoramentos de que são succeptiveis com a applica-
ção de processos culturaes aperfeiçoados, tendo por base a irri-
gação methodica.
No Ceará, e creio que em parte alguma do Brasil, não se
conhece o emprego de aguas, armazenadas em reservatorios
ou derivadas de fontes, na agricultura. As regas, que, nas serras
de Maranguape e nas encostas do Araripe se fazem, não obe-
decem a principio algum, nem consultam as necessidades agri-
colas para lhes dar opportuna satisfação, sendo ao contrario, não
poucas vezes, mais nocivas que beneficas á vegetação das plan-
tas por esta mesma inopportunidade.
Muito embora essa falta concorra para inutilisar parcial-
mente os beneficios das irrigações, é patente a sua excellencia ,
quando se comparam os terrenos simplesmente humidecidos du-
rante o inverno aos que o são por aquelle methodo defeituoso .
Poucas, bem poucas, são as culturas que compartilham os
favores da irrigação. Salvo, talvez, a canna, o arroz, o capim
de planta, e alguns pomares na serra de Maranguape , onde o
portuguez laborou ou já mostrou a sua efficacia, nenhuma ou
tro os recebe. A regra geral é entregal-as a incerteza da sorte,
534

a inconstancia das estações, que tantos desastres teem occasio-


nado desde 1877 para cá.
Quasi não se passa anno sem que este proceder traga dam-
no a lavoura. Frequentemente annunciam- se as chuvas em
dezembro por aguaceiros mais ou menos copiosos. Os lavrado-
res, crentes de que o inverno realmente vai começar, apres-
sam-se em fazer plantações. As sementes germinam, mas com
a suspensão das chuvas, definham e morrem , quando a lagarta
não se apressa em devoral- as. Ensaios como estes repetem- se
as vezes em janeiro e fevereiro, sem comtudo abater completa .
mente o animo do agricultor. Pode-se com o registro pluvio-
metrico na mão verificar as decepções soffridas pelo lavrador,
de certos annos a esta parte. Como exemplo, basta recordar os
annos decorridos depois da grande secca de 1877 á 79. Em
1879 cahiram pequenas chuvas a 4, 7, 8, 9, 10, 11 de Janeiro ,
e depois a 19 e 21 do mesmo mez. Pequenas chuves, quasi ne-
blinas. succederam-se a 29 de Janeiro, 10 , 18 de Fevereiro,
qnando a 23 deste mez uma batega d'agua de 27 mill. tornou
a reanimar a esperança de inverno, para desilludir logo depois.
Em 1880 chuveo a 9 e a 10 de Janeiro. Desde 19 de dezembro
de 1880 começaram as chuvas (attingindo a do dia 31 do mes-
mo mez 28 mill ) e se prolongaram até 2 de Janeiro de 1881. Só
a 7 de fevereiro seguinte recomeçaram ellas regularmente. Em
1885 cahio a primeira chuva a 12 de fevereiro. Em 1886 a ul-
tima queda regular d'agua em Janeiro foi a 24 e só a 13 de fe-
vereiro tornou- se o inverno normal. Em 1888 foram chuvosos
os dias 11 , 13, 15 e 16 de Janeiro, cairam neblinas a 3, 7, at-
tingindo no dia 10 a 75 mill. , á 11 , 21 , 28 de fevereiro ligeiras,
neblinas, á 29 chuva de 13 mill. Em 1889 o inverno foi escas-
sissimo. Em 1891 chuveu bem a 17, 18, 19 e 24 de janeiro, e
so á 28 de fevereiro seguinte recomeçou o inverno. Em 1892 só
a 10 de fevereiro vieram as chuvas regulares.
Como se vê destes dados, a irregularidade da estação pluvi-
osa é quasi a regra.
E industrias que estão tão intimamente dependentes della,
qual a agricultura e a creação, entregues a azares repetidos,
não poderão prosperar, porque a incerteza de bom exito entibia
a actividade do sertanejo, e affasta para longe o capital, sem-
pre desconfiado .
535

A' despeito de tantos obices ao desenvolvimento economi-


co deste Estado, a sua prosperidade não fica aquem da de ou-
tros, mais bem dotados pela natureza : e não falta ao cearense
espirito de emprehendimento, ou desejo de libertar- se da fata-
lidade que pesa sobre o seu solo natal. A idéa, bem que em-
brionaria das irrigações, entrou no animo de todos, e açudes
de parede de terra, que a traduzem praticamente, são annual-
mente construidos as dezenas. Por um inquerito incompletis-
simo, feito na administração do presidente Ottoni, havia na
provincia cerca de 2500 açudes pequenos em 1885.
Presentemente este numero deve exceder de 5.000 .
Tive occasião de observar o prodigioso effeito das filtra-
ções de alguns destes açudes no rigor do verão de 1890 ( dez").
na zona banhada pelo riacho do Rosario, nas encostas da serra
de S. Pedro. Varios proprietarios de terras barraram o riacho
em alguns de seus pequenos tributarios e em sitios differentes
por meio de argila e arêa.
As filtrações, e se não estou enganado, a tomada d'agua
por encanamantos, collocados na parte inferior da parede, hu-
mediciam áreas de 10, 20 e talvez de 30 á 40 hectares de
cannaviaes, bananeiras, etc., cuja verdura contrastava como
negrume dos troncos seccos, do matagal carrasquento e espi-
nhoso que rodeava aquelles sitios.
Como este, muitos outros factes identicos, poderão ser
lembrados, pois não são raros os possuidores de açudes que
os aproveitam para plantações de canna ou capim ( 1).

[1] Dentre alguns açudes existentes no Rio Grande do


Norte escolherei em primeiro lugar o do Cauassú, propriedade
do Sur. Joaquim da Virgem Pereira, encravado no municipio
do Acary, um dos mais seccos do Estado.
A área inundada é de 1452.000 m. quad. , o comprimento
da barragem 330m ; altura 7,7 ; espessura da base 30m 8.
A barragem é toda de terra e o custo de construcção foi
apenas de 8.000$000.
O rendimento tem sido, desde 1903, epoca em que foi
construido, de 20.000$, incluida a producção de jusante, cor-
respondente a 841.840 m 2 irrigados com a agua do açude .
O proprietario dividio todo o terreno cultivavel em peque-
nos lotes, que destribuiu com familias pobres para trabalha-
536

Infelizmeute, taes reservatorios, por suas acanhadissimas


bacias, pela fraca quantidade d'agua que represam . mal po-
dem resistir a evaporação activa dos mezes seccos. quando os
ventos, auxiliados pelos raios solares, desseccam-nos como por
encanto em poucas semanas.

Felizes ainda são os que habitam as suas margens, quando


não soffrem os effeitos da decomposição vegetal, da elaboração
dos miasmas ou dos micro- organismos que os caldeirões dos
açndes, apenas cobertos por aguas lodosas, cultivam prodiga-
mente para infeccional- os lenta e perseverantemente.
Essas rapidas considerações tem por fim mostrar como
actualmente o solo é aproveitado nos valles do Ceará, qual o
methodo de cultura seguido, e quaes os resultados economicos
retirados das explorações agricolas.
QUAL A PRODUÇÃO DA PLANICIE DO ICÓ COM O AUXILIO
DA IRRIGAÇÃO. - Na hypothese da construcção do açude de
Lavras em 4 a 5 annos, e admittindo que os trabalhos de irri-
gação para os 10.000 hectares do valle do Icó comecem ao mes-
mo tempo que a grande barragem, é licito crer que até a entra-
da do 3º anno a mór parte, senão a totalidade destes serviços,
esteja concluida.
Por sua vez, a muralha principal no fim do inverno do 30
anno, quando a necessidade d'agua se fizer sentir para a lavou-
ra, já estará em altura de reprezar uns 100 milhões de metros
cubicos, e do açude poder iniciar o seu abastecimento d'agua
áquella região .

rem de parceria. Producção : 140000 litros de arroz , a 100 rs. o


litro (metade ) 7.000$000 : G000 arrobas de algodãc a 3$ = 9: 000$;
cereaes e engorda do gado 4.000$000 .
Outro açude no municipio do Acary, o dos Garrotes, con-
struido pelo Sr. Felix de Araujo Pereira--passa por ser o me-
Thor do Rio G. do Norte. A sua barragem é de terra e tem
214m de comprimento e 13m,20 de altura ; custou 12.500$. Sua
renda liquida pode ser avaliada em uma media de 10 :000$000
annuaes, inclusive o peixe.
Dr. Eloy de Sousa - Seccas do norte e cabotagem nacional
-Rio de Janeiro 1905 -pag. 42-43.
537

Não será demasiado, no calculo da producção provavel da


lavoura, admittir que ao menos metade das planicies do Icó,
(sejam 5000 hectares) possa ser convenientemente laborada
dentro do 3 anno da construcção do açude : 6.000 hectares no
4º, 7.000 no 5º , 10.000 no 6º e dahi em diante á razão de 3.000
a 5.000 hectares por anuo até o maximo que permittir a po-
pulação do valle e a que for sendo para elle attrahida.
A área aproveitavel em todo o valle do Salgado e do Ja-
guaribe equivale a 100.000 hectares, talvez mais. Do Aracaty
ao Boqueirão de Lavras contam- se 58 legoas ou 290 kilometros
legoa de 5 kilom . ] Desprezando -se por imprestavel ou de dif-
ficil trato 90 kilom . e tomando sómente 200 kilom. com a lar-
gura media de 3 kil . para cada lado do rio, tem- se 1.200 kilom.
quadrados ou 120.000 hectares. Quem conhece o valle deste rio.
sabe que a horizontalidade de suas margens alarga-se por
muitas legoas, 8 a 12 kilometros, não sendo exagerada, senão
baixa, a proporção de 100 a 110.000 hectares para área verda-
deiramente aproveitavel
Serão precisos 15 a 20 annos para o seu total aproveita-
mento, conforme a affluencia de capitaes e de braços para a
agricultura.
Qual será a renda dos 5.000 hectares na hypotheso do sys-
tema cultural em grandes lotes de 50 hectares e com o minimo
de despezas possivel ? Por outra, com a agricultura extensiva
ou com os processos actuaes, tendo apenas a agua de mais,
qual será a renda provavel da lavoura ?
Attendendo -se a qualidade do terreno, (todo de primeira
qualidade ) sem levar em conta a sua composição, senão as facilida-
dades que possam offerecer ao plantio, as bemfeitorias, fiscalisa-
ção, colheitas e sahida ou venda dos productos agricolas, deve
ser aproveitado em lavras de differentes especies, quaes sejam :
o algodão, a canna de assucar, os cereaes , a mandióca, o fumo,
prados e fructeiras, segundo a maior renda do capital empre-
gado.
Dos 100 lotes de 50 hectares, admitto que 40 sejão destina-
dos a canna de assucar, 25 ao algodão, milho, feijão mandióca,
15 ao arroz, 10 a prados, 5 a fumo e 5 a fructeiras : por outros,
teremos 2.000 hectares á canna ; 1.250 ao algodão e cereaes
750 ao arroz, 500 a prados, 250 a fumo e 250 a fructeiras
538

Não ha necessidade, ao menos nos primeiros annos, de reservar


terra para afolhamentos futuros, e nem de deixal- a desapro-
veitada por falta de capitaese braços que a roteem.
A propria companhia ou o Estado, constructor das obras
de irrigação, deverá ter á mão um certo numero de trabalha -
dores seus, que conheçam praticamente o serviço e sirvam
como que de mestres aos indigenas. Occorre -me lembrar al-
gumas familias lombardas e uma dezena de chinezes das pro-
vincias meridionaes, onde a pratica das irrigações é muitas vezes
secular, tocando quasi perfeição com o aproveitamento mais com-
pleto d'agua, dos adubos e das machinas agricolas. Na China as
culturas de algodão, arroz, milho, feijão e outras identicas as
nossas, attingiram o mais alto gráo de desenvolvimento , sen-
do difficil exceder a sua producção por unidade territorial.
Accresce que o trabalhador chinez é de una sobriedade sem
igual, intelligente e o mais barato que é possivel encontrar.
Com o capital, embora estrictamente essencial para esse
genero da cultura, e com braços affeitos a pratica das irriga-
ções, pode se assegurar a empreza um exito, além do que ella
espera.
Presentemente um dos maiores embaraços á lavoura, em
escalla maior do que a ordinaria, é, não a carencia absoluta de
braços, mas a falta de permanencia ou constancia no trabalho .
A facilidade com que o solo produz, a relativa sobriedade do
cearense, affeito a escassez dos verões prolongados, a instabi-
lidade da população masculina: e, mais do que tudo, a fascina-
ção que sobre ella exerce o El dorado do Amazonas, onde es-
pera encher facilmente as mãos de ouro, e na maioria dos ca-
sos, só encontra enfermidades, devidas á insalubridade do cli-
ma e a prolificação de a.opheles das margens dos rios, a mise-
ria e todos os horrores da expatriação : o espirito de aven-
tura do povo, tantas vezes arrancado aos patrios lares pelas
grandes calamidades das seccas ; tudo isto concorre para tor-
nar o cearense inconstante na lucta pela existencia.
As fortunas sertanejas consistem, na sua maioria, em fa-
zendas de crear, e em lavras nas vasantes dos rios e de lagôas.
ou na revencia de açudes. Nas quadras calamitosas, quando os
alongados verões destroem toda a vegetação e o gado pere-
ce de fome e sêde, como que se evaporam aquellas economias,
539

e o mais rico fica nivelado em bens de fortuna com o mais


pobre.
Esses vaivens da sorte, repetidos amiude, acabam por le-
var ao fatalismo o já propenso espirito, insciente, desses po-
bres compatriotas, sob a forma um tanto surpérsticiosa da
crença n'um ser supremo, tão inplacavel como o Jehaveh dos
judeos, quando para castigar os tresmalhados da fé nosaica,
ordenava a matança ou o exterminio completo de populações
inteiras, inclusive as proprias crianças. Este fatalismo que se
annuncia pelo- Deus quer-abate todas as energias, suffoca todo
o sentimento de reacção e gera o beatismo supersticioso, que
actualmente impera nas camadas inferiores e medianas da so-
ciedade cearense .
Cumpre reagir contra este estado de cousas, e o mais se-
guro proceder, é regularisar, nos limites das forças humanas,
as estações desiquilibradas, assegurando ao trabalho a sua ne-
cessaria regularidade, e ao capital a certeza de sua conserva-
ção remuneradora
Cessando a causa principal da instabilidade na fortuna
particular, irão pouco a pouco os animos, avessos ao methodo
e as condições normaes do trabalho industrial, cedendo ás
vantagens do novo regimen, identificando -se com o solo, como
o francez ás suas terras.
Quando muitas outras razões, cada qual mais valiosa, não
aconselhassem os poderes publicos a enveredar resolutamente
pela estrada larga dos melhoramentos deste genero, bastariam
as que acabo de expor para dissipar qualquer indecisão.
Ninguem ignora que nos annos de invernos regulares, e
durante a estação que elle beneficia, reina abundancia, bem
estar e prosperidade no Ceará. Durante 5 a 6 mezes as cultu-
ras se desenvolvem exhuberantes e produzem de modo a com-
pensar amplamente os encargos do lavrador.
D'aqui resulta que o aproveitamento dos 6 ou 7 mezes
restantes do anno depende tão somente da humidade roubada
ao solo pela evaporação e seccura na estação estival.
Ora, sendo a media dos invernos no sertão de 800 mil a
900 millimetros, e sabendo-se que mais de duas terças
partes desta quantidade deslisam pelo solo, e correm pelos
leitos dos rios para o mar, em pura perda, e que só uma fracção
540

bem pequena atravessa as camadas porosas da terra até a ro-


cha impermeavel , formando o lençol d'agua subterraneo, além
da que se evapora a superficie das terras, verifica -se, sem pre-
cisar de recorrer a volumosos tratados de meteorologia, que
só uma minguada porção das chuvas é realmente aproveitada
nos mistéres agricolas. Póde- se dizer, sem receio de errar, que
apenas 300 millimetros d'agua, caida em fórma de chuva, são
realmente utilisados, perdendo-se os 500 ou 600 mil. exce-
dentes.
Eis o grande mestre que nos mostra claramente o meio
de aproveitar os dons da natureza. Em lugar de deixarmos
deslisar-se para o mar á riqueza que as nuvens nosenviam, deve-
mos guardal-a, enthesoural-a nos cofres fortes que se chamam
grandes açudes.
Essa digressão arredou-me da demonstração incetada, de
saber quanto produziriam os 5.000 hectares, divididos em par-
cellas, da área irrigavel, no fim do terceiro anno da construc-
ção do acude de Lavras eis- me voltado para ella.
Ao findar o inverno do 3º anno da construcção do açude
de Lavras, 5.000 hectares, dos 10.000 que formam a plauicie
do Icó, isto é, da área mais proxima do açude, poderiam estar
com o serviço de irrigação prompto, capaz de dar os pri-
meiros rendimentos á empreza ou ao governo que directamen-
teo explore.
Não me referi a venda d'agua do açude. neste primeiro
trecho dos trabalhos, jé porque convem ao constructor de-
monstrar praticamente a excellencia das irrigações, já por sup-
por que elle será o proprio explorador d'aquella área cul-
tural.
Admitti, como provavel, que esses terrenos podesssem se
prestar á differentes lavras em lotes de 50 hectares, destribuidos
da seguinte forma : 2000 hectares para o plantio da canna ;
1250 para o do algodão, milho. feijão, mandioca ; 750 para o
arroz : 500 para prados artificiaes (alfafa e outras forragens ),
250 para o fumo e 250 para fruteiras.
Affirmei anteriormente que um roçado com 3 hectares de
terreno [ cerca de 10 tarefas ] plantado de algodão e milho pro-
duzirão 12 a 15.000 litros deste cereal e 230 a 300 arrobas de
algodão.
541

E' esta a orcasião de adduzir factos comprobatorios d'aquel-


la asserção, que a primeira vista pode parecer exagerada.
ALGODÃO. --Affirma o Sr. Revy (já citado) que 1 hectare
de algodão produz 250 kilos em pluma e 5 a 10 vezes mais com
o auxilio do arado e da irrigação No Assaré, segundo me in-
formaram varios agricultores, esta área produz 370 a 380 ki-
los em pluma. Em Sergipe a mesma área dá até 705 kilos [ 1 ]
e em alguns sitios privilegiados 1920 kilos : no Rio de Janeiro
produz 370 kilos : em S. Paulo 960 kilos : [2 ] no Maranhão,
de 375 a 1090 kilos [ 3].
Vé-se d'aqui que a media de 1200 kilos em caroço ou de
350 em pluma não excede a normal, ficando ao contrario
muito abaixo. [ 4]
Na hypothese, portanto, de uma cultura sem irrigação uos
1250 hectares da planicie do Icó seria o producto de 500 :000
kilos de algodão ein pluma.
Admittindo, porém, para os terrenos irrigados a media ob-
tida em regiões de clima semelhante ao do nosso sertão, como
o Egypto, a Argelia , etc., a producção será maior.
Segundo Barrois [ 5 ] em cuja autoridade já me apoiei, 1
hectare de terreno produzia no Egypto, no começo da cultura
do algodão, 600 a 700 kilos de la limpa de 1ª qualidade.
Nos estados centraes do Mississipi [ Estados Unidos ] o al-
godão upland dá 535 kilos em pluma por hectare, e 700 a 1000

[ 1 ] Dr. Nicolau Moreira --Notas agricolas pg. 65.


(2) Dr. Nicolau Moreira obr. cit. pag. 82.
[3 ] Dr. Carneiro - Agricultura no Maranhão,
(4 ) No Ceará o algodão bem cultivado pode produzir mui-
to mais do que actualmente. A base mais segura para o caleu-
lo da producção no valle de Jaguaribe deve ser regulada pela
do Egypto ou India. A do Egyto seria alta dada as qualidas ter-
tilisantes das innundações do Nilo : a de Bengala e Occidente
da India muito baixa por ser o elma cearense muito superior ,
mais igual e mais exhuberante de vegetaçã . Ronna, no seu
livro sobre Irrigação i vol. 3ª pag 465), dá para aquelle 595 ki-
los por hectare, e para esta 460 , Pode-se pois admittir como
base certa a producção de 500 kilos para o Valle de Jaguaribe
dada a sua irrigação. O Meara - relat. cit pag. 19.
[ 5 Barrois Les Irrigations en Egypte pag. S 109.
542

nos do golfo do Mexico, segundo Marini [ 1 ] . O sea island ou


longa seda, que é cotado de 3 a 9 vezes mais alto em Liverpool,
produz 250 a 300 kilos limpos em pluma. Na Italia, a produc-
ção, se bem que contrariada pelas geadas, é de 360 a 400 kilos
por hectare. Na Argelia 1 hectare de cotoniers auquel on à
prodigué l'eau dans les premiers mois pour activer la végétation,
donne un bénéfice net plus élevé qui celui de deux hectares
auxquels on aurait économisé l'irrigation (2).
Destes factos deduz-se que a media por mim adoptada de-
veria ser dobrada para attingir a verdade. Dou tão somente
50 % de accrescimo on 600 kilos para o hectare, o que elevará
a producção dos 1250 á 750000 kilos de algodão .
Nessa mesma área faz- se a cultura do milho, da mandioca
e do feijão, entremeiando as covas do algodbeiro com a destas
lavras.
Nos Estados Unidos é costume preceder o plantio do algo-
dão pelo do milho, mas no Ceará fazem- se ambos ao mesmo
tempo. Tomarei da área plantada do algodão 1000 hectares pa-
ra a mandioca, 200 para o milho e 50 para o feijão. afim de
proceder ao calculo da produção de cada um .
MILHO -produz em 90 dias e nas terras irrigadas duas a
quatro colheita. No Ceará dá de 1 a 300 e excepcionalmente até
600 : em S. Paulo 1 para 150 em cada colheita, regulando 3
por anno ; no Parană 1 para 150 por colheita (3 por anno) ; no
Matto Grosso e Espirito Santo 1 por 200 a 300, na ilha de Fer-
nando Noronha 1 para 400. Em S. Paulo a producção por co-
Theita e per hectare é de 1820 litros ou 5490 pelas 3 colheitas
annuaes : sendo que no municipio de Palmeiras eleva -se a 3200
por cada colheita, segundo a bella obra official : a Provincia de
S. Paulo - publicada em 1888. Muitos agricultores cearenses
asseguram-me que em 450 palmos em quadro ( 1 hectare) colhem-
se 7 a 9000 litros de milho. Não pude verificar o facto pessoal-
mente, mas acho a proporção exagerada. Verdade é que leio
no magistral livro de Ed. Lecouteux, professora de gricultu-
ra no conservatorio de Artes e officios, de economia rural
no Instituto agronomico de França - Economie rurale, [ 3] que

[1] Marini .. Della cultivacisne de cotoni guziana e georgia.


[2] Ronna-des irrigatines vol. 3 pg. 725.
[3 ] Leconteux -Economie rurale pg. 173.
543

a colheita por hectare de milho verde é nos bons terrenos de


8000 kilos, e a do milho secco 6.000 kilos de grão e 12000 de
palha forragem . Em Portugil, segundo Paulo de Moraes, ( 1 ) a
produção é de 4560 á 6000 kilos de grão e de 30 a 60000 kilos
de forragem verde .
Tomando como media da producção ponco mais de metade
do que me affirmam ser a real, ou 5000 kilos, os 200 hectares
darão 1.000.000 kilos.
Em S. Paulo, ha tres colheitas : no Ceará planta-se ape-
nas 1 vez na epoca pluvial e nos logares baixos, mas nas serras
frescas, como as de Baturité e Grande, repetem - se as colheitas.
Quando no sertão a vegetação está queimada, em Dezembro, na
Serra Grande o milho viceja e floresce, como tive occasião de
ver em 1891.
A abundancia das safras nos invernos regulares é tão gran-
de que o preço da venda nem sequer compensa o trabalho da
colheita. Em 1881 atravessei leguas e leguas entre Iguatú. S.
Matheus, Varze Alegre e Lavras, nas quaes boa parte dos mi-
lhos nos roçados haviam sido abandonados e entregues aos
animaes de carga por não terem preço e os paióes ( celeiros fei-
tos de palha em fórma de cabana, a certa altura do chão ) esta-
rem repletos.
As despezas de transporte são tão onerosas que não raro é
preferivel importar dos Estados Unidos para o litoral á mandar
buscal- o do sertão e serras do interior.
Acredito que com o prolongamento das vias ferreas exis-
tentes no Estado e com tarifas baixas, a producção do milho
se alargará consideravelmente de modo a alimentar a ex-
portação.
Nos Estado Unidos esta cultura constitue não só a gran-
de exportação, de 59 a 60 mil contos de valor, como uma rique
za de primeira ordem por ser a base da alimentação nos esta-
dos do centro. oéste e sul. e a principal forragem para a crea-
ção do porco e animaes domesticos .
Para se fazer a idéa approximada da producção ame-
ricana e da concorrencia que ella faz ao resto do mundo , bas-

[ 1 ] Paulo de Moraes - Manual do Agricultor pag. 191 .


544

ta saber- se que nas grandes fazendas de Illinoes e Towa a despe-


za da producção de um alqueire de milho regula de 200 a 500
réis, sendo de 900 réis a media para as pequenas plantações.
Dando 15 % para o lucro do fazendeiro, 7 % para o transporte
a Chicago, diz o Dr. S. Coutinho, [ 1 ] temos que o alqueire de
de milho chega ahi por 1 $ 100 e a Nova York por 1 $600 . Quan-
do ainda muito barato, eu sta este genero no Brazil o dobro ou
mais 50 % do que nos Estados Unidos.
O Sur. O' Meara, no trabalho a que me tenho referido, diz
deste cereal que "elle é produzido no Ceará somente para o
consumo local, mas que ainda assim a producção é muito
grande. O custo do transporte afasta completamente a possibi-
lidade de exportal-o com proveito A producção cearense é
na media estimada em 4.600 litros por hectare que será ven-
dida em Fortaleza por £ 25.
Se houvesse um bom serviço de transporte esses 4.000 li-
tros não importariam em mais de £ 6 na Fortaleza e Pernam-
buco ou £ 8 no Rio, dando mais vantagem do que o al-
godão. (2)
MANDIOCA. --E' o 3º producto a que me referi. Sobre a
sua producção diz o Snr O'Meara, que ella é toda consumida
no Estado, porém que em anno de secca é largamente impor-
tada.
Sua producção por hectare é de 600 litros. Com agua suf-
ficiente esta poderá ser duplicada ou mesmo triplicada. I am
of opinion that it would be, perhaps, the most lucrative produce of
the Jaguaribe Valley.
( Sou de opinião que esta cultura será, talvez, a mais lucra-
tiva do valle do Jaguaribe ) . E accrescenta : it will be seen later
on, that at avery 6 kilom. or o along the canal there would be an
abundance of horse power avaitable for mills required to extract
the flour, starch, etc., from the root.
A consideração de se poder aproveitar a agua dos canaes
de irrigação como motor para accionar moinhos de fariuba
etc., é ainda um argumento subsidiario em favor do açude.

11 ] Dr. S. Coutinho - Relatorio sobre a exposição de Phila-


delphia,
121 O'Meara - Irrigation in Jaguaribe Valley. pag. 20 .
545

Tomando -se por termo de comparação a producção de fa-


vinha de mandioca em outros Estados do Brasil chega - se a
conclusão muito mais satisfactoria do que a tirada por este
profissional. Sirvo - me dos dados officiaes de pessoas bem infor-
madas.
Na obra mandada organisar pelo governo imperial sobre
o Estado do Paraná ( 1 ) lê -se que uma área de 5 hectares pode
couter 40.000 pés. os quaes produzem, mesmo nos terrenos
fracos, 36.720 kilos de tapioca, que á preço de 1 schiling por
kilo dão mais de £ 2.000 (actualmente cerca de 30 coutos ou
6 contos por hectare].
No Pará, em 330 metros em quadro, obtem-se 7.372 litros
de farinha . ( 2 )
Pode-se tomar por media a quantidade de 1 1/2 litro de
fariuha e 1,2 de gomma por pé. Num hectare plantam-se
10.000 pés, guardando a distancia de 1 metro entre elles. Tomo
metade sómente desta quantidade ou 5.000 pés, que produzi-
rão 7.500 litros de farinha e 2.000 de gomma. Assim os 1.000
hectares produzirão 7.500: 000 litros de farinha no valor de
600 contos, á 80 por litro de farinha, e 2.000.000 kilos de
gomma, que a preço de 200 por kilo, darão 400 contos.
FEIJÃO. - Os 50 hectares restantes dos 1250 plantados de
algodão, na hypothese figurada , serão destinados ao feijão .
O de corda produz de 1 grão 200 em 5 mezes, podendo as
suas bages ser utilisadas desde o 3º mez Um hectare produz
800 a 1.600 conforme a qualidade do terreno. No municipio
de Palmeiras (S. Paulo) regula 700 litros [ 3] . O peso medio da
semente por hectolitro é de 79 kilog. Em Portugal semeiam
125 a 200 litros para colher 15 a 26 hectolitros [ cerca de 2000
kilog. por hectare ] segundo Paulo de Moraes [ 4]. A palha pesa
2.300 a 4.000 kilog. sendo excellente forragem.
Os 50 hectares poderão dar 75.000 litros de feijão, a ra-
zão de 1.500 litros por hectare, ou expresso em dinheiro - 15 a
20 contos.

[1] O Paraná -Informações para immigrantes, pag. 19.


[2] Dr. N. Moreira - Notas agricolas.
131 4 Provincia de S. Paulo em 1888 , pag. 473 .
[4) Paulo de Moraes - Obrá cit, pag, 199.
546

Recapitulando o renda provavel da área de 1.250 hectares,


segundo as suas culturas teremos ?
1.250 hectares de algodão a 600 kilog. por hectares 750.000 kil
os quaes a 600 por kit. ……….. 450:000$
1.000 hect. de mandioca [ eultura intercalada} a 750 li-
tros por hect. = 750,000 litros a razão de 80 reis 515:000$
200 hect. de milho a 5.000 kil. por hect. = 1.000.000
kilos a 70 reis 70.000$
50 hect. de feijão a 1500 kil. por hect. =75.000
kilos ou 15:000$

Total .......... 1.050 : 0008


A renda por hectare das terras irrigadas corresponde ap-
proximadamente a 1.050 000.
CANNA DE ASSUCAR -Em lugar competente quando tra-
tar do systema cultural no Ceará, estudarei os processos
adoptados nesta e nas demais lavouras deste Estado ; por ora
desejo tão somente demonstrar qual a producção por hectare
de canna no valle do Jaguaribe, dadas as facilidades da irri-
gação por meio do açude de Lavras.
As irformações que pude recolher sobre a producção da
eanna variam consideravelmente. O conselheiro Nicolau Mo-
reira dá 90.000 á 100.000 kilos de canna por hectare com a des-
peza de 36 á 37 %.
As Informações de immigrantes no Paraná, publicação of-
ficial, dão para 6 acres [ 2 hect. 468 ] 168.000 kilg. de canna ou
68.000 kilg por hectare.
Segundo o Dr. Pires de Almeida ( 1 ) I hectare no Brazil
produz 100.000 kilg. de cannas : no Perú 80.000 k de cannas.
O Sr. Robert Meriweather affirma que em S. Paulo 1 geira
produz 1000 k. de assucar ; em Campos 1 , hectare dá 3000 k.
de assucar . (Carneiro da Silva).
Em Essequibo [ Demerara] as boas cannas dão 5000 k. de
assucar por hectare [ Ronna]” no Japão 3700 kil. de assucar por
por hectare : no Egypto 23.000 k. de canna por hectare, na
média, e 62.000 k. no maximo ; na Martinica 2.500 k. de as-

[ 1 ] Pires de Almeida -L'agricul et les industrie du Bresil,


pag. 207.
547

sucar ; na Antigua 3.5000 k.; nos Estados Unidos 1.700 k. de


assucar e 1.300 k. de mel ; no Brazil a média é de 60 a 70 k.
de cannas por hectare : no Cariry 1 hectare produz 2580 a 3000
kil. de rapadura.
Meu amigo, coronel Cicero Franklim, intelligente agricultor,
proprietario da fazenda Monguba, á 30 kil . desta capitul, res-
pondendo- me acerca deste assumpto, escreveo :
"Nunca pesei todas as cannas de um hectare mais pelo de
uma carga, o ne de cargas em um dia e o nº de dias de corte,
calculo em 129.800 kilgr.
"As cannas aqui crescem 3 metros, termo médio, e as tou-
ceiras são geralmente de 5 a 14 cannas, sendo communs as tou-
ceiras de 32 cannas e não é raro encontrar -se de 45.

"As cannas raramente pendoam, o que acontece em Março


e Abril, quando as sóccas são, muito velhas e a estação das chu-
vas rigorosa.
"A densidade do sueco varia conforme o estado de matu-
ridade, seudo em julho 7, agosto 9 , setembro 10, outabre 12,
Beaumé.
Um hectare de boas cannas bem maduras produz em as-
sucar bruto 7.500 kilos e 4 pipas de aguardente ou 20 pipas de
aguardente". [1 ]
Penso que ha engano relativamente a producção de cannas
por hectare. Sendo a média no Brazil superior a de qualquer
outro paiz, salvo talvez o Perú, isto é de 60 a 70 toneladas,
como conceder o duplo ao Ceará, cujo sólo não é melhor que
o de Campos ou de Pernambuco ? Por outro lado, como ad-

[1] Informações posteriores de agricultores dos arredores


da Fortaleza [ Alagadiço ] discordam desta quanto a producção
da cauna por hectare. A 4 kilometros desta capital ( Fortaleza )
a canna é plantada em covas distanciadas de 2 a 5 palmos
uma da outra. Cada cova dá 4 a6 cannas com o peso medio
de 2 kilos por canna ou 10 kilos por cova. Num hectare pode-
rão ser plantadas 10 a 12000 covas, com o espaço para o transi-
to entre as cannas. A producção. portanto, será de 100 a
120.000 kiles por hectare , o que ainda excede da media geral.
Reduzindo- a a 70.000 kilos julgo approximar- me da
verdade .
548

mittir que com moendas e com processos tão primitivos quan-


to os nossos se possa extrahir da eanna mais 5,5 % de assuear,
além de uma parte não pequena de aguardente ?
Ha talvez lapso em relação a unidade ou ao ponto de par-
tida para calcular a producção . Reduzindo- a a metáde , ter - se-
ha a media geral no Brazil.
Assim, calculando em 70.000 kils. de canna a producção
por hectare, os 2.000 da área do valle do Iró, reservados ao
seu plantio. darão 140.000.000 de kilg. em cannas.
Ainda, tomando por base da producção em assuear 5%
do peso das cannas, ter-se-ba 7 milhões de kilos de assucar
bruto, além de 4.000 pipas de aguardente. Vendido o assucar
a 200 réis por kilo, os 7 milhões produzirão 1.400:000 $000 e as
4000 pipas a 100$009, cada uma, 400 000$000 ou 1.800:0004000
para o total. Cada hectare renderá, bruto , 900$000.
A construcção de um ou dous grandes engenhos centraes
que possam moer 1 : 400.000 k. de canna diariamente ou 140 mi-
lhões em 100 dias, será a consequencia de uma cultura tão
extensa e assim normalisada pelas régas opportunas e benefi-
cas do açude. Um engenho nestas condições com wagons. lo-
comotivas, trilhos de ferro, etc. , poderá custar de 4 a 5 mil
contos. A produção augmentará de 5% á 9 % e melhorará de
2 para 3 na peior hypothese . Em vez de 7 milhões, será a
produção do assucar de 10:000.000 kilos os quaes, ainda vendi-
dos a 200 réis, darão 2.500 contos, e o aguardente, notavelmen-
te melhorado, poderá dar mais de 5000 pipas com 50 % de fa-
bricação e qualidade superiores, rendendo no minimo 500 con-
tos. O valor total da producção será de 3.000 contos.
A renda por hectare com o plantio do algodão e cereaes
intercalados é, como ficou demonstrado, de 1 050$, como o da
canna de - 900$000. Concedido para não exagerar que a ren-
da por hectare não exceda de 800$000 na media, teremos
para os 5.000 hectares, do 3º para o 4º anno da construeção
po açude de Lavras --4.000 contos e para os 10.000 dos valles
do lcó 8.000 contos
Na hypothese de ser a barragem de Lavras erguida so-
mente a 30 metros para represar 750 milhões de metros cu-
bicos dagua, poderá a irrigação estender- se nos annos regu-
lares até 50.000 hectares, em 1 anno escasso a 40.000, em 2
549

seccos a 16.000 hectares, em 3 seccos a 9.000 hectares ; o valor


da producção variará naturalmente. acompanhando a escassez
dos productos. A cultura circumscrever - se - ha aos generos ali-
menticios de primeira necessidade, a criação do gado achará
refugio para se salvar do desbarato geral, como aconteceu
em 1877 a 79. Por sua vez o valle do Jaguaribe. cuja popula-
ção não excede presentemente de 250.000 hab., concentrará
grande parte da riqueza sertaneja, e poderá alimentar 500
mil pessoas em annos anormaes e 1 milhão nos regulares .
Poder se ha orçar o valor da producção total do valle
( 110.000 hectares irrigades ] em 60 a 70 mil contos, dos quaes
só os impostos directos e indirectos de consumo sobre mais de
500.000 habitantes darão para pagar os juros e amortisação
do capital empregado.
Em vez de uma operação aleatoria, de despezas impro-
ductivas por cada crise, tornar-se-ha fonte de riqueza, um
capital tão productivo quanto o do resgate da região acreana
a Bolivia
AÇUDE DE ITACOLOMY - E' o local cujos estudos foram mais
detidos. O Sr. Revy demorou -se ahi por muitos mezes, lançan-
do no seu relatorio, publicado no "Diario Official" de 1878, as
bases economicas para a construcção de obras deste genero no
Ceará.
Resumidamente seguem-se os dados apresentados por este
professional :
O lugar em que deve ser construida a barragem é forma-
do pelas ramificações da Serra grande, que depois de alargar-
se circularmente, desde as encostas da serra. estreita-se no
boqueirão por onde rolam as aguas do rio Itacolumy.
Este local fica a 70.000 metros do litoral, a 27.600 metros
de Granja e a 32.100 da cidade da Viçosa .
O leito do Itacolumy, segundo os calculos do Sr. Revy,
deve receber annualmente 370.000 : 000 de metros cubicos
d'agua ; quantidade subeja para alimentar o reservatorio.
O mesmo profissional, depois de examinar os differentes
typos de represa a adoptar, pronuncia- se pela de 30 metros de
altura com a capacidade para conter 192,633.000 metros cu-
bicos d'agua.
550

Eis a tabella que demonstra comparadamente a altura das


barragons, com o seu comprimento, volume de alvenaria, etc,

1010 Altura das barragens em metros.


1.095 117.000

425 23.650
866 52.710

Comprimento das barragens em metros,


174.207

10.000

Volume de Alvenaria em metros cubicos.


179.800
93.300
36.200
11.500
000:

3.600
000:

000:
000:

000:

Agua no reservatorio em metros cubicos de-


pois de 3 anuos e meio de secca.
1.254
1.457
2.560
2.807
1.025

Volume de alvenaria por mil metros cubicos


d'agua.
1.400 154050
690
376

Custo da obra em contos de reis.


300

480

300
680
12

17
24
34
$

$
$

Preço de mil metros cubicos d'agua depois


de 312 annos de secca.
3.100
1.200

Estensão de terreno irrigavel em hectares,


400

| depois de 31 2 annos de secca.

Como se ve dos dades acima. o preço de mil metros cu-


bicos d'agua, depois de 3 annos e meios de secca, ficará por
15 $050, ou menos de metade de que ficaria com a barragem de
15 metros.
Relativamente a acção benefica das aguas para as irriga-
ções do valle que se extende abaixo da projectada barragem
551

de 30 metros, diz o engenheiro Revy que ha cerca de 2.000


hectares de terrenos planos de primeira qualidade que podem
ser irrigados pelo reservatorio de Itacolumy.
Plantada a metade d'esses terrenos segundo os processos
modernos, com applicação do arado e outros apparelhos agrico-
las, e sendo a área irrigada durante a estação secca do anno,
produziria cerca de 10.030 fardos do melhor algodão, represen-
tando um valor de 1.000: 0004000 approximadente.
A outra metade dos alludidos terrenos poderia ser destina
da á producção de cereaes, quaes o arroz, feijão, milho etc..
bem como a forragem para o gado, em larga escala, plantan-
do- se a luzerna, o capim, etc. Este ultimo producto é de gran-
de importancia, do que dá prova a pastagem verde, que se po-
de obter de boa qualidade durante todo o anno nos terrenos
irrigados, a qual não só é favoravel a criação do gado em larga
escala, como tambem pelos seus effeitos dá incremento ao fa-
brico da manteiga, do queijo para a exportação, augmentando
além disso a quantidade de estrume que irá utilizar o terreno,
conservando assim o vigor das plantações e sua força pro-
ductiva.
Esta metade de terrenos irrigados, accrescenta o mesmo pro-
ficional, tomando o valor actual, não produziria menos do que
a primeira, porem desde que parte do seu producto fique nos
proprios municipios, podemos com segurança dizer que rende-
ria em dinheiro metade do que déssem os terrenos de algodão,
isto é, cerca de 500: 000$ por annos.
D'essas considerações se segue que o producto, em grosse,
dos referidos terrenos irrigado pelas aguas do reservatorio do
Itacolumy seria de cerca de 1.500 contos annuaes : deduzidas
todas as despezas, taes como : salarios a trabalhadores, impos-
to d'agua, arrendamento de terras, custo de transporte, com-
missão aos negociantes, etc., ter- se -hia na media, um lucro li-
quido da terça parte do valor total, isto é : cerca de 500 contos.
Supponho (é ainda o Sr. Revy quem continua a fallar ) que
pesentemente esses mesmos terreno não dão a seus proprieta-
rios lucro liquido de 1 conte de réis por anno . Servem elles
para alimentar uma pequena população pobre que não se im-
porta com o futuro, e nada economisa, e constituem na sua
maior parte pastagens naturaes para o gado. Não existe alli
552

agricultura : a falta de instrucção, de agua e de recursos fi-


nanceiros a tornam impraticavel, em terrenos aliás fertilissimos.
Todas essas considerações se baseam em calculos financei-
ceiros de resultado importantissimo, que trará compensações,
quaes a de attenuar os desastrosos effeitos das seccas periodicas
n'aquella parte da provincia, mas que entretanto não podem ser
representadas por uma cifra exacta de contos de reis . Ainda
que haja terra igual ás mais fortes, os alludidos terrenos com
a irrigação do reservatorio nada soffrerão, continuando a pro-
duzir como nos annos normaes e mesmo tornar- se- hão melhores
porque terião irrigação durante os 12 mezes do anno , e não só
durante 4. como agora acontece.
Como medida economica, a consteucção do açude de Ita-
columy excede a qualquer outra que o Estado possa emprehen-
der. Basta considerar que com o capital de 1,500 contos a pro-
ducção da região irrigada attingirá a importancia equivalente
a elle, deixando para o Estado lucro superior ao que dá a mais
rendosa estrada de ferro do Brazil.

AÇUDE DE QUIXERAMOBIM. - A ideia da construcção de


um açude nesta lacalidade é antiga. Em 1878 a commissão de
engenheiros enviada pelo governo imperial ao Ceará, entre va-
rios projectados, propoz a barragem do rio Quixeramobim no
local em que este corta os serrotas do boqueirão , a W. da cida-
de deste nome [ 1 ].
Esses estudos, feitos rapidamente sob a pressão das cir-
cumstancias, não podiam ser senão ensaios ou esboços para
investigações mais acuradas.
O Dr. B. Piquet incumbio recentemente aos membros da
commissão , de que é chefe, os engenheiros Th. Pompeo sobri-
nho, e Jules Destord o exame do local e a apresentação de
planos relativos ao mesmo.
As informações que se seguem me foram graciosamente
prestadas pelo engenheiro Jules Destord, que nos ultimos dias
da sessão legislativa de 1908 propoz ao Congresso federal a
construcção deste açude em ordem a aproveitar igualmeute a

(1) Este projecto, como outros estudos estão na Secretaria


da Viação e agricultura, mas nunca foi publicado.
553

de Quixada por meio do refluxo e derivação das aguas de um


para outro ; bem como o do Acarape, mediante garantia de ju-
ros sobre o capital de 25 mil contos.
Eis o que escreveo este proficional :
Em 8 de Outubro do anno proximo findo enderece aos
Exmos. Snrs. membros do Congresso Nacional um pedido de
concessão para construcção dos Açudes de Quixeramobim e A-
carape e melhoramento do de Quixadá, acompanhado dum me-
morial justificativo das obras. E ' esse memorial, ampliado, que
constitue a presente exposição.
O nome de SECCAS dado as crises climatericas do Ceará é
impropriamente consagrado pelo uso, sabendo - se que ellas são
devidas a seu systema orthographico e ao regimem dos ventos
dominantes, sujeito a estações irregulares.
A media annual das aguas pluviaes que caem, mesmo nos
annos mais escassos, seria sufficiente para tornar o solo uber-
rimo, si essas chuvas viessem a intervallos regulares. Temos a
prova disto em aunos que não attingiram a 500m de chuvas
e não obstante produzirem boas safras de algodão, em-
quanto outros que ultrapassaram de quasi o dobro essa quanti-
dade foram de producção escassa ou nulla. Não é portanto a
quantidade de chuva caida e sim sua distribuição que princi-
palmente influe sobre a agricultura.
Sendo impossivel modificar a direcção e a intensidade
dos ventos, a altitude e orientação das serras, o unico meio
de salvar a população laboriosa , que vive em constante luta
contra a fome, é a creação de grandes reservatorios que permit-
tam tornar a lavoura independente das estações.
Bem que a opinião de alguns seja a favor dos pequenos
açudes, duvidamos dos resultados beneficos que elles possam
proporcionar. Alem de sua serventia limitada, irão tão somen-
te aproveitar a alguns particulares ; por sua exiguidade taes
açudes não poderão armazenar agua para irrigação, sob pena
de logo no segundo anno de secca ficarem reduzidos a infectos
barreiros dos quaes apenas serão utilizaveis algumas vazantes.
Alem disto a evaporação diminue proporcionalmente ao volu-
me d'agua armazenada, o que vamos esclarecer tomando o açu-
de de Quixeramobim como exemplo e encarando - o sob tres as
pectos differentes.
554

Com a profundidade ao pé da parede de 42m, com outra


de 25m e uma ultima de 12m, e sendo o coefficiente da evapo-
ração e a infiltração annual estimado em 2m e a profundidade
em 42m temos para o
Volume d'agua arinazenada . 1.440.000.000m 3
Evaporação e infiltração .. 130.000.000
Proporção 9 %.
Profundidade 25m:
Volume dagua.. 630.000.000) m3
Evaporação .. 90.000.000
Proporção 14.3 %.
Profundidade 12m :
Volume d'agua…. 180.000.000
Evaporação ... 45.000.000
Proporção 25 %
Esses algarismos são sufficientes para actuarem sobre o
espirito dos mais teimosos em favor do systema de açudagem.
onde, conforme seja a configuração da bacia hydraulica, a eva-
poração pode attingir 40 e 50 % do volume total, contra 9 % e
5 % nos pequenos.
A pequena açudagem só pode ser conveniente nas zonas
assucareiras dos Estados de Parahyba, Pernambuco e Alagoas,
onde existem rios e riachos permanentes ou quasi perma-
nentes que poderão vantajosamente ser utilizados por meio
de pequenas barragens. As pequenas barragens, que não se
devem confundir com pequenos ayudes, poderiam ser profi-
cuamente empregadas para diminuir a declividade dos rios e es-
tabelecer sua permanencia. Com effeito, se por meio artificial
conseguirmos dar ao Jaguaribe uma declividade media igual
a do Seine obteremos um rio permanente que, alem de prestar
innumeros serviços a agricultura, servirá de estrada commer-
cial. Para isto suppomos que bastará estabelecer - se de 10 em
10 kilometros uma barragem de 6m de altura, que dará ao
rio a declividade de 0m70 por kilometro, fará represas es-
calonadas de 9 kilometros, separadas umas das outras por um
kilometro, as quaes ligadas por um canal e uma eclusa es-
tabelecerião communicação permanente ; emquanto os gran-
des açudes de Lavras, Banabuhiú e Quixeramobim serviriam
de reservatorios de alimentação. Essa continuidade de açudes
555

represando a totalidade das aguas escoadas pelos rios, ali-


mentados pelos açudes gigantescos de Lavras, Banabuhiú e
Quixeramobim, que formariam uma collossal reserva supe-
rior a 4.000 milhões de m³ , permittiriam a cultura intensiva
em todo o extenso e fertillissimo valle do Jaguaribe, e consti-
tuiram uma via de transporte perfeitamente navegavel a bai-
xo preço para os productos de toda aquella zona até o porto
de Aracaty.
Tendo demonstrado alguns dos inconvenientes dos peque-
nos açudes, que tem tambem o de encarecerem a agua por
unidade metrica de 45 até 10 vezes mais do que nos gran-
des açudes, examinemos as vantagens que estes nos apre-
sentam .
Esses grandes reservatorios, alem de servirem a zonas mais
vastas, de sairem do dominio das influencias locaes, tein, se
forem construidos em lugares apropriados, com bacias hydro-
graphicas sufficientes, a incomparavel vantagem de resistir du-
rante tres, quatro e mais annos as irregularidades das esta-
ções. Offerecendo vasta margem a infiltração e a evaporação
mantem nas suas margens humidade favoravel a vegetação,
a qual pouco a pouco irá se estendendo as frondosas mattas,
modificando n'uma certa proporção a climatologia local. Alem
disso, o ar humido, sendo excellente conductor electrico, mo-
dificará relativamente os phenomenos meteoricos em toda a
visinhança da zona por elles beneficiada.
Se o Estado do Ceará fosse dotado de tres ou quatro la-
gos artificiaes de 1 a 1500 milhões de metros cubicos cada um ,
em menos de um seculo, por pouco que o homem quizesse
auxiliar a natureza , seu aspecto. do Estado, seria completamente
modificado.
As correntes de ar humido, indo esbarrar contra as ser-
ras que circumvizinham estes lagos, além de provocarem de
quando em vez phenomenos meteoricos de maior intensidade,
depositariam abundante orvalho que favoreceria a formação
de mattas e com ellas, ao cabo de certo tempo, conforme a
natureza do terreno, a de fontes perennes.
E' impossivel reformar bruscamente a climatologia dos
sertões aridos, porque a natureza não dá saltos, mas podemos
transformal-a gradualmente, operando da mesma forma que
556

a propria natureza agiria, se não tivesse deixado aos homens


o cuidado de completar sua obra ou de concertar-lhe os es-
tragos causados pelo tempo .
Os boqueirões de Lavras, Quixeramobim e Banabuhiú nos
mostram os trabalhos a executar. O de Lavras, assim como
o demonstrou no seu excellente trabalho o Snr. Revy, era an-
tigamente fechado, e acima d'elle existia vasto lago que co-
bria extensa zona ; fonte perenne o alimentava vindo da
serra do Araripe que então não se achava desnudada . Os li
gnitos encontrados naquella zona provam que em tempos re-
motos existiu vegetação mais frondosa, mais poderosa, que se
depositon nessa bacia lacustre, assim como o trabalho das
aguas sobre as rochas do boqueirão de Lavras deixaram - lhe
os signaes indéleveis do nivel a que attingiram.
Que nos resta fazer ? Reconstituir o que a natureza ha-
via feito é a unica solução ao problema .
Reconstituidos os antigos lagos de Quixeramobim, de
Lavras e Banabuhiú voltaremos a obter em parte o clima
que essa região deve ter gozado alguns milhares de annos
atraz. Dizemos em parte, porque nos é impossivel restituir ás
serras onde nascem as primeiras torrentes a altitude que
tinham, repor em outras as centenas de metros de rochas que
hoje, convertidas em areias, formam as dunas que se estendem
por toda a costa.
Era a altitude que detinha os ventos e permittia a pro-
ducção de phenomenas meteoricos mais frequentes ; mas se
é impossivel reconstituir o que o tempo destruiu, pode - se obter
OS mesmos resultados com processo differente. Com effeito ,
correntes electricas de polos differentes circulain nas nuvens
que vem do mar carregadas de vapor d'agua, e da terra des-
secada pelo sol. Como é sabido os dois pelos contrarios attra-
hem-se e seu encontro provoca choques que se traduzem em
relampagos e condensações do vapor d'agua de que as nu-
vens estão saturadas,
Quando as serras são bastante elevadas esses phenomenos
se produzem por si mesmo, porque ao encontro destas as
correntes de ar formam turbilhões, que provocão a approxima-
ção das nuvens, sufficiente para estabelecer o contacto das
duas correntes electricas, ou se a serra for muito alta será
557

envolvida pela propria nuvem que se condensará então pela


rarefacção e frio do ar. As chuvas irão se estendendo da
serra a planicie, generalisando-se, até que vento contrario.
secco, a venha dominar. Não havendo serras elevadas para
produzir es es effeitos na orientação dos ventos, os uni-
cos meios de os provocar artificialmente serão a creação de
grandes lagos artificiaes, cuja enorme massa de vapor d'agua,
por elles desprendida , sirva de fio conductor a corrente
electrico - terrestre a encontrar a electrica aeria de cujo con-
tacto resultará a precipitação de chuvas, do mesmo modo que
se houvessem serras altissimas.
O açude de Quixeramobim será tão grande quanto o de Lavras.
Sua enorme bacia hydraulica tem por limites : ao norte as ser-
ras do Machado e das Imburanas ; a N.N. as serras da Pi-
cada e da Telha a W. a serra das Mattas, das Bestas e das
. Almas : a S. W. a serra de Santa Rita e Genipapo; ao S. as serras
do Olho d'agua, Branca e Canindé; a S. E. a serra do Boquei-
rão ; a S. E. a serra da Preguiça, donde nascem innumeros
riachos ; cobre uma area superior a 7.750 kilometros qua-
drados.
O Rio Quixeramobim nasce na serra das Mattas e tem até
sua passagem no boqueirão de Quixeramobim um curso de
cerca 240 kilometros ; recebe na sua margem esquerda--o rio
Magdalena ou dos Cachorros, que é seu principal tributario :
divide- se em tres galhos : o rio dos Cachorros, o rio Magdalena e
o riacho Barriga, attingindo reunidamente o curso de 220 ki-
lometros, recebendo cada um delles numerosos pequenos afflu-
entes que só poderão ser conhecidos quando se proceder aos
estudos definitivos. Osaffluentes principaes da esquerda são :
o Pirabibú, que nasce na serra do Machado e tem um curso
de noventa kilometros, o rio Sibiró, que tem um curso de 30
kilometros.
Na margem direita recebe o rio Calogy, que nasce na
sérra deste nome e tem um curso de cerca de 40 kilometros :
o Boa Vista, que se divide pouco acima de sua foz em dous ga-
lhos de igual extensão, o Boa Vista e o Algodão, nascendo
o Algodão nas proximidades da serra de Santa Rita e o outro
na extremidade W da serra do Olho d'agua ; o Barrocas, que
nasce na extremidade SE da serra do Olho d'agua, e vem du-
558

rante algum tempo correndo parallelo ao rio Fatú, affluente do


Banabuhiú. O Barrocas, que tem um curso igual ao rio Pirabi-
bú acha-se, como este, situado na mesma bacia hydraulica e tem
quasi igual importancia O ultimo dos affluentes importante
da direita é o Alegre, que nasce nas proximidades da Serra Bran-
ca e tem um curso de 50 a 60 kilometros. Só eitamos aqui
os affluentes importantes, havendo porém mais de cincoenta
outros de cursos variaveis com um a dez e mesmo vinte kilo-
metros, os quaes só serão, como ficou dito, reconhecidos, quan-
do se fizerem os estudos definitivos.
O rio Quixeramobim, dous kilometros antes de banhar a
cidade de seu nome, passa entre duas serras, euja conforma-
ção parece ter em tempos idos pertencido a uma só cadeia.
O boqueirão ahi aberto e que propomos vedar com uma pa-
rede de alvenaria de 45 metros de altura, proporcionará um
reservatorio de 962 kilometros de superficie, com a capacidade
de 1.440 milhões de metros cubicos, que por enquanto só tem
de superior o açude Roosevelt de 1.600 milhões de metros
eubicos, na America do Norte, vedando a passagem do Salt
River, no boqueirão de Arizona.
Este açude foi construido com O mesmo intuito que nos
leva a propor a construcção do Quixeramobim, qual o de ferti-
lisar uma zona analoga a que nos occupa.
O americano sempre audacioso não recuou diante dos
enormes sacrificios que lhe impunha a construcção desse col-
Josso depois de comparal-o aos beneficios que d'ahi resulta-
riam. Construiram uma Estrada de ferro atravez d'um paiz
montanhoso, arido e deserto, instalaram uma fabrica de ci-
mento, dando nascimento a uma povoação que hoje é
villa ; trabalharam dias e noites e em poucos annos o collosso
chegou a conclusão , e desde 1906 começou a funccionar, irri-
gando 100.000 hectares de terreno.
Para o que propomos construir, não são necessarios sa-
erificios identicos. A estrada de ferro chega quasi ao pé da
parede a construir, o cimento das melhores marcas ingleza,
comprado em quantidade tal que possa motivar o carregamento
completo de navios , chegará, com todas as despezas pagass
incluidas a de 11 reis por kilog. na Estrada de ferro, a Quixe-
ramobim ao preço de oitenta reis por kilo, e si nos servirmo,
559

das marcas allemães - Corôa ou similares, a reducção attingirá


de 10 ou 15 %. Não ha pois razão justificavel para ficarmos
atraz dos yankees e entregarmos a miseria, a fome e a todos
os seus consectarios de horrores, uma população que só dese-
ja trabalhar, o que com sacrificios de numerosas vida tem
demonstrado, indo desbravar as impenetraveis florestas do
Amazonas, levando nessas selvaticas regiões os primeiros ger-
mens da civilisação.
A bacia hydraulica que, como já o dissemos, cobrirá uma
superficie de 96 kilometros quadrados. terá a profundidade
media de 15m. A represa será no rio principal ou Quixeramo-
bim de 27 kilometros, no rio Pirabibú de 30 kilometros, partin-
do da foz d'aquelle rio ; no Sibirá de 13 ; no Alegre de 10; no Bar-
roca de 15 : no Bôa Vista de 8 : no Algodão de 4 ; ne riacho do
Tenente de 8, no riacho Santo Antonio de 112. Uma barca
que partisse da actual confluencia do rio Sibito com o Quixe-
ramobim navegaria em linha recta. rumo ao SSW, durante
15 kilometros conservando uma profundidade media de 30m
em todo o percurso por ella effectuado .
Calculando ser a infiltração e a evaporação media annual
de 2 , correspondente a 120.000.000 m³ . no caso do açude
não receber agua por tres annos, e dando para agua ne-
cessaria a fertilisação de 25.000 hectares de terras irrigaveis
150.000.000m3, o que equivale cobrir essas terras com uma ca-
mada d'agua de 600m, ter-se -ha a diminuição media annual
de 270.000.000 m3 ; sejam por tres annos de secca completos
810.000.000 m3, ficando ainda uma reserva de 680.000.000 m3
com uma profundidade superior a 25m ,
Parecerá, talvez, bem mesquinha a proporção d'agua distri-
buida, mas se deve levar em conta que este projecto é baseado
sobre o minimo, e que os calculos apresentados se referem a
producção apenas de uma safra annual, porém segura e não
duas, como o admittem os projectos Revy para o de Lavras
e o projecto Piquet para o Quixadá. Mesmo nos annos es-
cassos a estação chuvosa attinge a 300 mm de chuvas.
caidas. Si a estes 360 um jantarmos os 600 mm fornecidos pela ir-
rigação, obteremos um total de 900 mm, Ora os projectos Revy
e Piquet se accordam em dar as duas safras annuaes irri-
gadas o total de 16.000ms, equivalente por cada safra a 8.000m3
560

O nosso projecto dá para uma safra 9.000m3, Alem do que


acabamos de expor, observaremos que chuvas annuaes de
500mm tem sido e são aqui consideradas como media muita fa-
voravel, produzindo excellentes safras de algodão, em quanto
annos que obtiverem 600 e 700 mm foram de producção nulla
ou escassa, o que, como já o dissemos, prova que não é a quan-
tidade e sim a distribuição das chuvas, o principal fator
para agricultura. Doutra parte, se tomarmos uma media an-
nual de chuva de 500mm , que haja produzido boa safra , obser-
vamos que a quantidade utilisada foi apenas de 50 % e que
só 250mm se infiltraram na terra e activaram-lhe as pro-
priedades productivas.
Com effeito 25 % evaporam-se immediatamente ao contacto
da terra resequida , 25 % resvalam para os riachos e rios, 50 %
apenas são approveitados para agricultura . Num serviço d'irri-
gação bem comprehendido, só se perde a agua que se evapo-
ra, e se o serviço for bem determinado esta mesma pode ser
reduzida ; mas applicado este mesmo algarismo -25 % sobre
600 m = 150 mm que são perdidos por evaporação, ficam 450m
que serão realmente utilizados. Si a este juntarmos os 150mm,
quer dizer 50 % da agua caida n'um anno escasso, elevar-se - ha
o total a 600 m que permittirá em rigor colherem - se duas sa-
fras de algodão e milho . Certo é que si nos proposermos a fa-
zer a cultura do cacao estes algarismos seriam insuffici-
entes, mas como julgamos que ninguem, por emquanto, se
proporá fazer este genero de cultura, pensamos que nossos
calculos são sufficientes para obter, ao menos, uma excel-
lente safra annual. E' certo que, uma vez regularisado o
funccionamento do serviço de irrigação e o açude cheio e
aproveitados os pequenos açudes situados a jusante sobre os
canaes, o excedente das aguas pluviaes duplicará, triplicará
mesmo, si for convenientemente armasenɛda, assim como du-
plicará sem correr risco de faltar para a area dos terrenos
irrigaveis. Oitocentos a 900 m são quantidades superiores a
que recebem as regiões mais favorecidas da Europa Central ,
a Russia com uma media de 364 m, Vienna com 491 mn, são
lugares productivos.
Pelas observações feitas no observatorio de Quixeramo-
bim , verifica- se que em treze annos ( 13 ), só tres vezes o rio
561

deixou de correr, dando apenas enxorradas : durante esse mes-


to periodo o rio correu 1.200 dias, seja como media annual
92 dias. Tendo sido o escoamento medio calculado em 200 m3
por segundo, o volume total das aguas escoadas nesse periodo
de 92 dias é de 1.589.760: 000 m3, o que demonstra ser suffici-
ente um anno de estação regular para obter-se um volume
d'agua superior ao necessario para encher o açude que , na peior
das hypotheses, encheria em menos de dois annos.
Propomos tambem abrir um canal que ligue o açude de
Quixeramobim ao de Quixadá, e permitta supprir a deficiencia
da bacia hydrographica deste ultimo. Este canal, conforme o
traçado que for adoptado, terá uns 40 kilometros de desen-
volvimento, com fraca declividade e grande secção de 18 a 20
kilometros, com extenso tunnel de pequena secção e forte declivi-
dade d'um metro, e custo approximado de 2.780.000$. Qualquer
que seja o traçado fornecerá durante o periodo de enchente
do rio os 60 ou 100ms de que precisa ser supprido o açude de
Quixadá, o que representa a metade ou dois terços da capa-
cidade deste açude.
A primeira vista o custo desse canal parece exhorbitante
em relação ao serviço que deve prestar, porém devemos ob-
servar que só representa mais ou menos 50 % do custo das
obras de Quixadá que ficarão perdidas se um trabalho desse
genero não vier salvar a enorme quantia já despendida.
D'outra parte esse mesmo canal prestar- se - ia ao serviço
d'irrigação no seu percurso ao atravessar numerosos peque-
nos riachos.' fazendo- se em vez de aqueductos dispendiosos
pequenos açudes, obtendo-se desse modo outros tantos cen-
tros de irrigação, que por si só justificariam a creação deste
canal.
Se o açude de Quixeramobim fosse construido somen-
te no intuito de salvar o de Quixadá, a enorme quantia
de seu custo não seria justificativel, mas como provaremos
em seguida, essa ligação é apenas una consequencia da exe-
cução das obras d'esse açude : alem de que, como já o dis-
semos, o canal de ligação é antes de tudo um canal de irrigação
que servirá para dois fins.
Os estudos que procedemos no valle de Quixeramobim e
o plano que adoptamos para proceder a irrigação , nos autori-
562

sam a dizer que sobre cada um dos cannes de irrigação pode-


rão estabelecer -se usinas hydroelectricas. que muito contribuirão.
para o desenvolvimento da região . Os dados que deduzimos
desses estudos nos induzem a calcular que sendo o despejo
de cada un dos canaes necessarios ao serviço de irrigação de
3.472 litros por segundo, durante 250 dias uteis, obteremos no
primeiro anno a altura de queda media de 29m, a qual fornece-
rá sobre cada um dos canaes a força bruta de 1.006 poncelets,
sejam 2.012 para ambos os canaes ; no segundo anno a altura
media de 23m nos dará sobre cada um dos canaes 798 ponce-
lets, ou o total de 1596 : no terceiro auno a altura da queda
media, achando - se reduzida a 16 m, disporemos ainda d'uma
força total de 1.110 poncelets para os dois canaes, supposto
o facto extraordinario do rio deixar de correr durante tres
annos consecutivos, facto esse que nunca se realizou , nem no
terrivel periodo de 1877 a 1879 .
Os calculos acima são baseados sobre a irrigação minima
de 25.000 hectares de terrenos ; mas uma vez o açude princi-
pal cheio, bem como os pequenos açudes situados a jn-
jante, construidos de forma a cada um conter a agua necessaria
a metade da totalidade da irrigação annual, será possivel irrigar
50.000 hectares de terras, e fornecer o dobro do volume d'agua
agora calculado. Como alem disto só podemos temer que o rio
deixe de tomar agua por um anno ou quando muito por dois,
consecutivos. a força minima disponivel será de 3.105 ponce-
lets para uma altura da queda minima de 23 m no primeiro
anno e da mesma quantia por altura minima de 11.3 no se-
gundo anno, que supporemos ser inteiramente secco e o açude
não receba agua.

Com effeito , segundo o nosso calculo, sendo necessarios para


satisfazer ao serviço d'irrigação 600.000.0003 annuaes, pen-
samos que nos pequenos açudes desseminados a jusante sera
no minimo armazenada a metade : portanto, no primeiro anno
o gasto importará em 300.000.000m3, o que fará baixar o nivel
do açude, comprehendida a evaporação e a infiltração , a cota
37 ; no segundo anno o fornecimento, caso seja totalmente
secco, isto é, inferior a 500mm de chuvas, = 600.000.000m3 o que
com a evaporação o reduseria a cota 33.5, ficando ainda
300.000.000m3 de reserva depois da primeira safra. Sendo o
563

anno secco será prudente não tentar nova, ficando com 50.000
hectares de terras irrigadas ; nesta hypothese serão dispendidos
300-000.000 o que permittirá dispor d'uma força de 2.300 po-
celets, ficando o nivel da agua na proximidade da cota 18,
tmais do que sufficiente para evolucionar inteiramente a vida
economica daquella região).
Si empregarmos 555 poncelets ao estabelecimento d'uma
fabrica de tecidos de 600 teares, ter-se - ha ainda uma reserva
minima de 555 poncelets que poderão ser empregados na indus-
(ria agricola, transporte. fabrica central de lacticinos, cortu-
mes e pequenas industrias particulares.
Os canaes servirão de vias de communicação que permitti-
rão o transporte, a baixo preço, dos productos da zona irriga-
da, para as fabricas estabelecidas sobre elles ou para embar-
rca na via ferrea.

A idéa de serem os canaes de irrigação aproveitados como


meio de transporte, parecerá a primeiaa vista de difficil ou
impossivel realisação, tratando - se d'uma zona tão arida como
o sertão do Ceará porém a execução deste plano tal como o
o concebemos, importará nisto. Com effeito os canaes de irri-
gações por motivos de interesse da empreza, a qual não en-
contraria nas margens do rio terrenos apropriados a cultura
na distancia da vinte a vinte e cinco kilometros, terão de ser
construidos de modo a atravessar mais proximamente possivel
valles cujos terrenos sejam de boa qualidade, podendo isto
se realizar desde que attinja os valles dos primeiros affluentes
do Quixeramobim, situados a jusante do açude, tal como o do
Truqué, etc. com a distancia de 8 a 12 kilometros .
Partindo da cota 12 os canaes seguirão quasi por uma cur-
va de nivel, transpondo o divisor das aguas por meio d'um tu-
nel de pequena extensão, que talvez possa ser evitado depois
de completos os estudos definitivos .
Chegando aos valles dos pequenos riachos teriam estes de
ser transpostos por meio de aqueductos .
Em vez de nos servirmos desse genero de obras d'arte, ge-
ralmente dispendiosas. approveitaremos esses valles para esta-
belecer outras tantas pequenas barragens, que nos permitti-
rão armazenar, uma vez o açude cheio, o excesso das enchen-
564

tes do rio e d'esse modo augmentar consideravelmente a su-


perficie irrigada, conserva ndo sempre no açude principal for-
midavel reserva ; destes rsservatorios é que partirão os verda-
ros canaes d'irrigação que nos permittirão, ao fim de 10 ou
15 annos, cultivar todos os terrenos disponiveis no valle de
Quixeramobim.
A função do açude de Quixeramobim será, portanto, man-
ter o nivel constante dos açudes situados a juzante, dando as
aguas um escoamento constante, tornado- se esta constancia
pontual por não ser necessario tirar directamente a agua pre-
cisa a irrigação dos canaes conductores.
Alem disto o conveniente aproveitamento do boqueirão
do Banabuhiú completará mais tarde esse plano, fertilisan-
do os terrenos que o margeiam até sua confluencia com o Ja-
guaribe.
O que acabainos de expor em relação ao açude de Quixe-
ramobim applicar- se-á proporcionalmente ao açude de Quixadá,
por emquanto considerado obra inutil, somente aproveitavel
havendo inverno excepcional, devido a deficiencia de sua ba-
eia hydrographica . Mas ligado, como propomos, ao de Quixe-
ramobim , será de real e efficaz utilidade, podendo irrigar
de 5 a 6-000 hectares de terrenos consagrados a cultura inten-
siva de cereaes. Os terrenos de inferior qualidade, na proxi-
midade da barragem, tornam -se melhores a alguma distancia
e optimos a proporção que se approximam do valle do Bana-
buhiú.
Descrever todas as vantagens que resultarão da creação
deste lago artificial seria tarefa superior as previsões humana,
pois muitas hão de surgir com o augmento da riqueza e bem
estar das populações marginaes.
Estimamos porém em 150.000 pessoas o numero das que
poderão viver desde os primeiros annos graças a lavoura ; jul-
gamos estar abaixo da verdade, porque só o açude de Quixa-
dá com os melhoramentos, que propomos, dará facil subsis-
tencia a 30.000 pessoas.
Naturalmente os desastres occorridos nas diversas obras
contra a secca, emprehendidas pelo governo, taes como o açu-
de de Quixadá, que não enche, o do Panta, cujos alicerces
repousam sobre areia, não sabendo -se de que lado fica a re-
565

presa, si a juzante, si a mont rte ; o açude do Papara com


um sangradouro artificial que custou dezenas de contos de
reis qua ido abaixo do nivel deste, a mais de um metro, existe
um natural, etc. , justificam até certo ponto as actuaes appre-
hensões do governo, sobre tudo em relação a creação de lagos
artificiaes da capacidade do que nos occupa .
Porém deixando de lado as censuras, aliás bem merecidas,
que motivam graves faltas technicas do genero das que acima
assignalamos, e que deveriam ter sido severamente punidas,
as demais são injustificaveis ou pelo menos injustas.
Dentre estas, destacamos a seguinte : No açude de Quixa-
dá gastou-se o triplo do que tinha sido orçado, portanto, com
taes deficiencias orçamentarias o governo nunca saberá quan-
to ha de gastar. Occorre, porem, que o açude de Quixadá,
orçado ha quasi trinta annos, quando o cambio se achava quasi
ao par, teve de soffrer as consequencias das fluctuações do
mesmo, as quaes durante esse longo intervallo influiram :
1º-Sobre o preço dos materiaes, cimento, forragem, etc.
2 -Sobre o preço da mão de obra, consequente a baixa
cambial, que augmentou a carestia da vida , em cerca de 100 % .
Uma segunda causa concorreu consideravelmente para o
desequilibrio dos orçamentos primitivos ; a difficuldade de
transporte, que a principio, feito em maxambomba ou em cos-
tas de animaes, gravou as despezas em tres a quatro vezes mais
do que a prevista e orçada.
Em terceiro lugar, devido a crise climaterica, enormes quan-
tias, pertencentes ao credito aberto para construcção do açude,
foram distribuidas a famintos a titulo de soccorros publicos .
Alem disto, é provavel que se procedesse, como ainda se
faz, sem rigoroso criterio, contando-se com a miseria d'uma po-
pulação faminta, e baseando- se sobre o minimo do salario, su-
perior ao preço habitual do trabalho em epocas normaes, esque .
cidos de que, alem de commetterem grave imprudencia profis-
sional, não deviam induzir o governo a especular com a mi-
seria do povo.
Tal modo de proceder, visando por fim tornar as obras
propostas mais facilmente acceitaveis, só conseguio desacre-
dital-as. Nem mesmo o preço commum do trabalho nas epocas
normaes, pago nos pequenos serviços particulares deve ser
566

applicado a grandes obras por se tratar de operarios escolhi-


dos em numero mui redusido.
Um grande açude requer numeroso pessoal, difficil de ser
encontrado na zona de seus trabalhos.
Quanto ao jornaleiro emigrante, que já abandonou seu lar,
só fica estacionario si lhe derem remuneração satisfactoria,
exigindo, ás primeiras noticias de chuvas no seu sertão, augmen-
to de salario sob pena de deserção.
E ' provavel que o nosso calculo das despezas seja taxado de
exagerado, porque taes e quaes obras, construidas ou construin-
do -se no norte, custaram relativa e proporcionalmente me-
nos ; mas alem das razões supracitadas, podemos responder
que o preço da mão de obra varia nos diversos Estados do nor-
te e seria absurdo querer applicar ao Ceará, onde pela emi-
gração para o Amazonas os braços se tornam cada vez mais
raros, os preços em vigor em obras identicas, mas de menor
importancia, que se estão fazendo nos Estados da Parahyba e
do Rio Grande do Norte. A tendencia, no tocante as estradas
de ferro, é querer equiparar todos os Estados do norte e re-
gel- os por uma só tabella, não se considerando as suas condi-
ções de vida peculiar. Suas topographias, que já variam num
mesmo Estado, bem como o coefficiente de saa população
dispensavel para taes serviços, a simples tabella do salario pago
em trabalhos executados nos Estados do norte, bastarão para
mostrar o absurdo dessa equiparação :
Alagoas 1$500 રી 34000
Pernambuco 1$200 a 1$500
Parahyba 1 $000 a 1$300
Rio Grende do Norte 14000 a 1$300
Ceará 1$400 a 1$800
Maranhão 24000 a 2$500
Isto quanto ao operario commnum.
Numa obra cuja construcção em prazos determinados
exigir 2.500 a 3.000 operarios, não nos é licito calcular o sala-
rio medio a menos de 1.800 ( 1 ), porque só conseguiremos reu-

(1) Supponho que pela diaria de 1 $200 a 1 $500 ha facili-


dade em obter-se 3 a 4.000 operarios. No prolongamento da
Estrada de ferro de Baturité com o trabalho penoso de remoção
de terra e carreto de pedras, desde 6 horas da manhã as 5 da
tarde, o operario não ganha mais de 1 $500. --( Th . Pompeu.)
567

nir operarios offerecendo- se-lhes remuneração mais vantajosa


do que a que elles têm em trabalhos onde não são submet-
tidos a rigoroso regulamento.
Alem disto, seremos forçados por circumstancias locaes
a trabalhar dia e noite durante a construcção das paredes.
Em face do desastre do açnde do Quixadá , occorre a to-
dos a interrogação : o açude de Quixeramobim encherá ?
A obra de Quixadá, concebida n'um periodo anormal, execu-
tada sob tristissima pressão moral, quando urgia accudir ra-
pidamente, dar trabalho a numerosos famintos, em vesperas de
succumbirem do modo mais horroroso, não pode servir de exem-
plo para qualquer serviço da mesma natureza. Faltaram- he dados
precisos sobre a media annual das chuvas, pelo que não pôde
ser bem estudado quanto a sua bacia hydrographica, reconhe-
cida hoje insuficiente.
O facto que alli se prodnziu não se repetirá mais, estamos
certos, por houra da engenharia brasileira e do governo. No
açude de Quixeramobim a bacia receptriz tem 96 kil.² , a de ca-
ptação 7.750 kil.2 ( 1) o que para uma media de chuvas annual de
800m, [ 2 ] da qual sejam apenas recolhidos 25 % , produzirá o volu
me minimo d'agua captada - de 1540000000 m3 , superior de 40
milhões ao necessario para encher os açudes de Quixeramo-
bim e Quixadá, ao qual, conforme o regimen pluvial durante o
anno, será enviado aquelle excesso. Mas como a media annual
pode sem receio ser calculada em 1000mm, segundo a opinião
do Ill.mo Sr. O. Weber, director de observatorio de Quixeramo-
bim, o qual consultado a respeito declarou - me que o observato-
rio de Quixeramobim, afastado da zona mais favorecida de chu-
va do Estado, situado fóra da bacia de captação do Açude ,

[ 1 ] Felo memorial dirigido ao Congreasso em 8 de Outu-


bro de 1908.
Faltando ainda calcular algumas áreas a bacia receptriz
accusada foi avaliada em 6.200 k.2 .
[ 2] Um erro de copia nos fez dar 1400mm como media an-
nual . Na passagem que diz : "mas a media annual sendo como
é de 1500mm deve ler se, mas nos annos excepcionaes o total po-
derá attingir a 1400mm , que é tambem a media annual provavel
nas serras das Mattas e S.ta Rita.
568

onde as serras do Machado, das Mattas, Cology. S.ta Rita, etc.


formam optimos portos de condensação, os seus dados forneci-
dos, delle observatorio, constituiam mesmo para annos a-
bundantes uma minima, podendo-se, portanto, sem receio caleu-
lar em 1000m a media annual para a bacia de captação.
Indagações a que procedemos nos permittem assegurar
que só 50 % das chuvas, caídas na bacia do açude, alcançam a
cidade de Quixeramobim, sendo as demais desviadas pelas ser-
ras Canindé. Boqueirão e Preguiça .
A prova material do que affirmamos é actualmente for-
necida pela estação pluvial do corrente anno [ 1909 ].
Desde Janeiro, o rio Quixeramobim está correndo regular-
mente, emquanto na cidade até a data [ 1 ] em que escrevemos
se deram apenas algumas chuvas sem importancia.
E' provavel, baseado nas experiencias feitas no Quixadá,
que a media de 25 % de agua recolhida venha a ser demasiada .
O Quixadá, alem das duas bacias hydrographicas que o
formão, a do Sitiá e a do Caracol, serem insuficientes, e situadas
em identicas condições topographicas, estão submetidas ao
mesmo regimen de ventos, devido a orientação das serras ;
não se podem compensar uma a outra.
Adopto a media de 25 % baseado em experiencia que pro-
cedi ha 10 annos, quando me achava no Cariry Velho, Estado
da Parahyba. Serviu-me para essas experiencias o Rio Parahy -
ba que nasce na comarca da Alagoa do Monteiro e é formado
por tres riachos que correm em direcções oppostas : o do Meio
on Parahyba, que nasce ao W, na serra da Jabitaca : o da
Serra, que nasce ao Sul, na Serra das Moças e o Chucuras, que
nasce ao Norte, nas proximidades do Boi Ve'ho .
A área da comarca, bem como a declividade media dos
tres riachos, em cujas cabeceiras tinham sido installados tres
pluviometros foram calculados. Instalamo - nos a 6 kilometros de
Sta Anna do Corego onde determinamos a secção do rio .
As chuvas, em 26 dias , no espaço de dois mezes, fizeram o
rio correr por 115 dias, dando o seguinte resultado :
Chuva caida 1440mm.

(1) Março de 1909 .


569

Volume d'agua passada na secção medida 1.382.400.000.m3


O que para uma área de 3200 k.² equivale a 30 % das chu-
vas caidas.
Outra experiencia que procedemos numa pequena área,
exactamente determinada, dentro da qual nascia um pequeno
regato cujas aguas iam despejar na barreira que tinhamos
cubado, nos permitiu fazer as observações seguintes :
Chuva caida 10mm Quantidade recolhida 8 %
66 66 20 66 * 11 %
66 30 " 66
.་ 15%
66 40 . 66
20 %
66 50 "
15

26%
66 60 . 33%
66 66 706 66 6. 43 %
80 " 52 %

Total 360mm 206 %


Media 45 " 25 %

Como o açude de Quixeramobim se acha situado em condi-


ções geologicas identicas ao dessa experiencia, servimo -nos des-
tes resultados para applical - os ao seu caso.
Outra consideração a fazer é que a quantidade d'agua reco-
lhida é tanta maior quanto mais copiosa for a chuva. Aconte
ceu-me recolher 40 % d'uma chuva de 20mm que durou apenas
alguns minutos, emquanto de outra vez uma chuva de 82mm,
que durou oito horas, com diversos periodos de intensidade
só permittio recolher 30 %.
Outra consideração deve - se accrescentar as experiencias fei-
tas em Quixadá. E' que para merecerem fé precisaria haver plu-
viometros collocados em diversos pontos da bacia hydraulica ,
porque um unico pluviometro, situado no observatorio meteoro-
logico do açude. fóra da bacia d'este, não bastava para
esse fim e nem pode veridicamente dar a media das chuvas
caídas nessa bacia .

Feitas essas observações, voltemos ao ponto principal. Affir-


mamos que a media annual podia sem perigo algum calcular - se
em 1000mm . Com tal media o volume total das aguas escoadas
pelo rio será de 1.937 .500.000m3 ou 437.500.000m3 a mais do
570

que é necessario para encher os dois açudes, suppondo que o


de Quixadá chegue a recolher por si a metade da sua capacidade.
São esses 137.500.000m³ que servirão para acabar de en-
cher os pequenos açudes situados a juzante, ao longo dos canaes.
AÇUDE DE ACARAPE. - O Açude de Acarape, cuja construc-
ção faz parte de nosso programma, visto a importancia excepci-
onal da zona que vae benificiar, está desde muito tempo estuda-
do e projectado pela Commissão Piquet.
Esse açude, se bem que de menor proporção, (60 milhões de
metros cubicos de capacidade ), tem a vantagem de ficar
n'uma zona oude a secca é desconhecida, sobre um rio quasi
perenne, mais onde existem grandes irregularidades que oc-
Cizionam a perda das safras, já por falta de chuvas em tempo
opportuno, já por causa das innundações que algumas vezes
são tão prejudiciaes quanto a secca. O fim desse açude é tor-
nar possivel a cultura intensiva de cereaes no valle fertilissimo
do Acarape ou Pacoty, fazendo irrigações até o Oceano. Feito
o açude esssa região será um dos principaes celeiros do Estado
O orçamento, que não conhecemos em seus detalhes, mas
que desde já podemos qualificar de deficiente por não abranger
as despezas com as obras d'irrigação, é calculado em 1800 contos,
Em nossa proposta gravamol- o com 20 % para occorrer as
surprezas que nos pode reservar a deficiencia de estudos, so-
bre os quaes já fizemos as devidas reservas.
Com pequena reforma no seu projecto, permitirá esse
açude a installação d'uma usina hydraulica, e consequente usi-
na central, para fabricação do assucar, a qual funccionaria em
optimas condições, contribuindo muito para o desenvolvimento
da região.
Para se realisarem esses melhoramentos serão necessarias
as seguintes obras :
I Açude de Quixeramobim :
a] uma parede convexa a montante de 454 no coroamento
e 194 na base com 45m de altura acima do nivel do rio ;
b] uma parede de terra de 650m de comprimento e 12m
de altura media ;
c) um sangradouro de 400m de extensão ;
d] dois canaes primarios para irrigação, um ao Norte, outro
ao Sul, com o desenvolvimento total de 130 kilometros, 24 ou
571

12 de cada lado nos terrenos estereis e difficeis que se achão


logo a margem da parede do açnde projectado.
No custo da construcção desses canaes acham - se compu-
tadas as despezas com os pequenos açudes donde partirãos os
canaes secundarios, effectivamente destinados a irrigação .
el Ligação do açude de Quixeramobim com o de Qui-
xadá.
f) Augmento da rede dos canaes primarios do Quixadá.
II Construcção do açude de Acarape com os respectivos
canaes.
Os estudos a que procedemos no Quixeramobim com &S
sondagem de 10 em 10m nos levarem a calcular em 25000m3 o
volume dos materiaes a extrahir para attingir a rocha sobre a
qual repousará o massiço de concreto, aliceres, da parede, cuja
base terá 37m de largura sobre a extensão de 193m , e a largura
no coroamento de 4m.
MONTANTE

O volume total dessa parede será de 194.482m ,


JUZANTE

Para o reservatorio cheio teremos os seguintes dados :


BASES

P.o P.m
Pinmx
(66-2a) P (4a -- 6b ) P
p(.1+1g. 2a
a2 a2
22

al 4.00 2.50 1.50 0.20 1.43 2.06


2
2

a2 4.55 3.33 1 22 3.60 5.18


a3 6.40 5.00 1.40 4.66 6.61
(40.96)
a4 10.42 7.80 2.62 5.47 7.87
( 108.57)
16.10 12.00 4.10 6.18 8.89
(259.21 )
a6 21.21 14.90 6.31 6.50 9.36
(449.86 )
a 38.30 23.98 14.32 6.91 9.95
|( 1466,84 )}

A juzante a pressão media será 6 k. 91 e a pressão maxi-


ma 9.95 .

a tga =- p = 0.6.0.70 tg a2 = 0.4189 e 1+ Plga = 1.44.
O sangradouro dará passagem a um lençol dagua de dois
572

metros, o qual pela extensão de 400m representa uma secção de


800m2, dando vazão ao dobro da massa liquida, media, actual do
rio, calculada em 400m2. Esse sangradouro, situado em conti-
nuação a barragem de terra, ao sul, requer um movimento de
terra de 112000m³, que será na sua quasi totalidade utilisada na
barragem visinha, o que nullificará financeiramente o custo do
sangradouro : sendo o preço dessa excavação englobada com o
da barragem, cujo volume real de 226.200ms foi elevado por
medida de segurança a 250000m³
O canal de ligação com o açude de Quixadá, que terá de
transpor pelo menos 6 pequenos valles, nos obrigará a estabele-
cer outras tantas barragem de 10m de altura media e 150m de
extensão no coroamento.
Essas barragens, que serão de terra, representarão na me-
dia um volume de 36000ms cada uma e o custo de 108.000$, o
que para 6, darão o total de 648.000$. O estabelecimento para as
mesmas está orçado um por outro em 20.000$ cada um. O ma-
chinismo de tomada d'agua e distribuição nos valles aproveita-
veis em 10.000$, o que reduzirá a despeza real a fazer com a
excavação do canal e obras accessorias em 51.025 por kllo-
metro.
Os canaes primarios de irrigação atravessarão nos 12 pri-
meiros kilometros terrenos bastante difficeis, e servirão para
alimentar ao menos 30 pequenos açudes com a capacidade me-
dia de 10.000 000m3 cada um, com paredes de 8m de altura me-
dia c 120m de extensão no coroamento.
Computadas todas as despezas orçará, termo medio, em 80
contos, cada um desses açudes, o que elevará o total da despeza
a fazer com elles a 2400 contos.
Apresentando estes açudes a represa media de 2000m, a
totalidade do percurso dos cauaes a excavar achar- se- ha redu-
zida a 60 kilometros com a despeza media de 38 contos por
kilometro.
Eis o orçamento de todas as obras :
Desapropriação 79.000$000

5.201.450$000

O valor do m³ d'agua seria de Rs. $0071 .


Para a altura de 45 , nivel d'agua na cota 42, e um vo-
573

Este orçamento foi org nisad aften lendo a tres alturas


differentes di ptrede -r
— 15ª, 25 ″ e 35º .
I- Altura da parede a 15 :
Alicerces, escavação 4.639m3 14.040$900
Concreto 66 185.328$100
Alvenaria 15842m 522.154$000
Dois tuneis lateraes de 300m de
extensão cada um , a razão de 2.000$ 1.200.000$000
por metro corrente
Desapropriação 20.000$000

Total 1.941:522$ 900


O nivel d'agua na cota 13 represent rá um volume de
196.000.000m³, o preço do metro cubico será de Rs. $ 099 .
II -Altura do açude a 25m, nivel d'agua na cota 22m ; vo-
lume d'agua armazenada 420.000.000m³,
Alicerces, escavações 9.9123 29.736$000
66 concreto 66 342.5124000
Alvenaria 52.029m3 1:717-6178000
Machinismo 60.060$000
Sangradouro, escavação 300.000m3 900.000$000
Desapropriação 30,000§006

3.079.865$000
O preço da unidade metrica será de Rs. $0073.
III-Altura 35m , Nivel d'agua na cota 32, volume armaze-
nado 730.000.0093.
Alicerces, escavações 18.327m3 54.980 000
Concreto 66
709.140$000
Alvenaria 104.010m3 3.432.330$000
Machinismo 80.000$000
Sangradouro, escavação 54.000$000
Alvenaria 24,000m3 792.000$000
Desapropriação 79.000$000

5.201.450$000

O valor do m3 d'agua seria de Rs. $0071 .


Para a altura de 45" , nivel d'agua na cota 42. e um vo-
574

lume de 1.440.000m3 , levando somente em conta a desapro-


priação relativa a bacia hydraulica, tem -se;
Desapropriação 120.000$C00
Fundações escavações]
91.800$000
Concreto
1.009.8008000
Alvenaria
6.417.906 $000
Machinismo
120.000$460
Barragem de terra 750.000$000
Sangradouro
583-446$600
9.092.952$000
O valor do m³ d'agua importará em Rs. $ 006.
Tomando, porem, em consideração o volume d'agua real-
mente utilisavel , achado a cota 12, ver- se-á que a parede de
15 dá resultado negativo por elevar o preço dagua a somina
superior as forças da producção agricola
O açude de 25mapresenta os seguintes dados :
Obras de construcção
3.074.868$000
Canaes de irrigação - 84 k. 3.024.000$090
Desapropriação dos terrenos irrigaveis 79.200$000
Total 6.178:068$000
Volume dagua utilizavel 240.000.000m3
Hectares de terra irrigaveis 12.000
Preço por metros Rs. $025
Preço por hectare irrigado -- Rs. 515$238
A parede de 35m dará os seguintes resultados :
Construcção
5.201.450$000
Canaes d'irrigação 120 k. 4.320.000$000
Desapropriação 165.000$000
Totai 9.686.450$000
Volume dagua utilizavel 550,000,000m³,
Hectares de terras irrigaveis 25.000 no maximo .
Preço por m.3 Rs. $017.
Preço por hectare -Rs. 387$ 458 .
A parede de 45m dá :
Construcção 9.092.952$0000
Canaes de irrigação 130 k. 4.680.000$000
Desapropriação
330.000$000
Total 14.102.952 $000
575

Volume dagua utilizavel 1.260.000.000m³¸


Hectares de terra irrigaveis 50.000.
Preço por m³ utilizavel-Rs. 60111 .
Preço por hectares. Rs. 2824059-
Desta comparação resulta ser a parede de 45m incompa-
ravelmente mais barata do que as de 25 e 35 , e a unica eco-
nomicamente vantajosa, não só pelo minimo preço dagua,
como pelo auxilio que vai prestar ao açude de Quixadá.
Comparando-se o preço por unidade metrica dagna do
açude de Quixeramobim com os demais açudes, vê se que o
de Quixeramobim é de Rs. $011 , o de Quixadá eleva- se a mais
de Rs. $034, o de Acarahú Mirim a Rs. $33, e no projectado
açude do Acarape elevar- se - ha á Rs. $060 .
Estudemos as vantagens economicas e financeiras resul-
tantes deste projecto de irrigação.
Pela clausula IV da proposta que dirigimos ao Congresso
Nacional o proponente ou empreza que se organisar, obriga- se
a arrendar as obras por elle construidas, pagando ao governo
15 % da renda bruta, a qual para os primeiros annos foi caleu-
lada no minimo em 3.130.000.
Esta avaliação não foi arbitraria, senta em bases seguras,
como se verá da seguinte demonstração. As culturas a explorar
serão as que commumente se fazem no sertão ; arroz, taba-
co, milho, feijão, fructas e especialmente o algodão, bem como
a alfafa, a canna e outros productos que a experiencia acon-
selhar e o solo permittir.
A producção normal de um hectare de terra irrigada é
para essas differentes culturas a seguinte :
Arroz 8.000 litros.
Milho 7 a 9.000 “
Algodão bruto 3.000 kilos.
Alfafa 10.000 kilos.
Feijão 800 a 1.000.
Canna 90 a 100 toneladas, que com um rendimeato medio
de 10 % dá 9 a 10 tonnelas de assucar bruto. Por medida de
prudencia adoptamos o minimo dessas medias, nos calculos
que vão seguir.
No quarto anno de existencia da empresa poderá esta ir-
rigar 10.000 hectares de terra. os quaes repartidos em lotes de
576

4 hectares acommodarão 2.500 familias de agricultores. cu


20.000 pessoas a razão de 8 por familia, das quaes quatro
ptas a diversos generos de trabalho.

Producção
O seguinte quadro mostra quies serão as culturas prefe-

hectares
unidade
ridas e qual o seu valor mercantil :

rectare
Kaninə
Valor
Valor
Valor

cada
heet
por


de
de

por
GENERO VALOR TO-

da
DE CULTURA TAL

Algodão brut. ] t. 3 135$ 4058


Milho ... 4.5 100$ 450$
Feijão . kls. 600 $300 180 $ 1.035* 2 2.070$000
Tabaco t. 1.23000$ 3.600$ 900$000
Arroz 7 200$ 1.400$ 700$000
Alfata 66 10 100$ 1.000$ 500$000
Canna [ assucar] 9 200$ 1.800$ 900$000
Fructs. diversas " 4 250$ 1.000$ 250$000

Total 5.320$000

O algodão , o milho e o feijão são culturas que se fazem


conjuntamente .
Por 10.000 hectares cultivados no primeiro anno, depois
cultivados
Prodneção

Producção
toneladas

toneladas
hectares

da construcção do açude, a producção total será :


unidade
hectare

Valor
total
por

por
de

]

GENERO
TOTAL
DE CULTURA

Algoda . 3 15.000 135 2.025.000 $000


Milho.. 5.000 4.5 22.500 100$ 2.250.000$000
Feijão 0.500k 3.000 300$ 900.000$000
Tabaco.. 625 1.2 7503.000$ 2.250.000$000
Arroz. 1.250 7 . 8.750 200$ 1.750.000$ 000
Alfafa 1.250 10 12.5001 100$ 1.250.000$000
Canna [ assucar] 1.250 9 13.250 200$ 2.650.000$000
Fructas . 625 4 2.500 250$ 625.000$000

Sommas.... 10.000 78.250. 13.700.000 (0)

A esta producção devemos accrescentar a de 250 hectares


577

das vasantes do rio, excellentes para cultura do arroz, sejam


mais 1.750 ton. de productos no valor de 350 contos, o que eleva-
rá a producção total a 80.000 toneladas, no valor de 14.050.000$
no fim de 5 annos.
Só pelo açude de Quixeramobim poderão ser irrigados
30.000 hect, de terra, dando -se a cada um 12.000m3 dagua, visto
como pelos dados obtidos, só de tres em tres annos se deve temer
a secca, nunca se tendo dado o facto do rio passar dois annos semi
correr. Os 12.000m³ com 3000m³, que receberá da atmosphera ,
formam um total de 15.000m3, superior as necessidades da cultura
intensiva dos generos descriptos.
Esses 50.000 hectares de terras irrigadas poderão receber
12.500 familias que representarão uma população de 100.000
pessoas.
A producção total então será de 400.000 tonneladas assim
repartidas :
PRODUCTO TONELADAS

Algodão bruto .... 75.000, em pluma 25.000


Milho.... 112.000
Feijão ... 15.000
Fumo .. 3.750
Arroz . 45.500
Alfafa . 62.500
Assucar.. 66.250
Fructas 12.500

que produsirá o valor total de 70.250.000 000 , o que para


cada hectare representa uma producção media de S toneladas
com um valor de 1.4054000 . Si applicarmos esses algarismos ao
açude de Quixadá para 8.000 hectares, ao açude de Acarape
para 10.000 hectares, obteremos um accrescimo de producção
para o Estado de 544.000 toneladas no valor de 95.340
contos.

Para attingir taes resultado é porém necessario que a cul-


tura seja submettida a empreza que siga um plano preconcebido
e disponha de crescido capital para poder organisar o trabalho
com os requisitos modernos, facilitando a cada agricultor as
machinas e meios necessarios.
578

O capital necessario para pôr em marcha essa obra collos-


sal será assim repartido :
Construcção das obras principaes .. 25.000.000$
Preparo e organisação de 68.000 h.res a razão
de 500$000 por hectare ... .. 34.000.000$
Alojamento de 17.000 familias de agricultores,
galpões para guardar os productos, etc., despeza me-
dia por cada familia 1.000$ ..... 17.000.000$
Fornecimento de instrumentos agrarios, a razão
da despeza media de 500.000 $ por cada lote ...... 8.500.000$

84.500.000$

Acquisição de sementes, e despeza imprevista


10 % sobre a somma de 59.500.000 $ .... 5.950.000$

Total .... 90.450 000$

A isto se deve addicionar o capital necessario para a in-


stallação de usinas para o beneficiamento dos productos, o que
será feito, quer pela mesma empreza, quer por outra que se en-
xertasse a principal.
E certo que a organisação da empreza não se fará desde
logo com o total do capital necessario, e sim, a medida que os
differentes serviços o exigirem .
Para melhor explicar este ponto, vou demonstrar como
Serão approximativamente repartidas as despezas annuaes da
construcção. tanto pela parte paga pelo governo em apolices,
como pela que tocar a empreza :

PARTE DO GOVERNO DESPEZAS PAR- TOTAL DE CADA


ESPECIFICAÇÃO DAS DESPEZAS CIAES ANNO

1 anno
Desapropriação da bacia do
açude 120.000$000
Fundições 1.101.600$000
Elevação da parede a cota 6 1.497.035$ 100
Canal de ligação ( 1ª parte) ……. 960.000000]
Canal de irrigação (1ª parte) 540.000$000
Açude de Acarape ... 1.160.000$000 5.378.635$ 100
579

PARTE DO GOVERNO DESPEZAS PAR TOTAL DE CADA


ESPECIFICAÇÃO DAS DESPEZAS CIAES ANNO

2º anno
Elevação da parede a cota 36 4.388.876$ 900]
Canal de ligação ………. 960.000$000
Canal de irrigação . 540.000$000
Açude de Acarape . 500.000$000
Canal .6 367.521$750
Desapropriação de 10.000 h.res 66.000$000 6.822.398 $650
3º anno
Conclusão da parede do Qui-
xeramobim ... 1.985.440$000
Conclusão do canal de ligação 960.000$000
do açnde de Acarape 500.000$000
Canal de irrigação do Quixe-
ramobim.. 576.000$000
Canaes de irrigação do A carape 367.521 $750
Desapropriação de 10.000 h.res 66.000$000 4.454.961 $750
4 anno
Continuação do canal d'irriga-
ção de Quixeramobim ... 1.008.000 $000
Continuação do canal do Aca-
rape ... 735.043$560|
Continuação do canal Quixadá 257.269$600
Desapropriação de 10.000 h.rss 66.000$006 2.066.313$ 100
5º anno
Canaes de Quixera mobim .... 1.008.000$000
.. Acarape ... 735.043 $500
66 257.269$600
" Quixadá...
Desapropriação de 10.000 h.res 66.000$000 2.066.313.100
6º anno
Canaes de Quixeramobim.... J.008.000$000
66 66 Acarape 935.043$000
.6
Quixadá 86.517$300 2.029.560$300

Semma ... 22.818.182$000


Administração e eventuaes 10 % 2.281.818$000

Total ..... 25.100.000$ 000

Quantia que arredondando os algarismos fica reduzida a


25.000 contos .
580

DESPEZAS PAR- TOTAL DE CADA


ESPECIFICAÇÃO DAS DESPEZAS CIAES ANNO

As despezas da empreza ele-


var-se -hão :

3a anno
Preparo do solo e canaes se-
cundarios para 15.000 k. a
500$ por hectare .. 7.500.000$000
Instrumentos agricolas neces-
sarios a 500$ por cada lote
de 4 hectares, 3750 lotes ... 1.875.000$000
Casas e galpões para 3750 lo-
tes a 1.000$ por cada lotes 3.750.000$ 000

Somma .... 13.125.000$ 000

Sementes e eventuaes 10 % 1.312.500 $oco 14.437.500 $000


4° anno
Preparo do 14.000 hectares a
500$ . 7.000.000$000
Instrumentos agrarios para
3.500 lotes a 500+ .. 1.750.00c $000
Casas e galpões - 3500 a 1.000$ 3.500.000$000

12.250.0004000
Sementes e eventuaes 10 % 1.225.000$000 13.475 .000 000
5º anno
Preparo de 14.000 hectares a
500$ 7.000.000 $000
Instrumentos agrarios para
3.500 lotes a 500$ 1.750.000 $000
Casas e galpões 3.500 a 1.000$ 3.500.000$000

12.250.000 $000
Sementes e eventuaes 10 % 1.225.000400 13.475.000$000
6º anno
Preparo de 14.000 hectares 7.000.000$000
Instrumentos agrarios para
3.500 lotes a 500$ 1.750.000$000
Casas e galpões 3.500 a 1.000$ 3.500$000$000

12.250.000$000
Sementes e eventuaes 10 % | 1.225.000 $000 13.475.000$000
581

DESPEZAS PAR- TOTAL DE CADA


ESPECIFICAÇÃO DAS DESPEZAS CIAES ANNO

7? anno
Preparo de 11.000 hectares .. 5.500.000$000
Instrumentos agrarios para
2.750 lotes a 500$ 1.375.000$000
Casas e galpões, 2.750 a 1 000 $ 2.750.000$000

9.625.000$000
Eventuaes 10 %…………. 962.500 000 lo .357 .500 $000

Somma 65.450.000 $000

que reunida ao capital empregado na


construcção dos açudes e canaes primarios 25.000.000$000

Forma o total de ... 90.450.000$000

O capital empregado por cada hectare de terra irrigada será


portanto de 1.360 $ 147 , assim distribuido :

Capital pago em apolices pelo governo 368$ 529


66
empregado pela empreza en
virtude da clausula V da proposta .... 991 $ 618 = 1.360 $ 147

Os dados que apresentamos são sensivelmente diversos dos


achados pelos Srs. Revy e O'Meara , porem observaremos que se
trata de terrenos differentes do valle do Icó ; que a taxa cam-
bial adoptada pelo Sr. Revy foi de 200 por mil réis, emquanto .
para o material a importar, nos servimos da taxa de 154. Alem
disto, computamos nos nossos calculos outros factores, taes
como -desbravamento do solo, casas para os agricultores, instru-
mentos agrarios, absolutamente necessarios. Não podemos con-
tar com a iniciativa particular e nem serem os cultores naci-
onaes, que collocarmos em cada lote, absolutamente desprovidos
de recursos. Si estabelecermos a taxa dagua de 50$000 , aliás mo-
dica, [ o Snr. Revy provou que a agricultura pode ao cambio de
20 supportar uma taxa de 6S$000 ] e o preço de 100$ para o ar-
rendamento do terreno, casa, dependencia e instrumentos agri-
colas por h.re , teremos o seguinte rendimento total no fim do
oitavo anno, depois do inicio das obras.
582

Rendimento :
Taxa de irrigação de 68.000 h.res a 50 $ .... 3.400.000
6. " arrendamento " .. 100 $ ...... 6.800.000$
66
de transporte a razão de $ 020 por tone-
lada metrica e por 400.000 t.das de productos e um
percurso medio de 135 kilom... 1.080.000$
Taxa de pesca [ 20$000 por mez ] contando-se
2.000 pessoas empregada nessa industria ....... 480.000$

Somma... 11.760.000$

Despeza da empreza :

Arrendamento ao Governo 15 %. 1.764,000$


Juro e amortisação do capital empregado pela
empreza em virtude de clausula IV—5 %…………. 3.422.035$
Administração 5 % ...... 588.000$
Conservação e renovação de material 15 % .... 1.764.000$
Fiscalisação ... 20.000$

Somma. 7.558.035$

quantia esta que subtrahida da receita dará o lucro liquido de


4.201.965$, que permittirá a empreza distribuir aos portadores
de seus titulos, deduzidas as despezas de direcção, um bonus su-
perior a 4 % . o que elevará o rendimento do capital empregado
(90.450 contos a 9 %.

As apolices do governo , sendo amortisaveis em 50 anno por


annuidades pagas pelo mesmo , serão de 1.375.000. Como a em-
preza pagará uma renda de 1.764.000 terá elle um bonus de....
389.000$.

Nos rendimentos acima, não incluimos o das vazantes por


considerarmol - as como logradouros publicos em caso de calami-
dade.

Vejamos agora qual será o sacrificio dos cofres publicos.


sendo as chamadas de capitaes feitas parcialmente , em alga-
rismos redondos.
583

CHA- CAPITAL CAPITAL ANNUIDADE RENDA


ANNOS PAGA PELO PAGA PELA
MADAS REALIZADO ACCUMULADO GOVERNO EMPREZA
1934 193

25 6.250.000$ 343.750$
30 7.500.000$ 13.750.000$ 756.250$
20 5.000.000$ 18.750.000$ 1.031.250$
10 2.500.000$ 21.250.000 $ 1.168.750$ 187.500
10 % 2.500.000 23.750.000 $ 1.306.250$ 652.500
59Ο 1.200.000$ 25.000.000$ 1.375.000$ 1,082 500

Somma.... 5.981.250$ 1.822.500

Daqui se vê que, findas as obras, a União só terá pago ....


4.158.750$, despeza da qual será largamente compensado, por-
que durante esse tempo terão sido empregados no Estado 90.450
contos, dos quaes 60 % , no minimo, terão entrado directamente
no commercio, o que representaria 54.27o contos. Calculando - se
o imposto de consumo em 20 % do preço das mercadorias, [ taxa
inferior a normal, pois que os impostos aduaneiros e de consu-
mo reunidos vão a 100 % e mais ], receberia a União desta fonte
10.854.000$, o que para ella equivalerá ao lucro de 6.696 coutos.
isto é um pouco mais de 150 % do capital desembolsado.
Pelo que acabamos de expor verifica - se que o sacrificio do
Estado é nenhum e representa para Elle uma excellente opera-
ção financeira.
Feita essa demonstração, passemos a analysar alguns pon-
tos susceptiveis de critica.
DESAPROPRIAÇÃO .-- Em primeiro logar : no memorial re-
mettido em 8 de Outubro do anno passado ( 1908 ), tomamos como
media de preço 24000 por hectare, baseados no preço commum
dos terrenos naquella zona, o qual varia entre 5 e 7 contos de
reis por legua de terra : equivalente a 3.085 h.re 80.25 =
Aqui foi este preço triplicado afim de evitar surprezas, e po-
dermos comprehender nelle as bemfeitorias.
Calculamos somente a desappropriação de 50.000 h.res ,
porque no tocante ao Acarape será conveniente entrar- se em
acordo com os proprietarios, visto o desenvolvimento da agri-
cultura naquella zona .
Este acordo consistirá na organisação de um syndicato ao
qual se encorporaria parcialmente a empreza afim de obter a
584

homogeneidade de direcção no plano de cultura a seguir, porque


si alguns são abastados, o maior numero carece de recursos
para desenvolver as suas culturas.
O mesmo acontecerá em alguns pontos do Quixadá e Qui-
xeramobim, para os quaes reservamos 8.000 hectares : caso, po-
rém, não haja possibilidade de chegar-se a um acordo com os
diversos proprietarios recorrer - se -ha a desapropriação. Dan-
do-se o facto da verba destinada a esse fim ser insufficiente,
suppril- o - ha a empreza com o seu capital particular, ficando.
porem, com o dominio perpetuo dos terrenos por ella adquiri-
dos, para os quaes estabeleceria taxas especiaes afim de, opera-
da a amortisação do capital empregado, ficarem proprietarios
dos mesmos as familias de agricultores nelles localisados.
VALORISAÇÃO .-- Cautamente admittimos que o rendimento
medio de um lote de quatro hectares será de 5.320 $ ou 1.330 $000
por hectare.
Orçando -se do seguinte modo o trabalho do agricultor, tem-
se por hectare de terra uma despeza total de 1.030$, assim re-
partida :
300 dias de trabalho do agricultor & 2$ .. 600$000
98 dias de jornaleiros durante a safra, a 1 $500 147$000
Taxa d'agua. ………… 50$000
Arrendamento do terreno ... 100$000
Reparação de instrumentos, compras de semen-
tes e imprevisto - 10 % do rendimento bruto ..... 133$000
Somma .. 1.030$000
a qual deduzida do rendimento bruto deixa o luero liquido de
300 $.
Tendo no fim da concessão de reverterem ao Governo todos
os terrenos desapropriados e as obras, si calcularmos que 300$
representa o juro de 10 % d'um capital de 3.000$, esses mesmos
terrenos [ 50.000 h.res ) representarão um valor de 150.000.000$;
sendo o total entregue pela empreza ao governo no fim de 60
annos de 175.000:000$.
Ao expirar a concessão, o Governo da União e a empre-
za se acharão reembolsados do seu capital ; será equitativo,
portanto, que as terras valorisadas revertam aos colonos oc-
cupantes, continuando apenas a cobrar- se a taxa d'agua ne-
585

cessaria ao custeio do serviço de conservação das obras e da di-


recção do serviço de irrigação. Esta taxa junta a de pesca e
transporte offerecerá ainda um bello rendimento. Adoptada essa
idéa, apresentada no contracto definitivo, ao cabo de 5 ou 8
aunos de occupação o colono receberia um titulo de propriedade
transmissivel. Sendo, no caso de transmissão , o seu successor
obrigado a aceitar os compromissos tomados para com a em-
preza pelo antecessor.

Julgamos ter, sufficientemente, esclarecido esse assumpto


e provado a exequibilidade de nosso projecto, cuja a idéa nos
foi suggerida pelos Snrs. Dr. Thomás Pompeu Sobrinho e Za-
charia Magalhães, que poderosamente nos coadjuvaram na sua
elaboração.
Terminamos aqui agradecendo ao Dr. Thomaz Pompeo
de Souza Brazil a benevolencia com que acolheu nosso modesto
trabalho e a honra que lhe fez incluindo- o na sua obra. ( 1)
AÇUDE DE QUIXADA .- Nas paginas anteriores referi-
me a ideia iniciadora deste açude e aos varios acidentes de
sua construcção.
E' a primeira obra difinitivamente concluida por conta do
serviço federal organisado contra as seccas
Seu custo, que ascendeo a cerca de 5 mil contos, não re-
presenta realmente a despeza feita com as obras. Por sua ver-
ba correram gastos com serviços extranhos, entre os quaes
avultam os concernentes a soccorros com as victimas da secca.
Seus dados technicos communicados ao Almanach do Ceará
pelo chefe da commissão, Dr. Piquet, são os seguintes :
OBRAS DE AÇUDAGEM. -A bacia hydrographica é constituuida
pelos valles dos riachos denominados Verde, Caracol e Sabiá
que, quando já reunidos, foram cortados pela Barragem Central.
Esta barragem dista da cidade de Quixadá, que é servida
pela ferro- via Baturité, cerca de 5 kilometros .
DADOS TECHNICOS .--Area da bacia hydro-
graphica ..... 210.000.000m2.
Area do açude cheio, na cota de 15 ...... 21.800.000m2.

(1) Este trabalho é do engenheiro Julio Destord .


586

Profundidade maxima 16m


Profundidade média 6m.3
Perimetro ... 91.000m
Capacidade 137.500.000me.
Numero de barragens ..
Numero de sangradouros .. 2
Extenção total das barragens .. 1.338m,5
D'estas barragens, uma, a Central, é de alvenaria de pedra
ǝ as outras tres de terra.
BARRAGEM CENTRAL - Em curva : Raio ………. 249m
Extensão 415m
Largura ... 15m
Largura no corôamento, na cota 16m.5 ………. 3m
Altura maxima 16m.5
Volume .... 61.200mc.
Secção transversal : Typo Krantz. Foi suspensa a sua
construcção na cota 15m, 30 .
BARRAGEM DO NORTE -Comprimento ... 209m
Largura no coroamento, na cóta 17m ... 3m,5
Talude ... 1: 1,5
Altura maxima, cêrca de 5m
Revestida de pedra. Custou cêrca de 10 contos.
BARRAGEM AUSTRAL - Comprimento .... 240m
Largura no corôamento, na cóta 17m ... 4m
Talude ... 1.1.25
Altura maxima ... 17m
Revestida de pedra. Custon cêrca de 152 contos.
BARRAGEM DOS FORGES -- Comprimento .... 464.5
Largura no corôamento, na cóta 16.4 . 2m
Talude a montante ... 1:2
Talude a jusante .. 1: 1,5
Altura maxima….. 2m.08
J SANGRADOURO - Comprimento 67m
Largura na base ……….. 5m
Cóta do corôamento . 14m.5
Volume 1.323mc.
Assentado sobre rocha descoberta, é de alvenaria de pedra.
com paramento interne vertical e o extremo parabolico. Cus-
tou cerca de 21 contos.
537

2º SANGRADOURO. - Com o comprimento de 23m aberto na


propria rocha, custou 3:500$000 .
TORRE DE TOMADA D'AGUA- Construida de cantaria, é si-
tuada do lado de dentro da grande barragem, com a qual faz
corpo commum.
-Tem em planta a fórma de um meio hexagono,
-A tomada d'agua é feita por meio de tres comportas col-
locadas uma em cada face do hexagono, sendo a primeira no
fundo, a outra circo metros mais alta e a terceira a dez
metros.
A primeira d'estas comportas é toda de bronze e as duas
outras de ferro .

-A agua sae da torre para o Canal Medidor, por uma aber-


tura ou boeiro aberto na propria barragem. Na entrada deste
boeiro, que é duplo, ha duas pequenas comportas, ditas de
segurança, que impedem a saida da agua no caso de accidente
nas outras e servem ainda para equilibrar a pressão nestas
quando o açude estiver muito cheio.

OBRAS DE IRRIGAÇÃO -A agua para os serviços de irriga-


ção é conduzida por um canal unico denominado Principal,
aberto na encosta da direita do valle a que vae servir.
Em seu inicio é de alvenaria na extensão de cerca de 300
metros, tomando nessa parte o nome de anal Medidor, por-
quanto tem por fim medir as descargas dadas.
O Canal Principal —termina em uma construcção de alvena-
ria denominada Partidor, onde as aguas que chegam são dividi-
das em partes proporcionaes ás áreas que tem de irrigar.
Do Partidor em diante, o Canal Principal divide se em dous
ramaes- Norte e Sul, um pela encosta esquerda e outro pela da
direita do valle a irrigar. Em seu percurso os ramaes cortam
normalmente pequenos riachos e uma serie de contrafortes, de
material geralmente impermeavel, proprio para a construcção
dos aterros, mas as vezes cobertos de blocos graniticos que obri-
gam a desenvolver os canaes pela meia encosta.
O systema geral de irrigação será o de dar descargas pro-
ximo da travessia dos riachos.
588

Essas descargas são de 100 litros por segundo para cada 80


hectares a irrigar.
O Canal Pri..cipal, iniciado a 18 de Setembro de 1900 , termi-
nou a 20 de Fevereiro de 1901.
Começa na estaca 18 + 13 . 36, onde acaba o Canal Medidor,
e termina no Partidor na estaca 94.
As obras de arte principaes estão todas concluidas, inclusi-
ve os dois grandes tunneis que foram encetados em 1904 ; e os
canaes que teem nma extensão prompta de dez kilometros e
meio podem irrigar pelas suas 27 comportas de descarga uma
área de 390 hectares, ou salvar, uma vez o açude cheio, cerca
de 7.800 individuos.
) inverno de 1904 foi de 670 millimetros, porem tão par-
(
ciaes as chuvas que não deram para elevar o nivel do açude
senão á altura de 1,45 de 0,68 ' a qual havia descido. A colheita
de milho foi quasi nulla e a de feijão muito boa.
Está de todo interceptada a communicação entre o açude e
o antigo leito do rio Satiá ; a água que sáe d'aquelle só póde ser
conduzida pelos canaes de irrigação.
A cidade de Quixadá já é supprida d'agua pelos canaes : a
distancia percorrida é de 7.200 metros em 24 horas.
Entre as 20 obras de arte construidas nos canaes já expe-
rimentados contam-se as seguintes :
O Canal Medidor, todo de alvenaria de pedra, com 360 me-
tros de comprimento, fechado por duas grandes comportas de
peso de 645 kilos cada uma.
Esta obra custou 140 contos e foi construida em 26 mezes .
O Partidor, ou divisor das aguas, tambem de alvenaria de
pedra e pedras de apparelho nos assentos, armado de 6 compor-
tas de ferro, custou 20 contos.
A Ponte-aqueducto sobre o rio Manaia, de alvenaria de pe-
dra até as empostas e de tijollo a parte restante, é esconsa de 45
gráos e tem dous vãos em arco abatido de 6,3 cada um e flexa de 4.
Custou 14 contos.

Finalmente a Ponte-aqueducto sobre o rio Satiá, recta,


tem vão duplo de 10 metros cada um em arcos abatidos de
tambem .
589

A ponte é de alvenaria ordinaria de pedra, mas os areos


são de apparelho .
Custou 57 contos.
DADOS TECHNICOS - CANAL PRINCIPAL
Secção de vasão ... 6m.9
Declividade.. Om,20 por kilom.
Velocidade .. 051 por segundo
RAMAES —A secção de vasão varia depois de cada descarga
de loo litros, assim como depois de cada declividade .
A velocidade mantem-se constante de 0,51 .
(
) volume effectivo para irrigação é calenlado em..
125 694.200 metros cubicos e dá para irrigar uma superficie de
2.572 hectares durante 5 mezes em 3 annos successivos. Em ca-
da periodo de 5 mezes pode se obter duas colheitas de milho
ligeira, de feijão de moita, pastagens e grande quantidade de
legumes.
Calcula- se em 70 mil a quantidade de peixes annualmente
pescados no Açude .
A despeza effectuada até dezembro de 1903 , foi de ………….
4.456:892 249. (1)
A IRRIGAÇÃO NOS PAIZES QUENTES . - A quem des-
conhece os resultados colhidos nas regiões intertropicaes on de
clima quente por meio da irrigação artificial, os votos ou as-
pirações, aqui externados em relação a sua efficacia no Ceará.
parecerão optimistas ou exagerados. Como estudo comparativo
seguem -se as seguintes informações, bebidas em fontes paras.
as quaes, espero, levarão a convicção ao leitor, se duvida ainda
possa pairar no seu espirito, sobre as vantagens agricolas basea-
das neste processo cultural.
Começarei pela Algeria, cujo clima e topographia muito se
approxima ao do Ceará :
"A questão das aguas, diz Doumere ( 2) tem representado
de longa data , na Algeria. consideravel papel. Os Mouros, os
Turcos, os proprios Arabes, deixaram em muitos logares vesti-
gios de importantes trabalhos destinados a assegurar a alimenta-

( 1 ) Esta noticia sobre o açude de Quixadá é de fonte official,


communicada ao Almanaque do Ceará para 1955, pag. 59.
(2) Doumere - Les barrages riservoirs de l'Algerie.
590

ção d'agua potavel nos centros que habitavam : e, relativamente


a vida agricola , encontram -se frequentemente fontes ou barra-
gens construidas para irrigação das terras. "
Referindo-se a quantidade das chuvas caídas, pondera
aquelle escriptor que - emquanto a media franceza é de 780
millimetros, a do Sahel d'Alger, em periodo de 40 annos, não
excede de 735 millimetros (no Ceará por auno é de 1.400 milli-
metros . ) Alem disto, prosegue Doumerc, a repartição das chu-
vas, não só por estações, como por localidades, está sujeita a
maior variação, e de um para outro anno, verifica- se, já para
um mesino mez, já para uma estação, consideraveis differenças .
“Assim o curso dos rios e ribeiros algerianos apresenta as
maiores irregularidades. Não são cursos d'agua que faltam, mas
ha muitos delles mais temporarios do que permanentes. Na zona
costeira todos despejam no mar, depois de um percurso mais ou
menos sinuoso ou directo ; nos planaltos, entre as cadeias de
montanhas que as ladeiam ao norte e sul, as aguas das monta-
nhas vão se lançar em immensas bacias fechadas, onde se eva-
poram sob a influencia dos calores estivaes ...
"A natureza argilosa do solo, que se oppõe a infiltração e
favorece o deslisar d'agua, a elevação da temperatura, que avo-
luma a evaporação, a duração da estação humida, as grandes
quedas d'agua que se precipitam em algumas horas, a carencia
quasi completa de chuvas no verão, tudo isto constitue, para os
cursos d'agua d'Algeria, um regimen especial que crea ao hy-
draulico grandes difficuldades, collocando o agricultor em situ-
ação frequentemente preeraria.
A divisão pouco mais ou menos igual do auno em duas es-
tações acentuadas : inverno, durante o qual cae quasi toda
chuva do anno : verão , no qual a secca é continua e crescente,
caracterisa o clima algeriano ... As plantas vivazes, utilisadas
por suas folhas e as annuaes, cujo desenvolvimento dura a mór
parte do anno, exigem forçosamente ser regadas desde o adven-
to da estação quente .
D'ali a importancia da irrigação do verão para a agricul-
tura algeriana.
"A hydraulica agricola tem, na Algeria, duplo problema a
resolver : a irrigação do verão nas regiões orientaes, a irrigação
em todas as estações nas do poente. E essas irrigações, para
591

produzivemi o maximo effeito util, devem ser sufficientemente


abundantes."
Como se vê destas citações, o elim , as condições geologi .
cas e topographicas da Algeria são exatamente as do Ceará,
sendo para notar a differença favor deste : primeiro em rela-
ção a quantidade, dupla, de chuvas que recebe ; segundo - não
necessitar em parte alguma de seu territorio de irrigação na
estação pluviosa, nos annos regulares.
A semelhança ainda é maior se descermos as minueias .
Doumere nota que os poços e fontes são tidos como recursos
preciosos, embora na estação secca a mór parte delle , fiquem
reduzidos a simples buracos onde a agua aparece por filtração
demorada ou cessa de aparecer.
Relativamente aos riachos, ou mais propriamente as aguas
pluvines, deslisam para o leito das ravinas ou valles, e na esta-
ção invernosa, engrossam desmedidamente. "E' com essas aguas.
acrescenta elle, que as irrigações de inverno e de verão se tor-
nam possiveis e faceis : as primeiras pela creação de diques e
de barragens que enviem aos canaes de derivação certa fracção
do despejo dos riachos; as segundas pelo estabelecimento de bar-
ragens- reservatorios nos quaes se vão armazenar, de setembro a
abril, todas as aguas caidas á superficie da bacia hydraulica, e
onde serão tomadas, de maio a setembro, para serem distribuidas
por canaes de irrigação, sobre a extensão da zona irrigavel.
"Essas barragens- reservatorios são geralmente situadas á
saida do riacho ou de alguns de sens affluentes no valle princi-
pal, em ponto cuja distancia, existente entre os dous flancos do
valle secundario e a constituição geologica das ribanceiras ou
margens, permitte assentar solidamente a espessa muralha que
deve reter uma massa d'agua, as vezes com a capacidade de 40
milhões de metros cubicos. Os declives das montanhas, que for-
mam as paredes da bacia de reserva, são em geral estereis e
nuas, de modo que o estabelecimento desses immensos reserva-
torios não prejudica aos ribeirinhos senão ligeiramente, poden-
do ser cons' ruidos outros nas partes altas do valle principal sem
receio de prejudicar aos seus raros habitantes "
Como na Algeria, os nossos rios ou mais propriamente ---
ravinas -são meios canaes, arenosos, abertos nos valles, por on-
de se escoam as aguas pluviaes na estação invernosa ; como elles
592

deixam apenas poços no seu leito na estação secca, sendo certo


que muitos descem de serras seccas, de faldas estereis, nuas, im-
proprias para agricultura. ( 1)
O simile é tão perfeito quanto comportam lugares distantes,
em latitudes diversas, mas de zonas equivalentes. Vejamos que
trabalhos de irrigação tem sido effectuados. qual a intervenção
do governe, os resultados economicos colhidos.
Si é verdade que, em solo tão agreste por falta de humida-
de, a industria humana conseguiu modificar as condições agri-
colas a ponto de tornal - o rico, producutivo, nenhuma razão ha
para recusar exemplo, ou repudiar a lecção, cujos ensinamen-
tos se impõem.
Uma das primeiras autoridades vivas em materia de irriga-
ção - A. Ronna—( 2 ) refere- se por estes termos aos açudes alge-
rianos :
"A construcção de reservatorios impoz - se á Algeria pela
colonisação das terras, as quaes sem irrigação são absolutamen-
te estereis, mas de maravilhosa fertilidade com o auxilio della. [ 3 ]
"Quatro systemas foram postos em pratica na construcção
dos reservatorios da Algeria :
1 -O Estado executa as suas expensas os trabalhos, e os
cêde a um syndicato.
2º -Os trabalhos se fazem por conta de uma companhia
concessionaria, subvencionada pelo Estado, ou com o capital,

(1 ) La massima parte de'corsi d'acqua dell'Algeria sono,


come moltissimi in Italia. torrentizi, cosi che mentre vanno sog-
getti nel verno a piene strabocchevoli, quali ad esempio quella
dell'Habra nel 1881 , di cui parleremo in seguito, sono poi nella
state affatto asciutti. Il massimo fiume dell'Algeria, il Cheliff,
che ha un bacino imbrifero di ben 40.000 chilometri quadrati,
non porta alla state che 304 m. c. di acqua, sempre torbida come
si provenisse da recenti pioggie, e non da sorgenti. Zoppi e Tor-
ricelli —Laghi artificiali dell'Algeria, della Francia e del Belgio - Ro-
ma- 1886. pag. 7 .
[2 ] A. Ronna-- Les Irrigations, Paris 1888 , vol. I, pag. 506 .
Veja tambem Zoppi e Terricelli-Laggi artificiali, dell'Al-
gelia etc.. Roma- 1886 -pags . 39 e 40.
[3 ] M. Aymard- diz que "esta terra, de natureza tão re-
belde, tornou se, pelos processos de irrigação, uma das mais
ferteis e mais proprias a cultura do algodão. "
Irrigat, du midi de l'Espagne -Paris, 1864.
593

cujos juros são por elle garantidos, a 5 por cento, darante 30


annos, passados os quaes o Estado e a Companhia participam
da renda.
Neste systema a administração fiscalisa os projectos e a
execução dos trabalhos.
3 -Um syndicate subvencionado pelo Estado executa os
trabalhos.
4 -O Estado concede a Companhia parte das terras irri-
gaveis.
De acordo com esses systemas, a barragem do Hamiz e a
de Marengo foram executadas por conta do Estado : a de Ha-
bra por companhia concessionaria, tendo recebido parte das
terras irrigaveis : a de Chaurfas por conta da associação syndi-
cal do Sig, subvencionada por um terço das despezas : a do Sig,
executada pelo governo, foi posteriormente concedida ao syndi-
cato deste nome. Finalmente o projectado reservatorio de Bu-
Rumi deve ser feito por um syndicato.
HAMIZ. Este açude fica situado na corrente do mesmo
nome, proximo a villa de Fonduk, a 32 kilometros de Alger, a
entrada de uma garganta estreita, aberta nas montanhas que
ladeiam a planicie do Mitidja . E' o mais recente, e o que mais
aproveitou a experiencia adquerida.
Tendo sido começado em 1869 só terminou em 1881 ; a
maior altura do dique é de 38 metros, sua extensão na bise é de
40 metros, no alto de 167 m. , tendo a espessura de 27m.80 na
base, e 5 metros na corôa.
A capacidade do reservatorio é de 14.000.000 de metros
cubicos, segundo Doumere [ 1 ] e de 30.000.000, segundo Ron-
na. [2]
Seu despejo, no periodo irrigatorio, pode ser elevado a
1.100 litros por seguudo, o que permitte regar, quer na margem
esquerda, quer na directa do ued-el Hamiz, a superficie de 30.000
hectares de terreno.
A agua do reservatorio serve exclusivamente para as irri-
gações da planicie, prados ordinarios e artificiaes, milharaes, ce-
vada e trigo candial.
A bacia hydrographica estende- se por 14.060 hectares, e re-

(1) Doumere - Obr citada, pag. 228.


[2 ] Ronna - Obr. cit. vol . I, pag. 509 .
594

cebe, segundo avaliações dos ultimos annos, 70 milhões de me-


tros cubicos d'agua de chuva, cuja quinta parte basta para en-
cher o açude. Sendo as filtrações no terreno pouco abundantes.
escôa - se o restante, parte para o Hamiz, parte perde- se por eva-
poração , calculada em 1 centimetro por dia no verão.
Por sua situação sobre conglomeratos calcareos, parece offe
recer notavel solidez, salvo, comtudo, a margem direita. Seu di-
que é rectilinio, como a da mór parte dos construidos na Al-
geria.
Relativamente a tomada d'agua e a descarga dos limos, as
barragens algerianas são semelhantes as da Espanha.
As tomadas d'agua consistem em um ou alguns poços, cuja
parede, do lado da represa, está furada em differentes alturas
de barbacans, de sorte que a agua possi penetrar no aqueducto
de tomada d'agua, qualquer que seja a altura da vas , en a
conduzir.
No fundo do poço estão dispostas uma ou mais galerias,
fechadas por portas de corrediças com cremalheira dentada .
Rodas entrosadas, que se manobram pela parte superior, per-
mittem regular com extrema facilidade a quantidade d'agua que
deve ser entregue as irrigações .
O canal de descarga superficial da bacia do Hamiz consiste
num escoadouro cavado no conglomerato da margem direita,
seguido de um canal de larga secção, cujo desenvolvimento dá
lugar a tres quedas successivas, antes que a agua entre com fra-
ca velocidade no leito da corrente.
Esta obra custou 5.000.000 de francos, armazena 13 000.000
de metros cubicos, vindo a custar cada metro cubico 0, 23 cen-
timos. -Dedusindo - se a quarta parte como gastos de custeio , e
o beneficio de 0, fr. 0 1 centimo por metro cubico, que permitte
servir um juro de 4 por cento ao capital empregado, verifica - se
que o colono agricultor deverá pagar o preço consideravel de 0
fr. 30 centimos por metro cubico .
HABRA. A barragem do Habra foi começada em 1865 e
terminada no inverno de 1871-72 ; está situada acima da con-
fluencia dos dous rios, o Ued - Fergug e o Habra, á pequena dis-
tancia da villa de Pessegaux. Sua espressura é de 4,30 na co-
rôa e de 27 metros na base. A bacia drainada pelo Habra é
avaliada em 800.000 hectares representando, a razão de uma
595

queda d'agua pluvial annual de 30 a 40 centimetros de altura.


um volume de 2.800 milhões de metros cubicos, dos quaes 1/93
bastam para encher o reservatorio.
A perda por evaporação é estimada, na mredi , em 1 centi-
metro por dia, durante o verão .
Fundada em terreno misceno medio [ areias e argilas em
camadas alternadas de espessura variavel], atravessado de nu-
merosas falhas, a barragem esborooa -se, de 13 a 14 de dezembro
de 1881. sob a pressão de enorme chuva de 171 millimetros, que
corresponde a 127 milhões de metros cabicos Nos primeiros annog
as infiltrações e fugas eram taes que o dique funccionava, pode-
se dizer, como filtro ; mas pouco a pouco o carbonato do cal
deposto pelas aguas obturaram as fendas .
As causas desse desastre, diz Ronna, não devem ser impu-
tadas a algum vicio de construcção na muralha do dique, mas
as fundações, pela má escolha do local. A 5 kilometros acima. a
obra teria repousado em rocha, em condições de perfeita so-
lidez.
Seja como fôr, a muralha -barragem foi reerguida no mes-
mo local, seguindo perfil de para:nentos parabolicos, calculado
para resistir mais completamente do que a primeira as pressões
d'agua ; o reparo de 1883 a 1884 comprehende a reconstrucção
do grande muro longitudinal, desde a brecha até a margem
direita, e de outros serviços.
Com o despejo de 3 metros cubicos por segundo , este re-
servatorio, mediante os dous canaes Perregaux e o da Compa-
uhia, regaranı 15.000 hectares de terreno, seja 1 litro por se-
gundo para 5 hectares .
Acerca de seu custo são estes os dados fornecidos por A·
Ronna. [ 1 ] Sobre a despesa inicial de 4 milhões de francos, 3
milhões incumbiram ao reservatorio, dos quaes 500.000 frs .
deveriam se dedusidos para accessorio ; 2.500.600 frs. repre-
sentam as despezas do dique. Esta somma, attendendo ao
cubo da alvenaria, corresponde a 25 por cento menos que a
do dique de Hamiz. E' que a cal para o de Habra foi fabri -
cada ao pé da obra, em lugar de ser importada, tendo sido os
outros materiaes preparados no paiz Sem o accidente , que ne-
cessitou para reparo das alvenarias 12.00.000 frs. e para outras

[ 1 ] Ronna- obra cit. vol. I, pag. 517.


596

obras 500 000 frs , o preço do metro cubico d'agua armazenada


teria sido somente de O frs. 13. Actualmente é de O francos 18
centimos.
O SIG -Ainda neste açude foram commettidos os mesmos
erros que no de Habra. Por economia e para se não fazer bar-
ragem mais estensa, embora sobre fundo solido, de rocha,
preferio o syndicato do Sig erguel-a em lugar argiloso, de
pouca consistencia. Um mez apenas depois de ter recebido a
carga d'agua, cedeo o lado direito, esboroando-se o dique por
uma desena de metros. Esta barragem, situada a 3 kilo netros
acima de St Diniz do Sig, foi erguida de 1882 a 84. A outra,
mais abaixo, á 22 kilometros, compõe -so de duas partes
distinctas, segundo J. Doumere : [ 1 ] uma construida em 1843
pelo corpo de engenheiros militares no lugar da antiga barra-
gem turca ; a outra em 1858. A altura total da represa é de
25 metros, 50 centimos, seu volume de 3.275.000 metros cubi-
cos. Apezar de seus alicerces bem construidos, não pôde re-
sistir ao empuxo dos 16 milhões de metros cubicos d'agna
que desabaram do açude superior ( Grande Cheurfas.)
Estão em via de reconstrucção. A despeza se elevará a
1.600.000 frs., dos quaes 1.200.000 frs. dados pelo Estado,
200.000 pelo orçamento da Algeria e o restante pelo syndicato
do Sig. Enquanto não se erguem , estabeleceram uma barra-
gem de derivação provisoria, que tem servido para as necessi-
dades da lavonra.
ARZEW. A dique do riacho Muley Magaon, collocado a 3
kilometros d'Arzew, foi construido parte de argila, e parte
de alvenaria, sobre schistos quartzozos. Por pouca estensão da
bacia hydrographica. o reservatorio não se encheu , isto é, não
attingiu a 1.000.000 de metros cubicos : além de que as infil-
trações e fugas d'agua forão tão grandes que o reservatorio
não foi aproveitado para a irrigação, nem para alimentação
de Arzew.
TLELAT. - Depois de ter sido construido um primeiro dique
de terra atravéz do riacho Tiêlat, em 1862, e de ter o mesmo
dique, apoz dous annos de serviço, arrombado, ergueram um
novo, de alvenaria, no lugar chamado Caracol. Tendo o Estadɔ
tomado a si a execução deste trabalho, concedeu gratuitamen-

[ 1 ] J. Doumerc--obra cit., pag. 238.


597

te parte das aguas para a alimentação da communa de Santa


Barbara, e vendeu o resto aos cultivadores para rega dos jar-
dins e das terras de S. Luciano. A capacidade do agude é de
700.000 metros cubicos.
DIJIDINIA- O dique sobre o richo deste nome fica a 7 kilo-
metros de Saint-Aimé, occupa o lugar de uma antiga barra-
gem, cujas ruinas veem -se ainda no seu leito. Permitte irrigar
2.500 hectares a margem esquerda do mesmo. Sua represa tem
a altura de 17 metros : a estensão da muralha é de 50 metros,
sendo a espessura de 11 metros na base, e 4 metros na coroa
Sua capacidade é avaliada em 2.000.000 de metros cubicos,
mas, acha se presentemente reduzida pela accumulação da
vasa a 500.000 metros cubicos. O riacho pode fornecer o volu
me de 1.500.000 metros cubicos d'agua por anno, pelo que
tratam de erguer a barragem de mais 8 metros, mediante a
despeza de 3.500.000 frs , afim de poder armazenar 5.000.000
de metros cubicos.
MARENGO .-- A 4 kilometros de Marengo, atravez do valle do
ued- Meurad, ergue-se esta barragem, construida de terra ba-
tida, com a altura de 21 metros, espressura de 90 metros na
base e 3,50 no alto, e o comprimento de 130 metros.
Pode reter 800.000 metros cubicos d'agua, e irrigar 500
hectares, sendo seu despejo normal de 50 a 60 litros por se-
gundo. Foi erguido de 1853 a 1857 por Malgraine, engenhei-
ro notavel, que empenhou os recursos pessoaes para concluil- o .
Senta sobre basalto, está provido de um poço, como os reser-
vatorios da Espanha e de um canal de despejo para os limos ou
vasa. Funciona perfeitamente bem, mas o preço d'agua é exor-
bitante : fr. 45 centimos por metro cubico.
RESULTADOS ECONOMICOs -- Resumindo o que fica dito .
pode se concluir que a má construcção de quasi todas as bar-
ragens, e a diminuta capacidade dos açudes, o preço excessivo das
obras, etc., não permittem retirar delles todas as vantagens que
eram de esperar. O custo d'agua, sobretudo , impede que o
agricultor algeriano colha os resultados economicos da irri-
gação. (1 ) A despeito disto, a proporção da productividade do

[1 ] E' este o principal argumento contra os pequenos açu-


des, nos quaes o preço d'agua fica as vezes tão alto que não pode
ser empregada em condições economicas vantajosas .
598

solo irrigado para o que não é regula de 1 para 4, e em


alguns lugares mais. Por outros termos : si um hectare de
terreno não irrigado produz 200 kilos de algodão, irrigado
produz S09, 1.000 e 1.300 kilogrammas !
Os trabalhos accessorios dos diques custaram de 10.000 a
500.000 francos, segundo a altura e as disposições adoptadas
para a tomada e a descarga d'agua. Quanto a canalisação, re-
gos principaes e secundarios, representam por um despejo de
2 a 3 metros cubicos por segundo a despeza de 100.000 frs, vo
Hamz e Habra.
A questão do envazamento é talvez a mais melindrosa e
difficil de resolver. A quantidade de vasa accumulada - an-
nualmente no fundo dos açudes é tão grande que basta alguns
aunos para inutilisal-os ; regula 1,35 nos açudes da Algeria.
e 1 60 nos da Espanha. [ 1 )
Neste ultimo paiz a questão tem sido resolvida pelo secca-
mento completo do açude em certos periodos, o que não é
praticavel na Algeria e quando o fosse, occasionaria a perda
do limo e de enorme quantidade d'agua, facilmente aprovei-
favel.
Pelo seguinte quadro se poderá apreciar rapidamente o
serviço de irrigação na Algeria :

1 ] E' ainda outro argumento contra os pequenos açudes,


de 10 à 20 milhões de metros cubicos, como são os da Algeria.
KEPREZA das
Custo da
Quantidade Custo
DIQUES LATA obr
em as d'agua
re- agua
no
LOCALI- francos em
presado açude
em
E DA OBSERVAÇÕES
DADES metros
cu- francos
AÇUDES CONCLUSÃO bieos

Altura

na corôa
Estensão
met
. .
met c.mub./
por
H
Oamiz Alger 1884 .
162 38 3.000.000
13.000.000
0.32 .
alven
de
Dique
Habra Oran 1872 325 30.000.009
35.60
4.000.0000.13
Cheurfas
Os 1884 155 30
. 1.160.000
16.000.009
0.07
1
( 858
Sig 66 97 26.50 3.500.0000.17
596.000
1881
Tlelat 66 1869 99
21 200.000 550.000 0.36
Dijidinia 66 1876 17
60 450.000
2.000.0000.22
Alger
Ued
-Meurad 1864 120
18 892.000 0.45
400.000 areia
de
Dique
Nova
Dijidinia
Oran 60
25 800.000
5.000.0000.16

70.942.000
10.606.000
599
600

ESPANHA. - Os aspectos climatericos e o regimen pluvial


de grande parte da Espanha apresentam notaveis semelhanças
com os do Ceará. A mesma irregularidade pluvial, ora mani-
festando - se por precipitações aquosas abundantes, excessivas,
ora por chuvas escassas, espaçadas e fracas.
Anteriormente, a pagina 414 consignei o testemunho de A.
Llaurado sobre a topographia e regimen dos rios esparhóes :
eis o de A. Ronna. [ 1 ]
"A mór parte dos cursos dagua espanhóes (Tejo , Guadiana
Guadalquivir]. torrentes devastadoras em parte do anno, seccam
no verão. Não goza, como na Italia spetentrional, desses ad-
miraveis lagos que servem de reservatorios, onde as aguas se
reunem, depositam o límo, e abandonam as suas correntes tor-
renciaes, tornando-se assim reguladoras da irrigação.
"O que forma ao contrario um des siguaes distinctivos dos
rios hespanhóes é a extrema variedade de seu regimen. No in-
verno e na primavera, quando a maioria das culturas não recla
mam irrigação , rolam consideraveis massas dagua, cujo limo
poderia servir para fertilisar vastos espaços desvalorisados ou
simi- incultos, mas actualmente quasi inutilisados.
"Com excepção da parte septentrional, não abunda agua
em parte alguma, sendo as chuvas raras. As mais elevadas mon-
tanhas, taes como os Pyrenneos, a Serra Nevada, pouca agua
fornecem ...
"As temperaturas oscilam entre + 45° e -15 °, isto é, com a
differença de 60 gráos cent. : a secca offerece desvios não menos
singulares ; por uma camada dagua pluvial de 0,387, a evapo-
ração, nas provincias do Murcia e Malaga, rouba só na estação
estival 2,048. [ Mais do que no Ceará, como se poderá ver na
pagina 239 deste livro].
A chuva media na vertente meridional é de 0,533, dos
quaes 0,188 no inverno e 0,020 somente no verão. O numero
de dias pluviosos é de 50 durante o anno.
"A desigual repartição das chuvas, junta a disproporção
enorme entre a camada dagua pluvial e a evaporação, requer
imperiosamente a irrigação e assignala -lhe inapreciavel valor

[ 1] Ronna- Les irrigations - Paris, 1888, vol. I, pag. 223 .


601

nas provincins de Valencia, Murcia, Malaga, nas quaes a relação


entre as terras de igual qualidade, irrigadas e não irrigadas, é
de 3 para 1 .
"A mór parte das terras e das culturas, debaixo de uma at-
mosphera secca, serena e transparente, e de um sol ardente, fi-
cariam calcinadas se não fossem irrigadas.
Assim a agua adquire tal valor "que ha interesse em a re-
tirar de 30 e mesmo de 40 metros de profundidade, como Ale-
ria e Carcagnente, para a cultura de larangeiras, onde o he-
ctare se paga, segundo Llaurado [ 1 ] até 30.000 francos.
Região desprovida de humidade, sujeita a alternativas de
chuvas copiosas ou escassas, irregulares e a longos intervallos, re-
queria a irrigação artificial, como meio de corrigir esse regimen .
E bem o diz Durand Claye [ 2 ] “a rega artificial é de uma neces-
sidade absoluta na Espanha onde a seccura atmospherica, a in-
sufficiencia e a irregularidade das chuvas não permittem obter
para as culturas a quantidade dagua que as suas necessidades
exigem."
Eis os principaes açudes desta região :
ALMANSA. -E' o mais antigo da Espanha por ter sido con-
struido em 1586. Permitte regar 1 vez por anno 350 hectares ou
700 h. quando cheio. E' alimentado por 5 regatos e por aguas
pluviaes. O dique, de forma poligonal, tem 89 metros de com-
primento por 20m, 69 de altura, e 10m, 20 de espessura na base
com 3m,98 na corôa.
Sua capacidade é de 1.400.000m³. O dique é em degráos,
sendo a pressão maxima de 14 kilg. por metro quadrado. As-
senta sobre calcareo compacto . [3 ] O sangradouro tem 12m de
abertura.
ALICANTE OU TIBI, construido de 1579 a 1591. E' o mais
importante da Espanha. Está situado atravez do rio Monegie .
Seu dique é de alvenaria, tendo de comprimento no alto 0,43,

(1) Llaurado—Irrigations en Espagne ; Journal d'agricult—


1877.
[2 ] Durand Claye - Hydraulique agricole Paris 1892, vol.
II,
pag. 341.
[3] Veja-se Llaurado - Aguas y riegos, vol . I, pag. 211.-
Crugnola- obr. cit. , pag. 40.
602

em baixo 6, desenvolvendo - se por 142m, dos quaes 58m na gar-


ganta, com a altura de 42m , 70 e a espessura na base de 32m, 50 ;
na corôa 20m, nos alicerces 33m70 - represa 5.000.000m , cub . [ 1 ]
e irriga 3.700 hectares. A tomada dagua faz-se por poço circular
de 0,80 de diametro.
ELCHE. - Construido de 1570 a 1590 sobre o rio Vinalopó ,
tem a capacidade de 10.000.000m cub. Seo dique, de alvenaria ,
tem a altura 19m,7 dagua, 23m.20 de parede, a extensão circular
interna de 70m, 50, a grossura na base de 12m e na corôa de gui ,
cubando toda a parede 10.000 m. c. Barra 3 riachos a toma-
da dagua em forma de poço circular tem o diametro de 0m.95 .
Rega 1.200 hectares de vinhas, oliveiras, palmeiras e cercaes.
HUESCA. -Construido no seculo 17º a 20 kilom. de Huesca,
sobre o rio Isuela , affluente do Ebro. Tem a capacidade de ....
1.178.000 m. c. , o dique de alvenaria com a extensão rectilinea
de 35m , a espessura na base de 16m, na corôa de 11m, e a altura
de 20. Custou 500.000 frs.
PUENTES. - Foi construido entre 1785 e 1791 ; tinha o di-
que 50,06 de altura com 46m na base e 10m.89 na corôa, e a
extensão de 282m, para a pressão maxima de 7,91 kilg. Acha- se
sobre o rio Guadalantin, com a capacidade de 53.000.000 m. cub.
Desabou a 30 de Abril de 1802 , matando 680 pessoas e destruindo
809 casas. Foi reconstruido de 1881 a 1886 com a capacidade de
40.000.000 m. c., sendo a sua bacia hydrographica de 1.500
kilom . quadrados - O dique tem a altura de 48m, a espessura de
39 na base e 4 na corôa, e a extensão circular de 180m na corda
e 20 na base. Custou 3.747.000 frs. , ficando o metro cubico da-
gua por 0,0937. ( 2 ) E' o maior açude da Europa.
GASCO ou do GUADARRAMA. - Começado em 1788 sobre o
Guadarrama, caío quando estava na altura de 57 , entre 12
a 14 de Maio de 1799.
VALLE DO INFERNO. - Fica a 13 kilom. de Puentes, sobre o
Luchena, affluente do Guadalantin. Foi construido de 1785 a
1792. Está quasi sotterrado , formando bella cascata. O dique

[ 1 ] Durand Claye -obr. cit., vol. II, pag. 342 dá -lhe apenas
3.700.000.
[ 2 ] Veja Crugnola - serbatoi, etc. pag . 44, e Durand Claye-
obr. cit., vol. II , pag. 351.
603

de alvenaria tinha a altura de 30,70 e 35m ,50 desde os alicer-


ces, com a espessura na base de 41m75 e 12,50 na corôa.
NIJAR. Acha-se a 15 kilom. da cidade de Almeiria e a 4
de Nijar. Foi construido de 1813 a 1850, barrando o rio Carri-
zal, tendo a capacidade de 15.000.000 m. c., mas por falta dagua
nunca enche. Senta sobre rocha dura o dique de alvenaria, cuja
altura é 30.93, em forma de degráos, com a espessura de
43,89 nos alicerces, 20m, 60 na base e 7,40 na corôa. Rega
13.000 hectares, a razão de 500 a 600 m. c. por anno e por he-
ctare. A agua, porem, nunca attingiu a mais da metade do
açude.
LOZOYA. - Sobre o Lozoya para alimentar o canal Isabel
2 , fei construido em 1852 com o dique de alvenaria, tendo a
altura de 32 m, a extensão de 72m50 na corôa, e a espessura
de 1866 na base e 6m, 70 em cima.
VILLAR.-- Construido entre 1869 e 1876. Tem a capacida-
de de 16.654.000 m, c., barrando o rio Lazoya. Seu dique as-
senta sobre rocha compacta [gneis ], tendo 51,40 de altura,
46,10 de espessura na base e 5m , 20 na corôa, com a forma
circular e o comprimento de 134m30 . Custou 1.665.655 francos,
ficando o metro cubico d'agua por 0.083. Serve para alimentar
a cidade de Madrid.
HIJAR. São 2 açudes construidos de 1880 a 1886 no valle
do rio Martin, a 30 kilom. da cidade de Hijar. O maior tem
a capacidade de 11.000.000 m . c. e a bacia hydrographica de
238 kilom . 1 ; o menor a capacidade de 6.000.000 in. c . e a ba-
cia de 48 kilom. quadr. Seus diques de alvenaria, assentam sobre
calcario neocomiano, tendo a altura de 45m, a espessura de
44,80 na base e 5m na corôa, o comprimento de 72m , em for-
ma de arco de circulo. Custaram 1.227.432 francos, ficando a
agua por 0.07.
ELDA- Visinho a cidade de seu nome, sobre o rio Vinala-
po ; construido de 1842 a 1879. Tem a capacidade de 60.784me.
enchendo, porém, 3 a 4 vezes por anno. Dique de alvenaria.
de 6 m. de altura, tendo custado 25.000 frs.
Ha muitos outros açudes, e ao tempo em que Llaurado
escreveo o tratado de Aguas y riegoes estavam projectados
alguns de grande valor, como por exemplo os de : S. Thereza,
na provincia de Avila com 3.000,000 m. c. para irrigar 2.050
604

hectares ; Almochuel em Saragoça com 3.000.000 m . c., para irri-


gar 1.500 hectar. : Hijar, na provincia de Teruel com 13.000-000
m. c. para irrigar 16.752 heet., orçado em 6.000.000 de reales ;
Denia, em Alicante para 40.000.000 m. c. e irrigar 12.000 hect. ,
alem de outros . [ 1 ]
O resultado economico destas obras verifica - se pela ren-
da elevadissima do solo por hectare.
Na huerta do Jucar, onde são cultivados os principaes ar-
rozáes da Espanha, por 24,000 hectares, o seu producto bruto
é avaliado por cada um hectare em 1.800 francos ou cerca
de 1.250 frs. liquidos, sem contar o que é incinerado para es-
trumar favas e o que serve de leito aos animaes. ]2 ]
Segundo documentos officiaes, publicados pela commissão
de inquerito em 1886, o producto liquido por hectare nos ar-
rozaes d'Autilla era de 927 francos.
INDIA INGLEZA - O notavel inquerito que o governo inglez
mandou proceder na India sobre as causas das seccas que peri-
odicamente assolam o paiz, e meios de minorar-lhes os effeitos,
é um documento do mais alto valor scientifico, economico e ad-
ministrativo. Notabilidades scientificas, como o tenente general
R. Strachy, H. F. Blanford, Normand Lockyer ; economistas,
como Elliot, Wingate, Peile, Buck e outros ; os agronomos Thi-
selton, Tupper ; estadistas e financeiros da estatura de lord Sa-
lisbury. Sir Erskine Perry, H. Maine, Caird, e numerosos pro-
fissionaes, engenheiros, administradores. legistas, etc., forão
postos em contribuição para aquelle fim . Cada qual levou á ad-
ministração o resultado de sua experiencia, de suas luzes e do
seu patriotismo.
Esta laboriosa investigação foi presente ao parlamento com
o titulo- Report of the Indian Famine Commisson—London 1880
-e comprehende alguns volumes. Os que interessam de perto
a solução das questões, debatidas neste capitulo, são o 2º, 3º e
4. No 2º trata da cultura das terras baldias (culturable waste
lands), dos processos agricolas nas provincias sujeitas as seccas;
dos generos alimenticios consumidos, da utilisação d'agua para

(1) A Llaurado -Aguas y riegos, vol. I, pags. 212 e 218.


(2) Ronna - obra cit,, vol. 3, pag. pag. 440.
605

irrigação ; da população ; da incidencia dos impostos ; do com-


mercio, vias de commun¨cação, administração geral e local, re-
gistro civil ; das relações do governo com os proprietarios
(landholder), senhorios (landlors) e rendeiros (tenants) ; dos
melhoramentos agricolis e da organisição de uma respartição
agricola ; dis obras publicas para assegurar o augmento da
producçã › e proteger o povo contra a fome ; da conservação
das matas, emigração, etc. No 3 vol. occupa - se das causas phy-
sicas das fomes, das chuvas na India, dis manchas solares e
alternativas dos invernos e seccas, das variações das chuvas na
região tropical da India ; das producções e estatisticas agrico-
las ; da divida territorial, do desenvolvimento industrial, dos
bancos agricolas, das condições economicas da população, etc.
No 4º historía a acção e proceder do governo em relação a sec-
ca de 1878, apontando os meios empregados para soccorrer o
povo e os resultados colhidos.
Como se vê, é um trabalho replecto de informações vari-
adas sobre quanto interessar possa o conhecimento da adminis-
tração e das camaras concernente as condições physicas, econo ›
micas e politicas de uma região situada á algumas mil leguas
de distancia da metropole.
O zelo desta por sua colonia é manifesto, digno de uma na-
ção intelligente, que se não contenta com o simulacro da liber-
dade, e de um governo que sabe comprehender as necessidades
populares, curvando - se a opinião da maioria.
Eis o que se lê neste sabio relatorio sobre a importancia
das irrigações :
"Entre os meios que podem ser adoptados para proteger
directamente a India da fome, proveniente da secca, occupam
inquestionavelmente o primeiro lugar as obras de irrigação .
(Among the means that may be adopted forgiving India direct prote-
ction from famine arising from drought, the first place must unques-
tionable be assigned to works of irrigation. ) [ 1 ]
"Tem sido vezo nas discussões politicas,relativas a construc-
ção de taes obras, avaliar-se- lhes a importancia por seus resul-
tados financeiros, considerados somente em relação ao lucro li-
quido para o governo, do capital empregado. O verdadeiro va-
lor das obras de irrigação deve ser aquilatado diversamente. Em

[ 1 ] The famine commission, cap. V, parte II.


606

primeiro logar é mister reconhecer a protecção directa que ellas


prestam salvando vidas humanas, evitando a perda das rendas
ou impostos devidos, e das despezas occurrentes no custeio de
medidas de soccorro. Mas não é somente nos annos de secca
que ellas são valiosas. Nas estações de chuvas regulares pre-
stam revelantes serviços e são uma grande fonte de riqueza, fa-
cilitando todas as operações agricolas, augmentando a produc-
ção da colheita por acre e tornando-o apto a cultura aperfei-
çoada dos productos. Do Punjab, ao norte, á Tinnevelly na parte
meridional da peninsula, onde a irrigação é praticada, taes re-
sultados são manifestos ; e vemos o arroz, a canna ou o trigo
tomar o logar do pain.ço [ milho ] ou da cevada, e vastas exten-
sões de indigo [ anil ] vicejarem numa estação em que as terras
seccas permanecem absolutamente improductivas. Para mostrar
como cresceram tão prodigiosamente a riqueza e recursos da
India com a applicação das obras de irrigação, basta destacar as
seguintes informações da massa de documentos presentes á
commissão. [1]
"As despezas dos canaes do Punjab balanceadas em …..
1877-78 forão de £ 2.260.000.
A área total irrigada por elles ( canaes ) foi de 1.324.000
acres. O peso e valor dos grãos alimenticios n'aquelle anno de
secca, nos do us principa es canaes, forão calculados como se se-
gue :
Total Valor em £
West Jumua Canal .. 158.000 1.147.000
Bari Doab Canal 141.400 789.000

Total ..... 299.400 1.936.000


"O valor das outras colheitas nesses dous canaes (canna, al-
godão, oleos, etc. ), foi estimado em £ 940.000 ou o total de £
2.876.000 (46.016 contos no cambio de 15ª ).
"Pode-se, sem exageração, assegurar que metade desta sa-
fra teria perecido ou não existiria se não fossem esses canaes .
Assim em um anno a riqueza de Punjab foi augmentada por
esses dous canaes com 1.438.000 £ , somma igual a quasi dous
terços do custo delles ; e sem a sua benefica influencia teria o

[1 ] Report ofthe Indian famine commission - 1898 , pag. 332 .


607

governo se visto dolorosamente forçado a dispensar os impostos


e a prodigalisar custosos soccorros aos famintos.
"Nos fins do anno 1877-78 o capital despendido com os
canaes nas provincias do Noroeste elevava - se a 4.346.000 £ . A
área irrigada n'aquelle anno foi estimada em 1.461.000 acres, o
valor da safra em 6.020.000 £ . Metade da área irigada era oe-
cupada por colheitas de outono, que, sem irrigação teriam sido
completamente perdidas ; podendo - se dizer com segurança que
a riqueza dessas provincias augmentou consequentemente de ..
3.030.000 £ 48 mil coutos ] ; assim tres quartos do primitivo
custo das obras ( de irrigação ) forão então restituidos ou repa-
gos ao paiz em um simples anno. A renda liquida para o go-
verno, da irrigação destas provincias, foi de 315.600 £ ou cerca
de 7 1/4 por cento.

"Nas provincias de Bengala e Behar o casto dos canaes, no


fim de 1878, era de 1.908.000 £ e por sua irrigação 159.500
acres de terrene plantados de arroz forão salvos e produziram
600.000 £ [ 9.600 contos de reis. ]
A estes dados convem accrescentar o que lord Salisbury re-
commendou a 10 de Janeiro de 1878 ao governador geral da India:
Obras de irrigação são naturalmente o remedio mais
efficaz para supprir a deficiencia das chuvas, e nenhuma du-
vida pode haver quanto aos beneficios que prodigalizam onde
é possivel construil-as sem crescidos dispendios e onde houver
sufficiente supprimento d'agua para sustental - as. O governo da
India tem dispendido e ainda dispende quantiosas sommas na
sua construcção . Mais de 16 milhões esterlinas [ 256 mil contos)
já foram gastos , até 1880 , e as obras que estão em construc-
ção ou projectadas consumirão, quando concluidas, 6.373.000 £
[ 101.968 contos ].
As obras mais antigas , especialmente as que foram ergui-
das em locaes apropriados para este fim pelos anteriores
dominadores do paiz, tem sido singularmente rendosas. Segun-
do a estimativa, que tenho presente, o canal oriental do Jum-
na produsio 36 por cento, e o Occidental 27 por cento ...
As obras de irrigação nas baixas regiões da Presidencia de
Madras tambem têm dado grandes lucros. Está verificado que
o delta do Cauvery, uma das mais antigas obras inglezas.
608

produzio 86 por cento : o do Godavoy 21 per cento ; o de


Kistna 15 "
Em fins de Janeiro de 1870 o notavel engenheiro nglez
Sir Arthur Cotton -que estivera na India por mais de 40 annos
na direcção de trabalhos de sua profissão, exprimio se acerca
das obras de irrigação nessa região, numa conferencia em Li-
verpool nestes termos :
O districto de Tanjore tem progredido sempre mate-
rialmente desde que a agua foi nelle introduzido. A receita
publica de £ 430.600, que era, subio a £ 750.000 e a popu-
lação quasi duplicou, de sorte que com uma unica excepção, a
do Godavery, é o mais florescente da India .
No Godavery havia a miseria chegado a tal ponto que o
governo receiou uma rebellião ."
Para acudir as necessidades da população e debellar esse
estado de cousas, o governo inglez incumbio ao mesmo Sir Ar-
thur Cotton de estudal-as in loco e projectar em beneficio da
lavoura as obras que julgasse mais urgente. Gastou o illustre
profissional 5 a 6 annos na construcção de um canal e nas
obras complementares. O resultado foi que a producção aug-
mentou 250 % , transformando- o no mais prospero districto da
India.
Os tres districtos da presidencia de Madras, onde se haviam
feito trabalhos de irrigação, davam ao governo um luero liquido
de 15, 21 a 87 por cento do capital empregado.
As obras de irrigação custaram £ 2 por geira [ 4040 me-
tros quadrados ou 840 braças quadradas] de terras beneficiadas,
e o lucro para o paiz foi de 100 por 100 na producção das terras.
Comparando as estradas de ferro com as obras de irri-
gação, affirmou A. Cotton , que o governo gastou n'aquellas,
em Madras. £ 14.000.000 (224 mil contos ao cambio de 15 d)
que rendem 212 por cento, sem impedir que o povo fosse
desimado pela fome.
Depois de descrever os horrores da secca de 1866 na India
pondera E. de Valbezen : ( 1 )

[ 1 ] E ' de Valbezen Progrés de l'Inde anglaise, 1975.


609

"Essas grandes calamidades paralysam o commercio e os


negocios, trazem formidaveis deficits as rendas publicas. No
que respeita aos seus interesses e aos da humanidade, um dos
primeiros deveres dos senhores da India é combater estas
desastrosas eventualidades propagando os meios de irrigação
artificial. A creação das grandes vias de irrigação nas provin-
cias de noroeste vem dos imperadores mongôes. De 1808 a
1822 a administração ingleza abrio o Eastern Jumna canal com
a extensão de 120 milhas, o qual rega 156.000 acres de terreno, e
o Western Jumna canal com 445 milhas.

O grande canal de Ganges, com 898 milhas e meia, irriga


1,471.500 acres de terreno e protege contra a fome mais de 6
milhões de habitantes. A linha principal, com 525 milhas de
extensão, 3 metros de profundidade maxima e 50 de largura,
é quasi sem rival no mundo.
Na provincia de Bengala contentaram-se em conservar
os diques e levadas que protegem as ribeiras das innunda-
çoes ...
As fome de 1861 e 1866 , e bem assim a de 1874, em Ben-
gala, despertaram novamente a attenção do governo inglez
para as obras de irrigação . Desde 1866 o governo da metropole
havia dado carta branca, na inteira accepção da palavra, as
autoridades da India para emprehenderem trabalhos de irri-
gação em escalla desconhecida até então. Um primeiro credito
de 1 milhão esterlino, (16 mil contos) aberto em 1867 para
essas despezas, não pôde ser empregado em vista da insuffici-
cia dos estudos preliminares. Depois d'esta data forão estes
trabalhos começados e proseguidos com actividade nunca es-
morecida, podendo se esperar que antes de 25 annos a India
estará provida de um systema completo de irrigação
"Proseguindo sem descanso essa grande empreza, mostra-
se a Inglaterra verdadeiramente digna do papel civilisador
que a Providencia lhe confiou . O dever do senhor europeo para
com o subdito asiatico não se restringe em dar- lhe ordem e paz ;
deve protegel- o, tanto quanto a arte e a sciencia moderna po-
derem fazer, contra essa terrivel eventualidade, cujo nome
empallidece os mais bravos -a fome,
"Não se trata na India de proporcionar irrigações onde
610

ellas são aproveitaveis. é mister que existam onde são pos-


siveis . (1 )
"A especialidade da agricultura indiana é o engenhoso e
assiduo modo como a agua é applicada para augmentar a pro-
dueção do solo. Alguns cereaes crescem durante a estação chu-
vosa ; muitos outros no inverno e primavera só podem vegetar
mediante a irrigação artificial.
O principal modo como o excedente d'agua de chuva é
aproveitado para irrigação é o da repreza por meio de açudes.
E' no sul da India que esses açudes são mais numerosos e forão
construidos em maior escalla . No Mysore verificou - se o nº de
38.000, e em Madras pode-se affoutamente assegurar que
não haverá menos do duplo deste n°. Nessas regiões a inge-
nhosidade do homem foi empregada durante muitos seculos em
aproveitar as vantagens de cada localidade na qual a agua
faltasse, fosse captada e guardada [ ouaght and stored], impedi-
da de correr para o mar. Onde existe depressão com duas ou
3 milhas quadradas de área, construiram - se barragens [emban
kment] de terra , a agua é represada e levada para os campos
abaixo, emquanto o superfluo escapa-se e passa ao lado das
paredes. Meia milha abaixo ergue - se outra barragem, e ainda
outras maiores, a proporção que a área irrigavel se alarga
Quando o volume d'agua é possante a pareda é frequente-
mente faceada de pedra para resistir a pressão d'agua. O san-
gradoro é aberto em leito de rocha natural ou revestido de so-
lida alvenaria. Os desaguadoros de alvenaria , abertos na pa-
rede, communica m - se com canaes que comduzem á área irri-
gavel : a abertura e o fechamento destes desaguadoros afim
de distribuir a agua, equitavel e regularmente, constitue a oc-
cupação de um hereditary servent do açude. O dever de reparar
e conservar a relva da parede, e de fornecer pedra para o re-
vestimento, desaguadoros e canaes, incumbe aos aldeãos
[ vilagers ) a quem aproveita o açude, ou a algum proprietario
landowner) que é remunerado com a posse de direitos sobre
parte de terra irrigada, ou ao governo no caso de ser o açude
de grandes proporções, alguns dos quaes podem ser chama-
dos lagos ( lacks) . Assim o açude Sul -kere no Mysore, dis-

(1 ) Veja-se a Revue des deux mondes, de Janeiro a Fevereiro


ep 1875.)
611

tricto de Chitaldrug e o Cambam, no Karuul, que provavel-


mente são os maiores da India, têm 10 milhas de circumferencia.
"Os pequenos açudes são unicamente utilizados durante
as chuvas e principalmente nos arrozaes, que requerem uma
alimentação constante e igual d'agua dentro de certo tempo ;
os maiores contem um supprimento para todo o anno e tornam
possivel a cultura do arroz tardio, semeado em Dezembro ou
Janeiro e colhido em Abril ou Maio, da canna de assucar. de
pomares, de cacáu ; areca, etc ...
"O mesmo systema de açudes existe, bem que não sejam
de tamanha importancia, na parte oriental do Estado de Hy-
derabad (Telingana ], e nas provincias centraes [ Chhatesgirh e
Bhandara), nos quaes o arroz é largamente cultivado. Alguns
grandes açudes forão feitos recentemente pelo governo inglez
em Bombay, Deccan, dos quaes alguns podem ser contados en-
tre as obras mais relevantes construidas durante a ultima
secca. Nos districtos do Nordeste do Deccan e no Berar mui-
tos (a good deal) em serviço são feitos com uma simples pare-
de de terra, que retem agua somente durante as chuvas e são
destruidos pelas enchentes por occasião das monções. Ein Raj-
putana e na India Central os açudes não são raros, e alguns
delles são obras explendidas feitas pelo lançamento de pare-
des ou desagoadouros de alvenaria atravez de valles entre
collinas. Em Ajinir e Mhairwara a energia do coronel Dixon
reparou numerosos açudes velhos e construio muitos outros á
uns 30 annos. Nos districtos de Bundelkhand , provincia
do Noroeste, ha muitos grandes e belios açudes. [ 1 ]
A protecção da India contra as consequencias da secca de-
pende immediatamente da provisão dos meios melhorados de
communicação e do alargamento da irrigação ...
Em 1864 o secretario do Estado, depois de prolongada
correspondencia com o governo da India sobre a necessidade
de estender a irrigação como protecção contra a fome, accei-
tou definitivamente as vistas de que o Estado poderá por si
mesmo emprehender a construcção de obras de irrigação. [ 2 ]
As despesas realizadas na India, diz Caird, nos sete annos

[1 ) Report of the Indian Famine Commission -parte II, cap.


I, secção V-the utilisation of Water for Irrigation—London 1882.
[2] Report of the Indian Famine com Parte II, pag . 146.
612

decorridos de 74–75 a 80—81 , em obras de irrigação, das quaes


estão tomadas as contas de capital e renda, forão
Pelos fundo do emprestimo .... lb. 12.679.900
Pelo excedente das receitas ..... 7.619-000

productivas
lb. 20.298.800

260.814
966.600
358.654
990.200
218.772
292.291
195.362
publicas
A renda liquida das obras de irrigação foi a seguinte:

Obras
:

" não
1.211.900
1.165-800
485.704
387.695
319.860
297.169
541.106

1876-7
1875-6
1874-5
1877-8
101.807
221.700
201.200
127.050
101.088
95.404
80.292

lb.
lb.
lb.
lb.

1878-9 1880-81
lb.

1879-80
lb.
lb.

"O supprimento dos rios da India durante a estação quen


613

O supprimento dos rios da India durante a estação quen-


te do anno é praticamente illimitado, porém isto se dá quan-
do a irrigação é menos necessaria, porque chove geralmeute
em toda a região. Muito se tem dito e escripto acerca dos vo-
lumes dagua que correm superfluamente (roll wasted to the sea)
para o mar ; mas a agua só pode ser armazenada (stored ) por
meio da construcção de reservatorios em sitios escolhidos ,
apertados por colinas.

Quando no governo da India, como encarregado da ges-


tão das suas finanças, eu fiz repetidas e acuradas indagações
sobre-se o rendimento das obras de irrigação era ou seria
remunerador, directa ou indirectamente, para o governo (the
expenditure on works of irrigation by Gavernment has been or will
remunerative, etc. ) e a conclusão geral foi que, mesmo na
parte septentrional da India, essas obras remuneravam - no di-
recta e perfeitamente.. [ 1]

Tenho me occupado deste assumpto com certa insistencla


porque o reputo da maior relevancia para o Ceará.

E' preciso insistir até vencer o tupor que invade os espi-


ritos mais bem intencionados e patrioticos, sem exceptuar os
que estão na posse do governo .
"E' facto bem averiguado que os terrenos adaptadas á ir-
rigação, diz W. T. Thornton [ 2) , são sempre muito beneficia
dos applicando -se esse meio de os tornar mais producti-
vos. O augmento de sua producção, devido á irrigação, varia
com o caracter do sólo . mas é raras vezes inferior a 50 por
100, e em alguns casos de 600 e até de 760 por cento. "
O mesmo autor, cuja severidade é bem conhecida, exami-
na minuciosamente as porcentagens de rendimento que aquel-
las obras dão e as consigna na seguinte tabella :

[ 1 ] Vejam-se nas Minutes of evidence given before the Indian


Famine, by His Exc. the Ho.. Sir Richard Temple, o depoimento
de J. Baird, Março de 1879 - London 1882.

12 W. T, Thornton - Se as obras de irrigação na India são


remunerativas.
614

Custo total fei- Porcentagem de


ta as devidas rendimento so-
deduções bre o custo

Provincias do Noroeste ... 3.565.455 5.2 %


Punjab . 3.134.702 4.8
Madras 1.893.440 22.72
Bombay 2.222.788 11.9
Canal do Ganges .. 2.880.178 4.5
Canal de leste do Jumna .. 467.978 11.2
Canal de oeste do Jumna .. 1.306.393 7.6
Canaes de Godavery .. 683.705 39.7
Canaes de Kistnah . 463.427 13.2
Canaes do Cauvery . 293.578 36.6
Canaes do Sind 1.180.000 18.6

£ 18.101.614

Estes resultados são excepcionalmente favoraveis e é pro-


vavel que surprehendam a muitas pessoas. Mas, por mais fa-
voraveis que sejam, não dão idéa do gráu completo de como
são remunerativas essas obras de irrigação ; porque não só
dão bôa porcentagem de lucro sobre o capital nellas empre-
gado, mas tambem impedem perdas.
E' a este respeito que as vezes são de efficacia notavel na
India. Quasi não se passa anno sem se sentir falta de chuva
em um on outro districto desse paiz, e raras vezes ha inter-
vallos de mais de cinco ou seis annos em que não soffra de
secca alguma região muito extensa.
Em qualquer desses casos o governo não só perde grande
parte dos impostos que, nos annos normes. são arrecadados
esses districtos ou regiões, se não houver nelles obras de irri-
gação, mas é tambem obrigado a sustentar os habitantes, se não
quer que morram á fome. Os gastos immensos feitos pelo
governo para minorar os effeitos da fome de 1874 teriam sido
maiores se não tivesse existido o canal do Garges, que, mes-
mo no estado imperfeito em que então se achava , e quando
não se tinha dispendido com elle somma superior a £ 800.000 ,
foi o meio de se conservarem , de modo a attingirem a matr.
615

ridade colheitas no valor excedente de £ 500.000 , produzidas si-


bre mais de 64.000 hectares de terreno onde, sem esse canal,
toda a folha de herva ou de arvore teria sido reduzida a pó
pelo calor do sol e seccura prolongada da atmosphera. E na
secca de 1860, quando em outros districtos nas provincias de
Noroeste tudo estava queimado como em um forno, o canal
do Ganges conservon cereaes sufficientes para sustentar mais
de um milhão de pessôas, que sem elle teriam morrido á fome,
a não ser que o governo lhes désse o alimento necessario, de-
pois de já perdoar- lhes os impostos. Se as economias indi-
rectas effectuadas assim em consequencia das obras de irri-
gação forem addicionadas ao rendimento directo auferido
dellas, o resultado será um total que convenceria ao mais sce-
ptico de que essas obras teem sido remunerativas. "
Até aqui W. Thornton.
Appellarei agora para o testemunho do notavel R. Baird
Smith, tenente coronel de engenheiros no exercito inglez , o
qual em commissão do governo apresentou importante relato-
rio sobre as irrigações no sul da India .
E' deste trabalho que transcrevo os seguintes trechos :
"A prosperidade permanente de Tanjore, sua presente ren-
da, e a favoravel condição de seus habitantes, notavel a pon-
to de attrahir a propria attenção dos mais indifferentes. são
attribuidas a construcção do açude sobre o Coleroon pelo Coro-
nel Cotton. (1 )

"A falta total de chuvas em 1833 affectou toda a região


abaixo dos Gants em graus proporcionados a efficacia dos re-
cursos artificiaes dos differentes districtos para supprir as ne-
cessidades causadas pela falta d'agua.

Foi somente nos districtos prodigamente irrigados do


sul, no Tanjore, Trichinopoly, e porções insignificantes dos
districtos circumvisinhos que a fome mais ou menos severa-
se tornou desconhecida. Em Guntoor, onde não existia irriga-
ção permanente, os resultados da miseria attingiram propor-
ções extraordinarias e terriveis. ( Pag, 52) .

[ 1 ] Baird Smith - Obra cit , pag. 31 .


616

Resumindo os resultados obtidos dos trabalhos de irrigação


no delta do Godavery, Baird Smith, na obra cit. (pag. 77 ) con-
clue por estes termos : "A falta das monções deixou de ser uma
medonha calamidade ; e onde nenhum homem ou animal po-
dia subsistir por falta d'agua para as suas necessidades, ha-
verá em todos os tempos abundante supprimento para to-
das as operações domesticas ou agricolas" .
Como isto deve encorajar o Ceará e bem dispor o animo
dos que se interessam pelo seu futuro !
Transcrevo ainda os seguintes trechos da obra, a que já
me referi anteriormente, e que tem por titulo :
"The Cauvery, Kistnah, and Godavery being a report on the
works constructed on these rivers for the irrigation of the provinces
of Tanjore, Guntoor, Masulipatam, and Kaiahmundry, in the pre-
sidence of Madras, published by order of the most noble the Governor
general of India by R. Baird Smith, F. G. S., lieu -tenent - colo-
nel, Bengal enginers, etc. , London , 1856 - Smith, Elder & Ca 65
Cornhill.
"The extent to which it has been carried throughout all
the irrigated region of the Madras Presidency is truly extraor-
dinary ... (1)
A extensão á qual a irrigação por açudes tem sido levada
por toda a região irrigada da presidencia de Madras é verda-
deiramente extraordinaria : um imperfeito registro do nume-
ro de açudes em 14 districtos mostra que elles sóbem a não
menos de 43.000 (em boas condições (in repair), e dez mil em
más condições (out of repair) , ou cincoenta e tres mil ao todo.
Seria uma moderada avaliação da extensão da represa , compu-
tal-a em meia milha, e o numero de obras de alvenaria, em
comportas de irrigação, sangradores, provavelmente não se-
ria avaliada demasiadamente em 6 milhas, termo médio.
Estes dados tomados sómente para dar idéa definida do sys-
tema, sommariam reunidos mais de 30 mil milhas de parede, o
sufficiente para pôr em redor do globo uma cinta de não me-

( 1 ) Baird Smith- The Cauvery, Kistnah , and Godavery.pags.


139 e 140
617

nos de seis pés de largura, e 300.000 obras separadas de alve-


naria."
"O todo deste gigantesco machinismo de irrigação é de
origem puramente indigena, e é um facto, que nenhum novo
açude foi feito por nós ; o testemunho auxiliar daquelles mais
bem informados sobre o assumpto mostra que muitos bellos
trabalhos desta especie têm sido descurados a ponto de ca-
hirem em grande ruiva.”
"A receita proveniente das obras existentes é avaliada por
alto (roughly estimated) em 150 lakhs ou um e meio milhões
esterlinos por anno, e o capital empregado nellas, avaliado
abaixo do real, é 16 vezes maior ou de 15 milhões esterlinos .
Pag. 141. Já mencionei quão crescidas são as proporções de
alguns dos mais antigos destes reservatorios, dando como
exemplo o Panairy, em Trichinopolis com a sua parede də 30
milhas de comprimento e a área provavel de 60 a 80 milhas
quadradas, presentemente imprestavel para a communidade : e
o açude de Veeranun com 12 milhas de parede [ embankments ]
e 35 milhas de área, felizmente ainda em completo uzo full
operation], e assegurando hoje, depois de uma existencia de
duração quasi fabulosa, uma renda annual de 114.500 rupias
ou 11.450.1 £ ao governo.

"Comtudo, vou limitar- me a generalidades, como as prece


dentes, á vista dos planos que tenho presente ; darei algumas
minucias daquelles dous exemplos propositalmente [ specially se-
lected] escolhidos para apoiar [to illustrate] o systema e por
estes uma boa idéa do trabalho pratico de todos póde ser for-
mada".
"O açude que tem o nome um tanto formidavel de Cham-
brumbankum é um dos mais bellos da presidencia de Madras.
Está pittorescamente situado na visinhança ( Pag. 133 ] de um
terreno muito montanhoso e assemelha- se a um lago natural,
n'uma posição em que uma tal toalha d'agua póde muí promp-
tamente ser utilisada.

E' puramente artificial, e o seu supprimento é retido por


uma barragem de 3 milhas, 5 estadios e 20 jardas de extensão,
tendo de 9 a não menos de 28 pés de largura, e de 16 a 26
pés de altura. Sua area é de 91,2 milhas quadrada e seu
618

volume pode ser avaliado em 3.000 milhões de pés cubicos


d'agua.
Elle mantem uma área de cultura de arroz de perto de
10.000 acres de extensão, dando ao governo uma renda an-
nual de pouco mais de 50.000 rupias ou £ 5.000 ; e o custo do
melhoramento das suas varias obras e da sua conservação em
reparos efficazes é avaliado durante os ultimos 20 annos em
cerca de 7 % da receita delle tirada. Seus apparelhos para dis-
tribuição consistem em 10 comportas de irrigação, cujos de-
talhes serão mais bem apreciados pelos planos.
"A sua segurança durante as inundações é garantida pela
acção de 6 sangradores chamados na localidade colingulas, dan-
do ao todo uma largura de canaes de derivação de 676 pés
com uma profundidade de 6 a 13 pés, conforme a posição.
(Pag. 14 ). "O açude Cauverypauk differe essencialmente
do que acabo de descrever em ser independente das chuvas lo-
caes por ser o seu supprimento derivado do rio Pellar, uma
torrente que conduz um grande volume dagna durante a esta-
ção. Elle é mesmo mais puramente artificial do que o prece-
dente, não havendo montanhas ou terrenos accidentados na
visinhança de que elle se possa ter aproveitado. Sua antigui-
dade é grande e ha poucos annos que concertando -se uma
das antigas comportas de alvenaria, achou- se nella uma
inscripção mostrando que tinha estado em exercicio 400 annos,
durante os quaes o leito do açude tinha sido claramente ele-
vado de 12 pés pelos depositos graduaes de lama e areia ; o
proprio açude é sem dúvida mais antigo do que isto mesmo .
A extensão de aterro Cauvery-pauk é de 3 2,4 de milhas ;
a área do açude de cerca de 7 milhas quadradas e o seu maior
derramamento d'agua de perto de 2 milhas. O açude é reves-
tido em toda a sua extensão de pedra, algumas vezes em
grandes pedaços muito massiços, porém, grosseiramente qua-
drados, sem argamassa, excepto em alguns pontos : a mu-
ralha de revestimento é de 6 pés no fundo, de 3 em cima
e de 22 pés de altura. O alterro atraz desta muralha é
mais alto de 5 a 6 pés ; em 1840, seu ponto mais alto era
[pag. 144 ] fixado uniformemente em cerca de 9 pés ácima da
maior altura d'agua. A largura em nenhuma parte era me-
nor de 32 pés no a'to, com um declive de 2 1/2 horisontal e 2
619

perpendicular. Toda a superficie é cuidadosamente coberta


com relva ou plantada de hervas, cujas raizes são um excel-
lente meio de fortalecer o solo."
"A extensão da terra irrigads do açude Cauvery -pauk é
de quasi 7.700 acres, dando ao governo uma receita annual de
um pouco mais de 5.800 rupias, ou , £ 5.800 . A agua é distri-
baida por nove comportas de alvenaria, cujos detalhes serão
achados nos planos; e como a terra irrigada está 20 pés
abaixe do nivel ordinario da agua do açude, o supprimento
de um curso dado corre sobre ella com toda a facilidade . A
segurança do açude é garantida pela acção de dous sangradores
de uma extensão combinada de quasi 580 pés, com uma pro-
fundidade de 4 a 6 pés para a passagem do excesso d'agua. "
(Pag. 146 ] "Não posso terminar meu relatorio, sem re-
ferir-me ao melhoramento apresentado pela presidencia de
Madras no unico departamento irrigado. ( Pag. 147). Em to-
das as partes da India o lucro para o Estado e a população
segue tão certamente como o effeito segue a causa, a provi-
são de um abundante supprimento d'agua para fins agrico-
las ; porém, em Madras os resultados vão muito além do ter
mo médio geral. Sendo o arroz o principal ramo da agricul-
tura nos districtos irrigados , a falta d'agua traz comsigo ex-
trema pobreza e o descontentamento ; a sua abundancia, a ri-
queza e contamente. Cada acre que é novamente irrigado
passa logo da receita de terrenos enxutos para a da cultiva-
ção de terrenos irrigados, garantindo ao governo uma renda
immediata paga com muito maior facilidade pelo cultivador da
terra do que a taxa mais baixa que se exigia ntes. A renda
é immediata e a sua somma grande. Quasi tenho hesitado em
adoptar os dados fornecidos pelos commissarios das obras de
Madras, tão exagerados parecem. Porém elles são fundados
em relatorios officiaes, francos á verificação, e não é provavel
que estejão seriamente em erro. Quando elles mostrão lucros
variando de um minimo de 77 a um maximo de 239 % sobre o
custo primitivo dos trabalhos, é inconcebivel que campos
igualados sómente, se é que são igualados pelos da Australia
ou da California, possão ser deixados por mais tempos incultos. "
"Se as descripções que são dadas em documentos publi-
cos do Estado acerca da população e do paiz, excepto em al-
620

gumas localidades favorecidas, são exactas ou não, é certo que


o governo de Madras não pôde augmentar os seus recursos de
nenhuma maneira mais certa ou mais legitima, ou mais apro-
veitavel do que desenvolvendo sobre toda a extensão e largura
dos territorios debaixo do seu dominio, os meios de utilizar os
grandes volumes d'aguas que correm anuualmente para o mar
por centenas de canaes actualmente inuteis. ( Pag. 148 ) . Falei
neste relatorio somente das partes que vi e por mim mesmo
julguei."
Os seguintes extractos são do appendice B, do relatorio do
director do Canal de Ganges, dirigido aos directores da Com-
panhia da India Oriental, impresso por ordem do governo
inglez.
Trata-se aqui das provincias do Noroeste da Presideneia
de Bengala, e da irrigação derivada dos rios Jumua e Ganges,
[ Pag. 213 ]. Logo apoz a sujeição destas provincias ao governo
britanico começou a ser verificada a conveniencia de restaurar
os canaes de Agra. Diz-se que foi attrahida a attenção para
este assumpto pelo offerecimento de um cavalheiro (o Snr.
Mercer) para reabrir o canal Delhi a sua propria conta, asse-
gurando-lhe todos os rendimentos por 20 annos ; offerecimento
que foi regeitado pelu governo,
Pelos annos de 1810 diversos officiaes forão commissiona-
dos para estudar a linha oriental e occidental do rio Jumaa e
fazer sobre ellas um relatorio . ( Pag. 319).
Deste exame resultou a construcção de alguns canaes. que
compensaram amplamente os capitaes nelles empregados. Eis
os resultados de um delles, o canal occidental do Jumna :
“Relação do valor bruto das colheitas provenientes de ter-
ras irrigadas pela canal occidental de Jumna em 1837 a 1858,
a maior parte da qual terra teria sido totalmente improducti-
va sem o uso d'agua do canal. ”
Colheita da estação calmosa
32.506, 25 acres de canna de assucar e anil a 81 por acre 102.450
47-026. 25 acres de algodão a 41 , 16$, por acre 225.746
46.256, 23 acres de arroz etc. , a 3/416 por acres por acre 277.62e
Colheitas de estação fria
199.335 acres de trigo, cevada. a 4,16 por acre 937.000 £

Total 1.462.800 £
621

"Este calculo é compilado de uns dados fornecidos pelo


major Baker e se basea na media actual As sommas são
muito moderadas, menos realmente do que podiam ter sido
presumidas com perfeita impacialidade : e o resultado mostra
que perto de 1.500.000 £ de producto agricola foi salvo pelo ca-
nal de irrigação, do qual cerca de um decimo ou 150.000 £ foi
pago ao governo como renda de terra e agua, emquanto o res-
to servio de alimentação e manteve confortavelmente du-
rante um periodo de fome devastadora, produzida pela grande
secca, os habitantes de quasi 506 aldeias. [ Pag 320 ] . Nenhuma
prova mais evidente do valor social e fiscal de canaes de irri-
ção podia ser dada, e sua efficacia é incarecida tanto quanto
o Estado é in teressado, pelo facto de importar o total dos tra-
balhos [ não incluindo as despezas ordinarias e o pessoal per-
manente ] dos canses occidentaes do Jumna até a actualidade
somente em lb. 119.474 ; de modo que o lucro do anno de
1837 a 1838 em taxa de terra e agua cobrio toda e despeza, dei-
xando um excesso de perto de £ 26.800 desta fonte somente."
[ Pag. 326 ] "O pessoal permanente dos canaes occidentaes
do Jumna é necessariamente grande. A extensão unida das
principaes linhas é de 445 milhas, exclusive os cursos d'agua
de primeira classe, commummente chamados Rajbuhás que, as-
sim como os braços de canaes , estão debaixo da direcção ex-
clusiva dos officiaes do canal...
Canal oriental do Jumna. -Pag. 333 -Tendo agora comple-
tado minha relação dos canaes occidentaes do Jumna.posso pas-
sar a descrever o canal occidental do Jumna que foi primeiro
estudado com o fim de activar operações, em 1822. pelo offi-
cial de engenheiros Debude."
Pag. 338 - Quando completado o systema de distribuição
do canal oriental do Jumna, ficará com 500 milhas de ca-
nal com todos os trabalhos necessarios a communicação cru-
zada, distribuição d'agua, regulação de declive, etc., bem como
sobre os principaes canaes. "
"Então o canal será tão completo quanto comporta a
sua capacidade irrigadora ; e está calculado que a exten-
são de terra actualmente irrigada por elle se elevará a perto
de 160.000 acres inglezes."
"Pelo que diz respeito ao custo destes trabalhos. uma taxa
622

geral de cerea de 7 pences por acre, annualmente, cobre todas as


despezas feitas com a conservação da linha ; ao passo que
se acha que a sua construcção primitiva foi effectuada com um
custo total aos proprietarios de cerca de 5 schillings por acre. "
Pag. 340 - A influencia do anno de fome de 1837 a 1838
é tão assigualada no canal oriental como achamos que foi nos
caraes occidentaes do Jumna ; e aqui junto um calculo do va-
lor bruto do producto agricola salvo para a communidade
naquella occasião pelo uso da agua do Canal."
Relação do valor bruto da colheita da terra irrigada pelo
canal oriental do Jumna em 1837 a 1838 , a maior parte da qual
teria sido inteiramente improductiva sem o uso da agua do
Canal.
Colheita da estação calmosa
12.986 acres de canna de assucar a £ 8 por acre £ 103.888
4.500 acres de algodão a £ 4,16s por acre £ 21.600
13.500 acres de arroz a £ 5.16s por acre £ 48.937
Colheita da estação fria
65 431 acres de trigo, cevada. a £ 4,16 por acre £ 314.068
Valor bruto das colheitas £ 488.493
"O valor bruto, portanto, do producto salvo pela irrigação
foi de perto de meio milhão sterlino, do qual cerea de um de-
cimo, ou lb. 50.060 foi receita do governo, e o resto proprieda-
de da communidade agricola . Os canaes vindos do Jumna.
por conseguinte, salvarão durante o anno de grande secca e
fome de 1837 a 1838 propriedades no valor de perto de dous
milhões eterlinos !! "
Pag. 352 -Pouco mais apenas ha a accrescentar a este
detalhe dos canaes de irrigação existentes nas provincias su-
jeitas ao governo d'Agra.
Vimos que depois que estes trabalhos occuparam a at-
tenção das autoridades britanicas, estas despenderam com
elles uma somma de perto de 557.000 lb. e tirarão delles a re-
ceita directa de quasi 546.000 lb.
Elles têm sujeitado á influencia da irrigação, e garantido
em condições de maior fertilidade una área de quasi 1.100.000
acres, produzindo o valor annual de não menos de 2.500.000
sterlinos, e alimentando uma população de 600,000 habitante
623

dos quaes uma consideravel parte fôra declarada de habitos


subversivos a todo o bom governo, nociva a si propria e pre-
judicial aos seus visinhos."
Canal do Ganges -Pag. 367— " Sómente resta agora descre-
ver o grande canal do Ganges, o ultimo e o maior dos canaes
de irrigação em via de execução ( em 1853 ) pelo governo bri-
tanico. Ter-se- ha notado que em quasi todos os trabalhos an-
teriormente descriptos nós tenhamos apparecido como res-
tauradores antes do que como projectadores primitivos.”
"O grande canal do Ganges é, comtudo, puramente uma
obra britannica; occupa un campo desoccupado antes."
Pag. 376-"A extenção total do canal do Ganges e dos
seus braços é a seguinte :
Linha principal de Hurdwar a Allahabad 453 milhas
Braço Futtchghur 160
Braço Bolundshuhur 70
Braço Etawah 172
Braço Cawnpúr 43 1/2
Total 898 12 milhas
"Em canaes tão extensos como estes, contendo tão grande
volume d'agua, uma questão que me assaltou o espirito quan-
do observava-os e estudava- os foi como serião construidos
os lados destes canaes para se libertarem da acção erosiva
das suas aguas, e então observei que elles são construidos de
modo que conservam em toda sua extensão o declive necessario
para as suas aguas nunca excederem uma certa velocidade na sua
correnteza : a correnteza e velocidade necessarias para conser-
vação dos lados do canal, sempre no mesmo estado, tirando as
suas aguas toda a acção erosiva.
E quando o volume das aguas é maior do que o necessario,
no mesmo canal ha derivativos ou escoadoros que fazem com
que a agua nunca exceda á velocidade necessaria. "
Pag. 377—" A distribuição de agua para fins de irrigação
[6.750 pés cubicos por segundo ] será effectuada exclusivamente
por meio dos principaes cursos d'agua, debaixo da superinten-
dencia de officiaes do governo. Nenhum curso d'agua particular
será permittido ou tirado do canal principal ou dos seus braços.
O lucro pleno do mais economico e salubre methodo de irriga-
ção será então assegurado ao paiz desde o principio, "
624

"O custo maximo do canal, suppondo que o governo con-


strua á sua propria custa não só a principal linha e os seus
braços, como tambem os principaes canaes de distribuição, ou
Raybuhás, é avaliado em um milhão e meio sterlino. ”
O custo total das obras do canal do Ganges, depois de con-
cluido, está de accôrdo com o relatorio official impresso por
ordem do secretario de estado da India, em rupias 1.41.60.311 ,
ou em 1 scrore, 41 lakhs, 60,311 rupias ou em libras sterlinas
1.416.031 . [ Vide relatorio sobre os trabalhos do canal do Ganges,
3 vol. , pag. 295].
O canal do Ganges foi aberto em 1856.
Pap. 378.-"A área total, cultivada e cultivavel, dos 12
districtos suppramencionados é, portanto, de 11.102.048 acres.
Agora suppondo que todo o supprimento do canal, sendo de
6,50 pés cubicos por segundo, torna- se aproveitavel para a irri-
gação, como afinal não duvidamos que acontecerá, sabemos da
experiencia dos canaes de Jumna, que cada pé cubico destɛ des-
carga é sufficiente para a irrigação de 218 acres durante o anno.
A área total que seria actualmente irrigada durante o anno che-
garia por conseguinte a 6.750 × 212 = 1.471.500 acres, ou, para
facilidade do calculo - 1.500.000 acres. "
Pag. 380 -Os lucros pecuniarios totaes, directos e indire-
etos, serião portanto de quasi £ 400.000 por anno.
"Pela experiencia de canaes existentes e tomando como
termo de comparação o Canal Oriental do Jumna, o mais dis-
pendioso de todos, a despeza annual com os reparos ordinarios
e o pessoal permanente regular do canal de Ganges, é avaliada
em muito perto de 40.000 £ . Por despezas augmentadas nos
departamentes civis pode-se conceder uma somma addicional
de 10.000 £ por anno.
"A receita liquida do canal. quando em plena operação,
ascenderia, pois, a 350.000 £ por anno, o que dá um lucro para
o capital empregado [ de £ 1.500.000 ] de 23 1,3 por cento. Este
resultado favorabilissimo não é de modo algum exagerado. E'
menos cerca de 13 1/3 por cento do que rende o actual Canal
Occidental do Jumna. ”
"Pag. 381 - Calculo do valor bruto de colheitas que serão
garantidas de damno nos tempos de secca e fome pelo grandə
canal de Ganges :
625

Colheitas da estação calmosa


250.000 acres de assucar e anil a £ 8 por acre £ 2.000.000
125.000 acres de algodão a £ 4.16s por acre £ 600.000
375.000 acres de arroz, a £ 3.16s por acre £ 1.434.375
Colheitas da estação fria
750.000 acres de trigo e cevada, a b 4.16s. por acre £ 3.618.750

£ 7,653.125
"Desta somma [ para cima de sete e meio milhões sterlinos
por anno], cerca de um decimo será paga ao governo sob a fórma
de renda da terra e agua, ao passo que o resto pertencerá á
communidade agricola . Inutil é insistir sobre a importancia de
collocar a propriedade, equivalente a um quinto e um sexto do
valor do producto agricola de toda a presidencia de Agra, fóra
da influencia das estações, e de assegurar aos cultivadores, em todas
as circumstancias, um proveito certo por seu trabalho. A influencia
do canal de irrigação no melhoramento de Doab deve necessa-
riamente ser immenso. "
"Pag. 384 - Creio ter agora provado sufficientemente os
beneficios que serão assegurados ao Estado e á communidade
com a execução deste grande canal de irrigação. Ficou demon-
strado que elle accrescentará á receita do governo a somma de
lb. 350.000 por anno ; que protegerá contra o risco da secca e da
fome uma extensão do paiz contendo para cima de onze milhões de acres,
habitado por perto de seis milhões e meio de almas, e pagando ao Es-
tado uma receita territorial annual de quasi lb. 1.800.000. Ficou
tambem demonstrado que na eventualidade da falta de chuvas or-
dinarias a propriedade agricola no valor de 7 1/2 milhões sterlinos
será salva para a communidade, que um augmento na producção
da terra em lb. 1.200.000 sterlinos por anno será obtido : e que
mesmo comparada com a outra unica irrigação aproveitavel [a
irrigação de poços ] uma economia de despezas na importancia
de 2 1/2 milhões sterlinos annualmente será effectuada.”
No Report ofthe Indian Famine Commisson --vol. II pag. 152
-lê-se :
"No Sindh acha - se uma estensa provincia na qual, sem a
irrigação, serião impossiveis a agricultura e a população ; mas
graças a ella têm 1.800.000 acres de terra cultivadas, em excel-
jentes condições de prosperidade.
626

Os tres grandes systemas de irrigação delticos em Madras,


o Godavery, o Kistna, e o Cavery rendem directamente 8.7-6.5
e 31.7 por cento do capital gasto. O valor do arroz produzido
nos deltas do Godaveri e Kistna é calculado em cerca de 5 mi-
lhões sterlinos ( 100 mil contos a cambio de 12 d . )
"Na mór parte da India a canna do assucar e o arroz só po-
dem vicejar com a auxilio da irrigação artificial ; e mesmo em
Maidnapur, Bengala, com ehuvas de 55 polegadas, verificou- se
que a producção do arroz irrigado é 40 por cento maior do que
o das terras não irrigadas [ over the greater part of India sugar-
cane and rice can only be grown with the help of artificial irri-
gation and even in Midnapur, in Bengal, with an avegare
rainfall of 55 inches. it has been found that the produce of irri-
gated rice is 40 per cent. in excess of that grown on unirrigated
lands].
"A renda ordinaria da terra na parte septentrional da In-
dia dobrou com a irrigação, emquanto em 11 districtos de Ma-
dras o total das rendas cresceu de 1.4.0 para 5.4.0 por acre,
quando supprido d'agua. Em Tinnevelly o augmento attinge a
quasi 10 vezes mais. Nos 8 annos precedentes a 1875-76. a
media do preço da venda das terras irrigadas no valle do Ca-
veri, em Mysore, foi de 35 lb. por acre. As melhores terras sec-
cas nɔ mes no periodɔ não passaram de 2 £ a 2 £ 10 shill.
"Seria, na verdade, grande erro avaliar o valor das obras
irrigadas somente por sua renda directa. Mas propriamente
deve atten ler- se si algun trato de terreno está sujeito a frequen-
tes ou serias seccis, e se nɩ eventualidade da fome a população
seja tão gran le que necessite largos despendios com soccorros e
consideraveis prejuizos com a cessação das rendas. Se estas
questões forem respondidas pela affirmativa, e se ao mesmo
empo for possivel introduzir a irrigação, o governo deve fazel-
o sem hesitação [ government might usually embark on the
enterprise without hesitation ) . O resultado certo será o augmen-
to da propriedade, do geral bem estar e do poder productivo da
população, e o desenvolvimento de cada fonte directa donde de-
flue a riqueza do paiz.”
Ainda outra autoridade Ronna [ 1 ] assim se exprime :
"A mór parte da India seria esteril sem o auxilio da irri-

[ 1 ] Ronna- Les irrigations, vol . pag. 9.


627

gação, com a qual os indigenas á principio e depois o governo


inglez despenderam em trabalbos de açudes e de canalisação
enormes capitaes. No Punjab, onde o solo de alluvião consti-
tuido por detrictos dos montes Himalaya e arêas dos rios não
recebe annualmente senão 400 millm. de altura d'agua pluvial ;
no Sind, de solo arenoso, que recebe metade menos de chuva,
não ha colheita sem irrigações que deem o meio de segurar a
producção, de dispensar o estrume pelo limo que as aguas de-
positam, ou do restituir ao solo o esterco do gado em vez de
servir de combustivel ; finalmente de melhorar o estado sanita-
rio geral. Todos os esforços do governo tenderam até hoje ao
desenvolvimento e protecção das pastagens pelas regas ; no
Punjab havia, em 1880, dous milhões de hectares consagrados a
prados, cujo producto augmentou mais de 50 por cento depois
das irrigações.
A recente obra de Buckley--Irrigation Werks in India ( 1 )
resumindo os trabalhos feitos, classifica- os segundo o criterio
do governo em : Obras maiores e obras menores.
Esta classificação, dis elle, não é completamente logica,
porque ha algumas obras menores que são mais importantes
do que outras maiores, porém, falando geralmente, se pode di-
zer que as maiores são as mais importartes na mor parte dos
casos, inteiramente construidas ou largamente reconstruidas
pelo Governo Britanico : as menores, geralmente de pequenas
proporções, são em muitos casos modificações ou melhoramento
do systema irrigatorio que existe em estado imperfeito antes
que o pais tivesse sido annexado.
Cada uma dessas classes está por sua vez subdivida em
outras duas secundarias, como se seguem :
OBRAS MAIORES.— ( A ) Obras cujo capital procede de em-
prestimo monetario (obras productivas) . (B) Obras cujo capital
provem da receita geral da India. (C) Obras productivas-
Productive Works].
OBRAS MENORES.-( A) Obras cuja conta de capital e renda
são retidas kept]. ( B) Obras cuja conta de capital e renda
não são retidas.

(1) Buckley -Irrigation Works in India and their financial


results -London 1903, cap. XVIII .
628

As despezas com as obras menores provem inteiramen-


te da renda ordinaria geral, da India , e de forma alguma
de emprestimo monetario
As obras maiores ( 4) são de alguns annos chamadas
-Obras publicas productivas, e daptemão conhecidas como
--Obras extraordinarias -isto é, obras não construidás pelas
rendas correntes ordinarias da India. Ha 35 systemas nesta
classe. Antes que o projecto seja sanccionado para construc-
ção por emprestimo monetario, como obra maior [ 4 ] , é ne-
cessario que haja boa razão para pensar-se que ella produsa
renda liquida igual ou inferior ao juro que o governo tem
de pagar pelo emprestimo para tal construcção. De facto o
criterio [ test ), que se applica a todos os projectos para obras
desta classe, é puramente commercial ; considera-se essen-
cial que o emprestimo monetario seja empregado exclusiva-
mente nas obras que devam ser igualmente remunerativas.
As obras maiores (B) são em nº de seis, e geralmante
conhecidas como - Obras protectoras -as quaes não é applicado
o criterio commercial das A, isto é, a renda liquida resultan-
te destas não é igualmente destinada a cobrir o juro do ca-
pital despendido.
OBRAS MAIORES [ 4 ] —As 35 obras desta classe que estão
completas ou em construcção custaram até o presente 27 mi-
lhões de Rx [ dez rupias)

Orçamento san-
cionado para a
No de Capital gasto. in-
obras 'clusive despezas completa execu-
indirectas ção dos proje-
etos

Rx Rx
447974

Bengala 6.167.319 7.271.964


N. W Provinces 7.440.501 7.435.639
Punjab 5.886.837 6.717.374
Madras 5.627.327 6.465.796
Bombay 1.054.612 1.656.093
Sind ... 858.875 881.698

Total... 27.035.471 29.8285.564 ·


Estas obras são destinadas a irrigar, quando completas, a
grande área de cerca de 10.000.000 de acres.
Orçamento
productivas
completo,
maiores.
quando
Obras
obras
custo,
das
do
A1)(
O custo por acre varia consideravelmente, como é de
629

Descarga
maxi-j Areas
irrigadas
PROVINCIAS cub
pés
em.
mas Custo
Custo
total
do
por
completo
quando
segundo
por acres
em Rx
-
projecto -
X
acre
esperar das variadas circumstancias locaes de taes obras.

Bengala • ....
Canals 6.058 399.431 3.231.584 8.1
Orissa
Midnapre
canal. 1.400 125.000 850.604 6.8

( 1) Buckley -Irrigat Works in India, pag. 272.


Sone
canal 5.955 1.016.400 2.928.830 2.8
Total
.... 1.540.831 7.011.018 4.5
Provinces
W.
GangesN.
..:
canal 6.800 1.600.000 3.114.965 1.9
Baixo
Ganges
canal
.. 5.100 1.187.326 3.007.571 2.5
...
canal
Agra 1.500 240.000 945.511 3.9
Eastern
Jumna
canal 2.350 370.000 367.592 0.9
Total
... 3.397.326 7.435.639 2.2
Punjab
... Total
4.000
865a 2.330.850 6.717.374 2.8
Madras.. 2.467.204 6.465.796 2.6
Bombay .. 175.299 1.056.093 6.0
Sind
.. 444.131 881.698 2.0
Total
..... 5.417484 15.120.961 2.8
Tota ..l
geral 10.356.641 29.567.618
Destas
obras
açudessão
em
Madras..:
Barur 5.887 42.530 7.3
Works
River:
Panjura
Baixo
Bombay 12.627 46.726 3.7
Kadwa 66 32
743 78.503 2.4
Mutha
canal
.. 55.000 629.393 11.4
Ekruk 15.820 133.493 8.7
630

Diz -se que as obras maiores [ A ] são aquellas cuja remu-


neração é esperada ; isto é, as que devem dar renda liquida
superior aos juros que o governo paga pelos emprestimos
monetarios para sua construcção. Tomadas collectivamente
preenchem esta condição, posto que individualmente e mesmo
en grupos de 2 a 6 proviucias falhem. Contas regulares,
bão sido tomadas desde o começo e annualmente creditadas
com a renda liquida e debitadas com os encargos dos juros.
O resultado do conjuncto destas obras evidencía que até
o presente somente 12 das 35 obras deram lucros superiores
a 4 % : porém, que taes lucros forão bastante para cobrir a
deficiencia das outras 23. O resultado liquido é que : the works
of this class have covered the interest charges with a gross ex-
cess of the credit of Government of nearly 4 millions of Rx.,
and the profit is increasing largely every year. [ 1 ] …….
As obras modernas, construidas pelo governo britanico
durante os ultimos 20 annos, teem. até hoje, sido antes uma
drenagem do que um auxilio a renda da irrigação, e o producto
liquido do capital total empregado nellas fica abaixo de 4 por
cento. Porém a cornucopia está de novo voltada ; algumas das
obras novas são notavelmente bem acabadas e quasi todas me-
Thoradas.
As ultimas estatisticas da renda se vêem na tabella C, que
mostra que, tomadas todas as 35 obras conjunctamente, a renda
liquida dá mais de 4.3 % sobre o capital total, emquanto que as
de N. W. Provinces, Punjab, Madras e Sind produzem 5.1 ,
5.9. 7.0. e 7,2 por cento respectivamente do seu capital.

1891 Renda liquida

Cauvery Delta system Madras . 37.1


Eastern Jumna canal N. W. P. 22.0
Kistna Delta system Madras . 13.15
Godaveri 13.3
Sidh nai canal Punjab . 10.88
Desert [Sind] 9.4
Begari [ " ] 9.3
W. Jumna [Punjab] 9.2
Unbrarwah [Sind]. 8.7
Bari Doab canal Punjab.. 8.07
Ganges .. N. W. P. 7.1

(1) Buckley-Irrigation Works in India, cap. XVIII , pag. 274


631

Resulta dos dados anteriores sobre as obras de irrigação na


India, que a sua extensão, sempre crescente, como resumidamente
se poderá ver no quadro seguinte, e a remuneração do capital nel-
las empregado , quer directamente sob a forma de renda dagua,
quer pelo augmento da producção agricola , constituem o prin-
cipal meio de combater os desastres das seccas e de enriquecer
o paiz.
Dahi a preoccupação do governo metropolitano em dar
maior extensão as obras de irrigação, de preferencia a outras
quaesquer, inclusive as da rêde ferro -viaria, como se vê do Rela-
torio apresentado ao parlamento em 1889 .
"Em 1896-97 e 1897-98, diz este documento ( 1 ), os cami-
nhos de ferro deram prejuizo com a receita do Rx. 1.504.100 e
Rx. 1.477.400 , emquanto a renda procedente de irrigações au-
gmentou de 424.900 e 557.700.
Não admira pois que desde 1886 o major Baring recom-
mende que dos creditos votados para as obras de protecção con-
tra as seccas o total ou pelos menos tres quartos delles sejam
empregados, NÃO EM ESTRADAS DE FERRO, mas em NOVAS OBRAS
DE IRRIGAÇÃO.
São estes igualmente os votos que a illustre commissão, no
meada pelo governo inglez dentre os profissionaes, economistas,
engenheiros, estadistas mais distinctos do paiz, lhe dirigio
Esta commissão, nomeada em 23 de Dezembro de 1879,
tinha por objecto "examinar e comparar os systemas de soccor-
ros contra a fome, sancionados pelas differentes provincias
empregados durante a recente secca ; inquerir qual o exito al-
cançado por estas medidas, e lembrar as lições e recommenda-
ções suggeridas pela experiencia emquanto os factos esta-
vam frescos."
No relatorio presentado, em alguns volumes, contendo in-
formações minuciosas e do mais alto valor para a solução do
grave problema das seccas, insiste a commissão preferencial-
mente pela construcção das obras de irrigação.
"Desenvolver, dız ella [ 2 ] , e melhorar os systemas existen-
tes de irrigação, e a construcção de novas obras menores, de

[ 1 ] Report of the famine commission -pag . 330.


[2 ] Report citado, nº 409, pag, 243.
632

irrigação, seria geralmente a forma mais desejavel como obra


de soccorro publico."
A commissão não duvida, em relação a novas obras irriga-
torias, recommendal-as para certas regiões, embora não sejam
directamente remuneradoras. " In many parts of the country
works of the kind can no doubt be proposed which, although
unlikely to be directly remunerative may nevertheless be justified
on their merits as likely to improve the condition of the people
and to prevent or mitigate distress in the future. [ 1 ]
Justificando nas suas conclusões a preferencia dada as
obras de irrigação em contraposição as ferro viarias assim pro-
nuncia-se a commissão :
We are disposed to agree largely with the following opi-
nion expressed by Sir John Strachey in which we believe he
had railways specially in mind.
"The true object of these protective works is to give incre-
ased security against the greatest dangers that arise in extreme
drought, to supply the means of saving life, and of averting
suffering and misery, rather than to cause an eventual reduction
in the cost of famine relief." ...
"We think that the greater part, if not the whole, of this
amount (refere- se a verba destinada a protecção contra as
seccas) should be devoted to protective irrigation works. [ 2]
Esta conclusão sanciona o que differentes commissões, em
epocas anteriores, aconselharam ao governo metropolitano,
como já me referi em outra parte deste trabalho.
São interessantes as da notavel commissão da secca de
1878 a 80, cuja transcripção, de seu Relatorio, no capitulo V,
part. II , se segue :
"Among the means that may be adopted for giving India
direct protection from famine arising from drought the first
place must unquestionably be assigned to works of irrigation. They
pointed out that the true value of these works could not be
measured by their financial success considered only with refe-
rence to the net return to Government on the capital invested
in them , but that account must also be taken of the direct pro-

[1] Report cit., nº 411 .


[2] Report citado, pag. 330.
633

tection afforded by them in years of drought by the saving of


human life and by the avoidance of loss of revenue remitted ,
and of the outlay incurred in costly measures of relief, while in
seasons of average rainfall they are of great service and a great
source of wealth, giving certainly to all agricultural operations.
increasing the outhurn per acre of the crops, and enabling more
valuable descriptions of crops to be grown. After giving some
figures showing the value of irrigation works in different pro-
vinces in this respect, they remarked that in spite of the ill- suc-
cess of some works "the actual experience is altogether opposed
to the view that the existing works of this class, taken as a
whole, are otherwise than positively remunerative to an extent
which completely justifies the measures which the Government
of India has carried out for their extension during the last 20
years or more." They showed that the net revenue of all these
works in the year 1879-80 amounted to very nearly 6 per cent.
on the capital expenditure, which included £ 3 millions on
works not yet brought into operation. Their general conclusion
was expressed in the following words :-
Viewing the provision of irrigation works as a means O
affording an insurance against drought, the Government may,
we think, properly regard them as a class of undertakings
which should be treated as a whole, so that any unusual facilities
obtained in one direction may be set off against special difficul
ties in another, and the general financial outcome of the entire
class may be accepted as a sufficient test of the policy that
should regulate their treatment. Thus considered, and bearing
in mind that it has never been the desire of Government to ma-
nage these works with a view to show great profits, the actual
results which have been stated appear to us entirely satisfactory,
and such as to justify their continued prosecution with all sui-
table precautions to ensure economy of construction ."
Foi, porventura, suggerido por tão valiosas opiniões, que o
governo inglez na ultima calamidade indiana redobrou de esfor-
yos mandando construir obras irrigatorias, que. comparadas as
realizadas na grande secca de 1876 a 79, execedem- nas em ex-
tensão. De 31.804.104 acres irrigados por aquellas obras, neste
periodo, attingiram a 77.662.805 em 1897 , como se vê da seguin-
te tabella :
Irrigação
inclusive
Burma.
India
na,
OBRAS
REMUNERADO RAS OBRAS
OBRAS
DE
PRO-
MENORES TOTAL
ANNOS TECÇÃO
Acros Acres Acres Acres
1876-77 4.027.758 5.448.199 9.475.957
1877-78 4.736.017 5.873.614 10.609.631
1878-79 5.171.497 6.547.019 11.718.516
3
annos 13.935.272 17.868.832 31.804.104
1894-95 6.099.952 159.918 7.228.324 13.488.194
1895-96 7.775.936 179.353 7.199.716 15.155.005
1896-97 9.448.692 323.820 7.442.990 17.215.502
3
annos 23.324.580 663.091 21.871.030 45.858.701
Total 37.259.852 663.091 39.739.862 77.662.805
CAPITAL
GASTO
COM
A
IRRIGAÇÃO IRRIGADA
Rx AREA
RENDA
LIQUID A
Acres
productivas
Obras
1879-80
a]|[
1896-97
31.852.948 9.448.692
66
protectoras 2.099.253 663.091 1896-97
em
6,52
%
menores 66 8.274.214 7.442.790 1896-97
em%
9,13
634

Rx
41.626.415 21.871.030
635

ESTADOS UNIDOS DA AMERICA DO NORTE. Por sua situ-


ação em zona differente da nossa, parece que os Estados Unidos
da America do Norte não deveriam servir de termo de compa-
ração ao Ceará : mas se observarmos de perto as condições
locaes de uma grande extensão territorial daquelles, veremos
que em relação a seccura e irregularidade nas precipitações
pluviaes ha pontos de contacto, semelhanças tão inequivocas
que permittem e sancionam essa approximação e parallelo.
O clima do Colorado (Estados Unidos ) em S. Bernardino, S.
Diogo e outros sitios é, segundo a autoridade do meteorologista
americano-general Greely [ 1 ] onde menos chove no mundo,
attingindo a camada pluvial 1.92 pollegadas em Indio e
2.81 em Yuna. O deserto arabico, comparado a esta região, é
um verdadeiro jardim (is a very gardner.)
E' esta a chamada zona arida, cuja definição nos dá o ma-
jor Powell [ 2 ] dizendo -que ella comprehende somente as terras
onde as chuvas não passam de 20 pollegadas por anno. "Over
the great belt in which irrigation, accrescenta elle, has so far
had its chief development, the record for a series of years gives
out little more than that half quantity, so that 10 to 12" may
be taken as fair average, though the extremes show a much
wider variation.
In Northern California, and among the mountains to the
east, the rainfall rises to 40", while in the desert of Southern
California it fall to four inches .
In Western Kansas the fall, not infrequently, reaches 20″ ;
but there, as with us, this is so irregular that the former who
relies solely upon a natural supply loses more by the dry seasons
than he can make in those which are more propitious. "
Um observador sagaz, que conhece por suas viagens e estu-
dos grande parte do globo, o Sr. Pierre Leroy - Beaulieu, na
sua recente obra sobre os Estados Unidos , referindo-se a esta
região diz [3 ] que : Zona arida - chama-se nos Estados Unidos
aquella onde cáe menos de 500 mill. de chuva annualmente. Do

[1 ] General Greely- American Weather.


[ 2 ] Major Powell-Irrigation in Western America, Egypt
and Italy.
[3] Pierre Leroy-Beaulieu - Les Etats Unis au XX siecle-
1904 -Paris, pag. 177.
636

meridiano 160 --á O. de Greenwich até as montanhas Cascatas


e a Serra Nevada, cobre esta zona cerca de 3 milhões de kilom .
quad., mais do terço, quasi 40 por % dos Est. Unidos [ sem com-
prehender Alaska ]. Oito estados - Montana, Idaho, Wyoming,
Colorado, Utah, Nevada, Arizona e Novo Mexico, estão inteira-
mente nella comprehendidos. Washington, Oregon e California
contam metade de sua superficie, sendo a restante bem regada.
Não se deve suppor que ahi não se possa obter agua, diz
Newell 1 ] ; ao contrario, cáem chuvas occasionaes, que
despejam quantiosas porções d'agua e inundam a planicie se-
quiosa. Após estas precipitações aquosas as ravinas dos rios fi-
cam quasi seccas. A intervalos espaçados existem tambem co-
piosas fontes perennes, cuja mor parte corre em canaes es-
treitos e canhões profundos.
Esta região não é total ou completamente deshabitada ; mas
nas proximidades de alguma fonte e á margem de ribeiros, que
não correm em canaes profundos, se encontram ranchos e rara-
mente pequenos povoados.
Compare-se este regime de chuvas com o nosso, e ver-se- ha
que sendo a media no Ceará de 1.400 mill . por anno, excede de
7 vezes a do Colorado.

Pois esta região esteril, afastada do littoral, situada no


meio de altas montanhas rochosas, quente, e deserta até bem
poucos annos, é presentemente uma horta verdejante, rica , e
cuja producção agricola é superior 20 a 25 vezes a de todo o
Ceará, graças aos trabalhos de irrigação recentemente realisa-
dos por grandes emprezas e pelo estado.
Quasi deserta em sua maior extensão até 1870 , graças a
este subsidio, conta actualmente cerca de 4 milhões de habi-
tantes [2]

[1 ] Irrigation - do Annnal Report of the Board of Regents of


the Smithsonian Institution para o anno de 1901 [ 30 de Junho ]
Washington 1902, by F. H. Newell hydrographo da U. S.
Geolog. Survey- pag 410.
[ 2 ] Na parte dos Est. Unidos onde ha terras publicas, nas
quaes as fasendas e habitações só podem existir com o auxilio da
irrigação, vivem actualmente 3 a 4 milhões de habitantes. --- F . H.
Newell- obra cit. , pag. 411.
637

"A colonisação começou nesta região arida em 1870. [ 1 ]


Nesta epoca havia apenas, nos 3 m lhões de kilom. quadra los dos
11 Estados aridos- 990.000 hab., dos quaes 560.000 na Califor-
nia, para onde as minas de ouro haviam attrahido desde o mei-
ado de Junho importante immigração, e 430.000 nos outros esta-
dos : em 1880 a população já attingia a 1.767.000 h , dos quaes
903.000 fóra da California ; em 1890 passava de 3.102.000 dos
quaes 1.894.000 fóra da California ; em 1900-4.091.000 . dos
quaes 2.606.000 nos 10 estados, sem a California.
"Este effectivo humano, tão fraco , ha já obtido resultados
admiraveis. Não contente em fazer viver nas suas magras pas-
tagens 8 1,2 milhões de animaes vaccuns e 33 milhões de car-
neiros, os colonos dos Estados aridos submetteram a irrigação
2.900.000 hectares de terras, equivalentes a superficie de 5 de-
partamentos francezes ; e as colheitas produzidas nellas attin-
giram em 1899 ao valor de 437 milhões de francos [ 275.300
contos] .

"Comparando -se, segundo o Census de 1900 a extensão des-


sas terras irrigadas com a das chamadas - melhoradas - impro-
ved land, vê- se, effectivamente que no Nevada, estado cujo clima
é o mais defeituoso, 88 por 100 das terras melhoradas são irri-
gadas ; no Wyoming 80 por 100 ; no Arizona 72 por 100 ; no
Colarado 71 por 100 ; no Novo Mexico 62 por 100 ; no Utah
61 por 100.
No Montana, que possue alguns cantões um pouco mais
humidos, esta proporção é ainda de 54 por 100 ; no Idaho, cuja
parte Noroeste comprehende altos valles em que os invernos do
Grande Oceano se vêm condensar, cáe a 43 por 100. Os tres
Estados ribeirinhos do Pacifico, cuja metade recebe abundantes
chuvas, contam menor proporção de terras irrigadas ; 12 por 100
na California e Oregon, menos de 4 por 100 no Washington ;
comtudo a extensão dessas irrigações é consideravel, sobretudo
na California."
Referindo -se ao trabalho já feito e aos que a elle se de-
dicaram, affirma Newell : ( 2 )

[1 ] Pierre Leroy - Beaulieu - Les Estats Unis, etc., pag. 179 .


(2) Newell- Obra citada, pag. 412.
638

" They have demonstrated that irrigation not an expe-


riment, but an assured success, highly profitable to the man
who cultivates his own land. " E para demonstral - o dá a se-
guinte tabella :
Area irrigada em acres (terras aridas) :

TERRITORIO DO ESTADO 1890 1900

Arizona 70.000 180.000


California . 1.200 . 1.500.-
Colorado 1.000.- 1.600.-
Idaho 230 . 600
Montana 380 900 .
Nevada. 240 . 500 .
New-Mexico 95 200 .
Orizona 180.- 400 .
Utah ... 300 . 600 .
Washington 100.- 140 .
Wyoming.. 250 . 600.-
Semi-humidos 70.- 280

4.115.000 7.500.000

Este immenso trabalho, realisado em poucos annos, nas-


ceu do esforço pessoal de um grande cidadão, dedicado aos
melhoramentos de sua patria. Refiro-me ao major Powell, de
quem o actual director do serviço de irrigação nos Estados-
Unidos, Newell com a sua indiscutivel autoridade fala com a
maior admiração no estudo sobre a Irrigação nos Estados-
Unidos, inserto na revista da Smithsonian Institution de 1901 .
São estas as suas considerações ( 1 ) :
O reconhecimento da irrigação, como capital problema
nacional, foi feito pelo Major John Wesley Powel, ha mais de
30 annos, como director de U. S. G. S.

Nas suas explorações do Oeste, rapidamente feitas, depois


da guerra civil, o major Powell impressionou -se com a grande-
za dos recursos da região, e da sua dependencia á conservação

1 ) Newell - Obra cit., pag. 418.


639

d'agua pelo maior desenvolvimento da irrigação . Seu relato-


rio acerca das terras da região arida (arid region) , impresso
em 1879, é tido como classico neste assumpto. A importancia
de sua personalidade e a impressão causada nos membros do
Congresso deu lugar a autorisação, em 1888 , para os exames es-
pecificos da extensão melhoravel das terras aridas. Logo de-
pois foram essas obras iniciadas, etc. "Uma commissão selecta
do Senado americano foi nomeada para acompanhar o major
Powell. O relatorio, em 4 volumes, compendiou todas as obser-
vações e testemunhos sobre as terras aridas.

O successor deste, como director da U. S Geol. Survey,


Charles D. Walcott, conseguio attrahir a attenção de nego-
ciantes, philantropos, manufactureiros, gerentes de transportes,
etc., para este assumpto, de que resultou finalmente o relato-
rio do Secretario do Interior recommendando a immediata
construcção de algumas das grandes obras ; e mais nota-
riamente a directa e incisiva mensagem do presidente Roose-
velt chamando a attenção do Congresso e do povo para a
ntilisação dos recursos prestaveis pela agus no Oeste como
uma das maiores questões internas da actualidade.
A commissão, encarregada pelo Congresso a Geolog. Survey,
que começou a funccionar em 1888, medio em annos succes-
sivos as fontes, estudou os sitios para açudes, e conta pre-
seutemente com um corpo completamente apparelhado e ex-
perimentado de engenheiros hydraulicos, muitos dos quaes
praticos na construcção de grandes obras irrigatorias. (1)
Vejamos o que dizem outras autoridades.
Numa monographia sob a epigraphe-Irrigation and irriga-
tions systems in San Bernardino county, California, by F. C. Finkle
[ 2] inserta no Engineering News de Nova e York, pronuncia- se o
seu autor por estes termos : "Terras que anteriormente erão
consideradas de nenhum valor, excepto para creação de carnei-
ros, forão pela intelligente applicação de capital, sob a previsão
da sciencia, convertidas em pomares de larangeiras e de outras
fructas, possuindo actualmente o valor de $ 1.000 a $3.000 ....

(1) Newell - Obra cit.. pag. 420 .


(2) Engineering News- de Julho de 1891 - New- York.
640

[ 3:200$000 a 9.600$000 ao cambio de 15 d ] por acre [ 64 metros


em quadro. ] E mais adiante accrescenta : Vê-se que ha chança de
proveitosa applicação de capital onde terras compradas a $10 e
$20 por acre podem ser vendidas por 100 vezes mais, graças a
irrigação (ibid pag. 72) .
As em prezas de construcção de açudes tornaram-se tão
rendosas que algumas, como por exemplo a do Bear Valle, no
districto de S. Bernardino, California, vio -se na necessidade de
construir outro. "Since the present dam ( Bear Valley) has pro-
ved such a successfull enterprise, and the colony of Redlands
nourished by its waters has showed such marked results, the
owners of the reservoir have begun to look around for other
similiar enterprises. ( 1 )
A questão das irrigações adquirio tal importancia neste
estado. que em setembro de 1891 reunio-se em Lake city um
congresso para tratar dos meios de alargar os seus beneficios
por todas as regiões esterilisadas á falta d'agua.
O governador do Estado de Utah, illustração ameri-
cana do mais fino quilate, e na opinião de uma grande revista
scientifica, um dos homens mais notaveis do seu tempo, Arthur
1. Thomas. no discurso com que abrio o congresso, disse que
"para valorisar as terras seccas do estado e triplicar os recursos
do territorio deveria proceder- se a construcção de açudes, ca-
naes de irrigação, etc. , mas que sendo a obra das companhias e
syndicatos geralmente morosa e cheia de complicações de inte-
1esses que faziam subir o custo d'agua de irrigação ao extremo
de desanimar os lavradores, imcumbia esta tarefa ao estado.
This development [ das obras ] . to be systematic, fair in its ap-
portionement of water and to do most good to the greatest
number of citizens of the territory, should be the work of the
territorial authorities, planed by their engineers, built and con
trolled by them . 1
No relatorio de 1890 sobre a irrigação das terras aridas nos
Estados Unidos, Joseph Nimmo, Jr. , agente especial do minis-
terio da agricultura da União americana. recommenda ao g₁-
verno a irrigação destas terras, pensando que elle deveria con-

(1) Ibid. - de 15 de Agosto de 1891 , pag. 147 .


}
641

sentir na eonstrucção de obras adequadas e dirigil- as nas terras


que pertencessem ao Estado.
O mesino pensamento forma por assim dizer o substractum
do excellente livro de H. Scongal [ 1 ] no qual advoga a necessi-
dade do governo mandar construir as grandes obras de irriga-
ção, afim de aproveitar as terras aridas, vendendo-as depois
com o desconto do custo proporcional a estes trabalhos.
E' esta a opinião que parece ir adquirindo adeptos, e de
accordo, alguns estados já decretarão obras de irrigação de su-
bido valor.
O governo do Dakota, por exemplo, logo apoz a inaugura-
ção das estações de irrigação experimental, mandou construir 3
grandes açudes no districto de Aberdeen ( sul ). [2 ]
Na California o açude de Bear Valley, a que já me referi ,
foi o ponto de partida para novas emprezas do mesmo genero .
Os seus resultados foram tão grandiosos que logo apoz se fɔr-
maram varias companhias para construir reservatorios seme-
lhantes a este.
O açude do Bear Valley, como está construido, tem a capa-
cidade sufficiente para supprir agua á irrigação de cerca de
18.000 acres [7.200 hectares, quando o de Quixadá poderá irri-
gar somente 3.500 á 4.000 hect. ] de terras no S. Bernardino
courty. Fica situado proximo as nascentes de Bear Creek, tri-
butario de South Ana River. Foi construido para supprir Re-
dlands e seus arredores. A parede actual tem 53 pés de altura
e represa agua na extensão de 5 1,2 milhas por 2/3 de milhas.
na media. Pode fornecer 65 pés cubicos d'agua por segundo e
por 6 2/3 mezes ou 111 pés cubicos por segundo por 4 mezes .
A barragem é de alvenaria com cimento de Portland. ( 3 ) Esta
barragem é curva e tem a largura de 8 1/2 pés na base e 316
na corôa. Pretendem por ora erguer a parede até 80 pés, fican-
do então com a capacidade 4 vezes maior, e mais tarde a 120
pés.

(1) H. Scongall — Modern Ideas on Irrigations - Salt-Lake


city, 1891 .
(2 ) Engineering News --de 23 de Maio de 1891 , pag. 485.
[ 3 ] Veja-se a descripção completa no Engineering News--
vol. XIX pags. 271 , 513, e vol. XX I pags. 484 e 512.
642

Em 1891 encorporou-se a Bear Valley Irrigation Cº com o


capital de $.4000.000 ( 13.200.000$000 ) para construir um novo
açude, orçado em $750.000 [ 2.400 contos ] e canaes de irrigações
deste para regar 210.000 acres [ 85.000 hectares ou área quasi
igual a do valle do Jaguaribe].
O açude Falsom Dam, no American River, California, foi
construido por conta deste estado, começando em 1886 e ficando
terminado em dezembro de 1890. A parede, sentada sobre
rocha, tem 92 pés de altura, 87 de espessura na base, 24 na co-
rôa e 650 de comprimento, sendo de alvenaria de pedra, conten-
do 84,590 jardas cubicas de granito. O sangradoro movel at-
tinge 6 pés de altura. E ' destinado principalmente a força mo-
tora, para illuminação electrica e fabricas, mas pode irrigar ....
400.000 a 500.000 acres de terreno. A altura d'agua represada
é de 56 pés, sendo de 126 pés a parede, contados do ponto mais
baixo ; forma uma bacia de 3 milhas d'agua.
O açude do Hemet Valley, California, estava em construcção
em 1891 , num sitio á 20 milhas a leste de S. Jacintho e cerca de
100 de S. Diogo da California ; destinava -se a irrigação do valle
de S. Jacintho, com a capacidade de 6.000.000.000 de galões
d'agua. Sua barragem é de alvenaria de pedra com 150 pés de
altura e 90 na base. Seu custo ficaria relativamente elevado
pela difficuldade de transporte para o material e carestia de
braços. O cimento sahia por barril, na obra, a $ 4 ou 12$ 800 ,
quando em Quixadá fica por 8 a 94000, ao cambio actual.
No Colorado estão em construcção grandes reservatorios ,
sendo 1 proximo a Buena Vista, outro perto do Monumento
El- Pasco, e o ultimo em Hard- erabble.
Na California ia começar-se a construcção de um açude
collocado em Penn- Valley, no Sacramento. destinado a irriga-
ção . [ 1 ]
O de Kound Valley em Lewis Creak, estava em estu-
dos . [2]
No Colorado o estado mandou construir um grande açu-
de com 800 pés de parede, á 13 milhas a oeste do Apiakapa.

[ 1 ] Veja-se o Engineering News de 5 de Setembro de 1891.


[2] Estas informações, como parte das que se seguem, da-
tam de 1891 .
Depois disto o governo americano avocou a si o serviço ge-
ral de irrigação .
643

No Idaho estava a terminar a construcção de Montain


Home
Ainda na California, a companhia, que executou as obras
do açude de Los Angelos, se propoz fazer o de Aliso Cañon
a 3 milhas de Acton, o qual terá uma barragem de alvenaria
de 150 pés de altura, 800 a 900 de extensão e represará …………….
8.000.000.000 de galões d'agua.
Em Julho de 1891 organisou -se uma companhia para con-
struir em Fresno, California, uma grande barragem atravez de
um rio que só corre no inverno, com 60 pés de altura e a ca-
pacidade para irrigar 27.000.000 acres, tendo 38 milhas qua-
dradas a sua área de drenagem.
O açude de Long Valley Creek, em via de construcção, tem
uma parede de alvenaria em forma de arco com 85 pés de al-
tura, 2.000 de extensão na corôa, 900 na base, e 20 de espessura
nesta, com a capacidade de 10.000.000 de galões.
Em S. Dimas, California, está projectado outro grande açu-
de para conter 6.000.000 de galões d'agua com parede formada
de 374.000 jardas cubicas de terra.
Em S. Bernardino, California, uma companhia contratou
a feitura de alguns açudes por $ 1.000.000 [ 5.400 contos ] para
irrigação de terras.
No estado de Conneticut o açude de Bethel foi construido a
custa do estado , em 1878, tendo a capacidade de 96.000.000 ga-
lões. A sua parede é de terra e tem 174 pés de extensão por
22 1/2 de altura.
Em Kerney, Nebraska, estão em andamento os trabalhos de
um grande açude e de 50 milhas de canaes com 50 pés de lar-
gura e 10 de profundidade, destinados a irrigação.
Até no ardente e arido Texas constroem-se açudes. No Co-
lorado River, em Austin, existe um grande roservatorio com a
parede de 1.150 pés de comprimento, 60 de altura, 18 de espes-
sura na corôa e 60 na base. Exteriormente esta parede é de
granito e interiormente de pedra calcarea, tendo consumido
cerca de 18.000 jardas cubicas de granito e 70.000 de alvenaria
de pedra [ a de Quixadá não excede de 45.000 metros cubicos ]
ao preço de $ 11 a $ 15 [ 36$ 200 a 48 $000 ] a jarda cubica de gra-
nito [ no Quixadá ficou no maximo por 25$000, ] e de $3,60, com
50 cts. addicionaes a de alvenaria de cimento [ 134000 ], quando
644

em Quixadá não attingio a 18$000 . Eis o seu orçamento, que é


curioso conhecer- se para se contrapor ao do Quixadá :
Represa $6.200
Escavações em terra, 1.000 j . c..... 5.000
Escavações em terra de baixo d'agua 58000 j.c. 8.700
Escavações na rocha 8. 150 j . c…………… 8.150
Alvenaria tosca 54.550 j . c.... 218.100
Pedra calcarea 6.800 j . c.. 68.000
Granito 9.000 j . c. a $ 13 . 117.000
Copeamento 2.000 j . c. a $16 32.000
Total ..... $463.250
Ou 1.482.400$000 na nossa moeda.
Este açude pode desenvolver a força motora de 14.636 ca-
vallos por 60 horas, na semana. Com os canaes necessarios para
a destribuição d'agua ficou a obra por $ 1.300:000 (4.260.000$000 ) .
O reservatorio do Oak Ridge, no rio Pequannock, em Ne-
wark (New-Jersey) tem a capacidade de 2.500.000.000 galões
d'agua, a parede 280 pés de comprimento na base, 620 na corôa,
51 de altura, 20 de espessura na corôa; o de Clinton, no mesmo
estado, sobre o rio do seu nome, à distancia de 5 1/4 milhas
d'aquelle, tem a capacidade de 3.538.000.000 galões : e o Nacopin,
á 4 milhas d'este, com a capacidade de 30.000.000 de galões -
têm as barragens de terra com uma parede central de pedra
assente na rocha. A do Oak ergue-se a 29 pés com um degráu
de 16 pés de largura. A sua parede central de alvenaria de pe-
dra, composta de 3 partes de arêa 1 de cimento e 4 de pedra
quebrada, tem 9 pés na base e 4 na corôa. O sangradouro fica
na rocha lateral, bem como as portas de tomada d'agua.
O açude de S. Matheus, na California, acha- se a 32 kilom.
de S. Francisco.
O seu dique ( barragem ) é de alvenaria, con a altura de
51 metros e 72 cent., espessura de 6.10 cent na corôa, 53.64
na base. Tem a forma curvilinea com o raio de 194.16 m . e é
todo de concreto.
A sua capacidade é de 121.000.000 m . c. [ o do Quixadá
138.000.000 m. c. ]. Um tunel aberto na rocha com 4.2 c. de di-
ametro, dá sahida as aguas. A elle vão ter 3 galerias de accesso
e 4 sahidas.
O de Spring Valley, na California, foi construido em 1864.
com parede de terra, de 29 metros de altura, 8 de espessu-
645

ra na corôa, 160 na base, com a inclinação interna de 23 4


O do lago Winnibogohish, construido entre 1880 e 1885. é tão
grande quanto deveria ser o de Lavras : tem a capacidade de
1.298.000.080 metros cubicos d'agua ( 1.500.000.000 m. c. o de
Lavras], occupa a superficie de 41,772.000 hectares. O
preço de suas aguas regula 0.0043 por metro cubico. O do
lago Leech ( 1881-85 ] tem a capacidade de S50.000.000 m. c..
cobrindo C0.554.000 hectares com as suas aguas. cujo preço
por metro cubico é de 0.0043 do franco. O da cascata do
Pokegama (1881-85 ) contem 81.000.000 m. c., occupando as
suas aguas a superficie de 11.730.000 hectares, e custando ca-
da metro cubico 0.0013. O do rio Pino ( 1880-86) represa
211.060.600 m. c. , d'agua, cobrindo 6.459.000 hectares.
O açude Boyd's Corner acha-se sobre uma ramificação do
Croton, e serve para abastecer d'agua a cidade de Nova York.
Foi construido de 1866 a 1872 , tendo a capacidade de………….
10.200..000 m . c , a profundidade maxima de 17 in . O dique
tem a altura de 23 m. 80 c. , desde os alicerces, a espessura
de 2,65 na corôa e 17.37 na base, 204 metros de comprimento
na corôa, 60,96 ao nivel do alveo do rio. Este dique foi con-
struido com grandes pedras de talho nos paramentos e conere-
to internamente. A captação d'agua opera-se por intermedio de
uma torre com dous conductos que atravessam o dique: O san-
gradouro da superficie tem 30.48 m . de largura e é aberto
na rocha.
O Sedon começou a ser construido em 1887 sobre o ramo
oriental do rio Croton e deve servir para alimentação de Nova-
York. Tem a capacidade de 30 milhões de m. c., a sua barra-
gem 23-80 m . de altura, acima do leito do rio, e 26,82 dos ali-
cerces. com a espessura de 3.66 na corôa a 14.32 na base, e o
comprimento de 155.45 m . na corôa e 45.72 na base.
O Quaker Bridge, em construcção para o mesmo destino,
sobre o Croton, armazena 121.000.000 de metros cubicos d'agua.
Era o maior do mundo no tempo em que Crugnola escre-
veo a obra Serbatoi d'acqua [ 1830 ]. da qual estrahi a noticia des-
tes 3 ultimos açudes. O dique tem 82.30 m. de altura. desde o
fundo do valle, [ o do Quixadá tem 20 m. ] , 6.10 de largura na
corôa, 65.84 na base e 411.48 de comprimento, recebendo a
pressão maxima de 14 kilg. a jusante e 19.21 kilg. por metro
quadrado á montante. O dique é rectilineo .
650

aridas do Pasco por meio de um açude em Washtuena. Irri-


gará uns 160-000 acres, pelo custo de $30 por acre ou
$3.000.000.
Wyoming- O projecto Shoshone attenderá a irrigação de
175.000 acres por meio de barragem, e pelo custo de $25
por acre ou $4.375.000.
Por estes projectos, cuja execução deve ter começado para
quasi todos, vê- se que a area irrigavel a ser aproveitada orça
por 1.441.000 acres e pelo custo medio de $25 por acre, ou
sejam $31.925.000 correspondentes a 118.882 contos de reis da
nossa moeda a cambio de 15 d .

Alem destes ha os projectos secundarios que são quasi de


igual importancia. [ which are almost equally important]. [ 1 ]
RESULTADOS ECONOMICOS. - Das obras realisadas e já em
exploração são estes os resultados economicos, tal como nol os
transmitte o Sr. Leroy- Beaulieu , na sua obra sobre os Estados-
Unidos .
De $2.863.000 que valiam, em 1899, as colheitas de Nevada
$2.853.000 provinham das terras irrigadas . No Colorado , que
tem a mais importante producção agricola da zona arida įcom
a excepção dos Estados do Pacifico ] $ 15.100.000 dos productos
sobre $16 860.000 vinham das terras irrigadas , seja 90 por 100 ,
no Arizona , Utah, Wyoming a proporção do valor das colheitas
fornecidas por essas mesmas terras excediam de 90 por 100 ; no
Montana attingio a 70 ; no Idaho a 60 p . 100 ; na California ,
se bem que as terras irrigadas não formem senão um oitavo do
conjuncto das terras melhoradas , o valor dos productos obtidos
naquellas attingio a mais de um terço do valor total, $33.000 000
sobre $93.500.000 .
"As colheitas fornecidas pelas terras irrigadas têm pois un
valor muito mais consideravel do que nas não irrigadas.
Isto se explica , em parte, porque naquellas se cultivam
productos mais preciosos , mas, sobretudo porque o rendimento
é mais consideravel.

[1) Third annual report, citado, pag. 52.


651

Eis as culturas irrigadas nos Est. Unidos :

SUP. EM VALOR
EM MILHÕES
HECTARES DE DOLLAR

Feno e forragens .. 1.466.200 34.8


Cereaes 559.900 14.3
Legumes 67.400 9.6
Fructas 100.500 10.0
Diversos 90.700 15.6

2.284.800 84.4

Os Estados de mais extensas irrigações são : o Colorado


664.000 hectares, California 578.000 hec. , Montana 360.000 hect.
Utah, Wyoming. Idaho, Nevada, 260.000 hect.
On de agricultures que se entregavam a irrigação na
zona arida era de 102 819 em 1899 contra 52.584 em 1889- ,
tendo passado de 1.436.000 a 2.905.000 hectares.
Na California, sobretudo. a irigação é applicada de pre-
ferencia a cultura das fructas.
No conjuncto são as forragens que occupam a maior ex-
tensão entre as culturas irrigadas. Sua producção por hect. irri-
gado é de 4.500 kilos em vez de 3,500 para todo territorio ame-
ricano.
No Colorado un hect. irrig. produz 19 hectolitros de trigo
mais do que a media da França, sendo a dos E, U. de 11 a 12,
quando no proprio Colorado o trigo não irrigado dá apenas 5 1/2
hectol. por hectare.
A media das culturas irrigadas é de 30 hect., e o valor
destes attinge a 550 francos. Na California o valor do hectare
irrigado sobe a 1.160 frs. Quanto ao valor do producto bruto ---
é de 192 frs. por hect. para o total da zona arida e de 370 frs .
na California. As despezas de mão d'obra que requerem as
regas ficam por lol por hect.; o custo d'agua, fornecido pe as
emprezas de canaes de irrigação (average first cost of Water)
não está comprehendido nesta somma.
As despezas do primeiro estabelecimento dos systemas de
irrigação existentes - baragens, canaes, etc. , são, segundo o
Census, bem pouco consideraveis. Elevam- se a $64.289.000.
648

de 52 reservatorios para beneficiar a agricultura, sommando to-


dos a capacidade de 2.209.400 acre - feet.
Na California, onde já existem mais de 50 grandes açudes
[pouco mais ou menos da capacidade do de Quixadá], e 100
menores, propoz a commissão de engenheiros a feitura de mui-
tos outros, entre os quaes 2 em Litle Yosemite com a capacidade
de 45.000 acre- feet ; 1 em Lake Tenaiya com 23.000 acre- fect ;
1 em Tuolumne Meadows com a barragem de 75 pés de altura, e
mais 3 lateraes, produzindo a repreza de 43.185 acre-feet ; 1 em
Lake Eleanor com a barragem de 65 pés e a capacidade de 45.770
acre-feet ; 1 em Kennedy's Meadow com a barragem de 102 pás
e 7.408 acre-feet de capacidade ; 1 em Kennedy's Lake com a
barragem de 51 pés e 2 000 acre- feet de capacidade ; 1 em Bear-
Valley com a barragem de 55 pés, e dous outros lateraes com
6.917 acre-feet de capacidade. A área que esses açudes cobrirão
será de 59.486.89 acres.
A iniciativa particular e dos Estados, juntou-se a da União,
que pela lei de 17 de Junho de 1902 estatuío as condições do
serviço de irrigação para as terras aridas.
Organisada a respectiva repartição central, são ali exa-
minados todos os projectos estudados in loco , e depois de ap-
provados e verificados, submettidos a secretaria do Interior.
O fundo creado pela lei é formado pela renda e utilisa-
ção de terras publicas, em 13 Estados e 3 territorios . [ 1 ]
As obras projectadas comprehendem 1 - Projectos- um para
cada Estado e cada territorio proposto para breve construcção ;
29 -Projectos - considerados maduros para serem tomados em
consideração na primeira opportunidade : 3 -Reconhecimentos-
geraes dependentes de estudos mais completos.
Os projectos principaes, cuja execução não se demorarão,
são os seguintes :
Arizona- no rio Salgado [ Salt River] um açude storage)
para irrigar approximadamente 160.000 acres, orçado em
£ 4.000.000 , ( 13.200.000$ de nessa moeda a 3.300 o dollar ] ou
$20 por acre.

[1 ] Para maiores esclarecimentos veja-se a minuciosa pu-


blicação official- Third annual report ofthe Reclamation service-
1903-4- Washington 1905, pag. 28 e segts.
649

California- no Yumna , baixo rio Colorado, ha projectos para


irrigar 130.000 acres a $50 por acre, ou $5.200.000 ( 17,160 contos
de reis) de ambos os lados do rio na California e Arizona .
Colorado- Pelo projecto Gunnison devem ser irrigados
127.000 acres no valle Urucunpahgre pelo custe de $30 por
acre ou $3.750.000,
Idaho -O projecto Minidoka attende a irrigação de 130-000
acres de terras devolutas, em ambas as margens do Snake
River, pelo custo de $25 a 35 por acre, ou cerca de $4.000.000.
Montana -O projecto de Milk River destina-se a irrigar a
zona de 60.000 acres por meio de açude e pelo custo de $20
a $25 por acre ou $ 1.330.000 no total.

Nebraska- O projecto North Platte attende a irrigação de


area indeterminada de ambas as margens do rio North Platte,
no Wyoming e Nebraska, por meio de barragem. Seu custo é or-
çado em $35 por acre.
Nevada - O projecto Truckeė, já em execução, supprirá a
irrigação de 150.000 acres, pelo custo de $26 por acre ou
$3.390.000.
Novo Mexico - O projecto Hondo, na visinhança de Roswell
poderá irrigar 10.000 acres, pelo custo de $28 por acre, e por
meio da açudagem do rio Hondo.
North Dacota - O projecto do Fort Bufard servirá a uma
zona de 66.000 acres, a oeste do rio Yellowstone , no Monta-
na e North Dacota, pelo custo de $31 por acre ou $2.046.000.
Oregon -O projecto Malheur, pela açudagem do rio Ma-
lheur, irrigará 90.000 acres, pelo custo de $30 por acre ou
$2.700,000.

South Dacota- O projecto Belle Fourche attende a irriga-


ção de 85.000 acres de terras aridas. situadas ao norte dos Black
Hills pela açudagem das aguas do Belle Fourche. O custo é
orçado em $32 por acre ou $2.720.000 .
Utah- O projecto de Utah Lake se destina as aguas tri-
butarias do lago do Utah, servindo a uma área de 60.000 acres
e pelo custo de $35 por acre on $2.100.000.
Washington - O projecto Palouse será o salvação das terras
646

O Bridgeport serve á alimentação da cidade do mesmo no-


me. Foi construido barrando - se o rio Mill que fica a 8 kilm . de
distancia. A sua capacidade é de 900 000 m. c. O dique é de
alvenaria com a altura de 13.71 m., a largura de 2 m. , 4 na co-
1ôa e 9 m . 75 na base. Seu comprimento na corôa é de 195 m.
e ao nivel do leito do rio 15 m. 24. A tomada d'agua faz -se por
meio de um conducto de 0.76 de diametro, que vai ter a uma
camara onde a agua chega por 3 aberturas de 0, m 76 c. , dispos-
tas em alturas differentes á montante do acude. O sangradoro do
fundo consta de uma galeria de 1 , m046 ein quadro. O da su-
perficie é aberto no dique com 24 m . , 68 de largura e 1 m. 52 de
altura. A parede assenta em rocha compacta , é toda de gneiss .
As filtrações e fugas d'agua são avultadas.
O açude de Buffalo (New-York) começou a ser construido
em 1890 e terminou em Janeiro de 1892. Pode conter 135 mi-
lhões de galões e serve para alimentar a cidade deste nome . A
secção fronteira da barragem é formada de argila, marga e
arêa grossa em partes iguaes, acarsada (puddled) e comprimida
(rolled) em camas ( layers) de 4 pollegadas de espessura. A outra
secção é de material inferior. Os rolos compressores pesavam
2 toneladas. A terra empregada na barragem cubou 453.833
jardas cub. , a argila 75.800, a terra grossa 28.562, a alvenaria
6.104, o concreto 768, a pedra de 8 poleg. que revestio o pavi-
mento da tomada d'agua tinha 32.150 pés quadrados, a pedra
para parte superior 44.711 p. q. Custon $500.000 ( 1.600 contos).
A grossura da parede é de 180 pés na base, 12 na corôa ; a
altura 41 pés.
Os progressos da irrigação são tão importantes nos Estados
Unidos que só o estado do Utah, que servia até poucos aunos a
habitação dos mormões por sua imprestabilidade para a agri-
cultura, conta 750.000 acres de terras irrigadas dos 2.304.000
que podem ser aproveitados. [ 1 ]

[1 ] Para os ultimos trabalhos de irrigação feitos por conta


do Governo da União americana, veja-se o Third Annual Report
ofthe Reclamation Service 1903-4, F. H. Newell - engenheiro che-
fe-Washington 1905.
Neste relatorio, acompanhado de desenas de cartas topo-
graphicas das regiões estudadas, e dos respectivos projectos [ em
volume separado do texto] estão consignadas as obras de irriga-
ção construidas, em construcção e projectadas, por cada estado
647

Para terminar a noticia, relativa a esta parte , que já vai


longa, e para qual tive de consultar laboriosamente muitas re-
vistas e obras especiaes sobre a materia, vou resumir as conclu-
sões de uma das publicações mais sabias dos Estados Unidos, e
porventura do mundo, a qual conta actualmente cerca de 800
vol., tendo principiado a sahir a luz no começo de 1800 — a
Geological Survey. No relatorio de Herber M. Wilson, director
desta grande publicação official, apresentada ao Congresso ame-
ricano, e no capitulo que se inscreve What the govenment is doing
to avance Irrigation Interests, depois de apresentar e recommen-
dar muitos locaes apropriados a construcção de grandes açudes,
insiste nos seguintes, como indispensaveis aos progressos da
agricultura :
"No Sun River, diz elle, devem ser construidos 19 agudes,
sendo 4 com barragens de alvenaria e capacidade de 4.870 a
50.056 acre-feets ; 5 no Villow Creek, de terra, com a capaci-
dade de 2.001 á 36604 acre-feet ; 1 de terra, barrando uma la-
gôa. Estes açudes serão servidos por uma rêde de canaes que
irrigarão cerca de 30.000 acres de terreno.
No Arkansas devem ser erguidos 8 açudes nos Twin Lakes,
dos quaes os locaes do Hayden, Sugar Loaf, Twin Lakes, Lea-
dville e Tennesse são preferiveis . Além destes ha ainda os
sitios Oil, Willon, Slate, Westoil , Six Miles, Beaver, Middle Be
aver, Seven Lakes, Big Turbey, Oak, Cottonwood e Bad- ger
Creeks, dos quaes forão exploradas as respectivas bacias hydro-
graphicas, e feitos os estudos sobre a natureza da barragem,
capacidade, e aluguel das terras, etc.
O governo americano empregou um verdadeiro exe cito de
profissiounes nestes serviços . O açude de Twin Lakes, acima
mencionado, tem a bacia hydrographica de 387 milhas quad . e
cobre 206.400 acre-feet, tendo a capacidade de 121.800 o acre-
feet, com a parede de terra de 73 pés de altura, revestida de
pedia. Cobrirá 4.716 acres.
No Rio Grande [ Colorado ] a commissão propoz a construc-
ção do açude Lake Constance, com a parede de alvenaria de 65
pés de altura, 26.000 acres de capacidade, com a profundidade
media de 26,6 pés, devendo custar $300.000 ou $ 1.060.000 , todo
o serviço.
Ainda no curso deste rio, propoz o relatorio a construcção
652

O que ha de notavel nestas cifras, observa o relatorio do


Census, é que ellas são 30 por 100 inferiores ao das colheitas
feitas nos terrenos irrigados : salvo nos Est. do Novo Mexico,
Arizona e Wyoming, onde as despezas de construcção dos ca-
naes e barragens são superiores a das colheitas. ( 1 )
INSALUBRIDADE DAS IRRIGAÇÕES. - Uma das ob-
jecções, frequentemente levantadas contra o alargamento das
irrigações, é a da sua insalubridade.
Dis-se, e o illustrado Barão de Capanema repete, que entre
os males trasídos pelo açude se deve contar o empeioramento
das condições sanitarias na zona por elle servida.
Ha nesta arguição defeito radical, resultante da observação
incompleta dos factos. Effectivamente, tratando se de irrigação
em regiões argilosos, planas, de facil alagamento, sem a drena-
gem precisa ao esgotamento das aguas superfluas. comprehen-
de- se quão nociva a saúde serão os multiplos viveiros de mos-
quitos prolificados em taes pantanos. E' o que acontece na re-
gião baixa do Ganges, na India, quer haja, quer não, derivação
de suas aguas para os usos agricolas. Phenomeno identico ope-
ra se em todos os sitios atravessados por cursos d'agua de ri-
beiras alagadiças, como em muitos dos tributarios do Amazonas,
sem que dahi se possa concluir pela condemnação dos mes-
mos.
Comprehende - se, porem, que no regimen da agua de réga.
sobretudo quando esta tem de ser empregada parcimomiosa-
mente, já por sua relativa escassez, já por seu custo venal, rara-
mente haverá demasias que occasionem alagamentos. Alem
disto, o cultivo irrigado por demandar especial amanho do solo ,
não se presta a inundações. que viriam iuutilisar todo o esforço
do agricultor.
Daqui resulta levantarem - se accusações contra a insalubri-
dade das irrigações tão somente naquelles lugares onde as con-
dições topographicas e geologicas facilitam a multiplicação dos
fócos palustres por serem as aguas prodigamente empregadas,
sem o correctivo da drenagem. Ordinariamente só a cultura de
arroz e de marcitas [ na India ] pode trazer algum subsidio a
proliferação do mosquito.

[1 ] Pierre Leroy- Beaulieu -Les Etats Unis au XX siècle-


pag. 182.
653

Um lance de vista sobre as regiões irrigadas do globo pa-


tenteará esta verdade em toda sua nudez, demonstrando igual-
mente que onde a réga é feita systematicamente, sem disperdi-
cios, deo-se notavel melhoramento nas suas condições sanitarias .
O Dr. H. S. Orne, membro da junta de saude da Califor-
nia, [ ] tratando deste assumpto em referencia a pratica dis-
persiva d'agua em Los Angelos, S. Bernardino e S. Diogo es-
creve :
"Os effeitos da irrigação nas terras agricolas, especial-
mente na California, sobre a saúde publica, é da maior impor -
tancia, e tauto quanto se pode avaliar do assumpto, são al-
gumas vezes centradictorias as opiniões, tornando- se preciso
notar as condições da localidade, relativamente ao solo, tempe-
ratura, humidade e escoamento ( drenagem ] , onde quer que a
irrigação seja empregada.
"Posto que a irrigação seja praticada na California desde
o primeiro estabelecimento dos Franciscanos, ha mais de um
seculo, pouco progresso se tem effectuad., na applicação scien-
tifica do systema, porque o objectivo do agricultor é somente
levar agua a sua terra sem attenção ao methodo empregado.

No caso da applicação dagua por flooding com a terra


aberta em su'cos, os varioe relatorios, apresentados por auto-
ridades superiores, são contradictorios sob algumas relações.
Em Los Angelos, Ventura, Santa Barbara, S. Bernardino e
S. Diogo por exemplo, a irrigação nenhum accrescimo trouxe de
casos málaricos.
Se consultarmos, porém, outras partes da California, acha-
remos um augmento de febres málaricas, com o augmento da
irrigação, intimamente ligadas uma a outra. Não é difficil de
conhecer a razão disto. Em Los Angelos e em outros valles, na
parte mais meridional da California, onde o solo é geralmente
arenoso ou de marga solta, de espessura desconhecida, a agua
de irrigação infiltra se na arêa ou se a superficie é mais in-
clinada deslisa immediatamente por ella, ou pouco abaixo.

(1) H. S. Orne --no Appendix to the Eigth Biennal Report of


the State Board of Health -California.
654

Em taes secções do paiz ha raras facilidades para as moles-


tias málaricas. Nas ribeiras de fraca inclinação, que não assegu-
ram a boa drenagem, ou onde o sólo conserva- se constantemen-
te saturado , o caso é differente. Reina ahi mais ou menos febres
intermittentes e remittentes durante a estação quente annua.
Nas terras irrigadas ou pantanosas, especialmente nas de
solo forte ( heavy), como nas que se conservam molhadas ou
humidas de chuvas ne inverno, e ficam no verão saturadas por
meios artificiaes, contendo tambem excesso de materia vege-
tal em decomposição e muitos poços estagnados, as doenças
malaricas de typo mais acentuado prevalecem ahi.
Em taes localidades todas as molestias zymoticas se ag-
gravam mais no verão do que no inverno, naturalmente em
consequencia da alta da temperatura e do augmento da eva-
poração.
O Dr. W. W. Hunter ( 1 ), sem maior investigação das
causas productoras da febre intermitente logo apoz a estação
pluviosa chega a seguinte conclusão :
A propria irrigação por si só desloca occasionalmente a
população e, em differentes pontos da India, crêa um salvo
conducto contra a fome a custa somente da desolação das al-
dêas pelas sezões.
Todas essas arguições dizem respeito as regiões irrigadas,
carecidas inteiramente de drenagem. E como pondera Bur-
ke : [2]
"A drenagem e a irrigação devem andar juntas, porém ,
quantos engenheiros a fazem ao mesmo tempo ? Certamente
nunca. Tem se visto em muitos districtos irrigados na Euro-
pa, e em quasi toda a India, tal como mostra a experiencia,
quando os canaes estão cheio e as terras baixas ficam alaga-
das, gerar-se molestias e peste ; e não ha duvida que grande
parte da insalubridade nas regiões onde os canaes de irriga-
ção são externamente utilisados, foi devida a falta de drena-
gem para levar o excesso de agua."

(1 ) Dr. W: W. Hunter- Life of Lord Mayo vol . 2 , pag. 326.


[2 ] G. J. Burke - Transations of the Institution of Civil En-
gineers, V. 73, 1883, London.
655

Diverso é o regimen sanitario onde a agua é pouca e a


drenagem opera-se regularmente.
"Na Algeria as febres são communs, no verão , em todo a
região mal cultivada, diz Zoppi [ 1 ], Os unicos remedios que
se oppõem ao seu desenvolvimento são a cultura intensiva por
meio das obras de irrigação e do plantío.
As planicies do Sig, do Macta e parte da do Cheliff estão
hoje em condiçõés hygienicas melhores que o resto do paiz ,
devido a construcção de açudes e de obras de irrigação.
"Os grandes reservatarios temperam e saneam o clima
dos lugares circumvisinhos, e graças a irrigação, e por conse-
guinte a cultura que se estabelece, levam a saúde e o bem es-
tar até onde as aguas vão fecundar os terrenos.
Parte da Algeria está em más condições climatericas, as
febres miasmaticas reinam em muitos lugares, especialmentə
na paludosa região do Habra e do Macta, nas quaes era impos-
sivel a vida na estação quente. O mesmo acontecia na plani-
cie do Sig, que actualmente é uma das mais risonhas da Alge-
ria, e deu vida a região de S. Diniz que prospera de dia
para dia.
Quem operou o milagre de sanear áquelles lugares e
tornal- os aptos a mais intensa cultura senão a agua do Sig
e do Habra, armazenada durante o inverno no reservatorio , e
destribuida no verão ao ardente campo . Não só nos terrenos
fecundados se sentio o benefico effeito do açnde, mas o mes
mo valle em que está a barragem , enfestado anteriormente de
febre, não as soffre presentemente .

Per completarə la nostra relazione su questa diga ( Sig)


vogliamo notare ancora com'essa ha portato la salubritá al
paese de Saint- Denis, prima infestato dalle febre, ora in con-
dizioni igrenichi ottime. Questo é devuto al rapido sviluppo
dell'agricultura.

(1 ) Zoppi e Torriceli -Laghi artificiali, pags . 18, 88, 211 .


Veja se tambem Giacomo Torricelli - Dei Grande bacini per irri-
gatione e del Serbatoio Grisanti sull'enza nell' Emilia - Roma 1885,
pag. 369 e segts.
SALUBRIDADE

A região, que demora entre a serra da Ibiapa ba e o rio


Mossoró, abrangendo ao occidente parte do Estado da Para-
hyba, é quanto a salubridade uma das mais bem reputadas do
Brasil.
Causas topographicas e meteorologicas, que já assignalei ,
tornam- na excepcionalmente secca, sujeita a longas estiadas,
que difficultam a sua superficie os pantanos ou alagados, viveiros
do paludismo.
Devido a estas condições, exerce desde longa data o Ceará
persistente attracção sobre grande parte dos habitantes dos
proximos Estados, até o Amazonas, a ponto de ser havido como
o melhor sanatorio para os enfermos que vem pedir a seu cli-
ma restaurante melhoras ao enfraquecimento da saúde, ao esgo-
tamento vital produzido pela acção deprimente das temperatu-
ras humidas e quentes.
Se bem que esta attracção seja motivada por factos, con-
stantemente reproduzidos, abonadores da inegavel salubrida-
de desta região, mais alto do que ella, do que essas preferen-
cias. cuja causa se podera sophismar e relegar para o domi-
nio das predileções pessoaes, fala o phenomeno conhecido do
povoamento cearense.
A despeito das calamidades climatericas, porventura as
mais ruinosas nesta parte do continente americano, a progres-
são vegetativa da população cearense é verdadeiramente
excepcional, senão assombrosa, superior a de qualquer outra
região brasileira, favorecida por melhores condições topogra-
phicas e meteorologicas.
658

Se áquellas causas, contrarias ao desenvolvimento da po-


pulação, addicionar- se a relativa inaptidão da orla maritima do
solo, unica aproveitavel, na falta de estradas e de outras vias
faceis de communicação, para as culturas productivas, apre-
ciaveis no regimen colonial, chegar-se ha a salientar mais ni-
tidamente a acção particular do clima sobre esse crescimento
rapido da população.

Em quanto em todo o litoral brasileiro era a uberdade do


solo e a facilidade de exportação de generos produzidos o princi-
pal estimulo á colonisação portugueza, no Ceará, menos dotado
destas vantagens, ella se operou tão lentamente que, aínda dous
seculo e meios depois do descobrimento do Brasil, se podiam
considerar quasi desertas as praias cearenses. Salvo alguns al-
deiamentos de indios proximos a Fortaleza, e o pequeno nu-
cleo do Aracaty, pouco mais havia para attestar a acção
permanente e civilisadora do elemento metropolitano.
Marinha dunosa, batida por todos os ventos, mal abrigada,
secca, e aparentemente esteril, nenhuma razão de preferencia
militava em seu favor, comparada com a das proximas re-
giões do Ceará -mirim , no Rio Grande do Norte, e o Maranhão.
Esta inferioridade explica o phenomeno anormal do po-
voamento cearense irradiar-se do sertão para o litoral e não
deste para aquelle. [ 1]
Nas demais capitanias a orla maritima representava a fa-
eilidade de communicação com as suas visinhas e a metropo
le, a maior segurança contra as incursões dos selvícolas, o ra-
pido abastecimento dos generos importados, o menor custo
da producção agricola, a certeza do mercado para esta, e ou-
tras vantagens não menos importantes. No Ceará o litoral
era quase o deserto, a vegetação enfezada, a areia movediça ,
a aguada escassa, a humidade varia , sob a forma de enxurra-
das ou de ligeiros aguaceiros pluviaes. O sertão, porém, offere-
cia serios attractivos. Os fugitivos, com outros forasteiros da
Bahia e Pernambuco, impellidos pela invasão Hollandeza verifi-

(1) Não tivemos colonisação directa européa : de Per-


nambuco vieram os primeiros povoadores da provincia Ara-
ripe-Historia do Ceará, pag. 38.
659

caram desde logo a superioridade deste como campos de creação


para o gado. As ribeiras dos rios, mais favorecidas de pasta-
gens, foram desde cedo rapidamente conquistadas ao gentio,
e este, impecilio ao desenvolvimento daquella industria pelas
depredações que fazia, foi sem demora perseguido, escur-
raçado, posto em fuga ou aniquilado, a despeito das tardias
ordenanças dos capitães- mores ou do governo metropo-
litano a favor dos selvicolas .
O crusamento das duas raças tornou -se praticamente dif-
ficil, e como o methodo de creação adoptado, então, como
ainda agora, não permitte confial- a a lealdade de seres escra-
visados, tendo o campo e a liberdade por si. na faina va-
queira, acontece que, não podendo o indio ser substituido pelo
escravo africano, teve o creador só por si e sua familia. de
origem livre, de bastar -se, e de contar com os proprios es-
forços .
Daqui : 1 a menor mescla ou mistiçagem da população
cearense ; 2º o seu desdobramento por effeito das faculdades
vegetativas da raça colonisadora.
Comprehende-se a primeira vista que o excesso de po-
voamento era antes contrario do que benefico aos interesses
do criador. Quanto mais campos elle possuisse tanto mais nu-
merosas podiam ser as suas manadas de gados, e portanto
maior o proveito pessoal. As rivalidades entre familias ser-
tanejas, entre Feitosas e Montes ( 1 ] , que ensanguentaram

[1 ] Os Feitosas haviam descoberto terrenos no valle do


rio Jucá, e apenas Geraldo do Monte soube disto, obteve por
sesmaria posse desses terrenos ; porém não as medio, nem as
situou com gados. Os indigenas ali existentes o contrariavam
nesse intento .
Passados 6 annos, a sesmaria cae em commisso por rão
haver o primitivo sesmeiro preenchido as condições legaes ; en
tão Feitoza consegue a data dessas terras, e o cunhado [ Monte)
despeitado por semelhante procedimento, resolveo obstar a to-
mada de posse do terreno."
Daqui verdadeiros encontros a mão armada, batalhas, cor-
rerias que por muitos annos ensanguentaram as ribeirrs do
Salgado e do Jaguaribo. -T. A. Araripe - Historia da Provincia
do Ceará, Recife 1867, pag. 117.
660

a capitania no decurso do seculo 17, não tem, por ventura, ori-


gem diversa da posse de terras, de disputas pela propriedade
territorial.
Todos esses elementos eram contrarios ao crescimento ra-
pido da população, salvo a benignidade do clima. Apezar
da escassez de terras lavradias para lavoura de canna,
proximas aos portos, das rivalidades dos primeiros povoadores.
do aniquilamento da raça indigena, de seccas devastadoras
e repetidas, continha o Ceará a população mais densa do Bra-
zil. exceptuando o Rio de Janeiro por condições excepcionaes,
em 1872, segundo o arrolamento daquelle anno .
f A prova era decisiva ; o Ceará em confronto com as de-
mais provincias irmãs,favorecidas pela chuva, pela fertilidade do
- sólo, pela acção official no seu povoamento, contava 6 habitantes
por kilom . quadrado contra 11,3 no Rio de Janeiro ; 5,6 em
Pernambuco ; 5,9 em Alagôas ; 2,3 em S. Paulo, e 1,8 no Rio
Grande do Sul . [ 1 }

Nada mais era preciso para demonstrar que as terriveis


calamidades, como a secca de 1792, que levou um terço da
população e as que se lhe seguiram de 1825 e 1845 , não
enfraqueceram a capacidade procreativa cearense, superior a
de qualquer outra em região brasileira.
A's causas que acabo de referir, deve se juntar a das nu-
merosas epidemias que hão grassado intensamente no Ceará.
tanto mais mortiferas quanto mais condensada era a sua popu-
lação.

As noticias que a tradicção e os raros chronistas nos lega-


ram dellas são incompletas e até certo ponto vagas.
Em 1771 reinaram febres tão intensas na ribeira do Aca-
rahú, que o governo foi obrigado a enviar uma commissão
medica sob a direcção do Dr. Thomaz José de Mello, a 14 de
Outubro, afim de soccorrer os seus habitantes. [2)

[ 1 ) Veja-se o recenseamento de 1872, e o Relatorio da Di-


rectoria Geral de Estatis de 2 de Agosto de 1876.
2 ] Veja-se G. Studart -Datas e factos, pag. 899.
661

Em 1792, de par com a secca, desenvolveo- se mortifera


peste de bexigas. [ 1 )
Em 1825 a variola causou talvez mais victimas do que a
propria secca.
De então em diante a variola, sob a forma esporadica
ou epidemica, não mais deixou de victimar a população do lit
toral, devido em grande parte a maior facilidade de communi-
cações entre os portos infeccionados do Recife e norte.

Os documentos officiaes sobre a marcha das affecções mor-


bidas, no Ceará, começaram a apparecer em 1838 nos relato-
rios presidenciaes. apresentados as assembléas.
Assumpto de pouco interesse nos annos regulares, não des-
pertava a saúde publica a attenção dos poderes publicos se-
não quando irrompiam epidemias violentas, que por seus es-
tragos causavam serios damnos a economia das localidades,
afugentando ou ceifando- lhes os habitantes e impressionan-
do a imaginação popular.
Durante o panico ou emquanto perduravam as conse-
quencias da peste, o governo provincial agia com Os recursos
medicos, então conhecidos, para em seguida cair na tradicional
apathia. Medidas hygienicas eram raramente tomadas para
evitar a volta do mal ; nem sequer as elementares, como a dre-
nagem de pantanos na Fortaleza, insistentemente lembrada
por muitos presidentes as assembléas legislativas.
Pelo breve historico das molestias reinantes, do meiado
do seculo até o presente, melhor se evidencia o que fica dito.
Em 1846 [ 12 Maio] foi creada uma infermaria para doen-
tes, e no decurso do 1º anno entraram para ella 344 enfermos ,
dos quaes sairam restabelecidos 277, morreram 45 e ficaram
em tratamento 22. [ 2 ] Em 1847 foi creado o hospital.
Em 1848, dizia o presidente, Souza Vasconcellos, que o
commissario vaccinador encontrava grande difficuldade em
propagar a vaccina devido a ignorancia do povo.

( 1 ) J. Brigido --Kesumo Chronologico, etc. , pag. 120.


(2) Relatorio de Ignacio Pereira de Vasconcellos em 1847.
662

Em 1850 o presidente Fausto Augusto de Aguiar [ 1 ] cha


mhou a attenção da assembléa para a necessidade de se ex-
tinguirem inteiramente os pantanos da Prainha [ na Forta-
leza], fócos perennes de miasmas, a que elle attribuia as febres
intermitentes reinantes no lugar.
Em 1849 a variola penetrou na provincia pelos sertões
do sul, tendo feito poucas victimas, apresentando caracter
benigno. Na capital foram accommettidas S7 pessoas, das quaes
falleceram 4. O presidente Fausto de Aguiar attribue ao iso-
lamento dos infermos ter podido jugular a epidemia. No Ara-
caty foram tratados 46 infermos, dos quaes falleceram 2.
O serviço da vaccina, diz elle [ presidente Fausto ], con-
tinua a apresentar resultados pouco lizongeiros, apezar
dos bons desejos e louvavel zelo do digno commissario pro-
vincial. Por um lado os preconceitos que na maxima parte da
população ainda predominam contra o uso deste tão salutar
preservativo e a ineficacia de quasi todo o puz que tenho re-
cebido, tem concorrido para que a propagação da vaccina haja
sido em tão diminuta escala.
Em Junho de 1851 começou a grassar na Fortaleza uma
febre com caracter epidemico , que, no dizer do presidente Al-
meida Rego (2 ) "attacara até então (Outubro) quasi toda a
população. Sobre a sua natureza divergiram a principio os me-
dicos, considerando -a uns como simples febre gastrica, e ou-
tros como febre amarella. Tendo começado com caracter be-
nigno, logo que a epidemia ganhou em extensão e intensidade,
tomou o caracter grave : deram-se muitos casos de vomitos
negros, e desde então cessou a divergencia sobre a sua natu-
reza, vindo a fazer grande numero de victimas, não só nos
habitantes desta cidade senão em alguns sertanejos e estran-
geiros.”
"Se bem que tenhamos a lamentar uma perda conside
ravel de vidas, prosegue o relatorio presidencial, todavia, at-
tenta a natureza e gravidade da febre e o nº de pessoas af-
fectadas por tão terrivel flagello, a mortalidade foi em peque-

(1) Relatorio com que abrio a assembléa provincill, pag. 48.


[ 2) Joaquim Marcos de Almeida Rego -Relatorio apresenta-
do na abertura da assembléa provincial a 7 de Outubro de 185 !,
pag. 9.
663

na escala, pois que podendo avaliar se o nº de doentes desta


capital em 6.000, apenas se nota o nº de mortos constantes do
mappa nº 3. ( 1 ) A mortalidade foi diminuta em relação ao
que se observou em outras provincias, flageladas igualmente
por tão terrivel enfermidade, onde fez maior nº de victimas,
devido isto certamente a beniguidade e salubridade do clima
desta provincia e a ausencia de outras causas que concorreram
para que a molestia tomasse o caracter grave e assustador
que se deixou de observar entre nós. O mal, que no principio
de seu desenvolvimento se limitava a esta cidade, se tem es-
tendido a diversos outros pontos ; assim Maranguape, Aqui-
raz, Quixeramobim e Aracaty tem sido visitados por tão en-
commodo hospede ."

Em Quixeramobim, alem da febre amarella, grassou a


epidemia de sarampos. No Aracaty a febre amarella foi be
nigna.
A administração esforçou -se em combater o mal, já orde-
nando a limpesa das ruas e praças, e destruindo os fócos de
emanações mephyticas e deleterias, segundo o testemunho do
proprio presidente de então, já mandando divulgar as medi-
das hygienicas e as regras de tratamento .
A bexiga appareceu em alguns pontos, mas por meio do
isolamento dos atacados foi promptamente debellada A resis-
tencia do povo a vaccinação continuou a entorpecer a sua
propagação, alem da má qualidade do pús vaccinico remettido
do Rio de Janeiro.
O presidente Rego insistiu pelo aterramento dos pantanos
como medida preventiva das febres intermittentes .
Em 1852 a epidemia amarilica propagou -se pelo interior
do Estado, accommettendo successivamente Russas, Baturité,
Icó, Acarahú e Sobral. Segundo informações incompletas os at-
tacados desta epidemia foram em nº de 5.000 no Aracaty, 700
em Russas, 1360 em Maranguape, faltando as dos demais lugares.

[1 ] Por esse mappa morreram até Julho 64, em Agosto 109,


Setembro 43, occorrendo a maior mortalidade nos dias 13 , 17 e
22 de Agosto ( 9 casos em cada um ) .
O nº de doentes tratados tão somente pelo medico Dr.
Carreira foi de 1502.
664

O nº de fallecidos attingio a 82 no Aracaty, 40 em Russas,


89 em Maranguape, 33 em Baturité. 22 em Acarahú, 85 no Icó,
O Dr. Almeida Rego, diz no seu relatorio ( 1 ), relativamente
a mortalidade de Baturité, que ella se não deve considerar exacta,
faltando dados completos do Icó e Acarahú, e em absoluto de
Sobral
Logo depois da febre, desenvolveu- se na Fortaleza uma pe-
quena epidemia de cholerina, que se dissipou em poucos dias
fazendo apenas algumas victimas.
Quanto a propagação da vacina, assim se pronuncia o pre-
sidente Dr. Rego : "Tenho me esforçado na propagação da va-
eina, mas de uma parte a ineficacia do pús vaccinico, e de
outra a répugnancia invencivel ou antes -o terror- com que
grande parte da população encara este meio, que em seus pre-
conceitos julga capaz de produzir uma epidemia , tem feito com
que pouco ou nada se tenha conseguido.
Verdade é que este receio é até certo ponto justo por
que mais de uma vez a epidemia variolica se tem desenvolvido
nesta provincia pela innoculação de seu pús, e o povo, não sa-
bendo neste caso distinguir, com difficuldade, se sujeita a
innoculação da vacina .
Reiterando o pedido de atterramento dos pantanos da For-
taleza para previnir o apparecimento das febres intermitentes,
lembrava o desenvolvimento um tanto grave que naquelle
anno 11852 ] ellas tiveram logo depois da estação chuvosa .
Em 1853 reappareu a febre amarella na cidade de So-
bral com caracter atterrador, segundo a expressão do presi-
dente Vilella ( 2 ] , e em Março, no Icó, com intensidade maior
do que nos dous annos anteriores, porque o nº de casos graves
era muito maior, guardada a proporção, conforme participa-
ções officiaes ao governo provincial.
Em Setembro do mesmo anno já em Sobral a epidemia
havia quasi cessado, sendo muito raros os casos, e estes be-
nignos.
O presidente confessava ignorar a quanto attingira exacta-

(1) helatorio apresentado a 1 de Setembro de 1852-pag. 9.


[2) Joaquim Vilella de Castro Tavares- Relatorio apresen
tado a 1 de Setembro de 1853 a assembléa provincial -pag. 49.
665

meute a mortalidade, mas não fôra tão grande quanto fazia


receiar a intensidade como apparecera.

Do Icó, o governo só recebeo communicação da epidemia


em Julho, attribuida pelo Dr. Pedro Theberge ao estado de
immundicie da cadeia.
Digno de transcripção é a communicação deste professional
ao governo para se avaliar a quanto chegara a falta de hygiene
nos estabelecimentos deste genero. Eis alguns trechos :
"Ao abrir-se a alçapão, que communica com a enxovia
central, exhalou se par elle um ar tão viciado, que foi mister
nos revistirmos de coragem para resolvermo -nos a penetrar
no interior de tão immunda sentina. O pavimento dos tres re-
partimentos é de tijolos que se conservam sempre humidos por
falta de ventilação sufficiente, e cobertos de espessa camada
de immundicie proveniente de materias animaes, que o andar
do tempo vai encaliçando e accumulando, que a humidade do
chão vai mantendo em estado permamente de putrefação e que
soltam a cada momento uma horrenda catinga amoniacal de
urina e de outras materias excrementicias.
As paredes lateraes estão denegridas e emplastadas de
camadas, não menos horrenda e repulsiva que a do pavimento.
Dous respiradoros quadrados, praticados um em cada parede
das extremidades, são tão estreitos que não deixam girar o ar
no interior das prisões : o seu calibre, que é de 4 palmos em
quadro, atravessa paredes de mais de 5 palmos de espessura, e
se acha redusido pelos menos de metade por duas ou tres or-
dens de grades de ferro feitas, não de varões redondos , mas
sim de chapas grossas e largas de meio palmo, e entrelaçada s
tão perto uma da outra, que interceptam toda a commu-
nicação, e não deixam penetrar o ar sufficiente para a susten-
tação da vida das miseraveis victimas, que, especialmente na es-
tação calmosa e quando ahi se acham entulha das em maior
numero do que o admitte, estão incessantemente ameaçadās
de suffocação, como provam diversos factos, que acho bem
singular não terem sido leva dos ao conhecimento das autoridades
superiores. Num dos cantos de cada uma dessas enxovias se
acham collocadas diversas vasilhas de madeira já meio podres ,
mal tapadas ou sempre abertas , onde se depositam até
666

transbordarem os productos das secreções animaes as mais ab-


jectas. Ellas não se podem retirar senão derramando-se meta-
de de seo conteudo pela difficuldade de transitar com ellas por
alcapões estreitos e difficilmente praticaveis. Nestas tres mas-
morras estreitas e pestilentas, privadas de ar respiravel, mas
prenhe de miasmas mepheticos, achámos 38 presos empilha-
dos uns sobre os outros por falta de lugar, entre os quaes 12
ou 13 luctando com a morte nos paroximos os mais horrorosos
da febre amarella.

Em 1856 o 1º vice - presidente Herculano Cunha [ 1ì di-


zia : Alem das enfermidades que na estação invernosa costu-
mava grassar em algumas localidades com maior ou menor
intensidade, segundo as circumstancias peculiares a cada uma,
apenas alguns casos de febre amarella produziram uma leve
alteração na salubridade publica na cidade de Aracaty, no
districto de Mutamba da mesma comarca, na cidade de Sobral
e na Imperatriz. No districto de Mutamba a epidemia fez 25
vietimas, na Imperatriz 2. Ignora-se o nº de mortos em Sobral,
onde a febre se tornou endemica.

Em 1854 reappareceu a febre amarella em Sobral, sem


que todavia tivesse feito muitas victimas ( 2 ] . Na cidade de
Aracaty a variola grassou epidemicamente, tendo accommetti-
do de Março a 31 de Julho 220 pessoas, das quaes 7 fal-
leceram.

A febre desapparecera inteiramente até o fim do auno.


No Acarahú appareceo o cholera-morbus em Março, e pou-
co depois em Sobral, tendo sido levado aquella villa por um
hiate que a 9 de Março chegara de Recife, do qual [ hiate]
adoeceram 2 passageiros com symptomas de cholera. Isto ,
porém, não teve consequencias.
O 1º vice - presidente receiava que esta epidemia , depois
de haver feito 6.000 victimas no Pará, passando para Bahia,

[1] Herculano Antonio Pereira da Cunha -Relatorio com que


abrio a assembléa provincial a 11 de Julho de 1856, pag. 23.
(2) Vicente Pires da Motta - Relatorio com que abrio a as-
semblea provincial a 1 de Setembro de 1854, pag. 14.
667

Sergipe, Alagoas, Pernambuco e Rio Grande do Norte, viesse


ao Ceará pelo Crato, Icó ou Aracaty.
Para todos os pontos ameaçados foram tomadas serias
providencias ; medicos e medicamentos -- mandados por conta
do governo.
Em 1857 o vice - presidente Jaquim Mendes ( 1 ) diz que
alguns dias depois da leitura de seu relatorio appareceo na
cadeia da Fortaleza um preso acommettido de variola, conta-
giando em seguida a 69 presos e a 7 pessôas fóra da cadeia.
Em 1858 dizia o presidente João Silveira de Souza [ 2 ] :
O estado sanitario desta capital não tem sido satisfactorio do
meado do anno findo para cá . Neste periodo foi ella por duas
vezes acommettida pela variola , que primeiramente se mani-
festou na cadeia publica, onde quase todos os presos foram
atacados em numero de mais de 200, depois a tropa e por fim
a pepulação.
O nº de victimas, em vista da intensidade e generalidade
do mal, foi ainda assim diminuto, graças ao zelo e activida-
de das auctoridades, etc.
A mesma epidemia appareceo em seguida em Maranguape,
Cauhipe, Siupé, Sobral, e outros pontos, e por ultimo no Ara-
caty.
Mais tarde manifestou-se na Fortaleza a febre amarella ,
que fez algumas victimas, e por fim a grippe que se genera-
lisou embora com caracter benigno.
A febre amarella apareceu tambem em Canindé, em partǝ
do districto de Cascavel, Baturité e Acarape tendo feito pou-
cas victimas. No Acarahú reinou febre não caracterisada,
mas que parecia ser grippal.
"Em 1859 a variola ainda çontinuou a fazer victimas em
ntervallos mais ou menos curtos em varios pontos da pro-

(1) Joaquim Mendes da Cruz Guimarães -Relatorio com


que passou a administração ao presidente no dia 27 de Julho de 1857,
pag. 3.
(2) Relatorio com que abrio a assembléa provincial a 1 de Ju-
lho de 1858, pag. 10.
668

vincia, taes como Maranguape, onde se achava extincta, Jubaia,


Tabatinga, Pacatuba, Acarape (extincta) , Aracaty. Russas.
Santa Cruz, Canindé, sempre com caracter benigno.
Nestes ultimos quatro lugares declarou - se, alem da variola.
uma febre que se julgou ser amarella , mais que pouco tempo
durou e poucas victimas fez. [ 1 ]
Em Coité, districto de Milagres, segundo communicação
official, appareceram alguns casos de cholera -morbus, que a
juizo do medico Dr. Theberge eram de febre typhica. (2)
Em 1860 o estado sanitario conservou - se em condições
regulares, não se levando em conta , como pondera o presidente
Nunes Gonçalves (3) , algumas ligeiras enfermidades que, com
caracter epidemico, se manifestaram em alguns pontos.
As molestias predominantes na capital foram a variola, de
Junho a Dezembro de 1859, as febres intérmitentes, as catar-
raes, as pleuresias, verwes intestinaes, ophtalmias, obstruções
intestinaes e a syphiles.
Foram medicados pelo medico da provincia 800 individuos
de ambos os sexos, dos quaes falleceram 27.
No interior manifestou -se em Janeiro de 1860 uma febre
de máo caracter, que acommeteo grande nº de pessoas, acom-
panhada de casos fataes no termo de Viçosa, e especialmente
no districto de S. Pedro de Ibiapina , tendo recebido cuidado
medicos mais de 200 individuos, dos quaes morreram 23-
Em Fevereiro manistou-se a variola no Icó e depois em
Lavras.
Em Maio grassou a febre amarella no Cascavel, fazendo
algumas victimas.
Em Junho [ 1860 ] reappareceu a febre amarella no Canin-
dé, sem gravidade.

[1 ] João Silveira de Souza-- Relatorio as abrir a assembléa


provincial em 1859, pag. 9.
[2 ] Relatorio com que o Dr. J. Silveira de Souza passou a ad-
ministração ao vice-presidente Joaquim Mendes a 15 de Setembro de
1859, pag. 3.
(3] Antonio Marcelino Nunes Gonçalves - Relatorio com que
abrio a assemblea provincial em 1850, pag. 12.
669

Em 1861 a variola appareceu em Março, na Fortaleza, ten-


do apenas atacado tres pessoas.
A epidemia da febre amarella, que se desenvolveu na ci-
dade de Baturité estava extincta em Junho . [ 1 ]
Em 1862 o estado sanitario soffreo grande perturbação em
toda a provincia, devido a epidemia do cholera.
Achava-se a provincia nas melhores condições sanitarias,
diz o vice- presidente José Machado ( 2 ) ; a febre amarella, que
tinha apparecido em Sobral, e alguns casos de variola nesta
capital e na villa do Acarahú, tinham sido completamente ex-
tinctos. Esse lizongeiro estado cessou com a invasão do cho-
lera- morbus, que grassando nas extremas da provincia da Pa-
rahyba, transmittio se a cidade do Icó e dalli as villas e po-
voados da comarca, á freguezia de Milagres e logo a cidade do
Aracaty.
No Icó a epidemia tomou proporções 'assustadoras.
A epidemia invadio as comarcas do Icó, Aracaty, S. João
do Principe, Crato, Jardim, Saboeiro. Capital. Baturité e Qui-
xeramobim. (3 ) Foram preservados della os municipios de Ca-
nindé e Maria Pereira, e as comarca de noroeste, Granja , Ipú,
Imperatriz, Viçosa e Sobral.
Na Fortaleza a epidimia foi benigna. Nas cidades do Icó
e Baturité, e principalmente na villa de Maranguape e po-
voação de Pacatuba tornou -se atterrador e excessivamente
mortifera, occasionando scenas tão dolorosas que o presidente
de então, [ Dr. José Bento ) qualifica no seu relatorio de pa-
vorosas.
A mortalidade foi crescida , attingindo a uns 12.500 . Foi
até então a maior epidemia que assolara o Ceará. Tendo per-
durado por mais de um auno.

[ 1 ] Dr. Manuel Antonio Duarte de Azevedo -Relatorio com


que abrio a assembléa provincial em 1861, pag. 14.
[ 2] José Antonio Machado- Relatorio com que passou a ad-
ministração da provincia ao presidente Dr. José Bento da Cunha
Figueiredo em 5 de Maio de 1862, pag. 3.
(3) Dr. José Bento da Cunha Figueiredo- Relatorio com
que abrio a assembléa provincial em 1 de Outubro de 1862, pag. 21 ·
670

A epidemia apresentando se no territorio da provincia em


Março de 1862 invadio as comarcas do Icó, Aracaty , S. João
do Principe, Crato. Jardim, Saboeiro, Baturité. Quixeramobim
e a Fortaleza, escapando apenas Canindé e Parasinho [ 1 ].
Até Maio de 1863 haviam sido poupadas as comarcas de
Sobral, Granja, Ipu e Viçosa. Na de Imperatriz a peste appa-
receu em Fevereiro de 1863, fazendo 23 victimas. A epidemia
foi mais duradoura do que em outras provincias, delongando-
se por um anno. Sua mortalidade excedeo de 12.000 pessoas.
nao sendo possivel determinal- a com exactidão porque a mór
parte dos medicos commissionados, cerca de 40. " não disseram
ao que foram, e nem porque voltaram" segundo a expressão do
Senador Pompeu.
Na cidade do lcó deram- se casos de cholerina desde 9 de
Fevereiro, na opinião do Dr. Rufino de Alencar, não aceita
pelo Dr. Theberge que lhes attribuia outra natureza.
O primeiro facto caracteristico manifestou -se a 18 de
Março em um homem vindo da cidade de Souza [ Parahiba] em
Cajaseira, lugar a 3 leguas do leó . A 5 de Abril rompeo fran-
camente na cidade, e já a 18 a mortandade diaria attingia a
30 pessoas, contando-se entre os affectados os dous medicos
Rufino e Theberge .
A população aterrou -se, e tão rapida foi a marcha da pes-
te que dentro de um mez dous terços daquella tinham sido
affectados, elevando- se a mortandade a 50 por dia, numero
avultado para uma população de 5.000 almas. O declinio foi
igualmente rapido, descendo com a cessação das chuvas abun-
dantes, a 7,5 e menos diariamente os casos occerridos, de
modo a julgar-se extincta no dia 8 de Maio.

( 1 ) A narração do texto relativa a peste do cholera-mor-


bus é extrahida da obra do Dr. José Pereira do Rego , intitu-
lada Memoria historica das epidemias da febre- amarella e cholera-
morbus que tem reinado no Brasil -Rio de Janeiro 1873. pag. 168 .
O Dr. P. do Rego declara que para organisar a sua noti-
cia servio-se de un impartante trabalho manuscripto do Se-
nador Pompeu, existente no archivo do Instituto historico e
geographico brasileiro sobre esta peste, no Ceará.
Este trabalho, longo e minúcioso, a que se refere o presiden-
te José Bento, no seu relatorio, segundo estou informado, já
não existe naquelle archivo .
671

A epidemia attingio a todas as classes, e as familias re-


sidentes em casas aceiadas e elevadas foram as mais perse-
guidas, emquanto de 66 presos apenas falleceram 4.
O numero de mortos neste termo foi de 500 até o dia 7 de
Maio, dos quaes 100 da primeira classe da sociedade .
Da cidade irradio-se o cholera para Lavras, Varzea-alegre
e S. Matheus, desceu pelo rio Jaguaribe, montando a cifra da
mortandade em toda a comarca, que comprehendia uma po-
pulação de 13.455 almas, a 700, tendo sido o numero presumi-
vel dos atacados de 4.500 .
LAVRAS - Neste termo o primeiro ponto attingido foi o lu-
garejo --Vacca Morta-em fim de Março, importada por boia-
deiros chegados do sertão de Pernambuco e Parahyba , entre
os quaes fez victimas.
Em principio de Abril começaram a apparecer casos fre-
quentes de cholera na villa, mas não progrediram. Em 15 ma-
nifestou-se francamente na povoação de Varzea - Grande, 10
leguas distante da villa, importada por um homem que servio
de coveiro no leó . Em um mez , que durou , fez a epidemia 105
victimas.
A 28 de Maio assaltou a villa com a mesma intensidade
do Icó, pondo em fuga autoridades civis e ecclesiasticas. Durou
até 15 de Julho, continuando a grassar nos districtos de S. Cae-
sano, Umary e Venda, onde permaneceu até o fim do mez.
O nº de affectados neste termo, segundo communicações
officiaes, orçou por 8.000 numa população de 27.815 habitan-
tes : tendo victimado por morte 570, dos quaes 240 em La-
vras, 120 em S. Caetano, 105 em Umary e Venda, 105 em Var-
zea-Alegre.
PEREIRO - Só em Agosto appareceu a molestia, mas com o
caracter tão benigno que apenas affectou 229 pessoas dos 9 : 015
habitantes que contava, tendo morrido daquelles 4 pessoas.
IGUATU -Apezar da sua proximidade do Icó, a epidemia
só se manifestou nelle a 26 de Abril, fazendo a primeira victi-
ma uma legua distante da cidade, e nesta 3. Affectou 293
pessoas, matando 54 até o dia 8 de Julho, quando se extinguio,
continuando a reinar por fóra da cidade até o fim de Agosto .
Em todo o termo, com a população de 10.515 almas, fo-
ram affectadas 2.093 pessoas, das quaes morreram 459.
672

Só na comarca do Icó, (incluindo os seus termos do Icó,


Lavras, Pereiro e Iguatú) com a população de 60.800 habitan-
tes, foram affectados 13.022, dos quaes morreram 733.
A proporção foi, para o termo do Icó, de 40 % de acom-
mettidos sobre a sua população, e de 6 % de mortos.
COMARCA DE SABOEIRO E INHAMUNS -A epidemia rompeo
a 13 de Maio na freguezia do Saboeiro, irradiando -se para os
povoados de Bebedouro, Brejo Secco, Assaré, arraiaes de
Quixaré, Tarrafa e serra dos Bastiões. A mortandade na villa
não excedeo de 8 pessoas por dia. Durou até fim de Junho,
tendo affectado em toda a villa 898 pessoas numa população
de 5.513 habitantes, daquelles morreram 71.
Na freguezia de Assaré surgio a 20 de Maio, fazendo 6
victimas. Extinguio- se. reapparecendo a 1 de Julho para ter
minar em fim de Agosto.
O nº de atacados foi de 800, sendo 300 no districto de As-
saré, dos quaes falleceram 64, e 500 no Brejo Grande, mor-
rendo destes 220 : ao todo 284 mortos numa população de
8.800 habitantes .
Na freguezia de S. Matheus a peste rompeo no dia 30 de
Abril, importada de Varzea - Alegre ; e com quanto não fosse por
demais grave, espalhou- se por toda a freguezia, estendendo se
pelos rios Cariri, Bastiões e Jaguaribe..
Fez 350 victimas em 3.500 affectados numa população de
11.355 habitantes.
Em toda comarca falleceram 480, dentre 4.520 acommetti-
dos para a população de 25.948 hab.
Na freguezia de S. João do Principe ( hoje Tauhá) surgio
a epidemia a 20 de Abril, e a 23 na villa do Tauhá, com tal
violencia que fazia 4 a 10 victimas diarias, até 10 de Maio
quando começou a declinar, extinguindo-se até o fim deste
mez .
Continuou a grassar nas circumvisinhanças, cessando a 12
de Julho em todo o municipio. Em Setembro reappareceu na
serra das Guaribas, e S. Bernardo, causando 25 mortes. Nas
duas invasões que soffreu esta freguesia, contando a popula-
ção de 14.056 habitantes, foram affectadas 510 pessoas, morre-
ram 216 .
673

No districto de Marrecas, invadido a 26 de Abril, fez 24


victimas até 23 de Maio, flcando extincta a 13 de Junho.
Na freguezia de Arneiroz manifestou se a molestia em fim
de Abril, affectou 141 pessoas, das quaes falleceram 29 numa
população de 7.226 hab.
A freguezia de Maria Pereira foi attingida em Julho por
casos isolados, fazendo em diversos logares 43 victimas De-
pois de haver desapparecido do termo, voltou a villa em prin-
cipios de Dezembro com tal violencia que até 23 de Janeiro de
1863 havia accommettido 100 pessoas e morto 25.
Nas duas manifestações occorridas nesta freguesia, cuja
população orçava por 11.649 hab., foram affectadas 860 e mor-
reram 68.
Em toda a comarca, com a população de 32,929 hab. , foram
accommettidas 1.611 e morreram 313.
COMARCAS DO CRATO E JARDIM. - Na cidade do Crato a
primeira victima do cholera- morbus foi uma mulher a 30 de
Abril, seguido de mais dous casos até 2 de Maio. Em fim deste
mez appareceu em dous lugares -Bom Nereu e Macapá [ Missão
Velha].

A 1 de Junho prorompeu terrivel na cidade da Crato e na


povoação de Porteiras, no Jardim.

No Crato os primeiros 16 doentes morreram em menos de


24 horas, e em Porteiras, no espaço de 25 dias, ceifou 140 pes-
soas .

A epidemia tocou o apogêo de 26 de Junho a 7 de Julho ,


elevando a mortalidade diaria a 48. De 18.230 habitantes da
freguezia foram affectados cerca de 3.000 , dos quaes succum-
biram 760.
Na freguezia de Missão Velha appareceu a 12 de Maio, fez
4 victimas. A 13 de Junho reappareceu em diversos pontos
e em Julho na povoação, cessando em Agosto. Foi benigna, af-
fectou 380 pessoas, das quaes falleceram 36.
No municipio e freguezia de Barbalha manifestou-se em
Junho, mas só em Julho tornou- se franca e sempre benigna.
O nº de atacados numa população de 12.000 hab., orçou por
4.000, dos quaes morreram 176.
674

Em toda a comarca do Crato foram atacadas 12.380 pes-


soas, das quaes morreram 963.
MUNICIPIO DO JARDIM - Foi attingido a 23 de Abril, no lu-
gar Poço pelo cholera -morbus, que se extinguio em fins de
Junho, tendo feito 66 victimas. Passou a villa, onde em 18 dias
ceifou 200 vidas.

No municipio affectou 3.370 pessoas, das quaes falleceram


550, contando elle a população de 25.640 habitantes.
Na freguezia de Milagres a molestia surgio a 5 de Abril no
districto do Coité, onde fez 105 victimas; depois invadio outro
districto e por ultimo a villa, causando pouca mortandade.
Em todo o districto foram acommettidas 200 pessoas das
quaes morreram 180, numa população de 10.000 habitantes.
Em toda a comarca 4.270 affectados e 730 mortos.
QUIXERAMOBIM E CACHOEIRA- Neste termo appareceu a
molestia em fins de Abril, dando-se 9 casos no districto de
Quixadá, e nisto ficou até 26 de Junho, quando a chegada de
um correio vindo de lugar infectado , rompeu ella violentamen-
te. Nos primeiros dias quasi todos os acommettidos morreram :
o declinio foi rapido, porque a 17 de Julho se havia extingui-
do, continuando a devastar as serras de Santa Rita e do
Estevam.
Na cidade a mortandade foi de 110 pessoas para 2.000 bab.;
em Quixadá de 60. A povoação de Bôa Viagem não foi attin-
gida.
Em todo o termo, cuja população era de 15.000 habitan-
tes, morreram 230 pessoas entre as 1.500 que se presume te-
rem sido affectadas.
No termo de Cachoeira a peste fez 50 victimas em Jagua-
ribe-merim tendo nelle penetrado em Junho. Dahi passou a
Santa Rosa, onde matou 32 pessoas e noutros pontos 70 pes-
soas. Na Cachoeira só victimou 2 pessoas. A epidema cessou
a 11 de Julho. Em Abril de 1863 reappareceu na povoação do
Frade, e sitio Cangati, fazendo 16 victimas
Em todo termo com 9.000 habitantes só morreram 118
pessoas
TERMO DE ARACATY - O cholera-morbus manifestou-se a
675

15 de Abril no lugar Brito, e seguidamente ao longo do rio


Jaguaribe com certa benignidade. Em Maio tornou-se virulento,
assolando a ilha Poró, Catinga do Góes, Paripueira, Passagem
das Pedras, e cidade onde attingio a 15 do mesmo mez, demo-
rando-se no termo até Agosto.
Em Canoa Quebrada com 80 cabanas foram affectadas 250
pessoas, das quaes falleceram 70.
Na Catinga do Góes falleceram 329 pessoas.
A epidemia aggravou -se nestes lugares com o augmento
das chuvas.
A mortalidade em todo o termo, que contava uma popu-
lação de 19.667 habitantes attingio a 1.000 pessoas, sendo 450
na cidade .
TERMO DE S. BERNARDO DAS RUSSAS - Neste termo a mo-
lestia fez explosão em Abril, trasida por um comboeiro vindo
da Parahyba, que communicou a 4 pessoas, victimadas, no
lugar Poço da Onça. Em Maio chegou a cidade, mas sob a for-
ma benigua, pois que em 300 pessoas affectadas morreram 16.
O nº de acometidos em todo o termo, cuja população era
de 19.200 habitantes, foi de 6.000 , e o de mortos 500.
TERMO DE CASCAVEL -O cholera- morbus surgio em meiado
de Abril na Varzea da Serra, uma legoa distante de Socatin
ga. Dahi passou ao Ingá, em Junho ao Cedro, e depois a outros
pontos.
Na villa deo - sa o 1º caso a 7 de Junho , e o ultimo a 7 de
Julho. Em Agosto do mesmo anno e Fevereiro de 1863 deranı-
se casos esporadicos .
On de affectados em todo o termo, com a população de
15.000 hab. , foi de 4.000 pessoas, das quaes falleceram 450 , sen-
do na villa somente 10. Em Fevereiro do 1863 morreram 27
pessoas..
AQUIRAZ --A epidemia manifestou -se a 31 de Maio no lu-
gar Barroca e Cutia, passou depois a villa e outros districtos,
cessando a 30 de Junho.
Foram atacadas neste termo, com a população de 8.500
habitantes , 1.500 pessoas, e morreram 320, das quaes 95 em
Montemor.
676

TERMOS DE MARANGUAPE, PACATUBA E MECEJANA- A 7 de


Junho appareceo em Maranguape sob a forma de diarhéa, con-
tinuando benignamente até o dia 10, quando morreo o primei-
ro doente. Do dia 18 em diante alastrou -se por Jubaia , Taba-
tinga, Sapupara, Jererahú, Limão, Piroás, Cachoeira e Pitan-
gui. Do fim de Junho em diante tomou tal intensidade que em
alguns dias a mortandade attingio 60 pessoas. Entre 16 de Ju-
nho e 31 de Julho a mortandade na villa e suburbios foi de
1.056 pessoas e o nº de affectados 3.600. A epidema cessou no
termo em principio de Outubro¡ mas só na villa ( Maranguape)
ate fins de Agosto, morreram 1.430 pessoas.
No dia 8 de Outubro, estande a epidemia extincta em todo
o termo, aconteceu que ao abrir-se a casa da camara, que ser-
vira de enfermaria, e revolvendo- se o lagedo, enfermassem e
morressem todas as pessoas que estiveram presentes, inclusive o
juiz e o escrivão, que deram audiencia na mesma casa ; então re-
começou a epidemia que fez para cima de 100 victimas.
No reapparecimento calcula- se que morreram na villa e
seu districto 370 pessoas, o que eleva a 1.800 o nº de mortes
neste districto.
Entre outras causas deste aggravamento do cholera - mor
bus em Maranguape assignalam- se : o desanimo da população.
a demora nos enterramentos, ficando insepultos por falta de
conductores e coveiros 40 e mais cadaveres, a pessima situação
do cimiterio, o enterramento superficial, etc.
No povoado de S. Antonio de Pitaguary o nº de mortes ex-
cedeo de 200 , na Jubaia morreram 362, até Fevereiro de 63, de
700 pessoas atacadas.
Em Pacatuba deo- se o primeiro caso a 21 de Maio numa
pessoa chegada da capital. Em Julho desappareceo, surgindo
em Outubro e depois em Fevereiro em alguns districtos. Até
3 de Maio fez 120 victimas das 300 pessoas affectadas.
A mortalidade do districto foi calculada em 600 pessoas,
sendo 480 na primeira phase, 120 na segunda e terceira,
tendo sido de 2.000 o nº de accommetidos.
NO MUNICIPIO DE MECEJANA- Só fez 1 victima na povoa-
ção, e 80 em todo o municipio.
A freguezia de Maranguape com 30.000 habitantes tevə
677

6.860 pessoas affectadas, dus quaes 4.300 em Maranguape, 960


na Jubaia, 1.300 em Pacatuba, 300 em Mecejana ; destas falle-
ceram 2.850, a saber--1.800 na primeira, 310 na Jubaia, 660
em Pacatuba, 80 em Mecejana.
TERMO DE BATURITÉ - Manifestou se a epidemia no dia 18
de Junho, sendo precedida em Maio pela febre amarella, que
atacou mais de 200 pessoas. A principio lenta, logo após tor-
nou-se mortifera, fazendo 30 a 40 victimas por dia até 23 de
Julho, cessando em fins de Agosto.
A mortalidade no fim de Julho excedia de 500 pessoas
na cidade. Em Dezembro ganhou a serra, atacando Gado, Pen-
dencia e Conceição-
No districto de Itans appareceo em Julho, fazendo apenas
5 victimas.
A povoação do Acarape foi invadida no dia 12 de Junho ,
em Setembro declinou a epidemia , recrudescendo em Dezem-
bro. Suppõe -se que morreram 500 pessoas.
Em todo o termo do Acarape a cifra dos mortos attingio a
2:040, sendo certo que, só na cidade do Acarape até Fevereiro
de 1863, haviam fallecido 680 pessoas. A população do termo
era de 25.360 habitantes.
CAPITAL- A primeira victima foí um cego, morador a rua
da Palha, o qual falleceu a 13 de Maio. Ganhou depois as demais
ruas, mas sempre com caracter benigno. No mar, de 1069
pessoas de tripulação, alem dos passageiros, desde Maio a 22 de
Julho, só um adoeceu, e esse mesmo não morreu .
Nos dias de sol, em Maio e Junho, subsequentes aos
chuvosos, recrudescia, ao contrario do que se deu em Mar-
ço e Abril de 1863 nos quaes a maior frequencia incidio com
as maiores chuvas. A mortalidade até o fim de Abril de 1863
foi calculada em 535, entre 2.000 affectados,
Na povoação de Soure, com 450 habitantes a molestia ma-
nifestou- se no dia 7 de Julho, fazende 190 victimas dentro e
fóra do povoado .
O districto de Arronches foi invadido pelo lado de Tapiry
em Junho , desapparecendo logo depois. Reappareceu em Janeiro
de 1863 , fazendo 114 victimas.
No Mucuripe a molestia appareceu em Julho e extingio- se
em Agosto, fazendo 24 victimas.
678

A mortalidade neste termo, cuja população era de 35.373


hab. ,foi de 839 pessoas.
Resumindo o que fica dito sobre a epidemia do cholera-

PESSOAS
morbus em 1862 a 63 temos :

MORTAS
DATA NO DE POPULA-
LUGARES DA EXTINÇÃO ATACA- ÇÃO PRE-
INVASÃO DOS SUMIVEL

Icó 5 Abril Julho 4.500 700 13.450


Lavras . 15 .. 8 000 570 27.800
Russas . 15 Agosto 6.000 500 19.200
15 66 1.000 19.700
Aracaty.
Cascavel 20 4.000 477 15.000
Tauhá ... 20 Junho -5101 216 14.060
Milagres 23 Setembro 900 180 10.000
Jardim. 23 .. 3.370 550 25.650
Telha ... 26 Agosto 2.093 459 10.500
Arneiroz 28 Junho 141 29 6.000
S. Matheus ... 30 66 3.500 350 11.400
Crato ... 2 Maio Setembro 8.000 760 18.230
Fortaleza 10 66 Maio-63 3.000 839 35.380
Saboeiro . 13 66 Julho 898 80 5.000
Assaré. 20 Agosto 800 286 8.800
Maranguape 21 Maio-63 6.860 2.850 20.000
31 6. 1.500 320 8.500
Aquiraz .. Agosto
Missão Velha 15 Junho 66 36 13.000
Cachoeira 66 66 118 9.000
Baturité . 66 Maio-63 2.040 25.400
Barbalha ... Julho Setembro 4.000 176 12.000
Quixeramobim 66 1.500 230 15.000
Maria Pereira Maio -63 860 6811.650
Pereiro.... Agosto Setembro 229 49.000
Imperatriz ... Fevereiro 63 Fevereiro 63 23

Total .... 12.861

Em 1863 manifestou se a febre amarella com máo ca-


racter, victimando 6 pessoas. (1 )
Em 1861 reappareceo a epidemia do cholera- morbus, me-
nos virulenta, do que em 1862, comtudo percorreo o leó, Boa-

(1) José Bento- -Relatorio a assembléa provincial a 9 de Ou-


ubro de 1863, pag. 44.
679

Vista, Missão Velha, Barbalha, Crato, Milagres e Lavras, (po-


voação do Jardim ].
Foram acommettidos 6 599 desvalidos, dos quaes fallece-
ram 886. (1)
Em Acarape a febre amarella fez grande nº de victimas.
O presidente, Dr. Lafayette, disse que o estado sanitario
da capital deixara de ser benigno porque se tornara ahi ende-
mica a febre amarella, atacando de preferencia os extran-
geiros.
O anno de 1865, que se annunciara excepcionalmente fa-
voravel a salubridade publica, findou prenne de calamidades.
Diversas molestias flagellaram com caracter epidemico a
população, sebresahindo a febre amarella, a epidemia de ca-
maras de sangue, que desde Setembro de 1865, appareceo com
caracter summamente grave [2 ], percorrendo varias localida-
des, a começar pela capital, passando em seguida a Marangua-
pe, Pacatuba, Soure, Trahiry, Mecejana, Aracaty e S. Ber-
nardo .
A variola desenvolvee- se tambem na Fortaleza com ca-
racter bastante grave.
São curiosas as ponderações do medico commissario offi-
cial acerca das causas e incremento destas epidemias ; revelam
a feição scientifica da epoca, e o insuccesso das medidas to-
madas para debellal- as.
Deve-se attribuir a permanencia da temperatura e da humi-
dade excessiva, diz o Dr. José Lourenço de Castro e Silva em
officio a presidencia, a 14 de Abril de 1866, tantos males hoje
em contribuição -bexigas, dysenteria, sarampão, papeiras, fe-
bre amarella e cholera -morbus, todas de typo epidemico.
A falta de viração, que era constante outr'ora , o excessi-
vo calor com exhorbitante humidade que todos experimentam ,
parece ter sido a causa efficiente do apparecimento da mór
parte destas enfermidades pestiferas, devendo contribuir gran-

(1) Lafayette Rodrigues Pereira - Relatorio com que abrio


a assembléa provincial a 1 de Outubro de 1864, pag. 3 .
[ 2 ] Francisco Ignacio Marcondes Homem de Mello - Re-
latorio com que abrio a assembléa provincial a 1 de Julho de 1866.
pag. 28.
630

demente as exhalações do envenenamento miasmatico do ci-


miterio, cujas sepulturas, em terreno frouxo eram poucos pro-
fundas e de vez em quando revolvidas.
"O augmento do calor no litoral e a permanencia da hu-
midade deve necessariamente produzir a turgescencia do san-
gue e por conseguinte a actividade de sua circulação. ”
Em 1366 manifestaram -se camaras de sangue, alguns casos
de cholera e a variola com caracter grave.
De Janeiro de 1866 a Março de 1867 foram victimadas pela
variola, na Fortaleza, 41 pessoas. [ 1 ] Segundo o relatorio do
Inspector da saude public , a 28 de Dezembro, tinham se dado
2 casos de vomitos negro na capital, o reapparecimento de dia-
rhéas, o coqueluche, alem da variola.
"As febres intermitentes, as catarraes, as pleurises, pneu-
monias, anginas, diarhéas , varioloides, sarampão , e as de ca-
racter tiphoide, e bexigas, formam o quadro pathologico da
Fortaleza.
"As terminações fataes poderiam ser reduzidas, sl, no
geral, os doentes fossem logo medicados convenientemente. Ou
por descuido , ou pela esperança de que sem medicos consegui-
rão prompto restabelecimento, quasi sempre só recorrem ao me-
dico muito inopportunamente, e quando o mal já se acha assás
desenvolvido.
Uma das molestias que mais estragos ha occasionado, e
que se tem prolongado de modo assustador é o virus syphili-
tico, que, no geral, torna difficil a resolução feliz de outra
qualquer, de differente natureza, pela infecção profunda que
tem deteriorado o organismo. (2 )
Em 1868 o estado sanitario foi bom, tendo apenas appa-
recido febres intermittentes sem intensidade ra Fortaleza. [ 3 )
Desde Dezembro de 1869 tratei de 360 doentes sem que
morresse um só, diz o Dr. J. Louronço . ?

[ 1 ) João de Souza Mello e Alvim- Relatorio com que passou


a administração ao 1º vice-presideme a 6 de Maio de 1867, pag . 11 .
(2) José Lourenço - Relatorio apresentado ao presidente Dr.
Leão Velloso a 28 de Dezembro de 1867.
[3 ) Dr. A. J. Rodrigues Junior - Relatorio com que passou
v administração as Dr. Gonçalo B. Vieira em 1868.
681

Desta data em diante, só no relatorio do Inspector da


saude a 1 de Junho de 1871 se encontram informações sobre
a salubridade da provincia . Neste documento diz o Dr. José
Lourenço, que em Fevereiro reinava febre de caracter ma-
ligno em S. Bernardo de Russas ; em Maio na Granja, Baturité,
Taboleiro da Arêa e Cascavel, tendo morrido na capital 3 es-
trangeiros chegados de Pernambuco e Maranhão acommettidos
de febre amarella.
"Dentre todas as molestias que fazem maior numero de
vietimas são os taes catarrões, que se incendeam, tomando
grande incremento. " [ 1 ] Refere - se ao mau tratamento applicado
as ophtalmias e assevera ser a syphiles o maior contribuinte
do estado morbido, alterando o organismo em todos os seus
reconditos vitaes.

"Não havendo, prosegue elle, estudo algum a respeito da


salubridade do Ceará, e nem estatistica sobre a mortalidade
desta capital, devo comtudo dizer que seu estado de salubri-
dade é incontestavelmente reconhecido como muito benigno .
Os annos de 1870 a 72 foram salubres.

Em 1873 grassaram febres de mau caracter em Sobral, S.


Quiteria, Acarahú, Imperatriz . Pará-Curú, Cascavel. ( 2]
Pela primeira vez foi officialmente assignalada a presen-
ça da beri -beri. (3) O medico da saude publica assim se expri-
me : "Ha tempos tem apparecido aqui alguns casos que se
tem diagnosticado beri-beri, vindo desde o anno passado bas-
tantes doentes do Maranhão , e que voltam bons com a mudan-
ça do clima. Esta enfermidade não parece ser contagiosa
"Estes doentes para aqui tem vindo, depois que se deram
alguns casos, sem que viesse de fóra nem um desses enfermos .
Mui poucos casos fataes, se tem dado, e alguns doentes se tem
restabelecido sem mudar de lugar.

( 1 ) Dr José Lourenço de Castro e Silva - Relatorio apresen-


tado ao 1º vice-presidente a 1 de Junho 1871.
[2) Relatorio do presidente F. de Assis Oliveira Maciel na aber-
tura da assembléa provincial a 7 de Julho de 1873. pag. 87.
[3 ] Dr Jose Lourenço -Relatorio apresentado a 7 de Maio
de 1873 ao presidente O. Maciel.
682

Em relação a variola diz este medico, que "outr'ora sur-


gia todos os annos, como medonho flagello, hoje apenas acom-
mette alguns bem poucos dos que não procuram preservar- se,
vacinando- se. Vacinei este anno 235 pessoas."
Em 1 de Julho de 1874 [ 1 ] dizia o vice- presidente, barão
de Ibiapa ba, que o estado sanitario da provincia não era lison-
geiro, porque a variola e febres de máo caracter haviam gras-
sado na cidade de Granja e villas do Pereiro [ 2 ], Jaguaribe-
merim, Ipú, Imperatriz, S. Quiteria, Lavras e povoação de
Soure. Na capital deram-se alguns casos fataes de febre ama-
rella [6 victimas).

Na povoação da Cruz [ Maranguape] a intensidade da fe-


bre-amarella foi tal que em pouco mais de 100 habitantes, 99
foram acommettidos, dos quaes falleceram 13. ( 3 )
Em 1875 o estado sanitario foi pouco lisangeiro ( 4 ), no di-
zer do presidente Esmerino. O sarampo, as febres intermitten-
tes e catharraes, a febre -amarella tornaram-se endemicas : sen-
do que esta ultima acommettia de preferencia os estrangeiros
recenchegados.
Na povoação da Cruz a febre amarella atacara a 99 pes-
sôas, das cento e poucas que elia contava, vietimando somentǝ
13 pessoas.
O municipio do Limoeiro tambem foi acommetido por
esta febre.
O paludismo grasson intensamente em Lavras, e outras loca-
lidades, entre as quaes Cascavel, S. Anna, S. Quiteria, Palma, S.
Bernardo, Mecejana, Telha, Morada Nova, Pacatuba, Sobral e
Ipú .

[ 1 ] Barão de Ibiapaba-Relatorio com que abrio a assembléa


provincial a 1 de Julho de 1874, pag. 13 .
[ 2 ) No Pereiro fez grande numero de victimas , tendo du-
rado pouco tempo. - H. de Alencastro Graça- Relatorio com que
passou a administração ao vice-presidente Esmerino, a 1º de Março
de 1875, pag. 14.
(3) Ibid .
[ 4] Dr. Esmerino Gomes Parente - Falla com que abrio a
assemblea provincial a 2 de Julho de 1875, pag, 19.
683

"As molestias mais comuns, e peculiares a estação inver-


nosa, diz o inspector da saude publica, ( 1 ) adquirem um eer-
to gráo de gravidade ao ponto de determinarem maior mor-
talidade, sendo alem de outras, as diarhéas e convulsões nas
creanças que mais contribuiram para um resultado fatal, con-
correndo para o seu desenvolvimento poderosas causas ; a per-
turbação funcional do apparelho digestivo, provocado ou por
alimentação impropria ou por excessiva quantidade, a denti-
ção, as affecções verminosas, que são frequentes nesta cida-
de Fortaleza ). "
A variola atacou a 15 pessoas na capital, vietimando i
que viéra do Recife.

No Corrego das Aningas foram atacadas 12 pessoas de


uma molestia que foi considerada cholera - morbus, fallecendo 1
dentro de 24 horas.

O inspector da saude lamentava a facilidade com que eram


dados a sepultura os cadaveres. "E' uma tristissima verdade,
escreveo no seu relatorio a presidencia, que entre nós nada se
tentou ainda no intuito de regularisar semelhante serviço, sen-
do que ainda hoje se fazem as inhumações precipitadas dos
cadaveres por um simples bilhete passado por particular, e
com licença do vigario, sem garantia séria e efficaz da ef-
fectividade do fallecimento.”

Em 1876 as epidemias de febres catharraes e intermitten-


tes caracterisa ram a constituição medica do anno, segundo o
pensar do medico da saúde publica. [ 2]
"A s outras molestias que predominam nas grandes cidades'
as que mais ostentaram malefica influencia, foram entre adul-
tos : as hydropesias consecutivas as obstruções do baço e figa-
do ou as lesões cardiacas , as pneumonias, a tuberculose pul-
monar, que por sua freq uencia assustadora já causa certo
reparo, etc .; e na infancia -as diarreas e convulsões. [2)

(1 ) Dr. Antonio Domingues da Silva-- Relatorio apresentado ·


ao presidente Dr. E. Gomes Parente a 2 de Julho de 1875.
[2 ] Dr. F. Domingues da Silva - Relatorio apresentado ao pre-
si lente Dezembargilor Farias Lemos a 31 de Maio de 1876 .
684

O paludismo continuou a grassar em Pacatuba, Impera-


triz, S. Bento d'Amontada, Acarahú, S. Anna, Sobral, Ipú, S.
Benedicto, Palma e Lavras : e segundo pensava o medico da
saúde era a modalidade morbida que causara maior numero
de victimas nestes lugares.
A febre amarella reinou em Sobral, atacando de preferen-
cia os recemchegados.
Em 1877 o estado sanitario da provincia, embora sujeito
a alterações em epocas certas e determinadas. como se ex-
prime o presidente de então, dezembargador Estelita ( 1 ), não
passou pela prova de uma dessas epidemias que abrem para
os povos momentos de angustias e soffrimentos.
Em algumas localidades reappareceram as febres inter-
mittentes, victimando da preferencia as populações de Gran-
ja, Acarape, Mecejana, S. Bento d'Amontada, Acarahú, Santa
Anna. Viçosa, Trahiry e Fortaleza,
Appareceram alguns casos de febre amarella na capital, e
foram recolhidos ao lazareto desta 2 tripulantes de variola, os
quaes a communicaram a 19 pessoas. Posteriormente foram
acommettidas mais 3 pessoas .
A 23 de Novembro deste mesmo auno [ 1977 ] , quando a
secca começava a consumir a fortuna publica , dizia o presi-
dente Estellita, ao passar a administracção a seu successor : ( 2 )
"O estado sanitario da provincia, nas condições climate-
ricas em que ella se acha, é bastante melindroso.
"A estação, rigorosamente calmosa, a agglomeração do
povo em diversas localidades, a inobservancia das leis de
hygiene, que não são consultadas, parecem haver despertado
os fócos de infecção on as causas morbidas que conspiram
contra a salubridade publica. 4

[1 ] Dezembargador Caetano Estelita Cavalcante Pessoa-


Falla com que abrio a acsembléa provincial a 2 de Julho de 1877 ,
pag. 39.
[2 ) Dr. C. Estelita-Relatorio com que passou a administração
ao Conselheiro João J. F. d'Aguiar a 23 de Novembro de 1875,
pag. 11.
685

A variola appareceu, mas foi logo debellada, graças ao


largo serviço de vaccinação de indigentes agglomerados na
capital (mais de 10,000 pessoas).
As febres de mau caracter, de envolta com a typho icto-
roide, reinaram no Ipú, Limoeiro, Crato, Canindé, Imperatriz,
Arraial, Mecejana, Pacatuba, Trahiry, Acarahú, Maranguape,
Granja , S. Quiteria, Acarape, Sant'Anna, Tamboril, S. Fran-
cisco, Baturité, Conceição, Canôa, Pendencia, Mulungú, Per-
nambuquinho, Jubaia, Cascavel, União. Aracaty, Bôa- Viagem e
Russas.

Essas febres não apresentavam a mesma symptomalogia ;


umas revelavam fundo palustre e bilioso, outras tomavam a
forma typhica ou a modalidade amarilica.
Uma molestia de certa gravidade, semilhante ao beri-beri,
reinou aqui demoradamente. Começava por inflammação dos
pés em uns, precedida em outros de dormencia e dores. ga-
nhava rapida ou lentamente o corpo, terminando por asphixia,
Esta enfermidade se alastrou por S. Bernardo, Limoeiro.
Aracaty, Quixeramobim, Bôa- Viagem, Tamboril. S. Quiteria e
Sobral, fazendo algumas vietimas.

A opinião dos facultativos não era accorde ; suppunham


uns que o mal tinha per sede uma lesão do figado, proveniente
do excesivo calor, outros que era o effeito da ataxia palustre, e
alguns que era beri-beri .
Ao tempo em que se refere o documento official citado, o
mal ia fazendo progresso e resistindo a applicação dos meios
therapeuticos
O anno de 1878 foi o mais calamitoso de que ha noticia
para a salubridade do Ceará.

"Logo que os effeitos da secca começaram a se manifestar,


appareceram febres infecciosas de diversos typos e naturezas ,
formando por si só a constituição medica reinante no primeiro
semestre de 1877.

No segundo, desenvolveram-se febres intermittentes e re-


mittentes de elemento bilioso, que, nesta capital e outros pon-
tos, eram de caracter grave, e tornaram-se rebeldes aos mais
686

poderosos recursos da sciencia [ I ) : ao mesmo tempo que a dia-


rhéa , a dysenteria, a anasarea e o beri-beri ceifavam numero-
sas vidas.
"Quando assumi a administração, diz o Dr. José Julio (2 ),
estas enfermidades já tinham a forma epidemica e, alimentadas
por diversas causas, abriam immensos claros na população .
Só na Fortaleza falleceram de 3.000 a 4000 pessoas por mez, e
quasi igual nº no Aracaty."
"Entre estas causas , devo assignalar a elevação da tempe-
ratura, que variava de 30 a 340 c. , a agglomeração da popula-
ção em perimetros acanhados e infectos, a falta de asseio nas
classes menos educadas, o uso de substancias nocivas a saúde
de que se alimentou por muito tempo a população faminta, a
deficiencia e natural viciamento da alimentação, especialmen-

[1 ] Dr. José Julio de Albuquerque Barros -Relatorio a


abertura da assembléa provincial a 1 de Novembro de 1878, pag. 37 .
[ 2 ) O Sr. Rodolpho Theophilo descreveu os symptomas des-
ta febre nestes termos : "O individuo era atacado de febres,
a temperatura elevava -se a 40°, appareciam logo vomitos, dyar-
rhéa , insomnia e suppressão das funcções da pelle. Era medi-
cado desde a invasãe do mal com vomitorios, purgativos e
sudorifleos. A temperatura pela manhã descia a 39º, o medico
aproveitava a remissão e empregava o sulfato de quinina em
dose elevada. No dia seguinte a molestia apresentava as mes-
mas alterações , porém nada de ceder ! O medico empregava to-
dos os esforços a seu alcance, mas ella zombava de tudo . O
sulfato de quinina era substituido pelas preparações arsenicaes:
o doente era mudado para outra casa e a molestia não cedía ,
No fim, as vezes, de 20, 30 e 40 dias o thermometro não de-
nnnciava o menor estado febril, o medico orgulhava se com
as suas victorias, quando o doente começava a delirar e oito
horas depois era cadaver.
Em outro individuo a marcha da molestia era differente,
A febre apparecia, a temperatura era de 38 1 /2 ° constantes ;
não havia symptomas gastricos, a transpiração era franca ,
entretanto havia insomnia. Dez dias depois a mucosa da lin-
gua tornava-se negra, apparecia delirio, seguia-se a cephala-
gia e horas depois a morte."
Quanto a beri-beri ainda são do mesmo observador, ( R.
Theophilo ) as seguintes linhas :
"A molestia manifestava -se por symptomas diversos, dis-
farçando-se as vezes a ponto de illudir a perspicacia da sci-
1
687

te das carnes e das aguas, concorrendo com ellas as materias


organicas em decomposição, dispersas nas cidades e nos
campos.
"Mais de 200.000 emigrados do interior existiam aggru
pados nas cidades e villas do litoral. A capital carecia de as-
seio, suas praças e travessas estavam convertidas em abarra-
camentos, o Liceu , o quartel de policia, as escolas publicas,
muitos outros predios, em diversas ruas, serviam de alojamen-
to de retirantes, e em cada um delles se apinhavam centenas
de individuos quasi inanidos. Os abarracamentos eram immnn-
dos, e não tinham commodos sufficientes, nem enfermarias, e
tudo fomentava a propagação das epidemias reinantes. "
O governo providenciou ne sentido de abarracar a popu-
lação emigrante, asseiar os edificios publicos e casas particu-

encia. Em alguns apparecia com a forma mixta, em outros pre-


dominava a paralytica, ainda em outros os symptomas patho-
gnominicos, se é que ella os tem, falhavam completamente.
O doente queixava- se de terrivel inapetencia, acompanhada de
vomitos tão violentos que não permittiam a ingestão do ali-
mento mais leve ! Não acusava dor alguma, os membros infe-
res estavam no goso de saude regular. Só o estomago soffria.
O medico procurava a causa daquelle estado morbido, tenta-
va combatel- o com tonicos, estomachicos e antepasmodicas,
mas eram improficuos os seus esforços. A molestia progredia,
até que no fim de 10 a 20 dias arrancava a mascara e conhecia-
se que o doente estava atacado de beri- beri- A paralisia ma-
nifestava se franca, as funcções de cerebro pervertiam-se, vi-
nha cegueira, delirie, e o doente estava as portas da morte.
Nesssas condições só havia um recurso, a mudança para as ser-
ras. Em estado desesperador era o enfermo conduzido para Ma-
ranguape, Pacatuba ou Baturité. Em alguns voltava a saúde
poucos dias depois da estada em tão amenos climas, durante
a ascensão das montanhas os vomitos passavam como por en-
canto.
"No interior, os que eram atacados de beri-beri morriam
completamente a mingua ! ...
"Na cidade de Sobral, onde foram dizimadas familias in-
teiras, deecobrio-se um meio de combater o mal. Consistia no
uso do leite crú tomado pela manhã , e em banhas frios."
(Rodolpho Theophilo -Historia da seccca do Ceará de 1877
a 1879. Fortaleza 1883, pag. 193.
688

lares, vias publicas, etc. , e com a acção conjuncta dos me-


dicos e seus cuidados rapidamente melhorou a salubridade da
cidade.
"O beri-beri que ceifou tantas vidas na capital, Aracaty
e outras localidades, especialmente Sobral, onde se pronun-
ciara com a maior gravidade e se tornara rebelde a toda ap-
plicação therapeutica, matando quase repentinamente, tomou
um caracter benigno e era combatido com a simples mudan-
ça de clima para as serras de Maranguape, Aratanha , Baturi-
té, Ibiapaba e até mesmo sob o regimen de uma nutrição re-
constituinte unida ao uso do leite e banhos frios. A hemera-
lopia (perda completa da visão durante a noite ) que tanto af-
fligio os retirantes, sendo observada pelo Dr. Studart em Ma-
ranguape e nesta capital, no abarracamento da Pacatuba, onde
chegou a examinar 60 casos, e por outros medicos aqui e em
varias localidades, cedia ao emprego da instilação do sanguə
de figado de boi exposto ao fogo , e extinguio - se a proporção
que os indigentes se nutriam, e melhoravam de condições hy-
gienicas, visto que era attribuida ao depauperamento de san-
gue e consequente eschima do nervo optico. A anasarea, que
se tornou molestia geral entre os retirantes, chegando o
edema ao ponto de tolher o movimento e romper os tecidos
deixando sulcos profundos na epiderme dos enfermos, res-
tringio-se a poucos casos e era facilmente combatida.
Desappareceu a febre biliosa , o beri-beri, a diarréa, a
dysenteria; e os casos de febres. pouco frequentes, revestiam-se
de symptomas benignos que eram combatidos vantajosa-
mente .
A variola deo a nota tragica do anno. Graças aos cuidados
do governo foi possivel conjurar o mal ao apparecimento də
alguns casos isolados. Quando, porem, a epidemia generalisou-
se pelo Rio Grande do Norte e de lá os fugitivos trouxeram - na
para o Aracaty, não foi mais possivel evitar o contagio aos
retirantes da Fortaleza, que foi invadida pelo abarracamento
do Alto da Pimenta.
Em Agosto falleceram 2 pessoas de variola, em Setembro
62, em Outubro 592, em Novembro 9.721 , em Dezembro 14.491 ,
em Janeiro de 1879-2 204, em Fevereiro 176, em Março 107 ,
em Abril 36, e em Junho 1.
689

Só ella victimara na Fortaleza, em poucos mezes, 27.395


pessoas, e no resto da provincia outro tanto ou mais, segundo
se deprehende de algumas communicações officiaes. [ 1 ]
Eis como minudencia o Sr. Rodolpho Theophilo ( 2) a
evolução desta epidemia, porventura a mais funesta por sua
sua marcha e violencia de que ha noticia ro Brasil ( 3 ) __
A variola era classificada pelo povo, segundo a forma que
tomava a erupção. Chamavam-na pelle de lixa, olho de polvo,
tabardia, canudo, fogo. etc '

"A bexiga de canudo era o terror dos retirantes. Não era


mais terrivel do que a pelle de lixa e a tabardia. As pustulas
tinham a forma cylindrica, eram de 10 a 20 centimetros de
comprimento e de 2 centimetros de diametro. Coberta a su-
perficie do corpo de tão enorme caustico , quando entravam as
pustulas em supuração, não havia organismo que resistisse, as

[ 1 ] No Cariry quando o medico enviado pelo governo alli


chegou já a epidemia declinava. Em Goyaninha, Caldas e Mis-
são Nova, quase extingue a população, segundo diz o Dr. An-
tonio Pompeo no seu relatorio ao governo.
[ 2 ] R. Theophilo --Historia da secca de 1877 no Ceará, pag
268 .

(3 ) A febre amarella fez de 1854 a 1857 na Bahla 534


vietimas, e menos nas recrudescencias de de 1859 , 61 e 62
1870. 71 .
Em Pernambuco a invasão de 1849, que no dizer da com-
missao medica de então não poupou em seu furor quasi habi-
tante da cidade, não matou mais de 1800 pessoas, e em toda
a provincia 2.800 . Em 1852 e 53 victimou 410 pessoas.
No Rio de Janeiro a invasão de 1849, que no dizer do
Dr. Pereira do Rego, em sua Memoria historica das epidemias da
febre amarella e cholera-morbus no Brasil, pag. 39, atacára cerca
de 80.000 pessoas, matou 3.300 [ officialmente ] ou 4..160 . se-
gundo outro computo. Em 1852 victimou 1.945 , em 1857-
1.868, em 1858-1,545 , em 1860 -1.249, em 1870-1.118 , em
4873-3 . em 1873 --- 3.659, em 1875-1.292, em 1876-3.476, em
1880-1.625 , em 1883-1.608 , em 1889-2.156, em 1891--4,456 ,
em 1892-4.312 , em 1894-4-852 , em 1897-2.929.
A variola matou no Rio de Janeiro em 1878-2.175 pes-
soas, em 1888-3.357, em 1891-3.944, em 1904—3.566 .
690

forças se aniquilavam de um dia para outro e o doente pere-


cia se desmanchando em pús.
O emprego da camara escura, como meio de diminuir a
força da irrupção, foi posto em pratica, sem graude resulta .
do. A ausencia de raios solares não impedia que a pelle de lixa
se desenvolvesse com todo o furor ; e, mergulhado na mais
densa escuridão, ella deformava um individuo pela inchação,
a ponto de fender-se a epiderme e o tecido cellular de todo o
corpo.
"A 16 de Novembra foram montados mais dous lazaretos-
o de Jacarecanga e a da Lagôa secca, ambos a sota vento da
cidade. Neste mesmo dia ficaram repletos de enfermos.
"Os cadaveres dos individuos continuavam a ser con-
duzidos para o cemiterio passando por dentro da cidade .
Para fazer sanar tão grave inconveniente, a camara munici-
pal, em 20 de Novembro, pedio mais providencias ao presiden-
te da provincta, Este acto da municipalidade foi mui tardio,.
devia tel-o praticado logo que o primeiro enterro de bexigoso
tivesse atravessado a cidade, não deixando que taes especta-
culos amedrontassem mais a populaçãe, e muito menos que a
atmosphera ficasse mais infeccionada.

"Attendendo a representação da camara, o presidente or-


denou que um piquete de cavallaria rondasse em todas as di-
reções com o fim de impedir o trajecto dos enterramentos por
dentro das ruas da capital. Os mortos passaram a ser condu-
zidos pela praia até o cemiterio da Lagoa funda.
"Do 20 de Novembro em diante começou- se a queimar
a noite alcatrão em todas as ruas, mas sem proveito.

A variola ganhava rapidamente Imperatriz , Icó, Telha ,


Cachoeira, em Novembro ; já tendo antes se manifestado em
Arronches, Maranguape, Pacatuba , Baturité, Mecejana e Cas-
cavel .

A 30 de Novembro foram removidos os abarracamentos do


nordeste e sudeste da cidade para sotavento da mesma , como
medida prophilatica .
O governo empregava todos os esforços para circumscre-
691

ver o mal ; a vacina, a despeito da resistencia do povo, era


praticada em larga escala.

"Quasi que já não era tempo de dissiminar tão poderoso


preservativo, diz o Sr. Rodolpho Theophilo [ 1 ] : Quasi sem-
pre o individuo vaccinado pala manhã , á tarde era atacado
de bexiga. Parece que neste tempo já estava a variola incu-
bada em todos os organismos não preservados .
Entre a lympha empregada na vaccinação encontrava- se
muita que, longe de pôr o individuo ao abrigo da peste, ser-
via unicamente de viciar- lhe o organismo inoculando virus
syphlitico e escrofuloso.
Tivemos occasião de observar em Pacatuba dezenas de
enfermos de ulceras syphiliticas desenvolvidas depois da vac-
cinação. Entre ellas uma creança de 6 annos .
"Consta que esta lympha fora importada do Rio de Ja-
neiro .
Em Dezembro de 1878 podia -se calcular em 80.000 o nº de
pessoas atacadas de variola na capital e suburbios (2 ), e para
attender a estes enfermos só havia 10 medicos. Havia 13 la-
zaretos e todos regorgitavam de enfermos.
“A variola hemorragica tornou -se o terror da população .
Tinha os mesmos symptomas da confluente . Tres ou quatro
dias depois da sua invasão appareciam as hemorrhagias pul-
monares, uterinas, nasaes, oculares e as entorragias. Pela su ·
perficie do corpo saiam manchas negras de formas irregu-
lares desde o tamanho de um grão de milho ao de um ovo de
pombo. As hemorragias recrudesciam quando a molestia chega-
va a seu termo, isto quasi sempre do quarto ao oitavo dia.
Dos innumeros casos de tão terrivel enfermidade não consta
que houvesse nenhum feliz..
"O transporte dos cadaveres era feito pelos proprios reti-
rantes pela insignificante quantia de 1000 por adulto e 500
reis pelo parvulo. No começo da epidemia havia muita re-
pugnancia do povo em transportar as victimas da bexiga. Esta

[ 1 R. Theophilo - obra citada, pag. 271 .


[2 ] R. Theophilo -obra citada, pag. 273.
692

repugnancia foi desapparecendo a ponto dos infelizes indi-


gentes instarem com os commissarios para lhes darem prefe-
rencia no transporte dos mortos. Só a miseria podia fazer com
que um homem se sujeitasse a conduzir o cadaver podre de
um bexigoso a uma distancia de 5 kilom. por 500 reis.
"Havia outro serviço altamente repugnante a que esses
desgraçades se sujeitavam pela diaria de 18000 e mesada, era
o de enterramentos.
A turma empregada em dar sepultura aos varioiosos no
cemiterio da Lagoa funda compunha -se de 40 homens. Antes
das 6 h. da manhã principiava o serviço que as vezes se pro-
longava até depois de 6 h. da tarde. Graças a bôa ordem no
trabalho tão pequeno numero de individuos podia durante o
dia deitar por terra grandes arvores, distocar o terreno, lim-
pal - o e depois abrir profundas valas onde se enterravam 10
corpos . Este serviço era perfeito. No fim do dia tinha a turma
sepultado 500, 600 e as vezes 700 cadaveres !
"No dia 10 de Novembro haviam fallecido de variola
1004 pessoas ! Ficaram insepultos até o dia seguinte 238 cada-
veres !
O unico estabelecimento em que a peste não penetrou foi
a companhia de aprendizes marinheiros , não obstante os en-
terros dos bexigosos passarem a sua frente e a poucos metros
de distancia, devido a vacinação previa.
A efficacia da vacina ainda se patenteou molhormente no
facto de ter sido rara a pessoa de certa ordem, residente
na capital, attingida pelo mal.
Não tenho informações officiaes dos outros pontos da
provincia, com excepção do Cariry.
Trechos do relatorio do medico encarregade do serviço de
variolosos. incerto na folha presidencial de 1º de Julho de
1880, dizem o bastante para se poder avaliar o que foi esta
epidemia no interior da provincia.
"Em Março de 1879 começou ella [ variola ] a victimar a
população do Cariry attingindo o maximo em Maio.
"Quando alli cheguei já a epidemia decrescia , mas ainda
permaneciam todas as formas e complicações que denunciam a
693

sua gravidade. Assim observei as tres sub -formas de variola


hemorragica que descreve Pierrellon - a ataxica, a hemorrha-
gica propriamente dita e a typhoide adnamica.
A epidemia nada apresenta de especial, a não ser a maior
frequencia das formas graves, hemorragica e confluente. En-
tre as complicações tornam-se muito frequentes a erupção for-
miculosa e acolite ulcerosa. Tive occasião de observar mio-
cardites, dando lugar a mortes subitas. Em alguns casos de-
ram-se desordens viceraes. A terminação fatal resultou quasi
sempre da infecção purulenta e de desordens nervosas. ] ]
Pode-se calcular que a variola não victimou menos de
50.000 pessoas nos 8 a 10 mezes em que grassou ( Setembro de
1878 a Abril 79] , sendo na capital 27-395 e no resto da provin-
cia 22.605 approximadamente .
A tabella seguinte mostra para a Fortaleza a marcha
mensal da grande epidemia :
Variola
Variola

1878 1879 1880


1877 OBITOS
OBITOS OBITOS OBITOS

Janeiro 63 1.637 2.962 2.204 187


Fevereiro 75 2.110 990 176 200
Março 77 3.281 792 107 238
Abril 93 3.889 g) 505 36 234
Maio 92 5.895 369 3 238
Junho 86 5-409 271 190
Julho 75 3.655 234 1 127
Agosto 118 2.273 2 166 94
Setembro 191 c) 1.358 62 156
Outubro 307 d) 1.757 592 ) 112
Novembro al 480 11.065 9.721 146
Dezembro b] 1.008 e) 15.435 i) 14.49 ] 120

Total 2.665 57.764 24.868 6.827 2.5271

[ 1 ] Dr. Antonio Pompeo --Relatorio sobre a variola no Ca-


riry .
a] O nº de retírantes era de 42.931 .
b] Idem, idem era de 83.000.
694

O anno de 1880 foi salubre. Apenas em Agosto appare-


ceram na parochia de Pentecoste febres biliosas de typo inter-
mittente e remittente. ] 1 ]
O de 1881 nao o foi menos. Em Mecejana e Mucuripe, Pa-
catuba, Acarape, Trahiry e Imperatriz, grassaram em fins do
inverno febres palustres. [ 2 ]
Em 1882 deram -se alguns casos de variola que foram

el Havia na capital 27.518 familias com 114.404 pessoas, ad-


venticias, devendo ser a população total de 160.000 hab
d) On de emigrantes era de 108.656 e o de variolosos
segundo o Sr. R. Theophilo, era de 49.000 !
e) O Sr. Rodolpho Theophilo na sua historia da secca de
1877 a 80 diz que o Ceará perdeu em 1878 por mortes
118.927 e pela emigração 54.875 ou o total de 173.802 pes-
soas !
f) A 10 de Fevereiro havia 21.973 familias com 80.036 pes-
sôas nos 10 abarracamentos da Fortaleza.
9) A 15 de Abril existiam 17.486 retirantes na capital.
On de indigentes na provincia era de 322.140 , sendo
no interior 192,140, a margem da estrada de ferro 50.000
na capital 80.000.
i ] Este numero comprehende somente os interramento
feitos officialmente nos cemiterios. Innumeros cadavere
eram sepultados ocultamente, como diz o Sr. R. Theo
philo, em sua obra sobre a secca , nos suburbios da cida
de, dentro dos mattos ; outros encontrados em complet
putrefacção eram queimados. No Alto da Pimentà fo
encontrado dentro de uma palhoça um montão de cada
veres em tal estado de decomposição que, não sendo pos
sivel transportal-o , foi queimado. Na visinhança do
abarracamentos da Pacatuba e Alto da Pimenta era ta
e viciamento da atmosphera que não só impedia o
fransito publico, como attrahia grande quantidade de
urubús .

(1) Conselheiro A. A. Padaa Fleury -Relatorio com que pas-


sou a administração ao Conselheiro Leão Velloso a 1 de Abril de
1881, pag: 47.
( 2 ) Senador Leão Velloso - Falla de 1º de Julho de 1881 e
Relatorio ao passar a administração em 26 de Dezembro de 1881, am-
bos a pag. 13-
695

promptamente isolados, na estrada de Mecejana e de Soure ( 1 ) ;


grassaram febres palustres na Fortalesa. Acarahú, Acarape,
Arronches, Imperatriz , Mecejana, Araripe, Pacatuba, Trahiry. [2)
Cascavel, Aquiraz. [3]
Em Dezembro de 1882 e Janeiro de 1883 deram-se alguns
casos fataes [ tres ] de variola na Fortaleza. de tripulantes vindos
do Maranhão.
Em Janeiro de 1883 a variola manifestou-se no Acarahú,
contagiando algumas pessoas por ter um vaccinador se servi-
do de pus varioloso na vaccinação. ( 4 ] O estado sanitario de
1884 foi regular.
O de 1885 foi perturbado pela epidemia de febres palustres
que grassaram na capital, e provados de Vasantes e Canafistula.
Cascavel, Aquiraz, Acarape e Soure. Por tal forma se generali-
saram essas febres que somente ellas caracterisam a constitui-
ção medica dominante, segundo se exprime o presidente Sin-
val (5)
A febre amarella atacou alguns extrangeiros e nacionaes
não aclimados.
Em 1886 continuaram a reinar as mesmas febres. "O beri-
beri, diz o presidente Calmon, que se tem tornado indemico
em algumas provincias do norte, tinha tambem se desenvol-
vido entre nós, sendo sempre grave quando acommette a indi-
viduos esgotados e em convalescencia. [6 ]

(1) Dr. Torquato Mendes Vianna- Relatorio com que passou


a administração ao Dr. Sancho de Barros Pimentel a 22 de Março de
1882, pag. 18.
[ 2] Dr. Sancho de B. Pimentel -Falla na abertura da as-
sembléa provincial a 4 de Julho de 1882, pag. 3.
(3 ] Dr. Sancho de B. Pimentel - Relatorio com que passou a
administração ao 2º vice-presidente a 31 de Outubro de 1882, pag. 13.
[4 ) Barão de Guajará -Relatorio ao passar a administração
da provincia ao 2º vice-presidente, pag. 13 .
(5) Dr. Sinval Odorico de Moura -Falla ao abrir a assem-
blèa provincial a 2 de Julho de 1885, pag. 4.
(6) Dezembargador Miguel Calmon du Pin Almeida- Re-
latorio com que passou a administração ao Dezembargador 1. da C.
Barradas a 9 de Abril de 1886, pag. 24,
696

No seu relatorio dá o Dezembargador Calmon o movi-


mento das enfermarias do Hospital da S. Casa de Misericordia :

Existen-

Sahidos

Mortali
Falleci-

Restan-
Entra-

dade
dos

dos
cla

tes
Annos Total

1981 173 2.293 2.466 200 2.082 184 8.1 %


1882 184 1.807 1.991 183 1.648 160 9.1
1883 160 1.501 1.661 143 1.424 94 8.6 "
1884 94 1.580 1.674 173 1.343 158 10.3 .
1885 158 1.985 2.143 226 1.769 148 10.5 "

Em Setembro de 1886 dizia o presidente Barradas a as-


sembléa "que não tinha sido muito benigno o estado geral da
salubridade da provincia."
"Na capital manifastaram-se casos esporadicos de febres
palustres e biliosas. que se reprodusiram com mais ou menos
intensidade em outros pontos da provincia, particularmente
na povoação de Monte-mór e Quixeramobim, onde fez muitas
vietimas ."
As molestias que mais avultam no obituario da capital ,
segundo informação do Inspector da hygiene, são a tuberculo-
se pulmonar e larygea e o beri - beri .

Em 1887 foi regular o estado sanitario. Na Fortaleza, Cas-


cavel, Ipú, Lavras, Aquiraz, e Palma manifestaram -se febres
iatermittentes, remittentes, paludosas. como sempre acontece
na estação invernosa , mas a excepção de Quixeramobim, onde
ellas fizeram algumas victimas, nos outros pontos não se re-
vistiram de symptomas graves. Na Fortaleza occorreram 2
casos fataes de febres amarella em tripulantes de um vapor
inglez, e de variola em uma passageira de portos na-
cionaes . [1 )
Em começo de 1888 externava - se favoravelmen
te o presi-
dente Eneas Torreão quanto a salubridade da provincia . Ape-

(1 ) Dr, Enéas A. Torreão - Fala dirigida a assembléa pro-


vincial a 1 de Julho pe 1867, pag. 4

1
697

nas nas cidades de Barbalha e Crato manifestaram se febrǝs


de caracter epidemico, fazendo algumas victimas.
Na Fortaleza deram-se alguns casos de variola [ 1 ]
As informações relativas aos annos de 1889 , 1890 faltam;
as de 89 pelo inesperado falecimento do presidente Caio Prado
e pela mudança do regimen governamental, as de 90 pela desor-
ganisação do serviço administrativo .

Em 1891 manifestou - se a febre biliosa em Quixeramobim


e Caio Prado. Na Fortaleza appareceu em Março a variola sem
produzir estragos . [2 ]
Em 1892 foi organisado o serviço de hygiene, e pelo rela-
torio do respectivo inspector, Dr Marinho de Andrade , vê- se
que a variola grassou em 1891 e nos ultimos mezes de 1892,
com alguma intensidade, em Maranguape. Em Pacatuba de-
ram -se alguns casos.
O anno de 1893 foi relativamente bom.
Em 1894 a grippe manifestou-se sob a forma esporadica na
Fortaleza e em alguns outros lugares, alem das febres palus-
tres [ 3]
Em 1895 o estado sanitario foi satisfactorio. "A tuberculo-
se pulmonar tem -se desenvolvido" de modo assustador - diz o
Inspector da saúde, [ 4] mas, é preciso notar que a mor parte
dos obitos desta molestia é de individuos que vêm de outros
Estados. Os obitos pela malaria, crescidos, têm a mesma causa.
Em Setembro manifestou-se a variola na villa de Ara-
coyaba, tendo ficado extincta em Novembro. Neste mez ap-
pareceram alguns casos nos soldados do 2º batalhão, dos
quaes 2 fataes.

[ 1 ] Dr. Enéas Torreão - Relatorio com que passou a adminis-


tração ao Dr. Caio Prado a 21 de Abril de 1888.
(2) General José Clarindo de Queirez - Mensagem lida pe-
rante o Congresso a 1 de Outubro de 1891.
[3 ] Dr. João Marinho de Andrade -Relatorio da Inspectoria
da Hygiene Publica em Maio de 1895, pg. 141 .
(4) Ibid de 1896, pag. 50.
698

Em 1896 reinaram febres palustres e molestias do appa-


relho pulmonar. A mortalidade das crianças foi consideravel,
devida, sobretudo , a gastro interite. De Julho á Junho deram- se
alguns casos de variola, importada do Recife.
"O anno de 1897 começou pouco benigno para a saúde
dos habitantes da cidade da Fortaleza .

"Desde Janeiro que o obituario se tem elevado a um coef-


ficiente que impressionou a todos " . [ 1 ]
Reinou o sarampo em larga escala, assim como as pertur-
ções gastro intestinaes, devido a inferioridade da alimentação,
que o inspector da hygiene chama pessima.
Os typos dominantes nas febres palustres forão as inter-
mittentes. nevralgicas e remittentes simples, e somente um ou
outro caso com a forma perniciosa, biliosa ou gastrica.
A grippe atacou de preferencia as crianças .
A variola desenvolveu- se em escala crescente , tendo se
dado até 31 de Maio 19 casos, contra 9 em todo o anno de 1896.
Em 1897 entraram para o lazareto 168 pessoas, das quaes falle-
ceram 20. alem de 7 cadaveres que foram inhumados em ou-
tras pontos diversos da cidade.
Em Pacatuba , Guayuba e Baturité deram- se tambem ai-
guns casos de variola , que se não propagou.
Ao relativo estado lizongeiro de salubridade, desde
Maio de 97 a Abril de 1898, attribue o inspector da saúde
publica a escassez de chuvas. [ 2 ) Na cifra geral da mortalida-
de dos 12 mezes [ 1440 obitos) notei, diz elle, dous numeros ele-
vados, tratando -se de duas molestias que considero hoje per-
feitamente evitaveis--a tuberculose e o impaludismo.
"O no de obitos causados pela tuberculose foi de 120 e
o de impaludismo 163. Quanto a tuberculose o seu desenvol-
vimento tem sido sempre crescente, concorrendo para isto tal-

[ 1 ] Dr. José Lino da Justa- Relatorio ao Secretario do in-


terior em 21 de Maio de 1897, pag. 76.
[2 ) Dr. José Lino da Justa -Relat. ao Secretario do Interior
em Maio de 1898, pag. 81.
699

vez a immigração de doentes procedentes de todos os pontos


do paiz que vêm procurar alivio na amenidade do nosso
clima, e a falta de cuidado e de isolamento hygienico necessario ,
que é verdadeiramente nenhum ."
Quanto ao paludismo attribuio o medico da hygiene aos
pantanos existentes em alguns pontos da cidade, fócos, no seu
pensar, de miasmas paludosos, e a atmosphera viciada do
ambiente com exhalações impuras que procedem do sub- solo
humido e carregado de materias vegeto mineraes . [ 1 ]
A respeito da frequencia das lezões do apparelho circu-
latorio na Fortaloza, pensa o Dr. J. Lino, no relatorio citado,
ser devida ao abuso das bebidas alcoolicas e a disseminação da
syphiles.
A secca ou o verão prolongado de 1893 foi relativamente
saudavel, diz o medico da saúde publica . [ 2 ] Apenas houve
recrudescencia na variola que já grassava desde 1897 .
A alimentação tornou -se má desde o ultimo semestre
de 98 , devido a magreza do gado e a escassez de verduras,
fructos e hortalices.
"Em condições semelhantes, pondera o Dr. J. Lino ( 1 ) não
podia deixar de soffrer toda a população da capital. Enfra-
quecidos assim os centros de resistencia da economia ani-
mal, accentuada deste modo a miseria physiologica de uma
populaçãa inteira, facil é comprehender como se achou ella
em condições de receptividade vis - a-vis dos agentes morbidos
que existem no ar e no solo de toda a parte, maxime de ci-
dades, como a da Fortaleza onde faltam as bases de um ver-
dadeiro saneamento.
"As chuvas excessivas caídas em Fevereiro, Março e
Abril de 1899, após uma seccura extraordinaria do solo, aqueci-
do por 18 mezes de verão, a constancia dos ventos N. N.
saturados de humidades ] e a deficiente e má alimentação,

[ 1 ] Terei em outro lugar de me referir a esta e a outras


opiniões, consoantes entre os nossos hygienistas para explicar
certas endemias.
(2 ) Dr. José Lino da Justa -Relatorio ao Secretario do inte-
rior em Maio de 1839.
700

além de outras causas. muito contribuio de modo evidente e


poderoso para aggravar as condições hygienicas da capital
no primeiro trimestre de 1899.
"Na linha geral do obituario, tomon lugar saliente as mo-
lestias do apparelho digestivo(gastro interite, diarrhea, disenteria].
Predominou ainda uma vez o numero elevado da mortalidade
entre creanças, pois de Janeiro a Abril falleceram 608.
As febres palustres fizeram grande nº de victimas, mas a
molestia que assolou de maneira generalisada ou quasi epide-
mica foi a influenza, sob as tres formas, pulmonar. gastrica e
nevralgica.
"Em fins de Fevereiro, posso affirmar ( Dr. José Lino ] sem
exagero que não houve casa na Fortaleza em que não tivesse
um ou dous habitantes, pelos manos, accommettidos de grippe,
pagando não pequeno tributo á morte os dous extremos da
vida--a velhice e a infancia !
No interior do Estado prapagou - se a influenza e a febrə
palustre.
Campre observar que o augmento do obituario neste anno ,
alem das causas apontadas, teve como alimentador a popu-
lação adventicia, que de Janeiro em diante agglomerou -se nos
arrabaldes da cidade, sem abrigo, nem conforto algum.
A tuberculose tomou ainda maior incremento.
A variola seguio marcha decrescente de Maio a Agosto
de 98 , recrudesceo de Setembro a Dezembro de 98, e Janeiro e
Fevereiro de 99, baixando em seguida.
Em 1898 entraram para o lazareto 152 variolosos dos
quaes falleceram 26 ; em 1899 até fim de Abril 82, dos quaes
falleceram 13.
Nos primeiros mezes de 1899 a cifra mortuaria augmentou
na capital, descrescendo de Maio em diante.
No interior do Estado a salubridade foi precaria ; reina-
ram febres perniciosas. epidemicamente em Maranguape, Bar-
balha , Bôa Viagem e Pará -curú.
A variola recrudesceo no ultimo trimestre. Em Maio exis-
tiam 8 variolosos no lazareto, de Maio a Julho entraram 16
atacados, em Agosto 59, Setembro 135, Outubro 117 , Novem-
bro 81 , Dezembro 63, dando o total de 479 ; destes falle-
ceram 55.
701

De Janeiro a Abril de 1900 foram atacadas 72 pessoas, das


quaes falleceram 14.
No interior do Estado a variola estendeo-se a pontos di-
versos, como Porangaba, Maranguape, Baturité, S. Pompeo,
fasendo porém poucas victimas . ( 1)
Na capital foram vacinadas 2.027 pessoas.
No quadro geral do obituario, diz o medico da saúde pu-
blica ( 2 ) , salienta- se na capital o nº de victimas produzido
pela tuberculose, impaludismo e lesões cardiacas. Num total de
1267 obitos aquellas tres entidades morbidas entraram com
a cifra de 430 , isto é, mais de um terço da mortalidade geral,
tocando a tubercolose 150 victimas, impaludismo 175, lesões
cardiacas 111 .

"A tuberculose vai augmentando no Ceará de anno a


anno, sendo isto devido não só a vinda de muitos doentes
de fóra, como por falta de isolamento Quanto ao impaludismo,
o nº sempre crescente de victimas, explica-se pela importa-
ção de grande quantidade de doentes procedentes das regiões
do norte.
Referindo-se ao anno de 1900, diz o presidente do Estado .
Dr. Pedro Borges) na sua mensagem ao Congresso [ 3 ) : "O es-
tado sanitario resentio-se profundamente das circumstancias
excepcionaes da calamidade que affligio o Estado, produzin-
do grande alteração na benignidade do clima. Molestias de
caracter grave elevaram de modo sensivel a cifra do obituario.
A variola que já grassava, recrudesceu ; febres de fundo pa-
ludoso em suas multiplas variedades, o sarampo, as perturba-
ções gastricas intestinaes nas suas infinitas modalidades, vie-
ram juntar-se ao cortejo funebre das infermidades inherentes
a uma quadra de profunda miseria, em que generos dete-
riorados ou de má qualidade, constituindo quasi a exclusiva
alimentação dos desvalidos, aggravaram as já pessimas condi-
ções hygienicas da população.

(1 e 2 ] Dr. José Lino da Justa-- Relatorio ao Secretario do


interior, em Maio de 1900, pag. 130.
(3 ) Dr. P. Borges -Mensagem ao Congresso estadual, em Ju-
lho de 1901, pag. 57.
702

"As infermidades gastro intestinaes concorreram mais


do que outras para a elevação da mortalidade ; assim entre
347 obitos no mez de Agosto- 108 pertenciam as molestias
daquelle apparelho.
A variola começou a declinar em Setembro, tendo pas-
sado da capital para Iguatú, Morada Nova , Benjamim Constant
S. Francisco, Missão Velha, Cratheús, Ipú, Sobral, Granja.
Quixeramobim , Saboeiro, Jardim, Senador Pompeu, Baturité,
Vazantes, Quixadá, Crato e outros lugares.
Quanto ao anno de 1901 , diziam, não só o presidente na
sua mensagem ( 1 ), como o medico da saúde publica [ 2 ] , ser a
mais lizongeira a salubridade publica.. Observa este, po-
rém , que de 1900 para 1901 se tem dado casos do adenite in-
feciosa [ peste bubonica. segundo alguns cuja etiologia escapa
as mais severas pesquizas .
A variola manifestou- se em alguns lugares no interior, bem
como febres de mau caracter, especialmente em Granja, Sobral ,
Baturite, S. Matheus . Quixadá . Viçosa, Vazantes, Independen-
eia, Senador Pompea, Marang uape. Lavras, Aracaty, S. Qui-
teria, Camocim e Lages.
Em 1902 continuaram a reinar as febres de mau caracter,
acompanhadas de adenites graves [ peste bubonica ? ] Na For-
taleza deram -se alguns casos fataes. em Maranguape foram
acommettidas 50 pessoas, das quaes falleceram 31 .
Anno de 1903. Quer na mensagem presidencial, quer no
relatorio do secretario do interior, nenhuma raferencia se
encontra sobre a salubridade publica neste auno. Este silencio
faz suppor que ella correo sem accidentes dignos de menção.
Em 1904 o estado sanitario foi regular.
Em Maio deu-se 1 caso fatal de variola hemorrhagica em
pessoa vinda de Pernambuco. Em Outubro desembarcaram
accommetttidos de variola 3 passageiros .

(1) Dr Pedro A. Borges-- Mensagem as congresso em Julho


de 1902, pag. 16.
12 ] Dr José Pinto Nogueira - Relatorio a 5 de Junho de
1502, pag. 17.
703

O anno de 1905 começou sob máus auspicios. A dysenteria


desenvolveo -se com o caracter epidemice , victimando de No-
vembro a Abril 369 pessoas, das quaes 228 por dysenteria, 1
por diarrhéa, 74 por interite, 46 por gastro interite, 20 por
interocolite.
Felizmente, diz o medico director da hygiene ( 1 ] , declinou
um pouco a sua malignidade, tornando-se intensa , porem de
forma benigna, e, se cresceu o numero de obitos foi devido a
falta de cuidados e meios proprios para o tratamento das
classes pobres .
A variola não se manifestou sob a forma epidemica : fo-
ram accommettidas 7 pessoas, das quaes falleceram 2.
A anno de 1906 foi regular, deram-se apenas casos de
febre amarella em Quixadá e na Fortaleza.
Deste historico, que pude collig r dos documentos offi-
ciaes, vê-se que a salubridade do Ceará desmente por com-
pleto as opiniões dos hygienistas europeus quanto a acclimação
das regiões equatoriaes ou intertropicaes, que elles con-
demnam por supporem-na de excessiva mortalidade, levados
por informações incompletas.
Os dados escassos, que se encontram sobre a constituição
medica do Estado ou mesmo da Fortaleza, não permittem ge-
neralisações systematicas. Nos relatorios do Inspector da
hygiene publica apenas se nos deparam rapidas referencias aos
morbus dominantes, quasi descompanha das de dados estatis-
ticos .
Na falta desses elementos de estudo seria mister conhe-
cer intimamente o regime de vida popular, em todo o Ceará,
para se poder tirar illações sobre a sua salubridade. Este
conhecimento difficil, só por si, torna -se ainda maior pela ca-
rencia de observações pessoaes em tão vasta zona.
E' , porém, conhecida a sobriedade da população, especial-
mente a do interior, e só quem o percorreo, como o autor
deste trabalho, em epocas de escassez, ordinariamente na es-
tação estival, pode conhecer o seu grao de resistencia a pe-
nuria alimenticia. Nos melhores annos, a chamada fartura, do

[1 ] Dr. Meton da F. Alencar- Relatorio apresentado ae


Secretario do interior , pag. 86.
704

inverno, é mais nominal do que real ; consiste na producção


de certos cereaes. [ feijão, milho e em alguns sitios o arroz ],
que são guardados para os mezes de verão, cereaes que ordina-
riamente mal resistem ao armazenamento por muito tempo
pelo ataque de insectos e de outros animaes damninhos. A esta
base de alimentação junte -se o uzo de alguma caça, de car-
ne de gados miudos, de cafe e rapaduras, e raramente nos
povoados, da carne de vacca, de pão de trigo e as vezes de
fractas e verduras, e ter-se-á a nota da ração alimenticia do
cearense.
Com este regimem , as molestias que procedem de exces-
siva ingestão carnivora e de outros principios azotados, a que
se attribuem defeitos de nutrição, retardamento na assimila-
ção (Bouchard), são raras no Ceará, constituem o triste apa-
gio da classe abastada. A obesidade é quasi desconhecida, a
gotta e a gravella biliaria ou renal, raras, o arthretismo nas de-
mais modalidades menos frequente do que nas regiões tem-
peradas.
Daqui um typo estructural distincto, com caracteres pro-
prios, que se vai distanciando particularmente do sulista bra-
sileiro, a proporção que o elemento alienigena, europeo, se
mescla a este : emquanto no Ceará, o clima e o meio con-
tinuam a sua acção adaptativa da raça existente.
O typo estructural do cearense denuncia a natureza so-
bria de seu habital ; nervoso, de olhos expressivos e em
geral cavos , de rosto alongado, mais triangular do que oval ,
de faces descarnadas e precocemente ragadas, de mento fino,
nariz afilado, cor morena baça, membros delgados. pouca cor-
pulencia, elle traduz no physico, como no moral, o aspecto ru-
de do ambiente em que vive.
A secura do ar imprimia-lhe vivacidade, certa inergia
de animo, aventuroso, com um quer que seja do yankee.
Desde que ás condições habituaes de seccura sucede a hu-
midade no periodo das chuvas abundantes, alagadiças, tran-
smudam-se os habitos e necessidades do cearense enfraquecen-
do-lhe a resistencia vital aos agentes morbidos.
O quadro seguinte comprova para cidade da Fortaleza o
gráo de resistencia organica dos seus habitantes em cada uma
das duas estações do anno a pluviosa de Janeiro a Junho, e
a secca de Julho a Dezembro :
705

OBITOS CHUVAS POR MILLIM.


AZ NOS
1º semes- 2º semes- Tetal 1 semes, 2º semes Total
tre tre tre tre

1881 551 516 1.065 1.176 133 1.419


1882 48% 431 914 1.072 111 1.183
1883 505 464 969 1.424 83 1.507
1884 662 370 1.030 1.050 99 1.149
1885 655 369 1.024 1.106 91 1.197
1886 566 376 942 1.329 87 1.416
1887 515 406 921 1.293 80 1.373
Total 3.936 2.932 6.868 8.456 684 9.140
Média 562,2 418,8 981 1.208 97,7 1 305,7
1893 852 567 1.418 1.345 117 1.462
1894 774 688 1.462 [ 1 ] 2.644 162 2 806
1895 909 632 1.541 ( 2 ) 1.938 176 2.114
1896 798 759 1.557 ( 3 ) 1.558 133 1.691
1897 1.126 656 1.782 (4 ) 1.653 110 1.763
1898 761 723 1.484 (5 ) 471 78 549
1899 1.237 612 1.849 [ 6 ] 2.461 306 2.767
1890 1.332 1.395 104 1.499
Total 6.457 4.637 12.426 13.465 1.186 14.651
Média 922,4 662.4 1.553.2 1.863,1 148,2 1.831,3
1901 942 406 1.348 1.309 226 1.535
1902 540 414 954 690 161 851
1903 595 450 1.045 768 44 812
1904 758 433 1.191 913 219 1.132
1995 1.056 605 1.661 [7) 974 159 1.133
1906 750 456 1.206 1.527 48 1.575
Total 4.641 2.764 7.405 6.281 857 7.138
Média 773,5 460 1.233,5 1.046,8 142,81.189,6
Média
semestral 751.7 516.6 1.268.3
1878 22.221 35.543 57.734(a) 475 40 515
1879 5.889 933 6.822 (a) 515 71 586
1880 1.287 606 1.893 (b) 1.286 133 1.419
1888 859 623 1.483 cl 651 54 705
1889 1.727 775 2.502 (d] 711 67 778
1892 1.344 1.021 91 1.112
1900 713 1.303 2.016 [ e] 271 295 566
Total 34.783

a) A elevação da mortalidade em 1878 e 79 foi devida a be-


706

Comparando -se nos annos regulares a mortalidade por


semestres com a respectiva quantidade de chuvas, nas mesmas
əstações, verifica -se o parallelismo entre a maior mortalidade
e a maior quantidade de chuvas no primeiro semestre ; nos
seccos, a mortalidade segue quasi a mesma marcha em relação
as duas estações, apresentando, porém, quanto ao total do

xiga e a agglomeração de emigrantes na capital em con-


sequencia da secca.
b) Ainda no primeiro semestre era grande o numero de emi-
grantes na Fortaleza.
c ] Si bem que relativa mente regular este anno houve affluxo da
população adventicia na Fortaleza pela irregularidade da
estação e facilidade de auxilios publicos prestados aos fa-
mintos.
d) Agglomeração de emigrantes na Fortaleza pelas causas
apontadas.
e] Agglomeração de indigentes na capital, variola, tuberculo-
se, paludismo.
1 ] Epidemia de grippe .
2] A tuberculose concorreo para este augmento, devido a pes-
soas vindas de fóra.
3 ] A tuberculose e as affecções do apparelho gastro intesti-
nal nas creanças explicam este accrescimo .
4 ) O sarampo, gastro interite, grippe- sobretudo nas crean-
ças, variola, paludismo explicam igualmente este accres-
cimo.
5) Se bem que secco, o anno anterior havia sido farto. Os
mezes de verão foram muito seccos, o gado emagreceu,
a creação soffreu muito.
6) As consequencias da secca do anno anterior se fizeram sentir
no primeiro semestre deste. A alimentação má, de gado ema
grecido, a escasez do leite concorreu para avolumar as
molestias do apparelho gastro intestinal e as da primeira
infancia. As chuvas copiosas que se seguiram, apanhando
organismos enfraquecidos, propagaram a grippe e outras
molestias A variola tambem concorreu para o augmento
da mortalidade.
7 A epidemia do dysenteria para aqui trazida do Recife avo-
lumou consideravelmente o obituario .
707

anno a proporção inversa, isto é, tanto maior nº de obitos


quanto foi menor a quantidade de chuvas cahidas.

Em ambos os casos , a causa predominante do aug mento


da mortalidade é a mesma : deriva do enfraquecimento organi-
co, quer sob a influencia das mudanças brus cas de temperatura
e da humidade excessiva na epoca pluviosa, quer por alimen-
ção impropria , escassa , as vezes adulterada nos annos seccos .
Naquella epoca a prolificação de germens pethogenos encon-
tra nos mosquitos e outros vectores meios faceis de con-
taminação , nesta [secc ] talvez as Correntes aereas com
suas nuvens de poeira, o menor acceio pessoal pela escassez
d'agua, á irritabilidade superficial da pélle ent retida pelo ca-
lor, poeira e raras ablusões, favorecem o incremento das mo .
lestias infecciosas, sobre tudo a vario la, sara mpão, etc,
Na quadra pluviosa, dous factores capitaes parecem coo
perar para o augmento da insalubridade : 19 as aguas em-
poçadas, verdadeiros viveiras de anopheles e de estegomias,
agentes transmissores da malaria e da febre amarella nas suas
diversas modalidades : mudanças de te mperatura, neblinas, etc.
causas e resfriamento que deprimem a resistencia organica ;
9a os desvios da alimentação , en tão mais abundante e va-
riada, após os mezes de sobrieda de, senão da relativa absti.
nencia. Ordinariamente o de Março em deante, quando ás
temperaturas excessivas s uccedem copiosas precipitações plu-
viaes, que a saúde public a se altera , peiora, e toca a maior
depressão de Março a Maio ].
Nos annos regulares, a me dia dcs obitos em Janeiro e Fe
vereiro regula 104,37 por me z, contra 128,1 de Março a Maio '
em Junho e Julho declina para 95,5 ; e de Agosto a Dezembro
cae a 81,23 . Entre o semestre secco e os tres mezes chuvo-
sos a differença é de 81,23 para 128,1 - equivalente a 50 %
para mais em relação a estes 3 mezes. Englobadamente o nº de
obitos nestes mezes ( de 1881 a 1890 , com exclusão dos annos
seccos de 88, 89 , 900 e os epidemicos de 92, 97 e 99) orça
por 7.688 contra 8.123 nos cinco mezes de Agosto a De.
zembro.

Os algarismos da seguinte tabella demonstram melhor-


mente esta proporcionalidade :
708

Janeiro Morço a Total de Agosto a Total


. ANNOS Fevereiro Maio Janeiro a Junho
Julho Dezembro do anno
Maio

1881 165 285 450 211 406 1.067


1882 155 226 381 190 342 913
.1883 151 283 434 157 378 967
1884 171 402 573 j48 311 1.032
1885 167 371 538 175 305 1.618
1886 178 310 488 140 314 942
1887 153 279 432 146 343 921
1890 274 393 667 1.332
1891 218 414 632 224
1893 315 430 745 208 466 1.419
1884 256 415 671 233 558 1.462
1895 260 511 771 244 1.541
1896 231 431 662 270 625 1.557
1898 219 425 644 228 612 1.484
1901 383 459 842 167 339 1.348
1902 168 300 468 156 330 954
1903 189 344 533 133 379 1.045
1904 200 457 657 185 349 1.191
1905 190 752 942 243 476 1.661
1906 222 441 663 171 372 1.206

Total 4.265 7.948 12.213 3.629 6.905 22.747


Média
mensal 106.62 132.4 122,13 95,5 81,2 91,43
Média
por grupo 213.25 397,4 610,65 191 406,1 1.197,26

Em verdade devem ser ainda excluidos deste quadro al-


guns annos, cuja letalidade foi accrescida por epidemias e
agglomerções da população adventicia na Fortaleza.
"Sendo de 60.000 habitantes a populaaão provavel desta
capital, sua mortalidade mal attinge a 20 por 1.000 habi-
tantes . (1 )

(1 ) Quando occupar- me da população , mostrarei desen-


volvidamente os factos sobre os quaes apoio o computo da po-
pulação da cidade da Fortaleza
Sendo a media do movimento dos 23 annos (de 1881 a
709

A estatistica nosologica do Estado está por fazer. Os pou-


cos e incompletos dados relativos a capital. apenas merecem
fé quanto ao registro de obitos, por serem os interramentos
serviço monopolisado e irem ter os cadaveres ao unico cimi-
terio existente .
Os attestados de obitos são passados, pela terça parte.
segundo estou informado, por medicos que apenas ouvem 08
interessados, pessoas da familia do fallecido , ques lhe vem so-
licitar este serviço . Raramente procedem ao exame cadaverico
A classificação dos obitos por molestias é em parte conjectu-
ral, e só por approximação dá idéa da verdade. Ainda assim,
os relatorios dos medicos do serviço hygiencico são falhos,
pobres em informações deste genero. O que nelles pude en-
contrar vai consignado na seguinte tabella :

1906 ) egual a 1.611.3 a que cumpre accrescentar os nati-


mortos, os não baptisados, os baptisados, mas não registados,
etc., (ou × 10 % sobre este total ] será de 1772 o nº dos nasci-
mentos, ou cerca de 30 nascimentos por 1.000 habitantes.
A mortalidade foi de 22.747 pessoas em 19 annos, alguns
dos quaes visitados por epidemias : o que dá para cada anno
1.197.26 obitos . Os annos de 1904 e 1906 approximaram- se
desta media ( 1191 e 1206) . Levando em conta porem a media
dos ultimos 6 annos ( 1901 a 1906 ], dos quaes o de 1905 foi as-
saltado por febres de mau caracter (peste bubonica ), aqnelles
algarismos attingirão apenas a 1.067,5 [ 6.405 ÷ 6 ] ou 18,88
obitos por 1.000 hab.
na
Obitos
cidade
da
Fortaleza
por
molestias
do
1900
1902
1901-2
1894
1892
1895
1899b)( 1905-6
1904
1906e)(
digestivo.
Apparelho 422
227
204
265
523
524 236 350 318 288
respiratorio
66 270
303
310a]
( 243
270
334 258 274 194 281
circulatorio
66 144
109
153 277 313 199 185 245 134 249
...
nervoso 308 77 86 4 28 35 25 48
Sarampo
crianças
de
e 162 302 309 87 ? 63 53 100 99 50
Paludismo 220 222
206 278 153 217 102 73 56 77
Beri
beri
...- 15 6 7 12 1 4
Febre
amarella
………. 4
Variola
.... 2 58 14 4
.....
molestias
Outras 214
281
175
315
743 32c)( 136
)[
93d
138 209
Total
... 1.874
2.016
1.849
1.541
1.462 990 1.014
1.191 920 1.206
quaes
Abril
Maio
1901
1902
tuberculose
pulmonar De
.-
Dos
201 de á[a(bc])[
710

infecciosa
bobonica
quaes
adenite
bubonica 11
Dos
die)[?].
infecciosa[
de
Maio30
De
-[
Abril
1905
1906
deá
e.
711

Desta classificação, um tanto vaga, imprecisa , das moles-


tias reinantes mais mortiferas, infere -se que as do apparelho
gastro intestinal entram com 23,8 % para o total dos obitos.as do
apparelho respiratorio com 19,5 % , as do circulatorio com 14,3 %-
o paludismo com 11.4 % , as molestias da primeira infancia
com 10 %.
Morrem, portanto, na Fortaleza 55,9 pessoas de molestias
do apparelho gastro-intestinal por 10.000 habitantes ou a media
de 335,4 por anno ; 45,6 do apparelho respiratorio [ 273,7 por
anno] ; 26,6 de paludismo ( 160,4 por anno ] : 33,4 do apparelho
circulatorio ou 200,8 por anno.
MOLESTIAS DO APPARELHO RESPIRATORIO .- Se estes dados
merecessem credito, a Fortaleza ficaria collocada em um dos
primeiros lugares na lista das cidades mais mortiferas pela tu-
berculose ou molestias do apparelho respiratorio. Um ligeiro
confronto entre ella e outras , assoladas por este morbus, bas-
taria para evidencial - o .
Por 10.000 habitantes morrem da tuberculose nas seguin-
es cidades : Havre 45,55 , Fortaleza 40, Triestre 40,67 , Ha-
vana 39,23, Paris 38,47, Athenas 38.26, S. Petersburgo 36, Bu-
dapeste 35.94 , Lyão 34,35. Lisboa 31,92 , Vienna 31,44, Gene-
bra 31,36, Breslau 31,26, Berne 29,87, Dublim 29,68 , Tukio 29,54,
S. Paulo 28.81 , Moscou 28,73, Madrid 28,53 , Praga 26,51,
Odessa 22,29, Munich 25.77, Genova 24,81 , Milão 23,43 , New-
York 22,18 , Varsovia 23,05 , Dresde 20.78 , Berlim 20,75 , Leipzig
19,68, Buenos - Ayres 19.63, Montevidéo 19,16, Roma 17,65 ,
Turim 17,23. Napoles 17,09, Glasgow 17,01 , Londres 16,69 ,
Chicago 15,31 , Copenhague 15,06,.
Felizmente a verdade não se acha naquella classificação,
se bem que a tuberculose, pela desidia individual e por igno-
rancia popular, tenha ultimamente ganho grande extensão na
cidade da Fortaleza e em alguns lugares do interior, escolhidos
como sanatorio para ella, como por exemplo, Quixadá.
E' sabido que os climas seccos são desfavoraveis a tuber-
culose, a ponto do Dr. Chassaniol ter sustentado em sua
these [ 1 ] que certos climas tropicaes tinham o privilegio da

1 ) Chassaniol--De l'influence des climats chauds et de la na-


vigation sur la phtisie pulmonaire. 1858.
712

immunidade contra a tisica. Thevenot notara a mesma cousa.


e Dutroulau apoia esta opinião . ( 1 ]

O Dr. G. Treille, estudando no seu livro sobre hygiere co-


lonial esta questão, nota beneficio desta immunidade
no Senegal, e accrescenta que ella se estende a notavel parte do,
continente africano. Confessa, porém , não ser bem conhecida a
causa disto. "Por mal elucidadas rasões que a sciencia ainda
não aprofundou , certos climas parciaes da zona intertropical
qualquer que seja a sua elevação, parecem gozar, ao menos
actualmente, de real immunidade quanto a tuberculose.
"E' certo que esta condição está em relação directa com o
estado organico da atmosphera e provavelmente não se trata
senão de algumas das suas qualidades , calor, seccura relativa,
pureza entretida por ventilação regular. Mas convem levar
em conta das localidades a densidade da população, todas as
condições, em uma palavra, susceptiveis de alterar a constitui-
çao primitivamente salubre da atmosphera". ( 2)
E' o que está acontecendo no Ceará pelas causas assigna-
ladas, a despeito dos repetidos avisos dados pelos encarrega-
dos do serviço hygienico aos poderes publicos, nos relatorios

(1 ) Dutroulau- Maladies des europ. dans les pays chauds, 1868


pag. 16.
Cumpre assegurar a raridade por toda a parte, nos tro-
picos, das molestias agudas do pulmão e dos bronchios, como
effeito directo do clima ou como doença primitiva.
Dutrouleau - Traité des maladies dans les prays chauds, Pa-
ris 1861 , pag, 102 .
O Saint- Vel, que escreveo posteriormente e clinicou por
muitos annos nas Antilhas, diz que "l'influence des climats
brulants n'agit que sur la tuberculisation du poumon, organe
auquel elle limite le dévelopement de la granulation. Elle s'op-
pose aux autres manifestations tuberculoses" .

Traité des maladies des regions intertropicales- Paris 1898,


pag. 360 .
(2) Compare - se com o Dr. Georges Treille Principes
d'hygiene coloniale—Paris, 1899, pag. 35.
713

annuaes que lhes apresentam. Nada, porém, se ha eito para


atalhar a propagação deste morbus, porventura, o mais mor-
tifero nos nucloos da grande população .
Alem da tuberculose, as molestias do apparelho respira-
rio em geral victimam crescido numero de pessoas na Forta-
leza. A que attribuir este phenomeno ? As pneumonias, raras
na estação secca , tomam certa gravidade depois das primeiras
chuvas ; resolvendo -se as mais das vezes pelo restabeleci-
mento do enfermo, deixando- o, porém, com o organismo enfra-
quecido, sujeito a virulencia e pullulação do bacillo de Koch.
Esta coincidencia entre o desenvolvimento do paludismo
e as molestias bronchicas será meramente accidental ou estas
affecções terão por principal causa a infecção do hematozoairo
de Laveran ?
Na recente obra sobre o Diagnostico e semiologia das mo-
lestias tropicaes ( 1 ) os professores Wurtz e Thiroux dizem
que ha acerca das manifestações broncho -pulmonares do
paludisino as mesmas divergencias de opinião que a respeito
das manifestações cardiacas desta infecção ; mas consideram-
nas como provocadas directamente pelo organismo pathogeno,
emquanto outros não veem nellas senão complicações da in-
fecção palustre .
"Os accessos da febre intermittente, a ffirmam elles, deter-
minam uma predisposição as congestões viceraes e principalmen -
te dos pulmões".
Os factos que se prendem a esta questão não estão ainda
bem estudado. Laveran verificou differentes vezes em cache-
ticos palustres, atacados de pneumonia aguda, não haver ele-
mentos parasitarios no sangue dos mesmos durante a pneumo-
nia. Acha se frequentemente ao contrario pneumococos na ex-
pectoração dos impaludados, atacados de pneumonia.
Grisselle, no seu Tratado de pneumonia emitte a idéa de que
"certas pneumonias se podem desenvolver sob a inflencia da
causa especifica que é a febre intermittente. A pneumonia,
diz elle, pode tornar-se uma das formas da febre perniciosa.'

[1 ] Wurtz etc., Thiroux- Obra cit. pag. 299.


71

Beaunis explicando o mechanismo da funcção pulmonar


expressa-se nestes termos : "Quando o ar é dilatado pelo calor,
inspiramol- o mais rarefeito, ou por outra, a quantidade de oxi-
genio que inspiramos é maior. Cada inspiração faz entrar nos
pulmões cerca de um meio litro de ar e 0,104 do oxigenio a
temperatura de zero. A +400 este meio litro não contem
senão 0,0915 de oxigenio. Effectivamente, o coefficiente da
dilatação do ar é de 0,00367, e 100 volumes de ara 6 occu-
pam 114 volumes a + 40 ° . Quando a temperatura eleva-se
de modo notavel somos obrigados para compensar essa dila .
tação de ar inspirado e readquirir a quantidade de oxigenio
necessario a augmentar o numero e a profundeza das respira-
ções. [ 1]
Este augmento de inspirações não favorecerá a penetração,
dos germens irritantes e, em seguida, a dos agentes pathogenos,
que em taes casos encontrariam o organismo predisposto a sua
cultura ?
Differenças de temperaturas pelas quedas pluviaes, maior
humidade atmospherica, pullulação exagerada nesta quadra
do anno de micro -organismos teluricos, mudança no regimen
alimenticio, irritação das mucosas da aeração, são outros tantos
factores concurrentes ao augmento destas affecções .
MOLESTIAS DO APPARELHO DIGESTIVO - Ha evidentemen .
te erro na classificação dos obitos por affecções deste appare-
lho no quadro nosographico da Fortaleza, a que me venho re-
ferindo .
Por muito que ellas predominem na pathologia tropical e
occupem, como pondera Saint Vel [ 2 ], papel muito mais im-
portante do que as affecções thoraxicas, a proporcionalidade
de quasi 56 obitos por 10.000 habitantes é evidentemente exa-
gerada.

[1 ) Lacassagne-Précis d'hygiene privée et sociale, Paris 1908,


pag. 70.
(2) Beaunis-- Nouveaux éléments de physiologie humaine, Pa-
ris 1876 , pag. 423.
(3) Saint- Vel --- Précis des maladies des regions tropicales
Paris -1865 - pag. 375.
715

As affecções intestinaes são endemicas na zona torrida,


como observa o mesmo autor. Agudas ou chronicas, inflama-
torias ou catharraes, ellas atacam em todas as idades, sobretudo
na infancia e na velhice.
E tal é a importancia do apparelho gastro intestinal relati-
vamente a aclimação nesta zona, que os hygienistas em geral
propendem em consideral- o como o principal agente da adapta-
ção climaterica. Wurtz e Thiroux externam o parecer de que
"a aclimação em região tropical é funcção do estomago e seus
annexos. " E acrescentam : Não existem, verdadeiramente, "do-
enças exoticas do estomago. mas se pode considerar o tubo
digestivo como uma das vias de infecção mais communs nesta
região.
"O alimentos excitantes, tomados muitas vezes para com-
bater a fadiga devida ao excessivo calor, o abuso dos amar-
gos, as bebidas geladas, o alcool, os condimentos usados para
combater a falta de apetite, determinam no estomago e no in-
testino perturbações secretorias, e em seguida a dispepsia".' [ 1]
Essas causas, que poderão ser invocadas em relação ao
europeo, não me parecem bastante especificas quando se trata
do indigena. No Ceará, por exemplo, poucos usam de amargos,
de bebidas geladas, mesmo do alcool, e são as mulheres e cre-
anças que pagam maior tributo a dysenteria.
Patrick Manson [ 2 } diz que "a proporção que se approxima
do equador a dysenteria tende a tornar- se mais commum, e
em regra geral mais grave. Como a malaria , prosegue o mesmo
autor, ella é endemica em certas localidades onde se mostra
sob a forma esporadica e algumas vezes sob a de epidemias
locaes limitadas. Como a malaria parece ter predilecções pelos
logares baixos e humidos."
Quanto a causa deste morbus, Manson confessa que, posto
em muitos casos a natureza especifica da molestia não seja du-
vidosa, o agente ou o germen especifico não foi indicado com
certeza, Grande numero de bacterias foram incriminadas - o

(1) Wurtz e Thiroux ―― Maladies tropicales, Paris 1905


pag. 352,
[ 2] Pratick Manson - The diseases of tropical climates, cap. ,
XX .
716

bacillus coli communis, um bacillus dysinteriæ, o staphylococus au-


reus e o S. albus, etc. Numa forma de dysenteria avançou se
que o agente pathogeno era a Amaeba coli. Até agora a especi-
fiquidade de qualquer un desses organismos, bacterias ou pro-
tozoarios , está longe de ser demonstrada. ( 1 ]
H. de Brun [ 2 ] diz tambem que as opiniões ainda não se
acordaram quanto ao germen pathogeno da dysenteria. Para
uns ella seria produzida por um nematode, para outros por um
protozoairo [ amiba do colon ], e finalmente para outros por uma
schizomiceta [ bacteria ] . Brun pensa que a anguillula estercoral
[nematode ], assignalada por Normand e Gervais em 1876, é se-
cundaria , e não existe em todos os casos de dysenteria, porque
sobre 244 doentes, Breton não a encontrou senão 20 vezes. [ 3 ]
Quanto a amiba do colon [ amœba coli ] , descripta por Loesch em
1873, e achada por Kartulis ( de Alexandria ) em 500 casos nas
fézes e em autopsias de dysintericos, oppõe-se as observações
de Massintin [de Kiew ] que a observou tambem em 4 casos de
dyarrhéa mucosa . A amaba coli, portanto, não tem uma acção
especifica. O bacillo descoberto em 1888 por Chantemesse
e Widal foi encontrado nas fezes dysentericas, nas paredes do
intestino grosso, nos ganglios mesentericos, e no baço. Seja
qual fôr o germen productor da molestia, Brun admitte que o
CALOR é um factor importante na sua virulencia, o que explica
o seu maximo de frequencia na estação quente, quer nos paizes
temperados, como a França, quer nos tropicaes.
Os trabalhos de Brun e Patrick Manson são anteriores a
1904, quando as observações microbiaticas desta enfermidade
não autorisavam a formar opinião segura sobre a pathogenia
dysenterica.
Actualmente sabe- se que existem duas dysenterias : a epi-
demica, causada por um microbio ( bacillo de Chantemesse, Shi-
ga, Flexner, etc. ), e a amibia ou tropical, sendo esta frequente-
mente, nos tropicos, a causa de abcessos do figado. "Não con-
vem considerar esta distincção como absoluta, ponderam Wurtz

[ 1 ] Patrick Manson -obra cit. - cap. XX.


(2 ) H. de Brun -Maladies des pays chauds- Paris - vol. II ,
pag. 6.
( 3) Ibid. pag. 13.
717

e Thiroux ( 1 ) porque a dysenteria epidemica ou bacillar, como


observaram medicos inglezes na India, encontra- se frequente-
mente nos paizes quentes concorrentemente com a forma amibia,
algumas vezes coexistindo na mesma pessoa. O termo dysenteria
tropical, que se presta a ambiguidade, deveria desapparecer."
Em todo o caso não se pode recusar sua origem micro-
biatica. (2 )
Existe ordinariamente no intestino, em estado normal ou
pathologico,grande quantidade de amibas de differentes especies,
das quaes a mais commum é a Amaba coli. Segundo Schaudinn ,
que publicou trabalho completissimo sobre a amiba pathogena
da dysenteria, esta amiba (A coli de Loesch ) não tem acção al-
guma especifica na dysenteria. E' uma variedade de amiba
visinha, vista por Jürgens, que lhe deu, pela acção desorgani-
sante sobre os tecidos, o nome de Entamoeba histolytica, que é
pathogena nesta affecção, e só se encontra na dysenteria tropi-
cal. Aquella ( a coli), muito espalhada, vive no intestiuo normal
sem ser pathogena, e Schaudinn encontrou- a 260 vezes em 385
observações de fézes. A Ent. histolytica foi apenas encontrada
pelo mesmo investigador em 12 casos de dysenteria tro
pical. (3 )

( 1 ) Wurtz e Thiroux - Diagnostique et séméiologie des maladies


tropicales -Paris - 1905 - pag. 336.
[2 ] Os microbios pertencem ao reino animal ou ao vegetal :
entre os animaes destinguem- se 1º os rhizopodos, 2º os spozoairos,
3º os infusorios ; entre os vegetaes - 1º os mofos, 2º as levaduras,
3 as bacterias.
Aos animaes (rhizopodos] pertencem as amibas. Aos spozoai-
ros, de cujas divisões fazem parte as coccidias, se prendem os he-
matozoairos do paludismo. No seu desenvolvimento passam por
uma serie de aspectos differentes em hospedes diversos .
[3 ] As principaes differenças entre as duas amibas são :
na Ent. coli, cujo ectoplasma ( a) é francamente refringente, pouco
distincto em consequencia das suas grandes dimensões, as
formas kysticas observam-se facilmente. Ao contrario, a amiba
dysenterica [ Ent. histoly. ] possue um ectoplasma muito nitido e
mais refringente do que o endoplasma (b ), Esta amiba pode,
graças a sua viscosidade, insinuar - se entre as cellulas epitheliaes
ou as fibras da camada muscular, o que é vedado a amiba não
pathogena pela molesa dos seus pseudopodes. O nucleo da Ent.
718

A dysenteria bacillar caracterisa se anatomicamente pela


necrose da coagulação da mucosa intestinal, que se acha in-
filtrada de numerosos bacillos, que não apparecem na sub-
mucosa engrossada ( Flexner ] : clinicamente -por sua evolução
rapida e pela grande raridade dos abcessos do figado, mesino
nos paizes quentes . [ 1 ]
Seja como for, o tubo digestivo é o paraiso des microbios :
cada milimetro cubico de materias. delle, contem 50.000 no
estomago, 30.000 no duodeno, 100.000 no intestino, 30.000 no
intestino grosso. O nº de microbios repartidos por todo o tubo
digestivo é de 411 bilhões , e diariamente são eliminados 12 a
40 bilhões pelas fezes . (2 )
A mór parte delles são beneficos. Os chamados saprophy-
tas intervem nos phenomenos de fermentação e de putrefação,
cujo resultado final é fazer voltar as substancias organicas 20
estado de combinações chimicas simples. Estes microbios des-
empenham importante papel na vida da materia . " São quasi,
como ensina Duclaux, os unicos agentes da hygiene do globo ;
fazem desapparecer os cadaveres de tudo o que viveu , pro-
tegem os vivos contra os mortos ... são os agentes indispensa-
veis a manutenção da vida."
Do que fica dito parece que a pullulação microbiatica in-
testinal opera-se mais rapida e morbosamente no Ceará do
que em outros lugares, por causas pouco estudadas, senão
desconhecidas.
No relatorio do Dr. Meton de Alencar, apresentado em
1905 ao secretario do interior, lê - se que nos mezes de Janeiro a
Abril deste anno desenvolvera- se epidemicamente a dysenteria,
trazendo o espirito publico alarmado. Falleceram nos 4 mezes
369 pessôas, na sua maioria creanças. Aquelle profissional ob-

histol. é excentrico, mal differenciado do endoplasma, homoge-


neo, pouco refrigente : as formas kysticas do parasita são dif-
ficeis de se observar por suas fracas dimensões - 3 a 7 million.
a) Chama-se ectoplasma a parte peripherica do protoplas-
ma, que não contem granulações e tem aspecto mais refrigente .
b) O endoplasma é a parte central de protoplasma, quasi
sempre granulosa, e que encerra o nucleo .
(1 ) Wurtz e Thiroux - Obra cit. , pag. 416.
(2) E. Boinet -Les doctrines medicales pag. 154.

1
719

serva que a epidemia declinara um pouco de malignidade, tor-


nando-se intensa, de forma benigna : e accrescenta que o
n? de obitos foi maior devido a falta de cuidado e de meios
proprios para o tratamento da classe pobre.
Que a impropriedade da alimentação contribue em muito
para augmentar o enfraquecimento organico, não resta a menor
duvida, mas que explique só por si essas exarcebações de
virulencia, é o que se deveria estudar cuidadosamente. Em rela-
ção a mortalidade infantil, causada em nove decimos pelas gas-
tro interites, parece não haver duvida quanto a sua causa deter-
minante a impropriedade da alimentação" e particularmente
a dos feculentos, farinaceos, a primeira infancia, quando os seus
succos digestivos [ a ptyalina ] ou não existem ou são tão escas-
sos que não permittem a digestão de taes alimentos.
Não creio que o calor exerça acção preponderante e ca-
pital no desenvolvimento das molestias deste apparelho . Se a
depressão causada pelo augmento da temperatura traz a pre-
guiça estomacal, não está provado que por isto diminuam os
succos digestivos . E' mais provavel que a menor resistencia or-
ganica ás infecções intestinaes seja causada pela alimentação,
já em adiantado processo de decomposição , especialmente a
animal : e que, como tal offereça favoravel cultura aos microbios
pathogenos no apparelho gastro intestinal.
PALUDISMO [ 1 ] -As febres palustres não grassam na For-
taleza senão em dous ou tres pontos, na epoca pluvia! ao lon-

(1 ) A causa directa do paludismo é um protozoairo da clas-


se dos Sporosoairos, da ordem dos Hemamabedes, o qual, vivendo
como parasita, tem por hospede habitual o mosquito e por hos-
pedes intermediarios o homem e talvez tambem outros verte-
brados.
O hematozoairo está adaptado não só a vida no corpo de seu
hospede, mas ainda a passagem de um hospede a outro, em vis-
ta de assegurar a continuidade da especie. Apresenta pois, em
relação ao homem , duas phases distinctas, uma intracorporal,
outra extra-corporal.
A observação clinica permitte affirmar que existe uma ter-
ceira -a phase latente. Cada especie de bematozoairo tem a sua
vida de uma duração particular, [ 24.48,62 horas ] : e uma hora
ou duas antes dos paroxysmos do accesso intermittente o pa-
rasita apparece sob a forma de um disco polido, de contornos
nitidos, occupando área mais ou menos extensa no interior de
720

go dos riachos da Jacarecanga , do Pagehú, nos baixios do Bem-


fica e Tauhape, e na Prainha.
Ordinariamente desapparecem com a evaporação dos pan-
tanos destes sitios, e só persistem todo o anno quando o
inverno foi prolongado e copioso. a ponto das aguas estagna- 1
das resistirem a acção evaporante des ventos raios solares.
isto aconte raramente.
A mortalidade por esta causa - 26,6 por 10.000 habitantes -
é talvez avolumada em 50 % ou mais por impaludados de volta
do Amazonas ou de outros Estados.
Deve-se levar em conta na classificação desta modalidade
morbida os erros de diagnostico. Os mestres da sciencia medica
confessam (Wurtz e Thiroux ) ( 1 ), que de todas as molestias dos
paizes quentes não ha diagnostico mais importante e muitas ve-
zes mais difficil do que o do paludismo, tão grande é a sua fre-
quencia e tão numerosas e variadas as formas clinicas que po-
dem revistir.
Si bem que as suas differentes modalidades estejam classifi-
cadas, em muitos casos, o accesso de forma typica, tal como é
descripta classicamente falha ou apresenta- se modificado. Quasi
todos os autores adoptaram a divisão de Laveran de
Febre intermittente ;
66 continua (comprehendendo a remittente)

um certo numero de globulos vermelhos. Nestes diseos polidos


estão disseminadas particulas de um pigmento negro intenso ou
avermelhado —a
- a melanina. As particulas de pigmente dissemi-
nadas reunem - se em pequenos grupos, dispostos algumas vezes
em raios. Por sua vez estes grupos em seguida a um ou dous
largos acervos mais ou menos centraes. em torno dos quaes o
protoplasma polido do hematozoairo grupa -se em minguados
seguementos, adquirem finalmente a forma arredondada e ap-
parecem como espherulas bem nitidas são os esporos. O
globulo vermelho, que os encerra, rompe- se, e os esporos, dos
quaes nenhum contem pigmento, separam-se e tornam- se livres
no liquido sanguineo, ao mesmo tempo que o acervo ou os acer-
vos de melanina. Os phagocytas absorvem então rapidamente
a melanina e um grande numero de esporos. Alguns destes es-
poros se escapam e se ligam a outros globulos vermelhos que
conseguem penetrar por um processo ainda desconhecido . - Pa-
trick Manson--Obra citada, cap. - malaria.
[1 ] Wurzt e Thiroux-- obra cit. , pag. 79.
721

Accesso pernicioso :
* de forma larvada :
Anemia e cachexia palustres.
A FEBRE INTERMITTENTE foi dividida em tres typos distin-
ctos : tercă, quartă e quotidiana , segundo o apparecimento dos
accessos, que no pensar dos medicos italianos são produzidos
por hematozoairos differentes.
A FEBRE CONTINUA marca de alguma forma a introducção
no organismo do Hamamaba, que poderá mais tarde manifestar
a sua presença por accessos intermittentes ( Wurtz) .
O ACCESSO PERNICIOSO ataca de preferencia os já impa-
ludados, especialmente os cacheticos, salvo quando toma a
forma de accesso typhoide.
AS FEBRES LARVADAS comprehendem affecções que nada
têm de palustre, com expecção das que se manifestam por ne-
vralgias desacompanhadas de hyperthermia e que se reprodu-
zem a intervallos, e são influenciadas pelo quinino.
CACHEXIA PALUSTRE- é a resultante dos accessos re.
petidos .
Quaes os typos palustres que predominam na mortalidade
da Fortaleza, quaes o de sua morbidade ?
As informações officiaes, defeituosas no geral, são incom-
pletas e quasi omissas neste particular.
Sem insistir nas causas especificas que mais concorrem
para avolumar o quadro nosologico cearense, examinarei rapi-
damente as causas geraes, das quaes aquellas [ especificas] de-
pendem mediata ou immediatamente.
O SOLO. A formação geologica do Ceará já ficou esboçada
na pag. 53 deste trabalho, e a composição do litoral descripta
em mais de uma parte do mesmo.
A cidade da Fortaleza ( 1 ) assenta sobre uma planicie are
nosa, em grande parte formada pelo deposito de areias trasidas
pelos ventos e impellidas pela acção mecanica das marés para
terra. E' como que o prolongamento da duna costeira, apenas
nivelada por agentes differentes. Por baixo da camada arenosa
e em alguns sitios, como Aldeiota, Bemfica, Tauape, etc. , emer-

[ 1 ] Veja as pags. 83 a 86 deste trabalho .


722

gindo a superficie, existe ontra de argila compacta, talvez de


formação terciaria.
A topographia da cidade, em geral plana, apresenta inclina
ções mais ou menos pronunciadas para os dous riachos a W.
[Jacarecanga) e a L. [ Pagehú) , bem como ao S. [ Tauhape, Trin-
dade, Cocó ]. Estes riachos formam drenos naturaes, que nos
annos de chuvas regulares dariam facil vazão as aguas pluvi-
aes se impecilios creados pela mão do homem não tivessem
modificado os seus cursos .
A cidade não possue serviço especial de esgotto para essas
aguas, e como o empedramento rudimentar de suas ruas não
obedece a um nivelamento regular, que facilite pelas sargetas
dos mesmos o escoamento prompto do excesso de chuvas, for-
mam - se, ordinariamente no mez de Abril , quando estas são re-
petidas e copiosas, aqui e alli , pequenos alagados , de pouca
duração, graças a evaporação solar, mas com a precisa para
alimentar alguns fócos de mosquitos.
A permeabilidade do solo é de tal natureza que poucas ho-
ras depois de chuvas de 10 a 20 millim. raros vestigios existem
dellas.
Os ventos geraes e a intensidade da luz, laborando de con-
tinuo pelas largas ruas da cidade [de 13 metros ], promovem
melhor de que outros agentes o seu saneamento.
As influencias telluricas, tão malsinadas pela velha hygiene,
são aqui relativamente fracas. senão infensas ao desenvolvi-
mento dos germens pathogenos.
O MIASMA já não é a entidade atterradora de outrora, e
quando a topographia do solo permitte facilmente a intervenção
humana na sua drenagem, desapparece por completo a acção
malefica daquelle .
Justamente pondera o Dr. Guiraud [ 1 ] que "as recentes
descobertas no modo de transmissão das febres palustres e do
papel que nella representam os mosquitos, tornaram caducas
parte dessas vistas especulativas, e mostraram que se certos so-
los, certas regiões se transformam em focos malaricos, é por se
converterem quasi exclusivamente, pela collecção de aguas esta-

[ 1 ] Dr. Guiraud -Manuel pratique d'hygiene, Paris - 1904.


pag.....
723

gnadas que nella se formam, no habitat predilecto das larvas


de mosquitos".
Não se deve, portanto, incriminar o solo por conservar es-
sas aguas superficiaes, mas tão somente ao homem, que por
inprevidencia não as sabe aproveitar, deixando que as servi-
das e as inserviveis ahi permaneçam para prolificação dos mi-
cro-organismos pathogenos.
O que por hora se sabe da biologia e dos habitos dos agen-
tes especificos não favorece a acção directa do solo como factor
de epidemia ou como vehiculo dos germens. Os microbios, pelo
menos o do grupo dos AEROBIOS, a que pertencem o bacillo ty-
phico e o vibrio cholerico, desapparecem a uma fraca profundi-
dade, embora seja a terra o melhor meio à sua prolificação. (1)
E se bem que o solo seja o maior receptaculo dos microbios,
como diz o Dr. Boinet [ 2 ], e constitua um excellente meio de
cultura no qual se conservam e se multiplicam, protegendo -os
contra a acção destruidora da luz e pondo os anaerobios ao abri-
go do ar, a partir de 1.50 cent. de profundidade elles raream e
desapparecem.
Ao lado desta cultura superficial de alguns microbios pa-
thogenos opera - se outra, muito mais prolifica, de saprophitas
beneficos, que dão combate a aquelles, reduzindo- os a propor-
ções insignificantes.
O solo não é somente um reservatorio no qual se accumu-
lam os residuos organicos, é tambem um laboratorio onde elles
se transformam e se resolvem nos seus elementos simples, azo-
to, acido carbonico e agoa [ 3] (Dr. Guiraud).
De modo geral pode dizer se que se, sob o ponto de vista
da biologia geral, o ar é um laboratorio de construcção, o solo é
um laboratorio de destruição [ Duclaux].
A terra faz o papel de filtro natural, a mór parte dos mi-
erokios são detidos na sua passagem atravez della . Miquel ve-
rificou que a agua de esgoto, que contem na media 23 milhões
de bacterias, não conta senão 1.600 depois de haver passado pe-

(1 ) Dr. Guirand -obra cit., pag. 35.


(2 ) Dr. E. Boinet-- Les doct. medicales, leur erolut. — Paris ,
pag. 15 .
[3] Dr. Guiraud -Manuel pratique d'hygiene - Paris , 1904 ,
pag . 31.
724

los campos de depuração de Gennevilliers . Falks, filtrando atra-


vez de uma camada de areia de 6,60 de espessura uma dilui
ção de sangue carbunculoso, não achou bacteria alguma depois
desta filtração.
Se os micro - organismos são muito abundantes no solo, pa-
recem pertencer a um pequeno numero de especies. Os mais
communs são o Bacillus subtilis [ bacillo do feno ] , o Bacillus ra
mosus, o Bacillus fluorescens liquefaciens e putridus e alguns outros
destes dous ultimos generos. Todos esses micro - organismos são
poderosos agentes da dislocação da molecula organica, cujos
elementos devem repassar ao estado mineral para ficarem aptos
a ser absorvidos pelas raizes dos vegetaes e reentrarem no ey-
elo da vida. Os microbios do solo representam em face da ma-
teria organica um papel analogo ao dos succos digestivos para
com os alimentos. Sob a influencia das diatases segregadas por
elles as substancias proteicas são a principio liquifeitas, pepto-
nisadas, depois transformadas em aminas e em amidos e final-
mente em ammoniaco. [ 1 ]
Ao lado de outros micro- organismos beneficos , elaborado-
res do solo , ha os pathogenos cuja resistencia ou victalidade
tem sido estudada.
Refiro -me ao vibrião septico [bacillo do edema maligno de
Koch), o bacillo tetanico (Nicolaier). São tão abundantes, diz um
hygienista, que basta injectar sobre a pelle de um animal por-
cella minima de terra para provocar habitualmente accidentes
tetanicos ou gangrena gasosa.
"Mas, accrescenta o mesmo autor, todos esses micro - orga-
nismos não dão ao homem nascimento a verdadeiras epidemias
e uma questão muito mais interessante e infelizmente ainda in-
completamente resolvida é a da sorte dos agentes especificos-
bacillo typhico, bacillo cholerico, bacillo tuburculoso, bacillo diptherico,
que são depositados incessantemente no solo com os nosSOS
dejectos ou os nossos cadaveres .
A intensidade da luz e certos agentes meteoricos operam
eomo verdadeiros saneadores do solo [ 2 ] Vejamos o papel da

[ 1 ] Dr. Guiraud- obra cit., pag. 35.


[2] As más qualidades do solo são locnes e tributarias da
vontade humana, a medida que vai crescendo com o progresso
das artes e de sua industria- J. Rochard.
725

ATMOSPHERA. -A influencia da poeira ou dos germens em


suspensão na atmosphera tem sido consideravelmente exagerada,
attribuindo-se- lhe quasi a mesma importancia na transmissão
de molestias epidemicas ou infecciosas que a velha escola sup-
punha existir no ar (mal ar) . Sabe-se, entretanto, que a mór
parte dos germens, especialmente os provenientes dos excretos,
envolvidos numa sorte de ganga mucosa, adherem tão intima-
mente a superficie do sólo que poderosas correntes de vento,
como 0 verificou Flügge, são impotentes para despren-
del - os. [ 1 )
A dessécação, porém, mata taes micro- organismos em tem-
po relativamente breve, sobretudo quando auxiliada por luz in-
tensa, como acontece no Ceará.
Fixando-se nos mais pesados e volumosos elementos das po-
eiras esses micro- organismos volvem facilmente por sua gra
vitação a terra, permanecendo no ar transitoriamente . As con-
dições de transporte dessas poeiras são raramente realisa-
das. [2]
Só podem ser impellidas por potentissimas correntes at-
mosphericas, onde aquelles germens encontram rapidos meios
de destruição, como a dessecação, e se diluem em particulas in-
finitesimas.
Os perigos das inhalações ficam praticamente reduzidos
a zero.
Ha factos, porém, que melhor demonstram essas vistas
theoricas. Curiosa estatistica feita entre as varredores de Ber-
Jim mostrou que só 2 por 100 dentre elles foram affectados das
vias respiratorias (bronchites chronicas, tuberculose ) , proporção
muito inferior a de outras corporações ; e entretanto 70 por 100
destes varredores exerciam esta profissão ha mais de cinco an-
nos, 55 por % ha mais de 10 annos.
A conclusão que um hygienista tira dos dados expostos é
que na atmosphera livre il est certain que données épidémi-
ologiques et données bactériologiques s'accordent à prouver
que les chances d'infection par cette voie sont à peu près
nulles."
O ar não é favoravel a pullulação dos germens, os quaes,

[1 ] Dr. Guiraud - obra citada.


[2 ] Dr. Guiraud - obra cit.
726

sendo pesadissimos para permanecer por muito tempo suspen-


sos, se depositam sobre os objectos, paredes, etc. , onde habitu-
almente se fixam. E' uma noção utilisada pela prophylaxia . São
as poeiras que transformam os microbios. A agua os contem em
maior numero do que o ar ; ella aloja os bacillos da febre ty-
1
phoide e do cholera, mas é pouco favoravel a sua pullulação. ( 1 )
A inculpação como agente morbigeno que se lhe tem attri-
buido é, senão injusta, ao menos exagerada, e porventura injus-
tificavel se quizermos apoial - a en. factos verificados e incon-
testes.
Korosi, o eminente estatistico hungaro, depois de haver
compulsado milhares e milhares de documentos, conclue pela
impossibilidade de tirar delles e desde alguns seculos uma lei
geral sobre as relações entre os phenomenos meteorologicos e a
evolução das epidemias.
Este resultado não deve ser lastimado quanto as conse-
quencias praticas, diz um hygienista [ 2 ], por que a analyse mais
aprofundada dos factos nos leva a restringir cada vez mais a
influencia do clima e das vicissitudes atmosphericas sobre as
quaes nada podemos ; ella nos mostra a um tempo a parte
preponderante que pertence na genese da maioria das moles-
tias ás influencias provindas do proprio homem, considerado
quer como individuo, quer como collectividade, e as influencias
sociaes ; em uma palavra, sobre as quaes exercemos alguma
acção e que podemos modificar ou transformar. (3)

( 1) E. Boinet- Les doctrines medicales, leur évolution - Paris –


1907. pag. 153.
(2 ) Dr. Guiraud -- obra cit., pag. 137.
(3, Dutroulau, aliás observador consciencioso e sagaz, cuja "
obra- Traité des maladies des européens dans les pays chauds, pu-
blicada em 1861 -servio de ponto de partida aos que escreve-
ram depois sobre este assumpto, attribue maxima importan-
cia na insalubridade das regiões quentes por elle estudadas
(Senegal Guyana, Antilhas, Reunião, Taiti ] a natureza do sólo
e aos agentes meteoricos.
As suas observações têm ainda hoje valor, não quanto as
causas assignaladas, mas em relação a successão dos phenome-
nos morbigenos, aos factos compendiados, que se estão a repro-
duzir .
"Pode dizer-se de modo geral, affirma elle (a) , que a ni
727

Os estudos mais recentes sobre climatologia confirmam ple-


namente estas asserções, e destroem os prejuizos, até bem pouco
correntes, acceitos pela velha escola hygienica, da inadaptabili-
de da zona tropical ao europeu.
A pretensa anemia tropical, que era um duende para este
e o lemma constante dos tratados de pathologia dos paizes
quentes [ 1 ], acha- se reduzida as suas justas proporções. A sci-
encia experimental demonstron o nenhum valor das allegações
sobre que a baseavam.
A verdade, que já todos começam a proclamar, é que "nos
paizes quentes, como nas zonas temperadas, é menos do lado
dos meteoros que dos defeitos da hygiene individual e social,
menos das perturbações funccionaes produzidas pelo clima à
physiologia humana que das aberrações do regimen de vida-qué
se devem procurar as causas de alteração da saúde do euro
peo. (2)
A pathologia geral dos tropicos ensina- nos com effeito que
as causas de insalubridade dessas regiões se repartem em duas
classes fundamentaes : a primeira, extremamente reduzida, e
que está, talvez, condemnada a desaparecer, comprehende as
molestias suppostas de origem meteorologica, a anemia tropi-
cal, certas dermatites, um grupo de febres ephemeras sem ca-
racter decisivo, cuja procedencia puramente climatica foi ne-,

vernagem é a estação das epidemias, o outonno a das endemias


o inverno a das molestias esporadicas, a primavera a estação
salubre.
"Naquelles em que as endemias grassam com mais ou me-
nos intensidade, no periodo que se segue as chuvas abundantes
durante o qual o solo está em toda a sua actividade de evapo-
ração, torna - se mais insalubre.
(a) Dutrouleau- Traité des maladies etc., pag. 69.
( 1 ) A anemia tropical, cujo desenvolvimento progressivo
está em relação com as condições da vida do europeu, cria
obstaculo mais seguro, mais inelutavel a migrações das raças
dos climas temperados para os quentes [ Orgéas - La pathologie
des races humaines, etc. - Paris 1836.
Com este autor afinam em geral os escriptores francezes,
cujas obras datem de 1900 para traz.
(2 ) Dr. Georges Treille - Principes d'hygiène coloniale, Paris ,
1899, pag. 2.
728

gada por differentes autores, notoriamente por Mahé [ 1 ], Kel-


soh e Kiener {2 }
A segunda classe comprehende todas as molestias infec-
ciosas, as hepatites, a dysenteria, o paludisme, o cholera, a febre
amarella, as febres biliosas, a febre typhoide, todas as pyrexias
polymorphas dos paizes quentes que se approximam desta, e del-
Ja talvez se derivem, e se comportam em todos os casos como
molestias de causa microbiana dando a nosographia da zona
intertropical um caracter absolutamente especial. [3 ]
Por sua vez, diz outro mestre nestas molestias. --Patrick
Manson.
"Existe apenas duas ou tres affecções, relativamente sem
importancia, que mereçam o nome de doenças dos paizes quen-
tes. Se, porém comprehender-se sob o nome de "doenças tro-
picaes" todas as molestias que se produzem nos tropicos, então
será mister percorrer quasi todo o campo dos estudos medicos ;
porque a mór parte das doenças dos paizes temperados se en-
contram , e quasi nas mesmas circumstancias, sob o clima dos
paizes quentes." (4)
A influencia que em particular se attribue ao calor, como
causa de certas molestias tropicaes, não deve ser considerada
como agente directo, senão como elemento mais favoravel a
pullulação dos germens das mesmas.
E assim o pensa o notavel observador. que se ha consa-
grado ao estudo especial de taes molestias, o Sur. Patrick Man-
son, quando assevera que “não se deve concluir, entretanto , que
uma temperatura elevada seja a causa unica e directa da mor
parte das molestias tropicaes. A constituição physiologica do
corpo humano está adaptada a supportar impunemente grandes
variações atmosphericas. Realmente, ainda que a temperatura
obre como importante factor pathogenico, é raro que ella o faça

[1] Mahé -- Programme de séméiologie, etc. Arch. de med.


etc., 1879 .
[2 ] Kelsch et Kiener -Traité des maladies des pays chauds-
Paris 1889, pag. 339.
[3 ] Dr. G. Treille - obrá citada, pag. 3.
[4] Patrick Manson- Diseases of tropical countries - intro
ducção.
[5 ] P. Manson - obra citada.
729

de um modo directo. Sob os tropicos, accrescenta elle, como nos


climas temperados, entre os europeos, como entre os indigenas,
quasi todas as molestias têm uma origem especifica.
"Na maioria dos casos, os germens morbidos são verda-
deiros parasitas, e por conseguinte, precisam, para assegurar a
continuidade da especie, passar de um para outro hospede. Se
durante esta passagem a temperatura do meio intermediario ,
seja a agua, o ar ou outra qualquer materia, se acha mui alta
ou mui baixa para as necessidades do germen em questão, este
morre e cessa de ser infeccioso . E' o que explica a ausencia nos
tropicos de uma classe de molestias directamente transmissiveis,
cujo typo é a febre escarlatina, e tambem a ausencia nos climas
temperados de outras representadas pelo dengue. No primeiro
caso, durante a curta passagem de um ser humano para outro,
a temperatura elevada é fatal ao germen que o ar transporta :;
no segundo, a temperatura baixa produz effeito semelhante.
"Grande numero de molestias reclamam para se transmit-
tir de individuo a individuo o auxilio de um terceiro hospede .
Assim na molestia produsida pela mosca tsêtsê, o organismo
protozoairo, que é a sua causa directa, é trasido de um animal
para outro nas mandibulas deste insecto" ...
"Existe uma classe de doenças, de intoxicação , que é pro-
dusida por toxinas segregadas por germens cujo habitat é o
solo, a agua ou outro qualquer meio exterior, e na qual a pre-
sença do germen no corpo humaro não é necessaria, comtanto
que a toxina seja nelle introdusida.
"A levadura e sua toxina o alcool, e a molestia que ella pro-
duz -o alcoolismo -são un exemplo familiar. O ergotismo, a pel-
lagra e talvez o lathyrismo pertencem a esta classe e prova-
velmente o beri-beri.
"Enfim , pode- se concluir, e . por minha parte, creio que
existe uma outra serie de condições que influem, ainda que de
modo menos directo, na distribuição das molestias , condições
que são ainda ignoradas dos epidemiologistas, mas que não de-
vem ser negligenciadas na questão . Os germens das molestias,
seus agentes de transmissão e seus hospedes intermediarios, sen-
do seres vivos, estão expostos durante as phases extra corporeas
a ser presos ou pelo menos victimas de outros organismos na
luta pela existencia. O parasita da malaria está ausente de
730

muitos lugares onde apparentemente se acham reunidas todas


as condições favoraveis a sua existencia. Porque não é ahi
achado, mesmo quando foi frequentemente introduzido ? Sup-
punho que, em certos casos, esses germens ou os organismos
que os abrigam são destruidos por inimigos naturaes que os
absorvem ."
"Quanto mais estudamos essas molestias [ tropicaes} menos
o papel da temperatura per se torna- se importante como agente
directo de sua producção, emquanto a influencia da fauna tro-
pical parece mais consideravel."
A cerca da anemia propria dos paizes tropicaes sobre a
qual os hygienistas europeos, que escrevem de longe e por in-
formações incompletas, são elles os primeiros a se contradizer.
O Dr. P. Just Navarre, medico da marinha franceza empenha-
do num livro de hygiene, que escreveo [ 1 ], em demonstrar a in-
possibilidade da aclimatação dos europeos nas regiões tropicaes.
não cessa de repetir por desenas de vezes banaes argumen-
tos contra esta supposta anemia. Citando os autores que estu-
daram a questão, oppõe-lhes objecções sem valor, cuja enunci-
ação traz em si a propria refutação.
O Dr. Maurel escreveo : [2]
"A verdade é que não conhecemos todas as condições da
genése da anemia, e além da diminuição da massa sangui-
néa , da diminuição do nº de hematias, de sua pobresa em he-
moglobina, pode sobrevir accidente nas qualidades ou nas func-
ções dos elementos do sangue que nos dará mais tarde a razão
do facto da anemia tropical. [3]
A hypoglobulia ou anemia é um estado que se encontra
em muitas molestias tropicaes : acreditou- se por muito tempo
que a residencia nos paizes quentes podia crear por si só uma
anemia especial, essencial, idiopathica : a anemia dos paizes
quentes. Admitte-se hoje, de modo geral, que a anemia destes
paizes não é senão a anemia palustre. (4)
Parece haver excepção a esta regra, que aliás é porventu-
- Paris--
[ 1 ] P. Just Navarre- Manuel d'hygiene coloniale
1895 , pag.
[2 ] E. Maurel -Hematimetrie normale etc.
[3] P. Just Navarre- Manuel, etc.. pag. 116.
[4] Wurtz e Thiroux -Diagnostique et semeiologie des maladies
tropicales - Paris, 1905 , pag. 253.
731

ra mais apparente do que real. "As pessoas que habitam os


paizes quentes, diz Laveran, anemisam-se em geral no fim de
algum tempo, quando mesmo escapam ao paludismo." Será esta
anemia causada por desvios no regimen hygienico ?
Os factos parecem autorisar esta hypothese, como conclue
Maurel.
"1 Nos militares que não soffrerão alguma molestia, de-
pois de 32 mezes de residencia em paiz tropical, o numero de
globulos vermelhos augmentou até o quinto anno .
20 Nos creolos brancos o n.º de globulos vermelhos é sen-
sivelmente o mesmo que na Europa.
39 Qualquer que seja a duração da residencia o nº de leu-
cocytas pouco varia : está comprehendido entre 4 e 5000 .
A relação numerica varia entre 12 e 1500 .
"4 A hematimetria comparada não dá differenças apre-
ciaveis no numero e proporção dos elementos figurados nas ra-
ças de côr e nos europeos ou creolos brancos.
Um outro observador- Dr. Marestang [ 1 ] notou em homens
da equipagem de um navio o augmento do nº de hematias, con-
cluindo por assegurar que as influencias climaticas, só por si , são
incapazes de produzir a anemia. (2) E Eijkman, citado por
Navarre, achou no sangue de 15 maláios na Batavia a media de
5.200.000 globulos e de 96,5 a riquesa em hemoglobina. Euro-
peos nos primeiros mezes de residencia apresantaram depois de

[i ] Marestang - Hematimetrie normale de l'européen aux pays


chauds.
[ 2 ] O Dr. Afranio Peixoto, no artigo que publicou no Jornal
do Commercio do Rio de Janeiro de 27 de Outubro de 1907 , sob o
titulo Clima e doenças do Brasil, observa mui judiciosamente :
"Com a facilidade de explicar o que não sabiam, fazendo -o
ás vezes mal, outras maldosamente, os autores europeus inter-
pretaram a differença de pigmento das raças do meio dia-
simples defesa natural contra a luz e o calor solar - como uma
inferioridade sanguinea. Os homens dos tropicos eram mais
morenos ou mais amarellos. como elles diziam, que os homens
alvos e rosados do norte, porque soffriam de uma anemia, cuja
causa devia ser necessariamente tropical.
Era a doença physiologica, se é possivel o absurdo, dos
climas quentes. O europeu, que aqui vinha viver, anemiava -se
tambem .
"Pois bem, não só se veio a explicar com melhor criterio a
differença ethnica de pigmentação, como provar que a anemia
732

3 a 14 mezes uma riquesa em hemoglobina de 96,5 ligeiramente


anormal.
Se a temperatura não exerce por si acção especial morbi-
gena, as demais causas nenhuma importancia terão porque, ef-
fectivamente, o que constitue e diversifica a climatologia da zona
intertropical da temperada é a continuidade de um calor medio
constante, quasi sem alternativas, mas sempre menos intenso
naquella zona do que na ultima, desordenado e acabrunhador
na estação estival, fraco e quasi nullo nas demais. As alternati-
vas climatericas fazem o effeito das duchas escossezas sobre o
organismo humano : obrigam-no a reacções pelo contraste das
temperaturas.
Os conceitos externados pelo Dr. Afranio Peixoto sobre o
Clima e molestias do Brasil [ 1 ] tem inteira applicação ao Ceará.
Traslado- os para aqui por explicarem satisfactoriamente a acção
particular dos climas quentes. e defenderem-no das imputações
molestas e graciosas de certos hygienistas.
"Doenças climaticas foram outr'ora a cholera, a malaria, a
doença do somno : hoje teem uma etiologia conhecida, sem nen-
huma subordinação ao clima ; invadem terras sob todas as lati-

tropical, invocada anteriormente, não existia sequer. Os estudos


de Maurel, Morestang, Scheube, Van der Scheer. Eijkman, Glo-
gner, Plehn, nas Antilhas, Nova Caledonia, nas Indias, em Java,
na Costa da Africa, atribuem, sem discrepancia, o mesmo valor
globular ao habitante das zonas quentes que ao europeu. E isto
não de oitiva ; após contagens no hematimetro.
"A mesma verificação foi no Brasil feita por diversos, es-
pecialmente pelos Drs. Ezequiel Dias (Rio de Janeiro), e Oswal-
do Barbosa (Bahia), com rigor de technica. Do que se apurou ,
ve - se que um homem são no Brasil tem 5.542.000 globulos ver-
melnos e 7.889 leucocytos por millimetro cubico de sangue e 74
por cento de hemoglobina, numeros iguaes ás médias dos me-
lhores observadores europeus, Ehrlich, Hayem, etc.
:
"Que a longevidade continúa a existir, como outr'oura, é
prova o recenseamento ultimo, de 1906. que na Capital do paiz
encontrou 178 centenarios, o que representa 0,22 por 1.000 da
população total, numero ainda não observado em cidade ou Es-
tado algum."
[ 1 ] Dr. Afranio Peixoto - 0 Clima e as doenças no Brasil, in-
serto no Jornal do Commercio do Rio de Janeiro, de 27 de Outu-
bro de 1907.
733

tudes : nas zonas de um mesmo clima, teem recuado diante da-


quellas cuja hygiene as tem sabido preservar.
"E essa verdadade tão simples e de tão grandes conse-
quencias para conquista territorial e economica do mundo
ahi está, de que não ha doenças climaticas, e portanto não ha
doenças tropicaes-se impõe, substituindo velhas crenças por
essa outra, scientifica pela observação e pela experiencia : exis-
tem apenas doenças evitareis, contra as quaes a hygiene tem meios se-
guros de defesa e reacção.
"A saúde no globo é independente da fatalidade das latitu
des : é uma conquista do esforço e do conhecimento humano.
"De facto, se se passarem em revista as doenças classifica-
das nos tratados europeus como tropicaes, verificar- se-ha que a
maior parte dellas são pequenas curiosidades de tal ou tal região
e não communs á mesma latitude, e que as restantes não são
peculiares exclusivamente ás zonas tropicaes, excedem - lhe os
parallelos, e ás vezes são mais divulgadas, exactamente, fóra
dos tropicos .
"A verruga peruana é uma especialidade até agora cir-
cumscripta ao Perú, como é a doença do somno ao continente
africano. Por que hão de chamar tropicaes, fazendo crer erra-
damente que ellas são geraes sob os tropicos ?
A ankylostomiase é mais commum e mais perigosa nas
minas de carvão da Westphalia, da Belgica , do norte da França,
como a malaria mais tenaz e mais mortifera na Italia que em
qualquer região tropical. Porque se hão de chamar tropicaes,
fazendo crer erradamente que são proprias destas zonas, e ex-
clusivas ou preferentes ?
"Quando com criterio se venha a julgar da pathologia dos
paizes quentes, se ha de averiguar sim que se ahi condições de
calor e humidade facilitam umas tantas infecções, muitas outras
são, porém, por essas mesmas condições, difficultadas ou impe-
didas. Se ha de dizer então que se a dysenteria e a febre ama-
rella podem ser mais temiveis nestas regiões, a diphteria e a
febre typhoide o são immensamente mais nos paizes tempera-
dos. O que não se póde, e se não deve, em bôa sciencia, esque-
cer, é que todas, umas e outras, não são doenças fataes, de lati-
tude ou de raça, mas doenças evitaveis que cumpre combater e
debellar.
"Não é, pois, uma questão de palavras aquella que propo-
734

sitalmente se discute aqui . E' principalmente uma questão ma-


gna de hygiene. A Europa nos fez crer que existiam fatalidades
pathogenicas de clima e contemporizou nesta ordem de idéas
com a dysenteria do Egypto, com a cholera na India, com a
peste na Indo - China, como faz com a febre typhica em França,
com a variola em Inglaterra, com a malaria na Italia : cumpre-
nos a nós, que repudiamos esse principio, evitar, pelos meios
idoneos, essas e todas as infecções que nos affligem e nos pos-
sam ameaçar .
“E não é outro o caminho que vamos seguindo, emancipa-
dos da tutella européa. Os nossos serviços de hygiene estão or-
ganizados. Com a prophylaxia especifica e a desinfecção vamos
exterminando o paludismo, como fizemos á febre amarella, as
doenças infectaosas commuuns, como tizemos ás doenças epide-
micas importadas .
"A contraprova está na observação dos povos chegados
mais cedo á civilização occidental ou daquelles que a desidia
das metropoles européas tem mantido, com pequena differença,
na semi - barbaria primitiva. Nas mesmas latitudes tem um ob-
tuario mais elevado , e, dentro de seus proprios numeros, mais
perigoso, que o daquelles, como nós, que souberam, com esfor-
ço, crear rapidamente um saneamento comparavel ao dos paizes
mais adiantados.
735

Coefficiente mortuario do Rio de Janeiro e outras cidades


brasileiras comparado com o de varias intertropicaes :

HABI- COEFFI
CIDADES OBITOS CIENTE POR
TANTES 1.000 HAB.

Madras 509.346 29.887 58.7


Guayaquil.. 50.000 2.877 57.5
Panamá 19.877 1.136 57.3
Bombaim 982.000 47.762 48.6
Mexico.. 344.721 16.721 48.5
Lima 131.499 4.563 34.7
Cairo . 650.371 22.817 34.6
Calcutá 935.289 32.131 34.4
Caracas . 86.965 2.945 33.8
Guatemala 72.102 2.274 31.5
Alexandria . 362.750 10.926 30.1
S. da Costa Rica . 105.823 2.816 26.6
S. Salvador.. 60.000 407 23.7
Havana .. 280.000 6.144 21.9
S. Paulo ( Brasil ) …. 286.000 5.952 20.8
Rio de Janeiro (Brasil). 811.443 16.742 20.7
Belém ( Brasil ) [ i ] .. 177.000 3.593 20.2
Bahia ( Brasil ) . 265.000 4.817 18.1

" Dados fornecidos pela Statistieck der Bevolking van


Amsterdam ( 1904-1906 ) e pela Demographia Sanitaria do Rio
de Janeiro.
"Sobre doenças do Brasil póde - se dizer que elle não tem
nenhuma propria. Nenhuma que ahi fosse achada e dahi exclu-
siva ou exportada para outras partes. O depoimento dos pri-
meiros viajantes e povoadores da terra descoberta por Cabral,
em 1500, é nisto eonforme ao dos viajantes e medicos que visi-
tam ou habitam o paiz civilizado, de quatro seculos depois. Ao
envez, a sua historia colonial vai indicando, successivamente, a
importação da variola, da febre amarella, da cholera, da peste.
do trachoma, trazidos por europeus e de que muito custaram a
desvencilhar- se .
"Apenas a malaria, desde os teinpos da colonia, e o beri-
beri, desde o seculo passado, constituiram as doenças mais no-
torias.

(1 ) Estes dados peccam pela base, porque a população da


Bahia não attinge sequer a 240.000 habt. , e a de Belem a 120.000.
736

"A malaria, aliás mal universal, tem sido successivamente


vencida, á medida que o povoamento avança, conduzindo os
processos faceis de saneamento. Cumpre notar que os autores
coloniaes se referiam a trechos da faixa littoral, unica conheci-
da então , e onde, nos estuarios alagados dos rios, pantanos e
varzeas facilitavam o desenvolvimento da doença.
"As terras altas do interior, muito mais importantes, são
inteiramente indemnes.
"No proprio littoral tem sido muito exagerada a mortali-
dade do paludismo, havendo até nos centros mais cultos do paiz
tendencia habitual dos medicos a diagnosticarem de palustre
todas as elevações de temperatura. Com o advento do micros-
copio para o exame do sangue, esta pretendida malaria vai de-
sapparecendo rapidamente.
"Quanto ao beri-beri, houve, ha algumas decadas, em Va-
rios pontos do Brasil, invasões epidemicas alarmantes, reduzi-
das hoje a um dizimo muito limitado. Além das medidas de hy-
giene e saneamento, parece, tem concorrido para isso a educa-
ção medica, que vai progressivamente aperfeiçoando a arte do
diagnostico. As perturbações discrasicas e polynevriticas, mui-
to frequentes no alcoolismo intenso da Amazonia, que ainda
hoje correm por conta do beri- beri, serão em breve convenien-
temente rotuladas, como foram as nephrites, arterio - escloroses,
cardiopathias, que na propria Bahia e no Rio, dous centros de
estudos medicos, durante muito tempo, e em muitos casos, fo-
ram julgados de beri - beri.
"A despeito, porém, de erros de diagnostico que exagera-
ram os numeros, as estatisticas brasileiras neste particular são
muito favoraveis. A excepção de Manáos (Amazonas ) quanto á
malaria, ou S. Luiz (Maranhão ) quanto ao beri-beri, os coeffici-
entes mortuarios dessas endemias são muito benignos como in-
dice de salubridade.
"Quanto á dysenteria e á ankilostomiase, que existem um
pouco em todo o mundo, faltam estudos serios a respeito.
"Não se fez ainda a distincção entre as fórmas amebiana e
bacillar da dysenteria, nome que é dado em geral ás enterites
agudas ou chronicas, sem mais exame, figurando assim errada-
mente nos obituarios. Quanto á ankilostomiase, outr'ora identi-
737

fica a uma supposta anemia dos tropicos e chamada mesmo


hypohemia intertropical, encontra- se frequentemente no inte-
rior do paiz. Só um exame systematico das fezes poderia dar
numeros dignos de menção.
"Algumas doenças universaes existem no Brasil , como em
toda parte, com coefficientes de morbilidade e mortalidade sen-
sivelmente os mesmos que os europeus. Outras . talvez mais pro-
priamente doenças dos paizes temperados, são raras ou pouco
communs na observação e nas estatisticas. Estão no primeiro
caso a lepra e a grippe ; no segundo a febre typhica e a diph-
teria.
"Umas tantas affecções, exoticas para os europeus, teem
sido, como raridades excepcionaes, encontradas no Brasil : as-
sim algumas dezenas de casos de aiuhum , observados todos em
africanos e principalmente ao tempo da escravidão : alguns
provaveis botões endemicos, se bem que ainda não confirma dos
por observação ulterior ; tres casos de tokelau ou tinea imbri-
cata de Manson, tres de pé de Madura, um de actinomycose e
outro de piedra , communicados ás sociedades scientificas e á
imprensa medica, como grandes curiosidades.
"Algumas doenças existiram e desappareceram. Ha algu-
mas decadas, ao tempo da escravidão, de origem africana, ob-
servou-se a dracontiase e era frequente a filariase. Foi mesmo
no Brasil que muitos dos estudos relativos começaram, com
Wucherer, em 1865. Os nossos avós observaram muito caso de
elephantiase do escroto, da mamma, dos membros inferiores,
urinas chylosas, lymphangites , etc. , devidos ao parasita : a ge-
ração medica actual quasi perdeu a memoria dessas affecções .
Se a cessação do trafico africano explica a parada da importa-
ção de novas filarias, em todo caso é curiosa , e ainda não expli-
cada, a razão por que o verme não conseguio sobreviver no
Brasil. Será uma vantagem climatica ?
"Outra doença , muito observada outr'ora, especialmente no
interior, e hoje muito rara é a bouba ou framboesia tropical.
"Varios males universaes são muito pouco accusados no
Brasil : o cancer é muito pouco frequente, a appendicite é rara,
os kystos hydaticos do figado rarissimos.
" Observou se uma consideravel attenuação da syphilis,
que excepcionalmente chega ás fórmas graves do terciarismo
na Europa, preferindo no Brasil a pelle e as mucosas, nas suas
738

determinações secundarias Prova - se este acerto com a raridade


das tabes e da paralysia geral, que não excede de 5 por cento
do total dos alienados observados.
"Nenhuma doença mental ou nervosa foi no Brasil encon-
trada : aliás o professor Kraepelin nenhuma achou nos tropicos
que já não conhecesse, de casa, na Europa. A Tropenkoller, es-
pecie de furia de que se tomariam os extrangeiros ao chegar aos
paizes quentes, é uma fantasia dos autores allemães, exclusiva-
mente made in Germany.
"Finalmente, como vimos fallando de regiões quentes e
tropicaes, convem desfazer um erro europeu em muito genera-
lizado : é sobre a frequencia da insolação e inthermação (coup
de solcil, coup de chaleur, Hitzchlag, Warmschlag, sunstroke siriasis)
nos paizes situados nestas regiões.
"Basta olhar para as taboas meteorologicas das regiões tro-
picaes para ver que as suas maximas de temperatura são insi-
gnificantes ao lado das dos paizes temperados ou frios. Depois, a
humidade attenua os effeitos do rigor solar. Nova York ou Pa-
riz teem, com razão, numerosos casos de insolação, todos os es-
tios ; no Rio de Janeiro elles são excepcionaes e no equador são
desconhecidos.
"O que caracteriza o augmento de latitude para o norte ou
para o sul, a partir do equador, é a maior amplitude das oscil-
lações, das maximas e minimas thermicas, tanto maiores quanto
mais altas são as latitudes. No Brasil não se conhecem os rigo-
res de inverno dos paizes temperados ou frios, nem tambem o
tormento dos seus dias calamitosos de verão.
"Em summa tem o Brasil uma patologia igual á européa,
com algumas vantagens em muitos casos particulares. Sem tra-
dicções e ainda em época de formação, a nossa hygiene realiza
com facilidade as mais notaveis acquisições da sciencia contem-
poranea. Todos os dias a morbilidade e a mortalidade cedem ao
saneamento das habitações e dos meios urbanos."
Num estudo que publiquei na Revista da Academia Cearense,
procurando investigar as causas da mortalidade da Fortaleza,
basiei as conclusões nos seguintes arguimentos e factos :

[ 1 ] Dr. Thomaz Pompeu -Importancia da vida humana como


factor da riqueza - na Revista da Academia Cearense, de 1896
pag. 26 e seg.
739

AS CAUSAS QUE MAIS CONCORREM PARA O AUGMENTO DA


MORTALIDADE NA FORTALEZA. -A progressão sempre crescente
da mortalidade, nesta capital [ 1 ], em contrario do que se obser-
va na maioria das grandes agglomerações, em paizes adianta-
dos, é um phenomeno que surprehende a todos e provoca a at-
tenção dos espiritos menos propensos ás observações demogra-
phicas.
Se as condições naturaes do solo, se a regularidade do cli-
ma, se a propria topographia da cidade são favoraveis ao alon-
gamento da vida humana, porque a ceifa da morte torna - se de
anno para anno mais copiosa e em proporção relativamente ex-
cessiva á media normal da mortalidade ?
Em traços geraes, já mostrei que a anomalia deste facto
deve ser imputada, quasi exclusivamente, á carencia dos pre-
ceitos hygienicos, de par com a restricção da área occupada
pelo augmento da propriedade immovel, predial.
Seja-me permittido descer as investigações mais minuci-
osas, e estudar as principaes causas do phenomeno assignalado ,
as quaes podem ser capituladas em sete classes, que se reduzem
a duas geraes.
As causas permanentes são :
1ª Agglomeração da população, crescimento da área occu-
pada por predios.
2ª Carencia de hygiene domestica e publica, particular-
mente d'agua potavel para os usos pessoaes da população .
3ª Uso das fossas fixas e de outros methodos primitivos de
aceio na habitação .
4ª Augmento do trabalho sedentario nas officinas, ca-
sas, etc.
5 Importação de doentes de molestias contagiosas e incu-
raveis.
As causas accidentaes são produzidas por :
Annos climatericos , epidemias, mortalidade infantil.
Todas essas causas, com excepção de uma a duas, caem sob
a acção da sciencia e podem ser removidas ou consideravelmen-,
te modificada pelos meios que ella faculta.
Assim, aos inconvenientes da agglomeração de pre dios

[1] E' preciso levar em conta a data desta affirmativa, refe-


rida aos annos proximos ao de 1896 .
740

consequencia do desenvolvimento da população da cidade, po-


de - se oppôr a sua construcção de accordo com as prescripções
hygienicas.
Tem-se observado que a derrubada de arvores, quasi sem-
pre fructiferas, plantadas nos quintaes, cercados ou chacaras
para abrir espaço á construcção de casas, não só contribue para
o augmento de calor no ar atmospherico respiravel, como facili-
ta a circulação franca das correntes áreas em certas e determi-
nadas direcções. Accresce que a disposição perpendicular dis
ruas, despidas de arborisação ou de outro amparo á poeira fina
que a tracção de vehiculos e das pessoas origina, favorece a sua
suspensão e por conseguinte a contaminação das habitações pe
los germens aerobios de molestias, como a tuberculose e em ge-
ral as das vias respiratorias. (1 )
Os detrictus organicos ou residuaes das casas, sem os meios
de remoção promptos, são outros tantos agentes de infecção .
Os restos de cosinha, as aguas servidas, etc., geralmente lança-
dos nos quintaes, ficam expostos á decomposição putrida e não
poucas servem de alimentação á creação miuda, de galinaceos,
etc. [2]
As poucas casas em que esses restos são enterrados, não
melhorão as suas condições hygienicas, porque as covas abertas
nos quintaes para tal fim, por superficiaes, não impedem que a
fermentação corrompa a atmosphera que as rodêa.
O serviço municipal, iniciado ha poucos annos, de remoção
desses residuos, é ainda redimentar, feito por carroças que atra-
vessam as principaes ruas da cidade derramando, as vezes , por
onde passam o mau cheiro, nanseabundo , da decomposição das

[ 1 ] Nesta época ainda se dava grande importancia a este


modo de transmissão de certas molestias .
[2 ] Dr. E. Lassance Cunha, no relatorio sobre os esgotos
da Fortaleza, pinta o seguinte quadro :
"Na construcção das casas de habitação preceitúa a hygi
ene, que conserve -se sempre uma certa área de terreno desoc-
cupada, afim de que possuam as casas maior quantidade de ar
e de luz, elementos necessarios para a vida.
"O habitante zeloso , que bem comprehende que, da pureza
do ar que respira depende, principalmente, a conservação de
sua bôa saúde , e ás vezes mais do que isto, a restituição da
saúde perdida, converte os referidos terrenos, vulgarmente cha-
mados quintaes, em jardins e pomares. Pratica de medida tão
741

materias que alli supportam por hora os ardores do sol meridi-


ano ou as chuvas com que a atmosphera se apraz refrescar o
ambiente.
Grande parte das ruas estão em areia, desempredadas, de
modo, que o unico systema de remoção existente, é falho para
ellas. Quando as áreas, não edificadas, estavam cobertas de vege-
tação, os males provenientes desta origem eram compensados
pelos beneficios da oxigenação do ar, apressada pela propria ve-
getação.
Os predios multiplicam-se, e de preferencia as pequenas
construcções para as classes pobres, quasi sempre apertados, de
commodos exiguos, sem quintaes, verdadeiros fócos para pro-
pagação das molestias infecciosas e de outros germens morbi-
genos.
Como se vê desta simples exposição é esta uma das causas
de facil attenuação, senão extincção.
Se não nos é dado imitar o que se faz nas cidades do velho
mundo, devemos procurar com os recursos economicos e o pes-
soal de que dispomos, approximarmo -nos dellas. Alli a sciencia,
de par com o capital, nada tem poupado para resolver o proble-
ma do saneamento urbano.
Uma vista rapida sobre este serviço nos mostrará o que nos
convém fazer.
Nas cidades francezas, diz Pignant ( 1 ) os residuos solido
de cosinha e de casa são geralmente conduzidos diariamente
pela manhã ás ruas, derramados sobre montes de detrictos pro-

acertada dá em resultado a vantagem de augmento d'oxigena-


ção do ar, creando além disso uma digressão das mais agrada-
veis para a vista e para o espirito.
Infelizmente, porém, facto inteiramente opposto passa-se
na cidade da Fortaleza . Com muito raras excepções, os quin-
taes das casas particulares não são jardins que deleitem a vista
e beneficiem o ambiente : são verdadeiros fócos de infecção,
onde a vista é impressionada desagradavelmente com depositos
de materias fecaes, aguas putridas e finalmente tudo quanto ha
de immundo, soffrendo o processo chimico da fermentação e
carregando o ambiente, não de maior quantidade de oxigenio,
porém, de uma porção de gazes mephyticos, predominaudo o
sulphydrato d'amoniaco e o acido sulphydrico."
[ 1 ] Pignant-Assainissiment des habitations - pag. 69.
742

venientes do varremento das calçadas, e com estes conduzidos


por carroças para fóra das fortificações.
Em Pariz, antes de 1870, os residuos domesticos po-
diam ser levados ás ruas publicas de 7 horas da noite ás
7 horas da manhã. Mas como entre outros inconveni-
entes tinha 1 ° o de infeccionar a habitação pela demora no
' interior della de residuos, que em caso de esquecimento pode-
rão permanecer ahi por mais de 30 horas ; 2º infeccionar du-
rante a noite a rua, na qual forem depostos : 3 espalharem- se
pelas calçadas : -fizeram- lhe modificações no sentido de remo-
ver taes inconvenientes.
Depois d'aquella data, os residuos devem ser depositados
em recipiente especial, e levados a rua somente quando passar
a carroça do lixo , entre 5 e 7 horas da manhã.
Em Londres, ainda é Pignant quem fala ( 1 ), os habitantes
respeitosos das regras concernentes ao aceio, e dispondo de ver-
dadeiros locaes para nelles depositar os restos e ciscos de casa.
têm por habito nada lançar nas calçadas.
Meninos apanham os excrementos dos cavallos e metten-
nos em caixas : o resto, como palhas, cisco, etc., é reunido pelos
varredores e condusido a especies de frades ou caixas de ferro
(bornes ) dispostas ao longo das calçadas. Essas caixas se en-
chem pela parte superior e se esvasiam pela inferior. O seu em-
prego tem a grande vantagem de evitar a dispersão dos detri-
ctos pelo vento ou pela circulação.
A limpesa do lixo das casas e das calçadas faz-se, a partir
de 7 horas da manhã, com o auxilio de pequenas carroças que
param em cada casa para esvasiar a caixa, mediante uma pe-
quena remuneração. Esta limpesa prolonga-se pelo dia alto e
isto sem inconveniente, graças aos habitos inglezes de recipiente
para o lixo de casa e a caixa para os detrictos da rua.
Na França, como na Belgica e na Inglaterra , este serviço é
feito, quer por empresa empreiteira, quer pela propria cidade,
que recupera uma parte das despezas pela venda dos produ-
étos, como em Lille e Bruxellas.
Em Londres, na City, as despezas de limpeza regulam 3.470
frs. por hectare, em Paris 2.160 frs. nos 4 primeiros arrondis-
sement.

[ 1 ] Pignant -- obra citada- pag. 119.


743

Em Chicago e outras cidades americanas o lixo das casas


é recolhido a fornos moveis, condusidos por carroças, nas quaes ,
se opera a combustão das materias organicas, redusidas a cin-
sas.
Um serviço regular de remoção de lixo a horas em que a
temperatura é branda e o sol não apressa a corrupção dos de-
trictos animaes ou vegetaes, em carros fechados, não é idéal ir-;
realisavel : entra nos limites das nossas possibilidades hygieni-
cas. A par deste serviço, as visitas domiciliarias ou fiscaes,,
muito concorrerão para tornar o seu beneficio uma realidade . f
Pode - se prevêr com alguns visos de certesa que a agglo-
meração humana, nesta capital, salvo casos excepcionaes, cres-
cerá d'ora em diante em proporções menores. Basta considerar
que as suas industrias são insufficientes para prover a subsis-
tencia dos seus habitantes e o seu commercio, mal servido de
porto e de outros meios de transportes, não pode alargar as
transacções muito alem do valor que ellas actualmente repre-
sentam.
As foutes que abastecem a riquesa da Fortaleza, senão de-
fluiram ainda o maximo, deram ao menos o que foi possivel,
attenta as difficuldades inherentes a producção agricola. Au-
gmentar-lhes o jorro, de modo a avolumar-nos a somma de
bem estar, é problema difficil, quasi insoluvel, se os poderes pu- :
blicos não se compenetrarem de que a sua principal missão,
neste assumpto, é refazer parcialmente a naturesa , dotando o
Estado de copiosas massas d'agua, d'onde retire a humidade
necessaria para os misteres da lavoura.
Os sitios frescos, ou que por suas condições topographicas
estão menos sujeitos as transições bruscas das estações, são la-
borados cuidadosamente. Nas serras de Maranguape e Arata-
nha a lucta do agricultor para fazer produzir o café tornou - se
quasi improfiqua, porque de anno para anno a preciosa rube-
acea menos dá, devido em grande parte ao deslavamento do
solo, da camada de terra vegetal que se adelgaça pelos corrosões
pluviaes. O mesmo vae acontecendo em Baturité.
As lavouras de algodão, pelo preço infimo que attingio nos
mercados consumidores este producto, não compensão sequer
os gastos da producção, sobretudo com a elevação dos salarios
e dos transportes.
744

Se os principaes generos, que não só alimentavão as indus-


trias e commercio desta capital, como ainda enriqueciam alguns
dos seus habitantes, escasseiam e já não podem ser produzidos
tão abundantemente, é logico concluir- se que o seu crescimento
terá de ser d'ora em diante mais lento.
CARENCIA DE HYGIENE DOMESTICA. - Pelo que ficou dito re-
lativamente ao perigo das construcções prediaes, sem as preci-
sas condições hygienicas, vê- se que nos faltam quasi todo con-
forto na habitação, e 03 meios mais rudimentares da hygiene
privada.
A disposição dos compartimentos de trabalho ou de re-
pouso parece propositalmente ordenada para prejudicar a sa-
úde. Os quartos internos, de dormir, são escuros, mal ventilados
e quentes nas horas calidas do dia ; as salas expostas, ora ao sol
da manhã, ora ao da tarde, de modo que a temperatura nellas
está acima ou abaixo da ambiente. As communicações entre
esses compartimentos se fazem por estreitos corredores. as mais
das vezes sombrios, por onde se precipitam as correntes de frio.
Quem sae de uma camara de dormir ou de uma sala aquecida
tem necessariamente de supportar as consequencias desse ar
encanado.
O aceio interno das casas é deficiente, e, na maioria dellas,
nenhum . Ao pó, depositado pelos ventos, reunem -se os detri-
ctos de todas as procedencias, arrastados pelos varredores e de-
positados em algum canto escuso, quando a vassoura entra em
tal processo .
O atijolamento das casas. feito de material poroso, de infi-
ma qualidade, fende- se frequentemente e nestes intersticios ou
mesmo nos que deixão os tijollos entre si depositão - se aquelles
restos, pasto dos micro- organismos com que a prodiga natureza
nos obsequeia.
A propria collocação dos moveis, que nas habitações das
classes medianamente abastadas não passam de velhas e car-
runchosas arcas de Noé, revestidos do sujo de algumas gera-
ções, favorece a multiplicação dos germens morbigenos.
Nenhum exagero ha nesta pintura, e inutil é insistir na
exposição do que todos nós conhecemos por longa e penosa ex-
periencia .
Mesmo nas casas mais sumptuosas, a falta de serventes do-
745

mesticos, intelligentes, zelosos ou simplesmente cumpridores de


seus deveres, deixa muito a desejar quanto a hygiene da habi-
tação.
Accresce a isto a mingua d'agua potavel para os differen-
tes misteres domesticos e pessoaes . A agua geralmente consu-
mida como alimentação provem de poços abertos em quintaes
ou chacaras, sendo condusida em baldes desaceiados e a toda
hora do dia. Ao lado desses poços, e de preferencia destes, pela
qualidade d'agua, o solo está sempre humido das aguas de var-
rella e de todas as sujidades que escorrem das lavagens de rou-
pas de procedencias diversas. Essas aguas ou deslisam directa-
mente para o poço, quando este não é amparado por parede de
alvenaria, ou infiltram - se lentamente pelo intersticio entre o seu
revestimento e o solo, indo mais tarde corromper - lhe as aguas .
Na mór parte das casas ha poçes cujas aguas salitrosas servem
tão somente para usos culinarios ou para o aceio pessoal. Raro
é o que não contem materias organicas em decomposição, ora
condusidas pelo esgoto, ora nelle lançadas por creanças ou por
creados ignorantes. São em regras focos permanentes de micro-
bios pathogenos .
Comprehende-se bem quão redusida é a quantida d'agua
assim obtida para os multiplos misteres domesticos . O labor in-
sano ou custoso de havel- a faz com que o seu uso seja raro.
A maxima de Foucher de Careil- de l'eau partout, car il en
faut trop pour qu'on en ait assez -é nesta capital completamente
desconhecida . [ 1]
A importancia que os hygienistas e homens de estado lhe
attribuem na conservação da saude dispensa qualquer commen-
tario da minha parte.
"Sem o fornecimento d'agua artificialmente e sem as tor-
neiras estabelecidas em todas as casas, diz lord Brougham,
Londres não teria podido attingir senão pequena fracção da sua
extensão e da sua actual população. "
Por sua vez opina um illustre engenheiro francez que :

[ 1 ] Da data deste trabalho para cá as nossas condições de


salubridade melhoraram. Em relação a agua as centenas de
moinhos do vento americanos em trabalho extraem grandes
quantidades della por meio de bombas, e de alguns poços pro-
fundos, indemnes de contaminação .
746

Para assegurar o aceio interior dos grandes centros, a pri-


meira preoccupação das municipalidades é prover a cidade de
abundante destribuição d'agua, base essencial de todo o sane-
amento serio. Sendo para a agua de fonte, lançam mão frequen-
[emente de duas distribuições distinctas uma d'agua potavel
tde fonte], reservada aos usos domesticos ; a outra, de qualquer
agua limpida, destinada aos serviços publicos , isto é a lavagem
das ruas, esgotos, serviços de boccas de incendios, jactos d'agua.
javanderias publicas, latrinas, etc. [ 1
A mesma autoridade diz que o volume d'agua necessario a
uma cidade é o seguinie :
"O homem consome na media, por dia, 2 litros d'agua na
bebida e alimentos. 18 litros em diversos usos externos e 10 li-
tros para manter a limpesa dos waterclosets.
"Pode-se calcular, portanto, para as exigencias de uma
grande cidade o volume total d'agua de accôrdo com a seguinte
tabella :
Por dia :
Por pessoa 30 litros
66 cavallo.... 75
66 boi ...... 75
carro de duas rodas .. 40
66 66 de quatro rodas .. 50
66 de 66 66 de luxo 100
66 100
loja ou armazem
Para as fontes monumentaes a razão de 20 litros
por hab...... 20
Por metro quadrado de calçadas, jardins, ala-
medas, etc... .. 3
Para lavagem de esgotos, etc., por hah. 50 a ... 100

As industrias exigem tambem maiores supprimentos d'a-


gua :
Por hectolitro de cerveja ……. 360 litros
66 banho ...... 300
.. cavallo vapor e por hora em machina de
alta pressão . 35

[1 ] Pinangt- Asssainissemente des habitations -pag 108 .


747

Idem de condensação .. 500 litros


6. de baixa pressão.. 800 66

E' curioso approximar estes dados dos que nos dão outros
autores.
E' este o parecer de Jules Arnaud, professor de hygiene
na faculdade de Lille, em França ;
"Dividem -se
-se na ordem seguinte as circumstancias em que
a agua é necessaria :
A- Necessidades da casa--Bebida, cocção dos alimentos, la-
vagem, cuidados de aceio, banhos. latrinas, réga de jardins, be-
bidas de animaes, limpeza de cavallariças, carros, cavallos, etc.
B-Necessidades da rua e do grupo de habitações -- Irrigação
das ruas e dos jardins publicos, fontes publicas e incendios.
Bürkli avalia que as necessidades da primeira ordem recla-
mam 35 por 100 de agua a fornecer, as da segunda 45 por 100 ;
a industria 20 por 100 .
Parkes faz a addição abaixo, referida a um adulto e a um
dia regular :
LITROS
Bebida.... 1.5
Cocção dos alimentos .... 3.5
Cuidados de asseio corporal .... 22.5
Manutenção da casa e de utensilios .. 13.5
Lavagem.... 13.5
Banho ( uma vez por semana ) . 18.6
Latrinas .... 27.0
Perda inevitavel.. 12.5

Total ... 112.5

Com uma provisão de 22 lit. 5 por dia para os animaes e


outro tanto para a industria, chega- se á cifra média de 157 li-
tros por hahitante.
Bürkli pedia para Zurich 190 litros, avaliando em 40 litros
por individuo as necessidades da industria, em 27 as de limpasa
das ruas, em 60 litros a agua necessaria á alimentação das fon-
tes publicas.
Na realidade estas avaliações são muitos liberaes e pode
crer-se com os engenheiros inglezes que, quando chega 150 h .
748

tros d'agua a uma cidade, por habitante della, são utilisados 50,
para casa, 50 para a rua e 50 esperdiçados.
E' preciso que haja muita agua para que se tenha bastante,
diz Foucher de Careil ; esta phrase deve antes referir - se á quan-
tidade disponivel do que á quantidade realmente distribuida :; a
perda d'agua não é limpeza e quando se conta com a facilidade
das lavagens, que aliás não são absolutamente vantajosas a to-
das as partes da casa, habituamos-nos a nos preoccupar pouco
de evitar o desaceio em tal ponto do sólo , em tal objecto de uso
quotidiano. Lavar é bom, não ter necessidade disso é ainda
melhor.
Segundo o engenheiro Grahn, 128 cidades na Inglaterra
recebem uma media de 142 litros d'agua por dia e por cabeça ;
nas cidades em que ha esgotos, a quantidade disponivel varia
de 180 a 340 litros.
Em Southampton [ 54.000 habitantes] ella é de 252 litros.
Em 30 cidades allemães, que gosam de distribuição d'agua
a quantidade disponivel é na média de 179 litros por dia e por
habitante a quantidade distribuida varia de 41 litros a 163 :
ella é na média de 63 litros.
Em França, Dijon dispõe de 150 litros, Toulouse de 160 ,
Marselha de 500 , Paris de 200 [ breve terá 250 ] , Lille recebe 100
litros e pode ter o dobro.
As cidades americanas têm provisões d'agua enormes, de
300 a 400 litros por cabeça ; isso, menos pelas necessidades ac-
tuaes, do que tendo em vista a extensão tão rapida destas cida-
des, que os seus engenheiros as dotaram de um modo que seria
exagerado em outras condições."
Outra autoridade, não menos notavel, A. Proust escreveu
no seu Tratado de hygiene :
"E' evidente que a quantidade d'agua indispensavel para o
uso quotidiano não pode ser fixada com o rigor mathematico.
"A agua, com effeito, não é somente necessaria como be-
bida, mas serve para diversos usos e desempenha um papel ca-
pital sob o ponto de vista do aceio, cuja importancia não se
pode exagerar em hygiene . Se existe alguma incerteza em rela-
ção ao algarismo que cumpre fixar, deve - se, com certeza , inter-
pretar esta duvida no sentido mais liberal.
Nas grandes cidades, e mais ainda no campo, a parte po-
749

bre da população não se serve d'agua senão para beber. Habi-


tos hereditarios de desaceio, que se transmittem de geração em
geração, reduzem notavelmente a quantidade d'agua necessaria
a cada familia.
Cumpre, sob o ponto de vista hygienico, reagir o mais pos-
sivel contra estas tendencias perigosas. E' preciso interpretar
largamente os dados da experiencia a este respeito ; e para nos
servirmos da phrase tão justa de M. Faucher de Careil "é pre-
ciso que haja muita agua, para que se tenha bastante."
As avaliações inglezas variam de um para outro autor :
O professor Rankine adoptou o algarismo de 45 litros para
usos pubicos e industriaes, sendo que as cidades manufactu-
reiras reclamariam mais 45 litros, o que faria o total de 137 li-
tros por habitante .
Adoptando as avaliações mais baixas, a média de 60 litros
por pessoa, a quantidade d'agua necessaria ao abastec mento
da Fortaleza seria de 60 × 50.000-3.000.000 por dia . Compu-
s em 1.000 poços para as 6000 casas existentes e em 500
tando--se
litros diarios a quantidade extrahida de cada um, teremos 500.000
litros ou a sexta parte do que deveria haver, na hypothese do
gasto mais restricto.
Para obviar esta falta, ha projectos estudados e orçamen-
tos organizados por profissionaes, esperando apenas azada op-
portunidade para serem traduzidos em factos.
Uso das fossas fixas e de outros methodos primitivos de asseio
domestico.
E' esta a terceira causa que me occorre assignalar como
deprimente da salubridade publica e particular.
Antes, porém, de entrar na apreciação das suas desvanta-
tagens, e por não parecer que propositalmente carrego as tin-
tas do quadro que se nos depara a vista, nesta capital, transla-
darei para aqui o que a tal respeito escreveu o Dr. Lassance
Cunha. (1 )
"A população neste ponto, divide-se em quatro grupos :
1º A minoria tem em seus quintaes pequenos depositos de
ferro ou de madeira, onde depositam as materias produzidas

[ 1 ] Dr. Lassance Cunha-Apontamentos sobre o saneamento


da cidade da Fortaleza- 1887.
750

durante um ou dous dias, fazendo a noite a sua remoção para


o mar.
2º Os que habitam as margens dos corregos Jacarecanga e
Pajehú servem se destes para esgoto, o que importa dizer, que,
principalmente na estação secca, as aguas apresentam o aspecto
mais repugnante possivel, sendo difficil ao transeunte approxi-
mar se de suas embocaduras.
3º A fossa fixa, arremedo grosseiro e pernicioso da Fosse
d'aisance fire de Paris.
"Estas fosses fixes da Fortaleza são eternas, jamais retiram
se as materias nellas depositadas. Estas, porém, encontraudo
um terreno, como o da Fortaleza , essencialmente permeavel,
por elle infiltram - se, procurando o ponto mais baixo que é na-
tural e facilmente encontrado na cacimba . Ahi infeccionam as
aguas, que o habitante, quando não a bebe , deila serve -se para
todo o uso domestico.
"Infelizmente é este o systema mais seguido na Fortaleza :
Consiste em um buraco de um a dous metros de profundidade
com um metro de diametro , recebe este todas as podridões
das casas. Estão expostos, e com repugnancia o habitante vê a
fermentação das materias depositadas e respira os gazes dellas
emanados ; uma vez cheia a cava, tapa-se com alguns centime-
tros de terra e abre- se outra a poucos metros de distancia. Ora
os quintaes das casas da Fortaleza são geralmente de pequena
superficie, sendo tomada uma secção para uma cacimba ou par-
te della, porque as ha pertencentes a duas, tres e as vezes a
quatro casas.
"Não só os terrenos contiguos aos depositos de materias
fecaes ficam por ellas saturados, como em virtude da capilari-
dade as outras secções de terreno vão se saturando gradualmen-
te das materias contidas nestes depositos."
Não só a commissão sanitaria da qual fazia parte o Dr
Lassance em 1877, como a que recentemente a Camara Munici-
pal incumbiu as visitas domiciliarias, teve de recuar mais de
uma vez pelo fetido e estado de immundicie em que encontrou
alguns quintaes, o que é bastante significativo tratando-se da
hygiene domestica.
Ao 4º systema, apresentado pelo Dr. Lassance, cumpre ac-
crescentar um 5º, o mais sordido, aquelle que consiste em lau-
751

çar sobre o solo, nos quintaes, as materias fecaes de envolta


com os residuos domesticos.
Qualquer seja o atrazo de civilização e a carencia de medi-
das hygienicas de uma cidade, esses tres ultimos systemas 2º ,
4º e 5º, não podem ser tolerados e menos justificados ; pelo que
occupar- me-hei somente das fossas fixas e das moveis, unicos
toleraveis por motivo superior, na falta de outros meios de es-
goto para materias fecaes.
CLOACAS FIXAS. -O uso das fossas é relativamente recente,
mesmo na Europa.
Na França me diavel era costume lançar á rua pelas janel-
las as materias excrementicias.
Velhos chronistas referem que o rei S. Luiz indo uma vez
a missa pela madrugada foi victima de um máo accidente deste
genero, devido a malicia de dous estudantes. E' escusado ac-
crescentar que o santo rei tomou um banho do peior genero, e
gratificou com presentes ricos os rapazes arrependidos.
Le Sage no seu romance Gil Braz refere caso identico,
acontecido em Madrid ao seu heroe.
Este costume perdurou até poucos annos nas cidades do
littoral Mediterraneo.
A cloaca (fossa ) é ainda a fórma mais commum de sane-
amento da quasi totalidade das cidades no sul da Europa, e das
pequenas no norte.
Sobre 100 cloacas fixas ha ainda em Dijon 90 abertas na
arêa, sem revestimento de cimento, segundo o testemunho de
Pignant ( citado ).
Em Paris. sobre 35.000 casas, 70.000 ainda conservão a
cloaca fixa.
Em Bruxellas as cloacas desta natureza, que subsistem, es-
tão submettidas pelos regulamentos a certo numero de condi-
ções prescripções simples ; as quaes são assim capituladas por
Durand- Claye na Memoire sur l'assainissement de la ville de Bru-
xelles (1 ) Ellas são estabelecidas, tanto quanto possivel, em lo-
gar descoberto, tendo a abobada 0m, 18 de espessura, as paredes
e fundo da fossa 0m,28 de espessura, o revestimento interno de
azulejos ou tijolos vidrados juntos com argamassa de cimento e

[i ] Durand-Claye -Memoire sur l'assainissiment de la ville de


Bruxelles, Paris, 1870, pag. 34.
752

rebocados com esta argamassa, a abertura central de 1 m. por


0m,65,os cannos de precipitação [ sumidoures] tão verticaes quan-
to possivel, com o afastamento de 2 metros de qualquer poço, etc.
As fossas fixas estão ainda muito espalhadas, segundo af-
firma G. Bechmann [ 1 ] , a despeito da infecção que resulta do
deposito prolongado de materias essencialmente fermentaveis,
na propria casa, apezar dos riscos de contaminação do solo pe-
las rachaduras da alvenaria, do ar dos commodos pelos tubos
mal ajustados ou pelas bacias abertas, da propria atmosphera
pelos tubos de aeração. Essas fossas recebem as aguas servidas
e materias excrementicias até ficarem cheias. Procede - se então
ao esgotamento da massa, e é esta operação que recebe o nome
de vidange [ despejo].
O trabalho de despejo, perigoso e repugnante, derrama
odores fetidos, mesmo quando tem-se o cuidado de lançar ante-
cipadamente desinfectantes nas fossas. Requer a circulação de
um material immundo, toneis armados sobre rodas com ou sem
bomba, á braço ou a vapor, wagons e bateis, cisternas, etc.
Custa caro e provoca guerra a agua na casa, porque toda a ad-
dicção desta augmenta o cubo a evacuar e diminue o seu valor
como estrume.
Para diminuir os inconvenientes da vidange ( despejo) pro-
puzeram estabelecer nas casas que ladeiam as ruas providas de
esgotos, apparelhos chamados separadores ou deluidores cujo
objecto é reter as materias solidas ou diluil- a em grande parte
e deixar escoar para o esgoto ou liquidos mais ou menos carre-
gados.
Estes apparelhos são pequenas fossas ou tinettes, geralmen-
te de metal e de formas appropriadas ao uso para o qual se des-
tina ; collocam- nas em supportes na cava , de alvenaria, sendo
ligadas por uma parte ao encamento de precipitação [sumidou-
ro] das materias fecaes, por outra ao conducto de evacuação .
Como não retêm senão pequena fracção das materias que nellas
caem , o seu enchimento é relativamente lento ; e quando é mis-
ter evacual- as, a operação faz - se rapidamente e não derrama
máo cheiro .
O principal inconveniente é a falta de evacuação regular e

[ 1 ] G. Bechmann - Salubrité urbaine, Paris, pag. 556.


753

o extravasamento que macúla a cava , os encanamentos e a pro-


pria casa.
Separadores ou diluidores são justamente appellidados de
--hypocrisia do tudo ao esgoto. Effectivamente, diz G. Bech-,
mann (obra cit. pag. 657) sem realisar o afastamento immediato
o arrastamento para fora de casa de todas as materias fermen-
taveis, elles enviam ao esgoto a mór parte das substancias azo.
tadas que provém das evacuações : o que retêm é quasi sem va.
lor e, não obstante, basta para envenenar algumas vezes a casa,
Ainda sobre a questão das fixes, opina Pignant, que nas
melhores condições, construidas segundo todas as regras d'arte
e da sciencia, ellas estão longe de offerecer solução satisfactoria.
A sua impermeabilidade não é absoluta, os conductores se de-
terioram rapidamente e logo depois o sob- solo fica impregnado
de materias fecaes fermentadas. Estes factos foram verificados
em Paris.
A estes inconvenientes , accrescentemos o dos tubos de ven.
ventilação, a extracção das fezes e o estabelecimento dos depo-
sitos. Os cannos de ventilação, indispensaveis nas fossas, des-
prendem hydrogeneo sulfurado e phosphorado, os quaes derra-
mam-se no ar. Essas ema nações são rapidamente dissipadas
pelo vento , quando sopra com alguma força mas quando o
tempo é pesado e a cidade está rodeada de nevoeiros, todos es-
ses odores fetidos permanecem suspensos sobre as casas, abai-
xam-se nas ruas e attingem em todos os casos as casas situadas
nos lugares mais altos da cidade.
A extração dos excrementos ainda mostra os inconvenien-
tes das fossas ; todos conhecem o máo cheiro que occasiona esta
operação, todos encontram os toneis ruidosos e immundos que
sulcavam durante a visita, as ruas das cidades condemnadas a
esta pratica barbara.
Boutmy publicou interessantes experiencias sobre o poder
toxico das materias fermentadas das cloacas, as quaes sob pe-
queno volume, são capazes de envenenar consideraveis massas
de ar.
A despeito de tudo quanto se tem dito e escripto contra
esse systema de saneamento é elle ainda empregado na mór
parte das cidades européas.
Ninguem seriamente pode centestar os perigos que do seu
754

emprego resultam para saude publica, porque basta considerar


as infiltrações que das materias excrementicias se fazem para os
terrenos inferiores, onde as vezes passam os lençóes subterra-
neos d'agua , para se avaliar a extensão dos males que deve
causar.
Ha, porém, attenuantes que até certo ponto justificam pro-
visoriamente o seu emprego .
Tratando - se de cidade edificada em solo vasoso ou com-
posto de densa camada de alluvião ou mesmo de terreno facil
mente permeavel, nenhuma duvida haverá quanto a aggrava-
ção d'aquelles perigos, e condemnação em absoluto da cloaca
fixa , seja qual fôr o modo de construcção ; mas razões de outra
ordem occorrem quando a composição do terreno diminue ou
impossibilita as consequencias nocivas das infiltrações.
Sabe-se que os terrenos siliciosos, arenosos, formados de
degradações e decomposições de granito, se deixam penetrar
difficilmente pelos liquidos . As experiencias de Boussingault
sobre a penetração das aguas pluviaes no solo mostraram que
as maiores bategas não o penetravam alem de alguns centime-
tros. A filtração se opera lentamente, de modo que a alguns
metros abaixo, os liquidos mais carregados de micro organismos
toxicos completamente ficam depurados.
Experiencia em larga escala acaba de ser feita na ultima
epidemia do cholera em Hamburgo e Altona, duas cidades ape-
nas separadas por uma rua. Em Hamburgo , que se provia de
agua do Elba, captada no seu curso superior, mas não filtrada,
a mortalidade pelo cholera foi consideravel ; em Altona, que
recebe agua potavel do curso inferior do mesmo rio, mas filtra-
da atravez de camadas de arêa fina, cascalhos , etc. , pouco ou
nada soffreu.
Em Londres e em muitas cidades, abastecidas por aguas do
rio á margem do qual estão, tem se observado que a propor-
ção dos microbios destas aguas é muito inferior a de outras pro-
cedencias.
Relativamente a esta capital, os maiores perigos das infil-
trações subterraneas são nullificados pela natureza do seu sub-
solo arenoso. Salvo um ou outro caso de grande proximidade
entre a cloaca e o poço d'agua de gasto, as fendas do solo ou os
filões de saibros, de pedriscos , ou de arêa calcarea intercalados
755

nelle, as infiltrações das cloacas se operarão lentamente e se


tornão inoffensivas.
Alem das razões decorrentes da constituição geologica do
solo, seja- me licito adduzir a da inocuidade das materias fecaes,
quando em putrefacção, como agente de molestias zymoticas .
Verificou - se que a destruição dos bacillos comma do cholera
pelos saprophytas da putrefacção é certa , quando o numeró
destes cresce mais rapidamente que o d'aquelles. Os cadaveres
dos cholericos em completa putrefacção não contém em parte
alguma dos intestinos ou de outro qualquer apparelho organico
bacillo virgula, bem como este micro - organismo, determinando
no organismo alterações em que immediatamente se possa de-
senvolver grande numero de outras bacterias, é por estas des-
truido. (1 )
As experiencias de Schottelius a este respeito não deixam a
menor duvida. Por seu lado Koch demonstrou que dos liqui-
dos das latrinas e esgotos, onde os phenomenos de putrefacção
e fermentação se acham em completa actividade, e aos quaes se
tem ajuntado as dejecções e objectos contendo grande quanti-
dade de bacillos virgula , não apresentão no fim de 24 horas ou
de 6 a 7 dias mais germen algum desta natureza. Todos foram
devorados, mortos ou destruidos pelos saprophytas.
Koch assegura, o que parece paradoxal, que nas latrinas
em que as bacterias da putrefacção estão em plena actividade,
não haverá necessidade de outra desinfecção para as dejecções
e vomitos de cholericos que ahi sejam lançados.
Vai ainda mais longe, condenina a mór parte dos desinfe-
ctantes empregados. Eis as suas palavras : "Supponha-se o
caso em que seja mister desinfectar uma cloaca, na qual se
achem bacillos comma. Penso que o simples processo da putre-
fação que se opera na cloaca é sufficiente para extinguir os ba-
cillos virgulas. Addicione- se - lhe o sulphato de ferrc até a re-
ação acida e paralisa - se por essa forma o processo da putrefac
ção, não se conseguindo senão deter o desenvolvimento das ba-
cterias e dos bacillos - virgulas. Aquellas não parecem, e os ba-
cillos virgulas são subtrahidos a acção mortifera das bacterias
da putrefação ; são poupados e não destruidos como se pre-
tendia."

(1 ) Dr. Vicente Saboia-Estudos sobre o cholera, III .


756

Se a affirmação tão categorica do illustre sabio allemão so-


bre o papel das materias putrefactas na destruição dos germens
da mais terrivel das molestias zymoticas não é bastante vali-
osa, embora as multiplas experiencias feitas em lugares diver-
SOS, soccorrer- me -hei as opiniões exaradas pelas primeiras
autorida des francezas na discussão das medidas a tomar sobre
saneamento de Paris.
"Principio algum contagioso resiste a acção do ar atmos
pherico, isto é, ao oxygeneo, diz o Dr. Fauvel. Ao contrario
esses mesmos principios, confinados ao abrigo do contacto do ar,
conservam por assim dizer, indefinidamente, as suas proprieda-
des contagiosas.
"A putrefacção das materias animaes, e particularmente
das fecaes, destroe os germens especificos das molestias con-
tagiosas mas a fermentação putrida géra gazes delecterios que
occasionam accidentes toxicos particulares.
Será preciso lembrar que, durante muito tempo, a aeração ,
ou como diziam "o Sereno ou o arejo" foi o unico meio applica
do nos lazaretos á destruição dos germens da contagião ? O ar
livre é o grande beneficiador que destróe todas as causas de in-
salubr dade.
O ar destróe não só os máus cheiros que se desprendem
das materias fecaes como os germens contagiosos que nellas po-
dem se achar.
As irrigações emprehendidas na Inglaterra e Gennevilliers
o provam, bem como os espargimentos do estrume humano em
Flandres.
A respeito da destruição dos germens contagiosos pela pu-
trefacção poderemos citar o proloquio popular : animal sem vi-
da, veneno morto.
"Estes effeitos da putrefacção são applicaveis as materias
fecaes, mas fazendo- se distincção de summa importancia . As
materias frescas, taes como são lançadas immediatamente no
esgoto ou nos rios, não se assemelham as que permanecem nas
cloacas ou nos depositos ; as primeiras podem conservar os
germens contagiosos que a acção oxydante do ar não destruio ;
as segundas soffrem pelo repouso uma decomposição putrida
que produz desprendimentos de gazes sulfurados e ammonicaes
toxicos. As materias putrefactas tornaram-se mephiticas, já não
podem produzir molestias especificas.
757,

"As cloacas e os depositos devem ser condemnados como


fontes de principios toxicos, e o mephitismo dominaria no ar
dos esgotos, se nelles fossem despejadas as materias fecaes sem
os largos melhoramentos das aguas correntes e da ventilação"
(Opinião do Dr. Fauvel, um dos tres mais illustres membros da
commissão do saneamento de Paris em 1883 -Junho ).
O Dr. Brouardel não contestou as observações de Fauvel.
mas não as acceitou na sua forma absoluta . "Não se pode con-
siderar como adquerido e demonstrado que todos os germens;
sem excepção , sejão destruidos pelo oxygenio do ar, pois que se-
gundo as operações de Pasteur, animaes carbunculosos, depois
de interrados, haviam ao cabo de alguns annos manifestado
grande virulencia .
"A oxydação não destróe todos os germens conhecidos :
não age senão com extrema lentidão, e a putrefacção não mata
o virus com mais certeza, nem mais rapidamente ."
A isto aindo oppoz Bouley que "quando os virus estão em
´estado de mycelium, isto é, são constituidos por filamentos on
bastonetes, taes como a bacteria do carbunculo, não possuem
em si grande força de resistencia á acção do ar que attenua
gradualmente a sua energia e acaba por exterminal - os. Mas o
mycelium do agente de uma virulencia pode se transformar em
sporos que se apresentam no estado de corpusculos, nos quaes
reside a potencia, a possibilidade [ devinir] da especie : e a natu-
reza, previdentissima, se considerarmos que esses sporos são os
meios da propagação no espaço e no tempo de certas molestias
contagiosas, a natureza os dotou de uma força tal de resistencia
á acção do ar que achamol os vivaces ainda e dotados de toda a
sua actividade de pollulação apoz dez annos.
"Mas quando o elemento de uma virulencia foi modificado,
attenuado na sua energia pela acção do ar, se elle se acha em
seguida nas condições favoraveis para se transformar em spo-
ros, esses sporos, gerados delle, não possuem seuão o gráo de
energia enfraquecido que o ar havia inspirado ao mycelium
donde elles procedem ; e, se esses sporos se transformam por
sua vez em bacterias, esssas bacterias terão apenas o gráo de
energia deixados aos seus sporos originaes ; de sorte que a sci-
encia resolveu o problema de constituir de uma especie virulen-
ta raças attenuadas que occasionam, quando são semeadas em
organismo susceptivel, molestias attenuadas como são ellas .
758

E' pelo conhecimento deste facto experimental, que fun-


dou-se a grande descoberta da nova vaccina contra as molestias
contagiosas.
Tem cabimento aqui a questão de saber se o gaz hydroge-
nio sulfurado, que é o producto da decomposição das materias
organicas, não seria por si mesmo um agente de saneamento
das materias excrementicias, em vez dos elementos de virulen-
cia que lhe podem ser attribuidos ? Recentes experiencias pare-
cem indical- o. Tome se um grupo de doze ratos, por exemplo,
e inocule- se em todos um virus mortal, o da septicemia. Collo-
quem-se 6 desses animaes debaixo de uma campanula na qual
se fará respirar uma dose toleravel de gaz sulphydrico mistura-
do com ar, deixando - se os outros 6 n'uma atmosphera normal .
Nestes a septicemia inoculada seguirá o seu curso, produzirá a
morte : n'aquelles ella ficará sem effeito."
Depois de outras considerações, prosegue : "os desenvolvi-
mentos nos quaes entramos, Fauvel e eu, não serão inuteis, se
contribuirem para bem estabelecer nos espiritos que os elemen-
tos vivos das molestias contagiosas que podem se misturar com
as excrementicias, acham as condições de sua destruição rapida
ua acção do ar, na do calor, e segundo todas as probabilidades,
que podemos deduzir da experiencia, nos gazes que são o pro-
ducto da putrefacção das materias organicas.
Só no estado de sporos é que os virus são resistentes : mas,
tanto quanto podemos julgar pelo que presentemente sabemos,
este estado é excepcional."
Depois destas profundas analyses, escreve A. Mille. [ 1]
"A Academia vio assim a concordancia da experiencia dos
seculos com as theorias mais adiantadas da sciencia moderna.
O presidente da Commissão , Alphand , propoz em conclu-
são a questão que substituia todas as outras : "O escoamento
total das materias excrementicias para o esgoto deverá ser au-
torisado nos que forem constantes e abundantemente alimenta-
dos por agua corrente, nos quaes não se accumulem areas ? 21
membros responderam sim, 7 não, 2 abstiveram -se.
Como applicação desta resolução, foram installados no Ho-
tel de Ville, Theatre Italien, nas escolas e no quartel municipal

(1 ) A. Mille - Assainissement des villes -pag. 241 .


759

do cáes Morland em Paris, apparelhos de accordo com as re-


commendações da commissão.
"Em vez das horrendas latrinas, diz A. Mille [ 1 ] , que fre-
quentemente se encontram nos estabelecimentos militares, ha
neste (quartel) gabinetes isolados, faiençados de esmalte branco ,
claros, ventilados. Os bacios são lavados por jorros d'agua in-
termittentes syphões interceptam a volta do ar : o tubo de
precipitação, de 0,15 de diametro, alteia - se ao tecto e é
aberto ao ar livre por cima e por baixo. A salubridade é ab-
soluta. Foi isto em 1883 ..
No anno seguinte procedeu -se a um inquerito que foi fa-
voravel as modificações aconselhadas pela Cominissão de sane-
amento apenas houve opposição quanto ao imposto creado
para fazer os trabalhos da canalisação que levassem as materias
fecaes ao esgoto e a agua para laval-os, fixado em 30 francos
por cada apparelho, além de uma taxa proporcional, variando
segundo o valor locativo dos immoveis. A administração mu-
nicipal, accedendo aos votos da maioria, que entendia que a
taxa deveria ser equivalente ao serviço prestado, supprimio os
direitos proporcionaes ao valor locativo e creou o imposto fixo
de 60 frs. por apparelho ( chute ), já existente para os depositos
das tinettes filtrantes. Relativamente as casas de aluguel inferior
a 500 frs. , admitio a reducção de metade, cobrando somen-
te 30 frs.
Novo inquerito em 1885 não só confirmou o bom exito das
anteriores experiencias, como aconselhou o alargamento das
medidas tomadas-do tudo ao esgoto.
Como se deduz da discussão havida, e das experiencias
feitas em Paris, prevaleceu a opinião de que as materias fecaes
não são tão nocivas ou prejudiciaes como pensavam alguns hy-
gienistas. Salvo o perigo de contaminação dagua de uso domes-
tico por ellas, pode-se assegurar que os demais são de pouca
importancia.
Vejamos o que dizem os inglezes :
"Se os esgotos em suas relações com a febre typhoide, diz
Murchisson, devessem ser considerados simplesmente como ve-
hiculos da transmissão pelas dejecções typhoides, em todas as
epidemias, era de esperar que a febre atacasse de preferencia

[ 1 ] A. Mille -obra citada, pag. 242.


760

os moradores das casas que communicassem mais livremente


com os esgotos publicos. Entretanto é o contrario que frequen-
temente se observa.
"A cloaca de despejo tem o grande inconveniente, diz Gu-
eneau de Mussy, de precisar ser esvasiada, inconveniente tanto
maior quanto o revolvimento das materias accumuladas ha tem-
pos é particularmente favoravel a explosão da febre typhoide .
Os esgotos constituem o systema mais proximo a perfeição, com
tanto que sejam de construcção perfeita.
W. Ford, de Philadelphia, os hygienistas inglezes Griffith,
Douglas, Galton, Radwin -Latham, Robert Rawlison , Van Mi-
erlo de Bruxellas, Lévin de Dantzig, Varrentrapp de Francfort,
Wirchow de Berlim são accordes em proclamar a inocuidade
das materias fecaes, quando abundantemente lavadas e carre-
adas por agua pura.
Um escriptor hollandez, Overbeek de Meijer, professor de
hygiene na Universidode de Utrecht, compendiou em duas
obras escriptas em francez [ 1 ], tudo quanto os profissionaes de
differentes paizes escreveram contra esgotos e especialmente
contra o systema - tudo ao esgoto -empregado primeiro na In-
glaterra e depois em quasi todas as grandes cidades do mundo .
Mais espaço dispozesse eu e transcreveria como curiosida-
de scientifica a verrina do erudito escriptor. Infelizmente em
todas as suas criticas sente- se o partidario de um systema que
cumpre a todo transe acreditar- o Liernur, cavando a ruina
dos rivaes.
Pelas demonstrações que adiante farei, baseadas em dados
estatisticos, fidedignos, comprehender- se-ha a importancia rea
que possuem os methodos de saneamento adoptados, na hypo-
these da innocuidade das materias fecaes.
Por ora, precis provar que os propri gazes , que inco
o os m-
modam ao olfato , não são tão perniciosos a saúde coino geral-
mente se crê .
"Os odores desagradaveis ou repugnantes, que tão grande
papel representavam na etiologia antiga , perderam muito a sua
importancia ; sabe - se hoje que o máo cheiro não prova presen-

Overbeek de Meijer Les systemes d'évacuation des caux et


immundices d'une ville- Paris 1888. A outra com o mesmo titulo
publicada em 1883.
761

ça de micro- organismos, da mesma forma que a não existencia


delle não garante que o ar, ao liquido ou outro qualquer corpo
esteja exempto de bacterias. ( 1 )
O professor Hofmann, de Leipzig, sustentando a inno-
cuidade dos cemiterios, allega o exemplo dos anatomistas a
quem os máos cheiros produzem nauseas e syncope, mas não
morrem por isto. O gaz da putrefacção, diz elle, repugnante em
relação a esthetica, tem o inconveniente, já assignalado por
Pettenkofer, quanto a hygiene, de obrigar-nos a fechar as ja-
nellas e impedir que respiremos livremente o ar puro.
O Dr. O. Du Mesnil pensa da mesma fórma : e Miquel diz
que o ar dos tumulos humidos são com certeza de uma extrema
pureza.
Nageli, Wernich e Miquel pozeram fóra de duvida o facto
de que "o vapor d'agua que se desprende das massas em com-
pleta decomposição é de uma pureza absoluta em relação a ger-
mens. (2)
O notavel hygienista francez - J. Arnauld [ 3 ] pergunta se
não haverá perigo em estar- se na visinhança das cousas putri-
das. "J'ai quelque peine à le croire" responde : "Os odores, diz
elle, não são um dynamismo puro, vibrações do ether, como a
luz e a electricidade ... Só os germens podem ser perigosos nas
materias putridas e d'ellas emanar em detrimento nosso. O mi-
croscopio e a chimica não vêm tudo, Os sentidos do homem fo-
ram por muito tempo guias assás livres e não perderam toda a
Sua autoridade .
Tem sido demonstrado muitas vezes e de modos diversos ,
por Nageli e por Wernich, que o ar que passa sobre liquidos,
putridos, ou sobre qualquer superficie penetrada de microbios
porém, humida, experimenta as maiores difficuldades em roubar
germens em quantidade sufficiente para fecundar liquidos de
cultura a fraca distancia da substancia infectada . E' mister para
que isto se dê que hajam bolhas que se rompam á superficie do
liquido putrido, ou algum outro modo bastante energico de agi-
tação. que projecte ua corrente de ar parcellas da materia em

( 1 ) Jules Arnauld - Les controverses recentes au sujet de l'as-


sainissement des villes- Paris 1882 , pag. 26.
(2) Jules Arnauld - cbra citada, pag. 28.
[3 ] J. Arnaul d― obra cit., pag. 28.
762

putrefação. Emfim, Miquel ( 1 ) , por meio de um apparelho tão


simples quão engenhoso, variou por todas as fórmas as experi-
encias que provam "a impossibilidade absoluta do vapor sus-
pender das infusões a mais leve bacteria. ( 2 )
Ouçamos o que um sabio engenheiro, director que foi das
obras municipaes e dos esgotos de Paris, Durand- Claye, disse
sobre a innocuidade dos gazes das cloacas
"Nous pouvons du reste produire à ce point de vue une
experience em grand, bien plus concluante, puisqu'elle se pour-
suit chaque jour depuis plusieurs mois . Le collecteur départe-
mental est dérivé à la porte de la Chapelle vers la plaine de
Gennevilliers par une galerie. A la prise de cette galerie sur le
collecteur, se trouvet deux ouvriers de notre service chargés des
manœuvres. Or, c'est en ce point que passent les eaux d'egout
additionnées à la dose de 1/100 de matières des cisternes du
dépotoir.
"Aucun fait, nous ne disons pas d'asphixie, mais de simple
indisposition ne s'est manifesté ; et afin de répondre à toute ob-
jection, provenant de la non continuité du séjour ( les ouvriers
remontant tous les soirs ), nous avons fait mettre un chien en
ce même point et l'on l'y a tenu attaché du 25 avril á 6 heures
du matin, au 30 avril 6 heurs du soir, soit 132 heures.
"Pendant ce laps de temps, dit M. C., conducteur prin-
cipal chargè de suivre l'experience, le chien couchait sur
une botte de paille ; sa nourriture était comme à l'ordinaire :
deux grosses soupes grasses melangées d'eau de vaisselle et des
os a ronger. Il n'a nullement souffert et a conservé tout sa
force ; aussi dès qu'il a eté remonté, á 6 heures, a t-il pris sa
course vers Gennevilliers, où il et est arrivé vers 6 heures 1,2
au jardin par le chemin des Cabæufs, le plus court."
Discutindo o resultado dessa experiencia, pergunta o Sr.
Durand-Claye se os 234 trabalhadores que passaram a vida
dentro da rede metropolitana dos esgotos de Londres são victi-
mas de asphyxia e se o modo rudimentar de ventilação das ga-
lerias de Londres e Berlim tem causado o envenenamento dos
transeuntes das vias publicas.
Mais adiante, quando tiver de tratar da ventilação dos es-

[ 1 ] Miquel - Annuaire de Montsouris - 1881 , pag. 475.


[2 ] J. Arnauld -obra cit., pag. 72 .
763

gotos, direi mais algumas palavras sobre esta questão, que, como
se sabe, é da maxima importancia quando se trata dos meios de
dotar uma cidade de esgotos e de outros melhoramentos sa-
nitarios.
A conclusão, portanto, a tirar da tolerancia das cloacas fixas
é a que a commissão de saneamento de Paris, composta das pri-
meiras sumidades medicas e da engenharia, formulou , depois de
24 sessões, durante as quaes as discussões se prolongaram, de
viagens e experiencias - nestes termos : Quando a agua e os
esgotos faltarem, tolerar-se - ha a fossa fixa, recommendando a
applicação da extração das fezes pelos processos aperfeiçoados
de esgotamento atmospherico. Quanto aos apparelhos separa-
dores e diluidores, tendo por fim deixar passar os liquidos e
guardar os solidos, serão proscriptos, porque são um modo im-
perfeito das fezes ao esgolo.
CLOACAS MOVEIS .-" No relatorio e trecho a que alludi, do
Dr. Lassance Cunha. suppõe o seu autor que este systema é
preferivel ao das fossas fixas por ser menos nocivo a salubrida-
de das habitoções.
Não me posso capacitar deste pretendido melhoramento .
A cloaca amovivel consiste, como todos sabem , em vasos de
madeira ou de ferro com a forma de pequenos barris, cuja ca-
pacidade não excede de 60 litros. Esses vasos recebem as mate-
rias fecaes por 3, 4 e 6 dias e estão geralmente expostos nos
quintaes a todas as intemperies.
As pessoas que fazem o serviço domestico nem sempre têm
o preciso cuidado, na occasião de lançar as excretas dos vasos
nocturnos nos taes barris, de evitar os extravasamentos, sendo,
pelo contrario, muito frequente a repetição d'este factos.
Accresce que, pela exposição ás intemperies, as materias
excrementicias entram em decomposição em 24 horas, derraman-
do no ambiente gazes mephiticos, principalmente quando rece-
bem o conteúdo dos vasos utilisados no serviço domestico.
Quando chove, as aguas lavam esses barris, e o solo, sobre
que elles assentam embebe -se dos liquidos carregados das ma-
terias em decomposição.
Ninguem dirá que esses pequenos cubos , saturados de mi-
cro-organismo desde o segundo dia de uso, sem chaminé , pela
qual descarregue a certa altura da atmosphera os gazes que se
764

desprendem dos excrementos , sem o correctivo do solo profundo


das fosзas fixas, nos quaes se lançam frequentemente desinfec-
tantes, proximos dos commodos habitados das casas, sejam um
melhoramento real sobre as cloacas fixas.
O systema de remoção desses cubos e o seu despejo, quan-
do outras razões não militassem contra a sua adopção bastaria
para condemnal - o, por ser o mais anti - hygienico e encommodo
para os infelizes moradores das ruas por onde passa esse corte-
jo do saneamento tolerado, senão aconselhado por nossa sciencia
official.
Os conductores dos barris, recrutados na escoria da infima
classe de jornaleiros, pela natureza repugnante do serviço, são
outros tantos agentes de infecção da cidade. Immundos, asque-
rosos, mostram nas suas vestes os traços do officio. Não raro
por embriaguez ou pelo máo estado dos vasos, despejam os es-
crementos nas ruas, nas quaes permanecem dias e dias, apenas
cobertos por tenue camada de areia, sem que a autoridade sani-
taria mande proceder a sua desinfecção dellas .
O trajecto dos vasos por dentro das ruas de maior transito
e a todas as horas do dia, mal obturados ou sem coberta, infec-
ciona o ar das mesmas. tendo na passagem pelo interior das
casas mal ventiladas, despejado os seus gases pelos comparti-
mentos habitados .
O modo como se opera o despejo no mar é um acto de sel-
vageria, senão um crime de lesa hygiene, que cumpre quanto
antes fazer cessar por honra dos nossos creditos de terra civili-
sada e para beneficio, não só dos que habitam o bairo littoral.
como de toda cidade lavada pelos ventos de leste, de mar, pelas
brisas marinhas.
O conductor entra no mar até a altura dos joelhos e alli
despeja o conteúdo do barril.
A vaga muitas vezes burrifa- o com agua e excrementos, e
n'este estado volta elle [ carregador] gottejando pelas ruas da
cidade, e até pelo interior das casas, que por essa forma ficam
maculadas, infeccionadas.
As ondas por sua vez repellem para a praia aquellas dejec-
ções, que permanecem na areia dias e dias até que sejam redu-
zidas a poeira ou a pequenos fragmentos e transportados pelos
ventos ou pelas correntes de maré para N- O da cidade.
765

Quem uma vez visitou a nossa praia pela manhã ou a noite,


nunca mais se esquecerá da orla de excrementos humanos que
as marés altas formam ao longo d'ella , sobretudo do hospital de
Misericordia para o norte.
Os odores pestiferos que d'alli se exhalam chegam algumas
vezes até o plano mais alto do Passeio Publico, e toda a praia é
uma vasta sentina, da qual ninguem se pode aproximar impu-
nemente.
Admitta-se que tal systema seja adoptado durante uma epi-
demia de molestia contagiosa , e depois d'esta descripção com-
prehender- se- ha a que perigos ficará exposta a população desta
capital. Em vez de um fóco (a cloaca fixa ), facilmente desinfec-
tavel e isolavel, milhares d'elles a derramar pelas ruas, nas habi-
tações e nas praias, os germens mortiferos, os microbios pes-
tilenciaes.
Vejamos, porém, se pelo lado economico é ao menos des-
culpavel.
O serviço, tal como se faz, é simplesmente inadmissivel, tra-
tando-se de uma empresa regularmente organisada ; não só pelo
enorme perigo que delle resultaria para a saude publica, como
pela falta de braços para as operações de transporte, des-
infecção. etc.
A Fortaleza contém mais de 6.000 casas, das quaes 4.000
dentro da área a que se póde applicar este melhoramento.
Admittindo-se que um homem condusa ordinariamente 8
barris por dia [ 3 $200 , a razão de 400 réis por cada um] seriam
precisos 500 trabalhadores para o transporte dos 4.000 barris
ou 250 de dous em dous dias.
O espectaculo que offereceriam as ruas da cidade, crusadas
em todos os sentidos durante o dia por taes carregadores, mu-
nidos de cubos de materias fecaes, seria o mais tristonho e o
menos saudavel. E' facil de imaginar os atropellos e os derra-
mamentos d'aquellas materias na via publica .
Um serviço regular, como se faz em algumas cidades euro-
péas, requer capitaes crescidos empregados em vehiculos de fer-
ro, em cubos do mesmo metal, revestidos de louça, em animaes
de carga, em armazem de deposito, no material, cavallariças,
casa de desinfecção, bateis de transporte para conduzir as
766

fézes até onde a corrente marinha e ventos possam carreal - os


para o mar alto , etc. I
Vou tentar, na deficiencia de dados certos, orçar esses di-
versos serviços.
Em primeiro logar, surge a questão de saber qual a quan-
tidade de materias excrementicias a retirar-se dentro do perime-
tro da cidade, na qual as carroças de transporte possam
trafegar.
A quantidade de materia excrementicia por habitante é
avaliada por Frankland nas seguintes cifras :
Producto diario total 1 k. 26, dos quaes
Liquidos • · 1,17
Solidos . 0,09
Equivalentes a proporção de 93 por loo de liquidos e 7 de
materias solidas.
No estado de puresa. - 1000 ks. desta materia fresca con-
tém grande quantidade dagua, 73 a 75 por loo ; dosam em azo-
to 9 ks. 373, dos solidos, seja uma dose superior de 8 vezes nos
liquidos aos solidos.
As 4,000 casas, dentro das raias do serviço das carroça.
conterão de 38,000 a 40,000 habitantes, o que equivale a dizer
que as materias excrementicias, na proporção admittida por
Frankland, terão o peso de 50,000 ks.
Os cubos de ferro pesarão de 12 a 18 ks.; sejam 15 kilos
na media.
Devendo cada casa possuir um cubo, além de outro para
as demoras havidas no despejo e desinfeçao, serão elles en nu-
mero de 6,000 para conterem os 50,400 ks. de fézes ou 12 ks. e
6000 grs. para cada um.
Cada carroça poderá conduzir 16 cubos com o pezo de 450
a 500 ks., de cada viagem, ou em 4 viagens -64 cubos com
2.880 kilos.
Fazendo- se o serviço diario seriam precisas 62 carroças :
fazendo - se em dias alternados o numero de cubos po cada car-
roça deverá ser inferior, porque a quantidade de materia excre-
menticia seria o duplo da que me serve de unidade para o
calculo.
Admitamos, porém, que o numero das carroças de serviço
seja de 40 a 45 e que no deposito fiquem 20 a 25 ao todo.
767

O seu custo não será inferior a 1 : 200$( 00 por


cada uma ou pelas 60 .... 72:000$000
5000 cubos a 20 $ .. 160:000$000
Animaes de carga , a razão de 2 por carroça
e 50 por cento para o descanso -90 + 45 = a 135 ,
a 250$ cada um .... 33:750$000
Casa para deposito do material e officinas
de reparo ... 30:000$000
Cavallariças 10:000$000
Installação na praia para recebimento dos
cubos, barco de transporte, etc ………. 65:000$000

Total 370:750$000

CUSTEIO

45 carroceiros a 3$000 diarios ... 130$000


15 homens empregados nas cavallariças, ar-
reios á 2 $000 ……….. 30$000
5 operarios, officiaes a 44000 .... 204000
20 para o serviço de desinfecção, barca, etc.,
a 24000 ... 40$000
Alimentação de 135 animaes a razão de ..
1 $400 por dia .... 189$000
Administração 30$000

Total. 439$000
Digamos 440 por dia. Em 365 ou um anno attingirão ……….
160 : 600$ . A esta quantia cumpre accrescentar a amortização
pelo estrago do material, a razão de 20 por cento para os cubos
ou 32 : 000 $000 , 10 por cento para as carroças ou 7:200$000, 2
por cento para animaes 675 $, lo por cento para rebocador ou
4: 000$, e para o demais material 1 : 500$ —Total 205 : 975 $000 .
Temos o grande total de .. 205:900$000
Eventuaes .. 20:500$000

Total.. 226:400 000

Assim o primeiro capital de estabelecimento não será infe-


rior a 500 contos, dos quaes cerca de 400 para o material, e
100 para as despezas do custeio até a percepção das taxas.
768

Qual será a receita provavel na melhor hypothese ?


Fazendo -se a remoção dos cubos de 2 em 2 dias, a razão de
300 por cada um, e em 182 vezes por anno, ter- se- ha 54$600
por casa [ o que já é exagerado ] , e pelas 4.000--218: 400$000 an-
nualmente.
Cada casa pagará por este serviço 4$555 mensaes '
Sendo a despeza do custeio de 226 contos, sujeita a even-
tuaes, segue-se que a receita mal cobrirá aquella, não dando
margem para amortização e juros do capital empregado.
Assim, o prejuizo pela não percepção dos juros [ 10 por
cento] do capital empregado importará em 50 contos, tendo-se
um serviço mau, condemnado por todos os hygienistas.
O transito das 45 carroças pelas ruas desta capital será es-
pectaculo repugnante, e a despeito de todos os melhoramentos
não se evitará o derramamento de gazes mephyticos nas casas e
ruas, e ás vezes o extravasamento das fézes [ 1 }.
Os que advogam o systema das fossas moveis soccorrem-se
a uns, poucos exemplos isolados, a factos mal observados, e na
sua maioria contraditados por autoridades insuspeitas.

[1 ] O Dr. João Felippe Pereira , que se occupou com o estu-


do dos esgotos da Fortaleza, pronuncia-se no seu helatorio, ainda
inedito, sobre as fossas moveis nos seguintes termos :
"O emprego de taes fossas em que differirá dos esgotos.
"O systema das fossas moveis consiste em conduzir as ma-
terias pelas ruas da cidade em vasos onde terão, passados al-
guns dias, entrado em fermentação, não havendo até hoje fe-
chamento algum hydraulico ou não, que impeça a dispersão
do mau cheiro e dos miasmas na substituição de um vaso por
outro no interior da habitação, não em um unico aposento da
mesma e sim em todos por onde passar, sendo depois lançados
na superficie do mar, necessariamente muito perto da costa,
salvo se em barcos forem transportados para longe. Além disto
tem as fossas moveis um defeito commum ás fixas sobre cujo
perigo não ha mais duvidas : o inquilino tem interesse em limitar
ao minimo a quantidade d'agua empregada no aceio da latrina, tanto
para não agmentar o custo de transporte do conteúdo dellas
como por não reduzir o periodo para o qual a capacidade dos
recipientes fixos ou moveis deve chegar, lançando ao quintal
as aguas da cosinha, etc.
Os esgotos, ao contrario, conduzem as materias muito abaixo
do nivel das ruas, no momento mesmo em que são nelles lan-
çadas antes da fermentação ; sem produção de miasmas chegam
769

Vejamos o que dizem os seus partidarios.


Segundo Alcok, de Sunderland , no congresso de Londres em
23 de Maio de 1878, os conselhos municipaes da cidade de Man-
chester e de Birmingham, que possuiam esgotos canalisados e
agua abundante, dicidiram- se adoptar o systema das fossas mo-
veis e interceptar as communicações dos water closets com os es-
gotos. Em Manchester deu- se este reviramento em 1868 , e a mor-
talidade baixou logo em Rocdale este mesmo systema foi ap-
plicado desde 1870 , epocha em que a mortalidade fora conside-
ravel- 27 por mil, na media. Nos 3 primeiros annos depois
desta applicação a mortalidade baixou até 24 por 1,000, no sexto
anno a 22 e no setimo a 21. A cidade de Halifax, Leeds. etc. ,
fizeram o mesmo .
Outro facto :
A cidade de Edimburgo compõe -se de duas partes : a nova
e a velha cidade; aquella habitada pela gente rica, esta pela po-
bre ou apenas abastada. A cidade nova é servida por uma rede
de esgotos e de water closets de systema inglez, comprehendendo
27,294 casas; a velha tinha 14,316 casas e empregava as fossas
moveis, limpas diariamente. N'estas casas a febre typhoide e a
diphiteria eram desconhecidas ; n'aquellas taes molestias são en-
demicas. (1 )
Deu-se o mesmo em Selkirk, segundo o testemunho do Dr.
Littlejohn.
Em contrario lêa-se o que escreveu Jules Arnauld na sua
monographia - Les controverses récentes au sujet de l'assainissement
des villes. (2) As cloacas moveis, quero dizer as que recebem e
guardam os excrementos solidos e liquidos, estão quasi abando-
nadas, quando se falla de cidades grandes. O systema é excessi-
vamente atravancador ( encombrant) : supponhamol- o generali-
sado em Paris, não se veria senão baldes [ tinettes ] nas ruas.

ao mar, ainda antes d'ella, sob uma camada d'agua consideravel,


longe da costa, e exigem que o inquilino lhe lance todas as aguas
do aceio, assim como as da cosinha, etc. [ Relatorio do Dr. João
Fereira nº 65!.

[ 1 ] William Haywood - Report to the struz committee of the


Honorable the Guemis.

[2] J. Arnould -- ibid. - pag. 6.


770

Além disto, só em theoria é perfeito. Os baldes ou barris


nunca fecham bem, não são sempre guarnecidos de desinfectan-
tantes, estão sujeitos ao extravasamento, requerem uma cava,
não são removidos frequentemente ... Por ser movel não deixa
de ser cloaca.
Algumas cidades inglezas empregam este processo sob for-
mas diversas: Leeds, Nottinghan , Rochdale. Salford , Glasgow, E-
dinburgo, Lancaster; mas elle não se generalisou em ponto algum.
Na Allemanha sabe - se que Heidelberg offere a mais séria
applicação das fossas moveis : 237 casas possuiam- nas em 1880.
O Dr. Mithermaier, que fez destas installações o objecto de
sua actividade, assegura que ellas exerceram benefica influencia
sob o estado sanitario da cidade e particularmente uma baixa
mortalidade typhoide. Varrentrapp. pelo contrario, acha essas
conclusões prematuras e apresenta dados officiaes que induzem
a crer que, de 1877 a 1880. Heidelberg foi uma das cidades
allemães mais maltratadas pelo typus abdominal.
"As mesmas reflexões pouco mais ou menos seriam appli
caveis as tinettes filtres ou divisores, si alguma cousa dividem¸
Taes quaes são, diluindo em vez de dividir, que é o que ellas
podem fazer de melhor, equivalem as despejo integral dos ex-
crementos no esgoto, com a differença de que retardam o curso
das materias e d'agua e constiruem uma complicação, pelo me-
nos encommoda , quando não occasionam incidentes bastante
perigosos".
"Um dos defeitos mais grave das fossas moveis, observa o
sabio director dos trabalos de hygiene de Paris - Dr. Brouardel
provem das despesas de manutenção e de transporte que ellas
impõem aos proprietarios. Para tornar as tinas (tinettês ] mane-
Javeis e transportaveis foram obrigados a reduzir o seu volume
ao de um barril ordinario, representando o peso de 250 kilos ,
Por isso é necessario de oito em oito dias, pouco mais ou menos.
substituir o recipiente cheio por outro. Concebe-se que se, em
Paris, todos os sumidouros, em numero de 230.000 fossem mu
nidos de uma tina semelhante, a circulação dos carros carrega-
dos dellas seria incessante na cidade".
Por algum tempo acreditou - se em Paris poder substituir van-
tajosainente as fossas fixas por tinettes filtrantes , cujas vantagens
eram as seguintes :
771

1ª suppressão do chaminé de ventilação e por conseguinte


dos odores que delles se escapam ; 2ª extracção rapida das ma-
terias : 3 suppressão das manobras do despejo ( vidange ) que
infectam as ruas ; diminuição consideravel na importancia dos
depositos [ depotoirs ] , 5º maior limpeza nos gabinetes . O seu
estabelecimento foi autorisado em Paris em 2 de Julho de 1867
e já em 1890 havia 27.000 apparelhos servindo cerca de 500.000
pessoas.
“Na realidade, diz Pignant, o effeito hygienico das tinettes
é nullo e talvez pernicioso. Effectivamente mantêm por baixo
do cano de precipitação um elemento de fossa mais ou menos
infecto. Da mesma forma que os barris, expõe o sub- sólo a
transbordamento pela manualização que pode maculal- o .
Accresce que os excrementos liquidos ou parte dos solidos
que a agua consegue desagregar e atravessam os crivos para o
esgoto são tão prejudiciaes a salubridade quanto os residuos
que ficam nas tinas, porque as materias liquidas contêm mais
elementos organicos e, consequencialmente, mais elementos
susceptiveis de entrar em fermentação.
De tudo quanto fica dito, pode se concluir que o systema
das fossas moveis não remedeia os males de cloáca fixa e que
pelo contrario, os aggrava em desproveito da hygiena e das eco-
nomias do contribuinte do fisco .
Pondo termo a esta consideraçõeo sobre os systemas de
saneamento domestico, empregados nesta capital, alonguei- as
propositalmente por me parecer que o proceder das commissões
domiciliarias, mandando fechar as fossas fixas e aconselhando
os barris removiveis, não obedecia a verdadeira orientação
scientifica.
Melhor fôra, sem duvida, submetter aquellas cloácas a cer-
tas condições , sobretudo a desinfecções periodicas, e para o fu-
turo, emquanto não se estabelecessem esgotos, a construção de
fossas estanques, segundo as regras da arte.
AUGMENTO DO TRABALHO SEDENTARIO. -Esta causa não
tem a importancia que assume em outras partes.
O clima, o atavismo, a facilidade de subsistencia não convi
dam a exercicios prolongados ao ar livre. Mesmo nos nossos

[ 1 ] Pignant- Assainissement des villes, pag. 127.


772

campos os agricultores são forçados a guardar a casa, fazendo a


sésta nas horas mais callidas do dia, o que demonstra que nem
o habito de soffrer as rudes intemperies do tempo os impelle a
arrostar o sol ardente das 11 ás 2 horas da tarde.
Nas cidades, e geralmente nos povoados de certa importan-
cia, os labores feminis são meramente domesticos. Quando cre-
anças e frequentadoras da escola, ficam pela erronea pedagogia
dominante, condemnadas a mais completa immobilidade nas
classes. O ter medo, isto é, o estar quieto, contra as exigencias
mais elementares da idade, constitue um titulo de superiorida-
de, de distincção. Longe de ensinar-se que a vida implica mo-
vimento, e que o exercicio em todas as idades e especialmente
na infancia é condição primeira da saúde, do desenvolvimento
intellectual, doctrinam que as creanças precisam imitar a gravi-
dade da velhice e a quietetude das estatuas.
Nas classes menos abastadas e nas medianas os poucos la-
zeres das meninas são occupados pela industria mais sedentaria,
a fabricação de crivos. rendas, etc.
Depois de alguns mezes deste regimem a natureza submet-
te-se, incapaz de reagir, debilitada, começando a anemia a fa-
zer os seus estragos habituaes.
Na Europa, onde os cuidados hygienicos são dispensados
pelos poderes publicos a todas as classes, e as industrias insalu-
bres são ameudadamente fiscalizadas, onde a vida individual,
să e integra, é uma força para o Estado, a sorte das classes o-
breiras, especiamente a das que se dedicam a trabalhos sedenta-
rios, deixa mui o a desejar, é por assim dizer um suicidio que
se protella.
Imagine-se o que será entre nós, onde nem os poderes pu-
blicos, nem a caridade particnlar vão em auxilio dos condem-
nados a trabalhos dessa natureza.

Segundo Thouverin, nada é mais triste do que a posição


das rendeiras ; em loo creanças de 5 a 7 annos a quem ensinam
por 4 annos, conforme o costume, este officio, 50 pelo menos,
antes dos 50 annos, estão corcundas soffrendo inflammação das
palpebras, amaurose, myopia. , e mesmo cegueira, resultado do
excessivo cansaço da vista ; noutras, são symptomas de escrofu-
las, a estatura abaixo da medio, pallidez , rosto descarnado, e
773

finalmente , a medida que se adiantam em annos, numerosas


infermidades.
"O trabalho, diz Becquerel ( 1 ) não é a causa unica destes
accidentes ; é mister referir a mesma origem a posição constan-
temente inclinada do corpo durante o dia inteiro, a immobilida-
de quasi absoluta das extremidades inferiores, a applicação con-
tinua dos olhos em trabalho fino e cansativo, a habitação nas
cavas ou nas camaras humidas e escuras, o desasseio, a má ali-
mentação".
As estatisticas medicas nos instruem sufficientemente sobre
a maior frequencia da mortalidade em certas profissões. Assim
Lombard, de Genebra, achou que em iooo obitos, a tisica
havia fornecido as proporções seguintes :
Profissões que recebem poeiras diversas . 145
66 de vida sedentaria ... 140
6. 138
de vida passada nas officinas ..
66 127
de ar quente e secco ...
66 de posição curvada ... 122
66 de movimentos de braços ... 116
6. de exercicio muscular e vida activa .. 80
66 de exercicio da voz ... 75
de vida ao ar livre ... 73
66 de emanações animaes .. 60
66 53
de vapores aquosos ...
O notavel hygienista Michel Levy [ 2], tratando das profis-
sões, ensina- que " causas multiplas se enfeixam para produzir
os estados morbidos que são o apanagio da vida sedentaria : o
ar limitado (escasso), a natureza das materias trabalhadas, a
posição viciosa, e a carencia de exercio ao ar livre. Basta esta
ultima causa para produzir a inercia dos orgãos, o embaraço
da circulação, a predisposição para os engurtimentos splanchni-
cos, as inchações, ao limphatismo, as escrophulas, etc. Lombard
achou que em 30 profissões sedentarias, que deixam o corpo em
repouso quasi completo, dous terços estão acima da media
geral dos obitos pela tisica em todas as profissões, a qual é

(1) Becquerel- Hygiene privé et publique. cap. XV, pag. 951 .


(2) Michel Levy - Traité d'hygiene publique et privé, Vol. 2
pag . 753.
774

de 114 por 1,000 ... Ramazzini já havia notado que as profissões


sedentarias que exercitam os braços, os pés e o corpo intei-
ro, debilitam menos e gastam mais vagarosamente assim a
nsufficiencia de movimento retarda o effeito da inacção muscu-
ar. -Seria longo transcrever o bello capitulo do livro classico
de Michel Lexy para mostrar a influencia exercida por cada in-
dustria sobre a conformação physica do operario e as lesões
que ella produz
Sabe- se que a vida sedentaria em aposentos estreitos, hu-
midos ou escuros, produz entre nós a chloro- anemia, fonte pre-
disponente para as demais enfermidades.
Com a fundação de fabricas de tecidos, de meias, cortume ,
cigarros, sabão, vinho de cajú, fundição, etc., o numero de opera-
rios mais que decuplicou nesses 15 ultimos annos. O pessoal.
dessas fabricas é superior a 2.500 pessoas. O serviço domest ico
conta a 5.000 pessoas. As pequenas industrias de rendas, bor-
dados, costura, tricós, engommados, nunca menos de 3 a 10.000 .
Geralmente essas industrias são exercidas em commodos acanha -
dos, sem as condições hygienicas precisas.
Quando proprietario e director da Fabrica de tecidos de
algodão cearense, tive frequentes occasiões de observar os effei-
tos da atmosphera saturada de poeira de algodão sobre cre-
anças e mulheres. Dentro de alguns mezes aquellas e estas ad-
quiriam uma côr macilenta, caracteristica, a despeito da gran
de tolerancia em permittir- se- lhes recreios na chacara da fabri-
ea, ao ar livre, duas, tres e mais vezes durante o dia, e por
muitos minutos de cada vez .
Acredito. porém, não ser tanto o regimen fabril e a vida
sedentaria a causa principal das molestias ordinarias nos opera-
rios. Raramente, a não ser em periodos epidemicos de sarampão .
bexiga douda, febres palustres, grippe, os meus operarios
faltavam ao serviço por molestias.
A influencia da vida confinada em agglomerações de 200 e
mais pessoas, embora a grande área dos edificios, como aconte-
eia na minha fabrica, deveria ser nociva á saúde, mas a percep-
çãode causa para effeito escapa as mais das vezes ao obervador .
Que ella existe, basta ver a transformação porque passam
as pessoas mais fracas submettidas ao regimen fabril : mas até
onde vão as suas consequencias é o que eu não poderia responder
775

IMPORTAÇÃO DE DOENTES DE MOLESTIAS CONTAGIOSAS E


INCURAVEIS. - Bem ou mal adquirida, o Ceará conquistou em
muitos Estados do Brasil a fama de lugar salubre, apropriado a
cura de certas molestias chronicas ou rebeldes a therapeutica
ordinaria.
A seccura do sertão, com a sua temperatura elevada e sem-
pre igual, provou ser conveniente as enfermidades das vias res-
piratorias, sendo numerosos os casos de restabelecimento , real
ou apparente, de tuberculosos. Os consumidos por febres pa-
lustres do Piauhy, Maranhão, Amazonia tambem encontram no
nosso clima prompta restauração das forças e da saude alterada.
Effectivamente a salubridade geral do Estado do Ceará é se .
melhante, superior talvez, a de outro qualquer estado do Brasil,
Comprova o, como já ficou dito, o desdobramento rapido da po-
pulação sem o auxilio de corrente immigratoria estrangeira ou
nacional.
Precisamente á essa qualidade excepcional deve esta capi-
tal as levas de enfermos que demandam as suas plagas em
procura de alivio . E como geralmente esses enfermos, guiados
por uma ultima esperança, só tardiamente recorrem á mudança
de clima, qual salvaterio infallivel, acontece que, na maioria dos
casos, mal acabam de chegar, não podem proseguir viagem
e aqui se existinguem em breve lapso de tempo.
Só em casos graves consentem os facultativos de outros Es-
tados que os seus doentes tentem os azares desta therapeuticas
a esperança ou o desejo de melhoral- os é serio obstaculo para
que elles os deixem partir mais cedo.
Não admira, portanto, que no obituario desta capital a
somma dos mortos, estranhos a ella, seja relativamente crescida
concorrendo por esta forma para elevar a media da mortali-
dade geral.
Por outro lado, não são sem perigo para a saude publica as
levas de tuberculosos que aportam a Fortaleza, e seguem para
as cidades do interior, onde vivem sem as cautelas necessarias
propagando os germens de molestias contagiosas pelas pessoa
da sua intimidade e serviço .
A tuberculose era, ha meio seculo, dos grandes males que
affligia a humanidade, um dos mais raros no Ceará.
A molestia de peito, como então a chamavam, excluia o pacien-
776

te do commercio estreito com os habitantes də uma localidade.


Mil cautelas eram tomadas para evitar- se o seu contagio. Hoje, a
despeito das experiencias de Koch sobre a transmissibilidade
d'ella, poucos são os que della se preservam .
Esta indifferença em face de um perigo tão serio, procede
da rapidez com que esta molestia se tem propagado no seio de
todas classes, trazida, sobretudo, pelos que demandam o Ceará
em procura de restabelecimento .
"As causas mais frequentes do desenvolvimento desta af-
fecção , além da hereditariedade e da contagião, são a humi-
dade do solo, o calor humido, habitações acanhadas, pouco ven-
tiladas, a alimentação insufficiente pela quantidade e qualidade,
os excessos de todo genero . etc. ( } )
A ociosidade e a inercia, os habitos artificiaes creadas pelo
luxo, a que Bouchardat chama--a miseria dos ricos são outros
tantos factores da propagação da tuberculose.
Em 1894 o Dr. Pierre Petit, nota vel especialista d'esta en-
fermidade, de Paris, procurou demonstrar por umaserie de ex-
emplos convicentes, que a hereditariedade causava menos es-
tragos do que a contagião, e a falta de precauções hygienicas [2 ]
Da comparação dos dados atras expostos, vê -se que a For-
taleza é uma das cidades do mundo na qual a mortalidade pela
tisica mais victima a população, regulando neste particular
com a triste celebridade de Paris e Bremen .
Em abono da verdade, devo accrescentar que muitos dos
victimados, computados no obituario geral, não habitavam a cida
de; eram forasteiros que aqui vinham exhalar o ultimo suspiro,
em busca da melhora sonhada. Poder- se ha dizer outro tanto
dos grandes centros de civilisação para onde affluem os doentes
na esperança de que a alta sciencia opere o milagre desejado . [ 3 ]
Seja como fôr, ha n'isto objecto para sérias cogitações e
delle não se poderá dizer o que repetia Hamlet . [ 4 ]
There are more things in heaven and earth
Than are dreamt of in our philosophy.

[1 ] Dr. Souza Costa -Relatorio, pag. 18.


[2] Rerue scientifique de 1894.
[3] Veja-se o que ficou dito a pagina anterior.
[4 ] Shakspeare - Hamlet- acto 1 , se. 5.
777

"Ha mais mysterios no céo e na terra do que os conhecidos


pelos philosophos".
Para desvendar o mysterio seria mister conhecel- o á luz
de investigações scientificas.
E' o que nos falta.
Qual o numero exacto de tuberculosos na mortalidade ?
Onde residiam os fallecidos ?
A que causas se deve imputar a molestia ?
Qual a população real da Fortaleza ?
A solução d'estes quesitos não transcende os limites da
acção official, nem demanda profundas investigações.
ANNOS CLIMATERICOS. -Ûutra causa, que assignalei como
productora da excepcional mortalidade, prende-se ás alternati-
vas meteorologicas por que tem passado o Ceará n'esses ultimos
15 aunos.
O observador superficial, imbuido de theorias especiosas
veria na coincidencia entre o abaixamento do lençol aquifero
do sub solo desta capital e em geral do Estado , nos annos seccos,
de 1877 a 79, de 1888 e 89, de 1891 , etc. e o augmento da mor-
talidade a confirmação da celebre doctrina do Dr. Pettenkoffer,
cuja exposição succinta nos dá J. Arnould nos Elementos de Hy-
gine, nesses termos:
"Um lençol mui proximo do solo pode exercer influencia
perniciosa, mas não é tanto a proximidade da camada aquifera
quanto as suas oscillações verticaes que tem importancia.
"Effectivamente, as camadas do solo absolutamente sub-
mersas e inaccessiveis ao ar obstam em absoluto ou parcialmen-
te o trabalho de putrefação das materias organicas. Os medicos
legistas sabem por exemplo, que os cadaveres se conservam por
muito mais tempo n'agua do que expostos ao ar. Da mesma-
sorte, se o ar é perfeitamente secco, a decomposição pode ser
ndefinidamente retardada. Resulta d'isto que o estado mais fa-
voravel do solo para as fermentações organicas é o que chama-
mos humido; isto é, o que permitte o conflito d'agua e do ar so-
be as materias organicas, que o solo recebeu.
D'aqui a importancia das oscillações do lençol aquifero sub-
terraneo .
"Se depois de ter estado muito alto , isto é, proximo á su-
perficie, obstando a fermentação nas camadas mais ricas em de
778

trictos organicos, elle começa a descer, é claro que deixa o solo


humido sendo ao mesmo tempo substituido pelo ar. Pelo con-
trario, estando muito baixo por tempo prolongado e as camadas
surperficiaes deseccadas, estas só possuem ar e por consequen-
cia são salubres : mas se a agua subterranea torna a subir, o
solo superior molha-se novamente e posto que salubre no tempo
da submersão, adquire humidade necessaria á putrefacção em-
quanto o lençol se abaixa de novo.
"Não é, diz Pettenkoffer, o solo poroso em si, nem o lençol
subterraneo só, que têm importantancia em face do desenvolvi-
mento das epidemias cholericas; é a circumstancia determinante
das alternativas do nivel d'este lençol, das inundações subterra-
neas. A epidemia de 1854 de Munich e a de 1855 de Zurich e
outras foram precedidas de enorme elevação do nivel d'agua
tellurica".
O Dr. Buhl, notando mez por mez, de 1855 a 1866, os casos de
mortes pelo typho no hospital de Munich, verificou igualmente
que os niveis mais baixos do lençol d'agua coincindiam com as
cifras mais altas da mortalidade typhoide e inversamente, que
os niveis mais altos do lençol subterraneo concordavam com as
cifras mais fracas do typho abdominal.
Depois desta exposição , ser-me-hia licito mostrar tambem
a concordancia entre as oscillações do lençol d'agua subterranea
nesta capital e as grandes epidemias da variola, do sarampão ,
das febres remittentes, que nos annos de 1878 , e 1891 tanto fla-
gelaram os seus habitantes.
Causas mais tangiveis e muito menos hypotheticas expli-
cam satisfactoriamente a recrudesceneia d'essas epidemias.
Por um lado o accumulo de população mal alojada, ora ex-
posta a todas as intemperies, ora encerrada em espaços estreitos.
infectos, sem ar, na maior promiscuidade de sexos, sem morali-
dade, nem a minima noção de hygiene, andrajosa, sordidamen-
te desasseiada : por outro, as condições telluricas da atmos-
phera, rarefeita , quente, acabrunhadora, a escassez da alimen-
tação, as privações de todo o genero, o desalento de espirito, a
penuria por toda a parte e em tudo, bastavam para gerar o
mais intenso foco de molestias contagiosas.
Nas immensas caravanas, que se chamaram abarracamentos
todas as sordidez do corpo, todas as enfermidades transmissiveis
779

deram-se rendez vous. Foram as alegres kermesses da peste, on-


de a morte fez a mais valiosa e a mais facil ceifa.
Esses annos climatericos são felizmente raros, e os seus ef
feitos desastrosos podem até certos limites ser minorados, senão
reduzidos a minguadas proporções, como acontece actualmente
na Europa, graças a hygiene e ás artes agricolas e industriaes.
Eis resumidamente as principaes causas da mortalidade
n'esta capital. Como se vê d'esta exposição, são ellas na maioria
removiveis ou minoraveis. E' uma questão de hygiene publica,
cuja solução se impõe a attenção dos governos .
Fechando este capitulo, dou aqui a tabella da mortalidade
da cidade da Fortaleza por mez, desde 1878 a 1906, e a de nasci-
mentos e obitos em 39 cidades.
190 903 1904 1905 1906 1907

129 88 98 90 115 95
145 101 102 100 107 96
127 106 171 270 138 145
144 133 185 281 163 132
122 105 101 201 140 106
62 101 114 87 106
8858

595 758 1.056 750 680


198727
708288

47 4 777074
96 71 84 129 84 97
93 68 68 93 87 80
97 60 60 102 64 89
89 89 82
86 84 93
120 95 108 100
82
00

450 433 605 456 541


332 .045 1.191 1.661 1.206 1.221

658 738 769 702 712


674 453 892 504 509

395 768 913 974 1.527 587


104 44 219 159 48 133

499 812 1.132 1.133 1.575 720

2
INDICE ALPHABETICO (* )
DAS MATERIAS CONTIDAS NESTE VOLUME

Abelhas 166
Acarahú [ R. ] 39, 45, 102, 107, 290–92, 339.
.
[Porto ] 45.
66
[ Cidade ] 92 , 367 , 663–64-69–84, 40, 52,
66
[Açude] 374, 476.
Acarahú-mirim [ Açude]
66 66
[R. )
Acarape [ Serra ] 29, 30 .
**
[Rio] 29, 575 .
66
[Cidade ] 66, 667 , 681 , 684-5, 38.
66
[Açude ] 488.
66 [ adeira na S. Grande, onde ha cobre] 106.
Accioly [ Dr. N. ] presidente 410 a 416.
66 [Chronista) -250.
AÇUDES 15, 173, 366, 376, 402 a 07, 412, 460 a 560.
[Commissão de] 370, 374.
existentes em 1858. pg. 367.
" 1885, pg. 53.
grandes 372 , 413 , 466, 553 , 611 .
pequenos 367 , 374 , 382 , 407 , 536, 553. 413, 467.

[ * ] C - cidade , I-ilha, L. lagoa.


P-povoação, povoado.
R-rio, riacho.
S-serra, serrote.
V- villa.
JI

AÇUDES sua superioridade sobre qualquer outro meio de


irrigação 60.
de Acarape 575, 488, 583.
de Aearahú -mirim 573, 477, 487.
de Banabuihú 554, 564.
.. de Itacolomy 469, 477 , 482, 549 a 552.
de Lavras 469, 487–88, 495 a 549.
de Panta 564 .
6.
de Papara 565 .
de Quixadá 585 487, 585 a 589.
de Quixeramobim 573, 477, 487, 552 a 585,
Custo do de Quixadá 565.
6. Orçamento do açude de Acarahú- mirim 573.
66 66 66 Quixadá 575.
66 66 " Quixeramobim 573.
da America ( Est. Unidos ) 485, 635 a 652.
da Argelia 484, 589 a 597.
da Espanha 416, 600 a 604.
da França 485.
da Inglaterra 485.
da India 406 a 634.
Egypto
Agassis (Professor Luiz) 23, 56, 76 a 78.
AGOA [ Custo d'agoa represada ] 575.
lençol subterraneo 287. 540.
sua acção sobre os ventos 418 .
Agoa Verde [ R. ]
Agoa Verde ( Est. da Estrada de ferro de Baturité
Agoa Preta (S. )
Alagoa 37.
Alagadiço sub. da Fortaleza ) 547.
Alegre ( R. affl. do Quixeramobim } 558.
Alencar [ Senador e presidente] 365.
Alfafa 389, 575.
Alfredo Carvalho [ Dr. ] 106 .
Aliseos [ ventos ] 334 a 350.
Algodão, sua cultura, 409 530, 541 , 551 , 575-79
Algodão (R. ) 557.
Almas (S. ) 22, 31 , 557.
Almecegas ( Lagoa)
III

Almeida Rego (presidente) 662, 664.


Almofala (barra ) 45, 52.
ALTITUDE DO CEARÁ 7.
Alumen 76.
Alvaro (serra de Baturité), tab. 77.
Alvaro de Oliveira [ Dr. ] 403, 433 , 436 , 333 .
Amarilio [ Dr. ] 391 , 407, 477, 501.
Ametista 60.
Amianto 60, 100.
Amoré [R. ] 37.
Amputy ( lagoa de Varzea-alegre].
Amphibolito 59.
Anemia tropical 727, 730.
Angara ( S.)
Angica (Est. da Est. de ferro de Sobral).
Annelides 166.
Anta (S. )
Antimonio 107.
Antonio Augusto ( Dr. ) 28, 37 , 96 .
Antonio Domingues (Dr. ) 683.
Antonio Olyntho (Dr.) 446.
Antonio Pompeo (Dr.) 689.
Antracito 74.
Apody (S. ) 28, 62, 113.
Aquiraz [ V. ] 108, 663 a 675, 696, 38.
Araçás (lag. em Aquiraz].
Aracaty [ barra].
66
(Cid . ) 10 , 80 , 83, 90 , 92 , 97 , 289, 370, 662 , 667, 675.
679, 685, 702.
66
(vento) 18 .
Aracaty- assú (R. ) 39.
66
[P. em S. Francisco }.
66 (região do) 99.
Aracoyaba [R. ] 29, 38, 293.
66
[ V. ] 293 , 336 , 685, 697.
Araripe [ S. ] 21 , 23 a 26, 33 , 55, 58, 62 , 71 , 93, 98, 108.
66
[ V. ]
Araripe [ Cons? Tristão] 659.
Aratanha [ S. ] 22, 29, 64, 77 , 114, 119, 688,
Arborisação 395, 404.
‫ر‬
IV

Ardosia 96, 98.


Areias [P.]
+6 [terreno de ]- 77, 83 a 87.
Areré [ S. ]
Argila [ terreno de] - 74, 82, 98, 110.
Arneiroz [ V. ] 100 , 111 , 673, 35.
Aroeira (S. )
Arraial ( P. ) 685.
Arronches-veja Porangaba
Arrosal (S. no Riacho do Sangue ).
Arroz sua cultura 575.
Arruda ( Dr. A. ) 24.
Ascides 60.
ASPECTO PHYSICO DO CEARÁ 113.
Assaré (V.) 541, 672.
Aurora (V. ) 671, 35 ( antiga Venda) 36.
Aves 164.
Ayres do Cazal 254.
Azevedo (Com.or) 405.
Azul ( S. ) 23 , 27 , 117.
B
Baião (R. ) 37.
Bahú ( Est, da E. de ferro de Baturité) 38.
..
(Lagoa).
(R. ) 38.
Baixa Grande ( P. )
.6 Verde (R. )
Baixinha (P. )
Baltazar (R. )
Banabuihú (açude) 554, 564.
66
(R. )
Bannana (S. )
Bannaneiras (P.)
Barbados (S. onde ha plombagina / 107 , 109 .
R. 109.
Barbalha (C. ) 673, 679, 697, 700, 35.
Barbalho (S. ) 31 , 33.
Barbosa Rodrigues /Dr./ 405 .
Barco porto dos-] 45.
V

Barra [arraial].
Barradas [ Dez?] presidente 696.
Barra Grande ¡ Porto ] .
66 Nova [Lag. ]
Barra Nova [ P.]
Barra do Satiá [ P.]
Barreiras [ planicie litoral Camocim ].
Barriga [ R] 557.
66
[S] 92.
Barro Alto [ L] 41 .
Barroca [ lugarejo em Aquiraz , 675.
Barrocas [ R] 557.
Barroquinha [ P].
Barro Vermelho [ sub. da Fortaleza].
Basalto 60, 88, 96, 110.
Bastiana [ L. em Iguatú ].
Bastiões [ R. ] 35, 672.
66 (8.) 23, 99 .
66 larraial) 672.
Batateira ( R) 35, 74.
Batoque ( R).
Baturité [ C. ] 58, 101 , 107, 663, 667, 685, C90, 698, 701.
66
(S. ) 19, 27, 38, 64, 107, 114, 117, 119, 141 , 287 ,
543, 688.
Bebedouro (P. em Arneiroz) 672.
66 (P. no Icó ).
Beberibe (V. )
Beirada (fonte thermal) 112.
Belem ( P. na S. do Machado/.
66
/P. no Trahiry).
(S. em S. Quiteria).
Benjamin Constant ( Maria Pereira) 702.
Beriberi molestia/ 685 a 688.
Bestas (baixio das-, no Jardim ) 25.
66
(S./ 23, 31 , 37, 557.
Bispo (lugar na comarca do Jardim onde ha hulha ) 100 .
Blbeasby Gow ! 85.
Blende [ sulfureto de zinco ] 107.
Boa- Agôa /P./ [ na S. Bat. ] 30.
VI

Boaçú [ P. ] 99, 100.


Boassú (Granja) 99, 100.
Boa Viagem [ R. ] 37.
66 66
[V. ] 674, C85, 700, 37.
Boa Vista [ P. ] 678 —na S. Bat. 30.
66 66 [R. 37, 557.
.6 66
(S. ) 23.
Boa Ventura [ R. ] 37.
Bois [ ilha] 52 .
66
[ S. ]
Bom Jesus, no Ipú, mina de ouro 101.
Bom Jesus [ P. ]
66
[R. ] 101 [ouro ] .
66
Nereo [ lug. em Missão - Velha ] 673.
66
Principio [ R. ] 38.
66
Successo [ P. ] na S. de Baturité 30 .
Boqueirão [ S. ] 12.
66 de Lavras 10, 93, 108 , 496, 67 a 71.
66 do Cunha 10, 35, 80, 84.
da Arara.
Boticario [ S. ] 39.
Boulder 79.
Branca [ S. 22, 28 , 31 , 67 , 557.
Branner professor J. C. ] 62 a 64, 72 , 79, 82. 86, 88.
Brejinho ( caverna na S. do Araripe) 93.
Brejo da Cruz (na S. de Baturité) 30.
das Pedras (pico da S. de Baturité).
dos Santos ( V.)
66
Grande (Sant'Anna do- )97. 672.
Secco (P. ) 672.
Brigada (S. ) 31.
Brigida ( R. ) 33.
Brito (lugarejo no Aracaty!.
Borzeguim L. de Itapipoca .
Buarque de Macedo (Dr. ) 403.
Buriti /P./
/R./
Grande L. em Milagres) .
Buritisinho (L.) " 66
Buzil ( R. em Sant'Anna ).
VII

Cabaceiras (morro).
Cabo do Corso (cabo a 40 30" Lat./
Cabogy [ S. ] 31 , 37 .
Cachorro (lugar nas extremas do Jardim onde ha ouro 101
cobre 106 .
Cachorros ( L. na Fortaleza ).
66 (R.) 557.
Cachoeira /V./ 674, 690.
66 [Missão Velha ] 35, 69.
Cacimba jenseiada no Acarahú].
Cafundó [ R. ] 100 .
[lugar no termo de Jardim onde ha magnesia 100 .
Caiçara [ P. no Aracaty] .
66 [P. em ('anindé].
66 [R. ] do Satiá 112 .
Caiçarinha [ P. em Canindé].
Carióca (R. em Sant'Anna).
Caio Prado (P. do Cangaty) 697 , 38.
Caixosó 37.
Cajazeiras (P. em Barbalha).
66
(P. em Maranguape.
(P. em Mecejana).
(P. em Pacatuba/.
Cajuáes ( P. no Aracaty).
Cajueiro ( P. no Jardim ) 99 .
66
( P. em Barbalha).
66
(lugar no Inhamuns onde ha pedrahume) 99 .
66
(S. e caverna) 93 .
Caldas (fonte thermal no Cariry ) 689 .
66
(P. em Barbalha].
Cala Bocca Est. da E. de Ferro de Baturité] 677.
་་ (R.)
Calcareo (terrenos ] 56, 66, 73, 96 ,
Calmas (estação das-) 174, 333, 356, 400.
Caminhoá (Dr./ 405.
Calmon Desembargador / presidente, 696 .
Calmon Dr. 455.
Calogeras Dr. 445.
VIII

Cology [ S.) 37 .
Calor 121 , 171 .
Camará (S. ) 22, 28, 64, 112.
Camaras de sangue 679
Camarão ( S. ] "
Cambôas (litora! ] 119 .
Camocim [ barra ] 43.
[C./ 702.
66
[R.] 40.
Camorupim [ L. ) 41 .
/R./ 25.
Campos 37.
Campo Alegre /P./
Campos Bellos (P. ]
Campo Grande ( V. ]
CANAES DE IRRIGAÇÃO 376 , 561 , 588.
Candandu (R. )
Candéa (R. )
Cangaty (lugar) 674.
[ R. ) 107.
(S. ) 38 , 108.
Canindé [ R. ) 39 .
66
(R. na S. do Araripe ) 26 .
66
( V./ 367, 667 , 685, 39.
Canna (de asssucar] 546.
Brava /S./
Cannafistula ( Est. da E. de Ferro de Baturité] 84.
Canôa- Veja Aracoyaba - 685.
66
(R. / 685.
Canoa quebrada (porto) 675.
Canoé (salina) 99 .
Cantagallo ( S. ) 65, 95.
Cantinho (R. ) 37.
Capanema (barão ) 395 , 452 , 33, 55, 64 , 76 , 88, 93, 97.
Capim grosso 99.
Capitão-mór (R. do Canindé) .
66
(R. no Riacho do Sangue) .
Capongas (poços em riachos/.
Carás /R./ 35.
IX

Carás [ S. ] 31 .
Caratheús ou Cratheús [ V. ] 702 .
Carbonato de cal 87.
66 de chumbo 107.
Carcará (P. )
Caridade [ P. em Canindé].
Carióça ( R. ] 29 ,
Cariú ( R. ] 35.
Cariry [ R. ) 672.
[S. ]. 23.
[ valle ] 33, 97, 100, 110, 527, 547, 692.
Carnahuba 9.
(R. )
Carnahubal (L. em Viçosa).
(P. de S. Benedicto ) .
(sitio salitroso) 99.
Carnahubinha ( R. ) 37 .
Carnaupage (fonte) 57.
Carnotim (S. )
Carrapateira (R. ) 34.
Carrapato (L. em Pacatuba).
Carrasco (vegetação) 115, 118, 25.
Carvão de pedra 58.
Cascavel [ C. ) tabella 71 , pag. 667, 675, 681 , 690, 696.
Castelano [praia em Acarahú
Castelano [ L ] 41.
Castro [R. ]
Catharina (S. fresco em Baturité] .
Catinga grande ( lugar proximo a S. de S. Pedro onde ha
zinco 107.
Catinga do Góes [ P. ) 675.
66 redonda [ P. na S. de S. Pedro].
Catolé [ S. ] 22, 31 , 37.
Catú (L. ) 40 , 45, 48 .
“ (R. ] 49 , 53.
Catunda (Senador ) 169.
Cauhype (R. ) 39, 44.
66
S.) 18, 22, 28, 30.
66
( L. ) 41 a 45 , 53 a 55, 476.
66
/região do- 667.
X

Cavallos (S. em Lavras .


Cavernas 74, 91 a 95.
Caxitoré (R.)
66
(S.)
CEARA Estado.
Posição astronomica 5.
Limites 5.
• Dimensões 6.
66
Superficie 6.
་་ Configuração do sólo 6.
66 Litoral 7.
Valles 9.
Sertão 14.
Serras 18.
Orographia 20.
Cordilheira circular 21.
Cordão central 22.
66 septentrional 23.
66 de Sueste 23.
+6
Serra do Cariry 23.
Hydrographia 32 .
66 baxios a sueste 34.
6. 66 entre o Aracaty e Fortaleza 38
་་ a noroeste 38.
་་ 99
Lagoas 40.
་་ Litoral maritimo 41.
Ilhas 52.
Phenomenos vulcanicos 88.
Tremores de terra 89.
Cavernas 93.
Mineraes 96.
Fosseis 109.
Fontes mineraes e thermaes 111.
Flora 112.
99 plantas medicinaes 153.
Fauna 163.
Clima 167.
27
Temperatura 176.
99 no litoral 178.
Pressão atmospherica 210.
XI

CEARÁ Clima Humidade 217.


19 "" Veutos 233.
99 19
Evaporação 239.
99 Chuvas 249.
,‫ و‬Seccas 249.
99 99 Grandes invernos 289.
99
Remedios para attenuar as seccas 366.
66 acção administrativa 366.
2

66 (6 açudes 372, 461.


66 acção official 410.
6. 66 Poços artesianos 444.
66 66 Lavoura secca 455.
66
Os grandes açudes 469.
66 66 Açude de Lavras 495.
99 66 66 de Itacolumy 549 .
66 64
de Quixeramobim 552.
66 66 66
de Quixadá 585.
66 Salubridade 657.
66 (barra) 46.
66
(R. ) 38, 46.
66 (S. )
Cearense (typo ) 704.
Cedro (lugarejo em Cascavel ) 675.
66
(P. em Quixadá) 585.
Céo (monte na Viçosa).
Cerquinha (L. no Cariry).
Cezar Marques ( Dr. ) 250 .
Chapadas, taboleiros, 33, 72.
Chaval (P. da Granja) 99.
Chelonios (passaros ) 165.
Christina (P. )
Choró ( R. ) 29. 38, 96, 99, 108 , 119.
Chuvas 15 e 16, 113 , 120-1 , 168, 174 , 249 , 286 a 295, 343.
384, 393, 458, 494.
67 de Cajú 114, 334.
66 de rama 121 .
66 suas causas- 333 a 337.
pelos aliseos 338.
66 e as manchas solares 348.
66 e as phases lunares 314.
XII

Chuvas suas irregularidades 534.


66
e as irrigações imperfeitas em relação a' lavoura
no Ceará 533.
66 " litoral 295.
66 66 variações annuaes 295.
66 6: 66 mensaes 298 .
66 66 diarias 311.
66 66
sertão, 322, 393, 535.
66 66
variações annuaes 325.
66 66 mensaes 325.
66 diarias 325.
6. 66 " horarias 326.
3
:

na Fortaleza 321 .
19
em Porangaba 332 .
99
Aracoyaba 331 .
35

no Quixadá, tab. 65, pag . 456 .


77
em Quixeramobim, tab. 68, 69, 70, pag. 329, 456,
560.
"T
no Icó, tab. 67.
99
em Cascavel, tab.
99
no Crato, tab.
no norte do Ceará 332.
Chumbo 107.
Cicero Franklim /Coronel , 547.
Clima do Ceará 167 a 340.
Clorureto de sodio [ sal] 57, 99 .
Coatiguaba [ R. }
Cobras [ S. ]
Cobre 106.
Cocó [ R. ] 38.
Cococy P. nos Inhamuns].
Cocos [S. ] onde ha plombagina 103, 107.
Coité V. de Baturité ].
.་ [P. em Milagres ] 668, 674.
Coitinho [ Dr. Silva ] 173, 397, 402 , 544, 531 .
Colares (L. no Crato ) 15 .
Colera- morbus 669 à 678.
Colheita 122 , 126.
Cology (R. ) 557.
Columinjuba (S. )
XIII

Conceição - veja Guaramiranga.


(L. no Riacho do Sangue) 41.
(R.) 35.
(região salitrosa) 99 .
• Conchas 87.
Concreções mineraes 74, 111.
Configuração do solo do Ceará 6.
Contendas (R. ) 37, 109.
1
Carnaupage [ fonte] 57.
* Cordilheira central 22 .
circular 21.
septentrional : 23 .
99 de sueste 23.
Corihú ou Carihú [ S.]
Corôa de rios) 120 .
""
Grande (Ilha ) 52.
99
(baixio no litoral) 47.
Coronel (L. ) 41 .
Corrego das Aningas (P. ) 683.
Corrente (S.)
Correntes subterraneas 113.
Cosmes e Damião [ S. ] 31 .
Costas do Ceará e seu parallelismo 399.
Cratéras 60.
1 Crato (C. ) 57, 71 , 74, 96,, 100, 204, 207 a 9, 669 a 74, 679,
685, 697. 702.
Cravata (R. )
Cretaceos (terrenos- ) 53, 56, 59, 62, 75.
Criolos [ S. fresca em Baturité ) .
Cristal 60, 109.
Cristalinos (terrenos → ) 60 , 64, 153.
Croatá (R.)
Crustaceos 166.
Cruz (R. )
[P. em Maranguape ] 39, 682.
Cultura do chá 406 .
66 intensiva 406.
Cumbe (morro ) 90 a 92.
Cuncas (P. em Milagres onde ha ouro) 101 .
Cunha boqueirão do- ] 35 .
XIV

Cunha Mattos (Coronel) 32.


Cunhas ( S. ]
Cunquê [ R. ] 37.
Curiahú [ R. ] 40.
Curiniatam [ R. onde na ouro] 101 .
Curral do meio [ R. ] 37.
Cutia [lugarejo no Aquiraz] 675.

D
Defuntos [ R. ]
Degradação de rochas 16, 80, 85.
Depressão barometrica 171 .
Desnudação 72.
Diamante [ R.]
Diluvium 80.
Dimensões do Ceará 6.
Dous Irmãos [ S. ] 26.
Doentes 128.
Dolomito 65, 97.
Drift 62, 77.
Dryades [ região de- ] 26, 116, 140.
Dysenterias 679, 683, 686 a 88, 700 a 702, 714.
E

Emigração 287, 398.


Emigrantes 687.
Encantada [ L. no Aquiraz].
Engenhos centraes 406.
Entre Rios [V. ] 40.
Envasamento dos açudes 380, 589.
Eoozon canadenses 53,
Erosão 72, S1.
Estelita [ Dezembargador] 103.
Eschwege Barão de- ] 103.
Estado hygrometrico 221 .
Estradas de ferro 373.
Estevão [ S. ) 674.
Estratificações 19.
Estrella [ S. ] 31 .
Euclides da Cunha [ Dr. ] 32.
XV

Eusebio [ L. em Aquiraz ].
Evaporação 239, 381 a 390 , 508.
66 no litoral 241.
66 no sertão 243, 560 , tab. 55.
annual 244.
mensal 244.
diaria 244 .
Exú [L. em Varze- Alegre].
F

Faél [ R. ] 37.
Faiscas [ S.]
FAUNA DO CEARÁ 163.
Fausto de Aguiar [ Dr. ] presidente 366, 662.
Favella [ R. ] 35.
Fazenda [ R. ] 37.
Febres no Ceará 660 a 62, C80-84 a 690.
Febre amarella 663 a 69, 678-9, 682-85 , 702.
Feijó [ Silva naturalista ] 59 , 86, 88 , 101 , 105 a 110 .
Feiticeiro [S. ]
Fétos arborescentes 64.
Feldspato 67, 98 .
Fenomenos vulcanicos 88.
66 sismicos 89-90 .
Fernando [ I. ] 52.
.. [porto] 45 .
Ferro 57, 74 , 108 a 110.
Figueredo [ barra do--] 28 .
66 [ R. ) 36 a 37.
Flamengo ( S. )
FLÓRA CEARENSE 23, 31 , 37, 112.
do litoral 139.
66 dos sertões 139.
66 das serras 140.
Flores (S. )
66 ( P. no Inhamuns ) .
re
Fogla (Dr. ) 391 , 407, 477 , 501 .
Fonseca ( L. no Iguatú).
Fontes 173.
Fonte mineral 111 .
XVI

Forragens 378.-
Forquilha [ R. ] 37.
Fortaleza [ porto] 47.
[ Cidade da- 78 , 84 a 87, 96 , 111 , 141 , 213, 221
226-7, 290-3, 547; 661-2, 667 a 70, 680-97.
o' sǝlo 721.
Fossas fixas 794.
Fossseis 56, 63, 73, 75, 81-2, 109-10.
Foz [ R ] 37 .
Frade [R.)'
¡ P. em Cachoeira] 674 .
Frecheiras [ S. ] 31.
66
(enseada )
Freire Allemão [ naturalista Dr. ] 112 .
Freire Allemão Sobrinho [ naturalista Dr. ] 26 , 116:
Fumo [do solo] 92.
Fundões (S. onde ha hulha) .
66
[L.] 361 .
Furtado [ S. ]

G
Gabaglia [ engenheiro Raja- ] 20 , 373, 375.
Gadelha [ L. no Limoeiro].
Gado [ criação do- 15, 285, 287, 293.
66
(retirada de- ) 395, 397.
..
(S.) 31.
(lugarejo na S. de Baturité) 677.
66 Bravo (L. no Limoeiro).
Galena 75, 98, 107.
Galinaceos [aves] 154.
Gama [Fernandes) 253.
Gameleira ( P. na S. da Ibiapaba ) 100 .
[ R. ]
Gardner [ naturalista) 33, 56.
Gavião ( R. ) 38.
'Geleiras 82.
Genipabú ( R.) 37.
Genipapeiro (R.) 37.
'Genipapo (mina de ferro na S. Meruócal •
(S.) 55.
XVII

Gererahú [açude) 374.


Gerimum 37.
Gesso 557.

Giboia (S. 65, 97.


Gijoca L. no Aracaty./
16
Giqui ( P. no
Glacial (época— ) 76 a 82.
Glaziou Dr./ 404 .
Gonçalves Dias [ Dr. ] 75.
Gneiss - 16, 58, 60, 64, 66, 79, 80, 83, 96.
Gorgory [ S. fresca de Baturité].
Goyanninha [ P. de Missão Velha 689/.
Graça (P. em S. Benedicto.j
Grande (L. ) 41.
Granja [açude) 394.
66 [C. ] 40 , 90, 99 a 101, 367, 549 , 669 , 681 .
Grangeiro ( R. ) 35, 526.
Granito 60, 75, 96, 110, 116,
Graphito 74, 97, 107.
Grêda 56, 73-4, 76.
Grès 54, 59, 74, 81 , 87.
Grippe (influenza ) 697 a 700.
Groayras [ R. ] 40 , 109.
Grossos ( R. ) 37.
(P. ]
Guajerú [ Ilha ] 52.
Guayuba (P. ) 69 e estação da E. de F. Baturité.
66 (R.)
Guaramiranga (V. antiga Conceição na S. de Baturité ) 30
31 , 141, 677 , 685.
Guarany (veja tambem Morada Nova) 675 .
Guaribas (S. ) 672 .
Guarita (S. ) 34 , 109.
Guimarães (P.)

(R.)
Gurihú [ L. no Acarahú].
Gypso 98.

Hamadryade [ região de- ] 116 a 118, 140 .


Hartt (professor e geologo ) 33, 161 .
XVIII

Hawkshaw ( engenheiro) 47.


Hemeralopia (molestia da visão ) 688.
Herculano Cunha ( Dr. ) vice- presidente 666.
Huber (Dr. J. ) botanico 139.
Hulha 100 ( vide carvão de pedra ).
Humaitá ( veja Senador Pompeu ).
Humidade 177, 217.
..
(relativa) 218 a 225.
Huroniano ( terreno ) 54 .
Hygiene (carencia de- ) 744.

1
Ibiapaba ( S. ) 19 , 21 , 28, 31 , 34. 57, 59, 76, 111, 117, 287, 688
Ibiapaba (barão) vice-presidente 682.
Ibiapina ( V. ) 668 .
Iboaçú ou Boassú.
Icó (C. ) 59, 67, 80, 96, 98, 175, 206, 322 a 24, 367, 422, 663
a 78, 690.
Icó (planicies do- ) 12, 391 a 93, 548.
Ignacio C. de Vasconcellos ( presidente ) 366.
Iguape (enseiada do— ) 42 48.
( L. no Aquiraz )
.. (P. do
Iguarassú ( R. )
Iguatú ( C. ) 35, 543, 671 , 682, 69, 702.
... (L. 41 .
ILHAS - 52,
Imburanas (S. ) 557.
(arraial)
Imperatriz - Veja Itapipoca.
Independencia (V. )
Ingá ( lug. em Cascavel) 675.
Inhamuns- 672.
[sertão de-- ) 23, 95, 99, 102, 111 , 339.
Innundações 288, 370, 380.
Insectos 166.
Insolação 58.
Inussi ( R. na S. Grande ) 25.
INVERNOS - 169 a 288.
Ipú (C. ) 99 a 102, 106, 108, 111, 669, 682, 684, 696, 702.
XIX

Ipuçaba R. no Ipú]
Ipueiras [V. ]
Ipueira [L. ]
Iracema -veja Caixa- só.
Irauaçaba [ P. do S. Francisco] .
IRRIGAÇÃO - 384, 366 a 380, 408, 411 , 491 a 93 .
Agua necessaria para- 521 a 24, 559.
sua importancia 424, 535.
. sua superioridade sobre as chuvas 421 .
• seu valor nos valles do Ceará 520.
66 seu custo no valle do Jaguaribe 509 .
Canaes de - 515.
66 na Algeria 539 a 600.
.. na Asia Central 416.
66 na Australia 439.
.. na Belgica 427, 432 .
66
no Egypto 433 .
.6 na Espanha 432, 440, 600 a 604.
nos Est. - Unidos da America 434, 430, 635 a 652 .
(6 na França 427.
.. na Inglaterra 433.
.. India ingleza 60ł a 634.
66 Italia 432.
66 no Turquestan 433 , 440 .
66 no valle do Jaguaribe 509 .
66 no valle do Cariry 533.
66 na serra de Maranguape 533.
.. nos paizes quentes 589.
66 seu objecto 420 .
quando se faz precisa 437.
66 qual a preferivel no Ceará 442.
66 suas vantagens no Ceará 525, 536.
.6 seus resultados economicos 597, 608 a 613, 650.
votos pela irrigação 441 .
6. Insalubridade das irrigações 652.
Itacoatiara [ pico da S. da Uruburetama ].
[ R. ]
Itacolumito 65, 116.
Itacolumy [açude] 394, 482 , 488, 549.
(S.)
XX

Itaculumy [ R. ]
Itaiteira [ R. ] 526.
Itaitinga [ S.]
Itans [ P. em Baturité] 677 .
66
[L. no Iguatú]
Itapahy [arraial do Acarape]
..
(S.) 96.
(Est. da E. de F. de Baturité) .
Itapagy (ponta a N. O. do rio dos Patos).
Itapipoca (V. ] antiga Imperatriz 366, 669, 681 a 84, 690.
Itarema (S. ) 105 .
*
(monte argentifero em Maranguape) 105.

J
Jaburú sitio onde ha ferro no Quixerabim/ 109 .
Jaburuna (L. de Granja )
Jaçanahú (L. em Maranguape/
Jacaré [ P. na S. da Ibiapaba]
Jacarecanga [ riacho na Fortaleza ] 293, 690.
Jacarehy [ L. em Mecejana]
Jacotinga [ rocha] 104 .
Jacú [ arraial em Canindé ] 59.
Jacú [ P. em Varze - Alegre ]
Jacuratá ( R. ) 40.
Jacurutuoca [ L. em Marangape ] .
Jaguaribe [ R. ] 34 , 36, 42, 49 , 80, 90, 92, 102 , 289 a 91 .
[valle do- ] 10, 90, 111 - 12, 391 , 409, 449, 541 a
549.
66
[valle do-] sua cultura irrigada 520.
66 sua producção agricola 526.
Jaguaribe- mirim [ V. / 12 , 382 , 682.
Jaibaras [ R. ] 293.
Jandaira [ R. ] 38.
Jandragueira [ P. em Soure ].
Janguruçú [ L. em Mecejana].
Jaramateira (R. ) 38.
Jardim [ C. ] 35, 90, 99, 107, 109, 669–70 , 673, 702 .
66
[R.]
Jarrinha (S. ] 23, 34.
Jatobá [ Serrote em Pacatubal 22, 31.
XXI

Jatobá /S. de S. Quiteria/


Jatobá [ R. aff. do Acarahúj 40.
Jererahú [ L. em Pacatuba ] 38.
66 66
/R. "
66
[P. em Maranguape ] 676.
Jericoaquara (enseiada) 44.
66 (R. que despeja na enseiada
66
/morro/
Joá-- [ R. ]
Joá [ S. ] 31 , 41 , 64.
Joá [ riachão em Maria Pereira ] .
João Alves /riachão em Maria Pereira .
João Brigido (Coronel) 252.
João Franklim 61 .
João Ribeiro ( R. ) 37.
João Machado (vice-presidente ) 669.
Joaseiro /P. em Morada Nova/.
66 /P. no Crato ·
Jordão (serrote de Granja ).
Jorge (riachão em S. Quiteria) .
Jorge (serrote secco em S. Quiteria) .
José Julio Dr./ presidente 369, 373, 686.
José Bento (Dr./ presidente 669.
José Lino Dr./ 699.
José Lourenço Dr./ 679-80.
Joaquim J. Pereira ( P.e ) 454.
Joaquim Mendes ( Dr. ) vice - presidente 667.
Jubaia (R. )
66
ramificação da Aratanha).
66
(P. em Maranguape) 668, 676, 685.
Jucá ( R. no Tauhá) 35.
Jucó (R. ) 37.
Julião (L. no Iguatú)
Julio Destord (engenheiro ) 552.
Junco ( P. na S. de S. Pedro ) 100 .
66 (Est. da E. de F. de Baturité).
66
(lugar proximo a Quix. onde ha amianto ) 100
Jurássico (terreno -) 35, 55, 73-4 .
Juré ( Riacho aurifero no Ipú) 40 , 100 a 103.
XXII

K
Karrus-18.
Katzer (Dr. Fred. ) geologo- 8.
Koster ( H. ] 257.
L

Lafayette R. Pereira (Dr. ) presidente 369, 679.


Lagedo (serrote em Maranguape) 31.
Lages (sertão Canindé].
Lages (P. em S. Pompeo) 702.
Lagoa [ sitio onde ha ferro quasi puro nas faldas da S. do
Jardim 108.
Lagôa- cruz (olho dagua na S. da Ibiapaba)
66 Formosa (laguna no Acarahú) .
66 Grande ( L. no Ipú ) 41 .
66 66 (P. no Ipù)
66 66
(L. no Riacho do Sangue ].
66 do Mangue-secco ( L. nas praias de Acara hú' .
66 da onça (lagarejo no Aquiraz ).
66 das pedras (L. no municipio do Guarany).
66 secca (P. no Aquiraz) .
Lagoinha (P. no Parácurú .
66
/P. no Aquirazį.
66 [L. no Trahiry/
LAGOAS do Ceará- 173, 175.
Lameirão (P. na S. de Baturité).
Lameiro [ P. suburbio do Crato].
Lapa ( P. em S. Benedicto ).
Lassance Cunha [ engenheiro ] 487, 740.
Lavas [vulcanieяs] 60, 68.
Lavoura 286, 530.
66 sua producção 530 .
66 secca 455.
Lavras [ açude ] 391 a 96, 415 , 449 , 469, 487 a 9+
66 66 suas vantagens 537.
66 (planicie) 12 , 392.
66
/C./ 36, 500, 543, 671 , 682, 696.
6. [boqueirão de- 1 12, 67. 70, 93.
66 [P. no Jardim] 679.
Lias [terreno] 73, 75.
XXIII

Limão (lug. em Maranguape( 676.


LIMITES DO CEARÁ- 5.
Limoeiro C. 682, 685, 35.
planicie do-] 10, 392, 522.
Limonito (rocha) 98.
Linhito 100.
LITORAL DO CEARA- 7, 41 , 112, 115 a 117. 231.
Livramento R. do Jaguaribe .
.6 (P. de Morada Nova).
Lobato P. proximo ao Icó ].
Loess terreno) 80 .
Logradoro [ R. ] 37.
Loló ( lugar de onde se desprendem ruidos ' 92 .

M
Macacos (Sitio em S. Quiteria] .
66
[S. entre Quixeramobim e Quixadá).
66
¡R. em S. Quiteria].
Macambira [sertão da S. da Ibiapaba].
Macapá, [ lugarejo em Missão Velha] 673.
[P. no Jardim].
66
[na S. de Baturitéļ tab . 77, pag. 30 .
Macedo [ Dr. Marcos de- ] 26, 27, 36 , 73 a 75, 93, 108 , 174, 287 .
Machado [ R. ]
66
[ S. ] 22, 27, 30-1 , 39, 117, 339, 557.
66 Grande P. em S. Matheus].
Madeira [sitio no Acarahú].
Madalena [ serrote em S. Quiteria ].
66
[ R. em Quixeramobim ] 557.
Magnesia 100.
Maia [serrinha cultivada no Iguatú].
Malhada dos Bois [ R. no Icó } .
Malcozinhado [ riacho em Cascavel ] .
Mammiferos 163.
Manchas solares e chuvas 348 a 360.
Mangue Alto [ serrote no Acarahú].
Mandioca 544.
Maniçoba 124-5.
Manuel Dias [serrote fresco em Baturité ] 31 .
6. cultivado em Itapipoca .
XXIV

Manuel Lopes [ riacho trebut. do R. do Sangue}.


Mãosinha /S./ 75, ( 100 hulha ) 107.
Maracanahù (P. e Est. da E. de F. de Baturité] 96.
Maranguape /C. ) 38, 103 , 663-4, C67 a 69, 676 a 99, 700 a 3.
66
¡S. ] 18, 19 , 29 , 38, 103, 114, 119, 688.
Maranguape [ R. ] 38.
Maranguapinho [ R. ) 38 .
Marga [rocha] 74.
Maria Pereira ( veja Benjamin Constant) 367, 669 a 673.
Marianna ( S ) . 23 , 30-1 .
Marés /sitio aurifero na S. de Baturité/ 101 .
66 (P. no Coitél 101 .
Marinheiro /S./ 3.
Marinho de Andrade /Dr./ 697 .
Marmore 96.
Marrecas ( P. no Inhamuns) 673.
Marroaes [ F. no Inhamuns].
Massapê (V. ] 111.
Mathias Beck colono holl. ) 104.
Matta [ L. no Aracaty) 41 .
[ S. fresca em Maria Pereira).
Mattas S. ] 23, 27, 117, 557.
Mattas 114.
Mattinhas S. / 22, 31.
Maurity (V. ) antigamente Burity.
Mecejana /V. , 84, 98, 676, 679, 689, 690.
[L.] 41.
Medicamentos populares 131-2 .
Meirelles [ enseiada] 48.
Mel (ponta)
Mel riacho de Canindé] .
Melancias ponta no Mondahù).
/R./ 37.
Meruóca [ V. )
Meruóca IS. 23. 27, 59, 117, 119 , 367.
Messy (serrote em Itapipoca) .
Meton de Alencar / Dr./ 718.
Mica 60, 84.
Micaschito 60, 96.
Milagres (C. ) 75, 101 , 107, 669, 674, 679.
XXV

Milagres [ R. ] 37.
Milhão [ R. ] 37.
Milho--sua cultura 389, 575 a 77.
66
sua producção 530, 542.
Miranda [ R. ] 35 .
Mirim (R. no Aracaty- mirim,.
Missão Nova [ P. de Missão Velha] 689.
Missão Velha ( V. ) 35 , 71, 75 , 96 , 102, 673 , 679, 702.
Mixira serrote no Cauhipe].
Moço [ R. ] 39.
Moleque L. no Aracaty ].
MOLESTIAS no Ceará - 128.
do apparelho digestivo 714.
66 do 66 respiratorio 711-14.
Mombaça [ sertão e S. ] 23, 31 , 37.
Mondubim [ P. e Est. da E. de F. de Baturité ] .
Monguba [ Est. da E. de F. de Baturité] 547.
66
[I.] 53.
Montealegre L P. no Crato] .
Monteflor [na S. de Baturité] 330.
Montemor-veja Guarany.
Montenegro [P. em S. Matheus].
Montepio [ P. no Crato].
Morada Nova ( V. ) 37 , 682, 702 .
Morêas (enseiada no Camucim).
Morêas [ morro entre Camocim e Acarahú 、
Morenas - 77, 78, 82.
Morgado (contraforte da S, da Ibiapaba).
Morro agudo (serrote no Ipú )
Morro dourado (sitio em Missão Velha ,
Mortalidade na Fortaleza - 739, 707.
Mosqueiro ( I. ) 53 .
Mosquito [I ] 52.
66
(P. em Maria Pereira ).
Mosquitos (L. em Mecejana) .
Mucambinho jaçude em Sobral ].
Mucuim (serrote em Arneiroz ) 23, 31 , 37 .
Mucunan ( açude em Baturité ).
Mucuripe [ponta ] 42, 48, 74, 76.
66 [farrol do- )
XXVI

Mucuripe [ Pov. na Fortaleza) 677.


Muds-lamps 90 .
Mulungú [ V. ] 685.
MULLUSCOS - 166.
Mundahú /V. / 97 .
[R. ] 39.
66 [porto ] 97, 46 .
66
[S ]
Munguba [ S. ]
66 [Pov. de Pacatuba ] 77, 96, 97.
[ R.
[Est. da E. de F. de Baturité).
Muritiama [ L. em Mecejana].
Murtas [ P. em S. Matheus ].
Mutamba [ P. no Aracaty ] 666.
Mutambeiro [ P. no Acarahú].
Mutuca [R. affl. do Jaguaribej.
66 [L. em S. Matheus ].
Muxuré Est. da E. de F' . de Baturité, açude].
N
Natividade [ P. em S. Francisco ].
Nicoláu Moreira [ Dr. ] 405 .
Nobre [ riacho que desce da S. Marianna].
Nogueira [ vigario] 92.
Noophito -74.
Nova Floresta (P. em Jaguarite - mirim ).
Nova Olinda ( P. de S. Anna do Brejo).
Nova Roma (P. antigo Araripe) .
Nunes Gonçalves ( Dr. ) presidente 668.

Obitos na Fortaleza 705, 709 a 11.


Oc.. 73.
Olho dagoa (S. ) 557.
.6 66 'sitio em Quixadá onde ha chumbo) 107.
66 66 (arraial no Limoeiro).
66
Grande (serrote em Sobral).
Olinda (P. em Bôa Viagem) .
O Meara ( engenheiro ) 17,491 , 501 a 513, 544.
Onça ( P. em Barbalha).
XXVII

Oreadas (região de- , 117.


Oriboré [serrote no riacho do Sangue ].
Orós [ S. ] 23, 35.
Orville Derby [Dr. ] 35, 53, 59, 78, 87, 88.
Ouro 101 a 123.
Oxido de ferro 81 , 98.
P

Pacatuba [ C. ] 58 78, 97 , 382, 668-9, 676, 679, 682, 684,


690-1, 697-8 .
66 [S.; 19, 30.
Pacheco [ R. de S. Anna].
Pacoty [ R. ] 29 , 38 , 76.
66 [ V. ]
Pacujá [ P. em Sobral] .
Pagé [fonte thermal ] 112.
Pajuçára [ P. de Pacatuba].
Pajehú [riacho na Fortaleza ] 293.
Palha [ R. ] 100 .
Palhano [ R. ] 35 , 38.
66 [P. no Aracaty].
Palma [V] 682, 684, 696.
Palmeira [ S. ] 21 .
66 (riacho na S. de Baturité ) .
66 (P. em Maranguape )
Palmipedes (passaros ) 165 .
Paludismo [veja febres ] 719.
Panta [açude ] 564 .
Pão de assucar [ P. em Itapipoca].
Papagaio [ serrote em S. Quiteria ].
Papara (açude ] 565 .
Pará [ P. em Granja].
Paracupiba [ cascata no rio Acarape ] 29.
Paracurú [ V. ] 681 , 700.
Parafuso (serrote em Canindé)
Paripueiras ( P. no Aracaty ) 675.
Parnamerim (L. no Aquiraz ).
Passagem das Pedras (P. na União) 10, 675.
Pastagens - 171 , 785.
Passaros 164.
XXVIII

Pasto 15.
Patanhem [ L. no Aquiraz ].
Patos [ L. ] 41.
[barra] 45.
[R. ]
Patú [riacho em Maria Pereira ] 558.
Pau Amarello [ região cultivada na S. da Uruburetama]
Pán Branco (lugar em Russas ) .
Pán dalho [ na S. de Baturité] 30 .
Páu ferrado [ R. ] 37.
Pán infincado [ serrote de S. Quiteria]
Paulet, A. J. da Silva - 36, 275.
Paupina [ L. em Mecejana].
Pavuna [ P. em Pacatuba ].
.. 66
{L. ].
Pecado (R. 37.
Pecem [ barra e P. ] 46.
Pedra Branca ( V. ) 293.
Pedra ferruginosa 74.
Pedra hume 99.
Pedrinhas [ P. em Palmaj .
་་ [porto no Aracaty].
Pedro Borges [ Dr. ] presidente 701 , 277.
Pedro Leitão [ riacho em Maria Pereira ).
Peixes 165.
Pejuaba [ riacho na Ibiapaba] 25.
Pendencia [ V. ] 30, 677, 685.
[R. ]
Penha [ S. ] 32, 31 .
Pentecostes [ V. ] 39 .
Perunduba [S.J
Perdição [ riachão em Canindé].
Pereira da Silva ( Alipio) 91 .
Pereiro (C. ] 28 , 36 , 307 , 671 , 682.
(S. J 22, 27, 28, 37, 96.
Pericoara (barra)
(L. 44 ).
[lugar junto de Granja)
Pernambuquinho (enseiada) 45.
(P. na S. de Baturité) 30, 685.
XXIX

Pescarias 133-4.
Pesqueira ( L. ) 41 .
Pesqueiro L. no Acarahú) .
66 (riacho e ariaial).
Petuba ( riacho na S. da Ibiapaba) .
Piabas arraial no Mulungú/
(riachão em S. Quiteria).
Picada ( S. ein S. Quiteria) 31 , 32, 557.
Picão (serrote alto em S. Quiteria ) 95 .
Picos (serrote em S. Quiteria).
Picos (monte na Itapipoca )
Picy (P. em Porangaba .
Piedade riacho em S. Anna/.
66
serrote em Quixeramobim/
Pilões (L. em Pacatuba).
Pindó /serrote em Canindé ) 110.
Pindoleo [ P. na S. de Baturité) .
Pinheiro (José) 44.
Pintos /S. prolongamento da S. do Pereiro ) 28.
Pintos (R. no Jardim) .
Piquet Dr. Bernardo / , engenheiro 244, 283. 485 , 488 .
Pirabibú /R./ 557 a 59.
Piraçunga (S. ) 110 .
Pirangy /R./ 38, 92.
66
(região salitrosa proximo ao rio Pirangy, 99.
Pirapora (riacho da S. de Maranguape) 38.
Pires (riacho em S. Quiteria/
Piroaes (lugarejo em Maranguape/ 676.
Pitombeiras (P. em S. Anna).
Piú /R. ) 35 .
PLANICIES-
.. do lcó.
66 de Lavras.
do Limoeiro.
de Russas.
do Sitiá.
PLANTAS dicotiledoneas 144.
66
de construcção 161 .
fibrosas 161.
floriferas 162.
XXX

PLANTAS - frutiferas 162.


66 forrageiras 138, 162.
66 industriaes 162.
66 para marcineria 161 .
46 medicinaes 117 a 123 , 133 a 138.
66 monocotiledoneas 141.
.. oleiferas 161.
66 saponiferos 162.
tinturiaes 161.
toxicas 133 a 138.
tuberculosas 162.
vasculares 139.
Plombagina 107.
Pneumonias no Ceará 713.
Poço doce (P. em Paracurú) .
Poço do Matto (P. em S. Matheus ].
Poço da Onça ( lugarejo em Russas ) C75.
Poço da Pedra ( P. em Saboeiro)
Poço ( lugarejo no Jardim) 674.
Poços 287 376.
artezianos 375-6, 444 a 55.
(R. ) 113.
Pocinhos (S. ) 59.
Pombos (S. ) 26, 27.
Pompeo (Dr. José) 101 , 103.
Pompeo ( Senador Thomaz) 21 , 24 , 28 , 31 , 36, 45, 60 , 153, 166,
249, 284 , 311 , 375, 385, 388 , 397, 359, 335, 406, 444, 670 .
Pompeo (Dr. Thomaz) 45, 79 , 94.
Ponta Gorda (ponta ao N. )
Ponta grossa (ponta ao S. ) 41.
Pontal das almas (I. )
População 285, 524 , 660.
POSIÇÃO ASTRONOMICA - 5.
Porangaba (L.) 41 .
66 (V.) 332, 09, 701.
Porangabussú (L. na Fortaleza ) .
Porcos ( riacho aff. no Jardim) 35, 71 , 97 , 508.
Porphiro (rocha) 61 , 96, 98.
Porteiras (V. ) 673.
Porto do Barco ( monte na costa do Aracaty)
XXXI

Porto do Barco (monte no Acarahú ).


Potassa 76, 100.
Poty (R. e açude ] 487.
Prainha (arraial no Aquiraz .
Prata (metal) 104.
Precabura (L. no Aquiraz).
Preguiça ( S. ] 22, 31 , 557.
Presidio [barra no Acarahú] .
66 (ilha no Acarahú).
PRESSÃO ATMOSPHERICA 210.
Priaóca (S. em Aquiraz ).
Primamuna ( L. em Mecejana) .
Primavera 171.
Psamenito (rocha) 71 76, 77.
Puijú ( R. no Tauhá) .
Putiú (R. em Baturité).
Pyrito 74, 75, 98.
Pytagoary [ serrote na Aratanha) .
e
Quartz (rocha ) 16, 60 , 68 96.
Quartzito (rocha ) 65, 67, 70, 84, 93, 98.
Quatinguaba ( P. na S. de Ibiapaba) 25 .
66 jenseiada a L. de Pernambuquinho)
Quincunquá ( S. ) 24, 31 .
Quixadá [açude ] 374, 390 , 394, 410, 454, 476.
66 Raa 30, 383-4 .
(C. 67, 79, 96, 110, 141 , 226 , 245, 322
m
Quixará (V.)
Quixeré ( P. no Saboeiro) 671 .
Quixaua L. no Iguatú .
Quixelô (sertão) .
Quixeramobim ( açude) 374, 487.
6. (boqueirão de- ) 402 , 557.
66
[C. ] 67, 100 , 107-8, 205, 226-7. 293, 233-4,
246, 322-9, 339, 383, 663, 669, 674, 685-97 .
[ R. ] 37, 40, 102, 290, 557-8, 568.
R
Raças humanas no Ceará 659.
Rajada [ açude em Itapipoca ].
66
(R.) 37.
XXXII

Rapina (L. Canindé).


(lugarejo em S. Cruz ) 111 .
Rosa ( L. em Granja).
Rato (ilha ) 52.
(serrote fresco em Maranguape ) 38.
Rebouças (Dr. André) engenheiro 403.
Recifes da costa cearense 86, 87.
Redempção -veja Acarape.
Redonda (ponta- )
(serrote em Canindé).
Remedios (R. em Granja) .
REMEDIOS PROPOSTOS PARA ATTENUAR os effeitos das sec-
cas 365.
66 acção administrativa 365.
66 official 410.
66 particular 375.
Resinas 124-5.
Retirada (do gado)
Retiro (P. em S. Francisco ) 10.
Retiro Grande (enseiada) 51 .
Retiro Pequeno ( ponta .
Revy J. J./ engenheiro 67, 94, 383, 391 a 96 , 408 , 479, 483 ,
488 a 91 , 549.
Riachão Iriacho em Sobral)
66
¡ P. em GranjaJ.
66 [ P. da Est. da E. de F. de Baturité!.
Riacho do Sangue [ S. ] 35, 37.
66 66 [região do - 1 339.
RICS DO CEARÁ - 113, 175.
Rio da Cacimba ( em S. Anna).
Rio Grande (Visconde do—) 83.
Rocha Pitta historiador) 25.
Rochas cristalinas 53, 60, 64, 86, 96 .
66 eruptivas 88, 89.
66 graniticas 79.
66 metamorphicas 96.
porphiricas 61.
Rodolpho Theophilo - 45, 266, 382, 398, 686.
Rohan (Conselheiro Beaurepaire― 32, 381 , 397, 401–6.
Rolas (R. em S. Anna ).
XXXIII

Rolas [ serrote em S. Anna].


Romualdo (serrote em Barbalha ).
Rosario [ S ]
66 [ P. em Milagres] .
66
[ R.] 498, 535.
Ruidos subterraneos 92.
Russas (C. ) 35, 663-4, 668, 675. 679, 681-5.
(planicies de-] 35, 392, 522.
S

Sabiaguaba ( L. em Itapipoca] .
66
[morro no porto dos Patos .
Saboeiro (V. ) 669, 702, 35.
Sacco [ ribeiro no Jardim .
Sacco da Orelha [ P. no Pereiro ] 41.
Sacco da Velha ( L. no Aracaty).
Saint Claire de Miranda [ engenheiro ) 84.
Saladeiros 406.
Salamanca [ ribeiro em Barbalha ] 35.
Salgado [ R. ] 13, 34 a 36, 67, 71 , 75, 96-7, 102 , 108, 175
455, 497.
Salina redonda (ruido em) 92.
Salitre 98-9.
[olho dagua salgada em S. Quiteria] 112.
Salobro [ lugar oude se encontra hulha na S. do Araripe 100.
Salgados (S. ) 38.
Salgadinho [ S. ] 172.
Sal gemma 99.
66 marinho 99.
66 muriatico 99.
SALUBRIDADE do Ceará - 657.
Sampaio [governador] 251 .
Sant'Anna [ C. ] 40, 61 , 75. 682, 684-5.
Sant'Anna do Brejo [ V.]
Santa Barbara [ riacho em Maria Pereira) .
S. Catharina [ S. ] 38.
S. 66
(L. no Inhamuns ) 111 .
S. Cruz [ arraial no Mulungù].
S. 66 (P. no Acarahù).
S. 6. (P. em Campo Grande).
XXXIV

S. Cruz P. no Icó ] 28.


S. 6. (P. na Uruburetama) 668.
S Luzia ( R. ) 39.
S (S. em S. Francisco ) 39 .
S. (serrote na Fortaleza ) .
S. 66
" em Itapipoca) .
S. Maria (riacho em Jaguaribe - mirim).
)
S. .. (S. em Lavras ) 22 , 24, 31 .
S. Quiteria (arraial na Independencia).
S. 66 ( V. ) 40. 90 , 95 , 98. 108 , 112, 367 , 681-5, 702.
S. Rita S. , 22, 31 , 37, 557, 674.
S. Rosa (lugarejo onde ha zinco, no Jardim) 107.
S. (P. em Jaguaribe - mirim) 674.
S. [riacho em S. Quiteria).
Santo Amaro (serrote em S. Quiteria) .
S. Antonio (corrego no Ipù) .
S. riacho em Quixeramobim, 559.
S. de Padua (P. em Palma) .
S. do Pitaguary ( P. em Maranguape).
S. Benedicto ( V. ) 95 , 684.
S. Bento [arraial da Pacatuba/.
S. .. da Amontada (V.) 684.
S. (S. fresca em Lavras ).
S. Bernardo da Cachoeira [ P. em Cachoeira'.
S. [S. no Saboeiro ) 672.
S. das Russas [ C. ] veja Russas.
S. Caetano [ P. em Lavras ] 671 .
S. " [S. fresca em Lavras ].
S. Domingos (riacho no Jardim).
S. Felippe [ lugar no Jardim on de ha zinco 107.
S. Felix [ corrego em Ibiapaba ?.
S. Francisco ( R. ).
S. [ P. no Riacho do Sangue].
S. {P. em Lavras).
S. [ riacho no Riacho do Sangue ].
S. da Uruburetama ( V. ) 685, 762.
Sonçalo [ lugarejo onde ha potassa, no Arneiroz 100.
S. [L.] 141 .
S. [P. em Maria Pereiral.
S. (P. na Ibiapaba ) 25.
XXXV

S. Gonçalo [ P. na S. do Machado ] 31 , 100 , 112.


S. 66 (riacho em Maria Pereira) .
S. 66 66 na S. de Baturité] 39, 41 , 44, 51 .
[
Santo Hilario [ S. na Viçosa ] .
S. João do Jaguaribe [ P. no Limoeiro].
S. João do Principe ( veja Tauhá ) 509 .
S. João da Uruburetama [ V. ]
S. Joaquim [ S. ] 34.
S. Matheus ( V. ) 35, 99, 100, 107 , 543 , 671. 702 .
S. Miguel (açude ).
S. 66 triacho no Iguatù).
S. 66
[S.] 28.
S. Pedro [ S. ] 24, 75-6, 90, 99, 100.
S. 66 [P. em Milagres ].
S. 99
[P. na Serra de S. Pedro).
S. Sebastião [ P. em Russas ] .
S. Simão [ serrote em Granja ].
S. Thiago ( L. no Tauhá ).
Sapupara [ R. ] 38.
(P. em Maranguape ) 670.
Sarampão [ molestia ] 679, 698 .
Sariema ( riacho em Canindé ).
Satiá (R. ) 13, 112.
(valle) 13. 454, 588 .
Schisto rochaj 75.
29
argiloso 59, 64, 55, 90.
betuminoso 75, 10.
Sebastião [ prolongamento da S. do Pereiro ] 25 .
SECCAS - 249 a 288.
Seccas [ estação—] 120 .
Seixos rolados 61 , 73 , 80, 85.
Senador Pompeo [ C. antiga Humaitá] 96, 701–2 .
SERRAS DO CEARÁ - 177, 191 , 223.
Serra [ R. ] 37.
66
Grande [ S. ] 26, 59 , 76, 95 , 100 , 104-1 , 113 , 542
66 Nova ( S. no Iguatú ).
66 do olho dagua [ em Lavras].
66 dos Pobres [ no Riacho do Sangue !.
66 do Vento [ em Maranguape ].
66 Verde (muito fertil) .
XXXVI

Serrania IS. 37.


Serrinha (S. , 31.
66 de S. Catharina ( P. no Acarape) .
Serrote [ P. em Pará- curú ].
66
Branco [ S. no Riacho do Sangue ].
Sertanejos ( caracter dos- ) 532.
Sertão [ região do- ] 14 a 16, 112 a 118, 174, 225, 223, 287 .
Severino [riacho em S. João da Uruburetama ].
Sibiró ( R. ) 557, 559.
Silex 60-1 , 98.
Silica 83, 86.
Silos 406.
Silveira de Sousa ( Dr. ) presidente 367, 667.
Sipó [ L. no Iguatúj.
Sitiá [ veja Satiá ].
Sitio Novo [ P. em S. Matheus ].
Sitios novos [ P. em Maranguape ] .
Siúpé (riacho ).
66
[P. ] 667.
Sobral [ açude ] 374.
66
[C.J 40 , 57, 91 , 290 a 94, 663–4, 666 a 70, 981-2, 684,
688, 702.
Sobriedade do cearense 704.
Soda 96.
Sombra (ribeiro no Jardim).
Sororo riacho em Itapipoca].
Soure [ V. ] 55, 97, 677, 682, 38.
Spato calcareo 60.
66 fluor 60.
Studart (Dr. Guilherme -barão de ) 36, 38 , 103, 256, 688.
Sucatinga ( P. de Beberibe ) 111.
[praia 675.
Salfato de ferro 74.
66 de mercurio 108.
66
de cal [ gesso ] 98, 75.
de zinco [ caporiosa ] 100, 107 .
66 de chumbo 75.
SUPERFICIE DO CEARA- 6.
Sussuanha [ riacho e valle na S. da Ibiapaba].
Syphiles 680.
XXXVII

T
Tabatinga ( terreno ] 74, 98.
29
(P. em Maranguape ] 668, 676.
99
[P. na Viçosa].
Tabocas [corrego no Ipú].
Taboleiros - chapadas - 72 , 115. 118-9.
3.257. Toboleiro grande [ planicie entre os rios S. Gonçalo e Curú]
da Areia [ Pov. no Limoeiro ] 681.
Taboqueira [ riacho no Iguatú].
Tahuba [ L. em Itapipoca ] .
Taitinga [serrote ] .
Tajicioca ou Tajacuoca /salitre/ 99.
Tamataúduba ( corrego na Fortaleza ].
Tamboatá ( corrego na S. da Ibiapaba ).
Tamboril [ V. ] 60, 685.
Tanque do meio ( Pov . no Acarahú) .
Tapera ( P. no Riacho do Sangue).
Tapery [ L. em "" Porangaba )] . 677.
(P.
Tapuio (riacho).
Taquars (P. em Sobral).
(lugar argentifero ) 103.
Taquary ( P. em Sobral) .
(riacho em Sobral).
Tarrafa [P. em Assaré ] 672.
Tatajuba (mina de salitre em S. Quiteria ) 98.
Tatumondé (P. em Porangaba).
Tauá (terreno ) 96, 100 , 74, 56, 102.
Tauá ( açude em S. João da Uruburetama ) .
Tauá ( V. ) 669-72 , 35.
Tauape (P. em Maranguape).
Tauápe ( L. na Fortaleza ].
Telha (L no Iguatú ).
་་
[S.] 31 , 37, 557.
(C. ) veja Iguatú.
Telhas jarraial no Tamboril].
TEMPERATURA — 176 .
Temperatura na capital 177.
66 no sertão 178 .
4. 66 nas serras 179.
XXXVIII

Temperatura horaria no Quixeramobim.


Tempo-[previsão ] 396.
Tensão do vapor 222 a 230.
Terra Nova (região na encosta do Araripe) 26.
99
[ R. em S. Anna 33.
TERREMOTO--89.
TERRENOS aluminosos 108.
77 alluviaes 80, 85.
artezianos 76, 84.
99 cretaceos 84.
devonianos 85.
:

99
jurassicos.
29 laurencianos 53, 59.
permicos 75.
99
plutonicos 75 .
quaternarias 85.
72 sedimentarios 59, 71 , 79.
secundarios 61, 62.
99
terciarias 59, 61 a 63, 72 , 81-2, 85, 186.
99
vegetal 82, 86, 89.
99 seu valor no Ceará 529.
Thomé Vieira ( R. ) 37.
Theberge Dr. Pedro) 97, 107-8, 110, 665, 668, 670.
Tianguá ¡ P. na S. da Ibiapaba] .
Tibáo inorro ao S. ]
Timbaúba (L. no Crato) 41 , 111.
66
(L. no Arneiroz ).
..
(R.) 37.
66 (P. na S. de S. Pedro ).
Timboassú [ R. ].
Timonha ( R. ) 40 , 102 .
Tope [ P. no Coité] .
Torre (serrote em Maranguape ) 31 .
Torre [ P. em Pacatuba).
Torreão ( Dezembargador Enéas ) presidente 696.
Trahiry [ L. 41.
66
(R. )
Trahiry V. ] 679, F84.
Trapiá [serrote }.
77
(S. em S. Matheus ) 31 .
XXXIX

Trapiá (P. em Palma).


Trepadores (animaes ] 164 .
Tres Irmãos (S. e mina de alvaiade/ 100 , 107.
Tricy [ R. ] 35, 37.
Tronco [ L. no Aracaty] 41 .
Truçú [ S. no Inhamuns ) .
[riacho no Saboeiro) .
Tubarão [ P. na Viçosa] .
Tuberculose 683 , 697 a 700 , 711 a 14.
Tubiba (riachão em S. Quiteria ] .
Tucunduba [riacho ] 38.
""
(P. na S. de Maranguape .
99 (P. em S. Anna).
(S. a N- O. da Fortaleza) 32.
Turmalina [ pedra ] 58, 109 .
Turri 103.
Tururú (P. em S. da Uruburetama).
U

Ubajara (gruta ) 95 , 105.


Ubatuba (R. ]
Ubatuba ( P. em Granja/.
Umary /V. 671.
Umburanas S. em S. Quiteria/.
Umbuseiro / riacho no Tauhá .
Umbuseiro /S. no Saboeiro/.
Umputy /L. em Lavras/.
Una R. em Granja .
União /C./
Urbano riacho da S. do Araripe /.
Urucutuba / L. em Porangaba/.
Urnahaú L. no Cascavel/.
Uracará Pov. em Maranguape/ .
Uruburetama /S./ 23 , 27 , 31 , 35, 57 , 39 , 46, 91 , 95, 99 , 104,
108, 117, 339.
Uruquê P. e Est. da E. de F. de Baturité .
V
Vacas L. 52.
Vaca Brava /P. em Varze - Alegre. )
XL

Vaca Morta lugarejo em Lavras) 671 .


Valentim [serrote em Itapipoca. )
VALLES DO CEARA 9.
Variola no Ceará 661 a 689, 693, 696 a 700.
Varjota P. em Entre Rios) .
Varze- Alegre ( V. ) 543, 671-2 .
Varze Formosa (P. em lpueiras).
Varze Grande (serrote em Canindé/.
99 77
(P. em Lavras) 671 .
Varze da Serra (lugarejo em Cascavel ) 675.
Varze da Timbahuba (L. em Arneiroz ) .
Vasconcellos [ presidente Pereira de ) 661 .
Vazante (de rios ) 120 , 410 , 471 .
Vazantes [P. em Aracoyaba ) 702 .
Venda-veja Aurora.
VENTOS -231 , 399.
"" annuaes 231.
19
mensaes 232, 236.
diarios 233.
29 horarios 233, 238 .
99 sua intensidade 237.
no litoral 231.
29
no sertão 233.
7: aliseos 334 a 342, 400.
99 contra aliseos 334 a 342.
71
sua frequencia 238.
97
na Fortaleza (tab. 50 ).
Verde (S. ) 39.
Vegetação 113 a 117, 170-2.
Verão - 124-5, 171-5 , 286.
Veranico 170, 459
Vermelhão (sulfato de mercurio) 108.
Vertentes ( S. no Aracaty-assú) .
99
(P. na Independencia) .
Viçosa (C.) 40 , 99 , 106, 549, 668-70, 684, 702.
Vidéo (P. em S. Quiteria).
Vilella (Dr. Joaquim) presidente 664.
Villa Nova (lugar onde ha chumbo ) 107 .
Viriato de Medeiros ( engenheiro) 375, 378, 391 , 395–6, 400-1 ,
Vieira (Padre Antonio) 19.
XLI

Weber ( Oswaldo) 215, 355.


Y
Ytaitéra (riacho no Crato) veja Batateira.
Z
Zoophitos 166.
Zozimo [Barroso engenheiro ] 401.

400-1
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