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A Influência dos Conteúdos do Youtube na Linguagem de

Crianças Portuguesas

Reflexões a partir da reportagem do Jornal Diário de Notícias

Docente: João Carlos Correia

Discentes: Bárbara Biolchi, Luís Diabão, Marcos Vinicius Leite

Mestrado em Jornalismo | 2º Ciclo de Estudos

UC: Teorias da Cultura

Covilhã, janeiro de 2023


Índice

Introdução ..........................................................................................................................3

1. Youtubers brasileiros viram notícia em Portugal ...........................................................5

2. Reflexões sobre Técnica, Tecnologia e Cultura ............................................................6

3. Ciberespaço, Cibercultura e Celebridades da Internet ..................................................9

4. A linguagem e os choques culturais em perspetiva .....................................................13

Considerações Finais .......................................................................................................16

Bibliografia ......................................................................................................................18

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Resumo

O presente trabalho tem como objetivos estabelecer uma reflexão sobre as


relações existentes entre tecnologia e cultura, bem como perceber a influência, na
linguagem das crianças portuguesas, do consumo de conteúdos produzidos por youtubers
brasileiros. Para tanto, o ponto de partida é a análise de uma reportagem publicada pelo
jornal Diário de Notícias, em novembro de 2021, intitulada “Há crianças portuguesas que
só falam ‘brasileiro’”, e dos comentários que foram feitos pelos leitores sobre a
publicação. Sob a ótica das Teorias da Cultura, o artigo buscou abranger os conceitos de
cultura, cibercultura, tecnologia e influencers, e encontrou em autores como Zygmunt
Bauman, Piérre Lévy e Clifford Geertz a base para o estudo proposto.

Palavras-chave: Cultura; Tecnologia; Youtube; Portugal; Brasil

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Introdução

É já senso comum que o acesso às novas tecnologias abrange também o público


infantojuvenil. A internet, enquanto cultura ou ambiente cultural, tem a plataforma de
vídeos Youtube como um dos seus grandes expoentes. Neste segmento, que é composto
pelos chamados “canais” e onde utilizadores podem se tornar seguidores e assinantes,
segmento em que se destaca o youtuber brasileiro Luccas Neto. Em publicação de
novembro de 2021, o Jornal Diário de Notícias descortinou a discussão sobre a influência
dos youtubers brasileiros na linguagem de crianças portuguesas. A reportagem provocou
uma série de comentários e acalorou as discussões sobre os limites da internet e sobre a
influência, positiva ou negativa, que os conteúdos exercem na formação linguística e
cultural das crianças.

Partindo do pressuposto de que o tema deste artigo surgiu de uma publicação


jornalística, não se vislumbram grandes vertentes de discussão senão aquelas decorrentes
das repercussões causadas pelo texto. Assim, a análise sobre a forma como o assunto foi
abordado e sobre as reações do público nos comentários no site do jornal, permite inferir
que o que foi colocado em questão trata-se de um fenômeno cultural. Primeiro, porque a
discussão recai sobre a utilização de termos “brasileiros” no idioma falado em Portugal.
Segundo, porque a linguagem faz parte do “dogma” cultural dos povos. E, em terceiro,
porque foram identificadas manifestações de resistência que indicam sentimento de
ameaça à cultura portuguesa, no que toca à linguagem utilizada pelas crianças.

O assunto torna-se relevante na medida em que, de um modo geral, são


depositadas nas crianças as expectativas de futuro e a ideia de uma nova geração que
levará adiante a cultura de um povo, seu idioma, seus costumes e suas tradições. Não
obstante, vale destacar que os termos brasileiros mencionados na reportagem com viés de
estrangeirismo pertencem, ainda que pareça ambíguo, à língua portuguesa. Este fato, por
si só, demonstra que a linguagem, enquanto elemento cultural, é passível de sofrer
transformações, sejam elas temporárias, decorrentes de modismos, ou perenes. Corrobora
esta tese o fato de que não existe uma língua brasileira, mas sim a língua portuguesa falada
no Brasil, com suas alterações históricas e variações culturais.

A reflexão aqui proposta, ainda que não aborde questões de natureza pedagógica,
sugere, através do contraponto em relação ao comportamento adulto quando do consumo
de conteúdos televisivos como as novelas brasileiras, que a linguagem, enquanto

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componente cultural, estará sempre sujeita a influências e modificações quando
contrapostas a outras culturas. Além disso, identifica que existe um contraste entre
crianças e adultos, na medida em que Luccas Neto, enquanto gera polêmica ao ter seus
conteúdos consumidos por crianças portuguesas através do Youtube, é também cara de
uma grande rede de supermercados do país e, com isso, atinge também o público adulto.

Neste sentido, a questão central deste artigo é analisar os factos sob a ótica das
Teorias da Cultura e evidenciar as relações que existem entre culturas e tecnologias,
sobretudo no que tange a disseminação de conteúdos na plataforma do Youtube. Portanto,
foram utilizados como base bibliográfica os autores Zygmunt Bauman e Piérre Lévy para
pensar os conceitos de cultura, cibercultura e ciberespaço. Além disso este trabalho se
apoia nos conceitos de Geertz sobre o impacto da produção cultural na humanidade, de
Ana Maria Rodrigues sobre os conceitos de tecnologia, de Thomson e Lambert sobre os
influencers, de Tapscott sobre o fenômeno da “viralização” e de Hall sobre os elementos
de desestabilização da cultura

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1. Youtubers brasileiros viram notícia em Portugal

A reportagem “Há crianças portuguesas que só falam ‘brasileiro’” foi publicada


no Jornal Diário de Notícias, na edição de 10 de novembro de 2021. Em linhas gerais,
inicialmente a matéria aborda o fato de que, depois do longo período de confinamento
decorrente da pandemia de Covid-19, as crianças portuguesas passaram a incorporar em
seus vocabulários diversos termos do idioma português falado no Brasil. De acordo com
a publicação, o tema parece dividir opiniões: enquanto pais e professores preocupam-se
com os estrangeirismos brasileiros, especialistas apontam que este fenômeno tende a ser
uma fase – como já ocorreu em relação à influência das novelas televisivas e da banda
desenhada.

No texto, há um destaque especial para o youtuber brasileiro Luccas Neto, que


produz conteúdos focados para o público infantil e que lotou a Altice Arena, em Lisboa,
com um espetáculo realizado dias antes da reportagem ir ao ar. Nascido no Rio de Janeiro,
Luccas Neto tem 31 anos, é um artista de multifacetado e suas atuações ocorrem como
cantor, ator, escritor, diretor, empresário, youtuber e guionista. A sua empresa, a Luccas
Toon, possui outros canais que associados atingem um público de mais de 38 milhões de
utilizadores. Desde 2019, é considerado um dos maiores influenciadores digitais do Brasil
e, ano após ano, tem ampliado o seu público além-mar.

O jornal descreve que são muitas as crianças que assistem aos conteúdos de
Luccas Neto no Youtube. Muitas delas na fase em que começam a falar. Os pais, ao
mesmo tempo em que permitem que seus filhos acedam essas tecnologias também
expressam medo de que as crianças adotem uma linguagem diferente daquela falada na
cultura portuguesa. Tal preocupação, segundo o artigo, levou alguns pais a encaminhar
seus filhos para terapias da fala pois acreditam que a utilização de termos “brasileiros” na
linguagem portuguesa pode ser nociva para as crianças. Os relatos chegam a comparar o
uso de termos “brasileiros” como uma espécie vício, o que justificaria uma intervenção
profissional de terapeutas.

É possível capturar ainda outros reflexos de caráter cultural. Este parece ser o caso
de uma mãe que relata ter sido interpelada pela professora do filho no sentido de saber se
o pai ou a mãe seriam brasileiros, diante do comportamento da criança em sala de aula.
De outro modo, o texto traz a opinião de especialistas que dizem haver correlação com
outros eventos do passado e que consideram que a abordagem atual do assunto é, por

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vezes, dramatizada. Segundo eles, os desdobramentos são semelhantes ao que outrora foi
visto com a leitura de banda desenhada e com o consumo das novelas brasileiras.

Outros especialistas ouvidos pelo Diário de Notícias, também de forma positiva,


entendem que de um aparente problema se pode ter uma interessante solução, na medida
em que a questão permite que a língua seja mais bem aprendida, discutida e estudada,
com a ressalva de que o consumo desses conteúdos do Youtube seja feito com moderação.
É sinalizada, ainda, a perspetiva de que existe uma tendência de que as crianças convivam
cada vez mais com diferentes culturas dentro das próprias salas de aula, devido ao
aumento do fluxo de imigração em Portugal.

A partir dos comentários publicados de leitores logo abaixo da reportagem, é


possível notar que o tema divide opiniões. Há quem defenda que o fenômeno seja
explicado pelo fato de o colonialismo ser uma via de mão dupla. Há quem expresse temor
de que Portugal se torne uma “favela”. Há reações daqueles que bradam contra o
preconceito. Outros argumentam que os portugueses tratam o idioma falado pelos
brasileiros como “inferior” e se esquecem que foram os próprios portugueses que levaram
a língua portuguesa para o Brasil, como herança cultural renegada. Também não faltam
aqueles que consideraram xenofóbica a abordagem do jornal.

O facto é que o texto é polêmico e controverso. O seu conteúdo foi capaz suscitar,
nos comentários analisados, a prática de preconceito e de intolerância cultural. E se há
preconceitos, na sua etimologia, há necessariamente um determinado choque cultural,
perfeitamente descrito no texto e facilmente identificável nos comentários. Para além
disso, a postura e a estratégia de Luccas Neto, que recentemente divulgou que passará a
dobrar as suas produções para o português europeu, abrem espaço para inferir que existe
receio em perder audiência no país ou, pelo menos, uma preocupação em se adequar ao
mercado que deseja explorar.

2. Reflexões sobre Técnica, Tecnologia e Cultura

São muitos os autores que, ao logo dos anos, buscaram definir o termo “Cultura”.
Por outro lado, bem menos são os que definem “Tecnologia”. Para pensar a influência
dos conteúdos do Youtube na linguagem de crianças portuguesas, é evidente a

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necessidade de buscar definições de tecnologia – que parece ser bem mais abrangente do
que simplesmente computadores, tablets e smartphones.

Do ponto de vista antropológico, há toda uma história que envolve os nossos


antepassados. Ossos de animais, artefactos em pedra e metal são exemplos do passado
mais distante e mesmo que não estivessem providos de inteligência artificial, foram
considerados tecnologias. Por sua vez, o conceito é bem mais novo que o Homo-erectus.
Geertz (1989) demonstra a impossibilidade de compreender a humanidade sem uma
análise do impacto da produção cultural na sua constituição.

Respeitando os contextos culturais de cada época, é através de um estudo da


evolução história das técnicas desenvolvidas pelo Homem, que podemos compreender
melhor a participação ativa - do homem e da tecnologia- no desenvolvimento e no
progresso da sociedade. Com efeito, temos o enriquecimento do conceito de tecnologia.
Também, é notório que as palavras “técnica” e “tecnologia” derivam ambas do mesmo
termo: techné, que inicialmente era mais um processo onde a ciência não tinha influência.
Sua abrangência, portanto, era voltada mais ao fabrico, à produção, à construção e às
próprias ferramentas (teuchos). Este termo grego, com o passar dos anos, acabou por ficar
mais ligado à Técnica e se tornar um ponto de partida para a Tecnologia.

Assim, o termo tecnologia deriva da junção de techné e logus, que significa razão.
Ao trocar isto para o idioma português, resulta em qualquer coisa como a razão do saber
fazer (Rodrigues, 2001), e/ou o estudo da técnica, da atividade de modificar, do
transformar (Veraszto, 2004; Simon et al, 2004a). Nos diferentes momentos da história,
a tecnologia sempre foi ligada às técnicas, ao trabalho e à produção, mas muito poucas
vezes diretamente ligada à cultura, mesmo que seja esta uma pedra basilar de muitas
sociedades. Desta forma, a relação entre cultura e tecnologia tende a ser bem mais do que
óbvia, razão pela qual seja ignorada por vários autores. Nos últimos anos, após a
revolução industrial e a facilitação do acesso às novas invenções, as sociedades passaram
a ter acesso aos mais diversos dispositivos tecnológicos. Com a redução nos custos e
sendo a tecnologia um excelente canalizador dos modernos padrões de consumo, ocorreu
também um significativo aumento do número de pessoas que podem ter acesso a esses
dispositivos.

Por consequência, as novas tecnologias na cultura têm gerado uma revolução


social. Esta envolve a forma como as pessoas observam o seu meio, bem como

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compreendem os seus contextos e se relacionam com o mundo. Contudo há quem pense
que as duas coisas não se direcionem para o mesmo lado. Tanto a influência da tecnologia
nas culturas como a interferência do contexto cultural nos avanços da tecnologia mostram
como esta relação está umbilicalmente ligada. Por esse motivo, há que mostrar como a
tecnologia e a cultura estão numa espécie de ciclo. O contexto tecnológico incide no
desenvolvimento das relações humanas assim como a cultura gera esse contexto
tecnológico.

Não se pode esquecer que nas últimas décadas a forma como as pessoas se
relacionam também tem se alterado, assim como as expectativas no mercado de trabalho,
o modo de consumo e a atitude das empresas. Fatores estes que permitem perceber como
as tecnologias e o seu contexto podem mudar uma cultura e, potencialmente, as próprias
pessoas. Em relação à arte, é possível notar que os negócios culturais tiveram que se
adaptar à indústria. Acabaram por serem ameaçados pelas inovações tecnológicas, graças
à emergente Internet e consequente disponibilização de conteúdo gratuito ou pago, mas
sem intermediação de uma gravadora, no caso da indústria musical.

Também os jornais e as livrarias sofreram com o emergir de tecnologias e


ferramentas mais baratas. Estas alteraram a forma como as impressões são produzidas e
até mesmo escritas, por vezes tendo de recorrer ao sensacionalismo como forma
desesperada de garantir algum lucro. O lado das livrarias é um pouco mais óbvio, já que
as que viviam das publicações periódicas acabaram por sucumbir aos novos modelos de
negócios.

Seguindo este entendimento, é possível inferir que plataformas com o Youtube


trouxeram mais-valia ao facilitar as tarefas relacionadas a estas interfaces culturais.
Porém, eliminaram também muitos dos intermediários e possibilitaram o contacto direto
entre o artista e o seu público, chegando num ponto em que os trabalhos artísticos foram
modificados de forma que o fã ganhasse voz. Esta aproximação entre o criador e o
utilizador promove o fascínio do consumidor por aquele que é célebre, e tende a criar
hábitos semelhantes nos seus seguidores, como o consumo, estilo e tendência (Thomson,
2006).

A ausência de literacia em crianças e jovens também permite o direto


envolvimento entre seguidores e influencers. Para Lambert (2006), são sete os elementos
para histórias digitais eficazes: apresentar um ponto de vista, colocar uma pergunta

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dramática, oferecer conteúdo emocional, utilizar a voz para dar sentido às imagens,
utilizar banda sonora apropriada, conciliar áudio e vídeo e, finalmente, gerir ritmos da
história. Nesse aspeto, o caso apresentado pela reportagem do Jornal Diário de Notícias
se encaixa perfeitamente. Mas o que isso poderia dizer em termos culturais? Como forma
de ter acesso aos conteúdos de forma mais fácil e ágil, as novas tecnologias instalaram
uma mentalidade de gratuidade. Como é óbvio, a indústria teve de inovar e assim
nasceram os anúncios que suportavam estas produções artísticas.

O fato é que as novas tecnologias lançaram tentáculos em muitos meios, culturais


e sociais. Até mesmo no tocante aos relacionamentos pessoais. Muita coisa mudou em
relativamente pouco tempo. Gerações anteriores costumavam usar as cartas. Depois
talvez as festas tenham se tornado um lugar para estabelecer relações. Mas a geração de
agora tem um novo ambiente de interação, baseado em uma ferramenta tecnológica. O
que antes era algo impensável ou futurista hoje é adotado como padrão pelas novas
gerações.

Nesse ambiente chamado digital, praticamente todas as interações sociais


passaram a ser suportadas por aparatos tecnológicos. O comércio digital, os
relacionamentos e até mesmo as instituições de ensino viram no ambiente online
oportunidades de levar adiante seus objetivos empresariais. Metaforicamente falando, por
mais que já se tenha retirado as sementes das uvas, por processos de melhoria genética,
no ambiente virtual atual os usuários nem sempre podem interagir ao ponto de evitar
choques culturais. São consequências muitas vezes inestimadas.

3. Ciberespaço, Cibercultura e Celebridades da Internet

Em razão de tudo isso, a presença da internet no quotidiano das pessoas cresceu à


medida que a velocidade dos avanços tecnológicos também aumentou. Se nos anos 90
ainda era digno de surpresa se deparar com alguém em posse de um telemóvel, ou era
uma novidade um computador pessoal conectado à rede, atualmente o que pode causar
espanto é alguém ainda não tenha um smartphone com acesso à internet. Seja para ver as
condições meteorológicas antes de sair de casa, para pedir o jantar, realizar pagamentos,
para atualizar as últimas notícias ou mesmo para assistir o vídeo do artista favorito, as
soluções encontram-se cada vez mais à palma da mão e nas aplicações que se multiplicam
a cada dia.
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A esse contexto de evolução tecnológica é possível acrescentar, como um fator de
aceleração, a recente crise provocada pela pandemia de Covid-19 que assolou o mundo
por mais de dois anos. Diante de um cenário de isolamento prolongado, a utilização dos
meios digitais parece ter adquirido uma outra proporção, bem como reafirmado a sua
importância. Com o encerramento das escolas e universidades, as salas de aula foram
transportadas para um ambiente virtual. Diante do risco de contaminação, os
supermercados adaptaram suas equipas para que clientes pudessem realizar compras
online e tivessem a garantia de que receberiam os produtos na porta das suas casas. O
contacto com familiares e amigos passou a ser por videochamadas. Eventos culturais e
artísticos, como concertos e peças de teatro, foram realizados virtualmente e os chamados
“diretos” bateram recordes de visualizações. Serviços que em 2020 ainda não operavam
de maneira digitalizada, encontraram no online a possibilidade de continuar a demonstrar
os seus produtos. Em um momento em que o mundo precisou fechar portas, a internet
possibilitou que se “abrissem janelas” para a interação social.

Embora seja percetível que a pandemia intensificou a velocidade com que as


tecnologias passaram a ser incorporadas no dia a dia das pessoas, os estudos sobre essa
temática já são desenvolvidos há vários anos. Ainda nos anos 90, o sociólogo e
pesquisador francês, Pierre Lévy, apresentou as suas ideias de cibercultura e de
ciberespaço. Conceitos que, na reflexão proposta aqui, se sustentam como caminhos
possíveis para refletir sobre as relações entre tecnologia e cultura.

Lévy (1999) definiu o ciberespaço como “o novo meio de comunicação que surge
da interconexão mundial dos computadores”. Segundo o autor, o termo abrange não só a
estrutura física necessária para esse novo meio de comunicação, como também todos os
outros elementos que o constituem – nomeadamente informações e usuários. No que se
refere ao conceito de cibercultura, o pesquisador explica que a definição diz respeito ao
“conjunto de técnicas (materiais e intelectuais), de práticas, de atitudes, de modos de
pensamento e de valores que se desenvolvem juntamente com o crescimento do
ciberespaço” (Lévy, p.17, 1999).

No seu livro “Cibercultura” (1999), a técnica é explicada como uma espécie de


instrumento que possibilita às pessoas, em particular, e à sociedade, de um modo geral,
criarem condições para se desenvolverem. Nesse sentido, apresenta uma contraposição à
ideia de que a técnica e as tecnologias representariam um potencial problema ou ameaça
à sociedade, justamente porque estas não apenas seriam “imaginadas, fabricadas e
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reinterpretadas durante seu uso pelos homens, como também é o próprio uso intensivo de
ferramentas que constitui a humanidade enquanto tal (junto com a linguagem e as
instituições sociais complexas)” (Lévy, p. 21, 1999).

A partir desta perspetiva, a tecnologia pode ser compreendida antes como


resultante de processos sociais e culturais do que como uma entidade abstrata, que possui
vida própria ou que por si só tenha capacidade gerar problemas para uma sociedade. Isso
não significa, no entanto, que seja negada a relação entre o avanço das tecnologias e as
mudanças sociais e culturais. A ampliação do ciberespaço e da cibercultura proporcionam
uma “evolução geral da civilização” na medida em que as tecnologias são incorporadas
ao quotidiano social e que a decisão sobre seus usos pode produzir condições
irreversíveis:

“Muitas vezes, enquanto discutimos sobre os possíveis usos de uma dada


tecnologia, algumas formas de usar já se impuseram. Antes de nossa
conscientização, a dinâmica coletiva escavou seus atractores. Quando finalmente
prestamos a atenção, é demasiado tarde... Enquanto ainda questionamos, outras
tecnologias emergem na fronteira nebulosa onde são inventadas as ideias, as
coisas e as práticas. Elas ainda estão invisíveis, talvez prestes a desaparecer,
talvez fadadas ao sucesso. Nestas zonas de indeterminação onde o futuro é
decidido, grupos de criadores marginais, apaixonados, empreendedores
audaciosos tentam, com todas as suas forças, direcionar o devir”

(Lévy, p.26, 1999).

Esse universo do ciberespaço, onde a cibercultura se desenvolve, é terreno fértil


para o surgimento de tendências que se disseminam rapidamente. Por meio de alguns
clicks, um jovem norte-americano pode aceder, consumir e compartilhar o mais novo
lançamento de uma banda coreana de k-pop. Ou uma criança portuguesa é capaz de
sozinha, encontrar e se divertir com vídeos infantis de um youtuber brasileiro. Não é
preciso mais do que um telemóvel e uma conexão de internet para descobrir e interagir
com produções culturais do mundo.

Direcionar o olhar para esses fenômenos permite perceber que do ciberespaço


emergem celebridades nativas da internet. É o caso das pessoas que não iniciam suas
vidas públicas em grandes canais de televisão, mas que produzem os seus vídeos e

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publicam nos seus próprios canais no Youtube e que, a partir do seu perfil pessoal em uma
rede social, viralizam ao compartilhar o seu dia a dia com seguidores. Aliás, o Youtube é
uma ferramenta capaz de tornar um desconhecido em celebridade, com a simples
viralização de um conteúdo (TAPSCOTT 2007).

Vasconcellos e Zanetti (2017) explicam que a “webcelebridade” nasce do conceito


do “faça você mesmo” e da propagação da ideia de que é possível construir a fama por si
próprio, sem necessariamente depender de um média de massa tradicional:

“Esse novo ator da cibercultura nasce das relações estabelecidas pelo contexto
digital; é cidadão desse território; sua produção está estabelecida nele; interage
com usuários que são bits – estes também descorporizados e mediados pela
linguagem eletrônica –; ganha visibilidade multitudinária em uma mídia massiva
através de relatos que, mesmo podendo perpassar referenciais distintos, acabam
se construindo em cima da imagem unificada do usuário autor do discurso, que
se torna famoso nas redes”

(Vasconcellos e Zanetti, p. 10, 2017).

De acordo com as autoras, esse é um fenômeno que promove uma rutura e que
“retira o monopólio da fama das mãos de uma elite nobre e artística e a democratiza, por
meio das novas técnicas de comunicação operadas pela web, possibilitando a celebridade
do homem comum em sua ordinariedade habitual” (Vasconcellos e Zanetti, p. 1, 2017).
Estas são noções que ajudam a entender a projeção de Luccas Neto, um jovem que criou
o seu canal no Youtube em 2014 e, após se envolver em polémicas e transitar por
abordagens de assuntos diversos, encontrou na temática infantil o caminho para atingir
bilhões de visualizações e ter, atualmente, mais de 38 milhões de pessoas inscritas em seu
canal.

O caso de Luccas Neto é um exemplo de uma celebridade que nasceu no


ciberespaço e que se tornou uma personagem que está inserida na cultura social. Luccas
Neto não somente produz vídeos para o Youtube, como também faz espetáculos que
geralmente enchem as maiores salas dos países por onde passa. Comercializa brinquedos,
roupas e acessórios que podem ser comprados em lojas online ou físicas. Lançou filmes
em plataformas de streaming e tem a sua imagem associada a grandes marcas – como é
o caso da propaganda da rede de hipermercado Continente, veiculada em Portugal no ano

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de 2022. O youtuber alcançou uma capilaridade que extrapolou as fronteiras do Brasil e
hoje está inserido na cibercultura de modo que é capaz de influenciar comportamentos,
despertar desejos e lançar tendências. Segundo Recuero (2017), “o influenciador é uma
pessoa que tem uma posição de certo privilégio na rede. Ele pode ter uma posição que
está conectando vários grupos, onde ele é muito importante para um grupo”.

4. A linguagem e os choques culturais em perspetiva

Transitar para os reflexos disso na linguagem das crianças e dos adolescentes é


como enfrentar os paradigmas pensados por Umberto Eco em “A busca da língua
perfeita”. Seria ela uma maldição ou uma bênção? Na sua obra, Umberto Eco procurou
envolver um pouco das utopias europeias a respeito da busca de uma língua perfeita, ou
mesmo uma língua original (Aseff,). Portanto, não restam dúvidas de que a linguagem
compõe um dos elementos fundamentais da cultura.

De acordo com Neira e Nunes, o movimento humano pode também ser entendido
como forma de expressão, o que o torna portador de significados e meio privilegiado para
expressar sentimentos, emoções e toda a produção cultural de um determinado grupo
social. Neste sentido, abstraindo a qualidade e sublinhando a natureza do conteúdo, é
possível inferir que os youtubers, como mecanismo de mudança em padrões de
comunicação e linguagem, se tornam agentes culturais e reforçam a ideia de que a língua
é elemento cultural. Todavia, pela forma como surgiu a reportagem aqui analisada, é
possível seguir o entendimento de que tais fenômenos sejam elementos de
desestabilização da cultura (Hall, 2003).

Segundo Lobosco, Moraes e Teixeira (2011), a evolução tecnológica e a


propagação da internet são consideradas faces de uma revolução digital e social
impulsionada pela globalização. Portanto, os influencers, youtubers, entre outras
designações que hão de surgir com as constantes inovações da tecnologia no ciberespaço,
fazem parte deste acervo de novidades que, de tempos em tempos, surgem e provocam
mudanças culturais, que podem ser consideradas como fenômenos culturais.

Sob o viés colonialista, apontado nos comentários ao texto como sendo uma “via
de mão dupla”, destaca-se o pensamento de Carl Jung (1979), em que as crenças, os
desejos, o poder e a aprovação social são influenciados por arquétipos que estão nas

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coletividades, consciente e inconscientemente. A “psique coletiva” é constituída por um
fundo de imagens com carácter histórico. Como imagens e representações simbólicas, os
arquétipos são restituídos à vida por intermédio de estímulos, exteriores e interiores.

A metáfora do romano e do escravo, descrita por Jung, é um bom exemplo. Nela,


um romano, cercado por escravos que haviam inundado a Itália antiga, fez com que todo
o romano se tornasse, internamente e inconscientemente em um escravo. Ao viver a
atmosfera dos escravos, ele (romano) acabou por contaminar sua própria psicologia
(Mcluhan, 2007).

Assim, considerando estes eventos como uma espécie de choque cultural, fica
clara a influência que os influencers, que como o próprio nome já diz, são capazes de
provocar no contexto da linguagem enquanto elemento da cultura. Da mesma forma e,
por via de consequência, as repercussões causadas pela reportagem podem coincidir com
o conceito de etnocentrismo – o ideal formado na Europa do século XVIII que
representava a perfeição humana, que outras partes do mundo gostariam de imitar.

Corroborando este conceito, etnocentrismo é uma visão de mundo onde um grupo


se considera como o centro de tudo, e todos os outros são pensados e sentidos através de
daqueles valores, modelos e definições do que é existência. Assim o etnocentrismo é um
verdadeiro julgamento à distância, uma crítica feita de longe, que termina por
desqualificar aquilo que é diferente e exaltar aquilo que é próximo (Rocha, 1988).

Nesse sentido, vale destacar o seguinte trecho da matéria veiculada no Diário de


Notícias: "Todo o discurso dele é como se fosse brasileiro. Chegámos ao ponto de nos
perguntarem se algum de nós era brasileiro, eu ou o pai", conta ao DN a mãe, Alexandra
Patriarca, numa altura em que o pequeno seguidor de Luccas Neto já frequenta sessões
de terapia da fala. "Neste momento estamos num processo de tratamento como se fosse
um vício. Explicámos-lhe tudo, que ele não podia ver porque isto só o prejudica. E já
notamos que está muito melhor. O que tentamos fazer agora é brincar mais com ele,
bloqueámos alguns conteúdos, deixámos apenas a Netflix e tudo o que é em português de
Portugal".

Esse recorte não deixa dúvidas sobre a forma como determinados pais veem a
influência do youtuber Luccas Neto sobre a linguagem de seus filhos. Depreende-se que,
para estes pais, a comunicação, enquanto fala, utilizando termos brasileiros, “só o
prejudica”. Tratar este fenômeno cultural como vício denota a ideia de que, para estes

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pais portugueses, reproduzir expressões brasileiras é um mau hábito, passível de
tratamento. Ressalvadas as proporções, é como se a terapia da fala funcionasse como
ferramenta de resgate, como ocorre com alcoolistas e adictos de todo gênero.

Considerando o conceito de modernidade líquida, inicialmente explorado por


Bauman no livro “Legisladores e Intérpretes” (1987) ainda sob o conceito de pós-
modernidade, os intelectuais deixam a posição de legisladores para adotarem a postura de
intérpretes. Isso se dá devido ao fato de que, na modernidade atual, a sociedade passa a
dar menor importância aos intelectuais enquanto formadores de opinião e especialistas.

Como consequência, esse papel de formador acaba por ser transferido ao cidadão
comum que encontra em ferramentas como o Youtube o “canteiro” ideal para produzir
seus conteúdos, multiplicar seus seguidores e atingir seu público-alvo – em sua maioria
sem qualquer respaldo intelectual e científico. Com efeito, aos intelectuais cabe uma
função quase que residual, no sentido de interpretar esses movimentos, mas não mais
podendo evitá-los. Bauman é, portanto, um autor que aborda este tema da desvalorização
do trabalho intelectual e, bem antes do surgimento do Youtube, já previa que tal fenômeno
pudesse acontecer.

Nesse caminho de aparente ausência de bom senso, agem os pais quando propõem
medidas acauteladoras ao considerar os trejeitos linguísticos de seus filhos como se vício
fosse. A eventual e despretensiosa falta de qualidade dos conteúdos dos youtubers,
enquanto ação, ocasiona nos pais reações também sem qualidade, cabendo aos
intelectuais, de fora, analisar estes fenômenos, classificando-os com base nas teorias
científicas da cultura.

Essa modernidade descrita por Bauman (2000) tende a ser leve, líquida e fluida,
onde a principal característica é justamente a mudança e o dinamismo, que afeta a vida
de todos. Esses efeitos, por sua vez, ocasionam um vórtice de sentimentos e emoções que
acabam sendo impulsionados pela globalização. Justamente por este caráter fluido, a
teoria de Bauman atenua estes fenômenos, dando-lhes menos importância do que de fato
aparentam ter, já que na modernidade líquida nada é feito para durar e tudo é passageiro,
sejam eles sentimentos, emoções ou planos de vida.

É possível perceber este viés no texto do Diário de Notícias, quando da oitiva dos
especialistas em relação ao assunto: "Gosto sempre de relativizar um pouco, face a estes
contextos", sublinha a professora, embora - até como mãe - registe a preocupação com

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"os tempos de exposição, sobretudo em idades muito tenras. Porque no caso dos
adolescentes é temporário, passa muito rapidamente, mudam para outras coisas em pouco
tempo. Agora, nos mais pequenos, quando começam a ser consumos já muito viciantes,
é complicado".

Pelo texto, em que pese constar a preocupação com a exposição excessiva às telas,
que poderia resultar em vício, os especialistas defendem que em pouco tempo esses
comportamentos tendem a desaparecer, levando a crer que não se trata de um fenômeno
de grande preocupação, senão no tempo em que ocorrem, ou ocorreram.

Há um outro fator, já mencionado anteriormente, que reforça a tese de que há


evidente presença de etnocentrismo no caso aqui analisado. Este fator diz respeito ao fato
de que Luccas Neto anunciou que irá dobrar seus conteúdos do Youtube para o português
falado em Portugal. Com tamanha desenvoltura empresarial, não se pode desconsiderar
que esteja preocupado com as repercussões, sejam elas etnocêntricas ou não. Desta forma,
antes de adentrar à seara do preconceito e do etnocentrismo, o youtuber encontra uma
saída que fulmina o risco apresentado e maximiza seus resultados.

Mesmo assim, se há um risco residual o mesmo está bem mais ligado à qualidade
de seus conteúdos do que propriamente aos efeitos linguísticos que provocou. Da mesma
sorte, deixando de existir as manifestações em “brasileiro” por parte das crianças, também
é sinal de que a “modernidade líquida” descrita por Bauman está por agir também no
gerador de conteúdos do Youtube, reforçando a tese do etnocentrismo.

Considerações Finais

A questão central levantada pelo presente trabalho reside principalmente na


análise do texto sob a ótica das teorias da cultura. Desta forma, por mais provocativo e
polêmico que seja este tema e o objeto de estudo, não cabe a este trabalho apontar
conclusões que não aquelas decorrentes do espelhamento dos fatos ante as teorias
científicas. Mesmo que sejam obvias as conotações preconceituosas, principalmente nas
partes descritivas do texto, como nos cometários dos leitores da reportagem publicada
pelo Diário de Notícias.

Assim, o estudo serviu como mais-valia, não só para nos envolver com a
bibliografia, mas também para perceber as correlações que esta guarda entre si. À luz do

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que preconizaram os estudos de Bauman, tão efémero é o surgimento de novas
tecnologias quanto o esquecimento dos assuntos que por vezes acirram ânimos, causam
dissabores, elevam medos e sentimentos menos auspiciosos, frutos do choque cultural.

Das reflexões aqui desenvolvidas, é possível perceber que a linguagem pertence


ao amplo conceito de cultura. Da mesma forma, sem entrar em questões colonialistas, das
quais Brasil e Portugal formaram grandes episódios da História da Humanidade, as
próprias teorias de Jung suscitam estas interseções que, na metáfora do romano e dos
escravos, descreve a influência de uns na cultura de outros.

Há, neste contexto, muita capilaridade entre a bibliografia apresentada e o texto


analisado. E é possível não somente visualizar como também identificar a presença do
ideal etnocêntrico, não apenas na descrição e desenrolar do texto como, sobretudo na
expressão de sentimentos de alguns pais e dos comentários que sucederam a reportagem.

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Bibliografia

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Eco. Cadernos de Tradução.

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cotidiana sob holofotes. Revista do Programa de Pós-graduação em Comunicação Universidade
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