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TEORIAS DO LETRAMENTO E
PRÁTICAS SOCIAIS DE LEITURA
E DE ESCRITA
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CONTEXTUALIZANDO
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ensinar e trabalhar com os alunos, pois esta nova fase configura-se sob uma ótica
de leitura hipertextual, que recorre a maneiras diferentes de ler e estudar.
Dessa forma, a problemática instaurada nas escolas de todo país cerceia o
fato de que estamos em um período histórico marcado pelo bombardeio de
informações que nem sempre correspondem a informações cientificas. Há um
emaranhado de conhecimentos que transitam, de forma simultânea, entre o senso
comum e a ciência e que fragmentam o conhecimento, desafiando os educadores
de todo o país a pensar em formas de ensino que ofereçam aos alunos ferramentas
que subsidiem as leituras de modo que consigam diferenciar as informações
cientificamente verdadeiras das inúmeras falácias postadas nos diferentes sites, ou
seja, o grande desafio da escola na atualidade está em desenvolver autonomia de
pensamento. Portanto, a questão que se coloca é: As mudanças ocasionadas, em
grande parte, pela tecnologia digital revolucionaram as formas de ler e aprender, e
a escola ainda se sustenta com base em padrões de ensino conservadores? Os
hipertextos são trabalhados na escola? De que forma?
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diferenciadas, contraditórias e díspares povoando conjuntamente todos os
espaços).” (Ferreira, 2017, p. 35)
A característica que se evidencia de forma inseparável à sociedade do
século XXI centra-se nos termos de velocidade, informação, tempo real,
dinamicidade, quantidade, agilidade, pró-atividade. Enfim, as condições a que os
seres humanos estão submetidos hoje são marcadas pelo aceleramento de tudo,
inclusive das relações sociais, que transitam entre duas dimensões: virtual e real.
Isso ocorre de forma simultânea e complementar e, visto com naturalidade, se
configura como um aspecto a ser repensado, pois estão circunscritas a esta
naturalização as posturas de individualismo e de egocentrismo, que conduzem as
pessoas, cada dia mais, a viver isoladamente e se relacionarem muito mais pelas
ferramentas da internet do que por meio da presença física.
No entanto, é imprescindível considerar que as tecnologias trouxeram
inúmeras possibilidades para os indivíduos; o acesso à informação ficou mais
próximo e abrange um número maior de pessoas, o que as tornam indissociáveis
à sociedade de hoje. Porém, é extremamente necessário aprender e ensinar a
todos os indivíduos o uso responsável e saudável destas tecnologias, o que as
tornam muito benéficas às condições de vida dos homens.
Ensinar e aprender a utilizar as tecnologias significa aceitar que elas
modificaram a forma como os seres humanos compreendem os conceitos, como
se apropriam dos conhecimentos, e como a sociedade está sendo ressignificada
a partir destas novas formas de os seres humanos se relacionarem e de
compreenderem o mundo à sua volta.
Neste contexto, também se incorporou, na sociedade e no campo
educacional, a expressão “indivíduos letrados tecnologicamente”, exigindo das
pessoas, além das capacidades de ler, escrever e compreender, conhecimentos
necessários para utilizar as ferramentas tecnológicas de acesso e disseminação
do conhecimento.
Historicamente, o homem vem desenvolvendo tecnologias relacionadas à
comunicação incorporadas à nossa cultura. A exemplo disso, podemos citar a
prensa com tipos móveis, criada por Gutenberg, em 1450, invenção que
possibilitou a milhares de pessoas o acesso a inúmeras informações; em seguida,
surgiram as máquinas fotográficas, o cinema, a televisão, os computadores, a
internet e as redes sociais virtuais, as quais estão incorporadas pela grande
maioria da população mundial.
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Todas estas invenções, fruto do desenvolvimento humano, interferiram
diretamente na dinâmica da comunicação e, consequentemente, no uso e domínio
das competências da leitura e da escrita. O modo como as pessoas leem e
escrevem sofreu mudanças em virtude desse processo de interação derivado das
possibilidades trazidas pelo uso do mundo digital, incorporado às práticas
humanas, transformando-as e modificando, inclusive, a forma como os seres
humanos processam as informações.
Contudo, as maiores mudanças provocadas pelas tecnologias, segundo
Nascimento (2015), não se encontram na materialidade ou na virtualidade do
mecanismo de transmissão e obtenção da informação, mas na forma pela qual os
indivíduos se apropriam e usufruem da comunicação e da informação,
promovendo uma revolução cultural global. De acordo com Lévy (1999), isso
acontece porque as ferramentas digitais ocasionaram mudanças nos hábitos
humanos e, consequentemente, alterou-se a forma como processam a
informação, como pensam, se relacionam e aprendem.
A diversidade de ferramentas, de curiosidades e de informações que a
internet oferece, assim como o grande volume de interações envolvidas e das
múltiplas possibilidades do espaço virtual promovidas pelos hiperlinks, propiciam,
segundo Nascimento (2015), que as pessoas se movimentem pelos caminhos da
virtualidade no instante em que desejarem e à medida que a página em que estão
não lhe seja mais agradável. Isso leva as pessoas a adotarem posturas de estudo
fragmentadas, aligeiradas, contribuindo para aumentar o número de pessoas com
muitas informações, mas com conhecimentos superficiais, ou seja, sem
aprofundamento, um esvaziamento de conceitos científicos.
Nesta conjuntura, a escola encontra-se diante de um dilema estabelecido
contraditoriamente à sua responsabilidade, pois o espaço escolar, como locus do
conhecimento cientifico, encontra-se em condições muito aquém das desejadas e
necessárias frente aos desafios impostos pelas novas tecnologias. Segundo
Prensky (2001), o fato de os avanços tecnológicos dos últimos 20 anos do século
XX terem promovido o surgimento da geração digital evidenciou que o sistema
educacional não está preparado para isso.
A falta de estrutura e de investimentos nos recursos e nas formações dos
professores contribuem para manter a escola em um cenário distante das
demandas existentes, deixando-a em condições de impotência frente aos seus
alunos e aos seus interesses, colaborando, dentre outras coisas, para mantê-los
desmotivados a aprender. Segundo Prensky (2001, p 03), “[...] o maior problema
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que a educação enfrenta hoje é que os nossos instrutores Imigrantes Digitais, que
usam uma linguagem ultrapassada (da era pré-digital), estão lutando para ensinar
uma população que fala uma linguagem totalmente nova.”
Para o mesmo autor, existem, na sociedade, os nativos digitais e os
imigrantes digitais. O primeiro termo diz respeito aos jovens que nasceram em um
mundo cercado pela tecnologia e dela usufruem naturalmente. Já o segundo
termo refere-se àqueles que não nasceram nesse mundo digital, ou só tiveram
acesso a ele mais tardiamente, e trazem resquícios de sua cultura, apresentando
uma estrutura mais linear de aprendizagem. Nesta compreensão, a escola se
insere em um contexto ambíguo e contraditório, pois, enquanto a sociedade está
sob uma emersão de tecnologias, a escola fica à margem dessa realidade,
mantendo-se sob uma estagnação que lhe é imposta devido às condições a que
está submetida.
Desse modo, a educação encontra-se diante de um grande desafio que
transita entre formar os alunos para atuarem ativamente na sociedade em que
estão inseridos e para uma sociedade digital, que, em ambas, exige-se o domínio
de leitura, escrita, interpretação; melhor dizendo, exige indivíduos letrados para
as duas condições. Portanto, a formação dos educandos deve pautar-se em
propostas que promovam o aprendizado no contexto social, mas diante das
mudanças tecnológicas que envolvem, entre outros, o uso da internet e a
interatividade das redes sociais.
A educação constitui-se em um grande desafio. Nas palavras de Moran
(2000, p. 137) “Educar é colaborar para que professores e alunos — nas escolas
e organizações — transformem suas vidas em processos permanentes de
aprendizagem”. Portanto, ainda no pensamento de mesmo autor, é extremamente
necessário reverberar propostas de ensino que gerem mudanças qualitativas no
processo de ensino/aprendizagem, o que, diante deste contexto, deve contemplar
todas as tecnologias, por exemplo, as telemáticas, as audiovisuais, as textuais, as
orais, musicais, lúdicas e corporais, entre outras.
É preciso destacar, ainda, segundo Nascimento (2015), que, apesar de a
maioria dos alunos ter acesso à internet e a usar frequentemente para diversas
intenções e até mesmo para fins escolares, não significa que tenha se apropriado
de uma aprendizagem efetiva que colabore para a aquisição de competências de
letramento.
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TEMA 2 – LETRAMENTO E MULTILETRAMENTOS
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links, levando os autores a “construir segmentos textuais que tenham um sentido
completo e que permitam a construção de relações de sentido, mesmo acessados
em uma ordem diferente”. (Braga, 2005, p. 758).
Sob esta perspectiva de movimento entre textos multimodais, os quais
estão nos mais variados tipos de mídias, surge a necessidade de um novo tipo de
letramento, o qual vem sendo denominado de multiletramento. As práticas
multiletradas se originaram, segundo Dias, com “as mudanças sociais, culturais e
tecnológicas advindas da era do ciberespaço. Com isso, o cidadão
contemporâneo precisa tornar-se aberto à diversidade cultural, respeitar a
pluralidade étnica e saber conviver on-line” (Dias, 2012, p. 8)
Entretanto, Rojo (2012) destaca a necessidade de diferenciar o conceito de
letramentos (múltiplos), que se refere à multiplicidade e variedade das práticas
letradas, do conceito de multiletramentos, que, para a autora, aponta para dois
tipos específicos e importantes de multiplicidades presentes na sociedade: a
“multiplicidade cultural das populações e multiplicidade semiótica de constituição
dos textos por meio das quais ela se informa e se comunica.” (Rojo, 2012, p. 13)
Ainda sob a ótica de Rojo, a multiplicidade de culturas caracteriza-se “pelas
produções culturais letradas em efetiva circulação social, como um conjunto de
textos híbridos de diferentes letramentos de diferentes campos” (Rojo, 2012,
p.13), os quais passam pela escolha pessoal e política e não se constituem
enquanto algo novo, pois vivemos, desde o início do século XX, “em sociedade
de híbridos impuros, fronteiriços.” (Rojo, 2012, p. 14)
Na mesma linha de raciocínio, Canclini afirma que foi a partir das novas
tecnologias que a produção cultural da atualidade passou por um processo de
desterritorialização, de descoleção e de hibridação, permitindo às pessoas que
fizessem suas próprias coleções. Ou seja, com as tecnologias, o acesso à cultura
foi democratizado, aumentando as possibilidades de apropriação dos patrimônios
culturais que antes estavam restritos a uma minoria, o que leva a escola a elaborar
outros gêneros, denominados por Canclini como “impuros de outras e novas
mídias, tecnologias, línguas, variedades, linguagens” (apud Rojo, 2012, p. 14).
Nesta compreensão, Rojo (2012), destaca a importância de haver uma
nova ética baseada não tanto pela propriedade de direitos autorias, mas centrada
no diálogo entre os novos interpretantes e em novas estéticas que emergem com
critérios próprios, o que se diferencia dos critérios de beleza, de apreciação dos
outros.
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No entanto, no que diz respeito à multiplicidade de linguagens, ou, como
se refere a autora Rojo (2012), a modos ou semioses nos textos em circulação,
são os textos compostos de muitas linguagens, contemplando imagens e arranjos
de diagramação, que exigem capacidades e práticas de compreensão e produção
de cada uma delas para sua significação. Para a autora, “é o que tem sido
chamado de multimodalidade ou multissemiose dos textos contemporâneos que
exigem multiletramentos.” (Rojo, 20012, p. 19)
Diante desta nova perspectiva multiletrada presente na sociedade atual, a
mesma intelectual afirma que são necessárias novas ferramentas além do lápis e
papel. É preciso incorporar recursos como áudio, vídeo, tratamento da imagem,
edição e diagramação, os quais exigem conhecimentos de novas práticas de
produção e de análise crítica como receptor. Ainda segundo Rojo (2012), o caráter
que se apresenta com maior destaque no funcionamento destes novos textos não
é a sua característica multi, mas sim hiper, como hipertextos, hipermídias.
Não obstante, é necessário, ainda, apontar algumas características
importantes sobre o sentido da palavra multiletramentos, caracterizada
imprescindivelmente pelo seu caráter interativo, ou, como afirma Rojo (2012),
colaborativo. Além disso, para a mesma autora, eles se fraturam e transgridem as
relações de poder estabelecidas, com especial destaque nas relações de
propriedade, e, por fim, a autora os define como híbridos, fronteiriços, mestiços
de linguagens, modos, mídias e culturas.
Portanto, pensar em multiletramentos é considerar, segundo Barbosa,
(2012 p.11), “que as novas tecnologias possibilitam um circuito de remixagem e
redistribuição de informações, que supõe algum tipo de manifestação diante dos
textos que circulam.” E estas manifestações só podem constituir-se de forma
consciente e crítica se fundamentadas em posicionamentos teóricos, os quais se
tornam possíveis desde que trabalhados na escola a partir de propostas de
multiletramentos baseadas em princípios de usuário funcional (Rojo, 2012). Este
deveria se apropriar de competências técnicas e conhecimentos práticos; o
criador de sentimentos deveria ser entendido como os diferentes textos e
tecnologias que operam; o analista crítico, considerado o entendimento de que
tudo que é dito e estudado é fruto de seleção prévia; e o transformador, como
aquele que usa o que foi aprendido de novos modos
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TEMA 3 – LETRAMENTO E HIPERTEXTO
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Marcuschi (1999, p.33), o hipertexto “rompe a ordem de construção ao
propiciar um conjunto de possibilidades de constituição textual
plurilinearizada, condicionada por interesses e conhecimentos do leitor-
co-produtor” (grifos do autor); 2. volatilidade – que é devida à própria
natureza do suporte; 3. espacialidade topográfica – por tratar-se de um
espaço não-hierarquizado de escritura/leitura, de limites indefinidos; 4.
fragmentariedade, já que não existe um centro regulador imanente; 5.
multissemiose – por viabilizar a absorção de diferentes aportes sígnicos
e sensoriais (palavras, ícones, efeitos sonoros, diagramas, tabelas
tridimensionais, etc.) numa mesma superfície de leitura; 6. descentração
ou multicentramento – a descentração estaria ligada à não linearidade,
à possibilidade de um deslocamento indefinido de tópicos; contudo, já
que não se trata de um simples agregado aleatório de fragmentos
textuais, há autores que contestam essa característica, preferindo falar
em multicentramento, como é o caso, por exemplo, Bolter (1991) e Elias
(2000, 2005); 7. interatividade – possibilidade de o usuário interagir com
a máquina e receber, em troca, a retroação da máquina; 8.
intertextualidade – o hipertexto é um “texto múltiplo”, que funde e
sobrepõe inúmeros textos que se tornam simultaneamente acessíveis a
um simples toque de mouse; 9. conectividade – determinada pela
conexão múltipla entre blocos de significado; 10. virtualidade – outra
característica essencial do hipertexto, que constitui, conforme foi dito,
uma “matriz de textos potenciais” (Bairon, 1995, apud Koch, 2007,p.26).
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[...] (1) seu franco desenvolvimento e um uso cada vez mais
generalizado; (2) suas peculiaridades formais e funcionais, não obstante
terem eles contrapartes em gêneros prévios; (3) a possibilidade que
oferecem de se rever conceitos tradicionais, permitindo repensar nossa
relação com a oralidade e a escrita. (Marcuschi, 2002, p.1)
[...] nessa era eletrônica não se pode mais postular como propriedade
típica da escrita a relação assíncrona, caracterizada pela defasagem
temporal entre produção e recepção, pois os bate-papos virtuais são
síncronos, ou seja, realizados em tempo real e essencialmente escritos.
(Marcuschi, 2002, p. 5, grifo nosso.)
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Nesta ousada tentativa de descrever e nomear os gêneros digitais, o
mesmo autor sinaliza para o fato de a Home-page (portal, página) não ser
considerada um gênero por se constituir como um ambiente específico de
localização de uma série de informações, situando-se muito mais nas
características de suporte textual do que de gênero. Para Marcuschi (2004), a
home-page se caracteriza como um serviço eletrônico que pode ser comparado a
um catálogo ou a uma vitrine. Nesta compreensão, o autor apresenta algumas
possibilidades de descrever os gêneros digitais, que podem ser designados como:
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12. weblog (blogs; diários virtuais) são os diários pessoais na rede, uma
escrita autobiografia com observações diárias ou não, agendadas,
anotações, em geral muito praticados pelos adolescentes na forma de
diários participativos. (Marcuschi, 2004, p.28)
FINALIZANDO
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Nesta compreensão, entender a tecnologia como possibilidade, mas
também como desafio, faz parte da grande teia de conhecimentos indispensáveis
aos educadores do século XXI. Compreender que estamos diantes de uma
sociedade que lê de forma diferente é indissociàvel à prática educativa, bem como
compreender que viemos de um emaranhado de novos e complexos conceitos que
transitam nas suas novas formas hipertextuais, conduzindo as pessoas a
processarem os conhecimentos de menira nova e diferente, carcaterizada pela sua
não lineariedade.
Neste contexto, também se estabelecem as multifacetas do conhecimento,
pois vivemos hoje em uma soceidade multicultural, caracterizada pela suas
multimodalidades comunicativas, de modo que é inerente ao trabalho educativo
entender os multiletramentos, bem como os novos discusos e os novos genêros
digitais.
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REFERÊNCIAS
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_____. As tecnologias da inteligência. Rio de Janeiro: Ed. 34, 1993.
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