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Respiração celular

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BIOQUÍMICA II | Respiração celular

DA ANTIGUIDADE AO INÍCIO DA MODERNIDADE

A Química da Antiguidade é essencialmente uma técnica:


fabricação de cores, de bebidas fermentadas, de preparação de metais
etc. Alguns produtos, como a cal e o enxofre, já eram conhecidos. Nessa
época, os homens assumiam que a natureza era composta por quatro
elementos fundamentais: fogo, ar, terra e água (os quatro elementos
de Aristóteles); estes quatro elementos estavam associados a quatro
qualidades: calor, frio, secura e umidade.
No fim da Antiguidade surge a Alquimia (século IX). O grande
Figura 12.1: Símbolo
objetivo dos alquimistas era a busca do ouro, a transmutação dos
alquímico. Uma cobra
devorando a própria metais. A interpretação das reações químicas acontecia através de um
cauda. O círculo for-
mado simboliza o “pensamento mágico”. Apesar do seu misticismo, a Alquimia teve um
infinito.
papel central no progresso da Química.

Figura 12.2: Um laboratório alquímico.

A vontade de experimentar se acentua em meados do século XVII.


A noção de ácido (chamado spiritus salis por Livabius) é um pouco mais
bem definida por Robert Boyle. O antagonismo entre ácidos e bases é
mais bem estudado. A existência dos gases é revelada (chamado spiritus
sylvestris ou espírito indomávell por Van Helmont). Torricelli e Pascal
demonstram a existência do vácuo.
Os “químicos” dessa época começaram a duvidar se as substâncias
seriam compostas apenas pelos quatro elementos e tentaram explicar por
que quando um corpo queimava suas propriedades físicas e químicas
se alteravam.

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Surgiu, então, em 1760, a Teoria do Flogístico ou Princípio do

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Fogo, postulada por Georg Ernst Sthal, que unificava o pensamento da
época. Esta teoria propunha que todo corpo suscetível à combustão
contém um princípio de inflamabilidade (flogístico) que era liberado
durante a queima.
Assim, o flogístico existia não só na matéria inanimada como
também nos seres vivos. Neste caso, o flogístico ou alma da matéria
seria liberado durante a respiração no decorrer da vida, levando ao
envelhecimento.

E E
TERRA (Pobre em flogístico)

P METAL (Rico em flogístico)


P P

FOGO (Flogiston)
Figura 12.3: Representação resumida da Teoria do Flogístico. A Terra
era considerada um elemento pobre em flogístico, enquanto o metal
era um elemento rico em flogístico.

Outra verdade da época era a concepção de que o ar era único.


Contudo, já se faziam referências quanto à qualidade do ar, atribuindo-se
características de ar bom (deflogisticado) e ar ruim (flogisticado), encontrados
nas montanhas e em ambientes confinados, respectivamente.

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LAVOISIER

Nesse contexto, o francês, economista e servidor público, Antoine


Laurent Lavoisier, iniciou, como hobby, seus estudos na área da Chymica.
Tido como conservador e metódico, introduziu métodos de trabalho
que lançaram as bases para a química moderna. Graças ao seu poder
econômico, pôde montar um laboratório, com instrumentos de precisão
bastante sofisticados para a época e, até então, nunca utilizados em
pesquisa.
Figura 12.4: Antoine Laurent
Lavoisier, interessado em entender os mecanismos da combustão Lavoisier, cientista francês
considerado o pai da química
de diferentes substâncias, realizou diversos experimentos, entre os quais moderna. Lavoisier foi guilho-
tinado durante a Revolução
um chamou particularmente sua atenção, conforme o enunciado que se Francesa.
Para saber mais consulte:
segue: http://scienceworld.
wolfram.com/biography/
lavoisier.html
“Por volta de oito dias atrás, eu descobri que o enxofre, ao ser
queimado, em vez de perder peso, ao contrário, ganha peso; o
mesmo acontece com o fósforo; este aumento de peso se deve a
uma prodigiosa quantidade de ar que é fixado durante a combustão
e se combina com os vapores.

Esta descoberta, que eu tenho estabelecido por experimentos que


eu considero como decisivos, tem me levado a pensar que o que
é observado na combustão do enxofre e fósforo pode acontecer
no caso de todas as substâncias que ganham peso por combustão
e calcinação; e eu estou convencido de que o aumento no peso de
calxes metálicos é devido à mesma causa.”

Nota selada depositada na Secretaria da Academia Francesa


em 1º de novembro de 1772.

Para saber mais, acesse:


Teoria do Flogístico - http://www.hcc.hawaii.edu/hccinfo/instruct/
div5/sci/sci122/atomic/skepchem/phloggen.html
Lavoisier: Principais contribuições para a Ciência Moderna - http:
//www.lucknow.com/horus/guide/ec109.html#ec1092
Alquimia - http://143.107.237.20/~edsonro/index.htm

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Pense
Conhecendo o contexto em que os resultados de Lavoisier foram
sobre isso!

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obtidos, pense sobre o que esses resultados indicam em relação à Teoria
do Flogístico.

Intrigado com a Teoria do Flogístico, Lavoisier resolve estudá-


la mais profundamente. Realiza experimentos com velas acesas e
camundongos confinados em campânulas separadas e hermeticamente
fechadas. Observa que os camundongos em pouco tempo morriam e que
as velas rapidamente se apagavam.

: Experimento inicial de Lavoisier. Campânulas são cubas


de vidro que não deixam passar ar do meio externo para o ambiente
onde estão a vela e o rato.
Pense
sobre isso!
A que conclusões você acredita que Lavoisier deve ter chegado?

Intrigado com a função química do “ar ruim”, Lavoisier é


convidado para participar de uma Reunião Anual da Academia de
Ciências da França. Durante o encontro com o professor e presbítero
inglês Joseph Priestley, ele ficou bastante interessado nos experimentos
do colega, que apresentamos a seguir.

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Experimentos de Priestley:

1. Calcinação

Hg + O2 2HgO
metal de óxido de
oxigênio
mercúrio mercúrio

2. Decomposição do óxido

2HgO 2Hg + O2
óxido de metal de
oxigênio
mercúrio mercúrio

3. Redução com adição de carvão


(também chamada de redução com phogistoal)

2HgO + C 2Hg + CO2


óxido de carvão metal de dióxido de carbono
mercúrio (carbono) mercúrio ou “ar fixado”

Símbolo utilizado Símbolo utilizado


para representar para representar
aquecimento aquecimento
brando. intenso.

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Pense
O que você faria se fosse Lavoisier?
sobre isso!

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Paralelamente às experiências de caracterização do “ar bom” e do
“ar ruim”, Lavoisier observou que a queima de velas de tamanhos iguais
originava velas menores e de tamanhos diferentes quando aprisionadas
em campânulas de dimensões variadas.
Esse resultado despertou no cientista o interesse em relacionar o
tamanho da vela com a liberação do flogiston. Assim, percebeu que o
critério de pesar a vela poderia ser de grande utilidade.
Com balança de alta precisão, pôde realizar diversos experimentos
de medidas de peso e obteve a seguinte tabela:

Tabela 12.1: Resultados do peso do sistema vela + ar + campânula antes e após a


queima da vela.

Peso antes da queima Peso depois da queima


CONJUNTO X X
VELA + AR* Y < Y (perde peso)
CAMPÂNULA W > W (ganha peso)

* ar antes = deflogisticado; ar depois = flogisticado


Pense
sobre isso!
Que fenômeno deve estar ocorrendo?

A partir desse resultado, Lavoisier formula a seguinte reação:

matéria orgânica + ar respirável CO2 + água + calor

Lavoisier, dessa forma, postula que “Na natureza nada se cria,


nada se perde, tudo se transforma” ou “a energia não pode ser criada
nem destruída, a vida se mantém graças à transformação de energia”.
Posteriormente, esta idéia é firmada cientificamente como a Teoria
da Conservação das Massas.
Nessa época, Lavoisier trabalha com seu aplicado aluno La Place.
Nos meses que se seguiram, ambos dedicaram-se a comprovar a idéia
de que a combustão da vela e a respiração eram na realidade o mesmo
fenômeno.
Pense
sobre isso!
Considerando a reação descrita acima, que componente faltava ser
verificado para que Lavoisier e La Place resolvessem esse problema?

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Após diversas tentativas de observar o calor na forma de luz nos


órgãos respiratórios de camundongos e moribundos, Lavoisier percebe
que o calor liberado pela respiração não poderia ser medido com os
aparelhos que possuía, e resolve construir o equipamento abaixo:

a b

Figura 12.6: Calorímetro de Lavoisier e La Place. O aparelho apresenta três câma-


ras: a mais interna (1) é a câmara que abriga a vela ou a cobaia; a do meio (2) é
preenchida por gelo e contém uma saída (a) por onde escoa o gelo derretido pelo
calor liberado pela queima ou pela respiração; a câmara mais externa (3), também
é preenchida por gelo e apresenta uma saída (b) para escoar o gelo derretido.

Este é o calorímetro de gelo de Lavoisier e La Place (Figura 12.6);


aparelho utilizado para obter medidas quantitativas do calor produzido
durante a queima de uma vela e da respiração de uma cobaia (geralmente
utilizavam porquinho-da-índia).
Após realizar diversos experimentos com tempos de queima e de
respiração fixos, os cientistas obtiveram o seguinte resultado (Tabela 12.2):
Tabela 12.2: Relação entre produção de CO2 e peso derretido após a queima de
matéria orgânica e a respiração de uma cobaia.

Produção de CO2 Gelo derretido Gelo/ CO2


Matéria orgânica 112,35g 2998g 26,69g
Cobaia 11,87g 330,30g 27,80g

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Esses resultados foram capazes de esclarecer a dúvida que restava Pense
sobre isso!

AULA
em relação à combustão e à respiração?
Descreva sua opinião sobre os dois fenômenos, baseada nos
resultados mostrados até aqui.

Esta aula foi baseada no material organizado pelo Departamento de Bioquímica Médica, CCS, UFRJ.

RESUMO

Nesta aula você acompanhou como Lavoisier chegou à equação geral da respiração
celular, aceita até hoje (matéria orgânica + ar respirável CO2 + água + calor).

INFORMAÇÕES SOBRE A PRÓXIMA AULA

Na próxima aula, nós continuamos a história. Falaremos mais especificamente


do ciclo do ácido cítrico e como ele foi sendo elucidado. Com as informações
apresentadas na Aula 13, você mesmo construirá o ciclo, antes de ser apresentado
a ele, o que ocorrerá na Aula 14. Foi o que Krebs fez e, por isso, o ciclo do ácido
cítrico é chamado ciclo de Krebs. Então, vamos lá...

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