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29562019 89
Artigo Article
Structural trends in the world of work in Brazil
Abstract Through a brief historical recovery, Resumo Através de breve recuperação históri-
the article seeks to describe the main trends in ca busca-se descrever as principais tendências do
the world of work in Brazil. The emphasis of the mundo do trabalho no Brasil. A ênfase do ensaio
article focuses on the current early transition to focaliza a atual transição antecipada para a so-
the service society, whose significant change can ciedade de serviços, cuja alteração significativa
be observed in the operation of the labor market pode ser observada no próprio funcionamento
itself. Also, it considers the predominance of mas- do mercado de trabalho. Também se considera a
sive open unemployment, the expansion of the predominância do massivo desemprego aberto, da
underutilization of the labor force and the gen- ampliação da subutilização da força de trabalho
eralization of precariousness in professions due to e da generalização da precarização nas ocupações
the absence of economic growth and the return em função da ausência de crescimento econômico
of the neoliberal reforms. The result has been the e do retorno das reformas neoliberais. O resulta-
increasing polarization within the world of work. do tem sido a polarização crescente no interior do
Key words Work, Politics, Society mundo do trabalho.
Palavras-chave Trabalho, Política, Sociedade
1
Centro de Estudos
Sindicais e de Economia
do Trabalho, Instituto de
Economia, Universidade
Estadual de Campinas.
R. Pitágoras, Barão Geraldo.
13083-970 Campinas
SP Brasil.
pochmann@unicamp.br
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Pochmann M
O mundo do trabalho na sociedade urbana respondendo por quase 70% do total das ocu-
e industrial pações abertas entre os anos de 1940 e 1980. O
ritmo de expansão de todos os postos de trabalho
A transição para a sociedade urbana e indus- equivaleu ao crescimento da própria PEA, o que
trial sofreu importante impulso com a Revolução permitiu tornar o funcionamento do mercado de
de 1930, capaz de abortar o curso do Estado li- trabalho próximo do pleno emprego da mão-de
beral instalado na República Velha e estabelecer -obra, com baixo desemprego aberto (Tabela 2).
as bases do desenvolvimento nacional assentado Mas isso não significou ausência da preca-
na consolidação e expansão do mercado interno rização e outros males do subdesenvolvimento,
do país. Para tanto, a constituição do Estado mo- como o baixo rendimento, a informalidade e a
derno com capacidade para guiar o projeto de ampla presença das ocupações não assalariadas,
urbanização e industrialização passou, inclusive, cuja taxa de precarização (soma das ocupações
pela implantação do sistema público das relações de assalariamento informal, conta própria e sem
de trabalho fundado na organização corporativa remuneração em relação ao total da PEA ocupa-
da sociedade enquanto elemento estruturante do da) reduziu-se significativamente no período de
próprio mercado nacional de trabalho. tempo considerado (de 85% para 45% da PEA).
Até então, os ciclos econômicos experimenta- A expansão da taxa de assalariamento (emprego
dos pela antiga e longeva sociedade agrária havia assalariado em relação ao total dos ocupados),
definido no território nacional uma espécie de que passou de 45% para 65% entre 1940 e 1980,
arquipélago de enclaves produtivos, responsáveis foi significativa (75% das ocupações abertas no
pela existência de esparsos mercados regionais de período foram assalariadas), ainda que 1/3 dos
trabalho. Apesar de sua concentração nas regiões ocupados permanecessem distantes da submis-
centro-sul e litorâneas em algumas capitais do são ao regime do salariado em 1980 (Tabela 3).
Nordeste, o desenvolvimento urbano e industrial A formalização do emprego assalariado foi
compreendeu cerca de cinco décadas de estrutu- outro aspecto importante do movimento de es-
ração do mercado de trabalho assentado na cen- truturação do mercado de trabalho. Em 1980,
tralidade do emprego assalariado, especialmente por exemplo, o emprego assalariado formal re-
com carteira assinada. presentou quase 51% do total dos ocupados, ao
O movimento de regulação do mercado passo que em 1940 não atingia, nem mesmo, a
nacional de trabalho desencadeado a partir da 13% do total das ocupações no país.
década de 1930, com a implementação da Con- Mesmo que tenha sido reduzido significati-
solidação das Leis do Trabalho (CLT)7 em 1943, vamente, constata-se que ainda em 1980, mais de
durante o Estado Novo (1937-1943), mostrou ser 35% dos assalariados não tinham contrato for-
fundamental para a disseminação do regime do mal de trabalho. Em 1940, quase 72% dos empre-
salariado, especialmente através emprego formal gados assalariados eram informais.
(com carteira de trabalho assinada). Por força Diante disso, percebe-se como a implantação
disso, o mundo do trabalho se transformou pro- da legislação social e trabalhista, com forte am-
fundamente no Brasil em apenas cinco décadas. paro no padrão corporativo de relações de tra-
Pela via da urbanização e industrialização, balho, contribuiu para estruturação do mercado
o emprego nas cidades foi o que mais cresceu, de trabalho durante a constituição da sociedade
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Tabela 3. Brasil – Evolução da população por tipo de ocupação e taxa de precarização em 1940 e 1980.
1940 1980 Variação absoluta Variação relativa
Itens
(em mil) (em mil) anual (em mil) anual (em %)
PEA ocupada 14.759 (100%) 42.026 (100%) 683 2,6
Empregador 362 (2,4%) 1.340 (3,2%) 25 3,3
Assalariado 6.615 (44,8%) 27.152 (64,6%) 513 3,6
Formal 1.906 (12,9%) 21.272 (50,6%) 484 6,2
Informal 4.709 (31,9%) 5.880 (14,0%) 29 0,6
Conta própria 4.694 (31,8%) 9.555 (22,7%) 122 1,8
Sem remuneração 3.088 (20,9%) 3.978 (9,5%) 23 0,6
Precarização* 12.491 (84,6%) 19.413 (46,2%) 174 1,1
Fonte: IBGE6-8 (elaboração própria) * Soma das ocupações de assalariamento informal, conta própria e sem remuneração em relação ao
total da PEA ocupada.
urbana e industrial. Nesse sentido, a definição do balhos urbanos (indústria e serviços) apontou
conceito de categoria profissional foi essencial para a formação de ampla classe trabalhadora
para estabelecer a organização e o financiamento e significativa classe média social entre as déca-
dos sindicatos, os acordos e negociações coletivas das de 1930 e 1940. A estrutura de classe e fra-
de trabalho e a atuação da justiça do trabalho. ções de classes sociais estabelecida por força de
Nas décadas de 1930 e 1950, por exemplo, a intensa expansão econômica nacional que per-
legislação social e trabalhista centrada na atuação mitia constituir a sociedade urbana e industrial
importante do Estado (Ministério do Trabalho e passou a ser profundamente modificada a partir
Justiça Trabalhista) focou fundamentalmente o da década de 1980, com crise da dívida externa e
mundo do trabalho urbano frente à reiterada re- a adoção - pela primeira vez desde a década de
sistência do patronato rural à qualquer forma de 1930 – das políticas recessivas no último governo
regulação pública do trabalho. Somente a partir da Ditadura civil-militar (1964-1985).
da aprovação do Estatuto do Trabalhador9, na dé- Com isso, o projeto de urbanização e in-
cada de 1960, quando a população agrária deixou dustrialização em curso desde a década de 1930
de ser dominante na população nacional, que, começou a perder a centralidade no Estado de-
lenta e gradualmente, as ocupações do meio ru- senvolvimentista. A herança da dívida externa,
ral foram sendo incorporadas ao sistema público da superinflação, do endividamento público, do
nacional de relações de trabalho. rentismo, da pobreza e da desigualdade deixada
pelo autoritarismo comprometeu significativa-
O mundo do trabalho na sociedade mente parte importante das políticas econômica
de serviços e social do período democrático, implicando per-
da de vários anos para superação de alguns deles
O decréscimo relativo nas ocupações agrá- (a superinflação em 1994 e a dívida externa em
rias em simultânea expansão dos postos de tra- 2008), começar a resolver outros (a pobreza e de-
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sigualdade nos anos 2000) e aqueles, ainda, sem pação relativa no total da PEA, com a diminuição
resolução (a dívida pública e o rentismo). de cerca de 13 milhões para 8,5 milhões de ocu-
Além disso, a adoção do receituário neolibe- pados (Tabela 4).
ral nos anos de 1990 coincidiu com o ingresso O setor secundário registrou redução na par-
passivo e subordinado do Brasil na globalização ticipação relativa no total da PEA de 36,2%, pois
comandada por grandes corporações transna- declinou de 27,8% para 17,7%, entre 1980 e 2018.
cionais. Desde então, o país precocemente in- Nesse período, contudo, a quantidade de ocupa-
gressou no processo de desindustrialização, pois dos no setor secundário cresceu 1,1% em média
sem universalizar o padrão de consumo a todos ao ano, enquanto a média anual foi de 2,1% para
os brasileiros, sobretudo na base da pirâmide so- a expansão da PEA ocupada e de 3,6% no caso
cial, vem declinando a capacidade de produção das ocupações do setor terciário.
manufatureira. Simultaneamente, a taxa nacional de desem-
Nos países com processo de desindustriali- prego elevou-se significativamente. Entre 1980 e
zação madura, a diminuição relativa da partici- 2018, a quantidade de desempregados foi multi-
pação da manufatura no ciclo produtivo trans- plicada por 10 vezes, fazendo subir a taxa de de-
correu após a totalidade da população ter sido socupação de menos de 3% para quase 12% da
incluída no padrão de consumo da sociedade PEA.
urbana e industrial, coincidindo com a maior Coincidindo com a elevação do desemprego
expansão do setor terciário na economia. Nesse nacional, percebe-se o aumento da precarização
sentido, os serviços mais dinâmicos tenderam a entre os ocupados. Dos 19,4 milhões de trabalha-
ser aqueles vinculados à produção e logística, en- dores expostos às condições de trabalho precários
tre outros, mais associados ao emprego de mão em 1980, o Brasil registrou, em 2018, a quantia
de obra com maiores requisitos de formação e de 44,5 milhões de ocupados em ocupações pre-
remuneração. cárias, cuja expansão média anual foi levemente
Em sendo necessário, as importações de bens superior (2,2%) à própria geração dos postos de
industriais podem complementar pontualmente trabalho no Brasil (2,1%). Ainda em relação aos
as exigências do consumo interno, uma vez que ocupados, nota-se relativa estabilização na taxa
se tratam, em geral, da reposição de produtos de assalariamento, uma vez que a sua expansão
pela população ou de alguma novidade. Isso pa- transcorreu no mesmo ritmo da abertura de pos-
rece ser irrealizável em países de desindustriali- tos de trabalho (Tabela 5).
zação precoce como no Brasil devido à expressiva Para, além disso, constata-se que os empre-
dimensão populacional excluída do acesso aos gos assalariados que mais cresceram foram a dos
bens industriais, cuja escala de importação de trabalhos informais, cuja participação relativa na
manufaturados torna-se difícil de ser compensa- PEA ocupada passou de 14%, em 1980, para qua-
da por bens não industriais. se 20%, em 2018. A contrapartida disso foi o de-
Além disso, o declínio relativo dos bens in- crescimento do peso relativo do emprego formal
dustriais na produção não se deveu tanto ao de 78,3% do total dos assalariados para 70,4% no
maior ritmo de crescimento do setor terciário, mesmo período de tempo.
mas a decadência da produção manufatureira, Com a estabilização relativa na taxa de assa-
com o encolhimento de alguns ramos e o desa- lariamento, as ocupações que mais cresceram em
parecimento de outros. Por força disso, a anteci- relação ao total de postos de trabalho abertos no
pação da passagem para a sociedade de serviços país durante o período foram as de empregador
decorre mais do inchamento do setor terciário da (52,1%) e de conta própria (12,8%). Por força
economia em virtude do vácuo deixado pela pre- disso que a recente e antecipada transição para a
coce desindustrialização. sociedade de serviços no Brasil tem sido marca-
Assim, o processo de terciarização da econo- da pela desestruturação do mercado de trabalho,
mia brasileira tem sido caracterizado pela especi- com significativa presença do desemprego aber-
ficidade da continuidade na queda absoluta das to, a subutilização dos trabalhadores e a precari-
ocupações na agropecuária e da recente queda zação das ocupações geradas.
relativa dos postos de trabalho na manufatura. Na sociedade urbana e industrial, com o de-
Em quase quarenta anos, a participação do setor créscimo da participação relativa do setor pri-
terciário no total da PEA aumentou 59,5%, pois mário e ascensão dos setores secundário e ter-
saltou de menos de 40%, em 1980, para 62,7%, ciário, os serviços foram, em 1980, o principal
em 2018. No mesmo período de tempo, o setor empregador de força de trabalho no Brasil. Em
primário registrou a queda de 73,4% na partici- comparação com o ano de 1940, por exemplo,
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Tabela 5. Brasil – Evolução da população por tipo de ocupação e taxa de precarização em 1980 e 2018.
1980 2018 Variação absoluta Variação relativa
Itens
(em mil) (em mil) anual (em mil) anual (em %)
População Total 119.002 208.495 2.355 1,5
PEA 43.236 (100%) 105.197(100%) 1.631 2,4
PEA desocupada 1.210 (2,8%) 12.195 (11,6%) 289 6,3
PEA ocupada 42.026 (100%) 93.002 (100%) 1.342 2,1
Empregador 1.340 (3,2%) 4.532 (4,9%) 84 3,3
Assalariado 27.152 (64,6%) 62.447 (67,1%) 929 2,2
Formal 21.272 (50,6%) 43.940 (47,2%) 596 1,9
Informal 5.880 (14,0%) 18.507 (19,9%) 332 3,1
Conta própria 9.555 (22,7%) 23.848 (25,6%) 376 2,5
Sem remuneração 3.978 (9,5%) 2.175 (2,4%) -47 -0,5
Precarização 19.413 (46,2%) 44.530 (47,9%) 661 2,2
Fonte: IBGE8-10 (elaboração própria).
a composição do setor de serviços tinha sofrido tência, para as atividades urbanas na construção
modificações importantes registradas em 1980 e civil, indústria de transformação, comércio e ser-
ainda maiores em 2018. viços. No interior do setor de serviços, constatou-
De um lado, a diminuição de importância se o deslocamento das ocupações mais simples e
relativa das ocupações totais nos segmentos dos de contida produtividade como nos serviços pes-
Serviços de Distribuição (comércio, comunica- soais (trabalho doméstico e outros) para os ser-
ção, transporte e outros) em 5,6% e dos Servi- viços sociais e de produção.
ços Pessoais (doméstico, segurança, cuidadores e Na transição atual para a sociedade de ser-
outros) em 22,2% entre 1940 e 1980. De outro, viços, percebe-se, contudo, que não parece ha-
o avanço na participação relativa no total das ver evidências precisas que o mesmo sentido
ocupações nos Serviços Sociais (saúde, educação, do deslocamento de atividades de menor para
assistência e outros) em 29,7% e nos Serviços de maior produtividade e remuneração, registrado
Produção (engenharia, tecnologia, propaganda e na sociedade urbana e industrial, esteja ocorren-
outros) em 56,1% no mesmo período de tempo. do. Pelo contrário, as informações oficiais exis-
De maneira geral, o ciclo da industrialização tentes apontam para o sentido inverso, ou seja,
e urbanização nacional representou a transfor- a destruição de atividades e ocupações situadas
mação da força de trabalho alocada em setores de nos segmentos de maior produtividade e remu-
menor produtividade e remuneração para os de neração e a expansão dos postos de trabalho de
maior produtividade e rendimento do trabalho. menor produtividade e rendimento.
Isso porque houve deslocamento de trabalhado- Na comparação entre os anos de 1980 e 2018,
res do meio rural, ocupados na própria subsis- nota-se, por exemplo, que o segmento que perdeu
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Pochmann M
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https://www.ibge.gov.br/estatisticas/sociais/trabalho Artigo apresentado em 07/04/2019
/9171-pesquisa-nacional-por-amostra-de-domicilios- Aprovado em 20/08/2019
continua-mensal.html Versão final apresentada em 08/10/2019
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