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MENSAGEIRO

DO CORAÇÃO DE JESUS

SER CRISTÃO
NO MEIO DA
GUERRA
pág. 3
NOVO ANO,
NOVAS PROPOSTAS
pág. 1

«JOGAR A CARTA DA PAZ»


JANEIRO | 2018
Livraria AO MENSAGEIRO
DO CORAÇÃO DE JESUS
janeiro 2018 // Ano CXLIII, n.º 1
GPS DO PEREGRINO
15-18 MARÇO | FÁTIMA Diretor
António Valério, s.j.

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P. António Valério, sj Direção de arte e produção gráfica


Francisca Cardoso | Henrique Almeida

Dia 15 (jantar) a 18 (almoço) Paginação


Editorial A.O.
de março de 2018
Impressão e acabamentos
Na Domus Carmeli* Empresa Diário do Minho, Lda.
Rua de São Brás, n.º 1 – Gualtar
4710-073 BRAGA
Contr. n.º 504 443 135
Diária: 40,50 euros (Só quartos individuais)
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(Pessoa Coletiva Religiosa – N.I.F. 500 825 343)
(limitado às primeiras 40 inscrições)
Depósito Legal 11.762/86
ISSN 0874-4955
*Rua do Imaculado Coração de Maria, 17 Isento de Registo na ERC, ao abrigo do Decre­to
2495 - 441 FÁTIMA Regulamentar 8/99 de 9/6, artigo 12º, nº 1 a
Tiragem: 9.000 exemplares

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Europa: 20,00€
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ATENDIMENTO AO PÚBLICO

Horário: 9h-12h30 / 14h30-19h


ABERTURA

SUMÁRIO
ABERTURA – Novo ano, novas propostas
P. António Valério, s.j. --------------------------------------------- 1

NOVO ANO,
INTENÇÃO DO PAPA – Viver a fé com liberdade
António Valério, s.j. ----------------------------------------------- 2

NOVAS PROPOSTAS DESTAQUE – «O meu sonho é renascer da morte»


P. António Valério, s.j. Ser cristão no meio da guerra - Entrevista a Firás Lutfi
Por: Betânia Ribeiro----------------------------------------------- 3
Começamos o novo ano com novas propostas na
Revista Mensageiro do Coração de Jesus, o órgão AS COISAS PEQUENAS E A FÉ – Santas Banalidades
oficial da Rede Mundial de Oração do Papa em Rui Fernandes, s.j.------------------------------------------------- 6
Portugal. Na recriação deste Serviço Pontifício,
responsável pela difusão das intenções do Santo CONHECER OS MÍSTICOS – Orígenes
Padre, a Revista Mensageiro aparece como o Brendan Comerford, s.j.------------------------------------------ 8
suporte que ajuda os Centros do Apostolado da
Oração e outras pessoas ou grupos interessados EM FAMÍLIA – Mafalda Rebelo e Luis Pedro Cardoso
em integrar esta Rede a aprofundar os desafios Respeitar as diferenças para crescer no amor
que o Santo Padre aponta como mais urgentes Por: Cláudia Pereira--------------------------------------------- 10
no mundo e na missão da Igreja, mobilizando
os cristãos na oração e ação por estes desafios. TIRAR A BÍBLIA DA ESTANTE PARA LER S. MARCOS
Evangelho: novidade e autoridade
Neste sentido, a intenção de cada mês é a linha
Miguel Gonçalves Ferreira, s.j.--------------------------------- 12
orientadora da publicação. O artigo sobre a
intenção, para além de uma breve explicação do
tema, contém propostas concretas para serem DOSSIER – Os desvelos de Francisco. «Jogar a carta da paz»
realizadas pelas pessoas e grupos que querem Andrés Beltramo Álvarez--------------------------------------- 13
rezar e fazer algo de acordo com a intenção.
No esquema proposto para a reunião de grupo, OPINIÃO – Há muitos anos
adotámos a forma da Lectio Divina, em que Isabel Figueiredo------------------------------------------------- 21
todos são convidados a ler e meditar a Palavra de
Deus, partilhá-la e trazê-la para a vida. Ao longo LECTIO DIVINA – Palavra de Deus para a vida
da revista, é aprofundado o tema da intenção,
Manuel Morujão, s.j.---------------------------------------------- 22
através de entrevistas, reportagens ou artigos.
Uma parte importante da nossa revista dedica-se
NOTÍCIAS
à formação cristã, com temas de catequese, Bíblia,
Cláudia Pereira----------------------------------------------------25
vida cristã, espiritualidade, sensibilização para
temas sociais e também testemunhos de vida EU RECOMENDO – Escravos dos Escravos
cristã, em particular a fé vivida em família.
Jorge Teixeira------------------------------------------------------29
A equipa que preparar a cada mês a revista
Mensageiro sente esta missão como um desafio HUMANIZAR-ME – Qual o tom do… Racismo?
constante a ajudar a viver mais profundamente
Constante Silva Rodrigues-------------------------------------30
a fé, na intimidade com Cristo e unidos ao Santo
Padre. Esperamos sinceramente que a sua leitura
e utilização seja de grande proveito para todos.
Votos de um bom ano 2018 e boa leitura! FOTOS
Fotografias: Capa: © Natcho Arteaga; pág. 2: © Evgniy Serov; pág. 3: © Betânia Ribeiro;
págs. 4 e 5: Cedidas por: Firás Lutfi; pág. 6: © Told Diemer; pág. 10: © Betânia Ribeiro;
pág. 15: © Lusa/EPA/Nyein Chan Naing; págs. 16, 17 e 20: © Lusa/EPA/Ettore Ferrari;
pág. 26: Todos os direitos reservados; págs. 30 e 31: © Larm Rmah; Arquivo A.O.

janeiro 2018 | 3
INTENÇÃO DO PAPA

António Valério, s.j.

Viver a fé com liberdade


«PARA QUE, NOS PAÍSES ASIÁTICOS, OS CRISTÃOS,
BEM COMO AS OUTRAS MINORIAS RELIGIOSAS,
POSSAM VIVER A SUA FÉ COM TODA A LIBERDADE».

A Ásia é um enorme e riquíssimo continente


onde a missão da Igreja encara grandes
desafios. Convivem nestas terras povos
de tradições religiosas muito antigas e diversas,
sendo a atitude espiritual perante a vida uma
rodeia, a nível familiar, de trabalho, ou nas minhas
relações, na expressão livre da minha fé? Falo
de Jesus, da Igreja, sem ter medo ou vergonha?
- Nos grandes temas sociais, culturais e políticos
da atualidade, procuro informar-me sobre os
marca destas culturas. Nalguns países deste valores que a Igreja propõe nestas questões e
continente, os cristãos constituem a maioria da procuro não me deixar levar acriticamente pelos
população, mas noutros são uma pequeníssima «slogans» e argumentos superficiais, e afirmar a
minoria. Os nossos irmãos e irmãs asiáticos minha fé com coerência e verdade, mesmo correndo
enfrentam todos os dias o desafio de conviver com o risco de ser incompreendido e criticado?
outras religiões, em situações muito bonitas de - Que propostas ou iniciativas de oração e
diálogo e colaboração, mas também, em muitos reflexão se podem realizar na nossa comunidade
lugares, de forte oposição, perseguição ou falta para ajudar a dar-se conta de como o nosso
de liberdade para viver e expressar a sua fé. contexto pode limitar a nossa liberdade de
O Papa Francisco convida-nos este mês a rezar nos dizermos e agirmos como cristãos?
pelos cristãos na Ásia, que sentem diariamente Estas e outras questões poderão ser tema de
os constrangimentos para viverem a sua fé com reflexão pessoal ou em grupo. Para este mês,
liberdade. Ao rezar por eles, também nós nos sugerimos que se procure encontrar oportunidades
podemos perguntar como é que, na nossa vida, concretas de falar da nossa fé em Cristo e do nosso
respeitamos as diferenças à nossa volta, no amor à Igreja com toda a liberdade, coragem e
caso de contactarmos com pessoas com crenças criatividade. A luz do Evangelho ilumina todas as
diferentes das nossas. Mas poderemos aprofundar realidades humanas e, por isso, é tão fascinante.
ainda mais este tema com estas questões: Procuremos ser os principais transmissores desta luz.
- Deixo-me condicionar pelo ambiente que me

4 | Mensageiro
DESTAQUE

Por: Betânia Ribeiro


«O MEU SONHO
É RENASCER DA
MORTE»
SER CRISTÃO NO
MEIO DA GUERRA
No Médio Oriente, o Cristianismo está à beira
da extinção. A guerra no Iraque e na Síria, nos
últimos anos marcada pela ofensiva do grupo
terrorista ISIS/DAESH, levou à fuga dos cristãos
da região para países limítrofes ou para outros
continentes, como o europeu. Para quem ficou, resta
o apoio prestado pelas instituições de solidariedade,
que tentam dar resposta às carências físicas e
psicológicas de quem vive a destruição do seu
país. O Mensageiro do Coração de Jesus esteve à
conversa com Firás Lutfi, frade franciscano sírio.

Firás Lutfi, de 42 anos, nasceu em Hama, no


centro da Síria. É frade franciscano, superior do
Convento de Santo António e diretor do Colégio
da Terra Santa, localizado em Alepo, no noroeste
da Síria. Esteve em Portugal pela primeira vez
para participar na Peregrinação Internacional
da Fundação AIS ao Santuário de Fátima, entre
12 e 15 de setembro de 2017. É testemunha
da perseguição dos cristãos sírios, que vivem
em Alepo uma «realidade muito dramática». A
comunidade cristã da Síria, uma das mais antigas
do mundo, está ligada aos primeiros anos da
História da Igreja através do episódio do encontro
de São Paulo com Jesus nas proximidades de
Damasco, que levou à conversão do santo. Hoje,
é uma das comunidades cristãs mais ameaçadas
pela devastação da guerra no Médio Oriente.

Conflito armado mil cristãos», uma das maiores comunidades cristãs


da Síria. «Hoje, são apenas 30 mil cristãos», sublinha
Firás Lutfi considera Alepo «a cidade mais Firás Lutfi. Calcula-se que mais de três quartos dos
perigosa em todo o mundo». E explica porquê: «Os cristãos tenham desaparecido da cidade. «Algumas
bombardeamentos dia e noite põem em perigo as pessoas morreram, outras deixaram as suas casas e
famílias e as crianças que vivem lá. Não há água, foram para outra parte do país, mas muitas fugiram,
eletricidade, aquecimento, gasolina, não há nada. especialmente para a Europa», explica o sacerdote.
A dignidade básica do ser humano desapareceu». Mas alerta: «Ninguém tem, de facto, vontade de
«Os números são desastrosos», afirma o frade. se fazer ao mar e morrer no Mar Mediterrâneo.
«Antes da guerra, só em Alepo, viviam cerca de 250 É melhor morrer na sua terra natal».

janeiro 2018 | 5
Esquecidos pelo mundo, os sírios puderam sempre contar com o
apoio da Fundação Ajuda à Igreja que Sofre (AIS). «O envio de comida
nas alturas em que não tínhamos comida ou água para beber ou até
medicação foi essencial para sobrevivermos», descreve Firás Lutfi.
Este apoio conseguiu, na ótica do frade, «suster este processo e motiva
os cristãos a ficar e a reconstruir as suas casas destuídas pela guerra».
Os cinco frades que permaneceram heroicamente em
Alepo cuidaram das pessoas que procuraram refúgio junto
da comunidade, fosse qual fosse o seu credo ou idade.

Momentos de celebração da fé

Mesmo no meio da catástrofe, os cristãos que ficaram em


Alepo não esqueceram os momentos de celebração litúrgica,
fortalecendo os seus laços com a fé cristã e com a comunidade.
Firás Lutfi descreve essas cerimónias, celebradas em relativa
paz, como o escape necessário para viverem sem estarem
constantemente precupados com um possível ataque ou
com a chegada da notícia de mutilações ou falecimentos.
Dos vários exemplos que o frade sírio dá sobre vivência da
fé num cenário de guerra, destaca com emoção um momento
vivido com mais de 400 fiéis reunidos num Domingo,
numa celebração eucarística, na igreja de São Francisco, em
Alepo, quando uma bomba entrou pela cúpula do edifício.
«Poderia ter sido um desastre, mas a explosão deu-se do
lado de fora da cúpula, os cristãos que se encontravam
no interior sobreviveram. Fomos protegidos pela Virgem
Maria. Temos fé e confiança em Deus», sublinha.

Fim do conflito, início da reconstrução

Os conflitos, que terminaram em novembro de 2017, duraram


seis anos e trouxeram os horrores praticados pelo ISIS/DAESH,
como a matança bárbara de civis. «Os fanáticos querem eliminar os
cristãos porque nos consideram cidadãos de segunda categoria», realça
Firás Lutfi. «Os cristãos nunca pediram para serem privilegiados,
pedem apenas para viver em paz na Síria, que é o seu país, lado a
lado com outras confissões religiosas e etnias, que representam,
no fundo, a riqueza cultural do Médio Oriente», explica.
O Gabinete da ONU para os Assuntos Humanitários faz o balanço
de 330 mil mortes no conflito sírio, mais de 6,5 milhões de deslocados
dentro do país e 5,5 milhões de refugiados, desde março de 2011.
Alepo, cidade libertada, vive hoje o seu renascimento.
«A situação está francamente melhor», declara o
sacerdote. «Vê-se que as pessoas regressam aos seus
trabalhos, a cidade está, agora, cheia de movimento».

Perdão e reconciliação

«Não são só as pedras que foram destruídas, as pessoas


foram muito afetadas psicologicamente, sejam jovens ou
idosos». O efeito psicológico da guerra é uma das grandes
preocupações do frade sírio para o futuro. «Como ajudar as
pessoas a perdoar? Como passar pelo processo de curdos e yazidis) do Médio Oriente, que constituem
reconciliação consigo mesmo, com o sofrimento «o grande mosaico composto por diferentes
que carrega na alma?», questiona Firás Lutfi, religiões e variadas confissões, como os sunitas,
considerando que diversas organizações locais xiitas, alauitas, ismaelitas, entre outros». «Se o
e internacionais podem desempenhar um papel imã da mesquita tiver uma mente aberta, talvez
significativo no apoio dado às populações, resulte numa boa formação, caso contrário, o
tendo em vista a reconciliação e o perdão. resultado é desastroso», exemplifica. No caso dos
«Não é fácil imaginar como vamos viver no futuro cristãos, o «sentido de cidadania» foi, para o frade
próximo, porque sofremos muito com a invasão franciscano, a salvação para quem ficou para trás.
de milhares de jihadistas cujo objetivo era destruir Questionado sobre o envolvimento estrangeiro
o rasto da cultura síria ancestral e o património, no conflito, Firás Lutfi considera que a guerra
antigo e belo, que era da humanidade», explica o na Síria dividiu o mundo em dois pólos de
frade. Mas não se mostra desanimado com o futuro: interesse, «como na Guerra Fria». Mas também
«Eu confio em Deus e na vontade de Deus, que nos é perentório: «Ninguém dá nada a ninguém
vai ajudar a aceitar o futuro, que não será um sonho, gratuitamente». E coloca uma questão: «Qual é a
mas a realidade». E dá alguns exemplos do passado: pior coisa que pode acontecer a um país? Existir
«Devem recordar-se de Berlim ou de Hiroshima. alguém de fora que acha que pode decidir o futuro
Os efeitos da Grande Guerra foram desastrosos! do país. Este pensamento destruiu a Síria».
Olhem para estas cidades agora. É preciso «A Síria precisa de evolução, precisa de ser como
confiança nos próprios sírios. Nós conseguiremos, qualquer outro país, onde valha a lei», conclui o
com o apoio da comunidade internacional, frade franciscano. «Precisa de tempo para chegar
tomar nas nossas mãos os instrumentos para onde a Europa chegou, depois de duas guerras
reconstruir. O meu sonho é renascer da morte». mundiais». «Quem vai reconstruir a Síria? As pessoas
Firás Lutfi acredita que o fanatismo pode ser inteligentes, as pessoas que se sabem defender,
ultrapassado através da educação, fomentando o não através da luta armada, mas da cultura».
respeito pelos diversos grupos étnicos (arménios,
AS COISAS PEQUENAS E A FÉ

Santas Banalidades
Rui Fernandes, s.j.

Como compreender a fé? Para muitos, esta aceitar as divisões? Pouco a pouco, crescer na fé
pergunta está condenada ao fracasso: a fé é torna-se cada vez mais sinónimo de um crescimento
inexplicável; não temos como reconciliá-la com humano, pelo qual o saber se transforma em
a linguagem nem com a razão. Para outros, sabedoria e as dúvidas em conversas de amizade
compreender a fé é, antes de tudo, compreender e discernimento. O «não-saber» da fé não é
as doutrinas e o conjunto da tradição da Igreja, preguiça nem ignorância, mas o reconhecimento
isto é, perceber o credo e o magistério. de que a vida – e Deus – é surpreendente.
A questão é complexa, sem dúvida. Por um Existem vários – e preciosos – comentários ao
lado, a fé constitui de facto uma tradição com credo, de leitura (quase) obrigatória. Afinal, muitas
textos e linguagens próprias, e percebê-las faz das nossas dúvidas de fé são, na verdade, dúvidas
realmente parte do percurso de crescimento por falta de leitura e, para essas, nada melhor do
na fé, tal como estudar ciências e letras deve que um pouco de estudo. Mas há outro tipo de
acompanhar o nosso crescimento humano. O dúvidas, mais existenciais; dúvidas que nos vêm do
«exemplo dos que nos precederam» não pode senão confronto diário com as contradições da vida ou,
enriquecer-nos. No entanto, a fé não cabe em tão simplesmente, do peso da rotina que arrefece
textos nem em palavras. Quanto mais refletimos em nós o gosto pelas pessoas e coisas. Essa dúvida
sobre ela, mais nos apercebemos da sua vastidão. que nos morde quando toca o despertador pela
O diálogo entre o credo e a vida é inesgotável, e manhã é mais profunda, e diz respeito ao sentido
obriga-nos a um trabalho constante. Falamos de das coisas e da vida. Vale a pena tudo isto? Ora,
um Deus de vida, mas como compreender a morte? de que nos serve uma fé que não nos dá gosto
Falamos de um Deus de Luz, mas porque somos de viver, apesar de tudo – apesar da vida? Como
tantas vezes confrontados com a noite? Falamos pode a fé devolver-nos a alegria, sem nos iludir?
de uma Igreja santa e una, como podemos então

8 | Mensageiro
O extraordinário mundo das coisas mesmo sonho secreto de um dia, no meio dos
banais: uma lição das parábolas nossos trabalhos rotineiros, encontrarmos algo
que nos faça perder a cabeça e investir tudo o
Quando pensamos sobre quem é Deus, que temos e somos. Ou talvez suspiremos com
somos por vezes tentados a refletir sobre sermos «descobertos» por alguém, como «pérolas
noções de perfeição, ou sobre uma realidade valiosas». De facto, esta história faz-nos pensar
outra, radicalmente diferente deste mundo que muitos dos nossos «desejos habituais»
tão engelhado. Nos Evangelhos, porém, Jesus têm algo de muito pouco corriqueiro, porque
surpreende-nos com uma forma bem diferente tocam em aspetos fundamentais da nossa
de falar [do reino] de Deus: as parábolas. vida: a vontade de encontrar/ ser encontrado;
O primeiro aspeto desconcertante das parábolas a vontade de descobrir um sentido pleno.
de Jesus tem que ver com o cenário e com as Outras parábolas são bastante mais
personagens que escolhe, de tão quotidianos. desinquietantes. A história dos trabalhadores
Tomemos, por exemplo, o Evangelho de Mateus que discutem com o patrão sobre o valor do seu
e a imagem do «grão de mostarda» (Mt 13, 31-32). salário (cf. Mt 20, 1-16) não pode senão obrigar-nos
O relato pinta-nos um homem a semear um grão a conversar sobre as nossas conceções de justiça.
de mostarda, pequena enquanto semente, enorme Será justo que pessoas com horas de trabalho
depois de plantada; tão grande que os pássaros a desiguais recebam o mesmo salário? Este relato
escolhem como abrigo. Não se fala de céu, mas acerta em cheio numa preocupação quotidiana
de terra; nem se pronuncia o nome de Deus, mas de tantas pessoas, que se sentem prejudicadas
descreve-se um agricultor. Mas, o que teriam por leis laborais injustas. Ao mesmo tempo,
de especial esse agricultor e aquela árvore? a releitura da história parece convidar a uma
O primeiro efeito das parábolas é o de dar reflexão sobre o que seria, para nós, um salário
valor a coisas perdidas e anónimas; é o de tornar justo e, mais do que isso, sobre um patrão justo.
valiosas as coisas banais. Se o banal parece não Será justo que os trabalhadores sejam avaliados
ter valor é porque, muitas vezes, nos esquecemos apenas pelo que produzem? As pessoas não são
de contá-lo. Contar histórias é já uma forma de todas igualmente valiosas, na sua diferença? Uma
as tornar únicas. Numa história, o banal pode vez mais, a parábola não esgota estas questões.
tornar-se extraordinário. Mas para contar histórias Porém, ela desafia-nos a olhar o quotidiano e as
é preciso estar atento ao que se passa. Quantos suas ambiguidades de uma forma mais profunda.
agricultores não terá Jesus visto? E com que olhos Algumas parábolas, como a do bom samaritano
os observou? Outro aspeto que transparece nesta (cf. Lc 10, 29-37), colocam-nos perante os nossos
e noutras parábolas é a atenção que Jesus presta ao preconceitos quotidianos a respeito dos outros, que
quotidiano. As histórias que Jesus conta mostram tantas vezes nos impedem de nos aproximarmos
também o modo como Ele olha para o mundo. Para deles. Mas talvez nenhuma nos faça revisitar a nossa
Ele, o mundo do dia a dia é digno de ser contado. história de vida como aquela onde se fala de um pai
Jesus olha para o mundo com admiração, e isso e dos seus dois filhos (Lc 15, 11-32). Desde a vontade
transparece nos exemplos que dá. De repente, uma de emancipação, aos conflitos e invejas entre irmãos,
árvore deixa de ser apenas raízes, tronco e copa, até ao tempo que leva para se chegar à reconciliação:
e passa a ser o palco de sonhos e de esperança. quem de nós é estrangeiro a este cenário?
Outras parábolas de Jesus falam explicitamente As parábolas entram-nos pela vida adentro:
de nós e dos nossos desejos. Como aquela história falam dos nossos trabalhos, dos nossos desejos,
do vendedor de pérolas que, ao descobrir uma das nossas dificuldades, do nosso modo de estar
gema valiosíssima, vendeu tudo o que tinha com os outros, da nossa família e das dores de
apenas para ficar com ela (cf. Mt 13, 45-46). Quem crescimento. As parábolas situam-se num território
representa Deus, nesta história? O homem que que nos é conhecido – o território do banal – talvez
larga tudo (como na encarnação de Jesus), ou a gema para nos dizer que é aí, e não nas nuvens, que
valiosíssima (por quem a fé anseia)? O reino de Deus podemos experimentar Deus. Sobra-nos, por isso,
será um lugar, uma relação ou um movimento? a pergunta: Com que olhos vemos o banal? Com
A parábola de Jesus não responde cabalmente que olhos queremos ver Deus? Teremos olhos para
a nenhuma destas questões. E, no entanto, é-nos ver o que há de extraordinário no nosso universo
difícil não empatizar com aquele vendedor e de banalidades? Quem sabe se, contado e rezado,
com o seu desejo. Todos convivemos com esse o nosso banal não se transforma em parábola.

janeiro 2018 | 9
CONHECER OS MÍSTICOS

Orígenes
do texto, exige oração e intimidade com Cristo!
Em artigos anteriores, fizemos referência ao facto
de o Cântico dos Cânticos ser o livro bíblico favorito
dos místicos, preferência que se manifesta ao longo
(C. 185 – C. 254) dos séculos. O Comentário de Orígenes ao Cântico dos
Cânticos é crucial para entendermos o seu misticismo.
Orígenes adverte para o facto de o Cântico
Brendan Comerford, s.j. dos Cânticos não dever ser lido por alguém
que pensa apenas ao nível do amor carnal.
Orígenes nasceu numa família cristã, na cidade Quem, pelo contrário, possui o que Orígenes
de Alexandria, Egito. Quando falámos de Clemente chama «amor celestial» (ou seja, aquele cujo
de Alexandria (ver Mensageiro | abril de 2017), coração foi profundamente tocado pelo
referi que Orígenes estudou com Clemente na escola amor de Cristo) encontrará no Cântico dos
catequética deste, em Alexandria. A seu tempo, Cânticos a mensagem central da Bíblia.
Orígenes seria nomeado professor na mesma escola. O Cântico dos Cânticos é, para Orígenes, o livro
Procurando alargar os seus conhecimentos, bíblico que ensina o conhecimento contemplativo,
Orígenes esteve em Roma, Atenas, Arábia e isto é, um conhecimento que, «sob as imagens da
Palestina. Durante a sua estadia na Palestina, foi Amada e do Amado, induz ao amor e ao desejo
ordenado sacerdote. Acabaria por se estabelecer das coisas celestiais, instruindo-nos no modo de
em Cesareia de Filipe, uma cidade do interior, chegarmos à amizade com Deus pela senda do
nas margens do rio Jordão. Dedicou os últimos amor e da caridade» (Cântico Comum, Prólogo).
vinte anos da sua vida a pregar, ensinar e escrever. Orígenes não receia utilizar o simbolismo
Por incrível que pareça, Orígenes escreveu erótico ao comentar o Cântico dos Cânticos, o
comentários sobre praticamente todos os livros que não é surpreendente, pois o próprio livro
da Bíblia! S. Jerónimo (c. 342-420), ele próprio usa o que pode ser visto como imagética erótica.
um grande estudioso da Bíblia, deixou-nos uma Orígenes fala da «ferida do amor», do «beijo
lista de 320 livros e 310 homilias de Orígenes! dos amantes», do «abraço». Tal como o filósofo
Para Orígenes, as Escrituras, na sua totalidade, grego Platão, ele considera que, embora o amor
não são outra coisa senão o Logos (Jesus Cristo) erótico (eros, em grego) seja experimentado na
ensinando cada crente na e por meio da Igreja. relação com um amante humano, no entanto,
Defendeu firmemente que é preciso ir além este mesmo amor erótico é, potencialmente, uma
da mera «letra que mata», procurando o, mais força celestial capaz de elevar a alma (a pessoa)
profundo, «significado espiritual» das Escrituras. desde a terra até às sublimes alturas do Céu.
Orígenes ajuda-nos a aceder a este «significado O que acabei de escrever lembra-me uma
espiritual» sugerindo-nos que vejamos os comovente passagem da maravilhosa primeira
acontecimentos e as pessoas do Antigo e do encíclica do Papa Bento XVI, Deus caritas est
Novo Testamento como «tipos» ou «alegorias» (Deus é Amor). Nela, Bento XVI escreve:
de realidades atuais. Esta perspetiva, deve tê-la «o eros quer elevar-nos “em êxtase” para o Divino,
recebido da sua herança cultural judaica e grega. conduzir-nos para além de nós próprios, mas
Mais adiante, neste artigo, apresentarei um ou por isso mesmo requer um caminho de ascese,
dois exemplos deste modo de ler a Bíblia. renúncias, purificações e curas» (n. 5). Não estamos,
A verdadeira originalidade de Orígenes reside aqui, a falar do uso egoísta, manipulador das
no facto de ele ser o primeiro cristão a descrever nossas capacidades sexuais, mas antes do amor
a receção pessoal dos ensinamentos de Jesus sexual, que é uma dádiva de Deus capaz de nos
como algo que ajuda a elevar a alma a uma esfera levar à transcendência de nós mesmos no amor
superior. Segundo ele, «O autor do Evangelho é do outro e, ao mesmo tempo, capaz de nos levar
alguém que, depois de estudar a narrativa dos ao desejo do Transcendente, Deus, que ama cada
eventos, sabe como ascender, sem hesitar, às um de nós altruística e incondicionalmente.
realidades espirituais» (Comentário Sobre Mateus, Orígenes, como muitos místicos, fala, por vezes,
10, 14). Para Orígenes, o nosso conhecimento das de modo verdadeiramente ousado. Segundo ele,
Escrituras, mais ainda do que o simples estudo Deus deve ser Eros: «Não me parece que alguém

10 | Mensageiro
deva ser censurado por chamar Amor Apaixonado
(eros) a Deus, do mesmo modo que João (no seu
Evangelho) chama Caridade a Deus (agape – amor
altruísta) (Cântico Comum, Prólogo). Se, como
Orígenes afirma, Deus é «Amor Apaixonado»,
então pode atrever-se a afirmar uma espécie de
«sofrimento» em Deus (Homilia sobre Ezequiel 6, 6)
– Deus «sofre» na paixão da Palavra (Jesus): o ícone
do amor absoluto de Deus por cada um de nós.
Orígenes compara a sensação de «ser beijado» com
a receção, pela nossa mente, dos ensinamentos
de Jesus (a Palavra), comunicados quer à Igreja
quer aos fiéis, individualmente. A imagem
de «provar os seios», encontrada ao longo do
Cântico dos Cânticos, é interpretada por Orígenes
como referindo-se ao coração de Jesus, sobre
o qual João, o discípulo amado, repousou.
Nos seus muitos escritos, é raro Orígenes
referir-se diretamente a si mesmo. Há, no
entanto, uma passagem que certamente nos fala
da nossa experiência d’Aquele que eu, por vezes,
chamo «o nosso Deus que joga às escondidas».
«Tomo Deus por testemunha de que, com
frequência, experimento o Amado a aproximar-se
de mim e a tornar-se-me intensamente presente;
então, de repente, retira-se e eu não o consigo
encontrar, embora o procure. Depois, quando
ele volta a aparecer e eu tomo posse dele,
ele escapa-se-me novamente; e quando isso
acontece, recomeça a minha demanda».
Noutros artigos desta série já encontrou ou vai
encontrar experiências similares deste Deus sempre
próximo e, no entanto, sempre inapreensível.
Orígenes entendeu sempre o objetivo da jornada
da alma em termos de um conhecimento superior,
um conhecimento que envolve uma relação pessoal
com Jesus, de quem fala, com frequência, de modo
tocante. A intimidade desta relação é sugerida não
apenas pela imagem dominante da Amada e do
Amado (uma imagem permanente no Cântico dos
Cânticos) mas também pelo símbolo do nascimento,
alusivo à procriação. Nesse sentido, Orígenes
fala da alma «amante» como Noiva e como Mãe –
aquela que ama e gera através do amor. Há aqui
um paralelismo evidente com Mestre Eckhart.
O falecido teólogo suíço Hans Urs von
Balthasar († 1988) escreveu acerca de
Orígenes: «Não há na Igreja pensador tão
invisivelmente presente como Orígenes».
Por mim, posso apenas deixar a última
palavra ao próprio Orígenes: «Contemplemos
constantemente a Imagem de Deus para que
sejamos transformados em semelhança de Deus».
(Publicado em The Sacred Heart Messenger / Irlanda)
EM FAMÍLIA

Mafalda Rebelo e Luís Pedro Cardoso

RESPEITAR AS DIFERENÇAS
PARA CRESCER NO AMOR
Por: Cláudia Pereira

O gosto pelo audiovisual uniu os percursos de Mafalda Rebelo, de 34 anos, e Luís Pedro Cardoso, de 38,
ambos do Porto. Com Mestrado em Som e Imagem, Mafalda é produtora. Engenheiro eletrotécnico de
formação, Luís sentiu-se cativado por este trabalho mais criativo e é realizador. Namoraram cinco anos,
casaram há seis e são pais do Gonçalo e da Luísa, com quatro anos e praticamente dois anos, respetivamente.
Embora tenham tido diferentes percursos de fé, empreenderam um caminho em conjunto, assente no respeito
pela diferença, o que contribui para o equilíbrio emocional de cada um e da família no seu todo.

Como se conheceram, como foi o Como foram os vossos percursos de fé,


tempo de namoro e como é que esse na infância, na adolescência
caminho levou ao casamento? e enquanto adultos?

Mafalda – Começámos por ser muito amigos. O Luís – A minha resposta vai ser mais cronológica.
Luís era amigo de uma amiga minha da Faculdade. Fiz a catequese até ao Crisma. Depois, não se
Estava nas engenharias, mas já gostava muito da área calhar imediatamente... mas naturalmente,
do audiovisual e aproximou-se do nosso grupo, para fui-me afastando, pelo menos a nível de rituais,
algumas brincadeiras audiovisuais. Fomos durante até cortar quase completamente. Há sempre um
alguns anos só amigos, mas muito amigos. Estávamos batizado, a missa de Natal ou algo para poder
com outras relações e estávamos bastante serenos em estar com a família, mas mais a nível social.
relação a isso. Houve uma altura em que, se calhar, tudo Se calhar também nunca estive muito interessado [nas
se conjugou, em que as outras relações terminaram questões religiosas]. Nunca foi algo que me preenchesse
e percebemos que tínhamos muito em comum. especialmente; era uma obrigação. A partir do momento
Começámos a namorar de uma forma muito natural. em que deixou de o ser, nunca senti essa necessidade.

12 | Mensageiro
Mafalda – A minha experiência foi desde a catequese segunda-feira à noite. Eu tenho futebol às vezes e ela às
e do grupo de jovens. Tenho uma formação associada vezes tem encontro de CVX; e domingo de manhã a missa.
à Serra do Pilar, em Gaia, uma comunidade que não é Mafalda – Até há pouco tempo, eu era a única do
paroquial. Com o grupo de jovens, participei em retiros meu grupo de CVX que tinha filhos e os encontros
e encontros, que foram muito marcantes e fizeram tudo eram quase sempre em nossa casa. O Luís não
tomar outra perspetiva. Quando estava na faculdade, participava das reuniões, mas participava do
pediram-me para dar catequese e dei. Sempre em paralelo, grupo. A certa altura, éramos todos amigos.
fazia voluntariado no verão com grupos católicos, o que
também ajudava a manter o espírito muito forte. O Luís Como é que se gere a educação
ainda chegou a ir vários anos comigo, como amigo e cristã dos filhos neste contexto?
depois como namorado. A questão da missa ao domingo
sempre foi muito importante, mas a partir desses retiros de Luís – Esta é uma questão que ainda não se colocou
adolescentes percebi o sentido e a completude que tinha. verdadeiramente. Mas também não creio que por aí vá
Participei em atividades do CREU [Centro de Reflexão haver um problema. Não sou ativamente contra, mas
e Encontro Universitário Inácio de Loiola], descobri o também não lhes vou mentir. Quando eles tiverem maior
GAS África [Grupo de Ação Social] e fiz a formação. compreensão, terei alguma sensibilidade para dizer as coisas.
Acabei por fazer missão dois meses em África. Numa Mafalda – A nível da educação das crianças, haverá
missa de envio, do GRÃO [Projeto de Voluntariado a minha maior convicção que a do Luís. Mas ele não
Internacional], em que participei, houve a tomada de se opõe. Para já, os miúdos querem ir à missa, o que
posse da nova direção da CVX e a homilia foi no sentido tem sido muito exigente: ainda são muito pequenos
de perceber que podia haver uma continuidade. Naquele e desestabilizam um bocadinho; por outro lado,
dia percebi que existia esse caminho e, mal cheguei sinto que se trata de um semear que é importante.
da missão, no ano seguinte inscrevi-me na CVX. Tem
sido, até hoje, muito importante no meu percurso. Quando chega a altura do Natal e da Páscoa,
tempos liturgicamente fortes, mesmo em
Apesar dessas diferenças de fé e de termos de celebrações, como gerem a situação?
caminhada, o amor foi mais forte?
Mafalda – O Luís segura mais a barra para eu poder
Luís – A questão não se coloca assim. Se calhar, era pior ir, é verdade. Para mim é importante. Ele percebe isso,
se fôssemos de clubes diferentes! Podem existir muitas respeita e colabora. Há outras alturas em que, por outras
relações que têm de superar diferenças que são graves, razões, cedo mais eu. Ajustamo-nos, dentro do possível.
mas no nosso caso não faz sentido estarmos a falar nisso.
Mafalda – Nunca foi uma barreira entre nós. Qual é o vosso “segredo”, a vossa “receita” para
Apesar de tudo, não há ninguém que é contra. Há uma ter harmonia, apesar destas diferenças?
enorme tolerância do Luís e há essa proximidade de
linguagem. Acho que ele desde sempre me conheceu Mafalda – É respeitar a diferença e aceitar que há
com essa vertente forte e percebeu que era inegociável necessidades diferentes de um e de outro. O Luís percebe
da minha parte. Mas sem nunca tentar impor. que este campo é muito importante para mim, respeita
É importante referir que a minha mãe é praticante e apoia, de certa maneira. Lembro-me que quando
muito convicta e o meu pai é agnóstico muito estávamos a viajar em Interrail, havia alturas em que ele
convicto. Eu cresci nesse ambiente de conjugação tinha reparado já qual era o horário da missa, para me
natural. Quando encontrei o Luís, as diferenças nunca dizer, porque sabia que eu ia querer ir à missa. Trata-se
foram uma barreira. Casámos pela Igreja e o Luís de respeitar o espaço, perceber o que é importante
fez o Curso de Preparação para Noivos comigo. para o outro e procurar que haja espaço para isso,
também para o equilíbrio emocional da outra pessoa.
Há diferenças no dia a dia que têm de
se gerir, porque a Mafalda acaba por ter A questão do respeito é a mais importante?
compromissos que o Luís não tem...
Luís – Claro. O respeito tem de existir. Acho que
Luís – Isso não é só neste campo; é um bocado a nossa existe em todos os campos da relação. No nosso caso,
vida. A Mafalda tem ténis quarta à noite, eu tenho as diferenças nem sequer chegam a ser um problema.

janeiro 2018 | 13
TIRAR A BÍBLIA DA ESTANTE PARA LER S. MARCOS

Evangelho: novidade e autoridade


Miguel Gonçalves Ferreira, s.j.

" Outro aspeto sublinhado


pelo Evangelho de
Marcos é a novidade
da pregação e do estilo
Com o novo ano, iniciamos também a leitura de religioso de Jesus.
um novo Evangelho – neste caso, o de S. Marcos
– próprio do ciclo litúrgico B, que acompanha os
Domingos de 2018. Marcos faz eco da pregação num qualquer espírito impuro e desintegrador
de Pedro à comunidade de Roma, para a qual a figura que aprisione a existência humana, mostrando-Se
de Jesus era uma total novidade. É ele o primeiro a poderoso em palavras e obras no dia memorável
escrever um «Evangelho», criando um novo género passado em Cafarnaum (1, 21-34). Jesus sabe que o
literário que, através de um esquema histórico e seu poder vem do Pai, por isso retira-Se e entrega-Se
geográfico, pretende dizer-nos quem é Jesus Cristo e à oração como parte integrante – e alimento – da
quais os desafios por Ele lançados a quem O encontra. sua missão de anúncio (1, 35-39). Ele não quer
A palavra grega «euangélion» não se aplicava suscitar mal-entendidos, nem juízos apressados
originariamente a uma forma literária, mas à «boa sobre a sua pessoa, por isso impõe segredo tanto nos
notícia» que os primeiros cristãos consideravam ser exorcismos (1, 25), como em algumas curas (1, 44).
a história de Jesus e a sua mensagem de salvação. Outro aspeto sublinhado pelo Evangelho de
Assim, o evangelista revela-nos, logo de início, Marcos é a novidade da pregação e do estilo
a identidade de «Jesus, Filho de Deus» (1, 1). No religioso de Jesus. Ele perdoa os pecados em
batismo, será a voz divina a dizer-nos que Ele é o nome próprio, chama e convive com pessoas
«Filho muito amado» (1, 11). Ao ler todo o texto, pouco recomendáveis, liberta temporariamente
deveríamos ser nós capazes de professar, como o os seus discípulos da obrigação de jejuar e
centurião romano junto à cruz: «verdadeiramente, revela-lhes um novo entendimento sobre o
este homem era Filho de Deus!» (15, 39). repouso sabático: «o sábado foi feito para o
O essencial da «boa notícia» é resumido por homem e não o homem para o sábado. O Filho
Marcos da seguinte forma: «Jesus foi para a do Homem até do sábado é Senhor» (2, 27-28).
Galileia e proclamava o Evangelho de Deus, E se no Antigo Testamento Deus era entendido
dizendo: “completou-se o tempo e o reino de como o esposo de Israel, agora é Jesus que Se
Deus está próximo: arrependei-vos e acreditai apresenta como um «noivo messiânico», aquele que
no Evangelho”» (1, 14-15). A boa notícia é que vem desposar e complementar a comunidade dos
Deus salva, aproximando-Se com a sua ação seus discípulos (2, 19). Contudo, a autoridade e
poderosa – o seu Reino. Por isso, o tempo que novidade manifestadas nas curas e ensinamentos
temos é o momento certo para reordenar a vida. criam polémicas e suscitam adversários. Surge,
Só alguém verdadeiramente especial pode por isso, bem cedo, a vontade de O matar (3, 6).
fazer uma afirmação tão forte. Por isso, um dos O Evangelho e o tempo inaugurados por
pontos sublinhados pelo evangelista Marcos é Jesus – o vinho novo – requerem recetividade
a autoridade de Jesus. Ele chama discípulos que renovada – os odres novos (2, 22). Como
deixam a sua família e a segurança económica desejo eu receber a boa notícia de Jesus em
para O seguir (1, 16-20). Ele tem poder sobre o 2018? Com novidade e autoridade… ou com
mal experimentado numa doença corporal, ou remendos e em sacos velhos e rotos?

14 | Mensageiro
ANDRÉS BELTRAMO ÁLVAREZ | CIDADE DO VATICANO

OS DESVELOS DE FRANCISCO.
«JOGAR A CARTA DA PAZ»
MENSAGEIRO | DOSSIER 34
«Há que insistir. É importante jogar a carta da à zona de argentinos e acompanhantes. Trocava
paz. Não importa os que criticam. Que critiquem!». gracejos e comentários com cada um. Um jornalista
Notava-se que o Papa estava seguro ao pronunciar e ex-diplomata colombiano apresentou-lhe uma
estas palavras. Decorria o dia 12 de junho de 2013. caixita de lata com doces. Francisco, ao ver as cores
Levava apenas três meses de pontificado e já da bandeira, exclamou sem duvidar: «A Colômbia
mostrava confiança no fim do pior conflito latino- está muito perto do acordo de paz». Pediu que se
-americano da história. Falava com esperança da insista. Jogar tudo e não dar ouvidos às críticas.
paz na Colômbia. Queria impulsionar, com todas as
suas forças, um acordo entre o governo e a guerrilha.
Nesse dia, durante uma conversa informal na «TUDO SE PERDE COM A GUERRA.
Praça de S. Pedro, demonstrou que a paz já era uma TUDO SE GANHA COM A PAZ».
das grandes cartas do seu pontificado. Tiveram
que passar mais de três anos para que aquela
intuição se convertesse em realidade. Francisco Não era um encontro diplomático. As suas
aguardou, com paciência, o tempo da paz. E o palavras não constituíam uma declaração oficial.
tempo chegou, abrindo uma nova etapa no país. Mas era isso o que o Papa tinha na cabeça: a paz. As
O Sol aquecia os mármores pálidos na fachada da delegações do governo do presidente Juan Manuel
basílica vaticana. Por momentos, o calor romano Santos e das Forças Armadas Revolucionárias da
tornava-se sufocante. As altas temperaturas não Colômbia (FARC) andavam há meses a negociar,
detinham a atividade de Jorge Mário Bergoglio, em Havana, em grande segredo. Várias vezes as
nessa manhã de quarta-feira. Um pouco mais conversações correram risco de naufragar.
afastadas, 80 mil pessoas assistiam à sua audiência Francisco bem o sabia. Onze dias antes, a 1 de junho
geral. Depois de concluir a sua catequese, o Papa de 2013, tinha recebido em audiência o presidente
dedicou-se a doentes e incapacitados, antes de chegar da República Oriental do Uruguai, José “Pepe”

16 | Mensageiro
Mujica. Um encontro privado de 44 minutos, na também tantos sinais de esperança. Gostaria de
biblioteca do Palácio Apostólico. A Colômbia ocupara animar os recentes passos realizados em vários
boa parte do colóquio. O mandatário uruguaio países da América Latina rumo à reconciliação
perfilava-se como garante do processo de pacificação, e à paz. Acompanhemo-los com a oração».
e encontrou no líder católico um aliado ideal. Os acontecimentos desses dias são o melhor
Por isso, não foi casual a mensagem que, sobre resumo do «método Francisco». Um homem realista,
esse particular, o Papa pronunciou, apenas 24 horas que adverte os sinais ao seu redor e responde,
depois. Ao meio-dia do domingo, 2 de junho, depois pondo em jogo a sua pessoa e a sua palavra. Um
de recitar com uma multidão a oração mariana do Papa com vocação pacificadora desde o princípio
Angelus em S. Pedro, advertiu que «as guerras são do seu ministério petrino. Que acompanha os
uma loucura». «Tudo se perde com a guerra. Tudo discursos teóricos com ações concretas. Para
se ganha com a paz», parafraseou. E insistiu: «No compreender a sua mensagem de paz é obrigatório
mundo existem tantas situações de conflito, mas transitar pelos roteiros dos seus atos.

Uma «terceira guerra mundial» em pedaços

«O mundo está em guerra. Por toda a parte!» .


O diagnóstico é cru, o Papa tem clara consciência
disso. Assim o denunciou, em inumeráveis
ocasiões, publicamente. Como naquela conferência
de imprensa a bordo do avião papal, após a sua
visita apostólica à Coreia, a 18 de agosto de 2014.
Referindo-se aos conflitos violentos pelo orbe,
cunhou uma frase muito precisa: «Alguém me dizia:
Sabe, estamos na Terceira Guerra Mundial… mas por
partes». Um conceito do qual se convenceu tanto que
se converteu numa das suas maiores preocupações.
O conceito foi adquirindo conteúdo, com o
tempo. E marcou as prioridades do Papa. Pensar
na violência como resultado de alguns conflitos
longínquos é uma coisa, mas ligá-los todos num
movimento internacional de guerra outorga ao
problema características angustiantes. Desde há
algum tempo, o mesmo Francisco foi afinando
o seu diagnóstico. Chegou a modelar parte do
seu pensamento num dos capítulos de O Vídeo
do Papa, a iniciativa de clips virais criada pela
Rede Mundial de Oração dedicada a rezar pelas
intenções do pastor supremo da Igreja.
«É uma contradição absurda falar de paz, negociar
a paz e, ao mesmo tempo, promover ou permitir
o comércio de armas. Esta guerra de acolá, aquela
guerra dali, é, de verdade, uma guerra por problemas
ou é uma guerra comercial, para vender estas armas
no comércio ilegal e para que os negociantes da
morte enriqueçam?», disse, no vídeo. Com as suas
palavras, simples, pôs a nu um problema geopolítico
de alto impacto. Porque essa Terceira Guerra
Mundial de que ele fala alimenta-se a partir das altas
esferas do poder político e económico internacional.

janeiro 2018 | 17
«CREIO QUE HOJE O PECADO SE MANIFESTA, COM
TODA A SUA FORÇA DE DESTRUIÇÃO, NAS GUERRAS,
NAS DIVERSAS FORMAS DE VIOLÊNCIA E NO ABUSO,
NO ABANDONO DOS MAIS FRÁGEIS. O MUNDO DEVE
DETER OS SENHORES DA GUERRA. PORQUE SÃO SEMPRE
OS ÚLTIMOS, OS INDEFESOS, A PAGAR O PREÇO».

Poderes de facto que utilizam corredores comerciais


para fazer chegar instrumentos de morte até às
zonas do planeta arrasadas pelo terror, a violência
e os abusos. O Papa chama-lhes «traficantes Unidos e a Coreia do Norte.
de morte» e não retira o dedo desta tecla. Desde há semanas, Trump e
A estas personagens de rosto anónimo dedicou o líder coreano, Kim Jong-un,
múltiplas chamadas de atenção. No seguimento acham-se enredados num
dos atentados terroristas de 2016, em Bruxelas, desafio à distância que desperta
exclamou: «Pobres daqueles que compram as armas a preocupação dos principais
para destruir a fraternidade. Por detrás desse gesto, líderes mundiais. Francisco
há fabricantes e traficantes de armas que querem decidiu tomar posição, de
o sangue e não a paz, que querem a guerra e não forma indireta. Aproveitou a
a fraternidade. Dois gestos. A mesma coisa. Jesus mais recente celebração dos
lava os pés a Judas, que O vende por dinheiro». Fiéis Defuntos para enviar
No fim de contas, a violência, como opção do uma mensagem inequívoca. Na
ser humano. Judas escolheu vender Jesus. É o tarde do dia 2 de novembro,
pecado, que mora no coração do ser humano. Como visitou um cemitério que reúne
explicou Francisco, numa entrevista ao diário os restos mortais de soldados
italiano «La Repubblica»: «creio que hoje o pecado dos Estados Unidos caídos
se manifesta, com toda a sua força de destruição, na Segunda Guerra Mundial.
nas guerras, nas diversas formas de violência e no Primeiro, rezou em silêncio
abuso, no abandono dos mais frágeis. O mundo diante das cruzes brancas
deve deter os senhores da guerra. Porque são de mármore, erguidas sobre
sempre os últimos, os indefesos, a pagar o preço». os túmulos anónimos. Uma
Uma vez mais, aquelas declarações não foram imagem que deu a volta ao mundo. Depois, clamou:
casuais. Abriram a primeira página do matutino «As guerras só produzem cemitérios e morte».
mais lido da Itália, precisamente na Quinta-Feira Já no dia anterior, na festa de Todos os Santos,
Santa, dia 13 de abril deste ano de 2017. Um tinha improvisado perante uma multidão na Praça
dia de reflexão e silêncio para a Igreja. Quando de S. Pedro: «As guerras não produzem outra coisa
apareceram, pouca gente explicava os motivos que não seja cemitérios e morte, a nossa humanidade
pelos quais Francisco tinha decidido romper o parece não ter entendido ou não querer entender a
recolhimento próprio da Semana Maior para o lição». Em Nettuno, cemitério construído em honra
catolicismo com uma entrevista dedicada, quase por dos jovens que protagonizaram a contraofensiva
completo, a condenar a guerra. Mas, nesse mesmo aliada contra as forças nazis, em 1944, clamou:
dia, o governo dos Estados Unidos anunciava que «Nunca mais, a guerra! Nunca mais este massacre
lançara a sua mais poderosa bomba não nuclear inútil!». Porque «com a guerra, perde-se tudo».
contra um complexo de cavernas sob o controle do Mais tarde, reafirmou o conceito. Percorreu
grupo radical Estado Islâmico no Afeganistão. as Fossas Ardeatinas, as escavações onde foram
O Presidente Donald Trump, autodeclarado fuziladas 335 pessoas, entre civis e soldados
cristão, não havia respeitado nem sequer a italianos, às mãos das forças de Hitler, como
Semana Santa. Os ares de conflito ameaçavam represália pela morte de alguns soldados alemães.
o planeta. O Papa sentiu-se chamado a intervir. Depois de recordar as vítimas, escreveu no livro de
Como o fez também, mais recentemente, no honra do monumento, com a sua letra miúda: «São
meio duma escalada de tensão entre os Estados estes os frutos da guerra: ódio, morte, vingança…».

18 | Mensageiro
Assim, a agência Notimex recolheu, para ele,
33 opiniões e perguntas de mexicanos comuns.
Mensagens em vídeo que pude ver, numa tarde
de janeiro, na Casa Santa Marta, do Vaticano.
Uma boa parte dos interlocutores, em diferentes
localidades do território mexicano, lançaram-lhe
a mesma pergunta: Como alcançar a paz?

«A PAZ É UM TRABALHO ARTESANAL,


UM TRABALHO DE TODOS OS DIAS,
QUE SE AMASSA COM AS MÃOS.
DESDE O MODO COMO EDUCO UMA
CRIANÇA, ATÉ COMO ACARICIO UM
IDOSO, TUDO ISSO SÃO SEMENTES
DE PAZ. A PAZ NASCE DA TERNURA,
A PAZ NASCE DA COMPREENSÃO, A
PAZ NASCE OU FAZ-SE NO DIÁLOGO».

Depois de escutar as preocupações e angústias


da gente comum, deteve-se numa frase: «Que
nos traga um pouco de paz, dizia um de vós»,
replicou. E continuou: «A paz tem de ser trabalhada
todos os dias. Mais ainda, eu diria uma palavra
que parece uma contradição: a paz, é preciso
pelejar por ela todos os dias! Há que combater
todos os dias pela paz, não pela guerra! Semear
mansidão, entendimento, semear paz».
«Como se amassa a paz?», perguntou.
E deu ele próprio a resposta:
«Todos os dias se tem de pelejar pela paz» «A paz é um trabalho artesanal, um trabalho
de todos os dias, que se amassa com as mãos.
«Violência, corrupção, guerras, crianças que não Desde o modo como educo uma criança, até
podem ir à escola devido aos seus países estarem em como acaricio um idoso, tudo isso são sementes
guerra. Tráfico, fabricantes que vendem armas para de paz. A paz nasce da ternura, a paz nasce da
que as guerras no mundo possam continuar. É este compreensão, a paz nasce ou faz-se no diálogo.
o clima que hoje vivemos, e cada um de vós está a Não na rutura, e esta é a palavra-chave, o
viver o seu pedacito de “guerra”, de sofrimento, de diálogo: diálogo entre os dirigentes, diálogo
violência. Se vou aí, é para rezar convosco para que com o povo e diálogo entre todo o povo».
os problemas de violência se solucionem, porque Um discurso articulado. Simples mas
o México da violência não é o México que a nossa compreensível. Um bálsamo, para um país crispado,
mãe quer. (Quero) exortar-vos à luta de todos lesto para a acusação mútua e a desconfiança social:
os dias contra a corrupção, o tráfico, a guerra, a «Quantas vezes encontramos, numa briga de bairro,
desunião, o crime organizado, o tráfico de pessoas». a solução que nos parece ser a melhor? E não, essa
Uma descrição mais que gráfica sobre o impacto é uma pequena guerra. Mesmo no bairro, mesmo
dessa «guerra mundial em pedaços», oferecida por na família, buscar e fazer a paz, e isso faz-se com o
Francisco numa mensagem, direta e sem filtros, diálogo: estar aberto a falar com o outro, a escutar
aos mexicanos. Poucas semanas antes da sua as suas razões, a deixar-se corrigir». Instou a «não
visita, em fevereiro de 2016, aceitou entabular ter medo de escutar o outro» e a «ver que razões
um diálogo à distância com os fiéis do país. tem». Em seguida, lançou uma recomendação, quase

janeiro 2018 | 19
um conselho não pedido, mas necessário: «Por afastada da magreza protocolar e das discussões
favor, não entrar em nenhum enredo que, por ganhar meramente diplomáticas. Porque, segundo as
dinheiro, me escravize toda a vida numa guerra interior suas próprias palavras, para que reine a paz no
e me tire a liberdade, porque a paz dá liberdade. Vou mundo é necessário que reine no coração de cada
pedir à Virgem, juntamente convosco, que vos dê essa um. Contudo, os inimigos da harmonia habitam
paz, que a Senhora de Guadalupe vos conceda a paz no mesmo espaço vital: a prepotência, a soberba,
do coração, da família, da cidade e de todo o país». o egoísmo, a discriminação e a indiferença.
Lá, dirigindo-se a fiéis da rua, a jovens, idosos e Enquanto não se extirparem radicalmente das
mulheres, o pontífice valorizou a complexidade almas aflitas, será difícil – senão impossível – pensar
da sua mensagem de paz. Uma mensagem num planeta de equilíbrio e respeito mútuo.
granjeou-lhe problemas (e protestos acalorados)
A diplomacia dos pequenos passos entre os cristãos orientais da Ucrânia. O seu
aval a uma mesa de diálogo entre o oficialismo
«O trabalho do embaixador é um trabalho de e a oposição na Venezuela não ofereceu frutos,
pequenos passos, de pequenas coisas mas que gerando a perceção de que o presidente Nicolás
acabam sempre por fazer a paz, aproximar os Maduro o usou para se perpetuar no poder. Teve
corações dos povos, semear a fraternidade». de cancelar as suas desejadas viagens ao Sudão
Naquela manhã, via-se que Francisco estava do Sul e à República Democrática do Congo,
especialmente contente. Entusiasmado. Chegou perante a impossibilidade de conseguir diálogos
com um sorriso evidente à Sala Clementina do internos. Contudo, para lá das iniciativas falhadas,
Palácio Apostólico do Vaticano. Ali, falou pela jogou, em todo o tempo, a carta da paz. Fê-lo em
primeira vez da «diplomacia dos pequenos passos». primeira pessoa. Empenhou a sua palavra onde
Poucas horas antes, simultaneamente considerou que podia marcar a diferença.
desde Havana e Washington, anunciava-se o
descongelamento histórico entre Cuba e os A cultura do encontro como arma para a paz
Estados Unidos. Barack Obama e Raúl Castro
agradeciam ao Papa a valentia do primeiro passo. Foi nesses termos que Federico Lombardi, antigo
Uma grande vitória para a diplomacia vaticana. diretor da sala de imprensa do Vaticano, o explicou.
As suas gestões silenciosas tinham impulsionado Em finais de 2014, numa entrevista com o autor
uma aproximação histórica e ele sabia disso. Mas destas linhas, o sacerdote jesuíta destacou dois
nada tinha sido casual. A vontade dos presidentes aspetos relevantes do atual pontificado. Traços de
e dos seus interlocutores tinha colocado as bases enorme transcendência nessa batalha pessoal de
para uma reconciliação até então impensável. Francisco por promover a paz onde for preciso.
Essa jogada com êxito não foi a única intervenção «Advirto dois elementos-chave nesta presença
de Francisco no tabuleiro internacional. O Papa internacional da Santa Sé. Por um lado, existe
foi chave em não poucas latitudes do mundo. Fez uma grande autoridade moral do Papa, graças
pressão com força para evitar a invasão militar ao amplo seguimento e atenção popular que
dos Estados Unidos à Síria, em setembro de 2013, tem. Isto não é fruto de poderes ou propaganda,
e conseguiu-o. Para o obter, empregou, por igual, é fruto do seu carisma. Os líderes mundiais
as forças diplomáticas e espirituais. Convocou não podem ser indiferentes ao facto de o Papa
embaixadores, enviou gestores, chamou presidentes, se manifestar como uma personagem para
escreveu mensagens e organizou uma jornada de a qual os povos olham objetivamente com
oração na Praça de S. Pedro. Instou abertamente os esperança, com confiança, como uma pessoa
líderes mundiais a evitarem a todo o custo a opção credível», explicou a pessoa mais indicada para
militar e evitou assim uma campanha azarada dos opinar sobre este particular, alguém que, nesse
Estados Unidos. Mas não conseguiu solucionar a momento, funcionava como seu porta-voz.
crise síria. Até hoje, insiste nos apelos à pacificação, «Depois, lá está o seu dom de relação pessoal»,
num território vítima dos sanguinários terroristas. continuou Lombardi. Reconheceu que, no início
Outras intervenções se somaram à lista. Em do pontificado, não compreendia bem a entidade
maio de 2014, o líder católico conseguiu convocar do conceito «cultura do encontro», muito usado
os presidentes de Israel e da Palestina para uma já pelo Papa. Mas afirmou que, seguindo-o,
significativa jornada de oração no Vaticano, um compreendeu que essa ideia tem eficácia, seja a
encontro sem precedentes. Concretizou o ansiado nível dos líderes religiosos ou políticos que ele
abraço com o líder ortodoxo russo, o patriarca encontra, seja nas relações entre povos e nações.
de Moscovo, Cirilo II, em Havana. Restabeleceu «Existe nele algo característico que te envolve e
as relações rompidas entre a Igreja Católica e o põe na situação de empurrar mais um passo os
a universidade Al-Azhar do Cairo, cujo ímã é processos que amadureceram no tempo. O Papa é
considerado a referência máxima da comunidade um mobilizador de pessoas, envolve os líderes e
islâmica sunita no mundo. Favoreceu o acordo ajuda-os a dar passos novos. A diplomacia faz um
que acabou com uma sangrenta guerra civil na trabalho importante em matéria de aproximação
República Centro-Africana, coincidente com a entre os povos e as nações, mas não consegue fazer
sua viagem apostólica, em novembro de 2015. tudo, e o cume que permite alcançar resultados
Também teve tropeços. A sua simpatia novos é este salto pessoal, de valentia, que o Papa
aberta com o presidente russo Vladimir Putin sabe suscitar e tornar mais viva», refletiu.

janeiro 2018 | 21
os olhos no nosso mestre, Jesus? Ele foi o grande
Uma chave: a «não-violência» modelo da não-violência. Por que motivo isto
foi esquecido? Nós somos seus seguidores, que
A pergunta surge espontânea: Como plasmar razão temos para não podermos considerar a
uma alternativa realista a essa Guerra Mundial em não-violência cristã como um caminho?»
pedaços? O Papa já deu a resposta. Na sua Mensagem Um apelo bem claro nas palavras de Francisco.
por ocasião da Jornada Mundial da Paz, celebrada Uma mensagem que convida à reflexão. Escreveu-o
a 1 de janeiro de 2017, lançou o desafio. Propôs na citada Mensagem para a jornada pela paz.
a «não-violência» como «estilo da política» e como Uma missão que toca a todos. «É um desafio
«caminho para a paz, no presente e no futuro». para os líderes políticos e religiosos, para os
Explicou-o, com simplicidade, Peter Turkson, responsáveis das instituições internacionais
prefeito do Dicastério para o Serviço do e para os dirigentes das empresas e dos meios
Desenvolvimento Humano Integral, do Vaticano. de comunicação de todo o mundo: aplicar as
«Existem muitos ensinamentos da Igreja que bem-aventuranças no desempenho das suas próprias
são considerados utópicos, não realistas; nós responsabilidades. É o desafio de construir a
queremos demonstrar que esta não é uma utopia, sociedade, a comunidade ou a empresa de que são
é uma realidade que pode suceder. Talvez a única responsáveis com o estilo dos trabalhadores pela
solução para todas as manifestações de violência paz, de dar mostras de misericórdia, recusando
à nossa volta resida nisto, em demonstrar que descartar as pessoas, prejudicar o ambiente e
este caminho já foi seguido por outros. O motivo querer vencer a qualquer preço. A não-violência
é propor, sacudir a consciência da humanidade, ativa é uma maneira de mostrar verdadeiramente
deixar claro que não se necessita de armas para como, de verdade, a unidade é mais importante e
resolver os problemas», precisou, explicando a fecunda do que o conflito. Comprometamo-nos
este jornalista o alcance da proposta do Papa. com a nossa oração e ação a ser pessoas que
Não se trata de promover um pacifismo a afastem do seu coração, das suas palavras e dos
todo o transe. «Não temos nada a ver com isso», seus gestos a violência, e a construir comunidades
precisou o purpurado. E acrescentou: «Para nós, não violentas, que cuidem da casa comum. Nada
a estratégia é a cultura do encontro para buscar é impossível, se nos dirigimos a Deus com a nossa
a paz. Sendo cristãos, por que razão não pomos oração. Todos podemos ser artesãos da paz».

22 | Mensageiro
OPINIÃO

Há muitos anos
Isabel Figueiredo

" A sensibilidade de cada


crente é um tesouro
que só Deus conhece
de uma forma plena.

H
á muitos anos, fui convidada para todo o sentido. Mas a sensibilidade de cada um é um
conhecer uma pequena capela tesouro, só partilhado na intimidade da relação com
particular. Lembro-me da beleza Deus. E, nestas memórias que partilho, o que ainda
do espaço, do silêncio, das flores hoje me enche o coração é aquela pequena sala,
frescas. Tudo convidava ao recolhimento pobre, por onde o frio entrava e não nos deixava
e à oração. Nos bancos de madeira clara, tirar os casacos. Aquele chão que conhecia os nossos
pequenas almofadas tornavam mais suave joelhos, aquela parede branca que nos gritava a sede
o ajoelhar. Regressei a casa, agradecida pelo de Jesus na cruz. Ainda era escuro lá fora, ainda a
convite, mas pouco tocada no coração. cidade dormia, e a presença de Jesus ocupava todo o
Pela mesma altura, fazia voluntariado numa espaço, enchia os nossos corações de desejo de mais.
casa das Missionárias da Caridade. Uma vez por Também por ter vivido esta realidade, sinto-me
semana, acordava quase de madrugada, metia-me incapaz de aceitar pompas e circunstâncias à volta
no carro, atravessava a cidade e chegava a um da celebração do mistério da presença de Jesus no
bairro de prédios altos e, muitos deles, degradados. meio de nós. É verdade que mais de vinte séculos de
O dia começava com a celebração da Missa numa prática religiosa permitiram muitas sensibilidades,
das divisões da casa. Lembro-me de umas cortinas muitos quereres, muita teoria e muita prática. Mas
quase transparentes, que procuravam alguma como nos faz bem voltar à pureza dos começos, em
privacidade, do chão coberto com um tapete que os gestos e as palavras nos aproximam da pessoa
usado, da simplicidade do altar. Na parede, as de Jesus, que nos continua a convidar a olhar para
palavras pintadas à mão: «Tenho sede». Algumas a beleza dos lírios do campo. O mesmo Jesus cujo
flores, umas vezes mais murchas, outras menos. As nascimento acabámos de celebrar e que nos revelou
Irmãs, sentadas no chão, convidavam-nos à mesma a simplicidade de ser recostado numa manjedoura
humildade e alguns de nós também escolhíamos e a companhia dos mais pobres, os pastores.
o chão para um tempo de recolhimento. O A sensibilidade de cada crente é um tesouro
único barulho que se ouvia era a tosse de alguns que só Deus conhece de uma forma plena. Mas
idosos, deitados a poucos metros. No fim da continuo convicta de que procurar ser testemunha
celebração, começava o dia de trabalho, o tratar deste Jesus, que conhecemos e reconhecemos
dos doentes, o servir os pequenos-almoços, a na leitura dos Evangelhos, implica saber
vida normal de quem escolhe servir os pobres. valorizar a beleza dos lírios e saber reconhecer
Tudo isto me veio à memória recentemente. O a dignidade dos mais pobres. Pressinto que o
cuidado e a beleza que se colocam na celebração da ouro e a prata, por mais belos que possam ser
Missa só nos pode agradar porque dar o melhor que e parecer, ficam do lado de fora daquela porta
temos e somos a Jesus, no mistério da Eucaristia, faz estreita por onde todos queremos entrar.

janeiro 2018 | 23
LECTIO DIVINA

PALAVRA DE
DEUS PARA A VIDA
Manuel Morujão, s.j.

1. Apresentação 3. Ler/proclamar a Palavra


que Deus me/nos dirige hoje (Mateus 2, 1-12)
Estamos entrando num novo ano, que Deus nos
dá para em tudo amar e servir. A Palavra de
Deus, contida nos livros da Sagrada Escritura, é Tendo Jesus nascido em Belém da Judeia, no
como o mapa ou GPS para acertarmos os nossos tempo do rei Herodes, chegaram a Jerusalém uns
passos pelos caminhos da nossa vida quotidiana. magos vindos do Oriente. E perguntaram: «Onde
Propomos, portanto, que este tempo de oração, está o rei dos judeus que acaba de nascer? Vimos
individual ou em grupo, seja centrado na a sua estrela no Oriente e viemos adorá-Lo.» Ao
Palavra de Deus. Como regra geral, escolheremos ouvir tal notícia, o rei Herodes perturbou-se e toda
o Evangelho do 1.º domingo de cada mês, a Jerusalém com ele. E, reunindo todos os sumos
como ponto de partida, seguindo o método da sacerdotes e escribas do povo, perguntou-lhes onde
«Lectio Divina», de um modo simplificado. devia nascer o Messias. Eles responderam: «Em
É aconselhável dar ocasião à partilha das Belém da Judeia, pois assim foi escrito pelo profeta:
ressonâncias da Palavra de Deus nos membros E tu, Belém, terra de Judá, de modo nenhum és a
do grupo. Tal poderá acontecer no seguimento menor entre as principais cidades da Judeia; porque
do n. 5. Terminaremos recordando a intenção de ti vai sair o Príncipe que há de apascentar o meu
do Santo Padre Francisco para cada mês, como povo de Israel». Então Herodes mandou chamar
Rede Mundial de Oração do Papa (Apostolado da secretamente os magos e pediu-lhes informações
Oração ou qualquer outro grupo ou movimento). exatas sobre a data em que a estrela lhes tinha
aparecido. E, enviando-os a Belém, disse-lhes: «Ide
e informai-vos cuidadosamente acerca do Menino;
e, depois de O encontrardes, vinde comunicar-mo
2. Oração inicial para eu ir também prestar-Lhe homenagem».
Depois de ter ouvido o rei, os magos puseram-se a
Rezemos com Santa Isabel da Trindade: «Ó caminho. E a estrela que tinham visto no Oriente
Verbo eterno, Palavra do meu Deus, quero passar ia adiante deles, até que, chegando ao lugar onde
a minha vida a escutar-Vos. Quero fazer-me toda estava o Menino, parou. Ao ver a estrela, sentiram
docilidade para aprender tudo de Vós. Passando imensa alegria; e, entrando na casa, viram o
através de todas as noites, todos os vazios, todas Menino com Maria, sua mãe. Prostrando-se,
as incapacidades, quero fixar-me sempre em adoraram-No; e, abrindo os cofres, ofereceram-Lhe
Vós e permanecer sob a vossa grande luz». presentes: ouro, incenso e mirra. Avisados em
Ámen. sonhos para não voltarem junto de Herodes,
regressaram ao seu país por outro caminho.

24 | Mensageiro
4. Meditar a Palavra,
facilitando que Deus visite a minha/nossa vida

Façamos um tempo de silêncio, não só de pessoal, familiar, paroquial, de movimento ou grupo?


ruídos e palavras, mas um silêncio interior que Regressar por outro caminho: os Magos, ao
crie recolhimento no nosso coração, inteligência, regressarem à sua terra, não passaram por Herodes,
imaginação e sentidos, deixando a porta aberta que desejava informações para poder matar Jesus,
para Deus entrar e se nos comunicar. mas seguiram por outro caminho. No começo
Meditemos sobre o simbolismo da estrela, que deste novo ano, não estará Deus a sugerir-me
é o próprio Cristo, que se autodefiniu como fonte para mudar alguma rotina ou hábito menos bom?
de luz: «Eu sou a luz do mundo. Quem Me segue Será fonte de alegria e paz que todos regressemos
não anda nas trevas, mas terá a luz da vida». Cristo por um caminho melhor, sempre orientados
pediu-nos para sermos luz nas trevas do mundo por Jesus, nosso «caminho, verdade e vida».
que nos rodeia: «Vós sois a luz do mundo».
Como aos Magos, é-nos pedido para estarmos
atentos aos sinais de Deus e, saindo do conforto
6. Intenção do Papa Francisco
em que facilmente nos instalamos, partirmos para o mês de janeiro de 2018
à procura de Cristo que nasce nos irmãos que
precisam de nós, nas periferias de todos os Beléns. Unamo-nos à intenção do Pastor da Igreja
Nem sempre vivemos com a claridade das universal: «Para que, nos países asiáticos, os
certezas e seguranças e temos de procurar cristãos, bem como as outras minorias religiosas,
quem nos oriente, atualizando a experiência possam viver a sua fé com toda a liberdade».
que fizeram os Magos em Jerusalém. Pedir Rezemos, em exame de consciência, para que
ajuda exige humildade, pois ninguém é promovamos à nossa volta um clima de liberdade,
autossuficiente e todos precisamos dos outros. respeitando a todos, sobretudo os que não pensam
como nós nem vivem segundo os nossos valores.

5. Discernir para agir


segundo a Palavra de Deus Oração comunitária
Como afirma a Carta aos Hebreus, «a palavra Pode encontrar esta secção, escrita pelo
de Deus é viva, eficaz e mais afiada que uma padre Dário Pedroso, s.j. no site da Rede
espada de dois gumes; penetra até à divisão Mundial de Oração do Papa - Portugal.
da alma e do corpo, das articulações e das É uma proposta de oração para
medulas, e discerne os sentimentos e intenções uma Hora Santa, tendo presente a
do coração» (4, 12). Ler e meditar a Palavra de
Deus deve ser caminho para agir consoante. Intenção mensal do Santo Padre.
Que interpelações Deus hoje me dirige pela sua
Palavra proclamada e meditada? O Deus, que Se www.redemundialdeoracaodopapa.pt
revelou aos Magos por sinais, é o mesmo Deus
que agora me está interpelando a segui-Lo, com
mais convicção, confiança e generosidade.
O que é que atualmente me impede de partir em
direção a Cristo, luz da minha vida e de todo o mundo?
Rotina, preguiça, ativismo, afetos desordenados?
Os Magos reconheceram a Deus na simplicidade
de um menino pobre. Abro os olhos da fé para
reconhecer a presença efetiva de Deus na pessoa
dos pobres e humildes, doentes e frágeis?
Os Magos ofereceram presentes de valor. Que
presentes deseja Jesus que Lhe ofereça, a meu nível

janeiro 2018 | 25
O QUE É A
REDE MUNDIAL
DE ORAÇÃO DO PAPA?
A Rede Mundial de Oração do Papa (RMOP) é um Serviço Pontifício
confiado à Companhia de Jesus, com um Diretor Mundial nomeado pelo
Santo Padre. Tem como missão sensibilizar e mobilizar os cristãos, a
partir de uma relação pessoal com Jesus, e todos os homens e mulheres
de boa vontade, para os desafios do mundo e da missão da Igreja que
o Santo Padre expressa nas suas intenções mensais de oração.

JUNTOS A TRANSFORMAR O MUNDO


WWW.REDEMUNDIALDEORACAODOPAPA.PT
NOTÍCIAS

CENTROS JUBILARES EM 2018

Com uma profunda ligação Diocese de Lamego – São Cipriano Diocese de Bragança-Miranda –
espiritual ao Coração de Jesus, os (Resende); Paradela (Tabuaço). Gondesende (Bragança); Azinhoso
Centros do Apostolado da Oração (Mogadouro); Vale de Frades
(A.O.) promovem nas comunidades Diocese de Leiria-Fátima – Souto (Vimioso).
esta espiritualidade através do culto da Carpalhosa (Monte Real) – celebra
eucarístico e outras manifestações o seu restauro. Diocese de Coimbra – Alfarelos
de fé. Além de viver esta dimensão (Alfarelos e Soure); Pussos
comunitária, os seus elementos Diocese do Porto – Aião (Alvaiázere); São Pedro do Rego
cultivam uma disponibilidade (Felgueiras); Silvares (Lousada); da Murta (Alvaiázere); Lagarteira
interior para fazer a vontade de Louredo (Paredes); Guidões (Trofa); (Ansião e Cinco Vilas); Cantanhede
Deus no dia a dia, através da oração, Maureles (Marco de Canaveses); (Cantanhede); São Bartolomeu (Zona
concretizada de modo particular no Fornos (Marco de Canaveses); Sande Urbana); Pala (Mortágua); Oliveira
oferecimento do dia, em união com (Amarante). do Hospital (Oliveira do Hospital);
a Intenção do Papa para cada mês. Redinha (Pombal); Almaça (São
Diocese de Viana do Castelo – Martinho da Cortiça); Carapinha
CENTROS DO A.O. FUNDADOS EM Portela (Arcos de Valdevez). (São Martinho da Cortiça).
1893, QUE CELEBRAM 125 ANOS
EM 2018 Diocese de Vila Real – Vilar de Diocese da Guarda – Bismula
Ferreiros (Baixo Tâmega); Abaças (Sabugal); Vilar Maior (Sabugal);
Diocese do Algarve – Fuzeta (Centro 1); Justes (Centro 1); Fontes Várzea de Meruje (Seia); Guilheiro
(Faro). (Douro 1); Loureiro (Douro 1). (Trancoso).

Diocese de Angra do Heroísmo Diocese de Viseu – Carraposa Diocese de Lamego – Vila Seca
– Salão (Faial); Calheta de Nesquim (Besteiros); Castelões (Besteiros); (Armamar).
(Lajes); Santo Amaro (São Roque); Alcafache (Mangualde).
Santo António (Velas); Praia da Patriarcado de Lisboa – São
Vitória (Vitória); Vila Nova (Vitória). CENTROS DO A.O. FUNDADOS EM Domingos de Rana (Cascais).
1918, QUE CELEBRAM 100 ANOS
Arquidiocese de Braga – Agilde EM 2018 Diocese do Porto – Refojos (Santo
(Celorico de Basto); Ribas (Celorico Tirso); Perafita (Matosinhos);
de Basto). Arquidiocese de Braga – Valadares (V. N. Gaia) Lufrei
Barcelinhos – São Martinho (Amarante) – celebra o seu restauro;
Diocese de Bragança-Miranda (Barcelos); Barcelinhos – Santo Arouca (Arouca).
– Eucísia (Alfândega da Fé); Pinhal André (Barcelos); Alvite (Cabeceiras
do Douro (Carrazeda de Ansiães); de Basto); Rio Douro (Cabeceiras Diocese de Viana do Castelo –
Castelãos (Macedo de Cavaleiros). de Basto); Fornelos – Santa Comba Távora (Arcos de Valdevez); Paderne
(Fafe); Briteiros – Santo Estêvão (Melgaço).
Diocese de Coimbra – Febres (Guimarães e Vizela); Fermentões
(Cantanhede). (Guimarães e Vizela); Urgeses Diocese de Vila Real – Soutelo
(Guimarães e Vizela); Cabeçudos (V. (Alto Tâmega); Limões (Baixo
Diocese da Guarda – Barco N. Famalicão). Tâmega) – celebra o seu restauro;
(Covilhã); Alvoco da Serra (Seia). Vales (Valpaços).

janeiro 2018 | 27
Diocese de Viseu – Figueiredo das Diocese da Guarda – Reboleiro (Porto cidade).
Donas (Vouzela). (Trancoso).
Diocese de Setúbal – Alhos Vedros
CENTROS DO A.O. FUNDADOS EM Patriarcado de Lisboa – Alcoentre (Barreiro-Moita).
1943, QUE CELEBRAM 75 ANOS EM (Vila Franca de Xira).
2018 Diocese de Vila Real – São
Diocese do Porto – Vila Fria Mamede de Riba Tua (Douro II).
(Felgueiras); Igreja da Trindade

VIVÊNCIAS DOS CENTROS DO A.O.


PARTILHADAS NO ENCONTRO NACIONAL

Partilha e troca de experiências Centros. Neste contexto, para além Revista Mensageiro, os Bilhetes
foram as tónicas dominantes do da diversidade de atividades nas Mensais Oração e Vida, o site e as
Encontro Nacional do Apostolado reuniões de grupo e celebrações da iniciativas Click To Pray, O Vídeo
da Oração (A.O.), que se realizou Primeira Sexta-Feira, chamaram do Papa e Passo-a-Rezar.
em Fátima, de 24 a 26 de novembro a atenção as festas do Coração No final do Encontro, foi
de 2017. Dirigido a responsáveis de de Jesus, os momentos de oração unânime a opinião do grupo no
equipas diocesanas e zeladores, o nas paróquias, a visita a doentes sentido de ser necessário conti-
Encontro congregou, na Casa Nossa e idosos, mas especialmente as nuar com este tipo de encontros,
Senhora do Carmo, 120 pessoas, iniciativas que se desenvolvem considerados muito proveitosos
vindas de todas as dioceses do país. com crianças, na catequese, e nos para o entusiasmo e renovação
A iniciativa pretendeu propor- grupos de jovens, em particular nos dos Centros, apresentando aspetos
cionar aos participantes a oportu- grupos do Movimento Eucarístico práticos que poderão dinamizar
nidade de partilharem entre si os Juvenil da Diocese de Bragança- mais estes mesmos Centros.
trabalhos e atividades dos Centros, -Miranda. Apesar das dificuldades sentidas,
o modo como os mesmos estão a Os trabalhos foram orientados os participantes saíram deste
ser dinamizados, as dificuldades pelo secretário nacional do Apos- Encontro com a consciência que
sentidas e algumas sugestões para tolado da Oração, P. António o Apostolado da Oração tem
melhorar e dinamizar a vida do Valério, s.j., que apontou os aspetos caminho a fazer e que é um movi-
A.O. em Portugal. centrais da espiritualidade do A.O. mento essencial na vida das comu-
Os participantes destacaram o e os desafios atuais da sua missão, nidades, desejando estar mais ao
grande fruto que retiraram deste integrado na Rede Mundial de serviço da oração e da colaboração
momento de partilha, primeiro Oração do Papa. Também dedicou com os seus párocos.
em pequenos grupos, e depois num bastante tempo a explicar aos Da parte do SNAO foi também
plenário, em que foram apresen- presentes os materiais que o Secre- uma oportunidade de recolher
tadas as conclusões e vários exem- tariado Nacional do Apostolado da muitas sugestões para o apoio à
plos de atividades e iniciativas Oração (SNAO) disponibiliza para vida do Apostolado da Oração nas
inspiradoras desenvolvidas nos a vida dos Centros, em especial a Dioceses.

28 | Mensageiro
PAPA QUER PACTOS GLOBAIS
EM DEFESA DOS MIGRANTES E REFUGIADOS
Na Mensagem para o Dia Mundial
da Paz 2018, o Papa Francisco diz
esperar que, precisamente este
ano, as Nações Unidas definam
e aprovem um pacto global para
migrações seguras, ordenadas e
regulares, e um outro pacto refe-
rente aos refugiados.
«Enquanto acordos partilhados
a nível global, estes pactos repre-
sentarão um quadro de referência
para propostas políticas e medidas
práticas», afirma o Santo Padre,
que entende que estes pactos
devem ser «inspirados por senti-
mentos de compaixão, clarivi-
dência e coragem, de modo a apro-
veitar todas as ocasiões para fazer
avançar a construção da paz». No
entender de Francisco, «só assim
o necessário realismo da política
internacional não se tornará uma
capitulação ao cinismo e à globali- ções, entende o Sumo Pontífice, bloqueadas ou demasiado lentas».
zação da indiferença». «pretendem expressar o interesse Francisco lembra que há quem
A Mensagem para o 51.º Dia da Igreja Católica pelo processo entenda as migrações globais como
Mundial da Paz, que se assinala que levará à adoção dos referidos uma ameaça. «Eu, pelo contrário,
a 1 de janeiro de 2018, refere que pactos globais das Nações Unidas. convido-vos a vê-las com um olhar
«o diálogo e a coordenação consti- Um tal interesse confirma uma repleto de confiança, como opor-
tuem uma necessidade e um dever vez mais a solicitude pastoral que tunidade para construir um futuro
próprio da comunidade interna- nasceu com a Igreja e tem conti- de paz».
cional». Na opinião de Francisco, nuado em muitas das suas obras Os migrantes e refugiados
«é possível também que países até aos nossos dias», acrescenta. «trazem uma bagagem feita de
menos ricos possam acolher um Francisco recorda, na Mensagem, coragem, capacidades, energias e
número maior de refugiados ou os mais de 250 milhões de aspirações, para além dos tesouros
acolhê-los melhor, se a cooperação migrantes no mundo, dos quais das suas culturas nativas, e deste
internacional lhes disponibilizar 22 milhões e meio são refugiados, modo enriquecem a vida das
os fundos necessários». e afirma que os conflitos armados nações que os acolhem».
O Papa aponta o contributo da e outras formas de violência Na Mensagem, o Papa refere que
Secção Migrantes e Refugiados do organizada «continuam a provocar oferecer a requerentes de asilo,
Dicastério para o Serviço do Desen- deslocações de populações no refugiados, migrantes e vítimas
volvimento Humano Integral, que interior das fronteiras nacionais e de tráfico humano a possibilidade
sugeriu «20 pontos de ação como para além delas». de encontrar a paz de que andam à
pistas concretas» para a imple- E se a «maioria migra seguindo procura, «exige uma estratégia que
mentação de políticas públicas e um percurso legal», há quem siga combine quatro ações: acolher,
para a conduta e ação das comuni- «outros caminhos, sobretudo por proteger, promover e integrar».
dades cristãs, que visem o apoio a causa do desespero, quando a «Acolher» apela «à exigência
requerentes de asilo, refugiados, pátria não lhes oferece segurança de ampliar as possibilidades de
migrantes e vítimas de tráfico nem oportunidades, e todas as entrada legal, de não repelir refu-
humano. Estas e outras contribui- vias legais parecem impraticáveis, giados e migrantes para lugares

janeiro 2018 | 29
onde os aguardam perseguições e migrantes e refugiados», nomeada- Estes quatro pilares estão no
violências, e de equilibrar a preo- mente «a importância de assegurar cerne da Mensagem que o Papa
cupação pela segurança nacional às crianças e aos jovens o acesso Francisco escreveu para o Dia
com a tutela dos direitos humanos a todos os níveis de instrução». Mundial do Migrante e do Refu-
fundamentais». «Proteger» recorda «Integrar» passa por «permitir que giado, que se celebra a 14 de janeiro.
o dever de reconhecer e tutelar refugiados e migrantes participem Acolher, proteger, promover e
a dignidade inviolável de quem plenamente na vida da sociedade integrar deve ser a resposta dada
foge de um perigo real «em busca que os acolhe, numa dinâmica de à «triste situação» de quem foge
de asilo e segurança, de impedir mútuo enriquecimento e fecunda «das guerras, das perseguições, dos
a sua exploração». «Promover» colaboração na promoção do desastres naturais e da pobreza».
refere-se «ao apoio para o desen- desenvolvimento humano inte-
volvimento humano integral de gral das comunidades locais».

Encontro diocesano
congregou mais de 300 pessoas
APOSTOLADO DA ORAÇÃO DO PORTO
REFLETE SOBRE A CARIDADE
A caridade foi o assunto em programa para a diocese, sob o conferência da parte da tarde.
destaque no Encontro Diocesano lema “Movidos pelo amor de Deus”. O programa terminou com a cele-
do Apostolado da Oração do Porto, O encontro de oração e reflexão, bração da Eucaristia.
que se realizou a 18 de novembro aberto a todos os membros do O padre Dário Pedroso expôs o
do ano passado, no Centro Dioce- Apostolado da Oração e a todos tema com muita profundidade,
sano do Vilar. Neste contexto, os aqueles que participam na Rede articulando-o com o primeiro Dia
mais de 300 participantes, prove- Mundial de Oração do Papa, Mundial dos Pobres, proposto pelo
nientes de 47 paróquias, anali- foi orientado pelo padre Dário Papa Francisco, que se celebrava
saram os temas “Anunciar a cari- Pedroso, sj. Durante a manhã no dia seguinte. Os participantes
dade”, “Viver da caridade”, “Viver realizaram-se duas conferências, ficaram verdadeiramente moti-
a caridade” e “Viver em caridade”. seguindo-se um tempo forte de vados para o exercício da caridade
Os trabalhos basearam-se no Adoração ao Santíssimo e uma aos mais diferentes níveis.

ESTIMADO ASSINANTE:

Antes de mais, agradecemos a preferência que tem


manifestado pela revista Mensageiro.

Aproveitamos para informar que o pagamento da


assinatura referente a 2018 deve ser feito até 30 de abril.
O valor é o mesmo do ano transato.

Pode fazer o pagamento por cheque, vale postal ou


transferência bancária (para a conta indicada no verso da
capa da revista). Agradecemos que nos comunique, pelo
telefone 253 689 442, através do email revistas@snao.pt, ou
por carta a realização da respetiva transferência bancária.

A Administração

30 | Mensageiro
EU RECOMENDO...

Escravo
dos Escravos
Pedro Miguel Lamet Jorge Teixeira
Assistente Social

A história deste livro começa em Espanha, em finais do século XVI,


com o nascimento de uma criança como as outras: Pedro Claver.
Cedo se vislumbra que será uma história arrebatadora, pelos desafios
que se vão colocando à alma do jovem Pedro e pelas respostas que este
vai dando, na fidelidade a Jesus Cristo, por quem se apaixona, e no
caminho de correspondência à vocação que Santo Inácio lhe inspira.
Este é um livro de descobertas. Numa época marcada pelos Descobrimentos
e Expansão Ultramarina, Pedro vai fazendo grandes e profundas descobertas
na sua vida. A maior descoberta de todas é a da amizade que Deus lhe
tem e à qual Pedro se esforça por corresponder com amor igual.
Em Palma de Maiorca, Pedro descobre também o valor divino da
amizade humana. Com o jesuíta Afonso Rodrigues, humilde porteiro,
Pedro cresce na vida interior ao ver como Deus Se materializa na
vida deste venerando ancião, que vive contínua e intimamente na sua
presença. Pedro guardará gratamente para sempre na sua alma a amizade
deste santo homem, que considera seu Mestre e Amigo no Senhor.
Pedro continua o seu caminho e as suas descobertas, e nós, através dele,
vamos também descobrindo Deus e os seus rostos. Em Cartagena das Índias, na
atual Colômbia, com o P. Afonso de Sandovál, outro Amigo no Senhor, Pedro
descobre Cristo presente nos pobres e nos pobres dos mais pobres: os escravos.
«... há um sinal que Mas não se deixe enganar por este relato breve e simplista! Este é um livro bem
duro e profundo! Com Pedro descemos aos porões fétidos dos navios negreiros,
nunca deve faltar: a cheiramos a podridão e a imundície dos corpos acamados na longa e dura viagem
opção pelos últimos, desde as costas africanas. Com Pedro vencemos a nossa natural repugnância
por aqueles que a diante do espetáculo hediondo causado pela maldade humana e descobrimos
naqueles pobres, doentes, moribundos abandonados a doçura da presença do
sociedade descarta próprio Cristo. Pedro desce e mergulha nas periferias mais longínquas da vida,
e lança fora» numa época em que grande parte questiona a natureza humana dos escravos,
escória da humanidade, animais sem alma nem dignidade, potentes máquinas
(Papa Francisco de trabalho. E aí, no convés de cada barco, nas imundas barracas dos leprosos,
in Evangelii gaudium) nos cárceres e nos hospícios, Pedro toca e beija Cristo encarnado nos pobres
dos mais pobres. Aí Pedro transfigura-se e diviniza-se. Aí Pedro vai deixando
uma marca divina misturada com incompreensões , calúnias e perseguições.
Preços: Portugal – 8,35€ Vale a pena ler esta fantástica vida que o escritor Pedro Miguel Lamet
Europa – 9,90€ | Fora da Europa – 12,00€ tão bem soube trazer até aos nossos dias. Penso que ninguém sairá
Portes de correio incluídos nos preços. indiferente desta leitura. Depois desta leitura, Pedro Claver continua a
Envio feito mediante pagamento prévio. interpelar-nos para que descubramos, nos dias de hoje, esse Cristo sofredor
com quem nos cruzamos nos pobres e nos escravos dos nossos dias!
Pedidos: Secretariado Nacional do A.O.
Rua S. Barnabé, 32 – 4710-309 Braga; «Deriva da nossa fé em Cristo, que Se fez pobre e sempre Se aproximou dos
livros@snao.pt; pobres e marginalizados, a preocupação pelo desenvolvimento integral dos
www.livraria.apostoladodaoracao.pt mais abandonados da sociedade» (Papa Francisco in Evangelii gaudium).

janeiro 2018 | 31
HUMANIZAR-ME

Qual o tom do…


Racismo?
Constante Silva Rodrigues
Técnico Social – Coordenador de Serviço:
Mediateca, Salas de Estudo, Formação
Centro Social da Musgueira

A
o minuto 55 daquela película, entra-me
pelo corpo um sibilino cantar em latim
de uma criança com timbre seráfico que
me extasia e me deixa perplexo. Parece
que estou numa qualquer sala de espetáculos ou
numa catedral onde a acústica nos envolve e penetra
ascensionalmente a existência. Esta audiência a
que assisto no meu sofá é tudo menos musical… é razões para o efeito. Aquilo que é ou não a
sim uma outra música. Esta audição do pequeno realidade dos factos encontra no emissor um novo
cantor é antes uma audiência de julgamento. Mas enquadramento e uma perspetiva que lhe pode
o que é que se julga ali? Capacidades canoras? A conferir a devida consonância cognitiva. Assim
entrada num fantástico grupo coral? A admissão sendo, poderemos procurar outras abordagens,
a algum prestigiado conservatório de música? além da cognitiva, que a completem e reforcem.
Tudo isto era possível, mas não. O que ali se julga Recentemente, numa entrevista publicada
é se aquela criança, com aquela competência no caderno de domingo P2 do jornal Público, o
canora, entre outras não visíveis, é ou não um neurocientista António Damásio alertou-nos para
ser humano. Claro que estava muito mais em uma realidade que, por vezes, parece que desejamos
julgamento que a eventual humanidade daquele esquecer: «a ideia de que somos capazes de violência.
tenor. Creio que por esta altura já os mais cinéfilos E há uma ideia que é consequente a essa e tem a ver
identificaram o frame do filme «A Missão», com a educação, com o facto de que a única maneira
de Roland Joffé, a que me estou a referir. de resolver o problema da nossa violência natural e
Este episódio apresenta uma tensão brutal, de como naturalmente as pessoas querem estar com
além de tudo aquilo que estava ali em jogo e em aqueles que são parecidos e não com os diferentes».
decisão. Uma incomensurável estética auditiva Temos uma forte apetência e atração para o
é rasgada pela singeleza e crueza do cenário e a que nos é conhecido, nos é familiar e próximo.
complexidade melódica do trecho musical é despida Gostamos de estar com os que fazem parte da nossa
pela nudez do índio guarani que a interpreta, ainda história há longo tempo, demoramos a criar novos
com muito tenra idade. Esgrimem-se argumentos relacionamentos, à medida que avançamos nos
sobre a humanidade daquela criança índia perante solstícios da vida. Incentivamos as nossas crianças
tão impressionante atuação e contrapõe-se que a manterem-se em grupos em que conhecemos os
também os animais podem ser ensinados e assim pais, ou então que não saiam muito dos universos
por diante… E naquele processo argumentativo e por onde gravitamos. Este comportamento é
contra-argumentativo, vale muita coisa. Quando válido, legítimo, racional e saudável. No entanto,
queremos realmente argumentar sobre algum como nos treinamos e treinamos os outros que
assunto que nos é muito importante e sobre o dependem de nós para o que é diferente?
qual temos muito interesse, o ser humano é capaz O neurocientista propõe um «plano de educação
de encontrar muitas “lógicas” e até científicas extraordinário, uma espécie de superplano de

32 | Mensageiro
investimento global». Embora não chegue a
concretizar estratégias específicas, faz referências

"
a algumas experiências na história recente
que lhe pareceram positivas no esforço de
compreender o que é diferente de nós. Contudo,
a mim o que me interessa realçar é a abordagem
Incentivamos as nossas proposta perante o desafio em questão da atração
para o que nos é semelhante e a repulsa para o
crianças a manterem-se em que nos é diferente e a nossa capacidade para a
violência. EDUCAÇÃO!!! E mais educação.
grupos em que conhecemos A Educação como instrumento e estratégia
de combate à violência só seria uma novidade
os pais, ou então que não se para alguém fosse uma novidade. Mas então
que NOVIDADE proponho eu neste artigo, após
saiam muito dos universos tantas palavras e redundâncias? Proponho a
novidade que há tantos milhares de anos se faz
por onde gravitamos. e tão bons resultados teve e continua a ter: a
«educação» com e nas relações interpessoais.
Este comportamento é Na minha atividade profissional, lido
diariamente com jovens e adolescentes de várias
válido, legítimo, racional e origens e contextos, sejam eles e elas quais forem.
Na interação que estabelecem diariamente uns com
saudável. No entanto, como os outros, a intolerância e desconfiança só existem
enquanto o outro é um anónimo e o caminho
nos treinamos e treinamos das relações interpessoais está no seu debute.
Quando o outro tem um rosto, um olhar, um jeito,
os outros que dependem de uma manha e sabe-se lá mais o quê, muitas das
denominações linguísticas, genéticas, sociométricas
nós para o que é diferente? e afins, mais não são do que dissonantes acordes
numa orquestra social onde o tom que rege a
pauta das nossas relações é o Fa_mília comum!

janeiro 2018 | 33
Pack 2018

Calendário
Agenda Litúrgica
Evangelho Diário
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os portes de correio são oferecidos.

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Pode também Agenda Litúrgica Calendário Evangelho Diário


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Portes de Correio incluídos nos preços. Envio feito mediante pagamento prévio.
Pedidos: Secretariado Nacional do A.O. Rua de S. Barnabé, 32 – 4710-309 Braga | livros@snao.pt | www.livraria.apostoladodaoracao.pt
ATIVIDADES INACIANAS janeiro
Em Soutelo (Vila Verde): CEC – Casa da Torre
Av. dos Viscondes da Torre, 80 – 4730‑570 SOUTELO – Tel. 253 310 400; Email: casadatorre@jesuitas.pt

04-07 jan. Exercícios Espirituais – P. José Frazão Correia


07 jan. Exercícios Espirituais na Vida Corrente (em colaboração com CVX e ACI)
11-14 jan. Exercícios Espirituais – P. Pedro Cameira
18-21 jan. Exercícios Espirituais – P. José Carlos Belchior
18-26 jan. Exercícios Espirituais – P. Mário Garcia
25-28 jan. Exercícios Espirituais – P. Nuno Branco
25-28 jan. Exercícios Espirituais “pé-descalço” [inscrições no CREU] – P. Luís Ferreira do Amaral
26-28 jan. Discernir a vontade de Deus – Margarida Corsino e P. Bruno Nobre
27 jan. História da Salvação I – Abraão e eu – Mariana Abranches Pinto e Mariana Rozeira
Em Braga: CAB – Centro Académico de Braga
Praça da Faculdade de Filosofia, 16 – 4710 297 BRAGA – Tel. 253 215 592; Email: cab.webmail@gmail.com

16 jan. CABaqueira
27 jan. Atividade K – Um Deus que te conhece
28 jan. CABaqueira em família

No Porto: CREU – Centro de Reflexão e Encontro Universitário Inácio de Loyola


R. Oliveira Monteiro, 562 – 4050-440 PORTO– Tel. 226 061 410; Email: secretaria@creu.pt

8 jan. Catequese de Adultos – O Getsémani e o Abandono de Deus


9 jan. U CAT – Formação Católica para Universitários (Ciclo de Cristologia)
11 jan. Noite QB – Reconhecer-se na graça do Encontro
13 jan. Refletir com Arte – Visita ao Museu Soares dos Reis
16-18 jan. Noites da Social – Estudo/Debate sobre a Doutrina Social da Igreja
22 jan. Catequese de Adultos – A Prisão, o Julgamento, as Testemunhas, a Sentença
23 jan. U CAT – Formação Católica para Universitários (Ciclo de Cristologia)
25 jan. Hoje há scones – Dinâmica à hora do lanche
26-28 jan. Café – Curso de Aprofundamento da Fé – P. Carlos Carneiro
29 jan. Catequese de Adultos – O Caminho do Calvário e as feridas do Rei Crucificado

Em Coimbra: CUMN – Centro Universitário Manuel da Nóbrega


R. Almeida Garrett, 4 – 3000-021 COIMBRA – Tel. 239 829 712; Email: cumn@cumn.pt

12 jan. Adoração Mensal


16 jan. Noite 4 Estações

Em Lisboa: CUPAV – Centro Universitário Padre António Vieira


Estrada da Torre, 26 – 1769-014 LISBOA – Tel. 217 590 516; Email: info@cupav.pt

16 jan. O que é o Eneagrama? Uma noite para explicar esta dinâmica – P. Gonçalo Eiró
17 jan. Catequese para adultos S 6 – P. Vasco Pinto de Magalhães
19-21 jan. Fim de Semana para Noivos – P. Carlos Azevedo Mendes e grupo de casais
24 jan. Encontro Mensal – Igreja: A casa dos puros? A mesma história de sempre... – P. António Júlio Trigueiros
25 jan. Encontro Mensal – Igreja: A casa dos puros? A mesma história de sempre... – P. António Júlio Trigueiros
26-28 jan. Fim de Semana de Eneagrama – Clara e João Pedro Tavares
26-28 jan. Fim de Semana no Campo
30 jan. Catequese para Adultos S 7 – P. Vasco Pinto de Magalhães

NO RODÍZIO – Casa de Exercícios de Santo Inácio


Estrada do Rodízio, 124 – 2705-335 COLARES – Tel. 219 289 020; Email: crsi.rodizio@jesuitas.pt

26 dez.-01 jan. Exercícios Espirituais – P. Hermínio Rico


12-14 jan. Génesis e Apocalipse – P. Vasco Pinto de Magalhães
18-21 jan. Exercícios Espirituais – P. António Vaz Pinto
18-21 jan. Exercícios Espirituais – P. António Júlio Trigueiros
27-28 jan. Fim de Semana para Noivos – P. Carlos Azevedo Mendes e grupo de casais
No início deste novo ano, formulo sinceros votos de
paz aos povos e nações do mundo inteiro, aos chefes
de Estado e de governo, bem como aos responsáveis
das Comunidades Religiosas e das várias expressões
da sociedade civil. Almejo paz a todo o homem,
mulher, menino e menina, e rezo para que a imagem
e semelhança de Deus em cada pessoa nos permitam
reconhecer-nos mutuamente como dons sagrados com
uma dignidade imensa.

PAPA FRANCISCO
Mensagem para o Dia Mundial da Paz 2017

Órgão oficial da Rede Mundial


de Oração do Papa — Portugal

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