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Nietzsche denomina tal homem como o “último homem”, e sobre ele diz:
1
Segundo Duarte o “esquematismo é um termo cunhado por Kant para designar o procedimento mental de
referir nossas percepções sensíveis a conceitos fundamentais, os quais chamava de categorias”.
2
A escola (...) que mantinha uma certa autonomia em relação à produção material e
por isso podia pensá-la e negá-la como sendo a principal esfera da vida, à medida
que adquire a função de produzir e reproduzir a mão-de-obra, diminuindo o seu
interesse pela formação individual, colabora com a eliminação da possibilidade de
formar alunos que possam refletir sobre as condições atuais de vida3.
2
GIACOIA, O. 2000, p.56
3
CROCHIK, L. 1998, p. 17.
3
“Deus está morto”; disse Nietzsche. “O homem já não é mais senhor dentro
de sua própria casa”; disse Freud. O mundo cartesiano fundado na razão, na posse
da verdade, na consciência, começa a ruir. A existência humana não se encontra
mais apenas no simples fato de pensar, vejamos porquê.
Sem entrar nos méritos do ateísmo nietzscheano, por não ser ele objeto desta
discussão, sua afirmação da morte de Deus não significa um pensamento
“anticristista”, ou niilista por definição, mas sim, uma forma de incorrer sobre a não
possibilidade de se atingir uma verdade absoluta; de demonstrar a inópia humana de
necessitar de verdades absolutas retiradas dos sofismas da linguagem - verdades
estas que escravizam o homem. Nietzsche propõe uma nova concepção de saber,
tendo em vista que, para Descartes, Deus era a prova da possibilidade de uma
verdade absoluta. “As verdades são ilusões que nós esquecemos que o são” 5 ,
preconiza Nietzsche.
Para Nietzsche o “eu” é apenas uma ilusão, uma convenção, uma construção
humana. O seu pensar é efeito das relações que estabelece com o outro e consigo
próprio: “O nosso corpo não é senão uma coletividade de muitas ‘almas’”6, muitas
forças se relacionando, onde se domina ou se é dominado (vontade de poder).
Assim se faz o devir humano, e é na filosofia pré-socrática, junto a Dionísio e Apolo,
que Nietzsche encontrará respaldo para seu pensamento.
4
FARIA, N. J. 1996, p.22.
5
NIETZSCHE, F. Sobre a verdade e a mentira no sentido extra-moral. Apud FARIA, 1996, p. 26.
6
Para Além do Bem e do Mal #19.
4
7
GIACOIA, O. 2000, p. 34.
8
FARIA, N. J. 1996, p.39.
5
Se Kant ainda podia acreditar que a razão humana permitiria emancipar os homens
dos seus entraves, auxiliando-os a dominar e controlar a natureza externa e interna,
temos de reconhecer hoje que essa razão iluminista foi abortada. A razão que hoje
se manifesta na ciência e na técnica é uma razão instrumental, repressiva. Enquanto
o mito original se transformava em iluminismo, a natureza se convertia em cega
objetividade10.
9
Idem.
10
FREITAG, B. 1988, p. 35.
6
Os bens culturais materializados nas obras de arte, nas obras literárias, nos
sistemas filosóficos não permaneceram por muito acessível apenas a uma minoria.
Quando a falácia alienante da pobreza material em favor de uma riqueza espiritual
tornou-se insuficiente para manter a submissão e a docilidade do trabalhador frente
ao novo sistema de produção, este, por intermédio do avanço tecnológico-industrial,
massificou os bens culturais transformando-os em mercadoria. Dessa forma a
cultura deixou de ser cultura para ser um produto, um valor (de troca pelo produtor,
de uso pelo consumidor) destinado à massa, dando origem ao que Adorno e
Horkheimer chamaram de Indústria Cultural.
A nova produção cultural tem a função de ocupar o espaço do lazer que resta ao
operário e ao trabalhador assalariado depois de um longo dia de trabalho, a fim de
recompor suas forças para voltar a trabalhar no dia seguinte, sem lhe dar trégua
para pensar sobre a realidade miserável em que vive. A indústria cultural, além disso,
cria a ilusão de que a felicidade não precisa ser adiada para o futuro, por já estar
concretizada no presente(...) E, finalmente, ela elimina a dimensão crítica ainda
presente na cultura burguesa, fazendo as massas que consomem o novo produto da
11
indústria cultural esquecerem sua realidade alienada .
Os ardis da indústria da cultura - da cultura que não é cultura, da arte que não
é arte, da razão instrumental, dos valores de troca - roubam do sujeito a capacidade
intelecto-crítica de ler, compreender e agir nas relações sociais (de exploração) de
forma a culminar em um sujeito emancipado, livre, criativo e ativo em sua existência
errante. Ao contrário, a indústria cultural transforma os sujeitos em algo amorfo,
sugestionável, no qual incute seu ideário, qual seja, o consumo como forma de
realização pessoal e o progresso científico-tecnológico como o ápice da realização
humana.
Mas é justo destacar que, mesmo em tempos como estes de deturpação das
consciências, formatação de desejo e atrofia da capacidade crítica, algo, alguém,
algumas práticas escapam a esse determinismo miserável. Talvez seja uma fantasia
compensatória tal afirmação, mas diante de algumas constatações empíricas (que
não virão à baila no presente momento) e de consistentes contribuições de autores
como Nietzsche e Benjamim, encontramos subsídios para delinear possíveis formas
de ruptura para tal cenário. Vejamos então, alguns fragmentos da obra de tais
autores.
11
Ibid, p. 73.
7
Nietzsche
Educação e cultura são, para Nietzsche, inseparáveis. Não existe cultura sem um
projeto educativo, nem educação sem uma cultura que a apóie. (...) Para o filósofo,
cultura e educação são sinônimos de ‘adestramento seletivo’ e ‘formação de si’; para
a existência de uma cultura, é necessário que os indivíduos aprendam determinadas
regras, adquiram certos hábitos e comecem a educar-se a si mesmos e contra si
12
mesmos, ou melhor, contra a educação que lhes foi inoculada” .
12
DIAS, R. 2001 p. 34
8
expressões e palavras utilizadas por maus romancistas. Diz que a escola de alta
qualidade deve levar o aluno a estudar seriamente sua língua a fim de sentir certo
asco ao se deparar com estilos, palavras e expressões que firam a riqueza e a
respeitabilidade da língua.
Poderíamos inferir que a beleza de tal ciência não estaria na descoberta, mas
no ato, no processo de descobrir. Quem sabe diante desta ação poderíamos romper
com o terrível ciclo vicioso que consiste na produção de um saber pelo poder, que
outrora legitima e serve como base para tal poder. Nietzsche clama por instituições
de ensino voltadas à cultura, que não priorizem a formação do “pequeno-burguês”,
mas que criem “cidadãos realmente cultos, formados a partir da necessidade interna
da fusão entre a vida e a cultura e capazes de exercer toda potencialidade de seu
espírito”14.
Além dos trabalhos empreendidos por Nietzsche entre 1870 e 1874 que
explicitam sua compreensão sobre educação e cultura – com ênfase no fragmento
Schopenhauer como Educador -, podemos nos apropriar de diversos conceitos em
sua rica obra que se fazem alicerce para pensarmos e agirmos com a finalidade de
superar a crise na educação que atravessamos hoje. Dentre as obras destaca-se
“Assim falou Zaratustra” que traz consigo talvez os principais conceitos
estabelecidos pelo filósofo/psicólogo Nietzsche, sendo eles: vontade de poder, o
eterno retorno e o além-do-homem, que combinados tornam-se a antítese do último-
homem.
Meu irmão! Queres caminhar para a solidão? Procurar o caminho que conduz a ti
mesmo? Detém-te um pouco e escuta-me. Aquele que procura, facilmente se perde
a si mesmo. Todo partir para a solidão é culpa – assim fala o rebanho. E tu fizeste
parte do rebanho durante muito tempo. A voz do rebanho continuará ressoando
dentro de ti. Queres, porém, percorrer o caminho da tua tribulação, que é o caminho
para ti mesmo? Mostra-me, então, teu direito e tua força para fazê-lo.
13
Ibid., p.37.
14
Ibid., p.40.
9
Benjamin
vencedores, mas aquela que poderia ter sido outra, que foi sufocada, mas deixou
interrogações, lacunas, brancos que são tantos sinais de alteridade e de
resistência”15.
Nietzsche e Benjamin
É claro que há outras semelhanças entre os dois autores, porém não se faz
possível expressa-las nesse momento. No entanto, o que deve ser discriminado até
o presente momento, é que os dois autores vislumbram possibilidades ao sujeito e a
sociedade de romper com uma realidade opressora que impossibilita uma formação
crítico-formativa. Fica aqui a expectativa de em um próximo trabalho expressar um
pouco mais das obras dos autores e principalmente relaciona-los com dados
empíricos. Desde já o convite está feito para darmos continuidade a este diálogo.
15
Gagnebin. J.M. 2006. p.53.
11
BIBLIOGRAFIA
BENJAMIN, W. O narrador. In: Magia, técnica, arte e política. Ensaios sobre literatura, e
história da cultura. Obras escolhidas v. 1. São Paulo, Brasiliense, 1996.
BENJAMIN, W. Sobre o conceito de história. In: Magia, técnica, arte e política. Ensaios
sobre literatura, e história da cultura. Obras escolhidas v. 1. São Paulo, Brasiliense, 1996.
BENJAMIN, W. Experiência e pobreza. In: Magia, técnica, arte e política. Ensaios sobre
literatura, e história da cultura. Obras escolhidas v. 1. São Paulo, Brasiliense, 1996.
FREITAG, B. A teoria crítica ontem e hoje. 2ª ed. São Paulo: Editora Brasiliense, 1988.
NIETZSCHE, F. A Gaia Ciência. Tradução, notas e posfácio Paulo César de Souza. São
Paulo: Companhia das Letras 2001.
NIETZSCHE, F. Além do Bem e do Mal: prelúdio a uma filosofia do futuro. Tradução, notas
e posfácio Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras 1992.