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PRINCÍPIOS DE FLUIDOTERAPIA

Introdução
A função tecidual e o desenvolvimento das formas de vida animal mais evoluídas dependem da manutenção e
do controle da composição dos líquidos corporais que banham todas as células teciduais. Toda forma de vida
está intimamente associada à água. A maioria dos íons e das moléculas que constituem a matéria viva tem
relações químicas e físicas com a água, e o número de compostos químicos que podem ser colocados em
solução aquosa é excepcionalmente grande. Devido à extrema importância da água e dos eletrólitos para os
processos biológicos, muitos sistemas orgânicos estão envolvidos na sua regulação e no seu equilíbrio. O
sistema gastrintestinal, os rins, a pele e várias glândulas endócrinas funcionam na manutenção da água corporal
e da concentração de eletrólitos em delicado equilíbrio, apesar das grandes variações na ingestão e na perda
destes elementos. Por esta característica de balanceamento e sua complexa regulação, muitas das doenças
que afetam os animais domésticos envolvendo os órgãos ou sistemas participantes deste processo resultam em
alterações dos equilíbrios dos fluidos corporais, dos eletrólitos e acidobásicos. A alteração do balanço da água
corporal, em que mais fluido é perdido do que é absorvido pelo corpo, ocasiona redução do volume do sangue
circulante e desidratação dos tecidos. As alterações do balanço eletrolítico ocorrem comumente como resultado
de perdas de eletrólitos, desvios de certos eletrólitos entre os compartimentos de fluidos corporais e alterações
relativas em suas concentrações devido à perda de água. Os desequilíbrios acidobásicos, sejam acidoses ou
alcaloses, ocorrem em consequência da adição de ácido ou da depleção da reserva alcalina orgânica, ou por
perda de ácido com um aumento relativo de bases, particularmente bicarbonato.
Sob várias condições, todos os desequilíbrios citados de fluidos e eletrólitos poderão ocorrer
simultaneamente, em graus variados, na dependência da causa inicial. Exemplificam essa situação os distúrbios
do sistema gastrintestinal, como a anorexia, o vômito e a diarreia, que com frequência resultam em significativas
alterações dos equilíbrios hídrico, eletrólito e acidobásico. A menos que sejam corrigidos de modo e em tempo
apropriados, essas alterações na homeostase dos fluidos corporais poderão retardar ou impedir a recuperação
dos pacientes afetados, mesmo que outros tratamentos específicos tenham sido realizados.
A terapia para restaurar e manter os equilíbrios dos fluidos corporais, dos eletrólitos e acidobásico depende
de conhecimentos e conceitos básicos que serão relacionados a seguir.

Água corporal, distribuição e equilíbrio

Água corporal total e compartimentos líquidos


O conteúdo de água corporal total apresenta considerável variação entre as diferentes espécies animais, idades,
sexos, estados nutricionais e outras condições. De maneira geral, o animal adulto não herbívoro magro tem um
conteúdo de água corporal total aproximado de 70% do seu peso corpóreo. O conteúdo de água é maior no
recém­nascido, declinando rapidamente no início da vida extrauterina e, a seguir, apresenta­se com gradativa
redução. O tecido gorduroso tem baixo teor de água, menos que 10%, e assim sendo, o conteúdo de água em
um animal gordo é menor do que aquele de um magro. Entre espécimes caninos e felinos, a água constitui 55 a
80% do peso corporal, com valores maiores em neonatos e menores nos adultos obesos. Em bovinos, à
concepção, tem­se 92% do peso em água; ao nascimento, 78%; em adultos magros e muito gordos, a água
representa, respectivamente, 70% e 40% do peso corpóreo.
A água corporal é distribuída por dois principais compartimentos. A água contida no interior das células é
denominada líquido intracelular (LIC) e corresponde a cerca de 50% do peso corporal. O fluido situado fora
das células é designado como líquido extracelular (LEC), equivalente a cerca de 20% do peso corpóreo, com
distribuição pelos espaços intersticial (15%) e plasmático (5%). O líquido intersticial banha as membranas
celulares e o plasma circula nos vasos sanguíneos separado do fluido intersticial pelo endotélio vascular.
As moléculas de água podem passar rapidamente através da maioria das membranas celulares e, havendo
um gradiente de pressão osmótica ou hidrostática entre quaisquer compartimentos, dá­se um desvio de água.
Não havendo diferença considerável de pressão hidrostática, o resultado do movimento de água será o de
igualar as concentrações osmóticas dos líquidos.

Equilíbrio hídrico
A quantidade total de água no corpo mantém­se relativamente constante a cada dia. A água é obtida pela
ingestão ou como produto final do metabolismo celular. A água é perdida pela urina, pela pele, com os gases
expirados na respiração, e pelas fezes; os animais em lactação também perdem água pelo leite que produzem.
Apenas a ingestão e a excreção urinária de água são controladas, no sentido de regulagem do volume corporal
de água.
O sistema neuronal que controla a sede e o comportamento associado ao ato de beber localiza­se na região
hipotalâmica do cérebro. À medida que se desenvolve o déficit de água, as concentrações osmótica e de sódio
aumentam no LEC, estimulando o hipotálamo e a sede; além disto, a queda de volume líquido e pressão
sanguínea estimulam também a sede, via sistema renina­angiotensina, e a liberação de hormônio antidiurético
(HAD), que diminui o volume urinário, retendo água como consequência.

Equilíbrio eletrolítico
A composição iônica característica dos líquidos corporais dos mamíferos tem diversidade e obedece à
necessidade de haver neutralidade elétrica, de modo que o número de miliequivalentes (mEq) resultantes dos
cátions seja exatamente igual àquele dos ânions em cada fluido. No LEC, o principal cátion é o sódio, e os
principais ânions são o cloreto e o bicarbonato. No LIC, os principais cátions são o potássio e o magnésio, e os
principais ânions os fosfatos orgânicos e as proteínas, e em menor proporção, o sulfato e o bicarbonato. O
componente plasmático do LEC apresenta como ânions considerável quantidade de proteínas.
A pequena diversidade de composição do LEC presente no interstício e no plasma é essencial para a
manutenção do volume plasmático normal, por meio das variações das pressões oncótica e hidrostática no nível
das porções proximal e distal dos capilares. A composição visivelmente distinta do LIC, quando comparada à do
LEC, é mantida pela permeabilidade seletiva da membrana celular e a atividade da bomba de sódio (Na+)­
potássio (K+), ligada à membrana e dependente de energia, que permite a entrada de K + e a saída de Na+ do
meio intracelular, contra um gradiente eletroquímico. Por outro lado, a impermeabilidade da membrana aos
fosfatos e às proteínas provoca grande pressão oncótica intracelular, que é suplantada pelo deslocamento iônico
ativo, evitando a entrada de LEC para o interior das células.
A composição iônica característica dos líquidos corporais dos mamíferos em termos de equivalentes
químicos é de aproximadamente 300 mEq/ de H2O no LEC e de 400 mEq/ de H2O no LIC. Se a composição
for expressa em termos de concentração osmótica, observa­se padrão similar.

Função renal na regulação da água e da concentração de sódio


As correções renais das alterações do volume do LEC dependem da retenção ou excreção de Sódio (Na+), ao
passo que as correções da osmolaridade desse líquido são dependentes da excreção ou retenção de água.
Cerca de 80 a 90% da água filtrada pelos rins são reabsorvidos passivamente nos túbulos contornados
proximais (TCP). Os íons sódio e outras substâncias acompanham a água de volta à circulação. Há reabsorção
ativa de Na+ e outros íons no TCP, e a água acompanha esse processo; ocorre ainda na porção espessa da
alça de Henle intensa reabsorção ativa de Na+. No néfron distal, a concentração da urina é função do
mecanismo de contracorrente e da ação do HAD, sendo esta importante na conservação de água no animal. A
concentração de HAD no sangue determina o nível de excreção de água pelo rim, de forma que a sua
diminuição ou aumento determinam, respectivamente, menor ou maior permeabilidade à água no néfron distal e,
assim, a variação na produção de urina mais ou menos diluída e em volume maior ou menor. Os níveis de HAD
liberados pela hipófise posterior são controlados pelos osmorreceptores do hipotálamo que são sensíveis à
osmolaridade dos fluidos circundantes, havendo maior ou menor liberação de HAD com o aumento de
osmolaridade e vice­versa.
O volume do LEC está mais sob controle da sua concentração de Na+, de modo que o rim excretará ou
reterá Na+ na dependência do seu volume. A taxa de excreção ou retenção de Na+ pelo rim é determinada pela
concentração de aldosterona (ALD). Os receptores de volume e pressão no sistema cardiovascular e
possivelmente as alterações na concentração de Na+ no LEC influenciam a liberação de ALD, através do
sistema renina­angiotensina. Assim, as quedas da pressão ou do volume determinarão o aumento da taxa de
secreção de ALD e vice­versa. Aumento ou diminuição da concentração da ALD provocam aumento ou queda
similar na reabsorção de Na+ a partir do filtrado e, desta forma, contribuem para a regulação de Na+ e da água
corporal.
O volume e a concentração osmótica do LEC são regulados em conjunto pelos sistemas mediados pelo HAD
e pela ALD. Esses dois sistemas operam juntos, porém em muitas situações pode haver conflito entre eles. Nas
formas de desidratação branda ou moderada predominam a defesa ou a correção da concentração osmótica do
LEC, sendo o Na+ eliminado em quantidades maiores. Todavia, se as perdas do LEC forem grandes o bastante
para afetar seriamente o volume de sangue circulante, a manutenção do volume será privilegiada, havendo
retenção de água, apesar da baixa concentração osmótica plasmática.
O controle das taxas K+, o principal cátion do LIC, conta também com a participação especial dos rins.
Quase todo o K + do LIC é facilmente intercambiável com o LEC. A concentração do K + no LEC é bem regulada,
e o íon presente na urina resulta da secreção pelos túbulos contornados distais e ductos coletores. Há também
uma relação entre a excreção de sódio e a de potássio, parecendo que a taxa de K+ plasmático é importante na
liberação de ALD, havendo com o seu aumento no plasma maior liberação de ALD e deste fato resultarão
maiores reabsorção de Na+ da urina e excreção de K+ pela urina, com resultante queda do potássio plasmático.
Os cátions do LEC estão em equilíbrio elétrico, em sua maior parte com os ânions cloreto (Cl–) e bicarbonato
(HCO3–), havendo um efeito osmótico desses íons que equivale ao promovido pelos íons Na+. A regulação da
concentração dos cloretos tende a ser secundária àquelas dos íons Na+ e HCO3–. Se o rim excretar excesso de
Na+, em geral o Cl– acompanha­o, sendo eliminado pela urina. Se o HCO3– estiver aumentado no plasma,
ocorrerá a excreção de quantidade equivalente de Cl– para ser mantida a eletroneutralidade do LEC.

Equilíbrio acidobásico
Por equilíbrio acidobásico entende­se a concentração de íons hidrogênio (H+) relativamente constante no LEC,
resultante do balanço entre o total dos ácidos e bases presentes nos fluidos corporais e gerados pelo
metabolismo orgânico. A concentração dos íons H+ no LEC é uma das variáveis corporais com mais rigorosa
regulação. O pH apresentado no sangue dos animais domésticos varia em uma faixa estreita, considerando­se
como fisiológica aquela situada entre 7,35 e 7,45, com um valor médio de 7,4. Nos mamíferos consideram­se,
em geral, como seus limites vitais de variação, valores entre 7 e 7,8.
A manutenção da constância do pH é essencial para o metabolismo celular, porém desvios da normalidade
podem ocorrer quando se adicionam ácidos ou bases aos líquidos corporais ou removem­se os mesmos
daqueles fluidos. A queda do pH sanguíneo abaixo do seu limite mínimo normal é conhecida como acidemia, e
a sua elevação a um valor superior ao limite máximo fisiológico é denominada alcalemia. O processo pelo qual
o excesso de ácido é acrescentado ou a base é removida do LEC é chamado de acidose. De modo oposto, o
processo pelo qual o excesso de base é adicionado ou o ácido é perdido do LEC é denominado alcalose. A
acidose e a alcalose podem ainda ser classificadas, conforme a origem, em metabólicas, quando resultantes da
adição ou da remoção anormal de íons H+ ou bicarbonato (HCO3–), e em respiratórias, quando geradas pelo
acréscimo ou pela perda em excesso de dióxido de carbono (CO2).
Sob condições normais, há no sistema orgânico uma adição contínua de ácidos e bases aos fluidos
corporais, devido à ingestão ou como resultado da produção destas substâncias pelo metabolismo celular. Em
condições patológicas, como diarreias, vômito, doenças renais ou respiratórias, podem estas provocar perdas ou
ganhos anormais de ácidos ou bases. Fisiologicamente, no interior do corpo, o metabolismo da maioria dos
compostos constituídos por átomos de carbono, hidrogênio, oxigênio e nitrogênio resulta na formação de água,
CO2 e ureia. O CO2 reage com a água, sob ação da anidrase carbônica, para formar o ácido carbônico, o qual
quantitativamente é o ácido mais importante que se forma no organismo. A eliminação deste ácido se faz pelos
pulmões, por meio da expiração, sob a forma de CO2. Os aminoácidos que contêm enxofre produzem, no
desdobramento metabólico, o ácido sulfúrico, o qual sofre tamponamento, sendo transformado em um ácido
fraco, sendo então eliminado pela via renal. Outros ácidos, que não o carbônico, sofrem eliminação por processo
semelhante.
Os compostos básicos são formados também como resultado do metabolismo de muitos alimentos de
origem vegetal. Um exemplo é o do citrato de sódio, que sofre oxidação, gerando CO2 e água; são, porém, para
isto necessários íons H+ que são obtidos da reação de CO2 e água, que gera ácido carbônico e dissocia­se em
H+ e HCO3. Resulta disto a produção de bicarbonato. Existem outros ânions orgânicos com semelhante
comportamento metabólico, razão pela qual nos herbívoros a urina é alcalina, pois o excesso de bases é
eliminado pela via renal. Em animais carnívoros e onívoros que ingerem alimentos ricos em proteínas ou
aqueles privados de alimentos, há produção excessiva de ácidos e, em consequência, a urina é ácida.
O combate às alterações potenciais, gerado pelo metabolismo normal, e às oriundas de situações
patológicas, com vistas à manutenção do equilíbrio acidobásico, se faz por meio de três mecanismos básicos:
tamponamento químico; respiratório (ajuste de concentração de ácido carbônico no sangue, pela variação do
nível de ventilação pulmonar) e renal (variação do nível de excreção de H+ e HCO3–). A ação dos tampões e do
mecanismo respiratório de correção do equilíbrio acidobásico ocorre em minutos, evitando grandes alterações
na concentração de H+. Esses são os mecanismos acionados na compensação de desequilíbrios acidobásicos
de origem metabólica. O tamponamento químico e a ação do mecanismo renal pela variação da excreção de H+
e HCO3– atuam na compensação de desequilíbrios de origem respiratória. Todavia, a longo prazo, a via renal
atuará também na compensação dos problemas de origem metabólica.

Tamponamento químico
Um sistema­tampão consiste na mistura de um ácido fraco com a sua base conjugada. A ação de um sistema­
tampão, quando do acréscimo de ácido ou base a um fluido, consiste em atenuar o desvio do pH que
normalmente ocorreria em sua ausência. Ao acrescentar­se um ácido forte a uma solução, os íons H+
adicionados ligam­se à base conjugada, formando mais ácido fraco. No sistema­tampão constituído pelo ácido
carbônico e o bicarbonato, a adição de ácido sulfúrico resulta na seguinte reação:
2H+ + SO4–+ 2HCO–3 2H2CO3 + SO4– –
Em que o efeito tamponante se dá pela substituição de um ácido forte por um ácido fraco do sistema­
tampão. A relação entre o pH e a mistura de ácido fraco com sua base conjugada é dada pela equação de
Henderson­Hasselbalch (ver Capítulo 4).
Ao adicionar­se um ácido a um sistema­tampão, há resistência a um desvio do pH, porém a proporção
base:ácido diminui, pois da ação tamponante resulta o consumo de base e a formação de ácido fraco, e o pH
sofre pequena diminuição. O acréscimo de mais ácido intensifica a diminuição da proporção base:ácido e, em
consequência, há maior redução do pH, sendo pois a função protetora dos sistemas­tampão limitada e, a menos
que se restaurem as concentrações e uma proporção favorável entre a base e o ácido, a adição contínua de
ácido determina a depleção dos tampões, resultando em acidemia. A adição de uma base forte aos líquidos
corporais resulta, pela ação do tampão, em uma reação da base com o ácido fraco e na consequente formação
de mais base tampão. A restauração da base e do ácido, componentes do sistema­tampão, depende da ação
renal, por meio da secreção de íons H+ e da excreção de base com retenção de H+, respectivamente.
Os principais sistemas­tampão no LEC são o do bicarbonato, da hemoglobina, das proteínas plasmáticas e
dos fosfatos; destes, os mais importantes são o do bicarbonato e o da hemoglobina. No acréscimo de um ácido
forte ao sangue in vitro, observa­se uma ação tamponante com participação de 53% do bicarbonato, de 35% da
hemoglobina, de 7% das proteínas do plasma e de 5% dos fosfatos. A capacidade tampão total do sangue é
adequada para impedir um desvio do pH além ou aquém dos limites vitais (7 a 7,8)/todavia, no sistema orgânico
parte da ação tamponante é rapidamente assumida pelos tampões do líquido intersticial e das células teciduais.
O sistema­tampão bicarbonato é o principal presente no LEC, não só pela sua eficiência, mas também pela
ampla distribuição, pela pronta disponibilidade, pelas grandes quantidades de HCO3– existentes nesse fluido,
bem como pelo controle renal e pulmonar que este sistema pode dispor para manter níveis adequados,
respectivamente, de HCO3– e de CO2, formando ácido carbônico. A proporção entre o HCO3– (base conjugada) e
o H2CO3 (ácido fraco) presente no LEC é de 20 para 1.
A hemoglobina (Hb) é o segundo tampão sanguíneo mais importante. Quando o pH do sangue é normal,
parte das moléculas de Hb das hemácias está sob a forma de íons proteinato, Hb– (base). Com seus ácidos
fracos, H­Hb, esses dois íons formam o par tampão. As proteínas do plasma, em parte, também estão
presentes na forma de íons proteinato no pH corporal, formando o par tampão­proteína (base) e proteína­H
(ácido fraco). Os componentes dos tampões fosfato no pH do sangue são HPO4– (base) e H2 PO4– (ácido
fraco), porém têm pouca participação no tamponamento do LEC.
No LIC, os tampões considerados mais importantes são os dos fosfatos e das proteínas.
Embora os diferentes sistemas­tampão tenham sido considerados isoladamente, todos eles no LEC atuam
de forma uníssona, participando da ação tamponante em conjunto. Como o pH é o mesmo para todos os
tampões em uma solução e como em um estado de equilíbrio todos os tampões estão presentes de forma
balanceada entre si, a mensuração de um sistema­tampão indica o estado de todos os outros. A relação entre
os diferentes tampões pode ser ilustrada da seguinte maneira:

pH = pka + log [HCO3–]/[H2CO3] =


= pkb + log [Hb–]/[Hb­H]=
= pkc + log [HPO4– –]/[H2 PO4–] etc.

A consequência deste fato é que pela sua disponibilidade no LEC e relativa facilidade de mensuração, o
sistema bicarbonato é aquele utilizado rotineiramente para a avaliação clínica da capacidade tamponante do
sistema orgânico animal e, em associação com outras determinações hemogasométricas, para a análise do
próprio equilíbrio acidobásico.

Mecanismo de compensação respiratória


Esse mecanismo de compensação do equilíbrio acidobásico é considerado de particular importância nos
desequilíbrios de origem metabólica. A sua ação se faz através da variação dos níveis de ventilação pulmonar e,
em consequência, da pressão parcial de CO2 (pCO2) nos alvéolos pulmonares, a qual, em geral, determina a
quantidade de CO2 dissolvido no sangue, e desta forma o ajuste da pCO2 sanguínea. O mecanismo respiratório
depende da sensibilidade específica dos sistemas de controle da respiração (quimiorreceptores periféricos e
medulares, centro respiratório) às variações da pCO2 e da concentração hidrogeniônica ou do pH. Assim, ao
acrescentar­se ácido aos líquidos corporais, a primeira ação que ocorre no sistema orgânico é o tamponamento
químico, cujo resultado é a formação de mais ácido carbônico e a depleção de bicarbonato. A proporção
[HCO3–]/[H2CO3] sofre redução e em consequência o pH também diminui. Na sequência, a respiração é
estimulada por aumento de CO2 e queda do pH, provocando inicialmente a rápida expiração do CO2 e a seguir,
como o pH ainda está baixo, mais CO2 é expirado lentamente, de modo que após algumas horas a pCO2 arterial
diminua a um nível inferior ao normal. O resultado do mecanismo respiratório de compensação é o retorno da
proporção [HCO3–]/[H2CO3] a um valor próximo do normal e do pH para quase 7,4, embora as concentrações
dos componentes do sistema­tampão não sejam normais. Ao adicionar­se uma base ao sangue haverá uma
resposta respiratória oposta, com redução da ventilação pulmonar que resultará na retenção de CO2 no LEC. O
aumento da pCO2 no sangue, o qual significa mais ácido carbônico no sistema, deve equilibrar o aumento da
concentração de HCO3– resultante da adição da base ao sangue.
Esses ajustes respiratórios da pCO2, vistos nos desequilíbrios acidobásicos de origem metabólica, começam
a mostrar efeitos em minutos, todavia, podem ser necessárias horas antes que alcancem um nível máximo.
Devem, ainda, ser considerados como compensatórios, pois a completa correção da alteração acidobásica é
efetivada pela via renal, pela variação dos níveis de excreção de íons hidrogênio ou bicarbonato.

Mecanismo renal de compensação


Os rins são fundamentais na manutenção da homeostase do sistema orgânico, regulando as taxas de
eliminação de água e o nível de excreção de diferentes íons pela urina, para manter a constância da pressão
osmótica, do volume de sangue circulante e da eletroneutralidade, ou seja, o equilíbrio hidreletrolítico. Em
associação com essas funções, tem participação essencial na manutenção do equilíbrio acidobásico por meio do
controle da acidez urinária pela variada excreção de íons hidrogênio e bicarbonato. Para o entendimento desta
última função é necessário, inicialmente, considerar­se o mecanismo básico da secreção dos íons H+, bem como
de alguns princípios que regem as trocas iônicas que ocorrem em função dele e da manutenção da neutralidade
elétrica nos fluidos orgânicos.
Na secreção dos íons H+, estes são gerados nas células tubulares renais por meio de um processo
metabólico que produz um íon hidroxila (OH–) para cada íon H+ secretado. O aumento do pH no interior destas
células estimula a ação da anidrase carbônica para haver uma rápida e suficiente produção de ácido carbônico a
partir da reação entre o CO2 e H2O. O H2CO3 sofre dissociação originando íons H+ e HCO3–. Assim, o íon H+
reage com o íon OH– disponível, neutralizando­o pela formação de água. O bicarbonato é então reabsorvido
passivamente para o sangue. Em concomitância, para manter a neutralidade elétrica, um íon sódio é trocado
pelo íon hidrogênio que foi secretado para o líquido tubular, pareando­se eletricamente com o íon bicarbonato
que adentrou o sangue. O resultado final deste mecanismo é a eliminação dos íons H+, com acidificação da
urina, além da recuperação dos íons bicarbonato e sódio para os fluidos corporais.
A taxa de secreção dos íons H+ pelas células tubulares em grande parte é determinada pelo pH intracelular,
que se altera com as modificações do pH sanguíneo ou da pCO2. Um pH intracelular elevado diminui a secreção
de H+ para o lúmen tubular, e um pH baixo aumenta­a. A concentração de íons K+ intracelular também atua na
secreção de ácido, de forma que sua concentração elevada determina o aumento do pH e a redução da
liberação de íons H+ na urina, enquanto uma baixa concentração de K+ resulta em maior secreção de ácido pela
urina. A explicação possível é que, à medida que íons K+ penetram nas células, deslocam os íons H+ que deixam
as células, e o pH intracelular sobe ou vice­versa.
A secreção de íons H+ na urina resulta na acidez da mesma, porém a quantidade de ácido que pode ser
eliminada sob forma de íons H+ livres é limitada. A urina pode ser acidificada até um pH em torno de 4,5. Isto
significa que a maioria dos íons H+ excretados deve sofrer tamponamento, ou seja, deve estar ligado a bases,
dentre as quais as mais importantes são o fosfato (HPO4– –) e a amônia (NH3+). O fosfato está presente, em
pH 7,4, no filtrado glomerular, principalmente sob a forma de íons bivalentes. À medida que o líquido tubular é
acidificado, os íons H+ secretados reagem com o HPO4– e forma­se H2 PO4–. A maioria dos íons Na+ que está
em equilíbrio elétrico com o HPO4– no filtrado glomerular retorna ao sangue ao serem substituídos pelos íons H+.
A base amônia é formada pelas células tubulares renais a partir da glutamina e outros aminoácidos do sangue.
O movimento da amônia em direção ao lúmen tubular se faz por difusão passiva e segundo gradiente de
concentração. Há ligação da amônia com os íons H+, se a urina for ácida, com formação de amônio (NH4), o qual
tem menor capacidade de passagem por membranas, permanecendo, pois, no líquido tubular e, deste modo,
grandes quantidades de íons H+ são eliminados pela urina sob a forma de amônio.
A principal base do plasma, o bicarbonato, está presente no filtrado glomerular e a quantidade filtrada
diariamente nos túbulos renais equivale a muitas vezes o total presente no corpo, sendo na maior parte
reabsorvido. O mecanismo de reabsorção do bicarbonato está ligado ao da secreção de H+ para o líquido
tubular. Quando há íons HCO3– no líquido tubular, os íons H+ liberados reagem com eles (H+ + HCO3– H2CO3
CO2 + H2O) formando água e dióxido de carbono. O CO2 gerado é prontamente absorvido para o sangue.
Todavia, para a formação de íons hidrogênio, há também a geração de íons HCO3– que vão ao plasma.
Portanto, para cada íon HCO3–, removido do líquido tubular pela reação com um íon H+, um íon HCO3– é
acrescentado ao sangue. A taxa de reabsorção de bicarbonato nos túbulos renais é um efeito da pCO2
sanguínea sobre os rins, sendo função direta e linear da pCO2. Quanto mais elevada a pCO2, maior será a
reabsorção e vice­versa, razão pela qual a via renal é o mecanismo compensatório dos desequilíbrios de origem
respiratória. Para manter a neutralidade elétrica o íon HCO3– mantém relação recíproca na sua excreção com
aquela de íons cloreto (Cl–). Assim, a diminuição da excreção de bicarbonato implica maior eliminação de Cl– e
vice­versa.
É importante ressaltar que nos desequilíbrios de origem metabólica a compensação se faz inicialmente pelos
mecanismos respiratórios, porém, a longo prazo, a via renal é aquela que efetiva a correção definitiva do
equilíbrio acidobásico, mediante as variações das taxas de excreção de íons H+ e HCO3– pela urina.

Desidratação

Conceito
Literalmente o termo desidratação significa esgotamento de água, porém é utilizado clinicamente para definir
alterações do equilíbrio hídrico corporal, em que a perda de água é maior do que a absorção, com redução do
volume de sangue circulante e depleção de fluidos tissulares, associando­se, em muitas situações, simultâneos
desequilíbrios eletrolíticos e acidobásicos, na dependência da etiopatogenia do processo patológico.
Basicamente existem duas causas principais de desidratação, ou seja, as falhas da ingestão de água ou as
perdas excessivas de fluidos corporais. Dentre as falhas da ingestão incluem­se a privação de água (não
suprimento e a incapacidade de chegar à fonte de água por debilidade física), a ausência de sede (comum nos
estados de endotoxemia) e a impossibilidade de beber a água (na obstrução esofágica, na fratura mandibular e
secundariamente às alterações do sistema nervoso central [SNC]). A causa mais comum da desidratação é a
excessiva perda de líquidos corporais. A diarreia tem destacada importância como causadora dessas perdas,
embora o vômito, as doenças renais, cardíacas e hepáticas sejam responsabilizados com frequência também.
Em casos esporádicos, podem ser importantes as perdas fluídicas resultantes de grandes lesões da pele,
sudorese e salivação excessivas, pancreatite, obstruções agudas gástricas ou intestinais e peritonite difusa.
Pode ainda ocorrer intensa desidratação, por sequestro de fluidos, em ruminantes acometidos por acidose
láctica ruminal por ingestão excessiva de carboidratos altamente fermentáveis e dilatação e deslocamento com
torção de abomaso. Quadros patológicos específicos, como os de diabetes melito ou insípido, podem também
provocar grande depleção de fluidos.
A desidratação pode, ainda, ser classificada em diferentes tipos, quando além das perdas de fluidos, se
consideram as variações dos teores do íon Na+ no LEC, onde é o cátion mais abundante e o principal
responsável pela manutenção da pressão osmótica. Pode­se caracterizar assim, três tipos de desidratação:
hipertônica, isotônica e hipotônica. A hipertônica ocorre nos casos de simples privação de água, ou seja,
quando há desidratação simples sem perda de íons Na+ e com discretas manifestações clínicas da perda de
fluidos. A isotônica é observada nas perdas de fluidos isotônicos em casos de sudorese excessiva, nefrose,
enterite simples, e caracteriza­se por perdas de água e de sódio, porém com concentrações deste íon similares
à do LEC. São observados sinais de desidratação leve e hiponatremia. Na forma hipotônica, constatada por
exemplo em colidiarreia de bezerros e salmonelose em equinos, associa­se intensa perda de fluidos com
elevada concentração de íons Na+. Neste tipo de desidratação as manifestações e a hiponatremia são intensas.

Etiopatogenia
Dois fatores estão envolvidos na patogenia da desidratação: a diminuição dos teores de fluido tecidual com
consequente interferência no seu metabolismo e na redução do conteúdo de água (anidremia) e/ou do líquido
no sangue circulante.
A resposta inicial ao balanço negativo de água é o desvio de fluidos dos tecidos e a manutenção do volume
do sangue normal. O líquido é drenado primariamente do espaço intersticial que compõe o LEC. Órgãos vitais
(sistema nervoso, coração) e o esqueleto pouco contribuem; as principais perdas são provenientes do tecido
conectivo, músculos e pele. O desvio de fluidos dos espaços intersticial e a seguir do intracelular resulta em
diminuição da elasticidade da pele, secura de pele e mucosas e redução e retração do globo ocular (enoftalmia)
em consequência à diminuição dos depósitos de gordura retrorbital.
Não havendo equilíbrio, ocorre redução no conteúdo de fluido do sangue, causando diminuição do volume
de sangue circulante (oligoemia) e hemoconcentração, com aumento da viscosidade sanguínea, o que dificulta o
fluxo de sangue com posterior exacerbação da insuficiência circulatória periférica. Há ainda mecanismos
compensatórios que reduzem as perdas de fluidos contínuos pelas fezes, pela urina e pela sudorese. Quando a
causa da desidratação é a privação de água, os sinais desta são mínimos, pois os rins fazem compensação
efetiva pela diminuição da produção e pelo aumento da concentração de urina; adicionalmente, a água é
preservada pela redução de eliminação fecal e aumento da sua absorção, resultando em desidratação do
conteúdo ruminal e daquele do intestino grosso, com eliminação de fezes secas e escassas. Em animais com
diarreia de pouca intensidade, os rins compensam de forma eficaz a perda de água pelas fezes, e o volume de
plasma pode ser mantido se houver adequada ingestão de fluidos.
O desvio preferencial circulatório que se estabelece quando da oligoemia determina menor perfusão
sanguínea renal, com diminuição da excreção de urina, que se torna progressivamente mais concentrada e a
falha da função renal pode acentuar a acidose preexistente e o desequilíbrio eletrolítico, sendo, pois,
fundamental a restauração da função renal nos processos de desidratação. São significativos, ainda, alguns
efeitos que a desidratação exerce no metabolismo tecidual. Há aumento no catabolismo de gorduras, em
seguida daquele de carboidratos e, por último, de proteínas, para produzir água metabólica e energia. O
metabolismo endógeno aumentado sob condições relativamente anaerobióticas resulta em formação de
metabólitos ácidos, entre os quais o ácido láctico, e no desenvolvimento de acidose. A diminuição da formação
de urina (oligúria), devido à restrição de fluxo de sangue renal, exacerba essa acidose, pela diminuição da
excreção de íons hidrogênio, além de causar moderada elevação dos teores sanguíneos de nitrogênio não
proteico.
A diminuição do volume de sangue circulante também contribui para a depressão mental nos animais
desidratados, como resultado dos variados graus de acidose e toxemia, dependendo da causa da desidratação.
A fraqueza muscular, a hipotermia e a anorexia também estão presentes. A desidratação pode causar morte,
especialmente na obstrução intestinal aguda, vômito e diarreia, porém ela é considerada causa contribuidora da
morte quando combinada com outros estados sistêmicos, como acidose, desequilíbrios eletrolíticos, toxemia e
septicemia.

Sintomas clínicos
Os sintomas variam de natureza e gravidade conforme o tipo e o modo pelos quais ocorrem as perdas de
líquidos, ou seja, na dependência da etiologia da desidratação, da evolução do processo patológico que a
determinou e até da espécie acometida. Segundo o tipo de desidratação, pode­se dizer que nas hipertônicas e
isotônicas as manifestações clínicas em geral são discretas, sendo, todavia, intensas no tipo hipotônico. Em
relação ao modo como os líquidos são perdidos, é necessário considerar se a evolução do quadro foi aguda ou
crônica e pode ocorrer por falta de aporte de água ou por perdas para o meio exterior ou por sequestro de
fluidos no interior de vísceras ou cavidades naturais, além da simultânea depleção ou retenção de eletrólitos
(Na+, Cl–, K+, HCO–3 e H+). Essas variáveis podem influenciar a intensidade dos sintomas, por meio de um
diferente nível de comprometimento dos compartimentos de líquidos no sistema orgânico. Em geral, ao início do
quadro de desidratação as perdas são mais evidentes no LEC, em primeira instância no espaço plasmático,
após no intersticial, para finalmente ser afetado o LIC. Em geral, os sintomas são mais evidentes se a perda de
água e eletrólitos ocorrer em um curto período de tempo. As perdas superagudas e agudas podem não ser
óbvias clinicamente em um primeiro exame, pois o maior prejuízo ocorre no compartimento
intravascular/plasmático e somente pequenos desvios de líquidos ocorrem do espaço intersticial.
Quanto aos sintomas clínicos, é importante ressaltar­se que são utilizados para estabelecer ou indicar o grau
de desidratação em relação à perda de peso corporal (p.c.) em porcentagem (%), todavia, as perdas de até 5%
do p.c. não apresentam sintomas clínicos específicos, sendo o grau máximo de perda de 12% em ruminantes
domésticos e de 15% em cães e gatos, e acima deles, haverá incompatibilidade com a vida.
Os sintomas mais importantes na desidratação são o ressecamento e o enrugamento da pele, tendo, em
particular, na região facial uma aparência retraída. O globo ocular apresenta­se afundado na cavidade orbitária
(enoftalmia). A elasticidade e o turgor da pele diminuem, podendo­se avaliar este fato por meio do
pregueamento do tegumento nas regiões da tábua do pescoço, sobre a escápula e da pálpebra superior,
verificando­se o tempo necessário para o retorno da pele à posição inicial. Em condições normais o retorno é
imediato ou se faz em até 2 s; o tempo de persistência do pregueamento aumenta conforme a maior intensidade
da desidratação, alcançando o extremo de até 45 s. As mucosas podem demonstrar ressecamento e estar
pegajosas. O tempo de preenchimento capilar (TPC), que normalmente é de 1 a 3 s, prolonga­se à medida que
se intensifica a desidratação.
Em associação a estas manifestações, devem ser consideradas as alterações do estado geral dos animais
desidratados que podem variar de leves a intensas. Caracterizam­se estas por perda de peso ou do estado
cárneo, em geral proporcional à intensidade da desidratação e, se relacionada a quadros crônicos, combina­se
com alterações da pele/pelame, e diminuição evidente de massa muscular; atitudes anormais – dependendo
da espécie animal, a alternância de estação com decúbito esternal, manutenção em decúbito esternal ou lateral
podem indicar progressiva gravidade da desidratação; apatia, depressão, com diminuição ou ausência de
respostas reflexas estão relacionadas com a intensidade da desidratação e a presença de acidose; a perda de
apetite, de sede e a incapacidade de sugação­deglutição são indicativas de acidose e presença de
endotoxemia; alterações das funções vitais como hipotermia e taquicardia com pulso filiforme podem estar
presentes nos estados pré­choque ou no choque hipovolêmico, e as modificações da frequência respiratória e
características da respiração podem acompanhar aquelas da função cardiocirculatória, todavia, em muitas
situações são compensatórias dos desequilíbrios acidobásicos de origem metabólica.
A avaliação do grau de desidratação relacionado à porcentagem de perda de peso corporal segundo o
exame físico é apresentada em Quadros 61.1 e 61.2.
Deve­se ainda ressaltar que certas manifestações sintomáticas podem ser relacionadas aos desequilíbrios
eletrolíticos e acidobásicos. Muitas das alterações eletrolíticas ocorrem pela perda destes eletrólitos nas doenças
do trato alimentar. A sudorese, a exsudação por queimaduras extensas, a salivação excessiva e o vômito são
também acompanhados por depleção de eletrólitos, porém são menos importantes em animais de produção,
com exceção daquelas que ocorrem por sudorese intensa em cavalos. Os eletrólitos mais importantes a
considerar­se são o sódio, o potássio, o cloreto e o bicarbonato.

QUADRO 61.1 Avaliação da intensidade de desidratação em cães e gatos, segundo exame físico, relacionada
com a porcentagem de perda do peso corporal.

Desidratação (%) Desidratação (decimal) Observações do exame físico

<5 Sem alterações na elasticidade da pele; histórico ou observação de perdas ou


não ingestão de líquidos

5a6 0,05 a 0,06 Perda discreta da elasticidade da pele/cutânea

Obs.: para a espécie canina, quando a elasticidade da pele é semelhante à


observada no felino hígido

7a9 0,07 a 0,09 Perda da elasticidade da pele (observa-se discreto aumento do tempo de
retorno da pele a sua posição normal); discreto prolongamento do tempo de
preenchimento capilar (TPC); possível discreta enoftalmia; possível discreto
ressecamento de mucosas

10 a 12 0,10 a 0,12 Elasticidade da pele comprometida; a pele permanece na posição pregueada


por um período longo; evidente prolongamento do TPC; enoftalmia; mucosas
ressecadas; possíveis sintomas de choque (taquicardia, pulso rápido e filiforme,
extremidades frias)
13 a 15 0,13 a 0,15 Sintomas definidos de choque; trata-se de caso de urgência morte iminente

QUADRO 61.2 Avaliação da intensidade da desidratação em animais ruminantes, segundo o exame físico,
relacionada com a porcentagem de perda do peso corporal.

Desidratação (%) Observações ao exame físico

<5 Ausência de sintomas clínicos de desidratação; história ou observação de perdas ou não ingestão de fluidos

6a7 Diminuição da elasticidade da pele (pregueamento persiste por 5 a 8 s); enoftalmia discreta ou ausente; discreta
apatia; apetite mantido; capacidade de manter-se em estação preservada

8a9 Intensificação da diminuição da elasticidade da pele (pregueamento persiste por 9 a 12 s); enoftalmia notável;
mucosas pegajosas/ressecadas ou sem brilho; apatia moderada; incapacidade de sugação/deglutição; alterna
estação com decúbito esternal, ou se mantém em decúbito

10 Intensa diminuição da elasticidade da pele (pregueamento persiste por mais de 12 s até não se desfazer);
enoftalmia muito evidente; mucosas secas; apatia intensa; anorexia; reflexos bem diminuídos ou ausentes,
extremidades frias

12 Sintomas de choque apatia extrema, ausência de reflexos, taquicardia, pulso filiforme,


hipotermia/extremidades frias; decúbito lateral

O sódio é o íon mais abundante no LEC e o principal responsável pela manutenção da pressão osmótica
neste fluido. A causa mais comum de hiponatremia é a perda aumentada de sódio pelo trato intestinal nas
enterites. Esta é particularmente marcada em cavalos com diarreia aguda, e também ocorre em bezerros
neonatos. Nos casos crônicos a hiponatremia pode ser mais intensa. Em cães e gatos essa diminuição pode
eventualmente ser evidenciada em diarreias, no diabetes melito e em casos de vômito. Nessa situação pode
haver aumento da excreção renal de água como tentativa de manutenção da pressão osmótica normal,
agravando a desidratação, além de promover fraqueza muscular, depressão mental, hipotermia e hipotensão,
devido à insuficiência circulatória periférica, todavia estes sintomas não são exclusivos da hiponatremia.
A hipernatremia pode ser também observada em pequenos animais, tendo em geral como causas a
excessiva ingestão do sódio, a inadequada tomada de água ou a intensa perda de água acompanhada por sua
insuficiente ingestão (vômitos, diarreia, poliúria – diabetes insípido, pielonefrite etc.). São considerados
sintomas de hipernatremia a depressão, a sede, as fasciculações musculares, as convulsões e o coma.
A hipocloremia ocorre como resultado de um aumento na perda líquida do íon cloreto no trato intestinal, na
dilatação gástrica aguda, na dilatação com torção do abomaso e na obstrução intestinal anterior aguda. Nestas
situações, a grande quantidade de íons H+ e Cl– secretados no estômago ou no abomaso e trocados por
bicarbonato de sódio circulante, normalmente no intestino delgado, são absorvidos junto com K +. Há nestas
condições sequestro destes íons e em consequência há alcalose hipoclorêmica e hipopotassêmica. Não há
manifestações clínicas características.
Alterações do equilíbrio de K+, resultando em hipopotassemia ou hiperpotassemia são relativamente comuns
em animais de pequeno porte. As causas de hipopotassemia são o vômito, as diarreias e, com menor
frequência, as enfermidades com poliúria. Nos animais de produção resulta de diminuída ingestão na dieta,
excreção renal aumentada, estase abomasal, obstrução intestinal e enterite. As doenças do abomaso
apresentam sequestro de fluidos com íons H+, Cl– e K+, resultando em hipopotassemia, hipocloremia e alcalose
metabólica. A fraqueza muscular é um sintoma que ocorre por alteração do potencial de repouso de membrana;
decúbito, depressão, tremores musculares, arritmia cardíaca e coma.
A hiperpotassemia pode ter como causa o aumento da ingestão na dieta e principalmente por diminuição
da excreção renal (obstrução do sistema urinário, lesões graves no túbulo contornado distal,
hipoadrenocorticismo etc.).A acidose metabólica pode agravar o quadro de hiperpotassemia, pela entrada de H+
para o meio intracelular e saída de K+ para o extracelular como mecanismo celular de compensação. Em
animais de produção a hiperpotassemia não é tão comum quanto a hipopotassemia e ocorre após acidose
metabólica grave. Potencialmente é mais perigosa que a hipopotassemia devido à ação cardiotóxica, tendo
marcado efeito sobre a função cardíaca, determinando bradicardia e arritmia, além de poder ocorrer a parada
cardíaca súbita. No eletrocardiograma podem ser constatados inversão e desaparecimento da onda P, aumento
da amplitude da onda T (pontiaguda) e aumento do intervalo QRS.
Considerando­se as alterações do equilíbrio acidobásico que podem ocorrer em associação com
desequilíbrios hidreletrolíticos e que são passíveis de tratamento por meio de fluidoterapia, deve­se ressaltar
aquelas de origem metabólica. Estas, quando presentes, influenciam as manifestações clínicas observadas,
sendo importante a consideração da causa primária das acidoses e alcaloses metabólicas. As acidoses
metabólicas têm como causas gerais a excessiva perda de base (bicarbonato), o acúmulo de ácidos, ou a
combinação de ambos processos. Em pequenos animais as causas mais comuns são a diarreia intensa, a
insuficiência renal, a cetoacidose diabética, a acidose tubular renal, a acidose láctica (parada cardíaca, choque,
hipoxemia), a administração de drogas ácidas, medicamentos (cloreto de amônio etc.) ou substâncias tóxicas
(etilenoglicol, metaldeído, metanol etc.). Nos animais de produção são causas comuns específicas a diarreia
aguda em neonatos, a enterite aguda de cavalos e bovinos adultos, a ingestão excessiva de carboidratos
(acidose láctica ruminal) ou de grãos (cavalos), a cetoacidose (toxemia gravídica dos pequenos ruminantes,
cetose dos bovinos), a doença renal e a asfixia neonatal de bezerros. A obstrução intestinal aguda em cavalos é
comumente acompanhada por acidose com a evolução do quadro, ao contrário de outras espécies em que a
alcalose ocorre inicialmente. As manifestações clínicas da acidose metabólica são a depressão mental e
variados graus de fraqueza muscular. Bezerros e cabritos neonatos apresentam­se deprimidos, fracos e
incapazes de mamar. Animais com grave acidose apresentam­se em decúbito lateral e coma terminal. Nas
formas compensadas de acidose metabólica, observa­se respiração com frequência e profundidade
aumentadas. Nos casos não compensados, quando há depressão de centro respiratório (choque hipovolêmico
ou colibacilose enterotoxigênica) ocorrem bradipneia e respiração superficial, taquicardia, pulso fraco e coma
terminal. Em presença de movimento compensatório de potássio para o espaço extracelular, a hiperpotassemia
pode determinar bradicardia e arritmia.
As alcaloses metabólicas podem ser causadas pela absorção aumentada de bases ou perda excessiva de
ácidos. Em pequenos animais as causas mais comuns desse desequilíbrio são os vômitos persistentes,
hiperadrenocorticismo, utilização de diuréticos que depletam os cloretos e administração excessiva de
substâncias alcalinas (bicarbonato). Em animais ruminantes a dilatação e o deslocamento à direita com torção
do abomaso são causas das mais comuns. Pode ainda ocorrer nas indigestões vagais posteriores e na
síndrome de refluxo, em que também há sequestro de ácido clorídrico e de potássio no rúmen. Em equídeos
com obstrução proximal do intestino pode­se observar inicialmente um quadro de alcalose metabólica.
As manifestações clínicas de alcalose não são específicas, havendo em geral predomínio dos sintomas
resultantes do processo nosopatológico primário e causador da alcalose. Nas formas graves de alcalose
metabólica podem ocorrer tremores musculares e tetania, com sinais de excitabilidade do SNC evidenciados por
convulsões tônicas e clônicas. As manifestações respiratórias compensatórias caracterizam­se por bradipneia e
respiração superficial; todavia, na fase terminal da alcalose taquipneia e dispneia podem estar presentes.

Avaliação da desidratação e sua etiopatogenia por exames complementares


A avaliação laboratorial de animais acometidos por desidratação e desequilíbrios eletrolíticos e acidobásico é
importante pois permite a confirmação do diagnóstico estabelecido por meio do exame físico, elucidar a
presença e o grau com que os desequilíbrios estão ocorrendo e o monitoramento do efeito da fluidoterapia
preconizada. O exame do hemograma pode ser útil, particularmente as determinações do hematócrito e do
leucograma.
O hematócrito (volume globular) pode identificar a hemoconcentração por meio do aumento do seu valor, e
consequentemente o grau de desidratação. É de grande utilidade no monitoramento da eficiência da
fluidoterapia, todavia seus resultados podem ser falseados pela presença de anemia. A determinação das
proteínas totais (no soro ou plasma) pode também ser utilizada com a mesma finalidade, sendo seus resultados
imprecisos quando da ocorrência de doenças que provocam hipoproteinemia. O leucograma é útil na
identificação de toxinfecções, evolução e prognóstico de cada caso, além de permitir a evidência de sinais
endotóxicos.
A urinálise (análise da urina) deve incluir a avaliação de densidade, pH, glicose, corpos cetônicos, proteínas
e exame do sedimento urinário. Durante a desidratação, se os rins funcionam normalmente, a densidade
aumenta e o volume de urina diminui, por reabsorção de água. Se a densidade não se altera ou diminui em
presença de desidratação, provavelmente observa­se má função renal, e outros testes para sua avaliação
devem ser realizados. O monitoramento da densidade urinária durante a fluidoterapia, demonstrando queda,
indica que a hidratação está ocorrendo. Em condições de hiperglicemia, em ausência de tratamento com
solução de glicose, a presença desta na urina pode indicar acidose diabética. A acetonúria é achado frequente
durante a desidratação e/ou privação de carboidratos ou jejum prolongado; pode também ser constatada na
toxemia gravídica dos pequenos ruminantes e na cetoacidose diabética em cães. O pH da urina pode com
segurança indicar, na dependência do valor normal para a espécie, se alcalino ou ácido, respectivamente, a
presença de acidose ou alcalose, desde que não haja doença renal ou do sistema urinário. A presença de
proteinúria e de sedimento com componentes anormais poderá indicar a presença de doença renal.
Alguns exames bioquímicos são considerados valiosos na avaliação dos desequilíbrios hídricos, eletrolíticos
e acidobásico, e suas consequências. As provas de função renal, dosagens de ureia ou nitrogênio ureico
sanguíneo e creatinina séricas são úteis na identificação da diminuição do volume de sangue circulante, por
meio de aumentos anormais que caracterizam a azotemia pré­renal consequente à diminuição da taxa de
filtração glomerular. Permitem também o monitoramento da eficácia da fluidoterapia na melhoria da perfusão
renal e ainda podem demonstrar a existência de doença renal.
Os testes de função hepática (AST, ALT, FA, GGT, proteinograma) são úteis no diagnóstico das
hepatopatias agudas ou crônicas. A avaliação da glicemia pode ser utilizada para a identificação da presença de
diabetes melito, bem como da necessidade de utilização de glicose como fonte de energia na fluidoterapia nas
enfermidades causadoras de estados hipoglicêmicos.
A determinação dos íons séricos, particularmente de sódio, potássio e cloreto, permite a identificação dos
desequilíbrios eletrolíticos, a necessidade de correções de seus teores por meio da fluidoterapia e a efetividade
do tratamento usado.
A hemogasometria é essencial na avaliação do equilíbrio acidobásico e no monitoramento da terapia
estabelecida. As alterações do pH em geral permitem a identificação de acidemia e da alcalemia, ou seja, a
possível presença da acidose ou alcalose. A determinação da pressão parcial de dióxido de carbono (pCO2) é
considerada uma medida da participação primária do componente respiratório na promoção do desequilíbrio e
da compensação ou não de alterações de origem metabólica, pela via respiratória. Por sua vez, as avaliações
de bicarbonato (HCO3–), total de CO2 (TCO2) e excesso ou déficit de base (BE) são consideradas medidas da
reserva alcalina indicadoras da participação primária do componente metabólico na determinação do
desequilíbrio e da compensação ou não de distúrbios de origem respiratória, pela via renal. Desta forma, na
acidose metabólica são observadas quedas do pH, do HCO3–, do TCO2 e do BE (déficit de base) abaixo dos
valores mínimos normais para a espécie examinada; se houver compensação respiratória, a pCO2 deverá estar
diminuída pela hiperventilação. Na alcalose metabólica ocorrem aumentos do pH, do HCO3–, do TCO2 e do BE
(excesso de base) acima dos valores máximos normais para a espécie analisada; havendo compensação
respiratória, a pCO2 estará aumentada. Quando a acidose for respiratória, ocorrem diminuição do pH e
aumento da pCO2; se houver compensação renal do desequilíbrio, os valores do HCO3–, do TCO2 e do BE
demonstram aumentos acima do nível máximo normal para a espécie analisada. Na alcalose respiratória, o pH
está aumentado e a pCO2 diminuída; a compensação renal é evidenciada pelas diminuições do HCO3–, do TCO2
e do BE. O diagnóstico da presença de desequilíbrios acidobásicos mistos, ou seja, quando ocorrem dois
distúrbios primários em concomitância, pode ser dificultado particularmente quando os efeitos de cada um dos
desequilíbrios se neutralizam. Exemplifica esta situação a coexistência de acidose metabólica e alcalose
respiratória. Nestes casos a hemogasometria é essencial e pode revelar um pH com pequeno desvio ou dentro
do intervalo normal. As variações dos valores níveis de HCO3– e pCO2 podem elucidar a situação e deve­se
avaliar bem se a compensação é apropriada. Além da consideração dos resultados do exame físico, da história
do paciente, é necessária a determinação do anion gap, definido como a diferença entre a soma das taxas de

cátions (Na+ e K +) e a soma daquelas de ânions (Cl e HCO3–), expressas as concentrações em mEq/ . O anion

gap estará aumentado a um valor superior à diminuição de HCO3 , nos casos de acidose metabólica por
acúmulo de ácidos orgânicos ou inorgânicos (insuficiências renais com azotemia, cetoacidose diabética; acidose
láctica).

Diretrizes para a instituição da fluidoterapia


A finalidade da fluidoterapia é a correção da desidratação e/ou do desequilíbrio eletrolítico. Pode também ser
indicada para corrigir um quadro de acidose ou alcalose, para tratar um animal em estado de choque, para
alimentação parenteral ou mesmo para estímulo de uma função orgânica, como a renal. Os princípios mais
importantes a que deve obedecer são de que: “deve corrigir ou minimizar a desidratação e as perdas de
eletrólitos sempre que possível” e “deve tratar perdas potenciais de fluidos e de eletrólitos, tão rápido quanto
possível, para minimizar o grau de desidratação e alterações do equilíbrio acidobásico”. Assim, seus principais
objetivos são: “corrigir anormalidades já existentes, monitorar e prover terapia de manutenção até que o animal
se recupere”. Existem, pois, pelo menos três anormalidades a corrigir: o volume de fluido perdido, os
desequilíbrios específicos eletrolíticos e acidobásicos.
As principais dificuldades iniciais no estabelecimento da fluidoterapia são a determinação da natureza e o
grau das anormalidades, e a escolha do fluido ou solução de eletrólitos que deve ser utilizada. Para resolver
estas duas questões há necessidade de uma cuidadosa avaliação clínica do paciente, precedendo o início do
tratamento, na qual devem ser incluídos a história, os exames físicos e complementares e o diagnóstico da
enfermidade, que é importante na previsão dos prováveis desequilíbrios com base na etiopatogenia do processo
patológico. As informações úteis sobre a natureza da doença e a história clínica são: ingestão dos alimentos e
água, tipo de alimentos, perdas gastrintestinais por vômito e diarreia, volume de urina, salivação ou sudorese
excessivas, exercícios recentes, exposição ao calor, traumatismos, hemorragia, febre, gestação e partos
gemelares, uso de diuréticos ou outros medicamentos. O conhecimento de duração da doença, frequência e
intensidade do vômito e/ou diarreia, consistência das fezes e frequência de micção deve ser acurado. A
sequência dos sintomas e a evolução do quadro clínico podem indicar a tendência da gravidade. Animais com
diarreia profusa e aquosa por 18 a 24 h podem estar com intensa acidose. Obstrução intestinal aguda em
bovinos não é tão grave quanto em equinos. Acidose por ingestão excessiva de grãos ricos em carboidratos em
bovinos pode ser fatal em 24 a 48 h, enquanto no cavalo pode ser fatal, vindo a óbito mais rapidamente.
O cuidadoso exame físico permite determinar a presença de desidratação e uma avaliação razoavelmente
precisa da sua intensidade. Durante o tratamento, a reavaliação clínica regular é importante para a
determinação da sua eficácia. A importância do exame físico é muito maior quando em condições de campo,
particularmente na prática da clínica de animais ruminantes e equídeos, nas quais não se conta geralmente com
retaguarda para avaliações laboratoriais complementares. São comuns, por exemplo, na acidose metabólica
variados graus de depressão mental, fraqueza e ataxia. A desidratação participa na determinação de depressão
e fraqueza. Em animais neonatos com acidose metabólica associada com diarreia, é comum a incapacidade de
mamar. A história imediata da doença, a duração da mesma e o provável diagnóstico podem também auxiliar na
determinação da possível natureza e grau de desequilíbrios eletrolíticos e acidobásicos. Animais afetados com
diarreia aguda devido a uma enterite infecciosa estarão em provável estado de acidose metabólica e
hiponatremia. Na obstrução intestinal aguda em cavalos, há variados graus de desidratação e acidose
metabólica. Na obstrução do trato intestinal anterior, ou na dilatação e deslocamento com torção do abomaso
em ruminantes, há variados graus de desidratação e alcalose metabólica com hipocloremia e hipopotassemia.
Os achados clínicos podem auxiliar no estabelecimento do prognóstico e consequente evolução do processo. A
temperatura normal não é bom guia prognóstico, porém quando abaixo do normal sugere uma situação pior. Um
aumento gradualmente progressivo da frequência cardíaca indica que o paciente está piorando. O
pregueamento de pele fria e que persiste por mais de 30 s sugere intensa desidratação. A cianose das mucosas
bucais e o tempo de preenchimento capilar (TPC) maior do que 4 s sugerem um prognóstico de reservado a
mau, assim como a presença de taquipneia com apneia intermitente. A inabilidade do animal desidratado para
se manter em estação é geralmente mau sinal. A depressão intensa e a apatia são em geral observadas em
condições agudas, e o estado de coma é geralmente terminal.
A avaliação laboratorial complementar é muito útil para o estabelecimento da natureza, confirmar a presença
e a extensão dos desequilíbrios hídricos, eletrolíticos e acidobásicos, além de permitir o monitoramento do
progresso do tratamento. As análises mais frequentemente realizadas são:

Hematócrito e dosagem da proteína total (plasma ou soro): seus aumentos podem indicar desidratação e
sua intensidade, além de ter utilidade em monitorar a fluidoterapia e na interpretação clínica segundo os
valores do hematócrito e da concentração de proteína plasmática (Quadro 61.3)
Leucograma: a leucopenia por neutropenia com desvio à esquerda degenerativo indica prognóstico
desfavorável, enquanto o desvio regenerativo é indicativo de evolução favorável
Exame de urina: as variações da densidade urinária podem ser úteis na detecção de função renal
adequada frente à desidratação, bem como a análise de urina pode auxiliar na verificação da presença de
desequilíbrios acidobásicos, de cetoacidose diabética e de doença renal, respectivamente, por meio das
alterações do pH, presença de cetonúria e de glicosúria e proteinúria com sedimento anormal
Taxas de ureia ou nitrogênio ureico sanguíneo e de creatinina: complementam a avaliação da função
renal
Glicemia: permite a identificação dos casos de diabetes melito ou de hipoglicemia associada à desidratação
Taxas de íons séricos: em geral indicam a gravidade das suas perdas e qual a necessidade de reposição
Hemogasometria: permite determinar a gravidade e a natureza do desequilíbrio acidobásico.

QUADRO 61.3 Interpretação clínica simultânea dos valores do hematócrito e da concentração de proteína
plasmática.

Hematócrito Proteína plasmática Interpretação

Aumentado Aumentada Desidratação

Aumentado Normal ou diminuída Contração esplênica, policitemia, desidratação com hipoproteinemia


preexistente

Normal Aumentada Animal hidratado com hiperproteinemia, anemia com desidratação

Diminuído Aumentada Anemia com desidratação, anemia com hiperproteinemia preexistente

Normal Normal Hidratado, desidratação com anemia preexistente e hipoproteinemia,


hemorragia aguda, desidratação com desvio para compartimento secundário

Diminuído Diminuída Perda de sangue, anemia e hipoproteinemia, hiper-hidratação

Diminuído Normal Anemia sem perda de sangue e sem desidratação

Volume de fluido a utilizar


O cálculo da quantidade de fluido a ser utilizado para o tratamento deve prever a reposição das perdas atuais,
ou seja, ser suficiente para reidratar o animal; propiciar quantidade de líquidos para atender às necessidades de
manutenção e das perdas contínuas. Se o animal em tratamento continua a perder água, esta quantidade
adicional deve ser calculada e somada aos volumes usados para reidratar e para manutenção e reposição das
perdas contínuas. O volume de reposição de fluido para a correção da desidratação é calculado com base na
avaliação clínica do grau de desidratação que considera a perda em relação ao peso corporal em porcentagem,
segundo as fórmulas seguintes:

Grau de desidratação (%) × peso corporal (kg) × 10 = quantidade em mililitros (m )


Grau de desidratação (valor decimal) × peso corporal (kg) = quantidade em litros
Grau de desidratação (%) × peso corporal ÷ 100 = quantidade em litros
O volume necessário para a manutenção e o atendimento das perdas contínuas apresenta variações
conforme a espécie, a idade e o porte do animal. Em cães e gatos considera­se genericamente que esse
volume deve estar entre 40 e 60 m /kg/dia, recomendando­se para cães de grande porte o volume mínimo e
para cães de menor porte, volume acima do mínimo até o máximo. Em relação aos gatos, deve­se estar atento
à capacidade do volume vascular (40 a 55 m /kg), que compreende quase a metade do volume vascular do cão
(90 m /kg), ou seja, apesar de o volume calculado para manutenção ser semelhante ao de um cão de porte
normal, a velocidade e a via de administração devem ser consideradas, como também a avaliação individual de
cada caso, respeitando o volume de perda e a ingestão de água. É de suma importância estar atento ao volume,
à velocidade e à frequência de administração nos felinos, pois nesta espécie há possibilidade de manifestação
mais frequente de edema de subcutâneo, efusão pleural e até de edema pulmonar devido a hipervolemia.
No caso de animais ruminantes e equídeos o volume é calculado com base no intervalo entre 50 e 100
m /kg/dia. Nos animais adultos deve ser considerado o volume mínimo de 50 m e para animais jovens o volume
máximo de 100 m , considerando que para neonatos o volume pode ser maior e de cerca de 130 m /kg/dia.

Necessidades de eletrólitos e bicarbonato


A estimativa dos déficits de eletrólitos pode ser calculada com base na diferença entre valores normais e
aqueles mensurados no animal afetado. Assim o déficit total do eletrólito em miliequivalentes (mEq) é o
produto do déficit do eletrólito em mEq/litro (mEq/ ) (valor esperado – valor medido) e o tamanho do espaço
do fluido extracelular como a porcentagem do peso corporal (kg). Assim, tem­se:

Déficit total do eletrólito (mEq) = déficit do eletrólito (mEq/ ) × 0,3 × peso corporal

Fórmula semelhante pode ser utilizada para estimar o déficit de bicarbonato nos animais afetados por
acidose metabólica. Nesse caso, podem­se usar os valores de bicarbonato (HCO3–) ou do excesso ou déficit de
bases determinados pela hemogasometria. Assim, tem­se:

Déficit de bicarbonato (mEq ou mmol/ ) = (HCO–3 normal – HCO–3 medido) × 0,3 × peso corporal

Obs.: o índice 0,3 pode ser substituído pelo valor 0,5, principalmente para os animais das espécies canina e
felina.
Ou

Déficit de bicarbonato (mEq ou mmol/ ) = déficit de base × 0,3 × peso corporal

Fluidos ou soluções a utilizar


Com base no histórico clínico, nas manifestações clínicas e avaliações laboratoriais, pode­se determinar qual a
necessidade de fluido e/ou de eletrólitos no tratamento em questão. Nessa condição ideal, os déficits podem ser
mais precisamente evidenciados, e fluidos ou soluções contendo os elementos deficitários podem ser indicados.
Como nem sempre se dispõe dessa condição ideal de avaliação dos déficits, deve­se optar por soluções
eletrolíticas balanceadas. De forma geral, na escolha do fluido devem­se levar em consideração suas finalidades
básicas (alcalinização ou acidificação do LEC; eletrólitos, diluição do LEC; manutenção; fornecimento de
nutrientes, aditivos concentrados), como a seguir:

Repor ou corrigir o volume do LEC: a solução deve restaurá­lo sem sua alteração qualitativa; são
soluções que contêm Na+, Cl–, K + e HCO–3 ou precursores, em concentrações similares às do LEC (plasma)
Alcalinização do LEC: são soluções indicadas para a correção da acidose metabólica; são aquelas que
contêm bicarbonato de sódio ou seus precursores (lactato, acetato)
Acidificação do LEC: em princípio, esses fluidos têm a finalidade de corrigir a alcalose metabólica, todavia
na atualidade não se recomendam soluções contendo agentes acidificantes específicos (soluções de HCl ou
de NH4Cl)
Diluição do LEC: deve proporcionar água sem provocar choque osmótico nas hemácias (soluções
isotônicas)
Manutenção: são fluidos que devem substituir a água de bebida, nutrientes e eletrólitos contidos nos
alimentos
Aditivos concentrados: geralmente são soluções que contém um único sal e são adicionadas a outras
soluções para repor determinadas substâncias deficitárias.

A fluidoterapia conservadora é eficiente quando não estão ocorrendo alterações eletrolíticas específicas ou
quando não existem meios para determinar­se qual o desequilíbrio eletrolítico presente. Consideram­se
soluções balanceadas aquelas que não induzirão anormalidades no paciente e que são isotônicas, ou seja, as
usadas para repor ou corrigir o volume do LEC. Todavia, não constituem meio eficiente para a correção de
acidose, alcalose, hiponatremia e hipopotassemia graves. As principais soluções utilizadas na fluidoterapia dos
animais domésticos, suas respectivas composições, finalidades e indicações de cada uma delas estão contidas
no Quadro 61.4. No Quadro 61.5 mostra­se a composição normal do plasma nas diferentes espécies de animais
domésticos.

Vias de administração
A escolha da via de aplicação de fluidos dependerá de: (1) tipo de afecção a ser tratada e da sua gravidade; (2)
estado clínico e das funções orgânicas do paciente; (3) grau de desidratação e tipo de desequilíbrio eletrolítico;
(4) duração/evolução da enfermidade; e (5) tempo e equipamento disponíveis.
A via oral talvez seja a mais fácil, econômica e fisiológica das vias de administração de fluidos e eletrólitos.
É a mais segura via de aplicação porque a solução pode ser fornecida sem atenção rigorosa quanto a
tonicidade, volume e assepsia. É indicada na desidratação discreta, na administração de fluidos para
manutenção e suplementação nutricional. É contraindicada na desidratação intensa, quando há vômito ou íleo
paralítico, e para animais com incapacidade de sugação/deglutição (bezerros com acidose moderada a intensa)
em que a sondagem nasogástrica torna o procedimento pouco prático.

QUADRO 61.4 Composição, finalidade e indicações das principais soluções utilizadas em fluidoterapia.

Na+ Cl K+ Ca++/Mg++ HCO 3 Glicose Osmolalidade


Finalidade (mEq/ ) (mEq/ ) (mEq/ ) (mEq/ ) (mEq/ ) (g/ ) (mOsm/ )/pH Indicação

Para reposição ou correção de volume do líquido extracelular

0,9% NaCl (solução fisiológica) 154 154 / 308 Expansão do volume;


5 sangue circulante
alcalose

Ringer 147,5 156 4 4,5/ 310 Expansão do volume;


5,5 alcalose

Lactato de Ringer de sódio 130 111 4 3/ 27 lactato 274 Acidose


6,5

Solução McSherry 138 100 12 3/5 50 acetato 308 Acidose/expansão do


volume

5% glicose em 0,9% NaCl 154 154 / 50 558 Expansão do volume


4

Soluções alcalinizantes

1,3% NaHCO3 (isotônica) 156 / 156 312 Acidose

5% NaHCO3 (hipertônica) 600 / 600 1.200 Acidose grave


Soluções acidificantes (0,9% NaCl;
Ringer)

0,9% NaCl+2,5 g KCl/ 154 188 34 / 376 Alcalose;


hipocloremia e
hipopotassemia

QUADRO 61.5 Composição do plasma de acordo com a espécie animal.

Ca++ (mg/d )/Mg++


Plasma normal Na+ (mEq/ ) Cl (mEq/ ) K+ (mEq/ ) (mg/d?) (ionizado) HCO 3 (mEq/ )

Equinos 141 101 4,2 4,5/2 24

(131 a 147) (95 a 107) (3,2 a 5,2)

Bovinos adultos 145 100 4,4 5,4/2,3 24 a 30

(135 a 155) (90 a 110) (4 a 5)

Bezerros 130 95 4,2 5,4/2,3 22 a 28

(115 a 145) (75 a 115) (3,5 a 5)

Caninos 143 (137 a 149) 106 4,4 4,9/1,9 20 a 29

(99 a 110) (3,9 a 5,2)

Felinos 151 120 4,3 /2,2 18

(147 a 156) (117 a 123) (4 a 4,5)

A via retal, relativamente pouco usada, poderia ser considerada especialmente em animais muito jovens.
A via intraóssea é referida em pequenos animais, particularmente filhotes, porém não é muito utilizada
pelas dificuldades que apresenta, além dos riscos de contaminação.
As vias parenterais são as mais usadas e talvez as mais práticas para a aplicação de fluidos e eletrólitos:
intravenosa ou endoflébica, subcutânea ou intraperitoneal.
A via intravenosa é a mais versátil, sendo a via de eleição para a terapia de perdas agudas de líquidos, nas
alterações do equilíbrio hidreletrolítico de moderadas a graves, prostração intensa com incapacidade de
sugação/deglutição, nos estados de choque e na administração de fluidos não isotônicos. Todos os fenômenos
tóxicos de soluções administradas por essa via, fundamentalmente, se relacionam mais à velocidade de
aplicação do que à composição e ao volume ministrado. Alguns dos problemas vistos com o uso desta via
referem­se a manutenção e assepsia de cateteres para fluidoterapia de longo tempo, coagulação e hematomas,
maior risco de tromboembolismo e infecção. Grandes volumes de fluidos administrados rapidamente podem
determinar sobrecarga do sistema cardiocirculatório, provocando efusão pleural, edema pulmonar e até a morte.
É a via preferida, ainda, para a administração de sangue, plasma sanguíneo e expansores do volume
plasmático.
A via subcutânea é utilizada particularmente em pequenos animais, podendo ser usada em ruminantes de
pequeno porte ou bezerros jovens, todavia, não é indicada em grandes animais adultos por causa dos enormes
volumes de fluidos que devem ser administrados. Nos pequenos animais é usada com certa frequência, porém
as soluções devem ser isotônicas e são absorvidas mais lentamente que pela via intravenosa. É recomendada
para manutenção de fluidoterapia em doenças crônicas, desidratação discreta e em animais jovens ou muito
pequenos. É uma via contraindicada em perdas agudas de fluidos, desidratação grave, hipotermia, hipotensão e
quando existe edema de subcutâneo. A glicose em qualquer concentração ou soluções que não contenham
eletrólitos em teores isotônicos são contraindicadas pela via subcutânea.
A via intraperitoreal é de mais rápida absorção do que a via subcutânea para a infusão de fluidos, sendo,
todavia, potencialmente mais perigosa que esta, pois apresenta riscos de peritonite, se não houver rigorosa
assepsia, como também de perfuração de órgãos abdominais. É uma boa via para a absorção de água e
eletrólitos, sendo o plasma e a grande porcentagem de eritrócitos do sangue total absorvidos pelo peritônio.
Tem recomendação em neonatos das espécies ovina e suína, podendo ser usada para administração de
grandes volumes de fluidos em grandes animais, porém a principal indicação desta via seja, talvez, para a
lavagem peritoneal.

Velocidade ou taxa de administração


A velocidade de administração de fluidos depende do tamanho do animal, da intensidade da desidratação ou da
enfermidade, da forma aguda ou crônica com que as perdas de líquidos se estabeleceram, a condição
cardiovascular, da composição do fluido que está sendo usada e da resposta apresentada pelo paciente à
fluidoterapia. As perdas agudas e volumosas de fluidos demandam uma rápida reposição de líquidos, e as
crônicas, uma administração gradativa do fluido para facilitar restauração dos equilíbrios intra­ e extracelular,
evitando­se efeitos colaterais. Inicialmente, os fluidos devem ser administrados rapidamente e após mais
lentamente, até a correção da alteração. Ao utilizar­se a via intravenosa, uma regra geral consiste em
administrar fluidos na velocidade maior até que se restabeleça o fluxo urinário e, posteriormente, a taxa deve ser
reduzida em um terço e mantida até a reposição completa, mas sempre monitorada. Caso o fluxo urinário não
se faça presente, a cada hora deverá reduzir­se a velocidade à metade. A administração de fluidos isotônicos e
com composição eletrolítica semelhante à do plasma pode ser realizada seguramente nas grandes perdas
agudas, em uma taxa de: até 90 m /kg/hora aos cães; 40 a 55 m /kg/hora aos gatos; 30 a 40 m /kg/hora a
bezerros, podendo chegar até 80 m /kg/hora; 20 a 25 m /kg/hora a bovinos e a equinos adultos, com limite
máximo de 40 m /kg/hora. Todavia, é necessário, com essas maiores taxas, monitorar as funções renal e
cardiovascular, observando­se os sinais de sobrecarga fluídica (inquietação, tremores, taquicardia, descarga
nasal serosa, taquipneia, estertores úmidos, tosse e ganho de peso corpóreo).
Soluções hipertônicas de bicarbonato de sódio com concentração maior que 1,3% devem ser ministradas
com velocidade reduzida a um terço; soluções em que se adicionou potássio devem ser ministradas
cautelosamente em taxa semelhante, não devendo conter mais do que 10 a 20 mEq de K +/ e de forma a não
exceder a taxa de 0,5 mEq/kg/hora. Essas soluções contendo potássio devem ser utilizadas após a correção da
acidose e da desidratação.

Avaliação da fluidoterapia
O único método eficiente para a avaliação do êxito da terapia é a utilização do exame clínico. Neste julgamento
deve­se considerar a gravidade inicial da desidratação e das alterações dos equilíbrios eletrolítico e acidobásico.
A boa resposta clínica à fluidoterapia é indicada pela recuperação das funções vitais, melhoria na coloração das
mucosas, regularização da arritmia e bradicardia presentes na hiperpotassemia, pela micção com retorno da
função renal dentro de 30 a 60 min, melhoria da depressão e mais tardia recuperação do turgor de pele e pelo
desaparecimento da enoftalmia. As respostas desfavoráveis incluem: dispneia, tosse, estertores úmidos em
caso de edema pulmonar; ausência de micção devido a insuficiência renal ou paralisia de bexiga urinária;
taquicardia e persistência da depressão.
Se houver retaguarda laboratorial disponível: a determinação seriada do hematócrito e as proteínas totais
séricas servem para avaliar a reidratação; a diminuição da azotemia (principalmente da ureia sérica) indica
retorno da perfusão renal; a hemogasometria – pH, bicarbonato/BE e pCO2 – possibilita avaliar a recuperação
do equilíbrio acidobásico. O retorno ao valor normal dos diversos parâmetros avaliados é indicativo do sucesso
da fluidoterapia.

FLUIDOTERAPIA EM CÃES E GATOS


A seguir, são apresentadas algumas das afecções clínicas mais frequentemente observadas nas espécies
canina e felina e que requerem a indicação de fluidoterapia.

Afecções gastrintestinais

Vômitos
Os episódios eméticos estão relacionados com os processos primários localizados no estômago e no duodeno, e
também com algumas alterações metabólicas em que há o comprometimento central (ativação do centro do
vômito decorrente de várias substâncias), como na insuficiência renal, na doença hepática, na pancreatite e na
cetoacidose pelo diabetes melito. O surgimento de déficit de eletrólitos, ácidos e água está na dependência da
frequência, do volume e da composição do material eliminado durante os episódios eméticos. Geralmente, as
principais alterações observadas estão associadas aos quadros de desidratação, alcalose metabólica,
hipocloremia e hipopotassemia.
A hipopotassemia ou hipocalemia que se desenvolve durante os episódios eméticos pode estar
relacionada a: (1) perda de potássio presente no material emético (suco gástrico; (2) perda de potássio através
da urina decorrente da ativação do sistema renina­angiotensina­aldosterona, em resposta ao quadro de
desidratação (a aldosterona favorece a reabsorção de sódio e a eliminação de potássio no segmento do túbulo
contornado distal) e; (3) presença de alcalose metabólica (bicarbonatúria favorece a reabsorção renal de sódio e
a eliminação de potássio no nível do túbulo contornado distal).
Com relação à hipocloremia, esta pode ocorrer como consequência da perda de cloro presente no material
emético, pois este íon encontra­se em altas concentrações no suco gástrico de origem do ácido clorídrico (HCl,
ácido forte – dissociado em H+ e Cl–), conforme descrito no Quadro 61.6.
No atinente à variação da concentração sérica do íon sódio, alterações mais evidentes podem estar
presentes nos quadros frequentes de vômito. Quanto ao desenvolvimento de hiponatremia, observa­se que
esta pode estar relacionada à perda de sódio presente no suco gástrico, bem como ao aumento da ingestão de
água e à ação do hormônio antidiurético (ADH), em resposta ao quadro de desidratação.
Quanto ao desequilíbrio acidobásico, a alcalose metabólica é a principal alteração relatada nos casos de
episódios frequentes ou incoercíveis de vômito e de obstrução de piloro, e ocorre devido à perda de grande
quantidade de ácido clorídrico (HCl) presente no suco gástrico. Entretanto, alguns animais podem não
apresentar alterações na hemogasometria, pois a perda de suco gástrico (HCl) pode ser compensada pela
perda de bicarbonato (HCO3–) presente no suco pancreático, não comprometendo o pH sanguíneo.
Eventualmente, a acidose metabólica também pode ser observada nos casos de vômitos em que ocorre a perda
predominante de suco pancreático ou, ainda, associada à desidratação (azotemia pré­renal), à acidose láctica
por diminuição de perfusão tecidual e à diarreia.
Os episódios eméticos frequentemente estão associados à perda, também, de grande quantidade de íon
cloro (HCl ou KCl), fato este que pode contribuir para o desenvolvimento de alcalose metabólica hipoclorêmica
ou para a perpetuação da alcalose. Durante o processo de reabsorção de sódio nos túbulos renais, na tentativa
de manter a volemia no organismo, geralmente ocorre a reabsorção concomitante de Cl–; entretanto, como
existe o déficit de cloreto, ocorre a saída de íons K+ ou H+ da célula e, em seguida, a reabsorção de bicarbonato
(HCO3–). Nessas condições, é possível a detecção de urina de pH ácido associada a alcalose metabólica,
chamada de acidúria paradoxal.
O Quadro 61.6 apresenta a composição das secreções gastrintestinais do cão.

Indicações de fluidos nos casos de vômito


A seguir, são apresentadas as principais soluções utilizadas na fluidoterapia de cães e gatos. O tipo ideal de
composição de fluido a ser administrado deve ser determinado após a mensuração sérica de eletrólitos
(potássio, sódio e cloro) e a avaliação da hemogasometria. Na impossibilidade de avaliação laboratorial, a
escolha do fluido deve ser baseada na patogenia do processo emético, conforme descrito anteriormente.
Entretanto, as determinações eletrolíticas e a avaliação das variáveis da hemogasometria irão assegurar a
indicação mais adequada e, assim, o sucesso da terapia.
Solução de Ringer. Indicada para reposição de sódio e cloro e pequena quantidade de potássio.
Solução fisiológica (NaCl 0,9%). Recomendada somente para a reposição de sódio e cloro, havendo a necessidade de
suplementação de potássio em casos de episódios frequentes de vômitos. Sugere­se que a suplementação de potássio não
deve exceder 0,5 mEq KCl/kg/h. A dose segura de suplementação de potássio deve basear­se no déficit do eletrólito,
conforme apresentado no Quadro 61.5. É importante ressaltar que não se recomenda administrar soluções que contenham
concentrações maiores que 20 mEq/ . Caso não haja possibilidade de avaliar laboratorialmente os eletrólitos no leito, o
monitoramento pelo traçado eletrocardiográfico, durante a fluidoterapia, pode trazer informações a respeito do
desenvolvimento de hiperpotassemia, mas ressalta­se que não se trata de procedimento que possa substituir a mensuração
sérica do cátion.

QUADRO 61.6 Composição aproximada das secreções gastrintestinais do cão.

Sódio (mEq/ ) Potássio (mEq/ ) Cloro (mEq/ ) Bicarbonato (mEq/ ) pH

Saliva 40 a 60 13 a 32 40 a 50 23 7,2 a 7,8

Suco gástrico 40 a 80 10 a 20 100 a 140 0 1,4 a 7

Bile (vesícula) 220 a 340 6 a 10 1 a 10 0 a 17 5,6 a 7,4

Suco pancreático 149 a 162 4a5 71 a 106 135 a 148 7,1 a 8,2

Duodeno 138 a 156 5a9 103 a 139 5 a 20 6,5 a 7,6

Jejuno 126 a 152 4 a 10 141 a 155 5 a 27 6,3 a 7,3

Íleo 146 a 156 5a7 68 a 88 70 a 114 7,6 a 8

Cólon 136 a 151 6a9 60 a 88 86 a 93 7,9 a 8

Fonte: DiBartola, 1992.

É importante lembrar que o volume de água deve ser sempre considerado nos cálculos para a reposição de
eletrólitos ou de base.

Diarreia
A diarreia pode manifestar­se em consequência de 4 mecanismos: osmótico, secretório e por alterações na
permeabilidade e na motilidade intestinal. Geralmente, a diarreia desenvolve­se pela combinação de vários
mecanismos que acarretam perdas hídrica, eletrolítica e de substâncias tampão (bicarbonato). A magnitude do
déficit dos elementos retrocitados depende do mecanismo responsável pela manifestação da diarreia, bem como
do volume fecal, da frequência e da duração do processo.
As alterações hidreletrolítica e acidobásica estão na dependência, na maioria das vezes, dos mecanismos
que ocasionaram a diarreia. A diarreia osmótica (por insuficiência pancreática exócrina ou por má absorção)
pode propiciar a perda de maior quantidade de água e também de outros elementos, exceto o sódio. Assim,
observa­se tendência ao desenvolvimento de hipernatremia nos casos de diarreia do tipo osmótico, quando se
compara com outros casos de diarreia de etiologia diversa. A diarreia causada por alteração da permeabilidade
intestinal (linfangiectasia, histoplasmose e linfossarcoma intestinal) pode vir acompanhada de hipoproteinemia e,
geralmente, este fato requer atenção especial no momento da indicação da fluidoterapia.
A hipopotassemia (ou hipocalemia) é achado relativamente frequente nos casos de diarreia profusa, e
independe do tipo de mecanismo que a ocasionou. A perda de potássio também pode ser agravada pelo
processo de desidratação que se associa ao hiperaldosteronismo (ativação do sistema renina­angiotensina­
aldosterona pela hipovolemia/hipotensão). Em alguns casos, os animais podem apresentar hiperpotassemia e,
geralmente, a acidose metabólica parece ser a causa desencadeante.
Em relação ao íon sódio, os valores da concentração sérica podem ser variados; geralmente não se
observam alterações significativas. Eventualmente, a hipernatremia pode estar presente nos casos de diarreia
osmótica, e a hiponatremia pode ocorrer em consequência da ativação do mecanismo da sede (ingestão de
grande quantidade de água) devido à desidratação. No que tange ao ânion cloreto, observa­se com mais
frequência a presença de hipocloremia, sendo esta associada a hiponatremia, principalmente nos casos de
diarreia acompanhada de vômitos.
A perda de bicarbonato durante os quadros diarreicos pode acarretar o desenvolvimento de acidose
metabólica, sem alteração do anion gap, sendo esta condição normalmente observada em casos graves de
diarreia.

Indicações de fluidos nos casos de diarreia


A escolha do tipo de composição de fluido, das vias e da velocidade de administração está na dependência da
gravidade do quadro clínico e do processo etiológico.
Em animais desidratados, recomenda­se que a correção do déficit hídrico seja iniciada o mais rapidamente,
utilizando­se a via intravenosa e/ou subcutânea de acordo com a avaliação clínica geral. A via oral pode ser
recomendada nos casos em que o animal apresenta um bom estado geral, sem sintomas de vômitos e com
episódios diarreicos esparsos, bem como em alguns casos de fluidoterapia de manutenção.
Solução de lactato de Ringer de sódio. Esta solução apresenta na composição (sódio, cloro, potássio e substância
alcalinizante) a maioria dos elementos em déficit que os pacientes com diarreia podem apresentar. Em casos mais graves,
como nos processos diarreicos agudos de etiologia viral (parvovirose, no cão; panleucopenia, no gato), além da
suplementação dos elementos anteriormente citados, recomenda­se, também, a administração de glicose (em concentração
de 5%) e o uso de antibióticos e corticosteroides, principalmente nos casos de choque séptico. Ainda, em casos mais graves,
recomenda­se a suplementação intravenosa de bicarbonato e de potássio (Quadro 61.7).
Solução fisiológica (NaCl 0,9%) e solução de Ringer. Estas soluções podem eventualmente ser utilizadas, mas é
essencial a adição de outros elementos (tais como potássio, glicose, bicarbonato...) de acordo com o déficit do paciente.
Deve­se evitar a adição de bicarbonato na solução de Ringer devido à presença de cálcio, que pode ocasionar a formação de
precipitado.
As informações relativas à composição dos fluidos, vias e velocidade de administração, bem como o cálculo
do volume de reposição hídrica e de manutenção, já foram apresentadas anteriormente e também são
apresentadas nos Quadros 61.7 e 61.8. Nos casos de episódios diarreicos agudos acompanhados de perda de
grande volume fecal, sem aparente alteração da elasticidade da pele, recomenda­se a administração de fluido
pela via intravenosa.
Recomendações gerais. Durante a fluidoterapia contínua, os animais devem ser monitorados diariamente, se possível
avaliando­se hematócrito, proteínas totais séricas e peso corpóreo.

Indicações de fluidos nos casos de diarreia e vômito


Os animais que apresentam concomitantemente vômito e diarreia podem apresentar alterações mistas em
relação ao equilíbrio acidobásico e, geralmente, observa­se, também, a presença de hipopotassemia e
hipocloremia. Para a correção adequada do déficit dos elementos, a avaliação laboratorial é fundamental.

QUADRO 61.7 Quantidade (mEq de KCl) a ser suplementada no fluido, para administração intravenosa, de
acordo com a concentração sérica (cães e gatos).

Máxima velocidade de infusão de fluido


Potássio sérico observado (mEq/ ) mEq KCl a ser adicionado em 250 m de fluido (m /kg/hora)

<2 20 6

2,1 a 2,5 15 8

2,6 a 3 10 12

3,1 a 3,5 7 16
Valor de referência de potássio sérico: 3,9 a 5,2 mEq/ (cães); 4 a 4,5 mEq/ (gatos). Fonte: Chew e DiBartola, 1986. Observação: a solução de
cloreto de potássio a 19,1% (KCl 19,1%) corresponde a 1 m da referida solução e equivale a 2,56 mEq/ de potássio.

QUADRO 61.8 Volume (m ) de manutenção de fluido para cães e gatos durante o período de 24 horas.

Animais Volume e velocidade

Cães de grande porte 10 a 20 m /kg/dia

Cães de médio porte 10 a 20 m /kg/dia

Cães de pequeno porte 13 a 20 m /kg/dia

Gatos 13 a 20 m /kg/dia

Observações: os volumes mencionados não se aplicam aos animais com insuficiência cardíaca congestiva, insuficiência renal em fase oligúrica,
pois cada caso merece atenção diferenciada.

Obstrução intestinal
Os principais processos associados à obstrução intestinal estão relacionados com presença de corpos
estranhos, intussuscepção, vólvulo, neoplasia, lesão inflamatória transmural, aderências e constrições e
alterações funcionais, como o íleo paralítico, observado em casos de parvovirose, peritonite, hipopotassemia e
devido à ação de anticolinérgicos.
Nos processos prolongados de obstrução intestinal, localizada principalmente na região proximal, observa­se
o aumento da secreção intestinal, e este acúmulo de líquido favorece ainda mais a manifestação de vômitos.
Assim, os principais desequilíbrios eletrolíticos observados estão relacionados com hipopotassemia e
hipocloremia. Quanto às alterações do equilíbrio acidobásico, tanto a alcalose quanto a acidose metabólica
podem estar presentes.
Geralmente, os quadros de obstrução intestinal evoluem para lesão da parede do sistema gastrintestinal,
que pode predispor a endotoxemia, peritonite e, consequentemente, ao choque séptico e, por sua vez, evolução
para acidose metabólica.

Indicações de fluidos nos casos de obstrução intestinal


No início do processo de obstrução intestinal, a solução de lactato de Ringer de sódio pode ser recomendada.
É importante ressaltar que a análise laboratorial dos eletrólitos e do equilíbrio acidobásico é fundamental para a
correção adequada dos déficits, considerando­se que os processos de obstrução intestinal são acompanhados
de distúrbios mistos, principalmente do equilíbrio acidobásico.
Recomenda­se, também, a utilização das soluções de Ringer ou de NaCl 0,9%, principalmente nos casos
de alcalose metabólica, geralmente acompanhada de suplementação com cloreto de potássio (Quadro 61.7).

Afecções pancreáticas

Pancreatite aguda
A pancreatite aguda é um quadro mórbido relatado com mais frequência na espécie canina, sendo o agente
etiológico geralmente indeterminado. Alguns relatos associam a pancreatite aguda com obesidade, dieta,
hiperlipidemia e uso de fármacos como os corticosteroides. Independentemente da etiologia do processo,
observam­se aumento da permeabilidade celular e lisossomal, lesão da célula acinar pancreática e, por fim, a
autodigestão pancreática.
Os quadros de pancreatite aguda caracterizam­se pela presença de hipovolemia, associada a
hipopotassemia e acidose metabólica. A hipovolemia, que ocorre como consequência da perda de líquido
(vômitos, diarreia, sequestro de líquido intestinal e peritoneal) e da vasodilatação que se instala por ação das
substâncias vasoativas e da endotoxina, pode, por sua vez, ser a causa de perpetuação da lesão pancreática
por diminuição da perfusão tecidual.
As alterações eletrolíticas observadas na pancreatite aguda são pouco frequentes; os distúrbios mais graves
estão geralmente relacionados com hipopotassemia, hiponatremia e hipocloremia, principalmente nos casos
associados a episódios de vômitos incoercíveis.
Com relação ao equilíbrio acidobásico, a acidose metabólica é o distúrbio mais frequentemente observado
associado ao choque séptico, mas, eventualmente, a alcalose metabólica pode estar presente nos casos de
perda de grande quantidade de suco gástrico.

Indicações de fluidos na pancreatite aguda


O fluido de escolha é a solução de lactato de Ringer de sódio, que fornece a reposição de sódio, cloro,
potássio e de substância alcalinizante. Em algumas situações é necessária a administração de potássio, de
acordo com o déficit (Quadro 61.7), e a suplementação de bicarbonato de sódio somente é indicada quando o
pH sanguíneo for inferior a 7,1 a 7,2. Deve­se evitar a correção rápida da acidose metabólica, pois este
processo diminui a disponibilidade de cálcio ionizado, favorecendo­se a manifestação clínica de hipocalcemia.
Em casos de confirmação laboratorial de alcalose metabólica, as soluções de Ringer ou de NaCl 0,9%
podem ser administradas, acrescidas de cloreto de potássio, pois frequentemente os animais encontram­se com
baixas concentrações de potássio sérico.
Algumas vezes, os animais podem apresentar hipoproteinemia e estes devem ser submetidos à transfusão
de sangue ou plasma.
A administração parenteral de fluidos é de fundamental importância nos casos de pancreatite aguda, sendo
preferencial a via intravenosa. Os animais que se apresentam em choque hipovolêmico devem receber o fluido
em velocidade de 60 a 90 m /kg/hora, durante a primeira hora; recomenda­se o monitoramento criterioso, pois
existe a predisposição ao desenvolvimento de edema pulmonar.

Diabetes melito com cetoacidose


A cetoacidose diabética (CAD) caracteriza­se por ser uma emergência médica em que urge a necessidade de
instituição rápida de terapia adequada. Esse processo ocorre quando da existência de deficiência absoluta ou
relativa de insulina, associada a um excesso de hormônios hiperglicemiantes (catecolaminas, glucagon, cortisol
e hormônios do crescimento).
Na deficiência de insulina, instala­se a lipólise, processo em que os triglicerídeos são cindidos em ácidos
graxos livres e glicerol. O glicerol participa do processo de neoglicogênese e os ácidos graxos livres são
oxidados, culminando na produção de cetoácidos. Assim, os animais em CAD apresentam acidose metabólica,
cetonemia, além de desidratação, hiperglicemia e perda de eletrólitos.
O tratamento da CAD está focalizado em administração de insulina, hidratação, correção da acidose e do
déficit de eletrólitos (potássio e fósforo), sendo que os procedimentos necessitam de terapia intensiva, ou seja,
monitoramento frequente e assistido.

Indicações de fluidos na cetoacidose diabética


A fluidoterapia deve ser iniciada imediatamente no paciente em CAD, pois geralmente apresenta­se em grau
avançado de desidratação (hipovolemia) e com diminuição de débito cardíaco. Assim, a expansão de volume
intravascular é extremamente importante para se assegurar a perfusão tecidual, particularmente a melhora da
perfusão renal que auxilia na eliminação dos cetoácidos, bem como a diminuição dos valores da glicemia e da
osmolalidade, e abolir o estímulo contínuo da secreção de hormônios hiperglicemiantes. A escolha da
composição ideal de fluido focaliza­se, principalmente, no fato de que os cães e gatos em cetoacidose diabética
encontram­se em déficit total (corpóreo) de sódio e potássio; entretanto, a osmolalidade plasmática, na maioria
das vezes, não se encontra alterada devido à presença de hiperglicemia. Assim, não se justifica a administração
de fluido hipotônico. Portanto, preconiza­se a utilização da solução fisiológica (0,9% NaCl), que auxilia não só
na reposição do íon sódio, como também na correção da hipotensão e oligúria, por esta solução permanecer em
volume e período maior no meio intravascular.
Recomenda­se, ainda, durante a fluidoterapia, a suplementação de potássio de acordo com o déficit
observado (Quadro 61.6) ou, se não possível, administrar a dose segura e empírica (30 a 40 mEq/ ), com a
finalidade de se evitar o desenvolvimento de hipopotassemia durante a terapia com a insulina.
A correção da acidose metabólica com bicarbonato de sódio consiste em ponto controverso nos pacientes
com CAD. A acidemia per se causa depressão cardiopulmonar, agrava a hipotensão e a resistência à insulina,
mas ainda não se justifica a utilização do bicarbonato de sódio. A correção rápida da acidose, por exemplo, com
a administração de bicarbonato, pode ocasionar a acidose paradoxal no sistema nervoso central (sintomas
neurológicos evidentes), diminuição da oxigenação tecidual e efeito rebote da alcalose, pois os corpos cetônicos
são biotransformados em bicarbonato na presença de insulina. O ­hidroxibutirato e o acetoacetato são ânions
metabolicamente utilizáveis, ou seja, 1 mEq de bicarbonato é gerado de cada 1 mEq de cetoácido
metabolizável.
Recomenda­se a correção da acidose metabólica quando a concentração de bicarbonato plasmático for
inferior a 11 mEq/ e esta deve estar associada ao quadro clínico de apatia, depressão; cabe ressaltar que a
correção da acidose deve ser muito lenta e monitorada e o bicarbonato nunca deve ser administrado como
infusão rápida, recomendando­se a administração de somente parte do bicarbonato calculado no período de 6 h
de infusão contínua, com acompanhamento clínico e laboratorial (hemogasometria e eletrólitos) e, após, nova
avaliação do equilíbrio acidobásico e recálculo do déficit.
É importante ressaltar que a acidose metabólica pode ser corrigida, na maioria das vezes, somente com a
administração de insulina e fluidoterapia.

Afecções hepáticas
O parênquima hepático é acometido por várias doenças que culminam em graves alterações do equilíbrio
hídrico, eletrolítico e acidobásico. As principais alterações observadas em relação ao distúrbio eletrolítico
relacionam­se ao déficit de potássio e à retenção de sódio. A hipopotassemia desenvolve­se devido às perdas
gastrintestinais, à diminuição de ingestão e à perda renal em consequência do hiperaldosteronismo (ativação do
sistema renina­angiotensina­aldosterona), devido à diminuição do metabolismo hepático.
No que se refere ao íon sódio, apesar de o balanço geral indicar a retenção de sódio no organismo devido à
estimulação do sistema nervoso simpático, à ativação do sistema renina­angiotensina­aldosterona e à ação do
hormônio ADH, observa­se, normalmente, normonatremia ou hiponatremia. A normonatremia é passível de ser
detectada, pois os animais acometidos pela hepatopatia não apresentam alteração na relação sódio:água, pois
ambos os elementos encontram­se retidos no organismo. A hiponatremia, por sua vez, parece ocorrer em
consequência da expansão de volume intravascular, em consequência do comprometimento renal de excreção
de água e da ingestão contínua de água.
Já no que se relaciona ao desequilíbrio acidobásico, a alcalose respiratória parece ser a alteração mais
frequentemente relatada; entretanto, a alcalose e a acidose metabólicas, bem como os distúrbios mistos, podem
acompanhar as afecções hepáticas.
Em seres humanos, descreve­se que o desenvolvimento da alcalose respiratória parece estar relacionada
com hiperamonemia, fatores hormonais estimulando o centro respiratório, acidose intracelular do sistema
nervoso central, hiponatremia, sepse etc. e a alcalose metabólica ao uso contínuo de diuréticos (furosemida), à
hipopotassemia, ao hiperaldosteronismo e aos casos de episódios eméticos frequentes. A manifestação de
acidose metabólica nos casos de hepatopatia acompanha, na maioria das vezes, a acidose láctica. Por ser
atribuída ao fígado a função de remoção de ácido láctico, nos processos hepáticos em que ocorre a produção
do referido ácido, a exemplo dos casos acompanhados de hipovolemia, sepse e alcalemia, existe a propensão
ao acúmulo dessa substância.
Em cães e gatos, descreve­se também que outros fatores podem contribuir para o desenvolvimento de
acidose metabólica nos casos de hepatopatia, como a presença de diarreia, desidratação e choque.

Indicações de fluidos nos casos de hepatopatia


Na insuficiência hepática aguda, recomenda­se a utilização da solução de Ringer, acrescida de 20 a 30
mEq KCl/ , por via intravenosa. Já para os casos de insuficiência hepática crônica, devido à probabilidade de
retenção de sódio, preconiza­se a solução de 0,45% de NaCl, ou ainda, a solução de glicose 5%. O
monitoramento da concentração sérica de potássio deve ser frequente, principalmente nos casos crônicos,
sendo a suplementação ideal baseada no cálculo do déficit (Quadro 61.7).
Geralmente, as soluções alcalinizantes (soluções de lactato de Ringer de sódio e de bicarbonato de sódio)
não são recomendadas para os casos graves, principalmente quando da manifestação de encefalopatia
hepática. Quando da necessidade de correção da acidose metabólica, indicam­se soluções que contenham
bicarbonato, evitando­se o lactato, pois o fígado teria, ainda, que biotransformar o lactato em bicarbonato.
Recomenda­se, ainda, acrescentar glicose nas soluções (concentração final de 2,5 a 5%), tanto para os
processos agudos como para os crônicos.

Afecções renais
Basicamente, a lesão do parênquima renal pode ocasionar a perda da capacidade do rim em reabsorver água
(manutenção da água no organismo), como também em excretar os metabólitos tóxicos (diminuição da taxa de
filtração glomerular), sendo que essas alterações são evidentes, para o caso do cão, quando aproximadamente
cerca de 2/3 e 3/4 do parênquima renal apresenta­se comprometido (insuficiência renal), respectivamente. Para
a espécie felina, a poliúria ou a perda da capacidade renal de concentração urinária ocorre após a diminuição da
taxa de filtração glomerular, ou seja, quando da perda de 3/4 e 2/3 do parênquima renal, respectivamente.
A insuficiência renal aguda (IRA) caracteriza­se por apresentar perda repentina da função renal e, portanto,
de evolução clínica aguda. Geralmente os animais apresentam vômitos, diarreia, prostração, alterações
neurológicas, oligúria etc. decorrente do acúmulo de toxinas urêmicas que acompanham a deterioração rápida
da função renal. Muitos dos casos de IRA evoluem para oligúria pois há lesão concomitante da maioria dos
néfrons; entretanto, a fase não oligúrica, ou ainda poliúrica, pode estar presente. A indicação de fluidoterapia
inicial é idêntica para qualquer caso de doença renal aguda, independente do agente etiológico. Caso seja
possível, por se tratar de processo agudo, recomenda­se a elucidação da provável causa, para que se possa
instituir outras medidas terapêuticas e assegurar ou evitar o desenvolvimento de mais lesões nos rins.
Alterações dos equilíbrios acidobásico e eletrolítico são também frequentes na IRA. Existe a tendência ao
desenvolvimento de acidose metabólica, pois os rins perdem a capacidade de excretar os radicais ácidos
(oriundos das toxinas urêmicas que deveriam ser excretadas pela taxa de filtração glomerular), como também
de reabsorver o bicarbonato. Ainda, o comprometimento da taxa de filtração glomerular e do fluxo sanguíneo
renal acarretam o acúmulo de potássio sérico (hipercalcemia), favorecendo o aparecimento de distúrbios da
condução elétrica da musculatura cardíaca. Já em relação à insuficiência renal crônica, atualmente denominada
doença renal crônica (DRC), classificada em estágios, observa­se que de acordo com a fisiopatologia da DRC, a
perda gradativa dos néfrons não ocasiona o aparecimento de sintomas clínicos evidentes, pois os mecanismos
adaptativos são ativados gradativamente. Por se tratar de doença de evolução crônica, as manifestações
clínicas observadas são discretas, sendo estas mais evidentes nos estágios mais avançados, tais como poliúria,
acompanhada de polidipsia compensatória, perda gradativa de peso, e quadros mais graves tais como vômito,
diarreia, desidratação, halitose e anemia.
Entre os cães, a perda da capacidade renal em conservar a água no organismo ocorre anteriormente ao
comprometimento da excreção de metabólitos tóxicos; em relação à espécie felina, geralmente os animais que
apresentam poliúria também já exibem diminuição da taxa de filtração glomerular (azotemia).
Nos casos de desidratação, a diminuição de volume no meio intravascular propicia a ativação do sistema
renina­angiotensina­aldosterona que, por sua vez, determina a perda urinária de potássio, favorecendo o
aparecimento de hipopotassemia. Para a espécie felina é provável também a existência de déficit de potássio no
meio intracelular, justificando­se a necessidade de suplementação desse íon, mesmo nos casos de
normocalemia ou normopotassemia. A suplementação de potássio deve ser sempre monitorada.
Assim, a fluidoterapia na insuficiência renal apresenta como objetivo a correção dos déficits hídrico,
eletrolítico e acidobásico, bem como a terapia de manutenção, que visa, além da reposição dos elementos,
também auxiliar na manutenção hídrica e, assim, assegurar o fluxo da taxa de filtração glomerular.
Indicações de fluidos nos casos de afecções renais
Insuficiência renal aguda
A acidose metabólica é o distúrbio observado com frequência nos casos graves de insuficiência renal aguda.
Preconiza­se, portanto, a utilização de fluidos que contenham substâncias alcalinizantes. Pode­se inicialmente
administrar a solução de lactato de Ringer de sódio mas, na dependência da intensidade da acidose, será
necessária a administração de bicarbonato (adicionar o bicarbonato somente em soluções isentas de cálcio –
não utilizar as soluções de Ringer e de lactato de Ringer).
Os animais desidratados devem receber inicialmente volume de fluido calculado de acordo com o déficit
hídrico (volume de reposição), com base nas variáveis anteriormente citadas, dentro do período de
administração recomendado, e sempre submetido ao monitoramento contínuo, principalmente do sistema
cardiovascular e fluxo urinário. Uma vez alcançada a hidratação, deve­se recalcular a dose de fluido,
considerando­se as necessidades de manutenção e de perdas, que deve estar baseada de acordo com a
existência ou não de poliúria ou oligúria, ou de perdas de líquido por episódios eméticos ou diarreia (Quadros
61.8 e 61.9). Ainda, é imprescindível monitorar não só pelo exame físico (peso corpóreo, elasticidade da pele,
estado mental, frequência e qualidade do pulso, frequência e padrão respiratório, auscultação pulmonar,
coloração de mucosas e perfil preenchimento capilar), mas também laboratorialmente (hematócrito, proteínas
totais, eletrólitos, ureia e creatinina séricas, lactato sanguíneo e hemogasometria) e avaliar o balanço dos
volumes da quantidade de fluido administrada e do volume urinário produzido para que se tenha informações
mais fidedignas para o cálculo de volume de infusão.

QUADRO 61.9 Volume (m ) de manutenção de fluido para cães e gatos durante o período de 24 horas em
quadros clínicos associados a perda de líquido/secreções.

Animais Volume e velocidade

Cães de grande porte 30 a 40 m /kg/dia

Cães de médio porte 40 a 50 m /kg/dia

Cães de pequeno porte 50 a 60 m /kg/dia

Gatos 50 a 60 m /kg/dia

Observações: os volumes mencionados não se aplicam aos animais com insuficiência cardíaca congestiva, insuficiência renal em fase oligúrica,
pois cada caso merece atenção diferenciada.

É importante ressaltar que a oligúria no paciente com insuficiência renal deve ser estabelecida somente
após a hidratação do animal e, assim, uma vez confirmado o baixo fluxo de volume urinário (oligúria < 1
m /kg/hora), outras medidas terapêuticas devem ser tomadas para se assegurar a diurese, como a utilização de
solução de glicose 25% (diuréticos osmóticos) e/ou de diurético potente de alça (furosemida), sempre sob
avaliação e monitoramento contínuo.
Outros tipos de fluidos também podem ser utilizados no tratamento da insuficiência renal aguda, como a
solução fisiológica e a solução glicofisiológica, acrescida de bicarbonato, quando necessário, sempre
baseada na avaliação laboratorial.
A hiperpotassemia é achado relativamente frequente nos casos de IRA, principalmente quando da presença
de oligúria e de acidose metabólica. Após a correção da acidose, observa­se a diminuição da concentração
sérica de potássio, devido ao deslocamento do cátion para o meio intracelular. Eventualmente, em casos mais
brandos, a simples correção da hiperpotassemia pode ocorrer após a fluidoterapia. A quantidade de potássio
presente nas soluções de Ringer e de lactato de Ringer de sódio não é suficiente para desencadear a
hiperpotassemia.

Doença renal crônica descompensada ou em crise urêmica


A poliúria é a manifestação clínica evidente na doença renal crônica (DRC) principalmente em cães, e quando a
polidipsia compensatória que se instala não é suficiente para manutenção do volume hídrico corpóreo, os
animais apresentam­se desidratados. Nessa condição, é de fundamental importância a reposição rápida do
déficit, pois a desidratação prolongada compromete o fluxo sanguíneo renal e a taxa de filtração glomerular,
sendo esta um fator adicional de lesão renal de etiologia isquêmica.
A quantidade de fluido para reposição de volume, bem como a quantidade necessária para a manutenção
do paciente, devem ser calculadas de acordo com as informações apresentadas anteriormente (Quadros 61.1,
61.2, 61.8 e 61.9). Nos casos de DRC, quando da necessidade de os animais serem submetidos a fluidoterapia
por tempo prolongado, recomenda­se dar preferência para a via subcutânea. A via intravenosa deve ser
preconizada, principalmente, quando da necessidade de reposição rápida de fluido, por exemplo, na
descompensação da DRC, na crise urêmica, e de acordo com a avaliação clinicolaboratorial.
Atualmente, em contraste com os procedimentos do passado, a administração de fluido na DRC deve ser
muito criteriosa, e não deve ter como objetivo apenas a diminuição dos valores séricos de ureia e creatinina, pois
não há como aumentar a taxa de filtração glomerular pela fluidoterapia, uma vez que o número de néfrons é
reduzido na DRC. A fluidoterapia na DRC tem como intuito evitar a desidratação, ou seja, evitar o
desenvolvimento de azotemia pré­renal e, desta forma, não comprometer a hemodinâmica renal que poderá
causar lesão adicional nos rins já com número reduzido de unidades funcionais (néfrons), no caso, de etiologia
isquêmica. Assim, para aqueles animais que por algum motivo tenham ou possam ter a ingestão de água
comprometida, ou cujo volume da poliúria seja grande, ou ainda, que haja perda importante de líquido por
processos gastrentéricos, a administração subcutânea de fluido de manutenção poderá ser indicada. A
frequência de administração estará de acordo com cada caso e com as características individuais, pois não há
como padronizar a terapia para todos os estágios da DRC. A fluidoterapia na manutenção da DRC também tem
como intuito repor déficits de eletrólitos ou base, mas a correção sempre deve ser norteada com o
monitoramento de exames laboratoriais. Ainda, a administração frequente de fluido na DRC poderá causar
hipernatremia, hiperpotassemia e hiper­hidratação que irá causar iatrogenicamente a hipertensão arterial
sistêmica, além de ocasionar hipertensão e esclerose glomerular, portanto, contribuindo a perda de mais
néfrons.
As soluções indicadas para a fluidoterapia dos pacientes com DRC são: lactato de Ringer de sódio,
Ringer, fisiológica (0,9%NaCl), glicofisiológica e glicose a 5%. A escolha da composição da solução estará
na dependência do quadro clínico que o animal apresenta. Para os animais em acidose metabólica preconiza­se
a solução de lactato de Ringer de sódio, ou ainda, solução fisiológica ou glicofisiológica acrescida de
bicarbonato; esta sempre por via intravenosa e com velocidade de administração controlada, conforme cálculo
baseado no déficit de bicarbonato ou na dose empírica de 0,5 a 1 mEq/kg. Nos casos de administração de fluido
por tempo prolongado, recomenda­se a diluição da solução de lactato de Ringer de sódio com a solução de
glicose a 5% (proporção de 1:2), com o intuito de se evitar hipernatremia.
A administração intravenosa de potássio só é recomendada em casos graves, sempre após avaliação da
concentração sérica do íon (Quadro 61.7). Para os cães e principalmente para os gatos, geralmente
recomenda­se para a suplementação oral o glicinato de potássio (30 a 100 mg/gato/dia) ou citrato de potássio,
sendo este de efeito mais alcalinizante e que requer monitoramento laboratorial.
É importante ressaltar que o tratamento da IRA e da DRC requer, também, outras medidas terapêuticas,
voltadas para os inúmeros distúrbios orgânicos que as doenças acarretam.

Choque
Face à complexidade do tema, a fluidoterapia no estado de choque será abordada de forma sucinta neste
capítulo. A definição clássica de choque consiste em:
“Estado clínico resultante de inadequado suprimento de oxigênio tecidual e inabilidade do tecido em utilizar
adequadamente o oxigênio, ou seja, insuficiência na microcirculação.”
O choque instala­se em decorrência de inúmeras etiologias e geralmente são classificados em:
hipovolêmico, hemorrágico, endotóxico, cardiogênico e neurogênico, ou de acordo com a presença ou a
ausência de comprometimento dos mecanismos de controle circulatório. Assim, independentemente do agente
causal, o choque se caracteriza pela inadequada perfusão tecidual que acarreta hipoxia celular e acidose
metabólica. A solução de escolha seria o lactato de Ringer de sódio e a correção da acidemia deve ser instituída
quando o pH sanguíneo arterial for inferior a 7,1 a 7,2 com adição de bicarbonato de sódio. O lactato pode ser
ineficaz nos casos de comprometimento hepático, que geralmente acompanha o quadro de choque, devido à
dificuldade na conversão do lactato em bicarbonato.
Principalmente nos quadros de choque endotóxico, recomenda­se a suplementação de glicose e potássio,
pois observa­se, com certa frequência, a presença de hipoglicemia e hipopotassemia. Já em relação aos
choques hipovolêmico e hemorrágico, nota­se a tendência dos animais em apresentar
normoglicemia/hiperglicemia, principalmente por estimulação simpática e, além da recomendação da solução
cristaloide citada, principalmente no choque hemorrágico, recomenda­se a utilização de soluções hipertônicas à
base de cloreto de sódio (NaCl 7,5%), com o intuito de assegurar a hemodinâmica.
Cabe lembrar sobre a utilização de coloides, indicados primariamente na reposição de volume intravascular.
Coloides naturais podem ser encontrados no sangue total, produtos do plasma e concentrados de albumina e os
coloides sintéticos seriam dextrana 70 e hidroxietilamido. Deve­se estar atento à frequência e ao volume de
administração dos coloides, pois podem causar a diluição dos fatores de coagulação no plasma e predispor a
distúrbios na coagulação.

Fluidoterapia nos animais com doença cardíaca


A afecção cardíaca/insuficiência cardíaca geralmente não requer a administração de fluidos. Entretanto, alguns
pacientes desenvolvem processos mórbidos que necessitam da suplementação de fluido e eletrólitos, como
desidratação, gastrenterite, insuficiência renal, hipopotassemia, intoxicação por digitálicos, hipotensão induzida
por drogas, diurese intensa pelo uso de diuréticos, inadequada ingestão de água etc. Resumidamente, em
decorrência da patogenia da insuficiência cárdica em fases avançadas, esse processo culmina na retenção de
água e sódio por ativação do sistema nervoso simpático, ativação do sistema renina­angiotensina­aldosterona,
aumento da liberação de ADH e ativação do mecanismo da sede. Assim, deve­se indicar, de preferência,
soluções cristaloides isentas de sódio (p. ex., a solução de glicose a 5% ou solução de 0,45% NaCl em 2,5%
de glicose), mas o uso de outras composições de fluido contendo sódio é passível de ser indicado desde que
haja monitoramento laboratorial de eletrólitos e do equilíbrio acidobásico. Durante a fluidoterapia prolongada,
recomenda­se a avaliação periódica da concentração sérica de sódio, evitando­se os valores séricos inferiores a
130 mEq/ . A velocidade de infusão venosa deve ser constantemente monitorada, dando­se preferência à
administração subcutânea sempre que possível, mas de soluções isentas de glicose. Na dependência do quadro
mórbido associado, alguns animais desenvolvem hipopotassemia, ou ainda acidose metabólica, que devem ser
corrigidas adequadamente.
Recomendações gerais. Durante a fluidoterapia contínua, os animais devem ser monitorados diariamente, e nos pacientes
em estado crítico, a avaliação ao longo do dia, se possível avaliando­se o hematócrito, as proteínas séricas e o peso corpóreo
(o paciente desidratado que permanece com o mesmo peso continua com desidratação; já o ganho de peso em curto período
denota retenção de líquido). Ainda, deve­se estar atento a hiper­hidratação, infecção bacteriana pelo uso inadequado do
cateter ou agulha e administração de volume inadequado no subcutâneo. Também observar com mais atenção os felinos,
que manifestam com mais facilidade e frequência a hiper­hidratação quando comparados aos cães, pelo surgimento de
taquipneia, efusão pleural, ascite e edema subcutâneo.

Considerações gerais na fluidoterapia de cães e gatos


A seguir, são resumidos os principais aspectos relativos à fluidoterapia de cães e gatos.

Fórmulas para o cálculo de volume de fluido, para os animais das espécies canina e felina, para correção da
desidratação
Fórmula 1:
Grau de desidratação (%) × peso (kg) × 10 = quantidade em mililitros
Fórmula 2:
Grau de desidratação (decimal) × peso (kg) = quantidade em litros

Obs.: o volume de reposição de fluido calculado deve ser administrado durante o período de 6 a 8 h, seguido
do volume de manutenção.

Vias de administração de fluidos


A escolha da via de administração está na dependência da afecção, da gravidade e da duração/evolução do
quadro. Seguem algumas indicações:

Indicações para a via intravenosa:


• Perda aguda de fluido
• Desidratação de moderada a grave (7 a 15%)
• Prostração intensa
• Durante os períodos pré e transanestésico
• Choque
• Locais de acesso para a via intravenosa: jugular, safena, cefálica e femoral
Indicações para a via subcutânea:
• Manutenção de fluidoterapia em doenças crônicas
• Soluções que contenham concentração de K+ até 30 a 35 mEq/ (para concentrações maiores, utilizar a
via intravenosa)
• Volume total de fluido recomendado até 10 m /kg, e verificar a elasticidade da pele de cada raça/espécie
• Pouca probabilidade de ocasionar hipervolemia
• Não é recomendado nos casos de perda aguda de líquidos, desidratação grave, hipotermia, hipotensão
etc.
• Somente administrar fluido isotônico
• Glicose 5% deve ser evitada
Indicações para a via intraóssea:
• Animais jovens, principalmente filhotes
• Quando da existência de dificuldade de acesso venoso
• Locais de acesso: tuberosidade da tíbia, fêmur (trocanter), asa do ílio, grande tubérculo do úmero
• Necessidade, em alguns casos, de anestesia local (periósteo) – lidocaína
• Possíveis efeitos indesejáveis – osteomielite, provável dor durante a administração do fluido.

Velocidade de infusão de fluidos


Em casos de perda aguda de fluido em grande quantidade:

Proceder à correção do déficit hídrico o mais rápido possível


Velocidade de administração para cães de 90 m /kg/hora e para os gatos de 40 a 55 m /kg/hora,
principalmente nos casos de choque hipovolêmico iminente
Monitoramento constante dos sistemas cardiovascular e renal
Quando da infusão de volumes maiores, proceder ao monitoramento pela pressão venosa central.

Em casos de perda crônica de fluido:

Velocidade de infusão lenta


Reposição gradativa do fluido para facilitar os equilíbrios intra­ e extracelular, evitando­se os efeitos
colaterais (edema, perda de líquido e eletrólitos pela diurese.
Obs.: é importante ressaltar que o cálculo do volume de fluido é estimado e as vias de administração e
velocidade de infusão foram apresentadas de forma genérica. Cada caso, portanto de forma individual, deve ser
analisado e ressalta­se a necessidade de monitoramento contínuo (clínico e laboratorial).

Cálculo para administração de bicarbonato


Dose indicada de bicarbonato em casos sem a avaliação da hemogasometria, somente baseada em justificativa
clínica:

Dose (de segurança): 0,5 a 1 mEq por quilograma (kg) de peso vivo

Dose indicada de bicarbonato após avaliação da hemogasometria, considerar:

Déficit de bicarbonato do paciente em mEq/ ou mmol/ . Obs: valores da concentração de bicarbonato normal
ou esperado no sangue venoso é de 20 a 29 mEq/
Peso do paciente em kg (quilograma)
Excesso de base (base excess) do paciente (mEq/ ).

O cálculo/a fórmula para obtenção da quantidade de bicarbonato (suplementação) necessária se expressa


por:

Quantidade de HCO3– necessária (mEq) =0,5 × (peso corpóreo) × (HCO3– esperado – HCO3– do paciente)

Ou

Quantidade de HCO3– necessária (mEq) = 0,3 × (peso corpóreo) × (base excess do paciente)

A solução de bicarbonato de sódio a 8,4% corresponde a 1 m da solução equivale a 1 mEq de


bicarbonato. Obs.: a solução de bicarbonato de sódio deve ser administrada diluída em solução de glicose 5%
em água destilada ou em solução fisiológica – NaCl 0,9%. Não utilizar as soluções de Ringer e de lactato de
Ringer de sódio, pois contêm cálcio na composição e formam precipitado com o bicarbonato. Recomenda­se,
ainda:

Monitorar frequentemente o paciente


Administrar inicialmente 1/2 ou 2/3 da dose calculada; se possível, acompanhar com a hemogasometria
Em caso de necessidade de infusão in bolus, a velocidade de infusão venosa deve ser a mais lenta possível.

Obs.: o bicarbonato de sódio não deve ser adicionado a soluções que contenham cálcio (glicinato de cálcio,
Soluções de lactato de Ringer de sódio e Ringer), epinefrina, insulina regular, meperdina, isoproterenol,
metoclopramida, penicilina G potássica, pentobarbital, tionembutal, complexo vitamínico B e C.

FLUIDOTERAPIA EM ANIMAIS RUMINANTES


A fluidoterapia em animais de produção é ao mesmo tempo desafiadora e gratificante. É uma modalidade
terapêutica básica que conduz a resultados clínicos que nenhuma técnica cirúrgica sofisticada ou medicamento
milagroso com elevado custo pode superar. Os seus princípios são relativamente simples, todavia, a utilização
da fluidoterapia em bovinos é com frequência mais difícil que em pequenos animais e equinos devido a
restrições financeiras, dificuldades na contenção dos pacientes e relutância que alguns clínicos demonstram em
utilizá­la. A existência de diferenças entre neonatos e ruminantes adultos em termos fisiológicos, bem como de
anormalidades frequentemente encontradas e soluções requeridas para corrigi­las, permitem discussões
separadas sobre a aplicação da fluidoterapia nesses espécimes. Convém ressaltar, ainda, que muitas das
pesquisas e da experiência clínica obtidas com uso desta terapia têm sido derivadas da espécie bovina, porém
os mesmos princípios podem ser aplicados a outras espécies de animais ruminantes.
Como destacou­se anteriormente, as alterações na quantidade de água ou de eletrólitos, ou de ambos,
refletem­se na função celular e definitivamente na homeostase do sistema orgânico. O corpo de um bezerro
sadio com 50 kg tem aproximadamente 35 de água, o que equivale a aproximadamente 70% do peso corporal.
Destes 35 , cerca de 24 representam o LIC e 11 o LEC. Por outro lado, em um bovino adulto (500 kg), o
conteúdo em água é de cerca de 66% do peso corporal, o que representa 330 , dos quais 220 estão no LIC e
110 no LEC. Em bovinos, como em outros animais, as perdas de fluidos ou não ingestão deles resultam em
desidratação. Os indicadores clínicos da desidratação incluem: diminuição ou perda do turgor da pele, que em
geral é proporcional à intensidade da desidratação, porém em adultos é um sintoma menos seguro que nos
bezerros jovens; enoftalmia; ressecamento de mucosas da cavidade bucal; depressão ou apatia; em bezerros
jovens, incapacidade de levantar e permanecer em estação bem como de sugar e deglutir. A intensidade da
desidratação pode ser determinada com base nos sintomas citados, sendo estimada a partir destes a
porcentagem de perda do peso corporal decorrente da desidratação, conforme mostra o Quadro 61.2. Assim,
uma estimativa do volume de fluido em litros requerido para restaurar a hidratação normal pode ser calculada
pelo produto entre: % de desidratação × peso corporal (kg) × 100. O grau de desidratação, nos casos de perdas
agudas, poderia ser quantificado pelo monitoramento do peso corporal, todavia, esta possibilidade é rara, pois
geralmente não se dispõe do peso pré­desidratação para essa avaliação. Determinações seriadas do
hematócrito (volume globular) e da taxa de proteína total (PT) permitem aquilatar o estado relativo de
desidratação, sendo mais precisos no auxílio do monitoramento da reidratação e na prevenção da super­
hidratação. No entanto, o hematócrito é melhor indicador de alterações no volume de sangue circulante que a
taxa de PT em espécimes bovinos.
Além da estimativa do volume de fluido para reidratar o animal é essencial a determinação de qual tipo de
solução é necessária para o manejo bem­sucedido do paciente. Para tal finalidade deve­se conhecer o estado
acidobásico e eletrolítico do mesmo, ou seja, valores hemogasométricos e do equilíbrio acidobásico (pH; pCO2;
HCO–3; CO2 total [TCO2] ou BE) e taxas dos principais íons (Na+, K+ e Cl–).
A acidose metabólica resulta da perda de base pelo sistema digestório de bezerros e de ruminantes adultos
com diarreia aguda intensa; esse desequilíbrio também pode ocorrer por aumento da utilização do bicarbonato
em doenças com acidose láctica (metrite­mastite séptica ou lactoacidose ruminal). A alcalose metabólica ocorre
em ruminantes seguindo a insuficiente reabsorção de ácido clorídrico gástrico no trato intestinal anterior em
doenças como dilatação e torção do abomaso, ou estenose funcional pilórica. A alcalose também está associada
à hipopotassemia e tem sido relacionada com a insuficiência renal aguda em bovinos adultos.
O cálculo das necessidades de bicarbonato em casos de acidose metabólica é baseado nas medidas do
HCO–3 ou BE ou TCO2 e no espaço de distribuição do bicarbonato conforme o peso corporal, aplicando­se as
fórmulas descritas na parte geral do capítulo sobre princípios da fluidoterapia. Porém, devido ao fato de não se
dispor frequentemente de retaguarda laboratorial para estas determinações, pode­se fazer uma estimativa do
grau de acidose e do déficit de base. O princípio da estimativa é embasado no fato de que, quanto mais intensa
a desidratação em bovinos com acidose metabólica (i. e., diarreia, indigestão por carboidratos e mastite­metrite
séptica), maior o déficit de bicarbonato. Considerando­se que o valor normal de bicarbonato é de cerca de 25
mEq/ , o déficit de base pode ser estimado segundo o grau de desidratação em bovinos como se segue: 7%,
9% e 12% de desidratação teriam valores de HCO–3 estimados (mEq/ ), respectivamente, em 20, 15 e 10 mEq/ ,
os quais, em relação ao valor normal, indicariam déficits de HCO–3 de 5, 10 e 15 mEq/ . Esquema similar, com
uso da determinação do BE (excesso/déficit de base), apresenta resultados de estimativa considerando
desidratações de 6%, 8% e igual ou superior a 10%, com –BE (déficits de base) respectivamente de –5, –10 e –
15 mEq/ .
No caso de bezerros, deve­se ter cuidado no uso destes critérios estimativos, pois são relatados casos de
acidose metabólica moderada a grave sem diarreia ou desidratação. Outro fato a ser considerado é que, nos
casos de diarreia grave em bezerros, há influência da idade sobre o déficit básico, sendo este estimado entre 10
e 15 mEq/ e de 15 a 20 mEq/ , em animais, respectivamente, com idades menor e maior do que 1 semana de
vida. Esses valores estimados podem ser aplicados às fórmulas mencionadas, ou então partindo­se do princípio
de que as perdas de fluidos e eletrólitos ocorrem do LEC, que é o espaço fluídico passível de tratamento.
Portanto, no segundo caso, se um bezerro com diarreia tem um déficit de HCO–3 estimado em 10 mEq/ , isto
significa que, para um neonato com 50 kg, que tem volume de LEC de 11 , são necessários 10 mEq/ X 11 , ou
seja, 110 mEq de bicarbonato para correção da acidose metabólica presente.
As análises laboratoriais dos eletrólitos do soro ou plasma têm muitas vezes valor limitado na avaliação das
necessidades de reposição em bezerros diarreicos e se mal interpretados poderiam induzir uma terapia
inapropriada. O plasma representa uma pequena parcela do total de água corporal e a concentração dos
eletrólitos na amostra de sangue deve ser interpretada à luz de tal fato. Assim, se o Na+ e o Cl– estão dentro de
limites normais ou se as taxas destes íons não podem ser determinadas, a estimativa da deficiência pode
basear­se no grau de desidratação (%) e no fato de que o déficit total de Na+ e Cl– é equivalente
aproximadamente ao percentual da desidratação. É importante considerar­se a etiopatogenia do processo e
quais são os íons deficientes em consequência desta.
O sódio é o principal cátion do LEC, sendo seu aumento possível na ingestão excessiva, embora a causa
deste seja em geral a restrição de água, que resulta em hipernatremia relativa. A sua diminuição pode ocorrer
em diarreia crônica do bovino adulto, insuficiência renal aguda ou na deficiência de sal em vacas lactantes. As
perdas ocorrem também nas diarreias agudas de bezerros.
A concentração de cloretos tende a ser inversamente relacionada à de bicarbonato. A hipocloremia é com
frequência observada nas alcaloses metabólicas que ocorrem em bovinos com problemas de escoamento para
o intestino, ou seja, com sequestro do conteúdo abomasal.
No caso do potássio, as dificuldades de interpretação de sua análise laboratorial são maiores. A maior parte
do potássio corporal está no LIC. Muitos bezerros com diarreia grave, além de desidratados e com acidose,
apresentam hiperpotassemia, que é atribuída ao estado acidótico e à reduzida depuração renal, ainda que
exista um déficit no potássio total corporal. Entretanto, a elevação da taxa de K+ no plasma contribui com a
disfunção cardíaca e morte subsequente. A hipopotassemia tem sido relacionada com a fraqueza muscular e
ocorre no ruminante adulto com anorexia, com diarreia persistente, ou com alcalose metabólica associada ao
sequestro de conteúdo do abomaso.
A determinação da glicose no sangue pode ser realizada, sendo, todavia, um balanço energético negativo
nem sempre facilmente quantificado, pois pode resultar de ingestão inadequada, má absorção­digestão,
demanda metabólica aumentada devido à febre ou baixa temperatura ambiental. A hipoglicemia em bezerros é
evidenciada por fraqueza, letargia, coma, convulsões e opistótono. Se o leite é suprimido por mais de 48 h,
especialmente no clima frio, pode ocorrer sério déficit energético.
A via de administração da fluidoterapia é em geral determinada pela intensidade e gravidade da
desidratação, além de se considerar o quanto exigirá de manuseio e contenção do paciente para sua aplicação.
Em animais com desidratação moderada a intensa a via intravenosa deve ser inicialmente considerada, pois
desta opção dependerá o sucesso ou falha do tratamento.
Em geral, desidratação de 8% é considerada a partir da qual a fluidoterapia oral será insuficiente ou
impraticável para corrigir os desequilíbrios hidreletrolíticos. Bezerros com desidratação a partir dessa proporção
ou maiores, se estiverem em acidose, apresentam depressão com diminuição ou ausência dos reflexos de
sugação e deglutição, dificultando a ministração de fluidos pela via oral, sendo necessário reposição para
reidratar pela via intravenosa. Em animais adultos deve­se considerar a possibilidade de administração de
fluidos pela via intrarruminal por meio de sondas nasoesofágicas. Devido à grande capacidade de volume do
rúmen, grandes quantidades de fluidos (25 a 40 ) podem ser oferecidos oralmente mais de 1 vez/dia em
bovinos adultos para auxiliar a reposição dos líquidos. Essa via, no entanto, deve ser evitada em bovinos adultos
desidratados nos quais haja estase do conteúdo ruminal ou alteração do transporte ou da passagem de
conteúdo digestivo pelo rúmen, omaso ou abomaso.
Devem­se considerar ainda os requerimentos de fluidos consequentes às perdas contínuas e para a
manutenção; todavia é importante saber quanto do déficit de fluido estimado deve ser reposto imediatamente.
Do ponto de vista prático e para poupar­se o tempo, em geral recomenda­se que aproximadamente metade do
déficit estimado seja reposto em um tratamento inicial, e que o paciente seja reavaliado em 6 a 8 h ou na manhã
seguinte. Nova estimativa das necessidades de fluidos e eletrólitos deve então ser feita. A maior dificuldade do
clínico na instituição da fluidoterapia a campo está justamente na necessidade das seguidas reavaliações e
administração de mais fluidos para a completa correção dos déficits existentes.

Tratamento de bezerros
A mais frequente indicação da fluidoterapia para bezerros é a diarreia neonatal. Independentemente do agente
etiológico, as alterações metabólicas resultantes da diarreia em bezerros são similares. Em geral incluem:
desidratação, acidose metabólica, anormalidades eletrolíticas (hiperpotassemia) e balanço energético negativo
e/ou hipoglicemia.
A desidratação resulta da perda fecal de fluidos, que pode alcançar até 12% ou mais do peso corporal em
24 h. Estas perdas ocorrem por diminuição da absorção intestinal em casos de enterites virais (atrofia das
vilosidades), salmonelose; ou por secreção aumentada, como nas infecções por E. coli enterotoxigênica. A
acidose é um achado consistente em bezerros com diarreia, sendo um fator que contribui com a morte. A
acidose metabólica resulta das perdas de bicarbonato nas fezes, produção aumentada de ácido láctico por
glicólise anaeróbica nos tecidos com má perfusão de sangue, redução da excreção renal de íons hidrogênio e
produção aumentada de ácidos orgânicos no cólon em diarreia por má absorção. Além de água e bicarbonato,
são perdidos nas fezes o sódio, o cloreto e o potássio, o que resulta em déficit desses íons em todo o
organismo. Apesar da diminuição do potássio total no organismo como um todo, desenvolve­se
hiperpotassemia, que reflete uma tentativa de compensar a acidose, por mecanismo celular, caracterizado por
entrada de H+ para o LIC e saída de K + para o LEC.
Um outro importante fato que ocorre em bezerros com diarreia é o balanço energético negativo devido às
diminuições da ingestão láctea, da digestão ou absorção de nutrientes, ou substituição do leite por soluções
orais de reidratação com baixa energia. Assim, a hipoglicemia pode ocorrer e também contribuir para a morte
dos neonatos afetados. Portanto, é recomendável a adição de glicose aos fluidos administrados pela via
intravenosa, não somente para prevenir a hipoglicemia, mas também para ajudar a superar o fluxo de água e de
eletrólitos para o lúmen intestinal. A glicose melhora a absorção de sódio do intestino quando dada oralmente e
favorece o movimento de potássio para dentro das células quando ministrada por via intravenosa.
Inicialmente, a prioridade no tratamento do bezerro desidratado deve ser a restauração do volume do LEC.
Na estimativa do volume de fluido necessitado pelo paciente, não se deve considerar apenas o déficit devido à
desidratação, mas também os requerimentos para a manutenção e compensação das perdas contínuas. Um
bezerro neonato necessita, para a manutenção diária, 50 a 100 m /kg, enquanto as perdas contínuas podem
variar de quantidades mínimas até um máximo de 4 em 24 h.
O segundo ponto a considerar é a correção da acidose. Tem sido sugerido que somente a restauração do
volume do LEC pode permitir aos rins a eliminação de ácidos em quantidade suficiente para restaurar o
equilíbrio acidobásico, todavia esse fato não tem sido observado na prática em bezerros com acidose moderada
a intensa. Assim, neste último caso a acidose deve ser corrigida pela administração de bicarbonato de sódio ou
dos chamados precursores de bicarbonato, que são sais de ácidos orgânicos fracos, como lactato, acetato,
gliconato e citrato. Em bezerros já se comprovou a maior eficiência alcalinizante do bicarbonato, quando
comparada ao lactato e ao acetato.
O uso de bicarbonato de sódio é mais econômico e a sua disponibilidade como agente alcalinizante é
imediata; não deve ser usado em soluções contendo cálcio e a sua utilização deve ser cuidadosamente
monitorada. Os agentes alcalinizantes alternativos oferecem vantagens e desvantagens. O lactato é
provavelmente o mais utilizado em Medicina Veterinária, apesar de suas limitações. Para a sua
biotransformação é necessário a integridade da função e perfusão hepática, além do fato de que o lactato
endógeno (ácido láctico) pode reduzir a sua biotransformação e está acumulado durante a hipovolemia e o
choque. Também deve ser ressaltado que só lactato é eficientemente metabolizado. O acetato tem a vantagem
de ser transformado em tecidos periféricos; o citrato e o gliconato podem ser usados preferencialmente em
soluções orais.
A taxa de administração intravenosa de agentes alcalinizantes, especialmente o bicarbonato de sódio, é
controversa, pois a rápida administração deste em soluções hipertônicas pode causar efeitos colaterais sérios
(hipernatremia e rápida alcalinização). Para evitarem­se estes efeitos indesejáveis recomenda­se o uso de
solução isotônica de bicarbonato de sódio (1,3%) ou então, as hipertônicas diluídas em soluções fisiológica ou
de glicose a 5%. A estimativa da quantidade total de bicarbonato de sódio a ser utilizada pode ser feita com o
uso da avaliação hemogasométrica ou segundo o exame clínico, por meio da aplicação de fórmulas ou cálculos
anteriormente abordados.
Por medida de segurança, para evitar­se a alcalinização excessiva, transformando a acidose em alcalose,
recomenda­se a administração inicial de 1/3 a 1/2 da quantidade total calculada de bicarbonato, seguida, se
possível, por reavaliação hemogasométrica ou clínica, para monitorar o efeito do tratamento, recalculando­se a
quantidade ainda necessária, e dar seguimento à terapia.
A adição de glicose nas soluções reidratantes tem, no caso de soluções orais, a finalidade de melhorar a
absorção de sódio no intestino delgado; uma vez absorvida ou injetada intravenosa, promover a liberação de
insulina, o que melhora o movimento de potássio do LEC para o LIC, e ser fonte de energia. A importância da
reposição de sódio e cloreto não deve ser negligenciada. Administração de potássio deveria seguir aquela de
bicarbonato e glicose, o que melhoraria seu deslocamento do LEC para o LIC (na dose de 20 mEq/ , que é
considerada segura).
Se o grau de desidratação for inferior a 8%, em geral a reposição de fluido pode ser feita pela via oral. A
fluidoterapia oral tem vantagens em comparação à intravenosa. O custo do tratamento e os cuidados do
acompanhamento são menores e a segurança é maior. Vários estudos revelam que eletrólitos e glicose são
absorvidos e aproveitados por bezerros com diarreia de origem diversa.
Poucos são os produtos comerciais para uso oral disponíveis no mercado para bezerros e a descrição de
preparações caseiras e seu uso com sucesso para reidratar bezerros tem sido feita. Existem controvérsias sobre
o uso de reidratação oral com suspensão do fornecimento de leite ao início do tratamento. Algumas pesquisas
sugerem que esta prática não seja benéfica ao bezerro. Todavia, há concordância em que se o leite for retirado,
deve ser reintroduzido na alimentação gradualmente após 24 h. Na atualidade, se tem recomendado o uso de
leite diluído em igual volume com água, para manter­se aporte de substrato de energia ao neonato.
As características das soluções reidratantes orais (SRO) são variadas. Quase todas as formulações incluem:
sódio, cloreto, potássio e glicose. Muitas contêm glicose, glicina, ou ambas, pois ajudam a absorção de sódio e
da água. Algumas apresentam na composição agentes alcalinizantes como o acetato, gliconato e citrato, ou o
próprio bicarbonato. Estão também presentes em algumas o cálcio, o magnésio e o fósforo.
As principais diferenças entre as formulações são relacionadas com: glicose, agentes alcalinizantes e
osmolalidade total. As soluções reidratantes orais com alta energia atendem as necessidades de manutenção e
reduzem a perda de peso, quando comparadas às de baixa energia. Soluções orais com bicarbonato
determinam alcalinização do conteúdo do abomaso, o que parece favorecer a proliferação bacteriana e a
passagem de patógenos ao intestino, além de interferir com a digestibilidade do leite.
Como soluções caseiras podem ser recomendadas as com concentrações equimolares de NaCl e glicose
isotônica (4,5 g e 25 g, respectivamente) e de NaCl e glicose hipertônica (9,0 g e 50 g, respectivamente). Ainda,
nas diarreias com discreta desidratação, além das SRO podem ser utilizadas substâncias protetoras de mucosa
(caolim, pectina) e adsorventes (carvão vegetal) misturadas às soluções ou junto com o leite. O volume total
estimado de fluido necessário deve ser parcelado e fornecido nas primeiras 24 h, com intervalos de 2 a 4 h entre
parcelas.
O tratamento pela via intravenosa é necessário em situações em que a desidratação é mais intensa (≥ 8%) e
o bezerro não é capaz de mamar adequadamente; recomendando­se que o volume estimado para reidratação
seja ministrado por essa via. Em geral, após a reidratação do animal por via intravenosa (em período de 4 a 6
h), este demonstra capacidade de mamar e o volume estimado para manutenção/reposição de perdas contínuas
pode ser fornecido pela via oral nas 18 a 20 h seguintes, com uso de soluções reidratantes orais em biberões
(baldes com teteiras de borracha conectadas) ou em mamadeiras. A velocidade de administração pela via
intravenosa é de 30 a 40 m /kg/hora em bezerros, podendo chegar até 80 m /kg/hora. Recomendam­se
soluções com osmolalidade entre 300 e 450 mOsm/ , contendo sódio e cloreto em concentrações próximas às
do plasma (soluções fisiológicas ou de Ringer), às quais pode­se adicionar 10 a 20 mEq/ de potássio (1 g de
KCl = 14 mEq) e 10 a 50 g/ de glicose. Como a acidose está presente deve­se usar solução isotônica de
bicarbonato de sódio (1,3%) ou contendo precursores como o lactato/acetato (25 a 50 mmol/ ) em volume
suficiente para corrigir o déficit básico estimado (lactato de Ringer e solução McSherry). Lembrar que o
bicarbonato não deve ser misturado à solução contendo o cálcio.
As dificuldades para uso intravenoso de soluções cristaloides e coloidais relacionadas respectivamente à
necessidade de grandes volumes e tempo gasto na aplicação, e ao custo elevado, têm motivado estudos com
uso de soluções hipertônicas, que têm como principal ação um efeito ressuscitador do paciente em choque
hipovolêmico e desidratação intensa em bezerros. As recomendações se fazem em situações naturais e
experimentais, para a utilização da solução salina hipertônica – SSH (solução entre 7,2 e 7,5% de cloreto de
sódio com cerca de 2.400 mOsm/ ) em doses de 4 a 5 m /kg p.c. ministradas em um período de 3 a 10 min.
Esse tratamento deve ser complementado com o uso de solução eletrolítica isotônica ministrada por via oral, em
dose de 60 m /kg p.c. aplicada imediatamente após a SSH, e a cada 8 h por mais duas vezes.

Tratamento de bovinos adultos


O tamanho de bovinos maduros e a grande quantidade de fluido requerido para reidratá­los têm evitado que
muitos médicos­veterinários usufruam a grande vantagem da fluidoterapia intravenosa para reidratação. Embora
muitos dos princípios da fluidoterapia de ruminantes maduros sejam similares àqueles recomendados a bezerros
e a animais de outras espécies, existem particularidades a considerar. Quando da avaliação do estado de
hidratação, deve­se lembrar que o peso corporal e o preenchimento do rúmen podem ser evidências
contraditórias, pois bovinos com acidose láctica ruminal podem não perder peso e parecer hígidos, porém boa
parte da aparência deve­se à água acumulada no rúmen, que representa fluido transcelular do LEC, que está
praticamente indisponível para o animal. Também, o pregueamento de pele e a enoftalmia devem ser avaliados
em relação à condição corporal, pois animais emaciados podem ter olhos fundos e pele com persistência de
pregueamento, independente do seu estado de hidratação.
O volume de fluidos requerido para a completa reidratação de uma vaca ou touro de grande porte é
substancial e pode dissuadir os clínicos de usar este tipo de terapia. Deve ser lembrado, no entanto, que 10 a 20
de fluido administrados mesmo que rapidamente podem salvar a vida do animal, mesmo que o volume
represente menos do que a metade do déficit total de líquidos. Com o uso de certa quantidade de fluido por via
intravenosa, o volume intravascular pode ser restaurado, sendo o problema primário tratado por meios cirúrgicos
ou médicos, podendo, por meio de soluções orais, repor­se o restante do déficit. Para reduzir o custo da
administração intravenosa de fluidos, o clínico deve considerar sempre a formulação de suas próprias soluções.
Ao contrário dos neonatos, os ruminantes adultos não requerem em geral fluidos alcalinizantes quando
estão desidratados. Umas poucas condições, como o choque, a acidose láctica ruminal, a diarreia intensa e o
diabetes melito são associados com acidose. Insuficiência renal, fígado gordo­cetose e toxemia da prenhez
também estão algumas vezes associados com acidose. Por outro lado, a dilatação com deslocamento e torção
do abomaso, intussuscepção, dilatação com torção do ceco, são causas de moderada a intensa alcalose
metabólica. Muitos bovinos com metrite, mastite, pneumonia e outras condições sépticas estão em alcalose ou
com o equilíbrio acidobásico normal. Portanto, as soluções não alcalinizantes representam o fluido de escolha
para a maioria dos ruminantes maduros desidratados.
Nos casos de dilatação com deslocamento e torção do abomaso ocorre desidratação aguda,
depressão, anorexia e brusca redução da produção de leite. As fezes são raras e o rúmen com frequência está
distendido por fluidos. Até o momento da cirurgia, a ajuda primária é dada ao se expandir o volume plasmático,
restaurar o equilíbrio acidobásico e repor os déficits eletrolíticos. Devido ao bloqueio do esvaziamento do
abomaso, a via oral é obviamente inapropriada. Acompanha geralmente a alcalose metabólica uma hipocloremia
devido ao sequestro de cloretos no abomaso e rúmen. A alcalose e a anorexia determinam hipopotassemia em
muitos bovinos afetados.
A solução a utilizar nestes casos deve repor o volume e os eletrólitos deficitários, não sendo combatida
diretamente a alcalose metabólica. Para a correção da alcalose e da hipocloremia, o fluido de escolha é a
solução salina isotônica (NaCl 0,9%), à qual recomenda­se a adição de cloreto de potássio e glicose. As
indicações de quantidades dessas substâncias são variadas, apresentando­se algumas possibilidades: solução
fisiológica em volume de cerca de 20 , adicionando­se, a cada litro, 2 a 3 g de KCl e 15 g de glicose, ou então, a
utilização de 160 g de NaCl, 20 g de KCl e 10 g de CaCl2, dissolvidos em água destilada em quantidade
suficiente para 20 . Nesta última preparação, se houver presença de cetose, pode­se acrescentar 1 de
solução de glicose a 50%. A aplicação dos fluidos deve ser feita pela via intravenosa, recomendando­se a
utilização de cateter, calibre 10 a 14, na veia jugular, ou de calibre 16 a 18, na veia da orelha, para
administração lenta. A velocidade de administração neste caso é determinada pelo potássio presente nas
soluções, o qual não deve ser aplicado em quantidade que exceda 0,5 mEq/kg/hora. Em bovinos com mais de
400 kg de peso corporal, a concentração não deve exceder os 200 mEq de potássio/hora, a fim de prevenir a
cardiotoxicidade determinada por esse íon.
Após a cirurgia, são indicados fluidos similares aos indicados anteriormente para complementar a correção
da desidratação e a reposição das necessidades de manutenção/perdas contínuas. Estes poderiam ser
administrados por via oral/ruminal (por sonda nasoesofágica), obedecendo­se aos volumes estimados segundo
as recomendações iniciais anteriormente descritas.
Uma outra condição possível de se tratar em bovinos adultos é a denominada acidose láctica ruminal. É
uma enfermidade que pode afetar as várias espécies de animais ruminantes domésticos, tendo maior
prevalência em criações semiextensivas e em confinamentos. A sua causa primária é a ingestão excessiva de
alimentos ricos em carboidratos altamente digeríveis (amido, sacarose, lactose e glicose), da qual resultam
modificações da microflora normal do rúmen e produção excessiva de ácido láctico nesse órgão, o qual, além de
acidificar o seu conteúdo, pode determinar acidose metabólica sistêmica. Um outro efeito da lactoacidose
ruminal é o osmótico, que determina a entrada de fluidos no rúmen, resultando na distensão do órgão e
desidratação de grau variado, que pode causar a morte por choque hipovolêmico.
Nesta doença a terapia tem como objetivos básicos as correções da desidratação e da acidose metabólica.
Para corrigir a acidose metabólica são recomendadas soluções alcalinizantes de bicarbonato de sódio (1,3%) ou
de seus precursores, em particular a solução de Ringer com lactato. A estimativa da quantidade de bicarbonato
de sódio necessária para o tratamento pode ser feita pela determinação hemogasométrica do déficit de base,
por meio das taxas de HCO3– e do BE, ou então, pela estimativa clínica do déficit básico, com a aplicação das
fórmulas anteriormente citadas. A partir desse cálculo, determina­se o volume de solução de bicarbonato de
sódio (1,3%) necessário para corrigir a acidose, sendo recomendada sua aplicação por via intravenosa, com
velocidade constante e lenta de 30 m /minuto, para evitarem­se efeitos indesejáveis decorrentes desta terapia.
Além do que, deve­se ministrar 1/3 a 1/2 da dose total calculada de HCO3– e reavaliar o animal para recalcular a
dose ainda necessária ou não para correção da acidose. A utilização da solução de Ringer com lactato tem
recomendação prática do uso de um volume de 6 para cada 100 kg de peso corporal, independente do grau de
acidose, aplicada pela via intravenosa em velocidade semelhante à indicada para a solução de bicarbonato;
todavia, com essa solução a correção da acidose é mais lenta. Adicionalmente, para auxiliar a hidratação, utiliza­
se solução fisiológica, que pode ser ministrada por via oral/intrarruminal (por meio de sonda nasoesofágica) com
volumes de 7 por dia, no primeiro e no segundo dia de tratamento. Além destas medidas, deve­se realizar a
retirada de suco de rúmen alterado, por sonda ruminal, em volume máximo possível, substituindo­o através de
transfusão de suco ruminal de animais sadios. Nos casos de acidose láctica ruminal grave, com pH do fluido do
rúmen igual ou inferior a 4, apesar de bons resultados com uso das medidas mencionadas, pode em alguns
casos ser necessária a ruminotomia para a retirada de todo conteúdo ruminal alterado, associada à transfusão
de suco de rúmen de animais sadios com a colocação de feno como substrato para desenvolver flora normal,
preencher o espaço ruminal e normalizar mais precocemente a função deste órgão.
Em todas as situações apresentadas é necessário o monitoramento da fluidoterapia para avaliação dos seus
resultados, por meio do exame físico, com a verificação da atenuação e desaparecimento dos sintomas clínicos
da desidratação e de outros desequilíbrios diagnosticados, e de exames laboratoriais, com a constatação do
retorno dos parâmetros analisados ao intervalo fisiológico de variação.

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