Você está na página 1de 5

Corrupção e criminalidade organizada no Estado

democrático
Gutemberg de Jesus Rodrigues Silva

1 INTRODUÇÃO
A administração pública é a maior responsável pelo bem-estar
coletivo e deve ser orientada pelos princípios básicos de sua
gestão. Desta maneira, os crimes contra ela não ofendem
apenas o Estado e seus órgãos, mas toda a sociedade.

Dessa forma, os crimes praticados contra a organização muitas


vezes, são causados pela mesma. Isso se dá pela
institucionalização da corrupção, bem como da aceitabilidade
da sociedade da mesma. Ao mesmo tempo, é preciso perceber
que a corrupção é algo inerente ao ser humano, e ela deve ser
levada com cuidado para que não seja radicalizada.

Este trabalho objetiva discutir sobre o conceito de corrupção,


crime organizado e Estado, e como um influencia o outro
perante a sociedade.

2 DESENVOLVIMENTO
A corrupção é percebida como um fenômeno, podendo ser
analisada conforme sugestão de Garcia (2015) a partir do
criacionismo, aonde a serpente ludibria o ser humano para que
ele experimente o fruto do conhecimento acerca do bem e do
mal, adquirindo o livre arbítrio.

Neste sentido, o ser humano pode desviar de sua natureza, e


assumir uma forma boa ou má culturalmente, ou praticar ator
imorais ou fora da conduta da normalidade no coletivo e
naquele social, e dentre eles, está a corrupção. Neste sentido,
pode-se entender que o humano em sua essência é corrupto, e
existe um enfrentamento da dualidade boa e má oriunda da
natureza benevolente ou malevolente.

Tudo e todos se corrompem. Conforme Soares (2012), a


corrupção ultrapassa e se afasta do território criminal e ilícito,
e vai para o universo da vida social em seus riscos e limites,
levando-se em conta comportamentos e ações, seja voltada
para o desejo de relações, objetos, ambições, entre outros. E ao
mesmo tempo que a todos são passíveis a isso, a reação social
de repúdio a corrupção é forte. Ela pode ser perigosa para a
sociedade quando a reação contrária a ela gera um efeito
dominó de violência e represália.

Como também, Soares (2012) afirma que “o perigo provém do


fato de que, nesse o caso, o contrário da corrupção não é o
rigor no cumprimento das determinações legais, não é o
respeito aos procedimentos” (p. 342), e nem por amor a
legalidade. O inverso da legalidade é a pureza, instalando um
paradoxo que, aonde a corrupção desagrada indivíduos,
relações e instituições, existe a exaltação da pureza, trazendo
um conceito de que esta é desprovida ou é a negação dos
interesses e das paixões mencionadas anteriormente.

E, ainda que nem toda corrupção envolva o crime organizado,


ela é sempre um crime, partindo da ideia de que não há crime
organizado sem corrupção. A corrupção se torna
institucionalizada quando se coloca o interesse privado acima
do público, podendo assumir o adjetivo ilícito, como apontado
por Soares (2012).

O governo democrático deve prover o interesse público acima


de tudo, mas o indivíduo conflitante com seus próprios anseios
e interesses está ali. Então, pode-se perceber que a corrupção,
é também inerente a ele, e não necessariamente o faz corrupto,
mas na possibilidade de cometer o ato. Desta forma, em todos
os tipos de governos de todos os tempos, a corrupção é
presente.
Werner (2017) afirma que a corrupção sistêmica é identificada
em um conjunto de ações coordenadas, aonde servidores e
agentes públicos firmam relacionamentos visando interesses
particulares, manter o poder político, assim, capturando o
Estado e instaurando a Cleptocracia.

É importante perceber que a corrupção se instala de maneiras


diferentes nos contextos sociais daqueles com poder político,
criando classes. Esta divisão é de um lado a ilegalidade dos
bens, através da transferência violenta da propriedade
enquanto a burguesia poderá se usar de suas próprias leis
corruptas e trabalhar nas margens da legislação, assim
configurando uma nova economia das ilegalidades, descrita
por Foucault (SCHILLING, 2001).

Nas margens da lei acontece a criminalidade escondida por


aqueles que detém o poder e o capital, movidos por interesse
próprio. As referidas organizações, conforme Werner (2015),
são bem estruturadas e poderosas, com forte influência moral
com a população, tendo poder de neutralizar a aplicação da lei
por meio da corrupção e de influências no setor econômico.

Isto se deu pela procura e demanda de ilegalidades, tanto de


ordem econômica como de ordem cultural. Schilling (2001)
afirmou que as mudanças sociais influenciam na distribuição e
redistribuição das ilegalidades, pois se entrelaça com os
conflitos sociais e acesso a recursos financeiros. Desta maneira,
enquanto os mais pobres são vítimas da corrupção, que causa
maior desigualdade de riqueza e poder, também é ela que
ajuda a mantê-la, devido a institucionalização na própria
sociedade da corrupção.

Já foi mencionado que nem todo crime é corrupção, mas de


certo, toda corrupção é crime (SOARES, 2012; WERNER,
2015; 2017). E desta forma, o crime organizado pode ser
definido como uma multiplicidade de ilegalidades organizadas
em torno do comércio e da indústria de diversas naturezas e
origens, conectadas a aparelhos políticos e econômicos,
passando por serviços educacionais, financeiros, de
informação, até tráfico de armas e drogas.

Afinal, ao cidadão ver a possibilidade de se beneficiar, ter seus


anseios realizados, ele pode realizar um ato corrupto ou não.
Esta possibilidade é eminente principalmente nos mais pobres,
com chances desiguais, e que buscam chances de crescer, e ao
mesmo tempo alimentam a máquina da corrupção
institucionalizada e o crime organizado. Mas o crime
organizado existe apenas no âmbito político?

O grupo é organizado, com hierarquia e linhas de comando,


como também divisão de tarefas e líderes. Desta maneira, é
percebido que pode ser um estado paralelo ali, pois tem um
funcionamento próprio.

Essas organizações se estabelecem nesses territórios


independentemente da permissão do Estado, sendo, muitas
vezes, definidas como evidentes instâncias de poder instaladas
em tais comunidades. Pode-se afirmar que, quando o crime
organizado subiu às favelas, o Estado desceu, deixando-as à
deriva.

Estas novas dimensões do crime organizados constituem um


novo estado, nomeado por Schilling (2001) de ‘sub-Estados’ ou
‘cripto-governos”. São organizações, como trazido por Werner
(2015; 2017) institucionalizadas e organizadas, corruptas em
essência, fomentando crimes e influenciando a sociedade para-
estatalmente, e de maneira muito mais intensa que o governo
legítimo.

3 CONCLUSÃO
No momento político nacional, situações de corrupção estão
vindo à tona. Mas isso não são sinais de uma sociedade ou país
em decadência, mas sim de crescimento democrático. Um
regime político democrático proporciona a visibilidade de
aspectos sociais que devem ser conhecidos para curar. A
democracia oferece uma consciência de quem somos, do que já
fomos, do que queremos nos tornar. Desta maneira, a ampla
divulgação da corrupção demonstra que a sociedade se esforça
para que o Estado seja democrático e verdadeiro com o povo.

REFERÊNCIAS
GARCIA, D. K. Corrupção: resenha temática crítica. Revista
Jurídica da Libertas Faculdades Integradas, v. 5, n. 1, 2015.

SCHILLING, F. Corrupção, crime organizado e democracia.


Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, v. 36,
2001.

SOARES, L. E. Crime organizado. In: AVRITZER, L. et. al.


Corrupção: ensaios e críticas. 2. ed. Belo Horizonte:
Humanitas, 2012, p. 341-347.

WERNER, G.C. Teoria Interpretativa das organizações


criminosas: conceito e tipologia. In: PEREIRA, E. S;
BARBOSA, E. S. (org.) Organizações Criminosas: teoria e
hermenêutica da Lei n. 12.850/2013. Porto Alegre: Nuria
Fabris, 2015. p. 47-80.
WERNER, G. C. Cleptocracia: corrupção sistêmica e
criminalidade organizada. PEREIRA, E.S. et al. In:
Criminalidade Organizada: investigação, direito e ciência. São
Paulo: Almedina, 2017, p. 17-78.

Você também pode gostar