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EDIÇÃO DE SETEMBRO DE 2022

KIKOSOFIA

Francisco Moreira
Número 3 SETEMBRO DE 2022

AQUI DE NOVO

Por Francisco Moreira

E vamos seguindo em frente com esse projeto,


tentando melhorar o conteúdo e falar sobre
aquilo que nos incomoda e nos instiga na busca
por expressar o que sentimos e pensamos, as
nossas visões e preocupações nesse mundo
cada vez mais intrigante cheio de novidades,
onde a corrida do dia-a-dia nos trás muitas
vezes desafios que nem sempre estamos
preparados para resolver sozinhos. Buscar
ajuda nem sempre é fácil, mas é o melhor
caminho a seguir quando percebemos que algo
está errado.

É mês de primavera e nela tudo se renova se


nos damos a chance de olhar para o milagre
que diariamente nos faz amanhecer. Aproveitar
as flores e o sol, os amigos e as risadas,
compartilhar os medos e os choros. Tudo isso
faz parte da jornada.

Viver sempre vale a pena, pois cada dia nos é


dado o presente de uma nova oportunidade.
Obrigado pela sua presença!

Kikosofia nº 3. © 2022 by Francisco Moreira is licensed under CC BY-NC-ND 4.0. To view a


copy of this license, visit http://creativecommons.org/licenses/by-nc-nd/4.0/

As imagens quando não creditadas são do site pngwing.com


imagem da capa: "O grito do Ipiranga" quadro de Pedro Américo
- Criado com o Canva -

KIKOSOFIA
Número 3 SETEMBRO DE 2022

SETEMBRO
Conscientizar para prevenir.
"Já choramos muito
Muitos se perderam no caminho
Mesmo assim não custa inventar
Uma nova canção
Que venha nos trazer
Sol de primavera
Abre as janelas do meu peito
A lição sabemos de cor
Só nos resta aprender"

Estamos no mês da primavera, quando após o frio


impacável do inverno, renascem a esperança, a vida, a luz
"Quando
que mais tarde desemboca no verão auspicioso e quente.
entrar
É tempo de pensar em Vida, "Viver e não ter a vergonha de setembro
ser feliz", tempo de refletir sobre o presente que é acordar
a cada dia e sentir a energia pulsar em nossas veias E a boa nova
apesar de todas as dificuldades. Há espernça, há
renovação, há solução para os problemas. As vezes é andar nos
necessário buscar ajuda, ter a coragem de reconhecer que
precisamos dela e falar sobre o que nos aflige. A vida nem
campos
sempre é cheia de luz, mas assim como a primavera ela
Quero ver
sempre trará a esperança de um novo verão, de novos
desafios e novas vitórias. Descobrir a cada dia uma nova brotar o
razão para apreciar a beleza da estrada da Vida.
perdão
Setembro é tempo de celebrar a nossa história, de rever a
nossa Independência e reconhecer que a luta por ela Onde a gente
continua, mesmo após 200 anos, reconhecer que essa é
uma conquista diária, fruto da luta de todos nós. Saber que
plantou
ainda precisamos nos libertar de preconceitos e
Juntos outra
ignorâncias, avançar em cidadania e saber, social,
científico, humano. vez"
Setembro é tempo de nos preparar para exercer essa
cidadania através do voto,buscando conhecer candidatos e
Beto Guedes
propostas, descobrir que eles devem ser nossos
representantes e não ídolos a serem celebrados. Que
eles deveriam nos servir enquanto povo e não ao seus
interesses particulares. Mas esse conhecimento, essa
conquista só vem pelo esforço de cada um de nós em se
envolver com as questões políticas que nos cercam, ou
tomamos a democraacia nas mãos ou vão usá-la para nos
manter escravos de uma corte cruel, corrupta e cheia de
falsos salvadores da pátria.

KIKOSOFIA
A CANETA
KIKO MOREIRA

A caneta desliza sobre a folha macia Deslizando, vai fazendo a história


Desvenda mistérios escondidos no Colocando gestos sobre um pano frio
sonhar Guardando chaves em sua memória
Levando ao mar palavras pelo rio.
Refaz a alma batizada na pia
Desperta o cego, faz o mudo enxergar.
Contente, as formas seguem um ritmo
Podando versos, semeando poesia
Mancha-se o branco com um negro risco
Lutando em vão contra o algoritmo
Escuta um canto, o rouxinol
Que surge incólume na maresia.
O padre encanta-se sob os olhos do
bispo
Segue a caneta, transmutando
Escondem-se a terra, a lua, o sol.
paixões
Zombando, à míngua, os tais amores
Versa um verso a gentil caneta
Levando a vela, segurando caixões
Inspira a ação do filme azul
Fortalecendo a vida com tais labores.
Espia, um astro, céus com a luneta
Aninha-se em pêlo o uirapuru. Segue o branco na linha negra
Mundano mundo, sereno e sujo
Que sequer conhece seguir a regra
Enlameia o risco, nervoso cujo.

E segue a caneta no seu prumo


Fazendo volta, finalizando um ponto
Ereta e forte, seguindo um rumo
Fazendo chuva, provocando encanto.

Voando livre de canto a canto


Nas mãos do oleiro se enrijece
Culmina a frase com um pranto
"Guardando
Mas nada foi que já não soubesse.
chaves em sua
memória, levando
ao mar palavras
pelo rio"
Número 3 SETEMBRO DE 2022

Estante
DICAS DE LEITURA PARA SEUS MOMENTOS
Pois a leitura nos faz viver mil vidas

Estórias Gerais é considerada umas das melhores HQs


publicadas no Brasil. Uma história de disputas entre cangaçeiros
e coronéis ambientada no sertão de Minas dos anos 20, com
roteiros de Wellington Srbek e desenhos do fantástico Flávio
Colin. É ganhadora dos maiores prêmios de HQ do País, o HQ
Mix e o Angelo Agostini. Uma preciosidade contada através de
pequenas narrativas que se entrelaçam para formar uma trama
complexa e incrivelmente fiel a nossa história e tradição literária.

A descoberta de uma velha faca pela irmãs Bibiana e Belonísia irá


mudar para sempre a vida das duas, criando um laço ainda mais
especial entre elas.
Uma história de amor e superação contada por vozes femininas
que acontece no interior do sertão baiano e mistura entidades
espirituais, desigualdes sociais, servidão e o direito de possuir a
terra em que se vive. Torto Arado é uma saga comovente e
facilmente reconhecível por todos que na vida lutam por
dignidade e respeito.
Ganhador do prêmio Jabuti de 2020, Itamar Vieira Junior é um
baiano da periferia de Salvador, formado em Geografia e Doutor
em estudos étnicos.

KIKOSOFIA
Número 3 SETEMBRODE 2022

REFULGIR URBANO
JANIS, RAINHA DO ROCK E DO SOUL

Capa do album In concert, 1972

A icônica capa de R. Crumb para o álbum Cheap Thrills


"I want you to come on, come on, come on, come on and take it
Take another little piece of my heart now, baby"

Quando eu nasci Janis já havia deixado a esfera terrena há alguns meses, mas creio que enquanto ainda
estava no ventre de minha mãe devo ter ouvido aqueles maravilhosos e potentes agudos que só ela
conseguia dar. Já pré adulto, na Kaya, um sebo que vendia de tudo que mais tarde viria a se chamar
geek, ali na ladeira de Santa Theresa, ao lado da Carlos Gomes, me deparei com um CD com capa de
revista. Na época não sabia quem era o Robert Crumb, mas a capa me chamou a atenção e levei pra
casa. Onde em um disc player da Sony ouvi aquela voz anasalada cantando "I need a man to me" e
depois "Piece of my heart" e algo despertou em mim. Onde já tinha ouvido aquela voz? Por que me soava
tão bem e me agradava tanto? De quem era aquela caricatura da capa?

Até hoje não consigo ficar indiferente aos primeiros versos de "Maybe" e já vi muitos amigos simplemente
me dizendo - Cara! Quem é essa ai? Maravilha! - Pois é, Janis soa estranha e agradável aos ouvidos,
assim como a imensa variação e potência vocal que ela possuía. Aos 27 ela se foi; drogas, àlcool e
depressão sempre foram uma combinação terrível. Mas nos meu fins de tarde me alegro ouvindo divertido
os versos de "Mercedes Benz" - Uma canção de relevante importãncia social e política - "Oh Lord, won't
you buy me a Mercedes Benz? My friends all drive Porsches, I must make amends". - Obrigado Crumb.
Thats it.

KIKOSOFIA
Número 3 SETEMBRO DE 2022

Uma carta para você


Alguns assuntos são difíceis de começar, embora seja preciso abordá-los
para que alguma coisa mude, saúde mental é um desses assuntos e por
isso vou começar fazendo um relato pessoal. Em 2019 comecei a sentir
umas dores no ouvido e em seguida zumbidos que me levaram a uma
surdez quase total, graças a minha procura rápida por um especialista, e ao
tratamento adequado, consegui recuperar a audição. Veio o início da
pandemia e de repente, me vi com uma sensação esquisita que me vinha
quando estava dirigindo nas estradas dessa vida, parecia que conduzia
num fio de uma navalha com enormes abismos ao lado, diversas vezes fui
forçado a largar o carro no meio da estrada, ir pra contra mão, andar a
10Km por hora. Labirintite, eu pensei. Mas exames deram negativo para
isso. De repente, me vi dependendo de outras pessoas para ir e vir, para
levar meu carro de um lugar a outro, pois não conseguia dirigir e quando o
fazia reduzia bruscamente a velocidade, temia o acostamento, ficava tenso.
Logo resolvi ir a uma psicóloga, estava me sentindo inválido e
desesperançado.

Fui diagnosticado com uma “síndrome aguda de ansiedade com episódios


graves de crise de pânico”. Não sabia de onde aquilo começara e, mais uma
vez me senti um inútil. A terapia, no entanto começou logo a funcionar,
descobri que um susto durante uma viagem havia sido a causa de todo
esse sofrimento, transformei esse susto num monstro que me perseguia.
Encaminhado a um psiquiatra, logo comecei um tratamento
farmacológico e os resultados começaram a vir rápidos. Com 45 dias de
medicação resolvi enfrentar a estrada, o tal monstro tentou, mas consegui
minha primeira vitória, com a continuidade do tratamento, logo o monstro
foi ficando menor e após alguns meses acabou sendo domado. Algumas
vezes ele ainda tenta aparecer, mas aprendi técnicas que o mantêm sob
meu comando e consegui recuperar o prazer em dirigir sem medos ou
tensões e me sinto inteiro e útil de novo.

KIKOSOFIA
Número 3 SETEMBRO DE 2022

Como falei no início, tem assuntos que são difíceis, somos


preconceituosos por natureza e cultura. Doenças da mente podem
acometer qualquer pessoa, igual à outra doença como hepatite,
pneumonia, gastrite, etc. Todas têm tratamento e quanto mais cedo a
gente procura ajuda, mais cedo a gente doma o monstro. Estamos no
mês de prevenção ao suicídio e é preciso saber que este é um problema
sério que afeta muitas pessoas no mundo e é a segunda maior causa de
morte entre jovens. O suicido tem muita relação com doenças da mente,
como a ansiedade, a depressão, a dependência química, esquizofrenia,
entre outros. Que precisam ser diagnosticados e tratados
adequadamente, por isso, se começar a sentir que precisa de ajuda, não
se cale. Tente falar com alguém, procure um profissional ou uma pessoa
de confiança que possa lhe ajudar. Se for procurado ou perceber
sintomas que mostrem que há sofrimento mental ou emocional de
alguém, pergunte de forma clara o que a pessoa está sentindo e ofereça
ajuda sem criticar, sem tentar minorar a situação. A dor de quem passa
por um problema emocional é sempre muito grande e não pode ser
medida por outro, por isso tente sempre entender, sem preconceitos,
sem acusações e com seriedade.

Saiba que existem maneiras de ajudar e buscar ajuda; através do CVV


(Centro de Valorização da Vida) que atende pelo número 188; através dos
CAPS (Centros de Assistência Psicossocial) dos municípios e dos
atendimentos na rede médica. Nunca deixe que um sofrimento seja
causa de problemas maiores, sempre há soluções que podem tratar e dar
qualidade de vida pra quem possui alguma doença da mente.
Principalmente, nunca deixe que o preconceito seja impedimento para
procurar ajuda ou falar sobre o assunto com outra pessoa. Prevenir é
também conhecer e falar claramente sobre o assunto.

Precisa falar:

KIKOSOFIA
Número 3 SETEMBRO DE 2022

NARRATIVA
KIKOSOFIA

“A proclamação da Independência”, de François-René Moreaux. 1844

O 7 de setembro de 1822 marca a data oficial da independência do Brasil, proclamada as margens


do Rio Ipiranga, em São Paulo; dizem as más línguas que Pedro I, diferentemente do retratado no
famoso quadro do outro Pedro, o Américo, não estava num garboso cavalo branco galantemente
vestido ao lado de seus dragões, tudo isso é firula, Pedro teria é parado às margens do rio para
descarregar o intestino, uma caganeira só. E como pra quem já está assim, nada mais importa
mesmo, quando chegou o mensageiro com novas determinações da Corte (Dom João VI havia
voltado a Portugal um ano antes para tentar sufocar as revoltas que assolavam a terrinha), que
retiravam poder do então Príncipe Regente, Ele teria então mandado retirar das fardas as insígnias
portuguesas e proclamado “Independência ou morte!” É bom ressaltar que já antes da proclamação
diversas lutam ocorriam no Brasil pela independência, assim como tentativas oficiais de nos separar
politicamente de Portugal, sem conflitos ou rompimento de laços.

Naquele ano ainda é aclamado Imperador, mas Portugal não iria entregar sua colônia assim tão fácil
e somente em 1825 é que reconheceu o Brasil como uma nação independente. Pedro I teve que
contratar mercenários para lutar e contar com voluntários do povo em vários estados, sangrentas e
importantes batalhas foram travadas para consolidar o novo país que nascia, ao final ainda tivemos
que pagar uma fortuna de 2 milhões de libras como indenização. Apesar de um importante momento
histórico, não houve mudanças radicais em nossa sociedade, que permaneceu uma monarquia.

Esse ano comemoramos 200 anos de independência, mas ainda não conseguimos nos estabelecer
como uma Nação forte, soberana e independente economicamente. Por anos temos visto a falta de
projetos políticos que nos faça crescer em educação, ciência e tecnologia; que invistam na indústria
nacional e na diminuição das diferenças sociais. É preciso ficar atento, nesse ano que é também de
eleições, a promessas eleitoreiras vazias. Mais uma vez temos a oportunidade de escolher o destino
de nossa Nação. Escolha bem!
KIKOSOFIA
Número 3 SETEMBRO DE 2022

O VÔO DE ARLINDO
UM CONTO POR FRANCISCO MOREIRA

Arlindo havia saído do cinema com a certeza de que o


homem podia voar assim com dizia o cartaz do filme. Ele
seria um herói de aventuras épicas, pararia trens com um
soco e voltaria no tempo para salvar sua amada. Arlindo
não temia nenhuma pedra que pudesse lhe roubar os
poderes, afinal já havia levado muitas pedradas nas brigas
com a galera da rua de cima e continuava lutando.
Em casa tratou logo de colocar a cueca por cima do
pijama, que não era azul, mas cheio de bolinhas vermelhas
(não importava), amarrou uma toalha vermelha no
pescoço como uma capa e pôs se a correr pelo quintal e
subir no muro do jardim de onde saltou em direção aos E ARLINDO
SALVAVA
céus. A queda lhe rendeu uns bons hematomas e um dedo PRINCESAS E
quebrado, mas nada que um herói deixasse de suportar. REPÓRTERES
DAS GARRAS
Sua mãe olhava para ele e dizia “tá maluco fio? Esquece DE PIRATAS E
essa coisa de voar que tu não é passarinho, menino”, VILÕES
ESPACIAIS
Arlindo ria e saía correndo pelo jardim, abria os braços e
pulava as cercas, o muro, as dificuldades. Ele queria voar.
De tanto insistir a mãe lhe fez uma fantasia completa,
com capa e tudo, Arlindo chegava da escola e logo
colocava seu uniforme de super. A turminha já se
acostumara a ver os saltos das árvores em volta do rio,
Arlindo fazia uma pose e gritava para o mundo “para o
alto e...” tchibum caía nas águas calmas do Rio Preto.
Sorria e tentava de novo e depois mais uma vez. A
criançada toda acompanhava suas aventuras e Arlindo
salvava princesas e repórteres das garras de piratas e
vilões espaciais.

KIKOSOFIA
Número 3 SETEMBRO DE 2022

Tarde de quinta-feira, movimento estranho no campinho da cidade, caminhões e


gritos, gente estranha e música, cores e buzinas. Um alto falante montado no
teto de um fusquinha verde anunciava com um som estridente – Gran Circo
Baskervilla! Esse fim de semana em sua cidade venham ver a mulher de barba, o
homem elefante, os palhaços Verruga e Rouquidão, Crusoé da ilha dos monstros,
os magníficos irmãos Stephanich voando sobre o picadeiro – foi o que bastou
para atiçar a curiosidade da molecada, a maioria querendo ver os palhaços, mas
Arlindo parecia ter ouvido apenas “voando sobre o picadeiro”.
O Gran Circo Baskervilla, cujo nome o dono, um sergipano que dizia ter
ascendência espanhola, havia tirado do romance de Sir Doyle e misturado com o
seu sobrenome - Villa, Epílogo Villa, a seu dispor! – dizia o quase catalão e
pegando nas mãos de seu interlocutor, caso homem, dava um forte e sacudido
apertão, caso mulher, um lisonjeiro e demorado beijo cheio de mesuras; era um
circo de tamanho médio, com bons artistas e uma boa estrutura. Havia elefantes
e leões, engolidor de fogo e adivinho, dançarinas e atirador de faca.
Mas o grande espetáculo era dos irmãos trapezistas que saltavam no ar sem rede
num verdadeiro vôo pelo picadeiro, a assistência toda segurava o ar nos
pulmões quando os irmãos saltavam de um trapézio a outro e eram seguros no
último instante, fazendo piruetas, curvas, mudanças de mãos, giros e saltos
mortais pousando elegantes na plataforma. Pareciam ter asas invisíveis, o
volante pulava no vazio, braços abertos, pernas coladas, olhar atento, até ser
seguro pelo aparador ou agarrar as barras presas nas cordas penduradas.
Arlindo não podia estar mais encantado, se um homem
podia realmente voar era daquele jeito e tão logo
encerrou o show sua mãe o levou para conhecer os
trapezistas, foi só uma questão de tempo, logo Arlindo
estava fazendo aulas no trapézio, saltando de uma
barra a outra, sua mãe, coração nas mãos, incentivava
o filho em seu sonho. O verão passou, tempo voando
igual a Arlindo no trapézio, fantasia colorida, azul e
vermelha igual a do seu herói favorito e os meninos
vinham de todos os lugares verem o garoto que voava
igual nenhum outro antes dele. E o Gran Circo
Baskervilla anunciava sua mais nova atração, Arlindo
enfim voava com um sorriso no rosto e a alma em paz.

KIKOSOFIA
Número 3 SETEMBRO DE 2022

POEMAS DO SAMS

Santo
Lá ia ele, barbas longas, cabelos jogados aos ventos,
no rosto, o semblante de um santo, nas vestes,
Sabino Antônio Marques dos Santos

sujas e esfarrapadas, a humildade de um mendigo.


Na alma a riqueza de um rei.
De repente, ele pára.
E fita o Céu.
Seus olhos os mais belos já vistos.
Suas mãos em concha, uma frente à outra,
uma prece se faz ouvir:
Oh Pai! Dá-me perserverança para continuar o
caminho traçado por Vós.
Dá-me a esperança de que meus sacrifícios
venham a ajudar essa humanidade.
Oh Pai! Dá-me coragem para enfrentar
os algozes que tentam destruir
esse mundo tão belo
e cheio de vida.
O Céu tornou-se um azul maravilhoso,
pássaros vieram regojizar-se diante dele.
Ele agradeceu, como entusiasmo.
Obrigado, Pai, esta foi a resposta que
queria ouvir.
E seguiu seu caminho.

KIKOSOFIA
Número 3 SETEMBRO DE 2022

Chamado a batalha
UM TOQUE ERRADO QUE MUDOU A HISTÓRIA. OU NÃO

Agora véi, imagine aí: Você, um oficial do exercito português


lá na batalha de Pirajá, achando que é “o rei da cocada preta”,
descendo os sarrafos pra cima desses brasileiros safados,
querendo a independência, que o Pedro tinha anunciado três
meses antes; o povo ainda tava lutando pra transformar as
palavras em verdade e tu, ali, vencendo a peleja, botando os
baianos pra correr e indo pra cima deles. Aí, meu rei, um
doido lá toca uma corneta do lado dos brasileiros mandando
“avançar e degolar”. Maluco! Os portugueses devem ter
pensado assim “Ô, pá! Eles não estavam fugindo? Que ave de
mau agouro é essa?”. A molecada ouvindo o toque da corneta
e pensando “Oxe! Chegou reforço” – Aí, meu irmão, deve ter
sido aquela correria, todo mundo que já “não se agüentava
nas canetas”, ganhando fôlego e partindo pra cima dos
portuga, e esses “arre, porra! Que lã do cão é essa?”. Achando
Foto: Arte iBahia que os brasileiros tinham ganhado uma cavalaria, imagine
aquela “renca” de português saindo “picados” no maior
O atrapalhado corneteiro tem um desespero. Diz que foi um tal de Luis Lopes, um corneteiro
curta romantizado do cineasta português que vivia aqui e quase “enterra o baba” com o
Lazaro Faria disponível em: toque errado, mas o “miserávi” fez a galera ficar mais animado
que folião na pipoca. Sei não, acho que esse tal de Luís foi
https://youtu.be/53-6216AVK0 formado na Minerva Cachoeirana e tava querendo mesmo era
garantir o acarajé dele, que besta ele num era.

KIKOSOFIA
Número 3 SETEMBRO DE 2022

Repente
QUERO, PARA NOSSA CANÇÃO, UM VERSO DECENTE,
ALGO ASSIM, QUE NÃO ME APOQUENTE;
QUE NÃO POSSUA A MELODIA DE UMA TRISTEZA LATENTE,
NEM A TRESLOUCADA AMARGURA DE UM CIÚME DOENTE;
QUE NÃO SEJA PERENE COMO UMA NOTA INSISTENTE,
MAS QUE EVOLUA NUMA RELAÇÃO TRANSCENDENTE;
QUE ENTORPEÇA OS SENTIDOS E NOS ENEVOE A MENTE
E SE ESPALHE AO REDOR DE MODO RELUZENTE;
QUE DESPERTE EM NÓS TODO SENTIMENTO DORMENTE,
E A TODAS AS DÚVIDAS ELA AFUGENTE;
QUE SEJA PAIXÃO, REAL, PERIGOSA E ARDENTE;
DAQUELAS QUE SÓ UMA VEZ SE APRESENTE
DURANTE A VIDA QUE TENHAMOS À FRENTE;
E A DESFRUTEMOS COMO UM DESAFIO, UM REPENTE,
CANTADO DE UM JEITO ASSIM TODO INDOLENTE;
UM SAMBA DE RITMO MALEMOLENTE,
SENSUAL, DIVERTIDO E PUNGENTE.
AFINAL, ALGO ASSIM TÃO GOSTOSO E TÃO QUENTE,
SÓ PODERIA MESMO EXISTIR ENTRE A GENTE.

Kiko Moreira

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KIKOSOFIA
Número 3 SETEMBRO DE 2022

Primavera (1480), de Botticelli. Galeria Uffizi, Florença, Itália

Primavera - Botticelli
Quadro do pintor italiano Sandro Botticelli, um dos mais populares do mundo, mostra Zéfiro (o vento
frio e cortante), à direita, perseguindo Clóris (a ninfa das flores), que acaba por se transformar em
Flora (a deusa da primavera), distribuindo flores de sua toga, representa a fertilidade, a vida sempre
renovada. Ao centro, temos Vênus, deusa do amor, com uma auréola formada pelas folhas do laranjal.
Ela representa a benevolência que protege os homens e os que amam. Eros, seu filho, está sobre sua
cabeça, vendado, lança flechas de amor para humanidade. As três graças (Aglaia, Tália e Eufrósina) -
Castidade, Beleza e Sensualidade - ensaiam uma dança, enquanto Mercúrio, o mensageiro dos
deuses. afasta o inverno com seu cajado.

AS TRÊS GRAÇAS

As Graças são uma representação da beleza


feminina, sua força e sensualidade e estão
representadas em diversas obras de arte ao longo
de toda historia da arte, sempre mudando de
formas, idades, vestes, demonstram a dinãmica da
beleza que está sempe em mutação.
As Três Graças (1831), de Pradier. Museu do Louvre

KIKOSOFIA
Número 3 SETEMBRO DE 2022

“VIVA A INDEPENDÊNCIA E A
SEPARAÇÃO DO BRASIL’. PELO MEU
SANGUE, PELA MINHA HONRA, PELO
MEU DEUS, JURO PROMOVER A
LIBERDADE DO BRASIL.
INDEPENDÊNCIA OU MORTE!”

DOM PEDRO I

"A Batalha de Pirajá" - Mural de Carybé


KIKOSOFIA

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