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EDIÇÃO DE FEVEREIRO DE 2024

KIKOSOFIA

Francisco Moreira
número 18 fevereiro de 2024

FEVEREIRO
Por Francisco Moreira

Depois de uma pequena pausa em janeiro, estamos


de volta com o projeto Kikosofia, em busca de
novos desafios e limites e com o mesmo espírito de
colaboração, provocações e visões de mundo
distintas. Venha juntar-se a nós.

A contagem de um novo ciclo traz esperanças e


perspectivas novas, os ânimos são renovados e
temos a sensação de que tudo pode mudar, que o
novo ano trará a solução de nossos problemas e
que todas as dificuldades ficaram no passado.
Quiçá assim fosse! - Entretanto sabemos que
apesar de nossas expectativas e sonhos, os
desafios continuarão surgindo e depende de nós
manter a fé e seguir pela estrada fazendo o melhor
possível em nossa busca pela felicidade e pela
harmonia. Um novo ano sempre traz reflexões e
visitas aquilo que marcou em nosso passado
recente, os votos e promessas de mudanças
sempre acompanham nossas resoluções cheias de
otimismo. E assim tem que ser. Olhar o passado
serve para planejar o futuro, tentando evitar os
erros e buscar mais acertos.
Boa leitura!
Kikosofia nº 18 © 2024 Este trabalho está licenciado por Francisco
Moreira sob CC BY-NC-ND 4.0. Para ver uma cópia desta licença, visite
http://creativecommons.org/licenses/by-nc-nd/4.0/

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KIKOSOFIA
número 18 fevereiro de 2024

Dengue
O carnaval passou e, como costumamos dizer, agora começa o ano
Todas as para o brasileiro. Tempo de por contas e projetos em ordem e
faixas etárias seguir na esperança de que até dezembro tenhamos construído
um país melhor, com mais ordem, mais progresso e mais
são
equilíbrio. É tempo também de buscarmos nos informar e
igualmente conscientizar sobre a dengue e outra doenças provocadas pelo
suscetíveis à mosquito Aedes aegypt, as chamadas arboviroses, como a
Chikungunya e a ZIka.
doença,
porém as A doença que se caracteriza por febre alta que começa de maneira
pessoas mais abrupta, dores no corpo, dor de cabeça e surgimento de manchas
velhas e vermelhas pelo corpo, leva várias pessoas à morte todos os anos e
é considerada uma das doenças infecciosas mais frequentes no
aquelas que País. Apesar da maioria dos óbitos poder ser evitado com
possuem tratamento de qualidade adequado.
doenças
Após passar pelo período febril, a pessoa deve-se ficar atento a
crônicas, sinais que podem indicar uma piora no estado do indivíduo, tais
como como:
diabetes e dor abdominal (dor na barriga) intensa e contínua;
vômitos persistentes;
hipertensão
acúmulo de líquidos em cavidades corporais;
arterial, têm hipotensão postural (sensação de tontura, desmaio e fraqueza
maior risco ao levantar);
letargia e/ou irritabilidade; e
de evoluir
sangramento de mucosa;
para casos
graves e Apesar do Brasil ser, agora, o primeiro do mundo a criar uma
outras vacina contra a doença (recomendada para faixa etária de 10 a 14
nos de idade), a principal forma de prevenção da doença continua
complicações sendo o controle do vetor de transmissão, o mosquito Aedes
que podem aegypt, que deve ser feito ao longo de TODO O ANO.
levar à
O mosquito se reproduz em locais de água parada (principalmente
morte.
limpa, mas já há subespécies que se proliferam mesmo em água
suja). Portanto é fundamental a manutenção de locais limpos, sem
acúmulo de lixo, fechar caixas de água e outros reservatórios,
evitar água empoçada, etc. além de, nos períodos de infestação,
utilizar telas contra mosquitos em casa e loções repelentes
aprovadas pela ANVISA.

KIKOSOFIA
número 18 fevereiro de 2024

TRATAMENTO

Basicamente o tratamento dos sintomas se dá através de


repouso, ingestão de líquidos e seguindo as recomendações
médicas para evitar complicações. A automedicação não é
recomendada uma vez que não existe um medicamento
específico para cura da doença que, em geral sara
espontaneamente em cerca de 10 dias.

Casos em que a pessoa tem a doença pela segunda ou terceira


vez podem levar ao desenvolvimento de febre hemorrágica, um
forma mais grave da dengue, que provoca uma reação
inflamatória exagerada no corpo e alterações na coagulação do
sangue, podendo levar a sangramentos ou hemorragias,
colocando a vida em risco. Apesar de grave, é tratável, havendo
necessidade de internação e monitoramento hospitalar. Seus
principais sintomas são:
o tratamento
1. Manchas vermelhas na pele;
2. Sangramento da gengiva, boca, nariz, ouvidos ou intestinos; dos sintomas
3. Vômitos persistentes, que pode ter sangue;
se dá através
4. Dor abdominal intensa;
5. Pele fria e úmida; de repouso,
6. Boca seca e sensação constante de sede;
7. Urina com sangue; ingestão de
8. Confusão mental;
líquidos e
9. Olhos vermelhos;
10. Dificuldade para respirar ou respiração rápida; seguindo as
11. Alteração dos batimentos cardíacos.
recomendações
Em alguns casos, entretanto pode não haver sangramento, o que médicas
indica a necessidade de sempre buscar atendimento médico ao
menos sinal da doença.

O transmissor:

O mosquito tem hábitos diurnos e pode ser identificado pelas


listras brancas que traz no corpo. Além da dengue, pode
transmitir também a Zika e a Chikungunya, além da febre
amarela. Costuma picar várias pessoas diariamente o que
aumenta a transmissão das doenças.
KIKOSOFIA
número 18 fevereiro de 2024

SI ALGUIEN LLAMA A TU PUERTA…

Si alguien llama a tu puerta, amiga mía,


y algo en tu sangre late y no reposa Gabriel Garcia Marquez
y en su tallo de agua, temblorosa,
la fuente es una líquida armonía.

Si alguien llama a tu puerta y todavía


te sobra tiempo para ser hermosa
y cabe todo abril en una rosa
y por la rosa se desangra el día.

Si alguien llama a tu puerta una mañana


sonora de palomas y campanas
y aún crees en el dolor y en la poesía.

Si aún la vida es verdad y el verso existe.


Si alguien llama a tu puerta y estás triste,
abre, que es el amor, amiga mía.
SE ALGUÉM BATE À TUA PORTA

Se alguém tocar em tua porta, amiga minha,


e algo em teu sangue bate e não descansa
e em seu tronco de água, temerosa,
a fonte é uma líquida harmonia.

Se alguém toca à tua porta e, todavia,


te sobra tempo para ser formosa
e cabe todo abril em uma rosa
e pela rosa se sangra o dia.

Se alguém bate à tua porta uma manhã


ao som de pombos e de sinos
e ainda crês em dor e na poesia.

Se ainda a vida é verdade e o verso existe.


Se alguém bate à tua porta e estás triste,
Abre, que é o amor, amiga minha.

KIKOSOFIA
número 18 fevereiro de 2024

O QUE É A VIDA?
João Marcos

Eis a vida, ela dura de forma diferente para os seres vivos, humanos
ou não; que diga os nordestinos que moram no semiárido, o que nos
faz lembrar o livro Morte e Vida Severina, de João Cabral de Melo
Neto.

Assim, uns vivem mais, outros menos, uns chegam à velhice, outros
não alcançam a adolescência, alguns têm poucos minutos de vida,
pois não tem cérebro, já tantos outros nascem sem vida, pois a
morte misturou-se com vida ainda no ventre da mãe... E nós que
pensamos da vida? Somos privilegiados por ser algo, por ter algo?
Por termos uma família feliz? Mas será apenas nesses ângulos que a
vida deve ser analisada. Uns falam que a vida é um sopro, alguns
que é como uma chama que de repente se apaga... e assim vemos
amigos, parentes, vizinhos, pessoas conhecidas e desconhecidas
sendo desconectadas dessa vida para um outro plano, é claro, para
aqueles que acreditam que existam essa alternativa.

Então vivo a perguntar. O que é a vida? Quanto tanto ela dura?


Vale a pena viver? Ora, por que alguns cometem suicídio? Será que
a vida se tornou tão insuportável que eles pensaram em viver uma
vida diferente em outro lugar, ou experimentar se a morte o traria
uma proposta mais atrativa de viver?

Ora, a vida é uma dádiva, ela foi-nos dada, por quem? Para muitos,
por um Ser Maior que fez o homem do barro e soprou em suas
narinas dando-lhe um espírito, alma e corpo; mas para outros, não
passa de um processo de amadurecimento que passamos, até
atingirmos um grau elevado de desenvolvimento como ser vivente
(questão de fé), mas as diversas formas de pensar a vida refletem o
que é a vida. E o que vem a ser a morte? Quem já esteve do outro
lado? Ah! soube que pessoas já experimentaram passar para o outro
lado, mas, de repente, foram trazidas de volta para esse plano.
Pergunta a elas se sentiram a paz lá ou cá.

KIKOSOFIA
número 18 fevereiro de 2024

O que é a vida? Ainda não consigo expressar o que ela


significa, para onde vai. Somos espírito, alma e corpo
mesmo? onde o primeiro pertence a algum Ser Poderoso
que nos deu e devolvemos a ele após a morte, enquanto
o segundo são a sede de nossos sentimentos, como
tristeza, alegrias, ciúmes, coragem.... já o corpo que é a
nossa casa, a qual precisamos cuidar, lavar, aspirar,
reformar, mudar, entre outras ações que podem
movimentar essa matéria para que não pare e o
sedentarismo ganhe espaço e a doença mental surja e a
vida dê lugar a morte por uma falta de movimento.

Então… Falo que a vida é viver o hoje e não ficar tão


preocupado com o amanhã, tampouco ficar só
relembrando o passado, quem faz assim, vive, com
alegrias e tristeza, mas não se esconde em passado ou
fica ansioso pelo futuro.

Veja o que é a vida: há momentos que nos deparamos


com uma pessoa em um velório de um parente dela e dias
depois estamos em uma celebração de aniversário de
outro; são os altos e baixo da vida, uns têm fome e
outros fartura, uns sucessos e enquanto outros
fracassos, uns são justos, outros injustos, uns se alinham
ao mal outros ao bem.

Mas a vida se finda nesta esfera, surge outra... (um


posicionamento de fé), o que nos habilita a vivermos bem
pós essa vida? e haverá lugar ruim ou bom após esse
plano? Mas seja como for o pensamento das diversas
convicções religiosas e filosóficas, a vida urge ser vivida
e não desprezada, seja qual for as situações favoráveis
ou adversas que ela apresenta.

Então, pergunto novamente, o que é a vida? vale a pena


viver?

Uma hora a vida, de repente, se finda, como essa


reflexão, e no momento que lemos estes versos a vida
continua e os fatos acontecem enquanto analisamos, o
que é a vida?

KIKOSOFIA
número 18 fevereiro de 2024

CLANDESTINO

SE NO ALÉM SOMENTE ISTO É O QUE ME RESTA,


UMA VOZ, UM GRITO, QUE UM LAMENTO CLAMA.
DESESPERADA ATITUDE, IGNÓBIL E FUNESTA.
PELA PERDA TORMENTOSA DE QUEM SE AMA.

SOFRIMENTO QUE EM MOMENTO ALGUM ABRANDA.


ANTES, RECRUDESCE, RETOMANDO O CICLO,
QUE EM TORNO DA ALMA VÊ DIMINUIR A CHAMA
À MEDIDA QUE DE AR SE VAI PERDENDO O SICLO.

BUSCO NO HORIZONTE ALGUMA REDENÇÃO


QUE, NESTE MAR, ME LEVE A ALGUM DESTINO.
QUE FAÇA VALER OS VERSOS DESSA CANÇÃO.

QUE NÃO ME ENLOUQUEÇA EM DESATINO


E CONDUZA À TRANQUILIDADE, MEU CORAÇÃO
QUE NAVEGA NA DOR COMO CLANDESTINO.

Kiko Moreira

KIKOSOFIA
número 18 fevereiro de 2024

DIVERGÊNCIAS
Indo na contramão de certas "correntes" - Francisco Moreira

Pátria educadora? - Ainda não.


A frase estampada em nossa bandeira, ”Ordem e Progresso”, traz consigo
uma necessidade implícita e fundamental para que alcancemos tal
condição, a promoção de uma educação universal e de qualidade que
possibilite a seu povo obter condições de efetuar as melhores escolhas em
nível pessoal e coletivo, ajudando a nação a desenvolver-se social,
econômica e espiritualmente. Portanto, criar condições para que o povo
consiga educar-se é indispensável quando se fala na construção da
cidadania.

Ao longo dos anos tentativas de democratização foram realizadas em nosso


país com mais ou menos resultados. Um dos mais importantes passos
vislumbrou justamente a inclusão ao criar cotas que favorecessem o acesso
a quem tinha menos condições de alcançarN OoT Í ensino superior. As cotas
CIAS IMPORTANTES,
raciais foram fundamentais para que grande
A T U A L I Zparcela
AÇÕES E I Dda
E I A S população

historicamente excluída fosse enfim alçada à graduação. O ENEM foi outra


iniciativa desmitificou o processo de concursos vestibulares,
2 - Tendências de Gestão antes
terrivelmente demonizados e, obviamente mais exclusivos e elitistas que
3 - Tendências de 2022
facilitadores.

Embora sejam conquistas importantes de inclusão, no entanto não


representaram grandes ganhos na melhoria do ensino em nosso país, que
continua amargando índices muito aquém daqueles alcançados por países
com potencial bem menos efetivo que o nosso. Anualmente vemos estudos
que mostram nosso “analfabetismo funcional” estagnado e sem perspectiva
de melhora a médio prazo. Vi recentemente uma reportagem que exaltava
uma estudante de uma escola pública que havia tirado nota máxima na
redação do ENEM. Afirmo, o mérito é apenas dela, e nenhum da escola e
digo isso, oorque apenas 4 dos 60 estudantes que tiraram nota máxima são
de escolas públicas, ou seja, nosso ensino é péssimo. Não que as escolas
particulares sejam tão melhores. 60 alunos no universo daqueles que
fizeram a prova (2,7 milhões) é uma vergonha, que foi exaltada como o
melhor desempenho dos últimos seis anos.

KIKOSOFIA
Número 13 fevereiro de 2024

E essa é apenas uma amostra do quanto precisamos


e devemos nos preocupar com a Educação em nosso
País. Desde que eu era estudante vejo exaltações a
como países como Coréia, Japão e outros, cujos
níveis educacionais eram semelhantes aos brasileiros
na década de 60, conseguiram através de massivos
investimentos na formação de professores, sua
valorização e estabelecimentos de metas, sair de
condições adversas e se tornarem potências
tecnológicas, econômicas, etc. com índices de
escolarização muito bons.

Um dos grandes problemas, sempre falado “à boca


pequena” entre professores, pais, educadores e
alunos é a facilitação artificial para inflar os
indicadores de melhoria. Ações de governo que
dificultam a aprovação, que retiram autoridade de
professores, que investe na construção de escolas,
mas não em sua estruturação e manutenção, que
exige cargas horárias absurdas de professores, com
uma remuneração desincetivadora, entre outras.

Recentemente o governador da Bahia, que já foi


secretário de educação, causou polêmica ao afirmar
que “escolas e professores autoritários punem os
alunos com reprovação” e editou uma portaria que,
entre outras coisas prevê “aprovação automática” até
para quem não frequentar ao menos 75 % das aulas.
A justificativa seria a de que o aluno não pode pagara
pelo fato da escola não dar condições adequadas
para que o aluno tenha bom desempenho. Mas de
quem é a responsabilidade para que as escolas
alcancem tal desempenho de excelência, senão do
próprio governo?

Não dá pra pensar escola com direcionamento


político ideológico. Claro, que toda educação irá
assumir caráter político, mas isso deve ser feito sem
direcionamentos, através do estímulo ao
pensamento livre, ao aprendizado, ao conhecimento
da língua culta, do saber técnico, do treinamento
que constante de habilidades.
KIKOSOFIA
Número 13 fevereiro de 2024

À população não pode permanecer em novos currais


eleitorais, cujos cercados deixaram de ser o colonialismo
feudal dos “coronéis” para se tornar grades
assistencialistas que impedem o cidadão de alcançar tal
condição, de imprimir o próprio progresso, de percorrer a
própria jornada de desenvolvimento.

Não basta criar acesso facilitado e “inclusivo” a todos, se


essa muleta permanecer por gerações, o ensino
fundamental precisa ser priorizado como formador de um
base sólida que liberte o aluno de migalhas
governamentais, que o ensine desde cedo a entender a
estrada que precisa percorrer em seu desenvolvimento
pessoal e lhe proporcione escolher que trilhas irá
empreender.

A política de cotas é necessária, mas deveria ser


temporária e não perene. Investimento na educação de
o ensino fundamental
base sim, deveria ser permanente, qualificado e
precisa ser priorizado
como formador de um estruturante para que o futuro de nosso país possa se
base sólida que liberte assentar sobre fundamentos estruturais sólidos e duráveis
o aluno de migalhas e não sobre facilitações de acesso, que levam estudantes
governamentais ao ensino superior, mas que nem sempre representa
melhora na condição social, econômica ou pessoal
daquele indivíduo.

Há que investir também na educação técnica, ainda que


isso venha sendo feito nos últimos anos com a
implantação de institutos de formação, ainda há uma
demanda reprimida muito grande. É preciso dizer que
nem todo mundo precisa “ter” educação superior para
contribuir de forma positiva para si e para o País.

Falas como a do governador baiano se mostram


equivocadas por vários motivos. A começar por
responsabilizar professores e escolas pela reprovação do
aluno, quando o próprio sistema não proporciona que a
qualidade do ensino seja melhor. Depois, por isentar o
aluno de seu dever de esforço pessoal para o aprendizado.
Erra ainda ao criar uma expectativa de ganho injusta para
os alunos e extremamente prejudicial para a relação entre

KIKOSOFIA
Número 13 fevereiro de 2024

estes e os professores. Relação esta que ao longo das


última décadas tem sido muitas vezes conflituosa, em
razão da diminuição da autoridade docente ,do aumento
gradual da violência nas escola e em seu entorno, da
fragilidade institucional que perpassa a noção de
responsabilidade e consequência e até pela insegurança
jurídica e legal que enfraquece nossas legislação com seus
inúmeros recursos, revisões e volatilidade que repercutem
na formação cidadã do jovem. ainda que sejam assuntos
quase nunca relacionados como ponto de discussão na
construção de um sistema educacional que vise criar
pensadores e não meros “concurseiros”.

Aliás, esse é outro ponto que precisa ser revisto. A grade


curricular que ao longo dos anos foi sendo transformada
em mero instrumento facilitador de ingresso em escolas
Se pensamos todos as
superiores e concursos, tendo seus conteúdos
mesmas coisas não
simplificados e muitas vezes condensados em módulos
somos mais do
autômatos sem vontade que visam unicamente treinar para a aprovação no ENEM,
própria, simples sem a preocupação da fixação do aprendizado, sem a
reprodutores de preocupação com a criação do conhecimento.
conteúdo.
Assim, vemos muitos alunos chegarem aos bancos das
universidades sem preparo científico algum, sem exercitar
o pensamento crítico e presa fácil de ideologias partidárias
(não políticas), que mais ajudam a estagnar o status do
que promover o progresso, a ordem e o desenvolvimento
social, econômico e político do País.

A escola precisa ser “libertadora”, mas é preciso lembra


que o pensamento para ser livre precisa ter escolhas, que
advém da confrontação de conhecimentos universais e por
vezes divergentes. Se pensamos todos as mesmas coisas
não somos mais do autômatos sem vontade própria,
simples reprodutores de conteúdo. Tudo aquilo que a
Educação não deveria ser.

KIKOSOFIA
número 18 fevereiro de 2024

Estante
DICAS DE LEITURA PARA SEUS MOMENTOS
Pois são as histórias que fazem o mundo

um dos maiores clássicos da literatura, o prestigiado autor


narra a incrível e triste história dos Buendía - a estirpe de
solitários para a qual não será dada “uma segunda
oportunidade sobre a terra” e apresenta o maravilhoso
universo da fictícia Macondo, onde se passa o romance. É
lá que acompanhamos diversas gerações dessa família,
assim como a ascensão e a queda do vilarejo. Para além
dos artifícios técnicos e das influências literárias que
transbordam do livro, ainda vemos em suas páginas o que
por muitos é considerado uma autêntica enciclopédia do
imaginário, num estilo que consagrou o colombiano como
um dos maiores autores do século XX. e marcantes
personagens femininas contemporâneas.

Gabriel Garcia Marquez


Ano: 2023 / 448 Páginas
Editora: Record

A história do príncipe Judá Ben-Hur inspirou um dos maiores


clássicos do cinema (Ben-Hur 1959), ganhador de 11 Oscars e
que permanece na cultura pop gerando remakes e séries de
TV. Uma cativante história de traição e redenção na qual o
protagonista se vê acusado injustamente pelo amigo de
infância, o oficial romano Messala, É transformado em escravo
e alimenta durante anos a sua vingança, numa jornada que é
paralela a vida de Jesus, com o qual se encontra em
momentos decisivos e dramáticos. Publicado pela primeira
vez em 1880, o livro permanece um romance histórico
emocionante, cheio de aventuras e momentos memoráveis
que nos prendem a leitura numa narrativa belíssima que evoca
uma metáfora da história de Cristo, com sua trajetória de
traição, sofrimento, redenção e salvação. Um livro
Lew Wallace
Ano: 2014 / Páginas: 528 verdadeiramente inspirador.
Editora: Jangada

KIKOSOFIA
número 18 fevereiro de 2024

Pleonasmos da Vida
Um dia pensei um pensamento,
De repente, para esquecer
Entrei para dentro de uma casa,
Percebi que estava preso
Sem conseguir sair para fora.
Então vi uma ladeira,
não sabia se subia para cima ou descia para baixo.
Daí, uma surpresa inesperada,
Baseada em fatos reais
Não era mentira, tampouco sonhos que sonhei,
Era tudo fato verídico. Fato de muitos anos atrás.
Mas na minha opinião pessoal,
Ah! se pudesse repetir de novo,
Iria encarar de frente a mesma situação,
viver a vida, como se fosse uma pessoa humana,
Em duas metades iguais,
Mas quem dera ser um Parnasianista.
Versos sem defeito.
Poético, sem fim, um relatório final.
E, sem preferir mais
E sem abusar demais das palavras,
Sem dar de graça o conhecimento dos pleonasmos.
Sem defeito, estilo Acabamento final.

Edmilson dos Anjos

KIKOSOFIA
número 18 fevereiro de 2024

"PSICOSSÍNTESE ESTRUTURAL E TOPOGRÁFICA"


AUTOAJUDA NO CRESCIMENTO PESSOAL.

Jorge L Oliveira
Psicoterapêuta/Psicanalista

O que quer a Psicossíntese Estrutural e Topográfica? Avaliando essa pergunta, podemos


dizer que a mesma, busca o ajustamento psíquico e o crescimento pessoal, que nada mais
é que uma inclinação natural da raça humana. Na busca de sua harmonização o homem
que está dividido em níveis e aspectos de sua organização irá com o auxilio deste método
sintetizar essas escalas. É observável que o ser em doses normais e até patológicas,
intrapsíquicamente trava conflitos de toda natureza, no intuito de satisfazer-se
atendendo seus anseios, buscando a esmo evoluir para níveis mais altos, desperdiçando
assim uma valiosa somo de energia que se em sua descarga não achar o caminho
adequado, resultará num agravamento das neuroses e suas patologias.

Estruturalmente a psicossíntese desmembra as instâncias do psiquismo para eliminar


aquelas que são dispensáveis para o caminho harmônico ou pelo menos neutralizar
inicialmente suas investidas, já que tais se alimentam do fracasso e baixa autoestima do
Ego. É conhecido da Psicanálise o SUPEREGO (SØ) este se desenvolve a partir do Ego,
quando primariamente, na busca para se libertar do primeiro objeto (mãe), que para o ser
nessa fase, é sua única forma de satisfação (gozo), uma vez rompendo, retornará ao
mesmo sujeitando-se a essa mudança. Assim, se observará o superego formado, pois para
o bebê a mãe (1º objeto) já não é mais ele, pois no seu entendimento mãe e bebê são a
mesma coisa, isso faz com que, ele possa se perceber fora dela e sendo outro. Para a
criança, isso é assustador e a partir de então ele fusiona-se com o objeto (mãe).

Dessa maneira, bem como as outras instâncias o (SØ) também tem níveis e ao alcançar a
fase adulta o (SØ) exerce sua função com mais força, tendo a capacidade de avaliar,
observar e julgar a partir dos seus próprios critérios. O método não tem por objetivo a
sua reprogramação e sim neutralizar suas investidas contra o Ego.

KIKOSOFIA
número 18 fevereiro de 2024

Outra instância chamada de (id) parte importante da estrutura psíquica formada pelos
representantes mentais e seus impulsos instintuais que também é uma fonte de energia
para todo aparelhamento mental. Alem disso, em nossa linguagem agregamos o (NA+O)
que são os Núcleos de Apoio + Objeto, que se referem a tudo aquilo que devotamos apego
e que, se por ventura do indivíduo for tirado inevitavelmente elaborará muito sofrimento
(luto). Uma vez eliminados os (OEx) Objetos Externos deixarão o caminho do Ego aberto
para ser livre e gozar de uma consciência capaz de se ajustar e alinhar-se com o (NAE) que
é o Núcleo de Apoio do Ego, Núcleo de Autoestima e que terá função autônoma e coerente
mantendo este último sempre com sua autoestima elevada.

O Ego tem como tarefa principal de sua existência a auto-preservação. Entretanto, para
que haja um melhor entendimento por parte do leitor, iremos facilitar o conceito sobre o
Ego de forma simplificada, pois este é o objetivo da psicossíntese, visto que, é no Ego que
tudo acontece, exemplo: se após uma péssima noite de sono você acorda mal humorado
mesmo sem ter tido contato algum com outra pessoa, será possível avaliar que estímulos
internos são os responsáveis pela agressão sofrida pelo Ego. Os estímulos externos são
aqueles percebidos do mundo existente fora do Ego podendo ele ajustar-se a estas ou
aquelas situações para não ser agredido.

Contando com o amparo incondicional do (NAE), o Ego se sentirá capaz de diluir as


tensões sofridas por ele na busca do prazer e do inevitável encontro com o desprazer. E
dessa forma, não prevalecerão mais sobre esse Ego as perversões, os conflitos, a solidão, a
desilusão, as perdas e as muitas outras formas de agressão.

A psicossíntese embora tenha um aspecto complicado é um método de abordagem


simples: [E+(SØ)+(NA+O)+id] = [E+(SØ)+id]. Estas são algumas das fórmulas em que a
psicossíntese apresenta os estados mentais do sujeito, sendo [E+NAE] soma do Ego (Eu)
com Núcleo de Autoestima o objetivo final da mesma.

KIKOSOFIA
número 18 fevereiro de 2024

Nossa metodologia vem sendo muito utilizada no Brasil não só na clínica, pois suas
aplicabilidades transcendem vários campos: o cientifico, o não cientifico, o pedagógico, o
religioso, o filosófico, o acadêmico, bem como em todas as áreas que têm a seus cuidados
a saúde mental. Contudo, ainda é possível fazer um questionamento: Quem pode utilizar-
se dos benefícios da psicossíntese na clínica?

Analisando-se a atual conjuntura da Psicanálise no Brasil, podemos dizer que esse método
pode ser utilizado em pacientes que se apresentam com baixíssima autoestima, por
exemplo: o homem de negócios, atormentado e nervoso, a dona de casa preocupada e
agitada, a criança exasperada por contínuos acessos de raiva, o homem e a mulher que
não conseguem deixar de beber, em suma, pessoas em estados deprimentes, entre outros.
A abordagem inicial como terapia de apoio no tratamento elege com meta a promoção do
processo de crescimento contínuo, integrando o corpo aos sentimentos, fazendo com que
a mente leve o indivíduo harmoniosamente à plenitude de sua vida, acessando com isso
em maiores níveis, suas capacidades e talentos e assim sua potencialização. Sendo assim,
o processo terapêutico da psicossíntese é na verdade uma forma diferente do indivíduo
ser conduzido a ver o outro lado do muro, o muro que o coloca do lado de dentro e o faz
medroso, lhe dando a falsa impressão de protegido. E do lado de fora um verdadeiro e
autêntico modo de viver, hostil, agressivo e competitivo, contudo verdadeiro e autêntico
como todo ser humano por natureza o é, e por formação não se permite assumir.

Assim sendo, é concludente que a Psicossíntese Estrutural e Topográfica permeia num


ajuste mais completo da pessoa em suas capacidades e relações, oferece ainda uma
técnica terapêutica para o desenvolvimento pessoal e psíquico.

Destarte, na terapia em Psicossíntese o processo dar início com o que é tônico na história
da pessoa e acorçoa o cliente na direção do esclarecimento mais melhorado de sua
própria potencialidade. O que somos significativamente em toda a nossa exterioridade,
nossa dádiva e características, nossa finalidade efetiva na vivência e nossa concepção da
inteligência e do desenvolvimento compassivo.

KIKOSOFIA
número 18 fevereiro de 2024

Publique na Kikosofia
A Kikosofia é um espaço de vozes, consonantes,
dissonantes, de livre e respeitosa expressão e opinião. Um
local que se pretende divertido, reflexivo, por vezes louco,
mas sempre acolhendo o outro, independente de diferenças,
somos todos iguais, e isso é o que de mais belo existe no
viver, saber que não somos cópias de outro ser.
Colabore, discorde, concorde, opine. Boa jornada.

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KIKOSOFIA
número 18 fevereiro de 2024

grandes autores

Coaduno com tudo, Gregório de Matos.


O que fazer?
Se pensar já não devo.
A culpa é de José, que sequer tem lugar para onde
ir?
Ou de Irene, que licença já não pede.
Ou será de Pedro bonachão?
O jeito é seguir.
Eu vou, por que não, por que não!!
E, mesmo que caminhando contra o vento!!
Mesmo que sem figueiras, sem laranjais. Eu vou!
O que não devo é ficar sobre o muro.
Ou isto ou aquilo!
Sigamos!

Edmilson dos Anjos

KIKOSOFIA
número 18 fevereiro de 2024

O AFOGADO MAIS BONITO DO MUNDO


GABRIEL GARCIA MARQUEZ

Os primeiros meninos que viram o volume escuro e silencioso que se aproximava pelo
mar imaginaram que era um barco inimigo. Depois viram que não trazia bandeiras nem
mastreação, e pensaram que fosse uma baleia. Quando, porém, encalhou na praia,
tiraram-lhe os matos de sargaços, os filamentos de medusas e os restos de cardumes e
naufrágios que trazia por cima, e só então descobriram que era um afogado. Tinham
brincado com ele toda a tarde, enterrando-o e o desenterrando na areia, quando alguém
os viu por acaso e deu o alarme no povoado. Os homens que o carregaram à casa mais
próxima notaram que pesava mais que todos os mortos conhecidos, quase tanto quanto
um cavalo, e disseram que talvez tivesse estado muito tempo à deriva e a água
penetrara-lhe os ossos. Quando o estenderam no chão viram que fora muito maior que
todos os homens, pois mal cabia na casa, mas pensaram que talvez a capacidade de
continuar crescendo depois da morte estava na natureza de certos afogados. Tinha o
cheiro do mar e só a forma permitia supor que fosse o cadáver de um ser humano,
porque sua pele estava revestida de uma couraça de rêmora e de lodo. Não tiveram que
limpar seu rosto para saber que era um morto estranho. O povoado tinha apenas umas
vinte casas de tábuas, com pátios de pedra sem flores, dispostas no fim de um cabo
desértico. A terra era tão escassa que as mães andavam sempre com medo de que o
vento levasse os meninos, e os poucos mortos que os anos iam causando tinham que
atirar das escarpas. Mas o mar era manso e pródigo, e todos os homens cabiam em sete
botes. Assim, quando encontraram o afogado, bastou-lhes olhar uns aos outros para
perceber que nenhum faltava. Naquela noite não foram trabalhar no mar. Enquanto os
homens verificavam se não faltava alguém nos povoados vizinhos, as mulheres foram
cuidando do afogado. Tiraram-lhe o lodo com escovas de esparto, desembaraçaram-lhe
os cabelos dos abrolhos submarinos e rasparam a rêmora com ferros de descamar
peixes. À medida que o faziam, notaram que a vegetação era de oceanos remotos e de
águas profundas; e que suas roupas estavam em frangalhos, como se houvesse
navegado entre labirintos de corais. Notaram também que carregava a morte com
altivez, pois não tinha o semblante solitário dos outros afogados do mar, nem tampouco
a catadura sórdida e indigente dos afogados dos rios. Somente, porém, quando
acabaram de limpá-lo tiveram consciência da classe de homens que era, e então ficaram
sem respiração. Não era só o mais alto, o mais forte, o mais viril e o mais bem servido que
jamais tinham visto, senão que, embora o estivessem vendo, não lhes cabia na
imaginação.

KIKOSOFIA
número 18 fevereiro de 2024

Não encontraram no povoado uma cama bastante grande para estendê-lo, nem uma
mesa bastante sólida para velá-lo. Não lhe serviram as calças de festa dos homens mais
altos, nem as camisas de domingo dos mais corpulentos, nem os sapatos do maior
tamanho. Fascinadas por sua desproporção e sua beleza, as mulheres decidiram então
fazer-lhe umas calças com um bom pedaço de vela carangueja e uma camisa de cretone
de noiva, para que pudesse continuar sua morte com dignidade. Enquanto costuravam,
sentadas em círculo, contemplando o cadáver entre ponto e ponto, parecia-lhes que o
vento não fora nunca tão tenaz nem o Caribe estivera tão ansioso quanto naquela noite,
e supunham que essas mudanças tinham algo a ver com o morto. Pensavam que, se
aquele homem magnífico tivesse vivido no povoado, sua casa teria as portas mais largas,
o teto mais alto e o piso mais firme, e o estrado de sua cama seria de cavernas mestras
com pernas de ferro, e sua mulher seria a mais feliz. Pensavam que tivera tanta
autoridade que poderia tirar os peixes do mar só os chamando por seus nomes, e pusera
tanto empenho no trabalho que fizera brotar mananciais entre as pedras mais áridas, e
semear flores nas escarpas. Compararam-no, em segredo, com seus homens, pensando
que não seriam capazes de fazer, em toda uma vida, o que aquele era capaz de fazer
numa noite, e acabaram por repudiá-los, no fundo de seus corações, como os seres mais
fracos e mesquinhos da terra. Andavam perdidas por esses labirintos de fantasia, quando
a mais velha das mulheres, que por ser a mais velha contemplara o afogado com menos
paixão que compaixão, suspirou: __ Tem cara de se chamar Estêvão.Era verdade. À
maioria bastou olhá-lo outra vez para compreender que não podia ter outro nome.As
mais teimosas, que eram as mais jovens, mantiveram-se com a ilusão de que, ao vesti-
lo,estendido entre flores e com uns sapatos de verniz, pudesse chamar-se Lautaro. Mas
foi uma ilusão vã. O lençol ficou curto, mal cortadas e pior costuradas, ficaram apertadas
e as forças ocultas de seu coração faziam saltar os botões da camisa. Depois da meia
noite diminuíram os assobios do vento e o mar caiu na sonolência da quarta feira. O
silêncio pôs fim às últimas dúvidas:era Estêvão. As mulheres que o vestiram, as que o
pentearam, as que lhe cortaram as unhas e barbearam não puderam reprimir um
estremecimento de compaixão quando tiveram de resignar-se a deixá-lo estendido no
chão. Foi então quando compreenderam quanto devia ter sido infeliz com aquele corpo
descomunal, se até depois de morto o estorvava. Viram-no condenado em vida a passar
de lado pelas portas, a ferir-se nos tetos, a permanecer de pé nas visitas, sem fazer o que
fazer com suas ternas e rosadas mãos de boi marinho, enquanto a dona da casa
procurava a cadeira mais resistente e suplicava-lhe, morta de medo, sente-se aqui
Estêvão, faça-me o favor, e ele encostado nas paredes, sorrindo, não se preocupe
senhora, estou bem assim, com os calcanhares em carne viva e as costas abrasando de
tanto repetir o mesmo, em todas as visitas,não se preocupe senhora, estou bem assim,
só para não passar pela vergonha de destruir a cadeira, e talvez sem ter sabido nunca
que aquele que lhe diziam não se vá, Estêvão, espere pelo menos até que aqueça o café,
eram os mesmos que, depois, sussurravam já se foi o bobo grande,que bom, já se foi o
bobo bonito. Isto pensavam as mulheres diante do cadáver um pouco antes do
amanhecer.

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número 18 fevereiro de 2024

Mais tarde, quando lhe cobriram o rosto com um lenço para que não o
maltratasse a luz, viram-no tão morto para sempre, tão indefeso, tão
parecido com seus homens, que se abriram as primeiras gretas de
lágrimas nos seus corações. Foi uma das mais jovens que começou a
soluçar. As outras, consolando-se entre si, passaram dos suspiros aos
lamentos, e enquanto mais soluçavam, mais vontade sentiam de
chorar, porque o afogado estava se tornando cada vez mais Estevão,
até que o choraram tanto que ficou sendo o homem mais desvalido da
Terra, o mais manso, o mais serviçal, o pobre Estêvão. Assim que,
quando os homens voltaram com a notícia de que o afogado também
não era dos povoados vizinhos, elas sentiram um vazio de júbilo entre
as lágrimas. __ Bendito seja Deus __ suspiraram: __ é nosso! Os homens
acreditaram que aqueles exageros não eram mais que frivolidades de
mulher. Cansados das demoradas averiguações da noite, a única coisa
que queriam era descartar-se de uma vez do estorvo do intruso, antes
que acendesse o sol bravo daquele dia árido e sem vento.
Improvisaram umas padiolas com restos de traquetes e espichas, e as
amarraram com carlingas de altura, para que resistissem ao peso do
corpo até as escarpas. Quiseram prender-lhe aos tornozelos uma
ancora de navio mercante para que ancorasse, sem tropeços, nos
mares mais profundos, onde os peixes são cegos e os búzios morrem
de saudade, de modo que as más correntes não o devolvessem à
margem, como acontecera com outros corpos. Porém, quanto mais se
apressavam, mais coisas as mulheres lembraram para perder tempo.
Andavam como galinhas assustadas, bicando amuletos do mar nas
arcas, umas estorvando aqui porque queriam pôr no afogado os
escapulários do bom vento, outras estorvando lá para abotoar-lhe uma
pulseira de orientação; e depois de tanto sai daí mulher, ponha-se
onde não estorve, olhe que quase me faz cair sobre o defunto, aos
fígados dos homens subiram as suspeitas e eles começaram a
resmungar, para que tanta bugiganga de altar-mor para um forasteiro,
se por muitos cravos e caldeirinhas que levasse em cima os tubarões
iam mastigá-lo, mas elas continuavam ensacando suas relíquias de
quinquilharia, levando e trazendo, tropeçando, enquanto gastavam
em suspiros o que poupavam em lágrimas, tanto que os homens
acabaram por se zangar, desde quando aqui semelhante alvoroço por
um morto ao léu, um afogado de nada, um presunto de merda. Uma
das mulheres, mortificada por tanta insensibilidade, tirou o lenço do
rosto do cadáver e também os homens perderam a respiração.

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número 18 fevereiro de 2024

Era Estêvão. Não foi preciso repeti-lo para que o reconhecessem. Se lhe tivessem chamado
Sir Walter Raleigh, talvez, até eles ter-se-iam impressionado com seu sotaque de gringo,
com sua arara no ombro, com seu arcabuz de matar canibais, mas Estêvão só podia ser
único no mundo e ali estava atirado, como um peixe inútil, sem polainas, com umas calças
que não lhe cabiam e umas unhas cheias de barro, que só se podia cortar à faca. Bastou que
lhe tirassem o lenço do rosto para perceber que estava envergonhado, de que não tinha
culpa de ser tão grande, nem tão pesado, nem tão bonito, e se soubesse que isso ia
acontecer, teria procurado um lugar mais discreto para afogar-se, de verdade, me amarraria
eu mesmo uma âncora de galeão no pescoço e teria tropeçado como quem não que nada
nas escarpas, para não andar agora estorvando com este morto de quarta-feira, como vocês
chamam, para não molestar ninguém com esta porcaria de presunto que nada tem a ver
comigo. Havia tanta verdade no seu modo de estar que até os homens mais desconfiados, os
que achavam amargas as longas noites no mar, temendo que suas mulheres se cansassem
de sonhar com eles para sonhar com os afogados, até esses, e outros mais empedernidos,
estremeceram até a medula com a sinceridade de Estêvão.

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número 18 fevereiro de 2024

Foi por isso que lhe fizeram os funerais mais esplêndidos que se podiam conceber para um
afogado considerado enjeitado. Algumas mulheres, que tinham ido buscar flores nos
povoados vizinhos, voltaram com outras que não acreditavam no que lhes contavam, e estas
foram buscar mais flores quando viram o morto, e levaram mais e mais, até que houve
tantas flores e tanta gente que mal se podia caminhar. Na última hora, doeu-lhes devolvê-lo
órfão às águas, e lhe deram um pai e uma mãe dentre os melhores, e outros se fizerem seus
irmãos, tios e primos, de tal forma que, através dele, todos os habitantes do povoado
acabaram por ser parentes entre si.Alguns marinheiros que ouviram o choro à distância
perderam a segurança do rumo, e se soube de que um se fez amarrar ao mastro maior,
recordando antigas fábulas de sereias. Enquanto se disputavam o privilégio de carregá-lo
nos ombros, pelo declive íngreme das escarpas, homens e mulheres perceberam, pela
primeira vez, a desolação de suas ruas, a aridez de seus pátios, a estreiteza de seus sonhos,
diante do esplendor e da beleza do seu afogado. Jogaram-no sem âncora, para que voltasse
se quisesse, e quando o quisesse, e todos prenderam a respiração durante a fração de
séculos que demorou a queda do corpo até o abismo. Não tiveram necessidade de olhar-se
uns aos outros para perceber que já não estavam todos, nem voltariam a estar jamais. Mas
também sabiam que tudo seria diferente desde então, que suas casas teriam as portas mais
largas, os tetos mais altos, os pisos mais firmes, para que a lembrança de Estevão pudesse
andar por toda parte, sem bater nas traves, e que ninguém se atrevesse a sussurrar no futuro
já morreu o bobo grande, que pena, já morreu o bobo bonito, porque eles iam pintar as
fachadas de cores alegres para eternizar a memória de Estêvão, e iriam quebrar a espinha
cavando mananciais nas pedras e semeando flores nas escarpas para que, nas auroras dos
anos venturosos,os passageiros dos grandes navios despertassem sufocados por um
perfume de jardins em alto-mar, e o capitão tivesse que baixar do seu castelo de proa, em
uniforme de gala, astrolábio, estrela polar e sua enfiada de medalhas de guerra, e,
apontando o promontório de rosas no horizonte doCaribe, dissesse em catorze línguas,
olhem lá, onde o vento é agora tão manso que dorme debaixo das camas, lá, onde o sol
brilha tanto que os girassóis não sabem para onde girar, sim, lá é o povoado de Estêvão.

Gabriel Garcia Márquez - O escritor e jornalista colombiano é


considerado um dos mais importantes autores do século XX.
Ganhador do Nobel de literatura em 1982. o seu livro “Cem
anos de solidão” é um dos mais aclamados romances da
literatura mundial

KIKOSOFIA
número 18 fevereiro de 2024

REFULGIR URBANO
Voz para os pobres e oprimidos

Emancipem-se da escravidão mental


Ninguém além de nós mesmos pode libertar nossas mentes

O recente lançamento da cinebiografia do cantor, guitarrista e compositor, Bob


Marley reacende o interesse nesse que é o nome mais famoso do reggae.
Jamaicano, que morreu de câncer aos 36 anos (1981), mas deixou um legado
que vendeu mais de 75 milhões de discos. A canção “One Love” (1977) foi
eleita a canção do milênio pela rádio BBC. O astro ajudou a popularizar o
reggae, tornando o estilo conhecido mundialmente e fez da música uma
ferramenta para espalhar sua mensagem de paz.

É difícil não se render ao ritmo e as letras das músicas de Bob Marley, ainda
que estas reverberem muito mais nas camadas mais básicas da sociedade e
que ainda haja muitos preconceitos em relação ao estilo. O reggae exalta
tranquilidade e paz, reflexão e calmaria, promovendo a paz e a
conscientização social através de uma revolução musical que busca mostrar
problemas e mazelas sociais numa mensagem de luta, esperança e sobretudo
amor.

KIKOSOFIA
número 18 fevereiro de 2024

REDEMPTION SONG
CANÇÃO DE REDENÇÃO

Old pirates, yes, they rob I


Sold I to the merchant ships
Minutes after they took I
From the bottomless pit
But my hand was made strong
By the hand of the Almighty
We forward in this generation
Triumphantly
Won't you help to sing
These songs of freedom?
'Cause all I ever have
Redemption songs
Redemption songs
Emancipate yourselves from mental slavery
None but ourselves can free our minds Velhos piratas, sim, eles me roubaram
Have no fear for atomic energy Me venderam para navios mercantes
'Cause none of them can stop the time Minutos depois de eles terem me tirado
How long shall they kill our prophets Do poço sem fundo
While we stand aside and look? Ooh Mas, minha mão foi fortalecida
Some say it's just a part of it Pela mão do Todo-Poderoso
We've got to fulfill the Book Nós avançamos nessa geração
Won't you help to sing Triunfantemente
These songs of freedom? Você não vai me ajudar a cantar
'Cause all I ever have Estas canções de liberdade?
Redemption songs Pois, tudo que eu sempre tenho
Redemption songs Canções de redenção
Redemption songs Canções de redenção
Libertem-se da escravidão mental
Ninguém além de nós pode libertar nossas mentes
Não tenha medo da energia atômica
Porque nenhum deles pode parar o tempo
Até quando vão matar nossos profetas
Enquanto nós permanecemos de lado, olhando?
Bob Marley Alguns dizem que isso faz parte
Nós temos que cumprir o Livro
Ajude-me a cantar
Estas canções de liberdade?
Pois, tudo que eu sempre tenho
Canções de redenção
Canções de redenção
Canções de redenção

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número 18 fevereiro de 2024

CINEOLHAR
O filme é um recorte específico de um período
de três anos da vida do cantor jamaicano, cujo
país estava as beiras de uma guerra civil, o
que o motivou a deixar a Jamaica, após uma
tentativa de assassinato. O exílio (ou fuga)
auto imposto marcou um dos períodos mais
criativos artisticamente de Bob, com a criação
de uma de suas maiores obras, o álbum
“Exodus” que levaria sua música a se espalhar
ao redor do mundo em turnês pela Europa e
EUA, até finalmente ocorrer seu retorno a
terra natal, onde foi figura importantíssima
para ajudar a firmar a paz entre os grupos que
Bob Marley, One Love
disputavam o controle político da pequena 2024 - 1h 47 min
nação insular. Direção de Reinaldo Marcos Green
Com: Kingsley Be-Adir, Lashana Lynch

Em “Who shot the sheriff” (Quem atirou no xerife?), a


série documental investiga os eventos por trás da
tentativa de assassinato de Bob Marley ocorrida no
interior de sua casa na Jamaica em 1976. Quem
seriam os envolvidos? Quem teria dado a ordem de
execução e porquê? A CIA estaria de alguma forma
envolvida no crime? - Essas e outras perguntas são
examinadas na tentativa de entender a turbulência
política pela qual passava o país e qual o papel do
popular cantor de reggae que pregava o amor e a
união entre as pessoas, usando a música para
difundir a sua filosofia rastafári. O documentário
Who Shot The Sherigg? encontra-se disponível na Netflix.
2018 - 57 min
Direção Kief Davison
Com Bob Marley, Arnold Bertram, Cindy
Breakspeare KIKOSOFIA
número 18 fevereiro de 2024

SEÇÃO HQ
As dicas de quadrinhos do mês, com recomendações de obras consagradas e excelentes opções
para uma boa e garantida diversão, um momento de descobrir novas terras, novos mundos e
aventuras em tempos e lugares diferentes. Uma forma de arte que mistura desenhos, cores e
literatura: Quadrinhos!

Blueberry
Esta é uma série de quadrinhos franco-belga criada no
ano de 1963 e até hoje uma das mais influentes obras de
quadrinhos do gênero faroeste. Com argumento de Jean-
Michel Charlie e desenhos de Jean Giraud, a história conta
a saga do tenente Mike Steve Donovan, o Blueberry, numa
recriação muito realista do cenário americano pós guerra
de secessão, no qual o personagem vive suas aventuras
como membro do exército, pistoleiro, defensor de causas
perdidas; um anti herói que nem sempre consegue salvar
o dia, um viciado em jogo e bebidas, que não é
especialmente atraente ou bonito, mas possui um senso
de honra e dever muito apurado. O personagem foi
publicado originalmente entre 1963 e 1971 e rende
adaptações e revistas derivadas até hoje. A editora
Pipoca e nanquim iniciou a coleção definitiva que compila
os albuns originais no formato ômnibus, com previsão de
4 volumes com aproximadamente 500 páginas cada.

https://pipocaenanquim.com.br/

Torpedo 1936
Publicado inicialmente na versão espanhola da revista
Creepy, Torpedo dos hispânicos Enrique Sanchez Abuly e
Jordi Bernet conta as aventuras do assassino de aluguel
Luca Torreli, com textos fantásticos que misturam humor,
policial e máfia juntos com um personagem impiedoso,
por vezes trapalhão e muito canalha, mas que consegue
nos atrair pelo seu charme e pelas situações inusitadas
em que se envolve. Um imperdível clássico noir das HQs,
reconhecido internacionalmente pela qualidade e agora
compilado em três álbuns publicados pela editora Figura,
que traz todas as aventuras clássicas do personagem.

https://www.figuraeditora.com/

KIKOSOFIA
número 18 fevereiro de 2024

RESENHA HQ
Angola Janga - Uma história de
Palmares
O quadrinista e historiador Marcelo D’Salete, em suas obras
procura realizar um resgate da trajetória do Brasil negro e
escravizado, cujas consequências ainda podem ser vistas em
nossa sociedade até dos dias de hoje. Seus heróis são
pessoas comuns, negros, mulatos, indígenas e brancos que
fizeram a nossa trajetória enquanto país.

Angola Janga, nome dado pelo negros quilombolas ao


aglomerado de pequenos mucambos que coletivamente
formavam o maior e mais famoso agrupamento de pretos,
fugidos ou não da escravidão, Palmares. É também nome
desse álbum em quadrinhos que conta pequenos episódios
que ajudam a traçar um retrato realista, sensível e dramático
dos eventos que precederam a queda daquela comunidade.

Descobrimos facetas inexploradas pela narrativa oficial que mostram as relações entre os
quilombolas e os fazendeiros donos de terra das cercanias, que incluíam relações de comércio e
algumas vezes até proteção. As motivações de brancos, mestiços e negros que caçavam outros
negros, motivados por um senso deturpado de liberdade e superioridade. As traições que
precipitaram o fim daquela quase utopia que durou cerca de 100 anos. A lealdade que o líder
Zumbi inspirava em seus seguidores e a inteligência deste, que nascido “livre”, escolheu viver a
sua cultura e resgatar seu povo dos algozes colonialistas.

Angola Janga reverbera suas revelações, que nos perseguem mesmo nos dias atuais, quando
percebemos que apesar de tantos anos e tantas conquistas depois, ainda permanecemos
excluídos e apartados de tantos direitos; que oportunismos, enganos e traições são tão comuns
quanto eram na época. A luta por igualdade de direitos e mesmo pelo simples direito de estar
aqui, presentes; ainda causa resistências hercúleas daqueles que preferem a negação do
respeito ao ser humano, independente de sua etnia, religião ou gênero.

Quadrinhos como esse, mais do que uma narrativa gráfica, trazem uma aula de reflexão sobre
temas importantíssimos e que deveriam estar sob constante revisão, aprimoramento e
discussão. Em salas de aula sim, mas principalmente no dia a dia de nossas rotinas, uma pausa
para pensar quem somos e quais os momentos históricos que ajudam a contar a nossa
trajetória enquanto povo que busca ainda uma identidade como Nação.

A obra de 430 páginas foi publicada pela editora Veneta em 2017, é ganhadora de 4 HQ MIx, do
prêmio Jabuti de 2018 e já foi traduzida para seis idiomas. No final do livro há extras que trazem
maior contextualização sobre Palmares como mapas, linhas dos tempo e um glossário.

KIKOSOFIA
número 18 fevereiro de 2024

VOCÊS, OREM ASSIM:


"PAI NOSSO, QUE ESTÁS NOS CÉUS!
SANTIFICADO SEJA O TEU NOME.
VENHA O TEU REINO;
SEJA FEITA A TUA VONTADE,
ASSIM NA TERRA COMO NO CÉU.
DÁ-NOS HOJE O NOSSO
PÃO DE CADA DIA.
PERDOA AS NOSSAS DÍVIDAS,
ASSIM COMO PERDOAMOS
AOS NOSSOS DEVEDORES.
E NÃO NOS DEIXES CAIR
EM TENTAÇÃO,
MAS LIVRA-NOS DO MAL,
PORQUE TEU É O REINO, O PODER E A
GLÓRIA PARA SEMPRE. AMÉM.
POIS, SE PERDOAREM AS OFENSAS UNS
DOS OUTROS, O PAI CELESTIAL TAMBÉM
PERDOARÁ VOCÊS.
MAS, SE NÃO PERDOAREM UNS AOS
OUTROS, O PAI CELESTIAL NÃO PERDOARÁ
AS OFENSAS DE VOCÊS.

MATEUS 6, 9 -15

Monge em oração,
J. Ferrer y Pallej (1846 - 1946),
Óleo sobre tela,
Pintado em 1899

KIKOSOFIA

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