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EDIÇÃO DE SETEMBRO DE 2023

KIKOSOFIA

Francisco Moreira
Número 14 SETEMBRO DE 2023

SETEMBRO
Por Francisco Moreira

Um dos grande desafios dos tempos modernos é


lidar com os níveis de stress, competição e
isolamento social em que vivemos. Parece estranho
falar em isolamento social numa era em que
parecemos cada vez mais conectados, em que as
distâncias físicas pouco importam e o acesso a
comunicação é cada vez maior. Vivemos um tempo
em que o excesso de informação trazido pelo
avanço tecnológico nos faz duvidar de forma crucial
do que está sendo comunicado e dificulta saber o
que é real ou não.

Nesse contexto até mesmo a proximidade


proporcionada pelas mídias sociais tem servido
muito mais para nos afastar do que aproximar. A
distância agora é trazida por telas que cabem na
palma da mão. Deveríamos aproveitar tais
facilidades para engrandecer o espírito, mas ocorre
justamente o oposto, basta olhar o tipo de conteúdo
mais consumido na rede e atestaremos que o
entretenimento vazio, viciante e alienador é que se
impulsiona emaranhando a todos numa teia de
inutilidades que apequenam a alma e o intelecto. É
preciso pensar, mas quem quer isso?

Kikosofia nº 14 © 2023 Este trabalho está licenciado por Francisco


Moreira sob CC BY-NC-ND 4.0. Para ver uma cópia desta licença, visite
http://creativecommons.org/licenses/by-nc-nd/4.0/

Os textos e poemas creditados são de propriedade intelectual de seus


autores, gentilmente cedidos para a Kikosofia, qualquer reprodução
depende de autorização destes

Capa: “A coragem militar“ - bronze - 180 cm × 61 cm × 81 cm - de Paul


Dubois (1885)

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ou publicados exclusivamente para divulgação cultural

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KIKOSOFIA
Número 14 SETEMBRO DE 2023

SETEMBRO
Cuidar uns dos outros
Segundo dados do Anuário Brasileiro de
Segurança Pública, o número de suicídios
no Brasil teria crescido 11,8% em 2022,
sendo registrados 16.262 casos, o que
significa uma média de 44 ocorrências por
dia, são 8 suicídios por 100 mil
habitantes. A Organização Mundial de
Saúde (OMS) estima que anualmente
O consumo de
quase 1 milhão de pessoas no mundo
cometam suicídio. Embora esse número álcool e
venha diminuindo globalmente (cerca de substâncias
36%), nas Américas o fluxo, ao contrário,
psicoativas
segue aumentando, sendo hoje a 4ª causa
de mortes entre jovens de 15 a 29 anos de durante a
idade. O consumo de álcool e substâncias infância e
psicoativas durante a infância e adolescência
adolescência possuem relação direta com
possuem
casos de suicídio entre jovens.
relação direta
O suicídio é um fenômeno complexo, um com casos de
importante problema de saúde pública,
suicídio entre
com impactos diretos na sociedade e que
pode afetar indivíduos de diferentes jovens.
origens, sexos, culturas, classes sociais e
idades. Sabe-se que praticamente 100%
de todos os casos de suicídio estão
relacionados às doenças mentais,
principalmente aquelas não
diagnosticadas ou tratadas
incorretamente. Dessa forma, a maioria
dos casos poderia ter sido evitada se
esses pacientes tivessem acesso ao
tratamento psiquiátrico e informações de
qualidade.
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Número 14 SETEMBRO DE 2023

Falar sobre o assunto ainda é visto como


um tabu, porém é importante tratar do
tema e buscar a conscientização como
forma de ajudar na prevenção e auxiliar
pessoas que estejam passando por
momentos de crise possam buscar ajuda e
um tratamento adequado, entendendo que
a vida sempre é a melhor escolha.

Dessa forma, se informar é


importantíssimo para lutar contra esse
grave problema. Quando uma pessoa
decide terminar a própria vida, seus
pensamentos, sentimentos e ações se
mostram muito restritivos e ela é incapaz É sempre
de perceber outras maneiras de lidar com
importante ter
os problemas. Toda ameaça de suicídio
deve ser levada à sério, toda pessoa que
atenção e
tem tais pensamentos deve receber escutar a
cuidado, atenção e atendimento. Por isso, pessoa sem
aprender a identificar os sintomas de
fazer
alguém que está pensando em se matar é
essencial. julgamentos

É sempre importante ter atenção e escutar


a pessoa sem fazer julgamentos, mostrar
disponibilidade e empatia, buscando levar
a pessoa a um psiquiatra que poderá lidar
com a situação de maneira técnica.
Transtornos psíquicos como a Ansiedade e
a Depressão costumam ser vistos de
forma preconceituosa pelas pessoas, mas
são doenças sérias que devem ser
encaradas sem nenhuma vergonha, que
podem ser tratadas e controladas de modo
que o paciente possa levar uma vida
saudável e produtiva.
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O suicídio é
uma
emergência
médica, se
perceber
intenção ligue
para o SAMU
192

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FATORES DE RISCO E SINAIS DE ATENÇÃO
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O Sistema Único de Saúde (SUS) disponibiliza atendimento para


pessoas em sofrimento psíquico por meio dos serviços da Rede de
Atenção Psicossocial (RAPS). A Atenção Primária à Saúde é a porta de
entrada para o cuidado e desempenha papel fundamental na abordagem
dos Transtornos Mentais, principalmente os leves e moderados.

Diferentes níveis de complexidade compõem o cuidado, sendo os CAPS -


Centro de Atenção Psicossocial, em suas diferentes modalidades, pontos
de atenção estratégicos da RAPS. Serviços de saúde de caráter aberto e
comunitário, constituído por equipe multiprofissional e que atuam sobre
a ótica interdisciplinar, podem ser encontrados em diversos municípios.

Algo extremamente vital é


que, tanto a imprensa quanto O Centro de Valorização da Vida (CVV) é um
as pessoas, tratem casos de dos principais serviços de aconselhamento
suicídio sem no país de pessoas que enfrentam
sensacionalismo e evitando pensamentos suicidas. Por meio do número
detalhes sobre os métodos, de telefone 188 (ligação gratuita), 3,5 mil
voluntários atendem uma média de 8 mil
sem glamourização e sem
ligações por dia.
tratar como um ato de
coragem, protesto ou
resistência. Isso, para evitar
o chamado “efeito contágio”,
que poderia incentivar outros
casos.

Dessa forma, sempre que


tomar conhecimento de
algum caso SEJA
RESPONSÁVEL e evite
postar ou reproduzir fotos u
vídeos em redes sociais,
ficar comentando o caso,
dando opiniões sobre o que
aconteceu ou sobre como o
ato foi consumado.

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O Pássaro Eu El pájaro yo (1966)

Chamo-me pássaro Pablo, Me llamo pájaro Pablo,


ave de uma pena só, ave de una sola pluma,
voador na escuridão clara volador de sombra clara
e claridade confusa, y de claridad confusa,
minhas asas não são vistas, las alas no se me ven,
os ouvidos me retumbam los oídos me retumban
quando passo entre as árvores cuando paso entre los árboles
ou por debaixo das tumbas o debajo de las tumbas
qual funesto guarda-chuva cual un funesto paraguas
ou como espada desnuda, o como una espada desnuda,
estirado como um arco estirado como un arco
ou redondo como uma uva, o redondo como una uva,
voo e voo sem saber, vuelo y vuelo sin saber,
ferido na noite escura, herido en la noche oscura,
aqueles que vão me esperar, quiénes me van a esperar,
os que não querem meu canto, quiénes no quieren mi canto,
os que me querem ver morto, quiénes me quieren morir,
os que não sabem que chego quiénes no saben que llego
e não virão para vencer-me, y no vendrán a vencerme,
a sangrar-me, a retorcer-me a sangrarme, a retorcerme
ou beijar minha roupa rota o a besar mi traje roto
pelo sibilante vento. por el silbido del viento.
Por isso eu volto e vou, Por eso vuelvo y me voy,
voo mas não voo, mas canto: vuelo y no vuelo pero canto:
pássaro furioso sou soy el pájaro furioso
da tempestade tranquila. de la tempestad tranquila.

Pablo Neruda
Escritor e político chileno considerado um dos maiores poetas da literatura latino-
americana e contemporânea mundial. ganhador do Nobel de Literatura de 1971.
Neruda faleceu em 23 de setembro de 1973

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ÍCONES DA CULTURA OCIDENTAL

MAFALDA
Francisco Moreira

Creio que a maioria dos leitores aqui, em algum momento de


suas vidas, já se depararam com a Mafalda, seja em exemplos
ou questões escolares e de concursos ou mesmo em tiras de
jornais por aí. Essa menina questionadora e altamente
observadora da vida social criada pelo argentino Quino (1932-
2020), que se recusa a aceitar o mundo como é, levando
temas importantes como capitalismo, feminismo e
desigualdades sociais para a reflexão histórica, sempre com
um humor ácido, inteligente e acessível, capaz de atingir
tantos adultos e crianças pela forma desafiadora de expressar
suas opiniões.

KIKOSOFIA
Número 14 SETEMBRO DE 2023

Por incrível que possa parecer, a personagem foi criada


inicialmente como parte de uma campanha publicitária
para empresa Mansfield de eletrodomésticos. O escritor
Miguel Brascó, amigo de Quino, através de uma agência
de publicidade sugeriu a este uma série de tirinhas que
mesclasse os personagens de “a turma de Charlie
Brown” (Minduim/Snoopy) e Blondy (Belinda)”, histórias
em quadrinhos que retratavam o cotidiano, sendo que
obrigatoriamente deveriam aparecer os produtos da
empresa, de modo subliminar e o nome dos
personagens deveriam começar com a letra “M” de
Blondie (Belinda, no Brasil)
Mansfield. é uma tira de quadrinhos
criada pelo cartunista Chic
Algo, porém, deu errado e a personagem acabou não Young, baseada no
sendo usada pela empresa, sendo então oferecida ao cotidiano de uma bonita
jornal Diário Clarín, de maior circulação do país. loira que forma uma
família de classe média.
Entretanto, a tira ficou parada por dois anos depois do
Distribuida pela King
periódico descobrir que a personagem havia sido criada
Features Syndicate, a
como estratégia de marketing. publicação em jornais
começou em 8 de
Em 1964, Mafalda aparece em três tiras no suplemento setembro de 1930. teve
humorístico da revista Leoplan (da qual Quino era um adaptações para filmes
dos diretores), para em seguida ser publicada por uma (1938–1950) e um popular
programa de rádio (1939–
das mais importantes revistas argentinas, a Primera
1950). No Brasil, a tira foi
Plana, voltada para classe média e que trazia uma pauta
publicada em revistas em
voltada para o contexto nacional e internacional com quadrinhos da Rio Gráfica
foco em problema econômicos e sociais, o que acabou Editora.
dando muita visibilidade a personagem, uma vez que
Quino inseriu tais preocupações como características
desta.

Em 1965, Quino rompe com a revista e passa a publicar


Mafalda no jornal El Mundo. Em 1966 Mafalda tem a
publicação de seu primeiro livro, com republicação de
tiras que saíram nos jornais, esgotando em apenas 15
dias a edição de cinco mil exemplares. Era a
demonstração do sucesso e apelo da personagem junto
ao público.

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Número 14 SETEMBRO DE 2023

No Brasil, Mafalda foi publicada pela Em 1971, Quino aceitou, ainda que
primeira vez na Revista Patota nº 1 a contragosto, uma proposta de
(julho de 1973), no Rio de Janeiro, uma produtora de desenhos
aparecendo em 27 volumes da animados para colocar as histórias
revista, em 89 tiras. Depois de a da Mafalda e sua turma na
revista ter sido extinta, as tiras foram televisão, sendo produzidos 260
publicadas no formato de livro pela curtas de cerca de um minuto e
Editora Global em 1982, editadas meio de duração.
pelo cartunista Henfil, que manteve
algumas expressões no original em Em 25 de março de 1973, Quino
espanhol (papá, mamá, dios mio), decide interromper a produção
para que os brasileiros a das tiras da Mafalda, afirmando
identificassem como estrangeira. que tinha medo de soar repetitivo
e que daria uma pausa de “um
Embora tenha sido criada num ano”. Entretanto, não voltaria mais
contexto argentino a menina a desenhar a personagem, exceto
contestadora foi bem recebida para algumas campanhas
internacionalmente por tratar de humanitárias a exemplo da
dramas universais numa época em UNICEF, para a qual fez alguns
que a América Latina vivia um cartazes e ilustrações sobre a
período marcado por golpes de Declaração Universal do Direitos
estado e repressão em plena vigência das Crianças em 1976.
da Guerra Fria. A tira ganhou
notoriedade internacional a partir de Em 1982 um filme de 75 minutos
sua publicação na Europa a partir de produzido por Daniel Mallo
1969 e acabou por ser traduzida para (“Mafalda, la película” na
mais de vinte países, incluindo Argentina ou “El mundo de
Finlândia e China. Sua edição italiana Mafalda” na Espanha); e
foi prefaciada pelo escritor Umberto finalmente em 1993, foram
Eco que definiu Mafalda como “uma produzidos mais de cem
heroína zangada que recusa o episódios mudos de cerca de um
mundo tal como ele é”. minuto de duração, dirigidos pelo
cubano Juan Padrón.

Após mais de 50 anos de sua


criação, a personagem continua a
inspirar debates e reflexões,
incentivando o pensar de forma
crítica, ética e globalmente.
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MAFALDA E SUA TURMA

Mafalda é uma garota de 6 anos de idade, que ama


os Beatles e detesta sopa. Através dela, seu criador
levantava questionamentos sociais importantes,
trazendo assuntos que suscitavam reflexões sobre
valores patriarcais, questões econômicas, políticas,
ambientais e sociais, com um tom crítico, porém
bem-humorado e que por retratarem contextos
sociais comuns a várias partes do mundo, assume um
caráter universal. Peanuts (no Brasil também
conhecido como Minduim
ou Turma do Charlie
Dessa forma, temas sérios como ética, cidadania,
Brown/Snoopy) é uma tira
liberdade, democracia, amor foram apresentados de de jornal escrita e
maneira lúdica, o que fomentou educadores e desenhada pelo cartunista
professores a utilizarem as tiras em salas de aula, norte-americano Charles
ajudando ainda mais na divulgação da personagem, Schulz que foi publicada
de 2 de outubro de 1950 a
que foi apropriada por diversos movimentos ao longo
12 de fevereiro de 2000. A
do tempo, a exemplo das feministas na Argentina em turma desenhada foi uma
sua luta a favor do aborto, inclusive com o apoio do das mais populares e
próprio Quino. influentes da história da
mídia. No seu ápice,
aparecia em mais de 2600
Mesmo após mais de 50 anos de sua criação, a
jornais em 75 países, e foi
personagem continua a inspirar debates e reflexões,
uma clara inspiração para
incentivando pessoas de várias gerações a pensar de Quino, que no entanto,
forma crítica sobre nossa sociedade, valores éticos e achava “bizarro” a
morais. ausência de adultos.

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MAFALDA E SUA TURMA

Além de Mafalda, sua turminha conta com outros


personagens que detém uma importância
fundamental na construção do mundinho dessa
garota ímpar.

Manolito Goreiro (em português Manuelinho).


Juntou-se as tirinhas de Mafalda no dia 29 de março
de 1965. Ele vive pensando nos negócios da
mercearia do pai, sempre pensando em como ganhar
dinheiro, representa o capitalismo. O personagem foi
criado com inspiração em Julián Delgado, dono de
uma rede de padarias da região onde Quino vivia.

Susanita (em português Susaninha), Apareceu em 6


de junho de 1965. uma típica menina de classe média
argentina, mas que é oposta a Mafalda, vive com
sonhos românticos de casar-se com um homem rico
e tem uma visão idílica do mundo. Na Argentina até
hoje, chamam de Susanita o que no Brasil seria uma
“patricinha”

Felipe, outro personagem da turma, apareceu no dia


2 de junho de 1968. O rapaz tímido e carismático de 7
anos é um idealista e foi criado em homenagem a
Jorge Timossi, grande amigo de Quino na escola.

Liberdad (em português Liberdade), surgiu nas


tirinhas no dia 15 de fevereiro de 1970. A garota é
filha de hippies socialistas, uma menina
questionadora, que em suas aparições costuma falar
a revolução do proletariado

Outros personagens são o Miguelito, o menor da


turma, que ama jazz e divide com Mafalda seu ódio
por sopas. Guille, irmão caçula de Mafalda e a
tartaruga Burocracia.
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Número 14 SETEMBRO DE 2023

QUINO, O CRIADOR

Joaquín Salvador Lavado, o Quino, nasceu “ Se Não começarmos a


no dia 17 de julho de 1932 na cidade de
Mendoza, Argentina, tendo recebido o
mudar o mundo. Depois
apelido ainda pequeno para se é o mundo que muda a
diferenciar do tio Joaquin Tejón, um gente. “
pintor e desenhista, com quem descobriu
cedo a vocação. Após terminar a escola
primária, Quino entra para Escola de
Belas Artes de Mendonza, que acabou
abandonando para se dedicar aos
quadrinhos. Aos 18 anos, se instala em
Buenos Aires em busca de emprego nas
redações de jornais e revistas, publicando
seus primeiros trabalhos na revista Esto
Es. Em 1963, lança seu primeiro livro,
Mundo Quino, com uma recompilação de
quadrinhos de humor.

Mafalda, seu personagem mais marcante


surge em 1964 e faz enorme sucesso,
ganhando mundo, no entanto em 25 de
junho de 1973, Quino resolve encerrar a
produção de tiras da personagem e
dedica-se a produção de outros
quadrinhos de humor. Mafalda segue
sendo reproduzida mundialmente, sendo
um ícone na educação e na
conscientização sobre assuntos que
permanecem atuais até hoje.

Em entrevista a revista Efe, por ocasião dos 50 anos de sua criação, disse
que não pensou que Mafalda se tornaria a voz de tantas pessoas. "Em meu
trabalho, apelava para as notícias do dia, e escrevia sobre o que saía nos
jornais; o mundo era assim. Eu não disse, 'vou a fazer uma menina
contestadora'; não, saiu assim. Muitas vezes desenhava coisas pelas quais
me sentia impelido". Quino faleceu em 30 de setembro de 2020.

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Número 14 SETEMBRO DE 2023

MAFALDA E A EDUCAÇÃO

Apesar de terem sido criadas há mais de 50 anos e dentro de um contexto


cultural argentino, as tiras de Mafalda tem permanecido atemporal devido
a universalidade de sua temática relacionada a preocupações sociais,
ambientais e políticas que fizeram e fazem parte da história latino-
americana. Criada num período marcado pela Guerra fria que dividiu o
mundo entre socialistas e capitalistas, as reflexões da pequena garota de 6
anos, com sua visão humanista e preocupada com a sociedade ao seu
redor espelham muitos dos conflitos ainda presentes em nosso cotidiano.

Justamente por esse caráter contemporâneo e além-fronteiras, as tiras de


Mafalda começaram a dar voz a diversos movimentos sociais e também a
serem utilizadas por educadores e professores que viram na pequena uma
fonte poderosa capaz de ensinar diversos conceitos como democracia,
liberdade, capitalismo, ambientalismo, direitos sociais e outros de maneira
lúdica e bem-humorada.

Hoje em dia é comum nos depararmos com extratos dos trabalhos de


Quino, Mafalda principalmente, em livros, textos, concursos públicos, como
instrumento para interpretação de situações do dia-a-dia e igualmente
como facilitador de acesso a conteúdos de história, geografia, sociologia,
português, entre outras.
KIKOSOFIA
Número 14 SETEMBRO DE 2023

Quadrinhos são um importante instrumento auxiliar na educação,


contribuindo na promoção do desenvolvimento educacional e de acesso ao
conhecimento, facilitando o reconhecimento de situações da realidade
própria e de outras culturas. Bem utilizados, podem influenciar
positivamente no crescimento intelectual dos estudantes, devendo,
entretanto, serem usados dentro de contextos específicos de acordo com
idades, grau de desenvolvimento e assuntos a serem tratados.

Como são capazes de contemplar diversos temas possíveis, inclusive em


razão do vasto material que pode ser encontrado, quadrinhos podem dar
variadas opções aos professores, após pesquisa sobre o assunto a ser
trabalhado, facilitando a transmissão de conteúdo. Mafalda em especial
dispõe de uma infinidade de fontes disponíveis em meio digital ou físico,
facilmente encontrados e com diversos estudos, programas e planos de
aulas para utilização de suas tiras nos mais diferentes níveis de
escolarização.

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Número 14 SETEMBRO DE 2023

SEMPRE SIEMPRE (1962)

Antes de mim Antes de mí


Não tenho ciúmes. no tengo celos.
Vem com um homem Ven con un hombre
às tuas costas, a la espalda,
vem com cem homens entre os ven con cien hombres en
teus cabelos, tu cabellera,
vem com mil homens entre teu ven con mil hombres entre tu
peito e teus pés, pecho y tus pies,
vem como um rio ven como un río
cheio de afogados lleno de ahogados
que encontra o mar furioso, que encuentra el mar furioso,
a espuma eterna, o tempo! la espuma eterna, el tiempo!

Traz todos eles Tráelos todos


para onde eu te espero: adonde yo te espero:
sempre estaremos sós, siempre estaremos solos,
sempre seremos tu e eu siempre estaremos tú y yo
sozinhos sobre a terra solos sobre la tierra
para começar a vida! para comenzar la vida!

Pablo Neruda

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Número 14 SETEMBRO DE 2023

Estante
DICAS DE LEITURA PARA SEUS MOMENTOS
Pois o mundo é feito de histórias

As recentes discussões sobre descriminalização ou não do


uso de drogas para uso recreativo criam a necessidade de
buscar entender um pouco mais sobre os risco envolvidos
por quem cai nessa armadilha mortal. Drogas são uma
roleta russa em que as consequências são drásticas não
apenas para o usuário para todos ao seu redor. Os
depoimentos contidos nesse livro dão uma visão crua de
como uma das drogas mais perigosas em circulação afeta
a vida de amigos, familiares e do próprio viciado, que
mesmo quando quer fugir de tal prisão busca o prazer da
tortura que a cada tira mais e mais da dignidade, da saúde
e da sociabilidade da pessoa, transformando-a num pária
totalmente rejeitado pelo Sistema. É para ler, se
emocionar, mas principalmente refletir sobre os perigos
desse problema social gravíssimo. Ana Paula Nonnenmacher
222.86 x 15.75 x 1.52 cm- 248 páginas
Editora Novo Século

Como não poderia deixar de ser, a recomendação de leitura


do mês vai para este álbum em capa dura cuja edição reúne
todas as tirinhas publicadas por Quino, da primeira à última,
e mostram, com muito humor e carisma, que ser politizado e
consciente não significa ser pessimista, e, principalmente,
não significa ser adulto. Traz ainda uma entrevista com
Quino, prefácio de Umberto Eco e um resumo da criação de
personagem e da carreira do autor. As tirinhas da Mafalda
continuam atuais e relevantes nos dias de hoje, revelando
que alguns temas e problemas parecem não ter
desaparecido ou se desenvolvido com o tempo, podem ter
mudado as guerras e os atores ideológicos, mas o mundo
ainda é um lugar precisando de cuidados urgentes e de mais
personalidades (reais ou ficcionais) que questionem e façam
Por Quino o outro pensar em qual legado queremos deixar para o
444 páginas
30.99 x 21.84 x 3.05 cm
futuro que chega mas insiste e se apegar a problemas do
Martins Fontes editora passado.
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Os cães românticos Los perros románticos

Naquela época eu tinha vinte En aquel tiempo yo tenía veinte


anos e estava louco. Havia años y estaba loco. Había
perdido um país, mas havia perdido un país pero había
conquistado um sonho. E se eu ganado un sueño. Y si tenía ese
tivesse esse sonho, o resto não sueño lo demás no importaba. Ni
importava. Nem trabalhar, nem trabajar ni rezar, ni estudiar en la
rezar, nem estudar de madrugada madrugada junto a los perros
junto aos cães românticos. E o románticos. Y el sueño vivía en el
sonho vivia no vazio do meu vacío de mi espíritu.
espírito.
Una habitación de madera, en
Uma sala de madeira, sombria, penumbras, en uno de los
em um dos pulmões dos trópicos. pulmones del trópico. Y a veces
E, às vezes, ele me virava para me volvía dentro de mí y visitaba
dentro e visitava o sonho: estátua el sueño: estatua eternizada en
eternizada em pensamentos pensamientos líquidos, un
líquidos, um verme branco se gusano blanco retorciéndose en
contorcendo de amor. el amor.

Um amor descontrolado. Um Un amor desbocado. Un sueño


sonho dentro de outro sonho. E o dentro de otro sueño. Y la
pesadelo me dizia: você vai pesadilla me decía: crecerás.
crescer. Você deixará para trás Dejarás atrás las imágenes del
as imagens da dor e do labirinto dolor y del laberinto y olvidarás.
e esquecerá. Mas naquela época Pero en aquel tiempo crecer
crescer teria sido um crime. hubiera sido un crimen. Estoy
Estou aqui, falei, com os aquí, dije, con los perros
cachorros românticos e vou ficar románticos y aquí me voy a
aqui. quedar.

Roberto Bolaño
Escritor chileno (1953 – 2003), considerado um dos mais
importantes de sua geração. É autor dos romances Noturno do
Chile, Amuleto, Estrela Distante, Os Detetives Selvagens, 2666, A
Pista de Gelo e Antuérpia. Ganhou vários prêmios literários

KIKOSOFIA
Número 14 SETEMBRO DE 2023

Se as câmeras resolvem...
Estrategista do silêncio

Vários estados brasileiros estão fomentando o uso de câmeras no peito dos policiais militares, como
forma de inibir desvios de conduta e melhorar o nível de segurança pública no país. Até o Ministério da
Justiça vem fomentando isso fortemente, algo deveras estranho, pois o Flávio Dino não conseguiu
preservar as imagens de seu próprio órgão (não somos otários!).

Então vamos lá. Se o uso de câmeras resolve, inibindo desvios de condutas, porque não colocar
também nos peitos dos professores? Saberemos se de fato estão indo à classe, em quanto tempo
permanecem, se aliciam os alunos e se de fato agem como professores ou doutrinadores.

Porque não câmeras nos peitos dos médicos? Daí será possível saber se é verdade ou não que alguns
estão mantendo relações sexuais com pacientes sedados, se atendem com presteza e se também
comparecem né?

Porque não câmeras nos peitos dos magistrados? Daí poderemos elucidar se as denúncias de venda de
sentenças procedem ou não. Inclusive......por esse mesmo argumento, porque não câmeras nos peitos
dos promotores, procuradores e defensores públicos?

Mesmo um pouco cansado......

Porque não câmeras nos peitos dos comissionados sem concurso público? Precisamos saber se de fato
comparecem ao trabalho ou se são fantasmas, ora bolas!

Porque não câmeras nos peitos dos presos? Será realmente que eles engendram crimes dentro dos
presídios? Difícil acreditar, mas não é impossível. E câmeras nos peitos dos traficantes contumazes?
Saber se eles dão propina mesmo a políticos, partidos, sindicatos e outras autoridades?

Porque não câmeras nos peitos dos deputados e senadores? Será que eles combinam crimes
financeiros, políticos, desvios de verbas? No mesmo gancho, porque não câmeras no peito da OAB?
Será que ela de fato chancela os abusos da justiça brasileira e faz apologia à destruição da constituição?

Pois é meu povo. Saibam todos que a insegurança pública que vivemos no Brasil não é causada apenas
pelo tipo de conduta do policial, ela é somatória de inúmeros desvios praticados na surdina dos
gabinetes e escritórios, formando uma nuvem densa de tristeza, desespero e desalento, ingredientes
adequados para o cometimento de crimes de diversas naturezas. Querer controlar os policiais militares
é fácil, pois a maioria é ordeira e cumpre com seus deveres. Está claro que o policial militar é o bode
expiatório, e sempre que possível, a culpa será despejada em seus ombros. A PM do Distrito Federal
que o diga!

E então, me diz: porque não câmeras em seu próprio peito?

KIKOSOFIA
Número 14 SETEMBRO DE 2023

Eu poesia
Serei eu poesia que se desfaz ao leve toque,
que ao vento sofre o dissabor de ver partir
o leve encanto,
que em meio a bruma esvai-se em longas fibras
de contentamento,
que de tanto ver o seu tormento,
altera o músculo dormente
em meu peito e dilacera
a alma que vaga nua em pleno mar;
que jaz ao pé da amada lusa
e pérfida agonia, que treme
e geme e sofre e cria;
que corta os céus, muda e esguia,
que na tarde altera a leve poesia
e perde-se em espaços de
louca ironia...

Kiko Moreira

KIKOSOFIA
Número 14 SETEMBRO DE 2023

Publique na Kikosofia
A Kikosofia é um espaço de vozes, consonantes,
dissonantes, de livre e respeitosa expressão e opinião. Um
local que se pretende divertido, reflexivo, por vezes louco,
mas sempre acolhendo o outro, independente de diferenças,
somos todos iguais, e isso é o que de mais belo existe no
viver, saber que não somos cópias de outro ser.
Colabore, discorde, concorde, opine. Boa jornada.

Envie seu texto, poesia, conto, comentário


para

kikosofia@gmail.com
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Número 14 SETEMBRO DE 2023

Beijo de mulher
Um beijo de mulher é uma honraria,
Que quando concedido lisonjeia,
Esplendoroso como a lua cheia,
Que entorpece o macho de alegria.

É um tocar de lábios excitante,


Que a mulher advinha quando dar,
Para fazer o homem desabar,
Da sua empáfia cruel e arrogante.

Pode ser o prelúdio de um fanal,


Ou o corolário de uma triste dor,
A mulher o imagina como amor,
E o homem só o vê como carnal.

O homem, dúplice, frio e arredio,


Busca o ósculo de forma trivial,
Mas, a mulher se vê sentimental,
Tornando o homem esquivo e fugidio.

É como se o beijo fosse a chave,


Que abre as portas da felicidade,
E vemos que, o amor é a verdade,
Que não sucumbe a qualquer entrave.

Mesmo que queiramos só beijar,


E excitarmo-nos naquele toque,
O sentimento divinal vem à reboque,
O que nos faz querer continuar.

O homem, a mulher e o momento


O verbo dito, a sedução a vista,
Para o homem a glória da conquista,
E a mulher envolta em sentimento.

O beijo de mulher é lindo e sedutor,


E à vida proporciona nexo,
E mesmo que só seja para sexo,
É impossível apartá-lo do amor.

The Cast
KIKOSOFIA
Número 14 SETEMBRO DE 2023

GOVERNANÇA E ADMINISTRAÇÃO MODERNA


Um casamento de sucesso

Wellington Bonnes
A administração, ao longo da história, experimentou uma série de
modelos tradicionais que moldaram o funcionamento das organizações.
Por décadas, esses modelos hierárquicos e centralizados
desempenharam um papel crucial no contexto dos negócios e das
instituições. No entanto, à medida que o mundo se tornava mais
interconectado, complexo e orientado pela informação, tornou-se cada
vez mais evidente que esses paradigmas tradicionais estavam se
tornando obsoletos. Eles não apenas enfrentaram problemas estruturais,
mas também falharam em se adaptar aos desafios emergentes. O A GOVERNANÇA,
resultado foi uma série de colapsos organizacionais, escândalos MUITO MAIS DO
financeiros e uma perda generalizada de confiança por parte dos QUE UMA SIMPLES
RESPOSTA A
investidores e do público.
PROBLEMAS
PREMENTES, É A
Esses fracassos deixaram uma marca indelével nas organizações,
EVOLUÇÃO
levantando questões sobre a sustentabilidade e a responsabilidade. À NECESSÁRIA DA
medida que os modelos sucumbiam devido a problemas estruturais e ADMINISTRAÇÃO.
disfuncionais, emergia uma nova abordagem - a Governança.

A Governança, muito mais do que uma simples resposta a problemas


prementes, é a evolução necessária da administração. Ela representa um
framework inovador que não apenas corrige as falhas do passado, mas
incorpora as melhores práticas de administração de diferentes
abordagens. Isso inclui planejamento, estratégia, compliance, riscos,
controle, monitoramento e inteligência. Ao fazer isso, ela abre um
caminho claro para o sucesso empresarial, institucional e público,
guiando-nos para o futuro da gestão eficiente e responsável.

KIKOSOFIA
Número 14 SETEMBRO DE 2023

Para compreender plenamente a importância desse novo viés, vamos fazer um tour histórico. Embarquemos
em uma viagem pelo tempo, revisitando a evolução da administração desde os primórdios da Revolução
Industrial até os desafios enfrentados pelas organizações contemporâneas. Nossa jornada começa com os
modelos tradicionais de administração, notáveis por sua influência nos setores público e privado.

Na intitulada “Era da Eficiência”, estabelecida no início do século XX, Frederick Taylor e Henri Fayol
desempenharam papéis fundamentais na definição dos modelos de administração. Taylor introduziu o
"Taylorismo" ou "Administração Científica", focado na busca pela eficiência e na divisão do trabalho,
enquanto Fayol delineou os princípios de gestão, enfatizando funções como planejamento, organização e
controle.

Nessa época, tanto no setor público quanto no privado, prevaleciam modelos puramente autoritários e
hierárquicos, herdados da primeira Revolução Industrial, entre os meados dos séculos XVIII e XIX. As
organizações eram comumente estruturadas de forma rígida e centralizada, o que, apesar de trazer uma
sensação de ordem, também resultava em lentidão na tomada de decisões, falta de estratégia e resistência
à inovação. De Efurt (Prússia/Alemanha) surge Max Weber, que introduz o conceito de burocracia, propondo
uma abordagem mais racionalizada e eficiente para a administração. O emergente modelo buscava
substituir práticas informais e nepotismo por regras e procedimentos claros. No entanto, essa abordagem
frequentemente levava a uma excessiva rigidez, falta de agilidade e uma cultura que privilegiava a
estabilidade em detrimento da inovação. Aliado a isso, a falta de vontade de implementar essas práticas,
por parte dos interessados à época (e que ainda perdura), gerava uma forte resistência devido aos conflitos
de interesses.

Nas esferas públicas, as ideias marxistas começaram a desafiar os tais modelos patrimonialistas e
autocráticos que dominavam. No entanto, as teorias marxistas também resultavam em sistemas de
administração que mantinham um status quo de privilégios para alguns, em vez de promover a igualdade.
Logo, apesar das diferenças entre esses modelos, todos enfrentaram problemas estruturais compartilhados:
falta de agilidade, opacidade na tomada de decisões, ineficiência e resistência à mudança. Esses problemas
não eram apenas sinais de dificuldades temporárias, mas indicações claras de que um novo paradigma de
administração era imperativo.

KIKOSOFIA
Número 14 SETEMBRO DE 2023

Enquanto a indústria evoluía com o Fordismo, marcado pela produção em massa e


especialização, seguido pelo Toyotismo, que introduziu a flexibilidade e o foco na
qualidade, o setor público persistia com o disfarce burocrático do patrimonialismo,
causando disfunções sistêmicas e ineficiência, o que culminava no contínuo aumento do
seu desgaste e desprestígio.

A virada do século testemunhou a chegada do movimento do Novo Serviço Público (New


Public Management - NPM), que buscava reformar a administração pública,
introduzindo conceitos do setor privado, como eficiência, transparência e
responsabilidade. No entanto, o NPM também enfrentou desafios em sua
implementação, resultando em uma adaptação parcial na maioria dos casos. Todas
essas fases históricas, embora distintas, compartilharam problemas estruturais. Essas
falhas sistemáticas indicavam a necessidade premente de um novo paradigma de
administração. É neste contexto que a Governança (Corporativa e Pública) surge como
solução viável, incorporando o melhor de cada abordagem tradicional e oferecendo
uma visão de gestão mais eficiente, perene e responsável para as organizações
modernas.

NA Governança não surge apenas como uma solução, mas como uma revolução. Ela
representa uma resposta ágil e abrangente aos desafios sistêmicos que afligiam e se
enraizaram na administração tradicional. Essa nova abordagem não se limita a uma
correção de erros, mas sim a uma transformação profunda da maneira como as
organizações são geridas.

O modelo é uma síntese das melhores práticas de administração adotadas ao longo do


tempo. Ela funde a eficiência do Taylorismo, o foco na estratégia de Fayol, a
objetividade da burocracia de Weber, a flexibilidade do Toyotismo e os princípios de
qualidade do Fordismo. Ao assimilar essas abordagens, a Governança cria um novo
paradigma, capaz de se adaptar às complexidades da era contemporânea.

A Governança não se contenta em buscar apenas a eficiência operacional. Ela abraça


princípios fundamentais, como a gestão participativa, reconhecendo que a colaboração
é a chave para a inovação e a adaptação contínua. Além disso, a responsabilidade
social é incorporada em seu DNA, reconhecendo o impacto das organizações na
sociedade e no meio ambiente. Um dos pilares centrais é o reconhecimento da
importância dos stakeholders. Ela vai além dos interesses exclusivos dos acionistas e
envolve todas as partes interessadas, desde os funcionários, servidores, até as
comunidades e o próprio ambiente. Essa abordagem não apenas aumenta a
responsabilidade das organizações, mas também fortalece sua conexão com a
sociedade em que operam.

KIKOSOFIA
Número 14 SETEMBRO DE 2023

Trata-se de uma revolução para o futuro. A Governança não é apenas uma correção de curso; é uma
revolução que redefine o propósito e a função das empresas, organizações e do Estado. Ela oferece uma
visão supervisória que não só resolve os problemas do passado, mas abre portas para um futuro promissor,
onde a eficiência, a responsabilidade e a transparência não são apenas princípios, mas a base de uma
administração verdadeiramente inovadora e sustentável. É a promessa de um caminho sem volta para um
modelo de gestão eficaz e responsável.

A Governança é mais do que uma simples alternativa; é o caminho para as empresas, organizações e
governos modernos. Neste momento crucial da evolução da administração, ela emerge como um farol de
transformação que nos guia a um futuro mais legítimo, coeso e resiliente. Ademais, ela é um catalisador
poderoso para a tomada de decisão participativa, o engajamento da comunidade (interna e externa), a
interdisciplinaridade e a transversalidade tão almejada e necessária entre os setores. Ao envolver uma
variedade de stakeholders, desde acionistas até colaboradores, de comunidades ao meio ambiente, a
Governança cria uma base sólida para o sucesso sustentável.
O seu poder transformador se manifesta na forma como fortalece a alta administração, permitindo que
líderes tomem decisões informadas e éticas que transcendem as preocupações de curto prazo. Ela enfatiza
o foco nos resultados, promovendo uma cultura de responsabilidade que não apenas evita colapsos, mas
fortemente impulsiona o crescimento.

Este é o momento de abraçar o modelo, não apenas nas empresas, mas em todos os setores públicos e
Estado. É um instrumento essencial para o fortalecimento organizacional, uma força que extrapola fronteiras
e setores. É a promessa de um futuro onde a administração se torna mais que uma função empresarial, uma
ferramenta vital para moldar um mundo mais justo, responsável e próspero.

Por tudo isso e muito mais que, com toda convicção enxergamos que a Governança não é apenas um
caminho, um modismo, mas a highway to success, ou a estrada para o sucesso duradouro das Instituições.
É uma bússola que orienta o nosso rumo a um futuro melhor, onde a administração não é apenas “eficiente”,
mas alinhada com os valores mais nobres da sociedade.

KIKOSOFIA
Número 14 SETEMBRO DE 2023

FELICIDADE

Felicidade é como água


Se tentarmos agarra-lá
Escorre entre os dedos
Se bebermos
Mata-nos a sede
Se demais
Nos afoga
Ah! Efêmera condição
Por que acaba?
Contraditória a tristeza, eterna.
Marcar-nos
Tão intenso
Tão intenso
Que consumimos tudo
E, logo, acaba...

SSILVA

KIKOSOFIA
Número 14 SETEMBRO DE 2023

Com rima

O mundo com rima é mais leve,


É mais cheio de graça
Ele estende a coisa breve
E a todos males rechaça.

O mundo com rima é feliz,


E não é tão carrancudo,
Concretiza tudo que diz,
E amolece qualquer escudo.

O mundo com rima é amoroso,


É sonhador, nefelibata.
Jamais será rancoroso,
Pois, o carinho arrebata.

O mundo com rima é erudito,


É transmissor de verdade,
É simples e é bendito,
Exala sonho e bondade.

O mundo com rima é certeiro,


Exato como uma seta.
Não há neste mundo inteiro,
Quem fale como o POETA!

The Cast

KIKOSOFIA
Número 14 SETEMBRO DE 2023

DAGON
H.P LOVECRAFT

Escrevo essa história sob uma pressão mental considerável, uma vez que hoje à noite me
apago.

Sem dinheiro, com o estoque da droga que torna a vida suportável próximo do fim, não
aguento mais essa tortura; estou prestes a me atirar pela janela da água-furtada na
desolação da rua lá embaixo. Não entenda minha dependência da morfina como uma
fraqueza ou uma perversão. Quando o senhor ler essas páginas rabiscadas às pressas
poderá entender, ainda que não por completo, a minha ânsia pelo esquecimento ou pela
morte.

Foi numa das regiões mais abertas e menos frequentadas do enorme Pacífico que o
paquete em que eu era supervisor de carga caiu vítima das forças alemãs. Era o início da
grande guerra, e as forças oceânicas dos teutos ainda não haviam afundado ao nível da
degradação posterior; de modo que nossa embarcação foi capturada como um troféu
legítimo, enquanto nós, da tripulação, fomos tratados com toda a justeza e consideração
devida aos prisioneiros navais. A postura de nossos captores, a bem dizer, era tão
tolerante que cinco dias após a abordagem consegui escapar sozinho em um pequeno
barco, levando comigo água e provisões suficientes para um período considerável.

Quando por fim me vi livre, à deriva, eu tinha pouca ideia das minhas coordenadas. Sendo
um navegador de poucas habilidades, eu só conseguia ter uma vaga noção, graças ao sol e
às estrelas, de que estava ao sul do Equador. Quanto à longitude eu não fazia a menor
ideia, e não havia nenhuma ilha ou litoral à vista. O tempo manteve-se bom e, por dias
incontáveis, fiquei à deriva sob o sol escaldante; esperando que algum navio passasse ou
que as ondas me conduzissem à orla de um lugar habitável. Mas nem o navio, nem a costa
apareceram; e comecei a entrar em desespero com a solidão em meio à grandeza
opressiva do infinito panorama azul.

A mudança operou-se enquanto eu dormia. Jamais conhecerei os detalhes; pois o meu


sono, mesmo sendo agitado e cheio de pesadelos, foi ininterrupto. Quando por fim
acordei, vi-me parcialmente sugado pelo lodo de um infernal pântano negro, que se
estendia à minha volta em ondulações monótonas até onde a vista alcançava, e onde o
meu barco estava ancorado a alguma distância.

KIKOSOFIA
Número 14 SETEMBRO DE 2023

Mesmo que se possa imaginar a minha reação de surpresa ante uma transformação tão
prodigiosa e súbita no cenário, a verdade é que eu sentia mais terror do que espanto; pois
no ar e no solo putrescente havia algo de sinistro que me enregelava até o âmago. O lugar
fedia a restos pútridos de peixes em decomposição e de outras coisas indescritíveis que
eu via erguerem-se do lodo asqueroso que recobria a infindável planície. Talvez eu não
devesse tentar pôr em meras palavras o horror indescritível que o silêncio absoluto e a
imensidão estéril podem encerrar. Não se ouvia nada, não se via nada afora a vastíssima
extensão de lodo negro; mas era a perfeição do silêncio e a constância do cenário o que
me oprimia com um terror nauseante.

O sol ardia em um céu que parecia quase negro em sua crueldade límpida; como se a
refletir o palude escuro como nanquim sob os meus pés. Enquanto eu retornava ao barco,
percebi que só havia uma teoria para explicar a minha situação. Por obra de alguma
erupção vulcânica sem precedentes, uma parte do solo marítimo fora arremessada em
direção à superfície, expondo regiões que por incontáveis milhões de anos haviam
repousado em silêncio nas insondáveis profundezas oceânicas. Tamanha era a extensão de
terra assim surgida que eu não conseguia ouvir o rumor do mar, por mais que tentasse.
Tampouco se viam aves marítimas a procurar comida entre as carcaças.

KIKOSOFIA
Número 14 SETEMBRO DE 2023

Por longas horas fiquei pensando ou cogitando no barco, que estava de


lado a fim de projetar alguma sombra enquanto o sol movia-se no
firmamento. À medida que o dia avançava o chão ficava menos pegajoso e
dava a impressão de que em pouco tempo estaria seco o suficiente para
uma caminhada. Dormi pouco à noite e, no dia seguinte, preparei um
suprimento de comida e água, antevendo uma jornada por terra em busca
do mar desaparecido e de um possível resgate.

Na terceira manhã o solo estava seco o bastante para que eu pudesse


caminhar sem dificuldade. O odor dos peixes era enlouquecedor; mas eu
estava compenetrado em assuntos muito mais graves para incomodar-me
com um mal tão insignificante e, assim, lancei-me rumo ao desconhecido.
Andei o dia inteiro em direção ao ocidente, guiado por um promontório
que se erguia mais alto do que qualquer outra elevação naquele vasto
deserto. Acampei naquela noite e, no dia seguinte, prossegui em direção
ao promontório, que, no entanto parecia quase tão distante quanto no
momento em que o vi pela primeira vez. Na quarta noite cheguei ao pé da
elevação, muito mais alta do que parecera ao longe; um vale destacava
seus contornos em meio ao panorama. Exausto demais para escalar, dormi
à sombra do promontório.

Não sei porque meus sonhos foram tão fantásticos naquela noite; mas
antes que a formidável lua gibosa subisse às alturas celestes, acordei,
suando frio, determinado a não mais dormir. Eu não seria capaz de
aguentar mais uma vez aquelas visões. O luar mostrou-me o quão tolo eu
fora ao viajar durante o dia. Sem o brilho do sol escaldante, minha jornada
teria consumido menos energia; em verdade, naquele instante eu sentia-
me apto a empreender a escalada que me vencera ao pôr do sol. De posse
dos meus suprimentos, parti em direção ao pico daquela eminência.

Disse eu que a monotonia constante da paisagem inspirava-me um horror


vago; mas acredito que meu horror tenha sido ainda maior quando ganhei
o cume do promontório e olhei para o outro lado, em direção a um
enorme fosso ou cânion, cujos negros recessos a lua ainda não subira o
bastante para iluminar. Senti-me nos limites do mundo, olhando para o
caos insondável de uma noite eterna. Meu terror era atravessado por
reminiscências do Paraíso Perdido e da terrível escalada de Satã pelos
domínios da escuridão primordial.

KIKOSOFIA
Número 14 SETEMBRO DE 2023

À medida que a lua subia, comecei a notar que os declives do vale


não eram tão íngremes quanto eu imaginara a princípio. Saliências e
escarpas na rocha proporcionavam uma descida relativamente fácil
e, após algumas dezenas de metros, o declive tornava-se bastante
gradual. Tomado por um impulso que não sou capaz de explicar,
desci pelo caminho de pedra e postei-me no declive mais suave lá
embaixo, olhando aquelas profundezas infernais onde luz alguma
jamais havia penetrado.

De repente minha atenção dirigiu-se a um enorme e singular objeto


que se erguia a pique no declive do outro lado, a uns cem metros de
distância; um objeto que resplandecia em brancura com os raios
recém-chegados da lua ascendente. Logo me convenci de que era
uma enorme rocha; mas por algum motivo eu tive a nítida
impressão de que aquele contorno e aquela disposição não podiam
ser obra da Natureza. Um exame mais atento encheu-me de
sensações inexplicáveis; pois, apesar da enorme magnitude e da
proximidade ao abismo hiante que repousava no fundo do mar
desde que o mundo era jovem, percebi sem a menor dúvida que o
estranho objeto era um monolito bem-formado, cuja opulência
conhecera o trabalho e talvez a adoração de criaturas vivas e
pensantes.

Confuso e assustado, mas sentindo o entusiasmo dos cientistas e


arqueólogos, examinei meus arredores em maior detalhe. A lua, já
próxima ao zênite, resplandeceu com um brilho estranho acima do
sobranceiro promontório que circundava o abismo e revelou um
enorme volume de água lá embaixo, que se estendia para os dois
lados e quase batia-me nos pés enquanto eu permanecia no declive.
No outro lado do pélago, pequenas ondas quebravam junto à base
do monolito ciclópico, onde se viam inscrições e esculturas
primitivas. A escrita usava um sistema de hieróglifos que eu
ignorava, diferente de todos aqueles vistos nos livros, e consistia,
na maior parte, de símbolos aquáticos estilizados, como peixes,
enguias, polvos, crustáceos, moluscos, baleias e outros. Muitos
hieróglifos representavam coisas marinhas desconhecidas ao
mundo moderno, mas cujos corpos em decomposição eu avistara na
planície que se erguera do mar.

KIKOSOFIA
Número 14 SETEMBRO DE 2023

Era o estilo pictórico, no entanto, o que mais me hipnotizava. Claramente visível na água,
graças a suas enormes proporções, havia um conjunto de baixos-relevos cujos temas
teriam despertado a inveja de um Doré. Acho que as figuras representadas eram homens
— ou pelo menos um certo tipo de homem; no entanto, as criaturas apareciam divertindo-
se como peixes na água de alguma gruta marinha ou rendendo homenagens em um templo
monolítico que também parecia estar sob as ondas. Os rostos e as formas eu não ouso
descrever em detalhe, pois a simples lembrança faz-me fraquejar. Grotesco além da
imaginação de um Poe ou de um Bulwer, o contorno geral das figuras era muito humano,
apesar das mãos e pés com membranas natatórias, dos impressionantes lábios carnudos e
molengos, dos olhos vidrados, arregalados, e de outros traços de lembrança desagradável.
Tive a curiosa impressão de que os desenhos estavam bastante fora de proporção com o
cenário ao redor; uma das criaturas aparecia matando uma baleia, representada em
tamanho só um pouco maior do que ela própria. Como eu disse, reparei no aspecto
grotesco e no tamanho exagerado das figuras; mas no instante seguinte pensei que
aqueles seriam apenas os deuses imaginários de alguma tribo primitiva de pescadores ou
navegadores; uma tribo cujos últimos descendentes haviam perecido eras antes que o
primeiro ancestral do Homem de Piltdown ou do Homem de Neandertal nascesse.
Estupefato com o vislumbre de um passado que extrapolava a imaginação do mais ousado
antropólogo, pus-me a meditar enquanto a lua lançava reflexos singulares sobre o
silencioso canal à minha frente.

KIKOSOFIA
Número 14 SETEMBRO DE 2023

Então, de repente eu vi. Com um leve rumor que marcou sua chegada à superfície, a coisa
apareceu acima das águas escuras. Vasto como um Polifemo, horrendo, aquilo dardejava
como um pavoroso monstro saído de algum pesadelo em direção ao monolito, ao redor do
qual agitava os braços escamosos ao mesmo tempo que inclinava a cabeça hedionda e
emitia sons compassados. Acho que foi naquele instante que perdi a razão.

KIKOSOFIA
Número 14 SETEMBRO DE 2023

Em relação à escalada frenética do aclive e do promontório e à jornada delirante rumo ao


barco não recordo quase nada. Acho que cantei um bocado e irrompi em gargalhadas
estranhas quando não consegui mais cantar. Tenho lembranças difusas de uma forte
tempestade algum tempo depois de retornar ao barco; de qualquer modo, sei que ouvi
trovoadas e outros sons que a Natureza só emite em seus momentos de maior furor.

Quando emergi das trevas eu estava num hospital em São Francisco; quem me levou até lá
foi o capitão do navio americano que resgatou meu barco, à deriva no oceano. Falei muito
em meu delírio, mas descobri que haviam dado pouca atenção às minhas palavras. Meus
benfeitores não sabiam nada a respeito de terras imersas no Pacífico; e não julguei
apropriado insistir em algo que eu sabia ser inacreditável. Certa vez falei com um
etnólogo famoso e diverti-o com perguntas um tanto peculiares sobre a antiga lenda
filistina de Dagon, o Deus-Peixe; mas logo, ao perceber que o estudioso era
irremediavelmente ordinário, desisti das minhas perguntas.

É à noite, em especial quando a lua está gibosa e minguante, que vejo a coisa. Tentei
morfina; mas a droga mostrou-se um alívio apenas temporário e prendeu-me em suas
garras como a um escravo desesperançado. Agora, tendo escrito um relato completo para
a informação ou para o deleite zombeteiro de meus semelhantes, pretendo pôr um fim a
tudo. Muitas vezes pergunto-me se tudo não seria a mais pura ilusão — um simples delírio
enquanto eu jazia vociferando durante uma insolação no barco exposto aos elementos,
logo após escapar da belonave alemã. Eis o que me pergunto, mas sempre tenho uma visão
nítida do terror em resposta. Não consigo pensar nas profundezas oceânicas sem
estremecer ao imaginar as coisas inomináveis que neste exato momento podem estar
deslizando e arrastando-se pelo fundo viscoso, rendendo homenagens a antigos ídolos de
pedra e esculpindo sua execranda imagem em obeliscos submarinos de granito úmido.
Sonho com o dia em que possam erguer-se acima das ondas para arrastar ao fundo, em
suas garras fétidas, os resquícios dessa humanidade pífia e devastada pela guerra — com o
dia em que à terra há de afundar, e o fundo escuro do oceano erguer-se em meio ao
pandemônio universal.

O fim está próximo. Ouço um barulho na porta, como o de um enorme corpo escorregadio
batendo contra a madeira. Jamais vão me encontrar. Meu Deus, aquela mão! A janela! A
janela!

Howard Phillips Lovecraft, ou H.P. Lovecraft, foi um escritor norte-americano que revolucionou o
gênero de terror, atribuindo-lhe elementos fantásticos típicos da fantasia e ficção científica.
Criando um gênero depois chamado de Terror Cósmico. Suas histórias expressam indiferença às
crenças e atividades humanas e uma atitude profundamente pessimista. Seu legado até hoje
influencia várias gerações de escritores de ficção de horror.

KIKOSOFIA
Número 14 SETEMBRO DE 2023

REFULGIR URBANO
voz de vel

"ah não, Mick Jagger"

Muito antes do senhor Bonner quem liderava a bancada do jornal mais popular do país era o Cid
Moreira, com sua inconfundível voz grave, o paulista de Taubaté, narrava com uma versatilidade e
precisão que emocionava, as notícias mais importantes do dia. É o jornalista detentor do recorde de
apresentação ininterrupta de um telejornal, cuja bancada foi inaugurada em 1969.

Cid iniciou a carreira como contador de histórias na rádio Difusora, passando a narrador esportivo e
jornalístico nos cinemas, antes da popularização da TV. Cid noticiou momentos marcantes para a
história do país, como a Constituição Brasileira de 1988, os 100 anos da abolição da escravatura e
a morte de Carlos Drummond de Andrade, quando recitou, ao vivo, o poema "E agora, José?".

Desde 1991 iniciou uma série de gravações de passagens bíblicas que alcançaram grande sucesso
e levaram a outras gravações como a “A Bíblia Sagrada”– O Novo Testamento” (2002), “Coleção
Novo Testamento” (2004), “A Bíblia Sagrada em texto integral" (2004 a 2009).

Criador de alguns bordões famosos da TV, como o “Jabulaaaanii”, nome oficial da bola da copa de
2010 e que provocava erros dos jogadores, levando ao bordão. No Fantástico, narrava as
apresentações do mágico Mister M, “O senhor de todos os segredos”, outro bordão que se tornou
famoso, assim como o aguardado “boa noite” ao final do jornal. Cid faz 96 anos em 29 de setembro.

KIKOSOFIA
Número 14 SETEMBRO DE 2023

AS LÁGRIMAS D'ALMA
DAVID MONTE NERO

A humanidade vive o pulsar das aparências, como se tudo fosse uma simples questão do
ter. Dos carros mais bonitos aos apartamentos mais caros e os sorrisos nas mídias
sociais, tudo apenas remonta a lacuna abismal que cada ser humano possui lá no âmago
da essência: é o conter das lágrimas d'alma que clamam por um momento de paz, uma
fração infinitesimal de amar e ser amado, o pulsar da luz divina dentro de si.

Nas incessantes jornadas exercidas pelos seres que aqui habitam temporariamente, por
vezes o caminho é solitário, árido e assaz pedregoso. É nesse interim que mais lágrimas
surgem nos bastidores do vasto campo do coração. Mas, em contrapartida, este processo
gera feridas que com o decorrer do tempo cicatrizam e são cicatrizadas. A dor é
necessária para a evolução do ser, da mesma forma que cada gota de orvalho que cai
sobre as folhas no amanhecer. E é naquela cicatrização que o fortalecimento se faz
mister, e de caráter imperioso.

O enxugar das lágrimas d'alma não se faz com lenços ou tecidos, até mesmo porque o
chorar é intrínseco, onde somente o ser que é provado para ser aprovado e a Entidade
Celestial são as testemunhas sentimentais de tais processos evolutivos. Da mesma
maneira que o organismo atua no processo de uma cicatrização física, o espírito tem a
seu encargo a importante viagem rumo ao abrir os olhos do intangível, com a plena
consciência de que o amanhã é tão possível quanto o agora; que nesta vida, tudo passa,
exceto a imortalidade da alma, que está bem ali, intacta, pronta para alçar voos cada vez
maiores, rumo à luz do conhecimento e da maturidade moral.

KIKOSOFIA
Número 14 SETEMBRO DE 2023

Quando o Cristo afirmou que "no mundo, tereis aflições", Ele, em


verdade, não quis conflitar aqueles que ali estavam ao seu redor,
mas sim, afirmar que neste orbe, repleto de seres falíveis, porém
amáveis por Elohim, as dores e aflições fizeram, fazem e
continuarão fazendo parte do elenco que estreia no palco da vida
de cada alma que aqui aporta.

Ao compreender isto, mais possível tornar-se-á o homem sobrepor


o espírito sobre a matéria, elevando templos a virtude, mudando
então o conceito do que hodiernamente é humano - provas, em
lugar da palavra angústias.

Sim, amados, as várias lágrimas que são derramadas ao longo desta


existência, em grande parte se deve ao fato de que não estamos
prontos o suficiente para compreender que tudo nesta existência
tem uma razão, um propósito de ser. Se o Carpinteiro de Nazaré
o espírito tem a carregou a dor da ingratidão dos que aqui habitavam, quando
seu encargo a dirigia para o Gólgota, o que reclamar quando carregamos a dor
importante efêmera para ser testado ? Se a materialidade passageira das coisas
viagem rumo ao assim não procedesse, não haveria tempos difíceis, fato este
abrir os olhos do formador de espíritos fortalecidos. Assim é a Lei Divina.
intangível
Neste amálgama dos sentimentos e sensações, talvez com o
pequeno entendimento já exposto aqui, seja possível que haja um
lenitivo às dores que cada leitor deste texto reflexivo,
balsamizando os recônditos do ser que habita em cada um de nós.
Acreditar na força superior, Divina e perfeita, que nunca adormece
perante às nossas provas é algo por deveras importante para que o
calçado da experiência às quais todos são submetidos na jornada,
possa caber em nossos pés com menos aflições.

Acalme o seu coração, ajuste o sapato da angústia e retire o


excesso do pó da terra que deixa a tua aparência enpedernida, e
siga em frente. As lágrimas d'alma secarão, dando lugar ao amor
que cada um precisa facultar ao Pai, que sempre acredita em nosso
caminhar.

Acredite também em si mesmo ! Você consegue.

Muita luz !

KIKOSOFIA
Número 14 SETEMBRO DE 2023

CINEOLHAR
Baseado no livro de mesmo nome da
autora Susanna Kaysen, Garota,
Interrompida é autobiográfico. Após uma
tentativa de suicídio, Susanna (Winona
Ryder) é internada em um hospital para se
recuperar. Lá, a garota faz amizade com
outras pacientes com transtornos
psíquicos e acaba se descobrindo uma
outra pessoa dentro daquele mundo
particular. O filme trata da rotina de
pacientes com distúrbios mentais —
principal causa dos suicídios — em um
hospital psiquiátrico. Uma narrativa sobre
Garota Interrompida
a loucura, a solidão e, sobretudo a amizade 2000 - 2h 07 min
e como tudo isso impacta nossas vidas. Direção de James Mangold
Com Winona Ryder, Angelina Jolie

Baseado na obra de Paulo Coelho, o filme retrata a


vida de Veronika, uma mulher de 28 anos que mora
em Nova York e tem uma carreira bem-sucedida.
Apesar disso, ela não é feliz e vive com uma
insatisfação que não consegue explicar. Ela tenta
tirar a própria vida tomando uma overdose de
remédios, mas sobrevive e acorda numa instituição
psiquiátrica, onde terá que aprender a conviver com
as consequências de seus atos. Ela volta a pensar em
tentar o suicídio novamente, até que faz amizade com
um dos pacientes e decide dar outro rumo a sua vida
enfrentando seus problemas e medos e realizando
Veronika decide morrer
2009 - 1h 43 min seus desejos.
Direção Emilly Youung
Com Sarah Michelle Gellar, Jonathan Tucker KIKOSOFIA
Número 14 SETEMBRO DE 2023

"OLHAI PARA OS LÍRIOS DO CAMPO,


COMO ELES CRESCEM; NÃO
TRABALHAM NEM FIAM;
²⁹ E EU VOS DIGO QUE NEM MESMO
SALOMÃO, EM TODA A SUA GLÓRIA,
SE VESTIU COMO QUALQUER DELES.
³⁰ POIS, SE DEUS ASSIM VESTE A
ERVA DO CAMPO, QUE HOJE EXISTE,
E AMANHÃ É LANÇADA NO FORNO,
NÃO VOS VESTIRÁ MUITO MAIS A
VÓS, HOMENS DE POUCA FÉ?”

MATEUS 6:28-30.

KIKOSOFIA

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