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EDIÇÃO DE MAIO DE 2023

KIKOSOFIA

Francisco Moreira
Número 10 MAIO DE 2023

MAIO
Por Francisco Moreira

Chegamos ao mês das mães, mês de Nossa


Senhora e de refletir sobre trabalho (1), literatura
brasileira (1), liberdade de imprensa (3), língua
portuguesa (5), do pedagogo (20) e até do silêncio
(7). Tudo bem voltado pra comunicação, algo que
vem fazendo muita falta em nosso dia a dia.

Tanta falta que opiniões divergentes se tornam


motivo para discussões acaloradas e geralmente
violentas, que pregam respeito desrespeitando os
outros, que apregoam a paz com um porrete nas
mãos e defendem liberdade através de punição.

Vivemos tempos difíceis de extremismos diversos e


ideológicos, que em nome de supostas minorias e
direitos destas ou da família e costumes, atacam
seus semelhantes proclamando-se donos da razão
e não permitindo visões divergentes de mundo.

Geralmente chegam com ideias que soam


absurdas, mas que são defendidas como soluções
mágicas de inclusão e fraternidade, ainda que pra
isso causem discórdia e afastem para o lado a
verdadeira necessidade daqueles que dizem
defender.

Kikosofia nº 10. © 2023 Este trabalho está licenciado por Francisco


Moreira sob CC BY-NC-ND 4.0. Para ver uma cópia desta licença, visite
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KIKOSOFIA
Número 10 MAIO DE 2023

MAIO
Lutas pelos direitos do trabalhador
O mês inicia com uma data fundamental na luta pelos
direitos do trabalhador, dia de manifestações e reflexões
sobre conquistas, necessidades e valorização de quem faz
a economia girar. A força motriz das sociedades sócio
capitalistas surgidas pós revolução industrial.

A data foi escolhida em homenagem ao esforço dos


trabalhadores dos Estados Unidos, que em 1º de maio de
1886, foram às ruas das maiores cidades do país para
pedir a redução da carga horária, que chegava até 14
horas por dia, direito a folga semanal e férias (direitos que
não eram assegurados).

Milhares de trabalhadores foram a ruas aos gritos de


"Eight-hour day with no cut in pay” (“diária de oito horas
sem redução no pagamento”), marcando o ínicio de uma
greve geral que resultou em passeatas em várias cidades
do EUA. Num confronto com a polícia em data de 04 de
maio, em Chicago, na praça Haymarket, os manifestantes
jogaram uma
que discursavam contra a morte de dois trabalhadores na
véspera, foram cercados e ameaçados com tiros, nao caos bomba contra
que se seguiu, jogaram uma bomba contra a polícia, que
explodiu matando 7 policiais e 4 trabalhadores e ferindo a polícia, que
mais de 130 pessoas.
explodiu
Lei marcial foi estabelecida em todo o pais e vários
sindicatos foram invadidos pelas forças policiais, dezenas matando 7
de sindicalistas foram presos. Oito destes foram
processados por incitação de violência, sendo 7 deles policiais e 4
condenados a morte. Rudolph Schnaubelt, manifestante
acusado de ter jogado a bomba, conseguiu fugir para
trabalhadores
Europa.
e ferindo mais
A repercussão do caso resultou na colocação da pauta do
trabalhadores na discussão politica. Diante disso, em 1889,
de 130 pessoas
na França, foi instituído o Dia do Trabalho em homenagem
às pessoas que perderam a vida lutando pelos seus
direitos, que ficaram conhecidas como os “Mártires de
Maio”.

Aqui no Brasil, os europeus que emigraram pra cá


trouxeram com eles os ideais de luta trabalhista e o
presidente Artur Bernardes decretou o Dia do Trabalhador
em 1925. Getúlio Vargas, em 1º de maio de 1940,num
empenho em transformar reivindicação em comemoração,
institui o salário mínimo e a Justiça do trabalho,
anunciando a Consolidação das Leis de Trabalho (CLT).

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Número 10 MAIO DE 2023

ABOLIÇÃO DA ESCRAVATURA
Uma
A Lei Aurea foi assinada pela Princesa Isabel em 1888, na
data de 13 de maio. Fruto de mudanças econômicas e
sociais que surgiram no final do século 19, bem como das
inúmeras lutas de negros escravizados que resistiam em
quilombos e outras comunidades, buscando a preservação
de sua liberdade, cultura e direito de viver segundo sua
vontade.

Pressões de outros mercados, bem como a mudança da


matriz econômica brasileira, com a decadência da produção
do açúcar a partir da cana e ascensão do café, faz com que
os fazendeiros passem a privilegiar a mão de obra europeia,
com grande incentivo a imigração e surgimento de uma
sociedade mais industrializada e urbanizada.

A resistência dos negros contra a escravidão, através das


lutas nos quilombos e também nas cidades através do
não é difícil
debate intelectual foram cruciais para que o debate sobre a
abolição fosse tratado na política nacional e resultasse em encontrar
leis que foram, de maneira tímida e quase sem efeitos
imediatos, mas recorrentes, levando a escravidão ao seu fim episódios de
oficial.
trabalhadores
Fim oficial, porque na prática a assinatura de Isabel jogou
nas ruas em estado de total abandono estatal, negros que
forçados a
de uma hora para outra se viram tendo que buscar por
condições sub
subsistência, jogados a pobreza e culminando no enorme
abismo social que ainda hoje reverbera em nossa humanas de
sociedade. A utopia de uma democracia racial foi por muito
tempo um discurso em voga que escondia as mazelas e os trabalho
preconceitos que negam oportunidades iguais aqueles que
possuem a tez escurecida.

Apesar de políticas reparadoras surgidas a partir da


redemocratização do país, há ainda hoje uma flagrante
desigualdade entre brancos e negros, em sua maioria ainda
inclusos nas mais baixas camadas sociais.

A escravidão, agora em forma "análoga", ainda sobrevive


em nossas fronteiras e não é difícil encontrar episódios de
trabalhadores forçados a condições sub humanas de
trabalho. Anualmente centenas são libertados de rincões
longínquos, mas também nas grandes cidades. A luta por
liberdade ainda está em curso e, se não há tanto a
comemorar, há muito ainda a se refletir e conscientizar
sobre a necessidade de falar sobre isso.

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Número 10 MAIO DE 2023
DOSSIÊ
ÍCONES DA CULTURA OCIDENTAL

REI ARTHUR
Francisco Moreira

A história de Arthur e os cavaleiros


da távola redonda é provavelmente
a mais conhecida e revisitada lenda
sobre cavaleiros medievais e magia
que há na cultura ocidental.
Recontada inúmeras vezes em livros,
filmes e quadrinhos a saga de Arthur
e sua espada mágica, a Excalibur,
segue encantando gerações e
inspirando novas interpretações e
releituras. Surgida durante a idade
média através de relatos orais, foi
compilada pela primeira vez pelo
clérigo e escritor Geoffrey de
Monmouth, em Historia Regum
Britanniae (A História dos Reis
Bretões), de 1136, onde surgem
também o mago Merlin e outros
personagens centrais.

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Número 10 MAIO DE 2023

As histórias do rei Arthur estão Merlin exigiu educar o recém-


situadas num momento em que os nascido, Arthur, alegando que
bretões dominavam a Grã-Bretanha este seria o salvador da Bretanha,
nos séculos V e VI. Os bretões eram os capaz de unir as duas culturas
celtas que haviam adotado os vigentes, a Cristã, professada pelo
costumes dos romanos, quando estes pai e a Céltica celebrada pela
habitaram a ilha. Apesar de ser um mãe. Seria uma tentativa de
ícone da fundação da nobreza inglesa, manter aspectos da cultura
Arthur em verdade teria lutado ao lado druídica que estava sob ameaça
dos Bretões, contra os Saxões e de extinção diante do avanço do
portanto, nunca ao lado daqueles que cristianismo.
formariam o povo inglês. Sua história Apesar de ser um ícone da
se inicia no País de Gales, região fundação da Inglaterra,
dominada pelos celtas durante as Arthur teria lutado contra
diversas invasões anglo-saxônicas que os Anglo-Saxões que
acabaram por formar a Inglaterra. formariam o povo inglês.

Arthur seria filho de Uther Pendragon, Arthur é criado na corte do Rei


um importante chefe dos exércitos Ector, sem conhecer sua origem.
bretãos e da Duquesa Ingraine, da Se tornando um guerreiro
Cornualha, pertencente à família real educado por Kay, filho de Ector,
da ilha de Avalon, local místico que que se tornará um de seus
cultuava uma religião antiga. Igraine cavaleiros e sob os cuidados de
era casada com o Duque Garlois, com Merlin que lhe ensina sobre a
quem tinha uma filha, Morgana, e teria antiga religião e seus aspectos
sido enganada por um artifício de místicos. Aos quinze anos,
Merlin para se deitar com Pedragon, durante um torneio na corte do
achando que este era Garlois (morto rei, Kay tem sua espada quebrada
durante uma batalha). Após perceber e pede a Arthur, servindo como
o ocorrido, e tenho ficado grávida, seu escudeiro, que busque outra,
Igraine foi forçada a se casar com para poder continuar no torneio.
Uther.
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Número 10 MAIO DE 2023

Ele acha uma espada enterrada Durante uma festa em que é


numa pedra em um bosque próximo apresentado aos costumes
e a retira, ao apresentar a espada, seu antigos, jurando proteger o povo
pai a reconhece e lhe pede que celta, Arthur é enganado e tem
mostre onde foi encontrada. Arthur relações com Morgana, sua meia
leva-os até a pedra e a coloca de irmã, gerando Mordred. Que no
volta, alguns cavaleiros tentam retirá- futuro será responsável por sua
la, mas somente Arthur consegue e é morte. Para criar alianças com os
proclamado sucessor do rei, para senhores cristãos, Arthur casa com
cumprir a promessa escrita que diz a princesa Guinevere, que
“Qualquer um que extrair esta entretanto é apaixonada por um
espada desta pedra será o rei da dos cavaleiros, Lancelot. Arthur e
Inglaterra por direito de nascimento” Guinevere não conseguem ter
filhos e durante uma ausência
Arthur assume a liderança do deste para combater os romanos,
exército e graças a suas capacidades Mordred usurpa o trono,
militares e estratégicas vence proclamando-se rei. Na tentativa
diversas batalhas contra os saxões, de retomar o reino, Arthur acaba
entre elas a histórica batalha de sendo mortalmente ferido na
monte Badon, por volta do ano 500, batalha de Camelot e é levado
na qual Arthur sozinho teria para a ilha de Avalon, onde acaba
derrubado mais de 900 saxões, morrendo.
atrasando a invasão — e a fundação
EXCALIBUR
da Inglaterra — em décadas.
A mítica espada de Arthur é citada
Tornado rei após a morte de seu pai. por Monmouth com o nome de
Arthur forma a Távola redonda, um "Caliburnus", já presente em vários
grupo de fiéis cavaleiros, doze no mitos celtas, que eram realmente
famosos pela fabricação de espadas
total, que se reúnem para discutir as
de qualidade. inicialmente ela é
estratégias de guerra e governo. Tem
entregue a Arthur por Nimue (ou
esse nome em razão de se sentarem Viviane), a dama do lago, por quem
em uma mesa circular de modo que Merlin é apaixonado, Além da
ninguém pudesse se sentir mais espada, a bainha protegeria Arthur

privilegiado que o outro entre seus de ser ferido, mas ele a perde na
batalha de Camelot.
pares, tendo igual importância
Posteriormente, o poeta Robert de
perante o rei, e assim fossem Boron, modificaria a origem
evitados disputas por poder, dando acrescentado a história da pedra da
igualdade a todos. qual ela é retirada.
.
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Número 10 MAIO DE 2023

Arthur existiu?

Não há um consenso histórico sobre a existência de Arthur, embora exista


a comprovação de que Uther Pedragon realmente foi um guerreiro famoso
entre os saxões. Alguns acreditam que Arthur pode ser a reunião de
diversos líderes que combatiam contra os Bretões entre os séculos V e VI.
Em 2016, arqueólogos encontraram evidências de um grande complexo de
prédios, que entre outras coisa abrigava um castelo, na região de Tintagel,
onde Arthur teria nascido, o que pode indicar que um grande rei existiu ali.
Anteriormente foram descobertas evidências de uma das batalhas que
teria sido vencida por ele, na região de Chester, onde teriam encontrado
também um anfiteatro que pode ser a famosa Távola redonda. Há ainda
relatos de que em 1191, monges da abadia de Glastonbury teriam achado
um túmulo com uma cruz de chumbo onde estaria escrito “Aqui jaz
enterrado o famoso rei Artur com Guinevere, sua segunda esposa, na Ilha
de Avalon” e uma pirâmide com os restos mortais de ambos; estes teriam
sido removidos do local na presença do rei Eduardo I e levados para local
desconhecido. Em 1960, tal túmulo foi localizado por arqueólogos, mas
nem os ossos e nem a cruz foram mais recuperados.

A morte do rei Arthur - John Garrick -


1862

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Número 10 MAIO DE 2023

O Rei Arthur na cultura pop


A importância da lenda do Rei Arthur pode ser medida pela quantidade de livros,
filmes, quadrinhos e outras adaptações que buscaram retratar a história de
alguma maneira. Listamos algumas dessas obras que ajudaram a consolidar esse
ícone.

Rei Arthur e os cavaleiros da Távola Redonda: edição comentada e ilustrada


(Howard Pyle) - Editora Zahar - 409 páginas

O ilustrador e escritor Howard Pyle revive, em palavras e imagens, a saga do


Rei Arthur e seus cavaleiros, desde o momento em que Arthur estabelece seu
direito ao trono, ao retirar de uma bigorna a espada nela cravada. O livro
relata suas batalhas com o Cavaleiro Negro e com o Duque da Nortúmbria, e
seus esforços para manter consigo a mágica Excalibur; seu amor por Lady
Guinevere e as origens da Távola Redonda; Merlin, traído pela feiticeira
Vivien, além de Morgana e a Dama do Lago;

O Rei do inverno - Bernard Cornwell - Editora Record - 546 páginas

O rei do inverno é o primeiro volume da trilogia As crônicas de Artur, finalizada


em O inimigo de Deus e Excalibur, do escritor inglês Bernard Cornwell. A partir
de fatos, este romance genial retrata o maior de todos os heróis como um
poderoso guerreiro britânico, que luta contra os saxões para manter unida a
Britânia, no século V, após a saída dos romanos.

A morte de Arthur - Thomas Malory - Editora Barbudânia - 699 páginas

Lançado em 1485, Sir Thomas Malory, com a intenção de criar um livro com
início, meio e fim da lenda Arthuriana, utilizou as várias histórias avulsas
disponíveis na época e criou uma obra única e completa do portador de
Excalibur. Seu trabalho levou a um novo patamar de reconhecimento e
influência as sagas cavaleirescas, a busca pelo Santo Graal, o amor proibido
de Lancelot e Guinevere e todas as outras aventuras do Rei Arthur.

as Brumas de Avalon - Marion Zimmer Bradley - Ed. Planeta Dinossauro - 968


páginas.

As lenda de Arthur vista pelos olhos de mulheres complexas e poderosas


como Morgana das Fadas, Viviane, a Senhora do Lago, Igraine, Morgause e
Gwenhwyfar. Os reinos de Camelot e de Avalon são revisitados neste clássico,
repleto de magia, sensibilidade e intrigas.

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Filmes
Os Cavaleiros da Távola Redonda (1953) - um
clássico da fantasia arturiana, o enredo
acompanha Sir Lancelot, que luta na guerra ao
lado do Rei Arthur enquanto mantém em
segredo seu amor pela Rainha, Guinevere. Com
Robert Taylor e Ava Gardner.

A Espada era a Lei (1965) - Uma das mais


amadas animações da Disney, foca na
infância de Arthur com muito humor,
música e aventura para apresentar às
crianças a lenda de Camelot.

Monty Pithon - Em busca do Cálice Sagrado


(1975) - Certamente uma das melhores
comédias de todos os tempos, aqui o grupo
inglês pega o gancho das lendas arturianas
para destilar um humor ácido e muito bem
vindo sobre a história.

Excalibur (1981) - um filme com um nível


assombroso de realismo e violência. mas com
umAencanto
lightweight, skin-friendly
épico controlling
que se mantém fiel a lenda .
serum
Com Nigel Terry, Helen Mirren e Nicholas
Klay.

Lancelot, o primeiro cavaleiro (1995) - Um


filme que foca bastante no triangulo
amoroso entre Arthur, Guinevere e
Lancelot, ainda assim com boas cenas de
ação e um charme especial resultante das
atuações aqui.

Rei Arthur (2004) - O filme é vendido como


a história real que inspirou a lenda. O
diretor Gui Ritchie toma várias licenças que
modificam bastante o contexto do que
conhecemos, Arthur aqui é um guerreiro
romano preocupado com o futuro da
Inglaterra.
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Número 10 MAIO DE 2023

O DIABO NÃO CRIA, ELE GANHA.


Estrategista do silêncio

Apesar de algumas pessoas não reconhecerem a existência de Deus ou do diabo, o fato é que energias
que circulam na sociedade são a eles atribuídas, seja em verborreias, em discursos mais formais ou em
bate-papos nas rodas de amigos. O que sabemos ao certo é que quando o nome do Criador vem na
frente, uma estrada de paz, saúde e progresso se perfaz, ao contrário daquele outro, que espalha
divisão, ódio, regresso e prisão.

Essa divisão criada e bem definida é o que se observa no Brasil de 2023, onde pessoas escolhem lados
bem claros, onde uns seguem e enaltecem valores cristãos, defendendo a necessidade de permitir que
o esforço seja a mola mestra do sucesso das pessoas, enquanto outros preferem a energia mais densa,
apaixonada e ansiosa por benefícios que sobem do inferno, de forma calorosa e risonha, a esculhambar,
desmerecer e destruir "méritos honestos'.

Da forma que está, creio que negar a existência de Deus e do diabo estaja cada vez mais difícil, pois
eles estão à mostra de forma muito mais evidente neste século. As "entidades" não querem mais
transitar apenas nos céus e nos infernos, buscam a nós a todo instante, como forma de fortalecer seus
exércitos e assim conquistar. A grande diferença é que para aqueles que escolhem Deus como
referência, dobrar os joelhos ao chão, pedir proteção e rumar em busca dos resultados é merito que
engrandece e fortalece, adubando o terreno para que a vida frondosa, produtiva e justa se firme.
Trabalhar, estudar, suar, tentar, perder, cair, se levantar e tentar de novo, pois é assim que se aprende.
Mas para quem opta por sentar-se ao lado do "cão", o tesão é outro, é criticar que o outro não tenha
tanto e não lhe critique por ter, é fomentar a divisão acelerada de tudo que for valor, pois assim esses
avermelhados se percebem mais forte, em condições de subjulgar os demais sem dó e nem piedade.
Ajudam o diabo, apoiam o diabo, mas não querem deitar em sua cama e nem beber de seu vinho. É uma
loucura que somente o tempo poderá explicar.

Pois é assim que vamos seguindo, os que trabalham chorando e os que mamam sorrindo. Uns tapando
buracos e tentando manter-se em pé e outros cavando sepulcros debaixo de seus próprios pés, como
se na derrocada eles também não sejam sugados ao quintos dos infernos. Apenas no fim da história, os
malditos verão que no primeiro grito, o Deus lhe dará a mão, enquanto o cão corre em busca de uma
nova oportunidade, que sempre lhe chega de graça, ao custo da desgraça de todos.

KIKOSOFIA
Número 10 MAIO DE 2023

Estante
DICAS DE LEITURA PARA SEUS MOMENTOS
Pois ler traz visões de mundo diferentes

Camelot 3000 é um quadrinho dos anos 80 que


reimagina a lenda do rei Arthur no século 30. Um
clássico escreito por um dos melhores roteirista
das HQs. Mike W. Barr, que aproveita a saga para
introduzir temas que até hoje seguem motivo de
incompreensão e preconceitos como
transgeneridade sexual, homosexualismo, papel
da mulher na sociedade, entre outros. Com
desenhos maravilhoso de Brian Bolland, um dos
melhores artistas dos quadrinhos. A edição é
daquelas que merecem um lugar todo especial na
coleção de qualquer apaixonado por quadrinhos
ou simplesmente por uma boa e divertida leitura,
que ainda nos faz refletir de forma leve sobre
Mike W. Barr e Brian Bolland
temas mais do que atuais. Formato 26, 6 x 17,6 cm • 324 páginas
Editora Panini

Arthur - Uma epopeia celta - (minissérie em 7


volumes) traz a visão dos franceses David Chauvel
(roteiro) e Jérôme Lereculey (desenhos). Mais uma
bela obra, com desenhos magníficos e um texto que
procura ser fiel a lenda, incorporando elementos
simbólicos que ficaram de fora em algumas versões,
criando um cenário rico e cheio de magia. Merlin aqui
assume uma vital importância e protagonismo na
jornada que irá levar Arthur ao trono, bem como
destrinchar a história e tragédia de seus cavaleiros,
amor, paixão, magia e traição criam uma fantasia com
os melhores clichês do gênero.

KIKOSOFIA
Número 10 MAIO DE 2023

Mater

Tu, grande Mãe!… do amor de teus filhos escrava,


Para teus filhos és, no caminho da vida,
Como a faixa de luz que o povo hebreu guiava
À longe Terra Prometida.

Jorra de teu olhar um rio luminoso.


Pois, para batizar essas almas em flor,
Deixas cascatear desse olhar carinhoso
Todo o Jordão do teu amor.

E espalham tanto brilho as asas infinitas


Que expandes sobre os teus, carinhosas e belas,
Que o seu grande clarão sobe, quando as agitas,
E vai perder-se entre as estrelas.

E eles, pelos degraus da luz ampla e sagrada,


Fogem da humana dor, fogem do humano pó,
E, à procura de Deus, vão subindo essa escada,
Que é como a escada de Jacó.

– Olavo Bilac, de ‘Alma Inquieta’ (1888), em “Poesias”.


Olavo Bilac. Rio de Janeiro: Edições de Ouro, 1978.

KIKOSOFIA
Número 10 MAIO DE 2023

OLHAR
KIKOSOFIA

ENTRE FAKES E PROJETOS


por Francisco Moreira

É inegável a necessidade imperiosa de criar mecanismos eficientes de


regulação da internet, como dito por alguém, ela não pode ser “terra de
ninguém” onde é cada um por si e salve-se quem puder, por isso
mesmo, iniciativas que visam estabelecer regras claras e que evitem
abusos e armadilhas digitais vem sendo implantadas em todo o mundo.
Mas quando a gente vê um projeto que desde 2020 vem sendo
paulatinamente atrasado em suas discussões, de repente ganhar ares de
urgência, sendo alçado a condição de “salvador de nossas crianças e de
nossa democracia”, a pulga atrás da orelha começa a coçar
absurdamente.

Tal projeto de lei, o de número 2630, alcunhado de “Lei das fakenews”


nasceu como um mecanismo de combate a “desinformação”, definida
inicialmente pelo relator do projeto, o Senador Alessandro Vieira, como
“conteúdo, em parte ou no todo, inequivocamente falso ou enganoso,
passível de verificação, colocado fora de contexto, manipulado ou
forjado, com potencial de causar danos individuais ou coletivos,
ressalvado o ânimo humorístico ou de paródia”, e foi ganhando volume
a ponto de ter hoje o dobro de artigos da proposta original.

Catapultada a status de prioridade depois dos protestos (tentativa de


golpe?) do, agora histórico, 08 de janeiro em Brasília, e se valendo da
perspectiva de que crimes cometidos em escolas por adolescentes logo
no início do ano teriam sido incentivados através de canais online, o PL
2630 começou a dividir opiniões entre aqueles que o vêm como uma
solução plausível e adequada e outros que o vêm como o precedente de
censura e controle de mídia.

KIKOSOFIA
Número 10 MAIO DE 2023

Vale dizer que entre declarações como “o WhatsApp é coisa de Satanás” ou “O PL2630 é
coisa de país tirânico”, uma verdade se sobressai, a de que o tema ainda está longe de ser
esgotado e que há sim a necessidade de maiores e melhores discussões sobre o assunto
antes que o projeto se torne Lei. Há ainda muitos pontos obscuros, falta de definições
claras de algumas condutas ali descritas; o conceito do que é desinformação, por exemplo
sumiu do texto. Uma das versões (já modificada) o substituía por “comportamento
inautêntico”, seja lá o que for isso. E, no momento em eu escrevo, pois a votação feste foi
adiada para mais discussões, não há qualquer definição do que seja desinformação, fake
News ou o tal conteúdo inautêntico.

No cabo de guerra, o governo e algumas empresas de comunicação (beneficiadas em razão


da lei não se aplicar a elas) dizem que provedores de conteúdo e mensageria privada estão
disseminando um terror injustificado e extremista contra a futura lei. Já os provedores
alegam que a falta de clareza de alguns pontos e certas posturas esperadas destes podem
acabar por criar mais desinformação e confusão do que já existem.

Fico com esses últimos, por enquanto, até porque, em um aceno possível as hipóteses de
censura que circulam pela rede digital, o STF determinou que os provedores retirassem de
seus portais as informações com as impressões destes sobre o projeto de lei. Opiniões que
de forma bastante equilibradas traziam questionamentos sobre o projeto, que, sejamos
sinceros, foi pouquíssimo discutido com a sociedade e os usuários das diversas mídias
sociais.

Há muitos pontos obscuros, falta de definições claras de algumas


condutas ali descritas; o conceito do que é desinformação, por exemplo
sumiu do texto.
Como dito acima, a necessidade de uma lei para regulamentar as vias digitais, apontando
responsabilidade e comportamentos, visando transparência e maior proteção contra
conteúdos nocivos é algo imperioso, porém para que seja eficaz tem que ser clara e
objetiva no que se propõe, tem que ser discutida em relação a tecnicidade, a
constitucionalidade, a exequibilidade e a um equilíbrio que mantenha o sistema social
funcionando de maneira ordeira e sem sobressaltos desnecessários. E não pode ser uma
colcha de retalhos que misture direitos autorais, relações comerciais e outros
penduricalhos.

As leis não existem em razão desse ou daquele comportamento pontual, mas precisam
atender a demanda de toda a sociedade organizada. Para que certos mecanismos de
controle tenham eficácia é preciso que se conheça a fundo o objeto de controle, de modo a
prevenir abusos ou excessos de facilidades. Claro que os provedores de mídia social
precisam assumir responsabilidade por conteúdos não moderados e nocivos em suas
plataformas, não podemos admitir mais que grupos extremistas, preconceituosos, nazistas,
pedófilos, etc. se perpetuem de modo a influenciar crianças, adolescentes ou quem quer
que seja à prática de atos criminosos ou perigosos.

KIKOSOFIA
Número 10 MAIO DE 2023
Lembro o recente bloqueio do Telegram acusado de não fornecer dados sobre
investigações policiais a respeito de grupos neonazistas, dados que segundo a empresa
seriam impossíveis de serem entregues devido a limitações técnicas. Não vou discutir o
fato em si, mas lembro que o Telegram era um mensageiro quase desconhecido há alguns
anos aqui no Brasil, mas ganhou força justamente após bloqueios seguidos do WhatsApp,
por motivos semelhantes. Ou seja, os usuários simplesmente foram buscar uma alternativa
e será sempre assim. Portanto, não basta apenas bloquear essa ou aquela aplicação, é
preciso investir seriamente em tecnologia de infiltração, em educação digital e social,
criar mecanismos de inclusão e ferramentas de investigação eficazes. Como tudo isso
interessa diretamente ao consumidor usuário das diversas redes sociais que operam na
internet, não é cabível que um Projeto de Lei seja votado e aprovado sem uma ampla
discussão que envolva a sociedade.

O que diz o projeto Qual a polêmica

Críticos desse trecho consideram que ele blinda empresas


A proposta estabelece que terá direito à remuneração jornalísticas de terem conteúdo removido, em caso de
qualquer empresa em funcionamento há ao menos 24 meses, desinformação, por exemplo. Hoje, as plataformas
mesmo se individual (apenas um jornalista), que “produza removem por conta própria conteúdos que firam suas
conteúdo jornalístico original de forma regular, organizada, diretrizes internas. a Meta diz ainda que a falta de uma
profissionalmente e que mantenha endereço físico e editor definição sobre o que é “conteúdo jornalístico” cria riscos.
responsável no Brasil”. “Isso pode levar a um aumento da desinformação, e não o
contrário.

As grandes empresas, por sua vez, dizem que incertezas


sobre o que se enquadraria na lei poderão levar a retirada
de conteúdos legítimos. “Sem os parâmetros de proteção
O PL das Fake News cria novas regras para a moderação de
do Marco Civil da Internet e com as novas ameaças de
conteúdo por parte das plataformas digitais, que poderão ser
multas, as empresas seriam estimuladas a remover
punidas com elevadas multas se não agirem “diligentemente
discursos legítimos, resultando em um bloqueio excessivo e
para prevenir e mitigar práticas ilícitas no âmbito de seus
uma nova forma de censura”, disse o Google, em uma
serviços”.
manifestação. Além de ter que monitorar todo tipo de
comunicação em suas redes, o que infligiria direitos de
privacidade.

“A última versão do projeto propõe uma complexa


Outra novidade da última versão do PL é a previsão de novas
mudança no sistema de direitos autorais, que não se
regras para remuneração de conteúdo protegido por direitos
relaciona com o restante do escopo do projeto, que é o
autorais, como músicas e vídeos. prevê que uma
combate à desinformação”, criticou a Câmara Brasileira da
regulamentação futura vai abordar “os critérios, forma para
Economia Digital. Tais licenças de direitos autorais
aferição dos valores, negociação, resolução de conflitos,
colocariam em risco a distribuição gratuita de conteúdo de
transparência e a valorização do conteúdo nacional, regional,
criadores, que poderá deixar de ser viável financeiramente
local e independente”.
para as plataformas.

O partido NOVO foi o único partido integralmente contrário


à urgência da votação, pois entendia que o projeto
Se de um lado há parlamentares favoráveis ao projeto e que
ameaçava a liberdade. Seus principais pontos de crítica ao
defendem a importância da aprovação da lei, há também
texto são :Transforma as plataformas em “polícias digitais”;
parlamentares que criticam o projeto e que se referem ao
Traz riscos à liberdade de expressão; Ameaça à liberdade
texto como “PL da Censura”.
religiosa já que os conteúdos podem ser classificados como
“discurso de ódio”, entre outros
KIKOSOFIA
Número 10 MAIO DE 2023

Travessia

Eu penso já ser adulto


Mas, ao atravessar a rua,
É ela quem me toma pela mão,
Mandando olhar para o lado.
"Menino, Toma cuidado!"
Devia eu protegê-la
Mas é ela a minha proteção.

Kiko Moreira

KIKOSOFIA
Número 10 MAIO DE 2023

O mundo em preto e branco


A modernidade vem trazendo para a sociedade um turbilhão de Tarcísio Caxias
tesões e emoções intensas, algumas até sufocantes, outras que
libertam e algumas que aprisionam. A uns ela trouxe a luz, a
outros a escuridão, mas nada se compara a felicidade em preto e
branco, onde as pessoas eram mais leais, centradas e felizes em si.

No mundo em preto e branco as pessoas se cumprimentavam nas


ruas, davam lugar aos mais velhos nos trens e nos ônibus, tinham
vergonha em soletrar um palavrão e se ofereciam a carregar as
pesadas compras de uma Senhora. Naquela época, as crianças
brincavam nas ruas, e os pais, no sereno das noites, papeavam,
reforçando os laços de amizade, uma forma de descanso do dia de
labor. Ali observavam seus filhos divertirem-se com os
coleguinhas, e oo primeiro sinal de comportamento indevido, o
"psiu" bastava, pois a linha educacional era firme, reta, não
vacilava. La as crianças queriam suar juntas e não apenas se
verem através de telas de LCD.

No mundo em preto e branco, os conteúdos sociais eram mais


elaborados, pois eles tinham que prender a atenção das pessoas.
Em outrora, inexistia esses elaborados midiáticos, essas
tecnologias que hipnotizam as pessoas, recursos que sem muito
esforço reforçam a capacidade de entendimento e de
convencimento, como também distorce realidades seriamente
existentes. Antigamente, os de mais idades lembram bem, era
importantíssimo concetração nas notícias no radinho de pilha ou
nas televisões com seus tubos de imagens em fósforo branco, que
ao se ligadas faziam aquele xiado por vezes irritante, até que se
conseguia ajustar o controle. Tanto fosse naz vozes dos locutores
como nas imagens em preto e branco dos apresentadores, o que
se consumia eram verdades, que o próprio "fio do bigode"
garantia. Naqueles tempos, ir em cartório para dizer que cachorro
era cachorro, era coisa de cachorro, pois o homem do mundo em
preto e branco tinha vergonha de envergonhar.

KIKOSOFIA
Número 10 MAIO DE 2023

Não se pode olvidar que a tecnologia trouxe uma série de avanços sociais, que perpassam pela
medicina, transportes, segurança da informação, e-commerce, agronegócio, construção civil, acesso à
informação, uma infinidade de coisas. A distância, para os que estavam longe, encurtou, é verdade, mas
para os que fisicamente estão próximos aumentou, alguns a ponto de se perderem. O foco na "palma
da mão" vem destruindo silenciosamente as relações de toda ordem, algo que não acontecia tempos
atrás. As relações de lá eram reais, verdadeiras, e a maioria das coisas se resolvia na conversa, pois

Inserir um título
educação e equilíbrio estavam presentes em boas doses em todas as famílias.

Os desenhos do mundo de preto e branco ensinava a criança sorrir, mas os atuais, com suas dimensões
4k, ensina a guerrear, a competir o tempo todo, como se o mundo não fosse capaz de permitir a
construção de felicidade com ajuda mútua, com respeito e consideração. O mundo bicolor
monocromático ensina que não se podia aproveitar das pessoas, obtendo vantagens indevidas, mas sim
de devolver os achados, de pedir desculpas e de se calar quando não era chamado. O mundo em preto
e branco era mais simples, mas infinitamente mais respeitoso do que hoje, porque lá cada ser humano
tinha apenas uma face.

Enquanto antes as pessoas adoeciam por falta de medicação, hoje é por excesso. Lá, no mundo preto e
branco, as pessoas eram impulsionadas a buscar a felicidade íntima, enquanto hoje se busca aquela que
precisa mais satisfazer os outros do que a si mesmo. Enquanto as escolas ensinavam Educação Moral e
Cívica, com conteúdo que davam lastro a se formatar o entendimento de que a coletividade em bem-
estar é de suma importância, hoje se busca mostrar o impossível, de que homem e mulher não têm
sexo fisicamente falando.

Ouvir o que diz Jessier Quirino em seu poema "Vou-me embora pro passado", dá também para exprimir
que no mundo preto e branco a felicidade era mais pura, o maior esforço era para se ter retidão e a
amizade era ouro de sete quilates, que por nada nesse mundo podia ser atacada. "Bença a Pai e Bença
a Mãe" eram elos de ligação de extrema confiança e fidelidade que jamais uma mensagem eletrônica
será capaz de substituir.

Uma pena que a modernidade não tenha conseguido até então produzir uma máquina do tempo, que
viesse a permitir a quem desejasse, voltar para o mundo preto e branco, viver vida simples, vida
verdadeira, vida real. Melhor ver Chaplin dançando mudo na TV.

KIKOSOFIA
Número 10 MAIO DE 2023

MINHA MÃE

Minha mãe, minha mãe, eu tenho medo


Tenho medo da vida, minha mãe.
Canta a doce cantiga que cantavas
Quando eu corria doido ao teu regaço
Com medo dos fantasmas do telhado.
Nina o meu sono cheio de inquietude
Batendo de levinho no meu braço
Que estou com muito medo, minha mãe.

Repousa a luz amiga dos teus olhos


Nos meus olhos sem luz e sem repouso
Dize à dor que me espera eternamente
Para ir embora. Expulsa a angústia imensa
Do meu ser que não quer e que não pode
Dá-me um beijo na fronte dolorida
Que ela arde de febre, minha mãe.

Aninha-me em teu colo como outrora


Dize-me bem baixo assim: — Filho, não temas
Dorme em sossego, que tua mãe não dorme.
Dorme. Os que de há muito te esperavam
Cansados já se foram para longe.
Perto de ti está tua mãezinha
Teu irmão, que o estudo adormeceu
Tuas irmãs pisando de levinho
Para não despertar o sono teu.
Dorme, meu filho, dorme no meu peito
Sonha a felicidade. Velo eu.

Minha mãe, minha mãe, eu tenho medo


Me apavora a renúncia. Dize que eu fique
Dize que eu parta, ó mãe, para a saudade.
Afugenta este espaço que me prende
Afugenta o infinito que me chama
Que eu estou com muito medo, minha mãe.

– Vinicius de Moraes (Rio de Janeiro , 1933). em “O Caminho para a Distância”.


São Paulo: Companhia das Letras, 2008.

KIKOSOFIA
Número 10 MAIO DE 2023

O DRAGÃO DE SONHO
UM CONTO POR KIKO MOREIRA

O suor escorria pela face de Dhalsin enquanto ele desviava por um instante a sua
atenção. Fixando o olhar em um dos cantos da caverna jurava ter visto um vulto esguio,
com um olhar de fogo fixo no seu corpo frágil, que mais lembrava o de um menino,
embora ele não fosse muito mais que isso. Um frenesi percorreu a espinha de Dhalsin
por um tempo que lhe pareceu uma eternidade até ir se alojar bem atrás de sua nuca,
como o sopro de uma mulher que busca seduzir com suas carícia; mas não eram carícias
que Dhalsin estava procurando isolado ali naquela caverna escura. Demoradamente
concentrou o cinza de seus olhos sobre o canto e não descobriu nada, provavelmente ele
havia imaginado coisas, afinal ele estava ali exatamente para isso, imaginar.

Imaginar tão forte que o sonho possa se tornar real diante de seus olhos e submeter-se à
sua vontade, Era assim que seu avô lhe falava da “arte”. Aquele já era o décimo quarto dia
e Dhalsin estava vendo, talvez, o início de seu sonho. Não um sonho onírico cheio de
esperanças, amadurecido e sustentado pela sabedoria de um homem, mas sim alicerçado
sobre desventuras de uma criança transformadas em rancor frio e assustador. O olhar de
Dhalsin, fixo na escuridão, lembrava mais o de um jovem assustado e não o de um mago
prestes a realizar sua maior proeza que muitos magos não conseguiam ou ousavam fazer.

Sua mente voltou-se novamente para o passado que resistia em apagar-se de sua
memória e ele relembrou os dias em que seu avô o colocava no colo e contava histórias
do princípio dos tempos e o fazia viajar nas lendas de seu povo. Ele adorava ouvir como o
“pequenino” havia derrotado um exército de gigantes e se tornado o senhor de seu povo.
Como o dia havia se recusado a morrer no horizonte para poder ajudar um povo justo, em
sua luta. O velho Shanizar sabia coisas de que nenhum outro homem tinha conhecimento,
ele dançava com o fogo e, durante a noite, as ninfas embalavam seu sono. A gazela e o
leão eram seus amigos mais íntimos e seus desejos se tornavam reais quando ele assim
queria. O pai de Dhalsin era o senhor de sua tribo e temia Shanizar por causa de seus
ensinamentos ao povo e tentava o menino dizendo “O pai de sua mãe é um louco, afaste-
se dele”, mas Dhalsin não o ouvia, sabia que seu avô não era louco e sim o mais sábio dos
homens e confiava nele. Shanizar costumava discordar da maneira como ele conduzia os
assuntos da tribo, principalmente por causa do desrespeito aos costumes antigos e dos
ataques feitos para saquear povos mais fracos, tornando-os escravos.

KIKOSOFIA
Número 10 MAIO DE 2023

Um dia, a mãe de Dhalsin morreu vítima de afogamento,


em circunstâncias suspeitas. O colar de Shanizar foi
encontrado perto do local onde ela morrera e ele foi
acusado de a ter matado, pelo pai de Dhalsin. Mas este
sabia que seu avô não teria motivos para matar sua mãe e
descobriu que o verdadeiro assassino era seu pai, que
queria desposar outra mulher sem perder o manto real,
sujeitando-se a uma separação, o que era proibido pelas
leis antigas que governavam seu povo. Infelizmente, não
conseguiu provar nada e quando enfrentou seu pai junto
ao conselho, foi expulso da tribo, juntamente com o avô,
acusado de cumplicidade e tentativa de golpe contra o
rei. A expulsão era a pior pena para seu povo, o
condenado era marcado a ferro com o sinal de
degradado e não podia mais fazer uso do próprio nome,
acreditava-se que assim o expulso não poderia entrar no
paraíso quando morresse por não ter o som sagrado do
nome reconhecido pelo guardião da ponte eterna.

Passaram a andar pelo deserto, sempre sendo


rechaçados pelos que viam o sinal em seus braços,
Shanizar mostrava como sobreviver no deserto e ia
ensinando aos poucos a arte a Dhalsin, que ia
aprendendo com afinco e progresso impressionantes,
querendo sempre mais e com tal voracidade que o
próprio Shanizar chegava a assustar-se com o
desenvolvimento do menino. Um dia enquanto falava
sobre as estrelas e o mundo da luz, deixou escapar a
possibilidade de tornar a imaginação tão real e palpável
quanto o próprio alimento que consumiam. Dhalsin se
interessou de tal maneira que daquele momento em
diante não deu um só minuto de paz ao avô e
insistentemente pedia para mostrar-lhe o conhecimento,
Shanizar negava-se. Criar uma Tulpa, uma forma-
pensamento, exigia muito poder e responsabilidade para
alguém tão jovem, dizia, mas o menino era teimoso como
um burro novo e fez o velho prometer que lhe contaria o
segredo.

KIKOSOFIA
Número 10 MAIO DE 2023

Depois de alguns anos vagando no deserto, o


avô sentiu que era chegada a sua hora de
morrer e preparou os sacrifícios de reparação,
ali morreria. Lembrando-o da promessa,
Dhalsin fez ver ao avô que ele ainda não podia
morrer e, durante os dois meses seguintes,
Shanizar mesmo contra vontade, mas tendo que
honrar o compromisso, passou a ensinar
Dhalsin sobre como esculpir um constructo
onírico pra atender aos seus desejos. Alertou-o
sobre o perigo e a disciplina necessária para ter
controle sobre a criação, mas ele tinha os
ouvidos tapados e apenas ouvia o que queria.
Nem o último apelo de Shanizar para ele
somente usar o poder quando tivesse
experiência e maturidade foi ouvido. Uma pedra
vermelha marcava o local onde o corpo do avô
descansava e com lágrimas nos olhos e o
coração cheio de ódio, Dhalsin tomou o
caminho do sol em direção a sua terra

Ele ouvia, bem ritmada agora, uma respiração do outro lado da caverna, no mesmo lugar
onde dias antes vira o par de olhos faiscando. Porém dessa vez não perdeu a concentração
e manteve firme a imagem em sua mente, um corpo poderoso e invulnerável, placas
cobrindo todo o torso, sua pele enegrecida brilhava, em seus dedos dois pares de garras
retráteis e tão afiadas quanto a espada do anjo guardião permaneciam firmes como se
feitas do mais puro bronze, seus olhos crepitavam com o calor de suas entranhas e fogo
saía de suas narinas como um jorro de lava de vulcão feroz. A fera iria se levantar da
escuridão onde estava e iria anunciar aos céus, com um grito, que havia despertado. O
povo de seu pai iria atropelar-se em fuga quando o bater de suas asas rugisse mais forte
que um vendaval e derrubasse tendas e cabanas, a fera iria cuspir o seu veneno ácido em
cima de plantações e dos animais. Seu pai, aterrorizado iria ajoelhar-se e pediria clemência
aos deuses, tentaria um pacto com o senhor da noite, mas seria agarrado pelo demônio
alado e veria seu povo em chamas pelas ruas, amaldiçoando o seu nome antes de morrer.
Seu pai seria levado pela besta até muito longe de sua terra, onde a fera depositaria seu
corpo frente a uma pedra vermelha, ele então compreenderia e em seguida seria
destroçado pelos caninos do vingador.

KIKOSOFIA
Número 10 MAIO DE 2023

A respiração se fazia mais forte e um cheiro acre invadiu a caverna. “imaginar tão forte que
nada mais exista, além da fantasia” – Era o vigésimos nono dia e a fera estava pronta,
Dhalsin fizera como seu avô havia dito e durante aquele mês isolou-se e só acreditou no
que ditava sua imaginação. Concentrou cada fibra do seu ser para esculpir o que agora
tinha a sua frente, a Tulpa havia sido construída com todo ódio que lhe era possível ter e
agora lá estava ela. Levantou-se e vislumbrou a sua criação, era perfeita, o dragão abriu
suas longas asas e fitou o pequeno Dhalsin com curiosidade e ódio no olhar, faíscas
atravessaram suas pálpebras e se tornaram mais intensas. Dhalsin, do lugar onde estava
finalmente abriu os ouvidos e compreendeu as palavras de seu avô “é poder demais para
uma criança”. Tentou dizer algo para o dragão, mas calou-se quando viu no fundo dos
olhos da fera a imagem do seu pai, foi a última coisa que viu. O dragão levantou voo e com
os olhos em brasas se dirigiu a uma aldeia ao leste.

KIKOSOFIA
Número 10 MAIO DE 2023

MINHA MÃE DIZIA


Minha mãe dizia:


– Ferve, água!
– Frita, ovo!
– Pinga, pia!
E tudo obedecia.

Paulo Leminski

KIKOSOFIA
Número 10 MAIO DE 2023

MARIA MÃE E ÍCONE DO CRISTIANISMO


POR FRANCISCO MOREIRA
Maria deve ter sido uma camponesa, vivendo
Muito pouco se sabe historicamente sobre quem
longe do centro político e religioso situado em
foi Maria de Nazaré, a mãe de Jesus. Os poucos
Jerusalém, teria sido prometida a José
conhecimentos que temos são aqueles obtidos
provavelmente entre os 11 e 13 anos de idade no
através do que é dito no Novo Testamento e em
início da puberdade, o que era comum na época
alguns livros apócrifos, todos eles escritos
para que não se tornasse motivo de inquietação
posteriormente à sua morte; assim como o Jesus
para os pais. Tais casamentos eram decorrentes
histórico, sua vida é envolta em mistérios e
de acordos familiares no qual, em geral, os
teorias que talvez nunca sejam desvendadas.
noivos só tinham contato no dia do casamento
ou pouco antes. José é tradicionalmente
Fato é que Maria tornou-se um ícone de fé e de
retratado como um carpinteiro, mas é provável
esperança para todo o povo Cristão, em especial
que fosse um construtor que, além de madeira,
os católicos que a tem entre as principais figuras
lidava também com ferro, pedra, etc. É
de veneração da hagiografia religiosa, sendo essa
amplamente aceito que ambos eram
veneração uma forma de admiração e
pertencentes a um ramo da casa de Davi, que
homenagem pela forma singular e
havia sido rei dos hebreus.
comportamental que a pessoa teve em vida,
tornando-se um exemplo a ser seguido.
Cronologicamente, cerca do ano 50 do 1º século,
Lembrada geralmente pelos vários títulos que
a primeira menção a mãe de Jesus está na carta
detém, criados a partir de episódios milagrosos,
do apóstolo Paulo aos Gálatas, quando diz que
como as supostas aparições marianas (Fátima,
“Deus enviou seu filho, nascido de uma mulher e
Lourdes, etc.) ou eventos fantásticos a ela
submetido a Lei”, porém sem mencionar o nome
atribuídos (Aparecida, Guadalupe e outros), e
de Maria ou dar mais detalhes sobre o
ainda relacionados à sua vida (das Dores, das
nascimento. O Apóstolo Mateus é quem a
lágrimas, Bendita). O que as vezes pode causar
identifica como “a virgem” da promessa contida
alguma confusão, no entanto, se referem a
no livro de Isaías, sobre a vinda do Messias.
mesma figura e não a pessoas distintas.
KIKOSOFIA
Número 10 MAIO DE 2023

Madona com Cristo morto (1789)


Anne Louis Girodet De Roussy Trioson
335 x 235 cm
Museu Churches (França)

A oração da Ave-Maria aparece


O dogma cristão dita que Maria teria recebido a
visita do anjo Gabriel, que lhe teria anunciado a originalmente escrita em grego no
concepção, da mesma forma que fez a sua prima
Isabel, mãe de João, o Batista. Inicialmente, José
século 3.
teria pensado em rejeitar Maria, após saber do Ao longo da pregação de Jesus, Maria é citada
ocorrido, mas o mesmo Gabriel lhe teria poucas vezes, porém é possível inferir que
aparecido em sonhos e atestado a origem divina acompanhava, ainda que a distância, os
da gravidez de Maria e o instruído a nomear e ensinamentos de seu filho. Maria está junto ao
proteger a criança, que veio a nascer na cidade filho, ao pé da cruz, com o apóstolo João,
de Belém, na Judéia. Yeshua, Jesus, O Cristo quando de sua paixão e morte. É citada uma
havia então encarnado. última vez reunida com os discípulos no
cenáculo de Jerusalém, após a ascensão de
Na tradição judaica a mãe era a responsável pela Jesus. Segundo a tradição Maria teria morrido
educação dos filhos, por transmitir a tradição em Jerusalém com cerca de 58 anos de idade.
religiosa, os valores judaicos para estes e Maria Arqueólogos teriam encontraram algumas
deve ter desempenhado esse papel ao longo da epígrafes de peregrino que passavam para
infância e juventude de Jesus, muito embora as venerar um túmulo datado do século I, atribuído
mulheres judias não tenham função de destaque a Maria e sobre o qual foi construída uma
em relação ao poder, mantido na mão dos basílica a ela dedicada. No entanto, desde os
homens, eram muito influentes no seio familiar. tempos mais antigos da Igreja Cristã, surgiu-se
É provável que Maria tenha tido outros filhos uma tradição acerca de sua suposta assunção ao
depois do nascimento de Jesus, O Evangelho de céu, tradição que se divide em duas posições
Marcos, diz que Jesus teve quatro irmãos, Tiago, diferentes. A primeira defende a assunção de
José, Simão e Judas, além de duas irmãs, porém, Maria ainda em vida. A segunda defende a
o dogma católico preconizado no Concílio de assunção de seu corpo após a morte. Tal
Latrão (649) dita que Maria permaneceu virgem tradição foi promulgada como um dogma
por toda a vida. católico em 1950, pelo Papa Pio XII.

KIKOSOFIA
Número 10 MAIO DE 2023
Embora nenhum documento comprove que Imaculada Conceição – Em 1854, o Papa Pio IX
Maria tenha sido objeto de culto na igreja definiu o terceiro dogma mariano, em sua Bula
primitiva, sua presença na fé dos primeiros “Ineffabilis Deus”, o Pontífice declarou a
cristãos é atestada pelos testemunhos de Santo doutrina que ensina ter sido Nossa Senhora
Inácio de Antioquia e São Irineu, já no século 2, imune de toda mancha de pecado original por
que passam a contrapor as figuras de Eva e singular graça e privilégio de Deus Onipotente,
Maria, em que uma teria gerado a morte em em vista dos méritos de Cristo Jesus, Salvador
razão do pecado e a outra, a salvação pela do gênero humano. Em seu Evangelho, São
concepção de Jesus. Lucas diz que Maria é “cheia de graça” (Lc 1,28),
significando que ela está plena do favor de Deus,
Há indícios de que a veneração a Maria date dos da graça divina. Se está totalmente possuída por
primeiros cristãos, a tradição registra uma Deus, não há, em sua vida e coração, lugar para o
aparição dela ao apóstolo Tiago, ainda no ano 40 pecado.
na cidade de Zaragoza, hoje Espanha, durante
uma pregação e o instruído a construir ali uma e Assunção – Na Constituição Apostólica
capela. Ela teria aparecido em Roma no ano 352, “Munificentíssimus Deus” editada pelo Papa Pio
fato que teria gerado a construção da igreja de XII, em 01 de novembro de 1950, se afirmou que,
Santa Maria Maior. Nas catacumbas de Priscila, depois de terminar o curso terreno de sua vida,
também
Madona com Cristoem
morto Roma,
(1789) pode ser visto o que é ela foi assunta de corpo e alma à glória celeste. A
Anne Louis Girodet De Roussy Trioson
considerado
335 x 235 cm
o mais antigo afresco com pinturas crença na assunção de Nossa Senhora é antiga,
marianas, mostrando
Museu Churches (França) a virgem com o menino remontando ao século IV. O povo cristão já

Jesus, datado do segundo século, em local de acreditava no fato, a partir do século VI já


reunião dos primeiros cristãos. É também do acontecia em Jerusalém e posteriormente outras
século 2 a mais antiga antífona (tipo de cântico cidades a celebração da festa da Dormição
curto) mariana conhecida, chamada de “Sub (trânsito) de Nossa Senhora, que veio a assumir
tuum praesidium” (Sob tua proteção em latim). A o título de “Assunção de Santa Maria”. Ao longo
oração da Ave-Maria aparece originalmente dos séculos foram diversas as petições para o
escrita em grego no século 3, como um dos reconhecimento, chegando a ser discutido no
muitos hinos marianos. Aos poucos a tradição Concílio Vaticano I. A grande Tradição da Igreja
eclesiástica foi se firmando, com alguns dogmas faz referências a vários textos bíblicos para
marianos sendo reconhecidos pela própria fundamentar o dogma mariano (Gn 3,15; Ex
Igreja, através de éditos ou decretos papais, são 20,12; Is 60,3; Sl 132,8; Ct 3,6; Lc 1,28; Ap 12).
eles:

Maternidade divina – Proclamado em Éfeso no


ano de 431, com intuito de afirmar a unidade da
pessoa de Cristo e reconhecer Maria como Mãe
de Deus (“Theotokos”), pois deu à luz segundo a
carne aquele que é o Verbo de Deus. A
proclamação pôs fim as divisões propostas por
Nestório (380-451), patriarca de Constantinopla,
que afirmava duas naturezas de Cristo muito
unidas, mas constituindo duas pessoas. Por isso,
manifestava que Maria é a Mãe do homem Jesus,
mas não a Mãe de Deus. Consequentemente,
Deus tinha habitado num homem, mas não se
tinha feito homem. O Concílio de Éfeso
classificou o nestorianismo como heresia e
depôs Nestório de sua sede patriarcal.

Virgindade perpétua – O Concílio de Latrão


(649) afirmou que Nossa Senhora foi sempre
Virgem, isto é, antes do parto, no parto e depois
do parto. Diversos credos e concílios antigos
retomaram e afirmaram este dogma.
KIKOSOFIA
Número 10 MAIO DE 2023
Embora nenhum documento comprove que Imaculada Conceição – Em 1854, o Papa Pio IX
Maria tenha sido objeto de culto na igreja definiu o terceiro dogma mariano, em sua Bula
primitiva, sua presença na fé dos primeiros “Ineffabilis Deus”, o Pontífice declarou a
cristãos é atestada pelos testemunhos de Santo doutrina que ensina ter sido Nossa Senhora
Inácio de Antioquia e São Irineu, já no século 2, imune de toda mancha de pecado original por
que passam a contrapor as figuras de Eva e singular graça e privilégio de Deus Onipotente,
Maria, em que uma teria gerado a morte em em vista dos méritos de Cristo Jesus, Salvador
razão do pecado e a outra, a salvação pela do gênero humano. Em seu Evangelho, São
concepção de Jesus. Lucas diz que Maria é “cheia de graça” (Lc 1,28),
significando que ela está plena do favor de Deus,
Há indícios de que a veneração a Maria date dos da graça divina. Se está totalmente possuída por
primeiros cristãos, a tradição registra uma Deus, não há, em sua vida e coração, lugar para o
aparição dela ao apóstolo Tiago, ainda no ano 40 pecado.
na cidade de Zaragoza, hoje Espanha, durante
uma pregação e o instruído a construir ali uma e Assunção – Na Constituição Apostólica
capela. Ela teria aparecido em Roma no ano 352, “Munificentíssimus Deus” editada pelo Papa Pio
fato que teria gerado a construção da igreja de XII, em 01 de novembro de 1950, se afirmou que,
Santa Maria Maior. Nas catacumbas de Priscila, depois de terminar o curso terreno de sua vida,
também
Madona com Cristoem
morto Roma,
(1789) pode ser visto o que é ela foi assunta de corpo e alma à glória celeste. A
Anne Louis Girodet De Roussy Trioson
considerado
335 x 235 cm
o mais antigo afresco com pinturas crença na assunção de Nossa Senhora é antiga,
marianas, mostrando
Museu Churches (França) a virgem com o menino remontando ao século IV. O povo cristão já

Jesus, datado do segundo século, em local de acreditava no fato, a partir do século VI já


reunião dos primeiros cristãos. É também do acontecia em Jerusalém e posteriormente outras
século 2 a mais antiga antífona (tipo de cântico cidades a celebração da festa da Dormição
curto) mariana conhecida, chamada de “Sub (trânsito) de Nossa Senhora, que veio a assumir
tuum praesidium” (Sob tua proteção em latim). A o título de “Assunção de Santa Maria”. Ao longo
oração da Ave-Maria aparece originalmente dos séculos foram diversas as petições para o
escrita em grego no século 3, como um dos reconhecimento, chegando a ser discutido no
muitos hinos marianos. Aos poucos a tradição Concílio Vaticano I. A grande Tradição da Igreja
eclesiástica foi se firmando, com alguns dogmas faz referências a vários textos bíblicos para
marianos sendo reconhecidos pela própria fundamentar o dogma mariano (Gn 3,15; Ex
Igreja, através de éditos ou decretos papais, são 20,12; Is 60,3; Sl 132,8; Ct 3,6; Lc 1,28; Ap 12).
eles:

O milagre de Guadalupe
Em data de 9 de dezembro de 1531, na cidade do México, Nossa Senhora apareceu ao
índio Quauhtlatoatzin — batizado com o nome cristão de Juan Diego — e pediu-lhe que
dissesse ao bispo da cidade para construir uma igreja em sua honra. Após transmitir o
pedido, duvidando da história, o bispo exigiu alguma prova. Então Nossa Senhora fez
crescer flores numa colina semi-desértica em pleno inverno, e mandou Juan Diego levar
ao bispo. Este colocou a flores em sua tilma (espécie de manto) e ao abri-lo diante do
bispo e de várias outras pessoas, viram admirados que a imagem de Nossa Senhora estava
estampada no manto. Era, então, o dia 12 de dezembro.

Passados mais de 490 anos, O manto de Guadalupe é considerado um dos milagres mais
estudados da fé católica, a iniciar por sua longevidade, já que, por ser feito de material
extremamente grosseiro deveria ter se desfeito há tempos. No século XVIII, algumas
pessoas fizeram uma cópia da imagem, a mais fidedigna possível. Teceram uma tilma
idêntica, com as mesmas fibras da original. Apesar de todo o cuidado, a tilma se desfez
em apenas quinze anos.

KIKOSOFIA
Número 10 MAIO DE 2023

Madona com Cristo morto (1789)


Anne Louis Girodet De Roussy Trioson
Em 1936, o Dr. Richard Kuhn (judeu e ganhador do Nobel de Química) analisou algumas
335 x 235 cm
fibras da tilma e chegou a conclusão de que as tintas utilizadas na pintura não têm
Museu Churches (França)

origem vegetal, nem mineral, nem animal, nem de algum dos elementos atômicos
conhecidos. No dia 7 de maio de 1979 o prof. Phillip Serna Callahan, biofísico da
Universidade da Flórida, junto com especialistas da NASA, analisou a imagem. Queriam
ver se a imagem poderia ser uma impressão fotográfica. Supreendentemente, após
tirarem mais de 40 fotografias infravermelhas para verificar como é a pintura,
constataram que a imagem não está colada ao manto, mas se encontra 3 décimos de
milímetro distante da tilma e que, ao aproximar os olhos a menos de 10 cm da tilma, não
se vê a imagem ou as cores dela, mas apenas as fibras do manto.

Mas o que mais intriga os cientistas sobre o manto de Nossa Senhora de Guadalupe são
os olhos dela. Desde 1929 o fotógrafo Alfonso Marcué Gonzalez descobriu uma figura
minúscula no olho direito. Os olhos da imagem são muito pequenos, e as pupilas deles,
naturalmente ainda menores. Numa superfície de apenas 8 milímetros de diâmetro
aparecem gravadas nada menos de 13 figuras presentes no momento em que a imagem foi
revelada.

Engenheiros da IBM no processamento digital de imagens, dizem não ser possível que tais
imagens sejam obra humana, primeiro, porque elas não são visíveis para o olho humano,
salvo a figura maior, de um espanhol. Ninguém poderia pintar silhuetas tão pequenas; as
treze figuras se repetem nos dois olhos. E o tamanho de cada uma delas depende da
distância do personagem em relação ao olho esquerdo ou direito da Virgem. E assim
como os olhos da Virgem refletem as pessoas diante dela, os olhos de uma das figuras
refletidas, a do bispo Zumárraga, refletem por sua vez a figura do índio Juan Diego
abrindo sua tilma e mostrando a imagem da Virgem.

Qual o tamanho desta imagem? Um quarto de mícron, ou seja, um milímetro dividido em


quatro milhões de vezes.

KIKOSOFIA

Número 10 MAIO DE 2023

REFULGIR URBANO
FOCO, DEDICAÇÃO E CARISMA

"Quando penso que cheguei num ponto que realmente é o ideal,


Logo descubro que dá pra melhorá-lo"

Domingo era dia de ver Senna correr. Não importava muito se ele iria ganhar ou não, nem sempre
ganhava, mas o tricampeão de Fórmula Um sempre dava um show de competência e arojo na
direção, dono de um estilo audacioso e competitivo, dava gosto ver os embates com outros
corredores, que para nós assumiam ares de vilão da semana que seriam batidos por Senna.

As freadas fortes e manobras audaciosas, sobretudo na chuva, em que corria como se estivesse
passeando no jardim de casa, uma brincadeira de criança, perigosa. Mas ainda assim uma gostosa
brincadeira. Ao final da corrida, quando entrava o tchan tchan tchan do hino da vitória, que não foi
feito para ele, mas que se tornou a música que o representava em todo canto.

Lembro aquele fatídico final de semana de 1994 marcado por incidentes e acidentes durante o
treino e na corrida. Mas o que ficou na memória de quase todos foi aquela batida na curva
Tamburello, os pneus voando, enquanto o carro se despedaçava. A barra de direção havia
quebrado e ele passou reto na curva, atingindo o muro há mais de 200 Km. Na batida, um pedaço
da barra de direção o atinge acima do supercílio direito, causando um traumatismo fatal. Era dia 1º
de maio.

As manhãs de domingo perderam muito de sua graça depois dali, a F1 se tornou mais segura, mais
tecnológica, mais cheia de recordes, porém muito menos emocionante.
KIKOSOFIA
Número 10 MAIO DE 2023

CINEOLHAR
Entre fevereiro e julho de 1858, na Gruta de Massabielle, Nossa
Senhora apareceu a Bernadette Soubirous de Lourdes menina
pobre. Uma verdadeira revolução do Segundo Império, sacode
a ordem estabelecida por sua mensagem universal de amor e
oração. Filmado em zonas portuguesas de Chaves, Ericeira,
Guimarães e Lisboa, “Milagre de Lourdes” conta a história das
aparições e da vida da Santa Bernadette, com a sua luta e
determinação para ser ouvida.
Direção: Jean Sagols
104 min (2011)
disponível no Prime Vídeo e Youtube

Lúcia é uma pastora que aos 10 anos de idade, na companhia de


seus dois primos mais novos, Jacinta e Francisco, em 1917, tem
uma visão da Virgem Maria. Muitos duvidavam da veracidade de
seus testemunhos, mas outros partiam em peregrinação ao local
na esperança de presenciar um milagre, num mundo que era
assombrado pela Primeira Guerra Mundial e ansiava pela paz.
Suas revelações tornaram a cidade portuguesa de Fátima um local
de peregrinação, o que desagradou a Igreja e o Governo de
Portugal, que tentaram forçá-los a recontar a sua história.
Direção: Marco Pontecorvo
1 h 53 min (2020)
disponíveis no Prime vídeo e Youtube

As aventuras de João Grilo (Matheus Natchergaele), um sertanejo


pobre e mentiroso, e Chicó (Selton Mello), o mais covarde dos
homens. Ambos lutam pelo pão de cada dia e passam por vários
perrengues enganando a todos do pequeno vilarejo de Taperoá,
no sertão da Paraíba. A salvação da dupla acontece com a
aparição da Nossa Senhora (Fernanda Montenegro). Adaptação da
obra de Ariano Suassuna.

Direção: Guel Arraes


1 h 35 min (2000)
disponíveis no Globo play

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Número 10 MAIO DE 2023

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crítica ou opinião? Quer escrever
uma bobagem qualquer (com
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dissonantes, de livre e respeitosa expressão e
opinião. Um local que se pretende divertido,
reflexivo, por vezes louco, mas sempre acolhendo
o outro, independente de diferenças, somos todos
iguais, e isso é o que de mais belo existe no viver,
saber que não somos cópias de outro ser. E não
esqueça colabore, discorde, concorde, opine. Boa
jornada.

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KIKOSOFIA
Número 10 MAIO DE 2023

"PORQUE DEUS TANTO AMOU


O MUNDO QUE DEU O SEU
FILHO UNIGÊNITO, PARA QUE
TODO O QUE NELE CRER NÃO
PEREÇA, MAS TENHA A VIDA
ETERNA.
Evangelho de joão 3,16

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