Você está na página 1de 11

Fala para a Reuniao/Mesa/Evento da Secretaria de Negras e Negros do SINTUSP -

31/03/2022

Iniciado em 17/03/2022, finalizado em 29/03/2022

Primeiramente, queria pedir licença aos meus antepassados, aqueles que me


permitiram ser Capoeira e hoje poder repassar o que me foi dado. Que possam observar
minhas palavras e que elas façam jus à memória deles.

Agradecer meus Mestres e Mestras, esses que, mesmo nas discordâncias, na crítica
dura e nas rupturas, me formaram Angoleiro, me formaram um Capoeira.

A minha licença à essas minhas pessoas mais velhas, pra tomar momentaneamente
seu espaço pra falar de Capoeira, e, particularmente, de Capoeira Angola.

Queria agradecer as pessoas da organização da Secretaria de Negras, Negros e


Combate ao Racismo do Sindicato dos Trabalhadores da Universidade de São Paulo (USP),
que me permitem hoje estar aprendendo a militar em conjunto.

Eu, que sou bem crítico a participar de eventos e mesas, só to aqui por causa do
convite dessa organização que constrói a Luta dos trabalhadores e trabalhadoras dessa
universidade de SP.

Queria agradecer às pessoas que estão na sintonia, ouvindo e atendendo o convite de


discutir Capoeira, nesse período político tão difícil e que a importância de retomar a Capoeira
como organização historicamente política, é muito grande, pra gente entender qual foi e qual
deveria ser o papel atualizado da Capoeira hoje.

Eu cumprimento os participantes desta mesa. Que desenvolvem trabalho dentro da
USP, e digo do meu desejo de em algum momento, poder conversar com vocês pessoalmente,
o que até o momento não foi possível, mas não por falta de tentativas…
… No momento oportuno, tudo no seu tempo.

Alguns destes que estão aqui, são pessoas que desenvolvem trabalho dentro da USP
há alguns ou muitos anos. Ainda faltam alguns, assim como o Pinguim, do Núcleo de Artes
Afro-Brasileiras.
Esses que estao aqui dão aula dentro da USP, assim como eu também, há quase dez
anos desenvolvo um movimento, um trabalho de Capoeira, dentro do Centro de Práticas
Esportivas da USP, o CEPEUSP, assumindo a cadeira de Capoeira do Gladson Oliveira,
quando esse se aposentou .

Importante ressaltar que, nestes dez anos, existe um apagamento e uma invisibilização
do meu trabalho e inclusive sendo do conhecimento da própria comunidade da Capoeira e da
própria instituição, que preferem manter o apoio a alguem que nao ta mais esta dentro,mas
mantém um lugar de poder e destaque com o nome da instituição, ao invés de fortalecer com
quem hoje ta compondo e batalhando.
E isso é reflexo direto das instituições burguesas e seus interesses, seus conchavos.
Que inclusive a comunidade da Capoeira muitas vezes copia.

E é a partir dessas contradições duras e concretas que quero falar hoje de Capoeira.
Não falar da minha história de Capoeira, mas sim da Capoeira e do seu
desenvolvimento histórico no Brasil.
Reconstituir historicamente a Capoeira como Luta real e concreta contra opressões e
explorações, ainda tão reais na nossa sociedade atual.

A Capoeira, uma manifestação que historicamente serviu às classes trabalhadoras


dominadas, racializadas no Brasil.
Que eram corpos escravizados no Continente Africano, trazidos pra essas terras.


A Capoeira, na história, se caracterizou, se formou, na sua identidade, por três
caracteristicas principais:
1 - O Sujeito Capoeira - Aquela pessoa que, pelas suas ações de rebeldia, era
classificado como “o Capoeira”;
2 - Os Grupos Organizados de Capoeiras - que foram chamados pejorativamente de
maltas de Capoeira, e eram Grupos de Resistência e de rebeldia à um sistema escravagista no
Brasil;
3 - E a Prática Social Capoeira - Aquela que era o brinquedo, a junção do treinamento,
da iniciação do Sujeito Capoeira, que era uma ação organizada e rebelde no Brasil.

Saber disso é extremamente importante, principalmente quando a gente ouve que o


Capoeira era aquele que fazia parte das Maltas, que era um marginal, malandro, capanga,
bandido, que agia só a favor de políticos e da disputa por território, pela sua “natureza
marginal”.
O Capoeira, sujeito social, dentro dessas organizações chamadas de maltas a partir da
sua prática, formava a base rebelde Negra contra o modelo de sociedade que existia. Não era
um mero marginal, como geralmente foi dito.
E saber dessa construcao faz a gente desafiar e negar a construção do Negro como o
bruto, o bárbaro, o não civilizado, sem inteligência, que não pensava e não era capaz de
produzir seus próprios movimentos de resistência e libertação.

As Maltas eram, na minha concepção, Grupos Negros Organizados de Resistência ao


Regime Escravagista. Grupos de acolhimento, de amizade, irmandade Africana,
que inclusive podiam agir em conjunto quando identificavam um inimigo em comum,
como o braço repressor do Estado.

E hoje a gente consegue entender melhor estes grupos entravam em conflito por causa
do controle do território e dos locais de trabalho, que eram espaços onde se mostrava a
exclusão social do Negro no meio urbano.
Os conflitos que aconteciam nos chafarizes, nos cantos dos carregadores, nas praças,
nos comércios, eram formas de disputar espaco com outros Negros ou com as classes
proprietárias brancas portuguesas e européias, que desejavam esses Negros fora dos seus
domínios.
E a gente entende que esses conflitos existiam por um problema fundamental da
questão do Negro no Brasil:
que é a questão do não acesso à terra pra poder produzir sua subsistência. O não
acesso à uma reforma agrária que resolvesse o problema da exclusão do Negro ao acesso à
terra, à educação, à participaão política, à mobilidade econômica e social…

A Capoeira, a partir do Estudo profundo, desmistifica a historia do Negro enquanto
um problema social, e recoloca o Negro enquanto resultado do problema imposto pelas
classes dominantes de um capitalismo nascente.

Tira o Negro do papel da culpa e coloca ele como fruto da exploração e da exclusão.

E pra que essa exploração e exclusão aconteça, o racismo não cumpre outro papel
senão manter o negro excluido e mais explorado, e sobre o controle econômico, social,
político e cultural, pra justificar essa exclusão.
O verdadeiro problema do Negro no Brasil se encontra na exclusão dele do trabalho e
do acesso à terra. Da exclusão do acesso a propriedade privada dos meios de produção, em
um Brasil escravagista… situação que permanece também depois da abolição.

O Negro e a Capoeira produzida pelos Capoeiras daquele tempo historico foram corpo
de Resistência. Coletivo e estratégico.
Nesse sentido, a Capoeira se funda, na sua origem, como um movimento rebelde dos
Negros. Esses mesmos Negros que nunca foram cordiais nem coniventes com sua
escravização, como a historia do dominador escreveu.
Pelo contrário, o Capoeira se utiliza da Capoeira, assim como outros grupos Negros se
utilizaram da sua rebeldia pra se organizar e produzir Levantes, Insurreições, Revoltas e
Rebeliões, buscando se libertar de uma opressão e se emancipar da escravidão.

Durante todo o período escravagista, movimentos Negros ocorreram e a Capoeira tava


presente, sendo uma manifestação que causou terror dessas classes dominantes, fazendo elas
criarem e desenvolverem formas cada vez mais sofisticadas de repressão e controle social.

Mas a repressão contra o Negro não se deu somente na violência ao corpo físico. Nem
somente na subjetividade desse sujeito.
A violência se deu na desumanização e na inferiorização, através do racismo, pra
justificar a escravidão. Mas se deu, acima de tudo, na exploração da força de trabalho dos
Negros, também dos indígenas no Brasil.
Além da exploração das riquezas e da terra. Seja do continente americano, seja do
Continente Africano. Onde todas as riquezas produzidas eram enviadas pra Europa, formando
a acumulação capitalista naquele local, e transformando o mundo na sua colônia.

O Negro foi o proprio produtor das condições pro seu movimento abolicionista, a
partir do momento que causou violência, morte de senhores e dos feitores, terror no meio
urbano, abandono das fazendas, fugas pras matas pra construção dos Quilombos.
A abolição ocorreu com apoio do sujeito branco só quando a pressão internacional ja
se somava com a própria pressão do Negro no Brasil.
E nesse movimento se incluía a Capoeira, o Capoeira.

Depois de acontecer a abolição, os Negros, com mais ou menos consciencia formam


por exemplo a Guarda Negra.
Esse mesmo Negro, preocupado em se voltar a ser escravizado no pós abolição e
depois da imposição da República, quando sai pra protestar é fuzilado por esse movimento
republicano nascente.

Além disso, muito importante, e’ que a Republica Velha, fundada através de um golpe
militar, destitui a monarquia, mas manteve a mesma estrutura anterior, da grande posse de
terras, os latifundios, pras classes ricas que vão se manter no mesmo lugar, agora, ajudando a
implantar o capitalismo, que já se amadureceu na Europa, aqui dentro do Brasil.
Depois da República em 1889 e da criminalização da Capoeira no código penal de
1890, se antes existia a perseguição dos Capoeiras, das maltas, a partir das decadas de 1920,
1930, essa perseguição vai continuar, até que estes grupos vão desaparecendo.

E agora, depois de muitas tentativas de cooptação pelo Estado, que buscou tomar a
Capoeira pra ser sua “gymnástica Nacional”, o estado vai tomando, a partir de decada de
1930 a Capoeira, pra um movimento de fortalecimento de uma ideologia do nacionalismo,
pra fortalecer uma ideia do brasileiro trabalhador, que seria contra a vagabundagem, contra a
vadiagem, e obviamente, contra o corpo Negro.

No plano econômico, do período das oligarquias da República Velha em 1889 até a
instituição da revolução do Estado Novo em 1930 com Getúlio Vargas, em mais um golpe na
nossa história, a propriedade da terra continuou na mão das classes dominantes, enquanto pro
Negro continuaram restarando as ações de imobilismo social.


Nesse momento, a Capoeira, a partir de Bimba, se mercadoriza. O ensino da Capoeira
se torna mercadoria e se adequa às necessidades de controle social do Estado. Uma Capoeira
pra formar o trabalhador, disciplinado.
Vira uma prática sistematizada, até mesmo parecida com uma estrutura militarizada,
por exemplo no caso dos treinamentos da especialização da capoeira regional, nas matas, que
lembravam táticas de guerrilhas.

Mas guerrilhas diferentes daquelas dos Escravizados do século XIX.

E ai, entre o período da Ditadura do Estado Novo (1937-1945), que controlou a
producao da cultura e cooptou as manifestações tradicionais como o Samba, o Candomble e a
Capoeira;
até o período da Ditadura Militar de 1964, a Capoeira enquanto mercadoria, enquanto
Luta de ringue, enquanto método da educação física, vai se desenvolvendo.

E é a partir de 1964, através de leis e projetos, que vai se aprofundar a captura da


Capoeira pelo Estado e pelo movimento militarista, que vai promover eventos que vão
visando a maior esportivização, a criação, mais tarde, das federações esportivas, os
congressos de sistematização das nomenclaturas de golpes…
Congressos que inclusive foram rechaçados por nomes como Bimba e Pastinha.

Neste momento, as classes empresariais, ricas, continuam mantendo o domínio de


grandes porções de terras e as relações de desigualdades não se modificam. O Negro que
antes estava abandonado nos meios urbanos, vai pros morros, pras favelas, continuando alvo
das policias e continuando excluído das melhores posições e remunerações do mercado de
trabalho, mesmo em um país que se industrializava.

O Capoeira de antes, que Luta contra a escravidão, sendo parte da estratégia da


acumulação capitalista na Europa, agora, mer adorizada, serve pra fortalecer esse mesmo
projeto capitalista no Brasil,

Enquanto o Estado eleva o discurso do “trabalho, que dignifica o homem”, vai servir
da sua força de trabalho pra enriquecer o “andar de cima”,
E nesse sentido, também se vai também se modificando a prática da Capoeira pra ser
aceita pela sociedade, e enquanto também vai embranquecendo ela, e transformando em mero
produto, em método.

Método que a partir de agora vai estar nas quadras das competições, nas escolas, nas
universidades, sempre servindo aos interesses ideológicos do capital, enquanto deixa de
servir às massas socialmente excluídas e vilipendiadas.

A Capoeira, pela mão dos fundadores das federações, que contavam com o apoio do
Estado militar da ditadura, que financiava tais atividades de competição, esportivização,
padronização, regramento, regulamentação, sistematização e expansão, deixa de ser o ponto
de aglutinação, iniciação e formação crítica da Luta Negra e passa a incluir o Negro no sonho
de poder ascender na vida a partir da mercadorização da Capoeira, que percorre toda a década
de 1970 e depois, de 1980, com o movimento de redemocratização e expansão da Capoeira
no exterior.
E não vai ser raro ver capoeiristas desse período histórico da esportivização
defenderem que o período da ditadura militar foi bom, pra si e pra a Capoeira. Além de
continuarem defendendo a esportivização da Capoeira ainda hoje. Inclusive capoeiristas
Negros.
O mesmo Negro que não vai deixar de sofrer com o racismo e com o controle social
no Brasil

Passando pela década de 1980, e já avançando a década de 1990 e anos 2000, as
relações não parecem mudar. Enquanto o Movimento Negro toma folego e buscou se centrar
nas políticas afirmativas pro reparo histórico do vilipêndio ao Negro, vao nascendo os
grandes grupos de capoeira.
Surge a internet, os cursos de formação, os workshops, a tentativa de tomada da
Capoeira pelo sistema da educação física dos CREFs e CONFEF, inclusive com apoio de
dirigentes de ligas, federações e confederações que, na verdade querem manter o controle do
mundo do trabalho da Capoeira pra si…
A Cada dia, a Capoeira, que ta na mão dos agora capoeiristas, especialistas em
educação e esporte, se distancia do povo mais pobre e Negro, e, na assanha de fazer dinheiro,
ocupando todos os espacos possíveis, se consolida como entretenimento, como folclore,
como esporte, como campo de trabalho, emprego e renda.

A Capoeira, que antes era auto-Organização do Negro Rebelde, se transforma em Luta


docilizada submetida ao sistema, e violenta contra o seu semelhante capoeirista. O que se tem
agora não é mais o Sujeito Social Capoeira, mas sim o especialista, o capoeirista.

A Luta toma outro rumo, e agora, auxilia o próprio modelo capitalista a se reproduzir.

E, resumidamente, enquanto fortalece a produção e comercialização de Fitas de Vídeo


VHS, fitas K7 de áudio, CDs, DVDs, revistas, jornais, roupa e moda, eventos, grandes festas
de trocas de graduação e formaturas, criação de métodos ginásticos alinhados ao mercado de
academias, durante toda a década de 1990,
e, enquanto mergulha nas redes da internet desde os anos 2000, hoje estando
totalmente submetida às plataformas digitais, às fake news, à necessidade de velocidade do
consumo de informação de forma acrítica, ao mercado de canais de vídeo que fazem “reacts
de tretas” das rodas,
Enquanto se submete às chances de monetização nas plataformas digitais, a Capoeira
serve como entretenimento e alienação do Capoeira da sua própria atividade social.
Se antes existia o Sujeito Social Político Capoeira, hoje, o praticante é só um
consumidor ávido do mercado de Capoeira e entretenimento e um mero lutador de artes
marciais mistas nas rodas.

Mas, e a situacao do Negro no Brasil atualmente?

- Recebendo menos que o sujeito branco, nos mesmos cargos. Sendo menos ainda,
caso seja uma mulher Negra;
- Principal vítima do homicídio policial, segundo os dados do Atlas da Violência;
- Maioria entre o número de desempregados, em trabalhos precários, no trabalho
informal sem direitos trabalhistas, subempregados e trabalhando menos do que poderia e
gostaria;
- E, fundamentalmente: Não é dono das posses de terras, nem pra sua moradia, nem
pro seu trabalho, nem pra sua subsistência;
Também não é possuidor dos meios de produção, como as fábricas, a ciência, os
meios de mídia, as universidades, os mecanismos financeiros…
O Negro, que antes era o principal representante do Ser social Capoeira, nao foi, nem
é hoje maioria representado nos cargos políticos, nos cargos do judiciário, nem do legislativo,
portanto, continua não tendo suas demandas representadas;

O Negro até hoje não vê atendidas suas demandas e, aquelas duramente conquistadas,
como as cotas, por exemplo, possivelmente seriam facilmente destrúidas por essa
representação política atual,
Assim como por exemplo a imposição contínua da discussão da pauta da diminuição
da maioridade penal, que vai encarcerar mais do mesmo: uma massa Negra, majoritariamente
sem precedentes, e que agora, serve também de mão de obra de um sistema carcerário
capitalista.

Atualmente, fundamentalmente, o Negro, o pobre, nao possui e nem é proprietario de


terras e dos meios de producao no Brasil, e esse é o problema central. O que existe e se
mantém é a manutenção das estruturas de classes, que mantêm o poder na mão daqueles que
sempre possuíram, e que controlam a nossa alimentação, nossa política, a segurança pública
que assassina a gente, que sao donos das fábricas, dos bancos…

O Negro não recebeu nenhum tipo de reparação, de reforma agrária. E assim também
são os Quilombolas, os Indígenas…

Estes, pelo contrário, tem suas demarcações de terras diariamente ameaçadas, além de
estarem continuamente morrendo na mão dos ruralistas, dos grandes proprietários de terra,
que querem expandir ainda mais suas terras e seu lucro, matando quem estiver à sua frente, e
com ajuda primordial do Governo Federal e de outras instâncias políticas, judiciárias e
empresariais.

Enfim, o problema do Negro, continua intocado no Brasil


O mesmo Negro que era o Sujeito Capoeira, daquela prática rebelde do passado.
A Capoeira, da forma que é praticada atualmente, não toca nem na superfície mais
rasa desse problema.

E ainda pior, mesmo quando o discurso atual de ditos mestres e mestras se faz em
cima da discussão da capoeira como “instrumento de libertacao”.

Esses discursos não encontram aprofundamento na discussão principal, que prende o


Negro e os demais grupos oprimidos. E esse é o discurso da exploração.
De como esses grupos oprimidos são concretamente mais explorados dentro do modo
de produção capitalista.
Como mulheres, Negros, indígenas são mais explorados e recebem menos nos
mesmos cargos. Como esta estrutura nos exclui mais socialmente?

A exploração, que mantém o Negro, o indígena, excluídos da da distribuição da renda,


das possibilidades de sobreviver em um modelo onde cada vez menos se produz e cada vez
mais se faz crescer o capital através do nosso endividamento, dos juros, dos mercados de
ações e do crédito
(credito que o atual governo tem oferecido, ao invés de oferecer uma renda básica
nesse período difícil, assim, ajudando a endividar mais as famílias, enquanto gera lucro pros
bancos).
Todos caminhos a gente não tem acesso. Mas que aqueles, donos dos bancos, das
terras, do agronegócio, do controle da política historicamente tiveram e ainda mantêm.

O discurso na Capoeira não consegue se atualizar e, a gente permanece na discussão


cosmética, que muitas vezes, tem essas pessoas, que hoje são também “influenciadoras”, se
utilizando de discursos de identidade somente pra ganhar espaço e vender cursos, workshops,
formações, e mercadorizando nossas Lutas e nossas dores reais e concretas.


A Capoeira, aquela manifestação Negra, Africana, Africano Brasileira, que se formou
ou se transformou em solo brasileiro na prática rebelde, violenta e estratégica do Negro;
Aquela que apaixona, pela corporeidade, pelo ritmo, pela história…
… Ela pode ainda ser uma arma poderosa, enquanto representada na Roda, pela Roda.

A Roda, que se formava e ainda se forma nas ruas, hoje nas escolas de capoeira. Que
tem um grande potencial de aglutinação, de organização de massas e de discussão dos
problemas que atingem a gente.
A Roda de Capoeira que, como foi antes, em tempos passados, pode hoje ser lugar de
politização, de ganho de consciência coletiva pra gente buscar sair da situação em que a gente
ta.
A Roda de Capoeira que, naquele momento, permitiu a gente se reunir, se
inconformar, se revoltar, faz a gente hoje poder sair momentaneamente do domínio das redes
sociais, da indústria cultural, e retornar pra um caminho de subversão e ação.

Mas, pra isso, é preciso que Mestres e Mestas de fato, atualizem seu saber, pois o
Negro historicamente não deixou de saber qual era a sua situação, pra buscar encontrar
saídas. Em todo o período de formação do país.
A historia de um Negro ignorante não encontra fundamento na história das Revoltas,
dos Levantes e das Revoluções que eses Negro produziu.
A Capoeira pode se reatualizar, a partir dos Capoeiras, sujeitos sociais e politizados de
hoje, a partir da consciência de onde a gente se encontra. Ganhar novamente seu papel social,
dentro das contradições que o capitalismo nos impõe.
Ou seja, mesmo que a gente precise ganhar dinheiro a partir da Capoeira, a gente não
pode perder de vista a continuidade da construção da Luta popular, que toque nos assuntos
históricos fundamentais pra nossa real autonomia e liberdade, que é a destruição completa
desse modelo de produção e reprodução da vida que se chama capitalismo. E assim, poder
retomar a busca de um modo de produção e reprodução da vida que seja de igualdade de
acesso às oportunidades pra todas as pessoas.
E essa é uma questão histórica, que precisa ser construída em conjunto, mas que
precisa ser discutida a partir da ideia da abolição de uma sociedade de classes e da
mercadorização de tudo e também da própria força de trabalho, da vida.

E essa é a maior homenagem que a gente poderia prestar ao Mestre Moa do Katende.
Homem Negro, militante, produtor da Cultura, orientador dos saberes tradicionais
Afro Brasileiros.
E foi por este saber que ele, politizado, bucando informar outro homem Negro, foi
assassinado!
O bolsonarismo e sua ignorância fez com que dois iguais pudessem impor violência
sobre o outro.

Moa do Katende não foi assassinado apenas pelo bolsonarismo. Mas pela ideologia
das classes sociais racistas e sexistas, que orientam esse pensamento.
Ideologia que forma uma classe política, que coloca na TV que o Agro é pop; que quis
fazer a gente acreditar durante uma pandemia, que a gente devia escolher entre viver,
podendo ser auxiliado pelo poder público eleito, ou ter que sair para trabalhar e morrer.
Afinal, os dados estatísticos mostram hoje que a grande massa de mortos pelo
COVID-19 foram motoristas do transporte público, caminhoneiros, trabalhadores da
construção civil e empregadas domésticas. E a gente pode imaginar quem racialmente
representa a maioria nesses cargos…

Honrar a vida do Mestre Moa do Katende, um militante da Capoeira Angola, da


cultura Negra no Brasil, é lutar contra o bolsonarismo, contra o pensamento burgues liberal
de direita, que faz o discurso do Estado mínimo pro povo, sem oferecer saúde pública,
educação, creche, moradia e transporte público de qualidade, mas que transfere bilhões para
banqueiros e acionistas da bolsa e da financeirização e dá benesses pros empresários,
enquanto diz que é “duro ser empresário no Brasil”.

Um discurso ideológico que mantém a gente despolitizado, com o discurso do


combate à corrupção, mas que não diz que, num modelo voltado à competição e ao acúmulo e
enriquecimento sem limites, a corrupção é parte da engrenagem.
Dar força à Luta que representava Mestre Moa do Katende é Lutar pra que se conheça
a historia do Negro, dos Capoeiras historicamente no Brasil. Que, mesmo de maneiras as
vezes contraditórias, não deixaram de Lutar pela sua libertação,
Assim como fizeram parte das Lutas a favor das classes trabalhadoras pobres no
Brasil, fosse no Quilombo dos Palmares, fosse nas Maltas do Rio de Janeiro.

Honrar a memória de Mestre Moa do Katendê é buscar uma Capoeira que retorne ao
seu papel social enquanto Luta rebelde concreta contra um modelo de vida que nos explora
pra poder continuar enriquecendo a poucos.
É reaprender, a partir da Luta dos nossos antepassados, que a Luta deles foi contra o
escravismo no Brasil, que estruturava o capitalismo nascente na Europa. O mesmo
capitalismo que precisou do racismo pra criar desigualdades pra poder explorar e escravizar
os Negros de um continente Africano inteiro.
Então, enquanto existir no mundo o racismo e o capitalismo, a Luta da Capoeira tá
mais viva do que nunca! E precisa ser feita!

Viva a Capoeira, Luta rebelde contra a exploração de nossos povos;


Viva Mestre Moa do Katende!
Abaixo o capitalismo e o racismo.

Volta do mundo!

Você também pode gostar