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I – ISBN 978-65-990226-0-9
Ano I
Volume I
Março de 2020
www.aprodab.org.br
ISBN 978-65-990226-0-9
Autores:
1. Apresentação ......................................................................................................... 6
SANTANA................................................................................................................8
SODRÉ ..................................................................................................................61
CAMARGO ..........................................................................................................165
11. - Marchando para o desmonte - THEMIS ALINE CALCAVECCHIA DOS SANTOS . 174
Apresentação
uma associação civil sem fins lucrativos e econômicos e sem finalidades corporativas,
sindicais, religiosas ou político-partidárias, com sede na cidade de São Paulo e que tem
de Direito do país e velar pela sua qualidade. Ademais, a APRODAB busca promover o
Terra.
Direito Ambiental que sonhamos desde Estocolmo/72 e, com maior intensidade, a partir
levar a sério o Direito Ambiental? Até que ponto sua aplicação transcende o plano
à análise de normas vigentes pura e simplesmente. Para este fim, já dispomos de farta
Monte -
Resumo
estabelece um panorama geral acerca da relação entre meio ambiente e direitos humanos, na
políticas que foram empregadas na atuação da CmIDH e suas manifestações sobre a questão.
Tradicional do Direito, o texto propõe, em atenção ao caso Belo Monte, necessários giros
Introdução
O presente texto tem por objetivo discutir a relação entre os direitos humanos, o meio
Humanos. Nesse espaço, o que se pretende é fazer uma reflexão sobre os caminhos que
poderão ser traçados para conservar a diversidade dos recursos naturais, bem como a
Para tanto, a partir da ideia segundo a qual a relação entre meio ambiente e direitos
humanos, tanto no plano da normatividade, quanto nos espaços institucionais supra Estatais,
atuação da CmIDH em casos emblemáticos de tutela direta de direitos civis e políticos, onde
a justiciabilidade das violações ambientais revelaram seu tratamento oblíquo, com ideia
central de que a tutela do meio ambiente, incluída no rol dos direitos econômicos, sociais,
culturais e ambientais deve atender ao critério correlacional com os direitos civis e políticos
da tutela oblíqua dos DESCA nos casos trazidos à colação, revelando sua consequente e
meio ambiente, propondo necessários giros epistemológicos e teóricos, com vistas a uma
Humanos no caso Belo Monte: norma internacional, diálogos políticos e relações de poder”,
o texto aborda, a partir das decisões da CmIDH sobre o caso Belo Monte, as inflexões
políticas sobre o debate acerca do meio ambiente, que sofre diretamente, no campo das
utilizado como genérico, provém do latim homo, que designa todo ser humano, sem
prerrogativas próprias ao ser humano, regidas por regras; deriva da expressão “direitos
(ARNAUD, p. 271-272).
Nesse sentido, a análise inicial do que os direitos humanos correspondem para o pensamento
de proteção, baseado no giro antropocêntrico que se observa como novidade histórica dos
universais, capazes de tutelar a vida humana diante dos desmandos estatais. De construção
burguesa, os direitos humanos são suportados pelo ideal de liberdade e igualdade. Portanto,
humanos e que visam a assegurar o seu respeito universal e efetivo” (ARNAUD, 1999, p.
271-272).
direitos do homem “são aqueles que estão consagrados nos textos internacionais e legais, o
que não impede que novos direitos sejam consagrados no futuro”. Considera, porém, que os
já existentes não podem ser retirados, vez que são necessários para que o homem realize
Direitos Humanos teve sua solução com a aprovação da Declaração Universal dos Direitos
jurídicos dos países em dimensões 1 (SARLET, 1998, p. 46) de direitos. Dessa forma, a
etc. São direitos que hão de materializar poderes de titularidade coletiva ou mesmo difusa.
1
A palavra que melhor expressa a trajetória desses direitos é “dimensão” e não “geração”, pois esta última, em
que pese a sua consagração, induz à ideia de substituição de alguns direitos por outros, quando, na realidade, o
que ocorre é justamente a sobreposição desses direitos, de modo que a nova dimensão agrega-se, de forma
indivisível, à já existente. SARLET, Ingo. A eficácia dos direitos fundamentais. Porto Alegre: Livraria do
Advogado, 1998. p. 46.
2
Declaração de Estocolmo sobre o ambiente humano, 1972. Biblioteca Virtual de Direitos Humanos,
Universidade de São Paulo – USP. Disponível em: < http://www.direitoshumanos.usp.br/index.php/meio-
ambiente/declaracao-de-estocolmo-sobre-o-ambiente-humano.html>. Acesso em 02 de junho de 2019.
(nós grifamos).
grifamos).
relações entre os seres humanos e destes com o mundo. Ainda de matriz idealista e
Uma das maiores contribuições da obra de Evguiéni Pachukanis (2017) para o Direito
direito. A configuração de subjetividade jurídica pelo Direito fez com que a relação de
sujeição entre o trabalhador e aquele que monopoliza os meios de produção se desse por
meio de figuras jurídicas, baseadas numa necessária ilusão social segundo a qual as relações
igualdade.
de que o Direito tem origem na norma jurídica (juspositivismo) pode esconder outras
síntese, busca-se analisar o objeto (direito) não apenas a partir do que ele é, mas do que ele
deve ser (ou poderia ser), considerando suas potencialidades e identificando os entraves,
Sob essa ótica, o debate sobre os direitos humanos, notadamente os direitos sociais,
que versam sobre o tema são protagonizados por tensões (obstáculos) políticas e
meio ambiente equilibrado não foge à regra, na medida em que, além de se colocar
Interamericana sobre Direitos Humanos, San José, Costa Rica, em 22 de novembro de 1969,
a plena efetividade dos direitos que decorrem das normas econômicas, sociais e sobre
educação, ciência e cultura” (trecho do artigo 26 do Pacto de San José da Costa Rica)3.
3
CONVENÇÃO AMERCANA DE DIREITOS HUMANOS. Disponível em:
<https://www.cidh.oas.org/basicos/portugues/c.convencao_americana.htm>. Acesso em 5 de junho de
2019.
referência expressa ao meio ambiente equilibrado como direito humano. Sobre o tema, o
povos americanos possam se desenvolver de forma livre e plena, dispondo de seus recursos
naturais e riquezas.
referência ao meio ambiente equilibrado como direito humano, em seu artigo 11:
questão, MOTTA (2009, p. 14) revela a difícil coexistência normativa e pragmática entre
ambiental:
4
PROTOCOLO ADICIONAL À CONCENÇÃO AMERICANA SOBRE DIREITOS HUMANOS EM
MATÉRIA DE DIREITTOS ECONÔMICOS, SOCIAIS E CULTURAIS, “PROTOCOLO DE SAN
SALVADOR”. Disponível em:
<http://www.cidh.org/Basicos/Portugues/e.Protocolo_de_San_Salvador.htm>. Acesso em 5 de junho de
2019.
justiciabilidade dos DESCA no âmbito do SIDH, inafastável no campo teórico, assim como
dos precedentes de tutela direta do meio ambiente naquele sistema. A conclusão, em termos
2009, p. 22). A análise dos precedentes (CIDH e CmIDH) reafirma suas conclusões.
administrativo (2006).
indígenas (2007).
empresa.
nas terras dos peticionários, sem a devida consulta aos membros e de maneira
Na ampla maioria dos casos citados, a questão ambiental, quando objeto de análise, é
apresentada em sua estreita relação com direitos civis e políticos. Assim, o tratamento direto
dos DESCA, incluída a tutela ambiental, se verifique de forma oblíqua a outros direitos
questões relativas à tutela direta dos DESCA no âmbito do SIDH. Nesse sentido, o
A luta pelo equilíbrio do meio ambiente deve considerar que seu postulado de
fundamental que se tome a consciência de que o ser humano compõe uma pequeníssima
fração do que o meio ambiente representa. Nesse passo, sobre o sistema jurídico de proteção
ao meio ambiente deve ser lançado um novo olhar, no sentido de que passa a ser papel do
uma luta humana, a proteção ambiental deverá, portanto, alcançar novos paradigmas
que deverá ser menos programática e mais potestativa, direcionada não apenas ao Estado,
relação simbiótica com os direitos civis e sociais. Nesse sentido, questiona-se, por exemplo,
leitura dos Direitos Humanos e da relação entre o cidadão, a sociedade política e o meio
ambiente.
desconectada com a realidade social dos seus pretensos titulares, afastada das relações
“universalidade dos direitos humanos” como algo fruto de um processo natural, espontâneo
e neutro. E é exatamente nesse sentido que essas categorias podem se colocar como eficazes
interesses de uma determinada categoria econômica e/ou social e, por outro, ignora as reais
dos Direitos Humanos, os quais acabam por distanciar o homem da sociedade política e o
gerações futuras. Isso depende do afastamento da nuvem de fumaça criada pelo modelo
reivindicativa dos direitos humanos surge invariavelmente pela ausência e pelas demandas
postergadas, essa ressignificação passa pelo exercício ativo da cidadania, com a participação
humanos, BELLO (2013, p. 17) propõe reencontros: (i) entre o homem e a política; (ii) entre
teoria e prática; (iii) entre norma jurídica e práxis social. Esses reencontros somente serão
possíveis quando houver o reconhecimento, pela sociedade civil, dos novos atores, espaços e
categoria abstrata “cidadania”, movendo-se, por outro lado, para uma efetiva interação
social, prática cidadã, reconhecida pela sociedade civil, realisticamente, e pelo Estado,
real pelo corpo coletivo, com a participação direta e efetiva nos movimentos sociais com
Nesse sentido, para a construção de uma ordem jurídica que se apresente como
ambientais devem ser criadas e aplicadas seguindo um movimento de baixo para cima, a
partir de sujeitos políticos coletivos. Trata-se, portanto, de abandonar a velha política que
implica para sua completa realização), possa ser vista como uma
emancipação humana, de cidadania ativa, mas como artifício para inviabilizar a efetiva
qualquer approache material, realisticamente posto, impondo a ilusão de que os espaços são
leis e as instituições da democracia formal permanecem como “aparências por trás das quais
9).
equilíbrio do meio ambiente, que o protagonismo dos movimentos sociais, num contexto
cidadania ativa e direta, mostra-se relevante para a construção de instrumentos jurídicos que
Portanto, a partir desse modelo de cidadania real, ativa, os princípios que são a base da
participação cidadã na esfera pública internacional sofrem releitura: (i) o cidadão deve lutar
pela conquista de direitos em matéria ambiental, construídos de baixo para cima, de forma a
seus problemas e satisfação de seus valores; (ii) a conquista dos espaços hegemônicos é
pressuposto para que a geração atual mantenha a qualidade do planeta, para que seja
transferida nas mesmas condições em que foi recebida, construindo uma legislação
Como a tentativa de se evitar a repetição das violações aos direitos humanos por
reconhecem que as instituições jurídicas e políticas, que regem a vida em sociedade, têm
felicidade”5.
5
Ministério Público Federal. Procuradoria Geral da República. Disponível em
<http://pfdc.pgr.mpf.mp.br/atuacao-e-conteudos-de-apoio/legislacao/direitos-
humanos/declar_dir_dev_homem.pdf>. Acesso em 28 de junho de 2019.
comissão, com sede em Washington, D.C., integrada por sete membros independentes que
humanos (SIDH)6.
A CIDH, que começa a vigorar no ano de 1978, também conhecida como Pacto de São
José da Costa Rica, disciplina os deveres dos Estados membros da organização, estrutura o
A CIDH foi ratificada, até janeiro de 2012, por 24 países: Argentina, Barbados, Brasil,
O procedimento para denúncia no SIDH pode ser provocado por qualquer pessoa,
petição indicando a violação de qualquer dos direitos e garantias tutelados pela Comissão
fatos, bem como as violações alegadas, as vítimas, com a indicação do Estado responsável
pela violação, além de indicar o esgotamento dos recursos dispensados na jurisdição interna.
objeto do presente estudo, acontece no complexo Hidrelétrico de Belo Monte, que envolve a
cerrado mato-grossense até a sua foz no rio Amazonas, o rio Xingu apresenta paisagens de
grande beleza cênica sem contar a grande diversidade de ambientes aquáticos inserido
curso do rio.
conservação, a bacia do Xingu sofre impactos severos causados pelo homem, especialmente
apareceria nesses espaços com previsão de construção de cinco hidrelétricas naquela bacia
hidrográfica, cujo projeto de engenharia relançado em 2002, denominado Belo Monte, agora
7
Petição para CIDH: entenda o caso. Disponível em: < http://www.xinguvivo.org.br/2011/06/16/peticao-para-
cidh-entenda-o-caso/>. Acesso em 02 de junto de 2019.
foi marcado pela falta de transparência e participação da sociedade civil, associada a graves
ações, dentre elas treze ações civis públicas pelo Ministério Público Federal (MPF) do Pará
reformadas pelo Tribunal Regional Federal -TRF1, sempre com argumentos voltados à
proteção da política econômica setorial, o mérito das ações não chegava a ser considerado.
efeitos da licença prévia, sustentando que a vida e integridade pessoal dos beneficiários
Nacional de oitivas com as comunidades indígenas que seriam atingidas pelo projeto,
conforme determinado pelo artigo 231 da Constituição Federal, como parte de um processo
sobre os Direitos Indígenas, das quais o Brasil é signatário; as audiências públicas realizadas
população mais ameaçada pelo empreendimento não teve oportunidade de participar. Nessas
distorcido da realidade e sem adequada divulgação prévia, e sob um forte aparato policial
repressivo; a concessão política da Licença Prévia para Belo Monte em fevereiro de 2010,
sob forte pressão do governo, contrariando pareceres das equipes técnicas do IBAMA e da
material de execução até que sejam observadas as seguintes condições mínimas. Determinou
Brasil, no sentido de que a consulta seja prévia, livre, informativa, de boa-fé, culturalmente
adequada, e com o objetivo de chegar a um acordo, em relação a cada uma das comunidades
realização dos citados processos de consulta, para que a consulta seja informativa, que as
respectivos, e , por fim . adotar medidas para proteger a vida e a integridade pessoal dos
membros dos povos indígenas em isolamento voluntário da bacia do Xingu, e para prevenir
Monte, tanto daquelas doenças derivadas do aumento populacional massivo na zona, como
8
Medidas Cautelares outorgadas pela CIDH no ano de 2011. Disponível em: <
https://www.cidh.oas.org/medidas/2011.port.htm>. Acesso em 02 de junho de 2019.
povos indígenas isolados, dizendo ser uma das mais vigorosas e eficazes do mundo. No
indígena implementada para esses povos (nós grifamos) pela recém-criada Secretaria de
Saúde Indígena (SESAI) do Ministério da Saúde, que atua em conjunto com a Fundação
do Xingu.
comunidades indígenas, realizadas nas próprias aldeias, com versão simultânea às línguas
No dia 29 de Julho de 2011, a CmIDH, durante o 142º período das sessões, fez nova
avaliação da MC 382/10 10 com base nas informações enviadas pelo Estado e pelos
medidas para proteger a vida, a saúde e integridade pessoal dos membros das comunidades
9
Resposta do Governo Brasileiro. Disponível em: <
https://documentacao.socioambiental.org/noticias/anexo_noticia//19927_20110517_104210.pdf>. Acesso em
02 de junho de 2019.
10
Medidas Cautelares outorgadas pela CIDH no ano de 2011. Disponível em: <
https://www.cidh.oas.org/medidas/2011.port.htm>. Acesso em 02 de junho de 2019.
Dentre outras medidas, o Estado Brasileiro, deveria adotar medidas para proteger a
dos planos e programas requeridos pela FUNAI, durante a fase de licenciamento, além de
garantir a rápida finalização dos processos de regularização das terras ancestrais ante
Nesse sentido, fica indene de dúvidas a flagrante violação do art. 225, CRFB/88, §1º,
inciso IV – onde o poder público deverá exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou
prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade; o art. . 231, §3º, CRFB/88 – onde
pesquisa e a lavra das riquezas minerais em terras indígenas só podem ser efetivados com
assegurada participação nos resultados da lavra, na forma da lei; o Art.170, VI, CRFB888 –
tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social,
Convenção 169 da OIT no seu art. 6º onde informa nesse processo o dever de consultar os
os povos interessados possam participar livremente, pelo menos na mesma medida que
aplica aos povos tribais, desse modo é patente a necessidade de consulta às populações
ribeirinhas (nós grifamos), uma vez que constituem o povo tradicional e serão afetadas pela
obra da usina.
Como indica Pádua FERNANDES (2014, p. 58), em análise das investidas contra o
contra o SIDH, contra os povos indígenas e a questão ambiental, afirmando que esses temas
não deveriam ser protegidos (VENTURA, et. al., 2013, p.43, apud FERNANDES, 2014, p.
59):
“Como vai revisar eu não posso dizer, porque não estou autorizado.
ainda que não tenha força obrigatória, os temas de que falava eram
temas ambientais e dos povos nativos abre um espaço que deve ser
tratado com muito cuidado (grifos nossos). Não creio que nenhum
povos nativos. Acho que o pior que se pode fazer neste caso é
governos para dar assessoria, opiniões, mas não tratar como um tema
semi judicial.
decidiu retirar seu embaixador da OEA (nós grifamos); deixou de pagar a sua quota por
Guilherme de Aguiar Patriota, irmão do então Ministro das Relações Exteriores, Antônio
Patriota, não época declarou no artigo “Dois pesos e duas medidas” (Folha de São Paulo,
2012):
às grandes empreiteiras, acha que construção de hidrelétricas nada tem a ver com direitos
humanos e, por isso, a legislação concernente não serviria para o caso. Imagino, piamente,
duas explicações para a tese brutal: ou ele acha que não há pessoas na região de Belo Monte
indígenas no Brasil), ou ele crê que os índios não são humanos. Nos dois casos, o horizonte
A partir da análise das colocações desses atores sobre o caso Belo Monte, bem como
dos precedentes da CmIDH, pôde-se observar: a) tensão entre direitos humanos e meio
o meio ambiente, tratam essas questões, de uma forma geral, pela via oblíqua, ou seja, de
forma adjacente aos direitos humanos individuais; c) a política e a economia como fios
mero fetiche.
Conclusão
permeado por obstáculos políticos e econômicos, indicando que evolução normativa, fruto
internacional deve ser encarada como obstáculo compreensível e compreendido, para que se
possa analisar, sob este peculiar ponto de vista, a problemática da ineficácia do SIDH no que
coloca o debate sobre o futuro dos recursos naturais sob monopólio do Estado, num processo
Referências
Paulo, 2009.
https://www.marxists.org/portugues/coutinho/1979/mes/democracia.htm>, acesso em 14 de
abril de 2018.
Medidas Cautelares outorgadas pela CIDH no ano de 2011. Disponível em: <
<http://domhelder.edu.br/revista/index.php/veredas/article/viewFile/15/130>. Acesso em 02
de junho de 2019.
http://www.xinguvivo.org.br/2011/06/16/peticao-para-cidh-entenda-o-caso/>. Acesso em 02
de junto de 2019.
https://documentacao.socioambiental.org/noticias/anexo_noticia//19927_20110517_104210.
<https://www.conpedi.org.br/publicacoes/0ds65m46/60572696/9jlA2mrMeRM8beWl.pdf>.
file:///C:/Users/Eraldo/Downloads/Concepcao_multicultural_direitos_humanos_RCCS48.P
Advogado, 1998.
GUILHERME PURVIN
do solo
Passeando por bairros de classe média alta, por vezes nos deparamos com
popular. Ruas são rasgadas e asfaltadas sobre um solo que supostamente deveria ser
protegido pelo poder público de qualquer forma de impermeabilização, para não perder
superior a 45 graus ou com solo instável e sujeito a desmoronamento diante dos olhares
indiferentes dos órgãos municipais de fiscalização do uso do solo, sem que seja
rios previamente retificados, construídas onde deveria haver matas ciliares. No verão,
gigantescos ficam ilhados ou são cobertos pelas águas das cheias desses rios.
Para fugir do neurótico ambiente urbano, famílias de classe média alta investem
paisagísticos do local, sem jamais imaginarem que em breve aquele sonho de consumo
campo. E então alguém descobre que o condomínio ecológico foi construído sobre
antigo aterro de lixo tóxico ou que, não muito distante dali, mas de forma pouco visível,
Estes são apenas alguns dentre incontáveis exemplos que poderíamos oferecer a
respeito do desrespeito à regra constante do art. 225, § 1º, inc. III, da Constituição
b) A Lei n. 6.766/79 que, em seu art. 3º, parágrafo único, proíbe o parcelamento
providências para assegurar o escoamento das águas; Il - em terrenos que tenham sido
aterrados com material nocivo à saúde pública, sem que sejam previamente saneados;
III - em terrenos com declividade igual ou superior a 30% (trinta por cento), salvo se
sua correção.
ajuizamento de ação judicial destinada à demolição de: a) prédio em ruína (art. 1.280 do
CC); b) construção prejudicial a imóvel vizinho, às suas servidões ou aos fins a que é
destinado (art. 934, I, do CPC); c) obra executada por um dos condôminos que importe
prejuízo ou alteração de coisa comum por (art. 934, II, do CPC); d) construção em
2. Discricionariedade
pela legislação ambiental e urbanística para atender aos interesses dos financiadores das
construção de prédios numa região e, numa de suas disposições finais, previsse a remota
completamente a regra geral. Para tanto, bastaria ao governante de plantão declarar esse
discricionariedade administrativa.
das funções que lhe são constitucional e legalmente atribuídas. O cumprimento destas
funções poderá estar inteiramente delineado pelo sistema jurídico e, nesta hipótese, não
vinculada às regras fixadas em lei e só disporá de uma única forma para cumprir as
Ambiental lida uma imensa gama de aspectos que exigem diálogo entre as mais diversas
Engenharia Química, Medicina, etc. Seria desastroso, por exemplo, nos valer apenas da
propriedade inseticida. Por isso, é inevitável que seja dada à Administração Ambiental
contornos precisos para o exercício do poder discricionário no que diz respeito a três
atendida sua finalidade. O Superior Tribunal de Justiça tratou de forma bastante incisiva
sobre o tema no AgRg no Agravo em Recurso Especial no. 476.067-SP, relatado pelo
restou bastante clara no julgamento do Recurso Especial 127.607/PR (Rel. Min. Mauro
anteriormente mencionado:
pode ser considerado o melhor para o meio ambiente não seja algo assim tão fácil de ser
feito, a ponto de se chegar à conclusão de que seria a “única escolha”. No entanto, não
há como negar que a mudança de orientação de nossos tribunais é bastante salutar e vem
colocar um basta no cheque em branco que o Poder Legislativo muitas vezes acaba por
Por conta dos abusos cometidos em nome do poder discricionário que, na prática,
Súmula 613, com o seguinte teor: “Não se admite a aplicação da teoria do fato
Exmo. Sr. Min. Luiz Fux, 1ª Turma, já havia adotado este entendimento:
“A teoria do fato consumado não pode ser invocada para conceder direito
11
A respeito das alterações na Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, em especial no que diz
respeito à sua repercussão no Direito Ambiental, escrevi para o Jornal ((o eco)) artigo intitulado “Temer
consegue retirar os ‘entraves ambientais’ apontados por Lula”. O artigo foi publicado em 14.05.2018 e
seu acesso pode ser feito pelo link https://www.oeco.org.br/colunas/guilherme-jose-purvin-de-
figueiredo/temer-consegue-retirar-os-entraves-ambientais-apontados-por-lula/.
Com base no art. 14, § 1º, da Lei 6.938/81, a Administração Pública pode revogar
“A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os
tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de
que diz respeito à efetiva ilegalidade do ato administrativo quanto no que concerne ao
legais (por exemplo, se o uso tinha por fim apenas o lazer) e prejudica o equilíbrio
etc. Nesse sentido, uma autorização expressa do órgão competente bastaria para conferir
passariam a ser, mais do que toleradas, protegidas judicialmente pela simples existência
a ninguém, mas às gerações presentes e futuras. Mais do que mera retórica, esta
afirmação está amparada pela Declaração do Rio de Janeiro (1992) e pelo caput do art.
Dos atos administrativos nulos não podem advir efeitos válidos e consolidação de
territorial;
De acordo com a orientação agora sumulada do STJ, esse círculo vicioso, no qual
o servidor público detém o poder majestático de decidir se a lei é ou não aplicável para
servidor, nos termos do tão esquecido art. 37, § 6º, da Constituição Federal: As pessoas
responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros,
apartamento num edifício, cuja regularidade para o erguimento já era questionada desde
a época de seu lançamento, prevaleça sobre o interesse de todo o país na proteção de seu
Por outro lado, em que pese o teor da Súmula 613 do STJ, em certas hipóteses o
de valor histórico localizado na Avenida Paulista (por sinal, em topo de morro) cujos
esfera penal, não haveria alternativa à exigência de indenização pelo dano causado.
com maior cautela. É aqui, porém, que reside o perigo maior de flexibilização da
(Cf. nosso “Curso de Direito Ambiental” : São Paulo : RT, 6ª Edição, esp. o cap.21,
sobre meio ambiente urbano, item 8.3 - “APPs em áreas urbanas consolidadas”).
de morros com inclinação igual ou superior a 45º. Na cidade de São Paulo as avenidas
urbana existente nessas áreas. Não é necessário invocar a regra do direito adquirido para
solucionar tais hipóteses, mesmo porque não existe direito adquirido de degradar o meio
ambiente.
reversão ao status original de APPs quando isso exigir a realização de obras de tal porte
antrópica no ambiente.
Referido recurso especial havia sido interposto pela União Federal contra acórdão
proferido em sede de apelação pelo Tribunal Regional Federal da 5.ª Região que
frequentemente enchentes.
longo do Riacho do Ipiranga, na cidade de São Paulo. Uma região que deveria de ser
ciliares, que deveriam constituir as “margens plácidas” do Ipiranga a que se refere nosso
Hino Nacional, são hoje caixas de concreto. As águas cristalinas que brotam do Parque
Estadual Fontes do Ipiranga não chegam a correr um quilômetro sem serem poluídas,
canalizadas sob uma avenida e, a partir daí, passam a receber os efluentes de incontáveis
esgotos da cidade.
art. 225, caput, mas também a do art. 37, caput, ambos da Constituição da República.
ambiente, causada por qualquer forma de matéria ou energia resultante das atividades
de obras altamente impactantes visando uma duvidosa recuperação da biota (inc. III) ou
6. Conclusão
“Peguemo todas as nossas coisas / E fumo pro meio da rua apreciar a demolição
Que tristeza que nóis sentia / Cada táuba que caía doía no coração”
ocupados pela população de baixa renda, para atender aos interesses do mercado
para determinadas classes, com a manutenção das casas em área valorizada da Cidade e
Totti Guimarães e Paula Máximo de Barros Pinto em seu excelente artigo “Racismo
A Súmula 613 do STJ pode constituir um marco decisivo para que Executivo e
grana que ergue e destrói coisas belas” (Caetano Veloso, "Sampa"), negando o direito
- A impotência do discurso -
o que ajuda a explicar o retrocesso da tutela ambiental, desde que a cabeça coroada não
Elaborou uma das mais belas normas constitucionais, o artigo 225 da Carta
Cidadã, corajosa ao contemplar o direito das futuras gerações. Não se cuida de mera
Todavia, lástima das lástimas, a partir daí, tudo começou a regredir. Em nome de
“culturais” e que o preço da carne tem como causa o excesso de proteção na região
amazônica.
uma das causas das emissões dos gases do efeito-estufa, no Brasil a questão é
nacional” está em jogo. Seriam interesses mesquinhos os das Nações que evidenciam
sua indignação para o recado que os dendroclastas captaram bem: destruam, porque o
de seu responsável. Faz lembrar o episódio farsesco de se retirar o sofá da sala, para
evidente desconhecimento de que a área não é propícia a tal cultivo. Por sinal que a
d’água” que desaparecerá, no momento em que não existirem mais suas árvores.
generoso e pela umidade produzida pela floresta. Sem a cobertura da vegetação, haverá
prolífica e ambiciosa. Tonelagem de leis, todas elas comentadas pela doutrina e, não
em que esteja no foco uma questão ambiental não pode se subordinar ao esquema
vítima, a comunidade difusa de lesados. Está em jogo o futuro da vida no planeta. Não é
a Terra que pagará por nossos crimes: ela continuará a existir. Mas prescindirá da
Quando a maior parte dos prejuízos ecológicos é de dificílima aferição. Quanto custa o
Ou a redução drástica da qualidade de vida afetada pelo delito ambiental? Até mesmo a
inexistentes.
natureza como bem intangível, de valia extrema, essencial à sadia qualidade de vida.
implementação, evidenciou que a natureza não tem por si o aparato da lei, da doutrina e
que os melhores talentos sejam recrutados para a defesa de causas indefensáveis. À luz
do direito, não haveria como deixar de reconhecer a prática de ato nocivo contra esse
bem difuso que é o ambiente hígido. Mas prevalece a retórica, bem amparada pelo
natureza?
defender os incendiários, sob argumento de que “as fagulhas emitidas durante a queima
mecanização custa menos do que o método tradicional. Com auxílio dos fiscais do
trabalho, que passaram a exigir tratamento condigno aos antigos “boias frias”, o que
vítima é um ser humano, aí sim, existe uma indignação. Quando a vítima é a natureza,
não há comoção.
alguém esteja adequadamente situado nesta frágil e efêmera passagem pela Terra, é
consigo mesmo: nunca foi tão atual o comando socrático: conhece-te a ti mesmo. Há
pessoas que chegam à velhice e não sabem exatamente quem, na verdade, são. Ou
costumam ser, porque a vida é um cenário teatral. Às vezes comédia, outras vezes
ira, o ódio. Ainda que nem sempre ecloda a violência física, há uma sensação de
cadeia vital que não admite ruptura. Quando não nos consideramos parte dela, o
Continuamos surdos aos seus clamores. Cegos à catástrofe que está sob nossos olhos.
Quem não respeita a natureza também não parece ter resolvido a sua relação
com a transcendência. Algo precisa existir para conter a inquietação da mente lúcida
que não cessa de indagar: por que nasci? O que estou fazendo aqui? Para onde irei
depois? Existe uma outra esfera, ou tudo terminará com o meu último suspiro?
queira enxergar.
concretização.
“No exato momento em que fisicamente agimos pela primeira vez sobre a Terra
Resumo: Este artigo tem como tema as ideias centrais expostas pelo
filósofo francês Michel Serres em seu livro O Contrato Natural. Serres parte da
ideia de que até hoje a humanidade, que está à beira de uma catástrofe
subjetivos da Natureza.
12
Este artigo é uma pequena homenagem a Michel Serres, filósofo francês, que, tendo nascido em
1930, faleceu em 2019 após produzir quase uma centena de livros. Nesta homenagem, vou me referir,
quase que unicamente, ao livro escrito em 1990 que mudou a minha forma de ver o direito em sua nova
amplitude, quando de sua leitura 25 anos atrás: O Contrato Natural.
Ser otimista neste mundo atual é possível? Michel Serres nos conta (1999, p. 08)
que dos seus nove anos até os dezessete anos – tempo de formação do corpo e da
sensibilidade – passou pela guerra da Espanha, pela derrota para os alemães nazistas,
acertos de contas após a Liberação e pela bomba de Hiroshima. Depois dos 18 anos, a
Guerra na Argélia e outros conflitos na África. Foram tempos de fome, mortes torturas e
bombardeios. Como Serres pode ser otimista neste mundo depois da dura passagem da
De todos estes eventos, talvez o mais marcante para sua vida intelectual tenha sido
Hiroshima. Nas suas palavras: “Hiroshima constitui o único objeto de minha filosofia”
(1999, p. 25). Em 1945, um grande mito da modernidade se foi: o mito das ciências
13
duras como um progresso constante a serviço da humanidade. Desta dor e
relacionava ciência e violência, era necessário abandonar este barco 14. Não foram os
próprios cientistas que, no projeto Manhattan, construíram a bomba atômica? Como isto
foi possível? Era preciso buscar um novo conhecimento e aí nasceu seu interesse pela
com uma outra surpresa: a filosofia pouco tratava do tema da violência também. Diante
processo que integre as ciências exatas e as humanidades. Sua filosofia toda é uma
13
Ciências exatas.
14
Serres faz frequentes alusões ao mundo náutico. Possivelmente por conta de sua passagem pela
marinha francesa.
exatas sem a cultura das humanidades, e, da mesma forma, nenhum benefício existiria
material. Poderíamos formular a seguinte afirmação (não dita por Serres): um físico,
sem conhecimento das questões da ética, continuaria a fazer a bomba nuclear enquanto
um humanista, sem conhecer a extensão dos efeitos de uma bomba nuclear, não teria
conhecimentos das ciências exatas e das humanidades (em especial a filosofia) que uma
nova Hiroshima poderia ser evitada, prevenindo-se a civilização desta violência global.
Mas o que toda esta história pessoal tem a ver com o surgimento do livro O
Contrato Natural? A relação é direta: se Michel Serres tem como tema central de sua
maiores – senão a maior – violência dos tempos atuais? A resposta ofertada por Serres
balanço dos prejuízos infligidos ao mundo equivale ao dos destroços que atrás de si
deixaria uma guerra mundial” (1994, p. 56). E quando ele escreve esta frase, o mundo
ainda vivia as repercussões da guerra fria entre Estados Unidos e União Soviética, com
a louca eloquência mútua de quantas vezes cada um poderia destruir o planeta com suas
bombas. Aliás, destruir o mundo uma única vez já bastaria. Vivíamos a irracionalidade
Para tanto, o entorno deveria ganhar um nome e um direito: o nome é Terra, e todos os
Direitos subjetivos das coisas e dos animais? Coisas e animais na posição de portadores
de direitos e não meros objetos? Caminhemos de mãos dadas com Serres no percurso
O livro O Contrato Natural tem quatro capítulos, sendo que um deles tem por
nome Contrato Natural. Vamos nos fixar neste capítulo específico, mas utilizaremos,
abertura do livro, no capítulo Guerra e Paz. Com uma escrita bastante diferente (mas
típica das obras de Serres), o autor inicia o livro com a descrição de um quadro de
Goya, Duelo de garrotazo15, pintada entre os anos de 1820/1823. O que vemos neste
quadro? Dois homens, um deles já ensanguentado, lutando com varapaus nas mãos.
Onde estão eles? Em um campo aberto com montanhas na parte de trás. Apesar das
cores sombrias, o lugar ainda mantém um certo ar de beleza. Onde pisam os duelistas?
pergunta: quem vai morrer? Quem vai ganhar? As apostas estão em aberto. O homem
quem está ganhando a batalha? Cada um pensa que será o vencedor. Será mesmo? Mas
o que a plateia vê? O quadro estimula apostas: quem vai sobreviver? Serres propõe um
olhar mais amplo, um olhar dele (nosso) sobre o todo: contendores, natureza e plateia.
Percebe-se primeiramente que a natureza ocupa quase toda a tela da pintura. E fixando
um pouco mais a atenção no quadro é possível enxergar que, a cada paulada, os homens
afundam mais no pântano. A pergunta precisa ser refeita: quem vai ganhar? Ninguém.
Nem os homens, nem a plateia e nem quem olha externamente. Quem vai ganhar? A
15
Duelo com vapaus.
da própria sociedade? Não mais. A violência do estado de guerra não é mais individual,
é global. O ato inaugural, papel escrito que nunca ninguém viu, está em risco. Serres vê
este perigo global ao constatar o que falam dos direitos da natureza os revolucionários
Humanos de 1948. Ausência. Silêncio. Nada. Como diz Serres, o mundo despareceu no
contrato social. Possivelmente o mundo nunca tenha existido neste contrato. Tudo gira
em torno do homem. “O contrato social ... fechava-se sobre si mesmo, deixando de fora
projeto da razão, e sua ciência, para o domínio do universo com Descartes, precisa ser
estancado e uma mudança de rota é quase tardia. É preciso buscar, antes que a
possibilidade se extinga, a paz nesta guerra suja entre razão e natureza, entre
O PARASITA. É a partir deste conceito da biologia que Serres nos mostra o que
vivos, muitas vezes, sugam seus hospedeiros até a morte: “L’un prend tout et ne rend
rien pendant que l’autre donne tout et ne reçoit rien” (1980, p. 09). Parasitismo. A
relação dos homens com os outros seres vivos e com as coisas do planeta é desta
espécie. O parasita é sempre um abusador. A troca não tem sentido. É uma flecha de
mão única. Mas o parasitismo tem limites fáticos. Leva à finitude do hospedeiro e pode
levar a sua própria finitude. Não estamos mais tratando apenas da poluição das fábricas,
todo, que nos cerca. Serre se utiliza de uma figura de linguagem marítima: como os
marinheiros de um barco em alto mar não têm como escapar do destino coletivo, os
habitantes da Terra não têm como se esconder da tragédia que se apresenta. O que a
humanidade não percebeu é que a Terra é muito anterior aos homens que a habitam e
pode muito bem continuar sem eles. O oposto não é verdade: os homens não podem
viver sem a Terra (1994, p. 58). E a conclusão é quase óbvia: quem deveria ocupar o
equilíbrios: equilíbrio do mundo físico na sua dinâmica interna e o equilíbrio dos pactos
sociais. Ocorre que, com a bomba de Hiroshima, ficou claro que não bastava mais estes
outro. Existem apenas dois caminhos: “ou a morte ou a simbiose” (1994, p. 59).
Quando a sociedade era composta por agricultores e marinheiros, todos sabiam dos
riscos do tempo, de respeitá-lo, de escutá-lo. De amoldar as ações por este fator externo.
Fora da minha razão. Era uma questão de sobrevivência. Quando a humanidade foi para
dentro das casas nas cidades, para o artificial, perdeu o mundo. Transformou-se o
“Resta-nos pensar num novo equilíbrio, delicado, entre esses dois conjuntos de
outro.
Para firmar um Contrato Natural é preciso que haja pelo menos dois sujeitos e
uma linguagem comum. Três dificuldades: (i) diante da catástrofe que se apresenta, toda
a humanidade deve ser contratante e não as pessoas individualmente; (ii) não somente
os filhos de Descartes devem estar nos lados do contrato; e (iii) em que linguagem o
pacto será firmado. Serres lembra que nunca ninguém leu o contrato social ou nem
mesmo uma cópia. A língua que serviu de substrato ao contrato social não era escrita,
era a linguagem de uma ética comum. Em Hobbes todos se comprometem pelo bem de
Em Serres, a Terra fala por meio de sua força, de suas ligações e interligações. É
possível escutá-la. É necessário sentir a força da sua linguagem. É impossível não ter
noção da potência de seus atos. Para Serres, a inclusão da natureza no polo ativo do
direito não é mais uma mera opção humana, é um fato: “O que é a natureza? Em
aquecimento e comida; além disto, ela priva-a disso, logo que abuse. Condiciona a
reconheçamos ou não. Reconhecer tal fato, abre uma senda; ignorá-lo, abre abismos,
descompassos... . A Natureza não tem como reivindicar direitos. O que ela pode fazer, e
dificuldades (ii) e (iii) podem ser solucionadas para a assinatura de um Contrato Social.
subjetivos? Estará disposta a ter uma relação simbiótica comensualista e não uma
que o grande perdedor do não reconhecimento é aquele que deixou a inércia tomar uma
contrato exige um novo homem político, um homem que não separe mais corpo e alma.
Alguns requisitos são necessários para garantir a assinatura deste novo contrato. O
mais fácil de compreender, e por isso mesmo mais difícil de realizar, é pensar a longo
perderam esta faculdade. São homens de curto prazo. Não são como os antigos
agricultores e navegadores que precisavam pensar a longo prazo. Devemos tomar como
ponto de referência o que ocorre dentro de um navio. Todos estão juntos e é impossível
efeito do afogamento. Nosso mundo deve ser pensado como este navio onde não existe
refúgio. Não temos outro planeta para se proteger caso o fim deste aconteça. Não
podemos erguer uma tenda em uma praia deserta. A unidade da ameaça exige a unidade
16
Para Serres, somente um contrato coletivo pode reverter o curso dos acontecimentos.
navio que vai ao leme? Olhar o horizonte. A maior das lições: se o piloto basear suas
ações unicamente no contrato social que rege a vida de seu navio, a morte rondará a
levam em conta a si mesmos. O direito tradicional comete este erro. Só leva em conta o
capitão – deve unir as humanidades com a física. O direito precisa olhar a física e ser
olhado. “A partir de agora, o governante deve sair das ciências humanas, das ruas e
dos muros da cidade, tornar-se físico, emergir do contrato social, inventar um novo
natural.
(de linha não cartesiana, por óbvio) pode ser o longo caminho a percorrer. O piloto e os
marinheiros estão no mesmo barco. Seus destinos estão unidos. Assim estão também
governantes e governados. Não existe rota de fuga individual. E tanto o piloto como o
de que vive e trabalha no mesmo mundo global de todas as outras” (1994, p. 76). É
mais do que um contrato meramente científico ou social, na exata medida que o mundo
deve ser considerado em sua totalidade (1994, p. 77). É um contrato que tem como
substrato uma simbiose entre Terra e humanidade. O contrato físico não consegue isto e,
Social: amar o próximo como a si mesmo. Este amor reduzido ao nosso entorno íntimo
leva às seitas, ao gangsterismo e ao racismo. É preciso uma segunda lei, aquela que
“exige que amemos o mundo” (1994, p. 81). Aquela que nos diz: “ama o elo que une a
terra à Terra e faz com que se aproximem o próximo e o estranho” (1994, 82). Estes
dois mandamentos devem andar de mãos dadas, sob pena de implantação do ódio, da
destruição. Mais ainda: é preciso que estes dois mandamentos sejam amalgamados em
apenas um: “amar os nossos dois pais, natural e humano, a terra e o próximo; amar a
humanidade, a nossa mãe humana e a nossa mãe natural, a Terra” (1994, p. 81). E a
dilúvio que se anuncia, em outra obra, enunciar três mandamentos universais17 (1999, p.
262):
II. Não te entregaras à violência, não mais contra somente o que jaz ou vive
17
Aos moldes Kantianos.
cultural. Contrato Social, Contrato Natural e ética intelectual devem andar de mãos
dadas.
Michel Serres vai fazer muita falta no mundo que se anuncia. Por isto mesmo, não
REFERÊNCIAS
Serres, Michel – Luzes: cinco entrevistas com Bruno Latour, Editora Unimarco, São
Paulo, 1999.
Positivas -
O direito ambiental revela-se como um dos ramos mais promissores do direito para
Summary: the demands of contemporary society requires the right besides its
Environmental law is revealed as one of the most promising areas of law for the
funcionalista.
A partir da segunda metade do século XX, o direito passou a ter uma função
estímulos positivos. Isso se deu em função dos novos temas com os quais o direito
estrutural18.
sobrepostas: o direito protegeria os atos lícitos (que podem ser tanto atos permitidos
do Estado, própria das várias correntes do liberalismo clássico, cujo aspecto essencial
18
LAFER, C. apresentação à edição brasileira. In: Da estrutura à função, novos estudos de teoria do
direito, Barueri/SP: Manole, 2007, p. LI.
19
BOBBIO, N. A função promocional do direito, in Da estrutura à função, novos estudos de teoria do
direito, Barueri/SP: Manole, 2007, p. 2.
20
Idem, p. 4.
21
BOBBIO, N. Em direção a uma teoria funcionalista do direito, in Da estrutura à função, novos estudos
de teoria do direito, Barueri/SP: Manole, 2007, p. 64.
22
BOBBIO, N., Estrutura e função na teoria do direito de Kelsen, in Da estrutura à função, novos
estudos de teoria do direito, Barueri/SP: Manole, 2007, p. 208.
medidas de controle social têm como objetivo exercer poder sobre os comportamentos,
O Estado social, por sua vez, em oposição ao Estado liberal, já não se limita a
exercitar o controle social, pois intervêm cada vez mais na gestão da sociedade e, em
repressiva para um direito cada vez mais promocional 25, que se utiliza de incentivos
23
As primeiras obras de direito de Bobbio são dominadas pela abordagem estrutural do direito. A sanção
é considerada pelo seu lado negativo, como uma reação institucionalizada a uma inobservância da norma.
São, portanto, sanções externas e institucionalizadas, dotadas de maior grau de eficácia. Aqui a coação
faz-se presente enquanto meio de constranger, pela força, o recalcitrante. A norma moral, por outro lado,
é de natureza puramente interior. Sua inobservância acarreta como punição ao infrator, o sentimento de
culpa, de arrependimento. Logo, a ação moral é observada apenas em função de uma satisfação íntima.
Porém, o defeito das sanções morais é o de serem muito pouco eficazes, e por isso, são reforçadas muitas
vezes por sanções religiosas que, por vezes, atrelam conseqüências externas às conseqüências internas,
como no caso da excomunhão. (BOBBIO, N. Teoria da Norma Jurídica. 2ª ed. Bauru/SP: Edipro, 2003.
p. 154.). Segundo Tércio Sampaio Ferraz Jr., a distinção tradicional entre moral e direito com base no
critério da conduta externa (direito) e interna (moral) é “vaga e ambígua, uma vez que não se pode negar
que motivos e intenções são relevantes para o direito”. O direito penal, por exemplo, procura qualificar o
comportamento criminoso conforme a intenção dolosa do agente. Os preceitos morais, por sua vez, não
são indiferentes à exterioridade da conduta, até mesmo quando a intenção é considerada boa: “de boas
intenções, o inferno está cheio”. Na questão da moral, há diferença entre escusa e justificação, pois se a
boa intenção pode ser uma escusa, mentir ao paciente sobre sua morte próxima para evitar-lhe um
sofrimento maior pode ser uma justificação. FERRAZ JR, T.S. Introdução ao estudo do direito: técnica,
decisão, dominação. 6ª ed. São Paulo: Atlas, 2008, p. 332.
24
LOSANO, M. Prefácio à edição brasileira, In Bobbio, N. Da estrutura à função, novos estudos de
teoria do direito, 2007, Barueri/SP: Manole, 2007, p. XLII.
25
BOBBIO, N. O futuro da democracia. Tradução de Marco Aurélio Nogueira, 8ª ed. São Paulo: Paz e
Terra, 2002, p. 126.
Ressalte-se que não se deve confundir a diferença entre normas positivas e normas
pode-se tanto desencorajar a fazer quanto encorajar a não fazer. Podem ocorrer
às honrarias, como títulos e medalhas, que não possuem o condão de promover condutas
26
BOBBIO, N. A função promocional do direito, in Da estrutura à função, novos estudos de teoria do
direito, Barueri/SP: Manole, 2007, p. 6.
27
Idem.
Bobbio, que a define como: “a ação que o direito desenvolve pelo instrumento das
Bobbio propõe, além disso, uma mudança de foco na teoria do direito, que deveria
direito – para uma análise funcional, mais apta à compreensão da função promocional.
Na obra de Kelsen, a nítida separação entre a análise funcional e a análise estrutural era
sendo um problema político, e não um problema jurídico. Isso não significa que na obra
de Kelsen não existam enunciados sobre a função do direito. De acordo com Bobbio, o
28
BOBBIO, N. Em direção a uma teoria funcionalista do direito, in Da estrutura à função, novos estudos
de teoria do direito, Barueri/SP: Manole, 2007, p. 66.
29
BOBBIO, N. Prefácio In Bobbio, N. Da estrutura à função, novos estudos de teoria do direito,
Barueri/SP: Manole, 2007, p. XII.
30
Kelsen não incide no erro de Stamler, pois menciona somente que o ordenamento tem estrutura própria,
e não que o direito nada mais é do que uma estrutura. BOBBIO, N. Em direção a uma teoria
funcionalista do direito, in Da estrutura à função, novos estudos de teoria do direito, Barueri/SP:
Manole, 2007, p. 56.
direito para Kelsen é uma técnica específica de organização social cuja especificidade
enquanto meio útil para alcançar um fim. Dessa forma, poderiam ser realizados fins que
não poderiam ser alcançados através de outras formas de controle social. Tais fins
Kelsen também não se furta a uma definição funcional das sanções, que seriam
que o legislador considera desejável 33 . Nesse ponto, Kelsen não está tratando da
estrutura normativa da sanção, mas apontando para que ela serve34. A preocupação de
Bobbio consiste em indagar até que ponto a teoria de Kelsen se torna obsoleta em
de outras técnicas de controle social (como a moral) não tanto pelo uso das sanções
A força não é o único meio para exercitar o poder. Este pode ser exercitado
31
Idem, p. 61.
32
Escolhido o fim, o direito exaure sua função na organização de um meio específico, a coação, para se
obter a concretização do fim. Segundo Kelsen, o fim do direito é a paz. Em 1960, no entanto, na última
edição da Teoria Pura do Direito, Kelsen afirma que o direito busca a segurança coletiva. Trata-se,
portanto, de uma definição funcional. BOBBIO, N. Em direção a uma teoria funcionalista do direito, in
Da estrutura à função, novos estudos de teoria do direito, Barueri/SP: Manole, 2007, pp. 56-57.
33
Idem, p. 61.
34
Cabe lembrar que, segundo Kelsen, as sanções das quais se vale um ordenamento coativo são as
negativas, ou seja, pena e execução forçada (KELSEN, H. Teoria pura do direito, p. 121-122).
35
BOBBIO, N. Em direção a uma análise funcionalista do direito, in Da estrutura à função: novos
estudos de teoria do direito, Barueri/SP: Manole, 2007p. 73.
36
Cumpre observar que de acordo com Hobbes há outra forma de conseguir a obediência dos súditos
além da sanção, a saber, a educação e a persuasão. Trata-se do poder de convencimento do soberano, que
“boa ação”. Enquanto o castigo é uma reação contra a ação má, o prêmio é uma reação a
mecanismo de incentivo criado pelo Estado para promover atos socialmente desejáveis.
comportamentos desejados: a ação pode ser tornada necessária, fácil ou vantajosa. Por
comportamentos não desejados, efetua três tipos de operações para impedir uma ação
vigilância e o uso da força. Nos outros dois casos, são utilizadas medidas indiretas, que
não atuam diretamente sobre o comportamento, mas buscam influenciá-lo por meios
psíquicos39.
é exercido pela linguagem e não pela espada. SALGADO, G. M. Sanção na teoria do direito de Norberto
Bobbio. Tese (Doutorado). PUC/SP, São Paulo, 2008, p. 46.
37
BOBBIO, N. As sanções positivas, in Da estrutura à função, novos estudos de teoria do direito,
Barueri/SP: Manole, 2007, p. 24
38
SALGADO, G.M. Sanção na teoria do direito de Norberto Bobbio. Tese (Doutorado). PUC/SP, São
Paulo, 2008, p. 124.
39
BOBBIO, N. A função promocional do direito, in Da estrutura à função, novos estudos de teoria do
direito, Barueri/SP: Manole, 2007, pp. 15-16.
comportamento que ainda está para ser realizado (facilitação). O encorajamento consiste
Conforme salienta Tércio Sampaio Ferraz Jr., a ciência do direito, em vez de limitar-se
delito), é forçada a uma nova ordem de considerações. Em primeiro lugar, a sanção não
será mais apenas “ameaça”, mas também “promessa”. Em segundo lugar, sendo também
promessa (de facilitar ou de premiar), inverte-se até mesmo a relação direito/dever. Uma
vez que a sanção é uma promessa, a relação direito/dever vai do sancionado, que tem o
direito, para o sancionador, que tem o dever de cumprir a promessa. Por outro lado, se a
sanção é uma ameaça, a relação direito/dever vai do sancionador, que tem o direito, para
(pena)41.
40
FERRAZ JR,. T S. Apresentação – O pensamento jurídico de Norberto Bobbio In BOBBIO, N. Teoria
do ordenamento jurídico. Brasília: UnB, 2006, pp. 14-16.
41
Bobbio apresenta o exemplo do pai que deseja que seu filho faça uma tradução difícil do latim. O pai
pode prometer ao filho que se ele a fizer poderá ir ao cinema (recompensa), ou então, permitir que o filho
utilize uma tradução bilíngüe (facilitação) (BOBBIO, N. A função promocional do direito, in Da
estrutura à função, novos estudos de teoria do direito, Barueri/SP: Manole, 2007, pp. 16-17).
privativas (no caso das sanções negativas, atribuição de uma desvantagem e privação de
uma vantagem; no caso das sanções positivas, atribuição de uma vantagem e privação
Feitas estas considerações, cabe salientar que a função promocional não pretende
função de direção social. A preservação do meio ambiente é justamente uma das suas
demandas principais.
brasileiro.
42
BOBBIO, N. As Sanções Positivas, in Da estrutura à função, novos estudos de teoria do direito,
Barueri/SP: Manole, 2007, pp. 25 a 32.
43
Cabe destacar que “a sanção da execução civil constitui dois deveres: o dever de não causar prejuízos,
como dever principal, e o dever de ressarcir os prejuízos licitamente causados, como dever subsidiário,
que vem tomar o lugar do dever principal violado. O dever de ressarcir os prejuízos não é uma sanção,
mas é o dever subsidiário. A sanção da execução, isto é, a indenização compulsória do prejuízo através do
órgão aplicador do Direito, surge apenas quando este dever não é cumprido”. KELSEN, H., Teoria pura
do direito, p. 139.
44
Ao comentar a dicotomia entre sanção negativa e sanção positiva, o professor Tércio Sampaio Ferraz
Jr. observa que na prática há nuances que dificultam classificar um caso de forma precisa como sanção
positiva ou negativa (aula ministrada no dia 12/05/09, referente à disciplina “Contribuições do
pensamento de Norberto Bobbio para a filosofia analítica e teoria geral do direito” do programa de pós-
graduação da FDUSP).
desse direito não pertence ao indivíduo na sua singularidade (como no caso dos direitos
45
BOBBIO, N. A era dos direitos, Nova edição. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004, p.64.
46
LAFER, C. A reconstrução dos direitos humanos: um diálogo com o pensamento de Hannah Arendt.
São Paulo: Companhia das Letras, 2003, p. 131.
47
NUSDEO, A.M.O., O uso de instrumentos econômicos nas normas de proteção ambienta. In: Revista
da Faculdade de Direito da USP. V. 101. São Paulo, 2006, p. 364.
ambiente tem crescido nos últimos tempos motivada, notadamente, pela impunidade;
controle; pela escassez de recursos públicos para a gestão ambiental; pela falta de
preservação 48 ; não observância da norma, pois muitas vezes é mais vantajoso não
ambiental. Para além de seu aspecto estrutural o direito ambiental deve assumir seu
para determinados objetivos preestabelecidos por meio de políticas publicas pois, se por
uma lado fixa e ordena as estruturas básicas de desenvolvimento de uma sociedade, por
políticas públicas adotam uma concepção mais propositiva do direito por meio de
objetivos, instrumentos e atores institucionais que devem ser bem definidos, bem
48
ALTMANN, A. A função promocional do direito e o pagamento pelos serviços ecológicos. In: Revista
de Direito Ambiental. V. 58. São Paulo: RT, 2008, p. 13.
49
ATTANASIO JR, M.R. Direito Ambiental e a Teoria Crítica da escola de Frankfurt. Porto: Juruá,
2018, pgs 82-99.
50
DERANI, C. Direito Ambiental Econômico. 2 ed. São Paulo: Max Limonad, 2001, pg 57.
51
ATTANASIO JR, M.R. Direito Ambiental e a Teoria Crítica da escola de Frankfurt Porto: Juruá,
2018, pgs 82-99.
de proteção ambiental.
públicas tornam-se mais legítimos quando há uma maior participação das partes
gestão implica participação direta das comunidades no manejo de seus recursos para
democracia sustenta-se sobre a hipótese de que todos podem decidir a respeito de tudo.
52
Há uma forte relação entre famílias pobres, deterioração local e voz política fraca. Dasgupta, Levin e
Lubchenco. Economic pathways to Ecological Sustainability: challenges for the millennium. 2000. P. 9.
53
Leff, Racionalidade ambiental, pp. 256 e 260.
54
Bobbio, O futuro da democracia, 2000, p. 46.
qual são válidas as normas que sejam aceitas por todos os indivíduos que são atingidos
por seus efeitos55, de modo que as minorias possam apresentar em público suas razões e
sociedade.
Segundo Habermas57:
Dessa forma, o processo deliberativo deve ser regulado por normas que garantam
chances iguais de acesso aos debates a todos os interessados que serão afetados pelas
decisões, de modo que possam argumentar, ser ouvidos, apresentar assuntos, dar
pretensão de levar os outros a aceitarem a proposta sendo que a decisão deve levar em
interesses e não seja possível o consenso, as deliberações concluem-se por meio do voto
55
Habermas. Direito e democracia, entre facticidade e validade. 1997, vol. 1, p. 142.
56
Santos, B.S.; Avritzer L. Introdução: para ampliar o cânone democrático, p. 52. In: Santos, B. S.
(org.). Democratizar a democracia: os caminhos da democracia participativa. 2ª ed. Rio de Janeiro:
Civilização Brasileira, 2003.
57
Habermas, J. Direito e Democracia, entre facticidade e validade . 1997, vol. 1, p. 138.
por meio de uma abordagem sistêmica, avaliar a melhor localização para a instalação de
uma obra ou plano de desenvolvimento, sendo que esta etapa é a mais complexa do
pelo Estudo de Impacto Ambiental tem que produzir todas as informações ambientais
zoneamento ecológico-econômico61.
58
Cohen apud Habermas. Direito e democracia, entre facticidade e validade. 1997, vol. 2, pp. 29-30.
59
A elaboração do Zoneamento Ecológico-Econômico constitui a diretriz 5 do Programa Nacional de
Direitos Humanos – 3 (Desenvolvimento e direitos humanos).
60
Souza, Instrumentos de gestão ambiental: fundamentos e prática, 2000, pp. 39, 42 e 43.
61
O zoneamento ambiental é um instrumento de informação por excelência e contribui para que os
objetivos da política ambiental sejam alcançados. Vale lembrar, neste sentido, que o art. 9º, XI da Política
Nacional do Meio Ambiente (Lei 6.938/86) prevê a garantia de prestação de informações ambientais,
obrigando-se o poder público a produzi-las, quando inexistentes.
Um estudo de caso apresentado por RANIERI (2000) em sua dissertação de mestrado ilustra bem a
importância do zoneamento e da participação da universidade para melhoria do meio ambiente. Vale
lembrar que o Zoneamento Ambiental pode ser utilizado para identificar as melhores alternativas para
instalação de empreendimentos segundo art. 5, II da Resolução Conama 01/86. A Metodologia consistiu
em analisar dois fatores de forma integrada: a tipologia da atividade e a localização do empreendimento.
Assim, para cada tipo de atividade (ex: área p/ loteamento, expansão urbana, área p/ aterro sanitário, área
p/ distrito industrial, áreas verdes, área p/ passagem de duto, etc) seriam identificadas as melhores
alternativas para sua localização, considerando-se as características dos meios físico, biológico e
socioeconômico de uma determinada área (ex: município). Cabe ressaltar que poderia ser instalada uma
atividade num lugar não totalmente adequado, por falta de opção, desde que se adotassem medidas
mitigadoras e a exceção não se tornasse uma regra. A decisão sobre a localização de cada atividade
(principalmente num local apto a receber qualquer tipo de atividade) no município seria decidida, com
mapeamento não prescritivo das limitações ecológicas para ocupação do solo, de modo
florestal com redução dos impactos ambientais, conforme algumas linhas de ação, entre
base no ZEE e com a participação da iniciativa privada, sociedade civil e poder público. O estudo de caso
foi realizado na cidade de Descalvado.
62
Becker e Egler 1997, Shubart 1994 apud Shubart, Biodiversidade: uma nova proposta de
desenvolvimento, 1999.
63
Cabe observar que o Art. 4 do Decreto 4297/02 estabelece: O processo de elaboração e implementação
do ZEE: I - buscará a sustentabilidade ecológica, econômica e social, com vistas a compatibilizar o
crescimento econômico e a proteção dos recursos naturais, em favor das presentes e futuras gerações,
em decorrência do reconhecimento de valor intrínseco à biodiversidade e a seus componentes; II -
contará com ampla participação democrática, compartilhando suas ações e responsabilidades entre os
diferentes níveis da administração pública e da sociedade civil. Além disso, conforme o art. 20 do
Decreto 4297/02: Para o planejamento e a implementação de políticas públicas, bem como para o
licenciamento, a concessão de crédito oficial ou benefícios tributários, ou para a assistência técnica de
qualquer natureza, as instituições públicas ou privadas observarão os critérios, padrões e obrigações
estabelecidos no ZEE, quando existir, sem prejuízo dos previstos na legislação ambiental.
e melhoria dos ecossistemas e que gerem serviços ambientais..., sendo que haverá
seu art. 6°, II o princípio do protetor-recebedor, uma novidade no âmbito das políticas
ambientais brasileiras mais conhecidas. Segundo este princípio aquele que protege o
meio ambiente pode receber um benefício em função desta proteção. A ideia é que além
estímulos e incentivos. Neste sentido, o artigo 44 desta mesma lei estabelece que a
O poder público municipal, por sua vez, poderá instituir incentivos econômicos
municipal de gestão integrada de resíduos sólidos (art. 35, I, II e parágrafo único da Lei
13.305/10).
poluição difusa rural e aumento da oferta de água em bacias estratégicas, geradas pelo
mercado cujas decisões são tomadas pelas fontes emissoras, sem participação pública.
os excessos de compra de créditos para poluir, bem como uma maior participação
Justiça Ambiental. A grande vantagem dos incentivos dos mercados, segundo ela, seria
devem remunerar não somente os agentes que agregam valor econômico ao bem, mas
devem incluir também o custo de reposição do recurso natural utilizado66. Caberia aqui
recurso ambiental tem direito de receber um benefício por esta proteção. Porém, em
muitos casos, a natureza é mercantilizada tornando-se uma mera comódite com valor
pública mais propositiva e proativa sobre pagamento por serviços ambientais deve
contemplar não somente a proteção dos ecossistemas, mas também deve observar sua
64
NUSDEO, A.M.O. Pagamento por serviços ambientais: sustentabilidade e disciplina jurídica. São
Paulo: Atltas, 2012, p. 66.
65
Nusdeo, Direito Ambiental e economia, pp. 129-133.
66
Nusdeo, Pagamento por serviços ambientais, pp. 137-138.
provocado pela sua produção ou prestação (art. 170, VI). O poder público pode, dessa
do produto reciclado70.
Cumpre ressaltar que são mais aconselháveis os incentivos fiscais que não
impliquem aumento da carga tributária, pois esses gastos são normalmente repassados
67
Gonçalves, Agroecologia e pagamentos por serviços ambientais: lições e perspectivas, pp.183-201,
229-230.
68
YOSHIDA, C.Y.M. A efetividade e a eficiência ambiental dos instrumentos econômicos-financeiros e
tributários. Ênfase na prevenção. A utilização econômica dos bens ambientais e suas implicações. In:
TÔRRES, H. T. (org.), Direito Tributário Ambiental. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 536.
69
MOLINA, P. M. H; VASCO, D.C. Marco conceptual, constitucional y comunitário de la fiscalidad
ecológica In: TÔRRES, H. T. (org.), Direito Tributário Ambiental. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 163.
70
ALTAMIRO, A.C. El Derecho Constitucional a um Ambiente Sano, derechos humanos y su
vinculación con el derecho tributário, in Revista tributária e de finanças públicas, n. 40. São Paulo, Ed.
RT, set-out, 2001, pp. 60-61.
industrial e que podem até mesmo criar um clima de incerteza quanto à sua
efetividade71. Isto não significa que as medidas repressivas devam ser abandonadas, mas
são elucidativos.
importação de petróleo73.
de incentivos fiscais neste setor. Há previsão de alíquota zero para PIS e Cofins para
elétrica não são contemplados por este beneficio. Há benefício fiscal com alíquota zero
71
Idem, p. 52. No mesmo sentido Picciaredda e Selicato apresentam os seguintes critérios: baixo custo,
ser administrativamente barato e simples; não provocar efeitos relevantes no comércio e na
competitividade internacional. PICCIAREDDA, F.; SELICATO, P. apud YOSHIDA, C.Y.M. A
efetividade e a eficiência ambiental dos instrumentos econômicos-financeiros e tributários. Ênfase na
prevenção. A utilização econômica dos bens ambientais e suas implicações. In: TÔRRES, H. T. (org.),
Direito Tributário Ambiental. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 537.
72
YOSHIDA, C.Y.M. A efetividade e a eficiência ambiental dos instrumentos econômicos-financeiros e
tributários. Ênfase na prevenção. A utilização econômica dos bens ambientais e suas implicações. In:
TÔRRES, H. T. (org.), Direito Tributário Ambiental. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 560.
73
TRENNEPOHL, T. D. Incentivos fiscais no direito ambiental. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 105.
para IPI para alguns componentes de equipamentos de geração de energia elétrica, tais
como, para energia solar (aquecedores solares e células solares), para biomassa
No entanto, o referido autor pontua que tais ações são extremamente direcionadas,
energia. Segundo ele, seria necessário ampliar os incentivos neste setor, com maior
edição de leis mais gerais que alcancem mais setores e não apenas alguns produtores e
Um imposto federal que pode ser utilizado como instrumento econômico premial
é o ITR (Imposto Territorial Rural). O art. 10, §1º, II da Lei 9.393/96 isentou deste
74
GORON, H. S. Tributação sustentável para fontes de energias renováveis. In: Revista de Direito
Ambiental, vol. 76. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, p. 502.
75
Idem. p. 506.
federal, áreas sob regime de servidão ambiental e áreas cobertas por florestas nativas
Constituição Federal de 1988, 25% (vinte e cinco por cento) do produto da arrecadação
do ICMS devem ser repassados aos municípios (art. 158, IV). Três quartos desta
nos territórios dos municípios, e até um quarto redistribuído de acordo com o que
dispuser a lei estadual (Parágrafo único do art. 158, I e II). Muitos estados já têm
destinado esse último valor aos municípios que promovem condutas ambientalmente
desejáveis.
instrumento para uma gestão ambiental integrada e descentralizada. Ele proporciona aos
conservação (São Paulo, Paraná, Rio Grande do Sul, Minas Gerais, entre outros), de
para calcular o repasse do ICMS. A Lei Estadual 8.510/93 alterada pela Lei Estadual
12.810/08 estabeleceu, em seu art. 1º, os critérios para definição dos índices de
seis por cento), com base na relação percentual entre o valor adicionado em cada
13% (treze por cento), com base no percentual entre a população de cada município e a
população total do Estado, de acordo com o último recenseamento geral, realizado pela
cento), com base no percentual entre o valor da receita tributária própria de cada
3% (três por cento), com base no percentual entre a área cultivada de cada município,
com base no percentual entre a área total, no Estado, dos reservatórios de água
76
SILVA, S.T. Reflexões sobre o ICMS Ecológico In: KISHI, S.A.S.; SILVA, S.T.; SOARES, I.V.P
(orgs.). Desafios do direito ambiental no século XXI, estudos em homenagem a Paulo Affonso Leme
Machado. São Paulo: Malheiros, 2005, pp.753-776.
Anexo desta lei; VII - 2% (dois por cento), com base no resultado da divisão do valor
Reservas Biológicas - Peso 1.0 (um); 2 III - Parques Estaduais - peso 0,8 (oito
APA’s) - peso 0,5 (cinco décimos); V - Reservas Florestais - peso 0,2 (dois
décimos); VI - Áreas de Proteção Ambiental (APA’s) - peso 0,1 (um décimo) VII -
Dalto, Pires e Gomes78 sustentam que a legislação de São Paulo carece de uma
mínimo igual ao peso das categorias das Unidades de Conservação de Proteção Integral,
77
Arquivos.ambiente.sp.gov.br/cpla/2011/12/1993-Lei-8510.pdf(acesso em 18/04/2017).
78
DALTO, K. K. S.; PIRES, M. Moura; GOMES, A. da S. Instrumentos econômicos tributários na
análise ambiental: uma aplicação de índice de desenvolvimento sustentável para o repasse do ICMS
ecológico. In: Revista de Direito Ambiental. V. 74. São Paulo: RT, 2014, pp. 547-590.
os municípios, o qual, por sua vez, seria composto pelos seguintes índices: um índice de
regulamentada pelo Decreto nº 264 de 2008, os imóveis edificados horizontais com área
permeável e com árvores na calçada em frente ao imóvel podem obter em cada caso
Campo há desconto para propriedades recobertas por vegetação que pode chegar a 80%
desconto de 5% para imóveis que tenham áreas verdes ou disponham de: aquecimento
solar, captação de água de chuva, coleta seletiva de lixo, sistema natural de iluminação,
79
Idem.
80
http://www.saocarlos.sp.gov.br/index.php/incentivo-ambiental-iptu.html. Acesso em 21/11/2019.
81
http://www.envolverde.com.br/sociedade/legislacao-sociedade/cidades-brasileiras-implantam-iptu-
ecologico. Acesso em 26/06/2015.
3. Conclusões.
encorajadores de comportamentos.
4. Bibliografia.
finanças públicas, n. 40. São Paulo: Revista dos Tribunais, set-out, 2001.
serviços ecológicos. In: Revista de Direito Ambiental. V. 52. São Paulo: Revista dos
estrutura à função, novos estudos de teoria do direito, Barueri/SP: Manole, 2007, pp. 1
a 21.
função, novos estudos de teoria do direito. Barueri/SP: Manole, 2007, pp. 23 a 32.
de Direito Ambiental, vol. 74. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, pp. 547-590.
2001.
http://www.envolverde.com.br/sociedade/legislacao-sociedade/cidades-brasileiras-
renováveis. In: Revista de Direito Ambiental, vol. 76. São Paulo: Revista dos Tribunais,
KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. Tradução João Batista Machado. 6ª ed.
estrutura à função, novos estudos de teoria do direito, Barueri/SP: Manole, 2007, pp.
LI-LVII.
pensamento de Hannah Arendt. São Paulo: Companhia das Letras, 2003, p. 131.
estrutura à função, novos estudos de teoria do direito, Barueri/SP: Manole, 2007, pp.
XIX-XLIX.
Heleno Taveira (org.), Direito Tributário Ambiental. São Paulo: Malheiros, 2005, pp.
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de proteção ambienta. In: Revista da Faculdade de Direito da USP. V. 101. São Paulo,
2018.
bens ambientais e suas implicações. In: TÔRRES, Heleno Taveira (org.), Direito
http://www.saocarlos.sp.gov.br/index.php/incentivo-ambiental-iptu.html. Acesso em
21/11/2019.
Dissertação de Mestrado. Escola de Engenharia de São Carlos. São Carlos: USP, 2000,
87p.
http://www.arquivos.ambiente.sp.gov.br/cpla/files/2011/12/1993-Lei-8510.pdf. Acesso
em 18/04/2017.
SILVA, Solange Teles da. Reflexões sobre o ICMS Ecológico In: KISHI, Sandra
Akemi Shimada; SILVA, Solange Teles da; SOARES, Inês Virgínia Prado (orgs.).
A utilização econômica dos bens ambientais e suas implicações. In: TÔRRES, Heleno
Taveira82 (org.), Direito Tributário Ambiental. São Paulo: Malheiros, 2005, pp. 527-
564.
x Proselitismo político -
Resumo
sobre meio ambiente. O jogo que se fez presente até os anos 90 sofreu um stalemate (ou
dama, bispo, torre e cavalo. Coletividade, a frente, como peões. Sem saber ao certo o
que fazer, esta era instada a fazer movimentos adjacentes sob o temor do comando e
controle. Neste pano de fundo, o presente artigo visa apresentar a evolução do Direito
nova partida está em curso e que as vitórias parciais descritas na notação algébrica dão
ambiental.
Abstract
environment. The game that was present until the 90s suffered a stalemate (or
drowning), and finished tied. On the one hand environmental protection, on the other,
the economic pretensions. On the board, states moved as king, queen, queen, bishop,
tower, and horse. Collectivity, at the front, like pedestrians. Without knowing for sure
what to do, it was urged to make adjacent movements under the fear of command and
control. In this context, this article aims to present the evolution of International
Environmental Law and the new governance rules as theoretical assumptions to answer
new match is underway and that the partial victories described in algebraic notation tell
I. Introdução
lógico, e estratégico. O conflito entre os lados não é pela conquista de um ideal ou pela
retaliação como é comum nas guerras bélicas. No xadrez, os dois exércitos podem,
Como em toda boa partida, as regras devem ser apresentadas no início. Por tal
outro, com base na orientação pós-92. Posições, estas, que não necessariamente são
antagônicas, mas que, como em um jogo de xadrez, podem ser harmônicas e buscar um
mesmo resultado.
É comum, nos jogos, as equipes terem nomes, que lembrem suas origens, suas
percepções e suas tradições. Sendo assim, neste capítulo, os lados serão chamados de
deônticos realizados pelos operadores “P” permitido, “V” proibido (ou vedado), e “O”
para lançar um novo movimento às suas peças: o “I” incentivo. A cada rodada, a vitória
de cada equipe está vinculada à melhor resposta jurídica para a resolução de uma
demanda ambiental. Sendo que as condutas podem ser degradantes ou protetivas, vence
Cientes das regras do jogo e dos movimentos dos peões, necessário conhecer
Direito Internacional escalados pela seleção simétrica e os novos atores escalados pela
perspicazes e cientes de que seu exército precisará se mover com maior agilidade,
buscaram formar uma equipe mista, contando com tais revelações promissoras e com os
medalhões tradicionais.
Com o deflagrar das jogadas, a partida caminha para a vitória de uma das equipes.
A efetividade fica evidenciada em uma das principais rodadas do dia: a vitória dos
conservador que contagia e conquista multidões. A torcida que ganha eco e que pode
organizada laranja grita: mudanças climáticas não passam de “trotes dos chineses83”.
mas, ainda, o xeque-mate avança a passos curtos. Será que por uma decisão da própria
83
Fala conferida ao Presidente dos Estados Unidos Donald Trump, em discurso proferida em 27/11/2018.
In:
https://ultimosegundo.ig.com.br/mundo/2018-11-28/trump-mudancas-climaticas.html - acesso em
02/06/2019.
foram assinadas com vistas a regulamentar a relação dos seres humanos com o meio
dos anos.
90).
O pós-guerra foi marcado pela proteção aos direitos de primeira geração (direitos
civis e políticos), que traduzem o valor da liberdade e aos direitos de segunda geração
divisão apresentada por Paulo Bonavides (1988, pp. 474-482). Com a evolução das
terceira geração, bem como, em vista de catástrofes ambientais que ocorreram nas
signatários a participar daquele que seria o maior evento internacional até então: a
o Princípio 1 da Declaração:
essencial para o bem-estar e para gozo dos direitos humanos fundamentais, até
O referido princípio é base para toda a evolução normativa que estaria por vir. O
ser humano deixou de ser apenas o “criador”, para também se colocar na figura de
“criatura”, evidenciando que toda e qualquer decisão que venha a ser tomada resultará,
fundamentais” e até mesmo à própria vida. Foi neste documento ainda que a ONU
plantou a semente da nova era. Aquela que permitiria uma efetiva evolução, que
84
In:
https://www.apambiente.pt/_zdata/Politicas/DesenvolvimentoSustentavel/1972_Declaracao_Estocolmo.p
df - visitada em 04/06/2019
ambientais dirigida tanto às gerações jovens como aos adultos e que preste a
bases de uma opinião pública bem informada, e de uma conduta dos indivíduos,
Ação para o Meio Ambiente composto por 109 recomendações. Um verdadeiro guia de
Conforme ensina Solange Teles da Siva (2010, p. 30), o referido documento pode
ser dividido em três eixos fundamentais: o primeiro engloba a avaliação dos problemas
ambientais, também denominado de “Plano Vigia” (do inglês “Earth Watch”), cujo
85
In:
https://www.apambiente.pt/_zdata/Politicas/DesenvolvimentoSustentavel/1972_Declaracao_Estocolmo.p
df - visitada em 04/06/2019
(PNUMA), formado por dezesseis países da África, treze países da Ásia, seis países da
Europa Oriental, dez países da América Latina e treze países da Europa Ocidental e
demais Estados.
Assembleia Geral, por meio do relatório “1st of the Governing Council of the United
alto nível, que transitasse politicamente tanto com os países desenvolvidos, quanto com
86
Dentre eles, possível destacar: “To promote international cooperation in the field of the environment
and to recommend, as appropriate, policies to this end” - Tradução livre: Promover a cooperação
internacional em relação ao meio ambiente e recomendar, quando for o caso, políticas para o
cumprimento deste objetivo.
meio ambiente que não mais podia se dissociar das questões relativas ao
de ECO/92. O Rio de Janeiro foi escolhido como a nova sede. Colorido como os anseios
87
COMISSÃO MUNDIAL SOBRE MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO. Nosso futuro
comum. 2ªed. Rio de Janeiro: FGV, 1991, p. 49.
crescimento econômico, nem tão cinza a ponto de refutar a presença dos ecologistas. O
local era perfeito para que, ao final, os países pudessem proclamar uma Declaração,
(...) buscando avançar a partir dela, com o objetivo de estabelecer uma nova
governamentais, o que demonstra sua grandeza e importância. Seu objetivo era catalisar
Brundtland.
Biológica.
estabelecer uma “nova e justa parceria global mediante a criação de novos níveis de
deste (Princípio 2), que os Estados adotarão legislação ambiental eficaz (Princípio 11), e
Sim, eram os sinais claros de que novos tempos estavam por vir. A economia
deixou de ser pressuposto (como na fase colonial) ou ser antagônica (como na fase
tempo que caberia aos países signatários adotar medidas de punição (internalização),
caberia a eles adotar medidas econômicas como forma de incentivar boas condutas.
Nem tão redonda quanto às proposições econômicas, nem tão tortuosa quanto às
relações sociais, a letra que desenhou os princípios desta nova Declaração era
geométrica, como observado nas obras de Gaudí, formas geométricas eram pilares
naturales es preciso encontrar la presencia de uma razón geométrica, que les infunde
88
Preâmbulo da Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento.
de la energia despertada por la diferencia abismal que separa a los contrários que
aspira a unir” (ÁLVAREZ, 2017, p. 59). É o contorno das formas imperfeitas. Nem
Evidente, portanto, que as regras deste tão complexo tabuleiro estavam traçadas.
também por medalhões que aceitaram dividir o protagonismo do time com atores menos
público. Como aponta Mazzuoli (2012, p. 419), “são os Estados, em suma, os sujeitos
primários e plenos do direito das gentes, já que somente eles possuem uma
modelo empregado para o tratamento das questões internacionais, que antes eram, em
Como o dano ambiental não respeita fronteiras, a solução demandava uma atuação
dessa natureza transfronteiriça89 dos danos ambientais, seus combates passaram a ser de
interesse de todos os países soberanos, deixando de ser apenas uma questão interna,
para ser uma preocupação global. Nesses termos, vale citar os ensinamentos de Michel
dos anos 60. É resultado de uma consciência da limitação dos recursos naturais e
internacional90.
central, as relações existentes entre Estados” (DERANI e COSTA, 2001, p. 11), tornou-
bem como o meio ambiente passou a ser importante na agenda internacional. Em suas
89
Neologismo: ultrapassando fronteiras
90
Le droit de l´environnement n´est que l´expression formaliseé d´ne politique nouvelle mise em place à
partir des années 1960. Il s´agit d´une prise de conscience de caractere limite des ressources naturelles
ainsi que des effets néfastes des pollutions de toute nature résultant de la production des biens et de leur
consommation. La necessite de sauvegarder l´environnement a pu n´être qu´um reflexe de survie d´um
monde désemparé. Il est remarquable que se mouvement se soit développé simultanément au niveau
national, au nível européen et au niveau international.
então.
Pode-se dizer, portanto, que neste contexto surgiu uma verdadeira diplomacia
internacionais cujo centro das atenções é voltado para o meio ambiente”. Essa interação
extrapola a simples relação entre dois ou mais governos oficiais, interagindo com outros
clássicos encontraram dificuldade para garantir efetividade das regras criadas. Primeiro,
pela alternância política no poder dos países, que ora conferiam importância para
terceiro em vista do embate em torno da dívida histórica dos países desenvolvidos com
o meio ambiente:
paradóxico entre a visão clássica das relações internacionais e a efetividade das normas
88).
91
Princípio das Responsabilidades Comuns, porém diferenciadas descrito no Princípio 7 da Declaração
do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento – in:
http://www.meioambiente.pr.gov.br/arquivos/File/agenda21/Declaracao_Rio_Meio_Ambiente_Desenvol
vimento.pdf - visitado em 20/06/2019.
subnacional ou local92”.
das agendas ambientais e tem mais chances de alcançar a efetividade. Como concluem
Por meio deste tipo de convenção, de acordo com Mazzuoli (2012, p. 198), “as partes
estabelecem as grandes bases jurídicas do acordo, bem como, os direitos e deveres das
é feito por meio de anexos e apêndices”. Tal, estratégia, pois, facilitou a assinatura de
um acordo multilateral.
92
“The effective capacity of international environmental law largely depends on the proper combination
of various levels and techniques of governance. It requires international, regional, national and also
subnational or local governance”.
“medidas tomadas pelas partes para celebrar acordos internacionais que atuem em seu
efetividade das normas no âmbito doméstico dos Estados. A internacional, por sua vez,
ambiental internacional
uma notícia que chama a atenção da plateia apreensiva: “pela primeira vez, cientistas da
A resposta para estas perguntas deve passar pela análise da ineficácia do princípio
do poluidor-pagador como norte das agendas ambientais internacionais, bem como, pela
Entende-se por poluidor-pagador, o princípio que “visa impedir o uso gratuito dos
93
https://revistagalileu.globo.com/Ciencia/noticia/2018/01/o-buraco-na-camada-de-ozonio-esta-
diminuindo-afirma-nasa.html - visitado em 22/06/2019.
coletividade, pois aquele que se beneficia com o uso dos recursos naturais deve suportar
princípio da responsabilidade.
todos os princípios ambientais, consegue, com maior rapidez e eficácia ecológica, com
Como visto nos capítulos acima, no entanto, a máxima apresentada por Canotilho
não encontra respaldo prático. Apesar da evolução das normas ambientais, a mera
índices de qualidade.
eficácia pode ser observada sobre três diferentes ângulos, (i) a eficácia técnica, (ii) a
jurídica, vínculo segundo o qual verificado para o direito o fato descrito na hipótese
764).
com aquele que infringe seus dispositivos: o poluidor. Apesar da evidente eficácia
uma regra é reiteradamente observada por seus destinatários ela é socialmente eficaz, ao
passo que, quando a conduta por ela descrita é frequentemente desrespeitada, ela é
Deste modo, o sistema normativo posto deve ser interpretado, para se adequar aos
consagra quase que um Direito Ambiental Punitivo. Teoria do risco integral decorrente
atenuado, uma vez que não se impõe a demonstração precisa da ligação entre a
matriz do Direito Ambiental. Em segundo, aposta nos incentivos como forma de regular
oposta - com modais deônticos diversos: o primeiro modal “V” (proibido) e o segundo
Pelas lições de Hans Kelsen (1986, P. 157), possível conceituar a antinomia como
“um conflito entre duas normas, se o que uma fixa como devido é incompatível com
Op) for verdadeira, desde que sejam válidas, no sistema normativo, as respetivas
normas “Op” e “-Op”; ou ainda, sempre que a fórmula (Pp . –Pp) for verdadeira,
Pp”.
quando tais critérios não são suficientes para solucionar o conflito, devendo este ser
fonte de produção jurídica sobre a outra, ou seja, de acordo com esse critério, uma
norma de nível superior deverá prevalecer sobre uma norma de nível inferior, até se
jurídica.
a norma editada por último prevalece sobre a editada anteriormente. Trata-se da máxima
Por fim, a especialidade indica que a norma específica deve prevalecer sobre a
Em que pese os três critérios poderem ser aplicados para a resolução da antinomia
apresentada, a verdade é que eles poderão resultar em novas antinomias, por isso, como
aponta Maria Helena Diniz, possível concluir que se está diante de uma antinomia real
antinomia, devendo esta ser resolvida por parâmetros ideológicos do aplicador) (DINIZ,
ambientalmente educada.
este para resolver as antinomias das normas ambientais. Nenhum outro critério exprime
não mais caberá a máxima de que “os mecanismos preventivos se mostram limitados e
simétricos que não se adequam às formas naturais. O direito ambiental não se assemelha
ao demais ramos do direito e, por essa razão, clama por um novo paradigma. Seus
A distância da norma em relação aos fatos e aos valores enseja sua ineficácia. Por
esta razão, a interpretação deve confluir elementos, que semelhantes aos fenômenos
países apontaram o que seria discutido na Conferência a se realizar naquele ano e o que
deveria fazer parte da declaração final. Dentre os temas, possível destacar uma
de informação que deram poder ao povo 95 ”. Por outro lado, retrocessos foram
apontados:
94
In: http://www.ceplac.gov.br/paginas/rio/rio.asp - visitado em 20.06.2019.
95
In: http://www.rio20.gov.br/documentos/documentos-da-conferencia.html - visitado em 20.06.2019
de carga dos ecossistemas”. Mais uma evidência de que todos os esforços vislumbrados
à época do direito ambiental internacional assimétrico não foram tão bem sucedidos
Não obstante, observamos que, apesar dos esforços por Governos e agentes
organizador apontou que era “importante permitir que todos os membros da sociedade
locais”.
da erradicação da pobreza”.
desenvolvimento sustentável que enfrentamos” (...) “nós pedimos que uma estrutura
política global que exija que todas as empresas privadas listadas e de grande porte
países”.
documento. “Nós reiteramos que a economia verde não tem a intenção de ser um
conjunto de regras rígidas, mas sim de ser uma estrutura de tomada de decisões para
verde devem resultar de decisões internas, via compromissos voluntários, relegando aos
mundial.
coletividade com vistas a melhoria da qualidade ambiental. Destacando que eles, após
Conclusão
afirmado na introdução. Não porque o jogo caminha para um empate, mas sim, por uma
visão – não necessária confliante com aquela, ilustrada pela equipe assimétrica, como
apresentado no capítulo 2.
O que separa Estocolmo-72 da Rio-2012 não são apenas os quarenta anos, mas
plantada na origem, a figura do protetor ganhou relevância, e, com isso, o interesse cada
vez maior em participar de uma agenda internacional ao lado dos clássicos sujeitos.
lógica do protetor. O terceiro poderá ser resolvido com a implementação das agendas
como, pela incorporação dos aspectos econômicos na tomada de decisão. Diante de uma
sofrer um xeque-mate.
Referências bibliográficas
ALVAREZ, César García. Gaudí: Símbolos del Éxtasis. Madrid: Siruela, 2017.
Malheiros, 1988.
nº.62, Ano 16 (Abril a Junho de 2011). São Paulo: RT, 2011, pp. 12-55.
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KELSEN, Hans. Teoria Geral das Normas. Porto Alegre: Fabris, 1986.
MENEZES, Paulo Roberto Brasil Teles de. O direito do meio ambiente na era
Ambiental – RDA nº.32, Ano 8 (Outubro a Dezembro de 2003). São Paulo: RT, 2003,
p. 123-144).
Noeses, 2005.
RESUMO
os textos com vistas a atingir com a mesma mensagem públicos distintos. O presente
bem como artigos científicos que se relacionam com os mesmos. Concluiu-se que a
autoridades nos anos 1980, ainda não foi totalmente superada ou consolidada, haja vista
Hans Jonas e pela Encíclica Papal para sustentar tais premissas diante de seus públicos.
Relatório Brundtland.
ABSTRACT
The present work sought to analyze the Brundtland Report's proposals and their
Encyclical Laudato Sí and Hans Jonas's ideas on the principle of responsibility. In spite
of the eminently distinct natures of the objects of analysis, the objective of this study
was to verify among the different languages and proposals, the points of convergence
between the texts with a view to reaching the same message with different publics. The
well as scientific articles that relate to them. It was concluded that the paradigm shift
proposed by the Brundtland report, which concerned the authorities in the 1980s, has
not yet been fully overcome or consolidated, given the contemporaneousness of the
ideas preached by the report and the effort made by Hans Jonas and the Papal
Brundtland Report.
INTRODUÇÃO
longo da segunda metade do século XX até os dias atuais e, em que pese a vetusta
discursos diversos têm abordado a mesma hipótese sob aspectos religiosos e científicos,
natureza”, como imperativo ético descrito pelo princípio responsabilidade trazido por
religiosas.
HISTÓRICO
com a sua beleza e simplicidade, isto porque, ver pela primeira vez este “grande mar
azul” em uma imensa galáxia chamou a atenção de muitos para o fato de que vivemos
em uma única Terra, compartilhamos a mesma casa. A cena singular do globo terrestre
global, passa a ocupar espaços cada vez mais significativos nos debates políticos
Nações Unidas sobre o Ambiente Humano, em Estocolmo – Suécia, que contou com a
Founex em junho de 1971. Esse teve como pauta a análise da relação entre o meio
tais como: acumulo de resíduos sólidos, poluição e uso excessivo dos recursos,
de definições. Hoje, há um verdadeiro mar de literatura que aborda o tema das maneiras
origens mais recentes estão plantadas na década de 1950, quando pela primeira
limitados.
o combate à pobreza. Essa divisão atravessava não apena os países, mas também
(ONU) deslocou o debate para uma comissão técnica que produziu Only one earth, um
(biologia) por uma tríade, com a inclusão da dimensão social (WARD et al., 1973).
Harlen Brundtland, cujo relatório de 1987, Our common future, propôs mudanças para o
que se chama hoje Desenvolvimento Sustentável. Neste sentido, e a partir daí, Lenzi
necessidades humanas atuais, e mais ainda as das gerações futuras, mas tal vagueza
sociais e direito de acesso aos bens necessários a uma vida digna, e aos valores éticos
Assim, pode-se considerar que o relatório Our common future se coloca contra os
efeitos do liberalismo:
sem uma perspectiva mais ampla, que englobe os fatores subjacentes à pobreza
Assembleia das Nações Unidas, em 1989, convoca a Conferência das Nações Unidas
Agenda 21.
científicos para que os países desenvolvidos repensassem suas práticas diante de uma
realidade ambiental em crise, mas tais esforços não surtiram o efeito esperado.
Alguns filósofos, entre eles Hans Jonas (2006), apontam para uma crise ética,
as futuras gerações, trazendo com sua obra o ineditismo filosófico que tratou da
emergência de uma ética que garanta a existência humana e de todas as formas de vida
princípio ético para a civilização tecnológica. É a essa reflexão que o presente trabalho
filósofos judeus nascidos na Alemanha. Viveu durante quase todo século XX,
Poder presenciar e analisar o estado real dos acontecimentos, fizeram com que Hans
oriundo da técnica, foi decisivo para alargar em grande escala, destruições em grandezas
nunca imagináveis. Para Jonas, o impacto que as bombas atômicas causaram durante a
“Age apenas segundo uma máxima tal que possas ao mesmo tempo querer que ela se
torne lei universal" (KANT, 1980, p. 129), sugere que o ser humano deve agir de tal
maneira que o princípio de tua ação se transforme numa lei universal. O imperativo de
consigo mesmo. Hans Jonas não se opõe às premissas da ética tradicional, mas busca
uma adaptação para a nossa condição moral, por isso, se considera que grande parte do
pensamento ético de Jonas nasce de uma crítica de toda história da filosofia moral da
ação humana.
ÉTICO.
defende um diálogo crítico em plena era tecnológica. Jonas entende que, “[...] sob o
signo da tecnologia, a ética tem a ver com ações de um alcance causal que carece de
precedentes [...]. Tudo isso coloca a responsabilidade no centro da ética” (JONAS, l995,
p. 16-17).
de ação humana: “Age de tal forma que os efeitos de tua ação sejam compatíveis com a
imperativo proposto por Hans Jonas é de ordem racional para um agir coletivo como um
Hans Jonas (2006) demonstra que muitas das premissas que limitam as questões
ser referências para o modelo de vida contemporânea, pois os antigos preceitos éticos
condição global da vida humana, o futuro distante e até mesmo a existência da espécie.
do homem, surge a ecologia forçando o repensar dos princípios básicos da ética, com
vistas a procurar não só o bem humano, mas também o bem de coisas extra-humanas,
A ética que Hans Jonas aborda como ética da responsabilidade é uma área do
p. 72):
(...) a ética não deve se referir somente ao homem, mas deve estender o
olhar para a biosfera em seu conjunto, ou melhor, para cada intervenção científica
fundamentação filosófica, mas ao sentimento geral, que até então os mais atentos
observadores poderão permitir cada vez menos de que algo poderia ir mal para a
própria existência. Entretanto, se havia comentado que era evidente a vinda da chuva
ácida, o efeito estufa, a poluição dos rios e muitos outros efeitos perigosos, fomos pegos
que o mundo animal, vegetal, mineral, biosfera e estratosfera passam a fazer parte da
um equívoco cometido ao isolar o ser humano do restante da natureza, uma vez que o
Para o autor, “ser é necessário existir, e para existir é necessário viver e ter
deveres, porém, (...) somente uma ética fundada na amplitude do Ser pode ter
significado” (JONAS, 2006, p. 17). Desta forma, defende que somos seres com
capacidades de entendimento, tendo liberdade para agir com responsabilidade frente aos
do homem e seu trato com o mundo, incluindo a ameaça de sua existência futura”
o qual uma nova teoria ética deve ser pensada. Que tipo de deveres ela exigirá? Haverá
algo mais do que o interesse utilitário? É simplesmente a prudência que recomenda que
não se mate a galinha dos ovos de ouro, ou que não se serre o galho sobre o qual se está
sentado? Mas este que aqui se senta e que talvez caia no precipício quem é? E qual é no
se os seres são ou não nossos descendentes. Jonas (2006) entende que, quanto mais se
pressente o perigo do futuro, mais temos que agir no presente. Jonas apropria o
categorias: Heurística do Medo, Fim e o Valor, o Bem o Dever e o Ser, a relação entre a
similitudes das doutrinas preconizadas por alguns autores. Singer (2004) afirma que um
conhecimento nem a modernização tecnológica, mas ambos devem estar submissos aos
vezes optam pela proteção ambiental e o bem-estar do consumidor, sendo contra aos
populacional. Esta ideia exposta por Singer demonstra uma grande similaridade com os
pressupostos sustentáveis.
Singer (2004) afirma que a economia solidária tem propósitos sociais e tem
empregado muitas pessoas e as incluindo no meio social. Neste aspecto, Sachs (2004),
ressalta que muitas das pessoas pobres estão excluídas do desenvolvimento; para ele o
Sachs (2004), não se deve diminuir a pobreza, mas sim acabar com ela através da
solidariedade entre as pessoas com menos condições financeiras muitas vezes nasce
fazer uma ponte teórica com o raciocínio de Sachs (2004) que defende que os conceitos,
gerações atuais para com as gerações futuras. O termo solidariedade está embutido em
Battestin e Ghiggi, (2010) destacam que Hans Jonas utiliza exemplos para
exemplo: O capitão de um barco não tem interesse em saber de onde vieram seus
passageiros e muito menos para onde vão depois de chegar ao destino programado. A
da vida. Para o médico, “não lhe interessam os outros prazeres e sofrimentos que tem
significado para aquela vida que ele salvou, sua responsabilidade termina com o fim do
tratamento”.
na Encíclica Laudato Sí, publicada pelo Papa Francisco em junho de 2015, sobre a qual
RELATÓRIO BRUNDTLAND
inteiro e aos fiéis da Igreja católica utilizado para exercer seu magistério doutrinário.
número de católicos passou de 1,11 bilhão em 2005 para 1,27 bilhão ao final de 2014,
17,8% da população mundial. Em dez anos, 157 milhões de pessoas foram batizadas.
Isso significa, segundo a Santa Sé, que a Igreja está ganhando adeptos num ritmo
católicos em dez anos. Nesse mesmo período, a população aumentou em 23%. Na Ásia,
aumentaram em 11,7% entre 2005 e 2014, contra uma expansão demográfica de 9,6%.
planeta.
taxa de apenas 2% em dez anos não permitiu que a taxa total fosse modificada. Hoje,
Pontífice da Igreja Católica edita a Laudato si', que em língua portuguesa significa
Louvado sejas, é o título da encíclica que tem o subtítulo "Sobre o Cuidado da Casa
irresponsável e faz um apelo à mudança e à unificação global das ações para combater a
comunicação social.
fidei, em 2013, sendo que está é, na sua maioria, um trabalho de Bento XVI. Assim,
dias" e lança o alerta para "a destruição sem precedentes dos ecossistemas, que
terá graves consequências para todos nós" se não forem realizados esforços de
A Encíclica tem seis capítulos: O Capítulo 1: faz uma análise da situação a partir
autorreferencial do ser humano como a raiz dos problemas; O Capítulo 4: propõe uma
processos de decisão transparentes; O Capítulo 6: recorda que nenhum projeto pode ser
eficaz se não for animado por uma consciência formada e responsável, e, sugere ideias
para crescer nesta direção em nível educativo, espiritual, eclesial, político e teológico.
construção teórica e prática da Laudato Si”, uma vez que a Encíclica assume o novo
paradigma contemporâneo segundo o qual tudo forma um grande todo com todas as
sustenta a noção de ecologia integral, que convida a ter em conta todas as lições desta
Para Leonardo Boff (apud FACHIN, SANTOS, 2015, [s.p.]), a encíclica assume o
novo paradigma contemporâneo segundo o qual tudo forma um grande todo com todas
Assim como Hans Jonas, o Papa assevera que a raiz da crise ecológica reside na
tecnocracia. Distingue-a da tecnociência que tantos benefícios nos trouxe. Mas ela
resolver todos os problemas ecológicos. Com justeza critica esta visão porque ela isola
os seres que estão sempre entrelaçados. Ao dissociá-los pode produzir mais malefícios
sobrepõe a ela como forma de dominação, quebrando a fraternidade universal. Por isso
humano, o seu bem-estar e não o bem comum de todos os demais seres, habitantes da
casa comum. Nesse sentido, a encíclica defende uma conversão ecológica em que o
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
camada de ozônio, temáticas que eram bastante novas para o momento de seu
lançamento. Elenca uma série de metas a serem seguidas por nações de todo o mundo
para evitar o avanço das destruições ambientais e o desequilíbrio climático. Foi uma das
primeiras tentativas nesse sentido já que, até a atualidade, as nações ainda não
comprometimento de uma atitude atual com uma realidade vindoura, verificou-se que
esta seria a primeira condição ética e responsável da presente geração para a geração de
intergeracional.
possibilidade de se efetivar uma práxis coletiva. Poder respeitar, cuidar, lutar, renunciar
e, acima de tudo, agir com responsabilidade, é um ato essencialmente ético, que está na
esfera de poder do indivíduo. Hans Jonas foi um educador e um pensador que remeteu
suas preocupações com a humanidade, com a vida presente e futura, assim, tornou-se
contemporânea.
meio ambiente atinge os mais fracos e que uma abordagem ecológica verdadeira se
torna uma abordagem social para que tanto o clamor da terra seja ouvido como o clamor
dos pobres.
Nesse sentido, a encíclica defende a ideia de que a solução não passa pela redução
conceber, mas, mas que, em existindo um a dívida ecológica entre o norte e o sul, tendo
em vista que os danos causados pelo excessivo consumo de alguns países ricos tem
repercussões nos lugares mais pobres do planeta, seria necessário que os países
consumo de energia não renovável e fornecendo recursos aos países mais necessitados,
pois as regiões mais pobres têm menos possibilidade de adotar novos modelos de
Estas situações exigem uma mudança de rota, um sistema normativo que inclua
econômico chega a prevalecer sobre o bem comum e manipular a informação para não
vez mais, no que tange sua efetivação, ao nível de consciência do indivíduo sobre sua
tempos e espaços em busca de sua compreensão e aplicação que perpassam por sua
análise ética, científica e espiritual. Essa análise amplia sua interpretação para além da
temática ambiental, mas para a própria busca da proteção do humano e de todas as suas
a sua compreensão nos discursos analisados demonstra que a ideia sobre a real
REFERÊNCIAS
princípio ético para os novos tempos. Thaumazein. Ano III, número 06, Santa Maria
1987.
da Laudato Si'. "Nem a ONU produziu um texto desta natureza''. Entrevista especial
ecologia-integral-a-grande-novidade-da-laudato-si-qnem-a-onu-produziu-um-texto-
Atual, 1998
http://w2.vatican.va/content/francesco/pt/encyclicals/documents/papa-
ao social, do social ao econômico. Estud. av., São Paulo, v. 26, n. 74, p. 51-64, 2012.
2017. http://dx.doi.org/10.1590/S0103-40142012000100005.
PEILLON, Antoine. GAULMYN, Isabelle de. A Laudato Si’ é, talvez, o ato número 1
de um apelo para uma nova civilização. Entrevista com Edgar Morin. Disponível em: <
http://www.ihu.unisinos.br/noticias/543811-a-laudato-si-e-talvez-o-ato-numero-1-de-um-apelo-
Acesso: <https://www.pensamentoverde.com.br/sustentabilidade/nosso-futuro-em-comum-
https://press.vatican.va/content/salastampa/es/bollettino/pubblico/2017/04/06/ter.html>.
jul. 2017.
Resumo
qual consiste no que segue: existe uma Ecoética, e os valores que lhe são próprios foram
que exige a construção de uma Hermenêutica Eco-Jurídica própria, haja visto que os
bem como nortear o seu resultado. Atente-se que, longe de ser um trabalho puramente
texto transita entre a Filosofia e o Direito, sem, contudo, ferir a racionalidade sistêmico-
I. INTRODUÇÃO
enfrentá-los.
Essa reflexão sobre os problemas concretos e abstratos deu origem àquilo que na
humano.
Ocorre que, com o tempo, a observação e a reflexão passaram a ser seguidas pela
experimentação. Esta última, por seu turno, permitia que se aferisse in concreto a
validade (ou invalidade) daquilo que fora teorizado como explicação para determinado
É assim que nasce a cisão entre Filosofia e Ciência. Enquanto a primeira teoriza in
ela deve seguir rigorosamente um método. Trata-se do método científico, que consiste
Note-se que o pensar filosófico, por meio do cogito (pensar problemático), auxilia
Ecoética devem permear a interpretação e a aplicação deste ramo do Direito, bem como
verificar a solidez da hipótese formulada, o que será feito na sequência, por meio da
hipótese.
sob a qual será avaliada logicamente a validade (ou invalidade) da hipótese. Isto
natimorta.
Marcelo Pereira dos Santos, pois, se válida, estará devidamente confirmada a premissa
Para iniciar essa verificação deve-se responder a uma pergunta básica: O que é
ética?
do texto em outro escrito, o qual conceitua ética como “a ciência que estuda a moral
que regem as normas morais na sua esfera de incidência” (KHAMIS, 2015, pp. 32-
33).96
a qual "o valor da ética como teoria está naquilo que explica, e não no fato de prescrever
possibilidade de, como fazem Edna Raquel Hogemann e Marcelo Pereira dos Santos,
natureza.
96
O mesmo autor conceitua moral como "a conduta realizada pelo indivíduo no plano concreto de sua
vivencia, em atendimento a uma norma conhecida, desprovida de coercibilidade, por ele intimamente
aceita” (2015, p. 26).
O radical “eco" advém da raiz grega oikos, que significa casa. Porém,
figurativamente, como o espaço comum em que habitam todos os seres vivos. Eco,
Assim, a Ecoética pode ser concebida como o capítulo da Ética (ciência) que
relação dos seres vivos (humanos e inumanos) com o meio em que habitam.
provenientes de causa natural, mas que exijam dita intervenção para solucioná-los,
a hipótese formulada pode ter a sua validade (ou invalidade) cientificamente aferida, na
Os problemas morais provenientes da relação dos seres vivos com o meio em que
Por se tratar de questões que impactam o plano da existência, não se pode admitir
(eco)sistema em desfavor do meio nas relações entre os seres vivos e o seu habitat.
por normas que, em sua maioria, são imperativas (BOBBIO, 2003, p. 125), as quais se
tanto a existência do meio quanto dos seres vivos que o habitam, ferindo de morte os
valores mencionados.
irrecuperável.
preciso, pois, que a hermenêutica ofereça ao interprete técnicas que permitam aliar os
praxis, dos valores contidos nos princípios Ecoéticos, oferecendo resultados que
existência de uma relação entre Ecoética e Direito, bem como que se identifique de
deve ser investigada, na medida em que indica que a relação entre Ecoética e Direito se
daria por meio da juridicização - isto é, da conversão em norma jurídica - dos valores
contidos nos princípios Ecoéticos. Ditos valores estariam refletidos nos princípios
jurídicos de Direito Ambiental que, ao contrário dos primeiros, são normas jurídicas e,
Se isso realmente ocorre, de que forma e em qual plano é tarefa a ser aferida em
parte dele).
contidos nos princípios Ecoéticos, bem como apontar de modo pormenorizado a forma
como Ecoética e Direito se relacionam, pois, sem a validação desses dois pilares, não
REFERÊNCIAS
pp.125-145, 2015.
KELSEN, Hans. Teoria pura do Direito. 6 ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998.
2015.
fatores que marcam as diferenças sociais, ser suscitado o fundamento da “natureza das
Afinal, o que pertencer a este campo, não poderá ser modificado, justamente
desígnio superior a que os seres humanos deverão sujeitar-se [ENGISCH, 1995, p. 323;
LARENZ, 1978, p. 168; ATHAYDE, 1931, p. 64; FERREIRA FILHO, 1992, p. 269;
A “natureza das coisas” seria, pois, o grande fundamento para que, uma vez
pudesse fazer desse objeto absolutamente tudo o que desejasse, inclusive destruí-lo.
gerar o maior proveito possível para quem tivesse arriscado o respectivo capital, e para
que todo aquele que não tivesse competência para arriscar o respectivo capital viesse a
empreender todos os esforços para captar as simpatias dos que, por definição, seriam
realidade, tem sido mais frequente do que se imagina, e não só em meio a pessoas
dotadas de pouca instrução, vez que se podem verificar, dentre os defensores de tal
posição, até mesmo indivíduos que vieram a ocupar cátedra [FERREIRA FILHO, 1978,
2004, p. 147; GRAU, 2010, p. 256; MOLL, 1995, p. 157] vem a ser substituída pela
apresentaria como um entrave, e isto vem a ser expresso tanto pelas medidas adotadas
destaque especial para a Lei 13.874, conhecida como “da liberdade econômica”.
contra a atuação empresarial, passou-se a tratar como uma verdadeira questão de honra
a extinção desses fatores (legislação trabalhista, ambiental etc.) que, numa visão
que se tais restrições existissem nos países desenvolvidos, nunca teriam chegado ao
agentes de mercado no Primeiro Mundo decorre do fato de que mesmo nos países tidos,
buscar a realização da sua vontade à plena, removendo tudo o que lhe pareça um
obstáculo.
Uma proposição sirênica que se mostra frequente é a que põe a questão ambiental
necessidades humanas, tendo em vista uma realidade marcada pelo desemprego e pela
constância da busca de capitais para permitir que o país atue no mercado internacional
com a velocidade que este exige: a ideia do mercado como “ordem natural” acaba por se
apresentar como uma razão para que se dê prioridade, antes, ao que facilite às empresas
aos cuidados que essas mesmas empresas devem adotar para a prevenção dos danos ou
custos.
escopo que contrariaria aqueles que dão a busca do atendimento aos “desejos do
efeitos sobre os humanos por decorrência dos desastres – a expressão é utilizada para
fins de designar tanto os “acidentes” quanto aquelas catástrofes que sejam provocadas
tanto pelo dolo quanto pela culpa dos seres humanos – conduzem ao arrependimento
novembro de 2015, matando o rio Doce, se voltou, muito mais, a minimizar os custos
dar a hierarquia funcional como impotente para determinar a verdade ou falsidade das
Nordeste, ao invés de atender ao dever estabelecido para todos os Poderes Públicos nos
artigos 23, VI, e 225 da Constituição brasileira, suscitou-se o silêncio das Organizações
muitos que acreditaram não existirem entre o país bolivariano e a Região Nordeste três
Guianas, mais um Estado do Amapá e um Estado do Pará, e que bastaria apontar nele a
culpada pelo vazamento para afastar qualquer responsabilidade do Estado, por suas três
A suposta omissão das ONGs foi desmentida pelos próprios fatos, diante da
[SOUZA, 2019].
É importante ter presente a formação de um certo senso comum, tanto nas redes
sociais como fora delas, acerca de a gravidade dos problemas ambientais ser mensurada
puderem ser atribuídas aos inimigos de sempre – “ONGs ligadas ao projeto vermelho-
mas sim sugadores da nação”, “quilombolas com peso em arrobas que não servem nem
modo, o Poder Público não tem nada com isto, tem que deixar as forças vivas que
Este senso comum, entretanto, não é suficiente para legitimar a demissão, pelo
acordo com a jurisprudência firmada pelo Supremo Tribunal Federal a partir da medida
Sepúlveda Pertence, cujo acórdão foi veiculado no Diário de Justiça da União do dia 8
de novembro de 2002.
Ao contrário, os encargos são conferidos pela ordem jurídica aos entes públicos
para que estes os executem, e se o são aos entes públicos, é em virtude de se entender
por um lado, por mais essencial que ela seja, e à necessidade do exercício do poder de
coação, por outro, para que ela seja executada. Tal distribuição parte do pressuposto de
que dificilmente o ser humano está disposto a atuar para além da expectativa de
benefício próprio ou em prol de algo que, por aumentar o benefício de outrem, diminua
o seu próprio e, contudo, a necessidade, nem por isto, deixa de existir e de merecer
atendimento.
conquistar facilmente, aos frustrados e inseguros, com a tese de que os seus interesses
são melhores em função da própria natureza das coisas e que tudo o que se lhes oponha
é, por definição, a expressão do Mal tem-se feito presente ao longo de cada recaída
autoritária na história mundial, seja pela grandeza da raça, no III Reich, seja pela defesa
A partir de tal tese, tudo o que exista que não seja para a maior glória do que, pela
vegetais e animais que não estejam destinados a nenhum uso humano até tribos de seres
humanos que não signifiquem absolutamente nada em termos de mercado – passa a ser
melhores para os seres humanos acabou sendo frustrada de várias formas, em especial
em virtude de, qualquer que seja o modo por que se organize a sociedade, quem quer
que assuma o poder sempre estará sujeito à tentação de utilizar a força para satisfazer os
seus próprios interesses, a empregá-la caprichosamente, de tal sorte que, para o ser
quando não perniciosa, já que pode implicar afastar o justo castigo do representante do
futuro glorioso, mesmo que, paradoxalmente, a esperança deste futuro glorioso tenha
CISCATO, Costanza. Natura, persona, diritto – profili del tomismo giuridico nel
Saraiva, 1978.
tiver coragem!”). Revista de Direito e Política. São Paulo, v. 17, n. 25, pp. 237-246,
2019.
Malheiros, 2010.
Direito Econômico na nova ordem mundial. In: CAMARGO, Ricardo Antônio Lucas
souverainité des individus – les formes actuelles de la vie économique: les groupements
– esquisse d’une structure nouvelle des forces collectives. Paris: Bernard Grasset, 1920.
noticias/redacao/2019/10/07/as-vesperas-de-leiloes-petroleo-em-praias-mostra-
despreparo-do-pais-diz-
greenpeace.htm?fbclid=IwAR0q8K0zJG8tIRO25gfo1lsu1Uw_c4E9SEbGtpaYH0Ltua
PUTTI, Alexandre. “Eu não peço, eu mando”, diz Bolsonaro sobre demissão de
bolsonaro-sobre-demissao-de-diretor-do-
inpe/?fbclid=IwAR0HvefFFRvDgnBCF8JR8Fyv_FFARJ3Z1lQkSkU5OolsGyVoNAB
https://josiasdesouza.blogosfera.uol.com.br/2019/10/25/bolsonaro-e-salles-decidiram-
aperfeicoar-os-
erros/?fbclid=IwAR3ZgGKi7KGZBwvED9a5RFTXjJXCVl7mcKUDQhIegjpjt2Mw5
Resumo:
gerações, vez que a recuperação dos ecossistemas atingidos poderá levar dezenas, ou em
ambiental por parte do atual Governo Federal, cujas primeiras medidas foram iniciar um
O presente trabalho tem como objetivo trazer um breve estudo bibliográfico sobre
Brasileira.
Federal
Abstract:
about the serious consequences for the present and the future generations, as the
recovery of affected ecosystems may take dozens, or in some cases never recover.
Added to this is the lack of an environmental policy on the part of the current Federal
Government, whose first measures were to initiate a dismantling of the structure of the
Mariana and Brumadinho, in addition to the recent burning in the Brazilian Amazon.
Federal government
1. Introdução
gerações, vez que a recuperação dos ecossistemas atingidos poderá levar dezenas, até
de uma política ambiental por parte do atual Governo Federal, cujas primeiras medidas,
tão logo ascendeu ao poder foram iniciar um desmonte da estrutura dos órgãos de
O Brasil possuía uma das mais avançadas legislações protetivas do meio ambiente
Isto fica evidente com as alterações que foram feitas no Código Florestal, nas propostas
etc.
A gravidade da situação é de tal monta que, logo nos primeiros meses do atual
Governo Federal, todos os ex-Ministros do Meio Ambiente, vivos, desde que foi criado
O presente trabalho tem como objetivo trazer um breve estudo bibliográfico sobre
Brasileira.
elaborar uma Sociologia Ambiental remonta a fins do século XIX e primeiras duas
Moderno”, de acordo com Hannigan (1995), foi o “Earth Day 1970” que consistiu
numa proposta de debates, a nível nacional nos EUA, entre alunos e professores,
Ambiental”.
pensador determinista, afirmava que a “sociedade humana é produto das forças naturais
geográfico é muito directa e, portanto, mais forte das pessoas ‘primitivas’, mas declina
pelas suas suaves colinas, e por animais domésticos nas quintas, representa um
De outro lado, tem-se uma visão darwinista, onde há a preponderância das leis da
que somente os “mais aptos” sobrevivem. Os seres humanos são dotados de aptidões
inatas que os diferenciam e os mais aptos obterão riqueza, sucesso, poder, ao passo que
inatas dos indivíduos e normais na luta pela vida dentro de uma sociedade.
(BOLSANELLO, 1996).
de acordo com os princípios liberais. Em seu sistema, pensou a sociedade sob o modelo
organismo individual uma analogia perfeita’ (SPENCER, 1889, p.08). Existe, portanto,
2).
sucumbiriam aos primeiros diante de sua inferioridade para manter a proliferação de sua
espécie. Para Spencer, isto significaria que os mais fracos não sobreviveriam, deixando,
modo, a sociologia não se fundava mais na física e na biologia, dando lugar à influência
da sociedade.
indústrias de base.
integrante da natureza, para dominá-la. Para muitos, é neste momento que surge a
formularam o que ficou conhecido como Sociologia Rural, surgida nos anos 60 do
Society – RSS), que criou um grupo de estudos sobre Recursos Naturais – o Natural
até então, ou seja, prevalece sobre a diversidade de ideias existentes entre elas. Os
autores destacam que esta visão antropocêntrica é parte da básica visão sociológica de
restrições ecológicas” (CATTON E DUNLAP, 1978, p. 42). O HEP seria uma “forma
seguintes premissas: a) os seres humanos são únicos entre todas as criaturas porque têm
uma cultura; b) a cultura pode variar quase que infinitamente e pode mudar muito mais
significa que o progresso pode continuar sem limites fazendo com que os problemas
surgir, os cientistas que se tornaram líderes de opinião não eram sociólogos. A aceitação
do “Human Excepcionalism Paradigm” fez com que a sociologia focasse seus estudos
ligação com outros fatos sociais” (CATTON e DUNLAP, 1978, p. 44), que criou
Este paradigma defendido pelos autores sustentava que: a) os seres humanos são
apenas uma das muitas espécies que são interdependentemente envolvidas nas
comunidades bióticas que moldam nossa vida social; b) as intrincadas ligações entre
Ambiental residiram no fato de que “as premissas do NEP se encontravam num nível de
abstração muito elevado para permitir uma pesquisa significativa, e que alguns dos seus
Ecológico não prosperou. Neste sentido, houve uma nova tentativa de se delimitar um
campo teórico para a Sociologia Ambiental que se deu através da revisão das teorias
forma, previram os problemas ambientais, ainda que dentro de uma visão ética, política
e de justiça social.
2014).
indução dos consumidores a quererem adquirir novos produtos, ainda que isto leve a
políticas que encorajam ainda mais a expansão” (HANNIGAN, 1995). Ou seja, é uma
produção.
nas sociedades industriais, onde, de um lado, o Estado tem que promover as condições
para a produção (geração de capital) e de outro tem que assegurar a proteção ambiental,
cada vez mais presente na agenda política. Isto seria um conflito entre os ‘valores
existem nos países socialistas (a China chegou a ser o país que mais polui no mundo),
mas não se pode negar que se trata de uma perspectiva que coloca a economia como um
ciência, além de refletir nas ações políticas e na visão do público de uma maneira geral
teorias da modernização, Beck propõe uma visão mais sombria, aquilo a que
responsabilizado pelos danos causados por esses riscos, e aqueles afetados não
podem ser compensados, devido à dificuldade de cálculo desses danos. Além dos
A partir dos anos 1990, estes enfoques teóricos trouxeram uma renovação no
debate sociológico no que tange à questão ambiental. Alguns pensadores que não eram
Ao mesmo tempo que Guiddens, Beck e outros tratavam das questões ambientais
224).
industrialização numa direção na qual a base de sustentação pode ser garantida. (...)
como também na importância que ela confere ao Estado como um ‘condutor’ dessa
mudança” (idem).
insuficiências do mercado para levar adiante este processo. Mas, deve-se frisar
burocrático e reativo das políticas estatais ecológicas dos anos 70. Ela procura
Para exemplificar, tem-se a energia nuclear que foi reverenciada como uma tecnologia
“limpa”, entretanto, os desastres com as usinas nucleares mostraram quão nociva pode
ser. Ele ainda destaca o fato de que foram pouco mencionadas as relações de poder.
Hannigan (1995) apresenta o que deverá ser observado numa investigação futura
produção para o consumo como foco central da ligação entre economia e o ambiente
natural”(p. 247-248).
mencionadas acima.
homem temia a natureza, atribuía a ela divindades (Netuno, Deus dos Mares; Thor,
não havia resposta, a partir desta Era, conhecida também como período
Minamata, no Japão, foi um grande marco, pois, causou inúmeras mortes de humanos e
Nos anos 60, pode-se citar o desastre do Mar Aral, que era o quarto maior lago de
água salgada do mundo. Com a decisão de se plantar o algodão, o curso dos rios foi
desviado para as plantações no deserto. O resultado foi a redução do nível de água, até
tóxico chamado isocianato de metila, além de vários outros gases venenosos, foram
liberados. Mais de seiscentas mil pessoas foram expostas à nuvem de gases mortais. Há
estimativas de que entre três mil e oitocentas e dezesseis mil pessoas morreram em
imensos danos não só ambientais como à saúde humana, levando a inúmeras mortes.
quais causavam graves danos respiratórios, além de deformidades nos bebês – muitos
utilizando mercúrio na sua célula de produção foi a primeira indústria do país a ser
reaberta. No início dos anos 200098, o Ministério Público Federal entrou com uma Ação
Civil Pública pedindo, entre outras coisas, o fechamento da planta novamente, pois
potassa cáustica. Destaca-se que vários operários da indústria foram contaminados pelo
mercúrio, que causa uma doença incurável, que afeta o sistema nervoso central,
“hidrargirismo”.
Não se pode esquecer do caso do Césio 137 quando uma exposição ao material
Um pó branco que emitia luminosidade azul foi encontrado por alguns homens que
material para casa e outros locais, contaminando o solo, água e ar, causando a
Samarco, empresa controlada pela Vale do Rio Doce e pela BHP Billiton, foi em
98
http://greenpeace.org.br/toxicos/pdf/corporate_crimes_port.pdf
chegar ao Rio Doce e contaminar outros dois rios, ocasionando uma vasta destruição até
o litoral do Espírito Santo, percorrendo 663,2 km de cursos d'água. O mar de rejeitos era
barragem, como:
parte frontal das barragens opera no sentido inverso à sua utilização, ou seja, ao
contrário de ser eliminada, a água é retida. Alguns especialistas consideram ser esta a
tragédia. No dia do rompimento das barragens, foram registrados onze pequenos abalos
Itabira e Itabirito;
de ferro que em 2016 aumentou sua produção do minério em 37% e, em razão disso,
jornalista Perez (2015) revelou que, em outubro de 2013, a empresa já tinha sido
diversos aspectos técnicos da barragem foram colocados sob alerta. Apesar dos
ferro na região e tampouco procedeu aos reparos que foram orientados pelos
Cleary Gottlieb Steen & Hamilton LLP, que formou um comitê que ao longo do período
Deslizamento Fluido? 2) Por Que Ocorreu Deslizamento Fluido Naquele Local? 3) Por
utilizar areia insaturada em uma área para apoiar a zona de lamas fracas. “Areia
neste aspecto”. Todavia, houve dificuldades para executar o projeto tendo sido
modificado e
Três condições eram necessárias para que acontecesse o deslizamento fluido: (1)
oculares relataram que o deslizamento fluido se iniciou em local que foi identificado
incorporado uma zona de 200 m para separar os dois depósitos. Todavia, dados
depósitos ricos em lama. Isto distingue a área da ombreira esquerda da direita e explica
verticalmente a zona rica em lama, que tende a ser expelida ou espalhar lateralmente,
Como se pode constatar, ao ler o que foi apontado como prováveis causas do
mineradora assumiu os riscos da tragédia. Não se pode deixar de mencionar, que tudo
isto poderia ter sido evitado se os órgãos de fiscalização do Estado tivessem agido com
rigor.
revelou que “o nível de impacto foi tão profundo e perverso ao longo de diversos
vidas humanas; a perda da história de vida dos sobreviventes das áreas que foram
Vale.
mortos e dezesseis pessoas ainda estão desaparecidas, além do enorme dano ambiental
(EXAME).
rompimento da barragem, onde aponta que “as normas técnicas, as boas práticas de
probabilidade anual de falha, segundo a análise dos peritos. Os dados coletados naquele
Laudo aponta que a barragem, que operou entre 1976 e 2016, “sempre esteve sujeita a
Os peritos da PF reportaram que não foi constatada qualquer ação efetiva dos
que já era conhecido que havia um risco de morte de duzentas e quatorze pessoas em
para consumo”, contendo cromo, cobre, manganês e óxido de ferro provenientes dos
2019)
vinte e um municípios visitados ao longo do rio, informando que a vida neste trecho
a sua preocupação em relação à não realização de uma CPMI, como se pode destacar a
seguir: "Nós precisamos reagir porque estão preparando 'pizza' com as pessoas se
povo. A expectativa é muito grande para que não se tenha impunidade”, (...) “Uma das
características de Mariana foi esta: 20 pessoas foram indiciadas na época, e a Vale, com
o lobby dela, conseguiu paralisar o processo na Justiça. Estão todos até hoje impunes.
Se não tivermos uma CPMI e tivermos uma 'pizza', provavelmente esses diretores da
nas cidades de Barão de Cocais e Nova Lima, de tentar comprar imóveis que estão em
Brumadinho, afirmou que é inevitável que se elabore uma legislação mais rigorosa para
evitar a repetição de crimes socioambientais. "É preferível a gente pecar pelo excesso
para que amanhã não venha a pagar pela omissão", declarou (CÂMARA DOS
DEPUTADOS, 2019).
O que se viu no decorrer dos meses, foi um clima de medo, apreensão e incerteza
por parte das populações que vivem sob as barragens (montanhas de lama mineral) da
rompimento, sirenes foram acionadas provocando a saída das pessoas de suas casas.
industriais, muitas vezes com um faturamento muito superior a produtos internos brutos
(PIBs) de muitos países, dão origem a estas tragédias, na verdade, crimes contra a vida.
O discurso do CEO da Vale destacou, principalmente, que deveria haver uma espécie de
compaixão com a empresa que, sabidamente, causou todas as mortes e todo o desastre
anunciada”. “A Vale matou. Destruiu o meio ambiente. Admite. Até sente muito. Mas
não quer ser punida. Por isso, pede compreensão. Um roteiro longe de ser inovador
ambiental foi bem clara desde a campanha, no sentido de desconstruir muitas medidas e
estruturas, até então, existentes no país para preservar ao meio ambiente, as queimadas e
Central.
Algumas áreas que foram queimadas já estão cercadas e com porteiras e cadeados
(MAAP) revelou que as queimadas na Amazônia foram para concluir a sua conversão
agosto”. Trinta e nove ml e cem hectares, que corresponde à maioria das ocorrências foi
O MAAP divulgou um mapa inédito que liga o desmatamento de 2019 aos focos
de incêndio, foi feita uma sopreposição de “duas camadas de dados principais: alertas de
incêndio da agência espacial americana NASA do mesmo período, revelando uma clara
A estrutura criada, ao longo dos anos, para a preservação do meio ambiente, leia-
se IBAMA, Instituto Chico Mendes, Polícia Ambiental, FUNAI etc. está sendo,
desenvolvimento, há que se destacar que não foi a primeira iniciativa neste sentido no
país. Mas, nunca foi tão forte e eficaz no desmantelamento da estrutura institucional.
preservação ambiental. Os EUA decidiram sair do Acordo de Paris, numa crença de que
ainda que o discurso para o público internacional seja o de que “o país é o que mais
desenvolvimento”99.
serão simplificadas e que a vida de quem quer produzir será facilitada, vê-se a
atividade do agronegócio no Brasil, contrariando uma exigência cada vez maior, tanto
por parte dos importadores europeus dos produtos brasileiros, quanto por parte dos
4. Considerações finais
ambientais que aconteciam, especialmente nas atividades industriais que poluíam solo,
ar, rios e mares, além da poluição sonora, paralelo ao que Hannigan qualificou como o
ponto de partida para esta consciência ambiental – o Earth Day, em 1970 – despertou a
99
Discurso do Presidente da República, Jair Messias Bolsonaro, na abertura do Fórum Econômico
Mundial, em Davos, na Suíça, em janeiro de 2019.
100
Idem.
que se tornaria a Sociologia Ambiental (apesar de ainda ser uma área de conhecimento
A partir dos anos 80 e 90, os problemas ambientais passam a ter uma dimensão
maior. O esgarçamento da utilização dos recursos naturais por parte das atividades
Paradigma Ecológico (NEP), que consideraria, entre outras coisas, a finitude do mundo,
(FLEURY, 2014).
objeto claro de estudo da Sociologia Ambiental, em razão de ser muito abstrato, duas
Todavia, de acordo com Hannigan (1995) faltou a estas teorias a dimensão das
diversos países, como França, Holanda, Áustria e Irlanda. De acordo com a DW Brasil
(2019), dos 751 assentos no Parlamento Europeu, 70 devem ser dos verdes.
o Brasil optou por perpetrar um desmonte dos órgãos de fiscalização e defesa do meio
ambiente.
argumentando que são grandes extensões de terras ricas no seu subsolo que devem ser
aproveitadas economicamente.
ambientais.
sua composição que passou de noventa e seis conselheiros para vinte e três.
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Março de 2020