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Serão os discursos de ódio compatíveis com a liberdade de

expressão?

Neste ensaio filosófico eu pretendo demonstrar que os discursos de ódio não estão de
acordo com os direitos humanos e, por isso são considerados violadores dos mesmos.
Quero também demonstrar que a utilização deste tipo de discurso não pode ser feita
com a desculpa de termos liberdade de expressão. Pretendo ainda demonstrar que
quem comete estes discursos de ódio quer pessoalmente, quer online ou de qualquer
outra maneira deveria ser punido pelos seus atos.

Para começar a falar de discursos de ódio é necessário falar primeiro sobre direitos
humanos. Segundo a Organização das Nações Unidas, os direitos humanos são
“direitos inerentes a todos os seres humanos, independentemente de raça,
sexo, nacionalidade, etnia, idioma, religião ou qualquer outra condição”,
incluindo “o direito à vida e à liberdade, à liberdade de opinião e de expressão,
o direito ao trabalho e à educação, entre muitos outros. Todos merecem estes
direitos, sem discriminação”. Nestas definições os direitos humanos estão
garantidos a todos os seres humanos independentemente das suas
características. No entanto, isto acaba por ir contra os discursos de ódio que
acabam por ser pura discriminação. Com isto, podemos perceber que os
discursos de ódio ferem as garantias dos direitos fundamentais de todos os
indivíduos.

Segundo Thorbjørn Jagland, Secretário-geral do Conselho da Europa, “Na Europa dos


dias de hoje, o discurso de ódio é uma das mais prolíferas formas de intolerâncias e de
xenofobia, sobretudo online: a internet é frequentemente palco de abusos por parte
de quem quer espalhar propaganda e difamar grupos ou pessoas diferentes. Cada vez
mais no discurso político dominante, vemos uma mistura tóxica de discurso de ódio,
notícias falsas, e “factos alternativos” que são uma ameaça real à liberdade e à
Democracia. Estas tendências contrastam claramente com os valores e objetivos do
Conselho da Europa, que se dedica à divulgação dos Direitos Humanos no continente.
A nossa Organização tem um papel proeminente na definição do que é discurso de
ódio, ajudando a garantir que quem o usa é responsabilizado e responsabilizada. (…) O
discurso de ódio não é algo que pode ser ‘protegido’; as palavras de ódio podem levar
a crimes de ódio reais e esses crimes já destruíram e ceifaram a vida de demasiadas
pessoas. O discurso de ódio é uma das formas mais comuns de intolerância e de
xenofobia na Europa atual. O aumento de narrativas de ódio no discurso político, bem
como o facto de se ter transformado num lugar-comum na esfera publica, sobretudo
na internet, é particularmente preocupante. Quando o inaceitável começa a ser aceite,
transforma-se na ‘norma’ e há́ uma verdadeira ameaça aos Direitos Humanos. (…) A
educação é a única solução a longo prazo para evitar e denunciar o discurso do ódio e
para promover a solidariedade com as vítimas. Aprender sobre, através e para os
Direitos Humanos é essencial na manutenção de um clima ativo de Direitos Humanos
perante as rápidas mudanças que as nossas sociedades hoje enfrentam. Esta questão é
particularmente relevante para as crianças e os e as jovens que hoje devem, com
certeza, receber como parte integrante da educação a literacia sobre os media e a
internet.” Resumindo o que o Secretário-geral do Concelho da Europa disse, os
discursos de ódio estão presentes quando se incita, promove ou propaga ódio racial,
xenofobia, anti-semitismo e/ou qualquer outra forma de ódio que tenha por base a
intolerância.

Os discursos de ódio são considerados um tipo de violência verbal, que tem por base a
não-aceitação das diferenças, ou seja, a intolerância. Sendo estes tidos em conta como
um tipo de violência, os casos que envolvam estes tipos de discursos devem ser
tratados como todos os outros casos de violência. Pois se num caso de agressão física
são trazidos transtornos e perturbações para a vida da vítima, num caso de violência
verbal as implicações trazidas não são menores nem menos traumatizantes. Logo, se
num caso de atos de violência física o agressor é punido, então num caso de discursos
de ódio o agressor verbal deve também ser punido de alguma maneira.

Os discursos de ódio online são bastante preocupantes. A internet é uma óptima


ferramenta de comunicação e de interacção porém têm poucos limites e pouco
controlo. Quem utiliza esta ferramenta pode muito facilmente esconder-se por trás de
um ecrã e utilizar o anonimato para promover o ódio contra outras pessoas. Além
disso, o ódio pode propagar-se muito rapidamente através de comentários ou de
partilhas. Os efeitos podem ser devastadores para a pessoa alvo deste mesmo discurso
de ódio.

Supervisionar discursos de ódio online é muito difícil e é precisamente por isto que se
torna tão fácil para quem os pretende espalhar e tão difícil para quem os pretende
controlar.

Algumas organizações já tentaram perceber a dimensão do problema e todas


concluíram que os discursos de ódio online têm vindo a aumentar.

Provavelmente o argumento mais utilizado para contradizer o que eu estou a defender


é que todos nós temos liberdade de expressão e, por isso temos o direito de dizer e
expressarmos da maneira que quisermos tudo sobre todo o tipo de temas, sem ter
qualquer atenção nem cuidado com a forma com a qual o fazemos. É claro que temos
o direito da liberdade de expressão mas isto não significa que não tenhamos que
desrespeitar outros direitos. No fundo isto significa que temos a liberdade para
expressar o que pensamos e as nossas opiniões desde que não transgrida nenhuma lei.
Ou seja, frases e expressões racistas, homofóbicas, xenófobas ou do mesmo género,
utilizando o argumento de que somo livres e temos liberdade de expressão, além de
ser um ato nada respeitador é considerado crime pois viola vários direitos
fundamentais.

Após apresentar todos os argumentos que considero relevantes para esta questão e
após refutar a que considero a sua principal objeção quero concluir que os discursos
de ódio vão contra a lei, pois são considerados um tipo de violência e por isso são um
crime. Concluo ainda que os mesmos não podem ser expressos com a desculpa de que
existe liberdade de expressão e de que temos direito a ela, pois estes discursos
acabam por violar outros direitos, sendo assim considerados, mais uma vez, crime.

Adriana Machado

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