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CONSTITUCIONAL
Aula 15
Liberdade de expressão
Professor
Luís Henrique Linhares Zouein
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Introdução: conceito, pressupostos e fundamentos.
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Caso Gerald Thomas:
Também no STF tem um caso curioso, o caso Gerald Thomas, julgado em
2004. Gerald Thomas era um famoso diretor de teatro, e na estreia de uma de suas peças
foi vaiado pelo público. Ao ser vaiado, baixou a calça e mostrou as nádegas. Ele foi
processado por ato obsceno. A questão chegou por meio de HC ao STF, que entendeu
pela atipicidade da conduta, que estaria protegida pela liberdade de expressão, à luz
daquele contexto.
Aquela peça teatral que estreava naquela noite, era uma peça que tinha cenas
de simulação de sexo, por isso mesmo, apenas para maiores de 18 anos, que começou
meia-noite e se deu na madrugada. Então o público era adulto, numa peça que tinha cenas
de sexo, na madrugada. E me parece que ele não foi apenas vaiado, ele foi muito xingado.
Como resposta, mostrou as nádegas. Entendeu o Supremo Tribunal Federal que não se
tratava de ato obsceno, poderia ser um exercício ilegítimo, mas não criminoso, da sua
liberdade de expressão. Então, mostrar as nádegas está abrangido pela liberdade de
expressão, a depender do contexto.
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personalidade do indivíduo, por isso integrante de um núcleo importante da dignidade
da pessoa humana. Sendo assim, a liberdade de expressão merece especial proteção e,
também porque tem uma carga instrumental, argumento humanista, quando ela é
utilizada, instrumentalizada para atentar, justamente, contra a dignidade humana de
outrem, ela pode esbarrar em barreiras, em restrições morais e também jurídicas.
Da mesma forma, a liberdade de expressão é um pressuposto para a
democracia, o que eu chamo de argumento democrático. Somente por meio da desta
são exercidas as mais diversas manifestações dos direitos políticos. E só há democracia
com autonomia para o exercício dos direitos políticos, o que abrange, por exemplo, o
direito à crítica, por mais ácida que seja.
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Por isso se fala que ela tem preferência condicionada em relação aos demais direitos. O
ônus argumentativo de quem restringir a liberdade de expressão é maior que aquele que
quer restringir outros direitos fundamentais.
Onde a liberdade de expressão está na Constituição brasileira? Art. 5º, IV e
IX e art. 220, inclusive seu §2º, que dispõe:
§ 2º: É vedada toda e qualquer censura de natureza política,
ideológica e artística.
1. Censura
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seu alcance e a possibilidade de imposição de restrições por fatores externos à liberdade
de expressão.
Censura estatal vs. censura privada. O caso das biografias e a posição do STF:
Quando falamos em censura, essa intenção ilegítima sobre a liberdade de
expressão porque desproporcional, pensamos sempre no comportamento estatal. Em
regra, a censura, de fato, é estatal. Mas a censura pode ser eventualmente privada. E isso
foi reconhecido pelo STF no informativo 789, oportunidade em que o STF, mudando
entendimento, entendeu que não é necessária a autorização prévia do biografado ou
de seus familiares, e que a exigência dessa autorização previa implicava em uma censura
privada.
E mais, quando a gente fala em censura, geralmente a gente associa a uma
censura prévia. O impedimento prévio de que determinados atos comunicativos sejam
proferidos, exercidos: a vedação à publicação de uma matéria jornalista ou de um livro,
ou vedação à um discurso.
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Mas a censura também pode ser posterior. Percebam, portanto, que o
conceito de censura não se confunde com o fato de ser estatal ou privada, prévia ou
posterior, mas sim o fato de a interação ser ilegítima, porque irrazoável e
desproporcional. Mas a censura prévia, leia-se uma restrição, desde que legítima sobre
a liberdade de expressão, é sim possível.
É esse o entendimento da doutrina e de boa parte da jurisprudência, desde que
excepcional. Quando se sabe que vai ser publicado um livro ou uma matéria jornalística
que defende o genocídio de um povo ou a escravidão de uma raça, isso pode ser
previamente impedido, sem que seja caracterizado como censura, mas sim como uma
restrição à liberdade de expressão prévia.
Em regra, contudo, a liberdade de expressão não pode ser cerceada
previamente. Em regra, o que deve ser feito é punição posterior no caso de exercício
ilegítimo. “Como regra, a medida própria para a reparação de eventual abuso da
liberdade de expressão é o direito de resposta ou a responsabilização civil, e não a
supressão de texto jornalístico por meio de liminar.”
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O filme a Última Tentação de Cristo trazia uma releitura da história de Jesus
Cristo, um filme que foi transmitido em todo o mundo na década de 1990 e seria também
no Chile. Mas, uma instituição religiosa, provocou um órgão administrativo então
existente e, com base num dispositivo da Constituição chilena, uma norma constitucional
originária, requereu a não exibição daquele filme do Chile, porque aquela releitura da
história de Jesus Cristo violaria a dignidade do cristianismo, o que foi acolhido por esse
órgão administrativo chileno. A questão chegou até a Suprema Corte Chilena e a censura
foi mantida. Censura porque ilegítima. A questão chegou ao sistema interamericano de
direito humanos e foi decidido pela Corte Interamericana.
Lá na aula sobre poder constituinte, nós falamos sobre esse assunto e nós
mencionamos que, nesse precedente, a Corte IDH reconheceu que ela pode realizar o
controle de convencionalidade internacional, inclusive das normas constitucionais
originárias, o que fortalece a corrente que defende que o poder constituinte originário não
é tão absoluto assim, como se dizia antigamente. Isso porque diante dos sistemas
internacionais de proteção dos direitos humanos, qualquer norma interna,
independentemente da hierarquia, é um mero fato. E a censura se deu com base num
dispositivo originário da Constituição chilena, a então Constituição de Pinochet.
Mas, para além disso, o caso a Última Tentação de Cristo é o grande leading
case sobre liberdade de expressão no âmbito da Corte IDH e de interpretação do art. 13,
em que se reconheceu a importância da liberdade de expressão para as democracias.
E o grande ‘bizu’ dessa manifestação da Corte foi o reconhecimento de que a liberdade
de expressão tem uma dupla dimensão: uma dimensão individual e uma dimensão
social. Ela não abrange apenas o direito do indivíduo se expressar (dimensão individual),
mas há também uma dimensão social, em que se reconhece o direito de buscar e de
disseminar informações. Por isso, a liberdade de expressão é tão importante e, por isso,
ilegítima a censura realizada pelo Estado chileno, corroborada pela sua mais importante
Corte.
Censura indireta:
Além disso, a censura não é apenas direta. Ela não implica apenas na
proibição da publicação de uma matéria jornalística ou do recolhimento de livros
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publicados. A censura mais comum, inclusive, é a censura indireta. E, aqui, trago uma
passagem do professor André de Carvalho Ramos:
“Outra espécie de censura que pode existir é a censura indireta,
que consiste no uso desproporcional de sanções cíveis e penais
na defesa do direito à honra supostamente atingido, bem como na
inércia no combate a ataques a jornalistas ou meios de
comunicação, com o propósito de desestimular o gozo da
liberdade de expressão. A censura indireta é uma forma sutil de
censura, pois aparentemente o Estado admite a liberdade de
expressão, mas possibilita a imposição de pesadas sanções
associadas ao seu exercício (por exemplo fixação judicial ou
administrativa de altíssimas somas referentes a supostos danos
morais por críticas a autoridades públicas) ou ainda admite
passivamente a impunidade dos autores de ataques a jornalistas
(investigações policiais inoperantes, casos não solucionados etc.),
gerando pernicioso efeito inibidor e autocensura. A Corte IDH
entende que a censura indireta também é proibida pela Convenção
Americana de Direitos Humanos, devendo o Estado impedir a
aplicação de sanções desproporcionais ou excessivas que gerem
esse tipo de efeito”.1
A censura direta está fora de moda, porque ela é muito autoritária. Hoje, a
censura indireta é, cada vez mais, recorrente e sua manifestação mais comum é por meio
do abuso do uso de ações judiciais. Políticos, quando têm a sua vida expostas por
jornalistas, a maior parte das vezes em posições legítimas, porque submetidos ao crivo
dos seus eleitores, processam esses jornalistas, requerendo montes milionários. Hoje em
dia, o STF tem coibido esse tipo de comportamento, mas evidentemente isso gera um
receio e um efeito inibidor sobre a liberdade de imprensa.
1 RAMOS, André de Carvalho. Curso de Direitos Humanos. São Paulo: Saraiva Educação, 2020, p. 701.
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Aliás, sobre o assunto, um caso muito importante também da Corte IDH é o
Caso Fontevecchia e D’amico vs. Argentina, um caso expresso nos últimos dois editais
da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro.
Em síntese, jornalistas argentinos publicaram duas matérias sobre a vida
privada do então presidente da Argentina, trazendo uma relação extraconjugal com uma
deputada, inclusive, tendo um filho com ela, decorrente dessa relação extraconjugal. Mas,
para além disso, havia a narrativa de atos imorais ou mesmo atos ilegais decorrentes dessa
relação extraconjugal e desse filho então não conhecido da maior parte da população. O
então presidente da República da Argentina processou esses jornalistas, pedindo
condenações milionárias em danos morais, por suposta violação à honra, intimidade e
privacidade, e essas condenações foram mantidas, inclusive, pela Corte Constitucional
argentina.
Em decorrência disso, o caso chegou à Corte IDH que entendeu pela
prevalência da liberdade de expressão e de imprensa e pela inconvencionalidade da
decisão dada pelo poder judiciário argentino, com alguns fundamentos. Um critério
importante utilizado pela Corte Interamericana de Direito Humanos é a diferente
condição de proteção de funcionários públicos, especialmente aqueles que são eleitos
popularmente com relação aos demais cidadãos. A honra, a privacidade, a intimidade de
funcionários públicos têm um peso menor que a dos demais cidadãos, ainda mais se esse
funcionário público exerce mandato eletivo, justamente (segundo critério utilizado pela
Corte), porque o interesse público de suas ações faz com que eles fiquem mais expostos
ao escrutínio da sociedade. O STF tem um critério semelhante.
Portanto, para além da condenação, que por si só já foi ilegítima, o montante
a que foram condenados esses jornalistas, indenizações milionárias, gera uma censura
indireta, porque tem como finalidade coibir que aqueles mesmos jornalistas, ou outros
jornalistas, exerçam, de forma legítima, a sua profissão tão importante para o regime
democrático.
2. Discurso de ódio:
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André de Carvalho Ramos. Para o autor, discurso de ódio (hate speech) “consiste na
manifestação de valores discriminatórios, que ferem a igualdade, ou de incitamento à
discriminação, violência ou a outros atos de violação de direitos de outrem.”
Caso Ellwanger:
E o grande precedente sobre o assunto no âmbito do STF é o caso Ellwanger,
um indivíduo do Sul, que realizada discursos e publicações antissemitas, atribuindo
qualidades negativas ao povo judeu, que têm uma identidade de povo, bem como negando
o holocausto. Por conta disso, foi processado criminalmente e a questão chegou STF por
meio de HC, que reconheceu que a liberdade de expressão não é um direito absoluto,
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encontra limites morais e jurídicos. A liberdade de expressão deve ser exercida de forma
harmônica com os demais direitos fundamentais e os demais valores consagrados na
constituição, que definitivamente não consagra um direito ao racismo. Nesse caso, deve
prevalecer a dignidade da pessoa humana, em detrimento da liberdade de expressão.
Ellwanger foi processado e condenado.
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a Guarda Municipal fosse ao evento e apreendesse todas as unidades desse livro, porque
essa exibição seria, supostamente, ilegal.
Qual foi o fundamento da controvérsia? O fundamento da controvérsia e, com
base nesses dispositivos, agiu o prefeito Marcelo Crivella, seriam os arts. 78 e 79 do ECA,
que dispõem o seguinte:
Art. 78. As revistas e publicações contendo material impróprio ou
inadequado a crianças e adolescentes deverão ser comercializadas
em embalagem lacrada, com a advertência de seu conteúdo.
Parágrafo único. As editoras cuidarão para que as capas que
contenham mensagens pornográficas ou obscenas sejam
protegidas com embalagem opaca.
Art. 79. As revistas e publicações destinadas ao público infanto-
juvenil não poderão conter ilustrações, fotografias, legendas,
crônicas ou anúncios de bebidas alcoólicas, tabaco, armas e
munições, e deverão respeitar os valores éticos e sociais da pessoa
e da família.
Foi com base nesse entendimento que o então prefeito Marcelo Crivella
determinou a apreensão de todos os gibis que estavam em exibição no evento. A Bienal
do Livro foi ao poder judiciário e impetrou Mandado de Segurança no Tribunal,
lembrando que prefeito de Capital tem foro por prerrogativa de função também no MS,
sendo deferida a liminar pelo desembargador a que foi distribuído o MS, de forma
favorável à liberdade de expressão, reconhecendo que a conduta da prefeitura era
ilegítima e caraterizadora de censura.
Contudo a presidência do Tribunal de Justiça suspendeu a liminar, mantendo,
assim, a censura e confirmando a possibilidade da prefeitura de recolher aqueles gibis. A
questão chegou ao STF por duas vias: a DPERJ por meio de Reclamação e a Procuradoria
Geral da República por meio da suspensão da liminar, que foi distribuída para o então
presidente do STF, Ministro Dias Toffoli.
A DPERJ, na sua Reclamação defendeu que um beijo entre pessoas do mesmo
sexo, do mesmo gênero, não pode ser considerado algo pornográfico, impróprio ou
inadequado, sob pena de discriminação. Se um beijo hetero podia ser exibido, da mesma
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forma, um beijo homo, também poderia ser, sob pena de discriminação. O único critério
para considerar aquilo inadequado ou pornográfico é a homoafetividade daquele beijo
exigido, o que não pode ser tolerado.
A Reclamação nem chegou a ser enfrentada, porque antes, o Ministro Dias
Toffoli enfrentou a suspensão da liminar ajuizada pela PGR, a Suspensão da Liminar
1.248.
Em síntese, além de tudo que a gente está vendo aqui sobre importância da
liberdade de expressão e os direitos da população LGBTQI+, reconhece que sob a
pretensa proteção da criança e do adolescente, se pôs o Município e mesmo o poder
judiciário fluminense, na armadilha sutil, da distinção entre proteção e preconceito. E o
comportamento do Rio de Janeiro e da presidência do TJ foi de censura e preconceito em
face da comunidade LGBTQI+.
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pressuposto para a democracia. Por isso ela tem essa preferência condicionada, uma
primazia prima facie. Sem falar que, “juiz não é crítico de arte e, conforme já restou
assente em nossa jurisprudência, não cabe ao Judiciário julgar a qualidade do humor,
da sátira, posto que matéria estranha às suas atribuições”.
Se o humor é infeliz, se é constrangedor, se é ruim, não cabe ao poder
judiciário fazer a análise. Mas a sacada dela, como sexta etapa argumentativa, para mim
foi brilhante. O filme não foi exibido numa sessão da tarde, na rede globo. O filme estava
numa plataforma de streaming, assina quem quer, assiste quem quer. Nessa ponderação
entre a liberdade de expressão e artística e a liberdade religiosa, que é a dignidade do
cristianismo, a modalidade de exibição também contribui nessa balança pela
preponderância da liberdade de expressão e artística.
Foi interposto um recurso e o desembargador do TJRJ determinou a
suspensão da exibição do filme, prevalecendo no discurso do desembargador a liberdade
religiosa, em detrimento da liberdade de expressão.
Uma vez mais o caso chegou ao STF, por meio da Reclamação 38.782, em
mais uma decisão curta do Ministro Dias Toffoli, em que ele, em boa medida, reproduz a
argumentação da magistrada, que era uma argumentação muito sólida, e vai além. Traz
dois principais pontos que eu quero ler com vocês. Uma síntese em dois parágrafos:
1. o “direito fundamental à liberdade de expressão não se
direciona somente a proteger as opiniões supostamente
verdadeiras, admiráveis ou convencionais, mas também aquelas
que são duvidosas, exageradas, condenáveis, satíricas,
humorísticas, bem como as não compartilhadas pelas maiorias”.
2. “Não se descuida da relevância do respeito à fé cristã (assim
como de todas as demais crenças religiosas ou a ausência dela).
Não é de se supor, contudo, que uma sátira humorística tenha o
condão de abalar valores da fé cristã, cuja existência retrocede
há mais de 2 (dois) mil anos, estando insculpida na crença da
maioria dos cidadãos brasileiros.”
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Determinou, portanto, a possibilidade de exibição do filme. Decisão
monocrática que foi corroborada pela 2ª Turma do STF e publicada no final de 2020 no
informativo 998.
Não é demais lembrar que a sede do Porta dos Fundos foi alvo de um atentado
terroristas, no final de 2019, em decorrência da exibição desse curta.
3. Marcha da Maconha:
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3. Defender a descriminalização de uma conduta não se confunde
com apologia;
4. A liberdade de expressão, em regra, é protegida, mesmo que as
ideias propostas possam ser consideradas, pela maioria, estranhas,
insuportáveis, extravagantes, audaciosas ou inaceitáveis.
4. Desacato:
Outro tema bom para cair em concursos públicos são os debates sobre
desacato, o art. 331 do CP. A Comissão Interamericana de Direitos Humanos, tem
posição consolidada, há décadas, pela inconvencionalidade, porque violadora do art. 13
da CADH, das leis de desacato. Portanto, tipos penais nos países signatários da CADH
que criminalizam essa conduta de forma muito específica: a ofensa em desfavor de agente
público. Isso porque, os agentes públicos estão submetidos a um maior escrutínio da
sociedade, bem como a sua utilização serve para desestimular o exercício legítimo do
direito à crítica.
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gerando um medo da sanção e, por consequência, um efeito inibidor, resfriador da
liberdade de expressão por meio de censuras indiretas. Sem falar que o reconhecimento
da inconvencionalidade do crime de desacato não impede que o indivíduo, caso abuse da
liberdade de expressão seja punido. Imaginem um indivíduo, embriagado, em uma blitz,
chama um policial militar de macaco. Ele pode, e deve, ser responsabilizado
criminalmente por uma injúria racial, da mesma forma que seria se a ofensa fosse
proferida em desfavor de um cidadão qualquer.
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criminalização dessa conduta é inconvencional. Assim como a própria Corte
Interamericana reconhece que a liberdade de expressão não é um direito absoluto. E mais,
tipificar de forma específica o desacato, desgarrado dos demais crimes contra a honra,
estaria, defenderam alguns ministros, dentro da margem de apreciação nacional, de tal
forma que o sistema interamericano garantiria alguma liberdade aos países signatários.
Eu tenho uma tendência a defender a inconvencionalidade do crime de
desacato, sobretudo porque defende ou protege com penas mais severas a honra do
servidor público, em detrimento da honra dos demais cidadãos. Sem falar da carga
autoritária que o crime de desacato traz numa América Latina, historicamente permeada
pelo autoritarismo.
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exposição de placas, estandartes, faixas, cavaletes, bonecos e
assemelhados.
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Um dos casos que mais gerou repercussão foi da cantora Pablo Vittar que,
durante seu show, gritou fora Bolsonaro; em alguns momentos faz alusão ao L de Lula e,
em outro momento, pegou a bandeira de um fã com o rosto do candidato e ex-presidente
Lula.
Diante desse comportamento de diversos artistas, não apenas de Pablo Vittar,
o PL, atual partido do Presidente da República e pré-candidato, ajuizou uma
representação eleitoral perante o TSE por propaganda irregular. Isso porque, dois
principais fundamentos: esse comportamento dos artistas, nos termos do art. 36 da Lei
9.504, lei das eleições, caracterizaria propaganda eleitoral antecipada, já que, de acordo
com o art. 36, a propaganda eleitoral somente é permitida após o dia 15 de agosto do ano
da eleição. Estávamos muito antes de disso.
Além disso, a legislação eleitoral no art. 39, §7º da mesma lei, veda o
showmício. Segundo o PL, essas manifestações artísticas seriam duplamente vedadas,
porque propaganda antecipada, por meio de showmício. O Ministro do TSE, Raul Araújo,
monocraticamente, surpreendeu a todos no meio do festival, proferindo decisão “no
sentido de prestigiar a proibição legal, vedando a realização ou manifestação de
propaganda eleitoral ostensiva e extemporânea em favor de qualquer candidato ou
partido político por parte dos músicos e grupos musicais que se apresentem no festival,
sob pena de multa de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) por ato de descumprimento, a
ser suportada pelos representados, até ulterior deliberação desta Corte.”
A decisão é teratológica, por dois principais motivos: um legal e outro
jurisprudencial. O PL, na sua inicial, menciona os dois artigos que eu mencionei, art. 36
e 39, §7º, mas o PL e a decisão monocrática desconsideram completamente o artigo
seguinte, o art. 36-A da lei das eleições, que dispõe:
Art. 36-A da Lei das Eleições: “Não configuram propaganda
eleitoral antecipada, desde que não envolvam pedido
EXPLÍCITO de voto, a menção à pretensa candidatura, a
exaltação das qualidades pessoais dos pré-candidatos (...), que
poderão ter cobertura dos meios de comunicação social,
inclusive via internet”.
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Enaltecer um e gritar “fora!” o outro, não caracteriza propaganda eleitoral
antecipada. Está na lei e o Ministro parece desconhecer ou instrumentalizar de forma
ilegítima. E eu não sei o que é pior, porque ele também desconsiderou a ADI 5770, uma
ADI decidida no final de 2021 pelo plenário do STF por unanimidade, de relatoria do
Ministro Dias Toffoli, que defendeu o seguinte:
“(...) este Tribunal reconhece haver uma instrumentalidade na
liberdade de expressão no contexto político-eleitoral,
considerando que o destinatário último da troca de informações
durante o período eleitoral é o cidadão eleitor, titular do direito ao
voto, que deve ser exercido de forma livre e soberana. Assim, o
que se busca é munir o eleitor de informações sobre os
potenciais representantes políticos do povo, para se proporcionar
a ele uma tomada de decisão qualificada pelo acesso à
informação, pelo que não são admitidas, por contrárias à
liberdade de expressão, limitações que venham a
desencorajar o fluxo de ideias e propostas de cada candidato,
ou a exercer uma censura prévia quanto a determinado
conteúdo, cabendo a responsabilização, a posteriori, por
eventuais abusos praticados no exercício desse direito. Pelo
mesmo motivo, é também assegurado a todo cidadão
manifestar seu apreço ou sua antipatia por qualquer
candidato, garantia que, por óbvio, contempla os artistas que
escolherem expressar, por meio de seu trabalho, um
posicionamento político antes, durante ou depois do período
eleitoral. Por seu turno, a proibição do showmício e de eventos
assemelhados não se confunde com uma censura prévia, pois
não significa a vedação à manifestação artística de cunho
político. Isto é, da norma não se extrai impedimento para que
um artista manifeste seu posicionamento político, incluindo-
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se o apoio explícito ou repúdio declarado a determinado
candidato em seus shows ou em suas apresentações.”2
7. Fake News:
Chegamos, finalmente, ao tema fake News. É difícil antever como isso pode
cair na prova dos senhores, o debate é muito aberto, é em construção. Mas o que eu pude
identificar é que, em duas provas, TJ Bahia e DPDF, o que o examinador quis exigir nas
provas é de que não existe um direito fundamental à fake news. A propagação
deliberada de informações falsas não estaria no âmbito de proteção da liberdade de
expressão.
Ocorre que, uma coisa é opinião, outra coisa é desinformação. O indivíduo
pode até defender que o voto escrito é mais seguro que a urna eletrônica. Se é,
efetivamente ou não, tenho as minhas dúvidas. O que ele não pode é colocar em xeque
todo o sistema eleitoral, elogiado por diversos países civilizados, por boa parte da
população e pela comunidade jurídica. O indivíduo pode defender que vacina não deveria
ser obrigatória, o que ele não pode propagar é que a vacina está associada à AIDS.
A opinião, mesmo que eventualmente odiosa, desde que não acabe em
discurso de ódio, deve ser protegida. A desinformação, sobretudo quando impacta a
saúde pública, a saúde coletiva dos indivíduos, e a higidez necessária do sistema eleitoral,
não pode ser tolerada e deve ser reprimida pela legislação eleitoral e, mesmo
eventualmente, pela legislação penal.
Este material de liberdade de expressão é um dos mais mutáveis, por isso,
provavelmente, será a que eu mais reescreverei, atualizando com base em informativos,
em questões de concursos, em debates atuais. O tema que eu mais quero aprofundar é o
2
STF - ADI: 5970 DF, Relator: DIAS TOFFOLI, Data de Julgamento: 07/10/2021, Tribunal Pleno, Data
de Publicação: 08/03/2022.
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das fake news, que merece uma melhor sedimentação da nossa jurisprudência, para que
seja exigido em concursos públicos. Até o momento, o que tem sido exigido é: fake news
não é protegido pela liberdade de expressão.
Com isso, encerramos mais uma aula.
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