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UNIVERSIDADE TECNOLÓGICA FEDERAL DO PARANÁ

DEPARTAMENTO ACADÊMICO DE DESENHO INDUSTRIAL


TECNOLOGIA EM DESIGN GRÁFICO

ANDRÉ SOUZA DOS SANTOS

HISTÓRIA ORAL E HISTÓRIAS EM QUADRINHOS: CONTRIBUIÇÕES


DO DESIGN GRÁFICO E DO CONCEITO DE TEXTO MULTIMODAL
NA PRODUÇÃO DE UM RECURSO EDUCACIONAL ABERTO

TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO

CURITIBA
2021
ANDRÉ SOUZA DOS SANTOS

HISTÓRIA ORAL E HISTÓRIAS EM QUADRINHOS: CONTRIBUIÇÕES


DO DESIGN GRÁFICO E DO CONCEITO DE TEXTO MULTIMODAL
NA PRODUÇÃO DE UM RECURSO EDUCACIONAL ABERTO

Oral history and comics: contributions of Graphic Design and the concept of
multimodal text in the production of an open educational resource

Trabalho de conclusão de curso


apresentado como requisito parcial à
obtenção do título de Tecnólogo em
Design Gráfico, do Departamento
Acadêmico de Desenho Industrial, da
Universidade Tecnológica Federal do
Paraná.

Orientador(a): Profa. Dra. Claudia Bordin


Rodrigues da Silva

CURITIBA
2021

Este trabalho está licenciado sob Creative Commons Attribution-NonCommercial-


ShareAlike 4.0 International License. Esta licença permite que outros remixem,
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são cobertos pela licença.
ANDRÉ SOUZA DOS SANTOS

HISTÓRIA ORAL E HISTÓRIAS EM QUADRINHOS: CONTRIBUIÇÕES


DO DESIGN GRÁFICO E DO CONCEITO DE TEXTO MULTIMODAL NA
PRODUÇÃO DE UM RECURSO EDUCACIONAL ABERTO

Trabalho de Conclusão de Curso de Graduação


apresentado como requisito para obtenção do título
de Tecnológo em Design Gráfico da Universidade
Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR).

Data de aprovação: 18 de maio de 2021

__________________________________________________________________________
Claudia Bordin Rodrigues da Silva
Doutora
Universidade Tecnológica Federal do Paraná

__________________________________________________________________________
Luciano Henrique Ferreira Da Silva
Doutor
Universidade Tecnológica Federal do Paraná

__________________________________________________________________________
Ed Marcos Sarro
Doutor
Universidade Tecnológica Federal do Paraná

“A Folha de Aprovação assinada encontra-se na Coordenação do Curso”.

CURITIBA
2021
AGRADECIMENTOS

Esta página é e sempre será injusta. Aqui não cabem todos os


agradecimentos merecidos e desejados. Mas, uma vez mais, vamos lá.
Agradeço a todo o Ensino Público e à Universidade Pública brasileira,
representada aqui pela Universidade Tecnológica Federal do Paraná por, mais uma
vez, me acolher e fazer parte de toda a trajetória de minha vida. Obrigado a todas as
professoras e professores com quem tive o prazer de compartilhar o mesmo espaço
– ou a mesma tela. O ensino público, gratuito e de qualidade, em todos os níveis, é
um direito de todos – hoje, talvez mais do que nunca, ameaçado. Então, este
agradecimento é também um reconhecimento da tomada de consciência e do dever
de pensar por, fazer pelo e defender sempre o ensino público no Brasil.
Escrevo durante o segundo ano da pandemia de COVID-19. Isolado com
minha companheira em nossa casa. Isto, por si só, é algo a ser agradecido, pois
poucos são aqueles que puderam e podem estar na mesma posição. Mas estendo o
agradecimento a todos os seus profissionais e às pessoas que historicamente
lutaram por e construíram nosso Sistema Universal de Saúde.
Enfim, aos nomes próprios.
Agradeço a minha família pelo amor e pela ajuda em inúmeros momentos da
vida. À minha mãe, Ana, meu pai, Jair, e meu irmão, Tiago. Amo vocês e sempre
amarei. Tenho saudades. Assim que nos reencontrarmos, irei abraçá-los com o
mesmo aperto que sinto agora no peito.
À Bianca, companheira com quem compartilho todas as noites, dias, risadas,
e lágrimas desde o início do ano passado. Quem repetidamente demonstrou ter uma
força inesgotável e me ajudou nesta etapa da vida de maneira indescritível. Com
todo o meu amor, muito obrigado por nossa caminhada.
Aos professores Ed Sarro e Luciano Silva, muito obrigado pela leitura,
críticas, elogios e indicações durante a qualificação deste TCC.
E à minha professora orientadora, Claudia Silva. A professora e amiga que
me vê chegar, ir, vir, voltar e voltar de novo às salas do DADIN desde 2013.
Agradeço por me acompanhar desde os primeiros dias desta trajetória e, ao fim, me
inspirar, encorajar e apoiar tanto para que este trabalho fosse concluído.
A todas e todos vocês. E a muitas e muitos mais. Obrigado.
RESUMO

SANTOS, André Souza dos Santos. História oral e histórias em quadrinhos:


contribuições do Design Gráfico e do conceito de texto multimodal na produção de
um recurso educacional aberto. 2021. Trabalho de conclusão de curso (Tecnologia
em Design Gráfico) - Universidade Tecnológica Federal do Paraná, Curitiba, 2021.

As histórias em quadrinhos podem ser um poderoso instrumento no processo de


ensino e aprendizagem de História. Como textos multimodais por excelência, ao
articularem diferentes modos semióticos podem trazer contribuições na articulação
de conceitos históricos relacionados à temporalidade. Este trabalho teve por objetivo
o desenvolvimento de um recurso educacional aberto (REA) para o ensino de
História no Ensino Fundamental – Anos Iniciais baseado na linguagem dos
quadrinhos, na metodologia da História Oral e em conceitos das áreas da Educação
Histórica e da Semiótica Social.

Palavras-chave: Recursos Educacionais Abertos. História – Estudo e ensino.


Histórias em Quadrinhos. Multimodalidade.
ABSTRACT

SANTOS, André Souza dos Santos. Oral history and comics: contributions of
Graphic Design and the concept of multimodal text in the production of an open
educational resource. 2021. Final paper (Graphic Design Technology) -
Universidade Tecnológica Federal do Paraná, Curitiba, 2021.

Comic books can be a powerful tool in the process of teaching and learning history.
As multimodal texts par excellence, when articulating different semiotic modes, they
can contribute to the articulation of historical concepts related to temporality. This
work aimed to develop an open educational resource (OER) for the teaching of
History in Elementary School - Early Years based on the language of comics, the
methodology of Oral History and concepts in the areas of Historical Education and
Social Semiotics.

Keywords: Open Educational Resources. History - Study and teaching. Comics.


Multimodality.
LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Detalhe de As aventuras de “Nhô-Quim”, ou impressões de uma viagem


à corte (Capítulo I)..................................................................................................... 17
Figura 2 - Detalhe de The Yellow Kid and a friend set up a cockfight. ..................... 17
Figura 3 – Selos do Comics Code Authority (EUA) e Código de Ética dos
Quadrinhos (Brasil). .................................................................................................. 19
Figura 4 – Capas das edições 6 (1951) e 222 (1971) da revista PS Magazine. ....... 20
Figura 5 – Detalhe de capa de livro escolar de 1949 produzido pela National Comics
e distribuído pelo Institute for American Democracy; e detalhe de página de HQ
chinesa durante o governo de Mao Tse-Tung. .......................................................... 21
Figura 6 – História em quadrinhos em livro didático de história de 1970 ................. 22
Figura 7 – Capas da série Redescobrindo o Brasil .................................................. 23
Figura 8 – Detalhes de quadrinhos de Adeus, chamigo Brasileiro: uma história da
Guerra do Paraguai (André Toral, 1999) e O Alienista, de Machado de Assis (Fabio
Moon e Gabriel Bá, 2007) ......................................................................................... 24
Figura 9 – Detalhe de quadrinho de Asterix entre os Bretões (1962) com uma
paródia dos ônibus de dois andares ingleses............................................................ 25
Figura 10 – Detalhes de Conan, o Bárbaro (1952) e O Príncipe Valente (1937) ..... 25
Figura 11 - Detalhe de quadrinhos de The Spirit representando simultaneidade ..... 26
Figura 12 – Arquivo aberto de Pepper & Carrot no original em francês ................... 27
Figura 13 – Páginas de Pepper & Carrot traduzidas para o português e o inglês .... 28
Figura 14 - Páginas 64 e 73 de 1968 Ditadura Abaixo ............................................. 37
Figura 15 – Esquema de layouts identificados ......................................................... 39
Figura 16 – Exemplos de layouts: modelos I, III e IV................................................ 40
Figura 17 – Rascunho de etapas do REA ................................................................ 43
Figura 18 – Painel semântico ................................................................................... 44
Figura 19 – Comparação de layout: “livros em U” e caderno de orientações ao
professor ................................................................................................................... 45
Figura 20 – Formato e grid do caderno de orientações ao professor ....................... 46
Figura 21 – Família tipográfica Montserrat ............................................................... 47
Figura 22 – Hierarquia visual com Montserrat .......................................................... 47
Figura 23 – Sistema visual de navegação dentro do texto. ...................................... 48
Figura 24 – Etapas desenvolvimento HQ “Espaço e tempo se fundem” .................. 49
Figura 25 – Duplas de páginas do caderno de orientações ao professor ................. 49
Figura 26 – Página do roteiro de entrevista .............................................................. 50
Figura 27 – Etapas de desenvolvimento da HQ “Um dia de Rita” ............................ 51
Figura 28 – Etapas de desenvolvimento da HQ “Um dia de Aurora” ........................ 52
Figura 29 – Etapas de desenvolvimento da HQ “Instrução à pesquisa” ................... 53
Figura 30 – Família tipográfica Komika .................................................................... 54
Figura 31 – Arquivo aberto de Instrução à pesquisa no Krita ................................... 55
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO .....................................................................................................13
1.1 OBJETIVOS ......................................................................................................14
1.2 ESTRUTURA DO TRABALHO .........................................................................15
2 HISTÓRIA NAS HQS ...........................................................................................16
2.1 O ENSINO DE HISTÓRIA E AS HQS ...............................................................16
2.2 EXEMPLOS DE HQS NO ENSINO DE HISTÓRIA ...........................................23
2.3 QUADRINHOS, LICENÇAS ABERTAS E REA ................................................26
3 SEMIÓTICA E HISTÓRIA COM AS HISTÓRIAS EM QUADRINHOS .................30
3.1 PENSANDO OS QUADRINHOS COMO TEXTOS MULTIMODAIS A PARTIR DA
SEMIÓTICA SOCIAL ..............................................................................................30
3.2 PENSANDO OS QUADRINHOS COMO INSTRUMENTOS PARA
ARTICULAÇÃO DE CONCEITOS DE SEGUNDA ORDEM COM A EDUCAÇÃO
HISTÓRICA .............................................................................................................32
3.3 ANÁLISE DOS RECURSOS SEMIÓTICOS DE SIMILAR: 1968 DITADURA
ABAIXO ...................................................................................................................36
4 DESENVOLVIMENTO DE UM REA PARA ENSINO DE HISTÓRIA COM HQS .42
4.1 CONCEITO DO RECURSO EDUCACIONAL ABERTO ...................................42
4.2 PAINEL SEMÂNTICO .......................................................................................43
4.3 ETAPAS DE DESENVOLVIMENTO .................................................................44
4.3.1 CADERNO DE ORIENTAÇÕES AO PROFESSOR .......................................45
4.3.2 HISTÓRIAS EM QUADRINHOS AOS ALUNOS .............................................50
4.3.3 DISPONIBILIZAÇÃO DO REA ........................................................................54
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................57
REFERÊNCIAS.......................................................................................................59
APÊNDICE A - Caderno de Orientações ao Professor (versão em cores) .......64
APÊNDICE B - Caderno de Orientações ao Professor (versão preto e branco)
.......................................................................................................84
APÊNDICE C - HQ Espaço e tempo se fundem ..................................................104
APÊNDICE D - HQ Um dia de Rita (cores e preto e branco) ..............................105
APÊNDICE E - HQ Um dia de Aurora (cores e preto e branco) .........................106
APÊNDICE F - HQ Instrução à pesquisa (cores e preto e branco) ...................108
APÊNDICE G - Slides - Caderno de Orientação ao Professor ...........................110
APÊNDICE H - Licença Creative Commons Atribuição-CompartilhaIgual 4.0
Internacional .......................................................................................................118
13

1 INTRODUÇÃO

Este trabalho coloca-se como uma proposta de produção de recursos


educacionais abertos (REAs) pensados para o ensino de história durante o Ensino
Fundamental – Anos Iniciais. Ele articula as áreas de conhecimento do Design
Gráfico e do ensino de História, utilizando-se de conceitos como texto multimodal,
história oral e memória.
Desde o ano de 2013, quando iniciei o curso de Tecnologia em Design
Gráfico na Universidade Tecnológica Federal do Paraná, minha trajetória pessoal,
acadêmica e profissional me levou a afastamentos e aproximações da área que se
refletem no presente projeto. Formado em Licenciatura e Bacharelado em História
pela Universidade Federal do Paraná em 2012, trouxe conceitos, ideias e visões de
mundo para a trajetória no Design Gráfico que viria a trilhar. Depois de trabalhar
alguns anos em agências e como freelancer, fui realizar um mestrado em
Intervenção e Animação Artísticas em Leiria (Portugal) no qual desenvolvi uma
pesquisa e um projeto de intervenção numa escola de ensino básico da cidade,
trabalhando junto às crianças a produção de histórias em quadrinhos (HQs) com o
uso de fotografias. Entre trabalhos de Design Gráfico e ilustração para materiais
didáticos, conclui o mestrado em 2019 quando passei a trabalhar como historiador
na autoria de materiais didáticos para editoras brasileiras – função que desde então
desempenho. O leitor irá averiguar a influência destas andanças em áreas diversas
na leitura deste trabalho e, espero, considerar que há pertinência na abordagem e
propostas definidas neste trabalho de conclusão de curso.
Me remeto agora às palavras de minha professora orientadora Claudia
Bordin Rodrigues da Silva, que em sua tese de doutoramento, ao refletir sobre sua
prática como designer, compartilhou questões que foram comuns à minha trajetória
profissional: “uma interface deve ou não permitir edições, rearranjos, novos e não
pensados dos usos”? (SILVA, Claudia, 2019, p. 21). Em nossas primeiras reuniões,
esta reflexão levou ao delineamento deste projeto como um recurso educacional
aberto (REA) desde seu princípio. Se o Design não é imparcial, mas “um campo
marcado pelos entornos sociais que conformam sua metodologia e sua prática”
(COUTO, 2017, p. 29), tomei o projeto de encerramento de curso como uma
oportunidade de criação que não representasse um fechar de portas, mas o
contrário: a abertura de algo que não se encerre em si mesmo, que seja o princípio
14

de um fazer a muitas mãos. Assim, a escolha pelo uso e produção de recursos livres
e gratuitos, sempre que possível, acompanhou todas as decisões do projeto.
Acredito que a produção de um recurso didático a partir dos conhecimentos
e práticas relacionados ao Design Gráfico, aliado a conceitos de ensino de história e
experimentações anteriores com a linguagem dos quadrinhos situadas em sala de
aula, pode ser pertinente ao trazer aspectos de outras áreas para a metodologia do
Design e, estas, fundamentarem a elaboração de um texto que articula diferentes
meios semióticos – como o são as histórias em quadrinhos. Ao mesmo tempo,
pessoalmente, este projeto representa um valioso momento em que, ao trazer a
produção de recursos didáticos à avaliação e discussão com outros designers,
assim como, e principalmente, professores e professoras que conectam o estudo
dos quadrinhos aos seus usos, possamos explorar e encontrar possíveis caminhos
de encontro entre áreas, às vezes, tão distantes: o Design e a História.

1.1 OBJETIVOS

Este trabalho de conclusão de curso teve como objetivo principal produzir


um REA a ser utilizado por educadoras e educadores com alunas e alunos do
Ensino Fundamental – Anos Iniciais nas aulas do componente curricular de História
que articulasse em planos de aula e atividades propostas a leitura e produção de
histórias em quadrinhos.
Com este propósito em mente, a reflexão sobre sua produção levou às
seguintes etapas e objetivos secundários:
 identificar conceitos e categorias de produção e análise na área do ensino de
História, do Design Gráfico e da semiótica relevantes para a criação do REA;

 caracterizar e analisar como as narrativas gráficas das HQs foram e podem


ser utilizadas no contexto do ensino de História e da produção de narrativas
históricas;

 projetar, produzir, avaliar e disponibilizar o REA voltado a professores e


alunos que trabalhem as HQs no contexto do ensino de História.
15

1.2 ESTRUTURA DO TRABALHO

Este documento foi organizado em três capítulos que apresentam as etapas


de pesquisa e produção do REA nomeado Conhecendo a História com Histórias em
Quadrinhos.
O capítulo História nas HQs apresenta um sucinto apanhado histórico da
produção e distribuição dos quadrinhos, em especial no Brasil, assim como
exemplos no contexto de ensino, histórias com temas históricos e voltadas ao ensino
de História. Em seguida, a partir de reflexões trazidas pelas leituras de autoras e
autores que versam sobre o tema, são apresentadas abordagens já propostas.
Em Semiótica e História com as HQs, conceitos das áreas da Semiótica
Social e da História são apresentados, assim como parâmetros estabelecidos pela
Base Nacional Comum Curricular (BNCC) do Brasil. O capítulo se encerra com uma
análise de uma revista em quadrinhos a partir de mencionados conceitos, mostrando
como os recursos semióticos produzem significados dentro da narrativa histórica
gráfica.
Finalmente, o capítulo Desenvolvimento de um REA para ensino de
História com HQs descreve a idealização do REA, apresenta um painel de
referências semânticas, define os materiais produzidos que compõem o REA (um
caderno de orientações ao professor e histórias em quadrinhos aos alunos) e
apresenta e justifica as escolhas de projeto relacionadas aos conceitos da História e
da semiótica apresentados anteriormente.
16

2 HISTÓRIA NAS HQS

2.1 O ENSINO DE HISTÓRIA E AS HQS

Assim como seria difícil traçar um ponto no tempo em que a escrita surgiu —
diferenciando-se dos recursos gráficos para fins de comunicação e de cujos usos,
aplicações e transformações ela é fruto —, seria penoso afirmar quando surgiu a
“linguagem” das histórias em quadrinhos.
Não é o objetivo, aqui, discutir sobre a transformação de representações
pictóricas de ícones em símbolos, construindo diferentes recursos simbólicos de
comunicação, seja de correlação fonética ou não. Tão pouco pretendemos esmiuçar
o processo de formação dos elementos que compõem a linguagem das histórias em
quadrinhos — o que poderia nos levar, como o fez Scott McCloud (1995, p. 10-19), a
uma longa digressão que incluiria códices mixtecas do século XIV, a Coluna de
Trajano erigida no século II e mesmo pinturas rupestres como as de Lascaux,
datadas de 17000 AEC. Para compreender a trajetória das histórias em quadrinhos
e o ensino, partimos do ponto em que elas estavam prestes a se estabelecer e
serem reconhecidas como tais: o final do século XIX e início do século XX.
A crescente produção de livros, periódicos e revistas ilustradas durante os
anos 1800 foi acompanhada pela experimentação no uso e impressão de textos e
imagens, de modificações técnicas relevográficas e planográficas (SILVA, 2012, p.
45). Periódicos em diferentes países dividiam suas páginas entre o noticioso e as
tiras (comic strips) caracterizadas pelo humor, pela caricatura e pela narrativa —
exemplos clássicos são encontrados no Brasil com Angelo Agostini, e seus
personagens Nhô-Quim e Zé Caipora da década de 1890, e nos EUA com Richard
Outcault, e seu Yellow Kid da década de 1890 (EDGAR & SEDGWICH, 2007, p. 54;
SILVA, 2012, p. 48-63; PAZ, 2017, p. 50-71).
17

Figura 1 – Detalhe de As aventuras de “Nhô-Quim”, ou impressões de uma viagem à corte


(Capítulo I).

Fonte: AGOSTINI, 2013, p. 34.

Figura 2 - Detalhe de The Yellow Kid and a friend set up a cockfight.

Fonte: Wikimedia Commons1.

Fruto de um longo processo de experimentação, produção, impressão e


consumo de narrativas gráficas, as primeiras décadas do século XX estabeleceram
a linguagem dos quadrinhos modernos (PAZ, 2017, p. 61), sistematizaram um
código semântico2 (SILVA, 2012, p. 48) que caracteriza os quadrinhos (comics)

1 Disponível em:
<https://commons.wikimedia.org/wiki/File:The_Yellow_Kid_Indulges_In_A_Cockfight..._A_Waterl
oo.jpg> . Acesso em 15 mar. 2021.
2 “Todos os elementos semânticos que conhecemos como típicos da linguagem dos comics,

foram sistematizados e aprimorados nestes períodos de afirmação da comic art [três primeiras
décadas do século XX]: balões, legendas, vinhetas, requadros, sarjetas, onomatopeias, linhas
cinéticas entre outros elementos gráficos, se institucionalizaram como códigos de linguagem
sequencial (COUPERIE; HORN, 1973)”. (SILVA, 2012, p. 52)
18

como os entendemos atualmente. Das páginas dominicais (sunday pages) às


tiragens diárias em periódicos com histórias predominantemente cômicas, os
quadrinhos passaram a se diversificar em formatos, estilos e temas, como as
aventuras ao fim da década de 1920 (VERGUEIRO, 2014, p. 95; SILVA, 2012, p.
50).
Em diferentes países, os quadrinhos se popularizaram massivamente
durante a primeira metade do século XX. Em 1950, metade da população dos EUA
lia quadrinhos (PAZ, 2017, p. 22) enquanto no Brasil pequenas e grandes editoras
se estabeleciam, a exemplo da Editora Abril (SILVA, 2012, p. 21). Tamanho
crescimento da mídia atraiu a atenção de governos, instituições, educadores e
intelectuais no mundo todo, resultando em movimentos igualmente complexos e
poderosos, um negativo e outro positivo.
Entre as décadas de 1920 e 1930, no Brasil “surgem as primeiras
manifestações acusando as histórias em quadrinhos de provocar uma suposta
degeneração intelectual, cultural e moral na sociedade” (PAZ, 2017, p. 26). Djota
Carvalho (2006, p. 32 apud SANTOS & VERGUEIRO, 2012, p. 82) relata como no
Brasil, à semelhança da Itália do mesmo período, entre grupos civis e religiosos
já em 1928, surgiram as primeiras críticas formais contra as historinhas: a
Associação Brasileira de Educadores (ABE) fez um protesto contra os
quadrinhos, porque eles “incutiam hábitos estrangeiros nas crianças”. Na
década seguinte, em 1939, diversos bispos reunidos na cidade de São
Carlos (SP) deram continuidade à xenofobia, propondo até mesmo a
censura aos quadrinhos, porque eles traziam “temas estrangeiros
prejudiciais às crianças.

A preocupação com a influência que as publicações de quadrinhos trariam


às mentes das crianças e jovens era compartilhada nos EUA, especialmente depois
da publicação do infame livro A sedução dos inocentes de Fredric Wertham (1954),
psiquiatra alemão radicado no país, e a consequente criação do selo Comics Code
Authority. Ainda que em terras brasileiras na década de 1940 Gilberto Freyre
enquanto deputado federal tenha lutado contra a censura das publicações,
“argumentando que constituíam ‘elementos de ajuda na alfabetização’” (PAZ, 2017,
p. 27), editoras brasileiras, à semelhança das estadunidenses, desenvolveram seu
próprio código de ética dos quadrinhos (VERGUEIRO, 2014, p. 149).
19

Figura 3 – Selos do Comics Code Authority (EUA) e Código de Ética dos Quadrinhos (Brasil).

Fonte: Universo HQ, 20153.

A defesa feita por Freyre não foi a única movimentação em direção ao


potencial pedagógico dos quadrinhos. Durante a Segunda Guerra Mundial, o
Departamento de Defesa dos Estados Unidos da América publicou e distribuiu entre
suas tropas manuais de treinamento, uso e manutenção de equipamentos em
comics, a publicação Army Motors, ilustrada por Will Eisner. Em sequência, o autor
de The Spirit — e referência da área das narrativas gráficas — fundou a empresa
American Visuals Corporation focada na produção de quadrinhos e ilustrações para
fins comerciais e educacionais4, produzindo a PS Magazine para o governo
estadunidense durante a Guerra da Coréia5.

3 NALIATO, Samir. Confins do Universo 002 – A censura nos quadrinhos. Universo HQ, 5 set.
2015. Disponível em: <http://universohq.com/podcast/confins-do-universo-002-a-censura-nos-
quadrinhos/>. Acesso em: 15 mar. 2021
4 WILL EISNER. The Army Years and PS Magazine. Disponível em:
<http://www.willeisner.com/biography/5-the-army-years.html>. Acesso em 15 mar. 2021.
5 PS MAGAZINE: informing army readiness. PS History. Disponível em:
<http://www.psmagazine.army.mil/About-PS/PS-History/>. Acesso em 16 mar. 2021
20

Figura 4 – Capas das edições 6 (1951) e 222 (1971) da revista PS Magazine.

Fonte: Wikimedia Commons6.

Ainda na década de 1940, nos EUA eram publicadas revistas em quadrinhos


como True Comics e Classics Illustrated. A primeira narrava a vida de personagens
e eventos históricos do país, enquanto a segunda adaptava clássicos de obras
literárias e chegou a ser publicada também no Brasil pela Editora Brasil-América
Limitada (EBAL) com o nome Edição Maravilhosa (VERGUEIRO, 2014, p. 200-213).
Não nos furtamos também de apontar como no período da Guerra Fria os
quadrinhos, que carregam consigo “não apenas estético-formais como também uma
ideologia” (SILVA, 2012, p. 48), ainda desempenharam um papel importante no
campo do embate ideológico. Como Liber Paz aponta citando Umberto Eco, o
Superman, super-herói clássico dos comics estadunidenses, “seria um ‘instrumento
pedagógico’ integrante de um projeto de sociedade” e “reitera valores como a
obediência às autoridades e o respeito e a proteção da sociedade privada” (PAZ,
2017, p. 70). Enquanto isto, na China revistas traziam histórias “enfocando
representantes da nova sociedade que se pretendia estabelecer no país” com
modelos de valores a serem seguidos (VERGUEIRO, 2014, p. 213-226).

6 Disponível em:
<https://commons.wikimedia.org/wiki/Category:PS,_The_Preventive_Maintenance_Monthly>.
Acesso em: 16 mar. 2021.
21

Figura 5 – Detalhe de capa de livro escolar de 1949 produzido pela National Comics e
distribuído pelo Institute for American Democracy; e detalhe de página de HQ chinesa durante
o governo de Mao Tse-Tung.

Fontes: DCE EDITORIAL7, 2017 e VERGUEIRO, 2014.

Com o transcorrer do século XX, a redução do preconceito contra os


quadrinhos e sua aceitação como outro veículo de comunicação — junto à televisão
e ao cinema, por exemplo — foram acompanhadas pelo aumento de estudos sobre
sua linguagem e seu uso como recurso educacional. No Brasil, como Liber Paz
descreve, três publicações de 1970 marcam este momento: Comunicação social:
teoria e pesquisa de José Marques de Melo; Shazam!, organizado por Álvaro de
Moya; e A explosão criativa dos quadrinhos de autoria de Moacy Cirne (PAZ, 2017,
p. 28). No mesmo período, livros didáticos passaram a trazer em suas páginas
vinhetas apresentando, exemplificando, sintetizando ou ilustrando conteúdos a
serem trabalhados (SANTOS & VERGUEIRO, 2012, p. 83). Como exemplo,
trazemos uma página de quadrinhos do livro didático de história de Julierme,
Colonnese e Zalla (1970), cuja narrativa, como identificado por Marcelo Fronza, é
“caracterizada pela desvalorização dos sujeitos que atuam historicamente, pois são
enquadrados ou didatizados por meio de uma narrativa anônima e generalizadora”
(2019, p. 74-75) e, neste caso, peça de valorização do poder instituído durante o
período da Ditadura Militar brasileira e caracterização dos indivíduos que a ela

7DCE EDITORIAL. Superman: a classic message restored. DC Comics, ago. 2017. Disponível
em: <https://www.dccomics.com/blog/2017/08/25/superman-a-classic-message-restored>.
Acesso em: 15 mar. 2021.
22

resistiam como terroristas, numa apresentação conteudística que prezava pela


memorização e leitura acrítica da história.

Figura 6 – História em quadrinhos em livro didático de história de 1970

Fonte: FRONZA, 2019, p. 75.

Revistas cuja produção fora premeditada como recurso de divulgação de


pesquisa, debate ou ensino de história no Brasil é notada a partir da década de 1980
com as publicações da coleção Redescobrindo o Brasil: Da Colônia ao Império: Um
Brasil para inglês ver e latifundiário nenhum botar defeito e Cai o Império: República
Vou Ver!, escritos por Lilia Moritz Schwarcz e ilustrados, respectivamente, por Miguel
Paiva e Angeli — ambos reconhecidos cartunistas e chargistas. Essas publicações
são, para Túlio Vilela, pioneiras na difusão de um conhecimento histórico crítico
(VILELA, 2014, p. 1272-1281).
23

Figura 7 – Capas da série Redescobrindo o Brasil

Fontes: Estante Virtual8 e Amazon9.

Finalmente, a aceitação oficial dos quadrinhos como recurso


pedagógico no Brasil ocorreu na década de 1990 com sua menção explícita nos
Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN, 1998) que se sucederam à criação da Lei
de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB, 1996) que já sublinhava a
necessidade do “conhecimento das formas contemporâneas de linguagem”
(SANTOS & VERGUEIRO, 2012, p. 82; VERGUEIRO & RAMOS, 2009, p. 70).

2.2 EXEMPLOS DE HQS NO ENSINO DE HISTÓRIA

Nesta seção, apresentaremos exemplos de histórias em quadrinhos que se


relacionam ao ensino de história, formal ou informalmente, de acordo com aspectos
de suas narrativas, linguagens ou temas que serão importantes para posterior
produção de um recurso educacional de mediação do ensino-aprendizagem na área.
Utilizamos o termo “histórias em quadrinhos com temas históricos” e suas
derivações partindo das pesquisas de Marcelo Fronza (2007; 2009; 2012) ao nos

8 Disponível em: <https://www.estantevirtual.com.br/oficinadosaber/miguel-paiva-lilia-moritz-


schwarcz-da-colonia-ao-imperio-um-brasil-para-ingles-ver-2604100823?show_suggestion=0>.
Acesso em 17 mar. 2021.
9 Disponível em: <https://www.amazon.com.br/Cai-Imperio-Republica-Vou-Ver/dp/8511130357>.

Acesso em 17 mar. 2021.


24

referirmos a todas as obras em quadrinhos que se propõem a construir uma


narrativa histórica ou delas se servem para sua ambientação.
Túlio Vilela enumera em seu capítulo de Como usar as histórias em
quadrinhos na sala de aula (RAMA & VERGUEIRO, 2019) algumas publicações de
acordo com estes aspectos que consideramos interessantes para uma análise e
catalogação inicial.
HQs cujas narrativas e desenhos ilustram um período histórico determinado
podem ser utilizadas, quando fundamentadas por pesquisas histórica e iconográfica,
como objetos de leitura e trabalho nas aulas de história dos diferentes anos do
Ensino Básico acerca de objetos, vestuários, arquitetura, “aspectos da vida social de
comunidades do passado” (VILELA, 2014, p. 1309) ou como recursos de mediação
na abordagem de conteúdos substantivos da história, como “ditadura, revolução,
democracia, Idade Média” (SCHMIDT, BARCA e GARCIA, 2011, p.11 apud
SANTOS e CAINELLI, 2016, p. 7).

Figura 8 – Detalhes de quadrinhos de Adeus, chamigo Brasileiro: uma história da Guerra do


Paraguai (André Toral, 1999) e O Alienista, de Machado de Assis (Fabio Moon e Gabriel Bá,
2007)

Fontes: VILELA, 2014, p. 1315 e SANTOS & VERGUEIRO, 2012, p.88.

Narrativas gráficas em quadrinhos também podem ser utilizadas por


representarem a época de sua produção, evidenciando conceitos e ideias de
determinado contexto. Vilela aponta as histórias de Asterix e Obelix como exemplo,
pois, apesar de suas histórias ficcionais se passarem durante a Antiguidade
europeia, eram recheadas de paródias e do humor de seu tempo, fazendo
referências a objetos, eventos e personagens contemporâneos à sua escrita.
25

Figura 9 – Detalhe de quadrinho de Asterix entre os Bretões (1962) com uma paródia dos
ônibus de dois andares ingleses

Fonte: VILELA, 2014, p. 1351.

Por fim, Vilela ainda pontua a potencialidade de HQs como recursos de base
à discussão de conceitos importantes para a história como bárbaro/civilizado,
império, expansionismo (2014, p. 1324) — o que também caracterizamos como
conceitos substantivos do ensino de história — e anacronismo (2014, p. 1441), ao
qual adicionamos outros conceitos de segunda ordem como permanências, rupturas
e periodizações — noções que contribuem na identificação, compreensão e crítica
de “processos e mecanismos de transformação e manutenção das estruturas
sociais, políticas, econômicas e culturais ao longo do tempo” (BRASIL, 2018, p.
402). Neste caso, o autor sugere a revista Conan, o Bárbaro (1952) para debater as
ideias de barbárie e civilização e O Príncipe Valente para discutir o conceito de
anacronismo — neste caso deliberado.

Figura 10 – Detalhes de Conan, o Bárbaro (1952) e O Príncipe Valente (1937)


26

Fonte: VILELA, 2014, p. 1135 e 1446.

Ainda entre conceitos importantes para a construção e o ensino-


aprendizagem do conhecimento histórico, somamo-nos a Vilela com um destaque às
possibilidades de trabalho com noções de temporalidade, aspectos importantes da
própria estrutura narrativa sequencial quanto às menções e usos deliberados ao
tempo em diferentes histórias. Para o Ensino Fundamental — Anos Iniciais, o
trabalho com as noções de passado, presente e futuro (BRASIL, 2018, p. 406),
assim como a habilidade de “identificar e organizar, temporalmente, fatos da vida
cotidiana, usando noções relacionadas ao tempo (antes, durante, ao mesmo tempo
e depois)” (BRASIL, 2018, p. 409) são de especial importância para o componente
curricular de história e as histórias em quadrinhos podem ser de grande valia neste
sentido.

Figura 11 - Detalhe de quadrinhos de The Spirit representando simultaneidade

Fonte: VILELA, 2014, p. 1299.

2.3 QUADRINHOS, LICENÇAS ABERTAS E REA

Dada a especificidade deste projeto, em produzir um REA, nos preocupamos


também em inserir ao menos uma referência de HQ que carregamos e é
disponibilizada em uma licença aberta.
27

Produzida digitalmente por David Revoy, ilustrador e quadrinista, no software


gratuito e de código-aberto Krita, Pepper & Carrot10 é uma HQ em formato digital em
cujo site o autor disponibiliza não apenas suas páginas para leitura gratuita, mas
também todos os arquivos em formato aberto para uso da comunidade, que participa
ativamente nas traduções em mais de 40 línguas.

Figura 12 – Arquivo aberto de Pepper & Carrot no original em francês

Fonte: montagem do autor.

10História em quadrinhos digital disponível em: https://www.peppercarrot.com/. Acesso em 3 mai.


2021.
28

Figura 13 – Páginas de Pepper & Carrot traduzidas para o português e o inglês

Fonte: montagem do autor.

Percebemos com este exemplo o potencial e a abertura que o uso de uma


estratégia similar traria ao projeto no desenvolvimento do material voltado ao ensino
de História com Histórias em quadrinhos. Contudo, ainda que compartilhando do
objetivo de produzir artefatos digitais em licença aberta para uso e remixagem livre,
os REAs possuem suas especificidades. Eles podem ser definidos tanto pela lógica
do artefato, como pela política pública com a qual se vinculam, a partir da produção,
uso e consumo de objetos de aprendizagem de natureza diversa. Como nos afirma a
professora e designer Claudia Silva,
A iniciativa dos Recursos Educacionais Abertos (REA) representa um
conjunto de sentidos, do artefato e sua produção, às políticas públicas e
editoriais de acesso a conteúdos de uso educacional, principalmente
direcionados àqueles produzidos para uso, reuso e remixagem públicos, por
meio do uso de licenças abertas, com finalidades de acesso aberto, gratuito
e democrático, em consonância com as políticas do movimento aberto e da
cultura livre (SILVA, Claudia, 2019, p. 163).

A partir da visão da Educação Aberta, os REAs referem-se aos materiais


produzidos para uso, reuso e mixagem públicos, por meio do uso de licenças
abertas, como exemplo a Creative Commons, com finalidades de acesso aberto e
29

gratuito, permitindo ajustes e alterações conforme o contexto e lógica de uso,


limitados às questões de licenças comerciais ou não comerciais, com ou sem
possibilidades de remixagem (SILVA, Claudia, 2019, p.166).
A proposta dos recursos, entretanto, precisa estar coerente com uma
orientação de usos e contextos, atentos a uma educação crítica e formadora de
consciência. Portanto, Silva aponta para práticas educacionais voltadas a uma
metodologia dialética, adaptada de Vasconcelos (1992) e fortemente ancorada na
proposta freiriana, de educação como processo, demonstrada a partir da orientação
metodológica de conteúdo.

Tabela 1 — Dimensões e Elementos do Plano de Aula de Celso Vasconcellos

As dimensões de plano de aula apontadas por Silva na Tabela 1 serviram


para a produção da estrutura dos planos de aulas e atividades propostas na parte do
REA nomeada caderno de orientações aos professores. Parte dos pontos também
são sugeridos para os próprios professores, para que estas possam de maneira
dialógica planejar aulas a partir das propostas, mas fundadas no contexto local e
com a participação dos alunos: ponto importante especialmente para o roteiro de
entrevista que também foi desenvolvido e sugerido como base.
Enquanto caderno de orientações aos professores e histórias em quadrinhos
aos alunos são ambos disponibilizados sob uma licença aberta que será descrita ao
fim do capítulo de desenvolvimento do projeto, ainda antes de partirmos à descrição
do REA será necessário nos aprofundarmos em conceitos relevantes que nortearam
toda a sua confecção – das formas aos conteúdos.
30

3 SEMIÓTICA E HISTÓRIA COM AS HISTÓRIAS EM QUADRINHOS

3.1 PENSANDO OS QUADRINHOS COMO TEXTOS MULTIMODAIS A PARTIR DA


SEMIÓTICA SOCIAL

Histórias em quadrinhos são uma linguagem narrativa que Will Eisner definiu
como arte sequencial e sobre a qual Scott McCloud se debruçou expandindo o
conceito, apontando como outras linguagens visuais são igualmente sequenciais
(como o cinema) e mesmo chegando a discutir a relevância da atribuição a ela do
estatuto de “arte” (EISNER, 1989, p.8; MCCLOUD, 1995, p. 5-9; 2006, p. 200).
Apontamos aqui, contudo, que ainda que seja formada por diferentes modos
de comunicação (escrita e imagética a princípio), podemos considerá-la um modo
semiótico, que faz usos específicos de recursos semióticos e opera sob uma lógica
semiótica própria (SANTOS, 2019, p. 22-37). Para tanto, nos apoiamos na semiótica
sob a perspectiva multimodal.
Nosso estudo parte dos mesmos princípios apontados por Carey Jewitt e
Gunther Kress em Multimodal Literacy:
Ainda que às vezes possamos falar de teoria multimodal, a teoria por trás
da multimodalidade e com a qual nós (C.J., G.K.) trabalhamos é a teoria
semiótica, e para nós a forma de semiótica que adotamos é a semiótica
social. (JEWITT & KRESS, 2003, p. 9, tradução nossa).

A semiótica social proposta por Michael Halliday em 1978 desloca o foco de


análise do signo em si para o papel do produtor do signo. Observa no indivíduo -
social, cultural e historicamente localizado - intenções e recursos disponíveis para
representar e transmitir uma informação. Para a semiótica social, portanto, há um
grande foco na escolha e intenção do comunicador para a construção de signos
(JEWITT & KRESS, 2003, p. 9-11; SANTOS & MEIA, 2010, p. 306).
Desenvolvendo a teoria de Halliday, Gunther Kress e Theo Van Leeuwen
propõem uma abordagem multimodal da semiótica social em Reading Images: The
Grammar of Visual Design (1996). Por multimodalidade se compreende “o uso de
vários modos semióticos no design de um produto ou evento semiótico” (KRESS &
VAN LEEUWEN apud JEWITT, 2009, p.1, tradução nossa). Linguagem escrita, fala,
gesto, imagem e cores são exemplos de modos semióticos - conjuntos de recursos
social e culturalmente moldados a fim de criar significados. Como afirma Jewitt
(2013), num evento comunicacional, os significados criados em qualquer modo se
31

entrelaçam com os de outros, cooperando na criação de sentido e tendo esta própria


interação entre modos parte na produção de significados do texto multimodal.
Dentro da semiótica social, onde mais proficuamente os estudos sobre
multimodalidade têm se desenvolvido, há uma grande ênfase no fazer dos signos. A
partir de escolhas de um conjunto de recursos semióticos disponíveis num
determinado contexto, pessoas expressam significados. Estes, portanto, são
considerados resultados de uma escolha a partir de um sistema desenvolvido
através do tempo e do uso por uma determinada comunidade (BEZEMER &
JEWITT, 2009; GUALBERTO & SANTOS, 2019).
Quando McCloud (2008) elabora categorias de análise para a interação
imagem-palavra nos quadrinhos, se aproxima a esta noção de diferentes modos
semióticos cooperando na construção de significados, mas com diferentes níveis de
protagonismo. Dentro da multimodalidade, termos como carga de informação
(functional load) (GUALBERTO & SANTOS, 2019, p.7) e peso (SANTOS, 2019,
p.30) são atribuídos ao analisar a divisão do potencial de construção de sentidos
num texto multimodal. Os potenciais de significação são condicionados, enfim, pelas
escolhas do comunicador e pelas especificidades dos modos em uso. Diferentes
modos semióticos definem potenciais distintos para a criação de significados de
acordo com a lógica semiótica sob a qual operam. “Imagens estáticas como pintura
e fotografia, por exemplo, operam sob a lógica do espaço e da relação de elementos
simultaneamente presentes neste. A escrita, por outro, é governada pela linearidade
e direcionalidade” (SANTOS, 2019, p. 9).
Como apresentado em pesquisas anteriores, podemos considerar a HQ
como um modo semiótico por articular recursos semióticos de diferentes modos sob
uma lógica semiótica própria: ela possui características do modo imagético
(distribuição espacial de elementos simultaneamente presentes), do modo escrito
(possui direcionalidade) mas também inclui o processo de significação que McCloud
nomeia como conclusão que permite a leitura das transições quadro-a-quadro como
um trilho ininterrupto (SANTOS, 2019, p. 26-30).
Nas HQs, como materiais impressos que operam dentro da espacialidade da
página, os recursos semióticos escolhidos para a construção de uma história são
dispostos de acordo com uma série de opções de layout/composição internas às
páginas e aos quadrinhos. O uso de requadros ou não, a proximidade entre
desenhos, o formato de página e tantas outras opções contribuem também na
32

formação de significados da história lida. “O layout ou composição de imagens e


textos conferem hierarquia a seus elementos, guiam o olhar do leitor em potencial,
conferem sentidos às representações” (SANTOS, 2019, p. 34). Ou seja, também tem
por função guiar o fluxo de leitura do leitor e alterar as possibilidades de significação
de seus elementos representados - ponto que será importante posteriormente ao
analisarmos a HQ 1968 Ditadura Abaixo.

3.2 PENSANDO OS QUADRINHOS COMO INSTRUMENTOS PARA


ARTICULAÇÃO DE CONCEITOS DE SEGUNDA ORDEM COM A EDUCAÇÃO
HISTÓRICA

O século XX foi um período de intensa transformação paradigmática da


historiografia, até então pautada pelo positivismo e pelo historicismo
(BITTENCOURT, 2008, p. 140-141). Na década de 1930, a revista Anais de História
Econômica e Social impulsionou os debates em curso sobre a crítica aos
documentos e às fontes históricas. O diálogo estabelecido entre os historiadores no
periódico, conhecidos hoje como Annales, destituiu do documento a posse da
verdade sobre o passado e o ofício do historiador passou a ser entendido como a
construção dos fatos históricos, não o seu resgate. Junto a outras formas de
registros e vestígios que foram ganhando espaço junto aos documentos oficiais e
escritos — como o cinema, a alimentação e a literatura — os relatos orais foram
paulatinamente incorporados à historiografia tradicional e a metodologia da História
Oral se estabeleceu (SILVA & SILVA, 2009, p. 158-161, 186-187; FERREIRA, 2019,
p. 221-223).
Na década de 1970, “a história oral se afirmava, assim como instrumento de
construção de identidade de grupos e de transformação social” (FERREIRA, 2019,
p. 223) e com ela se ampliaram e se firmaram os estudos de história sobre a
memória. Para Jacques Le Goff, historiador da Escola dos Annales, “a memória é a
propriedade de conservar certas informações [...] que permite ao indivíduo atualizar
impressões ou informações passadas, ou reinterpretadas como passadas” (SILVA &
SILVA, 2009, p. 275). Entre lembranças e esquecimentos, muitas vezes deliberados,
a memória é parte crucial e fundante de identidades individuais e coletivas assim
como uma operação realizada no presente (GIL, 2019). Até o fim da década de
1980, as novas perspectivas de trabalho com a memória pela metodologia da
33

história oral — que permitia alcançar pessoas e grupos antes invisibilizados pela
historiografia tradicional — multiplicaram as publicações na área.
Simultaneamente — e não coincidentemente — a todo esse processo, a
discussão sobre o ensino da história se transformou. Até meados do século XX, ela
foi pautada pela ideia de transposição direta do conhecimento histórico, formalmente
desenvolvido no meio acadêmico, para o espaço escolar. As pesquisas então
desenvolvidas — a partir da década de 1960, especialmente na França e na
Alemanha — modificaram esta visão hegemônica, passando então a colocar o saber
histórico escolar em uma posição qualitativamente e não hierarquicamente diferente
do acadêmico (SILVA, Cristiane 2019, p. 49). No Brasil, as décadas de 1980 e 1990
marcam esta passagem com a produção de pesquisadores das universidades
brasileiras e com a tradução de obras como as de Jörn Rüsen, um dos expoentes da
escola alemã sobre didática da história (SILVA, Cristiane 2019, p.50; CARDOSO,
2019, p. 83).
Atualmente, no Brasil, o ensino de história é pensado de forma a incluir o
trabalho com os diferentes tipos de fontes históricas desde os anos iniciais do
Ensino Fundamental. A Base Nacional Comum Curricular (BNCC), documento que
orienta o ensino dos diferentes componentes curriculares da Educação Básica, vê
nesta metodologia a oportunidade de incutir em alunos e professores uma “atitude
historiadora”, a produção de conhecimento de forma autônoma diante dos objetos de
conhecimento propostos e a percepção e construção de diferentes narrativas,
partindo sempre
[...] do tempo presente. O passado que deve impulsionar a dinâmica do
ensino-aprendizagem no Ensino Fundamental é aquele que dialoga com o
tempo atual. (BRASIL, 2018, p. 397)

A organização da BNCC vem sendo debatida há anos. Seu desenvolvimento


se deu em diferentes etapas: desde a Constituição de 1988, da criação da Lei de
Diretrizes e Base (LDB) da Educação Nacional, dos Parâmetros Curriculares
Nacionais (PCNs) até as diferentes versões de texto debatidas e redigidas entre
2014 e 2018 e o fim do prazo de adequação das instituições de ensino ao
documento em 2019. Thiago de Oliveira (2013) coloca a determinação de
competências e habilidades a serem desenvolvidas pelos alunos como “algo
tecnicista ‘como apertar botões’ (ou então, apenas identificar, analisar, selecionar,
diferenciar)” (OLIVEIRA, 2013, p. 6).
34

É contudo e portanto que este trabalho de conclusão de curso em Design


Gráfico se propõe em produzir um material de mediação do processo de ensino-
aprendizagem de história. Ainda que não tenha a oportunidade de aprofundar o
debate citado com Oliveira (2013), penso a utilização de relatos orais, a descoberta
de histórias locais e a produção de narrativas históricas gráficas a partir de
memórias da comunidade como maneiras de trabalhar aspectos da educação
histórica de Rüsen (com suas aproximações a uma perspectiva crítica e para a
liberdade) simultaneamente às diretrizes do componente curricular de História da
BNCC — a partir da leitura de trabalhos de Marcelo Fronza (2007; 2012), Thiago de
Oliveira (2013), Julio Sosa (2015), Moisés Silva e Jôyara Oliveira (2019) e outros
autores.
A BNCC coloca como um dos principais objetivos de História no Ensino
Fundamental o estímulo à
“autonomia de pensamento e a capacidade de reconhecer que os indivíduos
agem de acordo com a época e o lugar nos quais vivem [...]. A percepção
de que existe uma grande diversidade de sujeitos e histórias estimula o
pensamento crítico, a autonomia e a formação para a cidadania” (BRASIL,
2018, p. 400).

Tanto o filósofo da história alemão Jörn Rüsen quanto o filósofo da


educação brasileiro Paulo Freire versam sobre a autonomia dos sujeitos e o
pensamento crítico através de suas concepções de desenvolvimento da consciência,
seja a consciência histórica por Rüsen, seja a partir de uma tomada de consciência
por Freire. Enquanto a consciência histórica se entende pela capacidade de todo ser
humano em se situar no tempo, compreendendo sua “posição no processo temporal
da existência” (MARTINS, 2019, p. 54), a tomada de consciência de Freire seria um
processo de transformação da consciência ingênua à consciência crítica, “a gradual
percepção da realidade. Percepção daquilo que oprime, percepção dos sujeitos da
sua historicidade e, em consequência, percepção das possibilidades de luta” (SILVA
& OLIVEIRA, 2019, p. 40).
O recurso educacional aberto para a mediação do processo de ensino-
aprendizagem de história produzido neste trabalho foi pensado de maneira a
articular diferentes conceitos de segunda ordem da cognição histórica (como
35

permanências, simultaneidades e rupturas11) à construção de uma histórica local por


parte dos alunos e professores a partir de memórias individuais e, uma vez
articuladas em conjunto, coletivas. Esta etapa do processo de ensino-aprendizagem
pode ter mais significado nesta etapa ao ocorrer com a participação de membros da
família e da comunidade, assim como o oferecimento de diversas fontes, articuladas
através de diferentes modos semióticos,
favorece a autonomia dos alunos e das alunas e legitima sua produção
autoral. [...] como os alunos e as alunas aprendem a olhar os documentos
de modo crítico, podem empregar as mesmas reflexões sugeridas neste
verbete na avaliação e na análise de produções contemporâneas, como
filmes, artigos de jornal, telejornais, anúncios, mensagens em redes sociais
etc. (ALBERTI, 2019, p. 113)

Marcelo Fronza, ao colocar as histórias em quadrinhos com temas históricos


como narrativas históricas gráficas retoma o conceito de Scott McCloud dos
quadrinhos como mapas temporais (FRONZA, 2007, p. 50; MCCLOUD,
2006[2000], p. 206-207). Pensá-los a partir desta categoria aproxima-nos a um
potencial das HQs exposto por Túlio Vilela: o trabalho com a temporalidade.
Parece-nos um desafio pensar o uso de histórias em quadrinhos nas aulas
de história como forma de articular, paralelamente, um processo de desenvolvimento
da consciência histórica e crítica dos alunos ao de letramento multimodal com o uso
de fontes históricas. Pensamos, primeiro, que
O passado deve ser interrogado a partir de questões que nos inquietam no
presente (caso contrário, estudá-lo fica sem sentido). Portanto, as aulas de
História serão muito melhores se conseguirem estabelecer um duplo
compromisso: com o passado e o presente. (PINSKY, 2011, p. 22).

Consideramos, para futuras pesquisas, aprofundar o estudo e articular este


conceito às especificidades dos quadrinhos como modo semiótico multimodal,
especialmente de uma perspectiva a partir de seu layout, na produção de
significados relacionados ao tempo — o que já foi previamente discutido em nosso
relatório de pesquisa de mestrado a partir das ideias de timing de Will Eisner e
formatos de requadros de McCloud (SANTOS, 2019, p. 24-26).

11 Os conceitos de segunda ordem, definidos por Peter Lee, são conceitos estruturais do
conhecimento histórico, balizantes dos conceitos substantivos da história como ditadura, democracia,
Idade Média e Renascimento. Cf. SANTOS & CAINELLI, 2016.
36

3.3 ANÁLISE DOS RECURSOS SEMIÓTICOS DE SIMILAR: 1968 DITADURA


ABAIXO

Encontramos na obra 1968 Ditadura Abaixo (URBAN, 2008), uma


interessante proposta de trabalho para o ensino de História que alia
letramento/literacia multimodal, HQs (como meio genuinamente multimodal) e
material de mediação ao ensino de História. Ganhador do selo de “Altamente
Recomendável” pela Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil (FNLIJ), o livro
escrito por Teresa Urban e com quadrinizado por Guilherme Caldas articula
diferentes linguagens na construção de uma narrativa sobre o movimento estudantil
curitibano no fim da década de 1960, unindo relatos pessoais, entrevistas, recortes
de revistas e jornais e grande volume de fontes de pesquisa reproduzidas em suas
páginas.
A fins de análise, iremos dividir 1968 Ditadura Abaixo em três seções: a
primeira compreendendo os capítulos Muito, muito antes de 1968 e Pouco antes; a
segunda consideramos o capítulo da história em quadrinhos, 1968; e a terceira
seção formada pelos capítulos Depois, 2008 e Fontes de pesquisa (e de consulta).
Optamos por esta divisão de análise pois a primeira e a terceira seções
compreendem capítulos mais fortemente ancorados na escrita — ainda com uso de
elementos gráficos e ilustrações —, enquanto toda a HQ se concentra na segunda
seção.
Como apresentado na introdução do livro, trata-se de uma narrativa de um
ponto de vista pessoal, baseado em relatos, memória e extenso resgate e análise
documental. Para tanto, este texto multimodal faz uso de recursos semióticos que
imprimem sobre toda a leitura a sensação de se estar a acessar um arquivo de
documentos da década de 1960 curitibana.
37

Figura 14 - Páginas 64 e 73 de 1968 Ditadura Abaixo

Fonte: URBAN, 2008, p. 64 e 73.

a) Análise de modo semiótico: cores


Já é perceptível no primeiro folhear do material que, além das páginas
amareladas de gramatura média, na paleta de cores escolhida predominam os tons
de castanho e cinza, construindo na obra uma estética de impresso por décadas
arquivado. Quando há o uso de outros tons, estes servem para o destaque de
elementos importantes ou para favorecer a construção de outros significados. O
vermelho aparece em algumas passagens da HQ na segunda seção para destacar
um cartaz ou o caminho percorrido por uma passeata, e surge novamente na
terceira seção, substituindo o marrom claro até então utilizado nos elementos
gráficos, para destacar a violência perpetrada pelo regime militar brasileiro.
Estes elementos gráficos são reproduções de manchas de líquido
escorrendo — que ora pode se assemelhar ao efeito de pichações em paredes, ora
a sangue derramado — e boxes que contêm citações, letras de música, relatos
pessoais. O grafismo de tinta/sangue é importante para uma narrativa de tempos de
violência, repressão e, especialmente, resistência através de estratégias de
comunicação clandestina como pichações, colagem de cartazes e panfletagens com
recursos caseiros, marcando fortemente este aspecto relevante da resistência do
movimento estudantil durante a ditadura militar brasileira.
38

Estas possibilidades múltiplas de interpretação que coexistem na leitura do


material são possíveis através das relações que se estabelecem entre os diferentes
modos e suas narrativas. Como afirma Jewitt, ”a própria interação entre os modos é
uma parte da produção de significado” (JEWITT, 2013, p. 251, tradução nossa) e
neste caso a opção de uso dos grafismos de tinta/sangue se complementa à história
em quadrinhos que os ressignifica ao contar a história de pichação dos muros pelos
protagonistas.

b) Análise de modo semiótico: tipografia


A tipografia de 1968 Ditadura Abaixo contribui na construção do significado
já apresentado de relato pessoal (evidente nos textos introdutórios da autora)
especialmente ao utilizar a Escrita à mão feita (de Guilherme Caldas). Esta não
apenas segue o formato de letras tradicional dos balões de HQs, mas, por ser
criada pelo desenhista, confere à obra um elemento significante a mais na
construção do significado de narrativa pessoal, compartilhamento de memória
particular.
Como Vieira e Silvestre apontam, as opções em formas das letras,
espessura, ligaturas, tamanho e cores também podem influenciar na construção de
sentidos do texto (2015, p. 50) e neste caso as formas não perfeitas da escrita à
mão caracterizam especialmente o material como produção não profissional, como
uma produção artesanal de algum material
A predominância das fontes serifadas no modo escrito (American Typewriter
e Arno Pro) fora dos requadros das HQs, contudo, atribui simultaneamente às
páginas do livro características de documento e narrativa histórica tradicionais. Além
disto, a Arno Pro especificamente faz referência aos tipos das máquinas de
datilografar utilizadas na produção dos documentos oficiais e, especialmente, dos
relatórios e boletins policiais do regime. Não obstante, a tipografia Mesquite Std.,
mais ornamentada e condensada, parece ter sido escolhida para criar destaque de
inícios de capítulos e partes do texto e, todavia, não atribuir suas características
gráficas, de tradição turca, à obra - que, contudo, podem passar despercebidas pelo
leitor menos atento ou interessado em sua significação.
39

c) Análise de modo semiótico: layout/composição


Por último, mas definitivamente não menos importante, encontramos no
layout/composição um forte e interessante peso no potencial de construção de
sentidos.
A primeira e terceira seções são compostas por uma narrativa histórica mais
tradicional, ainda que não formal e que passa longe da linguagem acadêmica. Unem
os modos escrito e imagético estático na forma de documentos e imagens anexas às
páginas, mas não apresentam HQs.
A mancha gráfica das páginas - predominantemente ocupada pelo texto
disposto em uma coluna e alinhado à esquerda - não nos deixa esquecer a
seriedade do tema e o árduo trabalho de construção da narrativa histórica, com
investigação de material e memórias. Teresa Urban traduz em linguagem acessível
um grosso volume de pesquisa histórica e, na primeira e terceira seções, precisamos
nos aprofundar no entendimento de contexto e consequências da narrativa principal
que ocupa o meio da obra.
Nesta, com a segunda seção, encontramos cinco modelos de composição
da narrativa:

Figura 15 – Esquema de layouts identificados

⬤ Narrativa de contexto ⬤ Anexos ⬤ HQ

Fonte: o autor (2021).


40

Figura 16 – Exemplos de layouts: modelos I, III e IV

Fonte: URBAN, 2008, p. 133, 130 e 165.

A construção das páginas elabora duas narrativas paralelas e


complementares: uma mais factual/documentada e outra semifictícia ancorada em
relatos pessoais da autora e de entrevistados. Podemos também perceber que, em
termos de disposição dos elementos, o livro ainda segue uma hierarquia mais
tradicional dos modos semióticos - estando as narrativas de contexto (escrita) e
anexos (imagem estática) no topo das páginas e os quadrinhos da HQ na parte
inferior. Contudo, esta disposição cria em 1968 Ditadura Abaixo várias
possibilidades de leitura e significações.
Primeiro, temos as duas narrativas paralelas já mencionadas que podem ser
acompanhadas independentemente. Um leitor pode passar pelo livro inteiro lendo
apenas a HQ na metade inferior das páginas e pulando aquelas com anexos sem
prejudicar seu entendimento. O mesmo ocorre para aquele que busca material de
referência e uma narrativa menos pessoalizada no topo das páginas. É, entretanto,
na articulação dos modos que encontramos os caminhos mais ricos de experiência
do texto multimodal. A proximidade da escrita, anexos e HQ cria um vínculo direto
entre as duas narrativas, tornando-as complementares e criando uma terceira
experiência de leitura possível.
O ir e vir do olhar pela mesma página, buscando nos boletins de ocorrência
nomes e descrições dos eventos retratados pela HQ, estimula uma leitura não-linear
da obra. Além disto, o acesso a reproduções de fontes primárias também permite a
criação da experiência do pesquisador, que analisa e interpreta os documentos da
41

época a fim de construir um panorama mais amplo sobre os costumes, cultura,


sociedade e eventos do período.
Dado que as escolhas de layout variam pouco a disposição dos blocos de
conteúdo e dos modos semióticos, ainda há uma possibilidade de significação um
pouco menos superficial. No campo historiográfico há uma contínua discussão sobre
a produção da história oficial, que costuma privilegiar os grandes acontecimentos e
nomes importantes, e aquela cuja narrativa prioriza a memória do povo comum, com
entrevistas, uso de acervos pessoais, cultura material, a fim de construir um
panorama histórico visto de baixo. Nas páginas, estas duas histórias, assim como
em toda a historiografia, se entrelaçam, mas mantém sua disposição constante: uma
história vista de cima, dos grandes eventos, é lida na parte superior da página;
aquela história vista de baixo, das pessoas, lê-se na metade inferior.
42

4 DESENVOLVIMENTO DE UM REA PARA ENSINO DE HISTÓRIA COM HQS

4.1 CONCEITO DO RECURSO EDUCACIONAL ABERTO

Este projeto partiu da idealização de um instrumento de mediação do


processo de ensino-aprendizagem de história para o Ensino Fundamental — Anos
Iniciais. Os dois primeiros anos do Ensino Fundamental são pautados pelo processo
de alfabetização de alunas e alunos e pelo reconhecimento do Eu, do Outro e do
Nós (BRASIL, 2018, p. 355).
Para a área de Ciências Humanas, da qual o componente curricular de
História é parte, a BNCC indica que
No Ensino Fundamental – Anos Iniciais é importante valorizar e problematizar
as vivências e experiências individuais e familiares trazidas pelos alunos [...]
É nessa fase que os alunos começam a desenvolver procedimentos de
investigação em Ciências Humanas, como a pesquisa sobre diferentes fontes
documentais, a observação e o registro – de paisagens, fatos,
acontecimentos e depoimentos – e o estabelecimento de comparações.
Esses procedimentos são fundamentais para que compreendam a si mesmos
e àqueles que estão em seu entorno, suas histórias de vida e as diferenças
dos grupos sociais com os quais se relacionam. (BRASIL, 2018, p.355)

Assim, objetivamos a formulação de um recurso educacional de mediação


de ensino que auxilie professoras e professores, alunas e alunos na construção do
conhecimento histórico através da pesquisa histórica, do registro de depoimentos
das famílias e comunidade local e da produção de uma narrativa histórica gráfica. A
Figura 17 mostra a etapa inicial da estrutura pensada para o material, com o
planejamento de atividades a serem executadas por professores e alunos, formas de
elaboração das entrevistas e aspectos a serem considerados na produção de suas
HQs.
43

Figura 17 – Rascunho de etapas do REA

Fonte: o autor.

O recurso didático precisa orientar professores e alunos em sua utilização


em sala de aula sem apresentar uma rigidez que o torne indiferente ao contexto
destes indivíduos. Isto para que o processo de ensino-aprendizagem em história se
desenvolva de maneira relevante e crítica, partindo do — e a ele sempre relacionado
— contexto local. Assim, tomamos o desenvolvimento do material por duas
perspectivas: uma voltada aos educadores, com uma abordagem mais sóbria e
voltada à usabilidade, que levou à criação de um caderno de orientações ao
professor; e outra voltada aos alunos, mais lúdica e criativa, a fim de instigá-los a
criatividade e participação nas atividades propostas, gerando as histórias em
quadrinhos aos alunos.

4.2 PAINEL SEMÂNTICO

De uma pesquisa preliminar de materiais que articulam histórias em


quadrinhos, ensino e história procuramos tanto HQs (impressas ou digitais) quanto
44

outros tipos de materiais relevantes à pesquisa — como livros didáticos. Nesta


etapa, buscamos observar usos de tipografia, paletas de cores, linguagens e
distribuição dos elementos visuais, textuais e outros recursos para a produção das
narrativas.

Figura 18 – Painel semântico

Fonte: montagem do autor12.

4.3 ETAPAS DE DESENVOLVIMENTO

A partir da análise inicial, passamos às experimentações e definições


preliminares de uso dos modos semióticos de acordo com as necessidades do
projeto. Como resultado das reflexões e planejamento anteriormente apontados,

12 Capa de Asterix entre os Bretões (Fonte: Asterix entre os bretões. Asterix. Disponível em:
<https://www.asterix.com/pt-pt/a-colecao/os-albuns/asterix-entre-os-bretoes/>. Detalhe de página
de Turma da Mônica: O que é CDC? (Fotne: NHSINGO. Turma da Mônica e UNICEF publicam
páginas sobre a Convenção sobre os Direitos da Criança. ABRAL. Disponível em:
<https://abral.org.br/turma-da-monica-e-unicef-publicam-paginas-sobre-a-convencao-sobre-os-
direitos-da-crianca/>. Acesso em: 17 mar. 2021.Acesso em: 17 mar. 2021). Página de 1968
Ditadura Abaixo (Fonte: URBAN, 2008, p. 130). Detalhe de página de A Infância do Brasil.
(Fonte: AGUIAR, José. A Infância do Brasil [recurso eletrônico]. Capítulo 2: Século XVII, p. 13.
Disponível em: <https://www.ainfanciadobrasil.com.br/capitulos/>. Acesso em: 17 mar. 2021).
Detalhe de página do livro didático Buriti Mais História (Fonte: Buriti Mais História (1º ano —
manual do professor). São Paulo: Moderna, 2017, p. 52. Disponível em:
<https://pnldf1.moderna.com.br/historia/buritimais>. Acesso em: 17 mar. 2021.)
45

projetamos o recurso educacional em duas abordagens: o caderno de orientações


aos professores e as histórias em quadrinhos aos alunos.

4.3.1 CADERNO DE ORIENTAÇÕES AO PROFESSOR

Baseados nas análises de obras similares e na usabilidade de diferentes


materiais didáticos, a primeira etapa do desenvolvimento do caderno de orientações
ao professor foi a definição de seu formato e grid. Optamos pelo formato A4
(210x297mm), facilitando sua impressão, transporte e uso em sala de aula. O grid
das páginas foi parcialmente inspirado em uma convenção das versões para os
professores dos livros didáticos, os “livros em U”.

Figura 19 – Comparação de layout: “livros em U” e caderno de orientações ao professor

Fonte: montagem do autor13.

Nestes livros, as orientações aos professores vêm ao lado e abaixo de uma


réplica reduzida no livro dos alunos – formando um “U” nas páginas duplas. Desta
convenção já conhecida pelos professores abstraímos um grid modular. Sobre este,
construímos duas colunas cuja principal preocupação fosse definir hierarquias para
as informações apresentadas: uma maior, próxima à lombada e indicada em azul na
Figura 20, e outra menor, próxima à margem externa das folhas e indicada em
verde. Para as aberturas de seções, ainda separamos a primeira linha do grid
modular para os títulos. Ao definir estas áreas, elegemos uma região privilegiada
para o conteúdo principal de orientação aos professores, uma coluna mais estreita
com informações complementares e indicações de leitura e atividades.

13À esquerda, detalhe de página do livro do professor da coleção Buriti Mais História. (Fonte:
Buriti Mais História (2º ano — manual do professor). São Paulo: Moderna, 2017, p. 96.
Disponível em: <https://pnldf1.moderna.com.br/historia/buritimais>. Acesso em: 30 abr. 2021)
46

Figura 20 – Formato e grid do caderno de orientações ao professor

Fonte: montagem do autor.

O conjunto de materiais do recurso educacional aberto foi produzido


inteiramente com o uso de duas famílias tipográficas de uso livre e gratuito. A
primeira delas, com suas letras geométricas e sem serifa, Montserrat foi utilizada
para o caderno do professor.
47

Figura 21 – Família tipográfica Montserrat

Fonte: montagem do autor.

Ela permitiu a construção de uma hierarquia da informação textual sólida


com poucas variações de corpo, estilo e cor, como demonstrado no esquema
abaixo.

Figura 22 – Hierarquia visual com Montserrat

Fonte: montagem do autor.

Outras aplicações contextuais foram pensadas, de forma a construir um


sistema visual que permita a localização e navegação do material por parte do
professor.
48

Figura 23 – Sistema visual de navegação dentro do texto.

Fonte: montagem do autor.

A paleta em branco, preto e tons de cinza do caderno de orientações foi


decidida a partir de duas perspectivas: assim como o uso do formato, baratear e
facilitar a impressão do material; a identificação na análise de similares de um uso
mais restrito das cores nos materiais voltados ao público adulto – tanto em materiais
didáticos quanto em histórias em quadrinhos. Assim, quando inserimos uma história
em quadrinhos voltada à leitura apenas dos educadores no caderno, mantemos a
paleta monocromática.
Nossas pesquisas, rascunhos e experimentações, somado aos resultados
da pesquisa de mestrado anterior (SANTOS, 2019) apontam para uma intrínseca
relação entre a composição de tiras e páginas em quadrinhos com a articulação de
noções de temporalidade e outros conceitos importantes para o ensino-
aprendizagem de história. Portanto, inspirando-se especialmente em McCloud
(1995, p. 115), produzimos uma HQ voltada aos educadores que demonstrasse o
potencial de representação da temporalidade sobre o espaço da página.
49

Figura 24 – Etapas desenvolvimento HQ “Espaço e tempo se fundem”

Fonte: montagem do autor.

A partir destas definições, elaboramos o caderno de orientação aos


professores, com propostas de aulas, atividades, slides e imagens a serem
trabalhadas com os alunos.

Figura 25 – Duplas de páginas do caderno de orientações ao professor

Fonte: montagem do autor.

O último material do caderno de orientações ao professor trata-se de um


roteiro de entrevistas para uso dos alunos durante a última atividade proposta de
pesquisa de relatos orais para investigação de memórias e histórias.
50

Figura 26 – Página do roteiro de entrevista

Fonte: montagem do autor.

Ainda que voltado aos alunos, ele segue os mesmos critérios de projeto
estabelecidos para o caderno do professor, exceto pelo uso do texto em caixa alta.
Para seu uso complementar à proposta de aulas e atividades, priorizamos uma
organização de simples preenchimento e remixagem, dado que este é o principal
instrumento de recolha de informações do projeto – podendo, portanto, ser
modificado para a adequação ao contexto e realidade local de cada escola.

4.3.2 HISTÓRIAS EM QUADRINHOS AOS ALUNOS

O formato das histórias em quadrinhos voltadas para os alunos, exceto de


uma tirinha, foi definido seguindo critério semelhante ao caderno do professor: o A4
permitir uma mais fácil reprodução em impressoras domésticas. As três histórias
produzidas foram: uma tirinha (Um dia de Rita) retratando o cotidiano de uma
criança no tempo presente; uma página de HQ (Um dia de Aurora) representando
um dia de uma criança curitibana do passado; e mais uma página de HQ (Instrução
51

à pesquisa), cujo objetivo é apresentar ferramentas de pesquisa em História Oral e


auxiliar os alunos na última atividade proposta.

Figura 27 – Etapas de desenvolvimento da HQ “Um dia de Rita”

Fonte: montagem do autor.

A partir de transições cena a cena (MCCLOUD, 2008, p. 15), a narrativa Um


dia de Rita representa três diferentes períodos do dia de uma menina em idade
escolar. A estrutura de três quadros das tirinhas é aproveitada para o trabalho da
habilidade EF02HI06 da BNCC14, assim como conceitos como presente, passado e
futuro – todos relacionados a noções de temporalidade, como indicado em texto aos
professores. A paleta de cores selecionada parte da análise anterior de similares
voltados ao público infantil: uma paleta tetrádica com forte saturação.

14Identificar e organizar, temporalmente, fatos da vida cotidiana, usando noções relacionadas ao


tempo (antes, durante, ao mesmo tempo e depois).
52

Figura 28 – Etapas de desenvolvimento da HQ “Um dia de Aurora”

Fonte: montagem do autor.

Um dia de Aurora foi idealizada como um recurso para a reflexão sobre


semelhanças e diferenças entre o cotidiano de crianças de diferentes tempos. Sua
paleta foi definida por critérios similares aos de Um dia de Rita, com uma alteração
sugerida pelo estudo de similares e testes dos protótipos: uma leve redução da
saturação das cores mais frias e a predominância das cores amareladas e
avermelhadas, somando aos desenhos uma impressão de material mais antigo.
53

Figura 29 – Etapas de desenvolvimento da HQ “Instrução à pesquisa”

Fonte: montagem do autor.

A última história em quadrinhos aos alunos tem por função a Instrução à


pesquisa dos alunos proposta no caderno de orientações ao professor. Dada esta
característica, acompanhando as representações em desenho das instruções, o
texto escrito aparece exclusivamente em recordatórios. A família tipográfica Komika,
criada por WolfBainX e Apostrophic Labs, também presente no logo do projeto, foi a
escolhida para os textos desta e das outras HQs com textos escritos.
Uma convenção dos quadrinhos, o desenho das letras em caixa alta
presente na maior parte das revistas adequa-se ao momento de alfabetização dos
alunos, que passam a ler e escrever em caixa baixa entre o segundo e o terceiro
anos do Ensino Fundamental. A tipografia de Komika, não-serifada e de estilo à
mão, foi feita especificamente para o uso em HQs.
54

Figura 30 – Família tipográfica Komika

Fonte: montagem do autor.

Segundo seus autores, sua licença que permite o uso livre e gratuito,
inclusive para fins comerciais, foi pensada de maneira a suprir uma lacuna de boas
fontes para uso em histórias e quadrinhos, com suporte a outras línguas que não o
inglês e com ampla variedade de glifos — aspecto fundamental em nosso projeto ao
pensarmos sua utilização em um recurso educacional aberto.

4.3.3 DISPONIBILIZAÇÃO DO REA

Seguindo o objetivo de construir um REA todas as etapas de


desenvolvimento das histórias em quadrinhos (desenho, arte finalização,
balonamento, diagramação e colorização) foram realizadas no Krita – software
gratuito, livre e de código aberto. As camadas de traço, cor e texto foram
organizadas para a disponibilização aberta dos arquivos, encorajando a remixagem
do material de maneira livre.
55

Figura 31 – Arquivo aberto de Instrução à pesquisa no Krita

Fonte: montagem do autor.

Com a mesma finalidade, o caderno do professor, slides e páginas das


histórias em quadrinhos estão licenciadas com uma licença Creative Commons
Atribuição-CompartilhaIgual 4.0 Internacional, permitindo assim, atribuídos os
créditos de autoria e o compartilhamento sob os mesmos termos, seu uso, cópia,
compartilhamento e remixagem livre. Da mesma forma, todas as imagens que não
foram produzidas pelo próprio autor também estão sob licenças que permitam seu
uso livre e gratuito para quaisquer fins.
Estes aspectos são fundamentais dentro da perspectiva adotada de uma
educação que se proponha democrática, libertadora e contextualizada a partir do
local de ensino-aprendizagem. Retomando as ideias de Rüsen e Freire comentadas
anteriormente, os processos de tomada ou desenvolvimento de consciência crítica
pressupõe o desenvolvimento da autonomia dos sujeitos e sua ação sobre sua
realidade. Assim, não faria sentido a construção de um material didático tradicional,
cujas propostas, conteúdo e forma não fossem pensadas, a princípio, para o
compartilhamento e construção coletiva dos saberes.
Assim, ao término da produção do REA, disponibilizando tanto o caderno de
orientações ao professor quanto as histórias em quadrinhos aos alunos em formato
aberto e gratuito online, acessível via leitura de QRCode no caderno, voltamo-nos ao
caminho percorrido até esta conclusão.
56

Os conceitos de layout, tipografia e cores como modos semióticos,


perspectiva trazida pela literatura da semiótica social, nos fez refletir não apenas
pelos sentidos construídos na leitura contemporânea descontextualizada, mas
também nas significações que tais representações teriam inseridas em uma aula de
História do Ensino Fundamental. A marcação das paletas conforme não apenas os
públicos leitores, adulto ou infantil, mas também sua adaptação ao contexto de
impressão doméstica (no primeiro caso) e para a significação de um tempo passado
(pela paleta de Um dia de Aurora) parecem operar significativamente bem. A
articulação das noções, conceitos e termos de temporalidade descritos na habilidade
EF02HI06 da BNCC também ocorre de maneira satisfatória na justaposição dos
quadrinhos e nas transições quadro a quadro (MCCLOUD, 2008). Contudo, estas
impressões ainda necessitam de averiguação em contextos de ensino-
aprendizagem, onde sua leitura por parte de outros profissionais da educação e de
alunos poderão indicar seu sucesso.
O mesmo pode ser dito da sua caracterização como REA, mas nesse
momento não há outra possibilidade se não a divulgação e compartilhamento dos
materiais. Pois é no sistema de uso e remixagem que suas características e
potencialidades emergem e, portanto, esta acaba sendo apenas uma etapa
intermediária de um longo projeto que se deseja em contínua produção: para outros
anos do Ensino Fundamental e com participação de outros profissionais da
Educação e do Design Gráfico.
57

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Para as últimas considerações acerca deste trabalho de conclusão de curso,


trago uma reflexão sobre os objetivos elencados inicialmente, as etapas de seu
desenvolvimento e como vejo os resultados alcançados.
Os conceitos e categorias dos campos da História, do Design Gráfico e da
semiótica, ainda que não explicitamente citados em todos os momentos neste
trabalho, construíram uma base sólida sobre a qual o projeto pode se desenvolver e
geraram frutos entrelaçados que não se esperava num primeiro momento. Por
exemplo, ao encarar o próprio layout como um modo semiótico, percebemos que
suas construções de significados poderiam ser utilizadas para o trabalho dos
conceitos de segunda ordem da História. Os momentos em que isto mais ficaram
evidentes foram durante a produção das HQs Espaço e tempo se fundem e Um dia
de Rita, quando as poucas transições quadro a quadro puderam ser pensadas e
desenvolvidas com atenção aos sentidos que produziriam.
As narrativas um pouco mais longas das HQs Um dia de Aurora e Instrução
à pesquisa, por sua vez, nos levaram a dois caminhos, um deles menos esperado.
Enquanto a primeira foi desde o início pensada como uma narrativa histórica gráfica
que serviria de exemplo e inspiração aos futuros alunos na produção de suas
próprias HQs, a segunda nos levou nos levou de volta ao gênero de quadrinhos
vinculado ao design instrucional, cuja forma se traduziu em representações e
transições que destaquem as etapas da atividade. Neste ponto, o fim do trabalho
nos levou a um desdobramento das hipóteses inicialmente levantadas, levando a
uma nova reflexão que exigiria uma nova e longa pesquisa: quais as implicações da
narrativa dos quadrinhos para o ensino de metodologias de pesquisa? Este não foi
um objetivo do atual projeto, e é possível, se não provável, que pesquisas acerca do
tema já tenham sido desenvolvidas. Contudo, anotamos aqui a possibilidade de
problema a ser pesquisado em futuras oportunidades.
O terceiro objetivo citado em nossa Introdução começa com um termo que,
neste momento conclusivo, por si só nos fez rever este trabalho de conclusão por
completo. Inserido na área do design, agora parece óbvio que projetar não se
resumiria a apenas uma etapa, mas um trabalho que viria a ocorrer de forma cíclica
e constante em todo o trabalho. A busca por conceitos e referências que norteassem
58

a produção do REA fez parte deste projeto. As constantes leituras, revisões,


redesenhos, foram projeções daquilo que deveria vir a ser feito e refeito. A
identificação de encontros entre as áreas da História, Design e semiótica social
também projetaram, sobre o material que ainda nascia e dava seus primeiros
passos, imagens e novas ideias. Neste mesmo momento, em que disponibilizamos e
(re)avaliamos o REA produzido, estamos projetando perspectivas futuras e
caminhos que ele tomará.
Lembramos, finalmente, que ao trazermos Jorn Rüsen e Paulo Freire às
páginas deste trabalho, pensamos um material voltado ao processo de ensino-
aprendizagem que favoreça a construção de um saber de maneira coletiva e
autônoma, que promova o desenvolvimento e a tomada de uma consciência
histórica crítica. A construção da História é feita, também, através da memória e
ambas pressupõem a experiência humana. Esperamos que este trabalho faça aquilo
que Rüsen postula ao tomar a consciência histórica como a capacidade dos
humanos em compreenderem a sua posição nos processos históricos, localizaram-
se no tempo. Ao olhar para o passado e constatar o tamanho do caminho que até
aqui foi trilhado, é inevitável voltar-se ao futuro e imaginar que outras estradas serão
abertas.
Pois este não é um trabalho que se encerra aqui. A produção deste REA
voltado ao uso de professoras e professores, alunas e alunos, desenhou formas de
se criar histórias em quadrinhos aliadas à pesquisa de História Oral para, então,
auxiliar na descoberta e na construção de um saber histórico local pautado pela
memória das pessoas. É, portanto, um material que se pressupõe inacabado: foi
feito para ser refeito. E me encontro ansioso em vê-lo germinar tanto em minha
atuação futura – seja como designer gráfico, seja como historiador, ao trabalhar com
materiais didáticos –, quanto nas fecundas trilhas das aulas de História que serão
percorridas por outros educadores e crianças.
59

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APÊNDICE A - Caderno de Orientações ao Professor (versão em cores)


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APÊNDICE B - Caderno de Orientações ao Professor (versão preto e branco)


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APÊNDICE C - HQ Espaço e tempo se fundem


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APÊNDICE D - HQ Um dia de Rita (cores e preto e branco)


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APÊNDICE E - HQ Um dia de Aurora (cores e preto e branco)


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APÊNDICE F - HQ Instrução à pesquisa (cores e preto e branco)


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APÊNDICE G - Slides - Caderno de Orientação ao Professor


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APÊNDICE H - Licença Creative Commons Atribuição-CompartilhaIgual 4.0


Internacional
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