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A FALTA DE GERENCIAMENTO
DE MUDANÇAS: A ETERNA DOR
DE CABEÇA DOS CLIENTES

por Luiz Tubino

N
ão é raro nos dias de hoje problemas de qualidade devido a segmento automotivo onde uma vez que produto e processo estão
mudanças não autorizadas de produto e ou processo, geran- aprovados pelo cliente os mesmos são “congelados“. Não se muda
do os mais variados impactos até mesmo recall. nada sem autorização do cliente e nova homologação.
Atuo no segmento automotivo, logo vou escrever com base no Até aqui tudo entendido, mas como realizar a gestão de mudanças?
que vivencio Vamos lá então, tudo começa a partir de um pedido de mudança.
A questão é disciplina e gestão de mudança, avaliação do impacto,
ninguém muda nada sozinho, abaixo a ditadura da mudança. Toda a 1. Deve haver uma descrição da mudança proposta seus
mudança deve ser devidamente avaliada quanto ao risco e viabilida- benefícios e vantagens de efetivar a mudança. Todo o pedido de
de. Atuei como perito assistente em um caso de recall onde a causa mudança tem um número /identificação única.
da falha foi “apenas” a inversão de uma sequência de operações sem
a validação da mesma e sem comunicação ao cliente, tal alteração 2. Avaliação da mudança:
comprometeu a estrutura metalúrgica da peça. Querem saber o final? Todas as partes envolvidas na mudança devem participar de um es-
Ganhamos a causa por se tratar de mudança não autorizada, olha que tudo de viabilidade da mudança proposta onde apontam suas necessi-
isso já faz um bom tempo. dades e preocupações bem como o custo envolvido de cada área para
Hoje normas tais como IATF 16949 e ISO 9001 já trazem em efetivar a mudança, impacto nos prazos de efetivação e avaliação dos
seus requisitos explicitamente a preocupação com o gerenciamen- riscos envolvidos. A gestão geralmente é realizada pela engenharia.
to de mudanças. Uma vez que todas as partes interessadas dentro da organização
Nos dias de hoje uma das causas de peças com defeitos em monta- apontaram prós e contras bem como custos e prazos e dado o veredi-
doras continua sendo a famosa mudança não autorizada. Clientes são to final, via de regra do diretor de engenharia / diretor industrial (alta
surpreendidos, consequências muitas vezes são graves e de alto custo. direção) responsáveis por isso.
Encaremos uma mudança de lay out de um processo de ma-
nufatura como exemplo, na maioria das vezes precisamos parar 3. Caso a mudança proposta não seja aprovada, as razões pela
a produção, antes disso é necessário manufaturar um “pulmão” reprovação devem ser registradas e mantidas pela empresa, caso
de peças para cobrir a parada de produção. Onde vamos estocar a proposta de mudança seja aprovada é apontado um líder para
essas peças? Temos embalagens suficientes para isso? Necessário gerenciar a mudança e o planejamento em forma de cronograma é
trabalhar em regime de horas extras? Por quanto tempo? Como realizado. Pronto para mudar? Ainda não, precisamos da aprova-
preservar essas peças? Se for no domingo? O refeitório vai estar ção do cliente para iniciar o processo de mudança e a primeira
aberto? Alguma vezes me vi com muitas pizzas na mão para cobrir pergunta que o cliente faz é “quanto levo nisso“? Mudanças devem
almoço de operadores porque ninguém previu que operadores trazer aumento de qualidade e/ou produtividade, esteja preparado
sentem fome aos domingos. Várias questões que sem gerenciamen- para dividir isso com seu cliente.
to de mudanças não seriam respondidas.
E o PAPP, considerando o exemplo de mudança de lay out não 4. Implementação da mudança
deveria cobrir isso tudo? Não, ele não cobre isso tudo a função dele Uma vez aprovada pelo cliente a mudança é efetivamente implanta-
é homologar processo e produto. A organização e gestão de como a da. Aqui dois eventos são fundamentais, o primeiro é a aprovação da
alteração será feita não passa pelo PAPP. mudança implantada pelo mesmo time que fez o estudo de viabili-
E o cliente, já aprovou a mudança de lay out? Estamos alterando dade da mudança e a elaboração de um lote experimental, onde no
uma condição de processo previamente aprovadas por ele. Atuo no meio em que trabalho, chamamos de PTR (production trail run) que

Revista Grafeno | junho 2023 | 45


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aprova a mudança, não o produto. Uma vez aprovada a mudança


através do PTR aí então é manufaturado um lote piloto e a mesma
é homologada pelo cliente através do seu processo de aprovação
PPAP, VDA2, etc.

5. Mudanças não planejadas (processo sob desvio)


Em qualquer momento em que um produto e/ou processo é
alterado em relação ao plano de controle documentado e aprovado as
organizações deveriam estabelecer um procedimento de controle de
processo sob desvio que defina requisitos mínimos para verificação do
processo original ao sair do desvio.

Se as coisas não aconteceram como deveriam compartilha a pre-


ocupação com teu cliente pois ele também deve aprovar a condição
sob desvio, tanto para processo como produto. Pergunta que ouvi
duzentas vezes: se o processo é alterado mas o produto permanece
dentro de desenho, mesmo assim preciso notificar o cliente e solicitar
a aprovação dele? Óbvio que sim, pois a produção ocorreu fora de
uma condição previamente aprovada pelo cliente. Não esqueça que
ele precisa de teu produto, precisa abastecer as linhas dele, divida tua
preocupação, acredite na relação de parceria ou em 2023 tu ainda
pensas em enganar cliente?
Não esconda essa situação do teu cliente e lembre se que uma das
principais não conformidades em cliente tem como origem mudanças
não autorizadas. Vou falar o óbvio: qualidade nunca solicita desvio,
quem falhou é quem deve solicitar o desvio.
A aprovação do desvio via de regra é realizada por engenharia,
qualidade e produção. Por último o cliente avalia e aprova ou não a
condição sob desvio.
Os breakings points de início e fim de desvio devem ser registra-
dos, via de regra o desvio de engenharia é concedido por prazo ou
número de peças.
Importante que se faça uma análise de risco da operação sob des-
vio, realização de FMEA para a condição proposta, plano de controle
e instrução de trabalho.
Antes de retornar ao processo original, depois do desvio, os
parâmetros de ajuste do processo são verificados e uma quantidade
pré-estabelecida de peças são manufaturadas e validadas.
O gerente de produção/operações aprova o retorno a condição
original.
Ideias mirabolantes sem validação são um risco para a operação.
Muitas vezes a ditadura da mudança impede que um bom planeja-
mento seja realizado e a mudança devidamente implantada.
Mudanças muitas vezes são necessárias, fazem parte do proces-
so de melhoria continua desde que sejam devidamente planeja-
das, avaliadas por time multidisciplinar afetados pela mudança e
aprovada pelo cliente
Lembre se de que a aventura pode ser louca, o aventureiro não.
Planejamento é fundamental.

Luiz Tubino, Especialista em qualidade Automotiva IATF e


ferramentas da qualidade i core tools e solução de problemas.
Consultor de empresas e palestrante na LTC Brasil Ltda, provider
GM. Experiencia de 30 anos no segmento automotivo.

46 | junho 2023 | Revista Grafeno

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