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Artigo original

O ETANOL DE SEGUNDA GERAÇÃO NO


BRASIL
Políticas e redes sociotécnicas
Bruno Rossi Lorenzi (1)

https://orcid.org/0000-0001-8486-0726

Thales Haddad Novaes de Andrade (2)

https://orcid.org/0000-0002-4000-3527

(1) Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), São Carlos – SP, Brasil. E-mail: brunolorenzi@gmail.com.

(2) Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), São Carlos – SP, Brasil. E-mail: thales@sigmanet.com.br.

DOI: 10.1590/3410014/2019

Introdução de financiamento e de pesquisa envolvidas com o


E2G, entrevistas e cartas publicadas, bem como
Neste artigo, pretendemos discutir a formação as notícias relativas ao tema em portais, jornais
da rede do etanol celulósico – ou etanol de segunda de grande circulação e revistas especializadas, en-
geração (E2G) – no Brasil, identificando os princi- tre outros materiais secundários. As controvérsias
pais atores envolvidos em sua pesquisa, desenvolvi- técnicas e políticas relacionadas com o E2G foram
mento e produção, como empresas, fornecedores, analisadas a partir de nosso referencial teórico, no
institutos de pesquisa e programas governamentais, caso a Teoria Ator-Rede (TAR), modelo de pesqui-
além da parte técnica envolvida com esse objeto, sa e análise que tem como principais contribuidores
como as tecnologias utilizadas e em desenvolvi- Bruno Latour (2000; 2012), Michel Callon (1986;
mento, seus potenciais, questões técnicas, dilemas, 1987) e John Law (1999; 2007).
divergências e controvérsias. Utilizamos em nossa Segundo os autores da TAR, os fatos científicos,
pesquisa a bibliografia existente sobre o assunto tecnologias e ações sociais são resultado de uma rede
(teses, dissertações, livros, coletâneas e artigos que formada sempre por uma coletividade de atores hu-
abordam o assunto), documentos oficiais (progra- manos e não humanos, portanto, necessariamente
mas de governo, leis e projetos de lei), relatórios sociotécnica. As associações que formam uma rede se
dos ministérios, empresas produtoras, instituições dão através de ações, alianças, negociações, disputas,
resistências e adaptações dos atores humanos e não
Artigo recebido em: 19/10/2017 humanos envolvidos com algum objeto ou objetivo
Aprovado em: 11/03/2019 em comum. Esse processo também é chamado de
RBCS Vol. 34 n° 100 /2019: e3410014
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mediação sociotécnica ou movimento de translação – ou menos importante ou confiável. Pelo contrário,


termo que inclui a noção de movimento e de tradução a controvérsia deve ser utilizada como o principal
ao mesmo tempo (Latour, 2000; 2001; 2012; Callon, combustível da análise, fornecendo os elementos
1980; 1986; 1991). Para os autores, nenhuma rede se que vão ajudar o analista a abrir a caixa-preta do
sustenta sem a contribuição de atores não humanos, objeto estudado, expondo seu interior – os elemen-
ou seja, elementos da natureza ou artefatos tecnológi- tos constituintes, como eles funcionam e qual o pa-
cos que, combinados, realizam alguma atividade que pel e a importância de cada um. Somente ao fim
substitui o trabalho humano ou permite algo inteira- da análise, após se analisar o que há de comum ou
mente novo e fundamental para o sucesso do projeto convergente nesses relatos, é possível afirmar com
dos atores envolvidos e o funcionamento da rede. alguma certeza as ações e elementos fundamentais
Além disso, na perspectiva da TAR, todo ator é do objeto estudado.
em si um “ator-rede”. Isso quer dizer que nenhum Isso nos leva aos elementos não humanos que
ator age sozinho, há sempre uma rede de atores co- fazem parte de uma rede. Para a TAR, qualquer coi-
nectada a todos os outros, que lhe dá apoio, legitimi- sa que interfira ou modifique o curso de uma ação
dade, instrumentos e influencia suas ações e decisões. deve ser considerada um ator, ou actante. Esses ele-
Como Law (1999) aponta, os atores são na verda- mentos, apesar de não serem humanos, atuam e in-
de efeitos da rede. Ou, ainda, “uma rede de atores fluenciam de forma determinante no funcionamen-
é simultaneamente um ator, cuja atividade consiste to de uma rede, sendo, na maior parte das vezes,
em fazer alianças com novos elementos, e uma rede, peças fundamentais para a sua formação, funciona-
capaz de redefinir a transformar seus componentes” mento, estabilidade e sucesso. Os materiais e as tec-
(Callon, 1987, p. 93). nologias utilizadas têm, portanto, importância fun-
Segundo Latour (2012), para colocar a TAR em damental na análise, já que o tempo todo os atores
prática é fundamental acompanhar as controvérsias humanos precisam deles para agir e realizar seus
sem se preocupar em tomar lados ou prever seus objetivos. Os atores não humanos que participam
resultados, mas utilizá-las como fontes de informa- do fluxo da ação devem ser levantados e sua im-
ção (pois são nas controvérsias e problemas que um portância para a rede deve ser avaliada, apontando
objeto ou fato científico expõe suas entranhas) para também a quem esses actantes estão relaciona-
descobrir quem são os atores (humanos e não hu- dos (empresas, instituições, programas etc). Esse
manos) que fazem parte da rede relacionada objeto. ponto é fundamental quando se analisam inovações
A partir disso, o pesquisador deve acompanhar esses tecnológicas, dado que o comportamento até então
atores e observar como eles definem e tentam esta- desconhecido ou inexplorado dos atores não huma-
bilizar seus objetos para só depois tecer uma conclu- nos é provavelmente o palco das controvérsias e da
são sobre como esses grupos atuam e modificam o mudança em um processo de inovação ou constru-
mundo social à sua volta. Aí também estaria uma das ção de tecnologias sociais.
principais contribuições políticas da TAR, ao ajudar A partir disso, o observador que quiser acompa-
a revelar, através de sua descrição minuciosa, forças e nhar o desenvolvimento de um fato científico ou tecno-
grupos atuantes até então desconhecidos. logia deve se ater a quatro detalhes: observar o cenário
A ação aqui é tomada como um conglome- em que se encontra a alegação ou proposição; des-
rado de outras ações, das quais participa uma infi- cobrir quem são os atores (pessoas, instituições, em-
nidade de atores, como um enxame que aponta em presas, grupos de interesses etc.) que estão lutando
determinada direção. O autor também enfatiza que para transformá-la em fato ou realidade; verificar a di-
existem diversas figurações (ou representações) para reção para a qual a proposição está sendo empurrada;
a mesma a ação ou evento, ou seja, diferentes atores acompanhar os desdobramentos entre a alegação ou
narram ou descrevem os fatos cada um de acordo proposição original e os seus resultados.
com a sua percepção, com pequenas ou grandes O etanol celulósico é o álcool extraído das fibras
diferenças de um para o outro. Nenhuma dessas de um vegetal. No caso da cana-de-açúcar, principal
figurações deve ser tomada a princípio como mais insumo utilizado no Brasil para a produção de etanol
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e alvo da nossa pesquisa, o E2G é obtido através do processo e uma enorme incerteza quanto ao futuro
processamento do bagaço após a extração do caldo ou do etanol celulósico (NovaCana, 2016; 2017).
mesmo da palha. Por meio de um processo chamado A partir do nosso referencial, nos esforçamos em
de hidrólise – que liquefaz as fibras de um vegetal com considerar o etanol celulósico um actante, ou seja,
o uso de ácidos ou enzimas específicas – o bagaço e uma tecnologia em construção em torno da qual se
a palha tornam-se aproveitáveis, produzindo-se mais realizam diversos esforços e disputas, numa verda-
etanol (até 50% mais) a partir desse caldo hidrolisado. deira corrida pelo seu domínio. Da mesma forma,
Como cerca de metade dos açúcares e da energia da diversas outras tecnologias e elementos não huma-
cana-de-açúcar estão presentes nas suas fibras lignoce- nos que fazem parte dessa rede (como a palha, colhe-
lulósicas (bagaço e palha), seria possível produzir mui- deiras, novas variedades de cana, micro-organismos,
to mais etanol e energia com a mesma quantidade de enzimas, processos de transformação, cogeração etc.)
material e área plantada. Isso coloca o E2G como uma também devem ser considerados actantes para que
possível resposta a diversos desafios contemporâneos, possamos compreender sua importância e influên-
como a busca por alternativas energéticas renováveis cia no funcionamento da rede, além das questões e
que não contribuem com o aquecimento global, al- controvérsias ligadas relacionados ao E2G no Brasil.
ternativa aos derivados do petróleo e a dependência Ao levarmos em consideração em nossa pesquisa não
externa que vários países têm dele, assim como a de- somente as empresas, instituições, políticas e progra-
manda crescente no mundo todo por etanol e o uso mas de pesquisa relacionados ao etanol de segunda
eficiente de terras (BNDES/CGEE, 2008). geração, mas também as questões e desafios técni-
Muito tem se falado do futuro do E2G desde cos que estão em jogo, buscamos fazer uma análi-
2011, quando o Banco Nacional de Desenvolvi- se multidimensional sobre o assunto, relacionando
mento Econômico e Social e a Financiadora de essa inovação com questões mais complexas da po-
Estudos e Projetos lançaram o Plano BNDES-Fi- lítica energética nacional e de ciência, tecnologia e
nep de Apoio à Inovação dos Setores Sucroener- inovação (CT&I).
gético e Sucroquímico (Paiss) e algumas usinas e Em nossa pesquisa encontramos diversos di-
centros de pesquisa – como o Centro de Tecno- lemas e controvérsias relacionados ao E2G, como
logia Canavieira (CTC), a GranBio, a Raízen e a os problemas técnicos relacionados ao processo de
Odebrecht Agroindustrial – anunciaram seus pro- produção, as enormes decepções do setor e, tam-
gramas de pesquisa, desenvolvimento e produção bém, outras questões como a disputa entre o E2G e
em escala comercial do combustível. A previsão a geração e exportação de energia elétrica através de
dessas empresas e institutos de pesquisa, como o processos e equipamentos de cogeração, programas
Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE, governamentais controversos e disputas envolvendo
2009) era de que o E2G se tornasse parte signifi- o setor sucroenergético e a Petrobrás, além das prin-
cativa da matriz energética nacional e revolucio- cipais questões técnicas, ou actantes, que figuram
nasse o setor sucroenergético, com a expectativa tanto como um desafio quanto uma oportunidade
de que mais de uma dezena de usinas de segunda para as empresas brasileiras, como por exemplo o
geração entrassem em operação até 2025. desenvolvimento de processes de pré-tratamento
No entanto, sete anos após o lançamento do mais eficientes, enzimas hidrolisantes mais baratas
Paiss e depois de duas usinas de escala comercial e variedades mais robustas e produtivas de cana-de-
terem sido construídas e entrado em operação -açúcar, caso da cana-energia.
(da GranBio e da Raízen, além da usina piloto do
CTC), nenhuma das metas ou expectativas foram
atingidas. Houve diversos problemas, especialmen- Actantes: os atores não humanos do E2G e
te na fase de pré-tratamento, o que causou grandes sua atuação
paralisações nessas usinas, além de a produção ter
ficado abaixo dos 10% da capacidade em todos os Como dissemos, o E2G é o álcool extraído das
anos de operação, o que indica problemas graves no fibras lignocelulósicas de um vegetal. No caso da
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cana-de-açúcar, ele é obtido a partir do bagaço após parte das vezes é a própria empresa que precisa
a extração do caldo ou ainda da palha. Para isso, adaptá-lo ou aperfeiçoá-lo. No Brasil, o problema
primeiramente o material (bagaço ou palha) precisa se deve principalmente ao excesso de areia que per-
ser tratado fisicamente ou quimicamente para lim- siste após o pré-tratamento (Oliveira Filho, 2017),
par o material e expor suas fibras, o que é chamado o que prejudica a eficiência das etapas posteriores
de pré-tratamento. Em seguida, é necessário reali- e pode danificar os equipamentos. Por mais que os
zar um processo nesse material chamado de hidró- engenheiros que desenvolvem e adaptam os pro-
lise que, de forma simplificada, decompõe as fibras cessos de pré-tratamento se esforcem para retirar a
desses vegetais através do uso de ácidos, enzimas areia dessa rede, ela insiste em permanecer. Isso tem
específicas, ou ainda outros meios, transformando causado diversos atrasos, paralisações, adiamentos
o material sólido num caldo. Por fim, o material e baixíssima produtividade nas usinas de E2G no
hidrolisado é submetido à fermentação por meio da Brasil. Esse fato demonstra a capacidade de atua-
ação de bactérias ou fungos específicos, gerando eta- ção e resistência dos actantes, que não se dobram
nol a partir dos açúcares ali presentes (Hamelinck facilmente às tentativas de conformação dos atores
et al., 2005). humanos em domesticá-los.
Existem muitas rotas (hidrólise básica, ácida, A matéria-prima é um dos principais fatores
com ácido diluído, enzimática etc.) e configurações quanto à viabilidade do E2G, quesito em que o
(por exemplo, hidrólise e fermentação realizadas no Brasil desponta na liderança, pois a cana-de-açúcar
mesmo reator ou não, fermentação separada com os é muito mais produtiva que outros materiais uti-
diferentes açúcares no mesmo reator ou não, produ- lizados em outros países, como o milho ou a be-
ção das enzimas no mesmo reator ou não etc.) que terraba. Além disso, a situação que visualizamos é
podem ser utilizadas para se produzir E2G, sendo de quebra do paradigma de cana-de-açúcar para
que cada combinação possui vantagens e desvanta- produção de açúcar, tendo a energia (etanol, ener-
gens em relação às demais.1 Atualmente, a rota mais gia elétrica) como subproduto, e a migração para
utilizada e desenvolvida é a rota enzimática, na qual o conceito de cana-energia, que seria o desenvol-
enzimas específicas são utilizadas para hidrolisar o vimento de variedades de cana visando à maximi-
material após o pré-tratamento (Murakami, 2015). zação da energia primária e o processamento desta
Produzir essas enzimas de forma barata ainda é matéria-prima de forma otimizada para produção
um dos principais entraves e desafios dessa tecno- de energias secundárias úteis, como a energia elétri-
logia. Poucas empresas no mundo as produzem de ca e o E2G (CGEE, 2009).
forma comercial, além da dificuldade em reapro- A cana-energia (ou “supercana”) é um con-
veitar esses organismos. De acordo com pesquisas junto de variedades de cana em desenvolvimento
recentes, essa etapa do processo é atualmente a mais com um grau mais elevado de energia primária por
pesquisada mundo afora, apesar de o Brasil ainda tonelada ou por hectare comparado às variedades
engatinhar nessas pesquisas e as poucas empresas comuns. Seus componentes (açúcares e fibras) são
que possuem usinas de segunda geração ainda pre- mais adequados para o processamento de tecnolo-
cisarem importar esse material (Idem). gias de segunda geração devido a maiores concen-
Entretanto, não são somente as enzimas que trações de fibra, o que representa mais celulose e
representam entraves nesse processo. Apesar de hemicelulose para produção de E2G e lignina para
simples em teoria, o pré-tratamento é uma etapa uso nas caldeiras (Leal, 2010). Essa variedade pro-
fundamental do processo e provavelmente a mais duz menos sacarose que as espécies tradicionais
problemática até agora. O maior obstáculo relacio- (cerca de 40% menos), mas possui muito mais fi-
nado com o pré-tratamento refere-se à diversidade bras (aproximadamente 80% a mais por tonelada
de matérias-primas utilizadas nas nascentes usinas do colmo), não sendo, portanto, ideal para a pro-
de E2G (que importam a maior parte de suas tec- dução de açúcar, mas sim para a produção de ener-
nologias). Esses diferentes materiais acarretam di- gia elétrica e etanol de segunda geração devido a
ferentes processos de pré-tratamento e na maior maior quantidade de bagaço. Ela foi pensada para
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as regiões áridas, com défice hídrico, podendo su- mentos acima citados atuam como actantes nessa
perar assim as adversidades e aumentar a produção rede, influenciado e direcionando as ações dos de-
por área plantada (Milanez et al., 2015). mais atores como, por exemplo, incentivando mais
Outro elemento essencial da rede do etanol investimentos e pesquisas em variedades específicas
celulósico é a palha. Tradicionalmente queimada de cana, recolhimento da palha, processo de fer-
no processo de colheita manual ou deixada para se mentação de pentoses, direcionamento de recursos
decompor no campo com a colheita mecanizada, para produção de E2G ou bioeletricidade, adoção
a palha contém um terço da energia total da cana, de modificações no processo de pré-tratamento, ou
numa proporção semelhante ao bagaço (Leal, 2010; ainda alterando completamente as perspectivas de
Magalhães e Braunbeck, 2010). Ao mesmo tempo, produção e os planos de instalação de novas usinas.
a palha serve de insumo tanto para produção de As tecnologias em desenvolvimento e as questões
etanol de segunda geração quanto para produzir técnicas que continuam sem uma solução definitiva
eletricidade nas caldeiras. Definir qual desses usos mostram como o etanol de segunda geração ainda é
é mais vantajoso depende de diversos aspectos da uma caixa-preta aberta.
usina e do desenvolvimento tanto das tecnologias
de recolhimento da palha (ainda muito deficiente)
quanto da viabilidade do E2G em relação à cogera- As políticas e programas da rede do E2G no
ção. De qualquer forma, a palha deve se tornar cada Brasil
vez mais um ator essencial para a produção de E2G
e bioeletricidade (Cortez et al., 2010; Magalhães e A partir de nossa pesquisa, identificamos que o
Braunbeck, 2010; CGEE, 2009). programa de financiamento à pesquisa e inovação
Podemos citar também as pentoses (açúcares de tecnologias relacionadas ao etanol e ao E2G que
formados por cinco carbonos) resultantes da hidró- mais se destacou durante o período de nossa análise
lise da hemicelulose, que representam quase metade foi o Paiss. O plano foi criado em 2011 como parte
do potencial produtivo do caldo hidrolisado, mas são do Programa de Aceleração do Crescimento (Pacti,
de difícil fermentação, exigindo organismos muito 2007-2010), do Ministério de Ciência, Tecnologia
específicos que ainda precisam ser importados. São, e Inovação (MCTI), que foi então sucedido pelo
portanto, actantes com relevância para serem tradu- programa Estratégia Nacional para Ciência, Tec-
zidos e incorporados a essa rede em processos que nologia e Inovação (Encti, 2012-2015). O Paiss
estão em vias de desenvolvimento. contou a princípio com R$ 1 bilhão para financia-
Todos esses elementos técnicos ou não huma- mento e subvenção de pesquisas e projetos de ino-
nos – a cana-de-açúcar (e a cana-energia), as enzi- vação para o setor sucroenergético e sucroquímico
mas, a palha, a colhedora, as caldeiras, as pento- entre 2011 e 2014, com recursos do Fundo Nacio-
ses, as tecnologias que compõem os processos de nal de Desenvolvimento Científico e Tecnológi-
pré-tratamento e produção etc. – formam o que co (FNDCT), da Finep, e do Fundo Tecnológico
na perspectiva da teoria do ator-rede é chamado de (Funtec), do BNDES. Porém, devido ao sucesso do
tecnograma, ou seja, a parte técnica de uma rede programa e o alto número de propostas recebidas
(Latour, 2000). Porém, fica evidente a partir des- (dezesseis aprovados), o valor foi atualizado para
se levantamento que o tecnograma é parte funda- R$ 3,3 bilhões (Soares, 2016).
mental e determinante dessa rede, especialmente Após o sucesso do primeiro Paiss foi lançado em
quando falamos de tecnologia e inovação. O que 2014 o Paiss Agrícola, ou Paiss 2, já como parte das
nem todos os analistas percebem é que o sucesso iniciativas previstas no Encti, focado no incentivo
de uma inovação, como o E2G, depende tanto de à produtividade agrícola do setor sucroenergético
programas de financiamento, agente públicos, em- como desenvolvimento de novas variedades, meca-
preendedores (os atores humanos ou sociograma nização agrícola, plantio e colheita, desenvolvimento
da rede), quanto da domesticação dos atores não de máquinas e sistemas integrados etc. Para isso, foi
humanos, na mesma proporção. Portanto, os ele- reservado um total de R$ 1,48 bilhão somando os
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recursos do BNDES e da Finep entre financiamen- a pelo menos 18% de toda a energia consumida, ele-
tos (R$ 1,4 bilhão) e subvenção econômica (R$ 80 vando a produção de etanol de 28 bilhões de litros
milhões) a serem disponibilizados até 2018. (2017) para 54 bilhões até 2030.
Podemos considerar o Paiss um dos mediado- Para atingir esses objetivos, o programa pre-
res mais importantes da rede do etanol celulósico tende utilizar os seguintes mecanismos: gerar cré-
no Brasil, sendo seu principal financiador. Soma- ditos de descarbonização para os produtores de
dos, os programas Paiss 1 e 2 foram responsáveis biocombustíveis certificados que contribuírem
pela injeção de mais de R$ 4,7 bilhões no setor positivamente com a redução de GEEs, os cha-
sucroenergético entre 2011 e 2018. Esses recursos mados CBios; certificação de produção eficiente
foram fundamentais para a construção das plantas de biocombustíveis através da Nota de Eficiência
e os projetos de segunda geração da GranBio, da Energético-Ambiental emitida por firma inspeto-
Raízen e do CTC, que juntas utilizaram mais de ra; obrigação das distribuidoras de combustível de
R$ 1,7 bilhão entre financiamento, participação comprar esses créditos de descarbonização de acor-
acionária e subvenções pelo programa. do com a sua produção de combustíveis fósseis; por
No dia 26 de dezembro de 2017 foi sancio- fim, metas e incentivos fiscais e financeiros (Projeto
nado pelo então presidente Michel Temer a Lei de Lei Complementar n. 160/2017).
n. 13.576, referente a um novo programa gover- O programa funcionaria da seguinte forma:
namental para os biocombustíveis, o Renovabio. as usinas receberiam notas de zero a dez de acordo
Em discussão desde meados de 2016, a proposta com critérios que ainda não foram estabelecidos,
do programa foi lançada pelo Ministério de Minas que devem levar em conta a quantidade de carbono
e Energia (MME) em dezembro, em um encon- emitida na produção dos biocombustíveis, desde o
tro que envolveu, além do MME, o presidente, o plantio até o seu uso final. Quanto menores forem
Ministério de Agricultura, Pecuária e Abasteci- as emissões do produtor primário, maiores as notas
mento (Mapa) e diversos representantes do setor das usinas (MME, 2016).
sucroenergético (MME, 2016). A proposta de Lei Em contrapartida, as distribuidoras de com-
Complementar n. 160/2017 sofreu pouquíssimas bustíveis terão mandatos de redução de carbono
alterações e na Câmara dos Deputados e nenhuma dos combustíveis comercializados por elas como
alteração no Senado, tendo sido votada em regime diesel e gasolina, através da compra desses créditos.
de urgência. Isso demonstra a força do setor sucroe- O valor dos CBios seria definido pelo Conselho
nergético dentro do parlamento, pressionado pela Nacional de Política Energética (CNPE) de acor-
aprovação imediata da lei2 através de associações do com a quantidade total de créditos disponíveis
representativas do setor como a União da Indús- e o uso de combustíveis fósseis previsto para aquele
tria de Cana-de-Açúcar (Unica, 2017) e seis frentes ano. Ainda não está clara a forma como esses cré-
parlamentares.3 ditos devem ser obtidos pelas distribuidoras, mas
Os objetivos principais do programa, conforme atualmente a proposta é de que, se em um ano se-
a Lei n. 13.576/2017, são: 1) promover o aumen- jam gerados, por exemplo, 10 milhões de CBios,
to de produção dos biocombustíveis (com destaque esse total seja divido entre as distribuidoras de acor-
para o etanol e o biodiesel); 2) garantir mercado no do com a sua participação no mercado (e não de
longo prazo, assim como garantir previsibilidade da acordo com a produção absoluta) (MME, 2016).
matriz energética; 3) diminuir as emissões de gases Por exemplo, se a Petrobrás for responsável por
de efeito estufa (GEEs) para cumprir metas estabele- 50% da distribuição, teria de comprar metade dos
cidas na Contribuição Nacionalmente Determinada créditos existentes (5 milhões).
(CND) proposta na Conferência das Nações Unidas Dependendo dos critérios adotados para clas-
sobre as Mudanças Climáticas, a COP-21 (ONU, sificar as usinas e o preço desses créditos, o etanol
2015) – no caso, diminuir as emissões de GEEs em de segunda geração poderá ser muito beneficiado
43% em relação a 2005. Para isso, o MME (2016) por ser um biocombustível avançado (de baixo car-
sugere manter a produção de bioenergia equivalente bono). Por ser muito mais sustentável e produzir
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proporcionalmente menos GEEs, incentivaria as está formulado atualmente, colocando em disputa


usinas a investir em E2G em detrimento do etanol o setor sucroenergético e o setor de combustíveis
de primeira geração. Porém, a proposta tem muitos fósseis, especialmente as usinas de etanol e a Petro-
pontos controversos e indefinições. brás. No caso, esses atores disputam a representação
Em abril de 2017, a Petrobrás divulgou uma (figuração) da situação ambiental e energética bra-
nota com diversas críticas e apontamentos contun- sileira, com a Petrobrás defendendo a manutenção
dentes sobre o programa (Petrobrás, 2017). Segun- da dinâmica atual enquanto o setor sucroenergético
do a empresa, há diversas maneiras de o Brasil cum- insiste na necessidade de novos incentivos para se
prir o acordo da CND com menores impactos ao atingir as metas definidas na CND.
setor de combustíveis tradicionais, como regulações A criação dos CBios significa a entrada um
e modelações nos setores florestal, agropecuário, in- novo actante poderoso a essa rede, interferindo de
dustrial e de transportes. maneira decisiva na dinâmica atual e favorecendo
Segundo a Petrobrás (2017), a proposta igno- os atores do setor sucroenergético em detrimento
ra diversos fatores que devem contribuir com a di- do setor de combustíveis tradicionais e das distri-
minuição das emissões de GEEs sem a necessidade buidoras. Dependendo dos critérios estabelecidos
de políticas custosas por parte do governo, ou que para a nota das usinas e do valor atribuído aos
prejudiquem o setor de combustíveis tradicionais, CBios, o volume de recursos que será transferi-
como a diminuição do ritmo das vendas de auto- do das distribuidoras para o setor sucroenergético
móveis no Brasil verificada desde 2012, aumento pode ser significativo, capaz de alterar os preços dos
da eficiência dos motores (seguindo a tendência combustíveis tradicionais e renováveis e fortalecen-
mundial), melhoramento dos serviços coletivos de do o setor sucroenergético. Portanto, a figuração
transporte e a hibridização dos veículos nacionais desse actante – cuja definição encontra-se atual-
(automóveis que possuirão tanto um motor elétrico mente em disputa, já que ainda não foi definida a
quanto um motor convencional à combustão, uti- regulamentação referente à classificação das usinas
lizados alternadamente ou simultaneamente), pre- e o valor dos créditos – é fundamental no delinea-
visto pelas montadoras para 2021 em diante, o que mento da futura dinâmica do setor de combustíveis
por sua natureza implicaria um menor consumo de como um todo.
combustíveis fósseis, especialmente a gasolina.
Além disso, a Petrobrás aponta que o progra-
ma estaria em desacordo com o também recen- Principais iniciativas de produção no Brasil e
temente lançado Programa Combustível Brasil seus dilemas
(MME, 2017), apresentado em fevereiro de 2017
pelo MME e que visa atrair investimentos (princi- Através da pesquisa que realizamos, constata-
palmente externos) ao setor de refino de combus- mos que a rede formada pelas empresas em torno
tíveis derivados do petróleo no Brasil. Segundo a do etanol celulósico no Brasil é bastante complexa e
Petrobrás (2017), o Renovabio criaria incertezas em heterogênea, incluindo diversos atores de diferentes
relação à participação de cada segmento no mer- setores, como setor financeiro público (BNDES),
cado de combustíveis automotivos, prejudicando laboratórios e universidades públicas – Laborató-
os investimentos. De acordo com representantes rio de Ciência e Tecnologia do Bioetanol (CTBE),
da Associação das Distribuidoras de Combustíveis Instituto Agronômico de Campinas, Rede Inte-
(Brasilcom), a obrigação de compra de créditos runiversitária para o Desenvolvimento do Setor
de carbono pelas distribuidoras prejudicaria espe- Sucroenergético (Ridesa) –, empresas de tecnologia
cialmente as distribuidoras menores, que possuem e pesquisa privadas – CTC, Vignis –, empresas do
menor poder de reestruturação, o que pode agravar setor sucroenergético – GranBio, Raízen –, grupos
ainda mais a concentração das distribuidoras. internacionais – Beta Renewables, Novozymes,
Do ponto de vista teórico, há um claro con- DSM etc. –, associações representativas – Unica4 –
flito de interesses em relação ao programa como e diversos atores não humanos – leveduras, enzi-
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mas, cana-energia, cogeração, bagaço, palha etc. material, o que adiou suas expectativas e criou uma
Esses atores são fundamentais para o sucesso do grande incerteza com relação ao futuro do etanol
E2G e é difícil dizer quais são os mais importantes. celulósico até o momento desta publicação. Pelo
As tentativas de se produzir E2G no país até que acompanhamos pelas notícias em revistas es-
o momento partem da GranBio, da Raízen e do pecializadas, o clima é de grande incerteza, apesar
CTC. Somadas, essas empresas possuem plantas de essas empresas seguirem apostando no E2G e
com uma capacidade instalada de 125 milhões de afirmarem que são apenas problemas temporários.
litros de E2G por ano (ver Tabela 1), o que torna o A GranBio é uma empresa de biotecnologia in-
Brasil o quarto país do mundo em capacidade insta- dustrial com sede em São Paulo (SP). Fundada em
lada de segunda geração, atrás somente dos Estados 2010, a empresa conta com cerca de 264 funcio-
Unidos, China e Canadá. Entretanto, apenas uma nários e é 100% nacional, controlada majoritaria-
pequena fração (cerca de 10% ou menos) desse mente pela GranInvestimentos SA (Corrêa, 2014).
potencial anual foi produzida até agora, e o maior Em setembro de 2014, a GranBio anunciou que
problema para a operação dessas plantas ainda são começara a produzir etanol de segunda geração em
dificuldades na etapa de pré-tratamento. Mais de nível comercial em sua usina – a BioFlex1 – locali-
uma vez essas usinas tiveram suas atividades parali- zada em São Miguel dos Campos (AL). A unidade
sadas devido a problemas com o pré-tratamento do custou US$ 190 milhões e demorou vinte meses

Tabela 1
Principais Iniciativas de Produção de E2G no Brasil

Empresa/Variável GranBio Raízen CTC


Capacidade da 82 milhões de litros/ano 40 milhões de litros/ano 3 milhões de litros/ano
planta
Tipo Comercial Comercial Piloto
Local São Miguel dos Campos (AL) Piracicaba (SP) São Manoel (SP)
Custo da planta R$ 350 milhões (US$ 190 R$ 231 milhões R$ 80 milhões
milhões)
Financiamento R$1,225 bilhão (R$600 milhões R$ 207 milhões R$ 380 milhões (300 milhões
(BNDES)* via participação acionária) via participação acionária)
Tecnologia processo Proesa (Beta Renewables, – Iogen (Iogen Própria (CTC)
italiana) Corporation, canadense)
Hidrólise (enzimas) Novozymes (dinamarquesa) Novozymes Novozymes (dinamarquesa) e
(dinamarquesa) própria
Fermentação C5 e C6 (DSM, holandesa) C5 e C6 (Iogen, Apenas C6 (própria)
(leveduras)** canadense)
Pré-tratamento Hidrotérmico (Proesa, API) Explosão a vapor (Iogen) Vapor e catalisadores (própria)
Matéria-prima Bagaço (cana-energia) e palha Bagaço Bagaço e palha

* O valor financiado pelo BNDES refere-se à totalidade do investimento nas empresas citadas, não só à instalação das
usinas de segunda geração.
** C5 refere-se às pentoses e C6 às hexoses presentes no caldo hidrolisado.
Elaboração própria a partir de informações colhidas nos sites das empresas; Correa (2014); Soares (2016).
O ETANOL DE SEGUNDA GERAÇÃO NO BRASIL 9

para ser construída. Ela é capaz, segundo a Gran- Porém, a operação da usina não tem sido tran-
Bio, de produzir 82 milhões de litros de etanol de quila e ininterrupta. Desde sua inauguração, a usi-
segunda geração por ano, e com isso tornou-se a na já foi paralisada duas vezes, dois meses no final
primeira empresa a produzir etanol celulósico em de 2015 e entre abril e outubro de 2016. O mo-
nível comercial do hemisfério Sul, apesar de utilizar tivo das duas paralisações foram os mesmos: pro-
tecnologias importadas (Corrêa, 2014). blemas na etapa de pré-tratamento. Apesar de sua
A parceria com o BNDES é uma das alianças capacidade de produção de 82 milhões de litros por
mais importante da GranBio. Como principal par- ano de E2G, em 2015 a empresa produziu apenas
ceiro financeiro do projeto, o banco aportou R$ 4 milhões de litros, correspondentes a apenas 4%
280 milhões na forma de financiamentos e mais R$ de sua capacidade instalada. O principal problema
600 milhões por meio de participação acionária via que afetou a produção e causou as paralisações foi
BNDES Participações (BNDESPar), em troca de o excesso de areia restante após a etapa de pré-tra-
15% de suas ações, num total de R$ 880 milhões. tamento, o que prejudica o material e as peças da
Além desse valor, correspondente ao primeiro Paiss, instalação (Soares, 2016; Oliveira Filho, 2017).
em 2014, a GranBio teve quatro projetos aprova- Essa situação alterou radicalmente os planos da
dos pelo Paiss Agrícola (Paiss 2), incluindo três que empresa. A GranBio tinha planos de construir mais
envolvem especificamente o desenvolvimento da dez unidades de E2G, sendo que a segunda usina
cana energia, o que representou cerca de R$ 345 iniciaria sua construção em 2016. Porém, esses pro-
milhões em financiamento (Soares, 2016). jetos foram abandonados e a construção da segun-
Outro ator fundamental nessa rede é a empresa da usina está adiada por tempo indeterminado. A
italiana Beta Renewables.5 O processo adotado pela empresa ficou sem produzir E2G durante o ano de
GranBio utiliza a tecnologia Proesa, licenciada pe- 2017 inteiro, e sua estimativa de produzir 1 bilhão
la empresa. A Proesa engloba todas as etapas do pro- de litros de E2G até 2020 também foi postergada
cesso, desde o pré-tratamento da matéria-prima até a para ao menos 2030 (NovaCana, 2017c).
hidrólise e a fermentação. O processo utiliza bagaço A Raízen é uma empresa privada de capital fe-
e palha como insumo (trata-se da única empresa no chado fundada em 2011. Ela é fruto de uma joint
Brasil a utilizar a palha), alta temperatura e pressão venture entre a empresa brasileira Cosan e a anglo-
para o pré-tratamento da biomassa, enzimas da di- -holandesa Shell. A empresa conta com mais de 30
namarquesa Novozymes6 para a hidrólise e leveduras mil funcionários e é uma das maiores produtoras de
da holandesa DSM7 para a fermentação de ambos etanol de cana-de-açúcar no país, com um volume
os açúcares (pentoses e hexoses). Porém, a GranBio anual de cerca de 2 bilhões de litros. Atua ainda no
não tem participação nas pesquisas, desenvolvimen- segmento de distribuição de combustíveis (logística
to e resultados dessas tecnologias (Corrêa, 2014; e infraestrutura) por meio da Shell, o que permite
Soares, 2016). uma integração vertical da cadeia desde a matéria-
A rede formada pela GranBio para o desenvol- -prima (cana-de-açúcar) até a distribuição (postos de
vimento do E2G também inclui, além do BNDES, gasolina), com ampla penetração no país. A Raízen
outros atores-rede brasileiros. No caso, a empresa ainda é sócia do CTC e estabelece parcerias tecno-
está desenvolvendo sua própria variedade de ca- lógicas com o Instituto Agronômico de Campinas
na-energia, denominada Cana-Vertix, em parceria (IAC) e com diversas universidades (Corrêa, 2014).
com a BioVertis, subsidiária da Vignis.8 Essa va- Um mês após a inauguração da planta da
riedade é capaz, segundo a empresa, de crescer em GranBio, a Raízen inaugurou sua planta industrial
áreas degradadas (como pastos), com menos água em Piracicaba (SP), capaz de produzir, segundo a
e insumos, além de ser até três vezes mais produti- empresa, cerca de 40 milhões de litros de etanol
va comparada às variedades comuns plantadas no celulósico por ano. O investimento somou um to-
mesmo espaço. Ela deve ser utilizada principalmen- tal de R$ 231 milhões, dos quais R$ 207 milhões
te para a produção de etanol de segunda geração da foram financiados por meio de crédito do BNDES
empresa (Idem). através do programa Paiss (Corrêa, 2014).
10 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 34 N° 100

O processo utilizado nessa usina utiliza tecno- por uma reestruturação, deixando de ser um centro
logia desenvolvida pela canadense Iogen Corpo- de pesquisa particular (pertencente à Copersucar) e
ration,9 o qual foi licenciado para a joint venture tornando-se uma organização da sociedade civil de
(Corrêa, 2014). O processo utiliza somente o ba- interesse público (Oscip), sem fins lucrativos. Em
gaço como matéria-prima, explosão a vapor para o 2011, mudou de novo sua constituição jurídica e
pré-tratamento, hidrólise enzimática com enzimas passa a ser uma sociedade anônima, de capital aber-
da dinamarquesa Novozymes e fermentação de to e com fins lucrativos. Os antigos sócios torna-
ambos os açúcares (pentose e hexoses). A empresa ram-se então acionistas da empresa. Depois disso,
conta com o uso exclusivo dessa tecnologia e terá sua fonte de renda e lucros consiste exclusivamente
propriedade integral sobre todo o desenvolvimento na venda de suas tecnologias, através dos royalties
resultante do projeto (Corrêa, 2014). pagos pelas empresas pelo licenciamento de suas
Em 2015, a empresa projetou produzir 9,84 propriedades de patentes. Atualmente, conta com
milhões de litros de E2G, entretanto, estima-se que doze polos regionais e mais de 350 profissionais en-
apenas 1 milhão de litros tenham sido produzidos tre gestores e pesquisadores.10
(Soares, 2016). Assim como a GranBio, a Raízen As rotas escolhidas pelo CTC foram a hidróli-
também enfrenta problemas com a fase de pré- se enzimática, utilizando o bagaço e a palha como
-tratamento, apesar de não terem sido divulgados matéria-prima e vapor com catalizadores para o
detalhes. A Raízen tinha planos de construir mais pré-tratamento, integrado a usinas de primeira ge-
sete plantas de segunda geração após os custos de ração. As enzimas são fornecidas por uma parceria
produção de E2G se igualarem aos de primeira ge- com a Novozymes e os equipamentos foram for-
ração, planos que foram radicalmente alterados em necidos pela Andritz. O processo como um todo
função dos imprevistos mencionados, sem que haja é de propriedade do próprio CTC, constituindo o
previsões para a ampliação da operação atualmente único processo nacional para produção de etanol
(Oliveira Filho, 2017). de segunda geração já instalado e com potencial de
Como apontamos em seção anterior, a interfe- comercialização. Segundo a direção de Etanol de
rência dos actantes não humanos (especialmente o Segunda Geração do CTC, a unidade tem como
processo de pré-tratamento) se revelou decisiva em principal objetivo mostrar a investidores, acionis-
relação às projeções e planos das empresas produto- tas e clientes o potencial da tecnologia de segunda
ras, alterando significativamente o cenário previsto. geração desenvolvida pelo centro (Corrêa, 2014).
Além disso, os atores descritos (em sua maioria for- A construção da usina de segunda geração re-
necedores de equipamentos ou materiais) dão uma cebeu investimentos da ordem de R$ 80 milhões
ideia da complexidade e heterogeneidade da rede do por meio de financiamento do Paiss 1. Além disso,
E2G no Brasil, com diversas alianças internacionais, em 2014 o CTC recebeu um investimento de mais
todas relacionadas com algum ator não humano que R$ 300 milhões na forma de participação acionária
apresenta dificuldades de controle e domesticação pelo programa, via BNDESPar, para suas pesquisas
por parte das empresas brasileiras no momento, as (Soares, 2016).
quais se veem obrigadas a importá-los. Essas informações revelam que ao mesmo tem-
Por sua vez, o CTC atua na pesquisa de toda po que o E2G brasileiro está fortemente conectado
a cadeia produtiva da cana-de-açúcar, em temas a uma rede global, como os fornecedores de enzi-
como administração rural, melhoramento e desen- mas, celulases e tecnologias de processamento, ele
volvimento de novas variedades, fitossanidade, sis- também depende muito do esforço dos atores lo-
temas de plantio e colheita, processos de extração cais e do setor público de financiamento e pesquisa.
e fermentação e sistemas de energia para as usinas Os problemas relacionados com o pré-tratamento
de açúcar e bioetanol, tendo sido a principal base não devem ser superados sem um grande envolvi-
de inovações para as usinas paulistas e importan- mento e conhecimento das próprias empresas pro-
te suporte técnico em temas agrícolas e industriais dutoras e de atores locais, como os fornecedores
(BNDES/CGEE, 2008). Em 2005, o CTC passou de equipamentos e o CTC, que têm um profundo
O ETANOL DE SEGUNDA GERAÇÃO NO BRASIL 11

conhecimento sobre cana-de-açúcar. Além disso, a mundo todo; das enzimas, que representam gran-
parte mais significativa dos custos de produção do de parte dos custos; ou da cana-energia, que pode
etanol, tanto de primeira quanto segunda geração, alavancar a produção de segunda geração no Brasil.
se refere à matéria-prima (Milanez et al., 2015), e a Por esses motivos, o E2G também se mostra uma
cana-energia, que tem recebido bastante atenção e caixa-preta ainda aberta, com diversos actantes sem
investimento de diversos atores, deve baratear sig- uma figuração definida, abertos a novas associações
nificativamente esses custos. por parte de empresas, governos e tecnologias, o
A partir de nossa pesquisa sobre as iniciativas que representa uma grande oportunidade para as
nacionais, também pudemos constatar que as em- empresas nacionais.
presas brasileiras ainda investem pouco em pesqui- A rede do etanol celulósico brasileiro, espe-
sas e no desenvolvimento de enzimas, preferindo cialmente em relação aos atores não humanos (ou
licenciar essas tecnologias e importar as enzimas actantes), está ligada a uma rede internacional,
de empresas estrangerias como BetaRenewables, parceira ou fornecedora de muitas das tecnologias,
Novozymes, Iogen Corporation e DSM. O CTC das quais as empresas brasileiras são de certa for-
é o único ator que investe no desenvolvimento de ma dependentes, já que ainda não há fornecedores
um processo próprio de hidrólise enzimática, e a nacionais de enzimas. Por enquanto, a maior parte
GranBio, o único que investe no desenvolvimento dessas empresas estão mais focadas em dominar o
de enzimas, apesar dos resultados ainda tímidos. processo de produção, muitas vezes investindo na
Outros atores importantes já fizeram par- adaptação para a cana-de-açúcar de processos im-
te dessa rede, como a Petrobrás e a Odebrecht portados que utilizavam outras matérias-primas,
Agroindustrial. Porém, com os prejuízos recentes, em vez de desenvolver tecnologias próprias.
a Petrobrás abandonou seu projeto para se concen- A cana-de-açúcar já é a matéria-prima mais
trar nos combustíveis fósseis, e a Odebrecht, em produtiva para o E2G. Seu rendimento deve se
crise desde 2015, também não tem previsões de elevar ainda mais com o desenvolvimento, em fase
continuidade do projeto. Isso torna as três empre- de comercialização, de variedades de cana-energia:
sas que ainda investem no E2G ainda mais impor- sua produtividade por hectare é muito maior se
tantes e fortes dentro dessa rede. comparada à das variedades tradicionais, ela pode
ser plantada em solo mais degradado, com menor
uso de água e produzir uma porção muito maior de
Os pontos fortes e fracos da rede do E2G no fibras lignocelulósicas (bagaço), o que a torna ideal
Brasil para a geração de E2G e bioeletricidade. Esse ac-
tante e suas possíveis figurações podem contribuir
A variedade de atores humanos e não huma- não só com o desempenho das usinas brasileiras,
nos envolvidos na rede do etanol celulósico, como mas também representam uma grande oportuni-
as diferentes matérias-primas, micro-organismos, dade para empresas e institutos tecnológicos que
configurações e processos, implica uma grande desenvolvem variedades de cana, como a Vignis, o
variedade também de comportamentos e resul- CTC, o IAC e a Ridesa.
tados à rede do etanol celulósico. Diversos atores Além disso, os programas e políticas públicas
não humanos (ou actantes) dessa rede estão ainda dedicados ao desenvolvimento do setor sucroener-
num momento de construção e definição, como gético e do etanol de segunda geração, como os
a mecanização da colheita e utilização da palha, a programas Paiss 1 e 2 e o recente Renovabio, po-
cana-energia, as enzimas e leveduras, o processo dem ser considerados pontos fortes da rede do E2G
de pré-tratamento, entre outros processos e tecno- no Brasil. Os programas Paiss 1 e 2 contribuíram
logias que ainda estão em desenvolvimento. Esses com mais de R$ 4 bilhões em recursos de finan-
actantes são fundamentais e interferem diretamen- ciamento ao setor, o que possibilitou a construção
te no desempenho do etanol celulósico. É o caso das usinas de segunda geração em escala comercial
do pré-tratamento, que está atrasando projetos no da GranBio e Raízen, e o Renovabio deve garantir
12 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 34 N° 100

uma grande quantidade de recursos e estabilidade maior parte das inovações do setor realizada pelos
de mercado ao setor sucroenergético nos próximos fornecedores de equipamentos através de simples
anos, o que pode colaborar com o E2G de forma aquisição de equipamentos ou de caráter incre-
indireta e também direta (ao valorizar, através dos mental, as quais, em sua grande maioria, se dão
CBios, combustíveis renováveis avançados). por meio de projetos de engenharia e processos de
No entanto, a rede do etanol de segunda gera- aprendizados associados a mecanismos de know-
ção brasileira possui certas fraquezas, como as es- -how, know-who e learning-by-doing, nos quais
cassas iniciativas de produção (somente três usinas), prevalece o conhecimento tácito e sem atividades
o baixo nível de investimento privado (pois a maior de pesquisa e desenvolvimento propriamente ditas
parte do total investido partiu do BNDES), pou- (Varrichio, 2012). A exceção fica por conta da área
ca pesquisa e desenvolvimento (realizados quase de agricultura, com diversas instituições de pesqui-
exclusivamente pelo CTBE), baixíssimo patentea- sa, como o IAC, a Ridesa e o CTC, que juntos já
mento, grande dependência das empresas estran- desenvolveram centenas de variedades de cana-de-
geiras para fornecimento de material e tecnologias -açúcar mais produtivas e resistentes, além de varie-
de produção, além dos muitos problemas em seu dades de cana-energia nas quais o Brasil é pioneiro
funcionamento, especialmente na fase de pré-tra- e avança rapidamente, já produzida em escala co-
tamento, com as expectativas de produção cada vez mercial e utilizada para a produção de E2G.
mais baixas e distantes. Porém, o setor sucroenergético vive um mo-
As análises e indicadores apontam que as empre- mento difícil desde 2011, quando entrou em vigor
sas e os pesquisadores brasileiros têm realizado pou- a política de contenção de preços da gasolina para
cos esforços de pesquisa e desenvolvimento referente controle da inflação, encerrada somente no final de
aos processos básicos de segunda geração, no caso a 2014, que reduziu a competitividade do etanol fren-
hidrólise, a síntese de celulase (enzimas) e a fermen- te à gasolina e causou grande prejuízo e endivida-
tação das pentoses. Apesar dos esforços identificados mento do setor. Esse fato somou-se à recessão eco-
principalmente no caso do CTC e do CTBE, seus nômica iniciada em 2009 no Brasil e à falta de uma
resultados ainda são pouco expressivos em compara- política governamental clara de longo prazo para o
ção com o resto do mundo, com o depósito de pou- etanol, levando a uma estagnação da produtividade
cas patentes nacionais e a quase ausência de patentes sucroenergética, a qual pode se estender até 2030 se-
internacionais (Felipe e Rossel, 2010; Corrêa, 2014; gundo recentes análises (EPE, 2017a; 2017b). Esse
Murakami, 2015). O CTC depositou somente três cenário atinge inclusive o BNDES, principal inves-
patentes junto ao Instituto Nacional da Propriedade tidor do etanol celulósico na rede brasileira, que em
Industrial (INPI), relacionadas com o processo de janeiro de 2017 informou um prejuízo de R$ 568
hidrólise e produção integrada de primeira e segunda milhões com o setor sucroenergético em sua carteira
geração, as quais se juntam à patente depositada em de investimentos (NovaCana, 2017a).
2008, referente ao processo fermentativo compreen- Não podemos esquecer também os problemas
dendo a etapa de pré-tratamento e hidrólise enzimá- relacionados com o pré-tratamento. As empresas
tica utilizando biomassa (PI 0802153-8), concedida no mundo todo estão tendo muitas dificuldades
em 2016. GranBio e Raízen ainda não possuem de- com essa etapa do processo, o que tem reduzido
pósito de patentes relacionadas ao E2G. Já o CTBE significativamente o rendimento das usinas de se-
possuía catorze depósitos de patente até 2017, sendo gunda geração e adiando, ano após ano, as expec-
cinco depósitos relacionados ao desenvolvimento de tativas das empresas e investidores. Entretanto, por
enzimas e hidrólise enzimática (não licenciados), três se tratar da primeira etapa, as dificuldades com o
relativos ao desenvolvimento de micro-organismos e pré-tratamento podem estar camuflando problemas
fermentação, e o restante voltado à colheita e ao pro- talvez tão graves ou maiores nas etapas posteriores
cessamento da cana (Idem). de hidrólise e fermentação, o que ressalta a impor-
Historicamente, o setor sucroalcooleiro não tância das pesquisas e das plantas experimentais.
tem uma tradição de pesquisa industrial, sendo a No Brasil, esses problemas fizeram a produção das
O ETANOL DE SEGUNDA GERAÇÃO NO BRASIL 13

usinas de segunda geração despencar para menos de é um conjunto de tecnologias muito mais bara-
10% da capacidade e minaram os planos das em- to e desenvolvido, no qual as empresas brasileiras
presas pioneiras de construir mais de dez novas de são líderes no mundo e exportam equipamentos
usinas até 2025. (CGEE, 2009).
Uma última questão refere-se à controvérsia O incentivo à produção de bioeletricidade nas
envolvendo o E2G e a cogeração de bioeletricidade usinas de etanol poderia contribuir com a descentra-
sucroenergética. A maioria das usinas é autossufi- lização da matriz elétrica e com a desconcentração
ciente, produzindo sua própria força motriz ou ele- da produção de cana e etanol no Brasil. Ao tornar o
tricidade a partir da queima do bagaço em caldeiras investimento em usinas de cana-de-açúcar mais ren-
de cogeração. Há um grande potencial de se produ- tável devido à produção complementar de bioeletri-
zir energia excedente, o que significa que essa ener- cidade (sem a necessidade de grandes investimentos
gia pode ser exportada para o sistema elétrico. Mui- como o E2G), novas usinas poderiam se instalar es-
tas usinas, especialmente as mais novas e modernas, palhadas pelo Brasil, longe do Centro-Sul.
já realizam essa função. Em 2015, a oferta de É importante ressaltar que o E2G ainda é uma
energia para o sistema interligado obtida através aposta muito arriscada, e comparando o nível de
da biomassa de cana-de-açúcar totalizou mais de recursos que as empresas investiram com o que o
20 TWh (Unica, 2016). Isso é praticamente duas BNDES investiu, fica claro que este último é o ator
vezes o montante oferecido através dos parques que está assumindo os riscos, não as empresas. Es-
eólicos no mesmo ano e representa quase 4% do ses dados demonstram que o setor sucroenergético
total produzido de energia elétrica no Brasil. Se for não é uma exceção à regra quando o assunto é in-
considerado o autoconsumo das usinas, que não vestimento em pesquisa, o que reforça mais uma vez
entra como um dado positivo nos balanços de ele- a importância do Estado para o desenvolvimento
tricidade, mas representa uma economia de energia da ciência e da tecnologia brasileiras.
por parte do sistema produtivo, podemos somar Podemos dizer que a cogeração e o E2G são ac-
mais 15 TWh (EPE, 2016). tantes que fazem parte da mesma rede, disputando
Além disso, a energia elétrica obtida por meio nas usinas a figuração dos mesmos elementos (no
da biomassa da cana revela-se ainda mais interes- caso, o bagaço e a palha enquanto combustível para
sante por ser complementar ao regime hídrico, um ou outro), o que torna essa rede ainda mais com-
ou seja, o período de colheita e processamento da plexa e heterogênea. Análises recentes da Empresa
cana-de-açúcar se dá justamente no período de estia- de Pesquisa Energética (EPE, 2015) apontam que
gem. De forma regular, a safra sucroenergética nas as usinas mais novas ou modernas investiram pesado
regiões Sudeste e Centro-Oeste, onde se concentram em cogeração, o que deve comprometer o investi-
a maior parte da produção de cana no Brasil e mais mento e a produção de E2G nessas usinas no curto
de 70% da capacidade dos reservatórios brasileiros, prazo, algo visto ainda com receio pela maior parte
ocorre entre os meses de abril e novembro, coinci- dos produtores (Oliveira Filho, 2017). Por se tratar
dindo exatamente com o período de estiagem nessa de um investimento muito elevado e arriscado, as
região (Castro, Brandão e Dantas, 2010). A oferta tecnologias de segunda geração devem ser adotadas
de 20 TWh em bioeletricidade para o sistema elé- no início somente por grandes empresas ou parcerias
trico em 2015 representou uma economia de 14% entre grandes usinas (como nos revelou em entrevis-
das águas nos reservatórios do submercado elétrico ta o assessor técnico do CTC), dividindo assim os
Sudeste/Centro-Oeste (Unica, 2016). recursos das usinas com os processos de cogeração.
Porém, a controvérsia se dá na medida em que
E2G e a cogeração de bioeletricidade utilizariam o
mesmo material, no caso, o bagaço e a palha exce- Considerações finais
dente das usinas de etanol, disputando, portanto,
os recursos materiais e os investimentos das usinas. Em nossa pesquisa, procuramos mapear a rede
Além das vantagens já citadas, a cogeração ainda do E2G no Brasil a partir do material analisado e
14 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 34 N° 100

do nosso referencial teórico (TAR), ou seja, bus- ção de E2G no Brasil, o financiamento do BNDES
camos identificar quais eram os principais atores, foi fundamental. E daqui para frente, muito vai de-
humanos e não humanos, envolvidos no desenvol- pender do sucesso do programa Renovabio para a
vimento e produção de E2G, assim como a atuação construção e continuidade da operação das usinas de
de cada um desses atores, suas conexões, alianças segunda geração. Isso confirma o que a TAR insiste
e disputas. Com base nisso, pudemos constatar em afirmar que a ciência e a tecnologia são insepa-
que a rede do etanol de segunda geração no Brasil ráveis e praticamente indistinguíveis do restante da
envolve diversos setores (parte do setor sucroener- sociedade (a não ser por um recurso discursivo), o
gético, fornecedores de equipamentos, instituições que aproxima o papel dos cientistas e engenheiros ao
governamentais de financiamento e pesquisa como do empreendedor e dos políticos tradicionais.
o BNDES e o CTBE, empresas de tecnologia e me- As controvérsias envolvendo o desenvolvimen-
lhoramento genético etc.), além de fornecedores de to do E2G no Brasil – como os problemas com o
material, equipamentos e tecnologias de outros paí- pré-tratamento (que as empresas insistem em dizer
ses. A partir desse mapeamento pudemos entender que são só contratempos, enquanto os pesquisado-
melhor as disputas e controvérsias envolvendo esses res da área apontam como grande entrave), a com-
atores, decisivas no delineamento da trajetória do petição por recursos com a cogeração, assim como
E2G no Brasil e no seu futuro. as disputas envolvendo o setor sucroenegético e as
Procuramos também demonstrar a importân- distribuidoras de combustíveis – também foram es-
cia e atuação dos atores não humanos como ca- senciais para elucidar os atores não humanos e pro-
na-de-açúcar e suas variações – em especial a ca- cessos que poderiam passar despercebidos, assim
na-energia –, a palha da cana, os equipamentos e como os atores principais dessa rede e os seus in-
processos de pré-tratamento, hidrólise e fermenta- teresses. Com isso, esperamos ter trazido uma dis-
ção, as enzimas e leveduras, os açúcares resultantes cussão mais rica sobre o assunto do que seria uma
(pentoses e hexoses) etc. análise que não levasse em conta os não humanos,
Os problemas com o pré-tratamento, bem como além do embate entre os atores envolvidos – com
as dificuldades em produzir as enzimas de forma viá- diversos pontos de vista e expectativas quanto ao
vel e fermentação dos açúcares resultantes da hidrólise desenvolvimento e às possibilidades do E2G em re-
de forma eficiente (em especial as hexoses), demons- lação a outras alternativas energéticas.
tram a dificuldade em se domesticar e controlar os Ao final dessa pesquisa, ficou claro para nós
atores não humanos e fazê-los participar dessa rede que as primeiras expectativas e promessas para o
como desejado pelos pesquisadores e produtores. A E2G no Brasil eram precipitadas, prometendo
interferência da areia no processo de pré-tratamento, muito para muito cedo. Problemas e atrasos são co-
um imprevisto que à primeira vista parecia irrelevante muns a quase todos os grandes projetos tecnológi-
para os produtores e fornecedores de equipamentos cos, especialmente no setor de energia, como foram
(acostumados com outras matérias-primas), revelou- inicialmente os projetos de energia solar e energia
-se determinante na operação das usinas e em seu re- eólica nos anos de 1980, o que não significou seu
sultado final, alterando completamente as primeiras fracasso ou abandono. As expectativas atuais apon-
previsões nacionais que fomentaram o financiamento tam que o E2G deve se tornar um paradigma no
dessas usinas pioneiras. Isso mostra que esses atores setor sucroenergético a partir de 2030 se a maior
atuam e modificam o curso da ação de forma muitas parte dos problemas apontados for contornada. De
vezes imprevisíveis aos atores humanos, o que justifica qualquer forma, ele deve dividir com a bioeletrici-
o fato de a TAR chamar essas entidades não humanas dade os recursos materiais e financeiros das usinas.
de actantes. Muita coisa vai depender ainda do desenvolvi-
Também procuramos demonstrar como essas mento dessa rede sociotécnica, ou seja, dos atores
iniciativas, mesmo quando partem de setores priva- não humanos como as enzimas, matérias-primas,
dos da economia, necessitam de uma série de apoios processos de pré-tratamento, da continuidade e do
e recursos públicos para operar. No caso da produ- aumento dos financiamentos públicos para pesqui-
O ETANOL DE SEGUNDA GERAÇÃO NO BRASIL 15

sa e produção, da inclusão de novos atores do setor 7 A Royal DSM é uma multinacional holandesa com
de pesquisa e de universidades, além do sucesso ou sede em Heerlen, empregando mais de 25 mil pessoas
do fracasso das políticas energéticas e tecnológicas em mais de cinquenta países e um faturamento anual
ligadas ao setor, especialmente o Renovabio. superior a 10 bilhões de euros (informação disponí-
vel no site da empresa, www.dsm.com, consultado
em 28/3/2018). Atua na indústria química (saúde,
nutrição e materiais) e é a fornecedora das leveduras
Notas utilizadas para a fermentação dos açúcares na usina de
segunda geração da GranBio.
1 Para mais detalhes sobre esses processos, ver Seabra
8 A VignisBionergia Ltda. é uma empresa de tecnologia
(2008), Ogeda e Petri (2010), Galbe e Zacchi (2010)
do setor sucroenergético fundada em 2015 com sede
e Albarelli (2013).
em Campinas (SP) e pioneira no desenvolvimento de
2 Para mais detalhes sobre os tramites do programa, ver variedades de cana-energia – foi a primeira empresa
Lorenzi (2018). no Brasil a desenvolver uma variedade de cana-ener-
3 Conforme carta encaminhada ao Senado em 5 de gia, em 2008. Sua produção deve chegar a 1 milhão
dezembro de 2017 e assinada pelas seguintes frentes de toneladas na safra 2018-2019 (Cherubin, 2016).
parlamentares: Frente Parlamentar da Agropecuária; 9 A Iogen Corporation é uma empresa canadense de
Frente Parlamentar pela Valorização do Setor Su- capital fechado com sede em Ottawa. Ela desenvolve
croenergético; Frente Parlamentar Mista do Biodie- tecnologias de produção de biocombustíveis e, como
sel; Frente Parlamentar da Indústria de Máquinas e mencionamos, possibilitou a construção e operação
Equipamentos; Frente Parlamentar em Defesa do da usina de segunda geração da Raízen através de uma
Cooperativismo; Frente Parlamentar Mista em Defesa joint venture com a Cosan-Shell, (informação dispo-
das Energias Renováveis, Eficiência e Portabilidade da nível no site da empresa, www.iogen.ca, consultado
Conta de Luz (Unica, 2017). em 28/3/2018).
4 “A União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica) é 10 Informação disponível no site do CTC, new.ctc.com.
a maior organização representativa do setor de açúcar br, consultado em 28/3/2018.
e bioetanol do Brasil. Sua criação, em 1997, resultou
da fusão de diversas organizações setoriais do estado
de São Paulo, após a desregulamentação do setor no
País” (informação disponível no site da organização, BIBLIOGRAFIA
www.unica.com.br/historico-e-missao, consultado em
29/6/2018). ALBARELLI, J. Q. (2013), Produção de açúcar e
5 A BetaRenewables é uma multinacional de capital etanol de primeira e segunda geração: simulação,
aberto com sede na Itália (Milão) cujo o maior acio- integração energética e análise econômica. Tese
nista é a Biochemtex (italiana). Desenvolvedora de de doutorado. Campinas (SP), Unicamp.
biocombustíveis, produtos químicos renováveis e li- BNDES – Banco Nacional de Desenvolvimento
cenciadora das tecnologias que desenvolve. A empresa Econômico e Social & CGEE – Centro de
é parceira da Novozymes, que fornece as enzimas para Gestão e Estudos Estratégicos. (2008), Bioeta-
a tecnologia Proesa, licenciada pela empresa para a
nol de cana de açúcar: energia para o desenvol-
produção de E2G e utilizada pela GranBio em sua
vimento sustentável. Rio de Janeiro, BNDES/
usina de segunda geração (Corrêa, 2014).
CGEE.
6 A Novozymes é uma empresa multinacional de capi-
CARDOSO, V. M. (2008), Aplicação da radiação
tal aberto com sede em Bagsværd, na Dinamarca. Seu
principal acionista é a dinamarquesa Novo Holdings
de feixe de elétrons como pré-tratamento do baga-
A/S. A empresa é líder no ramo de enzimas no mun- ço da cana-de-açúcar para hidrólise enzimática
do, fornecendo 48% do mercado de enzimas indus- da celulose. Dissertação de mestrado. São Pau-
triais. Emprega mais de 6 mil pessoas e possui diversas lo, Ipen.
unidades espalhadas pelo mundo, inclusive no Brasil CASTRO, N.; BRANDÃO, R. & DANTAS, C.
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Campinas (SP), Unicamp.

Siglas utilizadas

BNDES – Banco Nacional do Desenvolvimento


Ecônomico e Social
BNDESPAR – BNDES Participações
CGEE – Centro de Gestão e Estudos Estratégicos
CND – Contribuição Nacionalmente Determinada
CNPE – Conselho Nacional de Política Energética
COP – Conferência das Nações Unidas sobre as
Mudanças Climáticas
CT&I – Ciência, Tecnlogia e Inovação
CTBE – Laboratório de Ciência e Tecnologia do
Etanol
CTC – Centro de Tecnologia Canavieira
E2G – Etanol de Segunda Geração
ENCTI – Estratégia Nacional para Ciência, Tecno-
logia e Inovação
EPE – Empresa de Pesquisa Energética
FINEP – Financiadora de Estudos e Projetos
FNDCT – Fundo Nacional de Desenvolvimento
Científico e Tecnológico
GEES – Gases de Efeito Estufa
IAC – Instituto de Açúcar e Álcool
RESUMOS / ABSTRACTS / RESUMÉS 19

O ETANOL DE SEGUNDA SECOND GENERATION L’ÉTHANOL DE LA SECONDE


GERAÇÃO NO BRASIL: ETHANOL IN BRAZIL: POLICIES GÉNÉRATION AU BRÉSIL:
POLÍTICAS E REDES AND SOCIO-TECHNICAL POLITIQUES ET RÉSEAUX
SOCIOTÉCNICAS NETWORKS SOCIO-TECHNIQUES

Bruno Rossi Lorenzi e Thales Haddad Bruno Rossi Lorenzi e Thales Haddad Bruno Rossi Lorenzi e Thales Haddad
Novaes de Andrade Novaes de Andrade Novaes de Andrade

Palavras-chave: Etanol de segunda ge- Keywords: Second generation Ethanol; Mots-clés: Étanol de seconde généra-
ração; Política energética; Teoria Ator- Energy policy; Actor-network theory. tion; Politique énergétique; Théorie de
-Rede. l’acteur-réseau.

O presente artigo propõe analisar as po- This article analyses the national policies Cet article propose d’analyser les poli-
líticas e as iniciativas nacionais relacio- and initiatives related to the production, tiques et les initiatives nationales rela-
nadas com a produção, a pesquisa e o research and development of the second tives à la production, à la recherche et au
desenvolvimento de etanol de segunda generation ethanol (E2G) in Brazil. Us- développement de l’éthanol de seconde
geração (E2G) no Brasil. Utilizando a ing actor-network theory as the theoreti- génération (E2G) au Brésil. En utilisant
Teoria Ator-Rede como referencial teó- cal and methodological referential, we la théorie de l’acteur-réseau comme cadre
rico e metodológico, buscamos identifi- sought to identity, from a bibliographi- théorique et méthodologique, nous cher-
car, a partir de levantamento bibliográ- cal and documentary survey, which are chons à identifier, à partir d’une enquête
fico e documental, quais são as políticas the policies interwoven with E2G, the bibliographique et documentaire, quelles
imbricadas com o E2G, os principais main actors that form this network, its sont les politiques incorporées à l’E2G,
atores que fazem parte dessa rede, suas alliances, the related technologies and the les principaux acteurs qui font partie de
alianças, as tecnologias relacionadas e as main issues involved in this process. By ce réseau, leurs alliances, les technolo-
principais questões envolvidas nesse pro- mapping this network and tracking its gies qui y sont associées et les principales
cesso. Ao mapear essa rede e acompanhar controversies, we try to demonstrate how questions impliquées dans ce processus.
suas controvérsias, tentamos demonstrar E2G is still a black box open to human En cartographiant ce réseau et en tra-
como o E2G ainda é uma caixa-preta and non-human actor associations, poli- çant ses controverses, nous essayons de
aberta a associações de atores humanos e cies and (in)definitions. Finally, we point démontrer comment l’E2G est toujours
não humanos, políticas e (in)definições. out the implications of this artefact with une boîte noire ouverte aux associations
Por fim, apontamos as implicações des- its related policies, seeking to contribute d’acteurs humains et non-humains, po-
se artefato com as políticas relacionadas, to the current debate on energy policy litiques et (in)définitions. Enfin, nous
buscando contribuir com o debate atual and Brazilian science and technology. indiquons les implications de cet arte-
sobre a política energética e a ciência e a fact avec les politiques connexes, tout
tecnologia brasileira. en cherchant à contribuer avec le débat
actuel sur la politique énergétique, sur la
science et sur la technologie brésilienne.

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