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420 ENSAIO | ESSAY

Práticas estéticas e corporais: criação e


produção de subjetividade na atenção
psicossocial
Aesthetic and body practices: creation and production of subjectivity
in psychosocial care

Elizabeth Araújo Lima1,2, Guilherme Providello2,3, Juliana Araújo Silva1,2, Juliana Maria Padovan
Aleixo2, Lívia Pellegrini2, Paula Carpinetti Aversa2, Tais Barrenha2, Tânya Marques Cardoso2

DOI: 10.1590/0103-1104202112913

RESUMO Práticas estéticas e corporais têm ocupado um lugar significativo na atenção psicossocial, no
contexto da Reforma Psiquiátrica brasileira. Propostas que inventam outras formas de produção de saúde
e de subjetividade, associadas à participação social, têm valorizado a diversidade de formas de expressão
em saúde mental e a diferença nas formas de existência. Com o intuito de estudar essas práticas e criar
um campo de comunicação e produção coletiva de suas singularidades e seu plano comum, um grupo de
pesquisadores se reuniu no Programa de Pós-graduação em Psicologia da Universidade Estadual Paulista
e desenvolveu pesquisas articuladas ao projeto ‘Práticas estéticas e corporais na atenção psicossocial:
processos de criação e produção de subjetividade’. Nessas pesquisas, foram exploradas as relações entre
arte e saúde mental, a produção das políticas públicas relacionadas ao campo, o desenvolvimento das
práticas clínicas, artísticas e culturais e a formulação de conceitos e perspectivas teóricas que sustentem
essas práticas. Neste texto, serão apresentadas, brevemente, as políticas públicas de saúde e cultura que
foram desenvolvidas no Brasil nos últimos 30 anos, sua articulação intersetorial e algumas experiências
práticas nesse campo, que temos desenvolvido e pesquisado.

PALAVRAS-CHAVE Saúde mental. Política pública. Arte. Cultura.

ABSTRACT Aesthetic and body practices have played a significant role in psychosocial care, in the context
of the Brazilian Psychiatric Reform. Proposals that invent other ways of producing health and subjectivity,
associated with social participation, have valued the diversity of expression in mental health and the differ-
ence in forms of existence. In order to study these practices and create a field of communication and collective
production of their singularities and their common plan, a group of researchers met in the Graduate Program
in Psychology at Universidade Estadual Paulista, creating the line of research ‘Aesthetic and body practices
in the psychosocial care: processes of creation and production of subjectivity’. In the inquiries developed, the
relations between art and mental health, the production of public policies related to the field, the development
1 Universidade de São Paulo
of clinical, artistic and cultural practices and the formulation of concepts and theoretical perspectives that
(USP) – São Paulo (SP), support these practices were explored. In this paper, the health and culture public policies that have been
Brasil. developed in Brazil in the last 30 years, their intersectoral articulation and some practical experiences in
beth.araujolima@gmail.com
this field, which we have developed and researched, will be briefly presented.
2 UniversidadeEstadual
Paulista (Unesp) – Assis
(SP), Brasil. KEYWORDS Mental health. Public policy. Art. Culture.

3 CentroUniversitário de
Ourinhos (Unifio) – São
Paulo (SP), Brasil.

Este é um artigo publicado em acesso aberto (Open Access) sob a licença Creative
Commons Attribution, que permite uso, distribuição e reprodução em qualquer
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O risco – estou arriscando descobrir terra nova. Nesse contexto, práticas estéticas e corpo-
(Clarice Lispector, em Água Viva) rais passaram a instigar a invenção de outras
formas de produção de saúde e subjetividade,
associadas à participação social e à produção
cultural. Promovem-se, assim, novas articu-
Introdução lações entre as experiências singulares e a
vida coletiva, na afirmação dos direitos de
A atenção psicossocial se configurou como um fruição e produção cultural e na valorização
conjunto de práticas e saberes que orientam a da multiplicidade de formas de existência e da
invenção de dispositivos de cuidado em saúde diversidade de formas de expressão.
mental no contexto da Reforma Psiquiátrica Com o intuito de criar um campo de comu-
brasileira (RPb). Entre esses dispositivos, nicação e investigação coletiva dessas práticas,
as práticas estéticas e corporais ganharam suas singularidades e seu plano comum, foi
relevância, ampliando as possibilidades de criado o projeto ‘Práticas estéticas e corporais
atenção em projetos de caráter artístico e na atenção psicossocial: processos de criação
cultural. Essa perspectiva começou a ser de- e produção de subjetividade’, na linha de pes-
senvolvida a partir dos anos 1980, quando quisa ‘Atenção psicossocial e políticas públicas’
movimentos sociais e mobilizações públicas do Programa de Pós-graduação em Psicologia
pela democracia provocaram importantes da Universidade Estadual Paulista (Unesp). O
transformações no cenário político do País. A projeto articula uma rede de pesquisas que in-
luta pelo fim da ditadura militar, a construção vestigam as relações entre arte e saúde mental,
da abertura política e o fortalecimento de di- a produção das políticas públicas relacionadas
versos movimentos em defesa dos direitos de ao campo, o desenvolvimento das práticas
todos criaram as condições para a promulga- clínicas, artísticas e culturais e a formulação
ção de uma nova Constituição, em 1988, à qual de conceitos e perspectivas teóricas que sus-
se seguiu a construção de políticas públicas tentem essas práticas2-9.
pautadas nas ideias de saúde e cultura como A cartografia é o ethos metodológico que
direitos fundamentais. ambienta essas pesquisas, que acompanham
Essas políticas foram fortalecidas nos processos e que são marcadas por uma atitude
últimos 30 anos e encontram-se, hoje, crítica de transdisciplinaridade. Essa atitude
fortemente ameaçadas por uma agenda faz atravessarem-se as disciplinas na constru-
de retrocessos. Evidencia-se, assim, que a ção de um plano composto por materiais e
construção das políticas não indica o fim procedimentos heterogêneos – “componentes
das lutas. É sempre no entroncamento das teóricos e tecnológicos, mas também estéticos,
lutas que se estabelecem formas de produzir éticos, econômicos, políticos e afetivos”10(74)
e exercer direitos, que só podem ser garan- – na afirmação do caráter construtivo e in-
tidos no espaço público quando se pertence ventivo da produção de conhecimento. As
a uma comunidade no interior da qual é pesquisas que envolveram seres humanos
possível agir e participar, segundo Arendt1. foram realizadas de acordo com princípios
Foi para construir esse espaço público que éticos e foram aprovadas pelo Comitê de Ética
trabalhadores de saúde, cultura e artes e em Pesquisa da Unesp.
usuários e familiares de serviços públicos se Neste texto, serão apresentadas, brevemen-
juntaram aos movimentos sociais e abriram te, as políticas públicas de saúde e cultura que
um caminho de atuação intersetorial, res- foram desenvolvidas no Brasil nos últimos 30
significando a presença das atividades artís- anos, sua articulação intersetorial e algumas
ticas e culturais a partir de uma perspectiva experiências nesse campo, que temos desen-
ético-estético-política. volvido e/ou pesquisado.

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A construção de políticas economia terapêutica, deveria emergir uma


públicas de saúde e cultura comunidade marcada pela solidariedade e
pela afetividade. A materialidade do espaço
institucional compreende a forma como o
serviço se organiza, o tipo de modelo assis-
Reforma Psiquiátrica e atenção tencial que o caracteriza, o regime de trabalho
psicossocial e a remuneração do profissional de saúde.
Nesse contexto, o deslocamento da noção de
As lutas sociais voltadas à defesa e à promoção cura para a de produção de vida potencializa
da saúde como direito mobilizaram diferentes mudanças subjetivas ao mesmo tempo que
atores e grupos da sociedade civil em torno de promove o desmonte da lógica asilar. Nesse
um projeto comum e, através do Movimento processo de mudança de paradigma, todos os
da Reforma Sanitária, possibilitaram a criação atores são convocados à construção do sen-
do Sistema Único de Saúde (SUS), fundado timento de pertencimento e à tessitura dos
nos princípios de justiça social, equidade, in- laços comunitários.
tegralidade e universalidade. A proposição A transmutação dessa proposta em polí-
do SUS expressa, assim, uma radicalização tica pública implicou a criação de uma série
do projeto democrático, que vai muito além de diretrizes e portarias que direcionaram a
da oferta de serviços de saúde e garantia de mudança paradigmática, além de alocar re-
acesso e consumo desses serviços, apostando cursos para sua implantação, possibilitando
na criação de práticas de saúde comprometidas o acesso à cultura, ao lazer e à saúde de modo
com a dimensão pública da vida11. interdisciplinar e intersetorial. A Lei nº 10.216,
No contexto da criação do SUS, e influen- de 2001, defende o direito à saúde mental em
ciada pelas experiências de transformação novos modelos de assistência e é operacio-
dos modelos de atenção em saúde mental em nalizada pelas portarias nº 336 e nº 189, de
diversos países, surge a Luta Antimanicomial. 2002, que instituem os Centros de Atenção
Esse movimento político e social, formado por Psicossocial (Caps) e possibilitam a abertura
trabalhadores da saúde mental, familiares e dos Centros de Convivência e Cooperativas
pessoas com sofrimento psíquico, tem lutado (Cecco) ou Centros de Convivência e Cultura
pelo fim dos manicômios e das práticas de (Cecc). Nesses estabelecimentos, são realiza-
violência, tortura e maus tratos que são rea- das oficinas terapêuticas, artísticas e culturais
lizadas ali, tendo como um de seus princípios inscritas na tabela do Sistema de Informações
a ideia de que a aproximação à experiência Ambulatoriais do SUS (SIA/SUS), por meio
da loucura deveria se dar no espaço cultural. da Portaria nº 728, de 2002. Seu conceito é
Um dos resultados da Luta Antimanicomial reforçado pelas Conferências Nacionais de
foi a construção da RPb como política pública Saúde Mental, e na IV Conferência, em 2010,
de saúde mental, pautada na estruturação de foi reconhecido seu papel na construção da
uma rede de atenção não hospitalocêntrica. rede intersetorial.
A RPb foi profundamente influenciada pela Sua efetivação e transformação em ações de
Psiquiatria Democrática Italiana, que con- cuidado requerem a superação do paradigma
siderava que os desafios colocados para os psiquiátrico e implicam, segundo Amarante,
profissionais de saúde mental não seriam a uma atuação em quatro dimensões: a dimensão
cura e a adaptação à vida produtiva, mas a teórico-conceitual, que problematiza teorias e
produção de vida, de sentido, de sociabilidade. conceitos que sustentam o saber psiquiátrico
Na articulação entre a materialidade do espaço tradicional; a dimensão técnico-assistencial,
institucional e a potencialidade dos recursos relativa aos modos de cuidar; a dimensão
subjetivos, nomeada por Franco Rotelli12 como jurídico-política, voltada para a discussão e

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redefinição das legislações que envolvem os oficinas, os ateliês e as cooperativas presentes


doentes mentais; e a dimensão sociocultural, nos Caps e nos Ceccos, como já citado. Várias
que abarca o conjunto de ações que visam a experiências culturais e artísticas, orientadas
transformar a relação que a sociedade possui pelo paradigma psicossocial, começaram a
com a loucura. A dimensão sociocultural – que ser gestadas e implementadas, ampliando a
busca provocar e desestabilizar o imaginário atenção em saúde mental com propostas para
social relacionado à loucura e envolver a so- assegurar oportunidades de acesso, exercício
ciedade na discussão da Reforma Psiquiátrica, e expressão dos potenciais criativos, artísticos,
a partir da produção cultural e artística dos culturais e intelectuais.
atores sociais envolvidos – é uma das di- A saúde mental passou a ser vista na sua
mensões “mais criativas e reconhecidas, nos relação com o viver, a convivência e as expe-
âmbitos nacional e internacional, do processo riências culturais. Concebendo a vida como
brasileiro de reforma psiquiátrica”13(73). movimento, assegurar a liberdade desse movi-
A articulação dessas quatro dimensões mento e sua sustentação seria criar condições
alicerça um novo modo de agir em saúde favoráveis para a invenção de múltiplas saúdes
mental: a atenção psicossocial, que propõe possíveis17.
o deslocamento do paradigma psiquiátrico
para o paradigma psicossocial, compreen- Cultura como direito e diversidade
dendo o tratamento do sujeito dentro de uma cultural
clínica ampliada e transdisciplinar. A atenção
psicossocial tem como elemento nuclear a de- No mesmo período em que ocorreram avanços
sinstitucionalização, compreendida como um na direção de uma atenção ampliada em saúde
processo de ruptura com o modelo asilar e uma mental, uma alteração significativa nas polí-
proposta de nova relação com as experiências ticas culturais desencadeou um processo de
de sofrimento psíquico, oferecendo tratamento democratização da cultura, valorização da
no território, produzindo aproximação entre diversidade cultural e incentivo, por parte do
usuários e comunidade, repensando as con- Estado, a iniciativas que emergem em diferen-
dições de cidadania e desenvolvendo ações tes regiões do País. Questões de subjetividade,
coletivas para fortalecimento de processos território, acessibilidade e diferença passaram
democráticos e construídos com os usuários14. a compor as pautas de políticas culturais que
Os aparatos institucionais da RPb são, concebem a cultura como direito e importante
antes de tudo, “dispositivos de produção de elemento para o desenvolvimento e para a
subjetividade e subjetivação”15(55) que fazem redução da pobreza e da desigualdade.
coincidirem as práticas em saúde mental com Lima e Ortellado argumentam que as políti-
práticas de produção de subjetividades e de cas culturais do período deslocaram o foco da
produção de cultura, o que demanda democratização do acesso aos produtos cul-
turais para dar suporte, fomento e acesso às
uma abordagem interdisciplinar, transdisciplinar atividades de produção cultural e ao processo
e intersetorial, com a decorrente construção de criativo aí envolvido, na direção de uma efetiva
uma diversidade de dispositivos territorializados democracia cultural. Segundo os autores, a ati-
de atenção e de cuidado16(29). vidade cultural gera produtos ou serviços, mas
sua verdadeira riqueza está no processo que se
A desconstrução do modelo manicomial e realiza num tempo estendido, e envolve esforços
asilar foi acompanhada, assim, da criação de constantes de criação, pesquisa e formação18.
uma ampla rede de dispositivos de cuidados e Um conceito ampliado de cultura orienta
produção de subjetividade com foco da assis- essas novas políticas, nas quais as manifes-
tência no território sociocultural, entre eles, as tações culturais ganham em diversidade,

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linguagens e funções sociais. A cultura passa estigmatização, ampliar territórios de circu-


a ser vista como experiência comum, vinculada lação e troca, produzir novos sentidos para o
à produção de sentidos e valores e expressão da sofrimento, criar novas linguagens e expres-
multiplicidade de formas de vida presente em sões culturais e produzir uma vida mais rica
uma determinada sociedade19. Em consonân- para todos21.
cia, as políticas culturais voltam-se a segmen- Para Yasui22, produzir a intersetorialidade
tos considerados mais vulneráveis, e passam implica
a incluir em sua agenda a cultura popular, a
cultura indígena, das comunidades quilombo- construir um processo que envolve um intenso
las, do povo cigano; voltam-se, também, para a diálogo, que pressupõe reconhecer e respeitar
expressão artística de pessoas em sofrimento as especificidades e as diversidades de cada
psíquico e das pessoas com deficiência, valo- campo; explicitar os conflitos e os interesses en-
rizando suas expressões artístico-culturais no volvidos, para que se possam negociar e pactuar
que estas têm de diversidade e singularidade. ações; unir potências, produzir encontros ao
Cultura e saúde começam a se imbricar. redor dos temas que perpassem por todos esses
campos, a saber: a melhoria da qualidade de
Saúde e cultura: intersetorialidade vida, a inclusão social e a construção da cida-
dania da população22(155).
A partir de 2003, uma série de iniciativas in-
tersetoriais começa a ser desenvolvida entre o Esse desejo de intersetorialidade recoloca
Ministério da Cultura e o Ministério da Saúde. o papel das políticas públicas como potencia-
Um exemplo dessas iniciativas foi a realização lizadoras da força criativa existente em todos
da Oficina ‘Loucos pela Diversidade – da di- e qualquer um, especialmente nas áreas de
versidade da loucura à identidade da cultura’, maior vulnerabilidade e risco social, apoian-
que, em 2007, congregou artistas, produtores do-se sobre os eixos da criação, expressão,
culturais, profissionais da saúde, pesquisa- acesso, difusão, participação e produção de
dores e usuários de serviços de saúde mental subjetividade. Trata-se, principalmente, de
comprometidos com o desenvolvimento de revigorar a dimensão pública das políticas,
projetos artístico-culturais no campo da saúde reconhecendo o protagonismo da criação de
mental20. A ela seguiu-se o Prêmio ‘Loucos políticas no âmbito dos coletivos e dos espaços
pela Diversidade’, que, em 2009, premiou pro- públicos plurais23. Público aqui não é aquilo
jetos artísticos desenvolvidos por pessoas em que é estatal, mas se refere ao espaço no qual
sofrimento psíquico, por grupos autônomos se está entre os seres humanos como seres
ligados à experiência em saúde mental ou por políticos, isto é, o espaço no qual as pessoas
equipes de instituições e equipamentos de podem exercer sua potência de agir.
saúde ou cultura.
Os pontos de confluência do conjunto
de experiências que se apresentaram a esse Experimentações no
prêmio, vindas de setores da cultura e/ou da território vivo das cidades
saúde, foram: a afirmação da saúde e da cultura
como direito; a ideia de que práticas culturais As práticas em saúde mental no paradigma
podem produzir saúde, e práticas no campo psicossocial buscam desconstruir os manicô-
da saúde podem produzir arte e cultura; e a mios, substituí-los por novas instituições que
aposta de que experimentações artísticas e se expandem e se movimentam na relação com
culturais com sujeitos que vivem ou viveram outros setores. Essas ações pedem a exploração
experiências de sofrimento e medicalização de um mundo extramuros que anseia pelo traba-
podem alterar padrões de discriminação e lho territorial e por uma clínica peripatética24.

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O paradigma psicossocial propõe a poten- Uma oficina de artes plásticas ocorrida no


cialização dos recursos que o próprio território ano de 2016, na periferia de uma cidade do
oferece para cuidar em liberdade, incentivando interior de Minas Gerais, ilustra a potência
as trocas, as relações interpessoais, a partici- desses dispositivos, que se constituem como
pação sociocultural, numa rede que sustente laboratórios, nos quais modos de ser e de estar
desestabilizações para que a vida possa seguir no mundo podem ser explorados e ganhar ex-
seu curso e suas errâncias. Essa rede é com- pressão através da oferta de materiais, técnicas
posta por diversos dispositivos, programas e repertórios artísticos. Essa oficina se desen-
e serviços de saúde e cultura, iniciativas da volveu em encontros semanais em um Centro
sociedade civil e de grupos autônomos. Juntas, de Esporte e Cultura Unificado, contou com a
essas iniciativas buscam criar as condições ajuda do Centro de Referência da Assistência
para um acompanhamento efetivo no território Social (Cras) da região e constituiu, para seus
vivo da cidade, que envolve elementos mate- participantes, um território de existência. As
riais e imateriais do lugar: ruas, casas, relações experimentações que aí tiveram lugar dialo-
interpessoais, afetos, memórias, histórias e gavam diretamente com a arte contemporâ-
universo cultural, num jogo de territorializa- nea, na medida em que esta tem explorado e
ção, desterritorialização e reterritorialização25. borrado deliberadamente os limites entre vida
No âmbito das ações que articulam arte, e arte, dando margem para que a vida se torne
saúde e cultura, as chamadas ‘oficinas’ ganha- estética e a arte se torne viva3.
ram destaque, introduzindo nos serviços de No contexto desse borramento, muitos
saúde mental diversos campos de atividades: artistas contemporâneos têm explorado for-
artesanais, artísticas, esportivas, produtivas temente aquilo que Nicolas Bourriaud de-
e educacionais. O intuito desses dispositivos nominou estética relacional26: um regime de
é instaurar espaços grupais de socialização, encontro casual intensivo que coloca a arte no
expressão e participação, funcionando como horizonte das trocas humanas e do seu contex-
ambiente de convivência e cuidado, de modo to social, acentuando sua prerrogativa de gerar
a romper com ações iatrogênicas do modelo relações inusitadas com o mundo. As estéticas
asilar e desestabilizar enquadres da clínica relacionais produzem configurações artísti-
tradicional5. cas coletivas cujo fundamento é dado pela
A seguir, serão apresentadas algumas ex- intersubjetividade e que têm como questão
perimentações que se deram num ambiente central o ‘estar-junto’ e a criação de redes de
intersetorial e que foram estudadas nas pes- conexão, colocando em relevo situações por
quisas que realizamos. Nelas, a produção de vezes modestas ou cotidianas, paisagens e si-
saúde e subjetividade implicou o desenvolvi- tuações obstruídas, silenciadas ou apartadas.
mento de “processos de criação voltados para Partindo do mote da coabitação, essas pro-
construção de novas línguas, novos territórios, postas colocam em questão as formas rígidas
novos sentidos”25(599). e padronizadas de relações humanas, dando
passagem a novas formas de se relacionar, de
Uma Oficina de Artes Visuais: amar, de viver. São lugares onde se elaboram
inventando relações sociabilidades alternativas e momentos de
convívio construídos, produzindo espaços-
Experimentações em artes visuais no âmbito -tempo relacionais que tentam se libertar das
da Reforma Psiquiátrica acontecem em muitos restrições da comunicação de massa.
Caps, Ceccos e instituições culturais, abertas Desta forma, a arte contemporânea contri-
aos interessados em diferentes modalidades bui para que as singularidades possam coabitar
artísticas, constituindo espaços do comum nos um mundo comum, evidenciando uma sintonia
quais predomina a heterogeneidade. preciosa com as propostas antimanicomiais.

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Do material que tece a vida – o prosaico, o ateliê de artes e um grupo de dança do ventre.
cotidiano e o imprevisto –, as artes plásticas Os Centros de Convivência surgiram no decor-
encontram meios de expressão, em exercí- rer do processo da RPb e desenvolvem ações
cios de colaboração coletiva, instaurando um que têm como foco a produção de encontros
estado de participação com o mundo. Como entre os usuários da saúde mental e a comuni-
afirma Bourriaud26(51) “é só, mas é muito”. A dade em que vivem, através de oficinas, grupos
partir de pequenos gestos, utilizando poucos e ações comunitárias. Trata-se de um equipa-
recursos, muitas vezes precários, a arte volta- mento idealizado a partir das diretrizes do SUS
-se à tarefa de “recosturar pacientemente o e da atenção psicossocial, onde se promovem
tecido das relações”. convivência, pertencimento e grupalidade na
Na oficina de artes plásticas, contando com relação com o território, com a rede de saúde,
o que tínhamos – sobretudo, conosco, nossos com a comunidade, buscando construir rela-
corpos e vidas –, realizou-se uma série de en- ções intersetoriais e fazendo interfaces com
contros nos quais eram produzidos objetos e ações culturais e artísticas2.
acontecimentos nas linguagens da colagem, O grupo de dança teve início em 2011 e conta
assemblagem ou performance, e tentava-se dar atualmente com cerca de 30 participantes.
uma forma ao que emergia no grupo. Tendo Desde o princípio, reuniram-se ali muitas mu-
como referência a estética relacional, pen- lheres, com faixa etária diversa, chegando de
samos a própria a oficina como obra de arte, lugares e caminhos muito diferentes. Avós
na medida em que operava no horizonte da vinham com suas netas e filhas, procuran-
convivência e das interações sociais. Filmes, do o grupo espontaneamente; adolescentes
documentários, roda de conversa, debates, chegavam por indicação de outras meninas;
referências artísticas serviram de trampolim mulheres eram encaminhadas ao grupo pelas
para a produção de objetos ou performances equipes dos Centros de Saúde, dos Centros
artísticas que problematizavam, principal- de Atenção Psicossocial, do Ambulatório
mente, temas como gênero e sexualidade, que de Transtornos Alimentares, do Centro de
emergiam dos encontros, o que levou à criação Referência à Mulher Vítima de Violência. E
do ‘Coletivo Diversos Muitas’. assim elas vêm chegando e indicando o espaço
Ao oferecer a oficina como território de da dança para outras mulheres.
existência, campo de experiência estética e O trabalho desenvolvido compõe movimen-
enlace social, a proposta aproxima práticas tos tradicionais da dança oriental árabe com
artísticas e práticas clínicas, contemplando alongamento, movimentos de improvisação,
o que se espera das políticas de atenção psi- práticas de consciência e expressão corporal
cossociais, reforçando mais uma vez que a alinhados a abordagens da Técnica Klauss
atividade artística é um campo privilegiado Vianna, criando espaços para que o grupo
para a construção de novas subjetividades, de possa construir uma linguagem corporal sin-
novas formas de estar-junto que sejam poten- gular a partir da escuta do corpo e da pesquisa
tes, generosas e mais solidárias. e investigação do movimento.
Ao longo desses anos, partilhamos trabalhos
Uma Oficina de Dança do Ventre: cênicos-artísticos, experiências estéticas, tran-
dançar o feminino sitamos em eventos no circuito da saúde e aden-
tramos o universo da dança, da arte e da cultura
No Centro de Convivência Rosa dos Ventos, de Campinas. São vivências que ampliam o
em Campinas, a equipe desenvolve práticas repertório de experiências das mulheres, for-
conectadas às novas formas de produção e de talecendo a grupalidade e construindo outros
sensibilidades no campo do cuidado. Entre lugares e outras formas de poder levar a vida,
elas, oficinas de artesanato, práticas de yoga, potencializando-a, intensificando-a.

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O foco do trabalho não é exclusivamente tera- [...] não se trata de privilegiar o corpo sobre o
pêutico, artístico, pedagógico ou de socialização. espírito: trata-se sim, de adquirir um conheci-
O dispositivo é experimentado em seu caráter mento das potências do corpo para descobrir
híbrido, de modo que o universo das artes, do paralelamente as potências do espírito que
cuidado e da promoção de saúde se transversa- escapam à consciência28(77).
liza, borrando fronteiras e criando espaços de
intercessão na produção de encontros. Ao se encontrarem, os corpos afetam e são
Para dançar em apresentações e eventos é afetados, atraem-se ou se repelem. O corpo
necessária a preparação dos corpos e a constru- vibrátil, imperceptível, é ativado, e o corpo
ção de personagens. As mulheres se arrumam organismo alcança um outro estado de atenção.
juntas, atentas à maquiagem, aos cabelos, ao E, assim, na composição desse encontro, um
figurino, aos acessórios. Desviando dos lugares plano de consistência é traçado, delineando um
cristalizados do dia a dia, transportam-se a território. A geografia é existencial. As sensa-
outros universos, conectam-se a outras formas ções marcam o corpo, forjando uma memória
de expressão e linguagem e acessam o femini- afetiva, tecendo cartografias e fazendo emer-
no, tão invadido e devastado na atualidade. São girem narrativas, como a que segue abaixo.
muitas Marias: Maria-mulher-trabalhadora-
dançarina; Maria-mulher-mãe que também Inverno. Tarde de sexta-feira azul. O verde da
dança; Maria-mulher marcada por perdas e figueira além-muro. Em nosso quintal há de
sofrimento; muitas Marias com marcas que haver sombra e também sol. A oficina inicia-
rotulam e que, ao dançar, deslocam-se, inau- -se e estamos todos um tanto desanimados.
gurando novos territórios existenciais. Lá estão o tecido, delineando a arena, cds,
Não se trata de terapeutizar a cultura em livros, bolinhas. Nice chegou e já se sentou no
tempos de grande patologização da vida. chão mais inquieta hoje. Silvia anda ao redor
Trata-se de possibilitar a experimentação de observando. Seo Chico já deitado com os
formas intensivas de vida. Colocar o corpo em pés ao sol, olha absorto o tempo passar. Um
outros movimentos, em experimentação nas silêncio milenar suspende-nos. Eu havia pre-
linguagens expressivas, em novas direções, parado um roteiro de aula mas imersa nessa
para disparar processos de subjetivação. atmosfera percebi que os corpos pediam chão
Falar do grupo de dança do Centro de e ele já estava aquecido para nos receber.
Convivência Rosa dos Ventos nos faz compar- Uma largueza estendida. Poder deitar junto...
tilhar testemunhos de vidas que se expandiram horizontalizar... espreguiçar e em contato
e se deslocaram do senso normativo pautado com o chão, respirar, deixando o ar entrar
numa saúde ideal. É preciso pensar e exercitar e sair, alongando e esticando (o limite é o
uma outra saúde que nos aproxime dos proces- próprio corpo) mãos, pés, braços, pernas...
sos expressivos como fonte de potencialização e logo em seguida relaxar entregando-se
da vida. Uma saúde frágil27, que, exatamente ao chão. Soltar sons se o corpo pede voz.
por sua fragilidade, intensifica-se nas linhas Desconfortos, queixas? Silvia para e vira de
de vida, agarrando-se às potências. lado, me aproximo e ela está de olhos fecha-
dos como uma criança que se aconchegou.
Uma Oficina de Teatro: experiências Nice respira, solta a voz fazendo um soliló-
de travessia quio, descrevendo as sensações corporais.
Enquanto isso, Seo Chico transcende, mergu-
Os corpos estão em travessia. Os estados estão lhado na temperatura do chão, em seu olhar-
em constante mutação, pois estão em plano de -menino – silêncio de semente? Introduzo
experimentação, partindo de um território co- uma música que passa a dar ritmo ao instante
nhecido para embarcar em uma viagem afetiva: e as pessoas iniciam movimentos corporais,

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sempre no tempo-desejo de cada um(a). Com Uma Oficina de Literatura: a vida


minha voz convido-xs a experimentar modos ficcionada
de caminhar (com pés e mãos, engatinhando,
na ponta dos pés, calcanhares, parte interna Entre as modalidades de oficina presentes nas
e externa dos pés) em diferentes velocidades experiências da atenção psicossocial, encontra-
que gradualmente se aceleram e desacele- mos as oficinas literárias, nas quais se trabalha
ram. Corpos que ao se encontrar com outros com formas de expressão através da palavra.
vão dialogando com o movimento, com o Experiências com a literatura oferecem possi-
olhar, em silêncio de fala. Continuar a mover- bilidades de contar as dores e, nesse sentido, forjar
-se até retornar à posição inicial. Seo Chico ferramentas que ajudem a lidar com o sofrimento.
levanta-se e senta-se, pernas cruzadas a Comunicar essa experiência possibilita produzir
observar o que acontece. Silvia experimenta marcas e inscrevê-las no mundo. Os relatos e as
os andares e se diverte, de pouco em pouco narrativas potencializam o desejo de arriscar-se
insinua parar. Nice tem dificuldade de andar, a existir muito além do diagnóstico, que, ao se
mas ela mesma se resolve, não sem recla- transformar em rótulo, restringe o autorreco-
mar, experimentando intensidades diversas: nhecimento e a autovalorização.
andando como passarinho, como tigre, como
a aranha; galopando, saltando como canguru Histórias têm o poder de ensinar, conservar
e enfiando os pés no chão como se de lama a memória ou alterar o passado; nelas, as
fosse. Está concentrada em seu fazer, e vai vidas são como textos sujeitos à revisão, onde
intensificando os movimentos junto com o autor é também o intérprete de si mesmo,
a expressão vocal em fio contínuo com a o que possibilita uma aproximação à ficção
expressão do corpo. Nice cresce e contagia no sentido da permanente reelaboração, da
todo o grupo a produzir coletivamente. Xs autoinvenção29(1308).
participantes iniciam um diálogo corporal-
-vocal que se sustenta no tempo enquanto há Uma experiência de oficina literária acon-
vontade de interação. Para finalizar a oficina, teceu em 2012, em uma cidade do interior do
compartilhamos em roda como foi a expe- Paraná. A proposta buscou proporcionar um
riência para cada um(a). Estamos suando, espaço de escuta e acolhimento aos usuários
perguntando se já acabou, se tem lanche do serviço de saúde da cidade, em particular,
agora, levantando, colocando os sapatos... aos usuários de saúde mental. Num primeiro
Nice está sentada e, ainda ressoando a ex- momento, com o objetivo de esclarecer sobre a
periência, olha e toca as pernas esticadas. proposta, foram organizadas algumas rodas de
Há um tremor: ‘Nossa! Senti, hoje, que tenho conversa. Observou-se que os usuários tinham
perna. Olhem como elas estão? E não por grande dificuldade em entender como esse
causa do haldol não, é diferente’. Silêncio. trabalho poderia contribuir para o tratamento,
Nos olhamos. ‘Quem sabe do meu corpo sou posto que o atendimento desse serviço era
eu!’. Ela ri. Todxs rimos6(75,76). quase que exclusivamente ambulatorial, com
consultas mensais e prescrição de medicamen-
A possibilidade de experimentar o corpo de to, o que os usuários e familiares consideravam
modo extracotidiano traçou um plano de con- a única e melhor forma de cuidado em saúde.
sistência em que Nice pôde atravessar estados Para facilitar a chegada dos interessados
de ir tornando-se. Nadar, boiar, afogar, remar à oficina, e enfrentar tanto a condição de
junto. Ao produzir algo singular, esse algo a ‘psiquiatrização’ que compromete a integra-
ultrapassa. (Re)invenções de si e do mundo. A lidade do cuidado quanto as dificuldades de
obra em processo inacabado, fazendo-se num locomoção até o serviço, optou-se por flexibi-
Caps no interior de São Paulo. lizar o acesso: as oficinas aconteciam em dias

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diversos, na Unidade Básica de Saúde, que Fazendo música e movimento


funcionava no mesmo prédio do Ambulatório
de Saúde Mental, nos horários de funciona- A música, no contexto da RPb, aponta para
mento do serviço. O usuário poderia participar uma diversidade de práticas com formatos,
no mesmo dia em que fosse para a consulta. objetivos e métodos distintos. Em uma pesqui-
Nos encontros, eram disponibilizados livros sa realizada nesse campo, foram identificadas
com poesias, alguns textos e material para cinco formas principais de se trabalhar com
que os participantes pudessem produzir seus música, organizadas nas categorias: musi-
próprios escritos se assim desejassem. A partir coterapia; oficinas sonoras e/ou musicais;
dessa proposta disparadora, surgiam, em forma bandas, corais, grupos musicais e trabalhos
de narrativas, questões pessoais e familiares, solos; blocos carnavalescos; e experiências de
troca de experiências, problematização de si- rádios e webrádios5.
tuações cotidianas e expectativas com relação Entre esses diversos formatos, chamam a
ao tratamento. Os textos em germinação pos- atenção os grupos musicais que circulam no
sibilitavam vislumbrar esboços de vida que se cenário da música popular. Em territórios de
arriscavam a existir. fronteira, ao habitarem propostas interseto-
Nessa experiência, procurou-se pensar as ofi- riais, esses grupos que exploram múltiplos
cinas literárias como ferramenta da clínica em estilos e gêneros musicais aventuram-se
saúde mental. Num contexto em que o cuidado numa existência sem vinculações institu-
ainda esbarrava em um modelo medicalizador cionais fixas. Muitos desses grupos tiveram
e individualista, pautado na doença, a arte e as origem em contextos de serviços de saúde
produções literárias surgiam como uma forma e se desvincularam, buscando autonomia e
de transgressão dessa lógica utilitarista. uma inserção nos circuitos artístico-culturais.
Pensar a literatura e sua relação com a Seguem, assim, sustentando-se, algumas
loucura é pensar na resistência aos discursos vezes de forma precária, através de parcerias
que reduzem a subjetividade à identidade; e cooperações que possibilitam espaço físico
é pensar em processos de singularização. A para promoverem seus ensaios, conexões
literatura é a arte de criar ou recriar textos com outros atores da saúde e da cultura e
através da escrita e da fala, de forma a trans- participação na formação de estudantes e pes-
gredir o controle dos corpos e da subjetividade, quisadores que desejam se conectar a essas
permitindo certa plasticidade com relação ao experiências, entre outras possibilidades
mundo habitado pela loucura4. É através da que alimentam um persistir nesse território
narrativa (em função de sua aproximação com híbrido. Exemplos de experiências como
a ficção) que um movimento de reinvenção essas encontram-se nas trajetórias do Projeto
é possível, e o grupo, por sua vez, é o espaço Cidadãos Cantantes e da Banda Lokonaboa,
onde essa resistência se materializa em uma que apresentaremos a seguir.
permanente reelaboração de experiências.
Para Foucault30, a resistência não é um O PROJETO CIDADÃOS CANTANTES
processo de cristalização, mas de combate
e, sobretudo, de criação de novos modos de Em 1992, surgia o Coral Cênico de Saúde
ser e de sentir, de transformar situações e Mental, em forma de oficina aberta, no Centro
de se transformar. Saltar do plano da sinto- Cultural São Paulo (CCSP), conjugando pro-
matologia para o plano da experimentação dução artística com produção de saúde e sub-
foi o exercício praticado nos encontros das jetividade. Dez anos depois nasceu, ligada a
oficinas. Acontecimento que marca os corpos- esse projeto, a Oficina de Dança e Expressão
-pensamentos de quem atravessou e deixou-se Corporal, quando o coral passou a se nomear
ser atravessado pela força intensiva da vida. Projeto Cidadãos Cantantes, compreendendo

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as oficinas de coral e dança e promovendo com as formas que possuem, com suas pos-
espaços de singularidade e invenção coletiva8. sibilidades de habitar os espaços, com as
A Oficina de Coral Cênico trabalha com sensações que emergem da experimentação.
ritmos, velocidades, ideias e gostos diferen- A partir da investigação dos movimentos, é
tes. Nela, cada voz importa, e cada um cuida possível uma qualidade de conexão consigo
um pouco do outro. As relações que se esta- que potencializa o encontro com o outro e
belecem na sala de ensaio transbordam-na, ajuda a tecer relações. Explora-se, assim, a
produzindo amizades e levando o canto para potência da dança de promover o exercício
outros espaços, ao encontro do público. O de apropriação de si e das possibilidades
trabalho de regência, que foi descrito como de transformar-se e de vincular-se. Cada
um “afinar as diferenças”31(124), busca uma encontro é diferente, tem um clima próprio,
harmonia inusitada no conjunto de tantas uma sequência de músicas particular, uma
vozes diferentes em seus timbres e afina- configuração dada pelas pessoas presentes,
ções. Quando o grupo explora uma afinação uma proposta construída naquele dia. Essas
coletiva, não está à procura da perfeição, construções poéticas coletivas possibilitam
que poderia vir a barrar o processo criativo, que se entre em estados de jogo com o que
impondo um crivo à seleção das músicas está posto no campo social, para que possa
pela capacidade dos participantes em surgir uma expressão singular.
manter sons agudos e graves. A afinação é Poiéses são atos de tecer sentidos e formar
construída numa tentativa de compor vozes, poéticas com matérias diversas, com ele-
ouvir e perceber os timbres de cada um, mentos de um campo coletivo, com os sons e
em um desafio coletivo para produzir uma com o corpo. Essas produções coletivas des-
conexão com os sentidos do que se trabalha viantes são, também, atos de resistência, já
nos repertórios. O incentivo às composições que através delas experimentam-se corpos,
dos próprios participantes é forte, e comu- linguagens e sensibilidade que constroem
mente utilizam-se nos repertórios poesias e escapes ao uso normativo e capitalista do
letras que surgem ali, numa criação que se corpo e às ‘formas moldantes’, com as quais
faz em muitos. As letras das canções tecem o somos bombardeados cotidianamente nas
trabalho com sua força expressiva. Elas são mídias e nas redes sociais, que veiculam
elementos importantes no trabalho do Coral; um cuidado com o corpo como vigilância.
ao escolhê-las, fazem-se conexões entre
sons e enunciados, emergindo uma temática A BANDA LOKONABOA
que constitui o eixo do trabalho num deter-
minado momento. As apresentações do coral Outra experiência musical que foi acompa-
são acontecimentos que começam no trajeto, nhada em nossas pesquisas foi a da Banda
quando se dá o aquecimento vocal: o grupo Lokonaboa, uma iniciativa do Projeto de
conversa, relembra as letras, canta músicas Extensão Universitária ‘Atenção Psicossocial
de repertórios antigos. Antes de entrarem na Saúde Coletiva’, do Curso de Psicologia
em cena, todos se preparam juntos, compar- da Unesp-Assis. Em sua forma embrionária,
tilhando maquiagens e adereços. Pequenos a banda foi uma oficina de música ofere-
desajustes saltam na hora da apresentação, cida junto ao Caps Ruy de Souza Dias, da
mas a resposta do público é sempre muito cidade de Assis, por estudantes ligados ao
forte e acolhedora. projeto de extensão. A oficina foi desenvol-
A Oficina de Dança e Expressão Corporal vida por vários anos, e o grupo se apresen-
(Odec) é um laboratório de movimento e tava em eventos da Luta Antimanicomial
contato de improvisação: os corpos se encon- ou da Faculdade, até que, em 2002, surgiu
tram uns com os outros e consigo mesmos, a ideia de criar uma banda, que foi um

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desdobramento natural do projeto, dada Algumas reflexões para


sua qualidade musical. finalizar
Posteriormente, a banda firmou uma parce-
ria com a Pirassis, Associação de trabalhadores, Nos exercícios e experiências que pudemos
familiares, amigos e usuários da saúde mental vislumbrar nos breves relatos acima, artes,
da cidade. Em 2009, os ensaios passaram a cultura e clínica se atravessam, potencializan-
acontecer no Galpão Cultural de Assis, um do seus vetores de invenção e conectando os
espaço compartilhado por vários grupos e processos de criação à produção de saúde e
Organizações Não Governamentais (ONGs), subjetividade. Esboçar exercícios como esses,
que havia se tornado um Ponto de Cultura. que tocam a ação política e a invenção de novas
Pautada em uma gestão descentralizada formas de vida e do viver, é uma urgência para
e desierarquizada, a banda se servia de uma todos nós33.
perspectiva democrática com relação às deci- São ações que promovem novas articu-
sões de figurino, repertório, uso dos recursos lações entre as experiências singulares e
e proposta estética. Buscava, assim, introduzir a vida coletiva, tornando possível superar
transformações que tocavam, também, os mi- a noção de arte e cultura como recursos
cropoderes, buscando a horizontalização das terapêuticos, para que possam acessar seu
relações de poder. potencial clínico, como experiência estética
O projeto trabalhou sempre com uma pers- que dá novos sentidos à vida. Na constru-
pectiva que se articula diretamente com a di- ção de propostas que restituem a vida na
mensão sociocultural da Reforma Psiquiátrica: dimensão coletiva e criativa, possibilidades
a produção de um espaço social para a loucura. de pertencimento são ampliadas, formas de
Para ser possível travar um diálogo entre os encontro e convivência são fortalecidas e a
ditos sãos e os ditos não sãos, participação cultural é intensificada, o que
contribui para a efetivação de políticas de
é necessário antes que a experiência que temos caráter verdadeiramente público.
da loucura seja desmistificada, seja deslocada, A proposição de políticas públicas e ações
de modo a permitir que a palavra dos ‘não- intersetoriais coloca em evidência o caráter
-sãos’ tenha aceitação. Seja palavra não mais público e comum das artes, da saúde e da
interdita7(90). cultura. Trata-se de sedimentar progressiva-
mente uma transversalidade entre processos
Tal questão pode ser apreendida quando de subjetivação e processos de constituição do
se considera que as apresentações da banda mundo, que têm por referência a produção do
produzem estranhamento e ruptura da pers- comum. Estão em pauta aqui experimentações
pectiva dos ouvintes, constituindo momentos públicas e coletivas no mundo comum, que
de reconhecimento cultural das manifestações comportam a invenção de territórios existen-
dos loucos. ciais, a criação de valores e a constituição de
Mas a experiência da Banda produz al- processos de subjetivação, tendo por critério
terações nas paisagens sonoras e sensíveis, a expansão da vida, e não sua exploração,
principalmente de seus integrantes. A criação limitação ou cerceamento. “O Comum não
de marcas, a apropriação de conteúdo, a reor- é uma escolha, mas um imperativo da vida
ganização de sensações, que ganham sentidos, humana, em sua requisição radical de relação,
tudo isso possibilita a construção de territórios de alteridade”23(121).
subjetivos, inseridos em uma temporalidade No momento político atual, em que as polí-
e uma ritmicidade próprias, que encontram ticas governamentais e estatais abandonam os
um lugar no mundo32. planos coletivo e público, as recentes experi-
mentações nos âmbitos da saúde mental, das

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artes e da cultura que buscaram e buscam de pela parceria e pelo suporte que nos ofertou no
alguma forma abrir-se em direção à dimensão desenvolvimento de nosso projeto de pesquisa.
pública que toda política comporta são um
patrimônio imaterial de valor inestimável para
futuras recomposições mais justas e democrá- Colaboradores
ticas da política que virá.
Lima EA (0000-0003-0590-620X)* coordenou
a elaboração deste artigo coletivo, organizando
Agradecimentos o processo, participando da escrita juntamente
com os outros autores e realizando a revisão final
Agradecemos ao Programa de Pós-graduação do texto. Providello G (0000-0001-9069-6571)*,
em Psicologia da Universidade Estadual Silva JA (0000-0002-2028-9417)*, Aleixo JMP
Paulista (Unesp), Campus Assis, à Coordenação (0000-0002-7120-7725)*, Pellegrini L (0000-
de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível 0002-9867-0621)*, Aversa PC (0000-0002-9348-
Superior (Capes) e à Fundação de Amparo à 1266)*, Barrenha T (0000-0001-6828-4482)* e
Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) por Cardoso TM (0000-0003-4293-4963)* contri-
todo o apoio que recebemos nos anos em que buíram para a elaboração do manuscrito, tendo
desenvolvemos nossas pesquisas. Gostaríamos participado da concepção, escrita do texto e
de agradecer também ao Professor Silvio Yasui aprovação de sua versão final. s

Referências

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Recebido em 03/03/2020
31. Maluf JCG. Afinando diferenças: o processo de cons- Aprovado em 18/08/2020
Conflito de interesses: inexistente
trução artística do Coral Cênico Cidadãos Cantantes.
Suporte financeiro: Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal
[dissertação]. São Paulo: Universidade Estadual Pau- de Nível Superior (Capes) – Códigos de Financiamento 001
(uma bolsa de mestrado e duas de doutorado no País, uma
lista; 2005. 331 p.
delas beneficiada com doutorado-sanduíche); Coordenação
de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) –
Processo nº 1750406 (bolsa de doutorado no país); Fundação de
32. Providello GGD. Música e subjetividade: experimen-
Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) – processo
tações híbridas do pensamento. [tese]. Assis: Univer- 2011/16633-7 (bolsa de mestrado no País)
sidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho;
2018. 100 p.

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