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O ENIGMA DE CAPITU EM ​DOM CASMURRO​ POR MEIO DO RITMO

EDITORIAL1

Letícia de Oliveira Emerim2


Davi Frederico do Amaral Denardi3

Resumo: ​A obra de Machado de Assis, ​Dom Casmurro​, levanta diversas


discussões em torno de um enigma de traição e a narrativa é de grande
importância para a literatura nacional. O design gráfico, por meio do design
editorial ao utilizar o conceito de ritmo editorial, pode apresentar à obra de uma
forma interessante. O objetivo deste estudo é realizar uma proposta gráfica de
diagramação da obra a fim de evidenciar o enigma de Capitu. Para que ocorra
essa diagramação, foi feita uma análise da obra e um estudo sobre ritmo editorial,
aliado à metodologia de criação de produtos industriais do autor Löbach.

Palavras-chave: Dom Casmurro. Enigma de Capitu. Design editorial. Design


gráfico. Ritmo editorial.

Introdução

Os livros clássicos são aqueles que, segundo Lourenço (ANO), não


perdem o seu valor com o tempo e influenciam outros autores sobre temas de
escrita e estilo. No Brasil, são considerados obras desta categoria segundo a
revista Bula4, entre muitos outros, “A Pedra do Reino” de Ariano Suassuna (1971);
“A Paixão Segundo GH” de Clarice Lispector (1964); “Dom Casmurro” de
Machado de Assis (1899), sendo este último o objeto de estudo desta pesquisa.
Existem livros que são clássicos e que são publicações antigas, como
é o caso de ​Dom Casmurro,​ que é uma história importante dentro da vasta
literatura brasileira. Publicado em 1899 exibindo um enigma que deve ser
decifrado pelo leitor, a obra é de tamanha importância que ainda é estudada nas
universidades do Brasil e é comum esta obra ser utilizada em vestibulares do

1
Artigo apresentado ao Curso de Graduação em Design Gráfico da Faculdade SATC, como
requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Design Gráfico.
2
Graduando em Design Gráfico pela Faculdade SATC. E-mail: leticiaoemerim@gmail.com
3
Mestre em Design e Professor nos cursos Design Gráfico, Jornalismo e Publicidade e
Propaganda da Faculdade SATC. E-mail: denardi.davi@satc.edu.br
4
NETO, Miguel Sanches. “Os 10 romances mais importantes da literatura brasileira”. Acessado
em 03/04/18.
[https://www.revistabula.com/3944-os-10-romances-mais-importantes-da-literatura-brasileira/]
2

país; como exemplo, foi cobrado na redação do vestibular da Universidade do


Estado do Rio de Janeiro5 em 2017.
Machado de Assis, inspirado por William Shakespeare em sua obra
Otelo que foi publicado em 1622, elaborou um romance carioca dos personagens
Bento Santiago - personagem apelidado de “Bentinho” ou “Dom Casmurro” - e
Capitu. Neste livro, é relatado um romance do seu princípio ao fim e há uma
suspeita de adultério. O livro apresenta os fatores que levam o
narrador/personagem Bento até a sua acusação e “o que se discute é o conceito
de verdade [...] a forma como a humanidade constrói seus valores e sua moral6”.
É importante salientar que este romance clássico, pode contribuir para
estudos na área de design gráfico, através design editorial, pois levanta aspectos
interessantes dentro do seu contexto, que podem tornar-se ainda mais atrativos
para os leitores por meio do design editorial.
Este projeto de design gráfico é voltado para uma das suas áreas, o de
design editorial, e tem por objetivo geral fazer uma proposta gráfica para a obra
Dom Casmurro,​ com foco no ritmo editorial, que propõe uma diagramação do
livro, considerando a relação visual entre todas as páginas de uma publicação,
contribuindo para que o leitor sinta-se instigado a continuar com a leitura (ALI,
2009).
O objetivo específico da pesquisa é elaborar uma proposta gráfica para
a obra ​Dom Casmurro​, utilizando elementos do texto de Machado de Assis que
podem colaborar a evidenciar o enigma de Capitu. O enigma são os argumentos
presentes na obra que o personagem narrador cita para acusar a esposa e o
melhor amigo de adultério, que não é comprovado de fato; por isso “o enigma de
Capitu”.

5
FERNANDES, Bruna. “Dom Casmurro na UERJ”. Acessado em 22/05/2018.
[https://blog.enem.com.br/dom-casmurro-na-uerj/].
6
Conforme afirma Marcílio em seu resumo sobre a obra machadiana para o portal de educação
da globo. “Dom Casmurro”. Acessado em 24/02/18.
[http://educacao.globo.com/literatura/assunto/resumos-de-livros/dom-casmurro.html].
3

1 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Nesta seção, será apresentado um breve resumo da obra ​Dom


Casmurro com o objetivo de identificar as principais características da narrativa
que constroem o enigma da traição. Os principais autores Moriconi (2008),
Carvalho (2011), Caldwell (2001), bem como conceituar o ritmo editorial por meio
dos autores Ali (2009), Raposo (2015), e Hoeltz (2001) a fim de esclarecer as
características e o seu uso no design editorial.

1.1 O enigma de Capitu em ​Dom Casmurro​ de Machado de Assis

Joaquim Maria Machado de Assis foi um escritor, jornalista, contista,


dramaturgo e poeta brasileiro, nasceu no ano de 1839, no Rio de Janeiro. É um
dos autores nacionais de grande influência na literatura, com as suas obras
estudadas em diversas universidades. O autor participou dos movimentos
literários romantismo, realismo e naturalismo e entre as suas obras, destacam-se
Memórias Póstumas de Brás Cubas​ (1881) e ​Dom Casmurro​ (1899).
O livro ​Dom Casmurro foi publicado em 1899, contando a história do
personagem Bento Santiago, que decidiu narrar sua vida desde a infância até a
idade adulta, em especial a construção do seu relacionamento com Capitu, a
suposta traição da esposa com o melhor amigo e as justificativas para a acusação
de adultério. A obra pertence à escola literária Realismo e é uma das obras que
exemplifica o movimento no Brasil (PEREIRA, 2003). A obra é inspirada em Otelo
de Shakespeare, e os personagens do drama inglês estão dentro do romance
brasileiro, conforme explica Caldwell (2001, p. 21) “é ele mesmo quem revela que
se trata da história de Otelo, mas com uma certa diferença, e muito importante:
sua Desdêmona é culpada”. Machado trabalha com a ideia central de Otelo, o
ciúme, e trabalha os personagens de Shakespeare de maneira inteligente.
Bento Santiago apresenta os eventos de sua vida sob o seu ponto de
vista, desde o princípio do seu grande e único amor, até o momento em que se
afoga nos “olhos de ressaca”7 de Capitu, colocando - por fim - o leitor como

7
Ressaca, dentro na narrativa do livro, vem de mar revolto, conforme explica Moriconi (2008) em
seu artigo.
4

testemunha do suposto adultério, para que este absolva ou condene a moça,


baseando-se em seu comportamento e fala. Durante o romance, o autor Machado
de Assis descreve situações nas quais a dúvida se torna o elemento essencial da
obra; não é evidente o adultério, apenas a suspeita dele, que em nenhum
momento da narrativa comprova-se e, boa parte das suspeitas, são motivadas por
crises alucinadas de ciúmes (MORICONI, 2008).
A partir disto, a construção da obra acontece de tal maneira que a
dúvida da traição se torna o protagonista. Casmurro busca atar as duas pontas da
sua vida procurando na Capitolina-menina as evidências de que os seus olhos de
ressaca – como assim os descreve – iriam arruiná-lo na vida adulta, não
permitindo-o seguir em paz, ao ponto de escrever as suas memórias para
comprovar para si mesmo e para os outros os seus hábitos calados e reclusos.
Porém, na construção do romance, Machado não deixa claras as intenções dos
seus personagens, fazendo com que o leitor se perca na tentativa de desvendar o
enigma de Capitu através do olhar enciumado de Bento Santiago, também
conhecido como Dom Casmurro (CARVALHO, 2011). Conforme explica Caldwell
(2001, p. 20) “sem demora ele aparenta ser um homem sutil e, além de tudo, um
advogado, cujas palavras convém ao leitor pensar cuidadosamente”.
Portanto, ​Dom Casmurro é uma obra na qual a resposta e a conclusão
final partem do leitor e não do autor. Não é possível comprovar o adultério,
porém, tão pouco é comprovada a inocência de Capitu. Ao mesmo tempo em que
as desconfianças que Bento sentia em relação ao relacionamento de Escobar e
Capitu, existe o vazio interior do personagem, as memórias tão doloridas de suas
crises de ciúmes e a evidente dor da perda de Capitu, que morreu na Europa.
Tentar desvendar o enigma de Capitu é tentar desvendar o enigma de Casmurro
(CARVALHO, 2011).
Sendo assim, com um narrador não confiável, uma vez que este
personagem só apresenta a sua história quando Escobar e Capitu já estão mortos
e não tem como se defenderem das acusações de Bento, como também o fato de
que os leitores não têm como saber quais são os pontos de vista de Capitu, ou o
que ela tem a dizer sobre o seu filho, Ezequiel, ser fruto de um adultério ou não.
Fica nas mãos do leitor absolver ou condenar Capitolina. Mesmo que o leitor tome
5

um partido neste inquérito, quem poderá dizer que conheceu a moça, uma vez
que a Capitu é uma projeção de Casmurro, que pode ou não ter apresentado ao
público sua história tal como ela é ou ter omitido fatos em seu favor. O
interessante desta obra é que enquanto Bento faz um recorte das suas memórias
e apresenta a sua vida, os leitores acabam por julgar Casmurro e toda a sua
trajetória, e não necessariamente Capitolina (MORICONI, 2008).
O amigo do casal – Escobar, a outra parte da acusação de traição –
morre afogado no mar, começam os desentendimentos entre Bentinho e Capitu.
A desconfiança se dá a partir do velório, quando Capitu observa o morto dentro
do caixão, e “deita os olhos de ressaca”. Neste instante, ocorre um ​insight na
cabeça de Bentinho e ele desconfia, cismando que Escobar e Capitu tiveram um
caso (MORICONI, 2008).
O menino, Ezequiel (suposto fruto da traição de Capitu) tinha a mania
de imitar os outros: imita José Dias, imita tio Cosme; mas quando Ezequiel imita
Escobar, Bentinho vê o amigo no menino por inteiro. E conforme a criança cresce,
a sua presença não faz mais nada pelo casal, a não ser separá-los. Ezequiel é
para Bentinho a carta anônima que comprova a traição do amigo com a esposa
(MORICONI, 2008).
Bento e Capitu decidem separar-se, e ela se muda para a Suíça com o
filho Ezequiel. Com a morte de Capitu, Ezequiel volta para o Brasil; não mais um
garoto, mas um homem feito – para morar com o pai. E ao reencontrar com o
garoto, Casmurro o descreve (1899, p. 137): “Era o próprio, o exato, o verdadeiro
Escobar. Era meu comborço; era filho de seu pai”.
A palavra casmurro não é atrelada à toa a imagem de Bento Santiago.
Conforme explica Caldwell (2001, p. 97), Bento “quer exorcizar alguns fantasmas.
Ele apostrofa com uma citação do Fausto: ‘Aí vindes outra vez, inquietas
sombras?’ Por que evocar essas sombras? Para trazer de volta sua juventude”. O
escopo de Santiago é revisitar o passado e contá-la sabendo que nenhum dos
acusados poderia defender-se das acusações.
São perceptíveis os vários elementos que sustentam o enigma de
Capitu que foram inseridos dentro da narração de ​Dom Casmurro.​ Tratar-se de
um livro publicado há mais de um século, é natural que a cultura da linguagem,
6

enquanto senso comum da sociedade, tenha se modificado com a passagem do


tempo, e os leitores deste século sentem um pouco de dificuldade de mergulhar
dentro da narrativa.
Por tanto, o design editorial pode auxiliar na imersão do conteúdo da
obra, para que o tema fique mais explícito e a discussão ao redor deste enigma
ocorra com clareza, uma vez que esta é uma obra de grande importância para a
literatura nacional. Dentro dos termos propostos, o design gráfico pode auxiliar na
construção de uma diagramação interessante por meio do ritmo editorial. O
objetivo geral deste trabalho é apresentar uma proposta de diagramação da obra
Dom Casmurro, utilizando o conceito de ritmo editorial. E o objetivo específico
deste trabalho é analisar os capítulos que levantam este enigma retirando
elementos do texto de Machado que podem colaborar com a programação visual
desta editorial.

1.2 Ritmo Editorial e Ilustrações

O design gráfico é um campo criativo e não uma ciência exata. Tem


uma postura interdisciplinar e busca em outras áreas referências e conteúdos que
possam vir a ser úteis para o desenvolvimento de seus projetos, apresentando
uma solução interessante para o usuário final daquela proposta (NOBLE;
BESTLEY, 2013). Dentro da área de design gráfico, existe o design editorial, que
trata da elaboração de projetos editoriais de livros e revistas, sendo algumas de
suas preocupações leiturabilidade e legibilidade, tradução intersemiótica do
conteúdo verbal para o não-verbal, ​layout de páginas bem estruturadas para
manter um padrão de diagramação reconhecível entre várias edições, entre
outros conceitos, incluindo o ritmo editorial.
Em termos gráficos, o designer editorial, profissional responsável pela
elaboração da diagramação, pode abrir mão de diversos elementos, como ​grid8,
tipografia, cores, imagens e ilustrações e o ritmo editorial.

8
“Grid” segundo Raposo (2015) é o elemento que estrutura a página e dá a base gráfica, o
formato da publicação, classificando as informações como título, subtítulo, legendas e numeração
de páginas.
7

Por ritmo editorial se entende planejamento de uma composição visual


de um projeto gráfico editorial, que elabora a publicação desde a primeira até a
última página, que proporciona para o seu leitor um fluxo de leitura considerando
a relação de texto e imagens, entre outros elementos que compõe um editorial.
Deve ser montado um espelho do projeto, um documento que comunica o ritmo e
o andamento da publicação e pode ser comparado à sequência de um filme, em
que se amplia o olhar para o projeto como um todo e vê em que momentos as
imagens devem ser inseridas, de que forma começar um novo capítulo e o
movimento que o olhar fará entre uma página e outra (ALI, 2009).

Figura 1: Exemplo de espelho editorial.

Fonte: Imagem retirada da internet.

Apesar de uma publicação ser estática, a movimentação que os olhos


fazem entre uma página e outra influenciam no tipo de leiturabilidade e
legibilidade que o gráfico proporcionará. Leiturabilidade e legibilidade são
conceitos ligados a este movimento dos olhos, onde o primeiro refere-se a
facilidade que a tipografia proporciona para que os olhos percorrem a linha e o
segundo refere-se ao quão distinguível uma letra é da outra. (ARTUR, 2011). O
contexto visual pode influenciar o leitor a seguir com a leitura, como se fosse uma
sequência de eventos ou vários ​frames de um filme. O ​layout de uma página,
8

quando se repete várias vezes ao longo de um projeto, é como uma mesma nota
soando no mesmo ritmo e repetidas vezes; uma mesma estrutura em um projeto
gráfico se repete visualmente, não estimula o leitor a seguir com a leitura que é
influenciada “pela memória daquilo que acabaram de ver, assim como pela
curiosidade sobre o que vem em seguida.” (WHITE, 2006, p. 29). O que
determina o ritmo de uma editoração, além da ordem cultural de leitura (da
esquerda para a direita, da direita para a esquerda) é estabelecer surpresas ao
longo da leitura, como o uso de tipografias variadas dentro do grid do texto,
sempre alinhado ao contexto da obra. Um texto com letras miúdas e parágrafos
extensos pode fazer com que o leitor se canse, pois o esforço ocular exaustivo
faz com que o desinteresse pela leitura surja. Para que o livro consiga uma boa
imersão, faz-se necessário que o leitor tenha o mínimo de esforço na atividade,
onde a velocidade dos olhos correndo pela linha é condicionada pela extensão
das palavras, das linhas; do conjunto gráfico que elas compõem, o tamanho do
retângulo que estas formam, etc. (ARAÚJO, 2008).
A padronização gráfica conta com alguns elementos que são
essenciais para a identidade visual do impresso, a forma que um papel com tinta
se apresenta para o seu público, como por exemplo, a quantidade de tinta que
​ ue limitam e alinham o
ocupará o papel formando uma mancha gráfica, os ​grids q
corpo do texto, que elementos ornamentam a página (como ilustrações, notas de
rodapé, numeração de páginas, etc) e como eles estarão dispostos em relação ao
texto, influenciam na maneira na qual o leitor interage com o impresso, quando
até as áreas em branco fazem parte desta interatividade, uma vez que o impresso
é primeiro visto e depois lido. Neste caso, o uso do branco é importante para que
o leitor não se sinta “sufocado” com muitas informações dentro da página. Hoeltz
(2001, p. 7) explica que:

O branco faz parte da página e normalmente é utilizado como


recurso estético. A valorização do branco da página representa o
espaço de circulação das ideias do leitor e os fluxos, os caminhos
deixados pelo designer. O branco proporcionado compensa a
perda de espaço pela beleza e leveza da página.
9

Primeiro, se nota as imagens, as cores, se há muito texto em uma


única página ou não, para depois partir para a leitura verbal (HOELTZ, 2001).
Um ponto importante para o desenvolvimento da diagramação de um
projeto gráfico editorial são as imagens, pois estas ajudam a transmitir uma ideia,
uma cena, um contexto e são compreendidas mais rapidamente do que o próprio
texto, mesmo que este seja escrito na língua nativa do leitor (HASLAM, 2007).
Uma publicação que trabalha com ilustração, por exemplo, proporcionará ao seu
público uma mensagem forte sem o uso de palavras. Essa colabora com a
compreensão do texto antes mesmo de este ser lido e as ilustrações, “permitem
que os leitores identifiquem, entre vários outros temas: constelações, planetas,
mobiliários antigos, animais, borboletas, etc.” (HASLAM, 2007, p. 111).

Figura 2: Exemplo de ilustrações em um livro.

Fonte: Imagem retirada da internet.

A ilustração é uma forma de demonstrar eventos, cenários, fatos ou


processos que não são visíveis para o público (FUENTES, 2006). Em livros de
ficção, nos quais os acontecimentos não são históricos ou reais, é comum o uso
de imagens para mostrar ao leitor as situações dos personagens da história.
Contudo, uma ilustração deve ocupar uma área gráfica que seja lógica,
10

harmônica; deve aparecer com um propósito claro dentro de um livro, não apenas
como um apelo estético (HURLBURT, 2002).
É bastante comum dentro do mercado editorial, que o designer ou
diretor de arte recorra a um ilustrador, e não a um fotógrafo, para mostrar sob sua
ótica e o seu traço, com o propósito de colaborar com um determinado texto ou
publicação. (FUENTES, 2006). Com as imagens, um projeto editorial fica mais
interessante visualmente, pois estimula a emoção das pessoas por meio das
ilustrações. (RAPOSO, 2015). O texto alinhado com a imagem transmite
sensações além daquelas descritas e fazem com que o leitor se aprofunde na
história, perceba detalhes que passaram despercebidos ao longo do texto e, se
for o caso, dê um rosto e um corpo que acompanharão a imaginação do leitor ao
longo do texto.
É importante considerar também o tempo em que as ilustrações
aparecem durante a diagramação do livro, uma vez que a imagem tem um
impacto visual grande, e que não se tem esforço visual para ler um desenho.
Pode ser utilizada para transmitir uma emoção, levando em consideração o
contexto em que se está inserida. E isto está ligado à ideia de padrão dos
elementos visuais utilizados, que devem ser alinhados a ideia central da
publicação; isto é, as ilustrações devem acompanhar o texto de maneira que
influencie o leitor a seguir com a leitura (RAPOSO, 2015).
A união entre a ilustração e o projeto gráfico deve ocorrer como
quebra-cabeças, em que uma peça se encaixa à outra. Tamanha é a importância
deste encaixe que esta união pode trazer para o editorial a oportunidade de uma
comunicação não-verbal que funciona como ilusão, com credibilidade. Ou seja, o
texto alinhado ao gráfico de maneira em que o público perceba ambas e a
estética seja harmoniosa. Para que a ilustração se adeque bem ao projeto, é
importante considerar o momento em que esta aparece dentro da diagramação,
de forma que não quebre o ritmo editorial – apenas colabore com o fluxo de
informações dentro da publicação (FUENTES, 2007).
Uma publicação original não precisa ser diferente ou fora de um
padrão editorial dentro do mercado. Para uma publicação ser considerada boa,
11

ela deve atender a algumas características: ser provocante, atual, fascinante,


esclarecedora, intrigante, entre outros adjetivos (WHITE, 2006).
Também é importante considerar que a estrutura das páginas deve ser
construída de modo que se alinhem de forma harmoniosa em todos os seus
elementos, para que a experiência do leitor não seja prejudicada. A diagramação
tem um papel de cuidar que a leitura não seja uma atividade cansativa, mas sim
algo prazeroso e que indique ao público que está avançando na leitura,
espaçando bem os seus textos em uma estrutura visual que mostre para o leitor o
que ainda há para ler. (HOELTZ, 2001).
Toda a estrutura gráfica do impresso deve colaborar para que o ritmo
de leitura flua com leveza fazendo com que a atenção do usuário fixe-se naquele
universo literário e o desejo de “ler só mais um capítulo” seja constante. Este
desejo deve ser estimulado pelo texto e reforçado pelo gráfico. Mesmo que o
leitor sinta que está avançando na leitura, o impresso deve dar pistas de que as
páginas não lidas contêm informações muito mais interessantes do que as que
ele já leu.
Com base nas informações apresentadas acima, é importante notar
que o ritmo editorial pode proporcionar uma experiência de leitura agradável para
uma obra como ​Dom Casmurro,​ uma vez que a narrativa dispõe de vários
elementos textuais que podem ser traduzidos9 de forma abrangente através do
design gráfico, como o uso de ilustrações, a diagramação dos ​grids dentro das
páginas de uma forma que não sufoque o leitor com manchas gráficas muito
pesadas, e a variação dos ​grids dentro de um livro, dando movimento aos olhos
ao longo de toda a leitura, fazendo com que o público sinta que está avançando.
Para que este projeto tenha um bom desenvolvimento, faz-se
necessário o uso de uma metodologia para estabelecer, de uma forma prática,
quais são os passos que precisam ser seguidos para a construção da proposta de
design editorial para a obra de ​Dom Casmurro.​ A seguir serão descritos os
procedimentos metodológicos que guiaram o desenvolvimento do projeto gráfico.

9
Neste caso, a tradução refere-se ao conceito de semiótica, que trata “a tradução de uma
informação por outra linguagem” (MACHADO, 2003, p. 163 apud. NAKAGAWA; NAKAGAWA,
2017, p. 3).
12

2 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

O presente estudo é classificado como pesquisa aplicada, em sua


natureza; pesquisa qualitativa, em sua forma de abordagem do problema;
pesquisa exploratória, do ponto de vista com os seus objetivos; pesquisa
bibliográfica, do ponto de vista dos procedimentos técnicos. (SILVA; MENEZES,
2001).
O projeto gráfico foi desenvolvido por meio da metodologia proposta
por Löbach (2001), criada para elaborar produtos industriais. Esta metodologia foi
aplicada ao projeto pois é uma metodologia bastante útil no campo do design
gráfico. A estrutura conta com quatro fases, que são nomeadas: análise do
problema; geração de alternativas; avaliação de alternativas e resolução do
problema. Cada uma das etapas levanta e discute pontos importantes para a
elaboração da peça. Como um projeto editorial de livro é considerado um produto,
a escolha desta metodologia ajuda a estabelecer melhor para qual solução
chegar.

2.1 Fase 1: Análise do problema.

Löbach (2001) afirma que é necessário ter pleno conhecimento do


tema abordado, coletando informações referentes a ele sem fazer o uso de
censura, sem deixar de lado nenhum dado relacionado ao problema.
Com as informações levantadas, faz-se uma análise do relatório
elencando o que é importante dentro do desenvolvimento do projeto. É neste
momento em que começa a filtrar quais dados podem ser relevantes dentro do
problema estabelecido, como por exemplo o consumidor final, que tipo de
material será utilizado para o desenvolvimento do produto, onde este produto será
fabricado e onde este produto será distribuído. No último ponto, constrói-se por
fim a definição do problema e definição das metas a serem cumpridas (LÖBACH,
2001).
13

O objetivo desta pesquisa é desenvolver uma proposta de


diagramação fazendo uso do conceito de ritmo editorial a partir da análise da
narrativa. Portanto, os aspectos que alimentam a questão central do livro foram
apresentados no item ​1.1 O enigma de Capitu em Dom Casmurro de Machado de
Assis nesta pesquisa. Foram apresentados os elementos do texto que sustentam
possibilidades de defesa de ambos os personagens centrais que contemplam a
dúvida do adultério.
O estudo de Helen Caldwell (2001), ​O Otelo Brasileiro de Machado de
Assis,​ que foi utilizado na fundamentação teórica, será o norte do projeto, para
levantar informações importantes dentro da narrativa e assim propor elementos
da revisão do ritmo. No estudo, Caldwell analisa a história de Machado,
comparando com ​Otelo de William Shakespeare, e como a narrativa machadiana
tem ligações com este drama inglês - os personagens de ambas histórias, a
apresentação deles, como eles se comportam - argumentando quais são os
pontos interessantes dentro da narrativa de Machado e como a referência de
Shakespeare é importante para a obra. Este estudo de Caldwell é uma referência
importante entre os estudos apresentados para a obra, e conforme explica
Machado10 (2002) “o trabalho de Caldwell deflagrou o grande debate da literatura
brasileira, virou ponto de referência incontornável dos estudos machadianos”.
É importante compreender o enredo para que a construção gráfica do
miolo do livro tenha em suas páginas elementos que complementam o texto de
forma harmônica e agradável aos olhos. Isto é, a construção do miolo do
impresso tenha uma identidade visual valorosa, com ilustrações que
complementam o texto e não sejam apenas um apelo estético, mas apresentados
em momentos importantes dentro da narrativa do livro e ajudem o leitor a
compreender a dimensão desta história.
Por tanto, houve uma análise das propostas gráficas de outras edições
da mesma obra, localizadas na biblioteca Sebastião Netto Campos, dentro da
faculdade Satc em Criciúma/SC, por ser uma biblioteca acessível à pesquisadora.

10
MACHADO, Cassia Elek. “Livro clássico de 1960 sobre "Dom Casmurro" chega agora ao Brasil
Capitu ganha "advogada de defesa" californiana”. Acessado em 07/07/18.
[https://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrad/fq0911200211.htm]
14

A análise destas edições vem com um intuito de traçar um paralelo entre o ritmo
editorial de edições já existentes em relação ao que poderia ser, levando em
consideração que esta obra é muito importante para a literatura nacional e ainda
é estudada por pesquisadores e profissionais da área de letras.
Finalmente, foi realizada a análise de capítulos e da narrativa do
personagem do livro ​Dom Casmurro,​ junto com o estudo de Caldwell e outros
autores citados na fundamentação teórica, a fim de levantar elementos que
podem ser trabalhados de uma maneira diferente dentro da construção da
diagramação do texto.

2.2 Fase 2: Geração de alternativas.

Segundo Löbach (2001, p. 150), o conceito de geração de alternativas


“é a fase da produção de ideias baseando-se nas análises realizadas”.
Analisando um problema, tem-se com mais clareza dentro da mente o que está
inadequado dentro de um projeto gráfico. Neste ponto, também é importante
permitir ao designer que ele crie sem impedimentos, sem filtros; o processo
criativo não é exato e nem sempre ocorre duas vezes da mesma maneira. Há
também a possibilidade de trabalhar com tentativa e erro, usar técnicas criativas
para que o projeto saia do campo imaginário do designer e entre no mundo real.
Nesta etapa, foram desenvolvidas propostas de espelhos editoriais
levando em consideração momentos importantes dentro da narrativa de ​Dom
Casmurro que reforçam o enigma de Capitu - para que auxilie o leitor a responder
a pergunta “Capitu traiu ou não traiu Bentinho?”.
Os espelhos editoriais são um desenho das páginas para estabelecer,
a partir da análise do conteúdo, como se dará a disposição do texto em relação a
página. Como por exemplo onde uma ilustração é interessante, que elemento do
texto pode se transformar em um gráfico, onde se dispõe a numeração da página,
que cores serão utilizadas e como tudo isso compõe o ritmo editorial, fazendo
com que o livro não se torne apenas texto atrás de texto. Estes conceitos foram
apresentados no item ​1.2 Ritmo editorial e ilustrações deste estudo, e serão
utilizados para estabelecer como será apresentada a proposta do livro.
15

Houve uma pesquisa de ordem gráfica para a geração de alternativas


utilizando a plataforma Pinterest11, para ter uma referência visual de como
indumentárias, mobiliário e os personagens são descritos dentro do texto. As
ilustrações presentes dentro do miolo do livro devem corresponder a época em
que se passa a história, e também a arte gráfica do livro, a identidade visual dele:
como os elementos são apresentados, como o texto e a estética contam em
paralelo a narrativa, sendo a imagem um complemento ao texto.

2.3 Fase 3: Avaliação das alternativas.

Nesta fase, segundo Löbach (2001), se discute e analisa qual das


soluções é a melhor dentro da proposta do projeto. No caso deste estudo, após o
desenvolvimento da pesquisa de imagens de referência de diagramação de livros
dos mais diversos conteúdos, foi feito um filtro onde as referências se alinhariam
e resultam em uma diagramação única; ou seja, foi estabelecido qual seria a
direção de arte que melhor imprimisse o conteúdo não-verbal que representasse
de forma correta o conteúdo verbal do livro.
Para isto, foram desenvolvidas pesquisas que direcionaram o projeto -
o verbal com o não-verbal - em relação às cores, as ilustrações, a interação dos
personagens nas cenas ilustradas, que elementos do texto seriam trazidos para a
página para completar o texto de Machado de Assis a partir dos resultados da
geração de alternativas descritas no tópico anterior.

2.4 Fase 4: Realização da solução do problema.

Na última fase da metodologia do Lobach (2001), é a fase na qual é


desenvolvida a solução do problema e que neste caso é a diagramação do livro
por si mesma, que será apresentada a seguir.

11
A pesquisa citada pode ser acessada através do link:
[https://br.pinterest.com/leticiaemerim/dom-casmurro/]
16

3 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

Nesta fase serão apresentados os resultados das pesquisas através da


metodologia do Löbach (2001) e, posteriormente, analisados e discutidos quais os
resultados de pesquisa, apresentando por fim, a proposta gráfica editorial para o
livro ​Dom Casmurro​ de Machado de Assis.

3.1 Fase 1: Análise do problema

A construção do clássico ​Dom Casmurro foi inspirada na obra de


Shakespeare, ​Otelo,​ e há uma influência direta na narrativa e tem referências a
esta obra ao longo do enredo. Não é um segredo a influência do escritor inglês
para Machado de Assis e funciona como um ​easter egg12 para os leitores atentos.
Otelo é um romance que termina em tragédia, motivada por uma crise severa de
ciúmes. Machado coloca os personagens do autor inglês dentro dos próprios,
conforme apresentado no item 1.1 desta pesquisa, em uma intertextualidade que
amplia a história.
Dentro da obra de Shakespeare, conforme explica Morais13 (2018),
Otelo é um homem apaixonado por Desdêmona, que acredita em uma mentira
contada por Iago, que alimentava uma inveja por Otelo mas mostrava-se um
amigo leal ao homem. Iago disse que a sua esposa Desdêmona o traía e então
Otelo movido por ciúmes, mata sua esposa, apesar da sua inocência.
Na narrativa de Machado de Assis, Bento não é só Dom Casmurro, é
uma fusão de Otelo e Iago, enquanto Capitu é Desdêmona. Com isso em mente,
a narrativa se constrói com momentos em que Capitu é apresentada por uma
ótica apaixonada e em outros momentos ela é apresentada como “oblíqua e
dissimulada”. E conforme afirmou Moriconi (2008), apresentado no item 1.1,
Capitu é uma das personagens-mulher de papel apresentadas sob óticas
masculinas dentro da literatura brasileira, que o público não conhece de verdade.

12
“Easter egg” é um termo utilizado na páscoa estadunidense, onde os pais escondem os ovos
para os filhos, com o propósito de fazê-los procurar. Acessado em 18/05/18
[https://canaltech.com.br/internet/Easter-Eggs-voce-sabe-o-que-sao/].
13
MORAIS, Erik. “Shakespeare e Psicanálise – Inveja e ciúme em Otelo” acessado em
13/05/2018. [https://www.contioutra.com/shakespeare-e-psicanalise-inveja-e-ciume-em-otelo/]
17

E por fim, quem deve ser realmente julgado são estes homens pelos leitores de
suas histórias.

3.1.1 Análise da estrutura editorial

Alguns capítulos do livro norteiam de forma mais abrangente os


argumentos que comprovariam a culpa ou a inocência de Capitu. Estes serão
apresentados a seguir com alguns comentários da pesquisadora. Os principais
tópicos são levantados e discutidos por Caldwell (2001) em seu livro sobre a obra
e os outros estudos citados no item 1.1 deste artigo. Todos os capítulos foram
apresentados e discutidos em uma tabela presente no anexo A deste artigo.
Abaixo (Quadro 1) estão os respectivos capítulos e títulos que dentro desta
proposta editorial constarão ilustrações das cenas, por serem capítulos muito
relevantes para a narrativa.

Quadro 1 ​- O enigma de Capitu.

XIV (quatorze) A inscrição O título do capítulo refere-se ao que Capitolina fez no muro de
sua casa com um prego: escreveu os nomes de Bento e
Capitolina, e a menina ao notar que Bento lera a inscrição, fica
em silêncio que denuncia o interesse dela por ele. Então,
ambos descobrem-se apaixonados.
XVIII (dezoito) Um plano Bentinho conta a Capitu a promessa de sua mãe de fazê-lo um
padre, e a menina explode proferindo ofensas a mãe de
Bentinho. Ao final do capítulo, Capitu elabora um plano para
salvar Bentinho de tornar-se um padre.
XXV (vinte e No Passeio Em um passeio, Bentinho súplica a ajuda de José Dias para
cinco) Público livrar-se do seminário, confessando que preferia estudar direito
em São Paulo ou ser cocheiro de ônibus; padre não. Com uma
possível viagem à Europa a fim de acompanhar o garoto em
seus estudos, José Dias promete falar com D. Glória. Neste
capítulo, José Dias “não planta apenas as sementes do amor
em Bentinho; ele planta também a suspeita de que Capitu
estaria tramando e acabaria por enganá-lo” (CALDWELL,
2001, p. 25).
XXXIII (trinta e O penteado Aqui, Capitu e Bento tem a sua primeira interação romântica
três) após a descoberta do amor recíproco. Bento penteia os
cabelos de Capitu, que está sentada em uma cadeira. Ela
inclina a cabeça para trás e ambos se beijam. Logo após, a
mãe de Capitu entra; Capitu faz uma cena que desvia a
atenção da mãe para o que realmente estava acontecendo e
18

avisa que o padre espera por Bentinho para sua aula de latim.
XLVIII Juramento do Após fazerem as pazes, Capitu e Bentinho mudam os seus
(quarenta e poço juramentos, prometendo então que um casaria com o outro.
oito)
LVI (cinquenta Um seminarista Aqui é apresentada a vida ao seminário e ao personagem
e seis) Escobar, que veio a ser o melhor amigo e confidente de
Bentinho.
LXV (sessenta A dissimulação Aqui, Bentinho narra que tem se aproximado de Escobar e
e cinco) deseja contar a ele suas penas e esperanças. Capitu o
impede. Após, na casa de Bentinho, Capitu afirma que espera
que ele se ordene padre. Em um diálogo de ambos, eles
afirmam: “—Você tem razão, Capitu, concluí eu; vamos
enganar toda esta gente. —Não é? disse ela com
ingenuidade.” (ASSIS, 1899, p. 71).
LXXVIII Segredo por Bentinho confessa para Escobar a sua angústia: não pretendia
(setenta e oito) segredo ordenar-se padre por amar Capitu. Em troca, Escobar
confessa que também não pretende tornar-se padre, e que
desejava trabalhar no comércio.
LXXXI (oitenta Uma palavra A melhor amiga de Capitu, Sancha, adoece e a menina vai até
e um) a casa para cuidar dela. A conselho de D. Glória, Bentinho vai
até a casa visitar Sancha e Capitu.
XCIII (noventa Capítulo Bentinho e Escobar, ao seminário, brincam de fazer contas.
e três) XCIII/Ideias Escobar se apresenta como um excelente matemático, o que
aritméticas explica a sua paixão pelo comércio. Também nos é
apresentada a dimensão da riqueza que D. Glória possuia.
C (cem) No céu Bentinho conta que Capitu ansiava descer a serra e voltar para
o dia a dia. “tudo me mostrou que a causa da impaciência de
Capitu eram os sinais exteriores do novo estado. Não lhe
bastava ser casada entre quatro paredes e algumas árvores;
precisava do resto do mundo também.” (ASSIS, 1899, p. 103).
CIX (cento e Rasgos da Neste capítulo, Bento descreve Ezequiel aos seis anos de
nove) infância idade, como um rapaz que não desmente os sonhos que ele
projetou em um filho que gostaria de ter. Inclusive, notara no
menino alguns trejeitos que via na mãe dele, Capitu, quando
ela era criança. Ele relata também o esquecimento de Capitu
sobre a toada cantada por um negro que vendia doces na
infância de ambos. Porém, no capítulo LIX ele confessa que
não tem boa memória, e ainda assim cobra uma lembrança de
Capitu da infância.
CXI (cento e Embargos de Bentinho conta que os seus ciúmes, apesar do filho e dos
onze) terceiro anos, ainda continuavam presente. Conta também que um
costume do casal era ir ao teatro, e lembra de uma vez que foi
sem ela. Capitu dizia que não estava se sentindo bem para ir,
mas quis que o marido fosse. Bentinho volta no primeiro ato e
encontra Escobar na porta de casa. Ele afirma que vinha falar
com o amigo sobre um fato importante que ocorreu no
comércio, mas não queria incomodar o amigo. Bentinho
19

insistiu que entrasse - se Capitu estivesse ruim, ele poderia ir


embora. Capitu estava boa e disse que pareceu estar pior para
que ele não deixasse de ir ao teatro.
CXIV (cento e A mão de Ambos, Sancha e Santiago compartilham um momento de
quatorze) Sancha pecado ao desejar um ao outro neste capitulo. "Sancha e
Santiago (segundo este nos conta) trocando olhares e
apertando reciprocamente as mãos. E ele admite ter, um dia,
pensado nela "como se pensa na bela desconhecida que
passa", e suspeita que ela percebe e até mesmo corresponde
aos seus sentimentos" (CALDWELL, 2002, p. 111). No
capítulo seguinte a este, Bento pede perdão para a leitora que
lê a sua obra, e afirma que mudará de rumo ao seguir a
história.
CXXI (cento e Olhos de Este é o capítulo onde o ciúmes de Bento e as desconfianças
vinte e um) ressaca de que Ezequiel não seja seu filho começam. Sancha, Bento e
Capitu estão abatidos com a morte do amigo, como é natural.
Ao redor do caixão, Sancha lavava o rosto com lágrimas,
assim como as outras pessoas; porém Capitu "parecia vencer
a si mesma" (ASSIS, 1899, p. 121). Ao notar, suas lágrimas
cessaram e ficou observando as dela. Conforme Bento
descreve "Momento houve em que os olhos de Capitu fitaram
o defunto, quais os da viúva, sem o pranto nem palavras
desta, mas grandes e abertos, como o mar lá fora, como se
quisesse tragar também o narrador da manhã" (ASSIS, 1899,
p. 121).
CXXXIII (cento Otelo Bento vai ao teatro e a peça é Otelo, de Shaskespeare. A
e trinta e três) intertextualidade apresentada entre a narrativa inglesa com a
brasileira não se dá ao acaso; é Machado de Assis
apresentando para o público a fonte da onde bebera a idéia de
seu Dom Casmurro. Bento fica espantado em como as coisas
se dão nesta história e escreve "Vi as grandes raivas do
mouro, por causa de um lenço. —um simples lenço!—e aqui
dou matéria à meditação dos psicólogos deste e de outros
continentes, pois não me pude furtar à observação de que um
lenço bastou a acender os ciúmes de Otelo e compor a mais
sublime tragédia deste mundo. Os lenços perderam-se. hoje
são precisos os próprios lençóis" (ASSIS, 1899, p. 129) Ao
final da peça, todos aplaudem, e Bento se pergunta o que o
público faria se Desdêmona fosse culpada e se reagiria da
mesma maneira.
CXXXVI (cento Capitu que Bento e Capitu discutem. A ideia de que Escobar é o
e trinta e seis) entra verdadeiro pai de Ezequiel é exposta durante a discussão e
Capitu exclama que "Pois até os defuntos! Nem os mortos
escapam aos seus ciúmes!" (ASSIS, 1899, p. 132). Bento
descreve que Capitu não aguentaria mais aquela relação. A
acusação de adultério é a gota d'água e determina o fim do
relacionamento de ambos. Ao final do capítulo, Capitu
confessa saber a razão da desconfiança de Bentinho, pela
"casualidade das semelhanças".
20

CXLIII (cento e O regresso Os anos se passam, Capitu morreu e Ezequiel veio em busca
quarenta e do pai. Pela descrição de Bento, era quase como ver um
três) fantasma; ele via em Ezequiel o companheiro do seminário,
um retrato vivo de Escobar. Este capítulo pode ser comparado
ao capítulo XCVIII, que relata a volta de São Paulo para o Rio
de Janeiro, quando Bento se torna bacharel em direito. D.
Glória olha para ele e vê o seu falecido marido. Todos ao redor
concordam com a semelhança dele com o pai. E esta
característica falta entre Ezequiel e Bento. Bento não se vê no
garoto, muito pelo contrário; ele vê Escobar se sentando para
comer "com a cara metida no prato" (ASSIS, 1899, p. 137).
Portanto, dentro da construção deste capítulo, há as
confirmações das suspeitas de Bento.
Fonte: Da autora.

3.1.2 Análise de edições anteriores

As sete edições do livro em questão são das seguintes editoras:


editora L± editora FTD; editora Escala Educacional; editora Martin Claret;
editora Moderna; editora Ática; editora Globo.

Figura 3: Edições de ​Dom Casmurro​ analisadas.

Fonte: Da autora.

Em questão de ritmo editorial, todas as edições apresentam os


números romanos quando o capítulo se inicia, e as edições das editoras Martin
Claret e FTD, contam com o recurso de letra capitular da primeira palavra que
abre o capítulo. O livro da editora L&PM tem o nome do livro e o do autor no
cabeçalho do livro. Um recurso interessante e diferente entre as edições
analisadas, se destaca a edição da L&PM, que mostra um mapa do Rio de
Janeiro da época da história.
21

Foram escaneadas as aberturas de capítulos XIV, XVIII e XXV para


compará-las esses capítulos entre as edições analisadas. A escolha deles
capítulos em específico embasaram-se em sua importância para o começo da
construção do enigma de Capitu.

Figura 4 - Mapa do Rio de Janeiro.

Fonte: Imagem retirada do livro publicado pela editora L&PM.

O livro da editora FTD tem um ritmo editorial mais interessante entre as


edições abordadas para este estudo. Os capítulos dispõem de um grande espaço
em branco o que deixa as manchas gráficas dispostas mais leves e mais fáceis
de serem lidas. Além disso, com o folhear das páginas, o preto dos capítulos,
sempre dispostos em locais diferentes ao decorrer da narrativa, destacasse em
relação ao texto, por ter uma fonte em negrito.
22

Figura 5 - Digitalização do livro ​Dom Casmurro​ da editora FTD.

Fonte: Da autora.

Dessa forma, as edições apresentadas neste estudo contêm poucos


recursos de ritmo editorial na sua diagramação, que poderia ser mais explorada,
dado ao texto muito rico e cheio de opções para ser explorados de forma gráfica.
Nenhuma edição contém ilustrações no miolo e algumas delas não
fazem uma variação grande de tipografia e o seu tamanho para colocar as notas
de rodapé, o que pode causar confusão no leitor que terminaria de ler o capítulo e
seguiria lendo o comentário, sendo que a narrativa e a nota contém informações
diferentes. Ainda que estas considerações tratem de assuntos relevantes para a
23

compreensão da história, a falta de diferenciação tipográfica afeta na experiência


de leitura do usuário, que pode optar por ler ou não as notas inseridas.
Ainda que algumas publicações trabalhem de forma sutil o conceito de
ritmo editorial, nenhuma delas se aprofundam ao longo da diagramação, que
pode fazer com que o leitor perca o interesse pela narrativa e abandone o livro.

3.2 Fase 2: Geração de alternativas

Para este estudo, é importante analisar dentro do texto de Machado de


Assis todos os elementos que condenam ou absolvem Capitu de seu julgamento
ao final da narrativa de Bentinho, Moriconi (2008) apresentou em seu artigo
argumentos que sustentam a desconfiança do narrador principal desta história,
porém, não há como saber se Bento conta toda a verdade, ou se oculta parte da
sua história em benefício de se explicar para os outros.
Dessa forma, conforme apresentado no item 1.2, os conceitos de ritmo
editorial guiaram o processo de construção gráfica do livro de Dom Casmurro, em
uma proposta onde o enigma será o motivo central da narrativa.
O princípio da construção desse design editorial ocorreu - por meio do
desenho de espelhos editoriais - que são desenhos no papel definindo onde fica
disposto a mancha do texto, como utilizar uma ilustração em uma determinada
página levando em consideração a posição de outros elementos na página
anterior.
Para isso, foi definido que a direção de arte do editorial seria a
construção de um manuscrito de um livro, isto é: uma versão do livro antes de
este ir para uma editora e passar por revisões. Portanto, foram feitos usos de
tipografias que imitam caligrafia para transmitir a mensagem descrita no capítulo
II do livro, onde o narrador conta que sente a necessidade de pegar a pena14
colocar no papel memórias que viessem a cabeça.

14
Devido à época da narrativa, “pena” neste caso é um instrumento de escrita, como uma caneta.
24

Figura 6: Espelho editorial do capítulo I ao capítulo XV.

Fonte: Da autora.

Figura 7: Painel semântico do aplicativo Pinterest.

Fonte: Da autora. Disponível em:


[https://br.pinterest.com/leticiaemerim/dom-casmurro/diagrama%C3%A7%C3%A3o-do-livro/]

Em relação às ilustrações, foi desenvolvida uma pesquisa de


indumentária masculina e feminina da época em que se passa a história para que
as imagens passem verossimilhança com o conteúdo escrito. Foi realizada uma
pesquisa com referências de poses para desenhos de casais, crianças, um grupo
de amigos etc, como um material de apoio para o ilustrador e como uma
ferramenta de direção de arte para guiar o livro em torno da narrativa.
25

Figura 8: Painel de referência de ilustrações de personagens.

Fonte: Da autora. Disponível em:


[https://br.pinterest.com/leticiaemerim/dom-casmurro/poses-de-refer%C3%AAncia/]

E por fim foram feitos pedidos de ilustrações para o profissional Sávio


Nobre Araújo, de cenas dos seguintes capítulos: XIV - A inscrição; XXVIII - Um
plano; XXV - No Passeio Público; XXXIII - O penteado; XLVIII - Juramento do
poço; LVI - Um seminarista; LXXV - O desespero; LXXXVIII - Segredo por
segredo; XCIII - Idéias aritméticas; C - No céu; CIX - Rasgos da infância; CXI -
Embargos de terceiro; CXVI A mão de Sancha; CXXI - Olhos de ressaca; CXXXIII
- Otelo; CXXVI - Capitu que entra; CXLIII - O regresso.
Todos esses capítulos têm uma importância grande dentro da narrativa
e foram destacados no item 3.1.1 desta pesquisa. Em anexo consta na tabela
com os outros capítulos da história completa, e os outros capítulos contam com
outros elementos de diagramação, e não necessariamente ilustrações de cenas.
E, nos capítulos onde uma ilustração é necessária, foi pedido ao ilustrador que
recorresse a essa pasta na plataforma Pinterest quando fosse desenhar as cenas
do livro que forem solicitadas.
Em todas as ilustrações foram pedidos pontos centrais das cenas que
são descritos ao longo do texto, como, por exemplo, na primeira ilustração do
livro, presente no Capítulo XIV - A inscrição, foi pedido para o ilustrador que
colocasse os personagens alguns instantes antes de eles darem as mãos um
26

para o outro, a fim de criar a expectativa no leitor de um beijo, algo que não
acontece, pois o pai da moça chega logo em seguida.

Figura 9: Ilustração proposta para o capítulo XIV.

Fonte: Do ilustrador Sávio Nobre Araújo.

As entradas de capítulos são compostos por páginas duplas com as


numerações em romanos, conforme a publicação original da obra. A escolha foi
colocar esse números com uma mancha gráfica grande, pois os números
romanos crescem e diminuem visualmente com bastante frequência. O número 1
em romanos é representada pela grafia I; o número 2 pela grafia II. Ou seja,
conforme o número cresce, cresce também a sua grafia visualmente. Tanto que o
número 38 é representado pela grafia XXXVIII, que na diagramação do livro
ocupa quase as duas páginas por completo e, dois capítulos depois, o número 40
é representado pela grafia XL. A composição visual cresce e diminui em uma
constante de dez em dez capítulos, mais ou menos, o que colabora para o
conceito de ritmo editorial.
27

Figura 10: Proposta de abertura de capítulo para o capítulo XIX.

Fonte: Da autora.

Figura 11: Proposta de abertura de capítulo para o capítulo XX.

Fonte: Da autora.
28

3.3 Fase 3: Avaliação das alternativas

As ilustrações foram elaboradas pensando em confundir o leitor, para


deixá-lo tirar as suas conclusões conforme a leitura vai avançando. As entradas
de capítulos também devem colaborar para este processo, uma vez que algumas
dessas entradas apresentaram pequenas ilustrações que norteiam o capítulo,
manchas de tinta, gotas de sangue, frases escritas e borradas, etc. Todos esses
elementos estão diretamente ligados ao texto e a narrativa.
Outro recurso utilizado nas entradas de capítulos é o uso das cores
branco, preto e amarelo. O preto é utilizado na tipografia que imita uma caligrafia,
para remeter ao leitor o conceito do livro apresentado no capítulo II, em que o
narrador conta que decidiu pegar a pena e escrever. As páginas amarelas contêm
o números romanos em branco e as páginas brancas contêm os números
romanos em amarelos. Entre essas duas estruturas há a variação de cinco em
cinco, isto é: os capítulos dois, três e quatro são páginas brancas com tipografias
amarelas. E os capítulos cinco, dez, quinze são páginas amarelas com tipografias
brancas. A quebra desta regra ocorre no primeiro e no último capítulo, para
favorecer o ritmo editorial.
O sangue, dentro do capítulo LXXV, simula um dos ataques de ciúmes
sentidos por Santiago, em um momento que ele se vê estrangulando o pescoço
de Capitu por imaginá-la o traindo. Em outros momentos, descritos no espelho
editorial proposto (figura 6), serão colocados elementos que remetem ao amor, ao
carinho, como no capítulo em que ambos se casam no capítulo CI, em que a
abertura de capítulo apresenta um floral. Este floral, no entanto, será composto da
flor Jacinto em amarelo. Houve uma pesquisa com relação aos significados de
flores, e foi descoberto que a flor ​Hyacinthus orientalis tem diversos significados
conforme a variação de sua cor (entre eles estão tristeza profunda, pedido de
desculpas, falsidade, humildade...)15 e esta flor na cor amarela representa inveja
ou ciúmes, quando estas são dadas de presente para alguém.

15
Estes significados foram retirados da matéria “Confira o significado destas 30 flores antes de dar
uma de presente”. Acessado em 04/05/2018
[https://noticias.bol.uol.com.br/bol-listas/confira-o-significado-destas-30-flores-antes-de-dar-uma-d
e-presente.htm].
29

Figura 12: Proposta de abertura de capítulo para o capítulo V.

Fonte: Da autora.

Figura 13: Proposta de abertura de capítulo para o capítulo LXXV.

Fonte: Da autora.

O ritmo editorial se dá com o folhear das páginas ao longo de toda a


estrutura do livro. São 146 capítulos no total do livro, e todos contaram com
entradas de páginas duplas, alguns ilustrações e tipografias que estão ligadas
30

diretamente ao contexto do capítulo em específico. A direção de arte está voltada


para a “produção de um diário”, que está ligado ao conceito de que Bento coloca
no papel as suas memórias conforme elas vem vindo para a cabeça dele,
exprimindo suas memórias em um livro, conforme Machado de Assis explica no
capítulo 2 chamado “do livro”, “vou deitar ao papel as reminiscências que me
vierem vindo” (1899, p. 3). A escolha do uso da cor amarela nesta proposta de
diagramação vem do capítulo “Convivas de Boa Memória”, onde ele descreve que
não gosta da cor amarela. A opção vem com o intuito de deixar o leitor com a
dúvida de por que o livro é amarelo se o protagonista não gosta desta cor.
Além disso, o livro conta com um tamanho de 20 centímetros de altura
com 25 centímetros de largura, deixando o livro mais quadrado, o que muda toda
a estrutura interna e a mancha gráfica do texto fica mais centralizada, o que faz
com que o leitor leia mais rapidamente já que a mancha é menor e contém menos
texto em uma página. Há pequenas manchas com pequenos textos em uma
coluna lateral ao texto do Machado, sendo que esta coluna que contém as
informações dos significados das palavras que estão distantes do vocabulário do
brasileiro do século 21. Essas palavras estão alinhadas conforme são
apresentadas dentro do texto, portanto, pequenas caixas de texto serão dispostas
na coluna lateral do livro, fazendo com que o folhear do livro apresente diferentes
caixas, em alturas diferentes com textos curtos, médios e longos, o que faz com
que ao virar a página, o leitor tenha uma nova mancha gráfica dentro da página e,
assim, o gráfico não se torna uma estrutura repetitiva ao folhear as páginas, mas
com uma variação que torna o passar de páginas com altos e baixos, fazendo
com que o leitor fique curioso com o que vem a seguir.
Os significados dessas palavras podem auxiliar o leitor a compreender
melhor a narrativa do texto em um primeiro momento, sem utilizar o recurso da
releitura para compreender melhor. Além de significados de palavras, há a
possibilidade de fazer pequenas explicações sobre referências utilizadas pelo o
autor ao longo do livro, contextualizando o leitor atual de como era a sociedade
daquela época que ajudaria o público a concentrar-se melhor na obra.
31

Figura 14: Proposta de diagramação para o capítulo XII.

Fonte: Da autora.

Figura 15: Proposta de diagramação para o capítulo XII.

Fonte: Da autora.

3.5 Fase 4: Realização da solução de problemas

Portanto, com esta proposta de diagramação para a obra ​Dom


Casmurro de Machado de Assis, ​pode fazer com que o texto seja lido mais
rapidamente, apesar do número de páginas ser superior do que outras
publicações da obra presente no mercado, e com o auxílio dos elementos gráficos
32

descritos anteriormente, a imersão na história fica maior e pode ajudar uma


pessoa jovem e com um vocabulário pouco extenso a compreender a obra e
realizar os seus estudos sem grandes problemas com a interpretação de texto.
Com o uso dos conceitos de ritmo editorial, a diagramação ganha
“altos” e “baixos” pois em alguns capítulos há o uso de muitos ​grids em diferentes
posições e em outros há apenas o texto de Machado de Assis. Não são todos os
capítulos que apresentam ilustrações de cenas e há a variação de entradas de
capítulos com páginas brancas e tipografias amarelas e páginas amarelas com
tipografias brancas.
A quantidade de notas nas laterais da página e como o conteúdo delas
varia, também gera sensação de ritmo editorial, pois cada uma dessas
observações na lateral da página fica na altura da palavra ou do conceito
apresentado pelo autor. Assim, quando o público se depara com aquele conceito
que é distante para ele, ao lado se encontra uma breve explicação ou a
apresentação da referência e essa explicação pode ser curta ou extensa,
dependendo do que se refere.

Figura 16: Proposta de diagramação para o capítulo XIV.

Fonte: Da autora.
33

Figura 17: Proposta de diagramação para o capítulo XIV.

Fonte: Da autora.

Essa variação de quantidade de informação impressa no papel faz com


que o ritmo de leitura avance mais rapidamente, além de atribuir a publicação
uma identidade exclusiva, devido ao uso de cores, ilustrações e tipografias que
são pouco comuns em livros clássicos brasileiros, e que pode quebrar o senso
comum de que livros antigos são chatos.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O objetivo deste artigo era desenvolver uma proposta de diagramação


de livro com uso do conceito de ritmo editorial, fazendo com que o leitor sinta-se
instigado a ler apenas por observar a página. Os elementos que constam na
diagramação foram retirados do texto, após uma análise de quais capítulos
sustentam o enigma de Capitu. Portanto, a variação gráfica dos elementos que
compõe a página de um livro na diagramação constroem o ritmo editorial da
publicação onde a aliança do conceito com a análise do texto entregam a
proposta apresentada neste artigo.
A construção gráfica do livro é como uma montanha russa de
informações visuais; em alguns momentos muitos ​grids e em outros com o uso de
34

variação tipográfica e ilustrações. Ou seja, a variação de informações e a


mudança de cores ao longo do livro pode criar no leitor uma expectativa e
interesse em continuar lendo-o para descobrir o que vem a seguir.
Contudo, os pontos a seguir ficaram em aberto durante o
desenvolvimento desta pesquisa devido ao curto tempo. Nem todas as ilustrações
foram produzidas, mas todos os momentos em que deve conter uma ilustração foi
representado dentro do editorial com uma página na cor rosa. Considero também
para esta proposta, que é necessário fazer um estudo sobre palavras do
vocabulário comum entre a população brasileira em 1899 e quais delas não são
comuns no vocabulário do brasileiro atualmente. Além disso, estudar a recepção
do público com a obra, a opinião dos leitores e se esta diagramação auxiliou a
compreensão do texto e da história. Seria interessante estudar também se os
elementos gráficos - as aberturas de capítulo, as cores, as ilustrações -
agradaram os leitores e se estes elementos auxiliam e não atrapalham durante a
leitura do conteúdo.
Por fim, considero que o objetivo da pesquisa de apresentar uma
diagramação onde o ritmo editorial se aliasse ao enigma de Capitu ocorreu de
forma interessante, ainda que esta proposta precisa ser trabalhada utilizando
conceitos e pesquisas de outras áreas do campo acadêmico de literatura e
design.

Agradecimentos

Agradecimentos que são muito longos e preenchem muitas páginas,


na minha opinião, nem sempre são escritos de todo o coração. Poemas, por outro
lado, com poucas palavras podem apresentar conceitos bastante profundos e
sinceros de seus autores.
Portanto, não irei me alongar, e farei o uso de um dos poemas de Rupi
Kaur, que ao meu ver exprimem os sentimentos controversos de Bentinho por
Capitu, escritos por Machado de Assis, ao colocar no papel algo que nunca
morrerá na alma humana - os encantos do primeiro amor, o desejo e o ciúme - e
que tanto me encantou durante toda a minha pesquisa.
35

“seu nome
é a conotação
positiva e negativa
mais forte em qualquer língua
ou ele me acende ou
me deixa dias em agonia”

REFERÊNCIAS

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2009.

ARAÚJO, Emanuel. ​A construção do livro.​ Rio de Janeiro: Lexikon Editora


Digital, 2008.

CALDWELL, Helen. ​O Otelo Brasileiro de Machado de Assis.​ São Paulo: Ateliê


Editora, 2002.

CARVALHO, Carolina Sá.​ ​Fotografia e Fantasmagoria em Dom Casmurro.


Machado de Assis Linhas​, Rio de Janeiro, v. 4, n. 8, p. 56-73, dez. 2011.

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<​https://blog.enem.com.br/dom-casmurro-na-uerj/​>. Acesso em: 22 maio 2018.

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2006.

HASLAM, Andrew. O livro e o designer.​ São Paulo: Edições Rosari, 2007.

HELLER, S. et. al. ​Linguagens do design: ​compreendendo o design gráfico. São


Paulo: Edições Rosari, 2007.
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______. ​Edição e design​:​ ​para designers, diretores de arte e editores. São


Paulo: JSN Editora, 2006.

ANEXOS

ANEXO A - O enigma de Capitu

Capítulo Título Comentários

Aqui é apresentado o motivo do título do livro ser um apelido bastante


conhecido entre os personagens que conhecem Bento Santiago. Ele pede ao
leitor que “Não consultes dicionários. Casmurro não está aqui no sentido que
eles lhe dão, mas no que lhe pôs o vulgo de homem calado e metido
I (um) Do título
consigo”. Se o leitor for desconfiado e buscar o significado da palavra,
descobrirá que esta significa “1. diz-se de ou indivíduo teimoso, obstinado,
cabeçudo; 2. diz-se de ou indivíduo fechado em si mesmo; ensimesmado,
sorumbático.”

Neste, Bento afirma que há em sua vida alguns “fantasmas” que o cercam,
fazendo uma citação de Fausto de Goethe. “Por que estas sombras estão
inquietas?” é uma pergunta levantada por Caldwell em seu estudo, onde a
II (dois) Do livro
autora afirma “a lenda diz que os fantasmas de homens assassinados
retornam para perseguir os seus assassinos; [...] Santiago é um assassino?
E quem eram esses fantasmas quando vivos?”.
Ao ouvir atrás da porta o seu nome, Bentinho fica escutando o que José
Dias, D. Glória, tio Cosme e prima Justina estão conversando. A denúncia
III (três) A denúncia em questão são os sentimentos de Bentinho pela vizinha, Capitu. E ele então
descobre os próprios sentimentos pela menina e que a denúncia é
verdadeira.

Neste, é apresentado para o leitor, um dos personagens da conversa na


sala. Bentinho conta quem foi tio Cosme e relembra um momento de sua
VI (seis) Tio Cosme vida em que seu tio tenta ensiná-lo a montar a cavalo. Naquele dia, ao nove
anos de idade de Bentinho, ele chora por sua mãe por medo do bicho, que é
descrito como “besta mansa” pelo tio.
O título do capítulo refere-se ao que Capitolina fez no muro de sua casa com
XIV um prego: escreveu os nomes de Bento e Capitolina, e a menina ao notar
A inscrição
(quatorze) que Bento lera a inscrição, fica em silêncio que denuncia o interesse dela por
ele. Então, ambos descobrem-se apaixonados.
O pai de Capitu chega e vê as crianças sérias, um olhando para o outro.
Outra voz
XV (quinze) Capitu improvisa uma cena que justificaria a pose de ambos, além de riscar
repentina
sob a inscrição um retrato do pai.

Bentinho conta a Capitu a promessa de sua mãe de fazê-lo um padre, e a


XVIII
Um plano menina explode proferindo ofensas a mãe de Bentinho. Ao final do capítulo,
(dezoito)
Capitu elabora um plano para salvar Bentinho de tornar-se um padre.

Em um passeio, Bentinho súplica a ajuda de José Dias para livrar-se do


XXV (vinte e No Passeio
seminário, confessando que preferia estudar direito em São Paulo ou ser
cinco) Público
cocheiro de ônibus; padre não. Com uma possível viagem à Europa a fim de
acompanhar o garoto em seus estudos, José Dias promete falar com D.
38

Glória. Neste capítulo, José Dias “não planta apenas as sementes do amor
em Bentinho; ele planta também a suspeita de que Capitu estaria tramando e
acabaria por enganá-lo” (CALDWELL, 2001, p. 25).
Ao visitá-la depois de conversar com José Dias, Bentinho lembra da
definição que ele dera aos olhos de Capitu. Bentinho então, os descreve:
XXXII (trinta e Olhos de “Retórica dos namorados, dá-me uma comparação exata e poética para dizer
dois) ressaca o que foram aqueles olhos de Capitu. Não me acode imagem capaz de dizer,
sem quebra da dignidade do estilo, o que eles foram e me fizeram. Olhos de
ressaca? Vá, de ressaca.” (ASSIS, 1899, p. 35)
Aqui, Capitu e Bento tem a sua primeira interação romântica após a
descoberta do amor recíproco. Bento penteia os cabelos de Capitu, que está
XXXIII (trinta sentada em uma cadeira. Ela inclina a cabeça para trás e ambos se beijam.
O penteado
e três) Logo após, a mãe de Capitu entra; Capitu faz uma cena que desvia a
atenção da mãe para o que realmente estava acontecendo e avisa que o
padre espera por Bentinho para sua aula de latim.
Aqui, Bentinho pensa em confessar a mãe que não tem vocação para ser
padre e o seu amor por Capitu. E afirma: “A imaginação foi a companheira de
XL (quarenta) Uma égua toda a minha existência, viva, rápida, inquieta, alguma vez tímida e amiga de
empacar, as mais delas capaz de engolir campanhas e campanhas,
correndo.” (ASSIS, 1899, p. 45).

Porém, logo que chega ao quarto da mãe, muda de ideia e não confessa. Diz
que teme a separação dele com a mãe e que só gosta dela. “Não houve
cálculo nesta palavra, mas estimei dizê-la, por fazer crer que ela era a minha
XLI (quarenta A audiência
única afeição; desviava as suspeitas de cima de Capitu. Quantas intenções
e um) secreta
viciosas há assim que embarcam, a meio caminho, numa frase inocente e
pura! Chega a fazer suspeitar que a mentira é muita vez tão involuntária
como a transpiração.” (ASSIS, 1899, p. 46).

Em uma discussão de Capitu e Bentinho, numa projeção de que não haveria


XLIV saída e Bentinho iria tornar-se padre, Capitu aceita uma das duas propostas
O primeiro
(quarenta e de Bentinho de confessar-se apenas com ele; a segunda era Bentinho ser o
filho
quatro) padre que a case e ela recusa, apresentando outra proposta, de que ele
seria o padre que batizaria o primeiro filho dela.
XLVIII
Juramento do
(quarenta e Após fazerem as pazes, Capitu e Bentinho mudam os seus juramentos,
poço
oito) prometendo então que um casaria com o outro.

Quando o pai de Capitu vai se despedir de Bentinho, que vai para o


seminário, ele pede ao garoto que lhe dê algo que deixe lembrança, e que
fosse qualquer coisa - o que importava era o valor sentimental. Ao final do
LII (cinquenta O velho
capítulo, Bento escreve “Tinha os olhos úmidos deveras; levava a cara dos
e dois) Pádua
desenganados, como quem empregou em um só bilhete todas as suas
economias de esperanças, e vê sair branco o maldito número,—um número
tão bonito!” (ASSIS, 1899, p. 55).
LVI
Um
(cinquenta e Aqui é apresentada a vida ao seminário e ao personagem Escobar, que veio
seminarista
seis) a ser o melhor amigo e confidente de Bentinho.

Após um final de semana em sua casa, voltando para o seminário na


LVIII companhia de José Dias, ambos passam por uma senhora que cai no chão e
(cinquenta e O tratado deixa amostra meias e cinta-liga. Bentinho afirma que “Dali em diante, até o
oito) seminário, não vi mulher na rua, a quem não desejasse uma queda, a
algumas adivinhei que traziam as meias esticadas e as ligas justas... Tal
39

haveria que nem levasse meias... Mas eu as via com elas... Ou então...
Também é possível…” (ASSIS, 1899, p. 63).
Neste capítulo, Bento afirma que não tem boa memória. Ele explica o que
LIX
Convivas de quis dizer com esta afirmação e após isto ainda escreve “E antes seja olvido
(cinquenta e
boa memória que confusão; explico-me. Nada se emenda bem nos livros confusos, mas
nove)
tudo se pode meter nos livros omissos.” (ASSIS, 1899, p. 64).
É o primeiro capítulo onde somos apresentados aos ciúmes de Bentinho.
Após perguntar de Capitu para José Dias, que o visitava no seminário, este
LXII responde “Tem andado alegre, como sempre; é uma tontinha. Aquilo
Uma ponta de
(sessenta e enquanto não pegar algum peralta da vizinhança, que case com ela…”
Iago
dois) (ASSIS, 1899, p. 67). Bentinho se imagina descendo o morro e indo até a
casa de Capitu e perguntar quantos beijos ela já tinha dado em rapazes da
vizinhança.
Aqui, Bentinho narra que tem se aproximado de Escobar e deseja contar a
LXV ele suas penas e esperanças. Capitu o impede. Após, na casa de Bentinho,
A
(sessenta e Capitu afirma que espera que ele se ordene padre. Em um diálogo de
dissimulação
cinco) ambos, eles afirmam: “—Você tem razão, Capitu, concluí eu; vamos enganar
toda esta gente. —Não é? disse ela com ingenuidade.” (ASSIS, 1899, p. 71).

Bento conta que Capitu ia se aproximando de D. Glória. Prima Justina não


LXVI demonstra claramente a todos o desprezo que sente pela menina, mas não a
(sessenta e Intimidade trata de todo o mal. Bento escreve: “Não penso que ela aspirasse a algum
seis) legado- as pessoas assim dispostas excedem os serviços naturais, fazem-se
mais risonhas, mais assíduas, multiplicam os cuidados, precedem os
fâmulos.” (ASSIS, 1899, p. 71).

LXVII D. Glória certa vez fica doente e manda chamar Bentinho. Ele, a caminho de
(sessenta e Um pecado casa, tem um pensamento pecaminoso de que se sua mãe morre, acaba o
sete) seminário. O pensamento é breve e logo ele se arrepende.
Escobar vai visitar Bentinho para saber se a mãe dele está bem. Bento
Visita de escreve que ambos estavam bem próximos, apesar de não tanto quanto
LXX (setenta)
Escobar vieram a ser; e ele lhe apresentou a casa após o jantar. Ao final do capítulo,
Capitu na janela pergunta quem era o rapaz.
LXXIII
O
(setenta e Um rapaz passa a cavalo por ali e observa Capitu na janela e ela faz o
contra-regra
três) mesmo. Isso desencadeia ciúmes violentos em Bentinho.
LXXV
(setenta e O desespero Correu de Capitu e de todos na casa, ficou sozinho no quarto imaginando-se
cinco) cravando as unhas no pescoço de Capitu até ver sair sangue.
LXXVI Bentinho fingiu não estar bem naquele dia para poder ficar em casa e
(setenta e Explicação conversar com Capitu. Após expor a sua angústia, ela explica que não houve
seis) nada e que ele era um rapaz que passou por ali assim como tantos outros.
LXXVIII Bentinho confessa para Escobar a sua angústia: não pretendia ordenar-se
Segredo por
(setenta e padre por amar Capitu. Em troca, Escobar confessa que também não
segredo
oito) pretende tornar-se padre, e que desejava trabalhar no comércio.

D. Glória, que é religiosa e temente a Deus, tem um vínculo moral com a


LXXX Venhamos ao promessa, mas deseja ver o filho fora do seminário e vê um futuro dele com
(oitenta) capítulo a vizinha. E Capitu por sua vez, se fazia mais presente e mais necessária a
vida da casa.
40

A melhor amiga de Capitu, Sancha, adoece e a menina vai até a casa para
LXXXI
Uma palavra cuidar dela. A conselho de D. Glória, Bentinho vai até a casa visitar Sancha e
(oitenta e um)
Capitu.
Gurgel, pai de Sancha, em um momento a sós com Bentinho, mostra-lhe um
LXXXIII
retrato da mãe da Sancha afirmando que esta é parecida com Capitu, até na
(oitenta e O retrato
amizade que ela tem com a Sancha. E afirma: “Na vida há dessas
três)
semelhanças assim esquisitas.” (ASSIS, 1899, p. 86).

Ao voltar para casa, após ver Capitu, um homem vê Bentinho e o chama


LXXXIV para avisá-lo de que o seu filho havia morrido. O convida para ver o defunto
(oitenta e Chamado e Bentinho reluta em entrar, pois em suas palavras “O mal foi que os dous
quatro) casos se conjugassem na mesma tarde, e que a morte de um viesse meter o
nariz na vida do outro.” (ASSIS, 1899, p. 87).

Aqui, se dá a segunda vez em que Escobar vai visitar Bentinho no seminário.


XCII (noventa Um amigo por
Todos na casa aprovaram a amizade; apesar de prima Justina afirmar que
e dois) um defunto
viu algo nele que não soube dizer bem o que era.

Bentinho e Escobar, ao seminário, brincam de fazer contas. Escobar se


XCIII Capítulo
apresenta como um excelente matemático, o que explica a sua paixão pelo
(noventa e XCIII/Ideias
comércio. Também nos é apresentada a dimensão da riqueza que D. Glória
três) aritméticas
possuía.
José Dias conta a Bentinho a ideia que tivera: para livrar D. Glória do vínculo
XCIV
com a promessa e libertar Bentinho do seminário, iriam para a Europa falar
(noventa e O Papa
com o Papa e contar-lhe a situação, para que assim este absolva ambos de
quatro)
seus pecados.

Escobar dá uma ideia a Bentinho: D. Glória poderia cumprir a promessa sem


XCV (noventa que Bentinho ordene-se padre. Bastava adotar um mocinho órfão e fazer
Um substituto
e cinco) ordenar a custo dela; assim ela estaria dando um padre ao altar sem que
fosse ele. Ambos planejam então sair do seminário juntos.

XCVIII Após anos estudando direito em São Paulo, Bentinho retorna ao Rio de
(noventa e O filho é a Janeiro advogado, um homem feito e a cara do pai. Todos o contemplam
oito) cara do pai saudosos.

Bentinho afirma em voz alta que seria feliz. José Dias ri dele. Ambos
XCIX “Tu serás conversam sobre o seu namoro com Capitu, que não esfriou apesar da
(noventa e feliz, distância. Namoraram por cartas durante cinco anos, e agora pretendiam
nove) Bentinho!” casar. José Dias retira o que havia falado anteriormente sobre Capitu
afirmando que se enganou.

Bentinho conta que Capitu ansiava descer a serra e voltar para o dia a dia.
“tudo me mostrou que a causa da impaciência de Capitu eram os sinais
C (cem) No céu exteriores do novo estado. Não lhe bastava ser casada entre quatro paredes
e algumas árvores; precisava do resto do mundo também.” (ASSIS, 1899, p.
103).
Tudo corria bem, apesar do desejo de ambos de ter um filho que não vinha.
Neste capítulo, Bentinho conta de um baile que foram, e que Capitu usou um
CIV (cento e vestido que não cobria os braços. Descreve que “Eram os mais belos da
Os braços
quatro) noite, a ponto que me encheram de desvane acontecimento. Conversava mal
com as outras pessoas, só para vê-los, por mais que eles se entrelaçam aos
das casacas alheias.” (ASSIS, 1899, p. 105).
Bentinho descobre Capitu distraída em uma conversa de ambos. Ela conta a
CV (cento e Dez libras
ele que conseguiu economizar dinheiro com a ajuda de Escobar. Bentinho,
cinco) esterlinas
ao comentar com o amigo, disse que “Capitu era um anjo”.
41

Nasce Ezequiel, filho do casal Bento e Capitolina. O nome é em homenagem


CVIII (cento e Um filho a Escobar, que quando teve a sua primeira filha com Sancha, nomeou-a
oito) único “Capitolina”; uma homenagem do casal para a amiga. Bento retribuiu então a
homenagem.

Neste capítulo, Bento descreve Ezequiel aos seis anos de idade, como um
rapaz que não desmente os sonhos que ele projetou em um filho que
gostaria de ter. Inclusive, notara no menino alguns trejeitos que via na mãe
CIX (cento e Rasgos da
dele, Capitu, quando ela era criança. Ele relata também o esquecimento de
nove) infância
Capitu sobre a toada cantada por um negro que vendia doces na infância de
ambos. Porém, no capítulo LIX ele confessa que não tem boa memória, e
ainda assim cobra uma lembrança de Capitu da infância.
Conforme o garoto cresce, Capitu e Bentinho descobrem um defeito no
CX (cento e Contado menino: ele gosta de imitar os outros. O modo de falar, o modo de andar.
dez) depressa Imita Tio Cosme, imita prima Justina e imita Escobar. Neste, imita os pés, as
mãos e o jeito do olhar.

Bentinho conta que os seus ciúmes, apesar do filho e dos anos, ainda
continuavam presente. Conta também que um costume do casal era ir ao
teatro, e lembra de uma vez que foi sem ela. Capitu dizia que não estava se
sentindo bem para ir, mas quis que o marido fosse. Bentinho volta no
CXI (cento e Embargos de
primeiro ato e encontra Escobar na porta de casa. Ele afirma que vinha falar
onze) terceiro
com o amigo sobre um fato importante que ocorreu no comércio, mas não
queria incomodar o amigo. Bentinho insistiu que entrasse - se Capitu
estivesse ruim, ele poderia ir embora. Capitu estava boa e disse que pareceu
estar pior para que ele não deixasse de ir ao teatro.

Ambos, Sancha e Santiago compartilham um momento de pecado ao desejar


um ao outro neste capítulo. "Sancha e Santiago (segundo este nos conta)
trocando olhares e apertando reciprocamente as mãos. E ele admite ter, um
CXIV (cento e A mão de dia, pensado nela "como se pensa na bela desconhecida que passa", e
quatorze) Sancha suspeita que ela percebe e até mesmo corresponde aos seus sentimentos"
(CALDWELL, 2002, p. 111). No capítulo seguinte a este, Bento pede perdão
para a leitora que lê a sua obra, e afirma que mudará de rumo ao seguir a
história.
Bento recebe uma visita do escravo de Sancha que dizia "o sinhô nadando, o
sinhô morrendo". Bento não quis ouvir mais nada e foi advinhando ao longo
do caminho o que aconteceu com o amigo. Escobar tinha o hábito de nadar
no mar, mas naquele dia, o mar estava de ressaca. Ao se arriscar um pouco
CXIX (cento
A catástrofe mais do que o costume, Escobar acabou se afogando e morrendo. "Que
nove)
Escobar amasse Capitu, não é inconcebível: o simbolismo que envolve o seu
afogamento pode até corroborar as intenções de Machado nesse ponto. E
como poderia ele deixar de amar Capitu? Todos os outros personagens do
livro se rendem aos seus encantos" (CALDWEEL, 2002, p. 112).

Neste capítulo, é quando se dá o enterro de Escobar. Todos estão abatidos


com a morte repentina de Escobar. Capitu e prima Justina ficaram de
CXX (cento e
O enterro companhia para a viúva enquanto Bento e José Dias cuidavam do enterro.
vinte)
Bento escreve com cuidado as palavras que diria pela última vez ao seu
amigo. Escreveu com o coração "deitando as emoções no papel".
42

Este é o capítulo onde o ciúmes de Bento e as desconfianças de que


Ezequiel não seja seu filho começam. Sancha, Bento e Capitu estão abatidos
com a morte do amigo, como é natural. Ao redor do caixão, Sancha lavava o
rosto com lágrimas, assim como as outras pessoas; porém Capitu "parecia
CXXI (cento e Olhos de
vencer a si mesma" (ASSIS, 1899, p. 121). Ao notar, suas lágrimas cessaram
vinte e um) ressaca
e ficou observando as dela. Conforme Bento descreve "Momento houve em
que os olhos de Capitu fitaram o defunto, quais os da viúva, sem o pranto
nem palavras desta, mas grandes e abertos, como o mar lá fora, como se
quisesse tragar também o narrador da manhã" (ASSIS, 1899, p. 121).

Após o enterro, Bento decide que não vai para casa logo de cara, para deixar
CXXIV (cento
que a cabeça cismasse a vontade. Fez as comparações entre os gestos e os
e vinte e Cismando
modos de portar-se entre Sancha e Capitu. Tudo o que ele revisava por meio
quatro)
de sua memória afirmaram-lhe que Capitu tinha agido de maneira suspeita.
CXXVII Este capítulo é dedicado para Sancha. Bento pede que ela não continue
(cento e vinte A D. Sancha lendo o livro e que o queime para não lhe dar tentação de abrir novamente.
e sete) Mas que, caso ela não queira ouvir os seus conselhos, a culpa seria dela.

Ezequiel com o passar do tempo se parecia mais e mais com o falecido


Escobar. O que levava Bento a crer que o menino era uma carta anônima
que contava o segredo de Escobar e Capitu. "Li a carta, mal a princípio e não
toda, depois fui lendo melhor. Fugia-lhe, é certo, metia o papel no bolso,
CXXX (cento O debuxo e o
corria a casa, fechava-me, não abria as vidraças, chegava a fechar os olhos.
e trinta) colorido
Quando novamente abria os olhos e a carta, a letra era clara e a notícia
claríssima" (ASSIS, 1899, p. 127). Ele afirma que Escobar saia do caixão
para sentar com ele a mesa e cear. E que a figura de Escobar estava
impressa em Ezequiel.
CXXXI (cento Neste capítulo, Bento conta que uma ideia decidiu abrir as asas e voar alto. A
Uma ideia
e trinta e um) ideia será apresentada nos capítulos seguintes
Bento vai ao teatro e a peça é Otelo, de Shakespeare. A intertextualidade
apresentada entre a narrativa inglesa com a brasileira não se dá ao acaso; é
Machado de Assis apresentando para o público a fonte da onde bebera a
idéia de seu Dom Casmurro. Bento fica espantado em como as coisas se
dão nesta história e escreve "Vi as grandes raivas do mouro, por causa de
CXXXIII
um lenço. —um simples lenço!—e aqui dou matéria à meditação dos
(cento e trinta Otelo
psicólogos deste e de outros continentes, pois não me pude furtar à
e três)
observação de que um lenço bastou a acender os ciúmes de Otelo e compor
a mais sublime tragédia deste mundo. Os lenços perderam-se. hoje são
precisos os próprios lençóis" (ASSIS, 1899, p. 129) Ao final da peça, todos
aplaudem, e Bento se pergunta o que o público faria se Desdêmona fosse
culpada e se reagiria da mesma maneira.

Bento e Capitu discutem. A ideia de que Escobar é o verdadeiro pai de


Ezequiel é exposta durante a discussão e Capitu exclama que "Pois até os
CXXXVI defuntos! Nem os mortos escapam aos seus ciúmes!" (ASSIS, 1899, p. 132).
Capitu que
(cento e trinta Bento descreve que Capitu não aguentava mais aquela relação. A acusação
entra
e seis) de adultério é a gota d'água e determina o fim do relacionamento de ambos.
Ao final do capítulo, Capitu confessa saber a razão da desconfiança de
Bentinho, pela "casualidade das semelhanças".
43

Ambos decidem separar-se, e Capitu embarca para Europa com Ezequiel.


No caminho, Bento paga uma tutora para que eduque o menino a sua língua
materna. Capitu e Ezequiel se estabelecem na Suíça. Bento também narra
CXXXIX que Capitu começou a escrever-lhe cartas que "eram submissas, sem ódio,
(cento e trinta A solução acaso afetuosas, e para o fim saudosas" (ASSIS, 1899, p. 134). Também
e nove) explica que Capitu pedia para que Bento o fosse visitar, e ele até embarca,
porém não os procura. Quando voltava, dava notícias de Capitu e Ezequiel
para quem perguntasse como se ele estivesse acabado de estar com eles.
Tudo isto para enganar a opinião.

Neste capítulo, Bento explica o motivo de ter construído uma casa que é uma
reprodução da sua infância ao invés de preservar a antiga. Ele descreve que
assim que a sua mãe faleceu, ele voltou a ver a casa, mas nada estava do
CXLII (cento Uma
jeito que a sua memória dizia para ele. Não reconheceu a sua identidade
e quarenta e pergunta
através dos móveis e dos cômodos daquela antiga casa. Ainda escreve "A
dois) tardia
razão é que, logo que minha mãe morreu, querendo ir para lá, fiz primeiro
uma longa visita de inspeção por alguns dias e toda a casa e o lavadouro,
nada sabia de mim" (ASSIS, 1899, p. 136).

Os anos se passam, Capitu morreu e Ezequiel veio em busca do pai. Pela


descrição de Bento, era quase como ver um fantasma; ele via em Ezequiel o
companheiro do seminário, um retrato vivo de Escobar. Este capítulo pode
ser comparado ao capítulo XCVIII, que relata a volta de São Paulo para o Rio
CXLIII (cento de Janeiro, quando Bento se torna bacharel em direito. D. Glória olha para
e quarenta e O regresso ele e vê o seu falecido marido. Todos ao redor concordam com a
três) semelhança dele com o pai. E esta característica falta entre Ezequiel e
Bento. Bento não se vê no garoto, muito pelo contrário; ele vê Escobar se
sentando para comer "com a cara metida no prato" (ASSIS, 1899, p. 137).
Portanto, dentro da construção deste capítulo, há as confirmações das
suspeitas de Bento.

Bento por fim encerra o seu julgamento de Capitu e expõe os motivos que o
levaram a ser "Casmurro" e um homem "calado e metido consigo". Isto é, o
livro veio para justificar-se para os outros sobre o seu comportamento
anti-social. E termina o livro "a saber, que a minha primeira amiga e o meu
CXLVI (cento maior amigo, tão extremosos ambos e tão queridos também, quis o destino
e quarenta e E bem, e o que acabassem juntando se e enganando-me... A terra lhes seja leve! Vamos
seis) resto? à “História dos Subúrbios." (ASSIS, 1899, p. 139).

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