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PLANTANDO IDEIAS
Domingos era um homem bonito, alegre, elegante, e até mesmo um razoável poeta. Nascido num
vilarejo chamado Caxangá (hoje, Cachoeiro do Itapemirim), no Espírito Santo, filho de pai militar, ele crescera
na Bahia, onde se tornara comerciante, e também vivera alguns anos em Lisboa e em Londres. Já o Recife,
para onde viera, em 1813, visando abrir uma filial de sua empresa, era uma cidade grande e movimentada.
Lá viviam de trinta a quarenta mil almas, divididas em três bairros: o antigo Recife, do porto e dos sobrados
onde moravam os comerciantes portugueses; Santo Antônio, onde ficavam os prédios públicos e os
brasileiros pobres e remediados; além da nova Boa Vista, de ruas largas e belas residências. E o capixaba,
que gostava de rodar pelo mundo afora, findara se instalando lá, definitivamente, por dois motivos: porque
conhecera Maria Teodora e porque descobrira Pernambuco.
Ora, além de rica, essa capitania possuía a elite intelectualmente mais preparada do Brasil, formada
pelo Seminário de Olinda; e, além disso, orgulhosa, que não abaixava a cabeça para os estrangeiros desde
os tempos da invasão holandesa. Afora uma massa de pobres que, devido aos altos impostos, o
recrutamento forçado e o alto custo dos alimentos, odiavam os portugueses. Era, enfim, o campo perfeito
para o cultivo das suas ideias democráticas e libertárias.
O capixaba não perdera tempo, tornando-se rapidamente benquisto e conhecido. Ajudava quem
pedia. Promovia muitas festas no sobrado que alugara no Recife e no Engenho Irapama, arrendado no Cabo.
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E fundara a loja maçônica “Pernambuco do Ocidente”, onde, em segredo, com seus irmãos nessa ordem,
planejava a revolução. Que, em 1817, já tinha até data para rebentar.
O INESPERADO
No início daquele ano, Domingos viajara para Salvador e para o Rio de Janeiro, em companhia do seu
xará, o capitão Domingos Teotônio, e lá acertara tudo com seus confrades maçons. O levante aconteceria
simultaneamente naquelas duas cidades e no Recife, as três maiores do País, na Semana Santa, em abril.
Entretanto, o comerciante português “Carvalhinho”, um sujeito tão canalha que já levara várias surras,
descobrira a trama, em Pernambuco, e a denunciara ao governador Caetano Pinto Montenegro. Que, no dia
seis de março, ordenara a prisão dos líderes civis e militares do movimento.
Então, o inesperado entrara em cena.
Os civis, inclusive Domingos, foram facilmente detidos. Mas, quando o brigadeiro português Manoel
Barbosa, comandante no Regimento de Artilharia, dera ordem de prisão ao capitão José de Barros Lima,
apelidado de “Leão Coroado” o caldo entornara. Em vez de se render, o Leão sacara a espada e o matara. E
a rebelião começara no quartel daquela tropa, logo recebendo apoio do povo pobre do Recife e rapidamente
se estendendo por todo Pernambuco, assim como pela Paraíba e pelo Rio Grande do Norte, nos dias
seguintes.
Diante do novo quadro, Bento da Costa avaliou que não seria um bom negócio dizer não ao
pretendente da sua filha. E já no dia 14 de março Domingos e Maria Teodora se casavam na capelinha de
Nossa Senhora da Conceição, no sítio do pai dela, em Ponte d’Uchôa (hoje, Parque da Jaqueira). Os padres
apressaram os trâmites e o governo bancou grandes comemorações públicas no Recife, em Olinda e nas
povoações mais próximas, porque muito lhe interessava que o povo também participasse daquele evento.
comerciante, sem nenhuma experiência militar, deixou a coluna sob seu comando ser surpreendida
ao cruzar o riacho Merepe, em Porto de Galinhas, e lá foi aprisionado, no dia 12 de maio de 1817.
No dia 19, o primeiro governo do povo brasileiro livre se dissolvia, no Recife. E, no dia 12 de junho, o
capixaba era fuzilado, em Salvador.
Seu último poema, dedicado à Pátria e à Maria Teodora, acaba assim: “Na morte, entre ambas
repartido / será de uma o suspiro derradeiro / e da outra há de ser final gemido…”.
Hoje, Domingos Martins é nome de rua, no Recife, e de cidade, no Espírito Santo. E em 2009 foi
inscrito no “Livro dos Heróis da Pátria”, através de projeto do deputado federal Maurício Rands.
Pernambuco libertário
Domingos Martins, portanto, veio ao lugar certo para fazer revolução com a qual sonhava. Esta
capitania era bem povoada e superava o Rio de Janeiro e a Bahia, em volume de negócios, um ano ou outro.
O Seminário de Olinda era o maior centro de estudos do País, educando jovens e difundindo ideias
democráticas desde 1800. A elite local orgulhava-se de ter expulsado daqui os holandeses, em 1654, e dois
governadores lusos — Jerônimo Furtado, em 1666, e Sebastião de Castro, em 1710. E os pobres odiavam os
portugueses, com quem frequentemente brigavam, nas ruas, em arruaças e distúrbios chamados de “mata-
marinheiros”.
Moda & revolução
No seu casamento, Maria Teodora e suas damas de honra não se cobriram com penachos,
lantejoulas, joias falsas etc., imitando as aristocratas europeias, como era o costume das mulheres ricas nos
eventos sociais da época. Tampouco fizeram os tradicionais penteados imensos, chamados de “tapa missa”,
presos com pentes de tartaruga, os “trepa-moleques”. Elas puseram vestidos simples, dispensaram as joias
e cortaram seus cabelos “à la Tito”, bem curtos, como os cabelos das francesas dos tempos da “Grande
Revolução”. As quais, por sua vez, copiaram o estilo das damas austeras da antiga Roma republicana.