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SABERES E PRÁTICAS PARA O ENSINO DA GEOMETRIA NA FORMAÇÃO DO

PEDAGOGO

Ana Lúcia Maia Gama


Faculdade do Maranhão

1. Introdução
Pensar e repensar a minha própria formação e prática como professora que ministra
aulas nos cursos de licenciatura para a formação de novos professores é um grande desafio
para quem está na profissão professor e dela se reconhece como pessoa e profissional.

No decorrer da docência venho acompanhando, observando e compreendo as


múltiplas dúvidas e dificuldades dos alunos estudantes dos/nos cursos de Pedagogia e de
Especialização em Docência na Educação Básica, referentes aos conhecimentos teóricos
básicos e metodológicos da Geometria a ser ensinada nos Anos Iniciais do Ensino
Fundamental (AIEF) brasileiro. É gritante a defasagem que alguns alunos apresentam na
compreensão, entendimento e sistematização do próprio raciocínio lógico que deveria ser
trabalhado nos anos iniciais da sua formação como indivíduo e estudante.

Tais inquietações são presentes em todos os conteúdos da Matemática conforme


estudos como os de Pavanello (2001), Serrazina (2002) e Moura (2005). Estes autores
evidenciam que os futuros professores dos AIEF estabelecem uma relação negativa com essa
área do conhecimento e apresentam pouca ou baixa compreensão dos conceitos que
possivelmente tentarão desenvolver com os alunos. É contraditório pensa em alguém que irá
desenvolver um conteúdo em que não o compreende e tão pouco o entende para poder ensiná-
lo aos demais.

Quanto aos estudos sobre o ensino da Geometria, as publicações de autores como


(NACARATO, 2002; PASSOS, 2000; PAVANELLO, 1993) ressaltam a importância do
trabalho com a Geometria como forma de proporcionar ao aluno a compreensão do mundo em
que vive, aprendendo a descrevê-lo, representá-lo e a se localizar nele. Assim, a necessidade
do seu ensino no âmbito escolar responde, principalmente, ao papel que a Geometria
desempenha na vida cotidiana seja na produção industrial, arquitetônica, topográfica, artes
plásticas e no estudo dos elementos da natureza.
Historicamente com o decorrer do tempo e os avanços tecnológicos, o homem passou
a se perceber como um agente transformador da sua própria realidade ao ser capaz de
observar e entender os fenômenos da natureza, percebendo que a maioria das transformações,
sejam elas cotidianas ou mesmo de longo prazo estão relacionadas aos processos que lhe
possibilitam fazer novas descobertas, bem como se apropriar de conhecimentos que o levam a
modificar as suas ações e consequentemente a História da própria humanidade.

Sabe-se que a matemática está presente em basicamente tudo que o indivíduo realiza e
para que tal ciência exata seja olhada, entendida e compreendida de maneira positiva, é
fundamental que seja revisto tanto os programas curriculares como a didática que será usada
para desenvolvê-la tornando-a prazerosa e proporcionando uma aprendizagem efetiva em
qualquer nível de escolarização.

A matemática é uma ciência exata que nos possibilita realizar as nossas atividades
diárias, sejam elas das mais simples até as mais complexas de maneira que realmente nos
possibilite chegarmos há um “denominador comum” de maneira mais eficiente diante das
nossas metas e objetivos a serem alcançados.

2. A Geometria e o Lúdico

Destacamos que um dos principais objetivos que fundamenta o ensino da Matemática


no Ensino Fundamental é o de “aprofundar o pensamento e liberar a criatividade”. Tal
criatividade está vinculada às metodologias que são desenvolvidas pelos docentes em suas
aulas práticas que promovem a interação do aluno do mundo real com o imaginário, levando-
os a desenvolver as suas potencialidades criativas.

Este mundo imaginário é fundamental pelo fato de estabelecer um processo criativo na


aprendizagem dos alunos ou discentes, colocando-os sempre diante de uma expectativa
dinâmica entre a convivência no ambiente escolar, como também levando para outros
ambientes que este agente esteja inserida.

Aprende-se um jogo na interação com os amigos, aprende-se um jogo lendo suas


regras na embalagem, na internet, fazendo experimentações, tentativas e ao mesmo tempo a
descoberta de saber lidar com o erro e o acerto, digo, o ganhar e o perder. Se o jogo desafia,
logo aparece a necessidade de continuar jogando, de repetir algumas vezes. É o interesse que
suscita a necessidade de aprender, a vontade de jogar e o desafio de vencer um obstáculo
apresentado. Tais procedimentos ludicamente auxilia no desenvolvimento das habilidades
inter e intrapessoal que favorecem o amadurecimento, seja da criança como do adulto ao
vivenciá-las.

Segundo Varão (2016), o lúdico é um grande aliado no processo de aprendizagem


principalmente quando se almeja a organização do pensamento através dos jogos e
brincadeiras.

“E a partir desse entendimento notar que a ludicidade e a brincadeira, é o


fazer conhecimento de forma divertida, é uma das grandes ferramentas de
aprendizagem que o professor pode usar para melhor desenvolver suas
práticas. ” (VARÃO, p.110.2016).

O espaço da criança está repleto de elementos geométricos com significado concreto


para ela: portas, janelas, mesas, bolas, cds, etc. Em seu entorno cotidiano, em seu bairro, em
sua casa, em seu colégio, em seus espaços de jogos e brincadeiras, aprende a organizar-se e
orientar-se de maneira significativa para ela. Esse é o contexto que nos parece útil para
desenvolver o ensino da Geometria: com objetos suscetíveis de observação e manipulação
como fonte de motivação e interesse por esse tópico matemático.

Apesar da relevância desse conhecimento, recentes pesquisas tem mostrado que o


ensino da Geometria é deixado de lado nos AIEF. Em relação a isso, Nacarato (2002, p.84)
afirma que existe certo descaso com a Geometria no Ensino Fundamental. De um lado, nos
anos iniciais o ensino deste conhecimento ou é deixado de lado ou normalmente é reduzido ao
“reconhecimento de figuras geométricas e cálculos de área e perímetros”. Por outro lado, nos
anos finais do Ensino Fundamental (AFEF), esse ensino privilegia o aspecto formal,
acreditando-se que os alunos já possuem condições para trabalhar com a dedução típica da
Geometria.

Pavanello (2001) acrescenta que os conceitos geométricos não puderam ser formados
devidamente pelo fato de o trabalho pedagógico realizado com o professor, nas diferentes
instâncias de sua formação, não ter sido muito abrangente.

Considerando que no desenvolvimento dos conceitos matemáticos para os alunos, os


saberes e práticas do professor são importantes, este trabalho objetiva identificar a relação
entre a formação do pedagogo e seus saberes e práticas no ensino da Geometria nos Anos
Iniciais do Ensino Fundamental, sob a ótica das categorias de conhecimentos de Lee Shulman
(1986, 1987 e 1999).

3. O pedagogo e seus saberes e práticas no ensino da Geometria


A formação de professores tem expressão nas pesquisas dos últimos anos, discutida
em fóruns, encontros e seminários como uma das principais estratégias para elevar a
qualidade do ensino. Entretanto, há ainda uma grande preocupação em relação aos conteúdos
e metodologias trabalhados na formação inicial de professores.

A complexidade da sociedade atual, com mudanças significativas na estrutura social e


seu impacto na educação escolar, sinaliza ao docente a necessidade de conhecer as
informações, compreende-las e saber utilizá-las na vida cotidiana, tendo em conta o processo
educativo do século XXI no qual a relação entre educação, escola e sociedade é alvo de uma
profunda transformação tecnológica.

Neste contexto, a Matemática precisa desempenhar seu papel na formação de


capacidades intelectuais, para que os alunos desenvolvam posturas críticas diante de questões
sociais.

A aquisição de conceitos matemáticos nos AIEF é suporte não só para o decorrer da


vida escolar, mas também para o cotidiano dos alunos. Por estarem tão presentes no dia-a-dia,
estes conceitos devem ser bem trabalhados e desenvolvidos ao longo do processo educativo.

O papel do professor nesse período é de encaminhar os alunos para uma melhor


compreensão desses conceitos, desafiando-os a encontrar soluções para questões que
enfrentam na vida diária.

Apresenta-se algumas manifestações de oito estudantes do Curso de Pedagogia da


Faculdade Santa Fé que são docentes nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental. Utilizamos o
método crítico dialético com enfoque qualitativo, de caráter descritivo, modelo não
experimental e estudo de caso como abordagem.

No entanto, a realidade nos mostra que muitos professores sentem dificuldades em


trabalhar os conteúdos matemáticos, particularmente a Geometria criando assim, uma barreira
no desenvolvimento das aulas e no processo ensino e aprendizagem. Tal fato é comprovado
pelo baixo rendimento dos alunos na avaliação nacional Prova Brasil, referente ao 5º ano de
escolaridade, encontrado em www.inep.gov.br.

Os Parâmetros Curriculares Nacional (PCN) indicam, como um dos seus princípios,


que o trabalho com Geometria – Espaço e Forma – precisa desenvolver nas crianças a
“percepção de semelhanças e diferenças entre cubos e quadrados, paralelepípedos e
retângulos, pirâmides e triângulos, esferas e círculos”. (BRASIL, 1997, p.73). Apontam,
ainda, que a importância da presença da Geometria está relacionada ao fato de que os
conceitos geométricos possibilitam aos estudantes compreender, descrever e representar de
forma organizada, o mundo em que vive.

Passos, Oliveira e Souza (2009), em pesquisa com os professores que ensinam


Matemática nos AIEF, constataram que a visão geométrica mais apresentada aos alunos é a
sua relação com os objetos do cotidiano. No entanto, não se pode esperar que alunos
aprendam Geometria somente a partir de identificação dos objetos do seu dia-a-dia. É
necessário desenvolver e estimular o pensamento geométrico com base em seus conceitos,
diferenças e semelhanças.

Grando (2009) pondera que houve um aumento nas investigações voltadas para a
Educação Matemática, principalmente, no que se refere ao ensino da Geometria, na tentativa
de resgatar este ensino teórico e metodológico nos cursos de formação de professores e suprir
a necessidade apresentada pelos acadêmicos do Curso de Pedagogia.

4. Shulman e o CDC – conceitualizando o conhecimento didático do conteúdo

Os estudos de Lee Shulman publicados em 1986, já o consagravam como grande


estudioso no campo da formação de professores, por identificarem três vertentes no
conhecimento do professor, no que se refere ao conhecimento da disciplina para ensiná-la:
subject knowledge matter (conhecimento do conteúdo da matéria ensinada), pedagogical
knowledge matter (conhecimento pedagógico da matéria) e curricular knowledge
(conhecimento curricular).

Quando Shulman introduz o termo Conhecimento Pedagógico da Matéria ou


Conhecimento Didático do Conteúdo – CDC – entre os anos 1986 e 1987 como categoria do
conhecimento, envolve os saberes que permitem, ao docente, fazer ensinável o conteúdo da
disciplina a ser ensinada. Entendendo ensinável como transferir o conteúdo a distintas formas
ou objetos, ou seja, identificar em um objeto ou em formas, o conteúdo ensinado.

O CDC representa a amálgama do conteúdo e a pedagogia dentro de uma


compreensão de como “temas particulares, problemas ou situações são organizadas,
representadas, adaptadas (...) para o ensino” (SHULMAN, 1987, p.8). Esta afirmação supõe
prestar atenção especial à forma de definir e compreender o conteúdo e a didática e como
estas relacionam-se.
Esta relação implica que para poder exercer a docência, requer-se “a transformação do
compreendido” de determinado corpo disciplinar. Ou seja, a capacidade de ensinar
determinado conteúdo está baseada, entre outros, no “[...] conhecimento profundo, flexível e
qualificado do conteúdo disciplinar, mas também, na capacidade para gerar representações e
reflexões poderosas sobre esse conhecimento”. (SHULMAN, 1999, p. xi).

O estudo do CDC oferece a oportunidade de entender como os(as) professores(as)


fazem para que os conteúdos sejam ensináveis. Esta categoria de conhecimento permite ao(à)
professor(a) ter a habilidade de converter suas compreensões acerca de um tema, em
diferentes estratégias de ensino que facilitam as aprendizagens dos seus alunos. Isto supõe
como os(as) professores(as) “conhecedores da matéria” transcendem e convertem-se “mestres
da matéria”. (BERLINER, 1986).

Shulman (1986, 1987) afirma que o manejo profundo da disciplina facilita o docente
antecipar os componentes e as relações do conteúdo que podem apresentar problemas para sua
compreensão. Um bom manejo da disciplina significa saber que algo é assim e compreender o
porquê desta natureza, mas também saber sob que circunstâncias validam-se este
conhecimento: “isto será importante nas subsequentes decisões pedagógicas que considerem a
ênfase curricular”. (SHULMAN, 1986, p. 9).
A proposta de Schulman continua ainda vigente, e tem sido abordada e desenvolvida
por vários autores, destacando-se os trabalhos de Ball, Lubienski e Mewborn (2001), Hill,
Ball e Schilling (2008) os quais introduzem a noção de “Mathematical knowledge for
Teaching”, que se define como “o conhecimento matemático que utiliza o professor em sala
de aula para produzir instrução e crescimento no aluno” (HILL, BALL E SCHILLING, 2008,
p. 374). Estes autores, baseando-se nas ideias de Schulman, propõem um modelo de
conhecimento matemático para o ensino no qual se caracteriza o conhecimento matemático
necessário para o ensino da matemática escolar, estabelecendo, também, a existência de uma
correlação positiva entre o conhecimento matemático para o ensino e o alcance de
aprendizagem matemático nos alunos.

5. A Metodologia
Trata-se de uma pesquisa qualitativa, não experimental (SAMPIERI, et al., 2006),
descritiva, onde utilizou-se a análise documental e a entrevista semiestruturada. A abordagem
adotada foi o estudo de caso.
Optou-se pelo estudo de caso, que de acordo com Triviños (2007) “é uma categoria de
investigação, cujo objeto de estudo é uma unidade dentro de um sistema maior” (p. 133),
sendo neste caso os estudantes do Curso de Pedagogia da Faculdade Santa Fé.
A Faculdade Santa Fé foi selecionada para a realização da pesquisa porque é uma
Instituição de Educação Superior (IES) particular em São Luis/MA, que oferece o Curso de
Pedagogia e tem obtido bons resultados nas avaliações externas (ENADE, IGC) realizadas
pelo MEC.
Para coletar os dados utilizou-se a pesquisa documental para buscar nos PCNs de
Matemática para os AIEF, no Projeto Pedagógico do Curso (PPC) e nos planos de ensino das
disciplinas relacionadas com a Matemática, os assuntos vinculados com o conteúdo e a
didática dessa área. Esta técnica serviu para complementar a informação dos dados obtidos na
pesquisa (LÜDKE, ANDRÈ, 1986, p.38).
Por sua vez, a entrevista semiestruturada pretendeu identificar a relação entre o
conhecimento de conteúdo da geometria adquirido no curso de Pedagogia/Magistério ou na
escola básica e seu ensino (conhecimento didático da Geometria -CDC) que tinham os
professores estudantes (PE) do Curso de Pedagogia da Faculdade Santa Fé, através de seis
questões relacionadas a:
1) Conceito de Geometria;
2) Onde aprendeu Geometria;
3) Importância do ensino da Geometria nos AIEF;
4) Conteúdos da geometria que ensina nos AIEF;
5) Estratégias que utiliza para ensinar Geometria;
6) Dificuldades para ensinar Geometria, além de solicitar sugestões para melhorar a
qualidade do ensino e aprendizagem da geometria no curso de Pedagogia da
Faculdade Santa Fé. Foram entrevistados oito professores estudantes (PE) que atuam
nos AIEF em escolas públicas e privadas de São Luís (três do 7º período e cinco do
8º período). Para este estudo apresentam-se resultados parciais obtidos nas
entrevistas.

Para a seleção da amostra se utilizou o tipo de amostragem por conveniência e


acessibilidade (GIL, 2007), porque foram selecionados somente os estudantes que
efetivamente exercem a docência nos AIEF e disponíveis a participar da pesquisa.
A seleção dos participantes levou em consideração:
1º) os estudantes que atuam como docentes nos AIEF;
2º) os que haviam cursado as disciplinas relacionadas com os conteúdos e as
didáticas da Matemática, bem como realizado o estágio curricular supervisionado nos
AIEF e;
3º) a disposição/disponibilidade em participar na pesquisa.

Para sistematização e análise das respostas obtidas nas entrevistas utilizou-se a análise
de conteúdo (AC) proposta por Moraes (1999): unitarização dos conteúdos, categorização das

unidades, definição das categorias a partir do problema e dos objetivos do estudo e


interpretação das categorias considerando o referencial teórico da pesquisa.

A pesquisa foi realizada na Faculdade Santa Fé nos meses de fevereiro a abril/2015.

6. Análises dos Resultados

Dos PEs selecionados para este estudo, 07 (87,5%) são do sexo feminino e um
(21,5%) do masculino, tem idade entre 23 e 52 anos. Dos oito PEs, cinco (62,5%) tem entre
02 e 05 anos de experiência na docência nos AIEF e três (37,5%) entre 08 e 15 anos . Três
(37,5t%) dos PE são formados no curso de magistério no ensino médio. A maioria (62,5%)
leciona na rede privada de ensino, cinco (62,5%) lecionam no 2 ano e três (37.5%) no 5 ano
dos AIEF.

A estrutura curricular do curso de Pedagogia da FSF foi reformulada três vezes (2009,
2012 e 2014). Até o primeiro semestre de 2014 oferecia-se no 6º período a disciplina “Teoria
e Prática do Ensino da Matemática” com carga horária de 90 horas. Na ementa dessa
disciplina e no seu conteúdo programático não aparece nenhum tópico relacionado com o
conteúdo da geometria, nem como ensiná-la nos AIEF. Apesar de constar a análise dos PCNs
para o ensino da matemática: objetivos, conteúdos e orientações didáticas, na bibliografia não
se inclui nenhuma referência relacionada a esse tópico.

No que se refere ao conteúdo matemático na Educação Infantil e nos AIEF, a


partir do segundo semestre de 2014 inclui-se a disciplina “Matemática para os anos iniciais”
no 5º período, com carga horária de 60h, além da disciplina “Teoria e Prática do Ensino da
Matemática” no 6º período, também com 60h, dedicando 120h para o conteúdo e o ensino da
Matemática, o que coincide com a maioria dos cursos de Pedagogia no país que ainda
oferecem poucas disciplinas referentes ao ensino da Matemática (CAZORIA e SANTA,
2005), e que em comparação com a carga horária (3200h) total do curso é bastante reduzida
(120h=3,8%).

A análise da ementa e da bibliografia da disciplina “Matemática para os Anos


Iniciais” evidenciou que no conteúdo de geometria incluem-se aspectos sobre Geometria
Experimental principalmente, o que como Curi (2015, p.6) afirma “pode revelar que esse

assunto não é considerado importante pelos formadores para ser ensinado nos anos iniciais
do ensino fundamental, ou que é de pouco domínio por parte dos formadores”.

O valor do conhecimento geométrico é ressaltado por Lorenzato (1995) e nos PCNs


(Brasil, 1997), pois além de desenvolver a capacidade de raciocínio, se mostra como elemento
importante no auxílio a solução de problemas matemáticos e de outras áreas.

As categorias identificadas das respostas à entrevista foram agrupadas em três


temáticas:

1) Saberes/Conhecimentos do conteúdo da geometria;

2) Conhecimentos sobre as Orientações curriculares sobre ensino da geometria e

3) Saberes/Conhecimentos para ensinar.

A categoria “Saberes/Conhecimentos do conteúdo da geometria” está composta por


três subcategorias que respondem ao conhecimento de geometria dos entrevistados, onde
aprenderam geometria:

a) Conceito de Geometria;

b) aprendizagem na Educação Básica;

c) aprendizagem no Magistério de Nível Médio e/ou no curso de Pedagogia.

Na categoria “Conhecimentos sobre as Orientações curriculares oficiais sobre o ensino


da geometria” foi agrupado o conhecimento sobre as orientações oficiais para o ensino da
geometria nos AIEF.

A categoria “Saberes/Conhecimentos para ensinar” agrupa quatro subcategorias:

a) Importância do desenvolvimento do pensamento geométrico;


b) Ensino dos conteúdos geométricos;

c) Estratégias para ensinar geometria e

d) Dificuldades para ensinar geometria.

No quadro1 apresentam-se as categorias, subcategorias e algumas manifestações dos


professores estudantes entrevistados.

Quadro 1- Categorias, subcategorias e algumas manifestações dos sujeitos entrevistados


Categorias Subcategorias Manifestações Sujeitos
Área da matemática que estuda as PE1, PE7
Conceito de figuras no espaço
geometria Conjunto de conhecimentos sobre PE5, PE8
comprimento, área e volume
A geometria foi a parte mais difícil PE2
da matemática
No Ensino Médio estudei
Geometria, mas não entendia nada e
os professores do Ensino PE7
Aprendizagem na Fundamental não ensinavam por
Saberes/ escola básica exemplo que a Pirâmide é um
Conhecimentos do poliedro
conteúdo da geometria Os temas de geometria foram
ministrado muito rápido, muitas PE4
vezes a professora não dava as
fórmulas completas
No curso de magistério aprendi
conceitos de Geometria para PE5
trabalhar com figuras planas e não
Aprendizagem no planas.
Magistério/Pedagogia O curso de Pedagogia não
contemplo aspectos da geometria PE8
para ser ensinado nos anos iniciais
Conhecimentos
sobre as Domínio dos Não foi estudado nem no P1, P2, P3,
Orientações conteúdo e do ensino magistério de ensino médio, nem no P4, P5, P6,
curriculares sobre da geometria nos curso de Pedagogia P7, P8
ensino da geometria PCNs
Saberes/ Aplica-se na vida cotidiana, na
Conhecimentos pintura, na arquitetura, na
Importância do
para ensinar astronomia, serve para estudar
desenvolvimento do PE2, PE5
outros temas das matemáticas,
pensamento PE6, PE8
desenvolve nos alunos a percepção
geométrico
do espaço, sua capacidade de
visualização e abstração
Ensino dos Os que indicam-se no livro de texto P1, P3
da escola
Conteúdos Não trabalho com Geometria, pois
Geométricos esse conteúdo será abordado nos P4, PE7
anos seguintes
Utilizo o livro didático e passo às PE1, PE3,
crianças as teorias e os exercícios PE4
As mesmas estratégias que utilizo PE6
para as outras partes da matemática
Mostro alguns objetos, os
Estratégias para identifico, descrevo e peço para PE5
ensinar geometria desenhá-los, decorar seus nomes e
propriedades
Utilizo diferentes jogos, trabalho
em grupo para diferenciar as figuras
PE8
geométricas, copiar figuras do livro
didático ou da lousa
PE1, PE4,
Desconhecimento do conteúdo
PE5, PE6,
básico
PE7
PE2, PE3,
Compreender o conteúdo
PE6
PE1, PE3,
Não saber como ensinar conceitos,
PE4, PE5,
fórmulas, etc
Dificuldades para PE6, PE7
ensinar geometria È uma matéria muito teórica e
abstrata, além disso eu tinha e tenho
ainda muita dificuldade para PE8
explicar o que é um ângulo, uma
reta...
Encontrar estratégias que PE3, PE4,
possibilitem a aprendizagem nas PE5, PE6,
crianças PE7, PE8
Fonte: Elaborado pelas pesquisadoras
.
Entre as sugestões realizadas pelos PEs para melhorar a qualidade da formação em
matemática e, em particular da geometria para o ensino nos AIEF, apresentam-se as seguintes:

1) Aumentar a carga horária da disciplina “Matemática nos Anos Iniciais” e


incluir o conteúdo da Geometria, suas teorias, princípios, objetivos;

2) Incluir o estudo e análise dos PCNs relacionados à Matemática face à realidade


escolar brasileira e maranhense;

3) Incluir o tema da geometria nos Estágios Curriculares Supervisionados do


curso; Realizar atividades de pesquisa e extensão vinculadas ao ensino e
aprendizagem da geometria.

As informações coletadas revelam que há restrições, por parte dos PEs, na realização
do trabalho com a geometria, mostram que as mesmas estão relacionadas à suas trajetórias
escolares, bem como à formação inicial desses professores. Basta considerarmos que boa
parte deles assegura que tudo era difícil e/ou não lembra quais foram os conceitos
geométricos estudados no período em que eram alunos.

Na concepção de Fainguelernt, as lacunas mencionadas e observadas no


desenvolvimento dos conteúdos geométricos, ao longo dos AIEF, acontecem também, pela
dificuldade de compreensão desses conteúdos por parte do professor que ensina Geometria,
devido a falhas em sua formação.

No que se refere à formação do professor, Climent e Carrillo (2003) fundamentados


em Shulman (1986) consideram que o conhecimento do professor em serviço consta de
diferentes componentes: o conhecimento do conteúdo matemático e sobre as matemáticas
(fatos, procedimentos, conceitos, as relações entre estes e os significados e princípios,
subjacentes, bem como o referido à compreensão da natureza do conhecimento matemático e
da Matemática como corpo de conhecimento); e o conhecimento da matéria para seu ensino
(modos de representação mais adequados para facilitar sua compreensão e o conhecimento
das características da aprendizagem dos conteúdos, o conhecimento dos currículos oficiais (no
caso do Brasil os PCNs) relativos ao ensino da matéria).

Assim, consideramos que a partir dos saberes da Geometria, o docente deve


trabalhar suas práticas em situações que resultem familiares para os alunos e mediante
atividades manipulativas e lúdicas, fomente o desenvolvimento dos conceitos geométricos
contemplados no currículo de cada etapa educativa.

Observa-se que as dificuldades dos PEs estão relacionadas tanto ao conhecimento


do conteúdo especializado (geometria) como ao conhecimento didático do conteúdo
geométrico.

Com base nas manifestações dos PEs entrevistados fica evidente que, tanto no
magistério de nível médio, como no curso de Pedagogia foram escassas e/ou precárias as
experiências que vivenciaram destinadas ao ensino e à aprendizagem da Geometria.
Consideramos que o pequeno envolvimento ou o envolvimento pouco significativo dos PEs
em situações voltadas ao ensino da Geometria resulta do pouco conhecimento do conteúdo da
geometria que tem os formadores do curso de Pedagogia produto de sua própria formação.
Neste sentido, concordamos com NACARATO (2003, p. 34), quando afirma que a
vida estudantil destes PEs seguiu um percurso “[...] reducionista e simplista, limitado ao
reconhecimento e identificação de formas, sem levar em consideração a complexidade do
pensamento geométrico”.

Conforme os dados obtidos na presente pesquisa, os PEs apesar de compreenderem a


importância da Geometria nos anos iniciais não privilegiam seu ensino, porque a experiência
estudantil e acadêmica que possuem não lhes garante segurança na realização do trabalho com
este tema.

7. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A análise documental e as manifestações dos PEs nas entrevistas evidenciaram que:

1) Os PEs não possuem o conhecimento geométrico especializado para ensinar os


temas de geometria nos AIEF;

2) O desconhecimento do conteúdo de geometria dificulta o seu ensino;

3) Os PEs desconhecem as Orientações Curriculares Nacionais para o ensino da


geometria, o que evidencia que continuam as divergências entre as políticas educacionais e a
sua efetivação nos cursos de formação do professor da Educação Básica;

4) Há necessidade urgente da inclusão da geometria nas disciplinas voltadas para a


formação matemática do pedagogo, bem como nos estágios curriculares do curso de
Pedagogia;

5) É necessário mudar o perfil do professor das disciplinas voltadas para o ensino do


conteúdo da Matemática.

Os resultados parciais obtidos neste estudo coincidem com o que Durham (2008)
destaca que ainda não se conseguiu um satisfatório equilíbrio entre o domínio dos conteúdos e
formação para a prática docente, ou seja, que é necessária a construção dos saberes e práticas
do pedagogo em relação à Geometria, para atuar com eficiência nos anos iniciais do Ensino
Fundamental.
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Mini-currículo

Ana Lúcia Maia Gama


E-mail: anamaiagama@hotmail.com
CV: http://lattes.cnpq.br/5768119747449361

Bacharel e licenciada em Matemática pela Universidade Federal do Maranhão (1974/1975).


Especialista em Planificação e Formulação de Políticas Educativas pelo Instituto Internacional de
Planejamento da Educação - IIPE-UNESCO de Buenos Aires/Argentina (2004). Doutoranda em
Ciências da Educação na Universidade Nacional de Rosario - UNR/Argentina (2011). Professora de
Matemática, Metodologia do Ensino da Matemática e Estatística na Universidade Estadual Vale do
Acaraú - UVA/MA e na Faculdade do Maranhão - FACAM. Realiza trabalhos e palestras apresentados
nos últimos cinco anos: Nov/2015, intitulado - A construção do conhecimento didático do conteúdo da
Geometria na formação do professor dos anos iniciais do Ensino Fundamental no Maranhão,
apresentação oral no VI CONGRESSO INTERNACIONAL EM AVALIAÇÃO EDUCACIONAL no
Nov/2014, Intitulado - A prática pedagógica pré-profissional e os conhecimentos didáticos da
Matemática no Curso de Pedagogia da Faculdade Santa Fé em São Luis/MA no XVII Encontro
Nacional de Didática e Prática de Ensino - ENDIPE realizado pela Universidade Estadual do Ceará, em
Fortaleza. Abril/2014, Intitulado - A formação do Pedagogo e o ensino da Matemática nos anos iniciais
do Ensino Fundamental no Brasil, no VIII Congresso Iberoamericano de Docência Universitária e de
Nível Superior pela Facultad de Humanidades y Artes - UNR - Rosario - Argentina. Dez/2013,
Intitulado - A importância do Planejamento para o desenvolvimento da Educação, Implantação do Plano
Decenal de Educação. Secretaria de Educação - Prefeitura Municipal de Matões do Norte. 2012,
Intitulado - Ensinando Matemática com a Literatura de Monteiro Lobato, na Semana da Matemática -
Universidade Federal do Maranhão - UFMA.

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