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Ribeirão Preto
2019
Angélica Teixeira Gomes
Versão corrigida
Ribeirão Preto
2019
Autorizo a reprodução e divulgação total ou parcial deste trabalho, por qualquer meio
convencional ou eletrônico, para fins de estudo e pesquisa, desde que citada a fonte.
Banca Examinadora
Prof. Dr.___________________________Instituição:_________________________
Julgamento:________________________Assinatura:_________________________
Prof. Dr.___________________________Instituição:_________________________
Julgamento:________________________Assinatura:_________________________
Prof. Dr.___________________________Instituição:_________________________
Julgamento:________________________Assinatura:_________________________
Prof. Dr.___________________________Instituição:_________________________
Julgamento:________________________Assinatura:_________________________
A presente Tese foi realizada com apoio financeiro da Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).
Dedico este trabalho aos meus mestres de
Psicodrama e à todos que compartilham
esse modo de vida comigo. Que possamos
continuar abertos à revolução criadora
nesse mundo!
AGRADECIMENTOS
À minha filha Flora, que passou meses tentando chamar a minha atenção
enquanto eu estava no computador, que colocava as provas na minha gaveta para
pedir ajuda, que perguntava amorosamente se ainda faltava muito, que aprendeu a
esperar a mãe terminar este trabalho com amor, coragem, paciência. Amo você filha!
Manoel de Barros
RESUMO
Current studies show the high prevalence of psychic suffering in the population of
university students and few studies focus on the qualitative dimension of academic
experiences. The present qualitative research is intervention based and was carried
out through a process of sociodramatic group intervention. The research was
conducted with university students of Psychology to understand the experiences of the
students. The goal was to map challenging situations that generated mental suffering,
as well as amplifying experiences of potentiality. Fifteen group sessions were
conducted based on the psychodramatic theory with 11 Psychology students from a
university. Each session was carried out in three stages: warm-up, development with
role-plays and sharing, in which exchanges of ideas, opinions about feelings and
session contents were carried out. After the sessions, elaborations were made in order
to perform the psychodramatic analysis of the group process. In addition, the sessions
were described in order to understand the process of producing the thoughts and the
themes discussed in each session. The results indicated difficulties in academic
experiences: personal , vocational, social and academic level, which are the source of
significant psychic suffering. It was highlighted how student-student relationships can
assume a competitive aspect that hinders social interactions in an academic context.
The teacher-student relationship has also stood out as a significant source of suffering
and is notably experienced as a relationship of submission. The academic demands
of psychology undergraduates have proved to be a source of psychological distress
due to several aspects related to the functioning of the academic course. It was also
verified that the activities and experiences developed in the sociodramatic group
allowed new types of relationships because of the revelation of the diversity of each
student. There was also the promotion of spontaneity-creativity in the role of university
student of psychology in some moments of the group process, which allowed the
rescue of a relationship of interiority with life and the emergence of possibilities of
experiencing the role of student in a less alienated way, which promoted the movement
of psychic suffering that remained unconscious. It also enabled the students to
question their own role and question the cultural preservation of the role and
institutional functioning.
1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 15
2 OBJETIVO ............................................................................................................. 61
3 MÉTODO................................................................................................................ 62
3.1 LOCAL................................................................................................................. 62
4 RESULTADOS ....................................................................................................... 77
1 INTRODUÇÃO
Porém, a grande maioria dos alunos em sofrimento psíquico não procura ajuda e,
quando o faz, motiva-se essencialmente por questões pessoais ou familiares,
desconsiderando os elementos acadêmicos visivelmente implicados no sofrimento.
Os autores concluem que os currículos e os modelos de ensino médico precisam levar
em consideração a forma como os estudantes lidam com o processo de formação em
seu contexto biopsicossocial, nesse sentido, as escolas de formação devem tornar
seus serviços de apoio psicológico mais integrados à execução dos planos de ensino,
focando os dois últimos períodos acadêmicos e estendendo suas ações às unidades
de cumprimento de internato. Além disso, oferecer suporte às tensões familiares e ao
enfrentamento da adaptação à cidade em que o aluno vive deve fazer parte do apoio
psicopedagógico. As instituições de ensino devem agir de forma ativa na oferta de
apoio psicopedagógico aos alunos, reconhecendo os elementos naturalmente
estressores e, auxiliando os alunos no enfrentamento dessas dificuldades.
O estudo de Costa et al. (2014) com 172 estudantes de graduação de Medicina,
Enfermagem e Odontologia (47) da Universidade Federal de Sergipe e cursando os
três últimos semestres, teve o objetivo de determinar a prevalência de Transtorno
Mental Comum (TMC) e identificar potenciais fatores associados, entre estudantes de
Medicina, Odontologia e Enfermagem. Como instrumento de coleta de dados os
autores utilizaram o Self Reporting Questionnaire (SRQ-20) e um questionário
desenvolvido pelos autores especificamente para identificar características socio-
demográficas, aspectos pessoais e fatores relacionados ao processo educacional. A
pesquisa encontrou uma taxa de prevalência de TMC em 33,7% da amostra pesquisa,
o que indica que a taxa de prevalência de TMC é maior na população de estudantes
universitários da instituição de ensino pesquisada do que na população em geral, cuja
taxa de prevalência para TMC varia de 22% a 35%.
Os fatores associados mais fortemente ao TMC foram: não ter boas
expectativas com relação ao futuro, não perceber o curso como fonte de prazer e
sentir-se emocionalmente estressado. A carga horária excessiva de atividades dos
cursos e a exposição contínua ao sofrimento humano e a morte são consideradas
fontes de estresse para os estudantes dos três cursos pesquisados. Os autores
concluem sobre a importância do cuidado e atenção à saúde mental para os
estudantes da área da saúde, à medida que o estudo não encontrou diferenças
significativas da prevalência de sofrimento mental em estudantes do curso de
Medicina, Odontologia e Enfermagem. Estratégias importantes de atenção sugeridas
22
estresse são iguais ou superiores a 40% da amostra pesquisada. Esses estudos ainda
apontam a correlação positiva entre estresse e depressão na população universitária
pesquisada, o que enfatiza o potencial prejuízo à saúde mental e ao aproveitamento
da experiência acadêmica por esses alunos. Os autores destacam a necessidade de
ampliação de pesquisas com essa temática, principalmente utilizando um número
maior e mais diversificado de alunos, seja mapeando-se de forma ampliada os
eventos considerados geradores de estresse no ambiente universitário, em especial
aqueles próprios à rotina e experiência acadêmica, assim como identificando o perfil
dos alunos mais afetados pelos eventos estressores, para a criação de estratégias
preventivas mais efetivas.
O estudo de Osse (2013) teve como objetivo geral mapear os serviços de
atenção ao estudante universitário, o estado emocional e as necessidades dos
mesmos, no contexto da Universidade de Brasília (UnB/DF), para obter subsídios ao
planejamento e implementação de programas de proteção, prevenção e assistência
estudantil. A autora realizou uma pesquisa com ação integral e sistêmica (PAIS) com
estudantes dos diferentes campi da UnB, representantes discentes e Gestores dos
serviços de Assistência Estudantil. Os instrumentos utilizados para a coleta de dados
incluíram a aplicação de um “Questionário Sobre o Estado Emocional (QEE)”,
desenvolvido pela própria pesquisadora; Grupos de Discussão com discentes de
diversos cursos e representantes dos Centros Acadêmicos, além de Entrevistas
Semiestruturadas com Gestores de Serviços de Assistência Estudantil da própria
universidade.
Foram considerados e analisados 522 questionários e os resultados obtidos
por meio do Questionário Sobre o Estado Emocional (QEE) apresentaram, em média,
um grupo de estudantes com uma postura positiva em relação à vida, pois
responderam que frequentemente apresentam sinais de bem-estar. No entanto,
apesar de os resultados dos respondentes apresentarem-se dentro da média, em uma
parcela dos investigados foram encontrados sinais de sofrimento psíquico acima do
esperado para a idade, especificamente, entre aqueles que se encontram entre 19-24
anos. Nessa faixa etária, 38% dos respondentes apontaram dificuldades de atenção
e alterações de sono, 33% indicaram sinais de dificuldades de concentração e 40%
apresentaram sinais de ansiedade acima da média. Portanto, um grupo significativo,
entre os participantes, apresenta sinais de necessidade de atenção.
25
dos acadêmicos, mas também que aprimore e auxilie na própria formação profissional
(ROCHA; SASSI, 2013).
Os estudos acima apresentados confirmam a elevada prevalência de
transtornos mentais menores em estudantes universitários e um alto consumo de
substâncias psicoativas por parte dos mesmos, principalmente de álcool e tabaco.
Esses dados indicam uma situação de risco ampliado para o aparecimento de
transtornos mentais nessa população de estudantes e justificam fortemente a
necessidade de uma atenção à saúde mental dos universitários por meio de ações
que visem a manejar esse sofrimento e propiciem bem-estar no ambiente acadêmico
(ANDRADE et al., 2016).
Os dados apresentados nas pesquisas anteriormente elencadas permitem a
realização de diversos questionamentos: quais são os fatores causadores e de que
modo se constitui o sofrimento psíquico dos estudantes? O que está acontecendo no
contexto acadêmico para tantos estudos atestarem o desenvolvimento de sofrimento
psíquico na população de estudantes? Quais são as vias utilizadas pelos estudantes
para minimizar os fatores causadores de sofrimento? Quais estratégias utilizam para
minimizar sintomas de ansiedade, estresse e depressão?
Pode-se afirmar, a partir dos estudos encontrados na literatura, a presença
significativa de Transtornos Mentais Menores em contexto universitário,
especificamente na população dos estudantes. Compreende-se que a ocorrência dos
mesmos pode influenciar diretamente, e de modo negativo, o desempenho acadêmico
e a qualidade de vida de alunos universitários, destacando-se a importância de
estudos a fim de compreender as vivências acadêmicas relacionadas ao processo de
produção de sofrimento psíquico (ANSOLIN et al., 2015).
Ciências e Letras da UNESP de Assis. O programa foi criado em 1998 para prestar
atendimento psicológico aos alunos dos cursos de graduação da faculdade, visto que
havia uma demanda cada vez maior de alunos universitários da instituição que
procuravam o serviço de clínica-escola para atendimento psicológico. Os autores
apresentaram as principais queixas trazidas pelos alunos e motivadoras da busca por
atendimento psicológico: problemas de convívio com companheiros de moradia,
ansiedade e estresse em virtude das atividades acadêmicas; queixas que denotam a
existência de uma demanda de tratamento, tais como tentativas de suicídio e uso
excessivo de álcool e/ou drogas. A procura pelo atendimento em função de uma
demanda de adaptação revela uma dificuldade muitas vezes severa dos alunos em
se desligar das pessoas queridas da cidade de origem e estabelecer novos vínculos
na faculdade.
O trabalho de Buzeli, Costa e Ribeiro (2013) constitui-se como um relato de
experiência em promoção de saúde e assistência estudantil, em que foram realizadas
rodas de terapia comunitária com alunos da Universidade Federal do Mato Grosso,
de agosto de 2010 a julho de 2011, semanalmente, com duração de 1 hora. A terapia
comunitária configura-se como um tipo de intervenção grupal que objetiva o partilhar
de experiências de vida, para que os participantes se tornem corresponsáveis na
busca de soluções e superação dos desafios do cotidiano. O objetivo do trabalho foi
promover a saúde dos estudantes universitários, por meio da criação de redes de
apoio, a redução das angústias e ansiedades do cotidiano acadêmico e a retomada
da autoestima. Os temas abordados nos encontros revelam aspectos do sofrimento
estudantil importantes de serem ouvidos e trabalhados, como a saudade da casa dos
pais, a solidão vivenciada no contexto acadêmico, a morte de pessoas queridas, a
insatisfação com o corpo físico, as dificuldades econômicas, a preocupação com a
carreira profissional, os conflitos familiares e com os colegas, o medo de não dar conta
das tarefas curriculares e/ou cotidianas e obter notas abaixo da média. Segundo as
autoras, o trabalho de intervenção por meio das rodas de terapia comunitária
favoreceu a expressão de sentimentos que quando não são expressados tendem a
interferir negativamente no bem-estar físico e mental das pessoas. A roda de terapia
comunitária, além de ser um espaço para expressão dos sentimentos, também
favoreceu o compartilhar, pelos participantes, das estratégias utilizadas para
enfrentamento e resolução de seus problemas, configurando-se como uma prática
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cursos de formação, como medida protetiva à saúde mental e como ferramenta para
ampliar o aproveitamento acadêmico dos discentes.
Os resultados das pesquisas apresentadas reforçam a urgência de as
universidades desenvolverem diferentes estratégias para auxiliar na diminuição da
prevalência de sofrimento psíquico na população estudantil. O estudo de Silva et al.
(2014) sugere inclusive o estabelecimento de programas de mentoring, serviços de
apoio psicológico e o desenvolvimento de novas propostas pedagógicas, focadas em
processos interativos de aprendizagem, como medidas de proteção e promoção de
saúde mental.
Partindo dos resultados das pesquisas aqui apresentadas, percebe-se a
importância de estudos qualitativos acerca da vivência do estudante universitário e os
principais conflitos e dificuldades encontrados na atualidade e que se constituem
como fatores que comprometem a saúde mental discente. Compreender a experiência
acadêmica tal como vivida pelo estudante universitário, com vistas a compreender os
aspectos que produzem sofrimento psíquico e os diferentes caminhos possíveis para
ressignificá-lo, apresenta-se como fundamental para o avanço do conhecimento a
respeito da temática. A análise dos estudos anteriormente apresentados nos permite
diversos questionamentos, por exemplo: quais fatores da vivência universitária
constituem-se como estressantes e desencadeadores de conflitos emocionais? Como
esses conflitos se desenvolvem, na visão dos estudantes? Quais as principais
dificuldades vivenciadas nesse período? Como os alunos percebem e significam a
experiência acadêmica, no que concerne à apropriação do papel de estudante
universitário e às demandas desse papel? Para responder a tais questionamentos é
que se realizou a presente pesquisa, uma investigação com estudantes universitários,
por meio do método sociodramático, a fim de investigar as dificuldades vivenciadas
pelos alunos, ao longo do período universitário, e oportunizar aos mesmos, espaços
para expressão do sofrimento psíquico vivido no contexto acadêmico.
Em 1921, Moreno já havia começado seu trabalho como psiquiatra, mas essa
atividade não era a única a que se dedicava. Muito antes de se aprofundar na
construção de possíveis tratamentos, ele se interessou pela busca da essência do
homem, sua conexão com o cosmos que integrava: não aceitava a compreensão do
ser humano desprendido de suas micro e macro-relações situacionais (BUSTOS,
1992).
Nesse percurso, interessou-se pelo teatro e em função de sua visão de homem,
evidentemente não aceitava o teatro tradicional. Fundou o Teatro da Espontaneidade,
localizado próximo a Ópera de Viena, que funcionou como um teatro experimental e
de representação espontânea. Tinha o objetivo de “libertar” o teatro do modo
conservador de dramatização de textos prontos, e os atores de terem que representar
um texto previamente escrito, um papel previamente determinado e que ignorasse as
idiossincrasias da pessoa. A partir do teatro, considerava possível a investigação da
espontaneidade no plano experimental.
A primeira sessão oficial de psicodrama aconteceu em 1º de abril de 1921. O
cenário tinha como única decoração uma poltrona vermelha semelhante ao trono de
um rei. No assento da poltrona havia uma coroa dourada. Na plateia, mais de mil
pessoas, que foram convidadas a figurar no cenário, sentar-se no trono e atuar como
rei, enquanto aqueles que permaneciam sentados funcionariam como júri. A
proposição era que as pessoas presentes seriam o elenco, os atores, mas também
seus dramaturgos, pois o enredo da peça estava presente no “inconsciente social dos
que, no cotidiano, viviam as expectativas e desempenhavam papéis verdadeiros”
(ALMEIDA, 1991, p. 48). A temática da peça era a busca por uma nova ordem política
através do papel do rei coroado: a plateia era convidada a subir ao palco e um de cada
vez, expor sua visão de líder. Ninguém foi aprovado como vencedor nessa primeira
sessão e ser o “salvador da Áustria”. Nesse sentido, o psicodrama nasceu como ato
político: naquele momento, Moreno inaugurava o psicodrama, mas também, sem
saber, o sociodrama, à medida que buscava analisar a produção psicológico-social de
uma coletividade (IDEM, IBIDEM).
Durante uma das sessões no Teatro da Espontaneidade, em 1923, Moreno
descobre acidentalmente, durante uma das sessões, a ação terapêutica da
representação. Trata-se do celebre caso Barbara e George, casal que se conheceu
no próprio Teatro da Espontaneidade. Barbara era uma atriz especializada em papéis
ingênuos e românticos. George era poeta e assíduo espectador dos espetáculos de
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Barbara. Um dia, procura Moreno para dizer que em casa, a atriz seria grosseria,
chegando mesmo às agressões físicas. Moreno prepara todo um trabalho dramático
para que Barbara possa melhorar suas atitudes com relação ao marido, convidando-
a a dar vida a personagens diferentes daqueles que interpretava até então. George
narra para Moreno a melhora de Barbara em casa e o médico propõe então mais um
passo no processo criativo-curativo: convida-os a encenarem sua vida conjugal no
palco. Em seguida, Moreno passa a atendê-los a sós, analisando junto com a casal o
desenvolvimento das sessões. Surgia assim o teatro terapêutico e com ele, a
abordagem terapêutica do casal e da família. A partir daí, Moreno formula de modo
mais consistente suas ideias psicodramáticas, e o teatro da espontaneidade se
transforma no teatro terapêutico, e este no Psicodrama (ALMEIDA, 1991; FONSECA,
1980).
Em 1925, deixando a Europa, Moreno vai instalar-se nos Estados Unidos,
especificamente em Nova York. Prossegue os contatos que tivera com o mundo do
teatro, onde fora buscar o núcleo de sua teoria; algumas de suas ideias foram
acatadas pelo famoso Actor´s Studio em Nova York. Moreno foi de forma gradual
ganhando espaço em solo americano, fazendo-se conhecer pelo trabalho e pela
dedicação ao psicodrama, ao teatro da improvisação e ao teatro terapêutico, suas
criações vienenses (ALMEIDA, 1991).
Já em 1927 faz a primeira demonstração pública de Psicodrama nos EUA,
apesar das dificuldades com a língua. Nesse período conseguiu validar o diploma de
médico em solo americano e foi trabalhar em um hospital como psiquiatra e
psicoterapeuta; gradualmente foi assumindo muitas atividades e desenvolvendo ainda
mais suas ideias e propostas terapêuticas. Ao desembarcar nos Estados Unidos,
encontrou um país envolvido no tema das relações humanas, da maior e melhor
produtividade no trabalho, dos dados estatísticos, da operacionalidade das teorias,
das propostas behavioristas e do pragmatismo. Fazia parte do ideal americano o
homem metrum e no bojo das propostas de investigação dessa temática, até as
relações humanas deveriam ser medidas (ALMEIDA, 1991).
Logo que realizou sua imigração para solo americano, Moreno dedicou-se a
dois grandes projetos que o ajudaram a assentar definitivamente as bases da
psicoterapia de grupo e da sociometria (FONSECA, 1980). Fez um profundo estudo
de uma escola de reeducação para moças em Nova York e dedicou-se também a um
projeto referente à reeducação dos prisioneiros de Sing-Sing (Nova York) com a
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A socionomia surgiu como algo mais que uma simples teoria sociológica, pois
se propunha como uma revisão de antigas correntes e visava a transportar
suas complexas elaborações teóricas para o nível da realidade vivida no
cotidiano, perseguindo no presente e por meio de investigações diretas, o
complexo estrutural dos intercâmbios e das interações humanas, tal como se
realizava, se cristalizava ou se transformava na realidade concreta e como
esta era vivida e produzida por cada sujeito humano (p. 128-129).
Será no interior das estruturas sociais rígidas, que pode ser considerada como
a própria conserva cultural da vida em sociedade, que vão se desempenhar papeis
sociais em conformidade com padrões pré-estabelecidos. Conserva cultural foi o
termo utilizado por Moreno para designar os padrões sócio-culturais cristalizados e
mantidos a todo custo na vida em sociedade. Desse modo, as instituições sociais
vigentes, que tendem a funcionar de modo conservado visando a manutenção do
status quo, dificultam a experimentação do novo na constituição das matrizes de
identidade dos indivíduos, assim como no desempenho dos diversos papéis sociais
(RIBEIRO, 2004).
Desde as primeiras experiências com o Teatro da Espontaneidade, Moreno
observou um conflito primário no ator entre o seu papel dramático e a sua pessoa
privada. Posteriormente, observou esse conflito em suas pesquisas com grupos,
quando analisou que havia oposição, no nível sociométrico, entre a organização oficial
do grupo e suas organizações espontâneas. Finalmente, no nível individual, ele
percebeu um conflito entre interesses coletivos e interesses privados, o que provocava
uma cisão interna. Nesse sentido, segundo Moreno, o grau em que a pessoa privada
é diminuída ou massacrada depende do quanto seus papéis sociais são compatíveis
ou não com seus papéis privados (IDEM, IBIDEM).
Em sua revisão referente aos conceitos morenianos, Naffah Neto (1997)
observou criticamente a função do papel em nossa sociedade, em sua dinâmica de
construção histórica. Na perspectiva do autor, a noção de papel assim como utilizada
na obra moreniana surge a partir da divisão social do trabalho, que provocou uma
cisão no indivíduo e em consequência, alienação, passando a ser por um lado mero
marionete, e por outro lado, uma pessoa privada, que na realidade não existe, é uma
abstração construída como refúgio do conteúdo pessoal que não pode ser expresso
pelo papel social (RIBEIRO, 2004). Os papeis sociais surgem, assim:
Dentro dessa perspectiva, pode-se afirmar que enquanto o sujeito não toma
consciência dessa clivagem (na qual se estrutura a adoção e o desempenho dos
papéis) essa vai se naturalizando e provocando um espaço cada vez maior entre o
coletivo e o privado, dificultando a integração do sujeito. Os papeis sociais passam a
ser desempenhados de modo a “colar” na pele, no corpo; as máscaras passam a se
confundir com o corpo transformando-se em atitudes conservadas, desempenhadas
de modo a corresponder aos padrões sociais. Nesse sentido, só será possível o
surgimento do sujeito espontâneo-criativo, a superação da pessoa privada que
aparece após a “clivagem”, quando ocorrer a desalienação, a integração do sujeito,
quando o coletivo e o privado coincidem, e papel e pessoa não se diferenciam. O
sujeito arrisca-se a questionar seu lado coletivo – os papéis - e o drama vivido pode
ser revelado (RIBEIRO, 2004).
Em sua revisão da obra moreniana, Naffah Neto (1997) irá propor uma revisão
dos conceitos de papéis sociais e psicodramáticos propostas por Moreno (2008).
Argumenta que os papeis sociais são aqueles prescritos pela coletividade, produtos
da conserva cultural e designados sempre com um certo grau de rigidez. Os papéis
decorrentes da brecha entre a fantasia e a realidade vai chamar de papéis imaginários.
Por fim, os papeis psicodramáticos são aqueles desempenhados de modo a incluir a
criação pessoal, flexibilidade e liberdade, devendo designar, necessariamente:
O autor argumenta que não se deve conceber papéis sociais como opostos aos
papeis psicodramáticos, a medida que é justamente na explicitação e
“desconservação” dos papeis sociais que se cria condições de possibilidade para a
emergência dos papeis psicodramáticos, havendo assim convergência entre o ator e
o drama, entre a ação e a imaginação.
Após essa explanação sobre alguns conceitos de Moreno, assim como da
sociometria e da sociodinamica, resta ainda apresentar aspectos referentes a
55
sentimentos, bem como elucidar em algumas ocasiões os conflitos que surgem frente
à trajetória acadêmica. Sobre esse ponto, os alunos reiteraram a importância de
compartilhar, na vivência grupal, angústias e ansiedades até então vividas
solitariamente.
Os autores concluem indicando a importância da instituição e aprimoramento
de atividades formativas reflexivas no ensino de graduação que permitam a expressão
da espontaneidade, promovendo assim mudanças nas representações que os
indivíduos possuem sobre os papéis sociais vividos em contextos educacionais.
Avaliando-se as pesquisas apresentadas, nota-se a necessidade de ampliação
de pesquisas com metodologias diferentes de investigação, à medida que tais estudos
são fundamentais para subsidiar o desenvolvimento de programas de apoio
psicológico específicos para a população universitária, assim como a ampliação da
discussão a respeito da assistência estudantil.
As exigências e demandas da vida universitária colocam diversos desafios aos
alunos e esse processo não é vivido sem impacto na saúde física e psicológica da
população universitária. De acordo com Bardagi e Hutz (2005), verifica-se uma
necessidade de elaboração de estratégias de auxílio aos universitários que sejam
criadas em função das dificuldades específicas dos mesmos, para não repetir
fórmulas preestabelecidas para outros públicos. Afinal, as instituições educacionais
não deveriam estar atentas somente ao desempenho acadêmico, à frequência escolar
ou à formação profissional dos alunos, uma vez que se constitui em um espaço de
formação integral do estudante.
A produção do conhecimento científico sobre a experiência do estudante
universitário se justifica e é fundamental para a compreensão qualitativa da temática
da produção do sofrimento psíquico na universidade, haja vista que esse
conhecimento é importante para o planejamento de ações voltadas para a promoção
de saúde mental no ambiente acadêmico. É fundamental possibilitar aos alunos
espaços de fala, de diálogo, de escuta, incentivando práticas de cuidado para que as
pessoas tenham a oportunidade de falar, expressar e refletir sobre o sofrimento vivido,
compreendendo aquilo que faz sofrer e construindo novos modos de subjetivação,
novos sentidos para a própria experiência como aluno universitário.
61
2 OBJETIVOS
3 MÉTODO
3.1 LOCAL
3.2 PARTICIPANTES
Outras
Exerce
Série da Tipo de experiências
Nome Sexo Idade atividade
faculdade residência no Ensino
remunerada
superior
Bruna Feminino 20 anos 3º ano Mora com a Não Não
família.
Laura Feminino 19 anos 3º ano Mora com a Sim Não
família.
Andressa Feminino 20 anos 4º ano Mora Não Não
sozinha.
Ingrid Feminino 21 anos 4º ano Mora Não Não
sozinha.
Ícaro Masculino 21 anos 4º ano Mora com a Não Não
família.
Tadeu Masculino 22 anos 4º ano Mora com a Não Não
família.
Isis Feminino 23 anos 5º ano Mora com a Não Não
família
Anahí Feminino 22 anos 5º ano Mora com a Não Não
família.
Jéssica Feminino 23 anos 5º ano Mora com a Não Não
família.
Aurora Feminino 24 anos 5º ano Mora com a Não Sim
família.
Felipe Masculino 28 anos 5º ano Mora com a Não. Sim
família.
Fonte: elaborado pela autora.
expressar. Além disso, pode emergir do grupo um ego auxiliar natural, que
venha a desempenhar um papel solicitado pelo protagonista na
dramatização.
3) Protagonista: será a pessoa em torno da qual se centraliza a dramatização.
É autor e ator, a medida que traz a cena para dramatizar e ao mesmo tempo
a desempenha. O protagonista representa o grupo ao dar voz aos dramas,
às angustia e temores vividos. Pode ser um ou mais membros do grupo, ou
ainda um subgrupo, como no Sociodrama.
4) Palco: é nesse espaço que a ação dramática acontece, fazendo emergir a
realidade suplementar, constituindo-se no espaço do como se, no qual os
papeis psicodramáticos são desempenhados. No palco se opera o contexto
dramático.
5) Plateia: compõe-se de todos os membros do grupo presente e que
assumem a função de observador- participante.
Quanto à forma de realização do encontro, o Sociodrama também deve se
desenrolar segundo as seguintes etapas: aquecimento, dramatização e o compartilhar
(FERREIRA, 2010).
1) Aquecimento: objetiva preparar os participantes para o encontro; é o
momento de criação de um ambiente de confiança e a partir do qual emerge o
tema a ser trabalhado na fase seguinte, a dramatização. É quando ocorre a
preparação, o relaxamento, o aquecimento do grupo para a busca de um
problema comum e do protagonista adequado. Pode-se pensar que é o
momento em que o tema do “encontro” vai se explicitar e o indivíduo ou
subgrupo cuja problemática melhor exprimir esse tema, vai ser escolhido como
protagonista. O aquecimento é uma fase essencial e fundamental para
compreensão do processo terapêutico do psicodrama e divide-se em duas
fases: aquecimento inespecífico e especifico. O aquecimento inespecífico pode
ser pensado como as falas, os movimentos e as expressões iniciais, atividades
corporais cujo objetivo é de preparação para o encontro. O aquecimento
especifico sensibiliza e direciona o grupo para a atividade sociodramatica,
podendo ir até aquela parte da sessão onde a temática do encontro se explicita
e requer o nível dramático (NAFFAH NETO, 1997).
2) Dramatização: nesse segundo momento, denominado dramatização,
espera-se que os participantes sejam capazes de representar, no universo do
71
3.4 PROCEDIMENTOS
A pesquisadora então preparou uma lista com nomes dos alunos e série e
compôs uma caixa com os nomes já recortados. Em seguida, realizou um sorteio para
convocação dos alunos, a fim de compor o grupo. Foram sorteados 12 alunos para
realizarem a entrevista inicial com a pesquisadora, a fim de dar início à composição
do grupo.
Deu início pela turma do terceiro ano: dos 12 alunos que se inscreveram, os
quatro primeiros sorteados explicaram que não poderiam participar do estudo no
horário pois haviam escolhido um estágio para fazer, depois que assinaram a lista. A
pesquisadora então realizou um novo sorteio e dessa vez, conseguiu agendar duas
entrevistas; outras duas pessoas disseram que não poderiam participar, uma por
motivo de trabalho e outra em função do horário do grupo. Somente no terceiro sorteio
a diretora conseguiu agendar mais duas entrevistas, esgotando as possibilidades dos
alunos inscritos no terceiro ano. Entretanto, no dia marcado para as entrevistas, duas
alunas não compareceram, e não retornaram os telefonemas da pesquisadora. Desse
modo, somente duas alunas do terceiro ano aceitaram compor o grupo da pesquisa.
Com relação à turma do quarto ano de Psicologia, dos quatro primeiros
sorteados, somente duas puderam agendar a entrevista e aceitaram a participação na
pesquisa. As outras duas alunas justificaram que não poderiam participar no horário
do grupo. A pesquisadora realizou então um novo sorteio e os dois primeiros
participantes selecionados aceitaram participar, deixando a entrevista agendada.
Com a turma do quinto ano, os quatro primeiros participantes sorteados
aceitaram participar e agendaram a entrevista. Além disso, outro aluno inscrito
procurou a pesquisadora, após o sorteio, para pedir a participação no grupo, pois
mesmo não tendo sido sorteado, possuía grande interesse pessoal em participar do
grupo, em função da temática abordada. Como duas participantes do terceiro ano
haviam desistido, havia vagas no grupo e o participante do quinto ano foi aceito.
Após o sorteio e o aceite de todos os participantes, foram agendadas
entrevistas individuais com os alunos, a fim de estabelecer um primeiro contato com
a pesquisadora, para esclarecimento dos objetivos da pesquisa, assinatura do TCLE
e resolução de dúvidas dos participantes. As entrevistas ocorreram no próprio local
em que foi realizado a pesquisa, o Teatro Terapêutico da escola de Psicodrama
localizada no município.
Em seguida à realização de todas as entrevistas individuais, esclarecimento de
dúvidas e a assinatura do TCLE, o primeiro encontro do grupo foi agendado para o
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4 RESULTADOS
Data: 31/3/2017
Duração do encontro: 2h30
Número de participantes: 11
Objetivo: apresentação da unidade funcional e dos participantes,
estabelecimento do contrato de sigilo.
Contextualização do encontro: o encontro ocorreu no local, data e horário
previamente definidos com os participantes. A pesquisadora os recebeu alegremente
na sala de espera do local, convidando-os para tomarem café enquanto aguardavam.
Conforme chegavam, pegavam café, água ou chá e eram encaminhados pela diretora
para o teatro psicodramático. Os participantes já se conheciam e alguns conversavam
animadamente sobre temas da faculdade, enquanto outros observavam em silêncio.
Às 15h30 pontualmente todos os 11 participantes haviam chegado e a diretora então
deu início ao encontro, dando boas-vindas aos estudantes universitários.
Aquecimento inespecífico: após a apresentação da diretora e do ego auxiliar,
a diretora comentou brevemente sobre a história do projeto de pesquisa. O grupo
estava silencioso e o clima expresso era de curiosidade. Foi conduzida uma
caminhada de reconhecimento pelo espaço externo do teatro psicodramático, em
silêncio e individualmente, a fim de relaxar os participantes e integrá-los ao local. A
diretora solicitou que, durante a caminhada, os participantes encontrassem no espaço
algo que estivesse relacionado ao seu momento de vida. Os participantes realizaram
a atividade de forma silenciosa e todos estavam mais sintonizados consigo mesmos,
não havendo interação entre os mesmos. A caminhada durou cinco minutos. Depois
que todos retornaram para o teatro psicodramático, se apresentaram dizendo o nome,
a série que está cursando na faculdade e compartilhando o que mais chamou atenção
ao longo da caminhada. Com exceção de Felipe e Tadeu, os demais comentaram em
seu compartilhar sobre os sentimentos vividos para vir para o grupo e para saber quem
seriam os demais participantes. Nesse momento foi proposto o contrato de sigilo
grupal e ressaltada a importância do sigilo para preservar a privacidade dos
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“Esse momento que a gente teve pra se tocar e se conhecer foi muito forte pra mim a questão
desse carinho né, que a gente fez na gente mesmo, porque as vezes a gente para de ter isso por vários
motivos, ou por falta de tempo, ou porque a gente começa a ter muito mais autocritica do que carinho
e autoamor eee foi muito emocionante esse momento pra mim sabe? De sentir esse carinho, porque
eu senti que fazia tempo que eu não tinha esse carinho e aí foi muito forte pra mim” (Tadeu, 4º ano).
“E foi muito bom encontrar com a minha sala com eles, representando, a gente até conversou
e é muito real que...ainda bem que são essas pessoas sabe? Fico muito feliz por serem eles que estão
aqui apesar de algumas vezes a gente nem conversar tanto mas eu acho que a gente está se
aproximando cada vez mais são pessoas de quem eu me sinto muito à vontade e que a gente está
junto e que eu gosto muito sabe? E acho que foi muito bom isso, essa imagem representou muito a
gente, esse apoio, que a gente se dá mesmo sem ter que falar, saber que tem o apoio ali, sem ter que
abrir...eu fico tranquilo, fico animado, agitado, porque eu queria mais internamente” (Tadeu, 4º ano).
“Eu compartilhei o mesmo que o Tadeu, me identifiquei muito com o que ele falou, nessa
questão de se tocar que foi a primeira vez assim na vida que eu me toquei e me senti porque geralmente
quando a gente fazia isso, eu fazia isso, era muito superficial tipo eu me tocava assim cabeça e tal,
nesse intuito de querer sentir mas eu não sentia era muito, tipo sempre eu passava a mão mas era
muito superficial, hoje eu não sei porque eu consegui éé dar esse carinho a mim mesma foi muito bom
assim a sensação, esse tocar, eu nunca fiz isso comigo mesma, então foi muito bom eu me senti muito
bem, é eu estava mais cansada quando eu cheguei, é engraçado né, eu cheguei cansada, fiz as
atividades e fiquei melhor, era para eu estar mais cansada por ter feito” (Anahí, 5º ano).
A participante comentou ainda que foi importante olhar para sua história como
estudante, pois percebeu o quanto se transformou ao longo do curso:
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“Ééé essa questão de ir relembrando desde o primeiro ano de faculdade, é eu entrei por um
motivo nada a ver tipo se eu for pensar hoje em dia, eu pensava algo tipo nada a ver com meu
pensamento de hoje, então eu fico feliz pela evolução que eu tive assim e foi muito bom relembrando
ano a ano que você vê cada crescimento de cada ano e eu conseguia distinguir certinho a minha
mudança de cada ano assim o que eu consegui mudar do primeiro do segundo, do segundo pro terceiro,
e foi tipo gradativo... é eu lembro que eu entrei tipo pensando nessa questão de comportamental tipo
era muito como que o ser humano age, os mistérios da mente humana, vamos assim dizer e hoje em
dia eu vejo mais a maturidade né, eu vi algo muito cientifico digamos assim, hoje eu vejo a naturalidade
né nesse sentir, experimentar, é essa liberdade mesmo eu acho que é mais assim mesmo,
descobrimento, eu entrei com uma cabeça super fechada e hoje em dia é completamente, por isso que
eu falo nada a ver o começo com hoje” (Anahí, 5º ano).
“E foi legal aqui no palco encontrar com o pessoal rola até uma emoção, porque tipo último ano
e aí eu fui lembrando também quando eu conheci cada um tipo foi bem legal, tipo lembrar, as vezes do
primeiro encontro assim com cada um, no primeiro ano, tipo totalmente diferente também de hoje em
dia, então foi muito bom essa experiência, é juntar com todos assim, na hora que a gente juntou me
deu uma emoção, a gente foi juntando aí eu já imaginei nossa último ano...cada um vai seguir seu
caminho...ah é isso assim, me senti muito bem” (Anahí, 5º ano).
“O tempo passou e já deu 5 anos e olha o tanto que a gente mudou, nossa, eu era muito
diferente no primeiro ano, no físico e também no meu jeito de me colocar na sala é muito diferente, tipo
não sei nem se tem alguma coisa ainda aqui do que eu era no primeiro ano e o tanto que a gente vai
perdendo algumas coisas no caminho eu senti que os anos foram passando e a gente foi ganhando
algumas coisas mudando algumas atitudes perdendo outras aumentando outras né...e foi uma
mudança muito grande, muito bom, tá acabando né” (Jéssica, 5º ano).
no palco para ela, primeiro ao se dar conta da transformação que ela e os colegas
viveram ao longo dos três anos de faculdade, mas principalmente porque sentiu a
diferença nos relacionamentos entre os colegas de sua sala; que era uma turma muito
desunida e agora estão se aproximando mais, estreitando mais os vínculos, e ela pôde
sentir no palco que estavam realmente juntos, dispostos a se aproximar e apoiar uns
aos outros:
“É uma coisa muito feliz por a gente tá junto, por a gente saber que pode apoiar um no outro,
foi uma coisa muito assim, antes eu tava nossa né a imagem que eu fiz pra mim mesma, tipo nossa
quanto coisa que eu tenho que lidar que tanto de problema de preocupação coisa pra fazer mas ao
mesmo tempo a gente está aqui, juntos, a gente tem o apoio um do outro, por isso que é pilar, a gente
pode contar um com o outro, a isso é muito gratificante muito feliz você poder contar com alguém
entendeu? Isso é muito importante, é um pilar mesmo, ainda mais, até eu falei pra Andressa, a gente
mora, nossa família é de outra cidade ter isso é muito importante, e foi nesse sentido mesmo, nossa é
um vínculo muito forte, sei lá fiquei muito emocionada com tudo que aconteceu, ver eles falando
também que vai acabar nossa...não quero chegar nesse momento que vai acabar entendeu? É muita
descoberta ainda pela frente, muita coisa ainda” (Ingrid, 4º ano).
Quando Ingrid acabou de falar, referindo-se a como ainda tem coisas para
descobrir antes do final da faculdade, Aurora se colocou imediatamente, dizendo que
também tomou consciência do quanto estão se aproximando do fim da faculdade, mas
pela primeira vez, vivenciou esse “fim” de uma forma renovada, e todo o encontro a
fez sentir-se mais leve:
“E falando em fim, eu também sinto esse fim, fim de tanta coisa não só da faculdade, coisas
que eu quero que tenham um fim, coisas que eu não quero que tenha um fim mas com relação a
faculdade me veio, hoje especialmente me veio essa questão do fim de uma forma transformada que
foi um, que é a parada, é a primeira parada de uma grande viagem acho que na vida né, é a primeira
parada de uma grande viagem então esse fim é uma parada né, uma estação que a gente vai entrar,
porque a gente vai entrar ainda em outras estações e vai ficar saudade daquela estação de tudo que
você viveu naquelas estações, os lugares, as pessoas que você conheceu, me deu essa sensação, e
ao mesmo tempo que dá uma sensação de saudade e aquele aperto que você vai ter que se despedir
também dá uma empolgação do novo que vem, e daquilo que de lá vai continuar também algo sempre
continua né? Sejam relações, sejam as sensações...e engraçado que eu cheguei aqui de um jeito e to
totalmente diferente, assim to super descontraída, me deu uma leveza muito grande e...eu fico grata
por isso também...ééé...eu estava sorrindo de nervoso e agora to sorrindo mesmo” (Aurora, 5º ano).
“E foi bem forte ver também é a questão do tocar a si mesmo como o Tadeu e a Anahí falou
porque ééé, o jeito que eu tenho lidado comigo mesma, como estudante também, tem sido algo bem
destrutivo assim né... eee eu acho que até para o estudante a gente tem que ter paciência com a gente
mesmo não se autocobrar tanto, entender seu tempo e eu não tenho feito isso, então ser estudante pra
mim tem sido difícil e poder me tocar e me sentir com afeto, porque eu senti afeto por mim mesma aqui
foi muito importante pra mim é...e associar éé no jeito que eu to lidando comigo mesma como estudante
então eu fiz essa associação” (Aurora, 5º ano).
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Aurora finalizou sua fala observando que sentiu gratidão, ao encontrar-se com
os colegas de sua sala no palco, pois observou o quanto tem uma relação diferente
com cada um, mais próxima ou distanciada. Entretanto, Aurora compartilhou com os
colegas que era um “grande prazer” (sic) conhecer cada um deles e ser da mesma
sala. Nesse momento Jéssica pediu a palavra e fez uma observação, dizendo que ao
ouvir Aurora se deu conta de que não irá fazer estágio com nenhum dos quatro
colegas que estão no grupo de estudantes e sentiu-se triste com isso; Aurora brincou
com Jéssica que irão se encontrar no grupo, e os participantes se descontraíram
bastante, brincando com a resposta da colega. O burburinho do grupo se encerrou,
quando Isis começou a compartilhar sobre o que vivenciou ao longo do encontro. A
participante destacou também a importância do encontro com os colegas de sua sala,
no palco, no subgrupo, pois se sentiu muito amparada por eles no momento de
construção da imagem corporal coletiva, à medida que sua própria imagem corporal
individual expressava muito cansaço e tristeza no papel de estudante de quinto ano
de Psicologia. Isis acrescentou um novo olhar para o trabalho desenvolvido no
subgrupo, retomando a importância do brincar como atividade terapêutica: sentiu que
nessa atividade, vivenciou com leveza pela primeira vez o quinto ano, desde que as
aulas começaram, em fevereiro:
“Eu me senti assim pelo pessoal amparada e quando a gente sentou né eu até brinquei que ai
surgiu a brincadeira e pela primeira vez nesse ano eu vi o quinto ano de uma forma leve pela primeira
vez...sabe porque? A gente passa assim um transtorno no quarto ano ai a gente pensa que o quinto
vai ser melhor ai vem o TCC... então pra mim foi muito bom esse momento assim de poder brincar, de
poder no papel de aluna poder ter um momento mais leve né porque o quinto ano... (Isis, 5º ano).
Isis compartilhou com o grupo como está sentindo pesado o começo do quinto
ano, em função da quantidade de estágios, de atendimentos que está realizando:
“Eu até comentei com eles assim o peso do quinto ano porque é uma responsabilidade assim
né, quem começou a atender quem começou a fazer alguma coisa assim de atuação a gente sente
assim, vem a demanda ai você atende o paciente você sai assim da sessão e você tem um tanto de
coisa para processar e ai no outro dia você está em outro estagio ai você está numa instituição ai tem
o peso da instituição, ai no outro dia você atende outro paciente ai tem esse outro peso... (Isis, 5º ano).
não possui um convívio mais próximo com Jéssica, mas que sentia- se bem com ela
e isso era importante, pois veio para o encontro preocupada com quem seriam as
pessoas que estariam no grupo. Em síntese, Isis comentou para finalizar que gostou
muito de todos os participantes que foram sorteados para montar o grupo de
universitários.
O participante Felipe se colocou logo depois de Isis, e de forma breve
compartilhou que gostou de todas as atividades realizadas e que a interação com os
colegas de faculdade faz muito bem para ele, pois nessa convivência sente-se
querido. Felipe finalizou dizendo estar animado para os próximos encontros. Em
seguida, Ícaro pediu a palavra e em seu compartilhar, feito de forma breve e sintética,
destacou ter vivido um momento de intensa emoção em cima do palco, quando
estavam no subgrupo, e os colegas disseram o quanto notaram uma transformação
nele ao longo dos quatro anos. Ícaro relatou que reconhecer as mudanças pessoais
vividas, ao longo dos quatro anos, o deixaram emocionado, mas que logo “cortou”
esse choro:
“O que me marcou mais foi nós quatro sentados conversando que há muito tempo eu bloqueio
uma parte emocional minha assim não sei nem a quanto tempo eu não choro mais pra você ter uma
idéia...acho que ninguém aqui nunca me viu chorar, talvez o Tadeu...mas o resto né...e me veio vontade
de chorar uma hora só que eu logo cortei e foi muito forte essa hora que o pessoal falou pra mim
também que eles viram essa mudança, do ponto onde eu parei de ser mais emocional, comecei a usar
mais a razão...eu comecei a trabalhar mais a cabeça e a deixar de lado minhas emoções de propósito
e acho que foi bom mas aqui eu posso começar a tentar me ver mais, na sala eu acho difícil mas aqui
por confiar em todo mundo que está aqui e pra mim foi muito positivo nesse aspecto” (Ícaro, 4º ano).
Após sua fala, o participante Ícaro explicou para o grupo que precisava sair,
pois teria um compromisso às 18h. Despediu-se de todos e foi embora. Bruna então
pediu a palavra e sua fala foi rápida, tensa. Compartilhou com o grupo que o ambiente
estava “favorável” (sic) por isso criou coragem em compartilhar, pois quando está em
grupo geralmente deixa para falar no final. Bruna revelou que durante o trabalho no
palco acessou em si mesma um sentimento de gratidão por estar na metade do curso
de Psicologia, pois sonhava em fazer essa faculdade e em muitos momentos de sua
vida teve dúvidas se iria conseguir realizar esse sonho. Contou que durante a
conversa com sua colega de sala, Laura, realizada no palco, sentiu-se muito bem pelo
fato de a colega sentir-se como ela, feliz e agradecida por estar realizando o curso
que sonhou. O sentimento de gratidão emergiu na conversa, ao perceberem que
fizeram a escolha de curso certa para elas. Além disso, Bruna destacou ter percebido
o quanto cada subgrupo apresentou vivências diferentes:
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“E depois a Laura foi falando da imagem dela e a gente acabou compartilhando a mesma coisa
e depois eu percebi como cada sala compartilha o mesmo sentimento é totalmente diferente eu e ela
aqui procurando algo, o pessoal tá ali mais firmado em alguma coisa e eles estão mais, não sei, meio
que no desespero e feliz e triste e olhando isso assim eu poderia ficar desesperada pra ver o que eles
estão passando mas acho que não tem necessidade de fazer isso agora, dá medo, mas acho que tudo
tem seu tempo vamo com calma vamo viver o terceiro primeiro e acho que é isso mesmo...como cada
sala vive uma coisa...e eu descobri pelo menos isso, o que ela está vivendo, o que ela está vivendo é
praticamente a mesma coisa que eu isso é muito bom ter ela aqui porque a gente pode trabalhar isso
juntas” (Bruna, 3º ano).
Logo que a participante terminou sua fala, a colega Laura, também do terceiro
ano, começou a compartilhar que está em uma fase de sua vida de autodescoberta,
de procura de si mesma, e que conversar com Bruna foi gostoso exatamente por
identificar que a colega está passando pela mesma busca de si mesma. Com relação
ao vivenciado no grupo, Laura comentou que a apresentação das imagens dos
subgrupos a deixou emocionada e que todo o encontro foi bom, pois chegou para o
grupo cansada e estava sentindo-se mais “leve”.
A última participante a compartilhar foi Andressa, que começou destacando em
tom de brincadeira que se sentiu ansiosa por ser a última a falar. O grupo se
descontraiu, rindo e Andressa continuou dizendo que gostou do encontro, que veio
animada para dar início ao grupo. Revelou que percebeu maior dificuldade pessoal
com as atividades realizadas no palco, pois sentia vergonha, e que quando foi
proposto que se reunissem em subgrupo ela sentiu vontade de chorar. O participante
Felipe a interrompeu nesse momento, dizendo que todos sentiram vontade de chorar:
“Andressa: até o momento que a gente estava aqui embaixo estava muito bom só que pra mim
subiu no palco a energia muda muito as luzes também, olhar no olho me incomoda, mas eu olho, mas
me incomoda, eu tenho medo de ser invasiva eu acho mesmo sabendo que eu não vou ser... e hora
que foi pra juntar com a nossa sala nossa parece que meu coração até sorriu né e o que ficou pra mim
assim foi mesmo, me deu um sentimento de saudade, porque eu sei que eu vou sentir saudades disso,
tipo ´aproveita agora´, porque eu sei que eu vou sentir saudades disso depois, da sala de estar com
todo mundo e nossa foi muito forte assim, me deu até vontade de chorar na hora acho que o grupo
sentiu isso..(Andressa, 3º ano).
Felipe: acho que todo mundo sentiu vontade de chorar (Felipe, 5º ano).
Andressa contou para o grupo que também estava sentindo o “peso do quarto
ano” (sic), pois em sua opinião até o terceiro ano o curso de Psicologia foi tranquilo
para ela, mas que desde que o quarto ano começou estava sentindo-se ansiosa com
o excesso de atividades e em muitos momentos sentiu-se em dúvida se iria conseguir
realizar todas as atividades necessárias. Por isso foi importante para ela a imagem
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que o grupo construiu, de suporte, de apoio, pois deu-se conta do quanto isso é
importante nesse momento do curso:
“Então a gente sai do sexto semestre, até o sexto semestre é muito tranquilo a gente mal tem
aula, ai você entra no sétimo muda muito...então...muda da agua pro vinho, de repente você começa a
ter aula todos os dias todos os horários você nem tem tempo de almoçar já tem que estar num lugar
com outras pessoas e a noite também...então é duro...e por isso suporte, a gente precisa se dar
suporte...” (Andressa, 4º ano).
“É o que eu te falei na entrevista de sentimento de não vou dar conta sabe? O que que está
acontecendo tá todo mundo muito angustiado por isso que não vai dar tempo o que que tem que fazer
o pessoal se perde você está fazendo uma coisa e ai esquece de fazer outra e a gente chega na aula
e ninguém leu o texto porque tem dez mil pra ler e ninguém leu o texto e fica todo mundo da sala com
aquele sentimento de nossa sou um bosta” (Tadeu, 4º ano).
A fala de Tadeu mobilizou Felipe e Aurora, que voltaram a falar como muitas
vezes sentiram-se incapazes de dar conta da demanda do curso e, portanto,
incompetentes no papel de alunos. Felipe destacou que era difícil ter tantas atividades
para realizar e que não sente que realizou todas de forma satisfatória, presente no
que estava fazendo. Andressa então comentou que por todas as questões
apresentadas percebia a importância do grupo de estudantes, pois poderia ser um
suporte para desempenharem o papel de alunos.
Nesse momento o grupo já havia ultrapassado o horário e se aproximava das
18h. A diretora então fez o convite para encerrarem o encontro, pedindo que cada um
dos participantes falasse uma palavra sobre como estavam sentindo-se no final da
sessão:
Isis: leveza
Felipe: areado
Bruna: gratidão
Andressa: gratidão
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Ingrid: gratidão
Tadeu: libertação
Laura: alegria
Anahí: sinceridade
Jéssica: transparência
Aurora: diversidade
“Eu percebi como cada sala compartilha o mesmo sentimento” (Bruna, 3º ano).
integrantes desse grupo? Como será o funcionamento? Será que eu vou gostar? Será
que vou encontrar o que estou buscando?
Os participantes sentaram-se próximos aos colegas de sala, de modo que 3º,
4º e 5º ano permaneciam juntos, em um bloco “inseparável”. O fato de compartilhar
esse espaço novo com colegas de sala já conhecidos exprimia um ar de “segurança”.
Após a caminhada no espaço externo, quando todos os participantes
retornaram para o teatro psicodramático, a diretora fez o convite para se
apresentarem, destacando nome, série da faculdade e o que chamou atenção durante
a caminhada. O primeiro a se apresentar foi Felipe, dizendo o nome, série do curso e
o que lhe chamou atenção no espaço externo. Felipe é breve e quando finalizou,
ocorreu um silêncio de um minuto. Tadeu então começou a se apresentar, referindo-
se a como estava sentindo-se em vir para o grupo de estudantes universitários:
“Eu sou o Tadeu, sou do quarto ano, e to achando muito legal estar aqui, eu to aqui olhando e
me sinto a vontade com praticamente todo mundo, mesmo sem ter tanto contato, acho que daqui o que
eu tenho mais distância é do Felipe não sei porque, acho que a gente não tem muito contato assim e
um pouquinho da da ...”(interrompe a fala e olha para Aurora, que diz o nome).
“Meu nome é Ingrid e eu to no quarto ano estar aqui eu to confortável to bem com as pessoas
e eu vim pra cá, não sei dizer ao certo assim, mas eu vim com um sentimento de procura sabe, uma
procura sabe, não sei, é algo que eu sinto vontade de fazer e eu cheguei aqui bem ansiosa, eu tava lá
fora e , eu observei muita coisa mas o que me chamou atenção foi uma árvore, não de porte grande,
porque ela estava seca mas mesmo assim ela tinha uns frutos sabe tipo, por mais que ela tivesse seca
ela tinha folha ainda, e isso me lembra muito, tipo, se for olhar pra mim, uma questão que por mais que
as coisas estejam difíceis a gente sempre pode florescer entendeu? E nada acaba, sempre você pode
fazer isso se tornar algo e isso me lembra muito uma questão tipo de esperança, eu tenho muito comigo,
eu acredito nas coisas, pode mudar, mudança essas coisas, eu acredito, então essa questão de
renascer sabe, eu acho muito bonito então é algo que me chamou muita atenção eu fiquei bastante
tempo focada nela, muita gente também não ia achar isso bonito mas eu achei lindo, foi isso” (Ingrid,
4º ano).
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“Meu nome é Isis, eu to no quinto ano, também to confortável, eu admito assim que quando
falou que seria terceiro, quarto e quinto ano eu fiquei um pouco assim ansiosa, por saber quem seriam
as pessoas, porque tem pessoas que eu não converso não conheço então não no sentido negativo
assim aí não tem ninguém que eu não goste algo assim, mas foi ai quem será né? Me deu um pouco
de curiosidade, de ansiedade sim, porque é algo que a gente precisa, formar esse grupo, então eu
fiquei ansiosa, aí agora chegando aqui eu to muito confortável, muito confortável assim, todas as
pessoas, as duas eu não conheço muito né (aponta para as duas integrantes do terceiro ano) porque
a gente não se vê, já o pessoal do quarto ano (risos, os colegas riem também) e da minha sala, então
assim é um grupo que eu fiquei muito feliz a hora que eu fui vendo todo mundo chegando” (Isis, 5º ano).
“Acho que todo mundo sentiu vontade de chorar” (Felipe, quinto ano).
Jéssica brincou, ao final de sua fala, sobre sua frustração em não haver nada atrás
da cortina, ocorreu um corte no fluxo de produção iniciado e o grupo silenciou-se. Um
certo estranhamento se fez no ar e Ingrid retomou o processo de compartilhamento,
destacando a emoção sentida em encontrar-se com os colegas em cima do palco, e
essa experiência foi citada como importante por todos os outros participantes do
quarto ano.
Aurora, aluna do quinto ano, retomou também a importância do encontro com
os colegas no palco: à medida que estão separados pelos diferentes estágios,
encontram-se pouco na faculdade, o que tornou o momento no palco bastante
especial. Jéssica se mobilizou e comentou:
“É eu estava pensando aqui agora ouvindo a Aurora falar que sobre os estágios, eu não estou
no estágio com ninguém aqui, eu estava no estágio com vocês de criança e eu mudei tipo ontem”
(Jéssica, 5º ano).
Todos riram muito com a brincadeira dos colegas, o grupo se dispersou. Nesse
momento, Jéssica apareceu como uma voz dissonante no grupo, pois a cada
comentário, parecia não conseguir mobilizar os colegas e silenciava-se. Isis, que
também é do quinto ano, começou então a realizar o compartilhar. A participante
resgatou em sua fala a intensidade do vivido no palco, à medida que especialmente
para ela, pôde vivenciar o quinto ano com leveza pela primeira vez, na brincadeira
com os colegas, no momento de criar a imagem e realizar a dramatização. Quando
comentou sobre sua expectativa para saber quem seriam os integrantes do grupo, Isis
revelou também a relação que possui com os colegas de sala do quinto ano, dizendo-
se próximo de todos (Aurora, Felipe, Anahí), mas distante somente de Jéssica; apesar
de serem da mesma sala, não têm um convívio próximo. Desse modo, o “isolamento”
de Jéssica com relação ao grupo do quinto ano também pareceu se revelar.
Ao longo do compartilhar, o clima no grupo era de relaxamento, intimidade e
entrosamento. Felipe se colocou dizendo que gostou muito de todo o encontro e que
estava animado para os próximos. Revelou que ao longo da troca no subgrupo,
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Data: 7/4/2017
Participantes: 8 (Felipe, Jéssica, Ingrid, Isis, Laura, Aurora, Andressa, Ícaro).
Ausentes: 3 (Bruna, Anahí, Tadeu)
Duração do encontro: 2h22minutos
Objetivos: trabalhar o reconhecimento do eu-estudante e promover maior
interação entre os participantes.
Contextualização do encontro: nesse dia, três participantes faltaram à
sessão. Tadeu avisou no encontro anterior que não viria pois passaria por uma cirurgia
dentária; Anahí e Bruna justificaram a ausência minutos antes do encontro, pelo grupo
do whatsapp, pois estavam “presas” na faculdade em função da chuva pesada que
caiu no horário da sessão. O primeiro a chegar ao encontro foi Felipe, adiantado 20
minutos, e a diretora permaneceu com ele na sala de espera tomando café e
aguardando os demais participantes, que chegaram aos poucos, comentando sobre
a dificuldade de locomoção em função da chuva e conversando animadamente. O
grupo atrasou 10 minutos para começar.
Aquecimento inespecífico: a diretora iniciou o encontro dando as boas-vindas
aos estudantes e convidando-os para tecerem comentários sobre o encontro anterior.
Os participantes apresentavam expressões de cansaço, e o clima no início do
encontro era de tensão e silêncio. Isis e Jéssica quebraram esse clima quando
compartilharam que ficaram sentindo-se muito bem após o primeiro encontro, mas o
restante do grupo permaneceu calado.
“Nossa, foi muito bom! Eu sai daqui na sexta e aconteceu um tanto de situação assim
estressante e frustração assim geralmente quando acontece, eu to esperando uma coisa e não
acontece ou acontece de uma forma diferente eu fico muito frustrada e irritada ao extremo e eu fiquei
uma paz que eu me desconheci...e eu tenho certeza que foi daqui porque fui justo assim que eu sai e
foi tudo acontecendo e dando errado e eu em paz” (Isis, 5º ano).
“Também fiquei muito bem! Já gostei bastante e já fiquei ansiosa para a próxima, queria voltar
de novo....fiquei muito bem...” (Jéssica, 5º ano).
ngrid: desgaste
“Eu sou o desgaste... to ferida, to cansada, to indisposta, to acabada...(chora bastante e se
encolhe)
Jéssica: cansaço
“Eu sou o cansaço...tá tão pesado, tão difícil, tá tão tampado, tá difícil mexer, tá cansando, tá
machucando”
Andressa: Dolores
“Eu sou Dolores...tá doendo minha garganta, as minhas costas, meu coração, tá doendo tudo”
Felipe: medo
“Eu sou o medo...medo de fracassar, medo de não conseguir, medo do julgamento dos outros,
medo...”
Laura: sono
“Eu sou o sono...devido a rotina cansativa, corrida, que cobra demais, faz a gente ficar doente,
resfriada, mal consigo cuidar de mim”.
Isis: tentando
“Eu sou tentando...tentando ficar bem, tentando conseguir, tentando se encontrar, tentando
conseguir...”
Cena: “Eu grito” (Os participantes em fila um ao lado do outro, e um a um se alternam para
frente, dizendo uma frase para a plateia dando voz e sequencia um à fala do outro).
Ícaro: eu fico aqui parado, não consigo mexer, não tenho reação, mas sei que eu posso sair
disso, parece que tá contra mim...
Jéssica: eu fico aqui parada, e eu também fico aqui cansada, também fico aqui imóvel sem
conseguir e querendo muito mexer...
Felipe: eu fico aqui parado, eu fico aqui cansado, tenho medo do fracasso
Isis: eu fico aqui parada, eu fico aqui cansada, com medo do fracasso, mas tentando, tentando,
e tentando...
100
Aurora: eu tenho comodismo, tenho cansaço, tenho medo, posso fracassar, mas vou continuar
tentando, porque diante de tudo isso, mesmo não sendo ouvida, eu grito...
Cena: “Silêncio” (as três participantes sobem ao palco, sentam-se em círculo e permanecem
olhando para o chão, em absoluto silêncio).
A diretora sobe ao palco e, atuando como ego-auxiliar, realiza o duplo das participantes.
Duplo de Ingrid: tô tremendo por dentro, to em carne viva, só quero ficar aqui, quietinha, só
quero ficar quietinha, porque ninguém nunca me entende mesmo...
Duplo de Andressa: não sei onde eu to, parece que to meio passada meio perdida, com dor,
dor na garganta, dor nas costas dor no corpo inteiro, sentimento de muita solidão, de estar sempre tão
sozinha...nossa gente difícil, tem um lugar que para, tem um lugar que deita na cama e para, queria
descansar...
Duplo de Laura: não sai...é tão doído, tão doído, tá tão aterrado que nem sai...não sai...então
eu venho aqui, para ver se encontro algo, para não sei bem, mas to procurando algo que me permita
ser eu mesma...
Eu te criei
Para que sejas tu mesmo,
Para lutar por si mesmo,
Para lutar por teu nascimento
E por tua morte.
Teu nascimento é o teu direito.
Tua vida é o teu direito.
101
Jéssica- “gente eu posso contar uma coisa vou ter que contar...eu decidi mudar o meu tcc
semana passada...ficou tudo bem, mudei, agora eu vou fazer sociodrama temático, e o meu sociodrama
temático tem um poema e tem também musica...ficou parecido com o de hoje”.
Risos no grupo.
Ingrid: gente, como dizer para minha orientadora que ela não é mais minha orientadora?
Risos. Começam a se distrair com outros assuntos e falam sobre orientação de TCC.
Jéssica: “falar do tcc acho que tem tudo a ver com o que eu vivi no palco, que eu acho que
trocando em miúdos até agora eu acho que eu escondi muito o que eu realmente queria no TCC o que
eu realmente queria fazer e muito muito devagar muito aos poucos eu fui escolhendo tentando
encontrar um caminho, e não deu certo e eu estou tentando de novo...até eu encontrar um caminho
que desse certo...antes eu queria trabalhar com sofrimento de estudantes também, ai agora eu quis
trabalhar relações de trabalho...mas eu ia trabalhar com janela de johari agora eu mudei, quero fazer
sociodrama também” (Jéssica, 5º ano).
Ingrid: eu sou uma pessoa muito esquisita...eu me acho esquisita, porque, não que aqui seja
um momento terapia tá? (Risos) já não basta a sessão que eu tive hoje...porque eu faço as coisas e
não queria fazer...sabe? Ás vezes eu não falo o que eu queria falar...e eu só fiz isso essa semana,
então estou de parabéns então as vezes eu me surpreendo comigo mesma com a minha capacidade
de me boicotar ...ai meio que foi isso que eu trouxe hoje... para mim foi muito difícil falar desse tema,
porque é um tema que eu venho vivendo faz dois anos sabe? Então é muito difícil pra mim falar disso,
é algo que tipo ta vivo em mim e até hoje eu sofro por conta disso e não parece que vai ser resolvido
tão cedo...então é muito difícil sabe assim eu acho que de qualquer coisa que eu poderia trazer hoje
esse é o tema mais difícil então por isso que realmente pra falar disso e difícil, pode contar nos dedos
as vezes que eu falei no assunto gente...então foi muito difícil pra mim hoje aqui mais eu acho que eu
até que eu consegui bastante dada as circunstancias e agora tipo eu to tranquila aqui...tipo não resolveu
nada mais eu to tranquila...não é que não resolveu nada...o problema continua ali entendeu? Mas eu
to tranquila, tipo eu to criando coragem no processo...
Felipe: o Felipe ideal não faria isso mas o Felipe real faz muito (risos)
103
A diretora percebeu Felipe olhando para a participante Isis, que estava sentada
no mesmo banco que ele, porém separados por dois outros participantes. A diretora
questionou Felipe se ele estava realizando um pedido de desculpas para a colega de
sala e de estágio e ele respondeu:
Felipe: aqui? É houve...eu deixei ela esperando uma hora num dia que não podia atrasar e tá
assim muito foda...a faculdade está foda pra todo mundo mas assim eu não to conseguindo lidar com
isso muito bem to meio que desistindo antes da hora assim...nossa eu não vou dar conta...eu lembro
que teve uma vez que uma pessoa falou pra mim, uma terapeuta falou pra mim que eu era
perfeccionista eu falei ´tá doida perfeccionista?´ ai ela explicou que quando eu quero fazer de um jeito
muito bom e quando eu vejo que ou vai dar muito trabalho ou eu não vou conseguir ser daquele jeito
eu desisto, simplesmente deixo quieto... aí não sei se isso tem a ver, sei que foi uma semana muito
triste pra mim, fiquei muito mal...mas bola pra frente..vamo ver...
Ingrid: pra mim é igual...vocês acordam numa boa? (pergunta para unidade funcional)
O grupo explode numa grande gargalhada.
Elaine (ego-auxiliar): eu acho que isso vem do caos...eu acho que o caos é muito a
sobrevivência assim...então é muito difícil a gente se organizar, a gente tem a nossa organização
caótica, de dar conta desse caos...mas essa organização, aquela coisa mais assentada, eu acho que
a gente só consegue, eu tenho pensado nisso quando a gente está num nível mais organizado de vida,
fora desse caos, já passou a tempestade....a tempestade eu acho complicado a gente conseguir...
Aurora: é difícil porque às vezes você está, é, tá todo mundo te vendo tão bem e você está
horrível né...e parece que você está fazendo tudo certo...e quando você está se sentindo super bem
fica todo mundo te olhando como se você fosse uma bosta... (risos) Tipo, você está fazendo no seu
tempo, tá achando que ta tudo certo, tá feliz mas tá todo mundo falando ´você tá atrasada, tá
péssimo´...é um contraste...
“E é agressivo, muito agressivo pra mim é...dói, tem dia que você se sente uma bosta, que você
não deu conta, você tentou, fez o máximo, mas não deu conta e ninguém entende porque você não
deu conta, acha que você tá fazendo corpo mole, mas você estava se matando...aí por isso que você
vai lá e bebe um pouquinho...pra relaxar...só um pouquinho...” (Aurora, 5º ano).
cedo. A diretora pediu que aqueles que ainda não tinham se colocado, comentassem
um pouco sobre como estavam se sentindo. Isis pediu a palavra realizando o
compartilhar:
Isis: “essa semana inteira eu senti que eu não ia dar conta...e isso é muito novo pra mim porque
eu nunca senti que eu não iria dar conta assim de não vou dar conta eu tenho medo eu tenho receio
eu fico ansiosa mas eu sempre sei que eu vou dar conta, assim em vários ou quase todos os aspectos
e essa semana não, essa semana juntou tudo eu comecei todos os meus estágios é também
desesperador, comecei todos, to atendendo em todos, do hospital psiquiátrico e aí eu senti um peso
assim porque todos os pacientes são casos muito pesados assim e ai você vai na supervisão você já
sentiu aquilo na sessão a hora que você vai na supervisão parece que amplia né? (risos) Assim minhas
supervisoras são maravilhosas as duas então assim nenhuma trata um caso como se fosse assim ´ah
tá´, elas vão entrando e compreendendo a dor da pessoa e a gente fica meu deus do céu, olha essa
pessoa está confiando em mim com um sofrimento desse tamanho que eu não sei se eu tenho
capacidade para ser o que ela precisa né...e os vários pacientes assim cada um tem uma necessidade
de mim..” (Isis, 5º ano).
Isis: nossa eu senti um peso essa semana assim então eu acho que os meninos falou, o que a
gente estava conversando de dormir porque é o momento assim ó de fugir igual o Felipe falou, tipo, eu
chego em casa, durante o dia, essa semana eu to assim eu chego, durante o dia eu faço tudo e bem ,
eu acordo 05h30 para ir na academia volto e começo o dia e faço to inteira e tudo mas a hora que
chega a noite uma tristeza do tamanho do universo um vazio uma falta de sentido e eu pensando nossa
podia ler algo sobre isso nossa o paciente falou disso vou pesquisar...nossa não consegui fazer nada
só consegui ver uma série que fala da menina que se matou (Isis, 5º ano).
Isis: sintetizando tudo eu acho que a gente conseguiu pensar nosso grupo que o que esta
protagonizando é o medo de crescer... o medo e a dificuldade de crescer... assumir as
responsabilidades da vida e banca-las...
Laura: foi legal...foi muito bom...é porque hoje a Bruna não veio e ela me avisou que não ia vim
ai eu pensei nossa eu vou sozinha, mas não foi ruim isso, foi legal
Andressa: então essa semana foi difícil eu to desde segunda feira, não, desde o final de semana
conversando menos e não querendo falar muito e no grupo da aula de quarta eu não queria ir, não
tinha vontade de falar, e mexeu muito comigo lá...e agora eu fiquei sem voz sabe? Então...e aqui
também eu não to com vontade de falar...mas eu to saindo bem...a hora que minha voz melhorar eu
falo (Andressa, 4º ano).
Ícaro: eu não vim de uma semana muito boa não...eu tenho o mesmo problema do Felipe assim
eu sou muito procrastinador sabe? E eu venho tentando mudar isso mas é tão difícil mudar isso, nossa,
é muito difícil...(Ícaro, 4º ano).
Ícaro: e não vou deixar então assim éé eu to tentando já melhorar, tanto que foi um dilema
muito grande eu entrei no quarto ano e falei nossa até que é tranquilo aí depois começou e eu pensei
nossa não é tranquilo...e aí que eu entrei nesses dilemas que eu estou hoje mas eu to sentindo que eu
to conseguindo ser mais organizado sabe eu criei um meio que um roteiro assim do que eu tenho que
fazer para tentar saber o que eu tenho que fazer no dia pra chegar na hora certa não atrasar em nada
107
e fazer, cumprir o que eu tenho que fazer....então assim, foi uma semana difícil, mais pesada mas ta
melhorando agora...(Ícaro, 4º ano).
E com essa fala, Ícaro finalizou o encontro grupal, reforçando o que foi
compartilhado por Felipe, Ingrid, Isis, Aurora, Andressa: estão finalizando nessa sexta-
feira uma “semana difícil” em função das demandas vivenciadas na faculdade. Laura,
silenciosa como única representante do terceiro ano, somente revelou: “eu cheguei
muito cansada aqui porque minha semana foi muito puxada mas eu tô saindo mais
leve” (Laura, 3º ano). Não falou sobre sua vida acadêmica, mas relatou alívio
emocional em função da participação do encontro. E assim, o grupo chegou ao final.
Quando a diretora encerrou, ainda escutou Felipe dizer para o grupo:
Ícaro: e agenda eu nem compro mais porque fica em branco nos primeiros dias eu escrevo
depois...
Ícaro: então eu fiz a planilha colei no caderno e vou tentar seguir...estou melhorando
“O que está protagonizando é o medo de crescer ...o medo e a dificuldade de crescer...” (Isis,
5º ano).
109
Data: 13/04/2017
Participantes: 8 (Anahí, Jéssica, Ingrid, Isis, Bruna, Tadeu, Ícaro, Andressa)
Ausentes: 3 (Felipe, Laura, Aurora).
Duração do encontro: 2h30
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Jéssica: rejeição
Isis: desafiador
Ingrid: tensão
Anahí: felicidade
Andressa: raiva
Ícaro: grupo
Tadeu: interrogação
Bruna: contato
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A dupla formada por Isis (5º ano) e Ingrid (5º ano) apresentou as cenas
seguintes:
tanto ela, eu acho que é um desafio até para o paciente mesmo que está ali eu acho...mas é um desafio
muito grande para ela atender ele sabe? Eee ela falou de um momento que aconteceu nessa última
sessão que eles tiveram em que o paciente pela primeira vez ele demonstrou emoção , ele deixou o
sentimento dele não racionalizou não levou para a mente e tentou fazer alguma coisa para fugir da
sessão, ele trouxe essa coisa do sentimento, ela até falou a palavra, desafia a –dor separadamente,
que é o que o paciente começou a fazer eu acho...”
Em seguida, Anahí (5º ano) compartilhou a cena de Jéssica (5º ano), e vice-
versa:
Quando Ícaro começou a contar sobre a cena apresentada por Andressa, que
se passava em sala de aula durante uma atividade vivencial dirigida pelo grupo de
115
Tadeu, que estava presente no grupo, ele se espantou e perguntou para Andressa:
“meu grupo? A colega respondeu afirmativamente, ressaltando que não ficou mal com
o grupo dele, e sim sentiu-se mal durante a vivência que realizaram. Tadeu
demonstrou espanto, assim como Ingrid; os dois são da sala de Andressa e Ícaro,
todos do quarto ano. Quando Ícaro terminou de contar a cena de Andressa, a diretora
pediu que os participantes se aproximassem da cena que mais se identificavam,
incluindo a própria cena, e formaram-se então duas duplas e um grupo. Anahí estava
sentada ao lado de Jéssica e colocou a mão nos ombros da colega, que permaneceu
sentada em seu lugar. Isis aproximou-se de Bruna, que também escolheu Isis. Todos
os participantes do quarto ano se reuniram em um único subgrupo, aproximando-se
de Andressa, que permaneceu em seu lugar. A diretora então perguntou para
Andressa se ela gostaria de trabalhar sua cena no palco e a participante respondeu
afirmativamente. A diretora ainda sugeriu para o grupo que essa cena fosse
dramatizada primeiramente, e que se tivessem tempo poderiam escolher ainda uma
segunda cena. Houve concordância de todo o grupo e a diretora então permaneceu
junto com Andressa no palco, explicando para os outros participantes que poderiam
descer e sentar-se.
Dramatização: foi dramatizada a cena apresentada por Andressa, vivenciada
em uma atividade em sala de aula. A dramatização contou com a participação de
vários membros da plateia como egos auxiliares. As técnicas do psicodrama mais
utilizadas foram duplo, espelho, inversão de papéis, solilóquio e Encontro do Eu
grande com o Eu pequeno (CUKIER, 1992, p. 85). As duas cenas, a primeira,
vivenciada em sala de aula, e a segunda, vivenciada quando a protagonista tinha seis
anos, traziam como temática questões relacionadas à constituição da autoimagem,
da autoestima e experiências de rejeição e preconceito em relacionamentos
interpessoais. A dramatização iniciou-se com a vivência em sala de aula e
aprofundou-se em um psicodrama, em que uma cena vivenciada na infância foi
resgatada e relacionada às dificuldades atuais da protagonista. Os integrantes do
grupo foram escolhidos como egos-auxiliares e participaram bastante mobilizados da
dramatização, desempenhando os papéis elencados pela protagonista com
desenvoltura. As cenas apresentadas pela protagonista remeteram a experiências de
preconceito e rejeição, revelando um momento de bloqueio da espontaneidade-
criatividade que foi relacionado pela protagonista como uma possível matriz de suas
dificuldades com a própria autoestima, em se assumir e mostrar-se nas relações
116
“É esse drama eu acho que é um drama que todo mundo passou, eu espero que não, mas
acho que sim... e eu passei muito disso também, principalmente na minha adolescência por ser fora
dos padrões também né (Isis, 5º ano).
“Lá na faculdade eles dão certificado e eu ganhei e eu ganho muito né, também, esse certificado
e pra mim foi tão ruim...sabe? Hoje eu já aprendi lidar com ele, ponho ele no lattes...vejo um proveito
para ele...mas no começo foi muito ruim...porque as pessoas...pode ser que não, mas eu senti que as
pessoas começaram a me ver diferente a partir desse certificado... e assim as pessoas...tem hora que
é bom você ouvir ´nossa como você é inteligente, nossa como você consegue´, mas tem hora que é
ruim porque tem pessoas, a pessoa está te fazendo um elogio mas você sente algo tão negativo... e aí
desencadeia nos meus complexos de não poder errar... por sempre estar sobre os holofotes das
pessoas...” (Isis, 5º ano).
Após sua fala, Isis estava bastante emocionada e silenciou, encolhida no sofá.
A diretora agradeceu sua participação e a acolheu, incentivando os demais
participantes a se colocarem. Ingrid pediu a palavra, dizendo que sentiu alívio por não
ter sido escolhida por Andressa para ser ego-auxiliar da dramatização, pois toda a
vivência mexeu muito com lembranças negativas dela, principalmente de quando
sentia muito o preconceito das pessoas com relação a ela, durante o Ensino
Fundamental II:
117
“Meu coração tá assim pequenininho sabe? Apertado tá doendo...mil coisas na minha cabeça
agora...vendo a situação eu pensei nossa ainda bem que eu não estava em nenhum papel ali
dentro...porque nossa...eu sofri muito na minha época de fundamental II, antes assim do colegial ...
muito... nossa é horrível sabe? Autoestima é uma coisa que eu não tinha... nada...ai um dia eu decidi
mudar...eu falei não, chega... eu dei um não...não quero mais passar por isso na minha vida... e resolvi
mudar e tipo quem me conheceu antes quem me conheceu depois fala são duas Ingrids...tipo duas
Ingrids completamente diferentes...porque eu mudei muito, muito...mas só que aí eu fiquei muito, nem
eu me reconhecia...acabei perdendo também minha identidade...quando eu entrei para a psicologia
que eu consegui trabalhar mais sabe? Consegui achar algo mais eu... tentar lidar com a dor que eu
sentia e também tentar lidar com o que eu tinha me tornado, que também não era algo que eu
gostava...aí estamos aqui tentando...mas lembrar disso é uma coisa que eu não gosto de jeito nenhum
eu não gosto procuro não pensar...procuro não pensar...teve uma hora que eu estava aqui e pensei
´nossa eu vou é rezar ´pra sair” (Ingrid, 4º ano).
Ingrid ainda revelou para o grupo o quanto estava emocionada, pois sempre se
considerou com problemas de autoestima e a partir da vivência de Andressa pôde
reconhecer o quanto vem lutando em sua vida para ser aceita como é nos diferentes
grupos de que participa. Ingrid se emocionou e finalizou o próprio compartilhar. O
clima era de tensão e forte mobilização emocional, e a diretora respeitou o silêncio da
participante e do grupo.
Após um minuto, Tadeu pediu para se colocar, dizendo que estava sentindo
raiva, pois toda a dramatização o fez perceber a violência gratuita que perpassa as
relações interpessoais e causam dor, diminuindo a autoestima. Além disso, percebeu
que a vida em sociedade dificulta a construção de uma autoestima saudável:
“E todo mundo aqui acho que já passou por algum momento...autoestima...acho que todo
mundo tem esse problema porque a gente se preocupa muito na sociedade com o outro, o que que o
outro vai pensar, o que que o outro vai falar, o que que eu to fazendo o que, o que...como que isso vai
ser...porque isso é muito dolorido também porque você fica tentando se enquadrar e para de olhar para
si e seguir seu coração, seguir as coisas que você quer, porque você acha que o outro não vai gostar
isso me da raiva” (Tadeu, 4º ano).
voltou a se colocar e de forma emocionada, disse para Andressa, que é sua colega
de sala:
Tadeu: porque a coisa que eu sempre achei mais bonito na Andressa é a cor dela...porque eu
sempre achei sua cor muito bonita sabe? Morena sabe? Da cor do pecado? (Tadeu, 4º ano).
Andressa sorriu para Tadeu, estava bem relaxada no grupo, encostada no sofá.
Nesse momento, a participante Bruna se colocou, mobilizada com a fala de Tadeu:
“Acho que o Tadeu falou o que eu ia falar...as questões que ela trouxe foi o que me chamou
atenção quando eu vi ela, eu achei ela bonita por conta da cor, dela ser morena no caso, o cabelo, eu
achei ela linda por conta disso e me comoveu muito isso ter sido um problema na infância e tudo mais,
eu achei muito agressivo ééé essas palavras isso que ela viveu, muito agressivo e o tanto que permeou
esse tempo todo...a gente não tem noção o tanto que isso afeta né? Acho que é muito sério...o jeito
que a gente se coloca para as pessoas...me tocou muito...e eu me identifiquei em algumas partes
quando ela fala que se sentiu feia...porque quando pequena eu tinha muito disso eu tinha uns seis anos
eu acho eu tinha muito disso...colocava uma roupa nossa não gostava ai por fim eu resolvia não ir e eu
ia na igreja e as vezes eu chegava na porta da igreja e pensava não vou entrar porque eu to feia...e ai
vinha as meninas que eu estava acostumada, vinham conversar, elas conversavam comigo ai depois
de muito custo eu entrava nossa eu tinha muito problema de autoestima também e uma questão que
ela trouxe que eu me identifiquei foi essa questão da defesa éé as vezes uma pessoa fala alguma coisa
assim que eu não concordo ou que me ofende de alguma forma eu não me coloco da forma como seria
adequado as vezes eu falo ´ah não vou falar isso não, deixa pra depois´ e as vezes eu vou guardando
então isso me tocou dessa forma também...” (Bruna, 3º ano).
Bruna comentou ainda que foi a primeira vez que vivenciou um psicodrama e o
quanto sentiu-se tocada com a experiência, pela força de Andressa em dramatizar
suas experiências e por ter tocado as questões de autoestima dos presentes. Em
seguida, o participante Ícaro comentou também o impacto do psicodrama, revelando
o quanto foi forte para ele, emocionalmente, participar como ego- auxiliar, pois sentiu
como é dolorido para uma criança a vivência de preconceito com cor, raça, peso,
estatura, nível socioeconômico. Ìcaro relatou também ter vivido “bullying” na
adolescência:
“Achei bem importante trabalhar isso hoje...são questões que mexem com a adolescência de
todo mundo né? Acho que eu também já passei por isso...quando eu era gordinho assim e cabelo
comprido ninguém gostava de mim e não tinha amigo... ou gostava só porque eu jogava bola ...então
eu acho que é um drama...foi muito forte” (Ícaro, 4º ano).
O participante Tadeu brincou com Ícaro que na atualidade o “jogo virou” e todos
riram muito, pois Ícaro é considerado o aluno “mais bonito da sala” (sic). Ícaro se
divertiu com o comentário, que trouxe mais leveza para o clima grupal.
119
Anahí pediu então a palavra, relatando que percebeu o quanto possui uma
criança ferida e traumatizada dentro dela, que precisa ser cuidada e acolhida para que
a adulta se desenvolva e não guarde as próprias dificuldades para si mesma:
“Eu sempre fui muito submissa, minha criança foi sempre muito submissa e isso eu fui
aprendendo tanta coisa tanta coisa, que hoje em dia me afeta em muitos aspectos assim da minha vida
e é por isso que eu falo que eu sinto ódio porque eu não aguento mais ter que lidar com
complexos...cada mínima coisa eu sei quando minha criança está agindo dentro de mim...eu sei quando
não sou eu, agora Anahí de 22 anos, eu sei quando é Anahí criança eu não sei em que ponto específico
da minha criança eu acho que foi tipo desde pequena até a adolescência, tipo, sempre submissa
sempre guardando coisa, guardando, guardando, e hoje em dia me afeta muito e eu não to sabendo
lidar aí me dá muita raiva quando eu sei que é a criança que está agindo dentro de mim aí eu fico com
raiva disso, nossa, não aguento mais isso, então isso me afetou muito” (Anahí, 5º ano).
Contou também para o grupo que sentiu muita raiva ao longo da dramatização
de Andressa:
“Ao mesmo tempo que eu queria muito acolher a criança eu também queria bater de frente com
quem estava fazendo aquilo pra tipo, acorda, você não está vendo o que você está falando pra essa
criança o que que no futuro ela vai ter que ela vai ter que lidar, então foi uma mistura assim, ao mesmo
tempo que eu misturei com coisas minhas, e foi essa mistura de querer acolher com muito ódio assim
muita raiva” (Anahí, 5º ano).
Angélica (duplo de Ingrid): eu tenho tanta história...um milhão de histórias mas eu não quero
falar agora...ainda bem que eu vou para a terapia...tenho tanto para chorar...ainda bem...tenho muita
coisa pra chorar...é muito choro pra chorar...(Angélica, diretora, atuando como ego auxiliar e aplicando
a técnica do duplo em Ingrid).
ficaria bem. A diretora então voltou-se ainda para Jéssica, perguntando se ela também
permitiria a realização de um “duplo” dela. Jéssica concordou e então a diretora
também sentou-se ao seu lado, começando:
Angélica (duplo de Jéssica): eu sei o que é ser rejeitada... eu não quero falar mais nada quero
ficar quieta (Angélica, diretora, realizando a técnica do duplo com a participante).
Jéssica se encolheu bastante e chorou, a diretora, sentada ao seu lado, lhe deu
um abraço e permaneceu com ela por alguns minutos. O clima no grupo era de
respeito, acolhimento, intimidade. Os participantes olharam respeitosamente para
Jéssica, como que a abraçando com os olhos. Depois que a participante se acalmou,
a diretora convidou o grupo para subir ao palco e realizarem um encerramento em
círculo, de mãos dadas. Nesse momento, o participante Tadeu perguntou para a
diretora:
Tadeu: porque será que a gente não dá conta de falar às vezes? Fico pensando nisso (Tadeu,
4º ano).
Angélica: será que as vezes a gente está muito mobilizado e não da conta? As vezes é muita
emoção e pouco tempo para processar.
Tadeu: ah tá...porque em mim às vezes é vergonha sabe? Eu fico lá com vontade mas tenho
medo de parecer bobo...(Tadeu, 4º ano).
“Porque será que a gente não dá conta de falar às vezes? Fico pensando nisso” (Tadeu, 4º ano).
O sol da manhã parece ter promovido uma tonalidade emocional diferente para
esse encontro. A mudança da sessão do grupo para o período da manhã, em um dia
que não tiveram aula, de certo modo revelou a disponibilidade dos participantes com
o grupo e com a proposta da pesquisa. Diferente da sessão anterior, Andressa foi a
primeira a chegar e estava bastante falante. Conversava com Ingrid, Tadeu e Ícaro,
na sala de espera. Jéssica também interagia com eles, participando da conversa
entusiasmada. Já as participantes Isis e Anahí chegaram silenciosas e durante o café,
conversaram pouco.
O trabalho corporal realizado no aquecimento inespecífico promoveu interação
entre todos, e apesar de realizarem a atividade em silêncio, o clima passou a ser de
intimidade. Quando subiram ao palco como estudantes de Psicologia, os participantes
estavam bem à vontade, o que se confirmou na conversa em duplas que realizaram.
A interação entre os participantes parecia ocorrer de forma natural e livre.
Ao compartilharem as cenas vivenciadas durante a semana na faculdade,
apareceram episódios de alegria e realização com as atividades da faculdade; por
outro lado, surgiram cenas relacionadas às experiências de conflitos interpessoais
com colegas e a mobilização de dificuldades pessoais durante uma atividade vivencial
em sala de aula.
Desde o primeiro encontro, Andressa comentou sobre como se constituía um
desafio para ela participar de grupos e atividades vivenciais. Na sessão anterior,
estava sem voz e quase não falou, comentando somente que tinha se sentido mal e
com raiva em um trabalho realizado na faculdade. Nesse encontro, a participante
conseguiu trazer a cena em que tinha se sentido mal: durante a proposta vivencial do
grupo de Tadeu, desenvolvida em sala de aula no contexto de disciplina com a
temática grupal. A revelação de Andressa parece ter gerado surpresa no grupo, e
123
“Eu não era uma menina ruim... eu só queria brincar...” (Andressa, 4º ano).
sentimento pode ter traduzido o status sociométrico que ocupa na sala de aula: o
quanto sente-se escolhida pelos colegas e integrada ao grupo?
“Vendo a situação eu pensei nossa ainda bem que eu não estava em nenhum papel ali
dentro...porque nossa...eu sofri muito na minha época de fundamental II, antes assim do colegial muito”.
(Ingrid, 4º ano).
Tadeu: ah tá...porque em mim as vezes é vergonha sabe? Eu fico lá com vontade mas tenho
medo de parecer bobo...(Tadeu, 4º ano).
Data: 19/5/2017
Participantes: 7 (Ingrid, Tadeu, Andressa, Aurora, Ícaro, Bruna, Jéssica)
Ausentes: 4 (Anahí, Isis, Felipe, Laura).
Duração do encontro: 2h30
Contextualização: após 1 mês de pausa dos encontros do grupo, em função
de feriado nacional, viagem da pesquisadora para congresso de Psicodrama e exame
de qualificação do doutorado, as sessões foram retomadas nesse dia, no mesmo local
e horário previamente combinado com o grupo. A diretora marcou a retomada do
grupo pelo aplicativo whatsapp, enviando mensagem aos participantes cinco dias
antes do dia em que seria realizado o quarto encontro. As participantes Laura, Isis e
126
Anahí retornaram a mensagem avisando que não poderiam participar. Felipe não
retornou a mensagem e não avisou que faltaria. Assim, estavam presentes 7 dos 11
participantes. Bruna (3º ano) foi a primeira participante a chegar ao encontro, seguida
por Aurora (5º ano). Acomodadas na sala de espera, enquanto aguardavam a
chegada dos demais participantes, comentaram com a diretora “estarem felizes” pela
retomada do grupo. Ícaro (4º ano) foi o terceiro participante a chegar e assim que
entrou na sala de espera, cumprimentou a diretora alegremente e realizou perguntas
sobre o congresso que a pesquisadora havia participado, demonstrando interesse em
participar de próximos eventos da área. Quando Andressa, Ingrid, Jéssica e Tadeu
chegaram, juntos, a diretora convidou todos para entrarem no teatro psicodramático e
darem início ao encontro. O clima era de descontração e retomada, recomeço.
Aquecimento inespecífico: Jéssica, Ingrid e Ícaro estavam mais animados e
puxavam conversa com os colegas e a diretora. Aurora e Bruna estavam mais
silenciosas e observavam a conversa dos demais. Logo que o grupo se acomodou no
teatro, Jéssica disse que tinha vindo “preparada para viver um Psicodrama”. Todos
riram e Tadeu então comentou que estava com “saudades” do grupo e que estavam
faltando 3 pessoas. A diretora explicou que Laura havia enviado mensagem particular,
pelo aplicativo whatsapp, avisando que não viria. Perguntaram ainda de Felipe, Anahí
e Isis e a diretora comentou que somente Felipe não comunicou sua ausência. O clima
no início era de dispersão. Ícaro e Tadeu estavam sentados um ao lado do outro e
conversavam em voz baixa. A diretora começou então dando boas-vindas aos
participantes e pedindo para que comentassem como haviam passado ao longo desse
1 mês, para se aquecerem. Ingrid então pediu para a diretora contar sobre o
congresso e por alguns minutos, houve um breve compartilhamento sobre o
congresso de psicodrama. Na sequência, a diretora convidou os participantes para
falarem livremente como estavam se sentindo em retornar para o grupo e como
haviam passado no tempo que permaneceram sem realizar os encontros. Dirigiu-se
especificamente para Andressa, perguntando como ela havia se sentido após o último
encontro, em que havia sido protagonista, pois seria importante ela contar para o
grupo como havia ficado após a dramatização. A participante estava bem encostada
no sofá, com as pernas estendidas no palco, relaxada e em uma postura observadora.
Começou sua fala comentando com o grupo que “estava com preguiça” de vir ao
encontro, mas que depois que chegou sentiu-se bem. Andressa comentou ainda que
apesar de o grupo não ter se encontrado ao longo do mês, o grupo do quarto ano
127
“Assim hoje me deu um pouco de preguiça, assim, eu estava querendo vim mas assim acho
que por causa do tempo de chuva, mas a hora que chega aqui... a hora que eu chego aqui é bom, bom
tá aqui, mas mesmo que a gente ficou esse tempo sem o grupo na nossa sala tá tendo técnicas de
grupo então não deixamos de falar disso entendeu né? Toda quarta tem as vivencias então ainda está
bem presente em nós, pelo menos na nossa sala, a gente está vivendo muitas vivencias” (Andressa,
4º ano).
“Eu conto...éééé....fui eu que sugeri o tema, na época...é, metade do grupo quis e a outa
metade do grupo não quis, metade do grupo queria amor e o outro queria 5 sentidos, aí deu um pouco
de atrito no grupo em si, mas aí a gente conversando o que tinha a cara do nosso grupo era mesmo o
amor, então, a gente sempre esteve no papel de estar vivendo a vivencia, é diferente você conduzir
uma vivencia, é muito diferente estar fora, e é muito difícil fazer uma vivencia, gente dá muito trabalho
sabe? E tem que ter muito cuidado, então a gente pensou em cada parte com muito cuidado mesmo,
porque a gente sabia que podia suscitar diversas emoções na hora” (Andressa, 4º ano).
“É nós tiramos todas as carteiras da sala, fizemos cantos, com almofadas assim...A professora
a hora que entrou na sala ela falou: “gente o que vocês fizeram? ” Suscitou muita coisa... aí no
aquecimento especifico foi música romântica só para cantar porque a nossa sala nós sentimos que
brincar não era muito o que a sala estava querendo mais sabe? Todas as os vivencias tiveram
brincadeira, não a gente saiu um pouco disso. Aí foi isso a gente pensou, na hora da vivencia a gente
falou um pouco desse amor universal, então para pensar desde quando era bebe, falamos dessa falta
de amor, dessas questões, agora pensa numa cena, aí foi para o soliloquio...foi muito bom...assim nós
pensamos em cada detalhe e escutar o compartilhamento também foi satisfatório, assim não sei como
cada um saiu de lá, mas eu falo por mim sai assim sabe, parece que com um dever cumprido sabe?
Parece que era o que eu tinha pra levar pra sala, aquele cuidado... a gente tinha acabado de sair de
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uma vivencia que não tinha dado muito certo e aí foi muito bom. Não sei como cada um saiu de lá
mas...a gente tentou acolher todo mundo que estava lá...e foi isso” (Andressa, 4º ano).
Após esse relato sobre a atividade vivencial realizada na sala de aula, que a
deixou visivelmente animada, Andressa comentou sobre o seu protagonismo, vivido
na última sessão. De forma breve, compartilhou com o grupo que tinha ficado muito
bem e sentindo-se leve, e que tinha esgotado o tema no palco, não pensando mais
no assunto. A diretora devolveu para Andressa que a estava percebendo mais livre,
mais solta para se colocar e a participante concordou, dizendo, entretanto, que estava
“cansada” de participar de vivências. Nesse momento, a participante Jéssica pediu
para sair da sala, causando espanto no grupo e provocando alguns instantes de
silêncio. Andressa retomou sua fala afirmando que está sentindo sua sala “cansada”
de fazer vivências:
“E como está tendo muita vivencia a nossa sala parece que está desaquecendo...não dá essa
impressão? Parece que a gente não quer mais? Todo mundo na hora que vai compartilhar fala “ah eu
não queria vir hoje” (Andressa, 4º ano).
“É medo de enfrentar né...o pessoal não quer enfrentar...no começo o pessoal estava
ainda...acho que o pessoal estava ainda mais desaquecido aí agora como já está, tem uma sequência
aí, o pessoal acho que está ficando mais aquecido, então é muito difícil você chegar lá e não entrar,
não se envolver porque mesmo se você ficar lá parado e não falar nada você tá ali no meio né tá
acontecendo você tá se envolvendo então eu acho que o pessoal chega...apesar que o pessoal fala
muito que não queria ir mas eles vão....ééé tem um ou outro que tá faltando assim toda quarta feira pra
não ir só que...mas o pessoal vai e aí aquece muito e aí depois reclama, mas fica esperando o próximo
também...eu vejo que as vezes tem uma resistência pra entrar no problema mesmo não deixar vir
porque tem vergonha, esse negócio de chorar no meio da sala, ou de falar das coisas” (Tadeu, 4º ano).
“Eu acho que quando forma subgrupos dentro do grupo todo tem um resultado melhor eu to
vendo isso na sala também, das vivencias que tiveram que junta alguns pequenos igual teve na de
vocês também né que a gente juntou com o sentimento que a gente trouxe soliloquio então aí eu acho
que é mais fácil que as pessoas se abrem mais...mas tá sendo ótimo” (Tadeu, 4º ano).
“Eu to bem com isso, com essas vivencias e tal, eu estava sentindo falta de vim aqui, apesar
que eu sei que foi uma pausa boa até porque você foi lá né e como você está dirigindo aqui a gente,
acho que você volta com uma bagagem diferente com uma consciência maior....e eu to tranquilo essa
semana eu to mais...to meio assim preguiçoso meio na minha assim” (Tadeu, 4º ano).
“Mas a vivência delas foi bem forte também...e é bem aquela coisa eu estava muito aquecido
na vivencia de vocês entendeu? (vira-se para Andressa) Até comentei com o Ícaro...eu estava assim
ó, querendo falar...aí chegou uma pessoa no grupo aí eu desanimei...(risos), desaqueci sabe...parece
que chegou aquela pessoa e eu desaqueci...(Tadeu, 4º ano).
Tadeu: é...aí eu comecei a falar assim eu ia falar uma coisa aí ele já chegou e eu travei (risos)
Angélica (falando com Tadeu): te inibiu? A pessoa te inibiu? Porque não é próxima de você?
130
Tadeu: é...só que aí o Ícaro também falou e aí foi bom pra mim escutar o Ícaro falar porque de
certa forma o Ícaro deu voz a alguma coisa que eu queria ter dado voz então de certa forma foi bom
escutar...
A diretora, então, comentou com os participantes que uma das dificuldades dos
grupos se dá justamente por conflitos não trabalhados entre os participantes e os
estudantes permaneceram em silêncio, por quase um minuto. A participante Ingrid
então começou a se colocar, dizendo estar muito cansada e que muitas coisas
aconteceram com ela ao longo do mês em que não houve encontros do grupo, e que
por esse motivo chorou muito na vivência realizada pelo grupo de Andressa:
Ingrid: aconteceu muita coisa que, de certa forma eu não soube lidar e quando eu não sei lidar
com algo eu fico introspectiva, por isso que na vivencia eu só chorei, só chorei, do começo ao fim, sai
chorando, chorei em casa, chorei mais, fui para a terapia chorei de novo (risos)...e sei lá tá acontecendo
um monte de coisas, em todos os sentidos até da faculdade, no estágio e eu to confusa então...eu não
sei elaborar o que eu estou sentindo não...só to cansada (Ingrid, 4º ano).
“Hoje tá todo mundo assim óó “não quero ser protagonista”...a gente estava numa discussão
dentro do carro que ninguém queria ser protagonista... Mas nem é pela questão do grupo...é medo de
acessar o que a gente sabe que está aqui dentro”...(Ingrid, 4º ano).
Ingrid, Jéssica e Ícaro vieram juntos para o encontro, “de carona” no carro de
Jéssica. Logo após a fala de Ingrid, a participante Andressa respondeu, em tom de
brincadeira e gerando descontração:
“Nossa estava com muita saudade, estava esperando muito voltar, teve uma semana, que eu
não sei qual semana que foi, mas que eu fiquei mal, aí eu fiquei pensando assim nossa tinha que ter
ido no grupo, tinha que ter tido grupo essa semana, que as vezes eu não teria ficado mal né, mas sem
querer a gente assimila desse jeito né? Eu não sei mas eu sinto...agora eu vou falar hein...eu sinto que
aqui é como se fosse uma terapia entendeu? E as vezes eu falo para as pessoas e as pessoas falam
que não, que não é terapia, que eu tenho que procurar uma terapia e tal, que é um trabalho e tal...tá
eu sei, mas eu sinto que é uma terapia porque eu to falando de mim e eu acho que em todo momento
132
que eu tiver falando de mim, olhando pra mim é terapêutico... então eu sinto que é uma terapia, e eu
sei que eu preciso muito então eu gosto muito de vim, estava ansiosa pra vim” (Jéssica, 5º ano).
“Eles me chamaram para fazer estágio na empresa, me falaram que a empresa queria muito
tal e a gente elaborou projetos e ai por exemplo, eu chegava lá eu não podia entrar, eu ficava esperando
uma hora, uma hora e meia lá fora pra fazer meu estagio e ai eu entrava e ai eu fazia tipo sabe estagiário
que faz o que ninguém mais faz?” (Jéssica, 5º ano).
“Ela me colocava pra imprimir folha, me colocava pra telefonar pras pessoas pra dar retorno,
entendeu? E eu queria fazer o projeto que a gente tinha combinado de fazer né...aí eu começava a
pedir o projeto, mas não dava certo, a pessoa desviava e aí chegou num ponto que eu fui ficando muito
mal sabe? E fui percebendo que a gente não estava fazendo nada, nada do que a gente tinha planejado
aí eu pedi essa reunião pra falar pra eles que estava muito ruim o estágio pra mim que eu tava tipo
sentindo que eu era muito, muito mal tratada sabe? Eles combinavam as coisas e depois descombinava
aí eles fizeram isso né...” (Jéssica, 5º ano).
“Nesse período eu senti muita falta daqui, como a Jéssica falou aqui pra mim é uma terapia, eu
não to fazendo mas aqui eu sinto como se fosse, foi um período tenso porque...quando parou estava
em semana de prova, e na semana de prova minha avó faleceu foi muito ruim, véspera de prova, foi
muito ruim mesmo porque minha avó ela representava a figura de mãe tanto pra mim acho que pra
família toda e depois disso...todo mundo sabe que a família vai se separar depois disso depois que ela
morreu porque era o único motivo que a gente se juntava era pra ver ela depois disso ninguém vai se
ver mais tipo ir na casa um do outro sabe?” (Bruna, 3º ano).
“Me desculpe ficar adiando minha fala to meio silenciosa esses tempos então...” (Aurora, 5º
ano).
A diretora retornou para Aurora ficar tranquila e falar somente daquilo que se
sentia à vontade. A participante estava abatida e cabisbaixa, ao longo de toda a
sessão, mas continuou compartilhando com o grupo:
“E eu acho que ela falou também é que essas coisas não são vistas né? Porque parece que
você não está fazendo nada e as pessoas te julgam e aí você fica até se sentindo mal por estar se
respeitando desse jeito...é engraçado porque ela fala e eu compartilho muito do pensamento dela, do
sentimento também, acho que por isso que antes dela falar, desde o começo eu estava olhando pra
ela estava me sentindo muito conectado sabe? Até perguntei pra ela se ela estava bem porque estava
muito forte aqui...e uma coisa que eu penso muito também, que é bem presente em mim essa coisa
de, meu tempo, de ‘ ah não to a fim de fazer isso agora’ e ter que, ter que acordar cedo, ter que fazer
tal coisa tal hora, é muito maçante né, ainda mais o 4º ano assim, eu não sei como que é o 5º, mas tá
sendo mais maçante ainda tem coisa pra fazer toda hora e aí você não pode ter o seu tempo, igual eu
falei de tocar um violão ou jogar um vídeo game, você não tem tempo pra isso você faz isso você tá
ferrado” (Tadeu, 4º ano).
“Não né, é tipo isso, ninguém te pergunta como é que está, ‘e seu TCC’, e ‘você vai se formar
e ninguém te pergunta como você está?” (Aurora, 5º ano).
“Com tudo assim que ela falou, a gente é obrigado assim a fazer muita coisa...a gente acabou
assim de sair de semana de prova e já tem mil coisas pra fazer...tanto assim que no dia que minha avó
morreu no outro dia assim a gente tinha aula, porque não ia ter prova a professora deu aula normal eu
não queria ir, tinha que entregar trabalho, não queria, fui totalmente obrigada é muito ruim isso porque
eu não estava me respeitando, a gente tem que passar nossos limites pra ter nota acho que não só na
faculdade mas em tudo, é muito isso que ela falou mesmo...é meio que a gente vai contra, a gente
estuda pra entender que assim a gente não deve fazer isso, a gente deve nos respeitar mas ao mesmo
tempo eles cobram isso...então é muito ruim...” (Bruna, 3º ano).
“Mas é isso, é muito difícil quem acredita nisso é muito fácil falar nas teorias, é muito bonito
isso, ‘respeite a individualidade de seu paciente’, respeite as pessoas, mas na própria rotina da nossa
faculdade e na vida, você tem que ter muito papel e muita postura assim dura...” (Aurora, 5º ano).
Andressa: crescimento
Ícaro: desafio
Jéssica: ser
Tadeu: intensidade
Ingrid: perdida
Bruna: tensão
Aurora: solidão
mensagem, o ego auxiliar fazia um espelho de cada um, de modo que todos ouviram
o que “sua palavra” teria vindo dizer como mensagem:
Aurora (como solidão, falando para Aurora): “que ela pode ser...que eu sou uma boa
companhia, pra ela desenvolver mais autoconhecimento, se conhecer mais, ter mais coragem de viver,
e de se abrir...”(Aurora, 5º ano).
Tadeu (intensidade): “que intensidade pode ser pesada mais mas é muito melhor ser intenso
do que ser superficial, ele só precisa aprender a ser intensidade, a lidar com ela” (Tadeu, 4º ano).
Jéssica (ser): “que ser é muito diferente de estar, toma cuidado com o que você é, com o jeito
que você está” (Jéssica, 5º ano).
Bruna (tensão): que tem momentos que eu vou aparecer muitas vezes com bastante
intensidade só tem que aprender a respirar e não ter que se preocupar em manter uma postura certa”
(3º ano).
Ingrid (perdida): eu estou perdida...eu sei que é difícil para você lidar com isso, você gosta de
ter o controle de muita coisa, mas não precisa ser forte, você pode não saber o que fazer, as vezes não
sabe mesmo” (Ingrid, 4º ano).
Ícaro (desafio): não tem como saber o final se você não chegar né, você aceita o desafio do
jeito que você quiser e enfrenta os desafios” (Ícaro, 4º ano).
Andressa (crescimento): que eu estou feliz em ver como você cresceu e mesmo sendo difícil
criar autonomia é realizante ao mesmo tempo ver como você evoluiu em poucos meses..é bom, é legal”
(Andressa, 4º ano).
Tadeu: eu sou o Tadeu, chego aqui com a minha intensidade, pode ser bom mas é difícil de
lidar, eee, mas eu aplico isso em todas as minhas relações de alguma forma não sei se está certo ou
errado mas é como eu faço...eu tenho que aprender a lidar com isso também, porque isso me afeta
muito, não é só os outros que tem que aturar isso né...sou eu que tenho que lidar com isso
também...mas to aqui para aprender e acho que to caminhando bem...” (Tadeu, 4º ano).
Andressa: “eu sou Andressa, venho aqui com meu crescimento, ele tá baixinho agora mas ele
tá grande ...que me diz que até estar aqui é um desafio e é essa busca mesmo de evolução, de
expansão, expandir...isso...” (Andressa, 4º ano).
Jéssica: “eu sou Jéssica, eu sou o Ser, porque eu posso ser uma infinidade de coisas que eu
estou descobrindo como ser e como fazer” (Jéssica, 5º ano).
Bruna: “eu sou a Bruna, eu vim com a tensão, diferente da Andressa ela está alta ééé acho que
vivi muita coisa, muitos momentos de tensão e eu acho que a atitude que eu tenho me deixa mais tensa
ainda, então eu acho que com a ajuda do grupo e conforme meu crescimento vai me ajudando a
diminuir essa tensão e também a lidar com ela” (Bruna, 3º ano).
Ingrid: “eu sou a Ingrid, eu trouxe aqui né uma pessoa que sou eu um pouco perdida, um pouco
bastante, mas isso é bom porque as vezes a gente fica perdido pra se encontrar, e eu preciso seguir
sempre pensando que eu tenho que resolver as coisas, tudo sempre tem seu tempo, estou perdida e
tenho que aprender isso” (Ingrid, 4º ano).
Angélica: a gente precisa aprender a ser perdida também né... bem vinda Ingrid-perdida!
Aurora: “eu sou Aurora e minha solidão é sempre minha companhia e agora me acompanha
bem mais forte...as vezes ela é uma grande amiga as vezes uma grande inimiga mas ela tá comigo e
acho que é isso que importa né e ela é parte de mim...eee, ela hoje não se sente muito só e acha bonito
de ver cada um aqui sente até nesse momento feliz de estar nesse grupo e de fazer parte também
desse momento, especialmente né, e do que virá...” (Aurora, 5º ano).
Aurora sorri abertamente e se mostra mais relaxada e solta no grupo, muito diferente do início.
Ícaro: “eu sou Ícaro, trago meus desafios é, muitas vezes eu não sei como agir diante deles,
muitas vezes eu nem sabia que eu ia ter um desafio e eu tenho que aprender cada dia mais a como
lidar com esses desafios de forma positiva aprendendo sempre mais porque senão eu fico muito estável
e acho que isso pode até ser positivo mas pode se tornar negativo” (Ícaro, 4º ano).
A diretora pediu ainda que nesse momento olhassem uns para os outros,
devagar, e repetissem, em um cumprimento, uma saudação calorosa: “que bom que
você está aqui!” Essa brincadeira gerou uma mistura de vozes e risadas entre os
participantes, que se divertiram com o momento. Tadeu ainda disse para Ícaro: “que
bom que você está aqui e que sua mãe fez você” e todos riram bastante, descendo
do palco.
Compartilhar: os participantes foram convidados a descerem do palco, e a
diretora perguntou se estavam todos bem, se alguém gostaria de comentar o
vivenciado. Como ninguém se manifestou e o tempo do grupo já havia excedido, a
diretora agradeceu a presença de todos e encerrou o encontro, pedindo que cada um
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“Hoje tá todo mundo assim óó “não quero ser protagonista”...a gente estava numa discussão dentro do
carro que ninguém queria ser protagonista... Mas nem é pela questão do grupo...é medo de acessar o
que a gente sabe que está aqui dentro”...(Ingrid, 4º ano).
encontro, pareceu isolada com relação ao grupo, e seus colegas de sala Tadeu, Ícaro
e Ingrid elogiaram a atividade desenvolvida pela colega, relatando como ao final da
mesma puderam perceber os conflitos existentes na sala com alguns colegas, que
pareceu ter cortado o fluxo espontâneo que haviam experimentado. Andressa não
teceu comentários sobre a percepção dos colegas e manteve uma postura de
observadora, demonstrando distanciamento dos demais participantes. Entretanto,
Ingrid e Tadeu pareciam estar mais sintonizados entre si, demonstrando formarem um
par sociométrico que antagonizava a fala de Andressa. O modo como retornou para
o grupo, após o protagonismo do terceiro encontro e disparado pela participação na
vivência realizada pelo grupo de Tadeu, somado ao fato de ter realizado sua “vivência
do quarto ano” com esmero, teria sido suficiente para encerrar sua participação no
grupo de pesquisa? Aos poucos, as diferentes colocações de Tadeu pareceram
revelar os conflitos sociométricos da turma do quarto ano de Psicologia, evidenciados
pelo processo de realização das vivências e atualizados no contexto do grupo de
pesquisa. Competição, rivalidade, dificuldade de cooperação, o que estaria sugerindo
a fala de Tadeu?
“Mas a vivência delas foi bem forte também...e é bem aquela coisa eu estava muito aquecido
na vivencia de vocês entendeu? (vira-se para Andressa) Até comentei com o Ícaro...eu estava assim
ó, querendo falar...aí chegou uma pessoa no grupo aí eu desanimei...(risos), desaqueci sabe...parece
que chegou aquela pessoa e eu desaqueci...(Tadeu, 4º ano).
Data: 26/5/2017
Participantes: 7 (Isis, Felipe, Anahí, Jéssica, Aurora, Ícaro, Ingrid)
Ausentes: 3 (Tadeu, Andressa, Bruna).
Duração do Encontro: 3h30
Contextualização: quatro dias antes da realização do quinto encontro, a
participante Laura entrou em contato com a diretora pelo aplicativo whatsapp para
comunicar que não iria permanecer no grupo. Nesse dia, Tadeu, Andressa e Bruna
avisaram que não viriam pelo whatsapp. Os participantes chegaram aos poucos,
causando atraso de quarenta minutos no início do grupo. Estavam agitados e
justificaram o atraso em função de atividades acadêmicas. A última a chegar foi a
participantes Isis, às 15h40, e somente então o grupo teve início.
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“Eu estava muito ansiosa pra vim tipo foi muito bom voltar...foi muito bom voltar eu estava muito
ansiosa pra voltar...aí eu não queria chorar e chorei...fui lembrando de várias coisas” (Jéssica, 5º ano).
Em seguida, Ingrid contou que a sessão passada teria sido importante para
aceitar o quanto está se sentindo perdida, podendo fazer as pazes com esse
sentimento. Além disso, Ingrid destacou o quanto foi importante para ela a vivência
realizada no palco, em que todos puderam se observar e saudar a presença de cada
um que estava presente, confirmando o quanto o grupo funciona como um apoio
emocional para ela:
“A palavra que me veio da última vez foi muito de aceitação porque você pediu para falar o que
a gente sentia e depois a gente estava em círculo cada um falou como se sentia, cada um tinha uma
palavra e isso foi bom porque eu estava perdida e foi bom, eu aceitar esse sentimento foi bom porque
o mais difícil pra mim era eu aceitar que eu estava perdida então só de eu ter aceitado já foi um passo
entendeu? E depois a gente falar um para o outro “ que bom que você está aqui” isso também não sai
da minha cabeça...foi engraçado porque quando você perguntou quando a gente estava relaxando aqui
isso foi a primeira coisa que me veio sabe? E é como se fosse uma questão de porto seguro, aqui, foi
muito bom saber que você pode aceitar o que você está sentindo eu sai daqui muito bem...foi bom, foi
reconfortante, é como se fosse um respaldo” (Ingrid, 4º ano).
Ingrid comentou ainda que após o grupo, realizou uma sessão de terapia
individual em que confirmou a necessidade de parar de fugir de uma experiência
vivenciada na faculdade que lhe causou sofrimento, e que agora sentia-se pronta para
compartilhar no grupo:
“Depois disso que eu estava perdida eu fui na terapia, levei em terapia muita coisa e no meu
dia a dia mesmo porque eu sai com um pensamento daqui de que eu ia parar de fugir do que eu estava
sentindo, de fugir do palco, eu pensei ´Ingrid se acontecer com você você não vai fugir´...porque eu não
sou de fugir das coisas e de uns tempos pra cá depois de umas coisas que aconteceram eu estou
fugindo de tudo...de tudo mesmo aí eu fiquei pensando mesmo que eu não ia fugir...e o que me veio a
hora que a gente estava aqui relaxando foi medo, eu to com medo, e é medo de acessar uma coisa
que eu sei que eu não quero acessar entendeu? Mas que eu vou acessar...e é medo de muita coisa...eu
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to com medo em todos os aspectos... eu to com medo e o medo me impede tanto de seguir, tanto de
escolher alguma coisa e eu fico perdida, entendeu?” (Ingrid, 4º ano).
“Por exemplo meu problema de 3 meses atrás não é meu problema atual, hoje eu olho e vejo
que não é nada, passou, e quando você estava falando eu até pensava nisso, ´vai passar´, deixa, se
permita´, quando eu me permiti viver a dor, passou, mas agora eu to com outra maior ainda...e a gente
está aqui pra enfrentar isso ... é a vida” (Ingrid, 4º ano).
“Foi mais pro final é quando estava todo mundo em roda eeee a gente não falou, se olhou,
estava conectado ali, a gente deu as mãos também...e eu acho que soa pra mim muito importante esse
momento de compartilhar.... porque.... é complicado quando você realmente pode compartilhar porque
a maioria estava compartilhando algo mais negativo, uma dor, um sentimento nesse sentido né, de
dificuldade de si, uma fraqueza, um limite, um medo e acho que é difícil você achar um espaço em que
você realmente você possa falar isso e que você se abra pra falar de verdade o que você está
sentindo...e ali naquele momento eu senti isso de verdade...em roda ali, que a gente realmente tinha
aberto ali...nem em palavras...só de estar em roda ali e estar exposto àquele momento...foi mais
abstrato assim...porque as vezes falar das fraquezas de si ou da sua dor incomoda as pessoas e te
incomoda também porque você não quer incomodar também eee saber que tem um lugar onde não vai
estar incomodando é muito bom...foi isso que ficou pra mim...tenho tido necessidade de falar da minha
dor, e tenho tido pouco espaço pra falar dela...então o pouco espaço que eu acho pra falar dela pra
mim é muito importante...uma dor que as vezes me deixa engasgada...com dor no peito
literalmente...”(Aurora, 5º ano).
solidão que relatou na sessão anterior, assim como um maior pertencimento ao grupo,
ao que a participante respondeu afirmativamente:
“É, bem isso...esse lugar, essas pessoas...em conjunto...foi bem isso assim, e eu vi
possibilidades...porque as vezes a dor te corta possibilidades você fica só nela né...por mais que você
aprenda, estude e viva, e sabe que tem pessoas que te ama, você fica nela, as vezes você mergulha
nela e só ela existe né...e ai você engasga, explode por dentro...” (Aurora, 5º ano).
“E ver o vínculo de confiança que a gente está criando aqui dentro né, porque não é fácil falar
de muita coisa que a gente fala...e a gente está falando dessas coisas, então eu acho isso muito
importante, foi o que mais ficou pra mim semana passada...” (Ícaro, 4º ano).
Quando o participante finalizou sua fala, a diretora voltou-se para Isis, Anahí e
Felipe, solicitando que comentassem como haviam passado no período de intervalo
sem os encontros grupais. Isis então comentou que assim como Jéssica, estava
ansiosa para retornar ao grupo, e havia ficado chateada por não poder comparecer
ao encontro anterior. Frisou que assim como os colegas disseram, já percebia o
espaço grupal como um local para se revelarem como são e como estão, de forma
autêntica:
“Me veio esse sentimento assim parecido com o que todo mundo falou, de ser um lugar que
pode falar, você não precisa ficar pensando assim, ´nossa mais será?´ Aqui não, aqui eu to podendo
falar ainda mais assim que tem muitas pessoas que eu tenho muito contato, pessoas que eu tenho
pouco contato...mas aqui todo mundo parece que fica igual, todo mundo pode falar...é esse sentimento
que eu to notando...preparem-se para me ouvir (risos)” (Isis, 5º ano).
Isis compartilhou ainda com o grupo que chegou muito agitada e ansiosa para
o encontro, mas que após o relaxamento estava se sentindo mais calma e presente.
Em seguida, Felipe, que também não esteve no encontro anterior, contou das
dificuldades que está vivenciando no papel de estudante e como tem sentido cada vez
mais dificuldade de organização para a realização dos relatórios de estágio:
“Cara eu nem sei o que eu estou sentindo no momento eu to tentando levar fazer as coisas e
ir fazendo para...tipo....o que é pra fazer em ação é ou estar presente num grupo ou dar uma aula ou
fazer um atendimento, é ruim, mas ainda vai, tipo assim, a antecipação disso ainda é ruim mas eu vou
lá fazer porque tem gente que tá contando comigo para que isso seja feito...mas na hora de elaborar
isso de passar isso pro papel nossa eu, é um sofrimento, eu vou usar sofrimento mas nem sei se é
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essa a palavra e elaborar isso também não é fácil e eu to preferindo fugir...ontem, por exemplo, ontem
eu terminei minhas coisas era, era umas 16h, 17h, e 18h eu deitei e dormi e dormi até hoje 6h fiquei
12h dormindo...eu acordava, ia lá tomava uma água fumava um cigarro eu ficava pensando nossa o
tanto de coisa que eu tenho que fazer, mas não, vou deitar vou dormir porque..quem sabe eu acordo
em outro corpo, uma outra pessoa que não tem essas coisas pra fazer...” (Felipe, 5º ano).
“O diferente que eu acho tipo assim, é que ano passado você tinha umas coisas pra fazer, que
eram coisas assim você pega e faz, todo mundo faz, é assim que começa é assim que vai ser o meio
é assim que vai ser o fim...esse ano tudo depende de você, então não é um peso externo, não é igual
assim, lá você tinha, era tipo tabelado, todo mundo vai começar assim, todo mundo vai fazer no meio
assim, todo mundo vai terminar assim, agora esse ano, você que precisa trabalhar suas questões pra
atender um paciente que te pega no seu calo, você que precisa ir pra o estágio, você que precisa
cronometrar o seu tempo para o seu TCC, então tipo assim, demanda uma demanda pessoal que você
tem que estar inteiro em tudo, igual ano passado a gente fragmentava ia fazendo as coisas assim, esse
ano não dá...parece que quando você tenta fragmentar assim não tem como...você não consegue
fragmentar para diminuir o peso porque você tem que se cuidar o tempo todo é você, você...” (Isis, 5º
ano).
“Eu ainda fico na impressão que é algo assim, não desvalorizando o que as meninas estão
falando mas eu ainda fico com um negócio que sou eu que to com muita dificuldade, que eu vejo, eu
sinto que o pessoal tem instrumentos tipo consegue cronometrar o tempo consegue sei lá concentrar,
produzir... eu sinto que eu sou muito improdutivo que eu não consigo e isso me dói muito...” (Felipe,
5º ano).
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Nesse momento, Anahí interferiu e respondeu para Felipe que acreditava que
a maioria dos alunos do quinto ano estava se sentindo desorganizada e “empacada”
com o excesso de atividades para realizar, e que ela mesma tem se sentido cada vez
mais estressada. A participante começou a compartilhar com o grupo como tem se
sentido confusa e que há muito tempo não se sentia tão perdida a respeito dos
próprios sentimentos, relacionando essa “confusão” às experiências vivenciadas no
quinto ano:
“Eu não sei estou confusa...tipo, de verdade, to bem confusa...é uma mistura de sentimentos
uma hora vem coisa boa outra hora ruim eee assim ah muito tempo que eu não fico tão confusa assim
aí vem essa coisa esse peso do quinto ano também tipo...uma hora é bom por causa dos estágios
porque nossa estou me sentindo muito bem só que ao mesmo tempo que é bom é ruim o estágio...eu
atendo...por exemplo eu estou com um paciente que eu estou atendendo ele duas vezes na semana e
tipo ao mesmo tempo que é bom que desenvolve bem a terapia nossa eu saio de lá, nossa por isso
que fala que a gente é um recipiente né, teve uma terapia que eu fiquei com uma dor no meio da sessão
começou a me pesar tudo as costas aqui e eu vi que era da sessão sabe? Que eu estava pegando
muita coisa dele ee não é só ele tem outros pacientes” (Anahí, 5º ano).
“Semana passada de noite, eu não sei se eu estava muito cansada, nunca aconteceu isso
comigo pela primeira vez eu estava de noite assim, eu estava mexendo no notebook sentada na cama
e me veio uma tontura do nada sabe quando você roda e fica rodando assim? E quando você para
você até fecha o olho e a cabeça fica rodando, me veio essa tontura, começou até a me dar um ataque
na hora gente que que está acontecendo? E eu estava na cama eu tive que jogar o notebook eu não
sabia o que eu fazia porque estava rodando, minha cabeça começou a rodar, eu fui tentar levantar eu
quase cai no chão e eu sentei, não parava a tontura eu falei gente que que está acontecendo, ai eu
deitei apaguei a luz, fiquei, acalmei, parou, foi muito estranho e nunca mais...nunca me deu isso, foi a
primeira vez que me deu isso, nunca mais me deu...e eu não sei parece que está acontecendo umas
coisas estranhas eu falo gente que que tá acontecendo?” (Anahí, 5º ano).
A participante compartilhou ainda que a única atividade que tem feito bem para
ela é “tocar piano para desestressar”. O grupo escutou Anahí atentamente e o clima
tornou-se tenso. Felipe comentou nesse momento sobre como estava sentindo o
“peso dos atendimentos” (sic) no quinto ano, e que no futuro provavelmente iriam
148
“Angélica (fazendo o duplo de Ingrid): quantos pacientes você atendeu por dia Angélica? Conta
pra nós? Como você conseguiu? Como é que você deu conta assim de tudo? Como é que deu conta?
Gente do céu eu não vou dar conta dessa faculdade não...vai piorar desse jeito está todo mundo desse
jeito ai? É assim mesmo que fica? Sério? Não vai melhorar não? Como é que faz? E outras pessoas
falam isso né, que saem do atendimento com dor, como é que faz Angélica, o que que faz? Eu to te
perguntando porque eu quero saber, gente como é que faz pra ser psicólogo gente que negócio
difícil...nossa que difícil...eu to sentindo assim tanta...ai nem sei nem sei mais...de tão perdida que eu
estou...parece que era uma coisa fácil agora não é fácil mais...que agonia, como que você deu conta,
conta pra nós...eu to achando que eu não vou dar conta não...”
“Não sei é um desespero...é um desespero, não sei se é de todo mundo, vou falar de mim ...é
um desespero por algo é como se fosse desconhecido porque enquanto você está na faculdade você
está aprendendo e é pra isso que a gente está na faculdade para aprender , pra cometer erros e um
dos motivos que eu to muito mal foi por um erro, mas não foi um erro, foi uma questão de aprendizagem
e a gente aprende com os erros e essa questão que posso formar, tipo, é uma responsabilidade muito
grande, você é um profissional mesmo” (Ingrid, 4º ano).
Felipe- incapaz
Jéssica- desesperança
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Ícaro: pressão
Ingrid: fracasso
Anahí: medo
Aurora: medo
Isis: força
Jéssica: lá e cá
Anahí: eu sou o medo, e eu vim lhe mostrar o quão perdida você pode ficar
Ingrid: eu sou o fracasso e vim lhe dizer que tudo pode dar errado
Felipe: eu sou a incapacidade e vim dizer que você não vai dar conta
Jéssica: eu sou a desesperança e eu vim te dizer que dói muito e é muito difícil se equilibrar,
então tenta sair disso porque senão você vai cair
Isis: eu sou a força eu vim dizer que sentir dor e as vezes não conseguir não é um fracasso
Aurora: eu sou o medo eu não sou de todo ruim eu posso ter algum fim mas não tente fugir de
mim
Aurora: agir...mesmo com medo, de expor, de expor as fraquezas, de falhar mas agir...viver...
Felipe: autônomo
Isis: relaxamento
150
Ícaro: calmaria
Anahí: paz
Jéssica: lá e cá
frente a frente. Isis diz para o paciente que percebe evolução no processo terapêutico
do mesmo, à medida que ele vem dando mais sentido à própria história. O paciente
pergunta para Isis se ela não está dizendo “isso só para agradar”, ao que ela nega,
afirmando que realmente acredita na evolução do processo. Isis se levanta e muda de
lugar, caminhando para a “sala de supervisão” e sentando frente a frente com Anahí,
que faz o papel de supervisora.
Na cena 2, Isis está na supervisão de estágio relatando para sua supervisora
esse diálogo com o paciente ao final da sessão. A supervisora orientou Isis para que
ela conduzisse menos o paciente e o auxiliasse a enxergar o próprio processo de
desenvolvimento. Isis concordou em silêncio com a supervisora, balançando a cabeça
afirmativamente; então se levantou e voltou para a sala a “sala de atendimento”,
sentando-se de frente para o paciente e dando início à cena 3.
Nessa cena, que novamente se passa ao final da sessão, o paciente diz para
Isis-terapeuta que já tinha falado “tudo” e que gostaria de ouvi-la. Isis então devolveu
a pergunta para o paciente, questionando quais ligações e sentidos ele percebeu a
partir do que abordou na sessão; o paciente reafirmou que já havia dito tudo e que
queria saber qual a visão de Isis do que ele estava falando. Nesse momento, Isis
abaixou a cabeça e permaneceu em silêncio, olhando para o baixo, a expressão triste
e perdida. Ícaro, representando o paciente, também abaixou a cabeça e permaneceu
em silêncio. O clima na cena é de angústia, tensão. A diretora então subiu ao palco e
sentou-se ao lado de Isis, pedindo que ela realizasse um solilóquio, abaixo transcrito:
“Eu não queria ter que mudar o jeito de conduzir, eu não queria ter que jogar pra ele porque
eu ofereço esse suporte pro processo dele, ele precisa de que alguém fale que está dando certo, que
ele está conseguindo, eu não queria ter que ficar pensando no que dizer eu só queria ser terapeuta do
jeito que eu sou mas eu tenho que fazer diferente...eu sei que...vai ser bom pra ele também, eu confio
plenamente na minha supervisora mas ela não...não é assim que eu sou e isso está gerando um
incomodo tanto em mim quanto nele...de ter que mudar” (Isis, 5º ano).
que permaneceu em silêncio. Contou ainda para a supervisora que ao final da sessão
o paciente afirmou que a mesma “foi chata”. A supervisora- Anahí respondeu, de
maneira tranquila, que estava percebendo o desagrado de Isis com a orientação, mas
que era importante para o paciente perceber a si mesmo. As duas então
permaneceram em silêncio, Isis se encolheu em si mesma, de cabeça baixa. A diretora
então se aproximou das duas e pediu que Anahí fizesse um solilóquio como
supervisora:
“Por mais que pareça muito difícil é fazer essa, ir contra o modo como você ia éé, a mudança
faz parte e o não entendimento também, por mais que pareça perdido a gente, na vida quando a gente,
a gente precisa se perder pra poder se encontrar, então não veja isso do lado negativo mas sim como
o lado bom”. (Anahí no papel da supervisora de estágio).
“Eu só quero que...ele viva o processo...só não quero que ele desista...eu não acho que é hora
dele olhar pra ele mesmo porque ele não consegue ver, ele precisa de uma continência precisa de um
suporte...ele precisa...” (Isis, 5º ano).
Angélica (duplo de Isis): você não sabe como é estar aqui, você não sabe como é não saber,
você não sabe como é sentir aquilo que você sente, querer fazer do seu jeito e não poder...
Isis: você não viu...ele pedindo para...por uma palavra, por algo que desse o suporte...você não
viu o quanto foi difícil, sofrido, pra ele, olhar para a própria história, para as próprias falas e não
conseguir ver ligação nenhuma...e eu estava vendo e eu queria devolver...eu sei que você não me
153
obriga a fazer nada você só me aconselha eu faço se eu quero, mas é muito sofrido, muito difícil porque
é muito triste quando uma pessoa não consegue reconhecer o processo dela, só consegue ver as
bostas, só consegue ver o lado feio...e pode ser que seja positivo sim mas foi horrível me sentir
incapaz...eu me senti incapaz de não oferecer o que seria menos doloroso (Isis, 5º ano).
Isis (agora no papel de supervisora): Isis eu acho que o que você está sentindo éé a
frustração de que por mais que a gente queira ajudar o paciente ele faz o próprio caminho e as vezes
na terapia nem sempre vai ser flores, as vezes vai precisar que o paciente se sinta desconfortável, vai
precisar que seja chato vai precisar que seja sofrido porque as vezes é.... A nossa profissão não é de
evitar o sofrimento, mas a sua presença com ele, e estar ali, é um suporte, mesmo que as vezes ele
vai ter que olhar para a dor dele, mesmo que as vezes vai ser dolorido pra ele, independente do que
você fale ou deixe de falar, que você pergunte ou deixe de perguntar, a sua presença é um suporte pra
ele, infelizmente você não vai conseguir deixar que tudo seja lindo, porque as vezes ele vai precisar
entrar em contato com esses dois e nem sempre você vai ser aquela que vai conseguir transformar em
flores, as vezes você vai precisar conseguir entrar na bosta junto com ele e estar ali e está tudo bem...
não se sinta, não pense que você deve fazer mais do que você pode, você está dando o seu máximo
permanecer até acabarem. Aurora explicou que precisaria sair para ir atender e a
diretora convidou-a para comentar sobre o vivido até o momento, e a participante
comentou:
“Foi surpreendente...eu não sei...é como se e a gente estivesse lá de novo...e ainda mais
porque eu faço parte da supervisão da Isis então ...eu...revivi... eu estava lá quando ela estava...quando
ela narrou todo o caso e tal e por mais que as vezes eu sinta que ela ficou incomodada, eu não sabia
o tamanho desse caso, dessa situação pra ela, estando do lado dela, sendo uma grande amiga dela
eu não sabia o tamanho e poder saber a profundidade disso pra ela foi importante pra mim e importante
ver né... eu acho que como estudante é...eu vou falar, pra mim, a estudante ideal é a Isis sabe? Vou
falar mesmo o que eu...e eu sou tipo aquela estudante muito é descompromissada sabe? Não que eu
seja, mas o meu jeito de não ter a eficácia que ela tem em tudo o que ela faz com as coisas da
faculdade, a força que ela trouxe aqui, eu me cobro muito ter essa força sabe? Não é uma rixa entre
nós duas, mas é só o jeito mesmo...eee...e aí parece que ela impacta no jeito de ela ser, mas não é,
ela tem os limites e as fraquezas dela mesmo com essa força toda né...e então eu venho trazer que eu
não tenho que ser o jeito dela eu tenho que entender que o jeito que eu sou, e tentar ser o meu melhor
do meu jeito como estudante eu acho que foi isso...(risos)” (Aurora, 5º ano).
permanecendo imóveis olhando para Ingrid. Felipe então começou a falar alto,
dizendo:
Felipe (no papel da colega de sala de Ingrid): vamos todo mundo fazer mimica vamos virar
animal agora, vamos virar animal, tipo um pássaro
Os colegas então começaram a imitar pássaro e sairam batendo asas pelo palco, com as
expressões fechadas. A cena assumiu um clima emocional tenso e os “dois colegas” realizaram as
atividades mecanicamente, com a expressão séria. Enquanto isso,Felipe e Ingrid estabeleceram o
seguinte diálogo, em voz baixa e expressão tensa:
Depois Felipe vira-se para os colegas e diz: Vamos gente faz animal
“É que desde o começo, quando a gente tinha programado de fazer a vivencia tipo as meninas
do grupo elas não queriam fazer sabe? Elas não queriam fazer nada, estavam negativas desde o
começo, então deixaram tudo pra mim, tipo, eu, sozinha, fazer uma vivencia sabe? (recomeça a chorar
e para de falar)...elas não queriam pegar direção, nem ego auxiliar, ficaram tudo jogadas, tipo Ingrid
faz tudo, você que gosta dessa matéria se vira sabe? Ai na hora tinha que imitar um animal aí elas
viraram pra mim `vai lá Ingrid vira bicho´, a Ingrid é diretora, a Ingrid vira bicho, o que que a Ingrid faz
sabe? (Ingrid, 4º ano).
“Jéssica (no papel de Ingrid): deixa eu te falar uma coisa, você vai ter que assumir que você
não quer fazer, NÃO VAI DAR (grita), olha eu não vou conseguir, você acha que eu vou conseguir fazer
isso aqui sozinha, olha o tanto de gente nessa sala e você acha mesmo que eu vou fazer isso sozinha?
Você acha que por acaso sei lá, devo ser superdotada ´e ah eu dou conta`, olha pra você e assume,
ASSUME (grita novamente com Felipe), ou então você vai tomar (...), tá decidido, assume, ou você vai
falar pra mim ´oh eu não vou fazer eu não quero participar ou você vai lá falar com a Fabi, mas aqui
ficar aqui comigo sem fazer nada, ´ah vira um animal´, JURA? SÉRIO? É só isso ou tem mais alguma
coisa? Só isso? Assume, vira homem, fala não vou fazer não quero... você pode não saber, não sei o
que acontece com você mais, nossa sala é grande, tem gente na nossa sala que eu não me dou bem,
eu não me sinto a vontade de estar aqui, eu acho que você também não, não é fácil estar aqui, é diretor,
é ego, a gente aprendeu, ou você então você não leu nada? Você leu não leu? A gente aprendeu que
não é fácil e você está me deixando aqui sozinha? Sério? È isso mesmo? Você não vai falar nada?
FALA ALGUMA COISA (gritando com Felipe) (Jéssica, 5º ano, realizando um duplo de Ingrid durante
a dramatização)”.
“Eu to perdido, eu não sei exatamente o que fazer, eu acho que a Ingrid é uma pessoa que
assume muito as responsabilidades e é mais confortável deixar em cima dela...eu acho difícil conduzir,
é, ter a espontaneidade que ela tem para conduzir as coisas, então o jeito que ela sempre faz as coisas
assim despachada, eu achei que ela ia fazer isso de novo e fiquei na zona confortável...eu não to
acostumado com essa posição, eu acho que...não sei o que fazer.... não sei o que fazer...fico quase
que paralisado assim, e fico na defensiva”. (Felipe, 5º ano, fazendo o papel da colega de Ingrid na
dramatização).
agora. A diretora sugeriu que ele se aproximasse de Ingrid e falasse com ela com
liberdade, olhando nos olhos, o que estava sentindo no momento. Ícaro se aproximou
de Ingrid e emocionado, começou a dizer:
“Eu vou te falar de mim...eu estava presente lá, senti a dificuldade que vocês tiveram mas eu
entrei desde o início, tanto na mimica quanto na parte do animal eu senti que realmente ficou muita
coisa nas suas costas, eu percebi que as pessoas deixavam muito de lado e...me ajudou muito,
muito...como a vivencia do Tomás, foi muito forte em mim aquilo, aquilo sussurra em mim até hoje,
então eu sei que você fez o que você pôde, e o que você pôde foi o suficiente para mim, então eu acho
que você já fez muito, porque me ajudou muito...” (Ícaro, 4º ano).
Ingrid voltou a se emocionar bastante enquanto Ícaro falava com ela. Quando
ele terminou ela agradeceu. Jéssica ainda disse para a colega: “nunca desista dos
seus sonhos” e Ingrid sorriu, pois Jéssica retomou a fala da professora Fabi no final
da vivência feita na sala de aula. Pediu então para dar um abraço em todos no grupo
e realizamos um abraço coletivo por quase um minuto, encerrando a cena do grupo
2. Em seguida, a diretora propôs que permanecessem por mais alguns instantes em
círculo e ensinou uma música para os participantes, para cantarem juntos encerrando
a dramatização:
Isis: entendimento
Ícaro: amizade
Ingrid: amizade
Anahí: empatia
Jéssica: sentimento
Felipe: parceria
“Bom hoje foi muito bom porque eu saí um pouco de mim, porque eu acho que eu estava tão,
tão presa em mim, é claro que é bom você ter esse momento introspectivo pra...só que eu já sou muito
introvertida e eu estava num momento de introspecção então eu acho que assim que esses tempos
parecia que eu estava muito dentro de mim e eu estava entrando muito em conflito e foi bom hoje eu
sai um pouco de mim e ver um pouco do outro, foi mais um alivio assim, eu to me sentindo muito bem”
(Anahí, 5º ano).
percebeu como muitas vezes ele também se sente perdido nas supervisões de estágio
psicoterápico, por não entender a relação entre a teoria e a prática. Felipe citou
especificamente a supervisão de um professor e enquanto ia falando, Isis interferiu e
complementou várias vezes a fala do colega, pois participa da mesma supervisão.
Felipe compartilhou ainda com o grupo como “tem medo” de ser um peso para os
colegas de sala, como o personagem que dramatizou na cena, e então perguntou para
Isis se é um peso para ela. Os dois desenvolvem um diálogo sobre o modo de
trabalharem juntos e o grupo escutou silenciosamente:
Felipe (5º ano): aí na dramatização da Ingrid a hora que a Jéssica começou a me pressionar
me caiu numa coisa assim por um momento eu fiquei paralisado por causa que eu fiquei ... as vezes
eu fico pensando do jeito que eu estou nesse negócio totalmente paralisado com esses negócios meu
da faculdade eu fico com medo de estar sendo peso para alguém igual eu estava sendo peso para a
Ingrid no ‘role’ me deu uma coisa...que que eu pensei eu acho que eu nunca ia tomar uma atitude tão
filha da puta igual os amigos dela tomaram de além de não fazer ainda pressionar ela, eu tento assim
fazer o máximo que eu posso de não ser um peso eee isso ficou muito forte pra mim assim na hora da
dramatização da Ingrid, dessa minha preocupação de não estar sendo um peso para as pessoas
principalmente para a Isis”.
Isis (5º ano): não Felipe você é uma pessoa muito parceria e eu vejo assim o esforço imenso
que você faz para estar lá no hospital que é muito pesado, acho que eu só sinto o peso na hora de
programar as coisas sabe? Porque tipo assim as vezes eu te mando....porque eu também deixo as
coisas para a última hora então nisso a gente combina, mas tipo assim o meu última hora é sempre
antes do seu sabe? Tipo assim então a única coisa que eu me sinto.
Isis: é, de tipo assim, o que a gente vai fazer amanhã, sabe, tipo assim? Então as vezes o peso
que fica é que tipo assim eu penso assim ´putz se eu não pensar nada pro grupo vamos chegar lá e
não vai ter nada’.
Felipe: hum.
Isis: só que tipo assim eu entendo que talvez pra você tudo bem que você chega na hora
improvisa da certo mas eu não sou assim sabe? Eu gosto de planejar por mais que eu procrastine eu
gosto de planejar então eu acho que é a única questão assim que as vezes que poderia pegar, é que
as vezes eu sinto assim que se eu não pensar nada se eu não planejar a atividade não vai ter nada
sabe? É isso...”
Felipe (5º ano): é uma coisa de combinar...eu já estava sentindo isso , eu fico pensando ´nossa
será que eu falo alguma coisa´, mas é aquele negócio, eu acredito que eu vou dormir e acordar no
corpo de outra pessoa entendeu?(risos) Quando a Isis chega no domingo ou na terça feira sempre ela
chega e fala `ou vamo fazer tal coisa`, eu falo `vamo´uhuuu vamos faze, então eu sou uma pessoa que
eu não sou muito líder eu sou muito melhor liderado
“Tipo assim o que eu entendi no palco é que na verdade a questão que me tocou foi perceber
que eu não vou conseguir fazer com que ele não sofra sabe tipo assim”? O meu conflito interno é aquilo
assim eu querer oferecer o que o paciente quer, e não o que ele precisa porque as vezes o que ele
precisa é ver as bostas as vezes o que ele precisa é o sofrimento de olhar a própria história e ver que
ele não consegue ver ligação nenhuma que ele não consegue ver bonito nenhum que ele não consegue
ver caminho nenhum, progressão nenhuma , evolução nenhuma sabe? As vezes ele precisa olhar isso
para talvez ir começando a ligar sabe?” (Isis, 5º ano).
A participante ainda diz para a colega Anahí que foi importante ela acolhê-la
em todos os momentos, pois percebeu que foi “ganhando coragem” para enfrentar as
próprias dificuldades, que nesse caso, seria a cobrança de “oferecer para o paciente
o que ele quer e não o que ele precisa”. Isis está visivelmente à vontade no grupo e
relata felicidade e gratidão por todo o processo vivenciado, que lhe trouxe uma outra
visão do que está vivendo como estagiária.
Em seguida, Jéssica se colocou e fez uma pergunta que trouxe estranhamento
para o grupo, levando todos os participantes a olharem para ela com expressão
interrogativa:
Jéssica (5º ano): pra mim tá tudo certo, eu só queria perguntar uma coisa, eu queria saber se
a semana passada esses buracos aqui no palco tinha?
Risos no grupo.
A diretora então perguntou para Jéssica como ela estava se sentindo após as
dramatizações e a participante respondeu:
“Não está tudo bem eu senti que eu gostei muito de hoje eu fico feliz porque eu não sou
protagonista, enquanto estiver assim acho que está bom sabe? E eu achei que algumas falas, de todo
mundo né, as vezes eu me identifico muito e sinto ´nossa eu també passo por isso´ e algumas eu sinto
que é muito ao contrário, comigo sabe? E aí parece que eu fico aqui vendo as pessoas, ouvindo as
pessoas e me respondendo mentalmente sabe? `eu faço isso` , ´mas eu não faço isso...” (Jéssica, 5º
ano).
161
“Não eu acho que eu to muito perdida eu to no fundo do poço mesmo, na escuridão , mas acho
que passa” (Jéssica, 5º ano).
Felipe comentou então com Jéssica que ficar perdida era procurar os “buracos”
do palco e todos riram bastante, inclusive a participante, que em seguida se calou e
disse que já havia terminado o compartilhar, reconhecendo-se perdida. Ingrid então
pediu a palavra e contou para o grupo que estava sentindo alívio emocional em função
da dramatização, e agradeceu todos pela participação na mesma. Ingrid relatou ainda
que já havia três semana que só falava desse assunto na psicoterapia individual, mas
que com a dramatização, pôde reviver a dor e colocá-la para fora, encontrando alívio
para a sensação de fracasso vivida desde o dia da experiência. A participante ainda
comentou sobre a relação com as colegas de sala com quem realiza as atividades
acadêmicas:
“As duas elas me ajudam muito mas em outros trabalhos, qualquer outra matéria que você
pensar elas fazem de tudo entendeu? Exceto se fala da Fabi...elas não gostam de nada que é técnica
grupal ou psicodrama ou algo desse tipo...então elas nesse sentido elas não fazem absolutamente
nada, mas em outros quesitos elas são muito boas, e foi justamente por isso que eu não quis falar mal,
pra nem criar uma imagem do tipo `ah elas não faz nada`, porque elas fazem sim eee nesse dia foi
horrível, acho que foi o pior dia meu na faculdade de quatro anos eu queria me esconder em algum
lugar e sumir do mapa, eu fiquei a vivencia toda depois escondida, bem no canto, onde ninguém me
enxergasse... então a Fabi olhou pra mim com e eu falei `não Fabi aqui não dá para eu falar´, tipo, tá,
o certo era eu falar, mas não dava tipo é grupo de sala, as meninas estavam ali, era impossível falar
ali, não tinha como eu falar ali...ai eu não falei né, guardei pra mim...aí depois disso ainda minha
psicóloga não podia me atender, tive que ir outro dia ai fui guardando isso, fui guardando, guardando,
inclusive não faço mais grupo com elas teve um trabalho que foram marcar e eu simplesmente não fiz
com elas”. (Ingrid, 4º ano).
“Na hora de verdade ..eu odeio fazer coisa mal feita...o que eu levei mais em terapia individual
foi na questão de me sentir um fracasso de eu não ter conseguido...no dia eu levei para o eu, e depois
fiquei levando em terapia no eu por duas semanas ai eu sai desse eu, eu sai, ai eu trouxe aqui
algo...porque eu acho que se eu tivesse trago direto pra cá seria muito do eu, seria muito eu sentindo
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um fracasso, bem diferente acho sabe? Mas eu levei em terapia individual antes...aí isso passou ai na
hora do compartilhar eu não pude compartilhar eu falei brevemente que eu estava me sentindo mal, e
que eu estava me sentindo meio que um lixo né e tipo eu sempre falei, sempre falo na sala, porque eu
gosto muito de terapia grupal, essas coisas né? Então todo mundo falava ´ah a Ingrid vai seguir essa
área´, então o peso em mim parece que foi maior sabe? E na hora eu levei muito pra questão, ‘nossa
isso é algo que eu quero que eu gosto e eu não consegui fazer´, eu levei muito pra esse lado na hora,
e agora não, agora eu vi que foi tudo um desencontro do grupo, foi difícil ver isso”” (Ingrid, 4º ano).
“Eu também escolhi organizacional, e eu também tive essa decepção, que eu acho que se eu
não tivesse o quinto ano eu largaria a faculdade” (Jéssica, 5º ano).
Isis: eu acho que é uma proposta muito boa fazer esse grupo, apesar de não ser terapia de
grupo
Risos no grupo.
Isis: não vai economizar um tempo e um dinheiro absurdo da minha terapia individual
“Que boa parceria essa aqui que a gente está fazendo aqui nesse lugar!”
A diretora iniciou o encontro convidando os estudantes a olharem
retrospectivamente para àquilo que vivenciaram na sessão anterior e que gostariam
de compartilhar com o grupo.
Ingrid chegou ao encontro se dizendo disposta a revelar para o grupo uma
experiência recente em que se sentiu fracassada na faculdade, por ter cometido um
erro, e que estava se aquecendo para trabalhar essa situação no grupo já há algum
tempo. Agradeceu a Jéssica por ter comentando novamente, na quarta sessão, sobre
como se sentiu rejeitada pelos donos da empresa em que realizava estágio de
Psicologia Organizacional, pois esse compartilhar da colega a incentivou a voltar a
fala de sua própria experiência dolorosa vivenciada na faculdade. E foi nesse
movimento que iniciamos o quinto encontro: Ingrid se propondo a enfrentar uma
experiência dolorosa.
Após o compartilhar das experiências dos integrantes que haviam participado
do encontro anterior, Felipe e Anahí comentaram sobre como estavam se sentindo
perdidos e adoecidos no papel de estudante, dada as demandas do quinto ano, o que
provocou uma discussão entre todos acerca das diferenças das atividades, demandas
e responsabilidades do quarto e do quinto ano. O grupo estava se aquecendo com
166
desenvolvida no palco, a diretora realizou um duplo de Isis, abrindo espaço para que
emergisse a experiência ainda não verbalizada pela participante, ou como ela havia
se sentido mal com essa orientação dada pela supervisora. Nesse sentido, quando
pôde realizar a inversão de papéis com a supervisora e repetir as palavras da mesma,
criou uma nova fala, direcionada para ela mesma, de dentro de suas dificuldades.
Essa cena permitiu uma saída do sofrimento trazido por ela e a criação de uma nova
saída para a relação professora-aluno; aluno- supervisor, além de uma nova
compreensão para Isis de como estava se posicionando perante o paciente. Pôde
então criar uma nova visão para a relação aluno-paciente, e em sua perspectiva, a
inversão de papéis com a supervisora permitiu que visse claramente sua necessidade
em dar respostas para o paciente e mostrar sempre o lado positivo das experiências
humanas, mesmo que o paciente não esteja ainda percebendo com esse olhar. A
troca de papéis realizada entre a protagonista e sua supervisora permitiram um novo
olhar para o drama vivenciado. Anahí, que participou da dramatização, mostrou-se
bastante tocada em vivenciar e compreender essa postura, pois segundo ela
compartilhou ao final, compreendeu que foi somente quando Isis assumiu o papel de
supervisora, na inversão de papéis, que pôde ver a si mesma e o conflito que estava
vivendo com a supervisora e com a realização do atendimento; na troca de papéis,
Isis compartilhou que se entendeu, olhando-se do ponto de vista da supervisora,
reafirmando que o seu conflito com os atendimentos consiste em justamente querer
ajudar o outro com aquilo que ela considera positivo e necessário, e que percebeu o
quanto precisa aprender a estar com o outro “na bosta” (sic).
Já a cena do segundo grupo passava-se na sala de aula durante uma atividade
de intervenção em grupo com os colegas de sala, foi uma cena trazida por Ingrid. A
participante pode reviver pela segunda vez e nesse sentido, liberar todo o sofrimento
que havia experimentado quando ela e grupo de trabalho não conseguiram
“desenvolver com êxito” a atividade de intervenção grupal, no contexto de uma
disciplina. Ingrid mostrou na dramatização como se sentiu sozinha e perdida no
desenvolvimento do trabalho, e como sentiu o abandono das colegas e a dificuldade
de cooperaram e trabalharem juntas no desenvolvimento da proposta vivencial. Com
a dramatização, pôde resgatar o choro, o sentimento de fracasso que viveu na
experiência em função da alta expectativa que tinha sobre si mesma para o
desenvolvimento do trabalho, por se identificar bastante com as propostas grupais.
Ingrid percebeu, ao final da dramatização, que tinha tomado para si a
168
responsabilidade de desenvolver o trabalho, e que foi o grupo todo dela que não
conseguiu desenvolver a proposta da maneira como havia imaginado. Saiu da
experiência sentindo-se individualmente fracassada e no palco, pode se permitir
resgatar a solidão vivida, desenvolver um diálogo com as colegas por meio dos egos
auxiliares, o que provocou nela uma sensação de alívio, uma nova visão sobre a
relação aluno-aluno.
Durante a apresentação das duas cenas, a diretora interviu com diferentes
técnicas do psicodrama, como solilóquio, duplo, espelho, inversão de papéis. Anahí,
Ícaro, Felipe e Jéssica foram também os egos auxiliares das dramatizações, o que
gerou grande mobilização emocional nos protagonistas das cenas e nos integrantes
dos grupos. Ao final das dramatizações, a diretora convidou para uma finalização em
círculo e ensinou uma música para o grupo, gerando grande descontração e
divertimento nos participantes.
Nesse sentido, o grupo apresentou um movimento de liberdade e cumplicidade
desde o início do encontro, ocorrendo em vários momentos o processo de
circularização (FONSECA, 1980). As falas confirmavam como já sentem confiança em
falar de si com liberdade, pois acreditam que serão aceitos do modo como são no
contexto grupal. O encontro revelou também como as vivências profissionalizantes do
quarto e do quinto ano apresentam-se como vivências de sofrimento acadêmico, à
medida que assumir o papel profissional de psicólogo acarreta diferentes desafios,
tais como as dificuldades dos atendimentos, do contato com a subjetividade humana,
a responsabilidade em estar com outro ser humano ouvindo-o em seus dramas, os
desafios do trabalho em grupo e a comparação entre os estudantes.
O processo de trabalho de grupo vivenciado na faculdade pôde ser revelado no
contexto dramático, colaborando para que compreendessem o modo de se relacionar
com os colegas, de trabalhar em grupo, indo além de uma postura individualista e se
aproximando de um modo mais autêntico de estar nas relações. Essa dramatização
permitiu que os participantes Isis e Felipe olhassem para a própria relação de parceria
nos estágios, refletindo de forma espontânea e afetuosa as dificuldades que estão
encontrando.
No momento do compartilhar, Anahí demonstrou um movimento diferente dos
encontros anteriores e foi a primeira a se colocar, contando para o grupo a sensação
de alívio e bem-estar que as dramatizações possibilitaram para ela. Anahí relatou que
estava se sentindo perdida dentro de si mesma e com a vivência no palco pode
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Data: 02/06/2017
Participantes: 6 (Aurora, Isis, Ingrid, Andressa, Bruna, Jéssica)
Ausentes: 4 (Anahí, Felipe, Tadeu, Ícaro)
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“Eu to um pouco cansada, bem cansada...muito cansada (risos), nossa eu quero é dormir,
quando eu cheguei aqui....agora melhorou, bastante...porém continuo cansada...foi muito bom o que a
gente fez aqui, jogar para a terra...nossa foi muito bom mesmo...e quando você pediu para vir uma
imagem do que aconteceu semana passada, me veio primeiro o momento da minha cena, que eu fui
protagonista, e me veio depois o momento que a gente estava no palco, cantando, que a gente
entendeu errado a letra da música, foi muito engraçado ... aí foi esse momento de dor e logo depois
tipo o riso sabe? Essa intimidade que a gente estava naquele momento...e isso me mostrou muito a
minha mudança, sabe? De como tudo aqui me fortalece, e isso me trouxe uma paz muito grande, no
171
sentido de eu to fazendo o que eu quero, no caminho certo, e está sendo muito bom, sabe? Uma coisa
muito positiva...foi isso” (Ingrid, 4º ano).
Andressa: é mas a impressão que eu tinha que estava de fora eu senti o grupo...eu lembro que
eu perguntei ´mas quem que é o grupo que está conduzindo´?
Ingrid: é e eles levaram para o lado que a sala estava muito cansada mas não era isso, o grupo
estava sem união
Andressa: é todo mundo percebeu no dia que não foi... é igual eu falei eu também senti que foi
o grupo eu não senti que foi a sala, a sala estava muito desanimada a gente tinha acabado de sair de
prova já fazendo a gente ser bicho...
Ingrid: “Como que eu chegava para 30 pessoas, as meninas da minha sala que eu achava que
elas não tinham participado que eu senti que eu estava sozinha, como é que eu olhava para a sala, 30
pessoas que convivem, com 3 pessoas que fazem parte do meu grupo e falava isso? Era impossível
falar isso não tinha como eu falar isso aí eu guardei pra mim e eu não gosto de guardar nada pra mim
porque fica né? E isso foi piorando, piorando...
Andressa: é que eu acho que a nossa sala, toda sala que tem técnicas de grupo tem muita
questão de sala, pelo que eu já escutei falar assim, nossa sala não surge, não surge...
Andressa: igual ela podia muito bem ter falado na hora que tinha espaço para ela poder ter
falado mas não fala, eu sinto que a sala não expõe o que acontece
Andressa: entre nós assim, a gente entra nas vivencias tudo mas leva pra questão de fora né,
não tem essa abertura pra poder falar dentro da sala
Andressa: é
Ingrid: é tb porque o grupo da nossa sala é muito grande...por exemplo, na última que teve de
vocês, do amor (fala com Andressa), teve um pequeno grupo lá do meu, que era de dor, lembra, o
Tadeu por exemplo não expos nada que sentia, porque quem estava no grupo era o aquele outro, que
é amigo da ex dele, ele não ia expor
Ingrid: é o grupo é muito grande, 30 pessoas e nem todo mundo ali é amigo, tem inimigo na
nossa sala é porque você não conhece as tetras (risos).
Ingrid: igual da Rosa...a gente fez lá..ai a Rosa ´ai vcs elevaram o nível´, eu não gostei do que
ela falou, elevar o nível do grupo, agora os próximos grupos tem que ser tão bom quanto
Ingrid: foi... é porque a gente tinha, a professora, a gente fez um trabalho sabe? E o trabalho
foi muito bem elaborado tinha um consenso do grupo ficou muito bom o trabalho, você não foi?
(perguntou para Andressa)
Ingrid: então foi muito bom o trabalho, ai depois que a gente finalizou o trabalho a professora
chegou e falou assim que foi muito bom o trabalho e foi o primeiro grupo a apresentar, que os próximos
173
tinha que ser tão bom quanto, não com essas palavras entendeu, mas tinha que seguir o padrão que a
gente começou com um padrão bem alto, porque não ficou aquela coisa maçante, a gente fez uma
coisa diferente
Andressa: um teatro
Ingrid: é aí ela fala isso entendeu? E isso leva um ar de competitividade e eu não gostei do que
ela falou
Andressa: é ai o meu grupo que vai ser agora depois de vocês estava nessa ´nossa o que nós
temos que fazer agora tem que ser criativo´
Andressa: eu falei gente nós não temos esse perfil o nosso vai ser slide mesmo não é slide que
nós gosta de fazer? Vai ser slide gente não tem que ter teatro porque o outro fez teatro
Ingrid: é o que eu penso por isso que eu não gostei do que ela falou
“Então foi uma cena muito forte, assim, de perceber isso que eu não tinha dado conta, até o
grupo de sexta eu nem tinha sentido que isso tinha me incomodado que quando a minha supervisora,
ela não pediu , ela sugeriu que eu fizesse diferente, me incomodou profundamente e eu não tinha me
dado conta, até eu subir no palco né, que ai no começo a gente trocou também eu fiz um soliloquio e
ai no soliloquio que eu fui perceber, eu falando pra ela que não é assim que eu não queria fazer isso,
que eu achava que eu não precisava, então eu não tinha me dado conta até então e ai veio muito de
encontro com o da Ingrid no sentido de incapacidade que a gente se sente assim como profissional que
as vezes tem situação assim que a gente não sabe nem como prevenir, esses sofrimentos mesmo da
atuação que vem, então a gente está aprendendo e o quanto e difícil quando as vezes não sai como a
gente quer, como a gente não consegue ficar tranquilo” (Isis, 5º ano).
Isis compartilhou ainda com o grupo que ficou muito bem após a dramatização
e sentiu maior liberdade para ir atender ao paciente na semana seguinte, mais aliviada
no papel de estagiária de psicoterapia, ao entender que não precisaria dar soluções
174
rápidas para o conflito do paciente. Contou ainda que passou a semana bem, está
cansada, mas não “acabada” e que todo o aquecimento havia feito ela sentir-se bem.
Em seguida, Andressa pediu a palavra e compartilhou com o grupo que não
pôde vir na semana anterior pois foi embora para sua casa, que é em outra cidade,
participar de uma festa. A participante comentou ainda estar se sentindo dolorida por
ter contraído um resfriado, e que estava “tranquila”. A fala dela foi breve e assim que
terminou, houve um silêncio de alguns segundos no grupo, quebrado pela participante
Bruna, que compartilhou estar muito bem, alegre, e que não compareceu ao encontro
anterior porque não teve aula e, portanto, tirou o dia de “folga”. A diretora questionou
Bruna sobre como ela havia se sentido com a saída de Laura e a participante
respondeu que a princípio ficou preocupada, com medo de se sentir deslocada, mas
que depois escolheu continuar participando, à medida que vivenciar o grupo configura-
se como uma oportunidade de autoconhecimento. Bruna complementou ainda que
nas sessões em que escutou os colegas do quarto e do quinto ano se colocarem,
sentiu-se apreensiva com o futuro, mas que acabou entendendo que cada série têm
os próprios desafios:
“É eu fico olhando elas falando e não fico afobada com isso não...no começo eu até ficava, eu
pensava, ´nossa será que eu já estou no terceiro ano e tenho que pensar alguma coisa´´ , e que que
eu gosto...mas não...porque no quarto ano eles pedem né, um projeto de TCC...mas eu não sei
ainda...igual agora no terceiro a gente já está tendo um preparo para isso, para não sofrer tanto no
quarto ano...mas eu to tranquila, não vou ficar preocupando não, depois vai encaminhando, até mesmo
nos estágios, só tivemos 3 só mas ainda não tive problemas...então é isso” (Bruna, 3º ano).
“Quando você pediu para visualizar a tela em branco e olhar alguma coisa da semana passada
eu não consegui visualizar nada não, só uma menina perdida na imensidão branca...só isso que eu
consegui visualizar...uma menina perdida na imensidão branca....não tinha nada para os
lados...branco...e o branco muitas vezes se refere ao nada né...”(Aurora, 5º ano).
“Eu me sinto uma menina mesmo perdida...e ai eu acho que eu senti tanto tanto que eu me
desconectei então hoje me sinto fria por dentro, fria...porque ai gente credo...que minha vida não é
muito fácil, não é muito fácil assim o que eu tenho passado, o que eu tenho vivido e tudo difícil...e eu
me sinto sozinha assim....numa imensidão branca, da tela branca que você falou pra gente
visualizar...eu me sinto até distante do que acontece na faculdade...eu sei que eu tenho que estar lá
que eu tenho que viver mas não sei muito onde eu to...acho que é isso...eu acho que to me cobrando
amadurecer sabe? Ser psicóloga...ser mulher, mas eu tenho me sentido muito criança por essa dor”
(Aurora, 5º ano).
“Eu até falo que eu estou cansada da minha família, to cansada de falar de família, quando
entra no estágio e começa a falar relação família, pai e mãe.... eu estourei com esse assunto porque
eu sei que é importante mas eu não estou conseguindo, porque eu tenho raiva e sentir raiva do meu
pai é ruim, é ruim dizer isso né?” (Aurora, 5º ano).
Angélica (duplo de Aurora): eu me sinto uma menina mesmo perdida...e ai eu acho que eu senti
tanto tanto que eu me desconectei então hoje me sinto fria por dentro, fria...porque ai gente... minha
vida não está muito fácil, não é muito fácil assim o que eu tenho passado, o que eu tenho vivido e tudo
difícil...eu tenho vergonha de falar para vocês mas eu me sinto sozinha assim....numa imensidão
branca, da tela branca que você falou pra gente visualizar...eu me sinto até distante do que acontece
na faculdade...eu sei que eu tenho que estar lá que eu tenho que viver mas não sei muito onde eu
to...acho que é isso...”
Após o duplo, Aurora disse para o grupo que se sentia muito envergonhada de
abordar esse assunto, e que estava se cobrando muito para dar conta dessas
angústias sozinha, para permanecer como boa aluna na faculdade, mas que não
estava conseguindo e por isso, criou coragem para compartilhar:
“Eu já quis desistir bastante e já fiz coisas para que eu precisasse desistir mas não foi...e ainda
tem toda a cobrança do que tem que ser feito na faculdade e minha mãe me cobra que eu não to
fazendo não to produzindo, porque que eu to triste tenho que tomar um remédio, que eu to depressiva
e...só me falam o que eu to ninguém me pergunta como eu acho que eu to e porque que eu to assim
porque apontar é fácil né? Mas eu queria que eu mesma pelo menos reconhecesse o meu esforço
sabe? É eu to fazendo a minha obrigação mas pra mim foi um grande esforço” (Aurora, 5º ano).
O grupo escutou atentamente e quando Aurora finalizou sua fala, disse que
estava aliviada por ter um espaço para falar, mas que estava sentindo “vergonha do
grupo”. A diretora então propôs que as participantes falassem com Aurora como
sentiram enquanto estavam ouvindo a ela, e todas o fizeram de forma afetuosa, dando
início à etapa do compartilhamento.
Compartilhar: a primeira a pedir a palavra foi Isis, que é muita amiga de Aurora
na faculdade e estava emocionada por ouvir a colega; levantou-se e as duas deram
um longo abraço. Isis comentou com a amiga que ficava emocionada de ouvi-la:
“Eu só consigo pensar no tanto que eu te amo...porque a Aurora é uma das minhas melhores
amigas então é uma relação muito profunda assim...não sei me desperta uma emoção também... eu
as vezes tenho vontade de ficar abraçada com ela também então é difícil pra mim ficar ouvindo assim
tudo que eu já passei assim junto com ela né, as vezes tipo claro é sofrido porque na correria a gente
não consegue igual ontem né Aurora...ontem eu falei assim pra ela, ela estava com muita raiva sei lá
ela estava estranha e eu falei assim ´como você está´? O que está acontecendo? Ela falou ´não consigo
falar em palavras agora´... então quando eu ouço ela eu fico pensando que eu amo muito ela e foi difícil
me conter aqui eu queria logo já correr e abraçar ela” (Isis, 5º ano).
Aurora agradeceu e disse para Isis que ela também era muito importante para
ela, e que a amizade das duas na faculdade vinha lhe dando apoio para continuar no
curso.
Uma por uma, todas as participantes foram comentando com Aurora como a
viam na faculdade, sempre muito criativa e poética, e que todas tinham muito
admiração por ela. A participante Bruna disse para Aurora, esclarecendo para o grupo
a dificuldade em vencer a vergonha da exposição pessoal para ter espaço de fala
verdadeiro e livre, conseguindo expor aquilo que se quer esconder:
“Eu acho que eu entendo a importância dela falar aqui sobre isso, essa questão que ela trouxe
de agressividade , de tentar diminuir a dor pra tentar lidar com a vida, é muito difícil fazer isso eu acho
que eu já me vi fazendo isso algumas vezes também...e é muito difícil você conseguir falar aquilo que
você quer esconder e...foi muito forte mesmo” (Bruna, 3º ano).
“Aí foi esse momento de dor e logo depois tipo o riso sabe? Essa intimidade que a gente estava
naquele momento...e isso me mostrou muito a minha mudança, sabe? De como tudo aqui me fortalece,
e isso me trouxe uma paz muito grande, no sentido de eu to fazendo o que eu quero, no caminho certo,
e está sendo muito bom, sabe? Uma coisa muito positiva...foi isso...” (Ingrid, 4º ano).
(sic) para se revelar nessas questões. Jéssica falou sobre o que estava vivendo e
chorou bastante, apresentando grande mobilização emocional. Foi acolhida pelo
grupo e pela diretora, em um círculo no palco. Em um clima de respeito e silêncio
finalizou-se a sexta sessão.
Data: 09/06/2017
Participantes: 7 (Isis, Ingrid, Tadeu, Anahí, Jéssica, Felipe, Aurora)
Ausentes: 3 (Bruna, Ícaro, Andressa)
Duração do Encontro: 2h30
Contextualização: os participantes Ícaro, Andressa e Bruna avisaram pelo
grupo do whatsapp que não viriam ao encontro desse dia. No início do encontro, a
diretora e o grupo combinaram sobre a sessão de encerramento do semestre, que
ficou marcada para o dia 30 de junho, no dia, horário e local do grupo. Além disso, em
função do feriado do dia 16 de junho, combinaram uma troca de horário de realização
do encontro do grupo, ficando agendada para o dia 22 de junho de 2017, uma quinta-
feira.
Aquecimento Inespecífico: os participantes foram convidados a contarem
brevemente sobre como passaram desde o último encontro. Ingrid foi a primeira a se
colocar, comentando com o grupo que passou a semana dormindo muito pouco e que
por isso estava se sentindo exausta; e que inclusive dormiu depois do almoço e teve
muita dificuldade para acordar e vir ao grupo. Ingrid contou ainda como em função da
insônia, deixou todos os trabalhos da faculdade “em dia”:
“Eu não conseguia dormir e ficava mexendo, um dia eu fui deitar lá em casa e fui dormir, era
nove e meia e pensei “nossa eu tenho esse tempo todo pra dormir” ai eu fiquei mexendo e mexendo e
mexendo e nada de dormir, eu fiz tudo o que eu faço pra dormir, já relaxei, fiz de tudo e eu não dormia,
inclusive quando eu relaxava e fazia alguma coisa eu ficava mais esperta, ai eu falei assim ´quer saber?
Vou fazer trabalho´, ai eu fazia trabalho, eu fiz todos, adiantei todos, não tenho nenhum trabalho para
fazer” (Ingrid, 4º ano).
Para finalizar sua fala, a participante contou sobre duas matérias que está com
dificuldade em ir à aula, por não estar gostando e o grupo se mobilizou falando de
duas professoras específicas; o modo de darem aula e se relacionaram com os
alunos. O grupo estava disperso e o comentário de Tadeu sobressaiu às diferentes
vozes:
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“Ontem foi engraçado, uma coisa que eu fiquei pensando, que a gente estava no hospital, ai a
gente estava saindo, ai eu virei para a minha dupla que é a Cristiane né, e falei assim “nossa parece
que as férias não chegam, né, ainda bem que já está no fim do mês”, ai ela- “ Tadeu hoje é dia oito”,
ai eu “nossa eu tinha esquecido totalmente que era dia oito” (Tadeu, 4º ano).
“Foi muito bom, eu agradeço, agradeço muito a todos e a vida pela oportunidade de me abrir
um pouco, foi muito importante, né? Não dá para falar com palavras, eu espero que... foi bem amplo,
bem importante, profundamente importante pra mim, obrigado gente. Mais um foguinho aí, acendeu
mais um pouquinho” (Aurora, 5º ano).
“Foi um pouco estranho essa semana, na terça-feira a gente tirou fotos pra formatura e tal, e
eu me senti meio estranho assim, parece que eu não estava pertencente aquela emoção que estava
dominando todo mundo de fechamento de ciclo, de coisa, eu estava meio, parece que não era comigo
assim, sabe? Parece que eu estava vendo uma outra turma, embora, assim, muito da felicidade do
pessoal passasse ali porque são pessoas que eu gosto e que estava feliz, mas eu estava me sentindo
assim, parece que gente “nossa o que eu estou encenando mesmo? Por que é que eu tenho que ficar
feliz?” (Felipe, 5º ano).
“Eu ia falar Felipe, não é só você porque, eu sinceramente, eu estava lá cumprindo mais uma
coisa... sabe tipo assim quando tem que fazer um relatório, tem que tirar foto eu estava tipo assim,
estava um sorriso muito superficial no meu rosto nas fotos, porque por dentro tem ish... Eu entendo o
que o Felipe está dizendo, só estava para cumprir... porque eu não queria ser a chata que não estava
lá e eu tenho consideração por todo mundo e queria estar com a classe, mas as fotos pra mim eram
irrelevantes, de verdade”. (Aurora, 5º ano).
Aurora: a companhia que valeu, né? Por mais que estava aquela correria
Felipe: é que tinha muita gente assim, tinham algumas pessoas que estavam animadas,
realmente feliz com aquilo
Aurora: é eu também
Felipe: eu também
“Eu também... foi numa época muito ruim também, eu não achei uma data boa não, estava tipo,
tem que preocupar com essas fotos, tem que fazer isso, aff” (Isis, 5º ano).
Ingrid comentou com os colegas que eles “atuaram” bem porque pareciam
felizes em tirar as fotos. Jéssica disse então que não queria perder o investimento “na
maquiagem” e todos riram muito. Ingrid ainda elogiou a brincadeira que o grupo do
quinto ano fez com os professores e então contaram para a unidade funcional o que
havia ocorrido. Isis finalizou esse momento comentando que a sessão de fotos havia
ficado superficial e que deveria ser feita no final do ano, depois que todos estivessem
aprovados, pois nesse momento estavam exaustos.
183
“Eu até queria assim, só fazer um comentário, até desse atendimento porque foi algo que me
marcou muito e semana que vem não vai ter supervisão, e acho que foi meio pesado, até que hoje eu
estou muito cansada, porque esses atendimentos nossa, está puxando muito da gente, nossa ontem
de noite eu até passei mal, eu fiquei muito mal, eu apaguei, eu quase cheguei a desmaiar de tão mal
que eu fiquei, só que, acho que não sei se a pressão caiu, não sei o que foi, acho que eu fiquei o dia
inteiro na faculdade e eu não, eu comi um lanche e não almocei comida mesmo, e fiquei o dia inteirão
até ás três e quinze na supervisão e três e meia eu atendi ele e nossa, depois que eu atendi ele eu
fiquei muito mal” (Anahí, 5º ano).
“A criança que eu atendo ela sempre sofreu bullying, sempre foi, sabe, agredida verbalmente,
não tem amigos e ontem eu fui agredida por ele, nossa eu me senti muito ruim, porque foi tipo assim,
eu acho que eu me senti no lugar dele, porque ele zuou de mim, ele meio que assim estava debochando
de mim assim, e eu senti ele me agredindo numa brincadeira assim, sabe? E eu via na expressão dele,
sabe? Tipo, ele querendo agredir e eu deixei porque eu não sei se foi como se eu tivesse me sentido
no lugar dele, tipo deixando, ou se ele precisava daquilo, tipo assim, ele sabe, porque ele sempre foi a
vítima, então não sei se ele precisava, enfim, mas eu sai de lá muito ruim” (Anahí, 5º ano).
Jéssica: lugar
Isis: inconformada
Felipe: surpresa
Aurora: impacto
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Ingrid: indignação
Tadeu: raiva
Anahí: aflição
“Bom para mim foi muito ruim, o começo de voltar porque, um ano antes, assim pegou bem na
ferida, porque um ano antes, eu fiquei um ano depois que eu terminei o colegial, porque eu prestei o
vestibular na UFTM, que era o meu sonho de estudar lá, ai eu passei na primeira fase e na segunda
não. E ai esse um ano antes foi o ano que eu fiquei sem fazer nada, só trabalhando, num ambiente
horrível, eu sofri muito, eu estava trabalhando numa fábrica no escritório e a pessoa que trabalhava
comigo, ela acabava comigo, assim, eu não sabia, era meu segundo emprego, então tinha muita coisa
que eu não sabia fazer e eu perguntava para ela e ela não respondia... Eu chegava do serviço, saia
cinco horas e eu chegava em casa e chorava, chorava e chorava. Foi assim, até quase um episódio
depressivo, eu não tinha sentido, sabe? Tanto que o nome que eu dei foi “Isis vazio”, porque a minha
vida não tinha sentido, assim, eu acordava e ter que ir para aquele ambiente horrível de trabalho era
insuportável, sabe? Mas eu precisava, sabe? Precisava do dinheiro e vinha a frustração de não estar
estudando, porque eu sempre queria psicologia, eu sempre soube, sempre gostei muito de estudar,
então tipo assim, estar parada, vinha todo aquele sentimento. Foi muito ruim voltar lá, sabe? Eu tive
dificuldade no começo, na hora em que você pediu” (Isis, 5º ano).
“Então assim, o primeiro momento foi muito difícil e muito dolorido, sabe? Foi muito ruim, mas
na hora de escrever a carta, veio assim, uma sensação tão prazerosa de poder falar para essa Isis que
as coisas mudaram, sabe? Que assim, parece que a faculdade foi um marco em todos os sentidos, até
eu conheci meu namorado no ano da faculdade, sabe? A gente começou juntos, e tipo assim, tudo
mudou. Então a faculdade, por mais que tenha sofrimentos e que a gente reclama das coisas, eu passei
por uns momentos difíceis também, mas eu me vejo tão realizada, tudo o que aconteceu durante a
faculdade foi realizador, até os sofrimentos tiveram sentido, porque antes os sofrimentos eram vazios,
eram sofrimentos que não me levavam a lugar nenhum, só na dor, só na dor, só na dor, e eu não tinha
força assim, sabe? Então esse primeiro momento foi muito difícil, muito doloroso de lembrar, porque é
como se antes da faculdade eu só visse uma escuridão assim, eu demorei para conseguir acessar,
sabe? Mas era preciso, então eu consegui e ai eu escrevi a carta” (Isis, 5º ano).
“Voltar no ano antes de começar a faculdade foi um pouco difícil porque, assim, difícil de
lembrar né? Eu acho que eu não estava conseguindo lembrar direito, eu não sei se era assim, muitos
traumas ou muitas coisas assim que eu tinha e eu não conseguia lembrar bem ao certo... mas meu
nome de antes eu coloquei ingênua né, Anahí ingênua, porque hoje, aqui comentando um pouquinho
da carta, antigamente eu vivia com muita máscara, eu fui falando aqui ao longo da carta e tudo e foi
muito bom ir escrevendo porque eu fui relembrando todos os passos assim da faculdade e tudo o que
eu fui deixando de ser e coisas que não eram minhas, corpos estranhos, digamos assim, que faziam
eu criar essas máscaras, eu nunca me senti eu mesma e foi na faculdade que eu encontrei, digamos,
a espontaneidade porque eu nunca fui eu mesma eu sempre fui outra pessoa, nunca fui eu mesma. Na
escola, até o terceiro colegial, sempre parecia que eu colocava uma máscara e ficava com aquilo,
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incorporava aquilo e nunca agia com espontaneidade, nunca fui eu mesma, e eu deixei isso, e questões
de traumas também, no terceiro colegial eu acho que eu colocava muito máscaras porque eu tinha
muitos traumas, muitas coisas internas não bem resolvidas dentro de mim. E que hoje em dia eu me
sinto bem resolvida, eu compreendi, ingênua porque eu me sentia uma estranha e ai eu falo “você não
é uma estranha” era o sentimento né de estranheza. Mas eu deixei, eu larguei tudo isso para trás, eu
falei aqui que eu consegui me compreender ao longo do curso, porque a psicologia te ensina, né? A
gente quando têm esses traumas, essas coisa não resolvidas, a gente pensa que é uma loucura nossa,
que a gente é assim, né? Só que a gente não compreende que realmente são coisas que a gente não
conseguiu resolver ou nunca enxergou isso mesmo, né? Estava inconsciente” (Anahí, 5º ano).
“Então é muita gratidão como a Isis falou, muita gratidão porque hoje eu consigo agir segundo
as coisas que eu quero, me sinto uma pessoa muito forte, eu não uso mais máscaras, eu sou eu
mesma, enfim, nossa eu me sinto muito bem realizada assim, sabe? Uma pessoa muito forte. Parecia
que as coisas eram muito, porque eu usava muito máscaras, eu acho que eu via as coisas assim muito
superficiais, eu vivia muito no campo da imaginação, eu sempre imaginava situações, mas nunca agia
realmente, eu sempre vivi no campo imaginativo e por eu sempre ter sido uma pessoa introvertida eu
não colocava aquilo para fora, então, e por ter coisas que eu não conseguia compreender em mim,
muitas vezes também, nossa, colegial, ensino médio, quantas vezes eu ficava chorando no quarto, eu
não saia para fazer as coisas, eu não me compreendia, eu me achava uma estranha, eu não entendia
nada, sabe? De mim. Ai eu ficava imaginando situações de eu sair e ficava feliz, mas só no campo
imaginativo mesmo, eu nunca vivia, e depois que eu entrei na faculdade eu passei a viver, eu sai dessa
imaginação e fui para a realidade mesmo e passei a viver mesmo as coisas, né? E as coisas eram
muito superficiais, né? Então eu comecei a compreender as coisas e eu sinto que eu sou uma pessoa
muito forte hoje, muito forte e é isso, me sinto muito realizada” (Anahí, 5º ano).
Anahí finalizou sua fala agradecendo o grupo pela oportunidade de ver como
na atualidade pode “viver sem máscaras”. O clima no grupo era de intimidade e logo
após a fala de Anahí, a participante Aurora pediu para compartilhar, pois assim como
Isis, teria de ir embora mais cedo. Disse para o grupo que tinha gostado da atividade
e que gosta de realizar essas viagens ao passado no seu dia a dia. Compartilhou em
seguida sobre como era sua vida antes de entrar na faculdade de Psicologia e que
sua primeira opção profissional havia sido Educação Física:
“Eu lembro que eu nunca imaginei fazer psicologia na minha vida, não tinha pensado nisso, eu
sempre imaginei um curso só, eu ia fazer educação física e era isso, eu amava esportes, era o único
lugar que eu me sentia livre, dentro da quadra, que eu me sentia eu, era só ali, sabe? Que eu podia me
soltar, tirar todas aquelas vestes e tudo, aquele jeito doce que eu sempre me exigia ser muito doce,
muito educada, lá eu podia ser mal-educada, podia correr, podia empurrar as pessoas, lá eu podia
pedir desculpa também, mas eu podia ser tudo, não precisava ser só uma coisa, ser só bonitinha, legal,
porque aquilo me cansava, mas eu tinha que vestir isso porque eu sempre tive para mim que eu tinha
que agradar as pessoas, tem que agradar todo mundo, eu era assim... Então eu era uma aluna boa,
na medida do possível me esforçava para ser excelente, calada, em casa eu tentava, em cada lugar
eu era o que queriam que eu fosse para agradar e isso era difícil, né? Ai eu coloquei Aurora trancada,
porque realmente a Aurora, ela estava trancada lá dentro, não saia, bem trancada, eu também não
falava muito, nem cumprimentava as pessoas na verdade, minha vergonha era tanta que eu não
cumprimentava as pessoas, e assim, o esporte ele era essencial para mim, ele era muito mais que
esporte, não sei, lá eu me descobri muito, então eu achei que eu ia fazer educação física” (Aurora, 5º
ano).
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Aurora contou para o grupo que passou em uma faculdade fora de Franca, mas
não conseguiu morar em outra cidade e retornou para a casa dos pais. Começou a
fazer educação física em uma faculdade de sua cidade, tendo desistido do curso dois
anos depois do ingresso, quando ficou por um ano cuidando de sua avó, que estava
doente, e quando ela faleceu, resolveu fazer Psicologia:
“E ai foi quando eu fiquei um ano parada mesmo, sai e fiquei um ano parada, fazendo, é, eu
lembro que eu comecei a fazer cursinho e ai fiquei muito vazia, nossa, ai eu descarregava, em alguma
coisa eu tinha que descarregar e ai eu descarregava em exercícios, eu tinha que descarregar, eu estava
vazia...eu lembro que a minha avó ficou muito doente e ai ela foi o meu objetivo, ela precisava de
alguém para cuidar dela, então eu fiquei cuidando da minha avó, antes de fazer faculdade, e ai eu
cuidava, ela estava muito doente mesmo e o convívio com a minha avó foi a única coisa que assim,
que realmente me levou a esse curso, de alguma forma. Não sei, a gente teve uma conexão tão bonita,
espiritualmente assim, ela entendia o que eu dizia, os outros não entendiam, ela entendia, e eu
conseguia ajudar ela na dor dela física, porque ela não podia levantar, ela não conseguia respirar, ela
tinha que fazer, então era uma troca que me preencheu tanto, né? De eu poder fazer essa troca e ai
acabou que ela faleceu, né? E eu acho que foi no primeiro ano que ela faleceu, eu me lembro, acho
que foi isso, ou antes de eu entrar, e eu vi ela morrendo, então foi muito, e eu queria ter visto, foi
importante para mim, foi um adeus para um recomeço ali, eu não sei, a morte dela foi um adeus para
um outro recomeço da minha vida também, sabe? Eu não sei explicar isso, estou falando tudo confuso”
(Aurora, 5º ano).
Aurora contou ainda para o grupo sobre como foi importante essa convivência
com sua avó no momento final da vida dela, pois sua avó era uma pessoa muito alegre
e positiva, e ela, Aurora, sempre se considerou muito “melancólica”. Compartilhou com
o grupo ainda como está se sentindo nesse momento final do curso:
“Foi bonito ter acompanhado ela, ela foi uma mestre para mim, sabe? Naquele momento que
eu estava super vazia, não sabia o que fazer. E ai eu entrei na psicologia e ai foi outra guerra, né?
Outra batalha muito grande, eu digo que foi uma guerra, uma batalha que está acabando agora, todo
dia para mim é uma batalha, sabe? Viver para mim é uma batalha. Está acabando essa guerra e eu
estou ansiosa para ver qual vai ser a outra guerra que vai começar e eu não quero que acaba essa
porque eu estou com medo da outra, porque se essa já foi difícil imagina a outra, porque eu já estou
machucada e eu ainda não recuperei gente, calma ai, preciso de recuperar, preciso de treinar para a
próxima batalha, só que não da tempo, né? O tempo me pega muito” (Aurora, 5º ano).
A participante encerrou sua fala dizendo que está cansada de viver “fins” e que
especificamente o final da faculdade está sendo bem dolorido de vivenciar, mas que
a partir da vivência compreendeu que faz parte da vida esse processo dolorido,
aceitando-o. A participante resolveu ler sua carta depois que compartilhou o processo
da escrita, finalizando sua fala com a leitura da mesma. Quando finalizou, pediu
desculpas para o grupo por precisar sair antes do encerramento. Aurora, Isis e Anahí
foram embora mais cedo, juntas. Anahí não teria dito para o grupo anteriormente que
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precisaria sair mais cedo, e então explicou que precisaria ir com as colegas “de
carona”.
Após a saída das três participantes do quinto ano, permaneceram no grupo
Felipe e Jéssica (quinto ano); Tadeu e Ingrid (quarto ano). Tadeu pediu para falar,
contando para o grupo que tinha gostado de escrever a carta, pois pôde lembrar de
quem era e do que “veio perdendo” ao longo do caminho. Contou para o grupo que
fez cursinho antes de entrar na faculdade pois não tinha certeza do curso que gostaria
de fazer. Ao final desse um ano, resolveu fazer Psicologia e apesar de ter passado
em uma faculdade fora, resolveu permanecer em sua cidade natal. Contou ainda que
ao escrever a carta, percebeu que era “bobinho” ao entrar na faculdade:
“Mas foi muito bom a época assim que eu descobri que eu queria mesmo psicologia, tentei
UFTM igual a Isis, depois eu passei, quando eu comecei aqui eu passei lá também, mas acabei optando
por ficar e eu estava lembrando e acho que mudei bastante desses tempos, sabe? Acho que teve coisa
positiva, porque eu era meio bobinho, mas teve coisa que era melhor do jeito que era, só que até na
carta que eu, eu falo muito de não me arrepender das escolhas que eu fiz, sabe? Que eu acho que
tudo foi bom, faz parte do caminho, as coisas que eu perdi devem estar em algum lugar também e o
que for para retomar a gente retoma, né? Só que por enquanto a gente vai caminhando, sem dar um
passo para trás, tentando dar um passo para frente...” (Tadeu, 4º ano).
O participante então leu sua carta para o grupo e ao terminar, comentou sobre
como a fala de Anahí no começo da sessão, ao narrar sobre o atendimento da criança,
provocou um sentimento de raiva nele, pois o fez pensar nas experiências negativas
de agressão que teve durante a faculdade, nos relacionamentos interpessoais:
“E o que a Anahí falou do paciente, né? Me veio raiva porque não é só o paciente que faz isso,
né? Não é só uma coisa da terapia, o tanto de pessoas, até em sala de aula, ou que a gente convive
que não perde uma oportunidade para vir ficar uma coisa agressiva ou falar uma palavra para te diminuir
de alguma forma assim sutil, mas “nossa você está, hein?”, sabe? Da aquela cutucada, aquela cara de
desgosto, de raiva, de alguma coisa que você sente né, às vezes você até fica meio assim, e você não
responde, não fala nada, se não é muito explicito a gente nem sabe como devolver ou se proteger
assim... e isso anda muito presente para mim também, sabe? Inclusive eu acho que essa doença que
eu tive esses dias foi muita coisa que eu estava e que foi fervendo dentro de mim, muitas coisas”
(Tadeu, 4º ano).
para o grupo, contando que dessa vez havia “acertado”, que a Psicologia era o curso
certo para ele e teria conseguido se descobrir como pessoa no curso, superando
várias dificuldades do passado, mas que ainda restava o desafio final, de se formar e
ele estava se boicotando, desacreditando que poderia ser um bom profissional no
futuro. Após ler sua carta, Felipe compartilhou com o grupo:
“Antes de entrar, né, eu passei por vários cursos, mas sempre era um misto de o curso não ser
o meu curso, eu não saber quem eu era, eu tinha problema de relacionamento, não conseguia me
relacionar com as pessoas, tinha fobia social, então era muito sofrido. Então eu comecei a fazer terapia
e fiquei um tempo parado, um ano anterior de fazer psicologia eu estava parado, mas eu já estava
melhor, já estava conseguindo me relacionar, tinha amizades e tal, saia, porque antes disso era bem
pior, eu ficava só preso dentro de casa, e ai comecei a fazer terapia e comecei a me interessar por
psicologia, eu li “Quando Nietzche chorou”, que para mim aquilo lá foi “e isso aqui, isso aqui faz muito
sentido para mim, é isso aqui que eu preciso para mim, para me encontrar na minha vida, é isso que
eu quero fazer”. Ai eu entrei no curso...e no curso eu vi que, nossa, eu cresci muito durante o curso,
muitas realizações, só que agora nesse momento parece que eu voltei para trás naquelas mesmas,
pontos cegos que eu tenho em relação a mim mesmo e que voltaram agora com muita força nesse fim,
atualmente” (Felipe, 5º ano).
O grupo escutou Felipe atentamente e quando ele terminou sua fala, a diretora
perguntou qual aspecto positivo de si mesmo o participante havia descoberto durante
o curso. Felipe respondeu que sua terapeuta individual e um supervisor de estágio de
psicoterapia haviam dito várias vezes o quanto ele era sensível e empático com as
pessoas:
“Então, eu não sabia não, mas muita gente fala de, é engraçado né, você vê só, não sou eu
que estou me validando, são as outras pessoas que estão me validando, mas. Eu acho assim, que eu
sou afetivo, minha terapeuta fala muitas vezes que eu sou afetivo. É dentro da psicologia assim, até o
professor fala, o dia que o professor me falou isso assim, então deve ser muito, ele falou assim “ou
você consegue sacar, você entende as coisas, sabe? Você tem umas sacadas legais. Parece que faz
muito sentido, você consegue dar sentido para as coisas”, eu falei “ah que legal”, e eu vejo que é meu
assim, isso” (Felipe, 5º ano).
Felipe contou para o grupo que até acreditou quando o professor falou bem
dele e que percebeu em si essa capacidade empática, mas que ainda não se sente
seguro em pensar que será um psicólogo competente.
A próxima participante a se colocar foi Ingrid. Compartilhou com o grupo que
foi difícil escrever a carta para o eu do passado e relembrar tudo o que viveu no
período de ingressar na faculdade, pois ainda sente-se muito culpada por vivências
do período, em que se colocou em situações destrutivas. Reconheceu como sentia-
se sozinha e perdida, pois sempre foi muito calada, muito quieta e sofreu “bullying” na
escola principalmente no Ensino Fundamental. Antes de vir para a faculdade, Ingrid
revelou para o grupo que seus pais se separaram e foi um período bastante
190
perturbador para ela e sua família. Segundo ela, escrevendo a carta, pôde perceber o
quanto, ao tomar a decisão de mudar de cidade para fazer faculdade, estabeleceu um
divisor de águas em sua vida, à medida que na faculdade de Psicologia começou a
se encontrar, compreendendo mais a si mesma:
“E hoje você me fez relembrar de tudo, essas, esse percurso, que por mais que tenha sido
muito, muito difícil, nossa eu passei por coisas na minha vida que eu achei que eu nunca fosse passar
saber e eu superei tudo isso, eu consegui passar por tudo isso...e eu ter dado a volta por cima de tudo
isso, o que me ajudou foi a psicologia, tanto na questão de autoconhecimento quanto de profissional,
porque eu vi que realmente é isso que eu quero, e a fase que eu passo hoje é total, tipo, ‘ nossa eu
passei por tudo isso, sabe’? Tudo isso aqui passou, às vezes eu choro por ´nossa mano, passou,
sabe´?” (Ingrid, 4º ano).
Ao finalizar, Ingrid disse que sentia gratidão por poder participar do grupo de
universitários, que ajudou a confirmar as escolhas feitas ao longo da faculdade e
sentir-se fortalecida em seu caminho.
Jéssica foi a última participante a realizar o compartilhar de sua carta para o eu
do passado. Ao longo da escrita, emocionou-se bastante e a diretora permaneceu por
um tempo ao seu lado, acolhendo. Escutou todos atentamente e deixou para se
colocar ao final, dizendo:
“É muito ruim pra mim falar e acessar, me acessar, dentro de mim, para mim é horrível porque
eu acho que tem muita coisa aqui dentro e eu luto muito para disfarçar tudo o que tem aqui dentro e
fazer o que mais ou menos eu acho que é normal, sabe? E ai quando acessa eu pareço que perco o
controle e dai não faço mais o que eu acho que deveria ser feito. Então foi difícil mesmo, eu não vou
me emocionar mais não, mas assim eu me emociono acho que por isso” (Jéssica, 5º ano).
Jéssica disse que foi muito difícil escrever a carta porque percebeu o quanto se
perdeu de si mesma durante a faculdade e que hoje só consegue ver maldade nas
pessoas. Contou para o grupo que entrou para a Psicologia como um bebê ingênuo
que acreditava no potencial das pessoas, que sentia desejo em conhecer as histórias
de vida das pessoas pois acreditava que todos podem ter um lado bom; era afetuosa
e carinhosa. No momento, sente-se constantemente desconfiada e acredita que
perdeu a crença nas pessoas, sentindo-se em constante luta com esses sentimentos.
Jéssica destacou para o grupo que ao escrever a carta, pôde entender quantas coisas
suas foi perdendo pelo caminho universitário.
“Eu tenho um pouco de saudade do que eu era antes da faculdade, né? Um ano antes da
faculdade. Eu coloquei o meu nome de Jéssica Bebê e eu assinei como Jéssica criança, justamente
porque eu acho que eu era muito bebê, muito imatura, muito ingênua, e eu acho que os anos se
passaram e eu evolui muito pouco, eu cresci muito pouco, e eu fiz muito, parece que vivi muito, sofri
muito, sorri muito, mas foi muito pouco, foi muito pouco cheio de sentido, muito sem valor, muito, eu
não sei falar, eu achei que foi muito pouco e eu acho que, eu olho para trás e eu sinto muita saudade,
porque eu acho que eu perdi algumas coisas minhas que eram minhas e eu deixei, fui deixando e ai
191
hoje parece que eu fico tentando resgatar isso, mas eu não consigo, não pertence a mim mais, então
assim, eu acho que eu era muito sensitiva, era muito afetiva, eu era muito doce, sabe? amigável,
boazinha, e hoje eu acho que eu não sou nada disso. E eu perdi isso, tipo, perdi, eu acho que eu fui
deixando no caminho, entendeu? Eu acho que eu fui desacreditando muito das pessoas e eu acho que
isso é terrível, sabe?” (Jéssica, 5º ano).
Ao final de sua fala, contou para o grupo que escreveu duas letras de música
e fez alguns desenhos no final da carta, pois estava muito emocionada e não
conseguiria terminar. Disse que está sofrendo muito. A diretora sugere para Jéssica
que talvez fosse bom ela retomar a psicoterapia individual para colocar sentido em
tudo o que está vivenciando com mais profundidade, pois muitas vezes no grupo não
é possível aprofundar nos dramas individuais toda sessão. Jéssica disse que já fez
psicoterapia muito tempo e que no momento está resistente em voltar. Chorou
bastante e a diretora voltou a afirmar que a faculdade pode provocar várias
transformações, no nível pessoal, relacional, intelectual, e que tudo isso é desafiador
e precisa ser compreendido e integrado em nossas vidas. Nesse momento, Felipe,
que também é do quinto ano, da sala de Jéssica, pede a palavra, dizendo para a
colega:
“E a faculdade de psicologia é muito, bom eu não fiz as outras, né? Mas eu acho que é muito,
precisa ser assim, né? Não tem como você passar incólume a ela, só com as teorias e aprender uns
negócios...nossa, se você não viver o negócio e eu acho que é muito isso, não tem jeito de você ser a
mesma, eu vejo isso lá na faculdade, todo mundo assim, e você mesmo, você mudou durante a
faculdade e agora tem que aceitar, ver o que é essa mudança, ter uma compreensão disso, porque é
muito, você vê, é tanta vivência, tanto desafio você lidar com outras pessoas, nossa é muito, te tira,
cada dia, assim, cada semestre, te tira uma pele e fica aquela pele nova, meio sensível assim, mas que
vai virar casca que vai virar outra coisa, mas é realmente, sei lá, eu acho que a faculdade é muito foda,
muito foda” (Felipe, 5º ano).
O grupo se mobilizou por alguns instantes com essa fala, comentando sobre a
intensidade das transformações vivenciadas na faculdade de Psicologia e como é
difícil passar pelo processo sem acompanhamento psicoterápico. Jéssica então se
acalmou, dizendo para o grupo que iria pensar no assunto.
A diretora convidou então os participantes para realizarem um circulo no palco
e desse modo, finalizar o grupo, despedindo-se do que havia sido vivido e encontrando
dentro de si qual sentimento seria importante levar embora. Solicitou ainda que os
participantes dissessem uma palavra.
Tadeu: caminhada
Felipe: caminho
192
Ingrid: mudança
Ao final, despediram-se da unidade funcional de forma afetuosa, encerrando o
sétimo encontro.
muitas vezes se destacar como a melhor aluna do curso. Isis, Aurora e Felipe
relataram o sentimento de vazio que sentiam até entrarem na faculdade. A partir da
experiência como estudante de Psicologia, puderam sentir maior liberdade para ser
quem se é, descobrindo-se a si mesmo e descobrindo um sentido para a própria vida.
Aurora, Tadeu e Jéssica destacaram a batalha que viveram para realizar a
faculdade, que em função de diversas e diferentes experiências, provocou sofrimento
psíquico. Aurora revelou que suas dificuldades no âmbito familiar tornaram a
realização do curso mais difícil, pois teve problemas com a família que dificultaram
sua presença na faculdade. Jéssica sentiu que perdeu muita da própria sensibilidade
e confiança nas pessoas durante a faculdade, pois viveu muitas experiências de
rejeição e frustração com relações sociais no âmbito acadêmico. Tadeu revelou que
um relacionamento que viveu durante a faculdade também provocou nela algumas
dificuldades emocionais e relacionais.
Por outro lado, Isis revelou como a realização da faculdade possibilitou que ela
saísse do sentimento de vazio que vivia até então e encontrasse um propósito para
sua vida. Anahí reconheceu e revelou ter vivido um grande processo de transformação
pessoal realizando o curso, pois na faculdade pôde abandonar muitas máscaras que
usava nas relações sociais para começar a ser ela mesma. Felipe revelou o quanto
sentiu-se grato por ter permanecido e se encontrado no curso de Psicologia, pois já
havia passado por duas experiências acadêmicas que abandonou. Reconheceu ter
crescido muito realizando o curso e no momento atual sua angústia era a dificuldade
sentida por não se ver formado e atuando no futuro. Ingrid revelou que ao longo da
faculdade foi se encontrando mais como pessoa, pois com o curso e a psicoterapia foi
compreendendo mais de si mesma.
Tema 5- Vivências de dúvidas profissionais antes da faculdade
Felipe, Aurora e Tadeu relataram como se deu o processo de escolha para
cursarem Psicologia. Para Felipe, o curso foi sua terceira experiência de graduação,
e antes disso abandonou dois cursos diferentes. Aurora começou a fazer outra
graduação e deixou no segundo ano, após uma pausa de um ano, resolveu fazer
Psicologia. Tadeu revelou que fez cursinho para se decidir entre Psicologia e outro
curso e acabou optando pela mesma.
Tema 6- Vivências de dúvidas sobre o futuro pessoal e profissional
Jéssica e Felipe revelaram a ansiedade que sentem com o final do curso e as
preocupações acerca do futuro profissional, em que emergem dúvidas se serão
194
“E a faculdade de Psicologia...não tem como você passar incólume a ela” (Felipe, 5º ano)”.
que olhar para sua história permitiu que ela percebesse o quanto se desenvolveu e
descobriu-se ao longo do curso, conquistando maior espontaneidade, e que essa
vivência permitiu que saísse do sentimento de incapacidade e angústia que chegou
ao grupo, em função do atendimento. Ao longo do compartilhar apareceram diferentes
temas. Aurora, Felipe e Tadeu relataram como vivenciaram dúvidas vocacionais e
profissionais antes da entrada na faculdade, mas que escrevendo as cartas puderam
tomar consciência do quanto se desenvolveram ao longo do curso e como sentem que
fizeram a escolha profissional adequada para eles. Nesse sentido, a escrita da carta
para o “eu do passado” permitiu aos participantes perceberem o processo de
transformação vivenciado ao longo do curso, pois puderam rever-se e diferenciar-se
de quem eram até então, experimentando novos modos de ser com liberdade, em um
processo de afirmação de si mesmo no papel de estudante universitário de Psicologia.
Entretanto, Aurora e Jéssica relataram que o percurso da faculdade se constitui numa
“batalha” para elas e Felipe afirmou sua preocupação sobre como será assumir o
papel profissional no futuro.
Todos tiveram tempo para se expressar com tranquilidade e o grupo apesentou
bastante entrosamento. O clima nesse dia foi de intimidade e cooperação, sendo que
realizaram a atividade proposta e compartilharam livremente as próprias histórias
durante o compartilhar, demonstrando confiança uns nos outros e um movimento de
circularização nos vínculos. A proposta de revisitar a história individual desde a
entrada na faculdade proporcionou um sentimento de “afirmação” da escolha do curso
para todos os participantes, ao retomarem a historicidade da constituição da matriz
profissional e o quanto se desenvolveram ao longo da mesma. Entretanto, Jéssica
retomou o quanto está experimentando um sentimento de caos nesse momento final
do curso, em função de diversos conflitos interpessoais vivenciados tanto em sala de
aula quanto nos estágios, emergindo uma vivência de dúvida a respeito de si mesma
e da própria capacidade de ser psicóloga.
Se no começo do encontro os participantes do quinto ano chegaram
desanimados com a sessão de fotos para a formatura, relatando uma experiência de
dissociação, pois não encontravam sentido na atividade e não sentiam alegria com a
mesma, ao final, todos puderam resgatar um pouco do que vivenciaram ao longo do
curso e o que teria sido significativo para cada um, resgatando a si mesmo de forma
mais inteira, revisitando a própria história e as diferentes conquistas, liberando assim
o potencial espontâneo-criativo. Ao final da sessão, tinham se dado conta de porque
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Data: 22/06/2017
Participantes: 6 (Isis, Ingrid, Tadeu, Aurora, Ícaro, Andressa)
Ausentes: 4 (Bruna, Anahí, Felipe, Jéssica)
Duração do Encontro: 2h40
Contextualização: esse encontro ocorreu com intervalo de 15 dias após o
último, dado o feriado do dia 15 de junho de 2017. Os participantes se dispuseram a
vir no período noturno nesse dia, e o encontro iniciou-se às 19h. A sala utilizada para
o aquecimento do grupo também foi diferente, dado que o teatro psicodramático
estava ocupado no horário. Como essa sala era aberta, logo após o aquecimento
específico a diretora convidou o grupo para se deslocarem para o teatro, pois fazia
muito frio. Todos confirmaram participação no encontro, mas 4 participantes faltaram
e somente Jéssica avisou que não viria.
Aquecimento Inespecífico: a diretora aguardou os participantes na sala de
espera e quando estavam todos presentes, explicou que o encontro teria início em
uma sala diferente, mas que depois iriam para o teatro terapêutico. Ingrid demonstrou
animação com a proposta, questionando a diretora se poderiam “gritar” nesse espaço.
A participante estava falante e entusiasmada. Tadeu observava o grupo e cantarolou
uma música no trajeto até a sala. Andressa, Isis, Ícaro e Aurora estavam silenciosos
e ao entrarem na sala sentaram-se imediatamente no chão, observando os demais.
Isis comentou que estava cansada e com frio. Ícaro não disse uma palavra, estava
com a aparência entristecida. A diretora então questionou porque haviam se sentado,
e os participantes protestaram: Isis disse que estava muito cansada e desanimada;
Aurora disse que gostaria de ficar embaixo “das cobertas”. Com exceção de Ingrid e
197
Tadeu, os demais estavam sentados com o aspecto de muito cansaço. Apesar dos
protestos, a diretora convidou-os para ficarem em pé e realizarem um círculo,
posicionando-se bem próximos uns dos outros, a fim de reconhecer quem estava
presente e se aquecer fisicamente. Os participantes se observaram então com ternura
e sorrisos tímidos apareceram. Permaneceram nesse círculo por dois minutos e então
a diretora pediu que caminhassem pela sala, silenciosamente, buscando relaxar e
soltar o corpo, reconhecendo a própria corporeidade e também o local. Como a sala
tinha bastante espaço, os participantes puderam se locomover sem esbarrar uns nos
outros. Isis caminhava lentamente e mais voltada para dentro de si; Aurora também
andava devagar e olhava fixamente o chão; Andressa andava mais rápido e olhava
para o espaço e para as pessoas. Tadeu e Ingrid caminhavam vigorosamente,
olhando para a sala, para o espaço, expressões sérias. Em seguida foi feito o convite
para realizarem a concretização de sentimentos por meio de imagem, pedindo que
demonstrassem com o corpo como estavam chegando para o grupo nesse dia. Com
exceção de Ingrid, que permaneceu em pé, todos realizaram a escultura deitados no
chão. Depois que todos encontraram a imagem individual, a diretora convidou-os para
realizarem um solilóquio, que foi feito na seguinte ordem:
Tadeu: eu estou cansado, mas eu não posso descansar ainda, tenho que ficar, me manter em
pé, eu não posso deitar
Isis: eu estou com frio, está faltando calor, está faltando aconchego, está faltando à luz, eu
queria só deitar embaixo das cobertas e deixar minha mente descansar, mas ela não para
Aurora: talvez eu não queira falar, talvez eu só queira partir, talvez eu tenha que ficar para
depois saber para onde ir
Andressa: nossa, eu estou cansada até para falar, eu acho, mas ainda tenho força, eu vou dar
conta
Ícaro: fechado, parece que tudo o que eu quero, tudo o que eu almejo é mais difícil para mim
do que pra outra pessoa, pra mim nunca da certo
Ingrid: eu estou ansiosa, mas eu estou cautelosa, eu estou pensando muito
a proposta e houve entrega e presença por parte dos participantes. Para finalizar, foi
proposto ainda que “localizassem” um local no corpo que estivesse dolorido e
massageassem o mesmo. Esse momento durou alguns minutos e em seguida, foram
convidados a se levantarem devagar, para caminhar novamente pelo espaço, notando
diferenças do estado inicial. Como estava muito frio no espaço externo e a sala de
trabalho corporal era aberta, a diretora convidou o grupo para se deslocarem ao teatro
psicodramático, o que fizeram em silêncio.
Aquecimento específico: já no teatro, no contexto grupal, a diretora convidou
para comentarem como estavam após a realização do aquecimento, pedindo que
comentassem livremente o que haviam percebido de “si mesmo”. O grupo
permaneceu em silêncio por quase dois minutos, e então Ingrid comentou:
“É engraçado, eu estou tentando lembrar, tipo, deixar vir alguma coisa assim, pois é, parece
que está nessa, tipo, não sei se eu relaxei muito e ai fiquei sabe?, eu não estou sentindo cansaço, não
estou “oh meu Deus, quero sair daqui” (Tadeu, 4º ano).
“Eu estou meio assim também, acredito que tem muita gente aqui que está dormindo um pouco,
mas essa semana antes das duas horas eu não dormi nenhum dia, então eu acho que eu tenho um
cansaço físico, mas o de energia assim acho que não tanto, sabe? Acho que mais também porque está
nesse fim e ai dá aquele gás, porque tem que fazer, tem que terminar, então vamos terminar, então
vem essa energia” (Tadeu, 4º ano).
Tadeu: do que?
Ingrid: nossa eu to
Isis: até o final do ano você vai estar odiando os seus amigos
Tadeu: não eu estou tranquilo porque eu estou dando graças á Deus que é em grupo na
verdade...porque a gente está se dando muito apoio, sabe? E eu to fazendo alguns grupos com outras
pessoas, sabe? E tem um que um fez mais, ai tem outro que aquele, e não é tipo uma coisa forçada,
tipo “ah, você fez mais no outro, agora eu vou fazer”, sabe? É natural, então a gente está tipo se
equilibrando, sabe? Estou mais cansado, ai o outro faz mais, não tem o que falar, sabe? Então eu acho
que isso está bom e a gente está se dando apoio e está fazendo tudo”.
“Eu não sou muito bom com uma coisa que é pré-estabelecida, que está tudo certinho, igual o
exame... é, para eu pegar e fazer isso me desgasta muito porque eu fico toda hora assim “nossa agora
eu tenho que fazer tal coisa, agora” e se eu não fizer certinho eu fico “caramba, errei”, sabe? “Merda!”,
eu fico puto, porque tem que ser daquele jeito, sabe? Então ai isso está me desgastando mais, porque
tem que fazer correção e tudo muito coisinha... eu acho que é por ai, de ter que fazer certinho, será
que eu vou dar conta de fazer certinho, sabe? Apesar que eu acho que dá conta sim, tranquilo...só que
ai eu estou em um trio, uma tem uma deficiência visual, então ela tipo tem uma limitação para me ajudar
desde a aplicação até na correção, né? Ver tabela, essas coisas assim, fica complicado. Então tem
parte que dá para ela fazer, digitar a entrevista, né? Isso ela consegue, mas essa outra parte já do teste
já não, e a minha outra, a outra pessoa que está no trio vai viajar, querendo ou não, ele vai fazer um
curso, então amanhã ele vai de manhã e volta domingo e é para entregar isso na segunda” (Tadeu, 4º
ano).
Quanto Tadeu terminou de falar sobre como está sentindo o peso de realizar o
relatório sozinho, apesar de estar em grupo, a participante Ingrid, que é sua colega de
sala, ofereceu-se para ajudá-lo a terminar o relatório no final de semana, pois já havia
entregado. Tadeu aceitou a oferta da colega e agradeceu, modificando sua expressão
facial e demonstrando alívio.
Em seguida, o grupo silenciou alguns instantes e a participante Andressa
compartilhou com o grupo que teve dificuldade em realizar o trabalho corporal e se
200
“Eu vou falar, porque eu estou muito ansiosa, eu estou achando que eu vou surtar, juro por
Deus, vou até levantar. Gente, essa semana, olha, eu falei até para a Rita na supervisão, falei “agora
eu estou sentindo aquela linha entre saúde mental e patologia, sabe?” Estou sentindo que está
balançando, mas eu vou conseguir, eu vou lá mas eu volto. Gente eu estou em uma ansiedade, numa
angústia, que Deus é pai, está vendo? Eu estou assim. E é muita coisa para fazer, gente vocês não
tem noção, sabe? Tipo assim, você coloca seis matérias mais quatro estágios, fora o projeto, então
assim, é muita coisa. E eu vou viajar, falta uma semana para mim viajar e ficar um mês, eu estou
desesperada gente...eu estou aqui desesperada porque eu não tenho tempo para sentar na frente do
computador para procurar nada, sabe? Não dá, não dá tempo mais de responder o whatsapp, dá tempo
gente? Sabe, não dá. Você tem que escolher as pessoas que você responde porque não dá tempo. Eu
ando chorando tanto, eu ando saindo da faculdade chorando assim, e parece que a coisa não acaba,
não acaba. Mas eu estou feliz. Não, dá esse desespero, mas eu estou feliz, sabe?” (Andressa, 4º ano).
“Nossa, eu acho que eu não aconselharia as pessoas a fazerem psicologia não. Nossa gente
é muito pesado, né? a gente sofre muito, sabe? É desgastante assim, é não dormir, é chorar, é nossa,
ter vontade de matar os outros. Por que sério tudo é em grupo, tudo é em grupo, esse ano, então tudo
o que você faz é em grupo, até as pessoas que você tem contato diariamente assim você começa a
ver a pessoa muito e começa a ter atrito, sabe? Mas a gente assim é muito aberto um com o outro
assim, o meu grupo, ás vezes a gente se xinga assim, mas se entende, né? Então é muita coisa, é
muito pesado mesmo, assim, até hoje eu acho que está pesado aqui na nuca, sabe? E é muito
201
conhecimento, sabe? Muito conhecimento, você acaba não captando nada eu acho, porque é muito
jogado, sabe? Nem sei a hora que passar o quinto ano eu te falo o que é que ficou disso. Eu não
consigo nem ver férias, não consigo, mas é o que eu quero, igual a hora que eu vi o resultado lá, eu
falei “nossa eu me esforcei para isso”, sabe? Ai vem a felicidade assim” (Andressa, 4º ano).
Ingrid: ah, não sei, eu estou mais focada para outra coisa mesmo, porque vocês estão tão
desesperados, né?
Ingrid: não
Tadeu: a gente estava falando e você estava assim “não estou entendendo esse povo”
Ingrid: eu não estou nem um pouco desesperada com a faculdade, na verdade, nada, eu já fiz
tudo o que eu tinha que fazer, falta uma coisa só mas ai eu termino amanhã. Por isso que eu ofereci
ajuda, eu já fiz tudo já, eu fui fazendo no decorrer. É que desse ano eu peguei firme, sabe? Tipo
acontecia uma coisa e eu já fazia no mesmo momento, igual o nosso estágio lá de escolar, então, tipo,
eu não sei, eu não tenho nada para fazer não, eu já fiz tudo, já fiz até para o semestre que vem, do
psicodiagnóstico, já deixei pronto também. Então é, eu não tenho preocupação de faculdade nenhuma.
Eu estava ansiosa mais por outras coisas mesmo” (Ingrid, 4º ano).
Nesse momento, Ícaro disse: “ah pela vida amorosa”, brincando com Ingrid,
que respondeu também sorrindo que não está vivenciando nenhuma questão
amorosa, e que exatamente por esse motivo sua vida acadêmica “caminhou em dia”.
Contou para o grupo que ganhou um carro do pai e está muito feliz com esse presente.
O grupo escutou Ingrid silenciosamente. O clima era de desânimo e tensão. A
participante comentou ainda sobre um encontro que teve com a ex- namorada e
enquanto falava, Tadeu e Isis faziam comentários esporádicos, brincando com a
participante. Quando Ingrid finalizou, a diretora também brincou que ela já estava de
férias e estabeleceu-se o seguinte diálogo entre os participantes:
Ingrid: eu estou pensando em tudo o que eu vou fazer, eu vou comer tudo o que eu quero
Ícaro: eu estou pensando na faca que eu vou usar para cortar o pulso
“Ai eu estou maníaca, deu para perceber, né? Eu estou assim, estou na pressão que todo
mundo está, acho que no quinto ano o que melhora é que é mais gostoso né? Assim, pelo menos para
mim. Todos os meus estágios são assim um xuxuzinho, essa semana eu finalizei e só faltou o hospital
que eu vou finalizar semana que vem para entrar de férias” (Isis, 5º ano).
“Mas ai tem esses pesos dos relatórios, foi igual o Tadeu falou né? Tipo assim, se fosse um
relatório por vez, estava tranquilo, estava perfeito, mas como junta todos, ninguém fica só no prazeroso
mais... ai quando estava ali fora, o que me veio assim foi a dor nas costas de ficar, sabe? Na frente do
notebook, essa imagem que eu não aguento mais, sabe? Toda hora eu tenho que chegar, abrir o
notebook e aparecer a telinha do Word, essa imagem, tipo assim... e ai como eu estou ficando ansiosa
porque tem que fazer as coisas e é um negócio assim, eu tenho estágio todos os dias da semana então
não têm como eu adiantar os relatórios, porque assim eu penso “hoje eu vou fazer um relatório”, mas
não, para amanhã eu preciso planejar a atividade que eu vou fazer lá no grupo, o que é que eu vou
fazer, a não, mas para hoje eu tenho que transcrever uma sessão que eu atendi para mostrar na
supervisão. Então assim, são coisas diárias, então você tem que viver um dia de cada vez sabe? Ai o
que é que aconteceu, eu comecei, toda vez, ano passado eu fui e agora assim eu aguentei o máximo,
mas não consegui, ai me desencadeou compulsão alimentar, muito forte assim, sabe? Porque, e eu
sei que é extremamente compulsão, sabe?” (Isis, 5º ano).
A participante continuou sua fala por mais algum tempo, contando para o grupo
como desde o quarto ano vem lutando com seu peso e com a compulsão alimentar,
tendo engordado sete quilos desde o último ano, fato que em sua perspectiva, está
diretamente relacionado com as exigências da faculdade:
“Então tipo assim, esse ano eu estava indo na academia, tal, estava me alimentando de uma
forma mais saudável, comendo quando realmente era preciso, e ai agora de um mês para cá, comecei
a não ter tempo para ir para a academia, e ai foi indo, foi desencadeando, desencadeando e ai eu fico
nisso, e ai eu fico bem chateada, sabe? Porque é tudo, eu estou tentando assim me por tarefas para o
dia “hoje eu vou fazer isso, e só isso, se eu terminar isso, está ótimo”. Ai eu fico o dia inteiro, e ai você
começa e o trem não flui e eu volto, sento e faço, e isso está maneirando minha ansiedade, mas está
203
difícil, ai eu vejo e penso “gente, depois para mim recuperar isso”, ai eu já fico ansiosa, além da
ansiedade normal, eu já fico ansiosa de recuperar o que eu estou ganhando agora, porque tipo assim,
não é saudável, eu fico com vontade de comer qualquer coisa, sabe? Não é tipo, uma coisa ou outra,
é qualquer coisa, porque para mim o maior prazer que tem é comer, que preenche, porque do resto é
como se tivesse uma máquina assim, que fosse sugando, então eu tenho que produzir, porque fazer
um relatório, até os próprios atendimentos é isso, é você com o que você tem, você oferece, né? Você
produz, então eu estou nisso assim, esse buraco que nunca é preenchido, esse buraco que nunca é
preenchido porque é essa questão do ´nunca acaba´... e é assim que eu estou” (Isis, 5º ano).
Angélica (como espelho de Isis): eu acho que eu estou assim que nem você, meio maníaca,
porque assim, não, tem um lado bom, né? Um lado que você vai é, eu estou fazendo cinco estágios,
então você vai vendo os pacientes desabrochando, você vai vendo as pessoas se desenvolvendo,
fazendo vínculo, tem esse lado bom, mas por outro lado, é tanta coisa para fazer que a imagem que
eu vi a hora que eu estava lá fora é até dor aqui, é aquele imagem de eu no notebook assim, você já
até sabe que vai abrir e vai ver a tela do Word. Ai você tem todos os dias aquela quantidade de relatório
para fazer, de coisa para escrever e para processar, e então assim, ai o que é que eu percebi, que eu
voltei, ai eu caio na compulsão alimentar, entendeu? Porque é tanta coisa para fazer gente, desde o
ano passado, esse maldito quarto ano. Eu sei que assim, que dá resultado, que é bom, que é bom ser
psicólogo, você vai vendo as pessoas melhorarem, mas é tanta coisa para fazer, e ai eu fico com esse
vazio, porque assim, essa compulsão assim, porque comer tem início meio e fim, então é uma atividade
que tem começo meio e fim, então você vai, você come e você preenche esse vazio. Porque eu estou
exausta, exausta, esgotada, ai eu como, como, como. Vocês entendem? (Angélica, diretora, no
espelho).
“Acho que é um paradoxo do tudo e do nada, que sempre me pega, porque eu sou a pessoa
do tudo e ai quando você dá tudo fica nada, só que sempre sou cem por cento em tudo, com todos,
então acho que esse vazio ele vem disso” (Isis, 5º ano).
“Eu cheguei num ponto esses dias para trás que eu realmente explodi por dentro assim, e ai
eu fiquei sem vida no meu corpo e lá dentro também , eu não queria levantar nunca mais, só ficar ali
até eu me dissipar, sabe? E a partir dessa experiência eu pude ver, eu não sei o que aconteceu, mas
alguma coisa me levantou e eu levantei, eu precisava levantar, é as pessoas cada detalhe de uma
palavra, cada detalhe, de o vento batendo no meu rosto foi me dando, é, juntando os pedaços da
explosão, sabe? E foi incrível, ai eu percebi que, eu falo do jeito que eu vejo, porque às vezes a gente
estuda tanto o equilíbrio entre mente, corpo e espírito, e ai a gente fica só na mente e no corpo e
esquece do espírito, né, eu pensei que é ele que nesses momentos mais incertos e que a gente tem a
sensação de não controle, porque realmente a gente não controla nada, mas a gente gosta de sentir
que está controlando, é ele que ajuda a gente a lidar, ai eu sei lá, meu lado espiritual parece que veio
nessa explosão e veio me dizer que eu nunca vou ter férias, as férias não vão vim a vida ela é
movimento, ela sempre vai trazer um trabalho, mesmo nas férias, e as minhas férias elas tem que estar
num espaço do dia que eu vou poder sorrir com a alma e respirar, cada dia, ela não tem que seguir um
espaço de tempo, que eu vou desesperadamente, igual eu estou tentando fazer os meus trabalhos,
tentar aproveitar meu tempo livre, e isso para mim não seria férias, seria mais um desespero, porque
vai chegar, entendeu? Eu acho que viver assim é tão vazio, e ai eu percebi que a gente tem que se
ligar ao percorrer, eu tinha esquecido disso. Ao percorrer, ao agora aqui... e fazer o que eu posso...
sem querer ser reconhecida, assim, sem querer fazer perfeito, fazer o que é meu, o que eu posso. É,
encontrar a paz dentro de mim e não lá fora, não sei, então eu pude depois de muito tempo sentir que
ainda tem vida aqui, muita na verdade, ela só precisava acordar, não sei, acho que é isso. Então eu
estou muito bem, não sei, eu não digo que eu estou bem, eu digo que eu estou viva, e é bom sentir
que eu estou viva...” (Aurora, 5º ano).
“Eu acho que o ponto que ela tocou, que é, que é muito assim, que é o ponto chave é quando
você fala não é viver as férias, um mês de férias, fazer coisas, tipo “ ah eu tenho tempo livre então vou
fazer alguma coisa, tipo jogar vídeo game, viajar”, até viajar que todo mundo vê viagem como “estou
bem, descanso” , mas as vezes não sabe, porque você faz isso tão no automático para fugir, tipo “ah
eu tenho que fazer isso para ficar bom” que você não vive a essência, né? Não é algo, como você
disse, as férias de cada dia, viver as férias de cada dia, de ter aquele momento que você fez alguma
coisa que é congruente como a gente fala, ne? Que você parece que te dá energia, que te ilumina,
igual quando eu falo de ontem de eu ter saído e tal, para mim fez esse papel, sabe? Porque eu fiquei
pensando assim “eu quero sair hoje, eu quero ir para algum lugar, eu quero ir lá comprar uma coxinha,
ficar lá e curtir”, eu fui e fiquei lá, estava um momento muito legal, eu quis ficar e fiquei lá até muito
tarde, fui dormir era quatro da manhã, acordei as sete fui para a faculdade, mas mesmo assim eu não
estou com a sensação esgotamento, sabe? Eu não sai porque eu tinha que sair para aproveitar, era
porque aquilo estava demandando,sabe? E é isso, essas coisas que eu acho que é muito difícil a gente
perceber e saber escolher para fazer, mas que faz toda diferença” (Tadeu, 4º ano).
205
Após a fala de Tadeu, a ego auxiliar Elaine pediu para contar sobre uma peça
de teatro que assistiu, intitulada “A alma imoral”, e que a fez pensar muito sobre esse
processo de viver fiel a si mesmo ou fiel ao sistema de produção. O grupo escutou
atentamente e pediram para anotar o nome da peça. Elaine ainda sugeriu o livro para
os participantes, que demonstraram interesse pela indicação.
Em seguida, como o tempo estava se encerrando, a diretora convidou Ícaro
para comentar como estava, pois, ainda não havia se manifestado. Ícaro disse que se
sentia muito fechado ainda para falar, mas que estava chateado com questões da
faculdade, pois percebeu que algumas coisas não estão dando certo para ele como
parece dar para outros colegas. Foi breve em sua fala, e ao finalizar, observou o grupo
e a unidade funcional. A diretora perguntou se ele gostaria de falar mais sobre essas
frustrações e Ícaro disse que não gostaria de falar sobre o assunto no momento.
Após a fala de Ícaro, Andressa pediu para sair pois precisava ir embora mais
cedo, em função de todas as atividades que ainda tinha para realizar. A diretora
respondeu afirmativamente e ela então despediu-se do grupo.
Dramatização: depois da saída de Andressa, a diretora convidou os
participantes para encerrarem o encontro no palco, por meio de uma imagem corporal
coletiva. Perguntou se eles concordavam em realizar a imagem de forma intuitiva, sem
combinarem previamente. O grupo concordou e subiram ao palco em silêncio.
Individualmente, foram procurando um lugar para se colocar, e então começaram a
rir. Tadeu então encontrou uma imagem corporal e todos os demais foram compondo
com a imagem iniciada por ele. Ingrid foi a última a encontrar um modo de se colocar
na imagem. Permaneceram na mesma por alguns instantes, em silêncio e ainda
durante a concretização da imagem, a diretora pediu que cada um dos participantes
dissessem uma palavra:
Isis: apoio
Tadeu: nada
Aurora: renascer
Ícaro: incapacidade
Ingrid: companheirismo
206
“E ai eu percebi que a gente tem que se ligar ao percorrer, eu tinha esquecido disso. Ao
percorrer, ao agora aqui...” (Aurora, 5º ano).
Data: 30/06/2017
Participantes: 7 (Jéssica, Isis, Aurora, Bruna, Ingrid, Tadeu, Ícaro)
Ausentes: 3 (Felipe, Anahí, Andressa)
Duração do Encontro: 2h30
Contextualização: conforme combinado previamente com o grupo, esse foi o
último encontro do primeiro semestre, antes de os participantes entrarem de férias
escolares. Nesse encontro, estavam ausentes três participantes, pois Andressa já
havia viajado de férias; Anahí e Felipe confirmaram presença, mas não chegaram e
não enviaram mensagens. A diretora combinou com os participantes, no início da
sessão, a data de retorno dos encontros grupais, ficando agendado para o dia 11 de
agosto, mesmo local e horário.
Aquecimento Inespecífico: depois de se acomodarem no teatro
psicodramático, Jéssica perguntou para o grupo o que havia acontecido na sessão
anterior, em que ela havia faltado e Ingrid respondeu à colega que tinha sido “bom”
pois saíram para “beber” depois da sessão. Jéssica reclamou que não a esperaram e
os participantes se descontraíram. Jéssica pergunta ainda se Tadeu virá ao encontro
e Ícaro respondeu que o colega já estava vindo. Ingrid perguntou então sobre Anahí
210
e Felipe, dizendo que eles “estavam sumidos”. Passaram então a comentar sobre os
participantes ausentes, Ícaro afirmou que Anahí havia dito para ele que estava sem
carro e viria com Felipe, mas nenhum dos dois deram notícias. Ingrid então disse: “O
Felipe não está vindo mais”; ao que Aurora respondeu: “daqui a pouco ele chega, ele
costuma chegar 1h depois”. Os participantes riram do comentário e o clima era de
tranquilidade. Após a chegada de Tadeu, a diretora fez o convite para realizarem uma
avaliação do processo grupal vivenciado até esse encontro final do semestre. Os
participantes aceitaram e quando a diretora questionou se alguém gostaria de
comentar algo antes de começarem, permaneceram em silêncio. Como aquecimento
inespecífico, foi proposta uma dança espontânea no palco, primeiramente individual e
depois coletiva. O grupo aderiu à dança lentamente, aos poucos foram soltando-se e
dançando de forma descontraída. Ao começarem a interagir fisicamente uns com os
outros, dançaram e riram juntos, brincando e compondo movimentos, costas com
costas, mãos com mãos. Bruna foi quem apresentou maior dificuldade de interação
com os colegas nesse instante. Ao final do aquecimento o grupo todo estava
dançando junto no palco, em roda, e o movimento do grupo incluiu Bruna. Ao final da
música, foram diminuindo o movimento e começaram a caminhar pelo palco. O grupo
se divertiu bastante ao longo do aquecimento e o clima se tornou relaxado e lúdico.
Aquecimento específico: após a dança espontânea, foi solicitado que os
participantes caminhassem pelo palco, buscando revisitar o processo grupal;
observando cenas e momentos vivenciados durante os oito encontros. A diretora
pediu que quando encontrassem a cena, pegassem uma almofada para simbolizar
essa escolha. Rapidamente os participantes buscaram as almofadas e continuaram
caminhando pelo palco. A diretora então pediu que escolhessem um título para essa
cena e verbalizassem em voz alta. Os participantes foram se colocando na seguinte
ordem:
Jéssica: cambaleando
Ícaro: evolução
Bruna: início
Ao silenciar, foi seguido por Ingrid, que disse, de olhos fechados e muito
concentrada:
“Como você é importante, você conseguiu elaborar de outra forma aquilo que foi mal resolvido,
e como você aprende com isso...a necessidade que a gente tem disso é muito grande, é uma revelação
do nosso eu quando a gente vivencia as coisas” (Ingrid, 4º ano).
“Nunca foi o outro que te prendeu, nunca foi o outro que te apontou, você era sua própria prisão,
seu próprio medo, sua própria acusação, era tudo muito seu...e agora, o que você quer ser?” (Isis, 5º
ano).
“Eu soube desde o começo que você iria fugir de mim....mas eu sempre estive lá, entre a
escassez do excesso...entre a dor e o amor, entre tantas coisas e quando você se permitia eu te
envolvia e te mostrava através de gestos, de empatias, o sentido que as vezes você perdia” (Aurora,
5º ano).
“Você está sempre fugindo mas vai se encontrar, vai se transformar” (Ícaro, 4º ano).
“Dói mesmo ficar cambaleando, não dá mesmo para aguentar muito tempo” (Jéssica, 5º ano).
“Esse foi só o início do processo para esclarecer tudo aquilo que está escuro, se reconhecer
enquanto pessoa” (Bruna, 3º ano).
Pediu ainda que os participantes escolhessem uma palavra que simbolizasse o que
tinham vivido nessa dramatização:
Jéssica: revelador
Tadeu: revelador
Ícaro: junção
Isis: angustiada
Bruna: lisonjeada
Ingrid: desafiador
Aurora: caótico
Em seguida, os participantes se encaminharam para o contexto grupal, a fim
de realizarem o compartilhar.
Compartilhar: já no contexto grupal, a diretora convidou-os a compartilharem
livremente como tinham vivenciado o encontro desde o aquecimento inespecífico e a
dramatização, buscando identificar o que aprenderam e perceberam de si mesmos no
processo grupal até a nona sessão. Houve um silêncio de dois minutos no grupo,
entreolharam-se, sorriram uns para os outros, mas ninguém se colocou. A diretora
então questionou se havia alguma tensão no ar, à medida que se mostraram
espontâneos no contexto dramático e agora estavam silenciosos. Tadeu então se
colocou, explicando para a diretora porque sentia dificuldade em realizar o
compartilhar:
“É eu tenho que pensar tudo o que eu tenho que falar senão depois...porque as vezes eu falo
e depois eu lembro, mas eu não volto para falar, digo, droga, perdi...sabe, já era minha chance de falar,
droga, acabou (risos)... e aí eu acho que a gente tenta, pelo menos eu, tento não invadir o espaço dos
outros também...ficar retomando toda hora fica parecendo que eu sou maior confuso...se bem que eu
sou mesmo...de ficar falando e depois retoma...acho que isso incomoda outras pessoas e você
fica...pelo menos no meu caso, por exemplo, toda hora que eu ficar lembrando de alguma coisa ficar
pedindo a palavra, ai é muito chato, porque fico cortando outras pessoas...então é isso essa coisa da
tensão” (Tadeu, 4º ano).
Ingrid: eu pensei que só eu sentia isso...eu tenho que aprender o que eu estou sentindo aqui e
agora e falar o que for mais importante porque se eu for falar tudo o que eu tenho para falar eu vou
ficar falando até sete horas, então acho que não é bom ficar até sete horas falando, aí eu me
compreendo primeiro.
213
Tadeu: tem que pensar meu deus o que eu quero falar primeiro, depois segundo, terceiro...
“Nossa gente eu pensei uma coisa louca, sabia que eu venho com fala pronta? Não tipo assim
você sabe o que você quer falar, você passa a semana pensando isso aí chega aqui, eu nunca falo, ai
parei com isso” (Jéssica, 5º ano).
Isis comentou com o grupo que organiza sua fala para ir à psicoterapia
individual, mas que para vir ao grupo de universitários, ela já tinha entendido que não
era esse o caminho. Destacou, entretanto, que passou a semana anterior ao encontro
desejando chegar ao grupo, subir ao palco e chorar muito.
“Não isso de pensar no que vou fala eu não penso... ontem foi um dia tão massacrante assim
que eu estava a ponto de explodir e fiquei o dia inteiro me segurando até essa bendita aqui me dar um
abraço (fala para Aurora, que está a seu lado), mas eu estava assim, falei para os meninos tudo, falei
para ela (aponta Aurora novamente), falei para o Felipe, para a Anahí, falei assim ó amanhã eu vou
chegar na terapia e já começar a chorar no início vou ser protagonista porque eu estou precisando de
uma explosão” (Isis, 5º ano).
“Eu sinto essa necessidade, por mim eu realmente ia na terapia todos os dias porque eu quero
falar todos os dias não dá pra falar tudo num dia, porque tem uma semana inteira e o resto dos dias?”
(Ingrid, 4º ano).
Isis retomou sua fala e compartilhou com o grupo como estava se sentindo
exausta, pois assumiu muitas atividades ao longo do semestre e tudo acumulou agora
no final, fazendo ela refletir sobre o quanto precisa se observar e colocar um “limite”
em si mesma, além de ter de “aprender a falar não”. Contou que ainda precisará
escrever a discussão dos resultados da pesquisa de Iniciação cientifica no fim de
semana, o que provocou muita angústia, pois se deparou- com a própria dificuldade
em ainda continuar produzindo algo com qualidade, em pleno final de semestre, e
sente muita cobrança interna para fazer algo que considerasse minimamente bom.
Emocionou-se bastante ao longo de sua fala, e apresentava uma aparência física
pálida e cansada.
“Ai gente.... eu to exausta...e-xa-us-ta... muito tensa, muito angustiada, muita coisa para fazer
ainda...eu achei que hoje seria o fim mas não é o fim e aí eu to muito...a ponto de explodir... ontem eu
estava segurando vamos fazer o que tem que fazer... mas minha vontade é assim de explodir...to
explodindo... eu to desde ontem com aquela música ´eu quero me curar de mim´ sabe? Eu to
precisando disso sabe? Passar por esse processo de aceitar as minhas próprias limitações físicas
sabe? Porque ai você conversa com as pessoas e elas me falam ´não você dá conta você é capaz´,
tipo eu não tenho dúvida disso não é isso a questão sabe? Não dar conta..o problema é esse sabe...eu
sei que capacidade intelectual eu tenho mas não estou tendo o resto, não to tendo física não to tendo
tempo” (Isis, 5º ano).
214
Após essa fala, a diretora convidou Isis para fechar os olhos e visualizar uma
imagem em que estivesse em paz, descansando. Isis aceitou, fechou os olhos e disse
para o grupo que estava se vendo na praia, com o namorado, descansando. Após
alguns instantes de silêncio, a diretora foi pedindo para que entrasse na cena e
aprendesse a descansar quando necessário. A participante abriu os olhos e sorriu
para a diretora, de forma amorosa.
Em seguida, Tadeu retomou a palavra e começou compartilhando que
“entendia” a exaustão de Isis, pois as duas últimas semanas de aula foram muito
cansativas, em função dos relatórios para entregar. Contou que pôde contar com a
ajuda de Ícaro e Ingrid para finalizar um dos relatórios de estágio, agradecendo os
colegas no grupo pela ajuda, à medida que não obteve ajuda dos colegas do grupo
do trabalho da faculdade e precisou finalizar o relatório sozinho (Ícaro e Ingrid haviam
oferecido ajuda para Tadeu na sessão anterior, pois já haviam terminado esse
relatório).
Compartilhou ainda que a cena que lhe veio no palco foi a da sessão anterior,
pois foi a sessão do grupo que mais gostou, à medida que pôde realizar todo o
trabalho corporal no seu “ritmo”, e isso mostrou para ele o quanto precisa aprender a
respeitar a si mesmo, pois percebeu que demora mais para realizar as atividades:
“E o que eu pensei que veio na minha cabeça foi na semana passada, e o que eu estava
pensando é que eu acho que a sessão da semana passada foi a que eu mais gostei de todas assim
né? É, teve muita coisa legal, e teve aquele momento que a gente ficou lá deitado, sentado, foi andando
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essas coisas, lá eu fui muito no meu tempo então por isso que eu vim com o respeito né ...de mim
mesmo aqui...acho que fui muito no meu tempo...acho que eu to num movimento desses sabe? De me
respeitar mais, as coisas que eu penso assim e tal, falar mais me colocar mais então tá legal” (Tadeu,
4º ano).
“E eu entendo que muita coisa que teve né, depois assim, de tudo o que foi acontecendo e
muitas coisas meu problema é não ter o limite mesmo meu sabe? Igual ela falou de achar que dá conta
ou querer dar conta e fazer pelos outros mais do que eu dou conta também isso sempre tem uma
ressaca muito grande depois” (Tadeu, 4º ano).
“É porque parece que você se preenche ou você se doa demais e na hora que o trem acaba
ou passa, você fica vazio...ou então fica aquela angustia né? Aquela falta de respeito que você teve
consigo mesmo que é o que eu vi no palco...então é isso ai...” (Tadeu, 4º ano).
Quando Tadeu terminou sua fala, houve alguns instantes de silêncio e então a
diretora perguntou para Bruna como ela estava, pois tinha faltado duas semanas dos
encontros grupais. Bruna então começou a se colocar:
“É eu estava pensando, estou muito igual ao Tadeu mesmo também, para falar eu tenho que
pensar numa lógica para depois falar...(risos)...mas os outros dias que eu não vim é porque não teve
como mesmo, é na quinta-feira passada foi confraternização do pessoal da minha sala já estava
combinado e como eu nunca tinha ido o pessoal estava me cobrando para eu ir e eu fui” (Bruna, 3º
ano).
“Eu escolhi uma cena, foi a cena da entrevista mesmo, primeiro dia que eu vim, eeee a palavra
início porque eu acho assim foi o início de um processo que como eu falei eu não faço terapia então
para mim aqui é uma terapia então cada detalhe assim a gente pega no ar e vai trazendo pra gente e
as vezes eu saia daqui e ficava pensando em casa, como era comum com todo mundo ou como isso
afetaria em mim e as vezes eu vinha e ficava pensando ´ai meu deus que ferida que vai tocar hoje´ eu
ficava meio com receio disso...mas toda vez que eu vinha eu vivenciava alguma coisa era um
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aprendizado inexplicável, eu chegava ficava pensando, começava a entender as coisas que acontecia
comigo e é só o começo de muita coisa pra me reconhecer enquanto eu mesma e eu acho que em
grupo é muito importante também porque é tanta coisa que o pessoal vive e é tão comum com a gente
e as vezes como eles fazem para lidar com isso também é uma nova perspectiva para lidar com a
situação e eu acho que é isso essa cena para mim foi muito importante” (Bruna, 3º ano).
A estudante contou ainda que vir para o grupo foi desafiador para ela, pois
muitas vezes não sentia vontade de vir para não se expor. Enquanto Bruna se
colocava, Ingrid e Ícaro começaram a conversar entre eles, baixinho, e a diretora os
observou por alguns instantes. Os dois então silenciaram, e Bruna não interrompeu
sua fala, continuando:
“É muito bom, essa terapia, igual eu falei às vezes eu vinha com isso na cabeça, as vezes de
não querer mexer em alguma coisa ou não falar tem dia que eu não to a fim de falar mas é sempre um
aprendizado... igual pra mim agora eu não queria falar mas é um exercício então...é muito bom ter essa
oportunidade de conhecer e poderia ser outras pessoas aqui no meu lugar, mas acho que tudo tem um
porque acho que eu estava precisando disso nesse momento desse empurrão e é muito bom,
aproximar das pessoas também que eu não conheço muito” (Bruna, 3º ano).
Angélica: então tem sido difícil vir Bruna, esse nível de exposição?
Bruna: é bem difícil
Angélica: mas me parece que você está lutando muito para continuar vindo
Bruna: é só esse período mesmo de vim depois que eu chego aqui já é mais tranquilo (risos)
Após essa fala, Bruna silenciou e sorriu para a diretora que comentou e tom de
brincadeira com a participante que outras pessoas também estavam silenciosas no
grupo; voltando-se para Ícaro, que respondeu: “viu Aurora!” Todos riram bastante do
comentário do participante e se dispersaram, falando ao mesmo tempo. Tadeu
comentou sobre como estava se sentindo relaxado após o trabalho no palco, que
provocou “integração”. Isis brincou nesse momento que os relatórios finais da
faculdade poderiam ser “um teatro”, e todos se divertiram, falando ao mesmo tempo
sobre essa questão do “ter que fazer relatório” - de todas as intervenções realizadas
nos estágios da faculdade. A diretora interrompeu pedindo para quem não se colocou
ainda comentar como estavam se sentindo, pois se aproximavam do final da sessão.
Ingrid diz que chegou muito agitada e que todo o trabalho de dança no palco
foi importante para que “chegasse em si mesma e se acalmasse”. A cena que viu no
palco foi quando foi “protagonista” e pôde elaborar o que tinha acontecido na sala de
aula com suas colegas de grupo de trabalho, o que foi muito positivo para ela.
“Eu falei tipo elaborar e aprender porque eu sou horrível para elaborar as coisas nossa. Tipo
eu levo isso diariamente em terapia, porque eu faço umas elaborações às vezes e eu fico com isso e
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às vezes nem é realmente...e sei lá, o psicodrama traz esse momento para a gente elaborar, rematrizar,
pra gente ver de novo...e eu lembrei daquele momento que eu tinha feito que deu tudo errado que a
gente fez aqui de novo né? Lembrei daquele momento porque foi um momento que realmente foi
elaborado que eu vi realmente o que eu não fiz no dia, e sempre que eu não faço as coisas depois eu
fico me culpando nossa, eu acho que o maior problema da minha vida sou eu mesma, eu não tenho outro problema sou
eu mesma...tipo eu não tenho nenhum problema na faculdade, na vida, meu problema sou eu e eu só me
cobro eu só me culpo, eu me puno a toda instante, e eu faço isso a todo instante, sabe? Não sei eu
tenho umas ideias loucas do nada...o Ícaro sabe? É muito difícil ser eu” (Ingrid, 4º ano).
Ingrid compartilhou ainda como percebeu, no palco, o quanto estava aflita pela
proximidade das férias, pois voltará para casa dos pais, que a cobram muito; inclusive
identificou como já existe uma cobrança sobre o que será no futuro profissional e isso
a angustia bastante. Sente-se solitária em casa e é difícil voltar de férias. Nesse
momento, Ingrid se emocionou e a diretora acolheu, dizendo para ela sentir a conexão
com o grupo, pois nesse espaço sua fala é importante, assim como suas angústias.
Ingrid agradeceu e quando se acalmou, sorriu afetuosamente para a diretora.
Após alguns instantes de silêncio, a diretora perguntou para Jéssica, Ícaro e
Aurora o que gostariam de comentar sobre a sessão e sobre o vivenciado ao longo
dos oito encontros e os participantes disseram que não gostariam de falar, se sentiam
“representados” pela fala dos colegas. A diretora insistiu que dissessem uma palavra
pelo menos sobre como estavam se sentindo. Aurora compartilhou que não sabia o
que estava sentindo e percebeu-se muito caótica ao longo de todo o encontro. A
diretora pediu que ela escolhesse uma palavra que a descrevesse nesse momento e
Aurora disse:
“Eu estou procurando minhas emoções para não me jogar em abismos...se não me jogo em
abismos” (Aurora, 5º ano).
“Eu to passando por um processo de renovação mas eu não sei ainda” (Ícaro, 4º ano).
Em seguida, Jéssica afirmou que estava tudo bem com ela e sorriu para o
grupo. Estava muito calada e diferente do modo como se colocou no grupo até este
encontro, além de ter faltado à sessão anterior.
A diretora então convidou os participantes para subirem ao palco e realizarem
um círculo de canto, a fim de despedirem-se para as férias. Todos de mãos dadas,
cantaram a música “Tocando em Frente”, de Almir Sater. Cantaram de forma alegre e
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o clima era leve e descontraído. Após o canto, se despediram com abraços uns nos
outros e na diretora.
Data: 11/08/2018
Participantes: Ícaro, Ingrid, Aurora, Isis, Jéssica
Ausentes: Anahí, Felipe, Andressa, Bruna, Tadeu
Duração do Encontro: 2h20
Contextualização: esse foi o primeiro encontro do grupo após um intervalo de
40 dias entre as sessões. Na sexta-feira anterior à da semana que precedeu o
encontro, a diretora enviou mensagem pelo grupo do whatsapp confirmando o retorno
para o dia 11 de agosto e convidando-os a confirmarem presença. Somente a
participante Bruna não confirmou presença e foi contatada pela diretora por telefone,
e na conversa, Bruna comentou com a diretora que estava com dificuldade em retornar
para o grupo. Decidiram agendar uma entrevista individual para a semana seguinte.
Os demais participantes confirmaram pelo grupo do whatsapp que viriam ao encontro,
mas houve cinco faltas.
Aquecimento Inespecífico: conforme iam chegando, os participantes
conversavam animadamente, sobre o retorno às aulas e aos estágios; disciplinas,
TCC. Após 10 minutos de espera e bate- papo, foram convidados para entrarem no
teatro psicodramático. Inicialmente a diretora convidou os participantes para
retomarem o contrato grupal. O convite realizado foi para que os estudantes
refletissem sobre como estavam retornando para o grupo, que comentassem sobre o
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desejo de continuarem vindo até o final do semestre e como sentiam o vínculo com o
grupo (se como obrigação ou escolha) e quais dificuldades estavam percebendo e
vivenciando no processo grupal.
Jéssica foi a primeira a se colocar. Estava animada e bastante solta em sua
fala, muito diferente de como participou na última sessão, antes das férias. Disse que
estava aguardando “ansiosa” o retorno dos encontros grupais:
“Eu to voltando muito feliz para cá, to muito feliz assim, queria voltar já, desde a semana
passada, começou as aulas e eu falei nossa tem que voltar já para o grupo, estava querendo já voltar,
só que eu sinto assim, aqui, é um processo terapêutico para mim, então eu acho que é um processo
muito importante que eu vivo aqui com outras pessoas que ele é mais voltado para o meu papel como
estudante mas eu sinto também que é um papel de vida, é uma terapia em grupo, sabe? Eu brinco que
eu tenho a individual e tenho a grupal que é aqui” (Jéssica, 5º ano).
“E eu sinto que aqui não é uma obrigação, eu sinto que eu estou vindo aqui por uma escolha,
para aprender mais sobre mim, aprender mais sobre os outros, aprender mais como que funciona um
grupo, como que desenvolve um grupo e tal e eu sinto vontade de vim, não me pesa como uma
obrigação nem nada, eu sinto uma vontade de vim...as vezes eu acho que nem todo mundo tem um
compromisso com vir e estar aqui e tal, mas eu sinto que a partir do momento que eu me dispus a
participar da pesquisa, se eu puder vir, eu vou escolher estar aqui, eu não vou colocar nada na sexta-
feira porque eu tenho que estar aqui e venho com gosto escolhendo estar aqui, porque é uma escolha
minha, é um processo meu, estou aqui porque eu quero estar aqui e tenho vontade de estar sempre
aqui e por mim a gente ficava até dezembro de 2018 por causa deles” (Jéssica, 5º ano).
“Engraçado eu estava pensando aqui que Psicodrama de certa forma dá um pouco de medo
porque a gente veste tantas máscaras a gente desenvolve tantos papéis na sociedade e eu acho que
o papel mais difícil de desenvolver é o de si mesmo, ser si mesmo, é o papel mais difícil de todos e o
psicodrama eu acho que lança essa ideia por isso que você quer estar nele mas você tem o receio de
entrar nele totalmente né tem hora? Porque é difícil ser si mesmo, porque te mostra não só lados bons
de você mas lados que as vezes você não queria saber que tem mas está ai e você precisa trabalhar,
e eu gosto desse desafio do psicodrama” (Aurora, 5º ano).
Aurora comentou ainda que se percebeu com mais “gás” nesse retorno para as
aulas, e que enquanto as colegas falavam, pensou também na importância do grupo
como suporte para essa etapa de finalização da faculdade. Disse que quer terminar a
faculdade “fazendo o que pode” (sic) e não o que “as pessoas esperam” (sic) e que
nesse sentido, a convivência com os colegas no contexto grupal promove um apoio
importante.
Quando Aurora terminou de falar, houve um silêncio no grupo por mais de um
minuto, e então, Ingrid, que estava sentada de forma encolhida no canto do sofá,
começou a se colocar. Disse para o grupo que estava retornando das férias “cansada
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e com vontade de se esconder na vida” (sic). Ingrid tinha uma aparência abatida e
desanimada. Sobre a participação no grupo, comentou que durante as férias percebeu
a importância do processo grupal como um respaldo para ela, no papel de estudante:
“Eu acho assim, nessa ausência, nesse tempo que a gente ficou longe eu fiquei meio longe de
tudo né porque eu fiquei de férias, não fiz nada mas eu fiquei de férias e eu comecei a ver o que me
mantém sabe? O que me deixa mais forte, o que eu sinto falta, o que me ajuda e aqui foi um desses
pontos sabe? Eu acho que com todas as pessoas aqui eu sinto como se fosse um respaldo e eu consigo
me manter mais firme sabe? Então aqui eu acho que meio que criou um sentido para a minha vida
estar aqui então é muito importante para mim estar aqui, então sim, é uma escolha minha” (Ingrid, 4º
ano).
Ingrid: eu me sinto muito bem aqui, eu gosto de todo mundo que está aqui embora tenha uns
que falte muito senti falta de outras pessoas aqui hoje, é bom quando aqui está cheio, eu acho que
cada um tem seu papelzinho aqui
Ingrid: é como se, cada um tem algo deles que preenche o grupo sabe, tá faltando a Andressa
aqui do meu lado, tá faltando eu olhar para a Bruna quietinha ali, tá faltando o Felipe viajante, o Tadeu
palhaço, sei lá...falta
Ícaro: essa questão de falta eu acho assim, vai faltar pelo menos avisa sabe? Não deixa na
mão o grupo, tipo nem avisa no zap ne? Às vezes acontece alguma coisa fala, pede para alguém falar
se está sem celular avisa no outro dia porque que não foi, mas eu acho que quando não avisa, sei lá
pode ser impressão minha, mas eu acho falta de respeito com o grupo, eu sei que todo mundo aqui é
uma boa pessoa mas eu acho que pô, pelo menos avisa...eu já faltei também mas pelo menos avisa
porque está faltando, ´não quero ir´, beleza então fala, to faltando porque eu não quero ir hoje, sei lá,
cada um é cada um”.
Isis: eu concordo com o Ícaro porque assim quando a pessoa manda no grupo que não vem,
eu já preparo meu coração que a pessoa não vai estar, então você já vem preparado, isso que o Ícaro
falou faz muito sentido, porque se não avisa, você chega aqui e espera que vai estar todos e aí você
não ve todos e tipo assim não é um compromisso com a Angélica ou com a Elaine, é com todos, eu
não sinto assim o pessoal não está querendo vir no grupo da Angélica, tipo assim o pessoal não está
querendo vir para o nosso grupo, de estudantes, dá uma sensação de descaso.
Após essa discussão entre todos os participantes, seguida por alguns instantes
de silêncio, Ícaro se colocou, comentando com o grupo que sobre essa questão das
faltas, ele está aprendendo com essa experiência, pois já faltou sem avisar de muitos
grupos e hoje percebeu como esse comportamento passa uma mensagem de
225
“descompromisso com o grupo” (sic). Comentou ainda que estava se sentindo muito
bem em retornar para os encontros. Ícaro estava solto e bastante integrado ao grupo,
também diferente do modo como participou dos encontros no semestre anterior. Ao
final de sua fala, afirmou para a diretora que gostaria de participar de congressos de
psicodrama no futuro e se ela já teria alguma informação sobre próximos eventos de
psicodrama. O grupo iniciou uma discussão sobre possibilidades de irem ao próximo
Congresso de Psicodrama, em 2018, em Fortaleza. Ícaro, Ingrid e Jéssica
demostraram mais entusiasmo do que Aurora e Isis, que observaram atentamente,
mas permaneceram silenciosas.
Após essa breve discussão, Ícaro recomeçou falando que estava angustiado
com o seu trabalho de conclusão de curso, por ainda não haver decidiu o tema do
mesmo. A diretora então começou a encerrar essa primeira etapa, ressaltando a
importância de retomar com cada um dos participantes que não vieram a
disponibilidade em continuar fazendo parte do grupo e problematizando essa questão
das faltas. Isis pediu a palavra e expôs sua preocupação com as ausências frequentes
de Felipe e Anahí, por sentir que os dois terminaram o semestre muito “ausentes do
grupo” e que esse fato a deixou angustiada.
“A Andressa, a Bruna e o Tadeu, o Tadeu até mais ou menos tem vez que ele falta mais assim,
mas parece que eles faltam quando não podem vir, mas a Anahí e o Felipe eu sinto eles tão distantes
e ao mesmo tempo eu queria eles perto e aí eu não sei eu entro nessa fantasia que a Jéssica falou,
não sei se é minha percepção porque eles são mais próximos de mim em outros contextos e eu fico
muito preocupada pensando gente o que será que está acontecendo porque eles não estão
conseguindo estar aqui, eu fico com essa coisa que a Jéssica falou, a gente espera, não hoje eles vão,
e eles não vem, porque eu acho que eles são os mais ausentes assim então no meu coração está um
espaço assim, sabe quando está querendo sair mas está aqui então isso parece que não tinha sido
trazido para a realidade e eu senti muita angústia em pensar sobre isso” (Isis, 5º ano).
que gerou angústia, mas que valeria a pena. Após a fala de Aurora, o grupo silenciou
por alguns instantes, e a diretora fez o convite para o aquecimento específico.
Aquecimento específico: foi feito o convite para os participantes se
levantarem, a fim de movimentarem o corpo, espreguiçando, percebendo dores e
tensões e aplicando-se uma “automassagem”. A diretora apagou as luzes e colocou
uma música suave. Esse trabalho corporal durou por volta de 10 minutos. Ao final do
mesmo, a diretora pediu que os participantes encontrassem uma palavra sobre como
estavam se sentindo:
Isis- aberta
Jéssica- crescimento
Aurora- presente
Ícaro-esperança
Ingrid- necessidade
Ingrid- meu desejo é de fuga, ela está ali e eu estou aqui e eu não queria voltar
Isis- desânimo
“Então tipo assim vai vim sabe esse turbilhão de coisas e ai tem as disciplinas que também tem
coisa para fazer, então tipo assim, eu estou desanimada de ter que enfrentar isso nesse último
semestre...não era o que eu queria...porque vai vim tanta burocracia, tanta coisa assim ó aquela
sensação aquela imagem minha sentada ali a ponto de explodir.... Me desanima sair do estado de
relaxamento das férias e já entrar na cobrança, então esse é meu desânimo sabe? Ver a faculdade e
saber que vai começar tudo de novo, que vai ser até um pouco mais porque vai ter apresentação do
TCC, apresentação da iniciação lá...tudo... gente...já deu...se eu pudesse eu falava gente vamos
encerrar aqui...já cumpri...eu gosto de ir para a aula, gosto de ir para a faculdade, mas você está ali na
aula e sabe que vai ter prova, e o professor fala gente isso é importante, vai ter prova, e isso desanima
sabe porque eu sei que eu não vou conseguir viver tudo. Mas ai eu fiz minha agenda desse semestre
de forma a priorizar a minha saúde mental, porque semestre passado eu terminei muito mal, então fiz
minha agenda deixando espaços para eu respirar, para eu viver...esse semestre não, eu fui, fiz de um
jeito que eu vou ter tempo para respirar que eu vou ter um tempo de não ter nada então eu fui, foi difícil,
mas eu deixei um horário para mim, que é a quinta-feira de manhã que não tem nada e eu quero que
não tenha nada para mim ter um tempo na semana, sabe, mesmo que for para fazer coisas mas pelo
228
menos não vou ter que faltar de uma coisa para fazer outra, então eu consegui fazer a agenda assim”
(Isis, 5º ano).
“Às vezes é um estágio muito bom, um estágio que você quer aproveitar que você quer viver,
uma abordagem que você gosta...só que você estava numa aula, cansativa, ai dessa aula você
almoçou correndo, foi para um estágio e desse estágio você foi para outro estágio...você quer se
entregar mas você não tem energia para se entregar, entendeu? Você não tem energia para se
entregar...não adianta você tentar que você vai fica ruim entendeu? Ai você faz de qualquer jeito,
pronto, fiz e passei...então eu penso assim, no quarto ano são no mínimo 3 estágios, no quinto ano
mais 3, eu acho que se você pudesse escolher sei lá, dois daqueles que você realmente gosta, acho
que tirar um já ia mudar muita coisa, a gente teria mais tempo para fazer melhor...eu sei que é bom
conhecer muitas coisas, é muito importante, só que para mim seria melhor fazer um bem feito do que
dois mal feito” (Aurora, 5º ano).
“E sabe o que é o mais engraçado? A gente fica até o terceiro ano sem fazer nada aí no quarto
ano começa daquele jeito” (Ingrid, 4º ano).
“Ai gente, porque não pode pegar tudo o que a gente viveu no estágio e fazer uma poesia, sei
lá, faz um texto que não seja repetitivo, faz uma relação com uma obra, sei lá (Jéssica, 5º ano).
“Mas tipo, o melhor que eu tive foi o que a gente tinha que, era tipo isso que a gente está
falando, tinha que fazer um artigo mas o artigo era comparando com um mito ou uma deusa né que...e
foi muito legal, foi o melhor assim, eu fiz com prazer porque eu fui lendo o mito e vendo a história da
minha paciente, lendo o mito, os traços do personagem e fui podendo criar sabe? Tipo assim em todos
ela viu a sua criação, nossa foi perfeito” (Isis, 5º ano).
de uma história que leu durante as férias. O estudante disse para o grupo que se
sentia angustiado com o futuro profissional e perdido com relação a quais
possibilidades terá para assumir-se profissionalmente.
A fala de Ícaro introduziu uma nova temática, diferente da que estava sendo
debatida até então:
“Eu vi uma coisa que eu não sei se tem muito a ver, mas é que me deu muita vontade de fazer
o que ele fez...e que eu lembrei...eu lembrei de uma história, um rapaz aqui do Brasil, e ele trabalhava,
estudava e tal, aí um dia ele foi passar as férias na Tailandia e ai a mochila dele sumiu, ele ficou um
tempão procurando, perdeu a passagem de volta e não voltou para o Brasil, aí ficou procurando,
procurando, aí descobriu que tinha sido um macaco que tinha pegado aí achou e até então, o pessoal
lá acolheu muito bem ele, então ele precisava de alguma coisa para viver e ele foi dando aula de
português para o pessoal lá e ai ele está lá até hoje, já faz quase cinco anos que ele mora lá na Tailândia
dando aula de português e morando em frente a praia gente” (Ícaro, 4º ano).
“Porque por exemplo, o semestre passado eu já tinha feito tudo, realmente estava tudo pronto,
eu fiquei as últimas semanas despreocupadas porque eu já tinha feito tudo, mas ai depois eu parei para
pensar, tá eu fiz tudo mas o que eu não acabei comigo para fazer tudo, o que eu tive que passar para
fazer tudo, o que eu fiquei, a consequência de ter feito tudo, qual foi para minha vida? Entendeu? E
pensar nisso foi tipo, valeu a pena? Eu faço porque eu amo psicologia, porque eu quero me formar,
porque eu quero ser, mas o decorrer disso é cheio de decepção, frustração e sofrimento sabe? Então
ver o que a Isis falou realmente, essas coisas de relatório é um absurdo, eu acho assim a gente ainda
faz Psicologia, é um curso em que você está vendo o outro que você está se olhando, está falando de
pessoas entendeu? Você está falando da subjetividade humana no qual não pensa em você? Ai eu
olho isso e falo assim nossa como a gente está atrasado no próprio curso né? Tipo um curso que não
olha o humano nunca...e isso causa raiva, é uma mistura de mil sensações, a respeito de tudo... nas
minhas férias eu parei e pensei nossa eu não me coloquei em primeiro lugar em nenhum momento,
entendeu? Eu costumo dizer para mim mesma, que a vida é feita de prioridades, e eu estar aqui é uma
prioridade minha, porque eu deveria estar fazendo meu projeto de TCC, que não está pronto ainda e
tem que entregar segunda...então eu quase nunca me coloco como prioridade, porque se não fizer tudo
que tem que fazer...então eu entendi isso” (Isis, 4º ano).
estava se sentindo angustiado por não ter ideia ainda do que gostaria de trabalhar.
Após a fala de Ícaro, Jéssica disse que precisava muito falar sobre o TCC com o
grupo, mas Ingrid retomou a palavra e terminou de falar sobre sua indignação a
respeito da antecipação do TCC. A diretora voltou a atenção para Jéssica pedindo
para ela comentar o que estava vivenciando sobre o TCC.
Jéssica contou que sua palavra no aquecimento foi despedida, pois sentiu
muita emoção em estar se encaminhando para o final da faculdade, à medida que
reconheceu a importância desse espaço em que passou os últimos 5 anos, vivendo
no local a maior parte do dia, que acabou se tornando sua “segunda casa” (sic).
Contou como desenvolveu uma relação especial inclusive com os funcionários da
faculdade e que viu muitas mudanças acontecerem na instituição. Jéssica contou que
estava sentindo uma mistura de sentimentos, pois ao mesmo tempo que estava
experimentando sentimentos bons, percebeu também sentimentos ruins e isso a
deixou confusa. O que mais a está angustiando é a finalização do TCC. Virou-se para
Ingrid e disse acreditar que é melhor para os alunos do 4º ano essa antecipação, pois
assim terão mais tempo para desenvolver o trabalho, haja vista que sua turma teve
somente 8 meses entre a entrega do projeto e o depósito da versão final.
“Eu fico um pouco revoltada de estar acontecendo isso justo com a minha turma entendeu, e
eu estar tendo que viver isso...só que ao mesmo tempo também fico tranquila porque a gente está
sinalizando isso para a direção, a coordenação sabe disso e eles estão sabendo que não está dando
certo, que está massacrando a gente e eles estão fazendo propostas para mudar entendeu? Tanto que
já mudou...o pessoal do quarto já mudou o prazo do projeto...só que de qualquer forma, até chegar
nessa mudança, como por exemplo o TCC, a gente passou por isso, está passando ainda...eu fico
olhando para o meu TCC, to entregando meu TCC semana que vem e eu fico pensando assim, talvez
se eu tivesse mais um mês acho que eu ainda mudava, tudo, mais uma vez...” (Jéssica, 5º ano).
A diretora comentou com Jéssica que era importante ter espaço para vivenciar
essa despedida, resgatando também aquilo que foi bom de se viver na faculdade, e
que talvez ela precisasse se dar espaço para sentir essa finalização. Jéssica
concordou e confirmou que esse final de curso trouxe muitas emoções contraditórias.
A participante então silenciou e Ingrid voltou a comentar sobre as mudanças que já
observou acontecendo na faculdade. Jéssica voltou a afirmar como se sentiu
injustiçada na faculdade e como sua turma lutou para conseguir mudanças com a
coordenação. Nesse momento, Aurora comentou com Jéssica que “muitas pessoas
haviam morrido na fogueira” (sic) para que pudessem “evoluir” e todos riram bastante.
Jéssica silenciou e a diretora perguntou se ela havia terminado, ao que ela respondeu
afirmativamente.
231
“Na hora que pediu para pensar eu gostei muito da música que tocou na verdade antes, eu
fiquei presa, envolvida pela música, ai ela me deu a sensação, sabe aquele quando tem uma cena nos
filmes que vai passando vários momentos da vida das pessoas, momentos simples mas que marcam,
sabe essas cenas que passam nos filmes e que toca uma música como aquela? Então me passou
esses momentos na faculdade sabe que apesar de todas essas bagunças, que tem tudo essas
questões, tem momentos assim que particularmente para mim eles ficam, sei lá, um bom dia diferente
para alguém que as vezes eu nem tenho contato mas é engraçado sabe? Um momento que sem querer
eu encontrava a Isis a gente nem combinava e sentava no sofá e começava a cantar sem importar com
quem estava em volta sabe? Eu acho que isso, acho que me marcou esses encontros sabe? É, coisas
que eu descobri de mim, dos outros, acho que isso que ficou muito importante pra mim...foi isso que
eu lembrei, isso me da forças para entrar lá...se não, não entraria não....se fosse pensar no material,
no mecânico eu já tinha...as vezes eu mando, eu aperto um botão e nem ligo, as vezes eu faço um
trabalho cinco horas antes da entrega...é errado mas...não sei se é errado mas é o que eu
consigo...porque eu dou valor para esses momentos...se sei lá eu tiver que fazer o TCC mas uma amiga
minha me liga e ela precisa conversar eu vou conversar com ela...eu deixo meu TCC...sei lá...é uma
coisa de prioridade o TCC é papel a minha amiga é um ser humano né? Eu penso assim...mas ai vem
o externo sempre cobrando e não vendo isso que você faz...é engraçado quando vem coisas assim,
ponto X da vida né, cheques mates a gente esquece que tem o tabuleiro todo né? Que teve tantas
jogadas que a gente fez antes de chegar no cheque mate...e eu acho que é isso” (Aurora, 5º ano).
“Parece que quando eu olho para a faculdade eu vou conseguir desbravar muita coisa ali pra
mim sabe? É até clichê falar mas é a faculdade é onde querendo ou não tem muito conhecimento
cientifico e eu tenho essa sensação boa por querer conhecer mais essa parte cientifica mas a gente
esquece muito que não é só de ciência que a gente vive né, que a gente também tem as nossas
relações sociais, a gente mesmo, pensar sobre a gente mesmo...igual eu até falei na sala essas férias
foram muito boa pra mim, porque eu consegui observar o que que eu fazia, no segundo ano onde eu
não tinha tanta coisa para fazer e como eu estava fazendo agora...então assim eu estava tratando as
pessoas é, eu estava sendo ríspido as vezes porque eu tinha muita coisa para fazer e aí a pessoa vinha
falar eu estava nervoso tratava mal sabe? Então nessas férias eu tentei voltar algumas amizades, com
os meninos do colegial a gente está saindo quase toda semana para se encontrar, conversar, eu
terminei o semestre muito estressado sabe? Então assim, eu to tentando tratar a minha família melhor
porque as vezes eu estava muito estressado e aí minha mãe vinha e eu já saia assim nem queria
conversar, então as vezes perguntar assim, ´ah como você está como foi seu dia´, porque querendo
232
ou não tipo minha mãe não faz terapia, minha irmã não faz terapia, então elas precisam de alguém
para ouvir elas sabe? Então eu to tentando fazer isso sabe? To tentado me melhorar, melhorar quem
eu sou e não dar tanta atenção para a faculdade assim sabe? Eu dou atenção para a faculdade lógico,
eu preciso disso, eu quero isso, é angustiante não ter tema e ter que fazer um tema e pensar que
provavelmente eu vá mudar meu tema e eu vou ter que fazer tudo de novo....mas eu to focando mais
igual a Aurora falou eu to focando mais em mim e nas pessoas que estão do meu lado, tentando tratar
elas melhores, tentando crescer como pessoa, não só como profissional sabe? Então a faculdade me
traz uma coisa boa porque é um pilar importante para mim eu acho que para todo mundo é e por mais
que cause angústia até o momento me traz mais motivação do que angustia, então essa é a visão que
eu tenho da faculdade” (Ícaro, 4º ano).
Após a fala de Ícaro, a diretora convidou o grupo para subirem ao palco a fim
de encerrarem o encontro. Colocou novamente música suave e pediu que
caminhassem pelo palco procurando sentir o que viveram ao longo de todo o encontro.
Depois solicitou que os integrantes do grupo se colocassem em uma postura física
que concretizasse o que estavam sentindo naquele momento. Os participantes
realizaram a postura física e disseram uma palavra cada um de como estavam se
sentindo.
Ícaro- perseverança
Aurora- como a vida pode ser surpreendentemente simples...e mesmo que eu me depare com
meus limites, que eu ainda tente e arrisque...
Jéssica- que bom se despedir, mas que dor tão pesada se despedir, tão pesada, invisível, mas
também tão viva...
“Eu tô focando mais em mim e nas pessoas que estão do meu lado... tentando crescer como
pessoa, não só como profissional sabe?” (Ícaro, 4º ano).
“Eu quero estar aqui mas além do que o grupo me oferece as pessoas também acho que a
gente está se tornando um grupo mesmo assim de querer estar com essas pessoas, além de estar aqui
participando do grupo que eu sei que vai ser bom a vivência eu quero estar com essas pessoas sabe?”
(Isis, 5º ano).
Com essa fala, a participante pôde contribuir com os colegas com um novo
modo de olhar para as questões do contexto acadêmico, destacando o quanto podem
escolher aquilo que será a prioridade e quais caminhos possíveis para não se
237
“Nossa mais eu quero continuar porque eu gosto de estar aqui e eu aprendi muito também eu
acho que estar aqui agregou na aula de grupo eu acho que casou muito então por mim eu continuaria
até o final, também esse semestre está mais tranquilo, eu tenho dois estágios a menos, apesar que
tem a iniciação, mas eu quero vim sim conversar sobre meus problemas (risos) (Andressa, 4º ano).
238
“Eu não tenho nenhum ponto negativo de vir para cá, é tranquilo” (Tadeu, 4º ano).
“É eu estou bem cansada na verdade...demais sabe? Estou muito esgotada? Parece que eu
não tenho tempo para pensar em mim, só pensando em paciente, em compromisso...muito cansada”
(Anahí, 5º ano).
239
A diretora comentou com Anahí que estava preocupada com o fato de ela
também sentir que o grupo era outro compromisso obrigatório, e que não gostaria que
isso acontecesse, pois estava percebendo a participante esgotada. Explicou que o
grupo funcionava como um espaço para compartilhar e cuidar das dificuldades
vivenciadas no papel de estudante, e o convite era para ser uma oportunidade, e não
uma obrigação. A participante respondeu que não sentia obrigação em vir e quando
conseguia participar sempre saía sentindo-se mais leve, mas que por motivos
diversos, não conseguiu participar dos encontros em várias sextas-feiras. Percebeu
desde o final do semestre anterior que tem muita demanda para trabalhar em terapia
individual e que não gostaria de falar no grupo, pois entendia que o foco do grupo era
o papel de estudante.
“Até hoje eu não tive oportunidade de estar fazendo a terapia ainda sabe? Individual...então eu
acho que isso está pesando muito sabe? Porque eu to vivendo muita coisa e parece que eu não consigo
focar em mim...então eu acho que isso está pesando muito...mas aqui, é porque aqui é um grupo né, a
gente está trabalhando coisas, eu me descarrego coisas da faculdade e tudo o mais, mas tipo coisas
muito internas mesmo, eu sinto que isso é individual e que eu não estou trabalhando entendeu? Isso
está pesando muito... mas aqui eu me sinto muito bem, é uma forma de alivio, de descarregar e tudo
mais, mas eu ainda tenho coisas muito fortes em mim, coisas que preciso de terapia individual, por isso
que está pensando tanto” (Anahí, 5º ano).
Quando Anahí terminou de falar, a diretora comentou com ela que talvez não
fosse necessária uma divisão rígida entre o papel de estudante e a vida pessoal deles,
e que ela poderia comentar sobre sua vida, suas dificuldades. Afirmou para Anahí que
a dor dela não pesaria no grupo e que outros participantes puderam trazer suas
questões pessoais familiares em outros momentos. Anahí chorou bastante e a diretora
e o grupo permaneceram em silêncio. Um clima acolhedor se estabeleceu e após
alguns minutos, a diretora comentou que sentia Anahí muito encolhida e em
sofrimento, e ficou contente que ela tenha vindo, pois sua presença era importante
para o grupo, assim como o que ela está vivendo, e que ela não precisava se
desculpar, mas sentir-se convidada a “olhar” para compreender e acolher o que
estivesse vivendo. A diretora agradeceu a participante por ter vindo e compartilhado
sua dor com o grupo e sua dificuldade de participação. Anahí respondeu que quase
não veio ao grupo novamente, pois estava se sentindo muito mal:
“É na verdade quase eu não venho porque eu estava muito mal e parece que é coisa que na
verdade eu estou segurando eu não quero falar mesmo sabe? Eu acho que aqui no grupo, por mais
que aqui me faça muito bem, eu tenho coisas que não sinto que é para compartilhar no grupo, porque
240
é coisa minha muito forte sabe? E por mais que eu goste muito daqui, eu sinto que essas questões
minhas eu sinto que não é desse grupo aqui, para compartilhar aqui, é por isso que eu estou segurando,
por isso que eu quase não vim, porque eu sei que isso está batendo forte e que eu não queria
compartilhar aqui, por isso fiquei meio na dúvida mesmo” (Anahí, 5º ano).
A diretora devolveu que apesar de não poderem entrar em contato com o que
ela estava vivendo, era importante acolher sua dor e não passar por cima de suas
dificuldades em estar presente. Pediu para que Anahí respirasse fundo e sentisse se
dava para continuar no grupo, se estava com condições de ouvir os colegas e a
participante comentou ainda que veio com o intuito de segurar a dor, mas que após o
choro e o acolhimento do grupo, estava se sentindo melhor e que foi um alívio poder
chorar e se expressar, mesmo que pouco.
Após alguns instantes de silêncio, a diretora perguntou para Jéssica o que
estava acontecendo com ela, pois a participante havia mandado uma mensagem pelo
whatsapp, para a diretora, solicitando auxílio com o Trabalho de Conclusão de Curso,
ao que a diretora respondeu que poderiam conversar no grupo.
“Eu acho que eu estou muito a flor da pele com esse negócio do TCC e às vezes eu acho
melhor não falar sabe? Eu te mandei mensagem hoje cedo e agora não sei se quero falar...parece que
estou remoendo, parece que entrou em um ciclo sem fim” (Jéssica, 5º ano).
A diretora devolveu para a participante que não estava entendendo o que havia
acontecido com ela e Jéssica explicou que estava vivenciando dificuldades em
finalizar o trabalho de conclusão de curso, pois não havia entendido as correções que
sua orientadora tinha sugerido para ela e que se sentiu ainda mais desesperada
porque sua orientadora teria entrado de licença médica. Contou para o grupo que
buscou tutoriais na internet sobre como corrigir o trabalho e que ficou muito
desesperada quando soube do afastamento da orientadora, chegando a ir parar no
médico. Disse que havia começado a fazer terapia individual com Elaine (ego-auxiliar
do grupo) e que elas conversaram sobre esse processo de finalização, mas que ela
ainda estava muito nervosa com medo de não conseguir terminar e não conseguir se
formar. Jéssica estava ansiosa e agitada, falando rapidamente. A diretora convidou
então a participante para investigarem o que estava acontecendo com ela no palco e
ela aceitou.
Aquecimento Específico e Dramatização: Jéssica foi convidada a caminhar
pelo contexto dramático entrando em contato com aquilo que estava sentindo,
deixando emergir também cenas relacionadas ao processo de orientação.
241
Jéssica realizou essa ação e após alguns instantes caminhando pelo palco,
disse que só conseguia sentir desespero. A diretora pediu então que ela fizesse uma
imagem que traduzisse esse sentimento e Jéssica se lembrou da pintura “O Grito”. A
diretora pediu que a protagonista escolhesse um dos integrantes do grupo para ser
ela e a participante escolheu Aurora, que subiu então no palco. Jéssica concretizou o
sentimento de desespero por meio da postura de “O Grito” e então Aurora fez um
espelho da mesma. A diretora então pediu que Jéssica colocasse as mãos na imagem
representada por Aurora e “dessa voz” para a mesma:
Jéssica (como a voz da imagem O Grito): eu to paralisada não sei o que fazer...Eu estudei
cinco anos (chora bastante)...será que eu não vou formar? E agora? Quem vai me ajudar? Qual que é
a saída que eu realmente tenho? To cansada das pessoas falarem que vai ficar tudo bem e não ta
ficando tudo bem...eu não tô conseguindo mais...me ajuda...alguém me ajuda...”
A diretora propõe que as duas troquem de papel e então Aurora, como medo,
repete para Jéssica:
Aurora (no papel do medo de Jéssica): eu to aqui com medo, de ser considerada a chata da
faculdade, eu só queria fazer bem feito...
Jéssica: porque que você está procurando a coordenadora do curso? A orientadora de outras
pessoas, a ajuda de outras pessoas, sendo que você tem a sua orientadora e você deveria conseguir
fazer o trabalho é seu, você chegou até aqui vai fazer...
Jéssica: eu acho que você é chata mesmo (com a voz firme), se você estivesse numa situação
tão caótica assim, a coordenadora não iria falar para você ficar calma e esperar até semana que
vem...você ia encontrar alguém para te ajudar e se você não está encontrando e se a coordenadora
mandou você ficar calma é porque não está assim, porque você pode estar exagerando, sentindo
demais, sentindo muito mais do que realmente é...(silencia).
Jéssica: eu to acabada...não dou conta, to acabada, não sou inteligente igual as pessoas
acham que eu sou, eu não consigo fazer mais do que eu já fiz...pensar mais do que eu já pensei...
Jéssica: só ouvir...só ouvi-la e acolher...e ela pode também entender que as vezes do outro
lado eles estão achando que está tudo bem...mas eu não to bem...as vezes a (Helena/orientadora) está
pensando que está tudo bem...as vezes a coordenadora também...mas ela não.
Diretora: então vamos chamar só a Helena, para você falar com ela, pode ser? Quem pode ser
a Helena?
Jéssica: a Ingrid.
Jéssica: Helena desculpa, mas eu não consigo entender sua doença agora e eu preciso muito
da sua ajuda, preciso muito que você olhe para mim ou que pelo menos se posicione, responda minhas
mensagens, me diz que não vai dar, qualquer coisa, mas responde minhas mensagens, se você acha
que vai dar tempo me responde que vai dar, mas me responde, você não pode assim ficar doente, tirar
licença e não responder...eu to aqui...você pode não estar preocupada mas eu estou...eu to preocupada
o trabalho é meu...(silencia e para de chorar).
243
Helena: ela é assim, mais para baixo, cheia de problema...complicada, eu não quero ouvir ela,
muito chata.
A diretora destrocou Jéssica com Helena e após Jéssica voltar para seu lugar,
fez então um duplo da participante, dizendo:
Angélica (duplo de Jéssica): Helena eu me sinto muito pequena perto de você e rejeitada...você
me rejeita e não entende que eu quero fazer um trabalho bem feito, quero que seja o melhor trabalho,
eu preciso disso, simplesmente preciso e você não me ajuda a realizar o melhor trabalho, não responde
minhas mensagens, me ignora...eu me sinto rejeitada...e sem saber se meu trabalho está realmente
bom...
Diretora: então Jéssica, estamos aqui com você juntos e cada um vai te dizer o que gostaria
de viver junto no congresso de fortaleza, no futuro, depois da formatura...vamos fazer de conta que
todo mundo vai junto e cada um vai dizer o que gostaria de viver junto com você lá .
Tadeu: eu desejo compartilhar também uma noite bem gostosa depois de todos os trabalhos.
Aurora: eu desejo que a gente possa compartilhar uma noite estrelada e conversar
desprentesiosamente, compartilhando a alegria de viver, de estar lá...
Ingrid: eu desejo que a gente possa tirar várias fotos lindas para postar nas redes sociais e
provocar inveja né? A gente vai estar em fortaleza...
Anahí: eu não conheço lá, então gostaria de conhecer e compartilhar com vocês a alegria de
conhecer esse lugar novo, lindo, que a gente possa compartilhar muitas experiências boas...
Diretora: eu senti Jéssica que apareceu mesmo uma relação com a Helena distante, mas tinha
um medo seu, medo grande de fracassar, de fracassar...
Diretora: desde quando você começou a falar da cena, eu fiquei sentindo se não tinha um
sentimento de, ´eu sempre tenho que ter sucesso, eu sempre tenho que acertar , eu sempre tenho que
ser boa, eu não tenho direito ao erro´, que de certa forma todos nós carregamos...todos nós...então o
que é fracassar? Pode ser tanta coisa...pode ser não ser perfeito, pode não ser maravilhoso, pode não
ter o melhor TCC, o TCC nota 10, pode ser não entregar o TCC no prazo valendo 10...ou... A gente
passa a acreditar que ter êxito é entregar o TCC nota 10...a gente tem muito medo de não ser boa, de
não ter sucesso... ...e se a Helena não voltar semana que vem você pode recorrer à faculdade
novamente e solicitar outro orientador para finalizar no prazo, e poder brigar pelo seu 10....eu pensei
que você tem o direito de querer entregar valendo 10, pode brigar por ele
Jéssica: eu queria tirar 10...agora já não quero mais...só quero entregar e acabar...eu sinto que
eu sou tudo graças aos meus pais, eles me deram muito amor né? E eu tenho gratidão por isso...eu
quero ser alguma coisa boa pra devolver pra eles tudo o que eles me deram de bom entendeu? (chora)
“Eu estava fazendo o TCC com a Joyce, a gente estava sentando junto e fazendo sabe? Ela
estava me ajudando e eu estava ajudando ela, e a gente estava assim, ela ia na minha casa eu ia na
cada dela, e ela acabou... e entregou... e eu to feliz por ela ter acabado mas ao mesmo tempo eu to
assim...a gente se sentiu desesperada e se juntou...mas o desespero dela acabou e eu ainda estou
aqui no desespero...eu ainda não acabei...” (Jéssica, 5º ano).
havia entregado valendo 10 e ela ainda não sabia quando iria entregar, o que dava
medo de não conseguir 10, e não há formatura. O grupo permaneceu em silêncio e
após alguns instantes de clima tenso, Elaine, ego auxiliar, comentou sobre como
sentiu-se na realização de seu TCC, e que na época travou a coluna por ter ficado
muitas horas na frente do computador. Após a fala dela, a diretora interviu solicitando
que o grupo se colocasse também.
Anahí disse que gostaria de falar pois precisaria ir embora mais cedo.
Comentou que se identificou com Jéssica sobre a questão do TCC no que se refere
ao processo de orientação, pois está “fazendo sozinha” (sic). Contou ter conversado
com o orientador em junho sobre o início do trabalho e começou a escrever em julho;
então não conversava com o orientador há 2 meses. Contou brevemente sobre o
tema, dizendo que também se interessou em pesquisar o sofrimento psíquico nos
anos finais da graduação, havia realizado algumas entrevistas e no momento estava
finalizando a análise de dados para enviar o texto pronto para o orientador. Disse
ainda que não estava vivendo a angústia de ter de ganhar uma nota alta porque não
se importava mais com a nota; à medida que se propôs a desenvolver o trabalho em
seu ritmo. Anahí afirmou ainda que sua angústia maior é o prazo final, pois tem um
ritmo de escrita que considera “lento” e isso a tem deixado ansiosa. Além disso, tem
dificuldades com a formatação nas normas da ABNT.
“Mas essa coisa...eu demoro para escrever, eu já conversei com a Aurora aqui e a gente se
identifica, eu demoro para escrever, eu penso muito e por isso demoro tanto para escrever, o meu único
problema é esse, eu estou demorando muito a escrever e meu único medo é prazo mesmo, porque eu
quero me formar e tudo mais, então eu to vivendo nesse sentido de ter que ficar pensando no prazo de
terminar e quanto mais pressão parece que eu não consigo fluir sabe? Então eu me identifiquei muito
com a Jéssica nesse sentido está muito pesado, tem que acabar, tem que entregar...mas pra mim eu
estou fazendo um bom trabalho e não estou nem aí se alguém falar que tá ruim porque para mim está
ótimo eu to ficando muito feliz com o que eu estou fazendo então eu só me sinto mal mesmo com essa
pressão do prazo, normas da abnt, porque para mim o conteúdo está bom mas aí eu tenho que
preocupar de perder nota por uma palavra, uma coisa que não está alinhada, então isso para mim é
terrível...” (Anahí, 5º ano).
Quando Anahí terminou de falar, Ícaro e Ingrid se ofereceram para ajudá-la com
a ABNT, afirmando que sabiam formatar o trabalho nas regras e manusear as
ferramentas do Word. Anahí agradeceu, despediu-se do grupo dando um beijo em
cada um dos presentes e foi embora.
Em seguida, a diretora perguntou quem mais gostaria de falar e Tadeu
começou contando para o grupo qual professor que está o orientando e os
participantes brincaram que ele “estava em uma situação difícil” (sic), riram bastante
247
e o clima se modificou. Tadeu recomeçou a falar, dizendo que até a semana anterior
não tinha tema para o trabalho, pois tentou encontrar com o orientador nas férias e
não foi possível. Contou que fez o projeto no fim de semana antes de entregar e na
segunda feira de manhã, dia da entrega, o orientador corrigiu e deu um feedback
positivo que ele poderia entregar. Contou ainda que pediu orientação de leitura para
o orientador e ele disse que tinham “tempo ainda para pensar nisso” (sic), portanto
estava tranquilo.
“Ai nisso eu já vejo que vou ter eu me virar muita coisa sozinho também sabe? Então ve a
Jéssica assim eu já pensei no meu futuro...(risos)” (Tadeu, 4º ano).
Tadeu disse ainda que o que mais chamou atenção na dramatização foi a
relação da protagonista com os pais, pois ele identificou que quando não está
sentindo-se bem com ele mesmo, por algum conflito, distancia-se dos pais e não
aceita ajuda. Ingrid cortou a fala de Tadeu dizendo que identificou o mesmo
movimento nela.
Depois de alguns instantes de silêncio, a diretora pediu para Aurora comentar
como havia sido participar da dramatização.
Aurora compartilhou com Jéssica que se sentiu emocionada em participar da
vivencia e conhecer mais sobre ela e sua história, e que ficou tocada pela emoção
muitas vezes em cima do palco. Devolveu para Jéssica que sempre a admirou na sala
de aula e que tomou muitas vezes a colega como modelo de estudante: dedicada,
disciplinada, participativa e sempre admirou isso, então conhecer a dor que ela vive
por sempre se cobrar muito foi importante para Aurora aproximar-se mais dela como
pessoa. Com relação ao TCC, Aurora disse que tem certeza que é uma das mais
“atrasadas” da turma, pois se deu conta que estão em agosto e ela ainda está fazendo
a transcrição dos dados; percebeu que não entrou em desespero ainda porque está
fazendo o que pode e consegue. Disse que gostaria de deixar o TCC para realizar no
ano seguinte, mas que sua mãe não autorizou, pois não teriam condições econômicas
de adiar a formatura. Então ela decidiu que faria o que fosse possível de fazer, sem
entrar em desespero. Aurora disse ainda que precisava falar com o grupo sobre a
relação com seu pai, pois acessou essa relação de maneira intensa quando estava
no palco. Compartilhou um pouco de suas questões familiares e o grupo ouviu
atentamente. A participante se emocionou dizendo que tem sentido falta de colo, e em
um movimento espontâneo, o grupo todo se levantou e foi até a participante, dando-
248
lhe um enorme abraço coletivo. Foi um momento bonito, silencioso, com intensa carga
emocional mobilizada. Depois de dois minutos, os integrantes foram se soltando e
voltando para seu lugar. Aurora agradeceu, dizendo sentir que carrega um “buraco”
dentro dela e o grupo é muito importante para lhe dar apoio.
Após essa pausa, a diretora brincou com os integrantes do grupo que cada um
teria um minuto para falar e o grupo se descontraiu, dizendo que estavam se sentindo
como no programa de televisão intitulado “Big Brother”. Depois de muitos risos,
Andressa pediu para falar, dizendo que se identificou muito com Jéssica e chorou
bastante ao longo da vivência, pois também sempre se sentia desesperada com
relação aos trabalhos da faculdade e que se sentiria muito frustrada se não pudesse
entregar o seu TCC valendo nota 10, à medida que se esforçou muito ao longo dos
anos para ser uma aluna excelente. Percebeu também realizando o projeto de TCC o
quanto é solitário o processo de escrita e que apesar de ter uma boa orientadora, que
dá muito suporte, descobriu que é um processo solitário pois o orientador tem muitas
outras atividades e tem um tempo reduzido para cada aluno. Disse que entendia
Jéssica pois muitas vezes gostaria de ter uma resposta pontual do orientador e essa
resposta costumava demorar para vir.
Quando Andressa terminou de falar, silêncio no grupo e a diretora perguntou
para Ingrid como ela estava. Ingrid disse que se sentia uma pessoa “ansiosa” por
natureza e que o foco de sua terapia individual tem sido essa ansiedade por buscar
muito a perfeição. Disse que se identificou muito com Jéssica pois tem a mesma
orientadora que ela, e já percebeu grandes dificuldades na relação com Helena.
Contou ainda que demorou para finalizar seu projeto e terminou no final de semana
anterior à entrega, pois estava desanimada com o que produziu, e quem a ajudou a
terminar foi Jéssica. Relatou que a orientadora delas estabeleceu uma relação de
distanciamento com as alunas e que essa postura transmitia pouca segurança para
os orientandos. Disse que durante a dramatização, sentiu que também estava
perdendo a confiança em Helena, mas que se deu conta também do quanto ela
mesma é muito exigente consigo e com os outros, por buscar muito a perfeição e se
frustrar quando não tem suas expectativas atendidas. Quando Ingrid terminou de falar,
Aurora disse que precisava ir embora para atender na clínica da faculdade e se
despediu do grupo.
A diretora pediu que Ícaro também falasse dele, como estava, antes de
encerrarem o encontro. Ícaro contou que conseguiu encontrar um tema e elaborou
249
seu projeto de TCC, mas quando mostrou para seu orientador, ele disse que não
poderia orientá-lo por não trabalhar com a temática. Dessa maneira teve que mudar
de orientador e ainda estava procurando quem pudesse ajudá-lo. Contou para o grupo
que sentiu um grande alívio por ter encontrado um tema para trabalhar que realmente
fizesse sentido para ele e que após sofrer muito com a falta de tema, agora estava
mais aliviado, precisando somente de um orientador. O grupo se descontraiu e riu
bastante do modo como Ícaro contou seu desligamento do orientador anterior. Após
a fala de Ícaro, Ingrid disse que entendeu a relação de orientação como uma relação
de amor e ódio, e todos riram bastante.
A diretora convidou para encerrarem o encontro e os participantes ainda se
agitaram, comentando sobre os painéis de apresentação que deveriam desenvolver
obrigatoriamente, para apresentar na semana da Psicologia e o quanto isso gerou
revolta nos alunos, pois eles teriam de pagar do próprio bolso pelo pôster que não
gostariam de fazer. A diretora pediu que contassem mais sobre o assunto na semana
seguinte. Os estudantes se despediram da unidade funcional e foram embora,
encerrando o encontro.
“E ali pela frente a esperar pela gente o futuro está” (Aurora, 5º ano).
“Eu vejo por experiência própria, no terceiro ano eu não sofria nada do que eu sofri a partir do
quarto e do quinto ano, então eu acho que a gente traz coisas que não batia com ela, que ela não se
identificou” (Anahí, 5º ano).
A diretora devolveu para o grupo que uma das falas de Bruna foi justamente
que se tivesse mais gente do terceiro ano, talvez se sentisse mais representada e
menos solitária no contexto grupal. Ingrid comentou que se sentia triste com a saída
de Bruna e que concordava com Anahí, pois percebeu que Bruna foi se isolando por
não compartilhar das experiências do quarto e quinto ano. Exemplificou retomando a
sessão anterior, em que o tema protagônico foi a escrita do trabalho de conclusão de
curso e a relação de orientação, e que esse seria um tema distante do estudante do
terceiro ano. Disse ainda que percebia Bruna muito fechada no grupo, principalmente
nas últimas sessões, e a única vez que se lembrou de algo compartilhado pela colega
foi quando ela relatou as dificuldades familiares que estava vivenciando.
254
Ícaro percebeu de modo diferente, dizendo que para ele existem dificuldades
no terceiro ano de faculdade, mas que talvez as dificuldades de Bruna fossem mais
relacionadas à família do que aos problemas acadêmicos.
Depois que todos se colocaram, a diretora convidou os participantes para se
olharem com atenção, partindo da experiência do desligamento de Bruna do grupo,
para se perceberem nos diferentes grupos que faziam parte e como estavam sentindo
a participação deles nos mesmos. Pediu ainda que os integrantes fechassem os olhos
e realizassem três ciclos de inspiração-expiração profunda e em seguida,
identificassem como estavam se sentindo naquele momento no grupo de
universitários de Psicologia. E que cada um dissesse uma palavra, ainda de olhos
fechados:
Isis- confortável
Jéssica- diferente
Aurora- partilhando
Anahí- inteira
Tadeu- reflexivo
Ícaro- calmo
Ingrid- pensativa
Após a leitura, que foi feita pela diretora, os participantes tiveram alguns
instantes para escreverem livremente as sensações. Em seguida, a diretora solicitou
que escolhessem uma palavra para compartilhar, dentre todas as que tivessem
registrado. Tadeu foi o primeiro a se colocar, seguido pelos demais:
Tadeu: satisfação
Anahí: identificação
Ícaro: empatia
Ingrid: identificação
Jéssica: desamparo
nunca ter sido amadas, mas não podem ser ridículas” (sic), pois precisam manter a
imagem que têm e por isso escondem a “verdade” de como realmente se sentem, as
pessoas preferem se esconderem a se revelarem. Percebeu que o autor do poema
propôs o contrário, preferia ser amado, ser traído do que não ser ridículo nunca. Tadeu
disse ainda que gostou muito de um dos trechos do poema e pediu licença para ler, e
a diretora o incentivou. Tadeu então repetiu: “queria ouvir de alguém a voz humana
que confessasse não o pecado mas o infame” (sic); em seguida, disse que sentia que
às vezes as pessoas falam mais sobre violências vivenciadas do que da própria
covardia, e que não assumem quando erram, quando foram covardes e também
provocaram algo visto como ruim. Ícaro interrompeu Tadeu dizendo ter destacado
exatamente o mesmo trecho. Os dois silenciaram e Aurora começou a se colocar,
repetindo o trecho “eu que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas”. A
participante revelou que se identificou com esse trecho por acreditar que uma
dificuldade que ela vê nas pessoas é em assumir a própria parte mesquinha e podre,
a sombra, pois todos querem mostrar somente a própria luz, e que ela percebia que
quanto mais “perfeita quer ser mais mata coisas dentro de si mesma” (sic).
Isis começou sua fala lendo o trecho “ai estou farto de semideuses onde é que
há gente no mundo, onde é que há gente no mundo” (sic). Disse que se lembrou de
uma supervisão de estágio na faculdade em que percebeu que quando pegam os
“casos” para atendimento, estão muito focados nos “casos”, e não percebem o quanto
o que os pacientes trazem eles também vivem, em casa, na família, nas próprias
vidas:
“Me lembrou até assim, o quanto na psicologia, a gente pega os casos e a gente está tão focado
nos casos tem hora que a gente fala assim ´mano isso a gente tem em casa a gente faz isso todo dia´
e a gente de repente está olhando para aquilo como se fosse anormal, porque a gente se dedica tanto
a ver o caso e tem a parte importante, mas o que me remeteu foi a isso, sabe? Porque patologizar
tudo? Porque está todo mundo neurótico precisando de ser curado? Ser curado de que? Até que ponto
só precisa da cura porque a sociedade adoece? Até que ponto se produz doença para produzir cura?
Precisa achar uma imperfeição para ai você ser a pessoa mágica que tem a fórmula de como curar...me
veio um pouco disso...porque talvez não é doença não...talvez é só ser gente...Onde é que há gente
no mundo? Então me veio isso...”(Isis, 5º ano).
A fala de Isis mobilizou Tadeu e Ingrid, que começaram a falar ao mesmo tempo
sobre o estranhamento que têm a respeito de algumas teorias psicológicas, que na
percepção deles se situam muito fora da vida, propondo interpretações muito
elaboradas teoricamente, mas que eles não entendem funcionando na vida cotidiana.
A diretora interveio pedindo que falassem um de cada vez, para que pudessem
257
escutar uns aos outros. Tadeu então retomou uma discussão que teve recentemente
na sala de aula com um colega em função desse tema, pois ele já notou que muitos
colegas querem ter a verdade sobre um assunto a partir de uma teoria e isso o deixava
angustiado, porque ele considerava importante aprender a olhar o contexto, de forma
sistêmica, e muitos discursos na faculdade, segundo ele, priorizam somente o
psicológico ou somente o social, dicotomizando a complexidade da experiência
humana.
O clima no grupo era de descontração e soltura, e Anahí começou a se colocar,
compartilhando com o grupo que a leitura do poema e a discussão estavam
provocando nela uma reflexão sobre a importância da simplicidade na vida:
“Essa coisa de simplicidade me lembrou uma banda que eu gosto bastante que eu me inspiro
nas letras assim que eles são bem poetas e chama Brasa, e eles lançaram um álbum agora e tem uma
música que a primeira frase, me lembrou assim a questão da simplicidade mesmo, que eles falam
“amor não tem sinônimo, alma não tem gênero, poder não é virtude, e a vida é sopro efêmero”, então
essas quatro frases assim eu acho sensacional...elas falam por si só, porque parece que tudo fica muito
complicado e eu acho legal porque por exemplo a palavra amor pra mim parece idiota isso mas faz
pouco tempo que eu entendi acho o significado da palavra amor, o que que é o amor mesmo...porque
parece tantas coisas assim e ai eu fiquei pensando o que é realmente amar, de todas as maneiras
possíveis, acho que é poder ser livre, com simplicidade mesmo” (Anahí, 5º ano).
“Eu acho que eu estou sentindo esse desamparo há um tempo mas eu acho que eu dei um
grito assim com essa história do TCC, eu não sou uma deusa, eu acho que o TCC esfregou na minha
cara que eu não sou mesmo e eu acho que até esfregou que eu sou uma bosta e eu comecei a ver
isso e eu me senti suja, desamparada” (Jéssica, 5º ano).
258
A participante continuou dizendo como está refletindo sobre todo esse processo
e podendo se descobrir mais a partir do mesmo, que não é perfeita, mas também que
não gostaria de se sentir tão “suja” (sic). Os participantes riram do comentário de
Jéssica e a diretora perguntou se alguém ainda gostaria de compartilhar algo antes
de prosseguirem. Ícaro leu uma frase do poema: “confessasse não o pecado, mas a
infâmia”, e “indesculpavelmente sujo” e disse que sentiu grande empatia e
identificação com o poema, por revelar dores humanas de forma tão simples, e que
gostaria de lê-lo muitas outras vezes, pois estava sentindo muito impacto.
Em seguida a diretora perguntou para Ingrid como ela estava se sentindo, pois
estava muito calada. Ingrid disse que havia gostado muito do poema, e que escolheu
a mesma frase de Aurora, “eu que tenho sentido a angústia das pequenas coisas
ridículas” (sic) e também a frase “então sou só eu que é vil e errôneo nessa terra?”
(sic), porque percebeu que as pessoas usam máscaras e ela se questionou muito na
sua vida os porquês disso:
“Todo mundo usa mascaras sabe? E porque que a gente usa? Eu até escrevi uma frase, você
se coloca no mundo ou o mundo molda você? Até que ponto a gente deixa o mundo moldar a gente ou
a gente se coloca nele? Porque as duas coisas, mas até que ponto que vai isso para cada um, e eu,
até pra mim foi interessante a hora que você falou o tema e trouxe a poesia eu pensei, foi um tema da
minha semana porque teve uma atividade no estágio, na supervisão, que cada um tinha um papel nas
costas e as pessoas escreviam características e impressões sua, e muita gente escreveu “alegre e
divertida” no meu, e eu falei assim nossa que ponto que eu to passando pro mundo, eu pensei muito
essa semana, a que ponto eu me coloco no mundo, tipo eu me mostro alegre e divertida? As pessoas
me veem assim mas eu não acho, internamente eu não estou alegre e divertida como vocês estão
vendo por fora, ai a professora até perguntou, pediu para eu falar alguma coisa do meu inferno e então,
o que seria, e eu respondi que tem dia que minha vontade é chegar na sala ir para o fundo da sala e
me colocar em posição fetal, mas acho que não seria interessante pra todo mundo me ver nessa
posição então o que a gente faz? A gente sorri, então eu fiquei pensando, de que jeito que a gente se
coloca no mundo, eu acho que ao mesmo tempo que a gente se coloca a gente também é moldado,
coloca mascaras” (Ingrid, 4º ano).
A participante disse ainda que estava vivendo questões que a deixaram muito
longe de se sentir alegre e divertida, e que tem sentido tristeza e solidão. Em seguida,
silenciou e Jéssica imediatamente pediu a palavra:
“Gente posso falar uma coisa nada a ver mas eu preciso falar, é que aconteceu uma coisa
comigo essa semana, pode não ter nada a ver, mas eu queria contar pra vocês, pra vocês me ajudarem
a pensar, porque um dia pode acontecer com vocês, o meu paciente eu tenho um paciente ele tem
doze anos e ele falou assim pra mim ó: “você está muito triste e desanimada, se você não voltar a ser
quem era antes eu quero trocar” e eu assim eu nunca esperava que eu fosse ouvir isso de um paciente,
eu esperava ouvir qualquer coisa menos isso, e eu to ligando pra isso ainda que ele falou, porque
parece que a gente deposita assim uma coisa no nosso terapeuta, a gente nem sabe muito bem o que
é, mas a gente deposita, e enquanto a Ingrid falava eu entendi, porque eu fiquei com raiva de você
Angélica, não sei porque, mas fiquei” (Jéssica, 5º ano).
259
palco, a fim de fazer um solilóquio. Depois de dois minutos, Tadeu foi o primeiro a se
manifestar, dizendo:
“Eu não tenho que agradar os outros, eu não tenho porque ter receio de ser eu mesmo” (Tadeu,
4º ano).
“Porque não ser só mais um na multidão? Talvez ser único é ser comum, não precisa tanto
esforço, não precisa tantas metas, não precisa tantos tantos, só precisa viver, sentir, sentir o prazer de
estar onde está, de estar fazendo o que tem que ser feito, mas de fazer também o que se gosta, o que
ser quer, o futuro é muito longe para viver ele agora, e o presente é muito belo para deixar para depois”
(Isis, 5º ano).
Enquanto Isis realizava o solilóquio, a participante Ingrid começou a chorar e a
diretora subiu ao palco e foi até ela, permanecendo ao seu lado, com as mãos em
suas costas, até ela se acalmar. O grupo também esperou uns instantes até que ela
se acalmasse, e depois recomeçaram a fazer os solilóquios. Jéssica começou a
pensar alto, de olhos fechados, assim como os demais participantes, em sequência:
“Esse buraco que tem na vida, que tem no palco, ele só assusta, porque não dá para ver o que
tem lá embaixo, mas talvez se abrir, se abrir muito, dá para ver, talvez não, mas ele é assim” (Jéssica,
5º ano).
“Eu preciso me importar um pouco menos com o que as pessoas acham, e falar um pouco mais
o que eu quero” (Ícaro, 4º ano).
“Vocês poderiam parar de falar, falar tanto? Ou pelo menos me deixar em silencio, porque o
silencio é o que eu tenho a oferecer com relação a isso...não é só porque vocês sentem raiva que eu
tenho que sentir também” (Aurora, 5º ano).
“Eu não sou como você, eu não sou como minha irmã, eu sou da forma que eu sou, eu não
tenho que mudar para você me aceitar, para você fazer o que você quiser da sua vida, é a minha vida,
minhas escolhas, sou eu que faço, não preciso te agradar, não preciso mentir para te agradar, as suas
verdades não são as minhas verdades, o que você quer para mim não é o que eu quero para mim, e
não adianta você fazer pirraça, você fazer graça, você pode cortar o que você quiser da minha vida, o
que você quiser, você não vai mudar, não vai mudar quem eu sou, eu sou assim, se você não pode
aceitar eu não posso fazer nada quanto a isso, não posso sentir da forma que você quer que eu sinta,
não posso agir da forma que você quer que eu aja, não sou você, não sou a minha irmã, eu sou eu,
somente eu” (Ingrid, 4º ano).
“E aí aqui foi bom...por isso que eu quis o afeto que eu falei né de todo mundo se abraçar...eu
quis para a gente sabe? Eu me senti um pouco mais energizado também com esse abraço de todo
mundo...”(Tadeu, 4º ano)
“Essa liberdade da criança seria muito importante a gente resgatar isso” (Tadeu, 4º ano).
Quando Tadeu terminou, a diretora se dirigiu para Ingrid e pediu que ela falasse
um pouco como estava, visto que havia se emocionado bastante em cima do palco.
Ingrid contou que o tema do aquecimento mexeu muito com ela, pois não estava
sentindo-se bem há alguns dias e tomou consciência de que esse sofrimento é antigo
e a acompanha desde criança; e notou o quanto o mesmo é oriundo de sua relação
com a mãe.
263
“Minha mãe sempre comparou muito eu e minha irmã, tipo a vida inteira, até hoje sabe, parece
que todas as escolhas que eu fiz nenhuma agradou minha mãe...de fato não agradou...ela me pergunta
porque eu tenho que ser diferente em tudo (...)e isso está me atingindo tanto sabe? Não tem mais como
eu relevar essa situação, não tem mais como eu tentar ser uma coisa que eu não sou porque se eu for
o que eu sou isso vai prejudicar ela de certa forma...ela não vai lidar com isso, então eu fico com isso
dentro de mim (...) Outro dia eu perguntei para ela, ´mãe quantos anos você acha que eu tenho´? E
ela respondeu ´cinco filha´... então é difícil, e eu chorei tudo isso em cima do palco” (Ingrid, 4º ano).
Depois que Ingrid finalizou, a diretora perguntou como Anahí estava, e ela
compartilhou que gostou muito do encontro e viu uma beleza no palco, quando todos
estavam brincando como crianças e ela observou uma beleza na cena, todos se
soltando e brincando, mas que ela não conseguiu se soltar, participar, somente
observou a beleza do momento. Disse que observou mais a cena do que vivenciou, e
que somente essa ação foi suficiente para fazê-la sentir muito melhor do cansaço que
está sentindo na vida e que gostou de participar do encontro. Quando Anahí finalizou,
Isis compartilhou com o grupo que tem sentido “ansiedade do futuro” (sic), e a cena
que lhe ocorreu no palco foi ela sentada em sua cama com o notebook no colo
pesquisando “mil sites de emprego, mil sites de concurso, lendo edital de concurso,
eu faço isso todos os dias” (sic).
“Todos os dias é essa rotina, eu tenho que entrar no site e ver todas as oportunidades de
emprego, emprego de mecânico que não tem nada a ver, eu leio todas as páginas, entro no site de
concurso, vejo todos os concursos, vejo a distância de Franca até as cidades, tenho uma neura com
isso e o que eu senti hoje no palco, eu to leve, porque tipo assim eu to preocupando com uma coisa
que mesmo que eu consiga, tem algo que eu não vou conseguir adiantar, eu não formei! Eu posso
querer adiantar tudo, mas eu não sou psicóloga, então como que eu to querendo adiantar o serviço se
eu não sou ainda? Então tipo assim, eu fiz meu máximo, eu faço o meu máximo, as coisas vão aparecer,
mas não precisa ser agora, eu não sou psicóloga, eu não sou formada, para que estou querendo
emprego, eu preciso formar primeiro... Então eu senti isso no palco, calma sabe, porque não viver o
aqui, agora? O solilóquio fez muito sentido sabe? O futuro está muito longe para viver agora e o
presente é tão belo para deixar para depois...e é o que eu tenho feito todos os dias da minha vida,
deixado o presente para depois para ficar vivendo no futuro, então eu preciso de paz, o que eu preciso,
que eu vi no palco, é que eu preciso de paz, paz comigo mesma, paz de calma, não precisa ser deus,
pode ser gente, pode ser gente, eu quero ser gente agora” (Isis, 5º ano).
Após a fala de Isis, a diretora perguntou para Jéssica como ela estava e se
gostaria de se colocar. Jéssica disse que estava sentindo muito cansaço, mas que
entendeu no palco “os buracos” que tem na sua vida, e que o solilóquio despertou
nela a necessidade de encontrar forças para se levantar e reagir a essa situação que
está vivendo, a frustração com o trabalho de conclusão de curso e todas as
idealizações que criou na relação com a orientadora e até mesmo na faculdade. A
diretora perguntou se ela havia descoberto porque estava sentindo raiva dela e
Jéssica respondeu que “ainda não, mas melhorou” (sic). Quando Jéssica terminou de
264
falar, Anahí pediu desculpas para o grupo pois precisava ir embora, despedindo-se
dos colegas. Depois que ela saiu, a diretora pediu para Aurora compartilhar o que
estava vivendo e ela começou falando que percebeu ao longo do encontro que o
cansaço que sentia em relação à faculdade não pesava para ela, e o que a tem
deixado muito exausta na vida é a relação com a sua família, e que se pudesse sairia
de casa e tiraria férias do grupo familiar. Percebeu também no palco o quanto a
dinâmica de sua família e todos os conflitos que vivenciam atrapalharam bastante o
seu envolvimento e desempenho acadêmico. Quando Aurora terminou de falar, a
diretora comentou brevemente sobre a beleza das vivências reveladas por todos
nesse dia. Agradeceu a presença de todos nesse dia e então encerrou o encontro.
“Eu não tenho que agradar os outros, eu não tenho porque ter receio de ser eu mesmo” (Tadeu,
4º ano).
O que significa ser eu mesmo? O quanto tenho liberdade para ser eu mesmo,
assumindo meus desejos; podendo errar e não ser perfeito; o quanto tenho me
cobrado corresponder às expectativas sociais e a busca por aceitação?
Saindo do encontro desse dia, essas questões ecoavam para a unidade
funcional. A proposta de leitura do poema como iniciador intelectual parece ter
promovido disposição no grupo para se olhar de forma a interrogar-se, questionando
a permissão própria de ser livre para simplesmente “sofrer pelas coisas ridículas”, “
sentir-se indesculpavelmente sujo”, confessar a infâmia e o erro e não somente o
sucesso. Se no contexto grupal discutiram as diferentes leituras realizadas acerca do
poema de Álvaro de Campos, buscando problematizar as diferentes máscaras
utilizadas nas relações sociais que impedem de certa forma, uma vida livre, autêntica;
no contexto grupal, simplesmente dançaram juntos, resgataram brincadeiras infantis,
266
é difícil habitar o corpo, por sentir insatisfação com o mesmo, e que em geral é crítico
consigo mesmo, sentindo dificuldade em se cuidar no nível corporal.
Andressa se colocou em seguida, dizendo que estava tranquila ao longo do
relaxamento e que foi prazeroso realizá-lo. Contou para o grupo que estava tranquila
na faculdade e conseguindo realizar suas atividades sem correria, o que estava
fazendo-a sentir-se bem.
Jéssica disse que chegou tranquila e começou a realizar o relaxamento de
forma rápida, mas foi acalmando-se devagar e gostou muito de realizar a atividade,
pois foi para ela um momento de contato consigo mesma e descanso.
Ingrid também relatou dificuldades de concentrar-se no relaxamento, pois
estava dispersa e ansiosa, pensando nas atividades do dia e na viagem que fará para
sua cidade no fim de semana. Contou que somente ao final do relaxamento é que
entrou em contato com seu corpo, sentindo-se mais presente e percebendo que
esteve ansiosa ao longo da semana inteira, mas que isso não se relacionava com
questões acadêmicas, mas com questões de relacionamento amoroso. Ícaro, Tadeu
e Isis riram e brincaram com a colega sobre esse tema.
Ícaro se colocou em seguida, contando que também se sentiu agitado ao longo
do relaxamento e por isso lutou para fazer todos os exercícios de forma lenta,
buscando encontrar um novo ritmo corporal, diferente da agitação. Isis então disse
para Ícaro que ele não parecia estar agitado “no externo” e sempre aparentava estar
calmo. Ícaro respondeu que “por dentro” (sic) sempre se sentia agitado e que na sala
de aula nenhum colega gostava de sentar-se próximo a ele, devido à agitação
corporal, mas que no grupo conseguia centrar-se mais em função dos exercícios de
relaxamento.
Depois que Ícaro terminou de falar, a ego auxiliar Elaine comentou que também
estava agitada ao realizar os exercícios e depois que ouviu os outros se deu conta
que também demorou para “chegar” (sic) no corpo, pois teve um dia bastante agitado.
Enquanto Elaine se colocava, a campainha tocou novamente e Tadeu levantou-se
para abrir a porta. Aurora então foi a última participante a chegar, após 1 hora de início
do encontro. O grupo se dispersou: Tadeu e Ícaro levantaram-se e buscaram café,
Andressa disse que iria beber água. Enquanto isso, Aurora entrou na sala e se
justificou pelo atraso, contando que estava apresentando trabalho no evento e por
isso só conseguiu chegar após o início da sessão.
269
Título da Escultura: “Até quando a gente acha que está sendo livre a gente não
está”.
O grupo apresentou uma cena, e não uma escultura, em que os quatro
integrantes permaneciam sentados no palco, em círculo, conversando sobre a tarefa
dada pela diretora, concretizar em uma escultura o que conversaram. Após debaterem
sobre o que iriam fazer, chegaram à conclusão de que não queriam fazer a escultura
proposta pela diretora e silenciaram. Após alguns instantes de silêncio, Tadeu
comentou: “é isso gente”, e todos começaram a rir. A diretora então pediu que a plateia
dissesse uma palavra acerca de como a cena havia reverberado neles.
Jéssica- perdida
Ícaro- eu me vejo muito neles também, mas as vezes não...hoje eu não estou assim...
Isis- acolhimento
Aurora- a gente espera da vida e a vida espera de nós um pouco mais de paciência
272
“Foi tão legal hoje...foi só acontecendo...foi chegando um...eu juro para vocês, eu não ia vim,
eu estava decidida a não vim, eu tinha que esperar o meu pai...mas aí várias vezes eu olhava no grupo
do zap aquele tanto de mensagem e eu pensei não eu vou...eu quero ir...ai até briguei com meu pai e
vim, eu queria estar aqui...ai eu fiquei mandando mensagem para o Ícaro se eles já estavam vindo,
pensava como que eles não foram ainda, olha a hora... fiquei pensando nisso...mas enfim eu pensei
eu vou, vou viver, minha psicóloga não falou para eu viver, então, vou viver...ai eu vim, e depois as
meninas foram chegando também, foi acontecendo...e na hora que a gente foi fazer a escultura, a
gente ficou um tempão pensando se a gente fazia mesmo o que a gente queria fazer ou se a gente não
fazia...aí a gente pensou assim ´esse é o sentido, fazer o que a gente quer fazer, aí a gente fez e sei
lá, parece que encaixou tanto sabe? E de tudo o que eu passei hoje e esses dias, mas principalmente
hoje assim, aqui sabe, me veio muito forte isso, que a gente tem que fazer o que faz a gente bem, que
faz a gente feliz, e eu acho que eu vim aqui justamente porque eu fico bem aqui, eu me sinto feliz aqui
e foi esse o principal motivo de todo mundo ter corrido tanto pra vim” (Ingrid, 4º ano).
participantes riram bastante e Isis ainda comentou que por isso escolheram realizar a
apresentação primeiro, antes do outro grupo, pois se descessem do palco sentiriam
“culpa” por não terem preparado a escultura.
“E foi assim eu nunca senti isso na vida porque eu sempre sinto muita culpa, né, muita
responsabilidade, eu sou uma pessoa que a responsabilidade me persegue...pra mim é muito forte a
questão da responsabilidade e ali não sabe, tipo assim, não vamos fazer...mas foi uma liberdade com
tanto amor que até o Tadeu questionou um pouco, a gente entrou em crise existencial...se a gente não
estaria sendo rebelde, mas não, foi uma liberdade com tanto amor porque esse espaço já proporciona
isso, vocês duas já proporcionaram isso e a gente sabia que seria acolhido do jeito que a gente está,
então ter tido a oportunidade de viver isso foi muito bom, ser acolhido do jeito que você está, eu to
imensamente leve, imensamente feliz, feliz, leve, livre, eu acho que vai ficar marcado para o resto da
minha vida esse momento, que eu pude dizer não e ser tão livre e tão amada e acolhida no meu não e
no meu estado de espirito” (Isis, 5º ano).
Tadeu e Ingrid bateram palmas ao final da fala de Isis e Ingrid gritou: “uhuuu”.
Ingrid, Tadeu e Isis divertiram-se bastante. Aurora permaneceu sorrindo, mas
silenciosa.
Tadeu complementou a fala de Isis dizendo que estava sentindo o oposto da
colega, pois ao contrário de Isis, não costuma se preocupar excessivamente com o
modo de realizar as atividades acadêmicas e não faz, na vida, aquilo que não tem
vontade ou não vê o sentido. Ele se diverte em dizer para o grupo que se estranhou
naquele momento, quando Isis propôs que não “fizessem nada”, ele sentiu-se
desconfortável, à medida que sentiu vergonha por não seguir a orientação da diretora,
com medo de magoá-la. Mas conforme a cena se desenrolou, ele compreendeu que
o movimento do grupo era de rebeldia e desejo de libertação.
“A gente estava falando disso, sabe, ter que fazer as coisas, eu falei no grupo que apesar de
estar fazendo coisas que geralmente eu gosto e que me descansa, está 90% obrigação e 10% de
prazer, sabe? Às vezes eu penso, ´ah sobrou um tempinho aqui e eu quero relaxar, então tenho que
relaxar agora, aí eu vou e coloco uma música e não relaxo, porque tem a obrigação de relaxar, então
não to vivendo isso” (Tadeu, 4º ano).
Tadeu disse ainda que a imagem apresentada pelo outro grupo suscitou muita
leveza nele, e que fazia tempo que não se sentia tão solto e descontraído como os
colegas se revelaram na imagem:
“A imagem deles ficou muito forte pra mim, porque eu gosto muito disso, da impressão, não sei
dizer com uma palavra, mas pra mim ficou a imagem de alguém muito tranquilo, tipo assim, na beira
da praia olhando o por do sol tá ligado, uma coisa assim, na praia, relaxado, olhando o mar, pensando
em nada, aquela coisa de leveza, de vazio sabe? Tranquilo...e eu falei nossa que saudade de me sentir
assim sabe? Faz muito tempo que eu não sinto isso e eu gosto muito dessa sensação, mas que faz
tempo que eu não sei o que é isso... fico nessa angustia de ter que fazer as coisas e não estar vivendo
nada direito, tudo tem que fazer por obrigação e aí não tem tempo pra fazer as coisas que eu quero
fazer, as coisas que eu gosto de fazer não tem mais o mesmo gosto sabe? A gente até discutiu, a Ingrid
274
perguntou, será que o tédio é o contrário do tesão, porque eu falei isso, eu não tenho tesão, tenho tédio
de estar fazendo”. (Tadeu, 4º ano).
“A semana passada, eu fiquei muito reflexiva sobre o feedback que você deu pra gente da
Bruna, de como ela estava se sentindo no grupo, e aquilo me tocou muito porque parece que você falou
de mim em um outro grupo que eu vivo fora daqui, mas ao mesmo tempo tem esse grupo, em que eu
me sinto totalmente incluída, e daí eu fiquei assim muito reflexiva” (Jéssica, 5º ano).
Continuou sua fala dizendo que estava sentindo falta de Felipe e Anahí, e que
não queria que o grupo terminasse sem eles, pois gostava muito do processo do grupo
e queria continuar vivenciando o mesmo, e se saíssem mais participantes ela sentiria
muito a perda. Além disso, comentou que tinha gostado muito do encontro desse dia,
principalmente do que Isis havia dito sobre a possibilidade de se sentir muito livre nos
encontros do grupo; e que gostou muito de fazer a escultura com o subgrupo dela
(Ícaro, Jéssica e Andressa):
“Mas eu me senti de coração cheio...que bom que eu pude estar aqui, que bom que eu pude
me expressar, que bom que eu pude estar com eles, a gente conversou e riu muito e o Ícaro até fez
terapia comigo e com a Andressa” (Jéssica, 5º ano).
A diretora esperou Jéssica terminar de falar e devolveu para o grupo que ainda
não tinha conversado com Felipe para saber se ele iria continuar, mas que como ele
não tinha vindo em nenhum encontro em agosto, não deveria retornar. Tadeu e
Jéssica pediram que a diretora conversasse com Felipe para ver se ele estava “dentro
ou fora” (sic).
Tadeu disse que sentia todos muito vinculados no grupo, com exceção de
Felipe, e que mesmo Anahí que costumava faltar mais, ele se sentia mais próximo a
ela no grupo. Ingrid, Jéssica e Isis começaram a falar ao mesmo tempo sobre o
comprometimento com o processo grupal e a diretora pediu que falassem um de cada
vez. Isis então comentou que no começo do grupo vinha mais pela curiosidade para
saber as vivencias que a diretora iria propor, para aprender mais sobre psicodrama, e
que agora ela sentia muito diferente, pois sentia que tinha um grupo para participar e
que se vinculou com todos, e que cada falta é sentida como uma oportunidade de
estarem juntos que se perdeu. Disse ainda para Andressa:
275
“Igual hoje...a Andressa...toda vez que eu vinha ela faltava e ela vinha eu faltava, então a gente
não estava se encontrando ai eu vi ela a semana inteira na faculdade e até falei pra ela, ‘hoje você vai
no grupo´ e ela falou que vinha então foi bom encontrar ela aqui, porque passou de ser o grupo da
Angélica para ser o nosso grupo, então eu fico esperando que todo mundo vai estar aqui, porque eu
quero partilhar esse momento aqui, eu sei que a minha semana vai finalizar assim com todo mundo
que está aqui, então acho que muda essa percepção de vim pra ver o que vai acontecer, que vivencia
que vai ser, eu quero estar com essas pessoas, por isso que a gente sente quando alguém não vem”
(Isis, 5º ano).
Em seguida, Andressa pediu para falar, contando para o grupo que poderia ter
ido embora desde quarta-feira, à medida que não estavam tendo aulas, mas ficou para
participar do grupo na sexta-feira. Relatou ainda que gostou bastante desse encontro,
pois apesar das angústias apresentadas, sentia que estavam mais verdadeiros uns
com os outros e ela gostou do clima de liberdade e leveza que prevaleceu ao longo
de todo o encontro. Andressa ressaltou que percebeu que o que estavam precisando
nesse dia era “dar essas risadas gostosas” (sic).
Após a fala de Andressa, o grupo permaneceu em silêncio por alguns instantes.
A diretora esperou e devolveu para o grupo que iria insistir para marcar um horário
com Felipe para conversarem. E também respondeu para Jéssica que entendia a fala
dela naquele momento como uma devolutiva para o grupo de quanto todo o processo
foi importante para ela, o quanto sentiu-se incluída e pertencente. Jéssica concordou
com a diretora e se emocionou.
Após mais alguns instantes de silêncio, a ego auxiliar se colocou, dizendo:
“Eu acho que foi bonito demais o grupo de hoje...cada um com a sua verdade, acho que, eu
fiquei olhando para os dois grupos e fiquei pensando que era a representação da dualidade que habita
em nós né? Nós somos isso, acho que são dois polos que habita em nós, um dia um pouco mais calmo,
um dia um pouco mais confuso, então do jeito que foi, com a naturalidade que foi, foi bonito demais
hoje, acho que hoje o grupo pulsou, como se estivessem dizendo ‘ nós somos um grupo’, como a Isis
falou (Elaine, ego auxiliar).
Aurora contou brevemente que fez muito esforço para vir ao grupo nesse dia e
que mesmo chegando tão atrasada fez muita questão de vir, pois sempre se
considerou uma pessoa reservada e mais fechada nos grupos, mas que nesse
processo grupal, com aquelas pessoas, conseguiu se soltar, relaxar, brincar, se
entregar.
“Eu estava pensando aqui, que o que eu senti aqui hoje, acho que o meu ser procurou este
estado, essa vibe em tantas coisas, em coisas assim (risos) e aqui naturalmente eu recebi esse estado,
de espirito, de SER, sem precisar me machucar ou...naturalmente...então sou muito grata, e é bom,
essa viagem é boa”, eu lembrei de uma frase e eu mudei ela um pouco para finalizar, aquela frase que
a alegria só vale a pena quando compartilhada, do filme na natureza selvagem, eu pensei que a vida
só vale a pena quando compartilhada né? Acho que fica isso pra mim, obrigada gente” (Aurora, 5º ano).
A diretora disse para Aurora que se emocionou ao ouvi-la, pois percebeu que
ela chegou silenciosa e retraída e conseguiu um pertencimento grupal muito bonito.
Aurora agradeceu ao grupo pelos “band-aid” e a diretora afirmou que a fala de
encerramento dela trazia muito beleza para o momento. Perguntou então para Ícaro
se ele gostaria de dizer algo para o grupo e ele disse que estava se sentindo muito
bem, que tirou a semana do evento da Semana da Psicologia para descansar. Contou
ainda que passou a semana pensando muito no encontro anterior, sobre como está
assumindo seus diferentes papéis nos pequenos grupos de que faz parte, o quanto
se permite ser livre ou não e que tudo isso mexeu com ele. Agradeceu à diretora por
ter dado o “poema em linha reta” e que todo dia lê o mesmo para decifrá-lo na própria
vida. Disse para o grupo que tinha vindo vestindo “bermuda” (sic) pela primeira vez,
porque está vivendo um movimento de se libertar, dado que sente vergonha do próprio
corpo, mas que resolveu encarar isso ao longo da semana em pequenos detalhes.
Ícaro então agradeceu ao grupo pelo encontro anterior, dizendo que foi o encontro
mais importante para ele, em nível de profundidade. A diretora então propôs que
encerrassem dizendo uma palavra:
Ingrid- felicidade
Isis- leveza
Jéssica- enraizando-se
Andressa- Encontro
277
Ícaro- calmaria
“Eu tô imensamente leve, imensamente feliz, feliz, leve, livre, eu acho que vai ficar
marcado para o resto da minha vida esse momento, que eu pude dizer não e ser tão
livre e tão amada e acolhida no meu não e no meu estado de espirito” (Isis, 5º ano).
“Fico nessa angustia de ter que fazer as coisas e não estar vivendo nada direito, tudo tem que
fazer por obrigação e aí não tem tempo pra fazer as coisas que eu quero fazer, as coisas que eu gosto
de fazer não tem mais o mesmo gosto sabe? A gente até discutiu, a Ingrid perguntou, será que o tédio
é o contrário do tesão, porque eu falei isso, eu não tenho tesão, tenho tédio de estar fazendo” (Tadeu,
4º ano).
das diversas e muitas demandas, mas também pelo modo como desempenham os
papéis de estudantes?
Andressa explicou que gostava de vir, sentia-se bem e aprendia muito nos encontros.
A diretora questionou se daria para ela identificar o que havia aprendido de forma mais
marcante e Andressa contou que aprendeu “a estar com o outro, a estar num grupo
mesmo” (sic), pois na sala de aula tinha dificuldades de relacionamento com alguns
colegas. Contou que sentia dificuldade na relação com uma das participantes do grupo
de pesquisa, por não “gostar muito do jeito dela” (sic), e que aprendeu a conviver com
ela no grupo, e agora conversavam mais na faculdade. A diretora questionou como
seria para ela trabalhar esses conflitos no grupo e Andressa respondeu que não se
sentiria a vontade. Nesse momento, os demais participantes- Ícaro, Tadeu, Aurora e
Isis chegaram e bateram na porta, entrando juntos. Depois que todos sentaram-se,
em silêncio, a diretora começou explicando para eles sobre o desligamento de Felipe
e Anahí do grupo. Comentou com os participantes que seria importante finalizar o
processo da pesquisa, com um encontro de avaliação e que posteriormente poderiam
continuar realizando os encontros com quem estivesse interessado em permanecer
no processo grupal. Em seguida, pediu que os participantes comentassem como
estavam e como se sentiam em função do encerramento da pesquisa. Tadeu disse
que considerava importante finalizar o processo da pesquisa para poderem seguir
com os encontros com quem realmente estivesse com vontade. Aurora comentou que
considerava triste o encerramento do processo grupal, mas que sentia alívio por existir
a possibilidade de encerrarem a pesquisa e continuarem o grupo em outro formato, à
medida que ela gostaria de continuar vindo aos encontros. Isis se colocou em seguida,
afirmando que percebia como Aurora, que gostaria de continuar participando do
grupo. Contou ter entregado o trabalho de conclusão de curso naquele dia para sua
orientadora e que ver o seu trabalho completo mexeu muito com ela, pois ficou
emocionada por tomar consciência de que a faculdade estava realmente acabando,
restando apenas dois meses até a formatura. Destacou ainda que gostaria que o
grupo continuasse por mais tempo, pois no nível emocional sentia-se conectada com
todos e gostaria de continuar tendo esse espaço para dar suporte ao final da
faculdade. Disse que o processo grupal havia sido importante como espaço de
encontro com os colegas, dado que no quinto ano o grupo de sala de aula se
encontrava pouco na faculdade:
“Acho que vem o sofrimento de perder o espaço para falar sobre isso, porque eu não vejo as
pessoas da minha sala, cada um escolheu um estágio e a gente tem uma aula em comum, que é na
segunda, primeira aula da manhã, claro que eu chego atrasada, então tipo assim, é difícil assim, e aqui
282
é o contato que eu mais tenho, porque mesmo que são pessoas que não são da minha sala, mas eu
posso falar sobre isso, me sentir acolhida, então o grupo faz esse papel na minha vida, eu consigo
sentir algo que tipo assim, me dá esse suporte para sentir as questões da faculdade...e eu odeio fins,
não gosto de terminar nada, é um período de muita inconstância” (Isis, 5º ano).
Angélica (como Isis, fazendo o duplo): é muito triste gente, acabar a faculdade, acabar o grupo,
é muito triste...eu gosto muito de todo mundo...aqui eu encontro as pessoas... e tá acabando gente, a
faculdade tá acabando...vocês não sabem o tanto que eu aprendi, cresci e aproveitei essa faculdade...e
agora está acabando...
Isis observou o espelho e se emocionou. Depois que retornou para seu lugar,
permaneceu em silêncio, assim como o grupo. Após alguns instantes, a diretora pediu
que Isis comentasse como havia reverberado nela o duplo e Isis começou dizendo
que a faculdade de Psicologia sempre havia sido o sonho dela, e esse sonho se
realizou e que ela percebeu naquele momento o quanto se doou na faculdade para
fazer o seu melhor, inclusive o quanto se doou para sua turma e pode desenvolver
relações de amizade com muitas pessoas. Isis contou ainda que na semana anterior
fez aniversário e seus colegas realizaram uma festa – surpresa para ela, que
prepararam com muito carinho e teria sido um momento de grande emoção.
“Semana passada foi meu aniversário aí o pessoal fez uma surpresa para mim aí eu acho que
ficou mais forte ainda, porque parece que eles ficaram muito tempo preparando a surpresa para mim,
fizeram tão carinhoso assim, escreveram mensagens sabe? Então assim, ficou mais próximo ainda...
escreveram tanta coisa linda para mim e foi delicado assim, eles fizeram uma cartolina e cada um foi
escrevendo uma mensagem tão sensível sabe? Tão única pra mim, não aquelas mensagens prontas,
não, sabe, mensagens assim profundas, personalizadas, e aí agora ficou mais difícil ainda separar
deles, e eu acho que só agora eu consegui acessar essa emoção” (Isis, 5º ano).
“Vocês não sabem quanto amor eu sinto por vocês, o quanto essa surpresa foi importante...o
quanto é importante receber o carinho que eu sempre dei para a sala, apesar dos pesares...o quanto
foi essencial pra mim tudo isso... eu sempre tive muita ligação com a sala, eu sempre me doei muito,
me sentia na posição de elo de ligação da sala, então sempre que teve alguma coisa era eu que
resolvia, sempre que a sala se reuniu foi no meu aniversário, então é muita emoção receber de volta,
eu não esperava receber de volta, muita emoção” (Isis, 5º ano).
Angélica pediu para Aurora se colocar como “turma”, o que ela teria a dizer para
Isis. Aurora falou muito baixo e de forma emocionada, que ela merecia a homenagem,
pois sempre foi uma amiga especial, sempre disposta a ajudar e estar com todos, sem
discriminação, sem inimizades, e que ela era especial e merecia todo esse carinho.
Disse para Isis: “eu te amo” e finalizou. As duas se abraçaram e permaneceram assim
por alguns instantes, depois Isis disse para Aurora, ainda no papel de “turma do quinto
ano”: “obrigada vocês”.
Compartilhar: após a dramatização, o grupo silenciou por dos minutos e a
diretora pediu que Aurora retornasse ao seu lugar, para se desligar “do papel de
turma”, e a participante disse que era melhor, pois estava muito tocada pela vivência
realizada. Depois que Aurora voltou para onde estava sentada, a diretora pediu que
os participantes se conectassem com o que estavam vivenciando, percebendo como
estavam se sentindo em participar desse momento.
Após alguns instantes, Isis comentou que pôde perceber o quanto tem
dificuldade para receber afeto das pessoas e que após a dramatização, percebeu a
diferença em dar e receber, trocando verdadeiramente com os colegas.
Andressa pediu para falar, dizendo que toda a dramatização a deixou bastante
emocionada, porque desde o primeiro ano de faculdade conhecia Isis (Andressa está
no quarto ano, na turma anterior a Isis) em função de um programa de estágio que
participaram juntas. Andressa devolveu para Isis que nunca conheceu uma pessoa
tão humana e gentil como ela, e que aprendeu muito com Isis ao longo desses anos
284
de estágio, além de ter se espelhado muito nela, à medida que Andressa sentia
dificuldade em falar em público e Isis a auxiliou bastante.
Isis se emocionou em ouvir Andressa e agradeceu suas palavras, dizendo para
a colega que também aprendeu muito com ela no grupo de estágio de docência. A
respeito de finalização do processo da pesquisa, Andressa revelou que sempre
valorizou muito a oportunidade de participar do grupo, e que percebeu muitas pessoas
de sua turma “frustradas” (sic) por não terem a chance de participar do processo, que
foi feito por sorteio. Afirmou que foi uma oportunidade grande para aprender a “olhar
nos olhos das pessoas e trocar” (sic), a compartilhar realmente os sentimentos em um
grupo. Andressa citou uma cena vivenciada no grupo em que estavam em cima do
palco e fizeram um exercício de olhar nos olhos para dizer uma saudação: “que bom
que você está aqui”, e que esse momento era inesquecível para ela, pois pôde
desafiar sua vergonha em “olhar nos olhos do outro” (sic).
Por esses motivos, Andressa notou que apesar de todas as dificuldades que
teve para estar no grupo, aprendeu a falar com o outro, e não “do outro” (sic).
Percebeu que aprendeu o sentido da Relação Eu-Tu que aprendeu nas aulas de
Psicodrama da faculdade e que esse aprendizado foi significativo para ela. Nesse
momento, quando a participante fez esse comentário, Tadeu brincou com Andressa,
dizendo: “foi na aula hein?” (sic) e todos se descontraíram no grupo, rindo. Andressa
respondeu sorrindo para Tadeu que foi à aula, gostou da teoria e vivê-la no grupo de
universitários foi de grande aprendizagem humana.
O grupo silenciou por alguns instantes e então Ícaro pediu para falar,
comentando com Isis sobre a vivência dela naquele dia. Devolveu para a colega que
desde quando a conheceu na faculdade a percebeu muito determinada e talentosa,
pois eles já tocaram e cantaram juntos em alguns eventos na faculdade. Ícaro disse a
Isis que sempre sentiu uma energia positiva vindo dela, à medida que sempre a viu
disposta em ajudar as pessoas.
A respeito do processo grupal, Ícaro disse que havia sido desafiador para ele à
medida que sentia dificuldade em se colocar em “público” (sic), mas que aos poucos
foi ganhando confiança e sentindo bem-estar em participar, aprendendo a
compartilhar mesmo que um pouco de si mesmo. Comentou com o grupo que
reconheceu ao longo dos encontros sua dificuldade em falar de si mesmo, pois em
muitos momentos não sabia “bem o que estava sentindo” (sic) e não conseguia falar.
Comentou que já teve mais facilidade em falar de si e que foi se fechando ao longo
285
Andressa- conquista
Isis- reciprocidade
286
Ícaro- empatia
Aurora- a vida
Depois que todos disseram sua palavra, a diretora pediu que voltassem a
caminhar, deixando que essa palavra os conduzisse para outra busca, uma palavra
que identificasse o que aprenderam uns com os outros naquele encontro.
Isis- psicodrama
Andressa- amor
Tadeu- amor
Ícaro- conquista
Aurora- amar
“Acho que vem o sofrimento de perder o espaço para falar sobre isso” (Isis, 5º ano).
Ingrid- cansada
Jéssica-preocupada
Tadeu- expectativa
Anahí- esgotada
Isis- leve
Aurora- concentrada
Felipe- entregue
co-criação. Agradeceu a presença de todos, pois a proposta do dia era que pudessem
realizar uma avaliação do processo grupal vivido, a fim de encerrar o grupo
sociodramático com estudantes universitários e que havia a possibilidade de dar
seguimento, até o final do ano, com aqueles que estivessem interessados em
permanecer no grupo, em outro formato. Nesse momento, Ícaro chegou e pediu
desculpas pelo atraso, acomodando-se no teatro. A diretora comentou ainda que
considerou importante todos se encontrarem para trocar a respeito do processo
vivenciado, a fim de construírem juntos uma compreensão do que haviam vivido e
valorizarem o vínculo criado, assim como o afeto que circulava entre todos no grupo.
Além disso, era importante simbolizar o fechamento desse ciclo, antes de dar início a
outro. A diretora então convidou-os para falarem livremente como estavam
entendendo esse convite e o que avaliavam sobre a própria participação no processo.
Tadeu foi o primeiro a se colocar, após alguns instantes de silêncio. Comentou
que não sabia ainda muito bem o que dizer, mas que entendia que era importante um
ciclo se encerrar antes de iniciarem outro, pois ele entendeu que começaram a fazer
o grupo para falarem das vivências como estudantes e acabaram estreitando os laços
e criando intimidade para compartilharem questões mais pessoais:
“A gente já estava tomando outro rumo, já estava deixando de ser voltado só para institucional
e tal, e voltando mais para a gente, nossos sentimentos mais pessoais, então eu acho que é isso e foi
rico demais, eu quero continuar” (Tadeu, 4º ano).
Logo que Tadeu finalizou sua fala, Isis contou para o grupo que havia entregado
o trabalho de conclusão de curso na semana anterior e que no momento de escrita
dos agradecimentos teria vivenciado intensa emoção; e dentre todas as pessoas que
pôde agradecer pela sua conquista em se formar na faculdade, ela se lembrou muito
do grupo de universitários, pois compreendeu a importância do processo grupal para
ela, por diversos motivos. Primeiro, ela explicou para o grupo a importância de os
encontros terem ocorridos nas sextas-feiras:
“E eu compreendi que esse grupo né, o que que eu avalio dele, que foi um momento de poder...
é como se durante a semana, e foi muito legal ser na sexta, não sei se foi algo pensado ou se foi algo
espontâneo que surgiu, mas ser na sexta-feira fez todo sentido, não sei se o pessoal concorda assim,
tem um negócio que você já está muito cansado mas tem um negócio que você já viveu a semana
inteira, então chegar aqui é um lugar assim, que foi pra mim, essencial, é como se durante a semana
na faculdade, nos estágios, nas aulas, eu me enchesse, e enchesse ao ponto de supitar, e a hora que
chegasse aqui, e tipo assim, sabe quando estava tudo flutuando? E esse grupo era o lugar onde tudo
conseguia se encaixar, então é essa sensação que eu tinha que abria um tanto de gavetas, um tanto
de coisas durante a faculdade, talvez um conteúdo muito denso, um atendimento muito denso, uma
situação que acontecia lá muito assim e que ia ficando, abria lá um tanto de gavetas assim e aí de
repente quando chegava aqui conseguia integrar, então é como se na faculdade, durante o dia a dia
291
da faculdade, eu tivesse que desintegrar de mim, não sei se o pessoal também faz isso, né? Mas tem
alguns estágios que a gente tem, por mais que a gente vai com o coração tem hora que a gente não
dá conta, então a gente tem que desinstegrar um pouco, as vezes nas aulas; desintegra e tenta estar
ali só de corpo presente, tenta absorver o mínimo necessário e ai eu acho que esse grupo foi
fundamental assim, eu avalio como um suporte para poder integrar o que que eu vivi a semana inteira,
sabe, integrar o que que eu to fazendo na faculdade, então eu acho que foi fundamental, essencial, o
grupo, porque ele deu essa possibilidade de fazer com que a minha formação fosse minha, não fosse
só algo para fora” (Isis, 5º ano).
Isis comentou ainda com o grupo como, a partir das vivências que tiveram
nesse processo, ela ia conseguindo integrar e dar sentido ao que estava aprendendo
na faculdade:
“Porque igual a questão de nota, de prova, de fazer um trabalho, fazer um relatório, você fica
só colocando o que você tem e o que não tem para fora, e acho que aqui me ofereceu essa
oportunidade de trazer o que eu produzi para fora e também reconhecer que ainda tem um pouco aqui
que não foi tudo, o que que ficou disso, porque eu recebo um modelo de fora, elaboro dentro e produzo
outro e muitas vezes eu me sentia assim, quando eu produzia, que é o resultado no final de semestre
por exemplo, não sobrava nada em mim, porque eu joguei tudo para fora sabe? E aqui no grupo eu tive
essa chance de elaborar, de processar isso e perceber o que, daquilo que eu produzi, ainda estava
aqui, e o que que era essencial de tudo isso que eu fiz, que estava uma bagunça durante a semana
que as vezes só resultava em cansaço, esgotamento, o que que isso repercutia aqui na minha vida, o
que me fez é compreender pessoalmente e profissionalmente, assim, de uma forma integrada, acho
que a palavra é essa” (Isis, 5º ano).
E por fim, comentou com o grupo como foi entendendo suas vivências
acadêmicas e o sofrimento psíquico no interior de um contexto institucional específico,
a faculdade de Psicologia, a partir das vivências grupais:
Após a fala de Isis, o ego auxiliar pediu para sair por alguns instantes, a fim de
tomar uma medicação para dor de cabeça, e enquanto estava fora da sala, a
participante Jéssica disse que gostaria de compartilhar, mas que iria esperar o retorno
292
de Elaine. Todos concordaram e após um breve silêncio, Jéssica comentou com Isis
que havia escrito os agradecimentos do TCC antes de fazer o texto inteiro, e que
agora ao final havia mudado o que tinha escrito, dado o percurso difícil que realizou
para escrever o trabalho. Felipe brincou com Jéssica que ela era “adiantada” e Tadeu,
Ingrid e Isis se divertiram com o fato de ela ter se posicionado assim, modificando os
agradecimentos. Após o retorno de Elaine, ego auxiliar, para o contexto grupal,
Jéssica começou a se colocar:
“Eu queria falar assim que pra mim é muito difícil quando a gente fala de despedida porque eu
não gosto de despedir, acho que ninguém gosta mais eu não queria me despedir de ninguém
mesmo...mas eu também entendo que faz parte do processo e eu vou fazer isso mas não era o que eu
queria não sabe? Me despedir de ninguém...eu acho que esse grupo, pra mim, foi o único grupo que
eu pude existir de verdade, me vincular com cada um aqui e parece que em cinco anos eu nunca me
senti inclusa realmente e aqui eu me senti inclusa, com cada um, de cada jeito, de cada forma e sempre
tive muita vontade de vir aqui, de vir, de estar aqui, de aprender com cada um aqui, aprender comigo
aqui, então acho que foi de uma importância indescritível não tem como explicar como foi o grupo pra
mim e eu sinto que eu aprendi aqui, tanto no lado profissional, porque eu aprendi muitas técnicas de
psicodrama e ai você vê e você fala assim nossa parece que tem uma coisa mágica sabe? E eu aprendi
muito com isso, mas eu aprendi também muito comigo, com meu pessoal, com o grupo, de vínculo de
grupo mesmo que é diferente de outros vínculos que eu tenho na vida, que ou é de uma pessoa, eu e
outra pessoa, ou é eu e uma sala com quarenta pessoas, como é na faculdade, mas não um grupo
assim menor que a gente realmente tem um grupo que eu sempre senti isso aqui com todo
mundo....então eu aprendi demais aqui com o pessoal, comigo, muitas vezes ficou claro algumas
questões minhas, ficou no palco, sabe assim? Ficou na minha cara, não tinha nem jeito de eu não ver,
e eu aprendi demais aqui, quero demais continuar, mesmo que as vezes eu me desdobre em dez para
estar aqui na sexta-feira, mas eu venho, eu quero vim” (Jéssica, 5º ano).
Jéssica comentou ainda que concordava com Isis sobre a pertinência do grupo
ocorrer na sexta-feira, pois as vezes em que não houve os encontros grupais ela
sentia que a semana não terminava.
“Quando não teve o grupo, aquelas vezes que foi feriado, eu tive uma sensação de que a minha
semana não acabou, daí eu ficava assim vou esperar até a semana que vem para ter o grupo, dai
parece que acabava a semana, parece que da uma sensação de encerramento da semana, de um
rever o papel de universitário, ´o que que eu to fazendo da minha vida´, sabe? O que que eu to fazendo
na faculdade, o que que eu to fazendo como profissional? O que que eu to fazendo como estudante e
como pessoa, que é o que eu estava colocando aqui, então eu acho muito importante estar aqui, quero
muito continuar”. (Jéssica, 5º ano).
Jéssica finalizou sua fala dizendo para Anahí e Tobias que gostaria de
transbordar esse sentimento de pertencimento para os dois e que sentia muito o
desligamento deles. Quando Jéssica finalizou, novamente o silêncio, e a diretora
comentou que estava se sentindo como na música “Encontros e Despedidas”, de
Milton Nascimento. Cantou um trecho da música e foi seguida por Isis e Tadeu.
Jéssica disse que gostava muito da música e que iria ouvi-la depois. Novamente,
293
“Eu queria dizer que aqui no grupo eu habito verdadeiramente, espontaneamente, é, sendo
difícil ou não é sempre pra mim, eu sempre quero estar aqui, sou grata por isso, por cada um, pelo que
cada um trouxe...esse conjunto forma essa unidade, eu sinto uma unidade aqui, uma unidade que não
tira a unidade de cada um” (Aurora, 5º ano).
Aurora finalizou sua fala dizendo que como estudante sentia-se mal, pois
comparada ao padrão do bom aluno percebia-se distante, e que terminava o curso
procurando se convencer que fez o melhor que pôde, dada as suas circunstâncias
familiares:
“Esses dias teve uma frase que me veio que era assim, o máximo que eu posso é o mínimo
que é imposto...então estou tentando lidar com isso, porque engraçado que não é só na faculdade que
tem isso, na família também, então é na instituição social, te cobram produção a todo momento, e o
sentimento vira secundário e para mim ele é primário.” (Aurora, 5º ano).
Após a fala de Aurora, seguida por alguns instantes de silêncio, Jéssica virou-
se para Ingrid e disse: “fala como você está, eu quero que você fala” (sic). Ingrid
começou a rir e disse que estava sentindo-se perdida, sem saber o que falar.
Percebia-se confusa na vida e estava sem palavras. A diretora então pediu para ela
sentir o grupo, como poderia situar-se a partir daquilo que estavam conversando.
“É porque algo em mim mudou sabe? E isso me deixa muito emotiva então eu to emocionada,
to emotiva então eu fico quieta porque eu não sei lidar com as minhas emoções...se eu parar aqui eu
choro, mas eu não choro de tristeza, não choro uma dor, vou chorar é de felicidade, vou chorar é de
muita emoção e foi muito bom aqui pra mim” (Ingrid, 4º ano).
Ingrid compartilhou que o processo grupal foi de grande transformação para ela
e estava sem palavras para descrever o vivido, estava somente sentindo emoção. A
participante silenciou por alguns instantes e depois recomeçou:
294
“É que tudo que a gente viveu aqui foi um processo aqui, foi, mas foi um processo tão maior
que aqui, eu aprendi tanta coisa, tanto as pessoas que eu conheci, que a gente se aproximou, pessoas
que eu queria conhecer mais, que eu só olhava o rosto lá na faculdade, a gente passava reto, não
sei...tudo mudou sabe? Eu mudei e parece que aqui fez parte da minha mudança e eu olho isso e é
algo que me emociona aí eu não sei dizer o que causa em mim, é estranho, é mais ou menos isso”
(Ingrid, 4º ano).
Jéssica disse para Ingrid que compreendeu o que ela estava dizendo pois
também se sentia como ela. Ingrid silenciou novamente e quando retomou, disse:
“Eu acho que eu estou aprendendo a ser verdadeira com meus sentimentos, e isso aqui é
verdadeiro” (Ingrid, 4º ano).
Após a fala de Ingrid, Anahí pediu a palavra. Primeiro comentou sobre como foi
para ela participar do processo grupal, dizendo o que pôde perceber sobre ela mesma:
“Primeiro eu queria falar sobre o processo do grupo, que foi muito diferente assim pra mim,
pelo que eu me lembre assim foi realmente o primeiro grupo que acessou coisas minhas profundas
assim né? E não sei me acrescentou em tantas, é difícil nomear ou falar aqui no momento, mudou
muita coisa igual a Ingrid falou, mudou muita coisa em mim, é, desde o primeiro dia, quando a gente
saiu lá fora, andando pelo jardim, assim, tudo, as pessoas aqui, a gente iniciou eu já conhecia todo
mundo já mas esse grupo mais profundo a gente criou aqui e eu admiro todo mundo aqui, cada pessoa,
cada indivíduo aqui, cada serzinho com suas particularidades é bonitas assim teve uma vez que eu
estava muito cansada aqui, acho que foi uma das últimas vezes que a gente estava andando pelo
palco, que eu vim, e eu não conseguia fazer nada, eu estava muito cansada, muito esgotada, mas eu
estava bem em ficar observando cada um assim, como todos estavam se interagindo e eu me senti
muito bem” (Anahí, 5º ano).
Anahí compartilhou ainda que quando o grupo teve início, sentia-se bem em
compartilhar com todos as angústias da faculdade, sentia que compartilhava os
sentimentos tristes e alegres de ser estudante, mas recentemente se isolou no grupo
porque suas angústias, sua demanda emocional, não estão mais relacionadas à
faculdade e por isso sentia-se fora do grupo, pois tem vivido questões pessoais
“complicadas” e não está fazendo terapia individual.
“Só que, igual começou a proposta do grupo que foi essa questão da faculdade, que foi como
estava afetando a gente é, as nossas angustias e felicidades também trazendo aqui é eu sinto que isso
estava pegando muito, estava fazendo bem vir compartilhar vê que tinha pessoas que compartilhavam
dos mesmos sentimentos, só que mais para o final do semestre eu senti que para mim as minhas
angustias, a demanda já não estava sendo mais as angustias da faculdade, eu senti que eram coisas
próprias minhas, individuais, e eu já estava ficando fora do grupo já, eu estava começando a me isolar
e eu senti que eu tinha que voltar mais para mim, porque a dinâmica de um grupo é diferente de um
individual, e eu sinto que a minha demanda no momento é individual, porque são coisas que estão
pesando, muito em mim, e por mais que eu tenha criado um vínculo muito forte aqui com o grupo, são
coisas que eu acho difícil até mesmo para mim enxergar quem dirá em expor para um grupo, então eu
sinto que seria muito difícil para mim” (Anahí, 5º ano).
295
Anahí justificou para o grupo que por esse motivo não veio mais aos encontros,
e apesar da gratidão que sentia por todas as vivências que tiveram, estava em um
momento difícil de sua vida e com dificuldade de estar em grupo.
“Por mais que eu admire todas as coisas que eu passei aqui com o grupo, me fez muito bem,
eu vi que chegou um ponto que não dava mais, porque eu senti que minha semana inteira é voltada
para o externo, atender pessoas, ajudar pessoas, eu me sinto muito bem em fazer isso, mas parece
que eu to sempre voltada para fora, para fora, para fora, e chegava aqui eu já não conseguia me expor
muito e parecia que eu já chegava voltada para o outro, na dor do outro aqui então eu estava ficando
muito cansada, porque eu já ficava a semana inteira nessa dor e chegava aqui mais angustia do outro
quando compartilhava e parecia que eu estava voltando muito para os outros e nunca para mim, então
eu cheguei nesse momento que eu decidi parar, por mais que eu goste muito de todos eu vim explicar
porque que a minha demanda já não é mais para grupo” (Anahí, 5º ano).
Anahí afirmou ainda para os colegas que também não gosta de despedidas e
que vir ao encontro encerrar sua participação foi difícil, mas que ela considerou
importante em respeito ao percurso do grupo. A diretora devolveu para Anahí que
respeitava sua decisão e que entendia seu posicionamento, e que apesar de sua saída
demonstrou uma atitude de respeito e gratidão pelo grupo. Tadeu e Jéssica
devolveram para Anahí que foi muito importante para eles ouvi-la, Jéssica agradeceu
a colega pela coragem e compromisso com todos, afirmando que gostaria de dar um
abraço coletivo nela. Anahí sorriu para a colega e agradeceu.
Em seguida, Felipe pediu para falar. Contou para o grupo que tem tido
dificuldade em estar presente em todas as atividades da faculdade, principalmente
nos estágios e que percebeu que teve um ano em que “fugiu de tudo” (sic) e não quis
se conectar com nada, nem com ninguém. Compartilhou que apesar de todas as
pressões institucionais, ele vem percebendo que sempre conseguia “burlar” o sistema
e passar de ano, mais dessa vez está vendo de forma diferente e não gostaria de
terminar a faculdade com a sensação de não merecimento.
“Bom a hora que você falou que fazem 15 sessões que está completando hoje eu tive o mesmo
sentimento que vivi na quarta feira no estágio que eu fui assinar lá minha presença e eu olhei que no
mês de agosto eu tinha que comparecer lá duas vezes por semana e eu acho que eu fui lá três vezes
e ai eu to pensando aqui que nessas 15 sessões eu vim três ou quatro vezes e eu acho que o meu ano
foi bem assim, eu acho que eu estava querendo fugir de mim o máximo possível, não querendo conectar
com nada nem ninguém nem nada e quando eu pensava de vim aqui qualquer motivo era motivo pra
mim não vim, então alguém se alguém quebrava o carro eu ia ajudar, se minha mãe precisava ir em
algum lugar eu levava ela e não vinha, nenhum momento eu pensei ´não eu tenho a obrigação de ir lá,
e minha faculdade esse ano foi isso, foi uma fuga completa de tudo acho que a única coisa que eu não
fugi foi do estágio com a Isis, e eu estava pensando que nós todos reclamamos que a gente faz tanta
coisa na faculdade só porque é preciso cumprir tabela, precisa corresponder a certas normas internas
lá da faculdade, tem que ter tantas horas, tirar tal nota, e a faculdade, nossa eu me senti tão bem lá e
eu vou terminar assim fugindo? (Felipe, 5º ano).
296
“Eu sinto que eu não aproveitei os estágios como eu não aproveitei aqui o grupo né? Eu não
consegui estar aqui...embora quando eu vim, das poucas vezes que eu vim eu estive aqui, consegui
compartilhar e absorver o que cada um trazia, mas o vir pra cá era muito difícil pra mim, eu sabia que
eu ia vim ouvir de faculdade e tudo o que eu não queria era ouvir de faculdade, eu fugi de mim, até
quando você fala assim, para ver quem continua, nossa dá muita vontade de continuar de realmente
fazer parte dessa experiência mas assim como a Anahí no momento eu não to disponível para o grupo
igual o grupo merece, acho que é isso” (Felipe, 5º ano).
Quando Felipe finalizou, Jéssica disse que precisava dizer para ele o quanto
sentiu sua falta no grupo de universitários, apesar de nunca ter sentido falta dele nas
aulas da faculdade. O grupo se descontraiu e Tadeu exclamou: “nossa estava
bonitinho” (sic) e todos riram muito pelo modo como Jéssica falou com Felipe. A
diretora interviu nesse momento, pedindo para Jéssica comentar mais sobre porque
sentiu falta do colega no grupo.
“Eu senti falta da sua presença aqui, porque me traz uma compreensão do ser humano, de
questões muito pessoais, de uma compreensão e aceitação muito incondicional de cada um, e eu
precisava muito de você aqui, eu senti muita falta de você...e eu preciso te perguntar uma coisa, você
falou assim, que burla o sistema, mas como?” (Jéssica, 5º ano).
Tadeu riu do comentário de Jéssica e disse: “isso é tão natural” (sic). Felipe
disse que quando comentou sobre burlar o sistema estava se referindo a ir fazer uma
prova estudando um dia antes e tirar nota para passar, ou passar a noite escrevendo
um relatório um dia antes de entregar e que ele estava considerando que com esse
comportamento não aproveitou bem a faculdade, e que gostaria de ter aproveitado
melhor as aulas e os estágios. Tadeu emendou dizendo que tinha ido naquele dia
fazer uma prova lendo as anotações de uma colega e teria conseguido fazer a
avaliação com tranquilidade.
Jéssica respondeu que atualmente esse modo de Felipe ser na vida a tocava
demais:
“É isso que me toca em você...de alguma forma você me instiga porque assim, hoje tudo o que
quero é aprender uma forma de burlar todo o sistema e nunca mais sofrer” (Jéssica, 5º ano).
Felipe respondeu para Jéssica que está tentando aprender a não burlar tudo,
pois em alguns estágios gostaria de realmente vivenciar e aprender mais sobre os
conteúdos acadêmicos.
297
“Com certas coisas não dá para enganar a si mesmo e eu não quero me enganar agora que
chegou no momento final da faculdade, certas coisas que são muito importantes, igual essas matérias
que eu acho interessantes, gostaria de aprender mesmo que isso implique em fazer de novo” (Felipe,
5º ano).
Tadeu disse para Tobias que se identificava com ele:
“Eu me identifico muito com o que o Felipe estava falando, com esse jeito dele sabe? Eu acho
que tem muito a ver comigo também essa coisa tipo, eu também não me comprometo com muita coisa,
faço de qualquer jeito, sempre dou um jeitinho e consigo dar um jeito e tem hora que eu penso assim
‘nossa como eu queria tomar um pau, sabe’? Pra ver se eu aprendo, pra ver se eu mudo o meu jeito e
às vezes não muda e ai quando eu pego pra fazer alguma coisa que eu me forço assim e ai eu faço,
vou estudar e alguma coisa assim, eu penso ´veio porque que eu não fiz isso antes e ai eu fico muito
puto comigo mesmo...ontem eu fui ler os textos da professora pra prova de hoje, li um pouco e ai eu
fiquei assim, nossa que textos legais, eu gostei tanto, assunto interessante, psicossomática e eu pensei,
´porque que eu não li isso antes, com calma, para discutir na aula e aprender´? Mas eu nem estava
indo na aula direito, e se bobear nem tenho falta sabe? Está tudo certo e isso é horrível pra mim
também...é muito ruim” ((Tadeu, 4º ano).
Felipe então reafirmou que se sentia mal quando tirava 10, pois não se
considerava merecedor, haja vista que lê as anotações dos colegas horas antes da
prova, comentando que gostaria de ser diferente e se sentir merecedor da nota 10.
Tadeu comentou ainda como estava se sentindo indignado com os colegas de
sala, pois uma professora permitiu que fizessem uma avaliação em duplas e com
consulta ao material da disciplina e muitos colegas estavam pesquisando na internet
conteúdo da matéria, o que o deixou constrangido perante a professora. Felipe
rebateu que provavelmente até a professora achava desnecessária a avaliação
naqueles moldes e Anahí, Felipe, Tadeu, Aurora e Ingrid iniciaram uma discussão a
respeito do tema das avaliações.
Aurora então disse que gostaria de se posicionar sobre como via as avaliações
das disciplinas, pois percebia um certo exagero nas reclamações dos colegas de sala,
que muitas vezes reclamavam dos professores “somente para reclamar” (sic). Ingrid
concordou que a quantidade de reclamações dos colegas a deixavam irritada também.
“Eu não gosto de tanta reclamação sabe? Eu entendo que existem coisas que a gente tem que
reclamar mas tem coisas que eu acho que só porque a gente não queria que fosse assim a gente
reclama” (Aurora, 5º ano).
Tadeu deu um exemplo de um professor que desistiu de dar “boas aulas” (sic)
na sala dele, pois implicou com a sala devido à quantidade de reclamações. Anahí
acreditava, a respeito desse assunto, que ou estão na posição de vítimas ou de
contraventores do sistema:
298
“Mas eu acho que esse modo de ser assim da gente a gente aprende por conta do sistema, ou
a gente é a vítima, ou a gente está passando a perna para se sair bem, porque você é sempre a vítima,
você sempre está com tanta coisa para fazer, tanto trabalho, prova, enfim ai quando você tem a
oportunidade de sair bem, uma oportunidade de passar a perna, de burlar de certo modo, você vai e
faz, você não consegue ter um equilíbrio, todo mundo aprende a sobreviver assim no sistema” (Anahí,
5º ano).
“Eu acho que a faculdade passa muito conteúdo, muita matéria e não aprofunda muito em
quase nenhuma, é um semestre de uma matéria, um semestre de outra e não aprofunda em nada aí
eu sinto que você sabe um monte de coisa e não sabe nada, é o que eu acho, que eu sinto...agora
sobre a minha vida mesmo eu continuo sendo muito procrastinador” (Ícaro, 5º ano).
Ícaro afirmou ainda que todo o processo do grupo teria sido de grande
aprendizagem para ele e que gostaria de continuar vivenciando esse processo com
299
Aurora: “eu vejo cada um em si, eu vejo cada um com o outro, eu vejo as partes, depois eu vejo
o todo, eu sou o que sou porque somos todos juntos”.
Jéssica: “olha que bonito a gente aqui, falando com nossos botões e com o botão de cada um,
de cada cor e de cada jeito...e aprendendo a ser “ser humano”, só sentindo de peito aberto, que bom
que a paz seria, que bom que a paz será”.
Ingrid: “eu aprendi a dar liberdade aos meus sentimentos, quando eu dou liberdade aos meus
sentimentos, eu sou livre, e se eu sou livre eu sou fiel a mim mesma, então ser o que eu sou é ser
livre”.
Anahí: “eu aprendi a ter um olhar mais apurado da beleza interna de cada um”.
Tadeu: “eu aprendi a não colocar tanto peso nas coisas, que as coisas podem vim e eu recebo
elas e deixo elas fluírem”.
vezes “que bom que a paz seria, que bom que a paz será, que boa parceria essa aqui
que a gente está fazendo aqui nesse lugar”.
Em seguida, a diretora agradeceu a todos pela presença, pela disponibilidade
e disse que a presença deles havia tornado possível o processo de pesquisa e as
vivências de transformações possíveis. Agradeceu a entrega de todos ao processo.
Perguntou como gostariam de se despedir de Felipe e Anahí, e Jéssica sugeriu que
se dessem um abraço coletivo. Após alguns instantes no abraço, Felipe disse que
estava se sentindo como em um barco, balançando. A diretora pediu que todos
fechassem os olhos e se percebessem nesse barco, que estava prestes a aportar.
Após alguns instantes, abriram os olhos, começaram a se despedir com
abraços, descontraidamente. Desceram do palco e depois de cinco minutos ainda
conversando entre eles e com a unidade funcional, foram embora.
interação dos colegas muitas vezes proporcionou bem- estar e alívio do cansaço e
esgotamento.
Tema 7- Sentimento de desorganização perante as vivências acadêmicas
e dificuldade de participação no grupo
Felipe revelou para o grupo as dificuldades pessoais pelas quais estava
passando e que inclusive estavam atrapalhando sua frequência à faculdade, o que se
estendeu ao grupo, pois não se sentiu disposto a compartilhar e ouvir sobre vivências
acadêmicas.
Tema 8- Angústias suscitadas pelo comportamento procrastinador
Felipe, Tadeu e Ícaro reconheceram muita angústia quando procrastinam a
realização de atividades acadêmicas, revelando como se sentiam pouco
comprometidos e presentes com as atividades da faculdade, como ler os textos para
assistir às aulas e fazer as provas com antecedência. Apesar desse comportamento,
percebiam êxito nas atividades, conseguindo aprovação nas disciplinas mesmo
procrastinando. Revelaram dificuldade de organização para desempenhar as
atividades propostas no tempo estipulado pelos docentes.
Tema 9- Percepção do padrão de atuação reproduzido pelos alunos:
vitimização e contravenção
Jéssica questionou Felipe como ele conseguia burlar o sistema acadêmico e
ainda assim se sair bem, o que provocou uma discussão a respeito do modo de
atuação do papel de aluno. Aurora afirmou que percebia muitas vezes os alunos
reclamarem dos professores somente por reclamar e Ingrid concordou com a colega.
Anahí revelou a percepção de que os estudantes ou estão se colocando na posição
de vítimas do sistema educacional ou de contraventores, burlando o modo ideal de
realização das atividades. Nesse sentido, Isis argumentou que estava aprendendo a
fazer as atividades acadêmicas que mais aprecia com qualidade e sentido, pois já
havia entendido que não seria possível realizar todas as demandas acadêmicas desse
modo mais integrado.
“Mas eu acho que esse modo de ser assim da gente a gente aprende por conta do sistema, ou
a gente é a vítima, ou a gente está passando a perna para se sair bem, porque você é sempre a vítima,
você sempre está com tanta coisa para fazer, tanto trabalho, prova, enfim ai quando você tem a
oportunidade de sair bem, uma oportunidade de passar a perna, de burlar de certo modo, você vai e
303
faz, você não consegue ter um equilíbrio, todo mundo aprende a sobreviver assim no sistema” (Anahí,
5º ano).
experiências e fazendo com que sua formação fosse para ela mesma. Devolveu para
o grupo que todo aquele espaço havia sido importante para ela integrar sua vida
acadêmica e problematizar o sofrimento vivido, mesmo que às vezes não houvesse
resoluções rápidas para o mesmo. Jéssica concordou com Isis e reafirmou a
importância do processo vivenciado para ela, e que sentiria muito a falta dos encontros
grupais. Aurora também se colocou de forma a avaliar seu processo no grupo, dizendo
ter percebido como conseguiu habitar espontaneamente esse espaço, e que percebeu
o quanto as individualidades foram respeitadas ao longo do processo.
Ingrid estava emocionada e reafirmou a importância do grupo para ampliar sua
percepção a respeito de si mesma e do que estava vivenciando como aluna, mas
também como pessoa, extrapolando suas dificuldades nesse papel, pode também ser
perceber em outras dimensões de sua vida. Ícaro revelou como foi desafiador
aprender a falar de si e se expor no grupo, pois muitas vezes, teve dificuldade de
definir o que estava vivendo e sentindo. O grupo permitiu que aprendesse mais sobre
ele mesmo, a elaborar suas questões pessoais, mesmo que silenciosamente.
A revelação de Jéssica para Felipe, de que sentiu muito a falta dele nos
encontros grupais, pois gostaria de ter aprendido mais com ele, provocou uma
discussão no grupo acerca das diferentes possibilidades de ser estudante
universitário, externalizando dificuldades, dúvidas, anseios, o que foi problematizado
por Anahí como a possibilidade de estarem no papel de outras maneiras, não como
vítimas ou contraventores do sistema educacional. Nesse sentido, Isis revelou uma
conquista realizada ao longo do processo: conseguir problematizar a vida acadêmica
de forma a realizar as atividades com sentido e, por esse caminho, revelou como o
grupo de universitários se constituiu em um espaço, em sua percepção, para dar
vazão aos problemas acadêmicos, mais do que para resolvê-los.
E foi em um movimento terno e alegre que o décimo quinto encontro chegou
ao final, permitindo que todos expressassem de que maneira aquele espaço havia
contribuído para o processo de formação e enfrentamento dos problemas acadêmicos
e do sofrimento psíquico, que, ao se revelar, pôde também se transformar.
305
“E foi bem forte ver também é a questão do tocar a si mesmo como o Tadeu e a Anahí falou
porque ééé, o jeito que eu tenho lidado comigo mesma, como estudante também, tem sido algo bem
destrutivo assim né... eee eu acho que até para o estudante a gente tem que ter paciência com a gente
mesmo não se autocobrar tanto, entender seu tempo e eu não tenho feito isso, então ser estudante pra
mim tem sido difícil e poder me tocar e me sentir com afeto, porque eu senti afeto por mim mesma aqui
foi muito importante pra mim é...e associar éé no jeito que eu to lidando comigo mesma como estudante
então eu fiz essa associação” (Aurora, 5º ano).
“E a faculdade de psicologia é muito, bom eu não fiz as outras, né? Mas eu acho que é muito,
precisa ser assim, né? Não tem como você passar incólume a ela, só com as teorias e aprender uns
negócios...nossa, se você não viver o negócio e eu acho que é muito isso, não tem jeito de você ser a
mesma, eu vejo isso lá na faculdade, todo mundo assim, e você mesmo, você mudou durante a
faculdade e agora tem que aceitar, ver o que é essa mudança, ter uma compreensão disso, porque é
muito, você vê, é tanta vivência, tanto desafio você lidar com outras pessoas, nossa é muito, te tira,
cada dia, assim, cada semestre, te tira uma pele e fica aquela pele nova, meio sensível assim, mas que
vai virar casca que vai virar outra coisa, mas é realmente, sei lá, eu acho que a faculdade é muito foda,
muito foda” (Felipe, 5º ano).
315
muitas vezes emergir, mas nem sempre puderam ser trabalhadas com profundidade,
conforme a demanda do grupo naquele encontro/sessão. Fica evidente, nesse
sentido, a demanda dos estudantes de Psicologia pelo atendimento psicoterápico a
fim de trabalhar questões pessoais que emergem durante o curso, conforme também
discutido por outros autores (ANDRADE et al., 2016; OSSE, 2013).
Como o contato com os diversos conteúdos acadêmicos suscita diferentes
transformações nos alunos, parece fundamental um espaço de escuta no contexto
acadêmico que se abra para dar lugar à integração das múltiplas formas de viver e
singularizar aquilo que é aprendido. Atenção ao modo como os estudantes vão
processando a aprendizagem e integrando-a à própria vida; afinal, se novos modos
de ser são produzidos, tais percursos de experiências, como mostram os dados da
presente pesquisa, não são vivenciados sem sofrimentos e emoções que reviram os
estudantes, os colocando em um fluxo contínuo de interrogação de si, de busca por
novas composições e modos de ver a vida, o mundo e a si mesmo. É desafiador, mas
se bem encaminhado, pode gerar crescimento. Na mesma perspectiva, Pellá e
Magnabosco Martins (2018), acreditam que o contexto universitário promove, além da
formação acadêmica, profissional e intelectual do aluno, a formação de sujeitos, de
modos de viver, de vidas; dizendo de outro modo, são vidas em formação. E nesse
sentido, vale questionar como a universidade tem contribuído para aspectos do
desenvolvimento pessoal dos alunos, especificamente no que se refere a espaços de
promoção de saúde mental e de fortalecimento da autoestima, de uma diferenciação
de si mesmo e compreensão dessa transformação.
se decidir entre Psicologia e outro curso e acabou optando pela mesma. Os três
participantes revelaram satisfação com a escolha realizada, apesar de que para
Felipe, havia certa ansiedade a respeito da futura atuação profissional. Nesse sentido,
Jéssica e Felipe revelaram a ansiedade que sentiam com a proximidade do final do
curso e as preocupações acerca do futuro profissional, pois emergiram dúvidas se
seriam capazes de assumir a profissão e encontrar um caminho de atuação
profissional. Esse sentimento já havia sido revelado, de modo incipiente, no início do
sétimo encontro, quando comentaram sobre a sessão de fotos para a formatura e
como essa se constitui em uma vivência dissociada, indicando a importância de
cuidado com as vivências de término experimentadas ao final do curso. Jéssica e Ícaro
compartilharam as vivências contraditórias experimentadas ao final do processo de
formação, em que parecia se misturarem a produção do trabalho de conclusão de
curso com as expectativas relacionadas ao futuro profissional. A escolha do TCC
apareceu como um momento que provoca ansiedade e sofrimento psíquico e de certo
modo parece se entrelaçar com as incertezas sobre o futuro profissional, em que já
se questionam o que farão como “psicólogos”.
As vivências reveladas pelos estudantes podem ser compreendidas na
perspectiva apresentada por Gondim, Bendassoli e Peixoto (2016), que compreendem
o processo de construção da identidade profissional exigindo um papel ativo do
estudante, embora seja fundamental o suporte oferecido pela universidade na
construção desse papel. Quando os estudantes estão mais próximos do final do curso,
apresentam preocupações com as reais possibilidades de futura inserção no mercado
de trabalho e nesse sentido seria importante as ações de suporte desenvolvidas pela
universidade, a fim de facilitar na definição de metas de carreira e no desenvolvimento
da identidade profissional. Seria importante o estabelecimento, nas universidades, de
espaços de reflexão acerca dos conhecimentos técnicos e as habilidades humanas
legitimadas no contexto social como própria à determinado grupo profissional,
permitindo que os jovens estudantes se apropriem desse conhecimento, a fim de
reconhecerem e se sentirem seguros a respeito das próprias características fortes que
vão oferecer condições de exercício do papel profissional. Dentro dessa perspectiva,
o domínio de um “corpo de conhecimento teórico e técnico é um elemento chave, e a
identificação afetiva com o que se crê poder fazer e ser está na base da identidade
profissional” (IDEM, IBIDEM, p. 226).
321
Essa identificação afetiva com o que se crê poder fazer, destacada pelos
autores, aparece como um fator determinante para o que estudante esteja fortalecido
no momento da saída da universidade, e a influência de professores e supervisores é
significativa nesse processo, assim como o modo de relação que estabelecem com
estudantes tendo em vista a futura atuação profissional:
“Eu vi uma coisa que eu não sei se tem muito a ver mas é que me deu muita vontade de fazer
o que ele fez...e que eu lembrei...eu lembrei de uma história, um rapaz aqui do Brasil, e ele trabalhava,
estudava e tal, aí um dia ele foi passar as férias na Tailândia e aí a mochila dele sumiu, ele ficou um
tempão procurando, perdeu a passagem de volta e não voltou para o Brasil, aí ficou procurando,
procurando, aí descobriu que tinha sido um macaco que tinha pegado aí achou e até então, o pessoal
lá acolheu muito bem ele, então ele precisava de alguma coisa para viver e ele foi dando aula de
português para o pessoal lá e aí ele está lá até hoje, já faz quase cinco anos que ele mora lá na
Tailândia dando aula de português e morando em frente à praia gente” (Ícaro, 4º ano).
“Então o Ícaro falou para mim que a palavra dele foi grupo eee ele me falou o grupo porque na
semana passada na nossa sala na quinta feira a gente comemorou os aniversários do mês na sala pela
primeira vez eee... é comemorou e nesse dia levaram bolo salgadinho teve nossa, colocou muitas
músicas tal todo mundo participou né (...) é durante a aula, então o Ícaro falou para mim que naquele
dia ele sentiu realmente o grupo que agora a nossa sala é um grupo que ele viu a sala como um grupo
mesmo e que agora ele está se sentindo melhor né, mais com ele não com a situação isso né?
(Andressa, 4º ano).
estágio, e por não ajudar a colega na elaboração das atividades a serem propostas
nos encontros. Isis disse ao colega que também percebia dificuldade dela em
“esperar” o tempo do colega, pois como ele nunca se manifestava, ela sempre tomava
a dianteira na organização das atividades. Puderam refletir sobre o modo como
estavam se relacionando para desenvolver a atuação no estágio e encontrar uma
possível saída para a dificuldade de ambos, que seria a de que em cada semana um
deles desenvolveria o trabalho interventivo, assumindo a liderança e contando com o
auxílio do outro. Essa negociação foi possível ao final do encontro do grupo de
pesquisa e pareceu promover um clima de aceitação e compreensão mútua dos
colegas, o que pode ter favorecido um modo mais cooperativo para a relação de
trabalho no estágio e a superação das dificuldades que estavam vivendo como dupla
no referido estágio.
As interações sociais podem assumir um caráter mais competitivo entre os
alunos, o que na visão de Gomes, Comonian e Araújo (2018) provoca relações sociais
de reclusão e exclusão no contexto acadêmico, derivados do não acompanhamento
ou correspondência aos padrões e processos educacionais desenvolvidos pelos
professores, perpassados pelas dinâmicas institucionais e pedagógicas
estabelecidas. Os participantes da pesquisa pertencentes à turma do quarto ano,
revelaram como percebiam a competitividade entre os alunos em função dos trabalhos
realizados em sala de aula. Se durante a quarta sessão Andressa demonstrou
satisfação imensa com a realização de atividade grupal desenvolvida no contexto de
uma disciplina, sendo bastante elogiada pelos colegas no grupo, Ingrid revelou na
quinta sessão como ela mesma idealizou um desempenho alto para si mesma no
desenvolvimento desse mesmo trabalho de grupo, sentindo-se frustrada por não ter
sentido o mesmo compromisso por parte das colegas:
“As duas elas me ajudam muito mas em outros trabalhos, qualquer outra matéria que você
pensar elas fazem de tudo entendeu? Exceto se fala da Fabi...elas não gostam de nada que é técnica
grupal ou psicodrama ou algo desse tipo...então elas nesse sentido elas não fazem absolutamente
nada, mas em outros quesitos elas são muito boas, e foi justamente por isso que eu não quis falar mal,
pra nem criar uma imagem do tipo `ah elas não faz nada`, porque elas fazem sim eee nesse dia foi
horrível, acho que foi o pior dia meu na faculdade de quatro anos eu queria me esconder em algum
lugar e sumir do mapa, eu fiquei a vivencia toda depois escondida, bem no canto, onde ninguém me
enxergasse... então a Fabi olhou pra mim com e eu falei `não Fabi aqui não dá para eu falar´, tipo, tá,
o certo era eu falar, mas não dava tipo é grupo de sala, as meninas estavam ali, era impossível falar
ali, não tinha como eu falar ali...ai eu não falei né, guardei pra mim...aí depois disso ainda minha
psicóloga não podia me atender, tive que ir outro dia ai fui guardando isso, fui guardando, guardando,
inclusive não faço mais grupo com elas. Teve um trabalho que foram marcar e eu simplesmente não
fiz com elas”. (Ingrid, 4º ano).
333
dificuldade de relacionamento que tinha com uma das participantes antes do início do
grupo, e que após a participação com ela no mesmo, em que a conheceu de forma
mais íntima, pôde aprender a interagir com a colega na faculdade e a respeitá-la. Além
disso, Tadeu também agradeceu, durante o nono encontro, em que se mostrou
visivelmente abatido e cansado em função das muitas demandas de atividades de
encerramento do semestre, a ajuda recebida por Ingrid e Ícaro para finalização de um
relatório de estágio, à medida que relatou no grupo a dificuldade que estava para
encerrar esse trabalho e recebeu a oferta de ajuda dos colegas, que já haviam
terminado a atividade.
Em uma pesquisa com 13 estudantes de Psicologia de uma universidade
pública do Estado do Rio de Janeiro, Soares et al. (2016) buscaram verificar e
conhecer, por meio de um grupo focal, quais relações interpessoais os estudantes
vivenciavam como fáceis e quais consideravam difíceis no espaço acadêmico.
Especificamente sobre as relações aluno-aluno desenvolvidas na universidade, os
estudantes destacaram a importância do estabelecimento de relações de amizade que
proporcionam ajuda mútua entre os pares, demonstrando a necessidade do
estabelecimento de relações interpessoais adequadas aos objetivos acadêmicos
comuns aos discentes, para aumento de produtividade e criação de um ambiente
propicio ao ensino e aprendizado.
Ainda sobre a temática da competição entre os grupos de pares, apareceram
também as possíveis idealizações no desempenho do papel de aluno, entendido como
aquele estudante que tira as melhores notas e consegue realizar todas as atividades
acadêmicas com sucesso. Na quinta sessão, a fala de Aurora, quando se deparou
com a dramatização da colega Isis, revelou as percepções acerca do que seria o
estudante ideal:
“Foi surpreendente...eu não sei...é como se e a gente estivesse lá de novo...e ainda mais
porque eu faço parte da supervisão da Isis então ...eu...revivi... eu estava lá quando ela estava...quando
ela narrou todo o caso e tal e por mais que às vezes eu sinta que ela ficou incomodada, eu não sabia
o tamanho desse caso, dessa situação pra ela, estando do lado dela, sendo uma grande amiga dela
eu não sabia o tamanho e poder saber a profundidade disso pra ela foi importante pra mim e importante
ver né... eu acho que como estudante é...eu vou falar, pra mim, a estudante ideal é a Isis sabe? Vou
falar mesmo o que eu...e eu sou tipo aquela estudante muito é descompromissada sabe? Não que eu
seja, mas o meu jeito de não ter a eficácia que ela tem em tudo o que ela faz com as coisas da
faculdade, a força que ela trouxe aqui, eu me cobro muito ter essa força sabe? Não é uma rixa entre
nós duas, mas é só o jeito mesmo...eee...e aí parece que ela impacta no jeito de ela ser, mas não é,
ela tem os limites e as fraquezas dela mesmo com essa força toda né...e então eu venho trazer que eu
não tenho que ser o jeito dela eu tenho que entender que o jeito que eu sou, e tentar ser o meu melhor
do meu jeito como estudante eu acho que foi isso...(risos)” (Aurora, 5º ano).
335
Nesse dia, durante o quinto encontro, Isis apresentou a dificuldade que estava
vivendo a partir de uma orientação dada por sua supervisora de estágio, e ao longo
da dramatização pôde enfrentar essa dificuldade e encontrar uma nova resposta para
enfrentar a situação. Durante o compartilhar, Aurora afirmou que em sua perspectiva
a colega era a estudante ideal, perfeita, que não apresentava dúvidas, e que se
percebeu surpresa com as revelações da dramatização da colega, o que também foi
confirmado por Felipe. Aurora disse estar aliviada para se assumir sendo a estudante
que é, pois pôde ser continente às próprias dificuldades nessa sessão, indo além de
uma visão negativa de si mesma como aluna. Nessa perspectiva, Matias; Martinelli
(2017) apresentaram uma grande quantidade de estudos sobre o autoconceito que
tem constatado como esse é um dos fatores afetivo-emocionais que mais se encontra
relacionado com o desempenho escolar. Para Suehiro (2006), o autoconceito do
estudante, entendido como as percepções e os sentimentos que ele apresenta em
relação a si mesmo e a sua própria competência acadêmica, pode estar relacionado
positivamente ao desempenho acadêmico do mesmo; porém, destaca o papel do
professor no processo de aprendizagem do estudante, ao exercer grande influência
sobre as avaliações que os alunos fazem de si mesmo e sobre o próprio desempenho.
As relações de amizade no contexto acadêmico e a importância das mesmas
para os participantes da pesquisa apareceram de forma mais enfática na 14º e 15º
sessões do grupo sociodramático. Ao comentar com o grupo sobre a festa surpresa
de aniversário que recebeu dos colegas de sala, Isis revelou o afeto que sentia por
todos os colegas, a importância da realização da faculdade de Psicologia e a emoção
sentida ao final da mesma, quando se viu encerrando esse ciclo muito importante de
sua vida. Aurora também se emocionou durante a dramatização e reafirmou a
importância do apoio afetivo recebido por Isis durante todo o percurso acadêmico,
valorizando a amizade que desenvolveram e na qual se apoiaram durante o percurso
acadêmico. Além disso, Aurora e Felipe devolveram para Isis em alguns encontros o
quanto a colega assumia um importante papel de liderança em sala de aula, sempre
disposta a ajudar os colegas com as atividades acadêmicas e promovendo encontros
de integração entre todos da turma. Anahí, outra participante do quinto ano, destacou
no décimo quinto encontro que apesar de já conhecer todos os participantes do grupo
na faculdade, pôde estreitar os vínculos e conhecer melhor os colegas durante as
vivências do grupo de pesquisa. Revelou também que apesar de suas dificuldades
336
“Isis (agora no papel de supervisora): Isis eu acho que o que você está sentindo éé a
frustração de que por mais que a gente queira ajudar o paciente ele faz o próprio caminho e às vezes
na terapia nem sempre vai ser flores, às vezes vai precisar que o paciente se sinta desconfortável, vai
precisar que seja chato vai precisar que seja sofrido porque às vezes é.... A nossa profissão não é de
evitar o sofrimento, mas a sua presença com ele, e estar ali, é um suporte, mesmo que às vezes ele
vai ter que olhar para a dor dele, mesmo que as vezes vai ser dolorido pra ele, independente do que
você fale ou deixe de falar, que você pergunte ou deixe de perguntar, a sua presença é um suporte pra
ele, infelizmente você não vai conseguir deixar que tudo seja lindo, porque às vezes ele vai precisar
entrar em contato com esses dois e nem sempre você vai ser aquela que vai conseguir transformar em
flores, às vezes você vai precisar conseguir entrar na bosta junto com ele e estar ali e está tudo bem...
não se sinta, não pense que você deve fazer mais do que você pode, você está dando o seu máximo”
(Isis, 5º ano).
em que haja espaço para que os dois lados da relação tenham liberdade em expor
aquilo que vivenciam a cada momento, espontaneamente se percebendo atores de
um contexto institucional em que se deve entregar um produto final, de preferência,
com alta qualidade. Como as expectativas de alunos na relação com seus professores
podem ser fonte de sofrimento, conforme visto a partir do protagonismo de Isis, seria
válido considerar a importância de trabalhos interventivos, em contexto institucional,
que busquem abordar essa relação de modo a torná-la mais aberta ao desempenho
de papéis cada vez mais descolados do padrão autoridade-subordinação, que
conforme visto, produzem sofrimento psíquico
desses conflitos familiares. Nesse encontro, a participante foi acolhida pelo grupo e
ao final do mesmo, disse estar sentindo alivio por ter compartilhado essas questões
com o grupo.
“Eu já quis desistir bastante e já fiz coisas para que eu precisasse desistir mas não foi...e ainda
tem toda a cobrança do que tem que ser feito na faculdade e minha mãe me cobra que eu não to
fazendo não to produzindo, porque que eu to triste tenho que tomar um remédio, que eu to depressiva
eeee...só me falam o que eu to ninguém me pergunta como eu acho que eu to e porque que eu to
assim porque apontar é fácil né? Mas eu queria que eu mesma pelo menos reconhecesse o meu
esforço sabe? É eu to fazendo a minha obrigação mas pra mim foi um grande esforço” (Aurora, 5º ano).
“O que que está acontecendo tá todo mundo muito angustiado por isso que não vai dar tempo
o que que tem que fazer o pessoal se perde você está fazendo uma coisa e ai esquece de fazer outra
e a gente chega na aula e ninguém leu o texto porque tem dez mil pra ler e ninguém leu o texto e fica
todo mundo da sala com aquele sentimento de nossa sou um bosta” (Tadeu, 4º ano).
Essa fala de Tadeu retomou uma percepção dos participantes que emergiu em
diferentes encontros, relacionadas ao sentimento de incapacidade pessoal em função
das mudanças drásticas que sentiam ocorrer entre o terceiro e o quarto ano do curso,
348
e desse para o quinto ano. Essa temática das diferenças entre vivências do terceiro,
quarto e quinto anos de Psicologia veio à tona no primeiro, no quinto e no décimo
segundo encontro, e pareceu estar interligada a um sentimento de incapacidade
pessoal frente às novas demandas que surgem de um ano para o outro e que
expressaram sentir-se despreparados para assumir, mostrando-se assustados com a
novidade apresentada pelas propostas de atividades específicas de cada ano do
curso, que parecem exigir mais tempo de dedicação, não somente aos estudos e à
organização do tempo para dar conta dos mesmos, mas também para estar presente
nas atividades práticas, conforme revelado pela fala de Andressa, ainda no primeiro
encontro:
“Então a gente sai do sexto semestre, até o sexto semestre é muito tranquilo a gente mal tem
aula, ai você entra no sétimo muda muito...então...muda da água pro vinho, de repente você começa a
ter aula todos os dias todos os horários você nem tem tempo de almoçar já tem que estar num lugar
com outras pessoas e a noite também...então é duro...e por isso suporte, a gente precisa se dar
suporte...” (Andressa, 4º ano).
“E é agressivo, muito agressivo pra mim é...dói, tem dia que você se sente uma bosta, que você
não deu conta, você tentou, fez o máximo, mas não deu conta e ninguém entende porque você não
deu conta, acha que você tá fazendo corpo mole, mas você estava se matando...aí por isso que você
vai lá e bebe um pouquinho...pra relaxar...só um pouquinho...” (Aurora, 5º ano).
“Essa semana inteira eu senti que eu não ia dar conta...e isso é muito novo pra mim porque eu
nunca senti que eu não iria dar conta assim de não vou dar conta eu tenho medo eu tenho receio eu
fico ansiosa mas eu sempre sei que eu vou dar conta, assim em vários ou quase todos os aspectos e
essa semana não, essa semana juntou tudo eu comecei todos os meus estágios é também
desesperador, comecei todos, to atendendo em todos, do hospital psiquiátrico e aí eu senti um peso
assim...” (Isis, 5º ano).
“A faculdade está foda pra todo mundo mas assim eu não to conseguindo lidar com isso muito
bem to meio que desistindo antes da hora assim...nossa eu não vou dar conta...eu lembro que teve
uma vez que uma pessoa falou pra mim, uma terapeuta falou pra mim que eu era perfeccionista eu
falei ´tá doida perfeccionista?´ ai ela explicou que quando eu quero fazer de um jeito muito bom e
quando eu vejo que ou vai dar muito trabalho ou eu não vou conseguir ser daquele jeito eu desisto,
simplesmente deixo quieto... aí não sei se isso tem a ver, sei que foi uma semana muito triste pra mim,
fiquei muito mal...mas bola pra frente..vamo ver...”(Felipe, 5º ano).
“Mas é isso, é muito difícil quem acredita nisso é muito fácil falar nas teorias, é muito bonito
isso, ‘respeite a individualidade de seu paciente’, respeite as pessoas, mas na própria rotina da nossa
faculdade e na vida, você tem que ter muito papel e muita postura assim dura...” (Aurora, 5º ano).
“Eu vou falar, porque eu estou muito ansiosa, eu estou achando que eu vou surtar, juro por
Deus, vou até levantar. Gente, essa semana, olha, eu falei até para a Rita na supervisão, falei “agora
eu estou sentindo aquela linha entre saúde mental e patologia, sabe?” Estou sentindo que está
balançando, mas eu vou conseguir, eu vou lá mas eu volto. Gente eu estou em uma ansiedade, numa
angústia, que Deus é pai, está vendo? Eu estou assim. E é muita coisa para fazer, gente vocês não
tem noção, sabe? Tipo assim, você coloca seis matérias mais quatro estágios, fora o projeto, então
assim, é muita coisa. E eu vou viajar, falta uma semana para mim viajar ficar um mês, eu estou
desesperada gente...eu estou aqui desesperada porque eu não tenho tempo para sentar na frente do
computador para procurar nada, sabe? Não dá, não dá tempo mais de responder o whatsapp, dá tempo
gente? Sabe, não dá. Você tem que escolher as pessoas que você responde porque não dá tempo. Eu
ando chorando tanto, eu ando saindo da faculdade chorando assim, e parece que a coisa não acaba,
não acaba. Mas eu estou feliz. Não, dá esse desespero, mas eu estou feliz, sabe?” (Andressa, 4º ano).
353
“Nossa, eu acho que eu não aconselharia as pessoas a fazerem psicologia não. Nossa gente
é muito pesado, né? A gente sofre muito, sabe? É desgastante assim, é não dormir, é chorar, é nossa,
ter vontade de matar os outros. Por que sério tudo é em grupo, tudo é em grupo, esse ano, então tudo
o que você faz é em grupo, até as pessoas que você tem contato diariamente assim você começa a
ver a pessoa muito e começa a ter atrito, sabe? Mas a gente assim é muito aberto um com o outro
assim, o meu grupo, ás vezes a gente se xinga assim, mas se entende, né? Então é muita coisa, é
muito pesado mesmo, assim, até hoje eu acho que está pesado aqui na nuca, sabe? E é muito
conhecimento, sabe? Muito conhecimento, você acaba não captando nada eu acho, porque é muito
jogado, sabe? Nem sei a hora que passar o quinto ano eu te falo o que é que ficou disso. Eu não
consigo nem ver férias, não consigo, mas é o que eu quero, igual a hora que eu vi o resultado lá, eu
falei “nossa eu me esforcei para isso”, sabe? Ai vem a felicidade assim” (Andressa, 4º ano).
Nesse mesmo dia, oitavo encontro, Isis revelou para o grupo que estava tendo
manifestações psicossomáticas advindas do cansaço, como a ansiedade, sentimento
de esvaziamento e compulsão alimentar, em função da quantidade de tarefas a serem
feitas no final do semestre e que gostaria de aprender a respeitar as próprias
limitações físicas e não se cobrar tanto:
“Então tipo assim, esse ano eu estava indo na academia, tal, estava me alimentando de uma
forma mais saudável, comendo quando realmente era preciso, e aí agora de um mês para cá, comecei
a não ter tempo para ir para a academia, e aí foi indo, foi desencadeando, desencadeando e aí eu fico
nisso, e aí eu fico bem chateada, sabe? Porque é tudo, eu estou tentando assim me por tarefas para o
dia “hoje eu vou fazer isso, e só isso, se eu terminar isso, está ótimo”. Aí eu fico o dia inteiro, e aí você
começa e o trem não flui e eu volto, sento e faço, e isso está maneirando minha ansiedade, mas está
difícil, aí eu vejo e penso “gente, depois para mim recuperar isso”, aí eu já fico ansiosa, além da
ansiedade normal, eu já fico ansiosa de recuperar o que eu estou ganhando agora, porque tipo assim,
não é saudável, eu fico com vontade de comer qualquer coisa, sabe? Não é tipo, uma coisa ou outra,
é qualquer coisa, porque para mim o maior prazer que tem é comer, que preenche, porque do resto é
como se tivesse uma máquina assim, que fosse sugando, então eu tenho que produzir, porque fazer
um relatório, até os próprios atendimentos é isso, é você com o que você tem, você oferece, né? Você
produz, então eu estou nisso assim, esse buraco que nunca é preenchido, esse buraco que nunca é
preenchido porque é essa questão do ´nunca acaba´... e é assim que eu estou” (Isis, 5º ano).
reafirmaram que são fatores passíveis de modificação por parte das instituições de
ensino, se adotarem estratégias interventivas que visem a favorecer o bem-estar dos
alunos e vivências mais positivas no ambiente educacional.
Na presente pesquisa, apareceram falas relativas às estratégias que os
participantes utilizavam para lidar com o estresse de final de semestre, e os mesmos
revelaram como era difícil ter tempo livre para lazer e relaxamento no período que
antecedia as férias. Apareceram nesse sentido três estratégias diferentes para
enfrentar a vivência de estresse do final do semestre: sair à noite com amigos, o que
foi entendido pelos participantes como bom até certo ponto, pois impedia que
dormissem pelo tempo necessário ao descanso; o planejamento adequado para
realização das atividades surge como uma saída importante, na visão de Isis; e a
possibilidade de se conseguir ter uma vida mais espontânea e criativa, quando Aurora
refletiu sobre a importância, em sua perspectiva, de descobrir como vivenciar as
atividades da faculdade todos os dias sem tamanha cobrança.
Quando o grupo retornou das férias, após a pausa de 40 dias, já no primeiro
encontro ainda ecoavam as experiências de estresse físico e emocional vivenciadas
ao final do semestre, e desde o primeiro dia do retorno, Isis, Aurora, Ícaro e Ingrid
compartilharam sentimentos de desânimo em voltar para a faculdade, quando se
davam conta do excesso de atividades burocráticas que precisariam cumprir. Isis se
referiu especificamente ao excesso de relatórios de estágio, provas e trabalhos de
disciplina.
“Porque o desânimo é assim a gente está numa fase, né, esse último semestre, último ano que
para mim deveria ser um momento de tranquilidade, é utópico né, mas tipo assim, a gente já deu tanto
sabe? Parece que a hora que eu vi essa faculdade aqui eu senti que estava desanimada porque eu
senti sem energia porque toda a minha energia eu já entreguei ali, então é como se a faculdade já teve
de mim tudo o que eu posso dar assim, já exigiu de mim tudo o que poderia ser exigido e ai o meu
desanimo de voltar, me veio a cena do semestre passado, no último dia de supervisão que foi assim
né, foi...eu estava acabada, foi o dia que eu tinha que terminar a iniciação, a orientadora me mandou
um email que eu tinha que fazer já para segunda e era numa quinta e eu tinha o relatório do estágio...e
assim é...foi aquela cena que eu cheguei na supervisão e eu não conseguia olhar no olho das pessoas
porque senão eu ia cair em lágrimas e desmanchar...então eu tive que vestir assim uma negação...não
sei, eu estava supitando e aí eu cheguei e fui fazendo a parte burocrática, e me veio a cena eu sentada
lá assim explodindo por dentro não me aguentando e eu desanimo de passar isso sabe?” (Isis, 5º ano).
estágios, referiram-se ao modelo que deviam seguir para a confecção dos mesmos, à
medida que a cada visita ao campo ou atendimento deveriam elaborar o diário de
campo, que depois se transformaria em um relatório padronizado. A vivência de peso
pelo excesso de atividades apareceu como um sentimento de que tudo isso é feito de
forma conservada e automática, não permitindo que os estudantes experimentassem
o gosto pelo aprendizado e a potência da criação, da autoria e de um aprendizado que
integra afetivo e cognitivo, como fica exemplificado pela fala de Jéssica, Isis e Ingrid:
“Ai gente, porque não pode pegar tudo o que a gente viveu no estágio e fazer uma poesia, sei
lá, faz um texto que não seja repetitivo, faz uma relação com uma obra, sei lá ( Jéssica, 5º ano).
“Mas tipo, o melhor que eu tive foi o que a gente tinha que, era tipo isso que a gente está
falando, tinha que fazer um artigo mas o artigo era comparando com um mito ou uma deusa né que...e
foi muito legal, foi o melhor assim, eu fiz com prazer porque eu fui lendo o mito e vendo a história da
minha paciente, lendo o mito, os traços do personagem e fui podendo criar sabe? Tipo assim em todos
ela viu a sua criação, nossa foi perfeito” (Isis, 5º ano).
“Porque por exemplo, o semestre passado eu já tinha feito tudo, realmente estava tudo pronto,
eu fiquei as últimas semanas despreocupadas porque eu já tinha feito tudo, mas ai depois eu parei para
pensar, ´tá eu fiz tudo mas o que eu não acabei comigo para fazer tudo, o que eu tive que passar para
fazer tudo, o que eu fiquei, a consequência de ter feito tudo, qual foi para minha vida? Entendeu? E
pensar nisso foi tipo, valeu a pena? Eu faço porque eu amo Psicologia, porque eu quero me formar,
porque eu quero ser, mas o decorrer disso é cheio de decepção, frustração e sofrimento sabe? Então
ver o que a Isis falou realmente, essas coisas de relatório é um absurdo, eu acho assim a gente ainda
faz Psicologia, é um curso em que você está vendo o outro que você está se olhando, está falando de
pessoas entendeu? Você está falando da subjetividade humana no qual não pensa em você? Ai eu
olho isso e falo assim nossa como a gente está atrasado no próprio curso né? Tipo um curso que não
olha o humano nunca...e isso causa raiva, é uma mistura de mil sensações, a respeito de tudo... nas
minhas férias eu parei e pensei nossa eu não me coloquei em primeiro lugar em nenhum momento,
entendeu? Eu costumo dizer para mim mesma, que a vida é feita de prioridades, e eu estar aqui é uma
prioridade minha, porque eu deveria estar fazendo meu projeto de TCC, que não está pronto ainda e
tem que entregar segunda...então eu quase nunca me coloco como prioridade, porque se não fizer tudo
que tem que fazer...então eu entendi isso” (Ingrid, 4º ano).
uma atitude clínica, por perpassar questões pessoais do estudante que muitas vezes
ainda não foram trabalhadas na própria psicoterapia individual. Além disso, nos
estágios profissionalizantes os estudantes parecem se ver desafiados a juntar todas
as peças do quebra-cabeça que foram guardando ao longo da formação e que estão
soltas: o desafio da formação nos estágios parece recair na necessidade de alinhar,
juntar os conteúdos teóricos aprendidos nas diferentes linhas teóricas de abordagem
com as especificidades da prática, daquilo que vão se deparar no encontro com cada
um dos pacientes que serão atendidos, ou em cada instituição que forem atuar.
Aprender a ser psicoterapeuta e entrar em contato com os temas relativos à
subjetividade humana emerge como um dos grandes desafios do estudante
universitário de Psicologia.
“Meu nome é Isis, eu to no quinto ano, também to confortável, eu admito assim que quando
falou que seria terceiro, quarto e quinto ano eu fiquei um pouco assim ansiosa, por saber quem seriam
as pessoas, porque tem pessoas que eu não converso não conheço então não no sentido negativo
361
assim aí não tem ninguém que eu não goste algo assim, mas foi ai quem será né? Me deu um pouco
de curiosidade, de ansiedade sim, porque é algo que a gente precisa, formar esse grupo, então eu
fiquei ansiosa, aí agora chegando aqui eu to muito confortável, muito confortável assim, todas as
pessoas, as duas eu não conheço muito né (aponta para as duas integrantes do terceiro ano) porque
a gente não se ve, já o pessoal do quarto ano (risos, os colegas riem também) e da minha sala, então
assim é um grupo que eu fiquei muito feliz a hora que eu fui vendo todo mundo chegando” (Isis, 5º ano).
Assim como foi apresentado pela fala de Isis e de outros integrantes, havia um
temor dos estudantes a respeito de quem seriam os componentes no grupo. Apesar
de verbalizarem no contexto grupal que estavam tranquilos por estarem na presença
uns dos outros, foi somente quando passaram ao contexto dramático e se reuniram
em subgrupos conforme a série que estavam cursando na faculdade, que o campo
tenso se transformou em campo relaxado e puderam compartilhar com os colegas de
sala como estavam se sentindo como estudantes de Psicologia e produziram uma
imagem coletiva a respeito desses sentimentos. Nesse sentido, pode-se perceber que
o trabalho em subgrupos com os colegas de sala funcionou como uma boa estratégia
para diminuição de comportamentos defensivos, possibilitando maior descontração
nos participantes e a possibilidade de compartilharem e dramatizarem como estavam
se sentindo nesse papel. O encontro com os colegas em cima do palco foi relatado
como de grande emoção e muitos revelaram conter o choro nesse momento: as
alunas do terceiro ano relataram que a partir da conversa que tiveram no palco,
identificaram experiências em comum como estudantes de Psicologia e o sentimento
de gratidão por estarem no terceiro ano da faculdade. Já os estudantes do quarto ano
identificaram a possibilidade de estabelecerem relações de apoio uns para os outros
nesse momento do curso, se conseguissem ir além das panelinhas e das relações
conflitivas vivenciadas na sala de aula. Os participantes do quinto ano revelaram a
emoção que sentiram ao se encontrarem no palco, pois se deram conta de que nesse
momento do curso já não possuem o mesmo contato frequente em sala de aula e que
estavam dando início ao último ano de faculdade. A tomada de consciência desses
dois fatores foi relatada como significativa pelos participantes do quinto ano, que
inclusive verbalizaram como tiveram a experiência de transformarem, no palco, o
sentimento “de peso” por serem estudantes do quinto ano em leveza, por meio de
uma gostosa brincadeira. Percebeu-se, nesse primeiro encontro, que os participantes
sentiram-se mais a vontade quando reunidos em subgrupo e que no momento das
dramatizações, as imagens grupais revelaram diferentes vivências acadêmicas,
conforme a especificidade de cada série do curso: terceiro, quarto ou quinto ano
362
Cena: “Eu grito” (Os participantes em fila um ao lado do outro, e um a um se alternam para
frente, dizendo uma frase para a plateia dando voz e sequencia um à fala do outro).
Ícaro: eu fico aqui parado, não consigo mexer, não tenho reação, mas sei que eu posso sair
disso, parece que tá contra mim...
Jéssica: eu fico aqui parada, e eu também fico aqui cansada, também fico aqui imóvel sem
conseguir e querendo muito mexer...
Felipe: eu fico aqui parado, eu fico aqui cansado, tenho medo do fracasso
363
Isis: eu fico aqui parada, eu fico aqui cansada, com medo do fracasso, mas tentando,
tentando, e tentando...
Aurora: eu tenho comodismo, tenho cansaço, tenho medo, posso fracassar, mas vou
continuar tentando, porque diante de tudo isso, mesmo não sendo ouvida, eu grito...
Todos juntos: eu grito!
manifestou como tinha se sentido por não ter sido escolhida por Andressa para
participar da dramatização:
“Meu coração tá assim pequenininho sabe? Apertado tá doendo...mil coisas na minha cabeça
agora...vendo a situação eu pensei nossa ainda bem que eu não estava em nenhum papel ali
dentro...porque nossa...eu sofri muito na minha época de fundamental II, antes assim do colegial ...
muito... nossa é horrível sabe? (Ingrid, 4º ano).
sentiam, quem eram e o que estavam vivendo. Apareceram então diferentes estados
emocionais como o reconhecimento e a afirmação de experiências de tensão e de
solidão; um modo intenso de ser que pode provocar incômodos; a confirmação da
busca pelo crescimento e a sensação de estar perdida dentro de si mesma, junto ao
desafio de tornar-se quem se é. A participante Aurora inclusive revelou o nível de
sofrimento psíquico que estava sentindo como estudante, sentindo-se atemporal e
sem cronologia, não conseguindo ir à faculdade ou realizar as atividades necessárias.
Ao afirmar que ninguém se interessava em saber como ela estava, mas somente se
ela estava fazendo o TCC, contou para o grupo a profundidade do sentimento de
solidão pelo qual estava passando. Com a realização da atividade no palco, Aurora
mostrou-se mais integrada ao grupo, conectando-se aos demais participantes e
permitindo-se experimentar a liberdade em ser aceita exatamente como estava se
sentindo. Ao final, estava visivelmente relaxada e comentou estar sentindo-se feliz por
pertencer ao grupo, a medida que tinha vivido no palco um sentimento de que no
grupo cada um poderia se mostrar como estava, com liberdade e respeito às
singularidades. Pode-se pensar que o exercício realizado em cima do palco, quando
puderam observar a diversidade que cada um trazia para o grupo e saudar a mesma
por meio da brincadeira, repetindo a frase “que bom que você está aqui”, proporcionou
relaxamento e integração entre os participantes, resgatando o processo vivido antes
da pausa de um mês, preparando o grupo para os próximos encontros e quem sabe,
cultivando um campo mais relaxado para o enfretamento dos conflitos que começaram
a aparecer.
A partir do quinto encontro, apareceram de forma mais clara as diferentes
experiências de sofrimento vivenciadas pelos participantes no papel de estudante, e
essa sessão foi particularmente marcante nesse processo. Os participantes Tadeu e
Andressa faltaram dessa sessão, e desde o início do encontro o clima do grupo era
relaxado. Ingrid mostrou-se bastante à vontade e disposta a trabalhar suas questões
como estudante. Aurora também estava à vontade e destacou como tinha sido
importante para ela o encontro anterior, em que sentiu-se muito acolhida pelo grupo.
A fala de Ícaro emergiu como síntese do que estava sendo vivido no grupo, ainda no
início da quinta sessão:
“E ver o vínculo de confiança que a gente está criando aqui dentro né, porque não é fácil falar
de muita coisa que a gente fala...e a gente está falando dessas coisas, então eu acho isso muito
importante, foi o que mais ficou pra mim semana passada...” (Ícaro, 4º ano).
368
que mais havia perdido sessões do grupo. Mas nesse dia, que Andressa já teria
viajado e não estava presente, o clima era afetivo e tranquilo no início do encontro, e
parecia revelar a intimidade já estabelecida entre eles. O modo como se colocou,
espontânea e livremente, desde o início do encontro, pareceu revelar a chegada real
de Tadeu no grupo, pois havia faltado algumas sessões e desde o sétimo encontro
pareceu ter criado um vínculo mais efetivo com o processo grupal. O nono encontro
permitiu a avaliação do processo já vivido, revelando a importância das vivências em
contexto dramático para maior reconhecimento dos conflitos vividos no contexto
acadêmico, do sofrimento psíquico vivido e em consequência a liberação da
espontaneidade-criatividade, como a necessidade de reconhecimento do próprio jeito
de ser aluno, na busca de uma relação de sentido com a vida, como estudante.
O décimo encontro ocorreu após uma pausa de 40 dias, em função das férias
escolares. A participante Bruna se desligou efetivamente do grupo, explicando para a
diretora que estava com dificuldades de se locomover até o local de realização das
sessões. A diretora considerou importante reiniciar o grupo retomando o contrato de
participação dos outros estudantes, a fim de verificar como ressoava a desistência de
Bruna- se era indicativa de um início de esvaziamento do processo grupal. Nesse
sentido, a fala de uma participante revelou como a sociometria do grupo e
possibilidade de um Encontro verdadeiro com os colegas emergia como a força
terapêutica, na perspectiva de se constituir em uma rede social de apoio entre eles:
“Eu quero estar aqui mas além do que o grupo me oferece as pessoas também acho que a
gente está se tornando um grupo mesmo assim de querer estar com essas pessoas, além de estar aqui
participando do grupo que eu sei que vai ser bom a vivência eu quero estar com essas pessoas sabe?”
(Isis, 5º ano).
que faz sofrer (Aurora); a necessidade de fazer o que tem vontade (Anahí); o olhar
para os buracos que aparecem na vida (Jéssica). Falas que promoveram liberdade de
expressão, oportunizando o resgate da espontaneidade-criatividade apesar das
exigências das conservas culturais.
Anteriormente à realização do décimo terceiro encontro, os participantes Felipe
e Anahí avisaram a diretora que iriam se desligar do grupo, por diferentes motivos.
Mais uma vez, a diretora devolveu para o grupo como se sentiam com o desligamento
dos colegas e Jéssica mostrou-se triste e inconformada. Ao conversar sobre essa
questão com os participantes nesse dia, a diretora questionou se não haveria um sinal
de esvaziamento da proposta da pesquisa e possível necessidade de finalização do
grupo. Nesse sentido, Tadeu, Ícaro, Ingrid, Isis, Aurora e Jéssica revelavam o desejo
em continuarem com o processo grupal, pois sentiam como um espaço de apoio
importante para compartilharem aquilo que viviam como estudantes de psicologia.
Destacaram o fato de estarem vinculados entre si e sentirem vontade de encontrarem-
se no contexto grupal para compartilharem o vivido no contexto social, institucional. A
diretora então propôs a formação em subgrupos e a produção de uma escultura que
provocou o desejo de dizer não às muitas e diferentes demandas vivenciadas na
faculdade, e pôde se concretizar no palco ao dizerem “não” à proposta da diretora,
revelando o desejo de romper com um certo modo automático de fazer as coisas. O
desejo de ser livre e romper com o sentimento de esvaziamento sentido por
enfrentarem tantas demandas e atividades obrigatórias foi experimentado pelo grupo
de Tadeu, Ingrid, Isis e Aurora, que afirmaram o prazer de simplesmente estarem
juntos, conversando, em um nível de interação que iria além da correria do cotidiano.
Tadeu externalizou o que viveram no encontro no subgrupo:
“Fico nessa angustia de ter que fazer as coisas e não estar vivendo nada direito, tudo tem que
fazer por obrigação e aí não tem tempo pra fazer as coisas que eu quero fazer, as coisas que eu gosto
de fazer não tem mais o mesmo gosto sabe? A gente até discutiu, a Ingrid perguntou, será que o tédio
é o contrário do tesão, porque eu falei isso, eu não tenho tesão, tenho tédio de estar fazendo” (Tadeu,
4º ano).
que não seriam possíveis no contexto social e por meio somente da linguagem verbal,
o que afirma a especificidade e importância do método psicodramático na condução
da pesquisa, que produziu dados originais, além de transformações nos diversos
modos de sofrimento apresentados pelos estudantes de Psicologia.
378
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
MALAQUIAS, M.C. Teoria dos grupos e sociatria. In: NERY, M.P.; CONCEIÇÃO,
M.I.G. (orgs). Intervenções grupais: o psicodrama e seus métodos. São Paulo:
Ágora, 2012.
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MORENO, J. L. Psicodrama. 16.ed. Trad. Álvaro Cabral. São Paulo: Editora Cultrix,
2008.
Serei identificado?
Não. Esta pesquisa garante a segurança de que você não será identificado e
que serão mantidas em segredo as informações que você nos falar, assim como as
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experiências vividas no grupo. Garante ainda o compromisso de que será você será
devidamente acompanhado e assistido durante todo o processo de pesquisa. A sua
participação na pesquisa é voluntária e você pode desistir a qualquer momento.
Garantimos a você o direito de receber resposta a qualquer pergunta, ou
esclarecimento a qualquer dúvida, sobre os procedimentos que serão realizados. Não
haverá nenhum custo ou benefício financeiro caso aceite participar, e você tem direito
a indenização, segundo as leis vigentes no país, caso ocorra dano decorrente de sua
participação nesse estudo, por parte do pesquisador e da instituição a que se vincula.
Os resultados dessa pesquisa serão apresentados em congressos científicos e em
revistas de pesquisa sem identificar ninguém que tenha participado dela.
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Assinatura do participante da pesquisa
Franca, _____________________________.
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Angélica Teixeira Gomes Profº Drº Luiz Jorge Pedrão
Contatos:
Angélica Teixeira Gomes
Email: angelicagomes@usp.br
Profº Drº Luiz Jorge Pedrão - email: lujope@eerp.usp.br
Comitê de Ética em Pesquisa da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto- USP
Avenida Bandeirantes, 3900, Ribeirão Preto, SP. Tel.: (16) 3315-9197
Horário de funcionamento: Segunda a sexta-feira das 8h às 17h.
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