Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
1. INTRODUÇÃO
Começo este trabalho com uma afirmação: o Brasil é um país peculiar, linguisticamente
falando. Vivemos em um país que recebeu influência linguística de diferentes modos: do povo
africano, vindo escravizado de sua terra natal pelos colonizadores do velho continente; estes
próprios, que primeiro chegaram aqui em 1500 para impor a língua portuguesa à força nos nativos
que residiam na Terra de Pindorama; e, por fim, estes nativos, que em um país de dimensões
continentais como o nosso, marcaram a variante da língua portuguesa que viria a ser conhecida
como Português Brasileiro (PB).
Isto posto, chegamos aos tempos atuais com uma língua carregada por variantes, variações,
dialetos e compreensões. A dificuldade, no entanto, do trabalho escolar no que concerne ao ensino
da língua portuguesa como língua materna, está na competência atribuída ao professor para o ensino
de uma variante prestigiada, tanto na modalidade oral quanto na escrita. Sabemos que a habilidade e
o domínio da gramática tradicional e suas classificações e categorizações, não dão a autonomia
necessária que o educando precisa para se expressar, a ponto de ser reconhecido como um usuário
hábil da língua, ao menos quando falamos dos grupos sociais mais prestigiados.
Portanto, o ambiente escolar mostra-se uma terra fértil para o cultivo de um assunto que
prioriza e muito a convivência social para o aluno enquanto usuário da língua portuguesa. A
importância desta investigação em sala de aula é clara, uma vez que visa a diminuição do
preconceito e da exclusão que a variação linguística, muitas vezes, pode proporcionar.
Língua e sociedade são indissolúveis. A espécie humana habita em um mundo onde as
pessoas se organizam em comunidades sociais, em que apenas uma forma de comunicação oral é
imposta a todos: a língua. Este fenômeno linguístico é estudado e investigado pela Sociolinguística,
que visa justamente entender a relação entre a língua, a sociedade e a cultura.
Alkmim (2008) expõe que o objeto da sociolinguística é o estudo da língua falada, escrita,
observada e analisada dentro de um contexto social e em suas situações de uso, e que cada
comunidade se caracteriza pelo emprego de diferentes formas de se comunicar. Este autor coloca
ainda que, a partir destas questões, surgiu o termo do que hoje chamamos de variação linguística.
2
2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
3. METODOLOGIA
4
4. RESULTADOS E DISCUSSÕES
médicos e como isso dificulta a comunicação com pessoas que não dominam este dialeto mais
formal. Por fim, no livro do 9º ano, de Ormundo e Siniscalchi, a variação linguística é
ostensivamente estudada, com ampla exemplificação de diversas variantes encontradas no PB.
No que concerne à limitação das variantes rurais e regionais da língua, o único LD que se
destaca é o destinado ao 9º ano, que trata este assunto de forma mais delicada ao abranger também
variantes sociais e periféricas como forma de combater o preconceito linguístico, como bem propôs
o linguista Marcos Bagno (1999) em seus estudos sobre o tema.
Este também é um destaque quando o assunto é as variantes mais prestigiadas da nossa
língua. O LD do 9º ano traz em seu escopo exemplos de palavras estrangeiras que, quando
abrasileiradas, dificultaram a pronúncia para alguns falantes menos prestigiados pela sociedade, o
que também pode ser um estopim para o preconceito linguístico. Palavras como playground, self-
service e selfie são alguns dos exemplos utilizados pelos autores para se referir à importação de
termos e estrangeirismos na língua.
Os livros do 6º e 8º ano não aprofundam a discussão social da variação linguística, mas o
LD do 9º ano traz a reflexão para o aluno ao não ponderar a norma-padrão como a variante correta a
se utilizar, mas sim uma variante a se considerar, como todas as outras apresentadas.
Como visto anteriormente, o fenômeno gramatical é tratado efetivamente apenas no livro do
9º ano, que traz, inclusive, exemplos de palavras e propõe atividade extraclasse de entrevista a
pessoas migrantes ou de regiões diferentes, instigando o aluno a perceber as diferenças mais sutis
nas palavras que ele já conhece.
Nenhum dos livros analisados tratam a variante formal da língua como certa ou como
exemplo a ser seguido. Todavia, apenas o livro do 9º ano especifica que não há separação do que é
certo e errado nas variantes da língua. Desta forma, está compatível com a visão de Bagno:
[As pesquisas] comprovam e recomprovam que as práticas tradicionais de
ensino da língua, sobretudo o chamado “ensino de gramática”, não têm mais
razão de ser, se é que um dia tiveram! (BAGNO, 2015, p. 270).
O livro do 8º ano evidencia a variação linguística no campo da oralidade, e os LDs do 6º e 9º
anos não diferem língua escrita de língua falada ao se mencionar a variação de dialetos.
Talvez o tema mais abordado em todos os três livros seja a variação histórica da língua. Nas
turmas do 9º ano, por exemplo, o LD propõe exemplos de gírias e palavras que entraram e saíram
de moda, como o adjetivo supimpa, que qualifica algo muito bom ou extraordinário, mas que hoje
em dia é pouco utilizado. Nos livros do 8º e 6º ano a explicação é mais superficial e não deixa
exemplos para os alunos.
6
Não há, em nenhum dos materiais didáticos analisados, afirmação alguma sobre qual das
variantes apresentadas é correta e tampouco há supervalorização da norma-padrão. O que se
percebe é que todas as variantes são bem apresentadas nos LDs, e, cada qual com sua maneira ou
com intensidades diferentes, ensinam os alunos a tratar respeitosamente outras pessoas que,
porventura, utilizem variantes diferentes do PB.
REFERÊNCIAS
BAGNO, M. Preconceito linguístico: o que é, como se faz. 52ª ed. São Paulo: Loyola, 1999.
BAGNO, M. Preconceito linguístico. 56ª ed. revista e ampliada. São Paulo: Parábola Editorial,
2015.
COSSON, Rildo. Letramento literário: teoria e prática. 2. Ed., 1ª reimpressão. São Paulo:
Contexto, 2011.
RODRIGUES, Roseli Hilsdorf Dias. “No meio do caminho tinha uma pedra”- ensino de
gramática: reflexão através do paralelo entre as diretrizes oficiais e a prática em sala de aula na
rede pública de ensino do estado de São Paulo. Tese de doutoramento em Língua Portuguesa.
Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2011,
278f.