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Revista Brasileira de Estudos Urbanos e

Regionais
ISSN: 1517-4115
revista@anpur.org.br
Associação Nacional de Pós Graduação
e Pesquisa em Planejamento Urbano e
Regional
Brasil
Petti Pinheiro, Eloísa
OS ARQUITETOS DA POLI: ENSINO E PROFISSÃO EM SÃO PAULO. Sylvia Ficher.
São Paulo: Fapesp; Edusp, 2005
Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionais, vol. 7, núm. 2, noviembre, 2005, pp.
111-113
Associação Nacional de Pós Graduação e Pesquisa em Planejamento Urbano e Regional
Recife, Brasil

Disponível em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=513951700008

Como citar este artigo


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OS ARQUITETOS DA POLI: A escolha metodológica recaiu no estudo do


ENSINO E PROFISSÃO EM desempenho profissional, como mercado de tra-
SÃO PAULO balho e regulamentação legal, fazendo, no traba-
Sylvia Ficher lho, um contraponto entre a formação institucio-
São Paulo: Fapesp; Edusp, 2005. nal e a atividade do arquiteto na cidade de São
Paulo na primeira metade do século passado.
Eloísa Petti Pinheiro Dividido em três capítulos – “A consolida-
PPG-AU/FAUFBA ção do mercado de trabalho 1894-1917”; “A as-
sociação profissional 1916-1933”; e “A divisão
No momento em que se discutem a reforma da profissão 1934-1947” –, o livro faz um recor-
universitária no Brasil e os novos currículos das rido pela trajetória da formação profissional
faculdades de Arquitetura, onde novas tecnolo- sempre mantendo a mesma sistemática – uma
gias surgem revolucionando o ensino e a forma primeira parte com uma leitura pessoal das in-
de fazer arquitetura, muito gratificante é poder formações contidas nas demais seções; uma se-
conhecer a história da formação desse ensino no gunda seção onde se descreve o ensino no curso
Brasil, em específico em São Paulo, como é o ca- de engenheiro-arquiteto da Politécnica; a tercei-
so do presente livro do qual nos propomos a ra se dedica às biografias profissionais comenta-
apresentar uma resenha. Sem dúvida, um desafio das dos professores; e a quarta, às biografias co-
em razão da quantidade de informações significa- mentadas dos diplomados.
tivas encontradas e dos caminhos e questiona- Partindo da abertura das inscrições para os
mentos que surgem ao ler esse volume, belo e exames preparatórios necessários à matrícula na
muito bem editado. Escola Politécnica, anunciados em janeiro de
Necessário e oportuno, o livro Os arquitetos 1894, Sylvia começa sua trajetória sobre a histó-
da Poli: ensino e profissão em São Paulo, de Sylvia ria da formação do curso de engenheiro-arquite-
Ficher, vem preencher uma lacuna nos estudos da to que, finalmente, institucionaliza o ensino de
formação profissional do arquiteto, em especial arquitetura em São Paulo em 20 de novembro
do engenheiro-arquiteto, na primeira metade do de 1894.
século XX no Brasil. Fruto de sua tese de doutora- Na primeira parte de cada capítulo a autora
do, após dezesseis anos, esse trabalho traz a públi- faz uma contextualização do período abordado,
co o conhecimento de uma importante parte da com destaque para os principais pontos que in-
formação daqueles que iriam intervir na imagem terferem na formação e atuação profissional, en-
na paisagem urbana, e não somente São Paulo, tendendo o período histórico, suas relações eco-
uma vez que muitos dos profissionais apresenta- nômicas e sociais, além de explorar a legislação
dos por Sylvia exerceram suas atividades em vá- que altera regimentos e estatutos do ensino do
rias cidades no Brasil. curso de engenheiro-arquiteto da Escola Politéc-
Apesar de também ter pesquisado o curso nica. No primeiro período, de 1894 a 1917,
de engenheiro-arquiteto da Escola de Engenha- apresenta uma análise da estrutura do curso onde
ria Mackenzie e do curso de arquiteto da Esco- demonstra a influência germânica, inclusive com
la de Belas Artes de São Paulo, o objeto central a adoção do ano letivo europeu, e a característica
do livro de Sylvia Ficher é o curso de engenhei- de unificar o curso fundamental com os cursos
ro-arquiteto da Escola Politécnica. Um traba- especiais. Mas Sylvia aponta também para uma
lho empírico com a sistematização de informa- influência da École Polytechnique de Paris no
ções relevantes em busca de descobrir um que se refere ao curso fundamental. Porém, dife-
processo histórico singular, que, conforme cita rente dos cursos de Paris e do Rio de Janeiro, on-
a própria autora (p. 18) visa “uma análise des- de os arquitetos tinham uma formação integrada
comprometida de valores coorporativos e/ou ao ensino artístico, em São Paulo o ensino de ar-
apologéticos”. quitetura seria uma das especialidades da enge-

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nharia. Assim, citando um dos formados no cur- uma vez que traz conseqüências imediatas, sen-
so de engenheiro-arquiteto, Archimedes de Bar- do uma delas a incorporação da Politécnica à
ros Pimentel, “éramos formados para sermos Universidade de São Paulo, recém-criada em
bons construtores de arquitetura” (p.26). 1934. Nesse segundo período, a autora se de-
Esse período coincide com o crescimento bruça sobre as legislações que formalizam os tí-
econômico de São Paulo e o crescimento das ci- tulos expedidos pelas escolas de engenharia e so-
dades, o que faz surgir um autônomo negócio da bre o controle do exercício das profissões de
construção (p.28). O crescimento da capital do engenheiro, arquiteto e agrimensor, o que leva a
Estado, com a industrialização e o crescimento embates pela regulamentação das associações
demográfico, requereu a modernização adminis- profissionais.
trativa e dos equipamentos urbanos, além da ex- Finalmente, no período que se estende de
pansão física, o que significou a abertura de no- 1934 a 1947, a autora aborda a ampliação do
vos bairros e a demanda por novas construções. campo de trabalho, incluindo discussões sobre a
O surgimento, em São Paulo de duas escolas su- especificidade da arquitetura, que leva os arqui-
periores de engenharia – a Politécnica de São tetos a se definirem por oposição, descolando-se
Paulo, em 1894, e a Escola de Engenharia do dos engenheiros civis, o que, junto ao surgimen-
Mackenzie College, em 1896 – e da reforma do to das primeiras escolas dedicadas ao ensino de
Liceu de Artes e Ofícios, em 1895, parece indi- arquitetura – Faculdade de Arquitetura do Insti-
car, segundo Sylvia, a difusão de uma ideologia tuto Mackenzie, em 1947, e da Faculdade de Ar-
do “progresso” em que uma das vertentes seria a quitetura e Urbanismo da Universidade de São
institucionalização da formação técnica (p.29). Paulo, em 1948 –, levará, por fim, à divisão da
As associações profissionais – criação do Ins- profissão. Nesse percurso, Sylvia analisa como os
tituto de Engenharia em 1916 – e os instrumen- escritórios particulares passam a se estruturar a
tos de difusão de idéias são outros pontos abor- partir da década de 1940 com vários profissio-
dados pela autora, especialmente no segundo nais que se organizam segundo uma divisão in-
período, que vai de 1916 a 1933. Fundamental terna de trabalho. Também crescem as possibili-
para entender a formação profissional é a relação dades de cargos no governo estadual e municipal
com o mercado de trabalho, o qual se incremen- com o aumento da demanda por obras públicas,
ta com a execução de obras públicas e a constru- incluindo uma desvinculação entre projeto e
ção de edifícios públicos em grande escala. Tudo construção.
isso se vincula à constituição e ao funcionamen- Em relação ao ensino, pontuam-se manifes-
to dos órgãos da administração estadual e muni- tações isoladas por um ensino independente de
cipal. Nesse ponto, a autora adverte sobre a difi- arquitetura, que culmina com a implantação de
culdade em entender esse funcionamento em duas faculdades no espaço de um ano. As duas fa-
razão das constantes reformas que os órgãos so- culdades de arquitetura tinham filosofias diferen-
friam podendo indicar mais uma falta de ação do tes de ensino: Anhaia Melo, muito influenciado
que o excesso de dinamismo. Também são anali- pela formação francesa, mais humanista e mais
sadas algumas obras particulares, com a apresen- culta, acaba implementando na FAUUSP – que não
tação de algumas propostas urbanísticas e arqui- é apenas uma faculdade de arquitetura, mas tam-
tetônicas para São Paulo. bém de urbanismo –, uma filosofia que resultou
As legislações que definem os rumos do en- na assimilação da prática urbanística americana e
sino superior também são objeto de investiga- na adoção da estética modernista para o ensino;
ção. Eventos como a criação do Ministério dos por sua vez, a formação americana de Christiano
Negócios da Educação e Saúde Pública, em Stockler das Neves, diretor da Faculdade de Ar-
1930, e do seu Conselho Nacional de Educação, quitetura Mackenzie, acabou representando a
em 1931, balizam, por exemplo, o limite tem- manutenção dos ideais do ensino beaux-arts fran-
poral do segundo período estudado por Sylvia, cês (p.254). E aqui Sylvia aponta para um novo

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capítulo na história do ensino institucional – o BRASIL URBANO


de arquitetura. Edesio Fernandes
A segunda parte de cada capítulo é dedicada Marcio M. Valença (org.)
ao ensino mais especificamente. A autora, para Rio de Janeiro: Mauad, 2004.
todo o período analisado, optou pela abordagem
do estudo dos regulamentos e da organização das William E. N. Pereira
cadeiras e aulas, dos respectivos docentes e dos UFRN
programas em currículos anuais dos cursos espe-
ciais de engenheiro-arquiteto e engenheiro civil, Brasil urbano se constitui em uma coletânea
o que permitiu distinguir quais as disciplinas es- de artigos de vários pesquisadores brasileiros e es-
pecificamente arquitetônicas, que a seu ver “defi- trangeiros. Os artigos foram, inicialmente, publi-
nem (...) o ensino de arquitetura preconizado pe- cados na revista inglesa GEOFORUM, no fim do
la Politécnica nos diferentes momentos” (p.43). ano de 2001. Posteriormente, foram traduzidos
Partindo da composição das disciplinas do curso para o português e publicados pela editora
fundamental, pré-requisito para as duas especiali- Mauad. Composto de onze capítulos, Brasil ur-
zações em análise, onde se estabelece um repertó- bano apresenta dois prefácios – um para a versão
rio de noções sobre as ciências exatas, a autora em inglês e outro para a brasileira –, escritos pe-
disserta sobre a composição das disciplinas e au- los organizadores da coletânea. O primeiro traz
las em cada ano do curso, buscando entender a uma breve apresentação dos debates mais recen-
formação dos arquitetos no período. tes e pertinentes sobre o processo de urbanização.
A terceira parte analisa os professores res- O segundo faz a apresentação dos artigos compo-
ponsáveis pelas disciplinas especificamente arqui- nentes da coletânea.
tetônicas, apresentando uma biografia comenta- O objetivo fundamental da coletânea é apre-
da de cada um deles e suas principais atuações sentar a urbanidade brasileira em sua grande di-
profissionais. Com a mesma metodologia, na versidade de aspectos. Com esse objetivo, os or-
quarta parte, Sylvia comenta a biografia dos di- ganizadores juntaram onze artigos em forma de
plomados e sua atuação profissional em São Pau- capítulos, de diversos e renomados pesquisado-
lo e em outros estados brasileiros, alguns com re- res, que analisam distintos aspectos da urbaniza-
conhecido destaque nacional. ção brasileira.
Após recorrer todo esse percurso que a auto- O primeiro capítulo do livro, de autoria de
ra apresenta, fica claro o caminho trilhado na Ana Cristina Fernandes e Rovena Negreiros, é in-
formação profissional do engenheiro-arquiteto titulado de “Desenvolvimento econômico, divi-
até a divisão tanto profissional como de ensino são de trabalho e mudanças na rede urbana bra-
que levam à formação específica do arquiteto. sileira: do desenvolvimentismo ao Plano Real”.
Apesar de sua leitura fácil e da sua forma didáti- Nesse artigo, as autoras procuram reunir e discu-
ca de apresentação dos conteúdos, ao final do li- tir as principais transformações existentes entre a
vro sentimos uma lacuna, a falta de uma amarra- divisão social do trabalho e as formas dominantes
ção entre os três capítulos, alguns comentários das atividades produtivas. Com esse intuito, as
finais, mas não há prejuízo para o entendimento pesquisadoras buscam, inicialmente, traçar um
global da obra. Por fim, podemos dizer que pela panorama do processo de urbanização do Brasil.
importância do seu conteúdo e pela lacuna que Posteriormente, apresentam a rede urbana brasi-
vem a preencher na historiografia, e também pe- leira como fruto da integração nacional ocorrida
la sua bela edição e a excelente qualidade da pu- nas últimas décadas. Em seguida, discutem a efi-
blicação, é um livro que não pode faltar na bi- ciência econômica e a fragmentação espacial nos
blioteca daqueles que se interessam pelo ensino anos 1990 no Brasil, ressaltando, especialmente,
da arquitetura e pela formação profissional do os efeitos das políticas neoliberais sobre o comér-
arquiteto. cio exterior, a indústria e o emprego. Por fim, dis-

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