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Carta de Judas

- Introdução

- Praticamente todo o texto da carta de Judas foi utilizado pela Segunda


Carta de Pedro. Dos 25 versículos que compõem esta carta apenas 6 ficam sem
paralelismo com 2Pedro. No entanto, trata-se de duas obras diversas. O autor de
Judas se limita a apresentar uma situação difícil, criada pela intromissão de uns
poucos rebeldes na comunidade e centraliza sua carta numa clara e decidida
denúncia dos erros deles. Um dos problemas é o comportamento licensioso.

- Embora certamente demonstre preocupação com alguma falsa doutrina, este


breve escrito não nos oferece dados suficientes para determinar que tipo de
heresia o autor tinha em vista. O autor desmascara alguns, que ensinam
erroneamente a doutrina tradicional da Igreja e põe em perigo a fé da
comunidade. Eles criam divisões entre os fieis, agem como Caim e Coré, são
como animais irracionais e árvores que no fim do outono ainda estão sem fruto,
sem raízes e mortas.
- Há muito tempo eles foram marcados pelo julgamento e serão punidos como os
israelitas rebeldes no deserto, como os anjos culpados e como os habitantes de
Sodoma e Gomorra. Judas os questiona pela sua imoralidade. Procedem de
acordo com suas conscupiscências, maus desejos etc. Disseminam sua falsa
doutrina para ganhar dinheiro e cortejam o favor dos poderosos. Justificam sua
conduta apelando para a graça que Deus lhes deu. Esses falsos mestres revelam
certa semehança com os nicolaitas denunciados por João (Ap 2,6-14s; 20-26).

- Embora seja verdade que a finalidade das cartas de Judas e 2Pedro sejam
idênticas na denúncia de falsos mestres, no entanto, existem entre elas grandes
diferenças. Enquanto que 2Pedro se constitui também como um testamento
espiritual atribuído ao apóstolo Pedro, por sua vez, Judas é um escrito mais direto
que não se preocupa tanto em desenvolver os argumentos doutrinais como em
2Pedro. O tema do conhecimento de Jesus e a demora na parusia também
não aparecem aqui.

- A carta de Judas se limita a expor um problema e afrontá-lo com uma


argumentação que tem como ponto de referência a atuação de pessoas
impiedosas e a pouca coerência dos seus argumentos.

1- Autor, data e destinatários

- A carta deve ser situada perto da Carta da Tiago, como mostra o título: irmão
de Tiago (Tiago Menor: Mc 6,3). Na lista dos apóstolos segundo Lucas (Lc 6,16;
At 1,13), “Judas de Tiago” aparece no lugar onde os outros evangelistas trazem o
nome de Tadeu (Mc 3,18), daí o chamado Judas Tadeu (Jo 14,11).
- O autor da epístola se apresenta como “Judas, servo de Jesus Cristo, irmão de
Tiago” (v.1). A identificação mais natural é com o Judas nomeado juntamente
com Tiago em Mc 6,3 e Mt 13,55 como irmão do Senhor. O autor de Judas (v.1)
não se intitula apóstolo e no v.17 parece distinguir-se dos apóstolos de Jesus.

- A carta está escrita em bom grego, embora não lhe faltem semitismos. O
versículo 17 dá a impressão de que a primeira geração de cristãos já passou e o
versículo 3 vê a fé cristã como um depósito tradicional e inalterável.
Considerando isso, muitos biblistas dizem que a carta é pseudônima e foi escrita
entre 80-90, ou, um pouco mais tarde pelo ano 100.
- O autor é alguém que conhece a cultura helenística, a retórica e as invectivas
helenistas como aquelas dos livros apócrifos judaicos. Sobre o lugar da redação e
os destinatários, não há nenhuma informação que possa esclarecer esses pontos.
2- Apócrifos do AT em Judas

- A carta cita diversos escritos antigos que não foram aceitos no cânon cristão:
Henoc (sec. II a.C; v.14-15); Testamento dos doze patriarcas (v.6-7) e Assunção
de Moisés (sec. I a.C. v.9). O uso destes escritos talvez indique o alcance da
discussão teológica nessa Igreja, quando o grupo examina minunciosamente os
pontos principais da fé que fora transmitida à comunidade e o fundamento desta
fé.

- O uso desses escritos incomuns e também de outros textos do AT e das


tradições judaicas populares talvez indique o senso que o autor tinha da verdade
da fé cristã, apoiada por fontes tão diversas e respeitadas. Se reconhece, em geral,
que 2Pedro recorreu a Judas e reelaborou esse material para ajustá-lo à sua
intenção.
3- Situação da Igreja na epístola de Judas

- A Igreja destinatária da carta está transtornada por ensinamentos incompatíveis,


é feito um apelo ao aprofundamento da fé que foi definitivamente transmitida
pelos apóstolos de Jesus e que de algum modo sofre ataques de membros
dissidentes da Igreja. É extremamente difícil descrever a natureza do desacordo
doutrinário, pois não há indícios seguros, somente o registro de alusões e
suspeitas.

- O silêncio sobre os ímpios é típico da literatura anti-herética, onde o autor evita


fazer mais publicidade gratuita aos erros que ataca. As acusações de libertinagem
moral não são bem descrições nas posições reais dos ímpios, mas, a interpretação
que o autor faz do caminho a que os erros deles levarão.

4- Teologia e Mensagem
- Para sua argumentação o autor usa referências do AT (v.9: Zc 3,2), livros
apócrifos (Henoc: v.6.12-16; Testamento dos doze patriarcas: v.6-7; Assunção
de Moisés: v.9) e os ensinamentos dos apóstolos (v.17-18).

- A carta chama os adversários de ímpios e intrusos. A exortação mais direta é


afatar-se deles, procurando com isto que ningúem se perca. Surpreendente é a
atuação destes ímpios: são libertinos, interesseiros e ambiociosos. A atuação
deles é comparada a dos habitantes de Sodoma e Gomorra citado no Gênesis.

- Os adjetivos dirigidos contra os ímpios deixa a impressão de uma oposição


frontal entre o autor e os intrusos. O ponto fundamental da réplica está em
recordar os aspectos fundamentais da fé tradicional: Deus é Pai, é um Deus
único, aquele que nos chama e salva, aquele que nos dá a graça, aquele que nos
dá o Espírito. Jesus Cristo é Senhor e soberano.

- Deus conduz a história, castiga o pecado e a perversão dos anjos e dos homens.
É ele quem vai julgar a todos e conduzir os ímpios, entre eles estão
evidentemente os ímpios. A estes é preciso salvá-los, tirá-los da condenação,
mas, sem ambiguidades, isto é, sem ter com eles uma atitude de conivência.

- Há referências a textos do AT sem citá-los (Zc 3,2 no v.9). Para as exortações


se recorre a temas conhecidos: a edificação da comunidade sobre a base da fé, a
oração movida pelo Espírito, a necessidade de manter-se no amor de Deus e a
espera da misericórdia de Jesus Cristo.

- A acusação mais grave é a de negar o Senhor e a sua Soberania. A importância


da Carta de Judas é o conhecimento da luta da Igreja para reconhecer suas raízes,
tradições e fé, mas não de maneira defensiva. As diferenças de opinião dentro
dessa Igreja remontam a seu início e, ao dirigir-se a novos povos com culturas
diferentes, desafia a Igreja desde o tempo dos apóstolos.

- A comunidade para a qual se dirige Judas é uma Igreja com tradição, mas que
navega por um mar pluralista de muitas opiniões. A importância da carta está na
imagem de uma Igreja que tenta recuperar as raízes de sua fé e, ao mesmo tempo,
falar com sentido para uma cultura diferente que a circunda.
- A doutrina da carta não propõe mais do que matizes sem nenhuma especial
originalidade em relação ao anúncio tradiccional do NT. O documento é direto,
vivo e interpelador.

- Em suma, podemos resumir com os seguintes temas:


a- Deus é Pai (Jd 1), Deus é único (Jd 25), aquele que nos chama e salva ( Jd
1.25)
b- Jesus Cristo é o Senhor (Jd 17.21.25) e Soberano (Jd 4.8).
c- Deus conduz a história (Jd 5).
d- Deus castiga o pecado, a perversão dos anjos (Jd 6) e dos homens (Jd 5.7)
e- Deus vai julgar a todos e condenar os ímpios (Jd 15.18).
f- A oração movida pelo Espírito (Jd 20) vai conservar-se no amor de Deus
(Jd 21).
g- A comunidade é edificada com a base da fé (Jd 20) e a espera da
misericórdia de Jesus Cristo (Jd 21).

- Estrutura Literária (uma proposta)


v.1-2. Saudação: cabeçalho de tipo epistolar
v.3-4. Motivo e finalidade da carta: combater os “intrusos”
v.5-19. Argumentos e invectivas contra os intrusos
v.5-7. Descrição dos três castigos do AT
v.8-16. Os ímpios merecem os mesmos castigos
v.17-23. Exortações à comunidade
v.24-25. Doxologia final

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